CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS Autor – Rafael S. F. Pereira
Universidade Anhembi Morumbi
Universidade Salvador
Janes Fidelis Tomelin Diretor de EaD
Adriano Lima Barbosa Miranda Diretor de Educação Corporativa e Novos Projetos
Fabiano Prado Marques Diretor Acadêmico – Escola de Engenharia e Tecnologia Conrad Elber Pinheiro Revisor Técnico
Universidade Potiguar Barney Vilela Coordenador Geral do Núcleo de Coordenação a Distância Catarina de Sena Pinheiro Diretora da Escola de Engenharia e Ciências Exatas
Rafael Gonçalves Bezerra de Araújo Diretor da Escola de Engenharia e TI
Rede Laureate Internacional de Universidades Daniella Loureiro Koncz Coordenadora de Novos Negócios André Torres Gregório Designer Instrucional
FabriCO Projeto educacional Projeto gráfico Autoria do conteúdo Revisão ortográfica e gramatical
SUMÁRIO CARTA AO ALUNO................................................................................................................ 6 AULA 1 - OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO............................... 7 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 7 OBJETIVOS................................................................................................................ 8 1.1 Estrutura atômica dos materiais....................................................................... 8 1.1.1 Ligações atômicas primárias................................................................... 11 1.1.2 Ligações atômicas secundárias............................................................... 13 1.2 A classificação dos materiais segundo suas ligações..................................... 13 1.2.1 Materiais Metálicos................................................................................. 13 1.2.2 Materiais Poliméricos.............................................................................. 13 1.2.3 Materiais Cerâmicos................................................................................ 14 1.3 Organização dos átomos em um sólido......................................................... 14 1.3.1 Sólidos cristalinos................................................................................... 15 1.3.2 Sólidos amorfos...................................................................................... 20 CONCLUSÃO........................................................................................................... 21 AULA 2 - IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS......................... 23 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 23 OBJETIVOS.............................................................................................................. 24 2.1 Imperfeições em sólidos................................................................................ 24 2.1.1 Defeitos pontuais.................................................................................... 24 2.1.2 Defeitos de linha.................................................................................... 26 2.1.3 Defeitos interfaciais................................................................................ 27 2.1.4 Defeitos volumétricos............................................................................. 29 2.2 Difusão............................................................................................................ 30 CONCLUSÃO........................................................................................................... 35 AULA 3 - PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS...................................................... 37 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 37 OBJETIVOS.............................................................................................................. 38 3.1 Tensão e deformação..................................................................................... 38 3.2 Ensaio de tração............................................................................................. 39 3.2.1 Comportamento elástico dos materiais.................................................. 42 3.2.2 Comportamento plástico dos materiais.................................................. 44 3.3 Ensaio de flexão............................................................................................. 47 3.4 Ensaio de compressão.................................................................................... 50
3.5 Ensaio de dureza............................................................................................ 52 3.4.1. Dureza Rockwell.................................................................................... 53 3.4.2. Dureza Brinell........................................................................................ 53 3.4.3 Dureza Vickers........................................................................................ 54 CONCLUSテグ........................................................................................................... 55
INFORMÁTICA APLICADA
CARTA AO ALUNO É tarefa corrente do profissional da Engenharia selecionar os materiais que farão parte de seus projetos, sejam eles de construção civil, montagem e manufatura de produtos ou de equipamentos. Uma escolha malfeita pode causar prejuízos econômicos ou até mesmo a perda de vidas. Por isso, é essencial que o engenheiro tenha uma noção mínima sobre aquilo que está usando, de forma que possa realizar um julgamento razoável sobre os materiais presentes em seu projeto. Para isso, é necessário conhecer noções básicas dos materiais: como eles são formados, do que são constituídos, suas classificações, quais as suas propriedades e como modificá-las, como é o seu processo de produção, além das suas vantagens e desvantagens. Através destas noções básicas, você será capaz de selecionar os melhores materiais disponíveis para realização de seu projeto. Você também terá conhecimentos para aplicar tecnologias inovadoras para construir desde um dispositivo em uma linha de produção até uma ponte ou uma aeronave.
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AULA 1 Os materiais e seus diferentes níveis de organização
INTRODUÇÃO Até que seja provado o contrário, tudo o que existe no universo é formado por átomos. De suas interações, resultam substâncias completamente diferentes, tanto em aspectos perceptíveis, como cores e estado físico, quanto em características não observáveis facilmente, como a resistência mecânica e condutividade elétrica. Apesar de muito difíceis de serem vistos e mais ainda de serem divididos, os átomos já são relativamente bem compreendidos, e as teorias atuais para sua composição respondem a boa parte das dúvidas científicas e tecnológicas do mundo. Sempre que você, como engenheiro, for utilizar um material, deverá lembrar que ele é formado por inúmeros átomos e que, além de cada material possuir suas particularidades, eles ainda interagem de formas diferentes uns com os outros, fornecendo uma gama enorme de soluções de materiais de Engenharia.
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Nesta aula, você verá que os átomos possuem uma estrutura particular, que determina que tipo de interações eles terão com outros átomos para formar materiais. Também perceberá que, na maioria das vezes, existe um padrão organizacional dos átomos dentro de um sólido e, com isso, é possível estipular propriedades de um material sem a necessidade de conhecer medidas.
OBJETIVOS » » Conhecer as diferentes ligações atômicas presentes nos materiais sólidos. » » Classificar os materiais de acordo com suas ligações (metálicos, poliméricos e cerâmicos). » » Definir o que é estrutura cristalina. » » Diferenciar materiais cristalinos e amorfos. » » Calcular a densidade teórica de materiais com base em sua estrutura.
1.1 ESTRUTURA ATÔMICA DOS MATERIAIS Se você procurar definições para a palavra átomo, fatalmente receberá resultados associados ao seu tamanho ou à sua indivisibilidade. O dicionário Michaelis (2014), por exemplo, o define como uma “[...] parcela de um corpo simples, considerada outrora como indivisível e formando a menor quantidade de um elemento que possa entrar em combinação”. A ideia de uma substância simples e indivisível vem de épocas muito antigas, quando se acreditava que a divisão de um sólido poderia ser feita subsequentemente diversas vezes, até que se chegasse a uma partícula maciça e indivisível. Essa seria a menor parte daquela substância, ou seja, o átomo. Com o tempo e os experimentos realizados, foi se entendendo que o átomo não é algo maciço e muito menos indivisível. Também foi descoberto que substâncias são formadas por combinações de átomos. O conhecimento atual sobre os átomos sugere que eles são compostos por duas zonas distintas: o núcleo, formado por dois tipos de partícula: os prótons e os nêutrons; e uma nuvem de elétrons, que está situada em torno desse núcleo. Tanto prótons quanto elétrons são carregados eletricamente: os primeiros possuem carga positiva e os segundos, negativa, ambas com a magnitude de 1,6xC. É no núcleo que cada átomo se difere, gerando os diversos elementos químicos conhecidos. Essa diferenciação ocorre graças ao número de prótons existente, característica chamada de Número Atômico, que é única para cada elemento. Outra característica definida no núcleo do material é o peso atômico do elemento, que é igual à soma de prótons e nêutrons (os elétrons não são somados, uma vez que sua massa é praticamente vezes menos que a massa dos prótons e nêutrons).
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AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
Figura 1 - Estrutura do átomo. Em azul estão os elétrons; em vermelho, os prótons e, em amarelo, os nêutrons. Fonte: Shutterstock (2014).
A periferia do átomo, ou eletrosfera, foi descoberta muito depois de ele ter sido proposto. Inicialmente, em 1898, Joseph John Thomson propôs que o átomo seria composto por partículas pesadas, chamadas prótons, e partículas leves, os elétrons. Depois dele, em 1911, Ernest Rutherford concretizou esta teoria, chegando à conclusão de que os elétrons, por possuírem cargas opostas aos prótons, deveriam estar em movimentos circulares ao redor do núcleo. Utilizando artifícios da mecânica quântica, Niels Bohr aperfeiçoou, em 1920, o modelo de Rutherford, estabelecendo que os elétrons deveriam girar ao redor do núcleo em quantidades unitárias de energia, não sendo possível para um elétron ocupar estados intermediários. Com essa definição, surge uma importante característica atômica: os números quânticos principais (n), que são níveis de energia específicos designados pelas letras K, L, M, N, O, e assim por diante, ou por seus respectivos números, n = 1, 2, 3, 4, 5 etc. Esses números são importantes, pois indicam a quantidade de energia que os elétrons possuem de acordo com a órbita em que eles estão inseridos. A estes números também está associada uma quantidade de elétrons específica, responsável por estabilizar a camada elétrica do átomo. Veja a relação da quantidade de elétrons ideal para cada número quântico principal. N
ELÉTRONS
1
2
2
8
3
18
4
32
5
32
6
18
7
2
Quadro 1 - Quantidade de elétrons necessária para estabilizar os níveis eletrônicos.
Fonte: Pereira (2014).
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Para a caracterização da eletrosfera, também existe o número quântico secundário (l), que determina o subnível em que o elétron se encontra, o número quântico magnético (m) e o número quântico spin (s). Através dos dados referentes ao núcleo e à eletrosfera, foi elaborada uma classificação lógica dos elementos, chamada Tabela Periódica. Nela, os elementos estão dispostos em ordem crescente de número atômico (N), da esquerda para a direita. As linhas da tabela representam o número de níveis principais de energia (n) de cima para baixo. Já as colunas, estas representam a estrutura eletrônica dos elementos. Os elementos mais à direita são aqueles que possuem uma condição estável energeticamente, ou seja, já possuem a quantidade máxima de elétrons em sua camada mais externa (camada de valência).
Figura 2 - Tabela periódica dos elementos. Fonte: Shutterstock (2014).
Ao passear pelas colunas de um lado ao outro, o número de elétrons da camada de valência mudará, estando sempre em uma condição não estável, com exceção da última coluna à direita. Estar na primeira coluna, por exemplo, significa que o átomo possui um elétron na camada de valência, o que não é uma condição estável. Para esse caso, é mais vantajoso para o átomo doar esse elétron e possuir sua camada de valência completa, como é o caso do sódio, que se encontra na terceira linha da primeira coluna. Por estar na terceira linha, deduz-se que ele possui três níveis principais de energia, K, L, M, e o último precisaria de 18 elétrons para ficar estável, mas possui apenas um. Nesse caso, é mais fácil que o sódio perca um elétron da camada M e a camada L torne-se a mais externa, completa. Da mesma maneira que os átomos da esquerda da tabela possuem a tendência de perder elétrons, os da direita tendem a ganhar, pois precisam de poucos elétrons para que sua camada de valência atinja o equilíbrio. A facilidade de perder ou ganhar elétrons é medida através da eletronegatividade 10
AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
dos elementos. Átomos da esquerda da tabela tendem a ser eletropositivos (perdem elétrons) enquanto os da direita tendem a ser eletronegativos (ganham elétrons).
O hidrogênio é o único elemento com característica eletronegativa que está localizado na esquerda da tabela. Isso ocorre porque ele possui apenas um elétron. Perdendo-o, o elemento ficaria sem nenhum elétron em sua camada de valência.
Essa disponibilidade de ceder e receber elétrons faz com que, quando fisicamente próximos, diferentes elementos tendam a se unir, estabelecendo uma condição mútua de equilíbrio energético. Esse é o motivo pelo qual átomos estabelecem diferentes tipos de ligações.
1.1.1 Ligações atômicas primárias De acordo com a disponibilidade dos átomos envolvidos em uma ligação em doar ou receber elétrons, três tipos de ligação primária são desenvolvidas.
Ligação iônica É o tipo de ligação mais fácil de ser compreendida. Nela, dois ou mais átomos com características eletrônicas completamente diferentes se unem a fim de estabilizar sua camada mais externa. É o caso do NaCl (o sal de cozinha), em que o sódio, como você já viu nesta aula, tende a perder um elétron enquanto o cloro tende a ganhar um. Dessa maneira, tem-se a atração de cargas positivas e negativas, formando uma ligação normalmente forte.
Figura 3 - Átomos de cloro e sódio formando o sal de cozinha. Fonte: Shutterstock (2014).
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Ligação covalente Nem sempre os elementos que se unem em uma ligação possuem características eletrônicas diferentes, ou seja, nem sempre um átomo deseja doar e outro, receber. Muitas vezes, a maneira alcançada para a estabilidade eletrônica envolve o compartilhamento de elétrons. Um bom exemplo é a molécula de água, na qual os átomos envolvidos são extremamente eletronegativos, sendo mais vantajoso para ambos que ocorra o compartilhamento.
Figura 4 - Ligações covalentes entre hidrogênio e oxigênio formando a molécula de água. Fonte: Shutterstock (2014).
É importante perceber que as ligações primárias não são arbitrariamente covalentes ou iônicas, possuindo normalmente uma predominância de determinada ligação, mas ainda um pouco do caráter de outra. Uma ligação terá maior caráter iônico quando realizada entre elementos com maiores diferenças eletrônicas.
Ligação metálica É o tipo de ligação que ocorre entre elementos que possuem caráter eletropositvo (também chamados metais). Nessa ligação, os elétrons de valência são compartilhados não apenas entre dois ou três átomos, mas entre todos os átomos presentes no material. Dessa maneira, existe uma nuvem de elétrons livres no material, responsável por manter cada átomo unido a ele.
Átomo
Elétron
Figura 5 - Ligação metálica. Fonte: Pereira (2014).
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AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
1.1.2 Ligações atômicas secundárias As ligações secundárias são resultado da criação de dipolos energéticos em átomos ou moléculas. Essas ligações ocorrem porque, quando dois ou mais átomos interagem, a disposição dos elétrons ao redor deles é alterada, criando polos positivos e negativos. Uma molécula que possui polaridade elétrica poderá se unir com outra que também a possui, formando uma ligação secundária relativamente forte. No entanto, ao interagir com uma molécula apolar, a ligação entre elas será fraca. A ligação secundária mais forte que pode existir entre moléculas, é conhecida como ligação de hidrogênio, que ocorre porque o hidrogênio, ao ligar-se covalentemente com algum elemento muito eletronegativo, tende a polarizar seu único elétron na direção do elemento ligante, deixando o polo exposto praticamente como um próton, facilitando a ligação de outras moléculas polares.
1.2 A CLASSIFICAÇÃO DOS MATERIAIS SEGUNDO SUAS LIGAÇÕES A maneira com que os átomos estabelecem ligações entre si é tão importante que é capaz de criar substâncias com propriedades completamente distintas umas das outras. Um exemplo de propriedade que está relacionada exclusivamente às ligações atômicas é o coeficiente de dilatação, também chamado de coeficiente de expansão térmica. Significa, em nível atômico, o quanto um átomo se afasta do outro com o aumento da temperatura. Para essa propriedade, a força de cada ligação é fundamental, pois dificultará o afastamento dos átomos, minimizando os efeitos da temperatura. Ao se analisar os materiais no estado sólido, existe uma classificação que os separa em três categorias, de acordo com suas características resultantes de suas ligações químicas: metais, cerâmicas e polímeros.
1.2.1 Materiais Metálicos Como o nome já sugere, esses materiais são formados majoritariamente por ligações metálicas. Por serem ligações não direcionais e por compartilharem uma nuvem eletrônica muito densa, esse tipo de ligação quase sempre resulta em materiais moles – ou seja, deformáveis – e com boa condutividade térmica e elétrica, além de possuírem, normalmente, alta densidade. Esses materiais são representados principalmente pelo aço, cobre, alumínio e tantos outros metais que fazem parte do cotidiano das pessoas.
1.2.2 Materiais Poliméricos Esses materiais são formados por duas ligações distintas. Seu arranjo ocorre de tal forma que existem cadeias de ligações principais (ligações primárias) covalentes, como você pode ver na figura a seguir. Cada cadeira polimérica se une à outra através de ligações secundárias. Sua estrutura é semelhante à estrutura molecular, com átomos ligados covalentemente, porém, com muito mais átomos presentes na estrutura principal, o que faz com que os polímeros sejam, em temperatura ambiente, materiais sólidos.
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Figura 6 - Uma cadeira de um polímero. Fonte: Shutterstock (2014).
Analise as ligações covalentes presentes nas cadeias poliméricas. Esses materiais deveriam ser bastante resistentes e inflexíveis, certo? É o que você pode pensar a princípio, mas não é o que acontece. Isso porque as ligações secundárias que unem as cadeias de polímeros tornam o material deformável, inclusive reduzindo sua temperatura de fusão. Basta lembrar de objetos bem comuns no seu dia a dia, como garrafas PET, borrachas e copos plásticos. São todos polímeros, mas não são, exatamente, materiais extremamente rígidos.
1.2.3 Materiais Cerâmicos Essa classe de materiais comporta tudo o que não é classificado como metal ou polímero. Sua ligação química é bastante variável, contendo ligações predominantemente iônicas (como cerâmicas de óxido de alumínio) ou predominantemente covalentes (como o diamante). Também há as cerâmicas com ligações diversas, como é o caso do cimento. De maneira geral, os materiais cerâmicos são inflexíveis após solidificados, maus condutores de energia e possuem alta temperatura de fusão. Todas essas características são oriundas de suas fortes ligações covalentes e iônicas.
1.3 ORGANIZAÇÃO DOS ÁTOMOS EM UM SÓLIDO Agora que você já conhece os tipos de ligações atômicas e a classificação dos materiais de acordo com elas, você deve partir para um novo nível de organização dos materiais, que é a maneira que os átomos se organizam em um sólido. O grau dessa organização será determinante para as mais diferentes propriedades dos materiais. De maneira geral, os sólidos podem ser classificados de acordo com sua organização atômica em: cristalinos e amorfos.
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AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
1.3.1 Sólidos cristalinos Se você imaginar que certa substância, ao solidificar-se, possui milhões de átomos emparelhados lado a lado, de acordo com suas ligações químicas possíveis, perceberá um cenário organizado na maneira que eles estão dispersos tridimensionalmente. As diferentes formas com que os átomos se organizam são chamadas de estruturas cristalinas.
Figura 7 - Estrutura cristalina. Fonte: Shutterstock (2014).
Como é de se imaginar, um sólido cristalino está fatalmente atrelado a uma estrutura cristalina, ou seja, a maneira com que os átomos se organizam para formá-lo. Por sua vez, a estrutura cristalina de um material é definida como a repetição em longo alcance de uma unidade de organização atômica, chamada Célula Unitária. Você já sabe que os átomos possuem sua estrutura atômica, formada por núcleo e eletrosfera, que definirá quantas e como serão as ligações químicas realizadas com outros elementos (ou entre átomos do mesmo elemento), certo? Estando diversos átomos ligados, eles poderão, no estado sólido, formar uma estrutura organizada, chamada célula unitária, que será repetida por todo o material. É assim que se forma a estrutura cristalina.
Para descrever células unitárias, é utilizado comumente o modelo de esferas, o qual representa cada átomo como uma esfera rígida.
Na imagem a seguir, você pode observar quatro células unitárias bastante comuns para materiais metálicos.
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cúbica simples
cúbica de corpo centrado
cúbica de faces centradas
hexagonal compacta
Figura 8 - Células unitárias. Fonte: Shutterstock (2014).
A primeira estrutura é conhecida como cúbica simples (CS), em que os átomos estão arranjados de maneira a formar um cubo em que o centro de cada átomo fica em cada um dos vértices. Essa estrutura deve se repetir tridimensionalmente, ou seja, em cada uma das oito faces do cubo existirá outro cubo adjacente, criando uma rede de cubos que formará a estrutura cristalina do material. Por essa razão, cada átomo presente nos vértices é dividido em oito e, ao se calcular o número de átomos que existem em uma célula unitária do tipo cúbica simples, basta multiplicar o número de vértices de um cubo por 1/8 de cada átomo presente no vértice, resultando em 1 átomo por célula unitária. Agora você já sabe que, em uma célula unitária do tipo cúbica, sempre existirá ao menos um átomo inteiro presente. O segundo modelo de célula unitária mostrado na imagem é conhecido como cúbico de corpo centrado (CCC), pois, além dos átomos presentes nos vértices do cubo, também existe um átomo localizado exatamente no centro. Para calcular a quantidade de átomos em uma célula deste tipo, basta utilizar a regra descrita anteriormente e acrescer o átomo que se encontra no centro do cubo. Por não estar compartilhado com outra célula unitária, o átomo central deve ser contado como inteiro, resultando em dois átomos para a célula CCC. As outras duas estruturas exibidas são conhecidas como cúbica de faces centradas (CFC) e hexagonal compacta (HC), que possuem, respectivamente, quatro e seis átomos em seu interior.
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AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
Perceba que os termos “estrutura cristalina” e “célula unitária” muitas vezes se confundem. Uma estrutura cristalina do tipo CCC é formada por diversas células unitárias CCC.
Além do número de átomos que constituem uma célula unitária, outros parâmetros podem ser analisados nesse tipo de estrutura, como o número de coordenação, o parâmetro de rede e o fator de empacotamento da estrutura. O número de coordenação é a quantidade de átomos em contato com determinado átomo em uma célula unitária. Para as estruturas do tipo CCC, esse número é 8. Já para as CFC e HC é 12, enquanto para as CS é 6. O parâmetro de rede, utilizando como exemplo uma estrutura cúbica simples, é o comprimento de uma aresta a formada pelo raio atômico dos dois átomos posicionados nos vértices adjacentes do cubo. Assim, a será igual a 2R (considerando que os átomos do vértice são iguais). Já as outras estruturas cúbicas necessitam de operações geométricas para o cálculo de a, pois os átomos presentes nos vértices do cubo não estão em contato entre si.
Quando as células unitárias não são cúbicas, use outras letras para indicar diferentes arestas.
A figura a seguir exibe a vista de uma das faces de uma célula unitária CFC, na qual é possível observar que as arestas do cubo não são formadas por átomos em contato, sendo necessário realizar uma operação geométrica simples para que se obtenha o valor de a.
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R
2R
a
R a
Figura 9 - Face de uma célula CFC. Fonte: Pereira (2014).
Nesse caso, os átomos presentes na face da célula unitária estão em contato com os átomos dos vértices. Assim, o valor de a pode ser determinado através do teorema de Pitágoras, em que a diagonal do quadrado que forma a face da estrutura será a hipotenusa do triângulo, e os catetos serão as arestas, que é o que você precisa descobrir. Observe bem a figura e perceba que a diagonal é formada pelo raio de um átomo presente no vértice da estrutura mais dois raios do átomo presente na face e o raio de um terceiro átomo do vértice, sendo: d = 4R. Utilizando o teorema de Pitágoras: d2 = a2 + a2 (4R)2 = 2a2 a = 2R√2
Para encontrar a, você sempre terá de buscar uma maneira de relacionar as arestas da célula unitária e a direção em que os átomos estão em contato, de forma e encontrar uma relação direta com R.
O fator de empacotamento atômico (FEA) é a densidade de átomos presentes em uma célula unitária, ou seja, o volume total de átomos em uma célula, divididos pelo volume da célula em si. Por exemplo, o volume de uma célula do tipo CFC é dado por: 4/3 3 FEA = 4 πR a3
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AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
Agora que você já conhece o valor de a, é possível calcular o FEA para a estrutura CFC, que será: 4/3 3 FEA = 4 πR (2R√2)3
Com isso, chega-se ao número de 0,74, que é a maior densidade atômica possível para estruturas metálicas. Você já sabe calcular a densidade atômica de uma célula unitária, mas também existe outra densidade possível de ser calculada utilizando o conceito de estruturas cristalinas: a densidade do material. A densidade de uma substância, ou massa específica, é sempre dada através da razão massa sobre volume. Para calcular a densidade teórica de um material, basta que você conheça sua célula unitária e os átomos que a compõem. A massa da célula unitária será o número de átomos que nela existem vezes a sua massa molar. Já o volume será o mesmo volume calculado no exemplo anterior, que foi utilizado para o cálculo do fator de empacotamento. Dessa maneira, a densidade pode ser escrita como: ρ = nA VNa em que n é o número de átomos em uma célula unitária, A é a massa molar dos átomos, V é o volume da célula (a3) e Na é o número de Avogadro (6,02x1023), utilizado para que o valor seja obtido por grama de material. Utilizando como exemplo o alumínio, que possui uma estrutura do tipo CFC, você pode calcular sua densidade teórica utilizando os dados: n=4 A = 26,98 g/mol V = (2R √2 )3 R = 1,43x10-8m ρ=
4 ∙ 26,98 (2 ∙ 1,43 ∙ 10-8 ∙ √2)3 ∙ 6,02 ∙ 1023
O resultado é uma densidade teórica calculada de 2,7093, que é muito próxima à densidade medida através de métodos convencionais (como Arquimedes). Nem sempre os materiais possuem a organização que você acabou de conhecer. Alguns deles, mesmo no estado sólido, permanecem em um estado de desordem atômica. São os chamados sólidos amorfos.
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1.3.2 Sólidos amorfos Quando determinada substância se encontra no estado líquido ou gasoso, não existe a organização que você conheceu anteriormente, ou seja, não há ordem de longo alcance. Nesses casos, os átomos, ou as moléculas, possuem liberdade de movimento, o que faz com que não existam células unitárias. A maioria dos materiais, quando submetidos ao estado sólido, organizam-se espontaneamente formando estruturas cristalinas. Porém, existem alguns que, ao se solidificarem, mantêm sua desordem atômica e, com isso, não formam estruturas organizadas de longo alcance. São os sólidos amorfos, ou vítreos, que possuem como principal representante o vidro, que está inserido na categoria de material cerâmico. Outra classe de materiais amorfos inclui as borrachas, que possuem estruturas poliméricas. Muitas pessoas ainda pensam que o vidro é um estado intermediário entre o sólido e o líquido. Essa ideia surgiu porque os vitrais de antigas igrejas possuíam sua base mais espessa que o restante da peça, fazendo com que as pessoas acreditassem que o material havia escoado. Com investigações, foi descoberto que, na verdade, a causa dessa discrepância era o processo de produção utilizado na época, que deixava ao menos uma extremidade das placas de vidro mais espessa que o restante. Isto demonstra que sólidos amorfos são realmente sólidos, uma vez que não escoam em temperatura ambiente.
Silicon atom Oxygen atom
(a)
(b)
Figura 10 - (a) Sólido cristalino. (b) Sólido amorfo. Fonte: Willian D. Callister Jr (2008).
Para esses sólidos, os cálculos teóricos são mais complexos. Por não possuírem estrutura definida, eles não têm, por exemplo, uma temperatura de fusão específica, sendo que sua mudança de estado físico é caracterizada por uma temperatura de transição vítrea.
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AULA 1 – OS MATERIAIS E SEUS DIFERENTES NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO
Assim como um material pode apresentar diferentes ligações químicas, é comum encontrar materiais parte cristalinos e parte amorfos. Diversos polímeros e cerâmicas são compostos de fases cristalinas e fases vítreas, aliando propriedades e características dos dois tipos de estrutura. Um exemplo é o dos materiais vitrocerâmicos, comumente utilizados em fogões de bancada.
CONCLUSÃO O átomo é a menor partícula a ser estudada no universo da Engenharia. Nesta aula, você viu que o átomo é dividido em núcleo, que é como se fosse o seu “DNA”, e a eletrosfera, responsável pela interação entre elementos. A interação entre átomos ocorre através de ligações químicas, que podem ser primárias – quando os átomos interagem através de seus elétrons – ou secundárias – quando os átomos ou as moléculas interagem através de forças eletromagnéticas geradas pelo deslocamento de elétrons. Quando átomos formam ligações químicas de maneira a formar sólidos, eles dão origem a três classes principais de materiais: os metais, os polímeros e os cerâmicos. Os primeiros são formados essencialmente por ligações metálicas, ou seja, entre materiais metálicos, ou eletropositivos; os segundos são constituídos de ligações covalentes e ligações secundárias; enquanto os terceiros são constituídos de ligações iônicas e covalentes. A natureza das ligações químicas é tão importante para os materiais que o fato de as classes serem divididas por elas gera sólidos com propriedades relativamente similares quando comparados às outras classes. Outro aspecto importante na avaliação de materiais é quanto à estrutura cristalina na qual eles se solidificam. Sólidos cristalinos, principalmente os metálicos, são tão bem organizados que é possível calcular facilmente sua densidade teórica com dados atômicos. Por fim, também existem os sólidos amorfos, como o vidro. Por não possuírem organização atômica de longo alcance, não possibilitam as mesmas predições que os materiais cristalinos.
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AULA 2 Imperfeições em sólidos e movimento de discordâncias
INTRODUÇÃO No mundo, é muito difícil encontrar coisas organizadas minuciosamente. Sempre que se aumenta a procura por algo fora de lugar, encontra-se alguma desordem. A formação marcial em um desfile; vista de longe parece perfeitamente coordenada e alinhada, mas se você tirar uma foto de todos os militares perfilados, certamente encontrará uma perna menos dobrada, alguém ligeiramente à frente ou mesmo alguma coluna com um militar a menos. Isso funciona para pessoas, para objetos e também para os átomos. Imaginar que, como proposto na aula anterior, 1023 átomos possam formar um sólido perfeitamente organizado e sem nenhum defeito é utópico. Assim como a formação dos militares possui suas falhas, a organização atômica também. E são elas que fazem com que a densidade que você calculou nos exercícios da aula anterior chegue bem perto da prática, mas nunca a atinja. Outro comportamento comparável entre átomos e seres humanos é a vontade de se mudar. Para muitas pessoas, a situação de permanecer estável em determinado lugar é agradável, mas quando algo faz com
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que seja necessária uma mudança, as pessoas se deslocam. Assim também é com os átomos. Enquanto estão no estado sólido, eles tendem a ficar em suas posições, pois não existe algo que os “motive” a se moverem. Porém, se alguma motivação é fornecida, eles, assim como os seres humanos, mudam de posição. Estes dois comportamentos serão apresentados nesta aula: os defeitos nos sólidos organizados (cristalinos) e sua capacidade de se moverem em um sólido (difusão).
OBJETIVOS » » Definir o conceito de imperfeição em sólidos. » » Conhecer os principais defeitos. » » Conceituar difusão. » » Conhecer os principais mecanismos responsáveis pela difusão. » » Definir discordâncias. » » Compreender a importância das discordâncias nas propriedades dos materiais.
2.1 IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS Você viu na aula anterior que, no estado sólido, os átomos tendem a formar estruturas organizadas, conhecidas como células unitárias. De acordo com essa teoria, cada átomo ocupa uma posição específica, formando uma rede cristalina perfeitamente organizada em um sólido. Na maioria dos materiais, os átomos possuem tendência ao ordenamento. Assim, pequenos desvios no padrão criado são vistos como defeitos. Os defeitos criados por desordens nos materiais podem ser classificados de acordo com sua magnitude. Assim, eles podem ser do tamanho de um átomo ou até visíveis a olho nu.
2.1.1 Defeitos pontuais Lacuna: também chamado de vacância, é o menor defeito encontrado nos materiais e se dá pela não ocupação de uma posição na rede cristalina por um átomo, como mostra a figura a seguir.
Figura 11 - Lacuna em uma rede cristalina. Fonte: Pereira (2014).
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AULA 2 – IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS
Vacâncias são inevitáveis nos materiais, e sua quantidade aumenta com o aumento da temperatura. O número de lacunas em equilíbrio é dado pela seguinte expressão: Nl = Nexp – Ql kT
(
)
em que Ql é a energia necessária para gerar uma lacuna, k é a constante de Boltzmann (que vale 1,38 x 10-23 J/átomo ⋅ K ou 8,62 x 10-5 eV/átomo ⋅ K), T é a temperatura de interesse e N é o número de posições atômicas por metro cúbico de material, que pode ser determinado por: N = Naρ A em que Na é o número de Avogadro (6,02 x 1023 átomos/mol), ρ é a densidade do material e A é seu número atômico. Segundo Callister (2008), a razão entre o número de lacunas e o número de posições atômicas para um metal logo abaixo de sua temperatura de fusão é de 10-4. Ou seja, a cada 10.000 átomos existe uma posição vaga. Impurezas: outro tipo de defeito de magnitude atômica são os elementos indesejáveis, ou não pertencentes ao material de origem. Da mesma maneira que as lacunas, esse tipo de defeito é impossível de ser completamente eliminado. Átomos “estranhos”, quando presentes em um sólido, podem incorporar-se à rede cristalina através de solução sólida ou formar uma segunda fase, com outro arranjo cristalino, modificando as propriedades do material de interesse. Quando em solução sólida, existem duas maneiras de se dispersarem na rede cristalina: através da substituição na posição de um átomo original da rede ou por meio do posicionamento em sítios atômicos (interstícios), como mostra a próxima imagem. Átomo intersticial
Átomo substitucional
Sítio atômico
Figura 12 - Impurezas e os sítios atômicos dos sólidos cristalinos. Fonte: Pereira (2014).
Você já observou que, ao adicionar açúcar ao seu café, existe um momento que, mesmo mexendo a bebida, o açúcar não fica mais em solução e se deposita no fundo da xícara? Isso acontece porque
25
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
a quantidade máxima de açúcar que o café aceita foi atingida e todo o excesso não será mais incorporado à solução. Assim como em soluções envolvendo líquidos, existe um ponto de saturação nas impurezas dos materiais. Acima dele, os átomos “estranhos” não permanecerão mais em solução, mas formarão outra fase. Esse ponto de saturação é determinado por características como o tamanho do átomo (que também determinará a preferência por soluções substitucionais ou intersticiais), sua valência, estrutura cristalina e eletronegatividade. Apesar do nome “impureza”, nem sempre átomos estranhos à rede cristalina podem ser considerados prejudiciais. Inclusive, muitas vezes eles são inseridos no material com o propósito de modificar propriedades. São as chamadas ligas, ou materiais dopados. Um exemplo é a liga de bronze, na qual cobre e estanho formam um exemplo de solução sólida substitucional. A solubilidade de um elemento no outro é completa, ou seja, eles sempre compartilharão a mesma estrutura cristalina, sem a formação de segunda fase. Esse tipo de comportamento é observado comumente em soluções do tipo substitucional. Já as soluções intersticiais possuem sempre um grau de saturação. A liga mais conhecida formada por solução intersticial é o aço, que possui como base ferro e carbono, sendo o primeiro responsável por formar a rede cristalina. Por mais que os defeitos apresentados sejam numerosos dentro dos materiais, eles ainda são pontuais. Existem, porém, aqueles que distorcem todo um alinhamento atômico, conhecidos como defeitos de linha.
2.1.2 Defeitos de linha O defeito que causa alterações em escala direcional nos materiais é conhecido como discordância (responsável por explicar boa parte das propriedades mecânicas dos metais).
Figura 13 - Discordância aresta. Fonte: Pereira (2014).
A discordância da figura é chamada aresta e possui caráter unidirecional, causando distorções em uma linha do arranjo atômico. 26
AULA 2 – IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS
Outro tipo de discordância é a espiral, formada por um deslocamento relativo de uma linha do plano cristalino, como mostra a figura a seguir. Observe que a linha AB é a zona de transição entre os arranjos atômicos na parte superior e inferior da figura.
A
B
b
Figura 14 - Discordância espiral. Fonte: Callister (2008).
Normalmente, uma discordância não é apenas aresta ou espiral, possuindo características das duas. Esse tipo de defeito é muito utilizado em metais para aumentar sua dureza. Através de impacto, criam-se mais discordâncias, o que faz com que o material se torne mais duro.
O aumento do número de discordâncias era a técnica utilizada por fabricantes de espadas, que após o resfriamento do aço também as submetiam a “amassamentos” para que sua lâmina adquirisse mais rigidez.
Mesmo os defeitos de linha sendo mais abrangentes que os pontuais, eles ainda podem ser considerados defeitos que atuam localmente, causando distorções apenas em alguns átomos; ao contrário de defeitos em áreas, conhecidos como interfaciais.
2.1.3 Defeitos interfaciais Como você viu na aula anterior, os materiais, quando em estado líquido (alta temperatura), não possuem organização atômica. Conforme eles são submetidos a temperaturas menores, tendem, na maioria das vezes, a formar estruturas atômicas organizadas. Olhando o fenômeno da solidificação mais de perto, pode-se supor que os átomos perdem energia (fornecida através da temperatura) e passam a interagir entre si em diversos pontos do líquido
27
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
em solidificação. Na medida em que alguns poucos átomos interagem, formam pequenos sítios organizados e sólidos, dispersos no líquido. Porém, esses sítios não são formados necessariamente próximos uns aos outros e muito menos possuem sua estrutura cristalina alinhada. Na verdade, eles são formados de maneira aleatória, em pontos diversos. Enquanto a temperatura continua a ser reduzida, mais átomos interagem e se alinham nos sítios formados anteriormente, fazendo com que a fase líquida dê lugar à estrutura cristalina, que se propaga dentro do sólido. Já no final do processo de solidificação, existe pouca fase líquida e os sítios cristalinos do início do processo se expandem e formam grandes estruturas cristalinas, porém cada uma com um alinhamento diferente. É ai que surge outro tipo de defeito nos sólidos cristalinos: o contorno de grão. A próxima figura mostra o desalinhamento entre as estruturas cristalinas de um material. A parte que possui alinhamento contínuo da estrutura cristalina é chamada de grão. Assim, você pode observar na imagem três diferentes grãos. O desalinhamento dos grãos é classificado em alto ou baixo, de acordo com o ângulo formado entre a organização de seus átomos, como você pode verificar nas retas azuis do esquema.
Normalmente, os sólidos cristalinos são formados por diversos grãos, recebendo o nome de materiais policristalinos. Os poucos materiais formados por uma estrutura continuamente alinhada de átomos são chamados de monocristalinos.
Ângulo de desalinhamento
Contorno de grão de alto ângulo
Contorno de grão de baixo ângulo
Ângulo de desalinhamento
Figura 15 - Contorno de grão. Fonte: Callister (2008).
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AULA 2 – IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS
Os contornos de grão são áreas importantes dos materiais, pois representam descontinuidade química e mecânica. Assim, é importante mensurar o quanto de área de contorno de grão existe nos sólidos cristalinos, e isso é realizado indiretamente através da medição do tamanho de grão dos materiais. Grãos maiores representam menor área de contorno de grão, enquanto grãos menores representam maior área de contorno de grão. Apesar de parecer algo difícil de ser observado, por ser uma imperfeição em arranjos atômicos, medir o tamanho de grão é algo corriqueiro e bastante simples. Isso pode ser feito utilizando, normalmente, microscópios ópticos não muito sofisticados, que dão como resposta imagens como a que você verá a seguir. Nela, você pode observar estruturas mais claras (os grãos) e linhas mais escuras (os contornos de grão).
Figura 16 - Grãos em um material observado através de microscopia ótica. Fonte: Callister (2008).
Em posse dessa imagem, é possível utilizar diversas técnicas para medir o tamanho médio dos grãos dos materiais. As mais comuns consistem em: contar o número de grãos presentes na área da foto ou, então, traçar linhas paralelas na imagem e contabilizar quantos grãos são cortados por cada uma dessas linhas. Existe também um método baseado em comparação com diversas imagens padrão. Aquela que possuir aspecto semelhante corresponderá ao tamanho médio de grão. Conforme a magnitude dos defeitos aumenta, eles se tornam mais facilmente observáveis, possuem maior influência nas propriedades dos materiais e também são menos difíceis de serem controlados. É o que ocorre com a maioria dos defeitos volumétricos.
2.1.4 Defeitos volumétricos Além dos defeitos de magnitude atômica (10-9 m) e microscópica (10-6 m), existem aqueles que são perceptíveis a olho nu ou que, mesmo não chegando a ser tão grandes, normalmente possuem ordem de grandeza maior do que as observadas até aqui. É o caso de porosidades, trincas ou inclusões (partículas estranhas em meio ao material de interesse). Normalmente, essas desconformidades são produzidas durante e em razão do processamento dos materiais e seu controle é realizado por métodos mais simples ou similares ao utilizado para mensurar tamanho de grão em materiais. 29
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
O controle de trincas em pisos cerâmicos é, muitas vezes, realizado através do som que o material emite ao ser golpeado com um martelo polimérico, sem ser quebrado.
Figura 17 - Poros (círculos pretos) em uma peça de alumínio observado em microscopia eletrônica. Fonte: Lee (2013).
Ao conjunto de fases e defeitos que constituem um sólido é dado o nome de microestrutura. Grãos, contornos de grão e defeitos volumétricos são elementos que a formam. Agora, você conhecerá um fenômeno que ocorre nos materiais: a difusão.
2.2 DIFUSÃO Muitas transformações em materiais ocorrem devido ao movimento atômico, que gera deslocamento de massa. A essa movimentação se dá o nome de difusão, que pode ocorrer de fora para dentro de um sólido (com a incorporação de diferentes elementos a ele) ou mesmo dentro dele próprio, entre seus próprios átomos. A primeira recebe o nome de interdifusão, enquanto a segunda é chamada de autodifusão. O processo de difusão é, muitas vezes, desejável quando, por exemplo, é necessário alterar a composição química da superfície de um aço ou quando se deseja substituir átomos da superfície de materiais cerâmicos, tornando-os mais resistentes. Mas esse processo pode ser também indesejável, como ocorre com materiais metálicos em presença de oxigênio ou então com o alumínio fundido na presença do hidrogênio. A figura a seguir mostra um exemplo de processo difusivo. Os esquemas “a”, “b” e “c” da esquerda exibem as concentrações de duas barras de cobre e níquel em um tempo 0. Perceba que, nesse exemplo teórico, as barras são formadas completamente por átomos de seu respectivo elemento. Os esquemas “a” representam as barras; em “b” observa-se os átomos que as constituem; enquanto “c” exibe um gráfico da concentração de átomos de cada elemento em função da posição.
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AULA 2 – IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS
Com a temperatura (T) e o tempo (t), os átomos de níquel e de cobre tendem a trocar de posição, difundindo, ou seja, se movendo, para a barra oposta. A força motriz para que ocorra difusão é o potencial químico existente entre as duas barras. Neste caso, é a diferença de concentração de níquel na barra de cobre e vice-versa. Difusão de átomos de Cu Cu
Cu
Ni
Cu-Ni alloy
Ni
100
0
(a)
(a)
(b)
(b)
Cu
Ni
Posição (c)
Concentração de Ni, Cu
Concentração de Ni, Cu
Difusão de átomos de Ni
100 Cu
0
Ni
Posição (c)
Figura 18 - Concentração de cobre em processo difusivo para t0 e t1. Fonte: Adaptada de Callister (2008).
Para que ocorra a difusão em sólidos, existem dois mecanismos possíveis e que são dependentes de defeitos pontuais: a difusão através de lacunas e a difusão através de interstícios. No primeiro mecanismo, através de lacunas, o átomo que deseja se movimentar é muito grande para que se posicione em um interstício. Nesse caso, o átomo, além do potencial químico, deverá receber energia suficiente para se movimentar e, sobretudo, deverá possuir uma lacuna em sua adjacência, tornando possível a troca de posição. Dessa maneira, pode-se entender o fenômeno de difusão por lacunas como átomos caminhando para um lado e lacunas para o outro. Esse mecanismo é o responsável, normalmente, por promover a autodifusão. A outra forma de difusão, através de interstícios, ocorre normalmente com átomos pequenos, como o hidrogênio, o carbono e o oxigênio. Por não depender da formação de lacunas e envolver átomos menores, ocorre, via de regra, mais rapidamente que o mecanismo através de lacunas. Seja por qual mecanismo for, durante o processo difusivo, o que ocorre de fato é o movimento de massa (átomos). Dessa maneira, é importante que o fluxo (massa em função do tempo) desse transporte seja qualificado e quantificado. Para isso, é essencial que haja a separação em dois tipos de difusão: a de estado estacionário (na qual o fluxo se mantém constante) e em estado não estacionário.
31
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
Por ser um processo fomentado por um potencial químico, é difícil que o fluxo atômico se mantenha constante com o passar do tempo, afinal, conforme a difusão ocorre, normalmente a concentração química tende à estabilidade, fazendo com que o fluxo seja reduzido. Mesmo assim, existem situações nas quais ocorre um fluxo constante de massa no material. Como você já viu nesta aula, a maior parte dos casos de difusão ocorre em estado não estacionário e pode ser descrita pela segunda lei de Fick, que pode ser generalizada, resultando em: Cx – C0 Cs – C0
= 1 – erf
x
( 2√Dt )
em que x é a distância da superfície do sólido até a profundidade de interesse, Cx é a concentração de átomos difundidos (soluto) na profundidade x após um tempo t, C0 é a concentração inicial, no tempo 0, do soluto no material (proposta como constante em todo o volume) e Cs é a concentração do soluto na superfície após um tempo t. x é conhecida como função erro de Gauss. Depois de calcular os valores A expressão erf 2√Dt x da fração , substituindo x, t e D (que é chamado de coeficiente de difusão), o número 2√Dt
(
)
obtido deve ser procurado na tabela 1, coluna erf(z). Depois, você precisa substituir na equação o seu correspondente em Z. Tabela 1 - Função erro de Gauss
Z
ERF(Z)
Z
ERF(Z)
Z
ERF(Z)
0
0
0.55
0.5633
1.3
0.9340
0.025
0.0282
0.60
0.6039
1.4
0.9523
0.05
0.0564
0.65
0.6420
1.5
0.9661
0.10
0.1125
0.70
0.6778
1.6
0.9763
0.15
0.1680
0.75
0.7112
1.7
0.9838
0.20
0.2227
0.80
0.7421
1.8
0.9891
0.25
0.2763
0.85
0.7707
1.9
0.9928
0.30
0.3284
0.90
0.7970
2.0
0.9953
0.35
0.3794
0.95
0.8209
2.2
0.9981
0.40
0.4284
1.0
0.8427
2.4
0.9993
0.45
0.4755
1.1
0.8802
2.6
0.9998
0.50
0.5205
1.2
0.9103
2.8
0.9999
Fonte: Callister (2008).
Por exemplo, para os parâmetros: x = 0,5 mm D = 1,6 x 10-11 m2/s t = 2h
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AULA 2 – IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS
Utilizando a função erro: erf(z) = erf
x
( 2√Dt )
Passando para o Sistema Internacional (SI) e substituindo: erf(z) = erf
5 ∙ 10-4
( 2√1,6 ∙ 10
-11
∙ 7200
)
z = 0,7365 Observando a tabela 1, o valor de Z encontrado está situando entre 0,70 e 0,75, o que corresponde a valores da função erro de 0,6778 e 0,7112, respectivamente. Por não possuir um valor exato, é necessário que seja feita uma interpolação da seguinte maneira: 0,7365 – 0,7 0,75 – 0,7
=
erf(z) – 0,6778 0,7112 – 0,6778
erf(z) = 0,7022 E a substituição na equação simplificada de Fick será: Cx – C0
= 1 – 0,7022
Cs – C0
Normalmente, esse desenvolvimento é realizado para encontrar o tempo necessário para que determinada concentração de soluto seja atingida. Por exemplo, se o lado direito da equação for igual a 0,5790 e você desejar descobrir o tempo para que se atinja determinada concentração. Utilizando os mesmos x e D anteriores: 0,5790 = 1 – erf
0,421 = erf
5 ∙ 10-4
( 2√1,6 ∙ 10
-11
∙t
)
∙t
)
5 ∙ 10-4
( 2√1,6 ∙ 10
-11
Ao contrário do procedimento anterior, agora é necessário encontrar um z correspondente a 0,421 na tabela 1, o que gerará como resultado a seguinte interpolação: z – 0,35 0,4 – 0,35
=
0,4210 – 0,3794 0,4284 – 0,3794
z = 0,392
33
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
Agora, igualando z à função erro: 0,392 =
5 ∙ 10-4 2√1,6 ∙ 10-11 ∙ t
t = 25.400 s Através da equação proposta, é possível traçar um gráfico relacionando a concentração e a profundidade de difusão. O comportamento esperado pode ser observado na figura a seguir, na qual a concentração de soluto máxima é encontrada na superfície e, após determinada profundidade, tende ao valor inicial do sólido.
Concentração: C
Cs
Cs – C 0 Cx Cx – C 0 C
0
Distância da superfície: x Figura 19 - Perfil de concentração de soluto após a difusão. Fonte: Callister (2008).
O coeficiente de difusão D, por sua vez, é afetado por três fatores principais: o material, o mecanismo de difusão (por lacunas ou intersticial) e a temperatura, e a influência dela é descrita pela seguinte equação: D = D0exp – Qd RT
(
)
em que D0 é um fator independente da temperatura, Qd é a energia de ativação associada ao processo de difusão, R é a constante dos gases e T é a temperatura de interesse. Através dessa equação, você pode concluir que o coeficiente de difusão possui uma relação exponencial com a temperatura, mostrando sua importância para os processos difusivos. Já a energia de ativação (Qd) e D0 dependem do meio no qual o material está inserido e do próprio material.
34
AULA 2 – IMPERFEIÇÕES EM SÓLIDOS E MOVIMENTO DE DISCORDÂNCIAS
CONCLUSÃO Você percebeu que, após esta aula, sua visão sobre a organização dos átomos se tornou mais ampla? Na aula anterior, você viu o átomo como uma partícula, suas divisões e suas relações com outros átomos. Isso tudo ocorre em escalas muito pequenas, de 10-10 metros. Agora, além dessa visão pontual, você já é capaz de ver algo mais tangível, que é a microestrutura dos átomos, facilmente observada em um microscópio óptico. Mas nem todos os conceitos apresentados nesta aula são facilmente observáveis. Os defeitos pontuais, como lacunas e impurezas, ainda se tratam de problemas em escala atômica e não são completamente observáveis. As lacunas, por exemplo, existem nos materiais por determinações termodinâmicas, enquanto as impurezas são resultado da interação do material de interesse com as substâncias presentes no planeta. Nessa escala, se encontra outro tópico abordado: a difusão, que é o movimento de átomos dentro dos materiais. Ela é dependente da estrutura cristalina do material, dos átomos que desejam se movimentar dentro do sólido, do tempo e, sobretudo, da temperatura. Partindo para uma escala maior, você também viu que a falta de uma coluna de átomos pode causar um defeito conhecido como discordância. Novamente, esse é um problema de magnitude atômica, que até pode ser observado com auxílio de técnicas mais avançadas de microscopia, mas que não se trata de um problema usualmente enfrentado. Acima dessa escala, encontram-se defeitos interfaciais e volumétricos. Na prática, esses são os parâmetros usualmente controlados quando se deseja projetar propriedades dos materiais. Assim como eles são mais facilmente visualizados, também são mais fáceis de controlar e, se necessário, corrigir. Com esses conhecimentos em mente, você poderá compreender boa parte do comportamento macroscópico dos materiais, assim como alterá-los quando necessário.
35
AULA 3 Propriedades mecânicas dos materiais
INTRODUÇÃO Você, como engenheiro, deverá conhecer, mesmo que basicamente, o comportamento mecânico dos materiais que utilizará. Mas como saber se a viga, projetada em aço e concreto, suportará aos carregamentos impostos durante sua vida? Como dimensionar componentes estruturais sabendo apenas qual força será exercida sobre eles? Para que seja possível projetar um componente e garantir que ele não venha a falhar devido ao mau dimensionamento mecânico, é necessário conhecer exatamente as propriedades mecânicas do material que será usado como matéria-prima. Isso envolve diversos testes que simulam as mais diferentes condições de carreamento ao qual a estrutura será submetida, sempre com a preocupação de extrapolar para a pior condição possível. Nesta aula, você conhecerá algumas caracterizações mecânicas. Através delas, você saberá como proceder quando necessitar de dados sobre o comportamento mecânico dos materiais que utilizará durante a sua vida profissional.
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
OBJETIVOS » » Conhecer as principais propriedades mecânicas dos materiais. » » Relacionar movimento de discordâncias com mecanismos de falha dos materiais. » » Interpretar gráficos de tensão versus deformação. » » Classificar os materiais de acordo com suas propriedades mecânicas.
3.1 TENSÃO E DEFORMAÇÃO Antes de aprofundar seus estudos, é importante que você possua bem definidos dois conceitos que regem todas as propriedades mecânicas dos materiais: a tensão e a deformação. Tensão é a intensidade de uma força em um ponto. Isto é, considerando a soma de vários pontos, é o resultado de uma força aplicada a uma área (bastante similar ao conceito de pressão). Ela é representada comumente pela letra σ, e sua fórmula matemática é: σ= F A em que F é a força aplicada e A é a área em que essa força atua. A unidade utilizada para essa grandeza é o Pascal (Pa), que equivale a 1 N/mm2. A tensão pode ser de duas maneiras principais: a) tensão normal (trativa ou compressiva): a força é aplicada perpendicularmente ao plano em que ela atua; b) tensão de cisalhamento: a força atua paralelamente à área de interesse. A figura a seguir mostra os dois tipos de tensão. Observe, no lado esquerdo, a atuação da tensão normal (neste caso, compressiva). Na imagem à direita, você pode ver a tensão de cisalhamento. F
A F
A
Figura 20 - Tensão normal e tensão de cisalhamento. Fonte: Pereira (2014).
38
AULA 3 – PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS
Lembre-se sempre que, segundo o princípio da ação e reação, quando uma força é aplicada em uma direção, existirá uma força resultante de mesma magnitude, porém de sentido oposto.
A deformação, por sua vez, é definida como a mudança em um comprimento L, definida infinitesimalmente por: dε = dL L Ao ser integrada, de um comprimento inicial L0, a um comprimento L, tem-se a deformação expressa por: ε=
L
∫L dLL = ln ( LL )
ƒ( )
0
0
Essa deformação corresponde à chamada deformação real, ou deformação verdadeira, e é expressa em fração adimensional ou mesmo em porcentagem. No dia a dia da Engenharia, não é usual usar a forma logarítmica para a deformação. Em seu lugar, utiliza-se a deformação de Engenharia, que também possui caráter adimensional, mas é expressa pela letra e. É obtida por meio da equação: e = ∆L L0 Agora que você já possui esses dois conceitos bem definidos, poderá compreender melhor algumas propriedades mecânicas dos materiais e qual a melhor maneira de medi-las.
3.2 ENSAIO DE TRAÇÃO Como você viu, a força aplicada sobre uma área pode gerar tensões normais e tensões cisalhantes. As primeiras podem ser divididas em tensões de tração (trativas) ou de compressão (compressivas), como mostra, respectivamente, a imagem a seguir.
39
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
Figura 21 - Tensão trativa (esquerda) e compressiva (direita). Fonte: Pereira (2014).
Uma das maneiras de caracterizar algumas propriedades mecânicas dos materiais é através da aplicação de tensões trativas no chamado ensaio de tração. Nesse ensaio, um corpo de prova é confeccionado com o material do qual se deseja conhecer as propriedades. Ele é fixado entre duas garras, ou dispositivos com rosca, que se afastam, gerando tensões de tração. A próxima figura mostra como é feito esse processo, utilizando objetos metálicos na parte inferior e superior como garras.
Figura 22 - Preparação de ensaio de tração. Fonte: Shutterstock (2014).
Durante o ensaio, mede-se o afastamento entre as garras e a força que está sendo aplicada. Como você viu, para que essa força seja transformada em tensão, é necessário dividi-la pela área em que ela está sendo aplicada. Para que se tenha certeza de que a tensão máxima aplicada seja paralela ao deslocamento das garras, os corpos de prova possuem a geometria exibida na figura adiante.
40
AULA 3 – PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS
Figura 23 - Corpos de prova para ensaio de tração. Fonte: Shutterstock (2014).
Você pode observar na imagem que o local de fixação dos corpos de prova possui um diâmetro maior que o restante. Dessa maneira, a força aplicada no ensaio, distribuída igualmente por toda a amostra, causará maior tensão na região de menor diâmetro. O resultado de um ensaio de tração é uma curva tensão-deformação (de engenharia), como mostra a figura a seguir. Olhe com atenção e observe três zonas distintas: a primeira de 0 a σys, que apresenta um comportamento linear; a segunda, de σys a σuts, que apresenta um comportamento não linear crescente; e, por fim, de σuts até o fim da curva, com comportamento não linear decrescente.
Tensão (σ)
σuts σys
eyp
eu
ef
Deformação (e) Figura 24 - Curva tensão versus deformação. Fonte: Best (2014).
Por representarem alterações no comportamento dessa curva, esses três pontos de tensão e deformação são propriedades mecânicas muito importantes para a Engenharia e recebem nomes específicos: » » σys é a tensão de Young, ou tensão de escoamento; » » σuts é a tensão máxima, ou tensão de resistência; » » o fim da curva é chamado de tensão de ruptura, que é onde o material fratura.
41
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
Você pode visualizar um ensaio de tração no vídeo: <https://www. youtube.com/watch?v=D8U4G5kcpcM>.
Através do σys, é possível separar o comportamento mecânico dos materiais em duas regiões distintas, a elástica e a plástica.
3.2.1 Comportamento elástico dos materiais Quando um produto é projetado, ele é pensado para que, durante seu uso, as forças aplicadas sobre ele não gerem tensões que ultrapassem a tensão de escoamento. Isso ocorre porque, na região elástica, as deformações causadas são reversíveis, ou seja, quando retirada a força responsável por causar deformação no material, ele recupera sua geometria anterior. É como um elástico de borracha. Enquanto você o estica, está aumentado a força sobre ele e causando uma deformação. Assim que você solta uma de suas extremidades, ele retorna ao seu tamanho natural. Essa é a primeira propriedade mecânica que você conhecerá nesta aula: a elasticidade. É uma propriedade que depende apenas das ligações químicas do material e de seus defeitos volumétricos (poros e trincas). A região elástica de um material, assim como o coeficiente de dilatação, é dependente da sua composição química e pode ser descrita através da lei de Hooke, por meio da equação: E= σ e em que E é chamado de módulo de elasticidade, ou módulo de Young. Ele pode ser encarado como a resistência de um material ao ser deformado. Grandes valores de E significam que o material é mais rígido. Ao tracionar o material em um eixo, ocorre o alongamento do corpo de prova nessa direção, ou seja, ele se torna mais longo. É esperado que, no eixo perpendicular ao carregamento, exista uma contração que compense esse alongamento, já que o volume do material deve permanecer constante, como você pode observar na figura a seguir. A essa relação entre a deformação nos dois eixos do material se dá o nome de coeficiente de Poisson, que é a segunda propriedade mecânica desta aula, descrita pela equação: ν = – ex ez
42
AULA 3 – PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS
A equação possui sinal negativo para que seu resultado seja positivo, pois uma das deformações também será menor que zero.
∆L
L
L
D
D
z
∆D
x
Figura 25 - Deformações causadas por forças trativas. Fonte: Pereira (2014).
Se o afastamento de ligações atômicas é o responsável pela deformação elástica em um material e cada ligação atômica possui uma energia específica, é natural que haja uma energia associada a esse afastamento. Essa energia é a propriedade chamada de resiliência. Em outras palavras, a resiliência é a energia máxima que o corpo suporta até que seja excedido seu limite elástico. Essa propriedade está representada, na próxima figura, pelo triângulo cinza.
43
Tensão (σ)
CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
σys E
eyp
Deformação (e)
Figura 26 - Resiliência. Fonte: Adaptada de Best (2014).
A resiliência é calculada como a área sob a região elástica do material, ou seja: eyp
Ur = ∫0 σ ∙ de em que Ur é a resiliência. Por ser descrita por um fenômeno quase sempre linear, a resiliência pode ser simplificada como a área de um triângulo, de forma que: Ur = 1 σys ∙ eyp 2 Ao ser ultrapassada a fronteira da deformação elástica, duas coisas podem acontecer ao material: ou ele fratura ou então ocorre a deformação plástica.
3.2.2 Comportamento plástico dos materiais Como você viu, o ensaio de tração gera um gráfico de tensão versus deformação, em um corpo de prova padrão. No início do ensaio, ele é deformado elasticamente até que seja atingida uma tensão de escoamento, que, graficamente, é quando o comportamento da curva deixa de ser linear. Porém, como você viu na figura anterior, nem sempre o limite de escoamento de um material é fácil de ser determinado. A próxima imagem mostra dois materiais com diferentes comportamentos quanto ao limite de escoamento.
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AULA 3 – PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS
Elástico Plástico Tensão superior de escoamento
σy
P
Tensão
Tensão
σy
Tensão inferior de escoamento
Deformação 0.002
(a)
Tensão
(b)
Figura 27 - Diferentes comportamentos quanto ao limite de escoamento. Fonte: Adaptado de Callister (2008).
Materiais com o comportamento semelhante ao de (a) não possuem um limite de escoamento definido. Por isso, para descobrir esse limite, você deve observar o ponto de intersecção entre a curva tensão-deformação e uma linha paralela à região elástica, que deve estar localizada a 0,002 de distância da curva, no eixo da deformação. A maioria dos materiais apresenta esse comportamento. No entanto, alguns possuem uma transição entre a região elástica e a plástica bem definida, como mostra (b) na figura que você acabou de observar. Para esses materiais, a curva tensão-deformação apresenta um pico em sua região elástica, seguido de uma queda da tensão aplicada. Após esse decréscimo, a curva tornase oscilatória até alcançar um valor crítico em que passa a aumentar não linearmente. Nesses materiais, o limite de escoamento é definido como a média da tensão na região oscilatória. Então, durante o ensaio, seu corpo de prova foi deformado elasticamente, em uma relação linear entre tensão e deformação, até que a resistência limite de escoamento foi atingida. A partir desse momento, dois comportamentos são possíveis de acontecer para o material: a deformação plástica ou a sua ruptura. Se a deformação elástica é aquela que só ocorre enquanto existir uma tensão aplicada, a deformação plástica é a que ocorre permanentemente, ou seja, que continua existindo mesmo após remover a tensão. Um amassado na lataria de um carro é um exemplo de deformação plástica.
Em temperatura ambiente, sempre existe uma deformação elástica associada a uma deformação plástica.
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Olhando em um aspecto atômico, a deformação plástica é a mudança de posição de diversos átomos, ou de um plano inteiro formado por eles. Então, para que ocorra deformação plástica, é necessário que os átomos possuam liberdade para se movimentarem dentro do material, e essa liberdade será conferida de acordo com ligações primárias e secundárias. Então, para que ocorra deformação plástica, é necessário que aconteça o movimento de defeitos de linha, ou seja, discordâncias, que você aprendeu na aula anterior. Materiais com ligações covalentes ou iônicas possuem pouca liberdade para que ocorra essa movimentação atômica. Já materiais com ligações metálicas podem possuir essa liberdade em maior ou menor grau. Os materiais que possuem ligações secundárias, como é o caso de polímeros, não dependem do movimento de discordâncias, mas sim do movimento das cadeias poliméricas, que é, em geral, facilitado pela existência de ligações mais fracas (secundárias). Mas então o que ocorre, após o limite de escoamento, com os materiais que possuem ligações que não favorecem o movimento de discordâncias? Eles fraturam. A fratura que ocorre sem a presença de deformação plástica é chamada fratura catastrófica, que ocorre de maneira súbita. Vidros são exemplos de materiais que sofrem esse tipo de fratura. Ao sofrer impacto, eles estilhaçam sem que haja deformação. A capacidade de um material deformar plasticamente antes de sua fratura é medida através de mais uma propriedade: a ductilidade. Materiais que não deformam, ou deformam pouco plasticamente, são chamados materiais frágeis, ou com baixa ductilidade. Os que possuem maiores deformações plásticas são chamados materiais dúcteis. A ductilidade de um material pode ser calculada tanto através de seu alongamento quanto por meio da redução de secção, utilizando as equações: AL% =
( l l– l ) ∙ 100 ƒ
0
0
RA% = A0 – Aƒ A0
(
) ∙ 100
em que AL é o alongamento percentual, lf é o comprimento final, l0 é o comprimento inicial, RA é a redução de área (ou secção transversal), A0 é a área inicial e Af é a área final. Observe a curva tensão-deformação de um material dúctil e o comportamento de seu corpo de prova na figura a seguir. Como você já viu, até o limite de escoamento, ocorre uma deformação elástica no material. Após o limite, o material passa a se deformar de maneira plástica e sua deformação é bem maior que no cenário anterior. Depois de ultrapassada a tensão máxima (marcada como TS na figura), ocorre uma concentração de tensão em uma região da amostra, que passa a deformar mais que o restante, em um fenômeno conhecido como empescoçamento. Esse fenômeno é característico de materiais dúcteis, e a fratura do corpo de prova ocorre nessa região, onde a tensão alcança seu valor máximo. O fenômeno do empescoçamento, ou instabilidade plástica, é associado a uma concentração extrema de discordâncias, geradas pela deformação, em uma região específica do material. A partir do momento em que a quantidade limite de discordâncias é atingida, a tensão nessa região aumenta mais do que no restante do corpo de prova, até que a fratura ocorra.
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TS
M
Tensão
F
Deformação Figura 28 - Comportamento de um material dúctil. Fonte: Callister (2008).
Para fins de projeto, os materiais são desenhados para nunca excederem o limite de escoamento. Durante o processo de fabricação de produtos, entretanto, a região plástica deve ser conhecida, pois é nela que ocorrem as alterações de formato dos materiais. Outra propriedade associada ao regime plástico dos materiais é a tenacidade, que é a área sob toda a curva tensão-deformação. Ou seja, para materiais dúcteis, corresponde a resiliência mais a parcela correspondente até o ponto de fratura do material. Para materiais dúcteis, o ensaio de tração é o meio mais eficiente de caracterizar as propriedades mecânicas. Devido à dificuldade operacional, materiais frágeis são comumente ensaiados com outros métodos.
3.3 ENSAIO DE FLEXÃO Como você viu, materiais frágeis apresentam pouca, ou quase nenhuma, deformação plástica. Por esse motivo, muitas vezes é inviável a realização de um ensaio de tração, que acarreta em inúmeros erros associados ao fenômeno da fratura catastrófica. Para solucionar esse problema, são utilizados ensaios mais simples de serem preparados, como os ensaios de flexão. Nesse tipo de teste, uma barra é apoiada sobre dois apoios, enquanto um punção (ou mesmo outro par de punções) aplica uma carga de flexão no centro da amostra, até que seja alcançada a tensão máxima e o corpo de prova frature. A próxima imagem mostra a configuração de um ensaio de flexão de três pontos, ou seja, apoiada em dois apoios e fletida por apenas um punção.
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Figura 29 - Ensaio de flexão de três pontos. Fonte: Pereira (2014).
A grande diferença do ensaio de flexão para o ensaio de tração é o estado de tensões criado no corpo de prova. Enquanto no ensaio de tração é aplicada uma tensão puramente trativa, o ensaio de flexão gera um gradiente de tensões na amostra, que, ao ser fletida, possuirá tensões compressivas na face superior e tensões trativas em sua face inferior, como mostra a figura adiante. O perfil de tensões é tal que, na linha média (em relação à altura da amostra), não existe tensão aplicada.
Figura 30 - Perfil de tensões nas superfícies de uma amostra sob flexão. Fonte: Pereira (2014).
Por não possuírem movimento de discordância, materiais frágeis são muito mais sensíveis a esforços trativos do que compressivos. Isso faz com que a fratura dos materiais em ensaios de flexão sempre seja iniciada na superfície sob tração. Outra diferença no perfil das tensões entre os ensaios de tração e flexão é o volume sob a tensão máxima aplicada. No primeiro, a força normal atua igualmente em todo o corpo de prova, gerando a mesma tensão na área de interesse (secção menor). O segundo, por sua vez, não possui uma força constante atuando sobre a amostra, gerando tensões diferentes. A força no ensaio de flexão é resultante de um momento, ou um braço de alavanca. Assim, considerando uma barra simplesmente apoiada e carregada em seu ponto médio, como mostra a figura a seguir, o momento máximo estará posicionado no meio da amostra, decaindo linearmente até os pontos de apoio.
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P
h S L
M=
PS 4
BMD Figura 31 - Perfil do momento em um ensaio de flexão de três pontos. Fonte: Adaptada de NPTEL (2014).
O momento é definido como uma força e pode ser transformado em tensão, para ensaios de três pontos em corpos de prova de secção retangular por: σ=
P∙S 2 ∙ b ∙ h2
em que P é o momento no ponto médio entre apoios, S é a distância entre apoios, b é a largura da amostra e h é sua altura. Juntando os dados das duas imagens, é possível chegar à conclusão de que a tensão de tração máxima está situada na face inferior do ponto médio entre apoios da amostra, como mostra a próxima figura. Nela, o ponto vermelho corresponde à localização da tensão trativa máxima, que deve ser considerada uma linha com comprimento igual a b da equação anterior.
σmax
Figura 32 - Tensão trativa máxima em ensaio de flexão de três pontos. Fonte: Pereira (2014).
Essa característica do ensaio faz com que os dados de resistência à flexão necessitem de tratamento estatístico, o que gera como resultado não mais uma tensão máxima absoluta, mas uma tensão característica, na qual determinada fração dos corpos de prova falharam.
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Para minimizar o efeito do pouco volume de material sob a tensão máxima, é utilizado o ensaio de flexão de quatro pontos, que não mais submete o material a uma linha de tensão trativa máxima, mas sim a uma área. A imagem a seguir mostra o diagrama da tensão trativa, resultante de um momento fletor, na face inferior de amostras fletidas em quatro pontos. Ao contrário do ensaio de três pontos, que possui só uma linha de momento máximo, o ensaio em quatro pontos possui uma área, formada pela distância entre os punções e a largura b da amostra. P
h
S1 S0 L
M=
P S 0 - S1 4
BMD Figura 33 - Momento máximo em ensaio de flexão de quatro pontos. Fonte: Adaptada de NPTEL (2014).
Apesar de o ensaio de flexão ser muito utilizado, ele não é a única alternativa para materiais frágeis, que, quando são menos resistentes, apresentam uma alternativa literalmente contrária ao ensaio de tração.
3.4 ENSAIO DE COMPRESSÃO Se no ensaio de tração uma carga é aplicada de forma a alongar um corpo de provas, no ensaio de compressão ocorre o contrário: a carga tende a achatar a amostra, que é, normalmente, um cilindro posicionado entre dois pratos metálicos que, ao se aproximarem, comprimem a amostra. O resultado do ensaio de compressão é a mesma curva vista para a tração. No entanto, a preparação da amostra e do ensaio é consideravelmente mais simples.
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Força de compressão (ou tensão)
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Deformação elástica
Deformação plástica
Deformação (ou tensão)
Figura 34 - Corpo de prova em ensaio de compressão e a curva tensão-deformação resultante. Fonte: NPTEL (2014).
Mas então por que os materiais frágeis não são todos ensaiados por este método? Uma das razões você viu no tópico anterior: materiais frágeis resistem muito mais à compressão do que à tração, e o objetivo do ensaio mecânico é quantificar da melhor maneira possível a resistência dos materiais, ou seja, buscando a condição mais severa. Outra limitação do ensaio de compressão, mais influente em materiais dúcteis, é que, ao comprimir o material na direção do carregamento, ocorre uma expansão na outra direção, causando o aumento de área do material. Por consequência, surge a necessidade de maiores forças de compressão para deformar a amostra. Esse problema poderia ser solucionado com equipamentos mais potentes, capazes de aplicar maiores carregamentos, mas o aumento da força não é a única barreira do ensaio. Enquanto o material expande sua área, é gerada uma força de atrito na interface materialequipamento, e isso é uma grande fonte de erro nesse tipo de ensaio. A próxima imagem ilustra essa situação. σ
σm
σ0
σ = tensão de compressão σ0 = σ sem atrito σm = média dos σ Figura 35 - A expansão da área de contato em ensaio de compressão. Fonte: Souza (1982).
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CIÊNCIA E TECNOLOGIA DOS MATERIAIS
Porém, mesmo com suas limitações, o ensaio de compressão ainda é utilizado. Uma de suas maiores aplicações é no ramo da Engenharia Civil.
Para aplicações na Engenharia Civil, o ensaio de compressão é imprescindível, uma vez que o concreto, quando aplicado a edificações, está sujeito a grandes tensões compressivas.
Para minimizar os efeitos do atrito durante o teste, foi desenvolvida no Brasil uma variável conhecida mundialmente como Brazilian Test (ou seja, Teste Brasileiro), ou compressão diametral. Nesse ensaio, o cilindro é posicionado deitado, como mostra a figura a seguir.
Figura 36 - Ensaio de compressão axial (esquerda) e ensaio de compressão diametral (direita). Fonte: Vieira (2011).
Por enquanto, você viu ensaios que medem a resistência mecânica dos materiais, ou seja, medem a resposta a uma carga aplicada com o intuito de rompê-los. Mas nem sempre os ensaios dão como resposta uma tensão. É o caso da dureza, que você verá a partir de agora.
3.5 ENSAIO DE DUREZA A dureza é uma propriedade comumente confundida com a resistência mecânica, ou seja, a capacidade de suportar cargas sem romper. Esse conceito popular não corresponde ao conceito da Engenharia, em que a dureza é a capacidade de um material em resistir à penetração por outro. O ensaio de dureza consiste sempre em um material, consideravelmente duro, penetrando na amostra de interesse. Os resultados obtidos são diversos e dependem da variante do teste utilizada, mas no fim sempre resultará em uma resistência à penetração. Você verá a seguir as técnicas mais utilizadas para medir a dureza.
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AULA 3 – PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS MATERIAIS
3.4.1. Dureza Rockwell Nesse ensaio, um indentador, de diamante ou aço, penetra na amostra, e a profundidade de penetração é medida em função da carga aplicada para a penetração.
Indentador: É um objeto duro utilizado para causar penetração em um material, formando uma endentação, ou impressão.
A dureza Rockwell é provavelmente a mais utilizada em linhas de produção, pois sua medição é rápida e a técnica gera um resultado direto, sem a necessidade de tratamentos. A próxima figura mostra uma máquina para realização do ensaio de dureza Rockwell. Na parte superior do dispositivo, é possível ver um relógio, que dá o resultado no momento da análise.
Figura 37 - Dispositivo para ensaio Rockwell. Fonte: Shutterstock (2014).
3.4.2. Dureza Brinell Ao contrário da dureza Rockwell, essa técnica necessita de uma análise de imagem posterior ao processo de penetração. O ensaio consiste em penetrar lentamente uma esfera de aço contra a superfície da amostra de interesse. Após o ensaio, a impressão deixada pela esfera é medida, e uma relação entre as dimensões da impressão e a carga aplicada é feita através da equação: HB =
2Q πD(D – √D2 – d2)
em que HB é a dureza Brinell, Q é a carga aplicada, D é o diâmetro da esfera do penetrador e d é o diâmetro da impressão deixada. 53
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3.4.3 Dureza Vickers A técnica da dureza Vickers é muito semelhante à Brinell, com a vantagem de que o indentador utilizado é uma pirâmide de base quadrada feita de diamante, o que confere maior regularidade aos ensaios. F
I1
I2
Figura 38 - Procedimento para medição de dureza Vickers. Fonte: NPTEL (2014).
O teste consiste em aplicar carga em um penetrador, causando uma impressão na amostra. Por ser uma pirâmide de base quadrada, a indentação possuirá aspecto de um quadrado, como mostra a imagem a seguir.
Figura 39 - Aspecto de uma indentação Vickers. Fonte: ASTM (2010).
Por se tratar de uma propriedade que correlaciona uma área deformada com uma carga, a dureza Vickers pode ser descrita matematicamente por: HV = 1,8544 ∙ F d2 em que F é a carga aplicada e d é o comprimento da diagonal do quadrado.
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CONCLUSÃO Ao se aplicar uma força sobre dado material, são induzidas tensões, que dependerão da área sobre qual essa força está sendo aplicada. Os ensaios mecânicos são, grosso modo, respostas que o material dá às forças ao qual ele é submetido. Em um ensaio de tração, forças normais trativas são aplicadas em um material que dá como resposta uma deformação. O comportamento da razão entre tensão e deformação fornece importantes características sobre o material. Assim, é possível determinar as propriedades mecânicas: módulo de elasticidade, limite de escoamento, resistência máxima, coeficiente de Poisson, resiliência, ductilidade, tenacidade e dureza (Rockweel, Brinell e Vickers). Além do ensaio de tração, outras técnicas são utilizadas, principalmente para a caracterização de materiais frágeis. O ensaio de flexão é utilizado devido à sua facilidade de preparação e ao baixo custo. Sua grande desvantagem é o pouco volume de material caracterizado durante o ensaio, sendo necessária a utilização de diversos corpos de prova e tratamento estatístico para determinação dos limites de resistência dos materiais. Ensaios de compressão, por sua vez, apresentam pouca vantagem em seu uso geral, mas possuem grande aplicabilidade na área da Engenharia Civil, em que os esforços exigidos pelos materiais são, muitas vezes, compressivos. Já ensaios de dureza são utilizados para caracterizar a resistência de um material à penetração. Esses ensaios são importantes para a Engenharia, uma vez que medem indiretamente a resistência ao desgaste na superfície dos materiais. Com esses conhecimentos, você, futuro engenheiro, terá mais subsídios para entender como os materiais se comportam, o que permitirá a construção de estruturas mais fortes e adequadas aos seus propósitos.
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