4 minute read
2 O mocho Ernesto
O mocho Ernesto era considerado por todos os animais do bosque como sábio e com autoridade. De facto, durante muitos anos, tinha estudado em muitos livros. Ocupava seu tempo a ler e a consultar manuais e enciclopédias de todo o género.
Tinha, porém, um mau carácter: era intratável, antipático, lamentava-se de tudo e andava sempre irritado. Por isso, preferia estar fechado no seu velho tronco e ninguém o podia incomodar.
Advertisement
Um dia, decidiu escrever a «Grande Enciclopédia do Bosque», aquela que ninguém tinha ousado compilar: um elenco pormenorizado e aprofundado de tudo o que vivia no bosque. A sua intenção era descrever todas as espécies de plantas, flores e árvores. Depois, os animais, vertebrados e invertebrados, catalogando minuciosamente os insectos presentes. A sua enciclopédia devia retratar fielmente a realidade do bosque, objectiva e cientificamente, mas fazendo também saborear ao leitor a paz e a tranquilidade do bosque.
Para começar, pôs por fora da porta um cartaz que dizia: «Não incomodar!» Depois fechou a porta e pôs-se a trabalhar sem descanso no seu minucioso projecto.
Começou com a letra «A»: Abeto. Escreveu a terminologia em latim, as várias classificações, descreveu as várias espécies de abetos, as formas, as cores, os tipos de tronco, a multiplicidade de folhas. Depois passou a descrever o ambiente em que vivem as várias espécies de abetos, as cores que adquirem conforme a luz e a altitude, e tantas coisas mais.
Quando chegou à página 1000 parou, mas deu-se conta que nem sequer tinha chegado a meio. Apesar de todas aquelas palavras escritas, não tinha sequer conseguido dar uma ideia «real» do abeto. De facto, não tinha ainda escrito nada acerca da luz e do calor do sol, das nuvens e da chuva, do ar e da poluição, do ambiente e da vida...
Não tinha enfrentado o problema de como tinha nascido o primeiro abeto, se era fruto do acaso ou obra de Deus.
O mocho Ernesto percebeu então que aquela sua ideia não era «realista». Abandonou o ambicioso projecto, abriu a porta da casa e pôs-se a contemplar o grande abeto que tinha em frente. Permaneceu dias e dias em silêncio, depois começou a rir-se.
Aquele velho ria-se tanto que todos os animais do bosque foram perguntar-lhe.
– Por que é que estás hoje tão alegre? Nunca te vimos assim!
O mocho respondeu:
– Rio-me de mim próprio, pensando como fui soberbo e estúpido, ao ponto de pretender encerrar este abeto tão alto e lindo num miserável livro. Agora percebi o que é a realidade e como é importante olhar intensamente para tudo o que nos rodeia. Com palavras não aprendemos senão palavras.
Reflexão
Podemos consultar todos os livros de botânica para conhecer tudo o que os cientistas escreveram acerca das muitas e variadas espécies de plantas.
Podemos contemplar os melhores documentários da televisão, que nos tentam explicar tudo o que de belo existe na natureza criada.
Nem as palavras nem as imagens, por abundantes que sejam, conseguem dispensar o contacto com a realidade. Só assim há conhecimento real.
Compromisso
Sai da tua casa e parte à descoberta de tudo o que de belo existe na natureza. Toca nas árvores, contempla a sua folhagem, saboreia os seus frutos.
3 A trama da vida
Carlota, a aranha um pouco ingénua, há muito que contemplava extasiada o cartaz luminoso da loja que estava mesmo em frente do charco. Podia ler-se: «A loja dos desejos».
Um dia, enchendo-se de coragem, entrou e pediu a uma velha tartaruga que estava do outro lado do balcão:
– Desejava felicidade, saúde e sucesso em grande quantidade.
A sábia tartaruga, depois de ter ajustado os óculos, olhou para ela fixamente e retirou-se lentamente para dentro.
Os minutos passavam e a tartaruga nunca mais aparecia, embora se ouvisse que lá dentro havia movimento.
Finalmente, apresentou-se com um conjunto de fios de várias cores e um pequeno tear. Entregou tudo à aranha e disse-lhe: – Aqui tens.
A aranha respondeu: – Mas que faço eu com todos estes fios coloridos? A tartaruga continuou:
– Não sejas ingénua e superficial: observa bem. Na vida tudo está por construir. Cada coisa terá de ser feita com as várias cores que formam a realidade.
Aqui tens o fio branco. Este é o principal que servirá de base. É o quotidiano, o querer construir, dia após dia.
Aqui tens o fio castanho. Este é pouco atraente mas robusto: indica esforço, empenho, suor, constância e paciência.
Aqui tens o fio vermelho. Recorda-nos o sangue, a luta, a paixão, o sofrimento, o sacrifício da própria vida.
Aqui tens o fio azul. Recorda o céu, a serenidade, a convivência, a alegria do estar juntos.
Aqui tens o fio cor de laranja. Indica a capacidade de se renovar, de enfrentar as coisas, de um modo novo.
Aqui tens o fio roxo. É a cor da reflexão, do silêncio, da meditação, do encontro consigo próprio.
Aqui tens o fio de oiro. É a cor do sucesso, do bem-estar, do pão abundante que é partilhado cada dia.
Aqui tens o fio negro. É o fio do fracasso, da morte. Sim, também isto faz parte da vida e não deve ser ignorado.
Aqui tens o fio verde. É a cor da natureza, da esperança, da ressurreição... da VIDA.
Pega em todos estes fios que te dei e com eles procura tecer a trama da vida. Não penses que será simples e nem sequer fácil ou que te ocupará pouco tempo. O tapete terminará apenas com a tua vida, mas é na sábia combinação destes fios que encontrarás o que sempre desejaste. E agora, bom trabalho, amiga Carlota.
(AdaptadodeSérgioBocchini)
Reflexão
Cada pessoa é um ser em construção. Ajudado por uns e estorvado por outros, será cada qual a construir a sua personalidade e a sua história.
Cada pessoa encontra, ao longo dos seus dias, muitas realidades, simbolizadas neste conto com as várias cores. Cada uma delas tem a sua conotação. É com todas elas que cada pessoa deverá ir fazendo a tramada vida, tal como uma tecedeira utiliza os fios de várias cores para fazer uma obra de arte.
Compromisso
Se somos seres em construção, empenhemo-nos em ir desenvolvendo tudo o que em nós é bom, belo, perfeito, portador de felicidade.