Céu: teologia em comunidade

Page 1



Sumário Lista de abreviações ......................................................................................... 11 Prefácio da série ............................................................................................... 13 Agradecimentos ............................................................................................... 15 Colaboradores .................................................................................................. 16 1. Aprendendo sobre o céu ............................................................................. 17

Robert A. Peterson

2. O céu no Antigo Testamento ..................................................................... 43

Raymond C. Ortlund Jr

3. O céu nos evangelhos sinóticos e em Atos dos Apóstolos ..................... 65

Jonathan t. Pennington

4. O céu nas epístolas de Paulo ....................................................................... 89

Stephen J. Wellum

5. O céu nas epístolas gerais .......................................................................... 121

Jon Laansma

6. O céu no evangelho e Apocalipse de João ............................................... 155

Andreas J. Köstenberger


7. Imagens do céu .......................................................................................... 179

Robert A. Peterson

8. A história do céu ........................................................................................ 209

Gerald Bray

9. Os anjos e o céu .......................................................................................... 231

Stephen F. Noll

10. O céu para santos perseguidos ............................................................... 253

Ajith Fernando

11. A esperança do céu .................................................................................. 275

David B. Calhoun

Bibliografia selecionada ................................................................................ 299


1 Aprendendo sobre o céu Robert A. Peterson

Mas, como está escrito: As coisas que o olho não viu, E o ouvido não ouviu, E não subiram ao coração do homem São as que Deus preparou para os que o amam”; Mas Deus no-las revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de Deus. —1Coríntios 2.9-10 (ARC)

As palavras de Paulo são irônicas. Ele, de um lado, diz que o “que Deus preparou para os que o amam”, o que Paulo chama de “nossa glória” (em 1Co 2.7) está além do conhecimento humano (v. 9). É inacessível aos sentidos humanos; não conseguimos decifrar. Além disso, o “coração do homem” não consegue nem mesmo imaginar sua grandiosidade. O apóstolo, por outro lado, no versículo seguinte, afirma: “Deus no-las revelou pelo seu Espírito” (v. 10). Então, o que é isso, Paulo? O céu está além da imaginação humana? Ou ele é revelado na Escritura por intermédio dos apóstolos? A resposta é sim! — as duas coisas. Por nós mesmos, não temos acesso ao divino. Mas Deus condescendeu em revelar a si mesmo de forma suprema na


18

pregação dos apóstolos e escrita da Escritura. Assim, conseguimos saber o que Deus nos disse antes do tempo sobre o céu.1 O problema é que nós, seres humanos, mostramos uma tendência incorrigível para não nos satisfazermos com a sagrada Escritura. Como resultado disso, buscamos conhecimento do “outro lado” em lugares errados. Isso é verdade ao longo da história da igreja e também na nossa época. Examinaremos rapidamente isso: • Tondal, um cavaleiro irlandês, a quem, por volta de 1150, foi concedida uma visita ao céu em sonho; • os adamitas nos anos 1400 que, por seu próprio esforço, tentavam trazer o céu para a terra; • Betty Eadie, cuja experiência de sair do corpo, em 1973, deu origem a um livro campeão de vendas; e • o culto Porta do Paraíso, da década de 1990, que tentava ir para o céu em um prato voador. tondal: uma visita ao céu em um sonho, em 1150

Essa é a história de Tondal, um cavaleiro irlandês, que, em 1150, visitou o inferno e o céu em um sonho. O conto, originário de um monastério beneditino irlandês, influenciou a literatura e a arte medievais. O anjo da guarda de Tondal tentava santificar o cavaleiro levando sua alma através das punições do inferno. Ele sofre as terríveis dores físicas do inferno, incluindo tormentos horrorosos.2 Ciampa e Rosner resumem bem o assunto: “Deus prepara coisas além da compreensão humana para os que são seus. [...] O motivo porque Paulo e outros mestres cristtãos podem declarar a sabedoria de Deus, “as [coisas] que Deus preparou” para todos os cristãos receberem, embora essas coisas sejam inacessíveis para os seres humanos, é que elas foram reveladas para eles. A palavra para conecta esse versíciulo [10] com os vv. 6,7 e o 9 e introduz a explicação necessária. [...] A ‘revelação’ a que Paulo se refere aqui não é a iluminação dada a todos os cristãos, mas a divulgação de todos os propósitos de Deus na cruz e em Cristo Jesus para os pregadores apostólicos, o qual eles, por sua vez, passam para aqueles que o amam com o objetivo de que possam ‘amadurecer’ ”. Roy E. Ciampa e Brian S. Rosner, The First Letter to the Corinthians, PNTC (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2010), p. 128–29; grifo do autor. 2 Jeffrey Burton Russell, A History of Heaven: The Singing Silence (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1997), p. 108. 1


19

A alma de Tondal também experimenta deleites sensuais quando ele é levado a um paraíso terrestre com três muros extraordinários feitos de prata, ouro e pedras preciosas, respectivamente. Ele, ao transpor o primeiro muro de prata resplandecente, vê pessoas leigas devotas em roupas brancas brilhantes entoando cânticos de louvor a Deus enquanto esperam a volta de Cristo. O cavaleiro é dominado pelos deliciosos aromas, visões e sons do céu na terra. Toda dor e sofrimento são banidos.3 A seguir, o anjo leva nosso cavaleiro para transpor o segundo muro — de ouro brilhante — em que pessoas resplandecentes entoam doces louvores. Elas, vestidas com seda, assentam-se em cadeiras de ouro e são adornadas com coroas brilhantes. Um sinal do propósito do conto é revelado: essas pessoas tiveram uma experiência sexual, mas depois foram purificadas por meio do martírio ou asceticismo.4 A história exalta a virgindade monástica. Tondal, indo mais fundo nessa mesma bela terra, vê pessoas tocando músicas encantadoras em um ambiente glorioso. Quem são elas? São os monges e as freiras mais obedientes. Tondal não pode entrar porque o Espírito Santo está presente e também porque, uma vez que a pessoa entrasse, não podia mais se separar da companhia dos santos. Tondal não está morto e, portanto, tem de voltar à vida e morrer em santidade antes de poder desfrutar a visão beatífica. Mas o anjo lhe dá um segundo motivo: ele não pode entrar porque não é virgem. Aqui, no interior do recinto monástico da terra dourada só são permitidos virgens perpétuos. [...] Ele tem de ficar do lado de fora, mas mesmo assim ele se regozija com todos seus sentidos.5

Tondal vem até uma árvore enorme com pássaros cantando em seus ramos e doces frutos pendurados em seus galhos. “Aqui ficam enclausuradas as pessoas virgens dos dois sexos que nunca deixam de louvar e bendizer o Senhor. Cada uma delas usa uma coroa de ouro e carrega um cetro de ouro”.6 A árvore é a igreja; as pessoas virgens são os construtores e defensores. Ibid. Ibid. 5 Ibid. p. 109. 6 Ibid. 3 4


20

O anjo leva o cavaleiro para o terceiro e mais glorioso muro. Esse não é feito de prata nem de ouro, mas é composto de gemas, com argamassa de ouro! As pedras preciosas são aquelas de Apocalipse 21, incluindo jaspe, safira, esmeralda, sardônico, berilo e topázio (vv. 19-21). A glorificação do conto da virgindade monástica alcança seu ápice quando Tondal sobe no muro e contempla as pessoas perpetuamente virgens entre as nove ordens de anjos. O cavaleiro ouve palavras inefáveis antes de acordar de seu sonho. Tondal, como resultado dessa jornada, fica cheio de sabedoria e se converte.7 Jeffrey Burton Russel está correto ao dizer: “Nessa visão de hierarquia ascética, os superiores monásticos virgens estão no topo”.8 Esse conto da jornada de um cavaleiro ao céu na terra é propaganda para a vida monástica em geral e para a virgindade monástica em particular. Infelizmente, nosso próximo exemplo não ocorre em um sonho, mas na história. E sua versão do céu na terra termina, conforme veremos, sendo terrível. os adamitas: trazendo o céu para a terra nas décadas de 1420 e 1430

Jan Hus (c. 1372-1415) foi um dos vários pregados tchecos que incitou o povo contra o alto clero boêmio, em grande parte alemão, muito rico e corrupto. Hus, um sacerdote católico-romano e professor na Universidade de Praga, ajudou a criar um movimento de reforma. Ele pregava a Bíblia como o meio de produzir mudança espiritual e moral. Ele revisou uma tradução tcheca das Escrituras para encorajar as pessoas a ler a palavra de Deus.9 Hus desafiou o poder do papa e ameaçou o status quo na Boêmia. Quando Hus recebeu a ordem do arcebispo de Praga para parar de pregar, ele se recusou a obedecer e deixou a cidade em 1412. Embora lhe tenha sido prometido salvo conduto para o Concílio de Constança, em 1414, quando ele chegou ao concílio foi preso, julgado por heresia e queimado na estaca. Ibid. Ibid., p. 110. 9 Evangelical Dictionary of Theology, ed. Walter A. Elwell, 2ª ed. (Grand Rapids, MI: Baker Academic, 2001), p. 582. 7 8


21

“Hus foi mais perigoso morto que vivo. Desenvolveu-se um movimento muito difundido que levava seu nome”10 — os hussitas. Embora todos fossem mais extremistas que o próprio Hus, eles tinham uma ala radical, os taboritas. Esses últimos tiraram o nome do monte Tabor, onde, ensinavam eles, Cristo predisse sua segunda vinda. Quando o milênio não veio em fevereiro de 1420, conforme tinham predito, eles se tornaram revolucionários, vendo-se como guerreiros santos de Deus. Eles conquistaram muitos adeptos boêmios e combateram seus oponentes com algum sucesso até sofrerem uma derrota devastadora em 1434.11 Mas nem mesmo os taboritas foram o grupo hussita mais extremista. Essa distinção pertence aos adamitas, também conhecidos como pikarts. Esse grupo ensinou muitas heresias. Os adamitas abraçavam vagamente um conceito panteísta de Deus. Eles, negando o pecado original e a existência de Satanás, acreditavam que eram totalmente redimidos e bons. Os adamitas viviam como se todas as profecias tivessem sido cumpridas e o milênio já tivesse começado. Eles, na crença de que eram como Cristo e tão inocentes quanto Adão e Eva no paraíso, não usavam roupas nem mesmo no frio. Eles se envolviam em promiscuidade sexual, proibiam o casamento e defendiam que todos os homens possuíam todas as mulheres em comum. Acreditavam, como não tinham propriedade, que tinham o direito de se apoderar das posses dos outros. Por isso, atacavam as vilas vizinhas pegando o que queriam e matando de forma cruel os habitantes delas. O comportamento selvagem e libertino dos adamitas provou ser tão chocante que um exército hussita os exterminou.12

Tondal visitou em um sonho um céu terreno especialmente para monásticos virgens, e os adamitas acreditavam que tinham trazido o céu para a terra, já nosso próximo personagem foi ao céu e voltou com revelações surpreendentes de Jesus. Richard Kyle, The Last Days Are Here Again: A History of the End Times (Grand Rapids, MI: Baker, 1998), p. 51. 11 Ibid., p. 52. 12 Ibid. 10



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.