Ensaios sobre a crise urbana do Brasil
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Wilson Cano
Ensaios sobre a crise urbana do Brasil
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Cano, Wilson, 1937Ensaios sobre a crise urbana do Brasil / Wilson Cano. – Campinas, sp: Editora da Unicamp, 2011.
1. Urbanização – Brasil. 2. Sociologia urbana – Brasil. 3. Comunidade urbana – Desenvolvimento – Brasil. I. Título.
cdd 301.360981
isbn 978-85-268-0958-1
Índices para catálogo sistemático:
1. Urbanização – Brasil 2. Sociologia urbana – Brasil 3. Comunidade urbana – Desenvolvimento – Brasil
301.360981 301.360981 301.360981
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Agradecimentos Agradeço a meus colegas, professores Ana C. Fernandes e Ulysses C. Semeghini, pela cessão dos direitos de coautoria de dois textos aqui inseridos. A meu colega, professor Barjas Negri, pelo estímulo, no início da década de 1990, a editar este livro, ideia que na época relutei em aceitar, mas que, diante do interesse que tem sido manifestado ao longo desses anos, por meio de muitas solicitações de pesquisadores e de alunos em diversos cursos que versam sobre a matéria, resolvi concretizar. Agradeço, ainda, a Marcos Barcellos, doutorando do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Economia (IE-Unicamp), pela leitura atual deste livro e por suas observações sobre alguns dos textos que o compõem.
Sumário
Introdução ..........................................................................................................................
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Parte i AGRICULTURA, QUESTÃO AGRÁRIA E URBANIZAÇÃO 1 EXPLOSÃO URBANA E REFORMA AGRÁRIA .................................................................. 21 2 Agricultura e urbanização . ................................................................................... 27 Parte ii Dinâmica urbana e limites ao planejamento urbano 1 Dinâmica da economia urbana de são paulo: uma proposta de investigação . ................................................................................................................. 39
2 Setor terciário no brasil: algumas reflexões sobre o . período 1970-1989 (Wilson Cano e Ulysses c. Semeghini ) ..................................... 71 3 Subsídios para a reformulação das políticas de descentralização industrial e de urbanização no estado de são paulo ............................... 89
4 Urbanização: crise e revisão de planejamento ............................................. 117 5 Questão regional e urbanização no desenvolvimento econômico brasileiro pós- 1930 .................................................................................................... 147 6 Reflexões sobre o papel do capital mercantil na questão regional . e urbana do brasil ...................................................................................................... 181
parte iii Concentração econômica e metropolização 1 Base e superestrutura em são paulo: 1886-1929 . ........................................ 209 2 Perspectivas da região metropolitana de são paulo no contexto econômico nacional e mundial ........................................................................... 233
parte iv A necessidade de um novo modelo nacional de desenvolvimento 1 Da crise ao caos urbano .......................................................................................... 249 2 Questão regional e urbana no brasil: alguns impasses atuais . ............ 267 3 O movimento do pêndulo: justiça social e escalas espaciais no capitalismo contemporâneo (Ana Cristina Fernandes e Wilson Cano) .............. 287
4 Uma agenda nacional para o desenvolvimento ........................................... 327 Bibliografia .......................................................................................................................... 367
Introdução
Este livro, cujo tema central é o da Economia Urbana no Brasil, tem suas origens no início da década de 1980, no Instituto de Economia da Unicamp, quando instituímos um programa de doutoramento sobre Economia do Setor Público. Nossa equipe inicial tinha sólida formação sobre o tema do desenvolvimento e sobre as especificidades do Subdesenvolvimento. Contudo, a temática central daquele curso, além de envolver questões basilares sobre desenvolvimento econômico, infraestrutura econômica e social, distribuição de renda, papel do Estado e políticas sociais, exige também um entendimento maior sobre economia regional e urbana. Graças a meu anterior trabalho na Cepal (Comissão Econômica das Nações Unidas para a América latina), tinha conhecimentos sobre a especificidade dos processos de urbanização em países subdesenvolvidos e, desde a década de 1970, em função de minha carreira acadêmica na Unicamp, realizei várias pesquisas e reflexões sobre a questão regional brasileira . Pela leitura de algumas obras clássicas, sabia que, em seu processo histórico, a urbanização brasileira apresentava grande diversidade e dispersão espacial, e que, pelo menos até 1930, havia sido construída em razão das diferentes células regionais exportadoras e pelas raras rotas da Tais estudos estavam consubstanciados em minhas teses: a de doutorado, “Raízes...” (1975), que discute o período 1870-1929, e a de Livre-Docência, “Desequilíbrios...” (1982), que abarca o período 1929-1970, ambas posteriormente editadas. Ver Cano, 2007a, 5a ed., e 2007b, 3a ed. Essas reflexões seriam atualizadas mais tarde, com novas pesquisas, constituindo um terceiro livro (Cano, 2008).
10 | ENSAIOS SOBRE A CRISE URBANA DO brasil precária integração de alguns mercados regionais . Sabia também, por leituras e pesquisas, que o estado de São Paulo tivera processo distinto e criara uma notável rede urbana, bastante avançada em relação aos demais estados, em razão das especificidades da economia cafeeira paulista. Assim, tomei a meu cargo estudar mais o tema da urbanização, tendo como base o espaço econômico paulista. Para tanto, formei uma equipe básica, desenhei e coordenei algumas pesquisas, em convênio com o Governo do Estado de São Paulo, que constituíram a base para que realizássemos nossos objetivos . Com essas pesquisas procuramos enfrentar algumas questões metodológicas que, em sua maior parte, restringiam em grande medida a análise da economia urbana a uma visão “intramuros”. Nossas pesquisas tentaram fundamentar melhor a análise da dinâmica da urbanização, utilizando um espectro maior e mais detalhado de relações de interdependência setorial com os vários compartimentos sociais e econômicos do urbano e do rural. Dessa forma, procuramos entender melhor as inter-relações do urbano com o rural e os nexos que disso decorrem para alterar o urbano. Dentro do próprio setor urbano, procuramos destacar e dar ênfase às múltiplas relações entre os setores industriais e os serviços, assim como lançar alguma luz sobre a dinâmica “autônoma” que o próprio movimento demográfico e social urbano pode imprimir sobre a dinâmica da economia urbana. Dedicamos especial atenção ao estudo dos vários componentes do Setor Serviços, dada a grande complexidade metodológica que o envolve. Procuramos, ainda, entender melhor as razões e os sentidos maiores dos fluxos migratórios interestaduais e inter-regionais e seus efeitos positivos e negativos sobre a dinâmica urbana. São exemplos disso a mineração do século XVIII em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, abrindo rotas que semearam muitas cidades naquelas zonas e entre elas, regiões do Rio de Janeiro, Nordeste, São Paulo e extremo sul do país. As sínteses dessas principais pesquisas foram publicadas em Cano (coord., 1988 e 1992), a primeira abarcando o período de 1920 a 1980 e a segunda, o de 1970 a 1989. Em nova pes quisa, atualizamos esse estudo, publicado em Cano et al., 2007. Em convênio com a Prefeitura Municipal de Campinas, fizemos trabalho semelhante sobre a Região Metropolitana de Campinas (Cano e Brandão, coords., 2002).
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Além de nossas preocupações acadêmicas, tínhamos também outras, tão ou mais importantes do que aquelas, no sentido de indagar sobre as ações e omissões do Estado na questão do planejamento urbano, do uso do solo e de suas políticas sociais, bem como dos atores principais na órbita privada — o capital mercantil, imobiliário e construtor. Por outro lado, os nefastos efeitos da “explosão” urbana da década de 1970 geraram sequelas que se somaram à grave crise econômica e social da década de 1980. Isso nos estimulou a pesquisar e refletir sobre aquele tema, para tentar entender melhor aquele processo e poder refletir sobre os maus prognósticos que então vislumbrávamos, antevendo a piora sensível de alguns daqueles problemas urbanos, caso não se alterasse o quadro institucional e as políticas sociais sobre o urbano brasileiro. Não se tratava, obviamente, de profecias ou adivinhações. Os graves problemas urbanos de então passariam a ser “ciclópicos”, no sentido de que, à medida que o tempo passasse, os custos, o tempo e os recursos necessários à sua superação cresceriam desmedidamente. É o caso das tragédias urbanas (enchentes, deslizamentos etc.) que temos visto acontecer em anos recentes, principalmente em 2009, 2010 e no início de 2011. Tragédias que não decorrem exclusivamente de fenômenos ou desequilíbrios naturais, mas também, e na maioria dos casos, principalmente, ocorrem pela omissão (ou pelas más ações) do Estado, cooptado ou não pelo capital mercantil urbano. Os resultados de nossas pesquisas foram altamente compensadores. Com eles, em primeiro lugar, consolidamos a formação de uma equipe de pesquisa, que forneceu a base para aquele curso e, anos mais tarde, para um novo programa de pós-graduação, o de Desenvolvimento, Espaço e Meio Ambiente, no qual hoje acumulamos considerável acervo de teses e pesquisas realizadas. Mas, acima de tudo, as pesquisas deram maior sustentação a nossos temores, o que o leitor poderá constatar através dos textos inseridos neste livro. Eles abarcam questões de que tratávamos em nossas pesquisas, discussões e aulas, desde a década de 1970, e que foram adquirindo a forma de textos mais breves e mais ágeis para divulgação e publicação partir de 1985.
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Conteúdo do livro O livro reúne 14 textos — 2 dos quais em coautoria —, 4 publicados em livros e os demais, em anais e revistas especializadas. Em que pese o fato de que todos eles têm traços comuns, em termos de problemas reais ou de teoria, julguei melhor separá-los em 4 grupos, de conformidade com suas especificidades principais. Todos os textos trazem a data e a referência de sua publicação original. Parte I – Agricultura, urbanização e reforma agrária
O primeiro e o segundo artigos foram publicados em 1985 e 1986, respectivamente, ao fim do regime militar e início da Nova República, quando os problemas das crises social e econômica retornaram com vigor no debate político acadêmico e no nacional. O tema da reforma agrária, praticamente excluído durante o regime militar, retomara seu lugar na agenda política do país, desde as vitórias das oposições, em eleições estaduais em 1982 e na nacional em 1985, e era visto como um dos principais problemas sociais do país. O tema retornou e, no início, ainda era justificado como necessário a uma reparação de justiça social, à diminuição do desemprego e como estímulo para o aumento da oferta de alimentos, mas esse argumento foi perdendo terreno, à medida que a produtividade agrícola subia e a produção alimentar crescia — não tanto quanto a de exportáveis —, atendendo à demanda explicitada no mercado capitalista nacional. Contudo, à medida que os problemas urbanos adquiriam contornos mais graves e a crise mantinha restrito o emprego, a questão da reforma agrária adquiria nova justificação, crescendo como fonte provável de em prego e, principalmente, como mecanismo para sustar a expansão urbana, que na década de 1970 havia sido “explosiva” e não mais “suportável”, como a que ocorreu durante as décadas de 1950 e 1960. Como se verá na leitura dos demais grupos — notadamente do II —, os temas da agricultura e da reforma agrária estarão presentes em quase todos os textos, fortemente imbricados na dinâmica da urbanização, principalmente no que se refere ao “inchaço” urbano.
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Parte II – Dinâmica da urbanização — Estrutura, principais determinantes e proposições de políticas
Este grupo contém 6 artigos que tratam de: a) alguns dos principais problemas teóricos e metodológicos que envolvem a dinâmica da economia e do planejamento da urbanização; b) análise (sintetizada) de nossos processos históricos de crescimento regional e urbano; c) elaboração de propostas de reformulação da legislação e das políticas urbanas, como tentativa de corrigir ou atenuar alguns dos problemas urbanos ali apontados. Na metodologia e na análise, especial atenção foi dada: a) à periodização daqueles processos históricos, harmonizada com o movimento macroeconômico nacional; b) à interação da política econômica nacional, com as de desenvolvimento regional e urbano, Guerra Fiscal, e algumas políticas setoriais e sociais; c) à interdependência técnica (renda e emprego) entre os setores primário, secundário e terciário da economia; d) à ausência quase absoluta de cálculos e estimativas dos custos-benefícios decorrentes do uso de políticas de descentralização-desconcentração industrial, em termos de seus principais efeitos: arrecadação e gasto público, renda, emprego, poluição, oferta e demanda de serviços públicos básicos etc.; e) à necessidade de avaliar, separadamente, os efeitos urbanos gerados dentro do próprio território do estado de São Paulo e os que decorrem de relações inter-regionais, como por exemplo, os fluxos migratórios interestaduais, as políticas de desenvolvimento estaduais e regionais e a guerra fiscal. O terceiro artigo (“Dinâmica...”, de 1985) é texto pioneiro, e sua estrutura serviu de base à formulação de uma importante pesquisa (“Interiorização...”) sobre o período 1929-1979, o que nos permitiu aprofundar o estudo do tema da economia urbana. O quarto artigo (“O Setor Ter
14 | ENSAIOS SOBRE A CRISE URBANA DO brasil ciário...”, em coautoria com Ulysses C. Semeghini) discute os principais problemas metodológicos e teóricos para a análise do setor Serviços, pelas óticas da renda e do emprego. Os dois artigos seguintes (“Subsídios...” e “Urbanização...”) detalharam mais algumas análises da dinâmica urbana e avançaram em termos de propostas de reformulação legal e de políticas para o setor. Foi a partir desses artigos que nos convencemos do perigo que a sociedade corria com o provável agravamento futuro da maior parte dos problemas urbanos que então constatávamos e que acabariam resultando em vários desastres urbanos “naturais”, o que tem ocorrido com frequência. Contemporâneo a esses quatro, o sétimo artigo (“Questão regional e...”) sintetiza a evolução e as principais transformações na dinâmica re gional e na urbanização do país, ao longo do período de 1930 até meados da década de 1980, destacando as principais diferenças regionais nesses processos. O oitavo artigo (“Reflexões sobre... capital mercantil...”), publicado em 2010, é um texto teórico e analítico sobre os efeitos da dominação do capital mercantil em vários espaços rurais brasileiros e sobre sua ação no mundo urbano, travestido de capital imobiliário, incorporador ou construtor, dirigindo e comandando os processos de especulação imobiliária e agravando os efeitos nefastos do descontrole do poder público sobre a urbanização. Parte III – Concentração econômica, urbanização, diversificação e metropolização
Este tema, que ganha grande importância para os países subdesenvolvidos a partir da segunda metade do século XX, é aqui tratado em dois textos distintos. O de no 9 (“Base e superestrutura...”) contém uma discus são teórica bastante polêmica, a da interdependência entre as transformações da estrutura produtiva — e sua infraestrutura — e as que se manifestam nas artes, na política, nas relações sociais etc. O artigo destaca a polêmica existente e as próprias ressalvas que Marx e Engels fizeram, limitando a interdependência direta da Base com a Superestrutura, mostrando que podem existir outras formas de interação direta e in direta entre aqueles dois espaços sociais.
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O texto está centrado na década de 1920, no espaço que viria a constituir a Região Metropolitana de São Paulo, mostrando importantes transformações quantitativas e qualitativas nas estruturas produtivas e na Superestrutura, apontando, ainda, para a capacidade que essa região já mostrava para receber as transformações modernizadoras (nacionais e internacionais) que ocorriam no período. Em especial, aponto também para o desiderato das pressões econômicas, políticas e sociais que ali fer mentavam e que iriam desaguar na Crise de 1929 e na subsequente Revolução de 1930, instaurando o processo de industrialização no Brasil. Em suma, é a partir desse momento — os anos 1920 — que a cidade de São Paulo vai, efetivamente, ganhando a condição de futura primaz da urbanização brasileira, passando a ser uma grande cidade, superando demograficamente a cidade do Rio de Janeiro na década de 1950. O texto no 10 mostra como as transformações proporcionadas pela industrialização vão alterando as estruturas da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), convertendo-a, já na passagem da década de 1950 para a de 1960, em metrópole nacional e, com a explosão urbana da dé cada de 1970, em metrópole de caráter internacional, passando a ostentar não só a primazia da industrialização, mas também a dos serviços, que se diversificam extraordinariamente, e passando também a ser a sede nacional do sistema financeiro. Entretanto, a velocidade desse progresso e a incúria e o casuísmo do setor público sancionaram a piora dos principais problemas urbanos, notadamente os que atingem mais as camadas de menor nível de renda. Parte IV – Crise e necessidade de um novo modelo nacional de desenvolvimento
São quatro textos mais recentes, que tratam da evolução do processo de urbanização ao longo da profunda crise que nos assola desde a década de 1980, chamando a atenção para a gravidade do momento atual, em que o neoliberalismo nos colocou uma camisa de força na política macroeconômica, privilegiando o superávit fiscal, constrangendo a taxa de inversão e o crescimento econômico. Os textos 11, 12 e 13 mostram que, com isso, os problemas urbanos e sociais se agravaram sobremodo, com
16 | ENSAIOS SOBRE A CRISE URBANA DO brasil a proliferação de uma série de desastres urbanos “naturais”, como enchentes, deslizamentos e soterramentos que estão ceifando milhares de vidas humanas e destruindo domicílios. O texto no 13 (“O movimento do pêndulo...”, escrito em coautoria com Ana C. Fernandes) discute e critica a “inventiva” neoliberal do Poder Local, analisando as dimensões políticas e econômicas das diferentes escalas espaciais em que a questão regional e a urbana podem ser tratadas, cobrando maior transparência e democratização na tomada de decisões. As conclusões dos textos convergem para o texto no 14 (“Agenda...”), que trata da necessidade de formulação de um novo Plano Nacional de Desenvolvimento Econômico que rompa com o compromisso neoliberal, que se volte mais para o mercado interno e resgate o enorme débito social da nação. Por seu tamanho (75 páginas), evitei incluir aqui um texto síntese sobre a ampla pesquisa que coordenei junto com outro colega, sobre a Região Metropolitana de Campinas (RMC). O leitor poderá consultá-la em Cano e Brandão, 2002 .
Correções e definições de algumas expressões Corrigi uns poucos erros da digitação anterior e substituí alguns vícios de linguagem, termos ou palavras para esclarecer melhor o texto específico. Acrescento, ainda, um pequeno número de notas de rodapé, para atualizações ou correções que julguei indispensáveis, as quais identifico com a sigla (NA). Além disso, adiciono abaixo algumas informações ou definições sobre algumas expressões usadas ao longo dos textos, para melhor compreensão do leitor: Califórnia Paulista: cunhei esta expressão ao realizar as primeiras pesquisas, para chamar a atenção para a área que compreende o vetor Campinas/Ribeirão Preto/São José do Rio Preto, dado o grande avanço das
A Região Metropolitana de Campinas — Urbanização, economia, finanças e meio ambiente. Campinas, Editora da Unicamp, 2002. 2 vols.
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forças produtivas capitalistas nos setores agro e urbano dessa área, bem como pelo seu alto nível de renda média, um dos mais altos do Brasil. Caos urbano: expressão cunhada pela opinião pública, na década de 1970, para se referir aos problemas urbanos mais gritantes (transporte coletivo, habitação, saúde e educação) e à desorganização social que isso causa no cotidiano. Descentralização e Desconcentração, seja de produção, de empresas, de serviços, ou de recursos públicos: deve-se entender por descentralização o processo ou procedimento através do qual uma quantidade de bens (reais ou imateriais) se transfere fisicamente de uma localidade para outra. Esse fenômeno, no setor industrial, ocorre com baixa frequência. Por desconcentração entende-se a diminuição da participação relativa de uma localidade X, no total (de A a Z) da produção nacional de um determinado bem ou serviço, podendo isso se dar sem que haja descentralização de X para Y, mas sim pelo resultado estatístico decorrente de a localidade Y ter crescido mais do que a X. Isso ocorre em função das variações relativas da produção nas diversas regiões de um país. Por essa razão, substituí a primeira expressão pela segunda, em vários dos artigos aqui publicados, em que o uso daquela expressão era indevido. Urbanização “suportável”: assim denominei a urbanização que se manifestou até a década de 1960, durante a qual os processos de deterioração dos serviços urbanos ainda não haviam atingido a situação crítica que se verificaria a partir da década de 1970. A periferização das maiores cidades, embora já se manifestasse, era ainda reduzida, e o sistema de transportes coletivos, mesmo precário, dava conta da demanda então existente. Embora o saneamento básico fosse precário, a questão habitacional ainda apresentava “soluções” (mutirão, pequena construção mercantil, baixa inflação, lotes baratos etc.) que minoravam seu déficit. O ensino e a saúde ainda eram serviços praticamente só públicos e atendiam razoavelmente a demanda. Urbanização “explosiva”: assim denominei a que se manifestou a partir da década de 1970, com a aceleração da industrialização, a consolidação da ocupação do Centro-Oeste e o início da Amazônia, expandindo sobremodo a urbanização, a uma velocidade que potenciava ainda mais os efeitos dos desmandos do Estado em termos da oferta de serviços
18 | ENSAIOS SOBRE A CRISE URBANA DO brasil públicos básicos e tornava crítica a especulação e a degradação urbanas. É a partir desse momento que a maior parte dos problemas urbanos se torna “ciclópica”, isto é, os problemas adquirem um enorme volume absoluto, exigindo elevadas somas de recursos para sua solução. Dadas as pressões sobre as finanças públicas (em todos os níveis hierárquicos) e os cortes no gasto público, começa a entrar em cena outro fatídico personagem: a privatização — de fato ou de jure — de serviços públicos.
PARTE I
agricultura, questão agrária e urbanização