EDUCAÇÃO E SEXUALIDADE Autora: Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
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SUMÁRIO AULA 1 - CONCEPÇÕES SOBRE SEXUALIDADE E GÊNERO NUMA ABORDAGEM EDUCACIONAL..........................5 AULA 02 - SEXUALIDADE NA INFÂNCIA...................................................................................................................................... 21 AULA 03 - SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA.......................................................................................................................... 37 AULA 04 - SEXUALIDADE NA IDADE ADULTA E NA TERCEIRA IDADE............................................................................. 59 AULA 05 - O EXERCÍCIO DA SEXUALIDADE EM SITUAÇÕES ESPECIAIS.......................................................................... 79 AULA 06 - VIOLÊNCIA SEXUAL E DE GÊNERO............................................................................................................................ 93 AULA 07 – EDUCANDO PARA A SEXUALIDADE......................................................................................................................111 AULA 08 – PROJETOS E PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO SEXUAL.......................................................................................135
E GÊNERO NUMA ABORDAGEM EDUCACIONAL
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AULA 1 - CONCEPÇÕES SOBRE SEXUALIDADE
Autora: Profª Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
Fazer uma abordagem conceitual sobre sexualidade e gênero é o que pretendemos com esta primeira aula, considerando esses construtos em sua complexidade, por envolver não apenas aspectos biológicos que caracterizam a pessoa humana, mas também as suas relações interpessoais – inclusive as de natureza sexual - inseridas na história e na cultura. Nesta perspectiva, esta aula comporta uma abordagem conceitual sobre sexualidade e sobre gênero, reconhecendo a centralidade desses conceitos para a formação de educadoras(es) que se propõem a educar para a sexualidade no contexto escolar.
Você sabe definir sexualidade?
E que compreensão tem de Sexo e Gênero?
Sabe o que significa diversidade sexual?
Essas e outras questões nortearão o estudo que propomos a seguir.
REFLETINDO SOBRE SEXUALIDADE1 A sexualidade é elemento constitutivo da pessoa, é dimensão e expressão da personalidade. Por ser um atributo inerente à pessoa humana, manifesta-se independente de qualquer ensinamento. Mas para ser compreendida, é preciso considerar o ser pessoa como um todo, pois a sexualidade é parte integrante e intercomunicante da pessoa consigo mesma e com o outro.
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Fonte: www.latifm.com/artists/Leonardo_da_Vinci.htm
A nossa cultura tende a reduzir a sexualidade à sua função reprodutiva e genital. Sexualidade e reprodução são processos que se expressam graças a órgãos específicos do ser humano e, por isso, têm uma estreita relação, mas não significam a mesma
________________________ coisa. Reprodução é o processo pelo qual a vida é gerada, ocorrendo, na espécie hu________________________ mana, quando se encontram e se fundem os gametas masculinos e femininos. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Como analisa Cavalcanti (1987, p.13): ________________________ ________________________ Atualmente ninguém discute a nítida diferença entre o campo sexu________________________ al e o campo reprodutivo [...] pode existir reprodução sem sexo [...] e ________________________ pode existir sexo sem reprodução. Esta, por sinal, é que é a norma. ________________________ [...] nossos corpos são eróticos e erotizáveis durante toda a vida; ________________________ apenas alguns anos possuímos o potencial de reprodução. A sexu________________________ alidade é a norma; a reprodução é uma ocorrência. ________________________ Sexualidade é muito mais do que ter um corpo apto para procriar e apresen________________________ tar desejos sexuais; pressupõe intimidade, afeto, emoções, sentimentos e bem-estar
resulta, também, de uma construção social marcada pela história, localizada pela cultura e que transcende as manifestações do corpo, transcende a genitalidade. Nossa compreensão da sexualidade ancora-se na dimensão corporal que a concretiza, mas é definida por uma perspectiva não biologizante.
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individual, decorrentes, inclusive, da história de vida de cada pessoa. A sexualidade
A dimensão biológica não é suficiente para explicar a sexualidade humana; faz-se necessária a função simbólica da linguagem para penetrar na complexa estrutura do relacionamento sexual, fortemente dependente de valores, mitos, crendices e tabus. Em sua análise sobre a questão, Caridade (1995, p. 52-53) apropria-se do texto de Platão, em O Banquete, que narra o mito da origem dos seres humanos e do amor:
Segundo esse mito, os homens tinham, na sua origem, órgãos duplos, formas arredondadas, quatro mãos, quatro pernas, dois órgãos de geração, duas faces, quatro orelhas e uma só cabeça. Havia três sexos distintos que correspondiam ao masculino, ao feminino e ao andrógino, que participava do masculino e do feminino. O masculino vinha do sol (Hélio), o feminino, da terra (Géia) e o andrógino, da lua (Selene). Os humanos eram redondos como os astros, seus progenitores, o que os tornava robustos e
muito velozes. Também eram muito audaciosos e um dia resolveram alçar aos céus e ________________________ atacar os deuses. Zeus, enfurecido, enfraqueceu-os, dividindo-os ao meio. Diz o mito ________________________ que, a partir de então, cada metade pôs-se à procura da outra. Seus órgãos que antes ________________________ eram posteriores e só podiam fecundar com a terra, foram colocados na frente e come- ________________________ çaram a procriar entre si, homens e mulheres. Em relação ao amor isso diferia, porque ________________________ o encontro de uma metade com qualquer outra, dava um estado de felicidade. Mesmo ________________________ assim, isso não correspondia ao estado de plenitude anterior, de seres integrados na ________________________ sua totalidade. Essencialmente o homem ficou sendo um ser dividido e incompleto, ________________________ desejante de um objeto capaz de resgatar-lhe a integridade. Permanecemos seres da ________________________ falta. Homens a mulheres, somos hoje essas metades ambulantes, desejantes de to- ________________________ talidade. Este é um sonho andrógino, e dele nos aproximamos pela vivência sexual, ________________________ quando machos e fêmeas rendemo-nos aos nossos limites e nos deixamos ‘completar’, ________________________ fundir, superar, por breves instantes orgásticos. Em torno dessa façanha, proliferam ________________________ inúmeros discursos, mas como o desejo nunca é satisfeito, porque não existe um obje- ________________________ to capaz disso, também esses discursos jamais se esgotam, e a verdade sobre o desejo ________________________ jamais se totaliza. É por isso que, repetidamente, falamos e escrevemos sobre sexo, ________________________ reprodução, erotismo e amor.
Esta reflexão destaca a importância do discurso, tanto para dar significado às experiências vividas no campo da sexualidade, quanto para aliviar as tensões nascidas da busca pela completude que jamais se realiza totalmente. Como analisa Foucault (1988), a partir de múltiplos discursos sobre o sexo que o normatizam e o regulam, instauram-se “saberes” e “verdades” sobre sexualidade, que a fazem “um dispositivo histórico”, uma invenção social.
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Neste sentido, os discursos produzidos e veiculados sobre sexualidade precisam ser revestidos de uma ampla compreensão sobre a complexidade e as variações que a caracterizam, evitando ênfases particularizadas em um ou em outro fator considerados determinantes de suas manifestações e exercício, que variam nas diferentes culturas e tempo histórico. Para dar conta do entendimento desta dimensão humana que é a sexualidade, é preciso, contudo, analisá-la como um processo relacional intenso que se fundamenta, basicamente, em elementos discretos, mas complementares: o potencial biológico, as relações sociais de gênero e a capacidade psico-emocional dos indivíduos. Neste sentido, é possível admitir, para uma mais sólida compreensão, que a sexualidade tenha três grandes componentes: o biológico, o psicológico e o sociocultural. O componente biológico é traduzido pelo corpo sexuado, matriz na qual se imprimem marcas indeléveis, como os órgãos associados à reprodução e os caracteres sexuais secundários. Neste campo, se incluem, desde um possível determinante genético para certas características do comportamento sexual, até a complexa fisiologia sistêmica de corpos masculinos e femininos dependentes de arranjos anatômicos funcionais e regulados por fatores neuroendócrinos. As discussões sobre caracteres biológicos que se associam ao exercício da sexualidade devem, também, considerar aspectos como as particularidades de indivíduos que não se enquadram nas descrições anatômicas e fisiológicas, ditas normais,
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bem como o perigoso determinismo biológico que justificaria a impossibilidade de vivência plena da sexualidade, em função da existência de genes, hormônios ou alterações orgânicas que se manifestariam em diferentes momentos de desenvolvimento ou fases da vida. Neste sentido, precisamos entender que pessoas com deficiências de naturezas diversas, como motora, visual, auditiva ou mental também vivem a sua sexualidade. Ressaltamos, ainda, o transtorno da distorção que alguns estudos na área biomédica geram na sociedade, ao associar as diferentes formas de orientação sexual (heterossexualidade, homossexualidade e bissexualidade) a fatores biológicos, como por exemplo, a busca de um “gene gay” ou de uma configuração hormonal específica para esta ou aquela orientação. Um caráter tão complexo que envolve o desejo e uma série de respostas não somente orgânicas, não pode estar condicionado, exclusivamente, pela Biologia. Admite-se que a compreensão do componente biológico da sexualidade esteja cada vez mais confusa porque o que antes era dado como fato irreversível hoje pode ser mudado até anatomicamente, além do próprio exercício da sexualidade de homossexuais e lésbicas que se diferencia do exercício dos heterossexuais. A sexualidade se realiza na corporeidade em completa sintonia com o psiquismo. A sexualidade compreende, também, aspectos ligados à emoção, aos sentimentos e conflitos. Em Freud (1973), houve a evidência da sexualidade no que ela difere da procriação, no que ela transpõe a genitalidade e a possibilidade de estar a serviço do prazer e do bem-estar emocional das pessoas. Na análise de Caridade (1999, p. 55-56):
É por ser esta dualidade de ordens, do instinto e da pulsão, do biológico e do psíquico, do animal e do humano, do real e do simbólico, que a sexualidade assume tanta importância na vida do indivíduo.
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Por ela tornamo-nos animais humanos com pretensões divinas, porque é nessa pluralidade de ordens e dimensões que o humano se supera e fere os limites da finitude. Por isso quando polarizamos a sexualidade em uma dimensão exclusiva, fazemos reduções e empobrecimentos. Sexo é apelo da totalidade, não de dicotomização.
Depreendemos, pois, que, do mesmo modo que não podemos atribuir aos fatores biológicos a determinação da sexualidade, devemos ter cuidado com as generalizações no campo da Psicologia, amplamente difundidas na sociedade e equivocadamente justificadoras tanto de comportamentos que seguem padrões considerados adequados quanto de distúrbios associados à sexualidade, com certeza, de múltipla causalidade. A dimensão social, histórica e cultural se associa aos componentes biológicos e psicológicos da sexualidade. Plasmada pela linguagem, normas e valores vigentes nas sociedades, em diferentes épocas, a sexualidade ganha a feição do contexto cultural em que se insere O conceito de sexualidade traz consigo a ideia de diferenças e de desigualdades; formas de expressão relacionadas ao conceito de gênero que analisaremos a seguir. As relações desiguais de classe, de raça, de geração e de gênero reproduzidas e mantidas nas sociedades se imbricam na constituição do sujeito sexuado. Assim, características do comportamento sexual de mulheres e de homens, de crianças, de jovens, de adultos e de idosos, bem como de pessoas de diferentes classes sociais, variam; são diferentes no tempo e no espaço, ou seja, se expressam com particularidades nas diversas sociedades. Admitimos, inclusive, que não temos apenas um tipo ou padrão de sexualidade. Há manifestações de sexualidade permitidas, outras reprimidas, toleradas ou encorajadas, veladas ou socializadas, legitimadas ou periféricas, enfim sexualidades múltiplas, que na percepção de Foucault (1986, p. 47) são: [...] as que aparecem com as idades (sexualidades do lactente ou da criança), as que se fixam em gostos ou práticas (sexualidade do invertido, do gerontólogo, do feitichista...), as que investem difusamente no relacionamento (sexualidade da relação médico-paciente, pedagogo-aluno, psiquiatra-louco, as que habitam espaços definidos) sexualidade do lar, da escola, da prisão – todas constituem o correlato de procedimentos precisos de poder.
Como um processo relacional de grande importância, a sexualidade se fundamenta em elementos primordiais do ser: o potencial biológico, as relações sociais de gênero e a capacidade psíquico-emocional. Neste sentido, admitimos que a sexuali-
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dade tenha três grandes componentes: o biológico, o psicológico e o sociocultural.
Como você diferencia os componentes biológicos, psicológicos e socioculturais da sexualidade?
Podemos admitir que o componente biológico seja traduzido pelo corpo sexuado, corpo matriz, na qual se imprimem marcas indeléveis, como os órgãos associados à reprodução e os caracteres sexuais secundários. O componente psicológico compreende os aspectos ligados à emoção, aos sentimentos e conflitos associados à sexualidade. E, por componente sociocultural, entendemos o conjunto de impressões ou representações sobre a sexualidade introjetadas pela pessoa em interação com os outros, ao longo de sua vida.
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Sexualidade também não é sinônimo de sexo nem de gênero.
Sexo pode ser definido como uma conformação particular que distingue o macho da fêmea nos organismos que se reproduzem sexuadamente, como os órgãos sexuais externos e até como sinônimo de relação sexual. O sexo é uma categoria anatômico-biológica e o gênero é uma categoria histórico-cultural; o gênero implica a construção social e histórica do ser mulher e do ser homem. Gênero tem sido definido como o elemento constitutivo das relações sociais baseadas nas diferenças que distinguem os sexos, ou nas diferenças percebidas entre os sexos. Neste sentido, as relações sociais de gênero desempenham papel fundamental na construção das identidades feminina e masculina, na perspectiva culturalista que pressupõe a identidade como resultante das aprendizagens advindas das vivências com os outros. Autoras como Judith Butler (2003) e Linda Nicholson (2000) discutem em profundidade mais essa dicotomia. Butler, por exemplo, desconstrói o conceito de gênero, no qual está baseada toda a teoria feminista; questiona o conceito de mulheres como sujeito do feminismo; desmonta a dualidade sexo/gênero. Se sexo é natural e gênero é construído, “nesse caso, não a biologia, mas a cultura se torna o destino” (BUTLER, 2003, p. 26); Butler também denuncia que as feministas não problematizaram um vínculo considerado natural: gênero e desejo. Enquanto Simone de Beauvoir afirma “A gente não nasce mulher, torna-se mulher”, Judith Butler (2003, p. 27) nos diz que: “[...] não há nada em sua explicação que garanta que o ‘ser’ que se torna mulher seja necessariamente fêmea”. Butler (2003) conceitua gênero como um “ato performático”, como um efeito,
gular de cada sujeito, dentro de um campo situado de possibilidades que é reafirmado ou renegociado através de sucessivas “performances”, ou seja, atos, práticas concretas (e não essências naturalizadas) através dos quais os sujeitos se constituem.
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produzido ou gerado. Essa definição resgata a noção de processo e de construção sin-
Aquilo que é socialmente construído – o que hoje entendemos por gênero –, não está em oposição ao que seria biologicamente dado – o sexo. Por outro lado, o biológico não é visto como uma base sobre a qual os significados culturais são construídos. De acordo com Linda Nicholson (2000, p. 13):
[...] precisamos entender as variações sociais na distinção masculino/feminino como relacionadas a diferenças que vão ‘até o fundo’ – aquelas diferenças ligadas não só aos fenômenos limitados que muitas associamos ao ‘gênero’ (isto é, a estereótipos culturais de personalidade e comportamento), mas também a formas culturalmente variadas de se entender o corpo. Essa compreensão não faz com que o corpo desapareça da teoria feminista. Com ela o corpo se torna, isto sim, uma variável mais do que uma constante, não mais capaz de fundamentar noções relativas à distinção masculino/ feminino através de grandes varreduras da história humana, mas sempre presentes como elemento potencialmente importante na forma como a distinção masculino/feminino permanece atuante em qualquer sociedade.
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Gênero
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Gênero
Robert Stoller (1968) apresentou o termo “identidade de gênero” ao Congresso Internacional de Psicanálise, em Estocolmo, em 1963. Formulou o conceito de identidade de gênero no quadro da distinção biologia/cultura, de tal modo que sexo estava vinculado à biologia (hormônios, genes, sistema nervoso, morfologia) e gênero à cultura (psicologia, sociologia). O produto do trabalho da cultura sobre a biologia era o centro, a pessoa produzida pelo gênero – um homem ou uma mulher. Em 1975, Gayle Rubin, ainda dentro de um pensamento epistemológico caracterizado pelo binarismo natureza/cultura, argumentava a favor da primazia da cultura (gênero) sobre a biologia (sexo) definindo o sistema sexo/gênero. Para Donna Haraway (2004, p. 240), [...] a teoria do sistema de sexo/gênero de Rubin, de 1975, explicava a complementaridade dos sexos (heterossexualidade obrigatória) e a opressão das mulheres pelos homens através da premissa central da troca de mulheres na fundação da cultura por meio do parentesco.
Linda Niholson (2000, p. 10), ao analisar o contexto do pensamento feminista entre as décadas de 60 e 70 do século passado, e o impacto do trabalho de Gayle Rubin sobre os estudos feministas, afirma:
A maioria das feministas do final dos anos 60 e início dos 70 aceitaram a premissa da existência de fenômenos biológicos reais a dife-
as sociedades para gerar uma distinção entre masculino e feminino. A nova idéia foi simplesmente a de que muitas das diferenças associadas a mulheres e homens não eram desse tipo, nem efeitos dessa premissa. Assim, o conceito de ‘gênero’ foi introduzido para
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renciar mulheres de homens, usadas de maneira similar em todas
suplementar o de ‘sexo’, não para substituí-lo. Mais do que isso, não só o ‘gênero’ não era visto com substituto de ‘sexo’ como também ‘sexo’ parecia essencial à elaboração do próprio conceito de ‘gênero’. Um exemplo disso pode ser encontrado numa das mais influentes discussões sobre ‘gênero’ da literatura do início da segunda fase. Em seu importante artigo, ‘The Traffic in Women’, Gayle Rubin lançou a expressão ‘[...] o sistema sexo/gênero’, definindo-o como ‘[...] o conjunto de acordos sobre os quais a sociedade transforma a sexualidade biológica em produtos da atividade humana, e nos quais essas necessidades sexuais transformadas são satisfeitas’. Aqui o biológico foi assumido como a base sobre a qual os significados culturais são constituídos. Assim, no momento mesmo em que a influência do biológico está sendo minada, está sendo também invocada.
O termo gênero foi ressignificado por Joan Scott (1991, p.14), em meados do Século XX, como sendo o “[...] elemento constitutivo das relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos”. Para essa pensadora, o núcleo essencial dessa definição baseia-se na conexão integral entre duas proposições: ser constitutivo de relações sociais e ser, também, uma forma de significar relações de poder. Os gêneros também concretizam uma ideologia; ao mesmo tempo em que são constituídos pela sociedade, o masculino e o feminino, em conjunto, a constitui. Por conseguinte, gênero é uma questão social, uma questão política e, como tal, diz respeito a todas as pessoas, assim como o é a sexualidade humana.
A partir de Scott, não mais baseado nas diferenças biológicas ou “naturais”, o gênero foi (des)naturalizado. O gênero passou a ser entendido como relação, primordialmente política, que ocorre num campo discursivo e histórico de relações de poder. O gênero é produto de um longo trabalho histórico e cultural de construção teórica e prática, exercido sobre os corpos e sobre as mentes. Como analisa Bourdieu (1989, p. 43), trata-se de um trabalho incessante de reprodução, de recriação de estruturas objetivas e subjetivas de dominação “[...] para o qual contribuem agentes específicos (entre os quais os homens com suas armas como a violência física e a violência simbólica) e instituições, família, igreja, Escola, Estado”. Com base nas ideias de Scott (1991) e de Bourdieu (1989), entendemos que o gênero é uma construção sociocultural e política que opera através de representações e estereótipos de feminilidade e de masculinidade, bem como de modos de ser ou habitus2 — femininos e masculinos — disposição para ser dominado e para dominar, somatizados através do processo educacional.
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CONSTRUINDO FEMINILIDADES E MASCULINDADES
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Fonte: Clipart
Autores como Hall (2001) e Woodward (2000) vêm afirmando que, na contemporaneidade, as identidades são fluídas, inconstantes, fragmentadas e múltiplas. Para Hall (2001, p. 13): O sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são unificadas em torno de um ‘eu’ coerente.
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Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que as nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas [...] à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis com cada uma as quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente.
Nessa perspectiva, a escola deve ser considerada um ambiente propício para diferentes tipos de relações e enfrentamentos, caracterizados como relações de poder, onde os sujeitos em formação estão em processo de construção de suas identidades, em especial, suas identidades de gênero. A escola, como uma instituição que reproduz valores e representações sociais vigentes, reforçam certos estereótipos sobre o ser homem e o ser mulher consagrados historicamente; assim, associadas ao interior, escuro, fechado e privado, a menina aprende que, do gênero feminino, a sociedade espera o ser mãe, o cuidar e o maternar, a dependência (do pai, do irmão, do marido, dos filhos), o ser companheira do homem, a pureza, a docilidade. Por outro lado, o menino, associado ao exterior, claro, aberto e público, aprende que a sociedade espera do gênero masculino a virilidade, a racionalidade, a força, o controle, o enaltecimento de seu trabalho, sua profissão, a produção, sucessos, aventuras, conquistas, o ser provedor da vida e do destino da família, além do controle das emoções, tidas como sinônimo de fragilidade. Trata-se de uma masculinidade hegemônica, em oposição à feminilidade, ambas minadas por outros códigos de represen-
Mas, ao admitirmos haver uma masculinidade hegemônica, não assumimos a crença de que há uma forma correta e única de ser homem, assim como não há uma correta e única de ser mulher, mas que há padrões de comportamentos, sentimentos
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tação.
e interesses que são construídos de modos diferentes. Mulheres e homens constroem, dessa forma, suas identidades, acreditando serem pertinentes ao seu gênero todos os dispositivos que lhes são impostos e, consequentemente, apreendidos. Falando em feminilidades e masculinidades, assumimos o que também deve ser questionado: como admitir a existência dessas duas formas que se inserem no sistema sexo/gênero nomeado por Rubin (1975), se é tão polimorfa a vivência sexual humana? Essa polimorfia se deve à complexidade do córtex cerebral e também, quem sabe primordialmente, à diversidade de respostas que damos ao contexto histórico e cultural? Sabemos que uma pessoa pode ser fêmea ou macho devido ao sexo genético, gonadal, ductal e genital, mas identificar-se e ter uma vida social e erótica de uma mulher ou de um homem é outro processo. À ampliação das possibilidades de discussão da sexualidade, a partir da segunda metade do Século 20, acrescenta-se a compreensão da amplitude das definições de feminilidades e masculinidades, incorporando as múltiplas formas de expressão da sexualidade como dos/das homossexuais no sistema social.
Há, inclusive, uma certa recusa em classificar os indivíduos em categorias universais e dicotômicas como mulheres e homens, heterossexuais e homossexuais, entre outras que desencadeou a formalização de uma corrente nomeada Teoria Queer. Queer é estranho, raro, esquisito. Queer é também o sujeito da sexualidade dita “desviante” – homossexuais, bissexuais, travestis, drags. É o excêntrico que não deseja ser “integrado” e muito menos “tolerado”. É um jeito de pensar e de ser que não aspira o centro e nem o quer como referência.(LOURO, 2004)
Como um movimento que se remete ao estranho e ao excêntrico pode articular-se com a Educação, tradicionalmente o espaço da normalização e do ajustamento? Como uma teoria não propositiva pode ‘falar’ a um campo que vive de projetos e de programas, de intenções, objetivos e planos de ação? Qual o espaço, nesse campo usualmente voltado ao disciplinamento e à regra, para a transgressão e para a contestação? (LOURO, 2004, p.47)
Ao mesmo tempo em que se reafirma o caráter discursivo da sexualidade, ampliam-se as concepções sobre o significado de sexo, sexualidade e gênero. Como analisa Butler (2009), as sociedades constroem normas que regulam e materializam o sexo dos sujeitos, normas essas que precisam ser constantemente repetidas e rei-
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teradas para que se concretize essa materialização. Por outro lado, ela acentua que, dificilmente, nossos corpos se conformam completamente às normas pelas quais essa materialização lhes é imposta. Corpo, sexualidade e história se imbricam numa dinâmica atraente e complexa.
Depois dessas reflexões, você pode explicar o que entende por:
Sexo = Gênero = Sexualidade =
Definir esses termos é possível, mas não mais necessário colocá-los como categorias antagônicas. É preciso desconstruir as concepções que referendam a dicotomi-
________________________ zação histórica de binarismos como mulher/homem, feminilidades/masculinidades e ________________________ posições ocupadas pelas mulheres e pelos homens na sociedade. ________________________ ________________________ ________________________ Reflita sobre o que analisamos e enumere, no quadro a seguir, tarefas que, na ________________________ atualidade, são pertinentes às mulheres e aos homens. ________________________ ________________________ Papéis de gênero ________________________ As mulheres... Os homens... ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Para continuar refletindo: ________________________ - Sempre foram assim desempenhados esses papéis? ________________________ ________________________ - Poderíamos trocar o que foi definido em cada coluna e continuar verdadeira a associação ________________________ das tarefas? ________________________ ________________________ ________________________ ________________________
Bem, com essas reflexões, não se esgota a abordagem proposta de ampliar o conceito de sexualidade, compreender o conceito de gênero e refletir e reestruturar concepções sobre sexualidades, sexo/gênero e educação sexual.
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Mas, finalizamos a aula considerando a posição de três grandes associações mundiais que lidam com a temática: a World Association for Sexuality (WAS); a Pan American Health Organization (PAHO) e a World Health Organization (WHO) (2000), ao afirmarem que a sexualidade se refere ao núcleo do bem-estar humano que inclui sexo, gênero, identidades, orientação do desejo sexual, erotismo, vínculo emocional, amor e reprodução. Sexualidade é a expressão de pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, papéis, relacionamentos, comportamentos, atividades e práticas sexuais que se manifestam nos planos pessoal, interpessoal e comunitário, caracterizados por autonomia, maturidade, respeito, consentimento, honestidade, proteção, busca de prazer e bem-estar. Vista, pois, de forma abrangente, a sexualidade resulta da integração dos fatores biológicos, psicológicos, socioeconômicos, culturais, étnicos e religiosos; inclui todas estas dimensões, inclusive as de construção das identidades, especialmente as
de gênero, mas elas não são, necessariamente, simultaneamente experimentadas ou ________________________ manifestadas. Somando-as, entretanto, temos nossa sexualidade experiente e expres- ________________________ sada em tudo que somos, sentimos, pensamos e agimos. Numa dimensão temporal, a sexualidade humana se estende do nascimento à morte, é parte fundamental de nossa identidade e uma característica importantíssima de nossa condição de humanidade, dimensão essa que objeto das aulas que se seguem.
SÍNTESE
Nesta aula, refletimos sobre os conceitos de sexualidade, sexo, gênero, feminilidades e masculinidades. Nas próximas aulas, faremos um estudo sobre como se manifesta a sexualidade na infância, na adolescência e na idade adulta, importante corpo de conhecimentos para educadores.
Avante!
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REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Difel, 1989.
BUTLER, Judith. Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do ‘sexo’. In: LOURO, Guacira Lopes (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. p. 151-172.
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Acesso em: 20 nov. 2014.
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Adaptação dos artigos: FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho. Sexualidade e gênero uma abordagem conceitual. In: FAGUNDES, Tereza
Cristina Pereira Carvalho (org.). Ensaios sobre Educação, Sexualidade e Gênero. Salvador: Helvécia, 2005. p. 9-20. e FAGUNDES, Tereza Cristina
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World Association for Sexology (WAS); Pan American Health Organization (PAHO); World Health Organiza-
Pereira Carvalho. Sexualidade Gênero: uma abordagem conceitual. Salvador: IAT, 2010. 2
O conceito de habitus refere-se ao sistema de disposições adquiridas no processo de socialização primária: capacidade cognitiva, esquemas
de percepção, pensamento, apreciação e ação, produto da internalização de normas culturais. O habitus expressa um estado habitual, especialmente do corpo, predisposição, tendência, propensão ou inclinação, incluindo a autodisciplina e a autoestima (BOURDIEU; PASSERON, 1975).
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Autora: Profª Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
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AULA 02 - SEXUALIDADE NA INFÂNCIA
Na primeira aula, fizemos uma abordagem conceitual para ampliar a compreensão do que conhecemos como sexualidade e como gênero. Nesta aula, o enfoque recai sobre as mais frequentes manifestações da sexualidade na fase da vida, conhecida como infância. Esses conhecimentos são muito importantes para a formação de professores de Educação Infantil e do Ensino Fundamental.
As ilustrações anteriores apresentam questionamentos comuns na infância e, entre outros, são indicadores da necessidade de se educar para a sexualidade na família e na escola.
OS DIFERENTES MODOS DE “SER” DA INFÂNCIA NA CONTEMPORANEIDADE1 Você já pensou qual o lugar da infância na atualidade? Como se caracteriza, hoje, a experiência de ser criança?
Nem sempre, contudo, a criança foi considerada como pessoa em desenvolvimento. Na sociedade medieval, o sentimento de infância, ou seja, a consciência das diferenças entre crianças e adultos não existia. Encontramos uma referência em Áries (1978, p. 99) para quem “[...] assim que a criança tinha condições de viver sem a solicitude constante de sua mãe ou de sua ama, ela ingressava na sociedade dos adultos e não se distinguia mais destes”. Crianças e adultos partilhavam das mesmas atividades 1 Texto em coautoria com a Profª Claudia Regina de Oliveira Vaz Torres
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cotidianas. Antes de falar sobre a sexualidade na infância, precisamos analisar a infância considerando o lugar que a criança ocupa nas diferentes organizações sociais, pois os diferentes modos de ser e agir da criança são construídos na interação com as pessoas, nos discursos e nas diversas expectativas sobre o “vir a ser” desse sujeito. Do mesmo modo, é preciso estar atento à produção de “verdades” sobre a infância, deslegitimando o saber dos pais. O significado social e ideológico da criança e o valor social atribuído à infância têm sido objeto de estudo da sociologia, afirma Kramer (1999), ao explicar que a dependência da criança em relação ao adulto é fato social e não natural. Através das pesquisas em Antropologia, conhecemos as populações infantis com suas diferentes práticas culturais. E com a concepção histórica materialista dialética de Vygotsky, que fundamenta a sua teoria histórico-cultural, passamos a compreender a constituição da pessoa humana na interação com o mundo social sempre permeada por contradições.
Quais são as contradições que as crianças vivenciam no seu processo de desenvolvimento? Como os adultos percebem e tratam as crianças?
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Até o Século XVIII, a criança não era percebida nas suas especificidades. O descaso com a criança tinha, como uma das consequências, as altas taxas de mortalidade infantil. A criança era inserida no mundo adulto, participava de todas as atividades como se fosse adulta e lutava para sobreviver. Segundo Ariès (1978), foi a partir do Iluminismo que a criança passou a ser reconhecida pela ciência. O ideário Iluminista procurava interpretar e analisar o mundo através da razão. Também a natureza dessacralizada, ou seja, desvinculada da religião, aparece em todos os campos de discussão no século XVIII. (ARANHA, 1996) A criança, então, passou a ser vista como um ser singular com características diferentes do adulto, mas que precisava ser percebida como o adulto de amanhã, um sujeito que se tornaria um ser de razão e, para isso, precisava amadurecer de modo mais rápido. Ghiraldelli (2002) explica que Montaigne e Rousseau estão na base da construção da ideia de infância. Montaigne, no século XVI, desejava que os adultos fizessem da criança um homem, o que significava considerar que a criança não era mais concebida como “um adulto em miniatura” e que precisava ser disciplinada e instruída. E Rousseau, no século XVIII, considerava que os adultos deveriam deixar a criança ser criança, de modo que a infância acontecesse. A infância, para Rousseau, é o período em que somos puros de coração porque não entramos em contato com a realidade so-
ressalta que, para Rousseau, o trabalho com a criança deveria ser voltado para o cultivo do coração, da intimidade, do que é a natureza de cada um e de onde podem sair os melhores frutos, porém, para o autor, o pensamento rousseniano é burguês, assentado no cultivo da privacidade que privilegia a relação íntima, a disciplina interior e a
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cial e cultural e não fomos corrompidos pela sociedade dos homens. Ghiraldelli (2002)
criança como indivíduo.
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/Image:Michel_de_Montaigne_1.jpg
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/Image:Jean-Jacques_Rousseau_%28painted_portrait%29.jpg
Com a Revolução Industrial e os desdobramentos do capitalismo, as crianças que estavam sendo destinadas à escola são encaminhadas para o mundo do trabalho. Ariès (1978) pontua que, no início do século XX, a escola torna-se de direito o lugar da criança, mas isso não ocorre de fato. No século XX, esclarece Ghiraldelli (2002, p. 25), generalizou-se a ideia da criança como ser ativo que deve ser colocada em ação, em contato com os materiais para manipulá-los e tomar consciência da sua ação. [...] Assim, se o século XX quer, ainda, se referir a uma essência da infância, deve fazê-lo entendendo que ela reside na existência, na medida em que esta lhe determina como um ser ‘espontaneamente ativo’, ‘curioso’, que ‘manipula o mundo’, enfim, que em certo sentido, trabalha _ e que isso a caracteriza como ser humano. (GHIRALDELLI, 2002, p. 25)
Na análise do autor, a criança considerada como um ser ativo justifica o surgi-
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mento das pedagogias centradas no interesse, na atividade e no trabalho. A ‘pedagogia do trabalho’, a ‘pedagogia ativa’, a ‘pedagogia centrada no interesse do aluno’ etc., são, na verdade, desdobramentos, opções e vertentes, ora mais ora menos vinculadas diretamente à profissionalização, inseridas no campo das diretrizes postas pelo status quo vigente. (GHIRALDELLI, 2002, p. 27)
Dessas análises, depreende-se que o olhar sobre a criança e o seu lugar na sociedade ocorreram de acordo com a organização da sociedade no século XX, em termos de estruturação econômica e social.
E hoje, como vemos a criança? Como a criança está inserida na sociedade de consumo?
Na sociedade contemporânea, os objetos de consumo tornaram-se mais valorizados, porque aumentam a visibilidade dos sujeitos que os possuem. Os objetos de consumo adornam o corpo, operam intervenções e criam possibilidades infinitas de observação, identificação, classificação e pertencimento. Com relação à criança, falar
________________________ do corpo consiste em analisar os diferentes discursos e marcas que são internalizadas ________________________ e incorporadas aos processos identitários no esforço de assumir aparências e modelos ________________________ aceitos no contexto social. ________________________ Deste modo, na sociedade de consumo, ________________________ ________________________ A noção de infância se altera significativamente. Ser criança é ter um ________________________ corpo que consome coisas de criança. Que coisas são estas? Primei________________________ ro, coisas que a mídia define como tendo sido feitas para o corpo de criança. Segundo, coisas que ela define como sendo próprias do ________________________ corpo de criança. Respectivamente: por um lado, bolachas, dano________________________ ninhos, sucos, roupas, aparatos para jogos, etc., por outro, gestos, ________________________ comportamentos, posturas corporais, expressões, etc. Ser criança é ________________________ algo definido pela mídia, na medida em que se possui o corpo-que________________________ -consome-corpo, na medida em que se é um corpo-que-consome________________________ -corpo. A infância deixa de ser uma fase natural da vida humana e ________________________ passa a ser um flash corporal autorizado pela mídia. Um flash que busca, nos segundos que dura_ repetidos a cada comercial de TV, re________________________ criar a criança como indivíduo, como ser livre, outrora apresentado ________________________ pelo humanismo; e como ‘ser ativo’ outrora apresentado pela ‘socie________________________ dade do trabalho’ e, de certo modo, ainda pela ‘sociedade científico________________________ -tecnológica’. Todavia, o que temos é, na verdade, mero corpo, mero ________________________ consumidor. Não indivíduo, mas simulacro dele. (GHIRALDELLI, ________________________ 2002, p. 38) ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Entende-se, pois, que a construção da subjetividade da criança na contempo-
transita entre ser único e semelhante a outros corpos, mas que habita e é produzido na cultura.
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raneidade tem, na dimensão corporal, um importante ponto de análise. Corpo que
Observe o seu cotidiano e reflita: A sociedade infantiliza as crianças ou as torna adultas mais cedo?
Nos últimos anos, as crianças amadurecem mais cedo, porque são “empurradas” a conviver com a realidade violenta dos grandes centros urbanos e enfrentam a contradição entre permanecerem crianças e tornarem-se adultas mais cedo. Sobre esse aspecto, Kramer (1999, p. 276) analisa:
E é numa realidade violenta, hostil e que não sabe lidar com a diferença que temos educado nossas crianças. Elas são obrigadas a conviver com: Galdino índio pataxó queimado; mendigos mortos nas esquinas; homossexuais chacinados nas estradas; meninos executados [...] métodos disciplinares que violentam os mais primários direitos das pessoas; processos visíveis ou invisíveis de calar a palavra alheia [...] As crianças
são, no cotidiano, educadas com imagens de guerra distante da Europa, das guerras ________________________ crônicas da África e do extermínio progressivo das populações pobres da América Lati- ________________________ na; com imagens de crianças matando colegas da escola; neonazistas vitimando gays, ________________________ negros, judeus [...]
No contexto das reflexões da autora, depreende-se que a história de vida de cada criança está atrelada às condições sociais e históricas do contexto em que ela está inserida, mas também temos que questionar a frieza, a crueldade, o descaso com o outro, a hipocrisia, a pobreza afetiva que permeiam as relações humanas do nosso tecido social nos dias atuais. Ao tomarmos consciência da situação da criança, nos perguntamos o que pode ser feito para recuperar o convívio, o diálogo, a sensibilidade diante da dor do outro, a generosidade e o sentimento de pertencimento a um lugar. As crianças são especialmente afetadas em sociedades em que a violência, a pobreza, a desagregação familiar, o escorraçamento e a exclusão social estão na tessitura da malha social. Dados da UNICEF (2007, p. 1) revelam:
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[...] as crianças são especialmente vulneráveis às violações de
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direitos, à pobreza e à iniquidade no País. Por exemplo, 29% da população vive em famílias pobres, mas, entre as crianças, esse número chega a 45,6%. As crianças negras, por exemplo, têm quase 70% mais chance de viver na pobreza do que as brancas; o mesmo pode ser observado para as crianças que vivem em áreas rurais. Na região do Semiárido, onde vivem 13 milhões de crianças, mais de 70% das crianças e dos adolescentes são classificados como pobres.
Esses dados evidenciam o desrespeito à infância, à violência e à desigualdade social. Há que refletirmos sobre os processos de socialização, a diminuição da autoridade e controle paternos, a permanente ideia de aligeirar a infância através da viabilização do acesso a todos os tipos de informação, de experiências e situações cotidianas do mundo adulto e as consequências provenientes disso. Também, a mudança nas relações familiares e na relação criança/adolescente/ adulto, o excesso de autonomia e independência conferida às crianças precocemente, a satisfação imediata dos desejos e o consumo têm proporcionado significativas alterações nos modos de construção da subjetividade de meninos e meninas. É na complexidade da construção dos novos modos de ser da infância na contemporaneidade,
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em que lidamos com crianças inseridas ou excluídas do consumo e da proteção da família e do Estado, que enfrentamos a necessidade, como educadores(as), de reconhecermos as crianças como sujeitos e com direitos sociais.
As crianças foram reconhecidas como “sujeitos de direitos” em 20 de Novembro de 1959, quando a Assembleia geral da UNICEF2 homologou a Declaração Universal dos Direitos das Crianças (Link: http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/c_a/lex41. htm). E para contemplar esses direitos, entre outros processos, situa-se a compreensão da criança como ser sexual e a garantia de uma educação plena/integral, que abarque a educação para a sexualidade.
FALANDO EM SEXUALIDADE Há quem considere que a sexualidade se manifesta desde a vida intrauterina, quando a criança é alvo do desejo mais ou menos ambíguo dos pais, segundo as circunstâncias que acompanharam a sua concepção. Em torno dela, são tecidos laços imaginários que o nascimento reforça ou desmente (BETTELHEIM, 1988). A partir do nascimento, pertencente a um ou outro sexo, é fundamental que seja aceita e amada, independente da expectativa materna ou paterna; a não aceitação certamente trará consequências sobre o desenvolvimento pleno da criança. Os estudos sobre a sexualidade humana, por mais articulados que sejam, são 2 UNICEF - United Nations Children’s Fund.
psicológico. Dessa maneira, o desenvolvimento da sexualidade como ciência tem considerado padrões de comportamento pouco flexíveis que desconsideram as importantes variações individuais (podemos admitir até mesmo imprevisíveis!), como, aliás, o são as demais expressões humanas. Neste sentido, ressaltamos que as fases do
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sustentados pela visão clássica de base essencialista de cunho biológico e de cunho
desenvolvimento da sexualidade humana, descritas a seguir, devem ser vistas como manifestações mais frequentes encontradas e relatadas em estudos realizados com diferentes populações. (GREGERSEN, 1983; TIEFFER, 1993; ABERASTURY; KNOBEL, 1981). Feitas tais considerações, que definem uma perspectiva não biologizante da sexualidade, mas que não despreza a dimensão corporal que a concretiza, analisaremos algumas manifestações da sexualidade comumente encontradas durante a infância de meninas e de meninos.
IDENTIFICANDO MANIFESTAÇÕES DA SEXUALIDADE NA INFÂNCIA
No início da vida, a criança não tem clara consciência de si mesma, tem forte dependência materna e evidencia sentimentos sexuais, como o prazer de ser acariciada. É o período em que se dá o início da aprendizagem do conhecer e experimentar o seu próprio corpo; usa a boca como fonte de conhecimento, de exploração e de prazer.
Fonte: Arquivo pessoal da Profª. Tereza Fagundes
Que outros tipos de comportamento você associa à sexualidade, nesse período?
Por volta de dois anos, a identidade de gênero (a aprendizagem do ser mulher e do ser homem) começa a ser entendida. É a fase da descoberta do corpo do outro e melhor conhecimento do seu próprio corpo, incluindo aspectos como: curiosidade pelo corpo da mãe e do pai, o exame dos próprios genitais e a masturbação auxiliando na compreensão de seu corpo, de seu prazer, como alívio nas frustrações.
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Fonte: Arquivo pessoal da Profª. Tereza Fagundes
Analisando o que refletimos:
= O que você pode depreender da análise das fotografias anteriores?
= Que características da sexualidade na infância podem ser inferidas?
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A partir dos dois ou três anos, as crianças questionam diferenças entre homens e mulheres, meninos e meninas, a presença de seios, o tamanho dos órgãos sexuais dos adultos. Por volta dos quatro anos, costumam praticar jogos exibicionistas, jogos sexuais. Esses jogos são importantes porque facilitam a exploração do ambiente e a união entre as crianças. Favorecem, inclusive, um melhor desenvolvimento cognitivo, ao permitirem a prática de papéis de gênero e manejo de conflitos e ansiedades.
Inspirando-se nas fotos que se seguem, exemplifique dois questionamentos associados à sexualidade que crianças desta faixa etária costumam fazer.
Fonte: Arquivo pessoal da Profª. Tereza Fagundes
a afirmação da identidade de gênero. E essa percepção do ser menina ou do ser menino não está centrada, apenas, nas diferenças anatômicas, como também nas características apresentadas pelas mulheres e pelos homens que fazem parte de suas histórias. Os dois sexos procedem a investigações mútuas que dão respostas aos problemas
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Aos seis anos, com a familiarização das diferenças entre meninas e meninos, há
das diferenças sexuais; começam a incluir o outro em suas brincadeiras sexuais, usam muito “palavrão” e conflitam-se com as contradições existentes entre informações obtidas através dos colegas, dos professores, dos amigos e dos pais.
Fonte: http://www.sxc.hu
Aos sete anos, é comum terem desejo intenso do nascimento de um bebê na família, pedindo, muitas vezes, um irmãozinho do mesmo sexo que o seu. Há crescente interesse pela gravidez da mãe, quando acontece, e excitação diante de fatos como nascimento, crescimento, alimentação de bebês, o papel do pai na procriação, piadas, ________________________ revistinhas e filmes de conteúdo sexual. Aos oito anos, a sexualidade em desenvolvimento continua a ser de interesse central, mas protegida pela “clandestinidade”. Significa dizer que não há ausência de interesse sexual e sim a formação da consciência de suas manifestações em condições de privacidade. Satisfazem-se em olhar dissimuladamente umas para as outras, em lançar expressões livres ou cochichar, escrever e pronunciar termos relativos à excreção e ao sexo. Tendem, nessa idade, a uma separação espontânea entre os sexos nas interações, nos jogos e nas brincadeiras.
Fonte: http://pt.wikipedia.org
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A partir dos oito ou nove anos de idade, as crianças passam a dar mais importância a um grupo de amigos que possuem gostos semelhantes.
Que lembranças você tem deste período da vida? Você acha que crianças de oito anos não manifestam interesse por questões sobre sexo?
A experiência e a literatura nos mostram que, quando estão em grupo, por volta dos nove anos, as crianças também podem se sentir estimuladas a brincar aos beijos e a dizer gracinhas sobre sexo e amor. Com a proximidade da puberdade (que varia temporalmente), aumenta o intercâmbio de vivências e de informações sobre sexualidade, principalmente com amigos do mesmo sexo.
________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Fonte: Clipart ________________________ ________________________ ________________________ Fato é que a sexualidade na infância estabelece as bases para a sexualidade na ________________________ adolescência e para a sexualidade na vida adulta; é, também, por outro lado, e infeliz________________________ mente, a raiz de muitos problemas relacionados ao sexo. ________________________ ________________________ Leia mais sobre Infância em ________________________ ________________________ ________________________ DEL PRIORI. Mary (org.). História das crianças no Brasil. 7. ed. São Paulo: Contexto, 2010. ________________________ ________________________ ________________________ FREITAS, Marcos Cezar de (org.). História social da infância no Brasil / Social history of childhood in Brazil. Säo Paulo: Cortez, 2001. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________
SILVA, Maria Cecília Pereira da (Org.). Sexualidade começa na Infância. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010. (Biblioteca virtual)
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Sobre Sexualidade, aprofunde seus saberes em:
Refletiremos, agora, sobre como os pais e educadores veem essas manifestações e como precisariam mudar a sua percepção, a fim de contribuir para que as crianças possam viver, em plenitude, sua sexualidade em desenvolvimento.
O QUE PENSAM OS PAIS
É costume, que atravessa a história e diferentes sociedades, a criança ser definida como um ser inocente. Pais e educadores, adultos, de um modo geral, que lidam com recém-nascidos e bebês menores de dois anos, costumam ignorar os prazeres íntimos individuais na criança como parte do lado bom da vida; não “enxergam” a sexualidade como integrante vital dos relacionamentos e como parte do que entendem ser a educação infantil, começam a incentivar comportamentos diferenciados entre meninos e meninas.
O que pensamos ser adequado fazer?
A criança é um ser dependente de cuidados. Para ter um desenvolvimento saudável, é importante que pais e educadores expressem carinho: peguem o bebê no colo, abracem, beijem, brinquem junto. É importante que aprendam a reagir naturalmente a qualquer manipulação genital, que usem corretamente nomes para todas as partes do corpo e que aceitem a sexualidade como parte integrante da vida.
Diante de crianças por volta dos dezoito meses e até aproximadamente três
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anos, pais e educadores evitam menções sobre a área compreendida entre a cintura e o joelho, começam a diminuir o contato corporal, principalmente com os meninos, apresentam dificuldades em aceitar a existência do prazer sexual nas crianças e manifestam repressões que podem levar à atividade sexual culposa. Cabeça, ombro, joelho e pé,
Joelho e pé, joelho e pé.
Cabeça, ombro, joelho e pé,
Olhos, ouvido, boca, nariz.
(Música infantil - sabedoria popular)
Dos três aos seis anos, há expectativas de comportamentos diferenciados de meninas e meninos. Frente aos jogos sexuais e às reações das crianças frente às informações de cunho sexual, comuns neste período, alguns adultos reprimem e outros são mais realistas. Mas, no geral, têm pouca consciência de como educar para a sexu-
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alidade.
É importante que a criança se sinta acolhida, mesmo quando percebe que não está agindo de forma conveniente. Os adultos precisam reagir com calma quando a criança fala ou faz gestos considerados feios relacionados a sexo e à sexualidade. Precisam, também, desde essa fase da vida, contribuir para o entendimento do que é ser menina e o que é ser menino – da identidade de gênero.
COMO EDUCAR PARA A SEXUALIDADE?
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Podemos admitir que a educação sexual para crianças dos três aos seis anos consiste em compreender que essa idade é de mudanças significativas e que precisam lidar com situações novas como os jogos sexuais e a masturbação; ser paciente com as demonstrações de ciúme e intervir quando necessário para não existir competição negativa entre as crianças. É importante responder objetivamente às questões sobre sexo ou a ele relacionadas, sem zombar ou reprimir. Os educadores devem respeitar os limites da sexualidade dos pais e ambos (pais e educadores) conscientizarem-se que são exemplos e que dão educação, principalmente através da linguagem não-verbal. Dos seis anos até antes da puberdade, pais e educadores demonstram impaciência com as crianças e costumam evitar contato corporal mais íntimo, com a desculpa de que este comportamento evita o despertar de sentimentos eróticos neles ou nas crianças. Muito pelo contrário, precisamos conscientizá-los da importância em promover a integração dos grupos, incentivar o senso crítico nas crianças, com relação aos valores da sociedade; em responder objetivamente às questões sobre sexo e sexualidade e indo mais além, em criar oportunidade e clima favoráveis para a discussão de temas, comportamentos e atitudes ligados à sexualidade.
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SÍNTESE Nesta aula, analisamos alguns aspectos da sexualidade na infância e os diferen-
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tes modos de ser e agir da criança na contemporaneidade que são construídos na interação com as pessoas e estão atreladas às condições sociais e históricas do contexto em que ela está inserida. Refletimos, também, sobre a importância de rever nossas posturas frente a esta dimensão da vida humana e a de atuarmos no processo de educar para a sexualidade como educamos para a vida. Na próxima aula, estudaremos a sexualidade na adolescência!
Até lá!
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VYGOTSKY, Lev Semenovich. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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Autora: Profª Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
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AULA 03 - SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA
Dando continuidade ao que estudamos na aula anterior - sexualidade na infância, analisaremos, nesta aula, a sexualidade na adolescência.
Você sabe o que é ser adolescente?
Que transformações são características desta fase da vida?
O que muda em termos da sexualidade da infância para a adolescência?
Fonte: http://www.sxc.hu
Dizer que a adolescência é a fase de transição da infância para a idade adulta é defini-la da forma mais simples porque, assim como outros conceitos, o de adolescência é bastante polêmico. Adolescência é uma palavra derivada do verbo latino adolescere, “[...] que significa crescer, desenvolver-se, tornar-se jovem” (BECKER, 1994, p. 8) e é um conceito relativamente novo. Segundo Áries (1981), somente no início do século XX houve o reconhecimento de que havia uma etapa do desenvolvimento humano entre a infância e a idade adulta que apresentava características marcantes e diferenciadas das demais. Neste sentido, apropriamo-nos da ideia de Cavalcanti (1988), para quem, se a infância nasceu com a burguesia, a adolescência foi gerada no bojo da revolução industrial. Também para esse especialista, adolescência é um conceito mais nítido na população urbana do que na população do campo e mais bem caracterizado quanto maior for o privilégio da classe social a que se pertence. Margaret Mead (1972), ao estudar o cotidiano dos jovens em Samoa, infere que o desenvolvimento dos jovens de sociedades primitivas segue um padrão de continui-
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dade, sem mudanças repentinas entre uma fase e outra da vida, quando comparado ao desenvolvimento dos jovens das sociedades modernas que é mais conturbado e rápido. Depreendemos, pois, que a adolescência é um entendimento variável conforme a época, o espaço geográfico e o grupo social a que se refere. Independente, contudo dessas variantes, a adolescência entendida como fase de transição entre a infância e a idade adulta, compreende aspectos fisiológicos, psíquicos e socioculturais.
Você, que já passou da adolescência, é capaz de lembrar alguns desses aspectos? Liste-os a seguir: Aspectos fisiológicos
Aspectos psíquicos
Aspectos socioculturais
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Em artigo disponibilizado para o programa Salto para o Futuro (FAGUNDES, 2004, p. 1) analisamos o seguinte:
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As modificações biológicas corporais, que não se iniciam na mesma época nem têm a mesma duração em todas as pessoas, envolvem todos os órgãos e estruturas do corpo. Há um grande impulso na estatura dos adolescentes, para as meninas, na idade média de onze anos e meio e, para os meninos, por volta dos treze anos e meio – é o chamado estirão puberal. Os picos de velocidade são 8,3 centímetros por ano, para as garotas, e 9,5 centímetros por ano, para os garotos. É por isso que a maioria das meninas de onze anos é mais alta do que os meninos da mesma idade, entretanto, a maioria deles logo alcança as meninas, ficando mais altos. O crescimento precoce não é indicativo de uma estatura mais elevada; as crianças que começam o estirão mais tarde apresentam uma média igual a das que começam mais cedo.
Interessante lembrar que mesmo antes de perceber uma mudança em sua altura, os adolescentes percebem mudança no tamanho de seus pés e de outras partes do corpo, como as mãos e braços, que às vezes os assustam.
Os meninos ganham peso ao mesmo tempo em que crescem em altura e têm um aumento muscular duas vezes maior do que as meninas; já as meninas crescem, para depois começar a ganhar peso e menstruar; acumulam mais gordura subcutânea (na pélvis, no busto, nas costas e nos braços) do que os meninos.
A maioria dos órgãos duplica o seu tamanho: coração, pulmões, fígado, baço, rins, pâncreas, tireóide, supra-renais, gônadas, útero, genitais externos (pênis e vulva). O sistema nervoso também tem um aumento real, mas não tão acentuado, enquanto as amídalas, as adenóides e a cavidade da medula óssea diminuem. As glândulas sudoríparas ficam mais ativas, fazendo com que a transpiração seja mais freqüente e com cheiro diferente do existente quando criança, nas axilas, palmas das mãos, plantas dos pés e área genital (vulva e pênis). Também as glândulas sebáceas se tornam mais ativas, podendo resultar em cabelos mais oleosos, genitais mais úmidos e poros da pele do rosto, costas e outras regiões do corpo tão oleosas que originam cravos e espinhas (acne).
Não há uma idade precisa que se defina como sendo da Adolescência, entretanto temos indicadores comuns que permitem sua delimitação. Podemos, contudo, adotar o que preconiza a Organização Mundial da Saúde (WHO, 1995) que considera a adolescência como o período da vida que vai dos 10 aos 19 anos de idade.
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40 Já o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1988), considera a adolescência como o período que vai dos 12 aos 18 anos. Com um adendo, o Parágrafo Único do Art. 2° que legisla ser criança, para efeitos legais, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Admite que, nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.
Tendo como parâmetro a puberdade, costumamos usar os termos pubescência, puberdade propriamente dita e pós-puberdade. A pubescência vai dos 9 aos 12 anos nas meninas e dos 12 aos 14 anos nos meninos. A puberdade propriamente dita vai dos 12 aos 14 anos nas meninas e dos 14 aos 16 nos meninos. E a pós-puberdade engloba as idades de 14 a 16/17 nas meninas e 16 aos 18/19 nos meninos.
Se houver aparecimento dos primeiros sinais de maturação antes dos 8 anos nas meninas e 9 anos nos meninos, consideramos o quadro de puberdade precoce. Da mesma forma, se o aparecimento dos caracteres sexuais secundários se der nas meninas após os 13 anos e houver ausência de menarca aos 16 anos temos o quadro
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da puberdade tardia. Nos meninos isto se configura quando o atraso se verifica até os 14/15 anos.
Para conhecer detalhes das sequências de modificações somáticas e fisiológicas que acontecem durante a puberdade, consulte a Escala de Maturação Sexual (SMR) ou Estágios de Tanner (TANNER, 1962), encontrados em Chipkevitch (2001). LINK: CHIPKEVITCH, Eugenio. Avaliação clínica da maturação sexual na adolescência. Jornal de Pediatria. 77 (Supl.2): s35-s42. Rio de Janeiro. 2001. Disponível em: <http://www.jped.com.br/conteudo/01-77-S135/port.asp>.
A maturação sexual inicia-se um ano mais cedo na menina, mas segue uma sequência mais ou menos constante em ambos os sexos.
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Fonte: Clipart
Fonte: Clipart
Relacionados aos aspectos físicos da adolescência, podem acontecer alguns problemas que precisam ser conhecidos pelos educadores a fim de que possam fazer os encaminhamentos necessários em busca do bem-estar de seus jovens.
São problemas comuns às meninas adolescentes:
- Diferentes tamanhos de mamas – no início da puberdade; - Presença de corrimento ou secreção vaginal, decorrente do desequilíbrio hormonal (ação dos estrógenos na mucosa uterina) inerente a esse período; - Menstruação irregular tanto na duração quanto na quantidade do fluxo que só tende a se estabilizar cerca de um ano após a menarca; - Ausência de menstruação – pode haver uma supressão da menstruação após um ano por períodos prolongados (cerca de 3 a 4 meses). Trata-se de um dado que requer investigação médica porque em muitos casos essa ausência está associada a situações como o desequilíbrio nutricional, à prática de atividades físicas em excesso, stress ou uso de medicamentos sem prescrição médica. Pode haver causas mais graves como a ausência de orifício que permita a passagem do fluxo menstrual. - Cólicas menstruais ou dores abdominais nem sempre são decorrentes do componente fisiológico, mas de aspectos psicológicos e emocionais da adolescente.
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A gravidade dos casos, contudo, precisam ser consideradas porque pode haver altera-
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- Sangramento uterino em excesso (disfuncional) – pode ser decorrente de dis-
ções físicas que desencadeiam essas cólicas, como:
túrbios hormonais ou de coagulação (mais raro), mas que deve ser considerado importante devido à possibilidade futura de gerar anemia na jovem. Nos meninos adolescentes o problema mais comum é a ginecomastia – que se traduz como o aumento no tamanho das mamas, muito frequente no início da puberdade, não é maligna e tende a desaparecer sem intervenção. Caso contrário, deve ser motivo de tratamento médico. A ginecomastia costuma vir associada a um excesso de peso, mas pode ser decorrente de problemas renais, do fígado e da tireóide, além de poder ser causada pelo uso de medicamentos.
Em ambos, meninas e meninos podem ocorrer anormalidades no crescimento que desencadeiam a baixa ou alta estatura. A baixa estatura pode ser devida à herança familiar, pode ser constitucional, quando há o crescimento lento no início da puberdade que se supera no final da adolescência, resultante da deficiência da somatotrofina (hormônio do crescimento) ou do hormônio da tireóide, da diabetes sem controle, doenças ósseas, asma, desnutrição
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e de outras doenças, inclusive genéticas. Já a alta estatura, menos preocupante (por desconhecimento da gravidade), também pode ser hereditária, constitucional, decorrente de problemas hormonais, genéticos e outras doenças1.
Como nem sempre a maturação biológica está associada ao desenvolvimento psicossocial, a puberdade é um período que desencadeia uma série de tensões vividas pelos jovens, que refletem em todos os aspectos de sua vida.
Desenvolvimento emocional do adolescente2 O desenvolvimento emocional do adolescente está associado à criação de uma identidade própria. Nesse dinamismo, que se processa através de sua interação com o mundo externo, o adolescente precisa elaborar uma série de perdas, denominadas pela Psicologia como “lutos”: luto pela perda do corpo infantil, pela perda dos pais da infância e pela perda da identidade e do papel infantil e que desencadeiam a chamada “crise da adolescência”.
1 Durante o período de crescimento, a deficiência de somatotrofina resulta no nanismo hipofisário e o excesso, no gigantismo. Se o aumento do volume da somatotrofina ocorre após o período de crescimento, resulta no quadro de acromegalia. Quando há falta de produção equilibrada da tiroxina durante o período do crescimento, instala-se o quadro de nanismo tireoideu acompanhado de deficiência mental, chamado de cretinismo. 2 Publicado originalmente em FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho, Juventude e Sexualidade. Salto para o Futuro. Série: Entre jovens e estudantes. Programa 3. TV, 2004. Disponível em: <www.tvebrasil.com.br/SALTO/boletins2004/em/tetxt3.htm - 72k ->.
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Mídias, vê se consegue ilustração de menina e menino adolescente
Fonte: Clipart
Essa crise foi definida por Aberastury e Knobell (1989) como Síndrome da Adolescência Normal por ser comum a todos os jovens, embora cada um tenha particularidades ligadas à família e sociedade a qual pertence, bem como à sua própria dinâmica psicológica e sua história de vida.
Como analisamos na publicação “Juventude e Sexualidade” – Programa 3, da Série: Entre jovens e estudantes do Salto para o futuro (FAGUNDES, 2007, p. 3-4), são indicadores da adolescência: Busca de si mesmo e da identidade adulta – Todas as mudanças corporais e alterações hormonais associadas a comportamentos de inquietude, de auto-afirmação, ansiedade pelo desconhecimento do próprio corpo, de busca de uma identidade como pessoa e como adulto levam o jovem a perceber uma mudança na maneira como a sociedade o trata, o que passa a ser uma situação nova para ele. Há conflitos entre a imagem do corpo ideal e a imagem do corpo real vividos pela garota e pelo garoto que, ora sentem orgulho e prazer com as mudanças que ocorrem em seus corpos, ora sentem vergonha e perplexidade. Os jovens passam horas e horas em frente ao espelho e comparam-se uns aos outros, buscando um padrão de normalidade e aceitação. Tais situações requerem momentos de isolamento e a assunção de identidades transitórias, ocasionais ou circunstanciais, no sentido de entender a sua intimidade e, assim, desenhar a sua própria identidade. Um processo educativo deve incluir a discussão desse padrão, fruto da cultura de massa que induz ao consumismo e cria imagens de referência, como modelos instituídos para um corpo de artista, ou adequados apenas à estatura que não se tem, pertencentes a ‘grifes’, etiquetas e marcas da moda, relegando a segundo plano os caracteres e atributos herdados de cada família e o bem-estar pessoal
– Flutuações de humor e de estados de ânimo – Ora sorridente e se sentindo a melhor pessoa do mundo, ora se sentindo péssimo e de mal com a vida, tudo e todos, o/a adolescente é por esse motivo, considerado muitas vezes por seus familiares como ‘aborrecente’ (termo com o qual, particularmente não concordamos), ficando, a partir deste estigma, ainda mais aborrecido e mal-humorado. Essas
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oscilações, instabilidades e contradições são perfeitamente normais
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ração dos lutos e das perdas que acompanham o processo identifi-
e estão na dependência direta da quantidade e qualidade da elabocatório nesta fase da vida.
– Tendência grupal e separação progressiva dos pais – Muitos aspectos da identidade familiar são substituídos por outros mais individuais, enriquecidos por novos elementos do seu âmbito social. Dessa forma, a construção da auto-imagem na juventude se dá através da busca de aceitação no grupo, valorização de auto-estima e afetividade. O afastamento dos pais, entendido aqui como dependência, é necessário para que o adolescente encontre identidades diferentes e seja capaz de formar sua própria personalidade. A questão da dependência/independência dos filhos em relação aos pais e vice-versa é vivenciada com sentimentos de ambivalência; ambas as partes desejam, mas ao mesmo tempo temem o crescimento, a maturação sexual e todas as responsabilidades e riscos que permeiam esses processos. Muitos pais não entendem esses comportamentos; o que o jovem quer não é o distanciamento dos pais, mas sim o distanciamento do seu papel de criança!
– Necessidade de intelectualizar e fantasiar – Consiste na elaboração do ‘luto’ pela perda da identidade infantil: ora o adolescente tem
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uma grande elaboração de idéias com justificativas concretas, próprias do mundo adulto, ora tem construções utópicas e fantasiosas que caracterizam o mundo infantil.
– Crises religiosas – A conduta do jovem vai do total ateísmo a comportamentos religiosos tão engajados que podem cursar com o misticismo e até com fanatismos. A educação para a sexualidade, pela sua abrangência, pode contribuir para a tomada de decisões neste sentido, para uma melhor conscientização e definição da prática religiosa a ser seguida.
– Deslocamento temporal e contradições sucessivas – As urgências do adolescente são tão grandes quanto o ‘deixar para depois’. Muitas vezes a urgência de uma roupa nova, de uma festa, de um programa com o grupo é dada muita importância, enquanto que os estudos e outras responsabilidades podem ser postergados!
– Atitude social reivindicatória – Em resposta às restrições a sua vida, impostas pela sociedade, os jovens tentam modificá-la ao tempo em que reestruturam sua personalidade; por este motivo são, habitualmente, considerados rebeldes.
– Evolução sexual do auto-erotismo até a heterossexualidade – Com o amadurecimento fisiológico, intensifica-se o impulso sexual e o contato com o corpo adquire um caráter exploratório, de descoberta de novas sensações pela erotização das sensações genitais. A manipulação dos genitais para obtenção de prazer – masturbação
o início da busca de parceiro de maneira tímida, mas intensa. Começam os contatos superficiais, depois profundos e mais íntimos, que preenchem a sua vida sexual.
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– é uma forma de reconhecimento do novo corpo em mudança. Há
Fonte: Clipart
Depreende-se que, na construção do mundo adolescente, sonhos reais e vivências concretas se fundem em um mundo sem fronteiras, em um mundo de fantasias:
encontros felizes, amor, paixão, expectativas transparentes, festas, grupos de amigos, ________________________ colegas, professores e professoras apaixonantes ou detestáveis, lazer, provas escola- ________________________ res, esportes, problemas insolúveis e problemas resolvidos, desencontros, família bem ________________________ estruturada, família-problema, visão de um povo que sofre, mas que tem esperança, ________________________ natureza maltratada, natureza com cheiro de poesia, de protesto, de mistério e... se- ________________________ xualidade...
Sexualidade na adolescência
A sexualidade no mundo adolescente se confunde com a própria adolescência... 3
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Fonte: http://www.sxc.hu
Fonte: http://pt.wikipedia.org
A adolescência compreende a puberdade, mas a transcende; não se restringe às mudanças biológicas, psicológicas e socioculturais.
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Fonte da imagem:Ronilson Moraes Lobo (Unifacs/EAD)
Como você analisa essas ilustrações?
Pois bem, a sexualidade na adolescência envolve uma série de manifestações como as que ilustramos, e que estão esquematizadas a seguir, que aparecem ora simultaneamente ora sequenciadamente, nem sempre com a mesma intensidade em todos os jovens, meninas e meninos, que vão se tornando mulheres e homens:
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Dentre as características que cursam com a Síndrome da Adolescência referida por Aberastury e Knobell (1989) apresentada anteriormente tem-se a “evolução sexual do auto-erotismo até a heterossexualidade”. A masturbação, comum da infância até o final da vida, constitui-se em uma prática sexual bastante frequente nessa fase. Sua frequência varia e não se pode determinar a normalidade do número de vezes. Acontecem também jogos sexuais entre meninos masturbando-se entre si ou em grupo, fato que não os determina homossexuais, enquanto que entre meninas, em que a masturbação é mais reprimida, são mais comuns os contatos corporais como pegar as mãos, abraçar e beijar.
A repressão à masturbação é histórica4 e se efetiva também através de mitos e crendices. Você deve ter sido alvo ou já ouviu falar de algumas dessas crendices. Procure lembrar de algumas e compartilhe com seus colegas.
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Jogos sexuais são comuns na fase de crescimento, de conhecimento do próprio corpo e de preparo para a vida sexual a dois. A prática da masturbação em si não faz mal, mas sim os conflitos decorrentes do sentimento de culpa, vergonha de si mesmo e dificuldades de relacionamento afetivo. Por muitos anos ela foi vista como um perigo, coisa suja e pecaminosa, causadora de cegueira, surdez, fraqueza, crescimento de pelos nas mãos, impotência e até debilidade mental. Um papel relevante do educador é o de desmistificar essas questões.
Outro aspecto explorado como prática sexual consiste no compartilhamento das curiosidades sexuais e desejos com o sexo oposto. O desejo de se envolver e o medo de se entregar à relação provocam uma verdadeira tempestade no pensamento do adolescente. Paralelo à aproximação para o namoro, existe um processo de ansiedade decorrente do abandono da relação estável com a turma para o desenvolvimento de novos papéis — de seduzir e de se deixar seduzir. Sedução pressupõe entrega e como toda entrega, tem como centro o modelo sexual, o modelo de trocas afetivas, surge o desejo de concretizar o ato sexual. A iniciação sexual, por conseguinte, pressupõe a escolha do parceiro, a escolha do momento e a relação sexual em si. Nos dias de hoje ela se dá, normalmente, entre adolescentes do mesmo grupo que criaram, inclusive, a instituição do “ficar”. Para a maioria dos jovens, “ficar” é um contato informal que explicita a não exigência de um compromisso maior — vai do estar junto, com troca de carícias, sem maiores compromissos ou complicações, podendo chegar até ao ato sexual. Se ficarem com a mesma pessoa por mais de três vezes, isto já é um “rolo” ou “caso”, que por sua vez, se repetido, consiste em namoro.
São vários os motivos que conduzem o adolescente à iniciação sexual.
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Escreva aqui alguns motivos que, em sua opinião, desencadeiam a iniciação sexual dos jovens.
A experiência que temos na área tem demonstrado, como razões mais frequentes para a iniciação sexual dos adolescentes, a curiosidade como uma forma de demonstrar amor e a influência do grupo/turma. Dizem as meninas: “no mundo não há mais virgem...”, “se eu não for, ele arranja outra...”, “minha família pensa que me controla...”. Os meninos afirmam: “procuro prazer...”, “homem não nega fogo....”, “o meu pai vai vibrar...”, “meus amigos vão morrer de inveja!” ... Por outro lado, encontramos adolescentes, meninas e meninos, que adiam essa iniciação por medo de não conseguirem, por medo do outro não gostar e por medo das consequências dessa iniciação sexual – a gravidez, por exemplo. Para a negativa as garotas declaram: “ainda não encontrei o cara legal...”, “pode ser que ele me ache fácil...”, “e se a minha família descobrir...?”. Já os meninos indecisos questionam: “onde transar?”, “e se ela for virgem?”. (FAGUNDES, 1995)
Como consequência da vivência sexual na adolescência pode acontecer uma gravidez não planejada.
Fonte da imagem:Ronilson Moraes Lobo (Unifacs/EAD)
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A gravidez na adolescência, na atualidade, contém um agravante que é se dar fora de um vínculo como o casamento, porque no tempo de nossos avós/bisavós, 14 e 15 anos eram as idades em que as mulheres tinham seus primeiros filhos. Entretanto, isso acontecia com a aprovação matrimonial para o exercício das relações sexuais; a gravidez não era estigmatizada porque não se constituía em um problema social, muito menos psicológico, uma vez que não dimensionava culpa por transgressão. Mas seja qual for a situação, embora uma adolescente tenha filhos e os eduque no contexto de uma família, os riscos de doença, lesão e morte, para ela e seus filhos são muito maiores do que os de uma mulher entre 20 e 30 anos.
Nos últimos anos, quase todos tivemos conhecimento de algum caso de gravidez em adolescentes da nossa família ou de algum grupo bem próximo de nossas relações sociais. Você já vivenciou essa situação? Foi adolescente grávida? Tem alguma adolescente grávida na família ou escola?
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Que repercussões tem desta vivência da sexualidade nesse período da vida, para meninas e para meninos? Para a família? Para a escola?
O Fundo de População das Nações Unidas publica anualmente, desde 1978, um Relatório sobre a Situação da População Mundial (UNFPA, 2013). O Relatório 2013 evidencia que, no mundo inteiro, 7,3 milhões de adolescentes se tornam mães e entre elas, 2 milhões são menores de 15 anos. Quando uma menina fica grávida, seu presente e futuro se alteram radicalmente, e raramente para melhor. Sua educação pode ser interrompida, suas perspectivas de emprego desaparecem, e suas vulnerabilidades à pobreza, à exclusão e à dependência se multiplicam. (UNFPA, 2013, p. ii)
Esse estudo revela, ainda, entre outras questões, que a gravidez não planejada na adolescência é fruto da desigualdade social. Nas diferentes regiões do mundo, meninas3 pobres, com baixa escolaridade e residentes em áreas rurais têm maior probabilidade de engravidar do que adolescentes com maior poder aquisitivo, maior grau de escolaridade e que vivem em centros urbanos. Constitui-se ainda na chamada “população de risco” meninas de minorias étnicas ou grupos marginalizados e aquelas que têm pouco ou nenhum acesso à saúde sexual e reprodutiva. 3 De acordo com a Convenção sobre os Direitos da Criança, uma pessoa com menos de 18 anos é considerada uma criança. (UNFPA, 2013. p.vii)
Do ponto de vista médico, Vitiello (1997), um dos maiores especialistas brasileiros no atendimento a adolescentes, apresenta-nos uma série de patologias encontradas em gestantes adolescentes que todos precisam saber:
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há elevação da pressão arterial; instaura-se a anemia, usualmente devida à má nutrição, aumentam as ocorrências de doenças sexualmente transmissíveis, associadas à maior freqüência de troca de parceiros, aliada aos baixos padrões de higiene e ao relativo descaso ao tratamento dos sintomas, surgem outras patologias que tendem a se fazer presentes em situações de stress e desnutrição como a tuberculose e as infecções urinárias, aumentam as chances de parto prematuro, torna-se ligeiramente superior à duração média, a duração do trabalho de parto; aumentam-se as intervenções obstétricas como o fórceps de alívio e a cesárea, devidas à maior freqüência de alterações da contratilidade uterina; elevam-se os casos de mortalidade fetal, associada às condições adversas da gravidez e do parto.
Fonte da imagem: Ronilson Moraes Lobo (Unifacs/EAD)
Essa perspectiva encontra eco no Relatório do UNFPA (2013, p.18) ao admitir que Embora a gravidez afete a vida de uma menina de formas variadas e profundas, a maioria das pesquisas quantitativas têm se concentrado nos efeitos sobre a saúde, educação e produtividade econômica: • O impacto na saúde inclui os riscos de morte materna, doença e deficiências, incluindo a fístula obstétrica, complicações de abortos inseguros, doenças sexualmente transmissíveis, incluindo o HIV, e riscos para a saúde dos bebês. O impacto educacional inclui a interrupção ou término da educação formal e as consequentes oportunidades perdidas para realização de seu
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pleno potencial. • O impacto econômico está intimamente ligado ao impacto educacional e envolve a exclusão de empregos ou meios de vida remunerados, custos suplementares para o setor da saúde e a perda de capital humano.
Realmente trata-se de uma situação difícil. E, surpreendentemente, constatamos também haver um grande número de adolescentes que desconhecem os fundamentos da anatomia e fisiologia sexual, ou por não terem tido oportunidade de serem instruídos neste sentido, por leituras mal compreendidas, por conselhos desinformados de outros jovens ou adultos, por preconceito ou pela sensação de invulnerabilidade e impunidade, resquício do pensamento mágico infantil ainda sobrevivente. Os meninos não se dão conta de que seu corpo lhes traz uma possibilidade constante de gerar um outro alguém!
Encontramos, também, jovens que frequentemente se recusam ou se omitem do processo de anticoncepção alegando que o uso de preservativo “é como chupar bala sem tirar o papel” ou ainda vão mais longe, afirmando “o problema é dela”, “eu não tenho nada com isso”, “se não quiser engravidar que se vire”!!! Atitudes dessa natureza
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só podem resultar num incremento assustador do número de adolescentes grávidas e do número de abortamentos provocados.
Essa problemática passa a ter um cunho social mais amplo, quando se estabelece a gestação. As adolescentes grávidas correm uma série de riscos, além dos orgânicos, tais como: ser expulsas da casa, ingressar na prostituição, deixar de estudar, optar pelo abortamento ou interrupção da gravidez, com prejuízos orgânicos e psíquicos, ser mães solteiras, ou ser levadas a um casamento forçado e, por conseguinte, mal estruturado.
A situação da criança resultante de uma gravidez na adolescência nem sempre lhe é favorável. Algumas são abandonadas ou encaminhadas a orfanatos ou à adoção. Outras, crescendo sem a figura paterna, podem se sentir pouco amadas. Na melhor das hipóteses, temos também a solução do caso da gravidez em adolescentes com a assunção de responsabilidade por parte das famílias de ambos os parceiros, cada qual permanecendo em suas respectivas casas. Nesse caso, a criança, após o nascimento, fica “dividida” entre os cuidados de uma ou de outra avó que representa, mais uma vez, uma mulher, aquela a quem a sociedade delega as maiores responsabilidades com a estrutura da família.
Mas, como em toda regra, há exceções. Temos conhecimento de relações afetivas duradouras, associadas ou não a casamentos formalizados, que tiveram início com uma surpreendente gravidez não planejada na adolescência, embora não tenhamos
coces.
Diante da problemática, nosso contato com os adolescentes nos últimos anos
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notícias de estudos sobre experiências positivas da maternidade e da paternidade pre-
nos permite inferir que as consequências psicológicas da gravidez não planejada, mas não tão indesejada quanto pensamos, sobrepõem-se, consideravelmente, às consequências orgânicas.
Diz o Relatório (UNFPA, 2013, p. vii-viii)
Como a gravidez na adolescência é o resultado de diversas forças subjacentes sociais, econômicas e de outras naturezas, ela requer estratégias multidimensionais orientadas ao empoderamento das meninas e adaptadas a grupos específicos de meninas, especialmente as marginalizadas e mais vulneráveis. Assegurar os direitos das meninas pode ajudar a eliminar muitas das condições que contribuem para a maternidade na adolescência e ajudar a mitigar muitas das suas consequências para a menina, sua família e sua comunidade. Enfrentar esses desafios por meio de medidas que protejam os direitos humanos é a chave para acabar com um ciclo vicioso de violações de direitos, pobreza, desigualdade, exclusão e gravidez na adolescência. Uma abordagem de direitos humanos à gravidez na adolescência significa trabalhar com os governos para remover os obstáculos ao gozo dos direitos pelas meninas. Isso significa abordar as causas subjacentes, como casamento precoce, violência e coerção sexual, falta de acesso à educação e à saúde sexual e reprodutiva, incluindo informação sobre métodos contraceptivos. Os governos, no entanto, não podem fazer isso sozinhos. Outras partes interessadas e portadores de responsabilidades, como professores, pais e líderes comunitários também desempenham um papel importante.
Neste sentido, o papel da escola deve se somar ao da família, na busca de conscientizar os jovens quanto a maternidade e a paternidade implicando em assumir responsabilidades; da necessidade de aceitar os aspectos físicos e emocionais da gravidez e do cuidado infantil; de considerar as necessidades da criança que virá a este mundo; de que é preciso aprender e praticar habilidades do ser mãe e do ser pai; de planejar as necessidades financeiras e as formas de sustento familiar, etc. Para que isso ocorra, entretanto, se faz necessário que os serviços de saúde também exercitem a sua função de dar condições à população de ter assistência global à saúde, incluindo as possibilidades de controle efetivo da natalidade no contexto de um planejamento familiar que inclua a população adolescente.
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Outra consequência que cursa com a vivência sexual na adolescência são as doenças sexualmente transmissíveis (DST), antigamente denominadas doenças venéreas, por causa das sacerdotisas dos templos de Vênus, que exerciam a prostituição como forma de culto à Deusa do Amor. Hoje, essas doenças têm um caráter menos pejorativo do que antes porque as condições para o exercício da sexualidade e, em especial a iniciação sexual, de um modo geral, mudou significativamente nas últimas décadas.
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Até pouco tempo, acreditamos que em algumas regiões do Brasil, até os dias atuais, os meninos se iniciavam ou se iniciam sexualmente com prostitutas em ambiente de promiscuidade. O desenvolvimento de uma DST, neste contexto, constituía-se por um lado prova de virilidade e até de orgulho e vaidade, mas por outro, deixava uma sensação de culpa e um ranço de impureza...
As DST podem ser causadas por vírus: herpes, condiloma acuminado ou crista de galo e AIDS; por bactérias: gonorréia, cancro mole, uretrites não gonocócicas; por fungos: candidíase; por protozoários: tricomoníase; por ácaro: escabiose ou sarna e pediculose do púbis ou chato, dentre outros agentes.
Por definição, essas doenças são aquelas transmitidas através do contato sexual com pessoas doentes, mas algumas delas não são de transmissão exclusivamente sexual. A sífilis, a AIDS e as uretrites não gonocócicas podem ser transmitidas pela mãe gestante; a herpes e a gonorréia, durante o parto e a sífilis e a AIDS, também por transfusão sanguínea. Os sintomas das DST variam, sendo os mais comuns: dor no ato de urinar, coceira, feridas, corrimento purulento e verrugas. O agravamento de alguns casos conduz ao abortamento, lesões no feto, infertilidade, câncer de colo de útero e, até mesmo morte. Atenção especial deve ser dada ao tratamento que só surtirá efeito
Em 1999, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estimou um total
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se for feito em ambos os parceiros. (PASSOS, 1985).
de 340 milhões de casos novos por ano de DST curáveis em todo o mundo, entre 15 e 49 anos, 10 a 12 milhões destes casos no Brasil. Outros tantos milhões de DST não curáveis (virais), incluindo o herpes genital (HSV-2), infecções pelo papilomavirus humano (HPV), hepatite B (HBV) e infecção pelo HIV ocorrem anualmente (BRASIL, 2005, p.11)
A problemática da AIDS, que se agrava pela falta de cura conduzindo à morte, vem ocupando nos últimos anos e com mais frequência os meios de comunicação de massa e sendo objeto de projetos específicos de intervenção pedagógica por parte da escola e de outras instituições de educação não formal. Entretanto, a prevenção apresenta algumas controvérsias tais como a época em que deve ser iniciada, quão explícita ela deve ser e a possibilidade de estímulo à promiscuidade, dentre outros motivos.
Para controle das DST e AIDS e suas consequências, o Sistema Único de Saúde do Brasil prevê estratégias de prevenção primária que corresponde ao uso de preser- ________________________ vativo e secundária que engloba o diagnóstico e o tratamento. ________________________
As ações nessa direção existem no país de forma pulverizada, com importantes diferenças regionais. As diretrizes para diagnóstico e tratamento precoces, incluindo a avaliação das parcerias sexuais, são pouco conhecidas ou implementadas pelo sistema de saúde. Não existe disponibilidade contínua de medicamentos padronizados para portadores de DST, bem como de preservativos. A pactuação entre os três níveis de governo estabelece que a aquisição dos medicamentos para as DST é de responsabilidade dos estados e municípios, e a aquisição de preservativos é compartilhada, sendo de 80% de responsabilidade do nível federal nas regiões sul e sudeste e de 90% nas regiões norte, nordeste e centro-oeste. Porém esta pactuação vem sendo cumprida com dificuldades. Pouco se valoriza a prevenção especificamente dirigida ao controle das DST (educação em saúde, disseminação da informação para reconhecimento de sinais e sintomas, busca precoce por assistência, convocação de parceiros, campanha em mídia, etc). Há ênfase no diagnóstico etiológico, pouco se conhece o manejo sindrômico e os profissionais capacitados são insuficientes. (BRASIL, 2005, p.13)
Outro aspecto a se considerar são os muitos estereótipos ligados à AIDS, que têm em sua raiz preconceitos e discriminações contra pessoas e comportamentos que já existiam mesmo antes de ela aparecer. O termo “grupos de risco” limitou o aspecto contagioso da doença, mas a mudança no perfil da epidemia nesses últimos anos veio
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confirmar que a AIDS não atinge apenas pessoas com uma sexualidade chamada “desviante” ou os viciados em substâncias ilegais cujos comportamentos são desvalorizados socialmente. Em adolescentes, a forma mais comum de contágio tem sido o uso de drogas endovenosas, mas isso não significa que eles estejam protegidos de outras formas de contaminação como a via sexual. É preciso que tenhamos consciência de que a AIDS não é um problema distante e irreal, mas um problema de todos nós. Ainda que não consideremos o nosso comportamento sexual arriscado, temos filhos, parentes, colegas, amigos ou mesmo conhecidos que podem não estar se prevenindo por não achar que correm risco de contrair o vírus da doença - o HIV. Dessa forma, embora não tenhamos tanta certeza dos resultados dos processos de prevenção utilizados e, mesmo sabendo que a camisinha não é um método infalível, sequer para impedir a gravidez não desejada, seu uso deve ser incentivado entre os jovens, vinculado a um processo de educação preventiva integral.
Como deve ser a educação sexual nesse contexto de prevenção?
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A educação preventiva é contemplada pela educação integral em sexualidade (objeto de estudo em aulas seguintes) assegura aos jovens conhecimentos, atitudes e habilidades que lhes permitam redução de riscos e escolhas conscientes e responsáveis quanto a sua sexualidade.
SÍNTESE Refletimos nesta aula sobre a adolescência em seus aspectos fisiológicos, psicológicos e socioculturais. Consideramos as peculiaridades da conhecida “sindrome da adolescência normal” e analisamos aspectos da sexualidade nessa fase da vida, transição da infância para a adultidade. Continuaremos na próxima aula estudando a sexualidade na idade adulta e na terceira idade.
Avante!
REFERÊNCIAS ABERASTURY, A; KNOBELL, M. Adolescência Normal. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989. ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. BRASIL. Casa Civil. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 30 out. 2014.
de Controle das Doenças Sexualmente Transmissíveis / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids. Brasília: Ministério da Saúde. 2005. Disponível em: <http://www. aids.gov.br/sites/default/files/manual_dst_tratamento.pdfhttp://www.aids.gov.br/sites/default/files/manual_dst_tratamento.pdf>. Acesso em: 5 dez. 2014.
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BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e AIDS. Manual
CAVALCANTI, Ricardo da Cunha. Adolescência. In: VITIELLO, Nelson (Org.), Adolescência Hoje. São Paulo: Roca, 1988.
CHIPKEVITCH, Eugenio. Avaliação clínica da maturação sexual na adolescência. Jornal de Pediatria. 77(Supl.2):s135-s42. Rio de Janeiro 001. Disponível em: <http://www.jped.com.br/conteudo/01-77-S135/ port.asp>. Acesso em: 30 out. 2014.
FAGUNDES, Tereza Cristina P. C. Educação Sexual - construindo uma nova realidade. Salvador: UFBA, 1995.
FAGUNDES, Tereza Cristina P. C. Juventude e Sexualidade. Salto para o futuro. Série: Entre jovens e estudantes. Programa 3. TV, 2004. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Uobn4IBz8sE>. Acesso em: 30 out. 2014.
FAGUNDES, Tereza Cristina P. C. Sexualidade na adolescência. Bahia Análise & Dados. Salvador: SEI, v.7, n.2, p.177-183. 1997
GREGERSEN, E. Práticas sexuais - a História da Sexualidade Humana. São Paulo: Roca, 1983.
MEAD, Margareth. Adolescencia, sexo y cultura en Samoa. Barcelona, Laia, 1972.
OMS. Organização Mundial da Saúde. Caracterização da Adolescência. 1997.
OMS / FNUAP / UNICEF. Saúde Reprodutiva de Adolescentes: uma estratégia para ação. Genebra: OMS, 1989.
PASSOS, M. R. L. et al. Doenças Sexualmente Transmissíveis. Rio de Janeiro, Cultura Médica, 1985.
TANNER J. M. Growth at adolescence. Oxford: Blackwell; 1962. In: CHIPKEVITCH, Eugenio. Avaliação clínica da maturação sexual na adolescência. Jornal de Pediatria. 77(Supl.2):s135-s42. Rio de Janeiro, 2001. Disponível em: <http://www.jped.com.br/conteudo/01-77-S135/port.asp>. Acesso em: 30 out. 2014.
VITIELO, N. Sexualidade: quem educa o educador: um manual para jovens e educadores. São Paulo, Iglu, 1997.
UNFPA. Fundo de População das Nações Unidas. Situação da População Mundial 2013. Maternidade Precoce: enfrentando o desafio da gravidez na adolescência. 2013.
WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Physical status: The use and interpretation of anthropometry. Geneva: WHO, 1995. (WHO technical Report Series, n. 854) 1Hipertrofia – crescimento por aumento de tamanho 2 Hiperplasia – crescimento por aumento do número 3 As reflexões que se seguem encontram-se, também, em artigos de nossa autoria: FAGUNDES, T.C. P. C. Sexualidade na adolescência. Bahia Análise & Dados. Salvador: SEI, v.7, n.2, p.177-183. 1997 e FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho, Juventude e Sexualidade. Salto para o futuro. Série: Entre jovens e estudantes. Programa 3. TV, 2004. 4 No final do século XIX, em algumas partes do mundo, eram feitas cirurgias (extirpação do clitóris) para impedir a menina de se masturbar, colocavam engenhocas que faziam soar campainhas e até pregos ao redor do pênis para evitar a polução noturna e a masturbação do menino
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(GREGERSEN, 1983).
E NA TERCEIRA IDADE
Autora: Profª Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
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AULA 04 - SEXUALIDADE NA IDADE ADULTA
Na aula anterior, nosso estudo particularizou aspectos da sexualidade na adolescência, marcada pelo interesse e preocupação com as mudanças do corpo, pelo aparecimento do prazer erótico-genital, pelo aprendizado das relações afetivas interpessoais — que vão do ficar ao namorar — e pelas expectativas, ansiedades e fantasias em torno da iniciação sexual. Na adolescência, há o início da função reprodutiva em decorrência de modificações hormonais desencadeadas pela puberdade, mas é na idade adulta que se plenificam, assim como chega ao ápice a função sexual. Essas e outras questões que caracterizam essa fase da vida, bem como a fase nomeada terceira idade serão objeto desta aula.
IDADE ADULTA Assim como delimitamos a adolescência como o período de vida situado entre ________________________ a infância e a adultidade, podemos considerar a idade adulta como aquela que vem ________________________ depois da adolescência e vai até o climatério.
A idade adulta é, ou deveria ser, o apogeu da sexualidade das pessoas que se encontram maduras e seguras para estabelecer vínculos afetivos mais sólidos, bem como para usufruir a sua sexualidade de forma adequada e prazerosa.
Como podemos definir uma vivência adequada e prazerosa da sexualidade?
Mulheres e homens usufruem igualmente de sua sexualidade?
Antes de continuarmos nossas reflexões, para nós é importante elucidar a diferença que há entre sexo, gênero e orientação sexual. Do ponto de vista biológico, existem dois sexos na natureza — macho e fêmea — e do ponto de vista cultural, dois gêneros: macho e fêmea. Entretanto, podem existir três orientações sexuais distintas: a heterossexualidade, a homossexualidade e a bissexualidade. Retome o que estudou até então. Defina e exemplifique os termos:
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Sexo Gênero Orientação Sexual
Como estímulo à análise que se segue, leia e assista aos seguintes documentários: Desejo sexual feminino no século 21, o que mudou? Carmita Abdo. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Veywk7RDxb8>. Acesso em: 6 dez. 2014. A separação entre amor e sexo - A fragilidade do tesão -- Flavio Gikovate.flv . Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=iv-nKzqb7D4>. O Casamento entre o Amor e o Sexo (O cuidado é feminino) -- Mary Del Priore. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=3aqjUke1kfo>.
Agora, reflita sobre esse poema de Elisa Lucinda (1999)
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Contudo sempre quis um amor
Elisa Lucinda
que me coubesse futuro e me alternasse em menina e adulto
Sempre quis um amor que falasse que soubesse o que sentisse. Sempre quis um amor que elaborasse Que quando dormisse ressonasse confiança no sopro do sono e trouxesse beijo no clarão da amanhecice. Sempre quis um amor que coubesse no que me disse. Sempre quis uma meninice entre menino e senhor uma cachorrice onde tanto pudesse a sem-vergonhice do macho quanto a sabedoria do sabedor. Sempre quis um amor cujo BOM DIA! morasse na eternidade de encadear os tempos: passado presente futuro coisa da mesma embocadura sabor da mesma golada. Sempre quis um amor de goleadas cuja rede complexa do pano de fundo dos seres não assustasse.
que ora eu fosse o fácil, o sério
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Da chegada do Amor
e ora um doce mistério que ora eu fosse medo-asneira e ora eu fosse brincadeira ultra-sonografia do furor, sempre quis um amor que sem tensa-corrida-de ocorresse. Sempre quis um amor que acontecesse sem esforço sem medo da inspiração por ele acabar. Sempre quis um amor de abafar, (não o caso) mas cuja demora de ocaso estivesse imensamente nas nossas mãos. Sem senãos. Sempre quis um amor com definição de quero sem o lero-lero da falsa sedução. Eu sempre disse não à constituição dos séculos que diz que o “garantido” amor é a sua negação.
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62 Sempre quis um amor Sempre quis um amor
que gozasse
que não se incomodasse
e que pouco antes
quando a poesia da cama me levasse.
de chegar a esse céu se anunciasse.
Sempre quis uma amor que não se chateasse
Sempre quis um amor
diante das diferenças.
que vivesse a felicidade sem reclamar dela ou disso.
Agora, diante da encomenda metade de mim rasga afoita o embrulho e a outra metade é o futuro de saber o segredo que enrola o laço,
Sempre quis um amor não omisso e que suas estórias me contasse. Ah, eu sempre quis uma amor que amasse.
é observar o desenho
Fonte: “Eu te amo e suas estréias”, Editora
do invólucro e compará-lo
Record - Rio de Janeiro, 1999, Disponível
com a calma da alma
em: <http://www.jornaldepoesia.jor.br/
o seu conteúdo.
elisalucinda1.html#chegada>. Acesso em: 7 dez. 2014
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Pois bem, os adultos expressam sua sexualidade com o exercício da resposta sexual humana (RSH), com o prazer erótico-genital, a capacidade reprodutiva e a vivência da intimidade. A resposta sexual humana é uma resposta integral do organismo a um estímulo sexual efetivo que engloba modificações fisiológicas genitais e extragenitais. Mas o desempenho sexual dos participantes está na dependência não apenas de fatores orgânicos, como de psicológicos e socioculturais, tais como: idade, saúde, personalidade, afetividade, cultura e histórias de vida e, também o ambiente no qual se leva, a efeito, a relação. A RSH tem sido motivo de interesses e estudos há muito tempo. Alfred C. Kinsey (1894-1956) estudou o comportamento sexual de homens e mulheres distintos, e concluiu que ele varia muito dentro da mesma sociedade. Publicou, em 1948, “O comportamento sexual masculino”, e, em 1953, “O comportamento sexual feminino”, ambos contendo dados abrangentes e diversificados. Entretanto, foram os pesquisadores William Master e Virgínia Johnson (1984) que, observando em laboratório mais 10.000 casos de pessoas em atividade sexual, durante 12 anos de estudo, publicaram, em 1966, “A resposta sexual Humana”, sugerindo quatro fases para resposta sexual: excitação, platô, orgasmo e resolução. Posteriormente, Kaplan (1977) introduziu uma fase prévia, a do desejo, incorporando o platô à fase de excitação e a resolução dentro de orgasmo, ficando o esquema:
Analise os esquemas, a seguir, representativos da RSH no homem e na mulher:
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desejo, excitação e orgasmo.
Pesquisando o significado de cada fase, preencha o quadro a seguir, definindo as modificações que as caracterizam:
Desejo
Excitação
Orgasmo
Sobre a RSH, resumidamente, assim considera Vitiello (s.d.): Vista de um ângulo estritamente biológico, a atividade sexual pode ser vista como ‘função’ que pode ser didaticamente dividida em fases. Na fase inicial, de fundo meramente intelectual, direcionamos nosso desejo para alvos culturalmente determinados. Nessa fase, denominada de ‘desejo’, ainda não existem comemorativos orgâ-
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nicos, passando-se tudo dentro do nosso intelecto e nossas emo-
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a demonstração inequívoca de nosso interesse, representada pela
ções. Numa fase seguinte, denominada de ‘fase de excitação’, surge ereção peniana entre os homens e pela lubrificação vaginal entre as mulheres. Finalmente, atingido um certo [sic] patamar de excitabilidade, um centro nervoso complexo, em nosso encéfalo, desencadeia intensas ondas de prazer, associadas a contrações voluntárias e involuntárias de vários grupos musculares, num processo que denominamos ‘orgasmo’.
Mas nem sempre “as coisas” vão bem!
Do ponto de vista orgânico, sempre que uma dessas fases não é cumprida ou o é de forma insuficiente, ocorrem as chamadas disfunções sexuais que variam também entre as mulheres. São disfunções no nível do desejo, no homem e na mulher, que se caracterizam pela inapetência sexual, ou a sua exacerbação ou erotomania, (satirismo no homem e ninfomania na mulher). No nível da excitabilidade, temos as disfunções eréteis ou impotência, a ausência, a incompletude ou ereção de curta duração, no homem. Na
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mulher, temos a frigidez e a insuficiência ou ausência de lubrificação vaginal. Quanto ao orgasmo, as disfunções na mulher se traduzam pela ausência e no homem pela ejaculação prematura ou bloqueio ejaculatório (retardo ou ausência). Para a mulher, as disfunções são acrescidas pelos quadros de vaginismo (contração perivaginal que dificulta ou impossibilita o coito) e dispareunia (dor). (FAGUNDES, 2002) Do ponto de vista emocional, é desejável e, portanto, adequada, a satisfação pessoal com o exercício da própria sexualidade numa relação a dois. Se isso não ocorre, traduz-se por uma inadequação sexual. A inadequação sexual diz respeito a uma relação a dois; está associada ao par sexual, ao casal.
Reflita, portanto, para si mesmo(a) e se quiser compartilhar, escolha com quem: - O que pensa que precisa ser diferente para que se sinta satisfeito(a) em relação à própria sexualidade?
Associadas a fatores sociais, temos as práticas sexuais aceitas e referendadas pela sociedade e época em que vivemos. Quando isto não acontece, caracterizam-se como desvios sexuais. Segundo Vitiello (2001), os desvios podem ser de objeto (para quem direcionamos nossa eroticidade) ou de objetivos (se em vez de prazer buscamos, por exemplo, dor).
nhecimento, não é mesmo? Para sistematizar, complete o quadro a seguir sobre os desvios sexuais mais frequentes:
Desvios Agorafilia
65 educação e sexualidade
Os desvios são também chamados de parafilias e sobre elas temos certo co-
Significados
B&D (Blondagem e Domnance) Coprolagnia Dendrofilia Erotolalia Escoptofilia Exibicionismo Fetichismo Flagelação Frotteurismo
________________________ ________________________ ________________________ Hebefilia ________________________ Necrofilia ________________________ ________________________ Parcialismo ________________________ Pederastia ________________________ ________________________ Pedofilia ________________________ Sadomasoquismo ________________________ ________________________ Sodomismo ________________________ Triolismo ________________________ ________________________ Voyeurismo ________________________ Zoofilia ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Por outro lado, ressaltamos que uma prática sexual só se caracteriza como des- ________________________ viante se ela se constituir na única forma de sentir prazer. Analisa Vitiello (2001, p. 185) ________________________ que, “[...] de uma maneira ou de outra, todos nós somos portadores de desvios em grau ________________________ maior ou menor”. ________________________ Gerontofilia
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66 Para saber mais leia: CARDOSO, Silvia Helena. Como o Cérebro Organiza o Comportamento Sexual. Cérebro & Mente. Revista Eletrônica de Divulgação Científica em Neurociência. Número 3. Setembro/Novembro, 1997. Disponível em: <http://www.cerebromente.org.br/n03/mente/ sexo.htm>. Acesso em: 6 dez. 2014.
Neste contexto de vivência da sexualidade na idade adulta, merecem reflexão, ainda que breve, nesta aula, os quadros de transexualismo, travestismo e transformismo.
Com base em sua experiência e nas ilustrações, dê o significado para os termos:
Transexualismo
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Fonte: http://www.radioprogresso640.com.br/2012/11/projeto-permite-a-transexuais-mudanca-de-nome-em-documentos/
Travestismo
Transformismo
Fonte: http://commons. wikimedia.org/wiki/
Fonte: http://commons.wikimedia.org/
Image:CrossdresserCollage.jpg br/
wiki/Image:Viewphoto.jpgbvc.jpg
Temos, assim, o transexualismo (também chamado de disforia de gênero), considerado como um transtorno da identidade sexual que se caracteriza pela recusa do sexo civil que tem. O corpo do transexual é biologicamente “normal” (genitálias interna e externa funcionais), mas o indivíduo se identifica psicologicamente como sendo do sexo oposto. Alguns transexuais desejam, compulsivamente, “mudar de sexo” porque associam a aversão que tem pelo próprio corpo à convicção de pertença ao sexo oposto.
O quadro de travestismo se traduz pelo vestir-se e assumir-se como tendo características físicas e psicossociais atribuídas ao sexo oposto, não acompanhado, necessariamente, de excitação sexual. O travesti não renuncia a sua identidade anatômica. Por exemplo, pessoas com pênis adotam atitudes e aparência femininas, mas
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utilizam ativamente seu órgão sexual para obtenção do prazer sexual.
Rodrigues Jr. (2007) assim define o travestismo: O termo travestismo foi criado por Magnus Hirschfeld, médico alemão que escreveu o livro ‘The transvestites’ no começo do século XX. [...] O psicanalista americano Robert Stoller (1977) definiu o travestismo como ‘condição na qual um homem se torna genitalmente excitado ao vestir roupas íntimas femininas’. John Money (1993) define o travestismo incluindo todo aquele que vista-se como se pertencera o sexo oposto, fazendo parte do rol das parafilias. [...] Outro nome utilizado para estas preferências sexo-eróticas (ou apenas expressão social) tem sido ‘eonismo’, em referência ao denominado cavaleiro Eon, pois vestia-se de roupas femininas.
Henry Havelock Ellis, médico e psicólogo
Magnus Hirschfeld (1868-1935)
inglês (1859-1939) que diferenciou travestis de
estudando 3000 homossexuais
homossexuais na Inglaterra vitoriana.
(1910) descobriu que muitos deles se
Fonte: Richard George. http://upload.wikimedia.org/wikipedia/ commons/5/54/Sir_Henry_ Havelock_Statue_Trafalgar_Square_2006-04-17.jpg
travestiam. Fonte: G.dallorto http://commons.wikimedia.org/wiki/ Image:WHK1901.jpg
Ao longo da história, variantes foram surgindo para designar formas distintas de travestismos, entre as quais: o transformismo, as Drag Queens e as Cross Dressers.
Por transformismo entendemos o vestir-se com roupas do sexo oposto, como um(a) ator(a), e representar esse sexo num espetáculo teatral. Se ele(a) sente prazer sexual ao se “transformar”, trata-se de um fetichismo transformista. Drag queen traduz-se pelo comportamento de homens que se vestem de mulher (exageradamente) para se divertir (brincar) em festas, desfiles e outros eventos, geralmente à noite. Podem ser heterossexuais, homossexuais ou bissexuais. E Cross Dressers é a prática do vestir-se elegantemente com roupas do sexo oposto, e frequentar clubes especialmente destinados a essa prática sexual. Pessoas Cross Dressers assumem-se heterossexuais.
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Convém registrarmos, a esta altura, a existência dos casos de ambiguidade sexual ou de estados intersexuais. Temos o hermafroditismo verdadeiro, de causa genética, que resulta na formação de indivíduos contendo simultaneamente tecidos ovarianos e testiculares (genitália interna e externa ambígua). Temos, ainda, o pseudo-hermafroditismo masculino e feminino. No pseudo-hermafroditismo masculino, a bagagem genética é masculina, porém, as genitálias (interna e externa) possuem vários graus de feminização. No pseudo-hermafroditismo feminino, a bagagem genética e genitália interna são femininas, mas a externa apresenta vários graus de masculinização. (OTTO; OTTO; FROTA-PESSOA, 2004)
Além desses, há outros quadros de origem genética e/ou hormonal que resultam em distúrbios sexuais. Para ampliar seu entendimento, entre outras fontes, estude:
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SANTOS, Jocélio Teles dos. Incorrigíveis, afeminados, desenfreiados: indumentária e travestismo na Bahia do século XIX. Rev. Antropol. [online]. 1997, vol. 40, no. 2 [cited 2007-12-07], pp. 145-182. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0034-77011997000200005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 6 dez. 2014. OTTO, Priscila Guimarães; OTTO, Paulo Guimarães; FROTA-PESSOA, Oswaldo. Genética Humana e Clínica. 2. ed. São Paulo: Roca, 2004.
Para acrescer nossas reflexões sobre vivências sexuais na adultidade, retomamos um tema pontuado na aula em que fizemos uma abordagem conceitual sobre sexualidade e gênero – a homossexualidade. Considerada doença por muito tempo, a homossexualidade é vista, na atualidade, como desvio de objeto que significa o direcionamento da eroticidade para pessoas do mesmo sexo (Ver a escala Kinsey na ilustração a seguir).
69 educação e sexualidade
A Escala Kinsey
Pesquisa sobre a conduta sexual de homens e mulheres coordenadas por Alfred Kinsey (1948 e 1953) indicaram que a orientação sexual dos indivíduos pode ser medida e classificada. A partir das respostas a questionários aplicados a um universo de 17.000 homens brancos norte-americanos, os dados foram tabulados e deram origem à Escala Kinsey. Na elaboração dessa escala, foram consideradas as experiências sexuais e as reações psicológicas dos indivíduos, em diferentes etapas de suas vidas, e resultou a seguinte classificação:
________________________ ________________________ ________________________ 1 - Predominantemente heterossexual e apenas incidentalmente homossexual. ________________________ ________________________ 2 - Predominantemente heterossexual e com experiências homossexuais mais que incidentais. ________________________ ________________________ 3 - Igualmente heterossexual e homossexual. ________________________ ________________________ 4 - Predominantemente homossexual e com experiências heterossexuais mais que ________________________ incidentais. ________________________ ________________________ 5 - Predominantemente homossexual e apenas incidentalmente heterossexual. ________________________ ________________________ 6 - Exclusivamente homossexual. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Esta classificação de Kinsey, analisada por Abdo (2000, s.p.) é acompanhada pe- ________________________ las seguintes estimativas porcentuais: ________________________ ________________________ ________________________ Aproximadamente 50% dos homens não tiveram qualquer experiência homossexual ________________________ aberta (nem física, nem psíquica), desde o inicio da adolescência. ________________________ Do total da população masculina estudada, 37% tiveram pelo menos uma experiência ________________________ 0 - Exclusivamente heterossexual.
abertamente homossexual, até o orgasmo, entre adolescência e fase adulta.
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Cerca de 13% dos homens tiveram uma relação erótica com outros homens sem manter qualquer experiência abertamente homossexual desde o início da adolescência. 30% dos homens tiveram experiências homossexuais, pelo menos incidentalmente, durante um período mínimo de três anos, entre 16 e 55 anos. Cerca de 13% dos homens tiveram mais experiências homossexuais que heterossexuais, durante um período mínimo de três anos, entre 16 e 55 anos. Quase 10% dos homens foram exclusivamente homossexuais durante um período mínimo de três anos, de 16 a 55 anos. E 4% dos homens são exclusivamente homossexuais (experiências físicas e psíquicas) por toda a vida, desde a adolescência.
Assim como se observa empiricamente até os dias atuais, a pesquisa realizada por Kinsey, em 1953, revelou que a incidência da homossexualidade feminina era consideravelmente menor do que a da homossexualidade masculina. Não é difícil inferir os motivos. Os mais contundentes são aqueles ligados à repressão feminina historicamente construída e que é mantida até a atualidade, a despeito das mudanças e conquistas que venham sendo obtidas pelas mulheres na esfera
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da sexualidade e gênero.
A homossexualidade, imemorialmente reprimida principalmente por não ser uma união fértil, nada mais é do que um desvio de objeto. Os homossexuais não são loucos, perversos, doentes, sem-
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Nelson Vitiello (2001, p. 29-30), grande estudioso da temática, afirma que:
-vergonhas ou qualquer outra das coisas de que são freqüentemente acusados. Claro que existem homossexuais maus, desonestos etc., mas também existem pessoas assim entre os heterossexuais, nada tendo a homo ou a heterossexualidade a ver com essas falhas de caráter. [...] Na verdade, pouco sabemos dos motivos que levam as pessoas a direcionarem sua eroticidade para este ou aquele objeto. Ao que tudo indica, a orientação sexual é condicionada por uma série de fatores, de fundo orgânico e de fundo psicossexual. [...] Estudos feitos com pares de gêmeos univitelinos (e, portanto, com o mesmo padrão genético) parecem indicar a influência de fatores hereditários na gênese da orientação sexual. No entanto, como os mesmos estudos demonstram, não há apenas um componente hereditário, parecendo que o ambiente, a influência dos fatores psicossociais têm também grande relevância. [...] Qualquer que seja o peso relativo de cada fator, entretanto, é necessário que fique claro não ser a orientação sexual uma escolha consciente. De fato, ninguém ‘escolhe’ ser homossexual, como também a maioria de nós não escolheu ser heterossexual. Apenas um dia nos damos conta que nos sentíamos atraídos eroticamente por pessoas de sexo igual ou dife-
________________________ ________________________ ________________________ ________________________ O que podemos depreender dessas considerações? ________________________ ________________________ Num processo de educação adequadamente conduzido, é mister que atuemos ________________________ no sentido de assegurar o respeito às pessoas quanto ao exercício de sua sexualidade, ________________________ à vivência das múltiplas formas de práticas sexuais bem como lutar contra os diferen- ________________________ ________________________ tes preconceitos sexuais e de gênero, que se perpetuam através dos tempos. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Para enriquecer seu estudo, sugerimos a apreciação e análise do vídeo: ________________________ ________________________ Preconceito, tô fora. Disponível em: <http://br.youtube.com/watch?v=HnM1Hh________________________ 166I>. Acesso em: 6 dez. 2014 ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ rente do nosso.
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TERCEIRA IDADE O envelhecimento da população é um fenômeno contemporâneo e suas representações sociais dependem do tipo de sociedade, de fatores históricos, psicológicos, culturais e econômicos. Numa análise feita sobre o tema por Canella, Jurberg e Araújo (2003, p. 182) indicam que: A expectativa média de vida [...] no início da era cristã era, aproximadamente de 30 anos, permanecendo nesses níveis durante os séculos iniciais e em toda a Idade Média. Após o Renascimento, com seus diversos avanços sociais, políticos, culturais e científicos, a expectativa ao nascer, no primeiro mundo, começa a elevar-se: em 1750, era de 35 anos, em 1880, era de 40 anos e, no começo do século XX já atingia 45 anos.
No Século XX, a Organização das Nações Unidas adotou como idade de transição para a inclusão no segmento idoso, 60 anos para as mulheres e 65 anos para os homens.
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Como você caracteriza o envelhecer?
Que representações tem sobre a velhice? E sobre a terceira idade?
A terceira idade começa com o Climatério (Klimakter – eros) que se traduz como o período crítico de vida, ponte entre a juventude e a velhice. O Climatério compreende a diminuição da fertilidade, sinais de atrofia progressiva dos tecidos, envelhecimento, diminuição da força dos impulsos sexuais, aumento do desejo de partilha e do crescimento da necessidade de dependência. A terceira idade é a antítese da adolescência.
E quanto à sexualidade nesse período de vida?
Muitas pessoas, inclusive quem está nessa fase da vida, têm ainda preconceitos com relação à vivência da sexualidade na velhice. Isto porque, em geral, foram educadas sob normas de padrões comportamentais muito rígidos que a impedem de vislumbrar a “permanência” do sexo nesse período de vida.
Todas as cartas de amor são ridículas
Álvaro de Campos,
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Heterónimo de Fernando Pessoa Todas as cartas de amor são Ridículas. Não seriam cartas de amor se não fossem Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor, Como as outras, Ridículas.
As cartas de amor, se há amor, Têm de ser Ridículas.
Mas, afinal, Só as criaturas que nunca escreveram Cartas de amor É que são Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia Sem dar por isso Cartas de amor Ridículas.
A verdade é que hoje As minhas memórias Dessas cartas de amor É que são Ridículas.
Todas as palavras esdrúxulas, Como os sentimentos esdrúxulos, São naturalmente Ridículas
Fonte: “Poemas”. Disponível em: <http://www.casadobruxo.com.br/poesia/f/alvaro103.htm>. Acesso em: 7 dez.2014.
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74 O processo de envelhecer é um movimento de perdas e ganhos. Nossa experiência, realizando oficinas sobre Sexualidade com Idosos, tem demonstrado que:
Para uns, ainda esta idade é sinônimo de chinelos, pijama, quietude, descanso, aposentadoria, (decreto social da velhice), ausência de objetivos, perdas da alegria, da auto-estima, da autoconfiança, sensação de inutilidade, desprestígio, auto-rejeição, do estar perdido no tempo e no espaço, de assexualidade e até mesmo da sensação de ‘morte em vida’.
A mulher que historicamente sempre foi induzida a depositar o significado de sua vida no casamento, no papel de ser mãe ou no cuidar de sobrinhos (quando não se casava) reproduzindo normas, valores e papéis desempenhados por suas mães, avós e outros membros da família, vê-se na terceira idade dissimulando a sexualidade sentida, por não mais se considerar útil e prestigiada como antes, por estar sozinha, separada, viúva e também por vergonha e por medo de ser censurada.
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O homem, ontem sábio, experiente, conselheiro, respeitado, requisitado, acreditado e todo-poderoso, passa a se sentir esquecido, desvalorizado, desrespeitado, desacreditado e até mesmo rejeitado pela família e pela sociedade. Busca muitas vezes a afirmação sexual, através de relacionamentos com pessoas mais jovens.
Por outro lado, felizmente, há quem diga que ‘a vida começa aos quarenta anos’.
Tem se tornado evidente a existência de mais dinamismo, novos estímulos, participação social e cultural mais ampla e até uma construção diferente da vida e da relação com o tempo, por parte de pessoas que estão na terceira idade. (FAGUNDES, 1995, p. 79-80)
Sobre sexualidade na terceira idade, há muito que considerar: aspectos biológicos, a visão de si (como exemplificamos anteriormente), a percepção do meio social e tantos outros. Nesta aula, contudo, particularizaremos as repercussões da idade na Resposta Sexual Humana. Master e Johnson (1984) concluíram que ela é equivalente a de indivíduos jovens e maduros, diferindo quanto ao tempo necessário à sua efetivação bem como quanto à intensidade das reações. Vejamos suas características no quadro a seguir:
Resposta sexual humana (RSH) na terceira idade HOMEM Diminuição da libido
Fases
- cultural DESEJO
baixa e prolactina elevada. Mais tempo para conseguir, porém maior duração da ereção; Dificuldade de reaver ereção se for interrompida; Testículos não atingem o períneo na fase de platô; Rubor sexual menos intenso.
ORGASMO
Diminuição da libido - cultural
- hormonal: testosterona diminui aproximadamente 50%, dopamina
EXCITAÇÃO
MULHER
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75
Mitos da menopausa Mais tempo para lubrificar a vagina (estrógeno-dependente); Menor intensidade de lubrificação; Coloração e intumescimento (vagina e p. lábios) atenuados; Rubor sexual e reações mamárias
Mais tempo para ejacular
de menor intensidade. Não modifica a intensidade;
(eventualmente ausência);
Menor nº de contrações da
Menor volume ejaculatório;
plataforma orgástica (5-10);
Menor força de propulsão do jato
Manutenção da capacidade
espermático;
multi-orgástica;
Ejaculação sem fase de emissão;
Resolução rápida.
Resolução rápida.
De modo geral, os homens, neste período, apresentam um aumento da proporção da gordura do corpo ao tempo em que diminuem a massa muscular e a quantidade de pelos no corpo; tendem a ter anemia, osteoporose, dificuldade de concentração, memória e ereção, perdendo, às vezes, o interesse sexual. Ficam irritadiços e passam a ter insônia.
O que você depreende desses dados?
Em que etapas da RSH há maior comprometimento?
Para Canella, Jurberg e Araújo (2003, p. 192): Apesar das injunções socioculturais, o exercício da sexualidade depende da individualidade dos parceiros, tanto como pessoas como verdadeiros parceiros. Não custa reafirmar que o equilíbrio da sexualidade do idoso depende de como ele viveu sua vida sexual como um todo. O seu jeito de ser, na atualidade, depende das experiências que viveu e de tudo o que aprendeu no decurso de sua existência, e que, como qualquer outra pessoa deve ser respeitada.
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76 Sabendo, pois, que a sexualidade está presente nos idosos, acreditamos na possibilidade de pessoas aos 60, 70, 80 anos viverem de maneira prazerosa, driblando e quebrando preconceitos, no contexto de sua época e cultura.
Para ampliar a análise sobre a sexualidade na terceira idade, assista aos vídeos: Fases do envelhecimento. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=nREpJo2K9l8 Idosos com vitalidade. Disponível em: http://br.youtube.com/watch?v=JhuYDqrB_ f0&feature=related O que é a vida. Disponível em: http://br.youtube.com/watch?v=rIC229QWnQY&NR=1
Uma das conclusões que emergirão das reflexões é que é possível reverter o quadro de uma vida de “perdas” mais do que “ganhos” se firmemente nos programarmos para visualizar novos horizontes, descobrir o direito de ser e de refazer a própria trajetória existencial, buscando o prazer.
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Afinal, em qualquer idade, afirma Araguari Chalar Silva (1989, p. 39), “O casal resulta da união de duas pessoas, de duas realidades distintas, que devem se encontrar num objetivo comum e em atividades complementares para que o momento atual exista”.
SÍNTESE Nesta aula, experienciamos discutir e analisar uma variedade de aspectos que integram a vivência da sexualidade na idade adulta e na terceira idade. Esperamos que você tenha depreendido, do que foi estudado, que a sexualidade, como forma de expressão pessoal, começa com o nascimento e vai até o fim da vida. Para muitas pessoas, ela oferece a oportunidade de uma vida intensa de sensações, conflitos, prazeres... e liberdade para vivê-la da forma mais satisfatória possível (ou até de não vivê-la). Na próxima aula, nosso foco de análise será a sexualidade de pessoas com necessidades especiais.
REFERÊNCIAS
77 educação e sexualidade
Até lá!
ABDO, Carmita H. N. (org). Sexualidade humana e seus transtornos. 2. ed. São Paulo: Lemos, 2000. CANELLA, Paulo; JURBERG, Marise B.; ARAÚJO, Maria Luiza Macedo de. Envelhecimento e Sexualidade. Revista Brasileira de Sexualidade Humana, São Paulo, v. 14, n. 2, 2003. p. 175-192. FAGUNDES, Tereza Cristina. Sexualidade Humana - causas sócio-culturais das disfunções sexuais. Revista Brasileira de Sexualidade Humana, São Paulo, v. 13, n. 2, 2002. p. 151-156. ________. Educação Sexual: construindo uma nova realidade. Salvador: UFBA, 1995. KAPLAN, H. S. A nova terapia do sexo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977. KINSEY, Alfred Charles. O comportamento sexual do homem e da mulher. 2. ed. EUA, 1998 MASTER, William H., JOHNSON, Virgínia E. A resposta sexual humana. São Paulo: Roca, 1984. OTTO, Priscila Guimarães; OTTO, Paulo Guimarães; FROTA-PESSOA, Oswaldo. Genética Humana e Clínica. 2. ed. São Paulo: Roca. 2004. RODRIGUES JÚNIOR, Oswaldo. Travestismo: compreensões psicossociais. Disponível em: http://www.oswrod.psc.br/saib_travest.php. Acesso em: 20 out. 2007. SILVA, Araguary Chalar. Terapia do sexo e dinâmica do casal. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1989. VITIELLO, Nelson. Principais variações, desvios, parafilias e perversões. Revista Brasileira de Sexualidade Humana, São Paulo, v. 12, n. 2, 2001. p.185-193.80 ________. Orientação Sexual. In: Sexualidade na Adolescência: manual de apoio ao educador. São Paulo: Organon, s.d. p. 28-29.
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EM SITUAÇÕES ESPECIAIS
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AULA 05 - O EXERCÍCIO DA SEXUALIDADE
Até a aula anterior, estudamos significados e manifestações da sexualidade em pessoas consideradas “normais”, segundo padrões vigentes em determinada época e cultura. Nesta aula, nossa análise recairá no exercício da sexualidade em situações especiais. Podemos admitir que a vivência da sexualidade sempre se dá em situações especiais; entretanto, nesta aula, adotaremos essa terminologia para nos referir às expressões da sexualidade em pessoas com deficiências. Na acepção da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo (BRASIL, 2009), pessoas com deficiência
[...] são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.
Deficiência é um conceito em evolução e não deve ser confundida com incapacidade. Antes do século XVIII, pouco se sabia sobre deficiências e, em geral, esse pouco estava associado ao misticismo e ao ocultismo, analisa Mazzotta (1999). Como qualquer outro fenômeno diferente do padrão tido como normal causava e, muitas vezes ainda causa, medo, temor, estereótipos e preconceitos. Em consequência, as pessoas com deficiências eram escondidas, marginalizadas, afastadas do convívio social, privadas da educação formal, agravando a situação. Piora ainda mais a permanência, no mundo inteiro, da antiga crença de que pessoas com deficiência são assexuadas e, por conseguinte, não precisam estar vinculadas a programas de educação sexual e de saúde sexual e reprodutiva.
Você conhece pessoas com deficiência? Quais as limitações dessa pessoa?
A análise que Maia (2007, p. 13) faz, também nos acrescenta dados para reflexões pertinentes aos quadros de pessoas com deficiência.
Pensar na pessoa com deficiência exige uma reflexão sobre as questões de
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diversidade e da ‘normalidade’. O conceito de deficiência se faz sob o parâmetro da igualdade e da ‘normalidade’ e a partir dessas idéias emerge uma série de antagonismos para justificar a ‘deficiência’: plenitude X falta, sanidade X insanidade, perfeito X imperfeito, eficiência x ineficiência; conceitos esses marcados por contradições e preconceitos.
Frequentemente, associamos às pessoas com deficiência a ideia de fragilidade, dependência, incapacidades múltiplas de quem devemos ocultar tudo o que possa machucar, marcar ou piorar o quadro.
Neste contexto, como fica a sexualidade dessa pessoa?
A compreensão da sexualidade em pessoas com deficiências requer um entendimento amplo das duas dimensões: sexualidade e deficiência. São dimensões que evocam emoções e sentimentos muito intensos. Sexualidade e deficiência não são fenômenos abstratos e restritos; são concretos, amplos e, ao mesmo tempo, manifestações particulares e especiais que coexistem numa mesma pessoa.
________________________ ________________________ ________________________ Assim como a sexualidade é universal e, ao mesmo tempo, particular e pró________________________ pria de cada pessoa, a sexualidade do deficiente é particular em função das diferen________________________ tes características do tipo de deficiência considerada. ________________________ ________________________ ________________________ Sabemos que as deficiências podem ser congênitas (que se manifestam ao nas________________________ ________________________ cer) ou adquiridas durante a vida. Para a especialista Arletty Pinel (1993, p. 312-313) ________________________ Podem manter-se estacionadas durante o período vitalício ou pro________________________ gredir obedecendo a distintos estágios de gradação. Em outros ca________________________ sos, podem até ameaçar a vida da pessoa envolvida. Há deficiências ________________________ visíveis ao passo que outras, como o câncer ou o diabetes, podem ________________________ manter-se ocultas. Algumas afetam a inteligência e outras apenas ________________________ as funções motoras e/ou dos sentidos. Na verdade, a maioria das ________________________ deficiências não afeta a função sexual, mas todas complicam o de________________________ senvolvimento da sexualidade. ________________________ ________________________ ________________________ Mas não devemos concluir, precipitadamente, que pessoas com deficiência ________________________ possam viver plenamente a sua sexualidade. Do ponto de vista orgânico, há proble________________________ mas concretos em duas situações que são explicadas por Pinel (1993, p. 313): ________________________ ________________________ 1 - Quando existem problemas clínicos que incluem alterações
anatômicas, fisiológicas, farmacológicas e seqüelas cirúrgicas que
lubrificação vaginal e/ou sensibilidade clitoriana da mulher. Por exemplo: malformação dos genitais, lesões medulares, efeitos colaterais de alguns medicamentos, cirurgia pélvica externa por câncer de próstata ou útero. [...] 2 – Quando coexistem problemas funcio-
81 educação e sexualidade
interferem diretamente na ereção e/ou ejaculação no homem e na
nais causados por paralisia, espasmos musculares, dor ou falta de ar. Por exemplo: esclerose múltipla. Paralisia cerebral, artrite reumatóide, enfisema pulmonar, câncer, uremia.
Acrescentamos, a essas situações, a sexualidade afetada pela mastectomia que requer da pessoa submetida à cirurgia mutiladora da mama um investimento pessoal muito grande (auxiliada por especialistas) para superar a aflição e os sofrimentos múltiplos em especial, neste caso, decorrentes da aceitação da nova forma corporal. Entretanto, do ponto de vista psicológico, os comprometimentos são muito abrangentes porque estão atrelados às condições fisiológicas emocionais e sociais que permitem desejar, dar e/ou receber prazer. As dificuldades repercutem na autoestima, imagem corporal, construção das identidades, exercício dos papéis de gênero e vulnerabilidade à exploração sexual por terceiros (objeto de estudo da próxima aula).
Para ampliar seu entendimento sobre sexualidade e deficiência, analise: AMARAL, Lígia Assumpção. Adolescência/deficiência: uma sexualidade adjetivada. Temas em Psicologia. [online]. 1994, v. 2, n. 2, p. 75-79. ISSN 1413-389X. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/tp/v2n2/v2n2a08. pdf>. Acesso em: 8 dez. 2014.
Retomando a premissa de ser a sexualidade inerente a todos os seres humanos desde o nascimento até a morte, precisamos nos conscientizar de que ela está presente e se manifesta em todas as pessoas com deficiência quer seja ela física — motora, visual, auditiva —, quer seja intelectual.
Fonte: Clipart
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Fonte: Clipart
Como você imagina a vivência da sexualidade em pessoas com deficiências?
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Vejamos algumas considerações acerca das deficiências motora, visual, auditiva e mental, sua relação com a sexualidade e possibilidades de intervenções educativas.
Deficiência Motora São múltiplas as causas que levam a esta deficiência, assim como as suas manifestações. Consequentemente, a sexualidade se expressa com mais ou menos intensidade e a resposta sexual humana pode ou não acontecer: há dificuldades que vão desde a falta de ereção e de lubrificação na vagina, a incontinência urinária, a instabilidade para se mover, o pouco ou inexistente controle do corpo ou parte dele. Segundo Pinel (1993, p. 312) a parte motora e a sensibilidade são afetadas em pessoas que tem lesão medular, “[...] mas o efeito sobre a resposta sexual humana dependerá da extensão e do nível da lesão, assim como das medicações e intervenção cirúrgicas efetuadas”. O exercício da sexualidade na vida adulta requer o aprendizado de novas habilidades, a superação de preconceitos, enfim uma reestruturação social, afetiva e sexual que capacite o deficiente para a vida.
Uma mulher com deficiência motora (DE PAULA; REGEN; LOPES, 2005, apud
Embora as sensações de prazer se deem no corpo material; a sexualidade se constrói e se expressa no corpo simbólico, ou seja, no corpo que temos em mente, na
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CERTEZA, 2013, p. 2)1 declara sobre sua sexualidade:
imagem que fazemos dele, nas fantasias que temos com ele. ‘Nós conhecemos nosso corpo ao andar, ao fazer amor, aos nos lavar, do mesmo modo que o conhecemos por meio da dor, da doença e das emoções. Esta bagagem inclui experiências físicas e psicológicas, imaginárias e reais, do presente e do passado’.
E continuando suas reflexões, admite Certeza (2013, p. 1): Erotismo e deficiência são termos que parecem não combinar quando postos lado a lado. Mas combinam! Nós é que não percebemos. Quando uma pessoa com deficiência diz que mantém relações sexuais, em geral, podemos reagir com desconfiança ou pena. Primeiro, por duvidar que alguém possa sentir atração por ela: é mais provável que esteja se aproveitando ou obtendo alguma vantagem. Segundo, por supor que ela esteja fantasiando ou mentindo. Lamentamos, então, a impotência humana diante das fatalidades que atravessam nossas vidas! Como o novo sempre nos assusta, procuramos nos vincular ao já conhecido. E, assim, buscamos refúgio nas imagens que a sociedade, geralmente, nos apresenta tanto da sexualidade (sexy é quem exibe um corpo perfeito e simétrico, segundo os padrões de beleza e estética da mídia); quanto das pessoas com deficiência (alguém que erroneamente supomos ser ‘imperfeito’, ‘incapaz’, ‘frágil’, e que não pode fazer parte da sociedade dita ‘normal’). O resultado é um misto de muita alienação, desinformação e preconceito.
Depreende-se, pois, que viver a sexualidade com deficiência motora requer a construção de novos olhares novos conceitos e novas formas de se relacionar no mundo. Torna-se relativa à compreensão de beleza, simetria, atração, conquista, habilidades, sexo e amor.
1 DE PAULA, Ana Rita; REGEN, Mina; LOPES, Penha. Sexualidade e Deficiência: Rompendo o Silêncio. Expressão & Arte Editora, 2005.
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Amplie sua compreensão sobre deficiência acessando o site do CEDIPOD Centro de Documentação e Informação do Portador de Deficiência - http://www. cedipod.org.br/docint.htm. Entidade civil, sem fins lucrativos, o CEDIPOD foi fundado em 1990 para suprir a falta de uma entidade especializada na coleta, organização e divulgação de informações sobre pessoas com deficiência. O CEDIPOD elabora material informativo para entidades de pessoas com deficiência e para a sociedade e presta assistência nas áreas de Legislação (Direitos Civis), Eliminação de Barreiras Arquitetônicas, Transportes, Comunicação e Participação Social. Suas ações se voltam para a conscientização e promove a participação plena das pessoas deficientes em igualdade de condições às não deficientes. Em sua página, temos indicação de livros escritos por deficientes sobre seus relatos de vida, além de documentos oficiais brasileiros.
Deficiência Visual ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________
Por deficiência visual, entende-se o comprometimento parcial (de 40 a 60%) ou total da visão, excluindo-se os distúrbios visuais como a miopia, a hipermetropia, o astigmatismo e outros que podem ser corrigidas com o uso de lentes ou por meio de cirurgias.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece critérios para classificação de diferentes graus de deficiência visual (OMS, snt) - Baixa visão (leve, moderada ou profunda): compensada com o uso de lentes de aumento, lupas, telescópios, com o auxílio de bengalas e de treinamentos de orientação. - Próximo à cegueira: quando a pessoa ainda é capaz de distinguir luz e sombra, mas já emprega o sistema braile para ler e escrever, utiliza recursos de voz para acessar programas de computador, locomove-se com a bengala e precisa de treinamentos de orientação e de mobilidade. - Cegueira: quando não existe qualquer percepção de luz. O sistema braile, a bengala e os treinamentos de orientação e de mobilidade, nesse caso, são fundamentais. Na análise do educador Robenilson Nascimento (2000, p. 1): Dentre as marcas corporais compreendidas como desvio à normalidade decorrente do déficit físico, sensorial ou intelectual, a cegueira é a que mais impressiona o espírito humano, suscitando a respeito
Segundo esse autor, construindo as concepções que permeiam a compreensão da cegueira, há uma série de mitos e de estereótipos que marcam as pessoas com deficiência visual como seres incapazes e, antagonicamente, também, como possuidoras
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dos indivíduos invisuais os mais diversos tipos de sentimentos.
de superpoderes e super capacidades. Os estereótipos do cego como incapaz e indefeso, de um lado, e dotado de sexto sentido e de visão interior, compensando o sentido que lhe falta, do outro, são duas faces de uma mesma moeda. Esses rótulos permeiam as representações sociais que fazemos do cego e em nada contribuem para os progressos escolares do aluno deficiente visual, porque não nos permitem perceber o aluno real à nossa frente. (NASCIMENTO, 2014, p.1)
A sociedade também constrói estereótipos associados ao corpo dos deficientes visuais. Mas o corpo da pessoa deficiente só apresenta limitação na visão. Entretanto, embora a ausência do sentido visual em si não limite ou cerceie a sexualidade, o valor social atribuído à visão é muito marcante, sendo comum a concepção de que o olhar vislumbra a possibilidade sensual, provoque o desejo e até mesmo assegure um “amor à primeira vista”! Como a maioria das informações que recebemos do mundo se processa visualmente, um deficiente visual aprende menos sobre tudo o que não pode ser tocado, ________________________ apalpado e “conhecido” através de suas mãos. ________________________ Como não existem parâmetros de comparação, muitos deficientes visuais acreditam ter genitais anormais; a menstruação ganha um agravante e algumas mulheres passam a apresentar um temor excessivo do primeiro contato sexual [...]. (PINEL, 1993, p. 320)
Sobre as superações necessárias, retomamos Nascimento (2014, p. 1) para quem A superação desses mitos, estereótipos e preconceitos é o passo inicial para que a inclusão transcenda a esfera do discurso e se efetive no cotidiano escolar, seja enquanto concepção seja na prática pedagógica. Pode-se observar em uma parcela significativa de professores dos diversos níveis e modalidades de ensino, compreensões e atitudes que obstaculizam o progresso educacional dos alunos com deficiência visual, muitas fundadas nas concepções anteriormente aludidas.
Depreendemos, pois, desses estudos que as pessoas cegas ou com baixa visão precisam ser “ensinadas” desde crianças a encararem a limitação visual como um dado que não as impedem de sentir desejo, de se relacionar afetivamente e de ter relações afetivas sexuais íntimas, intensas, profundas e ajustadas. É preciso que, pela educação, se promovam ações de superação das marcas negativas com relação à deficiência, tanto presentes em pessoas cegas como em pessoas com visão.
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86 Deficiência Auditiva Assim como a deficiência visual, a deficiência auditiva é identificada com o agravante de não ser descoberta precocemente e não contar com pessoas “eficientes” para intervenção que se fazem necessárias à inclusão no mundo majoritariamente de “ouvintes”. A deficiência auditiva pode ser entendida como a incapacidade para compreender o que é falado através do ouvido; consiste na perda total ou parcial (bilateral), que se manifesta desde o nascimento ou é adquirida posteriormente. A legislação a define como perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz. (BRASIL, 2004) Com surdez total ou severa, a pessoa não consegue perceber a voz humana, o que resulta na dificuldade, quando não na impossibilidade de adquirir o código da linguagem oral. Com surdez parcial, leve ou moderada, é possível perceber a voz humana, com ou sem o uso de aparelhos fazendo com que a pessoa surda aprenda a se expressar oralmente. No tocante à sexualidade de mulheres e de homens com surdez, há compro-
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metimento, somente, na comunicação auditiva e verbal. A vivência da sexualidade se processa com essa limitação, mas pode ser em plenitude, conduzindo a pessoa surda ao prazer. O corpo responde como um todo e particularmente aos jogos de sedução, atração, toques, aconchego, sexo, saúde sexual e reprodutiva, escolhas, decisões, relacionamentos amorosos e de constituição familiar. É importante encontrar caminhos para informar, esclarecer, desmistificar, assegurar a compreensão para que desde cedo as pessoas surdas — parcial ou totalmente — possam desenvolver sua autoimagem, autoestima e se sentir com uma sexualidade, para si, plena e saudável.
Deficiência Intelectual Na atualidade, o termo deficiência intelectual é indicado como substitutivo do termo deficiência mental. É o intelecto do individuo que está comprometido e não a sua mente. Não se trata de um traço absoluto da pessoa, mas sim uma qualidade ou característica que se manifesta em interação com o meio. No artigo nomeado “Terminologia sobre deficiência na era da inclusão”, Sassaki (2003) afirma que
em 1992 pela Associação Americana de Deficiência Mental, considera a deficiência mental não mais como um traço absoluto da pessoa que a tem, e sim como um atributo que interage com o seu meio ambiente físico e humano, que por sua vez
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A nova classificação da deficiência mental, baseada no conceito publicado
deve adaptar-se às necessidades especiais dessa pessoa, provendo-lhe o apoio intermitente, limitado, extensivo ou permanente de que ela necessita para funcionar em 10 áreas de habilidades adaptativas: comunicação, autocuidado, habilidades sociais, vida familiar, uso comunitário, autonomia, saúde e segurança, funcionalidade acadêmica, lazer e trabalho.
Como essa deficiência implica num funcionamento intelectual abaixo da média (da população), que se manifesta o longo do período de desenvolvimento (da pessoa) e cursa também com dificuldades de adaptação social, a sexualidade de deficientes mentais não é “controlada” pelo “crivo” da compreensão e da sua maturidade. Além de carinho, aceitação, raiva, descaso, interesse, atenção, etc., crianças e jovens com deficiência mental expressam seus impulsos sexuais, que são os mesmos que os das outras crianças e jovens sem essa deficiência. Aparentemente são espontâneos em suas manifestações sexuais — dependendo do maior ou menor grau de deficiência que têm —, o que resulta em maior ou menor criticidade. Consequentemente, podemos encontrar desde aqueles que não conseguem discernir sobre o que podem/ devem manifestar — quanto aos desejos e impulsos sexuais — até aqueles que, com menor grau de limitação, conseguem administrar suas expressões sexuais em público. Quanto à reação da família e da sociedade, percebemos ser bem mais difícil aceitar a “convivência” com essa espontaneidade, aumentando os medos, preconceitos, repulsa, entre outros sentimentos. Retomamos, como exemplo, o estudo realizado por Sheila Uzeda (2004), sob nossa orientação, que objetivou evidenciar a compreensão de mulheres com deficiência mental (especificamente Síndrome de Down), sobre sexualidade, identidade e papéis de gênero. A pesquisadora procurou identificar se os estigmas de subordinação e inferioridade, socialmente construídos e associados à identidade feminina, desencadeavam o reforço das ideias de incapacidade e imaturidade atribuídas à mulher com deficiência intelectual. Ter deficiência intelectual se somava à identidade de gênero contribuindo para a permanência dos estereótipos de passividade, incapacidade, dependência e subordinação, historicamente (e equivocadamente) associados à identidade feminina. A análise dos dados levantados por Uzeda (2004, p. 7) demonstrou:
[...] a existência de uma educação sexual marcadamente repressora para estas mulheres, que apesar da faixa etária e constituição biológica lhes conferirem condição de mulher, eram vítimas de uma postura infantilizadora, que resultava em atitudes de grande dependência em relação à figura materna. Evidenciou-se, também,
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desinformação e concepções distorcidas sobre corpo e sexualidade
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por partes das mulheres que integraram esta pesquisa, e diferenciação dos papéis sexuais em função do gênero.
Mas, por outro lado, e de forma animadora, Uzeda (2006, p. 7) concluiu que
[...] a limitação cognitiva, quando leve ou moderada, não inviabiliza a efetivação de programas de educação sexual; ao contrário, marca sua prioridade, entendendo que a sexualidade é dimensão presente durante todas as fases do desenvolvimento humano, independente da condição cognitiva que o indivíduo apresente.
Nesse contexto, reafirmamos a possibilidade de vivência plena da sexualidade pelas pessoas, mesmo com deficiência, e a demanda por uma educação sexual desde o início da vida, integral e abrangente.
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Como educar para a sexualidade pessoas com deficiência?
Nossa análise mais aprofundada sobre Educação Sexual será feita nas Aulas 7 e 8. Contudo, queremos, desde já, registrar a importância de propiciar condições para que crianças e adolescentes com deficiência:
Conheçam seu corpo, estrutura e funcionamento, “Compreendam” os principais “códigos” que regulam a conduta sexual humana; Recebam da família e das instituições especializadas atendimento adequado à sua condição de deficiente, no tocante aos seus comportamentos sexuais.
E como estar preparado para educar sexualmente os deficientes?
Para a especialista Maria Helena Gherpelli (1995), com quem concordamos, as pessoas que convivem com deficientes precisam se nortear por atitudes básicas, tais como:
Estar atentos ao seu próprio posicionamento frente à sexualidade e ao se sentirem inseguros, procurar auxílio de profissionais competentes; Ter atitude de escuta sensível para saberem exatamente o que os deficientes querem
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ou precisam e interpretar o que realmente está acontecendo, considerando seu desenvolvimento, estágio cognitivo e maturidade.
A educação iniciada desde os primeiros anos de vida precisa conduzir à compreensão do gênero, dos impulsos, desejos, emoções, sentimentos, reações do corpo, higiene pessoal, culminando com o entendimento da necessidade de viver a sexualidade na privacidade, da discriminação dos comportamentos adequados socialmente e na aprendizagem de valores e do respeito ao outro. Tudo dependendo, é claro, do nível da deficiência e levando em conta, principalmente, que há muitas fontes de prazer e gratificação além daquelas de ordem sexual.
Como lidar com a inadequação do deficiente mental?
Recorremos mais uma vez a experiência da educadora Maria Helena Gerphelli (1995, p. 78), ao nos relatar o seguinte caso: Lembro-me de um aluno matriculado na escola na qual eu dava aulas de orientação sexual que era considerado pela família como uma pessoa sexualmente descontrolada. No seu primeiro dia de aula, o orientador da escola sugeriu ficar na escola comigo para evitar que o aluno me causasse aborrecimentos. Não concordei e disse que o chamaria se precisasse de ajuda. A aula transcorreu normalmente. No final, esse garoto, visivelmente excitado, perguntou se poderia por as mãos nos meus seios. ‘Não’, respondi, olhando para ele. ‘Mas eu quero’, retrucou ele. Então eu afirmei: ‘os seios fazem parte de meu corpo, portanto só eu tenho o direito de decidir quem me tocar e quando. E eu não quero que você ponha a mão em mim’. Depois disso esse rapaz participou de várias aulas minhas e nunca criou qualquer tipo de situação embaraçosa para mim.
Depreendemos do relato que, compreender a situação de deficiência não implica em fazer parte dos jogos sexuais do deficiente ou ser condescendente com ele. Todos, deficientes ou não, precisam ter limites para que possam se integrar socialmente ao meio em que vivem.
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A Força de um campeão: Deficiência Física À primeira vista: Deficiência Visual Adorável professor: Deficiência Auditiva Além dos meus olhos: Deficiência Visual Amargo regresso: Paraplegia O milagre de Anne Sullivan: Deficiência Auditiva/Visual Gilbert Grape - Aprendiz de sonhador: Deficiência Mental Carne trêmula: Deficiência Física Desafio sem limites: Paraplegia/Deficiência Visual Feliz ano velho:Tetraplegia Os filhos do silêncio: Deficiência Auditiva Meu filho, meu mundo: Autismo Meu pé esquerdo: Paralisia Cerebral Nell: Autismo Nick and Gino: Deficiência Mental Forrest Gump - O contador de história: Deficiência Mental O óleo de Lorenzo: Deficiência Física
O piano: Deficiência Auditiva ________________________ O Silêncio: Deficiência Visual/Auditiva ________________________ Oitavo dia: Síndrome de Down ________________________ Perfume de mulher: Deficiência Visual ________________________ Rain man: Autismo ________________________ ________________________ Simples como amar: Deficiência Mental ________________________ Uma história verdadeira: Paralisia Cerebral ________________________ Uma janela para o céu: Deficiência Física ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Para ampliar o estudo, seu entendimento e apreensão da temática desta aula, ________________________ leia a publicação do Ministério da Saúde: “Direitos Sexuais e Reprodutivos na Integra________________________ lidade da Atenção à Saúde de Pessoas com Deficiência”: ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento ________________________ de Ações Programáticas Estratégicas. Direitos sexuais e reprodutivos na integralida________________________ de da atenção à saúde de pessoas com deficiência. Ministério da Saúde, Secretaria ________________________ de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília: ________________________ Ministério da Saúde, 2009. ________________________ ________________________
Ressaltamos, para concluir, que as escolas devem se organizar para atender às
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crianças e adolescentes com necessidades educacionais especiais, como determinam as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001), educando-as para a sexualidade como educam para a vida.
SÍNTESE Fizemos assim, nesta aula, uma breve abordagem sobre o exercício da sexualidade em situações especiais, que compreende desde as limitações físicas e/ou intelectuais congênitas até aquelas adquiridas ao longo da vida. Refletimos, também, sobre algumas possibilidades de educar pessoas com deficiências como educamos pessoas sem deficiências para a sexualidade e para a vida. Na próxima aula, nosso estudo será direcionado para uma grande problemática associada à vivência da sexualidade — a da violência sexual.
Sigamos!
REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial. Brasília: MEC/SEESP, 1994.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. MEC/SEESP, 2001. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/ pdf/diretrizes.pdf>. Acesso em: 8 dez. 2014.
BRASIL, Ministério da Educação. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. 2008. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf>. Acesso em: 8 dez. 2014.
BRASIL. Presidência da República. Câmara dos Deputados. Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis nº 10.048, de 8 de novembro de 2000... Brasília. 2004
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009... Brasília. 2009.
CERTEZA, Leandra Migotto. A sexualidade da pessoa com deficiência. Anais do I Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência –SEDPcD / Diversitas / USP Legal São Paulo, junho/2013. Disponível em: <http://www.inclusive.org.br/?p=12340>. Acesso em: 7 dez. 2014.
GHERPELLI, Maria Helena Brandão Vilela. Diferente mas não desigual – a sexualidade no deficiente mental. São Paulo: Gente. 1995.
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MAIA, Ana Claudia Bortollozi. Sexualidade e Deficiências. São Paulo. UNESP. 2006.
MAZZOTTA, M. J. S. Educação Especial no Brasil – histórias e políticas públicas. São Paulo: Cortez, 1999.
NASCIMENTO, Robenilson. A fenomenologia e a inclusão escolar de educandos com deficiência visual: pesquisa e prática pedagógica. WIKI Epistemologia e Construção do Conhecimento. Salvador: Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar de Difusão do Conhecimento/UFBA. 2014. Disponível em: <http://pt-br.epistemologia.wikia.com/wiki/Artigo_de_Robenilson>. Acesso em: 5 dez. 2014.
ONU. Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes. Resolução aprovada ela Assembléia Geral em 09.12.1975. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/deficiente/lex61.htm>. Acesso em: 7 dez. 2014.
PINEL, Arletty Cecília. A restauração da Vênus de Milo: dos mitos à realidade social da pessoa deficiente. In: RIBEIRO, Marcos (Org.). Educação sexual: novas idéias, novas conquistas. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos. 1993. p. 307-325.
SASSAKI, Romeu Kazumi. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. In: VIVARTA, Veet (coord.). Mídia e deficiência. Brasília: Andi/Fundação Banco do Brasil, 2003, p. 160-165. Disponível em: <http:// www.educacaoonline.pro.br/index.php?option=com_content&view=article&catid=6%3Aeducacao-inclusiva&id=69%3Aterminologia-sobre-deficiencia-na-era-da-inclusao&Itemid=17>. Acesso em: 8 dez. 2014.
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UZÊDA, Sheila de Q. Identidade feminina e sexualidade na concepção de mulheres com síndrome de Down: educação sexual como caminho para a construção de maior autonomia. 2006. 121fls. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2006.
Autora: Profª Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
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AULA 06 - VIOLÊNCIA SEXUAL E DE GÊNERO
Nas aulas anteriores, analisamos a sexualidade que se manifesta em mulheres e em homens ao longo da vida e que está intimamente relacionada ao prazer.
Infelizmente, há situações em que o prazer é substituído pelo desconforto, angústia, medo, dor, etc., que ocorrem em maior frequência do que supomos, e se caracterizam como violência sexual, objeto de estudo desta aula. Pode ser entendida como uma ação na qual uma pessoa, valendo-se do poder que lhe é socialmente conferido, utilizando força física, influência psicológica, drogas e, até mesmo, armas frias ou de fogo, coage outra a efetivar práticas sexuais.
Que exemplos (conhecidos ou vividos) você tem e considera casos de violência sexual?
A violência sexual é um fenômeno complexo, reflexo das desigualdades sociais, impregnada de marcadores sociais como gênero, classe, raça/etnia, idade/geração. É uma atividade sexual forçada, não consentida. Marilena Chauí (1985) a define como uma relação de força que converte as diferenças entre os sexos em desigualdades com o objetivo de dominação. “A vítima pode ser forçada fisicamente, coagida verbalmente, não tendo a capacidade cognitiva para consentir ou julgar o que está acontecendo”, complementa Sadigurski (1999, p. 16). Violência sexual é crime contra a dignidade sexual e como tal, foi legislado, no Brasil, pelo Código Penal de 1940 (BRASIL, 1940) atualizado pela Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009. (BRASIL, 2009)
Formas de Violência Sexual Há formas distintas de violência sexual definidas pela Lei:
Estupro - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que, com ele se pratique outro ato libidinoso (Art. 213).
Violação sexual mediante fraude - Ter conjunção carnal ou praticar outro ato
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libidinoso1 com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima. (Art. 215).
Assédio sexual - Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. (Art. 216-A)
O atentado violento ao pudor, que implicava a prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, foi associado ao estupro, que passou a significar tanto a prática de atos libidinosos quanto a conjunção carnal decorrente do constrangimento de alguém mediante violência ou grave ameaça.
Mantiveram-se como crimes as formas de violência nomeadas crimes sexuais contra vulnerável, entendido como pessoa frágil, que não tem meios para se defender, a saber:
Estupro de vulnerável - Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos (Art. 217A)2.
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Corrupção de menores - Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia3 de outrem (Art.218).
Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente - Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem (Art. 218A).
Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável - Submeter, induzir ou atrair à prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilitá-la, impedir ou dificultar que a abandone (Art. 218-B). Por que é importante estudar a problemática da violência sexual num curso de formação de educadores?
1Ato libidinoso = aquele que visa ao prazer sexual. 2 O § 1º do Art. 217ª define que “Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.” 3 Lascívia = libidinagem.
são alvo de pessoas maiores de idade, que, fazem uso de sua autoridade e poder, para obter prazer, favores ou vantagens sexuais.
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Em muitos lugares do Brasil e do mundo, infelizmente, crianças e adolescentes
Essas práticas configuram os quadros de exploração e abuso sexual e estão bem mais próximas de nossa realidade do que somos capazes de imaginar.
Exploração e abuso sexual Na história de suas vidas, é comum crianças e adolescentes (no Brasil e no mundo) serem alvo de adultos mal intencionados que as exploram ou as abusam sexualmente. Abuso e exploração são faces de uma mesma moeda. Diferem quanto à intenção final – a exploração visa lucros financeiros e o abuso não. O Ministério Público Federal (BRASIL, s.d) assim os define: Abuso Sexual
Acontece quando o corpo de uma criança ou adolescente é usado para a satisfação sexual de um adulto, com ou sem o uso da violência física. Desnudar, tocar, acariciar as partes íntimas, levar a criança a assistir ou participar de práticas sexuais de qualquer natureza também constituem características desse tipo de crime. Pode ser dentro ou fora da família.
Dada a frequência de abuso praticado por pessoa conhecida da vitima, depreende-se que é uma violência que acontece dentro ou fora da família. Exploração sexual comercial
É o uso de crianças e adolescentes em atividades sexuais remuneradas (ou seja, em troca de dinheiro). Alguns exemplos são a exploração no comércio do sexo, a pornografia infantil e a exibição em espetáculos sexuais públicos ou privados. Nesse tipo de violação aos direitos infanto-juvenis, o menino ou menina explorado passa a ser tratado como um objeto sexual ou mercadoria. Assim, ficam sujeitos a diferentes formas de violência, como o trabalho forçado. Em outras palavras, a exploração ocorre quando a criança ou adolescente vende seu corpo porque foi induzida a essa prática, seja pela situação de pobreza absoluta, pelo abuso sexual familiar ou pelo estímulo ao consumo. (BRASIL, s.d)
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Ressalta-se, contudo, que, como a criança não tem poder de decisão para se prostituir, o fato de ter seu corpo explorado por alguém que vai obter lucro com essa prática não se configura em “prostituição infantil”, e sim em exploração sexual comercial de crianças e adolescentes que pode envolver, também, a produção de materiais pornográficos como filmes, vídeos, fotos e sites. Na exploração sexual há sempre uma pessoa – o aliciador - que lucra intermediando a relação entre a criança/adolescente e o usuário ou cliente e uma verdadeira “rede” de pessoas que se beneficiam dos lucros auferidos com a exploração: familiares, amigos, caminhoneiros, donos de boates, bares e hotéis. Em 21 de maio de 2014 foi sancionado, pela presidenta do Brasil, o projeto de lei aprovado pelo Congresso que torna crime hediondo o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes. Vem contribuir com o que já prevê a Constituição Federal (BRASIL, 2008), em seu Art. 227 § 4.º: “A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente”.
Prostituição e exploração sexual Prostituição pode ser entendida como troca consciente de favores sexuais por dinheiro. O termo prostituição vem do verbo latino prostiture, que significa expor pu-
________________________ blicamente, por a venda. E prostituta diz respeito à pessoa que trabalha no campo da ________________________ prostituição, também chamada “profissional do sexo”. ________________________ Na análise de Cecarelli (2008, p.1.): ________________________ ________________________ ________________________ A representação social da prostituta varia segundo época e cultura; nem sempre foi acompanhada do estigma que o Ocidente lhe ________________________ atribui. Nas sociedades em que a propriedade privada inexistia e a ________________________ família não era monogâmica, por exemplo, o sexo era encarado de ________________________ forma bem diferente que a nossa, e ao que tudo indica, não havia ________________________ prostituição. Já em algumas civilizações tratava-se de um ritual de ________________________ passagem praticado pelas meninas ao atingirem a puberdade; em ________________________ outras, os homens iniciavam sexualmente as jovens em troca de pre________________________ sentes. ________________________ ________________________ ________________________ Na atualidade, contudo, há uma realidade muito triste que assola a nossa socie________________________ dade – a exploração de crianças e adolescentes - que se confunde com prostituição. ________________________ ________________________ Presente nas camadas sociais mais pobres dos grandes centros ur________________________ banos, sobretudo nas capitais do norte e nordeste do Brasil, assim ________________________ como em regiões isoladas do país marcadas por atividades extrati________________________ vas, supõe-se que o número de meninas envolvidas nessa atividade chegue aos 500 mil. Entre os motivos que as levam a se prostituir ________________________ destacam-se fatores econômicos e a baixa escolaridade (CECARELLI, ________________________ 2008. p.5) ________________________
de crianças e adolescentes frente à exploração sexual, por outro, somente pela educação é possível atuar de forma preventiva e advogar pelo cumprimento das leis e pela punição dos casos de exploração sexual.
97 educação e sexualidade
Se por um lado a falta de educação contribui para aumentar a vulnerabilidade
A Lei nº 12.015, de 07 de agosto de 2009 (BRASIL, 2009) referencia como crime diversas formas de lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual.
São elas:
Mediação para servir a lascívia de outrem
Induzir alguém a satisfazer a lascívia de outrem (Art. 227)4.
Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual
Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone (Art. 228).
Casa de prostituição
Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente (Art. 229).
Rufianismo
Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça Art. 2305.
Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual
Art. 231. Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estran4 Aumenta a gravidade do crime se a vítima for maior de catorze e menor dezoito anos, ou se o agente agressor for seu ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro, irmão, tutor ou curador ou pessoa a quem esteja confiada para fins de educação, de tratamento ou de guarda. Também se o crime for cometido com emprego de violência, grave ameaça ou fraude e/ ou com fins lucrativos. 5 Como no caso anterior, aumenta a gravidade do crime se a vítima tiver entre catorze e dezoito anos, se o crime for cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância, ou se for cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima.
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geiro (Art. 231). § 1º Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la6.
Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual
Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual (Art. 231-A).
A violência sexual pode acontecer em todas as fases da vida. Quando a vítima é criança ou adolescente, costuma ser traduzida como vitimização sexual.
Vitimização sexual
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Fonte: Clipart
As ilustrações anteriores representam diferentes grupos de vitimização sexual que podem ser perpetradas por familiares (intra) ou não (extra) da vítima. Há vitimizações que não envolvem contato físico (abuso verbal, telefonemas obscenos, exibicionismo, voyeurismo); há também as que envolvem contato físico (como passar a mão ou manipular os genitais, ter contato oral-genital, uso sexual do ânus, coito [ou tentativa de], prostituição infantil e incesto) e, no terceiro grupo, aquelas que envolvem o estupro, a brutalização ou mesmo assassinato de crianças como formas progressivas violentas de ataque sexual. (AZEVEDO; GUERRA, 1988)
Azevedo e Guerra (1988, p. 1-2) sobre violência sexual denunciam que:
6 Aumentará a gravidade do crime se a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tiver o necessário discernimento para a prática do ato; se o agente/traficante for ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; se houver emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
agressores são preferencialmente homens; - embora em pequeno número, há vítimas do sexo masculino; - os agressores estão, em média, na faixa dos 30-39 anos de idade e são, portanto, adultos do ponto de vista da definição legal; - entre os agressores há mais pais
99 educação e sexualidade
Quanto à direção: - as vítimas são preferencialmente mulheres e os
biológicos do que padrastos; - os agressores trabalham e geralmente residem em áreas de menor poder aquisitivo; - as vítimas têm em média 10 anos de idade e são, portanto, menores do ponto de vista legal; - a maioria das vítimas não trabalha (em termos de ocupação remunerada). [...]
Quanto às conseqüências: - a gravidez aparece como conseqüência indesejável e traumática (acrescentamos os quadros de DST, depressão, medo de sair de casa, de ficar sozinho/a e, a longo prazo, de relacionar-se sexualmente no futuro). [...]
Quanto à natureza: - [...] um processo do qual estão ausentes atos de força praticados pelo agressor como manobra coercitiva da vítima; [...] processo cercado pelo conhecido ‘complô do silêncio’, decorrente da natureza de interdito, característica do incesto em nossa sociedade. [...]
Quanto à visibilidade: - fenômeno com índice baixo de denúncia; -
________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Complemente essas reflexões analisando o documento ________________________ ________________________ ________________________ D O S S I Ê - Violência de Gênero contra Meninas. Violência doméstica ou intra-familiar; ________________________ exploração sexual e comercial; violência institucional por ação ou omissão. Porto Alegre; ________________________ Produção: Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos – Rede Feminista de Saúde – Regional do Rio Grande do Sul. 2005. Disponível em: <http:// ________________________ www.campanhapontofinal.com.br/download/new_23.pdf>. ________________________ ________________________ E o livro ________________________ AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane. Pele de Asno não é só História... um estudo ________________________ sobre a vitimização sexual em crianças e adolescentes na família. São Paulo: Roca, 1988. ________________________ Trata-se de uma obra que analisa, à luz do marco referencial do feminismo crítico, o ________________________ fenômeno da violência como manifestação da vitimização sexual da mulher-criança e nos ________________________ aponta a direção, consequências, natureza e visibilidade do fenômeno. ________________________ ________________________ ________________________ A violência sexual se operacionaliza como uma das formas de violência, como ________________________ a física, psicológica, econômica e patrimonial. A ela se soma a violência de gênero que ________________________ ________________________ abrange mulheres, crianças e adolescentes de ambos os sexos. ________________________ mães/madrastas são as principais denunciantes.
educação e sexualidade
100 Violência de gênero Inicialmente, admitimos que se trata de uma expressão comumente usada significando violência doméstica, violência contra a mulher e violência intrafamiliar. Historicamente, a violência contra a mulher se manifesta como decorrente das relações de poder desiguais entre mulheres e homens, que conduz à discriminação e ao domínio das mulheres por parte dos homens. E, embora a violência de gênero não se limite a ações contra a mulher, contra o gênero feminino, é nesse contexto de agressões, que a mulher se torna o alvo “privilegiado” do agente violentador. É a mulher que é agredida, espancada, forçada a ter relações sexuais, subjugada, dominada, subserviente, omissa, recalcada, ferida... Rodrigues (2010, p. 176) adverte que “[...] a violência de gênero contra as mulheres incorpora atos e condutas que causam dano/sofrimento psicológico, físico ou sexual tanto na esfera privada quanto nos espaços públicos, a exemplo da escola ou trabalho.” Essa problemática se tornou tão grave nos últimos anos que ganhou reconhecimento de diferentes instâncias no cenário jurídico-político internacional e nacional,
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“[...] como um problema de saúde pública e de direitos humanos” analisa Rodrigues (2010, p. 176), basta que verifiquemos as publicações “Declaração sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres” (ONU, 1993) e a “Convenção Inter-Americana de Prevenção, Punição e Erradicação da Violência contra a Mulher” conhecida como “Convenção de Belém do Pará” (OEA, 1994) e a “Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher – Pequim” (ONU, 1995). Sobre violência de gênero, muito bem analisa Saffiotti (2001, p.117), uma feminista marcante na história das mulheres no Brasil: Usa-se o conceito de dominação-exploração ou exploração-dominação, porque se concebe o processo de sujeição de uma categoria social com duas dimensões: a da dominação e a da exploração.
A violência de gênero é perpassada pela violência de classe, de raça/etnia, idade/geração e a simbólica, entre outras, reafirmamos.
Violência simbólica Violência contra a mulher? Violência doméstica? Violência contra minorias?
O conceito de violência simbólica foi introduzido por Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron (1970, p. 19), na obra “A Reprodução”. Para eles, a violência simbólica
101 educação e sexualidade
Você já ouviu falar em violência simbólica?
é vista como “[...] todo poder que chega a impor significações e a impô-las como legítimas, dissimulando as relações de força que estão na base de sua força”. Bourdieu (1995, p.143) também a define como uma “[...] condição oculta da eficácia real dessa ação aparentemente mágica chamada dominação” Para Saffioti (2001, p. 118-119),
A violência simbólica impregna corpo e alma das categorias sociais dominadas, fornecendo-lhes esquemas cognitivos conformes a esta hierarquia, como já havia, há muito, revelado. É exclusivamente neste contexto que se pode falar em contribuição de mulheres para a produção da violência de gênero. Trata-se de fenômeno situado aquém da consciência, o que exclui a possibilidade de se pensar em cumplicidade feminina com homens no que tange ao recurso à violência para a realização do projeto masculino de dominação-exploração das mulheres. Como o poder masculino atravessa todas as relações sociais, transforma-se em algo objetivo, traduzindo-se em estruturas hierarquizadas, em objetos, em senso comum.
A violência simbólica está presente em mensagens publicitárias que legitimam as desigualdades de gênero, na prática de colocar apelidos depreciativos nas pessoas, associados a características que acirram diferenças e desigualdades, como serem ricas ou pobres, negras ou brancas, magras ou gordas, altas ou baixas, bonitas ou feias, etc.
Amplie sua compreensão sobre a temática apreciando criticamente os vídeos: Se mira pero no se vê: violência simbolica Parte 1. Disponível em: <https://www.youtube. com/watch?v=phMDI9lxLtI>. Se mira pero no se vê: violência simbolica Parte 2. Disponível em: <https://www.youtube. com/watch?v=rfwwbLxE8oU>. Acesso em: 13 dez. 2014.
Do que viu e refletiu sobre os vídeos, você encontra similaridades com o que acontece no Brasil, em sua comunidade?
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Que perfil podemos traçar do agressor, da vítima e das consequências da violência?
Características marcantes do agressor
Características que predominam nas vítimas
sexual
da violência sexual
Consequências da violência sexual
Muito útil para nós, como educadores, é saber identificar comportamentos que, ao serem apresentados por crianças, podem sugerir abuso sexual. Eis alguns apontados pelo médico e psiquiatra Christian Gauderer (1993):
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medo de ficar sozinho (a); terror e pavor noturnos; sonambulismo; apego demasiado à outra pessoa; comportamento emocionalmente regressivo como por exemplo: chupar o dedo, agarrar-se a uma fralda, compulsivamente; medo de adormecer e ser atacado (a) durante o sono; recusa a sair de casa ou tendência ao isolamento; comportamento excessivamente submisso e obediente; interesse precoce em brincadeiras sexuais; desajustamento sexual e promiscuidade; comportamentos: agressivo, hostil, destrutivo, hipoativo; fuga para o mundo da fantasia; delinqüência, depressão e/ou fantasias suicidas; medo do sexo oposto ou sedução demasiada; incapacidade de criar laços afetivos, ter amizades construtivas; problemas ou dificuldades de aprendizagem.
Registramos, contudo, que esses comportamentos podem servir de alerta, mas não devem ser considerados, necessariamente, indicadores de violência sexual na in-
CANÇÃO PARA A MENINA MALTRATADA
educação e sexualidade
103
fância.
Celso Gutfreind
Não, não será com métrica nem com rima. Uma coisa sem nome violentou uma menina. Ação barata sem a prata do pensamento o ouro do sentimento o dia da empatia. Noite. Uma coisa. Não era o lobo nem o ogro nem a bruxa, era a fúria do real sem o carinho do símbolo. Stop, a poesia parou. Ou foi a humanidade? Stop nada, a menina sente e segue com métrica, rima, graça, vida. Onde está tua vitória, ignomínia? Uma prosa continua poética como era saltitante o bastante para não perder a poesia. A coisa (homem?) é punida como um lobo no conto de verdade.
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104 E imprime-se um nome na ignomínia. A menina liberta expressa ri e chora, volta a ser qualquer (única) menina. Pronta para a métrica pronta para a rima pronta para a vida (canto de cicatriz), pronta para o amor a dois, à espera, suave, escolhido.. Fonte: http://www.msmidia.com/lais/filmes.asp
A “Canção para a menina maltratada” foi feita especialmente para o documentário Canto de Cicatriz7 sobre violência sexual contra meninas. Nele, encontramos depoimentos de vítimas que relatam detalhes dos abusos sofridos intercalados
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por comentários de especialistas, desenhos feitos por crianças abusadas, filmes de ficção e enquetes nas quais ficam evidentes os mitos e preconceitos envolvendo o assunto do abuso e da exploração sexual comercial. O tema é abordado a partir de uma perspectiva de gênero, já que, embora meninos também sejam abusados, as principais vítimas são crianças do sexo feminino. Falando em vítimas do sexo feminino, é importante conhecer a história de uma mulher que, sofrendo graves consequências das múltiplas violências praticadas pelo próprio marido, sobrevivendo, lutou para que agressores como ele fossem sempre punidos e que outras mulheres, violentadas como ela, pudessem ser assistidas pelo governo e tivessem a garantia, por lei, de punição aos seus agressores – Maria da Penha. Sua luta resultou na promulgação da Lei Maria da Penha8 (BRASIL, 2006), cujo Art. 5 7 Canto de Cicatriz - Documentário relata história de vítimas de Violência Sexual.
Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=DHYt-a5say8. Acesso em: 13 dez. 2014. 8 Maria da Penha Maia Fernandes, biofarmacêutica cearense, hoje com 61 anos, fez da sua tragédia pessoal uma bandeira de luta pelos direitos da mulher e batalhou durante 20 anos para que fosse feita justiça. O seu agressor, o professor universitário de economia Marco Antonio Herredia Viveros, era também o seu marido e pai de suas três filhas. Na época, ela tinha 38 anos e suas filhas, entre 6 e 2 anos. Na primeira tentativa de assassinato, em 1983, Viveros atirou em suas costas enquanto ainda dormia, alegando que tinha sido um assalto. Depois do disparo, foi encontrado na cozinha, gritando por socorro. Dizia que os ladrões haviam escapado pela janela. Maria da Penha foi hospitalizada e ficou internada durante quatro meses. Voltou ao lar paraplégica e mantida em regime de isolamento completo. Foi nessa época que aconteceu a segunda tentativa de homicídio: o marido a empurrou da cadeira de rodas e tentou eletrocutá-la embaixo do chuveiro. Herredia foi a júri duas vezes: a primeira, em 1991, quando os advogados do réu anularam o julgamento. Já na segunda, em 1996, o réu foi condenado a dez anos e seis meses, mas recorreu. Em parceria com o CEJIL (Centro pela Justiça e o Direito Internacional) e o CLADEM (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), denunciou o Brasil na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) pela negligência do Estado Brasileiro tratar os casos de violência doméstica no Brasil. Após as tentativas de homicídio, Maria da Penha começou a atuar em movimentos sociais contra violência e impunidade e hoje é coordenadora de Estudos, Pesquisas e Publicações da Associação de Parentes e Amigos de Vítimas de Violência (APAVV) no Ceará. A história de Maria da Penha pode ser conhecida na biografia que escreveu em 1994, intitulada “Sobrevivi... Posso contar”. Hoje ela atua junto à Coordenação de Políticas para as Mulheres da prefeitura de Fortaleza e é considerada símbolo contra a violência doméstica e batizou a Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, sancionada pelo presidente Lula, no dia 7 de agosto de 2006. DIVULGUE A LEI “MARIA DA PENHA”!!! Você poderá auxiliar alguém que esteja sofrendo violência doméstica e não sabe o que fazer. Fonte: http://www.mpce.mp.br/nespeciais/promulher/mariadapenha.asp
Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar
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105
define:
contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. (BRASIL, 2006)
A Lei Maria da Penha criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do Art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher entre outras providências. Conheça, também, o que nos recomenda o Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes9 e descubra/defina quais os direitos sexuais das crianças e adolescentes.
Fonte: https://www.facebook.com/4setbrasil
Você sabe o que é WAS?
A WAS – World Association for Sexual Health (Associação Mundial de Saúde Sexual) é uma organização internacional que reconhecendo que todos os tipos de violência, perseguição, discriminação, exclusão e estigma são violações dos direitos humanos e afetam o bem-estar do indivíduo, famílias e comunidades, entre outros aspectos promulgou a Declaração dos Direitos Sexuais (WAS, 2014, p.2-3)10, que são 9 Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Disponível em: <http://maps.mootiro.org/organization/1957>. Acesso em: 13 dez. 2014. 10 “A “World Association for Sexual Health” (WAS – Associação Mundial pela Saúde Sexual) é um grupo mundial multidisciplinar de sociedades cientificas, ONGs e profissionais do campo da sexualidade humana que promove a saúde sexual por toda a vida e em todo o mundo através do desenvolvimento, promoção, e apoio à sexologia e a direitos sexuais para todos. “WAS” realiza tais objetivos, através de ações de defesa e integração, facilitando a troca de informações, ideias, experiências e avanços científicos baseados na pesquisa da sexualidade, educação e sexologia clínica, com uma abordagem multi disciplinar. A declaração de direitos sexuais da WAS foi originalmente proclamada no 13º. Congresso de Sexologia em Valencia, Espanha em 1997 e então em 1999, uma revisão foi aprovada em Hong Kong pela Assembleia Geral da WAS e reafirmada na “Declaração WAS: Saúde Sexual para o Milênio (2008)”. A presente declaração revisada foi aprovada pelo Conselho
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direitos humanos referentes à sexualidade: 1. O direito a igualdade e a não descriminação. 2. O direito a vida, liberdade, e segurança pessoal. 3. O direito a autonomia e integridade corporal. 4. O direito de estar isento de tortura, tratamento ou punição cruel, desumana ou degradante. 5. O direito de estar isento de todas as formas de violência ou coerção. 6. O direito à privacidade. 7. O direito ao mais alto padrão de saúde atingível, inclusive de saúde sexual; com a possibilidade de experiências sexuais prazerosas, satisfatórias e seguras. 8. O direito de usufruir dos benefícios do progresso científico e suas aplicações. 9. O direito à informação. 10. O direito à educação e o direito à educação sexual esclarecedora. 11. O direito de constituir, formalizar e dissolver casamento ou outros relacionamentos similares baseados em igualdade, com consentimento livre e absoluto.
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12. O direito a decidir sobre ter filhos, o número de filhos e o espaço de tempo entre eles, além de ter informações e meios para tal. 15. O direito de participação em vida pública e política. 16. O direito de acesso à justiça, reparação e indenização.
Todos os anos, no mundo, desde o ano de 2010, na semana que antecede o dia 4 de setembro (Dia Mundial da Saúde Sexual) é comemorado esse dia com ações educativas para e com crianças, jovens e adultos objetivando a promoção de uma maior consciência social acerca da saúde no mundo, em especial, a sexual e reprodutiva que inclui o combate à violência sexual e de gênero. É evidente que a legislação dos países ou as deliberações de organizações mundiais são de grande importância para a erradicação de qualquer tipo de violência contra quem quer que seja, especialmente a violência sexual contra crianças, adolescentes e mulheres. No entanto, mais importante que a letra da lei ou recomendações de organizações oficiais ou não governamentais, é o esforço de cada pessoa, da família e da escola, seja denunciando casos de abuso sexual de crianças e adolescentes, seja, como vítima, denunciando o agressor às autoridades policiais, sejam como educadoras e educadores, promovendo ações e estudos sobre a sexualidade nas escolas em parceria com a família.
Consultor da WAS em Marco de 2014.” (WAS, 2014, p. 3)
Para concluir, estude o documento que estabelece um conjunto de ações articuladas com vistas à intervenção técnica–política e financeira para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes:
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BRASIL. Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil. 3. ed. Brasília: SEDH/DCA, 2002. p. 59 (Série Subsídios, 5). Disponível em: <http://www. comitenacional.org.br/files/anexos/08-2013_PNEVSCA-2013_f19r39h.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2014.
Analise, também, o documento que objetiva subsidiar os profissionais dessa Rede no trabalho cotidiano de implementação das medidas de promoção, proteção e intervenção, nos casos de crianças e adolescentes vitimizadas. Diga não à violência sexual contra crianças e adolescentes no seu município / Maria Conceição O. Costa, Coordenação. Feira de Santana-Ba – Brasil: Universidade Estadual de Feira de Santana: Feira de Santana, BA, 2012. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/ sites/default/files/topic/gender/pub/diganaoaviolencia_1038.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2014.
Após esse estudo, nesse contexto, convidamos-lhe a assumir seu papel de efetivar ações educativas de prevenção às diversas formas de violência sexual e de gênero.
SÍNTESE Essa abordagem é apenas um começo. Mas com ela tivemos uma visão crítica e pontual sobre a violência sexual e de gênero, que objetivou, inclusive, a possibilidade de criar condições para que os educadores efetivem ações educativas de prevenção nessa área. Sobre educação sexual, ampliaremos nosso entendimento nas aulas que se seguem.
REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A reprodução. Elementos para uma teoria do sistema de ensino. Lisboa: Veja, 1970.
BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Educação e Realidade. Porto Alegre: UFRS. 20 (2). Jul/Dez 1995. p. 133-184.
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www2. camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-2848-7-dezembro-1940-412868-norma-pe.html>. Acesso em: 13 dez. 2014.
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BRASIL. Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009 (Altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/ lei/l12015.htm>. Acesso em: 13 dez. 2014.
BRASIL. Presidência da República. Constituição de República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/91972/constituicao-da-republica-federativa-do-brasil-1988>. Acesso em: 13 dez. 2014.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 13 dez. 2014.
BRASIL. Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil. 3. ed. Brasília: SEDH/ DCA, 2002. p. 59. (Série Subsídios, 5). Disponível em: <http://www.comitenacional.org.br/files/anexos/08-2013_PNEVSCA-2013_f19r39h.pdf>. Acesso em: 13 dez. 2014.
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BRASIL. Ministério Público Federal. Exploração e abuso sexual: um grande desafio. Disponível em: <http://www.turminha.mpf.mp.br/direitos-das-criancas/18-de-maio/exploracao-e-abuso-sexual-um-
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DE
Autora: Profª Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
111 educação e sexualidade
AULA 07 – EDUCANDO PARA A SEXUALIDA-
Depois de estudar e reestruturar concepções sobre sexualidade, sexo, gênero, manifestações em diferentes fases da vida, bem como em situações especiais prazerosas e de conflitos, refletiremos, nesta aula, sobre a importância da educação sexual nesse contexto.
Intencionalmente, ou não, a educação sexual é uma realidade. Como toda educação, e como a própria sexualidade, trata-se de um processo que começa ao nascer e nos acompanha até a morte.
A educação sexual deve se pautar, principalmente, no sistema de valores da sociedade na qual se insere, e na compreensão de que a conduta sexual humana está sujeita a um forte relativismo cultural. Como analisa Segú (1990), é mister a compreensão ________________________ de que há várias formas de condutas (boas ou más, positivas ou negativas) distintas. ________________________ Sendo assim, ao tempo em que vamos considerando cada faceta da sexualidade ma- ________________________ nifesta pelos grupos humanos, as diferenças entre eles nos certificam da importância ________________________ da influência cultural e da aprendizagem nessa área.
A educação sexual, nessa conjuntura, deve promover, não somente a compreensão de conhecimentos e vivências sobre sexualidade, como também a possibilidade de utilização adequada desses conhecimentos e vivências numa dada sociedade.
Diferentemente do que a maioria das pessoas acredita, a educação sexual não se restringe ao que é dito e mostrado com a intenção de educar. Constituem elementos dessa educação os silêncios, as negações, as atitudes limitadoras com relação à visibilidade dos corpos, as informações distorcidas veiculadas em situações do cotidiano, os comportamentos de repressão das expressões espontâneas de sexualidade, entre outras.
A educação sexual, nos primeiros anos de vida, acontece através da família que, consciente ou não de seu papel, cuida de instalar e de imprimir as primeiras noções sobre a sexualidade, conceitos e preconceitos, valores, atitudes e comportamentos considerados aceitáveis e adequados, tanto do ponto de vista individual quanto coletivo.
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Como afirma Barbosa (1994, p. 51):
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À medida que as crianças crescem, a curiosidade aumenta e dependendo da formação, conhecimento e até mesmo facilidade de expressão, pode ser desconcertante para alguns adultos falarem de sexo com os seus filhos, pois na realidade estão reproduzindo também a educação e a formação que tiveram [...].
Fonte : Clipart
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Entretanto, é preciso enfrentar essa realidade e educar para a sexualidade como se educa para a vida.
A contribuição da família como educadora da sexualidade fundamenta, de forma marcante, a vivência da sexualidade de uma pessoa durante toda a sua vida e constitui, também, a matriz dos relacionamentos interpessoais que se reproduzirão com maior ou menor intensidade, em outros ambientes sociais, como por exemplo, a escola.
Fonte : Clipart
Visões distorcidas deram origem a concepções ou filosofias distintas de educação sexual que predominaram no Brasil e na América Latina a partir dos anos sessenta do século passado. Colombino (1992) as identifica como: moralista, biologista, erótica,
A filosofia moralista opera mediante a pedagogia do “não” em defesa da pureza, da castidade e da virgindade. Dela não faz parte a problematização nem a discus-
113 educação e sexualidade
mecanicista, integral, liberal e dialógica conscientizadora.
são; sua ênfase recai na sexualidade como função procriadora.
A filosofia biologista prioriza as informações sobre anatomia e fisiologia da reprodução e a compreensão do sexo como reprodução, genitalidade. Segundo a filosofia erótica, o prazer é um fim em si mesmo; o corpo é a sede da sexualidade sem levar em conta a afetividade.
A filosofia mecanicista é reducionista, prioriza a solução de problemas sexuais mediante o ensino de técnicas baseadas nos estudos de Master e Johnson (1984). A filosofia integral parte da natureza humana em suas dimensões bio-psico-sociais; dá ênfase tanto aos ensinamentos sobre aspectos pontuais da sexualidade como o uso de métodos anticoncepcionais e a prevenção das DST, como a dimensão existencial da pessoa humana. A filosofia liberal propõe “liberar” a criança, o jovem e o adulto da sujeição, dos prejuízos e dos tabus, da ignorância e medos com relação à sexualidade. Para tanto, o(a) educador(a) deve, primeiro, estar “liberado(a)” de forma a promover uma educação crítica, contestadora, promotora de mudanças e renovações que conduzam a um processo de aceitação mútua e própria como pessoas autônomas e responsáveis.
Finalmente, a filosofia dialógica conscientizadora ou transformadora, proposta por Atucha (1988) e baseada em Paulo Freire, incorpora a filosofia integral, não aceita a classificação das condutas humanas sexuais como normais e anormais e sim a variação das mesmas de acordo com as situações pessoais e culturais. De acordo com essa concepção, é imprescindível o respeito às opções individuais responsáveis e o uso social do sexo sadio e prazenteiro. Efetiva-se, principalmente, através de oficinas vivenciais de confrontação dos participantes consigo e com os outros.
Na escola iniciada “humildemente” em meados do século passado, a educação sexual viveu na clandestinidade por algum tempo, dadas controvérsias que guiavam em torno do processo. Alguns pais e educadores consideravam positivas as experiências iniciais de sua implantação nas escolas, mas outros a viam como uma estimuladora de práticas sexuais por parte das crianças e jovens quando não como uma forma de perversão social.
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Fonte : Clipart
Mãe 1 – Você não sabe o que aconteceu ontem na Reunião de Pais! Mãe 2 – E aí? Mãe 1 – Fomos sensibilizados para a necessidade de discutir questões sexuais, amiga. Você nem imagina o que a orientadora falou que vai ser tratado com os adolescentes! Desejo, sedução, erotismo, relações sexuais, homossexualidade, contracepção, doenças sexualmente transmissíveis, violência sexual... Nunca pensei que fosse ver isso um dia! Mãe 2 – Pois eu sou totalmente contra! Nem pensar em ver meu filho envolvido com essas conversas na escola! Escola tem que ensinar Português, Matemáti-
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ca... Sexo, ele deve aprender com a vida!...
Felizmente, na contemporaneidade, em lugares distintos do mundo, algumas experiências de educação sexual nas instituições escolares conseguiram sobreviver e outras tantas têm sido, pouco a pouco, implantadas e mantidas. Em nosso país, do ponto de vista formal, somente em 1996, com a nova LDB que desencadeou a definição dos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), teve-se a educação sexual legislada e finalmente aprovada. Entretanto, questionamos a capacitação dos profissionais de educação para fazê-lo.
Como analisa Segú (1990), quando nos propomos a educar para a sexualidade, o educador sexual é ponto crucial do processo; sua formação pode determinar o sucesso ou o fracasso da experiência. Para assegurar o sucesso, necessário se faz, também, que exista um mecanismo de acompanhamento efetivo de suas ações práticas bem como dos pressupostos teóricos que lhe embasam.
Ao tratarmos da educação sexual, continua Segú (1990, p. 31), “[...] devemos ter em conta que nos referimos a um processo educativo e não informativo, o qual é diferente, já que a informação é só um instrumento para chegar à educação”. Devemos ampliar o que antigamente era considerado como educação para a sexualidade — os ensinamentos sobre biologia da reprodução, direitos sexuais e reprodutivos, controle
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voluntário da reprodução e de doenças sexualmente transmissíveis.
Então, que aspectos podem ser fundantes para o enfrentamento desse processo?
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/Image:Da_Vinci_Vitruve_Luc_Viatour.jpg
A educação sexual é uma educação para a pessoa.
Essa premissa se coaduna com o projeto pedagógico de formação de educadores sexuais que construímos na Universidade Federal da Bahia nas três últimas décadas, baseado nos seguintes pressupostos:
Todo programa de educação sexual precisa se fundamentar nos alicerces da vida do ser, marcada pelos registros inconscientes dos primeiros contatos e experiências. Deve estar atento ao que a família, consciente ou não de seu papel, cuidou de instalar e imprimir, repensando dimensões da sexualidade esquecidas, negadas ou distorcidas. A educação para a sexualidade deve considerar que para o indivíduo viver em plenitude no mundo que o cerca, é preciso estar sensibilizado para respeitar a si mesmo e aos outros, relacionar-se, ter responsabilidade, crer na vida e procurar vivê-la com prazer, conhecendo seus próprios direitos, inclusive o de ser feliz. A aprendizagem de conceitos só se processa quando ocorre de forma significativa para o sujeito; logo, é preciso que haja envolvimento e integração no grupo, considerando a metodologia participativa, em que o programa de atividades é construído pelos próprios sujeitos do processo. É preciso criar oportunidades para que as pessoas reflitam sobre suas idéias, sentimentos e conflitos na área da sexualidade e envolvam a totalidade de seu ser na reinterpretação e reconstrução da realidade.
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(FAGUNDES, 1995, p. 24)
Acreditamos na educação para a sexualidade na escola como continuadora daquela que acontece na família. Embora os PCNs a apresentem com a terminologia Orientação Sexual, entendemos que falar de Educação é tornar o processo formal mais abrangente.
Orientação, do ponto de vista educacional, refere-se a um processo pedagógico sistematizado que se propõe a informar, erradicar preconceitos e abrir a discussão sobre emoções, comportamentos e valores que impedem o uso dos conhecimentos. Entretanto, Orientação Sexual refere-se, também, a uma organização específica do erotismo de um indivíduo em relação à parceria sexual que pode ser heterossexual (entre pessoas do sexo oposto), homossexual (entre pessoas do mesmo sexo) e bissexual (entre pessoas de ambos os sexos).
Contextualizada desta forma, optamos pela terminologia Educação Sexual por se tratar de um processo mais abrangente que não se limita a um conjunto de informações sobre sexualidade. Há procedimentos pedagógicos voltados para a
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conscientização ou ao aconselhamento que o educador possa fazer para um ou outro educando. Educar, como afirma Vitiello (1997, p. 90), concordando com Segú (1990), referido anteriormente: [...] embora passe por informar, por orientar e por aconselhar, é mais do que a soma dessas partes isoladas. Educar, no sentido mais amplo, significa ‘formar’, não na acepção de que o educando seja uma cópia do educador, mas sim de que o educador dá ao educando condições e meios para que cresça interiormente.
A educação sexual na escola requer, portanto, uma competente, efetiva e duradoura atuação dos educadores. Eles precisam ter um corpo de conhecimento abrangente e grande disposição para atuar.
É preciso ter atitudes coerentes com as informações que possui, ter disposição para agir de forma favorável ou não em relação a uma situação particular. Esta disposição depende do conhecimento e também da forma como sentimos os fatos expressos esse sentimento; dessa intenção se origina o nosso comportamento.
Além do conhecimento (que ocorre a nível consciente e racional), educar para a sexualidade envolve na revisão de crenças (que atuam no campo irracional e até mesmo do inconsciente). O conhecimento apela para a lógica e a crença, na aceitação a crítica de algo como sendo verdadeiro independente de comprovação racional. Acrescentamos ao conhecimento e às crenças, o componente afetivo (sentimento ou reação emocional) que apresentamos com relação a um objeto ou situação.
Educar para a sexualidade é “obrigação” da família, da escola e também do Estado. Entendendo o Estado em suas esferas (municipal, estadual e federal) e vendo-o como agente do poder institucional, controlador e reprodutor de práticas e saberes
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117
sociais, admitimos que caiba a ele definir uma política de implementação do processo formal de Educação Sexual nas escolas e em espaços de educação não formal.
Quando afirmamos que a presença e o envolvimento do Estado na formalização da Educação Sexual são imprescindíveis, colocamo-nos também em estado de alerta por sabermos que, com relação à orientação científica e pedagógica da sexualidade, como analisa Moraes (1993, p. 253): A visão dominante foi construída pelo higienismo, pelo eugenismo e pelo assistencialismo. [...] o corpo, a saúde e a sexualidade estão desvinculados do prazer, do afeto, de qualquer visão economicamente não-produtora, e de reprodução da espécie, dos interesses sociais dos grupos hegemônicos.
E não é isso que queremos. Não pretendemos ver a educação sexual voltada apenas para a maternidade, a procriação, a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e da AIDS, não constituindo uma manifestação comportamental, atitudinal.
Como função do Estado, educar para a sexualidade envolve também o acesso aos meios de controle voluntário de reprodução e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, compondo programas de planejamento familiar. Esse processo aloca-se nos postos de saúde e precisa envolver profissionais capacitados que não deixem prevalecer valores pessoais sobre a natalidade de quem procura seus serviços, fornecendo apenas (e isto é muito) meios essenciais para que as pessoas controlem a sua própria prole, previnam-se de doenças e vivam plenamente a sua sexualidade.
A educação sexual assegurada pelo Estado deve incorporar e envolver profissionais diversos e diferentes projetos sociais que deem continuidade ao debate em torno do tema, iniciado e desenvolvido pela sociedade civil em busca de melhores condições de existência e do desenvolvimento do potencial de felicidade a que todos têm direito.
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118 E quanto à educação sexual nas escolas, você acha possível?
Em caso positivo, como descobrir a forma mais adequada dessa educação?
Quem é capaz de assumir a educação sexual?
O que deve ser considerado no processo?
Questões como essas compreendem a abordagem que faremos a seguir.
A ESCOLA E A EDUCAÇÃO SEXUAL A escola é um espaço de formalização do conhecimento. Na instituição escolar, há promoção e facilitação da aprendizagem sobre o mundo e sobre nós mesmos. Ao ingressarmos na escola, vivenciamos novas formas de relacionamentos, de conhecimentos, de esclarecimentos, de novos objetivos.
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Assim como a vida, a escola é um lugar de diversidade... Diversidade de gênero, etnia, crença, classe social, geração, etc. Neste espaço de ensino-aprendizagem cabem sonhos, curiosidades, desejos, medos, ideias, crescimento, questões sociais e políticas, expectativas para o futuro...
É um contexto que, certamente, inclui a sexualidade e a necessidade de respeito mútuo para que todos se sintam acolhidos em suas diferentes histórias de vida.
A escola não substitui nem concorre com a família na educação sexual de crianças e adolescentes. Ela deve contribuir para a discussão sobre sexualidade incluindo pontos de vista diferentes (e até contraditórios), sem impor valores e normas, mas preenchendo lacunas de informações que as crianças e os jovens adquirem, muitas vezes de forma distorcida e inadequada.
Sobre esse aspecto, o que estudamos em aulas anteriores encontra ressonância nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998, p. 77), ao partirem do pressuposto de que: As manifestações de sexualidade afloram em todas as faixas etárias [...] toda família realiza a educação sexual de suas crianças e jovens, mesmo aquelas que nunca falam abertamente sobre isso. O comportamento dos pais entre si, na relação com os filhos, no tipo de
estabelecem é carregado de determinados valores associados à sexualidade que a criança apreende. O fato de a família ter valores conservadores, liberais ou progressistas, professar alguma crença religiosa ou não e a forma como o faz determina em grande parte
119 educação e sexualidade
‘cuidados’ recomendados, nas expressões, gestos e proibições que
a educação das crianças. Pode-se afirmar que é no espaço privado, portanto, que a criança recebe com maior intensidade as noções a partir das quais construirá sua sexualidade na infância.
Mas é na escola que há continuidade dessa educação. O convívio com “iguais” na diversidade — crianças e adolescentes, meninas e meninos — de idades próximas, permite a revisão de conceitos e preconceitos, esclarecimentos de dúvidas, a troca de opiniões convergentes e divergentes que contribuem para o desenvolvimento do pensamento crítico e criativo que facilitam a ampliação de conhecimentos, revisão de valores e assunção de posicionamentos próprios em relação ao exercício da sexualidade.
A sexualidade se inscreve no espaço escolar!
São muito significativas as curiosidades das crianças sobre sexualidade porque se relacionam, principalmente, com o conhecimento de suas origens e com o desejo ________________________ de saber. Ao serem atendidas, terão impulso para saber cada vez mais, tanto sobre o ________________________ tema quanto sobre outros conteúdos escolares. Contudo, se não o forem, ansiedade e ________________________ tensões se farão presentes em suas vidas.
As instituições escolares desempenham um papel importante na educação para uma sexualidade ligada à vida, à saúde, ao prazer e ao bem-estar. Por conseguinte, o trabalho sistemático e sistematizado de Educação Sexual dentro da escola articula-se com a promoção da saúde das crianças e dos adolescentes. Deve ser um trabalho que consiga problematizar, levantar questionamentos e ampliar o leque de conhecimentos e de opções para que a criança e o adolescente escolham seus próprios caminhos.
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Na escola, é possível a discussão de crenças, tabus, preconceitos e atitudes que foram aprendidas/internalizadas ao longo da história de nossas vidas, desde que nascemos... Mesmo que não seja possível nem desejável uma isenção diante das situações, é preciso que aprendamos a dar certo distanciamento pessoal, como professores/educadores, para empreender a tarefa de educar para a sexualidade.
________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Exemplificando: ________________________ ________________________ Numa discussão, mediada pela educadora, sobre gravidez na adolescência ________________________ entre um grupo de quase adolescentes de dez anos, devem ser abordados: vários ________________________ aspectos e opiniões sobre o tema, seu significado para meninas e meninos, suas ________________________ implicações para a vida pessoal, familiar e escolar, suas conotações em diferentes ________________________ momentos históricos e os valores atribuídos por distintos grupos sociais contempo________________________ râneos. Caberá a cada participante, chegar (ou não) a uma conclusão sobre o que é ________________________ permitido e o que é interdito, não sendo imprescindível explicitá-la no grupo. ________________________ ________________________ Essa mesma temática, com certeza, terá efeitos diferentes se tratada pela ________________________ família, porque suscita expectativas e ansiedades dos pais e de outros familiares. ________________________ Cabe à escola abordar as repercussões de todas as mensagens transmitidas pela ________________________ mídia, pela família e pela sociedade, na intenção de preencher lacunas nas infor________________________ mações que a criança já possui e, principalmente, criar a possibilidade de formar ________________________ opinião a respeito do que lhe é ou foi apresentado. ________________________ ________________________ ________________________ Ao criar um clima propício ao diálogo, propiciar informações atualizadas do ________________________ ________________________ ponto de vista científico e explicitar os diversos valores associados à sexualidade e aos comportamentos sexuais existentes na sociedade, a escola assegura à criança e ao
como seus.
Figura 1 - Oficina sobre desenvolvimento do corpo e sexualidade (com crianças de 10 anos). Ação extensionista do PROEDSEX =
121 educação e sexualidade
adolescente o desenvolvimento de atitudes coerentes com os valores que eles elegem
Programa de Educação Sexual / IBIO-UFBA. 1997.
Fonte: Arquivo pessoal da Profª Tereza Fagundes (1997).
O(A) EDUCADOR(A) SEXUAL
Uma das principais dúvidas que cercam a questão da educação sexual na escola ________________________
recai sobre a “figura” da professora — ou do professor — que pode e tem condições ________________________ para assumir o processo.
Nossa experiência vem demonstrando que isso é fácil de “descobrir”.
Na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, para as crianças, sua professora, em geral, é aquela pessoa em quem podem confiar — que acolhe, ensina, e “abre-lhes as portas do mundo!”. É claro que ela é a pessoa ideal para educar, também, para a sexualidade. Pode ser que, até então, a educação sexual não tenha “feito parte da sua história”, mas sendo uma profissional como é, há de encontrar os meios para se capacitar e “ousar” planejar e efetivar ações educativas em sexualidade.
Nas séries seguintes, é comum ouvirmos que cabe ao professor de Ciências, discutir, também sobre sexualidade. Conhecer o corpo humano é importante, mas não garante as condições (ter postura, vontade, iniciativa e atitudes) de educar para a sexualidade. Em geral, há uma educadora que se destaca como aquela pessoa que é “buscada” pelos jovens para conversar sobre assuntos que se localizam além das programações da(s) disciplina(s) que assume. Dentre eles, se inserem as questões sexuais. Então, aí está a pessoa com o maior potencial de assumir a educação sexual na escola.
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Ademais, sabemos que se houver uma decisão em fazer algo, qualquer profissional encontrará os meios de alcançar o que se propõe.
Em que pode ou deve se basear o(a) educador(a)?
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998, p. 84) legislam que: O educador deve reconhecer como legítimo e lícito, por parte das crianças e dos jovens, a busca do prazer e as curiosidades manifestas acerca da sexualidade, uma vez que fazem parte de seu processo de desenvolvimento. [...] É necessário então que o educador tenha acesso à formação específica para tratar de sexualidade com crianças e jovens na escola, possibilitando a construção de uma postura profissional e consciente no trato desse tema. [...] O professor, assim como o aluno, possui expressão própria de sua sexualidade que se traduz em valores, crenças, opiniões e sentimentos particulares. Não se pode exigir do professor uma isenção absoluta no tratamento das questões ligadas à sexualidade, mas a consciência sobre quais são os valores, crenças, opiniões e sentimentos que cultiva em relação à sexualidade é um elemento importante para que desenvolva uma postura ética na sua atuação junto dos alunos. [...] Na condu-
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ção desse trabalho, a postura do educador é fundamental para que os valores básicos propostos possam ser conhecidos e legitimados de acordo com os objetivos apontados. Em relação às questões de gênero, por exemplo, o professor deve transmitir, pela sua conduta, a eqüidade entre os gêneros e a dignidade de cada um individualmente. Ao orientar todas as discussões, deve, ele próprio, respeitar a opinião de cada aluno e ao mesmo tempo garantir o respeito e a participação de todos.
Se ainda persistirem dúvidas com relação a como desenvolver um projeto específico de educação sexual, quando há todo um currículo para cumprir, não há dispensa de aulas e nem pagamento extra aos docentes envolvidos, cremos que um pressuposto básico para realizar qualquer projeto é o desejo que temos de enfrentar as dificuldades que se apresentam, transformando os obstáculos em desafios a serem superados por todos os envolvidos. Essa postura garantirá as condições para a sua realização.
A EDUCAÇÃO SEXUAL NOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS (PCN)
versal com a terminologia Orientação Sexual, entendemos que falar de Educação Sexual é tornar o processo formal mais abrangente, não limitado a um conjunto de informações sobre sexualidade, ou a um direcionamento para o enfrentamento das
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Como analisamos anteriormente, embora os PCNs apresentem o tema trans-
questões a ela relacionadas, como o termo “orientação” sugere.
Às informações se acrescentam os procedimentos pedagógicos voltados para a conscientização ou ao aconselhamento que o educador possa fazer para um ou outro educando.
A Educação Sexual proposta pelos PCN é circunscrita ao âmbito pedagógico e coletivo, não tendo, portanto, caráter de aconselhamento individual de tipo psicoterapêutico. Isso quer dizer que as diferentes temáticas da sexualidade devem ser trabalhadas dentro do limite da ação pedagógica, sem serem invasivas da intimidade e do comportamento de cada aluno. Tal postura deve, inclusive, auxiliar as crianças e os jovens a discriminarem o que pode e deve ser compartilhado no grupo e o que deve ser mantido como uma vivência pessoal. Quando houver demanda de atenção e intervenções individuais, é preciso que seja providenciado um atendimento em separado do grupo pela professora ou orientadora na escola e, dentro desse âmbito, discutir um possível encaminhamento para atendimento especializado.
Segundo os PCNs (BRASIL, 1998, p. 91), a Educação Sexual deve se organizar para que os alunos, ao fim do ensino fundamental, sejam capazes de:
respeitar a diversidade de valores, crenças e comportamentos existentes e relativos à sexualidade, desde que seja garantida a dignidade do ser humano; compreender a busca de prazer como uma dimensão saudável da sexualidade humana; conhecer seu corpo, valorizar e cuidar de sua saúde como condição necessária para usufruir prazer sexual; reconhecer como determinações culturais as características socialmente atribuídas ao masculino e ao feminino, posicionando-se contra discriminações a eles associadas; identificar e expressar seus sentimentos e desejos, respeitando os sentimentos e desejos do outro; proteger-se de relacionamentos sexuais coercitivos ou exploradores; reconhecer o consentimento mútuo como necessário para usufruir de prazer numa relação a dois; agir de modo solidário em relação aos portadores do HIV e de modo propositivo na
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implementação de políticas públicas voltadas para prevenção e tratamento das doenças sexualmente transmissíveis/AIDS; conhecer e adotar práticas de sexo protegido, ao iniciar relacionamento sexual; evitar contrair ou transmitir doenças sexualmente transmissíveis, inclusive o vírus da AIDS; desenvolver consciência crítica e tomar decisões responsáveis a respeito de sua sexualidade; procurar orientação para a adoção de métodos contraceptivos.
Nos PCNs, a educação sexual é prevista como Tema Transversal e isso significa que, tanto a concepção quanto os objetivos e conteúdos propostos devem ser contemplados pelas diversas áreas do conhecimento. Dessa forma, o posicionamento proposto pelo tema de Orientação Sexual, assim como acontece com todos os Temas Transversais, deverá impregnar toda a prática educativa. Cada uma das áreas tratará da temática da sexualidade por meio da sua própria proposta de trabalho. Ao se apresentarem os conteúdos de Orientação Sexual, serão explicitadas as articulações mais evidentes de cada bloco de conteúdo com as diversas áreas. Os blocos de conteúdo (que trataremos no próximo item) são: corpo - matriz da sexualidade, relações de gênero, manifestações da sexualidade em diferentes fases da vida e prevenção de DSTs e AIDS.
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Na escola, as ações de educação sexual poderão acontecer de duas formas: dentro da programação, por meio dos conteúdos já transversalizados nas diferentes áreas do currículo, e extraprogramação, sempre que surgirem questões relacionadas ao tema.
Indicadores do que deve fazer parte de um programa de educação sexual Para efetivar um programa de educação sexual na escola, recomendamos os seguintes passos: conhecer o campo temático; definir o objeto de estudo; e programar. Conhecer o campo temático significa definir os limites dentro dos quais vamos atuar. Em sexualidade, o campo temático é abrangente, diversificado e em constante mudança, embora sejam fundantes os componentes biológicos, psicológicos, históricos e socioculturais.
Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem.
Definir o objeto de estudo compreende a necessidade de estabelecer clara-
nhecimentos sobre sexualidade que vai da genitalidade até a abordagem ampla de sua inserção na cultura e momento histórico. Deve estar em consonância, também, com o público (ou universo de ação) a que se destina o processo de educar para a sexualidade: crianças, adolescentes, adultos, escolarizados ou não, inseridos em ações
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mente o que pretendemos entender, explicar, sistematizar e avaliar em termos de co-
formais ou não formais, etc.
E como toda ação educativa deve ser bem programada, um passo importante na efetivação de programas de educação sexual consiste em programar. Programar envolve a definição dos objetivos, seleção de conteúdos, escolha da metodologia e da avaliação, no contexto dos pressupostos filosóficos que norteiam o programa a exemplo do que definimos na aula anterior.
Prontos para começar?
Um bom caminho é a reflexão sobre as suas possibilidades de conhecimento e intervenção a partir dos conteúdos que indicamos a seguir, extraídos dos PCNs (BRASIL, 1998, p. 98-101):
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Corpo - matriz da sexualidade Este bloco pressupõe que precisamos Analisar as diferenças físicas externas e internas do corpo humano e as transformações físicas, sociais e emocionais da puberdade como algo intrínseco ao desenvolvimento. Espera-se também que eles sejam capazes de notar que as reações corporais são efeitos de uma combinação entre sentimentos e estímulos externos.
Conteúdos:
as transformações do corpo do homem e da mulher nas diferentes fases da vida, dentro de uma perspectiva de corpo integrado, envolvendo emoções, sentimentos e sensações ligadas ao bem-estar e ao prazer do autocuidado; os mecanismos de concepção, gravidez e parto e a existência de métodos contraceptivos; as mudanças decorrentes da puberdade: amadurecimento das funções sexuais e reprodutivas; aparecimento de caracteres sexuais secundários; variação de idade em
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que inicia a puberdade; transformações decorrentes de crescimento físico acelerado; o respeito ao próprio corpo e ao corpo do outro; o respeito aos colegas que apresentam desenvolvimento físico e emocional diferentes; o fortalecimento da auto-estima; a tranqüilidade na relação com a sexualidade.
Relações de gênero Compreender as diferenças, respeitar mulheres e homens, (inclusive no que tange à sua orientação sexual) e agir sem discriminações em relação ao compor-
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tamento dos outros, não depreciando atitudes e formas de expressão assumidas por pessoas do outro sexo. Considerar, também, as diferenças de atribuições e expectativas em relação ao homem e à mulher nas diversas sociedades, bem como no grupo social a que pertencem e notar as transformações dessas atribuições ao longo da história.
Conteúdos:
a diversidade de comportamento de homens e mulheres em função da época e do local onde vivem; a relatividade das concepções tradicionalmente associadas ao masculino e ao feminino; o respeito pelo outro sexo, na figura das pessoas com as quais se convive; o respeito às muitas e variadas expressões do feminino e do masculino. ainda, complementamos, as diferentes orientações sexuais em ambos os sexos.
Manifestações da sexualidade em diferentes fases da vida Compreende o desenvolvimento da sexualidade ao longo da vida, do nascimento à morte e os temas que abordamos (ainda que de forma resumida) nas aulas dois, três e quatro desta disciplina, além dos outros conteúdos que estão especificados nos demais blocos temáticos.
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Prevenção às doenças sexualmente transmissíveis/aids Ter conhecimentos básicos e corretos sobre doenças sexualmente transmissíveis/AIDS, suas formas de contágio e, de posse dessas informações, assumir atitudes de autocuidado (o cuidado consigo mesmo e com o outro). Com relação a pessoas doentes de AIDS ou portadoras do HIV, evidenciar atitudes de não-discriminação, mas de respeito e solidariedade.
o conhecimento da existência de doenças sexualmente transmissíveis; a compreensão das formas de prevenção e vias de transmissão da AIDS; a comparação entre as formas de contato que propiciam contágio e as que não envolvem riscos; recolher, analisar e processar informações sobre a AIDS, por meio de folhetos ilustrados, textos e artigos de jornais e revistas; o conhecimento e a adoção dos procedimentos necessários em situações de acidente ou ferimentos que possibilitem o contato sangüíneo; o repúdio às discriminações em relação aos portadores de HIV e doentes de AIDS; o respeito e a solidariedade na relação com pessoas portadoras do vírus HIV ou
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doentes de AIDS.
Viu como é possível implementar um processo de educação sexual na escola? Uma grande decisão consiste em querer, ousar e experimentar. Neste sentido, para encerrar esta aula, na qual abordamos a escola e a educação sexual, o(a) educador(a) sexual, a educação sexual nos Parâmetros Curriculares Nacionais, alguns indicadores do que deve fazer parte de um programa de educação sexual, convidamos-lhe a refletir sobre as possibilidades de educar sexualmente numa perspectiva de gênero ou de forma a combater o sexismo.
EDUCANDO NUMA PRESPECTIVA DE GÊNERO Gênero é a categoria social imposta a um corpo sexuado (SCOTT, 1991) e foi objeto de reflexão em nossa Aula 01. Considerar gênero é admitir a criação inteiramente social das ideias sobre papéis próprios aos homens e às mulheres, é considerar as origens exclusivamente sociais das identidades subjetivas dos homens e das mulheres. É levar em conta, também, as relações de gênero que são relações que se estabelecem socialmente com base nas diferenças entre os sexos e envolvem, necessariamente o exercício do poder. Relações de gênero constituem um dos blocos de conteúdo que integram o Tema Transversal “Orientação Sexual”. Neste contexto, referendamos algumas possibilidades para trabalhar essa temática na escola, apontadas pelos PCNs (BRASIL, 1998).
meiros ciclos, vê-se inúmeras situações que dizem respeito à questão dos gêneros. No primeiro ciclo, geralmente ocorre o agrupamento espontâneo das crianças por sexo, sendo mais dificultado o relacionamento entre meninos e meninas. Esse movimento pode e
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Ao se observar o comportamento diferenciado dos alunos dos pri-
deve ser respeitado, desde que não implique na desvalorização do outro. Trata-se de um movimento que se relaciona com a construção da identidade de cada criança, em que primeiramente é preciso afirmar-se como menino ou como menina a partir das semelhanças e afinidades de interesse típicas da idade e sexo. Vêem-se então os clubes do ‘bolinha’ ou ‘da Luluzinha’ e também as amizades exclusivas entre pares. Já no segundo ciclo costuma haver, espontaneamente também, uma aproximação entre eles, revelando-se mais claramente a curiosidade pelas diferenças. Com a puberdade há maior entrosamento e atração entre meninos e meninas. Essa aproximação não se dá sem conflitos, medos e por vezes agressões de diferentes intensidades. Muitas vezes o professor é chamado a intervir nesses conflitos ao mesmo tempo em que pode propor situações de trabalho em conjunto como estratégia de facilitação das relações entre meninos e meninas.
As relações de gênero podem ser trabalhadas em qualquer situação do convívio escolar: durante as brincadeiras infantis, no modo de realizar as tarefas escolares, quando meninas são estimuladas a serem mais cuidadosas do que os meninos, se observarmos discriminação de um aluno em seu grupo, com apelidos jocosos e às vezes questionamento sobre sua sexualidade, etc.
Essa perspectiva vem sendo admitida nos últimos anos como educação não sexista, ou seja, educação que promove a igualdade entre homens e mulheres (SOUZA, 2000). O sexismo é uma postura que se constitui em marcante ameaça à democratização da sociedade porque exclui, discrimina e limita a participação das pessoas em função de seu sexo. Trata-se de uma forma grave de preconceito que se manifesta desde a infância e vai se aprofundando, muitas vezes, ao longo dos anos.
Como sensibilização, convidamos-lhes a refletirem sobre o tema a partir do ensaio de Marcela Lagarde (s.d.):
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Educação não sexista
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Marcela Lagarde
Pedem-me para falar de educação não-sexista e o que primeiro me salta à vista é o não. O que é que eu poderia dizer a respeito de não-sexista e, especialmente, sobre a educação não-sexista? Não sei. Para mim é difícil abraçar uma causa e empreender uma jornada em negativo. Prefiro viver a favor. Estou convencida de que toda indagação, toda busca de resposta a dúvidas, a problemas apresentados, é mais rica e propicia melhores alternativas quando é colocada a favor de. Uma campanha de educação humana abrange os dois gêneros, masculino e feminino, mas é importante que nela se destaquem as mulheres porque, geralmente, de maneira sexista, somos absorvidas pelo humano. Além disso, quero me referir às mulheres, porque nós estamos empenhadas
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há muito tempo em desconstruir a ordem patriarcal do mundo e em construir formas libertárias de ser para as mulheres e para os homens. Um novo mundo construído sobre a diferença paritária e no qual sejamos humanas e humanos. Por isso, se é preciso dizer não a algo, prefiro evocar aqui os nãos decisivos das mulheres. O não histórico ao mundo patriarcal que de forma isolada e quase inaudível disseram sempre as primeiras.
duas ou mais. Quero evocar também a infinidade de nãos como os que dizemos todas a esta cultura opressiva e à nossa identidade, ainda patriarcal.
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E os nãos que em coro dizemos com força, cada vez que somos cúmplices
O não de que eu mais gosto é o de Franca Basaglia: ela diz que o primeiro não das mulheres aos outros é o primeiro sim a si mesma. Esse não é imprescindível e me encanta como núcleo de uma nova identidade para as mulheres. Não à sexualidade para os outros; não à maternidade a qualquer preço; não às gravidezes infantis e adolescentes; não aos abortos clandestinos; não ao próximo filho; não ao corpo feito coisa; não ao desejo alienado de receber o olhar sexista que nos concede a razão de ser. Não ao corpo partido em pedacinhos para que outros o repartam, naco de nádega, de cintura ou de seios fragmentados, coisas alheias sentidas por centímetros; não a ser a imagem desalmada ou o ser ocupado em coitos desabitados. Não a ser a pele e as suas profundezas de cada instante; não a ser o corpo para o prazer de outros; não à servidão voluntária de todas nós, denominada amor pelos outros; não à impotência como signo de feminilidade. Não e muitos nãos, suficientes para todas as dependências que inutilizam, que cerceiam, que bloqueiam, que impedem. Não à mulher maravilha. Não a parir sem dor e sem consciência; não à multiplicidade de orgasmos idílicos. Não à opressão das mulheres adoçada com a exaltação de feminilidades cativas. Não à invisibilização das mulheres, de nossas obras, de nossos trabalhos, de nossos esforços vitais.
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Proponho que iniciemos uma nova pedagogia de gênero com um sim às mulheres, com uma aprovação da sociedade às mulheres. Uma pedagogia social e coletiva, pessoal e privada, de afirmação do eu mesma desde o princípio. Todas ganharíamos e a cultura se enriqueceria com a língua inédita da fala feminina que começa por algo mais ou menos assim: Sim a mim mesma. Sim a todas nós. Sim com os outros. Desde o nascimento e durante toda a vida. Sim a indagar o mundo e a construir meu mundo, limitado, íntimo, contido e secreto, sim à minha privacidade, ao meu corpo, sim à minha integridade diante do dano e da fragmentação. Sim às opções, à descoberta de Eros no canto, na chuva, na carícia da flauta doce e na dança. Sim à suavidade do tato e às umidades; sim ao gozo e sim à consciência da morte; sim aos outros e às outras, às companhias escolhidas; sim à diversidade e à complexidade de seres sem certezas, em encontro e desencontro, em renovação. Sim a dizer não quero, não posso. Sim ao desejo. E a imaginar não ser mais território, silêncio e tabu. Sim a dar nome ao mundo com novas vozes, sim a desejar em primeira pessoa, sim a criar. Vim para somar-me a um sim que soe forte, que chegue a todas e todos, que nos comova.
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Sim a uma educação por uma sexualidade livre. Sim, porque nossa liberdade é, em essência, uma afirmação.
Neste contexto, um importante aspecto a ser destacado e “combatido” é a “naturalização” de diferenças cognitivas entre meninas e meninos, que acontece frequentemente na escola, especialmente no ensino fundamental. Meninos são considerados naturalmente mais propensos a cálculos matemáticos e às ciências naturais, enquanto as meninas são consideradas mais competentes para a habilidade verbal e para as questões mais subjetivas.
Uma educação não sexista deve suprimir comentários e até atitudes de professores que reforcem estes estereótipos, que podem ter importantes desdobramentos na vida de cada criança, determinando inclusive suas escolhas profissionais no futuro. É fato inconteste que, se meninas e meninos forem submetidos aos mesmos estímulos, poderão desenvolver habilidades cognitivas semelhantes. Danoso será o processo educativo que vincule a formação atitudes, o desenvolvimento de habilidades e a construção de saberes ao gênero das crianças e adolescentes.
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Convidamos a ampliar essas reflexões
Lendo o texto de nossa autoria: FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho. PGM 3: Relações de gênero. BRASIL. MEC. SEED. TV Escola. Série Saúde e Prevenção nas Escolas. Salto para o Futuro. Ano XVII. Boletim 15. Agosto 2007: p.46-55. Disponível em: <http://www.emdialogo.uff.br/sites/default/files/saude_e_prevencao_nas_escolas.pdf>. Acesso em: 8 dez. 2014 em que exemplificamos ações educativas que, além das práticas cotidianas, podem ser efetivadas numa perspectiva de gênero. e BRASIL. MEC. SEED. TV Escola. Série Educação para a Igualdade de Gênero. Salto para o Futuro. Ano XVIII. Boletim 26. Novembro 2008. Disponível em: <http://tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/163222Edu_igualdade_gen.pdf>. Acesso em: 8 dez. 2014.
Podemos depreender do analisado que, como educadores, nossa atuação em educação sexual deve ser efetiva de forma a contribuir de modo decisivo para a minimização, ou mesmo a eliminação, das assimetrias de gênero, numa perspectiva crítica das nossas práticas, muitas vezes dissociadas da consciência crítica imprescindível a educadoras e educadores. Precisamos assumir a construção de uma maior igualdade, nos mais diversos contextos entre meninos e meninas, entre homens e mulheres.
Para tanto, é mister a urgente implementação de uma educação não sexista que assegure a superação de preconceitos e a construção de pessoas comprometidas com a igualdade de direitos entre os sexos, criando uma nova forma de existir para mulheres e para homens.
Criar uma nova existência significa construir ou recriar as relações interpessoais, especialmente àquelas que constituem a base fundamental da construção dos sujeitos: o gênero, para que todos possam se realizar como pessoas e serem mais felizes.
Bom crescimento!
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SÍNTESE Nesta aula, fizemos uma abordagem conceitual da educação sexual, refletindo sobre seus aspectos históricos e instâncias sociais em que ocorrem ou devem ocorrer, sobre educação sexual na escola, os blocos de conteúdos do tema sexualidade nos parâmetros curriculares nacionais.
Na próxima aula, trataremos da elaboração e implementação de projetos e programas de educação sexual.
Até lá!
REFERÊNCIAS ATUCHA, Luis M. Aler. Sexualidad Humana, uma aproximacion ideológica y metodológica. Lima: Labor, 1988.
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BARBOSA, M.P.M. Uma experiência de educação sexual em escolas de 1º Grau. Revista Brasileira de Sexualidade Humana. São Paulo, v.1, n.2, p.104-108, 1990.
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos: apresentação dos temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998. p. 17-41 e 287-335 (Orientação Sexual).
COLOMBINO, Andrés Flores. Educación Sexual. Montevideo: Distar, 1992.
LAGARDE, Marcela. Educação não-sexista: sim a si mesma. s.d. Disponível em: <http://www.redemulher. org.br/espanhol/marcela.htm>. Acesso em: 09 dez. 2014.
MASTER, W. H., JOHNSON, V. E. A resposta sexual humana. São Paulo: Roca, 1984.
SCOTT, Joan. W. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Recife: SOS Corpo, 1991. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/textos/generodh/gen_categoria.html>. Acesso em: 30 nov. 2014.
SEGÚ, Hector F. Educacion Sexual em la família y em la escuela – um enfoque comprensivo y actualizado. Buenos Aires: Planeta, 1990.
SOUZA, Valquíria Alencar de; CARVALHO, Maria Eulina de. Por uma educação escolar não sexista. João Pessoa: Editora Universitária UFPB, 2000.
VITIELLO, Nelson. Sexualidade: quem educa o educador: um manual para jovens, pais e educadores. São Paulo: Iglu, 1997.
EDUCAÇÃO SEXUAL
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AULA 08 – PROJETOS E PROGRAMAS DE
Autora: Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes Na aula anterior, fizemos uma abordagem conceitual da Educação Sexual, refletimos sobre a participação da família e da escola nesse processo, intencional ou não, que se efetiva desde que a criança nasce e vai até o final da vida. Refletimos, também, sobre quem e como deve atuar o/a educador/a sexual e como está prevista, no Brasil, a Educação Sexual proposta pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998). Reservamos esta aula para tratar da elaboração e da implementação de projetos e programas de educação sexual na escola ou em outros espaços de educação não formal, campo de trabalho do/a profissional de Pedagogia.
O que compete a/o profissional de Pedagogia? Lembrando o que já estudamos em outros componentes curriculares dessa graduação, a formação no curso de Pedagogia se destina à docência na educação in- ________________________ fantil e nas séries iniciais do ensino fundamental. (BRASIL, 2006)1 A educação infantil é definida no Art. 29 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) como a “[...] primeira etapa da educação básica” que “[...] tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade. As séries iniciais, ou anos iniciais do ensino fundamental, correspondem, na legislação atual que ampliou a duração obrigatória do Ensino Fundamental de oito para nove anos, às chamadas classes de Alfabetização, 1ª, 2ª, 3ª e 4ª séries na legislação anterior, atualmente nomeadas de 1º, 2º, 3º, 4º e 5º anos. Também correspondem ao Segmento 1 da modalidade da educação básica nomeada de EJA ou Educação de Jovens e Adultos, que se destina às pessoas que não tiveram acesso ou continuidade de estudos na idade própria, quando crianças. É de se esperar, nesse sentido, que a educação para a sexualidade ocorra na escola, desde a educação infantil, dando continuidade a que acontece informalmente na família que assume o desenvolvimento integral das crianças e jovens. Educa-se pelo exemplo, pelo atendimento às demandas: comportamentos, atitudes, curiosidades, interesses, questionamentos... Na escola, contudo, devemos programar ações intencionais, adequadas à idade e maturidade das crianças, dos adolescentes e dos adultos. Por isso, ter conhecimento 1 Art. 2º As Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia aplicam-se à formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.
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do grupo que vai atuar é indispensável ao planejamento de quaisquer atividades pedagógicas que conduzam ao alcance de seus objetivos, como veremos a seguir.
Mas antes de começarmos a falar de projetos e programas, convidamos-lhe a rever as atribuições do/a egresso/a do curso de Pedagogia definidas no Art. 5º, das Diretrizes Nacionais (BRASIL, 2006): I - atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a contribuir para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social; III - fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na idade própria; IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e modalidades do processo educativo;
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V - reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas, cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações individuais e coletivas; VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano; VII - relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas; VIII - promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a família e a comunidade; IX - identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; X - demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras; XI - desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento;
plementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico; XIII - participar da gestão das instituições planejando, executando, acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em ambientes escolares e
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XII - participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração, im-
não-escolares; XIV - realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas experiências não-escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em diferentes meios ambiental-ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas; XV – utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de conhecimentos pedagógicos e científicos; XVI - estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras determinações legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e encaminhar o resultado de sua avaliação às instâncias competentes. § 1º No caso dos professores indígenas e de professores que venham a atuar em escolas indígenas, dada a particularidade das populações com que trabalham e das situações em que atuam, sem excluir o acima explicitado, deverão: I - promover diálogo entre conhecimentos, valores, modos de vida, orientações filosóficas, políticas e religiosas próprias à cultura do povo indígena junto a quem atuam e os provenientes da sociedade majoritária; II - atuar como agentes interculturais, com vistas à valorização e o estudo de temas indígenas relevantes. § 2º As mesmas determinações se aplicam à formação de professores para escolas de remanescentes de quilombos ou que se caracterizem por receber populações de etnias e culturas específicas.
Releia-as e atente para a pertinência de ações educativas em sexualidade no âmbito da educação integral de crianças, adolescentes e adultos.
PROJETOS E PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO SEXUAL Projetos e programas são modalidades ou formas de operacionalização de um plano. Tratando-se do processo de educação sexual na escola, a realização de ações intencionais implica em planejar ou em elaborar planos. Programas compreendem projetos e dependem dos projetos que a eles se subordinam. Consequentemente, seus objetivos são alcançados quando todos os pro-
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jetos que o integram tem os seus objetivos alcançados; e são dados como concluidos quando todos os projetos são concluidos.
Como saber o que deve ser feito? Que projetos e programas são necessários para o processo de educar para a sexualidade? Quais perspectivas e abordagens devem ser consideradas? Em 1990, o Conselho de Educação e Informação Sexual dos Estados Unidos (SIECUS - Sexuality Information and Education Council of the United States) convocou uma série de profissionais das áreas de saúde, educação e serviço para definir áreas-chave e conceitos que deveriam fazer parte de qualquer programa de educação sexual. O trabalho resultou na elaboração do Guidelines for Comprehensive Sexuality Education: Kindergarten–12th Grade que, no Brasil, foi adaptado pelo GTPOS – Grupo de Trabalho e Pesquisa em orientação Sexual, a ABIA – Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS e o ECOS – Centro de Estudos e Comunicação em Sexualidade e Reprodução Humana, recebendo o nome de Guia de Orientação Sexual: diretrizes e metodologia da pré-escola ao 2º grau (GTPOS, ABIA, ECOS, 1994).
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Em 2014, o Guidelines for Comprehensive Sexuality Education: Kindergarten –12th está em sua terceira edição nos Estados Unidos. Disponível em: http://sexedu. org.tw/guideline.pdf.
Esse guia é um norte para elaboração de projetos e programas de Educação Sexual em todo o mundo porque considera diferentes diversidades: de gênero, classe social, étnicas, de geração e de culturas. É um documento que conduz à ampliação da capacidade de reflexão, compreensão e avaliação que conduzem a um posicionamento crítico e próprio em relação ao exercício da sexualidade. Apresenta uma análise de objetivos e valores da educação sexual, ratifica o papel da escola, evidencia conceitos a serem (re)construídos - divididos em diferentes níveis de complexidade de acordo
adolescência inicial (12-15 anos) e adolescência (16-18 anos) - e apresenta subsídios metodológicos para a implementação desse trabalho.
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com a faixa etária do jovem a ser orientado: infância (5-8 anos), puberdade (9-12 anos),
Reafirmando que um programa comporta vários projetos de ação, registramos, como exemplo, o Programa de Educação Sexual (PROEDSEX) que implementamos na Universidade Federal da Bahia nos anos 80 do século passado que compreendia os seguintes projetos (FAGUNDES, 1995):
- Oficinas sobre Sexualidade e Gênero para crianças, adolescentes e adultos (Jovens e da Terceira Idade); - Ciclos de Estudo, Seminários, Encontros e Cursos de Formação de Educadores para profissionais de educação das redes pública e particular de ensino, de ONGs e de Associações de Bairros, dentre outros. - Disciplinas: Educação e Sexualidade,para estudantes de graduação (a exemplo desta que comporta esta aula) e Educação, Sexualidade e Gênero para estudantes do Mestrado e Doutorado em Educação.
PEDAGOGIA DE PROJETOS A Pedagogia de Projetos é uma prática pedagógica que surgiu com John Dewey e outros representantes da chamada “Pedagogia Ativa”, no início do século XX. Resultou do trabalho de educadores europeus como Maria Montessori, Ovide Decroly, Èdouard Claparède, Adolphe Ferrière, entre outros, e norte-americanos como John Dewey e William Kilpatrick, todos ligados ao movimento da Escola Nova. No Brasil, foi introduzida pelos educadores da Escola Nova, em especial, Anísio Teixeira e Lourenço Filho. Em contraponto aos princípios e métodos da pedagogia tradicional, a pedagogia de projetos, que se constitui numa reinterpretação do Método de Projetos, se baseia nos seguintes princípios: Aprender a aprender e aprender fazendo; Realização de ações significativas para os participantes; Apreensão do mundo através da resolução de problemas; Centralidade do processo educativo nos estudantes e não nos professores; Promoção da inter/transdisciplinar; Desenvolvimento da consciência critica da realidade na qual se inserem; Intervenção na realidade, solucionando os problemas identificados e analisados; Produção de conhecimentos significativos.
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Para Hernández e Ventura (1998), uma característica marcante na Pedagogia de Projetos é a mudança de paradigma quanto à transmissão dos saberes: o professor deixa de assumir o papel de “transmissor de conteúdos” para se transformar em um pesquisador e o aluno, por conseguinte, assume o papel de ser sujeito consciente do seu próprio processo de aprendizagem.
COMO ELABORAR UM PROJETO Para planejar ações educativas em sexualidade, é preciso ter certeza do que pretende fazer e onde quer chegar. Uma boa estratégia consiste em responder a uma série de questões norteadoras como:
- Qual o tema/área do projeto? - Por que quero desenvolver esse projeto? - Ele é importante e viável?
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- Qual o meu universo de ação? Será bem aceito pelo grupo? - Onde será desenvolvido, realizado? - O que pretendo alcançar – formação de conceitos, desenvolvimento de habilidades e atitudes, (re)construção de valores etc.; - como serão feitas as atividades? Que caminho(s) preciso percorrer para desenvolver as ações do projeto? - Que instrumentos, materiais e recursos serão necessários para concretizar o trabalho? - Quem participará comigo? terei uma equipe interdisciplinar ou vou coordená-lo sozinha/o? - Em quanto tempo o projeto será realizado? - Como será avaliado e por quem? - O que será feito dos resultados?
As respostas a esses questionamentos definem os elementos que estruturam um projeto: identificação, tema e título, justificativa, objetivos, metodologia, recursos, avaliação e referências.
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
- Qual o meu universo de ação? Será bem aceito pelo grupo?
(incluindo participantes – grupo/series)
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- Onde será desenvolvido, realizado?
- Quem participará comigo? Terei uma equipe interdisciplinar ou vou coordená-lo sozinha/o? - Quais o tema/área do projeto?
TEMA / TÍTULO
- Por que quero desenvolver esse projeto?
JUSTIFICATIVA
- Ele é importante e viável?
(incluindo base teóricometodológica)
- O que pretendo alcançar – formação de conceitos, desenvolvimento de habilidades e atitudes, (re) construção de valores, etc.;
OBJETIVOS
- Como seráo feitas as atividades?
METODOLOGIA
Que caminho(s) preciso percorrer para desenvolver as ações do projeto?
(Etapas, ações/ atividades)
- Que instrumentos, materiais e recursos serão necessários para concretizar o trabalho?
RECURSOS
- Em quanto tempo o projeto será realizado?
(materiais e financeiros, se pertinentes) CRONOGRAMA
- Como será avaliado e por quem?
AVALIAÇÃO
- O que será feito dos resultados?
Para a obtenção de sucesso com o projeto elaborado, é imprescindível que ele seja bem elaborado e resulte de um bom planejamento.
Na escola, o mais desejável é começar com sensibilização para ter a adesão de toda a comunidade escolar: gestores, colegas, pessoal de apoio e, principalmente, os estudantes. Se houver a adesão de colegas, o projeto pode ser realizado em equipe e isso resultará numa maior abrangência e, consequente, possibilidade de bons resultados e avaliação positiva. Mas, quando não se consegue uma adesão imediata, é importante não desanimar e começar... com o tempo, os resultados serão determinantes da continuidade e aderência de novas pessoas e grupos.
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Exemplos de estrutura/organização de projetos:
1.
2.
SENSIBILIZAÇÃO
Dados de Identificação (Escola, equipe, etc)
VIABILIZAÇÃO
Introdução
Inclusão da temática o planejamento global da instituição
Justificativa (incluindo Base legal)
Elaboração da proposta de implementação
Abordagem teórico-metodológica
Capacitação SOS envolvidos
Etapa 2 – Sensibilizando os estudantes
Competências e Objetivos (gerais e específicos) Etapa 1 – Trabalhando com os pais Etapa 3 – Planejando com os estudantes
IMPLEMENTAÇÃO
Etapa 4 – Realizando as atividades
Escolha e definição dos temas
Etapa 4 – Apresentando os resultados
Planejamento das ações educativas
Avaliação Referências
________________________ Anexos Seleção de técnicas, ________________________ Apêndices recursos e materiais ________________________ didáticos ________________________ ________________________ Acompanhamento das ________________________ atividades ________________________ AVALIAÇÃO ________________________ DIVULGAÇÃO DA ________________________ EXPERIENCIA ________________________ REFERÊNCIAS ________________________ ________________________ Uma das ações educativas que mais têm se revelado como adequadas ao estu________________________ do de temas de sexualidade na escola são as Oficinas. ________________________ ________________________ ________________________ Como analisamos noutra oportunidade (FAGUNDES; BARBOSA, 2010, p. 17) ________________________ ________________________ As oficinas são ações educativas em que o trabalho dos educado________________________ res não se restringe ao plano intelectual ou cognitivo, que prevê ________________________ informações e conhecimentos; envolvem principalmente mudança ________________________ de comportamentos, atitudes e valores, [...] concretizam uma me________________________ todologia participativa em que os educandos não são receptores ________________________ passivos, tem uma ação efetiva em seu próprio processo de apren________________________ dizagem ao terem seus conhecimentos e experiências valorizados e serem estimulados a se envolverem na discussão, identificação e ________________________ busca de soluções para os problemas levantados pelo próprio gru-
Oficinas contemplam, como podem depreender, os princípios da pedagogia de projetos na qual os estudantes se tornam construtores de saberes que eles próprios
143 educação e sexualidade
po...
definirem como necessários, importantes, significativos.
Exemplo de Oficinas Como estímulo para a realização de ações efetivas de educação sexual na escola, seguem alguns exemplos de Oficinas com temas recorrentes nas demandas por entendimento da sexualidade e do gênero pelos nossos estudantes:
Oficinas com crianças2 TEMA = Sou criança, com muito prazer
Objetivos Identificar a estrutura do corpo da menina e do menino; Discutir sobre o que é ser menina e ser menino na atualidade, envolvendo as ambiguidades presentes nessa identificação.
Desenvolvimento Organizar a turma em dois grupos, aleatoriamente; Distribuir duas folhas de papel metro e pedir que um grupo faça um desenho de uma menina e o outro de um menino, a partir de um contorno feito com um integrante deitado sobre a folha de papel; Pedir para colocarem todos os nomes que conhecem das partes dos corpos desenhados; Solicitar que cada grupo apresente o que fez, estimulando a análise, complementação, e revisão de conceitos subjacentes ao trabalho, confirmando as nomeações e alocações corretas, corrigindo as outras e complementando o necessário; Comentar que é mais adequado o uso dos nomes científicos dos órgãos do corpo, por serem palavras neutras, evitando sentido depreciativo ou agressivo; Analisar o que faz com que cada um, olhando o desenho, identifique se se trata de uma menina ou de um menino, e sobre quando não é possível essa identificação, justificando e avaliando as implicações dessas expectativas. Ampliar o entendimento do que é ser menina e o ser menino para além do corpo que têm. 2 Exemplos adaptados dos que foram originalmente publicados em Fagundes (1995).
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144 Avaliação Avaliar se houve envolvimento das crianças na atividade e a identificação adequada da estrutura dos corpos e o significado de ser menina e ser menino.
TEMA = Como é bom viver em família Objetivos Identificar e expressar sentimentos com relação à vida em família; Compreender que a família é o primeiro grupo ao qual a pessoa pertence e a importância que tem para o bem-estar de seus integrantes.
Desenvolvimento Organizar o grupo em equipes de três componentes; Solicitar a cada grupo que construa um painel com desenhos ou colagens que repre-
________________________ sentem situações vividas em família que lembram com satisfação e outras que não foram agradáveis (como por exemplo, o acordar, o café da manhã, a arrumação da casa, ________________________ as brincadeiras, a atenção da mãe, do pai, dos avós e outros membros da família, etc); ________________________ ________________________ Apresentar e analisar os painéis (estimulando as crianças a comentarem o que foi feito ________________________ pelos colegas). ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Avaliação ________________________ Analisar a experiência com as crianças a partir do alcance dos objetivos. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Obs. ________________________ Essa oficina, se tiver a duração de mais um dia, pode incluir a atividade de entre________________________ vistar membros da família com mais idade sobre o que pensam a respeito da vida em ________________________ família, que lembranças tem de sua infância e o que acham que mudou com o tempo. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Oficinas com adolescentes 3 ________________________ ________________________ TEMA = “DIZE-ME COM QUEM ANDAS E DIRTE-EI QUEM ÉS” ________________________ ________________________ 3 As Oficinas com adolescentes e adultos exemplificadas foram originalmente publicadas em livro de nossa autoria tendo com coautora a colega Maria Paquelet Moreira Barbosa a quem agradecemos a concessão de seus direitos para publicação nessa aula (FAGUNDES; BARBOSA, 2010).
Objetivos Identificar e analisar questões referentes às relações de gênero;
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Reelaborar conceitos e preconceitos associados ao ser mulher e ao ser homem.
Desenvolvimento Organizar o grupo em quatro equipes; Arrumar o ambiente contendo uma mesa próxima às equipes e, sobre ela, várias peças de vestuário feminino e masculino, brinquedos, objetos de uso pessoal, de higiene, escolar, de viagem, etc.; Solicitar a cada equipe que escolha um membro para representar (encenar), respectivamente: uma menina, um menino, uma mulher e um homem, utilizando o material disponível; Analisar a “incorporação” das identidades e desempenho dos papéis de gênero (socialmente aprendidos), considerando:
- características de menina e de menino, de mulher e de homem; - trajes e complementos; - hábitos e costumes; - trejeitos, comportamentos e atitudes; - emoções evidenciadas;
Avaliação Analisar criticamente as percepções de gênero que apreendemos no cotidiano como sendo (equivocadamente) naturais e construídas socialmente sob a influência da cultura, geradoras de conceitos, preconceitos e estereótipos, bem como das possibilidades que temos de modificá-las.
TEMA: COMO SERÁ QUE VAI SER?
Objetivos: Refletir sobre os sentimentos, saberes, crendices e questionamentos sobre a primeira relação sexual;
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Identificar e analisar a função dos órgãos sexuais masculinos e femininos na resposta sexual humana; Desmistificar as histórias ouvidas sobre desejo, ereção, ejaculação e penetração, etc.
Desenvolvimento: Colocar em uma caixinha tirinhas de papel dobrado, de duas cores, uma para homens e outra para mulheres; As tirinhas são numeradas de acordo com o número das afirmativas sobre o tema na listagem do educador e podem ter algumas sem numeração; Deve haver tantas tirinhas quanto o número de participantes; Passar a caixa com as tirinhas de um a um participante (sentados em círculo); Cada participante deve retirar um papel da caixa de acordo com a sua cor. Se for numerada, o educador lê a afirmativa correspondente ao número enunciado. Se não houver número na tirinha escolhida, ‘a vez’ deve ser passada quem estiver a sua direita; O participante analisa a afirmativa e o grupo interfere quando julgar pertinente.
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O que os homens pensam:
- O homem sabe quando a mulher não é virgem. - Não estou seguro do que estou fazendo - Deveria ter namorado mais. Paro ou continuo? - Ela não aceita usar camisinha. O que faço? - Não consigo ter ereção, estou nervoso. - Ela não tem a menor paciência comigo. - Não precisa conversar, já sei o que vou fazer. - Deu medo de não satisfazer a menina. - E se ela for virgem? - E se ela sangrar? Vou ficar apavorado!
- A mulher não engravida na primeira relação sexual.
147 educação e sexualidade
O que as mulheres pensam:
- A dor é insuportável. - O sangramento é grande. - A mulher sente menos prazer que o homem. - Não estou segura do que estou fazendo. - Deveria ter namorado mais. Paro ou continuo? - Ele não aceita usar camisinha. O que faço? - Não consigo relaxar, estou nervosa. - Não paro de pensar no outro. - Ele não tem a menor paciência comigo.
Avaliação: Solicitar ao grupo que avalie a oficina, relacionando-a a sua história de vida. Ex: Depois de tudo o que foi analisado, se você pudesse, mudaria o rumo da sua história? Como ela seria?
Oficinas com adultos TEMA = MITOS, CRENDICES E TABUS SEXUAIS4
Objetivos: Compreender o significado dos mitos, crendices e tabus referentes à sexualidade, a fim de evitar comportamentos discriminatórios; Analisar crenças populares que distorcem a realidade.
Desenvolvimento: Organizar o grupo em quatro ou cinco subgrupos; Solicitar a cada subgrupo que faça uma relação dos mitos, crendices e tabus ligados à sexualidade que fazem parte da sua história de vida; 4 Apesar de serem usados como sinônimos, mitos, crendices e tabus têm significados distintos. Certifique-se desses significados para desenvolver essa oficina.
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Organizar um mural ilustrado contendo os dados de cada subgrupo; Apresentar o mural analisando os dados levantados; Apreciar as apresentações com atenção para se ocorrer a lembrança de mais mitos, crendices ou tabus, complementar reciprocamente as reflexões.
Avaliação: Refletir sobre possíveis razões de manutenção dos mitos, crendices e tabus, mesmo tendo certeza que não são verdadeiros.
TEMA = VIVENDO RISCOS
Objetivos: Identificar e analisar possíveis riscos de contrair doenças sexualmente transmissíveis e AIDS.
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Desenvolvimento: Com os participantes sentados em círculo, pedir para fecharem os olhos e apreciarem a música “Noite dos Mascarados”:
Chico Buarque
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NOITE DOS MASCARADOS
Quem é você? Adivinhe, se gosta de mim Hoje os dois mascarados Procuram os seus namorados perguntando assim: Quem é você? Diga logo que eu quero saber o seu jogo Que eu quero morrer no seu bloco Que eu quero me arder no seu fogo. Eu sou seresteiro, poeta e cantor O meu tempo inteiro, só zombo do amor Eu tenho um pandeiro Só quero violão Eu nado em dinheiro Não tenho um tostão. Fui porta-estandarte, não sei mais dançar Eu, modéstia à parte, nasci pra sambar Eu sou tão menina Meu tempo passou Eu sou Colombina Eu sou Pierrô. Mas é carnaval Não me diga mais quem é você Amanhã, tudo volta ao normal Deixe a festa acabar Deixe o barco correr Deixe o dia raiar que hoje eu sou Da maneira que você me quer O que você pedir eu lhe dou Seja você quem for, seja o que Deus quiser Seja você quem for, seja o que Deus quiser.
Disponível em: http://w3.impa.br/~nivaldo/chico/all/0167.html
Após a apreciação livre, orientar a construção de um painel visual sobre situações de riscos, que se caracterizam pela exposição do indivíduo a circunstâncias que possam causar danos a sua saúde, tais como sexo sem camisinha com parceiro desconhecido, o uso de seringas e agulhas não-descartáveis entre outras que implicam na possibilidade de se contrair doenças, como as DSTs e a AIDS.
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Exemplo de painel resultante das discussões
Situações de risco mais comuns:
Não são consideradas situações de riscos:
- relações sexuais desprotegidas (sem uso de preservativo), anais, vaginais e orais;
- beijo, toque, abraço e aperto de mão;
- compartilhamento de agulha e seringas contaminadas;
- compartilhamento de toalhas, talheres e pratos;
- transfusão de sangue infectado;
- suor ou lágrimas.
transmissão de mãe para filho, inclusive pela amamentação. Avaliação: Avaliar a vivência em relação aos sentimentos que emergiram e conhecimentos adquiridos.
Planejando uma aula
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Quando precisamos planejar uma aula, integrante ou não de um projeto, a forma mais simples é seguir os indicadores comuns que explicitam a quem se destina, o que queremos com a aula, como vamos proceder para atingir nosso intento, e como vamos saber se valeu a pena o que foi realizado. Com os parâmetros curriculares nacionais, foi introduzido o termo “sequência didática” para traduzir os procedimentos ou etapas inter-relacionadas de um plano de aula ou atividades, que se estruturam em ordem crescente de dificuldade, de forma a tornar mais eficiente a aprendizagem. Segundo Zabala (1998, p. 18), sequências didáticas são “um conjunto de atividades ordenadas, estruturadas e articuladas para a realização de certos objetivos educacionais, que têm um princípio e um fim conhecidos tanto pelos professores como pelos alunos.” Seguindo essa reflexão, teremos estruturado um plano de aula, quando são explicitados: tema, série ou turma, duração, objetivos, esquema de conteúdo ou tópicos do conhecimento, desenvolvimento ou sequência didática, recursos, avaliação e referências.
Vejamos um exemplo de plano: Tema: Homofobia Série ou turma: 1º segmento /EJA Duração: 3 horas
- Identificar ideias, sentimentos, concepções e conflitos sobre homofobia; - Evidenciar práticas discriminatórias no ambiente escolar e na sociedade;
151 educação e sexualidade
Objetivos:
- Representar situações hipotéticas de vivência de pessoas iguais e/ou diferentes de si, quanto a expressões das sexualidades; - Praticar a incorporação prevista nos PCNs da temática diversidade como princípio de igualdade, de transformação das relações de poder heteronormativas e da construção da igualdade como representação mais plural das posições de gênero e sexualidade; - Possibilitar o questionamento da ordem heterossexista, procurando evidenciar que a hierarquia das sexualidades é tão insustentável quanto à de geração, etnia e classe social. Esquema de conteúdo ou tópicos do conhecimento: - Diversidade, relações de poder, pluralidades sexuais; - Homofobia – conceituação, permanências e mudanças de concepções distintas sobre o tema; - Discriminação e preconceitos; heterossexualidades e homossexualidades. Desenvolvimento ou sequência didática: - 1º momento: apresentação da proposta e processamento teórico (a partir dos objetivos) - 2º momento: planejamento do texto e das cenas - 3º momento: apresentação das cenas - 4º momento: debate a avaliação (sobre o tema e sobre o trabalho realizado) Recursos: quadro e pincéis pilotos, slides e data show Avaliação: - Analisar com o grupo o alcance dos objetivos. Referências: (enumerar, segundo a ABNT, livros, revistas e outras fontes consultadas e utilizadas para o desenvolvimento da aula).
Como registrar o que foi feito? O projeto implementado Os resultados de um projeto podem ser sistematizados sob forma de relatório, cuja estrutura se assemelha à do projeto e é legislada pela Norma 14724 da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 2005)
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INTRODUÇÃO A introdução é elaborada a partir do que no projeto foi definido como objetivos, justificativa, dados gerais do grupo trabalhado, local, etc.
DESENVOLVIMENTO O desenvolvimento compreende o planejamento, as etapas do projeto com discriminação das etapas: objetivos das aulas ou atividades ou dinâmicas/oficinas ou procedimentos, recursos e avaliação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Consistem na parte final do relatório em que o/a autor/a retoma os propósitos do projeto e tece considerações sobre o alcance (ou não) dos objetivos previstos, relacionando-os com o que foi feito ou resultados.
PERSPECTIVA DE CONTINUIDADE OU DESDOBRAMENTO DO PROJETO É uma parte opcional. Caso seja pertinente, comporta a descrição de uma pos-
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sível forma de continuidade do projeto.
REFERÊNCIAS Listagem de todas as fontes (livros, revistas, sites, etc.) usadas para o desenvolvimento do projeto, seguindo as Normas da ABNT.
Alem destes itens, o relatório poderá conter outros elementos pós-textuais opcionais como Glossário, Apêndices (material de sua autoria) e/ou Anexos (material da autoria de outrem). Um depoimento muito pessoal:
Vivências com crianças, adolescentes e adultos “cheios de reservas”, quando não desinformados sobre sexualidade, nos trouxe uma inquietação por estudos e atuação na área. Decidimos, então, começar a realizar pesquisas e atividades extensionistas sobre educação sexual na escola. Não tínhamos, contudo, orientação como essas que vocês estão recebendo, nem embasamento suficiente para satisfazer aos anseios, dúvidas, questionamentos e revisão de valores concernentes à construção dos gêneros e vivências da sexualidade.
neticista educador Oswaldo Frota-Pessoa, e promovíamos a construção de novos saberes a partir da identificação de um problema a ser estudado; do planejamento, das formas de estudo com os estudantes e colegas e da busca de conhecimentos
153 educação e sexualidade
Em nossa prática docente, valíamos do Método de Projetos inspiradas no ge-
em fontes variadas que incluíam o contato com a comunidade. A aprendizagem se fazia pela prática e os resultados que esperávamos eram positivos, principalmente a evidência do desenvolvimento da criatividade e da autonomia e o interesse e envolvimento com aprendizagens de Biologia, ciência pouco afeita a estudantes de Pedagogia. Da Biologia para a Educação Sexual ‘foi um pulo’. Convidamos profissionais de educação de escolas públicas e particulares, para com eles identificar o que precisávamos estudar, definir os objetivos que queríamos alcançar, escolher as atividades que levariam ao alcance dos objetivos, desde as mais simples como reuniões de estudo, realização de oficinas, seminários, simpósios, até chegarmos aos cursos de capacitação, contando com profissionais de formação diversificada, para ‘cobrir’ as múltiplas abordagens requeridas pela temática sexualidade humana. A culminância dos cursos compreendia a realização de ações educativas com os estudantes – crianças, adolescentes e adultos – campo de trabalho dos educadores participantes do processo. Muitas tentativas, acertos e erros aconteceram, mas as histórias de sucesso foram mais marcantes e duradouras. Estava assim configurado o Programa de Educação Sexual – PROEDSEX a que nos referimos anteriormente nesta aula. Com esse breve relato, queremos dizer a vocês que ousem, comecem, com mais fé do que medos, se acreditam que, além de ser papel do/a profissional de Pedagogia, educar para a sexualidade na escola vale muito a pena.
Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
Com essa abordagem sobre a educação sexual na escola, finalizamos o estudo desta disciplina que objetivou analisar as dimensões bio-psico-histórico e sociais da sexualidade humana para, identificando as manifestações em diferentes fases do desenvolvimento, planejar ações de educação sexual que evidenciem o respeito às diferenças de gênero, numa postura crítica frente à naturalização e hierarquização dessas diferenças.
Mas esse estudo é apenas um começo. Como poeta Fernando Sabino:
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154 De tudo ficaram três coisas... A certeza de que estamos começando... A certeza de que é preciso continuar... A certeza de que podemos ser interrompidos antes de terminar... Façamos da interrupção um caminho novo... Da queda, um passo de dança... Do medo, uma escada... Do sonho, uma ponte... Da procura, um encontro! (Disponível em http://www.minutodesabedoria.com.br/conteudo/autores-famosos/31/fernando-sabino/4665/br-de-tudo-ficaram-tres-coisas-br/)
Inspirando-nos, também, nesse poema, convidamos-lhe a continuar seu pro-
________________________ cesso de formação para educar para a sexualidade, através de muito estudo e tentati________________________ vas de ação. Dúvidas emergirão do processo... Crises poderão surgir... Mas, afinal, não é ________________________ durante as crises que encontramos as melhores oportunidades para crescer? ________________________ ________________________ ________________________ Avante! ________________________ ________________________ Boas realizações! ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ REFERÊNCIAS ________________________ ________________________ ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14724: Apresentação de Trabalhos Acadêmicos. ________________________ Rio de Janeiro, 2005. ________________________ ________________________ BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível ________________________ em: http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf. Acesso em: 12 dez.2014. ________________________ ________________________ BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ________________________ ciclos: apresentação dos temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998. p. 17-41 e 287-335 (Orientação Sexual). ________________________ ________________________ BRASIL. Parecer CNE/CP nº 5/2005, de 13 de dezembro de 2005. Estabelece as Diretrizes Curriculares Na________________________ cionais para o Curso de Pedagogia. Disponível em http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/pcp05_05. ________________________ pdf. Acesso em: 12 dez. 2014.
T.C.P.C Fagundes, 1995.
FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho; BARBOSA, Maria Paquelet Moreira. Oficinas sobre Sexualidade e Gênero. 2. ed. Salvador: Helvécia, 2010.
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FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho. Educação Sexual: construindo uma nova realidade. Salvador:
GTPOS, ABIA, ECOS. Guia de orientação sexual: diretrizes e metodologia (da pré-escola ao 2º grau). São Paulo: Casa do Psicólogo; Fórum Nacional de Educação e Sexualidade, 1994.
HERNÁNDEZ, Fernando; VENTURA, Montserrat. A Organização do Currículo por Projetos de Trabalho. 5..ed., Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
ZABALA, Antoni. A prática educativa. Tradução: Ernani F. da F. Rosa. Porto Alegre: ArtMed, 1998.
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