PONTO
ARIANO SUASSUNA E AS VOZES DO POVO CONVERSA COM LUIZ GÊ A GRAÇA DE DARIO FO A ARTE CONTEMPORÂNEA E SUAS DIVERSAS LINGUAGENS BIBLIOTECAS PELO MUNDO
#7 OUTUBRO 2O14 REVISTA PONTO® PUBLICAÇÃO LITERÁRIA E CULTURAL DO SESI-SP #7 OUTUBRO 2O14
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#7 OUTUBRO 2O14
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A peleja do mamulengo representado pelo boneco Benedito, com o Halloween.
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Na página anterior, ilustração de Jô Oliveira.
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P O N T OD E P A RT I D A
Este é o número 7 da revista Ponto. Nesta edição pudemos reunir uma amostra expressiva da riqueza e da diversidade das manifestações culturais existentes no país, reafirmando a missão do SESI-SP no que toca à difusão cultural. Nossa matéria de capa presta tributo à genialidade de Ariano Suassuna, autor “forjado da matéria viva”, que povoou nosso imaginário com tantas personagens do universo popular e da literatura de cordel. Suas personagens são verossímeis, porque arquetípicas; e são atemporais, porque retratam a essência humana. Suassuna foi a principal liderança do Movimento Armorial que, a partir do Recife, levou a todo o país a estética do cordel, da cantoria, do mamulengo, do maracatu, valorizando a expressão popular como legítima criação artística. Na entrevista sempre presente na Ponto, trazemos o cartunista Luiz Gê, figurinha carimbada da turma da Circo Editorial, que revolucionou nosso mercado de quadrinhos nos anos 80. Apaixonado confesso pela cidade de São Paulo, ele faz da própria cidade cenário e personagem de suas histórias sofisticadas. Aqui ele disseca sua relação com o mundo dos quadrinhos desde a infância, contando sobre suas primeiras histórias, criadas no tempo da faculdade de arquitetura, e sobre a aventura da revista Circo. Para ele, na criação de quadrinhos, sempre a experimentação é possível e desejável. Na seção dedicada aos 50 anos do Teatro Popular do SESI, esta edição faz uma viagem pela arte irreverente de Dario Fo, teatrólogo italiano e prêmio Nobel de literatura. Dele, o Teatro do SESI-SP exibiu a peça Mistero Buffo, em temporada de grande repercussão. Autor controverso, mesmo incomodando muita gente, Dario Fo não abre mão de expressar livremente sua visão crítica da sociedade em que vive. “A arte que não fala do seu tempo não tem relevância” – dispara ele. As diversas linguagens utilizadas pela arte contemporânea e o diálogo entre arte e tecnologia são o objeto de outra matéria desta edição. Tratando das diversas possibilidades de expressões artísticas, a SESI-SP Editora e o File (Festival Internacional de Linguagem Eletrônica) apresentam o livro Highlike, que reúne o trabalho de 577 artistas de 35 países. Trata-se de obra referencial sobre arte e cultura contemporânea global. Finalmente, uma retrospectiva histórica do paradesporto, ao longo das últimas décadas, nos mostra como evoluímos de uma visão de “esporte adaptado” até a de esporte de alto rendimento como poderoso mecanismo de inclusão e qualidade de vida. No contexto nacional, a matéria ressalta a importância da Metodologia SESI-SP Paradesporto.
Divirtam-se! O Editor
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#7 OUTUBRO 2O14
A REVISTA PONTO® É UMA PUBLICAÇÃO LITERÁRIA E CULTURAL DA SESI-SP EDITORA, COM EDIÇÕES TRIMESTRAIS
COMISSÃO EDITORIAL
FERNANDO ANTONIO CARVALHO DE SOUZA DÉBORA PINTO ALVES VIANA ALEXANDRA SALOMÃO MIAMOTO ÁLVARO ALVES FILHO RODRIGO DE FARIA E SILVA GABRIELLA PLANTULLI
EDITOR CHEFE
RODRIGO DE FARIA E SILVA
EDITORAS ASSISTENTES
JULIANA FARIAS ANA LUCIA SANT’ANA DOS SANTOS GABRIELLA PLANTULLI BEATRIZ SIMÕES ARAÚJO MONALISA NEVES
CAPA, EDITORAÇÃO E PRODUÇÃO GRÁFICA PAULA LORETO VALQUÍRIA PALMA CAMILA CATTO
COMUNICAÇÃO EDITORIAL GABRIELLA PLANTULLI
DIVULGAÇÃO E PROMOÇÃO VALÉRIA VANESSA EDUARDO RENATA DE CÁSSIA SILVA
ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO
RAIMUNDO ERNANDO DE MELO JUNIOR FELIPE AUGUSTO FERREIRA DE OLIVEIRA FLÁVIA REGINA SOUZA DE OLIVEIRA MÁRCIO DA COSTA VENTURA EDILZA ALVES LEITE
COMERCIAL
PAULO MAMEDE RAPHAEL CALDEIRA
COLABORADORES
ANA VILELA ARNALDO NISKIER BERNARDO AJZENBERG CAROLINA CARDOSO DEISI DEFFUNE JOSÉ EDUARDO DE CARVALHO MARCELO ALENCAR MARCO HAURÉLIO MARÍLIA FONTANA GARCIA NACIM WALTER CHIECO YASMIN TAKETANI
Capa Ilustração de Jô Oliveira.
REVISÃO
DANIELLE SALES
JORNALISTA RESPONSÁVEL
GABRIELLA PLANTULLI (MTB 0030796SP)
PROJETO GRÁFICO ORIGINAL VICENTE GIL DESIGN
TIRAGEM DESTA EDIÇÃO 5 MIL EXEMPLARES IMPRESSÃO NYWGRAF REVISTA PONTO® - PUBLICAÇÃO LITERÁRIA E CULTURAL NÚMERO 7 – OUTUBRO DE 2014 SESI-SP EDITORA AV PAULISTA 1313, 4º ANDAR TELEFONE: 3146-7134
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06 ESTANTE DE LIVROS LANÇAMENTOS 10 PONTO ENTREVISTA UMA CONVERSA COM O CARTUNISTA LUIZ GÊ 22 ARTE A ARTE CONTEMPORÂNEA E SUAS DIVERSAS LINGUAGENS 28 PONTO ESPECIAL ARIANO SUASSUNA E AS VOZES DO POVO 42 PONTO LEITURA BIBLIOTECAS PELO MUNDO 52 TEATRO A GRAÇA DE DARIO FO 60 ESPORTE DO “ESPORTE ADAPTADO” AO ALTO RENDIMENTO 68 PONTO DO CONTO POR BERNARDO AJZENBERG 72 PONTO DO NOVO CONTO POR RENATA PENZANI 76 NOVOS CAMINHOS DA LEITURA POR ARNALDO NISKIER 78 INSTIGAÇÃO ANALISAR O TRABALHO – ALGUNS PONTOS PARA PENSAR 80 EVENTOS DA EDITORA LANÇAMENTOS 84 AGENDA CULTURAL PROGRAMAÇÃO GALERIA DE FOTOS UNIDADES DO SESI
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ESTANTE DE LIVROS
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CLAUDIUS
ÁTILA, VOCÊ É BÁRBARO
DIÁLOGO COM CARTAS
CLAUDIUS CECCON
JAGUAR
JOCY DE OLIVEIRA
A produção de cinquenta anos de trabalho de Claudius Ceccon, um dos nomes mais representativos do cartum brasileiro, estão reunidas nesta obra, que abre com a reprodução do que Millôr Fernandes escreveu e desenhou de próprio punho, no livro de presença, após visitar a exposição do XVII Salão Carioca de Humor. O jornalista Jânio de Freitas assina a apresentação desta publicação, que conta ainda com textos do poeta Ferreira Gullar e do caricaturista e curador da obra gráfica de Millôr, Cássio Loredano.
Esta publicação é uma reedição do primeiro livro de Jaguar, Átila, você é bárbaro, lançado em 1968. Todo o seu lado contestador no combate à ignorância, ao preconceito e à violência, reunidos em desenhos e textos, que passam por assuntos como política, religião, arte, psicanálise e fraquezas humanas. Nada escapa ao seu crivo impiedoso, nem mesmo quando coloca o tom delicado em certos elementos que permeiam a ironia: uma flor, uma criança, a pomba da paz.
GUARDADOS DE MARIA LÚCIA GODOY
ANTONIO A. DE MITRY
MARIA LÚCIA GODOY
SENAI-SP
Um tesouro de memórias, sentimentos e marcos históricos, este livro apresenta peças de correspondência, textos de encartes de discos e testemunhos de personagens maiores de nossa história, como, por exemplo, Carlos Drummond de Andrade e Tancredo Neves. Traz também uma seleção das crônicas semanais que a autora publicou no Estado de Minas, revelando fina sensibilidade literária. É, sem dúvida, uma fonte de leitura saborosa e envolvente.
Esta publicação apresenta a diversidade das atividades relacionadas ao design Antonio A. De Mitry, que deixou uma marca própria por onde passou. O registro da trajetória deste mestre criativo contribui para resgatar a história de personagens que fazem do design um diferencial competitivo para os produtos brasileiros. Além disso, coloca à disposição de estudantes, profissionais e interessados no universo do design um rico conteúdo para ampliar o conhecimento do nosso país.
Esta obra traz um conjunto de 112 cartas, recebidas ao longo de quarenta anos pela compositora Jocy de Oliveira. A correspondência preciosa – e até agora inédita – expõe ideias, vivências e realizações de alguns dos expoentes da música de concerto do século XX, entremeadas pelas observações da autora, contextualizando fatos e explicando circunstâncias. O volume traz cartas inéditas de Igor Stravinsky, Robert Craft, John Cage, Luciano Berio, Karlheinz Stockhausen, Iannis Xenakis, Eleazar de Carvalho, Claudio Santoro, Lukas Foss, Robert Craft e Olivier Messiaen, trocadas ao longo de décadas com a autora. Além das cartas em fac-símile, o livro reproduz ainda partituras manuscritas em primeiras versões e não editadas.
SENAI MIX DESIGN OUTONO-INVERNO 2015 SENAI-SP
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Este boxe reúne cinco volumes (Direções Criativas, Vestuário, Calçados, Artefatos de Couro, Joias Folheadas e Bijuterias) e representa uma importante ferramenta, genuinamente brasileira, de difusão do conhecimento para a indústria de moda, que reúne pesquisas e informações sobre macrotendências de comportamento e consumo, gerando o embasamento conceitual e estratégico necessário à tomada de decisões das empresas.
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LANÇAMENTOS
BICHO-PAU, BICHO-FOLHA
A LAGARTA CAOLHA
O SEGREDO AZUL
CAROLINA CARNEIRO Classificação indicativa: Pré-leitor (de 15 meses até 6 anos)
UMBERTO MANCEBO E CIA. MALAS PORTAM Classificação indicativa: Pré-leitor (de 15 meses até 6 anos)
THAIS ACCIOLY Classificação indicativa: Leitor iniciantes (de 6 a 7 anos)
O que aconteceria se você descobrisse estar sendo caçado enquanto almoça? Na natureza é assim: uma vez é a hora da caça, outra vez, do caçador. Mas a todo instante pode-se encontrar novos amigos! Descubra com Bicho-pau, bicho-folha algumas surpresas desses curiosos insetos que se camuflam para se proteger de seus predadores.
A divertida história de uma lagarta faminta – que passava o dia comendo folha e rastejando pela árvore onde tinha nascido –, somada às coloridas e diferenciadas ilustrações, não são os únicos responsáveis por despertar a curiosidade da criançada com a publicação A lagarta caolha. Uma animação da história pode ser visualizada, o que torna a leitura uma experiência mais dinâmica, proporcionando mais que palavras e imagens sobre o papel.
Inspirar, por meio da celebração à beleza, à vida natural, ao bem-estar que surge das relações de cuidado e afeto, é o trabalho constante de Thais Accioly. Neste livro, a autora atrai, com suas poesias, lindamente ilustradas por André Ceolin, a atenção da criança para o lúdico, o mítico, a delicadeza dos sentimentos e dos relacionamentos, introduzindo-a no universo da escrita sensível com temas como o amadurecimento, perdas, segredos, relação de mãe e filho, entre outros.
PROCURA-SE UMA SEREIA
OS CABELOS DE CRISÁLIDA
O CONTO QUE NÃO EXISTE
LUIZ BRAS Classificação indicativa: Leitor iniciantes (de 6 a 7 anos)
EMILIE ANDRADE Classificação indicativa: Leitor em processo (de 8 a 9 anos)
LUIZ DIAS Classificação indicativa: Leitor em processo (de 8 a 9 anos)
Esta é a história de uma menina que descobre o poder incrível da imaginação. A pequena Aline e seus amigos entram em um universo fantástico e desconhecido a partir das lembranças de um velho que vive no banco da praça. O marinheiro que procura uma sereia é personagem central nessa aventura.
Uma crisálida é um ser inacabado, que ainda não se transformou. Engana-se, no entanto, quem pensa que está faltando alguma coisa neste livro. Ao contrário, a sensibilidade, a leveza e a força, de tão grandes, saltam do texto, para falar da careca como um local propício a novas criações: a narradora ora tem cabelos de chuva, flor ou nuvem, ora de cobras como a Medusa, ou mesmo de “jujuba, de lã, de macarrão, de giz de cera, até de borboletas”.
O grande segredo da Rainha das Fadas estaria ameaçado? Ora, dirá você, fadas não existem! Pois é, mas ainda assim queremos saber o que está tramando a Fada Turva com seus trasgos e por que o duende que toma conta do jardim real está tão preocupado. Não precisa dizer, também sei que duendes e trasgos não existem! Para saber o fim desta história, só lendo este conto que não existe...
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A INCRÍVEL HISTÓRIA DO HOMEM QUE NÃO SONHAVA RAFAEL ANTÓN Classificação indicativa: Leitor fluente (de 10 a 11 anos)
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Esta publicação conta a história de Manfredo, também conhecido como Mani, que gostaria de ter um sonho para poder se lembrar. Em toda sua vida, nem mesmo de pesadelo ele tinha recordação. Por isso, o homem que não sonhava nada começa a agir um pouco diferente do habitual, fazendo algumas coisas inusitadas, para ver se começa a sonhar. Até que um dia...
ALMANAQUE DA BANDA GIGANTE
O GALO E A RAPOSA
LU LOPES Classificação indicativa: Leitor fluente (de 10 a 11 anos)
ALEXANDRE CAMANHO Classificação indicativa: Pré-leitor (de 15 meses até 6 anos)
A Banda Gigante é formada por palhaços que amam a música ou músicos que amam a palhaçaria! Composta pela Palhaça Rubra, pelo Palhaço Manjericão e pelo Palhaço Fonseca, a Banda descobriu que a música, o humor e o improviso são ferramentas artísticas que desenvolvem nossos superpoderes humanos. E desde que isso aconteceu essa trinca está espalhando a descoberta para o mundo! O livro traz CD da Banda Gigante, produzido por Arto Lindsay e Gisela Moreau, com músicas de Lu Lopes e parceiros, e com os palpites essenciais de Arnaldo Antunes.
Neste livro ilustrado, um garboso galo de pena emplumada parece saber mais do que realmente sabe. Uma raposa de gesto sorrateiro e cauda macia quer devorar a ave, mas para isso terá de empenhar toda sua ardilosa malícia. Nesta obra, a cada página uma história pode ser reinventada com a imaginação. Ao final, o leitor descobrirá, entre o galo e a raposa, quem de fato é mais astuto.
MAR
DOMINGO VAMOS À LUZ
BLUE E OUTRAS CORES DO MEU VOO
RICARDO HENRIQUES Classificação indicativa: Leitor crítico (de 12 a 13 anos)
JOSÉ JORGE LETRIA Classificação indicativa: Leitor crítico (de 12 a 13 anos)
JORGE MIGUEL MARINHO Classificação indicativa: Leitor crítico (de 12 a 13 anos)
O poeta e jornalista José Jorge Letria é um dos mais destacados nomes da literatura infantojuvenil em Portugal e autor de programas de rádio e televisão. O poema que apresentamos neste livro retrata o entusiasmo de um pai que leva seu filho ao estádio da Luz. Seu filho, André Letria, que é ilustrador consagrado, especializado em livros para crianças, publicou este livro que a SESI-SP Editora agora traz para o Brasil, com poucas adaptações, respeitando a criação original do poema.
Neste voo blue e de outras cores, o autor traça uma linha afirmativa da poesia que utiliza recursos gráficos como exercício de autoconhecimento mesmo aos não iniciados nesse delicado e vigoroso gênero literário. Os poemas de Jorge Miguel Marinho revelam uma viagem interior, de descobertas e desencantos, concebidos com a clareza e precisão de um “design da linguagem”, de acordo com a definição de Décio Pignatari sobre a poesia concreta. Mas, diferente desta, Jorge Miguel consegue abrandar o experimentalismo e completar com uma poética jovial.
Como bem resumiu o poeta Pessoa, “o mar sem fim é português”. A profunda relação dos portugueses com o mar se traduz neste interessante “atividário” (atividades + abecedário), que convida o leitor a mergulhar num universo fascinante. Guiadas por este livro, crianças do Brasil e de Portugal, e seus pais, podem brincar com as palavras que contam histórias, fatos e descrevem personagens do mar.
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LANÇAMENTOS
CONTOS FILOSÓFICOS Uma seleção de textos literários curtos, intrigantes e curiosos, com fundo filosófico espelhado nas relações entre as personagens e em sua trajetória. Abrindo essa série, o bruxo do Cosme Velho, Machado de Assis. A IGREJA DO DIABO Classificação indicativa: Leitor crítico (a partir dos 12 ou 13 anos)
Este conto, marcado pela ironia, apresenta a história do dia em que o Diabo resolveu fundar uma igreja para concorrer com as diversas religiões. De acordo com as leis do Diabo, o importante é promover prazeres de todos os tipos, não importa de que maneira. Aos poucos, os adeptos do novo credo começaram a não acatar as leis e passaram, às escondidas, a dar esmola aos mais pobres e um pouco mais de atenção aos conhecidos, evidenciando a temática, utilizada aqui por Machado, da contradição humana.
IDEIAS DE CANÁRIO
TEORIA DO MEDALHÃO
Classificação indicativa: Leitor crítico (a partir dos 12 ou 13 anos)
Classificação indicativa: Leitor crítico (a partir dos 12 ou 13 anos)
Classificação indicativa: Leitor crítico (a partir dos 12 ou 13 anos)
Neste conto fantasioso, a Vaidade e a Modéstia tentam convencer os leitores de que somente uma delas habita o coração e a mente dos seres humanos. A Vaidade assume a palavra e faz o próprio elogio. Originalmente publicado em 1878, causou alvoroço entre os leitores ao trazer à tona verdades existentes em todas as pessoas..
A personagem principal deste conto é um canário, ou melhor, suas ideias. Depois de se mudar da loja em que vivia – um lugar fechado – para um lugar mais aberto, ele passa a ter diferentes visões da vida. E essas mudanças de ambiente fazem parte das experiências sobre o mundo que ele traz para esta história.
Tendo como pano de fundo uma conversa de um pai com um filho, este conto aborda, com muita ironia, a denúncia a uma sociedade burguesa e arrogante, que prega o sucesso a qualquer preço, mesmo que isso signifique o empobrecimento da vida interior e das relações humanas.
ELOGIO DA VAIDADE
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UMA CONVERSA COM O CARTUNISTA LUIZ GÊ POR MARCELO ALENCAR
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O
cartunista Luiz Geraldo Ferrari Martins – Luiz Gê para encurtar – considera-se “um verdadeiro vira-lata, saído do cadinho de raças que compõe o povo brasileiro”. Mencionado no livro Humor Paulistano – A Experiência da Circo Editorial 1984-1995 (SESI-SP Editora) como um dos expoentes das histórias em quadrinhos produzidas na Pauliceia, ele costuma levar para os gibis alguns dos principais cartões-postais da cidade, como o Monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret, que literalmente ganhou vida em seus desenhos. Coerente com sua obra, Gê mora no Edifício Copan, outro ícone de São Paulo. Foi lá que, na companhia de dois gatos folgados e de um manequim/HQ todo ilustrado, ele concedeu a entrevista a seguir para a revista Ponto.
QUANDO SURGIU ESSA IDENTIDADE TÃO GRANDE QUE VOCÊ TEM POR SÃO PAULO?
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Na infância. Eu nasci em 1951, sou o mais velho de três irmãos e, até os 7 anos, morei num sítio em Ribeirão Pires, onde meu pai tinha uma olaria, num cenário bem rural. Era um lugar lindo, que hoje virou subúrbio. Tinha um lago enorme, com duas ilhas no meio, onde brinquei muito. A gente morava lá, mas vinha bastante para São Paulo, para a casa do meu avô, que ficava perto de onde hoje existe o Hospital Beneficência Portuguesa. Essas visitas à capital me marcaram muito. Era uma cidade bonita, toda arborizada. As ruas eram lavadas toda noite. Meu pai tirava slides em que se vê a Praça Oswaldo Cruz como se fosse o jardim de uma casa, de tão arrumadinha que era. Vários prefeitos tinham embelezado intencionalmente a cidade, uma atitude que ensina às pessoas o respeito pelo ambiente urbano.
Imagem de acervo
QUE OUTRAS IMAGENS VOCÊ GUARDA NA LEMBRANÇA?
O Prestes Maia, quando construiu o túnel da Avenida 9 de Julho, botou até um mirante em cima. É uma obra da qual o cidadão participa não apenas de forma utilitária e que busca inclusive embelezar a cidade. Ele dizia: “Uma ponte tem de ser um monumento”. A Ponte das Bandeiras tem aquelas duas torres porque era a entrada de São Paulo. O então prefeito planejava erguer do outro lado do rio os principais terminais ferroviários, rodoviários [hoje há o Terminal do Tietê], um aeroporto [o Campo de Marte] e, se possível, Luiz Gê no lançamento do livro Humor Paulistano, em maio de 2014, em São Paulo.
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até um terminal hidroviário. Ele era desenhista, fazia umas aquarelas lindas e pensava essas coisas. Era bem diferente do mecanicismo de um Maluf: “Preciso fazer um Minhocão” e dane-se se isso detonar metade da cidade. Prestes Maia tinha uma outra visão, mais humana. Essa outra relação com a cidade me marcou na infância. E depois, quando eu entrei na adolescência, São Paulo começou a passar por um processo de transformação que a foi tornando cada vez mais uma máquina. Muros começaram a subir e esconder as casas com seus jardins voltados para a rua. Foram tornando-se corredores feios, agressivos. Nas minhas primeiras histórias em quadrinhos eu registrei um pouco disso. As sensações dessas mudanças envolvendo coisas que foram criadas pensando no cidadão e que, de repente, se viram relegadas a virar meras rotatórias de carros, quando não desapareceram simplesmente quando uma rua passa por cima de uma praça.
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VOCÊ JÁ PRESTAVA ATENÇÃO NISSO? ALGUÉM O ORIENTAVA, OU ERA UMA VISÃO PESSOAL SUA?
Isso é o que eu senti mais tarde notando o contraste entre as duas. Vim para São Paulo aos 7 anos e morei numa rua de terra, onde hoje fica a Avenida dos Bandeirantes, entre a Santo Amaro e a Ibirapuera. Naquele tempo, a região comportava quarteirões e quarteirões de eucaliptos e pastos para cavalos. Tinha criança brincando na rua e nos muitos terrenos baldios. Crescemos com muita liberdade. As pessoas viviam melhor. Hoje em dia fica todo o mundo em seu apartamento, no máximo desce com os filhos até o playground, e não tem outra escapatória a não ser o computador. Não há alternativa. Este é o momento de pensar em utopias para mudar esta realidade. O DESENHO FEZ PARTE DA SUA INFÂNCIA?
Totalmente. Eu comecei a desenhar muito pequeno, criancinha mesmo. Minha geração ainda estava próxima da II Guerra Mundial e, num certo sentido, sofreu sua influência. Eu adorava desenhar avião. Meu pensamento sempre foi muito visual. Lembro-me de uma vez em que estava desenhando um navio e queria que tivesse alguma coisa escrita no casco. Então, eu vi uma caixa de soldadinhos de brinquedo e comecei a desenhar as letras da embalagem no casco do navio. Imagine a surpresa da minha mãe quando viu, no desenho, uns troços escritos. Nem pré-alfabetizado eu era!
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E OS QUADRINHOS, TAMBÉM POVOARAM SUA MENINICE?
Minha geração era superligada em quadrinhos. Quase ninguém tinha televisão. E o cinema, embora popular, era frequentado uma vez por semana, ou com intervalos ainda maiores. E os gibis eram nosso dinheiro. Todo o mundo trocava revistinhas. E havia todo tipo de tema. Hoje eu chego à banca e vejo só super-heróis. E a Mônica. A temática atual é bem restrita. Naquela época você tinha de tudo: o humorístico, o caubói, o terror, a ficção científica, o infantil, o histórico... Era algo muito presente para a garotada. Muitas vezes, nas festas de amigos, enquanto uns estavam brincando lá fora, eu e mais uns 15 ficávamos lendo gibis dentro de casa. Era incrível como havia gibi que nunca havíamos visto. QUANDO VOCÊ DESENHOU SUA PRIMEIRA HQ?
Acho que só aos 13 ou 14 anos eu fiz uma história completa. A partir daí, comecei a inventar umas loucuras, incluindo coisas que eu gostaria de publicar, porque são legais até hoje. Umas histórias dadaístas que fiz quando estava no colegial, aos 16, 17 anos. Uma hora gostaria de mostrar.
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E A OPÇÃO POR ARQUITETURA E URBANISMO, SURGIU NESSA FASE?
O sonho adolescente era ser aviador. Mas começou a pesar a questão do desenho. Aí um amigo me levou ao Campo de Marte para voar numa espécie de um paulistinha velho. Para dar a partida, era preciso girar a hélice na mão. Só para ter uma ideia, o nome dele era Bananosa. Quando subiu, o piloto falou: “Agora nós vamos fazer umas manobras”. Fez. E eu comecei a ficar verde. Subiu e o avião entrou em perda e o avião mergulhou na vertical. Enquanto fazia isso, o piloto deve ter visto meu vômito passar (risos). Minha carreira de aviador acabou aí e eu decidi fazer arquitetura. VOCÊ INGRESSOU NA FAU-USP EM 1971, UM DOS ANOS DE CHUMBO DA DITADURA MILITAR. A FACULDADE RESPIRAVA ARES DE RESISTÊNCIA POLÍTICA?
Eu não estava tão engajado assim porque tinha estudado em colégio bastante conservador. Mas, na escola pública, havia muito mais politização. O engajamento passava por passeatas, pichação de muros... e a guerrilha estava próxima disso. No segundo ano da USP eu e uns colegas de universidade fizemos aquela tradicional viagem do Trem da Morte, algo que me marcou
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demais. Em Lima, conheci um guerrilheiro brasileiro que fora trocado por um embaixador sequestrado, não me lembro qual. Participara da célebre escapada do grupo do [líder guerrilheiro Carlos] Lamarca. Eu trouxe uma mensagem cifrada para a família dele.
Arquivo pessoal de Luiz Gê.
FOI NESSE CONTEXTO QUE NASCEU A REVISTA BALÃO?
Havia uma efervescência. Nos centros acadêmicos, todos faziam jornais com quadrinhos. Mas sempre ficavam no primeiro ou segundo número. Eu já havia publicado minhas primeiras HQs na Folha de Londrina. Aí, houve uma semana de editoração na ECA. O Laerte Coutinho ficou animado e foi à FAU dizer para a gente fazer uma revista. Eu também estava interessado, fizemos uma reunião (com pessoas que depois não continuaram na área: um é o Lorde K, o Fausto – um amigo do Laerte que desapareceu – e a então mulher do Laerte, a Lúcia). Num brainstorm a gente bolou o nome. Depois que saiu o primeiro número, o Balão começou a aglutinar. Vieram os gêmeos Paulo e Chico Caruso, Alcy, Angeli, Xalberto e muitos outros. Em nossas reuniões fiz meus primeiros contatos com pessoas que gostavam de fazer as mesmas coisas que eu. Era instigante. Num certo sentido, o desenho isola a gente, pois é uma prática bastante individual, solitária. O Laerte era mais engajado politicamente, pois já fazia parte do Partidão. Isso eu só fui saber bem mais tarde. Mas o Balão era bem político, contestador, libertário, mas sem qualquer filiação ou linha definida. A gente curtia a evolução uns dos outros e fazia certa cobrança quando o desenho estava parecendo o de algum autor conhecido. Era uma coisa que só aquele ambiente podia oferecer, a consciência das opções que podiam levar para resultados mais ou menos originais, ou colonizados, por exemplo. Eu também me cobrava. Meu traço acompanhou certas tendências meio gerais da época. Mas, dentro do próprio Balão, ele evoluiu e eu parei de me preocupar com isso. No número 2 da revista há uma HQ cinematográfica minha, em que cada quadro parece ter saído do anterior. Ele foi pensado como um desenho animado. Até hoje tenho vontade de animá-lo com um traço mais atual.
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VOCÊ SEMPRE EXPERIMENTA NOVAS TÉCNICAS E MATERIAIS?
Faz parte do meu trabalho pensar não só a história e o desenho, mas também a linguagem como um todo. Penso em mudar todas essas quesImagem em que um edifício enorme é transportado sobre rodas e que faz parte do álbum Avenida Paulista, um clássico dos quadrinhos nacionais.
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tões a cada momento. No caso da charge política, por exemplo, ela chegou a um determinado estilo gráfico e se definiu ali. É uma necessidade profissional, já que você tem de produzir incessantemente e com uma certa rapidez, então é preciso desenvolver uma certa fórmula para poder dar conta do trabalho dentro dos prazos preestabelecidos. Mas os quadrinhos, para mim, sempre tiveram esse caráter em que a experimentação é possível e desejável. A cada história eu busco um traço diferente, uma narrativa diferente, o uso do texto de forma diferente. Isso também me levou e/ou é possibilitado por uma formação um tanto interdisciplinar nessas linguagens um tanto híbridas da HQ, da arquitetura, que me ajudaram a ter certo trânsito dentro de diferentes formas visuais de expressão como a do teatro, no roteiro para televisão, na direção de arte... O LAERTE SE DECLAROU FRUSTRADO QUANDO ESCREVEU TEXTOS PARA OS PROGRAMAS TV COLOSSO E SAI DE BAIXO, PORQUE NÃO DOMINA
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MUITO BEM A LINGUAGEM TELEVISIVA. O TEXTO PASSAVA POR TANTAS MÃOS QUE, ATÉ CHEGAR À FORMA FINAL, ELE NÃO SE RECONHECIA NO PRODUTO FINAL. E TAMBÉM DISSE QUE VOCÊ TIRAVA ISSO DE LETRA...
Não é bem assim (risos). Fizemos roteiros para TV nos anos 1990. Quando os outros interferem, dificilmente melhoram. A tendência, em geral, é dar uma bela distorcida e muita coisa perder sentido. Lamentei muito isso na TV Colosso. Pouca gente na TV conhece e sabe explorar a linguagem. Eles repetem, repetem e repetem fórmulas. Não funciona. Quando eu escrevia para lá, fazia storyboards... Se tinha cenário, eu desenhava o cenário inteiro... Mas, em geral, o pessoal não entendia meu humor ou não interpretava direito. Era muito produção em massa. Então, eu precisava criar um texto capaz de sobreviver àquela distorção. Mas 80% ou mais da produção dançava mesmo. Como os autores estavam em São Paulo e as gravações eram feitas no Rio, a comunicação era prejudicada. SEU LIVRO MACAMBÚZIOS E SORUMBÁTICOS MOSTRA QUE VOCÊ SE VALEU BASTANTE DA LINGUAGEM DAS HQS NAS CHARGES QUE PRODUZIU PARA OS JORNAIS FOLHA DE S.PAULO, O PASQUIM E MOVIMENTO NOS ANOS 1970. MUITAS DELAS ERAM COMPOSTAS DE SEQUÊNCIAS DE QUADROS. VOCÊ TINHA ESSA LIBERDADE CRIATIVA? E COMO LIDOU COM A CENSURA?
No Pasquim e no Movimento, a censura era externa, exercida pela Censura Federal. Na Folha, ela vinha do próprio editor – no meu caso, o Cláudio Abramo e, depois, o Boris Casoy. Eu vinha de uma faculdade dentro da facul-
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dade, a revista Balão, em que aprendi muito sobre editoração. A imprensa alternativa foi superimportante nesse sentido. Comecei a colocar quadrinhos em tudo que era lugar em que colaborava, como Folhetim, o Pacotão do Movimento, Ovelha Negra, posteriormente Status, Placar e outros. Sempre propunha isso para marcar as possibilidades da HQ. Aí houve o contato com o Toninho Mendes, que era diretor de arte da Versus, e que mais tarde levou adiante a ideia de editar quadrinhos. Então meu nome ficou mais conhecido e rolou a grande imprensa. Quando comecei na Folha, não podia comentar nada relevante. Tinha que falar de buraco de rua, de lixo. Aí eu e meus colegas fomos conseguindo falar de vereador, de deputado, chegou em prefeito, então foi para governador para daí chegar a se falar de presidente. Havia uma batalha cotidiana no jornal. Às vezes, o jornal inteiro estava tratando de um assunto em escala federal, mas os editores censuravam a charge. “Ah, não dá. A charge tem 100% de leitura”, diziam. Era difícil por isso. Não bastava bolar uma ideia legal. Você tinha de passar pela autocensura. Era tenso, sofrido. Mas, ao mesmo tempo, havia uma mobilização. Eu fazia uma charge que passava e ela ganhava as ruas, nas passeatas. No tempo da campanha pelas Diretas Já, houve uma negociação entre as forças mobilizadas e a ditadura que culminou com a escolha de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Mas eu não entrei nessa. Continuei pelo voto direto. Como já não estava com muito saco para fazer charge (e a ditadura ia acabar – pelo menos oficialmente), saí do jornal. Aquela foi uma experiência importante porque lidou com a questão do humor, que eu não dominava muito no começo e fui aprendendo meio na marra. Aprendi. E ganhei, por exemplo, o II Salão de Piracicaba, com uma charge muda em que o papel do discurso de um general encarapitado em cima de um tanque se transforma na lagarta do tanque de guerra para passar por cima de qualquer coisa. Estou preparando uma coletânea de charges, intercaladas com textos que vão situando o leitor no período. Vai ser publicado pela Cia. das Letras. Dá para rapidamente se ter uma ideia do que foram os últimos anos do regime. O livro se chama Ah, como era boa a ditadura... DE QUEM PARTIU A IDEIA DE FAZER A REVISTA CIRCO?
O Toninho Mendes, diretor operacional da revista, fez com que aquilo tudo acontecesse. Era um projeto antigo nosso, falávamos disso desde a Versus, quando nos conhecemos. Eu já vinha tentando e projetando bonecos, tanto para mim como para certas ocasiões em que pareciam haver possibilidades. Naquelas alturas ele já vinha editando a Chiclete com Banana, do Angeli, que
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vendeu muito bem. E a Circo, que estreou em outubro de 1986, teve essa proposta, de mostrar o trabalho de artistas nacionais e estrangeiros que estavam injetando novidades na área, ao mesmo tempo em que abria mercado. Desde o primeiro número, a revista disse ao que veio por meio de um editorial em forma de HQ: convidar o leitor a entrar num mundo além da imaginação. Eu fazia a edição de arte e cuidava das HQs internacionais. O Alcy, o Laerte e o Glauco coeditavam. O título promoveu a estreia dos Piratas do Tietê, além de mostrar criações de Frank Margerin, Moebius, Arno, Alex Varenne, Attilio Micheluzzi, Robert Crumb. Reeditou material do Balão, como o Capitão Bandeira, do Paulo Caruso e do Rafic Farah. Encomendei capas para caras como o grande Jayme Leão, Miadaira, Marisa... A intenção era apresentar bimestralmente um painel coletivo e suas várias possibilidades. Mas as coisas na minha vida parecem acontecer assim: quando vêm, vêm tudo de uma vez e você tem de decidir entre uma ou outra (risos). Um pouco antes de receber o convite da Circo, eu havia sido aprovado no Royal College of Art, de Londres, para fazer minha pós-graduação. E fui adiando minha ida para a Inglaterra por um ano. Quando eu finalmente fui, o Laerte e o Toninho seguraram a coisa. Mas aí fiquei dois anos e a revista deixou de circular. Mas acho que existe espaço para uma revista assim no mercado atual de HQs.
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SUA TIRA PRESIDENTE REIS, QUE CIRCULOU NO ESTADÃO, TAMBÉM DEU AS CARAS NA CIRCO.
Era sobre um poeta tão bom, mas tão bom que acabou sendo eleito presidente da República (risos). Uma aventura seriada que não chegou ao fim. Na verdade, tinha uma longa introdução e parou de circular quando estava praticamente começando. Tenho mais uns três ou quatro meses de tiras esboçados. EM 1993, VOCÊ VOLTOU ÀS LIVRARIAS COM TERRITÓRIO DE BRAVOS (EDITORA 34). GOSTOU DO RESULTADO?
Gostei muito. Esse livro fora pensado em 1975-76, antes da criação de qualquer uma das suas histórias. Eu havia pensado um livro com histórias curtas sobre São Paulo, entrecortado com testemunhas de viajantes que passaram por aqui desde o século XVI. A capa, à primeira vista, é uma paisagem do velho oeste, mas, na verdade, é um tremendo congestionamento com um monte de “bravos” dentro de seus carros se xingando. Os textos citados eram
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resultado de pesquisas sobre São Paulo que eu já vinha fazendo nos tempos da FAU-USP. Ele traz histórias curtas voltadas para diferentes aspectos da vida na metrópole. Entradas e Bandeiras, feita para o jornal Extra, em 1984, resgata uma ideia que tivera nos tempos do Jornal da República, aliás onde fiz a primeira HQ com a paisagem urbana de São Paulo. A trama dá vida à popular “Estátua do Empurra”, de Victor Brecheret, um antigo símbolo da cidade que havia se degradado, pixado, transformado em rotatória. Tubarões Voadores foi uma HQ para a qual Arrigo Barnabé criou uma trilha sonora e chegou a ser apresentada na TV, pelo jornalista Mauricio Kubrusly, como se a invasão das feras estivesse ocorrendo de verdade – como Orson Welles fez com A Guerra dos Mundos. Em outras HQs, transportei o Grito do Ipiranga para Marte e voltei à infância para retratar a corrida atrás de um balão de São João. Esse álbum tem uma aproximação estilística bem distinta de Quadrinhos em Fúria, que lancei pela Editora Circo, nove anos antes, e que era mais político. Território de Bravos é mais voltado para o cenário urbano de São Paulo. VOCÊ PARECE GOSTAR DE BRINCAR COM OS CARTÕES-POSTAIS DE SAMPA.
Eu diria mais que são referências. Na época queria chamar atenção para uma HQ que refletisse nossa realidade. Um dos pontos culminantes desse período foi o álbum Avenida Paulista, agora editado pela Cia. das Letras. Nas charges, o uso desses marcos facilita a compreensão e a identificação pelo leitor, e ao mesmo tempo cria um repertório simbólico. Nos quadrinhos, eles ajudam a construir o imaginário, modificando símbolos que estão no cotidiano e no inconsciente das pessoas. Eu também explorei um ícone carioca: na capa do Balão 9, desenhei mosquitos com ferrões de bico-de-pena sobrevoando e picando o Cristo Redentor. Aquilo foi uma provocação, pois, além de representar o Brasil, representava o Rio que era naquela época o principal – quase único – centro das atenções, e a maioria dos autores da nossa revista era de São Paulo e estávamos começando. Éramos a mosca na sopa (risos). SUA AVENIDA PAULISTA, INTITULADA PRIMEIRAMENTE FRAGMENTOS COMPLETOS, CIRCULOU NUMA PUBLICAÇÃO DIRIGIDA A UM PÚBLICO RESTRITO E RAPIDAMENTE VIROU CULT, OBJETO DE DESEJO DOS COLECIONADORES DE QUADRINHOS. EM 2012, A OBRA FINALMENTE GANHOU VERSÃO EM ÁLBUM, AMPLIADO E ATUALIZADO...
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Em 1990, a jornalista Rosangela Petta me ofereceu um certo número de páginas da Revista Goodyear para criar alguma proposta gráfica sobre a Avenida Paulista. Achei que o tema merecia um detalhamento que a linguagem dos quadrinhos permite. Já que o assunto permeava minhas ideias e pesquisas desde o tempo da faculdade, reuni material iconográfico e rascunhei a história completa, imaginando que a cortaríamos depois, transformando-a numa HQ que ocuparia umas 16 páginas da publicação. Mas o resultado animou a equipe da redação, que decidiu produzir uma edição especial com uma história longa. Passaram-se meses entre a proposta inicial do trabalho e a aprovação do projeto. Cada página teve, no mínimo, três originais: da arte em preto e branco, dos fios e balões e da cor. O jornalista Geraldo Mayrink, também da equipe da revista, ficou encarregado de copidescar o texto básico. Como o trabalho foi amplamente divulgado pela grande imprensa, cerca de 30 mil pessoas enviaram cartas para a Goodyear solicitando exemplares. Na reedição pela Cia. das Letras, reescrevi os textos que entremeiam os quadrinhos e substituí o título original, que nunca “pegou”. O roteiro cobre um período que antecede a construção da avenida, passeia por sua história e conclui sugerindo dois futuros. Com a inclusão de duas páginas de prólogo, a HQ totalizou 78 pranchas.
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ATUALMENTE, VOCÊ DEDICA A MAIOR PARTE DO SEU TEMPO A LECIONAR QUADRINHOS NO CURSO DE DESENHO INDUSTRIAL DA UNIVERSIDADE MACKENZIE. É UMA MANEIRA DE CONCILIAR A CARREIRA ACADÊMICA COM AS HQS?
É também uma oportunidade de me manter estudando várias linguagens e pesquisar. Ali eu lidero um grupo de pesquisa sobre design de comunicação, com ênfase nas formas visuais de narração, interação e representação. Isso me permitiu, por exemplo, criar uma HQ tridimensional, não linear e interativa no corpo de uma manequim que batizei de Borba Gata. Outra possibilidade que a universidade me dá é a de garimpar talentos. Entre meus orientandos, pelo menos dois publicaram quadrinhos logo depois de se formarem: Jorge Otávio Zugliani, o Jozz, autor de O Circo de Lucca, e Thaís dos Anjos, criadora de Assim Falava Zaratustra – dos Céus aos Quadrinhos (os dois livros foram editados pela Devir).
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O uso de novas mídias nas obras artísticas cresce continuamente e acompanha o desenvolvimento de novas tecnologias. Apesar disso, grande parte das obras que usam linguagem eletrônica ainda se encontra marginalizada em grandes museus e galerias.
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A ARTE CONTEMPORÂNEA E SUAS DIVERSAS LINGUAGENS
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Muito antes do boom dos computadores pessoais, da internet e das redes sociais, ainda na década de 60, a parceria entre arte e tecnologia já ganhava forma entre os artistas contemporâneos. Foi exatamente quando eles começaram a questionar as mídias tradicionais de arte — como pintura e escultura — e a realizar trabalhos que, algum tempo depois, seriam chamados de instalações. Hoje, as instalações configuram uma das mais relevantes tendências da atualidade. São manifestações artísticas que permitem uma grande interatividade com o público, em uma relação de “intimidade” que se fortalece na medida em que mexem com os sentidos de seus apreciadores e neles provocam experiências que vão de sensações agradáveis ao mais profundo incômodo. The Mamori Expedition, da belga Els Viaene, é uma instalação de madeira que simboliza o caminho que a artista seguiu durante uma expedição pela Floresta Amazônica, em exposição nesta 15a edição do File.
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Com o passar dos anos e com o desenvolvimento tecnológico contínuo, os artistas começaram a utilizar as combinações de várias linguagens disponíveis para surpreender, e envolver, de maneira mais eficaz seus públicos não apenas em instalações, mas também outras manifestações artísticas. Entre elas, vídeos, esculturas, performances, computação gráfica e, mais recentemente, a internet. E divulgar essas manifestações artísticas que utilizam mídias eletrônicas é justamente o foco do File – Festival Internacional de Linguagem Eletrônica, realizado em São Paulo, que está em sua 15a edição e ocorre neste ano de 26 de agosto a 5 de outubro, e atrai um público maior a cada ano. No ano passado, cerca de 35 mil pessoas passaram pela galeria de arte do File. Para se ter uma ideia das inúmeras possibilidades de manifestações artísticas com o uso da tecnologia, em 2013, entre as obras expostas, estava o aplicativo de realidade aumentada para tablet ou celular, o Arart, dos artistas japoneses Takeshi Mukai, Kei Shiratori e Younghyo Bak, que possibilitou ao público modificar e transformar, de acordo com seu gosto, pinturas clássicas como Monalisa, de Leonardo da Vinci. Neste ano, são 28 instalações, de 12 países. Os visitantes podem, por exemplo, manipular os sons da Floresta Amazônica, por meio da réplica de um rio.
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Obra simulacra, da polonesa Karina Smigla-Bobinski, em que você só consegue ver algo quando coloca lentes de aumento na frente das tevês danificadas.
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Para o artista contemporâneo e organizador do File, Ricardo Barreto, apesar da evolução constante das linguagens tecnológicas entre os artistas da atualidade, o preconceito ainda é uma barreira para que as mídias eletrônicas sejam definitivamente integradas ao conceito de arte contemporânea em grandes museus e galerias. “A vídeo-arte, por exemplo, ainda conseguiu ser absorvida em alguns desses espaços, mas as outras linguagens não. Infelizmente, a arte eletrônica começou a ficar marginal à arte contemporânea. Dificilmente há exposições em galerias e museus tradicionais, apenas em ambientes específicos para essa linguagem, como o File e outros festivais organizados em países europeus e no Japão”, comenta. Segundo Barreto, um dos poucos espaços brasileiros nos quais a mídia eletrônica realmente faz parte do acervo, em igualdade com outras mais tradicionais, está a Casa Daros, localizada no Rio de Janeiro. “Mesmo em outros países, como os Estados Unidos, que estão mais avançados na questão da disseminação das mídias eletrônicas, ainda há pouca abertura”, comenta. Com a intenção de divulgar as possibilidades ilimitadas de manifestações artísticas do nosso tempo, a SESI-SP Editora e o File lançaram, na abertura do evento, o livro Highlike, obra de 584 páginas que reúne o trabalho de 577 artistas de 35 países. É um verdadeiro anuário sobre arte e cultura contemporânea global. A galerista Raquel Arnaud, uma das mais renomadas do Brasil, que recentemente comemorou quarenta anos de sua trajetória no cenário artístico nacional, defende que as novas tecnologias são, sim, reconhecidas como arte contemporânea. “O que importa na arte contemporânea é o processo de ruptura de linguagem e processos inovadores”, comenta. “Para construir uma linguagem esteticamente forte e radical, pode-se, ou não, contar com novas tecnologias na elaboração e conceituação das obras”, acrescenta Raquel, que cita o videoartista norte-americano Bill Viola e o artista digital carioca Eduardo Kac entre os principais expoentes do uso da mídia eletrônica na arte contemporânea. A curadora Ivana Bentes fez, em artigo publicado recentemente no site Arte e Tecnologia, uma reflexão ainda mais profunda sobre o papel da tecnologia nas artes contemporâneas. “Somos contemporâneos de um momento de reinvenção da relação arte-tecnologia, em que a hibridação entre arte, ciência e pensamento produz novos paradoxos e questões”, afirma. “Relação
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que não é nova, mas sem dúvida é problematizada de forma aguda no contexto atual, no qual a arte busca uma revitalização e encontra nas tecnologias emergentes um campo de experimentação”, complementa. Ricardo Barreto destaca uma outra questão que, segundo ele, representa mais uma barreira para o reconhecimento da tecnologia com arte. “Já presenciei muitas situações nas quais os enfoques acadêmico e científico dessas obras que mesclam arte e tecnologia se sobrepõem ao seu aspecto artístico”, comenta. É preciso entender que, se há a construção de uma poética naquela obra, ela é arte contemporânea, sim”, defende.
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Destaque do FILE Anima+, Europe in 8 bits é um documentário de 76 minutos que explora o mundo da chip music, um estilo musical que reaproveita aparelhos antigos de videogames e transforma-os em instrumentos para criar novas sonoridades. De Javier Polo / Turanga Films – Europe in 8 bits – Espanha
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LIVRO INTERATIVO DEMONSTRA ENORME DIMENSÃO DE OBRAS CONTEMPORÂNEAS
Mostrar que existe muita arte eletrônica de alto nível e, mais do que isso, demonstrar que a abrangência da arte contemporânea é muito maior do que tudo aquilo que se expõe hoje em dia em museus e galerias do mundo todo. Com esse objetivo, os artistas Ricardo Barreto e a Paula Perissinotto criaram o site Highlike (http://highlike.org/), no qual passaram a reunir imagens de todos os tipos de manifestações artísticas imagináveis. O site já reúne mais de 15 mil obras de artistas nacionais e internacionais. “Pouca gente tem noção da quantidade de obras contemporâneas que são criadas atualmente. Isso se deve muito ao fato de o mercado ainda categorizar a arte por nichos, o que não permite que ela seja vista em sua totalidade”, comenta Barreto. O nome “Highlike” vem da fusão das palavras highlight, que significa destaque em inglês, e like, em uma alusão à expressão tão utilizada atualmente nas redes sociais como aprovação de uma ideia ou notícia. Barreto acredita no potencial do projeto, que integra o livro e o site, de contribuir para a disseminação dos artistas que trabalham com mídias eletrônicas. “Ainda há muito a se fazer para mudar essa questão da marginalização das mídias eletrônicas e a falta de conhecimento sobre a abrangência da arte mundial, e acredito que o livro pode ajudar a transformar um pouco esse cenário”, comenta. Além de ser um material inédito, um dos diferenciais do livro é que todo o conteúdo está na nuvem. Cada uma das imagens de obras publicadas possui um QR (Quick Response) Code, que pode ser lido pelo celular ou tablet, e que leva diretamente à página do site Highlike, onde se encontram outras informações sobre aquela determinada obra, apresentadas em formatos como vídeos ou textos.
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O livro Highlike, da coleção Exposições, já está à venda nas melhores livrarias.
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ARIANO SUASSUNA E AS VOZES DO POVO
Iustração de Jô Oliveira
POR MARCO HAURÉLIO
A biografia do grande brasileiro Ariano Suassuna, falecido no dia 23 de julho de 2014, está suficientemente espalhada por vários sítios (se eu escrevesse site, ele ficaria bravo) da internet. Sua obra está ao alcance de todos, em lojas físicas e virtuais. Portanto, nesse espaço, eu me dedicarei mais ao seu legado. Ariano é daqueles autores que não nascem dos convescotes, dos movimentos, dos manifestos que emulam outros manifestos, dos conchavos enfim. Ele é forjado e se forja da matéria viva. Apesar de retrabalhar os arquétipos, seu trabalho talvez diga mais da realidade que a produção pretensamente realista que vemos por aí. Tipos como o preguiçoso, o valentão, o mentiroso, o espertalhão, o padre desonesto e o coronel caricato são — ou eram — encontrados sem muita dificuldade no sertão de carne, pedra e osso.
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Na ilustração ao lado, o pai assassinado transfigura-se em rei. No estandarte, a onça Caetana, que simboliza a morte.
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s vezes ele parecia deslocado no tempo, e assumia essa condição que, sem demérito, pode ser chamada anacrônica, porém, na verdade, sua obra revela uma impressionante intemporalidade, quando dialoga com Plauto, Boccaccio, Shakespeare, Gil Vicente, Calderón de La Barca, Cervantes, e mostra quão frágeis são as fronteiras estabelecidas da cultura. O episódio do julgamento celeste, ápice do Auto da Compadecida, sua mais celebrada criação, remete aos primórdios da catequese no Brasil, quando os jesuítas recorreram, para facilitar a conversão dos índios ao catolicismo, às encenações que, não raro, traziam as mesmas personagens da peça de Suassuna. A origem da crença, porém, nos leva mais longe no tempo e no espaço. Os antigos egípcios acreditavam que, depois da morte, a alma era enviada a um tribunal presidido por Osíris, tendo o irmão e adversário deste, Set, como acusador e Ísis como intercessora. Anúbis, o deus cinocéfalo, pesava, numa balança, o coração do morto. No catolicismo, essa atribuição caberá a São Miguel Arcanjo. Apesar do toque de mestre de Ariano, as situações e personagens por ele evocadas, todos arquetípicos, navegam há milhares de anos nas águas do inconsciente coletivo. O paraibano Ariano não se amofinou com a tragédia que marcou definitivamente sua vida — o assassinato do pai, João Suassuna, então governador do estado da Paraíba, no espocar da Revolução de 30. Sua família seguiu, então, para Taperoá, no Cariri paraibano, onde ele assistiria aos sete anos a uma apresentação do teatro de mamulengos, que seria determinante para a sua futura carreira de dramaturgo. Conviveu ainda com os desafios de viola, na época em que a feiras do Nordeste, espaço de trocas reais e simbólicas, ainda exalavam um forte cheiro de Idade Média, com seus menestréis errantes, charlatães a prometer a cura de muitas moléstias e apresentações de artistas populares. Ele aproveitou, então, seu exílio no sertão para juntar os muitos retalhos da sabença caatingueira, ampliando depois com a contribuição de todas as sabenças, e de uma espantosa erudição que ele, humilde, dizia não possuir, e, disso tudo, fez a colcha com que nos envolveu. E já fixado no Recife, com providencial ajuda de Hermilo Borba Filho, dez anos mais velho, autor de teatro e estudioso das tradições populares vestiu-se de sol e não mais se despiu nos oitenta e sete anos passados entre nós. A LITERATURA DE CORDEL
Base de boa parte das peças e de sua mais ousada incursão pela prosa, o Romance da Pedra do Reino e o Sangue do Vai-e-Volta (1971), a literatura de cordel, que
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Precisava de casar-se Por causa da sucessão Com esse fim reuniu-se A nobre corte em Ruão.
No Brasil, a mesma história foi publicada em sextilhas no início do século XX, em versão escrita ou divulgada por Leandro Gomes de Barros (1865-1918), poeta popular paraibano de grande engenho e que exerceria sobre Ariano profícua influência. Roberto é o filho do duque da Normandia que nasce sob o signo da maldição, renega a origem nobre e passa a liderar um grupo de foras da lei, até o momento em que se redime e busca, a todo custo, purificar-se. Serviu, no imaginário popular, de modelo para os cangaceiros do Nordeste, impelidos ao crime por fatores complexos que vão da desigualdade social às perseguições e intrigas familiares. Mas falemos de Leandro. São deste poeta alguns dos mais importantes títulos do nosso cordel. De espírito crítico, anticlerical, por vezes libertário, legou-nos várias páginas memoráveis. Um de seus livros mais célebres é a História de João da Cruz, que parece ter origem num romance em versos anônimo, por sua vez inspirado em algum auto religioso. É também um drama de queda e redenção, tingido com as cores do catolicismo popular. Há, no final, o episódio do julgamento celeste, com Jesus como juiz, o Diabo, promotor (ou acusador), e a Virgem Maria como advogada. E por que cito este romance? Por ter ele inspirado a segunda peça composta por Ariano, o Auto de João da Cruz (1949), que se seguiu a Uma mulher vestida de sol, composta dois anos antes. Na parte final do romance, a alma de João da Cruz, sentindo iminente a condenação, apela para a Virgem Maria, na cena que será recorrente na dramaturgia de Ariano:
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Na província da Normandia O duque Alberto vivia, Pelo seu nobre caráter O povo muito lhe queria.
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Ariano chamava Romanceiro Popular Nordestino, é herdeira direta da gesta medieval, mas suas raízes mais profundas estão na poesia épica de vários povos, com seus heróis e jornadas lendárias. À diferença de Portugal, país que serviu de fonte e ponte para a poesia popular que aportou no Brasil, a literatura de cordel que floresceu principalmente em meados do século XIX é toda em verso. Na pátria de Camões, as produções podiam ser em prosa ou em verso, sendo, no último caso, preponderantes as quadras setissílabas. Tomemos como exemplo a História de Roberto do Diabo, personagem de uma antiga lenda normanda:
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A alma vendo o demônio Querer fazer-lhe penhora E temendo que chegasse Aquela maldita hora Deu um pulo e foi cair Nos pés de Nossa Senhora. E disse: oh Virgem Maria Esposa casta e fiel Ide também ajudar O arcanjo São Miguel Para tirar o furor Daquele dragão cruel.
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Depois do embate verbal entre acusação e defesa, é feita a pesagem da alma por São Miguel, que a absolve. Vencido, o Diabo apela: Saiu o Diabo aos berros Com o maior desespero Exclamando em vozes altas: Miguel é alcoviteiro Ah! Maria piedosa! Ah! João da Cruz estradeiro! Ariano, no artigo dedicado à presença do Romanceiro Popular do Nordeste na Compadecida, entrega a fonte do Auto de João da Cruz, que, segundo ele, é “inteiramente baseado em três folhetos nordestinos: História de João da Cruz, História do Príncipe do Barro Branco e a Princesa do Reino do Vai não Torna e O Príncipe João Sem Medo e a Princesa da Ilha dos Diamantes”.1 E, para reforçar o valor do gênero que era a base de seu trabalho, ratificava em artigo publicado em 1967 na revista Cultura: É todo um cortejo de vasta humanidade que desfila livremente por aí, na força da Literatura coletiva, enquanto a nossa Literatura de salão 1 A Compadecida e o Romanceiro Nordestino. In: Literatura popular em verso: estudos. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp; Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1986.
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acadêmica, acanhada, sufocada de preconceitos e de bom gosto, se estiola, sem fôlego, no formalismo e no individualismo. Baste um pormenor para mostrar a diferença: quantas obras não já deixaram de ser escritas por causa da preocupação mesquinha, orgulhosa e estéril da criação individual? O Cantador nordestino não se detém absolutamente diante dessas considerações: apropria-se tranquilamente dos filmes, peças de teatro, notícias de jornal e mesmo dos folhetos dos outros. Que importa o começo se, no final, a obra é sua? Ele, depois de tudo, acrescentou duas ou três cenas, torceu o sentido de três ou quatro outras, de modo que a obra resultante é nova. Não era assim que procediam Molière, Shakespeare, Homero e Cervantes? (...) Os Cantadores procedem do mesmo jeito. Há, mesmo, uma palavra que, entre eles, indica o fato, o verbo versar, que significa colocar em verso a história em prosa do outro. Quando Shakespeare escreveu Romeu e Julieta não fez mais do que versar as crônicas italianas de Luigi da Porto e Bandello.
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Sem o cordel, a cantoria, o mamulengo, o maracatu, não haveria as experiências inovadoras de Ariano e Hermilo Borba, e nem afloraria o Movimento Armorial, que, na música popular, teve no Quinteto Armorial e, depois, em Antônio Nóbrega, que integrava o grupo, a melhor tradução. UM PÍCARO NO CÉU
Do desfecho da História de João da Cruz, possivelmente, tenha vindo a inspiração para criação mais famosa de Ariano, o já citado Auto da Compadecida. Em 1952, Ariano escreveu O Castigo da Soberba, que traz o mesmo tema de João da Cruz. Tratava-se, segundo o autor, de um “Entremês popular em um só ato”, baseado no folheto de mesmo nome, escrito pelo cantador Silvino Pirauá de Lima (1848-1913). Mas foi num folheto de gracejo que ele encontrou a personagem-símbolo de sua dramaturgia. As Proezas de João Grilo (ver trecho a seguir), história escrita em 1932 por João Ferreira de Lima, trazia como protagonista o célebre amarelinho oriundo dos contos populares portugueses, que, no processo de aculturação, ganhou características idênticas às de outro famoso espertalhão de origem ibérica: Pedro Malazarte. Reaproveitado no Auto da Compadecida, protagonizará o filme produzido em 2000 por Guel Arraes, sendo interpretado por Mateus Nachtergaele e com Selton Melo na pele do farofeiro Chicó.
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João Grilo foi um cristão que nasceu antes do dia, criou-se sem formosura mas tinha sabedoria, e morreu depois da hora pelas artes que fazia. (...)
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Na noite que João nasceu, houve um eclipse na lua, e detonou um vulcão, que ainda continua. Naquela noite correu um lobisomem na rua. (...) Entretanto, a Compadecida se baseia em três folhetos distintos, dois deles escritos por Leandro Gomes de Barros, autor recorrente na obra de Ariano. O primeiro é O cavalo que defecava dinheiro, que mostra como um finório consegue lograr um duque invejoso convencendo-o de que um cavalo é realmente capaz de obrar (sem trocadilho) o prodígio do título. Obviamente quem assistiu à peça ou a uma de suas versões para o cinema sabe que o cavalo foi transmutado num gato, por motivos mais que compreensíveis. O outro poema de Leandro reaproveitado por Suassuna é O dinheiro (O testamento do cachorro), onde aparecem as figuras do padre e do bispo. Para ilustrar, veja a seguir um trecho do folheto, que trata de uma tentativa de suborno feita por um inglês, instalado em Pernambuco, no início do século XX, por ocasião da construção da estrada de ferro Great Western, a um padre, para que este dê extrema-unção a um cachorro, além de um enterro decente. Leandro caricaturiza o inglês até na dificuldade deste em lidar com nossa língua: — Mim que enterrar cachorro! Disse o Vigário: — Ó inglês, Você pensa que isto aqui É o país de vocês?
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Disse o inglês: — Com cachorro Gasto tudo desta vez... Ele, antes de morrer, Um testamento aprontou, Só quatro contos de réis Para o Vigário deixou... Antes do inglês findar, O Vigário suspirou. — Coitado — disse o Vigário — De que morreu esse pobre? Que animal inteligente E que sentimento nobre! Antes de partir do mundo, Fez-me presente do cobre... Na Compadecida, o inglês é substituído pelo padeiro, que, ludibriado por João Grilo, insta com o padre para fazer o enterro. No início reticente, sabedor do testamento do cachorro, o padre muda de opinião muito rápido e, na sua fala, reproduz-se quase integralmente o trecho do folheto: PADEIRO: — Só para o vigário deixou dez contos. PADRE: — Que cachorro inteligente! Que sentimento nobre! JOÃO GRILO: — E um cachorro desse ser comido pelos urubus! É a maior das injustiças. A autoria de Leandro é inquestionável, embora a origem dos motivos que compõem a história seja mais difícil de rastrear. O próprio Ariano reconhece essa dificuldade quando afirma: “— a história do testamento do cachorro, que aparece no Auto da Compadecida, é um conto popular de origem moura e passado, com os árabes, do Norte da África para a Península Ibérica, de onde emigrou para o Nordeste”.2 2 Idem, ibidem. A origem árabe e a difusão via Península Ibérica, de que fala Ariano, devem ser vistas com ressalvas. Segundo José Joaquim Dias Marques, da Universidade do Algarve, Portugal, este conto existe em muitos outros países, nomeadamente na Europa, e, por isso, é arriscado pressupor que ele chegou
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Vamos todos nós embora Que o causo não é o primeiro, E o pior é que também Não será o derradeiro... Home que a mulher domina Não pode ser justiceiro.
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Além destes dois poemas de caráter marcadamente cômico, o Auto propriamente dito — a última parte — tem por base o folheto O Castigo da Soberba, citado anteriormente. A história tem a marcante presença do imaginário medieval que impregna a obra de Gil Vicente, outra evidente fonte de Suassuna. Maria (Nossa Senhora) é a advogada, Jesus é o Juiz, e o Diabo, o acusador. É a Nossa Senhora — a “advogada nossa” da oração Salve Rainha — que a alma recorre, em vista da iminente condenação. Evocada em nome de seu bendito filho, ela responde à súplica da alma. No final, após ouvir acusação e defesa, Jesus — no folheto também chamado Manuel — decide pela salvação da alma. O Diabo (Cão), vencido, chama os seus comandados. A estrofe a seguir reproduzida, com a última fala do tinhoso, está bem próxima do desfecho do Auto da Compadecida:
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Os três folhetos, diga-se de passagem, foram coligidos por Leonardo Mota no livro Violeiros do Norte.3 É nesta obra também que aparece o poema farsesco que João Grilo recita no céu, a seguir reproduzido na íntegra:
Ilustração de Jô Oliveira
Valha-me Nossa Senhora, Mãe de Deus de Nazaré! A vaca mansa dá leite, A braba dá quando qué: A mansa dá sossegada, A braba levanta o pé... Já fui barco, fui navio à Península Ibérica através dos árabes. Ele está inclusive documentado já num fabliau francês do século XIII. E, embora haja versões por toda a Europa, não parecer ter sido registrado em Portugal. No Catálogo Internacional do Conto Popular, o Sistema ATU (sigla que homenageia os formuladores do catálogo, Anti Aarne, Stith Thompson e Hans-Jörg Uther), a história aparece sob o número 1842 (The testament of the dog). 3 Ver “No reino da picardia”, capítulo do livro Breve história da Literatura de Cordel, em que se baseia esta seção.
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E hoje sou escalé... Já fui linha de meada, Hoje sou de carreté... Já fui menino, sou home, Só me falta ser muié... Valha-me Nossa Senhora, Mãe de Deus de Nazaré! O autor, segundo Mota, é o cantador baiano Canário Pardo, que foi assassinado por um rival em conquistas amorosas. Indiretamente, este pesquisador cearense, ao reunir as três obras em seu precioso estudo, apontou o caminho que Ariano Suassuna deveria seguir, mesmo apoiando-se em outras tradições populares — especialmente o Bumba-meu-boi, onde as personagens Mateus e Bastião cumprem um papel semelhante ao de João Grilo e Chicó na Compadecida.
38 CORDEL CANTA ARIANO
Os poetas do povo, amigos de Ariano desde sempre, sentiram a sua partida. Klévisson Viana, cearense de Quixeramobim, autor de O pescador arrependido aos pés da Compadecida, romance que evoca a peça de Ariano em suas origens medievais, assim se manifestou: Ariano Suassuna Viverá eternamente. Seu corpo físico perece, Mas sua obra contundente Servirá sempre de norte Para orientar a gente. O mesmo Klévisson, em parceria com o grande poeta baiano Bule-Bule, escreveu e publicou, um dia depois de confirmada a morte do escritor, um folheto que dialoga com a obra do dramaturgo. No enredo de A chegada de Ariano Suassuna no Céu, Jesus precisa escrever uma peça e envia a Morte à Terra para buscar Ariano, mas ela, atrapalhada, vai ao Rio de Janeiro e, por engano, leva o escritor baiano João Ubaldo Ribeiro. A morte veio ao País Como turista estrangeiro,
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Achando que o Brasil Era só Rio de Janeiro. No rastro de Suassuna, Sobrou pra Ubaldo Ribeiro. Depois de muitas confusões, a Morte prepara uma homenagem ao escritor, estendendo, à frente dele, uma faixa: A morte colonizada, Pensando em lhe agradar, Uma faixa com uma frase Ela mandou preparar, Dizendo: “Welcome Ariano”, Mas ele não quis entrar.
39 Vendo a tal faixa, Ariano Ficou muito revoltado. Começou a passar mal, Pediu pra ser internado E a morte foi lhe seguindo Para ver o resultado. Eu não sei se Ariano Morreu de raiva ou de medo. Que era contra estrangeirismos, Isso nunca foi segredo. Certo é que a morte o matou Sem lhe tocar com um dedo. Pedro Monteiro, piauiense, que vive em São Paulo, autor de João Grilo, um presepeiro no palácio e de Chicó, o menino das cem mentiras, dedicou ao mestre essa setilha: A cultura popular Tem hoje grande lacuna, A morte sempre inclemente É uma perversa gatuna,
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Fila cristãos e ateus, Desta vez levou pra Deus Ariano Suassuna. Paulo de Tarso, cearense de Tauá, mais solene, noticia: A cultura brasileira Muito entristecida está. Faleceu nosso Ariano, melhor que ele não há. Por aqui os sentimentos Do poeta de Tauá. O autor deste artigo, Marco Haurélio, dedicou-lhe esta trova:
40 Ariano não morreu, Anote no seu caderno. Jamais morre quem nasceu Com o dom de ser eterno. De Calderón de La Barca (1600-1681), poeta e dramaturgo espanhol de grande importância na obra de Ariano, pincei esta décima da peça A vida é sonho, que Ariano, sempre que podia, declamava, estabelecendo a ponte da tradição “culta” ibérica com a poesia “popular” do Nordeste: Eu sonho que estou aqui de correntes carregado e sonhei que noutro estado mais lisonjeiro me vi. Que é a vida? Um frenesi. Que é a vida? Uma ilusão, uma sombra, uma ficção; o maior bem é tristonho, porque toda a vida é sonho e os sonhos, sonhos são. (Tradução: Renata Pallotini)
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E, para encerrar com poesia, dediquei-lhe mais uma trova: Senhora Compadecida, De incomensurável brilho, Findo o sonho que é a vida, Recebei o vosso filho. A Morte, que Ariano chamava Caetana, referência à onça que também é a Moça Caetana, personagem fantástica que aparece com destaque na História d’O rei degolado nas caatingas do sertão, saiu, aparentemente, vitoriosa do último encontro. Basta, porém, uma olhada na repercussão da notícia que invadiu as redações e as manifestações de pesar, carinho e gratidão para que pensemos ao contrário. Viva Ariano! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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CASCUDO, Luís da Câmara Cascudo. Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: INL- MEC, 1962. HAURÉLIO, Marco. Breve história da literatura de cordel. São Paulo: Claridade, 2010. MOTA, Leonardo. Violeiros do Norte. Fortaleza: Imprensa Universitária do Ceará, 1962. NASCIMENTO. Catálogo do conto popular brasileiro. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, IBECC, Unesco, 2005. SUASSUNA, Ariano. A Compadecida e o Romanceiro Nordestino. In: Literatura popular em verso: estudos. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp; Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1986. _________. Auto da Compadecida. Rio de Janeiro: Agir, 1976. _________. Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta. 5. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004.
MARCO HAURÉLIO é baiano de Riacho de Santana, poeta (cordelista), ensaísta e pesquisador da cultura popular brasileira. Autor de Presepadas de Chicó e astúcias de João Grilo (Luzeiro), Meus romances de cordel (Global), Contos e fábulas do Brasil (Nova Alexandria) e A lenda do Batatão (SESI-SP Editora).
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BIBLIOTECAS PELO MUNDO DA ANTIGUIDADE AOS DIAS ATUAIS, TEMPLOS DA ARQUITETURA E DO SABER
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Pensar nas principais, nas melhores, maiores, mais modernas, mais bonitas, mais fascinantes, mais importantes e mais inovadoras bibliotecas do mundo é entrar em um labirinto, em um universo “de um número indefinido, e quiçá infinito, de galerias hexagonais”.1 É como abrir a porta de uma biblioteca virtual de proporções intermináveis. E para sair ao menos parcialmente da virtualidade, desse turbilhão de informações, nada melhor que estar em uma biblioteca, sentir o silêncio quase absoluto, como o de um templo, onde deuses vocabulares, peças históricas, com suas páginas amarelas, com seus escritos arcaicos, ou a mais moderna das tecnologias, residem.
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É necessário observar cada visitante que entra e segue em passos lentos, suaves, tentando prosseguir o silêncio, em um estado de contemplação, de respeito, o mesmo dispensado a igrejas e santos. É preciso desconstruir a origem grega do nome, considerar a palavra biblíon (livro) e desconsiderar téké, pois os significados caixa e/ou depósito reduzem a grandiosidade das bibliotecas, mesmo que incapazes de abarcar todos os livros, todos os saberes, muito menos “a história minuciosa do futuro, as autobiografias dos arcanjos”. 1
BORGES, Jorge Luis. A biblioteca de babel. In: __________. Ficções. São Paulo: Editora Abril, 1972.
Biblioteca pública de Estocolmo, na Suécia.
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as ao final é impossível sair, se desvencilhar desse dédalo ou chegar a qualquer conclusão, mesmo que parcial. Afinal, como definir sobre quais bibliotecas falar? De qual ponto de vista pode-se chegar ao entendimento de que esta ou aquela é melhor, mais bonita ou mais interessante? Pior jamais, porque qualquer biblioteca é essencial. Qual seria, por exemplo, a melhor biblioteca do mundo para Peter Kien?2 Provavelmente a sua casa-biblioteca com 25 mil volumes. Para muitos, pode ser a Biblioteca Popular do Açougue T-Bone, em Brasília, que desde 2007 distribui livros nas paradas de ônibus da cidade, com uma média de 300 mil exemplares emprestados por ano, com reposição dos acervos feitas diariamente pelos funcionários do açougue. Portanto, não há uma forma sensata de chegar a uma lista coerente de bibliotecas pelo mundo, somente é possível ir tateando, sentindo. Talvez o melhor seja iniciar a caminhada pelos livros, senhores absolutos das bibliotecas, cujos primeiros exemplares, por assim dizer, surgiram na região da Suméria (onde se originou a escrita), na Mesopotâmia, hoje sul do Iraque, há aproximadamente 5.300 anos,3 mas aí já seria outra história...
ALEXANDRIA EM DOIS TEMPOS
Talvez o certo então seja iniciar pelo que já nem existe, a Biblioteca de Alexandria, uma das mais famosas da história. Foi o filósofo grego Demétrio de Falero quem incentivou Ptolomeu I Sóter, então no reinado do território do Egito, a transformar Alexandria em um polo cultural. O primeiro passo foi a construção do Templo das Musas, dentro do qual nasceu a Biblioteca de Alexandria (280 a.C.), consolidada no reinado de Ptolomeu II. Demétrio, a cargo da biblioteca, recebeu altas somas para adquirir todos os livros que conseguisse. O desejo do filósofo era chegar a meio milhão de livros. Para tanto, não poupou esforços. Entre as suas iniciativas esteve a tradução dos textos judaicos do Antigo Testamento para o grego. Ptolomeu I levou a Alexandria 72 judeus, que traduziram desde Gênesis até o Livro de Malaquias. Peças oficiais das obras de Ésquilo, Sófocles e Eurípedes podiam ser encontradas ali.4 “Por lei, quem visitasse Alexandria devia doar uma obra”, diz Fernando Báez em História universal da destruição dos livros. 2 CANETTI, Elias. Auto-de-fé. Tradução de Herbert Caro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. 3 BÁEZ, Fernando. História universal da destruição dos livros – Das tábuas sumérias à guerra do Iraque. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006. 4 Ibidem.
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A biblioteca, que funcionava parte no Templo das Musas e parte no Serapeum, templo erigido por Ptlomeu III à divindade Serápis, chegou a ter setecentos mil rolos, mas há divergências quanto aos números. Segundo o comentarista bizantino João Tzetzes (1110-1181), o Serapeum teria chegado aos 42,8 mil manuscritos e o Museu, a 490 mil. O fato é que a Biblioteca de Alexandria foi sistematicamente destruída por vários incêndios, em datas e situações imprecisas: 48 a.C.; 272 d.C.; 392 d.C.; e o último e grande incêndio, em 642 d.C., que teria sido obra do califa Omar I , mas ainda hoje há controvérsias. E eis que no século XXI, em outubro de 2002, Alexandria ganha a sua nova biblioteca, com design totalmente contemporâneo e capacidade para até oito milhões de volumes. A Bibliotheca Alexandrina de hoje possui planetário, salas multimídia, laboratório de restauro, amplo centro de pesquisas acadêmicas, quatro museus, quatro galerias de arte, um centro de eventos, sala de leitura para até duas mil pessoas e recebe por ano 1,5 milhão de visitantes, segundo dados da instituição. A grande missão agora é ampliar o acervo, que está em torno de meio milhão de livros.
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RELÍQUIAS EUROPEIAS
Fácil é perder-se tanto no tempo quanto no espaço nessa biblioteca sem paredes, sem teto, sem livros até, porém repleta de dados. É exato dizer, juntando-se a Umberto Eco, que “Informação demais faz mal”.5 Assim, sem conexão alguma, partimos da Biblioteca de Alexandria para a Trinity College Library, localizada em Dublin, a maior biblioteca da Irlanda, onde está o Livro de Kells, o mais ilustre representante de um grupo de manuscritos do estilo insular produzidos entre o final do século VI e o início do IX, nos monastérios da Irlanda, da Escócia e do norte da Inglaterra. Também conhecido como o Grande Evangeliário de São Columba, escrito em latim, o Livro de Kells contém os quatro Evangelhos do Novo Testamento e já inspirou até um desenho animado, O segredo de Kells, em que a tarefa de concluir o livro é dada a um menino. A relíquia está em uma biblioteca com mais de seis milhões de volumes, com grandes coleções de jornais, manuscritos e mapas, entre outros. O prédio mais antigo data da fundação da universidade, em 1592, e possui a Early Printed Books Reading Room, com livros raros e de edição limitada, e a Manuscripts Reading Room, com manuscritos. 5 Entrevista publicada pela revista Época, em julho de 2013. Disponível em: http://epoca.globo. com/ideias/noticia/2013/07/bumberto-ecob-informacao-demais-faz-mal.html.
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De uma relíquia a outra, a uma biblioteca que, por si só, é considerada uma obra de arte, um dos principais exemplares barrocos da Europa. A Admont Abbey Library, a maior biblioteca monástica do mundo e um dos maiores bens culturais da Áustria, pertence ao monastério beneditino de Admont, fundado em 1074. De barroco tardio, foi concluída em 1776. O teto do salão da biblioteca contém sete cúpulas, decoradas com afrescos de Bartolomeo Altomonte, renomado pintor austríaco barroco. Os afrescos representam desde as etapas do conhecimento humano até o ponto alto da revelação divina. Dentro da abadia, relíquias em papel: mais de 1,4 mil manuscritos, sendo o mais antigo o originário do século VIII, e 530 incunábulos impressos antes de 1500.
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Bibliotheca Alexandrina, inaugurada em 2002.
Ainda pela Europa, há a Biblioteca Geral, da Universidade de Coimbra, em Portugal, que completou 500 anos em 2013. Consta da história da
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biblioteca que a mais antiga referência documental é uma ata de fevereiro de 1513, a qual trata da necessidade de colocar ou de consertar canos para o escoamento da água. Na época, era conhecida por Livraria do Estudo e não chegava a ter cem livros, completando 739 volumes no final do século. A Casa da Livraria, como ficaram depois conhecidas as bibliotecas, funcionou em vários locais em Lisboa e em Coimbra, até se fixar. Hoje, é constituída da Biblioteca Geral, que entrou em funcionamento em 1962, e de sua menor e mais distinta área, a Biblioteca Joanina. Construída entre 1717 e 1728, a Joanina é ícone da arquitetura, um dos expoentes do barroco português. Em sua decoração, atuaram mestres como Manuel da Silva, Simões Ribeiro e Vicente Nunes. O nome é em memória do rei D. João V (1707-1750). Os primeiros livros chegaram após 1750. Atualmente, possui 55 mil volumes. As duas unidades somam cerca de dois milhões de exemplares, manuscritos e incunábulos, compondo, segundo dados da instituição, a maior biblioteca universitária lusófona do mundo.
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PELAS AMÉRICAS
Saindo de Portugal, seguindo a língua-mãe, aportamos no Rio de Janeiro, na Biblioteca Nacional do Brasil, também conhecida como Fundação Biblioteca Nacional, com mais de nove milhões de itens em seu acervo, considerada pela Unesco a sétima maior biblioteca do mundo, sendo atualmente a maior da América Latina. Fundada em 1810 como Real Biblioteca, só foi aberta ao público em 1814, passando a se chamar Biblioteca Imperial e Pública da Corte e, desde 1876, Biblioteca Nacional. O núcleo original de acervo é a antiga livraria de D. José, organizada sob a inspiração de Diogo Barbosa Machado, abade de Santo Adrião de Sever. O objetivo foi substituir a Livraria Real, cuja origem remontava às coleções de livros de D. João I e de seu filho D. Duarte. A livraria, no entanto, foi consumida por um incêndio, em consequência do terremoto que atingiu Lisboa em novembro de 1755. A Real Biblioteca veio para o Brasil durante a transferência da família real e da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, durante a invasão de Portugal pelas forças de Napoleão Bonaparte, em 1808. O acervo trazido para cá, de 60 mil peças, entre livros, manuscritos, mapas, estampas, moedas e medalhas, foi inicialmente acomodado em uma das salas do Hospital do Convento da Ordem Terceira do Carmo, na então Rua Direita, hoje Rua Primeiro de Março. Quando, em 1821, a família real re-
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gressou a Portugal, D. João VI levou de volta grande parte dos manuscritos do acervo. Depois da proclamação da independência, a aquisição da Biblioteca Real pelo Brasil foi regulada mediante a Convenção Adicional ao Tratado de Paz e Amizade celebrado entre o Brasil e Portugal, em agosto de 1825. Da América do Sul para a América do Norte, para a maior biblioteca do mundo, localizada em Washington. A Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos tem hoje uma coleção de mais de 158 milhões de itens, incluindo 36 milhões de livros catalogados e materiais impressos em 460 línguas, além de mais de 69 milhões de manuscritos e a maior coleção de livros raros da América do Norte, incluindo uma das quatro cópias restantes da Bíblia de Gutenberg em papel velino. Estabelecida por um ato do Congresso em 1800, permaneceu no prédio do novo Capitólio até agosto de 1814, quando as tropas britânicas invadiram e atearam fogo ao edifício, queimando e saqueando o conteúdo da então pequena biblioteca. Em menos de um mês, o presidente aposentado Thomas Jefferson ofereceu sua biblioteca pessoal, construída durante 50 anos. Em janeiro de 1815, o Congresso aceitou os mais de seis mil livros de Jefferson. O prédio atual, em estilo renascentista, foi aberto ao público em 1897. NA ERA DA TECNOLOGIA
Não se pode esquecer, porém, que, desde o livro feito de argila, o mundo mudou drasticamente. Hoje, a tecnologia é renovada quase que diariamente e as bibliotecas também passaram por grandes transformações. Entre as consideradas mais modernas do mundo na atualidade está a DOK Library Concept Center, da pequena cidade histórica de Delft, que fica a trinta minutos de trem de Amsterdã, na Holanda, cuja missão é exatamente ser a mais moderna biblioteca do mundo. Por isso, a DOK apresenta muito mais que livros: traz a mais moderna tecnologia do mercado. Está dividida em três seções: DOK Art, DOK Music & Films e DOK Library. A seção das artes abriga obras de artistas locais e permite o aluguel dos itens do acervo por temporada, além de apresentar informações sobre artistas e o mundo das artes e ser, também, espaço para a exposições. A DOK Music & Films possui extensa coleção de CDs e DVDs, os quais podem ser levados para casa, e livros sobre música. A biblioteca objetiva ser um ponto de encontro, um espaço para um café, para reuniões de negócios e até para serem realizadas festas infantis de aniversário. Para as crianças, além de audiolivros, são oferecidos vários jogos digitais, que podem ser jogados no próprio local.
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Biblioteca considerada uma das mais modernas do mundo fica em Delft, na Holanda.
A Bishan Community Library, em Singapura, foi inaugurada em 2006 e é a mais nova integrante do National Library Board. Foi concebida no final dos anos 1990 e custou US$ 10 milhões. Sua arquitetura moderna foi agraciada com diversos prêmios. Para aguçar o sentido das crianças e encantar adultos, é invocada a metáfora de uma casa na árvore, com áreas individuais projetadas para fora na fachada principal do edifício, criando espaços mais privados, com acesso a internet. A Biblioteca Municipal de Sttutgart, no sul da Alemanha, inaugurada em 2011, também é tida como uma das mais tecnológicas do mundo e tem como outro ponto forte a sua arquitetura, concebida pelo coreano radicado na Alemanha Eun Young Yi. Sua forma é a de um grande cubo, em apenas duas cores, tanto interna quanto externamente: azul e branco. São nove andares e um porão, todos minimalistas, claros, limpos, dando destaque total aos livros, os protagonistas. O espaço ainda conta com um café e uma seção especial para as crianças, onde os livros são expostos em caixas, facilitando o acesso e criando um contato lúdico.
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CONTRA A VIOLÊNCIA, BIBLIOTECAS
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Na Colômbia, uma experiência inovadora implantada em áreas de risco, de alta violência e tráfico de drogas são as bibliotecas parque, que compõem a Rede de Bibliotecas de Medellín, um conjunto de bibliotecas que se comunicam entre si, dividem recursos, esforços e conhecimento com o objetivo de melhorar as condições educacionais e culturais das comunidades onde estão instaladas. As telecomunicações são um dos principais instrumentos da rede, na qual a infraestrutura tecnológica é essencial. Mais de trinta bibliotecas de Medellín e municípios da província de Antioquia fazem parte do sistema, entre elas as bibliotecas parque, um projeto cujas primeiras unidades foram inauguradas entre 2006 e 2007. Hoje, já são nove desses parques de leitura espalhados pela cidade. O quarto a ser construído, e um dos mais famosos, em virtude de sua arquitetura, é a Biblioteca Parque Espanha, que fica no bairro Santo Domingo Savio. Aliás, a arquitetura, os espaços amplos e agradáveis, interligados com a área externa, são alguns dos destaques do projeto.
Biblioteca Parque Tomás Carrasquilla, em Medellín.
A ideia deu tão certo que veio parar no Brasil, onde a primeira biblioteca parque foi inaugurada em Manguinhos, no Rio de Janeiro, em 2010. O espaço atende 16 comunidades da Zona Norte do Rio de Janeiro, cuja população soma, aproxi-
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madamente, 100 mil habitantes. Também já foram implantadas as bibliotecas de Niterói (2011), da Rocinha (2012) e a Biblioteca Parque Estadual (BPE), no centro da cidade, onde funciona a matriz da rede de Bibliotecas Parque do Governo do Rio de Janeiro. A BPE é uma instituição inaugurada em 1873, mas foi toda reestruturada e reaberta em março deste ano. A próxima será a do Alemão, com expectativas de funcionamento ainda para este ano. INTERMINÁVEL LABIRINTO
Tantas outras bibliotecas poderiam ser citadas, a começar pelo Real Gabinete Português de Leitura, que fica na rua Luís de Camões, no centro do Rio Janeiro, o qual possui mais de 300 mil volumes. Tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural, foi fundado em 1837 por um grupo de 43 imigrantes portugueses com o objetivo de promover a cultura entre a comunidade portuguesa na então capital do Império. O edifício da atual sede, projetado pelo arquiteto português Rafael da Silva e Castro, foi erguido entre 1880 e 1887 e tem estilo neomanuelino, que evoca as tendências gótico-renascentistas vigentes à época. Ou a biblioteca da Assembleia Nacional do Palácio de Bourbon, em Paris, a qual possui raridades como as minutas do processo de Joana d’Arc e os manuscritos originais de Rousseau; a Rijksmuseum Research Library, do Museu Nacional de Arte de Amsterdã, fundado em 1800, com a maior coleção de história da arte da Holanda; e a Beinecke Rare Book & Manuscript Library, da Universidade de Yale, em Connecticut, nos Estados Unidos, o maior prédio do mundo dedicado à manutenção de documentos raros e manuscritos. Já a Biblioteca de São Petersburgo, conhecida também como Biblioteca Nacional da Rússia, é estatal e congrega mais de 17 milhões de volumes de livros e coleções, 450 mil manuscritos e 600 mil jornais. E a Biblioteca de Lênin, em Moscou, também chamada de Biblioteca do Estado Russo, possui uma coleção única de documentos nacionais e estrangeiros em mais de 367 línguas, mais de 45,5 milhões de volumes, incluindo mapas especializados em montagem, partituras, gravações de som, livros raros, dissertações, jornais e outras publicações. Difícil sair dessa biblioteca de babel, desse “Universo, com seu elegante provimento de prateleiras, de tomos enigmáticos, de infatigáveis escadas para o viajante”, mas é necessário ao menos tentar, ou, então, entrega-se de vez a alma.
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A GRAÇA DE DARIO FO Autor de um teatro tão crítico quanto popular, o Nobel de literatura italiano retrata as contradições e injustiças da humanidade.
53 Fazendo coro a escritores, jornalistas e, quem sabe, até mesmo o papa, em 7 de dezembro de 1997 um italiano alto e de cabelos brancos se dirigia indignado ao comitê do Prêmio Nobel de Literatura: “Pazziàmme?”. Era ninguém menos que o próprio laureado a indagar, com um sorriso maroto, se a academia sueca havia perdido o juízo ao premiar um bufão, desencadeando uma crise no Vaticano e levando à escassez de calmantes na Itália. Mais do que um discurso, Dario Fo encenava ali sua própria vida e obra. Desde os primeiros monólogos, escritos nos anos 1950, às suas peças mais famosas – como Mistero Buffo (1969), Morte acidental de um anarquista (1970) e Não se paga! Não se paga! (1974) –, a premissa do ator e dramaturgo nascido em San Giano, ao norte da Itália, tem sido questionar instituições, autoridades e hábitos da sociedade – sempre com humor. “A arte que não fala de seu próprio tempo”, já afirmou Fo, “não tem relevância”. Sob essa perspectiva, sua obra é extremamente relevante. Vladimir Putin, igreja católica, aquecimento global, o rei Carlos XVI Gustavo da Suécia – nada nem ninguém parece escapar da sua sátira. “Ele alcança a universalidade do cômico e do crítico que não fica no rasteiro dos clichês políticos”, analisa Luiz Fernando Ramos. Para o professor-associado do departamento de Artes Cênicas da USP, trata-se de uma crítica social a um só tempo inteligente e popular, “com forte penetração nas questões universais, no ridículo do ser humano”. Ilustração de Claudius para o livro Mistero Buffo, da SESI-SP Editora.
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Não são todos, no entanto, que apreciam essa arte. Ao levar temas polêmicos ao palco e “incitar” a plateia à reflexão, Dario Fo se consagrou também como um dos autores mais controversos de sua geração, tornando-se alvo de censuras e ataques da direita e da esquerda – um aliado político do ex-premiê italiano Silvio Berlusconi o processou por difamação (e perdeu a causa); até 1984, o Departamento de Segurança dos EUA continuamente lhe negou visto de entrada ao país. Mas essa é uma via de mão-dupla, e tamanha reação ajuda a construir o mito: suas peças foram vistas por milhões de pessoas ao redor do mundo e a imprensa adora repercutir sua opinião sobre absolutamente tudo – da política milanesa à imigração, da reencarnação à arte do chinês Ai Weiwei. Dario Fo, aos 88 anos, incomoda muita gente. JOGRAL CONTEMPORÂNEO
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É preciso voltar no tempo para encontrar as origens de sua obra, composta por mais de 70 criações, entre monólogos, comédias, óperas e romances. Mais precisamente, a Idade Média, quando jograis narravam os fatos da hora em praças e feiras, abusando do grotesco e da hipérbole para satirizar os poderosos da vez. “Eles eram o jornal falado do povo, que era basicamente iletrado”, explica Fo em uma apresentação. Ignorada pela História, essa tradição permeou a infância do autor na voz de pescadores, vendedores ambulantes e seu próprio avô – todos grandes contadores de histórias. Já em Milão, no cenário do pós-guerra, Fo abandonava o curso de arquitetura na Politécnica da cidade, aproximando-se cada vez mais dos palcos e da militância política. “Naquela época eu trabalhava para um arquiteto e descobri toda a sujeira que me cercava – roubos, desonestidade, falta de ética”, lembra o autor em uma entrevista. Não demorou para que esse espectador assíduo começasse a esboçar seus primeiros textos e encenações no teatro de revista, voltando-se ainda para a leitura de Marx, Brecht e Maiakóvski. Mas tão importante quanto esses autores foi conhecer a bela (ao nível das musas de Marcello Mastroianni) atriz Franca Rame (1929-2013), sua grande companheira na vida e na arte. Juntos, em 1957, eles fundaram a companhia Fo-Rame, que desde então se colocou em defesa dos humildes e dos oprimidos, apresentando-se em teatros de todos os tamanhos, bem como igrejas, fábricas e praças. Suas peças, aliás, não raro eram interrompidas pela polícia ou por protestos: Os arcanjos não jogam pinball (1959), por exemplo, teve 192 encena-
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ções na Itália, com uma média de 500 espectadores por noite – e 192 denúncias por não ter cumprido os cortes da censura. A proposta política do italiano não seguiu, no entanto, o viés de um Brecht ou Maiakóvski. Isso porque Fo, ele mesmo seu principal ator – e cenógrafo, figurinista, diretor –, ambiciona um teatro popular, que fale ao homem comum em seus próprios termos. “Eu aprendi a me libertar da escrita literária convencional e a me expressar com palavras simples, sons incomuns e diferentes técnicas de ritmo e respiração”, diz o autor. No palco, isso se converte no uso de dialetos (sicilianos, milaneses, lombardos...), do gramelot (fala onomatopaica com referências em diversas línguas) e do baixo-cômico. “Fo é mais brincalhão, seu engajamento não é radical”, compara Aurora Bernardini, especialista em literatura italiana e russa. “Ele sabe captar o engraçado e o grotesco de cada situação, e a partir daí denunciar os males da política.”
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É esse jogral contemporâneo, como Bernardini o define, que encontramos nas sátiras de Mistero Buffo, no prelo pela SESI-SP Editora. Considerada uma de suas principais obras, Mistero se baseia nos evangelhos apócrifos e em contos da Idade Média para questionar a relação do homem com a religião e suas contradições: “A ressurreição de Lázaro” é vista pela ótica popular como o “espetáculo do século”, com direito a vendedores ambulantes e apostas entre a plateia que aguarda o evento; na “Moralidade do cego e do paralítico”, as personagens refutam o poder de cura de Cristo, pois não pretendem trabalhar para ganhar a vida; e em “O milagre das bodas de Canã”, Jesus transforma água em vinho e convida os presentes a simplesmente serem felizes, sugerindo que o paraíso é aqui e agora. “Nunca é um discurso que larga dogmas”, afirma a diretora Neyde Veneziano, tradutora das cinco peças selecionadas para esta edição. “Fo mostra isso na ação, armando situações para colocar ideias políticas que não são partidárias, mas no sentido de combater injustiças sociais.” Para Veneziano, que no início dos anos 2000 passou uma temporada na Itália pesquisando a produção do autor, sua força está no uso do passado como metáfora para o presente: “É uma obra universal, que fala não de um excluído na Itália, mas em qualquer situação e época”. ATOR EM MOVIMENTO
Apesar de existirem versões oficiais, que guiam as traduções e montagens, as peças de Dario Fo não possuem um texto rígido, muito menos definitivo. Cada apresentação é única: conforme o país em questão e os acontecimentos da hora, ele insinua novos paralelos contemporâneos, e de suas improvisações resultam adições e subtrações aos roteiros originais. “Sobre Il teatro di Dario Fo, um livro imenso que era para ser sua obra completa e definitiva, Franca me disse: ‘Eles nunca poderão afirmar que esse é o teatro de Dario Fo, porque ele está sempre mudando’”, recorda Veneziano. Também é desafiador fazer uma montagem à altura do ator Dario Fo – talvez seu melhor intérprete –, já que frequentemente suas peças não usam cenário, figurino ou iluminação elaborados, sendo o ator o único recurso para representar monólogos que não raro têm mais de uma dezena de personagens. “O que fala é o corpo, a gestualidade. O ator tem que ser muito preciso”, avalia a diretora. Vestido com uma camisa preta de gola rolê e jeans escuros, Fo emprega a mímica para passar de uma personagem a outra e dar sentido a palavras
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que nem sempre são compreensíveis – e não precisam ser: “Sua força corporal é tão grande que todo mundo entende”, afirma Neyde, que encenou as sátiras de Mistero Buffo junto ao grupo La mínima. O ator Júlio Adrião vive essa experiência há nove anos, desde que estreou A descoberta das Américas. Escrita por Fo no início dos anos 1990, a partir de uma pesquisa sobre Cabeza de Vaca (cronista espanhol que viajou com Cristóvão Colombo), a peça é contada ao espírito dos jograis, pela perspectiva de quem vivenciou a história. “Como Fo era o autor e possui um vasto repertório de histórias, ele ia contando, abrindo parênteses e contando mais. Esse vai e volta, sem recursos cênicos, é o que mais me fascinou”, diz Adrião sobre a representação do ator-autor. Após traduzirem A descoberta, ele e a diretora Alessandra Vannucci partiram para a apropriação da história em seu próprio tempo e cultura. No entanto, por mais que procurassem conferir à adaptação uma linguagem fluida, deparavam com um texto que ainda não era bom de ser falado. O ator decidiu então fazer como o próprio Fo – contar a história: “Eu fui ganhando propriedade, uma qualidade específica minha de autor da contação”, lembra Adrião, que acrescentou referências, vocabulário e expressão física próprios. Sua interpretação de Johan Padan – trocadilho que em bom português equivale a “Zé da Roça” – lhe rendeu o prêmio Shell de melhor ator.
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FO PARA PRESIDENTE
Foi, sobretudo, por intermédio do palco que a obra de Dario Fo, escassa no mercado editorial nacional – antes de Mistero Buffo, somente Morte acidental de um anarquista e outras peças subversivas havia sido publicado, em 1986, pela Brasiliense, com tradução de Maria Betânia Amoroso –, chegou ao Brasil: além do próprio dramaturgo, que trouxe Mistero ao país em 1989, Sérgio Britto, Antônio Abujamra, Denise Stoklos, Marília Pêra, Antonio Fagundes e Roberto Vignati estão entre os diretores e atores que também encenaram suas peças. Se elas não provocaram revolta como na Argentina, onde as apresentações de Mistero foram marcadas por protestos, ou na Itália, quando a transmissão da peça no formato de minissérie levou o Vaticano a execrá-la como o programa mais blasfemo na história da televisão, por aqui as adaptações dividiram a crítica: o trabalho de Abujamra com Morte acidental fez enorme sucesso como paralelo à ditadura militar, e a atuação de Fagundes até hoje é lembrada, ao passo que outras montagens foram consideradas datadas.
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Ainda que aspectos da luta de classes, do feminismo ou da relação entre os trabalhadores e os donos dos meios de produção soem pouco contemporâneos, pedindo atualizações, Aurora Bernardini minimiza seu prejuízo para o conjunto da obra. “Fo passou por várias etapas, e cada uma teve sentido na época em questão”, pondera a professora da USP, lembrando que, apesar do engajamento marxista, o dramaturgo soube satirizar diversos aspectos da política – inclusive o Partido Comunista italiano – e rever posicionamentos da juventude ao longo da carreira. “O importante é que ele tenha introduzido essa crítica aos atos políticos e aos políticos. Isso é extremamente atual”, diz Bernardini. Recentemente, o dramaturgo protagonizou uma cena curiosa na televisão italiana, quando a apresentadora de um programa de entretenimento o convidou para se juntar ao cantor pop Mika. Enquanto o inglês se virava no italiano, o dramaturgo, sem se preocupar com a letra da música, arriscava no canto à la gramelot. O resultado foi estranho, um pouco descompassado, mas os artistas se divertiram – e o público também. O momento que nos interessa, no entanto, vem logo a seguir, quando Mika observa em Fo “um dos maiores símbolos da liberdade – não só em sua obra, mas em sua própria vida”. Nos anos 1990, o autor reconheceu que seu teatro estava mais calmo, ainda que longe do conformismo. Para Neyde Veneziano, trata-se de uma mudança de foco: “Antes ele era um cômico em revolta”, diz a diretora. “Hoje, seu texto é de amor, um abraço coral.” Mesmo que seja uma celebridade capaz de entreter a plateia, e que sua crítica não soe subversiva nem gere represálias como antigamente – a mais triste delas o estupro de Franca Rame, em 1973, que posteriormente seria tematizado pela atriz em monólogos sobre os direitos da mulher –, seu humor não se rendeu ao riso fácil: para o italiano, a boa comédia deve conhecer a tragédia, saber o que pobreza, desespero e injustiça significam, para contar sua história. “A comicidade é um instrumento inteligentíssimo de quebra de barreiras. Serve para você refletir sobre o que e por que está rindo”, afirma Júlio Adrião, lembrando que a função do teatro é “fazer as pessoas se divertirem, mas também pensarem”. Dentro e fora dos palcos, Dario Fo uniu a reflexão ao riso popularesco e resgatou as tradições culturais e artísticas italianas no teatro moderno, chegando a empregar suas convicções em uma breve carreira política no ano de 2006. Nas eleições primárias para se candidatar à prefeitura de Milão, Fo obteve apenas 23,4% dos votos. Quem sabe os milaneses tenham preferido mantê-lo do outro lado do jogo, naquela que é sua melhor campanha.
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Imagem do livro Metodologia SESI-SP Paradesporto, da SESI-SP Editora.
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uando o paradesporto começou a ser tratado prosaicamente como “esporte adaptado”, em meados da década de 1940, propagar a prática sistêmica de modalidades físicas por parte das pessoas com deficiência, sem que se caísse num emaranhado de tabus e preconceitos, era por vezes uma tarefa inglória. Pensar em alto rendimento então não passava de uma quimera e, quando muito, os estímulos a quem tinha limitações físicas estavam ligados às formas terapêuticas da prática esportiva e aos programas de reabilitação, algo que mitigasse os sofrimentos com algum tipo de lazer e a busca por uma vida melhor, cuidando do corpo e da mente. Porém, com o forte crescimento do número de praticantes no pós-guerra e os vigorosos avanços científicos, a linha entre o esporte como tratamento e a busca por performance foi rompida poucos anos depois, impulsionada pela valorização social do cidadão com deficiência e da conscientização internacional quanto a um conceito tão simples quanto revolucionário, embutido em uma palavra mágica: inclusão. Competir era possível, como ficou comprovado nos pioneiros Jogos Internacionais de Stoke Mandeville, a cidade britânica que abrigava o Centro Nacional de Traumatismos do Reino Unido, onde estudos inovadores estimularam a organização de disputas das primeiras provas de arco e flecha destinadas a paraplégicos. Realizados a partir de então regularmente, ano após ano, os Jogos de Stoke receberam adesões de várias nações e se transformaram na gênese da Paraolimpíada, introduzida oficialmente em Roma/1960, como uma disputa paralela à Olimpíada, contando nesta experiência inicial apenas com atletas paraplégicos, como aconteceria também nas três edições seguintes (em Tóquio/1964, Tel Aviv/1968 e Heidelberg/1972, na Alemanha). Razões econômicas ou de falta de infraestrutura logística impediram que o México e Munique, em 1968 e 1972, realizassem as disputas paralímpicas nas mesmas dependências das Olimpíadas. Em 1976, Toronto promoveu os Jogos pouco depois da Olimpíada de Montreal, então com a participação de paraplégicos, amputados e deficientes visuais e já com 40 países inscritos. A trajetória dos recordes esportivos conquistados por atletas deficientes, o interesse crescente do público e o apoio das entidades governamentais em praticamente todos os continentes acompanharam os avanços sociais nas questões de acessibilidade e inserção das pessoas com deficiências físicas, uma blitz mundial pela conquista de direitos que teve um salto institucional definitivo com a Declaração de Salamanca, em 1994. Essa resolução da ONU, voltada para as práticas educativas mas com efeitos amplos que contemplavam a inclusão e integração dos deficientes nos demais segmentos, na verdade teve ori-
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gem nos grandes movimentos internacionais pelos direitos básicos do homem, no bojo das inúmeras transformações geopolíticas, tecnológicas e socioeconômicas que marcaram a última década do século passado. A partir de Seul/1988, Olimpíadas e Paraolimpíadas passaram obrigatoriamente a ter a mesma sede de disputa, decisão reforçada pela criação, em 1989, do Comitê Paraolímpico Internacional, com sede em Bonn, Alemanha, portanto, já desvinculado do COI – Comitê Olímpico Internacional. A partir de então, atletas com outros tipos de deficiência física e mental passaram a fazer parte do grupo de competição, incluindo os que sofriam de paralisia cerebral e outras enfermidades não relacionadas até ali (como algumas síndromes físicas e demais deficiências intelectuais). Se em Roma/1960, 400 atletas de 23 países haviam participado das competições, Seul/1988 recebeu mais de 3 mil atletas de 68 países, cifra que superou todas as expectativas nos Jogos Paralímpicos de Londres/2012, com participação de 4294 atletas de 164 países. Em outra frente, desde 1976 e a cada quatro anos, são disputadas as Paraolimpíadas de Inverno, na primeira edição, em Ornskoldvski (Suécia), apenas para deficientes visuais e amputadas, e hoje também para paraplégicos e pessoas com paralisia cerebral e deficiências intelectuais. O Brasil entrou com vigor no circuito paralímpico internacional, apesar da carência de recursos, na segunda metade da década de 1990, mas um conjunto de fatores fez com que as conquistas começaram a aparecer em menos de dez anos. Atendimento da demanda, mudanças na percepção da sociedade, um massivo sistema de divulgação e o surgimento de ídolos como referências despertaram o interesse de patrocinadores e da mídia. Principalmente, muito do crescimento do país em competições internacionais na última década e meia está vinculado ao salto científico nos métodos de preparação e ao investimento em infraestrutura, o que certamente é corroborado pelos números: de 24 colocados nos Jogos de Sydney/2000, com 104 participantes, o Brasil pulou dez posições em Atenas/2004 (com 168 atletas), chegou ao nono lugar em Pequim/2008 (já com mais de 300 competidores) e fechou a Paraolimpíada de Londres/2012 com o quinto lugar e 21 medalhas de ouro. Portanto, não é um sonho impossível imaginar o país como um top 5 nos jogos que serão disputados no Rio de Janeiro em 2016. Quanto mais ganhava força o binômio inclusão-qualidade de vida, um panorama no qual as práticas esportivas tinham lugar garantido – com o devido respaldo social no contexto brasileiro –, o SESI já estava em campo há muito tempo. Os vínculos do SESI-SP com os programas de natureza social vêm do berço, são resultado de uma longa trajetória de convivência e retroalimenta-
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ção: nem o SESI seria o que é se não estivesse voltado para servir a sociedade em sua procura por qualidade de vida, nem os projetos teriam sucesso não fosse a estrutura em que são montados e desenvolvidos. Quando o assunto, então, é a conexão entre inclusão social e prática esportiva, impulsionada pelas propostas de excelência e alto rendimento, a química torna-se praticamente infalível. É justamente o ponto de partida da publicação Metodologia SESI-SP Paradesporto, lançado pela Editora SESI-SP. CONSTANTE DESENVOLVIMENTO TÉCNICO
A evolução da performance dos atletas paralímpicos em nível mundial não é um fenômeno pontual, e sim resultado de uma conjunção positiva em que se encaixam três parâmetros de qualidade: tecnologia, ciência do esporte e recursos humanos. Sem analisar a fundo essas questões, não teríamos como explicar o fato de um atleta amputado das duas pernas conseguir a proeza de ficar, na prova de 100 metros, pouco mais de um segundo atrás de um velocista com todas as suas capacidades físicas. Tampouco teria justificativa a diferença de preparo e rendimento entre o atleta paralímpico de hoje e aquele que competiu 10 ou 15 anos atrás. O brasileiro Alan Fonteles foi campeão paralímpico em Londres nos 200 metros, categoria T44, com o tempo de 21s45, um segundo mais rápido do que australiano Neil Fuller precisou ser (22s78) para conquistar, 12 anos antes, em Sydney, a medalha de ouro – um ganho de rendimento excepcional para uma prova tão curta, na qual os recordes são conquistados em milésimos de segundo. A sofisticada tecnologia das próteses – hoje capaz de fabricar articulações “inteligentes” para joelhos, ombros e cotovelos –, as inacreditáveis proezas que saem dos laboratórios de biomecânica e os consórcios acadêmicos internacionais que aliam o estudo científico do esporte às técnicas eletrônicas mais avançadas, da robótica à nanotecnologia, explicam muito dessa evolução, mas há em todo o processo uma inegável dose de desenvolvimento na formação de profissionais, tanto para a criação de métodos de treinamento quanto para a competição em si – isto é, uma união entre as vocações esportivas e o talento individual dos atletas e de suas equipes. Ao trabalho de neurologistas, psicólogos, fisioterapeutas e especialistas em áreas como nutrição e biomecânica, soma-se a capacidade de treinadores e de pessoal técnico em geral de detectar potencialidades em atletas que, em geral, mostram suas habilidades em círculos restritos durante a infância e a adolescência, ou por falta de oportunidades ou por descaso com a infraestrutura adequada, fator especialmente delicado para quem tem deficiência física.
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O próprio crescimento do número de modalidades paralímpicas sustenta a argumentação tecnológica. Há hoje, por exemplo, quase duas dezenas de provas destinadas a pessoas com deficiência apenas no Atletismo, com categoria que permite utilização de próteses, de cadeiras de rodas ou o auxílio de guias. São provas de rua, de pista e de campo. O uso de equipamentos e materiais específicos marca outras modalidades, como o Hóquei sobre Trenó e o Esqui Alpino, disputado nas Paralimpíadas de Inverno por amputados, atletas com paralisia cerebral, paraplégicos e atletas com deficiência visual. O Rugby em cadeira de rodas é disputado apenas por quadriplégicos, enquanto as provas de Vela são abertas a amputados, paraplégicos e atletas com paralisia cerebral e deficiência visual. Mas novas práticas estão constantemente em estudo pelos organismos internacionais (Comitê Paralímpico e Federações), o que faz prever que a dinâmica do paradesporto trará por muito tempo constantes novidades às competições de alto rendimento.
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ÊNFASE NOS RECURSOS HUMANOS
A explicação para a escalada técnica do Brasil parte justamente do aperfeiçoamento dos recursos humanos, se for levado em consideração que o país ainda padece de inúmeras desvantagens na questão tecnológica em relação a potências como Estados Unidos, China, Austrália e Grã-Bretanha, os principais vencedores das últimas competições. Nas ações de médio e longo prazo planejadas logo após a Olimpíada de Pequim/2008, as três prioridades do Comitê Paralímpico Brasileiro eram exatamente, e pela ordem, Capacitação de recursos humanos; Interlocução institucional com universidades e meio acadêmico; Registro e produção científica. O intercâmbio com países que se tornaram referência em paradesporto, casos de Austrália e Ucrânia, também passou a fazer parte da pauta, bem como uma mudança de estratégia na captação de recursos, se bem que, neste caso, o surgimento de ídolos, como os nadadores Clodoaldo Silva, André Brasil e Daniel Dias, e expoentes do atletismo paralímpico, como Alan Fonteles e Tito Sena, entre outros, foram determinantes para dar visibilidade a esse segmento. No entanto, a evolução tecnológica no país voltada aos esportes de alto rendimento destinados a pessoas deficientes não pode ser desprezada, em especial se forem analisadas as conquistas dos últimos cinco anos. É certo que os altos custos das pesquisas, como nas demais áreas do conhecimento, são fatores de complicação na produção de equipamentos com alto de grau de precisão e sofisticação. Mas os programas criados em função da definição do Rio de Janeiro como sede olímpica e paralímpica em 2016 começam a provocar uma mudança
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de parâmetros na capacidade brasileira de se alinhar aos projetos internacionais. É o caso das iniciativas impulsionadas pelo Instituto Nacional de Tecnologia (INT) e pela Rede Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento em Tecnologia Assistiva, esta última criada no âmbito do Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – Viver sem Limite. Entre os núcleos que fazem parte da rede está o NH/Resp (Núcleo de Habilitação e Recuperação em Esportes Paralímpicos), com sede em Uberlândia. Ali, entre outras novidades, estão sendo produzidos aparelhos que se adaptam aos atletas, equipamentos mais resistentes de fisioterapia e musculação, cadeiras especiais para jogos em equipe e para o atletismo (arremesso de peso, disco e dardo), além de calhas utilizadas na bocha paralímpica. Vender o sonho de que o país vai se transformar em tão pouco tempo numa potência olímpica e paralímpica não teria sentido, mesmo diante dos investimentos e novos conceitos estabelecidos às vésperas do mais importante evento multiesportivo mundial. Ainda assim, hoje já é possível dizer que o Brasil conhece o “caminho das pedras”, mesmo que não tenha o volume ideal de recursos para destinar aos projetos de referência, especialmente no ambiente paralímpico. As inúmeras iniciativas oficiais, os avanços técnicos e em instalações e os programas com resultados profícuos, entre os quais o projeto em que o SESI-SP está inserido, trazem esperanças consistentes de um futuro mais esportivo e vitorioso – com as devidas consequências sociais. A METODOLOGIA SESI-SP
O papel das equipes do SESI-SP na elaboração desse padrão de excelência nacional tem sido determinante para dar peso à participação brasileira nas competições internacionais. A criação de equipes de modalidades olímpicas voltadas ao alto rendimento, iniciativa do SESI-SP a partir de 2008, abriu o caminho também para o paradesporto, que no ano seguinte via nascer o time de voleibol sentado, na unidade de Suzano. Somaram-se, desde então, o futebol de PC (paralisia cerebral), a fortíssima equipe de bocha paralímpica, a formação de um grupo altamente qualificado de atletismo em Suzano e Santo André, além da equipe de golbol em Mogi das Cruzes. Mas trabalhar com alto rendimento não significa, em nenhum momento, abrir mão da amplitude dos programas de inclusão com seu viés sócio-pedagógico e sua proposta de ressaltar os valores humanos, como salienta Ronaldo Gonçalves de Oliveira no livro Metodologia SESI-SP Paradesporto, da SESI-SP Editora: “Ao participar de um programa de atividade física ou esporte, a pessoa
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com algum tipo de deficiência forçou a sociedade a discutir como ela chegaria até o local da prática, como permaneceria lá e quem iria recebê-la. Fez também com que os profissionais passassem a desenvolver atividades que proporcionassem a socialização com outras pessoas, que não possuíssem deficiência. Isso tudo provocou outras possibilidades sociais que levaram em consideração que, se essa pessoa pode praticar esportes, também pode trabalhar, estudar e constituir família”. Uma vez que contemplar os esportes paralímpicos com estruturas de alto rendimento não é tarefa corriqueira – por demandar uma série de atributos que congregam tecnologia avançada, recursos humanos capacitados e instalações adequadas, com equipamentos de alta precisão –, a metodologia pode fazer a diferença. Para tanto, conhecer a fundo particularidades das deficiências, estabelecer propostas de treinamentos específicos para cada tipo de competidor, identificar as classificações funcionais e apontar as diferenças técnicas com as práticas esportivas regulares compõe um quadro complexo e minucioso das formas de treinamento, questões retratadas com riqueza de detalhes na publicação. Trata-se de uma marca do modelo SESI-SP de método de treinamento, na visão de Alexandre Ribeiro Meyer Pflug, diretor da Divisão de Esporte e Qualidade de Vida do SESI-SP: “O SESI-SP sai na frente das instituições que trabalham com formação esportiva, criando uma metodologia inovadora, utilizando os conhecimentos teóricos e práticos. Nosso trabalho de formação certamente trará mais pessoas com deficiência para a prática esportiva, melhorando sua qualidade de vida e consequentemente revelando talentos”. Para ele, o papel propulsor da instituição no cenário esportivo nacional está consolidado e os novos tempos estão encaminhados: “Toda ação realizada por instituições sérias contribuem para mudar o panorama. A sensibilização já foi alcançada e, com o crescimento da procura em nossas unidades, pouco a pouco ajudaremos a mudar o cenário nacional”.
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O SALTO MORTAL POR BERNARDO AJZENBERG
Estou longe. Não tenho, não quero ter mais nada a ver com aquilo. Com aqueles. Estou só. Quero estar só. Eu sei quando a coisa saiu dos trilhos. Faz tempo. Tanto tempo que só posso culpar a mim mesma pelo que aconteceu, pelo que não aconteceu e, a partir de agora, pelo que irá acontecer. São manchas, vozes – tão conhecidas, tão previsíveis, tão massacrantes, são olhares – tão opressivos, a começar pelo meu próprio, tão triste, no espelho gasto deste pequeno apartamento suburbano.
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O que faço aqui? Por que estou aqui? Engulo em seco. Eu sei por que estou aqui. Há muitos motivos, e o primeiro que me vem à cabeça é este: não suporto mais a mim mesma, não me suporto mais. Estou só. Saio e não conheço ninguém, não cumprimento ninguém. A solidão é este poço aqui, forrado de espelhos, com uma ínfima e renitente luz vinda lá de cima. Uma luminária. Um caleidoscópio.
Foto: Think Stock
Balanceie suas refeições. Entenda a diferença que existe entre os alimentos – a gordura, o cereal, as carnes, as frutas e as fibras. Ele era mestre em nutrição, sem dúvida. E ao mesmo tempo me nutria, não fisicamente, digo, mas filosófica, ideológica, moralmente. Eu tinha quinze, ele vinte e quatro. Vinte e sete, ele trinta e seis. Quando fiz trinta, ele completou cinquenta, talvez cinquenta e dois. Como explicar? Pois eu sei o que aconteceu. Eu sei o motivo, os motivos, daquele salto, e sei, mais ainda, os motivos pelos quais eu não saltei com ele.
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Não saltei com ele porque tive medo. Pavor. Terror. Saiba, ele me dizia, que os povos e etnias de maior longevidade são assim por levarem uma vida muito simples, despojada, uma alimentação também bem simples e uma vida rica em termos espirituais. Ligam-se à natureza e, em geral, vivem em comunidade, compartilhando experiências, ajudando-se uns aos outros. Ele sempre me dizia isso antes de dar o salto. O salto dele foi desastroso, no fim das contas. Mas devo dizer que tão desastrosa quanto, ou mais, foi a minha inércia no momento em que ele, corajosamente, deu aquele salto no escuro. No meu escuro.
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O salto dele foi para dentro do meu escuro, por isso, acredito, tenha sido tão profundo, e tanto tempo tenha ele levado para (talvez) perceber onde estava (até hoje, creio, não percebeu). Entre os meus seios, com certeza, mas isso, saber disso, basta? Não basta. Meu sonho arrancou a pele dele, descascou-o, deixou-o em carne viva dentro de mim. Poderia colocá-lo para fora, vomitá-lo, expeli-lo. Poderia? Como se faz com uma espinha amarelada, com um cravo, com uma pelota de gordura, com um furúnculo, uma farpa... Pessoas que passam dos cem anos de idade, ensinou-me ele, têm como ponto comum a frugalidade das refeições e lanches. Comem pouco, com baixa caloria e de forma saudável e equilibrado em termos nutricionais. Ele me dava aulas nas mesas de bar. Qual a dimensão do meu sonho? Pois ele, não o sonho — sempre foi grandalhão... Como poderia penetrar entre os meus seios? Como conseguiria se mover dentro de mim sem me matar, ainda que respeitosamente? Venha comigo. Vamos tentar responder essas perguntas. Você faz parte delas; e das respostas. Pode acreditar. Vai me ajudar a responder essas perguntas, e é por isso que as dirijo a você. Impiedosamente.
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Venha comigo.
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Perca, querida, dizia ele, esse hábito de comer demais à noite. Priorize as frutas e os legumes. Os antioxidantes naturais têm a capacidade de prevenir o envelhecimento. Você não quer envelhecer como eu, certo, querida? Preserve suas células ao máximo, dizia. Pois ele virou um monstro dentro de mim, entre os meus seios. Poderia estrebuchar, provocar horrores e empunhar bandeiras. Mas isso não o tiraria de dentro de mim, concorda? Por quê? — você pergunta. Pois tento responder da seguinte forma: meus seios eram puro aconchego; foram úteros para ele, tão mais velho e, no entanto, tão mais verde, frágil. Covarde. Mas, quem é você? Você tem seios? Isso talvez não seja muito importante, aqui, mas não posso deixar de perguntar, embora jamais venha a conhecer a resposta. Preciso perguntar isso por uma questão de honestidade, para mostrar que não tenho nada contra você tenha você seios, pinto, vagina, o que for. Você me entende...
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Pois ele fora um jovem brilhante, uma promessa. Estou perto de ser o que se costuma classificar como megera, mas o fosso entre a sensação e a classificação, em mim, é muito profundo, como este poço de paredes espelhadas. Vamos por partes, que é sempre melhor. E assim ele foi. E se foi.
BERNARDO AJZENBERG nasceu e vive em São Paulo. Escritor, tradutor e jornalista, é autor dos romances Minha vida sem banho (2014), Duas novelas (2011), Olhos secos (2009) e Variações Goldman (1998), além do livro de contos Homens com mulheres (2005), todos publicados pela editora Rocco, entre outras obras. É também diretor executivo da editora Cosac Naify.
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PONTO DO NOVO CONTO SE VOCÊ É UM AUTOR ESTREANTE E QUER TER SEU TEXTO PUBLICADO AO LADO DE ESCRITORES JÁ CONSAGRADOS NA SEÇÃO PONTO DO CONTO, MANDE O MATERIAL PARA AVALIAÇÃO PELO E-MAIL: COMUNICACAO_EDITORA@SESISENAISP.ORG.BR. O MATERIAL DEVE CONTER ENTRE 6 E 8 MIL CARACTERES.
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TODOS ESTÃO NESTE “Desculpa. Não tenho nada.” Disse isso e forçou um sorriso amarelo. Seus olhos percorreram todas as minúcias daquele rosto na velocidade de uma troca de cor do semáforo, e ela podia jurar que nunca o vira antes. Na luz ofuscante do meio-dia bem no meio de um dia qualquer, ela desviou o olhar, dobrou a esquina e trocou de sorriso. Não podia ser. Lembro-me ainda de Marcelo. Não, certamente não era ele. Marcelo tinha as mãos mais brancas que eu já havia visto, e com ela escrevia palavras intermináveis em folhas arrancadas de cadernos que deviam servir às matérias do colégio. Marcelo tinha uma paixão. Quanto mais tentava esconder, mais se denunciava. No lugar da Geografia, da Matemática e da Língua Portuguesa, os cadernos de Marcelo tinham história – não aquela com letra maiúscula, mas a história que ele contava todos os dias para aquelas folhas amassadas de arestas mal rasgadas, o garrancho de menino recém-alfabetizado preenchendo de ponta a ponta as linhas azuis de nossa infância. A paixão que Marcelo tinha, todos sabiam, era pela menina mais bonita da classe, ainda que diferissem as opiniões sobre quem ela era, afinal. A professora
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Dalva, complacente, deixava o menino absorto em seus escritos, desde que terminasse a lição, copiasse a matéria do quadro-negro, estivesse em dia com as respostas dos problemas (ao menos, os de Matemática) e nunca botasse os pés sujos de terra em cima da cadeira da frente, como o faziam, sem pudores, Jorginho e Heitor. Diziam que Marcelo era o protegido. Diziam que tinha um segredo. Diziam muitas coisas. Marcelo tinha olhos claros – as pupilas meio rosadas – e os mantinha constantemente arregalados, de modo que pareciam sempre dispostos a renovar a curiosidade pelo mundo. Marcelo tinha olhos iluminados. O que tinha de aceso nos olhos, tinha de apagado no corpo, que mantinha o mais longe quanto fosse possível de rodas de moleques trocando figurinhas. Além das mãos brancas, tinha o corpo todo também branco, de uma brancura que não se vê sempre. Mal ele chegava à escola, e aprofessorajá o cobria de cuidados excessivos. Marcelo, não anda pelo sol. Leva o casaco, Marcelo. Marcelo, as luvas. E havia os remédios, os tubos de pomada, umas listas de restrições esquisitas. Marcelo sempre sorrindo, os dentes amarelados em contraste com a pele muito branca. Não, definitivamente, não era ele. Quando batia o sinal do recreio, o doce som de nossas pequenas alforrias, os moleques todos saíam correndo. Heitor invariavelmente tropeçava porque Jorginho estirava o pé antes de ele passar. E riam. As gêmeas Talita e Tati faziam questão de rumar sentidos opostos para demonstrar personalidade. Mariana, antes de ganhar o pátio com suas risadas altas e graves, tirava o moletom que, todos apostavam, um dia chegaria sozinho à escola. Manoel, o filho do zelador, calçava os sapatos escondido embaixo da mesa, para que nem a professora nem ninguém percebesse sequer que um dia os havia tirado, embora todos sentissem, diariamente, um cheiro indecifrável que habitava impunemente a nossa sala. Já Pedro mirava a lousa com precisão cirúrgica e atirava um aviaozinho de papel, certo de que a algazarra do recreio anunciado garantiria o anonimato de sua infração. E assim a sala esvaziava de gente, de barulhos, de cheiros indecifráveis e de moletons semiemancipados. Esvaziava até mim, mas não esvaziava de Marcelo. Ele ficava sentado à mesa, na companhia de seus cadernos e lápis, mudando apenas de posição, que ganhava, na ausência dos meninos, um jeito de importância. Marcelo tinha medo de parecer importante no meio dos outros, e por isso o víamos sempre afundado em seu lugar, revelado apenas pela chamada oral e pelos risos abafados que deixava escapar quando a professora Dalva fazia alguma piada que mencionasse, não necessariamente nessa ordem, animais falantes, portugueses, bigodes. Que bobagem, não era o Marcelo.
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N OVO CONTO
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Ele tinha uns jeitos esquisitos de se fazer presente. Mais do que isso: ele tinha um jeito diferente de se fazer notar – pra mim. Os outros meninos cochichavam constantemente coisas no meu ouvido. Uns mexiam no meu cabelo e desfaziam meu penteado meticulosamente articulado – coisa que eu odiava por motivo de: orelha de abano. Outros me mandavam bilhetes – que eu nunca entendia por motivo de: garrancho. Marcelo só me sorria e lotava folhas e folhas do caderno. E sorria de novo. Era sempre sorridente comigo, ainda que de longe, do seu jeito. Alternava episódios de isolamento extremo com a única forma de ternura que ele sabia ser. Ele se isolava de todo mundo, mas de mim não. Às vezes, dava até para fingir que era eu a menina mais bonita da sala. Digo: quando ele me olhava. Eu me lembro ainda. Eu não esqueceria Marcelo. Não, não podia ser ele. Um dia, lembro como se fosse agora mesmo, a professora chamou Marcelo num canto, no meio de uma prova de Ciências. Disse algumas palavras e esperou a resposta do menino, como se quisesse que a informação percorresse cada poro e saísse em forma entendimento limpo e puro. Mas Marcelo se calou e voltou à sua cadeira meio cambaleante, como se tateasse no escuro, e se sentou, ainda mais isolado em si do que antes. Mais tarde, fomos saber que a notícia cochichada pela professora era de que a mãe de Marcelo o esperava do lado de fora da escola para levá-lo para casa. Mais tarde ainda, fomos saber que a mãe viera buscá-lo mais cedo porque, naquela tarde, o pai fora embora de casa. Pouco ficamos sabendo além disso. E isso não era muito: que Marcelo tinha um pai que fora embora, uma mãe que passou a ser só confusão depois do abandono e que sua família era a mistura de três coisas que não deveriam viver sob o mesmo teto: a sombra do pai que já não estava, a presença da mãe que estava, embora já não estivesse, e Marcelo, o saldo inevitável dos dois elementos anteriores. Diziam que a mãe era negra. Que o pai era negro também. Diziam que a mãe vivia chorando, quando chegava no portão da escola. Que o pai já ameaçava ir embora há muito tempo. Diziam que o pai e a mãe brigavam, que houve um dia uma discussão barulhenta, choro, grito; que o pai acusou a mãe de traição. Diziam muita coisa. Contávamos pouco mais de oito anos quando os meninos se ocupavam apenas de criar armadilhas para o tropeço alheio ou esconder os pés debaixo da carteira. Era fácil se perder na banalidade de ser criança. O mundo era todo feito para ser descoberto por nossos olhos curiosos, e tudo era notícia. Dona Fátima ganhou bebê depois de velha. Seu Nélio, da banca de jornal, trocou de mulher. Atílio Gama, o menino mais rico da escola, foi despachado pra Suíça porque o pai se cansou dele. Não bastasse tudo isso, ainda havia todos aqueles que não conhecíamos e
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que poderiam esconder segredos de que adoraríamos ser os guardiões. Lembro-me ainda de Marcelo e eu, atravessando a rua, os olhos tentando eleger o melhor canto para mirar; viver era apenas moldar os dias de acordo com nossos passatempos desimportantes. A eterna novidade do mundo se descortinava aos nossos sentidos no tempo exato do medo de que um dia deixasse de ser assim. E um dia deixou. Eu nunca mais vi Marcelo. Diziam que a mãe se mudou para a cidade grande, que queria tentar a vida. Vieram as férias, um novo verão, um Ano-Novo, uma nova escola. Pelo bairro, diziam que já não se ouvia uma palavra sobre os dois. Diziam que a cidade já os esquecera, e de todas as brigas, das discussões, do menino sendo levado pela mão urgente da mãe, dos braços brancos entrelaçados com violência aos braços negros dessa mãe que também era pai. Diziam muita coisa. Mas eu me lembro ainda de Marcelo. Não, não, não era ele. Com o espírito já sossegado pela certeza, ela continuou guiando seu carro pelo asfalto quase derretido de sol naquele meio-dia de um dia qualquer. Convenceu-se a voltar, só para dar cabo nos fiapos de dúvida que ainda enchiam de nebulosidade o seu dia claro, mas sabia: não era ele. Os faróis mais lentos do que nunca, posicionando-se vermelhos, um a um, como guardas que impedem a chegada de intrusos a um lugar de acesso proibido. Ela sentia cada poro prestes a deixar escapar uma gota de suor. Tamborila com as unhas compridas a borracha quente do volante, e esbarra quase sem querer na buzina. Uma rua longa, três viadutos, duas rotatórias. E finalmente a ruela estreita, agora ainda mais tomada pelo cheiro de lixo. Bobagem, não era Marcelo, pensou ela, enquanto dobrava a esquina de volta, ainda em tempo de cruzar o olhar com uns olhos rosados em um rosto branco, estranhamente familiar. Mas já não eram os mesmos olhos, já não era a mesma disposição a renovar curiosidades. Faltava-lhe a eterna novidade do mundo: um estranho. “Não, não tenho nada.” Aliviada, desceu o vidro do carro e seguiu, lembrando uns versos de Paul Éluard: “Há muitos mundos, mas todos estão neste”.
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RENATA PENZANI tem 26 anos, é jornalista formada pela Universidade Estadual Paulista e, apesar de trabalhar como repórter e assessora de imprensa, escreve ficção sempre que bate uma certeza de que a ficção existe pra gente não morrer de realidade. Seus trabalhos estão em www.renatapenzani.com e www.furtacores.tumblr.com
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NOVOS CAMINHOS DA LEITURA POR ARNALDO NISKIER DA ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS E VICE-PRESIDENTE DO CIEE NACIONAL
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Ilustração: Think Stock
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s recursos tecnológicos hoje disponíveis facultam, com um mínimo de conhecimento técnico, a intervenção do leitor diretamente nos textos. Hipertextos transferem parte do poder do escritor para o leitor pela possibilidade e habilidade que este último passa a ter de escolher livremente seus trajetos de leitura. Assim, ele elabora o que poderíamos denominar “metatexto”, anotando seus escritos junto a escritos de outros autores e estabelecendo links (nexos ou interconexões) entre documentos de diferentes autores, de forma a relacioná-los e acessá-los rapidamente. A comunicação tornou-se rápida e concisa, transformando a escrita. A fragmentação, certamente, não iniciou com a internet, mas era muito mais controlada. O texto encolhe cada vez mais, perdendo o aprofundamento. Temos hoje os miniblogs e, através do Twitter, instalou-se a twiteratura, onde as ideias têm que ser expressas com, no máximo, 140 caracteres. Para alguns autores, este novo mundo é “emburrecedor”. Quando não se estimulam algumas habilidades cognitivas, elas se perdem. Se a distração for constante, o pensamento não é o mesmo de quem tem o hábito de prestar atenção. Há pesquisas que demonstram a adaptação dos circuitos cerebrais. Os usuários da internet costumam receber tudo pronto. O jornalista Gilberto Dimenstein, em sua coluna na Folha de S. Paulo, citou uma pesquisa da Universidade de Stanford, sobre a realização de muitas tarefas ao mesmo tempo, o que tornaria o cérebro menos condicionado e menos funcional. Esse distúrbio é chamado de “cérebro-pipoca”, que dificulta o foco no que é realmente importante, trazendo dificuldades de diferenciar o valor das informações. Por outro lado, as experiências com hipertexto estreitam a distância que separa documentos individuais no mundo da impressão. Por reduzirem a autonomia do texto, reduzem também a autonomia do autor. O leitor torna-se um construtor de significados ativo, independente e autônomo. O leitor virtual tem diante de si o poder dos dígitos, que transformam qualquer informação numa linguagem universal. Multimídia é a nova linguagem, e o leitor navega na tela programando sua leitura, escolhendo textos, sons e imagens fixas ou em movimento. O acesso depende, apenas, dos interesses de quem navega. Tal como o cérebro humano, o hipertexto não possui uma estrutura hierárquica e linear. Sua característica é a capilaridade, ou melhor, uma forma de organização em rede. Ao acessarmos um ponto determinado de um hipertexto, consequentemente, outros que estão interligados também são acessados, no grau de interatividade de que necessitamos.
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L ETRA
AO PÉ DA
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INSTIGAÇÃO
Informativo do SESI-SP e SENAI-SP SUP/DR - número 04 - setembro de 2014
Por Deisi Deffune e Nacim Walter Chieco
ANALISAR O TRABALHO Alguns pontos para pensar
Análise ocupacional, análise do trabalho, análise do ofício, análise funcional e tantas outras mais são expressões para dizer a mesma coisa no que diz respeito ao estudo do trabalho para fins de formação pro78fissional. São técnicas de descrição do trabalho. O nome mais genérico é análise ocupacional, expressão guarda-chuva para essas técnicas. Em inglês, o nome genérico é job analysis. Em francês, é analyse de metier et d’emploi. No Senai, a análise ocupacional “convencional” foi aplicada até a década de 90, a partir das ideias de Della Vos, Allen, Selvidge, Fryklund, Luiz Gonzaga Ferreira, João Baptista Salles da Silva e Alcides Alcântara, entre outros. Era mais completa em relação às técnicas descritivas utilizadas atualmente, porém mais demorada e custosa porque requeria pesquisa de campo nos locais de trabalho de diversas empresas. A título de exemplo, uma dos estudos feitos pela divisão de pesquisas do Senai de São Paulo abrangeu 239 estabelecimentos industriais da área de química. Em casos como esse, a pesquisa caracteriza a empre-
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sa empregadora, identifica os trabalhadores (quantos são empregados, idade, sexo, escolaridade etc.), detalha tarefa, operação, conhecimentos, habilidades, atitudes, nível de desempenho, além dos equipamentos, processos e materiais empregados. Pode incluir história de vida profissional de uma amostra de trabalhadores e análise ergonômica de algumas situações de trabalho. A pesquisa de campo é antecedida por desenvolvimento e testes de instrumentos de coleta de dados e é sucedida por um período de sistematização de dados e elaboração de relatório de análise. A análise ocupacional “convencional” pode ser combinada com as técnicas de grupos fo-
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cais para validar a síntese dos conhecimentos, habilidades, atitudes e desempenhos elaborados na etapa de sistematização dos dados. Isto era praticado no Senai. Historicamente, a análise funcional deriva da ocupacional. Se a ênfase é no desempenho ou no conteúdo, é uma questão de definição, assim como é a definição de unidade de análise – posto, área, coletivo de trabalho, entre outras. A análise funcional do trabalho foi desenvolvida por Sidney Fine nos anos 40 do século passado, como método de descrição do Dictionary of Occupational Titles – DOT, instrumento que antecedeu e no qual se baseou a primeira Classificação Internacional Uniforme de Ocupações (CIUO), logo após a II Guerra Mundial. Fine orienta a descrição das funções e das tarefas perguntando ao trabalhador como ele se relaciona com dados (informação), pessoas (trabalhadores) e coisas (máquinas, ferramentas). Originalmente ela foi desenvolvida tanto para ser aplicada em pesquisa de campo ou por meio de grupo de especialistas – os chamados grupos focais.
atualmente em uso no Senai, Zop, Delphi e tantos outros mais. Outro detalhe: o Dacum analisa a ocupação ou a função, tendo nascido como uma síntese ou simplificação da análise funcional aplicada em pesquisa de campo. Por ser uma síntese, não quer dizer que seja pior. Como Da Vinci bem disse, a simplicidade é o mais alto grau de sofisticação. Para concluir, pode-se afirmar que não há método que seja panaceia. E o pior dos mundos para uma instituição de formação profissional é condenar seus especialistas a uma única ferramenta de análise do trabalho.
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Para a organização de grupos focais ou de especialistas (The Small Meeting Experts) com o intuito de descrever o trabalho, pode-se recorrer a diferentes técnicas – Dacum, Comitês Técnicos Setoriais
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EVENTOS DAS EDITORAS SESI-SP E SENAI-SP
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EV EN ES TO DI TO RA
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ANTÔNIO A. DE MITRY LIVRARIA SARAIVA (SP)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
DIÁLOGO COM CARTAS OI FUTURO DO FLAMENGO (RJ)
A LAGARTA CAOLHA LIVRARIA NOVESETE (SP)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
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BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
CLAUDIUS LIVRARIA DAS MARÉS (RJ)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
BIENAL DO LIVRO 2014 PAVILHÃO DE EXPOSIÇÕES DO ANHEMBI (SP)
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CARDÁPIO
CENTRO CULTURAL FIESP – RUTH CARDOSO* AVENIDA PAULISTA, 1313 SÃO PAULO SP TEATRO HOMEM DE LA MANCHA ATÉ 21/12/2014
Miguel Falabella, que adaptou e dirige esta versão, oferece uma encenação original e surpreendente, 42 anos após a primeira temporada brasileira de “O Homem de La Mancha”, dirigida por Flávio Rangel em 1972. Com texto original de Dale Wasserman, músicas de Mitch Leigh e letras de Joe Darion, tem produção do Atelier de Cultura. TUDO O MAIS PERMANECE O MESMO | E ELES ERAM ELES MESMOS? DE 8/10/2014 A 14/12/2014
Com textos de Teresa Borges e Vinícius Garcia Pires, a peça tem direção de Francisco Medeiros.
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EXPOSIÇÃO FILE − FESTIVAL INTERNACIONAL DE LINGUAGEM ELETRÔNICA ATÉ 5/10/2014
Realizado anualmente pelo SESI-SP, trata-se do maior encontro brasileiro de arte digital. Entre as atrações estão animações, instalações interativas, aplicativos para tablets, games, performances, workshops e mesas-redondas com convidados internacionais.
NÚCLEO DE DRAMATURGIA SESI-BRITISH COUNCIL 6º CICLO DO NÚCLEO DE DRAMATURGIA SESI-BRITISH COUNCIL: WORKSHOPS, BATE-PAPOS E LEITURA DRAMÁTICA ATÉ 02/10/2014
O projeto oferece um processo de excelência focado no aprimoramento da escrita, estimulando a criação de dramaturgias que expressem novas visões de mundo, linguagens e experimentações estéticas, além de estabelecer um intercâmbio entre autores brasileiros e dramaturgos internacionais por meio de workshops, encontros e espetáculos. MÚSICA EM CENA DUO RECITAL 5/11/2014 ESEMBLE NOTA BOUNA 12/11/2014 DANIELI LONGO E JI YON SHIM 19/11/2014 SAMI BORDOKAN TRIO 26/11/2014 BANDA SINFÔNICA 29/11/2014
SP URBAN DIGITAL FESTIVAL − 3ª EDIÇÃO DE 3/11/2014 A 30/11/2014
CIA. SCENA INCANTO 2/11/2014
LEONARDO DA VINCI: A NATUREZA DA INVENÇÃO A PARTIR DE 29 DE OUTUBRO
FUKUDA CELLO ENSEMBLE 9/11/2014
MOSTRA DE CINEMA CINE SESI-SP NO MUNDO: CINEMA FRANCÊS, DOS PRIMÓRDIOS AO NOSSOS DIAS ATÉ 20/10/2014
O Cine SESI-SP no Mundo tem como objetivo a formação de plateia para cinematografia de diversos países. O projeto, realizado em parcerias com embaixadas, consulados e organizações culturais internacionais, democratiza o acesso à produção audiovisual de reconhecimento da crítica, nem sempre presente nos circuitos comerciais.
PAULO GUSMÃO E SUTIL CAMERATA 16/11/2014 MARTA KARASSAWA QUINTETO 23/11/2014 BANDA SINFÔNICA 26/11/2014 VOZ ATIVA MADRIGA 30/11/2014
SHAKESPEARE AMARROTADO SESI MAUÁ 20 E 21 DE SETEMBRO SESI PIRACICABA 4 E 5 DE OUTUBRO SESI CRUZEIRO 11 DE OUTUBRO SESI TAUBATÉ 12 DE OUTUBRO SESI JUNDIAÍ 18 DE OUTUBRO SESI TATUÍ 25 DE OUTUBRO SESI PRESIDENDE PRUDENTE 8 DE NOVEMBRO SESI BAURU 9 DE NOVEMBRO SESI SUMARÉ 16 DE NOVEMBRO
DO JEITO QUE VOCÊ GOSTA SESI ITAPETININGA 27 E 28 DE SEMTEMBRO SESI RIO CLARO 4 E 5 DE OUTUBRO SESI CAMPINAS 11 E 12 DE OUTUBRO
CARAMBA, QUANTA BOBAGEM SESI CAMPINAS 19 E 20 DE SETEMBRO SESI BIRIGUI 10 E 11 DE OUTUBRO
* Datas e horários sujeitos a alterações. Mais informações no site www.sesisp.org.br/cultura/.
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MÁRIO AMÉRICO, O MASSAGISTA DA SELEÇÃO BRASILEIRA
SHAKESPEARE AMARROTADO DO JEITO QUE VOCÊ GOSTA CARAMBA, QUANTA BOBAGEM
SESI SUMARÉ ATÉ 28 DE SETEMBRO
Foto: Maria Tuca Fanchin
SESI ITAPETININGA DE 3/10 A 11/01/2015
FAVORETTO, AS CORES DO MEU RECANTO SESI CAMPINAS ATÉ 28 DE SETEMBRO
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SESI SÃO JOSÉ DO RIO PRETO DE 03/10 A 11/01/2015
AMAZÔNIA, DE MANAUS A BELÉM SESI BAURU ATÉ 14 DE SETEMBRO SESI TATUÍ DE 26/09 A 26/10
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Foto: João Caldas
SESI CAMPINAS I DE 07/11 A 07/12
SESI ARARAQUARA 20 DE SETEBRO
JAIR OLIVEIRA SESI ITAPETININGA 26 DE SETEMBRO
Foto: Neander Heringer
SESI RIO CLARO 29 DE SETEMBRO
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Foto: Divulgação
GALERIA DE FOTOS
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Foto: Débora Didonê
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Foto: Divugação
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FILE − FESTIVAL INTERNACIONAL DE LINGUAGEM ELETRÔNICA FILE − FESTIVAL INTERNACIONAL DE LINGUAGEM ELETRÔNICA CELSO SALIM E RODRIGO MANTOVANI MÁRIO AMÉRICO, O MASSAGISTA DA SELEÇÃO BRASILEIRA FAVORETTO, AS CORES DO MEU RECANTO JAIR OLIVEIRA CIDA MOREIRA AMAZÔNIA, DE MANAUS A BELÉM TIÊ
Foto: Daryan Dornelles
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88 A Revista de Educação, Tecnologia e Inovação do SENAI-SP divulga ideias e tendências nessas áreas de interesse da instituição. Com periodicidade semestral, traz artigos acadêmicos e notícias, além de seções especiais voltadas para design, inclusão profissional e publicações científicas e técnicas. Se você deseja recebê-la, envie um e-mail para editora@sesisenaisp.org.br com seu endereço e nome completo.
www.senaispeditora.com.br
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UNIDADES DO SESI-SP AMERICANA CAT DR. ESTEVAM FARAONE AVENIDA BANDEIRANTES,1000 CHÁCARA MACHADINHO CEP 13478-700 - AMERICANA - SP Tel: (19) 3471-9000 www.sesisp.org.br/americana ARAÇATUBA CAT FRANCISCO DA SILVA VILLELA RUA DR. ALVARO AFONSO DO NASCIMENTO, 300 - J. PRESIDENTE CEP 16072-530 - ARAÇATUBA - SP Tel: (18) 3519-4200 www.sesisp.org.br/aracatuba ARARAQUARA CAT WILTON LUPO AVENIDA OCTAVIANO DE ARRUDA CAMPOS, 686 - JD. FLORIDIANA CEP 14810-901 - ARARAQUARA - SP Tel: (16) 3337-3100 www.sesisp.org.br/araraquara ARARAS CAT LAERTE MICHIELIN AVENIDA MELVIN JONES, 2.600 - B. HEITOR VILLA-LOBOS CEP 13607-055 - ARARAS - SP Tel: (19) 3542-0393 www.sesisp.org.br/araras BAURU CAT RAPHAEL NOSCHESE RUA RUBENS ARRUDA, 8-50 - ALTOS DA CIDADE CEP 17014-300 - BAURU - SP Tel: (14) 3234-7171 www.sesisp.org.br/bauru
CAMPINAS I CAT PROFESSORA MARIA BRAZ AVENIDA DAS AMOREIRAS, 450 CEP 13036-225 - CAMPINAS I - SP Tel: (19) 3772-4100 www.sesisp.org.br/amoreiras CAMPINAS II CAT JOAQUIM GABRIEL PENTEADO AVENIDA ARY RODRIGUEZ, 200 - B. BACURI CEP 13052-550 - CAMPINAS II - SP Tel: (19) 3225-7584 www.sesisp.org.br/campinas2 COTIA OLAVO EGYDIO SETÚBAL RUA MESOPOTÂMIA, 300 - MOINHO VELHO CEP 06712-100 - COTIA - SP Tel: (11) 4612-3323 www.sesisp.org.br/cotia CRUZEIRO CAT OCTÁVIO MENDES FILHO RUA DURVALINO DE CASTRO, 501 - VILA ANA ROSA NOVAES CEP 12705-210 - CRUZEIRO - SP Tel: (12) 3141-1559 www.sesisp.org.br/cruzeiro CUBATÃO CAT DÉCIO DE PAULA LEITE NOVAES AVENIDA COM. FRANCISCO BERNARDO, 261 - JD. CASQUEIRO CEP 11533-090 - CUBATÃO - SP Tel: (13) 3363-2662 www.sesisp.org.br/cubatao
BIRIGUI CAT MIN. DILSON FUNARO AVENIDA JOSÉ AGOSTINHO ROSSI, 620 - JARDIM PINHEIROS CEP 16203-059 - BIRIGUI - SP Tel: (18) 3642-9786 www.sesisp.org.br/birigui
DIADEMA CAT JOSÉ ROBERTO MAGALHÃES TEIXEIRA AVENIDA PARANAPANEMA, 1500 TABOÃO CEP 09930-450 - DIADEMA - SP Tel: (11) 4092-7900 www.sesisp.org.br/diadema
BOTUCATU CAT SALVADOR FIRACE RUA CELSO CARIOLA, 60 – ENG. FRANCISCO CEP 18605-265 - BOTUCATU - SP Tel: (14) 3811-4450 www.sesisp.org.br/botucatu
FRANCA CAT OSVALDO PASTORE AVENIDA SANTA CRUZ, 2870 - JD. CENTENÁRIO CEP 14403-600 - FRANCA - SP Tel: (16) 3712-1600 www.sesisp.org.br/franca
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GUARULHOS CAT MORVAN DIAS DE FIGUEIREDO RUA BENEDITO CAETANO DA CRUZ, 566 - JARDIM ADRIANA CEP 07135-151 - GUARULHOS - SP Tel: (11) 2404-3133 www.sesisp.org.br/guarulhos INDAIATUBA CAT ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES AVENIDA FRANCISCO DE PAULA LEITE, 2701 - JD. CALIFÓRNIA CEP 13346-000 - INDAIATUBA - SP Tel: (19) 3875-9000 www.sesisp.org.br/indaiatuba ITAPETININGA CAT - BENEDITO MARQUES DA SILVA AVENIDA PADRE ANTONIO BRUNETTI, 1.360 - VL. RIO BRANCO CEP 18208-080 - ITAPETININGA - SP Tel: (15) 3275-7920 www.sesisp.org.br/itapetininga
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ITÚ CAT CARLOS EDUARDO MOREIRA FERREIRA RUA JOSÉ BRUNI, 201 - BAIRRO SÃO LUIZ CEP 13304-080 - ITÚ - SP Tel: (11) 4025-7300 www.sesisp.org.br/itu JACAREÍ CAT KARAM SIMÃO RACY RUA ANTONIO FERREIRA RIZZINI, 600 JD. ELZA MARIA CEP 12322-120 - JACAREÍ - SP Tel: (12) 3954-1008 www.sesisp.org.br/jacarei JAÚ CAT RUY MARTINS ALTENFELDER SILVA AVENIDA JOÃO LOURENÇO PIRES DE CAMPOS, 600 - JD. PEDRO OMETTO CEP 17212-591 - JAÚ - SP Tel: (14) 3621-1042 www.sesisp.org.br/jau JUNDIAÍ CAT ÉLCIO GUERRAZZI AVENIDA ANTONIO SEGRE, 695 - JARDIM BRASIL CEP 13201-843 - JUNDIAÍ - SP Tel: (11) 4521-7122 www.sesisp.org.br/jundiai
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LIMEIRA CAT MARIO PUGLIESE AVENIDA MJ. JOSÉ LEVY SOBRINHO, 2415 - ALTO DA BOA VISTA CEP 13486-190 - LIMEIRA - SP Tel: (19) 3451-5710 www.sesisp.org.br/limeira
OURINHOS CAT MANOEL DA COSTA SANTOS RUA PROFESSORA MARIA JOSÉ FERREIRA, 100 - BAIRRO DAS CRIANÇAS CEP 19910-075 - OURINHOS - SP Tel: (14) 3302-3500 www.sesisp.org.br/ourinhos
MARÍLIA CAT LÁZARO RAMOS NOVAES AVENIDA JOÃO RAMALHO, 1306 - JD. CONQUISTA CEP 17520-240 - MARÍLIA - SP Tel: (14) 3417-4500 www.sesisp.org.br/marilia
PIRACICABA CAT MARIO MANTONI AVENIDA LUIZ RALPH BENATTI, 600 - VL INDUSTRIAL CEP 13412-248 - PIRACICABA - SP Tel: (19) 3403-5900 www.sesisp.org.br/piracicaba
MATÃO CAT PROFESSOR AZOR SILVEIRA LEITE RUA MARLENE DAVID DOS SANTOS, 940 - JARDIM PARAÍSO III CEP 15991-360 - MATÃO - SP Tel: (16) 3382-6900 www.sesisp.org.br/matao
PRESIDENTE EPITÁCIO CIL - CARLOS CARDOSO DE ALMEIDA AMORIM AVENIDA DOMINGOS FERREIRA DE MEDEIROS, 2.113 - VILA RECREIO CEP 19470-000 - PRES. EPITÁCIO - SP Tel: (18) 3281-2803 www.sesisp.org.br/presidenteepitacio
MAUÁ CAT MIN. RAPHAEL DE ALMEIDA MAGALHÃES AVENIDA PRESIDENTE CASTELO BRANCO, 237 - JARDIM ZAÍRA CEP 09320-590 - MAUÁ - SP Tel: (11) 4542-8950 www.sesisp.org.br/maua MOGI DAS CRUZES CAT NADIR DIAS DE FIGUEIREDO RUA VALMET, 171 - BRAZ CUBAS CEP 08740-640 - MOGI DAS CRUZES - SP Tel: (11) 4727-1777 www.sesisp.org.br/mogidascruzes
PRESIDENTE PRUDENTE CAT BELMIRO JESUS AVENIDA IBRAIM NOBRE, 585 - PQ. FURQUIM CEP 19030-260 - PRES. PRUDENTE - SP Tel: (18) 3222-7344 www.sesisp.org.br/presidenteprudente RIBEIRÃO PRETO CAT JOSÉ VILLELA DE ANDRADE JUNIOR RUA DR. LUÍS DO AMARAL MOUSINHO, 3465 - CASTELO BRANCO CEP 14090-280 - RIBEIRÃO PRETO - SP Tel: (16) 3603-7300 www.sesisp.org.br/ribeiraopreto
MOGI GUAÇU CAT MIN. ROBERTO DELLA MANNA RUA EDUARDO FIGUEIREDO, 300 - PARQUE RESIDENCIAL ZANIBONI III CEP 13848-090 - MOGI GUAÇU - SP Tel: (19) 3861-3232 www.sesisp.org.br/mogiguacu
RIO CLARO CAT JOSÉ FELÍCIO CASTELLANO AVENIDA M-29, 441 - JD. FLORIDIANA CEP 13505-190 - RIO CLARO - SP Tel: (19) 3522-5650 www.sesisp.org.br/rioclaro
OSASCO CAT LUIS EULALIO DE BUENO VIDIGAL FILHO AVENIDA GETÚLIO VARGAS, 401 CEP 06233-020 - OSASCO - SP Tel: (11) 3602-6200 www.sesisp.org.br/osasco
SANTA BÁRBARA D' OESTE CAT AMÉRICO EMÍLIO ROMI AVENIDA MÁRIO DEDINI, 216 - V. OZÉIAS CEP 13453-050 - S. B. D`OESTE - SP Tel: (19) 3455-2088 www.sesisp.org.br/santabarbara
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SANTANA DE PARNAÍBA CAT JOSÉ CARLOS ANDRADE NADALINI AVENIDA CONSELHEIRO RAMALHO, 264 - CIDADE SÃO PEDRO CEP 06535-175 - SANTANA DE PARNAÍBA - SP Tel: (11) 4156-9830 www.sesisp.org.br/parnaiba SANTO ANDRÉ CAT THEOBALDO DE NIGRIS PÇA. DR. ARMANDO DE ARRUDA PEREIRA, 100 - STA. TEREZINHA CEP 09210-550 - SANTO ANDRÉ - SP Tel: (11) 4996-8600 www.sesisp.org.br/santoandre SÃO BERNARDO DO CAMPO CAT ALBANO FRANCO RUA SUÉCIA, 900 - ASSUNÇÃO CEP 09861-610 - S. B. DO CAMPO - SP Tel: (11) 4109-6788 www.sesisp.org.br/sbcampo SÃO CAETANO DO SUL CAT PRES. EURICO GASPAR DUTRA RUA SANTO ANDRÉ, 810 - BOA VISTA CEP 09572-140 - S. C. DO SUL - SP Tel: (11) 4233-8000 www.sesisp.org.br/saocaetano SANTOS CAT PAULO DE CASTRO CORREIA AVENIDA NOSSA SENHORA DE FÁTIMA, 366 - JD. SANTA MARIA CEP 11085-202 - SANTOS - SP Tel: (13) 3209-8210 www.sesisp.org.br/santos SÃO CARLOS CAT ERNESTO PEREIRA LOPES FILHO RUA CEL. JOSÉ AUGUSTO DE OLIVEIRA SALLES, 1325 - V. IZABEL CEP 13570-900 - SÃO CARLOS - SP Tel: (16) 3368-7133 www.sesisp.org.br/saocarlos SÃO JOSÉ DO RIO PRETO CAT JORGE DUPRAT FIGUEIREDO AVENIDA DUQUE DE CAXIAS, 4656 VL. ELVIRA CEP 15061-010 - SÃO JOSÉ DO RIO PRETO - SP Tel: (17) 3224-6611 www.sesisp.org.br/sjriopreto
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SÃO JOSÉ DOS CAMPOS CAT OZIRES SILVA AVENIDA CIDADE JARDIM, 4389 BOSQUE DOS EUCALIPTOS CEP 12232-000 - SÃO JOSÉ DOS CAMPOS - SP Tel: (12) 3936-2611 www.sesisp.org.br/sjcampos SÃO PAULO – AE CARVALHO CAT MARIO AMATO RUA DEODATO SARAIVA DA SILVA, 110 PQ. DAS PAINEIRAS CEP 03694-090 - SÃO PAULO - SP Tel: (11) 2026-6000 www.sesisp.org.br/carvalho SÃO PAULO – CATUMBI CAT ANTONIO DEVISATE RUA CATUMBI, 318 - BELENZINHO CEP 03021000 - SÃO PAULO - SP Tel: (11) 2291-1444 www.sesisp.org.br/catumbi SÃO PAULO – IPIRANGA CAT ROBERTO SIMONSEN RUA BOM PASTOR, 654 – IPIRANGA CEP 04203-000 – SÃO PAULO – SP Tel: (11) 2065-0150 www.sesisp.org.br/ipiranga SÃO PAULO – VILA DAS MERCÊS CAT PROFESSOR CARLOS PASQUALE RUA JÚLIO FELIPE GUEDES, 138 CEP 04174-040 - SÃO PAULO - SP Tel: (11) 2946-8172 www.sesisp.org.br/merces SÃO PAULO – VILA LEOPOLDINA CAT GASTÃO VIDIGAL RUA CARLOS WEBER, 835 - VILA LEOPOLDINA CEP 05303-902 - SÃO PAULO - SP Tel: (11) 3832-1066 www.sesisp.org.br/leopoldina
SOROCABA CAT - SEN JOSÉ ERMÍRIO DE MORAES RUA DUQUE DE CAXIAS, 494 - MANGAL CEP 18040-425 - SOROCABA - SP Tel: (15) 3388-0444 www.sesisp.org.br/sorocaba SUMARÉ CAT FUAD ASSEF MALUF AVENIDA AMAZONAS, 99 - JARDIM NOVA VENEZA CEP 13177-060 - SUMARÉ - SP Tel: (19) 3838-9710 www.sesisp.org.br SUZANO CAT MAX FEFFER AVENIDA SENADOR ROBERTO SIMONSEN, 550 - JARDIM IMPERADOR CEP 08673-270 - SUZANO - SP Tel: (11) 4741-1661 www.sesisp.org.br/suzano
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TATUÍ CAT WILSON SAMPAIO AVENIDA SÃO CARLOS, 900 B. DR. LAURINDO CEP 18271-380 - TATUÍ - SP Tel: (015) 3205-7910 www.sesisp.org.br/tatui TAUBATÉ CAT LUIZ DUMONT VILLARES RUA VOLUNTÁRIO BENEDITO SÉRGIO, 710 - B. ESTIVA CEP 12050-470 - TAUBATÉ - SP Tel: (12) 3633-4699 www.sesisp.org.br/taubate VOTORANTIM CAT JOSÉ ERMÍRIO DE MORAES FILHO RUA CLÁUDIO PINTO NASCIMENTO, 140 - JD. MORUMBI CEP 18110-380 - VOTORANTIM - SP Tel: (15) 3353-9200 www.sesisp.org.br/votorantim
SERTÃOZINHO CAT NELSON ABBUD JOÃO RUA JOSÉ RODRIGUES GODINHO, 100 CONJ. HAB. MAURÍLIO BIAGI CEP 14177-320 - SERTÃOZINHO - SP Tel: (16) 3945-4173 www.sesisp.org.br/sertaozinho
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Ilustração Jô Oliveira Acusada pelo diabo, a alma de João Grilo invoca a proteção da Compadecida.
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