Educação Profissional: Ciência e Tecnologia

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Edição especial | Special edition Julho-Dezembro 2010 | July-December 2010 Publicação Semestral | Semester Publication ISSN 1980-5594

Esta publicação conta com o apoio financeiro do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Distrito Federal (Senac-DF). This publication counts on the financial support of the Senac-DF

Capa: Comunicação/Senac-DF | Fotos: Banco de imagens Senac/DN

Volume 4, Número 1 | Volume 4, Number 1



SUMÁRIO > Volume 4, Número 1, Edição Especial EDITORIAIS v EDITORIAL > Por Juliana Eugênia Caixeta & Flávia Furtado Rainha Silveira O Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica: um marco no Brasil ix

EDITORIAL > Por Luiz Otávio da Justa Neves Educação ou ensino

ENTREVISTAS 1 JOAQUIM AZEVEDO > Por Juliana Caixeta, Ricardo Coelho & Rafael Voigt O panorama contemporâneo da educação profissional em Portugal: conquistas e desafios 7

RAMÓN MONCADA > Por Juliana Caixeta & Rafael Voigt Um debate sobre cultura e educação profissional

11

Michael Maynard > Por Juliana Eugênia Caixeta & Rafael Voigt Canadian colleges and the policies for access and inclusion Michael Maynard > Por Juliana Eugênia Caixeta & Rafael Voigt

17 21

JOS NOLLE > Por Juliana Eugênia Caixeta Policies for access and inclusion in Canada JOS NOLLE > Por Juliana Eugênia Caixeta

Centros de Ensino Superior canadenses e as políticas de acesso e inclusão

Políticas de acesso e inclusão no Canadá

25 ELIEZER PACHECO > Por Ricardo Coelho A expansão da rede federal de educação profissional 29 ANTONIO CARLOS DAS NEVES & ROSA MARIA PIRES BUENO > Por Flávia Furtado Rainha Silveira Educação profissional: e experiência da Fundação Bradesco no Brasil 33 SÍLVIA MANFREDI > Por Ricardo Silva & Rafael Voigt Uma crítica à pedagogia das competências 37 FRANCISCO CORDÃO > Por Flávia Silveira O panorama da educação profissional no Brasil 43 ISMÁRCIA GONÇALVES SILVA, TIAGO RODRIGUES, CAROLINE FERREIRA > Por Juliana Caixeta & Rafael Voigt Desafios e conquistas do Laboratório de Metodologias de Ensino de Ciências e Matemática (Labmet)

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. iii-iv, jul./dez. 2010

iii


49 SANDRA REGINA GARCIA > Por Ricardo Silva O ensino integrado: a experiência do Paraná 53 JOANA BOTINI (SENAC/EAD) > Por Suely Parrini Educação a Distância: avanços e desafios 57 LUCÍLIA MACHADO > Por Ricardo Coelho & Rafael Voigt A organização da educação profissional no Brasil 61 MOACIR GADOTTI > Por Ricardo Silva & Rafael Voigt Por uma educação profissional realizadora do ser humano

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

INSTRUÇÕES E NORMAS 65 Instruções aos colaboradores 66 Normas para publicação

iv

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. iii-iv, jul./dez. 2010


Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. v-vii, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

editorial

EDITORIAL > Por Juliana Eugênia Caixeta & Flávia Furtado Rainha Silveira

O Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica: um marco no Brasil

Queridos/as leitores/as,

como foi neste fórum mundial, evento que merece destaque em nossa revista por ter o objetivo de colocar a

A emoção nos invade ao tecer a história do número 4, volume 1 da nossa revista Educação Profissional:

Educação Profissional e Tecnológica no seu lugar de promotora de transformações sociais:

Ciência e Tecnologia. O motivo desse sentimento passa pelo fato de que de todos os números já publicados, este carrega em suas páginas a concretização de uma importante vitória da Educação Profissional e Tecnológica: o reconhecimento de seu papel fundamental na história do nosso povo, o reconhecimento do que fizemos até aqui e o reconhecimento de que muito podemos fazer para a construção de um país com igualdade social. O ano de 2009 marcou a Educação Profissional ao tornar visível essa modalidade educacional e colocá-la na agenda de um projeto de país que sabe dos seus desafios, mas

O Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica proporcionou a primeira grande discussão acerca das dimensões múltiplas a que está hoje vinculada a educação profissional. As atividades estiveram voltadas para movimentos pela cidadania e pelo direito universal à educação profissional, especialmente em propostas que buscaram refletir sobre a universalização da educação, o acesso à educação de qualidade sem perder a ótica de universalização do ensino sob o viés do trabalho, da diversidade, da inclusão, do desenvolvimento sustentável, da ética e da interculturalidade (Relatório do Ministério da Educação sobre I Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica, 2009, p.2)

também, das possibilidades que emergem do encontro das diferenças inerentes a sua própria constituição e das

Esta revista é a concretização da diversidade que

possibilidades do mundo do trabalho. Dois mil e nove

é a Educação Profissional no Brasil e no mundo. No I

foi o ano do I Fórum Mundial de Educação Profissional

Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica,

e Tecnológica, que aconteceu em Brasília, no Centro de

realizaram-se, em cinco dias de imersão cultural e

Convenções Ulysses Guimarães, de 23 a 27 de novem-

acadêmica, marcada sobretudo pela solidariedade e

bro. No Brasil, a Educação Profissional e Tecnológica

incursões em prol do reconhecimento da diversidade

nunca havia sido tão enaltecida, respeitada e defendida

como traço marcante da condição humana, 143 ativida-

v


des culturais, 15 conferências e debates, 165 atividades

como defende Paulo Freire, e levá-los à autonomia própria

autogestionadas, 18 Oficinas de Gastronomia, 3 Mostras

da participação cidadã.

(Painéis, Artes e Inovação Tecnológica por estudantes),

A terceira entrevista é a do professor Michael Maynard,

2 Feiras (Gastronomia e Sustentabilidade) e 3 Sessões

Diretor de Estudos do New Brunswick College of Craft and

Especiais (Abertura, Encerramento e Sessão de Anistia)

Design. O professor fala sobre a função inclusiva dos colle-

que foram prestigiadas por um público de 15 mil pessoas,

ges canadenses e descreve a importância da avaliação e

entre professores, alunos, técnicos, políticos, acadêmi-

reconhecimento de aprendizagem prévia (procedimento que

cos, ambientalistas, intelectuais, enfim, uma diversidade

valida os conhecimentos prévios dos alunos, que não foram

de gente para escrever uma história marcante. Descrever,

construídos no processo formal de escolarização) para seus

brevemente, as atividades não é suficiente para demons-

alunos e para as participantes do programa de inclusão de

trar a riqueza da educação profissional que fazemos e

mulheres, chamado Mulheres Mil, parceria entre os gover-

desejamos fazer no Brasil, bem como a riqueza das ex-

nos Canadense e Brasileiro.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

periências dos vários países amigos: Paraguai, Uruguai,

vi

A quarta entrevista, do professor Jos Nolle, Diretor

Argentina, Venezuela, Colômbia, Camarões, Canadá,

de

Estados Unidos, China, Portugal, França, Espanha,

Canadá, aborda a Associação Canadense de Faculdades

Angola, Benin, para citar alguns países. Por isso, deci-

Comunitárias (Association of Canadian Community College

dimos que este número seria todo dedicado ao I Fórum

– ACCC) e também a Avaliação e Reconhecimento da

Mundial de Educação Profissional e Tecnológica. Para

Aprendizagem Prévia (ARAP).

Educação

Internacional

e

Desenvolvimento

do

cumprirmos esse objetivo, nossa equipe mobilizou cerca

Eliezer Pacheco, secretário da Secretaria de Educação

de 12 profissionais entre funcionários da revista, técnicos,

Profissional do MEC (SETEC) nos brindou com uma en-

professores universitários e pesquisadores para trazer

trevista na qual discorre sobre a expansão da rede federal

por meio de entrevistas para vocês, nossos leitores, as

de educação profissional, que resultará na abertura de 250

temáticas que foram discutidas no fórum.

unidades em todo Brasil. Ademais, refere-se ao apoio do

Assim, essa revista congrega diferentes vozes, constru-

órgão ao Sistema S, que se prepara para até 2014 ofertar

ídas no encontro com diferentes personalidades nacionais

66.66% da sua receita compulsória em cursos gratuitos,

e internacionais, que debateram conosco a Educação

reconhecendo-o como uma das pontas do tripé da educação

Profissional e Tecnológica no Brasil e o no mundo. A revista

profissional no Brasil, da qual também fazem parte a rede

congrega diferentes posições ideológicas, políticas, so-

federal e as redes estaduais. Essas ações vem, em suas

ciais, enfim, congrega a diversidade, na rica experiência da

palavras, ao encontro das necessidades de formação de

imersão e da narrativa das possibilidades que se criam no

profissionais qualificados para um país em franco desen-

encontro com os iguais e os diferentes. Esta revista celebra

volvimento, o que esbarra com o conhecido fenômeno do

a educação profissional como um sistema educacional com-

“apagão de mão-de-obra”.

plexo, que possibilita a inclusão na diversidade. Ao todo, foram entrevistados 17 profissionais. Nesse número, apresentaremos 11 entrevistas.

A educação

profissional

na

renomada

Fundação

Bradesco é tema da entrevista de Antonio Carlos das Neves e Rosa Maria Pires Bueno. Os diretores de educação pro-

A primeira entrevista que apresentamos nesse número

fissional da fundação relatam que essa modalidade de edu-

é a do professor Doutor Joaquim Azevedo, de Portugal. O

cação é oferecida desde 1970, nas 40 escolas da rede que

professor, que já foi secretário de Educação do Governo

atendem 111 mil alunos no Brasil, com base nas demandas

Português, discute a educação profissional no seu país de

de cada região. Os entrevistados relatam que seus cursos

origem, comparando-a com a brasileira e destacando a im-

são balizados pela abordagem construtivista e pelos princí-

portância e os desafios que ela enfrenta para ser respeitada.

pios do pensar autonomamente, da solidariedade, do volun-

A segunda entrevista é com o professor Ramon

tariado e do fomento do empreendedorismo, da criatividade

Moncada, Diretor Executivo da ConCiudadania, Colômbia,

e da inovação. Além dos cursos técnicos, são ofertados

que apresenta o conceito de cidade educadora e defende

cursos de formação inicial e continuada com vistas à poten-

que a formação profissional deve discutir o papel da cultura

cialização da renda das famílias da comunidade nas quais a

na formação tanto de alunos quanto de professores para

escola está inserida.

não assumir um caráter tecnicista. Para ele, a educação

A entrevista de Silvia Manfredi nos esclarece sobre o

tem a função de explorar a leitura de mundo dos alunos, tal

sistema de certificação profissional idealizado pelo grupo do

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. v-vii, jul./dez. 2010


qual fez parte, mas que ainda não foi adotado no Brasil. Para

Em sua entrevista, Joana Botini comenta a educação a

a educadora, presidente do instituto Paulo Freire na Itália e

distância em geral e a educação a distância que é promovida

que até 2006 atuou como consultora da OIT no Projeto de

pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac).

Certificação e Orientação Profissional, a certificação, cons-

Ela defende que a rede Senac deve atuar em cursos de

tituída, por exemplo, por temas geradores, poderia resolver

graduação tecnológica, porque o Senac tem como missão

os desafios que se impõem e restringem a equivalência en-

formar profissionais para atuar no mercado de comércio de

tres os diversos níveis de ensino. Nessa entrevista, Manfredi

bens e serviços, turismo, hospitalidade e saúde. Atribui o

demonstrou ser crítica contundente do modelo de educação

sucesso dos cursos de EaD do Senac à própria marca e,

por competências que, a seu ver, tolhe a criatividade e a

também, à seriedade e ao foco que sustentam os cursos de

iniciativa dos professores e dos alunos.

graduação, pós-graduação e extensão a distância.

Referência nacional em educação profissional, Francisco

Lucília Machado discute, em sua entrevista, os concei-

Cordão, consultor educacional do Senac e Presidente da

tos de interdependência, trabalho e educação profissional.

Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de

Para ela, a educação profissional e tecnológica envolve um

Educação, relata em sua entrevista admiração que tem pela

conjunto complexo de fenômenos que precisam ser discu-

educação profissional praticada pelo Sistema S.

tidos e considerados na concretização dessa modalidade

A professora Ismárcia Gonçalves Silva e seus alunos

de ensino. Ela defende, inclusive, a perspectiva do trabalho

Tiago Rodrigues e Caroline Ferreira nos contam como o

como promotora de identificação da pessoa e de realização

Instituto Federal do Rio de Janeiro tem trabalhado para a

pessoal.

formação de professores de Química, Física e Matemática,

Moacir Gadotti, assim como Lucília Machado, defende

por meio de projetos que se fundamentam numa concepção

a articulação de conhecimentos na educação em geral e

interacionista de ensino e aprendizagem. Falam sobre a

na educação profissional, em específico. O autor discute

construção do Laboratório de Metodologias de Ensino de

a educação profissional na visão de Paulo Freire, marca a

Ciências e Matemática (Labmet) como um espaço físico e

importância do fórum no atual momento histórico do país,

social de construção de conhecimento, onde alunos e pro-

posiciona-se criticamente em relação a documentos do

fessores da universidade e das escolas públicas cariocas

Conae e à função do Sistema S na promoção da educação

poderão trocar ideias e desenvolver projetos que resultem

profissional. Gadotti defende uma educação contextualizada

em processos de ensino-aprendizagem de ciências contex-

e articulada em nossas escolas, sintonizada às demandas e

tualizados à vida cotidiana dos personagens que compõem

características da diversidade vivenciada na contemporanei-

a escola e a universidade.

dade nos vários espaços sociais em que nós nos construí-

Sandra Regina Garcia fala sobre a experiência do

mos e ajudamos a construir.

Paraná na estruturação da educação integrada. Nessa en-

Desejamos que confira todas as entrevistas e que elas

trevista, Sandra conta as características e os desafios da

sejam úteis na sua atuação como profissional e pessoa

implantação desse programa, defendendo a educação inte-

comprometida com a educação brasileira.

grada como um modelo educacional que permite a formação ampla, em suas dimensões pessoais e profissionais.

Boa Leitura!

vii

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. v-vii, jul./dez. 2010



Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. ix-ix, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

editorial

EDITORIAL > Por Luiz Otávio da Justa Neves

Educação ou ensino

O que há de comum entre pensamentos como o de

Para ser um verdadeiro educador, o professor deve ser,

Pitágoras, “Educai as crianças, para que não seja necessário

também, um contador de estórias, um comentarista dos fatos

punir os adultos”; de Albert Einstein, “A única coisa que inter-

e acontecimentos diários, um conselheiro, um amigo, um disci-

fere no meu aprendizado é a minha educação”; de Burruhs

plinador. Não basta ser um transmissor de conhecimentos, ele

Frederic Skinner, “A educação é aquilo que sobrevive depois

deve ser um receptor de angústias, de dúvidas, de dificuldades,

que tudo o que aprendemos foi esquecido”; de Immanuel

de carências e de queixas.

Kant, “O homem não é nada além do que a educação faz dele”;

O educador propicia possibilidades de reflexão, de amadu-

e de Nelson Mandela, “A educação é a arma mais poderosa que

recimento emocional, de solidariedade, de responsabilidade,

você pode usar para mudar o mundo”. Mesmo sendo pessoas

de respeito, de honestidade, de cidadania, de patriotismo aos

de diferentes épocas, culturas e formações, a concepção de

seus alunos, sem prejuízos ao aprendizado acadêmico.

educação de todos eles é convergente e aponta, claramente,

Lamentavelmente, não se encontram educadores com

para a diferença entre educar e ensinar; entre educação e

muita frequência entre os docentes, muitos deles temporários

ensino; entre educador, de um lado, e adestrador, treinador,

e outros, ainda, inexperientes. A pressa, a impessoalidade e

instrutor ou apenas professor, de outro.

tantas outras características dos tempos atuais (inclusive a

É claro que um professor pode ser, ou não, um educador,

redução da educação a números por meio de processos equi-

não se restringindo, somente, aos processos de ensino e apren-

vocados de avaliação), acrescidas do não reconhecimento do

dizagem de conhecimentos de natureza técnico-científica. Ele

real valor do professor-educador, expresso em inadequadas

deve adentrar, em todas as oportunidades surgidas, e nas por

condições de trabalho e baixa remuneração, forçam uma

ele criadas intencionalmente, nas questões da cidadania, da

atuação superficial e descomprometida que, com certeza, fará

ética e da moral, além das sociais e culturais.

tudo, menos educação.

Todo esse esforço do professor-educador não é, ainda, suficiente para propiciar o que se pode chamar de educação.

Prof. MSc Luiz Otávio da Justa Neves

É fundamental o exemplo que ele pode ensejar, em todos os

Presidente do Conselho de Educação do DF e

momentos, posto que é modelo para os alunos.

Diretor Regional do Senac-DF

ix



ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 1-6, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

JOAQUIM AZEVEDO > Por Juliana Caixeta, Ricardo Coelho & Rafael Voigt

Joaquim Azevedo é Professor da Universidade Católica Portuguesa (Portugal)

O panorama contemporâneo da educação profissional em Portugal: conquistas e desafios

EPCT | Como se organiza a educação profissional em Portugal?

EPCT | A sociedade em geral também considera valoroso o ensino secundário profissionalizante?

Hoje o ensino profissional técnico tem três grandes ver-

Isso é o que nós buscamos há muitos anos. Essas escolas

tentes: uma vertente mais escolar, outra menos escolar e mais

profissionais são recentes. Há 20 anos estamos a comungar

ocupacional, como se costuma dizer, e outra vertente mais

o nascimento e a proliferação delas em todo o país. Antes

social. Em Portugal, o aluno tem uma formação básica de nove

da Revolução da Democracia, existia o ensino técnico, muito

anos, a partir da qual começa a formação mais especificada, o

marcado do ponto de vista social. Era o ensino para os pobres,

ensino secundário. Até o 9º ano o currículo é único, depois os

para os mais necessitados para quem não tinha condições de

alunos são direcionados para as escolas profissionais, ou para

conseguir estudos, e isso ficou como uma marca nas represen-

as escolas secundárias, que também oferecem cursos profissio-

tações sociais. Hoje já se ultrapassou muito. No ensino médio

nais, ou para as escolas artísticas, que oferecem cursos de for-

português, por exemplo, que é esse secundário de três anos,

mação artística. Nosso ensino secundário, que aqui vocês cha-

40% dos jovens já estão matriculados em cursos profissionais

mam de ensino médio, tem duração de três anos. Terminada a

em todo o país. Portanto, esse nível de ensino deu um salto

formação básica de nove anos, que é comum para todos, vem

muito grande entre 20 e 25 anos.

então o ensino secundário de três anos, que pode ser feito em diferentes vertentes. Concluído o ensino secundário, todos os jovens podem se candidatar ao ensino superior em qualquer área sem nenhuma precedência. Entretanto, Portugal está

EPCT | No Brasil temos o mesmo desafio de superar a idéia de que o ensino profissionalizante é inferior ao ensino geral...

trabalhando pela unificação do ensino básico e secundário em

Agora, nós também estamos a superá-lo com mais faci-

um único ensino. O que nós valorizamos é o desenvolvimento

lidade. 20 anos é pouco para evoluírem as representações

das pessoas, e este pode se dar tanto no ensino profissional,

sociais, mas os resultados têm sido bons porque esses jovens

quanto no ensino geral inicial, pois estes têm os mesmos re-

têm melhores níveis de sucesso escolar que os seus colegas

cursos e um sistema de aprendizagem equivalente, sendo um

do ensino geral, têm melhores níveis de aproveitamento

mais para uma área e outro para outra.

e melhor capacidade de inserção no mercado de trabalho, Entrevista concedida em 27.11.2009

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além disso, podem seguir o estudo superior que quiserem. Destes, 22% querem prosseguir com os estudos e o restante ingressa no mercado de trabalho.

EPCT | A maior parte da formação educacional de Portugal é gratuita? Sim. Até o 9º ano é gratuito e agora até o 12º ano será gratuito, pois foi declarado obrigatório e universal a gratuidade até o fim do ensino não universitário.

EPCT | Na abertura do Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinalou que a educação profissional é estratégica para a inserção do Brasil no cenário mundial. Como o governo de Portugal entende atualmente o papel da educação profissional para o seu processo e progresso sócio-educativo?

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

Está sendo feito um investimento fortíssimo na educação

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EPCT | Nós pesquisamos no seu site um pouco sobre o 10º ano profissionalizante de Portugal. Como funciona esse programa no qual os jovens devem optar por um curso de profissionalização após saírem da educação básica? Em que contexto socioeconômico surgiu a necessidade de oferecer o 10º ano escolar profissionalizante?

profissional dos jovens. Estamos expandindo a oferta de educa-

Estamos falando de uma maneira muito pontual, creio que

ção profissional e também de ensino superior aos jovens de 16

vocês aqui chamam de subsequente. No fim da formação básica

a 18 anos. No início do ano 2000, lançamos um programa muito

de nove anos, alguns jovens, por diversas razões, não queriam

importante para os adultos. A população adulta hoje é pouco

prosseguir os estudos, queriam sair da escola e entrar no mer-

escolarizada por conta da ditadura, foram quarenta anos sem

cado de trabalho. Antes, isso era possível, agora não é mais não,

investimento na educação, quase a metade do século XX sem

agora é obrigatório estudar mais três anos, até o 12º ano. Como

investir na educação. E agora compramos esse atraso, mas ainda

não era obrigatório, as pessoas saíam da educação básica sem

estamos com dificuldades. Por isso, lançamos o programa Novas

qualificação do ponto de vista profissional. Dessa forma, criou-

Oportunidades, com o objetivo de criar novas oportunidades

se um ano a mais de formação profissionalizante, não com o

para toda a população adulta se qualificar, para ver reconheci-

objetivo de qualificar em nível técnico intermédio de três anos,

das, validadas e certificadas as suas competências adquiridas ao

mas de proporcionar uma entrada no mercado de trabalho com

longo da vida ou no seu exercício profissional, para complemen-

o mínimo de qualificação. Então, criou-se o 10º ano, que é quase

tar, por exemplo, a formação em TIC – Tecnologia da Informação

um subsequente do ensino da educação básica.

e Comunicação – ou em uma língua estrangeira, fazendo a equivalência ao 9º e ao 12º ano, fim do ensino básico e médio. E continuamos com esse processo. Em Portugal, há 1 milhão de pessoas inscritas no programa. Ora, 1 milhão! Nós somos 10 milhões!

EPCT | Qual o papel das faculdades e universidades portuguesas na preparação de profissionais para o mercado de trabalho? As universidades portuguesas também têm muito essa vertente profissionalizante. É claro que elas têm outras missões além da investigação e das relações de trabalho com

EPCT | De que maneira a educação básica portuguesa prepara seus jovens para o mercado de trabalho?

a comunidade. É evidente que elas têm uma relação muito estreita com a formação profissional e intelectual. Resta saber

Prepara no sentido de que proporciona uma formação ampla

até quando elas devem seguir na preparação e qualificação

do ponto de vista da formação de competências gerais. Em

das pessoas em nível superior ou se devem seguir exatamente

Portugal, chamamos de educação básica os nove anos iniciais,

aquilo que as organizações atuais querem que sigam. Hoje,

que têm um corpus comum, que eu chamo de corpus cultural,

quando o jovem chega à universidade querendo estudar his-

que são os instrumentos, a hierarquia de saberes, as compe-

tória, filosofia, ele se depara com a ideia de que não deve es-

tências gerais, a capacidade de ler, escrever e calcular. Assim, a

tudar, pois não há nenhuma empresa para filósofos instruídos.

educação básica prepara o aluno para avançar no conhecimento,

Assim, se a lógica é colocar a universidade a serviço de uma

situar-se no mundo, comunicar-se, distinguir e hierarquizar os

ditadura das necessidades das empresas, nós podemos correr

saberes, traduzir informações em mais conhecimento, ter auto-

o risco de deixar de lado a realização pessoal. Há muitos jovens

nomia para estudar e pesquisar e trabalhar em equipe, que já é

que preferem e acham fundamental estudar antropologia, fi-

uma preparação para o trabalho. Prepara também para o saber-

losofia, e eu creio que isso é muito importante, essa liberdade

viver, que é entender o mundo em que se vive, saber se situar

de escolha dos jovens é importante. Outro dia, em Barcelona,

e viver em sociedade, em comunidade e solidariedade com os

o presidente de uma grande empresa foi buscar filósofos. Por

demais, o que também é fundamental na formação educacional.

quê? Porque são os que têm a melhor capacidade de ler o

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 1-6, jul./dez. 2010


mundo. É isto que se dizia aqui no fórum: combater a hiper especialização, pois uma empresa, ainda que trabalhe em uma área especializada, precisa entender o mundo para perceber como são as sociedades, as culturas e os povos, como eles estão evoluindo e também para perceber como é que ela evolui em sua capacidade de prestar um servi-

Outro dia, em Barcelona, o presidente de uma grande empresa foi buscar filósofos. Por quê? Porque são os que têm a melhor capacidade de ler o mundo.

ço mais adequado à sociedade.

EPCT | Há programas do governo de Portugal preocupados com a formação inicial e continuada dos docentes do ensino profissional? Como é que acontece? No ensino profissional essa preocupação ainda é pequena. Há pouco investimento para os docentes do ensino profissional e do ensino geral também. É uma lacuna bastante grande que temos de enfrentar.

Creio que nós não podemos restringir as universidades à vertente profissionalizante, pois elas têm uma dimensão mais universal, mais aberta, são para todos, são para pensar tudo, e não ficar nada de fora, e o mais importante é pensar o homem e o seu desenvolvimento integral, essa é a sua principal função.

EPCT | Como os fóruns, conferências e seminários internacionais sobre educação têm contribuído para a construção de uma agenda programática, positiva, para a democratização do direito à educação básica e profissionalizante? É possível empreender uma mobilização mundial e policêntrica em torno desse assunto? Sim. E uma das áreas da minha investigação é exatamente

EPCT | Aqui no Brasil nós temos dividido a educação superior em vários níveis, por exemplo, temos os cursos tecnológicos que são bem voltados para o mercado de trabalho. Nesse sentido, como é em Portugal?

sobre isso, sobre a questão que se chama o sistema educativo

O ensino superior em Portugal está dividido nas vertentes

e incentivam essa articulação internacional, que, a meu ver,

universitária e politécnica. Nós temos institutos superiores poli-

poderia haver bem mais e ir um pouco mais longe. A União

técnicos e universidades, que são duas instituições distintas, em

Europeia, por exemplo, vai bastante longe nas articulações

que uma forma profissionais direcionados e qualificados para o

de políticas nacionais. Na questão do reconhecimento dos

mercado de trabalho e a outra também o faz, mas numa lógica

diplomas, que é uma questão central que nós, no âmbito

mais investigativa e menos articulada às necessidades do mer-

de uma rede de peritos da OEI (Organização dos Estados

cado de trabalho.

Iberoamericanos), tentamos construir uma nova articulação

mundial. É cada vez maior o número de encontros, simpósios mundiais e internacionais. Há uma dinâmica promovida pela Unesco e por outras organizações internacionais que facilitam

que permita a mobilidade das pessoas por conhecimentos mútuos de diplomas entre os países da América do Sul, a Europa já EPCT | Na Conferência, o senhor comentou sobre a necessidade de aproximação dessas instituições de ensino superior com o mercado de trabalho. Como Portugal tem feito isto, o que as instituições educacionais fazem? Elas promovem rodadas de negócios?

deu um grande passo. Assim, na Europa, mais do que produzir

Bom, o que se tem feito nos últimos anos é tentar trazer

diferenças culturais e históricas de cada país, permitindo a mo-

para dentro da universidade, e até nos seus próprios órgãos de

bilidade entre as fronteiras, facilitada pelas línguas espanhola

governo, órgãos de formação, o mundo exterior: as empresas, os

e portuguesa, quase que uma língua franca, pelas quais se en-

movimentos culturais e as principais atividades sociais; é tentar

tendem relativamente bem.

os mesmos modelos de ensino profissional, agora é possível encontrar dinâmicas de articulação entre os países para defi-

trazê-los para dentro das universidades, em órgãos mesmo para consulta. Em alguns casos do ensino superior, tendo em vista fortalecer essa adequação, os cursos têm estudado a empregabilidade de seus diplomados. Os dados desses estudos são pu-

EPCT | Como a educação profissional e tecnológica pode colaborar nas políticas de desenvolvimento sustentável?

blicados anualmente e essas informações são importantes tanto

O ensino profissional não deve ser um ensino desgarrado

para quem está entrando no mercado de trabalho quanto para

da realidade dos próprios alunos nem das necessidades econô-

quem procura o ensino superior.

micas, sociais e culturais da sociedade, deve estar muito ligado

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 1-6, jul./dez. 2010

joaquim azevedo

nirem as linhas comuns, os requisitos comuns, respeitando as

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ao desenvolvimento social local. No caso dos portugueses, as

emprego na área em que se qualificaram, poderão saltar

necessidades econômicas e sociais têm sido lentamente supe-

de um emprego para outro ao final de um, dois, três anos

radas com bastante sucesso pela sustentabilidade, que, antes

e poderão, se precisarem, ter na escola um apoio para uma

de mais nada, tem de repousar no desenvolvimento humano

qualificação ou atualização profissional de uma ou duas se-

de todos. A partir da adolescência e da juventude, sobretudo,

manas, um, dois ou três meses. A escola deve ser uma espécie

o ensino profissional tem um lugar muito importante, pois

de clínica de atendimento permanente capaz de responder

nem todos fazem o mesmo tipo de ensino e nem todos têm o

aquilo que é a sua missão como instituição educativa, e não

mesmo tipo de expectativas e capacidades, por isso que a edu-

empurrar as pessoas como se fosse um serviço de contabili-

cação deve criar oportunidades para todos realizarem alguma

dade: pagou? Pode ir embora. O próximo! A idéia não é essa.

atividade. E o ensino profissional deve ser de qualidade como

A responsabilidade social de uma instituição educativa vai

todos os outros, pois sua missão fundamental não é ensinar

muito mais longe.

os meninos a fazerem, mas aprenderem a ser fazendo, que é algo bem diferente. E é esta perspectiva que temos buscado trabalhar mais em nós: conciliar uma bagagem cultural cientí-

EPCT | E os egressos procuram e voltam às escolas?

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

fica, que é necessária a qualquer cidadão do século XXI, com

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uma articulação profissional adequada às necessidades não só

Eles voltam cada vez mais, à medida que percebem que

locais, mais também mundiais, pois muitos de nossos jovens

há uma instituição que os acolhe. E isso também depende da

hoje estão ligados e articulados a redes mundiais. As fronteiras

maneira como saem. A educação é um desenvolvimento, a

estão se desfazendo e rompendo cada vez mais, uma tendên-

pessoa aprende e cresce ali conosco, criamos laços, por isso,

cia que se acentua para o futuro. Portanto, creio que o ensino

ao sair, ao receber o diploma, é importante dizer à pessoa

profissional tem um papel muito relevante, porque forma e

que nós continuamos com ela, e quando precisar estaremos

qualifica as pessoas para servirem à sociedade como eletricista,

com um gabinete de apoio para encontrar a melhor solução

engenheiros, etc., profissões tão importantes quanto um juris-

para que ela continue pró-ativa, feliz e realizada profissional

ta, um arquiteto, por exemplo. Portanto, é preciso dignificar

e humanamente. Essa é a idéia, a educação tem aí um papel

igualmente o ensino profissional e os demais setores profis-

crucial, nós não podemos negar isto. Portanto, acredito que

sionais e laborais da sociedade, ou seja, dignificar as profissões

as escolas de formação inicial podem e devem cada vez mais

técnicas também. O problema do ensino profissional não está

evoluir para essa responsabilidade social de acompanhar seus

na escola, está na sociedade.

diplomados ao longo da vida.

EPCT | Há em Portugal alguma avaliação ou certificação dessas escolas profissionais?

EPCT | Quando o senhor foi secretário de Estado lá em Portugal qual foi a sua maior ação em prol da educação profissional?

Sim. Existem muitos relatórios de avaliação para acompa-

Foi a criação das escolas profissionais. Elas foram criadas em

nhamento e resultados, todo tipo de resultado, como funciona,

todo o país há 20 anos por minha equipe. Criamos cinquenta no

quanto se gasta, quantos qualificam, quanto sucesso, quantos

primeiro ano, mais cinquenta no segundo ano e outras cinquen-

anos demora para qualificar uma pessoa, qual a empregabilida-

ta no terceiro. E esta rede ainda hoje está toda por aí. E agora

de dos jovens por áreas, tudo isso está registrado.

está a ampliar-se por todas as escolas secundárias, para todos os diversos cursos. Como esses cursos cresceram muito bem e com bastante sucesso, agora o Ministério da Educação decidiu criá-

EPCT | As escolas têm acompanhamentos de egressos?

los em todas as escolas.

Sim, e é feito pelas próprias escolas. É na ótica que eu falava. Muito se fala das responsabilidades sociais das empresas.

EPCT | Existe rede privada de educação profissional em Portugal?

E a responsabilidade social das instituições educacionais? Uma instituição de ensino e formação tem responsabilidade

Sim. As escolas profissionais inicialmente começaram com a

social de acompanhar aqueles que ela qualificou. A instituição

rede pública e privada e hoje estão sendo alargadas a todas as

não pode simplesmente lançar os egressos e dizer “agora vão

escolas públicas também. Já temos cerca de 40% dos jovens nos

embora, desapareçam”. Não. Os egressos poderão encontrar

cursos profissionais. E isso é muito forte.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 1-6, jul./dez. 2010


EPCT | Quando o senhor fala da expansão da educação profissional para as escolas públicas, isso significa que a escola passa a ser uma instituição de educação profissional ou ela guarda as duas possibilidades?

para ensino profissional e a representação social, que nós estávamos tentando ultrapassar há 20 anos, volta a 1970, as pessoas voltam a dizer: “pois é, aqui, o ensino técnico é para os desgraçados, para os que reprovam.” E essa questão está provocando

Guarda sempre as duas possibilidades. Há cerca de 600 esco-

um grande debate hoje. Isso é um problema. Mas, digamos que a

las no país que oferecem o nível secundário, o ensino médio como

medida política em si é positiva, está correta? Agora o seu caráter

vocês chamam. Nas escolas secundárias públicas, havia cursos

apressado - vamos fazer isto rápido e... - tem esses contras, né.

artísticos e cursos gerais e havia uma razão de quase 75-25. E o

O sucesso das escolas profissionais depende de vencer vários

que é que se tem feito nesses últimos anos, uma vez que essas

fatores, um deles é que as escolas são de pequena e são escolas

experiências estavam a dar maus resultados? Não tinham sucesso

muito dirigidas a uma lógica, como é que eu vou dizer, há uma

e tinham uma má representação social. O Ministério da Educação

cultura profissional: os professores, os alunos, as família, todos

estudou essas experiências, que já têm 20 anos e não é mais uma

estão ali numa escola profissional, a cultura dentro dela é profis-

pequena experiência, e introduziu esses cursos agora em todas

sional , há muita obrigação ao mercado, às organizações sociais,

as escolas. Então, em Portugal, há cerca de 150 escolas que são só

às empresas, porque a escola é profissional. Ora, um Liceu, uma

profissionais e as outras 600 mesclaram os dois cursos. Daqui a um

escola secundária nunca teve essa preocupação e, portanto, por

ano, todas passarão a oferecer os dois tipos de cursos. Deixará de

vezes, é uma espécie de violência obrigá-las a ter um curso, dois

haver aquela lógica que vem do passado, o Liceu, escola de ensino

cursos profissionais e, ainda por cima, entre mil alunos tem um

geral, propedêutica do ensino superior e a escola profissional que

curso profissional, dois cursos profissionais. E pra que isso serve?

prepara para o mercado de trabalho, isso acabou agora.

Para empurrar, quer dizer, não assumir dentro de uma cultura profissional e esse é um dos problemas que temos hoje, mas creio que se for bem acompanhado pode ser superado. É irrever-

EPCT | Então, vocês estão implementando um processo que nós chamamos aqui de ensino integrado? Inclusive, não só integrado no modelo de ensino, mas inte-

sível isso. Porque não é criar uma rede nova, é inserirmos numa rede que já existe que é uma rede estável que é a rede de escolas secundárias públicas.

grado na mesma escola.

EPCT | Nós tivemos uma experiência com uma lei de educação no nosso país em 1971 que tornou obrigatório o ensino profissionalizante no país, isso foi péssimo para o ensino médio porque quando ele se tornou obrigatório, as instituições não tinham capacidade de oferecer essa educação profissional e eu tenho a impressão de que o que está havendo lá é algo similar a esse processo. É isso mesmo?

EPCT | Professor, existem vários cursos em cada uma dessas escolas? São vários cursos profissionais? Sim. Os cursos profissionais estão divididos em vinte áreas profissionais, áreas, digamos, do saber ligadas às tecnologias e dentro de cada área pode haver dois ou três cursos. As escolas tanto podem oferecer um curso ou outro em função das necessidades do público-alvo, da capacitação do corpo

Não é bem obrigatório, não é obrigatório, é um processo lento que já vai para o 4º ano ou 5º, não deixa de ter esse pro-

docente, das instalações e dos equipamentos que o ensino profissional requer.

blema. Isto é, há muitas escolas que eram de ensino geral, e que

profissional. Nesse contexto, em quê se transforma o ensino pro-

EPCT | Teve algum revezamento de professores da rede para essas escolas oferecerem essa nova modalidade de ensino até o 12º ano ou houve contratação de novos professores?

fissional? Num caixote com lixo para os meninos que reprovam?

Houve contratação de novos professores. A escola, em coo-

E nisso temos problemas, evidente, quer dizer, que nem tudo

peração com o Ministério da Educação e com outra rede já exis-

isso são rosas e precisamos acompanhar esse processo muito

tente, contratou e escolheu a área para não criar sobreposições.

lentamente agora. Mas, esse problema existe claramente e nós

Um artigo que escrevi à revista argentina Proposta Educativa, de

estamos preocupados com ele, é um problema latente e que se

número 30, explica como as escolas profissionais nasceram e se

manifesta em algumas escolas com manifestações desse tipo. Os

desenvolveram. O artigo ajuda-nos a perceber esta transição e

alunos que reprovam no primeiro ano – que é o 10º, são 3 anos:

fala também dos perigos dela e da necessidade de fazê-la com

10º, 11° e 12º - e têm os piores índices são re-encaminhados

muita precaução.

agora avaliando isso: por que está tendo efeitos negativos em algumas escolas? Porque elas não sabem o que é o ensino

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 1-6, jul./dez. 2010

joaquim azevedo

agora tem recursos profissionalizantes, é verdade. E estamos

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EPCT | Depois de 100 anos de educação técnica e profissional no Brasil, ao contrário do que se esperava – a integração maior entre a rede que já existia e a rede não profissional, criou-se uma nova rede, uma nova expressão que, inclusive, concorre, por exemplo: eu tenho uma rede de educação profissional que está vinculada ao Estado diretamente que é a rede federal e eu tenho uma rede profissional que é do Estado local...

escolas secundárias. As escolas estão abertas desde manhã cedo até a meia noite porque tem curso da formação inicial. Depois das cinco e meia da tarde, quando os alunos jovens vão embora, entra a população adulta, é onde entram os pais dos que estão de dia. Eles criam uma dinâmica social muito interessante de valorização do conhecimento, do saber, com ganhos incríveis porque são pais de aluno que ficaram com a quarta classe, quar-

Eu sei, já me falaram disso. Agora nós estamos fazendo outra

ta série como vocês dizem e que nunca mais estudaram, é um

coisa que ainda é mais interessante desse ponto de vista que

grupo de analfabetos que vêm à escola de novo, que ganham

é receber a população adulta para fazer a formação nas novas

gosto por saber e que depois vão pra casa fazer uma coisa que

oportunidades. Nesse programa, recebemos a população adulta

nunca fizeram, que é incentivar os filhos - tem que estudar, tem

para realmente reconhecer, validar e certificar o saber que essas

que estudar! E é isso que faz aumentar a escolarização no país.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

pessoas construíram ao longo da vida. Essa certificação se faz nas

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 1-6, jul./dez. 2010


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 7-10, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

RAMÓN MONCADA > Por Juliana Caixeta & Rafael Voigt

Coordenador do projeto Conhece tua Cidade,em Medellín, na Colômbia

Um debate sobre cultura e educação profissional

EPCT | Nós pesquisamos um pouco sobre sua história acadêmica e gostaríamos de saber de você o que significa o conceito de cidade educadora.

EPCT | Há alguma classificação para as cidades educadoras? Ou o que as diferem é o jeito de elas promoverem os caminhos educacionais?

Para falar de cidade educadora, é preciso antes falar da re-

Sim, há classificação, mas esta tem mais a ver com a in-

lação entre educação e cidade, porque sempre a existência da

tencionalidade do que com o tamanho da cidade. Existem

uma significa também a existência da outra. Pois onde há cul-

cidades no mundo que se declaram cidades educadoras

tura e sociedade há também educação. Por isso a necessidade

e se associam à Associação Internacional de Cidades

de diferenciarmos escolarização de educação, pois esta existe

Educadoras, com sede em Barcelona/Espanha1, mas não

há muito anos, ao passo que aquela é um sistema com pouco

fazem tudo o que se deve fazer para se converterem em

tempo de desenvolvimento na história da sociedade. Então, o

verdadeiras cidades educadoras. Para ser uma cidade edu-

mais importante não é o conceito de cidade educadora, mas

cadora é necessário ter objetivos comuns, políticas sociais,

a relação entre educação e sociedade, educação e cultura e

e não só políticas educacionais. Uma cidade educadora não

educação e cidade. O conceito de cidade educadora foi pro-

é somente uma cidade que educa, no sentido simples da

movido pela Unesco, em 1970, e pela Associação Internacional

educação, é uma cidade inclusiva, diversificada, democráti-

de Cidades Educadoras, em 1990, com o sentido de qualidade

ca, participativa, cidadã. Uma cidade excludente não pode

educativa/educadora das cidades. Toda cidade tem uma fina-

ser educadora. Nesse sentido, as cidades latino-americanas

lidade educativa, seja explícita ou implícita. Diz-se que uma

são um pouco contraditórias com a ideia de cidade educa-

cidade é educadora quando esta tem uma intencionalidade

dora, pois são pobres e excludentes e também porque suas

de educar a sociedade e não apenas de escolarizar. Na cidade

ditaduras ou oligarquias não correspondem à imagem da

educadora, tem-se a escola e também outros espaços, am-

cidade educadora.

7

bientes, agentes e conteúdos educacionais. Em tese, a cidade educadora é um sistema municipal de educação que se faz no campo do sistema escolar e também em outros âmbitos educativos ou educacionais não-formais.

1 Associação Internacional de Cidades Educadoras é uma associação de caráter intergovernamental, com forte influência dos municípios, inclusive, são os municípios os responsáveis por elaborarem declarações referentes ao conceito cidade educadora.

Entrevista concedida em 27.11.2009


EPCT | Existe alguma cidade educadora modelo?

temos buscado fazer um sistema único nacional de educação, mas precisamos de uma maior coordenação, sobretudo para termos

Em termos culturais, sociais e políticos, não gosto de falar em

uma maior coerência, uma maior participação dos subsistemas do

modelo, mas em modelos, no plural. Pois existem modelos de

grande sistema educacional nacional. Um outro aspecto impor-

cidades educadoras dentro de vários continentes, cujas culturas,

tante a considerarmos é que, com o neoliberalismo, o capitalismo

sociedades e formas de organização são diversas. As cidades asi-

e a economia de mercado, temos a tendência de promover as en-

áticas, por exemplo, não têm o mesmo jeito das cidades latino-

genharias, as tecnologias avançadas e, com isso, corremos o risco

americanas. Então não há como ter um modelo único a ser se-

de não formamos artistas, sociólogos, filósofos, antropólogos,

guido. Sendo assim, nós temos de reconhecer as experiências, as

psicólogos, etc., também importantes para a sociedade. Portanto,

trajetórias, os percursos de outros continentes, países e cidades

é preciso haver um equilíbrio na oferta dessas áreas.

e temos também a necessidade e a obrigatoriedade de construir os nossos próprios modelos e percursos de cidades nos países latino-americanos.

EPCT | Como a teoria freireana pode ser aplicada à educação profissional?

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

Penso que Freire expressou muito bem a ideia e o senti-

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EPCT | Como a educação profissional se relaciona com esse conceito de cidade educadora?

do político e cultural da educação, uma vez que a educação é a compreensão do mundo e sua transformação. Isto é o

A educação profissional e tecnológica tem justamente essa

que Freire chamou de “leitura do mundo”, que não é a leitura

relação, porque é uma educação permanente, não só dentro do

codificada dos textos, artigos, livros, mas a compreensão do

sistema escolar formal, mas para a vida toda. Outra característica

contexto. A leitura do mundo ajuda a compreender e trans-

que a relaciona à cidade educadora diz respeito às inteligências

formar o mundo. E o mundo, para ser transformado, precisa

múltiplas, de Gardner. Na tradição do sistema educativo esco-

de tecnologia. Não é só a tecnologia dos computadores. É a

lar sempre dominaram estas duas inteligências: a inteligência

tecnologia que está na vida toda: para você ter água, energia,

lógico-matemática e a inteligência da linguagem. Na formação

abrir e fechar uma porta. Para viver, você precisa de tecnolo-

profissional-tecnológica, além dessas, são reconhecidas e pro-

gia. A educação, a cultura, a sociedade precisam da formação

movidas diversas outras inteligências como na maneira de fazer,

tecnológica. Para compreendermos e transformarmos o

de pensar e de se relacionar no mundo. Isto é justamente a ideia

mundo, precisamos das tecnologias e, portanto, precisamos

da cidade educadora, em que a promoção da educação não é só

também da formação tecnológica profissional.

a educação geral acadêmica, mas também a formação técnicatecnológica e profissional mais específica e humanizada. Acho interessante diferenciar a educação acadêmica da educação técnica-tecnológica, pois são duas maneiras, duas formas complementares de compreender a educação e a cidade educadora.

EPCT | Em sua conferência, o senhor falou da cultura como essência do humano. O senhor acha que essa temática tem sido bem explorada na educação profissional? Eu falo sobretudo pela minha experiência na Colômbia. Eu acho que não. A temática da cultura não está muito relacionada

EPCT | Portugal tem um sistema educacional e profissional que é aglutinado, junto. O Brasil não. Aqui, há redes separadas de educação: a educação profissional, realizada, por exemplo, pelos Institutos Federal de Tecnologia (que são os antigos CEFETs) e a educação regular. Sabendo que há similaridades entre o processo educacional profissional da Colômbia e o daqui, como é esse aspecto na Colômbia?

e explorada na educação profissional e tecnológica. Acredito ser este um grande risco, pois não se pode formar só pelo saberfazer, pelas habilidades e competências, há de se ter também uma responsabilidade político-social com a cultura, com os projetos políticos e culturais. Por isso, é necessário saber-fazer num contexto social, num contexto cultural de responsabilidade política. Ainda porque os países latino-americanos injetam muita

Na Colômbia, é o mesmo problema. Nós temos o sistema

tecnologia estrangeira, tecnologias de diferentes matérias, e

educativo formal geral, de responsabilidade do Ministério da

com isso, temos a obrigatoriedade de refletir, de pensar a relação

Educação, e temos também o sistema técnico de formação pro-

entre essas tecnologias que vêm de fora com a nossa cultura,

fissional e tecnológica, que é de responsabilidade, sobretudo

com os nossos projetos sociais e culturais. Portanto, esta relação

no Ensino Médio, do Sena – Serviço Nacional de Aprendizagem.

com a cultura é, para mim, um grande desafio da educação e da

Nós não temos uma unidade no sistema educativo. Dessa forma,

formação profissional e tecnológica.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 7-10, jul./dez. 2010


EPCT | No Fórum do Alto Tietê, o senhor disse que a política educacional deve ter um horizonte cultural e estratégico a longo prazo. O que isso significa de fato? Significa que as políticas educacionais não devem se pautar apenas nos programas e projetos no prazo de um governo. Para mim, isto é muito importante. O Lula só fica dois governos, mas isto é muito pouco na história

Não se pode formar só pelo saber-fazer, pelas habilidades e competências, há de se ter também uma responsabilidade político-social com a cultura, com os projetos políticos e culturais.

EPCT | Quais são as possibilidades que se abrem para a cultura quando falamos de educação profissional? Para mim, as culturas se fortalecem com a educação profissional e tecnológica. Fazendo uma comparação entre a formação técnica e o mundo do trabalho e emprego, vejo, no caso da Colômbia, que a formação tecnológica é vista apenas com a finalidade de inserir

do povo, da sociedade brasileira.

os jovens no mercado de trabalho.

Os governos têm a responsa-

Entretanto, penso que os jovens

bilidade de fazer coisas no seu

devem ter a possibilidade de se

período, mas têm a obrigatoriedade de pensar a longo prazo,

educar não apenas para entrar de no mercado de trabalho, uma

porque a educação tem a ver com os câmbios culturais, das

vez que a razão de ser da educação deve ir além da preparação e

mentalidades. É a transformação cultural, a transformação das

formação para o emprego, deve formar para a vida, nas dimensões

mentalidades, não se faz a curto prazo, se faz a longo prazo. É

social, política e cultural. Os jovens não precisam entrar no mundo

por isso que precisamos dessa dimensão de políticas educacio-

do trabalho tão rápido, como eles entram agora nos nossos países.

nais para o longo prazo. Quatro, oitos anos para os programas

Esta é uma coisa do ponto cultural, porque culturalmente nós

e projetos implementados, às vezes, é um tempo curto para

aceitamos. Esta é uma idéia louca, eu acho. O que precisa, para a

que esses programas sejam de fato efetivados. São poucas as

nossa cultura e para a nossa sociedade, é um emprego, um traba-

verdadeiras políticas educativas, porque as políticas educativas

lho digno, para os pais e para as mães, para que os jovens possam

têm a ver com esse longo prazo.

ser jovens, se educar mais tarde, mas não só para o trabalho, não só para o emprego, porque a razão de ser da educação deve ir além da preparação e formação para o emprego, é uma formação

EPCT | Como o senhor percebe as diretrizes pedagógicas do ensino profissional brasileiro no âmbito geral? O senhor acha que o Brasil tem conseguido cumprir essas diretrizes?

para a cultura. É uma formação para a vida. Tendências estatísticas internacionais apontam que no futuro não haverá emprego e trabalho para todas as pessoas. Sendo assim, como as pessoas sem

Eu estou surpreso com o que vocês chamam de rede fede-

colocação no mercado de trabalho terão acesso aos direitos so-

ral de formação profissional e tecnológica. Eu acho que neste

ciais, políticos e culturais? Por isso, é que temos de procurar desde

governo a formação profissional e tecnológica ganhou uma

já a reconhecer e garantir esses direitos, inclusive na educação

importância que precisa ser reconhecida. Eu espero que a troca

técnico profissional.

de governo continue nesse mesmo sentido. Oxalá que não fique como um programa do Governo Lula e da Secretaria do Eliezer. que fique para o médio e longo prazo, para fortalecer essa rede federal, para fortalecer as escolas técnicas, para fortalecer os

EPCT | Como formar professores que consigam ter essa leitura do mundo para compartilhá-la com seus alunos da educação profissional?

institutos federais, para ter rede entre eles. Não só rede, porque

Tivemos essa discussão na Colômbia. Em tese, os professores

são muitos institutos federais, mas porque tem interação, tem

das escolas técnicas e do sistema nacional de formação profis-

comunicação, tem coordenação de ações entre eles. E, para isso,

sional e tecnológica têm uma formação especificamente técnica.

precisa mais orçamento, mas também precisa de um projeto

Eles possuem habilidades, competências, domínio e experiência

pedagógico e político para fortalecer esse projeto da formação

técnica específicos, mas são professores de uma escola! Não

profissional e tecnológica. Eu estou muito surpreso, porque acho

sei como é no sistema brasileiro, mas no sistema colombiano

que o Brasil vai por um bom caminho. E não só um bom caminho

você tem umas tecnologias, umas técnicas, que você não tem

para o Brasil, mas um bom caminho que significa muito para os

a necessidade de ter feito estudos em educação e pedagogia.

outros países da América Latina e do mundo.

Você só precisa ter a experiência, a habilidade, a competência

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 7-10, jul./dez. 2010

RAMÓN MONCADA

Esperamos que seja uma política educacional que fique no Brasil,

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técnica, mas isso é só uma coisa. É por isso que precisamos que

Conheço duas experiências, uma na cidade de La Paz, que se

a formação dos professores tenha não só essa dimensão técnica

chama Fundação La Paz, e outra na cidade de Cochabamba, que

e tecnológica, eles têm que ser formados também nessas dimen-

se chama Centro Educacional “Ikipayauassi”, que é quéchua. São

sões políticas, culturais, nessas dimensões estéticas. O professor

centros escolas técnicas que têm um projeto muito importante

é também um gerador e divulgador, o gerador dessa ideia de

de acompanhamento psicológico e também de prevenção das

leitura do mundo.projeto social e cultural comum.

doenças sexualmente transmissíveis e da AIDS. Os professores

Então, importa-nos agora promover uma formação que

de lá são muito mais do que professores de técnica ou de tecno-

tenha não só essa dimensão técnica e tecnológica, precisa e de

logia, são professores do humano, não só do saber-fazer, mas do

boa qualidade, mas que contemple também uma dimensão

saber-ser. Então, essas são as experiências que eu lembro no mo-

mais política, social e cultural, promotora da leitura de mundo.

mento, que são muito boas e vocês podem constatar, pois são professores dessa dimensão humana que precisam esses jovens.

EPCT | O senhor conhece alguma experiência de sucesso que trate essa formação docente da maneira em que pensa? Aqui no Brasil não conheço nenhuma, mas conheço algumas

EPCT | O que fica do I Fórum de Educação Profissional e Tecnológica? Para mim, fica uma grande aprendizagem. O fórum não só

cional dos salesianos, chamada Dom Bosco. É uma escola técnica

foi uma oportunidade de refletir sobre as temáticas específicas

com jovens trabalhadores informais, jovens de rua, que recebem

da formação profissional e tecnológica, mas também da conexão

não só uma formação técnica, mas também uma formação muito

dessa formação com outras temáticas, com uma outra dimensão

importante do ponto de vista cultural, estético e social. E os

da educação, da cultura, da diversidade e da construção de um

professores de lá têm uma formação muito específica. Também

projeto social-cultural comum. De outro lado, fica também o

colaboro com o Programa dos Direitos das Crianças e dos

reconhecimento do povo brasileiro, da organização e da rigoro-

Adolescentes, programa regional no Brasil que se faz na cidade

sidade no pensamento para construir o Brasil, o projeto brasilei-

de Fortaleza, na Cidade de Cochabamba e La Paz, na Bolívia, na

ro, e também compartilhar com os projetos de outros países e

cidade de Cuzco, no Peru, e na cidade de Medelín, na Colômbia.

continentes. Isso fica no meu coração.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

experiências na Colômbia. Uma delas é uma experiência interna-

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 7-10, jul./dez. 2010


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 11-12, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

Michael Maynard > Por Juliana Eugênia Caixeta & Rafael Voigt

Michael Maynard is President of the New Brunswick Community College (Canada)

Canadian colleges and the policies for access and inclusion

EPCT | Which was the context that allowed the creation of the Colleges in Canada?

EPCT | What is the relation between the concept of access and the College?

The colleges in Canada, the college system, started about

Well, as I explained, our philosophy is to make sure that

45 years ago when the government recognized that not

even if the student has not completed high school, they still

enough students were learning applied skills in the univer-

have access to college education. It’s not meant to keep peo-

sity, and so each province has a community college system,

ple out, it’s is meant to bring them in.

which has evolved over the years to include short-term applied training, joint partnerships with the universities offering joint degrees, and now, in certain provinces, some colleges offer their own applied degrees.

EPCT | Is it because it’s just for people who are excluded or not? Or can anybody study at the college? Anybody can study at the college. We make sure that even

EPCT | And how do they work? We have access policies there. In some programs students

students with disabilities, aboriginal students and international students: all have an opportunity.

have to complete high school. Grade 12 is the matriculation. In some special programs, students have to submit portfoCollege, Visual Arts, and so students are… have to complete

EPCT | And what about the technological training in the schools? Is it like technical vocational?

high school with good grades and in certain programs they

This has been the original mandate of the college system

have to submit a portfolio of work. We also have special con-

in Canada: to provide Vocational Applied Training. As I mentio-

sideration, we call it PLAR - Prior Learning Assessment and

ned, it has a vault, so now there’s more theory in some progra-

Recognition, where we can accommodate those students

ms, more critical thinking. But the approach is still vocational;

who have not completed a formal education.

so very much hands on learning.

lios of work. The college where I am the principal is an Art

Entrevista concedida em 27.11.2009

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EPCT | What is this program “Women 1,000”, and how does it work? “Mulheres Mil” (A Thousand Women) is a very important educational program. The Brazilian government wanted to try to improve the lives of disadvantaged women, by bringing them into the Brazilian college system. They visited colleges in America and Europe looking for institutional models, and they eventually came

Well, as I explained, our philosophy is to make sure that even if the student has not completed high school, they still have access to college education. It’s not meant to keep people out, it’s is meant to bring them in.

project so that we can help sustain the project, so that the access policies and curriculum can be broken into the regular program. EPCT | How does PLAR – Previous Learning Assessment and Recognition and Map of life work? PLAR works in Brazil differently from our model in Canada. There has not been a lot of similarities. The PLAR policy in Brazil has been in a

to Canada, where they recognized

past to exclude applicants, we

that the Canadian system was very

have lots of testing. In Canada,

close to what could work in Brazil. And so, they visited colleges all

it’s meant to bring students in, so we are trying to help, to

across the country, and the New Brunswick College of Craft and

find a better model. The challenge is the numbers. I have just

Design was selected as one of eight Canadian colleges to work

been speaking with my partners in Teresina: 25,000 women

with CEFETS in Brazil’s north and northeast, helping advise on

want to come in to the next project and only 1,700 have been

access policies, curriculum development and the cooperative in-

accepted. How do you test that number of people? It’s just

cubator concept. We’re going to help women learn about fashion

overwhelming.

and crafts, within the Brazilian college system, over the four years of the Mulheres Mil project. It would be a model program, provi-

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

ding new opportunities for women in Brazil’s college system.

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EPCT | How do you “process” this testing for selecting one thousand of all the 25,000?

I’ve visited Brazil four times now and I love Brasil (Eu amo

It’s a challenge. It’s a real challenge. I don’t think that the

Brasil!). I’m working with Sergipe (Aracaju), Tocantins (Palmas)

model that is used in Canada will work, because of the numbers.

and Piauí (Teresina). I was working with Belém (Pará) but I think

So there are people making it happen in Brasília with MEC to try

that sub-project has been suspended. It has all been a wonderful

to think about a system that will work for all colleges.

experience. I don’t know if you’ll have the opportunity at this Congress to see some of the women from the project. It’s just,

EPCT | “Map of life”: how does it work?

you know, it’s just amazing. These are women who have little

This is something that has been very successful. Women in

education, who don’t have a lot of training. I’ve visited them in

the project have been asked to draw their life: their husbands,

their “favelas” (shantytowns) and here they are now, so proud, so

their children, their home, their town, their river… and out of

empowered, so confident with their new lives. It’s very special!

these drawings they begin to see that they have life experience. It may not be on a piece of paper, it may not be from school, but

EPCT | Which are the other projects in Brazil that are financed by the Canadian Agency BSP/DSP International? Do you know? I’m sorry. I don’t know. Our project is funded by the Brazilian go-

the informal learning, the experiential learning, is as just as important, as just as powerful. And it’s a very graphical way to them to understand that they have something to offer.

vernment. They have been spending 4 million reais and the Canadian government, 2 million dollars to support this exchange and this project.

EPCT | And what other tools do you have in PLAR? In Canada, we usually have an English language test. We

EPCT | Which are the functions of the IFET’s (Federal Insitute of Education, Science and Technology - IFET’s are like canadenses colleges)? Which are the aims/the objects?

often have an interview and we also try to have the opportuni-

We are working with the IF/SE, IF/PA, IF/PI, several… and all

person and to try to find a way to match their needs with what

of them are doing wonderful work with these disadvantaged

the college can offer to try to find a middle ground. We would

women and the hope is that they are learning from this pilot

use any means we can to try to help people.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 11-12, jul./dez. 2010

ties laid down their experience. In certain cases, they might have to draw a life map, but what we try to do is to look at the whole


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 13-15, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

Michael Maynard > Por Juliana Eugênia Caixeta & Rafael Voigt

Michael Maynard é Reitor do New Brunswick Community College (Canadá)

Centros de Ensino Superior canadenses e as políticas de acesso e inclusão

EPCT | Em que contexto foi permitida a criação dos centros superiores de ensino chamados colleges no Canadá?

especialmente que com o PLAR - Prior Learning Assessment (and

Os centros de ensino de nível superior no Canadá, o sistema

Aprendizagem Prévia - daqui, nós podemos acomodar aqueles

de ensino college, começaram há cerca de 45 anos, quando o

Recognition), tal como o ARAP - Avaliação e Reconhecimento da estudantes que não completaram a educação formal.

governo reconheceu que um número insuficiente de estudantes não estava aprendendo as habilidades aplicadas quando ao curculdade, que evoluiu ao longo dos anos para incluir treinamento

EPCT | Qual é a relação entre o conceito de aos centros de ensino e a instituição em si?

aplicado a curto prazo (intensivo) em parceria com as universida-

Bem, como eu expliquei, nossa filosofia é assegurar que

des, oferecendo graduação conjunta. Agora, em alguns estados,

o aluno, mesmo que não tenha completado o ensino médio,

alguns centros oferecem sua própria graduação tecnológica.

ainda terá acesso à educação superior. O programa não foi

sar a universidade. Então, cada estado possui o seu sistema de fa-

feito para manter as pessoas do lado de fora, mas sim para trazê-las para dentro da instituição. EPCT | E de que forma eles funcionam? Nós temos políticas de acesso por lá. Em alguns programas, os estudantes precisam ter concluído o ensino médio. A matrícula se dá no 3º ano do Ensino Médio. Em alguns programas especiais, os estudantes precisam apresentar um portfólio de

EPCT | É por que o programa foi feito para as pessoas que são excluídas ou isto não se aplica? Qualquer um pode ingressar nos centros de ensino?

trabalho. Então, para ter acesso à Escola de Artes Visuais, o cen-

Qualquer pessoa pode estudar nestes centros. Nós ga-

tro de ensino técnico do qual eu sou diretor, os alunos precisam

rantimos que mesmo alunos com deficiências, de origem

ter completado o ensino médio com boas notas e, em alguns

Aborígene ou estudantes internacionais tenham acesso. Todos

programas, apresentar o portfólio. Nós também consideramos

têm uma oportunidade.

Entrevista concedida em 27.11.2009

13


EPCT | E sobre o treinamento técnico nas escolas? Eles são como os treinamentos técnico-profissionais? Este tem sido o lema original do sistema college de ensino

superior

no

Canadá:

oferecer Treinamento Profissional Aplicado. Como eu mencionei antes, nós temos um objetivo a ser alcançado, então, agora temos mais conhecimento teórico em alguns programas, mais pensamento crítico, mas a abordagem ainda é o ensino profissional, então

Bem, como eu expliquei, nossa filosofia é assegurar que o aluno, mesmo que não tenha completado o ensino médio, ainda terá acesso à educação superior. O programa não foi feito para manter as pessoas do lado de fora, mas sim para trazê-las para dentro da instituição.

muito foco na aprendizagem.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

EPCT | No que consiste esse programa “Mulheres Mil” e como ele funciona?

14

EPCT | Quais são os outros projetos no Brasil que são financiados pela Agência Canadense BSP/DSP International? Você sabe? Desculpe-me, eu não sei. Nosso projeto é financiado pelo Governo Brasileiro e Canadense. Eles nos dão uma verba de quatro milhões de reais e o governo Canadense nos ajuda com dois milhões de dólares, dinheiro esse que mantém esse intercâmbio e esse projeto.

EPCT | Quais são as funções dos IFET’s - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia? Quais são os objetivos, as metas? Nós estamos trabalhando com vários IFET’s, como os de

“Mulheres Mil” é um programa importante que o Governo

Sergipe, do Pará, Piauí, todos eles têm desenvolvido um ex-

do Brasil está implementando para tentar melhorar as notas

celente trabalho com essas mulheres desfavorecidas. A nossa

das alunas do ENEM ao inserí-las no sistema de ensino do

esperança é que elas estejam realmente aprendendo com esse

Brasil. Eles visitaram centros tecnológicos na América, na

projeto piloto. Isso nos ajudará a manter o projeto e também

Europa e, finalmente vieram ao Canadá; e reconheceram que

poderá fazer com que as políticas de acesso e currículo sejam

o sistema canadense de ensino seria o mais próximo do que

interrompidas e transformadas em um programa regular.

poderia funcionar no Brasil. Eles visitaram várias faculdades pelo país e o meu centro de ensino - a Faculdade de Arte e Design de New Brunswuick foi selecionada como uma das oito faculdades no Canadá para trabalhar com treze agricul-

EPCT | Como funciona a ARAP - Avaliação e Reconhecimento da Aprendizagem Prévia e o “Mapa da Vida”?

toras/plantadoras, à época no Norte e Nordeste, para ajudar

A ARAP funciona de forma diferente do nosso modelo no

com as políticas de acesso, currículos e uma incubadora de

Canadá. Não há muitas semelhanças. A política de ARAP no Brasil

cooperativas para ajudar “mil mulheres” dentro do sistema de

tem um histórico de exclusão, com a realização de vários testes.

ensino superior no Brasil durante 4 anos. Isso serviria como

No Canadá, ela foi feita para trazer os estudantes para dentro

um modelo para tentar criar novas oportunidades para as

das instituições de ensino; então, nós estamos tentando ajudar,

mulheres nos centros de ensino. Eu já visitei o Brasil quatro

tentando achar um modelo melhor. O desafio são os números.

vezes e eu “Amo Brasil” [risos] – eu estou trabalhando em

Eu estava conversando com os meus parceiros desse projeto em

Sergipe (Aracaju), Tocantins (Palmas) e em Piauí (Teresina).

Teresina: 25.000 mulheres querem entrar no próximo projeto e

Eu estava trabalhando em Belém (Pará), porém eu acho que o

apenas 1.700 foram aceitas. Como você testa essa quantidade de

sub-projeto de lá foi interrompido. Mas isso tem sido uma ex-

pessoas? Isso sobrecarrega a equipe do projeto.

periência fantástica e eu não sei se vocês já tiveram a chance de ver algumas dessas mulheres do projeto nesse Congresso. uma educação formal, que não têm muito treinamento. Eu as

EPCT | Como você maneja esse processo para selecionar apenas mil entre todas as 25.000 mulheres?

visitei nas favelas e aqui estão elas: são tão orgulhosas, tão

É um desafio. Este é um desafio de verdade. Devido aos

cheias de força, estão tão confiantes com suas novas vidas! É

números, eu realmente não acredito que o modelo usado no

muito especial.

Canadá vá funcionar aqui. Juntamente com o MEC, há um grupo

É simplesmente maravilhoso. São mulheres que não tiveram

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 13-15, jul./dez. 2010


procurando fazer esta realidade acontecer em Brasília ao tenta-

é uma forma bem visual, bem gráfica, de fazê-las entenderem

rem pensar em um sistema que funcione para todos os centros

que têm algo a oferecer.

de ensino. EPCT | E de que outras ferramentas vocês dispõem na ARAP? EPCT | “Mapa da Vida”, como ele funciona? No Canadá, geralmente, nós temos um teste de Língua Inglesa. Nós também entrevistamos as pessoas e tentamos

que as mulheres no projeto desenhem em uma folha de papel

descobrir as oportunidades que podem ser oferecidas a elas

suas vidas: seus maridos, seus filhos, a cidade em que moram,

pela experiência prévia. Em alguns casos, elas podem ter que

suas casas, o rio delas... E a partir desses desenhos, elas começam

desenhar um “mapa da vida”, mas o que nós tentamos fazer é

a perceber que elas possuem experiência de vida. Isso pode não

olhar a pessoa como um todo e tentar combinar as necessidades

ser um certificado obtido em uma escola tradicional, pode não

dela com o que a escola/centro de ensino pode oferecer a essa

ser formal, mas o conhecimento e a aprendizagem pela experi-

pessoa; procura-se tentar atingir um meio-termo. Nós usamos o

ência é tão forte e importante quanto a regular. O mapa da vida

que podemos para tentar ajudar as pessoas.

Michael Maynard

Isso é algo que tem atingido bons resultados. É solicitado

15

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 13-15, jul./dez. 2010



ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 17-19, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

JOS NOLLE > Por Juliana Eugênia Caixeta

Policies for access and inclusion in Canada Born in Holland, Jos Nolle earned his Master`s degree in Industrial Design Engineering at the University of Technology in Delft, Holland (1982). Following university he completed internships in Greece, South Africa and the Netherlands. From 1982-1983 he backpacked around the world. Employers included Fokker Aircraft Ltd, Amsterdam, Holland and Medecins sans Frontieres/Doctors Without Borders (medical relief group - two years based in Maputo, Mozambique coordinating medical relief projects, two years based in Toronto, Canada to set up the Canadian branch of this international organization, and two years based in Amsterdam, Holland, as a member of the management team as Director of Human Resources and Training). During these years he lived, worked and traveled in more than 40 countries. He joined Niagara College in 1995, coordinating international education development projects and stimulating the “internationalization process” of Niagara College. A creative and visionary leader, Jos specializes in starting new projects and programs, networking in order to bring the best people together to effect change, and working with budgets, auditors and funding agencies to provide sound financial management. He is an out-of-the-box thinker who is particularly passionate about providing access programs for non-traditional learners and short term practical vocational training programs for people with limited access to formal education.

EPCT | Are you a member of the Association of Canadian Community College (ACCC), sir? I work at Niagara College. It is one of the 150 institutions which are members of ACCC.

EPCT | The Association of Canadian Community College – ACCC is the sponsor of this Forum. What were the expectations of the institution when it decided to support the event? We participated in the Brazil Forum to promote our activities here and to discuss our ongoing interest to work with Brazilian

EPCT | What is this institution? Which are its goals? ACCC is a member organization which has as objective to lobby the colleges towards federal and provincial gover-

institutions, both current partner schools and new ones. EPCT | Had they been reached? Yes.

nments for adequate funding. They are all public institu-

from tuition fees of our students (including those from

EPCT | Since when does Canada have access policies, professor? Which is the concept of “access” that feeds the actions of the government and the Canadian universities?

other countries who pay full fees) and contract training

It was introduced in Canada about 25 years ago. We nee-

for companies and agencies. It also facilitates information

ded to do this because we always have many “non-traditional”

and experience sharing between teachers and adminis-

learners who somehow need to be included in the professional

trators of all the member colleges. Finally, ACCC pools

training in order to get work. Right now we have between 30

resources together from member institutions to bid for in-

and 40 % of students at Niagara College who have not com-

ternational projects funded by the Canadian International

pleted secondary education (for a wide range of social reasons)

Development Agency – CIDA and International Financial

or who did not enter post-secondary education immediately

Institutions such as the World Bank and the Inter American

after completing secondary education. We can’t leave these

Development Bank.

people outside of our training system.

tions, but we only receive about 60 % of our annual budget relocated from the government to us; the rest comes

Entrevista concedida em 29.11.2009

17


EPCT | What does PLAR (Previous Learning Assessment and Recognition) stand for the achievement of access? The PLAR analyzes competencies that people have gained through work experiences and informal learning. If those competencies can be articulated and be proven, then these students receive academic credits, which make it for them more attractive

It is important for Canadian students and teachers to realize that there are many systems of education around the world in order to stay positively critical about our own system.

that is for every non-traditional learner a different path. If we are not willing to invest in that, we will continue to exclude potentially good people from our society.

EPCT | Does Canada have other cooperation projects in Brazil based on this philosophy of access? Yes. There are other projects

to enter training programs. For

of social inclusion in Brazil funded

people with little formal edu-

by CIDA (Canadian International

cation, it gives them a sense of self-esteem which they need to

Development Agency).You can go to the Canadian Embassy in

succeed in formal training programs.

Brasília and ask to talk to the CIDA representative there to learn more about these projects.

EPCT | How does PLAR work? PLAR specialists need to take time to interview the student and compare their competencies and experiences with what will be taught in a training program. They need to talk to teachers in the training programs and then suggest decisions. This has all been formalized in the Canadian system.

EPCT | You have talked in your conferences about an access department in every institution of education. How do these departments in Canada work and how should they work in Brazil? Which institutions ought to have these sectors? Which professionals are supposed to constitute them? Which would their functions be?

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

In our Canadian colleges these access offices actively stimu-

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EPCT | The Canadian government is a Brazilian partner in the Women 1000 project? What does it mean to Canada? What have this partnership brought to Canada?

late non-traditional learners to come to the college. Then they

It is important for Canadian students and teachers to realize

throughout their learning at the college. Once they graduate

that there are many systems of education around the world in

they also offer ongoing “mentoring” to assist them to overcome

order to stay positively critical about our own system. Projects

possible barriers during the process of seeking formal employ-

like Women 1000 also bring Canadians to realize that solidarity is

ment. This requires a good amount of human resources at the

required around the world.

colleges. Our schools are better equipped than Universities who

offer a safe and friendly environment to council the students on an individual basis. Subsequently they keep counseling them

normally prefer to take only the best of the best students. That EPCT | Do you deal with a teaching based on competences? Many theorists criticize this teaching model because they particularize the learning activities in a way that the success/failure is attributed to the person instead of the context. What do you think about it?

type of higher education is also needed. Colleges complement

Non-traditional learners simply need that individualized at-

that it will need to change overtime. Access program will be

tention. They have lots of learning barriers otherwise they would

needed more and more because for a relatively rich country as

be in the regular system and would not have to be called non-

Brazil, you cannot accept that half the population is excluded

traditional learners. The barriers can be physical, psychological or

from vocational and higher education and training.

the work of Universities. In Brazil the higher education model has grown differently. One of our observations is that it has been too centralized, and

social. Many non-traditional learners had traumatic experiences generally do not do well in a traditional structured learning

EPCT | How do you evaluate the transference of the pedagogical technology linked to PLAR and other tools like that from Canada to Brazil?

model. And we cannot simply exclude them from our formal

We show the Brazilians our models and experiences (lessons

working world because of these reasons. So giving them a test in

learned). Our Brazilian colleagues then try to implement these

order to see if they can cope with the traditional system does not

models in their own realities and design the “made in Brazil”

work. Non-traditional learners need “just in time” learning, and

solutions. How the model looks like is not so important. What is

in their earlier years. They have in general low self-esteem. They

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 17-19, jul./dez. 2010


important is that we can give access and hope to people who

important aspect is that we do not just talk about change, but

have been excluded from the system, not because of their own

actually do something even if it is not perfect. It was again very

choice but because of their social, economic and family context.

gratifying for me to see some of the beneficiaries of our Mulheres Mil project at the Forum: women who would never have thought two years ago they would ever be at a stage like that. Life has

EPCT | What was the main turnover for you after you took part in this forum? It is always good to meet colleagues from other countries

changed for them: they will inspire others; and - as the aboriginal people in Canada say - maybe changes over the next seven generations will be all worth our efforts.

jos nolle

and discuss these important social issues. However, the most

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Educ. prof.: C & T, BrasĂ­lia, v. 4 n. 1, p. 17-19, jul./dez. 2010



ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 21-23, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

JOS NOLLE > Por Juliana Eugênia Caixeta

Políticas de acesso e inclusão no Canadá Nascido na Holanda, Jos obteve seu diploma de mestre em Engenharia de Projeto Industrial na Universidade Tecnológica em Delft, Holanda (1982). Após a Universidade, ele terminou seus estágios na Grécia, na África do Sul e nos Países Baixos. De 1982 a 1983 ele esteve viajando ao redor do mundo. Pode-se destacar em seu currículo a experiência na Fokker, uma empresa de aviões em Amsterdã, na Holanda e Médicos sem Fronteiras (grupo de socorro médico). No Médicos sem Fronteiras, Jos residiu dois anos em Maputo, no Moçambique, coordenando projetos de ajuda médico-humanitária; dois anos em Toronto, no Canadá para implantar a filial canadense desta organização internacional e de dois anos em Amsterdã, na Holanda, como um membro da equipe diretora, ocupando o cargo de Diretor de Recursos Humanos e Treinamento. Durante estes anos, ele viveu, trabalhou e viajou para mais de 40 países. Juntou-se à faculdade de Niágara em 1995, para coordenar projetos de desenvolvimento internacional de Educação e estimular o processo da internacionalização da faculdade de Niágara. Um líder creativo e visionário, Jos especializou-se em começar projetos e programas novos, trabalhar em rede a fim de reunir as melhores pessoas para efetuar a mudança, a executar orçamentos, revisar contas e financiar agências para fornecer a gestão financeira sadia. É um pensador fora do comum que é particularmente apaixonado em oferecer programas de acesso para aprendizes não-tradicionais e programas práticos de formação vocacional em curto prazo para indíviduos com acesso limitado ao ensino convencional.

EPCT | O senhor é da Associação Canadense de Faculdades Comunitárias (Association of Canadian Community College – ACCC)?

Internacional (Canadian International Development Agency

Eu trabalho na Faculdade Niágara. Ela é uma das 150

Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento

instituições que são membros da Associação Canadense de

– CIDA) e Instituições Financeiras Internacionais tais como o – BID.

Faculdades Comunitárias. EPCT | O que é esta instituição? Quais são os objetivos dela?

EPCT | A ACCC é patrocinadora deste Fórum. Quais eram as expectativas da instituição ao patrocinar o evento? Nós participamos do Fórum no Brasil para promover as

A Associação Canadense de Faculdades Comunitárias –

nossas atividades aqui e debater sobre o nosso interesse cres-

ACCC (Association of Canadian Community College) é uma

cente de trabalhar com instituições brasileiras, tanto as atuais

organização composta por membros que têm como objetivo

faculdades parceiras, quanto aquelas que se tornarão parceiras

defender os interesses das faculdades junto às províncias e ao

futuramente.

governo federal. Somos instituições públicas, mas o governo só nós repassa anualmente apenas o equivalente a 60 % do nosso orçamento; o restante vem das taxas de matrículas dos

EPCT | Elas foram alcançadas? Sim.

nossos alunos (incluindo estudantes vindos de outro país

lhamento de informações e experiências entre os professores

EPCT | Professor, desde quando o Canadá tem políticas de acesso? Qual é o conceito de acesso que fundamenta as ações do governo e das universidades canadenses?

e os administradores de todos os membros da associação.

Estas políticas foram introduzidas no Canadá há aproxi-

Finalmente, a instituição arrecada recursos junto aos mem-

madamente 25 anos. Nós precisavámos fazer isto porque nós

bros de instituições para submeter projetos internacionais

sempre temos bastantes estudantes “não-tradicionais” que

custeados pela Agência Canadense de Desenvolvimento

precisam ser incluídos no treinamento profissional de algum

que pagam taxas integrais) e contratos de treinamento para companhias e agências. A ACCC também facilita o comparti-

Entrevista concedida em 29.11.2009

21


modo a fim de arrumar trabalho. No momento, nós temos entre 30 e 40% dos estudantes na faculdade Niágara que não terminaram o ensino secundário (devido a uma vasta lista de razões sociais) ou que não se vinculou à educação superior imediatamente depois de terminar o ensino médio. Não podemos deixar estes indivíduos fora de nosso sistema de treinamento.

É importante para que estudantes e os professores canadenses compreendam que há muitos sistemas de educação em torno do mundo, para que eles permaneçam positivamente críticos sobre nosso próprio sistema.

Os estudantes não-tradicionais verdadeiramente necessitam de uma atenção particularizada. Eles possuem muitas dificuldades de aprendizagem, do contrário, estariam no sistema regular e não teriam que ser chamados de alunos não-tradicionais. As barreiras podem ser físicas, psicológicas ou sociais. Muitos aprendizes nãoconvencionais tiveram experiências traumáticas em suas primeiras séries. No geral, tais indivíduos

EPCT | Professor, o que representa a Avaliação e Reconhecimento da Aprendizagem Prévia – ARAP para a concretização do Acesso?

possuem

baixa

auto-estima.

Geralmente, estas pessoas não conseguem se adaptar bem a um modelo de aprendizagem es-

A ARAP analisa as competências que as pessoas adquiriram

truturado da forma tradicional. E nós não podemos simplesmente

com as experiências de trabalho e da aprendizagem informal.

excluí-los de nosso mundo de trabalho formal por causa destas

Portanto, se suas competências podem ser articuladas e testa-

razões. Assim, aplicar uma prova para verificar se eles podem lidar

das, estes estudantes recebem os créditos acadêmicos, o que

com o sistema tradicional não funciona. Os alunos não-clássicos

torna os programas de formação mais atrativos. Para sujeitos

precisam de um protótipo de aprendizagem “sob medida”, e isto

com pouca educação formal, esta proposta confere a eles um

significa que há um percurso distinto a ser vencido por cada um

senso de amor-próprio que é indispensável para obter sucesso

(a). Se nós não estamos dispostos investir nisto, nós continuare-

em programas de treinamento formal.

mos a excluir da nossa sociedade as pessoas que carregam um

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

bom potencial.

22

EPCT | Como a ARAP funciona? Os especialistas da ARAP precisam aproveitar o tempo para riências com o que será ensinado em um programa de formação.

EPCT | Professor, o Canadá tem outros projetos de cooperação no Brasil baseados nesta filosofia de acesso?

Precisam falar com os professores dos programas de capacitação

Sim. Existem outros projetos sociais de inclusão no Brasil

e então sugerir decisões. Isto tudo foi formalizado no sistema

financiados pela Agência de Desenvolvimento Internacional

canadense.

Canadense (CIDA). Os interessados podem se dirigir à embaixada

entrevistar os estudantes e comparar suas competências e expe-

canadense em Brasília e pedir para falar com o representante da EPCT | O governo canadense é parceiro do governo brasileiro no Projeto Mulheres Mil. O que significa esta parceira para o Canadá? Quais têm sido os ganhos do seu país? É importante para que estudantes e os professores canadenses compreendam que há muitos sistemas de educação em torno do mundo, para que eles permaneçam positivamente críticos sobre nosso próprio sistema. Projetos como Mulheres mil

CIDA para saber mais sobre estes projetos. EPCT | Nas suas conferências, o senhor tem falado sobre um departamento de acesso em todas as instituições de ensino. Como funcionam esses departamentos no Canadá e como deveriam funcionar no Brasil? Quais instituições deveriam tê-lo? Quais seriam os profissionais que deveriam compor estes setores? Quais seriam as suas funções?

fazem com que os canadenses concluam que a solidariedade é demandada ao redor do mundo.

Em nossas faculdades canadenses, estes departamentos de acesso estimulam ativamente estudantes não-tradicionais a ingressar na faculdade. Então, eles oferecem um ambiente seguro

EPCT | Professor, nas políticas de acesso, vocês trabalham com o ensino baseado em competências. Muitos teóricos criticam esse modelo de ensino porque individualizam as atividades de ensino de forma que o sucesso/fracasso é atribuído à pessoa e não ao contexto. O que o senhor pensa a este respeito?

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 21-23, jul./dez. 2010

e amigável para aconselhar os alunos de forma individualizada. A seguir, eles continuam a acompanhá-los durante todo seu curso de aprendizagem na graduação. Do mesmo modo, uma vez que estes universitários se formam, a faculdade oferece apoio


vocacional para ajudar-lhes a superar possíveis barreiras durante

executar estes modelos de acordo com as suas próprias realida-

o processo de procurar um emprego formal. Isto exige uma boa

des e esboçar as soluções “com o jeito do Brasil”. Não é tão im-

quantidade de recursos humanos nas faculdades. Neste sentido,

portante como o modelo parece ser. O que é importante de fato

nossas instituições são melhores preparadas do que as univer-

é que nós podemos dar o acesso e a esperança para pessoas que

sidades, pois estas preferem investir normalmente somente

foram excluídos do sistema, não por causa de sua própria esco-

nos melhores estudantes. Obviamente, esse tipo de educação

lha, mas por causa de seu contexto social, econômico e familiar.

superior é necessário também. As faculdades complementam o trabalho das universidades. No Brasil, o modelo de educação superior cresceu diferentemente. Uma de nossas observações é que este padrão se encon-

EPCT | Qual foi o principal ganho do senhor na participação deste fórum?

tra centralizado demais, e que mais cedo ou mais tarde precisará

É sempre bom encontrar colegas de outros países e discutir

mudar em relação ao que estava previsto. O programa do acesso

estas questões sociais importantes. Entretanto, o mais importan-

será cada vez mais imprescindível porque para um país relati-

te é que nós não apenas venhamos a falar sobre a mudança, mas

vamente rico como Brasil, não se pode aceitar que a metade da

realmente fazer algo, mesmo que não seja perfeito. Ver algumas

população esteja excluída da educação superior e da formação

das beneficiárias do nosso projeto Mulheres Mil no Fórum: as

vocacional.

mulheres que nunca pensavam há dois anos que pudessem estar em um palco como este, foi muito gratificante outra vez

EPCT | Como o senhor avalia a transposição da tecnologia pedagógica ligada a ARAP e outras ferramentas do Canadá para o Brasil?

para mim. A vida mudou para elas: elas irão inspirar outras mu-

Nós mostramos aos brasileiros nossos modelos e experiên-

a mudança no decorrer das sete gerações seguintes valerá todos os nossos esforços agora.

jos nolle

cias (lições aprendidas). Então, nossos colegas brasileiros tentam

lheres; e – assim como os aborígenes no Canadá dizem – talvez

23

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 21-23, jul./dez. 2010



ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 25-28, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

ELIEZER PACHECO > Por Ricardo Coelho Eliezer Pacheco é Secretário de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação.

A expansão da rede federal de educação profissional

EPCT | Secretário, estamos vivendo um momento de expansão da rede federal de educação profissional no Brasil. Estão sendo criadas mais de 250 unidades federais de educação profissional. Há uma demanda concreta dessa dimensão para a expansão da rede?

de em percentuais maiores. Entendemos que o país precisa

Na verdade, a expansão é grande porque as dimensões da

hoje. O Ensino Médio são três ou quatro anos, dependendo

rede federal são muito reduzidas no Brasil. Veja que, em cem

do curso. Então, na melhor das hipóteses, isso significa que os

anos de história de educação profissional pública no Brasil,

primeiros resultados, no Fundamental, acontecerão daqui 10

tivemos apenas 140 unidades. Um país como o Uruguai, por

ou 12 anos; no Médio, daqui a cinco ou seis anos. Portanto,

exemplo, com menos de 10 milhões de habitantes e uma área

temos pressa, porque o Brasil precisa dar continuidade a esse

menor que o estado do Rio Grande do Sul, tem 150 unidades.

processo de desenvolvimento.

urgentemente expandir sua oferta de formação profissional. E isto é muito sério, pois sabemos que na educação não existem projetos a curto prazo. O Ensino Fundamental são nove anos

Dessa forma, um país como o Brasil ter apenas 140 unidades é algo profissionalmente ridículo. No início do processo de

Aqui no Brasil essa oferta é feita basicamente pela rede federal,

EPCT | Considerando a necessidade como algo latente, ou seja, que ainda está por acontecer, e a demanda como algo concreto, a expansão da rede se deu por necessidade ou por demanda?

pelas redes estaduais, mesmo que com muitas dificuldades,

Acredito que pelas duas coisas. De um lado, há a necessi-

pelo Sistema S, e por algumas instituições privadas, no sentido

dade de dar sustentação técnica e tecnológica ao processo de

estrito do termo, as quais acredito que a oferta não seja muito

desenvolvimento, de outro, dada a procura imensamente su-

significativa. O esforço de expansão da rede está veiculado

perior às vagas ofertadas – acredito que em todos os sistemas

com o projeto de desenvolvimento do Brasil. Da mesma sorte,

-, há uma demanda muito grande por formação profissional

foi o esforço – bem sucedido, aliás - de restabelecer um acordo

no Brasil. As pessoas hoje valorizam muito a questão da em-

com o Sistema S, no sentido de restituir a oferta da gratuida-

pregabilidade. Um curso de bacharelado nem sempre garante

desenvolvimento mais acelerado de nossa rede, tivemos aquilo que a mídia chegou a chamar de apagão da mão de obra.

Entrevista concedida em 27.11.2009

25


empregabilidade, já uma formação técnica de nível médio, prin-

forma, procuramos sempre evitar a duplicação. Nos financia-

cipalmente no Brasil, garante quase que cem por cento de em-

mentos que fizemos para as redes estaduais, exigimos um

pregabilidade. Uma pesquisa que realizamos na rede federal com

levantamento dos cursos ofertados, das matrizes produtivas,

todos os egressos localizados demonstrou uma empregabilidade

e os cursos da rede federal e aquelas escolas estaduais finan-

de mais de 97%. Ou seja, todos aqueles que desejaram ingressar

ciadas pelo poder público, necessariamente, tiveram de fazer

no mercado de trabalho assim o fizeram. Em relação ao percen-

inúmeras audiências públicas com a sociedade para então

tual restante, estão aqueles que optaram por ir à universidade,

batermos o martelo. Portanto, acreditamos que, acordados

estabelecer seus próprios negócios, empreender, etc. Então a

com o Sistema S, nós vamos conseguir minimamente atender

empregabilidade, não somente no ensino médio, mas também

à demanda nacional que existe de formação de mão de obra.

nos cursos de tecnólogos em nível superior é quase que total. E as pessoas hoje valorizam muito isso na hora de escolher um curso.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

EPCT | O Senhor considera que a expansão e a criação dos Institutos Federais de Educação podem gerar uma dualidade com relação à rede estadual de educação profissional, uma vez que ambas cumprem a mesma função com aportes distintos de recursos?

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EPCT | Secretário, a rede federal de educação profissional está comemorando seu centenário e o Sistema S, seu sexagenário. Em sua opinião, qual a importância do Sistema S para a Rede de Formação Profissional no Brasil? Nós respeitamos muito o Sistema S. É interessante que quando nós começamos a fazer aquela proposta disseram: ‘querem acabar com o Sistema S’, etc. Isso é um absurdo. Nós

Não. Pois tivemos a preocupação de investir mais na re-

temos a avaliação de que nós salvamos o Sistema S, pelo que

cuperação, ampliação, reforma e equipamento das escolas

se começava a observar na sociedade. Realmente é injustificá-

estaduais do que das escolas da rede federal. Na expansão da

vel o fato que paulatinamente o Sistema S foi abandonando a

rede federal, estamos investindo pouco mais de 1 bilhão de

gratuidade. Não há nada que justifique isso, já que o Sistema

reais. No programa chamado “Brasil Profissionalizado”, que é

S recebe recursos substanciais que são públicos, embora na

para as escolas das redes estaduais, estamos investindo quase

disputa alguns negassem, isso é reconhecido legalmente,

1 bilhão e trezentos reais, porque, evidentemente, as redes

que são recursos públicos, descontados compulsoriamente,

estaduais são imensamente mais numerosas que a rede fede-

repassados pelo Ministério da Fazenda. Então nós temos a ava-

ral. Nós temos estados como o Rio Grande do Sul, Paraná, São

liação de que, ao estabelecer esse acordo, no sentido de que,

Paulo que têm redes estaduais muito numerosas, quase duas

respeitando inclusive as características, tanto que o Senai terá

centenas de unidades. Por isso, tivemos essa preocupação.

que oferecer esse ano no mínimo 50% de gratuidade; o Senac,

Sendo assim, todos os estados que desejarem receberão os

20%, porque o Senac tinha zero de oferta de gratuidade. Então

recursos necessários para colocar as escolas técnicas estaduais

não tinha como, de repente, pular para 50. Nós, quando abri-

no padrão das escolas federais. Para nivelar as escolas com o

mos aquele debate, recebemos muito apoio dos setores do

padrão de qualidade da rede federal, nós oferecemos desde

empresariado, que concordavam com a posição do Ministério

os laboratórios idênticos ao da rede federal até a planta da

da Educação, que por lei tem que supervisionar o Sistema S,

escola padrão. É claro que a manutenção das escolas é uma

mas nunca tinha exercido o seu papel. Nós achamos que esse

responsabilidade dos Estados. Nós não podemos tirar-lhes

acordo é extremamente positivo para o Sistema S. A sociedade

isto. Sendo assim, o estado tem de assumir com sua respon-

brasileira em pouco tempo ia exigir que se tomasse alguma

sabilidade, pois, do contrário, seria melhor federalizar essas

providência em relação a esse fato. Então, para nós, o Sistema

escolas, mas não temos condições de assumir uma rede desse

S faz parte desse tripé fundamental: rede federal, redes estadu-

tamanho. Outra preocupação que temos, e que as pessoas

ais e Sistema S. Por isso, a gratuidade é importante. Não adian-

precisam ter conhecimento, é que os cursos são absolutamen-

ta a gente contar com um braço que as pessoas tem que pagar

te sincronizados com as demandas das matrizes produtivas e

para estudar. Assim, o Sistema S entrou num acordo – diga-se

culturais da região. Nós fizemos esse levantamento e levamos

de passagem foi um debate de altíssimo nível, respeitoso, em

em consideração o que é oferecido pelo Sistema S e pela

nenhum momento houve nenhum atrito entre nós e o Sistema

rede estadual. Em São Paulo, no Centro Estadual de Educação

S. É claro que uma negociação dessas é uma negociação mui-

Tecnológica Paula Souza, levamos isso em consideração.

tas vezes dura, difícil, mas sempre de elevado nível e sempre

Contudo, essa sincronização nem sempre é absoluta, pois, às

de forma muito democrática e respeitosa. Tudo foi consensual.

vezes, tem oferta, mas ainda tem demanda reprimida. Dessa

Nada foi imposto. O Sistema S avulta a sua importância na

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 25-28, jul./dez. 2010


acordo e passa a ofertar também um número expressivo de matrículas gratuitas, com a qualidade que lhe é peculiar e que é reconhecida pela sociedade e pelo governo brasileiro.

O tecnólogo, além dos mesmos direitos de qualquer graduado, garantidos por lei, não é um profissional de segunda categoria. Ele é um profissional que tem uma formação mais específica.

EPCT | Secretário, o modelo de gestão do Sistema S ainda é algo polêmico. Fala-se em gestão pública, privada e tripartite. Existe uma preocupação da vinculação do Sistema S à gestão pública e a consequente perda da qualidade do ensino. O senhor acha isso possível?

das modalidades que mais cresce no Brasil hoje. No último censo, apresentou 300% de crescimento. Basicamente, acredito que sua oferta seja por necessidade, embora exista demanda. O Brasil tem uma tradição bacharelesca terrível e prejudicial ao país, um profundo preconceito com relação ao tecnólogo. Não se trata de desmerecer o bacharel, que também é importante, mas o desenvolvimento econômico

exige

profissionais

cada vez mais focados. E o tecnólogo, além dos mesmos direitos de qualquer graduado, garantidos por lei, não é um profissional de

Não mesmo. A nossa discussão se restringiu à gratuidade

segunda categoria. Ele é um profissional que tem uma formação

dos serviços do sistema S. Eu me lembro que essa proposta

mais específica. Vou te dar um exemplo na área da engenharia.

surgiu, mas não era exatamente em relação à gestão, e sim a

Um engenheiro civil, com seus quatro, cinco anos de curso, de-

um conselho gestor supervisor formado pelas confederações,

pendendo do currículo, aprende N disciplinas. Um tecnólogo de

federações, movimento sindical e governo. Entretanto, isso

construção de estradas estuda três anos sobre construção de es-

não entrou na mesa de negociações. Acredito que esse debate

tradas. Eu não tenho dúvidas de que ele sabe mais de construção

vai surgir no futuro. Houve sim especulações da mídia sobre a

de estradas do que o engenheiro civil. No mínimo ele sabe igual a

suspensão das atividades culturais do Sistema S. Não discutimos

um engenheiro civil. Então, um tecnólogo não é um profissional

acabar com isso, mas sim revermos os altos preços cobrados nas

de segunda categoria, ele é um profissional mais especializado,

apresentações teatrais e culturais no Sesi e Sesc, por exemplo,

mais focado. O que é uma necessidade para o desenvolvimento

de forma a atender aos industriários e comerciários que o sus-

econômico do país. Todavia, isso não significa formar um tecno-

tentam. Outra discussão foi rever a distribuição dos recursos do

crata. Acho que a rede federal é um bom exemplo disso. Ele tem

sistema S para as federações e confederações patronais, pois não

de aprender a aprender, porque a tecnologia se supera cada vez

é atribuição dos trabalhadores financiar os patrões, uma vez que

mais rapidamente. Se nós formarmos um profissional focado –

estes têm muito recurso para financiar suas próprias instituições,

digamos, com uma formação estreita daquilo ali - ele, em pouco

entidades. Nosso acordo foi simplesmente uma progressão da

tempo, vai estar defasado no mercado. Por isso ele tem de ser uma

ampliação da gratuidade da oferta correspondente aos recursos

pessoa com formação humanista geral que lhe permita ir se atuali-

públicos recebidos pelas entidades do Sistema S. Isto, porém,

zando. Se formar um sujeito muito bitolado, ele, em cinco anos, vai

não impede o Sistema S, como instituição privada, de cobrar o

estar superado no mercado de trabalho. Então, fazer uma forma-

que bem entender por suas atividades prestadas. O que nós que-

ção focada não significa abrir mão de oferecer uma formação mais

remos é a contrapartida dos recursos públicos recebidos.

geral para esse profissional.

EPCT | Secretário, os cursos tecnológicos no Brasil são ofertados desde a década de 1970. Há aproximadamente cinco anos houve um boom de oferta de cursos de tecnólogo. Voltando àquela diferença entre necessidade e demanda, em sua opinião, o crescimento da oferta de cursos tecnológicos é consequência de uma demanda ou de uma necessidade de formação de tecnólogos?

EPCT | Secretário, o tecnólogo, como comentado pelo senhor, tem o mesmo status do bacharel, entretanto, ainda enfrenta dificuldades com relação à certificação e ao reconhecimento dos conselhos profissionais. Como elaboradora de políticas públicas, de que maneira a Setec resolverá a questão da certificação e do reconhecimento profissional dos tecnólogos?

De fato, os cursos tecnólogos chegaram a ser ofertados,

Isso aí é uma reação coorporativa que estamos avançando.

mas tiveram um recuo e agora voltam com muita força. E essa

Com o Confea, que pega grande parte dessas profissões, nós já

ampliação ocorre não só no Brasil, mas no mundo inteiro. É uma

chegamos a um acordo. Todos aqueles cursos que constem do

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 25-28, jul./dez. 2010

ELIEZER PACHECO

medida em que ele entra nesse

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fundo, temem a competição dos tecnólogos. Pois, se não temes-

guns conselhos profissionais mais resistentes, na área da saúde,

se, se partisse do pressuposto de que o tecnólogo é um profissio-

por exemplo. Outras corporações internas de grandes empresas,

nal de pouco saber, não teria nenhum problema deixá-los fazer o

como a Petrobrás, por exemplo, não aceitam tecnólogo, o que é

concurso, porque eles certamente perderiam a competição para

uma ilegalidade, inclusive. Acreditamos ser uma resistência não

os engenheiros. É, portanto, uma reação corporativa normal, em

da própria direção da Petrobrás, mas da corporação de enge-

um primeiro momento, mas que vamos inevitavelmente superar,

nheiros que elabora os editais de concursos da casa e que, no

como já estamos superando em várias áreas.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

catálogo, o Confea os reconhecerá, o que é muito positivo. Há al-

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 25-28, jul./dez. 2010


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 29-32, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

ANTONIO CARLOS DAS NEVES & ROSA MARIA PIRES BUENO > Por Flávia Furtado Rainha Silveira Antonio Carlos das Neves é Gerente Nacional de Educação Profissional da Fundação Bradesco. Rosa Maria Pires Bueno é Supervisora Técnica de Educação Profissional da Fundação Bradesco.

Educação profissional: e experiência da Fundação Bradesco no Brasil

EPCT | Qual a relação entre a Fundação Bradesco e a Educação Profissional?

quando a Fundação Bradesco manteve os cursos técnicos

A Fundação Bradesco tem uma relação de muitos anos

separado da Educação Básica e do Ensino Médio, mas temos

com a Educação Profissional. Desde 1970 ela trabalha com a

ainda em algumas escolas a Educação Básica e Infantil até

Educação Profissional nos cursos de formação técnica. Desde

o Ensino Médio. A Educação Profissional Técnica é oferecida

a Legislação anterior à Nova Lei de Diretrizes e Bases, ela já

aos jovens após concluir o Ensino Médio, possibilitando o

desenvolvia Educação Profissional integrada com o antigo

desenvolvimento das competências e habilidades reque-

colegial, e, com o advento da LDB, em 1996, ela separou a

ridas pelo mercado de trabalho na região. Temos cursos

Educação Profissional da Educação Básica.

técnicos em áreas como Informática, Administração de

integrados com o colegial da época. Hoje, o curso técnico é

Empresas, Agropecuária e Eletrônica, oferecidos de forma regionalizada. O curso de Eletrônica está localizado no polo EPCT | Como surgiu essa relação?

de Porto Alegre, na Escola de Gravataí, que atende algumas indústrias que absorvem o contingente de alunos formados

Essa relação surgiu da necessidade de suprir, com o

na área de Eletrônica. A General Motors, principalmente,

advento das novas tecnologias, das indústrias e dos par-

contrata muitos profissionais formados pela Fundação

ques produtivos, o mercado de trabalho com profissionais

Bradesco. Na área de Agropecuária, temos o Internato em

competentes, dotados de habilidades e técnicas específi-

Tocantins e Mato Grosso do Sul. São duas escolas em regi-

cas, focados nas atividades e no próprio desenvolvimento

ões propensas ao desenvolvimento regional da agropecuá-

do país. Dessa forma, a Fundação Bradesco buscou inserir

ria e da agricultura no país e que estão investindo bastante,

no mercado de trabalho a população de baixa renda,

principalmente o Tocantins, na área de arroz irrigado, que é

socioeconomicamente não-favorecida, de tal forma que

o forte celeiro nacional. Por isso, visamos ofertar formação

tivesse formação técnica condizente e correspondente às

técnica para que esses jovens se mantenham na região com

necessidades do mercado. Isso aconteceu a partir de 1970,

uma boa formação e renda.

Entrevista concedida em 25.11.2009

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EPCT | Além dos cursos técnicos e da Educação Básica, a Fundação também oferta cursos de formação inicial e continuada em termos de Educação Profissional?

nós abrimos vagas na Educação Infantil, porque o aluno que entra

Sim. Nós temos cursos de formação inicial e continuada e a for-

conômica que os interessados preenchem na escola que deseja

mação técnica de nível médio e ainda o tecnológico. A Fundação

estudar. Essa ficha passa por um processo de análise em um sis-

estatutariamente se definiu por oferecer educação fundamental e

tema, e os pré-selecionados recebem da equipe da escola uma

média, a Educação Básica, compreendida até a formação técnica

visita domiciliar para verificar onde residem, como sobrevivem e

de nível médio. A formação inicial e continuada é mantida na rede

para confirmar se a declaração da ficha condiz com a realidade.

de escolas, porque entendemos que esses cursos dão possibilida-

Se confirmado isso, faz-se uma triagem da situação analítica dos

de às famílias dos alunos de empreender e ter uma fonte de renda

menos favorecidos e as vagas são disponibilizadas. Em síntese,

e de sobrevivência na sua cidade. A demanda e a procura pelos

as vagas são oferecidas a partir da situação socioeconômica e da

cursos se dá por meio de um cadastro que a Fundação Bradesco

proximidade entre a residência e a escola. A Fundação Bradesco

mantém em cada escola, para que a direção da escola e a equipe

zela bastante por esta questão, pois sabe que as pessoas em

técnica proponham a implementação de determinados cursos

situação socioeconômica não-favorecida não têm condições de

de formação inicial e continuada, e de algumas pesquisas sobre

custear ou manter transporte escolar, têm dificuldade de pagar

as condições do mercado de determinada região. Nas regiões

condução para se locomover. Sendo assim, é preciso que o aluno

Norte e Nordeste, por exemplo, em que o turismo é ponto forte

resida em um raio de três a cinco quilômetros para que, se preciso

de renda e receitas, oferecemos vários cursos focados na área de

for, possa ir à escola caminhando.

lá com cinco ou seis anos de idade acaba ficando na Fundação até se formar técnico. A seleção se dá por meio de uma ficha socioe-

alimentação, gastronomia, agenciamento e turismo de negócios, agendamentos e eventos e artesanato regional. Para a formação

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

daqueles que não tiveram a possibilidade de concluir o ensino

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EPCT | Em termos econômicos, a Fundação prioriza alguma faixa da sociedade?

médio, oferecemos na área de Administração cursos de auxiliar

Para ilustrar, em umas das últimas escolas inauguradas na

de escritório e recepcionista. Temos ainda cursos de cabeleireiro,

periferia de Osasco, nós tivemos quatorze mil inscritos quando da

corte e costura, cozinheiro, dando à comunidade toda a formação

inauguração da escola. Desses quatorze mil inscritos, pelo proces-

e certificação e também a possibilidade de abrir o próprio negócio.

so de análise da ficha socioeconômica preenchida, nós extraímos

Como mantemos quarenta escolas em rede, nos vinte e sete es-

entre quatro e cinco mil inscritos com possibilidades de análise de

tados e no Distrito Federal, isso possibilita, hoje, um atendimento

visita domiciliar. Como a escola estava sendo implantada naquele

fixo e anual de cento e onze mil alunos no Brasil, com investimento

ano, nós trabalhamos com uma equipe grande, em torno de vinte

de duzentos e trinta milhões de reais no ano de 2009 para custear

profissionais técnicos, e distribuímos essas fichas por setor no

a manutenção da rede de escolas.

bairro. Para se ter uma ideia, os ingressos inscritos tinham renda per capta entre R$ 87,00 a R$ 100,00, ou seja, abaixo da linha

EPCT | E a mantença dessa rede de escolas se dá pelo Bradesco?

da pobreza. Realmente, Osasco é um bairro muito pobre, muito

A rede é mantida pela Fundação Bradesco, que tem recursos

carente. Hoje, depois de cinco anos de atividade, a Fundação

próprios, é auto-sustentável. A Fundação é acionista do Bradesco.

Bradesco conseguiu contribuir para mudar um pouco o cenário

Ela recebe dividendos de ações do Bradesco e esses dividendos

daquele bairro. Vários jovens que ingressaram há cinco anos no

que ela recebe são investidos no campo social. É uma instituição

Programa Nacional Jovem Aprendiz Técnico hoje têm uma renda

social, filantrópica, declarada de utilidade pública, que tem o seu

e estão melhorando a condição de vida, desenvolvendo ativida-

capital em função das ações que ela possui do conglomerado.

des voluntárias e devolvendo para o bairro a graça de ter recebido

Essas ações proporcionam à Fundação a receita, por meio dos

uma escola da Fundação Bradesco, sendo agraciado gratuitamen-

dividendos distribuídos pela instituição financeira, e esses divi-

te com todo esse nível de qualidade de ensino, material escolar

dendos acabam sendo a receita e o sustento de todos os projetos

gratuito, uniforme, merenda escolar e assistência médica.

que a Fundação Bradesco mantém socialmente no país. EPCT | Você falou da missão da Fundação Bradesco e da área de educação dessa fundação. Como é a seleção dos jovens que ingressam na Fundação?

EPCT | Na palestra proferida pelo professor Leonardo Boff, destacou-se a missão da Educação Profissional de fomentar a consciência mundial, a ética e a cidadania. Essas questões são contempladas nos projetos da Fundação Bradesco?

A Fundação Bradesco se preocupa em atender os jovens de

Hoje um dos diferenciais no mercado de trabalho são as

condição socioeconômica desfavorecida. Para a Educação Básica

atividades voluntárias desenvolvidas em prol da comunidade. A

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 29-32, jul./dez. 2010


Fundação Bradesco desenhou um programa nacional de voluntariado que tem sido hoje destaque e modelo em todo o país. Dessa forma, o aluno, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, lida com todas as questões éticas e de respeito ao próximo, as questões da moralidade, dos vícios e dos cuidados para

Hoje um dos diferenciais no mercado de trabalho são as atividades voluntárias desenvolvidas em prol da comunidade.

temos um grupo de ex-alunos que formaram a Cooperativa Delícias da Floresta, que comercializa castanhas e frutas cristalizadas da floresta. Eles trabalham não só na produção do produto em si, mas na embalagem do produto e na distribuição do produto no mercado. Portanto, o empre-

se ter uma vida saudável. Todos

endedorismo perpassa todas as

esses temas acabam permeando os

áreas da educação profissional,

currículos da Fundação Bradesco.

ele não está vinculado a apenas

De que forma? Nós temos dentro do voluntariado um programa de

um eixo. A própria atividade voluntariada desperta também o

contribuição à AACD. A Fundação Bradesco tem preconizado junto

lado empreendedor da organização, da ação desses consultores

aos seus jovens o apego a essa causa. Anualmente, desenvolvemos

técnicos, dessas cooperativas que se formam.

uma série de atividades de arrecadação para ajudar o Programa da EPCT | A Fundação certifica por competências?

cofrinho da AACD para ir enchendo de moedinhas durante o ano.

Nós certificamos o aluno pela conjunção do curso, porém

No ensino técnico trabalhamos a visão de cooperação em assen-

nosso processo de avaliação é com base nas competências. A

tamentos. Os técnicos em agropecuária vão aos assentamentos,

avaliação do ENEM é basicamente por competências e o aluno

ajudam tecnicamente os assentados para que eles tenham sua

tem de realmente ter desenvolvido essas competências para ele

produção melhorada. Assim, eles além do conhecimento técnico,

ter uma boa classificação. A Fundação Bradesco incentiva os jo-

aprendem a exercer suas atividades para ajudar o próximo. Acredito

vens a participarem do ENEM e por isso trabalha com competên-

que isso é o diferencial para o país. A perspectiva do governo

cias. Estas são avaliadas por meio da teoria da TRI, cujas questões

Federal é abrir até 2010 quase trezentas escolas técnicas federais.

são analisadas em relação ao referencial curricular desenvolvido.

Imagine se cada escola técnica federal tiver um comitê de volunta-

As questões são organizadas de tal forma que permitem buscar

riado e desenvolver uma central de voluntariado nacional, todo um

na resposta se o aluno de fato recebeu o referencial curricular

programa que permita que esses jovens, técnicos formados pelas

que foi dado e se conseguiu assimilá-lo. Então, por meio de

escolas técnicas federais, possam contribuir com essas comunida-

indicadores no processo avaliativo, consegue-se detectar se as

des, a exemplo desse programa da Fundação Bradesco que está

competências técnicas foram desenvolvidas ou não.

locado nas suas quarenta escolas. EPCT | A Fundação Bradesco preparou para o fórum um material rico em informações sobre empreendedorismo e criatividade. Qual foi a intenção ao fazer essa escolha e como a Fundação trabalha o empreendedorismo, a criatividade e a inovação?

EPCT | A Fundação Bradesco tem programas de inclusão de adultos? Se sim, como se faz uma flexibilização dos currículos, que é o que tem sido falado também no fórum? Nós temos um programa de alfabetização de jovens e adultos que é modelo na inclusão de adultos. Em 1998, detectamos

Nós temos um curso específico na área de geração de ne-

um contingente de mais de treze mil pais analfabetos, que es-

gócios e empreendedorismo de negócios que é trabalhado nos

tudaram somente até a 4° série, ou que são analfabetos funcio-

cursos de formação inicial e continuada. Na formação de um

nais. Esse número nos assustou bastante. Diante deste cenário

cabeleireiro, por exemplo, pensamos não só em habilitá-lo e qua-

significativo, em que os pais analfabetos estariam com certa difi-

lificá-lo tecnicamente para cortar um cabelo, fazer um penteado, e

culdade em acompanhar o próprio desempenho escolar do filho

assumir as competências técnicas específicas, mas também busca-

e com vergonha de participarem das reuniões da escola, surgiu

mos desenvolver nele algumas outras competências referentes ao

a ideia de implementar um programa de alfabetização de adul-

empreendedorismo para que ele possa estabelecer a relação de

tos nas próprias escolas para atender a esses pais. Para você ter

quanto custa seu serviço, a prospecção e marketing do mercado, a

uma ideia, na aula inaugural que fizemos em 1998, em Osasco,

comercialização de produtos de artesanato, bem como participar

os filhos trouxeram os pais para a sala de aula de mãos dadas

de cursos e desenvolver com criatividade seu lado empreendedor

levando-os até o banco escolar. Orgulha-nos dizer que dos treze

para valorizar o seu trabalho e produto. No Acre, por exemplo,

mil e quinhentos pais, restam-nos apenas três mil e quinhentos

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 29-32, jul./dez. 2010

ANTONIO CARLOS DAS NEVES & ROSA MARIA PIRES BUENO (FUNDAÇÃO BRADESCO)

AACD, por meio do Teleton. As crianças, por exemplo, recebem um

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analfabetos ou analfabetos funcionais. Portanto, é um programa

melhoria genética, reprodução melhorada e maior produção de

bem sucedido de inclusão de jovens por meio da alfabetização.

carne. Nessas fazendas, os jovens técnicos têm atividades práticas em todos os setores da escola de forma monitorada. Todos esses

EPCT | As conferências desse fórum também falam da necessidade de a Educação Profissional estar conectada ao mercado. Como a Fundação Bradesco faz para se manter próxima ao mercado em suas diferentes unidades?

jovens passam pelos diversos setores e aprendem a tirar leite da vaca, a tratar o rebanho e a manusear a composição da ração, de forma a ter essa conexão entre a parte teórica do currículo e a parte prática que são desenvolvidas pelo curso técnico.

Nós temos um trabalho com a Educação Profissional que tem dado muito certo. É um encontro de gestores e empresários que promovemos anualmente em cada escola. A própria escola orga-

EPCT | As escolas da Fundação Bradesco são modelos no país, quais as concepções que fundamentam o trabalho dessas escolas?

niza o encontro de forma que os jovens possam se apresentar para

A Fundação Bradesco tem uma linha pedagógica construtivista,

o mercado de trabalho e atrair os empresários para a escola. Esse

em que o jovem é incentivado a aprender a aprender, a buscar por

encontro favorece também aos jovens a oportunidade de esta-

si só os conhecimentos. O mercado de trabalho exige que os pro-

belecer e organizar o evento, desde a parte do planejamento, da

fissionais formados tenham desenvolvido essa habilidade de apren-

divulgação, dos convites formulados e dos representantes do em-

der a aprender, pois nenhum profissional formado hoje se sustenta

presariado até a escolha dos gestores convidados, tanto do setor

apenas com a certificação técnica recebida. Ele recebe a certificação

público, quanto do setor privado. O início do evento sempre se dá

técnica esse ano e ano que vem sua certificação está desatualiza-

com a exposição do curso: o que é o curso, o que é estudado e

da. Se ele não aprender a se atualizar, ficará defasado no mercado

quais as competências desenvolvidas. Isso tudo se promove numa

de trabalho. Portanto, a concepção de educação da Fundação

apresentação, num encontro que geralmente soma em torno de

Bradesco é procurar desenvolver nesse jovem a autonomia para

cem a cento e trinta participantes. Nesses encontros com os em-

ele aprender sozinho e se atualizar em busca das instituições que

presários, os jovens se oferecem para o mercado de trabalho, apre-

oferecem aquilo que ele precisa e que o mercado favorece.

sentando o curso, o currículo, as experiências e disponibilidade no são fazendeiros, gerentes de comércio de produtos agropecuários

EPCT | Como se dá a inclusão de pessoas com necessidades especiais nas escolas da Fundação Bradesco?

e secretários de agricultura dos municípios. Nós promovemos

Nós temos alguns casos de alunos com deficiência física. No

um evento que realmente discuta essa questão da vinculação do

Espírito Santo, temos um aluno que não tem os membros supe-

profissional de formação técnica às necessidades do mercado de

riores e foi alfabetizado escrevendo com o pé. Hoje, ele frequenta

trabalho, para que aquele possa estar conectado e atualizado.

a sala de aula, está na 4ª ou 5ª série, com alunos que não tem ne-

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

mercado. Na área de Agropecuária, os convidados para o encontro

nhum nível de deficiência, e acompanha o currículo escrevendo EPCT | A Educação Profissional costuma ser criticada por sua ênfase na prática. Como a Fundação Bradesco trabalha a relação teoria versus prática?

com o pé. Temos também alunos deficientes visuais que frequen-

A Fundação acredita que a prática tem um significado impor-

escola do Jardim Conceição, na periferia de Osasco, há um progra-

tante para desenvolver as competências e favorecer aos alunos

tam as nossas escolas, eles acompanham as aulas por meio de um software chamado “Virtual Vision”, que faz a leitura para eles. Na ma de trabalho com surdos e intérpretes de Libras.

uma aprendizagem realmente significativa e adequada à vida profissional que eles irão desenvolver posteriormente. Em alguns cursos trabalhamos com laboratórios próprios, mas, na maioria deles, o aluno recebe a parte teórica na escola e desenvolve a parte práti-

EPCT | Para finalizar, Sr. Antônio, o que é a Pedagogia da Alternância e como vocês a operacionalizam nas escolas da Fundação Bradesco ou como pretendem operacionalizar?

ca nas empresas, por meio do programa nacional Jovem Aprendiz

A pedagogia da alternância nos permite ter um desenvolvi-

Técnico, que oferece bolsas ou estágios remunerados e vincula

mento teórico e pedagógico na formação desses jovens, desde a

os alunos às empresas. Nos cursos técnicos em Agropecuária,

educação básica até a técnica, e também um acompanhamento

oferecemos fazendas-escolas, que são escolas-modelo em que de-

nas atividades conciliadas desenvolvidas fora do contexto da

senvolvemos diversas atividades e experimentos da área agrícola

sala de aula, nos internatos.

e projetos, como o de genética animal com gado, que propicia

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 29-32, jul./dez. 2010


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 33-36, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

SÍLVIA MANFREDI > Por Ricardo Silva & Rafael Voigt

Sílvia Manfredi é Presidente do Instituto Paulo Freire - Itália e Professora aposentada da Universidade de Campinas (Unicamp)

Uma crítica à pedagogia das competências

EPCT | Professora Sílvia, poderia iniciar a entrevista falando um pouco sobre sua atuação profissional? Sim. Entrei na rede de ensino de São Paulo em 1964.

observamos é que vários órgãos de classe – como o CREA, o Conselho de Administração e alguns outros – não reconhecem plenamente os cursos de formação tecnológica. Qual a sua avaliação dessa questão?

Paulo Freire já havia sido exilado, mas durante uns quatro anos o movimento estudantil ainda usava a proposta dele

Primeiramente, é necessário observar que existe uma

para fazer trabalhos voluntários de alfabetização no estado

disputa conceitual de modelos de certificação entre o

de São Paulo. Fiz parte desse grupo durante três ou quatro

Inmetro, que já faz certificação, a ABNT e o Senai. Há uma

anos. E foram essas experiências que deram sentido à minha

tensão mesmo. É provável que um dos motivos pelos quais

escolha profissional até hoje. Entrei na educação profissio-

não conseguimos instituir um sistema de certificação seja

nal por conta do grande desafio do movimento sindical

o fato de esse sistema colocar em confronto as entidades

nos anos 1990. Atuei como consultora da OIT no Projeto de

profissionais, as instituições formadoras e os trabalhadores.

Certificação e Orientação Profissional, de 2004 até o final de

Um acordo só seria possível mediante negociação, para

2006. E hoje sou professora aposentada da Unicamp e presi-

consolidar os perfis e o tipo de certificação. Mas isso não foi

dente do Instituto Paulo Freire na Itália.

feito. No caso do Senac, o confronto se dá entre a instituição que oferece a formação e as entidades profissionais. Ele certifica com a anuência do Ministério da Educação, mas essa

EPCT | Professora, gostaria que esclarecesse algumas questões relacionadas à certificação. O Senac oferta, há alguns anos, ensino superior tecnológico. A Faculdade do Senac-DF, por exemplo, oferta cursos nas áreas de Gestão Comercial, Tecnologia da Informação, Marketing e Recursos Humanos. Entretanto, atualmente, presenciamos uma grande controvérsia envolvendo a atuação dos tecnólogos em certas áreas. O problema que

certificação não é reconhecida pelos conselhos de classe, por exemplo. O problema é que não possuímos um sistema de certificação cujas regras sejam universalmente aceitas. O modelo de sistema proposto pelo professor Homérico, na época em que ocupou o cargo de diretor do departamento de qualificação profissional do Ministério do Trabalho

Entrevista concedida em 26.11.2009

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e Emprego, previa ainda a criação das câmaras e comissões, de âmbito setorial, para discutir as questões relacionadas à certificação. Como isso não foi feito, a solução do impasse ficou mais complicada. Provavelmente, essas questões serão discutidas no Inmetro.

EPCT | Qual é a análise que a senhora faz de nosso atual sistema? Considerando a existência de um sistema regular e um sistema de educação profissional que coexistem de maneira paralela, quais os prejuízos dessa segmentação? O sistema profissional está dividido em três redes: estadual, federal e privada, que é o caso do Sistema S. Na verdade, o mais

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

correto nesse Sistema seria a denominação público-privada.

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EPCT | E como andam as discussões a respeito desse sistema de certificação? Há um grupo que discute a questão? O Ministério do Trabalho também teria de estar sentado à mesa de negociação?

Isso porque, a rigor, ele não é privado, embora seja considerado

De acordo com o projeto do sistema que idealizei, haveria

pelo menos, o estabelecimento de equivalências. Agora, sabe-se

um Conselho Nacional de Certificação, dentro do qual haveria

que aí entram os interesses de todas as partes, isto é, tanto do

as câmaras específicas, setoriais, e os grupos técnicos, que

Sistema S quanto das redes estadual e federal. E isso é um ponto

seriam os responsáveis pela implementação da proposta

de tensão, mas creio ser possível a integração. Acho possível o

concreta de cada setor. As comissões dariam os grandes pa-

estabelecimento de equivalências entre as redes por meio do

râmetros. No caso dos tecnólogos, primeiramente, procurarí-

catálogo de cursos do MEC, bem como do catálogo de qualifi-

amos levantar os cursos a serem certificados, reuniríamos os

cação profissional do Ministério do Trabalho. Os espanhóis, por

representantes dos diversos segmentos e definiríamos uma

exemplo, realizam a integração por conteúdos, porque eles ado-

pauta de certificação, standarts e normas gerais para serem

taram o modelo de competências e estipularam, para cada nível

utilizadas depois. Como o sistema não existe, o único espaço

(primeiro, segundo e terceiro anos), competências mínimas ou

que há, parece-me, é o MEC. Como associar isso ao Ministério

básicas e competências específicas. Os níveis são todos equipa-

do Trabalho, confesso a você que não tenho ideia. Porque, no

ráveis, porque isso vale para o sistema educacional regular, para

caso do Senac, entram o Conselho Federal de Administração,

a formação profissional e para a certificação. Foi assim que eles

o Conselho Federal de Engenharia, etc., o que torna a questão

resolveram a questão. No caso do Sistema S, parece-me que a es-

bastante complexa. O sistema criaria as normas universais

trutura curricular é modular e organizada por competências. Já

para os procedimentos de certificação. Havendo necessidade,

o nosso sistema regular, não é, nem as redes federal ou estadual.

levantando-se a demanda social, as comissões seriam criadas,

Então, é bastante difícil resolver o problema. A certificação pode-

o que facilitaria o início do processo.

ria ser uma solução? Creio que sim. Seria mais ágil, mais barato

como tal, mantendo autonomia administrativa e regulatória, respeitados os grandes princípios da LDB. Penso que o sistema deveria ter formas de integração entre os três subsistemas ou,

e mais fácil de fazer essa integração e essa passagem. Em minha opinião, o problema aí é político, e não técnico, ou, pelo menos, EPCT | Em relação à formação intermediária, considerando a experiência em outros países e outros modelos, existe a possibilidade de haver certificação intermediária, por exemplo, no Ensino Médio, após o término do primeiro, segundo e terceiro ano, respectivamente? Sim. Como no caso do sistema francês e do espanhol. No espanhol, por exemplo, o sistema educacional regular e o sistema profissional são integrados e equivalentes. Isso possibilita a certificação, válida em todo território nacional,

mais político do que técnico, uma vez que a certificação poderia estabelecer certos parâmetros e certas equivalências.

EPCT | Professora, historicamente, os Parâmetros Curriculares do Ensino Profissional de Nível Médio no Brasil foram construídos com base na matriz curricular conteudista. Na década de 1990, essa matriz foi substituída por uma matriz de competências e habilidades. Qual a sua opinião a respeito desses modelos?

e o trânsito do aluno entre os sistemas profissional e regular.

Eu não sou muito a favor do modelo de competência. A

Os sistemas se equivalem, não são diferenciados. No caso

matriz de competência, teoricamente, tem origem no campo da

do Brasil, o sistema de educação profissional não se comu-

Psicologia. Ela é bastante ligada à noção behaviorista e funciona-

nica com as ocupações, nem com o sistema regular. O ideal

lista. Do ponto de vista sociocultural, ela foi criada na Espanha,

seria criar, para cada profissão, requisitos de certificação

no interior de um movimento empresarial que usou esse modelo

com base na CBO (Classificação Brasileira de Ocupações), e

para substituir um antigo modelo de estruturação de carreiras e

para outras qualificações, com base no Catálogo de Cursos

de mobilização dentro das empresas. Isso desestruturou todo o

Profissionalizantes do MEC.

sistema de carreira, que antes era muito claro em todas as empre-

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 33-36, jul./dez. 2010


sas. O modelo de competências praticamente tira essa possibilidade, porque transfere o sistema de carreira para o indivíduo. Algumas competências se relacionam com o posto de trabalho, outras com o mérito e outras com as necessidades coletivas dos trabalhadores. Mas o modelo de competências é individualista, a competência é algo que você possui ou não

O modelo de competências é individualista, a competência é algo que você possui ou não possui, e você é responsável pela construção de suas competências.

é muito restrito à função, à tarefa e, na maior parte das vezes, à realização de trabalhos concretos, específicos, muito em função dos modelos das grandes empresas e do ideário destas. A adoção de um modelo como esse significa a exclusão de boa parte dos nossos trabalhadores, mesmo os de nível superior, porque não se contempla uma série de coisas que, numa

possui, e você é responsável pela

avaliação para certificação, é im-

construção de suas competências.

portante. É o que entendo.

Não há, digamos, uma responsabilidade social. No entanto, uma série de estudos mostra que as competências são social e cultuessa dimensão cultural. No caso dos trabalhadores, há muitas competências que são construídas dentro da cultura de um trabalho específico. O metalúrgico, por exemplo, tem uma série de competências da categoria, assim como o bancário, o professor. A

EPCT | A senhora afirma que quando consideramos o cargo ou a função tem-se clareza do que se fala, mas, quando se traduz isso em competências/habilidades, a noção fica esparsa. Então, como a senhora avalia os Parâmetros Curriculares, já que eles foram construídos sobre a noção de competências/habilidades?

noção corrente de competência não leva isso em conta. Fora isso,

São uma camisa de força. Sua constituição foi um briga que

no meu ponto de vista, os standarts utilizados para construir os

nós perdemos. A tradução de cargos e funções para competências/

modelos são feitos com grupos de especialistas que se baseiam

habilidades é extremamente subjetiva. Os métodos de identifica-

nos experts, os superespecialistas. Então você estabelece um

ção e avaliação das competências/habilidades são muito fechados

padrão de elite, muito seletivo e exclusivista. Assim, do ponto

e estereotipados: teste de múltiplas escolhas, quiz, inventários. E

de vista ideológico, essa noção torna todos os que não possuem

esses métodos desconsideram as diferenças culturais. A questão

essas competências/habilidades, como os superespecialistas,

não é só político-ideológica, mas também epistemológica. Como

incompetentes. Veja-se então o peso disso. Além disso, há a di-

sou muito mais piagetiana, vygotskyana, penso que cada um tem

mensão ideológica que considera o saber-ser e o saber-fazer. O

um modo próprio de se expressar, de falar, ou seja, as linguagens

que significa saber-ser neste modelo de competência? É você agir

são diferentes. Atuei por muito tempo com a formação sindical de

e desenvolver comportamentos funcionais. Contudo, é preciso

bancários, metalúrgicos, químicos. Para esses sujeitos, a forma de

observar que o problema não é o termo, mas todo o arcabouço

argumentar e de raciocinar é influenciada pelo processo e pelo

estrutural, a montagem desse modelo. Por que não o adotamos

contexto de trabalho em que se encontram. Por exemplo, se se

na certificação? A matriz de competência usa um modelo funcio-

trata de um bancário que trabalha com números e relações abs-

nal de tarefas, bem ao modo do engenheiro, para definir cargos e

tratas, ele facilmente expressará um raciocínio conceitual de nível

funções e a hierarquia dos cargos e funções. Com base nisso, de-

abstrato. Se for um metalúrgico que parte do mundo concreto, do

finem-se perfis e standarts. É como se aplicássemos o modelo de

real, ele formará o conceito, a abstração, e estabelecerá relações,

organização do trabalho de cargos e funções da Volkswagen ou da

mas por outro caminho. O trabalhador rural a toda hora faz o

Chrysler, por exemplo, à certificação. Daí, os perfis e standarts re-

contraponto com a natureza. Isso é muito bonito. Penso que, do

presentam uma elite de trabalhadores altamente especializados. E

ponto de vista da certificação, essas diferenças devem ser valoriza-

toda a massa de trabalhadores que possuir o saber fruto da expe-

das. A valorização apenas da educação e da formação próspera, da

riência fará parte desse conhecimento, mas todos os que ficarem

padronização e da homogeneização é que é destrutiva. Destrói-se

de fora do modelo serão considerados incompetentes. Agora, por

a diversidade, a cultura, não se considera uma série de coisas que

exemplo, a moda nas empresas é o trabalho em grupo. Valorizam-

sempre foram importantes.

se as capacidades de coordenar, dirigir grupos, tomar decisões,

Como paulofreireana, entendo que, se houvesse uma organi-

etc. Porém, como fica quem não possui essas competências, mas

zação por temas geradores, como propúnhamos e lutávamos, por

possui outras? Isso não é considerado na certificação. Então, o

projetos, ou tantas outras formas de organizar, teríamos parâme-

problema do Inmetro e da ABNT é que o seu rol de competências

tros curriculares bem mais abertos do que os que temos hoje.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 33-36, jul./dez. 2010

SÍLVIA MANFREDI

ralmente construídas. A noção corrente de competências “apaga”

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EPCT | Um professor da educação profissional é formado numa matriz conteudista e, ao chegar à escola, recebe uma orientação que diz “você deve desenvolver essas competências no aluno”. Resulta daí um conflito: o professor não consegue fazê-lo, dado à sua formação. Em sua opinião, como se estabelece essa relação no fazer docente?

três institutos: na Itália, Portugal e Espanha. A proposta do Instituto, tanto na Itália quanto nos demais países, é divulgar um pouco a filosofia e a pedagogia freireana e, ao mesmo tempo, ver como ela pode ser reescrita com base na experiência específica e nos desafios de cada país. A Itália, por

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

exemplo, tem recebido um número enorme de imigrantes. O fato é que mesmo com essa orientação, os professores a

Muitos deles não falam a língua italiana. Nesse caso, o grande

esquecem e fazem o que sabem e o que bem querem. Não tem

desafio é trabalhar a questão da integração e da língua. A Itália

jeito. Do meu ponto de vista, ensinar por competências não é

também começa a ter uma série de problemas sociais, como

legal, pois não estimula o trabalho coletivo, a troca, a produção

a marginalidade, o consumo de drogas, especialmente entre

entre os professores. Tenho vários colegas na Unicamp – na área

os jovens, a enorme quantidade de imigrantes sem família e

da Física e Matemática - que fazem trabalhos com formação de

de jovens desacompanhados, como eles chamam. Em todas

professores na linha da relação teoria e prática, estimulando

essas áreas, acredito que a proposta freireana ganha espaço,

os professores a refletirem sobre o que fazem, sobre como eles

não no sentido de “copiar e colar”, mas no sentido de ver os

poderiam modificar o que estão fazendo e como poderiam cons-

princípios e o ideário que estão por trás da proposta freireana

truir outras estratégias e percursos. E isso é muito interessante. A

e investigar como é possível reescrever e utilizar esses princí-

formação tradicional - e acredito que o modelo de competências

pios e esse ideário nos trabalhos na educação de adultos, na

também - corta a criatividade, a iniciativa, a capacidade produ-

escola tradicional, em que a dificuldade é maior, nos espaços,

tiva dos professores. Em muitos aspectos, o método de Paulo

digamos, não-formais, como centros de jovens, centros de

Freire é bastante superior, pois se funda em outra lógica. A lógica

cultura, teatros, associações culturais, associações de jovens,

do modelo de competências, para mim, é disciplinadora e fabril.

etc. Na Itália, o associativismo, a cooperação e o voluntariado

É o modelo de organização da fábrica traduzido para a organi-

são muito fortes, há associações para tudo, o que é bastante

zação escolar. É um pouco exagerada essa minha comparação,

interessante; há também cooperação com a América Latina

mas é válida. Se antes tínhamos uma visão conteudista, muito

e a África e o voluntariado. Há ainda muita gente sensível às

clássica, muito fundamentada em elementos pouco vinculados

propostas educativas mais dialógicas, interativas e libertárias.

à realidade prática do mundo do trabalho, hoje, temos o inverso.

É nesse campo que atuamos. Na escola nosso acesso é muito difícil, a educação profissional na Itália é bem estruturada, burocrática, com modelo bastante fechado. Tradicionalmente,

EPCT | Professora, para concluir, fale sobre sua atuação no Instituto Paulo Freire na Itália e sobre o trabalho do Instituto nos países em que ele também atua.

foi assim, as propostas de Freire teve mais aderência nos mo-

Temos o Instituto Paulo Freire de São Paulo, que é a sede,

candanga, a escola plural, em Minas, e a experiência em São

e uma rede mundial de quase trinta institutos. Alguns são

Paulo, mas, infelizmente, não fomos capazes de expandir essa

centros e outros, cátedras. Na Europa, temos estruturados

experiência para a escola pública no plano nacional.

36

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 33-36, jul./dez. 2010

vimentos sociais, na educação não-formal. No Brasil, tivemos quatro importantes experiências na educação escolar: a escola


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 37-41, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

FRANCISCO CORDÃO > Por Flávia Silveira

Francisco Cordão é membro do Conselho Nacional de Educação do Ministério da Educação.

O panorama da educação profissional no Brasil

EPCT | Em uma entrevista ao Senai, o senhor afirmou que a Nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) trouxe um novo status à Educação Profissional, integrando as dimensões educação, trabalho, ciência e tecnologia. Após 13 anos de promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, como está o cenário da educação profissional no Brasil?

lugar da educação básica’. A educação profissional e técnica complementam a educação básica. E a educação profissional vai além dos cursos técnicos de nível médio integrados ou articulados com o ensino médio. Ela integra todo o itinerário formativo das pessoas, preparando-as para o mundo do trabalho, para definirem seus próprios itinerários de profissio-

Essa mudança proposta pela LDB é uma mudança ra-

nalização. A escola, ao planejar os seus cursos, deve pensar

dical de ordem cultural. Mudança cultural não se consegue

em itinerários formativos das pessoas, de tal maneira que elas

da noite para o dia. Nós tínhamos durante longo tempo na

possam construir o seu percurso de profissionalização. As

história da educação brasileira certo preconceito em relação

pessoas se preparam efetivamente para o mundo do trabalho

à educação profissional. A educação profissional nasceu no

com uma sólida educação básica e complementarmente com

Brasil como obra de benemerência social, para atender aos

uma sólida educação profissional. A educação profissional

pobres, aos desamparados e aos desvalidos da sorte. Esses

está situada na confluência de dois direitos fundamentais

são termos utilizados nos documentos antigos a respeito de

do cidadão: o direito à educação e o direito ao trabalho, ou

educação profissional. Ao longo do século passado, com a

seja, o direito à profissionalização, conforme cita o artigo 227

criação do Senai e depois do Senac, houve uma valorização

da Constituição. A educação profissional é então entendida

da educação profissional e da estruturação da rede federal.

não mais como preparação para o posto de trabalho. Não é

Porém, esse ritmo de desenvolvimento da educação profissio-

treinamento operacional. Não é formação de mão de obra.

nal foi um pouco rompido com a lei 5.692/71. A despeito de

Até porque não existe mais aquela clássica separação entre a

valorizar a educação profissional, esta lei, ao contrário, contri-

mão de obra e o “cabeça” da obra, o gerente, o planejador, o

buiu para a sua desvalorização, na medida em que a educa-

controlador de qualidade. Hoje, cada vez mais, quem faz deve

ção técnica do ensino médio foi colocada no lugar do ensino

saber por que está fazendo dessa maneira e não de outra. E

médio. Essa nova LDB diz que ‘a educação não deve tomar o

quem faz é chamado a planejar a sua ação profissional, a con-

Entrevista concedida em 26.11.2009

37


trolar a qualidade de seu serviço profissional. Então se exige

conseguiu definir diretrizes curriculares nacionais. Porque

um profissional mais completo em termos de desenvolvimento

estava muito difícil para o próprio Conselho, para os próprios

de competência profissional. Dessa forma, na LDB, a educa-

conselheiros, identificar o cerne da nova orientação da LDB

ção profissional integra as dimensões de educação, trabalho,

em termos de uma educação comprometida, que articulasse

ciência e tecnologia. Assim, trabalha com o desenvolvimento

as dimensões educação, trabalho, ciência e tecnologia, objeti-

do conhecimento dos saberes e não de um conhecimento

vando o desenvolvimento de competências profissionais para

desvinculado da prática. A própria prática é impregnada de co-

desenvolver um trabalho integrado e articulado no mundo da

nhecimento. Muitos trabalhadores desenvolvem o seu conheci-

educação, do trabalho e no mundo da ciência e da tecnolo-

mento profissional na prática, sem cursos. É por isso que existe

gia. É uma mudança cultural muito grande. De início, muitas

a alternativa da certificação profissional, de avaliar, reconhecer

pessoas falavam: “bom, mais eu vou organizar, então, por

e certificar os seus conhecimentos desenvolvidos na prática,

competências. Isso significa que eu não vou mais organizar

para fins de continuidade de estudos e até de conclusão. Dessa

por conteúdo?” Quer dizer, eu não vou deixar o conteúdo de

forma, é essencialmente um trabalho educativo voltado para a

fora. É a capacidade de articular e mobilizar conhecimentos e

realidade do mundo do trabalho.

habilidades que deve ser levada em consideração. Eu tenho que ver que conhecimentos são necessários para desenvolver

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

aquela competência, porque competência implica capacida-

38

EPCT | Que norte deve guiar os projetos dos cursos de educação profissional?

de de articular conhecimentos, habilidades, atitudes, valores,

O perfil profissional é que estrutura o curso de educação

dos? Que habilidades eu vou desenvolver? Então, se eu estou

profissional. Quando vou planejar um curso, seja de qualificação,

organizando um curso básico de cabeleireiro, eu tenho de

técnico ou de tecnologia, seja um curso de graduação ou de pós-

questionar: quais são as práticas do cabeleireiro? Quais são

graduação, procuro sempre saber quem é esse profissional, qual

os conhecimentos que formam aquela prática e como aquela

é o campo de atuação dele no mundo do trabalho, quais são

prática dá forma aos conhecimentos? Eu não posso fazer de

os limites de sua atuação, com quem ele se relaciona, qual é a

maneira descolada: agora, é teoria; agora, é prática. Tem-se

cultura dele. Num mundo cada vez mais em constante evolução,

de trabalhar de maneira integrada, porque o conhecimento

provocada especialmente pelo desenvolvimento científico e tec-

informa a prática e a prática informa o conhecimento tec-

nológico, é importante as dimensões da ciência e da tecnologia

nológico. Muitas escolas começaram a trabalhar com isso já

para a qualificação e a evolução desse profissional no mundo

a partir de 1999. Nós consideramos como momento de tran-

do trabalho. Por isso é que toda instituição de educação profis-

sição, de 1999 até o final de 2000. E ampliamos depois esse

sional, seja de nível básico, seja de nível técnico, seja de nível

momento de transição até o final de 2001, porque as escolas

superior, tem de ser um centro de referência tecnológica para

tinham muita dificuldade de se planejarem dessa maneira. As

trabalhadores e empregadores na sua área de atuação e na re-

primeiras instituições que implantaram essa nova proposta

gião onde ela está situada. Esse é o grande desafio da educação

foi o Senac, o Senai e muitas unidades da rede federal de

profissional pós-LDB.

ensino, alguns Centros de Educação Estadual, como o Centro

emoções. Com que valores eu vou trabalhar aqueles conteú-

de Educação Estadual Paula Souza, em São Paulo. A comunidade europeia está seguindo a mesma linha. Só que eles EPCT | O senhor pode nos exemplificar algum caso de sucesso, alguma instituição de educação profissional que tenha conseguido essa articulação entre teoria e prática, certificação de competências, de saberes oriundos da vivência da pessoa, que sirva de modelo para as outras instituições do Brasil?

começaram antes da gente. Quando nós estávamos discutindo as diretrizes curriculares nacionais, nós nos inspiramos nos debates que estavam ocorrendo na Espanha, Inglaterra e França, em Portugal e também no Canadá, em termos de organização da educação profissional comprometida com o

Nós temos vários modelos. É claro que nós estamos

desenvolvimento de competências. Em 1999, estive em Turim,

aprendendo ainda. A LDB é de 1996. A discussão em torno das

no Centro de Educação Profissional da OIT (Organização

diretrizes curriculares nacionais para a educação profissional

internacional do Trabalho), junto com a Cleonice Rein, do

começou logo em 1997, a partir do Decreto 2.208/97, que foi

Ministério da Educação, discutindo com gente do mundo in-

o primeiro decreto regulamentador. Depois, teve outro decre-

teiro o planejamento de ensino centrado no desenvolvimento

to, o Decreto 5.154, de 2004. Só em 1999, três anos depois da

de competências. O Canadá conseguiu resultados muito mais

promulgação da LDB, é que o Conselho Nacional de Educação

efetivos porque desenvolveu uma cultura de planejamento,

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 37-41, jul./dez. 2010


com professores e técnicos, de maneira mais sólida, mais participativa e com maior debate.

EPCT | Qual o papel do professor nesse novo modelo? Neste ponto, a nossa LDB é muito sábia. Nos artigos 12 e 13, que, para mim, está ali a sua espinha dorsal, são definidas as

Na realidade, a verdadeira avaliação de competência não ocorre na escola, ocorre no mundo do trabalho, quando se está empregado. É lá no trabalho que verdadeiramente se é avaliado.

com clareza como a capacidade de articular, mobilizar, colocar em ação conhecimentos, habilidades, atitudes, valores, emoções para responder aos requerimentos da vida profissional.

EPCT | O senhor poderia falar um pouco sobre a avaliação de competências? Na realidade, a verdadeira

competências das escolas, inclusi-

avaliação de competência não

ve da educação profissional, e dos

ocorre na escola, ocorre no

docentes. A primeira competência do professor não é dar aulas e,

mundo do trabalho, quando se está empregado. É lá no trabalho

sim, participar da concepção, elaboração, execução, avaliação e

que verdadeiramente se é avaliado. A escola avalia evidências

replanejamento do projeto pedagógico da escola. Participar no

de desempenho e competência, mas não avalia o desempenho

sentido de pelo menos ter pleno conhecimento, ou, num segundo

e a competência. Porque, mesmo que o aluno desenvolva uma

estágio de participação, vestir a camisa da escola para concretizar

determinada tarefa ou uma prática profissional, ele vai desen-

aquele projeto pedagógico ou, num estágio mais aprofundado

volver numa situação de laboratório. Ele pode explicá-la, pode

de participação, fazer a escola vestir a sua camisa, ao levar os seus

demonstrar que sabe o que está fazendo, pode desenvolver

conhecimentos, suas habilidades e seus valores para aprimorar o

aquela mesma prática profissional de duas, três, maneiras dife-

projeto pedagógico da escola. A segunda incumbência também

rentes, mas só estará evidenciando à escola que ele desenvolveu

não é dar aula. É elaborar o seu plano de trabalho de forma coe-

tais competências. Ele só vai provar mesmo que desenvolveu

rente, vinculada com o projeto pedagógico da escola. A terceira

competências e habilidades lá fora, depois que ele sair da escola.

incumbência ainda não é dar aula. É zelar pela aprendizagem

Há um tempo, eu fui chamado por uma escola que estava

dos alunos. Porque as atividades de ensino terão de ser avaliadas

desenvolvendo um curso de técnico de Publicidade. O diretor

pelos resultados de aprendizagem dos alunos. Se o aluno não

da escola estava preocupado e me chamou para discutir com

aprendeu, não significa que o professor não ensinou. Significa que

professores e técnicos a reformulação do curso técnico de

não foi eficaz a ação docente do professor. A quarta incumbência

Publicidade, que oferecia 40 vagas. O ponto de equilíbrio do

do professor ainda não é dar aula. É recuperar os alunos de menor

curso era 20 alunos matriculados. Se ele tivesse uma evasão ou

rendimento. Quando isso foi apresentado no Senado Federal, o

inadimplência e se a soma não ultrapassasse 20 alunos, ele não

senador Darcy Ribeiro foi questionado: “Escuta, vocês estão colo-

estaria perdendo. Ele teria lucro a partir de 21, 22 até 40 alunos

cando recuperação antes de dar aula?” E ele disse: “Claro. Só que,

matriculados. E começaria a perder na hora em que a inadim-

antes da recuperação, está o zelo pela aprendizagem dos alunos”.

plência e a evasão chegassem aos 20. E essa escola estava no

Em termos de competência, esse conteúdo tem de ser trabalhado

vermelho. Era uma escola que mantinha o curso de técnico em

de maneira que todos entendam, que todos consigam fazer o link

Publicidade a longo tempo, mas, naquele ano, o curso estava só

da informação nova com a informação antiga. Se não tem infor-

com 16 alunos dos 40. Estava faltando pelo menos mais quatro

mação antiga, tem de ter, por isso a recuperação. Só depois disso

para ele empatar. O diretor queria saber o que estava acontecen-

é que vem a incumbência de dar aula. Então, é uma inversão que a

do e então me chamou para fazer uma discussão e avaliação. Os

LDB fez, e que é importante. O objetivo da educação profissional é

professores dele eram os mais gabaritados. Um deles era gerente

o desenvolvimento de competências para o exercício profissional

de produção de uma grande empresa de Publicidade. Um outro

competente. É isso que uma pessoa, por exemplo, quando entra

era gerente comercial de outra empresa de Publicidade. Tanto

no Senac está procurando, seja na faculdade, seja no curso técni-

a parte comercial quanto a de produção era muito bem traba-

co, seja num curso de capacitação ou de qualificação profissional

lhada. Eram dois gerentes de duas boas empresas. E outros com

na formação inicial, seja num curso de aperfeiçoamento e de

formação na ECA-USP. Todos tinham formação de nível superior

especialização. Ele quer melhorar o seu desempenho profissional

de boa qualidade. Eu comecei discutindo com os professores

constituindo competências profissionais, que nós entendemos

o plano de curso. Eles achavam que o plano de curso era bom.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 37-41, jul./dez. 2010

FRANCISCO CORDÃO

de competências profissionais,

39


Ensinavam tudo o que estava no plano e os alunos gostavam do

bolsa a ele, os alunos teriam se reunido e feito a “vaquinha”, por-

curso. Perguntei para um dos professores, que era gerente de

que qualquer um que saísse atrapalharia o andamento dos pro-

uma empresa de Publicidade, se ele levaria um aluno de lá da es-

jetos. Aqueles dois que saíram tiveram de passar o projeto em

cola para trabalhar com ele como técnico de publicidade. Ele deu

andamento para outro aluno que tinha tempo disponível para

uma parada e disse: “Eu acho que não”. “E você?” Perguntei para

assumir dois trabalhos. Depois, eu soube que, no ano seguinte,

o outro, que era gerente comercial de uma agência de publicida-

eles decidiram aprimorar um pouco, e em vez de o trabalho ser

de: “Eu com certeza não levaria. Eu poderia levar como trainee de

só individual, teria também a opção de dois ou mais assumirem

técnico de publicidade. Eu o contrataria como trainee.” Eu disse:

o mesmo trabalho. E, com essa possibilidade de trabalho coo-

“Bom, então muda o nome do curso de técnico de Publicidade

perativo, os projetos melhoraram. Porque, no primeiro ano, em

para trainee.” O dono da escola quase me bateu: “Claro que não!”

que o aluno fazia sozinho os projetos, houve muita necessidade

Mas eu falei: “Você, então, está fazendo propaganda enganosa.

de apoio do professor na recuperação de alguns alunos que ti-

Você está vendendo um curso de técnico em publicidade e não

nham maiores dificuldades. E com o trabalho cooperativo, eles

é técnico. Os seus dois professores que trabalham numa agência

conseguiram manter quase o mesmo ritmo. Aí a avaliação ficou

de Publicidade disseram que não os contrataria.” E poderiam

mais fácil. Por fim, tem escolas na área industrial, eu vi várias, que

dizer: “Ah, mas a minha agência é agência de ponta!” “Ah, então,

constroem trabalhos maravilhosos. Na própria escola do Sesc,

você está preparando para agência pobre. Você não está pre-

os alunos de um curso de qualificação profissional na área de

parando profissional competente.” Então, eu disse que não ia

Publicidade fizeram peças publicitárias sobre políticas públicas

preparar o plano de curso deles. O dono da escola falou assim:

para cada Ministério e foi um sucesso.

“Vocês podem criar o curso que vocês quiserem, podem mudar o currículo do jeito que vocês quiserem. Eu vou manter o contrato de trabalho do jeito que está. E se a gente conseguir manter pelo menos 30 alunos pagantes, o que passa do back-in eu vou dividir com vocês os lucros.” Daí, eles planejaram um curso fantástico. Eles chegaram à conclusão de que deveriam reorganizar todo EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

o conteúdo do curso por projetos. E, ao invés de organizar o

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EPCT | Professor, o senhor foi relator das Diretrizes Curriculares para Educação Profissional de Nível Técnico e atualmente examina as diretrizes para os cursos Tecnológicos. Qual o papel dos cursos Tecnológicos no desenvolvimento do Brasil e quais são as suas especificidades?

curso por disciplina, eles iriam organizar o curso por projetos.

Quando eu estava relatando as diretrizes para os cursos de

Criaram 35 projetos diferentes. Aqueles 35 projetos davam conta

Tecnologia, eu insisti que o tecnólogo é graduação. Ele é um

de todo o conteúdo do curso. Cada aluno, ao se matricular, re-

curso superior de graduação. Isto está na reforma da LDB. Isso foi

cebia um projeto para trabalhar durante o curso. O aluno fazia

marcado, inicialmente, no meu parecer de 2002, que definiu as

um contrato de aprendizagem e de trabalho com a escola. Os

diretrizes para a tecnologia. É uma graduação focada no mundo

professores começaram a ser considerados pelos alunos como

do trabalho, no desenvolvimento tecnológico, não no sentido

clientes. Eles se colocavam na posição de cliente, contratavam o

de preparar as pessoas para utilizar tecnologia, mas no sentido

projeto e forneciam informações tecnológicas para executá-lo. E

de preparar as pessoas para desenvolver tecnologias, para ad-

o aluno se comprometia a desenvolver o trabalho e dar conta do

ministrar o uso delas, para aprimorá-las e para ter condições de

recado para o seu cliente, que era o seu professor. Cada professor

atuar no mundo do trabalho. Não é um curso generalista. E esse

pegou, segundo sua carga horária, de um a cinco alunos. No final

é o grande diferencial do tecnólogo. É um especialista que não

do curso, os professores tinham 35 projetos. E cada aluno saiu

está voltado exclusivamente para o fazer. Tem condições de ficar

com um portfólio embaixo do braço, com 35 projetos em mãos

atento ao desenvolvimento tecnológico e ao que ele representa

e podia falar à empresa que tinha experiência. “Eu desenvolvi

como desafio para sua empresa e de implementar inovações. Eu

um projeto para fulano de tal, porque ele fez o contrato – tinha

fiquei muito feliz quando participei de um debate em Maringá

até o contrato para mostrar – e participei da elaboração de 34”.

(PR), promovido pelo Conselho Regional de Engenharia, em

Conclusão: dos 35 alunos que entraram, 33 se formaram. E esses

que o presidente do conselho do CREA do Paraná disse: “Eu

dois que não terminaram o curso não o fizeram porque mudaram

não tenho a menor dúvida quando eu tenho uma demanda na

de Estado. Um terceiro aluno iria sair, porque perdera o emprego

área de saneamento básico, na área de pontes’ e eu tenho um

e não tinha como pagar a escola. Os alunos discutiram em classe

engenheiro generalista e um tecnólogo formado em Umuarama.

e se propuseram a fazer uma “vaquinha” para pagar a mensalida-

Eu fico com o tecnólogo”. Então, ele estava dizendo que aque-

de dele, mas o diretor, sabendo disso, deu a ele uma bolsa até ele

la faculdade de tecnologia de Umuarama, que é vinculada à

arrumar um emprego. Entretanto, se o diretor não tivesse dado a

Universidade Estadual de Maringá, está fazendo o que tem de

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 37-41, jul./dez. 2010


ser feito com seus tecnólogos. Nós temos alguns cursos de tec-

de qualificação, cursos técnicos e também cursos superiores.

nologia do Senac de São Paulo, por exemplo, na área de Turismo,

Estatisticamente, os nossos cursos superiores, em nível na-

que concorre com turismólogos formados no nível de bacharela-

cional, não chegam a 5%. É inferior a isso. 80% são cursos de

do e ganha todas. Porque ele tem o conhecimento tecnológico,

formação inicial, continuada e de qualificação e menos de 20%

tem a prática, e tem condições de utilizar-se de serviço e de

são os cursos técnicos. O Ministro aceitou o questionamento

novas tecnologias, de administrar o uso de novas tecnologias, de

em termos de bacharelado, mas em termos de tecnologia, não,

alterar fazeres na própria empresa e de planejar essa alteração

porque a própria LDB define a educação profissional, tanto a

de modo consequente. A mesma coisa aconteceu com o nosso

qualificação, quanto o técnico, o tecnológico, a graduação e a

primeiro curso de gestão ambiental: teve uma grande empresa

pós-graduação, inclusive a formação de professores para a edu-

que contratou quatro alunos, por conta da competência desses

cação profissional, como nosso negócio também. A discussão

tecnólogos na administração de novas tecnologias para resolver

hoje está muito mais em torno do Bacharelado. Porém, para o

os desafios da empresa naquela área de gestão ambiental.

Senac oferecer um curso de bacharelado, este precisa ser um curso que faça a diferença. Para fazer igual aos outros, não tem por que fazer. Aí vale aquela mesma orientação: tem de ser um

EPCT | Recentemente, o Conselho Nacional de Educação (CNE) emitiu parecer questionando a ampliação da oferta da educação profissional em nível tecnológico por parte do Sistema S. Como o CNE e o MEC têm se posicionado frente aos pedidos de credenciamento de novas instituições de educação superior do Sistema S?

centro de referência tecnológica para trabalhadores, empregadores e para a sociedade em geral.

lisada. Primeiro, ninguém questiona a capacidade do Sistema

Eu sou um otimista inveterado. Eu acho que a LDB colocou

S no desenvolvimento da educação profissional, tanto no nível

a educação profissional em um novo patamar e não tem volta.

técnico quanto no nível tecnológico ou nos níveis básicos. O

Nós estamos, neste século XXI, caminhando para uma educa-

questionamento surgiu na Câmara de Educação Superior e

ção profissional que conduz efetivamente as pessoas para o

pode indicar muito menos uma preocupação com a competên-

desenvolvimento de competências profissionais. Chame isso de

cia com que o Senac e o Senai estão atuando na educação supe-

competência, chame como quiser, mas a exigência é essa. Num

rior e mais com o fato de estarem “tirando” mercado de escolas

mundo pleno de tecnologia e conhecimento e de exigência de

particulares. Eles alegam que o Sistema S recebe dinheiro pú-

profissionais de qualidade e de produtividade, ou nós nos en-

blico decorrente de contribuição compulsória para a formação

gajamos nesse movimento de aprendizagem permanente, para

básica do trabalhador e não para a formação em nível superior,

responder aos desafios da vida profissional de modo original

que é assunto das Universidades e dos Institutos Superiores

e criativo a cada momento, ou estaremos perdendo a parada

de Tecnologia. O próprio Ministério da Educação não assumiu

nesse mundo globalizado. É uma questão de inclusão ou de

esse questionamento da Câmara Superior de que o Senai e o

exclusão. Ou desenvolvemos uma educação profissional de qua-

Senac não têm, legalmente, vocação para a educação superior.

lidade, que seja referência para trabalhadores, empregadores e

Da mesma maneira que a nossa lei de criação não fala explicita-

para a sociedade, ou não sobreviveremos. A nossa sobrevivência

mente dos cursos de educação superior, o da rede federal tam-

está na qualidade do serviço que nós oferecemos para os nossos

bém não falava no início. Porém o mundo evoluiu. E o Senac e

clientes, que são os nossos alunos, os empregadores dos nossos

o Senai têm hoje trabalhado toda a sua estrutura ocupacional

alunos e a sociedade que se beneficia do trabalho dos profissio-

com cursos básicos, cursos de formação inicial, continuada e

nais que nós capacitamos. FRANCISCO CORDÃO

Aqui tem uma questão muito complicada que deve ser ana-

EPCT | Professor, poderia concluir falando um pouco sobre os rumos da educação profissional, para onde estamos caminhando?

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 37-41, jul./dez. 2010



Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 43-47, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

ENTREVISTA

ISMÁRCIA GONÇALVES SILVA, TIAGO RODRIGUES, CAROLINE FERREIRA > Por Juliana Caixeta & Rafael Voigt

Ismárcia Gonçalves Silva é Professora do Instituto Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro. Thiago Rodrigues é Estudante de Química do Instituto Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro Caroline Ferreira é Estudante de Química do Instituto Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro.

Desafios e conquistas do Laboratório de Metodologias de Ensino de Ciências e Matemática (Labmet)

EPCT | Conte-nos um pouco sobre o Laboratório de Metodologias de Ensino de Ciências e Matemáticas.

para cada um. Porém, existem componentes curriculares que

Professora Ismárcia: Como conversamos ontem na ofici-

A proposta é formar educadores nessas áreas e o Labmet é um

na , as licenciaturas começaram em 2004 com os cursos de

ambiente em que os alunos vão trabalhar junto conosco, crian-

Química, Física e depois Matemática. Nós sempre tivemos a

do e testando materiais didático-pedagógicos.

1

são comuns aos três cursos e a estrutura é muito semelhante.

preocupação de trabalhar muito bem a área de ensino dentro do projeto do curso, de forma a capacitar nossos alunos para

EPCT | O Labmet é uma determinação do MEC?

trabalharem com versatilidade, utilizarem diversos materiais

Professora Ismárcia: Sim. Esse projeto é da Capes/MEC. Nós

didáticos e entenderem o ato de ensinar. Hoje, nós trabalha-

tínhamos a ideia e o pessoal qualificado para trabalhar, mas

mos dentro de uma nova proposta orientada pelo MEC. Antes,

não tínhamos o investimento. A aprovação desse projeto era

os alunos cursavam disciplinas específicas, para só então

tudo o que nós precisávamos. O laboratório está se construin-

cursar disciplinas da área pedagógica. Hoje, em nosso curso,

do a partir disto: da união de pessoas qualificadas, de pessoas

os alunos estão sendo preparados desde o início para serem

interessadas e do investimento que temos.

educadores de Química, Física e Matemática. O Laboratório de Metodologias de Ensino de Ciências e Matemática (Labmet) surgiu da necessidade de criar um ambiente que fosse comum às três licenciaturas, que já tinham muitas pesquisas acumula-

EPCT | Há quanto tempo existe o Laboratório? Professora Ismárcia: O curso de Química existe desde 2004, já o Laboratório está passando a existir, de fato, agora.

das nessas áreas, para que os professores de Física, Química e Matemática pudessem trabalhar essas disciplinas em sala de aula. Os cursos são independentes. Há uma grade curricular 1 Oficina interdisciplinar de ensino de ciências e matemática aconteceu no dia 26/11/2009 como atividade autogestionada do I Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica. Foi ofertada pelo Instituto Federal do Rio de Janeiro – IFRJ.

EPCT | Qual a função do Labmet para vocês alunos? Professora Ismárcia: Deixa eu explicar para ficar bem claro, até para entender, porque eles vão falar sobre isso. O Laboratório, ambiente físico, ainda não existe. Quer dizer, o Laboratório existe, só que ele não está equipado. Então, por

Entrevista concedida em 27.11.2009

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enquanto, a gente realiza todo o projeto dentro da sala de aula, tanto no curso de Química quanto nos outros cursos.

Professora Ismárcia: Eu já trabalho com a área de ensino há bastante tempo, inclusive numa escola pública do Estado

Aluno Tiago Rodrigues: Na disciplina de Química, da professo-

do Rio de Janeiro. Essa deficiência é uma coisa que qualquer

ra Ismárcia, além de trabalharmos os textos mais teóricos e pe-

professor da área de Ciências da Natureza e Matemática per-

dagógicos, nós nos aprofundamos no ensinamento dos autores,

cebe. O que nós tentamos no Labmet é buscar metodologias

pondo-os em prática por meio de materiais alternativos. Esses

que possam melhorar tanto a interação aluno/ensino de

materiais alternativos é uma forma interessante de tentar sanar

Ciência quanto a interação professor/aluno. Nós buscamos

as dificuldades de recursos pedagógicos que encontramos nas

mostrar isso ontem, na oficina. Muito mais do que trabalhar

escolas públicas, por isso é importante pôr isso em prática e que

uma fórmula, é poder ajudar o aluno a construir um conceito,

isso possa crescer cada vez mais.

que é a maior dificuldade. Se analisarmos as turmas que eu já assumi até hoje, vamos perceber que a linguagem e a cons-

EPCT | A ideia de usar materiais alternativos vem de onde?

trução de conceitos são as maiores dificuldades dos alunos.

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

Então, se ele tem dificuldade de construir um conceito, ele

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Aluna Caroline Ferreira: Essa ideia de usar material alternativo

vai simplesmente memorizar, e aí, se tiver boa capacidade de

– ou de baixo custo – veio da dificuldade de as escolas, princi-

memorização, ele vai em frente sem perceber que aprendeu

palmente as públicas, conseguirem material para trabalhar com

ou não. O professor também não percebe. Então, o aluno ou

essas atividades específicas. O mais fácil para o professor é dar

vai ficar retido ou vai ter dificuldade. E a dificuldade que mais

uma ideia da utilização desses materiais, para poder trabalhar

tenho enfrentado é a construção de conceitos, que vem desde

em sala de aula sem um laboratório propriamente dito.

o momento em que o aluno começa a estudar Matemática e

Professora Ismárcia: Posso até complementar. A pesquisa

Ciências. O que não é no ensino médio, com certeza. É desde

com materiais alternativos não é nossa. Nós não iniciamos

sua formação básica, sua formação fundamental. Por isso,

essa pesquisa. Ela já existe. Nós temos publicações de outros

a tentativa das propostas desenvolvidas no Labmet não é

autores dessa área. Eu posso dizer que eu faço isso desde que

apenas formular e elaborar um experimento, mas também

eu estava na graduação, porque dentro da Universidade Rural

elaborar uma metodologia para aplicar esse experimento,

nós já trabalhávamos um projeto de integração de ensino de

para desenvolvê-lo dentro da aula. Porque o experimento

ciências com a universidade. A intenção era usar ao máximo

por si não resolve, mas sim como ele vai ser aplicado e uti-

qualquer material que fosse viável dentro de qualquer espaço.

lizado para construir um determinado conceito. A mediação

Então, é uma pesquisa antiga, que, hoje, várias licenciaturas

é importante. A linguagem que o professor vai utilizar, como

tentam fazer adaptações. O interessante é que eles, os alunos

ele vai mediar isso em conjunto com seu aluno também.

que estão conosco, fazem essa pesquisa. Eles são estimulados

Portanto, essa tem sido a preocupação do Labmet.

dentro do seu curso, de uma disciplina como a Química em Sala de Aula, a buscarem isso. A gente brinca que é uma pesquisa diferente, é entrar numa farmácia, numa drogaria, num supermercado e descobrir o que tem dentro deles que podemos usar em sala de aula. Não é para minimizar a importância

EPCT | Quais trabalhos o Labmet já desenvolveu ou vai desenvolver para multiplicar esses conhecimentos com os grupos sociais locais ou além das fronteiras do estado do Rio de Janeiro? O que vocês pensaram como proposta de atividades para divulgá-los?

de um laboratório, até porque eles sabem que este também

Professora Ismárcia: Num primeiro momento, nossa pro-

é importante. Eles trabalham, eles estudam dentro de um la-

posta junto ao Prodocência – Programa de Consolidação

boratório. Mas é para mostrar que a aula experimental, que é

das Licenciaturas - é fazer atualizações ou oficinas junto

essencial para o desenvolvimento da nossa ciência, não pode

aos nossos professores e colegas da rede que trabalham no

ficar restrita a um ambiente que tenha tecnologia. Então, são

município de Nilópolis, que é o nosso foco, e nos municí-

essas adaptações que eles fazem. Eles buscam recursos que

pios do entorno. Nosso objetivo é trabalhar primeiro com os

possam ser utilizados nos espaços que não têm tecnologia ou

nossos colegas mais próximos. À princípio, trabalharemos

que não estão totalmente preparados.

com oficinas, mas também são previstos cursos de aperfeiçoamento e atualização. Assim, nossa intenção é aplicar, a

EPCT | O ensino de Ciências e Matemática foi apresentado neste Fórum como um grande desafio para muitos países, inclusive para o Brasil. É uma das áreas que tem mais nota baixa. Em que medida o Labmet pode contribuir para a reversão do fracasso escolar nas áreas de Ciências e Matemática?

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 43-47, jul./dez. 2010

partir de 2010, em todas as escolas da rede, a oficina que aplicamos aqui no Fórum. As oficinas terão um tutor para dar um suporte e uma segurança a mais aos participantes. Sendo assim, o ano de 2010 será um ano de muito trabalho.


Todos estão felizes de entrar no projeto e ficarão felizes de trabalhar bastante também.

EPCT | E como vocês selecionam os alunos? Professora

Ismárcia:

Nesse

primeiro momento, nós estamos selecionando a partir da experiência que os alunos têm

A dificuldade que mais tenho enfrentado é a construção de conceitos, que vem desde o momento em que o aluno começa a estudar Matemática e Ciências.

dentro de uma outra escola, e não necessariamente só na nossa. Podemos fazer uma atualização, uma oficina numa escola local. Assim, se tivermos um público interessado numa escola da rede no nosso município ou em município próximo, nós podemos ir até lá. O Labmet tem uma sede dentro do Instituto Federal de Educação Profissional, no entanto, ele é uma

dentro do curso. Não avaliamos

proposta que pode circular para

em relação a notas, mas em re-

onde ele for necessário.

lação às experiências que eles acumularam durante o curso. Os dois alunos aqui já estão na metade do curso. Eles chegaram a um ponto em que eles já têm uma boa bagagem tanto na área específica, quanto na área de ensino, que é o que a gente mais precisa. Em princípio, nós selecionamos a partir da manifestação de interesse do aluno. Os dois que estão aqui já fazem parte de

EPCT | Vocês pensam em montar um laboratório móvel, um laboratório de matemática itinerante, por exemplo, como é isso para vocês? Conte-nos a experiência de vocês ao montar o laboratório móvel e o que são aquelas malinhas?

um projeto de pesquisa, que é o PIBID - Programa Institucional de

Aluno Tiago Rodrigues: O interessante da Química em sala

Bolsa de Iniciação à Docência. Eles quiseram fazer parte do proje-

de aula é que eu já tinha montado os kits2, uma espécie de com-

to. Nós temos outro aluno, que é de Matemática, que tem uma

plemento. Dentro do município de Nilópolis, as escolas foram

bolsa de iniciação científica, ele a ganhou a partir da experiência

selecionadas e nós levamos os kits para os alunos. Sabendo das

acumulada dele e do interesse de participar.

dificuldades das escolas, nós não exigimos salas com azulejo nem nada disso, só pedimos que o ambiente tivesse bancada, água e boa iluminação, só esses recursos. Com os nossos kits, que é feito

EPCT | E quando o PIBID ganhar reconhecimento na universidade, como é que vocês vão fazer para selecionar?

com objetos e soluções alternativas, nós estudamos a proposta e

Professora Ismárcia: Ano que vem, nós, com certeza, vamos

alunos do ensino fundamental e é difícil conseguir deles um enten-

precisar de mais pessoas, e pessoas interessadas. Então, já para

dimento do conteúdo, mas, com esses materiais alternativos, ao

março ou abril, nós devemos abrir inscrição e fazer as entrevistas.

fazermos a mudança do ácido e base da coloração, eles observam

Agora, como é que nós vamos avaliar quem é que vai entrar ou

aquilo e ficam bestificados. E com interesse eles falam: ‘poxa, pro-

não, vai ser uma tarefa difícil. Pois a entrevista é uma avaliação

fessor, semana que vem tem outra experiência?’. E são alunos de es-

qualitativa. Não tem como nós quantificarmos quem está mais

cola pública, então o professor já vai com aquele preconceito: será

interessado ou não. O nosso curso é noturno. Muitos dos nossos

que eles vão gostar? Então, quando eles veem os experimentos

alunos trabalham durante o dia e por isso têm pouca disponi-

serem realizados, eles ficam encantados e pedem mais e mais. Esta

bilidade. Esse aspecto, infelizmente, será um dos critérios de

experiência está sendo muito boa. E com o Laboratório, esperamos

seleção. Muitos deles estão aptos a trabalhar, mas, por terem

mesmo ampliar esses conhecimentos que adquirimos durante o

dedicação a um emprego durante o dia, ficam impossibilitados.

curso de licenciatura, entrar nas escolas e ver como vai ser.

Então, a seleção vai ser a partir do interesse, da bagagem acumulada e da disponibilidade para trabalhar.

Professora Ismárcia: Como uma espécie de estágio, os alunos vão às escolas e instituições de ensino para atuarem diretamente por meio dos laboratórios portáteis. Com o laboratório móvel, os alunos podem trabalhar com os professores, qualificando-os

EPCT | Vocês pensam em ampliar, por exemplo, atividades no sábado ou no domingo para que os alunos que trabalham durante a semana possam participar? Professora Ismárcia: Sim. Pensamos em ampliar para o sábado, principalmente, porque daí conseguiremos fazer atividade

e formando multiplicadores para atuarem em outras escolas 2 Os kits são maletinhas em que os alunos colocam materiais a serem usados em experimentos que são conseguidos em farmácias, pet shops, supermercados, entre outros comércios de fácil acesso. Os alunos entrevistados, por exemplo, tinham kits feitos com soluções encontradas em lojas de aquários e kits feitos com materiais de sucata.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 43-47, jul./dez. 2010

ISMÁRCIA GONÇALVES SILVA, TIAGO RODRIGUES, CAROLINE FERREIRA

a metodologia que seria aplicada para os alunos. Eu trabalho com

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EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

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e instituições. A intenção do Labmet é ter um conjunto de ex-

tem de saber fazer essas relações em sala de aula, tentando ao

perimentos e de atividades propostas, chamados de kits, que

máximo fazer esse contato com as áreas correlatas. No institu-

possam se deslocar de um ambiente para outro e que possam

to, por exemplo, não temos aulas interdisciplinares, mas temos

ser multiplicadores. Uma das propostas dentro da Labmet é

pessoas com atitudes ou propostas interdisciplinares em suas

fazer oficinas de atualização e capacitação, fornecendo às esco-

aulas. Acreditamos que o Labmet seja um importante espaço

las alguns materiais básicos de laboratório que não podem ser

de possibilidade para essa integração. Por isso vamos começar

substituídos. Nós compramos esses materiais por meio de verba

a trabalhar com a interdisciplinaridade dentro da instituição.

recebido do projeto Prodocência. A proposta também é oferecer

Porque temos de fazer a discussão interdisciplinar primeiro entre

em algumas escolas materiais alternativos que possam substituir

nós. Nós temos de ter certeza do que nós desejamos e de qual é

os oficiais e ensiná-las como usá-los de maneira alternativa.

a nossa proposta.

EPCT | Como vocês compartilham essas experiências do Labmet com os cursos profissionalizantes, especialmente aqueles que têm Química, Física e Matemática em seus currículos? Sabemos que as dificuldades nessas disciplinas não é são só no ensino médio tradicional. Os alunos que cursam cursos técnicos também têm e reclamam de dificuldades de aprendizagem nessas áreas específicas. Como vocês do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia podem contribuir para que os alunos de cursos técnicos e profissionalizantes possam entender mais facilmente os conhecimentos de Física, Química e Matemática?

EPCT | Foi desafiante para vocês fazer esta oficina? Aluno Tiago Rodrigues: Foi realmente um grande desafio. Como a professora mencionou anteriormente, nós estamos há menos de um mês nesta oficina. Foi desafiador arrumar as malas, deixar as provas da faculdade e vir para o Fórum fazer a oficina. De início, estávamos apreensivos se o experimento seria legal de ser aplicado. Não sabíamos também em função de espaço como seria. Fazendo uma avaliação geral, a oficina foi muito interessan-

Professora Ismárcia: Primeiro, realizaremos uma oficina de

te. Ao conversarmos com algumas pessoas, inclusive do Pará, elas

capacitação dentro da nossa própria instituição. Vale lembrar que

disseram que havíamos aplicado um experimento novo que eles

os nossos cursos técnicos estão dentro da área de Química, tendo

ainda não tinham feito no projeto deles. E até nos pediram uma

apenas alguma bagagem de Física e Matemática. Então, aluno

cópia por email, a qual gentilmente disponibilizamos. Gostaram

vai estudar Química do início ao fim do curso. Para tentar sanar

tanto dos nossos experimentos que quiseram levar para aplicá-los

alguma possível dificuldade que os alunos apresentam no início

no Pará. E isso foi bastante positivo para nós. Portanto, foi desafia-

do curso, faremos uma qualificação interna, não para falar dos ex-

dor sair do Rio de janeiro e vir para Brasília, sem saber como seria

perimentos, porque isso os professores já fazem nos laboratórios,

a aceitação das pessoas presentes e a quantidade de pessoas. Nós

mas para falar da construção dos conceitos na realização desses

não esperávamos uma quantidade tão grande de pessoas. Foram

experimentos, que é o mais importante no momento. Então só

quase 60 alunos presentes, entre professores e educadores. Nós

depois é que passaremos a qualificar as escolas da região.

esperávamos 20 ou 30 pessoas no máximo. E quando vimos aquela imensidão de alunos, professores, educadores, sentimos um frio na barriga, mas valeu a pena. Foi muito produtivo. Estamos felizes

EPCT | Quais são os maiores desafios no ensino integrado nas escolas em geral? Ontem, vocês propuseram uma oficina integrando várias áreas do conhecimento. Imagino, então, que vocês já tenham alguma experiência com a integração de áreas de conhecimento nos cursos.

com a proposta que trouxemos para vocês de Brasília e de outros estados. Acho que isso foi essencial para o Fórum.

Professora Ismárcia: Essa integração é extremamente difícil.

EPCT | Qual o maior aprendizado que vocês estão tendo com essa experiência do Labmet?

Quando sugerimos uma atividade ou oficina interdisciplinar, o

Aluna Caroline Ferreira: O maior aprendizado que estamos

primeiro obstáculo é o de os professores de áreas diferentes se

tendo e que vamos levar para a nossa carreira é a questão de

encontrarem. Eu sei, porque eu vivencio isso sempre. Contudo,

trabalhar com materiais alternativos em sala de aula, mostrando

uma das coisas que eu sempre digo é: temos de tentar. Temos

que se pode ensinar Química de uma maneira mais simples, e

de tentar pelo menos conversar, fazer um planejamento com

não só em laboratório, e ainda assim os alunos terem um bom

o colega de outra área. E, na medida em que esse planejamen-

aproveitamento em sala de aula.

to ou essa conversa for ficando limitados, temos de ter esse

Professora Ismárcia: Eu só complementaria. Eu me sinto na

pensamento interdisciplinar. O professor, dentro da sua área,

obrigação de falar. Se existe dificuldade de integração para o

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 43-47, jul./dez. 2010


professor, é lógico que ela vai existir para quem está se formando

temos alunos de licenciatura em Biologia. Primeiro, precisamos

como professor também. Porque cada área tem suas especifi-

construir em todos os alunos o pensamento de que são profes-

cidades. Os alunos tiveram dificuldade de integrar os conheci-

sores de ciências. Sendo professores de ciências, nós temos de

mentos de Química, Física e Matemática. E isso foi ótimo. Porque

conhecer as ciências como um todo para só então conhecê-las

tendo dificuldade agora, eles saberão, na hora em que tiverem

de acordo com suas especificidades.

em sala de aula com uma turma, como é que o aluno do ensino fundamental ou ensino médio se sente ao tentar juntar tudo aquilo que todas as disciplinas dizem e transformar isso num conhecimento. Eu tive dificuldade de orientá-los, e as professoras Carla, na Física, e Gisela, na Matemática, também. Mas eles

EPCT | É ideia do Labmet futuramente poder compartilhar ou fazer, dentro do instituto, uma política de integração cada vez maior de várias áreas do conhecimento? Professora Ismárcia: Sim. Primeiramente, dentro das próprias

período que eles mencionam. O período de um mês foi o perío-

licenciaturas. Porque mesmo que tenhamos uma proposta nova,

do com os alunos, mas já temos essa oficina mais ou menos es-

uma proposta dentro das novas diretrizes, todos nós formadores

truturada há uns dois anos. Ela começou só com Química, depois

temos, nesse momento, um histórico num curso tradicional. Meu

Química e Física e posteriormente Química, Física e Matemática.

curso de licenciatura foi tradicional. Então, eu tenho de me trans-

Ou melhor, as Ciências e a Matemática. A Biologia está implícita,

formar para pensar de uma maneira diferente. Primeiramente,

tem até uma atividade que envolve Biologia dentro do roteiro.

temos de trabalhar essa ideia no nosso grupo de docentes das

Só que nós não temos a licenciatura em Biologia. Então, os

licenciaturas. Nós temos de ter certeza de que estamos forman-

alunos ainda não se sentem à vontade. Nós temos uma profes-

do um profissional diferente, um profissional integrado. E, para

sora de Biologia no grupo, que é a professora Gabriela, mas não

isso, nós temos de repensar nossa formação também.

ISMÁRCIA GONÇALVES SILVA, TIAGO RODRIGUES, CAROLINE FERREIRA

conseguiram se sair muito bem. O planejamento foi anterior ao

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 43-47, jul./dez. 2010



Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 49-51, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

ENTREVISTA

SANDRA REGINA GARCIA > Por Ricardo Silva

Sandra Regina Garcia é Professora Assistente da Universidade Estadual de Londrina na área de Políticas Educacionais

O ensino integrado: a experiência do Paraná

EPCT | Qual é a concepção do Paraná sobre o Ensino Integrado?

mente, de forma representativa, diferentemente do coletivo. O Currículo Integrado constitui uma rede, em regime não experi-

O Ensino Integrado é um sistema que possibilita ao jovem e

mental, que começou com setenta e seis escolas e foi aumen-

ao adulto ter uma formação integral em um único currículo, que

tando gradativamente. Hoje são mais de duzentas escolas que

vai além daquilo que é necessário para o mercado de trabalho ou

integram a rede no Paraná. Quando a escola opta pelo Ensino

para o seu processo de escolarização e formação continuada. Na

Integrado, partimos então para a construção coletiva do currí-

verdade, o Ensino Integrado é a possibilidade de o aluno fazer uma

culo. A secretaria não propõe o currículo, nem contrata profis-

escolarização profissional com uma formação mais sólida. Contudo,

sionais para elaborá-lo. Primeiramente, propomos que a escola

esse sistema ainda está em processo de construção. No estado do

observe sua região, sua comunidade, por meio de indicativos e

Paraná, iniciamos o projeto em 2004, e ainda não concretizamos a

estudos clipados do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento

segunda estruturação curricular. Para avançarmos nessa perspec-

do Paraná, que a própria Secretaria apresenta, para então traçar

tiva da integração, partimos da junção de conhecimentos para a

uma fotografia do Estado do Paraná e de suas expectativas para

articulação de conhecimentos, pois julgamos ser este o caminho

o futuro. Então, a partir dessas duas perspectivas, é possível à

necessário para o professor compreender a integração não só como

escola indicar, num rol de opções de cursos técnicos, o curso

uma soma de disciplinas, mas também como uma construção de

mais adequado para a sua comunidade. Depois disto, nós con-

conhecimentos num processo de formação única, continuada,

vidamos os gestores e professores da escola a iniciarmos um tra-

profissionalizada, voltada para a inserção no mercado de trabalho.

balho coletivo com base num documento da rede estadual que apresenta os pressupostos pedagógicos e políticos da educação profissional do estado do Paraná e que nos ajuda a escolher os

EPCT | Professora, quais são os arranjos curriculares do Ensino Integrado?

cursos. Para construirmos a proposta curricular, sempre con-

O currículo do Ensino Integrado parte de uma concepção

de cada curso para articular os currículos com os professores da

de sociedade, de formação do homem constituída coletiva-

escola. Lembrando que a matriz curricular é disciplinar, ordena-

vidamos um profissional do ensino superior da área específica

Entrevista concedida em 26.11.2009

49


da de forma alfabética e não por prioridade – como disciplinas

hora atividade a ser desenvolvida na escola e use esse momento

básicas mais importantes que as disciplinas técnicas. A materiali-

para discutir com seus pares, no sentido de construir essa nova me-

zação desse currículo nas escolas tem uma variação muito grande.

todologia e promover a integração, sentimos ainda a necessidade

Dizemos que ela é representativa, porque é um ir e vir. As escolas

de um melhor compartilhamento de experiências por parte dos

indicam alguns professores, que participam da discussão, voltam

professores. Temos feito essa discussão desde 2003 e constatamos

para a escola, discutem com seus pares e retornam até construir

que a formação lá no chão da escola ainda é uma necessidade mais

a proposta curricular. Muitas vezes, a proposta não é unânime,

concreta. Pois, por mais que os professores se desloquem para fazer

pois há pensamentos diferenciados, mas nós tentamos construí-la

atividades, cursos, atualizações, para a escola obter esse retorno, por

de tal forma que a maioria dos professores concordem e tenham

meio do compartilhamento coletivo entre os professores, ainda é

opção de trabalho. E então a validamos. Após a validação, pro-

um desafio muito grande para nós. Por isso, estamos procurando

curamos de dois em dois anos fazer uma realimentação desse

fazer agora um trabalho que enfoque mais a escola.

currículo, buscando subsídios tanto da escola quanto dos alunos e professores, para a reelaboração. Portanto, é um currículo que está sendo sempre realimentado a partir da inserção de novas escolas para que possamos chegar a essa integração.

EPCT | De que maneira os conhecimentos da formação humana aparecem na matriz curricular do Ensino Integrado? O desenho curricular dos cursos prevê ementas e a matriz

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

curricular varia conforme a carga horária – de 2.000 a 2.400 horas

50

EPCT | Professora, segundo seu comentário, a matriz curricular do Paraná é pensada sob uma perspectiva disciplinar. Entretanto, os parâmetros curriculares do MEC apresentam as competências e habilidades a serem desenvolvidas. O currículo de vocês é pensado a partir da matriz de competências ou não?

para o nível médio e de 800 a 1.200 horas para os cursos técni-

É uma opção da educação do Paraná não adotar a matriz de

na, mas como um conhecimento que permeia todo o processo

competências. Em 2003, tivemos amplas discussões e decidimos

de formação. Assim também ocorre com as questões ambientais,

romper com ela. O estado do Paraná não trabalha com compe-

que não devem compor apenas o curso de meio ambiente, mas

tências e habilidades na educação básica e, principalmente, na

têm de permear a construção de todos os currículos, como um

educação profissional, pois as julgamos inconcebíveis na forma-

conhecimento necessário para a formação do sujeito.

cos. Alguns conhecimentos da área de formação humana são estruturados em disciplinas e outros são adicionados às ementas dos cursos. A segurança do trabalho, por exemplo, tem de permear todos os cursos. Ela está presente não como uma discipli-

ção de um sujeito integral. Discutimos muito, avançamos nesta discussão e hoje nosso currículo trata de conhecimentos e não de competências e habilidades.

EPCT | Como o estado do Paraná está tratando da formação do corpo docente da rede? Esse é um problema que nós temos discutido muito com o

EPCT | Por que não é possível a formação integral com base nas competências e habilidades?

Ministério da Educação. Desde 2004, realizamos dois concursos para professores de educação profissional. No primeiro concurso foram

Assim como alguns pesquisadores da área, entendemos

quinhentas vagas e no segundo concurso foram mil e quinhentas

que as competências e habilidades são limitadoras. Para nós, o

vagas. Os inscritos para as áreas técnicas, em sua maioria, foram ba-

conhecimento deve ser trabalhado na perspectiva da aplicabili-

charéis, portanto, não-licenciados para atuarem como professores.

dade e nosso entendimento é que ele é mais amplo que isso.

Para resolvermos esse impasse, articulamos com as universidades estatuais do Paraná, a partir da proposta pedagógica que tínhamos e dos fundamentos políticos pedagógicos nossos, um curso de

EPCT | Professora, quais as consequências da implementação desse currículo na prática docente?

complementação pedagógica de quinhentos e quarenta horas, que

Há a necessidade de um grande investimento na formação

versidades e firmamos uma parceria para oferecer aos professores

dos professores, pois a maioria deles vem de uma formação frag-

essa formação. Já formamos quinhentos professores inicialmente e

mentada. E por isso suas práticas precisam ser rediscutidas. Assim

agora estamos em formação de mais mil e quinhentos professores.

como o currículo é construído coletivamente, o trabalho docente

Provavelmente, abriremos um novo concurso para mais duas mil

na escola também deve ser coletivo. Mas esta ainda é uma tarefa

vagas, expandindo a formação não só para aqueles que já consti-

difícil. Mesmo que o professor tenha 20% de sua carga horária de

tuem a rede, mas também para o público externo em geral.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 49-51, jul./dez. 2010

é o que a lei permite. A proposta foi discutida entre as cinco uni-


EPCT | Professora, qual a sua avaliação a respeito das escolas que já implementaram o Ensino Integrado no Paraná? Nós temos escolas em fases diferentes. Temos escolas que estão iniciando, outras que já avançaram bastante e outras que estão bem próximas da

Assim como o currículo é construído coletivamente, o trabalho docente na escola também deve ser coletivo.

integração. Sabemos que o Ensino Integrado é o resultado

EPCT | Professora, o que é tratado em seu livro? O livro, na verdade, é uma coletânea de textos de alguns autores que iniciaram a discussão conosco no Paraná. Ele está dividido em três partes: a primeira traz uma fundamentação do programa, a segunda fala um pouco sobre a política de integração no estado do Paraná e a terceira parte traz duas contri-

de uma discussão e de uma decisão envolvendo a comunida-

buições de escolas, relatando um pouco como foi o segundo passo

de escolar, o gestor, o conjunto de profissionais da escola e a

da reestruturação curricular do estado do Paraná. O livro é apenas

comunidade externa. Mesmo assim, mudar um curso de três

uma pequena contribuição, mas queremos continuar essa discus-

para quatro anos não é uma tarefa fácil, pois envolve uma

são, pois acreditamos no ensino médio integrado no Paraná.

mudança de cultura. No primeiro ano, tivemos problemas de evasão. Hoje já diminuiu bastante, mas ainda ocorre, assim que temos. Tivemos casos de escolas que fizeram a escolha de curso inadequada para a comunidade delas. Em outras, tivemos gestores que decidiram isoladamente, apesar da

EPCT | Professora, para concluirmos, no Paraná há tanto o ensino médio regular quanto o integral, em qual deles a oferta é maior? Há alguma estatística com respeito a isto? E quanto ao tempo, por que o regular continua com a duração de três anos e o integral com quatro?

indicação de que tinha de ser coletivamente discutido o

Ainda não temos como fazer essa estatística. No Paraná, há

programa. A formação de professores ainda é uma dificul-

cerca de 400 municípios, muitos deles com baixa densidade po-

dade que a gente tem de trabalhar mais. A reestruturação

pulacional – com cinco a sete mil habitantes apenas –, o que torna

e atualização curricular também precisam ser constantes. É

inviável a oferta de escola com ensino técnico. Pois, por exemplo,

importante também que o professor seja do quadro próprio

se abrirmos um curso de informática em um desses municípios,

do estado, e não contratado temporariamente, como ainda

em quatro anos formaremos a cidade inteira, e deixaremos o

acontece, pois ele precisa acompanhar esses quatro anos de

professor sem atividade. Nos pequenos municípios a gente não

formação do aluno. Outro ponto não resolvido é a questão do

consegue checar isso, mas nos maiores e médios – a partir de 15

financiamento. Nós ainda não temos uma relação de custo/

mil habitantes – podemos, pois trabalhamos com arranjos e arcos

aluno na educação profissional de nosso país. O que temos

ocupacionais, isto é, pegamos cursos como de informática, secre-

são medidas paliativas, tanto do governo estadual quanto

tariado, recursos humanos e fazemos rodízio entre os municípios

do federal. A medida paliativa agora é a expansão do IFET

para que eles não fiquem permanentes. Oferecemos certo curso

(Instituto Federal de Educação Tecnológica) e a expansão do

em um município, depois de três anos mudamos o curso e os

Brasil Personalizado. Entretanto, a gente tem de ter o pé no

professores para outro município e, a partir daí, vamos formando

chão, pois não adianta construir, reformar, equipar, temos de

uma cidade inteira em informática, meio ambiente e assim por

ter professores bem preparados e a manutenção também é

diante. Em algumas localidades, nós temos de ter pelo menos

essencial. Nós não temos um fundo específico da educação

dois cursos, o parzinho, para recuarmos um e ampliarmos o outro.

profissional. O estado do Paraná possui um fundo rotativo de

Já nas cidades, como Curitiba, Londrina, Cascavel, a variação de

manutenção das escolas de ensino regular, com um valor não

cursos é imensa. Para vencermos o desafio dos pequenos muni-

muito alto, para a escola realizar alguns reparos na estrutura.

cípios, a Setec, em parceria com o Instituto Federal Tecnológico

Nosso avanço foi conseguir aprovar um fundo rotativo da

e a Universidade Tecnológica do Paraná, criou e vem buscando

educação profissional, para que as escolas recebam recurso

implementar o e-Tec Brasil (Escola Técnica Aberta do Brasil) –

para fazer a manutenção dos seus equipamentos. Contudo,

programa com cursos de formação profissional técnica de nível

por mais que o médio integrado possa utilizar os recursos do

médio a distância para todos os municípios do estado –, de forma

Fundeb, ele ainda não é suficiente. Por isso, o governo do es-

a atender à demanda desses municípios, sem assumir o risco de

tado tem colocado a maior parte de recursos para que esses

ter professores do quadro em cada um deles. Ano que vem, nós

cursos possam ser mantidos.

chegaremos a 382 municípios com o e-Tec Brasil.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 49-51, jul./dez. 2010

SANDRA REGINA GARCIA

como ocorre no ensino médio, pois é uma característica

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ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 53-55, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

JOANA BOTINI (SENAC/EAD) > Por Suely Parrini

Joana Botini é Coordenadora de EaD do Diretório Nacional do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac-DN).

Educação a Distância: avanços e desafios

EPCT | Fale um pouco sobre sua formação e atuação no Senac. Sou licenciada em Física e Matemática, com Especialização em Educação a Distância há mais de 30 anos. Trabalhei como professora primária e secundária e fui diretora de escola no

EPCT | Os cursos de nível superior a distância ainda são relativamente novos, estão em processo de aceitação pelo público brasileiro. Que razões você apontaria para o sucesso dos cursos de pós-graduação na modalidade a distância do Senac? Como você explica esse sucesso?

setor de escolas estaduais. No Senac, atuo na produção de

Considero que o sucesso veio devido à marca Senac. É uma

materiais institucionais para a educação a distância e estou há

marca muito forte e de credibilidade. Ao mesmo tempo, acre-

cinco anos na coordenação nacional da rede.

dito que ele veio também em razão de sermos uma instituição de educação profissional que, ao entrar no mercado de pósgraduação, vem oferecer uma especialização não com foco aca-

EPCT | Como você explica o crescimento dos cursos a distância no Brasil?

dêmico, mas voltada para a fundamentação teórica e prática, de

Um marco da educação a distância no Brasil foi o Decreto

Então, para mim, a marca e a proposta pedagógica do curso de

n. 5622, que regulamentou o artigo 80 da LDB. A educação a

forma a facilitar a entrada do egresso no mercado de trabalho. aliar a teoria à prática foram primordiais para esse sucesso.

distância já existia na LDB de 1996, mas foi regulamentada a partir desse Decreto. Acredito que as experiências internacionais também serviram de insumo para a expansão da educação a distância no Brasil. Temos hoje grandes universidades na China, Japão e Índia que impulsionaram a demanda por uma formação profissional e exigiram de várias empresas de porte

EPCT | Recentemente, o MEC autorizou o curso de Administração a distância no Senac de São Paulo. Para você, os cursos de graduação oferecidos pelo Senac vão ter a mesma visibilidade que têm os cursos de pós-graduação na modalidade a distância?

nacional a criação de universidades in company e também da

Acredito que o Senac deva investir na graduação tecnoló-

universidade aberta do Brasil. O governo tem investido bastan-

gica, pois esse é o viés da instituição, e marcar isso como foco.

te na educação a distância, disseminando essa modalidade e

Não nos cabe competir com instituições de ensino superior que

minimizando os preconceitos que há em torno dela.

já tem seu espaço dentro do bacharelado e da licenciatura. O Entrevista concedida em 27.11.2009

53


ministro da educação deixou bem claro que o espaço do sistema

especialização e vamos trabalhando internamente a formação pe-

Senac na graduação é no tecnólogo. Eu não vejo também que haja

dagógica, oferecendo cursos de tutoria, ou mesmo na prática, com

uma discrepância entre o modelo presencial e a distância. Se você

a observação e acompanhamento de um coordenador pedagógico

tem uma marca forte no presencial, você vai poder ter essa mesma

ou de um tutor orientador. Muitas instituições optam por estes dois

marca forte na educação a distância. Contudo, penso que não de-

tipos de tutoria: o tutor especialista e o tutor orientador. O tutor es-

vemos sair criando e ofertando graduação tecnológica só porque

pecialista tem o domínio do conteúdo e o tutor orientador, o domí-

está em alta no mercado ou por modismo. Se o foco for a gradua-

nio pedagógico. Eles normalmente fazem uma dobradinha, acom-

ção tecnológica, devemos, sim, fazer uma pesquisa de mercado, de

panham simultaneamente a turma e um ajuda o outro. O tutor

demanda, e uma análise do perfil do aluno. Considero essa pesqui-

orientador acompanha o trabalho do tutor especialista e os alunos

sa fundamental para se definir a proposta pedagógica dos cursos.

da turma no que diz respeito às dúvidas, às dificuldades de acesso e ao feedback. Assim, quando não temos um especialista com uma formação pedagógica, podemos então associá-lo com o trabalho

EPCT | Você comentou sobre a necessidade de conhecer a clientela do curso e traçar um perfil do aluno. Diante disso, quais são as características que esse público deve ter ou terá de adquirir para lidar com a educação a distância? É primordial que o aluno tenha o domínio integral da sua

de um tutor orientador ou de uma monitoria, cujo papel normalmente é ajudar o coordenador quando este tem muitas turmas. Por fim, acho fundamental que o tutor especialista tenha formação ou experiência em EAD, mas se não tem, tem de ser capacitado, e cabe à instituição a formação em trabalho desse profissional.

capacidade de leitura, interpretação e escrita. Além da sua capacidade de formação básica, ele precisa ter autonomia, cooperação, disciplina, participação e domínio das tecnologias. Ele deve ser capar de buscar seus próprios recursos para a construção do conhecimento e interagir de forma colaborativa com o outro na plataforma. Por fim, ele precisa ter disciplina para estudar a distância e saber administrar o seu tempo de estudo.

EPCT | No caso da Faculdade Senac-DF, que está montando um núcleo de educação a distância com cursos tecnológicos, a maior dificuldade talvez seja a falta de profissionais técnicos qualificados para aturarem como professores, principalmente como professores de educação a distância. Em sua opinião, como podemos resolver isso?

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

Temos que oferecer capacitação pedagógica para esse

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profissional e fazer reuniões constantes para dar-lhe o apoio e EPCT | Como as metodologias pedagógicas com base em EAD têm abordado a questão da afetividade como um dos elementos fundamentais do processo de aprendizagem?

as condições necessárias e acompanhar e avaliar o seu desem-

Verifica-se que esse vínculo da afetividade é maior na educa-

especialistas, aquelas que possuem algumas características que

ção a distância do que na presencial. No ambiente virtual, de 15

as identificam com a tutoria e a educação a distância. Não po-

dias a um mês, o professor já consegue traçar o perfil do aluno,

demos, por exemplo, selecionar uma pessoa que não acredita

se ele gosta de se expor, se ele tem características de liderança,

na educação a distância, que não tem capacidade de liderança,

se é tímido, etc. Portanto, para se criar um vínculo de afetividade

que é autoritária e não abre mão de seu papel de detentora do

é preciso trabalhar com uma metodologia ativa, em que o tutor

conhecimento. Então, precisamos, primeiro, traçar um perfil

deixa de ter o papel de detentor do conhecimento e passa a ser

desse profissional, buscando características como facilidade de

um mediador no processo de ensino-aprendizagem, permitindo

diálogo, motivação, liderança, organização, etc.

penho ao longo do processo. Entretanto, mesmo oferecendo capacitação, é importante observarmos, no universo de pessoas

ao aluno construir o conhecimento de forma autônoma e co-

Para ser um bom tutor é preciso acreditar na modalidade,

laborativa. Nesse sentido, cabe ao tutor trabalhar a questão da

na construção coletiva do conhecimento e ter organização. O

afetividade na construção coletiva do conhecimento.

professor tem de abrir mão do seu papel de dono da verdade e trabalhar em equipe.

EPCT | Joana, fale um pouco sobre a dificuldade que se tem de ter uma tutoria formada por um profissional especialista, capacitado para a docência e com domínio da tecnologia ao mesmo tempo. Quais os elementos que potencializam ou limitam o trabalho da tutoria em educação a distância?

EPCT | Joana, com relação ao material didático-pedagógico, você disse ser favorável à terceirização das atividades relacionadas à criação de produção do material. Por quê? Que experiência você teve nesse sentido para chegar a esse posicionamento?

Consideramos mais fácil capacitar para a tutoria do que para

Inicialmente, tínhamos uma equipe multidisciplinar, um

a especialização. Sendo assim, buscamos o tutor em sua área de

designer instrucional e um núcleo de produção. Com o tempo,

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 53-55, jul./dez. 2010


notamos que era inviável mantermos o núcleo integrado e em sintonia, devido à rotatividade dos

designers

instrucionais.

Vimos também que é caro ter esse núcleo de produção, pois muitas vezes inviabiliza o projeto e encarece o material. Por isso, optamos pela terceirização, tão comum em todo o mundo. Hoje nosso foco não

No ambiente virtual, de 15 dias a um mês, o professor já consegue traçar o perfil do aluno, se ele gosta de se expor, se ele tem características de liderança, se é tímido, etc

tecnológico, alguém para dar esse suporte, um núcleo administrativo, que pode ser o da própria faculdade, juntamente com a secretaria, e uma coordenação pedagógica, com coordenadores de curso, designer instrucionais, tutores, monitores, etc.

EPCT | O que fazer para despertar no público o interesse de fazer uma graduação a distância?

é a produção, é a oferta. Nesse sentido, o Senac conta com um designer instrucional que acompanha e valida os cursos produzidos.

mente de um núcleo de suporte

O aluno da pós-graduação sabe exatamente o que ele quer, seu perfil é de um trabalhador que busca estratégias para continuar seus estudos. Já o aluno de graduação, não. Como

EPCT | Como coordenadora da rede EAD do SENAC, como você organizaria a sua equipe?

geralmente não trabalha, ele tem tempo para fazer um curso presencial. Então você despertar nesse aluno a vontade de fazer um curso a distância é um grande desafio. Assim, acho que devemos fazer um trabalho de sensibilização dessa clientela,

mador ou profissional com experiência na plataforma Moodle,

mostrando-lhe as vantagens e despertando neles o desejo de

por exemplo. Então, para a rede funcionar precisaria basica-

estudar a distância.

JOANA BOTINI

É preciso ter um gestor, um coordenador pedagógico, um designer instrucional e um suporte tecnológico com um progra-

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 53-55, jul./dez. 2010


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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 53-55, jul./dez. 2010

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica


Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 57-60, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

ENTREVISTA

LUCÍLIA MACHADO > Por Ricardo Coelho & Rafael Voigt

Lucília Machado é Professora aposentada da Universidade Federal de Minas Gerais

A organização da educação profissional no Brasil

EPCT | Lucília, a sua palestra abordou os vários temas que estão vinculados à organização da Educação Profissional e Tecnológica (EPT), entre eles a interdependência. De que trata essa característica e qual a relação dela com a organização da EPT?

tegração ao sistema social respondendo pelas finalidades da

Interdependência significa que a educação profissional e

a acessibilidade, produzindo os efeitos necessários em termos

tecnológica é uma parte da sociedade que não sobrevive por

de eficácia e respondendo também pela noção e consciência

si só. Ela não tem sustentabilidade pedagógica, social e política

de cuidar do meio ambiente, da sustentabilidade do planeta

se não for integrada a um corpo mais amplo, que podemos

e das pessoas, garantindo, portanto, requisitos necessários à

dar o nome de sistema, do qual fazem parte outras instâncias

sua legitimidade social. Atendendo a essa lógica, poderemos,

da sociedade. Essa interdependência é que dá vitalidade à

então, passar com maior facilidade pelo crivo do controle

educação profissional e tecnológica. E compreendê-la é funda-

social, que diz respeito às sanções, positivas e negativas, que

mental. Para isso, é preciso olhar para a origem da educação

recebemos da sociedade com relação à nossa atuação.

educação profissional e tecnológica, que é a outra ponta. Essas finalidades dizem respeito ao atendimento, com qualidade social e pedagógica, das necessidades e demandas, garantindo

profissional e tecnológica e para a sua finalidade. Olhando para a origem, nós temos de responder, como parte de um sistema maior, às necessidades e demandas sociais. Porém, há uma distinção entre necessidade e demanda. Nem sempre as pessoas

EPCT | Atualmente, a educação profissional e tecnológica está respondendo mais às necessidades ou às demandas?

que têm necessidade de ter educação profissional têm cons-

Eu acredito que ela tem problema nas duas dimensões. Se

ciência ou conseguem expressar e traduzir essa necessidade

nós compreendermos a necessidade como desenvolvimento

em demanda. A demanda é quando se faz a reivindicação, a

integral do ser humano, portanto uma formação integral,

exigência. E as necessidades sociais são de diferentes origens:

e como desenvolvimento das potencialidades e multilate-

jovem, famílias, governos, setor produtivo, movimentos so-

ralidade da pessoa, no sentido da dignidade humana, nós

ciais, trabalhadores, etc. Portanto, nós temos uma interligação

podemos dizer que já caminhamos, porém, ainda pouco. Do

a partir da origem. E temos também uma necessidade de in-

ponto de vista das demandas, eu acho que a interlocução da

Entrevista concedida em 26.11.2009

57


educação profissional e tecnológica com relação à sociedade

intelectual e com articulação entre a ciência e tecnologias.

ainda está fraca, pois existem muitas demandas reprimidas,

Foi o próprio mundo do trabalho que trouxe a necessidade

que estão latentes e ainda não tiveram os canais abertos para

de pensar uma outra lógica. Embora o avanço tecnológico e a

a sua expressão. Fala-se muito do mercado de trabalho. É um

ciência tenham dado maior significação para a educação pro-

diálogo necessário, porém, ele ainda se figura numa abstração.

fissional e tecnológica, a questão da divisão social do trabalho

Nós temos de personificá-lo. O mercado de trabalho diz respeito

nas sociedades em classe repõe a mesma lógica anterior, só

fundamentalmente às relações mercantis de compra e venda da

que de uma maneira diferente. Temos hoje a dificuldade de

força de trabalho. Isso é o mercado de trabalho. Entretanto, o tra-

os cursos superiores de tecnologia serem reconhecidos como

balho é mais do que isso, mais do que vender e comprar a força

cursos superiores de igual qualidade que os de bacharelado. E

de trabalho. É essa instância que precisa ser considerada, e bem

não é necessariamente a carga horária que faz com que o curso

considerada, do ponto de vista das suas múltiplas implicações,

seja melhor do que o outro. Nós temos cursos de licenciatura

tanto para o trabalhador, que vende a sua força de trabalho,

que tem uma carga horária idêntica a de determinados cursos

quanto para quem compra a força de trabalho. O trabalho é mais

superiores de tecnologia.

amplo, pois ele envolve a realização humana em atividades que não são necessariamente mercantis. Há pessoas que trabalham sem, contudo, vender a sua força de trabalho. Há pessoas que trabalham porque querem produzir algo de bom e útil para a sociedade, independentemente de ganharem o seu sustento. Por isso, há, hoje em dia, a preocupação de pensar demandas e necessidades do mundo do trabalho, para dar conta de todos os

EPCT | A educação profissional e tecnológica no nosso país foi estruturada a partir das redes estaduais e municipais. Recentemente, foram criados os Institutos Federais de Educação Profissional, com status de universidade. A existência de distintas instâncias governamentais responsáveis pela educação profissional não reforça a dualidade comentada anteriormente?

componentes, sejam eles econômicos, políticos, sociais, culturais, que nós deveremos ouvir e com os quais dialogar.

Bom, os institutos respondem a uma confirmação, a uma oficialização de um movimento que já estava ocorrendo do

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

ponto de vista prático. As instituições da rede federal de edu-

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EPCT | Ainda sobre essa discussão da necessidade e da demanda, ontem, ao tratar dos problemas a serem enfrentados pela EPT, a senhora citou a dualidade estrutural. No que consiste essa dualidade estrutural?

cação profissional e tecnológica são antigas. Durante cem anos, elas foram acumulando experiências, saberes e competências que fizeram com que houvesse a necessidade de melhorar a qualidade. Vejo o ensino de excelência que foi construído ao

A dualidade estrutural é um marco constitutivo não só do

longo desse período e que mostrou que esse acúmulo de-

sistema educacional brasileiro, mas das sociedades de classe.

mandava um novo registro e a necessidade de potencializar

Ela diz respeito à constituição de redes de ensino que são

todos esses recursos que foram construídos historicamente.

destinadas a públicos distintos do ponto de vista da origem

Os institutos federais saem de um diagnóstico em que a ri-

socioeconômica. Assim, se temos uma origem popular, a rede

queza acumulada estava, de certa forma, subutilizada, com

é de educação profissional, se a origem for de outros estratos

um atendimento muito restrito em relação às vagas e à res-

não populares da sociedade, a rede é de formação geral, uma

ponsabilidade que eles poderiam atender. Portanto, a criação

formação profissional em nível superior. Esta foi a forma que se

de uma oferta verticalizada abriu campo para a pesquisa e

constituiu em quase todos os países os sistemas nacionais de

para a extensão e deu mais sentido a esta riqueza que estava

educação, em que um braço era praticamente independente

aprisionada. Então, considerando esses fatos, eu avalio como

do outro. Quem ingressasse em uma linha teria uma destinação

positivo os institutos federais de educação profissional. Estes

social diferente da outra. Esse é o modelo clássico de análise.

possuem personalidade jurídica diferente e um lugar diferente

Todavia, este modelo está um pouco mais complexo hoje, por-

do das universidades tradicionais. As universidades tradicionais

que temos, no âmbito da educação profissional e tecnológica,

não fazem curso técnico. Essa é uma diferença fundamental. A

o acesso ao ensino superior, à pós-graduação. Nós temos uma

outra questão que se coloca é em relação às escolas técnicas

maior complexidade dessa rede, que antes era pensada como

ou à educação técnico-profissional das redes estaduais a cargo

uma formação muito restrita e com uma terminalidade muita

das entidades subnacionais. Falo do estado porque o municí-

imediata. Hoje, a educação profissional e tecnológica é pensa-

pio não tem, por força de lei, nenhuma responsabilidade no

da de uma maneira mais complexa, com itinerários formativos,

âmbito do ensino médio. As redes estaduais ainda estão muito

com perfis amplos, com capacidades de desenvolvimento

deficitárias. Eu acho que existe uma falta de suporte de políti-

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 57-60, jul./dez. 2010


cas de financiamento o que tem impedido o desenvolvimento dessas redes estaduais. O Fundef, que era do ensino fundamental, não previa recursos para o ensino médio. Por conseguinte, não tinha também como financiar por parte da rede estadual os cursos técnicos em nível médio. Agora, com o Fundeb, cria-se uma perspectiva desses investimentos. E existe também uma

Há, hoje em dia, a preocupação de pensar demandas e necessidades do mundo do trabalho, para dar conta de todos os componentes, sejam eles econômicos, políticos, sociais, culturais.

ação importante por parte do

formação básica está se tornando cada vez mais tecnológica e a formação tecnológica mais requisitante dos conteúdos básicos. Então, a tendência é essa síntese e a abolição das diferenças, que são muito artificiais.

EPCT | Atualmente, que problemas são enfrentados no campo das pesquisas da área da educação profissional?

governo federal, que é o progra-

Mesmo que tenha ocorrido

ma Brasil Profissionalizado, que

avanço no campo da pesquisa,

veio garantir um aporte, dentro da filosofia do regime de co-

ainda temos dificuldade em reconhecer que a educação profis-

laboração, para que os estados também possam desenvolver.

sional também realiza pesquisas. A ideia que ainda prevalece

E hoje se trabalha também com uma noção de arranjos educa-

é a de que somente na instância acadêmica é que se realizam

cionais. O que é o arranjo educacional? Significa que todas as

pesquisas e que o campo da educação profissional é o campo

entidades públicas e privadas são chamadas a trabalhar juntas

da prática, de pôr a mão na massa, somente. Volto a dizer que

agora. Isso faz parte da organização. O arranjo educacional

hoje é impossível pensar no profissional técnico, tecnólogo,

significa que tanto instituições públicas estaduais, municipais

que seja puramente voltado para o fazer. Isso não existe. Hoje,

e federais de ensino, quanto instituições privadas de ensino,

nos processos de trabalho, exige-se do profissional uma atitude

possam congregar esforços e trabalhar conjuntamente para

de investigação, uma atitude de pesquisa para responder aos

atender localmente as demandas. Eu acho que há espaço para

problemas. Acredito que a diferença maior entre a pesquisa

todo mundo, principalmente de perspectivas solidárias de coo-

acadêmica e a pesquisa tecnológica é que a pesquisa acadêmica

peração, de relacionamento interinstitucional. De certa forma,

responde muito pelas questões do por quê das coisas, na esfera

isto já está acontecendo, porque o programa E-tec – Programa

mais básica, ainda que seja muito artificial separar pesquisa

de Educação Tecnológica a Distância – está sendo construído

básica da pesquisa tecnológica. Já a pesquisa tecnológica é

exatamente com esse desenho. Ele está sendo construído e al-

predominantemente uma pesquisa aplicada, propositiva, que

guns cursos já começaram. Então, a experiência já deslanchou.

busca exatamente a solução dos problemas. E nosso país precisa

Também o curso de formação de professores. Nos IFs também

muito disso. Precisa realmente ter linhas de financiamento para

eles se apóiam na noção de arranjo educacional.

garantir o crescimento de pesquisas no campo da educação pro-

EPCT | Em sua opinião, o sistema de educação profissional e tecnológica se integra com os demais sistemas de educação do nosso país? Ainda não da forma como deveria. Nós temos avanços,

EPCT | Como é a pós-graduação na área da educação tecnológica e profissional?

mas ainda existe um estranhamento muito grande, um estra-

Existe agora um modelo, que é o mestrado profissional. Eu

nhamento recíproco. Este se manifesta de uma maneira muito

sou coordenadora do mestrado profissional em Gestão Social,

clara nas experiências de cursos técnicos integrados. O ensino

Educação e Desenvolvimento Local, do Centro Universitário

técnico como uma modalidade do ensino médio ainda é pouco

UMA, uma instituição de Belo Horizonte. Eu estou muito encan-

compreendido, assim como é pouco compreendida a especifi-

tada com esse formato de mestrado. Durante muitos anos, eu

cidade da educação profissional e tecnológica. A grande vanta-

trabalhei no mestrado e no doutorado na perspectiva acadê-

gem é que as tendências do desenvolvimento da ciência e da

mica. Então me dei conta de que uma parte dos alunos não se

tecnologia no mundo do trabalho estão obrigando esses dois

localizava muito bem na proposta do mestrado ou doutorado

mundos a se encontrarem e promoverem um diálogo numa

acadêmico, eles vinham com perguntas e questões muito ligadas

perspectiva de interdisciplinaridade. Por que isso? Porque a

à prática profissional: como melhorar a prática profissional deles

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 57-60, jul./dez. 2010

LUCÍLIA MACHADO

fissional e tecnológica.

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ou como responder questões ligadas ao seu contexto de traba-

EPCT | Qual a sua opinião a respeito da gestão do Sistema S?

lho, por exemplo. No mestrado acadêmico, trabalha-se menos as ferramentas de intervenção e de inovação e mais as questões

Eu acredito que houve um avanço considerável na relação da

conceituais, no máximo, um diagnóstico. Em áreas propriamente

política educacional pública com o Sistema S, com o grande acor-

tecnológicas, embora sendo acadêmicos, eles conseguem ter

do que se estabeleceu em relação à gratuidade. Eu acho que foi

essa ponte com as ferramentas de intervenção, mas não é isso

um avanço muito bom. Contudo, ainda existem algumas questões

que acontece nas áreas de ciências humanas e sociais. Então, o

que, no meu entendimento, precisam ser mais discutidas. Uma

nosso mestrado profissional visa exatamente dotar o profissional

delas é a questão da gestão do Sistema S. Eu acredito que o sis-

que não está no mundo acadêmico com os conceitos e ferra-

tema tripartite pode oferecer uma perspectiva muito promissora,

mentas de intervenção e de inovação que permitam melhorar

no sentido de dar ao Sistema S a oportunidade de conviver com

a sua prática profissional. É importante lembrar que o mestrado

a diversidade de pontos de vista, com os diferentes interesses,

profissional é reconhecido e tem o mesmo valor e status do

necessidades e demandas da sociedade e, inclusive, fazê-lo mais

mestrado acadêmico pela Capes. Ele também habilita para a

próximo da sua missão, no sentido de tornar-se uma instituição

docência, formando profissionais docentes, capazes de dialogar

que realmente responda às necessidades que os diferentes atores

com o mundo do trabalho e de levar a experiência prática profis-

sociais e suas redes sociais representam. Não acho que seja o caso

sional aos alunos que estão formando. Acredito que o mestrado

de passar o Sistema S para a gestão do Estado. Não coloco nesses

profissional tem uma perspectiva muito grande de crescimento

termos. Pois um modelo muito fechado num só braço também

no Brasil, como já ocorre em outros países. Porém, ele ainda sofre

inviabiliza certos diálogos sociais que são fundamentais.

com a tal dualização estrutural da educação brasileira. Há alguns que acham que é um mestrado de menos valor, mas isso é fruto de preconceito de uma sociedade que ainda não conseguiu en-

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

tender o valor da educação profissional.

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 57-60, jul./dez. 2010


ENTREVISTA

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 61-64, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

MOACIR GADOTTI > Por Ricardo Silva & Rafael Voigt

Moacir Gadotti é Diretor Geral do Instituto Paulo Freire e Professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP)

Por uma educação profissional realizadora do ser humano

EPCT | Qual a concepção de Paulo Freire sobre a Educação Profissional?

visão muito humanista da educação profissional e tecnológica

Segundo as próprias palavras de Paulo Freire, a trajetória

para o trabalho deve ser uma formação homem “onilateral”,

dele deve-se ao trabalho e à “escola” que ele fez no Sesi de

como diria Marx, integral, e uma formação voltada para a jun-

Pernambuco. O Sesi foi a grande escola técnica na década

ção do trabalho e da cidadania.

e acompanhou a vida toda essa relação, em que a formação

de 1940, época em que Paulo Freire trabalhou lá. E ele falou uma coisa fantástica, disse que o Sesi fez com que ele tivesse

então, ele sempre vinculou a educação para cidadania à edu-

EPCT | O pensamento de Paulo Freire sobre a educação profissional converge para a concepção de educação integrada de Marx e para a concepção de educação unitária de Gramsci?

cação para o trabalho. É claro que ele entendia o trabalho, a

Ele foi decididamente um leitor de Gramsci, que, como

formação profissional, não só como formação para o mercado,

se sabe, foi traduzido tardiamente no Brasil, na década de

mas, sobretudo, como formação humanística, uma formação

1960. O primeiro livro Intelectuais e a formação da cultura

profissional mais integral. Ele usava as palavras “integral” e “in-

é de 1968. Carlos Nelson Coutinho foi quem o traduziu.

tegradora”. Então, se a gente recorrer aos seus textos e às suas

Paulo Freire já estava no exílio. Ele tomou conhecimento de

falas, a gente vai ver que essa influência inicial da relação que

Gramsci no exílio por meio das traduções em espanhol e de-

ele teve com os trabalhadores do Sesi, o fez valorizar muito os

pois em inglês e francês. Gramsci teve uma grande influência.

pais dos alunos da escola. Os primeiros textos dele, de 1955,

Ele tinha uma visão marxista da questão da formação para

estão ainda escritos à máquina – a tecnologia mais avançada

o trabalho. A visão dele trabalhou muito a questão do bom

da época. Ele nunca aprendeu a datilografar, nem a digitar.

senso no senso comum. Existem dois Gramsci, segundo os

Escrevia tudo à mão, adorava escrever à mão. O fascínio dele

intérpretes: o Gramsci popular e o Gramsci mais partido de

era escrever devagarzinho à mão. Os primeiros escritos são

vanguarda. Paulo Freire se identificava muito com o Gramsci

sobre a participação dos pais dos alunos do Sesi. Ele tinha uma

dito popular, o Gramsci da cultura popular, que valorizava as

contato com a classe trabalhadora e descobrisse a vocação dele de profissional da área de educação de adultos. Desde

Entrevista concedida em 25.11.2009

61


academias que eram centros de formação popular na Itália e

fissional esteja vinculado à definição do sistema como um

esse bom senso que existe na cultura popular.

todo. No período da ditadura, por exemplo, foi até criado um sistema de educação permanente para separar a educação de adultos da educação de jovens e crianças. Hoje, o concei-

EPCT | Qual a importância da realização desse Fórum Internacional de Educação Profissional?

to básico é a educação ao longo da vida. Não tem mais esses quadradinhos, essas gaiolinhas, esses espaços reservados

Olha, eu estava conversando há pouco com o Eliezer

para isso ou para aquilo. A articulação é importante. Eu acho

Pacheco, Secretário de Educação Profissional e Tecnológica do

que a mudança no currículo, que é um desejo antigo, a uni-

MEC, sobre a repercussão de 15 mil inscritos. E, passando nos

lateralidade e a formação integral estão sendo cada vez mais

estandes, a gente vê a riqueza de como a educação profissional

incorporados, mais na teoria do que na prática. Pois as práti-

e tecnológica está pulsando no Brasil, sobretudo, com a aber-

cas ainda resistem a essa intersetoralidade, interculturalida-

tura das novas escolas e dos Institutos Superiores. Isso dá outra

de e integralidade da educação. Penso que esse Fórum tem

marca à educação brasileira. Assim, acredito que todos deve-

um grande significado por isso. Porque ele está colocando a

ríamos ter uma formação profissional e tecnológica no Brasil.

questão do trabalho como uma questão central da formação

É claro que não necessariamente para trabalhar naquela área

do ser humano e não só do trabalhador.

específica da tecnologia. Não é isso! Nem todo mundo precisa trabalhar com isso. Mas se a gente reparar hoje, no mundo mais desenvolvido, 90% das pessoas têm um trabalho ligado ao chamado trabalho imaterial; no Brasil, isso já chega a 75%. Portanto, é um vínculo com o trabalho. Muita gente entende

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

a educação profissional como uma coisa do século XIX ainda.

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EPCT | No documento base da Conae, a Educação Profissional é citada apenas em dois ou três parágrafos. A impressão que ficou foi que não há necessidade de discutir sobre ela. Qual a sua opinião sobre a educação profissional no documento da Conae?

Se você pegar um torneiro mecânico hoje não tem nada a ver

Olha, eu já fiz essa crítica ao documento base da Conae,

com um torneiro mecânico de 50 anos atrás. Hoje, ele é um tor-

que tem uma concepção Iluminista, pré-capitalista, quase. Eu

neiro mecânico que tem de dominar a informática e o desenho

acho que as pessoas que o fizeram, que o elaboraram, deram

gráfico. Ele cria a peça no computador, mas é a máquina que

uma grande contribuição para que a gente pudesse ter o

vai executar. Não é mais ele que vai ao torno fazer a peça meca-

documento. Quanto ao documento, a ausência da educação

nicamente. Portanto, diante dessa grande evolução no mundo

profissional é tão grande quanto a ausência da educação

do trabalho, que incorporou a tecnologia, a inovação e a ciên-

popular. Não se fala em nenhum momento em educação po-

cia, acho que todos nós deveríamos nos formar para o trabalho.

pular. O artigo é tão repetitivo, tal a falta de imaginação do

Todos deveríamos ter uma formação técnico-profissional. Por

documento, que sequer conseguiu desenvolver a educação

fim, acho que um dos problemas da nossa qualidade de ensino

de adultos e a alfabetização de adultos. Tampouco apresenta

é que ela não conseguiu se articular em torno da questão do

sobre a educação cidadã, que é hoje o documento mais avan-

trabalho, da formação para o trabalho. Há um distanciamento

çado do século XXI. Sobretudo, a concepção geral do docu-

tão grande, principalmente nas camadas populares, que têm

mento me parece muito falha, dá a ideia de que a qualidade

de ir para a escola para aprender coisas que nunca vão usar,

da educação depende da existência de um sistema, como se a

acarretando, consequentemente, desistências.

gestão do sistema fosse suficiente para melhorar a educação. É uma tese muito velha esta e pouco consistente de que basta gerenciar melhor a educação para que ela seja melhor quali-

EPCT | Sobre a resistência, ela não seria consequência da pouca articulação da educação profissional e tecnológica com os outros níveis de ensino?

ficada. Na verdade, eu só vejo uma vantagem no documento: que é tê-lo. Mas o documento em si, como você falou, não atende às exigências atuais. É um documento muito antigo

Sim. A história mostra esse paralelismo absurdo que exis-

numa visão filosófica e ideológica muito antiga. Acho que,

te entre a educação profissional e a tecnológica. É certo que

pedagogicamente, ele é iluminista ainda, com uma visão eli-

isto está sendo quebrado, mas essa cultura do sistema para-

tista da educação. Porém está sendo consertado na prática e

lelo de educação ainda resiste. Pois a integração ainda não

as necessidades da prática estão sendo colocadas nele. Dessa

foi bem feita. É por isso que eu conclamo muito às pessoas

forma, acho que cabe a nós defendermos essa outra visão e

que estão trabalhando na Conae (Conferência Nacional de

fazermos com que, nas conferências municipais, estaduais e

Educação) que o sistema seja articulado, que o ensino pro-

na Conferência Nacional, ano que vem, tenhamos uma pre-

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 61-64, jul./dez. 2010


sença forte para defendermos essa visão nova da educação profissional e tecnológica.

EPCT | Professor, falando em sistema de educação profissional, nós temos a rede federal de educação que se dedicou mais à formação de nível médio – educação integrada-, formação técnica de nível médio, principalmente no Nordeste e Estados do Brasil. Agora, nós temos o Sistema S, que também vem, há 60 anos, contribuindo consideravelmente para a questão da formação profissional no Brasil. Como o senhor vê o Sistema S hoje?

Diante dessa grande evolução no mundo do trabalho, que incorporou a tecnologia, a inovação e a ciência, acho que todos nós deveríamos nos formar para o trabalho. Todos deveríamos ter uma formação técnico-profissional.

comum. O Paulo Freire também se originou dentro dessa visão. E, hoje, o Lula, na abertura do Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica, reconheceu que ele devia a sua trajetória dele aos cursos que ele fez no Sesi, em São Paulo. Assim, com a presença do Lula, com a mudança do mundo do trabalho, com essa visão freireana do mundo do trabalho e da educação, eu acho que a conjuntura é muito favorável para que haja avanços significativos e o Sistema S possa avançar ainda mais, além do que já avançou

Há uma luta para que o

nos últimos 60 anos. Eu acho

Sistema S realmente evolua numa linha de maior participação,

que, para as instituições que ficam muito presas a métodos e

já que é um dinheiro do trabalhador, um dinheiro público, não

visões tradicionais, a lição pode ser a mesma, mas as organiza-

necessariamente estatal. Há uma diferença enorme entre o mer-

ções do século XXI são, para mim, organizações caórdicas, que

cantil e o privado. A grande contradição não está entre o estatal

têm a ordem com base na missão, ou seja, que tem a ordem

e o privado. Está entre o público e o mercantil, porque você pode

orientada sempre para aquele foco, objetivo e missão do tra-

ter uma visão mercantil dentro do Estado também. Uma insti-

balho. As metodologias vão variando ao caos da reorganização

tuição estatal pode operar com uma visão extremamente mer-

das coisas. As grandes instituições, como o Google, o Visa, a

cantilista, enquanto outras instituições privadas de ensino, por

Microsoft, operam dentro dessa nova lógica. É natural que

exemplo, podem ter uma visão extremamente pública. Tornar

o Sistema S passe por essa transformação. E seria muito bom

mais pública uma instituição como o Sistema S é se articular

que o diálogo se aprofundasse, para que se transformasse real-

mais com as funções do Estado, evidentemente, sem perder as

mente numa instituição pública, sempre com o caráter estatal.

características de uma empresa privada, mas torná-la realmente

Eu gosto muito dessa junção, dessa relação. Você vê como a

um serviço público. Para isso, o acesso a esses serviços deveria

Petrobrás hoje, que é uma empresa mista e tem avançado, e

ser ampliado gratuitamente ao público por meio de serviços que

outras também. O mundo é favorável a esse tipo de avanços.

possam atender cada vez mais as camadas populares.

O Sistema S deverá se abrir cada vez mais para esses avanços.

A história do ensino profissional no Brasil é muito elitista.

onde se formavam os grandes quadros. Assim, acho que essa

EPCT | Com relação à formação profissional técnica em nível superior, qual o papel dos tecnólogos dentro das nossas empresas e indústrias?

rediscussão tem de ser feita dentro de um diálogo de constru-

Eu tenho uma experiência incrível nesse sentido. Em

ção coletiva. Não por rupturas violentas. O Sistema S é um bem

1970/1971, tive contato com o Conselho Nacional de Educação

da humanidade. Eu estive em Tóquio numa reunião do Banco

– que na época era o Conselho Federal de Educação. Este

Interamericano de Desenvolvimento (BID), para apresentar a

Conselho, formado por José de Vasconcelos, Nilton Sucupira e o

metodologia de Paulo Freire, e o ministro da educação quando

Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, lançou a Nova LDB do

me apresentou numa reunião que nós tivemos em Okinawa,

Ensino Médio, em 1971, que foi muito criticada, pois obrigou a

um Estado do Japão, ele disse o seguinte: Há duas grandes

todos terem o ensino profissional. Em decorrência disso, por

contribuições da América Latina à educação mundial: uma é o

motivos de discussões, eu fui aconselhado a sair do Brasil em

método Paulo Freire e a outra é o Sistema S (Senac, Sesi, Senai).

1973. Acontece que o ministro da Ditadura Militar inspirou-se

Eu iniciei minha fala dizendo que as duas têm uma origem em

na legislação da educação soviética. Então, de um lado, tínha-

pai é agricultor. Nas escolas agrícolas, o povão não tinha muito acesso, não. Era só filho de fazendeiro que tinha acesso. E era

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 61-64, jul./dez. 2010

MOACIR GADOTTI

Eu me lembro das escolas agrícolas, por exemplo, porque meu

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mos os objetivos da Lei de Educação Americana, de 1936, e, de

EPCT | Em sua opinião, qual seria a saída?

EDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

outro lado, em plena Guerra Fria, tínhamos a estrutura da lei de educação soviética. Em São Paulo, por exemplo, essa lei não

Em primeiro lugar, acho que seria generalizar a informação

vingou, não foi aceita, devido ao seu teor tecnicista e autoritá-

sobre o mundo do trabalho, obter uma visão libertadora do

rio. Se essa discussão tivesse sido feita em outro contexto, que

trabalho e uma educação que não seja para o mercado, mas

não o da Ditadura, num contexto democrático, como o que a

para a vida. A educação profissional e tecnológica não pode ser

Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica promove hoje

submetida à lógica do mercado, pois esta, quando introduzida

neste Fórum, a história seria diferente. É empenho do próprio

na educação, faz com que aquela perca seu sentido. Vou dar

Presidente Lula promover esse grande debate no Brasil. É claro

um exemplo. Se nós introduzirmos na relação professor-aluno a

que ele ainda tem certas resistências. Mas sustentamos a tese de

mesma competitividade da lógica do mercado, então o profes-

que todos nós temos de trabalhar, de nos formar para o trabalho,

sor perderá a alma dele, porque ele vai virar um reles instrutor,

e não necessariamente formar profissionalmente o aluno de en-

formador de mão de obra. O mundo do trabalho mudou muito

sino médio, como queria a Lei 5.692, de 1971. Pois para se formar

do fordismo até hoje. Aquela formação em série que se exigia

na educação tecnológica e profissional não precisa exatamente

antes, aquela formação profissional em que só se dominava um

ser no ensino médio. A tecnologia deve ser ensinada desde

momento do processo, no taylorismo me parece muito claro isso,

cedo. Eu, por exemplo, quando era criança fazia meus próprios

não serve mais. Hoje, o trabalhador tem de ter uma visão geral

brinquedos. Hoje, as pessoas não conseguem entender nem

de todo o processo. Então, é outra formação. Enfim, acho que

coisas mais corriqueiras, como trocar uma lâmpada. A tecnologia

este Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica está

impregna em nossas vidas, por isso temos de ter esse contato

trazendo discussões fantásticas, que deveriam ser divulgadas por

com a tecnologia desde a infância. E é uma preocupação nossa.

revistas como esta (Educação Profissional: Ciência e Tecnologia) e

Pois não há país algum no mundo que se desenvolveu para valer

estudadas nas faculdades de tecnologia e também na Fac Senac.

sem uma base grande de formação profissional e tecnológica e

Nesse mundo em que a tecnologia evolui de uma forma muito

de educação geral, evidentemente. Uma educação tecnológica,

rápida e inovações surgem a cada momento, a gente precisa

dentro dessa nova concepção libertadora, no sentido freireano

estar atualizados e por isso a importância de uma faculdade de

da palavra, e não domesticadora, tem de ler o conteúdo dessa

tecnologia. Recentemente, estive em Santa Catarina, a convite

formação tecnológica. Não é qualquer formação tecnológica.

do Instituto de Tecnologia da Tupi, que tem uma tradição muito

Eu vejo que o Brasil, com um índice ainda tão elevado de anal-

grande em Joinville na área de formação para o trabalho. Quando

fabetismo, com uma formação ainda muito precária em nível de

eu e minha família saímos da roça e voltamos para Joinville, quem

formação geral e de formação tecnológica também, encontrará

nos acolheu foi a Escola Técnica Tupi, que hoje é um Instituto

seu maior obstáculo no desenvolvimento não nos processos

Tecnológico, operando dentro dessa nossa visão. Chegando lá, vi

produtivos, mas na falta de um trabalhador qualificado. E este

as mesmas máquinas que vi há 30 anos, uma máquina que pro-

será o grande desafio de desenvolvimento do futuro: formar

duzia uma peça de avião, uma pecinha de um avião da Embraer,

trabalhadores qualificados para viver o século XXI e não o século

que custava 80 mil dólares e estava sendo produzida e testada

XIX, porque ainda a educação no Brasil não chegou ao século

lá. Como eu sempre fui fascinado por tecnologia, desde criança,

XX. Pensando na revolução tecnológica, pensando no mundo

quando eu ainda trabalhava na roça e me fascinava pelas coisas

do trabalho de hoje, que é imaterial, e que vai ser 90% imaterial

novas, arregalei os olhos quando vi aquela peça. Então, perguntei

para os países desenvolvidos hoje, nós estamos muito atrasados.

quem a tinha feito e me apresentaram um torneiro mecânico

Nos governos estaduais, municipais e até no governo federal, eu

vestido de terno. Ele me explicou como ele a produziu e disse-me

acho que não há suficiente sensibilidade para a necessidade de

que era uma peça muito cara, que não podia fazê-la duas vezes,

uma transformação radical de educação no Brasil. Espero que

pois se errasse perderia o emprego. Por fim, esse tema é de muita

isso apareça de forma mais contundente na Conae em 2010.

responsabilidade e agradeço a oportunidade.

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Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 61-64, jul./dez. 2010


Educação Profissional: Ciência e Tecnologia | volume 4, número 1, p. 65-69, jul./dez. 2010 EDIÇÃO ESPECIAL | FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E PROFISSIONAL

INSTRUÇÕES

INSTRUÇÕES AOS COLABORADORES Informações Gerais A revista Educação Profissional: Ciência e Tecnologia é uma publicação semestral, da Faculdade de Tecnologia Senac-DF, que divulga artigos originais referentes à pesquisa, ao ensino e à reflexão crítica de temas relacionados à educação profissional. Sua missão é promover a pesquisa por meio da divulgação de trabalhos técnico-científicos, a discussão de temas relacionados à educação profissional, bem como incentivar a formação continuada de profissionais e pesquisadores. São aceitos trabalhos em português, inglês, espanhol e francês.

Submissão A submissão dos trabalhos deve ser feita pela página eletrônica da revista (Plataforma SEER) no endereço www.revista.facsenac.com.br. O autor deverá efetuar um login – no qual habilitará a opção Autor. Deverá confirmar o cumprimento do que está expresso em Condições de submissão, na tela de Submissão, para que possa realizar upload do arquivo. Os arquivos devem ser enviados em formato Word (.doc).

Avaliação e Seleção dos Artigos Os artigos submetidos à apreciação da revista devem ser inéditos. Os originais serão remetidos ao exame da Comissão Editorial e avaliados por Doutores que possuam conhecimento do tema abordado no artigo. Nas avaliações são observadas, entre outras coisas, a relevância do conteúdo, a propriedade da exposição, a conformação do texto aos princípios éticos e às normas da revista. A Comissão Editorial poderá solicitar a colaboração de pareceristas ad hoc. Para garantir a impessoalidade do processo, a autoria dos artigos não será revelada aos avaliadores, assim como também não será informada aos autores a identidade dos avaliadores que procederam à análise e avaliação de seu manuscrito. Após aprovação, os artigos entrarão na lista para publicação. Os artigos a serem publicados em cada número serão selecionados entre aqueles que estiverem na lista para publicação, observando-se os critérios adotados para publicação científica (tema, categoria do trabalho, representatividade regional, etc.). Modificações formais poderão ser feitas no texto pela revista, mas as modificações substanciais serão solicitadas aos autores. Os originais não serão devolvidos.

Tramitação do Artigo O fluxo dos artigos submetidos à Comissão Editorial da revista Educação Profissional: Ciência e Tecnologia é o seguinte: i.

Avaliação do original

ii.

Comunicação ao autor do resultado da avaliação

iii. Reformulação (no caso de os avaliadores indicarem a necessidade de revisões no conteúdo do artigo) iv. Avaliação da versão reformulada v.

Publicação

Direitos Autorais e Responsabilidade sobre o Conteúdo Publicado Os direitos autorais dos artigos publicados pertencem à revista Educação Profissional: Ciência e Tecnologia. É permitida a reprodução parcial ou integral dos artigos em outros meios de divulgação, com a única condição da completa citação da fonte. Os artigos assinados expressam a opinião de seus autores. A submissão dos originais à revista Educação Profissional: Ciência e Tecnologia pressupõe o conhecimento dos termos aqui expostos e implica a aceitação de suas condições.

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Normas para Publicação Escopo temático dos artigos Os artigos submetidos à revista devem focar temas relacionados à educação profissional dentro de uma das seguintes áreas: comércio, comunicação, conservação e zeladoria, design, gestão, imagem pessoal, informática, lazer e desenvolvimento social, meio ambiente, saúde, tecnologia educacional, telecomunicações turismo e hospitalidade.

Categorias de Trabalhos Aceitas Artigos ÜRelato de pesquisa: descrição de investigação baseada em dados empíricos e utilização de metodologia científica (aproximada-

mente 20 laudas); ÜEstudo teórico: análise de construtos teóricos que suscite o questionamento de modelos existentes e proponha hipóteses para

futuras pesquisas (aproximadamente 20 laudas); ÜRelato de experiência profissional: estudo de situação-problema, contendo análise de implicações conceituais, descrição de

procedimentos ou estratégias de solução, com evidência metodologicamente apropriada de avaliação de eficácia, de interesse para a atuação em diferentes áreas da educação profissional (aproximadamente 15 laudas); ÜRevisão crítica de literatura: análise de corpo teórico-investigativo que ofereça subsídios ao desenvolvimento da educação

profissional (aproximadamente 20 laudas); ÜNota técnica: descrição de instrumentos e técnicas originais de pesquisa (aproximadamente dez laudas); O número de laudas de cada artigo inclui, além do corpo do texto, resumo, abstract, figuras, tabelas e referências.

Resenha Revisão crítica de obra recém-publicada que oriente o leitor quanto às suas características e usos potenciais (aproximadaEDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

mente cinco laudas). Como critério, a revista define obras recém-publicadas àquelas publicadas até dois anos antes da data de

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submissão do artigo.

Carta ao editor Avaliação crítica de artigo publicado na revista Educação Profissional: Ciência e Tecnologia, ou resposta de autores a críticas formuladas ao artigo de sua autoria (aproximadamente cinco laudas);

Notícia Divulgação de fato ou evento de conteúdo relacionado à educação profissional, não sendo exigidas originalidade e exclusividade na publicação. Limitada a duas páginas impressas na publicação. A publicação de notícias fica a critério do Editor. Uma lauda do manuscrito original, de acordo com o especificado em Formatação do Texto, equivale a duas páginas da publicação impressa.

Estrutura Os artigos deverão ser apresentados da seguinte forma: ÜFolha de rosto personalizada: com a) título em português (com no máximo 17 palavras); b) título em inglês (equivalente ao

título em português); c) nome de cada autor, seguido da afiliação institucional e titulação; d) endereço completo para comunicação com os leitores, endereço completo para correspondência com a Comissão Editorial, fax, telefone e endereço eletrônico; ÜFolha de rosto despersonalizada: sem o nome do autor, contendo exclusivamente: a) título em português; b) sugestão de

título resumido (máximo de 6 palavras); e c) título em inglês; ÜResumo: em português, com no máximo 150 palavras e acompanhado de quatro palavras-chave. Resenhas e notícias não admi-

tem resumo nem palavras-chave; ÜAbstract: resumo em inglês, equivalente ao resumo em português e acompanhado das palavras-chave (key words). Resenhas e

notícias não admitem abstract e key words.

Educ. prof.: C & T, Brasília, v. 4 n. 1, p. 65-69, jul./dez. 2010


Os artigos poderão conter ainda, quando for o caso: ÜApêndices e/ou Anexos: quando contiverem informações indispensáveis à compreensão do texto. Devem figurar no final do

artigo, numerados segundo a ordem de apresentação; ÜTABELAS E/OU Quadros: devem incluir legendas e devem ser numerados(as) sequencialmente. ÜIMAGENS: os arquivos devem ser enviados em alta resolução (300dpi) e, preferencialmente, no formato do programa em que

foram originariamente gerados (Excel, Corel Draw, etc).

Formatação do Texto Os textos deverão obedecer à seguinte formatação: Digitados em papel branco A4, fonte Times New Roman, tamanho 12, espaço duplo, com margens superior e inferior de 2 cm, e margens laterais de 3 cm. O corpo do texto não deve conter qualquer elemento que identifique o(s) autor(es). As páginas devem ser numeradas na parte inferior direita da lauda. O número de páginas deve limitar-se àquele estabelecido para cada categoria de trabalho (ver Categorias de Trabalhos Aceitos).

Sistema de Chamadas (Autor, data) ÜDe um a três autores: os nomes dos autores deverão ser separados por ponto e vírgula:

(GINTIS; SMITH; BOWLES, 2001) ÜA partir de 4 autores: cita-se o nome do primeiro autor seguido da expressão “et al.”:

(CORDANI et al., 2000) ÜAutores com sobrenomes idênticos: informam-se também as iniciais de seus prenomes:

(SILVEIRA, F., 2006); (SILVEIRA, B., 2007) (SILVEIRA, B.; SILVEIRA, F., 2007); caso as iniciais dos nomes também coincidam, os prenomes deverão figurar por extenso (SILVEIRA, Flávia, 2006); (SILVEIRA, Fábio, 2007) (SILVEIRA, Flávia; SILVEIRA, Fábio, 2005) ÜAutor com mais de uma publicação no mesmo ano: as obras deverão ser diferenciadas adicionando-se uma letra minúscula

após a data, ordenadas de acordo com a lista da seção de referências: (SODRÉ, 1969a), (SODRÉ, 1969b) ÜVárias obras do mesmo autor: os anos das publicações devem ser separados por vírgula:

(GIL, 1993, 1995, 1997)

Citações

ÜCitações diretas curtas: com até 3 linhas, deverão ser integradas ao texto, entre aspas, seguidas da chamada pelo sobrenome

do autor, incluindo o número da página. “[...] do conceito de consciência [...] sentido aos estímulos que nos atingem” (PENNA, 1986, p. 9). ÜCitações com 4 linhas ou mais: deverão ser deslocadas do corpo do texto, dispostas com recuo de 4 cm da margem esquerda,

sem aspas e com espaçamento simples, seguidas da chamada pelo sobrenome do autor.

Citações Indiretas (texto baseado na obra do autor consultado) As citações indiretas deverão ser seguidas da chamada pelo sobrenome do autor. A indicação do número da página é opcional: Segundo Fonseca (1986, p. 57-58), em estudo realizado em Recife (UNICEF, 1986)...

Citação de Citação (texto não retirado de fonte original, mas de obra que a ele faz referência) Deverá ser referenciada a fonte consultada e não a fonte original, usa-se a expressão apud (citado por) entre o autor original e o autor consultado. Conforme Platão e Fiorin (1990, p. 241 apud MEDEIROS, 2003, p. 71), os pressupostos são idéias não expressas de maneira explícita [...]

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INSTRUÇÕES E NORMAS PARA PUBLICAÇÃO

Citações Diretas (transcrição textual de parte da obra do autor consultado)

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Notas, Siglas e Abreviaturas As notas deverão figurar no rodapé da página, numeradas seqüencialmente. As siglas deverão ser apresentadas de forma estendida quando mencionadas pela primeira vez no texto: ...o Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), realizou estudos... As abreviaturas devem seguir as orientações da NBR 10522/88.

Seção de Referências Bibliográficas A seção de referências, no final do artigo, deverá conter as referências bibliográficas completas, ordenadas, primeiro por ordem alfabética do sobrenome dos autores, depois (quando houver mais de uma obra do(s) mesmo(s) autor(es)) por ordem alfabética do título da obra, conforme o definido pela ABNT (NBR 6023, ago. 2002). O elemento em destaque, a depender do tipo de referência, deverá ser negritado.

Referências de Livro ÜIntegral: ESTEVAM, C. Freud: vida e obra. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. ÜParte de Livro: PEREIRA, R. R. et al. Ladrões de sonhos e sabonetes: sobre os modos de subjetivação do infância na cultura do

consumo. In: JOBIM E SOUZA, S. (Org.). Subjetividade em questões: a infância como crítica da cultura. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2000.

Referências de Revista ÜIntegral: PSICOLOGIA: Teoria e Pesquisa. Brasília: Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, v. 22, n. 1, jan./abr. 2006. ÜArtigos e/ou Matéria: MOURA, M. L. S. Dentro e Fora da Caixa Preta: A Mente sob um Olhar Evolucionista. Psicologia: Teoria e

Pesquisa, Brasília, v. 21, n. 2, p. 141-147, maio/ago. 2005. Quando os artigos ou matérias não forem assinados, o título do artigo passa a ser o primeiro elemento da referência com a priEDIÇÃO ESPECIAL | fórum mundial de educação profissional e tecnológica

meira palavra em caixa alta: MÃO-DE-OBRA e previdência. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Rio de Janeiro, v. 7, 1983. Suplemento.

Dissertações e Teses STRAFORINI, R. Ensinar geografia nas séries iniciais: o desafio da totalidade mundo. 2001. Dissertação (mestrado) – Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.

Obras em mídias digitais A referência segue o padrão indicado para o material impresso acrescida da descrição do meio eletrônico e data de acesso, quando consultadas on-line: KOOGAN, A.; HOUAISS, A. (Ed.). Enciclopédia e dicionário digital 98. Direção geral de André Koogan Breikmam. São Paulo: Delta: Estadão, 1998. 5 CD-ROM. BICCA JUNIOR, R. L. Coisas nossas: a sociedade brasileira nos sambas de Noel Rosa. 2001. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Disponível em: <http://www.samba-choro.com.br/print/debates/>. Acesso em: 21 ago. 2004.

Autores Institucionais A referência começa com o nome da instituição em caixa alta: SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM COMERCIAL. Plano de Trabalho 2008. Brasília, 2008

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Formatação das referências A formatação da referência deve seguir impreterivelmente os modelos supracitados. Isso inclui o uso dos recursos tipográficos (negrito ou caixa alta) e a pontuação. As expressões usadas nas referências, tais como “et al.”, “In” “Org.”, “Coord.”, “Ed.”, “v.”, “n.”, “p.”, “s.n.”, “ed.”, serão sempre seguidas de espaço e devem ter o uso dos caracteres maiúsculos e minúsculos respeitados (o autor deve atentar-se para o fato de que os recursos de auto-correção do computador podem alterar a configuração da formatação, colocando, por exemplo, um caractere maiúsculo onde deveria figurar um minúsculo etc.). Nenhum item da referência deve ser sublinhado. Os recursos tipográficos devem ser aplicados exclusivamente quando requeridos. Todas as referências constantes no corpo do texto deverão ser incluídas na seção de referências, assim como todas as referências listadas na seção deverão estar presentes ao longo do texto. Os casos aqui não contemplados deverão seguir o estabelecido pela ABNT

INSTRUÇÕES E NORMAS PARA PUBLICAÇÃO

(NBR 6023, ago. 2002), e aqueles não assistidos pela presente norma nem pela ABNT serão decididos pelo corpo técnico da revista.

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