Fundamentos da Técnica Psicanalítica

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Escutando e ouvindo

2. Fazendo perguntas Partindo da ideia de que as abordagens contemporâneas ao tratamento psicanalítico parecem ter perdido de vista muitos insights fundamentais de Freud, Lacan e outros analistas pioneiros e adotado derivações da psicologia – especialmente da psicologia do desenvolvimento – que contradizem os princípios básicos da psicanálise – alguns fundamentais, como inconsciente, repressão, compulsão à repetição e assim por diante –, Fundamentos da técnica psicanalítica apresenta um material técnico com a finalidade de manter esses princípios básicos firmemente à vista. A obra foca naquilo que parece ser a técnica elementar para o autor, sem longas explicações teóricas sobre os princípios básicos. Também foi escrita ensando nos leitores que não têm conhecimento prévio de Lacan, mas possuem algum conhecimento geral de psicanálise.

PSICANÁLISE

3. Pontuando 4. Escansão (sessão de duração variável)

5. Interpretando 6. Trabalhando com sonhos, devaneios e fantasias

PSICANÁLISE

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1.

Fundamentos da técnica psicanalítica

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É psicanalista lacaniano praticante e supervisor formado no instituto psicanalítico que Jacques Lacan criou pouco antes de sua morte, a École de la cause freudienne (ECF) de Paris. Obteve Ph.D. pelo Departamento de Psicanálise da Université Paris 8 e foi professor de Psicologia de 1993 a 2013 na Duquesne University, em Pittsburgh. Atualmente, faz parte do conselho de diretores do Pittsburgh Psychoanalytic Center. Traduziu várias obras de Lacan para o inglês, incluindo Écrits: the first complete edition in English e On feminine sexuality: the limits of love and knowledge, e é também autor de alguns livros sobre Lacan, incluindo A clinical introduction to Lacanian psychoanalysis: theory and technique, Lacan to the letter, A clinical introduction to Freud: techniques for everyday practice, e, mais recentemente, Against understanding. É possível contatá-lo pelo seu site pessoal: http://brucefink.com/.

Conteúdo

Fink

Bruce Fink

Bruce Fink

7.

Fundamentos da técnica psicanalítica

8. “Análise por telefone”

Uma abordagem lacaniana para praticantes

Tratando transferência e contratransferência (variações na situação psicanalítica)

9. Análise não normalizante 10.

Tratando a psicose


FUNDAMENTOS DA TÉCNICA PSICANALÍTICA Uma abordagem lacaniana para praticantes

Bruce Fink Tradução

Carolina Luchetta e Beatriz Aratangy Berger

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Authorised translation from the English language edition published by W. W. Norton & Company. Fundamentos da técnica psicanalítica: uma abordagem lacaniana para praticantes Título original: Fundamentals of Psychoanalytic Technique: A Lacanian Approach for Practitioners © 2007 Bruce Fink © 2017 Editora Edgard Blücher Ltda.

Equipe Karnac Books Editor-assistente para o Brasil Paulo Cesar Sandler Coordenador de traduções Vasco Moscovici da Cruz Conselho consultivo Nilde Parada Franch, Maria Cristina Gil Auge, Rogério N. Coelho de Souza, Eduardo Boralli Rocha

F I C HA C ATA L O G R Á F I C A Rua Pedroso Alvarenga, 1245, 4 andar 04531-934 – São Paulo – SP – Brasil Tel.: 55 11 3078-5366 contato@blucher.com.br www.blucher.com.br o

Segundo o Novo Acordo Ortográfico, conforme 5. ed. do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, Academia Brasileira de Letras, março de 2009.

É proibida a reprodução total ou parcial por quaisquer meios sem autorização escrita da editora. Todos os direitos reservados pela Editora Edgard Blücher Ltda.

Fink, Bruce Fundamentos da técnica psicanalítica : uma abordagem lacaniana para praticantes / Bruce Fink ; tradução de Carolina Luchetta, Beatriz Aratangy Berger. – São Paulo : Blucher ; Karnac, 2017. 504 p. Bibliografia ISBN 978-85-212-1213-3 Título original: Fundamentals of Psychoanalytic Technique: A Lacanian Approach for Practitioners 1. Psicanálise 2. Lacan, Jacques, 1901-1981 I. Título II. Luchetta, Carolina III. Berger, Beatriz Aratangy 17-0775

CDD 150.195

Índice para catálogo sistemático: 1. Psicanálise


Conteúdo

1. Escutando e ouvindo 17 2. Fazendo perguntas 55 3. Pontuando 75 4. Escansão (sessão de duração variável) 91 5. Interpretando 133 6. Trabalhando com sonhos, devaneios e fantasias 175 7. Tratando transferência e contratransferência 213 8. “Análise por telefone” (variações na situação psicanalítica) 317 9. Análise não normalizante 347 10. Tratando a psicose 387


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CONTEÚDO

Posfácio 455 Referências 463 Índice remissivo 487


1. Escutando e ouvindo Escutando e ouvindo

Freud observou que talvez exista um tipo de fala que seja precisamente valiosa, porque até o momento foi simplesmente proibida – isso significa, dita nas entrelinhas. É o que ele chamou de reprimido. Lacan (1974-1975, 8 de abril, 1975) A primeira incumbência do psicanalista é escutar e escutar cuidadosamente. Embora isso já tenha sido enfatizado por  diversos autores, há surpreendentemente poucos bons ouvintes no mundo psicoterapêutico. Por que isso? Existem muitos motivos, alguns são simplesmente pessoais enquanto outros são mais estruturais, mas uma das razões mais importantes é que nossa tendência é ouvir tudo em relação a nós mesmos. Quando alguém nos conta uma história, pensamos em uma história similar (ou histórias mais extraordinárias), que poderíamos também contar. Começamos a pensar em coisas que nos aconteceram e que nos permitem “relacionar” com a experiência da outra pessoa, para “saber” como

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escutando e ouvindo

deve ter sido, ou pelo menos imaginar como nós nos sentiríamos se estivéssemos no lugar do outro. Em outras palavras, a maneira como escutamos está em grande parte focalizada em nós mesmos – nas nossas próprias experiências de vida, em nossos sentimentos semelhantes, nas nossas perspectivas. Quando conseguimos localizar nossas experiências, sentimentos e perspectivas que nos remetem à outra pessoa, acreditamos que nos “relacionamos” com aquela pessoa: dizemos coisas como, “Sei o que você quer dizer”, “É”, “Entendo”, “Sinto por você”, ou “Sinto a sua dor” (talvez bem menos “Fico feliz por você”). Nessa hora, nos sentimos solidários, empáticos ou sentimos pena pelo outro que se parece conosco; “Deve ter sido doloroso (ou maravilhoso) para você”, dizemos, imaginando a dor (ou a alegria) que nós mesmos poderíamos ter naquela situação. Quando não conseguimos localizar as experiências, sentimentos ou perspectivas que se assemelhem com as do outro, temos a sensação que não entendemos aquela pessoa – de fato, podemos achar a pessoa estranha, se não tola ou irracional. Quando alguém não age da mesma forma que nós, ou não reage às situações como nós, ficamos geralmente perplexos, incrédulos, ou até mesmo espantados. Somos inclinados, nessas situações, a tentar corrigir as perspectivas do outro, a persuadir a pessoa a ver as coisas da maneira como as vemos, e queremos que ela sinta o que nós sentiríamos se estivéssemos naquela situação. Nos casos mais extremos, simplesmente julgamos o outro: como pode alguém, nos perguntamos, acreditar ou agir ou sentir dessa maneira? Colocando de forma mais simples, do modo como geralmente escutamos, deixamos passar ou rejeitamos a alteridade do outro. Raramente escutamos o que torna única a história contada por

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2. Fazendo perguntas Fazendo perguntas

É sempre mais importante levantar o problema do que resolvê-lo. Lacan (1998b, p. 425) Dado o grau em que repressão e transferência levam a paciente a truncar e adaptar as histórias que ela conta ao analista, uma boa parte do trabalho dele consiste em fazer perguntas, e ela pode completar, terminar sentenças interrompidas e explicar o que quis dizer com certas coisas que disse. Esta é uma área em que a própria resistência do analista no processo analítico provavelmente se manifestará; é também uma área em que o analista acaba dizendo mais do que o necessário. Nos primeiros encontros – isto é, durante a fase que pode ser mais longa ou mais curta nas sessões frente a frente (durando um ano ou mais) que precede o uso do divã – o analista pode indicar uma dúvida, mediante alguma coisa que a paciente disse, sim-

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fazendo perguntas

plesmente levantando a sobrancelha ou olhando para ela com curiosidade. Essa dúvida, no entanto, não é extremamente precisa, porque a questão levantada pode se referir a tudo o que a paciente disse, ou só à última frase, à forma como disse, ou ao fato de que a paciente tenha rido ou ficado brava enquanto contava – resumindo, não aponta para alguma coisa em especial. Nesse caso, a paciente tem liberdade de interpretar o movimento da sobrancelha ou o olhar curioso da forma como entender, como sendo um sinal de desaprovação ou de crítica, sugerindo que ela não sabia o que estava dizendo, ou um pedido para uma elaboração mais extensa. Daí a importância de perguntas mais precisas, especialmente com pacientes propensos a pensar que o analista critica tudo o que dizem. Porém, como toda fala é potencialmente ambígua, quanto menos o analista se expressar, mais precisa será sua pergunta (exceto, como veremos mais adiante, se ele a formular deliberadamente, “o que você acha?”). Perguntas longas podem confundir ou fazer a paciente se perder, e quase sempre faz com que aquilo que foi dito fique em segundo plano, se não completamente esquecido. Se a paciente diz, “tive muitas dificuldades na escola primária porque minha família fez muitas mudanças”, e o analista quer saber que tipo de dificuldades, seria suficiente simplesmente perguntar “Dificuldades?” ao invés de perguntar, “Pode me dar alguns exemplos?” e receber como resposta explicações das diversas mudanças feitas pela família, de cidade a cidade, ao invés dos exemplos das dificuldades. Menos é sempre mais ao fazer perguntas, e se a paciente responder “sim, dificuldades”, o analista pode adicionar facilmente, “Que tipo de dificuldades?”. Nem sempre o mais produtivo é a precisão, naturalmente; pode acontecer da paciente ouvir coisas na pergunta do analista que o analista não teve a intenção de perguntar, e sua resposta à pergunta que ouviu é sempre mais interessante do que a resposta

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Pontuando 3. Pontuando

É fato que pode ser claramente visto no estudo dos manuscritos de escritas simbólicas, seja na Bíblia ou nos textos canônicos chineses, que a ausência de pontuação é uma fonte de ambiguidade. Pontuação, uma vez feita, estabelece o significado; mudar a pontuação renova ou desorganiza-o; e a pontuação incorreta distorce. Lacan (2006, pp. 313-314) Pode-se pensar em um orador colocando uma certa pontuação em seu próprio discurso aparentando a pontuação que encontramos em textos escritos, fazendo pausas em alguns pontos, dando ênfase em certas palavras, apressando-se ou murmurando, repetindo frases específicas, e assim por diante. Esta é a pontuação preexistente, em certo sentido – a pontuação que corresponde à leitura do discurso sugerida pelo próprio orador, a pontuação que corresponde ao significado que o próprio orador atribui à sua fala. Essa pontuação preexistente algumas vezes permite somente

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pontuando

uma leitura que pode ser superficial e pouco interessante, mesmo para o orador (ler é muito simples, nesse sentido), mas por vezes o texto fica difícil de ler, de qualquer modo. O ouvinte, por vezes, é confrontado com resmungos (que pode ser um ponto particularmente importante, ou um ponto sensível, difícil de acompanhar), com ênfase em uma parte do discurso, quando é a outra parte que parece mais importante, ou com o discurso mais ritmado sobre assuntos rotineiros, seguido por uma torrente de palavras sobre temas mais sensíveis (a afluência de palavras parece desmentir o desejo de esconder). Aqui a pontuação preexistente parece ocultar o significado do orador ou apresentar suas palavras de tal forma que só o significado que ele quer transmitir seja discernível em si. A analista – ao tentar que o paciente vá mais devagar, fazendo com que ele repita mais claramente as palavras que resmungou entre uma respiração e outra, e que ele se explique um pouco melhor – procura realizar uma mudança naquela pontuação preexistente. Um paciente certa vez colocou um ponto final depois do comentário “Meu irmão não tinha importância”. Na tentativa de mudar o ponto final por uma vírgula e o encorajar a elaborar esse comentário, respondi com um irônico “Hum?”, o que o fez parar um momento e depois comentar que um amigo, certa vez, contou que aquilo só tinha acontecido com ele: “Eu odeio meu irmão; por que não posso matá-lo?”. Colocar em dúvida (como vimos no Capítulo 2) pode levar a mais uma questão que reverte completamente o sentido da declaração precedente (a pessoa que alguém quer matar dificilmente é alguém “sem importância”!). Parte da tarefa do analista é estabelecer uma pontuação levemente diferente, uma pontuação que dê sentido ao “texto” da fala do paciente que antes não estaria visível. Os textos da Bíblia ou os trabalhos de Aristóteles – que geralmente não tinham pontuação nos primeiros formatos – podem ser compreendidos diferentemente se os pontuar-

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4. Escansão Escansão (sessão (sessão dede duração variável)

O fim de uma sessão não pode ser vivido pelo sujeito como uma pontuação de seu progresso. Sabemos como ele calcula o momento de sua chegada a fim de vinculá-lo à sua própria agenda, ou até mesmo às suas manipulações evasivas, e como ele o antecipa usando-o como uma arma, ficando à espreita, como faria em um local protegido. Lacan (2006, p. 313) De todos os conceitos conhecidos de Lacan no mundo do idioma inglês, escansão talvez seja um dos mais, e dos menos, compreendidos. É o mais compreendido no sentido de que muitos estão cientes de que se refere ao ato pelo qual o analista finaliza a sessão – em certas circunstâncias, subitamente (talvez seja raro para muitos leitores compreenderem algo essencial sobre qualquer conceito de Lacan). Até agora, este talvez seja o conceito menos compreendido, no sentido de que poucos sejam capazes de dizer por que e como a escansão é empregada. De fato, quando dou palestras em ins-

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escansão (sessão de duração variável)

tituições psicanalíticas nos Estados Unidos, independentemente do tópico que apresento, a discussão invariavelmente acaba desviando em direção ao tema sessão de duração variável, e algumas vezes o assunto continua até que eu pergunte se alguém da plateia teria alguma pergunta sobre outro tema que não seja escansão. Neste capítulo tentarei explicar alguns aspectos dos porquês da escansão. Quero começar tentando esclarecer alguns equívocos. Variar a extensão da sessão não implica, necessariamente, que a sessão será mais curta do que qualquer que seja o tempo-padrão praticado por outros analistas no mesmo país, quer seja de 30, 40, 45, 50 ou 55 minutos. Todas essas durações de sessão são consideradas padrão por diferentes profissionais, em diferentes partes do mundo (e muitas vezes por profissionais diferentes no mesmo país ou na mesma cidade), embora ninguém pareça surpreso com esse tipo de variação.1 Na teoria, pelo menos, variar a duração da sessão permite que o analista prolongue a sessão além de qualquer tempo estabelecido (conforme Freud, 1913/1958, pp. 127-128, indicou que ele próprio fez isso algumas vezes) a fim de dar continuidade a um trabalho que está progredindo em uma direção muito útil; para completar, pelo menos num grau relativo, a interpretação de uma fantasia ou sonho; para encorajar o trabalho analítico com o paciente que fala vagarosamente por qualquer que seja o motivo (quer seja porque sua língua nativa é outra, porque tem muita idade, pelos padrões de fala regionais, ou simplesmente devido ao hábito ou capacidade) ou leva muito tempo para realmente entrar no assunto; ou, por uma veia diferente, para desconcentrar o paciente que sistematicamente prepara grandes quantidades de material para as sessões, para evitar que ocorra algo não planejado, espontâneo ou surpreendente, ou que faz suas mais significativas declarações apenas quando já está quase na porta indo embora. Nas primeiras semanas de análise, eu próprio raramente encerro a sessão antes dos 45 minu-

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Interpretando 5. Interpretando

Muitas vezes temos a impressão de que, para usar as palavras de Polônio, nossa isca da falsidade pegou uma carpa de verdade. Freud (1937/1964, p. 262) Tirar do sujeito suas próprias palavras para poder voltar a elas, significa que uma interpretação pode ser exata somente se for... uma interpretação. Lacan (2006, p. 601) Antes de iniciar a psicanálise, a maioria de nós, provavelmente intuitivamente, considera que a meta da interpretação seja precisa. E, em certos domínios da atividade humana, um caso drástico pode ser feito, se a precisão estiver entre os critérios primários da boa interpretação. Alguns psicanalistas e pacientes com vários anos de análise nas costas se surpreenderiam com a noção de que a interpretação, na situação analítica, visa menos à precisão do que causar um certo tipo de impacto.

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interpretando

No domínio humano uma das primeiras questões levantadas é: para quem assumiremos que a interpretação pareça precisa ou verdadeira? A resposta natural seria supostamente que a interpretação deve parecer precisa para o paciente. Todavia, a maioria dos pacientes pode provavelmente lembrar de interpretações que suas analistas fizeram, que pareceram em um primeiro momento errôneas (e que eles talvez tenham tentado refutar ou até mesmo blasfemar contra), mas que os impressionou por terem sido bastante verdadeiras, mais tarde, às vezes bem mais tarde. A maioria dos pacientes pode provavelmente se lembrar das interpretações às quais chegaram sozinhos ou que suas analistas os ajudaram a compreender naquele momento, mas que mais tarde pareceram superficiais, incompletas ou desprovidas de embasamento. Portanto, se quisermos adotar o critério de que uma interpretação deve parecer precisa ao paciente, devemos acrescentar as palavras “cedo ou tarde” à formulação. Em certos casos, no entanto, os pacientes podem perceber que estavam desejando e até mesmo satisfeitos, em um determinado momento, ao adotar interpretações específicas, porque podem dar suporte a opiniões valiosas a respeito deles mesmos (sejam positivas ou negativas). Mais tarde em análise eles começam a colocar aquelas opiniões em questão e descobrir que são providas de verdade. Em tais casos, o sentido inicial do paciente de que a interpretação tocou a verdade parece prejudicada após tal fato.1

A verdade está sempre em todos os lugares Não há verdade que seja dita pela metade, assim como o assunto que vem com ela. Para expressá-la, como afirmei antes, a verdade pode ser dita apenas pela metade. Lacan (2005b, pp. 30-31) Para o paciente, a verdade não parece tão estável. Quando ele diz alguma coisa na sessão, que sente refletir genuinamente sua

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6. Trabalhando Trabalhando com com sonhos, sonhos, devaneios e fantasias

Dentro de uma análise, muito mais do que o que foi reprimido é trazido à tona em conexão com os sonhos do que em qualquer outro método. Freud (1932a/1961, p. 117) Ninguém pode praticar a interpretação de sonhos como atividade isolada: ela é uma parte do trabalho de análise. Freud (1925a/1961, p. 128) A maior parte do material de uma análise é normalmente fornecida pelos sonhos e fantasias. Por que isso? Porque através das criações oníricas, o inconsciente “participa” do trabalho analítico, em algum nível pelo menos, complementando a história da vida da paciente contada por ela, aludindo às memórias que esta deixou de fora. Em alguns casos a paciente pode simplesmente ter falhado ao contar suas memórias, ao relatar os primeiros eventos mais importantes da história de sua vida, no início da análise, mas consegue

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trabalhando com sonhos, devaneios e fantasias

facilmente se lembrar deles quando são evocados por elementos do sonho (ou seja, eram pré-conscientes). Em outros casos, a paciente pode ter se esquecido (isto é, tê-los reprimido). O inconsciente alude a essas memórias omitidas; sonhos, devaneios, e fantasias normalmente não ficam diretamente na memória, contudo fornecem fragmentos de cenas ou elementos associados a cenas do passado: nomes, lugares, cores, sons, cheiros, e assim por diante. É bastante raro que tais cenas se reproduzam diretamente neles; ao invés disso, são geralmente evocadas de uma nova forma, de modo desejável, nos permitindo chegar às ideias sobre as cenas que podem não ter sido evocadas, se tivessem vindo à mente de outro modo. Esse tipo de (re)presentação criativa das cenas do passado, nas produções oníricas dos pacientes, nos permite supor outros motivos, intenções, ou desejos nas cenas que aludem ao que podemos ter se a paciente simplesmente relatar em um simples discurso sobre sua vida. Como os sonhos, devaneios e fantasias podem ser bem utilizados em análise? Enquanto a paciente tenta espontaneamente interpretar um sonho como um todo – como uma história que, com algumas substituições, pode ser mais ou menos aplicado em sua vida (interpretando, por exemplo, um sonho em que ela dá a partida em um conversível amarelo gasto, para tentar se relacionar com um homem que ela conheceu recentemente) – o analista precisa solicitar associações para praticamente cada palavra e frase do relato do sonho da paciente, sem desconsiderar sua interpretação feita de forma grosseira e global: “Gasto?”, “Amarelo?”, “Conversível?”, ele deve perguntar. Suas associações a esses elementos podem levar além desse relacionamento que está brotando. Alternativamente (ou em combinação com o método anterior), a paciente pode espontaneamente tentar “decodificar” o sonho substituindo um ou dois elementos por outros elementos, do mesmo modo que Joseph fez ao interpretar o sonho de Faraó das sete vacas gordas e das sete

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7. Tratando transferência Tratando transferência e e contratransferência

Ela [transferência] permanece, com a força de adesão de um comum acordo, identificada com um sentimento ou uma constelação de sentimentos experimentados pelo paciente, enquanto, caracterizando-a simplesmente como um tipo de reprodução que ocorre em análise, fica claro que grande parte dela deve continuar despercebida pelo sujeito. Lacan (2006, p. 461)

Reconhecendo a transferência Na literatura psicanalítica contemporânea, o termo transferência serve para designar praticamente tudo que acontece no consultório da analista. Freud (1905a/1953, p. 116) introduziu o termo Übertragung – que tem sido traduzido como transferência, mas literalmente significa transmissão, translação, transposição ou aplicação (de um idioma ou registro para outro idioma ou registro) – para se referir a “novas edições ou cópias idênticas dos

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tratando transferência e contratransferência

impulsos e fantasias que surgem... durante o progresso da análise” e que “substituem uma pessoa anterior por aquela que ocupa o lugar do analista. Dizendo de outra forma: sequências completas de experiências psicológicas são revividas, não como se pertencessem ao passado, mas aplicadas à pessoa do médico no presente momento”. Essas translações ou transposições podem ter diversas e diferentes formas: • Em um nível perceptivo – seja visual, auditivo, olfativo, tátil ou outro – alguns aspectos da analista fazem com que o paciente se lembre de um de seus pais (ou de alguém muito importante de seu passado), tais como o som de sua voz, a cor dos olhos, cabelo ou pele, sua compleição, palmas das mãos suadas ou frias, quando se cumprimentam no início ou no final da sessão, e assim por diante.

Por vezes, basta que a analista simplesmente tenha um nariz – independentemente do formato e tamanho – para o paciente “vê-lo” como se fosse o nariz de sua mãe (ele pode dizer que só quando olhou por outro ângulo ou com a claridade, por exemplo, que se lembrou dela). Em outras palavras, não é que alguma característica real da analista tenha feito com que ele se lembrasse de sua mãe, mas sim por projetar na analista algo de sua mãe que ficou preso em algum momento, algo associado com uma característica especial de seu rosto. Ele “vê nela” como se fosse, como se registrasse uma percepção.

• Alguma característica “codificada” da analista, sua companhia ou o próprio ambiente, faz o paciente se lembrar de um dos pais (ou de alguém importante para ele no passado), tais como sua idade; seu jeito de se vestir (roupa, joia, maquiagem e acessórios), que pode sugerir uma determinada classe socioeconômica ou o empenho para criar um tipo de aspecto

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8. “Análise “Análise porpor telefone” telefone” (variações (variações na situação na situação psicanalítica) psicanalítica)

Quer se deseje ser um agente de cura, educador, ou tocar nas profundezas, a psicanálise só tem um meio: a fala do paciente. Lacan (2006, p. 247) Em média os americanos se mudam a cada 18 a 24 meses, algumas vezes “apenas para o outro lado da cidade” – o que em áreas expandidas, como Los Angeles, pode significar dirigir por duas horas vindo da antiga casa – algumas vezes para outra cidade, estado, país, ou mesmo continente. Em minha própria experiência, a maioria dos meus pacientes se mudou pelo menos uma ou duas vezes durante a análise, quase sempre para locais a mais de 1.000 milhas de lá; quatro dos meus pacientes deixaram a América do Norte por um ano ou mais; e dois se mudaram pelo menos oito vezes em cerca de oito anos. Dada a mobilidade da população americana – uma mobilidade que muitas pessoas que não são da América achariam

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“análise por telefone” (variações na situação psicanalítica)

difícil compreender – os analistas na América encontram um árduo problema: como manter uma análise de longo prazo com as pacientes. Algumas vezes é possível, claro, encaminhar uma paciente para outro analista da cidade em que ela foi transferida, mas é comum o analista não conhecer o trabalho de algum colega naquela cidade, que pudesse recomendar com confiança. Além do mais, muitas mudanças dos pacientes são por tempo limitado, como estágios de três meses, seis meses sabáticos, um ano inteiro Fulbright (bolsa de estudo), ou uma missão de dois anos na sede de uma corporação em país estrangeiro. Nesses casos, é impraticável continuar a análise com outra pessoa, em vista da certeza do retorno para casa, em um curto espaço de tempo (sem falar na resistência da paciente em “recomeçar” com alguém novo e ter que lidar com possíveis obstáculos linguísticos), e ainda as dificuldades da paciente podem ser tais que exijam tratamento continuado durante esse tempo. Em teoria, o analista poderia tentar dissuadir a paciente a fazer essa mudança por um curto período de tempo, tentando incutir nela a importância de continuar o trabalho analítico pessoalmente, e em alguns casos isso pode de fato ser adequado. Em muitos casos, no entanto, a mudança por um curto período representa uma oportunidade muito especial, que provavelmente não se apresentará novamente, e, em outros casos, isso representa uma escolha forçada, em que o empregador da paciente diz, “Mude-se para a cidade X para nos ajudar a montar um novo escritório, ou comece a procurar um novo emprego” (a segurança no trabalho nos Estados Unidos não é como na Europa, por exemplo, e as exigências da vida interferem na análise de uma forma que não interferiam quando as análises duravam apenas poucos meses). Por isso a importância de encontrar um jeito que permita que a paciente continue se tratando durante essas ausências, que são praticamente inevitáveis.

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Análise 9. Análise não não normalizante normalizante

Deveria ser óbvio que o discurso analítico não consiste, de jeito algum, em fazer com que aquilo que não esteja bem vá embora, em suprimir o que não esteja indo bem no discurso comum... O discurso que procede apenas da verdadeira fala é precisamente o que está transtornando... É o bastante para alguém fazer um esforço e falar verdadeiramente, e com isso incomodar a todos. Lacan (1973-1974, 12 de fevereiro, 1974) A noção de normalidade tem um peso tão forte sobre nós que muitos ficam aliviados ao saber que nossos demônios, desejos e fantasias, com os quais lutamos, são “normais”. McWilliams (2004, p. 212) forneceu um relato sobre um breve caso de uma pessoa neurótica que ela tratou que, depois de algum tempo em análise, começou a falar sobre “fantasias de masturbação, das quais estava muito envergonhada, envolvendo vários tipos de submissões masoquistas”. McWilliams relatou que ela pontuou para sua paciente “que tais fantasias são comuns e não estão

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análise não normalizante

necessariamente correlacionadas com o atual comportamento sexual masoquista”, pois a paciente estava preocupada “que ela fosse ‘realmente’, de algum modo fundamental, uma masoquista sexual”.1 Ao caracterizar as fantasias da paciente como “comuns” (outro termo para “normal” no vocabulário de muitos terapeutas), a abordagem da analista, aqui, é tentar remover a preocupação da paciente e aliviar sua tensão. Tal abordagem – que é tão divulgada em nossos tempos2 – pode oferecer alivio momentâneo para certos pacientes (outros podem achar irritante ou paternalista ouvir suas fantasias serem caracterizadas como “comuns”, “normais”, ou “usuais”), mas devemos considerar outros prováveis resultados de curto prazo, assim como os de longo prazo, de tais intervenções. Tais intervenções podem, imediatamente, bloquear a exploração das fantasias de masturbação da paciente – afinal, se elas são “comuns”, que necessidade haveria de articular todos os seus detalhes fazendo associações para descobrir a que se referem? Se a maioria das pessoas as tem, por que a paciente se daria ao trabalho de decifrar o que significam para ela especificamente, se esse processo de decifrar pode ser longo, árduo e humilhante? No longo prazo, tais comentários feitos pela analista sugerem à paciente que ela, como todas as pessoas, acredita que existem coisas como a normalidade, e que a pessoa está bem se ela estiver normal (e talvez todos devêssemos ser tão normais quanto possível). Isso leva a um tipo de tirania das normas por parte da analista – o tipo da tirania que o paciente espera dos amigos, parentes, orientadores, psicólogos escolares e afins (alguém dificilmente precisaria de uma analista para isso) – e, para mostrar à analista que ela (a paciente) está realmente doente, ou anormal de alguma forma, a paciente pode muito bem continuar perguntando se este ou aquele aspecto de sua vida é normal, até que fique claro algum momento que a analista não possa, talvez, caracterizar como normal.

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Tratando 10. Tratando a psicose a psicose

Logo, as psicoses... não são adequadas à psicanálise; pelo menos não pelo método que tem sido aplicada até o presente. Não considero, por quaisquer meios, que seja impossível que, com alterações adequadas no método, tenha sucesso e supere essa contraindicação – e assim, que seja possível iniciar uma psicoterapia das psicoses. Freud (1904/1953, p. 264) O papel do analista... deve variar de acordo com o diagnóstico do paciente... A grande maioria das pessoas que chega até nós para a psicanálise não é psicótica e os estudantes devem aprender primeiramente os casos de pessoas não psicóticas.1 Winnicott (1960/1965c, p. 162) Praticamente nenhuma abordagem à técnica que articulei até o momento, neste livro, aplica-se ao tratamento da psicose como ela é compreendida na psicanálise lacaniana. O termo psicose não cobre o assunto inteiramente no emprego que Lacan faz, mas co-

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tratando a psicose

bre na psicologia e psiquiatria mais contemporânea (no DSM-IV, por exemplo), sendo de formas diferentes, tanto na especificidade quanto na extensão – mais específico porque se baseia em um mecanismo de negação que Lacan chama de “foraclusão” (que é bem diferente de repressão),2 e mais extenso, pois cobre não apenas todos aqueles que já tiveram surto psicótico (mesmo que já tenha diminuído), mas também todos aqueles que poderiam potencialmente ter (esses são chamados algumas vezes de pré-psicóticos e devem ser caracterizados como tendo “estrutura psicótica”; para descrição detalhada sobre isso, ver Fink, 1997, Capítulo 7). Assim como há várias formas diferentes de neurose e diferentes abordagens para tratamento que podem ser úteis para as diferentes formas (ver Fink, 1997, Capítulo 8), existem formas diversas de psicoses – paranoia, esquizofrenia, erotomania, melancolia, mania, e assim por diante – e o tratamento não deveria ter o procedimento exatamente igual para cada forma, ou mesmo para todos os casos da mesma forma.3 Tão criativo quanto o trabalho psicanalítico é com pacientes neuróticos, cada caso demandando que o analista exercite uma grande quantidade de músculos mentais, para elaborar interpretações úteis e intervir de forma que seja oportuna para aquela pessoa em particular, o trabalho psicanalítico deve ser, como poderemos ver, talvez mais criativo ainda com pacientes psicóticos. Vou tentar não expor aqui toda a teoria da psicose de Lacan, uma vez que está além do escopo deste livro e também porque já o fiz em outro momento (Fink, 1995, Capítulos 4-5, 1997, Capítulos 6-7). Limitando-me à argumentação teórica de que não existe repressão e, estritamente falando, nem inconsciente na psicose (uma argumentação complexa e sem dúvida controversa),4 começarei oferecendo algumas comparações simples entre o tratamento da psicose e o da neurose, baseadas no que já foi dito nesse livro; depois disso, tentarei indicar como a psicose (conforme definida por Lacan) pode ser detectada através do tipo de trabalho clínico que

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Escutando e ouvindo

2. Fazendo perguntas Partindo da ideia de que as abordagens contemporâneas ao tratamento psicanalítico parecem ter perdido de vista muitos insights fundamentais de Freud, Lacan e outros analistas pioneiros e adotado derivações da psicologia – especialmente da psicologia do desenvolvimento – que contradizem os princípios básicos da psicanálise – alguns fundamentais, como inconsciente, repressão, compulsão à repetição e assim por diante –, Fundamentos da técnica psicanalítica apresenta um material técnico com a finalidade de manter esses princípios básicos firmemente à vista. A obra foca naquilo que parece ser a técnica elementar para o autor, sem longas explicações teóricas sobre os princípios básicos. Também foi escrita ensando nos leitores que não têm conhecimento prévio de Lacan, mas possuem algum conhecimento geral de psicanálise.

PSICANÁLISE

3. Pontuando 4. Escansão (sessão de duração variável)

5. Interpretando 6. Trabalhando com sonhos, devaneios e fantasias

PSICANÁLISE

M

1.

Fundamentos da técnica psicanalítica

C

É psicanalista lacaniano praticante e supervisor formado no instituto psicanalítico que Jacques Lacan criou pouco antes de sua morte, a École de la cause freudienne (ECF) de Paris. Obteve Ph.D. pelo Departamento de Psicanálise da Université Paris 8 e foi professor de Psicologia de 1993 a 2013 na Duquesne University, em Pittsburgh. Atualmente, faz parte do conselho de diretores do Pittsburgh Psychoanalytic Center. Traduziu várias obras de Lacan para o inglês, incluindo Écrits: the first complete edition in English e On feminine sexuality: the limits of love and knowledge, e é também autor de alguns livros sobre Lacan, incluindo A clinical introduction to Lacanian psychoanalysis: theory and technique, Lacan to the letter, A clinical introduction to Freud: techniques for everyday practice, e, mais recentemente, Against understanding. É possível contatá-lo pelo seu site pessoal: http://brucefink.com/.

Conteúdo

Fink

Bruce Fink

Bruce Fink

7.

Fundamentos da técnica psicanalítica

8. “Análise por telefone”

Uma abordagem lacaniana para praticantes

Tratando transferência e contratransferência (variações na situação psicanalítica)

9. Análise não normalizante 10.

Tratando a psicose


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Fundamentos da Técnica Psicanalítica

Uma abordagem lacaniana para praticantes Bruce Fink ISBN: 9788521212133 Páginas: 504 Formato: 14 x 21 cm Ano de Publicação: 2017


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