DESTAQUES DESTA EDIÇÃO: DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA: AUSÊNCIA DE ADVOGADO GERA NULIDADE MANTER CASA DE PROSTITUIÇÃO: ISSO É CRIME? E OS MOTÉIS? ABORTO ANENCEFÁLICO: NÃO É CRIME
PRESIDENTE PELUSO : EQUIVOCADAMENTE NEGA FORÇA DA DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA CRIMES DA DITADURA: GLORIFICAÇÃO, VERGONHA, RETALIAÇÃO…
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Depoimento de testemunha: ausência de advogado gera nulidade
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lidade ocorre se não há prejuízo para a acusação ou a defesa. Não será declarada a nulidade de nenhum ato processual, quando este não haja influído concretamente na decisão da causa ou na apuração da verdade substancial. Somente em casos excepcionais é declara insanável a nulidade. (Grifamos) (...)
Para a Sexta Turma do STJ não é possível proceder a tomada de depoimentos das testemunhas de acusação Por esta razão é que se encontra justificada a decisão quando ausentes representantes da defesa. A posição do Tribunal da Cidadania, já que o prejuízo é evidente foi tomada no julgamento do HC 102.226, no qual à parte que não pode efetivar seu direito constituciohavia pedido da defesa para anulação da sentença que nal ao contraditório. foi fundamentada exatamente nas alegações daquelas testemunhas de acusação. O pedido foi aceito pelo Min. Og Fernandes, relator do writ, de acordo com quem “a nulidade já ocorreria com a simples ausência dos defensores, mas no caso a ilegalidade é ainda mais grave, já que os depoimentos tomados foram usados pelo juiz para firmar sua convicção sobre os fatos e condenar o réu” (STJ - http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine. wsp?tmp.area=398&tmp.texto=100724). As nulidades no direito processual penal regem-se em linhas gerais pelo princípio do prejuízo, ou seja, apenas declara-se a nulidade de determinado ato se dele realmente adveio prejuízo concreto. Esta é a orientação legal, prevista no artigo 563 do Código de Processo Penal, e também a justificação que se extrai da exposição de motivos do mesmo Código: Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. (...) As nulidades XVII – Como já dito de início, o projeto é infenso ao excessivo rigorismo formal, que dá ensejo, atualmente, à infindável série das nulidades processuais. Segundo a justa advertência de ilustre processualista italiano, “um bom direito processual penal deve limitar as sanções de nulidade àquele estrito mínimo que não pode ser abstraído sem lesar legítimos e graves interesses do Estado e dos cidadãos”. O projeto não deixa respiradouro para o frívolo curialismo, que se compraz em espiolhar nulidades. É consagrado o princípio geral de que nenhuma nu-
Lei Maria da Penha: constitucionalidade
Recente notícia do Conjur (http://www.conjur.com. br/2011-fev-08/juizes-lei-maria-penha-feminista-viola-principio-igualdade) informa o fato de que alguns juízes de primeira instância não têm aplicado a Lei Maria da Penha por entenderem que ela é inconstitucional. Dois foram os casos relatados. O primeiro deles origina-se do Rio Grande do Sul. O juiz titular da 2ª Vara Criminal de Erechim, Marcelo Colombelli Mezzomo, nunca teria aplicado os institutos da Lei Maria da Penha sob o argumento de que “equívoco dessa lei foi pressupor uma condição de inferioridade da mulher, que não é a realidade da região Sul do Brasil, nem de todos os casos, seja onde for”, e que “perpetuar esse tipo de perspectiva é fomentar uma visão preconceituosa, que desconhece que as mulheres hoje são chefes de muitos lares e metade da força de trabalho do país”. Em Sete Lagoas (MG), o juiz titular da 1ª Vara Criminal de Sete Lagoas (MG), Edílson Rumbelsperger Rodrigues, também considerava a Lei 11.340/06 inconstitucional, mas suas decisões foram integralmente reformadas pelo TJ e o caso também foi julgado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que decidiu condená-lo à disponibilidade provisória por dois anos. Além de incorreto do ponto de vista jurídico, o comportamento do magistrado mineiro é lamentável, pela forma como ele se posiciona perante a lei. Com informações do Conjur:
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lógico. Hoje, ele é admitido para atender as peculiariO juiz declarou que a Lei Maria da Penha tem “re- dades do caso e em decisão motivada. Veja-se, assim, gras diabólicas” e que as “desgraças humanas come- que não há mais a obrigatoriedade da sua realização, çaram por causa da mulher”, além de outras frases mas poderá ser realizado quando necessário. igualmente polêmicas. Na ocasião da abertura do processo, declarou à imprensa que combate o feminismo Em recente julgado (HC 106477/RS – info. 604), a exagerado, como está previsto em parte da lei. Para Primeira Turma do STF firmou posicionamento no ele, esta legislação tentou “compensar um passivo fe- sentido de que, embora não seja obrigatório, uma vez minino histórico, com algumas disposições de caráter realizado o exame ele deve ser levado em consideravingativo”. ção. Incorreto do ponto de vista jurídico, porque a Lei Maria da Penha é instrumento de máxima importância no que tange às ações afirmativas (que nas lições de Gilmar Mendes são aquelas nas quais se busca, por meio de um tratamento juridicamente desigual, a igualação fática, com a promoção de grupos ou setores historicamente desfavorecidos STA - 233 / RS - RIO GRANDE DO SUL - http://www.stf.jus.br/portal/ cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=106882).
No mencionado writ, o paciente pretendia progredir de regime, mas o tribunal de origem negou o pedido, fundamentando a decisão em laudo de exame criminológico que atestava a necessidade de tratamento para o sentenciado que cumpria pena pelo crime de tráfico de drogas, mas que ainda se comportava como usuário.
A progressão de regime é a passagem do regime de cumprimento mais severo para o mais ameno. Pela A Lei Maria da Penha, longe de apresentar incons- Lei das Execuções Penais: Art. 112. A pena privatititucionalidade por afrontar o princípio da igualdade va de liberdade será executada em forma progressiva de tratamento, é sim uma forma de combater violação com a transferência para regime menos rigoroso, a ser dos direitos humanos, de acordo com o que preconiza determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprio artigo 6º da Lei 11.340/06. do ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado É ainda lamentável o comportamento do juiz porque pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as nornão se espera de uma pessoa, que representa o Judici- mas que vedam a progressão. (grifou-se). ário em determinada sociedade, a postura discriminatória por ele adotada. Como já frisado, embora hoje não mais exija a realização do exame criminológico para a progressão A todos os que praticam violência contra as mulheres de regimes, ainda continua existir na letra fria da lei faria bem a leitura de Gandhi (Reflexiones sobre la o critério subjetivo, qual seja, o bom comportamento no violencia), que afirmava: “Na nossa condição atual carcerário. O que não impede a verificação de outros – tal como nos ensina a doutrina hindu – não somos critérios subjetivos. mais que metade seres humanos. A parte inferior do nosso ser ainda é animal. Somente o domínio dos nos- Sendo assim, nas lições do Min. Dias Toffoli, relator sos instintos mediante o Amor pode sujeitar a besta do writ: que existe dentro de nós”. A jurisprudência desta Suprema Corte, preconizada no sentido de que “o exame criminológico, embora facultativo, deve ser feito por decisão devidamente Súmula 439 do STJ fundamentada, com a indicação dos motivos pelos quais, considerando-se as circunstâncias do caso cone exame criminológico creto, ele seria necessário”.
facultativo
Desde a edição da Súmula 439 do STJ, tem-se pacificado o assunto sobre a realização do exame crimino-
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Idade para ingresso nas Forças Armadas: depende de lei
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Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que veO STF acaba de concluir pela necessidade de que nha a ser fixado. o Congresso Nacional aprove lei para regulamentar idade para ingresso na carreira militar. A decisão foi Também houve modulação para assegurar o acesso à tomada no julgamento do RE 600.885 e a relatora foi carreira militar para todos os candidatos que tiverem a Ministra Cármen Lúcia. ingressado na Justiça contra o estabelecimento de limite de idade, tendo cumprido as demais exigências Um dos fundamentos do julgado foi o reconhecimen- do respectivo concurso. to da não recepção da norma prevista no artigo 10 do Estatuto dos Militares, que assim dispõe: O Min. Dias Toffolli lembrou que já está em trâmite no Congresso Nacional projeto de lei que deve reguArt. 10. O ingresso nas Forças Armadas é facultado, lamentar a matéria, cuja aprovação deve se dar até o mediante incorporação, matrícula ou nomeação, a to- fim deste ano. dos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei e nos regulamentos da Marinha, do Manter casa de prostituição: Exército e da Aeronáutica. A razão do entendimento está em norma constitucional (e, portanto, posterior ao Estatuto que é de 1980), no sentido de que: a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra (art. 142, §3º, X, CF/88). Note-se que a Constituição exige lei para regulamentar a matéria, logo, ela não pode ser tratada por regulamentos da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica. No mesmo julgado, o Supremo também decidiu modular seus efeitos para validar, até 31 de dezembro deste ano, todas as admissões ocorridas em função de regulamentos e editais que, até agora, vinham estabelecendo as condições para ingresso nas diversas carreiras militares, entre elas o limite de idade.
isso é crime? E os motéis? Para a Primeira Turma do STF não há que se falar em adequação social do fato de manter casa de prostituição. A posição foi fixada por ocasião do julgamento do HC 104.467. A questão foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal porque nas instâncias inferiores não houve consenso sobre se o princípio da adequação social faria excluir a tipicidade material do fato de manter casa de prostituição, crime previsto no artigo 229, CP (Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente).
Em primeira instância, a 1ª Vara Criminal da Comarca de Tramandaí/RS absolveu os acusados ao fundamento de que casa de prostituição é conduta que vem sendo descriminalizada pela jurisprudência em A modulação de efeitos é pratica adotada pelo Su- razão da liberação dos costumes, sendo a conduta premo cujo fundamento legal se encontra na Lei atípica. O recurso ministerial também não foi aco9.868/99, que dispõe sobre o processo e julgamento lhido pelo TJRS, com o mesmo fundamento: APEda ação direta de inconstitucionalidade perante o STF. LAÇÃO CRIMINAL. MANUTENÇÃO DE CASA Mencionada lei, no artigo 27, preconiza que: DE PROSTITUIÇÃO. ADEQUAÇÃO SOCIAL DO FATO. ATIPICIDADE. APELO [NÃO] PROVIDO. Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ABSOLVIÇÃO MANTIDA. ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o No Tribunal da Cidadania, no entanto, a posição ado-
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tada pelo Ministro Haroldo Rodrigues foi no mesmo sentido do Supremo: Esta Corte firmou compreensão A Ministra Cármen Lúcia (com informações do de que a tolerância pela sociedade ou o desuso não Conjur - http://www.conjur.com.br/2011-fev-09/ geram a atipicidade da conduta relativa à prática do comerciantes-exploravam-casa-prostituicao-nao-hc) crime do artigo 229 do Código Penal. sublinhou que a moralidade sexual e os bons costumes são valores de elevada importância. Na verdade, Por unanimidade, a tese da Ministra Cármen Lúcia, cada um tem direito de fazer da sua moralidade sexual que relatou o writ, foi acolhida. Para ela, há prece- o que bem entender. Vivemos um Estado laico e sedentes específicos do Supremo Tribunal Federal que cularizado. O Estado não tem que ficar ditando regras reconhecem a tipicidade da conduta de manter casa para as pessoas adultas, dentro do seu mundo privado. Cada um faz sexo como quiser, desde que livremente de prostituição. e sem ofensa à dignidade. Sem saber detalhes, fica difícil saber se houve ou não exploração sexual. De A teoria da adequação social, de Hans Welzel, preco- qualquer modo, é importante sublinhar que essa hoje niza o raciocínio de acordo com o qual é possível que, é a base de distinção do crime de casa de prostituição. ainda que a conduta se adeque ao tipo (formalmente), É por isso que não devemos punir os donos de moela seja considerada atípica quando socialmente ade- téis (enquanto não haja, dentro deles, exploração de quada, ou seja, se a prática que num primeiro momen- pessoas). O mundo da sexualidade é muito deslizanto é típica, mas está de acordo com a ordem social, te. Nesta área, confundir direito e moral é muito fáela é em verdade materialmente atípica porque não há cil. Esperamos que não tenha incorrido neste gelático lesividade ao bem jurídico protegido. deslize a preclara Ministra Cármen Lúcia. Hoje a teoria da adequação social de Welzel deve ser enfocada sob a perspectiva (dogmática) da teoria Aborto anencefálico: da tipicidade material, que está ancorada, sobretudo, na teoria da imputação objetiva de Roxin. O que é não é crime socialmente aceito (amplamente aceito) não geraria risco proibido. Pela teoria do risco proibido o fato amplamente aceito ficaria fora do âmbito material da Uma vez mais a Justiça se posicionou favoravelmentipicidade. te ao pedido de um aborto anencefálico. Desta vez, foi o Tribunal de Justiça de São Paulo que acolheu o Há fatos socialmente aceitos que não geram conflitos pedido da Defensoria Pública local para permitir que (mãe que perfura a orelha da filha, por exemplo). Não um casal tivesse o direito de fazer cessar a gravidez há aqui qualquer tipo de conflitividade. O mesmo não de um feto anencéfalo. A mulher já estava no seu sexocorre, no entanto, no fato de manutenção de casa de to mês de gestação.
prostituição, onde haja exploração. O novo tipo penal do art. 229 do CP é explícito: só existe o crime de casa Para os defensores Júlio Cesar Tanone e Rafael Bessa de prostituição onde houver exploração (abuso, vio- Yamamura: “não faz sentido algum, sob a ótica jurílência, subjugação etc.). Isso não está claro na ementa dica ou mesmo médica, prolongar uma gestação em do acórdão. que inexiste a possibilidade de sobrevida do feto”. Havia avaliação médica sobre os riscos físicos e psiSe, no caso julgado, não houve abuso, violência, cológicos que a gestante sofria com a gestação, o que imposição, ou seja, exploração, não há que se falar motivou a concessão da liminar pelo TJSP (com inem crime (porque a atividade sexual, por si só, não formações da Folha Uol é crime). Pessoas adultas têm direito de fazer o que http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/870734bem entendem com seu corpo (desde que façam livre- justica-permite-aborto-de-feto-anencefalo-em-sp. mente). Claro que isso pode ser censurado moralmen- shtml). te. Mas moral é moral, Direito é Direito. O que o CP reprime, na atualidade, é a exploração sexual, porque Como sabemos, pela letra fria da lei, a prática do ninguém é obrigado a participar de ato sexual sem sua aborto anencefálico constitui (melhor, constituiria) vontade (livre). delito. Literalmente haveria crime, já que para o Có-
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digo Penal não são punidos apenas os abortos praticados quando não há outro meio de salvar a vida da gestante ou se a gravidez resulta de estupro. Mas, para nós, adeptos da teoria constitucionalista do delito, o fato encontra resposta jurídica e social para deixar de ser considerado materialmente típico ou proibido. Para esta teoria (constitucionalista do delito) não há crime se o fato não é formal e materialmente típico. Explicamos. Crime é fato típico, antijurídico e, para alguns, culpável. No estudo do fato típico inclui-se a conduta, o resultado o nexo de causalidade e a adequação típica. Para nós, constitucionalistas, para que se possa falar em completa união destes elementos que compõem o fato formal e materialmente típico, o resultado que advém da conduta há de preencher alguns requisitos: que seja concreto, transcendental, relevante, intolerável, objetivamente imputável ao risco criado e que esteja no âmbito de proteção da norma. Pois bem. Compare-se a uma cadeia da qual retirado qualquer elemento não se tem o resultado final. Para que, tecnicamente, haja crime é preciso atentar para a cadeia acima relatada. No caso da conduta que faz cessar a gestação de um feto anencefálico há verdadeiramente um fato típico? Entendemos que não. Há uma conduta, desta conduta há um resultado previsto pelo ordenamento em norma proibitiva (abortamento – arts. 124 e 126, CP), mas este resultado é desvalioso? Não. Porque não intolerável. Porque a morte, no aborto anencefálico, não é arbitrária (art. 4º da CADH). Logo, não há fato típico e consequentemente não há crime. Ninguém pode ser privado da sua vida arbitrariamente (como diz o art. 4º da Convenção Americana de Direitos Humanos). Constatada a anencefalia e a impossibilidade de vida independente, não há que se falar em arbitrariedade. Mais, a antecipação do abortamento, nesse caso, nos parece bastante razoável e até mesmo permitida pela ordem constitucional visto que a Constituição Federal de 1988, mais do que garantir a vida, quer garantir a todos uma vida digna, por meio do princípio da dignidade da pessoa humana. *LFG – Jurista e cientista criminal. Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito penal pela USP. Presidente da Rede LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a
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2001). Acompanhe meu Blog. Siga-me no Twitter. Encontre-me no Facebook. **Áurea Maria Ferraz de Sousa – Advogada pós graduada em Direito constitucional e em Direito penal e processual penal. Pesquisadora.
Crimes da ditadura: glorificação, vergonha, retaliação… Sobre os crimes da ditadura o general José Elito, chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), escolhido pela presidente Dilma, segundo a imprensa teria dito: “Não temos que nos envergonhar ou nos vangloriar dos desaparecimentos”. O ministro da Defesa censurou: “Foi um equívoco”. Acrescentou: “Nenhuma glorificação, nenhuma retaliação” (Folha de S. Paulo de 09.01.11, p. A8). Juridicamente a CIDH decidiu (novembro de 2010), no caso Araguaia, que os crimes cometidos pelos agentes do Estado, durante a ditadura brasileira (1964-1985), são crimes contra a humanidade. Logo, imprescritíveis e não anistiáveis. A Corte anulou a eficácia da Lei de Anistia brasileira, que tinha sido convalidada pelo STF. O Brasil é obrigado a cumprir a decisão da Corte. O Ministério das Relações Exteriores já afirmou que vai cumprir a decisão. Não quer ter nem criar problemas internacionais. O sonho do Brasil é ter uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU. Esse seu sonho perderia força se não cumprisse as determinações internacionais. O sistema jurídico brasileiro foi totalmente modificado, depois que o Brasil subscreveu vários tratados internacionais. A Justiça internacional está acima da jurisdição brasileira, em matéria de direitos humanos. Esse é o sistema do “international concern”. Foi abandonado o “domestic affair”. O ministro Jobim, data vênia, está equivocado quando diz que a sentença da CIDH não tem valor jurídico. Também se equivocou (data vênia) quando afirmou que a Corte não podia examinar crimes anteriores a 1998. Crimes de desaparecimento de pessoas são permanentes. Podem ser examinados em qualquer tempo. Também não tem razão (data vênia) ao dizer que a CIDH não tem jurisdição sobre o STF. Em matéria de
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direitos humanos ela tem. E suas decisões são obrigatórias (não puramente morais ou políticas). O sistema interamericano de direitos humanos está acima da jurisdição brasileira. A Corte determinou a investigação de todos os crimes contra a humanidade cometidos pelos agentes do Estado. O Brasil tem que cumprir essa decisão. A lei de anistia não é obstáculo porque esses crimes não são anistiáveis. São, ademais, imprescritíveis. As declarações do ministro Jobim, em país mais civilizado, gerariam um transtorno internacional incomensurável. Imagine um ministro europeu dizendo que seu país não vai cumprir uma decisão da Corte Europeia de Direitos Humanos. Esse ministro seria internado. No Brasil, democracia nova, sabe como é!
A desigualdade gera delitos
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violentos), para o uso de drogas, aumento dos homicídios, incremento excessivo de policiais, de prisões etc. No período de um ano (de acordo com Pnad/2009, do IBGE, divulgado em 15.12.10), 20,6 milhões de pessoas foram vítimas de furto e roubo (consumado e tentado). Isso significa a vitimização de 12,7% do total de 162,8 milhões de pessoas pesquisadas. No que diz respeito aos furtos e roubos tentados, o índice de 1988 triplicou em 2009 (de 1,6% pulou para 5,4%). A desigualdade afeta a psique humana, criando ansiedades, desconfiança e uma série de enfermidades físicas e mentais. Os seres humanos são animais sociais que sofrem muito com as desigualdades excessivamente gigantes, geradoras de uma série de sentimentos nefastos: de injustiça, de exclusão, de marginalização, de incapacidade etc.
A conclusão óbvia a que podemos chegar é a de que as desigualdades, os preconceitos e as discriminações O já famoso livro The Spirit Level: Why Greater não fazem mal somente para os brasileiros, senão Equality Makes Societies Stronger – “O nível espiri- também para o país. Como disse Dominique Strausstual: porque uma maior igualdade torna as sociedades Kahn, diretor-presidente do Fundo Monetário Intermais fortes”, de autoria de dois epidemiologistas bri- nacional (FMI): “Quanto mais desigual o país, piores tânicos, Richard Wilkinson e Kate Picket (comenta- são seus indicadores sociais, mais ruinosos seus indo por Nicholas D. Kristof, no jornal O Estado de S. dicadores de desenvolvimento humano e mais altas Paulo de 04.01.11, p. A12), pretende comprovar que a suas taxas de insegurança econômica e ansiedade” desigualdade afeta o espírito humano, ou seja, a alma, (Veja de 26.01.11, p. 72). A esse rol de consequências gerando uma série interminável de malefícios (econô- indesejadas podemos ainda acrescentar: mais insegumicos, físicos, mentais, emocionais etc.). rança, mais medo, mais crimes, mais prisões etc. Essa desigualdade (social e econômica), embora seja muito forte no nosso país, não é um fenômeno só nosso. É mundial. Estudo da ONU de 1992 sobre a distribuição da renda entre a população mundial revelou que os 20% mais ricos detinham 82,7% da riqueza mundial. Os 40% mais pobres tinham 3,3% da riqueza planetária. Outro estudo da ONU, de 2006, mostra o agravamento da desigualdade: 11% dos mais ricos detêm 85% da riqueza; 50% dos mais pobres contam com apenas 1%. Os mais ricos estão ficando mais ricos, enquanto os mais pobres se empobrecem cada vez mais (Veja de 26.01.11, p. 73). A desigualdade intensa (social e econômica), tal como a vivida por nós brasileiros, desde que percebida como fonte de injustiça, contribui para o desencadeamento de alguns tipos de crimes (sobretudo os
Está ficando cada vez mais evidente que não basta só haver crescimento econômico para a prosperidade (bem-estar e felicidade) da população. Diante da quantidade exorbitante de delitos cometidos pelas classes sociais desfavorecidas (volume, aliás, muito provavelmente não menor que o aumento dos delitos cometidos pelas classes dominantes: corrupção, evasão de divisas, sonegação fiscal etc.), é chegado o momento de questionarmos seriamente o modelo de sociedade (escravagista) e de Estado (discriminador) que foram adotados no Brasil (desde o tempo colonial e imperial).
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Quando o STF validou a lei de anistia brasileira, somente dois foram os (lúcidos) votos vencidos: Ricardo Lewandowski e Ayres Britto. Foram os dois únicos Brasil deve cumprir a compreender (na ocasião) a atual dimensão da prodecisão da Corte teção dos direitos humanos, que não é mais só doméstica. Em matéria de direitos humanos a última palavra Logo depois de publicada a decisão da Corte Intera- é da Corte Interamericana de Direitos Humanos. mericana de Direitos Humanos que condenou o Brasil no caso Araguaia, várias foram as reações que subli- Do sistema do “domestic affair” (a tutela dos nosnharam a sua não obrigatoriedade no direito interno. sos direitos compete exclusivamente aos juízes naManifestaram nesse sentido o min. Peluso (Presidente cionais) passamos para o sistema do “international do STF), o min. Marco Aurélio, o ex-ministro Jobim concern” (se os juízes nacionais não tutelam um e, neste jornal (O Estado de S. Paulo de 03.01.11, p. determinado direito, isso pode ser feito pelos juízes A2), Paulo Sotero. Argumentam que o STF validou a internacionais). Os juízes internos fiscalizam o prolei de anistia em abril de 2010. Que a sua vontade é duto legislativo do Congresso Nacional. Se eles não que manda. amparam os direitos das pessoas, compete aos juízes internacionais cumprir esse papel. Isso foi feito pela É preciso compreender que na era do direito globa- CIDH no caso Araguaia. lizado e universalizado (ou seja, do direito pós-moderno) as decisões do STF, em matéria de direitos hu- O “acerto de contas” relacionado com os crimes comanos, já não significam a última palavra. Acima do metidos pelos agentes do Estado durante o período da Judiciário brasileiro está o sistema interamericano de ditadura militar finalmente tornou-se possível. O STF, direitos humanos, que é composto de dois órgãos: Co- majoritária e autoritariamente, tinha fechado as pormissão e Corte Interamericanas de Direitos Humanos. tas para a chamada Justiça de Transição (ou Justiça A primeira está sediada em Washington, enquanto a do “acerto de contas”). Mas suas decisões já não são segunda está na Costa Rica. Na Europa a situação é absolutas (quando há flagrante violação dos direitos idêntica: acima do Judiciário dos países europeus está humanos das vítimas). o sistema europeu de direitos humanos (em especial, a Corte Europeia de Direitos Humanos). Falar de violação de direitos humanos das vítimas (ou de seus familiares) num país tradicionalmente autoriQuando os direitos previstos na Convenção Ameri- tário e antidemocrático parece assunto fora de moda. cana sobre Direitos Humanos de 1969 (conhecida por Mas não nos resta outra alternativa se queremos dePacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Bra- nunciar uma vez mais essa tradicional simbiose entre sil em 1992 sem qualquer reserva) não são amparados o autoritarismo (militar ou não militar) e amplos sepela Justiça brasileira, há a possibilidade de recorrer tores do Poder Judiciário. O Tribunal de Segurança à Comissão Interamericana, que passa a ser uma es- Nacional, criado em 1937, durante o Estado Novo, pécie de “5ª instância” jurídica para nós brasileiros. que aceitava a presunção de culpabilidade do agente, salvo prova em sentido contrário, constitui expressão Todas as violações de direitos humanos não ampa- exuberante dessa conivência institucional. radas pelo Judiciário brasileiro podem (e devem) ser levadas ao conhecimento da citada Comissão, que re- Doravante terá o Brasil que eliminar todos os obssolve o assunto (tal como fez no caso Maria da Penha) táculos jurídicos (como a lei de anistia) que durante ou o encaminha para a Corte Interamericana (assim anos impediram as vítimas do acesso à informação, à foi feito no Caso Araguaia). verdade e à Justiça. Não se pode subtrair de nenhum
povo o direito à memória e à justiça. Essa é a princiSob o aspecto jurídico a decisão da Corte Interame- pal lição da decisão da Corte Interamericana de Diricana demonstra que as manifestações do STF já não reitos Humanos, que deve ser vista como um legado são definitivas, quando em jogo está um direito pre- humanista para a presente e futuras gerações. O mal não pode deixar de ser denunciado e investigado. visto na Convenção Americana.
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O Brasil sequer pode cogitar da possibilidade de não cumprir as decisões da CIDH. O não cumprimento pelo Estado brasileiro da sentença da Corte Interamericana acarreta nova responsabilidade internacional ao país, a ensejar nova ação internacional na mesma Corte e nova condenação, e assim por diante.
não é mais o dono da “última palavra” em matéria de direitos humanos no Brasil. E terá também (como fizeram a Argentina e o Chile) que cumprir de imediato as decisões dos tribunais internacionais enquanto deles o Brasil for parte.
A posição do Ministro Nelson Jobim no sentido de que o Brasil poderia deixar de cumprir as decisões da CIDH é totalmente equivocada. Nem o Brasil (a República brasileira) nem qualquer dos seus Poderes (o Legislativo, o Executivo ou o Judiciário) podem descumprir as sentenças da Corte Interamericana.
Presidente Peluso equivocadamente nega força da decisão da Corte Interamericana
O Executivo, em todos os casos que o Brasil foi condenado, cumpriu sponte sua sentença, pagando imediatamente a indenização às vítimas (v.g., isso ocorreu no Caso Ximenes Lopes, em que o governo Lula pagou espontaneamente a indenização às vítimas arbitrada pela Corte). Agora é a vez do Judiciário, que deve reabrir a discussão e rever o seu posicionamento anterior que “validou” a lei brasileira de anistia, sob pena de criar um enorme problema internacional para o Brasil.
No dia 24.11.10 a Corte Interamericana de Direitos Humanos (com sede em Costa Rica) impôs nova condenação ao Brasil (Caso Araguaia) e fez várias referências à decisão do STF que validou a lei de anistia editada (em 1979) para acobertar os crimes da ditadura.
Afirmações como a do Ministro Jobim, de que o Judiciário brasileiro não tem o dever de cumprir as sentenças da Corte Interamericana, demonstram total desconhecimento da sistemática de participação do Estado nos sistemas regionais de direitos humanos. Seria o mesmo que afirmar que os tribunais europeus estariam isentos de cumprir as determinações da Corte Europeia de Direitos Humanos (no contexto do Conselho da Europa) ou do Tribunal de Justiça da União Europeia (no contexto da União Europeia). Isso, nos países democraticamente mais civilizados, é impensável! É claro que esses tribunais internacionais citados vinculam todos os Estados europeus que deles são partes. Quando o Estado brasileiro assumiu (ratificou) a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e aceitou a competência contenciosa da Corte Interamericana (Decreto Legislativo nº 89/98), o fez em nome de toda a Nação, não tendo os seus órgãos internos qualquer poder jurídico de anular essa decisão soberana da República (tão soberana que aprovada pelo Congresso Nacional antes da ratificação presidencial do tratado).
O Ministro Peluso, no dia 18.01.11, disse: “Nenhuma corte internacional tem competência para rever, cassar, reformar ou interferir em qualquer decisão do STF” (O Globo de 19.01.11, p. 5). DATA VENIA, não é bem assim. O direito na era da pós-modernidade mudou completamente sua fisionomia. Toda lei, agora, está sujeita a dois tipos de controle (vertical): de constitucionalidade e de convencionalidade. O STF fez o primeiro controle (e validou a lei). A CIDH celebrou o segundo (e declarou inválida referida lei de anistia). Os juízes brasileiros precisam se atualizar e admitir que, agora, já não basta um só controle. E na medida em que a jurisprudência desses juízes não segue a jurisprudência da Corte, ela pode ser questionada (e eventualmente invalidada, de forma indireta, visto que a Corte só pode condenar o país, o Brasil). O Presidente Peluso está equivocado (data vênia) em sua declaração. Para que nosso internauta seguidor acompanhe o debate, vou transcrever vários trechos da sentença no caso Araguaia (perdoem o castelhano):
A preocupação não foi revisar a sentença do STF, sim, verificar se o Brasil cumpriu ou não suas obrigações: 48. La demanda presentada por la Comisión InteraEnfim, doravante o STF terá que se acostumar que mericana no busca revisar la sentencia del Supremo
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Tribunal Federal, decisión que ni siquiera había sido emitida cuando dicho órgano presentó su demanda ante la Corte Interamericana, sino que pretende que se establezca si el Estado violó determinadas obligaciones internacionales establecidas en diversos preceptos de la Convención Americana em perjuicio de las presuntas víctimas, incluyendo, inter alia, el derecho a no ser sujeto a una desaparición forzada derivado de los artículos 3, 4, 5 y 7 de la Convención Americana, el derecho a la protección judicial y a las garantías judiciales relativos al esclarecimiento de los hechos y la determinación de las responsabilidades individuales por los mismos, derivados de los artículos 8 y 25 de la Convención Americana.
La Corte Interamericana es competente en los términos del artículo 62.3 de la Convención para conocer el presente caso, en razón de que Brasil es Estado Parte de la Convención Americana desde el 25 de septiembre de 1992 y reconoció la competência contenciosa de la Corte el 10 de diciembre de 1998.
Cfr. Caso de los “Niños de la Calle” (Villagrán Morales y otros) Vs. Guatemala. Fondo. Sentencia de 19 de noviembre de 1999. Serie C No. 63, párr. 222; Caso Escher y otros, supra nota 27, párr. 44, y Caso Da Costa Cadogan, supra nota 35, párr. 12.
sanción de sus responsables.
Obrigação de investigar os desaparecimentos forçados: 108. En definitiva, toda vez que haya motivos razonables para sospechar que uma persona ha sido sometida a desaparición forzada debe iniciarse uma investigación . Esta obligación es independiente de que se presente una denuncia, pues en casos de desaparición forzada el derecho internacional y el deber general de Exame da lei de anistia brasileira: garantía, imponen la obligación de investigar el caso 49. En numerosas ocasiones la Corte ha sostenido ex officio, sin dilación, y de una manera seria, imque el esclarecimiento de si El Estado ha violado o parcial y efectiva. Este es un elemento fundamental no sus obligaciones internacionales en virtud de las y condicionante para la protección de los derechos actuaciones de sus órganos judiciales, puede condu- afectados por esas situaciones . En cualquier caso, cir a que este Tribunal deba ocuparse de examinar los toda autoridad estatal, funcionario público o particurespectivos procesos internos para establecer su com- lar que haya tenido noticia de actos destinados a la patibilidad con la Convención Americana , lo cual desaparición forzada de personas, deberá denunciarlo incluye, eventualmente, las decisiones de tribunales inmediatamente . superiores. En el presente caso, la Corte Interamericana no está llamada a realizar un examen de la Ley Necessidade de criar um tipo penal autônomo: de Amnistía en relación con la Constitución Nacio- 109. Para que una investigación sea efectiva, los Estanal del Estado, cuestión de derecho interno que no dos deben establecer um marco normativo adecuado le compete, y que fuera materia Del pronunciamien- para desarrollar la investigación, lo cual implica reguto judicial en la Acción de Incumplimiento No. 153 lar como delito autónomo en sus legislaciones inter(infra párr. 136), sino que debe realizar el control de nas la desaparición forzada de personas, puesto que la convencionalidad, es decir, el análisis de la alegada persecución penal es un instrumento adecuado para incompatibilidad de aquella ley con las obligaciones prevenir futuras violaciones de derechos humanos de internacionales de Brasil contenidas en la Convenci- esta naturaleza . Asimismo, el Estado debe garantizar ón Americana. En consecuencia, los alegatos referen- que ningún obstáculo normativo o de otra índole imtes a esta pida la investigación de dichos actos y, en su caso, la
Lei de anistia e sua compatibilidade com o direito internacional: 126. En el presente caso, la responsabilidad estatal por la desaparición forzada de las víctimas no se enexcepción son cuestiones relacionadas directamente con el fondo de la controversia, que pueden ser exa- cuentra controvertida (supra párrs. 116 y 118). Sin minados por este Tribunal a la luz de la Convención embargo, las partes discrepan respecto de las obliAmericana sin contravenir la regla de la cuarta instan- gaciones internacionales del Estado derivadas de la cia. Por lo tanto, el Tribunal desestima esta excepción Convención Americana sobre Derechos Humanos ratificada por Brasil en 1992 que, a su vez, reconoció preliminar. la competencia contenciosa de este Tribunal en 1998. De tal modo, la Corte Interamericana debe resolver en Competência da CIDH: 50. el presente caso si la Ley de Amnistía sancionada en
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1979 es o no compatible con los derechos consagrados en los artículos 1.1, 2 , 8.1 y
violaciones de derechos humanos, se desprende de la obligación de garantía consagrada en El artículo 1.1 Cfr. Caso Radilla Pacheco, supra nota 24, párr. 143; Caso de la Convención Americana. Esta obligación implica el deber de los Estados Parte de organizar todo el Chitay Nech y otros, supra nota 25, párr. 92, aparato gubernamental y, en general, todas lãs estrucy Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña, supra nota 24, párr. 65. Cfr. Caso de la Masacre de Pueblo Bello Vs. Colombia. Fon- turas a través de las cuales se manifiesta el ejercicio do, Reparaciones y Costas. Sentencia de 31 del poder público, de manera tal que sean capaces de de enero de 2006. Serie C No. 140, párr. 145; Caso Chitay Nech asegurar jurídicamente el libre y pleno ejercicio de y otros, supra nota 25, párr. 92, y Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen los derechos humanos . Como consecuencia de esta Peña, supra nota 24, párr. 65. obligación, los Estados deben prevenir, investigar y Cfr. Caso Anzualdo Castro, supra nota 122, párr. 65; Caso sancionar toda violación de los derechos reconocidos Chitay Nech y otros, supra nota 25, párr. por la Convención y procurar, además, el restableci92, y Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña, supra nota 24, párr. miento, si es posible, Del derecho conculcado y, en 65. su caso, la reparación de los daños producidos por la Cfr. Caso Gómez Palomino, supra nota 126, párrs. 96 y 97; Caso Radilla Pacheco, supra nota 24, párr. 144, y Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña, supra nota 24, párr. 66. El artículo 2 de la Convención Americana establece: Si el ejercicio de los derechos y libertades mencionados en el artículo 1 no estuviere ya garantizado por disposiciones legislativas o de otro carácter,
25 de la Convención Americana o, dicho de otra manera, si aquella puede mantener sus efectos jurídicos respecto de graves violaciones de derechos humanos, una vez que el Estado se obligó internacionalmente a partir de la ratificación de la Convención Americana. Dever de investigar: 138. El Tribunal reitera que la obligación de investigar violaciones de derechos humanos se encuentra dentro de las medidas positivas que deben adoptar los Estados para garantizar los derechos reconocidos en la Convención . El deber de investigar es una obligación de medios y no de resultado, que debe ser asumida por el Estado como un deber jurídico propio y no como una simple formalidad condenada de antemano a ser infructuosa, o como una mera gestión de intereses particulares, que dependa de la iniciativa procesal de las víctimas, de sus familiares o de la aportación privada de elementos probatorios . A la luz de ese deber, uma vez que las autoridades estatales tengan conocimiento del hecho, deben iniciar ex officio y sin dilación, una investigación seria, imparcial y efectiva . Esta investigación debe ser realizada por todos los medios legales disponibles y orientarse a la determinación de la verdad. O Estado tem o dever de investigar: 140. Adicionalmente, la obligación conforme al derecho internacional de procesar y, si se determina su responsabilidad penal, sancionar a los autores de
los Estados Partes se comprometen a adoptar, con arreglo a sus procedimientos constitucionales y a las disposiciones de esta Convención, las medidas legislativas o de otro carácter que fueren necesarias para hacer efectivos tales derechos y libertades. El artículo 8.1 de la Convención Americana establece: Toda persona tiene derecho a ser oída, con las debidas garantías y dentro de un plazo razonable, por un juez o tribunal competente, independiente e imparcial, establecido con anterioridad por la ley, en la sustanciación de cualquier acusación penal formulada contra ella, o para la determinación de sus derechos y obligaciones de orden civil, laboral, fiscal o de cualquier otro carácter. El artículo 25.1 de la Convención Americana establece: Toda persona tiene derecho a un recurso sencillo y rápido o a cualquier otro recurso efectivo ante los jueces o tribunales competentes, que la ampare contra actos que violen sus derechos fundamentales reconocidos por la Constitución, la ley o la presente Convención, aun cuando tal violación sea cometida por personas que actúen en ejercicio de sus funciones oficiales. Cfr. Caso Velásquez Rodríguez. Fondo, supra nota 25, párrs. 166 y 167; Caso Fernández Ortega y otros, supra nota 53, párr. 191, y Caso Rosendo Cantú y otra, supra nota 45, párr. 175. Cfr. Caso Velásquez Rodríguez. Fondo, supra nota 25, párr. 177; Caso Fernández Ortega y otros, supra nota 53, párr. 191, y Caso Rosendo Cantú y otra, supra nota 45, párr. 175. Cfr. Caso de la Masacre de Pueblo Bello, supra nota 139, párr. 143; Caso Rosendo Cantú y otra, supra nota 45, párr. 175, y Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña, supra nota 24, párr. 65. Cfr. Caso Velásquez Rodríguez. Fondo, supra nota 25, párr. 166; Caso González y otras (“Campo Algodonero”), supra nota 134, párr. 236, y Caso De la Masacre de las Dos Erres Vs. Guatemala. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 24 de noviembre de 2009. Serie C No. 211, párr. 234
violación de derechos humanos . Si el aparato del Estado actúa de modo que tal violación quede impune y no se restablece, en cuanto sea posible, a la víctima
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en la plenitud de sus derechos, puede afirmarse que ha incumplido el deber de garantizar su libre y pleno ejercicio a las personas sujetas a su jurisdicción .
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internas y la Convención Americana, evidentemente en el marco de sus respectivas competencias y de las regulaciones procesales correspondientes. En esta tarea, el Poder Judicial debe tener en cuenta no solamente el tratado, sino también la interpretación que del mismo ha hecho la Corte Interamericana, intérprete última de la Convención Americana .
Jurisprudência da CIDH: 148. Como ya ha sido adelantado, esta Corte se ha pronunciado sobre La incompatibilidad de las amnistías con la Convención Americana en casos de graves violaciones a los derechos humanos relativos a Perú O STF não considerou as obrigações internacio(Barrios Altos y La Cantuta) y Chile (Almonacid nais do Brasil: Arellano y otros). 177. En el presente caso, el Tribunal observa que no fue ejercido el control de convencionalidad por las autoridades jurisdiccionales del Estado y que, por el Interpretação brasileira equivocada: contrario, la decisión del Supremo Tribunal Federal 172. La Corte Interamericana considera que la forma confirmó la validez de la interpretación de la Ley de en la cual ha sido interpretada y aplicada la Ley de Amnistía sin Amnistía adoptada por Brasil (supra párrs. 87, 135 y Cfr. Caso Velásquez Rodríguez. Fondo, supra nota 25, párr. 136) há afectado el deber internacional del Estado de 166; Caso Ticona Estrada y otros Vs. investigar y sancionar las graves violaciones de de- Bolivia. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 27 de norechos humanos al impedir que los familiares de las viembre de 2008. Serie C No. 191, párr. 78, y Caso Garibaldi, víctimas en El presente caso fueran oídos por un juez, supra nota 18, párr. 112. conforme a lo señalado en el artículo 8.1 de la ConCfr. Caso Velásquez Rodríguez. Fondo, supra nota 25, párr. vención Americana y violó el derecho a la protección 176; Caso Kawas Fernández Vs. judicial consagrado en El artículo 25 del mismo ins- Honduras. Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 3 de trumento precisamente por la falta de investigación, abril de 2009 Serie C No. 196, párr. 76, y Caso González y otras (“Campo Algodonero”), supra nota 134, párr. 288. persecución, captura, enjuiciamiento y sanción de los Cfr. Caso Almonacid Arellano y otros, supra nota 251, párr. responsables de los hechos, incumpliendo asimismo 124; Caso Rosendo Cantú y otra, supra el artículo 1.1 de la Convención. Adicionalmente, al nota 45, párr. 219, y Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña, supra aplicar la Ley de Amnistía impidiendo la investiganota 24, párr. 202. ción de los hechos y la identificación, juzgamiento y eventual sanción de los posibles responsables de vio- considerar las obligaciones internacionales de Brasil laciones continuadas y permanentes como las desapa- derivadas del derecho internacional, particularmente riciones forzadas, el Estado incumplió la obligación aquellas establecidas en los artículos 8 y 25 de la Conde adecuar su derecho interno consagrada en el artí- vención Americana, en relación con los artículos 1.1 y 2 de la misma. El Tribunal estima oportuno recordar culo 2 de La Convención Americana. que la obligación de cumplir con las obligaciones internacionales voluntariamente contraídas corresponde Controle de convencionalidade: a um principio básico del derecho sobre la responsa176. Este Tribunal ha establecido en su jurisprudencia bilidad internacional de los Estados, respaldado por la que es consciente que las autoridades internas están jurisprudencia internacional y nacional, según el cual sujetas al imperio de la ley y, por ello, están obligadas aquellos deben acatar sus obligaciones convencionaa aplicar las disposiciones vigentes en el ordenamien- les internacionales de buena fe (pacta sunt servanda). to jurídico. Pero cuando um Estado es Parte de un tra- Como ya ha señalado esta Corte y lo dispone el artítado internacional como la Convención Americana, culo 27 de La Convención de Viena sobre el Derecho todos sus órganos, incluidos sus jueces, también están de los Tratados de 1969, los Estados no pueden, por sometidos a aquel, lo cual lês obliga a velar porque razones de orden interno, incumplir obligaciones inlos efectos de las disposiciones de la Convención no ternacionales. Lãs obligaciones convencionales de los se vean mermados por la aplicación de normas con- Estados Parte vinculan a todos sus poderes y órganos, trarias a su objeto y fin y que desde um inicio carecen los cuales deben garantizar el cumplimiento de las de efectos jurídicos. El Poder Judicial, en tal sentido, disposiciones convencionales y sus efectos propios está internacionalmente obligado a ejercer un “con- (effet utile) em el plano de su derecho interno . trol de convencionalidad” ex officio entre las normas
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Em seu voto particular (separado) o juiz ad hoc Roberto de Figueiredo Caldas sublinhou:
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que nenhuma lei ou norma de direito interno, tais como as disposições acerca da anistia, as normas de prescrição e outras excludentes de punibilidade, deve impedir que um Estado cumpra a sua obrigação inalienável de punir os crimes de lesa-humanidade, por serem eles insuperáveis nas existências de um indivíduo agredido, nas memórias dos componentes de seu círculo social e nas transmissões por gerações de toda a humanidade.
4. Continuando na breve incursão sobre temas pontuais relevantes, se aos tribunais supremos ou aos constitucionais nacionais incumbe o controle de constitucionalidade e a última palavra judicial no âmbito interno dos Estados, à Corte Interamericana de Direitos Humanos cabe o controle de convencionalidade e a última palavra quando o tema encerre debate sobre direitos humanos. É o que decorre do reconhecimento 31. É preciso ultrapassar o positivismo exacerbado, formal da competência jurisdicional da Corte por um pois só assim se entrará em um novo período de resEstado, como o fez o Brasil . peito aos direitos da pessoa, contribuindo para acabar com o círculo de impunidade no Brasil. É pre5. Para todos os Estados do continente americano que ciso mostrar que a Justiça age de forma igualitária livremente a adotaram, a Convenção equivale a uma na punição de quem quer que pratique graves crimes Constituição supranacional atinente a Direitos Huma- contra a humanidade, de modo que a imperatividade nos. Todos os poderes públicos e esferas nacionais, do Direito e da Justiça sirvam sempre para mostrar bem como as respectivas legislações federais, estadu- que práticas tão cruéis e desumanas jamais podem se ais e municipais de todos os Estados aderentes estão repetir, jamais serão esquecidas e a qualquer tempo serão punidas. obrigados a respeitá-la e a ela se adequar. 6. Mesmo as Constituições nacionais hão de ser interpretadas ou, se necessário, até emendadas para manter harmonia com a Convenção e com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. De acordo com o artigo 2º da Convenção, os Esta- AUTOR E COLABORADORES: dos comprometem-se a adotar medidas pala eliminar normas legais e práticas de quaisquer espécies que signifiquem violação a ela e, também ao contrário, Luiz Flávio Gomes comprometem-se a editar legislação e desenvolver ações que conduzam ao respeito mais amplo e efetivo Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito Penal pela USP. da Convenção . Presidente da Rede LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Ad29. O exame de conceito da esfera do Direito Penal vogado (1999 a 2001). Blog: www.blogdolfg.com.br. Internacional não deve melindrar a Corte ou instanTwitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. cias judiciárias nacionais, dada a evidente confluência Encontre-me no Facebook. de várias circunscrições do Direito Internacional, o que vem sendo propalado pela doutrina e pela jurisÁurea Maria Ferraz de Sousa prudência não é de hoje. Assim o é porque são largas as fronteiras entre os subramos como os Direitos Advogada pós graduada em Direito constitucional e Humanos, o Direito Humanitário e o Direito Penal em Direito penal e processual penal. Pesquisadora. Internacional. Suas normas e suas fontes são necessaVALERIO DE OLIVEIRA MAZZUOLI riamente complementares, senão correr-se-ia o grave risco de divergência entre as interpretações desses ni- Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Lisboa. chos jurídicos que jamais seriam uniformizadas, com Doutor summa cum laude em Direito Internacional pela UFRGS. Mestre em Direito pela UNESP. lamentável insegurança jurídica para a humanidade. Professor Adjunto de Direito Internacional Público e Direitos Humanos da UFMT. Professor da Rede LFG, 30. Finalmente é prudente lembrar que a jurisprudênem São Paulo. Advogado e consultor jurídico. cia, o costume e a doutrina internacionais consagram
Editado pela equipe do DIREITOLEGAL.ORG RECIFE BRASIL MARÇO 2011