Relatório TCC - Doc. Senhor das Artes

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO: JORNALISMO

RELATÓRIO VÍDEO DOCUMENTÁRIO: SENHOR DAS ARTES

Camila Rebecca de Sousa Peixoto Douglas François Xavier Silva

João Pessoa - Paraíba Agosto/2009


UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO: JORNALISMO

VÍDEO DOCUMENTÁRIO: SENHOR DAS ARTES

Camila Rebecca de Sousa Peixoto Douglas François Xavier Silva

Projeto experimental apresentado como requisito para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social.

Professor Orientador: Wilfredo Maldonado

João Pessoa - Paraíba Agosto/2009


UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO: JORNALISMO

A Comissão Examinadora, abaixo assinada, avalia o Projeto Experimental vídeo documentário Senhor das Artes, elaborado por Camila Rebecca de Sousa Peixoto e Douglas François Xavier Silva, como requisito para obtenção do Grau de Bacharel em Comunicação Social.

Banca examinadora:

Notas:

________________________________

10,0

Profª. Wilfredo Maldonado

________________________________

10,0

Profª. Drª. Suelly Maux

________________________________

10,0

Profª. Drª. Nadja Carvalho Média:

João Pessoa, 28 de agosto de 2009

10,0


Agradecimentos

Em primeiro lugar, todos os agradecimentos a Deus, que nos surpreendeu em diversos momentos, tornando concreto o nosso projeto do qual ele é autor e produtor. Aos grupos: Banda Alumiar, Boca na Rua, Cia. Abner, Cia. Corpo & Luz, Grupo Jovem Radical, Ministério de Louvor da Igreja Betel Bancários e Ministério Tenda do Encontro, pela disponibilidade, atenção e contribuição. Sobretudo por terem aceitado este desafio conosco. À Eldia Santos, Gildeão Bezerra, Ir.º Barreto, João Xavier e Prof.ª Joana Belarmino, por terem sido de fundamental importância para a concretização deste projeto.

A todos vocês o nosso muito obrigado!


Dedicatória

A Deus, o Senhor de todas as artes e o Senhor das nossas vidas. Aos nossos pais, Goretti e Raí, Edjane e Francisco, pelo amor e confiança sem limites. Aos nossos irmãos, Raí Jr., Narjara e Nathalya por caminharem conosco sempre. Aos nossos amigos, pelo apoio constante, pelos momentos de diversão e por sempre acreditarem em nós. Aos nossos mestres/doutores que deram o seu melhor para que nós tivéssemos uma educação superior de qualidade.


Nada foi tão difícil, tão batalhado e nos pareceu tão impossível. Mas, surpreendentemente tornou-se concreto e realizador. Douglas Xavier


Sumário

1.

Introdução............................................................................................................................. 7

2.

Objetivos............................................................................................................................. 11

3.

2.1.

Objetivo geral ................................................................................................. 11

2.2.

Objetivos específicos...................................................................................... 11

Justificativa......................................................................................................................... 12

4.1.

Gênero Documentário..................................................................................... 13

4.1.1. 4.1.2.

5.

Sub-gêneros do documentário ................................................................ 15 Perfil do documentário Senhor das Artes ................................................... 17

4.2.

Origens da arte................................................................................................ 18

4.3.

Arte e religião: imersão na História................................................................ 20

4.4.

A arte e o protestantismo, hoje e outrora........................................................ 22

4.5.

A crise da arte: a perda da “aura” ................................................................... 24

Metodologia........................................................................................................................ 26

5.1.

Pré-produção................................................................................................... 26

5.2.

Produção ......................................................................................................... 27

5.3.

Pós-Produção .................................................................................................. 29

6.

Entrevistas .......................................................................................................................... 31

7.

Grupos entrevistados .......................................................................................................... 34

7.1.

Banda Alumiar................................................................................................ 34

7.2.

Companhia Abner........................................................................................... 34

7.3.

Companhia Corpo & Luz ............................................................................... 35

7.4.

Grupo Boca na Rua ........................................................................................ 35

7.5.

Ministério de Louvor Betel Bancários............................................................ 35

7.6.

Ministério Tenda do Encontro........................................................................ 36

8.

Considerações finais........................................................................................................... 37

9.

Referências bibliográficas .................................................................................................. 38

10. Bibliografia consultada....................................................................................................... 39


7 1.

Introdução Ao analisar o percurso das igrejas evangélicas, especialmente no Brasil,

percebemos uma lenta e gradual transformação desse segmento religioso, desde a expansão das missões do protestantismo histórico, adentrando no fenômeno da multiplicação das divisões/denominações inspiradas sobretudo pelo pentecostalismo, e o fortalecimento dessa corrente ou doutrina, até desembocar no período contemporâneo, marcado pela emanação da cultura gospel, cujo o arcabouço de expressões artísticas constituem o tema do documentário que se apresenta1. Nos desperta a atenção o caráter e a qualidade técnica de peças de teatro, espetáculos de dança e shows musicais inseridos nessa cultura, como é notável pela evidência cada vez maior na mídia – em emissoras de propriedade de igrejas evangélicas ou mesmo redes seculares. Mas também nos deparamos com outra espécie de fazer artístico dos cristãos evangélicos, conhecido talvez apenas por quem mantém envolvimento com tal cultura, participando de eventos, tais como seminários, festivais, congressos etc., congregacionais2 ou interdenominacionais3, realizados em âmbito local, estadual, regional ou nacional. Falamos, de um lado, da arte gospel imbricada no conceito de Indústria Cultural, em que se sobressai a produção fonográfica, em constante expansão. De outro, da atividade artística de base – mantida como um trabalho/tarefa na “Casa de Deus”, e de grupos alternativos que usam o grafite, a pirofagia, malabares e outras expressões menos comuns para evangelização. São números de arte que servem ora como veículo da mensagem cristã em si, ora como mecanismos para a aproximação dos públicos; um meio de abertura para a pregação. Realizamos um documentário em que exploramos ambos os perfis. Praticamente todas as modalidades de arte, em seus diversos gêneros, são hoje utilizadas para evangelização por grupos paraeclesiásticos4 ou ministérios5 de igrejas

1

O trajeto histórico do protestantismo no Brasil é contado no livro A explosão gospel: um olhar das ciências humanas sobre o cenário evangélico no Brasil, de Magali Nascimento Cunha. 2 Relativo às atividades restritas ao espaço físico ou ao grupo de pessoas de determinada denominação; relativo ao templo. 3 Que se realiza entre duas ou mais igrejas. 4 Paraclesiástico é um termo usado para designar, em décadas anteriores, os grupos e movimentos cristãos protestantes não vinculados a igrejas ou que reuniam pessoas de diversas denominações. Ou seja, é equivalente a interdenominacional, palavra empregada atualmente. Cf. CUNHA, 2007. 5 Ministério significa exercício, função de serviço a Deus.


8 locais: no teatro, especialmente a pantomima e o teatro-dança6, mas também espetáculos com diálogos encenados em palcos de festivais, congressos etc., e espetáculos interativos; na dança, principalmente os gêneros não-convencionais (dança de rua/street dance, hip hop) e o estilo contemporâneo; além do teatro e da dança, tem-se ainda o circo (palhaço, mambembe, malabares, flags, swings etc.) e as artes radicais (pirofagia e outros números com fogo, além das investidas artísticas nos jogos extremos/x-games). De acordo com Mendonça (2007, p. 3), “o crescimento do pentecostalismo tem sido observado como fator preponderante na substituição dos métodos tradicionais de evangelização por meios modernos tecnicamente eficazes de divulgação do evangelho”. Cunha (2007) afirma que a cultura gospel, emergente na transição da década de 80 para 90, é resultante da abertura do segmento religioso cristão evangélico ao diálogo com outros grupos da sociedade, configurando-se assim como hibridização. O novo modo de viver dos cristãos evangélicos é delineado pela maior abertura ao mercado de bens de consumo, em excepcional à indústria fonográfica; pela inserção progressiva nas mídias e pela variação nas artes, com repercussão nos programas de redes evangélicas. A dança ou coreografia, por exemplo, foi introduzida nas igrejas, nesse período, como acompanhamento aos louvores. Antes terminantemente proibidas para os protestantes, passou a compor com as apresentações musicais nos templos. (CUNHA, 2007, p. 6768) Já na música, ocorreu a assimilação de gêneros popularizados no Brasil e no mundo, como o reggae, metal, funk etc. (CUNHA 2007, p. 68). Estas propostas perpassam a renovação musical cristã, que se apóia, a princípio, na sacralização de gêneros musicais nacionais, e mais recentemente tem abrigado todas as tendências musicais populares de massa, estrangeiras ou não, num processo que acompanha a globalização, a diversidade e o pluralismo da sociedade pós-moderna. (MENDONÇA; KERR, 2007, p. 5)

Na década de 90, os cantores e grupos musicais evangélicos passaram a receber a alcunha de artistas, o que coincide justamente com o momento da inserção do termo gospel no Brasil pela Igreja Renascer em Cristo. O adjetivo tem origem no movimento musical dos cristãos protestantes negros dos Estados Unidos, no início do século XX (CUNHA, 2007, p. 27). Bem como ocorreu entre os norte-americanos, o gospel tratava-

6

Sobre gêneros do teatro, da dança, inclusive modalidade teatro-dança, ver Pavis (2005).


9 se de um estilo musical religioso, de/para o segmento de cristãos evangélicos. Porém, o ascendente envolvimento social e cultural dos fiéis da confissão protestante naqueles anos trouxe o termo para uma dimensão maior. Hoje, o gospel é comumente usado para expressar qualquer tipo de atividade que seja desenvolvida e/ou dirigida por e para o público evangélico. A cultura gospel é uma cultura religiosa, um modo de vida construído por um segmento cristão brasileiro – os evangélicos. Portanto, ela é um modo de viver e experimentar a fé no sagrado dentro do qual há um sistema de significações que resulta de todas as formas de atividade social desse segmento religioso. (CUNHA, 2007, p. 171)

O gospel como cultura é experimentado e vivenciado similarmente por nações orientais e ocidentais, desenvolvidas e emergentes, dos mais diversos matizes culturais. Isso porque é desterritorializada e versa-se sobre o mesmo conteúdo, diferenciada, quando sim, por assimilação de particularidades de cada contexto sociocultural. É comum, por exemplo, em países africanos que o gospel assuma na liturgia local os ritmos de música e dança nativos. Para além da questão geográfica, Cunha nos fala em outros aspectos: Dizer que a cultura gospel é desterritorializada significa afirmar que ela não tem um território cultural demarcado – está presente em todas as denominações do campo evangélico e também no católico-romano, e os transpõe, pois, essa expressão cultural é vivenciada mesmo por pessoas que não possuem vínculo religioso. (sic) (CUNHA 2007, p. 190)

Entre as novidades que acompanham o surgimento da cultura gospel, considerando suas origens no moderno, apontam-se a constituição de um mercado de bens relacionados ao sagrado, e a liberalização do consumo; a crescente adequação ao modelo da Indústria Cultural; e crescimento do espaço das igrejas e artistas gospel nas mídias. O termo ganhou um peso mercadológico e midiático, e diante disso encontra moderada resistência dentro do segmento cristão evangélico. Partiu dessa oposição as modalidades da música e da produção artística qualquer que seja, a disseminação do uso do termo “ministério” para designar os grupos de artes cristãs, tal como já era empregado pelos grupos de louvor nas igrejas. Cantores/as de


10 carreiras solo também têm dado preferência a nomenclatura “ministério” para designar sua atividade profissional, porém de adoração a Deus (CUNHA, 2007, p. 105-113). Também observamos, nesse contexto, a diferenciação estabelecida entre equipes e obras do segmento religioso aqui tratado quando as encontramos na esfera midiática ou em eventos de grandes proporções, onde ouvimos com frequência a nomeação gospel; ou nos templos, onde são classificadas por “cristãs” ou “evangélicas”. Outro adjetivo comum é “de adoração”, mais associado ao louvor e à dança, também utilizado por cantores e grupos do mercado fonográfico gospel para rotular suas músicas.


11 2.

Objetivos 2.1.

Objetivo geral

Produzir um filme documentário de curta-metragem (entre 20 e 30 min), em caráter de Trabalho de Conclusão de Curso, tendo como tema as Artes Cristãs e Cultura gospel – em que se inclui a música, revelando a públicos mistos (cristãos evangélicos, cristãos católicos, acadêmicos etc.) o quantitativo amostral das expressões artísticas da cultura gospel na Paraíba, e o qualitativo técnico das mesmas, destacando a diversidade dos gêneros assimilados ou desenvolvidos nesse segmento. 2.2. a.

Objetivos específicos Revelar a qualidade técnica e artística dos espetáculos de autoria de companhias e grupos de artes gospel apresentados na Paraíba.

b.

Apresentar os diversos gêneros hoje assimilados e utilizados na música gospel, em shows realizados em nossa cidade e/ou municípios circunvizinhos, contemplando não só grupos de música, mas também de dança.

c.

Enfocar o regionalismo presente no repertório musical de grupos de música gospel paraibanos.

d.

Demonstrar os gêneros variados da dança, inclusive os característicos da contemporaneidade: hip hop, samba, dança contemporânea, streat dance etc.), clássica.

e.

Apresentar o formato de espetáculo teatral interativo realizado na cidade de João Pessoa pela parceria entre igrejas locais.


12 3.

Justificativa No ensejo das primeiras observações acerca do tópico, com o propósito de

elaboração do projeto, notamos que a cultura gospel e especificamente as artes do segmento são objeto de poucos trabalhos acadêmicos. Conforme nos indica Cunha (2007), mesmo estudos acerca do protestantismo e suas ramificações apresentam-se escassamente em obras bibliográficas. Tratando de filmografia documental, apesar de uma vasta produção voltada para as religiões, seja de obras de autoria de diretores de renome ou vinculadas a instituições religiosas, não encontramos qualquer documentário que verse, como usualmente ocorre nas abordagens à religião católica, um título de conteúdo específico sobre artes cristãs evangélicas.7 Acha-se, nesse ponto, outro argumento que justifica o documentário proposto. A obra servirá à comunidade acadêmica como uma compilação audiovisual da produção artística nascente do meio cultural gospeI, no qual propomos nos aprofundar, e que é relativamente pouco pesquisado e menos ainda compreendido. Um produto audiovisual documental possui pujança interdisciplinar para as ciências sociais e humanas, ao tratar de uma realidade que interessa aos estudos de ambas as áreas. O filme será de importância também para o público cristão evangélico, por uma questão de identificação ou, para muitos, uma relação de descoberta. Além do objetivo acadêmico, em caráter de pré-requisito para conclusão do curso de Comunicação Social – Jornalismo, o documentário configura-se como uma realização pessoal, com fins profissionais; um ponto de partida para uma carreira audiovisual em que pretendemos investir.

7

A conclusão é fundamentada em duas pesquisas: Religião e filmes documentários no Brasil (MONTEMÓR, 20005) e O que diz a “Voz de Deus” - Especificidades do documentário religioso (VALDICO, 2006). Esta última identifica que a maioria dos documentários católicos e evangélicos possui vínculos com as respectivas instituições religiosas e preocupam-se em reproduzir histórias bíblicas (épicos) e especialmente a história de Jesus Cristo. Na produção contemporânea, destacam-se aqueles que resultaram de coberturas de eventos congregacionais, seminários ou congressos, a exemplo do recente documentário do Aniversário de 97 anos da Assembléia de Deus no Brasil, em 2008.


13 4.

Fundamentação Teórica 4.1.

Gênero Documentário

Estabelecer uma distinção, dentro do Cinema, entre documentário e obra de ficção, que, não raro, estigmatizam, contrapõem um ao outro, é para nós uma tarefa indispensável, principalmente quando podemos pensar qualquer que seja a produção audiovisual sob um prisma das formas híbridas, que assumem plasticidades e ritmos diversos comuns à arte contemporânea. Não basta caracterizar aquele gênero como espelho do real, tampouco vale desconsiderar os reflexos da realidade no filme de pura ficção. A característica factual própria do documentário revela-se não como imagem no espelho, mas como luz que irradia sobre algo novo, o qual simula, ilude, mas desvenda, recria a própria realidade. Para alguns autores, o documentário remonta ao final do século XIX com os irmãos Lumière, como pura e simplesmente um registro (imagem em movimento) da realidade, em tom fiel e objetivo, explorando a espontaneidade da vida. Entretanto, Teixeira (2004, p. 14) discorda, afirmando que “a vida nua e crua jamais propiciou e sustentou alguma arte de interesse duradouro, a não ser quando se deixou passar pelo crivo de um trabalho de transformação, de transfiguração”. A despeito da primeira consideração quanto à origem do gênero, é apenas na década de 20, como destaca o autor, que o cinema subdivide-se em “de ficção” e “de realidade”, no primeiro caso referindo-se à estória forjada ou posada; no segundo, à objetividade sobre o espontâneo, o natural (TEIXEIRA, 2004, p. 8). Essa modalidade de cinema produzia, a princípio, os chamados “filmes de viagem”, a exemplo do afamado filme Nanook, o esquimó (1922), de Robert Flaherty. No Brasil, da mesma maneira, o documentário apresentou forte tom antropológico na sua primeira fase, com filmes que se voltavam para o registro de culturas e rituais das comunidades indígenas. Em geral, vídeos ou filmes documentários são claramente distinguíveis quando apresentam elementos tradicionais (NICHOLS, 2001): o uso de narração ou comentário; o uso do som direto, com entrevistas; cortes entre imagens correlacionadas; ilustração do cotidiano, de pessoas (“atores sociais”) em suas atividades rotineiras; além de uma lógica informativa que perpasse a história. Nichols (2001) não delimita fronteiras entre os gêneros, mas considera que tais elementos básicos são identificáveis na maioria dos documentários. No entanto, ele


14 transfere a questão da classificação para o campo da subjetividade, do autor e do espectador. De um lado, diz que a compreensão sobre o gênero se altera de acordo com as idéias de cada documentarista em particular. De outro, afirma que o reconhecimento de um filme ou vídeo como documentário reside no contexto e/ou estrutura do mesmo, mas também na percepção mental do espectador, que tem a sensação de que assiste a um produto do gênero documental. Seriam essas então as bases do cinema documentário: o factual articulado, uma narrativa construída a partir de fragmentos da realidade, ainda que essencialmente dramatizada por atores, mas fundada sobretudo em histórias concretas, não fabuladas. Para Nichols (2001, p. 20), “a tradição do documentário está profundamente enraizada na capacidade de ele nos transmitir a impressão de autenticidade” e na capacidade de nos “atrair para mundo que, de outra forma, jamais conheceríamos” (NICHOLS, 2001, p. 21). Penafria (2001) esclarece que o real como fonte narrativa não é uma limitação, mas sim “uma fonte inesgotável de conteúdos e formas” (PENAFRIA, 2001, p.6). Ela entende que o documentário é uma obra conduzida pela criatividade de seu autor e, assim sendo, demonstra seu ponto de vista, que não deve ser exclusivo na história, mas decerto predominante. O documentário já serviu a diversos propósitos ao longo de sua existência. Além do modelo antropológico, trabalhado por Flaherty, também encontrou, na década de 1930, apelo social e econômico nas obras de John Grierson. Nessa mesma época, foi usado no Brasil para fins educativos – uma linha tradicionalista que até hoje permeia os documentário mais expositivos, aqui e por todo o mundo. Mais tarde, assume então outro ponto de vista, o sociológico, em que o autor volta-se pra seu próprio contexto, para a sociedade/civilização, não mais para o outro absolutamente desconhecido. Isso acontece na década de 1960, classificando-se como “cinema de autor”, em que se começa a desmistificar o gênero documentário, valorizando-o não como retrato fiel da realidade, mas como discurso. (NICHOLS, 2001) A partir de 1970, o cinema documentário dedica-se a pensar sobre si mesmo, buscando reforçar a obra como produto, como discurso construído com base no real, mas não puramente real - que seria uma postura “anti-ilusionista”, mas mediado e alterado por uma câmera. Além disso, com um clima de bastidores, sem medo de revelar percursos, métodos, meios do processo de produção, atitude típica do Cinema Verdade.


15 De 1980 até a contemporaneidade, esses filmes e vídeos, sobretudo os experimentais, tem explorado cada vez mais inovações estéticas, nos formatos de montagem, etc; “não parou mais de lançar desafios ao pensamento, seja na esfera da criação, seja da reflexão” (TEIXEIRA, 2004, p. 10). 4.1.1. Sub-gêneros do documentário Da sua origem até aqui, o gênero documentário assumiu diversas faces, contemplando variados temas, inovações de estilo e estrutura. Superando os debates de métodos (dramatização/realidade; cinema verdade/cinema direto) ou das finalidades (antropológica/sociológica; informativa/artística), na contemporaneidade podemos classificar os documentário por sub-gêneros. Segundo Carlos Aberto (apud TEIXEIRA, 2004, p.58), no artigo Impressões de Amsterdam, seis tendências de documentário estão presentes nos festivais do gênero em escala mundial. São estas: A câmera e eu: tem o cineasta como narrador exclusivo, funciona como um “diário confessional”; Cinema do cinema: metalinguagem, cinema auto-reflexivo, construídos com tomadas de making of, de bastidores; Foco nas conexões: tendência contemplada pelos documentários ensaísticos, calcados em “cadeias de idéias” temáticas, em detrimento de personagens individuais; De olho na TV: filmes e vídeos baseados no formato televisivo, apresentando “colagem fragmentada”, “ritmo acelerado”, “alternância homogênea de depoimentos, material de arquivo e cena reconstituídas”; Os arquivos resistem: narrativas essencialmente montadas a partir de material de arquivo; Nem tudo parece verdade: documentários que jogam com o par real/ficção, provocando dúvida, confusão. Trazendo divisões um pouco diferentes, Nichols (2001, p. 62 e 63) apresenta também seis perfis sob o ponto de vista da estrutura narrativa.O modo poético “enfatiza associações visuais, qualidades tonais ou rítmicas, passagens descritivas e organização de formas; no estilo mais tradicional; o modo expositivo “enfatiza o comentário verbal e uma lógica argumentativa”; no modo observativo há o “engajamento direto no cotidiano das pessoas que representam o tema do cineasta, conforme são observados por uma câmera discreta”; encontramos no modo participativo a “interação de cineasta e tema. A filmagem acontece em entrevistas ou outras formas de envolvimento ainda mais direto”; o modo reflexivo “chama a atenção para as hipóteses e convenções que regem o cinema documentário. Aguça nossa consciência da construção da representação da realidade


16 feita pelo filme”; por fim, o modo performático firma-se no “aspecto subjetivo do expressivo próprio engajamento do cineasta com seu tema e a receptividade do público a esse engajamento”. De acordo com o autor, este último modo apresenta características peculiares aos filmes experimentais, pessoais e de vanguarda. Esses subgêneros, divisões, modos ou perfis, que diferem em certa medida de um autor para outro, ou apenas possuem nomenclaturas distintas, são interessantes na identificação da essência de cada filme ou vídeo. As características preponderantes de uma obra a subscrevem numas dessas definições, entretanto não anulam a possibilidade de associações com as demais. “Uma vez estabelecidos, os modos superpõem-se e misturam-se. Os filmes, considerados individualmente, podem ser caracterizados pelo modo que mais parece ter influenciado sua organização, mas também podem combinar harmoniosamente os modos, conforme a ocasião”. (NICHOLS, 2001, p. 63)

Outras novidades no cenário da cinematografia documental são pontuadas por outros teóricos do campo, como Hirszman (Org. TEIXEIRA, 2004), que fala do “modelo estrutural”, baseado em um conceito de Roland Barthes, entendido como discurso construído. Segundo Hirzman, esse modelo: “(...) busca captar o discurso – verbal, pictórico, literário etc. – pelo qual o outro representa o mundo, decompõe este discurso e depois o recompõe em conjuntos a partir de semelhanças e/ou diferenças temáticas e/ou formais. O filme apresenta os conjuntos, que, por sua vez, revelam entre si semelhanças e/ou diferenças.” (TEIXEIRA, 2004 p. 225)

De outro modo, Arthur Omar propõe o que chama de antidocumentários, conceito trazido à tona por Teixera (2004, p. 32 e 33). Seria essa uma forma de fugir do tradicional, sem desprezá-lo por completo, mas reorganizando-o e lhe acrescentando novas formas, dando maior liberdade de reflexão para o espectador. “O antidocumentário procuraria se deixar fecundar pelo tema, construindo-se numa combinação livre de seus elementos”. (OMAR apud TEIXEIRA, 2004, p.33).


17 4.1.2. Perfil do documentário Senhor das Artes O vídeo documentário Senhor das Artes é bem definido por Nichols (2001), quando ele diz que: “os personagens ou atores sociais podem ir e vir, proporcionando informação, dando testemunho, oferecendo provas. Lugares e coisas podem aparecer e desaparecer, conforme vão sendo exibidos para sustentar o ponto de vista ou a perspectiva do filme. Uma lógica de implicação faz a ponte entre esses saltos de uma pessoa ou lugar para outro” (NICHOLS 2001)

Dentre os modos ou perfis apresentados, identificamos o documentário Senhor das Artes mais fortemente no modo poético. Neste modo, “os cineastas enfatizam associações visuais, qualidades tonais ou rítmicas, passagens descritivas e organização formal” (NICHOLS, 2001, p. 62). Podemos também associar o nosso vídeo ao modo performático que, segundo o autor, enfatiza o aspecto subjetivo ou expressivo do próprio engajamento do cineasta com seu tema e a receptividade do público a esse engajamento, além do modo participativo, em menor grau, que de acordo com Nichols, o cineasta enfatiza a sua interação com o tema. Com referência às tendências apresentadas por Teixeira (2004), podemos localizar nosso vídeo em duas delas: “foco nas conexões” e “de olho na TV” . No primeiro caso a característica principal que encontramos em nosso vídeo o fato de não se enfocar personagens e situações específicas, mas “cadeias de ideias construídas a partir de personagens e situações particulares”. No segundo caso o que há de comum com o Senhor das Artes é a inspiração no formato televisivo como “colagem fragmentada”, “ritmo acelerado” e “alternância homogênea de depoimentos, material de arquivo”. (MATOS apud TEIXEIRA, 2004, p. 58).


18 4.2.

Origens da arte

Estudos sobre a razão, o sentido e a necessidade da arte constatam que ela, ou o seu plural, está presente nas mais distintas esferas socioculturais da humanidade. A arte é, então, considerada elemento fundamental das culturas. Mais que isso, “uma função essencial do homem, indispensável ao indivíduo e às sociedades” (HUYGHE, 19__, p. 11) Os historiadores apontam para o surgimento da arte no período pré-histórico, quando os primeiros hominídeos teriam registrado pinturas de animais nas paredes das cavernas. A arte é descrita como uma evidência do processo evolucionista dos seres humanos na terra, quando estes desenvolveram habilidades tais – físicas e mentais, para a criação e aperfeiçoamento de instrumentos, tornando-se agentes transformadores da/na natureza. (Cf. JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996, p. 14-21) Em A necessidade da arte, Ernst Fischer reserva um capítulo para relatar “as origens da arte”. Ele inicia dizendo: “A arte é quase tão antiga quanto o homem. É uma forma de trabalho, e o trabalho é uma atividade característica do homem”. Para além de teorias ou suposições acerca do berço da arte, assegurara que “não há ferramenta sem o homem, nem homem sem a ferramenta”. (FISCHER 1987, p. 22) Uma acepção similar a de Fischer é partilhada por Bosi (1995, p.13): “A arte é uma produção; logo supõe trabalho. Movimento que arranca o ser do não ser, a forma do amorfo, o ato da potência, o cosmos do caos”. À arte foi conferido um imenso poder de transformação, um valor transcendente, o que se revelava na preocupação das civilizações antigas com fórmulas e estruturas, resistentes até o período renascentista (BOSI, 1995, p. 17-19). A arte assumiu portes de ciência e magia, relação já mencionada por historiadores e arqueólogos a respeito das imagens das cavernas e rituais primitivos. “Quase não há dúvida de que faziam parte de um ritual mágico cujo propósito era o de assegurar uma caça bem-sucedida” (JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996, p. 15) . Segundo conta a História, os hominídeos acreditavam ser possível dominar os animais por meio da sua representação. Distante do ponto de vista histórico-científico, nas religiões monoteístas encontraremos outra vertente de pensamento para o nascimento da arte, pois estas refutam a teoria da origem e evolução do homem fundada em Darwin. Segundo a concepção protestante, o homem não é resultado de uma linha evolutiva gerada a partir


19 de um ancestral comum com o macaco, e sim uma criação divina, feita à semelhança do criador Deus. Seria em função desse aspecto de similaridade que o ser humano teria herdado os dons e talentos para as artes. a arte sempre traz seu significado e revela algo além do seu. A criação do cosmo revela um Criador bom e belo e também vimos que temos essa “mesma” capacidade criativa que a nós foi dada por ocasião da nossa criação à imagem e semelhança de Deus. (ANDRADE, 2005, p. 58)

Em sua monografia de Bacharelado em Teologia, Daniel Luiz Rodrigues de Andrade traz um capítulo tratando do “uso das artes nas Escrituras”, extraindo principalmente dos livros do Velho Testamento referências para consolidar sua defesa sobre a origem divina da arte e sua aplicação no relacionamento do povo de Israel com Deus. Recorrendo aos textos a que se refere o autor, encontramos passagens que citam o trabalho escultural (em bronze, prata e ouro) dos ourives e o dos artesãos, tomado como base elementar da adoração a Deus, sobretudo na ornamentação e nos cuidados com o Tabernáculo (lugar de adoração). Em seguida, apresentam-se a música e a dança, nessa ordem; a primeira como atitude enaltecedora, de louvor à figura do Senhor de Israel; a segunda como expressão de alegria diante da presença de Deus ou do Espírito Santo de Deus, como observamos na ilustração da passagem do livro de Crônicas, capítulo 15, verso 8: “Davi e todos os israelitas iam dançando e cantando com todo o vigor diante de Deus, ao som de harpas, liras, tamborins, címbalos e cornetas” (BÍBLIA, Sagrada, 2000, p.508). Mas também há referências de uma terceira base, o teatro, não praticado como arte, mas intrínseco nas alegorias e rituais aplicadas no ensino das boas novas (o evangelho) pelo próprio Jesus Cristo. Adriana Pinheiro, autora do livro Adoração criativa (2008) formula que, além das ilustrações por parábolas comuns nas pregações de Jesus, em sua vida missionária, outra referência ao teatro estaria na encenação da Santa Ceia entre o mestre e seus discípulos, um ritual deixado por Jesus para se cumprir por todos os crentes após a sua morte: “Fazei isso em memória de mim”. (BÍBLIA Sagrada, 2000, p. 1433)


20

4.3.

Arte e religião: imersão na História

Ultrapassando a discussão “criacionismo x evolucionismo’, da beleza do fiat lux narrado no livro de gênesis ou das intrigantes pinturas rupestres como evidências da criação artística do homem numa etapa de evolução, passamos a outro patamar do estudo das artes: sua íntima relação com as religiões e o misticismo em civilizações antigas orientais, como ainda se observa na atualidade, e a arte da igreja primitiva de Cristo e seus desdobramentos no Ocidente, com a legalização da religião cristã em Roma no ano 313 d.C., depois tornando-se estatal em 380 d.C. O Egito, civilização mediterrânea politeísta formada entre 3.000 e 2.500 a.C., revela ainda hoje boa parte das realizações materiais arcadas em suas crenças religiosas. As pirâmides - verdadeiros templos funerários, e os túmulos são algumas das evidências da prática de preservação dos corpos em virtude do mito da reencarnação dos reis, estes legitimados como representações divinas. Além do culto aos mortos, a arte egípcia carregava ainda uma segunda intenção, a de glorificação dos deuses. (JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996, p. 22-25) Encontramos nas estruturas internas da monumental arquitetura egípcia, artigos esculturais como representações da figura dos faraós e imagens dos deuses, formados em pedra. Segundo pesquisadores, os egípcios acreditavam no poder das representações e por isso pensavam que as esculturas eternizariam os mortos. As tumbas, por sua vez, eram personalizadas e personificadas em relevo. Os sarcófagos eram decorados com pinturas minuciosas. Conhecida por sua essência antropocêntrica, a Grécia Antiga também apresentava o par dicotômico arte-religião. Semelhante ao Egito, sua arquitetura remanescente declara sua veia religiosa nos imponentes templos do passado. A mitologia grega marcou profundamente a história daquela civilização, que atribuíam a vários deuses o poder sobre porções do universo e fenômenos naturais (céu, mares, terra etc.) e predicados humanos (amor, morte, sonho etc.). (JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996, p. 46-66) A relação da crença da arte com os deuses mitológicos é notável na escultura, nas pinturas de vasos usados em rituais, e no teatro, grande “invenção” grega. É proeminente a maestria ou majestade da Grécia em todas as artes, da pintura ao teatro e


21 à música, ancoradas em enredos religioso; no caso da pintura e escultura, personificadas em figuras com características humanas. Em Roma, a arte também é imputada aos templos erguidos a deuses como Júpiter e Saturno, além do Panteão que se configurava como centro dos cultos politeístas da Roma Antiga. Seguiu-se ao período da Arte Romana, o nascimento da Arte Paleocristã, produzida pelos primeiros discípulos/seguidores de Jesus Cristo, perseguidos no Império por promulgarem seu mestre como Filho de Deus, o Salvador. (cf. JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996, p.70-101) A perseguição aos primeiros cristãos (termo empregado posteriormente, na Antioquia), os obrigou a viverem em clandestinidade; quando morto algum deles, o corpo era enterrado em cemitérios ou catacumbas subterrâneas “visando evitar profanação dos túmulos” (BILHEIRO, 2008, p. 63). Alguns historiadores afirmam ter sido tais catacumbas lugares de culto para aqueles cristãos primitivos, mas Bilheiro (op. cit., p. 63) discorda, atestando que os locais subterrâneos eram “somente para sepultamentos dos mártires e dos fiéis comuns”. A pintura e escultura em baixo relevo eram constantes na Arte Catacumbária, como veio a se chamar. Tratava-se de uma arte semântica8, como alega Bilheiro (2008), dada a sua raiz simbólica nas referências secretas a Jesus, ora representado por um peixe, ora representado pelo pastor de ovelhas ou um cordeiro. Avançando em direção aos períodos seguintes da linha do tempo da história das artes, veremos ainda a relação arte-religião das civilizações muçulmanas, no culto a Maomé. No entanto, o período que precede a arte islâmica e todos os posteriores são dominados pelas artes cristãs: da Arte Bizantina até a Arte Gótica. No ano 380 d.C., o imperador Diocleciano fundou o cristianismo oficial em Roma. No século IV, o Estado, nas mãos de Constantino, muda sua capital para Bizâncio, chamada Constantinopla. É lá que se dá o surgimento da Arte Bizantina. Neste período, mais do que antes, institui-se uma arte consolidada pela religião. A arquitetura das igrejas era primordial, construídas em altas proporções, com grandes cúpulas e decoração imponente. O mosaico era um dos recursos artísticos mais aplicados, representando principalmente passagens bíblicas. Percebemos, pelos relatos históricos, a/em princípio a rejeição da escultura, entendida como forma pagã, para

8

Bilheiro(2008) chama de arte semântica, toda a arte que exige uma interpretação de significados. Representações baseadas em simples formas geométricas.


22 tanto usada apenas com formas em baixo relevo. (cf. JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996) A religião oficial do Império Romano definiu os principais valores da Idade Média, constituindo uma sociedade teocêntrica, sendo a igreja a realização do divino em meio aos homens. Assim segue a Arte Românica, depois a Gótica, fomentando a arquitetura, a pintura, escultura da época, baseada na opulência e magnitude. Bilheiro (2008, p. 63) demarca aspectos da transição da Arte Paleocristã até os sucessivos períodos da arte-religião em Roma. Para o autor, ocorreu o enquadramento do fazer artístico, no primeiro momento delegada aos cristãos perseguidos, ao ceio do cristianismo oficial, estatal. De acordo com o ele, a arte foi conduzida de um nível informal, praticada pelos primeiros cristãos (não abastados ou pobres) para o nível paradigmático, estilizado e pomposo. assim como a própria religião que, ao mostrar seu poder e seu potencial, foi incorporada pelos poderosos do Império, sua arte também o foi. O que, a princípio, foi uma arte tosca, praticada sem técnicas por homens simples, acabou se tornando um estilo elaborado e próprio à época da ascensão do Cristianismo, e, obviamente, passou a ser executada por técnicos e artistas importantes e, por vezes, de renome. (BILHEIRO, 2008, p. 63, grifo do autor)

Devido a isso, a arte cristã dos primeiros séculos é classificada em duas divisões: Arte Paleocristã ou Catacumbária, desenvolvidas pelos recém-convertidos, e a Arte Triunfal, tomada pela religião oficial (Bizantina e Românica, no oriente e no ocidente, respectivamente). 4.4.

A arte e o protestantismo, hoje e outrora

O cuidado inicial da Igreja Romana com as imagens, sobretudo as esculturais, tentando-se evitar a repetição do paganismo no ceio eclesiástico, não resistiu por muito tempo, e culminou na apropriação das obras materiais como intermediação ao Sagrado, quando não propriamente colocado em substituição. O estilo gótico de arte introduziu a escultura a partir de trabalhos de artistas renomados que imputavam em suas obras traços humanos definidos, exatamente como o antropomorfismo grego. (JANSON, H. W.; JANSON, A., 1996, p. 140-146)


23 Frente a essa doutrina iconográfica, e por outras divergências internas à Igreja Católica, o monge Martinho Lutero insurgiu-se, provocando a ruptura da Instituição e a fundação do protestantismo como religião cristã genuinamente seguidora do Livro Sagrado. A Reforma Protestante, concebida por oposição ao catolicismo oficial, despiu-se do materialismo comum aos rituais litúrgicos da Igreja Romana e adotou uma postura contra o uso de imagens, precavendo-se da idolatria, um dos pecados condenados pelos Dez Mandamentos de Deus, escritos por Moisés, os quais são apresentados em rol no Antigo Testamento. O processo de construção de uma cultura de negação do catolicismo e de racionalização e interiorização da fé por meio da conversão levou os primeiros evangélicos a optarem pela recusa das tradições e práticas litúrgicas herdadas da história do cristianismo, que inclui o repúdio ao uso da imagem como mediação material e simbólica na vida das igrejas. A linguagem dos gestos, dos símbolos e das imagens litúrgicas passou a ser associada ao catolicismo e, por isso, descartada. O privilégio estava reservado para a palavra falada. (CUNHA, 2007, p. 41)

Esse foi o primeiro momento do protestantismo no mundo, caracterizado, como descreve Cunha (2007), pela reserva moral, pelo sectarismo, ou seja, pelo ínfimo envolvimento social e cultural nas comunidades nas quais estavam inseridos os primeiros fiéis. Esse comportamento perdurou muito tempo. Até chegar ao momento atual da religião evangélica, as mudanças foram paulatinas e observadas com rigor. No puritanismo da Inglaterra era quase nulo o lazer, o divertimento. No Brasil, o protestantismo se resguarda da contaminação com a cultura nativa, conforme descreve Cunha (2007, p. 179): A ética puritana de restrição de costumes no Brasil representava uma forma de comunicar a negação do catolicismo e marcar a identidade protestante. A abstinência da bebida alcoólica, do fumo, da participação em festas dançantes e populares, em especial o Carnaval, e dos divertimentos populares como o teatro, o cinema, a música popular deveria dizer ao mundo que os protestantes eram diferentes. (CUNHA, 2007)

A abertura do protestantismo ao diálogo cultural e ao uso das artes compreende uma transição que vai dos anos 30, com a chegada o pentecostalismo estadunidense, a


24 expansão no meio urbano na década de 50 e a influência do Movimento de Jesus (EUA), na década de 70, até a concepção ou explosão da “cultura gospel”9 na década de 90. Já entre 60 e 70, a música evangélica, antes exclusivamente composta por hinos tradicionais, passaram a produzir os corinhos10, e depois foi apropriada pelos jovens evangélicos, seguindo a linha do Movimento de Jesus, daí por diante marcada pela maior abertura aos ritmos nacionais e internacionalmente populares (CUNHA, 2007). A partir da década de 90, demarcada pela “explosão gospel”, diversos outros processos de consolidação e modernização da “cultura gospel” são desencadeados, definindo um perfil híbrido das atividades socioculturais do segmento cristão evangélico, com novos espaços e formas de se vivenciar o Sagrado, a relação com Deus. 4.5.

A crise da arte: a perda da “aura”

Desde o final do século XIX, em Hegel, até a contemporaneidade, passando por W. Benjamin, questiona-se a respeito do possível fim da arte, em razão de um esgotamento de sua função ou da perda de sua aura, como prefere o segundo teórico (Hegel e W. Benjamin: variações em torno da crise da arte na época moderna, 2004). A crise da arte discutida pelos dois autores, em momentos diferentes, compreende um percurso histórico da arte-religião, partindo da fundação da Igreja Romana, cujos cânones foram confrontados na Idade Moderna pelo advento do Renascimento. A arte posteriormente é achada num estágio chamado por alguns pensadores de “libertação da arte”, ou seja, quando esta começa a ser desapropriada da temática religiosa. Segundo Werle, em Hegel e W. Benjamin: variações em torno da crise da arte na época moderna a crise da arte instaurou-se na modernidade, por meio da debilidade espiritual e religiosa causada pelas novas técnicas e pelo conceito humanístico empregado. Os artistas/criadores passaram, dali por diante, a trilhar uma busca pelo “aspecto sensível” de suas obras, na intenção de torná-las auto-suficientes, dotadas de conteúdo tocante. Estabelecia-se a oposição entre a religião e arte; esta última passava a receber posição privilegiada dada a sua “super-exposição”. (WERLE, 2004, pág. 37 Antes disso, Hegel (WERLE, p. 2004, p. 37) afirma ter sido a subjetivação/sensibilização das obras proporcionada pela transformação ocorrida na 9

Expressão adotada por Cunha (2007). Pequena evolução na música cristã, com a introdução de instrumentos de sopro e de corda, antes não permitidos. 10


25 própria religião romana. Para ele, a relação objetiva do sujeito-observador, antes intuitiva (no sentido racional) deslocou-se para a relação de contemplação subjetiva, em que o sensível emana da obra e não do sujeito. Podemos atestar, nos remetendo a Hegel (cf. WERLE, p. 2004), que a arte apresenta um conteúdo concreto e apreensível, e este conteúdo é decodificado pelos órgãos sensoriais humanos (visão, audição, tato), e só quando a nossa razão é capaz de compreendê-lo, a mensagem ou seu significado é despertado também no nível espiritual individual. O efeito pode ocorrer em coletividade. Entretanto, em diferentes níveis de interpretação e de sensibilidade. Num grupo de pessoas, pode ocorrer de a compreensão não ser alcançada de igual modo por todos, logo a experimentação espiritual também diferiria. A questão do nível espiritual presente ou deslocado na arte foi objeto de pesquisa sobre a relação entre experiência religiosa e experiência estética. Dentre as percepções obtidas, Paiva et al. concluem que: Funcionalmente, há reconhecido paralelismo entre arte e religião. Ambas estão em busca de algo menos palpável, do absoluto; ambas provocam reverência; o produto da arte é portador de uma verdade religiosa e sagrada, a verdade do artista; os atributos tradicionais de Deus se encontram no artista e na obra. (PAIVA et al., 2004, p. 8)

Segundo Scaléa, em artigo homônimo à obra de Fischer (1987), afirma que as obras de arte “Elevam-no [o homem] ao prazer intelectual e espiritual. Instigam sua imaginação e proporcionam o insight, ou seja, dedução, discernimento, percepção e introspecção” (2008, p. 3).


26 5.

Metodologia 5.1.

Pré-produção

A fase inicial deste projeto se constituiu de uma densa pesquisa em dois percursos teóricos aparentemente paralelos – arte e religião, em busca das evidências de sua antiga relação. A pesquisa foi o pressuposto para a elaboração do projeto, sendo crucial para a definição do tema e justificação da proposta. Na reconstituição do traçado histórico da arte-religião, nos baseamos em compêndios da história da arte e artigos bem fundamentados neste quesito. Outro estudo tomado por nós, trata da especulação acerca das novas relações do tema na contemporaneidade, em específico o eixo delimitado: artes cristãs no segmento evangélico. Magali do Nascimento Cunha, em sua publicação A explosão gospel: o olhar das ciências humanas sobre o cenário evangélico no Brasil, é quem nos traz com excepcionalidade e riqueza de informações o arcabouço da “cultura gospel”, música e artes cristãs, remontando inclusive aos primeiros tempos de protestantismo nos Estados Unidos (abordagem passageira, remetendo às origens do gospel) e no Brasil, delineando o percurso desde a resistência à realidade sociocultural nativa até o processo de inculturação do moderno em tempos contemporâneos. Além de recorrer aos livros e artigos referentes ao tema aqui proposto, a pesquisa nos serve ainda como suporte teórico para as investidas técnicas e de campo, seja na captação de imagens ou na execução das entrevistas, e por isso defendemos que ela seja continuada através da etapa seguinte, da produção propriamente. Também nos debruçamos sobre bibliografia teórica e técnica sobre o gênero documentário, de fundamental importância para a delimitação do conceito e desenho de produção elaborado aqui. Para a etapa das entrevistas, foi primordial a incursão em textos de comunicação interpessoal, entrevista jornalística e dialogia. Além do trabalho de pesquisa, acompanhamos o calendário de eventos gospel nas cidades onde serão as possíveis locações (João Pessoa e Campina Grande). Foram nestas duas localidades que selecionaremos os grupos que serão entrevistados para o documentário e são nestas localidades também onde temos observado frequentes e importantes iniciativas artísticas do meio evangélico. É preciso atualizar-se constantemente quanto a programação “cultura gospel” nas cidades citadas e outras


27 possíveis, catalogando os respectivos eventos e avaliando a viabilidade de abordagem no documentário. Posteriormente à finalização do levantamento dos grupos, deverão foram estabelecidos os contatos com os grupos ministeriais e interdenominacionais locais e os realizadores dos eventos considerados viáveis. Dentre os entrevistados, além das lideranças dos grupos de arte cristã, buscamos contar com depoimentos de artistas gospel profissionalizados na área, e, a partir desse lugar de fala, podermos conhecer a compreensão do Cristianismo sobre o fazer artístico, sua origem e finalidade. O objetivo é chegarmos ao cerne dialógico possível numa entrevista (cf. MEDINA, C., 1990). Por se tratar de um tema contemporâneo, a maior parte das imagens foi oriunda de captação dos eventos previstos, mediante a autorização dos respectivos responsáveis. Entretanto, recorremos a materiais de arquivo sempre que encontramos disponíveis, junto aos entrevistados e personagens tratados, itens filmográficos, fotográficos, e outros, que puderam ser acrescentados ao documentário, proporcionando maior riqueza à narrativa. Como já mencionado, utilizamos de produtos de autoria das companhias e grupos enfocados no filme, cujos espetáculos foram reproduzidos em DVDs. Mediante a aprovação do projeto. Tivemos o apoio de colegas profissionais e do próprio curso de comunicação para eventuais necessidades durante a produção, especialmente no quesito entrevistas. Além da dupla de discentes, autores deste trabalho de conclusão de curso, a equipe do projeto conta com o apoio de duas outras estudantes de comunicação social: Eldia dos Santos, habilitação jornalismo, 1º período e Najara Xavier, habilitação Relações Públicas, 5º período. Ambas irão desempenhar a função de assistente de produção.

5.2.

Produção

Em maio definimos um pré-roteiro e os grupos selecionados, sempre buscando abranger a maior quantidade de gêneros artísticos possíveis e prezando pelo ineditismo e qualidade dos grupos. Definimos um cronograma de trabalho que foi cumprido de maio a julho, buscando captar imagens de todos os grupos em seus ambientes de ensaio, a fim de


28 deixá-los mais a vontade com a câmera antes das entrevistas e também para conhecer melhor o grupo e saber quais personagens poderiam ser melhor aproveitados. Sendo que em maio e o início de junho foram inteiramente dedicados aos ensaios e a partir da segunda metade de junho partimos para as entrevistas tentando construir uma história interessante, buscando colher os melhores depoimentos de cada personagem, de cada grupo. Diversas foram as locações utilizadas para as captações das imagens, como; teatros, estúdios, templos e locais de ensaio. Todos os locais foram previamente selecionados e escolhidos de acordo com o tema do grupo e sua afinidade com o ambiente. a.

O grupo de teatro Cia Abner, por exemplo, foi entrevistado no Teatro Santa Roza, por ser um ambiente mais acolhedor e de completamente de acordo com o tipo de arte que o grupo desempenha.

b.

Por se tratar de um grupo musical, o local escolhido para o grupo de louvor Tenda do Encontro foi o estúdio Shamar Pro Áudio, além da proximidade dos integrantes com o local, pois foi nele que foram feitas as captações de áudio do DVD “Adorar para Transformar”.

c.

A Cia Corpo e Luz foi entrevistada em sua própria sala de ensaio, por acreditarmos que este seria o lugar que melhor contextualizaria um grupo de dança.

d.

A Banda Alumiar foi entrevistada em seu quarto de instrumentos, local que fica na residência do casal Gilbervânio José da Silva e Niliana Alves, sanfoneiro e vocalista da banda, respectivamente.

e.

As locações utilizadas nas entrevistas do grupo Boca na Rua foram as próprias dependências da MIRR (Ministério Internacional Resgate e Regeneração)

f.

O Ministério de Louvor da Igreja Betel Bancários foi entrevistado no próprio templo da igreja, pois é lá que os ensaios do grupo acontecem.

Todas as perguntas feitas aos entrevistados foram previamente discutidas pela dupla e desenvolvidas de acordo com o livro de Medina (1990). O roteiro foi definido tendo como ponto de partida as entrevistas já feitas, tentamos produzi-lo de forma a dar espaços parecidos aos grupos, tentando não privilegiar nenhum tipo de arte e buscando contar uma história interessante e dinâmica. Sempre mostrando imagens dos ensaios e das apresentações dos grupos.


29 Os equipamentos para o trabalho de captação e entrevistas. Foram as duas câmeras digitais Mini DV/DVCAM disponíveis no Departamento de Comunicação (Decom) da UFPB. Algumas imagens já haviam sido captadas, ao longo da pesquisa, numa Câmera Samsung S1050 10.1 MP, extensão de vídeo: MPEG 4/AVI.. Os áudios das apresentações e eventos dos quais fizemos imagens, foram capturados pelo próprio equipamento de vídeo utilizado. Depois que concluímos todas as captações de imagens nos eventos relacionados acima e as entrevistas com os respectivos responsáveis e pessoas de interesse, partimos para a fase de edição e finalização do vídeo. Procedemos com a edição do documentário em ambiente doméstico. 5.3.

Pós-Produção

Diante do fato de termos pouco tempo disponível desde a junção da dupla, adotamos o procedimento de avançarmos para os processos de pós-produção em paralelo às gravações que ainda não haviam sido executadas, nos casos em que dependemos da agenda de apresentações dos grupos. A medida que finalizávamos as tomadas e/ou entrevistas num dia, consecutivamente fazíamos as capturas das imagens no nossa ilha de edição não-linear ou digital, que, como todo o processo de edição e finalização, foi realizada em ambiente doméstico. Todas as fitas (06 ao todo) foram capturadas no computador pessoal do discente Douglas, a partir de uma placa de extensão firewire/IEEE 1394, utilizando-se da própria câmera de vídeo do Departamento de Comunicação que esteve em nossa posse. O aplicativo mediador dessa tarefa foi o mesmo empregado na edição do material, o Adobe Premiere Pro 2.0. O PC usado possui as seguintes configurações: Pentium IV, 2.4 GHz, 768 MB de RAM, HD interno de 40 GB, placa de vídeo 128 MB. Garantida a máxima qualidade de vídeo DV (Digital Vídeo), cada minuto de imagens gerou em média 215 MB. Para armazenamento desses arquivos, bastante “pesados”, priorizamos o uso de um HD externo com capacidade para 250 GB de armazenamento, com mais da metade desse total disponível. Esse recurso facilitou em grande medida o nosso trabalho, uma vez que a edição ocorreu não só na estação já citada, mas também na casa da discente Camila, em um notebook, com as seguintes configurações: Dual Core, 1.86 GHz, 2GB de RAM, 120 HD.


30 Como já foi mencionado, o aplicativo usado na edição foi o Adobe Premiere Pro 2.0. No Sound Forge 8.0, fizemos o tratamento de áudio, nos casos em que se fez necessário ajustes, e mixagens de efeitos. Os recursos gráficos (legendas e ícone) foram produzidos com auxílio dos aplicativos Corel Draw 12 e Adobe Photoshop CS2. Cada uma das fitas foi identificada e minutada, entretanto, todas elas foram capturadas integralmente, uma vez que nos comprometemos com cada grupo a devolver as imagens brutas à parte. Sendo assim, fazemos a seleção de tomadas já no Adobe, a partir dos arquivos completos. Essa etapa consistiu-se numa pré-seleção de tomadas e falas dos entrevistados que casassem com a proposta da narrativa. Algumas imagens foram captadas, previamente ao projeto, numa Câmera Samsung (modelo S1050 10.1 MP, extensão de vídeo: MPEG 4/AVI), as quais precisaram ser convertidas em formatos suportados pelo Adobe. Para tal artifício, usamos um aplicativo chamado Any vídeo converter, no qual convertermos o vídeos para o formato .mpg. Feito tudo isso, deu-se início a montagem de fato, seguindo um novo roteiro construído após a pré-seleção e baseado no roteiro inicial. A fase da montagem revelou a necessidade de algumas outras imagens, essencialmente externas para inserts e transições entre blocos, as quais foram prontamente realizadas no momento em que finalizamos as entrevistas. Já com todo o material necessário, o processo pôde ser acelerado, sendo praticamente concluído em dois dias, com todas sequencias. O vídeo “pronto” foi exportado para DVD e então assistimos para avaliação, ocasião em que identificamos alguns problemas com áudio, continuidade e com legendas. Apesar disso, apresentamos o vídeo para alguns amigos e familiares, que nos ajudaram bastante, confirmando nossas primeiras observações e contribuindo com outras sugestões. Submetido ainda ao professor orientador Wilfredo Maldonado, obtivemos tantas outras indicações. Munidos de todos os pontos questionados, tivemos um dia inteiro para rearranjar sequencias, corrigir sons, legendas e aperfeiçoar os detalhes. Nessa empreitada, novas falas e inserts foram acrescentados a favor da narrativa, os créditos até então deixados de fora, com a respectiva trilha sonora – música João Brasileiro gentilmente cedida pelo compositor e intérprete João Alexandre. A finalização do vídeo: renderização, exportação para o formato AVI, DVD; e confecção de menu de entrada do DVD; essas tarefas foram executadas no PC Pentium, com auxílio do aplicativo DVD Architect 4.0, da Sony.


31 6.

Entrevistas No desenvolvimento do documentário nos foi possível aliar ao experimentalismo

de uma produção audiovisual em comunicação o exercício próprio de nossa profissão. E há de se relevar que de maneira absolutamente distinta de todos os trabalhos com entrevistas realizados ao longo da grade acadêmica. Segundo a tradicional proposta do documentário Cinema Verdade, mas a despeito da estrutura e estilo utilizados no vídeo – obra do casamento entre forma e conteúdo, valorizamos as entrevistas como base de enunciação do tema e elucidação da narrativa. São os personagens da história que nos conduzem por ela e nos informam e explicam a respeito do contexto. Cientes da importância desse elemento na construção do documentário, tivemos o zelo de planejar, nos preparar e tornar os entrevistados preparados para o momento. Nosso objetivo era obter falas com marcas de personalidade bem definidas, livres de qualquer tensão, em outras palavras, caracterizadas pela espontaneidade de cada figura artística que tínhamos diante da câmera. Em função disso, iniciamos os contatos e acompanhamentos dos grupos previamente escolhidos, sem determinação de datas para entrevistas. Em quase todos os casos, já nos primeiros encontros com os grupos a câmera foi inserida no cenário dos seus ensaios, criações e reuniões. Pouco a pouco, por meio das conversas em off, em que explicávamos a razão do nosso documentário e colhíamos informações dos integrantes, demonstrando sempre nossa curiosidade, conseguimos deixar as pessoas à vontade diante do aparato de produção. Entretanto, em nenhuma ocasião adotamos uma postura ilusionista em nosso método de gravações, pois não pretendíamos ocultar o efeito da presença da câmera, pois sabemos que a realidade e as atitudes das pessoas alteram-se em certo grau com essa influência. Mas sabemos que a verdade não desaparece; ela apenas se enfeita. As entrevistas só ocorreram depois da etapa do contato inicial e acompanhamentos (na maioria dos casos). Primeiramente, fizemos as captações de imagens, que, junto às informações absorvidas nas conversas informais, nos deram suporte para melhor elaboração das pautas. Essas, por sua vez, consistiam em perguntas ou tópicos a respeito do tema geral “arte gospel” e de subtemas relacionados a cada categoria (dança, teatro, música, arte de rua), além de questões específicas para cada grupo e outras opinativas, de enquête.


32 Para além da pauta, em que não pudemos nos privar de perguntas elaboradas e que sugerissem respostas apropriadas ao propósito da narrativa e mesmo da edição, tivemos também a preocupação de permitir um diálogo espontâneo e mais fluido. Ficamos livres para rearranjar o roteiro da entrevista de acordo com o seu desenrolar, suprimindo itens da lista, comentando algo que despertasse outra fala do entrevistado numa ou noutra direção, expondo dúvidas etc., tudo com o propósito de tornarmos o diálogo possível. “De um extremo a outro, impõe-se uma tarefa extra à pauta: preparar a atmosfera de trabalho, proporcionar, com habilidades que têm muito de psicológicas, ou pedagógicas, uma abertura para o desbloqueio, o desarmamento. Só após desanuviar as desconfianças é que efetivamente se pode abordar a pauta” (1990, p. 30)

O diálogo difere da entrevista convencional, do jogo pergunta-resposta, da “camisa-de-força” da pauta, como menciona Medina. Para ela, a atitude dialógica do entrevistador sensibiliza o outro e ativa a liberdade expressiva, emocional do entrevistado. “O centro do diálogo se desloca para o entrevistado; ocorre liberação e desbloqueamento na situação inter-humana e esta relação tem condições de fluir; atingese a auto-elucidação”. (1990, p. 11) Do ponto de vista da elucidação, o método, se assim pode-se chamar, é eficaz para todo tipo de narrativa focada no outro, que é o caso da jornalística. Tratando de linguagem audiovisual/documental, a resposta ao estímulo dialógico é ainda mais valorizada, tendo em vista que além da comunicação verbal (fala), abarca-se um conjunto de signos não-verbais (linguagem do corpo – gestos, expressões e postura; paralinguagem e até roupas). Ou seja, um bom resultado denota não apenas fluidez no discurso, mas ainda expressividade física, gestual. Cremilda Medina aponta dois caminhos para a realização de entrevistas, um sustentado na espetacularização do homem, outro que se direciona para a compreensão e aprofundamento da/na personalidade do entrevistado. Nessa segunda possibilidade, a autora distingue cinco perfis possíveis, dos quais destacamos o perfil humanizado como aquele que define o método por nós utilizado. Assim Medina o descreve: “Ao contrário da espetacularização, a entrevista com finalidade de traçar um perfil humano não provoca gratuitamente, apenas para acentuar o grotesco, para “condenar” a pessoa (que estaria pré-condenada) ou para glamorizá-la sensacionalisticamente. Esta é


33 uma entrevista aberta que mergulha no outro para compreender seus conceitos, valores, comportamentos, histórico de vida”. (grifos da autora) (1990, p. 18)

Mediante o diálogo estabelecido, compete ao entrevistador, que então se torna espectador e ouvinte, a tarefa de observar o comportamento do entrevistado em cada uma de suas respostas, se apercebendo das características apresentadas por este em cada uma de suas falas, em que o destrave postural, a naturalidade da voz e os gestos peculiares àquela personalidade são os indicativos de uma conversa eficaz para o objetivo narrativo de um documentário. Como os comportamentos psicossociais diferem de pessoa para pessoa, as entrevistas resultaram em experiências distintas. Em alguns casos, tivemos um trabalho maior ao tentar estabelecer uma comunicação sem pressões, livre, fluida. Nessas ocasiões, fez-se necessário um espírito mais colaborativo de nossa parte a fim de destravar o entrevistado e desmistificar a presença da câmera. Foi comum a todas as entrevistas, o envolvimento dos personagens no processo de produção, organização de cenários, sugestões de imagens para captação, o que funcionou com um “período inicial de integração”.


34 7.

Grupos entrevistados 7.1.

Banda Alumiar

O grupo Alumiar surgiu com o propósito de fazer uma boa música nordestina e evangélica. A proposta do grupo é conseguir alcançar o maior número de fieis possível através da identidade cultural, com a música que eles tocam, o forró. A banda se formou naturalmente tocando, no início, esporadicamente, em alguns eventos, logo depois os integrantes do grupo foram se formalizando até que resolveram escolher um nome e oficializar de vez a Banda Alumiar. O nome Alumiar veio de uma expressão bíblica contida em Mateus capítulo 5, versículo 15 que diz assim, “não se acende uma luz embaixo de um alqueire, mas sim no velador, para alumiar todos os que se encontram na casa”. Para os integrantes do grupo este nome traz luz, e é esse um dos objetivos do grupo iluminar todos os que ouvem suas músicas. Atualmente o grupo é composto por seis integrantes, Um sanfoneiro, Gilbervânio; baterista, Jonatan; zabumbeiro, Rodrigo; contra-baixista, Gilmar; no triangulo Oswaldo Jr e a vocalista é Niliana Alves. 7.2.

Companhia Abner

A Companhia Abner nasceu em julho de 2001 durante uma reunião na Igreja Missionária do Betel Brasileiro, no bairro da Torre, em João Pessoa. Depois de formado o grupo assumindo a posição de uma companhia de teatro, com o propósito de consagração ao Senhor das Artes. A Abner atua promovendo ou participando de espetáculos. Atingindo todo tipo de público, utilizando varias técnicas para despertar a curiosidade nas pessoas. Servindo de impacto e exemplo ao mundo e buscando o aperfeiçoamento profissional. Ao longo dos seus oito anos de existência a companhia coleciona sucessos em peças teatrais. Muitos de seus espetáculos ganharam a cidade, mas sem dúvida o mais importante deles é a peça Casa do Julgamento, uma adaptação de uma peça produzida originalmente nos Estados Unidos, mas que o grupo estrela com profissionalismo a quatro anos. Aldo Galdino é o líder e diretor teatral da companhia desde que ela foi criada e o principal objetivo do grupo é levar a palavra de Deus através da arte, do teatro.


35

7.3.

Companhia Corpo & Luz

A Companhia Corpo e Luz surgiu a quinze anos e foi um dos primeiros ministérios de dança gospel do Brasil. O ministério faz parte da Primeira Igreja Batista. A Cia Corpo e Luz é responsável por um dos maiores festivais de dança gospel da Paraíba, o Festival Towdah de Artes. O principal objetivo do grupo Corpo e Luz é adorar através da dança, é mostrar o Senhor das Artes em suas apresentações. Atualmente o ministério é composto por noventa integrantes, entre crianças, jovens, adolescentes e adultos. Onde todos ensaiam aulas de balé clássico e contemporâneo. 7.4.

Grupo Boca na Rua

O Grupo Boca na Rua nasceu em 2007 com o objetivo de promover a evangelização de jovens marginalizados, jovens que estavam na rua através das artes. O teatrólogo e ator Hércules Pereira foi quem iniciou o trabalho no ministério. O grupo tem sede no Ministério Internacional Resgate e Regeneração e lá ensaiam diversos tipos de artes, para serem apresentadas em hospitais, creches, asilos, e praças da cidade. O Boca na Rua atualmente é composto de 35 integrantes que trabalham com artes consideradas artes de rua. Eles trabalham com o hip hop, teatro, skate, malabarismo e pirofagia. O nome do grupo surgiu no intuito de não relacionar o grupo diretamente com a religião, queriam um nome neutro e que ajudasse a divulgar a arte de rua e foi assim que o nome Boca da Rua foi escolhido. O grupo é interdenominacional - tem membros de diversas igrejas – mas é regido por uma Igreja própria, a Igreja MIRR. As pessoas que fazem parte grupo são todas voluntárias que se identificam com algum tipo de arte que é oferecida. 7.5.

Ministério de Louvor Betel Bancários

O Ministério de Louvor da Igreja Betel, do bairro dos Bancários, surgiu a seis anos da necessidade de se ter música na igreja.


36 No entanto eles se consolidaram como uma grande banda quando se uniram em torno de um objetivo maior, a reforma da nova Igreja, e produziram o seu primeiro grande trabalho, o CD Reconstruir . Foi um ano e meio de intensa preparação, entre aulas e ensaios para a finalização deste disco.

7.6.

Ministério Tenda do Encontro

O Grupo Tenda do Encontro surgiu em 1998, na Igreja Ação Evangélico (ACEV) em Campina Grande. No início, eram apenas dois integrantes, duas moças que não tinham experiência com a música e com o passar dos anos o grupo foi crescendo e hoje já conta com 38 profissionais quando unimos os músicos instrumentista e vocalistas além do núcleo da dança. O ministério foi instituído na igreja, na necessidade de música na igreja, pois toda ela precisa de música para embalar os louvores e os cultos. Depois do grupo consolidado foi quando eles pensaram em transcender as barreiras do templo e abranger toda a comunidade cristã. O grupo Tenda do Encontro, ao longo dos seus onze anos de trajetória colecionam três Compact Disc (CD) e um Digital Video Disc (DVD). O três CDs são: Toca teu povo, Ser como tu, e Vem louvar. Além destes o grupo tem mais outro trabalho, o primeiro DVD do grupo, chamado Adorar para transformar. Este último foi o mais repercutido, segundo o grupo, muitos fiéis dentro e fora do país já comentaram sobre o DVD. O nome do grupo veio do versículo bíblico contido em Êxodo, capítulo 33, versículos de 7 a 11, que diz: “Moisés montava a tenda do encontro para se encontrar com Deus”. De acordo com a bíblia quando Moisés se encontrava com Deus ele atraia as outras pessoas e quando ele entrava naquele lugar, vinha uma nuvem de glória que chamava a atenção de todo o acampamento e todos que passavam iam a entrada da tenda e adoravam a Deus. E com o objetivo de promover a adoração ao Senhor Jesus Cristo, o Senhor das Artes, é que foi escolhido o nome do grupo.


37 8.

Considerações finais O vídeo documentário Senhor das Artes quer mostrar sobretudo, que a “cultura

gospel” está enraizada no âmbito do cotidiano, ela se atualiza junto com a evolução dos estilos, das produções artísticas. Os grupos apresentados neste documentário provam com profissionalismo e competência que não têm nada de amador, apesar de poucos terem formação artística. Tentamos mostrar que é possível falar de arte cristã sem ser piegas. O desafio de realizar este trabalho além de um passaporte da vida acadêmica para a vida profissional, foi de enorme valia para o aprimoramento das técnicas aprendidas na academia. Nele pudemos exercitar tarefas comuns ao nosso cotidiano de futuros jornalistas, como a realização de entrevista e de edição de imagens e conteúdo. E principalmente, nos proporcionou uma vivencia com a produção áudio-visual, que sempre foi um desejo comum a estes dois discentes.


38 9.

Referências bibliográficas

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