Leis Especiais Comentadas - ECA

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Leis Especiais

Comentadas para Concursos

Gustavo Bregalda Neves, Kheyder Loyola e Emanuel Rosa

ECA ESTATUTO DA

CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Lei Federal no 8.069/1990

A obra compreende: • • • • • • • • • • •

Direitos fundamentais da criança e do adolescente Família natural e família substituta Guarda e tutela Adoção Prevenções especiais Políticas e entidades de atendimento Medidas de proteção Atos infracionais – conteúdo e procedimento Justiça da Infância e da Juventude Perda e suspensão do poder familiar Crimes e infrações administrativas

Prefácio de

Cleber Masson


Emanuel Rosa • Bacharel em Direito pela Faculdade Padre Anchieta – Jundiaí/SP. • Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pelas Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU – São Paulo/SP. • Professor em cursos preparatórios para concursos públicos. • Professor universitário na área de Direito Penal, Direito Processual Penal e Ciência Política.

Gustavo Bregalda Neves • Doutor em Direito do Estado. • Mestre em Direito Público. • Pós-graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. • Professor de Cursos de Pós-graduação em Direito e Preparatórios para Concursos Públicos e OAB. • Coordenador de Coleções Preparatórias para Concursos Públicos e Exame da OAB. • Aprovado em mais de 35 Concursos Públicos. • Ex-Advogado do BNDES. • Ex-Procurador Federal. • Ex-Juiz Estadual em São Paulo. • Juiz Federal em São Paulo.

Kheyder Loyola • Graduado pela UFEOB e UFMG. • Mestre em Processo Civil pela FADUSP. • Professor de curso preparatório do Complexo Damásio de Jesus, da REDEJURIS e do Agora Eu Passo. • Aprovado em vários concursos públicos. • Procurador Legislativo.


ECA

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE



Leis Especiais

Comentadas PARA CONCURSOS

Emanuel Rosa Gustavo Bregalda Neves Kheyder Loyola

ECA

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


EXPEDIENTE Presidente e editor diretora editorial editora-assistente assistente editorial Consultor jurídiCo da Coleção revisão téCniCa revisão Projeto gráfiCo diagramação

Italo Amadio Katia F. Amadio Ana Paula Ribeiro Renata Aoto Bruno Amaro Alves de Almeida Rosana Simone Silva Larissa Wostog Ono Lyvia Felix Sergio A. Pereira WK Editorial

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Angélica Ilacqua CRB-8/7057 Loyola, Kheyder Harp Estatuto da criança e do adolescente / Kheyder Harp Loyola, Gustavo Bregalda Neves, Emanuel Rosa. – São Paulo : Rideel, 2016. (Leis especiais comentadas para concursos) Bibliografia ISBN 978-85-3393-803-8 1. Brasil – Estatuto da criança e do adolescente 2. Direitos das crianças 3. Direitos dos adolescentes I. Título II. Neves, Gustavo Bregalda III. Rosa, Emanuel IV. Série 16-0009

CDU 347.157.1(81)(094) Índice para catálogo sistemático: 1. Brasil – Estatuto da criança e do adolescente © 2016 - Todos os direitos reservados à

Av. Casa Verde, 455 – Casa Verde CEP 02519-000 – São Paulo – SP e-mail: sac@rideel.com.br www.editorarideel.com.br Proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio ou processo, especialmente gráfico, fotográfico, fonográfico, videográfico, internet. Essas proibições aplicam-se também às características de editoração da obra. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos, do Código Penal), com pena de prisão e multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (artigos 102, 103, parágrafo único, 104, 105, 106 e 107, incisos I, II e III, da Lei no 9.610, de 19-2-1998, Lei dos Direitos Autorais). 135798642 0216


PREFÁCIO O grande desafio de um livro é ser claro. Transmitir ensinamentos ao leitor, com objetividade e precisão, reclama muita didática e comprometimento com o trabalho intelectual. Esse desafio foi superado pelas obras integrantes da coleção Leis Especiais Comentadas para Concursos, coordenada por Kheyder Loyola e Gustavo Bregalda Neves, professores respeitados no meio forense e com históricos de dezenas de aprovações nos concursos públicos mais concorridos do Brasil. Os livros contêm comentários dos dispositivos legais – artigos, parágrafos, incisos e alíneas –, acompanhados das divergências doutrinárias e das posições dos tribunais. Permitem, destarte, o estudo completo para as provas, amparado no tripé fundamental que deve nortear a preparação dos candidatos: letra da lei, doutrina e jurisprudência. Se não bastasse, ao final das obras constam diversas e atuais questões de concursos públicos, permitindo ao leitor simular seu desempenho e conhecer a forma pela qual a matéria estudada vem sendo cobrada pelas bancas examinadoras. Aos coordenadores e aos autores ficam as nossas homenagens pelos valorosos trabalhos, os quais servirão como ferramentas indispensáveis à preparação e ao êxito de inúmeros candidatos aos mais variados concursos públicos. E também o nosso sincero agradecimento pelo convite para prefaciar obras de inevitável e merecido sucesso. Janeiro de 2016

Cleber Masson

Promotor de Justiça em SP Doutor e Mestre em Direito Penal pela PUC/SP Professor de Direito Penal Autor de livros jurídicos

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................9 LEI No 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990 Título I – Das Disposições Preliminares .......................................................................23 Título II – Dos Direitos Fundamentais ..........................................................................27 Capítulo I – Do Direito à Vida e à Saúde ....................................................................................27 Capítulo II – Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade .........................33 Capítulo III – Do Direito à Convivência Familiar e Comunitária ...........................39 Capítulo IV – Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer .........87 Capítulo V – Do Direito à Profissionalização e à Proteção no Trabalho ........93

Título III – Da Prevenção ...........................................................................................................98 Capítulo I – Disposições Gerais ...........................................................................................................98 Capítulo II – Da Prevenção Especial.............................................................................................104

Parte Especial ....................................................................................................................................114 Título I – Da Política de Atendimento ......................................................................114 Capítulo I – Disposições Gerais ........................................................................................................114 Capítulo II – Das Entidades de Atendimento .....................................................................121

Título II – Das Medidas de Proteção...........................................................................145 Capítulo I – Disposições Gerais ........................................................................................................146 Capítulo II – Das Medidas Específicas de Proteção .......................................................147

Título III – Da Prática de Ato Infracional .................................................................164 Capítulo I – Disposições Gerais ........................................................................................................164 Capítulo II– Dos Direitos Individuais ...........................................................................................166 Capítulo III – Das Garantias Processuais...................................................................................169 Capítulo IV – Das Medidas Socioeducativas .......................................................................171 Capítulo V – Da Remissão ....................................................................................................................197

Título IV – Das Medidas Pertinentes aos Pais ou Responsável............199 Título V – Do Conselho Tutelar.......................................................................................204 Capítulo I – Disposições Gerais ........................................................................................................204 Capítulo II – Das Atribuições do Conselho ...........................................................................207 Capítulo III – Da Competência .........................................................................................................212 Capítulo IV – Da Escolha dos Conselheiros ..........................................................................213 Capítulo V – Dos Impedimentos ...................................................................................................214

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Sumário

Título VI – Do Acesso à Justiça ........................................................................................215 Capítulo I – Disposições Gerais ........................................................................................................215 Capítulo II – Da Justiça da Infância e da Juventude .......................................................218 Capítulo III – Dos Procedimentos ..................................................................................................228 Capítulo IV – Dos Recursos .................................................................................................................280 Capítulo V – Do Ministério Público.............................................................................................284 Capítulo VI – Do Advogado ...............................................................................................................293 Capítulo VII – Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais, Difusos e Coletivos ................................................................................................................................................................295

Título VII – Dos Crimes e Das Infrações Administrativas .........................307 Capítulo I – Dos Crimes ..........................................................................................................................307 Capítulo II – Das Infrações Administrativas ..........................................................................336

Questões de Concursos ..........................................................................................................368

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INTRODUÇÃO 1. ASPECTOS GERAIS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Durante um longo período histórico, a condição da infância e da juventude foi relegada a uma situação de esquecimento por parte do ordenamento jurídico, sendo-lhes, em geral, quando necessário, aplicadas as regras gerais de direito a todos impostas, não havendo qualquer preocupação legal em face da condição especial da criança e do adolescente enquanto indivíduo em fase de formação. Com a evolução da sociedade e do Direito, uma série de garantias passou a ser reconhecida, considerando essa condição especial, retirando a criança e o adolescente da condição de meros objetos de direitos para efetivamente se tornarem sujeitos e detentores de direitos. Nessa toada e em consonância com a disciplina e os novos paradigmas trazidos pela Constituição Cidadã de 1988, a Lei nº 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, alçou a um outro nível o tratamento jurídico e a proteção dispendida pelo ordenamento jurídico à infância e à juventude. Estabeleceu-se todo um regramento jurídico novo, preocupado em estabelecer medidas de proteção integral, firmando os direitos e as garantias inerentes à condição pessoal da criança e do adolescente enquanto sujeitos de direitos e pessoas em formação, bem como positivando os mecanismos de atuação do aparato estatal à proteção e à realização desses direitos e garantias. 2. SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE Historicamente, as crianças não eram reconhecidas como sujeitos de direito na maior parte das sociedades, que não vislumbravam a necessidade de proteção a sua condição pessoal de pessoa em desenvolvimento, o que ficava relegado àqueles indivíduos que, por vínculos afetivos, se preocupavam com tal necessidade de proteção. Tanto que, por um longo período, as crianças eram consideradas propriedade dos pais. 9


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Isso pode ser verificado claramente até mesmo em aspectos mais simples, como na arte, na qual as crianças, usualmente, eram ilustradas apenas como adultos pequenos, o que refletia a visão cultural, que ignorava a infância como uma fase essencial do desenvolvimento do indivíduo. Da mesma forma, no campo de vista jurídico, a condição inerente à infância e à juventude restou relegada na proteção jurídica, mesmo com as grandes revoluções liberais dos séculos XVIII e XIX. Tal situação ganhou relevo principalmente depois das Revoluções Industriais, com a mudança dos paradigmas econômicos e a necessidade da integração das pessoas aos sistemas de produção, o que acabou por fazer com que as crianças fossem indiscriminadamente absorvidas como mão de obra e sujeitas às mesmas condições degradantes e exploratórias de trabalho verificadas nesse momento histórico da sociedade ocidental. Apenas na primeira metade do século XX, especialmente depois dos horrores das grandes guerras e das barbáries que acometeram a população civil, com o aflorar da ampla proteção aos direitos humanos é que se passou a pensar em um ordenamento jurídico específico de proteção à infância e à juventude, formalizado no âmbito internacional. 2.1. Declaração Universal dos Direitos da Criança da ONU A Declaração Universal dos Direitos da Criança foi aprovada em Assembleia Geral pela Organização das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1959, tendo como base praticamente o texto integral da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O texto, reconhecendo já em sua parte introdutória a condição especial da criança e apresentando a noção de que toda criança merece uma infância feliz e que deve ter protegida sua condição como medida de garantia do indivíduo e de toda sociedade, expõe dez princípios básicos de proteção da criança, nos seguintes termos: 10


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Princípio 1 – A criança gozará todos os direitos enunciados nesta Declaração. Todas as crianças, absolutamente sem qualquer exceção, serão credoras destes direitos, sem distinção ou discriminação por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento ou qualquer outra condição, quer sua ou de sua família. Princípio 2 – A criança gozará proteção social e ser-lhe-ão proporcionadas oportunidades e facilidades, por lei e por outros meios, a fim de lhe facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, de forma sadia e normal e em condições de liberdade e dignidade. Na instituição das leis visando este objetivo levar-se-ão em conta, sobretudo, os melhores interesses da criança. Princípio 3 – Desde o nascimento, toda criança terá direito a um nome e a uma nacionalidade. Princípio 4 – A criança gozará os benefícios da previdência social. Terá direito a crescer e criar-se com saúde; para isto, tanto à criança como à mãe, serão proporcionados cuidados e proteções especiais, inclusive adequados cuidados pré e pós-natais. A criança terá direito a alimentação, recreação e assistência médica adequadas. Princípio 5 – A crianças incapacitadas física, mental ou socialmente serão proporcionados o tratamento, a educação e os cuidados especiais exigidos pela sua condição peculiar. Princípio 6 – Para o desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a criança precisa de amor e compreensão. Criar-se-á, sempre que possível, aos cuidados e sob a responsabilidade dos pais e, em qualquer hipótese, num ambiente de afeto e de segurança moral e material, salvo circunstâncias excepcionais, a criança da tenra idade não será apartada da mãe. À sociedade e às autoridades públicas caberá a obrigação de propiciar cuidados especiais às crianças sem família e àquelas que carecem de meios adequados de subsistência. É desejável a prestação de aju11


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da oficial e de outra natureza em prol da manutenção dos filhos de famílias numerosas.

Princípio 7 – A criança terá direito a receber educação, que será gratuita e compulsória pelo menos no grau primário. Ser-lhe-á propiciada uma educação capaz de promover a sua cultura geral e capacitá-la a, em condições de iguais oportunidades, desenvolver as suas aptidões, sua capacidade de emitir juízo e seu senso de responsabilidade moral e social, e a tornar-se um membro útil da sociedade. Os melhores interesses da criança serão a diretriz a nortear os responsáveis pela sua educação e orientação; esta responsabilidade cabe, em primeiro lugar, aos pais. A criança terá ampla oportunidade para brincar e divertir-se, visando os propósitos mesmos da sua educação; a sociedade e as autoridades públicas empenhar-se-ão em promover o gozo deste direito.

Princípio 8 – A criança figurará, em quaisquer circunstâncias, entre os primeiros a receber proteção e socorro. Princípio 9 – A criança gozará de proteção contra quaisquer formas de negligência, crueldade e exploração. Não será jamais objeto de tráfico, sob qualquer forma. Não será permitido à criança empregar-se antes da idade mínima conveniente; de nenhuma forma será levada a ou ser-lhe-á permitido empenhar-se em qualquer ocupação ou emprego que lhe prejudique a saúde ou a educação ou que interfira em seu desenvolvimento físico, mental ou moral.

Princípio 10 – A criança gozará de proteção contra atos que possam suscitar discriminação racial, religiosa ou de qualquer outra natureza. Criar-se-á num ambiente de compreensão, de tolerância, de amizade entre os povos, de paz e de fraternidade universal e em plena consciência que seu esforço e aptidão devem ser postos a serviço de seus semelhantes. 12


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2.2. Regras de Beijing ou Regras Mínimas das Nações Unidas para administração da Justiça da Infância e da Juventude A Resolução nº 40/33, adotada pela ONU em 29 de novembro de 1985, passando a ser conhecida como Regras de Pequim ou de Beijing, tem por finalidade estabelecer um regramento mínimo sobre as normas voltadas aos menores que cometam infrações penais, estabelecendo “n” princípios gerais a serem observados pelos Estados-membros no tratamento dos jovens infratores, visando justamente proteger a condição de pessoa em formação que lhes é inerente e garantir o pleno desenvolvimento em consonância com os demais regramentos que tratam da infância e da juventude. 2.3. Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança Em 20 de novembro de 1989, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Convenção sobre os Direitos da Criança, documento que visava disciplinar, no âmbito internacional, princípios e mecanismos de caráter geral voltados à proteção da criança, sendo até hoje o documento de direitos humanos com maior aceitação e adesão internacional, tendo sido ratificado por 193 países, à exceção da Somália e dos Estados Unidos. 3. A PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO O ordenamento jurídico brasileiro, historicamente, até um passado recente, não dispensava muita importância ao tratamento das crianças e dos adolescentes. Do ponto de vista jurídico, até praticamente a primeira porção do século XX, os menores eram tratados como meros objetos de direito, sob responsabilidade e cuidados dos pais, que detinham praticamente um direito como o de propriedade em relação aos filhos. Nesse período, o tratamento jurídico da criança e do adolescente ficou relegado ao esquecimento, não havendo regramentos es13


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pecíficos que os disciplinassem como sujeitos de direitos, salvo pequenas exceções na legislação civil. No campo do Direito Penal, como herança das ordenações do Rei, o Código Penal da República adotou um critério biopsicológico para determinada imputabilidade dos menores, de maneira que o indivíduo com mais de 14 anos era considerado imputável, já aquele entre 9 e 14 anos era submetido a uma avaliação pelo juiz, que, com base em sua convicção pessoal, avaliava a capacidade de discernimento do indivíduo e a ele a aplicação da lei penal. A partir de então, o sistema legislativo passou a adotar um critério baseado na situação irregular, que, sob o pretexto de proteger os menores, admitia a supressão de direitos e garantias individuais básicas, caracterizando a condição do menor como objeto da proteção do direito, e não como sujeito do próprio direito, culminando com a elaboração de leis, como o Código de Mello Matos, de 1927 (Decreto nº 17.943-A, de 12 de outubro de 1927), a primeira legislação latino-americana a disciplinar a situação dos menores, preocupando-se em tratar especificamente de menores em situação de abandono ou de menores delinquentes, revelando o espírito de atuação legal voltada tão somente àquelas situações de irregularidade. Posteriormente, em 1979, foi editado o Código de Menores (Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979), ainda seguindo os paradigmas da doutrina do menor irregular, preocupando-se com a atuação em face de menores em condição de irregularidade – abandonados e delinquentes –, sem, contudo, imprimir uma atuação positiva e garantista no que diz respeito à criança e ao adolescente de uma forma geral. Apenas com a Constituição Federal de 1988 é que houve uma mudança no modelo de atuação do ordenamento jurídico em face da criança e do adolescente, que passaram efetivamente a ser tratados com sujeitos de uma multiplicidade de direitos inerentes à sua condição humana especial de indivíduo em formação, fazendo surgir todo o arcabouço jurídico decorrente. 14


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3.1. Constituição Federal A Constituição brasileira, promulgada em 5 de novembro de 1988, já previa em seu texto original diversos dispositivos reconhecendo a condição pessoal e a necessidade de proteção da criança e do adolescente, bem como as garantias inerentes à infância e à juventude, tendo o texto anterior à Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, datada de 19 de novembro de 1989, demonstrado a preocupação e a sintonia do legislador constituinte originário com o sistema internacional de proteção da criança e do adolescente. Tal proteção se acha prevista no texto constitucional, sendo um direito social, trazido de maneira expressa no art. 6o da CF: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Além disso, em diversos dispositivos do texto constitucional estão previstas normas de proteção da criança e do adolescente, que permeiam todo o sistema jurídico-constitucional, especialmente no Capítulo VII do Título VIII da Constituição Federal, que trata da proteção da família, da criança e do adolescente, trazendo as regras de proteção em caráter constitucional, bem como o disciplinamento das medidas de realização dos direitos e das garantias inerentes à criança e ao adolescente. Na Constituição Federal, foram introduzidas as regras de caráter geral e as diretrizes que nortearam a legislação infraconstitucional, disciplinando de maneira específica a proteção aos direitos das crianças e dos adolescentes. 3.2. Estatuto da Criança e do Adolescente Dois anos depois da promulgação da Constituição Federal e lastreado nas bases principiológicas e nas diretrizes de proteção e defesa 15


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da infância e juventude estabelecidas no texto constitucional, foi então sancionada a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Tendo como fundamento as diretrizes estabelecidas no texto constitucional e os regramentos decorrentes do sistema internacional de proteção da infância e da juventude, o Estatuto veio a substituir toda a legislação anterior que disciplinava a tratativa dos menores, alterando os paradigmas até então vigentes, abandonando os critérios de intervenção apenas em situação de irregularidade (menores em situação irregular) por uma política de ampla proteção (proteção integral). Composto de duas seções principais – Livros I e II –, o Estatuto ocupa-se, em sua primeira parte, em disciplinar e estabelecer os direitos e as garantias fundamentais inerentes à condição pessoal da criança e do adolescente. Já em sua segunda parte, em disciplinar os órgãos e mecanismos que atuam na proteção da infância e juventude, bem como a tratativa especial dada aos menores que venham a cometer atos infracionais, ampliando as disciplinas trazidas inicialmente no texto constitucional. 4. CONCEITO JURÍDICO DE CRIANÇA E ADOLESCENTE Sempre que se pensa no conceito jurídico de algo, estamos nos referindo ao art. 2o do Estatuto da Criança e do Adolescente, que nos apresenta o conceito jurídico de tal condição pessoal: Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Por consequência, para efeitos da lei, criança é toda pessoa com até 11 anos, 11 meses e 29 dias (12 anos incompletos), ao passo que adolescente é toda pessoa entre 12 e 17 anos, 11 meses e 29 dias de idade (18 anos incompletos). 16


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5. PRINCÍPIOS DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE Quando tratamos de princípios, referimo-nos àquelas regras gerais que permeiam todo o sistema jurídico e com a finalidade de pautar toda a interpretação, aplicação e atuação das normas. Sob tal ótica, existem princípios que são inerentes à proteção da infância e da juventude, encontrando-se esparsos no ordenamento, mas sendo de extrema importância seu estudo para completa compreensão e aplicação dos mecanismos de proteção da criança e do adolescente. 5.1. Princípio da dignidade da pessoa humana A dignidade da pessoa humana trata-se de um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, conforme expressamente prescrito no art. 1o, III, da CF. O ser humano, enquanto pessoa, deve ser considerado um indivíduo e um fim em si mesmo, a todos sendo garantido todos os meios para alcançar a realização pessoal e a busca pela felicidade. Sob tal prisma, o indivíduo não pode ser reduzido à condição de meio, como se um objeto fosse, não sendo permitido ao Estado, sob qualquer pretexto, se valer do indivíduo como se um objeto fosse, para alcançar uma finalidade específica. O ser humano, dotado dessa qualidade – a dignidade –, não pode ter reduzida sua condição de pessoa, e esta sempre deve ser respeitada. À criança e ao adolescente é garantido, em sua integralidade, o reconhecimento dessa condição e qualidade de dignidade, não podendo ser considerados de maneira inferiorizada em relação a outras pessoas, gozando em sua integralidade de todos os direitos e de toda a proteção como garantia de sua condição humana. Assim, toda aplicação do Estatuto e das normas de proteção deve levar em consideração a condição da dignidade da criança e do 17


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adolescente na efetivação das normas. Por consequência, a criança e o adolescente não podem jamais serem vistos ou tratados como uma coisa, como um objeto, seja pelos pais ou responsáveis, pela sociedade ou pelo Estado. De tal sorte, é ultrapassado e equivocado o entendimento de que os pais sejam “donos” dos filhos ou outros raciocínios semelhantes, que procuram reduzir o indivíduo menor à condição de objeto, tolhendo-lhe sua dignidade enquanto pessoa humana. 5.2. Princípio da proteção integral Outro princípio norteador do Estatuto da Criança e do Adolescente é o da proteção integral, que encontra seu fundamento no art. 227 da CF: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

O dever de proteção é uma responsabilidade solidária de toda sociedade, incluindo a família e o Estado, de maneira a garantir a todas as crianças e adolescentes a proteção integral, não apenas naquelas circunstâncias em que os menores se achem em situação de risco ou perigo. Vale dizer, superante um entendimento de atuação apenas naqueles casos em que a criança ou o adolescente se encontra em situação irregular, por força do princípio da proteção integral, é dever da família, da sociedade e do Estado adotar medidas proativas de maneira a garantir o pleno desenvolvimento da infância e da juventude, antes mesmo do surgimento de qualquer situação de risco ou condição irregular. 18


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Da mesma forma, devem ser adotadas medidas de caráter protetivo e preventivo para afastar qualquer forma de violência ou abuso contra a criança ou o adolescente, em conformidade com o previsto no art. 5o do Estatuto: Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

5.3. Princípio da prioridade absoluta Também decorrente do previsto no art. 227 da CF, implica a garantia de que, na aplicação e na efetivação dos direitos e das garantias individuais, as crianças e os adolescentes devem gozar sempre de prioridade de atendimento e prestação. Nessa esteira, é a previsão do art. 4o do Estatuto da Criança e do Adolescente, explicitando no que consiste essa prioridade: Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. 19


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a)

b)

c)

d)

Diante disso, é cediço que: em situações de risco ou de perigo, a criança e o adolescente gozam de preferência absoluta para proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; nos atendimentos prestados pelo Poder Público, de qualquer natureza, devem ser garantidas a preferência e a prioridade de atendimento; O Estado, na elaboração das políticas públicas de atuação e prestação de serviços, deve sempre ter em consideração, de maneira prioritária, a condição da criança e do adolescente, como medida de garantia e realização do preconizado pelo art. 227 da CF; Corolário lógico do preconizado no item anterior, o Poder Público deve obrigatoriamente priorizar a destinação de recursos nas áreas de proteção da infância e da juventude.

5.3.1. Princípio da cooperação Também decorrente da garantia prevista no art. 227 da CF e reforçado no art. 4o do Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece que a proteção dos direitos e das garantias inerentes à infância e à juventude deve ser resguardada em uma atuação conjunta, solidária e cooperativa entre todos os entes que compõem a sociedade. Nessa linha de raciocínio, ninguém pode se eximir ou alegar incompetência para atuar na proteção dos direitos e das garantias da criança e do adolescente. De fato, cabe ao Estado a adoção de medidas positivas e prioridade nas políticas públicas de garantia e proteção da criança e do adolescente. Igualmente, cabe à família atuar de maneira ativa na proteção da infância e da juventude. Todavia, o princípio da cooperação impõe de maneira expressa à sociedade e a todos os agentes que a integram o dever de proteção dos direitos e das garantias da criança e do adolescente. 20


Outros

títulos

da coleção · Código de Defesa do Consumidor

Wilson de Deus Moura

· Leis Notariais e Registrais Clícia Roquetto

· Leis Tributárias – ICMS

Luciano de Almeida Pereira

· Leis Ambientais

Vanessa Carolina Fernandes Ferrari

· Execução Penal

José Carlos Gobbis Pagliucca e Matheus Guimarães Cury

· Lei de Drogas

José Carlos Gobbis Pagliuca e Matheus Guimarães Cury

· Estatuto do Idoso

Gustavo Bregalda Neves, Kheyder Loyola e Emanuel Rosa

· Manual de Controle de Constitucionalidade

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Leis Especiais

Comentadas para Concursos

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