P rofissão e formação docente
P rofissão e formação docente
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A639c Aparecida, Ione Contabilidade Introdutória./ Ione Aparecida. – Salvador: UNIFACS, 2013. 169 p. ISBN 978-85-87325-81-5 1. Contabilidade. I. Título. CDD: 657
S umário ( 1 )
Constituição Histórica da Formação Docente
(Parte A), 11 ( 2 )
Constituição Histórica da Formação Docente
(Parte B), 49 ( 3 )
Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Le-
gais e Perfil Profissional, 103 ( 4 )
Formação Continuada: Desenvolvimento Pesso-
al e Profissional, 151 ( 5 )
Educação a Distância: Uma Nova Abordagem na
Formação do(a) Educador(a), 183 ( 6 )
Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a),
219 ( 7 )
A Atuação do(a) Educador(a) na Contemporanei-
dade, 247 ( 8 )
Docência e Cotidiano Escolar, 275
(1)
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
“Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”. (Cora Coralina)
Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
Seja bem-vindo(a) a esta primeira aula da disciplina Profissão e Formação Docente, em que trataremos da questão da formação de educadores, com o olhar de Cora Coralina, que nos conclama a sermos felizes pela certeza de também aprender, enquanto ensinamos. Objetivamos com este estudo analisar a evolução histórica dos cursos de formação de educadores, em especial no Brasil, desde o surgimento das antigas Escolas Normais.
Boa aprendizagem! A questão da formação docente concretiza um debate recorrente nos últimos anos do século XX e que perdura até a atualidade. No Brasil, podemos considerar que a Lei de 15 de outubro de 1827 foi a alavanca para o processo de formação de professores. (BRASIL, 1827).
Como tudo começou? Depois de declarar a Independência do Brasil, D. Pedro I, atendendo ao Art. 179 da Primeira Constituição Brasileira (BRASIL, 1827, s.p.), que determinava a “[...] instrução primária e gratuita para todos os cidadãos”, mandou criar escolas de primeiras letras em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos do Império. A referida lei estabeleceu que essas escolas adotassem, como método, o ensino mútuo, bem como o que deveria ser
ensinado (BRASIL, 1827, s.p.)
Art. 6º Os professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de aritmética, prática de quebrados, decimais e proporções, as noções mais gerais de geometria prática, a gramática de língua nacional, e os princípios de moral cristã e da doutrina da religião católica e apostólica romana, proporcionados à compreensão dos meninos; preferindo para as leituras a Constituição do Império e a História do Brasil. Você sabe o que significa “ensino mútuo”?
Retomando a historiografia da educação, encontramos referência a essa metodologia desde a Antiguidade (ARANHA, 2006). Também conhecido como método de Lancaster, ou lancasteriano, caracteriza-se, principalmente, pelo uso de alunos mais adiantados ou avançados em determinados saberes/aprendizagens (chamados de monitores ou
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decuriões) que ajudavam os mais novos e menos experientes em seus estudos. Cada monitor recebia instruções à parte, antes dos demais, para auxiliar o mestre na instrução de um grupo de dez alunos ou decúria. Anos depois, esta foi uma prática adotada e mantida nas universidades como método de instrução personalizada ou Método Keller (KELLER, 1970).
Voltando à questão da obrigatoriedade do ensino formal em escolas no Brasil, depreendemos que, com essa medida, D. Pedro I atrelou a indicação de formação especial, em curto prazo, dos mestres (como eram na época chamados) que não tivessem a necessária instrução para esse ensino. A Constituição também previu que deveriam ser criadas, conforme o julgamento dos Presidentes1 em Conselho, escolas para meninas e assumidas por mulheres, nas cidades e vilas mais populosas, atendendo ao prescrito no Art. 12º (BRASIL, 1827, s.p.):
As Mestras, além do declarado no Art. 6º, com exclusão das noções de geometria e limitado a instrução de aritmética só as suas quatro operações, ensinarão também as prendas que servem à economia doméstica; e serão nomeadas pelos Presidentes em Conselho, aquelas mulheres, que sendo brasileiras e de reconhecida honestidade, se mostrarem com mais conhecimento nos exames feitos na forma do Art. 7º.
ricamente construída: meninos precisam e podem aprender saberes universais e meninas nem sempre devem, mas podem aprender, com limites e em especial, saberes necessários à
1. Presidentes, nessa época, correspondiam aos Governadores de Estado, da atualidade.
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Depreende-se desse artigo a diferença de gênero histo-
perpetuação de características atribuídas socialmente como afeitas a sua identidade, circunscritas ao mundo doméstico, ao cuidar e ao servir. Ademais, atentemos para a condição atrelada a essas mestras - serem mulheres ‘de reconhecida honestidade’, requisito não legislado para os homens.
Desse quadro, o que você identifica como permanência? E o que identifica como mudança?
Sobre essa questão de associação do gênero à construção da identidade docente, discutiremos na próxima aula.
Da Europa para o Brasil “Ensinar tudo a todos” foi um lema da pedagogia de João Amós Comênio (1592-1670), o maior educador e pedagogo do século XVIII, que pode ser considerado o ponto de partida para a emergência de uma formação docente sistematizada aliado ao registro datado de 1684, da instituição do primeiro estabelecimento de ensino voltado para a formação de educadores - o “Seminário dos Mestres” por São João Batista de La Salle, em Reims na França (DUARTE, 1986). Contudo, somente após a Revolução Francesa (1789-
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1799), o processo de institucionalização da formação de educadores, decorrente da demanda pela instrução popular, desencadeou a criação das escolas normais.
ESCOLA NORMAL - SÉCULO IX Figura 2: O edifício principal da Escola Normal Superior de Paris.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_Normal_Superior_de_Paris
A primeira instituição com nome Escola Normal destinada à formação de professores para as primeiras letras, ensinando tudo o que fosse considerado “normal’ para crianças e jovens aprenderem, foi instalada em Paris, em 1795, atendendo à Convenção de 17942. Para Saviani (2005, p. 1), desde a criação da escola Normal de Paris:
2. A Convenção de 1794 (assembleia que se estendeu de junho de 1793 a julho de 1794, terceira fase da Revolução Francesa) assegurou uma série de direitos para os cidadãos. Dentre eles estava o ensino gratuito para todos. Por todos os acontecimentos e efeitos para o mundo, a Revolução Francesa é considerada o mais importante acontecimento da história contemporânea. Com a inspiração nas ideias iluministas, o seu lema foi “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”.
17 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
[...] se introduziu a distinção entre Escola Normal Superior e Escola Normal, simplesmente,
também chamada de Escola Normal primária, para preparar os professores do ensino primário. Assim é que Napoleão, ao conquistar o Norte da Itália, instituiu, em 1802, a Escola Normal de Pisa nos moldes da Escola Normal Superior de Paris. Esta escola, da mesma forma que seu modelo francês, se destinava à formação de professores para o ensino secundário, mas na prática se transformou em uma instituição de altos estudos, deixando de lado qualquer preocupação com o preparo didático – pedagógico. Transformar-se em instituições de “altos estudos” pode parecer positivo, entretanto se revela, também, como um desvio da finalidade para a qual foram criadas essas escolas francesas, além de contribuir para a intermitência de seu funcionamento. Contudo, outras escolas normais foram gradativamente criadas. Ainda no século XIX, surgiram as Escolas Normais da Alemanha, da Inglaterra e dos Estados Unidos. Profissão e Formação Docente
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E no Brasil, quando surgiram as primeiras escolas destinadas à formação de professores? A criação das chamadas Escolas Normais, inspirada no modelo educacional das grandes sociedades europeias, se deu no final do século XIX, com a pretensão inicial de dar formação profissional adequada a homens e mulheres que
deveriam assumir o ensino das primeiras letras. Essas escolas deveriam, também, resolver o problema do abandono da educação nas escolas provinciais, que vinha ocorrendo e sendo denunciado desde o Império, descuido esse decorrente da expulsão dos Jesuítas, primeiros educadores do ensino formal no Brasil. Precisamente no ano de 1835, com a Lei nº 10 ou Decreto de Criação da Escola Normal, foi fundada a primeira Escola Normal no Brasil, em Niterói, na Província do Rio de Janeiro. De caráter público, esta escola foi pioneira também em toda a América Latina (BRASIL, 1835, p.1). A definição de sua estrutura foi legislada no Artigo 2º, que previa (na linguagem da época):
A primeira escola normal de Niterói foi considerada por Saviani (2005, p.1) como bastante simples, uma vez que seu currículo “[...] praticamente se resumia ao conteúdo da
19 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
A mesma Escola será regida por hum Director, que ensinará. Primo: a ler e escrever pelo methodo Lancasteriano, cujos princípios theoricos e práticos explicará. Segundo: as quatro operações de Arithmetica, quebrados, decimaes e proporções. Tertio: noções geraes de Geometria theocrica e pratica. Quarto: Grammatica de Língua Nacional. Quinto: elementos de Geographia. Sexto: os princípios de Moral Christã, e da Religião do Estado.
própria escola elementar, sem prever sequer os rudimentos relativos à formação didático-pedagógica” Essa escola funcionou até 1849 quando foi fechada e substituída pelo regime de professores adjuntos, categoria que compreendia professores auxiliares dos que estavam em exercício para aprenderem o oficio prático de ensinar sem, contudo, receberem formação teórica compatível com a função. Em 1859, foi criada uma nova escola normal em Niterói. Figura 3: Escola Normal de Niterói (Prédio onde funcionou no início do século XX)
Fonte: Arquivo pessoal da autora.
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A segunda Escola Normal do Brasil foi criada na Bahia, no ano de 1936, seguida da Escola Normal do Pará, em 1839, e da Escola Normal Paulista, em 1846. Em 1854, foi criada a Escola Normal Paraíba, em 1870, no Rio Grande do Sul e, em 1875 e 1878, outras escolas na cidade de São Paulo. Depois foram criadas a Escola Normal Livre, em 1874, e a Escola
Normal Oficial, em 1880, ambas na Corte (Rio de Janeiro), a de Mato Grosso, em 1876, e a de Goiás, em 1881. Outras tantas foram sendo criadas nas províncias do Brasil ainda no final do Império. Em geral, existia uma por província, de caráter público; quando havia duas escolas numa província, uma se destinava a atender à demanda masculina e outra à demanda feminina (TANURI, 2000). A criação não assegurava, por outro lado, o funcionamento regular dessas escolas normais. Há registros de fechamentos e reaberturas, caracterizando uma existência intermitente, como analisa Saviani (2005). Quanto ao que era ensinado nessas escolas, no programa da Escola Normal de São Paulo, estudada por Moacyr (1942, p.45), constavam as matérias: Lógica, Gramática Geral e da Língua Nacional, Teoria e Prática de Aritmética, Noções Gerais de Geometria Prática e suas Aplicações, Caligrafia, Princípios da Doutrina Cristã e apenas uma de caráter pedagógico - Métodos e Processos de Ensino.
Sendo essas as primeiras escolas de formação de professores, seus professores não eram habilitados a ensinar, então, como se caracterizavam os programas e as propostas pedagógicas? Seriam adequados aos seus objetivos?
adiante nesta aula. Além da precariedade nos programas, nas primeiras escolas normais não havia uma proposta pedagógica coerente com seus objetivos de formação de professores, nem profissionais qualificados para lecionar. (ALMEIDA, 1995). A qualificação (ou não) para ensinar, nesse contexto, configurou-se numa problemática que perdura até os nossos
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Retomaremos a reflexão sobre esses aspectos mais
dias. Em localidades pequenas do interior do Brasil, desde aquela época e, em menor escala, até a atualidade, atuam como professores profissionais sem a devida formação/qualificação. Temos médicos, advogados e engenheiros que somam ao exercício de suas profissões a docência, apenas porque detêm saberes de áreas específicas, como Ciências e Biologia, Matemática, Física e Química, entre outras.
O que você sabe a respeito da primeira escola normal em nosso Estado?
O Ensino Normal na Bahia O marco do Ensino Normal em nosso Estado se deu com a criação da Escola Normal da Bahia, pela Lei n°37 de 14 de abril de 1836 (BAHIA, 1862). Em funcionamento desde 1842 até a atualidade, a escola normal da Bahia, hoje nomeada Instituto Central de Educação Isaias Alves (ICEIA), continua a oferecer o curso de formação de professores para as séries iniciais do ensino fundamental. Na época de sua criação, destinada a preparar professores da instrução primária, pela prescrição da Lei, essa Escola Normal teria duas cadeiras3 ou matérias: a primeira de Ensino
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Mútuo e a segunda compreendendo: Leitura, Caligrafia, Aritmética, Desenho Linear, Princípios de Religião Cristã e Gramática Filosófica da Língua Portuguesa, com exercícios de análise e imitação dos clássicos. A descrição do que deveria ser estudado em cada uma
3. “Cadeiras” era a nomenclatura utilizada para as matérias e/ou disciplinas ministradas por cada professor ou lente.
dessas cadeiras, encontra-se também na referida legislação (TAVARES, 2001, p.226):
A primeira cadeira (Ensino Mútuo) seria regida por um professor e um monitor geral que seria substituto, a segunda, por um só professor. Para prover a primeira cadeira, o Governo no mandaria à França duas pessoas, escolhidas em concurso, para que aprendessem na Escola Normal de Paris o método teórico e prático do ensino Mútuo. A cadeira suplementar seria dada em concurso. Para compreenderem as novas formas de organização, da instrução primária pública e de uma Escola Normal, foram enviados à escola Normal de Paris dois professores baianos, escolhidos por concurso: João Alves Portela e Manuel Correia Garcia (NUNES, 2008). Quatorze anos depois é que foi legislado o curso destinado à formação de alunas mestras, pela Resolução nº 403, de 2 de agosto de 1850 (BAHIA, 1850, s.p.). Curso Normal para mulheres, com a duração igual ao destinado aos homens - 2 anos. Mas definiu, também, que “[...] as mestras de Instrução Primária seriam admitidas num curso especial da escola Normal”, em outro prédio, porque a coeducação não era permitida pela sociedade da época que temia a junção de mulheres e homens num mesmo espaço. Outra determinação associada à condição de gênero
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Essa resolução estabeleceu como teórico e prático o
se fez - as mulheres e os homens deveriam ser educados por professores do mesmo sexo. Figura 4: Primeiro prédio da Escola Normal da Bahia, na Avenida Joana Angélica em Salvador, onde atualmente funciona o Ministério Público.
Fonte:Arquivo pessoal de Tereza Fagundes Figura 5: Foto da Escola Normal da Bahia, hoje Instituto Central de Educação Isaias Alves (ICEIA) no Barbalho, sede para a qual foi transferida em 1939 e onde funciona até a atualidade. Salvador-Bahia.
Profissão e Formação Docente
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Fonte: Arquivo pessoal de Tereza Fagundes
Seguiram-se outras legislações definindo como seria o curso normal para alunas mestras, com dois anos de duração: curso teórico no mesmo edifício da Escola Normal para os homens e curso prático dirigido por uma professora, seguindo o programa: por semana, no 1º e 2º anos, o curso deveria ter 3 aulas de Instrução Pública, 6 de Leitura, 3 de recitação, 5 de escrita, 9 de Língua Portuguesa, 6 de Cálculo, 3 de canto e 3 de Ciências das escolas. (BAHIA, 1861) Sobre a Escola Normal da Bahia, cabe destacar a análise de Moacyr (1939, p. 518-519):
Folgo de dizer que a Escola Normal da Bahia, não obstante os seus defeitos, e os obstáculos com que tem lutado, tem sido de algum proveito, pois a ela se deve serem os seus professores primários geralmente melhores do que nas outras províncias; e todavia, por uma lei de 1848 nem mesmo os alunos da escola podem ser providos vitaliciamente. E no que se refere à separação entre mulheres e homens,
Esta escola é para alunos de ambos os sexos; tem três cadeiras; a primeira, de métodos mútuo e simultâneo com leituras da obra do Barão de Gerando; a segunda, de gramática filosófica com
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continua Moacyr (1939. p.519):
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análise de clássicos; a terceira, de aritmética, desenho linear e caligrafia. O curso é de dois anos, mas lecionando-se um dia aos homens, e no outro as senhoras, fica de fato reduzido a um somente. O professor de métodos repete no segundo ano as matérias que ensina no primeiro; o da gramática divide-a para fazer o curso em dois anos; o terceiro professor dá em um ano aritmética, e no outro caligrafia e desenho. As matérias são insuficientes porque faltam pelo menos música, desenho, princípios de geometria, de geografia, de história do Brasil, a história sagrada, a religião que se não ensina e, assim também, em todo ou em parte o que os alemães chamarão didática metódica e pedagogia. O principal defeito da escola, além do da insuficiência de matérias, estava em ser todo o ensino teórico, de modo que só em 1847 se determinou que os alunos frequentassem escolas primárias para se exercerem na prática. Assim foi só em fins do ano findo, que o diretor geral dos estudos conseguiu dos presidentes da província, que os alunos normais não fossem admitidos ao exame de métodos sem trinta lições de prática. Creio que se
trata de aumentar o número de lições requeridas, o que seria conveniente e melhor seria a criação, que me parece necessária de uma escola primária anexa, na qual pudessem ser ensaiados todos os métodos, inclusivamente o de Lancaster, porque, quaisquer que sejam os seus inconvenientes é o mais próprio para formar professores. Apesar de a legislação prever a existência do curso normal para mulheres e para homens, como analisa Moacyr (1939), eles não estudavam ao mesmo tempo - havia alternância nos dias que deveriam ser frequentados por cada sexo. Em consequência, houve redução do tempo de estudo para ambos. As matérias estudadas também eram insuficientes e não havia oportunidade de prática docente para os alunos em formação. Vem, então, o Ato de 21 de fevereiro de 1870 (BAHIA, 1870), que acrescenta novos componentes curriculares a essa modalidade de ensino, estabelecendo que, no ensino normal, devessem ser estudadas as seguintes matérias: no primeiro ano, Caligrafia, aplicada especialmente ao caráter da letra Exercícios de letra gótica; Desenho linear; Gramática portuguesa: conhecimento teórico da prosódia, etimologia, sintaxe e ortografia, análises etimológicas, exercícios de escrita ditada, leitura de prosa e verso, recitação; Aritmética teórica:
4. Modalidades de caligrafia adotadas na época.
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inglesa, em exercícios de bastardo, bastardinho e cursivo4,
Noções de sistema métrico decimal; Elementos de geografia e história; Catecismo; Exercícios na escola anexa5 no segundo ano, Doutrina Cristã e elementos de História Sagrada, Aritmética, compreendendo as proporções a progressões por diferença e quociente, e a sua aplicação aos usos da vida, desenvolvimento do sistema métrico decimal, comparado com o antigo sistema de pesos e medidas; Gramática portuguesa; Geografia e História pátria; Pedagogia e Metodologia, exercícios práticos na escola anexa. A prática docente no curso de formação de professores na Escola Normal6, até então inexistente, foi legislada pela reforma de 1870 (BAHIA, 1870) para ser operacionalizada, principalmente, numa escola primária anexa. Houve a determinação para que continuasse o internato da Escola Normal para mulheres, bem como o curso com a duração de três anos, mas foi supresso o internato para homens, substituindo-o por um curso semelhante, a ser concluído em dois anos por alunos externos (NUNES, 2008). Seguiu-se a Reforma Leôncio de Carvalho (Decreto 7.247, de 19 de abril de 1879), que, embora destinada às escolas de formação dos professores pelo Poder Central, tornou-se modelo para as escolas Provinciais. Nessa época, fica evidente a demanda pela ampliação do currículo das escolas normais. Essa reforma acolheu a frequência e os exames livres, e não fixou a duração do curso em anos, mas em séries Profissão e Formação Docente
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de matérias nas quais os alunos se submeteriam a exames. Referenciando o currículo dessas escolas, registra Tanuri (2000, p.67) que o mesmo deveria abranger as
5. Escola anexa - escola primária destinada à prática docente dos alunos do curso normal. 6. Para saber mais sobre estruturação das primeiras escolas normais da Bahia, leia: TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2. ed. Salvador: UNEB, 2001.
seguintes matérias:
[...] língua nacional; língua francesa; aritmética, álgebra e geometria; metrologia e escrituração mercantil; geografia e cosmografia; história universal; história e geografia do Brasil; elementos de ciências físicas e naturais e de fisiologia e higiene; filosofia; princípios de direito natural e de direito público, com explicação da Constituição Política do Império; princípios de economia política; noções de economia doméstica (para as alunas); pedagogia e prática do ensino primário em geral; prática do ensino intuitivo ou lição de coisas; princípios de lavoura e horticultura; caligrafia e desenho linear; música vocal; ginástica; prática manual de ofícios (para os alunos); trabalhos de agulha (para as alunas); instrução religiosa (não obrigatória para os acatólicos). Paralelamente ao que acontecia na Bahia, em outras escolas normais do Brasil, a legislação se aplicava. Tanuri (2000) referencia o currículo da Escola Normal de São Paulo, fixado pelo Art. 3º do Regulamento de 3/1/1887, contendo: Gramática e língua nacional, Aritmética, Gramática e língua francesa, Doutrina cristã, disciplinas estudadas no
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
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primeiro ano; Gramática e língua nacional, Geometria Física, Gramática e língua francesa, no segundo ano; Geografia e História, Pedagogia e Metodologia, Química, no terceiro ano. Quanto à competência para legislar sobre essa modalidade de ensino, a Constituição Republicana de 1891 não referencia nenhuma modificação, o que nos conduz a depreender que se manteve a descentralização estabelecida no Adendo Constitucional de 1834 (TANURI, 2000).
Esse é o quadro do ensino normal na capital do Estado. Enquanto isso, o que acontecia no interior?
No interior da Bahia, a primeira escola Normal foi a da cidade de Caetité, criada ainda no século XIX, no governo de Joaquim Manoel Rodrigues Lima (1892-1896) - primeiro governador eleito do Estado da Bahia, nascido em Caetité. Seguiu os mesmos moldes da Escola Normal da Bahia (em Salvador), mas, apesar de ter sido a primeira escola de formação de professores do interior, por questões político-partidárias, foi fechada em 1903, formando apenas uma turma nesse período. Posteriormente, foi reaberta e se tornou referência no Estado7. Profissão e Formação Docente
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7. Quer saber mais? Amplie o seu estudo sobre o ensino normal na Bahia (respectivamente em Feira de Santana, Jacobina e Vitória da Conquista) consultando as seguintes fontes: CRUZ, Antônio Roberto Seixas da. Mestras no sertão: reconstruindo caminhos percorridos, 2000. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2000.
Figura 6: Escola Normal de Caetité.
Fonte: http://anisioparacaetite.wikispaces.com/file/view/escola_normal.jpg/196845670/355x210/escola_normal.jpg
No final do século XIX, começaram a ser criadas, em todo o país, escolas normais de iniciativa privada e municipal, qualificadas como livres ou equiparadas, provavelmente como mecanismo de compensação para a pouca oferta de estabelecimentos oficiais de formação de docentes na maioria dos estados. Sem dúvida, essa possibilidade desencadeou a expansão do Ensino Normal no Brasil.
A ESCOLA NORMAL NO SÉCULO XX escolarização formal, novos caminhos foram surgindo. Tavares (2002) referencia a Lei nº 1051, de 18 de agosto de 1914, que reformou o Instituto Normal do Estado, nomeando-o de Escola Normal, determinando que a mesma oferecesse o curso em 3 anos e estudos seriados, de modo a ampliar conhecimentos a cada ano. Pelo Decreto nº 7.657, de 1º de outubro de 1931, foram reorganizados os cursos de teoria e
31 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
Entramos no século XX e, para todos os processos de
prática das Ciências da Educação na Escola Normal, determinando as seguintes cadeiras: 1ª - Pedagogia, 2ª - Metodologia e Didática, 3ª - Psicologia Educacional e 4ª - Filosofia e História da Educação. Dentro desse contexto, foram sendo criadas outras escolas normais no interior da Bahia, todas equiparadas à Escola Normal de Caetité: a Escola Normal de Feira, em Feira de Santana, o Colégio N. S. do Santíssimo Sacramento e o Colégio N. S. do Bonfim, em Bonfim, o Educandário da Cidade de Nazaré, e tantas outras em cidades como Alagoinhas, Amargosa, Cachoeira, Ipiaú, Itapetinga, Jacobina, Jequié, Palmeiras, Santana dos Brejos, Serrinha, Vitória da Conquista, na primeira metade do século XX, e outras de iniciativa privada, na capital do Estado. Saviani (2005), analisando as iniciativas dos anos 30 do século XX, no que se refere à formação de educadores, destaca “[...] as reformas de 1932, no Distrito Federal, encabeçada por Anísio Teixeira, e de 1933, em São Paulo, de iniciativa de Fernando de Azevedo”. De cunho renovador, essas reformas estimularam a criação de escolas-laboratórios com o objetivo de possibilitar aos professores em formação, oportunidades de experimentação pedagógica concebida em bases científicas. Na estrutura do curso normal, as cadeiras ou matérias foram alteradas pelo Decreto nº 8563, de 24 de fevereiro de Profissão e Formação Docente
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1933 (TAVARES, 2001, p.232), que estabeleceu 19 Cadeiras, a saber: • Língua Portuguesa e Literatura Nacional; • Língua Francesa; • Matemática elementar; • Geografia
Geral,
Noções
de
Cosmografia
e
Corografia do Brasil; • História Universal e do Brasil; • Física Aplicada à Agricultura e à Indústria; • Química Aplicada à Agricultura e à Indústria; • Agricultura geral e noções de Zootecnia geral e especial; • História Natural; • Higiene geral e escolar e noções de Puericultura; • Noções de Psicologia geral, Sociologia e Direito Público e Constitucional; • Pedagogia e Legislação escolar; • Metodologia e Didática; • Psicologia educacional; • Filosofia e História da Educação; • Desenho; • Música e Canto Coral; • Economia Doméstica, Prendas Domésticas e trabalhos Manuais; • Educação Física. Documentos pessoais de Alcira Pereira Carvalho Silva, normalista do Colégio Senhor do Bonfim, implantado em estruturava em cinco anos faziam parte essas cadeiras elencadas por Tavares (2001). Esse colégio foi inspecionado preliminarmente para o 1º ano do curso normal, pelo Decreto nº 10.134, de 28 de fevereiro de 1937 (BAHIA, 1944), para funcionar na cidade de Senhor do Bonfim, mas foi transferido, em 1939, para a cidade de Jacobina com o nome de Colégio Senhor do Bonfim de Jacobina (SILVA, 1984).
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Jacobina-Bahia, no ano de 1939, atestam que do curso que se
Figura 7: Diploma da professora primária de Alcira Pereira Carvalho Silva, na época, Alcira Pereira Souza.
Fonte: Arquivo pessoal da autora. Figura 8 - Certificado de exames realizados no Colégio Instituto Senhor do Bonfim de Jacobina.
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Fonte: Arquivo pessoal da autora.
Do certificado ilustrado, constam as seguintes matérias: Literatura, Pedagogia, Didática, Agricultura Especial, Higiene Geral, Higiene Escolar, Música, Economia Doméstica, Trabalhos Manuais e Prendas e Educação Física (no terceiro ano do curso normal), que estão em consonância com o legislado pelo Decreto nº 8563, de 24 de fevereiro de 1933, já referenciado (TAVARES, 2001). Muitas outras escolas foram criadas e, sem dúvida, com uma nova filosofia, em atendimento ao princípio estabelecido previsto pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (LEME, 2003, p.173), para o qual:
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, sem dúvida, põe em evidência novas recomendações atreladas à formação de professores no Brasil: consciência profissional de pertencimento e responsabilidade perante a Nação e remuneração condizente à eficiência do exercício profissional. Não muito tempo depois, surgem novas mudanças
35 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
Os professores, de todos os graus e modalidades de ensino, devem ser formados dentro de um espírito de unidade, constituindo-se num corpo profissional consciente de suas responsabilidades perante a Nação, os educandos e o povo em geral; para isso, devem receber remuneração condigna, para que possam manter a necessária eficiência no trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis ao desempenho de sua missão.
na estruturação dos cursos de formação de professores. Pelo Decreto nº 11.024, de 17 de outubro de 1939, novas diretrizes para o ensino normal foram estabelecidas. Referencia Tavares (2002, p.236) que:
A preparação do futuro professor primário se realizaria em cinco anos secundários e dois de formação pedagógica. O secundário constava das matérias do Ginásio. O Pedagógico seria ministrado em dois anos, compreendendo: Psicologia Educacional, Pedagogia e História da Educação, Metodologia Geral e Especial, Higiene, Puericultura e Educação Sanitária, Sociologia Educacional, Administração Escolar e Estatística, Desenho Aplicado e Artes Industriais, Música e Educação Física Com esse decreto, temos legislado, na Bahia, um novo nome para o curso de formação de professores primários - Curso Pedagógico -, que conviveu com a nomenclatura
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Curso Normal até o início dos anos 1950.
Figura 9: Normalistas de 1942 - Colégio Instituto Senhor do Bonfim - Jacobina-Bahia.
Fonte: Arquivo pessoal da autora.
O Curso Pedagógico, de dois anos, sucedia o curso ginasial, de quatro anos, mas antes dele havia uma série intermediária na qual eram estudadas as seguintes matérias: Português, Inglês, Matemática, Física, Química, Biologia, Desenho, Psicologia Geral e Lógica, Economia e Direito, Educação Física, Canto Orfeônico, seguindo o Decreto nº 12.987, de 22 de junho de 1944, que instituiu um ano de estudos preparatórios para o curso normal (TAVARES, 2001, p. 238). tro de Silva (1984, p. 57) para quem, nesse período:
[...] à proporção que as turmas concluíssem seu curso, pelo regimento antigo, seria extinto o Curso Normal de 5 anos de duração e em seu lugar, existiriam
37 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
Sobre essa modificação, encontramos também o regis-
o Curso Ginasial – de 4 anos, seguido de um Intermediário – de 1 ano e o Curso Pedagógico – de 2 anos, perfazendo um total de 7 anos de estudo para a formação de um Professor Primário. Verificaram-se mudanças também a nível nacional. Depois de esse curso passar alguns anos distanciado dos outros cursos de nível médio, em 1946, no período do Estado Novo, com a Lei Orgânica do Ensino Normal, foram criadas Escolas Normais Rurais e o Curso Normal foi considerado ramo de ensino secundário (BRASIL, 1946). Essa Lei foi promulgada juntamente com a Lei Orgânica do Ensino Primário, tendo ambas os mesmos efeitos administrativos: centralização das diretrizes e fixação de normas para implantação do ensino normal em todo o território nacional. A Lei Orgânica do Ensino Normal de 1946 ou DecretoLei nº 8.530, de 2 de janeiro de 1946 (BRASIL, 1946), oficializou as seguintes finalidades do ensino normal no Brasil: prover a formação do pessoal docente necessária às escolas primárias; habilitar administradores escolares destinados às mesmas escolas e desenvolver e propagar os conhecimentos e técnicas relativas à educação da infância. dos demais cursos do ensino secundário, foi dividido em dois
Profissão e Formação Docente
Para tanto, esse tipo de ensino, seguindo a estrutura 38
níveis: • Curso de 1° ciclo destinado à formação de regentes de ensino primário, com duração de quatro anos e funcionando em instituições nomeadas Escolas Normais Regionais;
• Curso de 2° ciclo ou curso de formação do professor primário, com três anos de duração (correspondendo ao ciclo colegial do curso secundário), funcionando nos estabelecimentos chamados Escolas Normais e Institutos de Educação. Além desses dois tipos de cursos, referencia Romanelli (2000), os Institutos de Educação ofereciam os dois ciclos - o Jardim da Infância e a Escola Primária anexos -, os cursos de especialização de professor primário (para as áreas de educação especial, ensino supletivo, desenho e artes aplicadas, música e canto) e a habilitação de administradores escolares (diretores, orientadores e inspetores escolares). Figura 10: Foto do Primeiro Jardim da Infância de Jacobina-Bahia (1948) implementado pela Profª Alcira Pereira Carvalho Silva, anexo ao Colégio Instituto Senhor do Bonfim, que oferecia o Curso Normal.
Fonte: Arquivo pessoal da autora.
Sobre a importância das escolas anexas - Jardins da Infância e Escolas Primárias -, registra Cruz (2004, p. 156):
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
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A existência de uma escola anexa à Escola Normal de Feira de Santana demonstra que esta instituição estava em sintonia com o que havia de mais moderno em termos educacionais no período de sua implantação, possibilitando que suas alunas e alunos se ambientassem com a sua prática docente desde o primeiro ano Normal. Referenda essa análise os depoimentos da educadora Alcira Pereira Carvalho Silva (1984), docente da cadeira de Prática de Ensino do Curso Normal, do então Colégio Instituto Senhor do Bonfim, em Jacobina-Bahia, sobre a medida tomada para atender o que previa a Lei Orgânica do Ensino Normal de 1946: assumiu a criação do Jardim de Infância anexo ao referido educandário, após curso preparatório específico realizado na Capital do Estado (Salvador). Quanto ao currículo dos cursos de formação docente nessa época, Saviani (2009, p.147) opina que:
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Se os cursos normais de primeiro ciclo, pela sua similitude com os ginásios, tinham um currículo marcado pela predominância das disciplinas de cultura geral, no estilo das velhas escolas normais, tão criticadas, os cursos de segundo ciclo contemplavam todos os fundamentos da educação introduzidos pelas reformas da década de 1930.
Esse modelo de formação docente permaneceu até o ano de 1961, ano de muitas tensões e mudanças no cenário sociopolítico brasileiro, marcado, sobretudo, pela renúncia do Presidente Jânio Quadros, pela pressão dos militares para tomar o governo e pela sucessão ao cargo de Presidente pelo então vice-presidente João Goulart, que, em 20 de dezembro daquele ano, fixa novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4024/61. Como se estruturaram os cursos de formação de professores a partir dessa época até a atualidade será objeto de estudo da próxima aula. Até lá!
SÍN T ESE Nesta aula, tratamos da questão da formação de professores, desde as primeiras escolas normais criadas na França e em outros países da Europa, no final do século XIX, quando também foram criadas no Brasil e, em especial, na Bahia. Consideramos, também, as diferentes nomenclaturas e modelos de escolas normais que funcionaram até meados do século XX, segundo a legislação vigente em nosso país.
qu estão pa r a Re f l e x ão Com base no que analisamos nesta aula, você avalia como apropriada e suficiente a formação de professores pelas escolas normais?
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
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Le i t u r a s i n dic a da s Para aprofundamento da compreensão desta temática, sugerimos as seguintes leituras: ALMEIDA, Jane Soares de. Mulher e Educação: a paixão pelo possível. São Paulo: Editora UNESP, 1998. CATANI, Denice Bárbara et al. Docência, memória e gênero: estudos sobre a formação. 4. ed. São Paulo: Escrituras, 2003. NÓVOA, Antonio. Vida de Professores. Porto: Porto Edições, 1992. TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2. ed. Salvador: UNEB, 2001.
Si tes In dic a dos SAVIANI, Dermeval. História da Formação Docente no Brasil: três momentos decisivos. Revista Educação, v.30, n. 2, 2005. Disponível
em:
http://coralx.ufsm.br/revce/revce/2005/02/
a1.htm. Acesso em: 25 out. 2012. TANURI, Leonor Marinho História da Formação de Professores. Revisa Brasileira de educação. Disponível em: http:// Profissão e Formação Docente
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www.anped.org.br/rbe/rbedigital/rbde14/rbde14_06_leonor_ maria_tanuri.pdf. Acesso em: 25 out. 2012. TEIXEIRA, Anísio. O problema de formação do magistério. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 82, n. 200/201/202, p. 199-206, jan./dez. 2001. Disponível em: http:// www.bvanisioteixeira.ufba.br/artigos/formagist.html. Acesso em: 25 out. 2012.
Re f e r ênci a s ALMEIDA, Jane Soares. Currículos da Escola Normal Paulista (1846/1920): Revendo uma Trajetória. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), 1995. nº 184, p. 665-690. BAHIA. Coleção de Leis e Resoluções da Assembléia Legislativa da Bahia, sancionadas e publicadas nos anos de 1839 a 1840, Volume II, contendo os números de 93 a 117. Bahia: Tipografia de Antonio Olavo França Guerra, 1862. BAHIA. Coleção dos Regulamentos, Instruções e Atos expedidos pela Presidência da Província da Bahia, no ano de 1861. Volume XV. Bahia: Tipografia constitucional (ao Aljube nº1), 1869. BAHIA. Coleção das Leis e Resoluções da Província da Bahia, promulgadas no ano de 1870 sob números 1.097 a 1.131. Bahia: Tipografia Constitucional (ao Aljube), 1870. BAHIA, Lei n.37, de 14 de abril de 1862. Leis e Resol. Assemb. Legisl. Bahia. Tip. de Antonio Olavo França Guerra, 1862. In: TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2. ed. Salvador: UNEB, 2001. p.226.
ano de 1937. Bahia. Imp. Of. do Est., 1944. In: TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2. ed. Salvador: UNEB, 2001. p. 235. BAHIA. Resolução n. 403, de 2 de agosto de 1850. Dec. ano de 1937. Bahia. Imp. Of. do Est., 1944. In: TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2, ed.
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BAHIA, Decreto nº 10.134, de 28 de fevereiro de 1937. Dec.
Salvador: UNEB, 2001. p. 235. BAHIA, Decreto nº 8563, de 24 de fevereiro de 1933. Dec. ano 1938. In: TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2. ed. Salvador: UNEB, 2001. p. 232-233. BRASIL. Lei nº 10. Decreto de Criação da Escola Normal. 1835. Disponível em: http://www.infoiepic.xpg.com.br/hist_ ato10.htm. Acesso em: 16 out. 2011. BRASIL, Lei Orgânica do Ensino Normal de 1946 ou Decreto-Lei 8.530, de 2 de janeiro de 1946. Disponível em: http:// www.soleis.adv.br/leiorganicaensinonormal.htm. Acesso em: 16 out. 2012. CORALINA, Cora. Pensador. Info. Uol. Disponível em: http:// pensador.uol.com.br/cora_coralina_frases/ Acesso em: 16 out. 2012. CRUZ, Antônio Roberto Seixas da. Mestras no sertão: reconstruindo caminhos percorridos. 2000. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2000.
Profissão e Formação Docente
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DUARTE, Sérgio Guerra. Dicionário Brasileiro de Educação. Rio de Janeiro: Antares/Nobre. 1986. FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho. “Tornar-se educadora” – a educação da mulher e a formação da educadora. In: Mulher e Pedagogia: um vínculo re-significado. Salvador: Helvécia, 2005. p. 47-74.
KELLER, Fred. S. Adeus Mestre! ... Ciência e Cultura, São Paulo, 24 (3), p. 204-207, 1970. LEME, Paschoal. O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova e suas repercussões na realidade educacional brasileira. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 86, n. 212, p. 163-178, jan./abr. 2005. MENDES, Geisa Flores. Luzes do saber: memórias e representações da Escola Normal de Vitória da Conquista. Vitória da Conquista: UESB, 2004. MOACYR, Primitivo. A instrução e as províncias: subsídios para a história da educação no Brasil (1834-1889). São Paulo: Editora Nacional, v. 1. 1942. MOACYR, Primitivo. A Instrução e as Províncias (Subsídios par a História da Educação no Brasil) – 1835-1889: Bahia, Sergipe, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso. 2v. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1939. Disponível em: http:// www.brasiliana.com.br/brasiliana/colecao/obras/139/a-instrucao-e-as-provincias-v-2 NUNES, Antonietta d’Aguiar. Fundamentos e Políticas Educacionais: história, memória e trajetória da educação na Bahia. Dez. 2008. Ponta Grossa: UEPG Disponível em: http://www. uepg.br/propesp/publicatio/hum/2008-2/Art.2.pdf.
Acesso
em: 25 set. 2012. SAVIANI, Dermeval. História da Formação Docente no Brasil: três momentos decisivos. Revista Educação, v.30, n. 2, 2005. Disponível
em:
http://coralx.ufsm.br/revce/revce/2005/02/
45 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte A)
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a1.htm. Acesso em: 25 out. 2012. SILVA, Jefferson Ildefonso da Silva. Formação do educador e educação política. São Paulo: Cortez/ Autores Associados, 1992. SILVA, Alcira Pereira Carvalho. Cinqüenta Anos depois. Salvador: s.c.p. 1984. TANURI, Leonor Maria. Contribuição para o estudo da Escola Normal no Brasil. Pesquisa e planejamento. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, v.13, p. 7-98, dez.1970. TANURI, Leonor Marinho. História da Formação de Professores. Revista Brasileira de Educação. Disponível em: http:// www.anped.org.br/rbe/rbedigital/rbde14/rbde14_06_leonor_ maria_tanuri.pdf. Acesso em: 16 out. 2012. TAVARES, Luis Henrique Dias. Fontes para o Estudo da Educação no Brasil. 2. ed. Salvador: UNEB, 2001. TEIXEIRA, Anísio. O problema de formação do magistério. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 82, n. 200/201/202, p. 199-206, jan./dez. 2001. Disponível em: http:// www.bvanisioteixeira.ufba.br/artigos/formagist.html. Acesso Profissão e Formação Docente
46
em: 20 out. 2012.
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(2)
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
Sai a jovem professora com o Diploma na mão e a vontade suprema de transformar o mundo através da educação1. Alcira Pereira Carvalho Silva
1. In: Reminiscências de uma educadora. Jornal A LETRA. Órgão de Informação da Academia Jacobinense de Letras. Ano IX. Nº30. p. 2. Jacobina-Bahia.
Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
Dando continuidade às reflexões sobre a constituição histórica da formação docente, iniciada na aula anterior, em que tratamos da criação dos primeiros cursos de formação de educadores, do curso normal legislado pela Lei Orgânica do Ensino Normal que estabeleceu as finalidades desse curso no Brasil, e dos cursos de formação de professores para a educação infantil e séries iniciais, nesta aula, consideraremos a dinâmica dos cursos de formação docente desde a segunda metade do século XX até a atualidade. Trataremos, também, da formação de professores para o ensino médio em nível superior. Como analisamos na aula anterior, o Curso Pedagógico conviveu com a nomenclatura Curso Normal até o início dos anos 1960, quando, após a Lei 4024/61 (BRASIL, 1961), consolidou-se com o novo nome de Curso Pedagógico.
CURSO PEDAGÓGICO A Lei nº 4.024/61, de 20 de dezembro de 1961, foi a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada após acirradas discussões sobre como deveria se estruturar o ensino no Brasil. Contextualizando a época, tomamos como parâmetro a análise de Bello (2001) para quem:
Se as discussões sobre a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional foi o fato marcante, por outro lado muitas iniciativas marcaram este período como,
talvez, o mais fértil da História da Educação no Brasil: em 1950, em Salvador, no Estado da Bahia, Anísio Teixeira inaugura o Centro Popular de Educação (Centro Educacional Carneiro Ribeiro), dando início a sua idéia de escola-classe e escola-parque; em 1952, em Fortaleza, Estado do Ceará, o educador Lauro de Oliveira Lima inicia uma didática baseada nas teorias científicas de Jean Piaget: o Método Psicogenético; em 1953 a educação passa a ser administrada por um Ministério próprio: o Ministério da Educação e Cultura; em 1961 tem início uma campanha de alfabetização, cuja didática, criada pelo pernambucano Paulo Freire, propunha alfabetizar em 40 horas adultos analfabetos; em 1962 é criado o Conselho Federal de Educação, que substitui o Conselho Nacional de Educação e os Conselhos Estaduais de Educação e, ainda em 1962 é criado o Plano Nacional de Educação e o Programa Nacional de Alfabetização, pelo Ministério da Educação e Cultura, inspirado no Método Paulo Freire. (BELLO, 2001, p.1)
Profissão e Formação Docente
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Essa lei organizou o ensino no Brasil, estabelecendo os seguintes níveis:
• Ensino pré-primário, composto de escolas maternais e jardins de infância; • Ensino primário de 4 anos, com chance de ser acrescido de 2 anos ou mais, com programas de artes aplicadas; • Ensino médio, subdividido em dois ciclos: o ginasial de 4 anos e o colegial de 3 anos, ambos por sua vez compreendendo o ensino secundário e o ensino técnico (industrial, agrícola, comercial e de formação de professores); • Ensino superior, com a mesma estrutura já consagrada antes. O capítulo IV desta reforma (BRASIL, 1961, p.1) previu a formação de professores para o Ensino Primário, Ensino Secundário ou Ginasial (atualmente correspondentes ao Ensino Fundamental) e Ensino Médio (também com essa nomenclatura na atualidade). No artigo 52, encontramos a definição de sua finalidade:
E no Art. 53 há definição dos estabelecimentos em que deveriam se formar os professores para o ensino primário:
53 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
Art. 52. O ensino normal tem por fim a formação de professôres, orientadores, supervisores e administradores escolares destinados ao ensino primário, e o desenvolvimento dos conhecimentos técnicos relativos à educação da infância.
Art. 53. A formação de docentes para o ensino primário far-se-á: a) em escola normal de grau ginasial no mínimo de quatro séries anuais onde além das disciplinas obrigatórias do curso secundário ginasial será ministrada preparação pedagógica; b) em escola normal de grau colegial, de três séries anuais, no mínimo, em prosseguimento ao vetado grau ginasial.
Nesta conjuntura, a escola normal, de grau ginasial, expedia o diploma de regente de ensino primário, e, a escola normal de grau colegial, expedia o diploma de professor primário. Como ilustrado na Figura 1, temos cópia de um diploma de professor primário expedido de acordo com a Lei 4024/61 (BRASIL, 1961) e a Lei Orgânica de Ensino ou Lei
Profissão e Formação Docente
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nº 2.463 de 13 de setembro de 1967 (BAHIA, 1967) que dispôs sobre a organização e funcionamento do ensino primário, secundário, médio, técnico, normal e superior, entre outros, em nosso Estado.
Figura 1: Diploma de Professora Primária da autora, expedido pelo Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro. Jacobina-Bahia
Fonte: Arquivo pessoal da autora
Apesar da mudança na nomenclatura, as mulheres que cursavam o Pedagógico ainda permaneceram sendo chamadas de ‘normalistas’, como nas décadas anteriores, ou professorandas. As fotos que se seguem ilustram a participação dessas estudantes em desfiles cívicos bem como o uso de uniformes - de gala e do cotidiano. Figuras 2 e 3: Professorandas do Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro (Jacobina-Bahia) em dois momentos: 1961 e 1971.
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Fonte: Arquivo pessoal da Autora.
Muitas evocações poéticas eram feitas sobre as mulheres em processo de formação docente que, se por um lado as colocavam em evidência, por outro encobriam a seriedade de sua formação profissional. Até mesmo o uniforme característico dessas estudantes, desde os anos 1930, mas ainda em uso, criava uma atmosfera inspiradora de poetas e músicos como J.J de Araujo Jorge (1938) e Benedito Lacerda e David Nasser (s.d.):
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Gosto de vê-la, sim ... Quando à tarde ela vem, fisionomia suave ingenuamente franca... Toda a rua se alegra, e eu me alegro também
com o seu vulto feliz: saia azul, blusa branca... (J.G. de A JORGE, 1938, s.p.)
Vestida de azul e branco Trazendo um sorriso franco No rostinho encantador ... Mas, a normalista linda Não pode casar ainda Só depois que se formar ... (LACERDA; NASSER, s.d.)
sucedia ao curso ginasial. Do Curso Ginasial, faziam parte as seguintes matérias: Português, Matemática, Iniciação à Ciência, Ciências Físicas e Biológicas, História do Brasil, História Geral, Geografia do Brasil, Geografia Geral, Organização Social e Política Brasileira, Desenho, Educação Moral e Cívica, Inglês e Francês. Do Curso Pedagógico, que conferia o grau de Professor Primário, faziam parte os seguintes componentes curriculares: Português, Literatura Infantil, Matemática (Estatística),
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O Curso Pedagógico dos anos 1960, como legislado,
Ciências Físicas e Biológicas, Geografia do Brasil e da Bahia, Organização Social e Política Brasileira, Psicologia Geral, Especial e da Aprendizagem, História e Filosofia da Educação, Didática Geral e Especial. Figura 4: Histórico escolar dos cursos ginasial e pedagógico com as matérias e disciplinas do currículo desses cursos - 1965-1971
Fonte: Arquivo pessoal da Autora
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Depreende-se da análise dessas matérias que, diferentemente dos outros modelos de cursos de formação de professores, desse modelo constavam componentes curriculares de natureza pedagógica e foi introduzida, formalmente, a prática de ensino sob forma de Estágio Supervisionado. Embora computado no 3º ano, cursamos essa modalidade de Estágio por ocasião de nossa formação como professora primária (Figura 4) e experienciamos a prática de ensino desde o primeiro ano do curso pedagógico quando realizávamos a fase de observação de aulas do ensino primário, associadas ao ensino de Didática. A observação era abrangente.
Como prescrevia Lourenço Filho:
A fase de observação destaca o que os alunos devem observar. Não o ensino como único trabalho do professor, mas, a situação geral da classe. O objetivo era fazer com que os alunos – mestres observassem a complexidade geral da sala de aula, seus condicionantes e os fatores em que o professor pode atuar. Logicamente não deixavam de observar também a atuação do professor. Os alunos – mestres realizavam cuidadosas anotações de tudo com o objetivo de analisar cada elemento e cada situação. As anotações eram levadas para discussão com os colegas assessorados pela professora assistente de prática. (LOURENÇO FILHO, 2001, p. 57).
tunidade de participar dando aulas. Em turno oposto ao do curso pedagógico que estudávamos, três vezes por semana, permanecíamos em escolas que ofereciam o curso primário e, gradativamente, éramos sorteados para desenvolver uma aula de cada área de estudo do curso primário, a saber: português (incluindo gramática e literatura), matemática, história, geografia e ciências. Enquanto um(a) estudante desenvolvia a aula, os(as) outros(as) atuavam como observadores(as) para, durante as aulas de Didática, discutirem a experiência.
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No segundo ano, além da observação, tínhamos opor-
A fase de participação prescindia de uma preparação prévia. Entrevista com a professora da turma para conhecer o andamento e condução do ensino. A interação deveria ser perfeita. O aluno-mestre atuava como um substituto ocasional da turma. Antes de atuar na sala, que permanecia 20 a 30 minutos, preparava um ‘roteiro de lição’. O importante nessa fase [...] não era a perfeição do que seria feito e sim a situação real na qual estaria o futuro mestre. Além disso, os colegas, a professora regente e a professora assistente de prática, acompanhavam o trabalho, anotando em fichas o desenvolvimento do processo. Essas anotações eram utilizadas nas discussões onde se faziam as críticas e o aluno-mestre fazia a autocrítica do seu trabalho. (LOURENÇO FILHO, 2001, p. 57). O terceiro ano começava com a prática mais frequente, sob forma de participação, que culminava com o estágio propriamente dito, em uma das classes do curso primário, assumida por sorteio entre as escolas disponíveis para esse fim, totalmente supervisionado pela professora de Prática de Ensino. O Estágio acontecia no segundo semestre, depois de todos terem vivenciado a etapa anterior. Também encontramos respaldo no que previa Lourenço Filho para essa etapa
Profissão e Formação Docente
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de formação ao admitir que:
A terceira fase, de direção de classe acontecia no trimestre final do curso. A turma era entregue ao aluno mestre. Inicialmente por um período de duas horas e depois pelo período todo. O aluno mestre nessa fase, já deveria ter o domínio de todos os aspectos que envolvem a condução de
uma classe. Assumir a sala conhecendo dominando os aspectos práticos, teóricos e burocráticos. Após essa fase o aluno-mestre preenchia ‘relatórios’. Essa fase era também acompanhada pelos colegas, pelo professor regente e professora assistente de prática. (LOURENÇO FILHO, 2001, p. 57). De nossa experiência e dos relatos de Lourenço Filho (2001), depreendemos que havia três fases para a organização do estágio: observação, participação e o estágio propriamente dito ou de direção de classe, sem dúvida, um marco nos cursos de formação de professores no Brasil, que, em modelos anteriores, não contava com o exercício docente vivenciado em formação. Concluído
este
curso,
estava
o(a)
profissional
formado(a) em Professor(a) Primário(a), de acordo com a Lei nº 4024/61 (BRASIL, 1961) e a Lei nº 2463 de 13 de setembro de 1967 ou Lei Orgânica de Ensino (BRASIL, 1967). Pedagógico existiu até ser promulgada a nova legislação educacional brasileira - a Lei nº 5692 de 11 de agosto de 1971 (BRASIL, 1971).
HABILITAÇÃO ESPECÍFICA MAGISTÉRIO (1971-1996)
DE
A Lei nº 5692/71 fixou diretrizes e bases para todos os níveis de ensino no país. Modificou a nomenclatura desses níveis nomeando-os de 1º, 2º e 3º graus. O 1º grau compreendia
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O curso de formação de professores na modalidade
as quatro séries do antigo curso primário e as quatro séries do antigo curso ginasial, nomeando-as de 1ª a 8ª séries. O 2º grau correspondia às três séries do antigo curso colegial e o 3º grau aos cursos de nível superior. Em decorrência dessa nova estrutura, deixaram de existir as Escolas Normais e o Curso Pedagógico foi substituído pela Habilitação Específica de 2º grau para o exercício do magistério de 1º grau (HEM), organizada em duas modalidades básicas, legisladas pelo Parecer 349/72 (BRASIL, 1972): • Modalidade 1 - com a duração de três anos (2.200 horas), que habilitaria a lecionar até a 4ª série; e • Modalidade 2 - com a duração de quatro anos (2.900 horas), habilitando ao magistério até a 6ª série do 1º grau. A formação de professores para as quatro últimas séries do 1º grau - 5ª, 6ª, 7ª e 8ª - prevista por essa reforma, deveria se dar em nível superior, em cursos de licenciatura curta, com 3 anos de duração, ou de licenciatura plena com 4 anos de duração. E os professores para atuar na Habilitação pelo curso de Pedagogia que, por sua vez, tinha também
Profissão e Formação Docente
Específica de Magistério do 1º grau deveriam ser formados 62
habilitações para formar os especialistas em Educação: diretores de escola, orientadores educacionais, supervisores escolares e inspetores de ensino, de que trataremos mais adiante.
Figura 5: Histórico escolar com as matérias e disciplinas do currículo - 1989-1991
Fonte: Arquivo pessoal da profª Denize Reimão
Analisando esse histórico, encontramos os seguintes componentes curriculares da Habilitação Específica de 2º grau para o exercício do magistério de 1º grau (HEM) em vigência de 1972 até a aprovação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional, em 1996: • Língua Portuguesa e Língua Brasileira
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• Língua Estrangeira e Moderna (Inglês) • História • Geografia • Matemática • Educação Artística • Ciências Físicas e Biológicas • Educação Moral e Cívica • Organização Social e Política do Brasil • Educação Física: jogos e recreação • Ensino Religioso • Português • Estudos Sociais • Didática Geral • Psicologia da Educação • Sociologia da Educação • Filosofia da Educação • Educação Pré Escolar • Metodologia do Ensino da Matemática • Metodologia do Ensino de Ciências Profissão e Formação Docente
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• Metodologia da Alfabetização • Metodologia de Português • Metodologia de Estudos Sociais • Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º grau • Prática de Ensino/Estágio • Cultura Popular • Literatura Infantil • Estatística Aplicada à Educação.
Esse novo modelo de formação de professores, visto como técnico, no bojo da profissionalização obrigatória de todos os cursos de 2º grau, perdeu seu caráter propedêutico. Embora contendo um maior número de disciplinas de caráter pedagógico, caracterizou-se como de menor adequação e propriedade que o anterior. Com muita clareza, Tanuri (2000) assim o analisa:
Saviani (2005) também registra sua percepção sobre os Cursos de Magistério, com a qual concordamos, como sendo uma descaracterização do modelo de Escola Normal.
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A Lei nº 5.692/71, que estabeleceu diretrizes e bases para o primeiro e o segundo graus, contemplou a escola normal e, no bojo da profissionalização obrigatória adotada para o segundo grau, transformou-a numa das habilitações desse nível de ensino, abolindo de vez a profissionalização antes ministrada em escola de nível ginasial. Assim, a já tradicional escola normal perdia o status de “escola” e, mesmo, de “curso”, diluindo-se numa das muitas habilitações profissionais do ensino de segundo grau, a chamada Habilitação Específica para o Magistério (HEM). (TANURI, 2000, p.80).
[...] nessa nova estrutura o antigo Curso Normal cedeu lugar a uma habilitação de 2º Grau, entre as muitas possíveis no âmbito da profissionalização universal e compulsória desse nível de ensino, determinada pela Lei nº 5.692/71. A formação de professores para o antigo ensino primário, agora identificado com as quatro primeiras séries do ensino de 1º Grau foi, pois, reduzida a uma habilitação dispersa em meio a tantas outras, configurando um quadro de precariedade bastante preocupante. (SAVIANI, 2005, p. 147). . Apesar de o currículo dos cursos de 1º e 2º graus ter sido organizado sob a ótica de formação do ‘cidadão nacionalista’, a diminuição da qualidade na formação de professores foi evidente. Atribui-se, como outros estudiosos na
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área, a exemplo de Saviani e Tanuri referenciados, que essa queda na qualidade associou-se à equiparação do curso de magistério aos outros cursos profissionalizantes ou habilitações de 2º grau definidas pela nova legislação, cujos objetivos seguiam a tendência tecnicista em que a instrução se sobrepunha à educação. Esse quadro perdurou por mais de uma década até que o governo brasileiro lançou o projeto de revitalização das escolas normais com a criação dos Centros de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério - CEFAM - em 1982. Entretanto, esses centros tiveram descontinuidade e não geraram os resultados esperados (CAVALCANTE, 1994).
Em de 18 de outubro de 1982, foi promulgada a Lei nº 7.044, alterando dispositivos da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, referentes à profissionalização do ensino de 2º grau. No que se refere, especificamente, à formação docente, especifica o Artigo 30 (BRASIL, 1982)
Art. 30 - Exigir-se-á como formação mínima para o exercício de magistério: a) no ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª séries, habilitação específica de 2º grau; b) no ensino de 1º grau, da 1ª à 8ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1º grau, obtida em curso de curta duração;
§ 1º - Os professores a que se refere a alínea “a” poderão lecionar na 5ª e 6ª séries do ensino de 1º grau, mediante estudos adicionais cujos mínimos de conteúdo e duração serão fixados pelos competentes Conselhos de Educação.
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c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação correspondente à licenciatura plena.
§ 2º - Os professores a que se refere a alínea “b” poderão alcançar, no exercício do magistério, a 2ª série do ensino de 2º grau mediante estudos adicionais no mínimo, a um ano letivo. § 3º - Os estudos adicionais referidos nos parágrafos anteriores poderão ser objeto de aproveitamento em cursos ulteriores. A organização dos cursos ficou mais clara e a profissionalização compulsória deixou de existir, contudo, não havendo mudanças na estrutura curricular do curso de formação de professores, depreende-se que permaneceu a visão tecnicista predominante na época. O curso de Magistério, como habilitação específica do ensino de 2º grau, assim permaneceu até que fosse promulgada a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1996, quando passou novamente a ser nomeado Curso
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Normal. Antes de continuar com esse percurso histórico dos cursos de formação de professores a nível médio, analisaremos a constituição dos cursos em nível superior, a partir da estruturação dos cursos de Licenciatura na universidade brasileira.
DOS CURSOS DE LICENCIATURAS AO CURSO DE PEDAGOGIA Tendo como base o ideário da Escola Nova, na década de 1930, foram criados, no Brasil, os Institutos de Educação.
O primeiro, em 1932, foi concebido por Anísio Teixeira e dirigido por Lourenço Filho, no Distrito Federal (Rio de Janeiro, na época) e o segundo em 1933, implantado por Fernando de Azevedo, em São Paulo.
A consciência da importância do magistério primário foi muito destacada no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova onde se lê: Todos os professores, de todos os graus, cuja preparação geral se adquirirá nos estabelecimentos de ensino secundário, devem, no entanto, formar o seu espírito pedagógico, conjuntamente, nos cursos universitários, em faculdades ou escolas normais, elevadas ao nível superior e incorporadas às universidades. Os docentes formados por esta escolas teriam uma base de uma educação geral comum (CURRY, s.d., p.7). Na concepção de Anísio Teixeira, o ensino normal deveria assegurar a formação de professores sem, contudo, deixar de assegurar a consolidação de uma cultura geral a esses profissionais.
Para esse fim, transformou a Escola Normal em Escola de Professores, cujo currículo incluía,
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já no primeiro ano, as seguintes disciplinas: 1) biologia educacional; 2) sociologia educacional; 3) psicologia educacional; 4) história da educação; 5) introdução ao ensino, contemplando três aspectos: a) princípios e técnicas; b) matérias de ensino abrangendo cálculo, leitura e linguagem, literatura infantil, estudos sociais e ciências naturais;
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c) prática de ensino, realizada mediante observação, experimentação e participação. Como suporte ao caráter prático do processo formativo, a escola de professores contava com uma estrutura de apoio que envolvia: a) jardim de infância, escola primária e escola secundária, que funcionavam como campo de experimentação, demonstração e prática de ensino;
b) instituto de pesquisas educacionais; c) biblioteca central de educação; d) bibliotecas escolares; e) filmoteca; f) museus escolares; g)
radiodifusão. (SAVIANI, 2009, p.145-146)
Os Institutos de Educação não tiveram amplo crescimento no país, mas nessa mesma época, pelo Decreto nº 19581/31 (BRASIL, 1931) do Ministério da Educação e Saúde Pública, foi outorgado o Estatuto das Universidades Brasileiras, congregando às faculdades até então existentes: Direito, Engenharia e Medicina. Esse decreto deixou em aberta a possibilidade de uma dessas Faculdades ser substituída por uma Faculdade de educação, de ciências (composta pelos cursos de matemática, física, química e ciências naturais), e a de letras (com os cursos de letras, de filosofia, história e geografia, e línguas vivas). Os profissionais formados pela universidade destinavam-se ao ensino de sua especialidade nos cursos normais e/ ou nos outros cursos secundários. Preocupado com a questão da formação do/a educador/a no contexto das condições de ensino na Bahia, o educador Isaias Alves fundou a Faculdade de Filosofia, destinada à formação de professores para o ensino médio e superior. A
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Letras, Ciências e Educação, que compreenderia as seções de
exemplo de outras no Brasil, na década de 1930, a Faculdade de Filosofia da Bahia compreendia os cursos de Licenciatura em Letras, Matemática, Física, Química, História Natural, Geografia, História, Ciências Sociais e o Curso de Pedagogia. Aos cursos de licenciatura coube a tarefa de formar professores para as disciplinas específicas que compunham os currículos das escolas secundárias e ao curso de Pedagogia, formar professores para as Escolas Normais. O Decreto-Lei nº 1.190, de 4 de abril de 1939, que organizou a Faculdade Nacional de Filosofia, Ciências e Letras, foi o marco de criação do Curso de Pedagogia no Brasil. Esta faculdade tinha por objetivo formar bacharéis em áreas específicas do saber e formar o educador para o ensino em nível médio. Foi estruturada em quatro seções fundamentais: Filosofia, Ciências, Letras e Pedagogia, e uma seção especial de Didática, o chamado Curso de Didática. Em três anos sairia formado o bacharel em uma das áreas oferecidas pela faculdade: Filosofia, Matemática, Física, Química, História Natural, História, Geografia, Letras, Ciências Sociais e Pedagogia; no quarto ano, o Curso de Didática, formava o licenciado. Essa disposição e ordem curricular ficaram conhecidas como “esquema 3 + 1” - três anos de formação específica
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e um ano de formação pedagógica para assegurar o domínio de conceitos e habilidades para o competente exercício da docência.
PEDAGOGIA FORMANDO EDUCADORES EM NÍVEL SUPERIOR2 Estruturado no mesmo esquema dos outros cursos
2. Esse texto, adaptado, foi originalmente publicado em FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho A Mulher Como Profissional de Educação- alguns aspectos de sua trajetória de formação. Revista da FACED, Salvador, v. 1, p. 57-77, 1999.
oferecidos pela Faculdade, o Curso de Pedagogia conferia o título de Bacharel ou Técnico em Educação e o de Licenciado, a quem cabia o ministério das aulas de disciplinas pedagógicas do Curso Normal. Contextualizando o sistema educacional vigente na época de implantação desse curso, pode-se definir que o mesmo (disseminado em maior escala na década de 1960) teria a missão de formar os professores para as Escolas Normais devido à obrigatoriedade do curso primário que se impunha, em consequência das mudanças ocorridas em toda a sociedade e como um dos princípios defendidos pelos renovadores. Esses princípios influenciaram, também, a pretensão de que o curso de Pedagogia formasse o “técnico em educação” politicamente neutro, cujas preocupações com a escola universal gratuita e com a qualidade de ensino pudessem ser tratadas à luz das teorias educacionais, baseadas em instrumentos científicos.
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A prioridade dada ao bacharelado satisfazia os conservadores que, dentro do tradicional esquema reinante, viam nesse tipo de ensino a possibilidade de aumentar ou mantê-los em seus status. Assim como nos demais ramos, o bacharel em Pedagogia era, teoricamente, considerado um expert em seu campo de conhecimento. A licenciatura, que tinha como objetivo e formação de quadros para o magistério constituiu-se em mero apêndice do bacharelado, tanto que para se obter o grau de licenciado, havia de se
passar antes pelo bacharelado. (MURANAKA, 1985, p.45). Nas universidades em que era oferecida, a graduação em Pedagogia não apresentava, do ponto de vista do currículo, nenhuma referência que apontasse para as particularidades dos sujeitos nela envolvidos. Assim como outras licenciaturas, o curso de Pedagogia não era lugar nem espaço privilegiado de questionamentos e reconstrução de conceitos sobre relações de gênero, mas sim, tempo e espaço propício à manutenção de estereótipos acerca do papel social da mulher como o de maternar, cuidar e servir, dentre outros, consolidadores da identidade feminina.
O que você pensa a respeito desta nossa análise? Para você, mulher, aluna de pedagogia e para você, homem, aluno de pedagogia, as expectativas sociais mais frequentes se coadunam com as que vocês têm do curso?
Na Bahia, bem como em outros estados do Brasil, Profissão e Formação Docente
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o curso de Pedagogia também integrou o conjunto de cursos oferecidos pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, implantada em 1941, oferecendo as opções de Bacharelado e Licenciatura. Como bacharel, o pedagogo poderia ocupar cargo de técnico de educação, do Ministério de Educação, campo profissional muito vago quanto às suas funções. Como licenciado, seu principal campo de trabalho era o Curso Normal, um campo não exclusivo dos pedagogos, uma vez que, pela Lei Orgânica do Ensino Normal, para lecionar nesse curso
era suficiente o diploma de nível superior, independente de sua natureza. Em 1946, com a criação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) face a exigências legais que estruturaram essa faculdade em departamentos, a partir dos cursos que oferecia, foi criado o Departamento de Pedagogia, precursor da Faculdade de Educação. Nesse ano, através do Decreto-Lei nº 9092 de 26 de março de 1946, foi substituído o antigo “esquema 3 + 1” pela obrigatoriedade de quatro anos de formação em Pedagogia, nas Faculdades de Filosofia. Tanto a licenciatura quanto o bacharelado passaram a ter quatro anos, estruturados em uma parte comum nos três primeiros anos e uma, especial para cada modalidade, abrangendo disciplinas optativas da especialidade (licenciatura ou bacharelado) e da área de formação didática, teórica e prática. Na opinião de Muranaka (1985), o curso de Pedagogia continuava inoperante no sentido de atender aos objetivos inicialmente propostos, e seus egressos, sem destinação profissional precisa, disputavam com egressos de outros cursos o mercado de trabalho no campo da educação. Em todo o Brasil, no início dos anos sessenta, questionamentos sobre o sentido do curso de Pedagogia já se faziam e ausência de conteúdo próprio, opinando, por isso, pela sua extinção. Outros, entretanto, defendiam-no ardorosamente. Nessa conjuntura, foi elaborado o Parecer nº 251/62 do Conselho Federal da Educação, buscando equilibrar as posições antagônicas sobre o curso, propondo formar o bacharel - especialista em educação - e o licenciado - professor do ensino normal - ambos na graduação. Ao mesmo tempo, esse Parecer apontava para a formação do especialista a nível de pós-graduação, bem como para a formação do professor
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presentes. Alguns educadores nele viam uma indefinição
primário3 em nível superior, tendência esta que somente na atualidade parece se concretizar. O Parecer 251/62, atentando para os dispositivos da Lei nº 4024/61, estabeleceu o currículo do curso de Pedagogia - o regime era seriado e a primeira série dava ênfase ao processo de aquisição de conhecimentos gerais nas áreas de humanas, exatas e naturais, através das disciplinas: Sociologia, Psicologia, História da Filosofia, Estatística e Biologia. Nas segunda e terceira séries, as mesmas ciências aparecem acrescidas do complemento aplicado à educação. As chamadas disciplinas pedagógicas começam na terceira série e culminam na quarta, tanto na licenciatura quanto no bacharelado, guardadas as respectivas especificidades: formação de docentes para o Ensino Normal ou pesquisadores em educação. Nessa época, não mais se requeria o bacharelado para que se pudesse cursar a licenciatura; pelo contrário, era comum o aluno graduar-se primeiro em licenciatura, e voltar para cursar o bacharelado. O golpe militar de 1964 desencadeou profundas mudanças no cenário político do Brasil. A educação também foi atingida, por exigências de adequação de todos os níveis de ensino ao contexto nacional. Em 28 de novembro de 1968,
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foi promulgada a Reforma do Ensino Superior. Como “pano de fundo” (ou de frente) dessa reforma, estava o imperativo de desarticular os estudantes de nível superior, que até então se constituíam em grupo coeso, por entrar e sair da universidade juntos, ao cursarem, em regime seriado, toda a sua graduação. A dinâmica de matrícula por disciplina, em horários alternativos e descontínuos, apregoada como favorável ao avanço individualizado no curso pelos
3. Professor das quatro séries iniciais (2º ao 5º ano) do Ensino Fundamental.
estudantes mais livres, bem como a possibilidade de também trabalhar enquanto estudavam para outros, foi, por outro lado, desagregadora e impeditiva de conclusão dos cursos no tempo mínimo legislado. Assim “vivenciamos” o Curso de Pedagogia da Universidade Federal da Bahia após a Reforma de 1968 ou Lei no 5540/68 (BRASIL, 1968). Com a reforma do ensino superior, o Curso de Pedagogia foi reorganizado, abolindo a distinção entre bacharelado e licenciatura, e criando “habilitações”. A concepção dicotômica presente no modelo anterior permaneceu na nova estrutura, assumindo apenas uma feição diversa: o curso foi dividido em dois blocos distintos e autônomos, desta feita, colocando de um lado as disciplinas dos chamados fundamentos da educação e, de outro, as disciplinas das habilitações específicas. O curso de pedagogia passou então a ser predominantemente formador dos denominados “especialistas” em educação (supervisor escolar, orientador educacional, administrador escolar, inspetor escolar, etc.), continuando a ofertar, agora na forma de “habilitação”, a licenciatura “Ensino das disciplinas e atividades práticas dos Cursos Normais”, com possibilidade ainda de uma formação alternativa para a docência nos primeiros anos do ensino Na Bahia, eram três as instituições de ensino superior que ofereciam o curso de Pedagogia: a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a Universidade Católica do Salvador (UCSal) e a Faculdade de Educação da Bahia (FEBA). Em 1969, na UFBA, o curso de Pedagogia ganhou novo impulso ao ser alocado na Faculdade de Educação (FACED), recém-criada em conformidade com os princípios da reforma universitária - Lei 5540/68 e Parecer 252/69 do CFE. Através do Decreto nº 662.241 de 8 de fevereiro de 1968, a UFBA foi reestruturada, passando a ser constituída por 24 unidades
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fundamental. (SCHEIBE; AGUIAR, 1999)
de ensino, pesquisa e extensão, dentre as quais, a FACED (BOAVENTURA, 1971). Esta unidade compreendeu o antigo Departamento de Pedagogia, as diversas disciplinas nomeadas Didáticas Especiais, oferecidas para as diversas licenciaturas na antiga Faculdade de Filosofia, e a incorporação de seu respectivo corpo docente. A integralização curricular se fazia apenas em dois semestres (CARVALHO, 1979). Também foram incorporados à Faculdade de Educação programas especiais mantidos pela Universidade, destinados ao aperfeiçoamento de professores, como o Centro de Ciências da Bahia (CECIBA), compreendendo as áreas de Ciências e de Matemática e o Programa de Linguística Aplicada, conjugando o ensino de Português e Línguas Estrangeiras4. Os princípios filosóficos que nortearam o desenvolvimento do curso de Pedagogia, por ocasião da criação da FACED, refletiam toda a política nacional, especialmente a política do Estado para a educação, numa tendência de encaminhar a questão da educação como um problema eminentemente técnico, a ser resolvido por especialistas.
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A ordem era modernizar a educação para melhor ajustá-la às novas necessidades de um processo de desenvolvimento altamente excludente, dentro dos princípios da racionalidade burguesa. A educação também devia entrar nessa ciranda, tornandose mais racional, mais eficiente e mais produtiva. Daí a ênfase na
4. Para mais detalhes, ver o Relatório de atividades da Faculdade de Educação da UFBA, 1968-1974 (JESUÍNO DOS SANTOS, Leda. 1979).
questão das habilitações no curso de pedagogia, habilitações que, supõe-se, vão formar pessoas preparadas para assumir uma prática pedagógica afinada com esses princípios. (COELHO, 1987, p.10). Os cursos de Pedagogia foram redefinidos dentro do espírito que imperava na sociedade brasileira à época da ditadura militar. Na perspectiva de uma educação autoritária, era objetivo formar mão de obra qualificada para o exercício de funções produtivas, bem como para funções de direção, supervisão e liderança, visando assegurar o processo de acumulação de bens das diversas unidades da empresa produtiva. Dessa forma, através dos especialistas formados pelo curso de Pedagogia, previam os legisladores que estariam asseguradas a economia de recursos destinados à educação e a maior eficiência e produtividade do sistema escolar, vez que a estrutura em habilitações promoveria a divisão do trabalho pedagógico. Na Universidade Federal da Bahia, a exemplo de foi reestruturado também em conformidade com o parecer 252/69, como curso de curta duração5. Aprovado pelo Conselho de Coordenação da Universidade em dezembro de 1970, passou a ser constituído por disciplinas que compreendiam um Tronco Comum e disciplinas que compunham o Ciclo Profissionalizante. O Tronco Comum estruturava-se com disciplinas de fundamentação básica para a formação
5. Os cursos de graduação eram considerados de curta duração quando a carga horária total não ultrapassava 2.200 horas. Acima desta, os cursos eram definidos como de duração plena.
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outras IES do Brasil, o currículo do curso de Pedagogia
pedagógica dentro da filosofia da reforma universitária, alocadas em unidades diferentes da UFBA, além da Faculdade de Educação, tais como: Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Instituto de Matemática, Instituto de Biologia e Instituto de Ciências da Saúde. A base comum foi composta pelas seguintes disciplinas: sociologia geral, sociologia da educação, fundamentos biológicos da educação, psicologia da educação, história da educação, filosofia da educação e didática. A parte diversificada, para cada uma das habilitações, ficou assim estabelecida:
- para a habilitação “Ensino das disciplinas e atividades práticas dos cursos normais”, as seguintes matérias: estrutura e funcionamento do ensino de 1º grau, metodologia do ensino de 1º grau, prática de ensino na escola de 1º grau (estágio);
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- para a habilitação “Orientação educacional”, as matérias: estrutura e funcionamento do 1º grau, estrutura e funcionamento do ensino de 2º grau, princípios e métodos de orientação educacional, orientação vocacional e medidas educacionais; - para a habilitação “Administração escolar”, as matérias: estrutura e funcionamento do ensino de 1º grau, estrutura e funcionamento do ensino de 2º
grau, princípios e métodos de administração escolar e estatística aplicada à educação; - para a habilitação “Supervisão escolar”, as matérias: estrutura e funcionamento do ensino de 1º grau, estrutura e funcionamento do ensino de 2º grau, princípios e métodos de supervisão escolar e currículos e programas; - para a habilitação “Inspeção escolar”, as matérias selecionadas foram as seguintes: estrutura e funcionamento do ensino de 1º grau, estrutura e funcionamento do ensino de 2º grau, princípios e métodos de inspeção escolar e legislação do ensino. O perfil do Orientador, do Professor e do Supervisor Educacional, curricularmente delineado, definia que a eles vimento interpessoal, atuar como docente de disciplinas do curso de formação de educadores para o ensino elementar e coordenar e supervisionar ações do processo pedagógico em instituições de ensino. Em 1970, o Colegiado do Curso de Pedagogia tornou possível aos ingressos antes deste ano a adaptação de seus currículos, bem como, a exemplo dos novos alunos, a opção de cursar mais de uma habilitação, podendo ser até duas simultaneamente e em 1973, o Curso de Pedagogia passou a ser considerado um curso de duração plena, pelo
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cabia: orientar crianças e jovens no processo de seu desenvol-
Parecer nº 306/73 da Câmara de Ensino de Graduação da UFBA (Carvalho, 1979), retornando-lhe o status perdido com a implementação da reforma universitária de 1968.
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É nesse contexto, bem como na tentativa de viabilizar a implantação das modificações previstas na Lei nº 5692/71, que surgem as indicações do CFE, de autoria do Prof. Valnir Chagas: Indicação nº 67/75, (estudos superiores em educação) que, de certo modo, dá origem às Indicações de nºs 68/75 (formação pedagógicas das licenciaturas), 70/76 (preparo de especialistas), 71/76 (formação de professores de educação especial). Ficou ainda a questão da formação do professor para as séries iniciais, o antigo professor primário, a nível de graduação, que acabou não sendo definida, nem mesmo a nível de indicação. (COELHO, 1987, p.11). No final dos anos 1970, começaram a surgir grupos organizados de educadores, atuantes nos cursos de Pedagogia e de Licenciaturas, procurando encaminhar a discussão acerca da educação, de forma mais abrangente, perpassando pelas questões das especializações em Orientação Educacional, Supervisão, Administração Escolar, etc. Para discuti-las, organizou-se na I Conferência Brasileira de Educação - CBE, o Comitê Nacional Pró-Formação do Educador, que desencadeou o surgimento de Comitês Estaduais. Estes comitês
congregaram professores, pedagogos e muitos outros profissionais que trabalhavam na área da Educação e que sempre ficaram à margem das discussões, até então restritas aos que compunham os aparelhos de Estado, em busca de melhorias na formação profissional, do ponto de vista filosófico, curricular e metodológico. Na época, toda a Faculdade de Educação da UFBA se mobilizou, sediando o Comitê Estadual da Bahia; quase todos os professores do curso, bem como os alunos de Pedagogia, reuniam-se regularmente. Encontros Regionais6 culminaram com o Encontro Nacional sobre Reformulação dos Cursos de Preparação de Recursos Humanos para a Educação, em 1983, que tentou definir uma proposta de reformulação do curso de Pedagogia e das outras licenciaturas, que fosse expressão do pensamento e da prática dos educadores do país. Entretanto, os encaminhamentos posteriores apontaram para a complexidade da realidade educacional que, longe de exigir a formação de especialistas, requeria a formação de educadores com visão globalizante do processo pedagógico e capacidade para enfrentar a educação, articulando a realidade prática à formação acadêmica. Nas décadas de 1980 e 1990, foram recorrentes os debade ensino. Entretanto, a implementação de mudanças vem sendo lenta, seguindo caminhos mais complexos, embora alguns projetos renovadores, em algumas Instituições de Ensino Superior, tenham sido postos em prática. Depois de uma longa tramitação no Congresso Nacional e acirradas oposições de interesse nesse campo, foi aprovada, em 20 de dezembro de 1996, a nova Lei de Diretrizes e Bases
6. Pelo envolvimento no Comitê local (Salvador), participei, com mais uma colega, representando a Bahia, do Encontro realizado na PUC-RJ, em setembro de 1981.
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tes sobre formação do educador no âmbito de cada instituição
da Educação Nacional - Lei 9394/96 -que, em relação às licenciaturas, extinguiu os “currículos mínimos”, anteriormente previstos na Lei 5540/68, delegando às universidades a fixação dos currículos de seus cursos, à exceção da graduação em Pedagogia, que deveria seguir uma “base comum nacional.” (BRASIL, 1996)7.
CURSO NORMAL SUPERIOR A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) foi criado, no ensino superior brasileiro, um novo curso para formação de professores da Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental - O Curso Normal Superior, ou como ficou logo conhecido - CNS. Segundo o Art. 62:
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A formação de docentes para atuar na educação básica far-seá em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. (BRASIL, 1996)
7. Dispõe o Art. 64, da Lei 9394/96: “A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional.”
O CNS se estabeleceu como curso formador de professores da educação infantil e das quatro primeiras séries do ensino fundamental. Paralelamente, em nível de ensino médio (anteriormente 2º grau), houve o oferecimento do Curso Normal Médio, também voltado para a formação de professores para as 4 séries iniciais do ensino fundamental. Apesar da semelhança com o curso de Pedagogia, o CNS não habilitou para a orientação educacional, orientação vocacional, supervisão escolar, gestão escolar, educação especial e educação de jovens e adultos, entre outras. Somente se destinou à docência da educação infantil e do magistério das séries iniciais do ensino fundamental. Obviamente, dada a justaposição que logo se fez, com o curso de Pedagogia, foi um modelo que teve pouca duração. Gradativamente, como trataremos mais adiante, esse curso foi sendo substituído pelo Curso de Pedagogia, em todas as Instituições de Ensino Superior que o ofereceram. Apesar de não ser objetivo desta aula, analisar a formação de professores para o ensino superior, registramos que, assim como em outras épocas, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/Lei n.º 9.394, de 20/12/96 (BRASIL, 1996) em programas de pós-graduação stricto sensu - Mestrado ou Doutorado, mas deixando em aberta a possibilidade de, em caso de escassez, serem admitidos como docentes, profissionais em formação ou com habilitação em cursos de pós-graduação latu sensu.
O CURSO ATUALIDADE
DE
PEDAGOGIA
NA
Para implementação de mudanças no curso de
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estabelece em seu Art. 66 que essa formação deva ser obtida
Pedagogia atendendo às exigências da atual Legislação (BRASIL, 1996), foi organizada uma Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia, formalizada pela Portaria SESu/ MEC 146/03/98. Em 6 de maio de 1998, essa comissão apresentou a Proposta de Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia, que estabelece como perfil comum do Pedagogo:
[...] profissional habilitado a atuar no ensino, na organização e gestão de sistemas, unidades e projetos educacionais e na produção e difusão de conhecimento, em diversas áreas da educação, tendo a docência como base obrigatória de sua formação e identidade profissionais. (BRASIL, 1999, p.1) Embora tenham sido acirradas as discussões em torno dessa proposta, assim como o foram para elaboração de diretrizes para outros cursos de graduação, incluindo os de formação docente em nível superior, inclusive por estímulo do
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governo federal, somente em maio de 2006 foram aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação – CNE, as Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia – DCNP (BRASIL, 2006). Essas Diretrizes definem também as áreas de atuação profissional do(a) Pedagogo(a), competências e habilidades, conteúdos básicos, tópicos de estudo de aprofundamento e/ ou diversificação da formação, estudos independentes, estrutura geral e duração do curso, modalidades de prática pedagógica, trabalho de conclusão de curso, regimes do curso - sequenciais e modulares - e indicadores para avaliação do
aluno de Pedagogia. Na UNIFACS - Universidade Salvador, a atualização imediatamente se fez. Por ocasião da concepção do Projeto Político Pedagógico do curso de formação de professores para atuar da 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental, estava em curso o debate específico sobre a escolha entre os cursos de Pedagogia e Normal Superior como melhor opção para a realização da formação em questão. Em fevereiro de 2004, este projeto foi submetido à avaliação de uma comissão do MEC para credenciamento institucional e, quando aprovado, (BAHIA, Portaria Nº 653 de 17/03/2004), foi ressaltada sua qualidade pedagógica e seu caráter inovador em termos curriculares, em especial a sua concepção de currículo integrado específica para cursos a distância. Na ocasião, a universidade optou pelo Curso Normal Superior, pois naquele momento, o debate nacional apontava para a necessidade de diferenciação entre os dois cursos e de uma formação específica para a docência através do Curso Normal Superior. No entanto, como não havia consenso absoluto entre os especialistas do Brasil, a equipe responsável pela implementação desse curso na UNIFACS teve o cuidado de construir uma matriz curricular que represenem caso de uma definição futura pelo curso de Pedagogia, não fosse difícil fazer a conversão. De fato, nesta instituição, em 2006, foi extinto o Curso Normal Superior e implementado o Curso de Graduação em Pedagogia - Licenciatura, na modalidade a distância, concebido em conformidade com a missão e os objetivos da instituição, bem como em resposta à demanda de formação de professores para a educação infantil e os anos iniciais no Estado da Bahia, em conformidade com a Resolução nº 1 de 15 de maio de 2006 do Conselho Nacional de Educação,
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tasse propósitos formativos das duas opções, de maneira que,
do Ministério da Educação, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia no Brasil (BRASIL, 2006).
O Curso de Pedagogia no Brasil O Curso de Pedagogia no Brasil é oferecido na modalidade a distância e tem como perfil formar docentes capazes de atuar na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, em projetos educacionais, seja de pesquisa ou de extensão, bem como na produção e difusão do conhecimento. Assim sendo, busca a formação de um profissional da educação que possua as seguintes características: • comprometimento com a prática educacional capaz de responder às demandas da educação infantil e dos anos iniciais do ensino fundamental, assim como às questões específicas relativas aos demais espaços educativos escolares e não escolares; • posicionamento como um profissional mediador
Profissão e Formação Docente
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entre o conhecimento sociocultural e o aluno, indo além de uma atitude técnica de simples transposição didática dos múltiplos conhecimentos, investindo na identificação dos problemas que surgem na sua atividade e procurando construir soluções adequadas para potencializar seu trabalho. (UNIFACS, 2011, p. 18) Com esse perfil, trata-se de um profissional decisivo para a implementação de propostas curriculares de qualidade, no contexto do desenvolvimento do trabalho educativo nos níveis já especificados, bem como para a educação
de jovens e adultos, com sensibilidade e disponibilidade para intervir de modo consistente e eficaz. Nas dezesseis atribuições do egresso do curso de Pedagogia, estão pontuados os objetivos, conteúdos e recomendações para o exercício das atividades docentes (BRASIL, 2006, p. 11):
Art. 5º O egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto a: I - atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária; II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a contribuir, para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social;
IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em
89 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
III - fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na idade própria;
diversos níveis e modalidades do processo educativo; V - reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas, cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações individuais e coletivas; VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano; VII - relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas; Profissão e Formação Docente
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VIII - promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a família e a comunidade; IX - identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas
a contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; X - demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambientalecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras; XI - desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento; XII - participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração, implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico;
XIV - realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre alunos e alunas
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
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XIII - participar da gestão das instituições planejando, executando, acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em ambientes escolares e não-escolares;
e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas experiências não escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em diferentes meios ambiental-ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas; XV - utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de conhecimentos pedagógicos e científicos; XVI - estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras determinações legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e encaminhar o resultado de sua avaliação às instâncias competentes.
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§ 1º No caso dos professores indígenas e de professores que venham a atuar em escolas indígenas, dada a particularidade das populações com que trabalham e das situações em que atuam, sem excluir o acima explicitado, deverão: I - promover diálogo hecimentos, valores, vida, orientações políticas e religiosas
entre conmodos de filosóficas, próprias à
cultura do povo indígena junto a quem atuam e os provenientes da sociedade majoritária; II - atuar como agentes interculturais, com vistas à valorização e o estudo de temas indígenas relevantes. § 2º As mesmas determinações se aplicam à formação de professores para escolas de remanescentes de quilombos ou que se caracterizem por receber populações de etnias e culturas específicas. Constatamos, a partir do que preveem as Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2006), que este curso continua tendo como área de atuação, a docência na educação infantil, nas séries iniciais do ensino fundamental e nas disciplinas pedagógicas de ensino médio. Contudo, diante do impositivo da sociedade que requer profissionais de educatura definida frente às demandas sociais contemporâneas,
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faz-se necessária, cada vez mais, uma formação docente crí-
Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
ção questionadores e atuantes, com visão abrangente e pos-
tica e consciente da prática educativa transformadora. Apple (1982), por exemplo, além de enfatizar as relações sociais de classe em sua obra Ideologia e Currículo, admite a importância de se considerar relações de gênero e raça, dentre outros aspectos, no processo de reprodução cultural e social exercido pelos currículos escolares. Neste sentido, complementamos, todos os cursos de Pedagogia precisam incluir abordagens que conduzam a
reflexões sobre as questões de gênero e ao entendimento de como se processa a escolha de uma profissão por parte de mulheres e homens; precisa, ainda, assegurar o resgate de uma identidade social e ampliação do universo da pessoa humana, em que os indivíduos, principalmente as mulheres, possam ter consciência de serem sujeitos de sua própria existência, seres que constroem e reconstroem a própria vida. Somente desta forma, poder-se-á considerá-lo um curso que, de fato, forma educadores. Mas a história da formação de profissionais para a docência não acaba aqui. Como analisa Nóvoa (2002, p. 36-37):
Profissão e Formação Docente
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Hoje em dia impõe-se cada vez com maior evidência: que os professores não são apenas consumidores, mas são também produtores de materiais de ensino; que os professores não são apenas executores, mas são também criadores e inventores de instrumentos pedagógicos: que os professores não são apenas técnicos, mas são também profissionais críticos e reflexivos. De facto, não há ensino sem uma renovação permanente dos meios pedagógicos, sem uma concepção quotidiana de novos materiais: quer se trate dos conteúdos ou das situações dictáticas, quer se trate das tarefas a propor aos alunos ou da organização curricular, quer se trate da planificação ou do sistema de avaliação,
os professores encontram-se perante uma atividade constante de produção e invenção. Como educadores, portanto, somos ‘sujeitos’ com identidade única e, ao mesmo tempo, diversificada e múltipla, por conseguinte, profissionais com identidade em construção permanente, como veremos nas aulas que se seguem.
SÍN T ESE Nesta aula, continuamos com a análise da estrutura e do funcionamento dos cursos de formação de professores, desde a metade do século passado até a atualidade; formação através dos cursos pedagógico, de magistério e normal, bem como das Licenciaturas, do Curso Normal Superior e do Curso de Pedagogia.
QU ESTÕES PARA R E FL E XÃO Na sociedade brasileira, a formação docente adquiriu nuanseja, ser professor(a) está relacionado ao processo de democratização da educação, e esse, por sua vez, assume diferentes significações ao longo da nossa história, podendo se traduzir em poder e prestígio social e profissional, estabilidade financeira e psicológica ou o inverso de tudo isso. Retomando o que foi estudado e, em especial, a última análise de Nóvoa (20002), reflita sobre as questões: - O que significa ser professor(a) no local onde você mora? - Quem eram os professores(as) ontem e quem são hoje? - Qual a formação de cada um nos diferentes momentos his-
95 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
ces diversas conforme a época, região ou local de atuação, ou
tóricos? - Das primeiras Escolas Normais ao atual Curso de Pedagogia, considerando as práticas formativas, com a qual você mais se afina e por quê?
L E I T URA S I N DICADA S Para aprofundamento da compreensão desta temática, sugerimos as seguintes leituras: FAGUNDES, Tereza Cristina P.C. Mulher e Pedagogia: um vínculo re-significado. Salvador: Helvécia, 2005. ROMANELLI, Otaiza de Oliveira. História da educação no Brasil. 22. ed. Petrópolis: Vozes, 1999.
SI T ES I N DICADOS CURY, Carlos Roberto Jamil. A Formação Docente e a Educação Nacional. p.1-24. Disponível em: <http://portal.mec. gov.br/cne/arquivos/pdf/conselheiro.pdf>. Acesso em: 13 nov.
Profissão e Formação Docente
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Acesso em: 25 out. 2012.
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mas de organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ L5540.htm>. Acesso em: 12 nov. 2012. BRASIL. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Disponível em: http:// www.pedagogiaemfoco.pro.br/l5692_71.htm. Acesso em: 12 nov. 2011.
97 Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
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BRASIL. Parecer CFE n° 349/72. CESU em 06 de abril de 1972. Dispõe sobre Exercício do magistério em 1.° grau, habilitação específica de 2.° grau. Disponível em: <http://lise.edunet. sp.gov.br/paglei/notas/parcfe349_72.htm>. Acesso em: 12 nov. 2012. BRASIL. Lei nº 7.044, de 18 de outubro de 1982. Altera dispositivos da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, referentes à profissionalização do ensino de 2º grau. Disponível em: <http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/7_Gov_Militar/lei%207.044-1982%20reforma%20da%20 lei%205692-71.htm>. Acesso em: 13 nov. 2012. BRASIL. CENAFOR. Centro Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal para Formação Profissional. A formação de professores. Bimestre: revista do 2º grau. MEC/INEP/CENAFOR, ano I, no 1, 1986. p. 25-27. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf. Acesso em: 10 nov. 2012.
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Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
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Profissão e Formação Docente
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Constituição Histórica da Formação Docente (Parte B)
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(3)
Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
Cláudia Regina Vaz Torres, Maria Izabel de Quadros Vivas e Tereza Cristina Pereira Carvalho Fagundes
Após termos feito, nas aulas anteriores, uma retrospectiva histórica sobre a formação docente e os cursos de formação de educadores, nesta aula, vamos refletir, mais detalhadamente, sobre o curso de Pedagogia. O que significa Pedagogia? O que caracteriza esta área do conhecimento?
PEDAGOGIA CONCEITUAL
-
ABORDAGEM
Pedagogia é uma palavra que tem origem na Grécia antiga: paidós significa criança e agogé significa condução. A partir de sua origem etimológica, construa uma definição para Pedagogia:
O grande educador da Idade Moderna, Comênio (15921670), é considerado o “pai da pedagogia”. Sua obra, a Didática Magna, contribuiu para a criação de uma ciência da educação, defendendo que é possível “ensinar tudo a todos”. A primeira parte da Didática Magna é uma autêntica apoteose
do homem; apresenta os fundamentos filosóficos da educação; a segunda parte é consagrada aos princípios da didática geral e a terceira à didática especial (focalizando o ensino das ciências, da arte, da moral, etc.). A última parte do livro compreende um esboço de plano orgânico dos estudos em que Comênio faz um grande apelo aos pais, aos formadores da juventude e pessoas instruídas, aos teólogos, aos governantes e a Deus para que o ajudem a realizar os projetos expostos. Figura 1: Comenius
Profissão e Formação Docente
106
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Comenius-detail.png
Podemos admitir que esta compreensão do que é Pedagogia, em vigência até os dias atuais, é restrita. Cabia ao Pedagogo, naquela época, o “escravo” que levava a criança para o local da relação ensino-aprendizagem, conduzir a criança até lugares específicos, lugares próprios para o ensino de idiomas, de gramática e cálculo, de um lado, e para a educação corporal, de outro. O pedagogo transportava a pequena bagagem de seu jovem amo e a lanterna que servia para iluminar o caminho. Por vezes até transportava a própria criança, se esta estivesse fatigada.
De modesto servidor, o pedagogo vai progressivamente adquirindo outras funções, nomeadamente ao nível da responsabilidade moral e do cuidado geral sobre a criança. Na verdade, ao acompanhar a criança à palestra tornava-se necessário protegê-la contra os perigos da cidade. Porque passava com a criança grande parte do dia, o pedagogo exercia sobre o seu pupilo uma contínua vigilância. Não é, pois, de estranhar que, pouco a pouco, lhe fosse confiada a educação moral do seu pupilo. Quer isto dizer que, apesar do seu caráter servil e de pouco prestígio que muitas vezes lhe era atribuído, o pedagogo cuidava da educação moral da criança, das suas boas maneiras, do seu caráter. A pequena lanterna que o pedagogo transportava e que servia para iluminar o caminho acabou assim por adquirir o estatuto de uma metáfora. Figura 2: Um jovem grego e seu pedagogo
Fonte: UNIFACS - Desenho adaptado de http://www.diaadia.pr.gov.br/tvpendrive/arquivos/File/imagens/2010/pdagogia/4pedagogogrecia.jpg)
Mas o vocábulo Pedagogia pode ser tomado em sentido lato significando um campo de conhecimentos que abriga saberes da área da educação, tais como a história e a filosofia da educação, a didática, a educação e a própria pedagogia,
Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
107
tomada então em sentido estrito. A Pedagogia é teoria e prática da educação
Pedagogia é a ciência que tem a Educação como objeto específico de análise. As outras ciências que não têm este objeto em primeira instância podem, contudo, a ele se voltar e então, valendo-se dos seus aportes teóricos específicos, constituir-se-ão nos fundamentos da educação. São exemplos: a Sociologia, a História, a Filosofia, a Biologia, a Antropologia e a Psicologia. Num outro sentido, ao longo da história, a Pedagogia se constituiu em disciplina, voltada ao estudo do campo pedagógico. Depois, essa perspectiva passou a ser coberta pela Didática e por estudos sobre currículo, quando enfatizam as teorias e as ideias pedagógicas, sintetizando os aportes das disciplinas anteriores, focando nos resultados do ensino e da educação e dos sistemas escolares.
Profissão e Formação Docente
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Para Libâneo (1999, p.22):
[...] a Pedagogia ocupa-se, de fato, dos processos educativos, métodos, maneiras de ensinar, mas antes disso ela tem um significado bem mais amplo, bem mais globalizante. Ela é um campo de conhecimentos sobre a problemática educativa na sua totalidade e historicidade e, ao mesmo tempo, uma diretriz orientadora da ação educativa.
Pedagogia, neste sentido, é o campo do conhecimento que estuda sistematicamente a educação, o ato educativo. Estuda a prática educativa concreta que se realiza na sociedade. Atualmente, denomina-se pedagogo o profissional cuja formação se dá no Curso de Pedagogia, que no Brasil é uma graduação1 plena da categoria Licenciatura2.
Costumamos nos referir ao profissional egresso deste curso como sendo o pedagogo, entretanto a experiência e a literatura nos mostram que este é um curso majoritariamente feminino, desde a sua criação, o que justificaria o uso contínuo da expressão pedagoga / a profissional.
Pedagogo é o profissional que estuda e que se insere na práxis da educação na sociedade. Neste contexto, entendemos que este estudo somente pode ser realizado como pesquisa das manifestações educativas, incluindo o ensino, fundamentos de várias áreas do saber como mencionamos anteriormente. A inserção profissional será transformadora e propositiva se baseada nesses princípios e ocorrerá nas instituições educativas existentes e a serem criadas, que não apenas a escola.
1. A graduação é um grau acadêmico que, nos sistemas de educação superior inspirados no modelo francês, se refere ao primeiro título universitário recebido por um indivíduo. Os cursos de graduação são, portanto, os primeiros a serem frequentados por alguém que procura formação superior. 2. No Brasil, a licenciatura em pedagogia é um tipo de diploma que habilita seu titular a exercer o magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental (neste caso, a formação se dá no curso de Pedagogia); nas séries finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio (neste caso, a formação se dá nas Licenciaturas das áreas específicas do conhecimento). A Licenciatura é diferente do Bacharelado, mas é possível obter o diploma de Bacharel e o de Licenciado cumprindo os currículos específicos de cada uma destas modalidades.
109 Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
que ocorrem nas sociedades. Para tanto, são necessários os
Depois dessas reflexões, como você caracteriza a Pedagogia como área do conhecimento?
Pedagogia professores?
-
Curso
de
formação
de
Depois de muitos anos com ênfase na docência das matérias pedagógicas em cursos de formação de professores (Curso Normal, Curso Pedagógico e Curso de Magistério)3, o curso de Pedagogia se voltou para a formação dos chamados “especialistas” de educação - supervisores escolares, orientadores educacionais e administradores escolares, entre outras habilitações previstas pela Lei 5540/68 ou Lei da Reforma Universitária (BRASIL, 1968). Como se caracterizavam esses especialistas? Os Orientadores Educacionais, inicialmente voltados para a aplicação de testes de inteligência e de aptidão vocanais de acolhimento aos educandos em seus problemas de
Profissão e Formação Docente
cional, consolidaram-se, posteriormente, como profissio110
aprendizagem e de comportamento, e também de promoção do desenvolvimento de sua autonomia. As áreas de atuação sempre foram diversificadas: orientação escolar, profissional, familiar, psicológica, recreativa e de saúde. Aos Supervisores Escolares cabiam as funções primordiais de construir e implementar o currículo de uma escola, assegurando o relacionamento e a ordenação sequencial dos conteúdos, ou seja, promover um desempenho de qualidade do trabalho didático-pedagógico, articulando e coordenando
3. Nomenclaturas para os cursos de formação de professores em nível médio, em diferentes épocas no Brasil.
as atividades do corpo docente. E aos Administradores Escolares competia administrar a instituição, como responsáveis legais e administrativos pela unidade escolar. Mas, principalmente, competia-lhes ter uma atuação global, dinâmica e eficiente como articuladores principais e implementadores do Projeto Político Pedagógico da Escola. Mas nem tudo transcorreu bem com a formação dos especialistas! Não satisfeitos com a “fragmentação” da formação profissional no curso de Pedagogia e em outros cursos de licenciatura, vários educadores no Brasil se organizaram em comitês, associações e movimentos visando interferir nas decisões do Conselho Federal de Educação (CFE) e do Ministério da Educação (MEC) quanto à formação de educadores em nosso país. Em decorrência dessa conjuntura, nos anos 1980, o Cursos de Formação de Educadores (CONARCFE), que se articulou sistematicamente com as comissões estaduais, cujo princípio fundante foi acompanhar e dar continuidade ao processo de definição da formação de educadores no Brasil. Esse comitê expandiu sua estrutura em 1990, transformando-se em Associação Nacional pela Formação dos Profissionais de Educação (ANFOPE), que deu continuidade à articulação de estudos e debates sobre a formação profissional assegurada no Curso Normal, Curso de Pedagogia e demais cursos de licenciatura (ANFOPE, 2004). Os princípios básicos para a organização curricular dos cursos de formação de educadores definidos pela ANFOPE foram
111 Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
MEC oficializa a Comissão Nacional de Reformulação dos
- [...] formação para o humano, forma de manifestação da educação omnilateral dos homens; - a docência como base da formação profissional de todos aqueles que se dedicam ao estudo do trabalho pedagógico; - o trabalho pedagógico como foco formativo; - a sólida formação teórica em todas as atividades curriculares (nos conteúdos específicos a serem ensinados pela escola básica e nos conteúdos especificamente pedagógicos); - a ampla formação cultural;
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112
- a criação de experiências curriculares que permitam o contato dos alunos com a realidade da escola básica, desde o início do curso; - a incorporação da pesquisa como princípio de formação; - a possibilidade de vivência pelos alunos de formas de gestão democrática;
- o desenvolvimento do compromisso social e político da docência; - a reflexão sobre a formação do professor e sobre suas condições de trabalho; - a avaliação permanente dos cursos de formação dos profissionais da educação como parte integrante das atividades curriculares e entendida como responsabilidade coletiva a ser conduzida a luz do projeto político pedagógico de cada curso em questão. (ANFOPE, 2004, p.12) Dessa forma, cabe à Pedagogia estudar e analisar o fenômeno educativo em instituições escolares, em sistemas culturais. Muito mais que formar professores, o Curso de Pedagogia deve preparar profissionais capazes de entender e de contribuir para a melhoria das condições em que se desenvolve a educação na realidade brasileira, comprometidos com um projeto de transformação social.
113 Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
de ensino, no trabalho, em movimentos sociais e em grupos
PEDAGOGIA OU CURSO SUPERIOR - UMA POLÊMICA
NORMAL
Figura 3: Pedagogia ou CNS
Fonte: UNIFACS EAD
A partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei 9394/96 (BRASIL, 1996) foi criado, no ensino superior brasileiro, um novo curso para formação de professores da Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental - o Curso Normal Superior, ou simplesmente, CNS como ficou mais conhecido.
Profissão e Formação Docente
114
Em seus artigos 62 e 63, a Lei 9394/96 propõe a ‘figura’ do Instituto Superior de Educação, contendo o curso normal superior, tendo a regulamentação desse curso pelo Conselho Nacional de Educação ocorrido em 10/08/99 e sua homologação em 10/09/99. Veja a seguir como a Lei situou o CNS:
Art. 63. Os institutos superiores de educação manterão: I - cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o curso normal superior, destinado à formação de
docentes para a educação infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental; Art. 64. A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional. (BRASIL, 1996). Foi justamente com a criação do CNS que se instalou a nova polêmica na área de formação de professores, pois, ao criá-lo, a lei instituiu um novo formato de curso para uma formação que já vinha acontecendo em um outro curso, além para formar professores da educação infantil e primeiros anos do ensino fundamental. Mas, se esta formação já vinha ocorrendo no Curso de Pedagogia, por que então criar um novo curso? O MEC apontou duas razões para justificar a criação dos Institutos Superiores de Educação: • a necessidade de elevar a qualificação dos
4. Os Institutos Superiores de Educação eram anexos às universidades e surgiram nos primeiros tempos da República.
115 Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
de reeditar a figura dos Institutos Superiores de Educação4
profissionais dedicados à educação infantil e aos anos iniciais do ensino fundamental, e • a suposta dissociação entre teoria e prática presente nos cursos já existentes. Mas a primeira razão posta pelo MEC não sustenta a necessidade de criação de um novo curso, visto que esta mesma formação poderia acontecer no próprio curso de Pedagogia, fazendo alguns ajustes às especificidades e necessidades do atual momento e de cada local. Quanto à segunda razão, que parece mais procedente que a anterior, dada a tradição academicista dos cursos de pedagogia brasileiros, temos no nosso país uma realidade que certamente não seria superada com o novo formato de curso apresentado, pois a experiência profissional, vista como oportunização da prática, em geral, nunca acontece com acompanhamento de formadores, o que pode ser visto em Kishimoto (1999, p. 73)
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[...] se a unidade formadora não dispõe de um projeto de prática de ensino que integre escolas da rede aos trabalhos acadêmicos, em convênios com escolas previamente definidas e com acompanhamento, mais uma vez estamos minando o sistema de formação teórico-prática dos alunos. Se todo aluno faz a prática de ensino na própria escola para aproveitar as horas que a lei oferece, instalamos, mais uma vez, a caótica situação do individu-
alismo, do espontaneísmo e da prática abandonada. Torna-se inviável acompanhar cada aluno em sua respectiva escola, em locais diferentes, com perspectivas distintas de trabalho. Na verdade, não parece que as razões apontadas pelo MEC não pudessem ser objetivadas e superadas no contexto da própria formação propiciada pelo Curso de Pedagogia, a despeito de alguns autores acharem que este curso deva ter uma formação mais acadêmica associada à Ciência da Educação, como em alguns países da Europa. A criação do CNS trouxe uma polêmica que não se restringiu a sua própria legitimidade, mas, ao confronto com o curso de Pedagogia, pois a este caberia, segundo a lei, apenas a formação de profissionais para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, retirando dos pedagogos a docência, princi-
PARA REFLETIR! E para você, qual deve ser o perfil do(a) pedagogo(a)? O(A) professor(a) ou cientista da educação?
Com este questionamento fica evidenciada a visão do nosso país quanto à dicotomia existente entre prática docente e formação acadêmica. E talvez esteja aí a origem de toda a polêmica. Porém, não foi somente esse o motivo do surgimento
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pal e tradicional atividade desses profissionais.
do Curso Normal Superior. A criação de um novo curso representou, também, no contexto das políticas públicas em educação, interesses de alguns segmentos da sociedade que desejavam acelerar a formação docente. Não necessariamente aqueles que realmente fazem a educação acontecer no país, pois representações educacionais, como ANFOPE, ANPED e outras, mostraram-se contrárias a este novo arranjo apresentado pela lei, sinalizando novos questionamentos e ampliando a discussão sobre o tema. Assim, da primeira pergunta que fizemos, várias outras decorreram, dentre as quais destacamos: Qual a diferença entre os currículos dos dois cursos? Qual o título e a identidade profissional dos egressos do CNS? Uma formação é científica e a outra técnica?
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E os pedagogos que já estavam atuando como professores, como ficariam?
Essas foram apenas algumas questões que emergiram na sociedade com a criação do CNS, porém, para refletirmos sobre elas, precisamos lembrar que toda lei é histórica e está inserida em um contexto nacional e internacional que a concebe e legitima. A Lei 9394/96 (BRASIL, 1996) foi fruto de um momento histórico, pautado pelos interesses do neoliberalismo que, em educação, inaugurou práticas aligeiradas de formação profissional, em que mais vale o mais rápido e o mais barato em detrimento da qualidade, conforme assinala Chauí (2000).
Nessa perspectiva, várias políticas educacionais foram impostas ao Brasil pelo Banco Mundial e por outras instituições internacionais, para serem implementadas no decênio 1997-2007 (e que na atualidade constatamos não terem sido em sua totalidade). Essas políticas visavam trazer novos formatos à educação dos países em desenvolvimento sob o pretexto da democratização. Segundo Kishimoto (1999, p. 63)
É claro que a oferta de cursos de formação de professores em nível superior precisava ser ampliada e que medidas de superação das lacunas existentes no modelo vigente deveriam ser apresentadas e implementadas com urgência, entretanto, o que se viu foi a abertura descontrolada de faculdades sem infraestrutura física e humana em todo o país, comprometendo a qualidade da formação dos novos profissionais.
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[...] A formação de profissionais de educação infantil começa a ser discutida, com mais vigor [...] em virtude das especificações da lei 9394/96, que propõe em seu artigo 87, § 4º: “Até o final da Década da Educação somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço”... Durante a Década da Educação - de 1997 a 2007 -, políticas de formação profissional para a educação básica deverão prever a formação dos quadros docentes em nível superior.
Além disso, precisamos considerar, nesta polêmica, o status diferenciado atribuído ao título desta nova formação. Assim, a partir da determinação estabelecida pelo MEC e pelas instituições internacionais financiadoras do país, desde o ano de 1999 não pararam de surgir e crescer no país os institutos superiores de educação e a oferta de cursos normais superiores. Porém, de lá para cá, acirraram-se ainda mais a polêmica e o debate sobre a formação de professores, especialmente por aqueles que defendiam a docência como atribuição do pedagogo, sem a consolidação da dicotomia formação técnica versus formação acadêmica. Com todo esse debate instalado na sociedade desde o ano de 1999, várias propostas foram surgindo para a formação de professores, desta vez apresentadas por aqueles que realmente fazem a educação no nosso país. Durante todo o ano de 2005, tivemos várias propostas das entidades de classe - ANFOPE, FORUMDIR, ANPAE, ANPEd, CEDES, Executiva Nacional dos Estudantes de Pedagogia e, vários Pareceres homologados e Projetos de Resolução apresentados pelo
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Conselho Nacional de Educação - CNE, requerendo novas diretrizes para o curso e principalmente a volta da docência para o curso de Pedagogia5.
QUAL O MELHOR CAMINHO? Após um longo processo de discussões e polêmicas no campo acadêmico-educacional e intervenções do governo, as Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia finalmente
5. A DEFINIÇÃO DAS DIRETRIZES PARA O CURSO DE PEDAGOGIA. Documento enviado ao Conselho Nacional de Educação visando à elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Pedagogia, em 10.09.2004. Elaborado pela ANFOPE - Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação e ANPEd – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação e CEDES – Centro de Estudos Educação e Sociedade. Disponível em http://www.anped. org.br/200904PosicaoDiretrizesCursosPedagogia.doc. Acessado em 14 dez. 2011.
foram aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação. Para as entidades que participaram das lutas em prol da reformulação do curso, a promulgação dessas diretrizes representa o resultado de uma construção coletiva iniciada desde a década de 1980 culminando com a sua homologação em 15 de maio de 2006. A partir das novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia - Licenciatura (BRASIL, 2006), ficou estabelecido que este curso deve formar professores para o magistério na Educação Infantil e para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, atribuindo ao curso de Pedagogia, portanto, a mesma função do CNS, e, consequentemente, fazendo com que o CNS perdesse a razão de existir.
Para entender mais a polêmica CNS X Pedagogia, leia o texto: Formação do Professor da Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental no Brasil: Avanços ou Recuos?1
1. Na elaboração deste texto, o autor contou com as preciosas sugestões dos professores: Olinda Evangelista (UFSC); Donaldo Bello de Souza (UERJ); Waldeck Carneiro da Silva e José Luís Cordeiro Antunes (FEUFF), além da revisão do professor Eduardo Braga dos Santos (DEnsM), aos quais expressivamente agradece.
E como ficaram os alunos do CNS com as novas Diretrizes de Pedagogia? Com a nova determinação, as instituições que ofereciam o CNS procuraram adaptar seus currículos tendo o prazo de um ano para efetivarem o pedido de transformação
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De Fernando de Souza Paiva. Disponível em: www.fae. ufmg.br/estrado/.../formacao_do_prof_educ_infantil.pdf.
de um curso em outro (de CNS para Pedagogia), processo esse que ocorreu, também, por solicitação dos próprios alunos em curso. Em princípio, os dois cursos continuaram coexistindo, porém o CNS foi extinto, uma vez que a formação em Pedagogia cumpre o papel de formar docentes para a Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental.
Diretrizes Curriculares Nacionais - Uma Conquista Iniciamos a nossa reflexão sobre a Pedagogia após a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais com as seguintes questões: • Qual é o conceito mais difundido de Pedagogia na atualidade? • Qual é a identidade do curso de Pedagogia depois das Diretrizes Curriculares Nacionais?
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• Qual é a relação das Diretrizes Curriculares Nacionais com a LDB 9394/96? Pedagogia é teoria e prática da educação. Na concepção de Libâneo (2006, p.1) com a qual concordamos, como campo científico, “[...] integra e sistematiza diferentes conhecimentos e processos de outros campos científicos, visando a dar unicidade à investigação e às ações em relação ao seu objeto, a prática educativa” A pedagogia, então, como teoria e prática, formula objetivos e propõe formas organizativas e metodológicas que promovam a educação, a formação do ser humano, como também sistematiza princípios e normas relacionados aos fins e
meios da educação. A definição do perfil de formação dos cursos de Pedagogia passou a existir com a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais, Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de maio de 2006 (BRASIL, 2006b), que define o curso como uma Licenciatura e o institui o como responsável prioritariamente pela formação do professor para a Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Para regulamentar as várias práticas sociais, estabelecer normas e adequar o funcionamento das instituições às mudanças que ocorrem na sociedade, uma legislação educacional é exigida por educadores e alunos. Tais demandas estão afinadas com a urbanização, a democratização do acesso à escolarização, a diversidade social e cultural na escola, o relativismo ético que produz mudanças comportamentais na juventude, a influência das mídias e a fragilidade das organizações que atingem o trabalho dos professores, a aprendizagem e as escolas, como também estão atreladas a interesses de grupos, posições hegemônicas e políticas que Com a Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996a), que estabelece a formação de profissionais para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, surgiram ações do MEC e do Conselho Nacional de Educação (CNE), para redefinir a formação do profissional do magistério. Essa necessidade surgiu em razão da insatisfação de instituições, entidades de classe e educadores dos cursos de pedagogia, que evidenciaram a distância entre a realidade dos cursos e os rumos traçados pelas políticas governamentais. Tornou-se necessário fundamentar a proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Pedagogia, identificando os pilares de sustentação teórica e prática do
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militam com o propósito da aprovação das suas ideias.
processo educacional. Para elaboração da proposta das Diretrizes, crises epistêmicas foram vivenciadas, a começar pela divergência nos modos de conceber a Pedagogia (concepções que criam diversas possibilidades de organização do trabalho pedagógico), como: • A Pedagogia como Ciência da Educação • A Pedagogia como uma teoria pedagógica dentro da didática, ou seja, uma teoria que se estrutura a partir e em função da prática educativa. E outras crises, como: • a divergência das instituições, entidades de classe e educadores com relação à formação de professores, que identificava o curso de pedagogia como curso de formação de professores das séries iniciais, criticando, 124
•
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assim, uma formação mais abrangente e desarticulada; • as dúvidas surgidas em razão das ambiguidades nos preceitos legais estabelecidos pela LDB 9394/96 no que tange à formação de professores, tanto na graduação como na pós-graduação, a critério da instituição de ensino.
Art. 64. A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de gradu-
ação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional. (BRASIL, 1996) A partir do que está estabelecido no artigo 64, surgiram as seguintes questões sobre a formação: 1- Como seria possível formar o professor, o gestor, o coordenador, o pesquisador no mesmo curso? 2- Como a instituição decidiria sobre a formação do profissional de pedagogia? No texto da LDB 9.394/96 (BRASIL, 1996), não fica clara a base nacional comum para formar o profissional do magistério e especialistas para os sistemas de ensino. O MEC e o CNE procuraram redefinir a formação do profissional de
Conhecendo o que está determinado pela legislação A Resolução aprovada pelo Conselho Nacional de Educação - Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de maio de 2006, instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura (BRASIL, 2006b), definindo:
[...] princípios, condições de ensino e de aprendizagem e procedimentos a serem observados
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magistério para atender às demandas que surgiram.
em seu planejamento e avaliação, pelos órgãos dos sistemas de ensino e pelas instituições de educação superior do país, nos termos explicitados nos Pareceres CNE/CP nos 5/2005 e 3/2006. (BRASIL, 2006b) No Art. 2º, essas diretrizes estabelecem que: [...] aplicam-se à formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. (BRASIL, 2006b) O texto estabelece, também, a que se destina o curso de Pedagogia, suas modalidades de formação, as competências
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do pedagogo e afirma que a base da formação do pedagogo é a docência. Sem definir o que é Pedagogia, o texto introduz, no Art. 2º, a conceituação de docência nos seguintes termos:
Compreende-se a docência como ação educativa e processo pedagógico metódico e intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia, desenvolvendo-se na articulação entre conhecimentos científicos e culturais, valores
éticos e estéticos inerentes a processos de aprendizagem, de socialização e de construção do conhecimento, no âmbito do diálogo entre diferentes visões de mundo. (BRASIL, 2006b) Depreende-se no texto das Diretrizes que o conceito de docência é identificado com Pedagogia.
Porém, qual o conceito de docência, atividades educativas e pedagogia na Resolução? Todas as atividades no campo da Educação são atividades docentes? Todo aquele que exerce uma atividade no campo da educação está exercendo a docência? E o pesquisador da área da educação é um docente?
Os dados encontrados no texto são insuficientes para são muito importantes. O Art. 2º, §2º, esclarece o que propiciará o curso de Pedagogia, por meio de estudos teórico-práticos, investigação e reflexão crítica:
I - o planejamento, execução e avaliação de atividades educativas; II - a aplicação ao campo da educação, de contribuições, entre outras, de conhecimentos como o filosófico, o histórico, o antrop-
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responder a essas questões, porém as reflexões nele contidas
ológico, o ambiental-ecológico, o psicológico, o lingüístico, o sociológico, o político, o econômico, o cultural. (BRASIL, 2006a) Observamos que, nesse artigo, a docência é compreendida como sinônimo de atividades educativas. No parágrafo único do Art. 4º, encontramos a definição de atividades docentes:
As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:
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I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação; II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares; III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares e não-escolares. (BRASIL, 2006b) A docência pode ser compreendida como um campo
teórico investigativo, não se resume a ensino, envolve compreensão mais ampla dos processos educativos, dos fundamentos da teoria pedagógica, da gestão educacional, da pesquisa e de todo o campo do trabalho pedagógico. O texto desse artigo, para Libâneo (2007), não diferencia campos científicos, setores, áreas de atuação e por isso ele questiona se todos, de fato, estarão fazendo docência? O Art. 5º descreve as competências necessárias aos egressos do curso de Pedagogia:
I - atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária;
III - fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização na idade própria; IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em
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II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a contribuir para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física, psicológica, intelectual, social;
diversos níveis e modalidades do processo educativo; V - reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas, cognitivas, emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações individuais e coletivas; VI - ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano;
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VII - relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos processos didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas; VIII - promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a família e a comunidade; IX - identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas
a contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e outras; X - demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambientalecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras; XI - desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área educacional e as demais áreas do conhecimento;
XIII - participar da gestão das instituições planejando, executando, acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em ambientes escolares e não-escolares; XIV - realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre alunos e alunas
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XII - participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração, implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico;
e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas experiências não-escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em diferentes meios ambientais ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas; XV - utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de conhecimentos pedagógicos e científicos;
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XVI - estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras determinações legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e encaminhar o resultado de sua avaliação às instâncias competentes. Nas dezesseis atribuições do egresso do curso de Pedagogia estão pontuados os objetivos, conteúdos e recomendações para o exercício das atividades docentes. Orientações também são dadas aos professores indígenas e a professores que venham a atuar em escolas indígenas. As mesmas determinações, também, são aplicadas à formação de profes-
sores para escolas de remanescentes de quilombos ou que se caracterizem por receber populações de etnias e culturas específicas, a saber: I - promover diálogo entre conhecimentos, valores, modos de vida, orientações filosóficas, políticas e religiosas próprias à cultura do povo indígena junto a quem atuam e os provenientes da sociedade majoritária; II - atuar como agentes interculturais, com vistas à valorização e o estudo de temas indígenas relevantes. (BRASIL, 2006b)
curricular do curso de Pedagogia em três blocos: Núcleo de Estudos Básicos, Núcleo de Aprofundamento e Diversificação de Estudos e Núcleo de Estudos Integradores, respeitando-se a diversidade nacional e a autonomia pedagógica das instituições:
I - um núcleo de estudos básicos que, sem perder de vista a diversidade e a multiculturalidade da sociedade brasileira, por meio do estudo acurado da literatura pertinente e de realidades educacio-
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No Art. 6º das Diretrizes, está definida a estrutura
nais, assim como por meio de reflexão e ações críticas, articulará: a) aplicação de princípios, concepções e critérios oriundos de diferentes áreas do conhecimento, com pertinência ao campo da Pedagogia, que contribuam para o desenvolvimento das pessoas, das organizações e da sociedade; b) aplicação de princípios da gestão democrática em espaços escolares e não-escolares; c) observação, análise, planejamento, implementação e avaliação de processos educativos e de experiências educacionais, em ambientes escolares e não-escolares; Profissão e Formação Docente
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d) utilização de conhecimento multidimensional sobre o ser humano, em situações de aprendizagem; e) aplicação, em práticas educativas, de conhecimentos de processos de desenvolvimento de crianças, adolescentes, jovens e adultos, nas dimensões física, cognitiva, afetiva, estética, cultural, lúdica, artística, ética e biossocial;
f) realização de diagnóstico sobre necessidades e aspirações dos diferentes segmentos da sociedade, relativamente à educação, sendo capaz de identificar diferentes forças e interesses, de captar contradições e de considerá-lo nos planos pedagógico e de ensino-aprendizagem, no planejamento e na realização de atividades educativas;
h) estudo da Didática, de teorias e metodologias pedagógicas, de processos de organização do trabalho docente; i) decodificação e utilização de códigos de diferentes linguagens utilizadas por crianças, além do trabalho didático com conteúdos, pertinentes aos primeiros anos de escolarização, relativos à Língua Portuguesa, Matemática,
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g) planejamento, execução e avaliação de experiências que considerem o contexto histórico e sociocultural do sistema educacional brasileiro, particularmente, no que diz respeito à Educação Infantil, aos anos iniciais do Ensino Fundamental e à formação de professores e de profissionais na área de serviço e apoio escolar;
Ciências, História e Geografia, Artes, Educação Física; j) estudo das relações entre educação e trabalho, diversidade cultural, cidadania, sustentabilidade, entre outras problemáticas centrais da sociedade contemporânea; k) atenção às questões atinentes à ética, à estética e à ludicidade, no contexto do exercício profissional, em âmbitos escolares e não-escolares, articulando o saber acadêmico, a pesquisa, a extensão e a prática educativa; l) estudo, aplicação e avaliação dos textos legais relativos à organização da educação nacional; Profissão e Formação Docente
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II - um núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos voltados às áreas de atuação profissional priorizadas pelo projeto pedagógico das instituições e que, atendendo a diferentes demandas sociais, oportunizará, entre outras possibilidades: a) investigações sobre processos educativos e gestoriais, em diferentes situações institucionais:
escolares, comunitárias, assistenciais, empresariais e outras; b) avaliação, criação e uso de textos, materiais didáticos, procedimentos e processos de aprendizagem que contemplem a diversidade social e cultural da sociedade brasileira; c) estudo, análise e avaliação de teorias da educação, a fim de elaborar propostas educacionais consistentes e inovadoras; III - um núcleo de estudos integradores que proporcionará enriquecimento curricular e compreende participação em:
b) atividades práticas, de modo a propiciar vivências, nas mais diferentes áreas do campo educacional, assegurando aprofundamentos e diversificação de estudos, experiências e utilização de recursos pedagógicos;
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a) seminários e estudos curriculares, em projetos de iniciação científica, monitoria e extensão, diretamente orientados pelo corpo docente da instituição de educação superior;
c) atividades de comunicação e expressão cultural. (BRASIL, 2006b)
No Núcleo de Estudos Integradores, estão incluídas disciplinas e atividades curriculares que deverão fazer parte da estrutura curricular do curso de Pedagogia, com o objetivo de preparar o pedagogo intelectual e metodologicamente, para que ele se torne um profissional capaz de promover a aprendizagem dos seus alunos. Os três núcleos: Estudos Básicos, Aprofundamento e Diversificação de Estudos e Estudos Integradores habilitam o profissional de Pedagogia para desenvolver atividades educativas, de gestão e coordenação de ensino. No Art. 7º, encontramos a distribuição da carga horária mínima de 3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico do curso de Licenciatura em Pedagogia.
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I - 2.800 horas dedicadas às atividades formativas como assistência a aulas, realização de seminários, participação na realização de pesquisas, consultas a bibliotecas e centros de documentação, visitas a instituições educacionais e culturais, atividades práticas de diferente natureza, participação em grupos cooperativos de estudos; II - 300 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado prioritari-
amente em Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, contemplando também outras áreas específicas, se for o caso, conforme o projeto pedagógico da instituição; III - 100 horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas específicas de interesse dos alunos, por meio da iniciação científica, da extensão e da monitoria. (BRASIL, 2006b)
A Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de maio de 2006, em análise, estabelece que a duração do curso seja de 3.200 horas. Ampliando as possibilidades de atuação do/a profissional de Pedagogia, o Art. 9º afirma que: 139 Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
[...] os cursos a serem criados em instituições de educação superior, com ou sem autonomia universitária e que visem à Licenciatura para a docência na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos, deverão ser estruturados com
base nesta Resolução. (BRASIL, 2006) A extinção das habilitações em cursos de Pedagogia atualmente existentes é determinada no Art. 10, a partir do período letivo seguinte à publicação da Resolução de 2006. As antigas habilitações somente serão efetivadas em nível de pós-graduação. O Art. 14 estabelece a formação de especialista em cursos de pós-graduação.
1º Esta formação profissional também poderá ser realizada em cursos de pós-graduação, especialmente estruturados para este fim e abertos a todos os licenciados.
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2º Os cursos de pós-graduação indicados no § 1º deste artigo poderão ser complementarmente disciplinados pelos respectivos sistemas de ensino, nos termos do parágrafo único do art. 67 da Lei nº 9.394/96. (BRASIL, 2006b) Nessa conjuntura, quem desejar se formar como especialista em coordenação pedagógica, gestão ou psicologia da aprendizagem deverá cursar uma pós-graduação e adquirir habilitações como especialista. Libâneo e Pimenta (2002), ao analisarem o impacto das
diretrizes para o curso de Pedagogia, avaliam que existe uma diferença entre a docência e o pedagogo. Ponderam que é um equívoco lógico-conceitual unir as duas funções em um mesmo profissional, uma vez que o trabalho pedagógico não pode ser reduzido ao trabalho docente nas escolas. A partir das Diretrizes, conflitos e posições antagônicas surgiram em relação à associação da pedagogia à docência. Kuenzer e Rodrigues (2006) analisam que essa redução no campo da pedagogia atende a uma concepção que privilegia a prática em detrimento da teoria, pois as resoluções e os pareceres que surgiram a partir de 1999 têm uma forte preocupação com a prática. O destaque dado à prática decorre da constatação de que as produções teóricas afetaram muito pouco o cotidiano do trabalho docente.
Tanta teoria ... e a prática em sala de aula? As análises de Kuenzer e Rodrigues (2006) apontam que a preocupação com a prática docente surgiu porque os curso complexo produzido pela academia. A apropriação por
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eles é precária ou equivocada. Em outras situações, há neces-
Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
professores não assimilam o conhecimento abstrato e o dis-
sidade de elaborar novos modelos de formação com base na epistemologia da prática, que é um campo de saberes e de investigação do trabalho docente, conceituado por Tardif (2002) como o estudo do conjunto dos saberes realmente utilizados pelos professores em sua sala de aula para desenvolver suas tarefas. Nesse sentido, a epistemologia da prática privilegia a formação reflexiva do professor e a construção de competências profissionais. Para a autora, a concepção de Pedagogia com as Diretrizes acentua a desarticulação, à medida que condiciona a teoria da Educação à prática específica de docência para
crianças de 0 a 10 anos. Segundo a autora, a pedagogia havia conquistado espaços de atuação que foram eliminados pelas Diretrizes. Na análise de Kuenzer e Rodrigues (2006), a emergência das discussões e da busca de um modelo que privilegiasse a prática no Brasil situa-se no final da década de 80 do século XX, que coincidiu com o movimento das reformas educacionais. Nesse período e contexto, surgiram autores que valorizavam a prática reflexiva do professor e a construção de competências educacionais. Donald Schon é um desses autores que desenvolvem o conceito de formação de profissionais reflexivos a partir da crítica feita ao modelo da racionalidade técnica do positivismo, que era adotado nas escolas profissionais e era baseado em padrões normativos e numa visão objetivista da relação do profissional com a realidade. Para Schon (2000), no trabalho em sala de aula, há situações que são muito singulares e que não há respostas certas ou procedimentos-padrão. Para tanto, ele propôs um ensino prático e reflexivo, baseado na epistemologia da prática que abria
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espaço para o talento artístico, aspecto essencial para a atuação em zonas indeterminadas da prática. Nesse sentido, é importante destacar que existem conflitos no universo acadêmico, em razão de autores como Libâneo, Pimenta e Kuenzer, que discordam do texto das Diretrizes, que associam a Pedagogia à docência, prioritariamente, e que são reafirmadas pela ANFOPE, ao criticar a fragmentação do trabalho pedagógico na escola e defender a docência como base da formação dos educadores. Acompanhe a análise de Libâneo sobre esses conflitos (2007, p. 17-18):
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A Pedagogia tem uma tradição epistemológica, tem uma história, tem uma longa produção que começa na antiguidade, é sistematizada no catolicismo e no protestantismo, temos no século XVI Comenius, mais tarde Rousseau, Hebart, Pestalozzi. Na segunda metade do século XIX, surge na Europa o movimento da educação nova, com repercussões no mundo todo, e que teve um representante norte-americano brilhante, que foi John Dewey. [...] Nas primeiras décadas do século XX, os pioneiros da educação nova trouxeram as ideias de Dewey para o Brasil, interrompendo a hegemonia da pedagogia católica e herbatiana. Eu penso que o enfraquecimento da ciência pedagógica no pensamento brasileiro, o enfraquecimento do campo teórico da pedagogia, começa ai. O poder da influência dos pioneiros na legislação educacional, desde a década de 1920, foi muito forte, numa direção cientificista. Uma visão cientificista tem a ver com o caráter objetivo das coisas, com o mensurável, com o que é científico. Como a pedagogia, na visão católica ou herbatiana, tem a ver com finalidades, objetivos, valores, ela não teria cientifici-
dade; esses elementos não seriam passíveis de serem considerados pela ciência. Privilegia-se, daí por diante, a ciência da educação, não a pedagogia. O campo científico passa a ser a educação, não a pedagogia. Não é casual que as faculdades foram denominadas “faculdades de educação”, não faculdades de pedagogia. [...] Para mim, o movimento pela reformulação dos cursos de formação de educadores, depois transformado em ANFOPE, a despeito de fazer questão de declarar sua afiliação ao marxismo, na verdade segue a tradição iniciada pelos pioneiros da educação nova.
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Com base na análise do autor, compreendemos que a identidade do curso de Pedagogia adotou a perspectiva cientificista dos pioneiros da educação nova, ao defender que a divisão social e técnica do trabalho se materializava na escola através da fragmentação do trabalho docente. Desse modo, as habilitações no curso de Pedagogia foram combatidas (supervisor, orientador, administrador escolar), uma vez que teríamos na escola um profissional que pensa (pedagogos com habilitação) e os demais profissionais que executam. Nesse sentido, a docência passou a ser assumida como a base da formação. Libâneo (2007) é contrário a essa posição, por acreditar que essa discussão contribuiu para que o curso de Pedagogia perdesse a sua identidade. Para o autor, a Pedagogia, antes
de ser um curso, é um campo de conhecimento que tem um corpo teórico, um conjunto de conceitos que constituem a base teórica para lidar com a prática profissional. A partir das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, foi superada a dicotomia bacharel e licenciatura; as habilitações em orientação educacional, administração e supervisão e a redução do curso de Pedagogia a formação do professor para as séries iniciais do ensino fundamental e educação infantil. Esperamos que, a esta altura de nosso estudo, você esteja bem consciente do significado do curso que faz e da sua importância na sociedade em que vivemos.
Vamos em frente!
Partindo de uma abordagem conceitual, nesta aula, contextu-
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alizamos a Pedagogia como teoria e prática da educação, ana-
Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
Síntese
lisando sua finalidade, objetivos, convergências e divergências com outros cursos de formação de educadores no Brasil. Finalizamos com uma análise das Diretrizes Curriculares Nacionais, em vigência, desde 1996, que representam uma conquista para o Curso de Graduação em Pedagogia, voltado para a formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar, assim como em outras áreas que desenvolvam conhecimentos pedagógicos.
qu estões pa r a Re f l e x ão Através de uma profissão, é possível mudar o mundo? Como é possível, através da inserção profissional do(a) pedagogo(a), criar condições para se constituir como pessoa e como agente formador(a)?
Le i t u r a s i n dic a da s ALMEIDA, Jane Soares de. Mulher e educação: a paixão pelo possível. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998. FAGUNDES, Tereza Cristina Pereira Carvalho. Mulher e pedagogia: um vínculo re-significado. Salvador: Helvécia, 2005. LIBANEO, Jose Carlos. Pedagogia e pedagogos, para quê? São Paulo: Ed. Cortez, 1998. LIBÂNEO, José Carlos. Diretrizes Curriculares da Pedagogia: um adeus à Pedagogia e aos pedagogos? Disponível em:
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Pedagogia - Concepções Teóricas: Aspectos Legais E Perfil Profissional
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Formação Continuada: Desenvolvimento Pessoal e Profissional
“O problema não é inventar. É ser inventado hora após hora E nunca ficar pronta Nossa edição convincente.” Carlos Drummond de Andrade
Maria Izabel de Quadros Vivas Olá! Depois de analisarmos, detalhadamente, sobre o curso de Pedagogia, iremos, nesta aula, refletir sobre a formação docente na perspectiva da formação continuada, tecendo relações com o contexto sociocultural contemporâneo e as implicações desse processo no desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional. Discutiremos, inicialmente, o significado do conceito de formação continuada e como a legislação brasileira situa esse processo no contexto da formação docente. Daremos continuidade apresentando algumas tendências e modalidades, seguidas dos limites e possibilidades de eficácia desses processos, tanto no âmbito pessoal quanto organizacional. Os principais autores que contribuirão para nossas reflexões são: Acácia Kuenzer, Bernadete Gati, José Carlos Libâneo, Moacir Gadotti e Philippe Perrenould.
Vamos lá, então? Bons estudos!
FORMAÇÃO CONTÍNUA OU CONTINUADA: DESENVOLVIMENTO PESSOAL, PROFISSIONAL E ORGANIZACIONAL “O conhecimento é enraizado na vida social, expressando e estruturando a identidade e as condições sociais dos que dele partilham.” (GATTI, 2003)
No atual momento histórico em que vivemos, todas as áreas do conhecimento humano são/estão sendo construídas e (re)construídas permanentemente na articulação entre teoria e prática e na interdisciplinaridade que emerge a todo o momento da cotidianidade, marcada e demarcada por transformações rápidas e intensas de ordem científica, tecnológica, cultural, econômica, epistemológica etc. Nessa perspectiva, a formação profissional já não pode mais ocorrer em uma única etapa como culminância de um processo que marcava a passagem para o mundo adulto e do trabalho. A complexidade do mundo contemporâneo exige reflexões, aprendizagens e atualizações que não cabem apenas numa etapa final de formação como antes se pensava. Pode-se mesmo até dizer que nunca estamos prontos quando se trata da formação profissional, sobretudo quando se trata da formação profissional docente, que, por si só, já constitui No campo educativo, o pensamento freireano sem-
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um campo multirreferenciado1. 154
pre defendeu a ideia de que somos inconclusos. Para ele, ser educador(a) é muito mais do que a aquisição da formação técnica ou uma questão de vocação. Ser educador(a) pressupõe a formação permanente, no cotidiano da prática pedagógica, daqueles que acreditam na educação como prática social dialética e transformadora, pois “[...] Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da prática.” (FREIRE, 1999, p.52). Assim, em conformidade com as demandas da contemporaneidade, emergiram em todo o mundo, nas últimas
1. O conceito de multirreferencialidade aqui é o defendido por Ardoino (1998), que diz que a Educação é uma função social global, a qual perpassa pelo campo de um conjunto de ciências em que estão diretamente implicados o homem e a sociedade.
décadas, vários modelos de formação que dão continuidade ao processo inicial realizado nas graduações, os chamados processos de Formação Contínua ou Continuada, que têm como principal objetivo promover a atualização e reflexão permanentes sobre a área de atuação profissional. Inicialmente, esses processos ocorriam por meio de treinamentos em serviço, pelas chamadas “reciclagens”, pelas capacitações, ou, apenas, pela realização sistemática de simpósios, seminários, conferências, congressos e outras formas de socialização de conhecimentos, seguidos, também, por uma maior procura pelos cursos de especializações lato e stricto sensu. No Brasil, em observação a essa necessidade, a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB-9394/96 (BRASIL, 1996) se refere à questão da continuidade da formação do educador no Cap. V, Título VI “Dos profissionais da Educação”, artigos 61, 63 e 67, na seguinte forma (grifos nossos):
I - a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço; (Art. 63) Os institutos superiores de educação manterão:
155 Formação Continuada: Desenvolvimento Pessoal e Profissional
(Art. 61) A formação de profissionais da educação, de modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do desenvolvimento do educando, terá como fundamentos:
III - programas de educação continuada para os profissionais de educação dos diversos níveis. (Art. 67) Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público: II - aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim;
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V - período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho [...] (BRASIL, 1996) Os trechos que grifamos mostram existir, na legislação brasileira, a intenção de promover a formação docente de maneira permanente, tanto em processos que necessitem de licenciamento para serem integralizados (Art. 67 – II), como no próprio exercício da função (Art. 61 – I e Art. 67 – V). Para Gadotti (2000), essas inovações trazidas no texto da atual LDB constituem um avanço para os profissionais da educação, principalmente ao considerar a importância da prática para o processo formativo e a formação continuada como princípio de valorização do magistério, podendo ocorrer inclusive em serviço e não se reduzindo apenas a cursinhos periódicos de reciclagem e/ou a participação em eventos.
Porém, mesmo constituindo um avanço da legislação educativa do Brasil, o que percebemos é que, na prática, ainda existe falta de condições objetivas, tanto materiais quanto simbólicas, para que os docentes dos diferentes níveis de ensino possam realizar de fato uma formação permanente para além dos seus próprios estudos e esforços. Embora a formação continuada de professores seja garantida pela própria LDB/96, observamos como o tempo para ela é contrário ao período de trabalho - nos fins de semana ou nas férias e, ainda, em muitos casos, os custos são por conta dos próprios profissionais, constituindo-se mais em uma obrigação que em um direito. O tempo da formação aumenta o tempo dedicado ao serviço das instituições públicas e/ou privadas. (PRADA, 2007, p.6). Percebemos, então, que a existência da Lei, por si só, não assegura ou garante que a formação continuada dos proa essa necessidade estão vinculadas questões referentes ao
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excesso de carga horária, aos baixos salários, à falta de pro-
Formação Continuada: Desenvolvimento Pessoal e Profissional
fessores possa se realizar de forma plena e eficaz. Atreladas
fessores nas escolas e à falta de políticas públicas e de gestão voltadas para um processo sistemático e continuado de formação profissional. Assim, cientes da complexidade que envolve os processos de formação continuada de professores no país, trataremos, aqui, deles, considerando suas potencialidades e os obstáculos para sua realização. Subsidiaremos nossas reflexões a partir do pensamento de autores que discutem a temática de forma crítica e aprofundada, revelando as modalidades, a importância do processo, suas implicações na vida pessoal e organizacional, conforme segue. Conheça, aqui, um pouco mais das atuais políticas públicas do MEC sobre Formação Continuada de professores:
• SISTEMA
NACIONAL
DE
FORMAÇÃO
DE
PROFESSORES • REDE
NACIONAL
DE
FORMAÇÃO
DE
PROFESSORES
A Rede Nacional de Formação Continuada de Professores foi criada em 2004 com o objetivo de contribuir para a melhoria da formação dos professores e alunos. O público-alvo prioritário da rede são professores de educação básica dos sistemas públicos de educação. As instituições de ensino superior públicas, federais e estaduais que integram a Rede Nacional de Formação de professores, produzem materiais de orientação para cursos à distância e semipresenciais, com carga horária de 120 horas. Assim, elas atuam em rede para atender às necessidades e demandas PAR dos sistemas de ensino.
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As áreas de formação são: alfabetização e linguagem, educação matemática e científica, ensino de ciências humanas e sociais, artes e educação física. O Ministério da Educação oferece suporte técnico e financeiro e tem o papel de coordenador do desenvolvimento do programa, que é implementado por adesão, em regime de colaboração, pelos estados, municípios e Distrito Federal. Fonte: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_con tent&view=article&id=231&Itemid=458
Ainda sobre as ações do Governo Federal sobre Formação Continuada de professores, podemos destacar o Decreto n° 6.755, de 29 de janeiro de 2009, conforme nota a seguir:
Governo Federal institui política nacional de formação de professores
159 Formação Continuada: Desenvolvimento Pessoal e Profissional
Sexta, 30 de Janeiro de 2009 17:08 O presidente Luís Inácio Lula da Silva assinou decreto que institui a Política Nacional de Formação de Professores, publicado no Diário Oficial da União desta sexta-feira, 30. A finalidade é organizar a formação inicial e continuada dos profissionais do magistério para a educação básica, em regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios. Os cursos de atualização e especialização de professores ficarão a cargo da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e deverão ser homologados por seu Conselho Técnico-Científico da Educação Básica. Na formação dos professores, a modalidade principal de ensino é presencial, reconhecendo-se a importância dos sistemas semipresencial e a distância. Entre os pontos de destaque estão o reconhecimento de que a formação docente para todas as etapas da educação básica é compromisso público de Estado, a necessidade de articulação entre formações inicial e continuada, bem como entre diferentes níveis e modalidades de ensino. O decreto enfatiza também a promoção da equalização nacional das oportunidades para os profissionais do magistério em instituições públicas de educação superior. Outros temas abordados no documento dizem respeito à educação inclusiva, educação no campo, educação de jovens e adultos, bem como apoio a programas de formação em regiões e comunidades com necessidades específicas, como quilombolas e indígenas. Para assegurar a implementação da Política, definiu-se a formação de Fóruns Estaduais de Apoio à formação Docente em regime de colaboração entre os entes federados. Esta colaboração será concretizada por meio de planos estratégicos. Antes de seguir para aprovação presidencial, o documento passou por discussões envolvendo profissionais da área e os mais diversos setores da sociedade. A minuta ficou disponível para consulta pública e sugestões no portal do Ministério da Educação (MEC), entre os dias 10 de
outubro e 24 de novembro de 2008. Jorge Guimarães, presidente da Capes, agradeceu a todos os membros do Conselho Técnico-Científico da Educação Básica pelas contribuições recebidas e a relevante participação desse Colegiado na operacionalização e execução da nova política. Leia a íntegra do decreto no DOU Nº 21, Seção 1, de 30 de janeiro de 2009, pág 1 e pág 2. Fonte:http://www.capes.gov.br/servicos/sala-de-imprensa/36-noticias/2523-governo-federal-institui-politica-nacional-de-formacao-de-professores-
FORMAÇÃO DOCENTE CONTINUADA: DAS RECICLAGENS AO APERFEIÇOAMENTO Historicamente, os processos de formação continuada de professores foram marcados por etapas e tendências que
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160
revelam a busca pelo aperfeiçoamento na própria trajetória a partir das experiências vividas por professores, especialistas e gestores. Na década de 90 do século XX e primeira do século XXI, predominaram as chamadas “Reciclagens”. E você já havia ouvido esse termo referindo-se à formação continuada? Em que consistiam as chamadas “Reciclagens”? Nos dicionários, encontramos que reciclagem é: Reciclagem (re-ci-cla-gem) s. f. Formação complementar dada a um profissional, para permitir-lhe adaptar-se aos progressos industriais, científicos etc. Ato ou efeito de se recuperar a parte útil dos dejetos e de reintroduzi-la no ciclo de produção de que eles provêm: reciclagem do papel. Ato ou efeito de se reprocessar uma substância, quando
sua transformação está incompleta ou quando é necessário aprimorar suas propriedades ou melhorar o rendimento da operação como um todo. Alteração de ciclagem. Fonte: http://www.dicionarioweb.com.br/reciclagem. html
Embora o dicionário defina ‘reciclagem’ também como formação profissional, predominantemente, seu maior uso ocorre em processos ambientais de sustentabilidade, o que levou ao seu “descarte” na área profissional, por não ser considerado “politicamente correto”. Além disso, os programas de “reciclagem” profissional eram pontuais, uniformes demais, essencialmente técnicos e dissociados do exercício da função, geralmente pensados e executados externamente, sem condesuso do termo nesse âmbito, embora o formato tenha permanecido em vários espaços e organizações de trabalho. Sobre esse aspecto, o sociólogo e educador Philippe Perrenoud (Figura 1) diz que,
As reciclagens obrigatórias estão sendo progressivamente abandonadas. Não mais fazem parte do espirit du temps. Não se pode apostar na profissionalização, nos projetos da escola, na responsabilização e, ao mesmo tempo, convocar os professores através de medidas autoritárias; não se pode solicitar que sejam consideradas as diferenças entre
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textualização e impostos de forma autoritária, o que levou ao
alunos e, ao mesmo tempo, ignorar as diferenças entre os professores; as reciclagens-padrão são, enfim, por demais elementares para alguns e claramente insuficientes para outros. (PERRENOUD, 1997, p.207) Segundo Perrenoud (1997, p.207), a formação continuada deve ocorrer muito mais como um aperfeiçoamento profissional do que como atividade extra, embora, para ele, o aperfeiçoamento “[...] respeita a liberdade de escolha de cada um, mas, em contrapartida, deixa o sistema educativo bastante desprovido da articulação necessária entre política educacional e formação contínua.”
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Philippe Perrenoud Doutor em sociologia e antropologia, ele dá aulas nas Faculdades de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Genebra, nas áreas de currículo, práticas pedagógicas e instituições de formação. Escreveu 10 Novas Competências para Ensinar (Ed. Artmed); Ensinar: Agir na Urgência, Decidir na Incerteza, (Ed. Artmed) entre outros. Fonte: http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/materias_296368.shtml Considerando a necessidade de articulação entre o aperfeiçoamento profissional, de caráter mais individual, e as políticas de formação continuada, de caráter mais político institucional, Libâneo (2004) nos diz que a formação continuada é uma das funções atuais da organização e da gestão escolar, devendo envolver tanto o setor pedagógico quanto o técnico e o administrativo, pois se constitui em condição para
a aprendizagem permanente e para o desenvolvimento pessoal, cultural e profissional de professores(as) e especialistas. Para o autor, é na ambiência da escola que são enfrentados e solucionados os problemas através de procedimentos e estratégias criados e recriados conforme as situações cotidianas. Logo, esse será o espaço privilegiado da prática-reflexiva, para além da formação inicial restrita aos conhecimentos teóricos e práticos e as experiências do estágio, o que constitui a chamada Formação Continuada em serviço. Ainda conforme Libâneo (2004), a formação continuada possui a dimensão individual e coletiva, podendo ocorrer durante a jornada de trabalho ou fora dela, contribuindo significativamente para o desenvolvimento pessoal, dos grupos e das instituições, pois diz respeito às ações de formação relacionadas a estudos, reflexões, discussões e confronto de experiências entre colegas, bem como à participação em ativigógico, minicursos de atualização, cursos na modalidade
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EAD, palestras, conselhos e demais atividades relacionadas
Formação Continuada: Desenvolvimento Pessoal e Profissional
dades de planejamento, elaboração do projeto político peda-
à vida escolar, importantíssimas para todos os seus atores. José Carlos Libâneo Graduado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1966), mestrado em Filosofia da Educação (1984) e doutorado em Filosofia e História da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1990). Pós-doutorado pela Universidade de Valladolid, Espanha (2005). Professor Titular aposentado da Universidade Federal de Goiás. Atualmente é Professor Titular da Universidade Católica de Goiás, atuando no Programa de Pós-Graduação em Educação, na Linha de Pesquisa Teorias da Educação e Processos Pedagógicos. Coordena o Grupo de Pesquisa do CNPq: Teorias e Processos educacionais. É membro do Conselho Editorial das seguintes revistas: Olhar de Professor (UEPG), Revista de Estudos Universitárias (Sorocaba), Educativa (UCG),
Espaço Pedagógico (UPF), Interface-Comunicação, Saúde e Educação (Unesp Botucatu), parecerista da Revista Brasileira de Educação e Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Membro do Conselho Editorial da Editora Unijui. Pesquisa e escreve sobre os seguintes temas: teoria da educação, didática, formação de professores, ensino e aprendizagem, organização e gestão da escola. Atualmente desenvolve pesquisas dentro da teoria histórico-cultural, com ênfase na aprendizagem, ensino e organização da escola. É membro do GT Didática da ANPEd-Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação. Fonte: http://lattes.cnpq.br/7261628151334430
Mas, e você, o que acha da formação continuada em serviço? É algo possível ou sobrecarrega mais ainda os (a) fazeres docentes cotidianos? O fato de poder ser realizada em serviço confere aos
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processos de formação continuada maior senso de realidade e coerência com as necessidades pessoais e institucionais, pois
[...] os processos de formação continuada em serviço, desenvolvidos na instituição escolar como um todo, a partir de um projeto de Formação Continuada em Serviço, construído pelo coletivo da instituição e inserido dentro do Projeto Político Pedagógico, contribui para melhorar a principal atividade do ser humano, o trabalho, neste caso o docente, dando a ele um sentido de desenvolvimento individual e coletivo necessário à transforma-
ção da educação, além de reduzir os custos financeiros. (PRADA, 2007 p.4, s.d.) Ainda sobre esse aspecto, destacamos que
Contudo, a realização de processos de formação continuada ainda não constitui uma realidade no país. Além disso, ao atrelarmos esses processos ao serviço, corre-se o risco de reduzir os espaços de reflexão e construção do conhecimento pedagógico de forma mais ampla e científica a mais uma tarefa a ser engolida pela rotina escolar e pela falta de condições materiais objetivas e subjetivas para sua realização, pois
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A realização da formação na própria escola é um grande passo nesse sentido, não somente porque ela constitui um coletivo de formação, mas também porque a formação acontece no local de trabalho do professor, ficando menos facilmente separada das práticas. lsso, todavia, é apenas uma vantagem virtual: podem-se imaginar formações realizadas em escolas, mas que se passam numa sala fechada, em horários fixos, com o formador tendo também pouco acesso às aulas, como se estivesse recebendo os professores num centro afastado [...]. (PERRENOUD, 1997, p.209)
se, por um lado, a formação continuada em serviço confere maior vínculo entre teoria e prática; por outro, diminui a responsabilidade do estado em garantir que se cumpra o que propõe a Lei 9.394/96 (LDB), visto que esta, de certo modo,
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[...] reduz o professor a tarefeiro, chamado de “profissional”, talvez como um marceneiro, encanador ou eletricista, a quem compete realizar um conjunto de procedimentos preestabelecidos. Nessa concepção, de fato, qualquer um pode ser professor, desde que domine meia dúzia de técnicas pedagógicas; como resultado, destrói-se a possibilidade de construção da identidade de um professor qualificado para atender às novas demandas, o que justifica baixos salários, condições precárias de trabalho e ausência de políticas de formação continuada, articuladas a planos de carreira que valorizem o esforço e a competência. (KUENZER, 1999, p.182) A problematização apresentada pela professora Acácia Kuenzer (1999) nos revela a outra face dos processos de formação continuada: aquela que sai do campo do que é ideal para o campo do real e possível. Afinal, o mundo do trabalho articula interesses de ordem pessoal e institucional que nem sempre convergem de forma simétrica, ou seja, nem sempre os interesses pessoais do profissional estão em conformidade
com os da instituição em que trabalha ou, ainda, com aquilo que esta oferece e assegura ao seu desenvolvimento, sobretudo quando se trata de instituições públicas de educação. A professora Acácia Kuenzer (1999) considera que o processo de formação continuada muda radicalmente o perfil do educador de hoje, visto que este não é apenas um distribuidor de conhecimentos produzidos pela humanidade, mas sim o produtor da ciência pedagógica construída historicamente com base nas relações sociais e produtivas, nos seus fundamentos, e com as teorias e processos pedagógicos que viabilizam a aprendizagem no dia a dia da escola, o que proporciona a produção de novos conhecimentos em educação e a capacidade de intervir, de forma competente, nos processos educativos.
Possui graduação em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (1972), mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1979) e doutorado em Educação: História, Política, Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1984). Atualmente é professor titular aposentado; professor sênior da Universidade Federal do Paraná. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação Profissional, atuando principalmente nos seguintes temas: educação profissional, educação e trabalho, educação tecnológica, formação de professores e ensino médio. Fonte: http://lattes.cnpq.br/9099032959087648
Esta visão da formação continuada permite que os educadores tomem para si o fazer e o pensar pedagógico numa perspectiva dialética, saindo da condição de objeto de pesquisas e estudos e passando à condição de sujeito da sua
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Acácia Zeneida Kuenzer
práxis, o que viabiliza tanto o seu crescimento como pessoa, elevando a sua autoestima, quanto como profissional, contribuindo para que o seu fazer pedagógico seja mais significativo. Tal visão proporciona, também, a melhoria dos processos organizativos e de gestão das instituições de educação que assumem, agora, essa prática como compromisso e responsabilidade institucional consoante a LDB vigente, elevando os processos formativos à condição de prática democrática colaborativa, essencial ao aperfeiçoamento da profissão docente e do próprio papel social da educação.
FORMAÇÃO CONTINUADA: CONSTRUÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS COMPETÊNCIAS DA DOCÊNCIA
Profissão e Formação Docente
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“[...] A vontade de aprender não basta, se não for guiada por uma percepção precisa do que se sabe fazer e do que se deveria saber fazer.” (PERRENOUD, 1997, p.228) Conforme refletimos anteriormente, já não é mais possível darmos por completa ou finalizada a formação profissional na sua etapa inicial – a graduação. Além de um formato excessivamente teórico, pouco articulado às situações concretas vivenciadas no mundo do trabalho docente escolar, sabemos que existe a necessidade de atualização e reflexão permanentes no exercício do fazer educativo, assim como o desenvolvimento de competências que só se tornam
exequíveis na própria dinâmica das tarefas relacionadas ao ensino-aprendizagem. Segundo Perrenoud (1997), em Genebra na Suíça, existe a falsa ideia de que a formação inicial é a mais importante para a aquisição das competências docentes. Porém, este seria apenas o primeiro passo de uma tarefa que se torna permanente e que requer esforços pessoais e institucionais para realizá-lo cotidianamente, refletindo sobre a práxis e adquirindo novas competências no e pelo exercício da profissão.
Perrenoud (1997, p.207) afirma que a aquisição das
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A certificação do início da carreira, portanto, não é inteiramente confiável, mas isso não tem conseqüências necessariamente graves, visto que o que foi adquirido inicialmente será apenas um dos determinantes das competências, principalmente dez ou vinte anos mais tarde. Existe uma tendência a superestimar a importância da formação inicial. Em um sistema educativo e em uma sociedade em transformação, ela é somente o ponto de partida de uma longa história, ao sabor da qual muitos outros fatores vão influenciar as representações da profissão, a identidade do professor, seus conhecimentos profissionais e suas competências. (PERRENOUD, 1997, p.227)
competências da docência se dá no próprio exercício da profissão docente e deve se consolidar por meio da formação continuada. Para ele, esse processo passa por 5 etapas, que descreve como avanços: 1. Integração da formação contínua à legislação e à tarefa docente, sob dupla forma: • entendimento da jornada de trabalho como mais ampla que as horas de presença em classe, incluindo para todos um tempo de formação contínua, em modalidades diversas; • adoção de um mecanismo de liberação dos alunos ou de substituição dos professores titulares das classes, que permita que parte do tempo de formação contínua seja tomada das horas escolares. 2. Gestão paritária da formação contínua pela admi-
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nistração escolar e pelas associações profissionais, ou pelo menos o estabelecimento de alguns acordos sobre as grandes linhas de orientação. 3. Desenvolvimento da formação contínua na própria escola, em articulação com um projeto (de pesquisa-ação, de inovação ou de formação). 4. Criação de um corpo de formadores e de serviços que garantam a oferta regular de formação contínua em temas que não estejam distantes demais das práticas profissionais, dos programas, dos modos de funcionamento específicos da escola. 5. Articulação com a formação inicial, ou seja, a formação contínua deve implicar uma forma de continuidade e de acompanhamento da primeira, cada uma delas se adaptando à evolução da outra e do sistema.
A formação continuada em serviço com foco no desenvolvimento de competências, como propõe Perrenoud, implica a assunção de uma postura de compromisso, tanto por parte dos docentes, quanto dos gestores, que deverão, juntos, mobilizar-se para esse fim.
Ainda para o autor, este é um processo que requer a adoção de um projeto de formação continuada na escola, sistematizando as etapas e os processos, instituindo, inclusive, um corpo de formadores que realize as formações, articulando-as a uma pesquisa-ação ou a uma outra metodologia científica que dê tratamento aos instrumentos de avaliação que forem utilizados no processo. Pensando a formação
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Uma competência é um sabermobilizar. Trata-se não de uma técnica ou de mais um saber, mas de uma capacidade de mobilizar um conjunto de recursos - conhecimentos, know-how, esquemas de avaliação e de ação, ferramentas, atitudes - a fim de enfrentar com eficácia situações complexas e inéditas. Não basta, portanto, enriquecer a gama de recursos do professor para que as competências se vejam automaticamente aumentadas, pois seu desenvolvimento passa pela integração e pela aplicação sinérgica desses recursos nas situações, e isso deve ser aprendido. (PERRENOUD, 1997, p.208)
continuada dessa forma, é possível promover o desenvolvimento pessoal, profissional e institucional.2
LIMITES E POSSIBILIDADES FORMAÇÃO CONTINUADA
DA
“Não quero faca nem queijo; quero é fome” (Adélia Prado) Iniciaremos esta última parte da nossa aula refletindo um pouco mais detidamente sobre a citação em destaque da poetisa Adélia Prado: “Não quero faca nem queijo; quero é fome”. Mesmo sabendo que muito ainda se tem a caminhar quando tratamos da questão da formação continuada de
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professores no Brasil, é preciso reconhecer que, nas últimas décadas, várias experiências de formação continuada vêm ocorrendo tanto por meio de políticas públicas no âmbito dos governos Federal, Estaduais e Municipais, quanto por meio de iniciativas privadas. Porém, ainda não é possível dizer que a realização desses processos tenha produzido mudanças significativas na educação brasileira no que se refere à qualidade dos processos pedagógicos, na gestão escolar e na promoção da valorização mais efetiva do magistério. Isto posto, cumpre fazer, pelo menos, dois questionamentos: • Qual é o motivo da visível resistência dos docentes aos programas de formação continuada em serviço
2. Para saber mais sobre a formação continuada por competências, leia o artigo de Philippe Perrenoud “Formação Contínua e Obrigatoriedade de Competências na Profissão de Professor”, disponível em: http://rived.mec.gov.br/comousar/textoscomplementares/complementarmod13.pdf .
quando eles acontecem? • Por que é tão difícil a aquisição de novas competências docentes? Embora pareçam simples, essas duas questões estão cheias de complexidade e, para respondê-las, é preciso ter cuidado e multirreferencialidade no olhar. Afirmar que existe resistência dos docentes em realizar processos de formação continuada não deve ser visto aqui como uma acusação, tampouco estamos criticando negativamente ou desqualificando a categoria profissional docente quando dizemos que é difícil para eles adquirirem novas competências profissionais. O que buscamos aqui, além de refletir sobre a formação docente, é, principalmente, analisar os limites e as possibilidades da efetividade desses processos tão importantes para o desenvolvimento da educação brasileira, em uma perspectiva Segundo a professora Bernadete Gatti3 (2003, p.192), em um artigo que analisa as condições em que podem “[...] ocorrer mudanças profissionais e pessoais como resultado de um programa de formação em serviço de professores”, que tem como caso-referência o programa desenvolvido pelo Ministério da Educação: o Proformação, a efetividade desse tipo de processo, que visa a mudanças cognitivas e de práticas, não está atrelada apenas aos conteúdos e à metodologia de trabalho. Para ela,
É preciso ver os professores não como seres abstratos, ou es-
3. Para conhecer mais sobre o pensamento da professora Bernadete Gatti sobre o assunto, leia o artigo “Formação continuada de professores: a questão psicossocial”, disponível em: http://www. scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742003000200010&lng=en&nrm=iso
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histórica e crítica.
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sencialmente intelectuais, mas, como seres essencialmente sociais, com suas identidades pessoais e profissionais, imersos numa vida grupal na qual partilham uma cultura, derivando seus conhecimentos, valores e atitudes dessas relações, com base nas representações constituídas nesse processo que é, ao mesmo tempo, social e intersubjetivo. Há também que se considerar o papel de eventos mais amplos, sejam sociais, políticos, econômicos ou culturais, com seus determinantes que perpassam a vida grupal ou comunitária. Sabemos que a interação desses fatores molda as concepções sobre educação, ensino, papel profissional, e as práticas a elas ligadas, concepções e práticas estas que, por sua vez, são estruturalmente delimitadas pela maneira que as pessoas se vêem, como estruturam suas representações, como se descrevem, como vêem os outros e a sociedade a qual pertencem. (GATTI, 2003, p.196) Toda essa complexidade a que a autora se refere ganha sentido quando pensamos em responder a primeira questão que propomos: “Qual o motivo da visível resistência dos docentes aos programas de formação continuada em serviço
quando eles acontecem?”. Seria demasiado simplista respondermos que os professores são resistentes porque não estão interessados em melhorar suas práticas, ou que não se importam/implicam com a qualidade da educação. Considerarmos que existe uma série de fatores materiais, objetivos e subjetivos relacionados aos processos formativos, nos permite compreender, de forma mais radical, a questão em pauta. Programas de formação continuada que ocorram fora da escola e que sejam pensados para atender a diferentes contextos e realidades sociais, como o caso em tese - o Proformação, precisam considerar a pluralidade cultural do país, as representações sociais dos docentes sobre a educação, além das características pessoais, socioeconômicas e culturais dos sujeitos envolvidos. Somente transcendendo o foco que se dá nos aspectos cognitivos individuais, como ocorre na maioria dos programas, e considerando todos esses demais aspectos, é que podemos pensar na efetividade dos Ainda sobre esse aspecto, destacamos que
Os conhecimentos adquirem sentido ou não, são aceitos ou não, incorporados ou não, em função de complexos processos não apenas cognitivos, mas, socioafetivo e culturais. Essa é uma das razões pelas quais tantos programas que visam a mudanças cognitivas, de práticas, de posturas, mostram-se ineficazes. Sua centralização apenas nos aspectos cognitivos individuais esbarra nas representações
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processos formativos continuados.
sociais e na cultura de grupos. (GATTI, 2003, p.192) Os pontos trazidos pela professora Bernadete Gatti também nos ajudam a refletir sobre o segundo questionamento que fizemos: “Por que é tão difícil a aquisição de novas competências docentes?”. Afinal, as mudanças nos modos de pensar e agir estão diretamente relacionadas aos aspectos socioafetivos e culturais. Contudo, além desses aspectos, podemos destacar outros de ordem mais operacional presentes nos contextos em que ocorrem os processos de formação. Para Perrenoud (1997), quando acontecem processos de formação continuada em serviço com docentes que já possuem formação inicial e/ou experiência profissional, pelo menos, dois processos contraditórios relacionados à aquisição de competências estão em ação:
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• a experiência dá uma certa segurança, aumenta a rapidez e a firmeza dos gestos profissionais, amplia a gama de situações já conhecidas e permite capitalizar conhecimentos vindos da prática; desse ponto de vista, a experiência reforça e fermenta as competências; • a experiência permite que se formem rotinas, dispensa progressivamente a reflexão e o questionamento, a partir do momento em que globalmente as coisas parecem funcionar
ela é, então, acompanhada pela diminuição das competências, mascarada pela desenvoltura que o hábito nos dá. (PERRENOUD, 1997, p.226) Assim, concluímos que, a despeito de todos esses aspectos que elencamos como limites postos à efetividade dos processos de formação continuada, devemos considerar sua importância para o desenvolvimento da educação brasileira e para a valorização e a promoção da profissão docente, pois
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Programas formativos, intervenções que visam trazer impactos e diferenciais nos modos de agir de pessoas/profissionais só mostram efetividade quando levam em consideração as condições sociopsicológicas e culturais de existência das pessoas em seus nichos de habitação e convivência, e não apenas suas condições cognitivas. Mas apenas o levar em consideração essas questões como premissas abstratas não cria mobilização para mudanças efetivas. O que é preciso conseguir é uma integração na ambiência de vida e trabalho daqueles que participarão do processo formativo. (GATTI, 2003, p.197)
Bernadete A. Gatti Possui graduação em Pedagogia pela Universidade de São Paulo (1962) e doutorado em Psicologia - Universite de Paris VII - Universite Denis Diderot (1972), com PósDoutorados na Université de Montréal e na Pennsylvania State University. Docente aposentada da USP e ex-professora do Programa de Pós-Graduação em Educação: Psicologia da Educação da PUC-SP. Atualmente é Superintendente de Educação e Pesquisa da Fundação Carlos Chagas e Consultora da UNESCO. Membro do Conselho Consultivo do INEP/MEC e do Conselho Administrativo do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC). Consultora Ad Hoc da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Coordenadora da Editoria Científica da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP). Suas Áreas de Pesquisa são: Formação de Professores, Avaliação Educacional e Metodologias da Investigação Científica. Fonte: http://lattes.cnpq.br/9474403645007597 Profissão e Formação Docente
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Dessa forma, o que devemos buscar nesse momento, muito mais que processos formativos com perspectivas técnicas, ainda que levem em consideração as condições sociopsicológicas e culturais dos sujeitos envolvidos, é a construção de uma cultura de valorização da educação que integre ambiência de vida e trabalho, como algo indissociável, a um projeto maior de educação e sociedade que defina, com clareza, a importância e o papel social da educação.
Síntese Podemos constatar, com esta aula, o destaque dado à nova concepção sobre a formação continuada, considerando a re-
lação existente entre a formação permanente de professores e a sua importância para o desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional. Professores mais preparados e mais conscientes do seu papel social, certamente, realizarão práticas pedagógicas mais significativas e com melhores resultados para toda a sociedade. Ainda sobre a formação continuada de professores, é mister destacar a importância da postura dos profissionais frente ao processo, a fim de que este se transforme em oportunidade real de sermos reflexivos, de realizarmos uma autoavaliação verdadeira sobre a nossa condição de estudante/professor e desenvolvermos a disposição para o trabalho em grupo, visto que, conforme as palavras de Paulo Freire, “ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho. Os homens se educam um ao outro em comunhão”.
É com base nessa máxima freireana que propomos a reflexão sobre o seu próprio processo de formação atual, a partir das seguintes questões: Que estudante/professor estou sendo? Com quem discuto as questões que enfrento em sala de aula? Como os estudos que estou desenvolvendo no Curso de Pedagogia têm ajudado a minha prática como estudante e como docente? Que contribuições tenho dado aos colegas e ao local onde trabalho? Quais as atividades de que participo no local de trabalho contribuem para a minha reflexão sobre teoria/prática e crescimento profissional?
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QU ESTÕES PARA R E FL E XÃO
Le i t u r a s i n dic a da s Assim como nas aulas anteriores, convidamos a discutir essas questões, também no fórum de discussão no Ambiente Virtual de Aprendizagem desta disciplina. Para obter mais informações sobre formação continuada de professores, acesse os textos na ferramenta BIBLIOGRAFIA, em nosso AVA, e/ou os seguintes sites: http://portal.mec.gov.br/seb/index.php?option=content&task= view&id=203 http://www.crmariocovas.sp.gov.br/prf_a.php?t=007 (A formação continuada de professores no cotidiano da escola fundamental) http://www.crmariocovas.sp.gov.br/prf_a.php?t=007 (A escola como espaço de formação continuada: tensões e possibilidades instituintes)
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http://www.conteudoescola.com.br/site/content/view/100/42/ (Repensando a formação continuada) www.abed.org.br/seminario2003/texto14.htm (Formação continuada de professores em cursos a distância)
R E F E RÊNCIA S ANASTASIOU, Lea das Graças Camargo; ALVES, Leonir Pessate (orgs.). Processos de ensinagem na universidade. Joinville: Univille, 2004. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União. Brasília, DF, v.134, n.248, 23 dez. 1996. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Cortez, 1999.
FREIRE, Paulo. A educação na cidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1991. GADOTTI, Moacir. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Artmed, 2000. GATTI, Bernardete A.. Formação continuada de professores: a questão psicossocial. Cadernos de Pesquisa. n.119, 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0100-15742003000200010&lng=en&nrm=iso Acesso em: 05 mar. 2013. KUENZER, Acacia Zeneida. As políticas de formação: a constituição da identidade do professor sobrante. Educação & Sociedade. v.20, n.68, dez, 1999. p. 163-183. Disponível http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid
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em:
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E ducação A Distância: Uma Nova Abordagem na Formação do(a) Educador(a)
“A menor distância entre dois pontos não é uma linha reta.” (Albert Einstein)
Teresinha Quadros e Maria Izabel Vivas Olá! Nesta aula, iremos refletir sobre a Educação a Distância (EaD) na contemporaneidade e o que ela representa em termos de possibilidades e desafios para a formação dos professores, considerando o ensino e a aprendizagem a partir dos sujeitos e processos dessa modalidade de educação. Vimos, em aulas anteriores, como se deu a evolução histórica dos cursos de formação de educadores (das escolas normais às licenciaturas), em especial, o curso de Pedagogia, e a importância de uma formação de natureza continuada para o bom exercício da profissão docente e para o cumprimento da função social da Educação. Agora, dando sequência a essas questões, falaremos sobre Educação a Distância - EaD. Veremos por que essa modalidade de ensino, na atualidade, representa, concretamente, mais uma etapa na história dos processos formativos dos educadores e também por que a sua aplicação pode representar uma grande oportunidade para a realização de programas de educação continuada, uma vez que possibilita que o processo formativo se dê em serviço, ou seja, sem que o professor precise, necessariamente, se afastar da realidade em que atua ou de suas atividades profissionais. Bem, para começarmos efetivamente a discussão sobre esse tema, vamos, antes de tudo, refletir sobre o contexto da temática, o conceito de EaD e sobre alguns “mitos” que existem sobre essa modalidade de ensino. Concluiremos destacando os sujeitos e os processos do ensino e aprendizagem na EaD.
Sigamos, então!
CONTEXTUALIZANDO A TEMÁTICA
Fonte: clipart
Antes de conceituarmos a Educação a Distância, faremos aqui uma brevíssima apresentação do contexto socioeconômico e cultural em que esta modalidade de ensino está inserida. O momento histórico que vivemos atualmente
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demarca uma nova revolução planetária, na qual a informação e o conhecimento ocupam lugar de destaque e geram mudanças significativas nos modos de produção, na ciência e na cultura. Diferentemente das revoluções anteriores, de bases industriais, as mudanças atuais decorrentes das tecnologias, aliam-se à reestruturação econômica e à crítica da cultura, implicando a construção de uma nova sociedade. Para Castells (2000),
[...] a tecnologia da informação é para essa revolução o que as novas fontes de energia foram para as revoluções industriais sucessivas, do motor a vapor à eletricidade, aos combustíveis fósseis e até mesmo à energia nuclear, visto que a geração e distribuição de energia foi o elemento principal na base da sociedade industrial. (CASTELLS, 2000, p.50)
Figura 1: Manuel Castells
O cenário tecnológico da chamada Sociedade da Informação e do Conhecimento tem, no computador e na internet, as ferramentas principais para a criação de
187 Educação A Distância: Uma Nova Abordagem na Formação do(a) Educador(a)
Manuel Castells (Hellín, 1942) é um sociólogo espanhol. Entre 1967 e 1979 lecionou na Universidade de Paris, primeiro no campus de Nanterre e, em 1970, na “École des Hautes Études en Sciences Sociales”. No livro “A sociedade em rede”, o autor defende o conceito de “capitalismo informacional”. Foi nomeado em 1979 professor de Sociologia e Planejamento Regional na Universidade de Berkeley, Califórnia. Em 2001, tornou-se pesquisador da Universidade Aberta da Catalunha em Barcelona. Em 2003, juntou-se à Universidade da Califórnia do Sul, como professor de Comunicação. Segundo o Social Sciences Citation Index, Castells foi o quarto cientista social mais citado no mundo no período 2000-2006 e o mais citado acadêmico da área de comunicação, no mesmo período [1][2]. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Castells Foto: http://commons.wikimedia.org/wiki/ File:Manuel_Castells_in_2009.jpg
ambientes interativos que possibilitam troca de informações muito mais rápidas, quase em tempo real, além de permitir conexões entre textos, sons e imagens simultaneamente. De acordo com Lévy (1999), uma das grandes diferenças entre os antigos meios (o rádio e a televisão) e o uso da Internet está na forma com que esta comunicação é estabelecida: um-todos, um-um e todos-todos. Ainda segundo Lévy (1993), a composição do mundo, da mente humana e da técnica é constituída por uma rede de relações nas quais atuam, variavelmente, atores distintos inseridos em um coletivo complexo, em que a Internet, como grande rede de computadores ligados entre si, permite acesso aos mais diversos tipos de informações e transferência de dados, constituindo a mais importante das novas tecnologias
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da comunicação e informação. Nessa mesma perspectiva, Castells (2000) afirma que as Tecnologias da Informação e Comunicação são muito mais que um conglomerado de ferramentas:
As novas tecnologias da informação não são simplesmente ferramentas a serem aplicadas, mas processos a serem desenvolvidos. Usuários e criadores podem tornar-se a mesma coisa. Dessa forma, os usuários podem assumir o controle da tecnologia, como no caso da Internet. Segue-se uma relação muito próxima entre os processos sociais de criação e manipulação de símbolos (a cultura da sociedade) e a capacidade de produzir e distribuir bens e serviços (as forças
produtivas). Pela primeira vez na história, a mente humana é a força direta de produção, não apenas um elemento decisivo no sistema produtivo. (CASTELLS, 2000, p.50-51) Figura 2: Pierre Levy
Filósofo, nasceu em 1956, na cidade de Túnis (Tunísia). Realizou seus estudos na França, doutorou-se em Sociologia e em Ciências da Informação e da Comunicação. Lecionou em várias universidades de Paris e Montreal. Atualmente é professor da UQTR (Université du Québec à Trois-Rivières), na cidade de Quebec, Canadá. Escreveu diversos livros sobre cultura do mundo virtual e as novas tecnologias. Pierre Lévy é um dos principais pensadores da cibercultura. Escreveu diversos textos sobre a nova forma de escrita, o hipertexto. Sua principal obra nesse campo é o livro “Ideografia Dinâmica”, onde afirma, inclusive, que “estamos reinventando a escrita”. É um dos mais proeminentes pensadores da atualidade sobre a temática das novas mídias digitais, e entusiasta acerca das possibilidades cognitivas e antropológicas da internet. Lévy foi quem propôs o conceito de “inteligência coletiva” no começo dos anos 90, quando a internet co-
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mercial ainda engatinhava. Fonte: ht t p://w w w.latec.u f r j.br/educ aon l i ne/i ndex. php?option=com_content&view=article&id=186:pie rre-levy&catid=40:quem-e-quem&Itemid=93 Foto: h t t p : //c o m m o n s .w i k i m e d i a . o r g / w i k i / File:Pierre_L%C3%A9vy.jpg Considerando o pensamento de Castells e de Lévy sobre o contexto da Sociedade da Informação e do Conhecimento, em que as chamadas Tecnologias da Comunicação e da Informação (TCI), em especial a internet, possuem destaque especial, concluímos que as diferentes formas de ser e estar
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na sociedade se alteraram, inclusive no concernente à educação. Assim, ressaltaremos o lugar e o papel que a Educação a Distância adquire, destacando sua relevância nos processos de ensino e aprendizagem e na formação de educadores.
CONCEITO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Fonte: Clip-art.
De forma bastante simplificada, a Educação a Distância - EaD, na contemporaneidade, pode ser conceituada como o processo de ensino-aprendizagem fortemente mediado por tecnologias, no qual os sujeitos envolvidos (principalmente formadores e alunos) estão separados espacial e/ou temporalmente. Historicamente, o uso da EaD vem sendo potencializado com o surgimento sucessivo de novos meios de comunicação, mas, historicamente, podemos associar a sua origem com o desenvolvimento da imprensa, quando a ideia da realização de cópias ganha escala produtiva. Mais recentemente, essa modalidade de ensino vem sendo repensada, reconfigurada e assumindo novo status em função do desenvolvimento do que chamamos de novas tudo as telemáticas, que, diferentemente das anteriores, possibilitam a realização de níveis crescentes de interatividade. Além da superação dos limites historicamente postos pelo tempo e espaço, a possibilidade de aplicação das tecnologias aos sistemas de ensino favorece a conformação de novos ambientes cognitivos - a exemplo do ciberespaço - que podem contribuir, de forma efetiva, para o estabelecimento de novas formas de pensar e de aprender. Embora sejam muitas as vantagens que a EaD apresenta, e seja verdade que o uso das novas tecnologias, na atualidade, pode representar a possibilidade de realização de um salto qualitativo no processo pedagógico e de democratização da educação, é preciso muito cuidado para que não sejamos ingênuos em relação aos limites e às dificuldades que essa modalidade de ensino apresenta quando de sua implementação, principalmente em nosso país, onde a EaD está associada não só à democratização do acesso à Educação Superior, mas também a algumas formas questionáveis de ensino, fato que
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Tecnologias da Comunicação e da Informação (TCI), sobre-
requer de nós uma reflexão crítica.
EAD
DISCUTINDO ALGUNS “MITOS” DA Antes de iniciarmos a discussão propriamente dita
sobre os mitos da EaD, cumpre esclarecer que a ideia de “MITO” aqui apresentada é a usual, do senso comum, a ideia de algo que não pode ser comprovado e que corresponde, aqui, às pré-concepções existentes sobre essa modalidade de ensino e à resistência de alguns segmentos da sociedade ao que é inovador e democratizador. Vamos enumerar e discutir aqui três mitos que normalmente conformam a ideia que muitos ainda têm de Educação a Distância, especialmente no cenário brasileiro, e que pre-
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cisam ser verificados com um pouco mais de cuidado, pois difundem e consolidam uma imagem, muitas vezes equivocada, dessa modalidade de ensino. São eles:
1 - A EaD é mais fácil? Realmente, se a EaD representar apenas a possibilidade de massificação dos projetos educacionais, essa pode ser uma grande verdade, ou seja, se não houver o devido rigor por parte dos poderes públicos e da população em geral em relação aos processos de acompanhamento, à fiscalização e à aferição da qualidade dos serviços prestados pelas instituições de ensino, é grande o risco de que essa modalidade de ensino venha a se consolidar como um caminho mais fácil para a aquisição de títulos e certificações. Ao contrário do que pensamos, essa modalidade de ensino exige maior rigor, tanto da instituição que oferece os cursos - na medida em que todo o projeto pedagógico, o material didático e a logística devem estar assegurados no
momento de início do curso, exigindo um esforço muito maior em termos de planejamento, acompanhamento e avaliação -, quanto por parte dos professores e alunos, que são desafiados da seguinte forma: os primeiros, os professores, a um processo de exposição do seu trabalho para além dos limites da sala de aula tradicional, o que, normalmente, não experimentam em sistemas presenciais, e os segundos, os alunos, por uma necessidade de desenvolvimento de uma postura autônoma e um autodidatismo, que, via de regra, também não são cobrados presencialmente.
2 - A EaD corresponde a uma Educação de qualidade inferior? apresentada. Em termos de Educação, algo visto como mais fácil, rápido e oferecido em grande escala, a princípio, está associado também a algo de qualidade inferior. Um outro fator que, certamente, contribui para a difusão dessa ideia é que, no Brasil, historicamente, devido às grandes diferenças sociais existentes, essa modalidade de ensino correspondeu sempre a uma estratégia alternativa e barata, a ser oferecida e buscada por aqueles que se encontravam, de alguma forma, impossibilitados de terem acesso aos sistemas regulares de ensino. Esse fato vinculou essa modalidade de ensino aos “excluídos” socialmente, categoria com a qual, voluntariamente, ninguém gostaria de estar associado. É verdade que, quando a EaD acontece em série e sem que haja rigor nos processos de produção, implementação e acompanhamento do processo pedagógico, as características inerentes a essa modalidade favorecem que sejam realizadas práticas questionáveis do ponto de vista ético, moral e pedagógico.
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Essa ideia, em grande medida, deriva da anteriormente
3 - A EaD é mais barata? A depender do modelo de implementação adotado, isso pode ser verdade. Algumas instituições apostam na possibilidade de ganhos fáceis, fato que acaba realimentando as outras duas ideias anteriormente apresentadas. Na atualidade, os novos sistemas de armazenagem e distribuição do conhecimento e da informação facilitam e barateiam a realização de cópias. Dessa maneira, se não há investimentos em recursos (humanos e tecnológicos) para acompanhamento e avaliação do processo pedagógico, ou seja, se o curso tem o caráter meramente instrucional e prevê pouca ou nenhuma interatividade, realmente, os custos do processo se limitam quase que exclusivamente aos custos de produção da primeira cópia que, quando replicada e distriProfissão e Formação Docente
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buída em larga escala, promove a diminuição dos preços de venda ao consumidor, ao tempo em que possibilita também a ampliação dos ganhos para quem investe na produção. Certamente, essa não é uma regra geral e começam a surgir experiências que utilizam modelos alternativos, que buscam efetivamente utilizar as novas tecnologias como forma de promover a qualidade do processo pedagógico e a superação dos limites que essa modalidade de ensino impõe, ou seja, a ausência de interatividade e consequente isolamento dos alunos; limite do material didático utilizado; caráter meramente instrucional da proposta etc. Quando o modelo adotado prevê um serviço de tutoria especializado, a realização de encontros presenciais, baixa relação tutor-aluno, ou seja, um número limitado de alunos por tutor e, consequentemente, alto nível de interatividade, material didático de qualidade, disponibilidade de recursos tecnológicos, intenso planejamento e acompanhamento pedagógico, a ideia de que a EaD é mais barata não se sustenta. Ao
contrário, o seu custo de produção pode ser, inclusive, mais alto que um curso presencial, pelo menos nas fases iniciais dos projetos.
Mas, e você: o que pensa sobre a EaD e os “mitos” que apresentamos? Na condição de estudante dessa modalidade, como você avalia a qualidade da sua formação? O que você pode fazer, na condição de e studante dessa modalidade, para minimizar os preconceitos com a EaD? A despeito dos aspectos listados anteriormente, para os possibilidades de superação, é preciso reconhecer que a EaD é considerada, internacionalmente, como estratégia privilegiada para a difusão, socialização e capilarização do conhecimento e valores em escala global e que, em seu atual estágio de desenvolvimento, essa modalidade de ensino apresenta grandes possibilidades e vantagens em relação ao ensino presencial, favorecendo, dentre outros aspectos, a democratização da oferta de serviços educacionais, a adaptação dos processos às realidades regionais e dos alunos, a formação em serviço, a inclusão tecnológica, bem como o desenvolvimento de uma postura mais autônoma dos aprendizes, contribuindo para a efetivação e consolidação da ideia da Educação Continuada. Vistos e considerados esses aspectos, vamos, agora, falar sobre o impacto dessa modalidade de ensino em nosso cotidiano como professores e alunos. Assim, dando continuidade às nossas reflexões sobre a relação pedagógica na/ da EaD, discutiremos, a seguir, o ensino e a aprendizagem a partir dos sujeitos e processos dessa modalidade de ensino.
195 Educação A Distância: Uma Nova Abordagem na Formação do(a) Educador(a)
quais precisaremos estar atentos e buscar a reflexão sobre as
EAD: REPENSANDO O TEMPO E o ESPAÇO DA SALA DE AULA “O homem, como um ser histórico, inserido num permanente movimento de procura, faz e refaz constantemente o seu saber.” (FREIRE, 1981) Profissão e Formação Docente
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Até o momento, as bases objetivas da escola, da sala de aula e das aulas propriamente ditas, foram os principais referenciais para o planejamento e a execução das práticas educativas formais e para o processo de formação profissional daqueles que nela pretendiam atuar. Algumas mudanças recentes contribuem para que esses referenciais sejam, no mínimo, colocados sob suspeita. As mudanças remetem basicamente à discussão sobre a necessidade de realização de práticas pedagógicas mais efetivas, que possibilitem a livre conexão dos conhecimentos processados à dinâmica cotidiana dos sujeitos em formação e também às possibilidades de renovação dessas práticas que são postas pelo desenvolvimento das novas Tecnologias da Comunicação e da Informação – TCI, que já não são mais tão novas assim, tendo em vista a rapidez com que se verifica o processo de inovação tecnológica no mundo contemporâneo. Como vimos anteriormente, a possibilidade de utilização das TCI nos processos formais de educação, formação e
capacitação, amplia o debate sobre a necessidade e as possibilidades de renovação das práticas pedagógicas, tendo como referência princípios como os da colaboração, interdisciplinaridade e autonomia do sujeito aprendiz, todos eles fortemente demandados pela sociedade contemporânea que reclama, cada vez mais, por uma visão de totalidade e atuação flexível e multifuncional em todas as esferas de nossa existência. Nesse contexto, a modalidade da Educação a Distância, “repaginada” e prestigiada pelo uso das TCI, emerge, pelo menos no plano do discurso, como locus privilegiado para a objetivação dessas mudanças e como depositório de grandes promessas no campo da Educação. Segundo Quadros (2001):
Na Educação a Distância, as bases de objetivação dos processos educacionais as quais nos referimos anteriormente,
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No campo específico da Educação, em sua dimensão mais pragmática, este impacto se faz particularmente evidente ao ser incorporado como premissa para a definição de novas práticas pedagógicas e modelos educacionais, a idéia de que um mundo globalizado pressupõe a eliminação de barreiras em todas as dimensões do existir humano, destruindo antigos parâmetros que serviram de referência, na sociedade moderna industrial, para o ordenamento da vida social e das atividades humanas em geral. (QUADROS, 2001, p.4)
ou seja, a escola, a sala de aula e as aulas, se virtualizam e/ou se reconfiguram e somos desafiados a construir novos parâmetros para a realização da nossa prática pedagógica. O processo ensino-aprendizagem e as relações de interação entre professor e aluno, e entre os próprios alunos (que deveriam ocorrer sempre) passam a ocorrer de forma intensamente mediada pelas tecnologias e a partir de novos referenciais de tempo e espaço. Para atuarmos dentro dessa modalidade de ensino, precisamos redimensionar e reconfigurar nossas práticas em função desses novos referenciais. No entanto, precisamos ter alguns cuidados: muitas vezes, a ideia do novo nos leva a pensar que a adaptação a uma realidade diferente implica desconsiderar as experiências vividas e os modos de atuação
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que, durante muito tempo, possibilitaram resultados que não podem simplesmente ser esquecidos. Nesse sentido, recomendamos muita cautela: atuar como professor ou aluno em cursos oferecidos na modalidade a distância significa adaptar as nossas práticas a novas condições, sem que sejam desconsiderados os nossos estilos, a nossa identidade pessoal e as nossas experiências, pois não se aprende a ensinar e a aprender a partir de um conjunto de instruções previamente definido. Para dar sequência a uma reflexão específica sobre a atuação do professor na modalidade de ensino a distância, considerado aqui como o ato pedagogicamente planejado de troca de experiências e mediado por TCI, cumpre, antes de mais nada, ressaltar a indissociabilidade entre os atos de ensinar e aprender, que, em nossa compreensão, correspondem a dimensões de um mesmo processo. Nós, professores (e você também é ou será um), sabemos que, por mais formação que tenhamos para esse fim, ensinar é uma habilidade que só se constrói de forma vivencial
- lembra da citação de Paulo Freire (1981, p.79)? “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo.” Nesse sentido, só aprendemos a partir do enfrentamento diário dos desafios que nos vão sendo postos por nossas experiências cotidianas, que se objetivam e ganham forma de acordo com as nossas características individuais e do universo no qual estejamos atuando. No ensino a distância, isso não é diferente: o professor, para saber como atuar nessa modalidade de ensino, precisará viver essa experiência, a fim de que possa conhecer e entender essa realidade, descobrir seus limites e possibilidades e, somente a partir daí, construir seus próprios métodos e técnicas de trabalho. A única coisa que muda, verdadeiramente, é que, nessa ser essencial, coisa que, se pensarmos bem, deveria acontecer também no presencial, concorda? Sendo assim, gostaríamos aqui de encorajar e estimular você para o enfrentamento dessa experiência e fornecer alguns elementos para que possa planejar suas atividades como profissional de EaD. O compromisso com a avaliação de seu próprio trabalho, a sua intuição e o seu espírito investigativo serão de fundamental importância no processo. Cada experiência vivida deverá se constituir em elemento de reflexão para o aperfeiçoamento gradativo de suas práticas. Uma boa dica é sempre socializar suas dúvidas e impressões, não só com os seus pares e com pessoas com maior experiência nessa área, mas principalmente com os alunos, para que possam aprender juntos.
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modalidade de ensino, a dimensão do planejamento passa a
ENSINO E APRENDIZAGEM NA EAD: SUJEITOS E PROCESSOS Iniciaremos nossas reflexões sobre os sujeitos e processos de ensino e aprendizagem na EaD, apresentando as legislações brasileiras para essa modalidade. Segundo o Decreto n° 2.494, de 10 de fevereiro de 1998, que regulamentava o Art. 80 da LDB (Lei n.º 9.394/96), que trata da Educação a Distância, tínhamos:
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Art. 1º Educação a distância é uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação. Parágrafo Único – Os cursos ministrados sob a forma de educação a distância serão organizados em regime especial, com flexibilidade de requisitos para admissão, horários e duração, sem prejuízo, quando for o caso, dos objetivos e das diretrizes curriculares fixadas nacionalmente. [...] Art. 7º A avaliação do rendimento do aluno para fins de
promoção, certificação ou diplomação, realizar-se-á no processo por meio de exames presenciais, de responsabilidade da Instituição credenciada para ministrar o curso, segundo procedimentos e critérios definidos no projeto autorizado.
Conforme destacou essa primeira legislação, que regulamentou os processos pedagógicos da EaD, diferentemente das modalidades presenciais, a EaD constituiria uma forma de ensino em que se espera que ocorra a autoaprendizagem, ou seja, a autonomia do discente como gerenciador da sua aprendizagem por meio da “[...] mediação de recursos didáticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados pelos diversos meios de comunicação” (BRASIL, 1998). Ainda, conforme essa legislação tem-se que os exames de avaliação deveriam ocorrer presencialmente, avaliando competências, conteúdos e habilidades previstas nas diretrizes curriculares nacionais de cada curso. Porém, considerando que se espera do discente a autoaprendizagem por meio dos diferentes suportes didáticos disponíveis nos meios
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Parágrafo Único: Os exames deverão avaliar competências descritas nas diretrizes curriculares nacionais, quando for o caso, bem como conteúdos e habilidades que cada curso se propõe a desenvolver. (BRASIL, 1998)
de comunicação, cumpre perguntarmos de que forma seriam construídas, desenvolvidas e asseguradas as competências e as habilidades esperadas nos cursos profissionalizantes. Seria mesmo possível o discente desenvolver e/ou adquirir novas competências e habilidades a partir da autoaprendizagem sem nenhum contato com a realidade prática material, apenas nos contatos com os recursos didáticos e sem a mediação pedagógica com os discentes? Talvez essa redação inicial do Decreto tenha sido responsável pelo surgimento de alguns dos “mitos” a que nos referimos anteriormente e, dessa forma, por conta da complexidade apresentada nesses questionamentos, o próprio processo político de discussão das políticas educacionais para EaD promoveu a reestruturação e o aprimoramento do
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texto da regulamentação. Assim, o Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005, traz o seguinte texto:
Art. 1º Para os fins deste Decreto, caracteriza-se a educação a distância como modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos. § 1º A educação a distância organiza-se segundo metodologia, gestão e avaliação peculiares, para as quais deverá estar pre-
vista a obrigatoriedade de momentos presenciais para: I - avaliações de estudantes; II - estágios obrigatórios, quando previstos na legislação pertinente; III - defesa de trabalhos de conclusão de curso, quando previstos na legislação pertinente; e
Como você pode ver, nessa nova redação, o Decreto traz, além de uma nova concepção pedagógica, a figura do professor como mediador do processo de ensino e aprendizagem, acrescentando à letra, também, de forma clara, a obrigatoriedade de momentos presenciais para além das avaliações. Esse Decreto apresenta um modelo para EaD mais compatível com a realidade e as necessidades brasileiras, legitimando os cursos, e tornando-os, portanto, mais valorizados e aceitos pela sociedade. Complementarmente a esse Decreto, o MEC apresentou, posteriormente, novos documentos referentes à regulamentação, regulação e normatização da EaD, a saber: o Decreto 5.773, de junho de 2006, e as Portarias Normativas 1 e 2, de 11 de janeiro de 2007. Além desses documentos, também em 2007, é apresentado pelo MEC o documento que instituiu os REFERENCIAIS DE
QUALIDADE
PARA
EDUCAÇÃO
SUPERIOR
A
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IV - atividades relacionadas a laboratórios de ensino, quando for o caso. (BRASIL, 2005)
DISTÂNCIA, destacando que:
No contexto da política permanente de expansão da educação superior no País, implementada pelo MEC, a EaD coloca-se como uma modalidade importante no seu desenvolvimento.
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Nesse sentido, é fundamental a definição de princípios, diretrizes e critérios que sejam Referenciais de Qualidade para as instituições que ofereçam cursos nessa modalidade. Por esta razão, a SEED/MEC apresenta, para propiciar debates e reflexões, um documento com a definição desses Referenciais de Qualidade para a modalidade de educação superior a distância no País. Esses Referenciais de Qualidade circunscrevem-se no ordenamento legal vigente em complemento às determinações específicas da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, do Decreto 5.622, de 20 de dezembro de 2005, do Decreto 5.773 de junho de 2006 e das Portarias Normativas 1 e 2, de 11 de janeiro de 2007. (BRASIL, 2007)
Embora esse documento não tenha força de lei, como o próprio texto destaca, nele são apresentadas as estruturas e infraestruturas materiais e pedagógicas norteadoras para cursos EaD de qualidade, compatíveis com os critérios avaliativos do MEC para fins de credenciamento, recredenciamento e reconhecimento de cursos. Dentre os itens apresentados nesse documento, destacaremos aqueles referentes aos sujeitos e processos de ensino e aprendizagem, que, segundo o documento, devem constar nos Projetos Político Pedagógicos - PPP dos cursos EaD:
(i) Concepção de educação e currículo no processo de ensino e aprendizagem; (ii) Sistemas de Comunicação; (iii) Material didático; (iv) Avaliação; (v) Equipe multidisciplinar; (vi) Infra-estrutura de apoio; (vii) Gestão Acadêmico-Administrativa;
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[...] Para dar conta destas dimensões, devem estar integralmente expressos no Projeto Político Pedagógico de um curso na modalidade a distância os seguintes tópicos principais:
(viii) Sustentabilidade financeira. [...] (BRASIL, 2007) Assim, considerando os aspectos em destaque quanto ao PPP de um curso EaD, anteriormente transcritos, refletiremos aqui sobre os sujeitos implicados no processo de ensino e aprendizagem dessa modalidade, dando destaque aos que estão mais diretamente implicados nesse processo, a saber: os estudantes, os professores e os tutores virtuais e presenciais. Mas, qual será realmente o papel desses sujeitos na EaD?
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Fonte: clipart
Primeiro, destacaremos o papel dos estudantes da EaD, partindo do questionamento: existe diferença entre um estudante da modalidade presencial e um da modalidade EaD? Em princípio, não, visto que a postura de estudante em ambas modalidades deve estar voltada para a qualidade da formação. Entretanto, considerando que, na EaD, os sujeitos do processo ensino e aprendizagem se encontram separados espacial e temporalmente, podemos elencar algumas posturas como fundamentais para o sucesso do estudante EaD, a saber: • Ter clareza e convicção do seu objetivo e do esforço que terá que dispor para enfrentar os desafios da nova condição. dos, leituras e realização das atividades). • Ter autonomia intelectual e ser autodidata (ampliar os estudos). • Ter responsabilidade com tarefas e trabalhos. • Realizar as atividades extracurriculares (estágios, cursos ou outro tipo de atividade). • Participar colaborativamente do AVA - Ambiente Virtual de Aprendizagem. Esse é o perfil desejado para o aluno EaD. Embora todas as posturas sejam relevantes, queremos destacar a que, de certo modo, diferencia o estudante contemporâneo por meio do modelo de construção do conhecimento - participação e colaboratividade em comunidades virtuais.
Falar em comunidade virtual de aprendizagem é entrever uma
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• Ter autodisciplina (responsabilidade com os estu-
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superação do velho e conhecido modelo tradicional de ensino. É vislumbrar criatividade, construção de conhecimento, inovações, interações em lugar da unidirecionalidade e passividade escolar. Trabalhar colaborativa e cooperativamente fazendo com que cada pessoa é responsável pela sua aprendizagem como também pela aprendizagem dos companheiros do grupo, construindo o conhecimento através de discussões, reflexões e tomadas de decisões na coletividade. Aprender através de comunidades de aprendizagem demanda o desenvolvimento de postura participativa, ativa e interativa por parte de todos os elementos pertencentes ao processo. (VALENTE, 2005, p.06) Concordamos com Valente e reforçamos a ideia de que o estudante EaD, mais que qualquer outro, deve ter autonomia intelectual para fazer da internet, por meio do uso das ferramentas de interatividade da comunicação e informação, um lugar onde possam “[...] construir os seus conhecimentos segundo os estilos individuais de aprendizagem que caracterizam cada um.” (LITTO, 1996, p. 101) Claro que essa é uma postura que deverá ser mediada por meio da interação com os colegas e com os demais sujeitos do processo como professores e tutores. Assim, cabe-nos perguntar: qual é o papel do professor nesse contexto?
O professor deverá ser o mediador da construção individual e coletiva do conhecimento, possuindo todas as competências e perfil desejado para docente de qualquer nível e modalidade de ensino, além de outras específicas para a realidade da EaD. Na modalidade presencial, a despeito da presença dos sujeitos em mesmo tempo e espaço físicos, a mediação não é um processo muito efetivo, particularmente na chamada educação tradicional, na qual a relação entre professor e aluno é hierárquica e verticalizada. Porém, na EaD, com a horizontalidade da relação e descentralização do professor, a mediação passa a ser a forma privilegiada de trocas significativas e construção de conhecimento. Belloni (2000) faz um comparativo entres as diferentes cial e virtual. Quadro 1: Comparação de formas de atuação docente
P ROF E SSOR PRESENCIAL
PROFESSOR DA EAD
* De mestre (que controla e administra as aulas).
* Para parceiro (prestador de serviços, quando o aluno sente necessidade, ou conceptor – aquele que prepara os materiais).
* atualização em sua área específica;
* atualização constante, não só de sua disciplina;
* monólogo sábio de sala de aula;
* diálogo dinâmico dos laboratórios, salas de meios, e-mails, telefone.
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formas de atuação do professor nos dois ambientes – presen-
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* monopólio do saber;
* construção coletiva do conhecimento, através da pesquisa;
* isolamento individual na preparação de suas aulas;
* trabalhos em equipes interdisciplinares e complexas;
* autoridade;
* parceria;
* formador – orienta o estudo e a aprendizagem, ensina a pesquisar, a processar a informação.
* pesquisador – reflete sobre sua prática pedagógica, orienta e participa da pesquisa de seus alunos.
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Fonte: Adaptado de Belloni (1999)
Considerando essa nova postura docente, ressaltamos o papel dos demais sujeitos para a efetividade do processo de ensino e aprendizagem na EaD, visto que essa é uma construção coletiva e colaborativa. Mas, e o(s) tutor(es), qual seria o papel desse(s) outro(s) sujeito(s)?
Bem, cumpre salientarmos inicialmente que, pela legislação brasileira para EaD, deve existir a figura dos tutores virtuais e presencias, exigindo para ambos a formação superior na área específica de cada curso, além da formação para EaD. Entretanto, destacaremos aqui o papel desse sujeito de forma genérica, visto que, para ambas as funções, são exigidas as mesmas qualificações e perfil.
Pimentel (2009) ressalta que o tutor é o responsável pelo acompanhamento dos discentes, sendo o principal elo entre a instituição que oferece os cursos e o aluno. A palavra tutor deriva do latim, significa guarda, defensor, protetor, ou seja, aquele que exerce tutela, quem ampara, é o guardião. Além disso, o tutor se destaca como profissional orientador e mediador pedagógico, elo entre aluno e professor, auxiliando na consolidação do processo ensino-aprendizagem. Como funções desse “novo” sujeito, destacam-se segundo Garcia Aretio (apud PIMENTEL, 2001): • Orientadora - centrada na área afetiva; • Acadêmica - relacionada ao aspecto cognitivo; entre aluno e instituição, bem como ao caráter burocrático deste processo. Segundo Belloni (2001, p.83), o professor tutor “[...] orienta o aluno em seus estudos relativos à disciplina pela qual é responsável, esclarece dúvidas e explica questões relativas aos conteúdos da disciplina - em geral participa das atividades de avaliação”, atuando também como interlocutor entre os estudantes e a instituição. Silva (2009) destaca que é importante que o tutor possua, além da formação acadêmica, um perfil constituído por capacidade intelectual, domínio da matéria, além de maturidade, empatia e cordialidade para saber lidar com diferenças culturais e regionais com as quais pode se deparar na função exercida. Para concluir, salientamos que todos esses sujeitos deverão possuir postura investigativa e autônoma, sendo necessário, também, que sejam conhecedores do projeto
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• Institucional - referente à relação estabelecida
político pedagógico do curso como um todo, estabelecendo relação entre a formação e o contexto sociocultural e econômico em que estão inseridos.
Síntese Chegamos ao fim desta aula. Aqui tivemos a oportunidade de discutir sobre o contexto das chamadas Tecnologias da Comunicação e Informação (TCI) e o impacto delas no mundo produtivo, nas relações econômicas, sociais e culturais, inclusive na educação, espaço-tempo em que apresentamos o conceito de Educação a Distância (EaD) e as implicações dessa modalidade nos processos pedagógicos e seus sujeitos. Para ampliarmos nosso conhecimento e aproveitarmos me-
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lhor os conteúdos vistos, sugerimos que siga três passos: 1- Volte ao início da aula e releia o objetivo previsto, cuja descrição está no primeiro parágrafo; 2- tomando-o como referência, faça uma breve síntese do que foi apresentado e discutido (apenas enumere os pontos); 3 - prossiga, avaliando sempre se os objetivos da aula foram plenamente alcançados.
qu estão pa r a Re f l e x ão Agora que discutimos vários aspectos importantes da EaD, como o conceito, os “mitos”, os sujeitos e processos pedagógicos, além da ideia de qualidade educacional dessa modalidade, como você avalia a atuação dos sujeitos envolvidos nessa modalidade educacional? E os resultados observados por esses cursos nos últimos anos, como você avalia? Por fim, discuta com seus colegas a importância da EaD para a democratização da educação brasileira. Boas aprendizagens!
Le i t u r a s i n dic a da s Para aprofundamento da compreensão desta temática, sugerimos as seguintes leituras: BELLONI, Maria Luiza. Educação a distância. Campinas: Autores Associados, 1999. LEVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. MORAN, José Manuel. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas, SP: Papirus, 2000.
Si tes In dic a dos http://www.cee.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/Dec_Fed_ http://www.cee.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/CNE_EAD_EJA/ Ref_QualidadeEAD.pdf http://www.smec.salvador.ba.gov.br/site/documentos/espaco-virtual/espaco-edu-com-tec/publicacoes/educacao%20e%20 cibercultura.pdf http://www.scielo.br/pdf/es/v23n81/13935.pdf http://tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/212448cibercultura.pdf http://forumeja.org.br/node/587
Re f e r ênci a s ANDRADE, A. Conceito de tecnologia educacional [on-line]. Disponível em: http://www.educ.ufrn.br/arnon/conceito. pdf. Acesso em: 31 mar. 2013. ARAUJO, Bohumila; FREITAS, Kátia S. de (Orgs.). Educação a Distância no contexto brasileiro: experiências em formação inicial e formação continuada. Salvador: ISP/UFBA, 2007.
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EAD/5622_05.pdf
______. Educação a Distância no contexto brasileiro: algumas experiências da UFBA. Salvador: ISP/UFBA, 2005. BRASIL. Decreto nº 2.494, de 10 de fev de 1998. Brasília, MEC, fev.1998. BRASIL. Decreto nº 5.622, de 19 dez de 2005. Brasília, MEC, dez.2005. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 20 de dez de 1996. Brasília, MEC, dez.1996. BRASIL. Ministério da Educação. Portaria nº 2.253, de 18 de
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______. Educação e cybercultura. São Paulo: Editora 34, 1998.
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SBC, 2001 SILVA, M. Educação online: teorias, práticas, legislação, formação corporativa. São Paulo: Edições Loyola, 2003. SILVA, Patrícia Rosa da; RICCIO, Nicia Cristina R. (Orgs.). Reflexões sobre Educação online. Salvador: ISP/PRADEM/ UFBA, 2008. SILVA, Rosa de Cátia Souza. A arte da tutoria em EAD. Publicado em 4 set. 2009. Disponível em: <http://www.webartigos.com>. Acesso em: 31 mar. 2013. SOUZA, T. S. Escola interativa: os meios de comunicação a serviço da educação. Presente Revista de Educação, Salvador, Ed.49. ano 13, n.2, p. 58-63,jun-ago 2005. VALENTE, Vânia Rita de Menezes. A formação de professores para tecnologias da informação e comunicação no
processo pedagógico: Caminhos percorridos pela Rede Municipal de Ensino de Salvador. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Educação e Contemporaneidade. Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Salvador, 2005. VIANA, G. Conceituando a web 2.0. Disponível em: <http:// web2.0br.com.br/conceito-web20/>. Acesso em: 31 mar. 2013.
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S aberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
“EDUCAÇÃO PELA PEDRA Uma educação pela pedra: por lições; para aprender da pedra, freqüentá-la; captar sua voz inenfática, impessoal (pela de dicção ela começa as aulas). A lição de moral, sua resistência fria ao que flui e a fluir, a ser maleada; a de economia, seu adensar-se compacta: lições de pedra (de fora para dentro, cartilha muda), para quem soletrá-la. Outra educação pela pedra: no Sertão (de dentro para fora, e pré-didática). No Sertão a pedra não sabe lecionar, e se lecionasse não ensinaria nada; lá não se aprende a pedra: lá a pedra, uma pedra de nascença, entranha a alma.” João Cabral de Melo Neto
http://www.fabiorocha.com.br/cabral.htm
Cláudia Regina Vaz Torres
Olá! O poema de João Cabral de Melo Neto nos convida a refletir sobre a educação e a nossa atuação no cotidiano docente em que construímos, em lições de sentido, afetos e vivências, o nosso fazer e abrimos espaços para outras leituras e aprendizagens. Esta aula tem por objetivo analisar os saberes necessários ao exercício profissional do/a educador/a. Para tanto, discutiremos sobre as relações entre saberes e competências e sua importância na profissão docente. Para iniciarmos as discussões, precisamos refletir sobre as seguintes questões: • Quais são os saberes que podem subsidiar e fundamentar a nossa profissão docente? • A realização de uma prática docente mais consistente, criativa, agradável e produtiva depende da apropriação dos saberes da ciência pedagógica? • Os profissionais de educação sentem falta de subsídios necessários à fundamentação da prática educativa/ docente? • Basta, apenas, ensinar ou dar orientações ao professor/a para que haja o enfrentamento das dificuldades cotidianas nas atividades docentes? • Na profissão docente, qual é a relação entre saberes e competência?
Vimos, nas aulas anteriores, que a profissão docente apresenta, como marcos históricos, a desvalorização e a proletarização do professor, uma atuação eminentemente feminina, formação inadequada, baixa remuneração, descompromisso com a atualização e distanciamento financeiro, social e intelectual entre professores da educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Segundo dados do INEP, cerca de 25,7% de professores da educação infantil possuem formação de nível superior. Ainda conforme o INEP, o Brasil tem cerca de 130 mil professores leigos atuando na educação infantil e nas séries iniciais
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do ensino fundamental e 720 mil professores de ensino fundamental e médio que ainda não cursaram o nível superior (BRASIL, 2010). A ausência de formação adequada que destaque o compromisso social do educador e de uma cultura que evidencie a necessidade da profissionalização entre os docentes faz com que a prática em sala de aula seja compreendida como um fazer que pode ser desenvolvido por pessoas generosas, que nasceram com a missão de ensinar e que se conformam com baixos salários. A profissionalização da docência exige qualificação, compromisso com a formação do estudante para a vida cidadã, reflexão sobre os processos de trabalho, construção da identidade docente e análise das condições de trabalho nas instituições. Nesse sentido, é preciso reconhecer as especificidades da profissão docente como a construção da identidade que envolve três processos que se interrelacionam: desenvolvimento pessoal, profissional e institucional (NOVOA, 1995). Os processos de produção da vida do professor estão atrelados aos aspectos da profissionalização docente e aos investimentos da instituição para o alcance dos objetivos
educacionais. Para Pimenta e Anastasiou (2002), é necessário, ainda, reconhecer na profissão docente sua especificidade epistemológica, que se constrói nas dimensões ética e ideológica que se manifestam nas ações e intenções dos professores e instituições, como também ampliar a discussão sobre os saberes que são necessários à atuação. Tardif (2005) analisa que a função dos professores não consiste mais em formar indivíduos, mas sim equipá-los do ponto de vista funcional e útil, para que possam concorrer ao mercado de trabalho. Nesse contexto, o conhecimento, os saberes são valorizados como bens de consumo.
[...] os mestres devem vender as disciplinas que ensinam aos alunos que exercem o poder de consumidores, muitas vezes, em função do valor de utilidade das disciplinas. A pedagogia, desse modo, é a arte de vender aos alunos e aos seus pais conhecimentos e formação úteis para não dizer utilitários. (TARDIF, 2005, p.147) Em face do que analisa o autor, percebemos que o trabalho docente é afetado pela lógica do mercado, que não valoriza o “saber magistral” do professor ou a sua conduta ética e moral. O importante é que o ensino seja cada vez mais eficiente e instrumental. Para Tardif (2005), o etnopluralismo, o relativismo cultural, a dispersão dos valores, a desqualificação progressiva dos conhecimentos escolares são tão valorizados quanto a experiência íntima de cada professor para justificar as suas ações na escola.
Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
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Nesse sentido, reflita: Diante desses aspectos, as condições de trabalho dos professores tornaram-se mais complexas?
O autor aponta que há uma deterioração da qualidade da atividade profissional do professor e se tornou mais difícil atuar nesse contexto, a começar diante da complexidade das relações com os alunos e das inquietações em relação aos saberes que consideram necessários.
Profissão e Formação Docente
224
Pimenta e Anastasiou (2002) analisam, na profissão docente, a relação entre os saberes da docência e o desenvolvimento de competências, mais especificamente sobre a substituição do termo “saberes” para o uso de “competências” e a ideologia subjacente. De acordo com as autoras, a política de competências simplifica os processos formativos e anuncia um novo (neo) tecnicismo na perspectiva do controle e da avaliação. Sobre isso, afirmam:
O termo competências polissêmico, aberto a várias interpretações, fluido, é mais adequado do que o de saberes e qualificação para uma desvalorização profissional dos trabalhadores em geral e dos professores. Falar em competência em lugar de saberes profissionais desloca a identidade do trabalhador para o seu local de trabalho, ficando ele vulnerável a avaliação e controle de suas competências, definidas pelo “posto
de trabalho”. Se suas competências não se ajustam ao esperado, o trabalhador facilmente poderá ser descartado. (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002, p. 133) Nesse sentido, a substituição dos termos saberes e conhecimentos para competências evidencia a preocupação das organizações para que as pessoas detenham competências que se ajustem à área de atuação. O professor, para as autoras, fica limitado a ser um executor de tarefas conforme procurar adquirir, permanentemente, novas competências, através de cursos, palestras, seminários e ações de capacitação continuada para atender às exigências do mercado. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998) têm assumido, em consonância com uma tendência mundial, a necessidade de centrar o ensino e a aprendizagem no desenvolvimento de competências e habilidades por parte do aluno. Perrenoud (2000) admite que o termo pode ser conceituado por diversos ângulos, mas que todos assumem a ideia de que a competência mobiliza conhecimentos para a solução de um problema, não sendo algo estático. Perrenoud (2000) aborda o ofício de professor propondo um inventário de competências que contribuem para redelinear a atividade docente e que supõem opções teóricas e metodológicas que revelam práticas conservadoras ou práticas renovadoras. Desse modo, é importante estar atento às práticas que as diversas competências mobilizam. Inspiradas num referencial de competências adotado em Genebra, em 1996, para formação contínua de professores, surgiram 10 famílias ou domínios de competências reconhecidas como
225 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
as necessidades da organização e tem a responsabilidade de
prioritárias na formação de professores, a saber:
1- Organizar aprendizagem
e
dirigir
situações
de
Esta competência consiste em imaginar e criar outras situações de aprendizagem que mobilizem ações carregadas de sentido. Esta competência contempla ações
Profissão e Formação Docente
226
[...] mais específicas, como conhecer, para determinada disciplina, os conteúdos a serem ensinados e sua tradução em objetivos de aprendizagem; trabalhar a partir de representações de alunos, como também dos erros e dos obstáculos à aprendizagem; construir e planejar sequências didáticas; envolver os alunos em atividades de pesquisa e projetos de conhecimento (PERRENOUD, 2000, p. 26).
2Administrar aprendizagens
a
progressão
das
A progressão dos alunos tem sido discutida pelos professores e envolve a administração de situações-problema ajustadas ao nível e às possibilidades dos alunos, o estabelecimento de laços com teorias subjacentes às atividades de aprendizagem, a avaliação dos alunos em situações de
aprendizagem de acordo com a abordagem formativa, entre outros. Para administrar a progressão das atividades, é preciso, também, otimizar a gestão do tempo e atuar na zona de desenvolvimento proximal (VIGOTSKI, 1998), propondo situações desafiadoras (PERRENOUD, 2000).
3- Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação Esta competência mobiliza competências mais espeampliar a gestão de classe, fornecer apoio integrado às pessoas com necessidades educacionais especiais e desenvolver a cooperação entre os alunos. Esta competência enfatiza um atendimento mais individualizado com instrumentos conceituais mais específicos. (PERRENOUD, 2000).
4- Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho No ofício do professor, além das competências de ordem didática, epistemológica, são necessárias competências de ordem relacional, que consistem em suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber, construindo sentidos para o trabalho escolar e para a percepção da necessidade da autoavaliação. Envolve, ainda, instruir e fazer funcionar um conselho de alunos e favorecer a definição de um projeto pessoal do aluno. Esta competência requer capacidade de comunicação, empatia e respeito ao outro. (PERRENOUD, 2000).
227 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
cíficas, como a administração da heterogeneidade da turma,
5 - Trabalhar em equipe Esta competência requer a consciência da cooperação profissional. Diz respeito à capacidade de discernir sobre os problemas que exigem cooperação intensiva, saber perceber e combater resistências, obstáculos e impasses no trabalho. (PERRENOUD, 2000).
6- Participar da administração da escola
Profissão e Formação Docente
228
Administrar a escola é ordenar espaços e experiências de formação. Consiste em elaborar e negociar um projeto para a instituição, administrar os recursos da escola, coordenar, dirigir a escola e organizar e fazer evoluir a participação dos alunos. (PERRENOUD, 2000)
7- Informar e envolver os pais Esta competência propõe que, através de reuniões, entrevistas, debates e projetos, os pais dos alunos sejam envolvidos no cotidiano da escola. (PERRENOUD, 2000).
8- Utilizar novas tecnologias A cultura tecnológica afeta as situações de aprendizagem e os professores precisam explorar as potencialidades didáticas das ferramentas multimídia de ensino. (PERRENOUD, 2000).
9- Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão No ofício do professor, o enfrentamento à violência, aos preconceitos, desigualdades, às discriminações sexuais, étnicas e sociais deve ser cotidiano. O professor precisa criar condições de um trabalho escolar que desenvolva o senso de responsabilidade, a solidariedade e o sentimento de justiça. (PERRENOUD, 2000).
Esta competência envolve a formação contínua que acompanha as transformações identitárias. Diz respeito à possibilidade de administrar a própria prática, estabelecer o balanço das competências mais necessárias ao seu trabalho e construir um programa de formação. (PERRENOUD, 2000) Percebeu que, a cada competência principal, se associam competências mais específicas? Então, a competência “Trabalhar em equipe” pode ser compreendida como: “saber explicitar as próprias práticas, envolver-se em tarefas, acolher a formação dos colegas” (PERRENOUD, 2000, p.158) O conceito de competência, analisa Perrenoud (2000), abrange os seguintes aspectos: as competências não são apenas saberes ou atitudes, são ações mobilizadoras, integradoras e transformadoras de recursos; as situações que envolvem o domínio de determinadas competências são sempre singulares; o exercício da competência passa por operações mentais
229 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
10- Administrar sua própria formação contínua
complexas e são construídas na formação, nas diversas situações de trabalho. A descrição de uma competência evoca:
- Os tipos de situação das quais dá um certo domínio; - Os recursos que mobiliza, os conhecimentos teóricos ou metodológicos, as atitudes, o savoir-faire e as competências mais específicas, os esquemas motores, os esquemas de percepção, de avaliação, de antecipação e de decisão;
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230
- A natureza dos esquemas de pensamento que permitem a solicitação, a mobilização e a orquestração dos recursos pertinentes em situação complexa e em tempo real. (PERRENOUD, 2000, p. 16) Depreendemos que, para descrever uma competência, é preciso verificar todos os aspectos citados anteriormente, assim como é preciso compreender que as competências são construídas a partir do real, do ofício do professor, do trabalho docente, mas também de redes conceituais e bases teóricas e metodológicas. A abordagem por competências de Perrenoud (2000) ganhou muitas críticas, pois evidencia a afinidade do autor com as demandas do modelo liberal de sociedade e as
exigências de uma sociedade capitalista. Ele, ao construir as dez famílias de competências, superficializa o trabalho docente e propõe uma adaptabilidade dos indivíduos à ordem social. Responde, então, às exigências no mundo do trabalho, que reduz os aspectos subjetivos da pessoa nas organizações a um conjunto de valores estabelecidos pelas organizações, que massifica, promove adaptações e se distancia da abertura para o pensamento crítico, criativo e político. Numa perspectiva mais ampla, o termo competências, admitem Pimenta e Anastasiou (2002), também significa teoria e prática para fazer algo e conhecimento em uma conhecimento e informação sobre o trabalho, sobre o que se faz. Competência pode significar ação imediata e conhecer implica ter uma visão mais ampla, de totalidade, de consciência das raízes, dos desdobramentos e das implicações do que se faz, para além da situação. As relações dos professores com as competências que deverão ser desenvolvidas através de cursos de formação continuada não são relações estritamente cognitivas e emocionais, são sempre relações mediadas pelo trabalho que fornecem pistas para o enfrentamento das problemáticas vivenciadas no cotidiano. Do ponto de vista histórico, no período de 1991 a 2001, intensificaram-se as regulamentações no âmbito legislativo, que vinculavam a melhoria na educação à formação de professores. Para essa formação, eram pensadas competências que deveriam ser desenvolvidas para mobilizar conhecimentos e recursos para atender aos alunos e garantir educação de qualidade nas escolas de educação básica. Nesse período, além do conceito de competência, a avaliação de desempenho, a promoção dos professores por mérito e os conceitos de produtividade, eficiência e eficácia eram enfatizados.
231 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
determinada situação. Ter competência é diferente de ter
Dias e Lopes (2003) analisam que um dos mecanismos apontados pelos documentos oficiais para o controle da formação de professores é o processo de avaliação de competências, mecanismo adotado para garantir a redefinição do processo de formação contínua dos professores em torno da profissionalização. No final da década de 1990, os estudos sobre formação de professores evidenciavam a necessidade de considerar as diferenças de percurso na formação de cada professor, tornando o professor responsável pelo desenvolvimento de suas competências que exigiam a articulação de conteúdos de diferentes disciplinas. Assim, instituiu-se que
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232
caberia ao professor a identificação de suas necessidades de formação e o empreendimento de recursos e estratégias para alcançar o desenvolvimento profissional. Você concorda com esse posicionamento? Cabe individualmente ao professor o desenvolvimento profissional?
É preciso, sempre, reconhecer a singularidade do trabalho docente, que não se resume a um conjunto de técnicas, apropriação de conteúdos, treinamento, entre outros. Tardif (2007) analisa que os saberes dos professores trazem as marcas do seu trabalho, situação que indica que os saberes são produzidos no e pelo trabalho e abarcam conhecimentos, saber-fazer, competências, habilidades, entre outros que são efetivamente mobilizados e utilizados pelos professores. Os saberes dos professores estão relacionados com os condicionantes e com o contexto do trabalho, como também com a identidade e a história profissional. Os saberes dos professores são de natureza social e plural, formados pela prática cotidiana, história de vida,
profissionalização, pelos currículos e pelas instituições formadoras. Então, não podem ser reduzidos a processos mentais individuais, como representações, crenças, imagens, processamento de informações. Os saberes, por serem partilhados por todo um grupo de agentes num coletivo de trabalho, também por serem legitimados nas instituições que definem e orientam a sua utilização, promovendo o reconhecimento social, e por desenvolverem um trabalho com sujeitos sociais, necessitam ser considerados como saberes que estão assentados no social e que são adquiridos pelo professor no contexto de uma sociaOs saberes são construídos na prática, ao longo da carreira profissional e dos processos de interiorização, interpretação e transformação. Por conta disso, percebemos que a prática docente é um campo da educação que tem suscitado inúmeras reflexões acerca da identidade docente, das condições atuais de trabalho, da formação e dos saberes necessários à docência. O surgimento de pesquisas que repensam a formação e a prática docente, a partir da análise das práticas pedagógicas, aumentou na década de 90 do século passado, com o predomínio das reflexões sobre as ações docentes, o funcionamento das organizações escolares e os sistemas de ensino. A literatura que tem sido publicada a respeito do assunto ressalta a importância da reflexão sobre os aspectos relacionados à especificidade da atuação do(a) professor(a) e sobre a conquista de saberes que o transforma em profissional de educação que lida melhor com as difíceis condições de seu exercício profissional, com a necessidade de um engajamento crítico e reinvenção da identidade como professor. Dando ênfase à mediação do conhecimento, Pimenta (2000) explica que a identidade do professor se baseia na
233 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
lização profissional (TARDIF, 2007).
articulação entre os saberes das áreas específicas com os saberes pedagógicos e os saberes da experiência. É a partir dessa articulação que os professores investigam sobre a própria atividade, constroem e transformam os seus saberes-fazeres docentes. Tardif (2007) admite que os saberes dos professores não se reduzem a uma função de transmissão de conhecimentos já constituídos. A prática integra os saberes oriundos da formação profissional, das disciplinas, dos currículos e das experiências de vida. Figura 1: Alunos do Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro em Jacobina-BA,1954
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234
Fonte: Arquivo pessoal da Profª Alcira Pereira Carvalho Silva cedido gentilmente.
O conhecimento das áreas específicas é um dos saberes da docência? Os saberes das áreas específicas dizem respeito aos conteúdos que serão ministrados em sala de aula e que precisam fazer parte da bagagem do educador, principalmente através do estudo, da aprendizagem e da participação em projetos de pesquisa sobre o assunto. De acordo com Tardif
(2007), os saberes disciplinares são sociais, definidos e selecionados pelas instituições; integram-se a prática docente através da formação inicial e continuada e correspondem aos diversos campos do conhecimento, sempre emergem da tradição cultural e dos grupos sociais. Para Freire (1996), fazem parte da natureza da prática docente a indagação, a busca e a pesquisa. O educador, através da busca, da indagação, da construção, da constatação e da intervenção, adquire conhecimentos, comunica e anuncia o que aprendeu. Sobre esse aspecto, Freire (1996, p.32) enfatiza que “Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem tica que o conhecimento do mundo tem historicidade, ou seja, o conhecimento produzido poderá ser, sempre, ultrapassado e novos precisam ser produzidos. Ter o domínio de um campo específico de conhecimento não é o bastante para o educador. Precisamos compreender o significado e o papel que o conhecimento tem para cada um de nós, como também para a nossa sociedade. Nesse sentido, Anastasiou (2002) aponta algumas questões que põem em evidência a dimensão de educabilidade do conhecimento: • Qual é a relação entre os conhecimentos históricos, matemáticos, biológicos, das artes cênicas, plásticas, musicais? • Para que ensiná-los? • Como o conhecimento é trabalhado nas instituições? • Qual é o significado do trabalho do professor nas diversas áreas do conhecimento? • Será que o objetivo da educação escolar, que é de possibilitar que os alunos desenvolvam habilidades
235 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
ensino”. O educador necessita deixar transparecer na sua prá-
para operar, rever e reconstruir os conhecimentos, está sendo alcançado? Sabemos da importância do conhecimento nas instituições educativas e das diferentes maneiras que temos acesso a ele: enquanto uns adquirem o conhecimento pelo estudo da teoria, outros adquirem com a experiência. A aquisição do conhecimento não é uma experiência fria e não é feita de certezas. Nesse processo, estão envolvidas a emoção, a sensibilidade e o afeto. Aliada a uma visão “subjetiva” de mundo e de homem,
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236
é absolutamente indispensável que o(a) educador(a) tenha uma dose considerável de criticidade, de consciência das próprias limitações e potencialidades e ousadia na inventividade de estratégias para favorecer ao aluno a criação de um estilo próprio de apreensão dos conhecimentos. Reforçamos, portanto, que conhecer teorias, conhecer métodos e práticas pedagógicas não são os únicos saberes necessários à prática docente que são adquiridos num curso de formação de professores, se adquirem o conhecimento de si e uma postura reflexiva consigo mesmo e com os outros. A formação docente deve, então, contemplar a construção de uma postura reflexiva, pois essa não é inerente ao educador(a), mas é historicamente construída nas diferentes relações sociais e possibilita que, diante das diversas práticas pedagógicas presentes nas escolas, o(a) professor(a) se pergunte: por que foram instituídas? A quais propósitos atendem? Como me posiciono diante delas?
A EXPERIÊNCIA FUNDAMENTAL?
NA
DOCÊNCIA
É
O trabalho docente também pode ser analisado em
função da experiência, do modo como o trabalho é vivenciado e do significado que recebe. Porém, o termo experiência pode ser entendido de duas maneiras. Tardif e Lessard (2005) definem como um processo de aprendizagem espontânea que promove acúmulo de conhecimentos e certezas para lidar com diferentes situações de trabalho. É o professor que “conhece as manhas da profissão, ele sabe controlar os alunos, porque desenvolveu, com o tempo e o costume, certas estratégias e rotinas que ajudam a resolver problemas típicos” (TARDIF; LESSARD, 2005, p.51). Todavia, compreendem-se os saberes da experiência, também, como a intensidade e experiências que podem ocorrer uma única vez, mas que são decisivas e mudam o posicionamento do indivíduo diante da vida. Figura 2: Alunos do Curso Normal Superior – POP Queimadas, 2005
Fonte: Arquivo pessoal do curso de Pedagogia EAD UNIFACS
O caminho percorrido por homens e mulheres para se tornarem professores está entrelaçado no processo de
237 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
a significação de uma situação vivida por um indivíduo. São
construção de identidade, incluindo as dimensões pessoal e profissional. A escolha e o posicionamento diante da profissão estão enraizados nos fatores sociais, históricos e psíquicos, como também no concreto das relações de gênero que modelam identidades e delineiam um modo de se relacionar com o fenômeno educativo e com a formação pessoal e profissional. Nóvoa (1995) também esclarece que não há indissociabilidade entre o eu pessoal, caracterizado pela singularidade e historicidade de cada um, e o eu profissional, que se refere à formação inicial e continuada e suas relações com os saberes
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238
e as experiências da docência. Desse modo, cada um vai construir uma história singular em relação à opção pela docência e num processo dialético distante de “certezas” e verdades. O(a) professor(a) irá implicar-se e responsabilizar-se pela sua formação e prática docente. Ao analisar os saberes da experiência, Tardif (2007) coloca a subjetividade dos professores no centro dessa discussão, quando alerta que os professores não devem ser considerados como técnicos (por exemplo, especialista em currículo). A visão tecnicista tinha como fundamento a concepção taylorista/fordista de produção nos anos de 1950 a 1970. Essa concepção passou a fazer parte do cotidiano da escola através da figura do supervisor, coordenador e inspetor pedagógico e da valorização da racionalização do trabalho do professor e dos alunos com a inserção da tecnologia educacional. Com a supervalorização da técnica, parte constitutiva do processo de modernização, o campo educacional compartilhou dos desdobramentos de uma visão tecnocrática, que lançara suas garras nos mais variados setores da sociedade brasileira (ARAUJO, 2000). Posteriormente, o tecnicismo pedagógico foi percebido pelos professores como um processo acrítico de formação humana e que estava a serviço do capital, da
reprodução social e que não satisfazia as demandas sociais, pois não promoviam a formação de estudantes de modo mais crítico. Do mesmo modo, os professores não devem ser concebidos apenas como agentes sociais cuja atividade é determinada exclusivamente por forças ou mecanismos sociológicos (por exemplo, a luta de classes), pois a visão tecnicista e a visão sociologista despojam os atores sociais, que são os professores, de seus saberes. Para o autor, essas visões são redutoras do ensino, uma vez que desconsideram a subjetividade dos professores.
Ora, um professor de profissão não é somente alguém que aplica conhecimentos produzidos por outros, não é somente um agente determinado por mecanismos sociais: é um ator no sentido forte do termo, isto é, um sujeito que assume sua prática a partir dos significados que ele mesmo lhe dá, um sujeito que possui conhecimentos e um saber-fazer provenientes de sua própria atividade e a partir dos quais ele a estrutura e a orienta. (TARDIF, 2007, p.230) Nesse sentido, é preciso sempre considerar que os professores são competentes e detêm saberes que são específicos ao seu trabalho. Os saberes da experiência adquirem uma objetividade através das relações com estudantes e outros
239 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
Sobre isso, Tardif (2007) explica:
professores e através do confronto com as condições de trabalho e com as experiências coletivas dos seus pares vivenciadas no campo de trabalho. Assim, o relacionamento com professores mais experientes, as capacitações, a formação continuada, o contato com estagiários, a relação crítica com os saberes disciplinares e curriculares permitem, como diz Tardif (2007), a objetivação dos saberes da experiência.
Profissão e Formação Docente
240
OS SABERES PEDAGÓGICOS E DIDÁTICOS: DE QUE ESTAMOS FALANDO? Não bastam à prática docente os saberes específicos das áreas de conhecimento e os saberes da experiência; do mesmo modo, os saberes pedagógicos e didáticos também são necessários ao trabalho docente. Os saberes pedagógicos não são sinônimos de saber aplicar técnicas e métodos e transmitir conteúdos. Os anos de experiência no magistério de um professor que reproduz conhecimentos sempre da mesma maneira, ou seja, que aplica os mesmos exercícios e se utiliza dos mesmos exemplos na sala de aula, não produzem saberes pedagógicos, produzem apenas saberes da experiência caducos, mecânicos e históricos. É no trabalho em sala de aula que os saberes pedagógicos são construídos. Nas situações de confronto com o não aprender do educando, com a organização curricular, com a avaliação, com o relacionamento com o aluno, o(a) educador(a) conseguirá delinear e reconstruir os saberes pedagógicos. Os saberes pedagógicos, analisa Tardif (2007), apresentam-se como doutrinas ou concepções provenientes de reflexões sobre a prática educativa no sentido amplo do termo. Esses saberes articulam-se com as ciências da educação e
constituem sistemas de representação e de orientação da atividade educativa. Pimenta (2000) pontua que os saberes pedagógicos podem colaborar com a prática docente, sobretudo se forem mobilizados a partir dos problemas que a prática coloca. Depreende-se, então, que há uma dependência entre ação e reflexão. Os saberes pedagógicos que são construídos pelo(a) educador(a) no exercício da docência não podem ser pensados como desarticulados, decorrem da práxis social intencionada e realizada por um sujeito histórico e consciente de seus determinantes sociais. articulados com o seu compromisso social e político. Não é mero copiador de fazeres descobertos pelos outros e que nada significam na hora da prática. Busca o conhecimento didático, metodológico e cultural disponível para construir seus saberes didáticos e metodológicos a partir da prática e das condições presentes. Anastasiou (2000) analisa que, na ação docente, o ensino e a aprendizagem são elementos básicos e que precisam ser analisados na perspectiva relacional, ou seja, o ensino e a aprendizagem são percebidos como aspectos disjuntos, pertencentes aos docentes e aos estudantes, mas precisam ser analisados numa outra perspectiva. A autora acrescenta, ainda, que é preciso compreender que o verbo ensinar contém em si as dimensões, uma utilização intencional e uma de resultado. Sobre isso, ela questiona:
Mesmo tendo uma sincera intenção de ensinar, se a meta (a apreensão, a apropriação do conteúdo por parte do aluno) não se efetivou plenamente, como seria
241 Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
O bom professor é capaz de produzir ações e saberes
necessário, ou esperado, para prosseguir o caminho escolar do aluno, posso dizer que ensinei? (ANASTASIOU, 2000, p. 2)
Em face do questionamento, depreendemos que ensinar não se reduz a passar uma informação, refere-se a uma organização, apropriação, apreensão, assimilação, compreensão e implicação no saber apreendido por parte do aluno. O aluno investido desse lugar de querer saber, conhecer, apro-
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priar-se e agarrar-se ao conhecimento constrói, em conjunto com o professor, uma prática social complexa, de parceria e de posicionamento político. Há, também, necessidade de o educador posicionar-se politicamente; caso contrário, estará legitimando as práticas dominantes. Não existe um não lugar, um não posicionamento político no seu exercício profissional. Uma prática pedagógica orientada nesse sentido, sem um compromisso político, produz sujeitos que assumem modelos, sistemas e comportamentos que estão a serviço da sociedade e de seus condicionantes. Compreendemos que, numa perspectiva freiriana, o professor que repensa a trajetória histórica da sua prática pedagógica percebe que o seu “fazer” vai se diferenciando, passando por mudanças ao longo do processo, permitindo o desvelamento das diferenças e contradições, que são importantes para a determinação da identidade do seu trabalho docente. É preciso sempre que o(a) educador(a) reinvente a sua prática, investigando as condições de trabalho na instituição, o não aprender dos educandos, as queixas escolares, as
estratégias de ensino e as práticas avaliativas. O foco da atenção do(a) educador(a) deve estar dirigido a todos esses aspectos, não apenas ao rendimento escolar do aluno. Sem a pretensão de alcançarmos um caminho seguro que nos levaria a uma situação hipoteticamente ideal, devemos acreditar na construção permanente de uma prática docente sólida atrelada a um arcabouço teórico que balize o nosso fazer docente. Na próxima aula, discutiremos sobre a docência na contemporaneidade.
Síntese Nesta aula, analisamos os saberes necessários ao exercício profissional do(a) educador(a) e discutimos as relações entre saberes e competências e sua importância na profissão docente.
qu estão pa r a Re f l e x ão Quais saberes e competências você considera mais importantes para o seu trabalho docente?
Le i t u r a s i n dic a da s ANASTASIOU, Léa da Graças Camargos. Ensinar, aprender, apreender e processos de ensinagem. Disponível em: http:// www.fcf.usp.br/ensino/graduacao/disciplinas/exclusivo/inserir/anexos/linkanexos/cap%c3%8dtulo%201%20leaanastasiou.pdf
Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
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DIAS, Rosanne; LOPES, Alice. Competências na formação de professores. No Brasil: o que (não) há de novo. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v24n85/a04v2485.pdf
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Saberes Necessários à Atuação do(a) Educador(a)
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(7)
A Atuação do(a) Educador(a) na Contemporaneidade
“Se não amo o mundo, se não amo a vida, se não amo os homens, não me é possível o diálogo.” (FREIRE, 1982, p.94).
Cláudia Vaz Torres Esta aula, que tem por objetivo analisar a atuação do(a) educador(a) na contemporaneidade, discutirá a docência, a escola e os fundamentos da ação educativa a partir das contribuições de Freire e Giroux, entre outros teóricos da educação. Para iniciarmos a análise, precisamos refletir sobre as questões: • Como
deve
ser
a
atuação
do
docente
na
contemporaneidade? • O que fundamenta a ação docente? Nas aulas anteriores, analisamos os saberes necessários ao exercício profissional do/a educador/a, e discutimos sobre as relações entre saberes e competências e sua importância na profissão docente. Profissão que apresenta como marcos históricos a desvalorização, formação inadequada, baixa remuneração, desarticulação política e falta de reconhecimento das especificidades da profissão docente como a construção da identidade pessoal, profissional e institucional que hoje tem um grande desafio nos seus espaços de atuação, que diz respeito à construção e à solidificação desses espaços como campos de ação-reflexão, de convivência e construção de cidadania, de diálogo e de emancipação dos seres humanos. Nesse sentido, são um desafio a formação e a profissionalização do educador que, na perspectiva da práxis, tem se efetivado nas dimensões ético-políticas, teóricas e epistemológicas do processo educativo. Essas dimensões provocam tensões e contradições na prática, pois carregam em si as contradições da nossa sociedade.
Charlot (1992) analisa que o professor tem sofrido os efeitos de contradição radical da sociedade capitalista contemporânea. Há necessidade de construção de saberes para formar trabalhadores reflexivos, criativos, autônomos, de consumidores informados, críticos e, há, também necessidade de promover a concorrência, a eficácia, a qualidade. É preciso ter bom desempenho, boa nota nas avaliações nacionais. (ENEM, ENADE, vestibulares, etc.).
Profissão e Formação Docente
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Desde a definição que havia em torno da função do professor, na segunda metade do século XX, que se caracterizava pela estabilidade, má remuneração e respeito dos discentes, até as funções que são conferidas à escola e ao professor nos anos 60 e 70, quando é endereçada à classe (professores) a responsabilidade pelo sucesso dos alunos, muitas mudanças ocorreram na profissão docente. Como analisa Charlot (1992, p. 19): “[...] Até as práticas pedagógicas, cuja eficácia parecia comprovada pela tradição, são questionadas e criticadas; começa a ser desprezado o professor tradicional.”
Reflita: Você concorda que hoje há um desprezo ao professor tradicional?
Do ponto de vista histórico, compreendemos que as mudanças que ocorreram no século XX, e que marcaram a função docente, resultam da modernização econômica e social, da globalização e das novas tecnologias de informação e comunicação, entre outras. Vamos ler um pequeno trecho que analisa as mudanças na profissão docente:
Para resolver os problemas, o professor é convidado a adaptar sua ação ao contexto. A escola e os professores devem elaborar um projeto político-pedagógico, levando em conta as características do bairro e dos alunos, mobilizar recursos culturais e financeiros que possibilitem melhorar a eficácia e a qualidade da formação, tecer parcerias, desenvolver
251 A Atuação do(a) Educador(a) na Contemporaneidade
Hoje em dia, o professor já não é um funcionário que deve aplicar regras predefinidas, cuja execução é controlada pela sua hierarquia; é sim, um profissional que deve resolver problemas. A injunção passou a ser: “faça o que quiser, mas resolva aquele problema”. O professor ganhou uma autonomia profissional mais ampla, mas, agora, é responsabilizado pelos resultados, em particular pelo fracasso dos alunos. Vigia-se menos a conformidade da atuação do professor com as normas oficiais, mas avaliam-se cada vez mais os alunos, sendo a avaliação o contrapeso lógico da autonomia profissional do docente. Essa mudança de política implica numa transformação identitária do professor.
projetos com os alunos, etc. Essas novas exigências requerem uma cultura profissional que não é cultura tradicional do universo docente; o professor, que não foi e ainda não é formado para tanto, fica um pouco perdido.
252 Profissão e Formação Docente
O professor deve, agora, pensar de modo, ao mesmo tempo, “global” e “local”. Há de preparar os seus alunos para uma sociedade globalizada e, também, de “ligar a escola à comunidade”. (CHARLOT, 1992, p. 20).
Depreendemos, então, que existem inúmeros desafios, tensões e contradições que são de natureza sócio-histórica, mas que também fazem parte do próprio ato de educar, ensinar, relacionar-se. Cabe ao educador criar espaço de expressão através de um trabalho pedagógico em que o educando tenha condições de perceber-se como sujeito de sua própria história, através dos processos de reflexão, criação e abertura para novas possibilidades. Ter espaço para explicitar a fala e as vivências torna possível para o ser humano assumir sua condição humana, perceber-se como pessoa e posicionar-se frente ao mundo. Freire (1983) pontua que o homem é um ser de relações; ele está no mundo e com o mundo, refletindo sobre sua realidade. Esta característica é própria de todos os homens e não
privilégio de alguns. A reflexão permite a compreensão da realidade, o levantamento de hipóteses e a busca de soluções com o intuito de transformação e criação de um mundo próprio. “O homem se identifica com sua própria ação, objetiva o tempo, temporaliza-se, faz-se homem-história.” (FREIRE, 1983, p.31). Nesse processo, não podemos conceber a educação como um modo de adaptar e acomodar o homem à sociedade. Há uma integração, através de uma atuação ativa. 253 A Atuação do(a) Educador(a) na Contemporaneidade
Figura 1: Paulo Freire
Fonte: projetos.unijui.edu.br
Carlos Rodrigues Brandão (1998) analisa pontos essenciais para o trabalho do educador que considera importantes pela maneira como se relacionam com o conhecimento, com a vida e suas consequências, como a competência intelectual, o conhecimento fluido e renovador, a autoconsciência
e consciência crítica, a criatividade solidária, o diálogo, a solidariedade envolvente e participativa, a tolerância ampliada, a simplicidade voluntária, o compromisso com a paz e o valor à vida. A competência intelectual responsável é o primeiro ponto a ser buscado pelo professor em razão da importância do saber, do conhecimento e da busca de uma atualização constante que o exercício permanente de estudo e reflexo
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propiciam. A docência exige uma prática contínua de estudo, leituras e reflexão crítica. Figura 2: Henri Giroux
Fonte: Global Education Magazine - copyleft - http://www.globaleducationmagazine.com/critical-interview-henry-giroux/
Henry Giroux (1997), educador dos Estados Unidos, representante da teoria crítica educacional, e estudioso da obra de Paulo Freire, analisa que os professores deveriam se tornar intelectuais transformadores para educar os estudantes numa perspectiva ativa e crítica. Nesse sentido, ele explica que a categoria de intelectual é útil na análise da atividade docente em razão da concepção do trabalho dos professores como trabalho intelectual, reflexivo, que alia pensamento e
ação, em contraste com a ideia do reducionismo da docência como uma atividade técnica, operacional ou instrumental. A caracterização da docência como atividade intelectual também é importante porque esclarece as condições ideológicas e práticas necessárias e evidencia o papel que os professores desempenham a partir das pedagogias que adotam na produção e legitimação de interesses políticos, econômicos, sociais. têm um expressivo compromisso social com a democracia. Nos processos formativos dos educadores, o acesso ao saber necessário à prática docente deve ser articulado com conhecimentos diversos, atualidades, pensamentos antagônicos e ação. Numa postura dialógica, precisamos nos aproximar dos saberes e conhecimentos produzidos em diferentes âmbitos.
Por que precisamos conhecer, refletir, indagar, criticar, duvidar do conteúdo que estamos lendo ou estudando? O conhecimento que o docente precisa construir está aberto à dúvida, à instabilidade, não é sólido, estável e permanente. A seriedade e o rigor embasam o conhecimento que foi construído e que foi adquirido através de processos de sistematização feitos pela escola, universidade e campos de prática. Os docentes precisam ter acesso, na sua formação, a uma educação rica, fecunda e desafiadora para que possam inquietar-se com o que está na sua realidade, ousar criativamente e produzir mais conhecimento na tentativa de encontrar respostas às suas perguntas. O educador, como diz Freire (1996) precisa manter vivo dentro de si o gosto da rebeldia que aguça a curiosidade, a dúvida e a luta contra os
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Giroux (1997) defende as escolas como instituições que
condicionantes. Este movimento que mobiliza cada docente no seu percurso formativo envolve a autoconsciência, a consciência crítica e a conscientização. A autoconsciência diz respeito a uma relação crescente e profunda do educador consigo mesmo, por intermédio do autoconhecimento, da busca interior de um sentido da vida e do acesso ao conhecimento desvelador das realidades com que nos defrontamos. (BRANDÃO, 1998).
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Para esse percurso, o conhecimento da realidade é fundamental para que o(a) educador(a) desenvolva o seu trabalho. A realidade é o mundo da convivência cotidiana.
O que tem a ver conhecimento da realidade e conscientização? A conscientização pressupõe a edificação de uma estrutura simbólica que permita a participação do sujeito na vida social. Implica na consciência dos deveres e direitos de cada ser humano, na aceitação dos limites, na superação das frustrações, na corresponsabilidade e na atuação constante em prol da transformação social. Como afirma Freire (1980, p.26):
A conscientização é um compromisso histórico. É também consciência histórica: é inserção crítica na história, implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. Exige que os homens criem sua existência com um material que a vida lhe oferece.
A conscientização, segundo esse autor, se dá na inter-relação, através da relação do homem com o mundo. Alcança-se um nível crítico de conhecimento pelo processo de compreensão, reflexão, crítica e ação, e não pela imposição, reprodução ou memorização. Nesse processo de engajamento na situação social e política, na busca de respostas à situação de opressão, através da codificação e análise crítica, o homem motiva-se para a aprendizagem e para o conhecimento. conhecimento da realidade concreta, isto é, da situação real vivida pelo educando, e só tem sentido se resulta de uma aproximação crítica da realidade. Acreditando numa pedagogia de atuação não-formal, distante do ensino em sala de aula, que domestica e não cumpre o papel de desvelar a realidade social de opressão, Freire (1980) propõe um método que não ensina a repetir, a copiar palavras, mas a reexistenciar criticamente as palavras que estão na realidade do educando. Nesse sentido, a partir dos estudos de Freire (1982), a atuação do(a) educador(a) deve tomar como diretrizes a vida e o saber dos educandos. É preciso compreender que os significados atribuídos pelos educandos às palavras que, no universo vocabular deles ou do grupo, geram e permitem a conscientização são produzidos pela coletividade no processo histórico, no desenvolvimento de sua consciência social. Esses significados das palavras transformam-se através da ação do indivíduo concreto e adquirem um sentido social. O(A) educador(a) que atua, considerando que o seu trabalho se resume apenas à transmissão de conteúdos específicos, não permite a análise da situação vivida e a criação de novas formas de relação e experiência. Concebendo a educação dentro de um processo de transformação, Freire (1982) afirma a necessidade de uma prática educativa que responda ao movimento dessa
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Aprender numa perspectiva freiriana é um ato de
transformação. Esclarece que, para a realização dessa tarefa, são imperativos o diálogo e a discussão entre educadores e educandos, cabendo ao grupo autogerir a aprendizagem e definir os conteúdos e métodos de ensino.
O diálogo é uma exigência existencial. E, se ele é encontro em que se solidariza o refletir e o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo a ser transformado e humanizado, não pode reduzirse a um ato de depositar idéias de um sujeito no outro. (FREIRE, 1982, p.93).
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O diálogo, assim, constitui-se como método para o processo ensino-aprendizagem. Educador e educandos encontram-se, como homens, assumindo a tarefa comum de transformar o mundo. O diálogo precisa ser compreendido como uma finalidade, não é um instrumento, é um ato de criação. E como sentido do trabalho da educação, possibilita a convivência, a inclusão, a aprendizagem, a participação envolvente e engajada em grupos e equipes. O diálogo permite as identificações, a partilha e a convivência com o diferente; propicia a construção de uma co-responsabilidade com o outro e com um mundo que valorize os direitos de cada um e uma cultura de paz. Qual o compromisso dos docentes com o diálogo? Na educação damos ênfase ao diálogo na relação com o aluno, com os pais?
Através do diálogo, mediamos os conflitos e construímos uma cultura de paz e aceitação das diferenças nos diversos campos de atuação. Esse modo de compreender o diálogo na relação entre educadores e educandos evidencia a dialeticidade que existe nesta relação. À medida que dialogo, convivo, reflito, transformo e sou também transformado que o criador dá forma, estilo a um corpo indeciso e acomodado, não há na verdade docência sem discência. “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”, assim quem ensina e quem aprende transformam-se e constroem uma outra realidade a partir do diálogo. (FREIRE, 1996, p.25) A atuação docente, então, envolve ensinar, pesquisar, planejar, aprender, etc. Freire (1996) analisa que ensinar exige: • rigorosidade metódica, ou seja, é preciso incentivar os educandos para que se aproximem dos objetos cognoscíveis com aprofundamento e criticidade, é preciso ter curiosidade, persistência e rigor metódico; • pesquisa, pois “não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino” (FREIRE, 1996, p. 32). • respeito aos saberes dos educandos, considerando suas experiências, o contexto em que vivem, as condições materiais que lhe são dadas e o modo como interpretam a sua realidade. • criticidade que quer dizer uma superação da curiosidade ingênua, do saber do senso comum pelo saber que resulta dos procedimentos que foram construídos metodicamente e que desvelam a realidade e o jogo de
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pelo outro. Não há, como diz Freire (1996), uma formação em
forças ideológicas que existem. • estética e ética que destacam o caráter formador da experiência educativa. “O ensino de conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do educando” (FREIRE, 1996, p.37). Desse modo, o trabalho docente ressalta a compreensão e interpretação dos fatos. • corporeificação das palavras pelo exemplo – o docente precisa atuar de acordo com o que pensa, com
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o que idealiza e acredita. A prática precisa corresponder ao discurso. • risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação ou prática preconceituosa de raça, gênero, de classe. • reflexão crítica sobre a prática, uma vez que a prática docente crítica envolve o movimento dinâmico, dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer. • reconhecimento e a assunção da identidade cultural que evidencia que [...] a experiência histórica, política, cultural e social dos homens e mulheres jamais pode se dar “virgem” do conflito entre as forças que obstaculizam a busca da assunção de si por parte dos indivíduos e dos grupos e das forças que trabalham em favor dessa assunção (FREIRE, 1996, p.47). Assumir-se como sujeito social e histórico com múltiplas identidades é fundamental para a construção de uma prática docente verdadeira, crítica e transformadora.
E os docentes na escola? Qual É a função? Os docentes têm uma importante função social na escola. Todo o seu trabalho deve estar contextualizado às
questões sociais, econômicas, culturais, ideológicas, políticas do local em que a escola está inserida. As escolas como local de construção de valores, relações, linguagem e conhecimentos legitimam modos particulares de vida social, evidenciam formas de regulação, de poder e de controle. Na contemporaneidade, como espaço de socialização, a escola inaugura margens de acesso à cultura letrada, estabelece normatizações e constrói o sujeito pedagógico que é forFreire (1982), com sua visão sociológica, centrada no mundo da consciência, talvez respondesse a essa questão sobre a função dos docentes na escola, aplicando a sua recusa à ideia tradicional da educação oferecida na escola como a “alavanca do progresso”. Para o autor, o acesso à cultura elaborada não se constitui elemento necessário no processo de elevação cultural; o conhecimento espontâneo, a consciência política, o diálogo entre educandos e educadores articulam-se e operacionalizam resultados desejados dentro de uma perspectiva teórica e prática. Freire (1981, p.96) questiona:
Como aprender a discutir e a debater com uma educação que impõe? Ditamos idéias. Não trocamos idéias. Discursamos aulas. Não debatemos ou discutimos temas. Trabalhamos sobre o educando. Não trabalhamos com ele. Impomos uma ordem a que ele não adere, mas se acomoda. Não lhe propiciamos meios para o pensar autêntico, porque recebendo as fórmulas que lhe damos, simplesmente as guarda.
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mado e regulado pelos discursos no interior da escola.
Depreende-se, então, que há uma ênfase na condição do homem como sujeito da práxis social e como agente da história para que ocorra a transformação das relações sociais. É tarefa da educação, como diz Freire (1982), promover a consciência crítica dessa realidade, através da ação e reflexão que se efetiva entre um sujeito com o outro mediatizados pelo mundo. Neste esforço comum entre os homens, estão envolvi-
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das a consciência da realidade e a autoconsciência, que se inscrevem como ponto de partida do processo educativo numa perspectiva transformadora.
Vamos conhecer uma outra análise sobre a escola e os docentes Minha escola primária fostes meu ponto de partida Dei voltas ao mundo. Criei meus mundos [...] Minha escola primária Eu era um casulo feio, informe, inexpressivo. E ela me refez, me desencantou [...] A escola da Mestra Silvina...
Tão pobre ela. Tão pobre a escola... Sua pobreza encerrava uma luz que ninguém via. Tantos anos já corridos... Tantas voltas deu-me a vida. Cora Coralina (Poema: Mestra Silvina) Fonte:http://leaoramos.blogspot. com.br/2007/08/cora-coralinalembra-que-escola-da.html A escola, como poetiza Cora Coralina (1985), é um espaço importante para a infância e a construção de sentidos sobre si e sobre o mundo. A escola foi designada para a construção da infância como projeto político e social e instituiu-se na Modernidade como agência formal das ações educativas (ÀRIES, 1978). Na contemporaneidade, como espaço de socialização, a escola inaugura margens de acesso à cultura letrada, estabelece normatizações e constrói o sujeito pedagógico que é formado e regulado pelos discursos no interior da escola. A escola, conforme estudos de Bourdieu (1966), reproduz ou conserva os valores que fundamentam a ordem social. Esta lógica está implícita nas rotinas, na localização da escola, nas interações, na linguagem e em todo o saber que é conferido à instituição e aos professores que eram encarregados de perpetuá-los e transmiti-los, demonstrado a imposição do
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sistema dominante sobre as práticas pedagógicas. Os sociólogos franceses Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron (1975), apesar de não proporem um modelo de prática pedagógica, analisam a contribuição do fazer pedagógico para a reprodução social; retomam Durkheim e a corrente estruturalista para explicar o poder reprodutor que a educação assume no seu trabalho pedagógico. Através da obra “A Reprodução: elementos para uma
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teoria do sistema de ensino”, Bourdieu e Passeron (1975) explicam que a educação serve como instrumento de reprodução das relações das forças vigentes da sociedade, das desigualdades sociais, através de um sistema axiomático em que conclusões particulares são deduzidas de princípios universais. O sistema de ensino é definido por Bourdieu e Passeron (1975) como uma modalidade específica de violência simbólica. A violência simbólica, axioma fundamental enunciado, é a imposição da cultura dominante apresentada de modo dissimulado. Atua sobre os educandos através da autoridade e do trabalho pedagógico, mediante forças simbólicas que exercem seu papel de reprodutora das relações de produção da sociedade. Para entender a abordagem de Bourdieu e Passeron, apresentaremos as suas reflexões. Esses autores tratam da constituição e do funcionamento dos campos de produção de bens culturais e simbólicos como o campo científico, o campo artístico, o literário, o universitário e outros, através da análise e da discussão de conceitos como habitus, campo e estratégia, fundamentais para a compreensão da sua teoria. O conceito de habitus diz respeito aos modos simbólicos que circulam na vida social e que estabelecem e sustentam relações de dominação dentro de um contexto histórico. Habitus são esquemas para a produção de práticas particulares. O conceito de habitus também diz respeito a um “[...]
sentimento do lugar da pessoa.” O habitus perpassa a vida do educando, da infância à maturidade, deixando uma marca indelével na história de vida de cada um. Advém de um trabalho de inculcação, interiorização e incorporação dos princípios culturais dominantes. Sobre a contribuição de Bourdieu para a educação, Silva (1996, p.230) comenta:
Mas, há que se perguntar: Qual a maior contribuição de Bourdieu para a educação, para a práxis pedagógica? A necessidade de romper com as rotinas, com os modelos e distanciar-se das explicações fatalistas, essencialistas, otimistas e fantasiosas sobre o homem e a vida cotidiana proporcionará ao educador uma disposição para problematizar as categorias sociais tomadas como verdades pelo senso comum, perceber relações existentes no mundo social e afastar-se das dicotomias: “[...] estrutura/sujeito, micro/macro, indivíduo/sociedade, ação/estrutura, objetivismo/subjetivismo [...]” (SILVA, 1996, p.233). A este respeito, Silva (1996, p.235) avalia:
A maior contribuição que Bourdieu poderia dar à análise edu-
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Apenas muito recentemente com o declínio do prestígio das otimistas metanarrativas educacionais [...] é que Bourdieu passa novamente a ser considerado como um teórico social cuja contribuição pode ser importante para a análise educacional e até mesmo para a teoria educacional.
cacional seria a de modificação desse habitus pedagógico. A única forma de aplicar Bourdieu à análise da educação é aplicando sua sociologia e não transformando-o num pedagogo ou sua sociologia numa pedagogia.
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Depreende-se destas análises que Bourdieu proporciona a compreensão das relações entre sistema de ensino e estrutura social e tece críticas às abordagens estruturalistas, incapazes de explicar os mecanismos envolvidos na passagem da estrutura social para a ação individual. Para Bourdieu e Passeron (1975), a escola e o trabalho pedagógico só podem ser compreendidos quando relacionados aos sistemas de relações entre as classes. No constructo teórico desses autores, assim como no de Freire (1980), está implícita a mesma noção de homem consciente e lúcido das determinações impostas pela sociedade. Cabe à educação o papel de conscientizar, conduzir o sujeito a reconhecer a sua história, entrelaçada à história da sociedade, aprendendo a pensar melhor, a problematizar, desconstruir, investigar, relativizar posições e assumir um papel crítico nos diferentes segmentos sociais. (FREIRE, 1980; BOURDIEU; PASSERON, 1975). Charlot (2000) alerta que a sociologia de Bourdieu é útil para compreender a relação dos alunos com o saber, mas é insuficiente porque é preciso pensar que o sujeito ocupa uma posição no espaço social, dá um sentido ao mundo que não se limita à interiorização de relações entre posições, sob a forma de habitus. Há confronto, há resistência. De acordo com Charlot (2000), o aluno é um sujeito confrontado com a necessidade de aprender e com a presença,
em seu mundo, de conhecimentos de diversos tipos. O aluno é um ser humano aberto ao mundo, portador de desejos, movido por esses desejos e em relação com os seres humanos. É um ser social, nasce e cresce em uma família, ocupa uma posição social e está inscrito em relações sociais. É um ser singular, que interpreta e dá sentido ao mundo e à posição que ocupa nas relações e na vida social. O aluno encontra a questão do saber como necessidade de aprender e como aluno produz a si próprio e é produzido através da educação. Charlot (2000) critica a escola que organiza o trabalho educativo pela repetição de tarefas mecânicas e repetitivas e pouco interativas, uma vez que essas atividades criam nos alunos a ideia de que a escola é a realização de tarefas para a aprendizagem de conteúdos que lhe garantam um futuro melhor. Freire (1982), ao analisar que a escola deve refletir sobre a vida dos alunos, admite que é através de uma atitude dialógica entre educador e educandos que se encontram como pessoas e assumem a tarefa comum de enfrentar os problemas e frustrações e de transformar a sua realidade. Para Giroux (1997, p.163), para que o professor assuma um trabalho transformador é preciso [...] “tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico”. Para tanto é preciso inserir a escolarização na esfera política, como uma ação reflexiva e crítica, que tem como objetivo promover a emancipação de mulheres e homens. A escola, como responsável por um projeto social de humanização e superação das injustiças sociais, econômicas e políticas necessita desenvolver no conjunto da gestão, proposta curricular e organização do trabalho pedagógico experiências de aprendizagem que visem autonomia, pensar crítico, ativo, reflexivo e coletivo dos estudantes.
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presença no mundo dos objetos, de pessoas e de lugares. O
Nesta análise, Giroux (1997) reforça que, tornar o político mais pedagógico significa utilizar práticas pedagógicas que incorporem interesses políticos que tenham natureza emancipadora, isto é, implicar os estudantes como agentes críticos; problematizar o conhecimento; utilizar o diálogo e dar voz ativa aos estudantes
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Em todas as práticas educativas, os estudantes têm voz ativa? Qual É a intencionalidade das práticas educativas?
Assim, considerando que toda ação educativa tem uma intencionalidade, que todas as atividades de ensino e aprendizagem são planejadas pelos docentes para atender os princípios estabelecidos no projeto político pedagógico da escola, é preciso analisar, de modo mais aprofundado, o que fundamenta a ação docente. O fenômeno educativo é histórico, social, relacional, cultural, político, por isso, há várias formas de compreendê-lo. Mizukami (1986) concebe o fenômeno educativo pela multidimensionalidade de aspectos a serem considerados: humano, técnico, cognitivo, emocional, sócio-político e cultural, destacando que, a depender da teoria (proposta ou abordagem), um outro aspecto do fenômeno educacional será privilegiado, ocasionando reducionismos. Então, os docentes e as instituições de ensino, ao conceberem o seu ideário pedagógico, tomam posições epistemológicas em relação ao sujeito e ao meio que são baseadas em teorias ou escolas psicológicas que fundamentam teorias ou abordagens pedagógicas. Nesse sentido a atuação docente
não é neutra ou desorganizada. Desse modo, cada docente, a partir das suas leituras, vivências e interpretações, assume um ideário pedagógico constituído por um conjunto de teorias pedagógicas, psicológicas que possuem conceitos específicos de mundo, sociedade, cultura, conhecimento, homem, aprendizagem, etc., e posições relativas ao sujeito, ao objeto e à interação sujeito-objeto. Todas as abordagens ou teorias pedagógicas e psicoanalisa que no Brasil as cinco abordagens que mais influenciaram os professores são: tradicional, comportamentalista, humanista, cognitivista e sócio-cultural. Os docentes aproximaram-se dessas abordagens através de informações obtidas através de leituras, cursos de formação ou pela exposição aos modelos nas experiências como discentes. Além dessas abordagens, destacou-se a abordagem escolanovista ou didaticista que foi introduzida pelo Movimento da Escola Nova e Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que atribuiu grande importância aos aspectos didáticos. Então, as diretrizes da ação docente são tomadas a partir de diferentes referenciais. Retomamos o que alertou Charlot (1992), que os professores são profissionais da contradição, debatem-se entre ser tradicional ou construtivista, entre ser herói ou vítima, ensinar ou formar, ser universalista ou respeitar as diferenças, ter autoridade ou demonstrar amor, entre outras. Os professores, além dessas tensões, ainda lidam com diferentes modelos de formação, como o modelo artesanal que tem o fazer baseado na intuição; o modelo instrumental-tecnicista que valoriza a técnica como solução dos problemas pedagógicos; o modelo sociopolítico que destaca a dimensão histórica e social da prática pedagógica; a epistemologia da prática que como analisa D’Avila (1992, p. 37) “[...] busca o reconheci-mento de um saber oriundo, mobilizado e
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lógicas fornecem diretrizes à ação docente. Mizukami (1986)
recons-truído nas práticas docentes”. Quanto à fenomenologia existencial, outro modelo de formação, as narrativas dos professores sobre o seu processo de escolarização ou escritos autobiográficos funcionam como importante dispositivo metodológico no processo de formação docente.
Esta aula teve por objetivo analisar a atuação do(a) educador(a)
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Síntese 270
na contemporaneidade, discutiu a docência, a escola e os fundamentos da ação educativa a partir das contribuições de Freire e Giroux, entre outros teóricos da educação. Compreendemos que os professores lidam com contradições, tensões e diferentes modelos de formação. A atuação docente não é neutra ou desorganizada, há sempre uma intencionalidade. questão para Reflexão A partir do que analisa Charlot (1992, p. 19): “[...] Até as práticas pedagógicas, cuja eficácia parecia comprovada pela tradição, são questionadas e criticadas; começa a ser desprezado o professor tradicional.” Caracterize o desprezo ao professor tradicional e o que é esperado do docente na contemporaneidade.
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A Atuação do(a) Educador(a) na Contemporaneidade
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Profissão e Formação Docente
272
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273 A Atuação do(a) Educador(a) na Contemporaneidade
ções na política da pedagogia e na pedagogia política. Petró-
(8)
D ocĂŞncia e Cotidiano Escolar
“A espantosa realidade das coisas é a minha descoberta de todos os dias” Alberto Caeiro, Poemas inconjuntos
Maria Luiza Coutinho Seixas Na aula anterior, analisamos aspectos fundamentais da atuação docente na contemporaneidade. Nesta aula, discutiremos as influências do cotidiano nas práticas educativas vivenciadas pelos sujeitos que participam do espaço escolar. Esperamos, ainda, contribuir para uma reflexão sobre o cotidiano e a sua relação com o contexto educacional e as possíveis intervenções na reorganização do cotidiano escolar.
O Cotidiano: o que é? É inquestionável que, em um passado não muito distante, a percepção que os envolvidos com a educação tinham sobre o cotidiano é que ele estava articulado ao padrão, à repetição, à reprodução e à ordem. Se nos ampararmos, por exemplo, somente em seu significado nos dicionários da nossa língua (FERREIRA, 2010), vamos encontrá-lo, ainda hoje, como um adjetivo, que diz “aquilo que se faz ou sucede todos os dias; o que é diário, o que acontece todos os dias; ou ainda, aquilo que é próprio de cada dia”. Em uma publicação na qual considera a introdução do cotidiano como um campo da análise social, Tedesco (1999) afirma que pensar o cotidiano demanda a realização um minucioso estudo, atento aos diferentes pressupostos teóricos que permeiam esse campo de análise:
Muito se fala sobre o cotidiano, tratado em vários textos como categoria de análise, como parte de um todo, como uma esfera do social, como uma dimensão da
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realidade que carrega características peculiares: senso comum, alienação, mesmismo, que anda por si, etc. Lefebvre diz que o cotidiano é uma soma de insignificâncias, não de significantes. O cotidiano é visto também como o mundo da vida (Schutz, Habermas); como unidade de análise e de atividade de tipo relacional (Weber); lugar do homem concreto, do imediato, do pragmático da reprodução da reprodução (Lefebvre, Kosik); reprodução individual e mediação entre o particular e o genérico (Heller); como a própria condição humana fundamental (Arendt); como o espaço dos homens históricos reais (Marx). Essas noções/conceitos têm uma justificação teórica peculiar: independente do que pesem essas afirmações e de que fonte teórica brotam, todos reconhecem que não há uma realidade humana que não esteja, bem ou mal, imbricada e vinculada à realidade do concreto cotidiano (TEDESCO, 1999, p. 27). Muitos estudiosos da área da Sociologia, da História, da Antropologia, da Educação têm discutido o que é o cotidiano, como este é conceituado e sua influência na vida dos sujeitos. Para nós, que nele estamos imersos, o cotidiano é entendido como a sucessão de acontecimentos vividos pelo homem em
seu dia a dia, na diversidade do tempo e do espaço.
O cotidiano é aqui considerado/percebido como um lugar rico e fecundo das questões sociais, sendo nele que as contradições, ambiguidades, insuficiências, necessidades e conflitos apresentam-se como faces inerentes à especificidade humana. Uma das maiores estudiosas do cotidiano é Agnes Heller . Para esta intelectual húngara, a vida cotidiana é “a 1
vida do homem inteiro, indissociada do cotidiano da história da sociedade” (HELLER, 1972, p. 17). Os fatos históricos, dirá Heller em “Cotidiano e a História”, sua mais conhecida obra, em nosso país, nascem no cotidiano. Ela vai assinalar que,
1. Em um texto apresentado no Ciclo de Conferências sobre a Escola de Frankfurt, realizado na Faculdade de Ciências e Letras da UNESP, em 1990. Maria Helena Patto (1990) nos conta um pouco de sua biografia. Agnes Heller nasceu em Budapeste, no ano de 1929. Tendo sido aluna e colaboradora de Lukács, foi pesquisadora do Instituto Sociológico de Budapeste até 1978, quando, por motivos políticos, teve que deixar o seu país natal. Foi para Austrália e atualmente integra o corpo de professores e pesquisadores da New School for Social Research, em Nova York. Agnes Heller participa de um grupo de intelectuais que elaboraram um marxismo crítico no leste europeu, movimento intelectual que ficou conhecido como a Escola de Budapeste.
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[...] o cotidiano exerce na vida do indivíduo a qualidade de dar forma, direção e rumo para essa vivência diária. Permite ao sujeito que, neste caminho, exponha o seu estilo de vida, o ser, que ao mesmo tempo é compartilhado e reconhecido pelo outro, constituindo-se a história social. As atividades assumem diferentes papéis, dependendo do contexto em que são realizadas. (BATISTA, 2011, p.8).
embora a noção de cotidiano, inicialmente, nos remeta à ideia de repetição, esse espaço não é só de reprodução, mas, sobretudo, de produção de sentidos. Nessa obra, Heller (1972) assinala que as atividades habitualmente realizadas fazem parte do cotidiano do homem e registram a sua passagem pela história, assumindo, Profissão e Formação Docente
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desta maneira, diferentes papéis. A depender do contexto em que são realizadas, social e culturalmente, passam a ter, para cada indivíduo, um significado, e indicam seus interesses, suas potencialidades, capacidades, mas, principalmente, suas necessidades, dificuldades e medos. Em sua defesa do cotidiano como uma categoria teórica necessária para a compreensão de como as práticas sociais se dão historicamente, em “Cotidiano e História”, Heller toma o trabalho nos diferentes tempos históricos, como categoria de análise. Esse fato não se configura como uma surpresa, haja vista ter sido a Escola de Frankfurt2 a matriz epistemológica do seu pensamento. Segundo a autora, a vida cotidiana é marcada pela heterogeneidade e pela hierarquia. Sobre essas duas condições, Lima (2004, p. 11) ressalta:
[...] é heterogênea no que diz respeito ao conteúdo e à significação ou importância de nossos tipos de atividades, a saber: organização do trabalho, da vida privada, do lazer, do descanso, da atividade social, dentre outros. É hierárquica quando se modifica de modo específico em função das
2. Caso queira saber mais sobre a Escola de Frankfurt, o site do Brasil Escola possui um texto bastante esclarecedor sobre ela e o que representou na Europa dos primeiros cinquenta anos do século XX. Acesse o link http://www.brasilescola.com/sociologia/a-escola-frankfurt.htm.
diferentes estruturas econômico-sociais. Para uma melhor compreensão desses aspectos, a autora parte do trabalho como categoria.
plo, Lima (2004, p. 2-3) pensa o cotidiano como “espaço de estudo das representações sociais, dentre elas o trabalho” e a através do qual se estabelecem as práticas sociais. Maria Helena Patto ressalta que a introdução desta matriz conceitual (materialismo histórico) no campo da educação e na literatura educacional brasileira, sobretudo, para compreender o cotidiano escolar, acontece em duas versões:
[...] althusseriana - que trouxe consigo a concepção da escola como Aparelho Ideológico de Estado - e em seguida em sua tradução gramsciana - que possibilitou a crítica às versões nãodialéticas do marxismo, mais especificamente, à concepção reprodutivista da relação escola-sociedade (PATTO, 1993, p. 119). A autora assinala que a principal consequência deste ingresso foi a mudança pela qual passou a pesquisa educacional brasileira, mudando o foco nos estudos da escola:
[...] os estudos tradicionais, baseados no modelo experi-
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Seguindo pela matriz apontada por Heller, por exem-
mental de pesquisa, que ora se detinham na investigação das características psicológicas dos alunos, [...] ora nos métodos de ensino e de avaliação da aprendizagem, via de regra em termos do estabelecimento de relações estatisticamente verificáveis entre dados empíricos [...] foram substituídos pela atenção à escola enquanto instituição inserida numa estrutura social marcada por relações antagônicas de classes. (PATTO, 1993, p. 119).
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Mas, esta não é a única matriz a tratar essa questão. A inclusão do cotidiano como categoria teórica foi feita por filósofos, sociólogos, historiadores, educadores, pensadores, enfim, que “enveredaram” por outras matrizes de pensamento, como por exemplo, Michel de Certeau (1996), reconhecidamente interessado pela corrente epistemológica da Fenomenologia. No segundo volume de sua obra, “A invenção do cotidiano”, o autor legitima uma discussão teórica sobre esse conceito:
[...] o cotidiano é aquilo que nos é dado cada dia (ou que nos cabe em partilha), nos pressiona dia após dia, nos oprime, pois existe uma opressão no presente. [...] O cotidiano é aquilo que nos prende intimamente, a partir do interior. [...] É uma história a caminhode nós mesmos, quase
Conforme Maria Helena Patto (1993), a matriz fenomenológica para os estudos do cotidiano ganhou força com a pretensão de “resolver”, ou pelo menos ampliar a possibilidade de se dar outro tratamento ao cotidiano escolar, duas questões “mal resolvidas”, pela matriz vanguardeada por Heller, Gramsci e Althussser. A primeira delas refere-se ao método, a partir do qual as investigações produzidas apresentavam como resultados “intrigantes relatos de pesquisa nos quais a uma fundamentação teórica marxista correspondiam investigações, onde a realidade era segmentada em variáveis e não se ia além do empírico” (PATTO, 1993, p. 120). A segunda diz respeito à questão teórica, pois, nessa matriz, a análise da historicidade da vida na escola limita-se ao tratamento dos [...] conceitos macroscópicos, que não permitem aproximar o foco de análise da escola como uma realidade específica, não generalizável, caracterizada pela complexidade e intersubjetividade, e que, por isso não conseguem dar conta de uma compreensão da questão do sujeito histórico, aquele que, ao mesmo tempo, faz história e é feito por ela:
Nesse sentido, o que parecia ser apenas um problema de atingir uma coerência entre teoria e mé-
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em retirada, às vezes velada. [...] Talvez não seja inútil sublinhar a importância do domínio desta história ‘irracional’, ou desta ‘não história’, como o diz ainda A. Dupont. O que interessa ao historiador do cotidiano é o Invisível... (CERTEAU, 1996, p. 31).
todo, revelou-se, acima de tudo, uma questão de procura de uma teoria que superasse não só as versões funcionalistas sobre a relação escola-sociedade, mas também as concepções críticas da escola que a vêem (sic) apenas como instituição reprodutora da ideologia e das relações sociais de produção (PATTO, 1993, p. 120).
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Duran (2007) analisa que pensar o cotidiano a partir de Certeau possibilita aos educadores e estudiosos da educação que falem de suas práticas, das “artes” da escola e de outros lugares, e que considerem “[...] a legitimidade dos saberes e valores que permeiam tais práticas subterrâneas do coletivo escolar, suas estratégias e táticas próprias” (DURAN, 2007, p.120). No âmbito da instituição escolar, como bem diz Melo (2013, p. 12):
[...] devemos pensar o cotidiano escolar como possibilidade de desenhar uma história diferente, imbuída de significados, dotada de ações, saberes e práticas que verdadeiramente possibilitem a promoção dos sujeitos humanos. Não é mais possível organizar o espaço da sala de aula baseado numa relação verticalizada entre professor e alunos. Estes devem ser sujeitos do processo de ensino-aprendizagem e não meros
repetidores de conteúdos prontos. Importante!!!
Figura 1 e 2: O cotidiano escolar
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Li%C3%A8ge_%2810%29.JPG Fonte:http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Li%C3%A8ge_%289%29.JPG
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Atualmente, quando o cotidiano é relacionado às práticas escolares, os professores e estudiosos da área educacional sinalizam que ele é complexo, invisível ou silencioso, cheio de símbolos e de significados; que ele é o espaço do acontecimento. Através dele, é possível buscar o significante do invisível; é também possível reconhecê-lo como tempo/lugar dos conflitos racionais e irracionais de nossa época, nos quais se estabelecem os problemas de produção da vida concreta.
Marli André (1992), em artigo publicado no periódico Em Aberto, do INEP, ressalta que muitos dos estudos e pesquisas produzidos, nos últimos anos da década de 1970 e os primeiros anos da década 1980, na área de educação se autoclassificam como “qualitativos”, mas que, efetivamente, o que se verificou foi que “a grande maioria envolve dados Profissão e Formação Docente
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de campo, sistematizados em forma de descrições que acrescentam muito pouco ao que se sabe ou conhece ao nível do senso” (ANDRÉ, 1992, p. 31). Para esta reconhecida teórica do campo educacional em nosso país, o que acontece nesses casos:
[...] é uma supervalorização dos procedimentos de coleta de dados em detrimento de uma opção metodológica ,uma vez que os estudos se limitam a apresentar esses dados na forma em que se manifestam, sem um questionamento mais profundo de suas raízes, de seu significado naquele momento histórico, de seus condicionantes e implicações. Falta-nos mesmos um suporte teórico que oriente o processo e construção do objeto de estudo, sendo bastante comum a apresentação de um referencial teórico no início do trabalho que tem muito pouco a ver como trabalho de campo e as análises realizadas (ANDRÉ, 1992, p. 32). Em outro texto, Marli André aponta mais uma vez a problemática que envolve os ditos estudos etnográficos que
têm como foco o cotidiano no âmbito escolar. Os “problemas” apontados nas pesquisas etnográficas que focalizam a vida escolar cotidiana
Mesmo considerando os estudos sobre o cotidiano escolar, a partir de uma perspectiva etnográfica, Marli André salienta a sua importância e se coloca, no cenário da pesquisa educacional, como uma de suas principais defensoras. Para esta autora, esse tipo de pesquisa permite entender como se operam, no cotidiano escolar, os mecanismos de dominação e de resistência, de opressão e de contestação, ao mesmo tempo em que são veiculados e (re)elaborados conhecimentos, atitudes, valores, crenças, modos de ver e de sentir a realidade e o mundo. A prática etnográfica permite, também, identificar as estruturas de poder e os modos de organização do trabalho escolar. Permite, também compreender o papel e a atuação de cada sujeito nesse complexo interacional, no qual ações, relações, conteúdos são construídos, negados, reconstruídos ou modificados. Dessa forma, essa prática contribui para consolidar a percepção da escola como um terreno cultural caracterizado por vários graus de acomodação, contestação
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[...] parecem decorrer da falta de conhecimento dos pesquisadores sobre os princípios básicos da etnografia, de sua falta de clareza sobre o papel da teoria na pesquisa e de uma dificuldade para tratar teórica e metodologicamente da complexa questão objetividade-participação (ANDRÉ, 2001, p. 4).
e resistência, uma pluralidade de linguagens e objetivos conflitantes. É sempre importante lembrar que, na sala de aula, o meio psicossocial constituído e influenciado por múltiplos fatores, os mais variados “problemas” são apresentados aos professores para que sejam resolvidos de maneira prática. É Profissão e Formação Docente
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exigido desse professor que as ações que executa, quer seja no diagnóstico das situações, na escolha das estratégias ou na previsão das consequências, estejam associadas ao, costumeiramente, denominado exercício reflexivo, uma imersão consciente do homem no mundo da experiência, mundo esse carregado de conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afetivas e interesses sociais. Nesse sentido, Marli André (1999) recomenda aos educadores e pesquisadores que, antes de tudo, devem tentar ir fundo na análise dos elementos que compõem o cotidiano, questionando suas origens, seu significado, suas limitações e, principalmente, suas vinculações aos objetivos sociopolíticos e econômicos que determinam esses elementos.
Importante!!! Todo ser humano reflete. Aliás, é isso que nos diferencia dos outros animais. No entanto, no início da última década do séc. XX, a expressão professor reflexivo tomou conta do cenário educacional brasileiro. Você sabe por quê? Não? Discutiremos, na próxima seção, alguns aspectos relacionados a essa perspectiva formativa!
O estudo da prática escolar não se pode restringir a um mero retrato do que se passa no seu cotidiano; deve, sim, envolver um processo de reconstrução dessa prática, desvelando suas múltiplas dimensões, refazendo seu movimento,
apontando suas contradições, recuperando a força viva que nela está presente. Isso pode levar o professor à percepção de valores, preconceitos, estereótipos, além das representações das redes de relações, de significados e situações construídos por ele próprio e pelos alunos no interior da escola que não são dissocia-
A FORMAÇÃO REFLEXIVO
DO
PROFESSOR
Essa perspectiva foi iniciada por Donald Schon, quando realizava atividades relacionadas com reformas curriculares nos cursos de formação de professores.
Figura 1: Donald Schön3
Fonte Autor VectorStudy: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Donald_schon_pic.jpg
3. Donald Schön, professor de Estudos Urbanos do Instituto de Tecnologia de Massachusetts – MIT (Estados Unidos). Em sua tese de doutorado (1983), Donald Schön estuda alguns autores. De Luria, extrai a importância dos conhecimentos tácitos. De Dewey, o conceito de experiência compreendida como mais do que a simples atividade, envolvendo o elemento ativo (tentativas, experimentos e mudança) e o passivo, quando experimentamos, passamos, sofremos as consequências da mudança.
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das do contexto mais amplo: a sociedade.
Observando a prática dos profissionais e valendo-se dos seus estudos de filosofia, este educador sugere que a formação dos profissionais não mais se dê nos moldes de um currículo normativo, que primeiro apresenta a ciência, depois a sua aplicação e, por último, um estágio que supõe a aplicação pelos alunos dos conhecimentos técnico-profissionais. Profissão e Formação Docente
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Conforme sua análise, essa formação deve valorizar a experiência, a reflexão na experiência e o conhecimento tácito4, e, sendo assim, propõe uma formação profissional baseada numa epistemologia da prática, ou seja, na valorização da prática profissional como momento de construção de conhecimento, através de reflexão, análise e problematização desta e o reconhecimento do conhecimento, presente nas soluções que os profissionais encontram enquanto atuam. Encontramos, dessa forma, uma forte valorização da prática na formação dos profissionais; mas uma prática refletida, que lhes possibilite responder às situações novas, incertezas e indefinições. Entretanto, como outros referenciais que se configuraram como propostas para a formação inicial e continuada de professores, a perspectiva de Donald Schön tem se estabelecido como uma tendência significativa, sem, contudo, deixar de ser alvo de alguns questionamentos e críticas. Essas críticas podem ser facilmente encontradas nos textos de Zeichner (1998, 1993), que entende que a concepção de intervenção reflexiva proposta é uma forma de sustentar a incoerência em se identificar o conceito de professor reflexivo com práticas e treinamentos que possam ser consumidos por um pacote a ser aplicado tecnicamente; e, também,
4. De uma forma simplificada, conhecimento tácito é aquele que não pode ser exteriorizado por palavras. Calado, silencioso. Não expresso; subentendido, implícito, que, por não ser expresso, se deduz de alguma maneira.
de Contreras (1997) que compreende a mera reflexão sobre o trabalho docente de sala de aula como insuficiente para uma compreensão teórica dos elementos que condicionam a prática profissional.
A análise desse tema não se esgota com essas considerações que apresentamos, apenas com a intenção de provocar outros questionamentos, dúvidas, desafios... Como refletir sobre o cotidiano escolar?
“De quem é o olhar Que espreita por meu olhar? Quando penso que vejo Quem continua vendo Enquanto estou pensando?” (Fernando Pessoa. S.d.) Disponível em http://www.citador.pt/poemas/de-quem-e-o-olhar-fernando-pessoa
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Para Contreras (2002), a prática dos professores precisa ser analisada considerando que a sociedade é plural, no sentido da pluralidade de saberes, mas também desigual, no sentido das desigualdades sociais, econômicas, culturais e políticas.
Em termos teóricos e práticos, ter o cotidiano como uma dimensão fundamental para a análise, significa fazer uma aproximação com a Antropologia, área do conhecimento para a qual a cultura é pensada como modo de vida. Grande parte dos educadores aponta e defende a utilização da pesProfissão e Formação Docente
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quisa etnográfica como uma forma privilegiada de compreender o cotidiano, sobretudo, em algumas das dimensões da prática educativa, como por exemplo, a institucional, a pedagógica e a histórica. Essa discussão culmina o estudo que fizemos com esse componente curricular que começou abordando a constituição histórica da profissão docente, discutiu a questão da construção da identidade e do perfil profissional, além de analisar os processos de formação e atuação dos professores na contemporaneidade.
sÍntese Nesta aula, tivemos a oportunidade de conceituar, a partir de múltiplas referências, o cotidiano; fazer algumas reflexões sobre ele e sua relação com o contexto educacional; destacar as principais relações entre o cotidiano e a formação do professor reflexivo; refletir sobre a utilização da pesquisa etnográfica como uma forma privilegiada de compreender o cotidiano, sobretudo, nas principais dimensões da prática educativa e do exercício da docência: a institucional/organizacional, a instrucional/pedagógica e a histórica/ filosófica/ epistemológica.
qu estão pa r a Re f l e x ão Com base nas palavras de Henri Lefebvre (1992, p. 26), “[...] é na vida cotidiana e a partir dela que se cumprem as verdadeiras criações, aquelas que os homens produzem no curso de sua humanização: as obras” , faça uma reflexão acerca da no exercício da profissão docente.
L E I T URAs I N DICADAs Para uma ampliação do seu conhecimento sobre a pesquisa do tipo etnográfico, sugerimos a leitura do texto “A abordagem de pesquisa etnográfica: reflexões e contribuições” disponível em: http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=702, e do texto de Marli André “Questões do Cotidiano na Escola de 1 ° Grau”, disponível na URL: http:// www.crmariocovas.sp.gov.br/amb_a.php?t=019.
SI T ES I N DICADOS http://www.psicopedagogia.com.br http://www.crmariocovas.sp.gov.br
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representações no cotidiano doscomerciantes do mercado