QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA Autores – André Vieira e Natasha Londero
Universidade Anhembi Morumbi
Universidade Salvador
Janes Fidelis Tomelin Diretor de EaD
Adriano Lima Barbosa Miranda Diretor de Educação Corporativa e Novos Projetos
Fabiano Prado Marques Diretor Acadêmico – Escola de Engenharia e Tecnologia
Rafael Gonçalves Bezerra de Araújo Diretor da Escola de Engenharia e TI
Adriana Trigolo Revisor Técnico
Diniz Alves de Sant’Ana Silva Revisor Técnico
Universidade Potiguar
Rede Laureate Internacional de Universidades
Barney Vilela Coordenador Geral do Núcleo de Coordenação a Distância Catarina de Sena Pinheiro Diretora da Escola de Engenharia e Ciências Exatas
Daniella Loureiro Koncz Coordenadora de Novos Negócios André Torres Gregório Designer Instrucional
FabriCO Projeto educacional Projeto gráfico Autoria do conteúdo Revisão ortográfica e gramatical
SUMÁRIO CARTA AO ALUNO................................................................................................................ 6 AULA 1 - ESTRUTURA ATÔMICA............................................................................................ 7 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 7 OBJETIVOS................................................................................................................ 7 1.1 Matéria e energia............................................................................................. 8 1.1.1 Os estados da matéria.............................................................................. 8 1.1.2 Elementos e compostos............................................................................ 8 1.1.3 Composição do átomo.............................................................................. 9 1.2 Estrutura atômica............................................................................................ 10 1.2.1 Número atômico..................................................................................... 10 1.2.2 Massa atômica........................................................................................ 11 1.3 As teorias atômicas........................................................................................ 11 1.3.1 Modelo atômico de Dalton..................................................................... 11 1.3.2 Modelo atômico de Thomson................................................................. 12 1.3.3 Modelo atômico de Rutherford............................................................... 12 1.3.4 Modelo de Bohr do átomo de hidrogênio.............................................. 14 1.4 Princípio da incerteza de Heisenberg............................................................. 15 1.5 Os níveis eletrônicos de energia.................................................................... 16 CONCLUSÃO........................................................................................................... 18 AULA 2 - PROPRIEDADES PERIÓDICAS............................................................................... 19 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 19 OBJETIVOS.............................................................................................................. 19 2.1 Classificação dos elementos........................................................................... 20 2.1.1 Os elementos do grupo principal........................................................... 21 2.1.2 Os metais de transição........................................................................... 22 2.1.3 O átomo de hidrogênio.......................................................................... 23 2.2 Propriedades periódicas ................................................................................ 24 2.2.1 Carga Nuclear Efetiva.............................................................................. 24 2.2.2 Raio atômico e raio iônico ..................................................................... 26 2.2.3 Energia de ionização............................................................................... 29 2.1.4 Afinidade eletrônica .............................................................................. 31 2.3 As relações diagonais..................................................................................... 31 CONCLUSÃO........................................................................................................... 32
AULA 3 - LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS............33 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 33 OBJETIVOS.............................................................................................................. 34 3.1 Ligação Química.............................................................................................. 34 3.1.1 Ligação iônica......................................................................................... 34 3.1.2 Formação de ligações iônicas................................................................. 34 3.1.3 Estrutura de Lewis.................................................................................. 35 3.1.4 Estrutura de Lewis para Íons.................................................................. 36 3.1.5 Estruturas de Lewis para compostos iônicos.......................................... 37 3.1.6 Ligação Covalente................................................................................... 37 3.1.7 Estrutura de Lewis para espécies poliatômicas...................................... 38 3.1.8 Exceções à regra do octeto..................................................................... 39 3.1.9 Ressonância............................................................................................ 39 3.1.10 Eletronegatividade................................................................................ 41 3.2 Teoria da ligação de valência......................................................................... 43 3.2.1 Ligações Sigma....................................................................................... 43 3.2.2 Ligação Pi................................................................................................ 44 3.2.3 Hibridização dos orbitais......................................................................... 46 3.2.4 Hibridização sp3....................................................................................... 47 3.2.5 Hibridização sp2....................................................................................... 48 3.2.6 Hibridização sp........................................................................................ 50 3.3 Teoria do orbital molecular............................................................................ 51 3.4 Sólidos............................................................................................................ 52 3.4.1 Sólidos iônicos........................................................................................ 52 3.4.2 Sólidos metálicos.................................................................................... 54 3.4.3 Sólidos covalentes.................................................................................. 56 3.4.4 Sólidos moleculares................................................................................ 57 3.4.5 Forças intermoleculares.......................................................................... 57 3.4.6 Consequências das forças intermoleculares........................................... 61 3.4.7 Energia Reticular..................................................................................... 63 3.5 Difração de raios x.......................................................................................... 65 CONCLUSÃO........................................................................................................... 66 AULA 4 - ESTEQUIOMETRIA................................................................................................ 67 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 67 OBJETIVOS.............................................................................................................. 68 4.1 O mol.............................................................................................................. 68 4.1.1 Número de Avogadro............................................................................. 68 4.1.2 Massa molar............................................................................................ 69
4.2 O As equações químicas................................................................................. 70 4.2.1 Escrevendo as equações químicas.......................................................... 71 4.2.2 Balanceamento das equações químicas................................................. 72 4.2.3 Cálculos estequiométricos...................................................................... 73 CONCLUSÃO........................................................................................................... 74 AULA 5 - SOLUÇÕES........................................................................................................... 75 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 75 OBJETIVOS.............................................................................................................. 75 5.1 Soluções.......................................................................................................... 76 5.1.1 Solubilidade............................................................................................ 77 5.1.2 Concentração de soluções...................................................................... 77 5.1.3 Soluções Ideais....................................................................................... 80 5.2 Coloides.......................................................................................................... 86 CONCLUSÃO........................................................................................................... 87 AULA 6 - REAÇÕES QUÍMICAS............................................................................................ 89 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 89 OBJETIVOS.............................................................................................................. 89 6.1 As reações em solução aquosa ..................................................................... 90 6.1.1 Propriedades gerais das soluções aquosas............................................ 90 6.2 Reações de precipitação................................................................................. 93 6.2.1 Equações iônicas completas e equações iônicas simplificadas.............. 94 6.2.2 Aplicações das reações de precipitação................................................. 95 6.3 Reações de ácido-base................................................................................... 96 6.3.1 Propriedades gerais dos ácidos e das bases.......................................... 96 6.3.2 Ácidos e bases fortes e fracos................................................................ 98 6.3.4 Neutralização ácido-base ....................................................................... 99 6.4 Reações de oxirredução .............................................................................. 100 6.4.1 Oxidação e redução ............................................................................. 100 6.4.2 Número de oxidação............................................................................. 101 CONCLUSÃO......................................................................................................... 103 AULA 7 - ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE............................................................. 107 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 107 OBJETIVOS............................................................................................................ 107 7.1 Célula Eletroquímica..................................................................................... 108 7.1.1 Célula Galvânica.................................................................................... 109 7.1.2 Representação esquemática de células................................................ 113 7.1.3 Célula Eletrolítica.................................................................................. 115
7.1.3.1 Leis de Faraday.................................................................................. 116 7.1.4 Potencial de eletrodo........................................................................... 117 7.1.5 Eletrodo padrão de hidrogênio............................................................. 118 7.1.6 A equação de Nernst e o Potencial Padrão de Eletrodo...................... 120 7.2 Medida de pH utilizando a eletroquímica.................................................... 125 CONCLUSÃO......................................................................................................... 127 AULA 8 - MATERIAIS MODERNOS..................................................................................... 129 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 129 OBJETIVOS............................................................................................................ 129 8.1 Polímeros...................................................................................................... 130 8.1.1 Classificação dos polímeros.................................................................. 132 8.2 Cristais líquidos............................................................................................. 133 8.2.1 Tipos de cristais líquidos....................................................................... 134 8.3 Fármacos....................................................................................................... 136 CONCLUSÃO......................................................................................................... 141 CARTA DE ENCERRAMENTO.............................................................................................. 143
CARTA AO ALUNO
CARTA AO ALUNO De onde viemos? O que somos? E para onde vamos? Algum dia você deve ter se feito uma dessas perguntas. Estas questões filosóficas instigam a humanidade faz muito tempo. De que são feitas as coisas? O que é a matéria? Qual a essência do universo? Perguntas desse tipo devem ter sido formuladas logo depois, mas são tão antigas quanto as primeiras e, claro, de grande importância. Na tentativa de explicar qual a natureza da matéria, surgiram várias teorias. Uma delas foi criada por um filósofo grego, Empédocles, por volta do século V a.C. Segundo ele, tudo que existe no universo seria composto de quatro elementos principais: terra, fogo, ar e água. A teoria dos quatro elementos mostrou-se inconsistente. Contudo, ela mostra a curiosidade do ser humano por tentar explicar e compreender a natureza da matéria. Nesta disciplina teremos como objetivo responder a tais questionamentos filosóficos e sanar outras perguntas que norteiam nosso cotidiano. Ah! Lembre-se: atenção e um pouco de curiosidade são os requisitos básicos para entrar no mundo dos átomos.
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AULA 1 Estrutura Atômica
INTRODUÇÃO Imaginar um mundo onde um átomo pode ser explicado por teorias extremamente complexas pode parecer um pouco assustador. Imagine então para os químicos e filósofos da antiguidade. A teoria atual para a estrutura do átomo não foi algo que nasceu em poucos anos, mas sim em séculos de estudos, desde a ideia inicial de Demócrito até a contribuição da teoria quântica de Bohr. Por isso, nesta aula, veremos a evolução científica dos conceitos e das teorias acerca dos átomos e de algumas de suas propriedades. Vamos começar?
OBJETIVOS » » Perceber o que é estrutura atômica, matéria e energia.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » Compreender os conceitos básicos da teoria atômica e partículas subatômicas. » » Adquirir noções básicas do modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio. » » Apreender o princípio da incerteza de Heisenberg. » » Reconhecer o magnetismo e paramagnetismo. » » Compreender a organização subcamadas atômicas e suas energias. » » Realizar a atribuição dos elétrons. » » Entender os níveis eletrônicos de energia e as configurações eletrônicas.
1.1 MATÉRIA E ENERGIA A matéria e a energia apresentam interesse tanto científico quanto filosófico desde a antiguidade. Atualmente, a matéria é tratada como sendo tudo o que tem massa e ocupa um lugar no espaço, como o ouro, a água e a madeira. Por outro lado, a energia é tudo o que pode modificar a matéria, tudo que pode provocar ou anular movimentos e causar deformações, mais especificamente tudo que tem a capacidade de realizar trabalho.
1.1.1 Os estados da matéria A matéria pode se apresentar em três estados: sólido, líquido e gasoso. Um sólido conserva o seu volume e a sua forma independente do recipiente. Um líquido mantém o seu volume, mas adquire a forma de seus recipientes. Por terem volumes e formas variáveis, os gases podem se expandir, adquirindo a forma do recipiente em que são postos. Tanto os líquidos quanto os gases apresentam fluidez, que é a capacidade de fluir – por isso também são chamados “fluidos”. (RUSSEL, 2008).
1.1.2 Elementos e compostos Existem duas espécies de substâncias puras: os elementos e os compostos. Um elemento é uma substância simples, fundamental e elementar. Os elementos, que estão presentes na tabela periódica (figura 1), são representados sempre por uma letra maiúscula, exemplo flúor (F), enxofre (S), nitrogênio (N), ou por uma letra maiúscula seguida de uma minúscula, como o ferro (Fe), cloro (Cl) e sódio (Na).
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AULA 1 – ESTRUTURA ATÔMICA
Figura 1 - Tabela periódica dos elementos. Fonte: <www.dicadetudo.com>.
“Os compostos ou moléculas são constituídos de dois ou mais elementos combinados em uma relação definida e, assim, são substâncias mais complexas do que os elementos.” (RUSSEL, 2008, p. 22). Exemplos de compostos: o cloreto de sódio, a água e o ozônio. Os compostos químicos são representados por suas fórmulas moleculares, por exemplo, o cloreto de sódio por NaCl, ou seja, significa que esse composto é formado pela combinação de 1 átomo de sódio (Na) e 1 átomo de cloro (Cl). A molécula de água, como já nos é familiar, é representada por H2O. Isso significa que ela é formada por 2 átomos de hidrogênio (H) e 1 átomo de oxigênio (O). O composto ozônio, que tem a fórmula O3, é formado por apenas 3 átomos de oxigênio (O). Perceba que o número representa a quantidade de átomos presente nos compostos.
Acesse o site: <www.tabelaperiodicacompleta.com>.
1.1.3 Composição do átomo Segundo Raymond (2007, p. 30). O átomo é definido como a menor partícula possível de um elemento. O átomo é composto por elétrons, prótons e nêutrons. O elétron é
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
uma partícula carregada negativamente que se move descrevendo uma trajetória ao redor do núcleo de um átomo. Os elétrons estão dispostos em camadas. Cada camada contém elétrons que orbitam a uma mesma distância média do núcleo. Eles compensam um igual número de prótons, que têm carga positiva, o que possibilita que o átomo todo seja neutro. O próton é partícula subatômica que se encontra no núcleo e tem uma carga elétrica unitária positiva. O nêutron é uma partícula estável que influencia na radioatividade e em outras formas das reações nucleares, porém tem pouca influência nas propriedades físicas e químicas.
Na tabela 1 são apresentados os símbolos, a carga e a massa de cada espécie. Tabela 1 - Propriedades das partículas subatômica
PARTÍCULA
SÍMBOLO
CARGA
MASSA (KG)
Elétron
E
-1
9,109 × 10-31
Próton
P (H+)
+1
1,673 × 10-27
Nêutron
N
0
1,675 × 10-27
Talvez você não consiga conceber o valor de massa de um próton ou nêutron (1,673 · 10-27 kg). Assim, podemos informar que uma formiga, por exemplo, pesa incríveis 0,000010 kg ou 10,0 · 10-6 kg, e uma gota de água pesa aproximadamente 0,000003 kg ou 3,0 · 10-6 kg. Isso mostra a dificuldade em estudar o assunto e porque os filósofos antigos se referiam aos átomos como “partículas invisíveis”.
1.2 ESTRUTURA ATÔMICA A estrutura atômica nada mais é que o número de prótons, a massa e o elemento químico existentes em um átomo.
1.2.1 Número atômico O número atômico (Z) é o termo usado para designar o número de prótons (P) no núcleo de um átomo. Em um átomo neutro, por exemplo, o número prótons é igual ao de elétrons. Veja: Z = P = ePerceba que o valor de Z é característico de cada elemento químico. Ou seja, se dois átomos possuem o mesmo número atômico, ele se trata do mesmo elemento. O número atômico será sempre representado como: ZE
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AULA 1 – ESTRUTURA ATÔMICA
1.2.2 Massa atômica “A massa atômica (A) é a soma do número de prótons (P) e do número de nêutrons (N) existentes no núcleo de um átomo” (RUSSEL, 2008, p. 238). A=P+N A unidade de massa atômica é representada por “u.” ou “u.m.a.” (unidade de massa atômica). Ao calcular a massa atômica, é preciso desprezar a massa dos elétrons. Isso porque a massa do elétron em relação ao próton é muito pequena, cerca de 2 mil vezes menor. Veja a seguir como é feita a representação da massa atômica e do número atômico: E ou ZEA
A Z
A letra E indica o símbolo do elemento químico. Ou seja, é apenas uma referência. Exemplo: 8O16 (ZEA) refere-se a um átomo de oxigênio com um número atômico 8 (Z) e um número de massa 16 (A). Embora alguns elementos apresentem o mesmo número atômico, eles podem mostrar diferentes números de massas. Esse é um caso de átomos isótopos: mesmo número Z e distintos números A. Entenda: C12 e 6C13 (isótopos)
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1.3 AS TEORIAS ATÔMICAS Vimos até aqui alguns fundamentos sobre a estrutura atômica. Porém, é interessante entender o desenvolvimento lógico envolvido nas teorias sobre os átomos e os experimentos mais importantes que contribuíram para sua definição.
1.3.1 Modelo atômico de Dalton Em 1807, John Dalton (1766–1844) propôs uma importante teoria acerca da natureza da matéria e dos átomos por meio de estudos e observações experimentais de gases e reações químicas. Dalton imaginou o átomo semelhante a uma bola de sinuca minúscula. Dessa forma, os átomos teriam a forma esférica, maciços, indivisíveis e indestrutíveis. A proposta baseada em seus dados experimentais resultou em mais alguns postulados como: » » todos os átomos de um dado elemento são idênticos; » » todos os átomos de diferentes elementos apresentam massa e propriedades diferentes; » » uma molécula apresenta combinação específica de átomos de mais de um elemento; » » em uma reação química, os átomos não são criados nem destruídos, porém trocam de parceiros para produzir novas substâncias.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
1.3.2 Modelo atômico de Thomson “Joseph J. Thomson (1956–1940) propôs um novo modelo atômico estudando valores de descargas elétricas em tubos catódicos.” (RUSSEL, 2008, p. 229). Talvez você não imagine, mas provavelmente deva ter um tubo catódico em casa: monitores e televisões. Em 1898, ele sugeriu que o átomo poderia ser uma esfera carregada positivamente, em que alguns elétrons estão inseridos e poderiam ser facilmente removidos. O modelo de Thomson, conhecido como “pudim de passas”, é ilustrado na figura a seguir.
Figura 2 - Ilustração do átomo de Thomson, conhecido como “pudim de passas”. Fonte: <www.agracadaquimica.com.br>.
Por meio de campos magnético e elétrico, Thomson ainda foi capaz de determinar a relação carga/ massa do elétron. Consequentemente, concluiu que os elétrons deveriam ser constituinte de todo tipo de matéria, ou seja, a relação carga/massa do elétron era a mesma para qualquer gás utilizado.
Este foi o primeiro modelo a reconhecer que o átomo seria formado por diferentes partículas.
1.3.3 Modelo atômico de Rutherford Atkins (2006, p. 45) afirma que Em 1890 descobriu-se que alguns elementos são radioativos. Isso significa que eles emitem radiação de alta energia: partículas alfa (α), beta (β) e raios gama (δ). Uma partícula alfa carrega uma carga positiva tem uma massa que é muito maior do que um elétron.
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AULA 1 – ESTRUTURA ATÔMICA
Sabendo disso, em 1911, Ernest Rutherford (1871–1937) realizou um dos mais importantes experimentos científicos da história. Tal experimento consistiu em bombardear uma fina lâmina de ouro, com partículas alfa emitida pelo elemento de polônio (Po). Com isso, foi possível estudar a trajetória dessas partículas. A partir desse experimento, foram realizadas três importantes observações: » » a maioria das partículas alfa atravessava diretamente a lâmina de ouro sem sofrer desvio em sua trajetória; » » algumas partículas sofriam desvio em sua trajetória com ângulos variados; » » apenas um pequeno número de partículas batia na lâmina e retornava. Por meio desses dados, Rutherford imaginou que os átomos de ouro não deveriam ser maciços, como afirmaram anteriormente Dalton e Thomson. Para ele, existiam “buracos” na lâmina de ouro que permitiam a passagem das partículas. Essas lacunas foram denominadas eletrosfera. As partículas que retornaram ou desviaram seriam fruto de alguma repulsão ou interferência entre cargas positivas das partículas α e uma região positiva. Diante disso, Rutherford concluiu que um “[...] átomo poderia ser composto por um pequeníssimo núcleo carregado positivamente (no centro do átomo), rodeado por uma região comparativamente maior, contendo os elétrons” (ATKINS, 2006, p. 236). A sugestão foi de uma estrutura planetária, semelhante ao sistema solar, onde o núcleo seria corresponde ao sol e os elétrons aos planetas que se movimentam em órbitas fixas. Ele compreendeu que se elétrons carregados negativamente estavam distribuídos na maior parte do átomo e se a carga positiva compreendendo a maior parte da massa estava concentrada em um minúsculo núcleo no centro do átomo, então não somente muitas partículas alfa passariam em linha reta sem apresentar deflexão, mas aquelas partículas alfa que passassem próximas do núcleo seriam fortemente repelidas por sua carga positiva. (ATKINS, 2006, p. 236).
A figura a seguir mostra um desenho do átomo idealizado por Rutherford.
Figura 3 - Modelo ilustrativo do átomo proposto por Rutherford. Fonte: <www.brasilescola.com>.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Uma comparação interessante entre a distância do elétron e o núcleo do átomo pode ser ilustrada no estádio do Maracanã, em que uma bola de futebol representa o núcleo de um átomo, no centro do campo, e seus elétrons estariam circulando nas arquibancadas do estádio.
1.3.4 Modelo de Bohr do átomo de hidrogênio Em 1913, Niels Bohr (1885–1962), um físico dinamarquês, identificou que a teoria de Rutherford violava uma das leis clássicas da física: a famosa mecânica newtoniana. Ou seja, um elétron acelerado à medida que fosse perdendo energia desceria em espiral até colidir com o núcleo do átomo. Isso significaria que a matéria deixaria de existir ou existiria por determinado prazo de validade. O modelo proposto por Rutherford foi aperfeiçoado por Niels Bohr, baseando-se nos estudos feitos em relação ao espectro do átomo de hidrogênio e na teoria proposta por Planck em 1900 (Teoria Quântica), segundo a qual a energia não é emitida em forma contínua, mas em “pacotes”, denominados quanta de energia. (ATKINS, 2006, p. 135).
Com essa nova teoria, foram propostos os seguintes postulados. 1) Os elétrons descrevem sempre órbitas circulares ao redor do núcleo do átomo, chamadas de camadas ou níveis de energia. 2) Nas camadas ocupadas por um elétron, possui um valor determinado de energia (estado estacionário), em que cada um deles possui uma energia fixa e definida. 3) Os elétrons absorvem uma quantidade definida de energia quando saltam de um nível para outro mais externo. Porém, se o elétron passar de um estado de alta energia para um estado de menor, existe a emissão de energia, que é igual à diferença de energia entre os dois estados.
Figura 4 - Ilustração do salto e decaimento eletrônico emitindo e absorvendo energia. Fonte: <www.mundoeducacao.com/quimica/estudo-atomo-bohr>.
4) Ao retornar ao nível mais interno e liberar energia, o elétron emite um quantum de energia (igual ao absorvido em intensidade), na forma de luz de cor definida ou outra radiação eletromagnética, denominado fóton.
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AULA 1 – ESTRUTURA ATÔMICA
5) Cada órbita ou camada é denominada de estado estacionário, que pode ser designada por letras K, L, M, N, O, P, Q. Essas camadas podem apresentar um número máximo de elétrons. Ou seja, K = 2; L = 8; M = 18; N = 32; O = 32; P = 18 e Q = 2.
Figura 5 - Representação de como seria um átomo, na visão de Bohr. Fonte: <www.mundoeducacao.com/quimica/estudo-atomo-bohr>.
1.4 PRINCÍPIO DA INCERTEZA DE HEISENBERG Todos os estudos realizados até hoje acerca do átomo e suas propriedades não conseguiram responder a umas das principais questões: onde se encontra cada partícula subatômica? “O princípio da incerteza de Heisenberg afirma que é impossível conhecer com certeza a posição e o momento (o produto da massa × velocidade) de uma pequena partícula, tal como um elétron.” (RUSSEL, 2008, p. 264). O princípio da incerteza diz que, para termos a informação sobre a posição e o momento de uma partícula, devemos interagir ou “ver” de alguma maneira essa partícula. Imagine o seguinte: você deseja acompanhar a queda de um balão de festa na sala de sua casa. Tente visualizar o referido balão descendo durante o dia, como se tivesse cronometrando o tempo e o lugar que ele toca o chão. Agora, imagine realizar essa tarefa à noite, totalmente no escuro. Será que é possível? Se você for habilidoso e tiver dedos sensíveis, poderá estender sua mão, deixando o balão tocá-lo levemente. A partir desta sensação, você terá uma ideia sobre a posição e o momento do objeto. Entretanto, o ato de tocar o balão poderia modificar ligeiramente seu movimento, fazendo-o cair em outro lugar e em outro tempo, certo? Ou seja, sua tentativa em determinar a posição e o momento do balão no escuro poderá causar uma alteração nos resultados. Assim, o ato de efetuar a “medida” manualmente introduziu uma incerteza nos resultados. Tal situação é semelhante para qualquer partícula minúscula e rápida como um elétron, por exemplo. O princípio da incerteza pode ser interpretado como, quanto mais de perto tentarmos olhar ou sentir uma pequena partícula, mais difusa se toma a visão. Para o elétron somos forçados a concluir que qualquer retrato físico ou qualquer modelo mental da estrutura eletrônica do átomo não poderá ser precisa em localizar o elétron e descrever o seu movimento. (RUSSEL, 2006, p. 264).
Em outras palavras, nenhum equipamento pode “sentir” ou “ver” um elétron sem influenciar no seu movimento.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
1.5 OS NÍVEIS ELETRÔNICOS DE ENERGIA Até o presente momento vimos que o átomo é a menor partícula possível de um elemento. Ele possui prótons, nêutrons e elétrons. Além disso, move-se descrevendo uma trajetória ao redor de seu núcleo, como a terra faz em torno do sol. Entretanto, como poderíamos organizar vários elétrons em um átomo? Eles giram de maneira aleatória ou seguem alguma direção? É isso o que vamos ver agora! Embora o princípio da incerteza diz que não podemos apontar onde está exatamente o elétron dos átomos, é possível matematicamente prever a região onde existe a maior probabilidade de encontrá-lo. Essa região é chamada de orbitais moleculares. Tente imaginar os orbitais simplesmente como níveis de energia. Você se recorda da analogia do átomo com o estádio de futebol? Pois é, por ela, podemos dizer que quanto mais perto do gramado menor será a camada orbital, certo? “Cada orbital no átomo irá acomodar no máximo dois elétrons e, quando dois elétrons ocupam o mesmo orbital, são ditos emparelhados.” (RUSSEL, 2008, p. 265). Agora vamos aprender uma nova forma de representar elétrons em átomos. Esquematicamente, os orbitais serão representados por pequenos quadrados . Um elétron em um orbital é representado por uma seta, orientada para cima ↑ ou para baixo ↓. Dessa forma, o único elétron do átomo de hidrogênio é representado por: ↑ . Por exemplo, o átomo de Hélio tem dois elétrons, ou seja, ↑↓ . Subcamadas: Os orbitais de um átomo são agrupados em conjuntos chamados de subcamadas. Em átomos no seu estado fundamental, quatro tipos de subcamadas são ocupadas por elétrons, designadas por s, p, d e f, que consistem em 1, 3, 5 e 7 orbitais, respectivamente. (RUSSEL, 2006, p. 269).
s= p=
f=
. .
.
.
d=
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
Já que cada orbital pode receber 2 elétrons, isso significa que a subcamada “s” pode receber no máximo 2 elétrons. Já as subcamadas seguintes: p 6, d 10 e f 14. Lembre-se: as subcamadas formam as camadas, correspondendo assim um conjunto de níveis de energia. Os elétrons de determinada camada estão a uma mesma distância média do núcleo atômico. A identificação de cada camada pode ser feita por valores inteiros positivos: 1, 2, 3, 4 etc., correspondentes ao número quântico principal “n”, sendo n = 1 a camada mais próxima do núcleo. Também se utilizam letras (K, L, M, N...): K para n = 1, L para n = 2, e assim por diante. Por fim, o spin eletrônico é uma propriedade dos elétrons. De acordo com os princípios da física, qualquer partícula com carga, ou com spin eletrônico, tem um momento magnético. Isso significa que ela atua como se fosse um pequeno ímã.
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AULA 1 – ESTRUTURA ATÔMICA
Se uma partícula com um elétron não emparelhado atravessa um campo magnético, uma força é exercida sobre ela e a trajetória da partícula será alterada. Este comportamento é chamado paramagnetismo. Quando dois elétrons estão ocupando o um mesmo orbital (ex. átomo de hélio), seus spins estão em direções opostas, havendo assim uma compensação de forças magnéticas. Nesse caso, não haverá efeito de atração pelo campo magnético. Assim, os resultados podem ser utilizados na determinação do número de elétrons desemparelhados na substância. Por acaso, você já percebeu qual são as substâncias que geralmente respondem a ímãs? Se você respondeu metais, parabéns! Com as informações que obtivemos até aqui, podemos realizar distribuições eletrônicas em diversos átomos. Iniciaremos pelo Lítio (3Li). Esse átomo possui número atômico 3, ou seja, 3 elétrons. Utilizando o diagrama de Pauling e os conceitos obtidos na aula, podemos fazer a distribuição eletrônica para esse átomo, certo?
Figura 6 - Representação do diagrama de distribuição de elétrons de Linus Pauling. Fonte: RUSSEL (2006, p. 283).
Vamos iniciar o processo seguindo a seta no orbital 1s, de menor energia. O orbital 1s tem capacidade para 2 elétrons. Na sequência avançamos para o orbital 2s, que também pode receber 2 elétrons. Mas como o lítio possui apenas 3, no total a distribuição ficará assim: [Li] = 1s2 2s1 ou [Li] = 1s2 ↑↓ 2s1 ↑ .
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Podemos afirmar, a partir da distribuição de elétrons, que o lítio é um átomo paramagnético, pois possuem um elétron sozinho no orbital 2s. Agora vejamos como fazer a distribuição eletrônica de um átomo maior, por exemplo, o silício (14Si). Como percebemos, ele possui 14 elétrons. Utilizando o diagrama de Pauling, a distribuição será: [Si] = 1s2 2s2 2p6 3s2 3p2 ou [Si] = 1s2 ↑↓ , 2s2 ↑↓ , 2p6 ↑↓ ↑↓ ↑↓ , 3s2 ↑↓ , 3p2 ↑
,
Sozinho, tente realizar a distribuição eletrônica do alumínio (13Al) e cobalto (26Co). Utilizando o diagrama de Pauling você verá que distribuir elétrons em um átomo é bem mais fácil do que se pode imaginar.
CONCLUSÃO Na presente aula, esperamos que você tenha obtido uma ideia da estrutura atômica e das principais teorias sobre o átomo. Além disso, que consiga fazer a distribuição eletrônica. Essa introdução à Química é muito importante para entender as transformações que ocorrem ao nosso redor e, também, em nosso dia a dia.
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AULA 2 Propriedades Periódicas
INTRODUÇÃO Ao longo da história da ciência, buscou-se periodicidade nos mais diversos fenômenos da natureza, em especial na regularidade das propriedades físicas e químicas dos elementos químicos. Atualmente, na tabela periódica, tais elementos são organizados em ordem crescente de número atômico. Além disso, há um padrão que pode ser observado em suas propriedades. Nesta aula, vamos estudar a organização da tabela periódica e entender como essa classificação se manifesta.
OBJETIVOS » » Ser capaz de reconhecer a organização da tabela periódica. » » Adquirir conhecimentos sobre as principais famílias de elementos.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » Compreender a origem das propriedades periódicas. » » Distinguir raio atômico de raio iônico. » » Entender o conceito de energia de ionização. » » Perceber como ocorre o efeito de afinidade eletrônica. » » Reconhecer as relações diagonais presentes na tabela periódica.
2.1 CLASSIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS No arranjo de elementos na tabela periódica moderna, estes formam famílias, as quais possuem propriedades semelhantes e são distribuídas em colunas verticais chamadas de grupos, conforme pode ser visualizado na figura a seguir. Os grupos são numerados de um a 18. Aqueles que possuem colunas mais altas são chamados de grupos principais. Na região central, estão os grupos menores, conhecidos como elementos de transição. O grupo 12 é uma exceção, pois seus elementos fazem parte da família dos metais, devido à sua origem eletrônica. As linhas horizontais são conhecidas como períodos e podem ser enumeradas de um a sete. As grandes regiões da tabela são denominadas blocos, de acordo com sua estrutura atômica, ou seja, a distribuição eletrônica de cada elemento (classificados como s, p, d e f).
Figura 7 - Estrutura da tabela periódica. Fonte: <http://www.clickescolar.com.br/tabela-periodica.htm>.
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AULA 2 – PROPRIEDADES PERIÓDICAS
2.1.1 Os elementos do grupo principal Você sabia que algumas famílias que constituem o grupo principal possuem nomes especiais? Pois é, a primeira delas são os metais alcalinos, conhecidos como Grupo 1. Os elementos que fazem parte dessa família são “[...] todos os metais macios e brilhantes que se fundem em temperaturas baixas” (ATKINS, 2006, p. 45). Os metais alcalinos podem ser encontrados com facilidade na forma de bases, ou seja, possuem propriedades alcalinas e reagem de forma rigorosa com a água, produzindo gás hidrogênio e calor. Fazem parte desse grupo: lítio (Li), sódio (Na), potássio (K), rubídio (Rb), césio (Cs) e frâncio (Fr).
Figura 8 - Reação entre o sódio e a água. Fonte: <http://www.brasilescola.com/quimica/reatividade-dos-metais-com-agua-bases.htm>.
O sódio e o potássio são comuns a todos os organismos vivos, atuando na manutenção do potencial elétrico da célula através da bomba de sódio-potássio. Tal processo está intimamente ligado à contração muscular e propagação de impulsos nervosos.
Ainda do lado esquerdo da tabela, podemos encontrar o Grupo 2, que são nomeados como metais alcalinos terrosos, pois seus óxidos eram chamados de terra e, assim como os elementos do Grupo 1, têm propriedades alcalinas. Os elementos do Grupo 2 são sólidos, coloridos e apresentam baixa densidade. Por exemplo, o cálcio, que é essencial para a dieta humana, atuando na construção dos ossos e dos dentes, em especial na infância, e na manutenção da saúde óssea. Do lado direito da tabela, no Grupo 17, estão os halogênios – flúor (F), cloro (Cl), bromo (Br), iodo (I) e astato (At) –, os quais possuem diferentes estados de agregação, sendo o “[...] flúor um gás quase incolor, o cloro um gás amarelo, o bromo um líquido de aspecto avermelhado e o iodo um sólido roxo” (ATKINS, 2006, p. 45).
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 9 - Frascos contendo os halogênios cloro (esquerda), bromo (centro) e iodo (direita). Fonte: Atkins (2006, p. 45).
Vizinhos aos halogênios estão os gases nobres – hélio (He), neônio (Ne), argônio (Ar), criptônio (Kr), xenônio (Xe) e radônio (Rn) –, assim chamados por serem quimicamente neutros, reagindo com pouquíssimos elementos. Essa característica de neutralidade tem origem eletrônica, pois a última camada na distribuição eletrônica desses gases (ns2np6) está completa.
2.1.2 Os metais de transição Os elementos que fazem parte do bloco d são todos metais, e suas propriedades são intermediárias entre os elementos do bloco s e do bloco p, portanto o nome metais de transição (exceto o Grupo 12). Em geral, os metais possuem propriedades semelhantes, como alto ponto de fusão e condução de calor e eletricidade. Além disso, eles são maleáveis e dúcteis (podem ser manuseados como fios). Todos são sólidos na temperatura ambiente, com exceção do mercúrio, que é líquido. Uma característica interessante desses metais é a capacidade em formar ligas entre si, o que é muito utilizado nas indústrias químicas e siderúrgicas.
Os metais estão presentes no nosso cotidiano. Por exemplo: a liga entre cobre e estanho, a qual forma o bronze presente nas moedas, conforme figura a seguir.
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AULA 2 – PROPRIEDADES PERIÓDICAS
Figura 10 - Moedas de bronze. Fonte: <http://www.infoescola.com/quimica/bronze/>.
Na parte inferior da tabela, estão localizados os lantanídeos e os actinídeos, ambos conhecidos como metais de transição interna – esses elementos pertencem ao bloco f e são encontrados na crosta terrestre.
Acesse o site: <http://www.ptable.com/>.
2.1.3 O átomo de hidrogênio O elemento mais abundante no universo é o hidrogênio. Ele é a principal fonte de combustível para a queima de estrelas, como o Sol. No nosso planeta, ele é encontrado naturalmente na forma de gás H2, o qual é inflamável, inodoro e incolor. Geralmente, o hidrogênio é posicionado acima do lítio na tabela periódica. Isso porque ele possui apenas um elétron na camada de valência. Porém, como as propriedades do hidrogênio não são semelhantes às de outros elementos, ele pode aparecer isoladamente na parte superior.
Figura 11 - O sol utiliza hidrogênio como principal fonte de combustível. Fonte: <http://www.observatorio.ufmg.br/dicas08.htm>.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Todas as estrelas existentes utilizam, ou já utilizaram, hidrogênio para a manutenção de sua vida. As estrelas utilizam a fusão nuclear de átomos de hidrogênio para gerar diversos tipos de energia, incluindo o calor. A quantidade de energia produzida nessa reação é tão grande que muitos cientistas acreditam em seu potencial para a geração de uma energia limpa.
2.2 PROPRIEDADES PERIÓDICAS Até agora vimos como a tabela periódica é estruturada, mas você deve estar se perguntando: como essa classificação reflete nas propriedades? E qual a origem das propriedades periódicas? A resposta para essas perguntas está na periodicidade da configuração eletrônica, adotada por cada átomo à medida que aumenta o número atômico. O átomo de hidrogênio (H), por exemplo, possui configuração ns1, assim como os átomos pertencentes do Grupo 1. Já a configuração ns2 é adotada pelos metais alcalinos terrosos e pelo hélio (He), localizado no primeiro período da coluna 18. A cada período, uma nova camada é ocupada na distribuição. Assim, como ocorre variação periódica na configuração eletrônica, também há variação nas propriedades físicas e químicas dos elementos.
2.2.1 Carga Nuclear Efetiva Para compreendermos as variações das propriedades periódicas, é necessário primeiro entender o conceito de carga nuclear efetiva, pois ela influencia diretamente nas outras propriedades periódicas. Na primeira aula, vimos que o núcleo do átomo contém partículas positivas (prótons) e, em torno dele, partículas negativamente carregadas (elétrons). Essas cargas (positivas e negativas) exercem atração entre si no átomo, ou seja, uma força atrativa entre os prótons e os elétrons. Imagine um átomo de hidrogênio (H). A sua configuração eletrônica é 1s1, ou seja, com um próton no núcleo. Como ele possui apenas um elétron, este consegue sentir toda a atração gerada pelo núcleo, denominada Z. Veja uma representação desse sistema utilizando o modelo de Bohr.
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AULA 2 – PROPRIEDADES PERIÓDICAS
Figura 12 - Átomo de hidrogênio utilizando o modelo de Bohr. Fonte: <http://qnint.sbq.org.br/qni/visualizarConceito.php?idConceito=37>.
Agora imagine um átomo de hélio (He), com configuração eletrônica 1s2. Ele possui dois prótons em seu núcleo, cada um com carga +1, e dois elétrons, cada um com carga -1, em sua camada eletrônica. Sabendo dessa composição, você esperaria que esses elétrons também sentissem a atração total em relação ao núcleo, afinal eles estão no mesmo orbital. Entretanto, isso não ocorre. Isso porque, mesmo estando no mesmo orbital, as duas cargas negativas próximas irão se repelir, diminuindo a atração que ambas sentem pelo núcleo. Os elétrons, pertencentes às camadas mais exteriores, sofrem uma menor atração do núcleo, pois os elétrons de camadas internas exercem um efeito de blindagem. Esse efeito de blindagem é decorrente da nuvem gerada pelo movimento dos elétrons. Isto é, como eles possuem carga negativa, essa nuvem também possui uma densidade negativa, e isso acaba repelindo os elétrons de camadas mais externas, que também tendem a se aproximar do núcleo. Como a atração entre cargas é dependente da distância entre elas, a atração entre o núcleo e as camadas externas tende a ser comprometida pela repulsão entre os elétrons. Isto é, a distância é maior entre a camada eletrônica e o núcleo do que entre as camadas eletrônicas. Assim, a atração entre o núcleo e as camadas externas se torna mais fraca (blindada) em relação ao que deveria ser, caso não houvesse a repulsão entre elétrons. Essa atração mais fraca é denominada carga nuclear efetiva (Zef), e representa a atração real sentida pelo elétron a que estamos nos referindo. A figura a seguir demonstra a Zef sentida pelo elétron mais externo em um átomo de sódio. Perceba que todos os elétrons das camadas um e dois blindam a carga sentida pelo elétron no orbital 3s1.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 13 - Carga nuclear efetiva para o sódio. Fonte: <http://qnint.sbq.org.br/qni/visualizarConceito.php?idConceito=37>.
A combinação desses fatores eletrostáticos influencia fortemente nas propriedades periódicas, como veremos a seguir.
2.2.2 Raio atômico e raio iônico Quanto mede um átomo? Medir o tamanho do átomo não é uma tarefa fácil, pois não existem fronteiras bem definidas sobre o alcance da nuvem de elétrons. Assim, o tamanho do átomo pode ser expresso em termos de raio atômico, ou seja, “[...] metade da distância entre dois núcleos em dois átomos adjacentes” (RAYMOND, 2007, p. 245), conforme figura seguinte.
Figura 14 - Raio atômico. Fonte: <http://www.iq.ufrgs.br/ead/biologiamarinha/raio_atomico.htm>
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AULA 2 – PROPRIEDADES PERIÓDICAS
Se o elemento em questão é um metal, o raio atômico pode ser medido por meio de uma amostra sólida e calculado como a metade da distância entre os núcleos dos átomos vizinhos. Porém, se o elemento não for metal, pode ser usada a distância dos núcleos de átomos iguais quando estão fazendo uma ligação química entre si. Para um elemento gasoso, é utilizado o raio de Van der Waals, ou seja, “[...] a metade da distância entre os centros de átomos vizinhos em uma amostra do gás sólido” (ATKINS, 2006, p. 147). Lembre-se de que o tamanho dos átomos está relacionado com diversas propriedades físicas, como o ponto de fusão, o ponto de ebulição e a densidade.
Figura 15 - Raios atômicos de alguns elementos. Fonte: Raymond (2007, p. 246).
O raio atômico é uma consequência direta da carga nuclear efetiva. Conforme descemos em um grupo, os elétrons ocupam uma camada mais externa que no período anterior, e a carga nuclear efetiva que atua sobre eles é mais fraca. Com isso, a repulsão entre elétrons atua de maneira mais pronunciada, fazendo com que eles se afastem o necessário para serem estáveis, aumentando o raio atômico. Já em um período, os elétrons de valência estão todos na mesma camada. Por esse motivo, a distância entre esses elétrons e o núcleo é igual. Porém, a blindagem da carga nuclear gerada pelos demais elétrons não é muito eficiente, fazendo com que os elétrons adicionados ao longo do período sejam 29
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
fortemente atraídos pelo núcleo (lembre-se de que, ao longo do período, um próton – carga positiva – é adicionado ao núcleo). Como a blindagem é pouco eficiente, a atração causada pelo próton extra é maior que a repulsão gerada pelo elétron extra, fazendo, assim, com que os elétrons se aproximem do núcleo e, como consequência, o raio atômico diminua ao longo de um período. Note, na figura anterior, que o raio atômico do flúor (F) é menor que o do sódio (Na), e este, menor do que o do césio (Cs). Em uma simples definição, o raio iônico é observado em um íon (cátion ou ânion). Quando um átomo neutro perde um ou mais elétrons e se torna um cátion, o seu tamanho diminui devido à redução da repulsão entre os elétrons. Isso porque existe um número menor de cargas negativas se repelindo. Mas quando o átomo se torna um ânion, ou seja, recebe elétrons, o seu tamanho aumenta devido ao aumento da repulsão dos elétrons. A figura seguinte ilustra a comparação entre raio atômico e raio iônico.
Figura 16 - Comparação entre raio atômico (redução do tamanho do átomo devido à perda de elétron) e raio iônico (aumento do tamanho do átomo por receber elétron). Fonte: Adaptado de Raymond (2007, p. 248).
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AULA 2 – PROPRIEDADES PERIÓDICAS
2.2.3 Energia de ionização Quando um átomo recebe energia, um elétron pode ser promovido de uma camada de menor energia para uma de maior energia. Esse efeito é conhecido como excitação eletrônica. Se uma energia suficiente for fornecida ao átomo, um (ou mais) elétron(s) pode(m) ser completamente removido(s) de sua estrutura eletrônica, gerando uma espécie com carga positiva. “A ionização é o processo de formação de um íon positivo pela remoção de um elétron. A energia de ionização é a mínima energia necessária para remover um elétron de um átomo isolado, no seu estado fundamental.” (RUSSEL, 2008, p. 312). Lembre-se de que, quando falamos de um átomo isolado, isso significa que ele se encontra em seu estado gasoso e sem influência de qualquer átomo vizinho. Com base nessas definições, a energia de ionização seria a mínima necessária para realizar o processo a seguir. Y(g) → Y+(g) + e-(g)
Y(g) representa um elemento qualquer em seu estado gasoso (isolado).
Como mais de um elétron pode ser removido de um átomo, a energia necessária para remover o primeiro elétron é denominada como primeira energia de ionização. Logo, a segunda energia de ionização é a energia necessária para realizar o seguinte processo: Y(g) → Y2+(g) + e-(g) Assim, podemos ter a terceira, a quarta energia de ionização e assim por diante. Geralmente, a primeira energia de ionização é menor que a segunda, que é menor que a terceira etc. Isso se deve ao fato de que a ausência de um elétron diminui a repulsão entre as cargas negativas, deixando-as mais fortemente atraídas pelo núcleo atômico (uma carga nuclear efetiva maior). Este é o mesmo princípio que rege a diferença entre os raios atômicos. De acordo com a figura seguinte, a primeira energia de ionização para o sódio (Na) é menor que para o argônio (Ar). Tente relacionar essa diferença com a do raio atômico entre os dois elementos. Lembre-se: as energias de ionização são expressas em elétron-volt (Ev) por átomo, quilojoules por mol (kJ mol-1) ou quilocalorias por mol (kcal mol-1).
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 17 - Primeiras energias de ionização. Fonte: <http://plato.if.usp.br/1-2004/fnc0376n/WWW/tabela/tabela.html>.
Analisando a figura, novamente vemos a carga nuclear efetiva em ação. Conforme andamos em um período, ela se torna mais forte, dificultando a retirada de um elétron, sendo necessária uma maior energia para que esse processo ocorra. Ao descermos em um grupo, notamos a tendência inversa, pois a carga nuclear efetiva se torna menor ao aumentar o número de camadas eletrônicas do átomo. Apesar de a energia de ionização possuir uma periodicidade, algumas exceções aparecem. O alumínio (Z = 13), por exemplo, possui a primeira energia de ionização menor que o magnésio (Z = 12). Isso é explicado pelo fato do elétron a ser retirado do magnésio estar no orbital 3s, o qual está mais firmemente ligado ao núcleo do que o orbital 3p, em que se encontra o elétron a ser retirado no alumínio. Vale ressaltar que os elétrons mais facilmente removíveis de um átomo são aqueles que estão na camada de valência. Em outras palavras, aqueles com maior número quântico n. Um exemplo é a prata, em que o primeiro elétron a ser removido será o do orbital 5s, e não o do orbital 4d. Ag {[Kr]4d10 5s2} → Ag {[Kr]4d10 5s1 }+ eA primeira energia de ionização é maior para os elementos próximos do hélio e menor para os próximos do césio. Os metais são encontrados na parte inferior, à esquerda, da Tabela Periódica porque esses elementos possuem baixa energia de ionização e podem perder elétrons facilmente. (ATKINS, 2006, p. 151).
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AULA 2 – PROPRIEDADES PERIÓDICAS
2.1.4 Afinidade eletrônica Assim como um átomo pode perder um elétron e formar um íon positivo, ele também pode receber um elétron e formar um íon negativo. Quando isso acontece, a energia liberada pelo átomo isolado, em seu estado fundamental, é denominada afinidade eletrônica (Eea). Mais formalmente, a afinidade eletrônica pode ser definida utilizando o exemplo a seguir: Y(g)+ e- =Y-(g) De acordo com a definição apresentada, a energia para essa reação – a afinidade eletrônica – é expressa por: Eea = E(Y-)- E(Y) Assim, quanto maior a diferença de energia entre as duas espécies, mais energia é liberada pelo elemento Y ao receber um elétron e, por consequência, maior a afinidade eletrônica. Porém, alguns elementos não possuem tendência de receber um elétron, como os gases nobres, devido às suas propriedades eletrônicas. Isso porque eles necessitam de energia para que o átomo aceite um elétron extra. Nesse caso, a afinidade eletrônica (Eea) é negativa. Apesar de a sua variação ser menos periódica do que outras propriedades, é possível notar que as afinidades eletrônicas são maiores na parte superior direita da tabela periódica, próximo aos halogênios, devido ao aumento da carga nuclear efetiva, o que facilita a atração e estabilização do elétron adicionado.
2.3 AS RELAÇÕES DIAGONAIS Certamente, você deve ter vizinhos que possuem as mesmas afinidades, certo? Na tabela periódica, isso também ocorre. São o que chamamos de relações diagonais, ou seja, elementos que apresentam propriedades químicas semelhantes. Essas relações diagonais ocorrem no grupo principal e podem ser explicadas pela proximidade na densidade de carga gerada nos cátions. Veja:
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 18 - Relações diagonais entre os pares de grupos distintos. Fonte: Atkins (2006, p. 151).
CONCLUSÃO Os conhecimentos adquiridos nesta aula são a base para explorar o universo dos elementos químicos. O conteúdo apresentado será primordial para a compreensão de muitas áreas do conhecimento, como a biologia e a engenharia. Esperamos que você, além de ter aprendido sobre os elementos e suas propriedades, tenha desfrutado do mundo dos átomos, pois, afinal, também somos feitos por eles. Até mais!
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AULA 3 Ligações Químicas, Forças Intermoleculares e Tipos de Sólidos INTRODUÇÃO Como vimos anteriormente, a matéria é formada por diversos tipos de átomos. Entretanto, é fácil notar que eles não estão “soltos” ao nosso redor. Caso contrário, todos os materiais que conhecemos simplesmente “desmontariam” até o nível atômico. A coesão que percebemos em tudo o que nos cerca é devida às ligações químicas existentes entre os átomos, e as características dessas ligações dependem das características dos átomos envolvidos, como o raio atômico, a energia de ionização, a afinidade eletrônica e uma nova propriedade, denominada eletronegatividade. Nesta aula, aprenderemos sobre os diferentes tipos de ligação existentes e algumas características de cada uma, além de fatores que influenciam a formação de um tipo de ligação em preferência a outro. Veremos, também, como representar essas ligações e alguns conceitos utilizados para entendê-las.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
OBJETIVOS » » Conhecer os tipos de ligação química. » » Aprender a representar estruturas químicas utilizando estruturas de Lewis. » » Compreender o conceito de eletronegatividade, hibridização e teoria do orbital molecular. » » Entender as características de alguns tipos de sólido. » » Realizar o ciclo de Born-Haber.
3.1 LIGAÇÃO QUÍMICA A junção de dois átomos é denominada ligação química. Ela irá ocorrer se os átomos possuírem menor energia quando ligados entre si do que isolados – efeito gerado pela redistribuição dos elétrons de cada átomo quando ligados. Os elétrons participantes de uma ligação química são os elétrons de valência, aqueles que se encontram na camada mais afastada do núcleo, pois sofrem menos atração do núcleo. Existem três tipos principais de ligação química: ligação iônica, ligação covalente e ligação metálica. É importante ressaltar que, embora sejam tratadas individualmente, ligações iônicas e covalentes são extremos opostos. A maioria das ligações existentes é intermediária entre esses extremos, possuindo maior caráter iônico ou covalente.
3.1.1 Ligação iônica O ponto principal de uma ligação iônica é a atração eletrostática (atração entre cargas) existente entre os átomos que formam a ligação. Dito isso, é possível perceber que os átomos ligados devem possuir cargas opostas e a estabilidade da ligação dependerá de quão forte é essa atração.
3.1.2 Formação de ligações iônicas Para formarmos uma ligação iônica, precisamos de cargas opostas. Isso significa que teremos um cátion (íon positivo) e um ânion (íon negativo) participando da ligação. Um caso simples de analisar é a formação de cloreto de sódio (sal de cozinha) a partir de um átomo de sódio e um de cloro. Como a energia de ionização do sódio é menor, um cátion é gerado mais facilmente a partir do sódio. Confira: Na(g) → Na+(g) + e- Energia de ionização = 494 kJ.mol-1 O cloro possui maior afinidade eletrônica que o sódio. Por isso, ele é mais apto a receber um elétron. Veja: Cl(g) + e- → CL-(g) + e- Afinidade eletrônica = 349 kJ.mol-1 Fazendo o balanço de energia dessas reações, a energia liberada pelo cloro ao receber um elétron é 145 kJ.mol-1 menor do que a necessária para retirar um elétron do sódio. Isso significa que o NaCl teria uma energia 145 kJ.mol-1 maior que os átomos separados, então essa ligação não deveria ocorrer.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Lembre-se: uma ligação química só ocorre quando os átomos possuem energia menor ligados do que quando isolados.
Experimentalmente, a formação de cloreto de sódio sólido a partir de Na(g) e Cl(g) tende a liberar 787 kJ.mol-1 de energia – mais que suficiente para suprir o déficit de energia para remover um elétron do sódio. Isso torna a composição mais estável. Mas você deve estar se perguntando: De onde vem essa energia liberada? A resposta é simples: vem da atração eletrostática (coulômbica) entre os íons de cargas opostas presentes no sólido formado. “Essa força de atração eletrostática é conhecida como ligação iônica.” (RUSSELL, 2008, vol. 1, p. 343). Embora não seja o único fator envolvido, o decréscimo da energia de um sistema é um fator importante para que um processo ocorra. Apesar de parecerem processos separados, a perda de elétrons por um átomo e ganho por outro são processos complementares. Isto é, o elétron perdido pelo sódio é ganho pelo cloro. Veja: A energia necessária para a formação de ligações iônicas é fornecida, em sua maior parte, pela atração coulômbica entre íons de cargas opostas. O modelo iônico é uma boa descrição da ligação entre não-metais e metais, particularmente no caso dos metais do blocos. (ATKINS, 2006, p. 165). 3.1.3 Estrutura de Lewis
Agora que você já sabe o que é uma ligação iônica, a questão é: como representá-la? Em 1916, o químico G. N. Lewis desenvolveu um método para representar os elétrons em íons, átomos e moléculas. Essas estruturas são hoje conhecidas como estruturas de Lewis. A estrutura de Lewis consiste no símbolo do elemento químico rodeado por um número de pontos equivalente aos elétrons em sua camada de valência. Por exemplo, o sódio possui um elétron em sua camada de valência e é representado na forma a seguir. [Na] = 1s22s22p63s1 = Na. Já o oxigênio possui seis elétrons na camada de valência e é representado por: [O] = 1s22s22p4 = O Note que, para a representação do oxigênio, alguns pontos estão agrupados. Nas estruturas de Lewis, pontos isolados representam elétrons isolados em seu orbital, e um par de pontos representa elétrons emparelhados que compartilham o mesmo orbital. No oxigênio temos dois pares de elétrons emparelhados e dois elétrons desemparelhados. Veja: [O] = 1s2 ↑↓ , 2s2 ↑↓ , 2p4 ↑↓ ↑ ↑ = O
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
3.1.4 Estrutura de Lewis para Íons Antes de utilizar as estruturas de Lewis para representar um composto como o cloreto de sódio, é necessário aprender a representar a estrutura de Lewis para ânions e cátions. Lembre-se da aula 2, na qual você aprendeu que os gases nobres possuem uma energia de ionização muito alta se comparados aos elementos de seu período. Isso porque eles são muito estáveis devido à sua configuração eletrônica. Ou seja, o hélio possui uma configuração eletrônica 2s2, e os demais gases nobres, uma configuração ns2np6. “A configuração ns2np6 é chamada octeto porque consiste em um total de oito elétrons, e a generalização desta configuração de especial estabilidade é conhecida por regra do octeto.” (RUSSELL, 2008, vol. 1, p. 304). A configuração para o hélio é chamada de dublete por possuir apenas dois elétrons. Essas configurações de gases nobres também são chamadas de “camada fechada”. Devido à estabilidade dessas configurações, vários átomos tendem a reagir para assumir uma configuração eletrônica de gás nobre – ganhando ou perdendo elétrons de acordo com a sua posição na tabela periódica. Consideremos um não metal. Como esses elementos possuem seu orbital nd quase completo, sua tendência é ganhar elétrons para completar seu octeto. O resultado é um ânion, cuja configuração eletrônica é idêntica à de um gás nobre. Um exemplo é o bromo (Br), cuja configuração eletrônica é dada a seguir: [Br] = 1s22s22p63s23p64s24p5 Como podemos notar, apenas um elétron é necessário para o Br completar seu octeto, e ele o ganha para formar o íon brometo. Br(g) + e- Br-(g) (1s22s22p63s23p64s24p6) Veja que, agora, o íon brometo possui uma configuração eletrônica idêntica à do criptônio, gás nobre que sucede o bromo na tabela periódica. Devido a essa igualdade eletrônica, dizemos que o íon brometo e o átomo de criptônio são isoeletrônicos. Utilizando as estruturas de Lewis, o processo a supracitado é representado da seguinte forma:
Br + e = Br Perceba que o sinal negativo indica a carga que o íon possui, e os colchetes servem para separar os pontos do sinal negativo.
Os colchetes sempre devem ser colocados nesse tipo de representação, e o sinal negativo é sempre colocado fora dos colchetes.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Vamos agora considerar os metais, principalmente os dos grupos 1 e 2. Tipicamente, um metal possui baixa energia de ionização e poucos elétrons em sua camada de valência; duas propriedades que facilitam a formação de cátions a partir desses elementos. Eles tendem a perder elétrons para adquirir uma configuração de gás nobre. Por exemplo: Note que, na forma de cátion, o potássio é isoeletrônico ao argônio. Como o cátion fica sem elétrons em uma camada que não a do octeto, ele é representado sem pontos ao redor do símbolo e com um sinal de positivo, como mostrado a seguir. K. = K+ + e-
3.1.5 Estruturas de Lewis para compostos iônicos A estrutura de Lewis para um composto iônico consiste na junção da estrutura de Lewis dos ânions que constituem o composto. Veja a seguir a estrutura do brometo de lítio:
LiLi
+
Br
A notação mostra que, nesse composto, a proporção entre os íons é de 1:1. Existem compostos que necessitam de uma proporção diferente entre os íons. Tais como: Ca 2 Cl Ca2+ 2+2
Como o cálcio (Ca) precisa perder dois elétrons para completar seu octeto e o cloro (Cl) precisa receber apenas um, o composto assume uma proporção de 1:2 entre o cálcio e o cloro. Por isso, a regra do octeto se torna uma ferramenta útil para se chegar à fórmula empírica de um composto, pois a soma de cargas entre cátions e ânions deve ser zero e, para se chegar a isso, basta descobrir a proporção adequada entre eles. É importante destacar que muitos metais, inclusive os do bloco p (Ga, Sn, Pb etc.), podem perder um número variável de elétrons e formar compostos diferentes, como o óxido de estanho (II), SnO, e o óxido de estanho (IV), SnO2 – o número entre parênteses indica quantos elétrons foram perdidos pelo metal. A possibilidade de um elemento formar diversos íons é chamada de valência variável.
3.1.6 Ligação Covalente Apesar de a ligação iônica explicar bem a ligação entre metais e não metais, as ligações entre não metais desconcertava os cientistas da época de Lewis. Naquela época, não havia o conhecimento sobre a natureza do átomo e das partículas nucleares como temos hoje – a física quântica e os conceitos de orbitais não existiam. Nesse contexto, Lewis propôs um tipo de ligação na qual um par de elétrons era compartilhado entre os átomos. Ela foi chamada de ligação covalente. Assim como nas ligações iônicas, uma ligação covalente só irá ocorrer caso os elementos fiquem mais estáveis quando ligados do que quando isolados. A grande diferença da ligação covalente para a ligação iônica é que não há perda nem ganho de elétrons por nenhuma das espécies – os elétrons são compartilhados pelos átomos para que cada um complete seu octeto. Veja a seguir as estruturas de Lewis para alguns compostos com ligações covalentes.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
H
H N
H
O H
H
H
H Amônia
C H
Água
amônia
H
água
H
C
Etano etano
H
Figura 19 - Estrutura de Lewis com ligações covalentes. Fonte: Londero (2014).
Note que, agora, os átomos são ligados por um traço, que é a representação da ligação covalente, e que os elétrons da camada de valência que não fazem parte da ligação são representados da mesma forma que nas estruturas para uma ligação iônica.
3.1.7 Estrutura de Lewis para espécies poliatômicas Como mostrado para os compostos iônicos, as estruturas de Lewis podem ser utilizadas para representar moléculas covalentes que são constituídas por mais que dois átomos. Para escrever uma estrutura de Lewis, precisamos saber quais átomos estão ligados entre si. Uma boa regra é escolher como átomo central aquele com menor energia de ionização. Por exemplo, no metano (CH4), o átomo central é o carbono, ligado a quatro átomos de hidrogênio. Veja:
H H
C
H
H Metano metano Figura 20 - Estrutura de Lewis do metano. Fonte: Londero (2014).
Agora, podemos juntar as estruturas de Lewis de compostos iônicos e covalentes para montar a estrutura de compostos mais complexos. Vamos usar como exemplo o sulfato de amônio (NH4)2SO4. Sua estrutura é representada conforme a figura a seguir. H H
N H
2-
O H
O
S
O
H H
O Figura 21 - Estrutura de Lewis do sulfato de amônio. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 172).
40
N H
H
AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Repare que essa estrutura é composta de três íons entre colchetes, cada um formado por uma molécula covalente. Se você olhar atentamente, notará que o enxofre (S) faz mais ligações do que o necessário para completar o seu octeto – ele necessitaria de apenas duas ligações, mas está fazendo seis! Esse é um caso, assim como muitos outros, que fogem à regra do octeto, como veremos no próximo tópico.
3.1.8 Exceções à regra do octeto A regra do octeto consegue explicar a valência de vários elementos, como o carbono, o flúor e o nitrogênio. Entretanto, outros elementos, como o enxofre, podem acomodar mais de oito elétrons na camada de valência. Elementos com essa característica acomodam elétrons extras àqueles necessários para completar seu octeto em orbitais nd vazios, em que podem acomodar mais elétrons e, por isso, fazer mais ligações. Como eles expandem sua camada de valência para fazer novas ligações, essa exceção é chamada de camada de valência expandida. Se um composto possui um átomo fazendo mais ligações do que o permitido pela regra do octeto, ele é dito um composto hipervalente. Elementos que podem expandir sua camada de valência geralmente apresentam valência variável, pois podem fazer um número diferente de ligações covalentes, dependendo do composto. Veja um exemplo em que o fósforo (P) faz um número diferente de ligações em diferentes compostos. Cl Cl
P
Cl Cl
Tricloreto de fósforo, PCl3
Cl
Cl
P
Cl
Cl
Cl Cl
Cl
P Cl
Cl
P Cl
Pentacloreto de fósforo, PCl5
Tetracloreto de fósforo, PCl4
Cl
Cl
Cl Cl
Hexacloreto de fósforo, PCl6
Figura 22 - Estruturas de compostos de fósforo com valência variável. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 179).
3.1.9 Ressonância Para entender o conceito de ressonância, considere o exemplo a seguir. O O
N
O
Figura 23 - Estrutura aceita por um período de tempo para o íon nitrato (NO3-). Fonte: Londero (2014). 41
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Experimentalmente, foi determinado que todas as ligações entre o nitrogênio e os três átomos de oxigênio possuem o mesmo comprimento. Isso parece estranho, não? Afinal de contas, como são tipos diferentes de ligação – uma ligação dupla e duas ligações simples – eles deveriam ter comprimentos diferentes. Então, observe as estruturas: O O
O
N
O
O
N
O O
O
N
O
Figura 24 - Ressonância do nitrato. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 174).
Perceba que as três estruturas são idênticas. Porém, podemos alterar a posição das ligações sem alterar a posição dos átomos. A estrutura do nitrato foi, então, pensada como uma fusão entre essas três estruturas. Essa fusão de estruturas em que os átomos permanecem no mesmo lugar mas as ligações podem ser alteradas é chamada de ressonância e é representada por uma seta de duas pontas entre as estruturas. A estrutura resultante da ressonância é chamada de híbrido de ressonância. Nelas, os elétrons que podem ocupar diferentes posições são conhecidos como deslocalizados, pois não podem ser relacionados a um átomo específico, estão dispersos por vários átomos. Por esse motivo, a molécula real não oscila entre as várias estruturas, ela assume uma estrutura intermediária, que é a fusão de todas as que são viáveis. O acetato, proveniente do ácido acético (vinagre), também possui ressonância em uma parte da molécula. Veja a seguir: H
H
H
H C H
O C
C H
C O
O Figura 25 - Ressonância do acetato. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 175).
42
O
AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
3.1.10 Eletronegatividade Você viu que, em uma ligação covalente, o par de elétrons é compartilhado entre os átomos que participam da ligação. Isso não ocorre de maneira igual. Cada átomo exerce uma força de atração diferente em relação a esses elétrons compartilhados, ou seja, alguns elementos conseguem exercer uma atração maior do que outros. Essa atração depende da carga nuclear efetiva e da distância entre os núcleos e a camada de valência. A medida dessa atração é chamada de eletronegatividade, e é definida como “[...] a tendência relativa mostrada por um átomo ligado em atrair o par de elétrons” (RUSSELL, 2008, vol. 1, p. 370). Podemos pensar na eletronegatividade como um cabo-de-guerra entre os átomos, disputando o par de elétrons da ligação. Essa propriedade acaba gerando consequências importantes para a Química. Uma delas é a polarização de ligações covalentes.
Figura 26 - Eletronegatividade. Fonte: Atkins (2006, p. 182).
Quando átomos com diferentes eletronegatividades estão ligados, o átomo mais eletronegativo tende a atrair os elétrons para si, ficando com uma carga parcial (também referida como densidade de carga) negativa, enquanto o outro átomo fica com uma carga parcial positiva. Essas cargas são ditas parciais porque são provenientes de uma distorção da nuvem eletrônica da ligação, e não da transferência de um elétron. Quando essas cargas parciais são formadas, é dito que há um dipolo elétrico e que a ligação é polarizada. A medida da magnitude das cargas parciais é chamada de momento de dipolo elétrico, representado pela letra grega µ (mu) e quantificado em unidades denominadas debye (D).
A unidade debye (D) é uma homenagem ao químico holandês Peter Debye, que fez importantes estudos nessa área.
Na figura a seguir, você verá como representar as cargas parciais e o dipolo elétrico em uma molécula de HCl. O dipolo é representado por uma seta riscada, com a ponta indicando o átomo mais eletronegativo, e a carga parcial, pela letra grega δ (delta) seguida do sinal da carga.
43
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 27 - Momento de dipolo. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 182).
Você se lembra de que ligações iônicas e covalentes são extremos opostos nos tipos de ligação? Uma regra útil para se definir o tipo de ligação em uma molécula diz que, se a diferença de eletronegatividade entre os átomos for cerca de duas unidades, o caráter iônico da ligação é tão alto que é melhor considerá-la iônica. Para diferenças menores que 1,5 unidades, é seguro afirmar que a ligação é covalente. Em diferenças entre essas duas zonas, é necessária uma análise específica para cada caso. A figura seguinte mostra os valores de eletronegatividade de alguns átomos.
Figura 28 - Valores de eletronegatividade. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 183).
O que você viu até agora foi o suficiente para explicar muito do que se conhecia na Química e na Física por anos. Mas, na medida em que o átomo e suas ligações foram mais entendidos, teorias sofisticadas foram necessárias para explicar o que realmente acontece no “mundo atômico”.
44
AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
3.2 TEORIA DA LIGAÇÃO DE VALÊNCIA O modelo da ligação de valência (modelo VB, do inglês Valence-bond) foi proposto pelos cientistas Walter Heitler, Fritz London, John Slater e Linus Pauling no fim da década de 1920. Ele utilizava um modelo quantomecânico para descrever a distribuição dos elétrons nas ligações químicas e ultrapassava a teoria de Lewis. Esse modelo explica, de uma forma mais real, a formação dos tipos de ligações que vemos na química. A teoria de ligação de valência é baseada na suposição de que (1) os níveis eletrônicos de energia em um átomo (orbitais atômicos – OAs) são usados quando um átomo forma ligações com um ou mais átomos, e que (2) um par de elétrons ligados ocupa um orbital em cada um dos átomos simultaneamente. (RUSSELL, 2008, vol. 2, p. 328).
3.2.1 Ligações Sigma Vamos começar a explicação desse modelo com a ligação mais simples de todas: a ligação entre dois átomos de hidrogênio. Após o desenvolvimento da mecânica quântica, foi possível determinar a forma dos orbitais s, p, d e f das diversas camadas. Os orbitais s possuem forma esférica e, no hidrogênio, cada átomo possui um elétron em seus orbitais s. Conforme os átomos se aproximam, esses orbitais se aproximam até o ponto em que eles se sobrepõem. Uma ligação formada por essa sobreposição frontal de orbitais é chamada de ligação sigma (σ). Observe a figura:
Figura 29 - Formação da ligação sigma. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 208).
Veja as formas obtidas através de cálculos computacionais em: <http://ptable.com/#Orbital>.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Uma ligação sigma não ocorre somente entre orbitais s. Ela pode ocorrer pela sobreposição entre um orbital s e um orbital p, como no caso do fluoreto de hidrogênio (HF). O flúor possui um elétron desemparelhado em sua camada de valência (2p), o qual pode fazer uma ligação com o elétron no orbital 1s do hidrogênio. Observe:
Figura 30 - Ligação do fluoreto de hidrogênio. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 208-209).
Assim, se dois orbitais p puderem fazer uma sobreposição frontal, eles darão origem a uma ligação σ.
3.2.2 Ligação Pi Vamos analisar outro gás, o nitrogênio – N2. Cada átomo de nitrogênio precisa fazer três ligações para completar seu octeto e, de fato, nele os átomos estão ligados entre si por três ligações. Você deve estar pesando que, do mesmo modo que os casos anteriores, os orbitais dos átomos de nitrogênios irão simplesmente se sobrepor. Mas não é o que realmente acontece. Os três orbitais p, presentes nos átomos de nitrogênio, são perpendiculares entre si, isto é, se um deles se sobrepuser de uma maneira frontal, igual ao orbital p do flúor no HF, os outros dois orbitais p não poderão se sobrepor. A figura mostra a forma calculada para os orbitais p. Cada uma dessas formas, parecidas com uma gota, é chamada de lobo (leia “lóbo”). Veja que os orbitais p possuem dois lobos.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Figura 31 - Orbitais p com dois lobos cada. Fonte: <http://www.angelfire.com/falcon2/dirgni/p.jpg>.
O que acontece nesse caso é que dois orbitais, digamos o orbital 2pz em cada átomo, estão no mesmo plano e irão se sobrepor frontalmente, deixando os outros orbitais p (px e py) de um átomo paralelos ao seu análogo no outro átomo de nitrogênio (note que eles são perpendiculares entre si). Como esses quatro orbitais também possuem um elétron cada, eles conseguem interagir e se sobrepor lateralmente – veja a figura adiante. É importante ressaltar que, embora os dois lobos de cada orbital se sobreponham, existe apenas uma ligação.
Figura 32 - Ligação pi. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 209).
A ligação formada por essa interação lateral é chamada de ligação pi (π). Ela é mais fraca que uma ligação simples, pois a sobreposição é menor que a ocorrida em uma ligação sigma.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Uma ligação π só é formada se já existir uma ligação σ formada entre os átomos.
Com base nesses dois tipos de ligação, foi estabelecido um padrão de nomenclatura para as ligações covalentes: » » ligação simples: apenas uma ligação σ; » » ligação dupla: uma ligação σ mais uma ligação π; » » ligação tripla: uma ligação σ mais duas ligações π.
3.2.3 Hibridização dos orbitais O átomo de carbono possui quatro elétrons na camada de valência. Esses elétrons são distribuídos da seguinte maneira: 2s22p2. Como você viu anteriormente, os orbitais p são dispostos perpendicularmente uns aos outros. Por esse motivo, comumente nos referimos aos orbitais p explicitando o eixo no qual ele está disposto com um subscrito, da forma: px, py e pz. As letras x, y e z indicam o eixo sobre o qual cada orbital p se encontra disposto. O carbono, então, deveria fazer apenas duas ligações, por possuir apenas dois elétrons desemparelhados. Veja a configuração eletrônica do carbono na figura a seguir.
Figura 33 - Configuração do carbono. Fonte: Atkins (2006, p. 208).
Temos aqui um empasse: o carbono necessita fazer quatro ligações – e de fato as faz – para completar seu octeto, porém possui apenas dois desemparelhados para fazê-las. Foi proposto, então, promover um dos elétrons emparelhados do carbono para o orbital p vazio – isso possibilitaria as quatro ligações. Ao acontecer essa promoção, a configuração do carbono fica da seguinte maneira:
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Figura 34 - Hibridização sp3. Fonte: Atkins (2006, p. 210).
O caráter tetravalente do carbono deve-se à pequena energia de promoção de um elétron em um átomo de carbono. Ela é pequena porque um elétron 2s é transferido de um orbital que ele partilha com outro elétron para um orbital 2p vazio. Embora o elétron fique em um orbital de maior energia, ele sofre menos repulsão de outros elétrons do que antes da promoção. Como resultado, apenas uma pequena quantidade de energia é necessária para promover o elétron. (ATKINS, 2006, p. 210).
Como energia é liberada ao se formar uma ligação, quando o carbono se liga a quatro átomos de hidrogênio, ela é maior que a necessária para promover o elétron. Assim, a promoção pode ocorrer e a molécula final, com quatro ligações, é mais estável do que se o carbono fizesse apenas duas. Mas isso não explica os ângulos entre as ligações no metano. Experimentalmente, esses ângulos, chamados tetraédricos, são de 109,5°. De acordo com a nossa descrição para as ligações no metano, os átomos de hidrogênio se ligam a um orbital 2s e três orbitais 2p, o que implica que as três ligações formadas com os orbitais p deveriam possuir um ângulo de 90° entre si, o que não está de acordo com os dados experimentais. Para melhorar esse modelo, foi então proposto que, ao ocorrer a promoção do elétron do orbital s para o orbital p, todos os orbitais contendo um elétron se tornavam equivalentes. Essa equivalência foi denominada hibridização, e os orbitais que participam desse processo na molécula ficaram conhecidos como orbitais híbridos. Eles assumem uma forma intermediária entre um orbital s e um orbital p.
3.2.4 Hibridização sp3 Ao analisarmos a molécula de metano, vimos que o carbono utiliza quatro orbitais híbridos: um orbital s e três orbitais p. Como os orbitais resultantes são semelhantes, dizemos que eles são orbitais híbridos sp3, explicitando quais e quantos orbitais são utilizados na hibridização (podemos dizer, também, que o átomo de carbono na molécula de metano possui uma hibridização sp3). A forma dos orbitais sp3 é mostrada a seguir. Perceba que eles são parecidos com os orbitais p, entretanto um lobo é maior que o outro.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 35 - Forma dos orbitais sp3. Fonte: McMurry (2008, p. 13).
Mas, e a geometria da molécula? Agora que temos quatro orbitais equivalentes, os elétrons irão se distribuir no espaço de forma a ficarem mais estáveis. Como cada orbital possui dois elétrons, um par de elétrons tende a repelir os outros. Logo, a geometria mais estável é aquela em que as ligações fiquem mais afastadas entre si. Assim, formase um tetraedro, em que as ligações estão afastadas por um ângulo de 109,5°, apontando para os vértices.
Figura 36 - Ângulo do carbono no orbital sp3. Fonte: <http://www.chemistryland.com/CHM151S/09-CovalentBonds/Covalent.html>.
3.2.5 Hibridização sp2 O metano possui apenas ligações simples (σ), mas existem muitas moléculas que possuem ligações duplas. Pela definição que você viu anteriormente, uma ligação dupla necessita que dois orbitais p interajam lateralmente. Um exemplo é o eteno.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
H H C C H H eteno Eteno Figura 37 - Estrutura do eteno. Fonte: Londero (2014).
Como é necessário que dois orbitais p interajam lateralmente, eles não podem sofrer uma hibridização igual à que ocorre no metano – se tivéssemos dois átomos de carbono com hibridização sp3 ligados entre si, os orbitais resultantes não ficariam paralelos. As ligações simples no eteno possuem um ângulo de, aproximadamente, 120°. Nesse caso, ocorre uma hibridização entre o orbital s e dois orbitais p – uma hibridização sp2 (Veja a figura adiante). Quando isso acontece, os orbitais híbridos resultantes possuem um ângulo de 120° entre si, e o orbital p, que não participou da hibridização (dito um orbital “p puro”), se encontra perpendicular aos orbitais hibridizados.
Figura 38 - Hibridização sp2. Fonte: Atkins (2006, p. 214).
Como os orbitais “p puros” encontram-se perpendiculares aos orbitais híbridos, eles também ficam perpendiculares às ligações sigma formadas. Com essa geometria, os orbitais p ficam paralelos entre si e podem formar uma ligação π.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 39 - Ligação sp2. Fonte: McMurry (2008, p. 15-16).
3.2.6 Hibridização sp Um terceiro tipo de ligação que pode ocorrer é a ligação tripla. Um exemplo simples é o etino.
H C C H Etino etino Figura 40 - Estrutura do etino. Fonte: Londero (2014).
Ela segue os mesmos princípios que a ligação dupla, exceto que agora necessitamos de dois orbitais “p puros” para gerar as duas ligações π. Para atingirmos essa condição, apenas um orbital p e um orbital s são utilizados na hibridização – por isso hibridização sp (veja a figura hibridização sp).
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Figura 41 - Hibridização sp. Fonte: Atkins (2006, p. 214).
Nessa hibridização, os orbitais híbridos sp assumem uma geometria linear, com um ângulo de 180° entre eles.
Figura 42 - Ligação sp. Fonte: McMurry (2008, p. 18).
3.3 TEORIA DO ORBITAL MOLECULAR Mesmo após o advento da teoria da ligação de valência, alguns fenômenos continuavam sem explicação, principalmente aqueles envolvendo a formação de espécies deficientes de elétrons, as quais não deveriam ser estáveis a ponto de existir. Com o desenvolvimento das teorias da física quântica, vários estudos mostraram que o comportamento de um elétron em um átomo pode ser descrito por uma equação de onda. Essa equação de onda é chamada de função de onda ou orbital, representada pela letra grega psi (Ψ). De acordo com a teoria do orbital molecular, os orbitais que um átomo isolado possui são chamados de orbitais atômicos (também definidos por funções matemáticas). Quando uma ligação se forma, a função de onda que representa o orbital de cada átomo se une, gerando um novo orbital, denominado orbital molecular. Quando o orbital molecular é formado, os orbitais atômicos deixam de existir. Ou seja, “[...] a formação do orbital molecular acontece por uma combinação linear de orbitais atômicos (LCAO – linear combination of atomic orbitals)” (ATKINS, 2006, p. 218). Essas combinações acontecem de duas maneiras. Primeiro, pela combinação das funções de onda de maneira construtiva, isto é, quando elas se somam e geram um orbital de mais baixa energia em relação aos orbitais atômicos, denominado orbital ligante. Segundo, pela combinação das
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
funções de onda de maneira destrutiva, ao se subtraírem e gerarem um orbital de energia mais alta em relação aos orbitais atômicos, denominado orbital antiligante. Veja a figura a seguir.
Figura 43 - Orbital molecular. Fonte: Atkins (2006, p. 219).
3.4 SÓLIDOS Você viu as ligações entre átomos. Agora, você vai estudar como os átomos se agregam para formarem sólidos. Lembrando que diferentes tipos de sólidos utilizam modos distintos de ligação para permanecerem unidos.
3.4.1 Sólidos iônicos Como o próprio nome indica, esses sólidos são formados por compostos iônicos. Um bom exemplo é o cloreto de sódio, em que vários íons de sódio e cloreto são unidos por interações eletrostáticas. Veja a figura.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Figura 44 - Estrutura do cloreto de sódio. Fonte: <http://www.meuclub.net/cloreto-de-sodio-use-com-moderacao/>.
Nesses sólidos, íons de cargas opostas se encontram nos pontos reticulares com um íon ligado eletrostaticamente a todos os outros íons de cargas opostas à sua que o circundam, e não como pares de íons de cargas opostas. Imagine-os como vértices de um cubo ou outro sólido, como na figura a seguir.
Figura 45 - Pontos reticulares. Fonte: <http://www.alunosonline.com.br/quimica/ligacao-metalica.html>.
Como as ligações iônicas são fortes, é difícil rompê-las. Por esse motivo, sólidos iônicos são tipicamente duros (resistentes à quebra ou ao esmagamento). Porém, uma vez que a estrutura é danificada, eles se estilhaçam, ao invés de se deformarem. Quando uma força é aplicada a um sólido iônico, ela tende a deslocar uma camada de íons em relação à seguinte – veja a próxima figura. Como a ligação é forte, ela tende a resistir à quebra, mas, assim que ocorre o deslocamento, os íons de cargas semelhantes se repelem e ocorre a fratura. Esse ponto é atingido inesperadamente e o cristal racha ao longo do plano em que a força é aplicada. Tal processo é chamado de clivagem e é comum em sólidos iônicos.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 46 - Clivagem de um sólido. Fonte: Russell (2008, vol. 1, p. 458).
Sólidos iônicos geralmente possuem pontos de fusão baixos, são duros, quebradiços e possuem baixa condutividade de calor e eletricidade.
3.4.2 Sólidos metálicos Você sabia que os metais possuem uma tendência de perder elétrons e não de ganhá-los? Pois é! Mas como eles podem fazer uma ligação entre si? Em uma ligação metálica, os elétrons de valência não ficam fixos em um átomo. Eles se dispersam ao longo dos átomos metálicos envolvidos na ligação formada pela interação eletrostática entre esses elétrons e os átomos metálicos.
Uma ligação é considerada metálica quando todos os átomos que participam da ligação são metais. Podemos citar como exemplo um pedaço de sódio ou uma liga de cobre e zinco.
Em um sólido metálico, os pontos reticulares são cátions, mantidos unidos por um “mar de elétrons” provenientes da camada de valência dos cátions. Devido à força eletrostática gerada, eles mantêm os cátions coesos e estabilizam a estrutura. Esses elétrons, denominados livres ou gás de elétrons, não estão propriamente ligados a nenhum dos cátions, mas sim deslocalizados sobre todo o cristal. Daí a expressão “mar de elétrons”. Observe a figura para visualizar melhor este efeito.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Figura 47 - Mar de elétrons. Fonte: <http://www.alunosonline.com.br/quimica/ligacao-metalica.html>.
Você já deve ter notado que o alumínio é muito diferente do ferro, apesar de ambos serem metais. As diferenças entre os metais são derivadas das camadas eletrônicas disponíveis. Por exemplo, o sódio, em forma de um sólido, é mole, facilmente maleável e muito reativo por possuir uma camada de valência com apenas um elétron para compartilhar com o mar de elétrons. Entretanto, alguns metais de transição, como o crômio (Cr) e o tungstênio (W), são muito duros.
Figura 48 - Sódio sólido. Fonte: <http://scienceforkids.kidipede.com/chemistry/atoms/sodium.htm>.
Essa dureza extra, além de outras propriedades, é atribuída a ligações covalentes complementares que esses metais são capazes de fazer com os cátions vizinhos. Mas, se os elétrons de valência estão sendo usados no “mar de elétrons”, como é possível que esses metais façam ligações covalentes? Se você olhar a configuração eletrônica dos metais de transição, verá que a maioria deles possui elétrons disponíveis no seu orbital d. Esses elétrons podem ser compartilhados com os íons adjacentes e, assim, formar ligações covalentes. A alta condutividade elétrica desses sólidos é devida a esse “mar de elétrons”. Como eles são livres para “andar” por todo o sólido, eles podem conduzir eletricidade livremente.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Para ter uma ideia da diferença de propriedades, o ponto de fusão do sódio é de 98 °C e o do tungstênio é 3410 °C!
Lembre-se: algumas propriedades gerais dos metais são: maleáveis, dúcteis, com dureza variável, ponto de fusão de médio a alto, alta condutividade térmica e elétrica e possuem brilho metálico.
3.4.3 Sólidos covalentes Nos sólidos covalentes, muitas vezes chamados de sólidos atômicos ou reticulares, os pontos reticulares são átomos unidos entre si por uma ligação covalente. Os átomos formam uma enorme rede tridimensional, que se estende até os limites físicos do sólido. Como essa rede é fortemente ligada, eles geralmente são muito duros, rígidos, quebradiços e possuem pontos de fusão muito altos; são insolúveis em água e péssimos condutores de eletricidade. A baixa condutividade elétrica é explicada pelo tipo de ligação presente. Como não existem elétrons circulando livremente no sólido, a passagem de corrente elétrica é muito difícil. Mas, é claro, existem exceções. O grafite, composto somente de átomos de carbono ligados entre si, é utilizado na indústria como um condutor e lubrificante. Já o diamante, também composto apenas de carbono, é um dos materiais mais duros conhecidos, utilizado para proteger brocas de perfuração. Isso é um grande contraste, não é mesmo? A explicação está em como as ligações estão dispostas em cada sólido. Embora os sólidos sejam compostos do mesmo elemento, a disposição das ligações é completamente diferente. Assim, enquanto o diamante apresenta uma forte estrutura tridimensional, o grafite apresenta uma estrutura laminar (em folhas) composta de hexágonos de carbono. Essas folhas são fracamente ligadas entre si e podem ser separadas. Por isso, ele é tão macio, enquanto o diamante é tão duro.
Figura 49 - Estrutura do diamante e do grafite. Fonte: <http://www.infoescola.com/quimica/estrutura-cristalina/>; adaptado de Atkins (2006, p. 289).
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
O grafite comercial, geralmente, possui impurezas depositadas entre as folhas, o que torna o processo de separá-las ainda mais fácil. Quando separadas, essas folhas de grafite deslizam facilmente umas sobre as outras, tornando-as um excelente lubrificante. Essa diferença estrutural entre sólidos que são compostos por um mesmo elemento, mas com uma estrutura tridimensional diferente, é chamada alotropia.
Você sabia? Os materiais cerâmicos tendem a ser sólidos reticulares.
3.4.4 Sólidos moleculares Nos sólidos moleculares, as estruturas que se encontram nos pontos reticulares são moléculas, compostas de ligações covalentes. Entretanto, o sólido é mantido por interações intermoleculares (entre moléculas distintas). Essas interações, em regra, são mais fracas do que as interações presentes nos outros sólidos. Isso porque os sólidos moleculares tendem a possuir um ponto de fusão relativamente baixo, são moles e isolantes elétricos. Para entender melhor as características dos sólidos, de acordo com seu tipo, observe a tabela a seguir: Tabela 2 - Principais características dos sólidos
IÔNICO Unidade nos pontos reticulares
METÁLICO
Íons positivos e negativos
Tipo de ligação entre Iônica as unidades
COVALENTE
MOLECULAR
Íons positivos
Átomos
Moléculas
Metálica – “mar de elétrons”
Covalente
Forças intermoleculares
Dureza
Razoavelmente duro, quebradiço
Mole a duro, maleável e dúctil
Muito duro, quebradiço
Mole
Ponto de fusão
Razoavelmente alto
Médio a alto
Muito alto
Baixo
Condutividade
Baixa
Boa a ótima
Baixa
Baixa
Fonte: Russell (2008, p. 463).
3.4.5 Forças intermoleculares Como o próprio nome nos indica, forças intermoleculares são atrações que ocorrem entre moléculas. Essas forças são chamadas de forças de Van der Waals, em homenagem ao físico holandês que propôs sua existência. A seguir, confira as diferentes interações das moléculas.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » Interação íon-dipolo: à exceção das outras, essa interação ocorre entre uma molécula polar e um íon. Como o íon possui uma carga, ele consegue interagir com uma molécula polar através de interações eletrostáticas com a porção molecular que possui uma densidade de carga com sinal oposto ao seu. Um exemplo é quando dissolvemos sal de cozinha em água. Os íons Na+ interagem com o átomo de oxigênio (porção com densidade negativa de carga) da água, enquanto os íons Cl- interagem com os átomos de hidrogênio (porção com densidade positiva de carga). » » Interação dipolo-dipolo: este tipo de interação ocorre entre moléculas polares que não são capazes de fazer interação de hidrogênio. Como essas moléculas são polares, uma parte delas possui um caráter positivo e outra parte, um caráter negativo permanente. Devido a essas densidades de carga permanentes, essas moléculas podem se alinhar e se atrair eletrostaticamente. Essas interações são mais fracas que a interação íon-dipolo.
Figura 50 - Interações dipolo-dipolo. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 271).
» » Forças de London ou interações dipolo-induzido–dipolo-induzido: também chamadas de forças de dispersão, são as mais fracas das interações intermoleculares, pois ocorrem entre moléculas apolares. Mas se essas moléculas são apolares, como elas irão se atrair? Estas forças foram descritas, primeiramente, pelo físico Fritz London, em 1930. Elas têm origem na flutuação das nuvens eletrônicas em um átomo ou uma molécula. Não confunda esse tipo de polarização com o que ocorre em moléculas polares. Nesse caso, o dipolo que surge na molécula se forma e se desfaz rapidamente. Entretanto, uma vez que ele se forma, ele induz uma molécula próxima a assumir também um dipolo (por isso o nome dipolo-induzido). Essa distribuição eletrônica para a formação do dipolo é flutuante, está em constante alteração. A figura a seguir ilustra esse fenômeno.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Figura 51 - Forças de London. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 273).
» » Ligações de hidrogênio: conhecidas como pontes de hidrogênio, elas são as forças intermoleculares mais fortes que existem. São também específicas a certos tipos de molécula. As ligações de hidrogênio ocorrem quando um átomo de hidrogênio fica entre dois átomos fortemente eletronegativos, pequenos (o que favorece a aproximação entre os átomos) e com pares de elétrons isolados – comumente átomos de O, N e F. Geralmente, uma das moléculas possui um hidrogênio ligado a um dos átomos citados anteriormente (-OH, NH ou FH) e a outra possui um desses três átomos para ceder um par de elétrons.
A nomenclatura de pontes de hidrogênio está caindo em desuso para esse tipo de interação por dar uma impressão errônea do fenômeno que está ocorrendo. Isso porque, em outros compostos, de fato um hidrogênio está ligado a dois átomos, formando uma ponte.
Por que essas ligações de hidrogênio ocorrem? Imagine um copo d’água. Nele existem inúmeras moléculas de água próximas umas às outras, interagindo. Como o átomo de oxigênio é mais eletronegativo que o de hidrogênio, os elétrons da ligação são atraídos em direção ao oxigênio e deixam o hidrogênio com uma densidade eletrônica positiva. Como existem outras moléculas próximas, esse átomo de hidrogênio está próximo ao átomo de oxigênio de outra molécula de água, o qual possui pares de elétrons isolados, e, assim, ambos podem interagir, formando a ligação de hidrogênio. Esse tipo de ligação é representado por uma linha pontilhada entre dois átomos, como mostra a figura a seguir.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 52 - Ligação de hidrogênio. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 276).
As ligações de hidrogênio cumprem um papel importantíssimo na manutenção da vida. A estrutura de uma proteína depende, principalmente, dessas ligações. Se elas são desfeitas, a proteína perde sua forma e, consequentemente, sua função. Outra função de vital importância é manter a união de duas fitas de DNA. Estas podem ser desfeitas para o processo de divisão celular.
Figura 53 - Ligações de hidrogênio no DNA. Fonte: <http://www.mun.ca/biology/desmid/brian/BIOL2060/BIOL2060-18/18_04.jpg>.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
3.4.6 Consequências das forças intermoleculares Embora tenhamos falado apenas de sólidos até agora, as forças intermoleculares também estão presentes nos líquidos. São elas que dão origem às propriedades importantes: a viscosidade, a tensão superficial e o estado físico da matéria. Com certeza, a mais importante dessas propriedades é o estado físico da matéria. Afinal, este é um ponto crucial na escolha de substâncias a serem utilizadas para determinado propósito. Mas qual a relação existente entre o estado físico da matéria e as interações intermoleculares? Pense de novo na água: sabemos que ela solidifica a 0 °C, entra em ebulição a 100 °C e, entre essas temperaturas, ela é líquida. Sabemos, também, que a água interage entre si por ligações de hidrogênio e que elas são ligações fortes. Entretanto, dependendo da energia que o sistema possui, essas ligações podem ser enfraquecidas ou vencidas. Agora imagine o gelo: ele consiste de moléculas de água interagindo entre si, mas que estão em um arranjo fixo. Isso porque, na temperatura em que a água congela, a energia do sistema não é suficiente para afetar as ligações de hidrogênio. Mas, se aquecermos o gelo, estamos fornecendo energia ao sistema e, aos poucos, as moléculas de água possuem energia cinética suficiente para romper o arranjo fixo e fluir, tornando-se líquida. Se continuarmos aquecendo o sistema, ele entrará em ebulição. Isso significa que, nessa temperatura, as moléculas possuem energia cinética o suficiente para romper as ligações de hidrogênio e passar para a fase de vapor. Já o açúcar, na temperatura ambiente, é sólido. Isso porque as moléculas que o compõem interagem entre si por inúmeras ligações de hidrogênio, fazendo com que seja necessária mais energia para rompê-las do que na água. Por isso, precisamos aquecer o açúcar para torná-lo líquido, como é feito na caramelização de doces. Podemos, também, fazer uma relação entre a força das interações intermoleculares e o ponto de fusão e de ebulição das substâncias. A seguir são mostradas as estruturas do butano (C4H10), da acetona (C3H6O) e do álcool isopropílico (C3H8O). Eles possuem a mesma massa molecular, mas interações intermoleculares diferentes. O
OH
H 3C CH3 H3C
Butano
CH3
Acetona
H 3C
CH3
Álcool Isopropílico
Figura 54 - Estrutura do butano, acetona e álcool isopropílico. Fonte: Londero (2014).
Pela estrutura das moléculas, podemos esperar que no butano existam apenas forças de London; na acetona, interações do tipo dipolo-dipolo; e no álcool isopropílico, ligações de hidrogênio. O ponto de ebulição do butano é -0,6 °C, o da acetona, 56 °C e do álcool propílico, 82 °C. Como esperado, quanto mais forte o tipo de interação intermolecular, mais energia precisamos fornecer para rompê-las e, por consequência, maior o ponto de ebulição do líquido.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
A viscosidade é a resistência ao escoamento – quanto maior a viscosidade de um líquido, mais lento seu escoamento. Você já deve ter notado que óleo de cozinha, antes de ser aquecido, demora mais a escorrer do que a água. Dizemos que o óleo é mais viscoso que a água. Essa viscosidade dos líquidos depende muito das interações intermoleculares: quando as interações são fortes, as moléculas estão fortemente ligadas entre si e têm dificuldade em se moverem em relação umas às outras. Se as interações são fracas, a movimentação é menos impedida e, com isso, o líquido escoa mais facilmente. Por exemplo, a molécula de hexano é composta apenas de átomos de carbono e hidrogênio (C6H14), e a única interação intermolecular que atua são as forças de London. Já em uma molécula de acetona, as forças intermoleculares atuantes são as de dipolo-dipolo; e em uma molécula de água temos ligações de hidrogênio. A viscosidade dessas três substâncias são, respectivamente, 0.000297, 0.000316 e 0.00089 N.s.m-2. Note que, de fato, quanto mais forte as interações intermoleculares presentes, mais viscoso o líquido se torna. É interessante notar que a glicerina, que também faz ligações de hidrogênio, possui uma viscosidade de 0.950 N s/m2, muito superior que a da água. Pela sua estrutura, podemos ver que ela faz três ligações de hidrogênio por molécula, o que fortalece a interação intermolecular e a deixa muito viscosa. Outro caso interessante é o do óleo de cozinha. Ele é composto de moléculas que possuem cadeias carbônicas muito grandes que fazem interações via forças de London, as quais são fracas, mas a somatória dessas forças ao longo de toda a cadeia faz com que ela se torne forte e também com que as cadeias se emaranhem, o que torna o óleo mais viscoso que a água. Talvez você já tenha notado que, ao encher um copo com água, se você colocar demais, ela não transborda imediatamente – existe certo volume que fica acima da borda do copo, como mostrado na figura a seguir.
Figura 55 - Tensão superficial. Fonte: <http://www.sciencebuddies.org/science-fair-projects/project_ideas/Phys_p010.shtml#background>.
Isso acontece devido a uma propriedade denominada tensão superficial. Assim como a viscosidade, a tensão superficial pode ser interpretada como uma resistência ao escoamento, mas, nesse caso, estamos tratando apenas da superfície do líquido.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
Em todo o líquido, as moléculas que se encontra na superfície interagem com as moléculas ao redor. Entretanto, diferentemente daquelas moléculas que não estão na superfície, as moléculas que ali se encontram só podem interagir com moléculas abaixo delas, no interior do solvente – observe a figura a seguir. Isso gera um desequilíbrio de forças e faz com que as moléculas que estão na superfície sejam atraídas para baixo pelas forças intermoleculares, o que faz a superfície criar uma resistência ao escoamento – no caso, pode ser tanto a escorrer de um copo quanto a de permitir que um corpo afunde.
Figura 56 - Forças da tensão superficial. Fonte: <http://www.ctgclean.com/tech-blog/2013/06/what-is-surface-tension/>.
Do mesmo modo que a viscosidade, a tensão superficial é dependente do tipo de força intermolecular que está presente no líquido – quanto mais forte a interação intermolecular, maior a tensão superficial. Por exemplo: o hexano, em que existe apenas forças de London, possui uma tensão superficial de 28,88 mN m-1 a 25 °C; já a água possui uma tensão superficial de 72,75 mN.m-1 na mesma temperatura.
3.4.7 Energia Reticular A energia reticular, também conhecida como entalpia de rede, pode ser entendida como a força que une as partículas (átomos, moléculas ou íons) em um sólido, e é definida como a quantidade de energia necessária para vaporizar as partículas em um mol de sólido, em pressão constante. Geralmente é expressa como entalpia (H) ou, mais formalmente, variação de entalpia (ΔH). A energia reticular dependerá do tipo de interação entre as partículas do sólido (iônica, covalente etc.) e da geometria do retículo cristalino (forma como as partículas estão dispostas no sólido). O procedimento experimental para determinar essa energia é chamado de ciclo de Born-Haber, um caminho fechado, em etapas.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
É importante relembrar o que foi visto sobre ligações iônicas. Dê uma olhada na seção 3.1, caso necessário.
Figura 57 - Ciclo de Born-Haber para o cloreto de potássio. Fonte: Adaptado de Atkins (2006, p. 335).
Começamos o ciclo com o potássio (K) e o cloro (Cl2) em seus estados fundamentais (estados de menor energia à pressão atmosférica), sólido e gasoso, respectivamente. A primeira etapa (A) é a passagem do potássio em seu estado fundamental para o estado isolado (gasoso). A etapa (B) é a dissociação do gás cloro, uma molécula diatômica, em dois átomos isolados de cloro. A etapa (C) consiste na ionização do potássio, formando um cátion, e a etapa (D) é o ganho desse elétron pelo Cl (lembre-se de que, quando o Cl ganha um elétron, ele se torna mais estável, ou seja, libera energia e, por isso, o sinal negativo na etapa (D)). Experimentalmente, é possível medir a energia necessária para romper as ligações no KCl sólido e fazer com que os seus constituintes voltem ao seu estado fundamental. Como esse ciclo é fechado, a soma de todas as etapas deve ser zero. Dessa forma, podemos determinar o valor da etapa (E) como a soma de todas as outras.
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AULA 3 – LIGAÇÕES QUÍMICAS, FORÇAS INTERMOLECULARES E TIPOS DE SÓLIDOS
E=A+B+C+D+F Podemos, então, chegar ao valor de –ΔHL de +717 kJ.mol-1. Como há um sinal negativo antes do Δ (letra grega delta maiúscula), isso indica que foram liberados 717 kJ.mol-1, ou seja, o sólido é 717 kJ.mol-1 mais estável que os íons em sua forma gasosa e, então, uma ligação iônica será formada entre eles (veja a seção 1.1.2).
Não definiremos formalmente a entalpia nesse momento, pois há necessidade de um formalismo matemático. É suficiente, neste ponto, pensar nela como a energia que as partículas possuem.
3.5 DIFRAÇÃO DE RAIOS X Para se entender sobre a estrutura do interior do sólido é necessária uma técnica chamada difração de raios x. Ela permite determinar os ângulos e comprimentos de ligação e estabelecer o arranjo dos átomos nos compostos sólidos. Mas qual o princípio dessa valiosa técnica? Os raios x possuem comprimento de onda muito curto e são gerados a partir da aceleração de elétrons até atingirem velocidades bem altas, quando acertam um alvo. A radiação eletromagnética de raios x sofre difração (é desviada) quando encontra uma série de átomos e, como as camadas de átomos no cristal possuem separação média de 100 pm, é necessário o uso de radiação com comprimento de onda próximo a esse valor. A técnica de difração de raios x consiste na emissão de raios x em um cristal, e os átomos que compõem esse cristal reemitem radiação em todas as direções. Algumas ondas reemitidas sofrem interferência construtiva (aumento da onda) e outras interferências destrutivas (cancelamento da onda), conforme demostra a figura seguinte.
Figura 58 - Difração de raios-x por dois átomos.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Fonte: Russell (2008, vol. 1, p. 414).
Após ocorrer a difração e a interferência das ondas, a radiação resultante é detectada por meio de um filme fotográfico que gera manchas. A localização dessas manchas é utilizada para identificar o arranjo entre os átomos no cristal e, através de um tratamento matemático que considera os ângulos de difração, a estrutura do cristal pode ser elucidada.
A técnica de difração de raios x é responsável por inúmeros avanços na área de biologia molecular, especialmente na determinação de diversas estruturas importantes como ácidos nucleicos, que compõem o DNA e as proteínas.
CONCLUSÃO Esperamos que, após esta aula, você tenha compreendido um pouco mais a respeito do universo atômico que nos cerca. As questões a respeito das ligações químicas são um pilar central na química e em diversas áreas. E lembre-se: as ligações e interações determinam as propriedades dos materiais que conhecemos e, por isso, são importantes para o desenvolvimento de materiais inovadores. Até a próxima aula!
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AULA 4 Estequiometria
INTRODUÇÃO Muitas vezes, estudar os átomos e as moléculas pode parecer um pouco abstrato, pois as dimensões não são familiares e concebíveis para a maioria de nós. No entanto, medir e calcular a quantidade dessas substâncias é imprescindível para a nossa sobrevivência no mundo moderno, pois desde fármacos até cosméticos possuem um número exato de átomos e moléculas necessários para que façam o efeito esperado. Assim, as relações estequiométricas são de absoluto interesse para as diversas áreas do conhecimento. Nesta aula vamos estudar os conceitos e cálculos que envolvem a estequiometria química.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
OBJETIVOS » » Compreender o conceito de número de mols. » » Entender a relação entre mol e número de Avogadro. » » Ser capaz de calcular o número de mols de uma substância. » » Reconhecer uma equação química. » » Entender o princípio da lei de conservação das massas. » » Conseguir balancear equações químicas. » » Identificar a transferência de elétrons nas equações químicas. » » Realizar cálculos estequiométricos.
4.1 O MOL Conforme já vimos na primeira aula, a massa de determinado átomo depende dos seus constituintes: prótons e nêutrons. Porém, somente um átomo é extremamente pequeno ao ponto que nenhuma balança existente conseguir pesá-lo. E, por essa razão, a maior parte dos cálculos realizados envolve um conjunto de átomos. Esse “pacote” de átomos é chamado de mol. O mol é definido como “[...] a quantidade de substância que contém tantas entidades elementares (átomos, moléculas ou outras partículas) quantas existem em, exatamente, 12 g do isótopo carbono-12” (CHANG, 2007, p. 58). Portanto, mol é uma unidade. Podemos dizer que mol é o análogo da dúzia, unidade que usamos no nosso cotidiano para nos referirmos ao número de ovos em uma caixa. Porém, o mol é um número grande, conforme veremos a seguir.
4.1.1 Número de Avogadro Imagine se você tivesse 12 gramas de carbono e tentasse contar quantos átomos contêm nessa amostra; parece uma tarefa impossível, não? No entanto, medidas experimentais permitiram calcular quantos átomos têm em 12 g de carbono-12. O valor encontrado foi de 6,022 x 1023, e este número é conhecido como número de Avogadro (NA), em homenagem ao cientista Amadeo Avogadro. Dessa forma, podemos dizer que 12,00 g de carbono-12 correspondem a 1 mol de átomos de carbono-12, o qual contém 6,022 x 1023 átomos. Se olharmos na tabela periódica, encontraremos que o enxofre tem massa atômica de 32,1 u. Desse modo, 32,1 gramas de enxofre contêm 6,022 x 1023 átomos, o que corresponde a um mol. Essa questão é ilustrada na figura seguinte.
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AULA 4 – ESTEQUIOMETRIA
Figura 59 - Um mol de cada um dos elementos: 32 g de enxofre (acima à direita), 12 g de carbono (acima à esquerda), 201 g de mercúrio (abaixo à direita), 207 g de chumbo (abaixo ao centro) e 64 g de cobre (abaixo à esquerda). Fonte: ATKINS (2006, p. 60).
O número de Avogadro é tão grande que 1 mol de segundos equivale a 19 quadrilhões (19 com 12 zeros) de anos.
4.1.2 Massa molar
Como calcular o número de mols (quantidade de substância) de uma amostra se não podemos contar o número de átomos? Se a massa da amostra for conhecida, precisamos de outra variável, a massa molar, M, que pode ser encontrada na tabela periódica. Assim, a “[...] massa molar de um elemento é a massa por mol de seus átomos, a massa molar de um composto molecular é a massa por mol de suas moléculas e a massa molar de um composto iônico é a massa por mol de suas fórmulas unitárias” (ATIKINS, 2006, p. 61). Ou seja, podemos calcular o número de mols e átomos utilizando a seguinte expressão:
Note que a massa molar é expressa em gramas por mol (g . mol-1), pois “m” deve estar em gramas. Um exemplo prático pode ser dado se pegarmos uma moeda de pura prata, que pesa 4,10
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
g. Consultando a tabela periódica, encontraremos que a massa molar da prata (Ag) é de 107,87 g. mol-1. Então, podemos calcular o número de mols da amostra:
Fazendo o cálculo, percebemos que a moeda de prata descrita contém 0,038 mol. Se quisermos saber o número de átomos dela, basta multiplicar pelo número de Avogadro. Veja: N (número de átomos)=0,038 mol x 6,022 x1023=2,289 x 1022 átomos de Ag Vale ressaltar que, quando trabalhamos com compostos moleculares, é necessário determinar a massa molar total da molécula. Desse modo, a massa molar dos elementos que constituem a molécula devem ser somados. Por exemplo, podemos calcular a massa molar do etanol, C2H5OH, da seguinte forma: M (C2 H5 OH) = 2MC+6MH+ MO M (C2 H5 OH) =2 (12,01 g mol-1) + 6 (1,01 g mol-1) + 16 g mol-1 M (C2 H5 OH) = 46,08 g mol-1
4.2 O AS EQUAÇÕES QUÍMICAS Como já vimos, os símbolos químicos representam os elementos. Assim, podemos escrever K no lugar de potássio e a fórmula CH4 para representar o metano. Ou seja, as equações químicas nada mais são que representações das reações. Confira: C(s)+ O2 (g) → CO2 (g) Essa equação química representa a formação do composto dióxido de carbono. À esquerda da seta estão os reagentes, neste caso o carbono “C” e o oxigênio “O”, na forma de O2, que representa a molécula de oxigênio. À direita da seta são indicados os produtos. Nessa reação, em particular, somente um produto é formado: o dióxido de carbono. As notações que aparecem ao lado dos elementos e compostos indicam o estado dos reagentes e produtos. Ou seja: (s): simboliza o estado sólido (l): líquido (g): gás (aq): soluções em água. Essa notação não é definitivamente necessária, porém fornece informações sobre os estados dos componentes descritos na equação química. Assim, se olharmos para a equação descrita, podemos mostrar o que acontece durante uma reação e esta pode ser lida da seguinte forma: 1 átomo de carbono (no estado sólido) reage com 1 molécula de oxigênio (no estado gasoso) para gerar 1 molécula de dióxido de carbono (no estado gasoso).
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AULA 4 – ESTEQUIOMETRIA
4.2.1 Escrevendo as equações químicas Certamente, você já ouviu a frase: na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Esta célebre frase é atribuída ao cientista do século XVIII Antoine Laurent de Lavoisier. Ela resulta das observações de que a massa total de um sistema é constante durante uma reação química, o que conhecemos hoje por lei de conservação das massas. De acordo com essa lei, nenhum átomo é destruído ou criado durante uma reação química. Assim, o mesmo número de cada tipo de átomo dos dois lados da seta, ou seja, o número de átomos no final da reação é o mesmo que no início e, se esse requisito é obedecido, dizemos que equação está balanceada. Para que o conceito de balanceamento fique mais claro, vamos considerar a equação seguinte, que descreve a formação da água a partir da combinação do hidrogênio molecular com o oxigênio molecular. H2 + O2 → H2O Ao olharmos com atenção para a equação anterior, veremos que existem 2 hidrogênios em ambos os lados, porém, nos reagentes, há 2 oxigênios, enquanto nos produtos encontramos somente 1 átomo de oxigênio. Portanto, dizemos que a equação não está balanceada. Se aplicarmos a lei de conservação das massas, podemos balancear a equação adicionando o coeficiente apropriado, nesse caso 2, na frente do hidrogênio molecular e da água: 2H2 + O2 → 2H2O Note que agora a equação química está balanceada, apresentando o mesmo número de átomos de cada tipo de elemento em ambos os lados. Assim, podemos interpretar a equação da seguinte forma: 2 moléculas de hidrogênio molecular reagem com 1 de oxigênio molecular para gerar 2 moléculas de água. Na figura seguinte, podemos visualizar três formas diferentes de representar a reação anterior balanceada.
Duas moléculas de hidrogênio
2H2
+
Uma molécula de oxigênio
→
+
O2
→
Duas moléculas de água
2H2O
Figura 60 - Três formas de representar a formação da água. Fonte: CHANG (2007, p. 72).
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
4.2.2 Balanceamento das equações químicas Como escolher o coeficiente adequado para balancear as equações químicas? Veremos agora algumas estratégias para determinar o coeficiente apropriado para cada equação. A primeira delas é o método da tentativa, que é utilizado para o balanceamento de equações mais simples como a queima do gás metano. Veja: CH4 + O2 → CO2 + H2O O primeiro passo é examinar a equação e escolher um elemento para começar a balancear. Uma dica é começar pela fórmula que tem mais átomos ou elementos diferentes. Nesse caso, podemos escolher o CH4. Vamos iniciar balanceando o carbono. Note que há um carbono de cada lado da seta, porém temos 4 hidrogênios nos reagentes e 2 nos produtos. Assim, colocamos o coeficiente 2 na frente da H2O. Até o momento, a equação fica desta forma: CH4 + O2 → CO2 + 2H2O Agora, observe que somente os átomos de oxigênio não estão balanceados, pois nos produtos temos 4 oxigênios e nos reagentes somente 2. Por isso, necessitamos de dois oxigênios nos reagentes, o que pode ser resolvido colocando um 2 na frente da molécula de O2. Com isso, obtemos a equação balanceada: CH4 + 2O2 → CO2 + 2H2O O último passo é conferir o número o total de cada átomo dos reagentes e produtos, a fim de verificar se eles são equivalentes.
Ao balancear uma equação, tenha em mente uma importante regra: nunca modifique a fórmula dos reagentes ou produtos durante o balanceamento.
A segunda estratégia que veremos envolve reações com transferência de elétrons, também conhecidas como reações redox. Não se preocupe, estudaremos essas reações com mais detalhes nas próximas aulas. Por ora, vamos focar no balanceamento das equações, que descrevem as reações redox. Durante uma reação química redox, os elétrons são transferidos de uma espécie para a outra, pois, assim como os átomos não podem ser perdidos ou criados, os elétrons também não. No processo de transferência de elétrons, uma espécie é oxidada (doa elétrons) e outra é reduzida (ganha elétrons), o que implica mudança de cargas de algumas espécies envolvidas. Dessa forma, para balancear uma equação envolvendo reações redox, devemos considerar a carga total dos produtos e reagentes. Observe a seguinte equação: Cu + Ag+ → Cu2+ + Ag
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AULA 4 – ESTEQUIOMETRIA
Perceba que temos a impressão de que ela está balanceada, pois o número de átomos de cada espécie é o mesmo nos dois lados. Porém, se analisarmos com mais atenção, veremos que o átomo de cobre doou dois elétrons e a prata recebeu um só, bem como as cargas dos reagentes e produtos estão desiguais. Então, para essa equação, temos de balancear as cargas. Cu + 2Ag+ → Cu2+ + 2Ag Assim, cada lado possui duas cargas positivas e o mesmo número de átomos de cada elemento.
Agora é com você! Tente balancear as equações químicas em um jogo interativo através de um simulador, acesse o link <http://phet.colorado. edu/pt_BR/simulation/balancing-chemical-equations>.
4.2.3 Cálculos estequiométricos Quando reagimos determinadas quantidades de reagentes, esperamos obter certa quantidade de produto. A interpretação quantitativa de uma reação química é chamada de estequiometria e pode ser definida como “[...] o estudo quantitativo de reagentes e produtos em uma reação química” (CHANG, 2007, p. 76). Para realizar tais cálculos, utilizaremos o nosso conhecimento sobre massa molar e mol. Podemos tomar como exemplo a reação que já balanceamos anteriormente. Ou seja: 2H2 + O2 → 2H2O Quanto será formado de água se 0,30 mol de oxigênio molecular reagir com o gás hidrogênio? O primeiro passo é identificar a relação estequiométrica entre o oxigênio molecular e a água. Nesse caso, 1O2 para 2H2O. A segunda etapa compreende uma conversão entre as duas espécies. Confira:
Essa conversão é chamada de razão molar porque relaciona a quantidade das espécies envolvidas. Colocando os valores desejados, podemos escrever da seguinte forma:
Assim, se reagirmos 0,30 mol de oxigênio molecular com o gás hidrogênio, obteremos 0,60 mol de água. Note que “[...] a equação química balanceada de uma reação é usada para estabelecer a razão molar, o fator usado para converter a quantidade de uma substância na quantidade de outra” (ATKINS, 2006, p. 99). 75
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Uma aplicação prática dos cálculos estequiométricos é no desenvolvimento de processos industriais. Digamos que uma empresa farmacêutica necessita produzir 20 kg de um medicamento, cuja massa molar é de 400 g mol-1. Um dos reagentes utilizados na produção desse medicamento possui massa molar de 122 g mol-1. Qual a massa desse reagente que será necessário para produzir a quantidade desejada de produto? Primeiro precisamos saber quantos mols de produto serão produzidos. Então:
Sabemos que o número de mols de produto formado é igual ao número de mols de reagente utilizado. Logo:
Assim, percebemos que serão necessários 6,1 kg desse reagente para a produção de 20 kg desse medicamento.
CONCLUSÃO Nesta aula, você aprendeu algo mais sobre a matéria: mol, massa molar e número de Avogadro. Com isso, você percebeu que a matéria não se processa de maneira aleatória, e sim por meio de padrões definidos – no caso desta aula, a estequiometria das reações. Através dos estudos, você compreendeu que essas relações estequiométricas são úteis na utilização quantitativa da matéria, não é mesmo? Inclusive, entendeu que, apesar de não poder pesar átomos separados, é possível estabelecer relações por meio das quais se pode trabalhar com quantidades definidas de átomos e moléculas.
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AULA 5 Soluções
INTRODUÇÃO Até agora, aprendemos vários aspectos dos átomos, das ligações entre eles e da formação de sólidos. Entretanto, a grande maioria dos processos utilizados por químicos, engenheiros e, principalmente, pelo organismo dos seres vivos acontece com substâncias em um meio líquido. Nesta aula, veremos algumas propriedades desse sistema e alguns cálculos importantes a respeito deles. Bom estudo!
OBJETIVOS » » Entender os conceitos de soluto, solvente, solução e solubilidade. » » Aprender a fazer cálculos de concentração e as formas de expressá-lo.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » Adquirir conhecimento sobre o conceito de solução ideal. » » Conhecer as propriedades coligativas. » » Compreender o que são sistemas coloidais.
5.1 SOLUÇÕES Na aula 3, estudamos um pouco a respeito de sólidos. Os sólidos que vimos lá são chamados de “puros”, pois são compostos de apenas uma substância. Entretanto, isso nem sempre acontece. Muitas vezes, encontramos várias substâncias misturadas em um sólido, por exemplo. Quando isso ocorre, podemos dizer que uma substância está dissolvida em outra. Isso também ocorre com substâncias misturadas em um meio líquido. É o caso de uma garrafa de refrigerante ou um copo de suco. Imagine um copo com 10 mols de água e, nele, 1 mol de álcool de cozinha (etanol). Como a água está em maior quantidade, dizemos que, nessa mistura, ela é o solvente; o etanol, que está presente em menor quantidade, é chamado de soluto. Por definição, solvente é a espécie em maior quantidade em uma mistura, e soluto é a espécie (ou espécies) em menor quantidade. Suponha agora duas jarras de água, cada uma contendo 1 litro. Em uma delas, colocamos uma colher de sal de cozinha e, na outra, uma colher de areia, agitamos bem e as deixamos repousar. Após certo tempo, veremos que a areia está no fundo da jarra e que o sal “desapareceu” na outra. Na jarra com sal, após o sistema atingir o seu estado mais estável, não podemos distinguir, a olho nu, as partículas de sal que estão na água. Por isso, dizemos que esse sistema possui uma única fase e o classificamos como uma mistura homogênea. Ou seja, uma solução em que o soluto (sal) está dissolvido no solvente (água). Agora vamos examinar a outra jarra. Na outra jarra, porém, podemos visualizar a areia no fundo. Isso porque esse sistema possui duas fases: uma fase é a água e a outra a areia. Por essa distinção, dizemos que essa mistura é heterogênea. Veja a figura a seguir para uma melhor visualização.
Figura 61 - Mistura homogênea e heterogênea. Fonte: <http://quimicano1anoconego.blogspot.com.br/>.
Isso nos leva a um conceito muito importante em várias áreas da ciência: a solubilidade.
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AULA 5 – SOLUÇÕES
5.1.1 Solubilidade Solubilidade é um termo utilizado para indicar a quantidade de determinada substância que pode ser adicionada a determinado solvente sem que ocorra a formação de uma mistura heterogênea. Com base nesta definição, usualmente dizemos que uma substância é solúvel em um solvente se puder dissolver uma quantidade de massa razoável dele em um volume pequeno de solvente. Por exemplo, 2 gramas de açúcar em 10 ml de água. Se mesmo uma pequena massa de soluto não é dissolvida por um volume considerável de solvente, dizemos que a substância é insolúvel nesse solvente. É o caso de 2 gramas de plástico em 100 litros de água.
Nenhuma substância é completamente insolúvel em um solvente, uma parte sempre é solubilizada. Entretanto, em muitos casos, a quantidade que pode ser solubilizada é insignificante. Por isso, dizemos que o soluto é completamente insolúvel.
Digamos, agora, que em um copo de água seja adicionada uma colher de açúcar. Em pouco tempo, o açúcar irá se dissolver e teremos uma solução. Entretanto, se continuarmos adicionando açúcar, atingiremos um ponto em que ele não se dissolve e começa a precipitar no fundo do copo. Quando chegamos nesse ponto, dizemos que possuímos uma solução saturada. Por definição, solução saturada “[...] é aquela que está em equilíbrio com excesso de soluto, ou seria, se estivesse presente excesso de soluto” (RUSSELL, 2008, p. 517). Uma solução insaturada é aquela que possui uma concentração de soluto menor que a necessária para gerar uma solução saturada. Em outras palavras, um soluto adicional poderá ser dissolvido, até obter a saturação da solução. Uma consideração prática utilizada na questão de solubilidade é a de que “semelhante” dissolve “semelhante”. Isso se refere às características de polaridade do soluto e do solvente. Por exemplo, NaCl (sal de cozinha) é um composto polar, pois faz ligações iônicas. Ele se dissolve facilmente em água, que é um solvente polar, mas é insolúvel em tetracloreto de carbono (CCl4), que é um solvente apolar. Resumindo, solventes e solutos de mesma polaridade fazem interações parecidas e acabam facilitando a formação da solução. Essa regra não é perfeita, existem várias exceções, mas é um bom ponto de partida para prever que um composto seja solúvel em um determinado solvente.
5.1.2 Concentração de soluções Como dito anteriormente, muitos dos processos químicos são realizados na presença de um solvente. Mas como saber a quantidade de cada componente que precisamos utilizar no processo? E como representar essas quantidades para que os processos possam ser reproduzidos sem problema?
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Um dos pontos principais para essa reprodução é saber a quantidade utilizada de cada substância nesse processo. Comumente, descrevemos essa quantidade utilizando a concentração da solução. Por definição, podemos dizer que a concentração de uma solução é a quantidade de um soluto contido em um volume de solução.
Quando falamos em concentração, estamos nos referindo a uma solução. Não podemos falar de concentração para uma mistura, pois não sabemos a quantidade de soluto que está de fato dissolvida e a quantidade que se encontra no fundo do recipiente.
5.1.2.1 Molaridade A maneira mais utilizada e, por isso, a mais importante, de se representar a concentração de uma solução é através da molaridade. A molaridade é definida como o número de mols de soluto dissolvido por litro de solução. Representamos a molaridade de um soluto X pela seguinte fórmula: Concentração molar de X =
nx (mol) Vsolução (L)
A molaridade de uma solução é expressa em mol L-1. Uma solução que contém 2 mols de X em um litro de solução é dita como uma solução 2 molares (representada por 2 mol L-1). Você vai encontrar em muitas fontes a molaridade representada por M (a solução anterior seria representada 2 M), mas a notação oficial, e recomendada, é mol L-1. Exemplo: Imagine que 0,42 mols de LiBr (brometo de lítio) são dissolvidos em 50 mL de água. Qual a molaridade dessa solução? Utilizando a fórmula, encontramos 8,4 mol L-1. Veja: [LiBr]=
0,42 mols 50 x 10-3 L
[LiBr]= 8,4 mol L-1
Uma forma comum de se referir à concentração molar de uma solução é colocar o soluto entre colchetes.
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5.1.2.2 Fração molar A fração molar (x) de uma substância é o número de mols divido pelo número de mols total de todas as substâncias presentes na solução. Representamos ela da seguinte forma: xA =
nA nA+ nB+ nC+ ...
=
nA nT
O xA é a fração molar da substância A; nA é o número de mols de A; nB é o número de mols de B e assim por diante, e nT o número total de mols na solução. Digamos que em um béquer, sem solvente, há 6 mols do composto A e 4 mols do composto B. A 6 fração molar de A nesse copo será: xA = = 0,6 10 Vale lembrar que a fração molar sempre varia entre 0 e 1. Afinal, o mínimo de um componente é 0 e o máximo é ele próprio puro, certo?
Se estivermos falando de um sistema que possui solvente, o número de mols desse solvente é incluído no cálculo da fração molar.
Uma unidade de concentração relativa à fração molar é a percentagem molar. Isto é, o número de mols de um componente expresso em percentual de acordo com o total de mols presente. De forma geral, nada mais é que a fração molar multiplicada por um fator de 100. Confira: % mol de A= xA . 100 Assim, usando o exemplo anterior, a percentagem molar de A será de 60%.
5.1.2.3 Percentagem em massa Semelhante à percentagem molar, a percentagem em massa é a quantidade de massa de cada componente multiplicada por 100. Veja a fórmula: % massa de A =
massaa massatotal
. 100
Ainda que de uma forma “disfarçada”, é comum utilizarmos a percentagem em massa em nossa cozinha. Ou seja, sempre que usamos medidas, como uma xícara disso para duas daquilo, na verdade estamos fazendo uma relação de massas. Assim, uma receita se baseia na percentagem de massa de cada ingrediente para chegar ao produto final.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
5.1.3 Soluções Ideais Para entendermos o conceito de soluções ideais, primeiro precisamos conhecer a Lei de Raoult para o abaixamento da pressão de vapor de um solvente. Em outras palavras, saber o ponto base para a explicação de uma solução ideal.
5.1.3.1 Abaixamento da Pressão de Vapor Uma parte do trabalho do cientista François-Marie Raoult foi a respeito da pressão de vapor de solventes. Essa pressão pode ser entendida como aquela que o líquido faz contra o seu vapor, a fim de expulsar moléculas da fase líquida para a fase de vapor. Quanto maior a pressão de vapor, mais facilmente o líquido irá se evaporar. Raoult descobriu que “[...] a pressão de vapor de um solvente é proporcional a sua fração molar em uma solução” (ATKINS, 2006, p. 404). Esta declaração é chamada de Lei de Raoult e pode ser escrita da seguinte forma: P= xsolvente Ppuro P é a pressão do solvente na solução. Ppuro é a pressão que o solvente exerce quando puro. Já xsolvente é a fração molar do solvente. De acordo com a Lei de Raoult, em qualquer temperatura, a pressão de vapor do solvente é linearmente proporcional à fração molar do solvente na solução. Para entender melhor, observe a figura a seguir.
Figura 62 - Fração molar de um soluto. Fonte: Atkins (2006, p. 404).
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AULA 5 – SOLUÇÕES
Uma solução que obedeça à Lei de Raoult em todas as concentrações é chamada de solução ideal. Nessa solução, as interações entre soluto e solvente são iguais às que ocorrem estre as moléculas do próprio solvente e àquelas entre as moléculas do próprio soluto. No entanto, as soluções comuns também podem seguir a Lei de Raoult em alguma faixa de concentração, como quando o solvente e o soluto possuem estrutura e propriedades muito parecidas. Um exemplo é a solução de tolueno e benzeno. Veja, na figura a seguir, a estrutura deles.
Benzeno
Tolueno
Figura 63 - Estrutura do benzeno e tolueno. Fonte: Londero (2014).
Para uma solução ideal, um soluto diminui a pressão de vapor de um solvente por questões trabalhadas na termodinâmica. Mas podemos pensar da seguinte forma: como as moléculas do soluto interagem com as moléculas do solvente – seja por interações do tipo dipolo, dipoloinduzido, ligações de hidrogênio etc. –, este se estabiliza em relação à sua forma pura. Com isso, ele tem uma tendência maior a permanecer na fase líquida, diminuindo sua pressão de vapor.
5.1.3.2 Propriedades Coligativas Note que na seção anterior falamos do soluto, mas não especificamos sua identidade química: um composto iônico ou covalente. Isso porque o abaixamento da pressão de vapor não depende da identidade química da substância, apenas de sua quantidade. Porém, os químicos perceberam que algumas propriedades seguiam essa regra e as classificaram como propriedades coligativas. Essas propriedades dependem apenas da razão entre soluto e solvente, não de suas identidades. As quatro propriedades coligativas mais importantes são: abaixamento da pressão de vapor do solvente, aumento do ponto de ebulição do solvente, abaixamento do ponto de congelamento do solvente e osmose.
5.1.3.3 Molalidade Como estamos falando a respeito de propriedades que dependem da razão entre soluto e solvente, veja outra maneira de se medir concentrações. Quando falamos em molaridade, estamos falando de uma quantidade de massa em um volume de solvente (mol . L-1). Entretanto, a densidade de um líquido varia com a temperatura – a massa
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de líquido em um mesmo volume varia de um dia muito frio para um muito quente –, o que pode levar a erros na medida das propriedades coligativas. Uma maneira que os químicos encontraram para circundar esse problema foi estabelecer outra maneira de se medir concentrações. Ou seja, a molalidade. A molalidade (m – lê-se molal) é definida como o número de mols do soluto por quilograma de solvente, com unidade mol kg-1. Observe: m=
na (mol) massasolvente (kg)
Essa medida contorna o problema da densidade, pois a massa é constante em relação à temperatura.
5.1.3.4 Elevação do ponto de ebulição A elevação do ponto de ebulição nada mais é que o aumento do ponto de ebulição de um solvente na presença de um soluto. A base para sua explicação é a mesma para o abaixamento da pressão de vapor e, na verdade, uma consequência dela. Preste atenção: um líquido entra em ebulição quando sua pressão é igual à pressão atmosférica. Como uma solução ideal possui uma pressão de vapor menor do que o solvente puro, é necessária uma temperatura maior para que esta se iguale à pressão atmosférica, causando uma elevação na temperatura de ebulição. Em uma solução diluída (uma solução com concentração baixa de soluto), “[...] a elevação do ponto de ebulição do solvente é proporcional à molalidade das partículas do soluto” (RUSSELL, 2008, p. 535). Veja: ∆Te=mKe ∆Te=(Te)solução- (Te)solvente O m é a molalidade da solução. O Ke é a constante do ponto de ebulição do solvente, medida experimentalmente. Já o (Te)solvente refere-se à temperatura de ebulição do solvente puro e (Te)solução à de ebulição da solução. Lembre-se: o valor de Ke depende apenas do solvente e representa o aumento do ponto de ebulição, provocado quando um mol de soluto é adicionado em 1 kg de solvente. Tal valor é dado em temperatura por molalidade (°C . m-1 ou K . m-1).
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AULA 5 – SOLUÇÕES
Quanto maior a concentração molal da solução, mais elevada a temperatura de ebulição da solução. Observe o gráfico da figura a seguir, em que a molalidade da solução 2 é maior que a da solução 1.
Figura 64 - Mudança da temperatura de ebulição em relação à mudança de concentração. Fonte: <http://meusresuminhos.tumblr.com/post/29003941737/propriedades-coligativas-tonoscopiaebulioscopia-e>.
5.1.3.5 Diminuição do ponto de congelamento Esta propriedade define a diminuição da temperatura de congelamento do solvente na presença do soluto. Assim como o soluto estabiliza o solvente e “impede” que ele passe para a fase vapor, aqui o soluto acaba fazendo com que o solvente não tenha propensão para passar à fase sólida. Essa relação entre a diminuição do ponto de congelamento é expressa pela seguinte fórmula: ∆Tc=mKc ∆Tc=(Tc)solução-(Tc)solvente O m é a molalidade do soluto; Kc, a constante do ponto de congelamento do solvente, medida experimentalmente. Já (Tc)solvente refere-se à temperatura de ebulição do solvente puro, e (Tc)solução à de ebulição da solução. Entretanto, o processo pode ser pensado ao contrário. Por exemplo, se temos um sólido e fornecemos calor, ele acaba seguindo a mesma propriedade. Mas se esse sólido for de uma substância pura, digamos água (gelo), ele irá fundir a 0 °C. Caso haja algum soluto nesse sólido, ele acabará se fundindo a uma temperatura menor que 0 °C.
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Em países que sofrem com nevascas, quantidades enormes de sal são jogadas no gelo que cobre as estradas. Isso faz com que a temperatura de congelamento da água diminua e o gelo volte ao seu estado líquido, possibilitando o tráfego de veículos.
Químicos orgânicos utilizam a referida propriedade para determinar se a substância que estão analisando está realmente pura.
5.1.3.6 Osmose Observe a figura a seguir. Nela temos a seguinte situação: dois recipientes são unidos por uma membrana, a qual permite apenas a passagem de solvente (membrana semipermeável). Perceba que ambos se encontram no mesmo nível. Em um recipiente, há um solvente puro e, no outro, uma solução.
Figura 65 - Osmose. Fonte: Russell (2008, p. 540).
Como foi dito antes, uma solução ideal é mais estável que o solvente puro e, por esse motivo, o solvente tende a se movimentar para o recipiente com a solução. Esse processo de transferência de solvente através de uma membrana semipermeável é denominado osmose. Após certo tempo, o sistema se estabiliza e o solvente para de migrar. Quando isso ocorre, o nível entre os dois lados da membrana não estão mais no mesmo nível. Isso indica que, nesse ponto, a pressão à qual o sistema está submetido é suficiente para interromper o processo de osmose. Essa pressão é a pressão osmótica, usualmente representada pela letra grega π (pi maiúsculo), e definida como a menor pressão necessária para interromper o processo de osmose. Observe a figura a seguir.
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AULA 5 – SOLUÇÕES
Figura 66 - Pressão Osmótica. Fonte: Russell (2008, p. 541).
Assim, podemos dizer que a pressão osmótica é diretamente proporcional à molaridade, à temperatura absoluta (temperatura na escala Kelvin) do sistema e à constante geral dos gases (R). Por isso, ela é descrita pela seguinte fórmula: π = MRT Como a molaridade de uma solução é a relação entre o número de mols de soluto (n1) em determinado volume (V), podemos substituir a equação anterior por: M=
π=
n1 V n1 V
RT, ou
Mas podemos fazer o processo reverso. Se aplicarmos uma pressão maior que a da pressão osmótica no recipiente que contém a solução, podemos forçar o solvente a migrar desse frasco para aquele que contém solvente puro. Esse processo é chamado de osmose reversa. A osmose é um processo fundamental em nosso organismo. As membranas das células agem como membranas semipermeáveis à passagem de algumas moléculas. Assim, a osmose ajuda a manter o equilíbrio necessário entre o meio intra e o extracelular, possibilitando a vida da célula.
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5.2 COLOIDES Até agora vimos casos em que o soluto se dissolve completamente no solvente e, passado o limite de solubilidade, ele precipita e forma duas fases. Entretanto, existe outro tipo de sistema em que o soluto não se dissolve no solvente, mas também não precipita rapidamente. Esse tipo de sistema é chamado de coloide (ou sistema coloidal). A espuma de barbear, a fumaça e o nosso próprio sangue são exemplos disso. Um coloide, ou fase dispersa, consiste em um material finamente dividido (geralmente com partículas em torno de 500 nm de diâmetro) disperso em outro material. O termo disperso é entendido como uma situação em que o soluto não está dissolvido no solvente, mas é estável o suficiente para não precipitar.
Coloides, geralmente, são agregados de partículas ou moléculas, os quais são pequenos o suficiente para não serem observáveis nem com microscópios óticos.
Os coloides são classificados de acordo com a natureza da fase dispersa (soluto) e da fase dispersante (solvente). Por exemplo, a dispersão de um sólido em um líquido é denominada sol, a de um líquido (ou sólido) em um gás, aerossol, e a de um líquido em outro líquido, emulsão. Outra classificação diz respeito à sua afinidade com o solvente. Coloides que são atraídos (têm afinidade) pelo solvente são denominados liofílicos, e os que são repelidos (não tem afinidade) pelo solvente, liofóbicos. Se o solvente for água, os termos hidrofílicos e hidrofóbicos, respectivamente, são aplicados. Emulsões de coloides (dispersão de um líquido em outro), geralmente, são preparadas agitandose vigorosamente os componentes. É o caso da maionese feita a partir de leite e óleo. Elas nem sempre são estáveis e, por isso, é necessária a adição de um surfactante (ou agente de superfície), que atua como estabilizante nesses sistemas coloidais. O sabão que utilizamos no nosso dia a dia é um exemplo de surfactante. Apesar de os coloides não serem estáveis, eles persistem devido a cargas que se formam na superfície dos aglomerados. Essa carga tende a repelir outros aglomerados que se aproximam, já que eles possuem carga de mesmo sinal. Quando essa repulsão não é forte o suficiente, os dois aglomerados coalescem (se unem).
O leite é uma emulsão de gorduras em água, estabilizada por uma proteína chamada caseína, que age como um surfactante.
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AULA 5 – SOLUÇÕES
CONCLUSÃO As soluções são importantes em muitos aspectos da ciência. Assim, compreender propriedades básicas delas é essencial para assimilar aspectos práticos utilizados na indústria. Por exemplo, questões de solubilidade são importantes para um bom funcionamento de sistemas industriais. Esperamos que, ao final desta aula, você tenha compreendido os aspectos principais das soluções e das misturas heterogêneas, a fim de aplicá-los no seu dia a dia e na sua nova profissão. Até a próxima aula!
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AULA 6 Reações Químicas
INTRODUÇÃO A cada minuto, diversas reações químicas ocorrem em nossa volta e em nosso corpo. Elas são responsáveis pelas inúmeras transformações da matéria. Por exemplo, quando ingerimos uma maçã, muitas reações ocorrem para que a sacarose presente nela se transforme em energia e em outras moléculas necessárias para a manutenção de nossa vida. Biológicas ou sintéticas, essas reações são primordiais para o mundo que conhecemos, pois são os processos que uma substância sofre para se transformar em outra. Nesta aula, vamos estudá-las e ver como elas ocorrem.
OBJETIVOS » » Reconhecer a importância das reações químicas. » » Distinguir um eletrólito de um não eletrólito.
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» » Compreender as principais características das reações de precipitação. » » Ser capaz de escrever equações iônicas completas e simplificadas. » » Entender o conceito de ácido e base. » » Identificar uma reação de neutralização. » » Reconhecer um processo de oxidação e redução. » » Identificar o número de oxidação das espécies em uma reação química.
6.1 AS REAÇÕES EM SOLUÇÃO AQUOSA Talvez a primeira imagem que você tenha ao pensar em uma reação química seja de um velho cientista misturando duas substâncias e, logo em seguida, uma explosão. Porém, nesse exato momento, diversas reações estão acontecendo em seu organismo sem você ou qualquer outra pessoa ordenar para que elas ocorram. Grande parte das reações químicas ocorre em meio aquoso, ou seja, quando o meio envolvido é a água. Essas reações são de extrema importância no ambiente biológico, afinal, em média 70% do nosso corpo é constituído de água. Existem três tipos principais de reações químicas que ocorrem em meio aquoso: reações de precipitação, reações de ácido-base e reações de oxirredução.
6.1.1 Propriedades gerais das soluções aquosas Antes de estudarmos as reações químicas, alguns conceitos sobre as propriedades das soluções aquosas devem ser apresentados e consolidados. Vimos na aula anterior que um soluto é uma espécie presente, em menor quantidade, numa mistura homogênea. O soluto em água pode existir como íon ou como molécula e, dessa forma, é classificado em duas categorias: eletrólitos e não eletrólitos. Um eletrólito pode ser definido como “[...] uma substância que, quando dissolvida em água, produz uma solução capaz de conduzir eletricidade, já um não eletrólito não conduz eletricidade quando dissolvido em água”. (CHANG, 2007, p. 94).
A natureza de um soluto pode ser identificada medindo a capacidade de condução de eletricidade de uma solução, pois somente soluções que possuem íons dissolvidos conduzem eletricidade. Essas soluções de eletrólitos são chamadas de soluções eletrolíticas e incluem compostos iônicos. Você pode não saber, mas já preparou uma solução eletrolítica quando dissolveu o sal de cozinha, cloreto de sódio (NaCl), em água. A figura seguinte ilustra um método fácil que você poderia usar para comprovar a existência de uma solução eletrolítica.
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AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
Figura 67 - Comparação entre eletrólitos e não eletrólitos: (a) água pura; (b) solução aquosa de um eletrólito fraco e (c) solução aquosa de um eletrólito forte. A concentração dos solutos é a mesma nos três recipientes. Fonte: Chang (2007, p. 94).
Observando a figura anterior, vemos três recipientes e, em cada um deles, um par de eletrodos de platina e uma lâmpada, constituindo assim um circuito. Quando a solução conduzir eletricidade, a corrente elétrica passará pelos eletrodos e acenderá a lâmpada. Em (a), temos um recipiente contendo água pura. Vale ressaltar que na água existe uma concentração muito pequena de íons que não permitem a condução de eletricidade. Assim, o eletrodo imerso no recipiente não conduz eletricidade necessária para que a lâmpada se acenda. Em (b), temos um eletrólito fraco, tal como o ácido acético, adicionado na água pura. Agora, podemos observar que a lâmpada acende com baixa intensidade. Em (c), porém, temos um eletrólito forte, como o ácido clorídrico, adicionado na água. Perceba que nessa solução a lâmpada acende com intensidade. Mas por que a lâmpada acende quando adicionamos um composto iônico? Quando adicionamos um composto iônico na água, seus íons são dissociados, ou seja, o ânion e o cátion são separados. Por exemplo, para o cloreto de sódio, temos Na+ e Cl-. Se colocarmos um par de eletrodos imerso nessa solução, os íons positivos (Na+) serão atraídos pelo eletrodo negativo e os íons negativos (Cl-), pelo eletrodo positivo. Como a corrente elétrica é gerada pelo fluxo de cargas, a solução conduzirá eletricidade. Por isso, dizemos que o NaCl é um eletrólito. A equação dessa solução pode ser escrita da seguinte forma: NaCl(s)→ Na+ (aq)+Cl- (aq) E como explicar a intensidade da lâmpada? Isso pode ser explicado pela força do eletrólito. Um eletrólito forte é aquela substância que, em solução, está presente quase que totalmente na forma de íons, exemplos: HCl, NaCl, NaOH e HNO3. Por outro lado, um eletrólito fraco é uma substância que, em água, se ioniza incompletamente, isto é, parte das moléculas possui carga e outra parte permanece neutra.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
O ácido acético, componente principal do vinagre, é um exemplo de eletrólito fraco. Isso porque, quando misturado na água, uma fração das moléculas permanece na forma de CH3COOH e uma pequena fração na forma de íons acetato, CH3CO2-. Como podemos observar no experimento apresentado da lâmpada, um eletrólito forte conduz melhor eletricidade do que um eletrólito fraco. Uma questão bastante pertinente pode ser feita nesse momento: de que forma os íons são estabilizados pela água? Você precisa ter em mente que a água é classificada como um solvente polar, apesar de ser uma molécula neutra. Podemos observar regiões positivas e negativas nela. Essas regiões são formadas devido à diferença de eletronegatividade existente entre o oxigênio e o hidrogênio. A figura seguinte mostra o “polo” positivo, concentrado no H, e o negativo no O, através de um mapa de densidade eletrostática, que apresenta as regiões com densidade de cargas.
Figura 68 - Mapa eletrostático da água: na região em azul está localizado o polo positivo e na vermelha, o negativo. Fonte: <http://www.abq.org.br/cbq/2007/trabalhos/6/6-165-19.htm>.
Ao dissolvermos um composto iônico como KBr, as cargas são dissociadas em K+ e Br-. A extremidade positiva da água é orientada na direção do ânion Br- e, do mesmo modo, a parte negativa se aproxima do cátion K+. Dessa forma, os íons são rodeados pelas moléculas de água e, assim, as cargas são estabilizadas em solução. Esse processo é conhecido como hidratação, o qual pode ser visualizado na próxima figura.
Hidratação de compostos iônicos. As regiões positivas e negativas da água são representadas por δ+ e δ-. Fonte: <http://zeus.qui.ufmg.br/~qgeral/?p=482>. 94
AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
6.2 REAÇÕES DE PRECIPITAÇÃO Entre as reações em solução aquosa mais comuns destacam-se as reações de precipitação, que são reações que apresentam a formação de um produto sólido insolúvel chamado de precipitado. Um precipitado é “[...] um sólido insolúvel que se separa da solução” (CHANG, 2007, p. 96). Podemos observar uma típica reação de precipitação quando adicionamos uma solução de cloreto de sódio (NaCl) a uma solução de nitrato de prata (AgNO3). Notem que são duas soluções de eletrólitos fortes e, em solução, formam os íons Na+ e Cl-, originados da dissolução do cloreto de sódio e Ag+ e NO3-, que são provenientes do nitrato de prata. Quando essas soluções se misturam, rapidamente um precipitado branco é formado, conforme podemos observar na figura seguinte.
Figura 69 - Formação do cloreto de prata, AgCl. Fonte: <http://imagens.tabelaperiodica.org/nitrato-de-prata-em-acido-cloridrico/>.
O precipitado branco, representado na figura anterior, é o cloreto de prata, AgCl, formado da combinação entre o cátion Ag+ e o ânion Cl-. Como ele é insolúvel em água, precipita imediatamente. Os íons resultantes, Na+ e NO3-, se combinam para formar o nitrato de sódio, NaNO3, e permanecem em solução porque são solúveis em água. A reação de precipitação entre o NaCl e AgNO3 pode ser representada pela seguinte equação: AgNO3 (aq)+ NaCl(aq) →AgCl(s)+NaNO3 (aq) A reação descrita é um exemplo de reação de dupla troca, em que os dois compostos trocam de pares, cátions e ânions durante a reação.
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Algumas das estruturas mais impressionantes da natureza são produtos de reações de precipitação, tais como os recifes de corais e a formação de grutas calcárias na forma de estalactites e estalagmites.
Figura 70 - Estalactites e estalagmites. Fonte: <http://educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/produzindo-estalactites-estalagmites-laboratorio.htm>.
6.2.1 Equações iônicas completas e equações iônicas simplificadas A equação que descreve a formação do precipitado AgCl, descrito anteriormente, pode ser representada na forma de uma equação iônica completa, que mostra todos os íons dissolvidos: Ag+ (aq) + NO3- (aq) + Na+ (aq) + Cl- (aq) → AgCl(s) + Na+ (aq) + NO3- (aq) A equação iônica completa é útil porque, através dela, podemos identificar todos os reagentes envolvidos. Porém, se olharmos com atenção, veremos que os íons Na+ e NO3- não participam diretamente da reação, pois, no final, permanecem intactos. Esses íons são chamados de íons espectadores, já que aparecem de forma inalterável dos dois lados da equação. Assim, podemos ocultá-los e escrever a equação iônica simplificada, ou seja, descrever apenas as espécies que participam diretamente da reação da seguinte forma: Ag+ (aq) + Cl- (aq) → AgCl(s) A equação iônica simplificada salienta a transformação provocada pela reação química. No entanto, é preciso saber que existem outros íons dissolvidos na solução. A figura seguinte ilustra a diferença das duas equações.
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AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
Figura 71 - Comparação entre uma reação iônica completa e reação iônica simplificada. Fonte: Atkins (2006, p. 83).
6.2.2 Aplicações das reações de precipitação As reações de precipitação são úteis em diversas áreas do conhecimento. A mais expressiva aplicação é a produção de compostos de interesse, pois, como o produto é insolúvel, a sua separação da solução pode ser feita por meio de filtração. Outra aplicação da precipitação é a análise química, que pode ser dividida em duas categorias: análise qualitativa e análise quantitativa. Na análise qualitativa, o interesse é determinar as espécies presentes na amostra, de forma que o precipitado é utilizado para identificar a substância presente em determinados íons. Por outro lado, na análise quantitativa, o principal objetivo é definir a quantidade de substância presente na amostra. Esse tipo de análise é muito utilizada em investigações de contaminação ambiental, como a determinação da quantidade de chumbo, mercúrio e outros metais tóxicos no meio ambiente. Você deve estar se perguntando: como prever quais compostos serão insolúveis em água? A tabela a seguir apresenta alguns padrões de solubilidade de compostos iônicos, classificados como compostos solúveis e insolúveis em água, a uma temperatura de 25 °C.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Tabela 3 - Regras de solubilidade para compostos iônicos
COMPOSTOS SOLÚVEIS
EXCEÇÕES
» » Compostos contento íons dos elementos do grupo 1
» » Compostos de amônio (NH4+) » » Nitratos (NO3-), bicarbonatos (HCO3-), acetatos (CH3CO2-) e cloratos (ClO3-)
» » Haletos (Cl-, Br-, I-)
Haletos de Ag++, Hg22+ e Pb2+ Sulfatos de Ag++, Hg22+, Pb2+, Ca2+, Sr2+ e Ba2+
» » Sulfatos (SO4-) COMPOSTOS INSOLÚVEIS
EXCEÇÕES
» » Carbonatos (CO32-), cromatos (CrO42-), Compostos contendo íons dos elementos do grupo 1 e o íon oxalatos (C2O42-), fosfatos (PO43-) e sulfetos amônio (S2-) Compostos contento íons dos elementos do grupo 1 e 2, e o íon Ba2+ » » Hidróxidos (OH-) e óxidos (O2-)
6.3 REAÇÕES DE ÁCIDO-BASE Grande parte das pessoas utiliza ácidos e bases no seu cotidiano. Um dos medicamentos mais consumidos com ação anti-inflamatória, a aspirina, é na verdade o ácido acetilsalicílico. Além de medicamentos, os ácidos e as bases estão presentes em cosméticos, produtos de uso doméstico, são importantes em diversos processos industriais e fazem parte de inúmeros sistemas biológicos. Antes de estudarmos as reações ácido-base, é de suma importância entendermos um pouco sobre os próprios ácidos e bases.
O OH O O Figura 72 - Estrutura do ácido acetilsalicílico.
6.3.1 Propriedades gerais dos ácidos e das bases Os conceitos de acidez e de basicidade foram por muito tempo debatidos entre os químicos de diversas gerações. Em 1884, o químico Svante Arrhenius propôs: “Um ácido é um composto que contém hidrogênio e reage com a água para formar íons hidrogênio, e uma base é um composto que produz íons hidróxidos na água” (ATKINS, 2006, p. 87). Tais conceitos são bastante difundidos na química, os quais chamamos de ácidos e bases de Arrhenius. Um exemplo de ácido de Arrhenius é o HCl, pois em água libera um íon hidrogênio, H+.
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AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
Este íon é considerado um próton, pois não possui elétrons e, em solução aquosa, é hidratado pela água, formando o íon hidrônio H3O+. Veja: HCl(aq)+H2O(l)→ H3O+ (aq) + Cl-(aq)
Figura 73 - Formação do íon hidrônio. Fonte: <http://bibliotecadeinvestigaciones.wordpress.com/quimica/reacciones-acido-base/>.
Seguindo o mesmo conceito, o NaOH é uma base de Arrhenius, pois, quando dissolvido em água, libera íons OH-. Embora o conceito de Arrhenius sobre ácidos e bases seja eficiente, ele possui limitações, já que se refere somente a um solvente: a água. Para suprir a limitação conceitual de Arrhenius, algumas propostas mais abrangentes foram feitas. Entre elas, dois químicos que trabalharam de forma independente, Thomas Lowry e Johannes Brønsted, propuseram que a transferência de elétrons era responsável pelas propriedades dos ácidos e das bases. Assim, a definição Brønsted-Lowry é a mais aceita nos dias atuais. Segundo essa definição: » » um ácido é um doador de prótons; » » uma base é um receptor de prótons. Entre os ácidos, os mais utilizados são: o ácido nítrico (HNO3), presente em muitos processos industriais; o ácido sulfúrico (H2SO4), utilizado na produção de outros ácidos; o ácido acético (CH3COOH) e o ácido clorídrico (HCl). Com exceção do ácido sulfúrico, todos os ácidos citados são ácidos monopróticos, ou seja, cada um desses ácidos libera um íon de hidrogênio na sua ionização para água ou outras moléculas: HNO3 (aq) → H+ (aq)+ NO3- (aq) CH3COOH(aq) ⇌H+ (aq)+ CH3 COO- (aq)
As equações apresentadas descrevem a ionização de dois ácidos monopróticos distintos (ácido nítrico e ácido acético, respectivamente). Note que em cada caso somente um próton é liberado. O ácido acético (segunda equação) é um eletrólito fraco. Por esse motivo, sua ionização é incompleta e, assim, utilizamos setas duplas. Porém, alguns ácidos podem liberar mais de um próton durante a ionização, esses são chamados de ácidos polipróticos. O ácido sulfúrico (H2SO4) é um exemplo disso, pois libera dois íons H+ durante sua ionização em etapas distintas. Veja:
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Por se tratar de um eletrólito forte, no H2SO4, a primeira etapa da ionização, a qual perde o primeiro próton, é completa. Na segunda etapa, temos o HSO4-, que é um eletrólito fraco, por isso representamos sua ionização com setas duplas, já que não ocorre de maneira completa.
O ácido sulfúrico é tão importante, pois sua produção consiste em um bom indicador da economia e da força industrial de um país.
Agora, vamos tratar das bases. O NaOH, hidróxido de sódio, é uma das bases mais utilizadas no mundo. Podemos verificar que ele é uma base de Brønsted, pois depois da ionização libera o íon hidroxila, OH-, que é uma espécie aceptora de prótons: NaOH(s)→Na+ (aq)+OH- (aq) Assim, o íon OH- pode aceitar um próton para formar uma molécula de água: H+ (aq)+OH- (aq)→H2O(l) Aplicando o mesmo conceito de basicidade para a amônia, NH3, vemos que esta pode ser classificada como base, porque aceita um próton da água e forma os íons NH4+ e OH-, conforme descrita na equação:
Alguns compostos apresentam comportamento de ácido e base, esses compostos são denominados anfóteros.
6.3.2 Ácidos e bases fortes e fracos A medida da força de um ácido e de uma base está relacionada com a força dos eletrólitos. Isso porque os eletrólitos fortes formam íons com maior facilidade do que eletrólitos fracos. Por isso, quando tratamos de ácidos e bases, usamos o termo desprotonação (liberação de um próton) e protonação (recebimento de um próton). Dessa forma, podemos classificar os ácidos e as bases: Um ácido forte está completamente desprotonado em solução. Um ácido fraco está incompletamente desprotonado em solução. Uma base forte está completamente protanada em solução. Uma base fraca está incompletamente protonada em solução. (ATKINS, 2006, p. 89).
Assim, o ácido iodídrico (HI) é um ácido forte, pois, em solução, encontramos íons iodeto e íons hidrônio, além de uma quantidade extremamente pequenas de HI:
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AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
HI(aq)+H2 O(l)→H3 O+ (aq) + I- (aq) Como vimos anteriormente, o ácido acético em água sofre uma desprotonação. Porém, por ser um ácido fraco, uma pequena fração das moléculas libera o próton, permanecendo assim a maior parte das moléculas na forma de CH3COOH: CH3 COOH(aq) ⇌H3 O+ (aq)+CH3COO- (aq)
Da mesma forma, uma base forte, quando dissolvida em água, recebe prótons. Vejamos o exemplo de um óxido: O2- (aq) + H2O(l) →2OH- (aq) Assim, praticamente todo óxido se encontra na forma protonada. De uma forma geral, os óxidos e hidróxidos de metais alcalinos e alcalinos terrosos são bases fortes. Por outro lado, as bases fracas são bastante comuns, como as aminas, compostos que conferem o forte odor aos peixes, que são derivados da amônia: NH3 (aq)+ H2O(l) ⇌ NH4+ (aq) +OH- (aq)
Podemos observar, na equação anterior, que a amônia é uma base fraca, pois somente uma pequena proporção das moléculas está na forma protonada, íon NH4+, permanecendo assim a maior parte das moléculas na forma não protonada, NH3.
6.3.4 Neutralização ácido-base Uma reação que ocorre entre um ácido e uma base é chamada de reação de neutralização. De uma forma geral, a reação de neutralização de um ácido forte e uma base forte produzem água e um composto denominado sal. “O sal é um composto iônico constituído por um cátion diferente de H+ e um ânion diferente de OH- ou O2-” (CHANG, 2007, p. 104). ácido +base→sal +água Um típico exemplo de reação de neutralização é aquela que ocorre quando HCl é misturado com NaOH. Veja: HCl(aq)+NaOH(aq) → NaCl(aq)+H2O(l) O sal formado é o sal comum de cozinha, cloreto de sódio. E, como todo sal formado a partir de uma reação ácido-base, o cátion é proveniente da base, e o ânion do sal vem do ácido. Agora vejamos a reação de uma base forte, NaOH, e um ácido fraco, HCN: HCN(aq) +NaOH(aq) → NaCN(aq)+ H2O(l) Vimos que para as reações de precipitação podemos escrever as equações de forma completa ou simplificada. Essas representações também são válidas para as reações de ácido-base. Considerando a reação entre o NaOH e HCN, a equação iônica completa para essa reação é a seguinte: HCN(aq) + Na+ (aq) + OH-(aq) → Na+(aq) +CN-(aq) +H2O(l) Perceba que podemos cancelar os íons comuns presentes de cada lado da equação e escrever a reação iônica simplificada assim: HCN(aq) +OH- (aq) → CN- (aq) + H2O(l) 101
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Note que utilizamos a forma molecular do HCN, pois este é um ácido fraco e a sua forma molecular predomina na solução. No nosso cotidiano, estamos cercados de reações de neutralização. Quando preparamos uma limonada, a acidez do limão (que contém ácido cítrico) pode ser amenizada acrescentando uma base, como o bicarbonato de sódio. Dessa forma, por meio de uma reação de neutralização, podemos deixar a limonada mais apetitosa.
6.4 REAÇÕES DE OXIRREDUÇÃO Elas são assim nomeadas por envolverem dois processos inseparáveis: a redução e a oxidação. Exemplos desse tipo de reação são a fotossíntese, a combustão e a extração de metais; reações que parecem completamente diferentes, mas que em seu princípio são semelhantes. O principal aspecto dessas reações é a transferência de elétrons entre as espécies envolvidas, gerando compostos diferentes por uma permutação dos átomos envolvidos na reação.
6.4.1 Oxidação e redução Como foi dito, os processos de redução e de oxidação são inseparáveis. Mas o que são esses processos? O termo oxidação, originalmente, se referia a uma “reação com o oxigênio” (ATKINS, 2006, p. 92), como na reação entre grafite e oxigênio, para gerar CO2. Confira: C(s)+O2(g) → CO2(g) Entretanto, ao longo da evolução da Química, notou-se que várias outras reações seguiam o mesmo padrão de reação, ou seja, elétrons eram perdidos por uma espécie e transferidos para outra, igual ao que acontece com o carbono no exemplo dado. Por isso, o termo oxidação é utilizado para a perda de elétrons por um átomo, independentemente da espécie para qual eles migram (não é necessário ser o oxigênio), pois a etapa principal desse tipo de reação é a transferência de elétrons, e não as espécies envolvidas. Mas se os elétrons são transferidos de espécies, uma das espécies envolvidas na reação deverá recebê-los, certo? Veja o exemplo a seguir. F2O3(s)+3CO2(g)→2Fe(l)+3CO2(g) Note que nessa reação o átomo de ferro, contido no óxido, torna-se um átomo livre – uma reação oposta à de oxidação. Nessa reação, o Fe3+ é convertido a Fe0 (a reação mostrada é uma etapa na produção do aço). Como podemos ver, o Fe3+ ganha 3 elétrons para neutralizar sua carga. Em outras palavras, 3 elétrons migram para ele.
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AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
Essa reação é denominada redução e, originalmente, “[...] era utilizada para a extração de um metal de seu óxido” (ATKINS, 2006, p. 92). Assim como na oxidação, um padrão de reação foi observado e, hoje, o termo redução é utilizado para o ganho de elétrons por um átomo. Seguindo as leis de conservação, sabemos que os elétrons não podem ser “perdidos” nem podem “surgir do nada”. Por esse motivo, as reações de oxidação e redução são inseparáveis na prática. Sempre que, em uma reação, alguma espécie se oxidar, obrigatoriamente outra irá se reduzir. Analisando as reações mostradas, vemos que o carbono perde elétrons para o oxigênio e que o ferro ganha elétrons do CO. Entretanto, podemos dizer que o oxigênio causou a perda de elétrons do carbono, no primeiro exemplo, e por esse motivo ele é denominado de agente oxidante. Já o CO causou o ganho de elétrons do Fe, no segundo exemplo, e é denominado agente redutor. Lembre-se: o agente oxidante de uma reação é a espécie que provoca a oxidação e, então, é reduzida. Já o agente redutor atua de forma inversa, provocando a redução de uma espécie e se oxidando.
6.4.2 Número de oxidação Após ver os conceitos básicos das reações, você deve estar se perguntando: mas como vou identificar a oxidação e a redução em uma reação química? Primeiro é preciso distinguir qual espécie perde e qual ganha elétrons, mas essa não é uma tarefa fácil apenas olhando a reação. Os químicos encontraram uma maneira de tornar essa tarefa mais simples, atribuindo um “número de oxidação” a cada elemento. Ele pode ser entendido como uma medida de quantos elétrons determinado átomo perde ou ganha em determinada reação. O número de oxidação é definido do seguinte modo: - A oxidação corresponde ao aumento no número de oxidação. - A redução corresponde à diminuição no número de oxidação. Uma reação redox, portanto, é qualquer reação na qual os números de oxidação se alteram. (ATKINS, 2006, p. 93).
A figura a seguir apresenta um esquema geral da relação entre oxidação e redução do número de oxidação.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 74 - Oxidantes e redutores. Fonte: Atkins (2006, p. 95).
Veja agora um exemplo de reação redox, vista na aula 4, com a variação dos números de oxidação.
MnO2 + KClO3 + KOH +4
K2MnO4 + KCl + H2O
+5
-1
+6
-
Redução: Cada átomo de Cl ganha 6 e Cada fórmula unitária de KClO3 ganha 6 e-
Oxidação: Cada átomo de Mn perde 2e Cada fórmula unitária de MnO2 perde 2eFigura 75 - Reação redox. Fonte: Adaptado de Russell (2008, p. 595).
Balanceando a equação, obtemos: 3MnO2 + KClO3 + KOH → K2 MnO4 + KCl +H2O Veremos agora algumas regras úteis para determinar o número de oxidação dos átomos em um composto. » » O número de oxidação de um elemento não combinado com outros elementos é zero. Exemplos disso são moléculas como O2, H2, Cl2. » » A soma dos números de oxidação de todos os átomos em uma espécie é igual à sua carga total. » » O número de oxidação do hidrogênio é +1 quando combinado com não metais e -1 quando combinado com metais.
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AULA 6 – REAÇÕES QUÍMICAS
» » O número de oxidação dos elementos dos grupos 1 e 2 é igual ao número do seu grupo, +1 e +2, respectivamente. Exemplo: Na+1, Mg+2. » » O número de oxidação de todos os halogênios é -1, exceto quando o halogênio está combinado com o oxigênio, ou outro halogênio, em um período mais alto no grupo. O número de oxidação do flúor é -1 em todos seus compostos. » » O número de oxidação do oxigênio é -2, na maioria de seus compostos. As exceções são seus compostos com flúor e em peróxidos (O22-), superóxidos (O2-) e ozonídeos (O3-).
CONCLUSÃO Esperamos que, ao final desta aula, você tenha compreendido a importância e o impacto das reações químicas em nossa vida. As informações apresentadas aqui são apenas um pequeno exemplo das quase infinitas reações que ocorrem em nossa volta. Até porque podemos obter os mais diversos produtos que utilizamos por meio de reações químicas e imaginar muitos outros utilizando nossos conhecimentos sobre reações, não é mesmo?
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AULA 7 Eletroquímica: Pilhas e Eletrólise
INTRODUÇÃO A maior parte da energia elétrica que utilizamos, em nosso dia a dia, é proveniente da transformação da energia mecânica (geralmente a movimentação de grandes turbinas) em eletricidade. Outra parte da energia elétrica utilizada por nós advém da transformação de energia química, comum em pilhas e baterias. Nesta aula, veremos como ocorrem essas transformações e realizaremos cálculos para determinar a voltagem gerada. Assim, entenderemos a importância dessas fontes de energia e sua utilização para a ciência. Vamos em frente!
OBJETIVOS » » Entender o que é o funcionamento de uma célula galvânica e eletrolítica.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » Saber diferenciar uma célula galvânica e uma eletrolítica. » » Aprender a representar as células eletroquímicas. » » Entender o conceito de potencial padrão de eletrodo. » » Utilizar a equação de Nernst para calcular o potencial de um eletrodo.
7.1 CÉLULA ELETROQUÍMICA Você se lembra que, na aula 6, estudamos a reação redox? E que seu fator principal é a transferência de elétrons entre espécies? Então, por esse motivo, algumas dessas reações podem ser realizadas sem que haja o contato direto entre os reagentes. Como? Colocando em frascos separados. Para entender, observe a figura a seguir, que mostra três sistemas diferentes que podem ser utilizados.
Figura 75 - Solução eletrolítica: célula eletroquímica com utilização de ponte salina. Fonte: Russel (2008, p. 870).
O sistema, onde ocorre essa reação, é chamado de célula eletroquímica, que pode ser classificada de galvânica ou eletrolítica. Essa célula consiste em “[...] um dispositivo em que uma corrente elétrica é produzida por uma reação química espontânea ou é usada para forçar a ocorrência de uma reação não-espontânea”. (ATKINS, 2006, p. 543). Quando a reação que está ocorrendo é espontânea, classificamos como galvânica. Já quando a reação não ocorre espontaneamente, chamamos de eletrolítica. Uma célula eletroquímica tem dois condutores denominados eletrodos. Na figura anterior, percebemos placas de zinco e cobre, cada uma imersa em uma solução eletrolítica. Para que o fluxo de cargas no sistema não seja interrompido, o modo mais comum é a colocação de uma ponte salina em contato com os dois recipientes. Assim, através dela, o fluxo será mantido.
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AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Você sabia que a pilha de Daniell foi inventada pelo químico britânico John Daniell, em 1836? O objetivo dessa invenção foi fornecer uma fonte de energia confiável e estável para a telegrafia. A célula consistia em eletrodos de cobre e zinco, imersos em soluções de sulfato de cobre e de zinco, respectivamente. Essas soluções entravam em contato através de uma barreira porosa. Veja o esquema na figura a seguir.
Figura 76 - Figura 76 – Pilha de Daniell. Fonte: Atkins (2006, p. 544).
7.1.1 Célula Galvânica Uma célula galvânica armazena energia. Por exemplo, pilhas e baterias são compostas de uma ou mais células galvânicas, em um arranjo em série, para produzir a energia necessária à sua utilização. Como vimos, essa célula é capaz de produzir eletricidade devido ao fato de a reação redox ocorrer de forma espontânea, ou seja, transferência de elétrons entre os eletrodos, produzindo uma corrente elétrica.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 77 - Barra de zinco imersa em uma solução de sulfato de cobre. Fonte: Russel (2008, p. 869).
Analisando a figura anterior, há uma barra de zinco (Zn) imersa em uma solução de sulfato de cobre (CuSO4). Após certo tempo, uma camada de Cu2+ se deposita na superfície da barra. Isso ocorre devido à transferência de elétrons dos átomos de zinco da barra para os íons Cu2+ da solução. Observe a equação: Zn(s)+ Cu2+⇌ Zn2++ Cu(s)
Com a oxidação dos átomos de zinco, os cátions que se formam viram solúveis e passam para a solução de eletrólito. Com isso, os íons de cobre, que são reduzidos, se fixam na barra metálica. Entretanto, podemos realizar essa mesma reação colocando o zinco e o cobre em compartimentos separados, desde que seja fornecida uma maneira dos elétrons serem transferidos. Por exemplo, se colocarmos um fio metálico unindo os dois eletrodos. Confira essa hipótese na imagem a seguir.
Figura 78 - Eletrodos imersos em seus respectivos eletrólitos e separados por uma parede porosa. Fonte: Russel (2008, p. 869).
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AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Lembre-se de que uma reação de oxirredução depende da transferência de elétrons entre as espécies. Em uma célula eletroquímica, isso se reflete na natureza (estados e concentrações das espécies), conforme veremos em breve.
Vamos agora observar uma célula galvânica mais de perto, por meio da figura a seguir, que mostra eletrodos de cobre (Cu) e prata (Ag).
Figura 79 - Esquema de uma célula galvânica. Fonte: Skoog (2007, p. 472).
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Nesse sistema, o eletrodo de cobre se encontra mergulhado em uma solução de sulfato de cobre (CuSO4); já o de prata, em nitrato de prata (AgNO3). Perceba, através da equação a seguir, quais reações ocorrem: Cu(s) ⇌ Cu2+ +2e-
2Ag++2e- ⇌2Ag(s)
Note que o eletrodo de cobre sofre oxidação. Ou seja, o cobre contido no eletrodo perde elétrons e se oxida para Cu2+, o qual é transferido para a solução. Conforme os elétrons “abandonam” o eletrodo, há uma concentração de carga positiva na superfície, fazendo com que os íons de sulfato (SO42-) e de hidrogenosulfato (HSO4-) sejam atraídos para perto do eletrodo. Após certo tempo, o eletrodo de cobre começa a perder massa, devido a essa passagem de íons para a solução.
Os elétrons fluindo no fio podem realizar trabalho, como acender uma lâmpada ou ligar um rádio. Por convenção, a corrente elétrica (I) gerada flui no sentido oposto ao fluxo dos elétrons.
Como podemos ver na figura, os elétrons migram para o eletrodo de prata e, por consequência, este se reduz, fazendo com os íons Ag+ transformem-se em Ag0, fixando no eletrodo. Com o ganho de elétrons, o eletrodo de prata adquire uma concentração de carga negativa em sua superfície, fazendo com que os íons de nitrato (NO3-) sejam repelidos. Assim, esse eletrodo ganha massa, devido ao depósito de íons. A ponte salina, colocada para conectar esses dois eletrodos, fecha o sistema e permite o movimento de cargas. Note que elétrons fluem de um eletrodo para o outro. Eventualmente, isso acaba gerando acúmulo de carga nos dois lados do sistema, tornando-o instável. Na ponte salina há íons que se movimentam para as interfaces dessa ponte com cada solução para balancear as cargas. No exemplo da figura, os íons de cloreto (Cl-) movimentam-se para o eletrodo de cobre (Cu), visto que existe acúmulo de cargas positivas (aumento da concentração de Cu+) no eletrólito; e os íons de potássio (K+) para o eletrodo de Ag, pois há um acúmulo de cargas negativas (diminuição da concentração de Ag+) no eletrólito. Portanto, pela ação eletrostática entre as cargas, a carga total do sistema acaba sendo neutralizada. Como nas extremidades da ponte salina ocorrem interações eletrostáticas, ali ocorre um efeito chamado de potencial de junção líquida, o qual pode alcançar alguns centésimos de volts e acarreta um erro nas leituras. Entretanto, escolhendo-se adequadamente a composição da ponte salina, esse potencial se torna pequeno o suficiente para ser desprezível. Por isso, o eletrólito mais usado em pontes salinas é uma solução saturada de cloreto de potássio (KCl). Para não haver a necessidade de especificar qual eletrodo sofre a oxidação e qual sofre redução toda vez que nos referimos a uma célula galvânica, esses eletrodos recebem nomes especiais: ânodo, quando ocorre oxidação, representado sempre à direita; cátodo, quando há redução, representado sempre à esquerda.
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AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Para se lembrar dessas denominações, pode ser usado o seguinte truque: no catodo ocorre redução – ambas as palavras começam com consoante –, e no ânodo ocorre oxidação – ambas começam com vogal.
7.1.2 Representação esquemática de células Imagine que no seu trabalho você precise representar células galvânicas. Seria extremamente tedioso e demorado desenhar todas as partes de uma célula da mesma forma que foi mostrado na figura anterior, certo? Por esse motivo, uma representação mais simples foi inventada. Veja a seguir como essa representação pode ser feita. Cu | Cu2+ (X mol L-1) || Ag+ (Y mol L-1) | Ag Segundo Skoog (2007, p. 471), “Por convenção, uma linha vertical simples indica um limite entre fases, ou interface, na qual o potencial se desenvolve. A linha vertical dupla representa dois limites, um em cada extremidade da ponte salina”. Note que a representação segue a mesma utilizada na figura anterior. Da esquerda para a direita, temos: o eletrodo onde ocorre a oxidação, cobre (Cu), com sua interface com o eletrólito, Cu2+; a ponte salina, representada pela linha vertical dupla; o eletrólito de prata (Ag+) com a interface com o eletrodo onde ocorre a redução, Ag. Por fim, as letras X e Y, representando as concentrações do eletrólito de Cu2+ e Ag+, respectivamente. Sempre se coloca o ânodo na esquerda e o cátodo na direita nesse tipo de representação. Uma segunda forma de representar uma célula galvânica é mostrada a seguir. Observe que agora indicamos os compostos utilizados para sua preparação. Cu | CuSO4 (X mol L-1) || AgNO3 (Y mol L-1) | Ag Duas aplicações de grande importância de células galvânicas são as pilhas/baterias e a proteção contra oxidação. Na utilização das células galvânicas como pilhas, podemos citar as células primárias. Uma célula primária é uma galvânica onde os reagentes são selados em seu interior, no momento da fabricação, e que não pode ser recarregada. Das células primárias, podemos citar as pilhas secas, também chamadas de células de Leclanché (uma homenagem a seu inventor, Georges Leclanché), que são cilíndricas e utilizadas em nosso dia a dia. O invólucro cilíndrico é feito de zinco, o qual serve como ânodo, com um papel recobrindo seu interior e servindo de barreira porosa. O cátodo se localiza no centro e é constituído de um cilindro de carbono. Já o eletrólito é uma pasta úmida de cloreto de amônio, óxido de manganês (IV), grânulos de carbono e uma carga inerte, geralmente de amido. A seguir é mostrado um esquema dessa pilha.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 80 - Esquema estrutural de uma pilha seca. Fonte: Atkins (2006, p. 566).
Uma célula mais duradoura é a pilha alcalina. Ela é semelhante à pilha seca, mas usa um eletrólito que reage mais lentamente com o eletrodo de zinco, quando não está em uso. Apesar da oxidação de metais por exposição ao ambiente não ser, exatamente, uma célula galvânica, o processo que ocorre em sua oxidação e seus princípios são os mesmos que vimos anteriormente. Veja bem, a água, na presença de oxigênio, é capaz de oxidar o Fe. O Fe (II) é posteriormente oxidado a Fe (III), dando origem ao que conhecemos como ferrugem, ou seja, ao óxido de ferro hidratado (Fe2O3.H2O). Esse processo se dá de maneira espontânea, conforme figura a seguir.
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AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Figura 81 - Processo de formação de ferrugem. Fonte: Atkins (2006, p. 565).
Entretanto, se depositarmos uma camada de Zn sobre a estrutura de ferro, impedimos a oxidação do material pelo contato com a água e com o oxigênio, conservando, assim, as propriedades dessa estrutura. Esse processo de deposição é chamado de galvanização e é amplamente utilizado na indústria.
7.1.3 Célula Eletrolítica Vimos que em uma célula galvânica as reações de oxirredução acontecem de forma espontânea, gerando energia. Entretanto, podemos fazer com que a reação inversa ocorra, fornecendo energia elétrica à célula. Uma célula onde a reação ocorre devido ao fornecimento de uma corrente elétrica externa é chamada de célula eletrolítica, e esse processo é dito eletrólise. O arranjo de uma célula eletroquímica, geralmente, é diferente daquele de uma célula galvânica. Tipicamente, os dois eletrodos estão no mesmo compartimento, utilizando apenas um eletrólito, com concentrações e pressões muito diferentes das condições padrão. A figura a seguir mostra um esquema da célula utilizada no processo Dow para produção de magnésio. Com a motivação de não causar confusão, usaremos o diagrama para células eletrolíticas, igual ao utilizado para células galvânicas.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 82 - Esquema da célula utilizada no processo de fabricação do Mg. Fonte: Atkins (2006, p. 559).
Perceba pela figura que a representação de ânodo e cátodo em uma célula eletrolítica é a mesma de uma célula galvânica. Ou seja, o anodo à esquerda e o catodo à direita. Um ponto importante para uma célula eletrolítica é quantificar a energia a ser fornecida para realizar a eletrólise de determinada massa de material, a qual veremos a seguir.
7.1.3.1 Leis de Faraday No começo do século XIX, o cientista Michael Faraday estabeleceu certas relações conhecidas como as leis de Faraday para a eletrólise. Essas relações dizem que: a) a quantidade de substância produzida pela eletrólise é proporcional à quantidade de eletricidade utilizada para realizá-la; b) para certa quantidade de eletricidade utilizada, a quantidade de substância produzida é proporcional à sua massa equivalente. Para desenvolver essas relações, estabeleceu-se uma unidade denominada Faraday (F), que equivale a 1 mol de elétrons. Por exemplo, na semirreação a seguir, 2 elétrons são necessários para reduzir 1 molécula de cobre. Logo, para reduzir 1 mol de Cu2+ são necessários 2 mols de elétrons, ou seja, 2 faradays. Veja: Cu2+ +2e- ⇌ Cu(s)
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AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Uma unidade menor de energia é o coulomb (C), e 1 F equivale a 9,6487 x 104 C (podemos arredondar esse valor a 9,65 x 104 C), e uma unidade convencional de corrente elétrica, o ampére (A), equivale a 1 C por segundo (1A = 1C.s-1).
Imagine que você precisa calcular a quantidade de cobre sólido (Cu(s)) formada ao se passar uma corrente de 4 A, por 3 horas, em um eletrólito, contendo Cu2+ em solução e utilizando-se eletrodos inertes. Sabemos que 2 mols de elétrons são necessários para reduzir 1 mol de Cu2+. Agora precisamos quantos faradays são utilizados durante a eletrólise. Temos: 4 A=4 C.s-1 3 h=10800 s Utilizamos um total de 4,32 x 104 C, que equivale a 0,45 F. Utilizando a massa molar do cobre (Cu), 63,54 g mol-1, temos a equação:
Assim, vemos que, após aplicar a corrente informada, iremos obter 14,30 g de cobre sólido (Cu(s)).
7.1.4 Potencial de eletrodo Vimos até agora células galvânicas e eletrolíticas, mas como saber sobre qual delas estamos falando ao olharmos uma representação de célula? Como calcular o potencial gerado pela pilha ou saber o potencial mínimo a ser aplicado para realizar a eletrólise? Seria útil se possuíssemos as tensões de várias semirreações, os chamados potenciais de eletrodo absoluto, que poderiam ser somados de forma algébrica, visto que uma oxidação não ocorre sem redução, gerando o potencial da célula, como mostrado a seguir: Etotal = E1 + E2 Suponha que possuíssemos um eletrodo, o qual gera um potencial de 0,52 V ligado a outro de 0,68 V, em uma célula galvânica. O potencial total dessa célula seria dado por: Ecélula = 0,52 V + 0,68 V Ecélula = 1,20 V Explicaremos o cálculo do potencial de célula e como realizá-lo mais adiante.
117
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Entretanto, não é possível medir diretamente o potencial de um eletrodo. Isto é, só se pode medir o potencial de um eletrodo em relação a outro. Para tanto, o eletrodo de referência escolhido para essas medidas é o eletrodo padrão de hidrogênio.
7.1.5 Eletrodo padrão de hidrogênio Um eletrodo de referência necessita obedecer a alguns critérios: ele precisa ser de fácil construção, reversível e de comportamento reprodutível. Um eletrodo que atende a esses critérios é o eletrodo padrão de hidrogênio (EPH). Ele tem sido usado como referência para medir os potenciais de semirreações. O EPH é constituído por um pedaço de metal recoberto com platina finamente dividida para aumentar sua área superficial. O eletrodo é, então, imerso em uma solução contendo íons de hidrogênio (H+) com concentração adequada e conhecida. A solução é mantida saturada em hidrogênio, borbulhando-se o gás a uma pressão constante no eletrodo. É importante ressaltar que a platina não participa da reação, ela serve apenas como a superfície por onde os elétrons são transferidos. Esse arranjo é mostrado na figura a seguir.
Figura 83 - Eletrodo padrão de hidrogênio. Fonte: Skoog (2007, p. 477).
A semirreação que ocorre nesse eletrodo é a seguinte: 2H+aq + 2e- ⇄ H2(g)
E representamos o eletrodo da seguinte maneira:
Pt, H2 (p = 1,00 atm) | ([H+] = x mol L-1) || Com isso, dizemos que o hidrogênio possui uma pressão de 1 atmosfera no eletrodo e os íons H+ a uma concentração de x mol L-1 no eletrólito. Por convenção, o potencial do eletrodo padrão de hidrogênio é definido como tendo um valor de 0,000 V sob todas as temperaturas.
118
AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Como consequência, qualquer potencial desenvolvido em uma célula galvânica consistindo de em um eletrodo padrão de hidrogênio e algum outro eletrodo é atribuído inteiramente ao outro eletrodo. (SKOOG, 2007, p 477).
Com isso, agora podemos falar dos potenciais de diversas reações e utilizá-los para aplicações úteis. Se quisermos obter o potencial de algum eletrodo, digamos um eletrodo de cobre, colocaremos um eletrodo de cobre puro em contato com uma solução contendo íons Cu2+, ligado a um EPH (eletrodo de referência). Essa célula é mostrada a seguir.
Figura 84 - Eletrodo de EPH ligado a um eletrodo de Cu. Fonte: Skoog (2007, p. 478).
Podemos, então, determinar o potencial do eletrodo de cobre por um algebrismo simples, pois o EPH possui potencial de 0,00 V: Ecélula = Edireita – Eesquerda = ECu – EEPH = 0,337 V – 0,00 V = 0,337 V Mas se utilizarmos um eletrodo de zinco no lugar do cobre, veremos que a tensão medida é de -0,763 V. Isso nos mostra uma segunda situação possível. Veja: Ecélula = Edireita – Eesquerda = EZn – EEPH = -0,763 V – 0,00 V = -0,763 V Note que definimos o potencial do EPH como zero, mas isso não significa que esse eletrodo irá reduzir todos os outros elementos, igual ao eletrodo de cobre (Cu). Assim como vários elementos serão reduzidos pelo EPH, outros tantos não serão e, de fato, irão oxidá-lo. Lembre-se de que, em uma célula galvânica, a corrente elétrica acontece de maneira espontânea, o que significa que mediremos uma tensão positiva na célula, como no caso do eletrodo de cobre (Cu). Se a reação não for espontânea, necessitamos fornecer energia para que ela ocorra, como em uma célula eletrolítica. No arranjo do EPH, ele se encontra à direita. Assim, a corrente flui no sentido inverso ao desejado e obtemos uma medida negativa para o potencial.
119
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Pelo arranjo do EPH, então, sempre mediremos o potencial de redução do eletrodo à direita. Se o valor for positivo, o EPH reduz o eletrodo à direita. Se o valor for negativo, o EPH é reduzido pelo eletrodo à direita.
Digamos, agora, que queremos construir uma célula galvânica utilizando o eletrodo de cobre (Cu) e o de zinco (Zn). Qual eletrodo deveria ir à esquerda e qual à direita? Para sabermos isso, precisamos olhar o potencial de cada eletrodo. Sabemos que a célula galvânica possui um potencial de célula positivo. Se usarmos o algebrismo mostrado para o eletrodo de cobre e os valores mostrados para os eletrodos de cobre (Cu) e zinco (Zn), vemos que o Zn tem de ficar na esquerda, pois: Ecélula = ECu – EZn = 0,337 – (-0,763) = 1,100 V Veja que, com esse cálculo, podemos saber o valor máximo de potencial que a célula pode alcançar. Também podemos escrever o diagrama da seguinte forma: Zn | Zn2+ (X mol L-1) || Cu2+ (Y mol L-1) | Cu Se invertermos o diagrama, obteremos uma célula eletrolítica, cujo potencial mínimo necessário a ser fornecido para a reação ocorrer é de 1,100 V (note que o valor encontrado ao invertermos o diagrama é de -1,100 V, o que indica que a reação não é espontânea, portanto uma eletrólise, por ser necessário fornecer, no mínimo, o valor encontrado para a reação ocorrer, por isso o sinal negativo).
7.1.6 A equação de Nernst e o Potencial Padrão de Eletrodo Como já mencionado, a concentração de um eletrólito influenciará o seu comportamento. Note que até agora omitimos a concentração dos eletrólitos nas células mostradas. Por exemplo, se deixarmos uma célula galvânica agindo por certo tempo, será normal que a voltagem produzida diminua, até a pilha parar de funcionar. O cientista alemão Walther Nernst deduziu uma expressão que relaciona a concentração dos eletrólitos e o potencial da célula, expressão conhecida como Equação de Nernst, em sua homenagem. Considere a seguinte semirreação reversível: aA + bB+ne- ⇄ cC + dD
Em que as letras maiúsculas representam as espécies participantes, as letras minúsculas a estequiometria da espécie à sua direita e e- representa os elétrons. A equação de Nernst que descreve esse sistema é a seguinte: Sendo: E0 – o potencial padrão do eletrodo, o qual é característico de cada semirreação; R – a constante ideal dos gases (8,314 J K-1 mol-1);
120
AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
T – a temperatura em K; n – o número de elétrons que aparecem na semirreação balanceada para o processo; F – o faraday; ln – logaritmo natural = 2,303 log.
Na equação de Nernst, no dividendo sempre são colocados os produtos e no divisor, os reagentes.
Se substituirmos o valor de R na equação, trocarmos ln por log e fixarmos a temperatura em 25 °C, a equação de Nernst se reduz a:
Veremos agora três situações distintas na utilização da equação de Nernst. 1) Uma célula em que o eletrodo é feito do metal envolvido na semirreação. Na célula representada a seguir, o eletrodo é feito de ferro (Fe) e a solução contém Fe2+ e é mostrada a semirreação que está ocorrendo.
A equação de Nernst para essa situação é:
Note que, a parte da equação em que colocamos o reagente, igualamos ele a 1 em vez de colocar a concentração. Isso porque o reagente, no caso o eletrodo de Fe, é sólido. Por esse motivo, sua concentração é considerada constante e igual a 1.
121
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
2) Uma célula em que o eletrodo é feito de um metal inerte e a semirreação ocorre no eletrólito. Observe a célula e a semirreação a seguir:
A equação de Nernst para esse caso é:
Perceba que utilizamos a concentração de Fe2+ como reagente, pois o eletrodo de platina serve apenas como interface para a transferência de elétrons. Ou seja, ele não toma parte na reação que está ocorrendo. 3) Uma célula que envolve a transferência de mais de 1 elétron. Veja a seguinte célula:
Nessa célula, acontecem as seguintes semirreações:
A equação balanceada é:
E a semirreação para o cobre (Cu) fica:
Você poderia pensar que o potencial gerado pela semicélula de cobre é 3 vezes maior do que o gerado em uma semicélula, em que somente 1 molécula de cobre é necessária para balancear a equação. Entretanto, isso não ocorre. O potencial é o mesmo, independentemente do número de mols necessário. Podemos demonstrar isso matematicamente. Veja:
122
AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Aplicando as propriedades de logaritmo:
Simplificando a equação:
A única diferença é que, nessa situação, o cobre (Cu) será consumido 3 vezes mais rapidamente e a célula terá um tempo de utilização menor. Vamos, agora, calcular o potencial gerado pela pilha representada a seguir. Pt | Sn2+ (0,23 mol L-1), Sn4+ (0,02 mol L-1) || Co2+ (0,41 mol L-1), Co3+ (0,05 mol L-1) | Pt Primeiro, temos de lembrar que o potencial da pilha se dá por: Ecélula =ECo - ESn Agora, utilizando a equação de Nernst e o potencial padrão de eletrodo (E0) para cada semirreação (dados na tabela a seguir), devemos calcular o potencial para cada semicélula. Para o estanho (Sn), temos:
Para o cobalto (Co), usamos a mesma expressão:
Assim, para o potencial máximo da célula, obtemos: Ecélula
= 1,77 V-(-0,07 V) = 1,84 V
Com a equação de Nernst, podemos agora definir o potencial padrão de um eletrodo (E0). Esse potencial é definido assim quando o quociente das concentrações é igual à unidade. Geralmente, os valores dados para semirreações são os de potencial padrão.
123
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Na tabela a seguir, são apresentados alguns potenciais padrão de redução. Confira. Tabela 4 - Potenciais de redução padrão.
E0 /V
MEIA-REAÇÃO Li+ (aq) + e- → Li (s)
-3,05
K (aq) + e → K (s)
-2,93
Ba (aq) + 2e → Ba (s)
-2,90
Sr2+ (aq) + 2e- → Sr (s)
-2,89
Ca2+ (aq) + 2e- → Ca (s)
-2,87
Na (aq) + e → Na (s)
-2,71
Mg (aq) + 2e → Mg (s)
-2,37
Be2+ (aq) + 2e- → Be (s)
-1,85
Al3+ (aq) + 3e- → Al (s)
-1,66
+
-
2+
-
+
-
2+
-
Mn (aq) + 2e → Mn (s) 2+
-1,18
-
2H2O + 2e → H2 (g) + 2OH (aq)
-0,83
Zn (aq) + 2e → Zn (s)
-0,76
Cr3+ (aq) + 3e- → Cr (s)
-0,74
Fe (aq) + 2e → Fe (s)
-0,44
-
-
2+
-
2+
-
Cd (aq) + 2e → Cd (s) 2+
-0,40
-
PbSO4 (s) + 2e → Pb(s) SO (aq)
-0,31
Co2+ (aq) + 2e- → Co (s)
-0,28
Ni2+ (aq) + 2e- → Ni (s)
-0,25
Sn (aq) + 2e → Sn (s)
-0,14
Pb (aq) + 2e- → Pb (s)
-0,13
2H+ (aq) + 2e- → H2 (g)
0,00
Sn4+ (aq) + 2e- → Sn2+ (aq)
+0,13
Cu (aq) + e → Cu (aq)
+0,15
-
2+
24
-
2+
2+
-
+
SO (aq) + 4H (aq) + 2e → SO2 (g) + 2H2O
+0,20
AgCl (s) + e- → Ag (s) + Cl- (aq)
+0,22
Cu2+ (aq) + 2e- → Cu (s)
+0,34
24
+
-
O2 (g) + 2H2O + 4e → 4OH (aq) -
+0,40
-
I2 (s) + 2e → 2I (aq) -
MnO4 (aq) + 2H2O + 3e → MnO2 (s) + 4OH (aq)
+0,59
O2 (g) + 2H+ (aq) + 2e- → H2O2 (aq)
+0,68
Fe3+ (aq) + e- → Fe2+ (aq)
+0,77
Ag (aq) + e → Ag (s)
+0,80
Br2 (l) + 2e → 2Br (aq)
+1,07
O2 (g) + 4H+ (aq) + 4e- → 2H2O
+1,23
MnO2 (s) + 4H+ (aq) + 2e- → Mn2+ (aq) + 2H2O
+1,23
Cl2 (g) + 2e → 2Cl (aq)
+1,36
-
-
+
-
-
-
-
124
+0,53
-
-
-
AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
E0 /V
MEIA-REAÇÃO Au3+ (aq) + 3e- → Au (s)
+1,50
Ce4+ (aq) + e- → Ce3+ (aq)
+1,61
-
H2O2 (aq) + 2H (aq) + 2e → 2H2O
+1,77
Co (aq) + e → Co (aq)
+1,82
O3 (g) + 2H+ (aq) + 2e- → O2 (g) + H2O
+2,07
F2 (g) + 2e- → 2F- (aq)
+2,87
+
3+
-
2+
Fonte: <http://www.dqi.iq.ufrj.br/tabela_de_potenciais.pdf>.
7.2 MEDIDA DE PH UTILIZANDO A ELETROQUÍMICA Um dos usos mais amplamente estabelecidos para a eletroquímica é a medida de íons em solução. Mais especificamente, podemos citar a medida de pH. Os primeiros métodos de determinação eletroquímica de pH empregava um EPH como eletrodo de referência. Entretanto, outro eletrodo que passou a ser amplamente utilizado devido à sua construção mais simplificada e manuseio mais fácil em relação ao EPH é o eletrodo saturado de calomelano, o qual possui uma tensão reprodutível de 0,24453 V a 25 °C. Calomelano é o nome antigo do cloreto de mercúrio (I), Hg2Cl2, e o termo saturado é devido ao fato de os íons Cl- serem provenientes de uma solução saturada de KCl.
Uma célula utilizada para a determinação de pH é mostrada na figura a seguir.
Figura 85 - Eletrodo de pH. Fonte: Russell (2008, p. 912).
125
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
No eletrodo de referência, temos uma semirreação, cujo potencial é conhecido e reprodutível, no caso o de calomelano, como mostra a figura. Esse eletrodo serve como o referencial utilizado para medir o potencial gerado. Já o eletrodo de vidro interage com a solução, gerando um potencial de célula. Como temos uma medida do potencial da célula e sabemos o potencial do eletrodo de calomelano (valor conhecido), pela diferença dos valores, pode-se calcular o valor do potencial no eletrodo de vidro e, por consequência, a concentração de íons H+ na solução. Imagine que você use a célula da figura anterior para medir o pH de uma solução e, ao fazer a leitura da célula, obtenha um potencial de célula de 0,150 V. Assumiremos que o potencial do eletrodo de prata (Ag) e o de calomelano possuam valor de 0,22 V e 0,24 V, respectivamente. De acordo com o que vimos até agora, o potencial que existe entre os dois eletrodos seria de: Ecélula = 0,24V - 0,22V = 0,02 V Com isso, podemos assumir que o potencial causado pela concentração de íons H+ é: E(H+) = 0,150 V - 0,02 V = 0,148 V Utilizando a equação de Nernst, temos:
Para o hidrogênio, temos E0 = 0, e isso simplifica a equação a:
Logo:
Com o avanço no desenvolvimento de eletrodos, hoje em dia, não necessitamos de um aparato grande como o mostrado na figura anterior. Isso porque muitos eletrodos possuem eletrodo de referência e de detecção, dispostos em um arranjo mais simples, os quais se tornaram equipamentos portáteis. Um exemplo é mostrado na figura a seguir.
126
AULA 7 – ELETROQUÍMICA: PILHAS E ELETRÓLISE
Figura 86 - pHmêtro portátil. Fonte: <http://www.phmetro.net.br/cat/phmetro>.
CONCLUSÃO Esperamos que, com esta aula, você tenha compreendido os aspectos gerais das células eletrolíticas. Elas são de grande aplicabilidade em nosso dia a dia. A eletroquímica tem aplicação em vários processos industriais e os eletrodos possuem um papel importante nas áreas de controle de qualidade e de preservação ambiental. Até a próxima aula!
127
AULA 8 Materiais Modernos
INTRODUÇÃO O conhecimento adquirido desde os filósofos gregos até os cientistas da atualidade trouxe um imenso impacto no modo como vivemos e na sociedade. A descoberta e o desenvolvimento de materiais com propriedades químicas diferenciadas têm sido um grande desafio. Isso porque o avanço tecnológico está diretamente ligado à utilização de materiais com desempenho notável, quanto às propriedades óticas, elétricas, magnéticas, entre outras. Nesta aula, você conhecerá alguns desses materiais modernos, os quais fazem parte do nosso cotidiano, tais como os polímeros, os cristais líquidos, os biomateriais e os fármacos.
OBJETIVOS » » Reconhecer a importância dos polímeros. » » Distinguir entre reação de polimerização por adição e por condensação.
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » Compreender as principais características dos cristais líquidos. » » Identificar os principais tipos de cristais líquidos. » » Entender o desenvolvimento de um fármaco. » » Compreender a utilização dos biomateriais.
8.1 POLÍMEROS Certamente, em algum momento do seu dia, você utiliza polímeros, pois eles estão presentes na composição de vários objetos do cotidiano, como: tintas, sacolas plásticas, canos de água, colas etc. Mas, afinal, você sabe dizer o que são os polímeros? E do que eles são feitos? Até agora vimos moléculas que apresentam massa molar exata e relativamente baixa, por exemplo, a aspirina. Entretanto, os polímeros são substâncias de alta massa molecular, podendo ser chamados de macromoléculas. A palavra polímero é derivada do grego e significa “muitas” (polys) e “partes” (meros). Assim, polímero “[...] é um composto molecular que se distingue pela sua elevada massa molar, que varia de milhares a milhões de gramas, e por apresentar muitas unidades repetitivas” (CHANG, 2007, p. 717). As unidades que constituem um polímero e se repetem são chamadas de monômeros. A figura a seguir representa a formação do polietileno, que é utilizado na fabricação de sacos de lixo e garrafas.
Figura 87 - Obtenção do polietileno. Fonte: Brown, Lemay e Brusten (2008).
Ao observar a reação de polimerização do polietileno, você pode notar que a unidade de repetição, ou seja, o monômero do polietileno, é o CH2. A reação para formar o polietileno é um exemplo de reação de adição, a qual envolve compostos insaturados, em especial contendo ligações C=C e C≡C. Muitos polímeros utilizados no nosso dia a dia são provenientes de reações de adição. Um exemplo é o poli (cloreto de vinila) – conhecido como PVC. Ele é empregado na instalação de encanamentos e em filmes transparentes para empacotamento de alimentos. Outo caso é o poliestireno, utilizado em embalagens descartáveis e isolantes. Veja a figura a seguir.
130
AULA 8 – MATERIAIS MODERNOS
(a)
(b)
Figura 88 - Estrutura de (a) poli (cloreto de vinila) e (b) poliestireno. Fonte: Brown, Lemay e Brusten (2008).
Repare que a letra n nas estruturas (a) e (b) representa o grau de polimerização, ou seja, o número de unidades de repetição de cada uma (monômeros). Uma segunda maneira de obter os polímeros é através de reações de condensação. Nesse tipo de reação, duas moléculas se unem para formar uma molécula maior. Por consequência, eliminam uma pequena molécula; no caso a seguir, de água (H2O). Confira:
Figura 89 - Reação de condensação entre uma amina e um ácido carboxílico. Fonte: Brown, Lemay e Brusten (2008).
Um dos polímeros mais utilizados é o náilon, que tem sua escala de produção anual na casa dos bilhões de quilos, devido à sua versatilidade. Ele pode ser utilizado em engrenagens, roldanas, utensílios de cozinha e, até mesmo, na medicina. A obtenção do náilon é feita por meio de uma reação de condensação. Visualize a seguir.
Figura 90 - Formação do náilon. Fonte: <http://www.mundovestibular.com.br/articles/777/1/POLIMEROS-DECONDENSACAO/Paacutegina1.html>.
131
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
8.1.1 Classificação dos polímeros Você sabia que existem diversas formas de classificar os polímeros? Uma delas é quanto à unidade de repetição. Você viu anteriormente que o polietileno é formado pelos monômeros CH2. E por conter somente um tipo de monômero, ele é chamado de homopolímero.
Figura 91 - Materiais que contêm polietileno. Fonte: <http://www.alunosonline.com.br/quimica/polietileno.html>.
Por outro lado, um copolímero é um polímero que contém duas ou mais unidades monoméricas diferentes. Um exemplo é o ABS (acrilonitrila-butadieno-estireno), amplamente utilizado na fabricação de brinquedos, painéis de automóveis e embalagens. Veja como o ABS se forma:
Figura 92 - Obtenção do ABS. Fonte: <http://www.mundoeducacao.com/quimica/copolimeros.htm>.
Mas o que acontece quando colocamos um brinquedo de plástico sob o sol em um dia escaldante? Inicialmente, este fica mole, como se fosse começar a derreter, certo? De acordo com esse comportamento, os polímeros, quando são aquecidos, podem ser classificados em termoplásticos e termofixos.
132
AULA 8 – MATERIAIS MODERNOS
Os termoplásticos são aqueles polímeros que, quando sujeitos ao calor, podem ser moldados, devido ao enfraquecimento das interações intra e intermoleculares. Dessa forma, as moléculas adquirem certa movimentação e o material pode ser moldado. Quando resfriados, as interações são reestabelecidas, sem quebra de nenhuma ligação, e o polímero torna-se novamente rígido. Ao aquecê-lo, mais uma vez, ele pode ser moldado. Assim, o processo de modelagem é reversível. Já os termofixos, uma vez aquecidos e moldados, não podem ser remodelados. Isso porque esse polímero é formado por uma rede tridimensional bastante estável, devido ao seu processo de polimerização realizado em duas etapas. Na primeira etapa ocorre uma polimerização que produz um composto intermediário. Por sua vez, na segunda etapa, o polímero reage com outros reagentes, tornando-o bastante resistente. Antes mesmo de o homem pensar em fazer polímeros sintéticos, a natureza já produzia esse tipo de composto. Entre os polímeros que ocorrem naturalmente estão as proteínas, as quais desempenham inúmeras funções nos processos biológicos, como transporte e armazenamento de substâncias essenciais para a nossa sobrevivência. Outros polímeros importantes e naturais são os ácidos nucleicos, como DNA e o RNA, que armazenam e transmitem a informação genética.
Figura 93 - Representação da proteína hemoglobina, responsável pelo transporte de oxigênio no organismo humano. Fonte: Shutterstock, 2014.
8.2 CRISTAIS LÍQUIDOS Algumas substâncias possuem propriedades tão particulares que simplesmente não se encaixam em nenhuma categoria existente. Em 1888, o botânico austríaco Frederick Reinitze estudava derivados do colesterol quando se deparou com uma propriedade ímpar até então. Quando ele aquecia esses compostos a uma temperatura de 145 °C, ocorria a fusão, ou seja, os compostos se juntavam,
133
QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
tornando-se um líquido leitoso. Porém, a 179 °C esse líquido turvo ficava transparente. Mas, ao resfriá-lo, o processo inverso podia ser observado, isto é, e a substância era solidificada.
Figura 94 - Ésteres de colesterina. Fonte: Londero (2014).
Por seu estudo pioneiro sobre o que hoje conhecemos como cristal líquido, Reinitze é tido como o descobridor do estado líquido cristalino. Atualmente, o cristal líquido é considerado um material com propriedades intermediárias entre um sólido cristalino e um líquido desordenado. A região na qual essas propriedades se manifestam é marcada por temperaturas de transição definidas, ou seja, em determinado intervalo de temperatura, o cristal líquido apresenta organização molecular distinta, sendo considerado por muitos cientistas como um novo estado da matéria.
Figura 95 - Benzoato de colesterina: (a) fundido acima de 179 °C; (b) temperatura entre 145 °C e 179 °C. Fonte: Brown, Lemay e Brusten (2008).
8.2.1 Tipos de cristais líquidos As moléculas que apresentam comportamento de cristal líquido são, geralmente, longas, na forma de tubos. Já as forças intermoleculares, que mantêm essas moléculas coesas, são fracas. Assim, na fase líquida comum, o grau de orientação é aleatório. Em contraste, no estado líquido cristalino, essas moléculas apresentam certo grau de organização. De acordo com natureza da organização, existem diferentes tipos de cristais líquidos e estes podem ser classificados como: nemáticos, esméticos ou colestéricos. Vale ressaltar que o grau de
134
AULA 8 – MATERIAIS MODERNOS
organização dos cristais líquidos é sensível a mudanças na pressão, na temperatura e no campo magnético. Na fase líquida cristalina nemática, as moléculas se encontram alinhadas ao longo do seu eixo, não havendo organização quanto aos lados das moléculas. Esta é a fase utilizada na fabricação de televisores de LCD, por ser facilmente afetada pela passagem de corrente elétrica, o que faz as moléculas se torcerem vários graus, controlando a passagem de luz. A fase líquida cristalina esmética é caracterizada por uma organização adicional em relação à fase nemática, apresentando organização em camadas. Existem diversos tipos de alinhamento nesta fase (A, B, C etc.), que se diferem pelo eixo no qual as camadas estão empilhadas. Nessa fase, as forças intermoleculares atuam para que as moléculas não deslizem umas sobre as outras, e as interações dipolo-dipolo fazem com que as moléculas se alinhem.
Figura 96 - Representação de cristais líquidos. Fonte: Brown, Lemay e Brusten (2008).
Já na fase líquida cristalina colestérica, as moléculas estão organizadas ao longo de eixos e dispostas em camadas com uma leve torção em relação a cada camada. Esse tipo de fase apresenta propriedades óticas interessantes, como a reflexão seletiva da luz branca, produzindo padrões de coloração. Como essas variações de cor são sensíveis a mudanças de temperaturas, os cristais líquidos colestéricos são utilizados para a detecção de temperatura em sistemas como circuitos microeletrônicos.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Figura 97 - Estrutura colestérica de um cristal líquido. Fonte: Brown, Lemay e Brusten (2008).
Fique por dentro do funcionamento do monitor de cristal líquido acessando este link: <http://www.moderna.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId =8A7A83CB30D6852A0130DBBA660801A0>.
8.3 FÁRMACOS Além da importância no desenvolvimento de materiais, a química também possui forte aplicação na área farmacêutica, principalmente na síntese de novos fármacos. Ao ficar doente ou se sentir mal, você já deve ter tomado chá, certo? Antigamente, essa era a única forma de se obter um remédio: extraí-lo, de alguma maneira, da planta adequada e ingeri-lo. Não se engane ao achar que isso é um processo ultrapassado: uma porção dos medicamentos que utilizamos hoje possui o seu princípio ativo extraído da natureza. Entretanto, conforme a ciência evoluiu, o ser humano tornou-se capaz de obter esses princípios ativos de forma artificial, através da síntese de moléculas – um processo que envolve a química até seu princípio mais elementar.
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AULA 8 – MATERIAIS MODERNOS
Figura 98 - A camomila é conhecida por suas propriedades anti-inflamatórias. Fonte: Shutterstock, 2014.
Um exemplo disso é o ácido acetilsalicílico, o principal componente da Aspirina®. Desde a Grécia antiga, a casca de salgueiro era utilizada para baixar febre e aliviar dores. Em 1827, uma molécula chamada salicina foi extraída das árvores, do gênero do salgueiro, e descobriu-se que essa molécula possui propriedades analgésicas. Após sua estrutura ser conhecida, um derivado dela foi sintetizado: o ácido acetilsalicílico, considerado uma molécula melhor para utilização como analgésico, por apresentar menos efeitos colaterais. A seguir, você pode ver as estruturas dessas duas moléculas. O
HO OH O
O
OH
O
OH O
HO
OH
Ácido Acetilsalicílico
Salicina
Figura 99 - Estrutura da salicina e do ácido acetilsalicílico. Fonte: Londero (2014).
Não é recomendada a ingestão da aspirina durante a gravidez, isso porque ela interfere na coagulação do sangue e pode aumentar o risco de hemorragia na gestante e no feto.
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
Com a evolução da química, foi possível identificar a estrutura de várias moléculas que eram utilizadas como remédios advindos da natureza e, então, sintetizá-las para comercializá-las em grande escala. Após esse avanço, o próximo passo na evolução dos medicamentos foi o desenvolvimento de drogas sintéticas, que não eram cópias das moléculas encontradas na natureza. Entretanto, por muito tempo, a maneira de se encontrar uma molécula propensa a se tornar um medicamento foi o teste das moléculas sintetizadas em busca de alguma atividade. Esse processo era extremamente dispendioso, tanto em tempo quanto em custo financeiro. Com o tempo, e após o teste de milhares de moléculas, observou-se que moléculas para medicar certas doenças possuíam semelhança estrutural. Com isso, a síntese de medicamentos deu um passo adiante e passou a utilizar tal semelhança como base para novas moléculas. Com o avanço da Química, Biologia e técnicas de identificação, existem métodos mais práticos de se encontrar uma molécula com elevado potencial de se tornar um fármaco. É possível determinar a estrutura de várias moléculas que são essenciais ao ciclo de diversos agentes patológicos e, com isso, poder direcionar a síntese de medicamentos que irão interagir com essas moléculas, a fim de eliminar o agente patológico. Uma técnica usada é a interação de moléculas pequenas, denominadas fragmentos, com essas moléculas essenciais. Através de medições extremamente sensíveis, é possível saber quais fragmentos interagem e, com isso, sintetizar moléculas que contenham esses fragmentos. Após a síntese, são realizados vários testes com essas moléculas, com o objetivo de determinar quais delas possuem atividade suficiente para serem utilizadas em testes mais avançados. Essa técnica possibilita uma abordagem mais direta para o desenvolvimento de medicamentos que sejam específicos para determinada enfermidade, gerando uma economia de tempo e de dinheiro para a indústria. A figura seguinte demonstra esse processo. Inicialmente, vários fragmentos são testados. Depois, observa-se quais deles possuem interação com a molécula-alvo. Posteriormente, os fragmentos vão sendo ligados e testados, criando a primeira geração de moléculas. Em seguida, os fragmentos de primeira geração, com maior propensão, são incrementados, dando origem aos produtos de segunda geração, sendo estes melhorados para se tornarem um potencial medicamento.
Figura 100 - Esquema para o teste de fragmentos. Fonte: <http://www.pharmacy.nus.edu.sg/staff/phadbw/fragment.html>.
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Para entender um pouco mais sobre as fases de teste de um medicamento, acesse: <http://www.anvisa.gov.br/medicamentos/pesquisa/ def.htm.
Este é um dos maiores exemplos de como a Química está ligada profundamente ao nosso dia a dia. Ou seja, por uma grande contribuição dessa área que os medicamentos estão cada vez mais eficazes.
8.4 Biomateriais Combinando os conhecimentos a respeito de materiais e do nosso organismo, uma área em desenvolvimento é a de biomateriais. Um biomaterial é um material que possa substituir, total ou parcialmente, um tecido vivo ou ajudar na sua recuperação. Para isso, ele precisa, além de um bom desempenho na função para a qual foi designado, possuir baixa toxicidade, leveza, resistência, flexibilidade e ser durável ou biodegradável – dependendo de sua aplicação –, inclusive não causar resposta imunológica adversa (não causar rejeição pelo organismo). Você já deve ter ouvido falar ou conhecido alguém que precisou colocar implantes de platina, como placas ou pinos após sofrer uma fratura grave. Esse é um dos exemplos comuns de biomateriais. A figura a seguir mostra pinos de titânio utilizados por dentistas em implantes dentários.
Figura 101 - Pinos de titânio. Fonte: <http://www.benattiodontologia.com.br/implante-de-titanio.php>.
A argila, por exemplo, devido às características de seus tipos, pode ser utilizada sozinha ou em conjunto com polímeros, como biomateriais. Entre as potenciais aplicações desse material, podemos citar sua utilização como: » » curativo de tecido ósseo, devido às características porosas e à resistência desses materiais. Além disso, eles servem como suporte para o desenvolvimento de células que irão regenerar o tecido danificado, seja por um acidente ou doença;
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QUÍMICA APLICADA À ENGENHARIA
» » material implantável na substituição de tecidos; » » curativo de tecidos macios (não ósseos). Outro material de grande aplicabilidade são os polímeros. Devido ao conhecimento cada vez maior na produção e modificação desses materiais, eles podem ser largamente manipulados para atingir as características necessárias ao seu uso. Algumas das utilizações que podem ser citadas são: » » na engenharia de tecido cartilaginoso; » » em dispositivos implantáveis; » » como pele artificial, ajudando na recuperação de queimaduras, úlceras cutâneas etc., favorecendo o crescimento de tecido saudável no local de aplicação; » » na geração de uma matriz para fixação de células, incluindo células tronco diferenciadas in vitro, que serão implantadas no tecido doente. A figura a seguir mostra uma representação esquemática do processo de cultivo de células para implante. Primeiro, as células sadias podem ser retiradas do tecido do paciente. Assim, elas são isoladas para ser feito o seu crescimento 2D in vitro, a fim de gerar um número satisfatório de células. Em seguida, pode-se utilizar um suporte de polímero ou argila para originar uma estrutura tridimensional do tecido a ser implantado. E, finalmente, as células sadias podem ser implantadas no tecido danificado do paciente.
Figura 102 - Esquema do crescimento de células. Fonte: Adaptado de Hosseinkhani (2013).
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CONCLUSÃO Esperamos que, com esta aula, você tenha sentido a química mais próxima e aplicável ao seu cotidiano. Além disso, que você tenha entendido, por mais simples que possa parecer, a existência de muito conhecimento químico no processo de desenvolvimento dos materiais. Inclusive, os materiais aqui citados – polímeros, cristais líquidos, fármacos e biomateriais – fazem parte da nossa vida e refletem uma relação íntima nossa com a ciência.
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ENCERRAMENTO
CARTA DE ENCERRAMENTO Ao final desta jornada, acreditamos que você tenha aprendido um pouco mais sobre a matéria e como ela compõe tudo que nos cerca. A maneira com que lidamos e manipulamos a matéria nos permitiu compreender muito sobre o universo e transformá-lo, trazendo inúmeros avanços tecnológicos e modificando a forma que vivemos. Esperamos que o conhecimento aqui passado tenha lhe instigado a continuar a aprender Química. Você se lembra daqueles primeiros questionamentos do início destas aulas? As questões filosóficas, infelizmente, não puderam ser respondidas. Esperamos, no entanto, que as outras questões tenham sido compreendidas e muitas outras tenham aparecido, pois é o conhecimento, a curiosidade e a iniciativa que movem o mundo. Até mais!
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