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SERVIร O SOCIAL 2ยบ SEMESTRE


© 2014. Universidade Salvador – UNIFACS – Laureate International Universities É proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização. Curso de Bacharelado em Serviço Social

Universidade Salvador – UNIFACS Diretor Presidente

Marcelo Henrik Chanceler

Manoel Joaquim Fernandes de Barros Sobrinho Reitora

Marcia Pereira Fernandes de Barros Diretor de Educação Corporativa & Novos Projetos

Adriano Lima de Barbosa Miranda Pró-reitora de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão Comunitária

Carolina de Andrade Spinola Coordenadora do Eixo de Formação Humanística

Sílvia Rita Magalhães de Olinda EAD UNIFACS Coordenador Geral de EAD, GEX e Extensão

Luciano Pena Almeida de Souza Coordenadora do Curso

Suzana Coelho Conceição Coordenadora de Design Educacional

Agnes Oliveira Bezerra

Coordenadora de Sistemas e Processos

Karina Fabiana Vieira da Silva Supervisor de Produção de Mídias

Jorge Antonio Santos Alves Designers

Adusterlina Cerqueira Lordello Carlos Eduardo Cova Santos Paulo Ricardo de Souza Dourado Thiago Gomes Monteiro Penha Revisão / estrutura

Noemia Carla Santana Reis Séfora Joca Maciel Sonildes de Jesus Sousa Tatiana Souza Motta EAD UNIFACS - http://ead.unifacs.br/ UNIFACS Atende (Salvador): 3021-2800 - Demais Localidades: 0800-284-0212


SUMÁRIO PRÁTICAS EM SERVIÇO SOCIAL II.................................................................................................... 5 AULA 01 - CAPITALISMO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES...........................................................................................................9 AULA 02 - OS PRECURSORES DO SERVIÇO SOCIAL NA EUROPA E NOS ESTADOS UNIDOS................................... 23 AULA 03 – O PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA...................................... 37 AULA 04 – DESLOCAMENTO DA INFLUÊNCIA NEOTOMISTA PARA A CONCEPÇÃO FUNCIONALISTA............... 53 AULA 05 – A PROFISSIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL E A IMPORTAÇÃO DOS MÉTODOS NORTE-AMERICANOS................................................................................................................................................... 67 AULA 06 – SERVIÇO SOCIAL DE CASO......................................................................................................................................... 83 AULA 07 – SERVIÇO SOCIAL DE GRUPO...................................................................................................................................... 99 AULA 08 – DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE..............................................................................................................113



2º Semestre

PRÁTICAS EM SERVIÇO SOCIAL II Autora: Patricia Dantas Vergasta



APRESENTAÇÃO Querido(a) Aluno(a),

É com muita alegria que vamos desvendar os aspectos históricos, teóricos e metodológicos do Serviço Social, como profissão, no período dos anos 30-50. Nesta jornada teremos a oportunidade de conhecer a influência europeia no Serviço Social na América Latina e no Brasil, contextualizar historicamente a profissionalização do Serviço Social no Brasil, compreender a influência norteamericana no Serviço Social Brasileiro e conhecer os métodos de Serviço Social de Grupo e Desenvolvimento de Comunidade. Vamos degustar de modo instigante, interessante e inteligente, informações relevantes para sua formação. É preciso muita curiosidade para descobrir os caminhos percorridos por este profissional. Este material foi preparado com carinho, pensando em você! Cada texto e atividade que encontrará foram construídos na intenção de potencializar suas habilidades e competências. Isso só será possível se contarmos com seu comprometimento e disponibilidade. Por isto, recomendo uma leitura atenta e a realização de todos os exercícios propostos, a fim de compartilharmos a delícia da construção do conhecimento. Temos muito trabalho pela frente, por isto, desejo iniciativa, coragem, determinação e dedicação!

Profª Patricia Vergasta



DERAÇÕES

Autora: Patricia Dantas Vergasta “Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no

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AULA 01 - CAPITALISMO: ALGUMAS CONSI-

trabalho, na ação-reflexão”.

Paulo Freire.

Olá querido(a) discente,

Vamos reiniciar nossa jornada... No primeiro semestre, em Introdução ao Serviço Social, estudamos alguns temas importantes para a profissão. A partir de agora, vamos conversar sobre a trajetória histórica, teórica e metodológica do Serviço Social. Para que nosso objetivo se concretize, em nossa primeira aula, faremos algumas considerações sobre o modo de produção capitalista, pois é em seu contexto que surge o Serviço Social. Bons estudos! O Serviço Social surge como resultado do modo de produção capitalista. Por isso, para entendermos o sentido da profissão é importante compreender o que está por trás da palavra: “capitalismo”. O que ela significa? Como surgiu? O que representa? Para compreendermos a lógica do capitalismo, faremos uma viagem histórica rumo ao final da Idade Média, quando o feudalismo imperava.

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Feudalismo

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Veja outras informações sobre o feudalismo em: http://www.historianet.com.br/conteudo/ default.aspx?codigo=295

No feudalismo, a terra era chamada de feudo, controlada pelos nobres e pela alta hierarquia eclesiástica. O feudo era um bem precioso e, praticamente, a única fonte de riqueza e sustento medieval. Este quadro propiciava um rígido sistema de estratificação social, em que as relações sociais, de produção e de poder eram pautadas no princípio do privilégio do nascimento.

O ‘feudo’, domínio territorial de um único ‘senhor’ – geralmente barão ou bispo –, consistia quase sempre em uma pequena aldeia de camponeses e suas áreas circundantes, às vezes incrivelmente vastas: o senhor de terras característico das áreas de servidão era assim um nobre proprietário e cultivador ou um explorador de enormes fazendas. (TRINDADE, 2002, p. 19)

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No feudo os representantes da Igreja Católica ocupavam o topo da pirâmide societária, condenavam o lucro e determinavam a forma como as pessoas deviam pensar e se comportar, com base nos ensinamentos bíblicos. A nobreza, apesar de ter os domínios econômico, “militar” e agrário, estava localizada no centro da pirâmide; era constituída por donos de grandes fazendas, que lhes rendiam muito dinheiro. Na base da sociedade, estavam os servos. De acordo com Trindade (2002), nesta época, pagava-se dízimo à igreja e impostos ao Rei; os sevos eram obrigados a trabalhar, gratuitamente, durante dois ou três dias da semana nas terras do seu senhor feudal.

ESTRUTURA FEUDAL Fonte: UNIFACS EAD


troca de proteção, pois as guerras entre os feudos eram constantes. Além de pagar impostos e tirar da terra, somente, o extremamente necessário para a sobrevivência, todo o pequeno excedente da produção deveria ser entregue ao seu senhor. Se a terra fosse vendida esses trabalhadores passariam a dever suas obrigações ao novo dono, ou seja, ao novo senhor feudal. Esta prática gerou acumulação de riquezas nas mãos da nobreza e da Igreja; a mobilidade social inexistia.

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Os servos recebiam do senhor feudal um pedaço de terra para produzir em

Aprofunde seus conhecimentos sobre a estrutura feudal em: http://www.eumed.net/libros/2008a/372/ESTRUTURA%20FEUDAL.htm

Na metade do século XIV até o século XVIII, a Europa foi atingida pela peste negra. Doença transmitida pelas pulgas dos ratos, similar à peste bubônica, que matou quase um terço da população européia, eliminando mais de vinte milhões de pessoas. Muitos servos morreram e os senhores feudais ficaram frente a frente com uma enorme escassez da mão-de-obra, sendo obrigados a “alugar” a força de trabalho em larga escala. Assim, o aluguel da força de trabalho passou a ficar cada vez mais caro e os trabalhadores agrícolas se fortaleceram, emergindo as rebeliões camponesas.

Figura 1: Vítimas da peste negra Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Peste_negra

Outra força social, lentamente, ganhou espaço: a burguesia. Os burgueses eram os habitantes dos burgos, pequenas cidades que iam se formando no cruzamento de rotas comerciais. Os burgos foram se desenvolvendo, reunindo vários trabalhadores “livres”, que queriam se tornar aprendizes das corporações de ofício. Através da exploração da força de trabalho e de práticas mercantis usurárias – condenadas pela Igreja – os burgueses começaram a acumular capital, permitindo o nascimento de uma pequena elite econômica. Nos séculos XV e XVI, o feudalismo estava enfraquecido enquanto a burguesia tornava-se cada vez mais influente na Europa ocidental. Reis, senhores feudais e mer-

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cadores tomavam dinheiro emprestado junto aos burgueses que estavam envolvidos com os negócios mais promissores da época como: bancos e manufaturas. Com isso, a Idade Moderna foi marcada e pela ascensão da burguesia. Assim, surge o modo de produção capitalista, onde o poder passou a estar nas mãos daqueles que detinham o capital e os meios de produção. Entre os séculos XVII e XVIII, a burguesia já estava bastante diversificada em vários estratos, desde os mestres artesãos que expandiram suas oficinas contratando muitos empregados e montando manufaturas até grandes (para a época), industriais e banqueiros, e constituía o que podia ser chamado de uma classe “média” – no sentido de setor intermediário entre a aristocracia e a grande massa do povo. (TRINDADE, 2002. p. 25)

Os capitalistas apoiavam pesquisas científicas que possibilitaram a substituição das antigas manufaturas pelas indústrias, permitindo, por exemplo, a “[...] invenção da fiandeira e do tear mecânicos, produção de ferro com carvão de coque, fabricação de navios e locomotivas movidos a vapor, etc”. (TRINDADE, 2002, p. 83).

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Figura 2: Máquina de fiar Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1quina_de_fiar_hidr%C3%A1ulica

No final do século XVIII e início do século XIX, a Europa vivenciou a Revolução Industrial, decorrente do sistema capitalista. Houve o crescimento desordenado de cidades, acompanhado com péssimas condições sanitárias, devido à maciça migração dos antigos servos para os burgos na esperança de venderem suas forças de trabalho, sob forma de salário, como modo de garantir a sobrevivência de suas famílias. A identificação da força de trabalho como mercadoria foi essencial para a extração mais-valia, ou seja, a obtenção de lucro. A mais-valia é o resultado final do processo de produção capitalista. Ela é adqui-


o que foi investido para a sua confecção. Representa a parcela de trabalho não pago ao trabalhador que o capitalista transforma em capital. Pode-se afirmar que o sistema capitalista traz como pressuposto a ideia de que de um lado situam-se os que concentram em suas mãos meios de produção (mercadorias, matérias primas, ferramentas, maquinários), enquanto que, antagonicamente, estão os despossuídos, aqueles que não têm as condições materiais para a concretização do seu labor e por isto precisam vender sua força de trabalho como via exclusiva

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rida no momento em que as mercadorias finais assumem maior valor de troca do que

para sua sobrevivência. Quando o trabalhador emprega sua força de trabalho, gasta sua força vital, único elemento produtivo que detém. Contudo, esta força pertence ao capitalista que a comprou por um certo espaço de tempo e valor, para usá-la na produção. A força de trabalho só ganha sentido na hora em que se relaciona com os demais meios de produção, ou seja, só no ato em que é consumida, durante o processo produtivo é que ela gera valor. O que vale dizer que: “Assim como o trabalho é propriedade do capitalista o é, também, o produto de trabalho”. (IAMAMOTO; CARVALHO, 1988, p. 41). Sendo assim, interessa aos donos do capital ampliar cada vez mais a intensidade e/ou a duração do trabalho, seja dilatando sua jornada, seja acelerando o tempo médio requerido na produção da mercadoria. Isto quer dizer que o preço de custo da mercadoria não traduz efetivamente o quanto o capitalista empregou para produzi-la, pois ele exclui do seu cálculo a parcela do valor que não lhe custou nada, mas custou ________________________ para o trabalhador: a mais-valia. Por isto, chamamos atenção para o fato de que o capi- ________________________ talista não se refere a custos, mas propaga a ideia de lucro. Lucro este que nada mais é ________________________ que a forma que encontrou para encobrir o segredo da extração da mais-valia, ou seja, ________________________ ele representa a mais-valia maquiada. Diante desta realidade, e analisando o processo produtivo de forma continua, é possível observar que no final das contas o salário da classe trabalhadora é pago com o seu próprio trabalho. Além do mais, o que o capitalista retribui aos seus empregados em forma de salário é usado pelos mesmos empregados para adquirir as condições de sobrevivência e reprodução de toda a sua família, garantindo deste modo, inclusive a perpetuação deste processo de produção, tendo em vista que quando consome algo, está reproduzindo a lógica que edifica o conceito de trabalhador assalariado.

Fonte: UNIFACS

Partindo de tal lógica, Iamamoto e Carvalho (1988, p. 30) afirmam que:

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O processo capitalista de produção expressa, portanto, uma manei-

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ra historicamente determinada de os homens produzirem e reproduzirem as condições materiais de existência humana e as relações sociais através das quais levam a efeito a produção. Neste processo se reproduzem, concomitantemente, as idéias e representações que expressam estas relações e as condições materiais em que se produzem, encobrindo o antagonismo que as permeia.

O trabalho remunerado e o capital nascem do processo capitalista, em que classes sociais antagônicas se criam e recriam continuamente, ao ultrapassarem uma simples relação de produção de objetos materiais e, representarem relações sociais de produção entre pessoas e classes sociais distintas: os capitalistas e os trabalhadores assalariados.

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Fonte: Clipart

Os fatores de produção – terra, capital e trabalho – configuram-se como mercadoria porque são frutos de trabalhos privados que precisam ser trocados, entre os seus donos. O trabalhador termina criando as condições materiais, sociais e econômicas que possibilitam a perpetuação do sistema capitalista e de sua dominação. Tendo em vista que ao gerar capital com a sua força de trabalho, ele aumenta a lucratividade da classe capitalista, reproduzindo-a estruturalmente e, automaticamente, reforça as condições que edificam sua própria exploração, reduzindo, contraditoriamente, as alternativas de alcançar os meios para a sua própria libertação.

Fonte: Adaptação sobre clipart


necessidades do capital, ou seja, são gerados mais braços do que o capital precisa para empregar na produção. Este excesso de pessoas, disponíveis para o trabalho é denominada, numa perspectiva marxista de “exército industrial de reserva”. É justamente esta legião de indivíduos a mais que faz com que os capitalistas, explorem cada vez mais os trabalhadores, tendo em vista que essa massa sobrante faz cair o valor da força de trabalho no mercado. O resultado deste processo reverte-se num empobrecimento da classe traba-

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A classe trabalhadora termina, também, gerando uma população superior às

lhadora. Este empobrecimento se traduz na precarização da sua saúde e da sua moradia, no aumento dos acidentes de trabalho provocado pela inserção de máquinas modernas no processo fabril, na deterioração dos seus valores morais e cerebrais, na redução do seu tempo ocioso em virtude das horas extras vendidas ao capitalista. Esta pauperização que atinge a família trabalhadora, não poupa sequer mulheres e crianças que passam a trabalhar cada vez mais cedo. Deste modo o dia a dia do operário se transforma numa sofrida batalha contra o capital, em prol da sua subsistência. Pode-se afirmar que a ampliação da riqueza capitalista provoca, simultaneamente, a ampliação da pobreza que atinge a classe trabalhadora e dos conflitos expressos na luta entre estas duas classes antagônicas. O desenvolvimento tecnológico impulsionado pelas pesquisas científicas – patrocinadas pelos capitalistas – trouxe para dentro das fábricas máquinas que requeriam a cooperação de muitos trabalhadores livres para a realização da produção, em ________________________ virtude das tarefas laborais, terem sido fragmentadas em atividades o mais simples ________________________ possível, como jamais havia acontecido antes. Foi assim que surgiu a figura do traba- ________________________ lhador parcial, através do parcelamento do próprio trabalho produtivo. Este parcelamento do trabalho é diferente em cada fase do desenvolvimento das forças sociais que compõem o processo produtivo e a sua forma equivalente de se apropriar do trabalho alheio. De acordo com Iamamoto e Carvalho (2003, p.17) “[...] A divisão do trabalho e a propriedade são expressões idênticas: o que a primeira enuncia em relação à atividade do homem, a segunda enuncia com relação ao produto da atividade do homem”.

Para reforçar a aprendizagem sobre o significado do capitalismo, acesse o site: http:// pt.wikipedia.org/wiki/Capitalismo

Visite também: http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S000967252006000400013&lng=pt&nrm=iso http://br.geocities.com/temposmodernos_de_chaplin/indice.htm

Agora que já compreendemos o que representa o “sistema capitalista”, e o antagonismo entre classes que ele pressupõe, vamos refletir sobre a inserção e significação

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dos serviços sociais neste cenário.

O Significado dos Serviços Sociais no Mundo Capitalista A partir do estudo das questões referentes ao surgimento do capitalismo, foi possível perceber que a divisão social do trabalho e o conflito entre os burgueses e os proletários – classes sociais de interesses antagônicos –, juntamente, com as inovações tecnológicas da época, provocaram uma valorização do capital e um empobrecimento das condições de vida do trabalhador no que se refere à sua alimentação, moradia, saúde, educação, etc. Foi por causa dessa divisão do trabalho e do alijamento que os trabalhadores sofreram, e ainda sofrem, no sistema capitalista, que surgiram os serviços sociais, como forma de minorar a pressão antagônica existente entre os explorados e os exploradores. A revolução industrial tem uma intensa relação com o surgimento da necessidade da prestação de serviços sociais para a sociedade. Como já foi sinalizada a mudança do sistema de produção feudal para o sistema capitalista, provocou uma drástica mudança nas relações sociais da população européia. Durante esta transição, a população migrou excessivamente para os grandes

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burgos – que não estavam preparados para acolher tanta gente –, com o propósito de conseguir uma vaga de trabalho nas fábricas que começavam a surgir impulsionadas pelas novas descobertas tecnológicas, como a máquina a vapor e o motor a combustão. Vale ressaltar que as condições sanitárias vividas nestas cidades eram péssimas, assim, constantemente, uma série de doenças e epidemias atingia os trabalhadores, chegando a matar muitos pais de família, mulheres e crianças que serviam ao capital. Além disto, muitos camponeses, acostumados a lidar apenas com o trabalho no campo do raiar do dia ao por do sol e a enxada, foram submetidos a um tipo de trabalho totalmente novo: o trabalho fabril. Nas fábricas, locais fechados onde se perdia a noção do tempo, eles foram submetidos a uma excessiva jornada de trabalho que às vezes ultrapassava 18 horas seguidas; foram obrigados a utilizar ferramentas e maquinárias que nunca haviam visto antes, o que terminou provocando muitos acidentes que resultaram numa legião de mutilados, órfãos, viúvas e mendigos que não tinham como vender sua força de trabalho, mas precisavam subsistir na metrópole.

Fonte: http://www.gifmania.com.pt/profissoes/carpinteros/


miseráveis ou quase miseráveis, foi se ampliando e trazendo ameaças para a manutenção do sistema capitalista, que para sobreviver precisava ser legitimado, ou seja, aceito pelos sujeitos que lhes davam vida – capitalistas e proletários. Sendo assim, diante da possibilidade de perder seus privilégios, muitos representantes da burguesia transformaram-se em verdadeiros filantropos, cuidando daqueles que foram vítimas da usura capitalista.

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Com o passar do tempo, o contingente de pessoas que integrava a parcela dos

Enquanto os camponeses e artesãos podiam dosar o ritmo de suas atividades, era bem diferente a sorte dos trabalhadores nas primeiras fábricas: trabalho ininterrupto durante horas intermináveis, disciplina severa, serviços repetitivos, frio, calor e barulho, tudo isso acarretando muita recusa ao trabalho. Esse contexto fez com que os novos capitalistas se tornassem ‘filantropos’ e se dedicassem à recuperação dos desvalidos, oferecendo ou impondo a eles trabalhos nas oficinas em troca de comida. (CARMO, 2005, p. 42)

É diante deste cenário de supremacia do capital financeiro e fabril frente às mazelas da classe trabalhadora que se instaura a nova forma do que Iamamoto e Carvalho (1988) chamam de questão social. Vale lembrar uma as definições de questão social apresentadas na disciplina Introdução ao Serviço Social. A questão social é:

[...] o conjunto de problemas políticos, sociais e econômicos que o surgimento da classe operária impôs no curso da constituição da sociedade capitalista. Assim, a ‘questão social’ está fundamentalmente vinculada ao conflito entre o capital e o trabalho (CERQUEIRA FILHO, 1982, p. 21 apud NETTO, 1992, p.13)

Ao se analisar a concepção destes teóricos, podemos afirmar que a questão social se materializa no momento em que o operariado se desenvolve e se organiza para exigir dos empresários e do Estado a sua legitimação enquanto classe social que deve participar do jogo político da sociedade ao invés de somente receber a “caridade” daqueles responsáveis pelo seu empobrecimento. É nesta relação de forças contrárias – explorador e explorado – que a classe proletária passa a exigir dos capitalistas ações que fossem além de atos de filantropia, caridade e/ou repressão. Por isto, o Estado começa a interferir nas relações entre patrões e empregados, implementando leis que alterem as relações comerciais no mercado de trabalho, estabelecendo, especificamente, direitos e deveres sociais e trabalhistas. É deste modo que o Estado passa a assumir a gestão, organização e prestação dos serviços sociais como uma nova questão social. O Estado, então, para garantir a sua legitimidade política, não pode mais ignorar, totalmente, os anseios e necessidades da classe dominada, ainda que ele represente,

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de forma maquiada, a classe dominante. Isto quer dizer que o Estado, pressionado pelos proletários, se vê forçado a incorporar algumas das exigências dos seus opositores, desde que estas, no fundo, não interfiram diretamente nos interesses da burguesia. Essas concessões feitas pelo Estado à classe trabalhadora fazem parte de um pacto de dominação política da classe dominante, que vai além do controle das condições materiais dos proletários e assume, também, disfarçadamente, a direção ideológica, moral e intelectual de toda a sociedade. E é assim, ultrapassando a questão governamental para atingir toda a sociedade civil que a classe dominante legitima a sua hegemonia.

Diante desta realidade, fica claro, então, que o Estado, preocupado em manter as colunas de sustentação do seu poder, não tem mais como desconsiderar, na formação de suas políticas públicas, as condições de vida e o trabalho da classe dominada. Além disso, o aparelho estatal para garantir os níveis de produtividade exigidos pela expansão industrial exacerbada, se vê compelido, também, a suprir através da oferta de serviços sociais, as mazelas provocadas pelo processo de empobrecimento, relativo ou absoluto, da crescente massa de trabalhadores urbanos que serve ao capital.

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Fonte: Clip-art

Vale ressaltar que classe trabalhadora não é só aqueles indivíduos que estão participando ativamente do mercado de trabalho, ou seja, os que estão, efetivamente, empregados. Esta noção de classe engloba, também, a população de trabalhadores que excedem, momentaneamente, às necessidades do capital, o “exército industrial de reserva”, formado por aquelas pessoas que estão aptas para o trabalho, mas, não encontram emprego. Como o exército industrial de reserva, não tem a quem vender sua força de trabalho, não recebe salário, logo não está apto para o consumo, comprometendo a lógica capitalista. Para sobreviver, estas pessoas que estão fora do mercado de trabalho passam a depender da benesse da classe dominante. Contudo, os capitalistas, embora pressionados por toda a sociedade a assumir os custos do seu sistema, tentam de todas as formas livrar-se desta carga, aumentando ainda mais as condições de vida subhumanas dos trabalhadores “livres”, a fim de que o Estado passe a intervir, através das suas políticas sociais com a prestação de serviços sociais, pagos pelos impostos recolhidos por toda a sociedade, inclusive os próprios trabalhadores. Por auxiliar no processo de reprodução da classe trabalhadora, os serviços sociais, apesar de não estarem diretamente ligados à função produtiva do capital, po-


capitalista traz consigo uma série de atividades que apesar de não serem diretamente atreladas à sua produção são essenciais ou auxiliam a circulação e produção do capital. Tais atividades, embora não gerem valor permitem que o trabalho produtivo seja mais eficiente, tornando-se deste modo, também, uma fonte geradora de lucro. O Estado começa a incorporar, paulatinamente, os encargos sociais frente à sociedade civil. A noção de cidadania passa a ser assumida como um dos direitos sociais do trabalhador. A noção de cidadania traz embutida em si a idéia de que todos são

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dem ser inclusos nos custos indiretos de sua produção, tendo em vista que o sistema

iguais perante a sociedade, têm os mesmos direitos, deveres e oportunidades. Contraditoriamente, o nosso sistema capitalista busca através da concepção de cidadania e da prestação de serviços sociais, mascarar a relação desigual sem a qual o sistema capitalista não existe. Os serviços sociais são vendidos como a mais pura expressão de cidadania, visto que eles são direitos de qualquer cidadão, embora, praticamente, só usufruam deles àqueles que não possuem terra e capital suficiente para patrocinar a sua subsistência e por isso precisam transformar sua força vital (física e/ou mental) em mercadoria e, ainda assim, não conseguem obter o padrão mínimo de vida para ser considerado um cidadão. Os serviços sociais, prestados pelo Estado, são custeados por uma parcela da riqueza gerada por toda a sociedade – o salário do trabalhador, a renda advinda dos donos de terras, o lucro e os juros gerados pelo capital – recolhida por meio do pa- ________________________ gamento de impostos e taxas governamentais. Nesse sentido, o Estado, logo a classe ________________________ dominante, se apropria de parte do valor produzido pela classe trabalhadora, para ________________________ depois devolvê-lo, com uma nova roupagem, aos mesmos trabalhadores através da ________________________ concessão de serviços sociais. Ao serem transmutados em serviços sociais, os valores que foram subtraídos da classe trabalhadora pelo Estado e pelos capitalistas, retornam para estes em forma de favor, como se estivessem sendo doados pelos representantes estatais ou empresariais, graças aos seus posicionamentos humanitários. Contudo, se os trabalhadores não se organizassem na busca de conquistas por melhores condições de vida e trabalho, este valor não retornaria à sua classe. Os serviços sociais representam conquistas do movimento operário na sua luta pela cidadania e não um ato de solidariedade ou benesse do Estado ou classe dominante. Por outro lado, muitas vezes Estado e capital, incorporam reivindicações da classe operária como: melhores salários, saúde, moradia, educação e cultura, por exemplo, para depois devolvê-los aos trabalhadores como benefícios indiretos, controlados, racional e burocraticamente, por instituições assistenciais, na maioria das vezes estatais que deste modo, enfraquecem a mobilização operária e ao mesmo tempo trazem para si os ganhos da prestação de tais serviços. Na maioria das vezes, os serviços sociais são utilizados pela classe dominante, através do aparelho do Estado “[...] como uma atividade auxiliar e subsidiaria no exercício do controle social e na difusão da ideologia da classe dominante junto à classe trabalhadora”. (IAMAMOTO; CARVALHO, 1988, p.94). O Estado, ao regular os salários e as relações trabalhistas, assim como as políticas públicas, assume, então, uma posição de bem feitor social. Mas, sua intenção maior

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é, como representante indireto dos donos dos meios de produção, fragmentar a mobilização operária, a fim de continuar controlando-os junto com os meios de produção e, concomitantemente, garantir aos capitalistas a manutenção de suas altas taxas de lucratividade, via exploração do trabalhador.. Os serviços sociais são dados para estas pessoas, visando atender apenas alguns fragmentos da sua vida social como: moradia, alimentação, lazer, saúde, etc. Vale a pena chamar atenção para o fato de que, curiosamente, quando oferecidos pelas empresas privadas aos seus empregados, os serviços sociais são chamados de salários indiretos, pois são encarados pelos detentores do poder como uma complementação salarial. Opção bastante vantajosa para o empresariado, uma vez que o salário indireto não representa a elevação do salário real – aquele percebido em dinheiro, o salário líquido –, ainda podem ser descontados, de modo integral ou fragmentado, dos impostos recolhidos para o governo ou até mesmo dos próprios beneficiários, ou seja, do próprio trabalhador. Mais, uma vez, os capitalistas saem ganhando, pois os serviços sociais são transformados em mais uma maneira de reduzir os custos de reprodução da classe trabalhadora. Soma-se a mais esta vantagem da classe dominante, o fato da qualidade dos serviços oferecidos aos seus empregados, estarem diretamente atrelados à qualidade da rentabilidade que estes últimos conquistam para as empresas. Senso assim, na ótica dos detentores do capital “[...] a filantropia é redefinida: a ‘ajuda’ passa a ser concedida

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como investimento, que é o principio que preside a organização dos serviços sociais”. (IAMAMOTO; CARVALHO, 1988, p. 101). Fica claro, então, que os serviços sociais são mais um meio de elevar a lucratividade do capital, no momento em que contribuem para a manutenção dos equilíbrios mentais e físicos dos empregados, evitando, inclusive, possíveis focos de tensão que possam por em risco a “paz social” fundamental para a maximização do processo de exploração dos trabalhadores. Alguns destes serviços, diante da pressão da especialização da produção e dos avanços tecnológicos, como por exemplo, os prestados atualmente pelo Serviço Social da Indústria (SESI), direcionados para o ensino profissionalizante visam suprir o mercado de trabalho de uma força de trabalho capaz de atender as exigências do mundo global. Para finalizar a pequena lista dos sentidos que podem ser dados à implementação dos serviços sociais por parte do Estado, é preciso lembrar mais uma vez, que eles servem, também, como um mecanismo efetivo para a manutenção e perpetuação das condições mínimas de reprodução do exército industrial de reserva. O exército industrial de reserva é um grande aliado dos empresários, pois permite a ampliação das já elevadas taxas de lucratividade do capital, no momento em que frente à demanda dos donos dos meios de produção, alargam a oferta de mão-deobra, concorrendo com seus próprios pares (outros proletários), empurram os salários para baixo. Neste sentido, já virou lugar comum afirmar que os serviços assistenciais prestados aos trabalhadores, excluídos do mercado de trabalho atendem, substancialmente, aos interesses da classe capitalista ao garantirem a existência constante de força de trabalho excedente e de baixíssimo custo.


atrelado às relações sociais, provoca novos conflitos, novos anseios e novos profissionais cada vez mais qualificados, de acordo com os critérios de racionalidade e excelência próprias da sociedade capitalista, que surge a figura do Assistente Social enquanto profissional inserido na divisão social do trabalho. Iamamoto e Carvalho (1988, p. 89-90) afirmam:

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E assim, envolto nesta conjuntura onde o crescimento das forças de produção,

Dentro desse panorama vigente na sociedade, poder-se-ia caracterizar o Serviço Social como uma tecnologia social e o profissional como um técnico cuja atuação é, geralmente, mediatizada pela prestação de serviços sociais em instituições que implementam políticas sociais específicas, sendo nesse sentido relevante indagar-se sobre o significado desses serviços na sociedade vigente.

Verifica-se, desse modo, que é fundamental para a práxis do assistente social em formação, conhecer os agentes que se tornaram os precursores das atividades assistenciais enquanto profissão.

SÍNTESE Buscamos conhecer nesta aula os mecanismos do modo de produção capitalista. Tal compreensão é fundamental para a compreensão do Serviço Social, visto que a profissão nasce no berço o capitalismo. Na próxima aula, mergulharemos na origem do Serviço Social, a partir do conhecimento dos seus precursores na Europa e nos Estados Unidos.

QUESTÃO PARA REFLEXÃO Explique, resumidamente, quais foram os acontecimentos que provocaram o surgimento do capitalismo e qual o interesse dos capitalistas em prestar serviços sociais para a classe trabalhadora. Que tal adicionar esta discussão em nosso fórum?

LEITURAS INDICADAS GOMES, Carlos. Estrutura Feudal i n_____ Antecedentes do capitalismo. Disponível em: http://www.eumed.net/libros/2008a/372/ESTRUTURA%20FEUDAL.htm Acesso em: 04/04/2010. O FEUDALISMO. Disponível em: http://www.historianet.com.br/conteudo/default. aspx?codigo=295 Acesso em: 04/04/2010.

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REFERÊNCIAS CARMO, Paulo Sérgio do. A ideologia do trabalho. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2005.

IAMAMOTO, Marilda Vilela e CARVALHO, Raul de. Relações sociais e serviço social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 6. ed. São Paulo: Cortez, 1988.

NETTO, José Paulo. Capitalismo monopolista e serviço social. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

TRINDADE, José Damião de Lima. História social dos direitos humanos. São Paulo: Peirópolis, 2002.

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CIAL NA EUROPA E NOS ESTADOS UNIDOS Autora: Patrícia Dantas Vergasta

“A história é êmula do tempo, repositório dos fatos, testemunha do

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AULA 02 - OS PRECURSORES DO SERVIÇO SO-

passado, exemplo do presente, advertência do futuro.”

Miguel de Cervantes

. Olá!

Após refletirmos na última aula sobre o modo de produção capitalista, vamos conhecer, agora, os precursores e pioneiros do Serviço Social na Europa e nos Estados Unidos. Nosso objetivo será compreender como essas pessoas colaboraram para as primeiras elaborações a respeito da profissão. A trajetória do Serviço Social foi traçada a partir da negação e do aprimoramento de suas práticas. Bons estudos!

OS PRIMÓRDIOS DO SERVIÇO SOCIAL NA EUROPA E NOS ESTADOS UNIDOS

A Europa foi o berço do nascimento do capitalismo. Logo, a sociedade européia foi a primeira a vivenciar todas as mazelas provocadas por este sistema que pressupõe compra e venda da força de trabalho e a luta entre classes. Os europeus, então, foram impulsionados a propor as primeiras alternativas de solução para todas estas moléstias e conflitos, dentre as quais destacamos aqui os atos caritativos e assistencialistas.

http://www.freeclipartnow.com/money-business/

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Neste cenário, entre mazelas e soluções, Octavia Hill, Florence Nightingale, Charles Loch, Samuel Barnett e sua esposa Henriette Rouland merecem um destaque especial, pois foram reconhecidos pela história como precursores do Serviço Social na Europa. Já nos Estados Unidos, quando nos referimos aos pioneiros da nossa profissão são Josephine Shaw Lowell, Edward Devine, Mary Follet, Jane Adams e Mary Richmond que aparecem em evidência. Vale destacar que tanto no continente americano quanto no europeu, as Igrejas Católica e Protestante também devem ser consideradas como grandes incentivadoras do nascimento do Serviço Social como profissão, exercida, principalmente, pelo segmento feminino.

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Fonte: Clipart

A partir de agora, nós vamos falar um pouco sobre a influência destes sujeitos desbravadores na profissionalização do Serviço Social, com base em um recorte histórico que vai da segunda metade do século XIX a meados do século XX.

DESBRAVADORES EUROPEUS Começaremos pela Inglaterra, o berço da Revolução Industrial. Entre as décadas de 50 e 60 do século XIX, frente a um quadro de extrema pobreza, provocada pelas transformações sócio-históricas vivenciadas pela Inglaterra, burgueses ligados à Igreja Protestante, incentivados pelas autoridades locais se reuniram com o objetivo de aperfeiçoar o sistema assistencial inglês. Segundo Martinelli (2006), este grupo beneficente que se autointitulava refor-


giam aos trabalhadores e que refletiam em toda a sociedade, ameaçando, inclusive, a ordem social vigente. Os reformistas sociais foram muito bem recebidos pelos detentores do poderio econômico, e destes tiveram total apoio, pois estes grupos de filantropos os ajudavam a conter a expansão desenfreada do estado de pobreza que atingia a classe trabalhadora e tornava-se uma verdadeira ameaça ao sistema capitalista. Assim, “[...] a burguesia tratou de fortalecer sua aliança com os filantropos, transformando-os em

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mistas sociais, visava estabelecer soluções alternativas para as dificuldades que atin-

importantes agentes ideológicos, responsáveis pela socialização do modo capitalista de pensar” (MARTINELLI, 2006, p. 64). Fruto das ações caritativas desenvolvidas através da aliança entre os burgueses, os ativistas da filantropia, os representantes da Igreja e o Estado, em 1869, em Londres, na Inglaterra, nasceu a Sociedade de Organização da Caridade, em que os seus membros assumiram, formalmente, frente à sociedade européia, a responsabilidade de normatizar e racionalizar as ações assistencialistas. A Fundação da Sociedade de Organização da Caridade foi muito importante, pois graças a ela entraram em cena, no palco da história, os primeiros responsáveis formais pela prática da assistência social, os Assistentes Sociais. Estes sujeitos deram vida a uma nova atividade profissional: o Serviço Social que recebeu este nome, justamente, para destacar que o seu foco era a prestação de serviços. Inspirada nas ações propostas pela Sociedade citada, Octavia Hill iniciou com o apoio de seus seguidores, uma ação educativa, pioneira, junto às famílias dos trabalhadores europeus.

Figura 1: Octavia Hill Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Octavia_Hill

Octavia Hill nasceu em 3 de Dezembro de 1838 e viveu até 13 de agosto de 1912. Considerada uma reformuladora social, essa britânica se preocupou com o bemestar das pessoas nas cidades e propôs o desenvolvimento da habitação social. She was also a founder member of the Charity Organisation Society (now the charity Family Action) which organised charitable grants and pioneered a home-visiting service that formed the basis for modern social work.Organizou doações de caridade e abriu

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caminho para visitas domiciliares que serviram de base para o trabalho social. She was a member of the Royal Commission on the Poor Laws in 1905. À frente de seu tempo, foi uma ativista ambiental. Preocupada com a racionalização das práticas propostas por Octavia Hill, Florence Nightingale passou a defender que a visita domiciliar deveria ser aplicada como um dos métodos mais adequados para este processo, influenciando de modo marcante a organização do trabalho assistencial em bases científicas.

Figura 2: Florence Nightingale Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Florence_Nightingale

Florence Nightingale, nasceu em 12 de Maio de 1820 e viveu até 13 de Agosto 1910, foi uma enfermeira que ficou famosa por ser pioneira no tratamento a feridos de guerra. Ficou conhecida na história pelo apelido de “A dama da lâmpada”, pelo fato de servir-se deste instrumento para auxiliar na iluminação ao auxiliar os feridos durante a noite. Não aceitava o papel destinado as mulheres de tornar-se esposa submissa e, através da enfermagem, decidiu se dedicar à caridade; preocupava-se com as condições de tratamento médico dos mais pobres e indigentes. Juntamente com diaconisas e irmãs de caridade, Florence Nightingale realizava visitas domiciliares, objetivando minimizar os sentimentos físicos e sociais de pobres doentes. Desenvolveu, ainda, atividades no âmbito da educação familiar e social com moradores de bairros operários. Em 1875, também inspirado nos ideais de Octavia Hill, Charles Loch passa a incentivar a reorganização e expansão dos trabalhos assistenciais

Figura 3: Charles Loch Veja a imagem no link abaixo: Fonte: http://www.nationalgalleries.org/media_collection/18/PG%203181.jpg


estar dos pobres e desfavorecidos. Trouxe como novidade a necessidade de criação de um local específico para o atendimento da população necessitada. Through pamphlets and other publications, letters to the press and public lectures, and by lobbying where and whenever he could, Loch made a great contribution to welfare policy and legislation. Através de folhetos e outras publicações contribuiu para a política social e para a legislação relacionada aos mais necessitados. Aos poucos Loch foi ganhando cada vez mais adeptos e, em 1884, o pastor Sa-

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Charles Loch viveu entre 1849 e 1923. Dedicou sua vida para melhorar o bem-

muel Barnett e sua mulher Henriette Rouland inauguraram, também em Londres, o Toynbee Hall, um Centro de Ação Social destinado aos mais necessitados, trabalhadores ou não. Samuel Augustus Barnett nasceu em 8 de fevereiro de 1844 e faleceu em 17 de junho de 1913. Foi um padre anglicano e reformador social. Destacou-se por buscar auxiliar as pessoas para além da concessão de esmolas.

Barnett [...] ao se deparar com os vários problemas da Cidade de Whitechapel, percebeu que estes não podiam ser resolvidos apenas por atuação individual e através de esmolas, fazia-se necessária à conscientização da sociedade para os direitos das pessoas (RODRIGUES, 2006, p. 23).

Percebe-se que Barnett preocupava-se com a garantia de direitos, superando a ideia da ajuda. Henrietta Barnett nasceu em 1851 e faleceu em 1936. Desenvolveu trabalhos com crianças e mulheres. Valorizava o papel das mulheres como mães e pacificadoras, capazes de difundir a luta de classes (KOVEN, 2004 apud SMITH, 2007). Henrietta Barnett’s was a formidable social innovator. Henrietta Barnett apresentou inovações na área social e as desenvolveu em parceria com Samuel Barnett (SMITH, 2007). Theirs was one of several partnerships of husband and wife which have contributed so notably to English public life... O modelo assistencial inglês antecedeu a formação dos centros e agências sociais, organizados com base na ideologia da classe dominante. Dessa forma, o Serviço Social foi se expandindo e ainda na década de 1880, o Estado passou a incluir nas equipes profissionais de suas instituições de saúde o Assistente Social. A década de 1880 foi muito importante para o Serviço Social, pois a Sociedade da Organização da Caridade se solidificou e cresceu a tal ponto que ultrapassou as fronteiras da Europa. Foi assim que em 1882, nos Estados Unidos, Josephine Shaw Lowell fundou em Nova Iorque a primeira sede desta Sociedade, na América. Após 11 anos realizou o primeiro curso de Formação de Visitadoras Sociais Voluntárias.

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Figura 4: Josephine Shaw Lowell Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Josephine_Shaw_Lowell

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A Sociedade de Organização da Caridade, entre o fim do século XIX e início do XX, tinha como sua principal preocupação o embasamento científico das ações assistenciais, concomitante ao aumento do seu próprio efetivo. Este fato fez com que os Assistentes Sociais deixassem de lado a atenção ao acirramento dos problemas sociais. Este posicionamento alienado levou estes profissionais a não perceberem que serviam ao sistema capitalista; deviam sua existência à existência dos males sociais (MARX, apud MARTINELLI, 2006). Toda a mobilização em prol da formação científica do agente assistencialista fez com que antes mesmo do início do século XX, mais precisamente em 1893, o primeiro Curso de Formação de Visitadores Sociais Voluntários fosse criado em Londres, sob responsabilidade da sede inglesa da Sociedade de Organização da Caridade. Esta iniciativa foi tão bem aceita pela sociedade que no ano seguinte as sedes da Sociedade, situadas nas cidades americanas de Cincinatti e Wisconsin, também ofereceram suas primeiras turmas. Vamos conhecer a partir de agora, a trajetória dos colaboradores norte-americanos.

DESBRAVADORES NORTE-AMERICANOS Josephine Shaw Lowell, juntamente com Edward Devine, em Nova Iorque, foram alguns dos defensores da técnica de visita domiciliar. Sendo que este último em


luntários qualificados. A visita domiciliar era um método usado pelos Assistentes Sociais, onde eram investigadas as condições de saúde e moradia dos trabalhadores in loco e, ao mesmo tempo, reproduzia-se a ideologia capitalista.

Fonte:Clipart

Mary Richmond, membro da Sociedade de Organização da Caridade da localidade de Baltimore, compartilhava com a ótica Devineana. Ela entendia que só uma escola especializada no ensino da Filantropia Aplicada poderia qualificar adequadamente este profissional, por isto, lutou muito pela criação das Escolas de Serviço Social.

Figura 5: Mary Richmond Veja a imagem no link abaixo: Fonte: http://mp.natlib.govt.nz/detail/?id=20635&l=en

Em 1897, na Conferência Nacional de Caridade e Correção, em Toronto, Mary Richmond aproveitou a oportunidade para disseminar entre seus participantes este sonho. Seus sábios argumentos convenceram Edward Devine, em 1898, então secretário da Sociedade de Organização da Caridade de Nova Iorque, a implantar este curso em sua cidade. A sociedade recebeu este curso com tanto êxito que, no ano seguinte, Nova Iorque já possuía a Training School in Applied Philantropy, sua primeira Escola de Filantropia Aplicada.

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1897 chamava a atenção para a necessidade, urgente, da formação de visitadores vo-

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Acolhendo a concepção dominante na sociedade burguesa de que

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aos problemas sociais estavam associados problemas de caráter, Richmond concebia a tarefa assistencial como eminentemente reintegradora e reformadora do caráter. Atribuía grande importância ao diagnóstico social como estratégia para promover tal reforma e para reintegrar o indivíduo na sociedade. (MARTINELLI, 2006, p. 106).

Contrapondo-se a Richmond, Mary Follet e Jane Adams, pregavam que a ação social precisava atuar em uma esfera mais global, preocupando-se com aspectos como a gestão de conflitos sociais e as relações industriais. Contudo, os ideais de Richmond agradaram muito mais a classe dominante, principalmente, porque contribuíam para devolver os operários para muitos postos de trabalho.

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Figura 6: Mary Follet Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Mary_Parker_Follett_%281868-1933%29.jpg

Mary Parker Follett contribuiu com o estudo da natureza e das funções do Serviço Social no trabalho. Suas teorias estabeleceram a lei da situação, com a finalidade de resolver conflitos, interagindo pessoas e fatos de maneiras circulares, recíprocas e a teoria da integração seria esse meio de aproximar diferenças (ESTEVÃO, 1985 apud RODRIGUES, 2006).

Figura 7: Jane Addams Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Jane_Addams


onde qualquer classe social podia cooperar com toda a vizinhança, de forma a organizar, executar e levar à reforma do ambiente social. Orientava os residentes a despertarem para a consciência social, de modo a beneficiar não só um grupo de pessoas, mas, - para o bem de todos - como movimento trabalhista, a criação de sindicatos. Rejeitava a caridade (RODRIGUES, 2006). Richmond considerava que termos como: ação social, assistência social, caridade, bem-estar social, filantropia e beneficência, usados por outras visitadoras sociais,

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Jane Addams fundou o Neighborhood Center (Centro de Vizinhança), local

não definiam claramente sua proposta, pois, na perspectiva do trabalho social, este profissional que atua em prol do trabalhador e da sua família era, também, antes de tudo, um trabalhador. Sendo assim, os representantes do Estado e da burguesia acreditavam que ao denominar sua prática de trabalho social, ela incentivava os trabalhadores a legitimarem esta atividade, incutindo nos proletários a ideia de que todas estas ações foram criadas para atendê-los. Graças à qualidade do trabalho desenvolvido por estas visitadoras sociais domiciliares, cidades americanas como Massachusetts, Boston e Chicago estabeleceram que nos tribunais de justiça, os casos que envolvessem crianças e adolescentes deveriam ser acompanhados por um Assistente Social.

SURGIMENTO DAS PRIMEIRAS ESCOLAS DE SERVIÇO SOCIAL

Na Europa, foi a Holanda o primeiro país a implantar em 1899, mais precisamente em Amsterdã, a primeira escola de Serviço Social do continente. Já a Alemanha implantou a sua primeira escola para Assistentes Sociais somente em 1908, fruto dos cursos para agentes sociais implementados por Alice Salomon, nove anos antes. Como se pode ver, a partir de então os cursos de Serviço Social foram se difundindo por toda a Europa e Estados Unidos.

Em 1907, portanto apenas vinte e cinco anos após, os registros apontavam para a existência de 180 sedes naquele país (Estados Unidos, grifo nosso). [...] Em 1908, fundou-se na Inglaterra a primeira escola de Serviço Social, não ainda com esta denominação, porém já incorporada à Universidade de Birmingham. Logo em seguida foram fundadas duas escolas em Paris, uma em 1911, de orientação católica, e outra, em 1913, de orientação protestante (MARTINELLI, 2006, p.104-107).

Conforme a citação anterior, a partir de 1911, a França tornou-se uma grande disseminadora da vertente católica da profissão, pois logo depois de inaugurar sua primeira escola de Serviço Social, incentivou a criação de diversos núcleos que reuniam

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assistentes sociais para discutir assuntos como: a doutrina social da Igreja Católica e sua influência na prática profissional e as suas relações com as questões sociais. Em pouco tempo, estes movimentos se multiplicaram na França e atingiram toda a Europa. Enquanto isto, de acordo com um estudo encomendado pela Escola de Filantropia a Edward Devine e Mary Van Kleec nos Estados Unidos, em 1915, Nova Iorque já possuía, aproximadamente, quatro mil assistentes sociais trabalhando em suas instituições públicas (MARTINELLI, 2006). Sem dúvida, a expansão das escolas que visavam preparar agentes sociais veio profissionalizar esta prática, ao desenvolver conhecimentos, técnicas e métodos específicos, desvinculando-a da simples ação caritativa e/ou religiosa. Pois, os assistentes sociais de agora em diante precisavam ter objetivos mais amplos, suas ações tinham que ter suporte teórico e conceitual próprios para a sua profissão. Por isto, em 1916, a Sociedade de Organização da Caridade, percebendo necessidade da profissionalização da profissão, organizou, em Nova Iorque, a I Conferência Nacional de Trabalhadores Sociais. Vale salientar que o termo “Trabalhador Social” ou “Social Work” foi proposto a partir dos estudos científicos e práticos da norte-americana Mary Richmond, contrapondo-se à concepção inglesa do “Social Service”. Os adeptos da visão americana acreditavam que a palavra work enfatizava o caráter

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científico-profissional das ações dos agentes sociais, distanciando-os da imagem européia de Serviço Social, que vinha carregada de voluntariado, assistencialismo, filantropia, caridade, etc., fruto de uma inspiração pessoal e/ou religiosa. Surge então, na história do Serviço Social uma dicotomia entre as concepções européias e norte-americanas sobre o significado da nossa profissão. Mas, independente do posicionamento ideológico, um fato nos chama atenção: “[...] a questão da remuneração era pouco relevante e a inserção do Serviço Social nos quadros da divisão do trabalho atendia mais à exigência da sociedade que se moldava ao sistema capitalista do que a pressão dos próprios agentes”. (MARTINELLI, 2006, p. 112). Vamos, a partir de agora, conhecer, um pouco, a trajetória que a institucionalização da nossa profissão percorreu em cada um destes continentes: o europeu e o norte-americano.

INSTITUCIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NA EUROPA E ESTADOS UNIDOS

Nos Estados Unidos, como já foi dito anteriormente, a expressão “Trabalho Social” passou a ser adotada no momento em que as Sociedades de Organização da Caridade lutavam pela profissionalização do Serviço Social, com o fito de torná-lo autônomo, libertando-o da pesada influência canônica. Outro forte marco na história americana da nossa profissão foi o lançamento


pregava, de forma veemente, a necessidade do trabalho social individual. A autora considerava que era a união de indivíduos que formava a base da sociedade, por isto era, exatamente, a partir deles que os trabalhadores sociais deveriam centrar suas práticas, com o intento de possibilitar o correto funcionamento da sociedade. Em 1919, nasce em Nova Iorque a Escola de Trabalho Social como resultado da integração da Escola de Filantropia Aplicada à Universidade de Colúmbia. Em 1920, nesta mesma cidade foi criada a Associação Nacional de Trabalhadores Sociais, fruto

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do Livro de Mary Richmond, em 1917, denominado “Diagnóstico Social”, em que ela

da luta do grande contingente de agentes sociais que buscavam se organizar para constituir, formalmente, uma organização que pudesse representá-los e defendê-los como categoria profissional na sociedade americana. Com o passar do tempo, esta associação se fortaleceu e ganhou reconhecimento social, incorporando, inclusive, na década de 1940, a Sociedade da Organização da Caridade. Já na Europa, as Sociedades de Organização da Caridade optaram por perpetuar termos como Serviço Social e Assistente Social, pois, a intenção era reforçar que esta profissão tinha, antes de qualquer coisa, a intenção de servir, por meio da doação pessoal. Esta vertente altruísta casava, perfeitamente, com os ideais da Igreja Católica que com a expansão do capitalismo passava a se preocupar, cada vez mais, com as questões sociais resultantes da relação capital-trabalho, indo de encontro tanto a este regime político-econômico como às suas consequentes mazelas. Pois, os católicos entendiam que o Capitalismo feria, gravemente, o que pregava a ética cristã. Esta afinidade entre o Serviço Social e a Igreja Católica, se olharmos além das aparências, nos revela que a esta última interessava mesmo ampliar o raio de ação e difusão do catolicismo por todos os países da Europa e suas colônias, e as técnicas e os saberes produzidos pelos Assistentes Sociais eram perfeitos para convalidar sua ideologia junto à população trabalhadora. Enquanto isto, completamente imerso nesse jogo de interesses mútuos, o Serviço Social apoiava-se na consistente estrutura física, política e econômica que a Igreja possuía em todo o continente europeu, para disseminar suas ações na sociedade, incutindo na população a sua legitimação como profissão. A história nos mostra que, dentre os países europeus, os que mais se contaminaram com a ligação da doutrina da Igreja Católica às práticas do Serviço Social foram Bélgica, Espanha, França, Itália e Portugal. Na Europa, merece destaque a contribuição de René Sand. Foi médico sanitarista, voltado para a Saúde Pública, Medicina Social e o Serviço Social. Idealizou e fundou as Conferências Internacionais de Bem-Estar Social, e conectou-se com Associação Internacional das Escolas de Serviço Social (IASSW). Organizou as Conferências Internacionais de serviço Social, que tinham o objetivo de socializar documentações, contatos pessoais, experiências, de modo a proporcionar dignidade e autoridade a todos na atividade profissional de Serviço Social (RODRIGUES, 2006).

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Figura 8: René sand

Veja a imagem no link abaixo: Fonte: www.socwork.net/2007/1/historicalportraits/eilers

Outro traço interessante sobre o desenvolvimento do Serviço Social europeu foi o uso da intervenção grupal em detrimento da ação individual, de cunho mais psicanalítico, proposta por Richmond e seus adeptos norte-americanos. Os Assistentes Sociais da Europa acreditavam que era preciso entender como se davam as relações sociais, a fim de evitar ou corrigir os conflitos individuais que prejudicavam toda a ordem social. Por isto, eles consideravam fundamental buscar respaldo em conhecimentos, teorias, métodos e técnicas que respaldassem suas ações de modo científico, e ao mesmo tempo, possibilitassem uma melhor e/ou maior inserção e apreensão dos problemas que surgiam neste contexto social. Daí nasceu uma relação muito próxima com a Sociologia e a Economia. E assim, chegamos à década de 1940, com o perigo iminente da segunda Guerra Mundial, vivenciando o mesmo movimento do início do século, marcado pela progressiva expansão e institucionalização do Serviço Social. A esta altura o próprio Estado já empregava muitos assistentes sociais para realizar tarefas assistencialistas e de dominação-controle (IAMAMOTO; CARVALHO, 1988).

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Com o fim da guerra mundial, a Europa, os Estados Unidos e, inclusive, a América Latina já contavam com mais de 200 escolas de Serviço Social. E nossa profissão já atuava em diversos segmentos, subsidiados pelo setor público e/ou privado, como: o médico, o educacional, o jurídico, o comunitário, o laboral, etc. Com o reconhecimento do Serviço Social como categoria profissional do mundo capitalista, os assistentes sociais passaram a se reunir, com mais regularidade, para discutir questões referentes ao futuro desta profissão.

SÍNTESE

Nesta aula tivemos a oportunidade de conhecer os precursores do Serviço Social na Europa e nos Estados Unidos. O estudo e análise de tais contribuições colaboram para a compreensão da profissão hoje. É possível verificar a evolução teórica e metodológica do Serviço Social. Na próxima aula, vamos descobrir como se deu o surgimento da profissão na América Latina. A gente se encontra lá!

QUESTÃO PARA REFLEXÃO A partir do estudo deste módulo escolha um dos precursores do Serviço Social, aprofunde a pesquisa sobre o mesmo e compartilhe suas descobertas nos fóruns do nosso AVA.


Florence Nightingale. Disponível em: http://www.pucrs.br/famat/statweb/historia/ daestatistica/biografias/Nigthingale.htm

REFERÊNCIAS

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LEITURA INDICADA

IAMAMOTO, Marilda Vilela; CARVALHO, Raul de. Relações sociais e serviço social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 6. ed. São Paulo: Cortez, 1988.

MARTINELLI, Maria Lúcia. Serviço social: identidade e alienação. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

RODRIGUES, Maria de Sousa. Intervenção profissional e interface entre assistentes sociais e operadores de direito nos núcleos de prática jurídica. Tese de Doutorado. PUC Rio Grande do Sul, Porto AlegreRS, 2006.

SMITH, M.K. Henrietta Barnett. A reforma social e a construção da comunidade, a Enciclopédia da educação informal. Disponível em: < http://www.infed.org/thinkers/henrietta_barnett.htm>. Acesso em: 29 abr. 2010.

Dame Henrietta Octavia Weston Barnett ( née Rowland ) (1851-1936) was born in Clapham, London.

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DO SERVIÇO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA Autora: Patrícia Dantas Vergasta

“Nós na América Latina, só podemos ser indignados ou resignados. E eu não vou me resignar nunca.”

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AULA 03 – O PROCESSO DE CONSTITUIÇÃO

Darcy Ribeiro

Olá, querido(a) discente,

Pronto(a) para mais uma etapa de nossa caminhada? Já estudamos muitos temas introdutórios e importantes no primeiro semestre. E, após falarmos sobre o capitalismo e os precursores da profissão, veremos como se consolidou o Serviço Social na América Latina. Iremos estudar brevemente o processo de industrialização propulsor do movimento que legitimou o Serviço Social e, com mais afinco, verificar o processo de inserção e sedimentação da profissão em nosso continente, seus movimentos precedentes e suas perspectivas peculiares. Mãos a obra!

________________________ ________________________ ________________________ O SERVIÇO SOCIAL NA AMÉRICA LATINA ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Delinear historicamente o processo de constituição do Serviço Social latino- ________________________ americano, traçando e explicando suas origens responderá, sistematicamente, a ques- ________________________ tionamentos que permeiam a historicidade da profissão. Então vamos conhecer a tra- ________________________ jetória do Serviço Social na América Latina! ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Bons estudos!

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Am%C3%A9rica_Latina


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É preciso, nesse ínterim, situar o Serviço Social a partir de teorias que precederam seu panorama continental e verificar os discursos que deram margem a questionamentos a cerca das transformações sofridas pela profissão. A partir de definições elaboradas e determinadas pela profissão na Europa, em textos precursores, o Serviço Social encontrou parâmetros norteadores para sua militância em nosso continente. As propostas de trabalho, cumuladas com ações registradas e documentos procedimentais, inauguraram na América Latina uma espécie de extensão do trabalho tradicional desenvolvido na Europa. Deste modo, “[...] menciona-se pouco ou nada dos precedentes remotos que a profissão teria em nosso mundo” (CASTRO, 2006, p. 29). Em 1925, no Chile, foi fundada a primeira escola de Serviço Social que se tem notícias no ambiente latino-americano.

________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Chile ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ De acordo com Ander Egg: ________________________ ________________________ ________________________ Desde o seu nascimento, o Serviço Social latino-americano recebeu ________________________ forte e decisiva influência externa. Não é surpreendente que a sua ________________________ concepção tenha sido basicamente, a de um mero reflexo. Entre ________________________ 1925 e 1940, aproximadamente, foi tributário da Europa, em espe________________________ cial sob o influxo belga, francês e alemão; a partir de 1940, passou a ter o exclusivo solo norte-americano (ANDER EGG apud CASTRO, ________________________ 2006, p. 29-30). ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ O responsável pela fundação da primeira escola de Serviço Social na América


borou para a sedimentação da profissão, projetando-a socialmente, sendo apontada como uma derivação da medicina, uma subprofissão (CASTRO, 2006). Contudo, haveria de deixar claro que a profissão não deveria ser confundida com o exercício solidário e beneficente do assistencialismo, pois deveria estar sempre amparada em “preocupações técnico-científicas” (ANDER EGG apud CASTRO, 2006, p.31).

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Latina foi Dr. Alejandro Del Río. E o fato de ter sido um médico o seu fundador corro-

Fonte: http://www.gifmania.com.pt/medicina/medicos/

Ao examinar o início da militância da profissão na América latina, podemos ve- ________________________

rificar e afirmar que o surgimento do Serviço Social se deu em observância ao modelo ________________________ já existente no Velho Mundo, ou seja, havia uma matriz basilar que impedia que fosse ________________________ dito que a profissão simplesmente surgiu, sem qualquer precedente, com a fundação ________________________ da primeira escola em 1925. Justifica-se essa assertiva ao passo que nos remetemos à ________________________ Europa do momento em que se torna transparente a expansão capitalista associada a ________________________ conflitos e disparidades de classes sociais.

[...] Ao lado da indiscutível prosperidade que se registra no século XIX e da acumulação crescente de riqueza pela classe possuidora, começam a preocupar algumas conseqüências que afetam aos despossuídos. A atenção aos pobres e desvalidos, durante a época da expansão capitalista, surge principalmente nos ambientes cristãos (protestantes e católicos), implicando que a assistência social que se organiza então se assemelhe àquela desenvolvida na Idade Média (ANDER EGG apud CASTRO, 2006, p. 32-33).

De acordo com a citação de Ander Egg, o cenário resultante do modo de produção capitalista propiciou o surgimento de trabalhos assistenciais voltados aos indivíduos desfavorecidos economicamente. Nesse sentido, destacam-se as ações da Igreja.

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As formas de ação social, surgidas na Europa com o propósito de minimizar as consequências do desenvolvimento capitalista europeu, operaram na história do Serviço Social de modo a intervir no confronto produzido entre capitalismo e caridade filantrópica, configuração da classe operária e proletariado e burguesia. Este fenômeno, consequentemente, irradiou efeitos além das fronteiras européias, refletindo na América Latina as suas condições de atuação e conduzindo o surgimento do Serviço Social latino-americano ao patamar de mera repercussão daquela. O fato de o Serviço Social da América Latina ter sido uma forma de extrapolação da profissão na Europa ajudou a compreender o processo de inauguração da profissão no continente latino-americano. A sua emergência em nosso continente delineou uma nova etapa, transportando a profissão a um nível superior, formulando uma autonomia laboral sistemática e peculiar ao seu ambiente de trabalho, muito embora não seja correto afirmar que a Escola do Chile foi o marco inicial da profissão no continente, a não ser que seja tomada como referência para marcar, historicamente, o início da militância do Serviço Social latino-americano no sentido de que aí a profissão começa a impor seus próprios limites e delinear suas particularidades. Nesse sentido, reverbera os comentários de Castro (2006, p.35):

A criação de uma escola, em si mesma, não equivale à abertura de

________________________ um processo que se quer identificar como o início de uma profissão. A fundação das primeiras escolas – 1925, Chile; 1936, Brasil; 1937, ________________________ Peru – apenas revela momentos específicos de um processo de ma________________________ turação que atinge um ponto qualitativamente novo quando a pro________________________ fissão começa a se colocar sua própria reprodução de modo mais ________________________ sistemático (CASTRO, 2006, p. 35). ________________________ ________________________ ________________________ À medida que as Escolas de Serviço Social foram fundadas na América Latina, ________________________ ________________________ os profissionais foram refletindo sua prática e buscando adequações ao seu agir profis________________________ sional. O Serviço Social foi se transformando de acordo com as demandas específicas ________________________ de seus países. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Fonte: Adaptação sobre Clipart ________________________ ________________________


nalização do Serviço Social na América Latina.

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Nesse sentido, vamos refletir, a seguir, um pouco sobre o processo de profissio-

Fonte: http://www.gifmania.com.pt/homens/pensando/

A profissionalização do Serviço Social na América Latina

A afirmação de novas classes sociais, advindas após o processo de mutação produzido pelo capitalismo, a inserção de capital estrangeiro (norte-americano) para estimular o processo de industrialização e a exploração do proletariado são alguns dos fatos que marcaram o Chile por volta da década de 20. Entretanto, desde o final do sé- ________________________ culo XIX, o país despontou num acelerado processo de industrialização, multiplicando ________________________ produções dos mais diversos artigos consumíveis. A classe do proletariado, influenciada pelos ideais socialistas, precursora de notável reorganização da realidade social, exigiu do Estado respostas para a nova situação que vivenciava a época. O progresso econômico do Chile foi fruto da exploração da classe operária, intensificada, no que dizia respeito à produção de cobre, principal referencial econômico do país. O sistema capitalista chileno desenvolveu-se rapidamente e, consequentemente, muitas sequelas do rápido desenvolvimento capitalista marcaram a sociedade da época em comento.

Miséria, crescimento urbano caótico, migrações de camponeses expulsos de suas terras etc., instauraram o solo fértil e propício para a emergência e a proliferação de agentes encarregados de trabalhar estes fenômenos – agentes entre os quais,naturalmente, contam-se os assistentes sociais (CASTRO, 2006, p. 37).

Não obstante à época médicos, advogados e engenheiros laborarem além das

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fronteiras de suas profissões (você há de lembrar que foi um médico quem fundou a primeira escola de Serviço Social no Chile), o processo de mutabilidade da sociedade exigiu muito mais desses profissionais, exigiu dedicação exclusiva frente às modificações na infraestrutura social. Era imprescindível a participação de um agente com níveis especiais de preparação para lidar com a crescente e implacável onda de mutação proporcionada pelo capitalismo. Esse processo promoveu diversas alterações nas modalidades de ação social, que expressaram um retrato das novas relações de produção e sociais. Exatamente, a partir deste panorama, o Serviço Social latino-americano incorporou para si contornos particulares, afastando-se da perspectiva de que se tratava apenas de um reflexo do modelo europeu da profissão, subordinado exclusivamente àquele que o influenciou. O fato é que à influência européia somaram-se diversos processos vivenciados pela esfera social do continente, expressando a maneira e as características da profissão na América Latina. Entrementes, essa influência européia não deve ser tratada apenas como um modelo de profissão. Isto porque a Europa que estamos delineando nesse estudo era a fonte inspiradora de muitos dotes almejados pelo Estado e pela Igreja. Seja por suas ideias e estratégias, seja pela organização de seus exércitos ou arquitetura, a Europa era o parâmetro compulsório para a organização interna das esferas públicas e privadas de diversos países.

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A configuração do Serviço Social na América Latina e sua influência européia podem ser explicadas a partir do momento em que havia identidade entre as situações, entre o conteúdo das ações. Havia compatibilidade entre o que já existia na Europa e o que necessitava de ação no continente latino-americano e, negar esta referência poderá levar-nos a uma compreensão equivocada dos mecanismos aplicados à realidade de cada lugar.

A influência das idéias da Europa na configuração do Serviço Social latino-americano explica-se se compreendem os nexos de subordinação estrutural (dos quais, para os nossos objetivos, destacamos os de caráter ideológico). Sem esta referência, chega-se a uma verdade parcial que pode propiciar um entendimento equivocado: pode-se situar o denominado reflexo como se ele fosse o produto de uma seleção voluntária em face de um leque de alternativas (CASTRO, 2006, p. 39).

Não se pode negar que apesar de a Europa emanar os seus reflexos para o continente latino-americano, é preciso reverberar que a iniciativa do Dr. Alejandro Del Río, à época da fundação da escola de serviço Social no Chile, foi pioneira no sentido de que, a partir do dinamismo e dos exemplos da época urgiu apresentar à sociedade premissas lúcidas e visionárias que reforçaram a compreensão das potencialidades de ação.


A Influência da Igreja no Surgimento do Serviço Social na América Latina

O desenvolvimento mencionado anteriormente, no século XX, marcou o pe-

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ríodo por causa das consequências que afetaram determinada classe da sociedade, seja pelas novas forças que se manifestavam, seja pelas tensões políticas que originavam. Logo, algumas instituições começaram a prestar atenção ao que acontecia com os menos favorecidos socialmente, tais como a Igreja, àquele tempo como a principal instituição civil organizada, que se destacou com um importante papel no período de gênese da profissão que comentamos.

Fonte: http://www.gifmania.com.pt/religiao/iglesias/index2.htm

O principal objetivo da Igreja era perpetuar suas intenções, nem sempre tão religiosas, e sedimentar a sua hegemonia frente à sociedade em processo de constantes transformações. E foi exatamente no solo fértil da ingerência do novo, o Serviço Social legitimado enquanto profissão, que a ação religiosa propôs à sociedade uma espécie de reforma cristã, estabelecendo normas de cunho abrangente e genérico e que deveriam ser observadas sob o crivo de ser a maneira adequada de tratar os problemas acarretados pelo desenvolvimento capitalista.

Desde a era medieval e avançando para épocas mais recentes que atingiram até mesmo o século XIX, a assistência era encarada com forma de controlar a pobreza e ratificar a sujeição daqueles que não tinham posses ou bens materiais. Assim, seja na assistência prestada pela burguesia, seja naquela realizada por instituições religiosas, havia sempre intenções outras além da prática da caridade. O que se buscava era perpetuar a servidão, ratificar a submissão (MARTINELLI, 2006, p. 97).

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44 Urge reverberar que a Igreja desempenhou um papel de relevância ímpar para o surgimento e desenvolvimento do Serviço Social nos países da América Latina. No período em que as novas organizações populares se estruturavam, sobretudo a classe operária, diversificados conflitos e imposições sociais denunciam lutas entre classes sobre as quais caberia ao Estado o controle adequado. As organizações operárias, muito combatentes no sentido de repudiar a exploração sofrida e em busca de respeito aos direitos dos trabalhadores, logo passaram a ser assistidas, discretamente, por mecanismos emanados da burguesia que manipulavam a sua combatividade, intervindo diretamente na “[...] defesa e ampliação do capital” (CASTRO, 2006, p. 46).

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Fonte:http://www.freeclipartnow.com/people/groups/

A forte influência cristã se revelou como instrumento de suma importância para o processo de intermediação entre o Estado burguês e a classe colaboradora e fornecedora da mão-de-obra como mercadoria, o proletariado. Isto porque, na condição de “ópio do povo” (ver link http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%93pio_do_povo), a religião seria a maneira adequada de intervir sob as reclamações demandadas da classe operária e as necessidades de intervenção do Estado eminente burguês sobre esta. E, envolto a este complexo sistema de subordinação entre força de trabalho indispensável e interesses gerais do capital, o Serviço Social aliado à Igreja encontra terreno fértil para aplicar, tecnicamente, recursos de caráter remediáveis para as apatias da sociedade.

É nesta ótica que se deve visualizar a relação Igreja-Serviço Social, pois os vínculos daquela com o assistencialismo profissional foram mudando de caráter conforme as transformações sociais reclamaram uma redefinição não só do assistencialismo católico, mas também da doutrina social da Igreja, das suas políticas e relações de poder no bojo do novo quadro emergente de forças (CASTRO, 2006, p. 47).


Graças à doutrina da Igreja, o Serviço Social experimenta uma ascensão sistemática de seus recursos técnicos. Uma vez associado à influência da Igreja e à grandeza dos acervos clericais, a profissão estaria, finalmente, conectada às incidências sociais.

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Os elementos que mais colaboraram para o surgimento do Serviço Social têm origem na Ação Católica (grifo do autor) – intelectualidade laica, estritamente ligada à hierarquia católica – que propugna, com visão messiânica, a recristianização da sociedade através de um projeto de reforma social. Estes núcleos de leigos, orientados por uma retórica política de cunho humanista e antiliberal, lançamse a uma vigorosa ação dirigida para penetrar em todas as áreas e instituições sociais, criando mecanismos de intervenção em amplos segmentos da sociedade, com a estratégia de, progressivamente, conquistar espaços importantes no aparelho de Estado. A Ação católica (e, por extensão o Serviço Social) prende-se a um projeto de recuperação da hegemonia ideológica da Igreja – incentivado oficialmente pela hierarquia e tendo como suporte as encíclicas papais -, lutando contra o materialismo liberal e contra a agitação social de cariz anarco. (CASTRO, 2006, p. 47/48).

A Igreja Católica foi a responsável por diversos processos na história da sociedade. Conectou seus objetivos com a caridade e a prática da assistência pública e visualizou mecanismos para intervir socialmente na difusão de suas ideologias em busca da reestruturação de sua hegemonia, institucionalização de seus parâmetros e sedimentação de sua influência sobre as grandes massas sociais.

[...] E como qualquer outra instituição humana, a Igreja – similarmente ao que fizera em face de revoluções precedentes – teve que recriar quer seus argumentos de poder, procurando adaptar-se às mudanças, quer às fórmulas práticas de ação que oferecia aos leigos; para isto, valeu-se tanto do contato regular que mantinha com as massas quanto dos organismos laicos de ação que, como seu sistema nervoso central, passaram a parametrar a intervenção católica (CASTRO, 2006, p. 49).

Em meio à iminência de enfraquecimento das classes que se garantiam sob a égide do poder capitalista, a Igreja desperta para providências incisivas no sentido de reagir frente à possibilidade de sucumbir com sua hegemonia influente, consequência das constantes e ameaçadoras lutas de classes que possibilitavam sensíveis mudanças no panorama social até então confortável para a Igreja e para a burguesia.

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46 Como elemento da estratégia destinada a recuperar a sua hegemonia ideológica, tanto a hierarquia católica quanto a leigos valorizaram em maior grau a ação social e a participação ativa e organizada dos crentes na vida social, criando-se, para colimar estes objetivos, os suportes de tipo legal e institucional.

Nestes cabe destacar o ensino confessional, os centros de estudo, a Ação Católica – grifo do autor -, as universidades, os sindicatos católicos, as novas formas de ação paroquiais etc. Estas respostas sincronizam-se às mudanças operadas no interior das sociedades latino-americanas, nas quais a ação da Igreja (e o trabalho dos seus agentes) perdia significativos espaços (CASTRO, 2006, p. 50-51).

As encíclicas papais, instrumentos que tratam de diversas matérias doutrinárias utilizadas pelo Papa para o seu magistério doutrinário e representam uma imprescindível ferramenta, usada nas ações políticas do ordenamento religioso (http:// pt.wikipedia.org/wiki/Encíclica), em meio à intensificação das lutas sociais, represen-

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taram um importante papel na profissionalização do Serviço Social. Podemos fazer referências a duas encíclicas que muito corroboraram para o desenvolvimento da profissão, inclusive na implementação de centros de ensino superior, seja pela inspiração ideológica, seja pela organização de seus fundamentos clericais. A encíclica, divulgada em 15 de maio de 1891, por Leão XIII, Rerum Novarum, trabalhava seus propósitos sob a égide de duas vertentes: a primeira era “A solução proposta pelo socialismo”, seguida de “A solução proposta pela Igreja”, ambas com o escopo de influir sobre a necessidade de estabelecer posicionamentos em face da questão social.

Figura: Brasão pontifício de Leão XIII http://pt.wikipedia.org/wiki/Rerum_Novarum

O seu texto fazia referências às relações de disparidade provocadas pelo capitalismo, inclusive com críticos posicionamentos a respeito da exploração desenfreada da mão-de-obra assalariada, comparando-a, por ocasião da acumulação capitalista, à escravidão propriamente dita e criticando a ganância cega dos ricos responsáveis pela exploração da força de trabalho.


Quer saber mais sobre a Rerum Novarum? Então leia o texto a seguir: http://www.vatican. va/holy_father/leo_xiii/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum_ po.html.

Criticava duramente a falta de princípios éticos na concorrência capitalista e

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laicização da sociedade, ao passo que, por outro lado, defendia o direito à propriedade como um pilar imprescindível para a constituição e manutenção das relações capitalistas, impondo-se de maneira áspera contra o socialismo e sua, segundo a encíclica, famigerada intenção de estimular a discórdia entre pobres e ricos.

A encíclica reconhece que há desigualdade legitimada pelo direito natural. Se o direito a propriedade e a organização social e do Estado, como instituição política, é direito natural e todo direito natural está sujeito a vontade de Deus, consequentemente o socialismo opera contra a vontade divina, pois nele há um embate fervoroso contra o Estado e a propriedade privada. Para a Rerum Novarum, todas as tentativas de resolver os conflitos deveriam ________________________

ser banhadas por decisões emanadas da Igreja, em ordem prioritária, haja vista que a ________________________ inadmissão de que as soluções não passassem pelo crivo da Igreja. Posteriormente, ________________________ seria observado os posicionamentos dos dirigentes do Estado, dos ricos proprietários ________________________ do capitalismo e, havendo a necessidade, o do proletariado. A intenção primordial da Igreja, por meio da encíclica papal era, sobretudo, trabalhar o assistencialismo sob o prisma da convivência pacífica das classes sociais, materializando, deste modo, não amor ao próximo e a vontade divina e sim os ideais políticos que constituem a força estrutural da Igreja.

A Igreja, ademais, chegava a este ponto respaldada por todo a sua trajetória de intervenção prática, amplamente generalizada entre as grandes massas, sustentada e reproduzida pelo papel de suas camadas de intelectuais orgânicos. A encíclica papal de 1891 visava renovar a sua concepção de mundo e instaurar-se como novo guia de orientação intelectual, e, nesta medida, introduzia elementos de conflito no seio de sua própria estrutura interna. Mas a hierarquia e a sujeição à autoridade, tanto maior quanto provinha diretamente das mais altas esferas do poder eclesiástico, eram uma garantia de que as novas concepções de mundo, organizadas no discurso da encíclica, permeariam progressivamente todo o corpo da instituição e, através dela, o conjunto das classes sociais, nas quais a Igreja sempre teve presença (CASTRO, 2006, p. 60).

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48 Percebe-se na citação de Castro que a Igreja se posicionava de modo a confirmar o seu poder junto à sociedade.

A segunda encíclica papal, datada de 1931, foi a Quadragesimo Anno. Redigida por Pio XI com o objetivo de comemorar os 40 anos da elaboração da Rerum Novarum, trazia entre as suas propostas havia a Ação Católica, que consistia num acervo de princípios e perícias de cunho indispensáveis para a organização e desenvolvimento da sociedade, através dos quais eruditos e leigos poderiam trabalhar a doutrinária da Igreja para que “influam na formação dos seus outros filhos” (CASTRO, 2006, p.63).

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Figura: Papa Pio XI Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_Pio_XI

Alguns anos antes da publicação da referida encíclica, em 1925, foi fundada em Milão a União Católica Internacional de Serviço Social (UCISS), com o objetivo de reverenciar a necessidade da efetividade do Serviço Social, assegurando seu progresso, no mundo, estimulando a instituição de escolas de serviço Social em todo o raio de influência da Igreja Católica.

Com efeito, a partir de 1925, a UCISS realizou um profícuo trabalho, sempre em estreita relação com a hierarquia católica, recebendo e difundindo, processando e aplicando a mensagem social da Igreja. Entre suas atividades, destacam-se os eventos nos quais se colocava em debate o trabalho profissional do assistente social católico. Um exemplo disso foi a sua V Conferência Internacional, celebrada em julho de 1935, em Bruxelas (Bélgica), com a participação de 550 con-


do encontro foi: ‘O Serviço Social Como Realizador da Nova Ordem Cristã’ – e da perspectiva que o tempo nos fornece hoje, bem poderíamos dizer que o que se debateu foi ‘a ordem cristã como realizadora do Serviço Social’, pois agora podemos compreender que ambos os temas correspondem a lados complementares da mesma moeda (CASTRO, 2006, p. 62-63).

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gressistas e representantes de 20 países dos 5 continentes. O tema

O Quadragesimo Anno incentivou, dentre seus vários dispositivos norteadores, o aperfeiçoamento do Serviço Social como profissão a ser amparada em técnicas especializadas e peculiares, estimulando expressamente a criação de escolas de nível superior para a formação de profissionais, devendo converter o assistencialismo artesanal em profissão manuseadora de instrumentos próprios de ação. Vale mencionar que, ao passo que a igreja estimulava a profissionalização do Serviço Social, reafirmava sua hegemonia e reforçava a fé católica dos profissionais e seus seguidores.

Conheça um pouco mais o Quadragesimo Anno acessando: http://pt.wikipedia.org/wiki/ Quadragesimo_anno

Escola Católica de Serviço Social

O interesse da Igreja em criar um centro de ensino para formar assistentes sociais competentes, conforme a técnica da Igreja, a lidar com as constantes transformações sociais do Chile, materializou-se por volta de 1929, com a inauguração da Escola Elvira Matte de Cruchaga, e seu principal objetivo era a manutenção da influência católica sob os conflitos de classe e reforçar o seu papel de orientadora da moral da sociedade. Fundada por Miguel Cruchaga Tocornal, a escola Elvira Matte de Cruchaga irradiou-se por outros países latino-americanos, demonstrando o respeito que impunha inclusive pelo fato de ter sido um homem público o seu fundador. À época, a fundação desta escola deu um tom paradoxal em relação à escola fundada por Del Río, anteriormente comentada nesse estudo. A principal diferença motivacional para a fundação das escolas diz respeito aos interesses em questão. A Escola do médico Del Río almejava uma colaboração aos interesses médicos, relegando ao serviço social, ainda que sob a égide da doutrinária católica, a condição de colaborador técnico do médico.

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A iniciativa de Del Río parte de motivações sumamente específicas,

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inseridas no campo de interesses da profissão médica. Como se sabe, e o próprio Del Río se encarregou de explicitá-lo, o ‘assistente social deveria ser um subtécnico incumbido de colaborar diretamente com o médico’. Por mais que o perfil original da profissão, esboçado pela primeira escola chilena, se colocasse sobre uma base doutrinária católica, o seu trabalho prático tinha um marco de ação bastante delimitado, pois, quase por definição, situava-se nos contornos da profissão médica (CASTRO, 2006, p. 74).

Por outro lado, a escola da Igreja objetivava trabalhar a questão social em sua amplitude espacial, independendo de estar relacionada às profissões diversas, formando agentes competentes para desenvolver e difundir profissionalmente os ensinamentos técnicos somados à doutrinária religiosa.

Merecem algum destaque certos elementos contidos no ideário da

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escola. Em primeiro lugar, salta à vista a ênfase dada ao aspecto vocação – diz-se –nos: concebe-se o Serviço Social ‘mais que uma simples profissão’. O componente da entrega incondicional, do espírito de sacrifício, do afã por cuidar tanto do corpo quanto da alma humana, que por tanto tempo acompanhou a profissão até quase como sua espinha dorsal, este componente recebe uma claríssima formulação (CASTRO, 2006, p. 74-75).

O fato de a Igreja Católica transcender suas influências além das fronteiras estimulou a formação de escolas de Serviço Social, seja no âmbito estatal, seja sob o signo de sua gestão, conferindo à profissão relação internacional mais eloquente e solidez na formação profissional. Para ingressar nas escolas católicas, cujo curso de Serviço social tinha a duração de 3 anos entre atividades teóricas e práticas, as mulheres deveriam passar por um rigoroso processo de seleção: ter entre 21 e 35 anos de idade, atestado de boa saúde, recomendação paroquial, atestado de idoneidade, ciclo de provas. Posteriormente, em 1938, a Escola Elvira Matte de Cruchaga foi escolhida pela UCISS, retro-citada, para ser o foro do Secretariado da UCISS para a América Latina, graças ao seu pioneirismo latino-americano e ao zelo da Igreja pelo exercício da profissão sob o manto dos ensinamentos da Igreja católica, com o objetivo de promover a difusão do Serviço Social católico em toda a América Latina. Em 1940, sob o crivo de uma das responsáveis pela Escola Elvira Matte de Cruchaga, Rebeca Izquierdo, foi fundada na capital argentina a Escola Católica de Serviço


1937, ano de criação da escola peruana. Na Venezuela também foi fundada uma escola sob a orientação da Escola Elvira Matte de Cruchaga, reforçando sua liderança e a ação católica sobre os leigos. Num raio de uma década, oito escolas católicas de Serviço Social foram fundadas na América Latina, inclusive Rio de Janeiro e São Paulo, todas graças ao trabalho e dedicação dos responsáveis pela Escola de Serviço Social Elvira Matte de Cruchaga. Em todas elas, percebia-se a forte influência da Igreja católica, como podemos perceber

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Social, que seguiu os passos da fundação da escola em Montevidéu, no Uruguai, em

na citação de Castro.

Naquelas rápidas palavras está admitida a busca de um espaço para a ação dos leigos católicos e, portanto, para todo o aparelho eclesiástico, que tentava novas respostas para um mundo em pleno processo de mudança. Cabia à Igreja – a partir do seu ponto de vista particular – ser a força moral orientadora deste processo, ser o justo meio que direcionasse o destino da humanidade com o seu discurso caritativo e bondoso, com a entrega incondicional de seus militantes, evitando – tanto quanto possível – que o cientificismo e o pragmatismo burgueses, ou o ameaçador “materialismo” socialista, se colocassem como alternativas ao evangelho católico (CASTRO, 2006, p. 97).

No Brasil, a fundação das escolas de Serviço Social se deu em meio à “Revolução de 30”, quando a Igreja encontrou um momento muito propício para a sua intervenção, pois o processo de industrialização se abateu no Brasil muito mais intensamente que em outros países, promovendo inúmeras crises originadas pela luta de classes e intensos movimentos do proletariado em prol de seus direitos. Foi sob essas condições que a Igreja Católica interveio de modo a somar forças com o então presidente da república, Getúlio Vargas, que reconhecia a Igreja como uma aliada fundamental, dada à natural influência e exercida sobre o povo com seus ideais religiosos.

As vantagens obtidas pela Igreja nesta etapa resultam de uma complexa interação com o governo de Vargas, que reconhecia nela um aliado apreciável a ser atraído em função da sua influência e autoridade, especialmente depois de alguns confrontos nos quais a hierarquia deu provas da sua disposição de luta (em 1931, D. Sebastião Leme não hesitou em proclamar que “... ou o Estado... reconhece o Deus do povo ou o povo não reconhece o Estado”) (CASTRO, 2006, p. 102).

Parece redundante comentar que, para os interesses da Igreja, a situação parecia confortável e fértil para a implantação de projetos religiosos, tais como “tornar facultativo o ensino religioso nas escolas públicas” (CASTRO, 2006), promovendo, tam-

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bém, a formação da “Ação Universitária Católica, do Instituto de estudos Superiores, da Associação de Bibliotecas Católicas, de círculos operários, da Confederação nacional de Operários, da Liga Eleitoral Católica e da Ação Católica, esta em 1935” (CASTRO, 2006, p. 103). Nessa mesma época de ascensão do Serviço Social no Brasil foi implementado o curso de Formação de Jovens e o CEAS – Centro de Estudos e Ação Social, proporcionando a profissionalização do Serviço Social no Brasil e fomentando a fundação da Escola Paulista de Serviço Social, em 1936, e das escolas de Serviço Social no Rio de Janeiro, a partir de 1937.

SÍNTESE Nesta aula conhecemos o processo de constituição do serviço social na América Latina. Pudemos observar a forte influência européia, bem como da Igreja católica. Na próxima aula estudaremos o deslocamento teórico do Serviço social do Neotomismo para o Funcionalismo.

QUESTÃO PARA REFLEXÃO ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________

A partir da leitura do módulo, destaque os principais fatores que colaboraram para o Surgimento do serviço social na América latina e leve a discussão em nosso AVA.

LEITURA INDICADA MANRIQUE CASTRO, Manuel. História do serviço social na América Latina. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

REFERÊNCIAS CASTRO, Manuel Manrique. História do serviço social na América Latina. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

MARTINELLI, Maria Lúcia. Serviço Social: identidade e alienação. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2006.


NEOTOMISTA PARA A CONCEPÇÃO FUNCIONALISTA Autora: Patrícia Dantas Vergasta

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AULA 04 – DESLOCAMENTO DA INFLUÊNCIA

Pois é muito mais grave corromper a fé, da qual vem a vida da alma, que falsificar dinheiro, pelo qual a vida temporal é sustentada.

São Tomás de Aquino.

Olá, querido (a) discente!

Estamos cada vez mais submersos no universo do Serviço Social! A cada etapa vencida verificamos que a sedimentação do Serviço Social em nosso país é consequência de uma série de eventos significativos e importantes para a consolidação da profissão. Estudaremos, nesse momento, a concepção funcionalista e sua influência para o Serviço Social, tecendo breves comentários sobre o neotomismo que a precedeu, de modo que as características dessas influências possam nos explicar as atuais vertentes seguidas no exercício da profissão. Boa aula! Avante!

Bons estudos!

Adentrar ao estudo da concepção funcionalista exigirá, para um melhor entendimento, perpassar por nuances teóricas acerca do deslocamento da influência neotomista para o modelo funcional, verificando as peculiaridades do tomismo e sua importância para os aspectos mais significativos do estudo do Serviço Social.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O TOMISMO Para compreender o Neotomismo, faz-se necessário entender o Tomismo, filosofia de São Tomás de Aquino (1221-1274).

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Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Tentaci%C3%B3n_de_Santo_Tom%C3%A1s_de_Aquino,_by_Diego_ Vel%C3%A1zquez.jpg

O princípio norteador do tomismo, à época adotado como filosofia oficial da Igreja, era a dignidade. São Tomás de Aquino buscava conciliar as ideias de Aristóteles

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e do Cristianismo. O tomismo era uma filosofia do Ser, baseada na fé e referendada pela teologia científica. Vamos ver o que nos diz Tomás de Aquino.

Tomás de Aquino apresentou a solução definitiva do problema das relações entre a razão e a fé. Trata-se de duas ciências: a filosofia e a teologia; a primeira funda-se no exercício da razão humana; a segunda, na revelação divina. São duas ciências independentes, mas que apresentam às vezes o objeto material comum: a existência de Deus, a essência da alma, etc. A distinção entre essas ciências deriva mais do objeto formal, pois a teologia estuda o dogma pelo método da autoridade ou revelação, ao passo que a filosofia o considera por demonstração científica ou pela razão (JUNIOR, 2001, s.p.).

De acordo com essa citação, o paralelo entre a razão e a fé era a vertente que baseava os dogmas da filosofia tomista, que demonstrava, ainda, valores de ordem abstrata ligavam o ser humano á ordem divina, devendo estar próximo a Deus, causa primeira de todas as coisas, possibilitando, desta forma, a convivência pacífica em sociedade sem intervenções nas obras superiores.


Para conhecer mais sobre a Filosofia Tomista, acesse: http://www.aquinate.net/portal/Tomismo/Tomistas/tomistas-o-que-sao.htm

http://www.mundodosfilosofos.com.br/aquino2.htm

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Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Tomismo

A INFLUÊNCIA NEOTOMISTA O neotomismo é um movimento que resgata as ideias de São Tomás de Aquino. As perspectivas neotomistas preceituavam o ser humano como ser detentor de um corpo e de uma alma, dotado de inteligibilidade e liberdade como condições intrínsecas da pessoa humana. Por isso, a sociedade deveria garantir a integridade física do homem e, consequentemente, da alma. Com capacidade para fazer escolhas, o homem deveria sobrepor à materialidade as causas espirituais, o amor com fonte de libertação e explicação aos anseios humanos, considerando a coletividade como detentora dos bens divinos, e não o ser individualizado.

Fonte: http://www.sxc.hu/photo/1057759

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Às empresas e ao governo não era permitido se sobrepor aos direitos e dignidade do ser humano. Ao Estado, segunda forma da sociedade humana (a primeira era a família), cabia o dever de organizar positivamente a sociedade, bem como efetivar a sua função moral, eminentemente espiritual, conforme o estudo em tela, subordinando-se ao fato de que o indivíduo não era um meio para o Estado, e sim este para aquele, de modo que seus objetivos de proteção dos bens temporais do homem devessem estar em fina sintonia com a religião e a Igreja como forma de tutelar, integralmente, o ser humano. Em conformidade com a visão neotomista, era inaceitável compartilhar de princípios liberais e do comunismo, haja vista estes negarem o amor por causa do individualismo predominante.

Veja a imagem no link abaixo: Fonte:http://mundofantasmo.blogspot.com/2008/07/0441-o-fantasma-do-comunismo-1882004.htm

Para a influência neotomista, qualquer filosofia moderna, que não compartilhasse com os preceitos do tomismo, estaria fadada ao equívoco e seria a única responsável pelas crises e contratempos do mundo moderno.

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As primeiras assistentes sociais brasileiras compartilhavam estas ideias. Nesse diapasão, o Serviço Social, que também refutava o liberalismo e o comunismo, buscou se posicionar sob uma doutrina de meio termo entre o individualismo e o comunismo, almejando a harmonia entre as classes sociais organizadas sobre o ideário do bem comum postulado pela filosofia neotomista (GUEDES, 2003).

Entrementes, era preciso analisar os acontecimentos sociais conforme a realidade dos fatos, observar o constante desenvolvimento social e seu reflexo nos agentes da sociedade. Era preciso, sobretudo, analisar tecnicamente as causas para pensar, metodologicamente, seus efeitos e agir sobre suas consequências, operando sistematicamente sobre a sociedade e sobre seus componentes, individualmente. Mancini (1940) fala sobre o papel que cabia ao assistente social.

Cabe, portanto, ao assistente social, segundo Mancini, desenvolver um trabalho com vistas à preservação da pessoa humana e não visando promoção da cidadania (vinculada à sobrevivência física, a dimensão do indivíduo). [...] Esta exaltação de Mancini ao homem, neste contexto, refere-se à promoção da dignidade humana, peculiaridade inerente ao homem que é criatura de Deus (Ato Puro) (MANCINI, 1940b, p. 7 apud GUEDES, 2003, p. 13).

Percebe-se que a intervenção do assistente social estava centrada no homem, que era seu objeto de intervenção na década de 30, do século XX. Ao assistente social,


da restauração do ideário comunitário. Nesse sentido, Guedes (2003) afirma:

Com relação à elevação do indivíduo à condição de pessoa, os primeiros assistentes sociais idealizavam um processo educativo erigido, sobretudo, a partir de dois atributos constitutivos neotomista da pessoa humana: a inteligibilidade e a liberdade. O homem, por ser

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cabia atuar no sentido de elevar o indivíduo à condição de pessoas humana, através

pessoa, é dotado desta inteligibilidade e pode superar sua própria condição, caso esta seja precária em termos materiais e espirituais, fortalecendo-se para sua realização enquanto pessoa humana. (GUEDES, 2003, p. 13-14)

De acordo com o pensamento de Guedes (2003), os assistentes sociais buscavam um projeto de sociedade que pudesse reconstruir a ordem social destruída pelo desrespeito à dignidade humana. Sendo assim, vinculavam sua prática profissional às diretrizes da Igreja Católica, pautando sua prática na reeducação moral.

A INFLUÊNCIA NEOTOMISTA A transição da influência neotomista para a funcionalista para o Serviço Social originou importantes reflexos no desempenho das tarefas do assistente social, que visava á preservação da dignidade humana e do desenvolvimento da personalidade em associados à compreensão do tempo e do espaço em que estavam inseridas as circunstâncias sociais. Posteriormente, com as bases de constituição da sociologia moderna, podemos verificar que Durkheim, fundador da sociologia como uma ciência social apartada das demais, evidencia que a abordagem frente os conflitos sociais tinha por objetivo permear o terreno das regras que deveriam, sistematicamente, ser observadas quando da lida e verificação de tais situações conflituosas.

Para conhecer mais sobre Durkheim acesse: Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/ Ficheiro:Emile_Durkheim.jpg

Os fatos sociais eram a base do funcionalismo de Durkheim, conforme afirma Dias: Um dos aspectos mais polêmicos, na época, de sua metodologia foi afirmar que os fatos sociais deviam ser considerados como ‘coisas’, no sentido de serem individualizados e, portanto, observáveis. So-

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mente assim procedendo, o cientista social poderia abordar os problemas sociais, do mesmo modo que eram observados os problemas físicos e químicos nas ciências exatas (DIAS, 2010, p.32).

O Fato Social era o objeto central da sociologia de Durkheim, que o pensava como uma forma de ser, de agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo, e dotadas de um poder coercitivo paralelo às regras jurídicas, morais, dogmas religiosos, sistemas financeiros, maneiras de agir e costumes. O Fato Social é caracterizado, eminentemente, pela coercitividade, exterioridade e generalidade, haja vista que estão relacionadas à força dos padrões impostos culturalmente aos grupos e seus indivíduos integrantes, aos padrões exteriores dos indivíduos que os fazem serem independentes em suas consciências, e aos fatos que precisam existir e irradiar seus reflexos no seio de uma coletividade. Trabalhar com o fato social implica desvencilhar-se da dogmática neotomista e delimitar o objeto de seu estudo, a causa que o impulsiona à verificação técnica dos acontecimentos. Identificar o que será estudado e tratado é necessário para uma atuação concreta sob os fenômenos sociais, observando as características visualmente concretas e identificáveis, partindo para uma investigação aprofundada sobre o foco do conflito no grupo social de maneira que todos os indivíduos que apresentem características semelhantes sejam também orientados tecnicamente.

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Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Emile_Durkheim.jpg


efetivamente, após a Segunda Guerra Mundial, quando o Serviço Social, observando que o indivíduo é um ser social psíquico, atribuiu à Escola Psicológica as principais diretrizes para a sua militância.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Segunda_Guerra_Mundial

Esta ideia foi propagada após a II Guerra Mundial, no Brasil, sobretudo pela influência dos primeiros assistentes sociais brasileiros que se especializaram nos Estados Unidos, onde já era forte a prática funcionalista. A Escola Psicológica ramificou-se em duas outras escolas: a Diagnóstica e a Funcional. Conhecida, também, como escola psicanalítica, a Escola Diagnóstica caracteriza-se pela ajuda psicológica e pelo planejamento social, visualizando o Serviço Social como “[...] um tratamento planejado e dirigido a uma meta com base no diagnóstico, que revela tanto o conteúdo factual intelectual e emocional, envolvendo o cliente” (OLIVEIRA, 1982, p. 102). A Escola Funcional, com origem na América do Norte, em torno dos anos 30, acreditou, com uma visão mais animadora, que o homem era o responsável por si mesmo. Um discípulo de Freud, Otto Rank, foi o principal responsável por esta escola, tendo desenvolvido ideias genitoras do funcionalismo que influenciaram muitos assistentes sociais, inclusive da Filadélfia.

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O deslocamento de influências, como sugere nosso estudo, pode ser verificado,

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A proposta funcionalista lastreava-se na sociedade com um todo integrado, em que os fatos sociais repercutem na seara de todos, pelo simples fato de viverem em sociedade e se comportarem conforme preceitos estabelecidos por convenções, tacitamente ou explícitos, no próprio corpo social, rompendo com o caráter exclusivamente espiritual e inserindo cientificidade à busca de respostas. Eis uma contribuição de Dias que nos remete ao funcionalismo:

O fato de vivermos em sociedade nos faz permanecer eternamente vigilantes quanto aos nossos comportamentos e atos diários. Muitas vezes fazemos algo que não é aceito ou tolerado pelas pessoas que estão ao nosso redor e, nesse momento, se formos vistos, sabemos que seremos repreendidos. Para pequenas transgressões, um olhar de desaprovação já nos deixará menos à vontade, surgindo um sentimento de culpa. Para delitos maiores, um tapa, um isolamento e até mesmo a cadeia nos deixarão claro qual o procedimento culturalmente correto a ser seguido. (DIAS, 2010, p. 132).

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A perspectiva funcionalista ensina que, por meio de um mecanismo de proteção da sociedade, a Instituição Social, que representa um conjunto de regras e procedimentos padronizados e socialmente reconhecidos, é estratégica a organização, manutenção e funcionamento do controle social do grupo para satisfazer as necessidades dos indivíduos que dele participam. A instituição social desempenha seu papel utilizando o controle social.

O controle que um grupo social exerce sobre seus membros, para que não se desviem das normas aceitas, muitas vezes é imperceptível, e nós mesmos exercemos um certo controle sobre nossos atos, aflorando um sentimento de culpa quando nos desviamos do que é considerado correto. Esse controle é absolutamente fundamental para o funcionamento (grifo osso) das sociedades: sem ele não haveria nenhum tipo de ordem social e não saberíamos como proceder nas mais diversas situações, criando, assim, uma desordem nas relações entre indivíduos e grupos sociais. (DIAS, 2010, p. 132).

As instituições sociais, tão reverberadas pelo funcionalismo, são essencialmente conservadoras, podendo apresentar-se sob os títulos de família, escola, instituições religiosas, econômicas, políticas, contudo, mantém um liame de afinidade, no que


tuições desenvolvem-se de acordo com as necessidades do grupo social, adotando a característica da flexibilidade, afastando de si o engessamento de conceitos e padrões sedimentados, operando conforme a cultura estruturada pela sociedade. As relações sociais revelam-se um terreno fértil para a militância do Serviço Social. Isto porque, a instituição social, ao apresentar para a sociedade modelos de comportamento, também compreende uma série de conflitos internos oriundos da própria convivência em grupo. Desta forma, esses conflitos passam a ser vistos como

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tange a seu principal objetivo, qual seja a manutenção da ordem social. Essas insti-

um produto das relações interpessoais, da materialização das vontades e, nesse momento, o Assistente Social deve iniciar um processo de orientação nas transformações de comportamento dos clientes, tratando os problemas como conseqüência do meio, legitimando sua função de administração das necessidades da comunidade, tornando-se o “libertador desses processos” (OLIVEIRA, 1982, p. 105). Continua Oliveira: O uso dessa relação com o cliente é considerado como elemento essencial, devendo possibilitar a criação de uma atmosfera favorável, a fim de que o cliente descondicione suas defesas, elaborando seus próprios planos de ação, para atingir o autoconhecimento e tornarse responsável por seu processo de mudança. Para que isso ocorra, o Assistente Social Funcional é facilitador do processo, dando respostas ao sentimento do cliente na situação imediata, além de avaliar o significado para ele da situação atual, através de informações por ele fornecidas objetivamente (OLIVEIRA, 1982, p. 105)

O Assistente Social Funcional deve priorizar a vontade do cliente que se responsabilizará por suas escolhas frente à resolução dos conflitos. Neste caso, o profissional possibilita a manifestação da capacidade criativa do cliente, de modo que este desenvolva um processo de crescimento e autodireção na construção de suas escolhas. A influência funcional no Serviço Social imprime alguns direcionamentos peculiares para a prática dos trabalhos com os indivíduos do grupo social. Conciliar os padrões e objetivos de trabalho da profissão com os anseios da sociedade, promovendo a observância de prioridades, estabelece a distinção entre o papel do profissional e a vontade do indivíduo. Esta é necessária na condição de propulsora dos acontecimentos sociais, ao passo que o trabalho do assistente social imprime o foco de ajuda para operacionalizar processos de simbiose entre conflitos de ordem pessoal e intervenção sistemática da ajuda técnica do assistente social (OLIVEIRA, 1982).

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Fonte: UNIFACS - Imagens: http://www.sxc.hu

O modelo funcional apresenta qualidades e características essenciais para a interpretação do trabalho desenvolvido com o cliente. Em uma instituição, o assistente social deve promover o afloramento de vontades dos componentes do grupo social de modo que programas de realização pessoal sejam desenvolvidos em prol de toda a comunidade, visando à realização de toda a coletividade.

Três valores são subjacentes à consecução dos objetivos do Modelo: 1 – respeito pela dignidade e valor de cada indivíduo; 2 – oportunidade para cada um realizar seu potencial de forma efetiva e socialmente contributiva; 3 – promoção dessa oportunidade pela sociedade através de sua política e instituições. (OLIVEIRA, 1982, p. 110).

O Assistente Social Funcionalista atua administrando as habilidades técnicas que devem garantir o desenvolvimento e efetividade dos programas que objetivam realizar pessoal e coletivamente os indivíduos inseridos nos diversos contextos sociais, agindo sobre as peculiaridades dos clientes de modo que a relação entre profissional e cliente se estreite em busca das resoluções e explicações para os conflitos. Por isso, o modelo funcionalista trabalha sob um referencial teórico respaldado em bases que complementam seus estudos.


o Assistente Social e o cliente. Preleciona esta base que o profissional deverá manterse responsável pela compreensão subjetiva do cliente. Para saber o motivo ensejador do que pretender reverter, é preciso conhecer a intimidade da motivação subjetiva do indivíduo, mantendo um relacionamento que impulsione crescimento e promova descobertas sobre sua natureza. O crescimento do indivíduo, elemento da base psicológica, promove o autoconhecimento e o desenvolvimento de seus potenciais em busca de realizações pessoais

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A base psicológica está inserida no canal de comunicação estabelecido entre

e coletivas, haja vista pertencer a um conjunto de indivíduos que imprimem a mesma busca, numa simultaneidade favorável para o desenvolvimento de um todo. Aqui, o objetivo maior é conduzir o indivíduo à capacidade de utilização de suas próprias características em busca de seu crescimento social, como pode ser observado na citação de oliveira.

A partir dessa orientação o Assistente Social considera que cada indivíduo carrega consigo capacidades que mudam constantemente (físicas, intelectuais, emocionais e sociais). Essas capacidades crescem de forma irregular em diversos aspectos e sofrem uma redução que acabam em morte, caracterizando o processo da vida (OLIVEIRA, 1982, p.112).

O Modelo Funcional explora a natureza do indivíduo acreditando que este é o criador de si mesmo, de modo que, relacionando-se com seus semelhantes que também possuem características individuais, estipule objetivos a serem alcançados como consequência de sua própria vontade, de sua razão. Nesse ínterim, a vida do ser humano apresenta-se como um constante processo de evolução e descobertas, tornando ainda mais peculiar a tarefa de compreender o cliente por parte dos profissionais do Serviço Social. Visto como um processo, o crescimento do homem apresenta significação desde seu nascimento, quando começa a desenvolver, na sociedade, características subjetivas e a confrontar e explorar situações inéditas em sua vida. Nesse sentido, o Assistente Social passa a compreender seu cliente tomando como referência o processo evolutivo desencadeado pelo acionamento da vontade como mola propulsora das descobertas e desenvolvimento.

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Fonte: Montagem sobre Clipart

Outro elemento substancialmente importante a ser observado na relação Assistente Social e cliente é a natureza do indivíduo após verificar o contexto em que

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está inserido o processo de desenvolvimento vivenciado por cada indivíduo.

Quando o Assistente Social Funcional procura ajudar o cliente a lidar com algum problema, é básico que leve em conta a natureza do indivíduo para quem oferece ajuda. É necessário que saiba: idade, sexo, potencial intelectual, experiências de vida e o que fez com elas, saúde física e mental, para que a ajuda seja realmente apropriada e eficiente. É necessário, também, que veja o que seu cliente tem de particular em relação ao intelecto, sentimento, impulso, vontade, sua maneira de relacionar-se e de usar relacionamentos, isto porque cada pessoa tem um certo “Modelo” que retém uma identidade essencial e uma continuidade, que durará por toda a vida, ao mesmo em que cada pessoa é capaz de crescer em direção ao seu propósito de realização potencial e dentro de seus limites genéticos e ambientais (OLIVEIRA, 1982, p.121).

Durante o seu labor, o Assistente Social Funcionalista tem que observar todas as características de seu cliente, notando o seu crescimento e as manifestações de sua vontade, atento aos relacionamentos estabelecidos, respeitando sempre a individualidade de cada ser humano, pois há inúmeras diferenças na natureza constituinte de um indivíduo para outro. Ao trabalhar com esse cliente, o profissional precisa orientá-lo no sentido de


suas metas estipuladas e, consequentemente, fortalecendo as relações estabelecidas sob a ótica dos propósitos do Serviço Social. É preciso, na seara do Serviço Social, estar atento à base social do Modelo Funcional que afirma ser obrigação do grupo social administrar programas que permitam o desenvolvimento do homem em sociedade. Uma vez não atendida às perspectivas de crescimento, a frustração representa uma grave ameaça à convivência em sociedade.

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influenciar o uso de sua vontade para algo positivo, libertando-o para as conquistas de

Esses programas citados anteriormente têm a função precípua de ajudar indivíduos que não conseguem crescer e se desenvolver e, por conta, possam vir a representar um retrocesso ou engessamento das relações sociais. Oliveira (1982) complementa:

Os programas são implantados em instituições, quando se identificam necessidades experimentadas por indivíduos incapacitados, no sentido de encontrarem soluções por si mesmos, quando o não atendimento dessas necessidades constitui uma ameaça, tanto para o bem-estar do indivíduo, quanto da sociedade. A instituição, nessa perspectiva, é considerada o lugar onde os interesses do indivíduo e da sociedade estão juntos e se operacionalizam através de programas e serviços.(OLIVEIRA, 1982, p.122).

O Serviço Social Funcional engloba uma série de elementos para assim ser denominado. É preciso fazer uso da agência social, conceito introduzido por Jessie Taft (apud OLIVEIRA, 1982, p.123), que representa o norte de um processo de auxílio na busca pelo crescimento, direcionando o foco das habilidades do Serviço Social a fim de encontrar o objetivo principal da função da Assistente Social. É preciso que o Assistente Social mergulhe na busca da meta delimitada com emoção, almejando fazer a diferença utilizando todos os recursos e limites fornecidos pela profissão em prol de ajudar positivamente a sociedade e seus integrantes e sua clientela.

SÍNTESE Nesta aula fizemos uma reflexão sobre as influências neotomista e funcionalista no Serviço Social. Verificou-se que a profissão assumiu um viés funcionalista a partir da influência norte-americana. Na próxima aula veremos como se deu a profissionalização do Serviço Social no Brasil a partir da influência dos Estados Unidos.

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QUESTÃO PARA REFLEXÃO Elabore um quadro comparativo entre o neotomismo e o funcionalismo, destacando as características em comum dos dois momentos. Utilize o material produzido para suscitar debates nos fóruns.

LEITURAS INDICADAS GUEDES, Oligna de Souza. A compreensão da pessoa humana na gênese do serviço social no Brasil: Uma influência neotomista In: Serviço Social em Revista. Centro de Estudos Sociais Aplicados, Universidade Estadual de Londrina. – Vol. 4 n. 1 (Jul/Dez. 2001), Londrina: Ed. UEL, 2003. JUNIOR, Maurício. O Pensamento de São Tomás de Aquino (1225-1274). Disponível em: <http://www.portaldoespirito.com.br/portal/artigos/geae/historia-docristianismo-12.html>. Acesso em: 29/04/2010.

REFERÊNCIAS ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________

DIAS, Reinaldo. Introdução à Sociologia. 2. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010.

GUEDES, Oligna de Souza. A compreensão da pessoa humana na gênese do serviço social no Brasil: Uma influência neotomista In: Serviço Social em Revista. Centro de Estudos Sociais Aplicados, Universidade Estadual de Londrina, Vol. 4, n. 1 (Jul/Dez. 2001), Londrina: Ed. UEL, 2003.

JUNIOR, Maurício. História do Cristianismo XII. Boletim GEAE Número 419 de 12 de junho de 2001. Disponível em: http://www.portaldoespirito.com.br/portal/artigos/geae/historia-do-cristianismo-12.html.

Acesso em 29/04/2010.

OLIVEIRA, Lourdes Maria Moraes. Serviço social e sociedade: o discurso do profissional. São Paulo: Cortez, 1982.


VIÇO SOCIAL E A IMPORTAÇÃO DOS MÉTODOS NORTE-AMERICANOS

Autora: Patrícia Dantas Vergasta

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AULA 05 – A PROFISSIONALIZAÇÃO DO SER-

“Se as pessoas são boas só por temerem o castigo e almejarem uma recompensa, então realmente somos um grupo muito desprezível.”

Einstein

Olá querido (a) discente,

Mais uma vez, nos encontramos para a promoção de importantes debates sobre o Serviço Social! Sedimentar uma opinião embasada na crítica é o nosso principal objetivo no estudo de todo o material apresentado a você. Já vimos que o Serviço Social traz em sua essência o resultado de inúmeros acontecimentos que marcaram toda a história do desenvolvimento da sociedade. Seja pela influência estrangeira, seja pela herança teórica dos precursores da profissão ou mesmo pelo sistema capitalista de trabalho, a profissão que almeja permeia um universo em constantes metamorfoses e discussões. Por isso, é importante avançar nos estudos e complementá-los a fim de enriquecer o acervo subjetivo dos futuros Assistentes Sociais. Nesta aula, vamos falar sobre a profissionalização do Serviço Social e como as influências norte-americanas se situam neste importante processo de afirmação da profissão. Conto com você para o sucesso de mais esta empreitada. Vamos lá!

Bons estudos!

Por volta das primeiras décadas do século XX, o Serviço Social começou a delinear sua profissionalização, institucionalizando seu processo de trabalho nos moldes fordistas/tayloristas (ABREU, 2002), a partir da organização e da difusão do conjunto de inovações organizacionais na produção e no trabalho.

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Fonte; http://pt.wikipedia.org/wiki/Linha_de_montagem

Vale mencionar que o fordismo é um modelo de produção em massa que surgiu no início do século XX, nas fábricas da Ford. O nome do referido modelo é consequente do sobrenome de seu idealizador Henry Ford, um empresário norte-americano.

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Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Frederick_Taylor

Para conhecer mais sobre essas duas personalidades, você pode acessar:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Frederick_Taylor http://www.administradores.com.br/informe-se/artigos/um-pouco-da-historia-defrederick-taylor/26591/ http://pt.wikipedia.org/wiki/Henry_Ford http://www.brasilescola.com/biografia/henry-ford.htm

A compreensão do taylorismo e do fordismo é fundamental para a compreensão da trajetória do serviço social. A partir do final da década de 40, no Brasil, assistentes sociais que se especializaram nos Estados Unidos retornaram ao país disseminando as práticas aprendidas, que apresentam grande influência com os modelos citados.

Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Fordismo

Como já mencionado, a essência do fordismo é baseada na produção em massa. O aumento da produção era estimulado através do aumento de eficiência, resultando a possibilidade de oferta do produto final a preços mais baixos. Consequentemente, tinha-se o aumento das vendas, ou seja, o aumento do consumo.

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Já que falamos nos moldes fordistas e tayloristas, que tal aprofundamos nossos conhecimentos?

Para saber mais sobre o fordismo, acesse:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Fordismo

Para saber mais sobre o taylorismo, acesse:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Taylorismo

http://www.infoescola.com/administracao_/taylorismo/

Dentro de um contexto histórico sob forte influência fordista, a classe trabalhadora sente suas consequências. Os profissionais de serviço social serão fundamentais para mediar as relações entre capital e trabalho.

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A mediação do sistema de controle social promoveu as práticas assistenciais, necessárias devido ao novo padrão produtivo e de trabalho, bem como do agravamento da questão social. As práticas de cunho “educativo” ressocializador inculcaram um novo código de conduta individual, familiar e política do trabalhador e sua família (ABREU, 2002).

Fonte: Clipart


de civil proporcionou experiências assistenciais que embasaram e proporcionaram o processo sistemático de profissionalização do Serviço Social, haja vista a estratégia do capital sobre o trabalho ter fomentado a necessidade de consolidar as experiências assistenciais. Apesar de possuir raízes franco-belgas, o Serviço Social no Brasil começou a sedimentar a sua identidade profissional partindo das indagações acerca do que seria apenas um ato voluntário e dos determinismos sociais. Isto porque o modelo preconi-

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O enfrentamento da questão social pela Igreja, Estado e setores da socieda-

zador baseava-se na ação social oriunda da Igreja, de cunho fortemente religioso, de base filosófica eminentemente neotomista e assistemático.

Para relembrar as bases do neotomismo, acesse:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Neotomismo

http://www.estudantedefilosofia.com.br/doutrinas/neotomismo.php

Para relembrar a influência do neotomismo no Serviço social, leia o texto “A compreensão da pessoa humana na gênese do serviço social no Brasil: uma influência neotomista”, disponível em:

http://www.ssrevista.uel.br/c_v4n1_compreensao.htm

A superação do modelo neotomista foi imprescindível devido ao novo padrão de acumulação do capital e o processo de recomposição da mão-de-obra trabalhadora para que houvesse uma institucionalização frente ao Estado.

A partir desse ponto de vista, o redimensionamento profissional e a superação dos seus vínculos ao processo de reprodução das relações de exploração e dominação encontram-se nas condições concretas de contestação e superação da necessidade histórica que determinou a atualização da assistência no âmbito das estratégias de controle social do capital, isto é, na luta das classes subalternas na perspectiva da emancipação (ABREU, 2002, p.40).

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A tradução desse contexto é o confronto entre o nascedouro das demandas trazidas com a inflamação da questão social e determinações históricas das lutas, ocasionadas pela questão social, das classes sociais que mediaram relações com o Estado em prol de desfazer inquietações e assimilar à profissão novas tecnologias (SILVA, 2008). O Estado se envolveu em importantes processos com a sociedade civil, promovendo a evidenciando ações de cunho social, assistenciais e filantrópicas (ABREU, 2002), promovendo uma sociabilidade estratégica em que o controle do capital consolida sua hegemonia nas lutas dos movimentos operários. O serviço Social passou a ser vislumbrado como uma profissão consolidada no momento em que assumiu a necessidade de introduzir em sua perspectiva as influências do ideário norte-americano, pois este possuía como pilar fundamental, contornos delineados por uma forte construção teórica de importantes cientistas sociais.

A via encontrada para responder a tais inquietações foi a do Serviço Social norte-americano, não por acaso, mas em função da necessidade de ampliação do ideário daquela sociedade para os demais países nas quais pretendia estender seu projeto de denominação. Nesse sentido, o Serviço Social necessitava para sua institucionalização assimilar essas “novas tecnologias” que permaneceram (e ainda permanecem) na formação e prática dos/as assistentes sociais, nor-

________________________ teadas pelo estrutural/funcionalismo e o positivismo da sociologia ________________________ norte-americana, tendo em vista sua predominância cultural nas ________________________ Ciências Sociais (SILVA, 2008, p.98). ________________________ A vertente norte-americana priorizava em seu estilo de trabalho a base psica________________________ ________________________ nalítica, enfatizando que uma orientação individualizada, baseando-se nos limítrofes ________________________ psicossociais, justificando o seu conservadorismo. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Figura: Freud – pai da psicanálise ________________________ Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Sigmund_Freud ________________________ ________________________


http://pt.wikipedia.org/wiki/Psican%C3%A1lise

http://www.cobra.pages.nom.br/ecp-psicanalise.html

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Aprofunde seus conhecimentos sobre a psicanálise pesquisando os seguintes sites:

http://febrapsi.org.br/

http://www.rbp.org.br/

Ao passo que os problemas sociais são vislumbrados como desajustes sociais, consequência dos moldes capitalistas, a proposta pensada pela América do Norte era, ainda que de forma camuflada, a supressão de qualquer tentativa para promoção de hegemonia por classes subalternas, a fim de promover a hegemonia do capital e consolidar seu ideário de valores e profissionalização, irradiando-o para o mundo, inclusiva no Brasil, onde se percebe a sua latente influência frente a respostas para as novas demandas sociais. Alguns princípios consideravam a base de conhecimentos importada dos norte-americanos. Trata-se de funções pedagógicas de coerção de persuasão sobre as quais os assistentes sociais deveriam debruçar suas forças na abordagem de suas organizações no sentido de concretizar uma ordem de hierarquia entre o capital e as classes subalternas, articulando a intervenção profissional de uma maneira que a força de produção e a força de trabalho estivessem articuladas em fina sintonia com a prática de trabalho associada a “mecanismos sociopolíticos, culturais e institucionais, necessários para o enquadramento da reprodução social aos padrões morais de sociabilidade e do controle político sobre os subalternizados” (ABREU, 2002, p.42). Sob o ponto de vista educativo, havia uma necessidade de inserir na sociedade o conformismo. Por meio deste, as necessidades de estipular determinados imperativos deveriam ser uma derivação da consequente adequação de suas ideologias e do modo de vida que pretendia impor à vida social. O conformismo social imposto pressupunha um equilíbrio artificial entre os ideais da produção capitalista e o trabalhador treinado para agir mecanicamente, com a finalidade precípua de evitar um desgaste fisiológico por conta dos métodos de produção capitalista, rigorosos em sua essência.

Assim, sob o ponto de vista das exigências da produção fordista/ taylorista, esse conformismo supõe um equilíbrio psicofísico pura-

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mente mecânico. Trata-se, como mencionado anteriormente, de um

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conformismo mecanicista, base da formação do trabalhador fordiano – o chamado ‘gorila amestrado’. Esse conformismo, imposto, não significou, de fato, uma ‘segunda natureza’, visou apenas impedir o colapso fisiológico do trabalhador esgotado pelo novo método de produção (ABREU, 2002, p.43).

É preciso compreender, nesse contexto, o americanismo e o fordismo como condições intrínsecas ao conformismo, considerando-os como respostas pedagógicas a suas discussões.

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Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Tio_Sam

O americanismo correspondia à influência na formação cultural da sociedade de maneira que, com seus aportes teóricos, uma hegemonia do capital fosse firmada como o facilitador de uma revolução passiva, que consistiu, em outras palavras, na ascensão do controle do capital pela burguesia sem que houvesse a necessidade de participação popular, transformando a produção capitalista conforme sua ambições avassaladoras sobre o processo objetivo de produção e acumulação do capital.

Ver link: http://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_passiva


americanismo inspirava (e almejava) o desejo de garantia de lucro a partir da multiplicação da produção, encobrindo qualquer perspectiva de emancipação das classes subalternas, inaugurando, assim, novas formas de organização do processo de produção e de controle social. (ABREU, 2002).

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Revelando-se a materialização do processo de desenvolvimento capitalista, o

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeira_dos_Estados_Unidos

Em verdade, o americanismo tratou, eminentemente, de controlar a resistência dos trabalhadores no que tange a suas exigências frente ao modo de produção e acumulação capitalista, travando, consequentemente, uma incansável luta para a manutenção dos imperativos do capital.

Importante ressaltar que o americanismo ainda contou com o Estado como um forte aliado na institucionalização e legitimação de seus preceitos, através da implantação de políticas educativas que incentivavam o trabalhador, inclusive com altos salários e benefícios que podem ser comparados hoje aos da previdência social, a fim de invisibilizar os processos coercitivos de controle e manutenção do sistema social então implementados.

O fato de fazer uso da força associada à persuasão, destruindo o sindicalismo operário de base territorial (ABREU, 2002) e ofertando altos salários e benefícios sociais, proporcionou ao empresariado capitalista a inserção e assimilação do discurso político-ideológico pregado pelas bases sociais articuladas sob as vertentes fordistas/ taylorista, que contaram com o reforço persuasivo da religião família e do Estado. De acordo com Gramsci (1976, p. 381.2 apud ABREU, 2002, p. 46), “[...] a hegemonia vem da fábrica, e para ser exercida só necessita de uma quantidade mínima de intermediários profissionais da política e da ideologia”.

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Figura: Gramsci http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonio_Gramsci

Gramsci nos diz que através de benefícios concedidos à classe trabalhadora, a mesma tendia a se conformar e não questionar suas condições de trabalho, passando

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a reforçar a lógica capitalista. Tal comportamento era reforçado por profissionais que eram contratados manter o controle dos trabalhadores.

Que tal conhecer um pouco da história de Gramsci? É muito fácil! Acesse: http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonio_Gramsci

http://www.acessa.com/gramsci/

http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u379.jhtm

http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/antonio-gramsci-307895.shtml

As classes dominantes contaram com o fordismo para combater a militância ousada das intenções em formar grupos operários combatentes. Por meio de sua coletânea de ideias, o fordismo instituiu novas classes sociais, a operária e a média, constituindo um homem coletivo como importante componente de uma empresa, condicionando-o à concordância dos novos métodos industriais como uma necessidade de intensificar o labor gerador de lucro e matando, dentro deste, as memórias e intenções irracionais de lutas em favor de sua classe, sujeitando-o à imposição do novo sistema de trabalho.


o sistema de produção, de modo que a repartição do trabalho, em funções práticas e intelectuais, pudesse facilitar a operação dos novos meios de produção e fazer morrer, definitivamente, qualquer tipo de luta operária franqueada por qualquer vestígio de resistência aos novos meios de produção. Essas novas perspectivas nos meios de produção impulsionaram, como consequência natural das mudanças implementadas, a profissionalização do Assistente Social graças à suas funções intelectuais e pedagógicas. Fala-se que Ford:

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A intenção era a implantação de quadros técnicos (ABREU, 2002) para organizar

[...] enviou um exército de assistentes sociais aos lares de seus trabalhadores ‘privilegiados’ (em larga medida imigrantes) para ter certeza de que o ‘novo homem’ da produção de massa tinha o tipo certo de probidade moral, de vida familiar e de capacidade de consumo prudente (isto é, não alcoólico) e ‘racional’ para corresponder às necessidades e expectativas da corporação. (HARVEY 1994, p. 122 apud ABREU 2002, p.48).

No cerne da questão, era possível afirmar que o Assistente Social fazia, às vezes, o papel de neutralizador das manifestações operárias no sentido de anular as manifestações das classes trabalhadoras, a esta altura muito explorada e cansada tanto material quanto espiritualmente, em função da defesa dos interesses capitalistas. Contudo, foi exatamente sobre este terreno fértil de necessidades que o Serviço Social delineou sua institucionalização, se fazendo essencial para responder às questões suscitadas oriundas das tais necessidades, aqui tão reverberadas. O assistente social intelectual não podia deixar que sua militância política se sobrepusesse em relação à sua intervenção no seio do capitalismo, ou seja, era preciso haver um equilíbrio entre as funções intelectuais e pedagógicas dentro de um sistema de acumulação capitalista. Para Gramsci, importante referência do contexto histórico que ora inserimos o Serviço Social, o processo de formação dos intelectuais fomentou o surgimento de intelectuais orgânicos “como parte do processo de constituição histórica das classes sociais” (ABREU, 2002, p.50). Para determinadas classes sociais, a importância do intelectual orgânico se revelava por ser necessário haver intelectuais que promovessem a homogeneidade entre as camadas da sociedade. O intelectual deveria orientar as massas e não deveria ser visto apenas como aquele que mantinha estreitas ligações com o sistema de produção, mas também como a profissão que vislumbrava as estruturas subjetivas da produção.

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78 Para aprofundar a compreensão sobre o conceito de intelectual orgânico, acesse:

http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/antonio-gramsci-307895.shtml

http://www.achegas.net/numero/onze/laudicea_pinto_11.htm

http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=700

Havia também, ainda numa perspectiva gramsciniana, os intelectuais tradicionais, que correspondiam àqueles que representavam uma continuidade histórica, uma camada que poderia tranquilamente ser confundida com os intelectuais orgânicos desde que desenvolvessem funções eminentemente orgânicas, tais como as atividades organizacionais e diretivas. Observemos a citação que se segue:

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A posição do assistente social na organização e divisão de trabalho no nível do processo produtivo, dentro das unidades industriais, pode ser pensada como o desdobramento de uma das funções originais do capitalista no âmbito da produção, delegada, posteriormente, a seus quadros técnicos administrativos: a de controle e disciplinamento dos operários, tendo em vista sua subordinação aos requisitos do processo de valorização (IAMAMOTO apud ABREU, 2002, p. 51).

Na condição de um profissional intelectual, o assistente social, por vezes, encontrava (e encontra) obstáculos para o desempenho de suas funções no seio da sociedade. Ocorre que, submerso às funções subalternas da hegemonia social, o assistente social vislumbrava-se podado e limitado às funções de direção e de domínio (ABREU, 2002). Na verdade, o processo de formação das classes sociais possuía estreita ligação com a função intelectual do assistente social. Em geral, a classe empresária, que detinha o capital, colaborou significativamente para a especialização dos intelectuais com a necessidade que tinha em criar um complexo de trabalho tecnicamente especializado, diga-se, era muito importante que a sua produção estivesse em sintonia com as atividades organizativas dentro de suas fábricas e precisavam confiar a alguém as relações além das paredes do negócio. Consoante as lições de Gramsci (apud ABREU, 2002, p.53), “as elaborações mais amplas e complexas de camadas intelectuais ocorrem em conexão com a classe dominante”.


possuir a capacidade de organizar a sociedade em geral, em todo o seu complexo organismo de serviços, inclusive no organismo estatal, em vista da necessidade de criar as condições mais favoráveis à expansão da própria classe; ou, pelo menos, devem possuir a capacidade de escolher os ‘prepostos’ (empregados especializados) a quem confiar esta atividade organizativa das relações gerais externas à fábrica. Pode-se observar que os intelectuais ‘orgânicos’, que cada nova classe cria consigo e elabora em seu desenvolvimento

79 práticas em serviço social II

Os empresários – se não todos, pelo menos uma elite deles – devem

progressivo, são, no mais das vezes, ‘especializações’ de aspectos parciais da atividade primitiva do tipo social novo que a nova classe deu à luz.” (GRAMSCI apud ABREU, 2002, p.53)

O americanismo imprimiu à vida do sistema de acumulação de capital uma ética renovadora e reformadora da moral. A racionalização da produção pelo trabalho apresentou um homem, um homem encantado e confuso em relação aos altos salários percebidos. E esta incerteza comportamental representava um perigo ao sistema de produção, pois um homem desregrado representava um trabalhador pouco rentável. O puritanismo, concepção da fé cristã em que os homens se submetiam a um controle rígido de seus costumes, especialmente no que diz respeito à sexualidade, era visto como uma tentativa de afastar os perigos que o desenvolvimento do trabalho, e do trabalhador, por vezes apresentava. Por meio de sua cultura ético-religiosa, a ________________________ relação do homem com Deus era exaltada de modo que fosse possível racionalizar as ________________________ conquistas materiais e a espiritualidade.

A inculcação das idéias puritanas vincula-se à disseminação de um conteúdo ético-religioso, centrado na elevação moral do indivíduo, a partir da sua transformação interna (modificação da personalidade), resultante de uma relação íntima e espontânea homem/Deus. Esta transformação supõe a necessária e máxima racionalização da ação para obter o sucesso terreno e apresenta uma dimensão revolucionária, na medida em que, centrada na força da espiritualidade, negava a mediação de qualquer Igreja. O puritanismo propugnava a salvação pela regeneração, como produto de processos racionais, garantidos por uma férrea moral, ou seja, por uma crena profunda na própria capacidade de perseverar e prosperar na própria vocação (ABREU, 2002, p. 55).

O puritanismo reforçou, sobremaneira, o processo educativo dos trabalhadores frente ao novo sistema de trabalho, afinal, era preciso conter o encantamento dos trabalhadores, mantendo a serenidade em prol de uma melhor qualidade no trabalho.

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80 Para saber mais sobre o puritanismo, acesse: http://pt.wikipedia.org/wiki/Puritanismo

Associado ao proibicionismo, o puritanismo representava a luta contra os maus hábitos dos trabalhadores, por exemplo, o consumo exagerado de álcool, as irregularidades sexuais. Para os americanos, os trabalhadores precisavam gastar seus salários de maneira racional, contudo, gastar tudo, perpetuando a ideia de energia nervosa (ABREU, 2002), que nada mais era do que muita energia no trabalho para transformála em resultados financeiros em seus salários. Daí a importância do assistente social para os moldes americanizados, pois era necessário manter um serviço de inspeção da vida particular de todos os trabalhadores inseridos nos novos moldes de produção capitalista. A ideia era evidenciar a importância da base familiar para todo e qualquer trabalhador de maneira que este trabalhasse em função daquela, mantendo cíclica a relação entre acumulação capitalista e homem trabalhador. Intervenções no modo de vida desses trabalhadores foram implementadas na classe como um dos requisitos para ser um rentável operário do sistema capitalista.

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Ademais, era preciso criar um ambiente propício ao desenvolvimento constante do industrialismo, e o incentivo técnico ao modo de vida ‘adequado’ dos trabalhadores garantia uma qualidade linear nos serviços de produção.

Nesse sentido, o proibicionismo, como uma expressão das idéias puritanas, constituiu uma modalidade da luta contra o alcoolismo e o abuso e irregularidades das funções sexuais, problemas considerados derivados do mau uso dos altos salários. Tais problemas colocavam-se para os industriais americanos como os maiores inimigos das ‘energias nervosas’, condicionadas às necessidades da grande indústria. Neste sentido, os serviços de inspeção e acompanhamento da vida privada do trabalhador e de sua família foram fundamentais para a conformação de novas relações entre a produção e a reprodução biológica, bem como na reorganização da divisão sexual do trabalho no âmbito doméstico, o que redefiniu substantivamente as funções da mulher no interior do grupo familiar e na sociedade, bem como as funções da própria família (ABREU, 2002, p. 57).

A consequência secundária desta busca pela manutenção da produção industrial foi a estruturação reordenada do núcleo família. Era preciso trabalhar para manter a família que precisava consumir para se manter e precisa do chefe para a manutenção de seus custos, segmentando, portanto, o padrão natural da família que se auto-organiza e produz apenas para seu sustento. Nesse momento, a produção para a indústria era a garantia de manutenção da vida em família. Merece um rápido comentário a ascensão da mulher, nesse contexto histórico, que tem seu papel redimensionada, com funções eminentemente reprodutivas e elevada à condição de ‘rainha’.


de mantê-lo em seu campo de trabalho que, com suas funções pedagógicas prestava a assistência social especializada no sentido de manter a tranqüilidade do sistema industrial através do controle social. O contexto do americanismo fomentou movimentos no seio do Serviço Social. O primeiro correspondeu ao fato de a profissão ter se revelado como importante aliada no processo de reprodução e acumulação capitalista. O assistente social representava o equilíbrio entre o padrão almejado de comportamento, qual seja o taylorista,

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A burguesia industrial legitimou o assistente social e consolidou a necessidade

e a manutenção das atividades industriais conforme o desejo da burguesia. Nesse sentido, a profissionalização do Serviço Social garantiu a racionalização da produção e o controle social sobre a classe operária. Vale salientar que a influência teórica do funcionalismo foi fundamental.

Para relembrar as bases do funcionalismo, acesse: http://pt.wikipedia.org/wiki/Funcionalismo_(ci%C3%AAncias_sociais)

http://educacao.uol.com.br/sociologia/durkheim1.jhtm

http://www.infoescola.com/sociologia/emile-durkheim/

O segundo movimento conferiu ao Serviço Social o papel de resgatar a consciência cristã dos operários, recuperando a moral católica como uma maneira de estar a salvo das más influências do socialismo e liberalismo.

Nesse processo é possível admitir que o taylorismo, como suporte filosófico e técnico de cunho positivista, fundamental na organização do americanismo, imprime, naquele momento, a direção do desenvolvimento tecnológico alcançado e incorporado pela profissão, no afã de adequar-se às exigências da nova racionalização da produção e do trabalho, da reprodução social e do exercício do controle social. Ao mesmo tempo, e aparentemente de forma paradoxal, esta orientação, nos marcos dessa profissão, articula-se a um conteúdo dogmático à base da filosofia humanista cristã, consubstanciada no pensamento neotomista, referência inicial da constituição profissional da sociedade capitalista (ABREU, 2002, p. 59).

O taylorismo, portanto, representou, para o Serviço Social, uma proposta de conciliar as lições neotomistas à nova racionalidade de produção, orientando os seres sociais de maneira que pudessem promover o bem estar social, respeitando as peculiaridades existentes e, por meio de sua técnica especializada, pudesse atuar pedagogicamente no controle social frente à produtividade industrializada.

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SÍNTESE Nesta aula, vimos que o serviço social brasileiro sofreu influência norte-americana. Destacou-se, sobretudo, a influência do fordismo para a profissionalização do serviço social. Nas próximas aulas, verificaremos os frutos de tal influência, através dos métodos de serviço social de casos, serviço social de grupos e desenvolvimento de comunidade. Iniciaremos esta caminhada na próxima aula, estudando o serviço social de casos. Até lá!

QUESTÃO PARA REFLEXÃO

Como o fordismo influenciou na profissionalização do Serviço social no Brasil?

LEITURA INDICADA ABREU, Marina Maciel. Serviço Social e a organização da cultura: perfis pedagógicos da prática profissional. São Paulo: Cortez, 2002. (Capítulo 1)

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REFERÊNCIAS ABREU, Marina Maciel. Serviço Social e a organização da cultura: perfis pedagógicos da prática profissional. São Paulo: Cortez, 2002.

SILVA, Ivone Maria Ferreira da. Questão social e serviço social no Brasil: fundamentos sociohistóricos. Cuiabá: EdUFMT, 2008.


Autora: Patrícia Dantas Vergasta “Para ver uma estrela cintilante é preciso ter um caos dentro de si.”

Friedrich Nietzsche

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AULA 06 – SERVIÇO SOCIAL DE CASO

Olá, querido (a) discente!

Parece que está sendo devagar, mas já estamos na aula 6! Nesse momento é muito importante continuar! A cada aula podemos perceber que estamos na direção certa e que todos nós estamos aptos a fazer novas descobertas e grandes progressos. Tudo que no início, nos pareceu fora do alcance está sedimentado dentro de nós, hoje. São conhecimentos que, certamente, farão a diferença em nossa vida profissional. Após estudarmos as considerações iniciais e de suma importância sobre o Serviço Social, a sua história, influências e precursores, nos deparamos com técnicas da profissão que, sem todo o estudo anterior, não seria possível compreender e apreender as novas descobertas. Estudaremos, nesta aula, o Serviço Social de Caso, sua importância e procedimentos e, com muito empenho, estaremos mergulhados no universo do ser humano com aptidões para ajudar na sedimentação de sonhos e alcance de objetivos. Todos os momentos são oportunos para aprender, para construir. Não importa a velocidade que imprimimos para satisfazer nossas perspectivas, o importante é não parar! Avante, sempre!

Bons estudos!

O Serviço Social enfrentou inúmeros desafios para sua instituição na sociedade. Muitas dificuldades foram vivenciadas de modo que os processos da prática foram se adequando conforme o ambiente em que esteve inserido. Sabe-se que, com a dinamicidade das transformações sociais, foi preciso adaptar as técnicas do Serviço Social às demandas sociais, diferentes e determinadas por culturas, tradições e costumes diversificados em todas as nações. Reconhecendo a necessidade de individualizar a assistência social, o Serviço Social de caso analisa a perspectiva de um processo de trabalho entre os profissionais e os indivíduos, com a sua individualidade e inserido em um contexto coletivo. Em 1960 a ONU elaborou um documento conceituando o Serviço Social de Caso como:

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[...] ação de dinâmica mútua, entre o assistente social e o cliente,

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deliberadamente utilizada para o tratamento social, e que se origina no estudo do indivíduo, e na situação peculiar onde se encontra, nos problemas que o afetam e da maneira em que pode ser ajudado a resolve-los, mediante seus próprios recursos e os da comunidade (VIEIRA, 1981, p. 52).

O Serviço Social de Caso, por seguir as peculiaridades de cada sociedade, respeitando e compreendendo as diferenças, podia ser aplicado em qualquer lugar do mundo.

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Fonte: Unifacs EAD

O Serviço Social de Caso é apontado como de natureza genérica no que diz respeito a sua essência e a seus princípios. É na aplicação da técnica que, diante de determinados clientes (que sempre serão peculiares) que o Serviço Social de Caso vai trabalhar as particularidades, adaptando-se à situação em que esteja inserido e se tornando específico para cada fim.

Fonte:Unifacs EAD


Caso como sendo o processo pelo qual se desenvolve a personalidade, através de ajustamentos realizados conscientemente entre os indivíduos e o seu meio.

Ver iamgem no link abaixo: Figura: Mary Richmond Fonte: www.ifsw.org/p38000052.html?print=true

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Mary Richmond, citada por Hamilton (1996), conceituou o Serviço Social de

O assistente social que milita diante de um Serviço Social de Caso trabalha junto com o cliente. Aquele o ajuda a se descobrir e se desvendar, faz o indivíduo se perceber como ser social e o ajuda na resolução dos problemas através da análise dos mesmos. Nesse sentido, é o conceito trazido por Hamilton:

No Serviço Social de Casos, o cliente é estimulado a participar no estudo de sua situação, nos planos a serem feitos e no esforço para resolver sua situação, usando seus próprios recursos e os da comunidade que lhe sejam necessários ou favoráveis a seu caso. Quando se trata de pessoas relativamente independentes, que estejam sofrendo sérias dificuldades ou pressões externas, o objetivo pode ser alcançado através de conselhos ou de providências práticas para que o indivíduo possa sair daquela situação. Conforme já dissemos, estimula-se o indivíduo a agir por si mesmo. Se a pessoa se encontra doente, enfraquecida ou inválida, o assistente social deve apoiá-la e até mesmo intervir junto ao seu meio ambiente, para reduzir as pressões que a afetam, quer partam das pessoas, quer da sociedade. Está hoje aceita a hipótese de que a mudança nas atitudes e nos costumes é mais fácil quando se criam novas condições de vida que favoreçam novas experiências e novas satisfações (HAMILTON, 1996, p. 39).

O processo de trabalho do Serviço Social de Caso tem aplicação com indivíduos sozinhos ou na família. Isto porque são as características de cada um, e de cada família, que vão determinar como o assistente social vai trabalhar. O trabalho com a comunidade é outro, sobre o qual iremos falar oportunamente. Percebe-se, desse modo, que a abordagem do Serviço Social de Caso se apresenta de forma fragmentada. Apesar de considerar as especificidades de cada local, não há preocupação com as múltiplas manifestações da questão social. Vieira (1981) nos chama a atenção para esse aspecto:

A aplicação do Serviço Social de Casos é, portanto, influenciada pelo próprio ambiente. O que há de especial na natureza do Serviço So-

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cial de Casos não se transforma de um país para outro, porque a natureza humana é a mesma no tempo e no espaço; do mesmo modo, não mudam as necessidades básicas psicológicas do homem – instinto de conservação e sobrevivência, necessidade de ser amado e apreciado e desejo de participar da vida de sociedade. O que se modifica, afetando, então o Serviço Social de Casos em sua aplicação é o ambiente, são as tradições e os costumes, é o desenvolvimento econômico e social, enfim o grau de civilização e a cultura das nações. Assim sendo, o Serviço Social de casos pode ser praticado em qualquer região, civilização ou cultura; mas seu modo de aplicação variará de conformidade com a cultura e o grau de desenvolvimento do país ou da região (VIEIRA, 1981, p. 52).

É preciso, pois, analisar o caso social como um todo, um complexo de várias determinantes que juntas fazem os fatores objetivos e subjetivos se fundirem, materializando as características de cada caso e determinando, consequentemente, o foco para o trabalho do assistente social.

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Fonte:Unifacs EAD

O assistente social deverá trabalhar a subjetividade do indivíduo, de modo a fazê-lo compreender o que se passa a sua volta. Não é possível trabalhar toda e qualquer modificação no seio da sociedade. Elas são contínuas e passageiras. Possível, então, é trabalhar o indivíduo no sentido de ajudá-lo na adaptação frente às constantes metamorfoses pois cada ser social reagirá de maneira diferente aos conflitos. Por isso se faz necessário compreender as situações a partir de todo o acervo subjetivo sedimentado no íntimo de cada um, sendo estimulado, tecnicamente, pelo assistente social.

O PROCESSO DE INTERVENÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL DE CASO No intuito de auxiliar adequadamente os indivíduos, o Serviço Social de Caso lança mão de instrumentos deveras importantes para um trabalho adequado. Uma técnica muito importante para o Serviço Social de caso é o estreitamento das relações do assistente social com o cliente. É preciso enraizar na esfera subjetiva do indivíduo confiança para poder resolver seus próprios problemas. Para isso a observação do comportamento do indivíduo é muito importante.


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Fonte:Unifacs EAD

Durante o tratamento é muito importante que o assistente social demonstre firmeza para seu cliente. Tratá-lo com amor não deve ser confundido com envolvimento emocional. Se o cliente está abalado psicologicamente, um envolvimento desta maneira não vai ajudar em nada na busca pela solução. É preciso ter um profissional amoroso, contudo, focado em demonstrar para o cliente que está apto a ajudar, está focado no seu bem-estar e, sobretudo, ensinando-o a lidar com essas situações de conflito. Ao profissional deve restar a competência emocional e uma personalidade focada no tratamento de seus clientes, e não no compartilhamento do sofrimento.

Fonte:Unifacs EAD

Vieira (1981) sintetiza bem a relação entre o assistente social e o seu cliente, na perspectiva do Serviço Social de Caso: Essa mistura de força e de simpatia, de firmeza e de interesse, de iniciativa e autocontrole, é o que se chama em Serviço Social ‘atitude profissional’, que o assistente social adquire na escola, durante os anos de formação. É evidente, porém, que deve possuir uma personalidade que permita o desenvolvimento dessas qualidades, sem as quais não poderá estabelecer, com seus clientes, as relações necessárias ao êxito do tratamento (VIEIRA, 1981, p.56).

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88 Adquirir a confiança do cliente ajudará o assistente social a desempenhar um bom trabalho. É preciso que haja reciprocidade de confiança na relação estabelecida.

Fonte: Unifacs EAD

O segredo profissional encontra guarida nesta parte da discussão. Muitas pessoas não imaginam que permeia sobre o Serviço Social o sigilo profissional. Pois bem, se faz necessário manter a discrição ao assimilar as informações do cliente e garantir que as mesmas serão mantidas em segredo profissional. Dessa maneira, o indivíduo

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sentirá confiança e ficará mais a vontade em dialogar francamente sobre suas aflições com o assistente social. Se, por algum motivo, houver a necessidade de divulgar as declarações do cliente, certamente o profissional com uma postura pautada na ética haverá de solicitar a permissão do indivíduo.

Fonte: www.sxc.hu

A sedimentação da confiança que o cliente deve perceber no assistente social denota a necessidade de uma unidade do tratamento. Trata-se de um elemento muito importante para a lida com as dificuldades de seu cliente. O mesmo assistente social que o entrevistar deverá acompanhá-lo no decorrer de seu tratamento, estabelecendo uma relação mútua de confiança e pessoalidade. Contudo, é importante frisar que o cliente deverá estar preparado para uma possível eventualidade na qual o assistente social que está assistindo-o não possa ir ao seu encontro.


situação parecida que possa vir a ocorrer, trabalhando essa transição de maneira que o cliente não se sinta rejeitado pelo “seu” assistente social.

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É preciso, nesse diapasão, que o assistente social deixe-o ciente sobre qualquer

Fonte: www.sxc.hu

Daí a necessidade de uma franqueza educativa com o cliente, pois desta maneira será possível ao assistente social esclarecer ao indivíduo, inclusive, sobre a possibilidade de outro assistente social vir a ocupar-se do caso sem que pareça que está sendo segmentada a confiança outrora estabelecida. O cliente deve confiar no assistente social e entender suas atitudes profissionais de modo que um eventual afastamento não venha a interferir no trabalho realizado.

As relações de confiança mútua e a confidencialidade nos levam a considerar outro elemento importante: a unidade do tratamento; o caso deve ser tratado em todas suas fases pelo mesmo assistente social. O mesmo assistente social que entrevista o cliente deverá proceder, quando necessário, às visitas domiciliares, providenciar os encaminhamentos etc. De fato, é difícil dispensar igual confiança a pessoas diferentes; como ter certeza de que as informações não serão divulgadas se um assistente social recebe o cliente na obra e outro o visita em casa? Em qual dos dois acreditar? No entanto unidade de tratamento não quer dizer que só o assistente social poderá ocupar-se do caso; várias providências podem ser tomadas por outras pessoas, porém os contatos com o cliente deverão ser mantidos por um único assistente social (VIEIRA, 1981, p. 57)

Numa situação hipotética de necessidade de desvincular-se do tratamento, o assistente social deverá trabalhar, profissionalmente, esta situação junto ao cliente de modo que não faça parecer um abandono ou desinteresse profissional. Uma atitude profissional durante o tratamento evitará este tipo de situação e facilitará inclusive, para aqueles clientes com traços de dependência em sua personalidade, uma desvinculação sem imagem de rejeição.

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Fonte: www.sxc.hu/ID 1195576

Como você deve ter percebido, um dos instrumentos mais importantes para o início do tratamento social é a entrevista. Através dela, é possível estabelecer parâmetros para o início de um tratamento e traçar objetivos a serem alcançados. É preciso, no entanto, visualizar com clareza a maneira como o cliente tenha se apresentado ao assistente social. A voluntariedade do cliente que se dirigiu à obra é pressuposto de uma entrevista livre. O cliente deve ser estimulado a colocar, espontaneamente, seus problemas. Aqui, uma observação é de estimado valor: não há que se confundirem os pedidos do cliente com os seus reais conflitos sociais.

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Conheça mais a técnica da entrevista acessando: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/ index.php/fass/article/viewFile/2315/3245 Neste endereço, você encontrará um artigo de Alzira Maria Baptista Lewgoy e Esalba Maria Carvalho Silveira, intitulado: A entrevista nos processos de trabalho do assistente social.

Na situação em que o cliente é encaminhado ao Serviço Social, este profissional deve esclarecer a situação, de modo que o cliente torne-se ciente sobre as razões que implicaram o seu encaminhamento e como poderá ser auxiliado durante o processo. Contudo, há situações em que o assistente social é que deve ir até o cliente, abordá-lo, se apresentar e informar o que significa a sua visita a ele. Essa situação é mais complicada para o assistente social, porque ele terá que estabelecer um canal de comunicação através do qual irá falar muito mais que o cliente, no intuito de firmar um liame de confiança entre eles e tentar estabelecer um diálogo claro em que ele, como assistente social, possa desenvolver suas técnicas na conversação com o cliente.


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Fonte: Unifacs EAD

Após esse primeiro contato, o assistente social deverá iniciar suas próximas visitas do mesmo ponto de onde parou, evidenciando, desta forma, a seriedade e importância do trabalho, pois este é contínuo e sequenciado, bem como esclarecer pontos divergentes oriundos da entrevista anterior, fornecer informações e solicitando informações novas de seu cliente.

Fonte: Unifacs EAD

O assistente social não deve se envolver emocionalmente com o cliente, pois acarretaria uma reciprocidade obrigatória que desviaria, consequentemente, o foco do trabalho. Deve controlar suas emoções, evitando, deste modo, que a identificação com o cliente se dê pelo seu problema, e não pelo problema daquele. Entrementes, isso não quer dizer que o assistente social tem que ser árido, completamente desprovido de emoções. É possível sim, que durante a entrevista, o assistente social venha a responder alguma pergunta, satisfazendo os questionamentos do cliente, desde que seja sobre fatos públicos de sua vida particular.

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Fonte: Unifacs EAD

Será preciso, durante a entrevista, estar atento para a condução da mesma. Se houver qualquer tentativa de desvio do foco, caberá ao profissional um adequado posicionamento de modo que o regate para o foco que realmente interessa se dê rápido e discretamente. Por isso, o autoconhecimento e o autodomínio do assistente social serão, sempre, os instrumentos basilares na sedimentação da confiança na relação profissional-cliente. O assistente social deve dar a direção à entrevista, impedindo que o cliente não se afaste da proposta. Uma entrevista muito longa, deveras poderá ser a responsável

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por um eventual desvio, desconforto ou cansaço durante os trabalhos que, além de desestimular o cliente, causará consequentemente, dificuldades para que seja redigido o relatório sobre a entrevista. Entretanto, um alongamento da entrevista, por parte do próprio cliente, poderá revelar uma relação de dependência emocional, carência afetiva, problemas subjetivos. Por isso, tomando as rédeas do trabalho, o assistente social não deve permitir que se estabeleça essa dependência, podando qualquer tipo de aproximação emocional e direcionando a entrevista ao que se propõe.

A entrevista não pode ser muito longa, pois, no fim de certo tempo, o cliente mostrará sinais de cansaço; mexer-se na cadeira, suspirar, olhar para o relógio,para a saída etc.Para o assistente social uma entrevista demasiadamente prolongada torna-se também cansativa e difícil de ser reconstituída ao redigir o relatório. A prolongação da entrevista pelo cliente, sem razão válida, pode ser considerada uma manifestação de dependência emocional; para o próprio benefício do cliente, o assistente social deve impedir que se estabeleça esta dependência e procurar o término da entrevista. Esta, entretanto, não deve ser curta demais;o cliente precisa sentir que o assistente social se interessa por ele e pode consagrar-lhe o tempo necessário à exposição de suas dificuldades (VIEIRA, 1981, p. 59)

O adequado, ao final de cada entrevista, é que o assistente social e o cliente consigam elaborar conclusões sobre o que foi trabalhado naquele dia, seja para a manifestação para solicitação de um auxílio, ou demais providências a serem tomadas


damento do trabalho. O tempo da entrevista vai de acordo com o seu conteúdo e com a disponibilidade de ambos os envolvidos, porém, como foi dito anteriormente, se a entrevista se estender muito acabará interrompendo a produção, influenciando no resultado pretendido.

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por ambas as partes, estabelecendo uma reciprocidade fundamental para o bom an-

Fonte: Unifacs EAD

Durante as entrevistas, algumas técnicas são muito utilizadas para conduzir um bom trabalho, como por exemplo: observar o cliente, com a atenção devida, seu com-

portamento, suas atitudes, sua aparência e apresentação, a maneira como elabora os ________________________ questionamentos e como responde quando é questionado, ajudará o assistente social ________________________ na elaboração de um diagnóstico. Por vezes, o cliente não verbaliza o que realmente sente porque não sabe que vivencia, de fato, esses sentimentos. Então, por meio da observação, o assistente social poderá revelar esses conflitos apenas pelas atitudes e comportamento do cliente, identificando sentimentos não reconhecidos ou assumidos e que revelarão indicações precisas da personalidade de cada um. Outra técnica muito utilizada, ou melhor, que deve ser sempre utilizada nas entrevistas é “ouvir”.

Fonte: www.sxc.hu/ID 1032418

Ser um bom ouvinte será determinante para o sucesso da entrevista, contudo, é preciso estar bastante atento para que o foco do trabalho não se perca em meio a emoções.

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O assistente social deve igualmente saber ouvir. Não é fácil ser um

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bom ouvinte, muito embora ninguém negue o valor terapêutico do desabafo. O fato de poder falar com alguém que escuta com interesse, de poder contar e, portanto, verbalizar sua preocupação representa para muitos clientes o tratamento quase completo. Ouvir com atenção e com interesse não quer dizer conservar-se em silêncio ou passivo; a atitude atenta, sinais de compreensão e assentimentos mostram ao cliente que está sendo ouvido. (VIEIRA, 1981, p. 59)

Observar e ouvir são técnicas fundamentais para o desenvolvimento da entrevista, em especial quando o cliente tem dificuldades em interagir sobre seus sentimentos. No momento em que o cliente está começando a desenvolver a sua história, imprimindo grande força para se expressar, se questionado sobre algo que o faça sentir-se tímido ou perca o sentido da conversação, certamente ele irá travar o seu raciocínio, sentindo grandes para, posteriormente, reiniciar a entrevista. Por isso, a importância de observar com atenção e ouvir com tranquilidade o que ele tema dizer. Além de facilitar o desenrolar dos trabalhos, será sedimentada a sensação de confiança do cliente para com o assistente social, e irá facilitar o prosseguimento dos trabalhos numa sequência proveitosa, sem que o cliente precise dispensar grande esforço para que os resultados sejam obtidos.

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Ao questionar, no decorrer da entrevista, assistente social precisa adequar a sua necessidade à realidade do cliente. É preciso fazer uso de uma linguagem de fácil entendimento, acessível à compreensão do mesmo. Termos científicos podem vir a atrapalhar a compreensão do cliente e é preciso evitar, durante os questionamentos, sugestões que possam influenciar as respostas ou obter como respostas um “sim” ou “não”, pois é preciso que o cliente desenvolva a resposta narrando-a de modo a deixar em evidência os problemas que o aflige, assim como deverá ser estimulado a elaborar seus próprios questionamentos para o assistente social. Durante a entrevista é recomendado que o assistente social não faça anotações enquanto o cliente estiver falando. Se houver a necessidade de preencher alguma ficha, por formalidade, que seja feita na presença do cliente para que ele verifique e, achando pertinente, acrescente ou mude alguma informação. As entrevistas poderão ser realizadas na obra, empresa ou mesmo na residência do cliente. Neste caso, o ideal é que seja evitada a intromissão de vizinhos ou amigos, pois, na presença destes, provavelmente o cliente não falará com tanta transparência quanto falaria se apenas na presença do assistente social estivesse. Interrupções durante a entrevista também acontecem nesse âmbito, como a interrupção para verificar afazeres domésticos, atender ao pedido do filho, ao chamado do vizinho. São situações que, seguramente, não permitirão que os resultados da entrevista sejam obtidos, assim como visitar o cliente nas horas de refeições, pois o cliente pode se ver compelido a convidar o assistente social para se juntar à mesa e, se o assistente se negar, poderá soar como uma ofensa á família. Contudo, se outrora lhe for oferecido um café ou suco, será de bom tom aceitar. Ao degustar o líquido juntos a relação poderá se estreitar, o que proporcionaria maior fluência nos trabalhos.


dades tanto para o assistente social como para o cliente. Há muitos “barracos” ou casa de cômodos onde o assistente social não encontrará um banco ou um caixote para sentar-se. A entrevista será freqüentemente interrompida pelas crianças, pelos vizinhos e até pela necessidade de retirar uma panela do fogo. [...] Deve-se evitar visita às horas das refeições; o cliente pode julgar-se obrigado a convidar o assistente a participar da mesa e este, recusando-se fazê-lo, pode involuntariamente ofender o dono da casa. Por outro lado, se no de-

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A entrevista na residência nem sempre oferece as mesmas comodi-

correr da visita lhe for oferecido um “cafezinho” ou um refresco, deve aceitá-lo sob pena de melindrar o cliente. O fato de tomarem juntos uma xícara de café poderá contribuir para um bom relacionamento (VIEIRA, 1981, p. 61).

Observar estes detalhes irá focalizar o cliente nos seus próprios problemas e ele irá aceitar que mudanças precisam acontecer. O assistente social deve conhecer a comunidade onde trabalha, onde vive seu cliente, quais são os recursos disponíveis, como vivem diante das adversidades. Normalmente, os clientes do Serviço Social que são moradores de comunidades são pessoas simples, de poucos recursos, pouco alfabetizadas, pouco entendedoras de documentações e, normalmente, ludibriadas por pessoas que tiram vantagens

aproveitando-se da ignorância desses moradores. Nesse diapasão, o Serviço Social de ________________________ Caso “[...] procura um equilíbrio entre a pessoa e o meio em que vive; focalizando os ________________________ elementos sadios da personalidade, o cliente pode ser ajudado a melhor adaptar-se ao ________________________ meio e a melhor atuar nele” (VIEIRA, 1981). Após conhecer o ambiente que cerca o seu cliente, o assistente social conseguirá distinguir, após as entrevistas, ou durante elas, se as reações de seus clientes são proporcionadas pelo ambiente que os cercam ou se este os revolta e angustiam ou se trata apenas de reações da própria personalidade de seu cliente. A partir desse momento, ao assistente social será possível aplicar os princípios técnicos e desempenhar o seu papel de liderança, contribuindo para uma significativa melhoria nas relações estabelecidas entre o Serviço Social e os clientes, público de seu trabalho. O maior benefício que se faz a uma pessoa é torná-la consciente de poder reformar-se e aperfeiçoar-se. Não se pode, entretanto, desenvolver tais energias sem ensinar, de maneira sistemática, a compreender a natureza da motivação, isto é, sem fazê-la ver como encarar essa situação ou como lidar com os outros e que atitude ter para com o assistente social que atua como “conselheiro” ou “terapeuta”. Para que o assistente social possa ajudar o cliente a mobilizar seus sentimentos no sentido de tomar novos rumos, progredir e adaptarse à realidade – é preciso que tenha na sua formação profissional, adquirido boa base psicológica. No Serviço Social de Casos, o cliente é estimulado a participar no estudo de sua situação, nos planos a serem feitos e no esforço para resolver sua situação, usando seus próprios recursos e os da comunidade que lhe sejam necessários ou favoráveis a seu caso (HAMILTON, 1996, p. 38).

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96 Uma das principais características do Serviço Social de Caso é a individualização dos problemas sociais pelo assistente social de modo que seja possível fornecer capacidade técnica e psicológica para o cliente lidar com as situações diversas e resolver seus problemas. Uma participação ativa do cliente será possível a partir da construção de um relacionamento baseado na confiança e reciprocidade que deve ser estabelecida entre o assistente social e o cliente. Isso se dará a partir de um estudo, em conjunto (isso é importante) dos problemas identificados e das respectivas medidas necessárias para a resolução dos mesmos. É importante informar que o método de serviço social de casos surgiu nos Estados Unidos. Mary Richmond foi quem sistematizou o método. Era uma abordagem centrada no cliente. De acordo com Neves (1990, p.202 apud SILVA, 2008, p 99), Gordon Hamilton defendia que:” [...] O caso era considerado um problema e o tratamento um processo psicossocial. O “caso social” é um fato humano” no qual estão contidos fatores econômicos, físicos, mentais, emocionais e sociais que atuam com menor ou maior intensidade”. ratava-se de uma abordagem com forte influência da psicanálise, visto que os casos eram tratados de forma individualizada. Entretanto, deve ser salientado o viés funcionalista, pois o assistente social trabalhada numa perspectiva de ajustamento do indivíduo à sociedade. No Brasil, este modelo foi incorporado à prática dos assistentes

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sociais no pós II Guerra Mundial. Na atualidade, o assistente social não trabalha mais com este método, visto que o serviço social contemporâneo está referendado na teoria marxista, todavia não se pode negar a contribuição do método no que se refere ao seu instrumental. Hoje, os profissionais ainda trabalham com entrevistas, visitas domiciliares e pareceres, por exemplo. Antes, estes instrumentos eram utilizados para alienar o indivíduo em prol da ordem social; agora, são utilizados como meios de garantir os direitos dos usuários do Serviço Social.

SÍNTESE

Nesta aula, conhecemos o método do Serviço Social de Caso. Apesar deste método não ser mais utilizado pelos assistentes sociais, é importante conhecê-lo, a fim de nos apropriarmos da evolução teoricometodológica do Serviço Social. Na próxima aula, vamos desvendar o serviço social de grupo. Nos encontraremos lá!

QUESTÃO PARA REFLEXÃO O assistente social em sua trajetória profissional experimentou vários métodos de trabalho, entre eles o Serviço Social de Caso. Nesse sentido, reflita sobre a impor-


cussão em nossos fóruns.

LEITURA INDICADA LEWOY, Alzira Maria Baptista; SILVEIRA, Maria Carvalho. A entrevista nos processos de trabalho do assistente social. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/

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tância desse método e escolha um de seus instrumentos para aprofundarmos a dis-

index.php/fass/article/viewFile/2315/3245 Acesso: 30/05/2010.

REFERÊNCIAS HAMILTON, Gordon. Teoria e prática do serviço social de casos. 3. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1996.

LEWOY, Alzira Maria Baptista; SILVEIRA, Maria Carvalho. A entrevista nos processos de trabalho do assistente social. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fass/article/viewFile/2315/3245 Acesso: 30/05/2010.

SILVA, Maria Ferreira da. Questão social e serviço social no Brasil: fundamentos sociohistóricos. Cuiabá: EdUFMT, 2008.

VIEIRA, Balbina Ottoni. Serviço social: Processos e técnicas. Rio de Janeiro: Agir, 1981.

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Autora: Patrícia Dantas Vergasta

“O homem não se mede pelas vezes que cai, mas pela elegância com que se levanta.”

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AULA 07 – SERVIÇO SOCIAL DE GRUPO

Charles Chaplin

Olá, querido (a) discente!

Estamos no caminho certo para o sucesso! É possível ganhar o sucesso? Não, não é possível, ele é a consequência de um processo de busca pelo alcance de objetivos, ele é conquistado. E essa conquista é tão somente derivada de uma sequência de atos e obstáculos vencidos. E, a cada aula que estudamos, enveredamo-nos pelo caminho do sucesso, seguramente. Decidir conquistá-lo é o primeiro passo para a sua obtenção, assim como decidir pelo viés do conhecimento é o primeiro passo para uma formação técnica e capacitada para lidar com inúmeras situações ao longo da vida pessoal e profissional. Estudaremos, agora, o Serviço Social de Grupo, penúltima etapa do nosso atual período. Iremos verificar suas nuances técnicas e como atuar frente uma coletividade, algo simples de imaginar, contudo, complexo e desafiador para a militância da profissão nos primórdios da profissão. E, graças ao nosso acervo de conhecimentos, certamente o trabalho frutificará na forma de resultados positivos, progressivos e reveladores de um sucesso sedimentado ao longo de suas carreiras. Definidos e estipulados os nossos objetivos, estejamos prontos para mais uma etapa rumo ao sucesso, para mais uma aula. Avante!

Bons estudos!

REFLEXÕES SOBRE GRUPO

Sabe-se que o homem não consegue viver só. É necessário estar em grupo, comunidade, sociedade. Suas necessidades estão intimamente ligadas à vida coletiva e, para manter esta convivência, se faz necessário administrar e aperfeiçoar suas relações, independente dos vínculos causais, independente de fatores éticos ou culturais. Outrora, os grupos detinham em sua essência inúmeras funções, deveres a serem observados e realizados. Isto porque, dada a pouca numerosidade, esses grupos eram responsáveis pela realização das mais diversas tarefas e eram obrigados a con-

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centrá-las em seus seios, afirmando sua polivalência.

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Por conta dos poucos grupos, as sociedades adquiriram contornos patriarcais, familiares. Atualmente, a sociedade apresenta uma enorme variedade de grupos em seu cerne, e a velocidade com a qual veem surgindo transforma a sociedade num complexo sistema de pessoas, objetivos e ideais.

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Os grupos apresentados como voluntários, quais sejam aqueles nos quais as pessoas ingressam e os deixam livremente, tais como associações econômicas, ligadas à cultura ou esporte, são os que mais interessavam ao estudo do Serviço Social, contudo, num primeiro momento não foram considerados tão importantes para serem trabalhados.


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Fonte: Clipart

Paradoxalmente, no início do século passado, o Serviço Social preocupava-se mais com as classes mais saudáveis, a fim de fazer a manutenção do bem-estar de seus integrantes, evitando, deste modo, que más influências maculassem a sua saúde e equilíbrio. Os Centros Sociais da época tinham o objetivo de evitar que os adolescentes se tornassem delinquentes em potencial, oferecendo-lhes o que havia de mais interessante na área do esporte, cultura e recreação.

Fonte: Clipart

Os programas propostos por esses centros eram o reflexo do desejo dos educadores. Diversos grupos materializavam movimentos que, dentro da coletividade, semeavam códigos de conduta e comportamento capazes de abranger um maior número de jovens ao mesmo tempo. Isto representava economia financeira e de tempo, além de permitir que expressões e valores individuais fossem analisados sob uma perspectiva de convivência social.

A Ação Social era um dos programas sedimentados pelos Centros Sociais. O principal escopo desse programa era auxiliar os indivíduos dos grupos de modo a incentivarem a melhorar o meio ambiente em que viviam, conforme aborda Vieira (1981):

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102 Um terceiro programa, objetivo dos Centros Sociais, era a Ação Social; treinar ou ajudar indivíduos em grupos para melhorar o ambiente, obter uma legislação adequada ou recursos necessários às comunidades ou dirigir atividades. As obras sociais não tinham idéias precisas sobre o assunto, mas sentia a necessidade de treinar o pessoal: o líder para os movimentos de juventude, o instrutor ou monitor para as atividades esportivas ou recreativas, o animador para os grupos de ação social (VIEIRA, 1981, p. 104).

Os grupos começaram a ser visualizados como um terreno fértil para a formação e desenvolvimento da personalidade. Os voluntários mais aptos trabalhavam com os grupos das crianças e adolescentes, enquanto os assistentes sociais trabalhavam, também, com os grupos, porém, sob uma perspectiva terapêutica, de tratamento.

Ver Imagem no Link a baixo: Fonte: http://sandracajado.com.br/2010/06/08/voce-ja-se-olhou-no-espelho/

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No período pós-guerra, o Serviço Social foi decisivo para orientar os grupos. O elevado número de idosos, inválidos da guerra, jovens em bases militares, crescente organização industrial impulsionou o direcionamento dos métodos do Serviço Social também nesse sentido, tendendo a ampliar o processo de tratamento para os indivíduos em estado de desequilíbrio, afirmando uma atuação não somente preventiva como repressiva também.

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Segunda_Guerra_Mundial


ajudaram a rabiscar um conceito do que seria o Serviço Social de Grupo, qual seja: “[...] ajudar os indivíduos, através de grupos, a solucionar problemas pessoais e de relacionamento ou de ajustamento social; alcançar os objetivos do grupo; prepará-los para participar ativa e efetivamente na vida da comunidade (VIEIRA, 1981, p.105)”.

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Nesse sentido, os estudos realizados por Escolas Americanas de Serviço Social

Tal conceito fez reverberar que o Serviço Social mantinha os mesmos objetivos estipulados no início do século passado, contudo suas finalidades evidenciaram a valoração à essência do ser humano e a necessidade de se trabalhar os conflitos debruçados sob uma base científica, ampliando o processo terapêutico dos trabalhos do Serviço Social de Grupo, fazendo com que o indivíduo, sujeito das relações sociais estabelecidas, pudesse identificar seus problemas e encarassem a resolução dos mesmos como

um objetivo a ser alcançado, ajustando-se no seio social de modo

a sedimentar relações equilibradas com todos a sua volta e, consequentemente, trabalhando a prevenção referente aos desajustes sociais que poderiam desequilibrar o processo social.

Fonte: Clipart

Para Vieira (1981), é possível elencar a finalidade do Serviço Social da seguinte forma:

1) ajudar o indivíduo a resolver problemas pessoais que não podem ser resolvidos por um tratamento individual, seja pela interferência de costumes ou tradições culturais, seja porque precisa de uma experiência de socialização;

2) resolver problema de relacionamento ou de adaptação ensinando o indivíduo a viver em sociedade, ajustá-lo às exigências da vida moderna, através de experiências planejadas, de modo a levá-lo a

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participar inteligentemente das atividades do grupo, e assim obter satisfação pessoal como membro de uma equipe;

3) ajudar o Grupo, como um todo, a atingir seus objetivos e desenvolver nesta experiência sua consciência social cooperando com a instituição que o obriga e com outros grupos da comunidade. [...]

4) descobrir e treinar líderes e educar os membros do grupo para assumir responsabilidades cívicas e sociais na comunidade (VIEIRA, 1981, p.106).

Obrigado a conviver em sociedade, o indivíduo precisa estar atento ao seu espaço e ao espaço alheio, ciente de que todos possuem opiniões diferentes e diferenciadas e têm o direito de manifestá-las, devendo controlar paixões e impulsos, respeitar direitos e observar deveres, assegurando uma sociedade equilibrada e participativa. Trabalhando no Grupo, o Serviço Social pode usar as experiências alheias em compasso com as técnicas profissionais para proporcionar aos indivíduos de um grupo o planejamento de suas próprias escolhas, adaptando as orientações às qualidades e expectativas do grupo, almejando superar dificuldades, vencer desafios e estimular

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a busca para alcançar objetivos.

Fonte: Clipart

A vida em grupo, sociedade, pleiteia a liderança como forma de orientação e organização, estimulando os demais para agir frente à diversidade de situações vivenciadas diariamente e estimulando a busca pela resolução dos conflitos. Por isso, é tão importante para o Serviço Social de Grupo a identificação desses líderes. Ademais, estimulando a capacidade dos indivíduos e desenvolvendo a potencialidade para liderar, será possível ao Serviço Social entrar em sintonia com o grupo a partir do momento em que os líderes podem dispensar oportunidade de satisfação e realização para si e para os outros que integram o grupo, beneficiando a todos, inclusive quando da ne-


contribuição de Vieira:

Essa finalidade do Serviço Social de Grupo: descobrir e treinar líderes, se pre4nde às duas primeiras; de fato, para auxiliar o indivíduo a se ajustar à vida da sociedade e a viver nela de maneira satisfatória, é preciso ajudar o indivíduo a desenvolver harmonicamente suas

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cessidade de fazer escolhas e direcionar obrigações. Nesse sentido, vamos conhecer a

capacidades e aplicar suas qualidades e talentos não apenas para sua satisfação própria, mas para o bem do grupo e da comunidade. Se possui latentes qualidades de liderança, estas, tendo oportunidade de se desabrochar, beneficiarão tanto a ele como ao grupo. As experiências num grupo restrito lhe darão oportunidades para assumir, aos poucos, responsabilidades quanto a escolha de soluções e divisão e execução das tarefas, permitindo um treinamento progressivo para que cada um dos membros possa contribuir, dentro de suas possibilidades, para o desenvolvimento da sua comunidade (VIEIRA, 1981, p.107).

Os grupos podem variar sua constituição, conforme seu tamanho e dimensão. Grupos grandes representam relacionamentos distantes, vazios, ao passo que os menores se revelam quase familiares, todos se conhecem e respeitam e interagem.

Fonte: Clipart

Nesse ínterim, os grupos podem ser a turba, que consiste num grupo em que as pessoas convivem no mesmo espaço, não se respeitam, não se controlam e dificilmente são controláveis, com infraestrutura física e íntima semelhantes à de animais; a massa, que se trata de uma aglomeração de pessoas semelhantes sociologicamente, contudo, indiferentes entre si; os agrupamentos são os grupos de pessoas reunidas

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com uma finalidade imediata, próximas num determinado espaço físico; o pequeno grupo é aquele cujas pessoas compartilham de interesses e objetivos semelhantes, mantém uma relação frequente e são próximos fisicamente. Nesse último, o Serviço Social de Grupo consegue estabelecer uma relação profissional, pois não basta ser um grupo, composto por indivíduos que se relacionam, é preciso que haja uma sintonia entre os objetivos, anseios e, consequentemente, haver uma relação de proximidade entre as pessoas que o compõem. Nesse sentido, Vieira (1981) corrobora para conceituar, mais uma vez, o Serviço Social de Caso, quando rume que “o grupo é uma reunião homogênea de indivíduos que pode se formar espontaneamente ou ser motivada por um agente exterior e reúne-se freqüentemente para satisfazer interesses ou necessidades comuns” (p. 108). Na sociedade, os grupos podem ser formados por si só ou provocados,como nos afirma Vieira:

Os grupos podem se formar espontaneamente ou ser motivados. Nossa sociedade oferece inúmeros exemplos de formação espontânea de grupos; basta observar na rua, num bairro residencial, para verificar a existência de vários grupos de crianças e adolescentes; nas praias surgem interessados nos esportes praianos ou numa con-

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vivência domingueira à sombra das “barracas”; jovens e adultos se reúnem periodicamente, às vezes durante vários anos consecutivos, para promover excursões, dança,jogar. Nossas cidades estão cheias de pequenos grupos que se reúnem na casa de um outro para ouvir música, jogar “bridge” ou canastra (VIEIRA, 1981, p.104).

Para que o Serviço Social de Grupo possa fazer suas vezes nos grupos constituídos espontaneamente, é preciso que o assistente social conheça as causas que deram origem a sua constituição, suas características e motivações para que seja possível a aplicação do processo. Quando um agente alheio provoca a sedimentação de um grupo, os assistentes sociais encontram uma possibilidade maior para sua obra porque, em verdade, a obra não provoca a formação de um grupo, e sim proporciona que pessoas se organizem a fim de estabelecer entre si vínculos que os permitam sedimentar e apreender algo junto, pois, como se pode deduzir, se o grupo é motivado, significa que ainda não há nenhum tipo de relação entre os indivíduos. Nesse sentido, alguns atrativos podem ser os provocadores de tal constituição, seja o oferecimento de um esporte ou a possibilidade de desenvolver algum tipo de arte ou, simplesmente, descrever conhecimentos que poderão ser adquiridos. Desta maneira, os laços serão constituídos aos poucos, a partir das afinidades identificadas, satisfazendo os interesses pessoais e estruturando objetivos em comum a serem alcançados. Os grupos podem organizar-se formalmente ou mesmo nada que se pareça com organização, o que não interessa para o Serviço Social de Caso.


vado para o ingresso de seus membros, divididos em grupos de socialização, de aprendizagem e de representação, que nos são apresentados por Vieira:

Os grupos de socialização representam a democracia em ação, pois em geral os membros elegem diretorias responsáveis para os trabalhos relacionados com as atividades e a sobrevivência do grupo; é

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Quando formais, os grupos têm estabelecido regramento próprio a ser obser-

incontestável o melhor tipo de grupo para a aplicação do processo de Serviço Social de Grupo. (...) Os grupos de aprendizagem possuem uma organização mais rígida, visto que a direção do grupo repousa nas mãos de uma pessoa – o professor – que quase sempre não é um membro do grupo. A permanência no grupo é reduzida, pois é provável que ele se disperse uma vez terminado o programa de ensino. Os grupos de aprendizagem constituem, em nosso país, um meio importante para motivar as pessoas a ingressar num grupo de socialização. (...) Os grupos de representação, ao contrário dos dois primeiros, não procuram beneficiar seus próprios membros, mas os diversos grupos que os membros representam; a comissão, o conselho, se reúne e trabalha em benefício de outros grupos. Sua duração pode ser mais ou menos longa, dependendo da sua finalidade; o número de seus membros é sempre reduzido. Nesses grupos, o indivíduo aprende a representar seus pares, a lutar democraticamente para o benefício do seu grupo, a esquecer seus interesses em benefício daqueles que o escolheram. É, portanto, o complemento do grupo de socialização na educação para a democracia (VIEIRA, 1981, p.110/111).

Para os grupos restritos se tornarem férteis para a obra, é necessário que algumas condições estejam presentes em seu cerne, de modo a permitir a introdução das técnicas do Serviço Social. Trata-se de precisar haver um número limitado de pessoas, homogeneidade e reunião periódicas e com certa frequência.

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Faz-se necessário que as pessoas do grupo se conheçam, estabeleçam certa afinidade e permitam um canal de comunicação entre si. Por isso é importante que o grupo tenha um numero limitado, contudo, estipular o número de indivíduos não se-

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ria adequado. Apesar do número ideal de pessoas num grupo ser entre 6 e 15 indivíduos, é preciso ter bom senso para que os indivíduos não se sintam perdidos no grupo. Observar como interagem será importante para direcioná-los aos grupos certos, que melhor se enquadre aos objetivos da obra. O assistente social precisa saber quais são as necessidades e conflitos de cada membro do grupo, daí a importância de direcionálo para um grupo em que as suas características possam se tornar evidentes. A homogeneidade dos grupos corrobora para a identificação dos seus membros, visto que os interesses e “problemas” devem ser compartilhados pelos membros do grupo de modo a permitir que os objetivos do Serviço Social de grupo sejam trabalhados num contexto razoável de interesses semelhantes. Para isso, o ideal seria articular grupos levando em consideração as características dos indivíduos, seja idade, classe social, e, por vezes, o sexo. Entrementes, afirmar uma homogeneidade rigorosa poderia gerar situações desagradáveis, segregando os indivíduos e impedindo de continuar o trabalho. Quando se fala em homogeneidade, deve-se ter bem aclarado que cada pessoa é um mundo diferente e rico em características e possibilidades. Por isso, sedimentar grupos conforme suas características, tais como adolescentes com adolescentes, adultos com adultos, classe média com classe média, dentre outros, seria necessário a partir do momento em que são reconhecidas as diferenças e semelhanças de cada grupo. Um exemplo disso é reconhecer que adolescentes vivem situações relativamente diferentes das vivenciadas por adultos, um trabalhador da classe média internaliza conflitos que um membro de classe alta desconheça completamente. Portanto, vale a pena refletir as palavras emprestadas de um ilustre Jurista Rui Barbosa, muito pertinentes ao nosso assunto, quando afirmou, no pretérito a seguinte lição:


te aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade... Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. (BARBOSA, 2006, s.p)

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A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmen-

NAVEGANDO NA WEB: Vale a pena conhecer o famoso Jurista a que fizemos menção. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ruy_Barbosa

Convém aqui fazer uma importante e oportuna observação: quando nos reportamos à lição de Rui Barbosa, não pretendemos aqui fazer soar em tom de discriminação o desmembramento em grupos de indivíduos com características pessoais e sociais semelhantes. É de fácil compreensão a afirmação de que todos são iguais, sob ________________________ o ponto de vista formal e de direitos políticos, todavia, sob o plano dos direitos sociais, ________________________ muitas desigualdades são apresentadas de modo que o próprio Estado permite, nos ________________________ dizeres de Simões (2009) uma “discriminação legal” a fim de que seja obtido um equi- ________________________ líbrio social em meio às desigualdades sociais. Em relação à igualdade, vale refletir sobre a contribuição de Simões:

Isso significa que a igualdade, como princípio geral, pode ser excepcionada quando a Constituição assim permite, o que expressa seu valor relativo. E permite a exceção quando a lei, ao diferenciar os cidadãos com base nas desigualdades sociais (discriminação positiva), nada mais objetiva do que compensar essa desigualdade e, assim, repor a igualdade, segundo o princípio de que os iguais devem ser tratados igualmente e os desiguais, desigualmente, na razão inversa dessa desigualdade (equidade). (SIMÕES, 2009, p. 73-74).

Desprendemos de toda a discussão acima que um certa homogeneidade revela-se uma condição importante para que o Serviço Social de Grupo possa tornar eficaz e eficiente as suas técnicas, respeitando as peculiaridades e procurando estabelecer um liame subjetivo entre os membros que vivenciam situações assemelhadas entre si. A frequência nas reuniões do grupo garante a continuidade do processo. Por meio do contato frequente, é possível estreitar laços e promover o progresso da obra,

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seja sob a baila individual, seja em relação à coletividade. Alguns fatores devem ser observados e respeitados para estipular a frequência das reuniões. Se o grupo for composto por jovens e adultos, as reuniões tendem a ser intervaladas, pois a frequência diária poderia gerar um desconforto assemelhado a obrigação, o que não seria interessante no processo. Para um grupo de crianças, o ideal é que as reuniões sejam diárias, fazendo com que se torne cada vez mais interessante, agradável ao seu dia-a-dia e produtivo.

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A duração desses grupos será determinada pela visibilidade de suas próprias necessidades e respostas ao processo aplicado. Alguns terão uma longevidade maior, outros um período de vida predeterminado.

[...] alguns duram anos, transformando-se aos poucos tanto na sua composição como na sua estrutura ou finalidade. [...] Outros grupos, pela sua própria natureza ou finalidade, tem uma duração predeterminada, como acontece com grupos formados nas colônias-deférias ou para um curso. A duração prevista para o grupo influi sobre a técnica a ser empregada, a organização do programa e o uso das atividades. Os objetivos a serem atingidos devem ser claramente definidos pelo assistente social e o processo sofrer as adaptações necessárias. Não é, no entanto, a duração da vida do grupo que é importante, mas o aproveitamento do tempo em benefício dos membros individualmente e do grupo como um todo. (VIEIRA, 1981, p. 111).

Os indivíduos de um grupo precisam se aceitar, mutuamente, para que haja resultados durante o processo. O papel que cada indivíduo desempenha, seus anseios, a personalidade, enfim, sua situação inicial serão fatores determinantes para que haja identificação com os membros de um mesmo grupo. Suas qualidades pessoais e seu nível de contribuição podem determinar ser o indivíduo será aceito por todos ou rejeitado por alguns. Nesse diapasão, é preciso que o respeito se sobreponha seja na relação indivíduo grupo quanto na relação grupo indivíduo, pois, sendo assim, posteriormente, a aceitação será alcançada.


O PROCESSO DO SERVIÇO SOCIAL DE GRUPO O Serviço Social de Grupo ganhou espaço, no Brasil, no final da década de 40, do século XX, como resultado da influência norte-americana. Hoje este método não existe mais, contudo é importante compreendê-lo.

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A finalidade precípua do Serviço Social de Grupo, conforme Vieira (1981), é ajudar o indivíduo nos seus problemas de relacionamento e o grupo, como um todo, a funcionar normalmente na sociedade. A observação de regras, diferenças comportamentais e o respeito poderão ajudar na sedimentação de uma convivência harmônica com reflexos para além das obras. Isso corresponde à função de socialização do Serviço Social. Outros objetivos imediatos podem ser identificados como objetivos do Serviço Social de Grupo, tais quais: a adaptação a modos de vida, treinar lideranças, reabilitar, entre outros. O processo de aplicação necessita que o assistente social esteja atento para aplicar algumas fases do processo: o estudo do grupo e seus membros, o diagnóstico e o tratamento social do grupo e respectivos membros. O estudo dos membros e do grupo consiste em conhecer o contexto ao qual o ________________________ indivíduo está inserido, podendo fazer uso de perguntas com o intuito de obter res- ________________________ postas esclarecedoras ou, ao menos, que permitam estabelecer um canal de comuni- ________________________ cação. ________________________ O assistente social deverá identificar as características e comportamentos dos membros, verificando quais os problemas que os acometem, quais atividades são frequentes em suas vidas diariamente, o que pensam, como conduzem as dificuldades, de que maneira deliberam e executam possíveis soluções para os conflitos. Toda e qualquer informação será válida quando da intenção em trabalhar junto destes indivíduos. A partir da observação, ao assistente será possível elaborar um diagnóstico, que servirá de planejamento para o tratamento social, que começará pela formação dos grupos, onde o assistente social será o facilitador para que os membros se conheçam; a deliberação, em que o assistente social atuará mais incisivamente , escolhendo, planejando, distribuindo tarefas, sempre em parceria com o grupo, orientando-os e estimulando os comportamentos desejáveis pelo processo de tratamento social; a utilização dos controles servirá para que o assistente social identifique e municie os líderes em potencial de modo que estes atuem como líderes construtivos, sem que o assistente social se abstraia do grupo, devendo saber até onde deve agir impondo suas pretensões e como poderá aconselhar para que as mudanças se materializem. As atividades dentro dos grupos ocupam papel de responsáveis para as finalidades que almejam atingir. Devem sempre transportar para cada membro uma experiência construtiva e estimuladora de novas descobertas. Os valores agregados a essas atividades irão refletir um relacionamento construtivo e padronizado de interesses por

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mudar as situações de conflitos vivenciadas. É o grupo, em grupo, buscando e diligenciando as soluções de seus próprios conflitos. Analisar as atividades desempenhadas nos grupos revelará as necessidades proeminentes e as possíveis soluções para obtenção da satisfação dos membros, dentro do grupo, e no contexto onde vivem.

SÍNTESE

Nesta aula, conhecemos o método de Serviço Social de Grupo. Apesar de o serviço social não trabalhar mais com essa abordagem, é fundamental conhecê-la a fim compreender a evolução da profissão. Na próxima aula, estudaremos o método de desenvolvimento de comunidade. A gente se encontra na próxima aula!

QUESTÃO PARA REFLEXÃO Hoje o Serviço Social trabalha numa perspectiva de materialização de direitos. No passado, através dos métodos de Serviço Social de Caso, estudados na aula 6, e do

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Serviço Social de Grupos que conhecemos na aula atual, os assistentes sociais atuavam com o objetivo de ajustamento social. Comente esta assertiva e relacione as principais características do Serviço Social de Grupo no Fórum desta aula disponível no AVA.

LEITURA INDICADA VIEIRA, Balbina Ottoni. Serviço social: processos e técnicas. Rio de Janeiro: Agir, 1981.

REFERÊNCIAS BARBOSA, Rui. Oração aos moços (texto integral 1920). São Paulo : Martin

Claret, 2006.

SIMÕES, Carlos. Curso de direito do serviço social. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Cortez, 2009.

VIEIRA, Balbina Ottoni. Serviço social: pocessos e técnicas. Rio de Janeiro: Agir, 1981.


AULA 08 – DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE.

Autora: Patricia Dantas Vergasta

“Uma comunidade é como um navio; todos devem estar prepara-

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dos para tomar o leme.”

Henrik Ibsen

Olá, querido (a) discente!

Estamos na reta final de nossos trabalhos. Mas, o que seria o final se não início de uma nova etapa, de um novo começo? Alcançar objetivos é a essência dos que querem da vida muito mais do que ela tem a oferecer. Buscar o conhecimento, enfrentá-lo e aceitá-lo revelam as facetas de um guerreiro que não desiste frente ás diversidades, aos obstáculos e aos devaneios nas palavras “é muita coisa, eu não vou conseguir” ou “eu não consigo, não vou continuar”. Vale a pena, frente às resistências, fazer reverberar o lugar comum de “querer é poder”. Sim, aquele que quer alcançar metas busca, aquele que materializa a busca tem poder, e aquele que finaliza seu ciclo, independente do resultado, materializa o processo de desenvolvimento, do seu desenvolvimento, revestindo-se de coragem para encarar a vida exatamente como ela é. Acreditar é a palavra de ordem, contudo somada a nossa atitude nos faz experimentar um poder imensurável: o da mudança. Em nossa última aula deste período vivenciaremos os processos do Desenvolvimento de Comunidades, buscando identificar suas nuances técnicas, perpassando pela sua trajetória histórica de implementação e conceituação, afirmação e expansão do Serviço Social como agente imprescindível para os trabalhos, revelando a importância de um trabalho direcionado á satisfação do bem-estar de toda a sociedade. Juntos, iremos conseguir!

“O homem é mortal por seus temores e imortal por seus dizeres”. (Pitágoras)

Bons estudos!

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CONCEITUAÇÃO E HISTÓRIA O Desenvolvimento de Comunidades nasceu da preocupação com o ambiente da sociedade. Alguns assistentes sociais americanos, num período que precedeu a Segunda Guerra Mundial, estudaram sobre a “Organização da Comunidade” (VIEIRA, 1981, p. 173) com a finalidade de verificar a atuação da mesma na condição de processo do Serviço Social. A partir desse estudo, inúmeros conceitos surgiram, inclusive afirmando que era possível haver organização da comunidade fora do âmbito do Serviço Social. Ocorre que, o objetivo da organização em comento era, prioritariamente, coordenar os recursos sociais, e nos Estados Unidos isto era e ainda é responsabilidade dos Conselhos de Serviço Social, contudo, na Europa esse trabalho não foi relacionado a processos do Serviço Social, permanecendo apartado da expressão “Organização da Comunidade”.

________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/2f/Flag_of_the_United_Nations.svg ________________________ ________________________ ________________________ O reconhecimento da importância da Organização da Comunidade se tornou ________________________ evidente a partir da criação da Organização das Nações Unidas (ONU). Vieira nos apre________________________ senta a importância da ONU para a organização da comunidade: ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Com a criação da ONU e o auxílio técnico dado aos países subde________________________ senvolvidos, a Organização da Comunidade tomou um novo rumo ________________________ e uma importância crescente. Através de seus trabalhos de Assistên________________________ cia Técnica, a ONU constatou a necessidade de auxiliar os países a ________________________ desenvolverem suas comunidades dentro de sua cultura própria, ________________________ promovendo os recursos indispensáveis à vida normal e propiciando às populações uma educação de base que permitisse um mínimo ________________________ de bem-estar e de dignidade humana. Aplicou-se vários processos, ________________________ todos visando as comunidades, focalizando um ou outro aspecto, ________________________ empregando técnicas diversas, mas dirigidos para a mesma finali________________________ dade (VIEIRA, 1981, p.173). ________________________


PARA CONHECER MAIS SOBRE A ONU ACESSE:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Organiza%C3%A7%C3%A3o_das_Na%C3%A7%C3%B5es_ Unidas

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http://www.onu-brasil.org.br/ http://www.suapesquisa.com/geografia/onu.htm

O processo elaborado através da Organização da Comunidade, difundido, posteriormente, na América Latina, identificando que não bastava apenas promover os recursos assistenciais no seio das comunidades, era preciso tornar evidente, dentro da comunidade e pela comunidade, os problemas que a afligia, identificando necessidades e fazendo nascer, em seu seio, atitudes que visassem à colaboração no sentido de priorizar a dissipação dos conflitos, dentro de suas possibilidades e recursos disponíveis. Posteriormente, o processo de Organização da Comunidade originou uma matéria de estudos nos cursos de Serviço Social. Nesse ínterim, muitas escolas no Brasil resolveram estudar as diferenças entre “desenvolvimento de comunidades” e “organização da comunidade”. Após vários estudos, ficou constatado que as técnicas do Serviço Social, para o fim que ora discutimos, não podiam ser aplicadas igualmente em contextos diferenciados. Algumas comunidades, como as de países subdesenvolvidos, por exemplo, que apresentam indivíduos mais próximos uns dos outros, difere de comunidades de países industrializados. Nesse sentido, mudanças precipitadas em seus “meio-ambientes” gerariam uma série de desconfortos sociais, promovendo, inclusive, mudanças em valores considerados fundamentais para determinada comunidade. A ONU, em um de seus documentos, delimitou as finalidades do Desenvolvimento de Comunidade, conforme segue:

O termo “Desenvolvimento de Comunidade” designa a aplicação, dentro de um determinado programa e de uma comunidade, considerada como unidade de trabalho, de técnicas que procuram combinar assistência externa com os esforços locais de autodeterminação devidamente organizados, de maneira a estimular a iniciativa e a liderança, como instrumentos básicos para as mudanças a serem seguidas. Nos países agrícolas das áreas subdesenvolvidas são focalizadas atividades que podem proporcionar a melhoria das condições básicas de vida, assim como a satisfação de algumas das suas necessidades não materiais (VIEIRA, 1981, p. 176).

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Houve quem afirmasse, ao longo desses anos, que o Desenvolvimento de Comunidades relacionava-se à união de esforços dos habitantes de uma referida região com os poderes públicos, objetivando contribuir, de alguma maneira, para o bem-estar social. A ideia de que o Desenvolvimento de Comunidades também seria um elo entre a população e uma melhoria da qualidade de vida, igualmente foi disseminada. Trata-se de afirmações e indagações pertinentes, pois o propósito do Desenvolvimento de Comunidades possui íntima ligação com a participação popular, pois as suas intervenções e processos contam com a colaboração direta da própria comunidade, almejando, sobretudo, melhorar as condições sociais dos seus integrantes. Os principais precursores deste processo são a Inglaterra e os Estados Unidos. Em virtude das conquistas de territórios, aos ingleses coube a importante e urgente missão de controlar as populações sob seu domínio, desembainhando as técnicas do desenvolvimento de comunidades como forma de manter pacíficas as inquietações e, consequentemente, reverberando a sua poderosa influência, como nos apresenta Manrique Castro:

Dentro da multiplicidade de formas de intervenção e programas que os ingleses impulsionaram nos seus domínios coloniais, des-

________________________ tacaram-se inicialmente os que se inseriram no campo educacio________________________ nal – a integração cultural e a capacitação da força de trabalho -, ________________________ destinados a acelerar o trânsito ao capitalismo e a assegurar a su________________________ bordinação das forças autonomistas das nações dominadas. Sob este prisma [...], os programas iniciais de desenvolvimento de co________________________ munidade, auspiciados pelos ingleses (e, depois, durante os próprios ________________________ processos de descolonização), devem ser considerados “como estra________________________ tégias de dominação e controle estatal das contradições sociais, já ________________________ que tentavam, por um lado, conterás tendências emancipacionistas ________________________ das colônias e, por outro lado, redefinir os laços coloniais – valendo________________________ se de governos acumpliciados ou títeres -, num momento histórico ________________________ em que o simples controle militar da metrópole era insuficiente para manter o domínio colonial” ou assegurar a prosperidade dos negó________________________ cios do capital monopolista. Para isto, era necessário – como estava ________________________ inscrito no desenvolvimento de comunidade – incidir sobre o desen________________________ volvimento desigual não para suprimir as desigualdades nacionais, ________________________ mas para que a combinação entre tais desigualdades (nacionais ou ________________________ regionais) permanecesse favorável às metrópoles imperialistas nas ________________________ suas sucessivas fases de expansão e crise (MANRIQUE CASTRO, 2006, ________________________ p. 136-137). ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ O regime de desenvolvimento de comunidades continuou predominante du________________________ ________________________ rante o período neocolonial. Nos Estados Unidos, o desenvolvimento de comunidades ________________________ surgiu sob um prisma de apelido diferente, chamado de “organização da comunidade” e fazendo o uso de técnicas mais próximas do Serviço Social propriamente dito. O ob-


mercado, “[...] controlando as pressões reinvidicativas das maiorias rurais e urbanas, geradas ou postergadas pela anarquia capitalista” (MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 137). Nessa baila, temos dois processos de inserção do desenvolvimento de comunidades em contextos diferenciados, seja o da descolonização da África e Ásia pelos ingleses e neocolonização das mesmas, seja o do controle interno por motivos mercadistas. Apesar das contextualizações, os processos históricos carregam em comum o caráter de sistematização das técnicas e processos com uma finalidade, qual seja

117 práticas em serviço social II

jetivo nesse contexto era trabalhar dentro das desigualdades internas de seu próprio

considerar os problemas sociais e identificar os tratamentos pertinentes a cada reivindicação. Oportuno se torna, nesse momento, evidenciar as considerações de Bonfiglio (1982) que assim dispõe:

Outro aspecto comum destes métodos de intervenção é o fato de ambos recolherem uma variada gama de técnicas, sobretudo aquelas que derivam do auge das ciências sociais aplicadas, verificado nesses anos – a psicologia social (muito empregada com objetivos de comunicação, persuasão, organização etc.), a dinâmica de grupos, a utilização da funcionalidade das lideranças e outros procedimentos que confluem no chamado método de grupo do Serviço Social. Há que mencionar, ainda, os métodos e técnicas da antropologia aplicada (estudo de sistemas de parentesco, de dialetos e idiomas nativos etc.), assim como as técnicas de educação e alfabetização de adultos (BONFIGLIO, 1982, apud MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 139).

Nos Estados Unidos, a concepção de organização de comunidade permeava nuances funcionalistas no que dizia respeito à questão social. Isso revelava a peculiaridade do sistema norte-americano para identificar conflitos e tratá-los com o que estivesse disponível, aproveitando os recursos que estivessem ao alcance dos profissionais do Serviço Social. Vale ressaltar que a contextualização a que se faz referência era a de um país que almeja administrar seus conflitos oriundos do capitalismo, do mercado. Havia recurso, era preciso organizá-los. Na América Latina, a situação era diferente, em nada lembrava a situação vivenciada nos Estados Unidos. Inúmeras situações históricas e altamente complexas pareciam oferecer barreiras de resistência ao trabalho dos assistentes sociais, revelando um quadro social bem diferente do que era percebido na América do Norte.

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Entretanto, a situação da América Latina era e é essencialmente

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distinta da norte-americana e, pois, todas as recomendações sobre as modalidades de intervenção não podiam ignorar esta realidade elementar. A dramática condição de nosso continente, por exemplo, não poderia encontrar respostas apropriadas sobre as premissas emanadas dos procedimentos de organização de comunidade gestados nos Estados Unidos. Os profundos problemas derivados da sujeição econômica, do processo de proletarização da mão-deobra, dos efeitos da expansão do domínio imperialista, entre tantos, constituíam barreiras infranqueáveis para as recomendações concernentes ao trabalho dos assistentes sociais, em sua busca de uma combinação mais adequada entre as necessidades identificadas e recursos disponíveis (MANRIQUE CASTRO, 2006, p.143).

Nesse diapasão, foi preciso trabalhar sob a perspectiva de estar frente ao atraso no desenvolvimento social, a necessidade de intervir através de instrumentos adequados ao contexto de trabalho. Dada a sua consistência no que dizia respeito ao trabalho de desenvolvimento mais abrangente que métodos anteriores, como grupo e caso, pois o enfoque projetado na coletividade, além de focar individualmente os problemas, atribuiu uma ideia de completude por entender que contribuiu positivamente para o desenvolvimento

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de projetos estruturais importantes, o Desenvolvimento de Comunidades enfatizava, sobremaneira, a participação popular em todos os processos, evidenciando uma participação consciente, motivada e responsável dos indivíduos das comunidades assistidas.

DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADE: ASPECTOS IDEOLÓGICOS

O Desenvolvimento de Comunidade apresentou propostas que seduziram vários segmentos da sociedade

. Muitos setores reconheceram nele oportunidades

e motivações para enfrentar as condições de subdesenvolvimento apresentadas em seus respectivos contextos. Para tanto, revela-se imprescindível que os indivíduos das comunidades se identificassem como agentes participativos do processo, com o objetivo precípuo de identificar em seu próprio ambiente instrumentos para ajudar no enfrentamento do subdesenvolvimento. Manrique Castro nos fala sobre o papel da comunidade em seu desenvolvimento:

A comunidade como tal – imprecisamente definida – deve, segundo esta concepção, chegar ao convencimento de que os instrumentos para o seu desenvolvimento residem nela e, por conseguinte,


ma. Nesta interação de entraves e potencialidades, a comunidade terá que descobrir e libertar aquelas energias que a direcionem ao progresso econômico-social. Deduz-se também que este processo implica o acatamento dos termos desiguais da “associação” com o ”governo”, frente aos quais a capacidade negociadora da comunidade, para fazer prevalecer os seus pontos de vista, será insignificante se comparada com a magnitude real dos recursos disponíveis pelo Estado (MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 148).

119 práticas em serviço social II

que as razões do se atraso também se explicam a partir dela mes-

As sociedades subdesenvolvidas em nada vivenciam uma sensação de equanimidade frente outras comunidades. Reconhecidas as diferenças, a concepção fictícia de igualdade inclinaria a comunidade a estabelecer uma relação conjunta de trabalho com o Estado. A este caberia deixar à disposição dos trabalhos, recursos financeiros e técnicos, enquanto àquela era dispensado o dever de comprometimento e doação de esforços. Ocorre que, ao aceitar estes padrões desenvolvimentistas, a comunidade anuiria, tácitamente, com a relação de subordinação desta para com o Poder Público, como nos mostra Faleiros:

A aceitação deste padrão de relações acarretaria, por parte da comunidade, tanto a anuência com as formulações desenvolvimentistas quanto o estabelecimento de laços de gratidão e lealdade ao governo articulando-se um – entre vários outros – circuito reprodutor da ideologia dominante, apto para “mascarar as relações de exploração” e as “contradições fundamentais”. (FALEIROS, 1981, apud MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 149).

Sobre isso, Marinrique Castro afirma: “Em suma, embora formalmente se assinalasse o contrário, as organizações populares deveriam sujeitar-se à tutela oficial.” (MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 148-149). Conforme o seu conteúdo, o Desenvolvimento de Comunidades, de acordo com a ONU, significava “um método de trabalho destinado a facilitar a integração de recursos da população e do governo para colimar “o progresso nacional” “(MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 149). Nesse sentido, a capacitação de profissionais para laborar nesses processos era imprescindível, dada a crescente demanda dos díspares processos de desenvolvimento. Com esse objetivo, a ONU dispensou energia para elaborar programas de capacitação profissional para os assistentes sociais, ora denominados de especialistas em desenvolvimento comunitário, expandindo, consequentemente, a profissão e modernizando o Serviço Social e evidenciando a necessidade de ter um assistente social a frente desses processos de desenvolvimento, pois suas técnicas mos-

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travam identidade com os objetivos dos programas. A experiência desses profissionais com o caso e o grupo evidenciava certa vantagem em relação a outro profissional alheio a estes procedimentos em comunidades. Surge, nesse contexto, uma evidente expansão profissional do Serviço Social, tornando-se referência para o desenvolvimento comunitário, com novas responsabilidades e revalorizações que o situou em lugar de destaque junto à administração pública. Manrique ressalta o impacto sofrido pelo Serviço Social:

Este impacto sobre a profissão, sem dúvida, foi ainda maior quando o desenvolvimentismo saltou do marco de uma proposta para resolver os problemas do atraso e converteu-se em prática e diretriz de ação política de diversos regimes latino-americanos. Então, o conteúdo desenvolvimentista da profissão, que paulatinamente se gestava desde os anos cinqüenta, ganhou um campo de implementação no qual podiam ser desdobradas as mais variadas proposições e recomendações adotadas em numerosos encontros e seminários celebrados naqueles anos (MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 151).

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Graças a esta concessão dos verdadeiros valores e reconhecimento da importância do Serviço Social para o desenvolvimentismo, uma série de considerações foi delineada, tal qual a humanização do capitalismo, bem como a conquista do bemestar social e da democracia, todas refletindo objetivos sempre evidenciados pelo Serviço Social como condições conceituais necessárias à condução de uma sociedade equilibrada. Para efetivar as ambições desenvolvimentistas, aos assistentes sociais da época coube a tarefa de analisar as propostas impostas e avalizar “o programa desenvolvimentista, fornecendo assim um eloqüente testemunho de identidade e comprometimento” (MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 152). A ascensão dos profissionais do Serviço Social invadiu searas inusitadas para a profissão, refletindo a sua importância junto à administração pública. Investimentos em especialização, com o fornecimento de bolsas de estudos, facilitação de pesquisas multidisciplinares e concessão de cargos hierárquicos na estrutura da administração pública. Esta assertiva pode ser confirmada nas palavras de Manrique Castro:

Finalmente, converter-se em instrumentos da construção do desenvolvimento significava, para os assistentes sociais, conquista o reconhecimento social que a profissão almejou por tanto tempo. Está claro que – em nosso juízo – a expansão profissional gerada pelo


nando os seus alcances reais e conferindo-lhes efeitos que só parcialmente alcançou (MANRIQUE CASTRO, 2006, p. 152).

A doação técnica do assistente social para o Desenvolvimento de Comunidades significou adotar uma postura diferente da que lhe era dispensada quando de seus

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desenvolvimentismo se processou no Serviço Social superdimensio-

trabalhos anteriores. Faz-se referência ao caso e grupo. Por isso, era preciso redefinir as estratégias de ação, no sentido de priorizar as necessidades fundamentais e arrebanhar o maior alcance possível da participação popular para o processo de desenvolvimento comunitário, fomentando a discussão sobre as necessidades percebidas pelos membros da comunidade e mobilizando recursos físicos, econômicos e sociais, para, posteriormente, tornar efetiva a tomada de decisões.

ASPECTOS TÉCNICOS DO DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADES ________________________ ________________________ O Desenvolvimento de Comunidades tem a finalidade de ajudar através de um ________________________ esforço conscientizado e mobilizado neste sentido. A XI Conferência Internacional de ________________________ Serviço Social, em 1962 no Rio de Janeiro, assim conceituou: ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Desenvolvimento de Comunidade é um esforço consciente e delibe- ________________________ rado para ajudar as comunidades a reconhecerem suas necessida________________________ des e a assumirem responsabilidades na solução de seus problemas ________________________ pelo fortalecimento de sua capacidade em participar integralmente ________________________ na vida da nação (CISS, 1962 apud VIEIRA, 1981, p. 178). ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ Aplicado em zona rural e urbana, o Desenvolvimento de Comunidades tinha ________________________ como objetivos, dentre seus vários outros, acompanhar a urbanização planejada de ________________________ pequenas comunidades, bem como recuperar zonas em situação de regresso. Suas ________________________ finalidades precípuas pairavam em torno da elevação do nível de vida, tanto econô- ________________________ mico como cultural e social, das comunidades; participação ativa dos interessados, ________________________ sem dispensar ajuda técnica externa; busca pelo desenvolvimento da iniciativa dos ________________________ ________________________ interessados, sem dispensar ajuda técnica externa. ________________________ A implantação do programa deveria ser elaborada por um agente externo à


práticas em serviço social II

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comunidade, visando mudanças tecnológicas sem deixar de preocupar-se com os aspectos sociais, baseando-se na avaliação de necessidades e soluções apontadas pelos interessados, que participavam ativamente da execução dos programas, pois se tratava, também, de uma prática educativa. Os assistentes sociais se destacavam entre os profissionais que integravam os programas de Desenvolvimento de Comunidades. “Os assistentes sociais são treinados tendo em vista o trabalho com indivíduos, grupos e comunidades [...]” (VIEIRA, 1981, p.185). Dentre as suas inúmeras atribuições, era possível destacar a orientação do Serviço Social sobre os assuntos sociais, despertando e mantendo o interesse da população e ajudando na formulação de suas demandas. A informação para decifrar novos programas e serviços, bem como identificar e auxiliar líderes no seio das próprias comunidades, além de organizar e dirigir os serviços assistenciais necessários ao progresso social, também faziam parte das contribuições do Serviço Social para o Desenvolvimento de Comunidades. O Desenvolvimento de Comunidades é um processo de relacionamento do Assistente Social com os indivíduos e grupos e dos vários indivíduos ou grupos entre si. Através deste programa, o Serviço Social focaliza o indivíduo indiretamente, procurando melhorar o ambiente através do esforço de seus habitantes.

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Os princípios básicos e norteadores afirmavam que as comunidades devem ser aceitas como são, têm o direito de escolher suas soluções, pois os indivíduos e os grupos são livres e responsáveis pelos seus atos. Vieira nos adverte sobre o despertar dos indivíduos no interior de suas comunidades:

Os indivíduos não procuram solucionar seus próprios problemas, mas os que afetam a comunidade; não trabalham em benefício de um determinado projeto, plano ou serviço estabelecido por instituição ou pessoa alheia à comunidade, mas para o projeto, plano ou serviço que depois de estudado por eles é escolhido como o mais adequado à comunidade. O processo procura criar nos indivíduos e nos grupos uma atitude de interesse ativo para com a sua comunidade. Não deixa de ser também um proveito para as pessoas individualmente, pois, educando-se para agir na comunidade, novos horizontes se abrem e obrigam os indivíduos e os grupos a saírem de um círculo de conhecimento e aspirações restritos para um campo mais amplo e abandonar atitudes egoístas por outras altruístas (VIEIRA, 1981, p. 188).

Tendo em vista que, quanto maior a comunidade, mais difícil o relacionamento no grupo vai se torna. Por isso, a implantação do Desenvolvimento de Comunidades precisa ser processada no seio dos grupos, não devendo perder de vista que estes


um todo. O processo do Desenvolvimento de Comunidades se divide em três fases, quais sejam a de estudo, planejamento e execução, podendo ser processados em separado ou conjuntamente, orientados pela mesma pessoa ou outra pessoa do grupo ou de grupo diferente. O mais importante, para uma efetiva implementação do processo e consequen-

123 práticas em serviço social II

podem estar subdivididos em subgrupos, levando-os a colaborarem entre sim e como

te sucesso diz respeito à participação ativa de todos os interessados e em todas as fases do trabalho. Nesse momento, o assistente social é o orientador que estimula os trabalhos, não devendo ser substituído pelos líderes, pois é ele que indicará os nortes do processo educativo com o objetivo de dar ao grupo a possibilidade de resolver seus próprios conflitos, num processo contínuo de educação e aprendizado aplicado à prática.

SÍNTESE

Chegamos ao final de mais uma aula e de um semestre. O Desenvolvimento de ________________________ Comunidade foi um método de grande importância para o Serviço Social no Brasil. A ________________________ partir das experiências nas comunidades, os assistentes sociais se aproximaram das ________________________ mazelas sociais e perceberam a necessidade de rever sua prática. No próximo semes- ________________________ tre estudaremos como se deu esta transformação.

________________________ ________________________ ________________________ Forte abraço! ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ QUESTÃO PARA REFLEXÃO ________________________ De acordo com Vieira (1981), o desenvolvimento de comunidade (DC) como ________________________ processo técnico e profissional é relativamente recente. Partindo desta afirmação, fale ________________________ da incorporação do processo de DC no Brasil, destacando aspectos históricos, teóricos ________________________ e metodológicos. ________________________ ________________________ ________________________ ________________________ LEITURA INDICADA ________________________ ________________________ ________________________ CASTRO, Manuel Manrique. História do serviço social na América Latina. 7. ed. São ________________________ Paulo: Cortez, 2006. ________________________ ________________________


REFERÊNCIAS CASTRO, Manuel Manrique. História do serviço social na América Latina. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

IAMAMOTO, Marilda Vilela; CARVALHO, Raul de. Relações sociais e serviço social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 19. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

VIEIRA, Balbina Ottoni. Serviço social: processos e técnicas. Rio de Janeiro: Agir, 1981.


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