JOÃO ABREU DE FARIA BILHIM
João Abreu de Faria Bilhim Agregado em Sociologia das Organizações, Doutor em Ciências Sociais (Sociologia), Mestre em Ciências Antropológicas, Licenciado em Ciências Antropológicas e Etnológicas pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), da Universidade Técnica de Lisboa (UTL), Formado em Filosofia e Licenciado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa. É Professor Catedrático e preside à CRESAP. Foi Presidente do ISCSP/UTL. Presidiu à Comissão Técnica do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE). Foi Subdirector do Departamento de Gestão da Universidade Lusíada (Responsável pela Licenciatura em Gestão de Recursos Humanos) e Vice-Presidente do Instituto Superior Politécnico Internacional. Foi também Responsável de Recursos Humanos da Direcção Regional de Correios de Lisboa, Responsável de Comunicação e Investigador do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (INESC); Director de Formação e Desenvolvimento e Director de Comunicação Interna nos CTT. Exerceu as funções de Director do Gabinete de Auditoria e Modernização do Ministério da Justiça.
Ciência da Administração
DE
FARIA BILHIM
ISBN
978-989-646-087-7
Ciência da Administração
JOÃO ABREU
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João Abreu de Faria Bilhim
Ciência da Administração Fundamentos da Administração Pública
Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas UNIVERSIDADE DE LISBOA
Dezembro de 2013
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Ficha Técnica Título: Ciência da Administração Autor: João Abreu de Faria Bilhim Editor: Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas Data de edição: Novembro de 2013 Tiragem: 1000 exemplares Execução gráfica: Gráfica 99, Lda. Impressão e acabamento: Cafilesa, Soluções Gráficas Lda. Depósito legal: ??? ???/13 ISBN: 978-989-646-087-7 © Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas Colecção Manuais Pedagógicos
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ÍNDICE GERAL
Agradecimentos ..........................................................................................................9 . A Administração Pública como Objecto de Estudo ......................................11 Sumário ....................................................................................................................11 Objectivos da unidade ..............................................................................................11 1. Gestão ...............................................................................................................12 2. Administração ...................................................................................................16 3. Ciência da Administração em Sentido Lato .......................................................18 4. Ciência da Administração em Sentido Estrito: Objecto de Estudo......................19 5. Autonomia da Ciência da Administração ..........................................................23 6. Itinerário da Ciência da Administração .............................................................25 7. Origem da Ciência da Administração ................................................................29 8. A Perspectiva Gestionária: Managerialismo .......................................................33 9. A Reinvenção da Governação ............................................................................36 10. O Novo Serviço Público ....................................................................................39 Teste Formativo ........................................................................................................41 Respostas às Actividades ...........................................................................................41 Respostas ao Teste Formativo ....................................................................................42 Leituras Complementares .........................................................................................43 . Fundamentos de Administração Pública ........................................................45 Sumário ....................................................................................................................45 Objectivos da unidade ..............................................................................................45 1. O controlo político da administração pública ....................................................46 2. Fusão, burocracia e política ...............................................................................47 3. Da teoria organizacional à institucional .............................................................49 4. Da administração à gestão pública .....................................................................50 5. Da Teoria da Decisão à Escolha Racional ..........................................................52 6. As Teorias da Governança ..................................................................................54 5
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Índice Geral
Teste Formativo ........................................................................................................55 Respostas ao Teste Formativo ....................................................................................56 Leituras Complementares .........................................................................................56 . A Administração Reguladora e Prestadora de Serviços ...............................57 Sumário ....................................................................................................................57 Objectivos da unidade ..............................................................................................57 1. Do Estado Circunscrito ao Estado Inserido na Economia ....................................58 2. O “Consenso de Washington”: Expansão dos Mercados e Retracção do Estado ...61 3. A Compressão do Papel do Estado ......................................................................64 4. As Privatizações, Externalizações e Contratos de Concessão .................................67 5. A Administração Produtora e Prestadora .............................................................71 6. A Administração Reguladora ...............................................................................76 7. A Noção de Serviço Público ................................................................................83 8. Interesse Nacional, Público e Geral .....................................................................86 Teste Formativo ........................................................................................................89 Respostas ao Teste Formativo ....................................................................................90 Leituras Complementares .........................................................................................90 . Missões e Estruturas da Administração .........................................................93 Sumário ....................................................................................................................93 Objectivos da unidade ..............................................................................................93 1. Administração Pública .........................................................................................94 2. Missões da Administração ...................................................................................95 3. Administração Central do Estado ........................................................................98 4. Administração Indirecta do Estado ....................................................................100 5. Administração Local do Estado .........................................................................102 6. Administração Local Autárquica ........................................................................102 7. Delegação de Poderes e Competências ...............................................................104 8. Desconcentração, Descentralização e Devolução de Poderes ..............................106 Teste Formativo ......................................................................................................111 Respostas ao Teste Formativo ..................................................................................112 Leituras Complementares .......................................................................................112 . Organização Administrativa ..........................................................................113 Sumário ..................................................................................................................113 Objectivos da unidade ............................................................................................113 1. Diagnóstico dos Problemas de Estrutura ...........................................................114 2. Organograma ....................................................................................................116 3. Departamentalização .........................................................................................118 4. Princípios Gerais de Organização ......................................................................119 6
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Ciência da Administração
5. Estruturas Tradicionais ......................................................................................124 6. Estruturas Modernas .........................................................................................126 7. Estruturas Contemporâneas ..............................................................................128 8. Serviços Partilhados ...........................................................................................132 Teste Formativo ......................................................................................................133 Respostas às Actividades e ao Teste Formativo ........................................................134 Leituras Complementares .......................................................................................134 . Planeamento E Avaliação na Administração ................................................135 Sumário ..................................................................................................................135 Objectivos da unidade ............................................................................................135 1. Itinerário Teórico do Planeamento ....................................................................136 2. Planeamento Central .........................................................................................140 3. Planeamento Regional .......................................................................................142 4. Planeamento Local ............................................................................................145 5. Planeamento Organizacional ou de Actividades .................................................147 6. Planeamento e Gestão Estratégica .....................................................................152 7. Planeamento e Avaliação das Actividades na Administração Pública ..................160 8. Avaliação na Administração Pública ..................................................................162 Teste Formativo ......................................................................................................168 Respostas ao Teste Formativo ..................................................................................168 Leituras Complementares .......................................................................................169 . Decisão e Políticas Públicas ..........................................................................171 Sumário ..................................................................................................................171 Objectivos da unidade ............................................................................................171 1. A Tomada de Decisão ........................................................................................172 2. O Processo de Decisão ......................................................................................176 3. Modelos de Decisão ..........................................................................................177 4. Decisão Individual e de Grupo ..........................................................................182 5. Modelos de Avaliação e Decisão no Sector Público ............................................184 6. O Princípio da Decisão .....................................................................................190 7. Políticas Públicas ...............................................................................................191 Teste Formativo ......................................................................................................192 Respostas ao Teste Formativo ..................................................................................193 Respostas às Actividades .........................................................................................194 Leituras Complementares .......................................................................................194 . Gestão de Recursos Humanos ........................................................................195 Sumário ..................................................................................................................195 Objectivos da unidade ............................................................................................195 7
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Índice Geral
1. A Gestão Estratégica de Recursos Humanos ....................................................196 2. Princípios Orientadores da Gestão de Recursos Humanos: Regime jurídico ....200 3. Vínculos ..........................................................................................................201 4. Recrutamento e Selecção .................................................................................205 5. Carreiras .........................................................................................................206 6. Remunerações .................................................................................................208 7. Gestão e Avaliação do Desempenho ................................................................211 8. Mobilidade ......................................................................................................215 9. Exercício de Cargos Dirigentes ........................................................................216 10. Férias, faltas e Licenças .....................................................................................219 Teste Formativo ......................................................................................................225 Respostas ao Teste Formativo ..................................................................................225 Leituras Complementares .......................................................................................226 . Gestão Financeira ...........................................................................................227 Sumário ..................................................................................................................227 Objectivos da unidade ............................................................................................227 1. A Reforma da Administração Financeira do Estado ...........................................228 2. Funções e Regras do Orçamento .......................................................................230 3. Elaboração, Aprovação, Execução e Fiscalização do Orçamento .........................236 4. Regime de Administração Financeira do Estado ................................................238 5. O Plano Oficial de Contabilidade Pública .........................................................242 Teste Formativo ......................................................................................................248 Respostas ao Teste Formativo ..................................................................................248 Leituras Complementares .......................................................................................249 . A Reforma Administrativa e a Qualidade em Serviços Públicos ..............251 Sumário ..................................................................................................................251 Objectivos da Unidade ...........................................................................................251 1. A Modernização e a Reforma Administrativa .....................................................252 2. O Processo de Mudança ....................................................................................258 3. Evolução do Conceito de Qualidade ...................................................................261 4. As Normas ISO 9000 e a Certificação ...............................................................265 5. A Satisfação dos Clientes como Medida .............................................................267 6. A Qualidade nos Serviços Públicos ....................................................................269 7. O Modelo de Auto-avaliação da EFQM ............................................................273 8. O Modelo de Auto-avaliação da CAF ................................................................277 Teste Formativo ......................................................................................................279 Respostas ao Teste Formativo ..................................................................................280 Leituras Complementares .......................................................................................280 Bibliografia Geral ..............................................................................................281 8
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AGRADECIMENTOS
Nenhum manual nasce do nada. Por norma, tem origem no estado da arte que resulta da enorme concentração de trabalho e esforço dedicado de muitos investigadores de quem o autor é devedor. Para que este manual visse a luz do dia muitos autores contribuíram directa ou indirectamente. A muitos se faz referência e presta homenagem no interior do trabalho a poucos queremos destacar neste local por nos terem apoiado mais de perto com o seu estímulo ou com o seu trabalho. À Dr.ª Teresa Campos Andrada agradecemos a sua contribuição para a elaboração do Regime Jurídico da Função Pública que constitui um ponto importante do capítulo sobre a Função Recursos Humanos. Prestamos homenagem e reconhecimento aos colegas e amigos que contribuíram para este trabalho com sugestões e particularmente aos Professores Hermano Carmo e Dantas Saraiva, às Professoras Maria Engrácia Cardim e Elisabete Carvalho, aos Professores Lopes Rodrigues e Hugo Silvestre pelo estímulo para que este manual pudesse ver a luz do dia. Por fim, um agradecimento aos alunos da Universidade Aberta, do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa e de muitas outras universidades que estiveram presentes nos momentos mais difíceis da elaboração deste manual. Espero que este esforço lhes seja útil.
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1. A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA COMO OBJECTO DE ESTUDO
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. Gestão 2. Administração 3. Ciência da Administração em Sentido Lato 4. Ciência da Administração em Sentido Estrito: Objecto de Estudo 5. Autonomia da Ciência da Administração 6. Itinerário da Ciência da Administração 7. Origem da Ciência da Administração 8. A Perspectiva Gestionária: Managerialismo 9. A Reinvenção da Governação 10. O Novo Serviço Público Teste Formativo Respostas às Actividades Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a: • Relacionar gestão pública e gestão privada; • Distinguir a ciência da administração em sentido lato e em sentido estrito; 11
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
• • • • • • •
Identificar a especificidade da administração pública; Identificar as três perspectivas sociológicas da gestão; Distinguir gestão e administração; Identificar o papel do gestor; Explicar o objecto de estudo da ciência da administração; Indicar o itinerário da ciência da administração; Discutir a autonomia da ciência da administração face às restantes ciências sociais; • Relacionar a “nova administração pública” com a “reinvenção da governação”; • Elaborar um projecto de pesquisa em ciência da administração; • Distinguir um estudo científico sobre a administração pública de um estudo de ciência da administração.
1. GESTÃO Desde o início do século XX e, particularmente após a Segunda Guerra Mundial, devido aos escritos e à acção pessoal e pedagógica, em especial de Peter Drucker, a direcção das organizações vem sendo objecto de estudos de análise e de sistematização, por parte de investigadores que dão origem a novos modelos conceptuais que constituem um novo corpo organizado de conhecimentos, uma disciplina académica, habitualmente designada por gestão. Encarada, por vezes, como conjunto de ferramentas analíticas ou como conjunto de técnicas e truques, a gestão define regras que permitem estabelecer conexões de causa a efeito, a partir de uma sucessão de casos anteriores. De facto, as orientações para a acção, que propõe, vêm conseguindo resultados positivos na vida das empresas, acabando por conformar o modo como as organizações são dirigidas e por confirmar a validade dos pressupostos. No entanto, outros autores defendem uma perspectiva diferente, considerando a gestão como uma arte, pelo facto de corresponder a uma actividade que tem que ver com seres humanos, com motivações e projectos variados e interactivos, que não se enquadram em regras fixas que permitam prever consequências inevitáveis dos respectivos pressupostos. O que é curioso, contudo, é que aparecem convergências entre as duas linhas, que apontam para a validade de um tratamento científico, embora com pressupostos mais alargados, exigindo o estudo da acção humana livre. Esta acção humana começa quando duas ou mais pessoas têm de produzir algo em conjunto, e a imagem mais conhecida da gestão corresponde a um 12
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conjunto de processos racionais que visam atingir objectivos instrumentais, através da mobilização de tecnologias organizacionais eficientes 1. A ideia de gestão que acabamos de apresentar, tanto se aplica à gestão do sector empresarial privado como do público. O termo gerir tem origem na arte de manejar cavalos. Durante muitos anos gerir e administrar foram sinónimos e, ainda hoje, há cursos superiores, em Portugal, com designações de gestão e administração. Todavia, o termo gerir tende a aplicar-se mais à actividade desenvolvida por organizações empresariais – que visam o lucro, sujeitas às leis de mercado –, quer o seu capital social seja total ou parcialmente privado ou público. Por gestão pública, em Portugal, entendia-se a actividade desenvolvida pelas organizações empresariais do sector empresarial do Estado ou das Autarquias. As empresas cujo capital social pertence ao Estado ou às Autarquias, quer assumam a natureza de empresas públicas, quer de sociedades comerciais, integram-se numa designação comum de sector empresarial do Estado ou das Autarquias 2. Todavia, há, actualmente, quem defenda que as recentes tendências nas organizações públicas conduziram a uma nova gestão pública (public management), diferente da tradicional administração pública e da gestão empresarial. Esta é a posição nascida do “managerialismo”, um movimento surgido na década de 80, nos países anglo-saxónicos, que teve por base o chamado “consenso de Washington” e que admite que uma melhor gestão é a solução eficaz para os males sociais e económicos 3. Alguns autores 4 advogam que esta gestão pública funde a administração pública tradicional com a orientação instrumental da gestão privada. Não é, porém, esse o sentido que queremos dar aqui à expressão gestão pública 5. Em Portugal, Oliveira Rocha 6 defende que gestão pública e administração pública são conceitos que se sobrepõem.
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Mike Reed – The Sociology of Management. New York [etc.]: Harvester wheatsheaf, 1989. O autor desmonta nesta obra esta imagem estereotipada da gestão. 2 Veja-se Lei n.º 58/98 de 18 de Agosto (Lei das Empresas Municipais, Intermunicipais e Regionais);Decreto-Lei n.º 408/82, de 29 de Setembro (Código das Sociedades Comerciais); Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril e Decreto-Lei n.º 75-A/77, de 28 de Fevereiro (Lei das Empresas Públicas). 3 Vd. Christopher Pollit – Managerialism and the Public Services: Cuts or cultural change in the 1990s. 2nd ed., Oxford: Blackwell Publishers, Ltd., 1993, p. 1. 4 V. J. Perry e K. Kraemer – Public Management: Public and Private Perspectives. California: Mayfield, 1983. Citado por David Farnham e Sylvia Horton – Managing Private and Public Organisations. In D Farnham e S. Horton (ed.) – Managing the New Public Services. 2nd ed., London: MacMillan Press, Ltd., 1996, p. 25. 5 C. C. Hood – Public management for All Season. Public Administration, 69, 3-19; Vincent Ostrom – The Intelectual Crisis in American Public Administration. Alabama: Alabama University Press, 1971. 6 Oliveira Rocha – Princípios de Gestão Pública. Lisboa: Presença, 1991.
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
O que é a gestão? Será a gestão um processo racional de planeamento, organização, comando, coordenação e controlo? Mike Reed 7 analisou o processo de gestão ao longo deste século, na tentativa de identificar tal processo, e chegou à conclusão que há três perspectivas diferentes: técnica, política e crítica. Isto significa que, para o autor, a ideia que os especialistas e os práticos têm de gestão não é a mesma. Na perspectiva técnica a gestão é um instrumento racionalmente concebido para a realização de objectivos instrumentais. Esta perspectiva faz uso da teoria sistémica, e a sua estratégia de acção é a valorização da eficácia organizacional. Na perspectiva política, a gestão surge como um processo social de negociação, para regulação do conflito de grupos de interesse, num meio envolvente caracterizado por incertezas consideráveis acerca dos critérios de avaliação do desempenho organizacional. Esta perspectiva rompe com a racionalidade e a tendência determinista, implícita na perspectiva técnica anterior. A gestão concentra-se nas transformações permanentes do equilíbrio de interesses e de poder que se gera no quadro dos órgãos de gestão, o que pode gerar comportamentos não racionais dos actores envolvidos. Na perspectiva crítica, a gestão surge como um mecanismo de controlo destinado à extracção máxima de mais-valias, que funciona para satisfação dos imperativos económicos impostos pelo modo de produção capitalista, e para difundir o quadro ideológico que permite obscurecer estas realidades estruturais. Esta caracterização dos processos e das estruturas de gestão encontra-se ligada à abordagem marxista das organizações. A perspectiva técnica é, claramente, a mais conhecida e de maior utilização quotidiana e está presente nas diversas acções de formação ministradas. A perspectiva política e crítica são mais conhecidas e utilizadas pelos investigadores, mas têm menor impacto na vida quotidiana das empresas e dos gestores. Perspectivas sobre a Gestão Temática 1. Perspectiva técnica
7
Instrumentos racionalmente concebidos para a realização de objectivos instrumentais
Modelo Estratégia de explicação de acção Teoria sistémica Valorização da eficácia da configuração organizacional
Mike Reed – The Sociology of Management. New York [etc.]:Harvester Wheatsheaf, 1989. p. 1-32.
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Temática 2. Perspectiva política
3. Perspectiva crítica
Processo social de negociação para regulação de conflitos de grupos de interesse Mecanismo de controlo destinado à extracção máxima de mais-valias
Modelo de explicação Teoria da acção
Teoria marxista
Estratégia de acção Aperfeiçoamento das capacidades de negociação dos que exercem funções de gestão Evitar, aos profissionais de gestão, visões distorcidas da realidade social
Fonte: Mike Reed – ob. cit. p. 14.
Para sabermos o que é a gestão, podemo-nos interrogar sobre o que fazem os gestores, e quais as suas funções e tarefas? Henry Mintzberg fez notar: “se perguntar a um gestor o que é que ele faz, provavelmente responderá que planeia, organiza, coordena e controla. Em seguida, observe o que ele de facto faz, e não fique surpreendido se não conseguir relacionar o que vê, com aquelas quatro palavras” 8. O autor conclui que o gestor desempenha dez papéis integrados em três grupos diferentes: relações interpessoais, informação, decisão. O papel interpessoal diz respeito à representação formal, ligação entre colegas e liderança dos subordinados. O papel relativo à informação integra a monitorização, a disseminação e interlocutor para o exterior. O papel de decisor envolve o de empreendedor, que inicia a mudança, o de controlador da perturbação, de responsável pela afectação de recursos e negociador 9. Normalmente as actividades de um bom gestor implicam: – Estabelecimento de objectivos claros; – Sua comunicação à organização; – Afectação de recursos para que os objectivos sejam atingidos; – Controlo de custos; – Motivação do pessoal; – Aumento da eficiência; – Actuação estratégica e pro-activa. 10
8 Henry Mintzberg – The Manager’s Job Folklore and Fact. Harvard Business Review. 53:4 (1975) 49; – Nature of Managerial Work. London: Harper& Row, 1973. 9 – Nature of Managerial Work. London: Harper& Row, 1973. p. 56-57. 10 Christopher Pollitt, ob. cit., p. 5.
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
Durante os anos 80, também se discutiu, bastante, a necessidade dos gestores de topo formarem e gerirem culturas organizacionais conducentes a um melhor desempenho, sobretudo após a publicação de ln Search of Excellence de Tom Peters e Robert Waterman. 11 A gestão não é apenas gestão de negócios (business). É parte integrante de todas as iniciativas humanas que reúnam numa organização pessoas com diversos conhecimentos e competências. Tem de ser aplicada a todas as instituições do sector terciário, como hospitais, universidades, associações privadas sem fins lucrativos, organismos públicos. Por todo o mundo a gestão tornou-se numa função social. Actividade 1 Escreva cerca de mil caracteres (uma página A4), respondendo, de forma fundamentada, à questão: Pode o Estado ser accionista de uma sociedade anónima?
2. ADMINISTRAÇÃO O termo administrar remonta às expressões latinas administratio e ad ministrare. Os etimologistas não estão de acordo quanto à origem de ad ministrare. Para uns seria ad manus trahere, sinónimos de trazer à mão, conduzir, servir e manejar. Segundo outros, derivaria de minister – o agente, auxiliar, o intermediário na realização de um serviço. Têm sido atribuídos diversos sentidos ao termo Administrar. De acordo com o Código das Sociedades Comerciais, as sociedades por quotas dispõem de conselhos de gerência, enquanto as sociedades anónimas têm conselhos de administração. Esta diferença parece induzir uma certa hierarquia entre os dois termos: administrar seria uma actividade superior à de gerir. Por outro lado, e em sentido oposto à hierarquia anterior, quando se quer referir a actividades rotineiras fala-se em administração como no exemplo: pessoal administrativo. Administrar, durante o século XX, foi uma actividade vista como: a interpretação das missões e objectivos fixados por quem de direito, e a sua transformação em acção organizacional – produção de bens ou serviços –, através do planeamento, organização, direcção e controlo, de todos os esforços realizados, a fim de atingir tais objectivos.
11
Thomas J. Peters e Robert H. Waterman Jr. – ln Search of Excellence (Na Senda da Excelência). 2.ª ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1987.
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Tem havido tentativas para determinar o que seja a actividade de administrar, e o seu significado e amplitude sofreram grande aprofundamento e ampliação. De entre as muitas definições desta actividade, uma das mais simples, é a de Gulick: “a administração tem a ver com fazer coisas; com a prossecução de objectivos definidos”. Administrar tem, efectivamente, a ver com fazer coisas e alcançar objectivos, num contexto organizacional. Vimos, no ponto anterior, que gerir e administrar têm sido sinónimos, designando ambos os termos a mesma actividade ou processo. Por isso, não admira que o carácter instrumental e a convicção de que a administração tem a ver com a prossecução de objectivos – apresentando um carácter determinístico, racional e instrumental – sejam, de resto, frequentes em gestão. Assim, administrar é uma actividade que, tal como gerir, se expressa através da combinação de recursos, que dão entrada num processo de transformação, e saem sob a forma de bem ou serviço, num contexto organizacional. Vale a pena lembrar, que o termo organização tem origem no grego organon, que significa instrumento, utensílio. Ora, é com este instrumento chamado organização, que o “fazer coisas, prosseguindo um determinado objectivo”, se transforma em administração. É que nem toda a acção destinada a obter um efeito é administração. Por isso, é compreensível que se encare a administração como uma decorrência da teoria organizacional, como um processo que tem lugar no âmbito da actividade organizacional. O que distingue o trabalho de administração, do restante trabalho que tem lugar numa organização, é o facto do trabalho de administração ter a ver com o futuro. É ele que deve traçar o rumo geral, definir a visão a missão, e os objectivos globais da organização, condições para a sua sobrevivência saudável por longo prazo. Se no sector privado os termos administrar e gerir são usados ao longo do século passado de forma mais ou menos indiferenciada, dependendo do contexto o sentido em que a expressão é utilizada, é certo que em Portugal sempre se usou e continua a usar a expressão “administração pública” com duas acepções bem distintas. Por um lado, um modo de organização específica e concreta (conjunto de instituições) que visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegido dos cidadãos. Por outro lado, a acção de organizar, de impor o cosmos no caos que é objecto da teoria organizacional ou da sociologia das organizações. No Brasil o termo “administração” aplica-se independentemente ao setor público e ao privado. Assim, um curso de administração pode ser sinónimo de gestão de negócio ou de gesetão pública. Actividade 2 Encontre no texto e sublinhe o que é a administração para Gulick? 17
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
3. CIÊNCIA
DA
ADMINISTRAÇÃO
EM
SENTIDO L ATO
A ciência da administração, em sentido lato, tem como objecto de estudo a administração privada como a pública e confunde-se, frequentemente, com a teoria organizacional. Um bom exemplo de definição de ciência da administração em sentido lato encontra-se em Herbert Simon: “uma ciência da administração prática consiste em propostas, relativamente ao modo como os homens devem agir, se quiserem que da sua actividade resulte o maior grau de realização dos objectivos administrativos” 12. Simon integra-se num grupo de teóricos conhecidos por generics theorists que pugnam por uma concepção unitária e homogeneizada da ciência da administração, que esbate o que há de específico na administração pública face à administração privada. A ciência da administração, em sentido lato, não valoriza a instrumentalidade do poder político, ou seja, o contexto político da actividade administrativa. Não concede também qualquer especificidade no campo técnico à gestão financeira e orçamental pública, à gestão de recursos humanos no contexto público (função pública), ao planeamento público (nomeadamente nas vertentes de planeamento central, sectorial, regional e municipal), à produtividade pública, etc.,. Em sentido lato, a ciência da administração confunde-se com a ciência da gestão, e não apresenta um corpo teórico diferente. A título de ilustração, referem-se dois casos de sistematização elaborados por dois autores, cujas obras têm sido ensinadas a diversas gerações de jovens de língua portuguesa. Em primeiro lugar, Idalberto Chiavenato 13, que organizou a sua obra intitulada “Introdução à Teoria Geral da Administração”, do seguinte modo: introdução à teoria geral da administração, primórdios da administração; abordagem clássica da administração; abordagem humanística; abordagem estruturalista; abordagem neoclássica; abordagem comportamental e abordagem sistémica. Em segundo lugar, David R. Hampton 14, que atribuiu à sua obra “Administração Contemporânea”, a seguinte estrutura: elementos da organização, motivação grupos e organizações informais, tecnologia; planeamento, organização, direcção, controles, e mudança organizacional. As diferenças que se podem verificar, nos manuais de ensino prendem-se ou com as preferências pessoais dos autores, ou com as suas posições teóricas, em 12
Herbert Simon – Administrative Behaviour: A study of decision making processes in administration organization, 4 th. New York: Free Press, 2000 (1945) p. 253. 13 Idalberto Chiavenato – Introdução à Teoria Geral da Administração. São Paulo [etc.]: McGraw Hill, 1980. 14 David R. Hampton – Administração Contemporânea, 3.ª ed.. São Paulo [etc.]: McGraw Hill, 1992.
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termos de modelos ou paradigmas científicos seguidos. É o caso de que falámos das três perspectivas identificadas por Mike Reed 15, sobre o ensino e investigação em gestão. Todavia, a administração pública possui especificidades face à administração privada, derivadas do contexto político da sua actividade (dependência dos órgãos políticos, representativos da comunidade), e da sua missão (assegurar a satisfação de necessidades colectivas) 16. Por isso, os termos administrar e administração, no âmbito desta obra e a partir deste momento, serão reservados para designar actividade e processos, desenvolvidos por organizações públicas de tipo não empresarial. Actividade 3 Que defendem os generics theorists? (Compare o que escreveu com a resposta que se encontra no final da unidade)
4. CIÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO DE E STUDO
EM
SENTIDO E STRITO : OBJECTO
A ciência da administração, em sentido restrito, trata do estudo científico da administração pública, como entidade no seio da qual se desenvolvem actividades administrativas, destinadas à satisfação de necessidades colectivas. A satisfação de necessidades colectivas pela administração pública confere-lhe uma especificidade: dependência instrumental do poder político. A sujeição da administração pública ao poder político afasta-a do âmbito da administração privada, que está marcada pelo mercado e suas leis. A administração privada prospera e fracassa com o mercado. O mercado emite sinais onde há carências e onde há excedentes desnecessários. É, justamente com os incentivos e as penalidades, um estímulo à invenção e ao aperfeiçoamento. Nem Adam Smith, nem os seus sucessores, salvo raras e extremas excepções, acreditavam que a actividade pública, no seu total, devia ser da responsabilidade do mercado. Há lugar para o Estado e as Autarquias, pelo menos, suprirem as carências de mercado e desenvolverem actividades públicas, quer sob a forma de prestação de serviços, quer de regulação.
15
Mike Reed – ob. cit.. João Bilhim – Administração do Território e Regionalização. In ISCSP – 90 anos: 1906-1996. Lisboa: ISCSP, 1996. p. 249-269. 16
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
A administração pública actua num contexto de constrangimentos jurídico-formais, que sobrepõe os aspectos processuais o “como deve ser feito” aos objectivos ou “o que deve ser feito”. A administração privada está sujeita à lei da falência, ou seja, morte da actividade organizacional, ao passo que a administração pública, por razões de ordem política, nomeadamente o preço, pode continuar a sobreviver à custa de fundos públicos e através de dotações orçamentais. O poder político pode sustentar uma actividade de administração pública, independentemente do seu êxito ou fracasso. Diversos autores 17 apontaram diferenças entre a administração privada e a administração pública. Para o Prof. Freitas do Amaral 18, “embora tenham em comum o serem ambas administração, a administração pública e a administração privada distinguem-se todavia pelo objecto sobre que incidem, pelo fim que visam prosseguir, e pelos meios que utilizam”. Quanto ao objecto, a administração pública trata das necessidades colectivas, assumidas como tarefas e responsabilidades próprias da colectividade, ao passo que a administração privada trata das necessidades individuais. Quanto ao fim, a administração pública prossegue o interesse público, enquanto a administração privada prossegue fins particulares, pessoais. Quanto aos meios, a administração pública utiliza o comando unilateral, quer a forma de acto normativo (regulamento administrativo), quer a forma de decisão concreta (acto administrativo). Pelo contrário, a administração privada usa o contrato civil – instrumento jurídico típico da administração privada –, baseado no princípio da igualdade das partes. L. Willcocks e J. Harrow procuraram, também, diferenciar os serviços públicos do sector privado, tal como podemos ver abaixo: Principais diferenças entre os serviços públicos e o sector privado Serviços Públicos
Sector Privado
Regulamentação; códigos de conduta
Conselho de administração; enquadramento condicionado pelo planeamento da empresa
Necessidades provindas da gestão da economia nacional
Indicadores do mercado
Relativa transparência da administração e a tomada de decisão –, ênfase sobre os representantes
Relativo secretismo; ênfase sobre a confidencialidade do negócio
17
J. Setwart; S. Ranson – Management in the Public Domain. Public Money and Management. 8:2 (1988) 13-19. 18 Freitas do Amaral – Curso de Direito Administrativo, Vol. I.. Coimbra: Almedina, 1993. p. 41.
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Ciência da Administração
Serviços Públicos
Sector Privado
Público atento; uma base ampla de multiFoco primordial nos accionistas e na gestão -interessados (stakeholders); impacto de stakeholders; impacto de corpos corpos reguladores subsidiários Múltiplos valores e objectivos: Serviço; Interesse público; Equidade; Profissionalismo; Relativamente restritos Participação do utente; Trocas complexas Fonte principal de recursos: impostos
Fonte principal de recursos: receitas operacionais e empréstimos
Ampla responsabilidade
Responsabilidade restrita
Dar resposta às orientações políticas e aos horizontes de curto prazo
Não há uma sobreposição política nacional: local real; menos constrangimentos artificiais em tempo
Objectivos sociais primordiais, ex segurança, saúde, educação, entre outros
Objectivo primordial: lucro
Indicadores de desempenho complexos e discutíveis.
Sobretudo medidas quantitativas de carácter financeiro
Directivas políticas ambíguas: complexidade na implementação
Políticas relativamente menos ambíguas
Fonte: Adaptação de Willcocks e Harrow, ob. cit., p. XXI
As diferenças entre os serviços públicos e os privados resultam de factores únicos e específicos inerentes às organizações públicas, e que restringem a sua descrição, estruturas e estilos de gestão. Estes factores incluem: • • • •
Controlo por políticos eleitos; Enquadramento legal destinado especificamente aos serviços públicos; Relativa abertura; Responsabilidade perante uma série de garantias do interesse público. 19
As diferenças entre a gestão nas organizações privadas e nas públicas resultam, em última análise, dos respectivos contextos e orientações.
19
D. Farnham; S. Horton, ob. cit. p. 45.
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
Contexto e Orientação do Sector Privado e do Sector Público Sector Privado Contexto Orientação
Dirigido pelo mercado Satisfação das necessidades dos clientes como meio para se alcançar lucros
Sector Público Dirigido pelos políticos Satisfação das exigências políticas, como um meio para a integração política e estabilidade social
Fonte: Adaptação de D. Farnham e S. Horton, ob. cit., p. 45
Em resumo, a Administração Pública enquanto Estado-administração, pessoa colectiva pública e Administração do Estado que integra diversas pessoas colectivas públicas distingue-se das restantes organizações em dois pontos essenciais: pertença obrigatória dos cidadãos ao Estado-administração; o Estado dispõe de poderes de coacção (jus imperium) e privilégio de execução prévia”, exerce-os sem precisar da aquiescência dos indivíduos. Estas duas características serão suficientes para fundamentar uma diferença essencial entre a administração privada e a pública? Se entendermos a administração como um conjunto de padrões formais e informais de comportamento e processos que regem o comportamento dos indivíduos que integram a Administração do Estado (sistemas de remuneração, de incentivos e restrições, mecanismos de coordenação e supervisão, fluxos de informação, relações hierárquicas) a resposta deve ser negativa 20. Os problemas da administração pública podem ser analisados e solucionados com o apoio dos conceitos, modelos e técnicas em uso na administração privada. A administração pública é essencialmente administração (decisões de coordenação e motivação, destinadas a obter resultados através do cooperação dos outros indivíduos, utilizando recursos materiais escassos). Não são a complexidade, o tamanho, a sua natureza hierárquica traços específicos e muito menos essenciais da administração pública. Há organizações privadas grandes, complexas e hierárquicas. A diferença entre a administração privada e a pública situa-se fundamentalmente ao nível do enquadramento. De facto, a administração pública tem lugar numa envolvente particular e específica de restrições impostas pelo carácter jurídico-político que a envolve. A Administração Pública está marcada pela supremacia do direito e da natureza política dos seus fins. Deste ponto de vista, faz tanto ou mais sentido escrever um manual ou ensinar administração pública como administração das instituições financeiras, industriais, de serviços, etc. “É um aspecto de um conceito mais geral – a adminis-
20
João Bilhim – Ciência da Administração: Relação público/privado. In António Tavares (Coord.) – Estudo e Ensino da Administração Pública em Portugal. Lisboa: Escolar Editora, 2006.
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tração – cuja essência é descrita como conjunto de acções destinadas a obtenção de um determinado resultado ou atribuições” 21 Será que a Administração Pública Portuguesa mudou nos últimos vinte anos? O seu verdadeiro significado mudou profundamente. É que a Administração perdeu uma força laboral composta por trabalhadores pouco qualificados e ganhou em contrapartida uma força de trabalhadores e funcionários do conhecimento em certos casos altamente qualificados. Isto teve como consequência que muitas das suas funções, atribuições e competências foram alteradas por força daquela alteração demográfica. Acresce que se encontra em curso um processo que pode levar à substituição do paradigma jurídico tradicional, napoleónico pelo paradigma gestionário. Tradicionalmente à pergunta: o que faz um funcionário, obtinha-se como resposta: interpreta e aplica a lei. Agora a resposta é outra: melhora continuamente a qualidade do serviço que presta. Neste novo paradigma a interpretação da lei é uma condição para a melhoria, deixou de ser a razão de ser final da administração. Actividade 4 Compare a razão de ser da política e da ciência da administração.
5. AUTONOMIA
DA
CIÊNCIA
DA
ADMINISTRAÇÃO
Não existe, ainda, um acordo total entre os cientistas sociais, acerca da administração pública poder constituir uma ciência autónoma, integrada na família das ciências sociais. Para alguns destes cientistas sociais os estudos científicos da administração pública sobrepõem-se, total ou parcialmente, com a Teoria Organizacional, com o Direito Administrativo e, ainda, com a Ciência Política. Na Europa Continental houve um predomínio do método jurídico nos estudos sobre a administração pública. Esta hegemonia do direito administrativo teve como consequência a sobrevalorização dos aspectos normativos, e a ocultação da teoria e comportamento organizacionais. Nos Estados Unidos da América e em Inglaterra passou-se o mesmo fenómeno, mas com sinal contrário. Valorizando-se os aspectos ligados ao poder e ao comportamento organizacional, ignoraram os aspectos formais e legais. Mas qual é o corpo teórico da ciência da administração? Qual é a sua matriz teórica, entendida esta como conjunto organizado de conceitos e relações entre conceitos referidos directa ou indirectamente ao real? As respostas a estas perguntas 21
Ferrel Heady – Public Administration, 4th ed.. New York: Marcel Dekker, Inc., 1991, p. 2.
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
não são fáceis. Por isso, não descobrindo tal corpo teórico, há quem defenda que a ciência da administração, em sentido lato, ou em sentido restrito, não passa de uma pura aplicação da ciência. Para suprir esta carência há quem lance mão do contributo de outras ciências e reúna num todo, os contributos para o conhecimento, a compreensão e a explicação do fenómeno administrativo. É, em nosso entender o caso de Rosenbloom 22, para quem a teoria da administração pública deve integrar (assemble) três abordagens distintas – gestionária, política e legal –, para que haja um efectivo corpo teórico. Para Dwight Waldo 23, num trabalho sobre o pensamento de Woodrow Wilson – pai da administração pública dos Estados Unidos da América –, “o que Wilson estava tentando fazer como o estudo da administração pública era uma combinação da política, do direito público e da gestão, tudo isto iluminado pela história e pelos estudos comparados”. Para Freitas do Amaral, a Ciência da Administração apresenta três perspectivas diferentes, que se conjugam: uma de análise (sociologia da administração); uma de construção teórica (teoria da administração); uma de proposta crítica (reforma administrativa). A ciência da administração tem, até ao presente, integrado contribuições de diversas ciências sociais, e estas têm estudado a administração pública a partir de ângulos de visão próprios e, simultaneamente, diversos uns dos outros. Todavia, todas as ciências sociais se preocupam em explicar, articuladamente, a relação entre conduta humana e as condições materiais e simbólicas que dela resulta e por sua vez a determina. Fruto deste enorme contributo, os pais fundadores da Ciência da Administração são, igualmente, de outras ciências sociais, tais como: Max Weber, sociólogo e economista; Pierre Grémion, sociólogo; Pierre Langrod e Goodnow juristas; Gaus, politólogo; entre outros. Significa isto que não estão ainda, devidamente, reconhecidas pela comunidade científica, a existência de uma agenda de investigação, a formulação de uma problemática teórica específica e uma metodologia firme, que ilumine os passos da pesquisa. Já existe, todavia, há vários anos, ensino sobre a administração pública e revistas específicas, onde são divulgados trabalhos sobre este tema na óptica das ciências sociais. Estão reunidas as condições, para que novos cultores possam surgir neste campo. Em Portugal, as Faculdades de Direito trataram o tema da administração pública no âmbito exclusivo do direito administrativo, seguindo, naturalmente, 22
David H. Rosenbloom – Public Administration Theory and the Separation of Powers. Public Administration Review. 43 (1983) 219-227. 23 Dwight Waldo – The perdurability of Politics-Administration Dichotomy in Jack rabin; James s. Bowman – Politics and Administration. New York: marcel Dekker, Inc. p. 219-233.
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Ciência da Administração
o método jurídico. Pelo contrário, a escola que teve a seu cargo a formação de administradores para o antigo ultramar português e, no pós 25 de Abril, a formação de gestores e administradores públicos – o Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina – adoptou um modelo mais próximo do americano, inspirado na Universidade de Colúmbia. No final do século XX, a Ciência da Administração tende, no nosso País, a surgir autonomamente no interior das ciências sociais. Para tal, tem contribuído o Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, da Universidade de Lisboa, as Faculdades de Direito, a Universidade do Minho e a Universidade Aberta e em muitas Escolas que integram os Institutos Politécnicos do País. A ciência da administração é interdisciplinar, circunstância que lhe confere ambiguidade e riqueza. Trata-se de uma ciência aplicada que lança mão de paradigmas de diversas áreas do conhecimento para adaptar a um determinado contexto. O seu objecto mantém-se como gestão dos assuntos públicos pese embora a sua evolução ao longo do tempo e entre países. Há relativo consenso sobre quais as área científicas que integram a ciência da Administração: Direito Administrativo, Teoria e comportamento organizacional, Teorias da Administração Pública, Gestão Pública e Políticas Públicas, Missões ou Funções do Estado, Economia Pública. Acresce que, actualmente, há um crescente interesse pelas teorias da escolha pública e da decisão. Em Portugal e na Europa Continental, está em curso uma aproximação à perspectiva americana do Management, pese embora o facto de tal aproximação respeitar e salvaguardar a legalidade, a legitimidade e um conjunto de imperativos constitucionais. Actividade 5 O que é que todas as ciências sociais tentam explicar?
6. ITINERÁRIO
DA
CIÊNCIA
DA
ADMINISTRAÇÃO
A Ciência da Administração numa perspectiva jurídica teve uma origem e insere-se na evolução dos estudos de cameralismo dos séculos XVII e XVIII. Todavia, foi Bonnin (Bonnin 1808) que definiu a administração pública como campo de estudo, continuando por um conjunto de pensadores franceses, alemães, americanos e italianos. O cameralismo é uma designação genérica para classificar um conjunto de escritos heterogéneos, sobre a administração pública, elaborados numa perspectiva prática e sem preocupação científica, na sua maioria de autores alemães. 25
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
Os historiadores não estão de acordo sobre qual o autor que esteve na origem da transformação do cameralismo numa verdadeira ciência. Para Langrod, foi Sonnenfels e para Small terá sido Justi 24. No século XIX, a divulgação do princípio da separação de poderes, e o êxito do Estado liberal, levaram a que a ciência do direito administrativo adquirisse uma posição hegemónica nos estudos dedicados à administração pública. Foi neste ambiente marcado pelo direito administrativo que Lorenz Von Stein, autor hoje aceite como fundador da moderna ciência da administração, escreveu a sua monumental obra “Verwaltungslehre”, publicada entre 1865 e 1884. Von Stein defendeu, uma tendência dominante no seu tempo e que viria ainda a persistir durante décadas, contra o carácter unitário da ciência da administração. A este propósito, escreveu João Caupers: “Stein, lutando isoladamente contra a vaga de fundo do direito administrativo, contra nomes respeitados como Orlano, Otto Mayer e Laferrière, não pôde obstar ao eclipse que a ciência da administração já então atravessava” 25. Nos E. U., A. a Ciência da Administração nasceu marcada pelo conceito de sociedade industrial e por um sentimento, fortemente antijurídico e sem grandes pontos de contacto, com o pensamento europeu, apesar da proximidade cronológica das suas produções. Para outros autores, o estudo de Woodrow Wilson 26 sobre “The Study of Administration” e as suas lições sobre administração na Universidade de Johns Hopkins, correspondem ao nascimento da disciplina da administração pública, na América. Outros, ainda, entendem que é a obra de Frank Goodnow, “Politics and Administration”, publicada em 1890, que marca o verdadeiro início dos estudos científicos sobre a administração pública 27. Leonard White publicou, em 1926, a sua “Introduction to the Study of Public Administration” e, 1927 foi o ano em que William Willoughby deu ao prelo “Principles of Public Administration”. A substantiva intervenção do Estado no sector económico, na década de 30 do século passado, esteve na origem da publicação de um número muito signifi-
24 João Caupers – A Administração Periférica do Estado: Estudo de Ciência da administração. Lisboa: Ed. Notícias, 1994. p. 21; Sousa Franco – Manual de Finanças Públicas e Direito Financeiro, Vol.I. Lisboa, 1974. p. 216. 25 João Caupers – A Administração Periférica do Estado: Estudo de ciência da administração. Lisboa: Ed. Notícias, 1994. p. 21. 26 Cfr. Wilson’s Era: Philosopby and Times in Jack Rabin e James Bowman Politics and Administration. Nova lorque: Marcel Dekker, Inc. 1984. p. 17-49. 27 Cfr. Georges Langrod – La Science et I’Enseignement de I’Administration Publique aux Êtats-Unís. Paris, 1954. p. 41.
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cativo de obras. Em 1935 “Public Administration”, de John Pfiffner e em 1937, os “Papers on the Science of Administration” 28, por exemplo. Esta última publicação reúne as contribuições de autores que publicavam matérias ligada à gestão em geral, e hoje classificadas como integrando a metáfora mecanicista 29, entre os quais L. Urwick, J. Mooney, M. Dimock e L. Gulick. Não há dúvida de que, até à Segunda Guerra Mundial, a Ciência da Administração apresentou um nível de desenvolvimento mais avançado nos EUA que na Europa. Do lado europeu há duas excepções: o francês Henri Fayol (l841-1925), 30 e o alemão Max Weber (l864-1920), 31 que ficou conhecido mundialmente a partir da sua tradução para inglês, pela mão de um americano, Talcott Parsons. Weber representa um papel de grande destaque no pensamento das ciências sociais, desde a sociologia à economia, e na gestão salientou-se pela forma como caracterizou as organizações de tipo burocrático. As suas ideias encontram-se, porém, muito próximas das de F. W. Taylor (l856-1915) 32. Ambos defendem um modelo organizacional mecanicista, marcado pela: previsibilidade, racionalidade, controlo e impessoalidade. Henri Fayol também não esteve distante do grande organizador da indústria americana no início do século XX, Taylor. O autor francês, dando mais ênfase à estrutura e ao poder formal do que às funções e tarefas, representou para a organização administrativa o que Taylor significou para a organização industrial. O ponto de maturidade epistemológica da administração pública situa-se a meados do século XX. Foi uma época de revolução científica. Nos EUA, a pós-guerra permitiu lançar um novo e mais intenso dinamismo nos estudos sobre a ciência da administração, de que o ano de 1947 é expressão. Nesse ano, Simon 33 desenvolveu a sua teoria da racionalidade limitada, pondo em causa o princípio basilar do modelo mecanicista e Robert Dahl publicou o importante artigo intitulado, “The Science of Public Administration: Three Problems” 34 Ainda nos E.U.A. Waldo 35 introduziu uma nova perspectiva sobre os estudos da Administração Pública, até então marcados pela preocupação da eficiência e, 28 Lutlier Gulick & Lyndall F. Urwick (ed) – Papers on the Science of Administration. Nova Yorque: Columbia University, Institute of Public Administration, 1937. 29 Cf. Gareth Morgan – Images of Organization. Londres: Sage, 1986. p. 19-39. 30 Henri Fayol – Administration Industrielle et Générate – Prévoyance, Organisatíot, Commandement, Coordination, Controle. Paris: Gatithier-Villars, (l9l6), 1981. 31 Max Weber – Social and Economic Organizations. Londres: Free Press, 1947. 32 Frederick W. Taylor – The Principles of Scientific Management. Nova Yorque:Harper & Row, 1911. 33 Veja-se G. Morgan – Images of Organization. Londres: Sage, 1996, pp. 81-84; Herbert Simon e outros, Public Administration. Nova Yorque: Alfred A. Knopf, 1950. 34 Robert Dahl, The Science of Public Administration: Three problems. Public Administration Review. 7 (1947). p. 1-11. 35 Dwight Waldo – The Administrative State, 2.ª ed. New York: Holmes and Meier, (l949), 1984.
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
nessa medida, numa óptica comum à da administração privada. Tendo estudado na Europa, o autor, tornou-se mais sensível às questões da relação entre a administração pública e a política. Assim, as questões relacionadas com a medição da produtividade e o retorno do investimento público têm, na sua opinião, de entrar em linha de conta com a valorização dos aspectos de “serviço público” que, em geral, os estudos sobre a administração privada não têm que ponderar. Os anos cinquenta são marcados pela publicação de: “The Study of Public Administration”, de Waldo, em 1955, e “The Bureaucracy in Modern Society” de Peter Blau, em 1956. A década de sessenta vê aparecer: “Administrative Organization” e “Public Administration” de Pfiffner, respectivamente, em 1960 e 1967. Howard McCurdy, num estudo feito com base nas vinte obras mais citadas nos EUA, em dois períodos de transição, da década de sessenta para a de setenta e desta para a de oitenta, conclui que, no primeiro período houve um forte abrandamento das temáticas da administração pública, e no segundo um fortíssimo incremento dos temas da Ciência da Administração. Na Europa, a Ciência da Administração está ligada à matriz do Estado nação, daí o seu pendor mais jurídico. O seu renascimento teve lugar na década de sessenta, como resultado da acção de dois franceses: Georges Langrod e Roland Drago. Langrod publicou uma vastíssima bibliografia, com destaque que para o “Traité de Science Administrative” em 1966. Drago publicou, “Les Missions de I’Administration” e foi quem assegurou, no início da década de sessenta, a cadeira de Ciência da Administração, em Paris. Na década de setenta foram publicados três manuais que merecem ser assinalados: “lntroduction à la Science Administrative”, de Bernard Gournay, “Science Administrative”, de Charles Debbasch, e “Science Administrative” de J. Chevallier e D. Loschak. Numa perspectiva mais sociológica, será de destacar, em França, os contributos de Michel Crozier e lsabelle Orgogozo. Em Portugal, no século XIX, merecem destaque, as seguintes obras: “Instituições de Direito Administrativo Português”, de Justino de Freitas, publicado em 1861, e “Estudos de Administração”, de Lobo d’Ávila, em 1874. São, no fundo, manuais de direito administrativo, embora o livro de Lobo d’Ávila integre matérias que poderiam constar no índice de um manual de ciência da administração. Na obra, “Curso de Sciência da Administração e Direito Administrativo”, publicada já no século XX, o autor, Guimarães Pedrosa, parece ultrapassar os conteúdos e a visão estritamente normativos e jurídicos do tema, embora a Ciência da Administração apareça, ainda, como subsidiária do Direito. Marcello Caetano, Afonso Queiró e Freitas do Amaral, embora nas suas obras não seja abordada a ciência da administração, não deixam de dedicar ao tema algum tempo. Esforçaram-se, também, por distinguir a ciência da administração 28
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Ciência da Administração
do direito administrativo e por incentivar a emergência, em Portugal, da ciência da administração, como ciência social autónoma. Mais recentemente, a Universidade do Minho, as Faculdade de Direito e a Universidade de Lisboa atribuíram umas duas dezenas de doutoramentos nesta área científica e centenas de dissertações de mestrado já foram aprovadas. A Ciência da Administração, enquanto ciência da administração Pública ganhou finalmente o seu espaço e muitos profissionais estão a ser lançados no mercado de trabalho. Actividade 6 Caracterize a ciência da administração nos Estados Unidos da América e na Europa.
7. ORIGEM
DA
CIÊNCIA
DA
ADMINISTRAÇÃO
Já vimos que a Ciência da Administração tem uma dupla origem. E apresenta dois tipos de investigação diferentes. O primeiro, europeu, que tem muito a ver com a Administração Pública, concebida como instrumento de acção do Estado. O segundo, que aparece tardiamente nos Estados Unidos, é uma ciência que se interessa pela organização, e transcende as fronteiras entre o público e o privado. A emergência destas concepções deu origem às duas tradições existentes na ciência da administração. Não há dúvida, porém, que ambas têm a ver com o contexto socio-político bem característico que está subjacente a cada uma. No primeiro caso, é a construção de um “Estado de Nação”, na Europa. No segundo, o desenvolvimento do conceito de “sociedade industrial”, nos Estados Unidos 36. A partir dos anos sessenta destacam-se na ciência da administração três concepções diferentes: a) Uma concepção jurídica: marcada pelo objectivo de conhecer as estruturas de funcionamento da administração pública, a partir da pesquisa documental. b) Uma concepção gestionária: voltada para a investigação e implementação das técnicas de gestão mais eficazes que não se limita à administração pública e não vê razões para a existência de fronteiras entre o sector público e privado. 36
Jacques Chevalier – Science Administrative, 2.ª ed.. Paris: PUF, 1994.
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. A Administração Pública Como Objecto de Estudo
c) Uma concepção sociológica: que investiga o fenómeno administrativo, com recurso às técnicas específicas da sociologia, em particular o inquérito sociológico. Perspectiva Jurídica Segundo a concepção jurídica, o objecto da ciência da administração é, apenas, a administração pública, considerada com uma instituição específica e diferente de outro tipo de organização. Nos países europeus é a ela que os juristas se referem e a mesma é objecto de estudo nas escolas de direito dos respectivos países. Em geral, os seus defensores não confundem “ciência da administração” com “direito administrativo”, encarando a primeira como uma ciência positiva, e a segunda como uma ciência normativa. Com excepção da Inglaterra a perspectiva jurídica tem sido a abordagem marcante em todos os países europeus. A sua ligação está, claramente, patenteada no facto de se localizar nas faculdades de direito europeias uma cadeira ou um licenciatura com o nome de Ciência Administrativa ou Ciência de Administração. Por outro lado, o imperativo do direito sobre a ciência da administração revela-se, ainda, no facto de desempenhar um papel importante nesta ciência, já que ocupa um capítulo onde se distingue a ciência da administração do direito administrativo. Este último, encarado como disciplina normativa, fundada sob os métodos da lógica formal, e a ciência da administração vista como disciplina positiva, que tem por objecto a administração tal e qual ela é. Apesar desta separação, em geral admitida, nem por isso a ciência da administração deixa de ser tributária dos esquemas do direito administrativo. É, ainda, a partir de critérios de tipo administrativo, que se institui o próprio objecto da ciência da administração, ou seja, ela trata da administração pública, enquanto titular de um estatuto específico, e da sujeição a um regime jurídico que se afasta, e muito, do regime de direito comum. Mesmo a distinção entre a administração e a política é estabelecida a partir de textos da Constituição, e não se efectua, portanto, uma separação a partir de critérios próprios da ciência da administração. A importância do direito está, ainda, presente, no método utilizado pela ciência da administração, na perspectiva jurídica. Ora como sabemos, a ciência do direito usa, fundamentalmente, o método dedutivo, ou seja, a partir de uma regra procura examinar as condições da sua aplicação. Só com muita dificuldade é que os juristas procuram, por exemplo, fazer investigação empírica. Nesta perspectiva, a Ciência da Administração ainda se mantém, claramente, com uma impressão característica da ciência do direito, podendo mesmo considerar-se como um prolongamento desta. 30
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Perspectiva de Gestão Uma segunda concepção é a concepção de gestão, que difere da anterior ao procurar fazer uma assimilação da administração e da gestão. O seu objectivo é bastante pragmático, na medida em que procura descobrir, e pôr em marcha, métodos mais racionais e eficazes de organização. Assim, a ciência da administração parece confundir-se pura e simplesmente com a gestão. Todavia, esta perspectiva não deixa de reconhecer, na administração pública, a existência, de certos particularismos administrativos, que não se encontram no campo das empresas privadas. Nesta perspectiva, a ciência da administração tende a transformar-se no ramo da gestão que tem aplicação na gestão pública. Haveria, assim, um tronco comum de gestão, que subdivide-se em dois ramos, um voltado para a gestão privada e o outro para a gestão pública. Quanto à finalidade, a gestão é bastante utilitária e claramente operacional. A sua ambição é definir as melhores regras, normas e preceitos, com o fim de permitir às organizações, com o máximo de eficácia, atingir os objectivos que fixaram. Em princípio, a gestão lida com a optimização da relação entre utilização de recursos e resultados. Todavia, a gestão não se limita, apenas, a ser um conjunto de receitas sobre a melhor forma ou, dito por outras palavras, a forma mais eficaz de gerir. Há uma dimensão, teórica e conceptual, onde estas práticas se ligam com a representação da realidade que se quer científica. De qualquer forma, a gestão permanece com uma preocupação fundamental, que é a de encontrar as condições óptimas de realização e de articulação de operações, nomeadamente, planear, organizar, gerir e controlar, no sentido de obter a maior eficácia, os melhores resultados. Mesmo para esta perspectiva de gestão, a administração pública possui um conjunto de particularismos que, de alguma forma, se distinguem do sector privado, ou seja, uma coisa é assimilação outra é uma aproximação. Embora – como vimos –, se reconheça que existem estes particularismos no sector público, não existe unanimidade acerca do grau de especificidade destes particularismos. Para uns, a Administração Pública tem um conjunto de instrumentos de acção idênticos aos da gestão privada e, apenas, as escolhas estratégicas divergem, em razão das diferentes objectos de estudo. Para outros, a gestão pública deve forjar instrumentos próprios de gestão e evitar qualquer imitação das empresas privadas.
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Perspectiva Sociológica Uma terceira concepção é a concepção sociológica, que tem três tipos de investigadores e de defensores. Um primeiro tipo constituído por pessoas da Ciência Política (politólogos), que se interessam fundamentalmente, no quadro dos trabalhos da Sociologia Política, pelo actor administrativo. Se é verdade que a Ciência Política abandonou durante muitos anos, as questões ligadas à administração, ela acabou por descobrir que a administração é um aspecto primordial da actividade do Estado. Esta descoberta deu-se, sobretudo, pelo papel económico e social que o Estado tem, a partir dos anos sessenta, vindo a desempenhar. Por outro lado, esta perspectiva dos estudos políticos levou ao abandono progressivo da visão jurídica e formalista da administração, que a encerrava nas tarefas da simples execução. Permitiu, ainda, perceber a sua implicação no exercício do poder, e revelar a grande dificuldade dos políticos traçarem fronteiras entre a esfera administrativa e a esfera política. Assim, este grupo interessou-se pela análise do poder burocrático, do fenómeno tecnocrático, pela elaboração de políticas públicas sobre o processo de decisão e, fundamentalmente, sobre o funcionamento do sistema político administrativo. Em segundo lugar, esta perspectiva integra, também, um grupo de sociólogos que se interessam pela administração pública, seja no quadro de uma sociologia do Estado (prolongando a tradição de Weber), ou no quadro de uma sociologia das organizações. Em terceiro lugar há, ainda, o contributo dos juristas, que procuram romper com a dogmática jurídica e se vão reapropriar do saber sociológico. Estes três grupos têm como motor, como elemento fundamental, o desenvolvimento enorme da sociologia das organizações que vai dar à ciência administrativa, não só o corpo de referências teóricas, como as metodologias necessárias. A sociologia das organizações parte da confluência dos trabalhos e das preocupações de Max Weber e da sua ligação com o movimento de relações humanas desenvolvido no interior das grandes firmas industriais. O seu postulado é o de que o funcionamento de uma organização não pode ser reduzido, para que apenas sejam tidos em conta os regulamentos explícitos que a governam. Há todo um conjunto de elementos que completam e corrigem, concretamente, este aspecto formal, e que passam pela análise das motivações, comportamentos e estratégias dos membros dessa mesma organização. Nesta perspectiva, as organizações são unidades sociais complexas, formadas de indivíduos e grupos, cujo interesse raramente coincide, sendo, muitas vezes, palco de conflito. As organizações não são sistemas fechados, pois evoluem num meio determinado, com o qual estabelecem trocas mais ou menos intensas. Por isso, é neces32
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sário tomar em conta as chamadas variáveis do ambiente ou da envolvente, que condicionam o tipo de estruturação interna e a sua própria sobrevivência 37. Isto leva a que a organização se confronte com um duplo processo de ajustamento. Por um lado, o ajustamento interno, com a sua envolvente interna no sentido da integração e, por outro, a sua envolvente externa, que vai no sentido da adaptação aos diversos elementos dessa mesma envolvente 38. Actividade 7 Sublinhe no texto os principais termos que caracterizam a perspectiva sociológica.
8. A
PERSPECTIVA
GESTIONÁRIA : MANAGERIALISMO
Desde o final dos anos 70 que se vem assistindo a uma mudança de foco: da public administration para a public management. A diferenciação entre elas deriva da procura e adopção de modelos de gestão alternativos aos tradicionais, com origem no sector empresarial. Por managerialismo entende-se, em geral, um conjunto de práticas, raramente testadas, fundadas na crença de que uma melhor gestão é a solução eficaz para um vasto campo de males económicos e sociais. 39 Os pressupostos destas crenças são os seguintes: • o caminho para o progresso social depende da obtenção de aumentos contínuos de produtividade; • tais aumentos de produtividade resultam da aplicação de tecnologias cada vez mais sofisticadas, tais como sistemas de informação e comunicação; • a aplicação e exploração destas tecnologias implica a existência de uma força de trabalho altamente treinada e disciplinada, de acordo com as normas da produtividade; • a gestão é uma função organizacional separada e distinta das demais; • o sucesso do negócio dependerá, cada vez mais, das qualidades e do profissionalismo dos gestores; • para que os gestores possam desempenhar esse papel crucial deverão possuir um espaço de manobra considerável. 40 37 Sobre as diferentes abordagens sociológicas das organizações veja-se de João Bilhim – Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 20008. 38 Sobre esta abordagem veja-se João Bilhim – Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2008. 39 Christopher Pollitt. ob. cit., p. 1. 40 Christopher Pollitt. ob. cit., p. 2-3.
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Generalizou-se, a partir dos anos oitenta, a ideia de que os bons gestores possuem as mesmas tarefas e capacidades, independentemente do sector onde se encontram. 41 Daí, o impacto do managerialismo nas doutrinas da administração pública, nas últimas décadas, traduzido em dois movimentos idênticos: a New Public Management e o Reinventing Government. O managerialismo, reflectiu-se, nas últimas décadas do século XX, num movimento de reforma e modernização administrativa, que atravessou os países da OCDE – a New Publíc Management. Segundo Hood, a New Publíc Management é a designação atribuída a um conjunto de doutrinas globalmente semelhantes, que dominaram a agenda da reforma burocrática em muitos países da OCDE desde o final dos anos 70. 42 Para o autor, a emergência desta corrente, durante os últimos 15 anos, é uma das mais surpreendentes tendências internacionais na administração pública. O seu aparecimento parece estar ligado a quatro mega tendências administrativas, nomeadamente: a) a tentativas para abrandar, ou reverter, o crescimento do sector administrativo em termos de despesa pública e número de funcionários; b) uma tendência para a privatização e quase-privatização, e um afastamento das instituições governamentais, com uma ênfase renovada na subsidiariedade na provisão de serviços; c) o desenvolvimento da automação, especialmente das tecnologias de informação, na produção e distribuição dos serviços públicos; d) o desenvolvimento de uma “agenda” internacional cada vez mais centrada nos aspectos gerais da administração pública na concepção de políticas, nos estilos de gestão e na cooperação intergovernamental (em vez da velha tradição da especificidade da administração pública nacional). 43 Trata-se, em resumo, da importação de conceitos e técnicas do sector privado para o sector público, 44 e os pressupostos que a legitimam: a gestão é superior à administração; a gestão no sector privado é superior à gestão no sector público; a boa gestão é uma solução eficaz para uma vasta variedade de problemas económicos e sociais; a gestão consiste num corpo distinto de conhecimentos universalmente aplicáveis 45. Para o autor, a New Publíc Management possui uma pretensão à universalidade: “a public administration for all seasons”. Esta pretensão assumiu duas formas: 41
J. Stewart e S. Ranson, ob. cit., p. 26. Christopher Hood – A Public Management for All Seasons?. Public Administration. 69 (Spring, 1991), p. 3 -4. 43 C. Hood, ob. cit. p. 3. 44 Elisabeth Wilson, ob. cit., p. 42. 45 E.Wilson, ob. cit., p. 50. 42
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Para Hood, os elementos-chave da New Public Management são: a gestão profissional actuante; os padrões e as medidas de desempenho explícitos; a maior ênfase nos controlos de resultados; a tendência para a desagregação de unidades; a tendência para uma maior competição; a ênfase nos estilos de gestão praticados no sector privado; uma maior ênfase na disciplina e parcimónia na utilização de recursos. 46 As críticas feitas ao managerialismo 47, e à sua aplicação no domínio público (New Public Management), andam à volta da possibilidade de se aceitar a universalidade da gestão e, logo, da aplicação dos seus conceitos e técnicas, independentemente do contexto considerado (sector privado, público ou voluntário). A questão, à partida, reside em se saber se existem diferenças entre o sector público e o sector privado, e em que é que elas se traduzem. Para Christopher Pollitt existem factores de diferenciação entre os sectores público e privado, que são incontornáveis e irão condicionar, se não mesmo desvirtuar, a aplicação de conceitos e técnicas oriundos do sector privado no sector público. Estes factores são: Responsabilidade perante os representantes eleitos; Múltiplos e conflituantes objectivos e prioridades; Ausência ou raridade de organizações em competição; Relação oferta/rendimento; Processos orientados para o cliente/cidadão; Gestão do pessoal; Enquadramento legal. 48 Em suma, a gestão pública encontra-se, internamente, balizada pela legislação, regulamentos e procedimentos formais e, externamente, limitada pelo tipo de legislatura política que esteja a ser efectuada. Pelo contrário, a gestão privada acha-se menos circunscrita pelo tipo de legislatura política menos espartilhada por imperativos constitucionais, nomeadamente, pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé (artigo 266.º da CRP). Dado o tipo de constrangimentos formais com que, obrigatoriamente, tem de lidar o gestor público em Portugal, afigura-se ser mais exigente ser um bom gestor público do que ser um bom gestor privado. Actividade 8 Descreva, por palavras suas, as crenças subjacentes ao managerialismo, e compare-as em seguida com o texto.
46
C. Hood, ob. cit., p. 4-5. Moshe Moar – The Paradox of Managerialism. Public Administration Review, Vol. 59, n.º 1, 1999, p. 5-18. 48 Christopher Pollitt, ob. cit., p. 118. 47
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9. A REINVENÇÃO
DA
GOVERNAÇÃO
Desde o início da década de 90, que nos Estados Unidos da América, a administração Clinton liderou um movimento conhecido por: reinventing government. Este movimento apresentava uma forma mais moderada que a anterior, protagonizada por Margareth Tatcher e Ronald Reagan. No anterior modelo, o termo mais expressivo do seu pensamento era “privatização” dos serviços públicos e introdução do espírito da administração privada nas áreas que não fossem susceptíveis de privatização. Para o movimento do reinventing goverment e para a terceira via do New Labour em Inglaterra o termo “privatização” é substituído por “concorrência”. Sustenta-se que o monopólio é sempre mau, quer seja público quer seja privado. Assim, o que importa, então, é criar as regras de jogo (regulação) para que os diversos actores públicos e privados possam actuar. A concorrência entre serviços públicos e entre estes os privados seria o elixir para a modernização da Administração e a solução para uma Administração mais eficiente, eficaz, económica e ética. Importa,porém, salientar que a expressão «reinventing government» deve-se a David Osborne e a Ted Gaebler, que, em 1992, publicou uma obra muito divulgada, mundialmente, intitulada: Reinventing Government.- How the entrepreneurial spirit is transforming the public sector from schoolhouse to statehouse, city hall to the pentagon. 49. Os postulados de Osborne e Gaebler destacam as directrizes da concepção da administração pública empreendedora via empresarialização dos serviços públicos sociais: [...] A maioria dos governos empreendedores promoveria a competição entre os que prestam serviços ao público. Eles dão poder aos cidadãos, transferindo o controlo dessas actividades da burocracia para a comunidade. Medem a actuação das suas agências, focalizando não os factores utilizados, as entradas de recursos, mas sim, os resultados. Orientam-se pela missão e pelos seus objectivos, em vez de regras e regulamentos. Redefinem seus utilizadores como clientes, oferecendo-lhes opções – entre escolas, programas de formação, tipos de moradia. Evitam o surgimento de problemas, limitando-se a oferecer serviços à guisa de correcção ou remédio. Investem as suas energias na produção de recursos, concentrando-se simplesmente nas despesas. Descentralizam a autoridade, promovendo a gestão com participação. Preferem os mecanismos do mercado às soluções ao público, mas, também na catálise de 49
David Osborne; Ted Gaebler – Reinventing Government: How the entrepreneurial spirit is transforming the public sector from schoolhouse to statehouse, city hall to the pentagon. Reading, Massachusetts: Addison-Weslev Publishing Company. Inc., 1992.
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todos os sectores – público, privado e voluntário – para a acção conjunta dirigida à resolução dos problemas da comunidade 50 Tendo como cerne tais directrizes, os autores propõem ainda que os mesmos princípios sejam aplicados nos sectores sociais dos sistemas de saúde, educação e justiça. Nessa linha, sugerem uma reinvenção do ensino público em torno da ideia de reestruturação da gestão escolar. Os autores advogam “[...] maior escolha para os pais, um sistema de avaliação focalizado nos resultados, no lugar do cumprimento de regras e regulamentos; descentralização da autoridade e da responsabilidade pelas decisões em favor da escola local; um sistema de pessoal que premeie, efectivamente, o sucesso dos estudantes e faça com que o insucesso tenha consequências reais; além da participação activa e sustentada dos pais e da comunidade empresarial” 51 No seu livro, Osborne e Gaebler defendem a existência de dez princípios para uma «administração de tipo empresarial» que são: 1. Administração Catalisadora 2. Administração Pertencente à Comunidade 3. Administração Competitiva 4. Administração Dirigida pela Missão 5. Administração Orientada por Resultados 6. Administração Orientada para o Cliente 7. Administração de Tipo Empresarial 8. Administração Pro-activa 9. Administração Descentralizada 10. Administração Orientada para o Mercado Todavia, o precursor desta proposta, na prática política, foi o antigo vice-presidente dos Estados Unidos, Albert Gore, ao elaborar um relatório acerca da administração pública norte-americana, onde propagou a necessária reinvenção da mesma. O enfoque de governança empreendedora representou o novo contrato sobre o funcionamento dos serviços públicos, uma nova administração eficaz, eficiente e capaz de dar respostas aos problemas “[...] diz respeito à mudança da rotina burocrática para a obtenção de resultados concretos, criando uma Administração Pública que funcione melhor e gaste menos” 52 O Relatório de Albert Gore apresenta recomendações para mudanças com base numa nova filosofia de gestão: “[...] na qual inspiram as cerca de 380 recomendações apresentadas, implicando a adopção de cerca de 1200 medidas 50 51 52
Osborne; Gaebler, ob. cit., p.20. Osborne; Gaebler, ob. cit, p.343. Albert Gore – Reinvenção da Administração Pública. Lisboa: Quetzal, 1996, p. 25.
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concretas. O que se pretende, confessamente, é uma reinvenção da Administração Pública” 53 Albert Gore chama a proposta de reinvenção da administração pública de National Performance Review sob a alegação de que essa gestão funcione melhor e gaste menos: “[...] Chegou a altura de pôr a Administração Pública a trabalhar para os cidadãos, aprender a fazer muito com pouco e a tratar os contribuintes como clientes” 54 A proposta teve por base quatro princípios-chave: 1) Eliminar a burocracia; 2) Pôr os clientes em primeiro lugar; 3) Dar competências aos funcionários para obter resultados; 4) Regressar ao fundamental: melhor Administração por menos dinheiro. Idêntica filosofia pode ser identificada na “terceira via” protagonizada pelo New Labour de Tony Blair, cujo teórico foi o sociólogo Anthony Giddens 55. Para o autor, o primeiro objectivo de uma política de terceira via devia ser o de ajudar os cidadãos a encontrar um caminho através das revoluções mais importantes do nosso tempo: globalização, transformação da vida pessoal e o nosso relacionamento com a natureza. Uma política de terceira via deveria ter uma atitude positiva a respeito da globalização mas, e isto é fundamental, na medida em que ela for um fenómeno de âmbito mais alargado do que o mercado global. Os sociais-democratas têm de combater o proteccionismo económico e cultural, têm de lutar no terreno da extrema-direita, que encara a globalização como uma ameaça à integridade nacional e aos valores tradicionais. Uma política de terceira via não deve encarar a globalização como aceitação tácita da liberdade dos mercados. O comércio livre pode ser a locomotiva do desenvolvimento económico mas, devido ao poder destrutivo que os mercados exercem sobre a sociedade e a cultura, temos sempre de analisar as consequências mais graves da sua libertação. Uma política de terceira via deve manter a justiça social como preocupação nuclear, embora levando em linha de conta que o leque de questões que não cabem na velha dicotomia esquerda/direita é mais amplo do que nunca. Igualdade e liberdade individual podem tornar-se antagónicas, mas as medidas de igualização podem também alargar as perspectivas de liberdade que se apresentam aos indivíduos. Para os sociais-democratas liberdade devia significar autonomia de acção, o que por sua vez exige o envolvimento da comunidade social mais alargada. Tendo abandonado o colectivismo, a política de terceira via procura um novo tipo de relacionamento entre o indivíduo e a comunidade, uma redefinição de direitos e obrigações.
53 54 55
Albert Gore – ob. cit, p. 9. Albert Gore – ob. cit, p. 33. Anthony Giddens – Para Uma Terceira Via. Lisboa: Presença.
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O segundo preceito da sociedade actual deveria ser não há autoridade sem democracia. A direita sempre viu os símbolos como meios privilegiados de justificar a autoridade, fosse a Nação, o Governo, a Família ou outras instituições. (...) Numa sociedade em que a tradição e os costumes estão a perder forças, o único caminho para a estabilidade passa pela democracia. O novo individualismo não corrói inevitavelmente a autoridade, mas exige que ela seja repensada numa base de participação activa. Uma modernização sensível aos problemas ambientais não significa “mais e mais modernidade”, mas tem consciência dos problemas e limitações dos processos de modernização. Está alerta para a necessidade de restabelecer a continuidade e melhorar a coesão social num mundo de mudanças erráticas, em que as energias, por si próprias imprevisíveis, da inovação científica e tecnológica têm um papel importante. Constituem valores da terceira via: igualdade; protecção dos desfavorecidos; liberdade encarada como autonomia; não há direitos sem obrigações; cosmopolitismo pluralista; conservadorismo filosófico Um programa da terceira via incluiria: centro radical; o novo Estado democrático (o Estado sem inimigos); sociedade civil activa; a família democrática; a nova economia mista; igualdade como inclusão; protecção social positiva; o Estado social como investimento; a nação cosmopolita; democracia cosmopolita
10. O NOVO SERVIÇO PÚBLICO Para os seus proponentes, estes princípios, quando plenamente implementados, resultarão num Governo tão diferente que merecerá a expressão «reinventado». Os seus autores não tiveram a preocupação de os definir teoricamente (como proposições sujeitas à prova empírica 56). Pelo contrário, de forma instrumental, oferecem-nos como proposições que exortam o leitor e os governos a aceitar e agir em conformidade. 57 Actualmente, há claramente dois modelos em presença: o tradicional ou Burocrático, centrado na interpretação e aplicação da lei, de raiz jurídica; e o modelo Gestionário, onde se inserem as políticas de gestão por objectivos na Administração Pública centrado na medição. Para este último gerir é medir objectivos;
56
Uma análise crítica à obra de Osborne e Gaebler, pode ser encontrada em Grant Jordan – ‘Reinventing Government’; But Will lt Work?. Public Administration. 72 (l994), p. 271-279. 57 Ronald C. Moe – The “Reinventing Government” Exercise: Misinterpreting the Problem, Misjudging the Consequences. Public Administration Review. 54:2 (Março/Abril, 1994).
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medir é comparar resultados; e comparar é melhorar a prestação da qualidade do serviço público. Principais diferenças entre os serviços públicos e o sector privado Atributos
Burocrático
Objectivos
Vagos, atribuições departamentais
Critérios de sucesso
Uso de Recursos
Evitar erros, seguir os procedimentos administrativos Foco no despacho de delegação de competências. Gasta-se de acordo com a lei. Baixa preocupação com o resultado
Tipo de Organização Mecanicista, rígida e hierarquizada Papel do Dirigente
Interpreta e aplica a lei
Gestionário Precisos, com indicador de medida Atingir/superar objectivos operacionais Eficiência, eficácia, qualidade e ética Flexibilidade, estrutura achatada, rede e delegação. Lidera, opta entre soluções alternativas
O modelo gestionário inspira-se na tradição anglo-saxónica área cultural onde a administração pública partilha idêntica origem com a gestão privada, isto é, o conceito de sociedade industrial. Acontece que o modelo tradicional e continental europeu lança as suas raízes no conceito de Estado-nação. Daí a sua matriz mais jurídica. Ora, a aproximação destes dois modelos que está, actualmente em curso não está isenta de problemas em virtude das diferenças culturais subjacentes a ambos os modelos. As perspectivas managerialista e de reinvenção do governo promoveram a visão de um gestor público empreendedor de um novo governo reduzido e progressivamente mais privatizado imitando não apenas as práticas da gestão privada, mas até os seus valores. Os seus autores argumentavam com base no contraste entre a sua perspectiva e a administração pública burocrática e mecanicista. Mais recentemente, Robert B. Denhardt e Janet Vinzant Denhardt 58 têm posto em causa esta dicotomia entre administração gestionária e burocrática e propõem que tal comparação se estabeleça com o que os autores chamam o novo serviço público “New Public Service,”movimento apoiado na cidadania democrática, na comunidade e sociedade civil e numa dimensão humanista do sistema organizacional.
58
Denhardt Janet; Denhardt Robert – The New Public Service: Serving, not steering. London: M. E. Sharpe, 2003.
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Assim, Robert B. Denhardt e Janet Vinzant Denhardt sugerem sete princípios para o novo serviço público em que o papel mais importante do funcionário ou trabalhador da Administração é ajudar a estabelecer parcerias entre a administração e cidadãos e empresas, para a solução dos seus problemas mais do que controlar ou pilotar a sociedade. Tais princípios constitutivos deste movimento do novo serviço público são: Buscar o interesse público; Valorizar a cidadania; Pensar estrategicamente e actuar democraticamente; Prestar contas; Servir e não mandar; Valorizar as pessoas; Respeitar os ideais do serviço público. Actividade 9 Apresente uma crítica à perspectiva da reinvenção da governação a partir de um artigo de um jornal.
TESTE FORMATIVO 1. Qual a perspectiva técnica da gestão? (Assinale a resposta que julgar mais correcta). A. A gestão é um processo racional instrumental. B. A gestão é um processo negocial, regulador de conflitos. C. A gestão destina-se a extrair a mais-valia. 2. 3. 4. 5.
Qual o sentido etimológico dos termos administrar/ administração? Em sentido estrito de que trata a Ciência da Administração? Que se entende por administração pública? O que é o cameralismo?
RESPOSTAS
ÀS
ACTIVIDADES
N.º 1: Pode. Temos entre outros casos, a TAP SA ou TAP Portugal. É uma sociedade anónima cujo capital pertence 100% ao Estado Português. N.º 2: A administração tem a ver com fazer coisas; com a prossecução de objectivos definidos. N.º 3 Pugnam por uma concepção unitária e homogeneizada da Ciência da Administração, esbatendo o que possa haver de específico na administração pública face à privada. 41
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N.º 4: A política existe para definir o interesse geral da colectividade, enquanto a administração pública tem por finalidade interpretar e executar o interesse geral definido por aquela. N.º 5: As ciências sociais tentam, articuladamente, explicar a relação entre a conduta humana e as condições materiais e simbólicas que dela resulta e por sua vez a determinam. N.º 6: Nos EUA, a Ciência da Administração está marcada pelo conceito de sociedade industrial, enquanto na Europa, a matriz encontra-se na noção de Estado nação. N.º 7: Politólogos; Sociologia Política; actividade do Estado em matéria económica e social; abandono progressivo da visão jurídica formalista da administração; fronteiras entre a esfera administrativa e a esfera política; análise do poder burocrático; prolongando a tradição de Weber; juristas que procuram romperem com a dogmática jurídica e se vão reapropriar do saber sociológico; o desenvolvimento enorme da sociologia das organizações que deu à ciência administrativa não só o corpo de referências teóricas como a metodologia necessária.
RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
N.º 1: A. N.º 2: O termo “administrar” remonta às expressões latinas administratio e ad ministrare. Os etimologistas não estão de acordo quanto à origem de ad ministrare. Para uns seria ad manus trahere, sinónimos de trazer à mão, conduzir, servir e manejar. Segundo outros, derivaria de minister o agente auxiliar, o intermediário na realização de um serviço. N.º 3: A ciência da administração, em sentido restrito, trata do estudo científico da administração pública como entidade no seio da qual se desenvolvem actividades administrativas, destinadas à satisfação das necessidades colectivas. A satisfação das necessidades colectivas pela administração pública confere-lhe uma especificidade: a dependência instrumental do poder político. N.º 4: Entende-se por administração pública a entidade social, formalmente coordenada, com fronteiras delimitadas, e funcionando numa base relativamente constante. As actividades que desenvolvem, na dependência dos órgãos políticos representativos de uma comunidade, destinam-se a assegurar as necessidades colectivas de segurança, cultura e bem-estar, individualmente sentidas. 42
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N.º 5: O cameralismo é a designação genérica que se usa para classificar um conjunto de escritos heterogéneos, na sua maioria de autores alemães, elaborados numa perspectiva prática e sem preocupação científica, sobre a administração pública.
L EITURAS C OMPLEMENTARES BILHIM, João – Teoria Organizacional: Estruturas e pessoas 6.ª edição. Lisboa: ISCSP, 2008. BOZEMAN, Barry – Public Management. San Francisco: Jossey-Bass, 1993. CAUPERS, João – A Administração Periférica do Estado: estudo de ciência da administração. Lisboa: Notícias, 1994. CHEVALIER, Jacques – Science Administrative, 2a edição. Paris: PUF, 1994 DENHARDT, Robert – Public Administration, 2th. New York [etc.]: Harcourt Brace College Publishers, 1995. DENHARDT Janet; DENHARDT Robert – The New Public Service: Serving, not steering. London: M. E. Sharpe, 2003 HOOD, C. C. – Public Administration for All Seasons. Public Administration, 69, 3-19. ROCHA, Oliveira – Princípios de Gestão Pública. Lisboa: Presença, 1991.
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2. FUNDAMENTOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
SUMÁRIO Objetivos da Unidade 1. O controlo político da administração pública 2. A fusão de burocracia e política 3. Da teoria organizacional à institucional 4. Da administração à gestão pública 5. Da Teoria da Decisão à Escolha Racional 6. As Teorias da Governança Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJETIVOS
DA
UNIDADE
A Administração pública evolui sem cessar, expressando os valores, as preferências de cidadãos individuais, de grupos organizados de cidadãos e da sociedade no seu todo. Certos valores e preferências são constantes mas outros evoluem. Acontece que, periodicamente, um conjunto de valores acaba por predominar. Ora, isto obriga a evoluir o papel do Estado e a prática da administração pública para espelhar esta nova realidade. Nesta unidade, tentaremos mostrar como a teoria é importante num domínio do saber, ensino e investigação tão aplicado, prático e interdisciplinar como é o da administração pública. Verificaremos que, ao longo do tempo, a perspetiva científica sobre a administração pública evoluiu bastante desde o trabalho de Gulick e Urwick (Papers on the Science of Administration, 1937) passando por Herbert Simon (Administrative Behavior, 1947), até às recentes abordagens como a da escolha racional 45
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. Fundamentos de Administração Pública
(James Buchanan; Robert Tollison; Gordon Tullock (ed.) – Toward a Theory of the Rent-Seeking Society. College Station, Texas: University Press 1980).
1. O
CONTROLO POLÍTICO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A questão colocada neste ponto foi pela primeira vez apresentada, em 1887, por Woodrow Wilson quando, nos seus escritos sobre administração pública, afirma que os políticos eleitos não devem interferir com a administração enquanto representada por profissionais designados para os cargos e funções, nem esta com aqueles. Os “burocratas”, isto é, os dirigentes, trabalhadores da administração, funcionários e servidores cumprem as orientações ou respondem perante a lei, o legislador, ou os políticos eleitos? Woodrow Wilson e Frank Goodnow 59 partiram do princípio de que existe uma dicotomia entre política (os eleitos) e burocracia (os designados para ocupar cargos não eleitos) em democracia, por exemplo, no caso de Portugal essa dicotomia centra-se entre os membros do governo e os diretores gerais ou o presidente do município e o diretor municipal. Para eles é nesta dicotomia que reside a origem da administração pública. Acontece que esta dicotomia não foi posta em causa, até meados do século XX, quando Dwight Waldo (1946) e Herbert Simon (1947) a desafiaram por diferentes razões. Para Dwight Waldo todo o ato administrativo era fundamentalmente político sendo impossível distinguir onde começava um e terminava o outro; e para Herbert Simon, preocupado em fazer da administração pública uma ciência que busca a verdade dos factos, era difícil separar, empiricamente, política e administração e, por força, disso negou a existência desta dicotomia. Entre 1950 e 1970 a sabedoria em uso era de “não existência de qualquer dicotomia”. Desde 1980, a dicotomia voltou à agenda de investigação e ensino e está na base da “control bureaucracy theory”. Esta teoria estabelece a diferença entre atos e atores administrativos e políticos. Numa tentativa de responder a Herbert Simon, o político apresenta-se como variável independente e a administração como variável dependente. Nesta abordagem, os políticos eleitos devem controlar os administradores (funcionários) designados. Sobre este ponto, atualmente, há duas teses: Para Theodore Lowi 60 a lei deve ser precisa e controlar ao máximo o espaço de liberdade do funcionário. Para Charles Godsell 61 o funcionário deve dispor de espaço de liberdade para melhor ir ao encontro do espírito da lei e do legislador. 59
GOODNOW, Frank – Politics and Administration: A study in government. NY: Russell and Russell, 1990. LOWI, Theodore – The End of Liberalism. NY: W. W. Norton & Company, 1979 61 GODSELL, Charles – The Case for Bureaucracy: A public administration polemic. N.J: Chatam House, 1983 60
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Política Administração A relação entre política e administração apenas como tipo ideal pode ser apresentada como uma linha diagonal. Na realidade, as diferentes realidades organizacional públicas, arenas políticas e tempos obrigam esta linha a curva-se. Há situações em que a administração invade o campo do político e o político o da administração. Nos estudos feitos por Svara 62 sobre a realidade desta dicotomia nos municípios, o autor chega à conclusão que existem quatro diferentes tipos de relação. Em cada um deste quatro tipos a missão, a política, a administração e a gestão sofrem variações. Um exemplo do que pode ser uma invasão do campo da administração na política será a famosa série televisiva britânica intitulada “sim, senhor Ministro”. O exemplo oposto encontra-se na administração pública portuguesa, onde o política penetra profundamente na administração, restando um parco espaço a ocupar pelos dirigentes dos organismos. O facto dos dirigentes superiores terem passado, por força da Lei n.º 64/2011 de 22 de Dezembro, a serem designados, na sequência de um procedimento concursal e por um período de cinco anos, superior ao período da legislatura que é de quatro anos, veio aumentar o espaço da administração através da sua legitimação meritocrática.
2. FUSÃO ,
BUROCRACIA E POLÍTICA
As teorias da fusão entre políticos e burocratas, ou seja, entre membros do governo e diretores gerais recusam a existência da dicotomia discutida no ponto anterior e procuram explicar o papel que políticos eleitos e administradores designados têm nas políticas públicas, desde a concessão, passando pela implementação até à avaliação das mesmas. Se por política entendermos a capacidade de decidir “quem recebe o quê, quando e como”, na sua perspetiva facilmente se verificará que os administradores designados e não eleitos possuem um campo significativo de poder nesta matéria. Por isso, em sua perspetiva não são “neutros” na sua intervenção, nem 62
SVARA, James – Dichotomy and Duality: Reconceptualizing the Relationship Between Manager Government in Council- Manager Cities. In FREDERICKSON, George – Ideal and Practice in Council- Manager Government. Washington D. C: International City/ County Management Association, 1994
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máquinas executoras da lei, da vontade do legislador ou dos titulares de cargos políticos. Pelo contrário, são atores consciente do processo em causa e de alguma forma também políticos, mesmo não tendo sido objeto de eleição. Esta abordagem teórica começa por aceitar o que parece ser observado empiricamente; na prática a administração não é uma atividade neutral separada da política. A administração é política 63. Dwight Waldo na sua célebre obra de 1948 intitulada the Administrative State defende a tese que A teoria administrativa é uma teoria política. Nesta obra o autor bate-se contra alguns pressupostos da teoria ortodoxa da dicotomia tais como: a compatibilidade entre democracia e eficiência e a separação clara entre decisores e executores nas políticas públicas. A primeira compatibilidade teria levado a criar uma ciência destinada a maximizar a eficiência na administração pública, tarefas dos administradores designados. Em grande parte da obra o autor analisa o papel da administração à luz de cinco perspetivas: a visão sobre o que deve ser uma boa sociedade; quais os critérios a seguir nas decisões que digam respeito à coletividade; Quem deve governar; Como devem ser repartidos os poderes do Estado, por exemplo, como articular o poder legislativo, judicial e executivo; a centralização e a descentralização ou centralização regionalização. Para o autor, os estudantes de administração pública acreditam que a eficiência administrativa constitui o seu campo específico de ação e que se houver eficiência na administração haverá uma sociedade melhor. No que toca aos administradores e funcionários estes acreditam que uma boa decisão será a que otimiza o rácio in put out put. Dwight Waldo critica esta posição por se identificar com a da administração privada e argumenta que a equidade, o consenso, a satisfação de interesses particulares são critérios de ação em democracia e que os mesmos não são por si mesmo critérios de eficiência. Acrescenta que os administradores aceitam facilmente a eficiência como o seu principal princípio, mas aceitam igualmente a democracia que é notoriamente uma base pouco eficiente para a organização de uma sociedade. Acresce ainda na perspetiva do autor que aceitando a dicotomia política/administração se tem de deixar de fora do processo das políticas públicas a democracia que é igualmente aceite hoje em qualquer estado moderno. Dwight Waldo a sua obra The Administrative State, que corresponde no essencial à sua tese de doutoramento em ciência política em Yale, contesta a ortodoxa dicotomia por entender que essa dicotomia parte de um princípio questionável. O de que do lado da política ficaria a democracia (values, politics, policy making) e do lado da administração estaria a racionalidade técnica da decisão e a eficiência. Quando, em seu entender, na prática tudo se encontra misturado no processo de desenho, implementação e avaliação de políticas públicas. 63
Dwight Waldo – The Administrative State. NY: The Ronald Press Company, 1948
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3. DA
TEORIA ORGANIZACIONAL À INSTITUCIONAL
A teoria pública institucional pública situa-se no âmbito das teorias da dimensão subjetiva, para quem o mundo social é por natureza inatingível, na medida em que não tem existência fora da mente dos indivíduos. Não é mais do que uma construção subjetiva dos seres humanos individuais que, através do desenvolvimento e uso comum da linguagem, da interação da vida diária, criam e mantêm uma realidade de significados partilhados intersubjetivamente. Nesta perspetiva, a organização expressa-se através da descrição de práticas, com as quais as pessoas procuram compreender o mundo 64. Nos estudos clássicos de administração pública, a teoria organizacional constituía o corpo de conhecimentos com o qual se procura entender as estruturas organizacionais e a sua relação com os resultados. Embora, a teoria organizacional seja elaborada a partir dos estudos em organizações privadas, muitas das afirmações possuem cabal aplicação nas instituições públicas. Há, no entanto, diferenças entre as empresas e as organizações públicas e tal diferença encontra-se refletida na diferença entre teoria organizacional e teoria institucional pública. De forma simplificada, pode dizer-se que o institucionalismo encara as organizações como mapas mentais construções partilhadas de regras, normas, e expectativas circunscritas, isto é, fronteiras que definem quem está fora e está dentro) que limitam e controlam o comportamento e as escolhas de indivíduos e grupos de indivíduos. March e Olsen descrevem as instituições como “crenças, paradigmas, códigos, culturas e conhecimentos que apoiam as suas regras e rotinas” 65. Uma instituição é uma estrutura formal circunscrita de regras, normas e identidades. Acresce que no seio desta estrutura formal as preferências mudam com frequência e as tomadas de decisão são condicionadas pelo sistema endógeno de regras. Nas instituições, consequência da sua cultura, ou seja, das suas normas, valores e crenças, existe uma espécie de apropriação do que é feito, por exemplo, a estrutura organizacional expressa o sistema de valores da comunidade institucional. O Institucionalismo aplicado às organizações públicas, acrescenta ainda alguns aspetos importantes que não se encontram presentes na teoria organizacional, tal como é vista na administração privada sobre objetivos, resultados, performance, eficácia e efetividade. O institucionalismo fornece, assim, um contributo importante à compreensão acerca de como as organizações públicas se comportam e produzem resultados, nomeadamente quanto a relação entre o setor público /
64 65
Ver João Bilhim – Teoria Organizacional: Estruturas e pessoas. Lisboa: ISCSP, 2014, 3.º capítulo. James March; Johan, Olsen – Rediscovering Institutions. NY: the Free Press, 1989.
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privado e terceiro setor. Assume como ponto central a liderança, a gestão o profissionalismo e meritocracia. Acresce que o institucionalismo combina bem o estudo das estruturas organizacionais e das pessoas, ou seja, o que normalmente se chama de teoria e comportamento organizacional 66.
4. DA
ADMINISTRAÇÃO À GESTÃO PÚBLICA
É frequente na teoria da administração pública juntar as temáticas da gestão e da organização e tratá-las em conjunto ou, pelo menos, ao mesmo tempo. Ora, isto pode levar a certa confusão que aqui convém clarificar. Assim, por exemplo, a descentralização é, frequentemente, tratada como um tema da gestão, (descentralização de atribuições e competências) e, por vezes, como um tema da organização (estrutura organizacional). As teorias precedentes estão focalizadas na organização pública; este ponto agora centra-se sobre algo diferente: sobre a gestão pública. Lançando mão de uma metáfora poder-se-ia dizer que a organização está para a gestão como a máquina – o computador – está para o software. A organização pública é a máquina onde a gestão tem lugar. Assim, a gestão pública identifica-se com os processos formais e informais que guiam e orientam a interação humana (quem trabalha) para a realização dos objetivos das organizações públicas. Neste caso, a unidade de análise são os processos de interação humana entre dirigentes e funcionários e os efeitos da gestão do comportamento nos trabalhadores e nos resultados. Neste ponto, vamos salientar a teoria que conta para a explicação do comportamento da gestão pública. A teoria da gestão vai beber à obra de Frederick W. Taylor e a sua importante obra The Principles of Scientific Management cuja publicação original remonta a 1911 e continua a ser republicada. A sua intenção foi dar fundamento científico à gestão do trabalho; a gestão do trabalho fabril deveria deixar de se basear nos costumes, tradições, regras de ocasião e de senso comum para se apoiar em princípios, cientificamente, testados 67. Luther Gulick, um dos fundadores da moderna administração pública abraçou a ortodoxia de Taylor, que fora experimentada e pensada para o setor privado, tendo-a adotado à administração pública através da célebre mnemónica inglesa 66 James Q. Wilson – Bureaucracy: What Government Agencies Do and Why They Do It. NY: Basic Books, 1989. 67 Sobre este ponto veja-se João Bilhim – Teoria Organizacional: Estruturas e pessoas. Lisboa: ISCSP, 2014. (capítulos 2 e 3).
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POSDCORB (planning, organizing, staffing, directing, coordinating, reporting, budgeting). Esta perspetiva constituiu a ortodoxia de ensino em administração pública até meados de 1950. Assim, as teorias da gestão pública durante quase todo século vinte foram absorvendo e endogeneizando o que se ia descobrindo e praticando no setor privado. Salienta-se a contribuição ed Chester Barnard na sua obra as Funções do Executivo: os Estudos de Hawthorne; A teoria do sgrupos com Homans e Shaw; a teoria X e Y de McGregor; a teoria do papel social com origem na psicologia social; a teoria da comunicação organizacional e toda a teoria comportamentalista dos anos sessenta e setenta do século passado. Desde finais dos anos oitenta do século passado, a “nova gestão pública”, conhecida em inglês como New Public Management (NPM), contribuiu para a renovação da gestão pública e o restabelecimento da relação entre teoria e prática. Em particular, nos países da Europa continental, a nova gestão pública contribuiu para o derrube do paradigma jurídico, napoleónico baseado no império do direito administrativo em que se baseavam as respetivas administrações públicas e substituiu por um novo paradigma de matriz anglo-saxónica, baseado na meritocracia, na eficiência e na melhoria contínua do serviço público. A partir desta nova perspetiva, a todos os níveis do Estado, os dirigentes da administração estão a reinventar e a fazer a reengenharia da gestão pública acolhendo certos processos da gestão privada, lutando por um serviço público de maior qualidade, mais inovador, com maior valor acrescentado, mesmo que para tal tenham de assumir maiores riscos. A “nova gestão “ substituiu os velhos princípios da administração pública com um novo conjunto de princípios tais como a externalização, a contratualização, descentralização, aumento da margem de poder de dirigentes e funcionários, possibilidade de escolha por parte dos utentes, usuários ou clientes dos serviços públicos, desregulação de setores antes monopólios públicos, agora abertos à concorrência, avaliação da eficácia, eficiência e efetividade da prestação de serviço e quanto à gestão dos funcionários esta está apoiada np profissionalismo e no mérito. Apoiado nestes princípios, exige-se agora ao dirigente que seja um líder/ empreendedor sem deixar de ter em conta o contexto político em que opera. A nova gestão pública propõe-se substituir a má burocracia por boa mesmo dando-lhe outro nome como gestão por processos. Atualmente a teoria da gestão na administração pública anda á volta de três conceitos chave: liderança/empreendedorismo; externalização de serviços/ contratualização; governança. Acentua-se atualmente bastante a importância da liderança transformacional ou carismática que ativam fortes emoções nos seguidores, suscitam confiança e identificação destes com ele e influenciam os seus ideais; o líder comunica uma visão apelativa, usa símbolos para fomentar o esforço dos seguidores; estimulação 51
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intelectual – o líder estimula nos seguidores a tomada de consciência dos problemas, dos seus próprios pensamentos e imaginação; ajuda os colaboradores a reconhecer as suas próprias crenças e valores, fomentando-lhes o pensamento inovador/criativo e incitando-os a questionarem as suas assunções; o líder atende às necessidades de desenvolvimento dos seguidores, apoia-os, encoraja-os, treina-os, tenta desenvolver o seu potencial, fornece-lhes feedback, delega-lhes responsabilidades. Por outro lado, atualmente, a gestão pública centra-se mais na externalização de serviços e no “contracting out” que na própria produção de serviços pela administração. A administração abandona a produção e passa a contratar no exterior o que significa que os funcionários precisam de aprender novas competências. Já não precisam de saber fazer algo mas de saber comprar e gerir contratos. A governança, representa a teoria contemporânea que representa a teoria da gestão de redes. Com a teoria da governança o Estado abandona a posição de único elemento do jogo para passar a ser apenas um dos muitos jogadores e por vezes já nem é o mais importante.
5. DA TEORIA
DA
DECISÃO
À
E SCOLHA R ACIONAL
A teoria da decisão será aprofundada no capítulo 7 desta obra. Importa, desde já, acrescentar a título de introdução que esta abordagem teórica tem origem em Herbert Simon, na sua importante obra intitulada Administrative Behavior, publicada em 1947 cuja tese central consiste em identificar decisão e administração, isto é, administrar/gerir é decidir 68. A teoria da decisão corresponde ao corpo teórico da administração pública de caráter mais empírico e multidisciplinar influenciado pela economia, sociologia das organizações, psicologia social e ciência política. Para Simon, a decisão é o predicado da ação e a ação corresponde a um acumulado de ações. Para o autor, as teorias da administração pública existentes até então, encontravam-se excessivamente concentradas em “princípios” de ação que ele classifica de “proverbs”, ou seja, de boas práticas, receitas sem fundamentação empírica e, consequente, falhas de base científica. Por isso, a nova administração pública a partir de meados dos anos 1950 devem basear-se num nova e diferente unidade de análise – a decisão. A teoria da decisão lança, assim, os seus fundamentos na lógica positivista que permite distinguir factos (preferências individuais e coletivas, objetivos) suscetíveis de serem testados empiricamente de valores que não podem ser testados. Na 68
Herbert Simon – Administrative Behavior. NY: The Free Press, 1947.
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base da teoria da decisão encontra-se o conceito de eficiência e de racionalidade administrativa ou técnica. A verdade ou falsidade de uma decisão administrativa possui um caráter relativo; não tem caráter absoluto, instrumental como acontece com os valores que dizem respeito ao bem ou ao mal. Assim, uma decisão administrativa é verdadeira/certa/ verdadeira se os meios selecionados para atingir um determinado objetivo/fim/preferência forem os meios apropriados. O administrador/dirigente da administração expressa uma atitude racional quando está preocupado e focalizado na escolha dos meios adequados para atingir um determinado fim. A racionalidade aqui está baseada na lógica da relação entre meios e resultados/objetivos. É certo que certos objetivos são meramente instrumentais relativamente a outros objetivos mais importantes, ou seja, assume a necessidade de hierarquizar objetivos. O autor admite na sua abordagem a existência de uma série de objetivos e a, consequente, necessidade da sua hierarquização, mas reconhece igualmente as limitações desta lógica dos meios/resultados porque nem sempre é possível separá-los empiricamente por se apresentarem por vezes incompletos, obscuros e ambos – meios e resultados – serem influenciados por diferentes circunstâncias nomeadamente de tempo. Este reconhecimento remete o autor para a indispensabilidade de assumir a limitação da racionalidade. Tal limitação não impede que a decisão constitua a unidade de investigação e de teoria da ciência da administração. Assim a ciência da administração tal como as restantes ciências deve estar preocupada com os factos, não deixando espaço para os juízos de valor que constitui o campo da ética e dos valores. Neste ponto, há a salientar que esta posição de Herbert Simon é diametralmente oposta à de Dwight Waldo – dicotomia entre valores os valores democráticos e eficiência – de que já falámos e foi objeto de longa controvérsia nos anos cinquenta do século passado entre os dois autores. Importa salientar que a teoria clássica da decisão de Simon está na origem da mais recente abordagem teórica conhecida por racional choice, ou da escolha racional. A escolha racional foi profundamente influenciada pela teoria económica e a lógica de mercado e tende a usar modelos matemáticos para testar a relação entre objetivos/preferências e alternativos cursos de ação. A escolha racional é a aplicação da teoria económica neoclássica ao setor público. O seu objetivo é determinar, num conjunto de decisões alternativas, a mais eficiente ou racional para atingir determinados fins sejam individuais, coletivos ou organizacionais. Procura construir uma ponte entre a microeconomia, a administração pública e até a ciência política encarando as escolhas dos cidadãos, dos pelíticos, dos funcionários e dirigentes análogas às escolhas baseadas o interesse individual e egoísta dos consumidores e agentes económicos em geral. 53
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Nesta lógica cada agente económico procura maximizar ou pelo menos obter o maior resultado egoísta em qualquer decisão que toma. Os políticos visam egoisticamente ser reeleitos, os dirigentes da administração manter o seu poder e os consumidores a maior e melhor quantidade de bem pelo menor custo. A escolha racional, embora se ligue à teoria da decisão de Simon vai tal qual a teoria neoclássica lançar as suas raízes no pensamento filosófico em Adam Smith, na obra mãe da ciência económica, a Riqueza das Nações, publicada pela primeira vez em 1776. A escolha racional está ancorada nos pressupostos básicos da teoria neoclássica e na crença de que esta é universal, ou seja, aplica-se a tudo, do agente económico ao comportamento político e administrativo. O interesse egoísta conduz todas as nossas decisões e ações, desde a compra de uma viatura, a escolha eleitoral por um determinado partido, até ao orçamento do Estado 69. A força desta abordagem teórica não se limita à sua coerência interna mas igualmente devido à sua capacidade para gerar proposições suscetíveis de serem testadas empiricamente. A escolha pública refinou de tal forma o conceito de maximização a utilidade e o individualismo metodológico que o coloca de pleno direito entre as abordagens teóricas da atual administração pública.
6. A S TEORIAS
DA
GOVERNANÇA
As teorias e conceitos associados ao termo governação assumem progressiva importância para a administração pública. A governação liga-se à forma de relação entre o governo e a sociedade. A fragmentação porque tem passado o Estado desde finais dos anos oitenta do século passado transformou-o num Estado oco (hollow state) mudando os processos e a natureza da administração pública e o que deve o governo fazer e como deve fazê-lo 70. O termo governança aparece ainda como guarda-chuva de coisas muito distintas: i) sinónimo de administração pública e de implementação de políticas públicas; ii) sinónimo de nova gestão pública; iii) conjunto de teorias que trata do declínio da soberania, e da fragmentação institucional. Na perspetiva de Lynn e outros, a governança é o conjunto de leis, regras administrativas, práticas e constrangimentos, prescrições e capacidades que permitem a ação do governo enquanto entidade capaz de produzir e distribuir
69
James Buchanan; Robert Tollison; Gordon Tullock (ed.) – Toward a Theory of the Rent-Seeking Society. College Station, Texas: University Press 1980. 70 LARRY D. TERRY – THE THINNING OF ADMINISTRATIVE INSTITUTIONS IN THE HOLLOW STATE. ADMINISTRATION & SOCIETY, Vol. 37, no. 4, September 2005 426-444, 2005
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bens e serviços públicos 71. Isto implica que no conceito de governança haja elementos separados mas interrelacionados que incluem elementos organizacionais financeiros, estruturas programáticas, leis e regulamentos administrativos, recurso disponíveis e normas e regras institucionalizadas. O conceito de governança opera a três níveis: institucional, organizacional e técnico. Ao nível institucional, a governança procura compreender a formação, adoção e implementação da política pública. Ao nível organizacional ou de gestão compreende as questões da hierarquia entre departamentos, agências independentes, e entidades do terceiro setor e concentra-se ainda nos incentivos, no poder administrativo, medidas da realização. Ao nível técnico, foca-se na envolvente específica de atuação organizacional nomeadamente questões ligadas ao profissionalismo, competência técnica, motivação, transparência, performance, meritocracia, eficiência, liderança. Com as reformas operadas nos últimos trinta anos o modelo weberiano perdeu força na administração pública e hoje as democracias industrializadas confrontam-se com um Estado fragmentado, desregulado, cujas atribuições competências foram externalizadas. Tradicionalmente quase se identificava a natureza pública das instituições com o serviço público que prestavam. Esta identificação esboroou-se. Atualmente, temos a prestar serviços públicos sobre diversas formas de contratos – empresas privadas, empresas de capital total ou parcialmente público, entidades administrativas independentes do governo, entidades públicas empresariais, institutos públicos e direções gerais. À unidade do Estado produtor e distribuidor de serviços públicos sucedeu-lhe uma constelação de operadores com diferentes naturezas jurídicas e missões. O Estado cedeu o seu lugar único e majestático a uma miríade de operadores de tal forma que o Estado já muitas vezes nem é o ator mais importante na rede de relações institucionais. Ora, a governação na linha da teoria das redes de gestão trata deste fenómeno emergente.
TESTE FORMATIVO 1. O que é a governação/governança na perspectiva de Lynn? 2. Compare Simon e Waldo, acha que têm idêntica perspectiva da administração pública?
71
Laurence Lynn; Heinrich Carolyn; Hill Carolyn – Studying Governance and Public Management: Why? How?. In Laurence Lynn; Heinrich Carolyn (ed.) – Governance and Performance: New Perspectives. Washington D. C: Georgetown University Press, 2000.
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RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
N.º 1: É um conjunto de leis, regras administrativas, práticas e constrangimentos, prescrições e capacidades que permitem a ação do governo enquanto entidade capaz de produzir e distribuir bens e serviços públicos. N.º 2: São opostas.
L EITURAS C OMPLEMENTARES BILHIM, João – Teoria Organizacional: Estruturas e pessoas. Lisboa: ISCSP, 2014 FREDERICKSON, H. George; SMITH, Kevin B. – The Public Administration Theory Primer. Oxford: Westview Press, 2003. LARRY D. TERRY – “THE THINNING OF ADMINISTRATIVE INSTITUTIONS IN THE HOLLOW STATE”. ADMINISTRATION & SOCIETY, Vol. 37, no. 4, September 2005 426-444, 2005. SIMON, Herbert – Administrative Behavior. NY: The Free Press, 1947 WALDO, Dwight – The Administrative State. NY: The Ronald Press Company, 1948
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3. A ADMINISTRAÇÃO REGULADORA E PRESTADORA DE SERVIÇOS
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. Do Estado Circunscrito ao Estado Inserido na Economia 2. O “Consenso de Washington”: Expansão dos mercados e Retracção do Estado 3. A Compressão do Papel do Estado 4. As Privatizações e Contratos de Concessão 5. A Administração Produtora e Prestadora 6. A Administração Reguladora 7. A Noção de Serviço Público 8. Interesse Nacional, Público e Geral Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a: • Relacionar a acção reguladora e produtora do Estado; • Distinguir o papel abstencionista e intervencionista do Estado, em matéria económica; 57
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. A Administração Reguladora e Prestadora de Serviços
• Distinguir o papel da Constituição Portuguesa de 1933 e de 1976, em matéria económica; • Identificar a função que a Constituição da República Portuguesa (CRP), confere ao Estado na organização do processo económico; • Explicar em que consiste o modelo de economia mista, consagrada na CRP; • Indicar as razões principais que alimentam o movimento redutor do papel do Estado como empresário; • Discutir o significado da privatização e reprivatização; • Distinguir o papel do Estado como produtor de bens e serviços e, como regulador da actividade económica; • Discutir o significado de serviço público.
1. DO E STADO CIRCUNSCRITO ECONOMIA
AO
E STADO INSERIDO
NA
Teoricamente, o papel económico do Estado passou de um período abstencionista no século XIX para um período intervencionista e de inserção na economia, no século XX. Para o Estado Liberal do século XVIII, a economia não precisava de ser regulada artificialmente por meio de comandos exógenos. O mercado podia reagir sobre os factores de perturbação e reequilibrar o funcionamento dos mecanismos económicos. A regulação era inerente à própria economia. A máquina funcionava “naturalmente” sozinha, não precisando de qualquer regulação. Este foi o modelo postulado e que vigorou no mundo ocidental até à I Guerra Mundial. Em 1926, Keynes publica a sua célebre conferência intitulada The End of Laissez Faire, apresentando a certidão de óbito deste tipo de capitalismo. Todavia, os ataques à ordem liberal da economia não começaram com o opúsculo de J. M. Keynes, co-editado por Virginia Woolf. Tais ataques já vinham de trás. Nos Estados Unidos nascera, por volta de 1887, a primeira comissão reguladora, e no final do século passado, foi aprovado o Clayton Act, destinado a lutar contra os trust concentradores e anticoncorrenciais 72. Mas o modelo liberal clássico, enquanto capitalismo auto-regulado de dentro para fora pelo mercado, nunca existiu tal como foi postulado. Tratou-se antes de um “ideal model”, no sentido weberiano da expressão. Contudo, não é menos verdade que, até à I Guerra Mundial, não se podia afirmar que as Constituições
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C. V. Brown; P. M. Jackson – Public Economic Sector. Oxford: Blackwell, 1990, 3-27.
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dos países tivessem matérias económicas 73, e que os Estados fossem Estados económicos. Em matéria económica os Estados tinham um papel circunscrito e abstencionista. Foi a Constituição de Weimar, na Alemanha (1919), a primeira a introduzir uma secção especialmente dedicada ao enquadramento da vida económica. No entanto, outras constituições anteriores – como a Lei Fundamental Soviética, de 1918, e a Constituição Mexicana, de 1917 –, contivessem já uma ordem económica explícita. A ordem constitucional da economia passa a garantir o livre funcionamento do mercado (o princípio de auto-regulação, característico das constituições liberais), mas também para enunciar formas de hetero-regulação necessárias ao seu equilíbrio. Foi, assim, a partir da I Guerra Mundial, que a intervenção económica do Estado se fez sentir. Até aí, a sua intervenção nos domínios económico e social era, quando existia, rara, indirecta e, normalmente, reflexo de intervenções de finalidade e protecção social. A intervenção do Estado na economia acentua-se, porém, com a crise iniciada nos Estados Unidos, em 1929. Com esta crise, a maior parte dos países passou a fazer da economia uma questão fundamental de governo. Mas foi particularmente nos anos trinta, que se multiplicaram as agências reguladoras nos EUA, como ferramentas do New Deal rooseveltiano, bem como os offices intervencionistas em França, e os organismos reguladores em Portugal 74. No nosso País, foi a Constituição de 1933 que, pela primeira vez, consagrou um princípio explícito de hetero-regulação do mercado. Todos os textos constitucionais anteriores (constituição de 1822, Carta Constitucional de 1826, Constituição de 1838 e Constituição de 1911), obedeciam, genericamente, em matéria económica, às características das constituições liberais. Na Constituição de 1933 reconhecia-se a necessidade de intervenção dos poderes públicos, com carácter subsidiário e correctivo, pela afirmação de um princípio proteccionista da economia nacional, pela consagração de um modelo de representação orgânica dos interesses, e pela acentuada limitação dos direitos dos trabalhadores. A II Guerra Mundial acabou com os regimes autoritários, que tinham instituído formas de capitalismo de direcção estatal camuflado, de corporativismo, mas não restabeleceu o Estado Liberal, divorciado da economia. Pelo contrário, em diversos países, a intervenção estatal assumiu grandes dimensões: constituíram-se extensos sectores públicos empresariais e procedeu-se a nacionalizações, nomeadamente em França. 73
J. Canotilho e V. Moreira – Constituição da República Portuguesa Anotada. Coimbra: Coimbra Editora, 1993, p. 383. 74 Joseph E. Stiglitz – Economics of the Public Sector. Londres: W.W. Norton Company, 1988, 1-22.
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. A Administração Reguladora e Prestadora de Serviços
Assim, nos anos setenta, estavam instituídos modelos de regulação que chegaram a tomar a forma de planeamento central, mais ou menos forte, e o capitalismo na Europa ocidental tomava a forma de uma economia orientada e coordenada pelo Estado. O Estado Providência apostava no alargamento das prestações sociais, e o Estado produtor assumia-se, em todo o seu esplendor, em nome do “serviço público”. Isto, de acordo com a tradição francesa, ou em nome da “public utilities”, de tradição anglo-saxónica. Este movimento, porém, só chegou a Portugal com a Revolução de 25 de Abril. De facto, a revisão constitucional de 1971 não alterou o carácter autoritário da Constituição de 1933, expresso nas limitações dos direitos dos trabalhadores e no regime de condicionamento industrial. Portugal remava contra todas as marés da história do seu tempo. Só a Constituição de 1976 consagrou, pela primeira vez, uma economia aberta ao exterior, orientada para o desenvolvimento e corrigida pela intervenção do Estado democrático de direito. Com ela ficavam garantidos os direitos dos trabalhadores e dos demais agentes económicos, e conciliado o plano e a concorrência, enquanto elementos de coordenação da economia, tal como haviam feito, antes, muitos países europeus. Desde a sua versão inicial, a Constituição de 1976 garantia a existência, em Portugal, de um sistema económico complexo, assente na coexistência de três sectores de actividade económica e de três tipos de iniciativa: pública, privada e cooperativa. Por via das sucessivas revisões constitucionais de 1982, 1989 e 1992, a matéria económica da Constituição sofreu transformações em relação ao primitivo texto constitucional 75. Aos poucos, foi conferida à Constituição económica maior flexibilidade, ao alargar as possibilidades de combinação de formas de apropriação e de regulação. Foi, também, reforçada a iniciativa privada e aumentado o seu espaço de manobra, possibilitadas as reprivatizações e o mercado e reduzido o papel da “planificação democrática da economia”. De todas as revisões, parece-nos que foi a de 1989 que mais transformação trouxe ao domínio económico, em especial no que se refere à abolição do princípio da proibição das privatizações. Todavia, a Constituição Portuguesa actual atribui ao Estado diferentes funções na organização do processo económico. É possível agrupá-las, de modo aproximado, em dois tipos: • Aquelas em que o Estado aparece como empresário – como produtor ou distribuidor de bens ou de serviços; • Aquelas em que cabe ao Estado regular (condicionar, fiscalizar ou planear e promover). 75
J. Canotilho e V. Moreira – ob cit., 390.
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Genericamente, pode dizer-se que a Constituição consagra um modelo de economia mista e estabelece os princípios básicos de uma economia de mercado. Isto, ao impor a regulação pública de alguns aspectos do seu funcionamento, e ao salvaguardar os direitos dos trabalhadores e dos consumidores, enquanto limites ao poder económico privado ou público. Este modelo, de equilíbrio entre interesse público e economia de mercado, está presente em vários preceitos constitucionais. Defende a propriedade privada, estabelece a liberdade de empresa, favorece a concorrência, define a posição central do sector privado no processo económico e permite as reprivatizações. Simultaneamente, atribui ao Estado incumbências em matéria de orientação e controlo da actividade económica e de distribuição de rendimentos, estipula a segurança do emprego e o direito à greve, concede o direito de informação ao consumidor, proíbe-se a publicidade enganosa e protege a qualidade ambiental. No texto constitucional actual deixou de estar consagrado um princípio de subsidiariedade relativa à acção do Estado, como acontecia na Constituição de 1933. Neste último reconhecia-se a necessidade de intervenção do Estado na economia apenas com carácter subsidiário e correctivo. A actual Constituição reconhece a pluralidade de sectores de actividade económica e de formas de iniciativa: privada, pública e cooperativa. Estamos, pois, perante uma Constituição económica explícita na definição dos limites objectivos ao livre funcionamento do mercado. Estes limites têm origem na capacidade do Estado enquadrar e limitar a actividade económica privada e de concorrer com ela na produção de bens e serviços. A Constituição reconhece e garante ainda direitos eventualmente conflitantes com o livre funcionamento do mercado, como os direitos dos consumidores ou os dos trabalhadores.
2. O “C ONSENSO DE WASHINGTON”: EXPANSÃO E R ETRACÇÃO DO E STADO
DOS MERCADOS
Em 1989, com Reagan como Presidente dos Estados Unidos e Margareth Thatcher, Primeira Ministra da Inglaterra, máximas expressões do neoliberalismo em acção, reuniram-se em Washington, convocados pelo Institute for International Economics, entidade de carácter privado, diversos economistas latino-americanos de perfil liberal, funcionários do Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do governo norte-americano. O tema do encontro foi “Latin American Adjustment: How Much has Happened?”, visava a avaliar as reformas económicas em curso no âmbito da América Latina. 61
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John Williamson, economista inglês e director do instituto promotor do encontro, foi quem alinhavou os dez pontos tidos como consensuais entre os participantes e, simultaneamente, quem cunhou a expressão “Consenso de Washington”, através da qual ficaram conhecidas as conclusões daquele encontro, como regras universais: 1. Disciplina fiscal, através da qual o Estado deve limitar seus gastos à arrecadação, eliminando o deficit público; 2. Redução dos gastos públicos com Focalização em educação, saúde e infra-estrutura 3. Reforma tributária que amplie a base sobre a qual incide a carga tributário, com maior peso nos impostos indirectos e menor progressividade nos impostos directos 4. Juros de mercado: Liberalização financeira, com o fim de restrições que impeçam instituições financeiras internacionais de actuar em igualdade com as nacionais e o afastamento do Estado do sector; 5. Câmbio de mercado: Taxa de câmbio competitiva; 6. Abertura comercial: Liberalização do comércio exterior, com redução de importação e estímulos á exportação, visando a impulsionar a globalização da economia; 7. Investimento estrangeiro directo: Eliminação de restrições ao capital externo, permitindo investimento directo estrangeiro; 8. Privatização, com a venda de empresas estatais; 9. Desregulação, com redução da legislação de controlo do processo económico e das relações trabalhistas; 10. Propriedade intelectual. Estas medidas destinadas a expandir o papel dos mercados e a restringir o dos Estados, desde então, não deixaram de dominar a discussão em torno das funções do Estado e a política de desenvolvimento económico. Conforme disse John Williamson, em 2002, estas medidas “são princípios de base, sendo, por isso, que deram origem a consenso”. A discussão à volta da redução do papel do Estado e da introdução dos valores e do espírito da gestão empresarial na Administração Pública vai beber a sua inspiração aqui nestas bases do Consenso de Washington. Mas agora Dani Rodrik, um reconhecido economista da Universidade de Harvard, foi a mais recente voz a questionar os fundamentos intelectuais do Consenso de Washington num convincente novo livro, intitulado “One Economics, Many Recipes: Globalization, Institutions, and Economic Growth”. A tese de Rodrik é a de que, apesar de haver apenas uma economia, existem muitas receitas para assegurar o sucesso do desenvolvimento económico. 62
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A tese das “muitas receitas” diz que os países se desenvolvem com êxito ao seguirem políticas ecléticas, feitas à medida, que respondem a condições locais específicas, em vez de seguirem fórmulas genéricas de melhores práticas concebidas por teóricos da economia. Esta teoria põe em causa as certezas universais do Consenso de Washington e a sua fórmula de aplicação universal em matéria de privatização, mercados laborais desregulamentados, liberalização financeira, integração económica internacional e estabilidade macroeconómica baseada numa baixa taxa de inflação. No entanto, se bem que a tese das muitas receitas suscite um grande interesse, usufrua de suporte empírico e sugira um espírito de pluralismo teórico, a reivindicação de uma “economia única” é questionável, uma vez que dá a entender que a economia neoclássica dominante é a única economia autêntica. Parte da dificuldade em explicar esta restrição reside no facto de haver uma discussão na família dos economistas neoclássicos, que divide aqueles que acreditam que as economias de mercado do mundo real se aproximam da concorrência perfeita e aqueles que não acreditam nisso. Os crentes identificam-se com a “Escola de Chicago”, cujos principais exponentes incluem Milton Friedman e George Stigler. Os descrentes identificam-se com a “Escola do MIT” (Massachusetts Institute of Technology), associada a Paul Samuelson. e Rodrik, bem como outros nomes conhecidos, como Paul Krugman 76, Joseph Stiglitz e Larry Summers. Esta divisão esconde a uniformidade subjacente do pensamento. A Escola de Chicago defende que as economias de mercado do mundo real produzem resultados em grande medida eficientes, que as políticas públicas não podem melhorar. Por isso, qualquer intervenção do Estado na economia prejudicaria sempre alguém. Pelo contrário, a Escola do MIT sustenta que as economias do mundo real suportam as consequências das falhas dos mercados, onde se incluem a concorrência imperfeita e os monopólios, as externalidades associadas a problemas como a poluição e a incapacidade de fornecer bens públicos, tais como iluminação pública ou a defesa nacional. Consequentemente, as intervenções estatais dirigidas às falhas de mercado – bem como às generalizadas imperfeições da informação e à inexistência de muitos mercados necessários – podem beneficiar todas as pessoas. Acresce que, nem a Escola de Chicago nem a Escola do MIT defendem que os resultados do mercado são equitativos, porque os resultados reais dos mercados dependem da distribuição inicial dos recursos. Se essa distribuição não for equitativa, os actuais e futuros resultados também não o serão. Os economistas de Chicago parecem acreditar que a falta de equidade nos resultados do mundo real é aceitável e, o que é ainda mais importante, que as tentativas para emendar essa 76
Paul Krugman – The Conscience of a Liberal. London: Penguin Books, 2007.
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situação são demasiado dispendiosas, porque a manipulação dos mercados provoca ineficiências económicas. Eles parecem estar convictos de que a intervenção do governo tende a gerar os seus próprios fracassos, bastante dispendiosos, devido à incompetência burocrática e à procura de rentabilidade fácil, mediante as quais os interesses privados tentam orientar as políticas em seu próprio benefício. Os economistas do MIT pensam exactamente o contrário: a equidade é importante, o mundo real é de uma injustiça inaceitável e os fracassos do governo podem ser evitados através de um quadro institucional apropriado, nomeadamente o democrático. Acresce que economistas heterodoxos como Thorsten Veblen e Joseph Schumpeter há muito que expuseram muitas das actuais questões mais prementes da economia neoclássica, incluindo o papel das normas sociais e a relação entre inovação tecnológica e ciclos económicos. A economia heterodoxa engloba conceitos teóricos de base que são, fundamentalmente, incompatíveis com a economia neoclássica em qualquer das suas duas formas contemporâneas. Estes conceitos resultam em explicações significativamente diferentes do mundo real, incluindo a distribuição dos rendimentos e os factores determinantes da actividade económica e do crescimento. Além disso, muitas vezes resultam na prescrição de diferentes políticas. A forma como o Estado tem encarado as falhas de mercado tem conduzido, desde o Consenso de Washington à procura de alternativas que permitam, por um lado evitar intervenções de consequências nefastas e, por outro, promover o eficiente desempenho das funções fundamentais do Estado, ou seja, actualmente, assiste-se a uma discussão de natureza política tendo por base uma doutrina económica sobre as novas funções/missões/atribuições do Estado.Com o peso crescente do Estado e o poder crescente dos Governos, a análise das regras de decisão política e do modo como actuam os agentes políticos torna-se essencial 77
3. A C OMPRESSÃO
DO
PAPEL
DO
E STADO
Os anos oitenta vieram pôr em causa o status quo quanto ao papel do Estado, tendo sido palco de um movimento de redução desse papel na vida económica e social. A concepção de um menor Estado, ou seja, de um menor protagonismo directo deste na actividade económica, apresenta tónicas diferenciadas entre si,
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André Alves; José Moreira – O que é a Escolha Pública? Cascais: Principia, 2004.
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desde versões minimalistas do tipo Estado mínimo, até versões mais intervencionistas, do tipo “intervir menos para intervir melhor” 78. Esta evolução conhece uma assinalável aceleração, em especial desde a queda do Muro de Berlim e do impulso decisivo da globalização económica e dos mercados. Representa, também, com a revolução tecnológica e comunicacional, a entrada de um novo paradigma de organização económica e social, marcado pela agressividade competitiva à escala planetária. O movimento de resposta às novas condições da envolvente assentou em três ideias. Uma foi a de promover a privatização de sectores económicos controlados pelo Estado. Outra foi a de assumir uma orientação no sentido da diminuição e simplificação da intervenção económica pública. A terceira foi a de garantir a aplicação às relações com as empresas, do princípio da igualdade e das regras da livre concorrência. Este movimento foi acompanhado por orientações políticas de desregulamentação e de desregulação e, no campo ideológico, foi incentivado pelo reviver das doutrinas neoliberais da Escola de Chicago e pelas conclusões saídas do Consenso de Washington em 1980. Desde então, tem-se assistido a uma enorme vaga de privatizações de empresas públicas e de sectores públicos em quase todos os países do mundo. Esta vaga começou em Inglaterra e espalhou-se, posteriormente, à Austrália, Nova Zelândia e países do Norte da Europa. Os países francófonos parecem ser mais resistentes ao impacto desta vaga mas, lentamente, também apresentam sinais de cedência à sua força e sedução. Este movimento de privatização tem diminuído, substancialmente, a participação do Estado na actividade económica, e a desregulamentação de sectores, até há pouco explorados em regime de monopólio. Aliviou e restringiu, também, o peso da intervenção pública. Tudo isto, associado ao derrube das economias comunistas de planeamento central estatal, deu a esta onda, nos anos noventa, traços de um movimento regenerador, cujas consequências ainda são em grande parte, imprevisíveis. Razões, de vária ordem, têm sido aduzidas para explicar o movimento redutor do papel do Estado empresário. Em primeiro lugar, a ineficiência das empresas públicas, provocada, em parte, pela sua gestão sacrificar os objectivos económico-financeiros e comerciais, aos políticos e sociais, entre estes, o endémico endividamento, fruto de resultados operacionais e financeiros altamente negativos, a redução de tarifas e preços por razões políticas circunstanciais e a manutenção de elevados níveis de emprego 79.
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Joseph E. Stiglitz – Economics of the Public Sector. Londres: W.W. Norton Company, 1988, 1-22. Joseph E. Stiglitz – Economics of the Public Sector. London: W.W. Norton Company, 1988, 90-116.
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Em segundo lugar, a necessidade de diminuir o desequilíbrio dos orçamentos públicos, (défice e dívida pública) aliviando-os dos défices de algumas empresas públicas, com o acréscimo de receitas extraordinárias provenientes da venda de capital e património. Em terceiro lugar, a redução do peso político dos sindicatos ou das clientelas político-partidárias. Em quarto lugar, a intenção de promover vantagens sociais adequadas à presente fase do capitalismo. Por exemplo, o acesso à propriedade directa do capital das empresas à generalidade dos agentes, nomeadamente dos trabalhadores no capital das empresas a privatizar. Para os partidários da desintervenção ou da redução das actividades produtivas de bens ou serviços do Estado, a passagem da gestão pública para a gestão privada acarreta uma série de melhorias. Aumenta a eficácia, melhora a qualidade, reduz os impostos, diminui o sector público e melhora o atendimento dos clientes. Esta nova filosofia administrativa tem-se expressado – como vimos através da Administração Pública de tipo Empresarial “New Public Management”, da Reinvenção da Governação “Reinventing Government”, das abordagens da Escolha Pública 80 e do Novo Serviço Público 81. Para Peters e Waterman, o modelo burocrático, característico das organizações públicas, é gerador de ineficiências e disfunções, razão por que se deverá adoptar modelos e técnicas de gestão empresarial. As administrações públicas apresentam um excessivo formalismo que paralisa as organizações, as quais ignoram os resultados e os clientes para insistirem no cumprimento de regras. Os gestores, por sua vez, são avaliados em função do grau de cumprimento das normas. No âmbito desta nova filosofia administrativa, ao sector público não deverá, como no passado e durante décadas, ser pedido que seja um grande empregador e que resolva os problemas de desemprego. Isso já não constitui a sua missão. A sua missão é prestar um bom serviço a um preço ou taxa baixa, isto é, dar ao cliente maior qualidade ao menor custo. Numa óptica microeconómica, as privatizações têm, pois, como objectivo melhorar o funcionamento dos serviços, aumentando a qualidade e baixando os preços, ou introduzindo mais valor no produto ou serviço final mantendo o mesmo preço. Numa óptica macro-económica, tem-se em vista restaurar os mecanismos de mercado e reduzir o peso do Estado na economia. Razões de ordem financeira, económica, política e ideológica misturam-se, pois, no
80
André A. Alves; José M. Moreira – O que é a Escolha Pública. Cascais: Princípia, 2004. Janet Denhardt; Robert Denhardt – The New Public Service: Serving, not steering. London: M. E. Sharpe, 2003.
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mosaico de justificações do processo de redução do peso do Estado na economia. Como referimos, a revisão constitucional de 1989 veio retirar da Constituição o princípio da irreversibilidade das nacionalizações. Deste modo, suprimiu os principais limites à reprivatização total de empresas nacionalizadas, seja da titularidade, seja da gestão dos meios de produção (art.º 85, n.º 1) e permitiu uma rápida compressão do sector público produtivo. A própria Constituição inclui uma norma transitória (art. 296), contendo os princípios básicos de uma futura lei-quadro das privatizações, que surgiu em 1990 (Lei n.º 11/90, de 5 de Abril). Na sequência dela, o Governo levou a cabo um vasto plano de reprivatizações, a que juntou o anúncio da privatização da gestão de vários serviços públicos. O grande limite à privatização é, parece-nos, o que decorre, em última análise, do princípio constitucional da coexistência dos sectores público, privado e cooperativo dos meios de produção e que impede uma eventual privatização total do sector público produtivo. Acresce, ainda, que a Constituição estabelece, de forma moderada, sectores vedados à actividade privada, cuja titularidade e gestão não podem ser transferidas para o sector privado, nos termos do art.º 87.º, n.º 3, senão até 49% do seu capital (art.º 2). O sector empresarial do Estado é constituído por empresas públicas, sociedades de capitais públicos, e sociedades de economia mista controladas. O Estado pode, ainda, deter participações minoritárias em sociedades comerciais privadas. Por último, importa salientar que, existe um grande debate académico, teórico, político e económico na área do bem-estar e das finanças públicas acerca das velhas e novas funções do Estado. Na prática é aqui que se focaliza o essencial da questão, por exemplo, acerca do sector público poder ou não ter um peso superior a 35% do Produto Interno Bruto (PIB) de um país? Na última década Portugal aplicava cerca de 50% do PIB no sector Público. Todavia, há países como a Suécia com um peso superior. Por isso, há quem se interrogue se deveremos centrar a questão apenas no peso da despesa pública face ao PIB ou na relação entre este rácio e a qualidade de serviço público prestada ao cidadão pela Administração?
4 A S PRIVATIZAÇÕES , EXTERNALIZAÇÕES C ONCESSÃO
E
C ONTRATOS
DE
A privatização é uma técnica pela qual o Estado reduz ou modifica a sua intervenção na economia em favor do sector privado. Os modelos a seguir, para que esse objectivo seja alcançado, variam de acordo com as políticas públicas econó67
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micas. Esses modelos vão da alienação da propriedade dos meios de produção públicos e da cedência da sua gestão à abertura de sectores anteriormente vedados à iniciativa privada. Passam, ainda, pela liberalização dos regimes legais da actividade económica privada e ainda pela colaboração de entidades privadas na execução de tarefas públicas. O termo privatização pode assumir diversos significados, confundindo-se com externalização de serviços, por isso convém esclarecer os vários sentidos com que esta palavra tem sido utilizada 82. De um modo geral são os seguintes, significados mais correntes: a) Transferência total ou parcial da propriedade de empresas e/ ou bens públicos para entidades privadas. Utiliza-se o termo reprivatização quando a natureza de tais bens ou empresas resultou de nacionalização anterior. b) Concessão a entidades privadas, mediante contrato, da gestão de empresas públicas ou de serviços públicos. c) Contratação de serviços por entidades públicas a entidades privadas (contracting out ou subcontratação de serviços públicos). d) Abertura, à iniciativa privada, de sectores anteriormente explorados pelo sector público em regime de monopólio. e) Desregulamentação, quando as entidades públicas deixam de regulamentar, na totalidade ou em parte, o modo de produção ou de distribuição de um bem ou serviço. f ) Processo de submissão dos serviços ou das empresas públicas a regras de gestão de natureza privada. É a privatização formal, que se traduz no mero recurso a formas organizacionais ou regimes jurídicos de direito privado. A privatização material ocorre quando há efectiva transferência de propriedade do Estado para os privados. g) Parceria público-privada que por sua vez assume diversas formas. Uma das mais conhecidas é o Project finance, outra acepção a dar ao termo. O Project finance inclui três aspectos: decisão de investimento, envolvendo um activo; decisão organizacional, envolvendo a formação de uma empresa independente; e decisão de financiamento, envolvendo o tipo de dívida e garantias relacionadas. Historicamente, o sector privado tem utilizado o project finance para financiar projectos industriais. Mais recentemente, outra área em que este mecanismo tem se mostrado promissor é a de infra-estrutura na qual identificam-se parcerias público-privadas para o financiamento de instalações de transporte, estações geradoras de energia, sistemas de comunicação e outros projectos. Estes projectos de infra-estrutura tais como pontes ou certas redes de auto-estrada, portos e aero82
E. S. Savas – Privatization and Public Partnerships. Chatam, NJ: Chatan House, 2000.
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portos são altos e de longa maturação, exigindo financiamentos também de longo prazo, além de um ambiente económico estável. A presença do sector privado está aumentando em várias áreas de infra-estrutura pública, sendo de grande proeminência na de transportes. A prestação de serviços, que envolva receita de taxas dos utentes, tem sido objecto de financiamento por parte do sector privado. Os acordos entre os sectores público e privado podem assumir diversas formas, diferindo entre si na forma pela qual responsabilidades, riscos e retornos são compartilhados. Importa salientar que nos termos dos contratos existentes por regra num prazo mais ou menos alargado a propriedade da infra-estrutura reverte a favor do Estado. Trata-se na prática de um mecanismo que permite aos cidadãos antecipar a fruição de um bem de infra-estrutura pública. Muita polémica do ponto de vista académico se tem levantado sobre isto, nomeadamente se o recurso a este instrumento não custa mais ao Estado. Naturalmente que é mais oneroso. Todavia, afigura-se ser a via para usufruir um bem quando não se tem recurso para o financiar no momento. Importa, por último referir que o Project finance não é novo. O financiamento baseado em fluxo de caixa é uma técnica antiga, tendo seus primórdios no século VII, no comércio na Europa. Em 1299, a Coroa Britânica negociou um empréstimo junto a Frescobaldi, um dos principais bancos de investimento italianos da época, para desenvolver minas de prata. Contratualmente, o credor controlaria as minas e retiraria o minério na quantidade que quisesse, durante um ano, assumindo o custo da operação. Importa salientar que no que toca às parcerias público-privadas o Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, foi publicado tendo em vista potenciar o aproveitamento pelo Estado da capacidade de gestão do sector privado, melhorar a qualidade dos serviços públicos prestados e gerar poupanças consideráveis na utilização de recursos públicos. O desenvolvimento de projectos estruturantes e a inerente criação de encargos de médio ou longo prazo para o parceiro público ou para o Estado, que poderão perdurar por várias gerações, constitui o traço definidor das parcerias público-privadas, justificando a necessidade de um regime jurídico especialmente orientado para assegurar o rigor e a exacta ponderação dos custos e benefícios das opções tomadas, bem como a respectiva articulação com as normas de enquadramento orçamental. Aquele decreto-lei pretendeu, com efeito, instituir princípios gerais de eficiência e economia, designadamente através de uma mais cuidada avaliação da possível repartição do risco e da criação de incentivos à definição de parcerias financeiramente sustentáveis e bem geridas. Com a revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 141/2006 de 27 de Julho, ao regime jurídico anterior procedeu-se ao alargamento do seu âmbito de aplicação, alterou-se o modo de funcionamento das comissões de acompanhamento das 69
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parcerias, instituiu-se a obrigatoriedade de se constituírem, via de regra, comissões de negociações quando estejam em causa alterações a contratos de parcerias público-privadas já celebrados ou quando haja lugar à reposição do equilíbrio financeiro dos mesmos e estabelecem-se os procedimentos a observar quando existam situações ou se pretendam tomar decisões susceptíveis de gerar novos encargos para o parceiro público ou para o Estado. Estes diversos sentidos, atribuídos ao termo vulgarmente conhecido por privatização, deixam bem claro que este movimento de redução do peso do Estado na economia, não diz respeito apenas, nem sobretudo, ao sector empresarial do Estado, mas a toda a Administração Pública. Há quem defenda que passa, também, por aqui a indispensável modernização administrativa. A privatização, em sentido estrito e material, e em sentido amplo e formal, constituiria, assim, um instrumento poderoso na enorme tarefa da modernização administrativa. Modernizar a administração pública passa, nesta perspectiva por reduzir o peso do Estado na economia. Por o Estado sair e dar lugar a outras entidades para operar, muitas vezes em seu nome, ou seja, em nome do Estado. Fica claro que, em muitas situações, o Estado não abandona o seu papel de financiador, de planeador e mesmo de tutor. Do que atrás referimos pode-se concluir que, em alguns casos, não se trata tanto de transferência da propriedade ou da gestão públicas, mas apenas de formas de abertura à concorrência. É uma forma de ampliar o papel da actividade privada ao lado da pública ou, apenas, de um artifício legal para permitir maior flexibilidade à gestão, retirando-a do espartilho das normas do direito administrativo da disciplina orçamental e do modelo rígido da função pública. O outsourcing engloba um conjunto de ferramentas de externalização que podem contribuir quando tecnicamente bem geridas para aliviar o peso do Estado e aumentar a eficiência dos dinheiros públicos. É uma decisão e técnica de gestão destinada a baixar os custos de produção e a concentra as energias da Administração Pública no essencial das suas competências, com maior eficiência na utilização dos recursos. Outra forma de redução do peso do Estado na prestação de serviço público é o recurso à concessão. A concessão compreende a atribuição, feita através de contrato, pela Administração Pública, a um entidade externa, a concessionária, da gestão e/ou da exploração de uma dada actividade ou serviço públicos. O art.º 9.º da Lei 46/77 (Lei da Delimitação dos Sectores), já previa que a exploração e gestão das empresas, referidas no art.º 2.º, poderiam ser confiada pelo Governo a entidades privadas. Nas bases gerais das concessões de serviço público de movimentação de cargas em áreas portuárias, aprovadas pelo decreto-lei n.º 324/94, de 30 de Dezembro, afirma-se que: a “concessão tem por objecto o direito de exploração comercial, em regime de serviço público, da actividade de movimentação de 70
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cargas, incluindo o respectivo estabelecimento.” No preâmbulo deste diploma clarifica-se o objectivo do recurso, pela Administração, a este tipo de mecanismo. Diz textualmente: “criam-se as condições para que as administrações portuárias se libertem do envolvimento em actividades operacionais e de gestão comercial, concentrando a sua acção no exercício das funções de autoridade portuária, que melhor correspondem à sua natureza de institutos públicos e à sua vocação prioritária”. Através do contrato de concessão, a concessionária passa a exercer uma actividade de interesse geral, que está reservada por lei à entidade que concessiona. A entidade concessionária assume o papel de colaborador permanente da Administração, em virtude deste tipo de contrato possuir uma vigência de longo termo, embora seja sempre outorgado por um determinado prazo. A concessionária tanto pode ser uma sociedade de capital público, como misto, ou mesmo privado. É o caso dos CTT Correios de Portugal, que são uma sociedade anónima de capital 100% público, a quem foi concessionado o serviço público de correio. A concessão efectiva-se através da celebração de um contrato de natureza administrativa realizado entre o Estado e a entidade concessionária. Importa, porem, salientar que há uma diferença entre privatizar e externalizar serviços e atribuições da Administração. A privatização em português sempre passa por alienação da propriedade e património de mãos públicas para mãos privadas. Pelo contrário, a externalização de serviços como por exemplo os de limpeza de serviços de cantina, de gestão de sistema de informação ou de serviços públicos como hospitais não implica qualquer alienação de património e consequentemente deve ser encarado como um instrumento diferente da privatização que por norma causa um encaixe financeiro que vai directo para a redução da despesa pública do Estado. Actividade 1 Entreviste alguns clientes de um serviço que seja prestado, em concorrência, pelo Estado e por entidades privadas, e compare o grau de satisfação.
5. A ADMINISTRAÇÃO PRODUTORA
E
PRESTADORA
Na época liberal, as intervenções directas dos Estados na produção de bens e de serviços restringiam-se, na generalidade dos países europeus, aos investimentos em infra-estruturas de interesse geral, aos serviços de correios e comunicações, de transportes ferroviários, às imprensas nacionais, às manufacturas de material de guerra e aos monopólios dos tabacos e dos fósforos (fontes de receitas fiscais). 71
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. A Administração Reguladora e Prestadora de Serviços
Serviços de interesse público como a distribuição de água, gás e electricidade, lançados também durante esse período, foram assumidos pelas administrações municipais. A actividade económica do Estado – distinta, por natureza, da sua função como legislador e administrador da coisa pública – era, então, entendida como excepcional. À luz da doutrina liberal, os poderes públicos deviam abster-se de actuar como agentes económicos, sob pena de falsearem as leis do mercado. Daí que, as suas intervenções só fossem, em princípio, admitidas quando justificadas pela existência de «falhas do mercado». Por exemplo, a incapacidade do mercado de produzir bens ou serviços de interesse geral em quantidades ou condições adequadas (de preço, universalidade, etc.), os monopólios naturais (os caminhos de ferro, as telecomunicações) e actividades que constituíssem o prolongamento natural da acção de um serviço público administrativo (caso das imprensas nacionais e do fabrico de equipamentos para as forças armadas). Nesta fase, foram duas as formas de organização e gestão das actividades do Estado como produtor de bens e de serviços: a administração directa por departamentos da Administração Pública sem personalidade própria, e a concessão dessas actividades a sociedades de estatuto privado. A figura do serviço público económico não personalizado foi cedendo, progressivamente, lugar à instituição de serviços dotados de personalidade jurídica. Embora, esta tendência para a personalização dos serviços públicos, que se desenvolveu sobretudo a partir da Primeira Guerra Mundial, tenha abrangido tanto os serviços administrativos propriamente ditos como os serviços industriais e comerciais, ela marcou em especial estes últimos por razões que se prendem com a maior exigência de autonomia e flexibilidade que os caracteriza. Desenvolveram-se, na mesma época, as empresas de economia mista. Ao conceder a empresas privadas a exploração de actividades de interesse público, o Estado pretendia que o funcionamento destas obedecesse a princípios e regras de gestão característicos das empresas privadas (designadamente, a liberdade de organização, gestão e autonomia contratuais). Isso não o impedia, porém, de atribuir às empresas concessionárias prerrogativas de autoridade pública, quando julgadas necessárias 83. A criação de serviços públicos de carácter industrial e comercial na esfera do Estado veio, também, acompanhada da tendência para a submissão desses serviços a regras do direito privado. Isso, sem que prejudicasse a sua vinculação institucional ao sector público, e a sujeição ao direito público de aspectos do seu funcionamento, como a tutela, o estatuto do pessoal e a possibilidade de recorrer ao contrato administrativo em determinadas circunstâncias. Verifica-se assim que, tanto no caso da concessão como do serviço público personalizado, se usaram técnicas de direito privado para a prossecução de finalidades públicas. 83
Joseph E. Stiglitz – Economics of the Public Sector. Londres: W.W. Norton Company, 1988, 1-22.
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A seguir à Segunda Guerra Mundial, particularmente nos países que haviam estado envolvidos de forma directa no esforço de guerra, tiveram lugar processos de nacionalização de empresas privadas (que abrangeram, em certos casos, empresas concessionárias). As nacionalizações deram origem a uma nova figura institucional, a entidade pública empresarial, a par dos serviços públicos personalizados. Estas nacionalizações, que se explicam (como mais tarde as privatizações), por um contexto político e ideológico específico, coincidiram com o reforço de outros mecanismos de intervenção desses Estados na economia, como o plano e os auxílios às empresas privadas. Em Portugal, as formas jurídico-institucionais da actividade empresarial do Estado só em parte mostram traços semelhantes aos de outros países da Europa Ocidental. Recorreu-se, inicialmente, às figuras de concessão de bens e serviços públicos (por exemplo, dos caminhos de ferro e dos telefones e telégrafos), e à administração directa (imprensa nacional, fabrico de material de guerra). O reconhecimento da necessidade de tornar mais flexível o regime de determinados serviços públicos económicos conduziu, igualmente, o Estado português a atribuir a muitos organismos personalidade jurídica e autonomia administrativa e financeira. Mas só no final dos anos 60 se assiste, em Portugal, à transformação de alguns desses serviços em empresas, bem como à criação ex novo de outras empresas públicas. Ainda que em obediência a uma filosofia de organização distinta da maioria dos regimes ocidentais do pós-guerra, o «Estado Novo» favoreceu, também, uma experiência de colaboração próxima entre as economias pública e privada. Isso traduziu-se na participação pública, por vezes maioritária, no capital de empresas privadas, particularmente no lançamento de empreendimentos em sectores básicos, como a siderurgia e a produção de energia. Foi, porém, com as nacionalizações de empresas realizadas entre 1974 e 1976, na sequência da Revolução de Abril de 1974, que se verificou a expansão do sector empresarial do Estado. Finalmente, a política de privatizações, desencadeada em 1988 e prosseguida após a revisão da CRP, em 1989, reduziu consideravelmente a dimensão, e alterou as formas institucionais da actividade económica do Estado. Passaremos, seguidamente, em revista os vários formatos institucionais que tem assumido a actividade empresarial do Estado. Começaremos pelos serviços públicos económicos e abordaremos, depois, o regime das empresas públicas 84. Tendo estas empresas resultado, em Portugal, directamente das nacionalizações, dedicaremos especial atenção a este processo. Referiremos, a seguir, o regime das privatizações e, a terminar, a concessão de bens e serviços públicos. Esta última representa, de certo modo, uma forma de «privatização» de actividades económicas do Estado, e readquire uma importância renovada no quadro da actual política de privatizações. 84
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Na origem das actuais formas de organização do Estado como produtor de bens e de serviços encontram-se – como se indicou –, os serviços públicos económicos. Originariamente, como serviços administrativos, os serviços públicos económicos começaram a ser geridos de modo directo pela Administração Pública, por meios de estruturas sem personalidade jurídica própria (régies). No serviço público gerido directamente, a pessoa pública assume não apenas a sua direcção e orientação estratégica, mas também a prestação operacional do serviço. De um modo geral, esses serviços foram sendo transformados em serviços personalizados (ou estabelecimentos de carácter industrial e comercial), dotados de autonomias administrativa e financeira. O recurso ao serviço personalizado foi, pensado como um meio de evitar os perigos da estatização (politização e burocratização), das actividades económicas do Estado, o que se tornava especialmente premente no caso das actividades industriais e de prestação de serviços ao público. Beneficiando de orçamento e gestão autónomos, esses serviços podiam, assim, escapar à rigidez das regras orçamentais e da contabilidade pública, adquirir, desse modo, condições de uma maior eficiência. Os serviços públicos económicos passaram, em consequência, a ser definidos não só pelo seu objecto, que consiste numa actividade de carácter industrial ou comercial, como pelas condições do seu funcionamento, que se aproximam das que regem as empresas privadas. Uma das características desses serviços é a do seu funcionamento ser, em grande parte, subtraído às regras do direito administrativo, o que vale, designadamente, para as suas relações com fornecedores e clientes. Hoje, subsistem, entre nós, poucos serviços públicos de carácter económico, quer sob administração directa do Estado, quer como estabelecimentos públicos personalizados. São exemplos, a nível da Administração local, os serviços municipalizados (dependentes das Câmaras Municipais e sem personalidade jurídica, ainda que desfrutando de autonomia funcional), e a nível da Administração central, alguns estabelecimentos fabris militares. A tendência actual é, porém, para a aquisição de um estatuto empresarial por parte deste últimos estabelecimentos. A noção de empresa pública (em sentido amplo), surgida na Europa posteriormente à Segunda Guerra Mundial, acabou por se sobrepor ao conceito de serviço público económico ou estabelecimento industrial e comercial. Em França, por exemplo, o conceito de empresa pública – que acabou por não encontrar expressão na definição de um regime específico deste tipo de empresas – passou a englobar quer as sociedades de capitais públicos (e de economia mista controladas) que resultaram das nacionalizações, quer os estabelecimentos públicos industriais e comerciais, tendo as duas categorias passado a ser diferenciadas, de modo relativamente impreciso, em função do maior ou menor grau de privatização dos seus regimes 85.
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Em Portugal, a empresa pública foi, até meados dos anos 70, entendida como uma categoria do serviço público personalizado e representava o substracto de determinados serviços económicos personalizados9. Nessa acepção, foram empresas públicas tanto a Fábrica de Vidros da Marinha Grande, legada ao Estado no século XIX, como os CTT ou a Imprensa Nacional. Só em 1976 veio a ser criado um regime específico para as empresas públicas, instituindo-se um verdadeiro sector empresarial do Estado 86. O sector empresarial do Estado, hoje, integra as empresas públicas, isto é, as sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias: a) Detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto; b) Direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização; c) as pessoas colectivas de direito público, com natureza empresarial, criadas pelo Estado conhecidas por «entidades públicas empresariais». Acrescem a estas as empresas participadas, isto é, organizações empresariais que tenham uma participação permanente do Estado ou de quaisquer outras entidades públicas estaduais, de carácter administrativo ou empresarial, por forma directa ou indirecta. Consideram-se participações permanentes as que não tenham objectivos exclusivamente financeiros, sem qualquer intenção de influenciar a orientação ou a gestão da empresa por parte das entidades participantes, desde que a respectiva titularidade não atinja uma duração, contínua ou interpolada, superior a um ano. Presume-se a natureza permanente das participações sociais representativas de mais de 10%do capital social da entidade participada, com excepção daquelas que sejam detidas por empresas do sector financeiro 87 Com a revisão da lei de bases das empresas públicas de 1999 Portugal aproximou-se do conceito da União Europeia relativamente à doutrina contida no Decreto-lei de 1976. Nas doutrinas europeia e comunitária, este conceito é mais amplo. Nelas o conceito de entidade pública empresarial abrange todas as empresas criadas por iniciativa pública e que são controladas pelo Estado, independentemente, da sua estrutura e forma institucional. A definição de entidade pública empresarial pela Comunidade Europeia considera, como tal toda aquela em que os poderes públicos possam exercer uma influência dominante com base na propriedade, na participação financeira ou nas regras que a regem. Esta noção (de entidade pública empresarial em sentido material), tende a tornar-se, em Portugal, progressivamente, mais operativa com o processo de privatizações. Este
86 87
Decreto-lei n.º 260/76, de 8 de Abril (lei de bases das empresas públicas). Decreto-lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
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processo levou à transformação de muitas empresas públicas, ora em sociedades de capitais públicos e em sociedades de capitais mistos e privados. Os municípios, as associações de municípios e as regiões administrativas podem criar empresas públicas, no seu âmbito, para exploração de actividades que prossigam fins de reconhecido interesse público 88 São empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas as sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais os municípios, associações de municípios e áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, respectivamente, possam exercer, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias: a) Detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto; b) Direito de designar ou destituir a maioria dos membros do órgão de administração ou de fiscalização. São também empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas as entidades com natureza empresarial reguladas Os municípios, as associações de municípios e as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto podem constituir pessoas colectivas de direito público, com natureza empresarial, designadas «entidades empresariais locais» 89 Actividade 2 Entreviste um administrador público e tente descobrir a razão pela qual o Estado tem de ser o produtor daquele tipo de serviço.
6. A ADMINISTRAÇÃO REGULADORA A redução do peso do Estado-empresário e a liberalização de determinados sectores de actividade económica, a que se tem assistido nos últimos anos em diversos países, têm sido acompanhadas por um alargamento do papel de Estado como regulador. A Constituição da República Portuguesa (CRP), no seu art. 81.º, alínea f ), atribui ao Estado, sob a epígrafe “Incumbências Prioritárias”, a obrigação de “assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organizações monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral”.
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Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto – Lei das empresas municipais, intermunicipais e Regionais. Lei n.º 53-F/2006, de 29 de Dezembro (Aprova o regime jurídico do sector empresarial local, revogando a Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto).
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Na verdade, quer o funcionamento eficiente dos mercados, quer a concorrência equilibrada, quer ainda as formas de organização monopolistas, incluindo abusos de posição dominante e outras práticas lesivas do interesse geral, exigem do Estado uma melhor regulação Em certo sentido, hoje, exige-se que o Estado converta parte dos recursos nomeadamente humanos que dedicava, tradicionalmente, à produção tangível de bens públicos em novas competências destinadas a satisfazer as novas atribuições da regulação. Com feito, os desenvolvimentos elaborados a partir da primeira legislação dos EUA“anti trust”, ou seja, o Sherman Act (1890) e, por outro, o paradigma de “undistorted competition”, que adquiriu cidadania universal no quadro das relações internacionais e da administração pública existente em vários Estados, e que tem vindo a operar a partir do Tratado de Roma (1957), com várias externalidades positivas, de que a Construção Europeia é o exemplo mais evidente. De facto, a defesa do interesse público pelo estado regulador pode manifestar-se sob três formas ou regimes. Como autoridade que define as condições de acesso e as regras e obrigações a observar no desempenho de uma dada actividade. Como co-participante no funcionamento das unidades empresariais, que assumem tal actividade, enquanto accionista. Como poder regulador que acompanha, fiscaliza, controla e até pune os agentes prestadores do serviço público 90. Este fenómeno da regulação incide, em especial, sobre os mercados emergentes, como resultado dos referidos processos de privatização e de liberalização. Assim, tanto a privatização de empresas públicas – que, em muitos casos, não havia sido objecto de uma regulação pública sistemática –, como a abertura à concorrência de sectores anteriormente vedados ou de acesso controlado (como, por exemplo, as telecomunicações, a electricidade, o serviço de televisão, os correios, o transporte aéreo, água, saneamento básico) têm dado origem ao estabelecimento de novos regimes e instâncias de regulação. São dois os objectivos essenciais destes regimes. Garantir o respeito das empresas pelas regras da concorrência, designadamente as privatizadas, públicas ou de capital público. Assegurar a qualidade e a quantidade dos bens ou serviços produzidos, em particular, quando se trate de bens ou serviços de interesse geral. O Estado regulador apresenta, ainda, outras facetas, que têm coincidido historicamente com os desenvolvimentos referidos, e que se distinguem quanto às suas causas e características. Trata-se, nomeadamente, da regulação pública das 90
M Motta – Competition Policy – Theory and Practice. Cambridge: Cambridge University Press,,. 2004: M. Neumann; Weigand (eds.) – The International Handbook of Competition. Cheltenham: Edward Elgar, 2004;. Annette Bongardt, (ed.) – Competition Policy in the European Union. Experiences and Challenges ahead. Oeiras: INA, 2005.
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actividades económicas que comportam riscos para a saúde, a segurança e o meio ambiente, e da regulação dos mercados financeiros 91. Na opinião de alguns autores, o Estado regulador configura um novo paradigma de intervenção do Estado intervencionista, ou dirigista, que marcou as décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial. Também na Constituição económica portuguesa, e na actividade económica propriamente dita, a perda de importância do sector empresarial do Estado não foi acompanhada pelo declínio do seu papel como regulador dessa actividade. Isto não significa, que no desenvolvimento e aplicação do texto constitucional não tenham variado, ou possam variar, as actividades regulamentadas ou os instrumentos utilizados para esse efeito. Tal acontece, por exemplo, quando o Estado concede maior importância à protecção da concorrência do que à regulamentação dos preços. E, também, quando prefere a negociação à imposição, como meio de vincular os agentes económicos a determinados comportamentos. Neste aspecto, a ordem jurídica portuguesa vem reflectindo tendências globais para a desregulação de certas actividades e a regulação de outras. Muitos autores chamam a atenção para o papel que a substituição da intervenção pública pela privada desempenha como forma de modernizar a Administração Pública. Uma vez que parece ser consensual, actualmente, que o sistema de concorrência é a melhor forma das empresas se apresentarem no mercado, a necessidade do Estado intervir como regulador, em especial nas situações em que existem desvios significativos a essa concorrência, é cada vez maior. Se tivermos em conta o momento que actualmente se atravessa, de passagem de estruturas monopolizadas para situações de concorrência, a intervenção reguladora do Estado é ainda mais importante. Em causa estão, entre outras, áreas como a energia, as telecomunicações, os transportes, a água, os resíduos sólidos e a saúde, os correios. À medida que estas diversas áreas deixam de ser públicas e vão sendo abertas a privados, importa regular, de forma eficaz, as relações entre a esfera pública e privada, de modo a assegurar a defesa de todos os interesses em confronto, sobretudo, os dos cidadãos. Na maioria dos casos, a salvaguarda de interesses cabe a uma Entidade Reguladora, cuja criação tem sido feita à medida que o fim dos monopólios se avizinha. O objectivo assenta, assim, na necessidade de definir o quadro de relacionamento entre as entidades públicas e privadas que actuam num sector. Ou seja, evitar
91 António Pinto Barbosa – Economia Pública. Lisboa: McGraw-Hill, 1997; José Fernandes Soares – Teorias Económicas da Regulação. Lisboa: Instituto Piaget, 2007; A. Castro Guerra – Política de Concorrência em Portugal. Lisboa: GEPE, 1997.
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abusos de posição dominante dos agentes já instalados, assegurar a sã concorrência e, ao mesmo tempo, salvaguardar o interesse dos consumidores 92. Importa salientar que, até aos anos oitenta, em todo o mundo, os Governos expandiram o âmbito das suas actividades e assumiram funções que incumbiam, outrora, ao sector privado. Por exemplo, as instituições de protecção social, contra a doença e invalidez, e a segurança económica na velhice, tiveram origem fora da esfera estatal. Houve inúmeras instituições ou redes informais de segurança social ao longo da história, a começar na família, passando pelas Misericórdias, com génese religiosa, e acabando nas associações de socorros mútuos, de origem sindical. A partir do século XIX, na Europa, esta tendência inverteu-se em favor do Estado Produtor, até que, no final dos anos oitenta do século XX surgiu novamente a tendência a alterar-se pugnado-se por menor e melhor Estado Segundo os partidários da desintervenção ou da redução das actividades do Estado, a passagem da gestão pública para a privada é de tal maneira importante que acarreta uma série de melhorias. Entre elas, o aumento da eficácia, a melhoria da qualidade, a redução dos impostos, a diminuição do sector público e o melhor atendimento do cliente. Que se entende por regulação pública da economia? Esta consiste no conjunto de medidas legislativas, administrativas e convencionadas, através das quais o Estado, por si ou por delegação, determina, controla, ou influencia o comportamento de agentes económicos. O objectivo é evitar efeitos desses mesmos comportamentos, que sejam lesivos de interesses legítimos, e orientá-los em direcções socialmente desejáveis 93. Na essência, estas medidas visam a alteração dos comportamentos dos agentes económicos (produtores e distribuidores), em relação ao que seriam se esses comportamentos obedecessem apenas às leis de mercado ou a formas de autoregulação. A regulação pública económica distingue-se, portanto, da regulação pelo mercado, e das regras provenientes de entidades privadas dotadas de poder económico suficiente para as tornarem efectivas (por exemplo, regulamentos internos, decisões associativas ou códigos de conduta provenientes de associações privadas). Têm cabimento, contudo, no conceito de regulação pública, as medidas convencionadas ou contratualizadas entre entidades públicas e privadas, por iniciativa e num quadro legal definido pelas primeiras (como é o caso dos contratos-programa, dos preços convencionados ou dos acordos de concertação). Tem ainda lugar aqui, parece-nos a regulação feita por entidades privadas por
92 93
Robert Boyer; Yves Saillard – Théorie de la Régulation L’état des Savoirs. Paris: la Découverte, 1995. R. Boyer; Y, Saillard – Ob. Cit.
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delegação e apoiada no enquadramento produzido por entidades públicas, como acontece com as normas técnicas. O facto dos principais destinatários da regulação pública serem agentes económicos privados não significa, que o sector empresarial do Estado não seja também por ela abrangido. Assim acontece, por exemplo, em matéria da concorrência, cujas regras se aplicam a todos os agentes económicos, independentemente da sua natureza pública, privada ou outra. De acordo com Carlos Santos 94, em função dos seus objectivos, as medidas de regulação pública podem ser agrupadas em duas categorias básicas. a) A primeira compreende as que visam restringir a liberdade de iniciativa económica, em qualquer das suas componentes: acesso, organização, ou exercício da actividade económica. Esta forma de regulação corresponde à tradicionalmente designada por política económica. Ela exprime-se, tipicamente, em medidas de carácter preventivo e repressivo. b) A segunda categoria compreende as medidas que contêm indicações, incentivos, apoios ou auxílios aos agentes económicos, para que assumam comportamentos favoráveis ao desenvolvimento de políticas públicas, designadamente económicas ou sociais. Os planos de desenvolvimento e os diversos tipos de auxílios de natureza financeira ou técnica, concedidos pelos Estados às empresas, enquadram-se neste tipo. Daí, advêm ónus ou faculdades para os seus destinatários. Estas formas de regulação – no passado designadas como medidas de fomento económico –, podem ser concedidas com ou sem contrapartidas. Mais do que uma função correctora ela é incentivadora da actividade económica também, na medida em que o Estado usa incentivos para inflectir os comportamentos dos agentes económicos em determinados sentidos compatíveis com os objectivos das políticas públicas. Constata-se que, no âmbito da sua acção reguladora, a Administração recorre a medidas imperativas, de natureza legislativa e/ou administrativa, de âmbito geral ou individual. Por esse meio, limita a liberdade dos agentes económicos ou proporciona-lhes vantagens condicionadas à assumpção de determinados comportamentos 95. A lei define o enquadramento geral que a Administração se encarrega de aplicar, através de actos administrativos de carácter preventivo (licenças ou autorizações), repressivo (sanções de natureza civil, administrativa ou penal), acompanhados dos respectivos actos de controlo (inspecções, etc.). A lei cria, igualmente, incentivos às empresas ou programas de apoio de que os agentes 94 95
António Carlos Santos et al. – Direito Económico. Coimbra: Almedina, 1997, 225-227. R. Boyer; Y, Saillard – Théorie de la Regulation: l’état des savoirs. Paris: La Découverte, 1995.
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económicos beneficiam. Isto, desde que preencham as condições definidas, ou de acordo com os critérios de apreciação da Administração (quando a lei lhe confere o poder discricionário para proceder a esse julgamento). A Administração pública tem vindo a privatizar os seus instrumentos de regulação económica, complementando ou substituindo os actos administrativos unilaterais por acordos de incitação ou de colaboração com os destinatários da regulação. Este tipo de procedimento é susceptível de ser aplicado, independentemente dos objectivos da regulação, sejam eles restritivos ou incentivadores, ou procurem atingir os dois objectivos em simultâneo. Como acontece, por exemplo, num contrato-programa em matéria ambiental. Os mais típicos procedimentos negociados são os contratos económicos e os acordos de concertação. As principais áreas de regulação económica variaram ao longo do século XX por razões por razões que se prendem com o desenvolvimento tecnológico, com os fenómenos da internacionalização e globalização da economia, e mais recentemente, com as políticas desreguladoras e de privatização. Assim, enquanto áreas tradicionais de regulação, como a fixação de preços, perderam importância, emergiram outras, como o controlo da qualidade, do ambiente ou do consumo. Não obstante as variações sucessivas e a dificuldade em traçar fronteiras precisas entre as diferentes áreas de regulação pública da economia, podemos destacar nove áreas principais: • • • • • • • • •
Planeamento e formas de orientação e auxílio aos agentes económicos; Restrições e condicionamentos ao acesso à actividade económica; Concorrência e preços; Actividade monetária e financeira; Ambiente; Qualidade e protecção dos consumidores; Electricidade; Comunicações; Informação.
Em qualquer destas áreas cruzam-se, muitas vezes, os objectivos de polícia ou de restrição da liberdade dos agentes económicos, com os de promoção ou apoio à sua actividade. Mas o peso relativo de cada um deles é muito variável. Por exemplo, o planeamento é basicamente promocional, enquanto a protecção da concorrência constitui uma área que se caracteriza, essencialmente, pela proibição de comportamentos lesivos do livre funcionamento das leis de mercado. Os procedimentos utilizados variam igualmente, passando dos imperativos aos negociados, e vice-versa, nas diferentes áreas de regulação económica. Todo o regime de regulação implica, três vertentes essenciais: o estabelecimento de regras; a sua implementação concreta; e a sanção às infracções come81
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tidas. Nada impede, porém, que estas vertentes e os poderes em que elas se analisam, estejam repartidos por diferentes instâncias regulatórias 96. Num sistema de regulação deverão estar as instituições reguladoras na dependência do poder executivo do Governo ou poderão depender do poder político a Assembleia da República, ou poderão ainda ser autónomos? Trata-se de uma questão de grande interesse actualmente, do ponto de vista da Ciência da Administração. Encontram-se no mundo e na Europa, presentemente, experiências diversas e falta a avaliação de tais experiências de forma a se obter doutrina sobre o tema. Há países de maior tradição democrática onde as agências reguladoras são órgãos independentes em que é o Parlamento quem designa a maioria dos membros do Conselho Regulador. Em Portugal temos um sistema misto, estando a maioria na dependência de um membro do governo e poucos são os casos na dependência do Parlamento como acontece com a Entidade Reguladora para a Comunicação Social, criada pela Lei 53/2005, de 8 de Novembro. A ERC foi constituída como uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, com natureza de entidade administrativa independente. O Quadro abaixo enuncia os vários níveis ou instâncias organizativas da regulação de acordo com o Vital Moreira 97. Instâncias Reguladoras Tipo de Regulação
Instância Reguladora
Regulação estadual directa Regulação estadual indirecta Regulação pública “independente Co-regulação Auto-regulação pública Auto-regulação privada
Governo Instituto público “Independent regulatory agency” Organismo misto Estado/profissões Organismo profissional público Organismo profissional privado
Um Estado regulador tem de desenvolver políticas de concorrência. As democracias formais enfrentam uma dicotomia que está marcada por uma questão ideológica: qual a posição a assumir entre o poder privado e o das autoridades públicas. Os mercados começam por ser a emanação de regras ditadas pelo Poder Político, o que, nomeadamente, implica um paradigma de exclusão. Os mercados começam por ser a emanação de regras ditadas pelo poder político, o que, nomeadamente, implica um paradigma de exclusão e, em 96 M. M. Leitão Marques; J. P. Simões de Almeida; A. M. Forte – Concorrência e Regulação. Coimbra: Coimbra Editora, 2005. 97 Vital Moreira – Auto-Regulação Profissional e Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1997, 114.
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consonância, com o conceito “paradigma de concorrência” começam a desenvolver-se neste paradigma de concorrência inclusiva, acabando por sucumbir às mãos dos grupos mais eficientes com maior poder de mercado e maior poder económico. Os mercados começam por ser a emanação de regras ditadas pelo poder político, o que, nomeadamente, implica um paradigma de exclusão e, em consonância, com o conceito “paradigma de concorrência” começam a desenvolver-se neste paradigma de concorrência inclusiva, acabando por sucumbir às mãos dos grupos mais eficientes com maior poder de mercado e maior poder económico. Ora estes grupos mais eficientes geram e consolidam barreiras à entrada e quando se julgam suficientemente protegidos, tornam-se ineficientes, em seu exclusivo benefício, inventando formas de condicionar ou mesmo eliminar a concorrência, e os mercados tornam-se draconianos, e exclusivos. É aqui que nasce a necessidade de uma política de concorrência com o triplo objectivo de: promover a variante inclusiva, já que é a única que promove o desenvolvimento sustentável; impedindo a emergência das variantes exclusiva e abusiva; assegurar uma cidadania com uma efectiva liberdade de escolha e igualdade de oportunidades 98.
7. A NOÇÃO
DE
SERVIÇO PÚBLICO
A noção de serviço público tem evoluído ao longo das últimas décadas. A concepção tradicional construída, no essencial, com base em noções sobre o papel do Estado e da Administração Pública não coincide com as regras de mercado e de livre concorrência que actualmente dominam. Em Portugal, e em particular na expressão de Marcello Caetano 99, “o serviço público é o modo de actuar da autoridade pública a fim de facultar, por modo regular e contínuo, a quantos deles careçam, os meios idóneos para satisfação de uma necessidade colectiva individualmente sentida”. O Estado Novo fez coincidir a noção de serviço público com a ideia de serviço administrativo ao qual, enquanto elemento de certa pessoa colectiva de direito público, pertenceria em princípio a respectiva gestão. Marcello Caetano aceitava que, em certos casos, a pessoa colectiva de direito público entregasse a gestão do serviço público a particulares. Todavia, o papel central na garantia do serviço público era sempre conferido ao Estado, embora apresentasse diferenciações em função dos sectores em que o 98 99
Lopes Rodrigues – Políticas Públicas de Concorrência. Lisboa: ISCSP, 2007. Marcello Caetano – Manual de Direito Administrativo, vol. II. Lisboa, p. 1068.
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serviço público se inseria, na terminologia do autor “serviços públicos económicos, sociais ou de segurança e culturais. Esta concepção, que identifica serviço público com serviço administrativo, organicamente vinculado à Administração, dependente da disciplina do Direito Público e norteado por preocupações incompatíveis com as regras de concorrência sobre que assenta a economia de mercado, tem sido altamente criticada e posta em causa nas últimas duas décadas, no mundo e em Portugal. No essencial, este movimento crítico centrou os seus argumentos na inaptidão do Estado em gerir sectores económicos inteiros. Pelo fraco dinamismo face aos clientes. Pela paralisia face à evolução tecnológica. Pela ausência de reais economias de escala nos custos. Pelo condicionamento político dos preços e pela escassa independência das instâncias de regulação. A grande questão, hoje, é saber o que se deve entender por serviço público. Isto, num contexto de passagem do Estado produtor e prestador, para um Estado regulador e mais selectivo no desempenho da função prestadora (entendida como prestação directa de serviços públicos). Há que reconhecer que, nesta passagem forçada por todo este movimento crítico referido abriu, em todos os quadrantes novos espaços de afirmação à iniciativa privada. Por si ou em articulação com capital público, mesmo nos sectores tradicionalmente tidos como exclusivos do Estado. Neste quadro, o conceito e a função de serviço público não ficaram imunes nem no plano nacional, nem no plano europeu. O que foi posto em causa foi, fundamentalmente, a fórmula organizacional de prestação do serviço público. Hoje, já não se defende que este tenha de ser identificado com a Administração Pública. Caminha-se, assim, no sentido do reconhecimento da validade de serviços públicos para efeitos de satisfação de necessidades colectivas, individualmente sentidas e do abandono da antiga ligação entre serviço público e a titularidade administrativa. É, muitas vezes, a fuga para o direito privado. Além disso, não parece ter sentido, a recusa da generalização das concepções de “Estado mínimo”, no domínio das prestações de serviço público. Do mesmo modo, não faz muito sentido o entrincheiramento nos modelos clássicos de reserva, em benefício de serviços administrativos, de empresas públicas ou de capitais cem por cento públicos. Os pressupostos do modelo europeu continental de serviço público estão também a evoluir, com vista à adaptação dos princípios e dos modelos organizacionais às regras de acrescida concorrência. Neste quadro, o serviço público fundamenta-se em regras de solidariedade e de igualdade de tratamento e concretização de direitos sociais dos cidadãos. Assim, o serviço público localiza-se na encruzilhada do funcionamento do mercado, com a realização de finalidades de solidariedade, coesão e equidade. De 84
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tal forma que estas finalidades não se têm totalmente por satisfeitas apenas com o exclusivo jogo das forças de mercado 100. Em Portugal e por assento constitucional, o Estado está vinculado à prestação de serviços públicos ligados à satisfação de direitos fundamentais dos cidadãos. As formas de alcançar as finalidades previstas na Lei Fundamental encontram-se abertas à cooperação com o sector privado, desde que salvaguardado um “conteúdo mínimo” de serviço público. Este conteúdo é, cada vez menos, definido em função da vinculação orgânica ao Estado. Ao invés é cada vez mais caracterizado pelas regras de acesso e obrigações de prestação, que impendem sobre os operadores, num contexto de concorrência das próprias entidades públicas entre si. A concepção económica do serviço público faz salientar a ideia de prestação de um serviço ou fornecimento de um bem abaixo do seu custo. Os economistas costumam distinguir entre bem público e serviço público. O primeiro caracteriza-se por duas ideias: ausência de rivalidade no consumo e a não exclusão. O serviço público justifica-se nas situações em que é necessário um “empurrão” do Estado, pois do livre jogo do mercado resultaria um sector subdimensionado. Assim, há uma situação de serviço público sempre que seja fornecido um bem ou um serviço a toda a população, abaixo do preço de custo. Esta necessidade ocorre devido, em especial, às externalidades 101. A ideia de externalidade corresponde à situação em que a acção de um agente económico tem impacto no bem-estar de outros, e que tal impacto não é medido por uma transacção de mercado, sendo portanto ignorado pelo agente decisor. Esta relação entre agentes económicos é, assim, externa ao mercado. Se o Estado não intervir no sentido de compensar esta externalidade, o agente não investirá. Para entender bem este problema, há que distinguir: serviços de interesse geral, serviços de interesse económico geral, serviço público e serviço universal. Os serviços de interesse geral integram as actividades comerciais consideradas de interesse geral pelas autoridades públicas e, por esse motivo, sujeitas a obrigações específicas de serviço público. Os serviços de interesse económico geral, mencionados no artigo 90.º do Tratado da União Europeia, integram actividades de serviços comerciais que consubstanciam missões de interesse geral e que, assim, se encontram sujeitas, pelos Estados-membros, a obrigações específicas de serviço público. Trata-se, em particular, do caso dos serviços em redes, tais como o das comunicações.
100
Joseph E. Stiglitz – Economics of the Public Sector. Londres: W.W. Norton & Company, 1988. Joseph E. Stiglitz – Economics of the Public Sector. Londres: W.W. Norton & Companw, 1988, 214-235.
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O serviço público tem, normalmente, um duplo sentido. Tanto designa o organismo que presta o serviço, como diz respeito à missão de interesse geral a ele confiada. Ora, é com o objectivo de favorecer ou de permitir a realização da missão de interesse geral, que a autoridade pública pode impor obrigações específicas ao organismo que presta o serviço, por exemplo, em matéria de transportes, de energia e de comunicações. Por último, o serviço universal designa uma série de exigências de interesse geral, a que deveriam estar sujeitas as actividades das telecomunicações ou dos correios. As obrigações daí decorrentes destinam-se a assegurar, por toda a parte, o acesso de todos a prestações de qualidade e por um preço razoável. Em resumo, o serviço público visa a satisfação de necessidades colectivas individualmente sentidas, através do fornecimento de bens ou serviços abaixo do seu custo. Actividade 3 Examine edições recentes de publicações, e escolha um caso onde seja nítida a necessidade do Estado intervir como regulador.
8. INTERESSE NACIONAL , PÚBLICO
E
GERAL
A expressão “interesse nacional” congrega um conjunto de objectivos e atribuições, que se associam, directamente à essência de Portugal, enquanto Estado-Nação, na sua acepção internacional, política e administrativa.Trata-se da “essência” que se mantém inalterável perante o devir da “existência”, pese embora as “leituras” de quem ao longo da “história” têm legitimidade para tanto. Assim, o “interesse nacional” decorre, antes de mais, do que esteja na letra da Constituição da República Portuguesa CRP ou da sua exegese ou interpretação. Por isso, a primeira aproximação ao que hoje deve ser entendido por interesse nacional decorre do articulado da CRP, em cuja hierarquia intrínseca, avulta desde logo a Secção de abertura, intitulada “princípios fundamentais.” Neste sentido, todos estes artigos configuram o conceito interesse nacional. Numa perspectiva mais descritiva, não pode deixar de tomar em devida conta o conjunto das designadas “Tarefas Fundamentais do Estado”, (que estão plasmadas no artigo 9.º da CRP. De forma complementar o interesse nacional, aparece configurado, num primeiro nível da análise, nos discursos programáticos do Presidente da República, enquanto mais alto Magistrado da Nação, do Primeiro-ministro, enquanto Chefe do Governo, e, nas Leis Fundamentais aprovadas pela Assembleia da República. 86
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Num segundo nível da análise, aparece igualmente nos programas dos diferentes Governos, e também nas designadas Grandes Opções do Plano. Em níveis complementares da análise, os programas dos partidos da oposição, e, em particular os discursos programáticos dos respectivos líderes, incluem também elementos que permitem contribuições subsidiárias para a compreensão do interesse nacional num determinado momento. O que se poderia considerar uma regra de algibeira para averiguar se estamos ou não perante um interesse nacional, devidamente sustentado, reside em saber se ele é ou não, objecto de acordo entre o partido do Governo e o (s) partido (s) da oposição. Todavia, esta regra tem de ser relativizada dado que pode acontecer que o interesse partidários num determinado momentos e conjuguem em seu favor e não do interesse nacional Assim sendo, nas últimas décadas, existem alguns objectivos que claramente foram objecto de um determinado interesse nacional, tais como: a) A celebração da Primeira Constituição da República Portuguesa, a seguir à Revolução de Abril de 1974, ou seja a Constituição de 1976; b) As inovações políticas introduzidas em cada uma das sucessivas revisões Constitucionais já operadas, (democratização plena; opção pela economia de mercado; voto Presidencial extensivo a todos os portugueses espalhados pelo mundo; alterações institucionais exigidas pelo processo de participação na União Europeia; c) A candidatura de Portugal à adesão às Comunidades Europeias, e, mais tarde à fundação da União Económica e Monetária. Um outro sinal dos esforços para delinear perspectivas pragmáticas do que é o interesse nacional encontra-se nas audições que o Primeiro-ministro faz regularmente, com os líderes dos partidos da oposição com representação parlamentar, antes dos Conselhos Europeus da União Europeia. Acresce que actualmente, o interesse nacional tem múltiplas interfaces com o que se discute e se decide politicamente nesses Conselhos tais como: alargamento da EU; perspectivas financeiras; conclusão do mercado interno; defesa e segurança comuns; imigração; combate ao terrorismo. A sociedade conectada de hoje, inclui verdadeiramente a confluência de diversas dimensões de dimensão transnacional, e, exactamente por isso, o interesse nacional é obtido, não só através da depuração de tudo o que é aleatório nas relações internacionais, mas também, pela cristalização daquilo que verdadeiramente é essencial. Quanto ao conceito de “interesse público” é menos ambicioso que o de interesse nacional, pese embora a possibilidade de ser invocado de forma mais alargada e extensiva. No fundo o interesse público consagra situações que se podem sistematizar na seguinte taxonomia: a) realidades expressamente previstas na lei, como configurando objectivos, critérios, factores, ou quaisquer outros elementos, ditos de “interesse público”; b) a acção do Governo e de outros órgãos de soberania, dentro da margem de discricionariedade prevista no Estado de Direito, 87
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Constitucional e Democrático; c) a acção de entidades diversas, de natureza institucional, inseridas na acepção lata do Estado, no exercício de atribuições que a CRP ou a lei ordinária lhes confiou; d) acção de outras entidades, eventualmente privadas, a quem a lei confiou o exercício de atribuições de serviço público. Relativamente à categoria (a), os conteúdos normativos, volitivos e axiológicos do interesse público estão positivamente definidos em cada um dos instrumentos legais considerados. Significa isto que uma boa hermenêutica destes diplomas deve ser suficiente para explicitar aqueles significados. Reconhece-se, contudo, que esta é uma situação ideal, nem sempre suficientemente próxima da realidade tangível do cidadão comum. Na verdade temos uma extensa panóplia de leis, decretos-lei, decretos, portarias, normas, circulares, e, outros instrumentos com efeito jurídico, que constituem frequentemente um elevado obstáculo epistemológico à sua exacta compreensão. Acresce que esta multiplicidade de textos frequentemente dá azo a interpretações de sentido divergente ou mesmo contraditório. Assim sendo, o objectivo de delimitar o conceito de interesse público através da análise formal dos textos legais em que o mesmo é invocado, seria sempre um projecto de longa duração e de sucesso incerto. Relativamente à categoria (b), e, não obstante existir uma larga intersecção com a categoria (a), há um critério objectivo que permite atalhar muitos caminhos, desfazer muitas ambiguidades, e, chegar a um porto seguro, com alguma rapidez. Esse critério decorre da configuração do interesse público como sendo aquele que é objecto da alocação de dinheiros públicos. Assim sendo estar-se-ia perante um projecto de interesse público, se e só se, no respectivo financiamento existisse, no passado, no presente, e, no futuro, dinheiro dos contribuintes. Quanto à categoria (c), e pese também, embora um conjunto de várias intersecções possíveis com as categorias anteriores, parece que o critério objectivo que melhor permite averiguar da efectiva prossecução do interesse público decorre das seguintes iniciativas: mecanismos de avaliação pública previstos nas leis orgânicas daquelas entidades, é o caso por ex. da Autoridade da Concorrência; auditorias temáticas realizadas por outras entidades independentes como por exemplo o Tribunal de Contas. No que toca à categoria (d), aplicam-se antes de mais, as considerações anteriores adaptadas à circunstância. Por último, o conceito de interesse geral tem um suporte jurídico e administrativo particular que o permite diferenciar dos conceitos anteriores. A sua existência decorre de imperativos de cidadania em sociedades democráticas. De facto, não existindo legitimidade para que haja cidadãos de primeira e segunda classe, o Estado tem obrigação de assegurar a provisão de um determinado “stock” de bens colectivos a todos os cidadãos, tais como: saneamento básico; distribuição 88
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de água e de energia; comunicações postais e telefónicas; cuidados básicos de saúde. Os exemplos mais sofisticados têm a ver com o acesso a determinados bens culturais, de que o serviço público de rádio e de televisão corresponde à situação mais facilmente identificável A profusão e disseminação destas situações vêm ao encontro de disposições previstas nos Tratados de Roma (1957) e de Amesterdão (1999) no sentido de assegurar que o Estado em nome destes objectivos, não favoreça determinadas empresas, criando distorções múltiplas à concorrência. Esta matéria tem dado azo a uma extensa doutrina e a uma jurisprudência variada, nem sempre convergente. No fundo, trata-se de distinguir na referida intervenção do Estado, as componentes de financiamento, que, podem ser subsumíveis ao conceito de Auxílio de Estado. Como se sabe, os auxílios de Estado são proibidos pelo artigo 87.º do Tratado de Roma. Todavia, esta proibição pode ser derrogada ou excepcionada, mas sempre na base de normas específicas também previstas no mesmo Tratado. O não cumprimento destas normas tem pesadas sanções, a menor das quais, será seguramente a obrigatoriedade que impende sobre o Estado no sentido de recuperar o montante financeiro que foi indevidamente concedido. Desde a existência das Comunidades Europeia, estas questões têm sido intensamente controvertidas e objecto de frequentes reclamações de empresas concorrentes que se sentem lesadas. Para que um incumbente, por exemplo os Correios de Portugal, possam pelo “serviço universal” (assegurar a comunicação postal em área não rentáveis) que prestam ao País receber um contrapartida do Estado financeira ou outra é necessário que fique provado que tal se deve a título de “montante compensatório” e não como “auxílio do Estado”. Actividade 4 Discuta com os colegas a comparticipação financeira atribuída pelo Estado a uma empresa concessionária de um serviço de interesse geral e veja se se trata de “auxílio do Estado” ou “montante compensatório”.
TESTE FORMATIVO 1. Nas alíneas que a seguir se apresentam, há um termo que não combina com os restantes. Identifique-o: a) Keynes; b) estado liberal; estado intervencionista; estado inserido na economia. 2. De acordo com os partidários da redução das actividades produtivas de bens ou serviços do Estado, quais são as principais melhorias resultantes dessa redução? 89
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3. Pelo contrato de concessão, pode a concessionária passar a exercer actividade de interesse geral, reservada por lei à entidade que concessiona? Justifique a resposta. 4. Que se entende por sector empresarial do Estado? 5. Quais as categorias em que se agrupam as principais medidas reguladoras? 6. Defina serviço público.
RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. b) Estado liberal. 2. Aumento da eficácia, a melhoria da qualidade, a redução dos impostos, a diminuição do sector público e o melhor atendimento do cliente. 3. Pode. A entidade concessionária, neste caso uma entidade privada, assume o papel de colaborador permanente da Administração, e pelo contrato de concessão, passa a exercer funções de administração pública. É o caso das empresas com contrato de concessão do serviço público rodoviário, de entidades privadas encarregadas da certificação de qualidade ou de origem de certos produtos, etc. 4. Por sector empresarial do Estado entende-se o conjunto das unidades produtivas do Estado ou de outras entidades públicas, organizadas e geridas sob a forma empresarial. Costuma incluir as empresas públicas, as sociedades de capitais públicos, e as sociedades ou empresas de economia mista, controladas pelo Estado. 5. São as que visam restringir a liberdade de iniciativa económica, e as medidas que contêm indicações, incentivos, apoios ou auxílios aos agentes económicos. 6. Satisfação de necessidades colectivas, individualmente sentidas, através do fornecimento de um bem ou serviço abaixo do seu custo.
L EITURAS C OMPLEMENTARES ALVES, A André; MOREIRA M. José – O que é a Escolha Pública? Cascais: Principia, 2004 BOYER, Robert; SAILLARD, Yves – Théorie de la Regulation l’État des Savoirs. Paris: la Découverte, 1995. KRUGMAN, Paul – The Conscience of a Liberal. London: Penguin Books2007 RODRIGUES, Lopes – Políticas Públicas de Concorrência. Lisboa: ISCSP, 2007.
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SANTOS, António Carlos; GONÇALVES, Eduarda; MARQUES, Maria M. Leitão – Direito Económico. Coimbra: Almedina, 1997. SAVAS, E. S. – Privatization and Public Partnerships. Chatam, NJ: Chatan House, 2000 STIGLITZ, Joseph – Economics of the Public Sector. London: W. W. Norton & Company, 1988. VITAL MOREIRA – Auto-Regulação Profissional e a Administração Pública. Coimbra: Almedina, 1997.
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4. MISSÕES E ESTRUTURAS DA ADMINISTRAÇÃO
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. Administração Pública 2. Missões da Administração 3. Administração Central do Estado 4.Administração Indirecta do Estado 5.Administração Local do Estado 6. Administração Local Autárquica 7. Delegação de Poderes e Competências 8. Desconcentração, Descentralização e Devolução de Poderes Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a: • • • •
distinguir administração pública e Estado; identificar os órgãos de soberania; identificar as missões da administração; distinguir Estado e Governo; 93
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• identificar as características do Estado; • explicar a relação entre administração pública e a administração da justiça; • discutir a relação entre administração directa e indirecta do Estado; • identificar os elementos compreendidos no conceito de autarquia local; • distinguir as divisões administrativas básicas do território; • distinguir desconcentração, descentralização e devolução de poderes; • distinguir entre delegação de poderes e transferência de competências.
1. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A colectividade portuguesa, como qualquer outra, possui um conjunto de necessidades comuns cuja satisfação é tarefa da colectividade, com recurso a serviços por esta executados. É o caso das necessidades de protecção dos mais fracos, de segurança de pessoas e bens, de cuidados de saúde, de protecção na velhice e no trabalho. E é, ainda, o caso da recolha de lixo e saneamento básico nos centros urbanos. Ora, a satisfação destas e de outras necessidades colectivas exige a união de esforços, e um volume enorme de recursos materiais e humanos. Assim, quando se manifesta de forma persistente uma necessidade colectiva surge, normalmente, nas sociedades organizadas, uma resposta da colectividade, destinada a satisfazê-la em nome e no interesse da colectividade. Todavia, nem todos os serviços que existem para satisfazer as necessidades colectivas pertencem ao Estado. Há, para além dele, uma grande constelação de pessoas colectivas públicas e territoriais que existem para responder às necessidades colectivas. Com efeito, uns são criados e geridos pelo Estado, outros entregues a institutos e estabelecimentos públicos, e outros, ainda, são assumidos e administrados pelas autarquias locais, no âmbito da sua área geográfica. A administração pública tem por objectivo satisfazer as necessidades colectivas de segurança, cultura e bem-estar. Fica, assim, fora do seu âmbito, a satisfação das necessidades de justiça, dada a separação entre os Poderes executivo, legislativo e judicial. Todavia, as necessidades colectivas entram, em geral, na esfera administrativa, originando o vasto conjunto de actividades económicas que se chama administração pública. Assim, a Administração Pública não se limita ao Estado. Para além de o englobar, integra muitas outras entidades e organismos. Por isso, nem toda a actividade administrativa é estadual, dado que a administração pública não é 94
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uma actividade exclusiva do Estado. Embora, este desempenhe o principal papel da actividade administrativa.
2. MISSÕES
DA
ADMINISTRAÇÃO
No terminologia administrativa tradicional, o termo missão era sinónimo de atribuição. Hoje liga-se à razão de ser de uma organização, ao motivo especial ou motivos, que justificam a sua existência. As missões, apesar da turbulência de mudança registada nas diversas envolventes, tendem a permanecer. Os objectivos mudam e ajustam-se, assim, como as estratégias e as políticas. As missões raramente mudam e nunca de forma radical. Para que isso suceda era necessária a refundação da entidade organizacional. Assim, ao falar-se de missão, devemos entender as funções que a administração pública terá de desempenhar para corresponder à razão da sua criação pelo poder político. Porque a classificação das missões da administração levanta sempre problemas, e existem muitos sistemas de classificação. Algumas das razões da dificuldade de classificação prendem-se com a heterogeneidade, a multiplicidade e o carácter altamente interdependente das missões prosseguidas pela administração. Verifica-se, ainda, que, ao longo deste século e particularmente a seguir à Segunda Guerra Mundial se registou, no mundo ocidental, um desenvolvimento muito forte das missões da administração. Às missões clássicas (polícia, moeda e impostos), juntaram-se numerosas actividades de ordem económica, social e cultural. Em certos casos, estas novas missões emergiram do nada, e noutros tiveram origem em missões assumidas por instituições não estatais, nomeadamente as Igrejas. No final dos anos noventa do século XX já não era pedido à administração que fornecesse mais serviços a administrados mais numerosos, mas que distribuísse serviços de natureza diferente e de qualidade superior. Ora, para isso eram necessários meios financeiros e técnicos mais elevados, e recursos mais poderosos. Como dissemos, há diversas formas de classificar as missões da Administração. Entre outras possíveis salientamos as de Drago, Renate Mayntz, Caupers e Gournay. Drago estabelece uma separação entre missões gerais e missões de carácter técnico. As missões gerais compreendem as de concepção e as de direcção. As de concepção são repartidas em missões de previsão e organização, e as de direcção em missões de comando e de controlo. As missões técnicas (ou especiais), repartem-se, por sua vez, em missões de interesse nacional e de execução e gestão. As de interesse nacional, por seu turno, 95
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dividem-se em missões de representação dos interesses nacionais e de segurança. As missões de execução e gestão englobam as de carácter económico e as de carácter social. Renate Mayntz refere várias classificações das missões da administração, dividindo-as por cinco áreas: 1. Regulação das relações entre a sociedade e o exterior (defesa e negociações estrangeiras); 2. Regulação das relações entre indivíduos e grupos dentro da sociedade; 3. Garantia da capacidade de acção do sistema político e administrativo (recursos humanos e financeiros etc.); 4. Prestação de bens e serviços; 5. Promoção do desenvolvimento (crescimento económico, igualdade social etc.). Caupers 102 na obra, Administração Periférica do Estado, reparte as missões da administração – pensando na administração periférica –, em seis grandes grupos: • • • • • •
relativas à segurança interna; de regulação social e económica; de angariação de recursos; de prestação; relativas às infra-estruturas e ao desenvolvimento; auxiliares.
Bernard Gournays 103, na obra, Introdução à Ciência Administrativa, apresenta uma classificação das missões da administração, que foi seguida por Freitas do Amaral e que se adequa bem aos objectivos deste manual. Esta a razão por que aqui se desenvolve mais em pormenor a classificação deste autor. A classificação de Gournay aponta quatro conjuntos de missões: (de soberania, económicas, sociais e educativas e culturais), que, por sua vez, se subdividem em várias missões específicas. a) Missões de Soberania (ou funções políticas) 1. Missões de soberania: defesa (ou segurança) nacional; condução das relações externas. 102 103
João Caupers – Administração Periférica do Estado. Lisboa: Notícias, 1994, pp. 421-422. Bernard Gournays – Introdução à Ciência Administrativa. Lisboa: Europa-América, 1978, 24-26.
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2. Missões de soberania interna: polícia (também chamada segurança civil); justiça (incluindo o registo civil). 3. Missões propriamente políticas: funcionamento das instituições políticas (eleições, assembleias); relações com instituições religiosas; informação da opinião para fins políticos. b) Missões Económicas 1. Atribuições do Estado relativas à moeda: (a emissão de moeda é considerada por alguns autores uma questão de soberania). 2. Acções específicas: nos diferentes sectores da economia (energia, minas, transportes, telecomunicações, indústrias de transformação, agricultura e pescas, serviços etc.); a propósito das diversas funções ou problemas comuns aos sectores (pesquisa aplicada e produtividade, mão-de-obra e formação profissional, investimento, crédito, preço, fiscalidade, comércio exterior, etc.). 3. A coordenação geral da política económica e financeira: (incluindo aqui a coordenação no espaço: ordenamento do território). c) Missões Sociais 1. Em matéria de saúde. 2. No domínio da habitação e do urbanismo. 3. A defesa dos direitos e interesses das categorias socioprofissionais (designadamente dos assalariados). 4. A distribuição de rendimentos em proveito dos socialmente desfavorecidos. 5. A manutenção ou a transformação das estruturas sociais (política familiar, promoção social etc.). d) Missões Educativas e Culturais 1. A investigação científica. 2. A educação das crianças e adolescentes (ensino geral, profissional, artístico, desportivo etc.), incluindo as acções a favor da juventude.
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3. A organização dos lazeres e actividades culturais destinadas aos adultos, incluindo a informação de carácter não político. 4. O desenvolvimento das actividades artísticas: conservação do património artístico e histórico; incentivo à criação de novas obras e difusão das obras de arte. 5. A salvaguarda dos recursos naturais e a melhoria do meio ambiente. Esta classificação, dá-nos uma visão do conjunto das atribuições da administração no final do 2.º milénio. No entanto, há que ter em mente que nem sempre foi assim. Até o início da Primeira Guerra Mundial, o Estado liberal era um estado abstencionista e não interventor, que deixaria para o mercado um leque enorme de serviços que hoje são, com toda a naturalidade assumidos pelo Estado. As condições em que nascem, morrem ou se modificam os serviços distribuídos pela administração, encontram-se profundamente ligadas a factores de ordem política e social. À medida que as sociedades se complexificam, levantam novas questões e exigem novas respostas. Ora, os políticos vão introduzindo nos programas partidários as respostas a tais questões, acabando estas por ser incorporadas nos programas dos governos e ser, posteriormente, executadas pela administração. Actividade 1 Identifique, no Diário da República, o programa do governo, e estabeleça uma comparação entre a classificação das missões da administração, feita por Gournay, e a utilizada pelo governo.
3. ADMINISTRAÇÃO C ENTRAL
DO
E STADO
Estado O Estado é uma pessoa colectiva pública, entre muitas outras pessoas colectivas de direito público que prosseguem fins públicos. Entre as diversas dimensões que o termo possui, destacamos três que nos parecem mais significativas: • dimensão internacional: Estado soberano, titular de direitos e deveres ao nível internacional; • dimensão constitucional: Estado como comunidade, o conjunto de cidadãos; 98
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• dimensão administrativa: Estado como pessoa colectiva pública, que através do governo executa a actividade administrativa. Há que distinguir a administração central do Estado, da administração local do Estado. A primeira, diz respeito ao conjunto de órgãos e serviços do Estado, com competência extensiva a todo o território nacional. A segunda, prende-se com os órgãos e serviços locais, instalados em diversos pontos geográficos do território nacional, e cuja competência é limitada a uma determina área. As principais características do Estado e da sua administração directa são, segundo o Prof. Freitas do Amaral: • unicidade: Há muitas autarquias, mas o Estado é a única espécie do género; • carácter originário: A pessoa colectiva Estado não é criada pelo poder constituído. A sua natureza é não derivada; • territorialidade: Faz parte da natureza desta pessoa colectiva a ocupação de um certo território; • multiplicidade de atribuições: Prossegue fins múltiplos; • pluralismo de órgãos e serviços: O Governo, os directores gerais, os governadores civis, etc., são órgãos do Estado; • organização em ministérios: Os órgãos e serviços do Estado-administração ao nível central são os ministérios; • personalidade jurídica una: Embora haja pluralismo de órgãos, como vimos, o Estado mantém uma personalidade jurídica una; • instrumentalidade: A administração é um instrumento para o desempenho dos fins do Estado; • estrutura hierárquica: Há um vínculo de subordinação a ligar os diferentes órgãos e agentes, que confere poderes ao superior e impõe deveres aos subordinados; • supremacia: O Estado-administração, dado o seu carácter único, originário e instrumental, exerce poderes de supremacia em relação às pessoas colectivas de direito privado, e ainda em relação a outras pessoas colectivas públicas. Os institutos públicos estão sujeitos à superintendência do Governo. As autarquias locais à tutela administrativa do Estado. As regiões autónomas a uma limitada fiscalização dos órgãos de soberania e do tribunal constitucional. Nos termos da CRP, são órgãos de soberania do Estado o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais. Atendendo à separação de poderes (legislativo, judicial e executivo), só o executivo, isto é, o Governo, pertence à Administração Pública. Além de órgão político, o Governo é o órgão administrativo por excelência. 99
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Há, ainda, um conjunto de órgãos que, embora pertençam à administração central, sendo órgãos do Estado não dependem do Governo. O Conselho Nacional do Plano, a Comissão Nacional de Eleições e outros órgãos análogos. Os directores gerais são órgãos do Estado, pertencentes à administração central, embora, ao contrário do Conselho Nacional do Plano, estejam colocados sob a direcção do Governo. Governo O Governo é o principal órgão permanente e directivo do Estado com carácter administrativo e mais importante da administração central do Estado. Nos termos da CRP, o Governo é, simultaneamente, o órgão de condução da política geral do país e o órgão superior da administração pública (art.º 182.º). Qual a composição do Governo? O art.º 183.º da CRP determina que a estrutura do Governo seja constituída por: Primeiro Ministro; Vice-Primeiros-Ministros; Ministros; Secretários de Estado; Subsecretários de Estado. Para sabermos qual a estrutura e a organização dos vários ministérios é aconselhável lançar mão das respectivas leis orgânicas. Por vezes, a forma mais prática consiste em consultar o orçamento do Estado, publicado todos os anos no Diário da República. Consta desse documento, todos os serviços existentes, e faz-se referência à legislação que lhes é aplicável.
Actividade 2 Identifique, no Diário da República, a estrutura orgânica do actual governo. Acha que há relação entre o programa do governo e a sua estrutura?
4. ADMINISTRAÇÃO INDIRECTA
DO
E STADO
No ponto anterior tratámos da administração central do Estado. Vamos, agora, falar da administração indirecta do Estado que, embora esteja ligada à administração central, não faz parte do Estado. E não faz parte deste na medida 100
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em que a administração indirecta é composta por uma miríade de entidades com personalidade jurídica própria. E estas são pessoas colectivas públicas, como o Estado, sendo desse ponto de vista iguais ao Estado. Todavia, estas entidades públicas prosseguem fins ou atribuições do Estado e, nessa medida, encontram-se-lhe indirectamente ligadas. No caso da administração indirecta do Estado, este confere a outros sujeitos de direito a realização dos seus fins. Esta administração é estadual, por prosseguir fins que pertencem ao Estado e é indirecta, na medida em que a execução de tais fins tem lugar no seio de uma entidade diferente do Estado. O recurso a este tipo de administração tem a ver com o alargamento das missões do Estado, a sua complexidade e a satisfação das novas necessidades dos cidadãos. Por outro lado, tem também a ver com a necessidade, imposta pela CRP, da Administração Pública dever ser estruturada de modo a evitar a burocracia, e a aproximar os serviços das populações. Ora, a desburocratização parece passar pela fuga às regras apertadas da contabilidade pública e da função pública. O que fomenta a expansão deste tipo de administração e, por vezes, vai mais longe ao incentivar a fuga para o direito privado. Sobre a administração indirecta estadual, o Estado dispõe, em regra, do poder de nomear e demitir os dirigentes desses organismos. Possui o poder de lhes dar instruções e directivas acerca do modo de exercer a sua actividade. Tem, ainda, o poder de fiscalizar e controlar a forma como tal actividade é desempenhada. Este tipo de administração é exercido no interesse do Estado, mas importa salientar que é exercido em nome próprio, isto é, em nome daquela entidade pública em concreto. Isto significa, em resumo, que: • o património pertence a essa entidade e não ao Estado; • os recursos humanos são dessa entidade e não do Estado; • os actos são praticados em nome dessa entidade e não do Estado. A criação e extinção destas entidades públicas, que constituem a administração indirecta, é feita por livre decisão do Estado. O seu financiamento tem origem no Estado e em outras fontes, nomeadamente em receitas próprias. Constitui a administração indirecta do Estado as seguintes espécies de organismos: institutos públicos, empresas públicas e associações públicas. O sector público administrativo (SPA), compreende o Estado, os institutos públicos, as associações públicas, as autarquias locais e as regiões autónomas. O sector público empresarial (SPE), integra as empresas públicas e as de capital, total ou maioritariamente público. 101
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5. ADMINISTRAÇÃO L OCAL
DO
E STADO
A administração local do Estado assenta em três elementos: • divisão do território: exige-se a delimitação do espaço que serve para definir competências em razão do território; • órgãos locais do Estado: centros de decisão, espalhados pelo território nacional, mas habilitados, por lei, a resolver assuntos administrativos, relativos uma área geográfica em concreto, em nome do Estado; • serviços locais do Estado: os serviços administrativos encarregados de preparar e executar as decisões dos diferentes órgãos locais do Estado. Para efeitos de administração civil há duas divisões administrativas básicas do território: • divisão para efeitos de administração local do Estado: distritos e concelhos; • divisão para efeitos de administração autárquica: freguesias, municípios e regiões administrativas no continente. Neste ponto, vamos apenas tratar do primeiro tipo de divisão o segundo passará para o seguinte, dedicado à administração local autárquica. Os órgãos locais do Estado são instalados em diversos pontos do território nacional e à frente deles, o Estado coloca alguém para chefiar e tomar decisões. São os casos do delegado de saúde, do chefe da repartição de finanças, etc.,. Tomando de empréstimo a definição do prof. Freitas do Amaral, 104 os órgãos locais do Estado “são os órgãos da pessoa colectiva Estado que, na dependência hierárquica do Governo, exercem uma competência limitada a uma certa circunscrição administrativa”. Isto significa, que estes órgãos podem tomar decisões em nome do Estado pertencem a este e não às autarquias (mesmo que funcionem no mesmo edifício), e só podem decidir dentro de uma delimitada zona geográfica.
6. ADMINISTRAÇÃO L OCAL AUTÁRQUICA Apesar de também ser administração local, como a anterior, coisa bem diferente, é a administração local autárquica, que não se confunde com a administração local do Estado. É uma forma muito diferente de administração local. 104
Freitas do Amaral – Curso de Direito Administrativo. Coimbra: Almedina, 1993, p. 399.
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Por administração local autárquica entende-se, tanto o conjunto das autarquias locais, como a actividade administrativa exercida por elas. As autarquias locais são constituídas por imperativo constitucional. Com efeito, a CRP no seu art.º 235.º determina: “1. A organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais. 2. As autarquias locais são pessoas colectivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas”. As autarquias locais são, todas e cada uma, pessoas colectivas distintas do Estado. Repare-se, que a CRP diz que são “pessoas colectivas territoriais”, e não pessoas colectivas públicas. Assim, elas não fazem parte do Estado, não são Estado, são até anteriores ao Estado. Trata-se de entidades independentes e completamente distintas do Estado, apesar de poderem ser fiscalizadas e inspeccionadas. Apesar de poderem ser subsidiadas pelo Estado, as autarquias locais não são instrumentos da acção do Estado, como é o Governo. São formas de organização das populações locais, residentes nas respectivas áreas. Elas são constituídas por via ascendente, tendo origem nas populações, e não por via descendente, como ocorre com a criação dos institutos públicos. O conceito de autarquia local integra os seguintes elementos: • • • •
comunidade de pessoas; ocupação de um determinado espaço territorial; defesa dos interesses desta comunidade; haver órgãos representativos, livremente eleitos.
A existência de autarquias locais, e o reconhecimento da sua autonomia, expressam uma certa descentralização da administração. Isto significa, que a administração pública não é, apenas, exercida pela pessoa colectiva pública – o Estado –, mas sim por um conjunto de entidades independentes e diferentes deste. Todavia, as autarquias, para serem auto-administradas como é da sua natureza, têm de ser geridas por órgãos representativos das populações locais livremente eleitos. Os órgãos não podem ser nomeados pelo Governo, como aconteceu durante o Estado Novo. Além disso, só se poderá falar de verdadeiro poder local, quando as autarquias dispuserem de um significativo grau de autonomia administrativa e financeira. Nos termos do n.º 1 do art.º 236.º da CRP, no continente, as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões administrativas. Em Portugal, a Lei 103
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n.º 56/91, de 13 de Agosto estabelece os poderes, a composição e a competência das regiões administrativas, bem como o funcionamento dos seus órgãos. Actividade 3 Identifique, no Diário da República, a estrutura orgânica de uma Direcção Geral do Ministério da Saúde.
7. DELEGAÇÃO
DE
PODERES
E
C OMPETÊNCIAS
Não vamos, neste manual, discutir o problema jurídico da natureza da delegação e poderes e competências. Interessa, apenas, abordar alguns aspectos introdutórios, que podem ser causa de equívocos. Em nosso entender, a verdadeira delegação há de ter, sempre, impacto na capacidade de decisão e implicar sempre a transferência do poder para decidir. Nos termos da lei 2/04 (Artigo 9).Os membros do Governo podem delegar nos titulares dos cargos de direcção superior de 1.º grau a competência para emitir instruções referentes a matérias relativas às atribuições genéricas dos respectivos serviços e organismos. Os titulares dos cargos de direcção superior de 1.º grau podem delegar em todos os níveis de pessoal dirigente as competências próprias e subdelegar as competências que neles tenham sido delegadas, Os membros do Governo podem delegar nos dirigentes máximos dos serviços e organismos que, nos termos da lei, sejam responsáveis pela gestão centralizada de recursos humanos de cada ministério poderes mais alargados, incluindo as competências relativas ao procedimento do concurso. A delegação de assinatura da correspondência ou de expediente necessário à mera instrução dos processos é possível em qualquer funcionário. A delegação e subdelegação de competências constituem instrumentos privilegiados de gestão, cabendo aos titulares dos cargos de direcção superior de 1.º grau a promoção da sua adopção, enquanto meios que propiciam a redução de circuitos de decisão e uma gestão mais célere e desburocratizada. O exercício de funções em regime de substituição abrange os poderes delegados e subdelegados no substituído, salvo se o despacho de delegação ou de subdelegação, ou o que determina a substituição, expressamente dispuser em contrário. Com efeito, nos termos do art.º 35.º do Código do Procedimento Administrativo, “os órgãos administrativos competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, através de um acto de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique actos administrativos sobre a mesma matéria. 104
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O n.º 2 do mesmo artigo acrescenta que, “mediante um acto de delegação de poderes, os órgãos competentes para decidir em determinada matéria podem sempre permitir que o seu imediato inferior hierárquico, adjunto ou substituto pratiquem actos de administração ordinária nessa matéria”. O último número deste artigo esclarece que os órgãos colegiais também podem delegar poderes nos respectivos presidentes, a não ser que haja lei de habilitação específica a estabelecer uma particular repartição de competências entre os diversos órgãos. A delegação de poderes foi concebida como um instrumento da desconcentração administrativa. A delegação de poderes nos termos do Código do Procedimento Administrativo (CPA), é o acto pelo qual um órgãos (legalmente habilitado para o efeito) permite que outro órgão ou agente pratique actos administrativos sobre a mesma matéria. Freitas do Amaral define a delegação de poderes ou a delegação de competência da seguinte forma: “é o acto pelo qual um órgão da Administração, normalmente competente em determinada matéria, permite, de acordo com a lei, que outro órgãos ou agente pratiquem actos administrativos sobre a mesma matéria. A possibilidade da delegação de poderes depende da lei a prever, ou seja, precisa de estar consignada na chamada lei de habilitação. Sem esse requisito, a delegação é ilegal, nula, por envolver uma renúncia ou alienação de competência. Daí, os actos que venham a praticar-se ao abrigo dela, ficam feridos, também, do vício de incompetência (geradora, consoante os casos, de anulabilidade ou de nulidade). A exigência da habilitação legal tem, mesmo, consagração constitucional. Pois o (art.º 111.º, n.º 2) determina que “nenhum órgão de soberania, de região autónoma ou de poder local pode delegar os seus poderes noutros órgãos, a não ser nos casos e nos termos expressamente previstos na Constituição e na lei”. É, assim, necessário a existência de dois órgãos, ou de um órgão e de um agente da mesma pessoa colectiva pública, ou de dois órgãos de pessoas colectivas públicas distintas, dos quais um seja o delegante e o outro o delegado. A delegação pode ter como destinatário um órgão ou agente, e cria entre o seu autor e o destinatário uma relação nova, a relação de delegação. Por último, a delegação para se tornar operante carece de um acto de delegação formal. Não basta a mera previsão normativa nem uma medida ou ordem informal. A transferência legal de competências é uma forma de desconcentração originária, ao passo que a delegação de poderes é uma desconcentração derivada, resultante de um acto do delegante. Acresce, que a transferência é definitiva – até disposição legal contrária –, enquanto a delegação de poderes é precária, pois é livremente revogável pelo delegante. Tanto a concessão, como a delegação de serviços públicos constituem uma transferência temporária de competências para entidades particulares. A diferença é que, no primeiro caso é para sociedades comerciais, e no segundo para associações privadas sem fins lucrativos. 105
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Outra forma de delegação é a coadjuvação. A coadjuvação é a relação que se estabelece entre dois órgãos a que a lei atribui competências iguais, que podem ser exercidas indiferentemente por qualquer deles. Constitui um caso particular de coadjuvação a posição dos Secretários de Estado perante os ministros respectivos. No caso da delegação interna não há, propriamente, uma delegação, mas antes uma repartição de tarefas e competências internas no âmbito dos serviços de um órgãos administrativo. Esta situação não tem, por isso, relevância no ordenamento jurídico geral, e corresponde a um poder normal dos titulares de órgãos administrativos. É, por exemplo, o caso de se distribuir ao chefe da secretaria, ou da tesouraria dos serviços, tarefas de processamento e contabilização, para efeitos de liquidação de taxas e custos subsequentes. na delegação da firma ou assinatura não há uma delegação propriamente dita, porque o delegante, o titular da competência, não transmite qualquer poder a outrém. Nesta situação, o titular, apenas, incumbe um agente coadjutor de assinar, em seu nome ou representação, os actos por ele praticados e que lhe são, exclusivamente, imputáveis. Nos termos do art.º 36.º do CPA, o delegante pode autorizar o delegado a subdelegar, e este pode subdelegar as competências que lhe tenham sido subdelegadas. Nos termos do Código, tudo indica que o subdelegado não pode proceder a mais subdelegações e que outras estão proibidas. Nos termos do art.º 37.º do CPA, no acto de delegação ou subdelegação, o órgão delegante ou subdelegante deve especificar os poderes que são delegados. Estes actos encontram-se sujeitos a publicação no Diário da República ou, tratando-se da administração local, no boletim da autarquia e, quando tal boletim não exista, devem ser afixados nos lugares do estilo. Actividade 4 Identifique, no Diário da República, um caso de delegação de poderes.
8. DESCONCENTRAÇÃO , DESCENTRALIZAÇÃO PODERES
E
DEVOLUÇÃO
DE
Desconcentração A origem do termo desconcentração está razoavelmente esclarecida. Trata-se de uma importação da linguagem das ciências naturais, especialmente da física, onde o grau de concentração significa a quantidade de um elemento sólido dissolvido num líquido. 106
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O sistema de concentração e de desconcentração, no sentido que lhe atribuimos, diz respeito à organização administrativa do Estado ou de uma pessoa colectiva pública. Na expressão de Gournay, 105 tem a haver com a forma como “as missões de serviço público são confiadas a células administrativas que dependem hierarquicamente das autoridades governamentais e no que toca ao poder de decisão”. O grau de concentração do Estado não tem nada a ver com a relação que o Estado possa ter com as restantes pessoas colectivas públicas. É que a concentração/desconcentração é um fenómeno de organização interna da pessoa colectiva pública – dimensão intra –, e não de relação externa – dimensão inter. O problema da relação entre o Estado e as diversas pessoas colectivas públicas é um problema de descentralização, e não de desconcentração. A desconcentração é um fenómeno interno do Estado ou de uma pessoa colectiva pública, contrariamente à descentralização, que se consubstancia no reconhecimento de outras pessoas colectivas públicas. Gournay distingue a desconcentração, que qualifica de geográfica daquela a que chama técnica, funcional ou vertical. A primeira consiste na transferência das missões e dos poderes de decisão detidos pelos serviços centrais, para um representante do governo a nível territorial – no nosso caso o governador do distrito. A segunda diz respeito à transferência para um funcionário situado à cabeça de um serviço dotado de um campo de acção nacional ou de uma missão específica. Para Freitas do Amaral, a “concentração ou desconcentração têm como pano de fundo a organização vertical dos serviços públicos, consistindo basicamente na ausência ou existência de distribuição de competências entre os diversos graus ou escalões da hierarquia”. Assim, para este autor que segue, no essencial, o critério de Marcelo Caetano “a concentração de competência”, ou a “administração concentrada”, é o sistema em que o superior hierárquico mais elevado é o único órgão competente para tomar decisões, ficando os subalternos limitados às tarefas de preparação e execução dessas decisões. Por seu turno, a “desconcentração de competência” ou a “administração desconcentrada” é o sistema em que o poder decisório se reparte entre o superior e um ou vários órgãos subalternos, os quais todavia, permanecem, em regra, sujeitos à direcção e supervisão” 106. Há vários níveis, graus e formas de desconcentração. Quanto aos níveis há que distinguir entre: • central: quando diz respeito à administração central; • local: quando se refere à administração autárquica. 105 106
Bernard Gournay – Introdução à Ciência da Administração. Lisboa: Europa América, 1978., p. 156. Freitas do Amaral – Curso de Direito Administrativo, vol. I. Coimbra: Almedina, 1993, pp.657-658.
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Quanto aos graus de concentração pode ser: • absoluta: quando os órgãos a que deu origem deixam de ser subalternos e se tornam independentes; • relativa: quando é menos intensa e não foi tão longe como a primeira e por isso os órgãos subalternos criados mantém uma relação de subordinação ao superior. Quanto às formas, distinguimos entre a desconcentração: • originária que decorre imediatamente da lei, que desde logo reparte a competência entre superior e subalternos; • derivada que precisa de permissão legal expressa, e só tem lugar perante um acto expresso, praticado para o efeito pelo superior. Descentralização Por descentralização tem-se entendido coisas muito diferentes, nos diversos países e ao longo dos tempos. Por isso, há autores que pensam que a ideia é vaga e imprecisa e reflecte dúvidas e equívocos. Perante tais dúvidas João Caupers 107 questiona: – “trata-se de um fenómeno de natureza administrativa ou de natureza política? Ou haverá duas descentralizações, uma do domínio do direito constitucional, outra do domínio do direito administrativo? – a descentralização é um fenómeno com um indispensável suporte territorial ou é admissível uma descentralização a favor de centros de interesses desprovidos de carácter local? – a descentralização pressupõe a existência e o envolvimento na prossecução do interesse público de uma pluralidade de entes jurídicos ou pode ocorrer dentro dos limites de um ente? – a descentralizarão exige a difusão do poder ou contenta-se com a distribuição do trabalho? – as privatizações e as concessões enquadram-se no fenómeno da descentralização ou esta apenas existe realmente quando opera a favor de entes de natureza pública?” Duas coisas parecem claras entre as diversas questões que se colocam. Uma é que o Estado não parece dispor do monopólio do interesse público. Outra é que 107
João Caupers – A Administração Periférica do Estado. Lisboa: Notícias, 1994, p. 230.
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a descentralização exige a existência de centros plurais de promoção do interesse público. A descentralização tende, assim, a andar associada ao reconhecimento do poder de decisão. A organização administrativa pública pode considerar-se descentralizada sempre que integre uma pluralidade de centros dotados de poder de decisão. O grau de descentralização liga-se à latitude da discricionaridade permitida à decisão. Na Europa continental pode-se agrupar o significado do termo descentralização: • à especificidade dos interesses locais; • à repartição territorial do poder; • à técnica de repartição de funções ou de competências. A repartição dos interesses, entre locais e gerais, é prática seguida por muitos autores 108. Os interesses locais, que o Estado se obriga a respeitar, e os interesse gerais, cuja prossecução lhe cumpre. É pacífico, que a descentralização aproxima a administração pública dos cidadãos, favorece as iniciativas locais, incrementa os vínculos sociais, e aumenta a sensibilidade daquela aos problemas dos cidadãos e às necessidades destes 109. Claro que a descentralização também tem os seus custos. – Aumenta em geral as despesas, porque força a especialização das pequenas unidades funcionais, e porque o desenvolvimento territorial da administração multiplica as relações funcionais e as necessidades de comunicação entre os serviços; – Pode ser geradora de políticas e decisões diferenciadas e criar desigualdades ao nível nacional; – Tende a fragmentar a decisão relativamente aos grandes problemas; – Aumenta a complexidade na execução das políticas de redistribuição e de investimentos; – Toma a administração pública mais permeável aos grupos de pressão locais. Nos termos da CRP (art.º 267.º n.º 1), a ideia subjacente à descentralização visa a aproximação da administração aos cidadãos, e o envolvimento destes nos problemas que mais directamente lhes dizem respeito. Desta forma, ela aparece indissociavelmente ligada à democracia participativa. Nos Estados politicamente consolidados e desenvolvidos, a descentralizarão não provoca, a desagregação da colectividade nacional. É, mesmo, a forma mais 108 109
Charles Debabasch – Science Administrative, 4.ª ed.. Paris, 1985, p. 220. Costa Lobo – Regionalização ou Reforma Administrativa Regionalizada?. Lisboa: Cesur, 1998.
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adequada de conciliar a promoção da satisfação dos interesses gerais, com a resolução dos problemas específicos Nos países de tradição centralizadora é prudente que a descentralização seja encarada como um processo gradual. Isto por forma a que a transferência de poder de decisão, para entes e órgãos descentralizados, permita superar os riscos de duplicações e lacunas, e de agravamento injustificado de despesas. Costuma-se, também, distinguir a descentralização política da descentralização administrativa. O modo como a distinção é feita não comporta grandes divergências quanto ao critério distintivo, que assenta no tipo de funções do Estado em que incide a descentralização. Assim: • a descentralizarão administrativa incide exclusivamente sobre a função administrativa; • a descentralizarão política incide sobre mais do que a função administrativa. Para Freitas do Amaral 110, a descentralização administrativa desdobra-se em dois níveis político administrativo e jurídico. • ao nível político administrativo seria indispensável que os entes públicos territoriais, distintos do Estado, fossem dotados de órgãos livremente eleitos, possuíssem atribuições próprias, e somente estivessem sujeitos a tutela administrativa de legalidade, para se poder falar de descentralização. • ao nível jurídico seria suficiente a pluralidade de entes públicos territoriais para existir descentralização. Para este autor há, ainda, diversas formas e graus de descentralização. As formas de descentralização podem ser: territorial, institucional e associativa. • A descentralização territorial é a que dá origem à existência de autarquias locais. • A descentralização institucional é a que dá origem aos institutos públicos. • A descentralização associativa é a que dá origem às associações públicas. De acordo com o autor são numerosos os graus da descentralização. Do ponto de vista jurídico são os seguintes: 110 Freitas do Amaral – Curso de Direito Administrativo, vol. I. Coimbra: Almedina, 1993, pp.686-687; Ministério do Planeamento e da Administração do Território – Descentralização; Regionalização e Reforma Democrática do Estado. Lisboa: MPAT, 1998.
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• Simples atribuição de personalidade jurídica de direito privado; • Atribuição de personalidade jurídica de direito público; • Além da personalidade jurídica de direito público, atribuição de autonomia administrativa; • Além da personalidade jurídica de direito público e de autonomia administrativa, atribuição de autonomia financeira; • Além das três anteriores, atribuição de faculdades regulamentares; Para além de tudo o que ficou enumerado, atribuição também de poderes legislativos próprios. Na opinião de Freitas do Amaral, no primeiro caso estamos, perante uma forma de descentralização não administrativa. Nas quatro alternativas seguintes, estamos perante fenómenos de descentralização administrativa. No sexto caso, estamos perante um fenómeno de descentralização política (como é o caso das Regiões Autónomas). Devolução de Poderes Os interesses públicos garantidos pelo Estado podem ser transferidos para outras pessoas colectivas de direito público (institutos públicos e associações públicas), de fins singulares, especialmente incumbidas de assegurar tais interesses 111. Daí, considerar-se devolução de poderes, o sistema em que alguns interesses públicos do Estado, ou de pessoas colectivas de população ou território, são postos, por lei, a cargo de institutos públicos ou associações públicas.
TESTE FORMATIVO 1. A administração pública limita-se ao Estado ou é mais vasta? 2. Como nascem, morrem ou se modificam os serviços distribuídos pela administração pública? 3. Quais as três principais dimensões do Estado? 4. Indique um órgão que, sendo administração central, não dependa do governo? 5. O Estado tem mais poder sobre a administração directa ou indirecta? 6. A repartição de finanças de um bairro de Lisboa é administração local estadual, ou administração local autárquica? 111
Bernard Gournay – Introdução à Ciência Administrativa. Lisboa: Europa-América, 1978, 168-173.
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7. A junta de freguesia é administração local estadual, ou administração local autárquica? 8. Nos termos do Código do Procedimento Administrativo (CPA), em que consiste a delegação de poderes? 9. Caracterize as formas de descentralização: territorial, institucional e associativa.
RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. A Administração Pública não se limita ao Estado. Para além de o englobar, integra muitas outras entidades e organismos. Por isso, nem toda a actividade administrativa é uma actividade estadual, dado que a administração pública não é uma actividade exclusiva do Estado. 2. As condições em que nascem, morrem ou se modificam os serviços distribuídos pela administração, encontram-se profundamente ligadas a factores de ordem política e social. 3. Dimensão internacional, constitucional; e administrativa. 4. A Comissão Nacional de Eleições. 5. Sobre a administração directa. 6. É a administração local estadual. 7. É a administração local autárquica. 8. É o acto pelo qual um órgãos (legalmente habilitado para o efeito), permite que outro órgão, ou agente, pratique actos administrativos sobre a mesma matéria. 9. A descentralização territorial é a que dá origem à existência de autarquias locais. A descentralização institucional é a que dá origem aos institutos públicos. A descentralização associativa é a que dá origem às associações públicas.
L EITURAS C OMPLEMENTARES FREITAS AMARAL, Diogo – Curso de Direito Administrativo, vol. I. Coimbra: Almedina, 1993. CAUPERS, João – A Administração Periférica do Estado. Lisboa: notícias, 1994. GOURNAY, Bernard – Introdução à Ciência Administrativa. Lisboa: Europa América, 1978.
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5. ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. Diagnóstico dos Problemas de Estrutura 2. Organograma 3. Departamentalização 4. Princípios Gerais de Organização 5. Estruturas Tradicionais 6. Estruturas Modernas 7. Estruturas Contemporâneas 8. Serviços Partilhados Teste Formativo Respostas às Actividades e ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade, o estudante deverá estar apto a: • Relacionar os diversos elementos que entram no organograma; • Distinguir os elementos a ter em conta no diagnóstico dos problemas de estrutura; • Identificar a importância do papel da estrutura no cumprimento da estratégia organizacional; 113
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• • • •
Identificar os princípios gerais de organização; Explicar a importância da delegação de competências; Elaborar uma estrutura organizacional; Desenhar um organograma.
1. DIAGNÓSTICO
DOS
PROBLEMAS
DE
E STRUTURA
O objectivo deste ponto é efectuar uma breve introdução ao diagnóstico dos problemas da estrutura orgânica. A estrutura orgânica é uma ferramenta utilizada pela organização, para permitir, de maneira eficiente, a execução da sua estratégia. Uma utilização adequada dessa ferramenta pressupõe, evidentemente, o conhecimento completo dessa estratégia, o que impõe a necessidade de adaptação da estrutura à tecnologia e à envolvente. Para Peter Drucker 112, no diagnóstico da estrutura organizacional deve-se ter em conta a análise das actividades, das decisões e das relações. Quanto à análise das actividades, importa inventariar um conjunto de questões para as quais se deve encontrar resposta. Qual o trabalho que se deve fazer? Quais os tipos de trabalho que podem ser reunidos? Qual a importância que deve ter cada actividade na estrutura da organização? No que respeita à análise das decisões, convém clarificar a estratégia da organização, identificar os locais na estrutura onde deve residir maior e menor autoridade. Para tanto a resposta às questões que seguem pode ajudar a elaborar o tal diagnóstico. Que estrutura de topo precisa a organização? Qual a autoridade e responsabilidade que devem ter os diferentes níveis de gestão? Segundo Drucker cerca de 75% das decisões são tomadas por níveis hierárquicos acima do necessário. Relativamente à análise das relações interessa analisar o trabalho do chefe em relação às actividades que dirige, mas também em relação à contribuição que a sua actividade deve dar à unidade maior de que faz parte. Trata-se de analisar o valor acrescentado, ou introduzido, na cadeia de valor. As questões colocadas pelos especialista de organização no diagnóstico dos problemas estruturais devem ter em conta os objectivos, as funções, as políticas, as relações entre órgãos, as decisões, a autoridade, a responsabilidade, a coordenação, a delegação, a gestão, a informação, o planeamento, o controlo e as reuniões. Desde logo, interessa saber quanto aos objectivos: a clareza e detalhe da sua definição; o grau de compreensão dos mesmos por todos os níveis do pessoal; a 112
Peter Drucker – The Practice of Management. Boston: Butterworth Heinemann, 1995, cap. 16.
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compatibilização de objectivos sectoriais com os departamentais; a correspondência entre os objectivos atribuídos e os resultados alcançados. Quanto às funções interessa indagar da sua descrição e grau de detalhe; se se encontram distribuídas equilibradamente (equidade interna); o seu grau de compreensão por quem as executa; quais as funções e tarefas efectuadas para além das formalmente estipuladas. Relativamente, às políticas interessa identificar os seus autores e as suas linhas mestras; e se os objectivos estão alinhados com as políticas. As relações entre os órgãos constituem outro parâmetro a ter em conta diagnosticando o tipo de relações (cooperação ou competição) existentes entre os departamentos Quanto às decisões há que saber a que níveis são tomadas; se não poderão com vantagem ser tomadas a nível mais baixo da hierarquia; que tipo e qualidade de informações serão necessárias e suficientes; o grau de participação dos escalões inferiores. No que respeita à autoridade tem de se conhecer se as linhas são claras, definidas e precisas e qual o grau de ambiguidade; se número de níveis de escalões é o adequado; se será possível e/ou necessário suprimir/aumentar alguns; se a delimitação entre serviços de apoio (staff) e serviços de linha ou operacionais está definida; qual a qualidade das relações horizontais. Relativamente à responsabilidade será necessário identificar o seu detentor; e os meios de que dispõe para assumi-la. Os aspectos ligados à coordenação merecem particular atenção nomeadamente conhecendo: o órgão coordenador; se a sua acção é permanente e eficaz; se há emanação de ordens de várias proveniências sobre o mesmo assunto; se há duplicação de processamentos desnecessários; se há excessiva fragmentação do trabalho; como está dividido o trabalho pelos diversos escalões; como exerce o órgão coordenador a assistência, consulta e assessoria aos restantes órgãos. No que toca à delegação importa conhecer se a autoridade/responsabilidade está reunida e delegada nas chefias inferiores, que apresentem condições e competências necessárias; se foram assinalados seus limites; se há atrasos por falta de decisão ou de iniciativa. No que se refere à gestão vale a pena conhecer: se o responsável emprega bem o seu tempo; se conhece os seus poderes em termos de gestão operacional, financeira e do pessoal: se lhe estão atribuídos índices de realização e quais; se dedica a cada trabalho um tempo de acordo com a sua importância; se tem à sua disposição, em tempo oportuno, os elementos de que necessita; se tem a certeza de que os trabalhos que executa não podem ser feitos por pessoas de menor categoria; se está convencido de que o trabalho de pormenor será menos bem feito, se não for ele a fazê-lo; se pensou em delegar alguns dos seus trabalhos; se conserva, neste caso, a sua responsabilidade; se as ordens são concretas, explícitas e enérgicas, de modo que se obtenham, com rapidez, os resultados esperados. 115
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Quanto à informação merece ter em conta: se o pessoal sabe, sempre, o que querem os chefes, se os chefes conhecem os desejos e dificuldades dos colaboradores; se a informação emanada dos dirigentes resulta estimulante para uma colaboração positiva; se o pessoal é informado, de modo suficiente, sobre o andamento da organização; se é avaliado o grau de satisfação dos colaboradores e do público e se os motivos desfavoráveis são objecto de estudo; se são utilizados convenientemente os instrumentos de comunicação para o efeito; se há quem retenha a informação no todo ou em parte; se luta contra o secretismo desnecessário defendendo a prestação de contas. Relativamente ao planeamento importa salientar: o grau de planeamento das acções a desenvolver; grau de fiabilidade do planeamento; clareza, síntese e representação gráfica do mesmo; grau de flexibilidade da programação para adaptar-se a possíveis contingências; alinhamento entre programas e as tarefas a executar; fiabilidade dos dados; robustez do planeamento dos fluxos de trabalho; em que medida os colaboradores acham que: “bem planeado é meio trabalho feito”; ou se há improvisação desnecessária e ineficiente. Quanto ao controlo/ avaliação/acompanhamento da execução dos objectivos planeados importa saber se: há controlo das acções; há divergências entre os resultados reais e os esperados; o pessoal foi informado desta função; surgem situações difíceis nos processamentos previsíveis; há casos de racionalização bem sucedidos; existem relações dos defeitos mais notórios observados; é estabelecida estatisticamente a frequência dos erros; quando há erros graves é pedida a opinião dos colaboradores; o sistema de observação é simples e compreensível por todo o pessoal; os postos de trabalho acatam as «advertências» provenientes do controlo; se reconhece a sua importância. Por último, no que toca a reuniões importa indagar se: o sistema de reuniões é reconhecido pelos responsáveis como um meio eficaz para favorecer a colaboração de todos; os motivos de reunião são anunciados, dando-se a conhecer previamente o tema; os horários são afixados de acordo com as disponibilidades dos participantes; começam à hora indicada e dentro do horário normal de trabalho, de modo a não perturbarem a vida particular dos participantes; dão bom resultado.
2. ORGANOGRAMA Para representar uma estrutura organizacional utiliza-se o gráfico designado por organograma que é a representação abreviada da estrutura da organização. Existem vários tipos de organogramas, alguns simples, outros complexos. 116
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Em princípio o organograma deve representar: os órgãos da organização; tanto quanto possível, de forma genérica, as funções de cada órgão; as relações de interdependência entre órgãos; os níveis administrativos que compõem a organização; a via hierárquica. Para a construção de um organograma, deve-se observar o seguinte: os órgãos devem ser representados por figuras geométricas, normalmente o rectângulo; os tamanhos dos rectângulos podem ser proporcionais à importância hierárquica do órgão; os órgãos de menor hierarquia são colocados abaixo dos de maior hierarquia; os órgãos de staff ou de serviços de apoio devem ser posicionados horizontalmente, pouco abaixo do ponto da via hierárquica; Se necessários, os tipos de autoridade podem ser representados por diferentes linhas de ligação, padronizadas da seguinte forma: • • • •
a) Hierárquica ––––––––––––––– b) Funcional ––––––––––––c) Coordenação –––/–––/–––/ d) Assessoria ou staff ––––.––––.––––.
Sendo a estrutura a expressão das responsabilidades e das ligações entre as pessoas da organização, veremos, seguidamente, os tipos de ligações aos quais correspondem diferentes tipos de estrutura. São cinco os tipos possíveis numa organização: hierárquicas, funcionais, de cooperação, de staff e de representação. Ligações hierárquicas – são ligações entre chefe e subordinados, também chamadas operacionais ou de exploração. Em princípio, estas relações só devem ser aplicadas a órgãos de execução ou produção. O número de subordinados deve ser tal, que o chefe os possa comandar, coordenar e controlar eficazmente. Daí que, quanto maior for o contacto entre o chefe e os subordinados e quanto mais diversificado for o trabalho, menos deve ser o número de subordinados. Ligações funcionais – são as ligações estabelecidas entre serviços, em função da sua competência técnica, com vista à emanação de directivas e conselhos. Em caso da existência de conflitos, eles serão resolvidos pela via hierárquica. Este tipo de ligações nasceu em consequência da especialização, e da complexidade crescente da evolução técnica. Mas, não pode existir uma estrutura só com ligações funcionais. Complementadas com as ligações hierárquicas, dão origem a estruturas de staff e linha. Devemos ter em atenção que os órgãos, ditos funcionais, só são justificados atendendo à sua competência técnica. Ligações de cooperação – são as ligações entre o mesmo nível hierárquico, mas de departamentos diferentes. Geralmente, só são usadas quando é necessário constituir grupos de trabalho com vista ao desenvolvimento de um determinado projecto. 117
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Ligações de staff – são as ligações entre determinado grupo de pessoas (especialistas), e a Organização. Este grupo actua em nome da Administração, por delegação da autoridade (não tem autoridade própria), e encontra-se à sua disposição para esclarecer e /ou preparar as decisões. Ligações de representação – são ligações independentes da hierarquia e das ligações funcionais que têm em vista a satisfação de necessidades específicas externas e internas: externas em representação da organização junto de outras entidades; internas em representação da administração junto do pessoal. Actividade 1 A partir do que sabe, conceba um organograma para uma direcção de serviços de recursos humanos de uma direcção geral. Compare, posteriormente, com a estrutura existente e publicada na respectiva lei orgânica. Verifique as semelhanças e as diferenças. Use uma ferramenta electrónica neste trabalho.
3. DEPARTAMENTALIZAÇÃO Um roteiro de regras de acção, que pode ser seguido na departamentalização, é o de Lyndall F. Urwick. São os seguintes os princípios apresentados por Urwick 113: a) Objectivo: a estrutura precisa de ser a expressão de uma organização como um todo; b) Especialização: cada membro de uma organização deve dedicar-se a uma só função importante; c) Coordenação: a finalidade de toda a organização é conseguir coordenar e assegurar a unidade de esforços; d) Autoridade: deve haver uma linha de autoridade clara e definida, partindo de cima para baixo; e) Responsabilidade: um superior tem absoluta responsabilidade pelos actos dos seus subordinados; f ) Correspondência: para cada responsabilidade deve haver um grau correspondente de autoridade, para dar instruções que sejam obedecidas; g) Definição: os deveres de cada função (não pessoa) englobando atribuições, autoridade (capacidade formal de decisão) e relações, devem ser divulgados, por escrito, para serem do conhecimento de todos; h) Alcance do controle: a amplitude de supervisão adequada raramente deve abarcar mais de 5 a 6 pessoas; i) Equilíbrio: as diversas unidades da organização devem ser equilibradas; j) Continuidade: o crescimento e o desenvolvimento da organização devem ser, permanentemente, examinados.
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L. Urwick – The Elements of Administration. London: pitman, 1943.
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Partindo de investigação sobre os órgãos governamentais norte-americanos, Gulick 114, identificou como critérios básicos de departamentalização, o propósito dominante, o processo dominante, a clientela/material e a área geográfica. Propósito dominante (ou função principal), é a reunião, numa única estrutura, sob uma única direcção, de todos os órgãos, actividades e pessoas, envolvidos no desenvolvimento de um objectivo amplo, função principal ou propósito dominante. Por exemplo, o fornecimento de água, a prestação de assistência médica, o controlo do crime e a direcção da educação, pela sua importância, são coordenadas por estruturas centrais, (ministérios ou órgãos afins), directamente subordinadas ao chefe do governo. Processo dominante é a reunião, numa única estrutura, sob uma única direcção, dos órgãos, actividades e pessoas, cujos trabalhos envolvem a manipulação de uma tecnologia, o exercício de uma certa profissão, ou a utilização de habilidades específicas. Clientela/material é a reunião, numa única estrutura, sob uma única direcção de todos os órgãos, actividades e pessoas, que trabalham com determinado grupo de pessoas ou uma determinada espécie de material. Isto, sem que se considere o propósito do serviço ou técnicas de processo utilizadas. Área geográfica é a reunião, numa única estrutura, sob uma única direcção de todos os órgãos, actividades e pessoas que trabalham em determinada área geográfica. Isto sem levar em conta o serviço que prestam ou a técnica que usam. Além destas há outras formas de departamentalização, nomeadamente por função, produto ou serviço, tempo, quantidade e número de clientes. Pode, ainda, ser por divisão do trabalho ou por agrupamento de actividades homogéneas.
4. PRINCÍPIOS GERAIS
DE
ORGANIZAÇÃO
Que princípios gerais se deve ter em conta na reestruturação (ou criação), de um órgão, de forma a assegurar a máxima eficácia do trabalho no seio da organização? A estrutura de uma organização deve harmonizar a actividade humana, de forma a favorecer a realização, o mais económica e eficaz possível, dos objectivos, por intermédio dos seus diferentes órgãos e dentro dos prazos estabelecidos 115. Ela deve, pois, contribuir para: simplificar o trabalho de gestão, facilitar o contributo de todos e assegurar a transmissão, rápida e precisa, das informações 114 L. Gulick; L. Urwick – Notes on the Theory of Organization in Papers on the Science of Administration. New York: Instituto de Administração Pública, 1937. 115 Bernard Gournay – Introdução à Ciência Administrativa. Lisboa: Europa-América, 1978, 120-137.
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necessárias; a formação pessoal e, uma vez que o crescimento de uma organização está, em larga medida, condicionado, pela sua capacidade de resposta às necessidades dos cidadãos, é necessário que sejam assegurados meios aos dirigentes e aos trabalhadores. Isto, para despertar a sua criatividade e iniciativa, o estabelecer de relações de trabalho eficazes e o encorajar o desejo de aperfeiçoamento de conhecimentos; um ambiente propício à inovação e ao favorecimento de um nível óptimo de descentralização, delegação e responsabilização. A definição de uma estrutura deve partir dos responsáveis, aos quais deverá ser prestada assessoria por técnicos especializados, uma vez que a atribuição de funções terá de ter em conta os gestores existentes. A missão destes técnicos é a de ajudar, clarificando, e orientando através do diálogo, os pontos duvidosos ou que contrariem os princípios. São dez os princípios a que uma estrutura orgânica deve obedecer para alcançar a eficácia. 1.º Princípio dos objectivos: É necessário classificar os objectivos a atingir, por ordem da sua prioridade, com vista à atribuição dos recursos (humanos, materiais, financeiros e equipamentos). Os objectivos têm um papel tão importante que devem ser conhecidos por todas as pessoas da organização. Devem ainda: ter em conta os factores que podem ter repercussões notáveis; ser enunciados separadamente; ser tão precisos quanto possível. Um objectivo ideal deve: ser uma orientação para a acção; ser capaz de sugerir vários tipos de acção; ter em conta os factores internos e externos (legislação, competição, etc.,.); ser conciliável com as políticas e objectivos mais gerais, a níveis superiores e inferiores; ser claro; ser enunciado em termos de resultados finais, e não de actividades; ser quantificado; determinar o tempo de concretização. Peter Drucker identificou na administração pública americanas os seguintes pecados no que toca aos objectivos: Imprecisão na definição dos objectivos, programas e acções; indefinição quanto a prioridades; gastos de tempo e recursos de forma desnecessária; exagero na composição das equipas de trabalho; apego a dogmas para justificar os maus resultados; incapacidade ou falta de vontade política para aprender com o erro; resistência em abandonar programas e acções reconhecidas como erradas 116 Um regra de algibeira para saber se uma organização valoriza o processo de fixação e avaliação dos objectivos é conhecer as percentagens de: funcionários e trabalhadores que conhecem os seus objectivos; de técnicos superiores que
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Peter Drucker, The Deadly Sins in Public Administration. Public Administration Review, Vol. 40, n.º 2, Mar- Apr., 1980, pp. 103-106.
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ocupam uma hora por mês a discutir e compatibilizar objectivos; de dirigentes liga objectivos ao orçamento; de dirigentes que liga os incentivos aos objectivos. Nos termos do SIADAP os organismos têm de fixar os objectivos do serviço para o ano seguinte, tendo em conta a sua missão, as suas atribuições, os objectivos estratégicos plurianuais determinados superiormente, os compromissos assumidos na carta de missão pelo dirigente máximo, os resultados da avaliação do desempenho e as disponibilidades orçamentais 117 2.º Princípio da separação: Sempre que possível deve-se definir os serviços, de acordo com a sua função dominante, em: a) Serviços executivos; b) Serviços de controlo, auditoria e fiscalização; c) Serviços de coordenação 118. Deve separar-se ainda o trabalho de gestão, de apoio do trabalho de execução operacional. O trabalho de gestão engloba (por ordem decrescente de importância): previsão (estado actual, evolução); fins a atingirem (políticas e objectivos); organização dos meios (programas, orçamentos) responsabilidade (delegação, coordenação e informação); chefia (selecção, aperfeiçoamento, motivação); controlo/avaliação (acção correctiva); execução. Este princípio da separação nos termos da Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro que estabelece os princípios e normas a que deve obedecera organização da administração directa do Estado atinge também as 3.º Princípio da autoridade e responsabilidade: Este princípio que não está isolado e compõe-se de vários outros. Assenta nos seguintes pressupostos: as linhas de autoridade devem ser claras, do topo ao nível mais baixo; a autoridade é o direito formal de exigir actos dos outros (Urwick); a autoridade é o direito de corrigir, coordenar e decidir (Gillmor); a responsabilidade e a autoridade de cada gestor devem ser claramente definidas por escrito; deve existir uma descrição de funções e um manual de organização; a responsabilidade deve, sempre, ligar-se à respectiva autoridade; a autoridade mais elevada é absoluta; a autoridade deve, o mais possível, ser delegada, através da linha hierárquica; o número de níveis de autoridade deve ser limitado ao mínimo. 4.º Princípio da unicidade do comando: Ninguém deve reportar a mais que um chefe. Toda a pessoa deve saber a quem reporta, e o chefe deve saber quais as pessoas que estão na sua dependência.
117
Consultar Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro que estabelece o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública. 118 Consultar a Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro que Estabelece os princípios e normas a que deve obedecer a organização da administração directa do Estado.
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5.º Princípio da especialização: O trabalho de cada pessoa deve, tanto quanto possível, limitar-se a uma única tarefa; para ser aplicado, na prática, a indivíduos, pequenos órgãos ou pequenas organizações, este princípio é, também, apresentado de outro modo (complementar): “se uma pessoa é responsabilizada por mais de uma tarefa, elas devem ser semelhantes”. 6.º Princípio da coordenação: Existe um limite para o número de indivíduos que podem ser eficazmente, coordenados por uma única pessoa. Esse limite deve ter em consideração: a semelhança ou diferença de posição dos subordinados e do seu grau de independência; que um maior número de interligações exige um maior trabalho de coordenação; a localização geográfica das actividades; a complexidade das funções de cada subordinado; a estabilidade da organização; a frequência com que aparecem novos factores de alteração. Ao nível executivo, o gestor não deve ter mais de 25 subordinados. Ao nível de gestão, não deve ter mais de 7 119. 7.º Princípio da flexibilidade: Este princípio compõe-se, também, de dois outros, que são complementares: a estrutura deve ser flexível para que possa adaptar-se e ajustar-se às condições de evolução; a estrutura deve ser o mais simples possível e evitar a proliferação de níveis hierárquicos que tornam a comunicação difícil. 8.º Princípio da funcionalidade: Toda a função necessária deve ser atribuída a um órgão criado para o efeito. Não deve haver mais do que um órgão para idêntica função. Uma função, no mesmo âmbito de actuação, não pode ser atribuída a mais do que um órgão. 9.º Princípio do controlo: Não se podem atribuir a uma mesma pessoa responsabilidades que impliquem um controlo recíproco. Dificilmente se é, simultaneamente, juiz e réu., pese embora, tratando-se de trabalhadores qualificados, ser necessário atribuir cada vez mais graus de liberdade ao titular do posto de trabalho no controlo do seu próprio trabalho. 10.º Princípio da desconfiança: Desconfiar da tendência de certas pessoas para fazer depender o seu serviço directamente da gestão de topo, Director Geral, administração etc. Importa articular os princípios acabados de enunciar com a Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro que veio definir um conjunto de regras para a reestruturação da Administração Central do Estado. 119
Este princípio hoje é muito contestado. Veja-se a propósito: S. Goshal; C. Bartlett – The Individualized Corporation. London: Heinemann, 1998, p. 250.
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Neste ponto, importa realçar em particular os princípios de organização a serem respeitados em cada ministério: a) Adequar a estrutura à missão, garantindo a justa proporção entre a estrutura operativa e a estrutura de apoio; b) Assegurar um equilíbrio adequado entre serviços centrais e periféricos, visando a prestação de um serviço de qualidade; c) Agregar as funções homogéneas do ministério por serviços preferencialmente de média ou grande dimensão, com competências bem definidas, de acordo com o princípio da segregação de funções, com vista à responsabilidade pelos resultados; d) Assegurar a existência de circuitos de informação e comunicação simples e coerentes, tendencialmente agregando num mesmo sistema centralizado a informação de utilização comum, tanto no seio de cada ministério como no âmbito da prossecução de finalidades interministeriais; e) Garantir que o desempenho das funções comuns seja atribuído a serviços já existentes em cada ministério, não determinando a criação de novos serviços; f ) Reduzir o número de níveis hierárquicos de decisão ao mínimo indispensável à adequada prossecução dos objectivos do serviço; g) Privilegiar, face à emergência de novas atribuições, a reestruturação dos serviços existentes em prejuízo da criação de novos. Seguindo o espírito da Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro, o Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE) 120 veio estabelecer uma diferença importante entre as missões operacionais de cada ministério e as funções de suporte. As primeiras traduzem as principais políticas e acções públicas as quais se podem subdividir em normativas, reguladoras, fiscalizadoras, produtiva ou prestadora de serviços. As missões produtoras ou prestadoras de serviços, por norma, devem estar o mais próximo possível dos cidadãos, devendo-se privilegiar critérios racionais de desconcentração, descentralização e, sendo caso disso, de externalização. As funções de suporte ou apoio, são as que se traduzem nas actividades complementares às missões operacionais mas que possibilitam a sua execução com eficácia e eficiência. Estas podem ser funções de apoio à governação (actividades centradas na estratégia, planeamento e controlo de gestão) ou em funções de suporte à gestão de recursos com actividades centradas na gestão eficiente dos recursos complementares mas necessários à realização das missões operacionais. Por norma estas funções devem ser concentradas e se possível organizadas de acordo com uma filosofia de serviços partilhados.
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Consultar a Resolução de Conselho de Ministros n.º 124/2005, de 04 de Agosto.
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5. E STRUTURAS
TRADICIONAIS
O grupo de estruturas simples, envolvendo o modelo linear, o Staff/linha, a solução funcional, e a colegial, pode, também, ser designado por estruturas tradicionais. Cada um destes tipos de estrutura apresenta vantagens e desvantagens em relação aos demais, pelo que se justifica a sua descrição. Estrutura Linear, Militar ou Linha É representada graficamente por uma pirâmide e mostra de forma clara a unidade de comando e o princípio do escalonamento hierárquico. É um tipo de estrutura baseado na organização dos antigos exércitos e apresenta as seguintes características: tem um direcção única; não valoriza a especialização; a chefia é a fonte exclusiva da autoridade; as ordens seguem por via hierárquica; cada funcionário recebe ordens de um só chefe imediato. Vantagens: é de aplicação simples; facilita a transmissão de ordens e a recepção de informações; permite a definição clara dos deveres e das responsabilidades; facilita a rapidez de decisão; facilita a disciplina; reduz os custos de administração. Desvantagens: não favorece a especialização; torna a organização rígida; sobrecarrega a direcção; exige chefias excepcionais; não favorece o espírito de equipe e de cooperação; dificulta a substituição das chefias devido a excessiva centralização. Estrutura Funcional Este tipo de estrutura apoia-se na técnica da supervisão funcional, tendo sido planeada para implantar o modelo de Taylor. Baseia-se na separação entre funções de concepção e funções de execução e na unidade de direcção. Este tipo de estrutura concretiza-se por: possuir uma direcção única; valorizar a especialização; aplicar a divisão do trabalho às tarefas de execução e de supervisão. Vantagens: promover a especialização e o aperfeiçoamento; possibilitar melhores salários e maior rendimento; permite uma maior facilidade de adaptação das capacidades e aptidões à função; promove a cooperação e o trabalho em equipa; é mais económica, a médio e longo prazo; torna a organização de produção mais flexível.
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Desvantagens: é de difícil aplicação e requer maior habilidade de gestão; requer maior e mais difícil coordenação; não facilita a manutenção da disciplina; permite a divisão de controlo; dificulta a formação de chefias administrativas; é de elevado custo. Estrutura Staff /Linha A estrutura Staff /Linha possui as características básicas da estrutura linear e distingue-se pela existência de órgãos de staff junto dos gestores de linha. Estes órgãos de staff têm a função de assessorar e aconselhar o executivo a que se encontram ligados. A estrutura Staff /Linha caracteriza-se por: direcção única; os dirigentes podem dispor, em todos os níveis, segundo as necessidades, de um órgão de estudos, informação, assessoria técnica; o staff exerce apenas autoridade de ideias, excepto quanto ao pessoal da sua estrutura interna, que é integral; mesmo que haja duas fontes de autoridade, apenas uma se projecta directamente sobre cada funcionário, que é a dos chefes de unidades de linha; cada funcionário recebe ordens de um único chefe imediato; o staff pode ser unipessoal. Vantagens: facilitar a participação de especialistas em qualquer ponto da linha hierárquica; possibilitar melhor controlo da quantidade e da qualidade; tornar a organização facilmente adaptável às suas necessidades; favorecer a execução do trabalho das unidades de linha; utilizar em maior grau a divisão do trabalho; promover maior eficiência. Desvantagens: requer hábil coordenação das orientações emanadas do staff; as sugestões, às vezes, confundem-se com as ordens ou entram em conflito com estas; o staff tende a usurpar a autoridade dos chefes de linha; os órgãos de execução reagem contra as sugestões do staff. Estrutura Colegial Na estrutura colegial continua preservada a unidade de direcção, no sentido de que prevalece a vontade da maioria, cabendo apenas ao executivo ou chefia a responsabilidade pela execução pelo cumprimento da decisão colegial ao longo da organização. Caracteriza-se por: direcção plural ou colegial; a tomada de decisão pertence ao grupo; a responsabilidade da execução é impessoal; poderes restritos dos membros; situa-se em nível hierárquico superior; as ordens partem de um grupo para cada empregado, mas cada um só tem um chefe imediato; denominações características: junta, comissão, conselho.
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Vantagens: facilitar a participação de especialistas; julgamento impessoal; pontos de vista mais gerais. Desvantagens: fraqueza na direcção de operações quotidianas; decisões mais demoradas; responsabilidade mais diluída.
6. E STRUTURAS MODERNAS A lei n.º 4 de 2004 estabelece que a organização interna dos serviços executivos e de controlo e fiscalização deve ser adequada às respectivas atribuições, obedecendo aos seguintes modelos: a) Estrutura hierarquizada; b) Estrutura matricial. Estipula ainda a Lei que sempre que seja adoptado um modelo estrutural misto, o diploma de criação do serviço distinguirá as áreas de actividade por cada modelo adoptado. Quando seja exclusivamente adoptada a estrutura hierarquizada, e desde que se justifique, com vista a aumentar a flexibilidade e eficácia na gestão, podem ser criadas, por despacho do respectivo dirigente máximo, equipas de projecto temporárias e com objectivos especificados A estrutura interna hierarquizada é constituída por unidades orgânicas nucleares e flexíveis. A estrutura nuclear do serviço é composta pelas direcções de serviços, correspondendo a uma departamentalização fixa. A estrutura flexível é composta pelas divisões. As unidades orgânicas flexíveis são criadas, alteradas ou extintas por despacho do dirigente máximo do serviço, que definirá as respectivas atribuições e competências, bem como a afectação ou reafectação do pessoal do respectivo quadro, no âmbito do limite máximo previamente fixado em portaria do membro do Governo competente. A criação, alteração ou extinção de unidades orgânicas no âmbito da estrutura flexível visa assegurar a permanente adequação do serviço às necessidades de funcionamento e de optimização dos recursos, tendo em conta uma programação e controlo criteriosos dos custos e resultados. Quando estejam em causa funções de carácter predominantemente administrativo, no âmbito das direcções de serviços ou das divisões, podem ser criadas secções. As organizações, nos estádios mais evoluídos do seu processo de crescimento, e por imperativo da sua maior complexidade, dimensão e tipo de diferenciação, adoptaram novas alternativas estruturais. Isto, para conseguirem atender às novas estratégias e atingir os seus objectivos. Com isso surgiram dois novos tipos de estruturas. Um baseando-se nas funções. O outro valorizando os produtos ou serviços produzidos. Vejamos cada um desses modelos.
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Estrutura com base na função A estrutura baseada na função possui as seguintes características: é unidimensional, pois a sua base é, exclusivamente, a função principal; cada uma das suas áreas dedica-se ao desenvolvimento de uma única função; baseada na especialização, mas em nível de função principal; objectivo permanente, exigindo uma envolvente estável; longo prazo, dado que mais voltada para a produção repetitiva em grandes quantidades. Vantagens: centralização de recursos similares a cada função; solidificação da especialização em cada unidade organizacional; perspectiva de carreira para profissionais; uniformidade em normas e procedimentos; permite alta qualidade nos produtos, desde que o ambiente seja estável. Desvantagens: na hipótese de vários projectos/produtos em desenvolvimento, podem surgir conflitos pela disputa de recursos disponíveis; ênfase na própria especialidade, às vezes, em detrimento dos objectivos dos projectos/produtos; quando a direcção se torna mais exigente com os órgãos funcionais, visando os projectos, isto pode gerar ressentimentos, falta de motivação e inércia, tornando a organização funcional lenta; do ponto de vista dos projectos, a organização funcional é vista como pouco eficiente e inflexível; inaplicável quando o meio ambiente é instável; não é flexível. Tendência à centralização; não favorece a cooperação interdepartamental. Estrutura divisional Quando as grandes organizações, nomeadamente as administrações públicas, começam a enfrentar as dificuldades típicas das estruturas funcionais, procede-se, em geral, à divisão da estrutura existente em unidades orgânicas de maior flexibilidade operacional, o que se traduz na criação de uma estrutura divisional. A estrutura divisional 121 é aquela em que as actividades díspares, mas vinculadas a um objectivo final específico, são agrupadas numa unidade organizacional, geralmente denominada “divisão de…” ou “direcção …” O importante é que a unidade descentralizada seja constituída como um centro de resultados (profit center) normalmente produtos ou serviços. A estrutura divisional caracteriza-se por: unidimensional: a sua base é um produto ou serviço; um grupo de serviços ou produtos similares; o processo de trabalho; serviços; áreas geográficas; actividades díspares (recursos humanos, finanças, etc,) mas vinculadas a um objectivo final específico (saúde, prestações de segurança social, cobrança de impostos), são agrupadas numa mesma unidade organizacional; a estrutura divisional resulta do parcelamento da estrutura com 121
Henry Mintzberg – Estrutura e Dinâmica das Organizações. Lisboa: Dom Quixote, 1995.
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base em funções, numa série de órgãos menores, considerados, até certo ponto, miniaturas básicas, funcionais da organização; cada divisão ou direcção desenvolve um único produto ou grupo de produtos afins; desenvolve um único processo de trabalho; ou volta-se para uma região definida.
7. E STRUTURAS C ONTEMPORÂNEAS Sob esta designação vamos analisar dois modelos emergentes de estruturas: Projecto e Matricial. Vantagens: cada gestor, em função do mercado, é orientado, estrategicamente, para enfatizar, em relação aos seus produtos, problemas de programação, expansão, comercialização, custos e rentabilidade; torna mais fácil o processo de coordenação, em função do produto (ou outro indicador), porque o negócio é visto em conjunto e não em partes, tornando-se as actividades funcionais, dessa forma, secundárias, se sujeitando ao objectivo principal, que é o produto, a área geográfica, os serviços ou os negócios; permite a utilização máxima da capacidade pessoal e do conhecimento especializado, favorecendo a inovação, o crescimento e a diversificação de produtos e mercado; a energia e o entusiasmo se concentram no produto/linha particular de produtos, negócios, serviços, etc. havendo, assim, flexibilidade, pois as estruturas divisionais, segundo as condições, podem mudar sem interferir na estrutura geral da organização; melhor histórico de cumprimento de cronogramas e de controlo de custos, podendo-se exigir dos gerentes responsabilidade em relação aos lucros, porque são normalmente responsáveis pela programação, produção, venda etc.; facilita o emprego de capital especializado, em função dos objectivos, de fácil assimilação pelos investidores. Desvantagens: os custos são elevados, pela duplicação de órgãos, podendo reduzir a margem de lucros; um grupo de produtos presta pouca consideração aos outros grupos de produtos dentro da organização, dificultando a integração; sacrifica a especialização funcional e as economias de escala pela diferenciação de produtos e suas estruturas consequentes; tendo o gestor divisional ampla autonomia, não raramente, têm ocorrido decisões de expansões de fábricas, de investimentos ou de aquisições de materiais, gerando excedentes onerosos às organizações; quando a área de produção é organizada por divisões de produtos, há uma forte tendência para forçar um agrupamento semelhante nas vendas, compras, contabilidade etc., pois é difícil, em caso contrário, sincronizar essas actividades com aquelas que se relacionam com as classes dos produtos; é difícil a integração entre múltiplas e diferentes unidades organizacionais; pode, assim, levar a uma instabilidade nas estruturas de organização.
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Estrutura com base em projecto ou temporárias O artigo 28.º da Lei n.º 4 de 2004, de 15 de Janeiro, refere que a prossecução de missões temporárias que não possam, fundamentadamente, ser desenvolvidas pelos serviços existentes pode ser cometida a estruturas de missão, criadas por resolução do Conselho de Ministros. As estruturas de missão têm uma duração temporal limitada e objectivos contratualizados e dependem do apoio logístico da secretaria-geral ou de outro serviço executivo. A resolução do Conselho de Ministros deve estabelecer, obrigatoriamente: a) A designação da estrutura de missão; b) A identificação da missão; c) Os termos e a duração do mandato, com a definição clara dos objectivos a alcançarem; d) O estatuto do responsável e dos elementos que a compõem; e) O número de elementos que deve integrar a estrutura e respectivas funções; f ) Os encargos orçamentais e respectivo cabimento orçamental. As estruturas de missão devem recorrer essencialmente à requisição e ao destacamento de pessoal pertencente aos quadros dos serviços e organismos da Administração Pública. Em casos excepcionais, devidamente fundamentados, podem ser celebrados contratos individuais de trabalho a termo, os quais cessam automaticamente no termo do prazo do mandato. A estrutura de missão considera-se automaticamente extinta uma vez decorrido o prazo pelo qual foi constituída, sem prejuízo de o respectivo mandato poder ser prorrogado por resolução do Conselho de Ministros, que deve fundamentar tal decisão referindo, designadamente, o grau de cumprimento dos objectivos iniciais. Findo o prazo da missão, o responsável elabora relatório da actividade desenvolvida e dos resultados alcançados, a publicar no site do Ministério, após aprovação do membro do Governo competente Este tipo de estrutura tem origem na ideia do desenvolvimento de um projecto. O qual é entendido como um grupo de actividades que têm cada uma e no conjunto um termo temporal. A definição mais simples de projecto é qualquer coisa que tem um início e um fim. Um empreendimento complexo destinado á realização de tarefas criadoras de mudança; possui objectivos específicos com limitações de qualidade, custo e tempo; obriga o envolvimento de pessoas com origem em diferentes funções. As características das estruturas com base em projectos são: unidimensional, pois cada unidade da organização está voltada para o desenvolvimento de um único projecto, chefiada por um único gestor; a base da estrutura é o projecto, desenvolvido segundo especificações de clientes; objectivos e prazos bem definidos; prazo relativamente curto, sendo portanto uma estrutura temporária; a sua departamentalização interna é funcional, isto é, a equipa de projecto é dividida em várias unidades funcionais. Vantagens: unidade de direcção, voltada para o objectivo único, que é o desenvolvimento do projecto; desenvolvimento do espírito de corpo, através da iden129
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tificação com o projecto; comunicação informal, como uma fonte importante de integração; gestor controla todos os recursos de que necessita para desenvolver o seu projecto, tendo, assim, autoridade total. Desvantagens: não é bem aceite pela organização permanente, devido ao seu carácter temporário; os meios são duplicados, porque para cada projecto existe uma sub estrutura funcional; os recursos, consequentemente, são utilizados com menor eficiência; insegurança no emprego, quando do término do projecto, de carácter temporário; ao se afastar para o projecto, às vezes, o profissional pode perder o seu lugar na estrutura permanente. Estrutura Matricial O artigo 22.º da lei n.º 4 de 2004, de 15 de Janeiro, no que toca a estruturas matriciais refere que a estrutura matricial é adoptada sempre que as áreas operativas do serviço possam desenvolver-se essencialmente por projectos, devendo agrupar-se por centros de competências ou de produto bem identificados, visando assegurar a constituição de equipas multidisciplinares com base na mobilidade funcional. A constituição das equipas multidisciplinares e a designação das suas chefias, de entre efectivos do serviço, é da responsabilidade do respectivo dirigente máximo. O estatuto remuneratório dos chefes de equipa consta do diploma de criação do serviço por equiparação ao estatuto remuneratório fixado para os directores de serviço ou chefes de divisão, sendo a dotação máxima de chefes de equipa fixada por portaria do membro do Governo respectivo. De facto, a adopção da estrutura matricial 122 permite à organização as condições de flexibilidade e de funcionalidade adequadas para atender às mudanças na envolvente. A estrutura matricial é uma solução mista em que se combina a estrutura com base em função com a estrutura divisional ou de projectos. As características da estrutura matricial são: multidimensional, por utilizar as características de diversas modelos de estruturas; permanente, sendo temporários apenas os grupos de cada projecto; é adaptativa e flexível; tenta dar ênfase às vantagens e superar as desvantagens das estruturas por função, divisional ou por projecto; combina a estrutura hierárquica vertical com a horizontal de coordenadores de projectos Vantagens: equilíbrio de objectivos, pela atenção dispensada tanto às áreas funcionais quanto às coordenações dos projectos/produtos; visão dos objectivos dos projectos/produtos através das coordenações dos projectos/produtos; desenvolvimento de um forte e coeso trabalho de equipa e de equipas que se identifiquem com as metas dos projectos/produtos; elimina mão-de-obra ociosa, pois o 122
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profissional ou está trabalhando em algum projecto (s)/produto (s) ou está desenvolvendo suas tarefas no seu órgão funcional; elimina extensas cadeias hierárquicas, pela existência de comunicação entre projectos/produtos e funções, sem a exigência obrigatória de observância aos chamados “canais competentes”; o conhecimento especializado pode estar disponível para todos os projectos, em base igual; assim, o conhecimento e a experiência podem ser transferidos de um projecto para outro; a utilização de mão-de-obra pode ser flexível, porque mantém uma reserva de especialistas nas estruturas permanentes (funcional e de serviços). Desvantagens: subutilização de recursos, com o objectivo de se obter a cobertura completa de projectos/produtos, gerando insucesso na obtenção de certas economias de escala; insucesso na obtenção de coordenação de funções, no estabelecimento de padrões de eficiência e de uniformidade de prática entre os especialistas que não são mais controlados por um chefe único; insegurança entre os membros do projecto, porque as suas equipas são dispersadas após o término de um projecto; um indivíduo de posição intermediária trabalha para dois chefes: verticalmente prestando contas ao chefe do seu departamento funcional e, horizontalmente, reportando-se ao coordenador de projecto/produto; portanto, numa situação de conflito, ele pode ficar “prensado” no meio dos dois, o que é incómodo; muitas vezes, o gestor de projecto/produto entende que tem pouca autoridade quanto aos departamentos funcionais, enquanto os chefes destes departamentos julgam que o coordenador de projecto/produto está interferindo no seu território; não havendo um adequado relacionamento interpessoal entre os chefes de grupos funcionais e os gestores de projectos/produtos, pode haver conflito de autoridade. Funcionamento em rede O artigo 9.º da n.º 4 de 2004 refere que o modelo de funcionamento em rede deve ser adoptado quando estejam em causa funções do Estado cuja completa e eficiente prossecução dependa de mais de um serviço ou organismo, independentemente do seu carácter intra ou interministerial. Este modelo de funcionamento determina, em todos os casos, a integração ou disponibilização da informação de utilização comum ou pertinente em formato electrónico. O funcionamento em rede deve ser considerado quando da fixação da estrutura interna dos serviços envolvidos. Actividade 2 Conceba uma estrutura matricial para uma câmara municipal.
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8. SERVIÇOS PARTILHADOS Actualmente as funções de apoio ou de suporte ao contrário das missões operacionais tendem a ser concentradas e partilhadas. Por isso, importa dar a devida importância a uma forma de organização que tem, de acordo com a literatura produzido poupanças no sector privado na ordem dos 40%. No sector público e na sequência do PRACE, temos casos de (USP) como a Empresa de Gestão Partilhada de Recursos da Administração Pública (GeRAP), criada Decreto-Lei n.º 25/2007, de 7 de Fevereiro. Trata-se de uma entidade pública de cariz empresarial nos moldes previstos no regime do sector empresarial do Estado, a quem compete assegurar o desenvolvimento de serviços partilhados no âmbito da Administração Pública. O propósito essencial da GeRAP confessado pelo Governo no preâmbulo do diploma é instituir um modelo organizacional, integrado e coerente, dotado de flexibilidade de actuação, agilidade e capacidade de ajustamento rápidas e autonomia de gestão, sempre numa óptica de partilha de actividades comuns. O Governo com esta iniciativa acredita que será este um passo essencial para a reforma, a modernização e a racionalização da actividade administrativa e da gestão dos recursos públicos, esperando que, a prazo, os resultados da actividade da GeRAP possam vir a evidenciar volumes significativos de poupança anual, contribuindo para a necessária consolidação das contas públicas. Isto acontece porque em geral se acredita que com a criação de unidades de serviços partilhados se consegue: libertar os organismos de actividades de apoio para se focarem nos seus objectivos estratégicos; fornecer serviços centrados no cliente por uma unidade de negócios especializada; optimização dos investimentos tecnológicos; aumento de eficiência com economia de custos; melhoria contínua de processos e actividades; partilha de benefícios pelos diversos agentes. Importa, porém, salientar que os serviços partilhados dimanam da consolidação de processos administrativos não críticos para as organizações (sem prejuízo das respectivas competências e atribuições de gesta) numa outra entidade dedicada a proporcionar estes serviços. O modelo envolve a reengenharia de processos e padronização, suporte documental apoio técnico especializado numa unidade autónoma de serviços partilhados. Esta operação força a organização a focalizar-se estrategicamente na sua missão principal, enquanto a missão central da nova unidade de serviços partilhados será a provisão eficiente de serviços administrativos ao melhor custo, centrados no utilizador e na qualidade do serviço prestado. Para garantir que cumpre a sua missão, a unidade de serviços partilhados (USP) recomenda-se que passe por três níveis de exame: auto-avaliação: a (USP) analisa a sua própria actuação face aos níveis de serviço a que se compromete e 132
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promove planos globais para resolver as disfunções detectadas; demonstração: a (USP) evidencia as vantagens das suas soluções, serviços e tecnologias, face a casos concretos e promove planos específicos para resolver as disfunções detectadas; revisão independente: a (USP) é avaliado pela sua capacidade de resposta às necessidades dos clientes, incluindo o grau de cumprimento dos níveis de serviço contratados Esta mesma filosofia de partilha de serviços foi consagrada no artigo 8.º da Lei n.º 4/2004, de 15 de Janeiro, que estabelece os princípios e normas a que deve obedecer a organização da administração directa do Estado. Estabelece este artigo que “deve ser promovida a partilha de actividades comuns entre os serviços integrantes de um mesmo ministério ou de vários ministérios para optimização dos recursos. A partilha de actividades comuns não prejudica as competências próprias ou delegadas dos respectivos dirigentes máximos, podendo o seu funcionamento ser enquadrado por protocolos que estabelecerão as regras necessárias à clara actuação de cada uma das partes. Este modelo de funcionamento abrange especialmente actividades de natureza administrativa e logística, designadamente: a) Negociação e aquisições de bens e serviços; b) Sistemas de informação e comunicação; c) Gestão de edifícios; d) Serviços de segurança e de limpeza; e) Gestão da frota automóvel; f ) Processamento de vencimentos e contabilidade. No Ministério das Finanças a GERAP foi extinta e criada a nova entidade pública empresarial ESPAP com funções idênticas e mais alargadas, nomeadamente com as compras públicas pelo Decreto-Lei n.º 117-A/2012, de 14 de Junho. (Consultar www.espap.pt)
TESTE FORMATIVO 1. Quais são, segundo Peter Drucker, as variáveis a ter em conta no diagnóstico da estrutura organizacional? 2. O que é que representa o organograma organizacional? 3. Identifique as regras de acção que Lyndall F. Urwick recomenda que sejam seguidas na departamentalização. 4. O que é o princípio da unicidade do comando? 5. Caracterize a estrutura linear, militar, ou linha. 6. Caracterize a estrutura com base na função. 7. Identifique as características da estrutura matricial.
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RESPOSTAS
ÀS
ACTIVIDADES
E AO
TESTE FORMATIVO
1. Análise das actividades, das decisões e das relações. 2. Os órgãos da organização; as funções de cada órgão; as relações de interdependência entre órgãos; os níveis administrativos e a via hierárquica. 3. Objectivo; especialização; autoridade; responsabilidade; correspondência; definição dos deveres de cada função; alcance do controle; equilíbrio das diversas unidades e continuidade da organização. 4. Que ninguém deve reportar a mais que um chefe. Que toda a pessoa deve saber a quem reporta, e o chefe deve saber quais as pessoas que estão na sua dependência. 5. Possui direcção única; não valoriza a especialização; a chefia é fonte exclusiva de autoridade; as ordens seguem por via hierárquica; cada funcionário recebe ordens de um só chefe imediato. 6. É unidimensional; cada área dedica-se ao desenvolvimento de uma única função; baseada na especialização, mas em nível de função principal; objectivo permanente, exigindo uma envolvente estável; longo prazo, dado que mais voltada para a produção repetitiva em grandes quantidades. 7. É multidimensional, por utilizar as características de diversos modelos de estruturas; permanente, sendo temporários apenas os grupos de cada projecto; é adaptativa e flexível; tenta dar ênfase às vantagens e superar as desvantagens das estruturas por função, divisional ou por projecto; combina a estrutura hierárquica vertical com a horizontal de coordenadores de projectos
L EITURAS C OMPLEMENTARES AMARAL, Diogo Freitas – Curso de Direito Administrativo, vol. I. Coimbra: Almedina, 1993. BILHIM, João – Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2013. CAUPERS, João – A Administração Periférica do Estado. Lisboa: notícias, 1994. GOURNAY, Bernard – Introdução à Ciência Administrativa. Lisboa: Europa América, 1978. MINTZBERG, Henry – Estrutura e Dinâmica das Organizações. Lisboa: Dom Quixote, 1995. WALDO, D. – Problemas e Aspectos da Administração Pública. São Paulo: Pioneira, 1966.
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6. PLANEAMENTO E AVALIAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. Itinerário Teórico do Planeamento 2. Planeamento Central 3. Planeamento Regional 4. Planeamento Local 5. Planeamento Organizacional ou de Actividades 6. Planeamento e Gestão Estratégica 7. O Planeamento e Avaliação das Actividades na Administração Pública 8. Avaliação na Administração Pública Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a: • • • •
Relacionar os diversos tipos de planos; Distinguir as etapas do itinerário teórico do planeamento; Identificar os momentos mais importantes do planeamento em Portugal; Discutir a função do planeamento central; 135
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• • • • • •
Discutir a função do planeamento regional; Identificar o que é o planeamento local; Explicar a importância do planeamento e controle; Distinguir os diversos níveis do planeamento organizacional; Relacionar planeamento e gestão estratégica; Identificar os métodos de avaliação na administração pública.
1. ITINERÁRIO TEÓRICO
DO
PLANEAMENTO
O trabalho do administrador público tem sido encarado do ponto de vista formal como consistindo basicamente em planear, organizar, dirigir e controlar/ avaliar. Ora, se prestarmos atenção, verificaremos que, mal nos levantamos de manhã, já estamos a pensar nas actividades que faremos durante o dia, no horário, nos recursos necessários para realizar essas actividades, nas dificuldades que pode vir a encontrar e na forma de os superar. Quando pensamos antecipadamente no que faremos, estamos a fazer escolhas, opções sobre acontecimentos futuros, estamos portanto planeando. De entre as múltiplas definições de planeamento, reteremos a de R. L. Ackoff: “O planeamento consiste em conceber um futuro desejado, bem como os meios reais de lá chegar”. Por outras palavras, o planeamento é um processo formal destinado a produzir um resultado articulado, sob a forma de um sistema integrado de decisão. O planeamento é o processo de estabelecer antecipadamente a finalidade do governo ou de uma organização, escolher objectivos e prever as actividades e os recursos necessários para atingi-los. É a acção de determinar a finalidade e os objectivos da organização e prever as actividades, os recursos e os meios que permitirão atingi-los ao longo de um período de tempo determinado. A figura do plano surgiu nos primórdios deste século, nas experiências de socialismo de Estado (economias de direcção central, colectivizada) como instrumento privilegiado de coordenação da actividade económica, em alternativa aos mecanismos de mercado. O crescimento da intervenção do Estado na economia, porém, levou a que a maioria dos Estados viessem a dar grande importância ao planeamento, pelo menos em termos macroeconómicos, como instrumento de racionalização e coordenação da sua actividade e de redução da incerteza. Todavia, nas sociedades capitalistas, o planeamento não tinha pretensões substitutivas à coordenação da actividade económica pelo mercado, mas um
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carácter complementar deste. Nestas sociedades, a base da actividade económica continuava a assentar na liberdade de decisão dos agentes económicos. Nos anos setenta, ao mesmo tempo que começa a delinear-se a queda de importância do planeamento central ou nacional de tipo macroeconómico, ganha um grande impulso o planeamento ao nível do micro. Desde os anos noventa, mesmo este último parece estar a perder terreno 50. O plano que o general de Gaulle, antigo Presidente da França, considerava uma “ardente obrigação” tornou-se na agitação inútil das torres de marfim analíticas denunciadas por Peters e Waterman, na obra In Search of Excellence 51. Para que serve fixar-se, de maneira voluntariosa, objectivos estratégicos e comprometer os meios correspondentes se, cada vez com mais frequência, forem modificados devido à turbulência da envolvente e das políticas? A técnica dos planos deslizantes não chega para dar uma resposta satisfatória a este dilema. Assim, o planeamento conheceu uma dupla crise. A crise do plano, posto em causa pela turbulência da envolvente e pela recuperação do liberalismo. Será o laisser-faire das forças do mercado o melhor remédio, face aos desequilíbrios provocados pelo intervencionismo estatal e regulamentar? Na Europa, o plano foi vítima do seu sucesso. Ao prevalecer a rigidez do plano sobre a atenção ao cliente/utente da administração, valorizou-se o aspecto burocrático, ritualista do planeamento. Isto, em detrimento do exercício e do processo de concertação, que está subjacente ao acto de planear. Em nosso entender vale mais um processo de planeamento sem relatório final (plano) do que o inverso. A crise de planeamento que hoje se vive é, de igual modo, da corrente clássica. As correntes clássica e neoclássica privilegiam os valores frios e duros (razão, análise quantitativa, cálculo, previsão) e apoiam-se nos instrumentos de análise económica e de investigação operacional, cujos êxitos, abusos e, também, efeitos de moda encontram-se em declínio. O excesso de sofisticação estatística deu lugar ao bom-senso, sem que se tenha deixado de cair no lado oposto da corrente heurística, em que o pragmatismo se torna lei e em que só contam os valores quentes e moles do entusiasmo, do carisma e da vontade. Parece ter-se, assim, passado da busca da excelência, à força da paixão pela excelência, vindo a terminar na gestão do caos. A paixão e a razão constituem, conforme afirma Daniel Goleman 52 em Working with Emotional Intelligence, elementos do todo, de uma pessoa emocionalmente competente. Para se obter um desempenho de ponta em todas as funções e em todos os campos, a competência emocional tem o dobro da importância das capacidades puramente cognitivas. Em média, 90% do êxito dos bons líderes fica-se a dever à inteligência emocional. Os gestores de primeira grandeza mostram possuir uma 50 51 52
Henry Mintzberg – The Rise and Fall of Strategic Planning. San Francisco: Jossey-Bass, 1993. Peters e Waterman – In Search of Excellence. Londres: Harper & Row, Publishers, 1982. Daniel Goleman – Trabalhando com Inteligência Emocional. Rio de Janeiro: Objectiva, 1999.
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força significativamente maior nas competências emocionais, as quais são de destacar a influência, a liderança de equipas, a percepção política, a autoconfiança e a vontade de realização. A oposição entre razão e paixão é tão inútil e estéril como a oposição entre o lado direito e o lado esquerdo do cérebro. O espírito humano constitui um todo indissociável. Sem razão, a paixão é cega. Sem a paixão que anima o desejo e o projecto, a razão não leva a parte alguma. Depois deste percurso, cabe perguntar: será, ainda, o planeamento um processo actual? Que perspectivas terá no futuro? Está fora de causa repetir o tipo de planeamento que vingou até ao início dos anos setenta, particularmente nas décadas de 50 e 60. Apesar das limitações que todos reconhecem hoje ao planeamento, os administradores continuam a defendê-lo, devido sobretudo ao facto do Estado e das administrações necessitarem de: coordenar as suas actividades; assegurar que o futuro é tomado em consideração; serem racionais; controlar. Em Portugal, os Planos de Fomento do Estado Novo, com início em 1953, representaram a primeira experiência de planeamento formal, tendo estado na base da realização de importantes projectos de investimento. O I Plano de Fomento (1953-1958), e o II Plano de Fomento (1959-1964), eram planos parciais, na medida em que eram constituídos pela soma de programas sectoriais e de programas de grandes investimentos públicos. O I Plano é um plano de obras públicas que, contempla três aspectos: hidráulica agrícola; povoamento florestal e colonização interna conhecido mais tarde por reorganização agrária. O II Plano deixa de ser um plano de infra-estruturas, passando a ser um plano orientado para o crescimento económico. O Plano Intercalar (1965-1967), foi o primeiro concebido numa perspectiva mais global. Este plano continha já medidas no que respeita à indústria enquanto sector. Todavia, no que toca à agricultura, há quem afirme que o mesmo não apresentou qualquer avanço em relação aos dois planos anteriores. O III Plano de Fomento (1968-1973), e o IV Plano de Fomento, continuaram com uma parte importante de investimentos públicos. Eram seus objectivos principais o enquadramento dos investimentos privados e a manutenção de uma taxa de crescimento mínima. Devido à Revolução de 1974 este último plano não entrou em execução. O III Plano de Fomento aponta como principais objectivos: elevar a taxa de crescimento do PAB (produto agrícola bruto); melhorar a balança comercial agrícola e elevar o nível de vida das populações. Pode dizer-se que, nesta primeira fase do planeamento português, as organizações desempenhavam um papel passivo. O plano macroeconómico era mais um instrumento de política económica. De qualquer forma, os investimentos públicos e orientações sectoriais serviram para tornar mais claro o horizonte económico e permitir a algumas organizações uma decisão mais segura. 138
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Após 1974, surgiram: o Plano de Política Económica e Social (1975) e o Plano de Médio Prazo (1977-1980). Deste esforço, que funcionou como ensaio, resultou a lei de planeamento (Lei n.º 31/77) e legislação vária sobre o planeamento das organizações públicas. Assim, apesar do enquadramento constitucional de 1976, que atribuiu ao planeamento um papel fundamental na gestão da economia portuguesa, não existiram planos de médio prazo, existiram, apenas os planos anuais com o respectivo orçamento. A situação só se altera com a adesão de Portugal à CEE, em 1986. A partir desse momento, teve início a elaboração dos Planos de Desenvolvimento Regional (PDR), que são planos de médio prazo. Parece que a pressão financeira da CEE conseguiu aquilo que a Constituição da República Portuguesa (CRP) não tinha conseguido: obriga a Administração a uma efectiva prática de planeamento. Por outro lado, na sequência do Relatório da Comissão Técnica do Programa de Reestruturação da Administração Pública (PRACE) todos os ministérios passaram a dispor de uma direcção-geral com atribuições específicas de planeamento e avaliação 53 O PRACE teve como linha estratégica reforçar as funções estratégicas, estudo e avaliação/controlo de resultados de apoio à governação 54. No domínio do planeamento estratégico e avaliação o PRACE considerou essencial garantir um adequado apoio à definição de políticas sectoriais e a observação e monitorização contínuas dos respectivos efeitos, estabelecendo prioridades, definindo objectivos e metas estratégicas a atingir, alinhando orçamentos e a consequente programação financeira com essas prioridades e mantendo um adequado nível de acompanhamento e gestão activa da respectiva evolução operacional, nomeadamente através do acesso permanente a informação de gestão e indicadores de desempenho alinhados com a estratégia definida. A disponibilidade de informação e o seu tratamento analítico diferenciado desempenham um papel central na operacionalidade destas funções. Por isso foi considerado nessa medida que as mesmas deveriam integrar, na sua vertente de gestão e análise de informação, as actuais funções Estatísticas dos Ministérios. Procurou o PRACE garantir a existência em cada Ministério de um organismo exclusivamente dedicado à manutenção de um olhar estratégico permanente sobre os níveis de desempenho inerentes ao cumprimento de cada uma das suas Missões. A sua acção não deve esgotar-se na perspectiva do “observador atento”, pretendendo-se uma actuação mais pró-activa que influencie de forma consciente e determinante as diversas decisões e intervenções em presença, com vista a uma 53
A Resolução de Conselho de Ministros n.º 124/2005, de 04 de Agosto; Despacho Conjunto n.º 734/2005, publicado na II-S do DR, de 23 de Setembro. 54 http://www.min-financas.pt/inf–geral/default–PRACE.asp (11 de Dezembro de 2008).
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evolução permanente e optimizada dos níveis de eficiência, qualidade, eficácia do serviço público prestado pelo sector. Foi preconizada a criação, em cada Ministério, de uma estrutura específica para este efeito, cumprindo, entre outras, as seguintes atribuições: Dar apoio técnico em matéria de definição e estruturação das políticas, prioridades e objectivos do Ministério; Proceder à elaboração dos instrumentos de planeamento, benchmarking e análise da envolvente; Apoiar tecnicamente o Governo na elaboração de instrumentos de previsão orçamental, em articulação com os instrumentos de planeamento; Garantir a articulação das prioridades estratégicas em função do programa do Governo; Assegurar a coerência das prioridades políticas com os instrumentos de planeamento, orçamento e reporte; Definir os factores críticos de sucesso e os momentos de avaliação do desenvolvimento (execução) das políticas; Definir no plano técnico objectivos e indicadores estratégicos que indexem e objectivem os resultados pretendidos com as políticas ministeriais; Estimular e apoiar a definição de indicadores chave de performance (métricas) por parte dos diversos organismos/unidades internas, alinhados com os objectivos estratégicos do Ministério; Acompanhar em permanência o desenvolvimento das políticas/programas, mediante a utilização desses indicadores; Promover a identificação de riscos e desenvolver estratégias de gestão de riscos (planos de contingência); Possuir uma visão global e permanente sobre a actividade e desempenho dos organismos, ponderando recursos consumidos e resultados alcançados; Garantir uma comunicação adequada entre o membro do Governo, os dirigentes, os funcionários, os cidadãos em geral, formatando a informação em função dos públicos alvo, nas áreas das suas atribuições; Elaborar e divulgar guiões sobre o processo de planeamento, programação financeira e reporte; Contribuir para a elaboração de documentos estratégicos (Grandes opções do Plano; Relatório do O.E., etc.); Contribuir para a concepção e execução da política legislativa do Ministério.
2. PLANEAMENTO C ENTRAL A nível nacional, (central e sectorial) fica reconhecido um conjunto de circunstâncias que justificavam a existência do planeamento: a escassez de recursos a longo prazo, incluindo o ambiente; a procura crescente de consumo colectivo, ligado ao consumo e ao investimento públicos; a instabilidade da ordem económica internacional, que impõe a preparação de planos contingentes para responder a choques económicos ou sociais, e a constituição de reservas de recursos únicos não imitáveis; as imperfeições do mercado, que levam a que este introduza desvios, dada a sua miopia em termo de visão do futuro e a necessidade de uma eficiência dinâmica, ligada ao curto prazo. 140
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Actualmente, a CRP estipula que a elaboração dos Planos Nacionais de Desenvolvimento Económico e Social é da responsabilidade do Governo, devendo as Regiões Administrativas ser ouvidas e, competindo à Assembleia da República aprovar as grandes opções consagradas nos mesmos. O sistema de planeamento, incluindo a sua organização e processo de funcionamento são, actualmente, regidos em Portugal pela Lei n.º 43/91, de 27 de Julho, que veio revogar a Lei n.º 31/77, de 23 de Maio. Esta Lei prevê a existência de três níveis de planeamento: as grandes opções do plano; os planos anuais; os planos a médio prazo. O papel do planeamento central, de acordo com esta Lei deveria ser: a identificação das “grandes questões” que se colocam à sociedade, como por exemplo o envelhecimento da população e a competitividade; o lançamento de programas horizontais ou multisectoriais (como o do combate à droga); o planeamento do sector público em aspectos ligados à elaboração de orçamentos correntes plurianuais e à coordenação e avaliação de investimentos públicos. Tudo indica que o aumento da incerteza justifica e não dispensa o esforço de planeamento macroeconómico, enquanto instrumento fundamental de política económica. Não há, pois, contradição entre mercado e planeamento mas complementaridade, desde que ambos sejam bem entendidos. Assim, desde que os planos sejam mais valorizados pelo processo do que pelo produto, aceita-se que estes possuam funções de: racionalização da actuação da gestão e administração; informação, relacionada com a recolha e tratamento de grande massa de dados; comunicação e concertação estratégica com os agentes económicos e sociais, com a introdução das “grandes questões” nas suas actuações; análise dinâmica (relacionada com o estudo da situação e tendências de curto prazo); quantificação da estratégia e do desenho estratégico; programação do curto e médio prazo; programação de longo prazo, com vista a integrar esta perspectiva na acção governativa (por exemplo as políticas de longo prazo de I&D); articulação de instrumentos – planos regionais, locais e sectoriais –, destinada a evitar acções contraditórias e desarticuladas; assessoria técnica, a quem tem a obrigação de gerir e definir a estratégia; instrumentos de controlo. O Departamento de Prospectiva e Planeamento e Relações Internacionais, (DPP), – criado pelo Decreto Regulamentar n.º 51/2007 é o serviço central do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (MAOTDR), dotado de autonomia administrativa que tem a seu cargo o planeamento central. As competências do DPP apreendem dois eixos essenciais: de apoio técnico à formulação de políticas públicas, ao planeamento estratégico e operacional e ao acompanhamento do desenvolvimento económico, territorial e ambiental de Portugal sob a óptica integradora do desenvolvimento sustentável, e concertação interministerial das políticas transversais de ambiente, ordenamento do território 141
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e desenvolvimento regional ao nível comunitário e internacional, bem como dinamização e articulação da participação dos vários organismos do Ministério da tutela nas instâncias internacionais. O DPP prossegue as seguintes atribuições: a) Preparar cenários e trajectórias relativos à estratégia de desenvolvimento regional, integrando políticas sectoriais e espaciais, cooperando com os departamentos da Presidência do Conselho de Ministros, do Ministério das Finanças e da Administração Pública e do Ministério da Economia e Inovação e acompanhar o desenvolvimento económico, territorial e ambiental de Portugal sob a óptica integradora do desenvolvimento sustentável; b) Elaborar estudos e análises prospectivas sobre os factores de desenvolvimento, prosperidade e inovação de regiões, metrópoles e cidades em Portugal e no estrangeiro, com o objectivo de identificar orientações de política pública e elaborar estudos e análises técnicas que apoiem a monitorização e coordenação estratégica dos instrumentos de programação que enquadram a utilização dos fundos comunitários em Portugal, de forma a assegurar a melhor utilização desses instrumentos ao serviço dos objectivos de desenvolvimento nacional; c) Consolidar e desenvolver competências nas áreas das metodologias de prospectiva e cenarização, com especial enfoque no território e na articulação económico-ambiental, bem como em outras áreas de análise económica e social; d) Organizar acções de formação nas áreas da sua competência dirigidas a entidades públicas que delas possam beneficiar; e) Participar, de acordo com a solicitação da tutela, no processo de definição do enquadramento e da estratégia da política de investimento público, e integrar o planeamento de investimentos associado a programas sectoriais e verticais que os concretizem; f ) Proceder ao acompanhamento sistemático das prioridades estratégicas do MAOTDR, verificando a coerência destas com os respectivos instrumentos de planeamento e com o orçamento; g) Assegurar o desenvolvimento dos sistemas de avaliação dos serviços no âmbito do MAOTDR, coordenar e controlar a sua aplicação. A localização orgânica deste gabinete tem variado com as diferentes Leis Orgânicas dos governos. Todavia, no essencial as atribuições e competências mantêm-se.
3. PLANEAMENTO REGIONAL O principal objectivo do planeamento regional é contribuir para a definição correcta da política de desenvolvimento regional. Por desenvolvimento, entende-se o crescimento equilibrado do espaço nacional, facultando iguais oportunidades de acesso a bens e serviços a todos os cidadãos, independentemente do local onde nasceram, optaram por concretizar projectos de valorização pessoal ou viver. 142
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As actuais Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), têm desempenhado um papel fundamental nos processos de planeamento regional 55. Importa, pois, salientar aqui a evolução destes organismos. O Código Administrativo de 1936 atribui, parece que pela primeira vez, competência em matéria de planeamento à Junta de Província. Mais tarde, com a revisão do Código, em 1959, a província é substituída pelo distrito. Em 1965, com a elaboração do Plano Intercalar de Fomento, é apontada a necessidade de pôr em funcionamento a orgânica administrativa de planeamento regional. A primeira Comissão de Planeamento Regional (CPR) surge em 1971, no Norte do país. O Decreto-Lei n.º 46909, de 16 de Março de 1966, definiu a primeira estrutura de planeamento regional, orientada para a elaboração de estudos de base, articulando os serviços centrais de planeamento, os órgãos centrais dos ministérios e os interesses locais, e definido linhas de rumo para o desenvolvimento regional. Sob este quadro legislativo viveram as CPR no período em que se desenvolveram os Planos de Fomento, de 1971 à Revolução de 1974, tendo continuado, até à sua transformação em 1979, em Comissões de Coordenação Regional (CCR) –, Decreto-lei n.º 494/79, de 21 de Dezembro. As novas CCR passam a dispor de uma nova e estratégica função de apoio ao jovem poder local democrático e de duas linhas de actuação estratégica. Nas áreas dos estudos e programação, para o apoio ao planeamento regional. No apoio às autarquias locais, de acordo com as novas competências Entretanto houve necessidade de actualizar a aprofundar as missões e atribuições destas Comissões em especial em matéria de desenvolvimento. Razão por que as CCR passaram a designar-se Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) pelo Decreto-Lei n.º 134/2007, de 27/04/2007. Nos termos do Decreto-Lei n.º 228/2012, de 25 de outubro, as CCDR, são dotadas de autonomia administrativa e constituem serviços periféricos da administração direta do Estado, no âmbito da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional. Em Portugal existem as seguintes Comissões: a) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR Norte), com sede no Porto; b) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDR Centro), com sede em Coimbra; c) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR LVT), com sede em Lisboa;
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Costa Lobo – Regionalização ou Reforma Administrativa Regionalizada? Lisboa: Cesur, 1998.
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d) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo (CCDR Alentejo), com sede em Évora; e) Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve (CCDR Algarve), com sede em Faro. As CCDR têm por missão executar as políticas de ambiente, de ordenamento do território e cidades e de desenvolvimento regional, ao nível das suas respetivas áreas geográficas de atuação, e apoiar tecnicamente as autarquias locais e as suas associações. As CCDR, na esteira das anteriores CCR estão encarregadas de dar corpo aos Planos Regionais. Os conteúdos do PDR – 1986-89, PDR (1989-94 e do PDR -1994-1999, correspondem à definição de estratégias de desenvolvimento económico e social. Para além disso, existe uma cuidadosa programação financeira e uma definição do enquadramento institucional de execução e acompanhamento dos planos. O carácter obrigatório do PDR como instrumento de negociação e obtenção de fundos estruturais, sobrevaloriza a rapidez da preparação e da obtenção dos documentos (produtos), em detrimento da concertação (processo). Neste ponto, o Conselho Económico e Social, nos termos da Lei-quadro do Planeamento a que fizemos referência, tem um papel fundamental a desempenhar. Por outro lado, importa realçar a necessidade de reforçar a articulação do PDR com os planos anual e de médio prazo. É de salientar também, que a política de desenvolvimento da União Europeia, com realce para a construção do Mercado Único, atribui um papel relevante ao planeamento, traduzido nos PDR. Os planos regionais de ordenamento do território (PROT) (Lei n.º 48/1998, DL 380/1999, DL 310/2003) definem a estratégia regional de desenvolvimento territorial, integrando as opções estabelecidas ao nível nacional e considerando as estratégias municipais de desenvolvimento local, constituindo o quadro de referência para a elaboração dos planos municipais de ordenamento do território. Além de serem um pilar da política de desenvolvimento territorial, os PROT são documentos fundamentais para a definição dos programas de acção a integrar no próximo período de programação das intervenções co-financiadas pelos Fundos Estruturais e de Coesão da União Europeia, concretamente no QREN – Quadro de Referência Estratégica Nacional entre 2007 e 2013. As competências relativas aos planos regionais de ordenamento do território são exercidas pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional. O novo pacote de fundos europeus, que vem substituir o antigo QREN – Quadro de Referência Estratégica Nacional é o “Portugal 2020”. Os primeiros fundos comunitários entram no segundo semestre de 2014, prolongando-se até 2020. 144
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O enfoque deste programa de apoio comunitário é o estímulo da economia com vista à criação de emprego e riqueza, assim como combater assimetrias no desenvolvimento do território nacional. Ajudar os empresários a tornar as empresas mais competitivas, apostar na formação dirigida às necessidades das empresas e orientar o tecido empresarial para os mercados externos são pilares da estratégia delineada para o programa cofinanciado pela União Europeia. A grande alteração que o “Portugal 2020” regista é o decréscimo de investimento em infraestruturas e o consequente reforço do investimento na economia. Outra novidade é a criação de um programa operacional temático dirigido à inclusão social, que complementará os programas de competitividade, capital humano e inovação, que transitaram do QREN.
4. PLANEAMENTO L OCAL O Decreto-lei n.º 208/82, de 26 de Maio, instituiu a figura obrigatória de elaboração de um Plano Director Municipal (PDM). O PDM define as metas a alcançar pelo município nos domínios do desenvolvimento económico e social nas suas relações com o ordenamento do território. O PDM é, pois, um instrumento de: • planeamento de ocupação, uso e transformação do território do município, pelas diferentes componentes sectoriais da actividade nele desenvolvida; • programação das realizações e investimentos municipais. Respeitando as normas urbanísticas existentes, o PDM constitui um meio de coordenação dos programas municipais, com os projectos de incidência local dos departamentos da administração central e regional. Articula ainda com os planos ou estudos de carácter nacional e regional. O Decreto-Lei n.º 69/90, de 2 de Março, revogou o anterior e estabeleceu que os planos municipais compreendem: • os planos directores municipais (PDM) que abrangem todo o território municipal; • os planos de urbanização que abrangem áreas urbanas e urbanizáveis (podendo também abranger áreas não urbanizáveis intermédias ou envolventes daquelas); • os planos de pormenor, que tratam, com detalhe, as áreas referidas nos dois planos acabados de referir. 145
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Além destes há ainda a considerar, os planos de salvaguarda e valorização das zonas de protecção de imóveis ou conjuntos classificados, previstos na Lei n.º 13/85, de 6 de Julho. Os planos municipais têm a natureza jurídica de regulamento administrativo. Este carácter regulamentar tem sido objecto de polémica, dado a sua natureza unilateral a favor da Administração e, devido ao seu pendor imperativo e não indicativo, que não permite uma necessária flexibilidade 56. A elaboração dos planos municipais compete às Câmaras municipais; a aprovação compete às Assembleias Municipais; a ratificação ao Governo. Na elaboração de um plano director municipal é obrigatório a constituição de uma comissão técnica integrada por representantes da comissão de coordenação e desenvolvimento regional, que preside, da Direcção-Geral do Ordenamento do Território, da delegação regional do Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e de outros serviços cuja participação seja aconselhada no âmbito do plano. Após a publicação do Decreto-Lei n.º 69/90, de 2 de Março e respetivas alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 211/92, de 8 de Outubro, foi o PDM aperfeiçoado através do Decreto-Lei n.º155/97 de 24 de Junho. Com estas alterações pretendeu-se tornar mais operacional a aplicação do diploma, designadamente com a previsão de dois tipos de alteração aos planos, uma de âmbito limitado e outra de pormenor, esta última com um processo mais simplificado, apenas sujeita a registo e publicação. Pode-se afirmar, em síntese que o PDM 57: O plano director municipal estabelece uma estrutura espacial para o território do município, a classificação dos solos, os perímetros urbanos e os indicadores urbanísticos, tendo em conta os objectivos de desenvolvimento, a distribuição racional das actividades económicas, as carências habitacionais, os equipamentos, as redes de transportes e de comunicações e as infra-estruturas. O plano de urbanização define uma organização para o meio urbano. Designadamente, ao estabelecer o perímetro urbano, a concepção geral da forma urbana, os parâmetros urbanísticos, o destino das construções, os valores patrimoniais a proteger, os locais destinados à instalação de equipamentos, os espaços livres e o traçado esquemático da rede viária e das infra-estruturas principais; O plano de pormenor define, com minúcia, a tipologia de ocupação de qualquer área específica do município, estabelecendo no caso de área urbana a concepção do espaço urbano, dispondo, designadamente, sobre usos do solo e 56 Associação Portuguesa de Direito do Urbanismo – A Execução dos Planos Directores Municipais. Coimbra: Almedina, 1998. 57 Consultar o Decreto-lei, n.º Decreto-Lei n.º 211/92, de 8 de Outubro.
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condições gerais de edificação, quer para novas edificações, quer para transformação das edificações existentes, caracterização das fachadas dos edifícios e arranjos dos espaços livres. Actividade 1 Consulte a Constituição da República Portuguesa (CRP) e identifique dois artigos importantes sobre o papel do planeamento.
5. PLANEAMENTO ORGANIZACIONAL
OU DE
ACTIVIDADES
O planeamento organizacional envolve a selecção de cursos de acção para a organização como um todo, para os seus departamentos ou secções e, bem assim, a escolha de objectivos organizacionais e departamentais e os modos de os realizar. A primeira finalidade do plano é, pois, facilitar a realização dos fins e objectivos da organização. Só depois de estabelecido o plano é que sabemos que estruturação é necessária. O planeamento precede, assim, as restantes funções organizacionais, e necessita do apoio de todas elas, especialmente da função de controlo. Planeamento e controlo são, como se costuma dizer, irmãos siameses. Não se podem controlar acções não planeadas e os próprios planos devem fornecer os padrões do controlo. Se os planos dizem onde devemos ir, o controlo permite-nos saber se estamos a ir no rumo certo. O planeamento respeita aos gestores de todos os níveis, embora as suas características variem de nível para nível. Um plano pode contribuir para a realização de objectivos a custos elevados ou desnecessários. Interessa, assim, elaborar planos que sejam eficientes. A sua eficiência não se mede apenas em termos de relação para os factores utilizados, mas também em termos da satisfação dos indivíduos e grupos neles envolvidos 58. O planeamento deve partir de uma concepção estratégica, a qual resulta de se transpor para a organização o conceito militar de estratégia, e de lhe atribuir o significado conveniente. A estratégia militar respeita aos planos elaborados pelo general comandante das forças armadas, assistido pelo seu estado-maior, com o objectivo de vencer a guerra. A palavra estratégia deriva do grego strategos, que significa general ou a 58
Fernando Tenório – Gestão das ONGs, 2.ª edição. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1998, 27-
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pessoa que dirige as forças militares n a guerra. Numa situação de conflito, procura-se dispor de informação sobre a situação do inimigo, as suas intenções, forças e fraquezas, para se escolher a acção mais apropriada. Na organização, o termo estratégia tem a ver com a reflexão desencadeada pela gestão cimeira, sobre as respostas a dar às seguintes questões: • • • • •
Qual a nossa missão? Quais dos nossos concorrentes, as forças e as fraquezas? Quais as nossas forças e as nossas fraquezas? Como devemos utilizar as nossas forças e os nossos recursos? Quais as mudanças que estão a ocorrer na envolvente e de que modo afectam a nossa organização?
O planeamento organizacional situa-se a três níveis: estratégico, táctico e operacional. O planeamento estratégico ou institucional respeita ao processo de desenvolver planos de acção, face às alterações da procura, concorrência, tecnologia e outras forças relevantes. Não se reduz à mera formulação de cursos de acção, pois introduz, também, no processo de planeamento, a reflexão estratégica. Concebido a longo prazo, o planeamento estratégico envolve a organização como um todo. É projectado para o exterior, para o exame cuidadoso da envolvente, que se está a tornar cada vez mais turbulenta. O planeamento é feito a nível cimeiro e com o apoio dos outros tipos de planeamento. O planeamento táctico ou de gestão respeita à tomada de decisões relativas a áreas menos amplas da organização, a empreendimentos mais limitados, a prazos mais curtos, e a níveis baixos de hierarquia da gestão (geralmente o nível intermédio). No nível táctico são tomadas decisões específicas sobre cada parte da organização, como produção, finanças, recursos humanos, património, cabendo a cada responsável estabelecer objectivos, metas e recursos. O planeamento operacional ou de execução responde ao que fazer e a como fazer e caracteriza-se pelo pormenor como fixa as tarefas e as operações. Com carácter imediato, envolve o estabelecimento de numerosos planos operacionais. Neste nível de planeamento são resolvidos os problemas do dia-a-dia e especificados detalhes sobre a melhor forma de realizar o trabalho 59.
59
Vários – Estratégia e Planeamento na Gestão e Administração Pública. Lisboa: ISCSP, 1995.
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Enquanto processo, o planeamento segue os seguintes passos: fixação de objectivos; auditoria externa; auditoria interna; avaliação estratégica; operacionalização da estratégia; fixação do calendário. O ponto de partida do planeamento é a consciência de existir uma oportunidade. O segundo passo é estabelecer objectivos para a organização como um todo e para cada uma das subunidades, especificando-os e aos resultados esperados. Deve também indicar os pontos terminais do que deve ser feito, a ênfase a colocar em cada aspecto e o que se espera da rede de estratégias, políticas, procedimentos, regras, orçamentos e programas. Os objectivos da organização orientam os planos principais que definem os objectivos dos maiores departamentos. Estes, por seu lado, controlam os objectivos dos departamentos subordinados. O terceiro passo é estabelecer e obter acordo para disseminar as premissas críticas de planeamento. Estes são dados de previsão de natureza factual, políticas basilares aplicáveis, e planos da organização já existentes. Mais propriamente, as premissas são as hipóteses de planeamento que incluem o ambiente esperado da organização e o seu clima organizacional. Importa que as pessoas encarregadas do planeamento compreendam e concordem em utilizar premissas coerentes. Outro aspecto fundamental no estabelecimento das premissas é a previsão das espécies de mercados em que nos situaremos. Há que prever o volume de vendas, os preços que vigorarão, os produtos escolhidos, os desenvolvimentos técnicos, os custos, as taxas salariais, os impostos e suas políticas, as novas instalações, as políticas de dividendos e as financeiras e as perspectivas do ambiente social e político. O quarto passo é congeminar vias alternativas de acção para encontrar as mais promissoras, especialmente as que não são imediatamente aparentes. Raras vezes haverá um plano para o qual não existam alternativas razoáveis de acção e, com frequência, a alternativa menos óbvia pode ser a mais recomendável. As alternativas são, posteriormente, ponderadas no exame dos seus pontos fortes e fracos, o que reduz as vias de acção com hipótese de poderem ser seleccionadas. O quinto passo é avaliar estas últimas alternativas, tarefa que pode ser muito complexa, se for grande o número de cursos de acção alternativos e de variáveis e limitações envolvidas. O sexto passo consiste em seleccionar o curso de acção julgado mais apropriado. Por vezes, a escolha não recai sobre um único curso de acção, seleccionando-se dois ou mais. O sétimo passo é a formulação de planos derivados para apoio do plano básico que foi escolhido. Finalmente, o oitavo passo consiste em quantificar o plano ou planos seleccionados, convertendo-os em orçamentos. 149
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De forma sintética, apresenta-se abaixo o modelo de processo de planeamento proposto para uma autarquia local: Processo de Planeamento FASE 2
FASE 3
FASE 4
Conduzir Diagnóstico da Envolvente
Conduzir Diagnóstico Interno
Desenvolver “Mission statements”
FASE 1 Desenho de Programa
Determinar Direcções Estratégicas
Desenvolver Fins e Objectivos
Determinar Capacidades Organizacionais
FASE 5
FASE 6
Implementação do programa
Monitorização e Avaliação
Desenvolvimento do Plano de Acção
O planeamento, como resulta dos passos anteriores, é uma mera contribuição racional para a realização de um objectivo. Os planos devem ser estabelecidos para um horizonte de planeamento variável, de acordo com as circunstâncias e os assuntos. Podemos, pois, planear para uma semana e ou para vários anos. A duração do período deve ser fixada de acordo com o princípio do compromisso commitment principle, que estabelece o seguinte: O planeamento lógico pressupõe um período de tempo futuro necessário para prever, tanto quanto possível, o preenchimento dos compromissos relacionados com as decisões tomadas. Como aplicação mais expressiva deste princípio há que referir o estabelecimento de um período de planeamento, suficientemente longo, para antecipar a recuperação dos custos despendidos com um determinado curso de acção.
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O princípio do compromisso implica que o planeamento a longo prazo não é, realmente, um planeamento para decisões futuras, mas sim, para determinar o impacto futuro das decisões de hoje. A aplicação do princípio do compromisso na aviação, por exemplo, de um novo jacto comercial, pode exigir um período de planeamento de doze anos. Cinco ou seis anos serão despendidos na concepção, engenharia e desenvolvimento, enquanto os restantes são necessários para a produção e vendas e para recuperar custos e obter lucros razoáveis. Noutro caso, seja a produção de um instrumento, a aplicação do princípio do compromisso pode apenas exigir um a seis meses, tempo suficiente para se planear rendimentos e despesas. Esse pode ser o período necessário para adquirir a matéria-prima, produzir e vender. No entanto, se se tratasse do lançamento de um novo produto, tal período teria de ser alargado, dadas as necessidades de preparação do pessoal e do desenvolvimento e promoção do novo produto 60. As situações, que acabámos de apresentar, revelam que podem existir diferentes tempos de planeamento para o mesmo caso, dependendo da natureza do compromisso envolvido. Esta circunstância mostra, ainda, que faz pouco sentido referir os planeamentos de curto prazo, de médio prazo e de longo prazo, como processos essencialmente diferentes. O que as organizações hoje vão fazendo, é um planeamento compreensivo em natureza e orientado para o planeamento estratégico. Tem, assim, pouco sentido, como por vezes se estabelece entre nós, atribuir ao planeamento de curto prazo, o período de um ano, ao de médio prazo quatro anos, e ao de longo prazo, um período que pode ir de quatro aos vinte anos. O princípio do compromisso deve ser conciliado com a necessidade dos planos serem flexíveis, isto é, poderem ser alterados para contemplar exigências futuras que não foram, ou não poderiam ter sido, previstas. A flexibilidade dos planos pode permitir que o seu período seja mais curto, o que não ocorreria com planos rígidos. A flexibilidade é ideal porque há sempre incertezas e possíveis erros. É claro que as alterações dos planos têm os seus custos, que devem ser ponderados face aos riscos envolvidos no compromisso feito no futuro. Surge, assim, um novo princípio, o princípio da flexibilidade que estabelece o seguinte: Quanto maior flexibilidade existir na construção dos planos, menor é o perigo das perdas provocadas por inesperados acontecimentos, se bem que seja sempre de ponderar o custo dessa flexibilidade. Para muitos gestores, a flexibilidade é o princípio de planeamento mais importante. Tem grande valor poder-se mudar um plano sem exagerado custo ou fricção, rumar em direcção a outro objectivo, devido a alterações do ambiente ou a falhas desse plano. É claro que a flexibilidade se torna crítica, quando a obrigação é grande e, a curto prazo, não pode ser ultrapassada. 60
Vários – Estratégia e Planeamento na Gestão e Administração Pública. Lisboa: ISCSP, 1995.
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Mas a flexibilidade só é possível dentro de certos limites. A introdução da flexibilidade nos planos pode ser dispendiosa, arriscando-nos a que os benefícios não cubram os custos. É o caso de uma organização pretender alterar uma fábrica, originalmente estabelecida para fim específico, de modo a que possa servir para outros fins, por se vir a reconhecer que o programa inicial não tem êxito. Em tal situação, tudo depende dos custos, face aos riscos a evitar. Há, também, casos em que a flexibilidade não pode ser praticada. Por exemplo, no caso de uma máquina para fabricar ou embalar um determinado produto e que não serve para outros propósitos. Um outro princípio, a observar para a fixação do período de planeamento, tem a ver com a revisão regular dos planos, e designa-se por princípio da mudança da navegação, a qual se formula do seguinte modo: Quanto mais as decisões de planeamento nos comprometem no futuro, mais importante é que se comprovem, periodicamente, os acontecimentos e as expectativas, e reformulem os planos de modo a manter-se o rumo do objectivo desejado. Este princípio aplica-se à flexibilidade no processo de planeamento. Os gestores, como os navegadores, devem comprovar o rumo que estão a seguir e corrigi-lo, se necessário. Finalmente, nestas considerações sobre o período de planeamento, importa referir a necessidade de coordenação dos planos de curto prazo com os de longo prazo. Não devemos tomar decisões, no imediato, sem analisarmos as suas repercussões longínquas. Se uma organização, por exemplo, aceita uma larga encomenda sem reconhecer o efeito que irá produzir na sua capacidade produtiva, ou na sua situação de caixa, isso pode dificultar a futura capacidade de financiar uma expansão ordenada ou até requerer uma complexa reorientação do seu programa de longo prazo.
6. PLANEAMENTO
E
GESTÃO
ESTRATÉGICA
É no sentido pró-activo do relacionamento da organização com a sua envolvente contextual e necessariamente transaccional, que queremos enquadrar o que se designa por planeamento estratégico. Encaramo-lo aqui como a actividade central do órgão da organização que corporiza o seu subsistema institucional. O planeamento estratégico é um processo de tomada antecipada de decisões, com vista a que a organização venha a atingir um estado futuro mais desejável 61.
61
Gerald, Kissler, et al. – State Strategic Planning: Sugestions from Oregon Experience. Public Administration Review, Vol. 58, n.º 4, 1998, 353-359.
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Vejamos os elementos que se afiguram cruciais, numa definição como a que acabamos de avançar: a) O planeamento estratégico é um processo, no sentido de que é uma actividade que continua e que visa pensar o futuro com o objectivo de co-produzi-lo. Isto é, visa adaptar a organização à evolução da envolvente, mas igualmente situá-la face a esta, logo, alterando o que seria o seu futuro, caso a organização adoptasse uma postura estática ou meramente adaptativa. b) O planeamento estratégico é um processo de tomada antecipada de decisões que se traduz na definição apriorística do que irá ser a actuação da organização face ao exterior, no futuro, e de como irá actuar, hoje, para que esse futuro venha a concretizar-se. c) O planeamento estratégico é um processo de tomada antecipada de decisões com vista a que a organização venha a atingir um estado futuro mais desejado. A organização tem de começar por ser capaz de formular aonde quer chegar, qual o seu posicionamento face ao exterior, e só então, tendo presente este objectivo, irá desenvolver todo o processo de planeamento. Temos, pois, que distinguir planeamento de previsão, e planeamento de plano. Planear não é prever Prever consiste em extrapolar o passado, em ver antes qual a evolução das variáveis em presença, admitindo que a estrutura de relacionamento se mantém e que não há modificações resultantes de factores externos ao sistema, cujo futuro está a ser analisado – previsto. Pelo contrário, planear é definir as acções necessárias para co-produzir um futuro que, à partida, formulamos como desejado (aquele que a organização gostaria que se viesse a concretizar). Em termos práticos, prever não é mais do que formular qual o futuro que viria a ter lugar se todas as tendências de evolução detectadas no presente, e com base em acontecimentos passados, se mantivessem durante o tempo considerado. Pelo contrário, planear é tentar alterar esse futuro previsível, com base em actuações conducentes a evitar que o futuro real não seja o previsível mas sim o desejável. Planear não é produzir planos Um plano não é mais que um documento que resulta de um esforço de planeamento. Porém, esse esforço é intrinsecamente contínuo. Não só varia a envol153
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vente, como a própria organização e mesmo os seus objectivos. Assim, produzir planos não é a finalidade do planeamento, mas sim o seu produto, num dado momento do tempo. É afinal, se quisermos, um corte sincrónico no processo de planeamento 62. O planeamento estratégico é, pois, um processo através do qual a organização, e nesta o subsistema institucional, se monitoriza constantemente a si e à envolvente a fim de, tendo presente os objectivos traduzidos num estado futuro desejável, equacionar as acções tendentes a facilitar a transição do presente para esse futuro. Claro está, que o planeamento estratégico não se circunscreve apenas ao subsistema institucional. Neste nível, é coordenado, tendo em conta os inputs de informação resultantes da actividade negocial constante do nível de gestão, e as necessidades do aparelho produtivo (gerido no âmbito do subsistema operacional). É neste sentido, que é usual definir três níveis no planeamento estratégico, em que as questões a decidir – a estratégia –, têm objectos diferentes: a) A nível da organização como um todo (nível institucional) a questão essencial reside em saber que negócio, actividades, se deve esta envolver. Está em causa a própria actividade da organização. b) A nível de cada negócio, actividade (nível de gestão), a questão essencial é como competir, como posicionar a organização face à envolvente transaccional, a fim de ganhar ou criar vantagens comparativas. c) A nível funcional (nível operacional), a questão essencial é como maximizar a produtividade dos recursos disponíveis, para competir eficientemente nos domínios em que a organização pretende estar. Temos, pois, que o planeamento estratégico é algo que envolve toda a organização, embora com preocupações distintas. Isto é, fazendo face a questões de âmbito diferente, conforme o nível ou subsistema em que nos coloquemos. Planeamento interactivo O planeamento interactivo é o resultado da conceptualização levada a cabo durante uma década (desde meados dos anos 70), por uma equipa da Wharton School, liderada por Russel Ackoff. Pretendeu-se, a partir da concepção sistemática da organização, e do conceito básico de que as organizações são sistemas que geram objectivos próprios, desenvolver uma abordagem ao processo de pensar o 62
João Bilhim – Estrategas e Planeadores na Administração Pública. In Estratégia e Planeamento na Gestão e Administração Pública. Lisboa: ISCSP, 1995, 197-212.
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seu futuro na organização, ou seja, elaborar o seu processo de planeamento estratégico. Com base nesta concepção, a ideia básica do planeamento interactivo é a de que a organização é capaz de conceber um futuro desejado e, em seguida, inventar os meios que o façam acontecer. Procura-se um controle sobre o próprio futuro é participar na construção do próprio futuro. Em suma, Ackoff 63 distingue, claramente, esta postura face ao planeamento de outras, que têm sido dominantes: a) Planeamento reactivo – quem assume esta postura considera que, no passado, a organização atingiu o seu estado ideal, pelo que o objectivo é voltar a reconstruir esse passado, ainda que mítico. A ideia base é evitar as ameaças e livrarmo-nos das alterações que entretanto aconteceram, e que são vistas como indesejáveis. O planeador reactivo procura fazer bem, satisfazer para permitir a sobrevivência da organização. b) Planeamento preactivo – é a postura que as técnicas de gestão, nomeadamente as quantitativas, vieram tornar moda. Baseia-se na tentativa de previsão do futuro e preparação para ele. Assume que o futuro que prevemos virá a acontecer, pelo que tudo que há a fazer é optimizar a adaptação da organização à previsão feita. A ideia base é explorar oportunidades. O planeador preactivo tenta fazer tão bem quanto possível, para optimizar e permitir o crescimento organizacional c) Planeamento interactivo – aqui, o objectivo fundamental é evitar ou controlar a mudança ou os seus efeitos, respondendo de forma rápida às mudanças que não podem ser evitadas. A ideia base é aproveitar as oportunidades e evitar as ameaças. O planeador interactivo esforça-se por fazer, no futuro, mais e melhor do que faz actualmente, tendo em vista o desenvolvimento organizacional. Uma organização desenvolve-se quando vai ao encontro da satisfação das necessidades dos seus multinteressados (stakeholders) – fornecedores, clientes, empregados, accionistas etc. Um exemplo, pode elucidar, mais claramente, o essencial da forma como estas posturas se traduzem em termo de planear a solução de um problema. Imaginemos uma região a ser atingida por um processo de desertificação dos solos, e vejamos as soluções típicas que seriam assumidas pelos responsáveis que adoptassem cada uma das quatro posturas. Do ponto de vista reactivo – o objectivo será recuperar o terreno perdido, desertificado, de forma a voltar ao tempo em que era utilizável em termos agrí63
Russel l. Ackoff – Ackoff’s Best. New York: John Wiley & Sons, Inc., 1999, pp. 97-128.
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colas. A mudança detectada, considerada indesejável, é a falta de chuva, pelo que a solução proposta seria irrigar a zona anteriormente agrícola, a fim de reconstituí-la com base na inversão da causa agora ausente – a água. Do ponto de vista preactivo – começar-se-ia por prever a desertificação para os próximos anos e onde se deveria investir em termos agrícolas, a fim de não ser atingido pela normal evolução do processo, durante o período em análise. O objectivo seria adaptarmo-nos à evolução prevista, a fim de se conseguir os melhores resultados possíveis no que fosse restando de terreno agrícola. Do ponto de vista interactivo – o objectivo seria tentar descobrir as causas de desertificação e em seguida, tentar inventar a forma de invertê-las, de maneira a erradicar o processo. Não há a ideia de reconstruir o passado, manter o presente, ou adaptar ao futuro, mas sim a de refazer o futuro, tornando-nos elemento participante na reconstrução. Princípios operacionais O planeamento interactivo baseia-se em três princípios operacionais 64: participação; continuidade; concepção holística. a) Participação – o produto mais importante deste planeamento é o seu próprio processo de elaboração. Esta afirmação traduz, claramente, a ideia essencial, de que o planeamento interactivo se baseia no esforço conjunto a que obriga as pessoas na organização. Pretende-se que, na organização, as pessoas pensem o futuro em conjunto, e se habituem a considerá-lo não como um dado a prever, mas como algo a criar. Neste sentido, diz-se que ninguém pode planear por outrem. Logo, o papel dos especialistas ou do tradicional departamento de planeamento nas organizações, não pode ser planear. Compete-lhe tão-só, providenciar informação, conhecimentos técnicos, compreensão e também motivação e imaginação necessários, a todos, a fim de que cada um se integre na organização na filosofia do processo de planeamento. b) Continuidade – o processo de planeamento é contínuo, não se traduz num esforço sincopado, periódico, que termina com a elaboração de um documento – o plano. Pelo contrário, exige um esforço constante de monitorização da realidade, repensar dos objectivos, e criatividade no desenvolvimento dos meios para os atingir. De acordo com este princípio o planeamento é baseado num vasto número de pressupostos, princípios que são tidos como indiscutíveis e válidos dentro da organização. Os pressupostos são diferentes das previsões. Por exemplo, nós temos na viatura um pneu suplente por partirmos do princípio de que podemos ter um furo, não o fazemos por prever ter um furo. 64
Russel l. Ackoff – Ackoff’s Best. New York: John Wiley & Sons, Inc., 1999, p. 111-113.
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Estes pressupostos podem e mudam ao longo do tempo. Por isso, há que monitorizar esta mudança, para que a organização melhor se adapte á envolvente e melhor satisfaça as necessidades dos seus stakeholders. c) Concepção holística – o planeamento interactivo só é possível para a globalidade do sistema, e não faz sentido aplicar esta concepção a partes ou sectores da organização. O que está em causa é o futuro do sistema, que não depende do agregado dos futuros das partes, pelo que não são possíveis esforços paralelos de planeamento. Nesta concepção há que salientar o princípio da coordenação e o princípio da integração. No que diz respeito ao primeiro, isto é, ao princípio da coordenação, assume-se que todas as partes da organização do mesmo nível devem ser planeadas simultaneamente e de forma interdependente. Isto fica-se a dever ao facto das ameaças e das oportunidades raramente se localizarem nas zonas onde o sintoma se manifesta. Por exemplo, a redução de custos de produção pode exigir que o produto tenha de ser novamente desenhado ou que sejam introduzidas mudanças no mix das vendas. Além disso, uma alteração nas vendas pode exigir uma mudança no sistema de remuneração da força de vendas. No planeamento a extensão pode ser mais importante do que a profundidade e a interacção mais que a acção. Quanto ao princípio da integração das partes no todo, dentro do conceito sistemático de que salienta-se: o comportamento de cada parte afecta o todo; o comportamento das partes e os seus efeitos são independentes; quaisquer que sejam os subgrupos que se formem dentro de um sistema, cada um tem efeito no comportamento do todo, e nenhum tem um efeito independente. Quando os princípios da coordenação e da integração se combinam obtém-se o princípio holístico ou do todo. O sistema tem propriedades que as partes não possuem. Logo, se o objectivo do esforço de planeamento é co-produzir um futuro desejado para o sistema, só faz sentido se o esforço abranger e integrar todas as partes da organização. Temos, assim, que as cinco fases essenciais do processo de planeamento interactivo são: formulação do problema; planeamento dos fins; planeamento dos meios; planeamento dos recursos; implementação e controle. Vamos analisar cada uma destas cinco fases com maior pormenor. A formulação do problema envolve três aspectos distintos: a) Análise do sistema – que compreende a descrição do estado da organização, como ela funciona, que entidades afecta e por quem é afectada, e como se processa a interacção com o meio ambiente. Consiste na recolha de informação factual sobre todos os aspectos relevantes para o conhecimento pretendido. 157
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b) Análise das obstruções – que consiste na identificação dos obstáculos ao desenvolvimento da organização, nomeadamente a nível de discrepâncias e conflitos. Discrepâncias são as diferenças entre o que os responsáveis pensam que a organização é, e o que ela realmente é. Esta é uma das principais obstruções ao desenvolvimento da organização, pois leva a elaborar estratégias ou actuações irrealistas, na medida em que se baseiam em pressupostos errados. A análise das discrepâncias coloca-se a todos os níveis, desde os objectivos em vigor, até ao conhecimento dos próprios stakeholders. c) Projecção de referências – consiste em extrapolar as tendências do passado para o horizonte temporal em análise e, sempre que possível, fazer ressaltar a impossibilidade pragmática de que esse futuro extrapolado venha a ser realidade. Há, claramente, o objectivo de «provocar» os responsáveis da organização com o fim de realçar a impossibilidade de manter uma postura preactiva de planeamento (hoje a mais divulgada). Com base nas extrapolações é possível elaborar o chamado cenário de referência, que consiste na descrição do futuro do que seria se tudo se mantivesse dinamicamente constante. A elaboração deste cenário e a provocação que geralmente lhe está subjacente é crucial, pois ele será o padrão de referência com o qual iremos comparar o futuro desejado pela organização. Esta comparação permite avaliar o intervalo entre o desejável e o previsto, que terá de ser colmatado pelo esforço de planeamento. O planeamento dos fins Esta é a fase essencialmente criativa do processo de planeamento. Nela, pretende-se idealizar o futuro desejável, a fim de fixar objectivos para as fases seguintes, em que se irá tentar programar a transição da organização para esse futuro concebido. Dentro desta fase, devemos destacar três actividades distintas, embora sequenciais: idealização; desenho dos sistemas de gestão; desenho da organização. a) Idealização – consiste na definição do que a organização pretende vir a ser no futuro. O aspecto conceptual fundamental é que este esforço, de desenhar o ideal, deve ser tão livre quanto possível. Deve haver um esforço consciente para que a criatividade não seja restringida, pelo que Ackoff designa por self imposed constraints, restrições que o indivíduo inconscientemente impõe a si próprio, e que não existem na realidade.
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É neste sentido, que o processo de idealização deve despegar-se da realidade do presente, pois admite-se que, num horizonte de planeamento razoavelmente alargado, tudo é possível. O processo de idealização começa, necessariamente, pela definição da missão da organização. Isto é, pela definição de um propósito muito geral que providencie a todos na organização, e a tudo o que nela se faz, um sentido orientador. Em seguida, há que especificar as características desejáveis nesse estado ideal quanto a: negócios, mercados e marketing; produção; organização e gestão; pessoal; finanças; propriedade da organização; enquadramento face à envolvente contextual. b) Desenho dos sistemas de gestão – consiste na idealização do que seriam os sistemas de informação e controle ideais, bem como as regras de funcionamento internas, que se ajustariam ao idealized design anteriormente concebido. c) Desenho da Organização – consiste na idealização dos sistemas de relações internas da organização, a fim de definir a forma de agrupamento dos indivíduos (departamental), as funções que desempenhariam e a articulação entre eles e os departamentos. Consiste ainda, em definir outros princípios gerais, tendo em vista determinar o processo de tomada de decisão. Em suma, pretende-se, na fase de planeamento dos fins, definir com precisão o que seria a organização ideal em termos de actividades, do relacionamento com os mercados e com os stakeholders, e, ainda, em termos de estruturação. Definidos os fins, estabelecidas as bases de que se parte e a previsão do daí decorrerá, a manterem-se as tendências detectadas há que proceder à comparação, a fim de detectar o diferencial de planeamento (planning gap) a que aludimos. O propósito nesta fase é relevar a diferença entre o futuro desejável e o futuro previsto, ou seja entre o idealized design e a projecção de referência. Estabelecido o intervalo que se pretende colmatar há, agora, que pensar criativamente, a partir desse diferencial futuro: que acções serão necessárias para que ele venha a ser reduzido ou eliminado. Nesta fase, elaboram-se as estratégias alternativas, que permitirão desenvolver cenários para a evolução da organização, com base quer na sua actuação, quer na evolução não controlável da sua envolvente. A questão seguinte é a avaliação dessas simulações, quer em termos de eficácia, (em função de conduzirem a organização ao seu estado ideal), quer da sua probabilidade de se tornarem reais. As três fases a que aludimos constituem o cerne do planeamento estratégico, ou seja, aquele que mais directamente tem de ser coordenado e integrado no subsistema institucional da organização. Porém, como dissemos, o esforço de planeamento tem necessariamente de envolver toda a organização. Por conseguinte, há que definir os recursos necessários para implementar a estratégia, como 159
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obtê-los e como utilizá-los, ou seja, o papel dos subsistemas de gestão e operacional, a fim de se concretizar o disposto no cenário seleccionado. O planeamento dos meios O planeamento dos recursos é a fase em que se define que recursos, quando e onde são necessários para implementar a estratégia definida. Em que se determina as matérias-primas e outros fornecimentos, os recursos humanos, as instalações e, finalmente, os recursos financeiros indispensáveis à concretização da estratégia definida. Definido o quê, há que estipular quem e quando vai desempenhar cada actividade ou actuação concreta, quer a nível interno quer no relacionamento com os mercados em que a organização está presente. Implementação e Controlo É a fase em que se especificam em pormenor as funções dos indivíduos na organização, se atribuem responsabilidades e fixam metas a atingir. Em suma, define-se o quem e o quadro das actuações, e o quanto e o quadro de resultados que se pretendem atingir, bem como os pressupostos concretos utilizados nesta programação, a fim de que seja possível estabelecer a posteriori um controle bem fundamentado. Estas cinco fases do planeamento interactivo normalmente interagem. Elas podem ocorrer em simultâneo. As fases, que acima indicámos, são aquelas pelas quais normalmente é iniciada, podendo haver excepções. Numa perspectiva de planeamento contínuo, nenhuma delas estará alguma vez acabada. É uma acção para continuar e renovadamente ser implementada.
7. PLANEAMENTO E AVALIAÇÃO ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
DAS
ACTIVIDADES
NA
Em Portugal, a obrigação da elaboração do plano anual de actividades foi introduzida através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 34/87, de 8 de Julho, pelo Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho e pelo Decreto-Lei n.º 183/96, de 27 de Setembro de 1996. Este último diploma, indo ao encontro das novas funções do planeamento organizacional, insiste na necessidade de todos os trabalhadores e utentes, desig160
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nadamente através das respectivas associações, participarem na elaboração do plano anual. O Decreto-Lei n.º 183/96, de 27 de Setembro de 1996, determina que todos os serviços e organismos da administração pública central, institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados, e fundos públicos, deverão, anualmente, elaborar o seu plano de actividades, e divulgá-lo por todos os potenciais interessados. Trata-se do princípio pedagógico e informativo a que o planeamento deve obedecer. O plano anual de actividades deve discriminar os objectivos a atingir, os programas a realizar e os recursos a utilizar. Este, após aprovação pelo ministro competente, fundamentará a proposta de orçamento a apresentar na fase de preparação do Orçamento do Estado e será corrigido em função deste, após aprovação da Lei do Orçamento. Por outro lado, os serviços e organismos deverão, ainda, elaborar um relatório anual sobre a gestão efectuada, com uma rigorosa discriminação dos objectivos atingidos e dos recursos utilizados, bem como do grau de realização dos programas, o qual será aprovado pelo ministro competente. O relatório anual é a formalização do controlo encarado como uma acção que compara os objectivos estabelecidos e os recursos previstos com os resultados atingidos e os recursos realmente gastos. O objectivo do relatório anula é a tomada de medidas que possam corrigir ou mudar os rumos fixados. A lei 66-B/07 de 28 de Dezembro, veio dar ainda maior importância ao planeamento integrando-o no ciclo de gestão pública com o Sistema Integrado de Avaliação do Desempenho (SIADAP). O SIADAP articula -se com o sistema de planeamento de cada ministério, constituindo um instrumento de avaliação do cumprimento dos objectivos estratégicos plurianuais determinados superiormente e dos objectivos anuais e planos de actividades, baseado em indicadores de medida dos resultados a obter pelos serviços. A articulação com o sistema de planeamento pressupõe a coordenação permanente entre todos os serviços e aquele que, em cada ministério, exerce atribuições em matéria de planeamento, estratégia e avaliação. Compete, em cada ministério, ao serviço com atribuições em matéria de planeamento, estratégia e avaliação assegurar a coerência, coordenação e acompanhamento do ciclo de gestão dos serviços com os objectivos globais do ministério e sua articulação com o SIADAP. Os três Subsistemas (SIADAP 1, 2 e 3) funcionam de forma integrada pela coerência entre objectivos fixados no âmbito do sistema de planeamento, objectivos do ciclo de gestão do serviço, objectivos fixados na carta de missão dos dirigentes superiores e objectivos fixados aos demais dirigentes e trabalhadores. Compete ao serviço com atribuições em matéria de planeamento, estratégia e avaliação, em cada ministério: a) Apoiar a identificação dos indicadores de desempenho e os mecanismos de operacionalização dos parâmetros de avaliação; 161
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b) Apoiar os serviços, designadamente através de guiões de orientação e de instrumentos de divulgação de boas práticas; c) Validar os indicadores de desempenho e os mecanismos de operacionalização; d) Monitorizar os sistemas de informação e de indicadores de desempenho e, em especial, os QUAR quanto à fiabilidade e integridade dos dados; e) Promover a criação de indicadores de resultado e de impacte ao nível dos programas e projectos desenvolvidos por um ou mais serviços de modo a viabilizar comparações nacionais e internacionais 65.
8. AVALIAÇÃO
NA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O professor Robert Behn 66, num artigo de 1995, afirmava que uma das três grandes questões científicas relativas à Administração Pública como ciência e que devem constituir a agenda de investigação futura, é determinar como é que os administradores públicos poderão medir a realização da realização (achievement). Por outro lado, à medida que a Administração Pública é progressivamente enriquecida com funcionários com mais elevada formação académica e profissional, o resultado final da sua realização é, cada vez mais, sujeito à crítica do cidadão/cliente. Isto leva também a que os administradores públicos tendam, progressivamente, a transformar-se em grandes consumidores e utilizadores de modelos de avaliação 67. A combinação do interesse público, da pressão política e do aumento da capacidade técnica, em especial a que é oferecida pelos sistemas de informação, permitiu, nos anos sessenta, a emergência do conceito de responsabilidade pública. Em consequência surgiu também a necessidade de se proceder à avaliação da Administração Pública. Pois só a monitorização da performance permite fornecer informação periódica sobre os resultados e impactos dos serviços públicos 68. Esta preocupação, que se verifica a nível internacional e em especial nos EUA, pela mensuração da eficiência e eficácia da Administração e das Políticas Públicas, começa em 1960, com as discussões sobre os célebres PPBS (planning65
Consultar a Lei 66-B/07, de 28 de Dezembro. BEHN, Robert – The Big Questions of Public Management. Public Administration Review, Vol.55 (Jul./ Agosto 1995) 313-324. 67 WILLIAM III, Frank P. (et al.) – Barriers to Effective Performance Review: The Seduction of Raw Data. Public Administration Review, Vol. 54, n.º. 6 (Nov. / Dez. 1994) 537-542. 68 GARU, Henry; KENT, Dickey – Implementing Performance Monitoring: A research and Development Approach. Public Administration Review, Vol. 53, n.º. 3 (Maio/Junho 1993) 203-212. 66
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-programming-budgeting systems), 69 e em especial graças à acção de McNamara. Nos anos setenta, diversos elementos do PPBS foram introduzidos em vários países europeus. Nesta década, a perspectiva dominante na teoria da economia política ia no sentido de reforçar o papel dos governos, alargar o sector público e, consequentemente, o emprego público. No início dos anos oitenta, emerge a vontade de melhorar a produtividade pública e de reduzir o peso do sector público na economia. Esta mudança ficou-se a dever a três factores, a saber: a) os Estados Ocidentais enfrentam sérios problemas orçamentais, necessitando de proceder a cortes; b) a introdução dos conceitos Value for Money (VFM) desenvolvidos em Inglaterra pelo National Audit Office (NAO); c) a reorientação do sector público, a partir da reavaliação do contributo neoclássico sobre o papel dos governos. Estes factores criaram um ambiente propício à avaliação da Administração Pública performance, e à mensuração da sua produtividade. Para tanto, surgiram conjuntos diversos de dimensões (item) a observar e medir, modelos de análise e técnicas de recolhas de dados, entre outros. A lei 66-b/07, de 28 de Dezembro veio instituir um sistema integrado de avaliação integrado por três subsistemas: SIADAP 1 destinado à avaliação dos organismos, fundamentalmente com base no Quadro de Avaliação e Responsabilização (QUAR); o SIADAP destinado a avaliar os dirigentes; SIADAP 3 dirigidos aos restantes funcionários e trabalhadores em funções públicas. Avaliação fundamenta-se na teoria do comportamento (behaviorista), isto é, num ciclo de causalidade (condicionamentos fortes em que há: repetição, aprendizagem, avaliação, melhoria, sucesso, prémio. Com efeito o que se premeia é repetido; o que se aprende mede-se; o que se mede melhora; o que melhora é bem sucedido; o que é bem sucedido é premiado. Há sete erros muito frequentes na avaliação: Ser pouco exigente nos níveis de resultados: datas fáceis de serem cumpridas; Objectivos departamentais que fomentam conflitos: Uns aumentam as vendas outros sofrem o aumento do risco; Não avaliar a partir do ponto de vista do cidadão; Avaliar o mais fácil, mas não o necessário; Objectivos com efeitos paralisantes: não pensar nas consequências; Encontrar desculpa fácil; não aprender com o erro. O SIADAP possui como objectivo: Avaliar a qualidade dos serviços; Avaliar os dirigentes; Diferenciar o desempenho; Potenciar o trabalho em equipa; Iden69
BILHIM, João – Estrategas e Planeadores na Administração Pública in Vários – Estratégia e Planeamento na Gestão e Administração Pública. Lisboa: ISCSP, 1995, p. 197-210.
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tificar necessidades de formação; Fomentar a mobilidade; Promover a comunicação; Fortalecer a liderança; Melhoria da gestão pública; Consolidar práticas de avaliação; Identificar necessidades de formação; Promover a motivação; Distinguir serviços e pessoas; Melhorar a arquitectura de processos; Melhorar a informação, promovendo a transparência; Apoiar o processo de decisão estratégica. Modelos de Avaliação Em geral, considera-se que há dois grandes modelos de avaliação: a avaliação de resultados outcome evaluation e a avaliação de processo process evaluation. Nesta obra, a avaliação da qualidade será tratada especificamente no último capítulo, podendo-se desde já adiantar que o modelo da CAF 70 é o mais utilizados pelas instituições públicas da União Europeia. A avaliação de resultados procura medir o diferencial existente entre os resultados alcançados com um determinado curso de acção, e os objectivos, em termos de impacto sobre a envolvente, previamente fixados. Se, por exemplo, o curso de acção é a pavimentação de uma rua, a avaliação vai medir o número de metros de rua pavimentada. Esta informação é, de seguida, relacionada com os inputs, ou seja, com os recursos consumidos, para dar o rácio custo/benefício relativo ao número de metros quadrados pavimentados por quantidade, em escudos. Há quem distinga entre outputs e outcomes. Os primeiros dizem respeito aos resultados actualmente obtidos e os segundos relacionam-se com os objectivos desejados. Ao contrário da avaliação de resultados, a avaliação de processo está centrada na forma como os programas e acção da Administração Pública são desenvolvidos. Esta avaliação está no processo e não no resultado final, e é a mais corrente e usada pelos serviços de auditoria e de inspecção. É a preocupação com a legalidade que se torna determinante. O importante não é tanto, nem sobretudo, o que se faz, mas o modo como se faz. Neste caso, as medidas mais relevantes são tomadas do lado dos inputs, na afectação de recursos e nas cargas de trabalho. Neste contexto, é útil distinguir eficiência e eficácia 71. A eficiência é o rácio entre output e input, sendo geralmente feito um rácio por unidade de input, (por exemplo, o custo por metro quadrado de pavimentação de uma determinada área pública). A eficácia diz respeito à relação entre o efeito procurado e o resultado obtido, ou seja, tem a ver com o grau de obtenção dos objectivos propostos. A eficácia é um rácio dos sistemas abertos e, por isso, é outcome oriented, centra-se nas mudanças reais que os programas produzem, tais como a dimi70 71
http://www.caf.dgaep.gov.pt BILHIM, João – Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2013.
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nuição do insucesso escolar, a existência de certas doenças, o grau de poluição do ambiente ou a exclusão social 72. Muitas vezes, a avaliação do processo acontece depois de determinado curso de acção ter terminado, embora também possa ter lugar à medida que a acção vai tendo lugar 73. À medida que se vai introduzindo, na Administração Pública, o conceito de concorrência externa e interna, 74 tem-se aberto espaço para uma nova metodologia de avaliação, designada por Benchmarking, que muitos benefícios têm trazido ao sector privado 75. O Benchmarking permite posicionar uma organização ou um departamento estatal no contexto dos seus concorrentes, comparando o seu desempenho com o dos melhores. Os projectos de avaliação com base no Benchmarking levam, normalmente, seis meses a ser efectuados, através de equipas que, em média, reúnem cerca de cinco pessoas. O objectivo desta técnica de avaliação não é levar a organização ou o departamento a imitar algo, adoptando o modelo de gestão da performance alheia, mas adaptar esse modelo à realidade em estudo. Com o Benchmarking, ultrapassa-se a mera comparação dos serviços prestados e visa-se a análise dos processos que suportam essa actividade. Entre as organizações ou departamentos em comparação há a necessidade de, simultaneamente, cooperarem e competirem. Avaliação de Custos e Benefícios Uma das técnicas quantitativas mais conhecidas e utilizadas é a avaliação custo/eficácia, que permite ao analista comparar e defender políticas, quantificando o total de custos e efeitos 76. Os custos são, habitualmente, medidos em termos monetários, mas os efeitos são medidos em unidades de outro tipo. Este método assume duas variantes. Na primeira, é fixado o nível desejado de eficácia e, de seguida, procuram-se meios que possam atingir aquele nível ao preço mais baixo. Na segunda variante, fixa-se o orçamento global e, seguidamente, analisam-se as alternativas que possam dar àquele montante o nível máximo de eficácia.
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BOORSMA, Peter; DE VRIES Piet – The Drive for Public Productivity: The Ductch Experience, 1980-1993. Public Productivity & Management Review, Vol. 19, n.º 1 (Setembro 1995), 34-45. 73 POISTER, Theodore – Performance Monitoring. Lexington, MA: Lexington Books, 1983. 74 Sobre o conceito de concorrência veja-se: AL GORE – Reinventar a Administração Pública. Lisboa: Quetzal, 1994. 75 BENDELL, Tony (et al.) – Benchmarking for Competitive Advantage. Londres: Pitman Publishing. 76 DUNN William – Public Policy Analysis. EnglewoodCliffs, NJ: Prentice Hall, 1981.
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Uma outra metodologia próxima desta é a análise custo/benefício, que identifica e quantifica os impactos negativos (custos), e positivos (benefícios), de um curso de acção. Em seguida, subtrai-se uma da outra, de forma a obter o resultado líquido dessa acção. Ao contrário da análise custo/eficácia, esta – custo/ benefício –, transforma os dois elementos de comparação em termos, para calcular o resultado líquido através da subtracção. A variante que vem sendo, recentemente, mais utilizada, na avaliação custo/ eficácia, é o chamado modelo Value for Money (VFM) 77. Este modelo tem sido utilizado pelo National Audit Office (NAO), no Reino Unido, desde os anos oitenta. Os teóricos da avaliação levantam dúvidas sobre o modelo VFM, dado que só entra em linha de conta com os objectivos declarados pelo Governo ou pelo Parlamento. Todavia, parece-nos ser um modelo a seguir e, como nesta fase, a própria NAO encontra-se em avaliação, é normal que este modelo venha a ser enriquecido. Estudos de Impacto Regional A avaliação dos impactos das políticas públicas pode ser dividida em métodos de avaliação ad hoc e estruturados a) Avaliação ad hoc A avaliação ad hoc caracteriza-se por não possuir um modelo formal, devido a limitações de tempo, situações não repetitivas ou falta de dados. Neste caso, recorre-se ou, à análise informal, ou à análise comparativa. A primeira, lança mão do painel de peritos, como seja a técnica Delphi, ou, a partir das conclusões de um estudo de caso, cuja validade é sempre local, extrapola-se para outros casos. A segunda, utiliza as experiências transregionais sectoriais, ou nacionais, com problemas semelhantes (por exemplo, o impacto do Tagus Park de Oeiras feito a partir do caso de Birmingam). Apesar do baixo custo e do uso fácil, as análises ad hoc não oferecem grandes taxas de precisão. No entanto, são úteis em virtude de permitirem, rapidamente, obter ideias sobre as consequências do lançamento de uma determinada política.
77
ROBERTS, Simon; POLLIT, Christopher – Audit or Evaluation? A National Audit Office Study. Public Administration, Vol. 72, .º. 4 (1994) 527-549.
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b) Avaliação Estruturada Este tipo de avaliação permite analisar o efeito de um conjunto de medidas de política, sobre outro conjunto de variáveis políticas dentro de certas condições. Do ponto de vista do impacto económico, um dos primeiros contributos foi dado por Tinbergen 78. Nesta avaliação, com recurso a técnicas quantitativas (econométricas ou estatísticas), é importante tomar em consideração dois níveis de análise dos estudos: micro e macro. Ao nível micro, os estudos têm por base a observação de indivíduos que serão, ou foram, afectados por determinadas medidas de política, com recurso ao método do inquérito (questionário e/ou entrevista). A informação é obtida pela inquirição feita, directamente, sobre as questões tratadas nas medidas de política. Este tipo de estudo é, por vezes, conhecido como experimentação controlada, quase/experimental e não experimental. No caso da construção de uma estrada, é, por exemplo, possível interrogar os proprietários dos terrenos expropriados, e os investidores, os administradores municipais, nomeadamente para descobrir mudanças comportamentais, atitudes e percepções. Poderíamos, ainda, interrogar os turistas, os cidadãos pagadores de impostos que não vão utilizar aquela estrada, os visitantes, etc. Ao nível macro, os estudos não são totalmente separados dos anteriores. Por vezes são a agregação das conclusões de estudos efectuados ao nível micro, claramente menos demorados que os anteriores, e mais baratos. Os estudos em causa podem ter por base um modelo formal matemático, ou não dispor, explicitamente, de nenhum modelo formal. Do primeiro caso, temos os dois exemplos: a) Modelo de impacto qualitativo para avaliação da política estratégica de uma determinada cidade 79; b) Tabelas de análise contingencial 80. Do segundo caso, temos: a) modelo de equações simples (o mais adequado à análise de impactos parciais); b) modelo de equações múltiplas (o mais adequado à análise de impactos cruzados, e que permite a obtenção de uma fotografia geral dos impactos mais relevantes). Nos estudos sobre impactos, há que distinguir os estudos prévios e os estudos posteriores à implementação de medidas. Dada a dificuldade na obtenção de dados, recorre-se, hoje, muito aos estudos de simulação. Estes podem ser utilizados numa cadeia causal de impactos estruturados, mesmo quando alguns coefi-
78
TINBERG, Jan – Economic Policy: Principles and Design. Amesterdão: North Holland. NIJKAMP, Peter; PELT, Michel va – Spatial Impact Analysis in Developing Countries: Methods and Aplications. International Regional Science Review, Vol. 12 (1989) 211-228. 80 BROUWER, Floor – Integrated Regional Environment Modeling. Dordrecht:Martinus Nijhoff, 1978. 79
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cientes não foram criados com base sólida, mas com fundamento na estimativa 81. Actividade 2 Entreviste um administrador público. Peça uma cópia do plano de actividades e pergunte-lhe qual é a necessidade de controlo periódico do plano.
TESTE FORMATIVO 1. Dê uma definição de planeamento. 2. Refira duas razões para a existência do planeamento central. 3. Refira um aspecto positivo e um negativo do carácter obrigatório do PDR, como instrumento de negociação e obtenção de fundos estruturais. 4. Que planos municipais estão previstos no Decreto-Lei n.º 69/90, de 2 de Março? 5. Quais são os diversos tipos de planeamento? 6. Quais são as fases essenciais do processo de planeamento estratégico? 7. Quem está obrigado, pelo Decreto-Lei n.º 183/96, de 27 de Setembro de 1996, anualmente, a elaborar um plano de actividades e a divulgá-lo por todos os potenciais interessados? 8. Caracterize a análise custo/benefício como metodologia de avaliação.
RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. R. L. Ackoff: “O planeamento consiste em conceber um futuro desejado, bem como os meios reais de lá chegar”. 2. Escassez de recursos a longo prazo, incluindo o ambiente; imperfeições do mercado. 3. Sobrevaloriza a rapidez da preparação e de obtenção dos documentos (produtos), em detrimento da concertação (processo). 4. Planos directores municipais; planos de urbanização; planos de pormenor. 5. Os diversos tipos de planeamento são: estratégico, táctico e operacional. 6. São: Formulação do problema; Planeamento dos fins; Planeamento dos meios; Planeamento dos recursos; Implementação e controle. 81
GIAOUTZI, Maria; NIJKAMP, Peter – Decision Suport Methods for Regional Sustainable Planning. Aldershot, U. K.: Avebury, 1993.
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7. Os serviços e organismos da administração pública central, institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados, e fundos públicos. 8. Esta metodologia identifica e quantifica os impactos negativos (custos), e positivos (benefícios), de um determinado curso de acção e subtrai uma da outra para obter o resultado líquido dessa acção.
L EITURAS C OMPLEMENTARES BRYSON, John M. – Strategic Planning for Public and Nonprofit Organizations. San Francis: Jossey-bass, 1988. LAFER, Betty Mindlin – Planejamento no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1987. Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas – Gestão por Objectivos na Administração Pública. Lisboa: ISCSP, 1998. Vários – O Planeamento Económico em Portugal. Lisboa: Sá da Costa, 1984. Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas – Estratégia e Planeamento na Gestão e Administração Pública. Lisboa: ISCSP, 1995.
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7. DECISÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. A Tomada de Decisão 2. O Processo de Decisão 3. Modelos de Decisão 4. Decisão Individual e de Grupo 5. Modelos de Avaliação e Decisão no Sector Público 6. O Princípio da Decisão 7. Políticas Públicas Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Respostas às Actividades Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade, o estudante deverá estar apto a: • • • •
Relacionar decisão e gestão; Distinguir entre decisões de rotina e estratégicas; Identificar as seis funções do processo de tomada de decisão; Caracterizar o carácter genérico e dinâmico do processo de tomada de decisão; 171
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• • • •
Identificar o contributo das ciências para a teoria da decisão; Explicar os principais modelos de tomada de decisão; Discutir as vantagens e desvantagens da decisão individual; Caracterizar os principais modelos de avaliação e de decisão no sector público.
1. A TOMADA
DE
DECISÃO
A tomada de decisão constitui parte integrante da gestão de qualquer tipo de organização pública ou privada. A competência nesta área, mais do que outro tipo de competência, diferencia os gestores quanto à sua eficácia. A importância da decisão, no contexto organizacional, deriva do facto dela afectar todas as funções do gestor nas organizações formais públicas ou privadas. A boa ou má gestão encontra-se ligada à boa ou má tomada de decisão. Acresce que na área das políticas públicas há uma forte tradição que tende a identificar o processo político com as actividades de resolução de problemas ou de opção entre alternativas que se colocam aos políticos 82 Herbert Simon 83, no seu clássico trabalho sobre a decisão de gestão, identifica a tomada de decisão com o processo de gestão em si mesmo. Para este autor, a tomada de decisão compreende três fases: a) identificação de situações que exigem a tomada de decisão; b) descoberta dos diversos cursos de acção disponíveis; c) escolha do curso de acção que se afigura mais adequado. Não é fácil o consenso sobre o que é uma boa decisão. Para uns, é uma escolha feita por consenso. Para outros, é uma escolha que não provoca reacções desfavoráveis aos que são afectados por ela. Para outros, ainda, é a escolha que oferece as melhores garantias de cumprimento do objectivo. Esta diversidade de pontos de vista dificulta a identificação das competências necessárias a um bom decisor. Não existe acordo geral e universal sobre o que é uma boa decisão, ou mesmo, sobre a melhor abordagem na tomada de decisão. Neste capítulo, vamos estudar quatro abordagens sobre a tomada de decisão: racional, ou de actor único, organizacional, política e de processo ou ecléctica. Podemos definir a tomada de decisão como o momento da escolha de uma entre diversas alternativas, momento esse que se integra num processo que compreende diversas etapas. Esse momento em que o decisor selecciona o curso de acção é o que lhe parece mais adequado para atingir os objectivos previamente fixados.
82 83
Walter Lasswell – A Pre-View of Policy Sciences. NY: American Elsevier, 1971. 1951. Herbert Simon – The New Science of Management Decision. New York: Harper & Row, 1960, p. 1.
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A tomada de decisão é, pois, um processo genérico, por ter lugar em toda a actividade organizada, é dinâmico, porque ocorre em todos os níveis da hierarquia e tipos de organização, e é tão antigo como a gestão. Todavia, há que reconhecer que este é um ponto de vista académico sobre um campo recente de investigação e ensino. No passado, a abordagem prevalecente sobre a tomada de decisão incidia sobre a decisão em si mesma, e baseava-se nas técnicas quantitativas, em particular, na matemática e na estatística. Actualmente, dá-se maior enfoque ao processo de tomada de decisão do que à decisão em si mesma. É importante salientar, que a decisão é um meio para atingir um fim, e não um fim em si mesma. O fim é, naturalmente, o resultado da escolha, ou seja, a obtenção do objectivo que esteve na base do processo de tomada de decisão. Para a compreensão interdisciplinar do processo de tomada de decisão, as ciências sociais – sociologia, psicologia e antropologia –, são tão importantes como a matemática e a estatística. Há vários tipos de decisão. Para Herbert Simon 84 as decisões podem ser programadas e não programadas. • As programadas são repetitivas, rotineiras, resultantes da existência de um procedimento administrativo que prescreve o modo de lidar com esses problemas • As não programadas fogem à rotina pois não beneficiam de uma experiência anterior que permita definir procedimentos, ou são tão importantes que não podem ser tratadas como algo do tipo pronto a vestir. Há muitos autores que têm apresentado outras tipologias de decisão, nomeadamente: a) Delbecq 85: Decisão rotineira; decisão criativa e decisão negociada. b) Mintzberg 86: decisão empreendedora; decisão adaptativa e decisão planeada. c) Thompson 87: decisão computacional; decisão de juízo; decisão de compromisso e decisão inspiracional.
84
Herbert Simon – opus cit., p. 4-6. Andre Delbecp – “The Management of Decision-making Within the Firm”. Academy of Management Journal December 1967, 329-339. 86 Henry Mintzberg – “Strategy-Making in Three Modes”. Califoria Management Review, Winter, 1973, 44-53. 87 James Thompson – Organizations in Action. New York: McGrow-Hill, 1967, 134-135. 85
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Todavia, todas estas tipologias podem ser reduzidas a dois tipos básicos: rotineiras, repetitiva, certas e precisas; não rotineiras, não repetitivas, incertas e imprecisas. Harrison 88 apresenta o seguinte esquema, baseado nestes dois tipos básicos: Decisão Tipo I Rotineira Classificação Programáveis, rotineiras, genéricas e quanto a computacionais. Estrutura Processual, previsível, relação segura entre causa/efeito, repetitiva; ocorre no quadro da tecnologia existente; canais de informação bem definidos; há critérios definidos de decisão. Estratégia
Apoia-se em regras e prin-cípios; resposta conhecida e pré-abricada, processo uniforme; técnicas compu-tacionais; métodos aceites para lidar com prazos de produção, afectação de trabalhadores, estimação de custos.
Decisão Tipo II Não Rotineira Não programáveis, únicas, criativas e inovadoras. Nova, não estruturada, complexa, relação incerta entre causa/efeito; não repetitiva; canais de informação não definidos; informação incompleta; desconhecimento dos critérios de decisão. Apoia-se em juízos pessoais, opções, intenções e criatividade; processo individualizado; técnicas humanistas para resolver problemas; uso de regras de algibeira.
Os gestores deverão tratar as decisões de tipo I e as decisões de tipo II de modo diferente, pois, é gastar tempo e dinheiro, inutilmente, quando não se procede deste modo. Deve-se distinguir as decisões de tipo I das de tipo II e agir em conformidade com tal distinção, para que seja alcançada maior eficácia e eficiência na administração. A decisão de tipo II, ou estratégica, possui as seguintes características: a) Diz respeito à envolvente da organização, mais do que ao seu interior; b) Liga-se à missão da organização; c) Relaciona-se com o todo organizacional e não apenas com uma parte desta; d) Integra todas as áreas funcionais; e) Relaciona-se com a direcção das actividades; f ) Dela depende a sobrevivência e o sucesso futuro. Em geral, é recomendado que as decisões de tipo I, as programadas, sejam tomadas pelos níveis mais baixos da hierarquia – gestores operacionais; enquanto 88
E. Frank Harrison – The Managerial Decision-Making Process, 5th edition. Boston: Houghton Mifflin Company, 1999, 21.
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as decisões de tipo II, as não programadas, devem ser tomadas pelo topo da pirâmide. A gestão intermédia supervisiona a tomada de decisão do nível operacional e prepara a decisão estratégica, de tipo II, que deverá ser tomada pelos escalões mais altos da hierarquia. Técnicas de tomada de decisão Decisões a tomar Tradicionais Programadas
1. Hábito.
Decisões repetitivas 2. Rotina administrativa: e de rotina. Procedimentos padronizados de operação A organização desenvolve processos 3. Organização estruturada: específicos para Expectativas comuns; tratá-las. Um sistema de sub-objectivos; Canais de informação bem definidos. Não Programadas 1. Julgamento, intuição e criatividade. Decisões políticas 2. Normas práticas. mal estruturadas. Tratada por processos gerais de resolver problemas.
3. Selecção e formação de executivos.
Modernas 1. Investigação operacional; Análise matemática; Modelos; Simulação com computador. 2. Processamento electrónico de dados
Técnicas heurísticas de resolver problemas aplicado a: a) Formação de indivíduos que tomam decisões; b) Montagem de programas heurísticos de computadores.
Os gestores têm, permanentemente, que ponderar a oportunidade da decisão em termos temporais, ou seja, o momento adequado, sem esquecer o custo que a escolha de uma alternativa vai implicar. Consequentemente, na tomada de decisão, há três perguntas, a que os administradores não poderão nunca escapar: quando decidir; quanto custa; qual o risco envolvido.
Actividade 1 Dê um exemplo de uma decisão estratégica e de uma decisão rotineira na administração pública.
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2. O PROCESSO
DE
DECISÃO
A decisão organizacional deve ocorrer dentro de um processo dinâmico, constituído por um conjunto de etapas interrelacionadas. As decisões tomadas fora do contexto organizacional são, normalmente, espontâneas, e não estruturadas. Pelo contrário, as decisões, ou as escolhas de cursos de acção em contexto organizacional, devem ser orientadas por processos. Para Frank Harrison, há, fundamentalmente, seis funções no processo de tomada de decisão: fixação de objectivos organizacionais; busca de alternativas; comparação e avaliação das alternativas; acto de escolha; implementação da escolha feita; avaliação e controlo da implementação. Na fixação de objectivos organizacionais, o processo de decisão começa, precisamente, com a fixação dos objectivos a atingir pela organização. A busca de alternativas exige a procura activa de informação pertinente sobre as envolventes interna e externa da organização, informação essa que deve ser organizada tendo em vista o grau de satisfação dos objectivos organizacionais. A função que se segue é a comparação e avaliação das alternativas. As alternativas representam cursos de acção que, isoladamente ou em associação, podem ajudar a atingir o objectivo. As alternativas são comparadas através de meios formais ou informais, tendo por base o maior ou menor grau de certeza na relação causa/efeito, isto é, na relação com o objectivo a atingir e, ainda, as preferências do decisor. O acto de escolha é o momento do processo de tomada de decisão, em que o decisor opta por um determinado curso de acção, entre outros possíveis. A implementação da escolha feita permite que o curso de acção, anteriormente escolhido, seja levado à prática. Corresponde ao momento em que a decisão se transforma em realidade operacional, abandonando o carácter abstracto que assumira até então. Uma decisão brilhantemente concebida pode vir a provar-se como não tendo qualquer valor após a implementação. Até ao momento da sua implementação, a decisão não passa de uma boa intenção. A avaliação e o controlo da implementação permitem medir o grau com que o resultado final da decisão corresponde aos objectivos, inicialmente, propostos. O real valor de uma decisão só se torna visível após a sua implementação. Actividade 2 Descreva uma decisão de tipo II em cada uma das seis etapas do seu processo.
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3. MODELOS
DE
DECISÃO
Vimos, que o processo de tomada de decisão é dinâmico e genérico, aplicando-se a todas as formas da actividade organizada. Acresce, que este processo é, também, ecléctico, enquanto selecciona o que de melhor há em várias doutrinas ou estilos ou, ainda, na medida em que é composto por elementos de origem diversa. A decisão é, assim, em certa medida, causa e efeito da cultura. A teoria da decisão constitui, pois, um ponto de encontro de diversas ciências, em que cada uma delas dá o seu contributo. Os aspectos interdisciplinares da tomada de decisão são ilustrados por quatro modelos de decisão que passaremos a apresentar. De referir que a necessidade de criar modelos tem a ver com a limitação dos seres humanos para lidar com um número infinito de variáveis com diversos graus de complexidade. É, pois, impossível à mente humana abarcar a imensidão de variáveis e complexidades. Por isso, recorre-se à elaboração de modelos teóricos, com um pequeno número de variáveis causais que sejam, ao mesmo tempo, significativas e susceptíveis de ser compreendidas. Se as variáveis são insuficientes ou incorrectas, o modelo não funcionará, nem explicará o fenómeno do mundo real que está a modelar. Se o número de variáveis utilizado é excessivo, mesmo sendo estas adequadas, a complexidade do modelo não permitirá a sua compreensão. Teoricamente, para que um modelo seja útil, tem de possuir um número óptimo de variáveis, que permita ao decisor prever a realidade de forma consistente e correcta 89. Os modelos podem ser matemáticos, sociais ou filosóficos, e envolver fenómenos físicos, emocionais, ou qualquer coisa capaz de análise teórica. Para explicar o mesmo fenómeno há, por vezes, diferentes modelos e cada disciplina científica desenvolve, ao examinar um determinado problema, o seu próprio modelo de explicação. Quanto aos quatro modelos que vamos apresentar, há que, previamente, salientar o seguinte: a) os modelos não são mutuamente exclusivos e partilham, mais ou menos, elementos uns dos outros; b) os modelos são simplificações e, por isso, deixam de fora, forçosamente, certas características da realidade Modelos de decisão têm sido propostos, por diversos autores e talvez o mais conhecido, seja o que foi proposto por Graham T. Allison, professor de
89
C. V. Brown; P. M. Jackson – Public Sector Economics, 4th Ed.. Oxford: Blackwell, 1994, 87-118.
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Harvard, para analisar a decisão do Presidente Kennedy sobre o bloqueio naval a Cuba. Todavia, vamos apresentar os quatro modelos de Harrison, por nos parecer que os mesmos integram as principais dimensões que os restantes autores quiseram valorizar. Assim, Harrisson identifica os seguintes quatro modelos: a) Racional; b) Organizacional; c) Político; d) o de processo. a) Modelo Racional O modelo racional, também, conhecido por modelo clássico é, essencialmente normativo, e mais prescritivo do que descritivo. A partir de certos pressupostos teóricos, este modelo determina as condições em que os gestores devem tomar decisões, dentro das suas organizações. Prescreve o que o gestor deve fazer para ser um decisor eficaz e é tão estruturado, que chega a ser mecanicista. O seu critério de decisão é a maximização do resultado final. Trata-se do modelo clássico da teoria da decisão e as primeiras disciplinas científicas que contribuíram para a sua elaboração teórica foram, nomeadamente, a matemática, a estatística e a economia. É devido a este modelo que, ainda hoje, muitos indivíduos identificam a teoria da decisão com os modelos quantitativos. O modelo racional assume que, toda a variável que não possa ser atribuída um valor numérico, deve ser posta de lado ou tratada como uma constante. Opera em sistema fechado e tem como pressuposto o conceito clássico do “homo economicus”, ou o homem racional da moderna estatística e da teoria dos jogos, o qual faz “escolha óptimas”, em situações bem delimitadas e definidas. Por isso, este modelo é mais adequado para a tomada de decisões do tipo I, ou seja, decisões repetitivas e rotineiras, não estratégicas. O modelo parte do pressuposto de que o decisor tem consciência de todas as opções alternativas, e que o efeito dessas alternativas pode ser comparado e avaliado, pelo menos no curto prazo. Neste modelo, parte-se do pressuposto de que: há apenas um decisor único; possui apenas um objectivo; pode ser quantificado; há um número finito de alternativas que podem ser identificadas e a decisão consiste, apenas, na escolha da melhor alternativa. Este modelo está mais preocupado com a consistência lógica do processo de decisão do que com o próprio conteúdo da decisão. Por isso, não possui os requisitos para ser aplicado às decisões de tipo II, que são estratégicas, inovadoras e não repetitivas. Estas decisões procuram ser “suficientemente boas”, e não tentam ser “óptimas”.
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b) Modelo Organizacional Também conhecido por neoclássico, o modelo organizacional combina a contribuição das disciplinas quantitativas, base do modelo anterior, com as disciplinas das ciências sociais. O seu critério de decisão é a obtenção de um resultado final que “satisfaça”. Entre este modelo e o anterior há pontos comuns e divergentes. Entre as diferenças, destaca-se o facto do modelo racional partir do princípio de que os objectivos eram fixos, enquanto neste os objectivos são atingíveis. Acresce, ainda, que o modelo organizacional reconhece que há limitações de informação, cognitivas, de tempo e de custo. Por isso, este modelo introduz a sociologia, a psicologia e a filosofia na situação de decisão. Todavia, a principal diferença consiste no facto do modelo racional procurar a “optimização”, enquanto o modelo organizacional procurar o “suficientemente bom”. Para Simon, há cinco diferenças entre os modelos organizacional e racional que têm a ver com a divisão dos problemas, a satisfação, a busca, a fuga da incerteza e a informação: Divisão dos problemas: Os problemas são tão complexos que, só tratando uma parte de cada vez, pode-se decidir bem. Satisfação: A maximização dos resultados, característica do modelo racional, é substituída pela satisfação dos mesmos. O decisor organizacional não possui todas as alternativas possíveis quando tem de escolher (há uma relação a ter em conta entre o custo de informação adicional e o tempo que a mesma exige), por isso, ele procura uma decisão “apenas suficientemente boa” para o objectivo. Busca: A organização, com base num processo relativamente estável de busca sequencial, gera alternativas. Assim, quando no processo de busca emerge uma alternativa que se aproxima do que se pretende, é logo abandonado o processo e não se procuram mais alternativas, eventualmente mais adequadas. Fuga da incerteza: A incerteza tende a ser evitada com decisões susceptíveis de serem corrigidas através de sistemas de feedback de curto prazo. Informação: As organizações tendem a lançar mão das segundas e terceiras alternativas, quando o feedback obtido indica que as primeiras não estão a atingir o objectivo almejado. É de salientar, o facto de ambos os modelos terem um horizonte de curto prazo e de estarem orientados para os resultados imediatos. c) Modelo Político Este modelo, também conhecido por modelo adaptativo, baseia-se, fundamentalmente, nos contributos da ciência política, da filosofia, da psicologia e da sociologia. É, pois, completamente diferente do modelo racional, que está ligado 179
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apenas às disciplinas quantitativas. É um modelo fundamentalmente comportamental, e o seu critério de decisão é que os resultados sejam “aceitáveis”. A principal diferença entre os modelos organizacional e político, radica no facto deste último utilizar uma estratégia de decisão baseada na negociação e no compromisso, para conseguir obter resultados que sejam aceitáveis por diversos grupos externos. O modelo organizacional encontra-se, por sua vez, ligado a resultados que beneficiam a organização ou a instituição em si mesma. O modelo político é incremental, sendo a escolha pouco substancial e marginal. O decisor político deve considerar apenas as pequenas diferenças existentes no actual estado das coisas. A abordagem incremental só entra em linha de conta com as alternativas que diferem marginalmente do status quo ou uma de outra. Só essas pequenas diferenças são objecto de análise. A escolha final não é única, muito menos é a “decisão certa”, pois, é apenas a decisão “aceitável”. Desenvolve-se uma cadeia de meios e fins; o que hoje é um meio, amanhã poderá ser um fim. Consequentemente, a decisão tende a aliviar o presente, a melhorar mais as condições e as imperfeições actuais, do que a resolver o problema de fundo 90. As principais características do modelo político são: • Decisor não está preocupado por reunir a informação completa e por analisar todas as alternativas. Está focalizado nas políticas que possam diferir um pouco das existentes; • Facultar, apenas, um pequeno número de alternativas; • Possibilitar, em cada alternativa, apenas a avaliação de um pequeno número de consequências importantes; • Levar a que o problema, com que se confronta o decisor político, seja permanentemente avaliado; • Não há uma decisão certa; • Procura, mais aliviar os males presentes, do que encontrar a solução correcta no longo prazo. As principais diferenças entre o modelo político e os modelos clássico e organizacional são: • Fixação dos objectivos e a busca de alternativas são, nos dois último, realizadas simultaneamente, e não sequencialmente, como no modelo político; • Modelo político, fins e meios são se distinguem; • Uma boa decisão, para o modelo político, é aquela cujo resultado final levanta menos reacções negativas; 90
João Ferreira do Amaral – Política Económica. Lisboa: Cosmos, 1996, 14-22.
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• Há uma análise mínima das alternativas, no modelo político; • Modelo político minimiza a incerteza, através da comparação dos resultados desejados com as políticas existentes. d) Modelo de Processo Este modelo, também conhecido por managerialista, como critério de decisão concede uma forte ênfase à orientação para os objectivos. Como modelo está mais próximo do organizacional do que do racional, ou do político. Ambos os modelos managerialista e organizacional usam as disciplinas quantitativas e reconhecem a importância das ciências sociais. Ambos estão abertos à envolvente externa e assentam em princípios, profundamente interdisciplinares. Entre os dois modelos há várias diferenças: • Modelo de processo possui uma orientação de longo e não de curto prazo, assim como o modelo organizacional; • Está voltado para o futuro e para o crescimento, e não para as mudanças rápidas; • É estratégico na sua orientação, enquanto o organizacional é táctico; • É adequado à inovação e o organizacional está limitado pela prática e pelos procedimento regulamentares; • As suas políticas e procedimentos são guias de acção, meios e não fins, enquanto para o organizacional são quase sempre tão importantes como os próprios fins. Ecléctico, o modelo de processo não deixa de utilizar algumas das técnicas do modelo racional, que realça o papel das disciplinas quantitativas, reduz a incerteza da decisão e compara e avalia alternativas. Por vezes, pode também lançar mão das técnicas de negociação e compromisso, características do modelo político, para tornar mais aceitável uma escolha por um grupo de pressão.
Actividade 3 Caracterize o critério de decisão de cada um dos quatro modelos, usando apenas uma palavra.
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. Decisão e Políticas Públicas
4. DECISÃO INDIVIDUAL
E DE
GRUPO
Os autores da literatura de gestão, ao referirem-se ao decisor, defendem as seguintes posições: • Uns salientam os méritos da decisão colectiva ou da escolha consensual 91; • Outros realçam as desvantagens inerentes à coesão requerida para uma eficaz decisão de grupo 92; • Outros, ainda, pensam que indivíduos competentes encontram-se melhor posicionados para tomar decisões, do que o menor denominador comum do consenso característico da escolha colectiva 93; • Há, por fim, quem pense, que muitos indivíduos encontram-se mais inclinados a aceitar riscos como membros de um grupo do que como decisores individuais 94. O processo de tomada de decisão acontece graças à acção de indivíduos, que actuam sozinhos ou em grupo, para chegar a uma escolha que satisfaça o cumprimento dos objectivos. Forças psicológicas estão presentes e condicionam o comportamento do decisor durante todo o processo de tomada de decisão e influenciam-no, quer a nível do consciente, quer mesmo a nível do inconsciente. A psicologia ensina-nos que os factores psicológicos que mais influenciam o indivíduo na tomada de decisão são: • O perfil da sua personalidade; • A imagem mental que resulta do processo de percepção do que está em causa; • A vontade individual e a habilidade para lidar com a incerteza; • A influência do seu inconsciente. A decisão em contexto organizacional tem, normalmente, lugar em grupos, tais como equipas, grupos tarefa, conselhos de gestão ou de administração. É raro as decisões sejam tomadas individualmente. Verifica-se, também, que só as decisões de tipo I tendem a ser tomadas individualmente, e que as de tipo II a ser tomadas em grupo. 91
Donald Piper “Decision Making”. Educational Administrative Quarterly, Vol. 10, pp. 82-95, 1974. Iring Janis – Groupthinking. Boston, Houghn Mifflin, 1982. 93 Campbell – “Individual Versus Group Problem Solving in an Industrial Sample”. Journal of Applied Psychology, Vol.52, n.º 3, 1968. 94 Stoner – “Risky in a Group Decision”. Journal of Experimental Social Psychology, Vol. 4 pp. 442-459, 1968. 92
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Há, fundamentalmente, duas razões para a decisão ser tomada em grupo: o aumento da complexidade organizacional que exige a intervenção de peritos em diversos campos; a implicação no processo de todos quantos serão chamados a implementar a decisão. Parece que se implementa e executa melhor quando se participou na tomada de decisão. A sociologia ensina-nos que há vantagens na tomada de decisão em grupo, dado que: • Os grupos possuem maior e mais variado grau de conhecimento do que qualquer indivíduo separadamente; • As decisões de grupo revelam maior probabilidade de aceitação por aqueles que as devem implementar, particularmente se os mesmos tiveram voz activa na decisão; • Tais decisões podem diminuir o capricho de certos decisores individuais. Há, porém, desvantagens na tomada de decisão em grupo, tais como: • A quantidade de tempo despendido é maior; • A decisão tende a ser pior do que se fosse tomada pelo membro mais qualificado do grupo; • A tendência para ser de fraca qualidade se a maioria dos membros não são altamente competentes; • Constituir um obstáculo aos mais inovadores, por causa da tendência para a conformidade ao pensamento geral do grupo. Em resumo, certas decisões são mais eficazes quando tomadas isoladamente, em particular, se são rotineiras e previsíveis, do tipo I, e têm lugar nos níveis operacionais mais baixos da estrutura. Outras decisões, em especial as de tipo II, estratégicas e não estruturadas têm vantagens, em ser tomadas em grupo, nos níveis mais altos da hierarquia. A investigação sociológica apresenta algumas provas que nos levam a concluir que a decisão de grupo: • É muitas vezes melhor do que a média das decisões individuais, mas raramente é melhor do que as dos melhores indivíduos; • Pode ser superior à decisão individual, embora, nem sempre possa ser demonstrado, e particularmente quando esteja em causa a participação de todos na implementação. A participação no processo de decisão constitui, assim, um ponto fundamental da teoria da decisão e pressupõe o envolvimento activo dos indivíduos directa-
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mente afectados, sejam funcionários, sejam utentes, usuários de um serviço público. A participação é, em geral, justificada pelo pressuposto de que aumenta a produtividade, conduz a uma maior satisfação dos funcionários e corresponde à obrigação moral de uma gestão participativa. Assim a participação dos funcionários é vista como: • • • •
Fomentadora de atitudes agradáveis para com a administração; Criadora de uma melhor relação entre chefia e subordinado; Impulsionadora da comunicação ascendente; Um elemento que melhora a aceitação dos superiores como seus representantes; • Motivadora dos funcionários; • Favorecedora da aceitação das decisões pelos subordinados. As potenciais desvantagens mais importantes da participação são: • Poder esta ser vista como perda de tempo; • Exigência de mais tempo disponível, para a decisão, que pode impedir que todos os elementos se pronunciem; • A confidencialidade de certas decisões; • Poder exigir conhecimentos especializados em matérias mais complexas. Actividade 4 Caracterize um tipo de decisão aconselhável a ser tomado em grupo.
5. MODELOS
DE
AVALIAÇÃO
E
DECISÃO
NO
SECTOR PÚBLICO
A necessidade de avaliar um programa, o impacto de uma política pública ou de um serviço prestado pela administração pública, tem origem na crença, comum, de que o resultado destas acções, por parte dos decisores públicos, acarreta benefícios mensuráveis. Por exemplo, um programa público destinado a alfabetizar adultos deve levar a melhorias mensuráveis nas capacidades de leitura dos cidadãos. Uma medida de redução dos limites de velocidade num itinerário principal, ou apenas a tolerância zero, por parte dos agentes reguladores de tráfego, deve conduzir à diminuição dos acidentes e, talvez, a alguns ganhos no consumo de combustível.
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Tudo isto pressupõe que os programas sociais devem possuir metas e objectivos bem explícitos, para que o sucesso ou o fracasso possam vir a ser observados e medidos empiricamente. A afirmação ou a simples pressuposição de que a medida vai ter sucesso, já não é, nos nossos dias, suficiente na administração pública. As forças políticas envolvidas e os cidadãos, individualmente ou organizados em grupos de pressão, exigem mais de quem governa. As afirmações só são válidas quando acompanhadas de provas empíricas que comprovem, ou neguem, a relação afirmada a montante, de que tal programa ou curso de acção iria provocar tal resultado. Resta perguntar em que medida a avaliação de que aqui falamos, apoiada nas teorias das diversas ciências sociais, é diferente de uma avaliação feita por um jornalista. Quanto a nós, a resposta encontra-se no uso do método científico. Na verdade, tanto o camponês como o meteorologista fazem previsões sobre o tempo, e o camponês pode acertar mais do que o meteorologista. Todavia, ambas as previsões, embora baseadas ambas em evidências empíricas – voo das aves e fenómenos meteorológicos –, são diferentes, por terem por base o senso comum e a ciência. O facto de uma observação ser científica tem a apoiá-la a comunidade científica – a opinião dos pares –, e dispõe de padrões ou protocolos tidos em conta na observação, que permitem a réplica, ou seja, que outro cientista, a partir dos mesmos dados, chegue a idêntica conclusão. Há, ainda, que salientar um ponto importante: a avaliação de que falamos, embora seja científica, não é investigação básica ou fundamental. É, sim, investigação fundamentada, mas sempre no âmbito do que é conhecido por investigação aplicada 95. Princípios para um Sistema de Decisão O que parece ser crítico para todos os métodos de avaliação que sejam adoptados é a resposta às seguintes questões: • O que é que o governo ou a presidência da autarquia se comprometeu, no programa eleitoral, a fornecer aos cidadãos? • Quem é responsável por o quê nesse mandato? • Quais as condições mais desejáveis? • Que imagem deseja promover junto da população? • Quem são e o que desejam os lobbies que influenciam a decisão política?
95
Sobre estes conceitos consultar: BILHIM, João – Gestão de Ciência e Tecnologia. Lisboa: ISCSP, 1995.
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Existem métodos que ajudam os decisores a avaliar e a determinar as prioridades programáticas, tendo em conta os níveis de constrangimento de financiamentos. Os três mais importantes são o incremental, o conceptual e o de desempenho:
Método Incremental Já muito se escreveu sobre a importância do método incremental no processo de tomada de decisão sobre a afectação de recursos na administração pública e, ao longo dos tempos, os decisores têm depositado nele muita confiança. De acordo com este método, as decisões são tomadas sobre o volume marginal de mudança que possa ocorrer de uma ano para o outro e os interesses instalados, em anos anteriores, não são postos em causa. Em linha de conta toma-se, apenas, o aspecto marginal de mudança que ocorre todos os anos. Caiden 96 observou que, historicamente, este tipo de afectação de recursos funcionou muito bem, dado que a ênfase colocada no ajustamento marginal anual era um bom guia para a acção no futuro imediato. Na prática, este método apenas possibilitava a escolha entre alternativas na parte marginal que dizia respeito ao novo ano. No essencial, o passado estava, automaticamente, aprovado para o ano seguinte. A principal atracção do modelo encontra-se, em nosso entender, na acentuação da estabilidade, e num processo de decisão assente na rotinização de procedimentos, tendo em vista a minimização da incerteza. A principal crítica que se faz a este método reside no facto de não ser sensível às mudanças da envolvente, num tempo marcado por profundas mudanças na forma de relacionamento entre os cidadãos e a administração. Neste contexto, o amanhã tende a ser encarado como diferente do hoje, pelo que o passado – mesmo que tenha sido brilhante –, poucas garantias pode dar relativamente ao futuro. A orientação pelo passado lembra a imagem do condutor de uma viatura que se orienta pelo espelho retrovisor. Para que lhe serve essa informação se não tomar em linha de conta o que se está a passar à sua frente? Do mesmo modo, o modelo incremental deu muito bons resultados nos períodos de forte estabilidade, mas não parece ser o mais aconselhável no presente, nem tão pouco no futuro próximo. 96
CAIDEN, N. – Public Budgeting Amidst Uncertainty and Instability in SHAFRITZ, J. M.; HYDE A. C. ed. – Classics of Public Administration. Pacific Grove, CA: Brooks/Cole, 485-496.
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Método Conceptual Este método concentra-se na discussão política acerca do papel do governo e ou da autarquia, sobre os propósitos subjacentes ao fornecimento de qualquer serviço pela administração pública. Por exemplo, o propósito do governo ou da autarquia é manter o nível de pobreza – de acordo com o provérbio chinês é oferecer peixe ou ensinar a pescar – ou criar condições de auto-suficiência? O salário mínimo garantido tem em vista criar condições ao emprego ou reforçar o desemprego e a dependência? Do ponto de vista social, o problema prende-se com a produtividade. Até que ponto as necessidades dos cidadãos em relação a alimentação, vestuário, habitação, saúde e segurança social, estão satisfeitas? Quando se estabelecem prioridades usando este método a ênfase é posta no grau em que a ajuda pontual ao cidadão lhe possibilita a auto-suficiência futura. Assim, a prestação de serviços de educação e formação profissional pode ser mais crucial para a tal auto-suficiência, do que subsídios para a ida ao teatro. Do ponto de vista estrutural, há que reconhecer que uma das vantagens da comunidade é a existência de sinergias na prestação de serviços, impossíveis de ser obtidas por cada um individualmente. O aspecto mais importante deste método está no facto de forçar a análise do papel que o governo ou a autarquia deve desempenhar, não dando como adquirido o que foi feito no passado. O passado é posto em causa, e confrontado com o que deve ser feito, tendo em conta o propósito da administração, conjugado com o princípio da maximização da utilidade. Método do desempenho Este tipo de método dá prioridade à medida sistemática dos resultados, por estes reflectirem mais os objectivos desejados do que a tradicional relação sistémica de “entrada, transformação e saída” como base para o estabelecimento de prioridades para a acção administrativa. Este método, mais próximo do planeamento e da gestão estratégica, 97 detalha bem a missão, metas, objectivos, programas, orçamentos e monitorização ou controlo da implementação. Há cinco pressupostos onde este método se apoia: a) muitas pessoas tomam decisões com base na sua experiência, formação profissional e gostos; 97
KOTEEN, Jack – Strategic Management in Public and Non-profit Organizations. London: Praeger, 1997.
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b) a postura reinante é a de minimizar o impacto negativo e maximizar os benefícios; c) a escolha do tipo de medida a usar no controlo reflecte, normalmente o processo/ produto; d) os indicadores devem ser mensuráveis; e) é importante maximizar as capacidades analíticas e minimizar o potencial de manipulação política. Nesta perspectiva, a medida de desempenho (performance), da administração pública exige que: a) Os decisores públicos – administradores, analistas, financiadores – compreendam a real natureza do sistema prestador de serviços. Por exemplo, este sistema está claramente definido? É de confiança e apresenta bons níveis de qualidade? b) Haja acordo quanto aos resultados a alcançar por tal sistema e haja incentivos capazes de basear todos os comportamentos organizacionais nos objectivos e nos resultados; c) Os dados sobre a medida do desempenho sejam correctamente recolhidos, analisados e claramente apresentados, e mereçam a confiança generalizada. Em nosso entender, são dez os principais princípios conceptuais a ter em conta na avaliação eficaz do desempenho: • Formulação de uma missão clara e coerente, da estratégia e dos objectivos; • Desenvolvimento de uma estratégia de medição explícita; • Envolvimento de utilizadores – chave na fase de concepção e desenvolvimento; • Racionalização da estrutura programática para fundamentar a medição; • Desenvolvimento de conjuntos múltiplos de medidas para múltiplos utilizadores; • Consideração do programa e dos sistemas de clientes ao longo do processo; • Fornecimento de detalhes suficientes para uma imagem clara do desempenho; • Revisão periódica do sistema de medição; • Previsão das complicações que possam surgir; • Evitar uma agregação excessiva de informação.
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Uma Nova Abordagem Até aqui fizemos o levantamento de três diferentes sistemas de avaliação e priorização de acções no sector público. Todavia, Mary Hale e Aimee Franklin 98, num artigo recente, apresentam os traços de um novo modelo de priorização que chamaram “reavaliação”. Este novo modelo trata da adequação entre três elementos: a) Necessidades do serviço a ser prestado; b) Alternativas de financiamento; c) Alcance dos objectivos. Este modelo alternativo valoriza, particularmente, a integração de serviços a prestar à comunidade, realçando a necessidade de canais permanentes de comunicação entre todos os stakeholders e a flexibilidade necessária para se proceder a revisões periódicas de objectivos. A chave para uma boa utilização deste modelo passa pelo envolvimento dos principais actores no próprio processo, a comunicação social e a opinião do público. Passa, ainda, pela a implementação de um sistema de controlo e revisão dos objectivos, associado a outro, de colheita sistemática de dados, aliado a um bom sistema de resolução de conflitos. Este modelo procura reduzir duplicações, compreender as ligações, encorajar a colaboração e estabelecer áreas de responsabilidade baseada na performance. O modelo introduz, ainda, uma democraticidade maior no processo de estabelecimento de prioridades e, consequente, tomada de decisão. No quadro que se segue, sumariamos, de acordo com Mary Hale e Aimee Franklin, os benefícios e os problemas que cada um dos quatro métodos de análise e priorização da intervenção pública levantam. Mapa Comparativo de Diferentes Enquadramentos Enquadramento
Benefícios
Incremental
Engloba a política do processo de determinação de prioridades.
Conceptual
Força um exame do papel apropriado do governo e tem em consideração os valores da comunidade.
Problemas Ausência de revisão periódica da política adoptada; resposta mínima às mudanças na envolvente. Não conduz a uma participação alargada, em especial por parte dos cidadãos.
98
HALE, Mary; FRANKLIN, Aimee – Re-evaluation Methods of Establishing Priorities for Governmental Services. Public Productivity & Management Review, Vol. 20, n.º 4 (Junho 1997), 384-396.
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Mapa Comparativo de Diferentes Enquadramentos Enquadramento Desempenho
Reavaliação
Benefícios
Problemas
Identifica os resultados desejados, e Dificulta o desenvolvimento permite a hierarquização de uniforme, a quantificação objectiva múltiplas alternativas/organizações. e minimiza o papel do processo político. Estabelece as prioridades, com base Ausência de recursos humanos numa visão sistemática e com formação, no levantamento abrangente da questão política, de necessidades e técnicas de através dos vários intervenientes. avaliação final.
Por último e numa tentativa de integrar a contribuição de todos os stakeholders no processo de avaliação e estabelecimento de prioridades da intervenção administrativa, gostaria de lembrar que os modelos e técnicas de avaliação que permitam a integração da visão dos clientes/utentes e dos funcionários da Administração Pública parecem estar a ganhar grande atenção actualmente 99. Hoje, não se aceita que haja organizações públicas bem posicionadas na sua performance, se não possuírem clientes/utentes e funcionários satisfeitos.
6. O PRINCÍPIO
DA
DECISÃO
O poder de decisão é, em nosso entender, a capacidade de manifestar e executar uma vontade sem sujeição a interferências de outras instâncias administrativas. De acordo com o n.º 1, do art.º 9.º, do Código do Procedimento Administrativo, os órgãos administrativos têm o dever de se pronunciar sobre assuntos da sua competência, apresentados pelos particulares e, nomeadamente: a) assuntos que, directamente, lhes respeitem; b)petições, representações, reclamações ou queixas formuladas em defesa da Constituição, das leis ou do interesse geral. Todavia, nos termos do n.º 2 do mesmo art.º e Código, não existe o dever de decisão quando, há menos de dois anos contados da data da apresentação do requerimento, o órgão competente tenha praticado um acto administrativo sobre o mesmo pedido formulado pelo mesmo particular com os mesmos fundamentos. Este artigo 9.º, do Código do Procedimento Administrativo, integra-se no capítulo II, dedicado aos princípios gerais. Constituindo verdadeiros princípios,
99
BILHIM, João – Metodologias e Técnicas de Avaliação. In Avaliação na Administração Pública. Lisboa: INA, 1999.
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a Administração fica vinculada, sempre que actua, a tê-los como padrão das suas opções, dos actos e das medidas que as regras jurídicas prevêem ser tomadas.
7. POLÍTICAS PÚBLICAS As políticas públicas compreendem o produto dos governos, responde à pergunta simples do que faz um governo? Produz políticas públicas. Corresponde ao curso de acção por parte de um ou mais actores públicos ou governamentais 100. Normalmente identificam-se duas grandes perspectivas de definição do processo político. A primeira mais de cariz generalista integrando tudo quanto possa ser tido por actividade do governo. Por vezes, aplica-se a teoria dos sistemas 101, em que o processo político é encarado como um sistema aberto, não raro actualmente encarar-se o processo político pelo lado da racionalidade nos termos da teoria da escolha pública 102. Uma outra perspectiva mais circunscrita alude às actividades de resolução de problemas. Normalmente organiza-se esta área do conhecimento em torno das seguintes eixos: O processo político em que se listam e identificam as fases do processo político; o efeito e aplicabilidade das políticas em que se identificam as técnicas e processos de gestão de programas públicos; as determinantes políticas, em que explica o processo de formação de uma política pública, nomeadamente, estimando custos e benefícios envolvidos na adopção de programas para a solução de problemas públicos em alternativa; avaliação ex ante e ex post dos impactos de tais políticas em termos de eficiência (rácio meios/resultados), de eficácia (objectivos alcançados), qualidade (grau de satisfação dos cidadãos); natureza democrática, isto é grau de envolvimento activo dos cidadãos em todas as fases do processo 103. Esta área tem as suas raízes nos EUA, tendo-se expandido nos anos sessenta do século passado com os programas sociais dedicado à war on Poverty da Administração Johnson. Estes programas exigiram um significativo esforço da intervenção social do Estado, esforço, aliás, iniciado, pese embora tenuemente, nos anos vinte desse mesmo século. Este significativo intervencionismo do Estado traduziu-se na expansão das missões e atribuições governamentais em matéria económica e social.
100 101 102 103
James Anderson – Public Policy Making. NY: Holt, Rhinehart & Winston, 1984 João Bilhim – Teoria Organizacional. Lisboa: ISCSP, 2013. André Alves; José Moreira – O que é a Escolha Pública? Cascais: Principia, 2004. Paul Sabatier – Political Science and Public Policy. Political Science & Politics June, 1991, 143-146.
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Aconteceu que a ampliação do volume de acções do governo na área social acarretou um aumento a tecnicidade das decisões na forma de lidar com estes novos problemas o que, por sua vez levou á necessidade de formar e seleccionar profissionais detentores destas novas qualificações ou competências. Esta foi a razão que esteve na origem da explosão de curso de graduação e pós graduação surgidos, então nos EUA. Neste ponto, o trabalho de Herbert Simon de quem temos falado ao longo deste capítulo, foi de enorme relevo em particular no que toca ao processo de tomada de decisão no processo político 104. Na Europa continental sempre houve a preocupação de qualificar profissionais nas áreas da administração e implementação. Todavia, o desenvolvimento do Estado de bem-estar social levou o Estado a uma maior intervenção nas áreas sociais e de combate à pobreza tendo surgido cursos ligados ao trabalho social, serviço social e política social, como foi o caso do ISCSP da Universidade de Lisboa ainda antes do 25 de Abril. Há, porém que reconhecer que o perfil de formação destinava-se a qualificar profissionais para desempenhar o papel “almofada” nas contradições sociais da época, quer no interior das empresas, quer na relação entre o Estado e a sociedade e que as técnicas ministradas em tais cursos se focalizavam na administração e intervenção, não relevando suficientemente os aspectos do desenho das políticas e da avaliação dos impactos.
TESTE FORMATIVO 1. 2. 3. 4.
Qual o papel dos gestores intermédios na tomada de decisão? Comente a frase: “decisão é igual a gestão”. Quais as características mais significativas do modelo de processo? Quais as principais conclusões da investigação sociológica sobre a decisão em grupo? 5. Quais os princípios a adoptar na medição do desempenho? 6. O que é o poder de decisão?
104
João Bilhim – Políticas Públicas e Agenda Política. Revista de Ciências Sociais e Políticas, Vol. 3, 2008.
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RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. A gestão intermédia supervisiona a tomada de decisão do nível operacional e, prepara a decisão estratégica de tipo II, que deverá ser tomada pelos escalões mais altos da hierarquia. 2. A tomada de decisão constitui parte integrante da gestão de qualquer tipo de organização pública ou privada. A competência nesta área, mais do que qualquer outro tipo de competência, diferencia os gestores quanto à sua eficácia. A importância da decisão no contexto organizacional, deriva do facto de afectar todas as funções do gestor nas organizações formais, públicas ou privadas. A boa ou má gestão tem a ver com a boa ou má tomada de decisão. 3. O modelo de processo possui uma orientação de longo prazo; está voltado para o futuro e para o crescimento; é estratégico na sua orientação; é adequado à inovação. As políticas e os procedimentos no modelo de processo são guias de acção, meios e não fins. 4. A investigação sociológica apresenta algumas provas que nos levam a concluir, que a decisão de grupo é, muitas vezes, melhor do que a média das decisões individuais, mas raramente é melhor do que as dos melhores indivíduos. A decisão de grupo pode ser superior à individual, mesmo quando não é demonstrado, particularmente quando esteja em causa o grau de implicação de todos os indivíduos no momento da implementação. 5. Princípios a adoptarem na medição do desempenho: Formulação de uma missão clara e coerente, da estratégia e dos objectivos; desenvolvimento de uma estratégia de medição explícita; envolvimento de utilizadores – chave na fase de concepção e desenvolvimento; racionalização da estrutura programática para fundamentar a medição; desenvolvimento de conjuntos múltiplos de medidas para múltiplos utilizadores; consideração do programa e dos sistemas de clientes ao longo do processo; fornecimento de detalhes suficientes para uma imagem clara do desempenho; revisão periódica do sistema de medição; previsão das complicações que possam surgir; evitar uma agregação excessiva de informação. 6. Poder de decisão é a capacidade de manifestar e executar uma vontade sem sujeição a interferências de outras instâncias administrativas.
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RESPOSTAS
ÀS
ACTIVIDADES
N.º 1. Exemplo de uma decisão estratégica: o aumento ou diminuição do investimento em educação. Exemplo de uma decisão rotineira: proceder ao pagamento de um recibo a um fornecedor. N.º 2: O aumento do investimento em educação: Fixar o objectivo: aumento, por exemplo, em 10% do número de crianças em jardins-de-infância num determinado ano; buscar alternativas: 1%, 2% 5% 7% etc. avaliar as suas consequências; tomar a decisão de aumentar em 0.5% a rubrica orçamental que cobre esta medida de política; implementar as acções que apoiam a decisão; avaliar e controlar o grau da satisfação dos objectivos que era o aumento em 10% do número de crianças em jardim-de-infância. N.º 3: Modelo racional: maximização; modelo organizacional: satisfação; modelo político: aceitação; modelo de processo: objectivos.
L EITURAS C OMPLEMENTARES ALLISON, Graham T. – Essence of Decision: Explain the Cuban Missile Crisis. Boston: Litle, Brown and Company, 1971. HARRISON, E. Frank – The Managerial Decision-Making Process, 5th edition. Boston: Houghton Mifflin Company, 1999. NIGRO, Lloyd G. – Decision Making in the Public Sector. New York: marcel Dekker, inc., 1984.
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8. GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. A Gestão Estratégica de Recursos Humanos 2. Princípios Orientadores da Gestão de Recursos Humanos: Regime Jurídico 3. Vínculos 4. Recrutamento e Selecção 5. Carreiras 6. Remunerações 7. Gestão e Avaliação do Desempenho 8. Mobilidade 9. Exercício de Cargos dirigentes 10. Férias, faltas e licenças Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a: • Relacionar gestão de pessoal e de recursos humanos; • Identificar as novas competências; 195
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. Gestão de Recursos Humanos
• Distinguir as funções e tarefas de um departamento de recursos humanos; • Explicar o que significa desenvolver pessoas para a sociedade do conhecimento; • Caracterizar a gestão de recursos humanos na administração pública. • Compreender a diferença entre regime de nomeação e de contrato de trabalho em funções públicas • Distinguir carreiras de regime especial e de regime normal • Compreender a diferença entre gestão e avaliação do desempenho • Conhecer o conceito de posição remuneratória • Distinguir os instrumentos de mobilidade
1. A GESTÃO E STRATÉGICA
DE
RECURSOS HUMANOS
Os novos modelos de gestão, capazes de fazer frente às profundas transformações da envolvente, baseiam-se numa nova filosofia, centrada nas pessoas funcionários e trabalhadores da Administração (drivers da criação de valor na organização), e no desenvolvimento das capacidades de cada trabalhador. Uma das mais poderosas forças que levam às reformas administrativas e transformações estruturais e de processos de trabalho é a mudança que está a ocorrer para colocar o cidadão no centro de toda a actividade administrativa. O primeiro desafio que se coloca a qualquer organização pública, é compreender a natureza desta nova postura estratégica para que proceda ao alinhamento das competências dos funcionários e trabalhadores da Administração com esta nova orientação estratégica. Para uma organização pública dar este salto estratégico, os seus gestores têm de mudar de paradigma, por exemplo, ao nível operacional, têm de evoluir da sua função tradicional, de fazedores mecanicistas de primeira linha, para se tornarem empreendedores e inovadores; os dirigentes intermédios têm de passar de controladores administrativos a treinadores do desenvolvimento das suas equipas de trabalho; os dirigentes máximos terão de ser menos arquitectos da estratégia da organização, e mais construtores da instituição. Os dirigentes máximos (cargos de direcção superior) têm de dar exemplo de valor acrescido, como resultado das suas capacidades de desenvolvimento, em vez das suas capacidades de controlo. Usando a sua posição de alto nível para oferecer apoio e coordenação. Esses gestores conseguirão fazer com que os recursos e a experiência de uma grande organização consigam suportar unidades operacionais mais autónomas. Se as pessoas são o centro de toda a reforma e da melhoria da qualidade das políticas públicas e da provisão de bens públicos ao cidadão, é indispensável que 196
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estas pessoas disponham das qualificações e competência profissionais adequadas e que estas estejam alinhadas com os novos desígnios e atribuições estratégicas da Administração. Por isso impõe-se que a formação contínua e especializada em áreas estratégicas sejam uma prática comum na Administração, pese embora a constatação a formação formal, só contribui com cerca de 10 por cento para o desenvolvimento do conhecimento e experiência de que um gestor necessita. Em organizações de alto desempenho, o desenvolvimento do conhecimento está instituído na corrente sanguínea das operações em curso no seu âmbito. O conhecimento e as competências baseados na experiência, necessários à função de gestor de topo, são mais amplamente definidos e demoram mais tempo a desenvolver. Além das atitudes e características pessoais de um indivíduo, e em adição aos seus conhecimentos e experiência adquiridos, há um conjunto final de competências pessoais, que descrevemos como habilidades e capacidades. Esses atributos são, normalmente, os melhores indicadores do sucesso de um indivíduo. Até porque têm tendência para estar directamente ligados às funções chave, e às tarefas centrais que caracterizam um determinado trabalho. Chave para o desenvolvimento das habilidades críticas para o futuro da organização é facultar, aos funcionários e trabalhadores, a formação e apoio que os encoraje a aplicar os seus talentos naturais e a experiência acumulada, nos desafios específicos da sua função. Esta função de treinador por parte dos dirigentes e todos os níveis tornou-se tão importante, que é, agora, definida como uma responsabilidade central da gestão pública. Algumas organizações dispõem de um mentor pessoal e acreditam que existe algo quase místico na função catalítica que o mentor/treinador desempenha na ligação das capacidades dos trabalhadores com o seu conhecimento e experiência adquiridos de forma a permitir que tais habilidades, tão difíceis de reter, possam emergir e serem postas ao serviço da organização Este enfoque, no desenvolvimento das habilidades e capacidades dos colaboradores constitui um factor de elevada motivação e satisfação no e com o trabalho, revelando grande importância para os indivíduos e a organização. Deve constituir prática corrente os dirigentes de todos os níveis, nomeadamente os intermédios (directores de serviço e chefes de divisão) reunirem com cada colaborador para discutir e acordar os objectivos de eficácia, eficiência, qualidade e em particular o seu desenvolvimento e melhoria continua. O SIADAP 3 105 é claro nesta matéria não apenas da avaliação do desempenho, mas em especial da gestão do desempenho por parte dos dirigentes Gerir é obter resultados (eficiência, eficácia, qualidade), através do trabalho e da acção dos outros, isto é, dos membros de uma equipa. Ora, como poderá este 105
Consultar a Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro que estabelece o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública.
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líder de equipa, dirigente da Administração, obter tais resultados, se ele não comunica bem os objectivos (o que há para fazer durante o ano) e se, periódica e sistematicamente, não faz o ponto de situação com cada membro da sua equipa acerca do progresso verificado? Ora, é através deste processo de gestão do desempenho que os indivíduos desenvolvem, gradualmente, a capacidade de reconhecer os problemas centrais, aplicar abordagens de resolução de problemas, dividir responsabilidades e integrar tarefas. Este processo é a chave para o desenvolvimento da criatividade, perspicácia e iniciativa. Para o trabalhador que desenvolve as competências chave, tal como para o treinador cujo cuidado, exigência e incitamento oferecem a energia catalítica, chegar a este objectivo é muito satisfatório. O relacionamento (entre o mentor e o indivíduo), começa como um acto de vontade, mas torna-se, ao longo do tempo, muito mais do que uma ligação emocional. São transmitidas capacidades de resolução de problemas mas também inspiração, valores, desafios, e uma imagem positiva do valor individual, de que quase tudo é possível. Chegados a este ponto importa perguntar: mas afinal o que é gestão de recursos humanos? Para os autores da Harvard Business School, a gestão de recursos humanos, diz respeito “a todas as decisões de gestão que afectam a relação entre a organização e os seus empregados” 106. Por isso, trata de questões mais ligadas à técnicas tais como: vínculos; recrutamento e selecção; formação e desenvolvimento de competências; carreiras; gestão e avaliação do desempenho; remunerações; segurança e higiene no trabalho; estatuto disciplinar. Por outro lado, trata dos processos de gestão de recursos humanos e, progressivamente, mais críticos para o sucesso de qualquer organização tais como: desenvolvimento de equipas de trabalho, implicação e motivação dos trabalhadores, comunicação interna, qualidade, liderança, mudança organizacional. Haverá diferenças entre a gestão de recursos humanos na administração pública e na administração privada? Embora tenha havido pouca investigação empírica comparativa das práticas de gestão da função pública e do sector privado, que nos identifique com clareza as diferenças, há a percepção generalizada de que ambos os sectores possuem práticas diferentes, e que os governos têm incentivado a aproximação de regimes 107. Apesar desta aproximação, parece-nos que ainda prevalece uma distinção de “ethos” bastante profunda entre os dois modelos pelos menos relativamente aqueles indivíduos que desempenham atribuições e competência ligadas à autoridade e soberania., que representam o Estado face à sociedade. 106 M. Beer et al. – Human Resource Management: A general manager’s perspective. Nova York: Free Press, 1985. 107 George Boyne, et al. – Human Resource Management in the Public and Private Sectors: An empirical comparison. Public Administration, Vol. 77, n.º 2, 1999, 405-420.
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Num estudo, levado a cabo, em Inglaterra, por George Boyne 108 e colegas, chegou-se à conclusão de que o modelo de gestão de recursos humanos do sector público é mais paternalista, estandardizado e colectivizado do que o modelo privado. Convém salientar, que estas três características foram definidas na obra de Farnham e Horton, 109 que desenvolveram um método de análise da gestão de recursos humanos, no sector público, a partir destas três variáveis básicas. O estilo paternalista tem a ver com os propósitos de proteger e promover o bem-estar dos funcionários. As práticas estandardizadas de emprego ligam-se à uniformização, não tendo em conta que há diferenças de performance, e prendem-se com o facto de o modelo não admitir excepções, as quais são avaliadas em termos de precedente grave. A colectivização prende-se com o tipo de relações industriais, ou seja o tipo de relação entre os funcionários e os sindicatos e entre estes últimos e a administração. Até ao presente e em Portugal as semelhanças são apenas em aspectos acidentais e periféricos, pese embora o facto dos capítulos de qualquer manual apresentarem as mesmas designações. A gestão de recursos humanos praticada em contexto político diferente, substancialmente, da gestão de recursos humanos praticada no contexto empresarial. Acontece, porém, que tais diferenças não são de grande monta, pelo menos em Portugal, entre empresas do sector público – sociedades anónimas de capital total ou parcialmente público – e empresas de capital privado. Uma Administração Pública moderna, ao serviço das pessoas, exige novas formas de gestão e de mobilização dos funcionários, mais objectividade, mais equidade, melhor serviço, menos burocracia, e mais inovação e criatividade. Actividade 1 Faça uma entrevista a dois gestores ou técnicos de gestão de recursos humanos, respectivamente da administração privada (empresa) e da administração pública (direcção-geral ou instituto público) e identifique as diferenças e semelhanças quanto às técnicas e processos de gestão.
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George Boyne et al. – op. Cit. p. 417. D. Farnham; S. Horton – Managing People in the Public Services. Londres: Macmillan, 1996.
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2. PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA GESTÃO HUMANOS : REGIME JURÍDICO
DE
RECURSOS
Até ao XVII Governo Constitucional verificava-se a existência de uma grande variedade e indefinição de critérios de utilização de vínculos de nomeação; (provisória e definitiva) e de tipo e natureza de contratos: contrato administrativo de provimento; comissão de serviço extraordinária; contrato individual de trabalho a termo (certo ou incerto); por tempo indeterminado; contrato de prestação de serviço. Quanto às carreiras havia no total havia 1179 com conteúdos funcionais sobrepostos e pouco discriminados repartindo-se por 653 do regime geral, 119 do regime e dos corpos especiais e 407 por categorias isoladas. Quanto às escalas remuneratórias as carreiras do regime geral e as do regime especial dispunham de uma escala única com o índice 100 (mesmo valor) no que toca aos corpos especiais cada possuía a sua escala própria partindo de índices 100.com valores diferentes. As escalas remuneratórias existentes eram superiores a 522 posições. As componentes remuneratórias eram compostas por: remuneração base com várias escalas; suplementos por norma em percentagem; subsídio de refeição; prestações sociais. Proliferavam suplementos remuneratórios com natureza permanente, cuja atribuição apenas depende da integração em carreira e que se cumulam, em regra, com uma remuneração base superior à de outras carreiras com idênticas exigências habilitacionais. Os principais problemas que a situação, então, revelava eram: descaracterização dos vínculos; excessivo número de carreiras; opacidade do sistema remuneratório (sem relação com a gestão do serviço e com as disponibilidades orçamentais); rigidez, retirando capacidade de gestão aos dirigentes; evolução remuneratória automática em muitas situações; excessiva relevância dada ao tempo de serviço. Em suma, o sistema de gestão de recursos humanos na Administração Pública ao tempo revelava-se: rígida, difícil e complexo de gerir; impeditivo de uma verdadeira gestão de RH; desincentiva a melhores desempenhos; desalinhamento com a estratégia de modernização da Administração. Os princípios da reforma apoiaram-se na opção estratégia da gestão por objectivos definida pelo XV Governo e continuada pelo XVII. Foi a partir desta perspectiva estratégica que parece terem sido arquitectadas as propostas de: manutenção da perspectiva de carreira; aproximação ao regime laboral comum; diferenciar níveis de desempenho para progressão nas carreiras; gestão de recursos humanos relacionada com a gestão por objectivos em cada serviço; revisão do regime de protecção social numa perspectiva de convergência; reforço das condições de mobilidade; reforço dos poderes de gestão dos dirigentes, mecanismos de 200
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responsabilização, fundamentação dos actos de gestão e respectiva transparência. A reforma subordinou-se aos seguintes princípios: subordinação ao interesse público, imparcialidade e transparência na gestão dos RH e igualdade de acesso ao exercício de funções públicas; valorização profissional dos trabalhadores e estímulo e reconhecimento de melhores desempenhos; maior flexibilidade na gestão dos RH (nas opções de gestão, no recrutamento; na fixação de remunerações); monitorização e controlo das despesas com pessoal. As principais medidas de política foram: aproximação ao regime laboral comum, com respeito pelas especificidades da Administração Pública; sujeição ao mesmo regime, em domínios fundamentais, da relação de emprego público, independentemente do tipo de vínculo; gestão de RH relacionada com a gestão por objectivos dos serviços e com os postos de trabalho necessários para as suas actividades; manutenção de perspectiva de carreira para os trabalhadores; reforço dos poderes de gestão dos dirigentes, dos mecanismos de responsabilização, de fundamentação dos actos de gestão e da sua transparência; predominância da avaliação do mérito na evolução nas carreiras; reforço das condições de mobilidade; controlo da evolução anual das despesas com o pessoal da AP; revisão do regime de protecção social, numa perspectiva de convergência, incluindo a protecção no desemprego nas vinculações não definitivas.
3. V ÍNCULOS Com o novo tipo de vinculação a gestão dos recursos humanos deixou de se basear em “quadros de pessoal” para se apoiar em “mapas de pessoal” de actualização anual, com identificação dos postos de trabalho necessários. Acresce ainda que a execução das actividades passou a estar condicionada pelas atribuições, objectivos (anuais e plurianuais) e recursos financeiros do organismo. Para garantir a imparcialidade no exercício de funções públicas definiram-se os conceitos de “incompatibilidades”- que expressa a ausência de conciliação entre cargos ou funções e de “impedimentos” que traduz uma impossibilidade do exercício de funções por aquela pessoa. No sentido da salvaguarda do mesmo princípio por regra é proibida a acumulação de funções públicas (públicas + públicas). Pese embora poder ser derrogada (n.º 1 do art. 27.º): No caso de actividades não remuneradas (se existir manifesto interesse na acumulação; no caso de actividades remuneradas (se existir manifesto interesse público e se ocorrer uma das situações taxativamente enunciadas nas diversas alíneas do n.º 2.
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Acumulação com outras funções privadas (públicas + privadas) a regra neste caso é da sua permissão. Esta acumulação só será proibida quando a lei determinar uma incompatibilidade entre ambas. Não depende da natureza remuneratória da actividade nem da concreta pessoa do trabalhador. Entende-se por actividade concorrente ou similar aquela cujo conteúdo é idêntico às funções públicas acrescida do seu exercício de forma permanente ou habitual; são ainda integradas neste conceito as situações previstas no n.º 4 do artigo 28.º. No orçamento de cada Serviço é fixado: o montante destinado a encargos com o pessoal em funções; o montante destinado ao preenchimento de novos postos de trabalho; o montante destinado a mudanças de posições remuneratórias dos trabalhadores do serviço; o montante destinado à atribuição de prémios de desempenho dos trabalhadores do Serviço. Com a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro que estabeleceu os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, passou a existir apenas três modalidades de relação jurídica de emprego público: a) contrato de trabalho em funções públicas b) nomeação; c) comissão de serviço. 3.1. Contrato de Trabalho em Funções Públicas A definição da actividade contratada é feita por remissão para o conteúdo funcional de categoria legalmente descrito, ou de carreira quando se trate de carreira unicategorial, e, sendo o caso, para o elenco das funções ou das tarefas que, no regulamento interno ou no mapa de pessoal da entidade empregadora pública contratante, caracterizam o posto de trabalho a ocupar. A contratação em funções públicas abrange todos os não nomeados e que não exerçam funções em comissão de serviço. O contrato pode ser por tempo indeterminado ou a termo resolutivo certo ou incerto. Por outro lado, a lei 12-A/08 adaptou para o vínculo de contratação o regime laboral comum salvaguardada a especificidade da Administração Pública; foi adaptado o Estatuto do Pessoal Dirigente; impôs-se a publicitação das contratações por tempo indeterminado; mantiveram-se as causas de cessação do vínculo contratual consagradas na lei, mas introduziu-se um regime de mobilidade especial para possível reafectação do trabalhador a outro serviço. Foi adaptado o regime de contratação colectiva às especificidades de prossecução do interesse público; seguiu-se o princípio da igualdade mínima entre os regimes das duas modalidades de vinculação; afirmou-se a inderrogabilidade dos princípios enformadores dos sistemas, por instrumentos de contratação colectiva; introduziram-se instrumentos de contratação colectiva por carreira ou conjunto de carreiras e não por serviço, sector ou ministério.
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A relação para o exercício de funções públicas nasce com a formação do contrato que constitui a sua fonte. Na sua formação, as partes devem agir de acordo com os ditames da boa fé, sob penas de responderem pelos danos que venham a causar. Salienta-se que esta regra é comum, tanto a este regime como ao Código do Trabalho e ao Código Civil. Isto implica que as partes que negoceiam um contrato o cumprimento dos deveres de protecção ou segurança, informação e lealdade. A conformação ao conteúdo destes deveres assenta no princípio da tutela da confiança. O contrato está sujeito à forma escrita e dele deve constar a assinatura das partes. Do contrato devem constar, pelo menos, as seguintes indicações: a) Nome ou denominação e domicílio ou sede dos contraentes; b) Modalidade de contrato e respectivo prazo ou duração previsível, quando aplicável; c) Actividade contratada, carreira, categoria e remuneração do trabalhador; d) Local e período normal de trabalho, especificando os casos em que é definido em termos médios; e) Data do início da actividade; f ) Data de celebração do contrato; g) Identificação da entidade que autorizou a contratação 110. O período experimental corresponde ao tempo inicial de execução do contrato e destina -se a comprovar se o trabalhador possui as competências exigidas pelo posto de trabalho que vai ocupar. A duração do período experimental pode ser reduzida por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. O período experimental não pode ser excluído por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. São nulas as disposições do contrato ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que estabeleçam qualquer pagamento de indemnização em caso de denúncia do contrato durante o período experimental. Nos contratos por tempo indeterminado, o período experimental tem a seguinte duração: a) 90 dias para os trabalhadores integrados na carreira de assistente operacional e noutras carreiras ou categorias com idêntico grau de complexidade funcional; b) 180 dias para os trabalhadores integrados na carreira de assistente técnico e noutras carreiras ou categorias com idêntico grau de complexidade funcional; c) 240 dias para os trabalhadores integrados na carreira de técnico superior e noutras carreiras ou categorias com idêntico grau de complexidade funcional. 3.2. Nomeação A nomeação aplica-se às actividades relativas ao exercício de poderes de soberania e autoridade: missões das Forças Armadas em quadros permanentes; repre110
Consultar a Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (artigo 72).
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sentação externa do Estado; informações de segurança; investigação criminal; e segurança pública; inspecção. A nomeação reveste as modalidades de: definitiva: exercício de funções por tempo indeterminado; transitória: exercício de funções por tempo determinado ou determinável – observa as disposições do contrato de trabalho em funções públicas referentes aos contratos de trabalho a termo resolutivo (art. 13.º). As actividades relativas ao exercício de poderes de soberania e autoridade (nomeação) apresentam três características inovatórias: eliminado o conceito de funcionário público; passa a ser restrita a o núcleo duro da Função Pública – o legislador anunciou áreas de actividade e não carreiras; pode passar a revestir uma natureza precária – passando-se a ter nomeações a termo resolutivo certo ou incerto. São causas de cessação da nomeação: a) conclusão sem sucesso do período experimental; b) exoneração a pedido trabalhador; c) mútuo acordo, mediante justa compensação; d) pena disciplinar expulsiva; morte do trabalhador; e) aposentação. 3.3. Comissão de Serviço A relação jurídica de emprego público constitui-se por comissão de serviço quando se trate: a) do exercício de cargos não inseridos em carreiras, designadamente dirigentes; b) da frequência de curso de formação específico, aquisição de determinado grau académico, ou título profissional antes do período experimental para o exercício de funções integradas em carreira (por parte de quem está sujeito a prévia relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado). A comissão de serviço tem a duração de três anos: o tempo de serviço em comissão de serviço é contado na carreira e categoria a que o trabalhador regressa; a aceitação da comissão de serviço reveste a forma de posse; a comissão de serviço cessa a todo o tempo por iniciativa da entidade empregadora ou do trabalhador, com aviso prévio de 30 dias; a cessação determina ou o regresso à situação jurídica de que era titular, ou a cessação da relação jurídica de emprego público (nos dois casos com direito a indemnização, quando prevista em lei especial). 3.4. Contrato de Prestação de Serviços A celebração de contratos de tarefa ou avença pode ter lugar quando, cumulativamente: a) se trate de executar trabalho não subordinado; b)o trabalho seja realizado, em regra por uma pessoa colectiva; c) seja observado o regime legal de aquisição de serviços – procedimento de realização de despesa; d) o contratado
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comprove ter regularizadas as suas obrigações fiscais e com a segurança social; e) O trabalho seja realizado, em regra por uma pessoa colectiva. Esta regra geral apenas pode ser derrogada em situações excepcionais: a) quando se mostrar impossível; b) ou quando se verificar inconveniência na contratação de pessoas colectivas. Esta excepcionalidade é reforçada pela obrigatoriedade de sujeição a autorização prévia a conceder através de acto discricionário do membro do Governo responsável pela área das Finanças. No caso dos contratos de prestação de serviços violarem os critérios referidos: os contratos produzem plenos efeitos durante o período em que tenham estado em execução; cominação legal (nulidade); o responsável pela celebração do contrato incorre em responsabilidade civil, financeira e disciplinar; para efeitos de efectivação da responsabilidade financeira (nos termos da Lei do Tribunal de Contas), consideram-se os pagamentos despendidos em sua consequência como sendo pagamentos indevidos.
4. RECRUTAMENTO
E
SELECÇÃO
O recrutamento de novos trabalhadores obedece aos seguintes pressupostos: impossibilidade ou inconveniência de assegurar o cumprimento dos objectivos do Serviço com o pessoal no activo, pode apresentar um juízo de avaliação sobre os índices de produtividade dos trabalhadores existentes e do nível remuneratório que em função deste índice lhes deve competir. Em função deste juízo, o dirigente pode optar pela abertura de concurso verificada a necessidade de preenchimento de novos postos de trabalho e assegurada a respectiva dotação orçamental. Os Serviços publicitarão obrigatoriamente o procedimento de Selecção. No recrutamento de novos trabalhadores por regra: Só pode ser candidato ao procedimento quem seja titular de nível habilitacional e área de formação correspondentes ao grau de complexidade da carreira e categoria do posto de trabalho a ocupar. Existe uma excepção: aquando da publicitação do procedimento, pode prever-se a possibilidade de candidatura de quem, não sendo titular de habilitação específica considere dispor da experiência profissional ou formação necessárias (excepto se lei especial exigir título ou preenchimento de certas condições); possibilidade de candidatura por qualquer trabalhador, independentemente da sua carreira, categoria ou posição remuneratória; Nas carreiras em regime de nomeação e nas carreiras especiais (regime de contrato), pode exigir-se: titularidade de certa categoria e período de experiência Profissional em áreas identificadas. Posicionamento Remuneratório em regime de contrato. O posicionamento do trabalhador recrutado numa das posições remuneratórias da categoria é 205
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objecto de negociação com a entidade empregadora pública. Há pela primeira vez na história da Administração um mecanismo inovador de fixação inicial da remuneração do contratado que permite negociação do escalão retributivo, que tem por base uma fundada expectativa quanto ao nível qualitativo da prestação laboral, que deve ter como referência as posições remuneratórias ocupadas pelo pessoal no activo. Negociação importa salvaguardar alguns critérios de equidade e transparência: a determinação do posicionamento remuneratório tem em consideração a posição relativa dos candidatos na lista de graduação – tem em conta mérito relativo dos candidatos; o posicionamento em concreto resulta da negociação, por escrito, entre trabalhador e dirigente máximo do Serviço; a falta de acordo com determinado candidato determina a negociação com o que se lhe siga na ordenação; a este candidato não pode ser proposto posicionamento remuneratório superior ao máximo que tinha sido proposto e não aceite por qualquer dos candidatos que antecedem naquela ordenação; após o encerramento, a documentação relativa aos procedimentos concursais é pública e de livre acesso.
5. CARREIRAS O Estado de Bem-estar Social ao longo do século XX provocou um crescimento exponencial das funções do Estado que acarretou o crescimento da Administração e o aumento da despesa pública e da carga fiscal, até um nível em que se impôs o controlo dos custos com pessoal, fazendo mais e melhor com menor dispêndio. A concepção clássica sobre os recursos humanos da Administração Pública na generalidade dos países ocidentais, assenta na existência de um corpo estável de trabalhadores, tecnicamente competente e politicamente neutro, dotado de um estatuto específico destinado a garantir o respeito da legalidade e a prossecução eficaz, permanente e imparcial do interesse público, evitando que a actuação deste corpo seja contaminada por interesses particulares. O seu referencial é a “Função Pública” imune às vicissitudes político-governativas, isenta perante o jogo partidário e protegida de pressões da sociedade civil. O estatuto específico destes trabalhadores, resume-se nos termos seguintes: a) Regime estatutário de direito público, livre e unilateralmente modificável pela Administração; b) Nomeação vitalícia; c) Integração numa organização hierárquica; d) Estruturação por carreiras rígidas; e) Definição estatutária dos requisitos exigidos para o ingresso em cada carreira; f ) Não reconhecimento da experiência profissional exterior à carreira; g) Sistema de promoções e progressões salariais definido estatutariamente e assente principalmente nas qualificações e na 206
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antiguidade; h) Regime de aposentação especial; i) Estatuto disciplinar especial 111. As vantagens e regalias específicas deste estatuto face á lei geral do trabalho tinham em vista compensar um eventual acréscimo de deveres e restrições (e, nalguns casos, um nível remuneratório mais baixo) equivalente ao chamado modelo de carreira Ora, modelo de emprego dos funcionários públicos – e, em última análise, o próprio modelo tradicional de Administração – encontra-se em crise desde finais dos anos oitenta do século passado e acha-se sob tensão crescente. Progressivamente o cidadão comum interroga-se por que razão o funcionário público há de ter um regime de trabalho diferente do seu e numa sociedade aberta como é a dos nosso dias as respostas encontradas para tal especificidade não são abundantes 112. Por isso nos países da OCDE progressivamente se estão a adoptar modelos diferentes na gestão dos recursos humanos das duas administrações públicas. As estratégias reformadoras têm se norteado pelos seguintes eixos: Redução da dimensão do Estado e das Administrações Públicas; Introdução de novos modelos de orçamentação, gestão e controle orientados para objectivos e resultados; Modificação da natureza, das modalidades e das condições do emprego na Administração Pública. Este último eixo encerra diversas guias específicas: Reorganização, reestruturação e redimensionamento do pessoal; Diversificação dos tipos contratuais (público ou privado, termo ou sem termo, a tempo integral ou parcial), com a correspondente multiplicação dos regimes aplicáveis aos trabalhadores da Administração Pública; Alteração ou eliminação de alguns dos elementos do modelo de carreira, tomando como referência as condições de trabalho no sector privado. Na lei 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, todo o título IV trata do regime de carreiras. Nos termos da referida lei, só os trabalhadores com vínculo permanente (nomeação ou contrato) exercem funções integrados em carreiras. As carreiras estão qualificadas em função de três critérios: a) o conteúdo funcional dos postos de trabalho, art. 41; se a execução das funções necessárias a satisfação das necessidades do serviço são comuns à generalidade desses serviços – a carreira deve qualificar-se como geral; se o posto de trabalho envolve funções apenas necessários em alguns serviços – a carreira deve qualificar-se como especial. As carreiras especiais só podem ser criadas quando: a) Os respectivos conteúdos funcionais não possam ser absorvidos pelos conteúdos funcionais das carreiras gerais; 111
Confrontar Comissão de Revisão do Sistema de Carreiras e Remunerações (CRSCR) – Relatório Vínculos, Carreiras e Remunerações na Administração Pública: Diagnóstico e perspectivas de evolução. Lisboa: Ministério das Finanças e da Administração Pública, Setembro de 2006. 112 Veja-se João Bilhim – Gestão por objetivos, desempenho e progressão nas carreiras in César Madureira; Asensio, Maria – Handbook de Administração Pública. Lisboa: INA, 2103, pp. 189-206.
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b) Os respectivos trabalhadores se devam encontrar sujeitos a deveres funcionais mais exigentes que os previstos para os das carreiras gerais; c) Para integração em tais carreiras, e em qualquer das categorias em que se desdobrem, seja exigida, em regra, a aprovação em curso de formação específico de duração não inferior a seis meses ou a aquisição de certo grau académico ou de certo título profissional. Quanto ao número de categorias, as carreiras classificam-se em unicategoriais ou pluricategoriais, consoante sejam compostas por uma ou mais categorias. Só podem ser criadas carreiras com mais de uma categoria quando o conteúdo funcional seja distinto. Apenas podem ser criadas carreiras pluricategoriais quando a cada uma das categorias da carreira corresponde um conteúdo funcional distinto do das restantes. O conteúdo funcional das categorias superiores integra o das que lhe sejam inferiores. Por outro lado, deixou de existir a distinção entre carreiras verticais e horizontais. Quanto ao grau de complexidade funcional, nos termos do art. 43.º passou a ser obrigatório que o conteúdo funcional de cada carreira esteja legalmente descrito, tendo sido estabelecidos três graus de complexidade funcional para as carreiras, consoante o nível habilitacional mínimo que se exige para a integração nas mesmas: a) grau 1, escolaridade obrigatória; b) grau 2, 12.º ano de escolaridade; c) grau 3, licenciatura ou um grau académico superior. Pelo Decreto-Lei n.º 121/2008, de 11 de Julho são identificadas e extintas as carreiras e categorias cujos trabalhadores integrados ou delas titulares transitam para as carreiras gerais de técnico superior, assistente técnico e assistente operacional previstas no n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro. Este diploma identifica, ainda, as carreiras e categorias que subsistem por impossibilidade de se efectuar a transição dos trabalhadores nelas integrados ou delas titulares para as carreiras gerais, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 106.º da lei 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.
6. REMUNERAÇÕES A cada categoria das carreiras corresponde um número variável de posições remuneratórias. À categoria da carreira unicategorial corresponde um número mínimo de oito posições remuneratórias. Nas carreiras pluricategoriais, o número de posições remuneratórias de cada categoria obedece às seguintes regras: a) À categoria inferior corresponde um número mínimo de oito posições remuneratórias; b) A cada uma das categorias sucessivamente superiores corresponde um número proporcionalmente decrescente de posições remuneratórias para que: i) Estando a carreira desdobrada em duas categorias, seja de quatro o número 208
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mínimo das posições remuneratórias da categoria superior; ii) Estando a carreira desdobrada em três categorias, seja de cinco e de duas o número mínimo das posições remuneratórias das categorias sucessivamente superiores; iii) Estando a carreira desdobrada em quatro categorias, seja de seis, quatro e duas o número mínimo das posições remuneratórias das categorias sucessivamente superiores. Tendo em consideração as verbas orçamentais destinadas a suportar o tipo de encargos previstos, o dirigente máximo do órgão ou serviço decide, se, e em que medida, este se propõe suportar encargos decorrentes de alterações do posicionamento remuneratório na categoria dos trabalhadores do órgão ou serviço. Esta decisão, fundamentadamente, deve fixar: o montante máximo, com as desagregações necessárias, dos encargos a suportar pelo Serviço; o universo das carreiras e categorias onde as alterações de posicionamento remuneratório podem ter lugar. Determinação do universo a desagregar, tendo em conta: A atribuição, competência, ou actividades que os trabalhadores de determinada carreira ou categoria devem executar; A área de formação académica ou profissional, quando esta tenha sido utilizada na caracterização dos postos de trabalho contidos nos mapas de pessoal. As alterações podem não ter lugar em todas as carreiras, nem em todas as categorias de uma carreira, nem ainda relativamente a todos os trabalhadores de determinada carreira ou categoria. Esta decisão é pública, devendo ser afixada no Serviço e inserida em página electrónica. Nos termos do artigo 46.º quem preenche os universos definidos: Os trabalhadores do Serviço (onde quer que exerçam funções) que tenham obtido nas últimas avaliações do desempenho (referentes às funções exercidas durante o posicionamento remuneratório em que se encontram). Art. 47.º; duas menções máximas consecutivas; três menções imediatamente inferiores às máximas consecutivas, ou; cinco menções imediatamente inferiores às supra referidas, desde que consubstanciem desempenho positivo, consecutivas. Uma vez determinados os trabalhadores em cada um dos universos definidos, são ordenados, dentro de cada universo, por ordem decrescente de classificação quantitativa obtida na última avaliação de desempenho. A alteração de posicionamento remuneratório tem lugar quando, independentemente dos universos referidos, o trabalhador tenha acumulado 10 pontos nas avaliações de desempenho durante o posicionamento remuneratório onde se encontra, sendo os 10 pontos são contados da seguinte forma: 3 pontos por cada menção máxima; 2 pontos por cada menção imediatamente inferior à máxima; 1 ponto por cada menção imediatamente inferior à referida a alínea anterior, desde que consubstancie desempenho positivo; 1 ponto por cada menção correspondente ao mais baixo nível de desempenho. Ainda que não se encontrem reunidos os requisitos mencionados, o dirigente máximo, ouvido o CCA, pode: (art. 48.º) Alterar para a posição remuneratória imediatamente seguinte, o trabalhador que na última avaliação de desempenho 209
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tenha obtido a menção máxima ou imediatamente inferior; Determinar que a alteração do posicionamento na categoria do trabalhador se opere para qualquer outra posição remuneratória seguinte àquela em que se encontra (tendo como limite a posição remuneratória máxima para a qual tenham alterado o seu posicionamento os trabalhadores que, no memo universo, se encontrem ordenados superiormente). Estas alterações são particularmente fundamentadas e tornadas públicas com o teor integral da respectiva fundamentação e do Parecer do Conselho Coordenador da Avaliação. Quanto à atribuição de Prémios de Desempenho os trabalhadores que obtenham classificações mais elevadas – a menção máxima ou a imediatamente inferior a ela e; exerçam funções no órgão ou serviço pode ser atribuído um prémio pecuniário, de prestação única, no quadro das disponibilidades orçamentais destinadas a esse fim. O Dirigente máximo fixa, fundamentadamente, no prazo de 15 dias após o início de execução do Orçamento, o universo de cargos, carreiras e categorias onde a atribuição de prémios de desempenho pode ter lugar, com as desagregações necessárias do montante disponível em função de tais universos Não terá direito à atribuição de prémio de desempenho trabalhador que, ainda que preencha os requisitos, tenha, no ano a que se reporta a última avaliação de desempenho, mudado de posição remuneratória na categoria em que se encontrava; os trabalhadores que preencham os universos serão graduados no universo a que pertencem por ordem decrescente e em função da classificação quantitativa obtida na última classificação de serviço; pelo que, mesmo que demonstrado o mérito, a sua percepção depende da verba afecta a essa finalidade não se ter esgotado com o pagamento do prémio ao trabalhador ordenado imediatamente à frente. O prémio terá o valor da remuneração base que cada trabalhador auferir. No prazo de 15 dias, após o início da execução do orçamento, o dirigente máximo do serviço terá de garantir: as remunerações dos trabalhadores; as alterações de posicionamento remuneratório (10 pontos – avaliação desempenho. Deverá optar entre: Recrutamento de novos trabalhadores (artigos 50.º e seguintes.); Alterações de posicionamento remuneratório não obrigatórias (artigos 46.º e seguintes); Atribuição de prémios de desempenho (artigos 74 e seguintes). O novo sistema retributivo é agora extensivo a todos os trabalhadores que possuam uma relação jurídica de emprego público: nomeados; contratados por tempo indeterminado; contratados a termo resolutivo; comissão de Serviço. Os grandes princípios do regime remunerativo terão: por base as seguintes componentes: remuneração-base (incluindo subsídio de férias e Natal); suplementos; prémios de desempenho; tabela remuneratória única (engloba a totalidade de níveis remuneratórios, das carreiras gerais e especiais); o número de posições remuneratórias deve permitir que o trabalhador atinja a posição máxima perto do fim da sua vida profissional; A mudança de posição remuneratória 210
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opera-se, em regra para a posição imediatamente superior, dependendo da verificação de requisitos de tempo e de classificação de serviço; elimina-se a natureza automática e permanente de quaisquer suplementos; em matéria de suplementos segue-se um princípio de limitação, de modo a que apenas existam quando os trabalhadores, em certos postos de trabalho, tenham condições mais exigentes que outros de idêntica carreira ou categoria; Os suplementos constituirão, em regra, montantes determinados e não percentagens da remuneração base; os suplementos são sempre referenciados a um concreto posto de trabalho, e não apenas à titularidade da carreira, categoria ou área funcional; aos trabalhadores com melhor desempenho pode ser atribuído um prémio pecuniário, de prestação única, caso exista disponibilidade orçamental para o efeito; prevê-se a possibilidade de sistemas específicos de recompensa pelo desempenho: em carreiras especiais e em função do resultado de equipas.
7. GESTÃO
E
AVALIAÇÃO
DO
DESEMPENHO
Há uma diferença essencial entre a avaliação do desempenho e a gestão do desempenho. A Lei 66 B/07, de 28 de Dezembro refere por diversas vezes a necessidade do desempenho ser gerido. Talvez, infelizmente, não tenha dado tanta importância à gestão como deu à avaliação do desempenho. Todavia, a lei não a esqueceu. Aliás, se a tivesse esquecido, olvidaria a dimensão mais importante que é a gestão e não a avaliação. Gerir o desempenho é assumir a postura básica que gerir é obter resultados através do trabalho dos outros (equipa de trabalhão). Ora, como é possível obter resultados obtidos por outrem se o dirigente não estabeleceu correctamente no início do período os objectivos a atingir por aquele colaborador e se em particular ao longo do ano foi fez pontos de situação, dando feedback sobre a forma como este seu colaborador está alinhado ou não com os objectivos definidos em termos de eficiência, eficácia, qualidade economia e ética? A avaliação não é um fim em si. A avaliação é um meio para que o colaborador/trabalhador possa permanentemente progredir e melhora continuamente. O fim não é punir ou gratificar. Estes são processos cujo fim é o aumento da satisfação dos trabalhadores, utilizadores dos serviços prestados e da equipa de gestão entre outros multi-interessados (stakeholder). Quando não se fez a gestão do desempenho dos colaboradores ao longo do ano, não existe sistema de avaliação que possa suprir esta carência grave por mais impressos e formulários que seja necessário preencher. Pelo contrário, quando a gestão foi feita, isto é, quando os objectivos foram fixados e bem comunicados, a monitorização (feedback) ao longo do ano e de forma periódica foi realizada, até 211
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uma simples folha de papel A4 é instrumento suficiente para recolher e materializar a avaliação final. Precisamente porque os dirigentes não têm praticado a gestão do desempenho e, num determinado dia, sem avisos ao longo do ano, confrontam os trabalhadores com um formulário onde expressam a sua avaliação, é que este dia se transforma num dia fatídico para dirigentes e funcionários. Importa ainda salientar que o regime previsto na lei 66B/07, de 28 de Dezembro é um sistema integrado o que significa que é um sistema que exige que em simultâneo seja feita a avaliação do organismo (SIADAP 1) a avaliação dos dirigentes (SIADAP2) e a avaliação dos funcionários (SIADAP 3). Acresce que um sistema de gestão e avaliação do desempenho deve ser flexível e com grande plasticidade para se adaptar às diversas situações. Por isso o facto deste regime estar consagrado em Lei não se afigura ter sido a melhor opção legislativa em virtude de uma lei, por regra, comportar princípios gerais que são detalhados em diplomas de menor importância. A lei 66B/07 contém tantos detalhes que nunca deveriam estar contidos num diploma desta natureza não apenas do ponto de vista da legística mas do ponto de vista da gestão. Tais detalhes têm de ser plasmados às novas necessidades e contingências que anualmente surgem. Por outro lado avaliar é sempre difícil. É frequente os dirigentes sentirem-se desconfortáveis com a hipótese de discutir os pontos fracos do desempenho directamente com os colaboradores receiam a confrontação sempre que tenha de dar um feedback negativo Muitos colaboradores tendem a ficar na defensiva quando os seus pontos fracos são evidenciados, não aceitando o feedback como algo construtivo e base de melhoria. Em 98% dos casos o dirigente depara com algum tipo de agressão. Os colaboradores tendem a ter uma percepção exagerada do seu desempenho. As pessoas são peritas em desviar a responsabilidade pelos erros, mas muito rápidas a ficar com p crédito pelos sucessos. Julgamos as pessoas de maneira diferente, dependendo do significado que atribuímos a determinado comportamento. As pessoas têm a tendência para atribuir os seus sucessos a factores internos, tais como as competências ou o esforço, e os seus falhanços a factores externos, tais como a sorte e o azar. O sistema de gestão do desempenho tem de desenvolver uma cultura de confiança e estimular a participação dos colaboradores. Quando isto não acontece importa rever o procedimento. É que algo está errado! A avaliação do desempenho refere-se a um processo de identificação, medida e gestão do nível de realização dos membros de uma dada organização 113. A avaliação do desempenho remonta ao início do século XX. Tentava-se que a avaliação do desempenho, tal como os testes psicológicos, deveria exprimir afirmações exactas acerca do desempenho dos indivíduos. Nos anos oitenta, inicia-se 113
João Bilhim – Gestão Estratégica de Recursos Humanos. Lisboa: ISCSP, 2007.
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um modelo de avaliação diferente, que até hoje corre em paralelo. Procura-se analisar os processos cognitivos dos avaliadores com o objectivo de identificar as regras que seguem na elaboração dos seus julgamentos. A avaliação de desempenho tem duas grandes funções: administrativa e de desenvolvimento. A função administrativa prende-se com a utilidade dos resultados da avaliação, para outras técnicas de GRH, tais como a remuneração e a promoção, entre outras. A função de desenvolvimento de potencial liga-se à formação destinada a aumentar as competências do trabalhador. A avaliação de desempenho é a pedra angular de qualquer sistema eficaz de gestão de recursos humanos. A avaliação de desempenho fornece a informação necessária para a tomada de decisões estratégicas ao diagnosticar o grau de adaptação entre o sistema actual de GRH e o que é exigido pela mudança de direcção estratégica da organização. Serve ainda como um sistema de controlo estratégico para medir o desempenho actual relativamente aos objectivos estratégicos já fixados. O processo de avaliação da realização é difícil em virtude de os critérios de eficácia e ineficácia serem frequentemente difíceis de definir e da pouca clareza das áreas de realização pelas quais um indivíduo é responsável. Por outro lado, muitas vezes, a avaliação não é baseada na efectiva realização do titular de uma determinada função, mas na percepção subjectiva da sua chefia. Alguns destes ambíguos e vagos juízos são difíceis de evitar, dada a pouca clareza na atribuição de funções e, em especial, a ausência de gestão do desempenho por parte das chefias 114. O primeiro passo a dar na avaliação de desempenho é identificar “o que deve ser medido”. Há em primeiro lugar que identificar bem as dimensões, isto é, os aspectos da realização que determinam um desempenho adequado. Se faltar uma dimensão (aspecto/característica), é normal que esta ausência vá afectar a moral do colaborador em virtude de ele se ter esforçado exactamente naquele ponto. Se, pelo contrário, for levada em linha de conta uma dimensão claramente irrelevante e trivial, o colaborador pode ficar com a ideia de que o processo não tem sentido, nem valor. A métrica, isto é, o sistema de medida que traduzirá a avaliação. Há quem use uma escala numérica de um a vinte e quem, pelo contrário, lance mão de uma escala de quatro pontos: excelente, bom, médio, pobre. Há ainda quem prefira uma escala com cinco posições, deixando espaço para três como ponto médio. Há vantagens e desvantagens em todas elas. O importante é a decisão tendo em linha de conta o tipo de cultura organizacional e de trabalhador em presença. Os sete principais erros da avaliação Ser pouco exigente nos níveis de resultados: datas fáceis de serem cumpridas; Objectivos departamentais que fomentam conflitos: Uns aumentam as vendas outros sofrem o aumento do risco; Não 114
João Bilhim – A Meritocracia na Administração Pública. In Hugo Silvestre; Joaquim Araújo – Coletânea em Administração Pública. Lisboa, Escolar Editora, 2012, pp. 163-180.
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avaliar a partir do ponto de vista do cliente; Avaliar o mais fácil, mas não o necessário; Objectivos com efeitos paralisantes: não pensar nas consequências; Encontrar desculpa fácil. Quanto aos critérios da escolha dos objectivos ter em conta: Mensurabilidade: O que será obtido, quando, como, onde; Exequibilidade – existe uma probabilidade aceitável de se atingir o objectivo; Realismo; Possibilidade de controlo/ avaliação -quem faz; Relação Custo/Benefício: Quanto custa; Prioridade e sequência – de entre dois ou mais objectivos qual deve ser atingido primeiro. Os objectivos deverão ser apresentados pelo superior hierárquico aos colaboradores a título provisório e só após estes terem sido ouvidos, o dirigente fixará definitivamente os objectivos para cada um. A realidade não corrobora a ideia geral de que os objectivos estabelecidos de forma participada são superiores aos que são atribuídos. A participação não é um meio que garanta o aumento do desempenho dos colaboradores. As pessoas tendem, porém a aceitar melhor um objectivo difícil se for estabelecido de forma participada do que um atribuído arbitrariamente. Para que a participação funcione, tem de haver tempo suficiente para participar, os assuntos nos quais os colaboradores são envolvidos têm de ter importância e ligação com os seus interesses, os colaboradores têm de ter capacidade (inteligência, conhecimentos técnicos, capacidades de comunicação) para participar e a cultura da organização tem de apoiar e incentivar o envolvimento dos colaboradores. Acresce que nem todas as pessoas desejam a responsabilidade inerente à participação. Preferem que lhes seja dito o que devem fazer e que o chefe fique com as preocupações. Os objectivos difíceis e específicos (operacionais) permitem um maior nível de desempenho do que o objectivo genérico do estilo “faça o seu melhor!” Uma grande percentagem dos trabalhadores acredita ter falta de objectivos específicos no seu trabalho. O grande desafio dos dirigentes é terem colaboradores que encarem os objectivos difíceis como alcançáveis. Assim que um colaborador aceitar uma tarefa difícil, é natural que despenda um grande nível de esforço para a alcançar. Salienta-se que os objectivos globais do SIADAP são: Avaliar a qualidade dos serviços; Avaliar os dirigentes; Diferenciar o desempenho; Potenciar o trabalho em equipa; Identificar necessidades de formação; Fomentar a mobilidade; Promover a comunicação; Fortalecer a liderança; Melhoria da gestão pública; Consolidar práticas de avaliação; Identificar necessidades de formação; Promover a motivação; Distinguir serviços e pessoas; Melhorar a arquitectura de processos; Melhorar a informação, promovendo a transparência; Apoiar o processo de decisão estratégica Por último, importa salientar que se os objectivos foram mal fixados será impossível correr bem este momento da avaliação. Investir a montante na fixação dos objectivos é poupar a jusante na avaliação: que resultados são expectáveis? 214
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Foram atingidos os resultados pretendidos? Quais as razões dos desvios? Estas são questões fundamentais para que o SIADAP não se transforme num ritual burocrático de gestão.
8. MOBILIDADE Os grandes instrumentos da mobilidade são: mobilidade externa (art. 58.º); mobilidade interna (artigos 59.º a 65.º). Ambas as Mobilidades têm como pressuposto o interesse público, podem apenas abranger trabalhadores que possuam relação de emprego por tempo indeterminado. A mobilidade geral e especial dos funcionários e agentes encontra-se disciplinada na Lei n.º 53/2006, de 7de Dezembro e nela prevêem-se os seguintes instrumentos de Mobilidade Geral: transferência, permuta, requisição; destacamento; afectação Específica; cedência especial. Há ainda instrumentos de Mobilidade Especial: reafectação; reinicio de funções do pessoal colocado em situação de Mobilidade Especial. A transferência consiste na nomeação do funcionário, sem prévia aprovação em concurso, para lugar vago do quadro de outro serviço: a) Da mesma categoria e carreira; b) De carreira diferente desde que os requisitos habilitacionais exigíveis sejam idênticos e haja identidade ou afinidade de conteúdo funcional entre as carreiras. A permuta é a nomeação recíproca e simultânea de funcionários pertencentes a quadros de pessoal de serviços distintos, podendo ocorrer para lugar vago do quadro do outro serviço: a) Da mesma categoria e carreira; b) De carreira diferente desde que os requisitos habilitacionais exigíveis sejam idênticos e haja identidade ou afinidade de conteúdo funcional entre as carreiras. A «requisição e destacamento» é o exercício de funções a título transitório em serviço diferente daquele a que pertence o funcionário ou agente sem ocupação de lugar do quadro, sendo os encargos suportados pelo serviço de destino, no caso da requisição, e pelo serviço de origem, no caso do destacamento. A requisição e o destacamento fazem-se para a categoria e carreira que o funcionário ou agente já detém. A requisição pode ainda fazer-se para a categoria imediatamente superior da mesma carreira ou para categoria de carreira diferente desde que o funcionário ou agente preencha, em ambos os casos, os requisitos legais para o respectivo provimento. A «afectação específica de funcionário ou agente» corresponde ao o exercício de funções próprias da sua categoria e carreira noutro serviço ou pessoa colectiva pública, para satisfação de necessidades específicas e transitórias, se necessário em acumulação com as do serviço de origem 215
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Mediante acordo de cedência especial entre serviços ou com pessoa colectiva pública, o funcionário ou agente que tenha dado o seu consentimento expresso por escrito pode exercer funções noutro serviço ou pessoa colectiva pública em regime de contrato de trabalho, com suspensão do seu estatuto de funcionário ou agente. A reafectação é instrumentos de mobilidade especial em que o pessoal que tenha a qualidade de funcionário ou agente dos serviços que sejam objecto de extinção, fusão e reestruturação ou de racionalização de efectivos pode ser mantido no respectivo serviço, sujeito a instrumentos de mobilidade ou colocado em situação de mobilidade especial, de acordo com os seguintes procedimentos: a) Em caso de extinção; b) Em caso de fusão; c) Em caso de reestruturação; d) Em caso de racionalização de efectivos. O reinício de funções de pessoal colocado em situação de mobilidade especial pode ter lugar em qualquer serviço, a título transitório ou por tempo indeterminado, desde que reúna os requisitos legalmente fixados para o efeito. Quando não se trate de cargo ou função que, legalmente, só possam ser exercidos transitoriamente, o exercício de funções a título transitório pelo prazo de um ano determina, por opção do interessado, a sua conversão automática em exercício por tempo indeterminado, em lugar vago, ou a criar e a extinguir quando vagar, do quadro de pessoal do serviço onde exerce funções, com a natureza do vínculo e na carreira, categoria, escalão e índice que o funcionário ou agente detinha na origem. O regime de mobilidade especial foi substituído e alterado pelo novo regime da requalificação de trabalhadores em funções públicas pela Lei n.º 80/2013, de 28 de Novembro. Com estas alterações o governo procura obter mais flexibilidade na gestão dos seus recursos humanos. Há uma preocupação por aproximar o regime da contratação pública ao regime geral do trabalho. Trata-se de uma política que está a ser seguida por outros países da OCDE.
9. EXERCÍCIO
DE
CARGOS
DIRIGENTES
Actualmente, o diploma básico regulador é a Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro que definiu o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado. Esta lei é aplicável aos institutos públicos, salvo no que respeita às matérias específicas reguladas pela respectiva lei-quadro. A aplicação deste regime nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira não prejudica a publicação de diploma legislativo regional que o adapte às especificidades orgânicas do pessoal dirigente da respectiva administração regional, sendo igualmente aplicada, com as necessárias adaptações, à administração local Todavia, não é aplicável aos cargos dirigentes próprios das Forças Armadas e das forças de segurança. 216
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O diploma considera cargos dirigentes os cargos de direcção, gestão, coordenação e controlo dos serviços e organismos públicos Estes cargos dirigentes qualificam-se em cargos de direcção superior e cargos de direcção intermédia e subdividem-se, respectivamente, em dois graus, em função do nível hierárquico, das competências e das responsabilidades que lhes estão cometidas. São cargos de direcção superior de 1.o grau os de director-geral, secretário-geral, inspector-geral e presidente e de 2.o grau os de subdirector-geral, adjunto do secretário-geral, sub-inspectores, vice-presidente e vogal de direcção. Constituem cargos de direcção intermédia de 1.º grau o de director de serviços e de 2.º grau o de chefe de divisão. A missão do pessoal dirigente é garantir a prossecução das atribuições cometidas ao respectivo serviço, assegurando o seu bom desempenho através da optimização dos recursos humanos, financeiros e materiais e promovendo a satisfação dos destinatários da sua actividade, de acordo com a lei, as orientações contidas no Programa do Governo e as determinações recebidas do respectivo membro do Governo. Os titulares dos cargos dirigentes estão exclusivamente ao serviço do interesse público, devendo observar, no desempenho das suas funções, os valores fundamentais e princípios da actividade administrativa consagrados na Constituição e na lei, designadamente os da legalidade, justiça e imparcialidade, competência, responsabilidade, proporcionalidade, transparência e boa fé, por forma a assegurar o respeito e confiança dos funcionários e da sociedade na Administração Pública. Os titulares dos cargos dirigentes devem promover uma gestão orientada para resultados, de acordo comos objectivos anuais a atingir, definindo os recursos a utilizar e os programas a desenvolver, aplicando de forma sistemática mecanismos de controlo e avaliação dos resultados. A actuação dos titulares de cargos dirigentes deve ser orientada por critérios de qualidade, eficácia e eficiência, simplificação de procedimentos, cooperação, comunicação eficaz e aproximação ao cidadão. Na sua actuação, o pessoal dirigente deve liderar, motivar e empenhar os seus funcionários para o esforço conjunto de melhorar e assegurar o bom desempenho e imagem do serviço. Os titulares dos cargos dirigentes devem adoptar uma política de formação que contribua para a valorização profissional dos funcionários e para o reforço da eficiência no exercício das competências dos serviços no quadro das suas atribuições. O exercício da função dirigente está dependente da posse de perfil, experiência e conhecimentos adequados para o desempenho do respectivo cargo, bem como da formação profissional específica. A permanente actualização no domínio das técnicas de gestão e desenvolvimento das competências do pessoal dirigente é garantida através do sistema de formação profissional. O exercício de funções dirigentes de nível intermédio implica o prévio aproveitamento em curso específico para alta direcção em Administração Pública. 217
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A formação profissional específica incluirá necessariamente as seguintes áreas de competências: a) Organização e actividade administrativa; b) Gestão de pessoas e liderança; c) Gestão de recursos humanos, orçamentais, materiais e tecnológicos; d) Informação e conhecimento; e) Qualidade, inovação e modernização; f ) Internacionalização e assuntos comunitários. No exercício das suas funções, os titulares de cargos dirigentes são responsáveis civil, criminal, disciplinar e financeiramente. Os titulares dos cargos de3 direção são recrutados, por procedimento concursal, de entre indivíduos com licenciatura concluída à data de abertura do concurso há pelo menos 12 ou 8 anos, consoante se trate de cargos de direção superior de 1.º ou de 2.º grau, vinculados ou não à Administração Pública, que possuam competência técnica, aptidão, experiência profissional e formação adequadas ao exercício das respetivas funções. A iniciativa do procedimento concursal cabe ao membro do Governo com poder de direção ou de superintendência e tutela sobre o serviço ou órgão em que se integra o cargo a preencher, competindo-lhe, neste âmbito, definir o perfil, experiência profissional e competências de gestão exigíveis aos candidatos. 115 O procedimento concursal é efetuado pela Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP), entidade independente, que funciona junto do membro do Governo responsável pela área da Administração Pública, nos termos dos respetivos Estatutos. A Comissão estabelece, nos termos das suas competencias, os critérios aplicáveis na seleção de candidatos a cargos de direção superior, designamente as competências de liderança, colaboração, motivação, orientação estratégica, orientação para resultados, orientação para o cidadão e serviço público, gesetão da mudança e inovação, sensibilidade social, experiência profissional, formação académica e formação profissional. (www.cresap.pt) Os titulares dos cargos de direcção intermédia são recrutados de entre funcionários dotados de competência técnica e aptidão para o exercício de funções de direcção, coordenação e controlo, que reúnam, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) Licenciatura; b) Aprovação no curso de formação específica previsto no artigo 12.º; c) Seis ou quatro anos de experiência profissional em carreiras para cujo provimento seja legalmente exigível uma licenciatura, consoante se trate de cargos de direcção intermédia de 1.º ou 2.º grau, respectivamente. Sem prejuízo do disposto no número anterior, a área de recrutamento para os cargos de direcção intermédia de unidades orgânicas cujas funções sejam essen115
Consultar: José Eugenio Soriano; João Bilhim – “La Racionalidad Política y técnica en la selección de la Alta Administración Pública y Gestión Pública Portuguesa”. El Cronista, n.º 38 Júnio 2013, pp. 30-36. João Bilhim – “Papel dos Gestores na Mudança Cultural da Administração Central do Estado: O caso da Meritocracia”. Passagens, Revista Internacional de História Política e Cultura Jurídica, Rio de Janeiro, vol. 5, n.º 2 Maio-Agosto, 2013, pp. 205-207 (DOI 10.553/1984-2503-21135202).
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cialmente asseguradas por pessoal integrado nas carreiras técnicas é alargada a pessoal destas carreiras, ainda que não possuidores de licenciatura. Quando as leis orgânicas expressamente o prevejam, o recrutamento para os cargos de direcção intermédia pode também ser feito de entre funcionários integrados em carreiras específicas dos respectivos serviços ou organismos, ainda que não possuidores de curso superior. O estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, é aplicável, com as necessárias adaptações, aos trabalhadores que exercem funções públicas na modalidade de contrato 116.
10. FÉRIAS ,
FALTAS E LICENÇAS
O regime das férias, faltas e licenças dos funcionários e agentes da Administração Central, Regional e Local, incluindo os institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos, consta do Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de Março, alterado pela Lei n.º 117/99, de 11 de Agosto. Nesta sede, vigoram ainda outros diplomas que iremos referir quando abordarmos os aspectos a que se aplicam. Férias O direito a férias é um direito com relevância constitucional, uma vez que se encontra previsto na alínea d) do n.1 do artigo 59.º da Constituição da República Portuguesa, sendo irrenunciável e imprescritível, nos termos do n.º 7 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 100/99. O número de dias a que cada funcionário ou agente tem direito é diferenciado consoante a idade e vai desde um mínimo de 22 dias úteis, até se completar 39 anos, 23 desde esse limite e até aos 49, 24 entre os 49 e os 59 e 25 a partir dos 59 anos de idade, considerando-se, para este efeito, a idade que o interessado completar até 31 de Dezembro do ano em que as férias se vencem (n.ºs 1 e 2 do artigo 2.º). No ano civil de ingresso, só há, todavia, direito a dois dias úteis de férias por cada um dos meses completos de serviço até 31 de Dezembro desse ano e depois de decorridos 60 dias de prestação efectiva de trabalho (artigo 3.º, com a redacção dada pela Lei n.º 117/99).
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Consultar a Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (artigo 6).
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Os dias de férias podem ser gozados em meios-dias, no máximo de quatro meios-dias, seguidos ou interpolados (n.º 6 do artigo 2.º). O direito a férias adquire-se com a constituição da relação jurídica de emprego público, vence-se no dia 1 de Janeiro de cada ano e reporta-se, em regra, ao serviço prestado no ano civil anterior (n.º.s 3 e 5 do artigo 2.º). Corolário da finalidade de assegurar os objectivos deste direito, que estão fixados no n.º 4 do artigo 2.º, é a proibição, vertida no n.º 8 deste preceito, de exercício de qualquer actividade remunerada durante as férias, salvo se a mesma já viesse sendo legalmente exercida. O direito a férias confere direito ao pagamento do respectivo subsídio, nos termos do artigo 4.º. As férias devem ser gozadas, em princípio, no decurso do ano civil em que se vencem (artigo 8.º) e obedecem às regras sobre marcação contidas nos artigos 5.º e 6.º. Excepcionalmente, permite-se que as férias respeitantes a determinado ano possam ser gozadas no ano civil imediato, nos termos estabelecidos no artigo 9.º. Aos funcionários e agentes, que gozem a totalidade das férias entre 1 de Janeiro e 31 de Maio e/ou de 1 de Outubro a 31 de Dezembro, é concedido um período complementar de cinco dias úteis de férias, de acordo com o estipulado no artigo 7.º. As férias interrompem-se nos casos de maternidade, paternidade, adopção, doença do próprio ou de familiares e, ainda, por razões imperiosas e imprevistas decorrentes do funcionamento dos serviços, nos termos do artigo 10.º. Neste domínio, aplica-se igualmente o Decreto-Lei n.º 194/96, de 16 de Outubro, diploma que veio regulamentar o regime constante da Lei n.º 4/84, de 5 de Abril, bem como os diplomas que a vieram alterar (regime jurídico da protecção da maternidade e paternidade). As únicas faltas que descontam nas férias são as previstas nos artigos 66.º e 67.º do Decreto-Lei n.º 100/99 (faltas por conta das férias) e as faltas injustificadas. Já as licenças têm repercussão nas férias nos termos previstos a propósito de cada um dos tipos de licença (ver artigos 74.º e seguintes deste diploma). Neste capítulo, é ainda regulado o regime do gozo de férias nos seguintes casos especiais: cumprimento de serviço militar (artigo 14.º); comissão de serviço e requisição em entidades sujeitas a regime diferente do da função pública (artigo 15.º); cessação definitiva de funções (artigo 16.º). Faltas Define-se o conceito de falta, distinguindo desta a ausência por exercício do direito à greve, a qual se rege pelo disposto na Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto (Lei da greve), alterada pela Lei n.º 30/92, de 20 de Outubro, e considera-se justifi220
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cada, embora dê sempre lugar a perda das remunerações correspondentes aos períodos de ausência. As faltas podem ser justificadas quando observem o condicionalismo legalmente exigido e sejam reconduzíveis aos motivos tipificados taxativamente no n.º 1 do artigo 21.º ou injustificadas, quando sejam dadas por outros motivos, quando não respeitem o condicionalismo legalmente fixado e, ainda, quando o motivo invocado seja falso. Do elenco taxativo do artigo acabado de citar constam as seguintes faltas: a) Por casamento (ver também o artigo 22.º) – 11 dias úteis equiparados a serviço efectivo mas determinando perda do subsídio de refeição; b) Por maternidade, paternidade e adopção (artigos 23.º e 26.º, respectivamente, remetendo-se para os diplomas que contêm o regime jurídico desta matéria: Lei n.º 4/84, de 5 de Abril, alterada pelas Leis n.os 17/95, 102/97, de 5 de Abril, e 18/98, de 28 de Abril); embora não expressamente referido, é importante não esquecer que, nesta sede, é igualmente aplicável o Decreto-Lei n.º 194/96, já anteriormente citado – estas faltas são consideradas, para todos os efeitos legais, como prestação efectiva de trabalho, mesmo para efeitos de atribuição do subsídio de refeição; c) Por nascimento (artigo 24.º) – trata-se do direito conferido ao pai, de faltar dois dias úteis, aquando do nascimento de um filho – são equiparadas a serviço efectivo mas implicam a perda do subsídio de refeição; d) Para consultas pré-natais e amamentação – artigo 25.º, que remete para os diplomas reguladores da maternidade e da paternidade – não implicam perda de remuneração nem de quaisquer regalias; e) Por falecimento de familiar (artigo 27.º e 28.º) – até cinco dias consecutivos por falecimento de cônjuge não separado de pessoas e bens, de pessoa com quem o funcionário ou agente viva há mais de dois anos em condições análogas à do cônjuge ou de parente afim no 1.º grau de linha recta e dois dias no caso de falecimento de parente ou afim em qualquer outro grau da linha recta e no 2.º e 3.º graus da linha colateral – são consideradas serviço efectivo mas determinam a perda do subsídio de refeição; f ) Por doença (artigos 29.º a 48.º) – implicam sempre a perda do subsídio de refeição e determinam, exceptuados os casos de internamento hospitalar ou de faltas dadas por deficientes quando decorram da deficiência, a perda do vencimento de exercício nos primeiros 30 dias de ausência, seguidos ou interpolados em cada ano civil, bem como o desconto na antiguidade, para efeitos de carreira, quando ultrapassem 30 dias seguidos ou interpolados em cada ano civil; o vencimento de exercício perdido pode ser recuperado nos termos do n.º 6 do artigo 29.º, com a redacção dada pela Lei n.º 117/99, de 11/98. Para além das exigências em sede de comprovação da doença, contidas nos artigos 30.º a 32.º e da possibilidade de verificação 221
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domiciliária da doença, de acordo com o preceituado nos artigos 33.º a 35.º. g) Por doença prolongada (artigo 49.º) – constam de despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Saúde, conferem ao trabalhador o direito a faltar até ao limite de 36 meses e não descontam para efeitos de antiguidade, promoção e progressão; as faltas dadas ao abrigo da Assistência a Funcionários Civis Tuberculosos regem-se pelo disposto no Decreto-Lei n.º 48359, de 27 de Abril de 1968; quanto a este regime, há que ter em conta, todavia a revogação operada pelo art.º 107.º do Decreto-Lei n.º 100/99; h) Dadas por acidente em serviço ou doença profissional – não determinam desconto na antiguidade, nem perda de vencimento de exercício e do subsídio de refeição – regem-se por legislação especial (Decreto-Lei n.º 38523, de 23 de Novembro de 1951 e legislação complementar, sendo que, pela Lei n.º 105/99, de 26 de Julho, foi concedida autorização parlamentar ao Governo para legislar sobre esta matéria, com o sentido e limites expressamente fixados e no prazo de 180 dias, findo o qual esta autorização legislativa caduca); i) Para reabilitação profissional – artigo 51.º – é a situação em que se encontram os trabalhadores que, tendo sido considerados pela junta médica da ADSE incapazes para o exercício das suas funções mas aptos para outras, requeiram a sua reconversão ou reclassificação profissional; tem a duração de seis meses, prorrogáveis por duas vezes, por períodos não superiores a três meses; produzem os efeitos das faltas por doença, com excepção da perda do vencimento de exercício ou o das faltas por acidente de trabalho ou doença profissional, se for este o motivo determinante da situação; j) Para tratamento ambulatório, realização de consultas médicas e exames complementares de diagnóstico do funcionário ou agente (artigo 52.º) ou do seu cônjuge, descendentes ou equiparados (artigo 53.º) – têm de obedecer ao regime previsto nestes preceitos, sendo as horas utilizadas, depois de somadas, convertidas em dias completos de faltas, os quais são, para todos os efeitos legais, considerados como serviço efectivo; k) Para assistência a familiares (art.º 54.º, com a redacção dada pela Lei n.º 117/99 e diplomas reguladores da maternidade e paternidade) – nesta sede, há que distinguir duas situações: l) Por isolamento profiláctico (artigos 55.º a 58.º) – são equiparadas a serviço efectivo; m) Ao abrigo do estatuto de trabalhador – estudante (artigo 59.º e Lei n.º 116/97, de 4 de Novembro) – não implicam perda de vencimento nem de qualquer outra regalia, considerando-se justificadas as faltas dadas para as deslocações para prestação de provas de avaliação na estrita medida que essas deslocações impliquem; 222
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n) Dadas como bolseiro ou equiparado (artigo 60.º e Decretos-Lei n.os 220/84, de 4 de Julho, 272/88, de 3 de Agosto e 282/89, de 23 de Agosto) – há lugar a dispensa temporária, total ou parcial, do exercício das funções, sem prejuízo das regalias inerentes ao serviço efectivo, designadamente, pagamento da remuneração e contagem de tempo de serviço para todos os efeitos legais; o) Por doação de sangue e socorrismo (artigos 61.º e 62.º) – não implicam a perda de quaisquer direitos ou regalias, desde que respeitadas as formalidades fixadas nestes preceitos; p) Para cumprimento de obrigações (artigos 63.º e 64.º) – há que distinguir entre as faltas motivadas pelo cumprimento de obrigações legais ou por imposição de autoridade judicial, policial ou militar que não implicam a perda de qualquer direito ou regalia e as faltas dadas por motivo de prisão. No caso de prisão preventiva, as faltas determinam a perda do vencimento de exercício e do subsídio de refeição, sendo tal perda, todavia, recuperada se a prisão preventiva for revogada ou extinta e o funcionário não venha a ser condenado definitivamente. O cumprimento de pena de prisão determina a perda total do vencimento e a não contagem do tempo para qualquer efeito; q) Para prestação de provas de concurso (artigo 65.º) – não implicam a perda de quaisquer direitos ou regalias; r) Por conta do período de férias (artigos 66.º e 67.º) – 2 dias por mês, até ao máximo de 13 dias por ano, podendo ser utilizadas em períodos de meios dias e sendo dada aos interessados a opção de relevar essas faltas no período de férias do próprio ano ou no do ano seguinte; obrigam a participação ao superior hierárquico da intenção de faltar na véspera ou, se tal não for possível, no próprio dia, podendo aquele recusar, a autorização, fundamentando a sua decisão com base no interesse do serviço; s) Com perda de vencimento (artigo 68.º) – foram concebidas como uma situação excepcional que carece de autorização do respectivo dirigente, a conceder em termos idênticos à prevista para as faltas por conta do período de férias; não podem ultrapassar um dia por mês e seis dias em cada ano civil e descontam para todos os efeitos legais; t) Para deslocação para a periferia (artigo 69.º e Decreto-Lei n.º 45/84, de 3 de Fevereiro) – não determinam a perda de quaisquer direitos ou regalias; u) Por motivos não imputáveis ao funcionário ou agente (artigo 70.º) – são consideradas como tal as faltas determinadas por facto qualificado como calamidade pública ou por motivos não previstos neste diploma, desde que impossibilitem o cumprimento do dever de assiduidade ou o dificultem em termos que afastem a sua exigibilidade – são equiparadas a serviço efectivo. 223
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Licenças Definem-se as licenças como ausências autorizadas e prolongadas do serviço. O diploma prevê os seguintes tipos de licenças: a) Licença sem vencimento até 90 dias (artigos 74.º e 75.º) – pode ser concedida a funcionários e agentes e gozada seguida ou interpoladamente, implicando a perda total das remunerações e o desconto na antiguidade para efeitos de carreira, aposentação e sobrevivência; tem, ainda, reflexos nas férias, nos termos referidos nos n.os 2 a 4 do artigo 75.º; b) Licença sem vencimento por um ano, renovável até ao máximo de três anos (artigos 76.º e 77.º) – só pode ser concedida a funcionários e com fundamento em circunstâncias de interesse público, implicando a perda total das remunerações e o desconto na antiguidade para efeitos de carreira, aposentação e sobrevivência; é permitida a contagem desse tempo para efeitos de aposentação, sobrevivência e fruição dos benefícios da ADSE se o interessado mantiver os correspondentes descontos; os reflexos nas férias são os referidos nos n.os 3 a 6 do artigo 77.º; c) Licença sem vencimento de longa duração (artigos 78.º a 83.º) – só pode ser concedida a funcionários com provimento definitivo e um mínimo de cinco anos de serviço efectivo; não pode ter duração superior a um ano, determina abertura de vaga, suspensão do vínculo com a Administração, perda total da remuneração e desconto na antiguidade para efeitos de carreira, aposentação e sobrevivência, embora seja possível manter a contagem de tempo para os dois últimos efeitos, desde que tal seja requerido, mediante o pagamento das respectivas quotas; os reflexos nas férias são os regulados no artigo 81.º; o regresso ao serviço só é possível após um ano e está sujeito aos condicionalismos fixados nos artigos 82.º e 83.º; d) Licença sem vencimento para acompanhamento do cônjuge colocado no estrangeiro (artigo 84.º a 88.º) – aplica-se a funcionários ou agentes quando o respectivo cônjuge, seja qual for a natureza da sua relação de trabalho, for colocado no estrangeiro por período superior a 90 dias ou indeterminado, em missões de defesa ou representação de interesses do país ou em organizações internacionais de que Portugal seja membro; tem a mesma duração que a da colocação do cônjuge, embora possa ter o seu início em momento posterior e o regresso possa ser antecipado, determina a abertura de vaga, e não conta para quaisquer efeitos, excepto para aposentação, sobrevivência e fruição dos benefícios da ADSE, se forem mantidos os correspondentes descontos; o regresso e os reflexos nas férias vêm regulados nos artigos 85.º, n.º 3, 86.º e 88.º; e) Licença sem vencimento para exercício de funções em organismos internacionais (artigos 89.º a 92.º), só pode ser concedida a funcionários ou 224
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agentes que tenham o contrato administrativo como forma normal de provimento e reveste duas modalidades: licença para exercício de funções com carácter precário ou experimental e licença para o exercício de funções como funcionário ou agente do organismo internacional. Actividade Compare o regime de faltas da Função Pública com o regime de faltas dos trabalhadores de uma empresa privada da área da sua residência. Procure identificar qual dos dois regimes é mais favorável ao trabalhador e à entidade empregadora.
TESTE FORMATIVO 1. Apresente uma diferença entre o modelo tradicional de gestão de pessoal e o novo modelo de gestão de recursos humanos. 2. A contratação em funções públicas é sempre a termo resolutivo? 3. Quais as responsabilidades dos titulares de cargos dirigentes exercício das suas funções? 4. O SIADAP 1 refere-se à avaliação dos dirigentes? 5. A reafectação é um instrumento de Mobilidade Geral? 6. Quais são as modalidades da relação jurídica de emprego público? 7. Será o contrato de prestação de serviços uma modalidade de relação jurírica de emprego público?
RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. A adopção do novo modelo de gestão de recursos humanos assenta num conjunto de pressupostos mais abertos acerca da capacidade e da motivação das pessoas. Neste novo formato, os empregados passam a ser vistos como fontes de iniciativa, energia e criatividade, e não como controláveis centros de custos. 2. Não. Contrato de trabalho em funções públicas não é igual a precariedade de emprego. 3. Há responsabilidade civil, criminal, disciplinar e financeira. 4. Não. Refere-se á avaliação dos serviços ou dos organismos. 5. Não. É um instrumento da Mobilidade Especial. 225
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. Gestão de Recursos Humanos
6. A nomeação, o contrato de trabalho em funções públicas e a comissão de serviço 7. Não. Não se trate de executar trabalho subordinado.
L EITURAS C OMPLEMENTARES BILHIM, João – Gestão Estratégica de Recursos Humanos. Lisboa: ISCP, 2007 ROCHA, Oliveira – Gestão de Recursos Humanos: Presença, 1997. BILHIM, João – “O Mérito nos Processos de Seleção da Alta Direção da Administração Pública Portuguesa: Mito ou Realidade”. Revista Sequência, Estudos Jurídicos e Políticos, UFSC, Brasil, vol. 33, n.º 65, 2012, p. 57 (DOi: 10.5007/2177-70.55.2012v32n6 5p57).
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9. GESTÃO FINANCEIRA
SUMÁRIO Objectivos da unidade 1. A Reforma da Administração Financeira do Estado 2. Funções e Regras do Orçamento 3. Elaboração, Aprovação, Execução e Fiscalização do Orçamento 4. Regime de Administração Financeira do Estado 5. O Plano Oficial de Contabilidade Pública Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade, o estudante deverá estar apto a: • relacionar a antiga e nova metodologia de preparação orçamental; • identificar os objectivos da Reforma da Administração Financeira do Estado; • identificar os elementos fundamentais do conceito de orçamento.; • distinguir as funções do orçamento; • identificar as regras a que obedece a elaboração do orçamento; 227
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. Gestão Financeira
• explicar a importância da aplicação do POCP; • discutir a importância do POCAL.
1. A REFORMA
DA
ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA
DO
E STADO
O processo orçamental português baseou-se, até ao início dos anos noventa, do Século XX, na reforma de 1928-1930, a qual tinha por finalidade o equilíbrio das contas públicas. A metodologia de preparação do orçamento assentava numa óptica de obtenção de verbas, julgadas indispensáveis ao funcionamento dos respectivos serviços, sem nunca equacionar as tarefas que se propunha realizar, e os objectivos que se pretendia alcançar. O método incremental dominou o processo de elaboração do orçamento 114. A partir de 1987, o Governo estabeleceu que os serviços teriam de preparar os seus orçamentos com base na identificação e justificação das actividades a realizar, subdividindo-as em actividades em curso e actividades novas e imputando-lhes as respectivas despesas. Todavia, é pela Lei n.º 8/90, de 20 de Fevereiro e pela Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro, que são estabelecidas as bases da reforma da administração financeira do estado, seguidas do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho, e antecedidas pela revisão das bases contidas nos novos artigos 108.º a 110.º da CRP. A Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro, veio desenvolver os princípios constitucionais, reformular o sistema de execução orçamental e reforçar a responsabilidade pela execução, ao prever uma nova Conta Geral do Estado, cuja estrutura vai coincidir com a do Orçamento, de maneira a permitir uma fácil e clara leitura. Por outro lado, a Lei de Bases da Contabilidade Pública, Lei n.º 8/90, de 20 de Fevereiro, contém o regime de administração financeira do Estado, destinado a substituir o sistema de contabilidade pública que, vindo do do Estado Novo (reformas de 1928-1929 a 1930-1936), chegou até ao anos noventa. Esta reforma culminou com o estabelecimento de um novo regime de administração financeira do Estado, em que foram substituídos diplomas fundamentais de Contabilidade Pública, que vinham desde a 3.ª Carta de Lei, de 1908 (Dec.-Lei n.º 155/92 de 28 de Julho). No Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho, é referido, que a realização e o pagamento das despesas deixam de estar sujeitos ao sistema de autorização prévia pela Direcção-Geral da Contabilidade Pública, conferindo-se, assim, maior autonomia aos serviços e organismos da Administração Pública. Os seus dirigentes 114
Bernard Gournay – Introdução à Ciência Administrativa. Lisboa: Europa-América, 1978, 64-85.
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passam a gerir os meios de que dispõem para a realização dos objectivos definidos. Este diploma refere-se, ainda, que o regime financeiro dos serviços e organismos com autonomia administrativa constitui o modelo tipo. É suposto, este novo modelo permitir uma definição mais rigorosa do âmbito da gestão corrente, e dos princípios de organização interna que o adequam à estrutura do orçamento por programas. A ausência de uma contabilidade de compromissos traduzia-se num dos mais graves problemas da contabilidade pública, e impedia a existência de uma correcta gestão orçamental. Por sua vez, a introdução da contabilidade de compromissos permite a estruturação de uma nova contabilidade de caixa e uma contabilidade analítica, indispensáveis ao controlo dos resultados. Foi, também, adoptado um novo sistema de pagamento das despesas públicas, através de transferência bancária ou crédito em conta ou, ainda, quando excepcionalmente não for possível qualquer destas formas, através de emissão de cheques sobre o Tesouro. Como deixa de haver tesourarias privativas, permitem-se novas possibilidades para a gestão integrada da dívida pública. Foi, também, revisto o sistema de realização das despesas e da sua contabilização, no sentido da maior autonomia dos serviços. Na sua essência, os grandes objectivos da Reforma da Administração Financeira do Estado assentam: No aumento da racionalidade: • económica; • financeira/tesouraria; • da decisão. Na descentralização administrativa e financeira: • centralização da Informação. A reforma da gestão orçamental e da contabilidade pública tem, como instrumento básico de suporte, um modelo de informação – o SIGO – Sistema de Informação para a Gestão Orçamental –, consubstanciado num conjunto de aplicações (sistemas, subsistemas, programas e módulos), cuja integração da informação representa a chave para a revelação da gestão, quer a nível micro (serviço), quer a nível macro (OE). O SIGO destina-se, em cumprimento do art. 17.º, da Lei de Bases da Contabilidade Pública (Lei n.º 8/90, de 20 de Fevereiro), à informatização dos serviços nas áreas de Administração Financeira – SIC, Recursos Humanos – SGRH e Patrimonial – SGP. 229
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. Gestão Financeira
A Reforma das Finanças Públicas Portuguesas, lançada, dos anos noventa, obrigou a uma reforma da gestão financeira orçamental que teve como objectivos alcançar: – a unidade orçamental; – a unidade de tesouraria; – os instrumentos adequados a um sistema de informação que permitisse a gestão económica e financeira do Orçamento do Estado/SPA, e consubstanciasse, na prática, um modelo de «Macro Cash Management», e uma visão económica das actividades/projectos, e dos programas (meios/fins). A falta de unidade de tesouraria que as autonomias acarretam tem custos para a sociedade. Os grandes serviços autónomos, que recebem dinheiro do OE, tendem a constituir um capital de giro, que procuram aplicar nos mercados financeiros, a fim de conseguirem a sua reprodução (juros). O OE – Tesouro, por sua vez, vê-se obrigado a recorrer a empréstimos que, dados os diferenciais entre as taxas de juro (activas e passivas), se verificam acréscimos desnecessários de custos, em termos globais. As políticas públicas, expressas quantitativamente no orçamento do Estado, têm como suporte os programas (expressos no art. 108.ª da Constituição da República Portuguesa), que são constituídos por um suporte de projectos e/ou actividades. Assim, o conceito de actividade foi introduzido como vector de toda a formulação e execução orçamental. A filosofia da administração por resultados fica suportada pelo instrumento «actividade» (ou projecto no caso do PIDDAC), como sendo um conjunto de meios (financeiros, materiais e humanos) que, através de uma função de produção (métodos de trabalho) pretendem atingir determinados fins (resultados, objectivos). Daí que, as despesas (meios) orçamentais passem a ser afectadas às actividades (ou projectos), e estas deverão ter indicadores de «output»/produtos, «outcomes»/resultados, custos financeiros ou físicos e de ambiente/envolvente.
2. FUNÇÕES
E
REGRAS
DO
ORÇAMENTO
A actividade financeira consiste, essencialmente, na afectação de recursos financeiros à satisfação de necessidades colectivas. O Estado, para prosseguir as suas funções e dar resposta aos estados de carência colectiva, tem de calcular as despesas e avaliar as receitas que hão-de cobrir essas despesas 115. 115
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Por isso, o Estado tem de elaborar uma previsão de receitas e despesas para um período de tempo considerado, na qual exprime, sinteticamente, a forma como vai obter e gastar os seus rendimentos durante um ano, e de definir a política financeira a seguir durante esse ano. O orçamento pode ser definido como uma previsão, em regra anual, das despesas a realizar pelo Estado e dos processos de as cobrir, que incorpora a autorização, concedida à administração, para realizar despesas e cobrar receitas, e limita os poderes financeiros da administração em cada ano. Têm sido muitas as definições propostas para o orçamento. Todavia, o mais importante será destacar os elementos principais que, em diferentes graus, acabam por definir a sua essência, entre os quais destacamos: • elemento económico – previsão da gestão orçamental do Estado; • elemento político – autorização política do projecto ou plano de gestão; • elemento jurídico – instrumento pelo qual se processa a limitação dos poderes dos órgãos da administração financeira. Que funções desempenha o orçamento? A primeira função do orçamento é a relação das receitas com as despesas, isto é, o Estado tem de orçar as despesas e as receitas, a fim de se assegurar que estas são suficientes para cobrir aquelas. Se as receitas têm de cobrir as despesas, então há que fixar o montante destas. Assim, a segunda função do orçamento é a fixação das despesas. O total das despesas é a soma das despesas de todos os serviços do Estado. A cada um dos serviços são atribuídas verbas de despesas, que representam autorizações de gastar e, por isso, se chamam créditos. O orçamento de despesa é, assim, uma série de aberturas de créditos aos serviços, e estes, têm de confinar as suas despesas aos créditos que lhes forem assinados. O orçamento das despesas não tem o mesmo significado, nem a mesma natureza que o das receitas. As verbas nele inscritas devem corresponder às importâncias que se prevê que os serviços precisam de gastar. Logo, os serviços não podem ultrapassar o valor correspondente aos créditos orçamentais. Mas o orçamento não se limita, apenas, a relacionar as receitas com as despesas e a fixar as despesas. Através da previsão destas, fica-se a saber quanto o Estado se propõe despender com a organização e funcionamento de cada um dos serviços e como, através da previsão das receitas, se fica a conhecer o contributo de cada um dos meios de financiamento. Assim, a terceira função do orçamento é a exposição do plano financeiro.
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. Gestão Financeira
As duas primeiras funções do orçamento são referidas na Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado (Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro). Diz ela, no seu artigo 4.º, n.º 1, e de acordo com o artigo 108.º, n.º 4 da CRP: «O Orçamento do Estado deve prever os recursos necessários para cobrir todas as despesas (…)». E aquela Lei acrescenta, no seu artigo 18.º, n.º 1: «As dotações orçamentais constituem o limite máximo a utilizar na realização das despesas (…)». Quanto à última função, está explicitada no artigo 92.º, da CRP, ao dispor que o plano anual «tem a sua expressão financeira no orçamento do Estado». Os princípios e regras a que devem obedecer a elaboração, aprovação, execução, alteração e controlo do orçamento do Estado, encontram-se no essencial, previstos na CRP e na Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado – OE (Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro). Regra da Anualidade O Orçamento do Estado é anual, sem prejuízo da possibilidade de nele serem integrados programas e projectos que impliquem encargos plurianuais e para ele o ano económico coincide com o ano civil. Se a Assembleia da República não aprovar a proposta de orçamento, incluindo o articulado e os mapas orçamentais, de modo que possa entrar em execução no início do ano económico a que se destina, mantém-se em vigor o orçamento do ano anterior. A manutenção da vigência do orçamento do ano anterior abrange, ainda, a autorização para a cobrança de todas as receitas nele previstas. Durante o período em que se mantiver em vigor o orçamento do ano anterior, a execução do orçamento das despesas deve obedecer ao princípio da utilização, por duodécimos, das verbas fixadas nos mapas. Regra da Unidade O orçamento serve para saber o montante total das despesas, e se o montante total das receitas é suficiente para as cobrir, daí a conveniência que sejam previstas no mesmo documento. Por outro lado, o orçamento expõe o plano financeiro. Assim, um único documento (por isso se chama unidade), integra todas as receitas e despesas da administração central, incluindo as de todos os organismos que não tenham natureza, forma e designação de empresa pública, designados por serviços e fundos autónomos, bem como o orçamento da Segurança Social (n.º 1, art.º 3.º, da Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro). 232
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A Regra da Especificação O Orçamento do Estado deve, suficientemente, especificar as receitas nele previstas e as despesas nele fixadas. A especificação das receitas rege-se por um código de classificação económica, que as agrupa em duas rúbricas: correntes e de capital. A especificação das despesas rege-se, por sua vez, por códigos de classificação orgânica, funcional e económica. Se as receitas e as despesas fossem previstas em globo e não discriminadamente, o orçamento não indicaria as diversas fontes donde o Estado vai tirar os recursos nem os gastos que cada serviço público há-de realizar. Significa que não haveria, verdadeiramente, uma exposição do plano financeiro. Assim, o Orçamento de Estado deve especificar, suficientemente, as receitas nele previstas e as despesas nele fixadas (por isso se chama especificação). Regra do Orçamento Bruto Todas as receitas e despesas são inscritas no Orçamento do Estado pela importância integral em que foram avaliadas, sem dedução alguma para encargos de cobrança ou de qualquer outra natureza. A cobrança das receitas implica, sempre, despesas, e a realização das despesas proporciona, por vezes, receitas acessórias. Assim: o imposto é receita, mas para a obter, o Estado precisa de fazer despesas – por exemplo, despesas de lançamento e de cobrança. No orçamento das receitas pode inscrever-se o produto do imposto e no orçamento das despesas os gastos com os serviços que têm a seu cargo o lançamento e cobrança. Temos, assim, a receita bruta e a despesa bruta. Poder-se-ia, também, teoricamente, inscrever apenas no orçamento das receitas, o produto do imposto deduzido das despesas com a sua obtenção. Teríamos, assim, a receita líquida. O que acontece com as receitas, sucede com algumas despesas. Como se vê, o orçamento pode, teoricamente, ser de receitas e despesas brutas. (orçamento bruto), ou de receitas e de despesas líquidas (orçamento líquido). Todavia, o orçamento líquido não permite a fixação das despesas. É que, se as receitas forem compensadas pelas despesas e as despesas, pelas receitas, não se estabelecerá o montante das despesas. Com o orçamento líquido não se consegue a fixação das despesas, a qual constitui uma das finalidades do Orçamento do Estado. Por isso, nos termos do art.º 5.º, da Lei 6/91, de 20 de Fevereiro, as receitas e as despesas devem ser inscritas pela importância integral em que foram avaliadas, sem dedução alguma para encargos de cobrança ou de qualquer outra espécie (é o chamado orçamento bruto).
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Regra da Universalidade As receitas e as despesas devem ser inscritas no orçamento, sem qualquer compensação ou desconto, o que implica que sejam todas orçamentadas (é a chamada universalidade). Nos termos do n.º 1, do art. 3.º, da Lei 6/91, de 20 de Fevereiro, o Orçamento do Estado compreende todas as receitas e despesas da administração central. Regra da não Consignação A fixação das despesas, exigindo obediência à regra da universalidade exige, ainda, obediência a uma outra (a da não consignação), segundo a qual as receitas devem ser indiscriminadamente destinadas à cobertura das despesas. Não há, pois, receitas afectadas à cobertura de despesas em especial. Com efeito, o art. 6.º, da Lei 6/91, de 20 de Fevereiro, determina que, no Orçamento do Estado, não pode afectar-se o produto de quaisquer receitas à cobertura de determinadas despesas. Exceptuam-se, desta regra, os casos em que, por virtude de autonomia financeira ou de outra razão especial, a lei determine, expressamente, a afectação de receitas a determinadas despesas. No respeitante às receitas consignadas, convém perceber quando é que há, verdadeiramente, consignação para efeitos de contabilidade pública. A consignação ocorre quando o Estado cria um serviço, o que significa que irá haver aumento de despesas, e em consequência disso, cria um imposto e estabelece que tal receita fica afectada à cobertura das despesas desse novo serviço. Trata-se de consignação, visto que as receitas do imposto não poderão destinar-se a quaisquer despesas antes de assegurada a cobertura dos créditos a que foram afectadas. Por outro lado, esses créditos só poderão utilizar-se na medida do produto, maior ou menor, do imposto que o Estado lhes destinou. Por exemplo: previram-se despesas de 100 mil contos com o novo serviço; se o imposto render 100 mil contos ou mais, as suas despesas poderão realizar-se integralmente; mas, se o imposto só render 80 mil contos, o serviço não poderá gastar mais do que essa importância. Chama-se a isto duplo cabimento: havendo consignação de receitas, as despesas terão de caber não só nos créditos orçamentais (primeiro cabimento), mas ainda no produto das receitas que lhes foram afectadas (segundo cabimento). A consignação tanto se pode traduzir numa situação de favor, como numa situação de desfavor, para as respectivas despesas. Situação de favor, se o produto das receitas consignadas iguala ou excede o montante previsto das despesas. Situação de desfavor, se o produto das receitas consignadas vem a ser menor do que
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o montante previsto das despesas. Neste caso, o serviço não pode realizar as despesas previstas, mas gastar, apenas, até ao limite do montante das receitas. Regra do Equilíbrio Não é concebível a existência de um orçamento com receitas inferiores às despesas, isto é, deficitário. Por norma, o orçamento apresenta-se ou, com receitas iguais, ou com receitas superiores às despesas, o que significa que deve ser equilibrado ou superavitário. Nos termos do art.º 4.º, da Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro, o Orçamento do Estado deve prever os recursos necessários para cobrir todas as despesas, procurando-se que não sejam financiadas mediante a criação de moeda. As receitas efectivas têm de ser, pelo menos, iguais às despesas efectivas, excluindo-se os juros da dívida pública, salvo se a conjuntura do período a que se refere o Orçamento o não permitir. De acordo com o preceituado no artigo 4.º, que acabámos de referir, o que se entende por equilíbrio, pelo menos entre as receitas efectivas e as despesas efectivas líquidas dos juros da dívida pública, é o chamado equilíbrio primário, a que corresponde um défice ou um superave primário. Se for um défice, a execução do orçamento vai provocar o aumento da dívida pública e se for um superave, só não acontecerá o mesmo, se as receitas forem superiores, ou pelo menos iguais, às despesas efectivas. Durante o Estado Novo vigorou o chamado equilíbrio do orçamento ordinário, que se caracterizava por as despesas ordinárias igualarem as receitas ordinárias. As despesas ordinárias eram aquelas que se repetiam em todos os períodos financeiros, esgotando a sua utilidade dentro de cada período. As Extraordinárias, por sua vez, não se repetem em todos os períodos, oferecendo por isso uma utilidade duradoura. Haveria equilíbrio em cada ano, se a geração existente pagasse as despesas (cuja utilidade a cada ano se limita), e se as gerações que se sucedem aos longos dos anos pagassem as despesas, cuja utilidade durante esses anos, se mantivesse. Desde 1977 (Lei n.º 64/77, de 26 de Agosto), até aos anos noventa, vigorou o equilíbrio do orçamento corrente. Se as receitas correntes igualarem as despesas correntes, há equilíbrio. Neste sistema parte-se do princípio de que os impostos são sempre pagos com rendimentos que se destinam ao consumo privado. Por isso, as receitas correntes são receitas retiradas do consumo privado. Ora, como as despesas correntes também são de consumo, trata-se apenas da transferência do consumo privado para o consumo público. A actividade financeira não afectará o nível do consumo, nem do aforro.
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3. ELABORAÇÃO , APROVAÇÃO , EXECUÇÃO ORÇAMENTO
E
FISCALIZAÇÃO
DO
A existência de um orçamento pressupõe um conjunto de actividades, que se desenvolvem em cinco fases: elaboração, aprovação, execução e fiscalização. Elaboração De acordo com as opções do plano anual, compete ao Governo a elaboração da proposta de orçamento, para o ano seguinte, e a sua apresentação à Assembleia da República, até 15 de Outubro. Nesta proposta devem estar englobados o articulado da proposta de lei, os mapas orçamentais, e os anexos informativos. O articulado da proposta de lei deve conter: • as condições de aprovação dos mapas orçamentais e as normas necessárias para orientar a execução orçamental; • a indicação das fontes de financiamento que acresçam às receitas efectivas, bem como a indicação do destino a dar aos fundos resultantes de eventual excedente; • o montante e as condições gerais de recurso ao crédito público; • a indicação do limite dos avales a conceder pelo Governo durante o exercício orçamental; • o montante de empréstimos a conceder, e de outras operações activas a realizar pelo Estado, incluindo os fundos e serviços autónomos e, pela Segurança Social, desde que não sejam de dívida flutuante; • todas as outras medidas que se revelem indispensáveis à correcta gestão orçamental do Estado, para o ano económico a que o Orçamento se destina. São, ainda, exigidos, nos termos do art.º 12.º, da Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro, a apresentação de doze mapas orçamentais, entre os quais se destacam: os de receitas e despesas do Estado, o orçamento da Segurança Social, as Finanças locais e os Programas de investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC) –, e de 16 anexos justificativos da política orçamental. Aprovação A Assembleia da República deve votar o Orçamento do Estado até 15 de Dezembro. O plenário da Assembleia da República discute e vota, obrigatoriamente, na especialidade, o seguinte: 236
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• criação de novos impostos e o seu regime de incidência, taxas, isenções e garantias dos contribuintes; • extinção de impostos; • matérias relativas a empréstimos e outros meios de financiamento. As restantes matérias são discutidas e votadas na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Execução Ao Governo compete a elaboração da proposta de orçamento e a sua execução, após aprovação pela Assembleia da República. Por isso, o Governo deve tomar medidas para que o Orçamento do Estado possa começar a ser executado no início do ano económico a que se destina, e, em concomitância, aprovar os decretos-lei com as disposições necessárias a tal execução. Convém salientar, que nenhuma receita pode ser cobrada, se não tiver sido objecto de inscrição orçamental. Nenhuma despesa pode ser efectuada sem que, além de ser legal, se encontre suficientemente discriminada no Orçamento do Estado, tenha cabimento no correspondente crédito orçamental e obedeça ao princípio da utilização dos duodécimos (com excepção para as matérias autorizadas por lei). Acresce, ainda, a necessidade das despesas terem de satisfazer os requisitos da sua economia, eficiência e eficácia. Fiscalização A fiscalização administrativa da execução orçamental é da competência, além da própria entidade responsável pela gestão e execução, das entidades hierarquicamente superiores e da tutela, dos órgãos gerais de inspecção e controlo administrativo, e dos serviços de contabilidade pública. A fiscalização jurisdicional da execução orçamental é da competência do Tribunal de Contas. Trimestralmente, o Governo deve informar a Assembleia da República acerca do montante, condições, entidades financiadoras e utilização, de todos os empréstimos contraídos, bem como acerca do montante, condições e entidades beneficiárias de empréstimos e outras operações activas concedidas pelo Governo. Deve, ainda, o Governo enviar, regularmente, à Assembleia da República, balancetes trimestrais relativos à execução orçamental. O resultado da execução orçamental consta da Conta Geral do Estado, que abrange as contas de todos os organismos da administração central, que não tenham natureza, forma, e designação de empresa pública, e a conta da Segurança Social. 237
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A Conta Geral do Estado deve ter uma estrutura idêntica à do Orçamento do Estado e obedecer aos seguintes princípios: • clareza; • exactidão; • simplicidade. A Conta Geral do Estado compreende: • o relatório do Ministro das Finanças sobre os resultados da execução orçamental; • o mapa da conta geral dos fluxos financeiros do Estado; • os mapas referentes à execução orçamental; • os mapas relativos à situação de tesouraria; • os mapas referentes à situação patrimonial.
4. REGIME
DE
ADMINISTRAÇÃO FINANCEIRA
DO
E STADO
Além dos serviços dependentes (serviços simples), que carecem de autonomia administrativa, e não podem, por isso, praticar actos definitivos e executórios, nomeadamente autorizar despesas e pagamentos, convém distinguir as duas situações típicas relativas à autonomia dos serviços públicos: • a dos serviços com autonomia administrativa, que podem praticar actos de gestão definitivos e executórios, entre os quais autorizar as respectivas despesas e os pagamentos, mas com créditos inscritos no Orçamento do Estado; • a dos serviços com autonomia financeira, que, além de gozarem de autonomia administrativa, dispõe de receitas próprias, o que lhes permite autorizar os pagamentos das despesas previstas no seu orçamento. Nos termos do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de Julho, o regime geral de administração financeira do Estado é o de autonomia administrativa. O regime de autonomia administrativa e financeira é, pelo mesmo diploma, considerado como regime excepcional. 4.1. Regime geral – autonomia administrativa O regime jurídico e financeiro dos serviços e organismos da Administração Pública é, em regra, o da autonomia administrativa. 238
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O regime de autonomia administrativa significa que os serviços e organismos dispõem de créditos inscritos no Orçamento do Estado, e os seus dirigentes são competentes para, com carácter definitivo e executório, praticarem actos necessários à autorização de despesas e seu pagamento, no âmbito da gestão corrente. A gestão corrente compreende a prática de todos os actos que integram a actividade que os serviços e organismos desenvolvem, normalmente, para a prossecução das suas atribuições. Esta gestão corrente está, naturalmente, sujeita aos poderes de direcção, supervisão e inspecção do respectivo ministro. A gestão corrente não compreende as opções fundamentais de enquadramento da actividade dos serviços e organismos, nomeadamente a aprovação de planos e programas, e a assunção de encargos que ultrapassem a sua normal execução. A gestão corrente não compreende, ainda, os actos de montante ou natureza excepcionais. Convém salientar, que o decreto-lei de execução orçamental deve fixar, em cada ano, os critérios do regime duodecimal. Quanto às bases contabilísticas, a escrituração da actividade financeira deve ser organizada com base nos seguintes registos: • contabilidade de compromissos resultantes das obrigações assumidas; • contabilidade de caixa. No que diz respeito à contabilidade de compromissos ou encargos assumidos, esta consiste no lançamento das obrigações constituídas por actividades, e com indicação da respectiva rubrica de classificação económica, compreendendo: • os montantes, fixados ou escalonados para cada ano, das obrigações decorrentes de lei ou de contrato, como primeiro movimento da gestão do respectivo ano; • as importâncias resultantes dos encargos assumidos nos anos anteriores e não pagos; • os encargos assumidos ao longo da gestão. No decurso da gestão orçamental, o valor dos encargos que podem ser assumidos vai-se alterando, em função dos reforços ou anulações das dotações orçamentais, bem como das variações nos compromissos. Quanto aos contratos celebrados, os serviços e organismos têm obrigação de proceder ao seu registo, incluindo o montante global de cada contrato, suas alterações, escalonamento e pagamentos efectuados. Nenhuma despesa relativa a contratos pode ser efectuada, sem que caiba no seu montante global e respectivo escalonamento anual. O reescalonamento dos compromissos contratuais de que resulte diferimento de encargos para anos futuros, traduzir-se-á em saldo orçamental, salvo se a utili239
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zação das importâncias remanescentes for autorizada, no próprio ano em que for determinado o reescalonamento. Para a assunção de compromissos, os serviços e organismos adoptam um registo de cabimento prévio, do qual constem os encargos prováveis. Quanto à contabilidade de caixa, esta consiste no registo do montante global dos créditos libertados, e de todos os pagamentos efectuados por actividades ou projectos e por rubricas orçamentais, não podendo nenhum pagamento ser efectuado sem que tenha sido, previamente, registado o inerente compromisso. Os serviços e organismos solicitam, mensalmente, à Direcção-Geral da Contabilidade Pública, a libertação de créditos, por um montante que tenha em consideração o plano de tesouraria. Estes pedidos, quando referentes a despesas com investimentos do Plano, serão efectuados com autonomia, relativamente aos restantes. Dentro dos primeiros cinco dias úteis de cada mês, os serviços e organismos fornecem, os seguintes elementos justificativos: • o balancete da contabilidade de compromissos assumidos até ao final do mês anterior; • o balancete da contabilidade de caixa com os pagamentos efectuados até ao final do mês anterior; • a discriminação de todas as alterações orçamentais autorizadas até ao final do mês anterior; • a descrição, por rubricas orçamentais, dos pagamentos previstos para o mês, relativos a compromissos já assumidos e a assumir; • a indicação do valor do saldo existente entre os créditos libertados e os pagamentos efectuados até ao final do mês anterior. A autorização de despesas é conferida de acordo com os seguintes requisitos: conformidade legal; regularidade financeira; economia, eficiência e eficácia. Por conformidade legal é entendida a existência de lei, que autorize a despesa, dependendo a regularidade financeira da inscrição orçamental, da correspondente cabimento e da adequada classificação da despesa. Na autorização de despesas, ter-se-á em vista a obtenção do máximo rendimento com o mínimo de dispêndio, tendo em conta a utilidade e prioridade da despesa, e o acréscimo de produtividade daí decorrente. Quanto à competência para autorizar despesas, ela é atribuída aos dirigentes dos serviços e organismos, na medida dos poderes de gestão corrente que detiverem, e consoante a sua natureza e valor. A autorização de despesa em conta do Orçamento do Estado deve ocorrer em data que permita o processamento, liquidação e pagamento dentro dos prazos que vierem a ser fixados no decreto-lei de execução orçamental. 240
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A autorização de despesas deve ser acompanhada da verificação dos requisitos a que a despesa está subordinada, verificação esta a efectuar pelos serviços de contabilidade do respectivo serviço ou organismo. 4.2. Regime excepcional – autonomia administrativa e financeira Este regime aplica-se aos institutos públicos, que revistam a forma de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos, a que se refere especialmente o artigo 1.º, da Lei n.º 8/90, de 20 de Fevereiro. Os institutos públicos, designados por organismos autónomos, abrangem todos os organismos da Administração Pública, dotados de autonomia administrativa e financeira, que não tenham natureza, forma e designação de empresa pública. Os organismos autónomos dispõem de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, financeira e patrimonial e utilizam o Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP). Todavia, os organismos autónomos que, pela especificidade das suas atribuições realizem, essencialmente, operações de natureza creditícia, seguradora, de gestão de fundos de reforma ou de intermediação financeira, podem utilizar um sistema de contabilidade baseado no que for especialmente aplicado no sector da respectiva actividade. No que se refere ao património dos organismos autónomos, ele é constituído pelos bens, direitos e obrigações recebidos ou adquiridos para o exercício da sua actividade. Estes organismos administram e dispõem, livremente, dos bens que integram o seu património, sem sujeição às normas relativas ao domínio privado do Estado, mas devem, porém, manter um inventário actualizado de todos os bens patrimoniais. Estes organismos administram, ainda, os bens do domínio público do Estado afectos às actividades a seu cargo, devendo manter actualizado o respectivo cadastro. No que concerne às receitas próprias dos organismos autónomos há a considerar: • as receitas resultantes da sua actividade específica; • o rendimento de bens próprios e, bem assim, o produto da sua alienação, é da constituição de direitos sobre eles; • as doações, heranças ou legados que lhes sejam destinados; • quaisquer outros rendimentos que, por lei, ou contrato, lhes devam pertencer.
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A gestão económica e financeira dos organismos autónomos é disciplinada pelos seguintes instrumentos de gestão previsional: • • • •
o plano de actividades; o orçamento de tesouraria; a demonstração de resultados; o balanço previsional.
Os organismos autónomos devem elaborar anualmente, com referência a 31 de Dezembro do ano anterior, os seguintes documentos de prestação de contas: • • • • • •
relatório de actividades do órgão de gestão; conta de fluxos de tesouraria; balanço analítico; demonstração de resultados líquidos; anexos ao balanço e à demonstração de resultados; parecer do órgão fiscalizador.
O relatório de actividades do órgão de gestão deverá proporcionar uma visão clara da situação económica e financeira relativa ao exercício, espelhando a eficiência na utilização dos meios afectos à prossecução das suas actividades e a eficácia na realização dos objectivos propostos. O parecer do órgão fiscalizador deverá incidir sobre a gestão efectuada, avaliando da exactidão da contas e da observância das normas aplicáveis. Os documentos de prestação de contas serão remetidos ao Ministério das Finanças, até 31 de Maio do ano seguinte. Os organismos autónomos estão obrigados a apresentar anualmente, com referência a 31 de Dezembro do ano anterior, um balanço social, enquadrado na lei geral, qualquer que seja o vínculo contratual do pessoal ao seu serviço naquela data.
5. O PLANO OFICIAL
DE
C ONTABILIDADE PÚBLICA
5.1. Introdução 116 O Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP) foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 232/97, de 3 de Setembro. O POCP qual constitui um passo fundamental na reforma da administração financeira e das contas públicas e, representa 116
Neste ponto seguimos muito de perto o texto oficial do próprio POCP.
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um instrumento indispensável para dotar o Estado de um sistema de contas adequado às necessidades de uma Administração Pública moderna. O principal objectivo da contabilidade pública tradicional era demonstrar que, os diversos organismos da Administração Pública, aplicavam os meios financeiros atribuídos, de acordo com o aprovado pelas respectivas autoridades orçamentais (Assembleia da República para a administração central e segurança social, e assembleias regionais e municipais para autarquias regionais e locais). Actualmente, não se pode deixar de considerar intrínseco a qualquer sistema de contabilidade pública de um Estado democrático, a disponibilidade de informação contabilística. Ela é, essencial para permitir a análise das despesas públicas, segundo critérios de legalidade, economia, eficiência e eficácia. Traduz, também, o reforço da clareza e transparência da gestão dos dinheiros públicos e das relações financeiras do Estado. Além disso, há a razão imposta pelo artigo 104.º-C, do Tratado que instituiu a União Europeia: “Os Estados membros devem evitar défices excessivos”. A própria Comissão acompanha a evolução da situação orçamental e do montante da dívida pública nos Estados membros, a fim de identificar desvios importantes. Por outro lado, num quadro geral, ao complementar a contabilidade orçamental com a contabilidade patrimonial e analítica procura-se, também, realizar numa base regular as análises da eficiência e eficácia das despesas públicas. O que permite passar dos resultados das actividades e da realização dos projectos para os objectivos, e estabelecer a correspondência entre os meios utilizados e os objectivos realizados. O principal objectivo do POCP, em vigor, é a criação de condições para a integração dos diferentes aspectos – contabilidade orçamental, patrimonial e analítica –, numa contabilidade pública, que constitua um instrumento fundamental de apoio à gestão das entidades públicas e à sua avaliação. Além disso, o POCP permite, ainda: • a tomada de decisões estratégicas no domínio orçamental, designadamente no âmbito da orçamentação plurianual, face ao acompanhamento dos compromissos com reflexos em anos futuros; • disponibilizar informação para apoio do controlo da actividade financeira da Administração Pública, pelas entidades com competência legal nesse domínio, e reforçar a transparência da situação financeira e patrimonial, bem como das relações financeiras do Estado; • A obtenção expedita dos elementos indispensáveis ao cálculo dos agregados relevantes da contabilidade nacional, particularmente dos que respeitam às contas nacionais das administrações públicas. Estes elementos são bastante importantes para a aferição do cumprimento dos compromissos assumidos no quadro do Tratado da União Europeia. 243
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O POCP é, obrigatoriamente, aplicável a todos os serviços e organismos da administração central, regional e local, que não tenham natureza, forma e designação de empresa pública, bem como à segurança social. O POCP aplica-se, também, às organizações de direito privado sem fins lucrativos, que disponham de receitas maioritariamente provenientes do Orçamento do Estado. Os serviços são obrigados a enviar ao Instituto Nacional de Estatística, os seguintes elementos: • • • •
balanço; demonstração de resultados; mapas de execução orçamental; anexos às demonstrações financeiras.
5.2. Considerações técnicas O balanço apresenta uma estrutura semelhante à do POC 117, ao indicar a correspondência dos seus elementos com as contas do Plano, e as quantias do exercício anterior, tendo em vista contribuir para a melhoria da informação contabilística divulgada. A demonstração de resultados segue, ao apresentar os custos e os proveitos classificados por natureza, também, o modelo constante do POC. Os resultados são classificados em correntes e extraordinários, desdobrando-se os primeiros em operacionais e financeiros. Efectuaram-se algumas modificações e adaptações das classes 6, 7 e 8, por força das especificidades das entidades a que se destina o Plano, de que são exemplos: as contas 63 – «Transferências correntes concedidas e prestações sociais», 71 – «Vendas e prestações de serviços»; 72 – «Impostos e taxas», e 74 – «Transferências e subsídios correntes obtidos». Eliminaram-se, ainda, as contas: 85 – «Resultados antes de impostos»; 86 – «Imposto sobre o rendimento do exercício», e 89 – «Dividendos antecipados». Para apoio ao acompanhamento da execução orçamental prevêem-se os seguintes mapas: • controlo orçamental – despesa; • controlo orçamental – receita; • fluxos de caixa.
117
Sobre o POC veja-se: Jacques Margerin – A Gestão orçamental: como torná-la um utensílio de gestão. Lisboa: Prisma, 1991.
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Os mapas de execução orçamental das despesas e das receitas articulam-se com o de fluxos de caixa, e permitem acompanhar, de forma sintética, o desenvolvimento das principais fases das despesas e das receitas. O mapa de fluxos de caixa apresenta os recebimentos e pagamentos associados à execução do orçamento e às demais operações que afectam a tesouraria, evidenciando, ainda, os saldos iniciais e finais. Os anexos abrangem um conjunto de informações destinadas a permitir uma adequada compreensão das situações expressas nas demonstrações financeiras, ou de outras que, não tendo reflexo nessas demonstrações, são úteis para uma melhor avaliação do seu conteúdo. Prevê-se, também, a inclusão de elementos com vista à caracterização geral da entidade. Estes anexos compreendem três partes distintas: • caracterização da entidade; • notas ao balanço e à demonstração de resultados; • notas sobre o processo orçamental e respectiva execução. A exemplo do POC, o quadro de contas, mantém a classificação decimal. As contas que integram as classes de 1 a 5 dizem respeito às contas do balanço, as classes 6, 7 e 8, às contas de resultados e a classe 0, às contas do controlo orçamental e de ordem. A classe 9 reserva-se para a contabilidade analítica. As tabelas sobre a classificação económica das despesas e das receitas, e sobre a classificação dos sectores, referidas no presente Plano, são as que vigoram em cada momento, de acordo com as disposições legais aplicáveis. Um plano geral não pode, evidentemente, contemplar todas as situações possíveis e imagináveis. Por isso admite-se, em muitas contas, que as entidades possam criar subcontas (evidenciadas por reticências), segundo as suas necessidades, mas recomenda-se o maior cuidado na utilização desta faculdade e que se respeite, sempre, o conteúdo da conta principal. Uma vez que, na lógica do POCP, se pretende manter uma distinção clara entre a contabilização das operações orçamentais (com efeitos unicamente internos à entidade), e a das operações subsequentes ao reconhecimento de um direito ou obrigação (com efeitos na esfera patrimonial de terceiros), as contas da classe 0 destinam-se, apenas, ao registo do primeiro tipo de operações. São, assim, objecto de movimento contabilístico nesta classe de contas: • a aprovação do orçamento; • as modificações introduzidas nas dotações de despesa e nas previsões de receita; • os cabimentos; • os compromissos; 245
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• os processamentos (para as despesas sujeitas ao regime de duodécimos ou para todas as despesas, se for essa a opção da entidade). São, ainda, contabilizados nesta classe de contas, os compromissos com efeitos em exercícios seguintes. Com a aprovação do orçamento, registam-se as dotações iniciais para as despesas e as previsões iniciais para as receitas. Na sequência da aprovação do orçamento das despesas, são registadas as modificações introduzidas nas dotações, por forma a dispor-se de informação sobre congelamento e descongelamento de dotações; transferências de dotações (reforços e anulações) e créditos especiais; dotações disponíveis; duodécimos vencidos e créditos disponíveis. No decurso da execução orçamental, a utilização das dotações de despesa corresponde ao registo das fases de cabimento (cativação de determinada dotação visando a realização de uma despesa). Em termos documentais, na fase de cabimento dispor-se-á de uma proposta para realizar determinada despesa, eventualmente ainda de um montante estimado, enquanto na fase de compromisso haverá, por exemplo, uma requisição oficial, uma nota de encomenda, ou um contrato ou equivalente para aquisição de determinado bem ou serviço. Em princípio, a fase de processamento das despesas não é registada nas contas da classe 0. Exceptuam-se os processamentos de despesas por conta de dotações sujeitas ao regime de duodécimos, em que, para controlo daquela obrigatoriedade legal, há lugar a registar na fase de processamento ou de pedido de libertação de créditos (PLC). Obviamente, as entidades que pretendam dispor de um contrato directo dos compromissos – em que medida os compromissos assumidos têm correspondência em despesa processada –, deverão contabilizar a fase de processamento para todas as dotações. A fase de pagamento é contabilizada em contas das classes 1 e 2, incluindo os pagamentos respeitantes a exercícios anteriores, ainda que realizados no período complementar. No lado das receitas, dada a natureza das operações orçamentais, o movimento contabilístico é mais simples. Na classe 0 registam-se, apenas, os movimentos correspondentes à aprovação do orçamento, registo das previsões iniciais, das modificações introduzidas, revisões de previsões (reforços e anulações), créditos especiais e previsões corrigidas. A liquidação e o recebimento são registados noutras classes do POCP. As contas da classe 0 são desagregadas de acordo com a classificação económica das receitas e das despesas, podendo ser agrupadas, simultaneamente, segundo outros critérios, por exemplo, por projectos. Para o controlo orçamental das entidades públicas com programas plurianuais, nomeadamente as que executam projectos incluídos no Programa de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC), a disponibilidade de informação relativa a compromissos com reflexo 246
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nos orçamentos dos anos seguintes é essencial, e constituirá um precioso auxiliar da preparação do orçamento para o ano seguinte. Para responder a esta necessidade, o POCP prevê a disponibilização de informação sobre os compromissos com efeitos em exercícios futuros, desagregando os primeiros três anos e incluindo numa conta residual os valores respeitantes ao 4.º ano e anos seguintes. Relativamente ao encerramento das contas da classe 0, haverá que: • proceder à anulação dos cabimentos que não deram origem a compromissos; • transitar para a conta 05 – «Compromissos – Exercícios futuros», os compromissos assumidos no ano, e que não se concretizaram em despesa realizada; • encerrar as contas relativas ao exercício do ano que termina, e cujos saldos não sejam nulos, por contrapartida da conta 01 – «Orçamento – Exercício corrente». • encerrar a conta 05 – «Compromissos – Exercícios futuros», por contrapartida da conta 04 – «Orçamento – Exercícios futuros». A aplicação dos princípios contabilísticos fundamentais, a seguir formulados pode levar à obtenção de uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira, dos resultados e da execução orçamental da entidade. Tais princípios são: a) Princípio da entidade contabilística – Constitui entidade contabilística todo o ente público ou de direito privado, que esteja obrigado a elaborar e apresentar contas, de acordo com o presente Plano. Quando as estruturas organizativas e as necessidades de gestão e informação o requeiram, podem ser criadas subentidades contabilísticas, desde que esteja devidamente assegurada a coordenação com o sistema central. b) Princípio da continuidade – Considera-se que a entidade opera continuamente, com duração ilimitada. c) Princípio da consistência – Considera-se que a entidade não altera as suas políticas contabilísticas de um exercício para o outro. Se o fizer e a alteração tiver efeitos materialmente relevantes deve ser referida, de acordo com o anexo às demonstrações financeiras (nota 8.2.1). d) Princípio da especialização (ou do acréscimo) – Os proveitos e os custos são reconhecidos, quando obtidos ou incorridos, independentemente do seu recebimento ou pagamento, devendo incluir-se nas demonstrações financeiras dos períodos a que respeitem. e) Princípio do custo histórico – Os registos contabilísticos devem basear-se em custos de aquisição ou de produção, quer em escudos nominais, quer em escudos constantes. f ) Princípio da prudência – Significa que, ao fazer as estimativas exigidas em condições de incerteza, é possível integrar nas contas um grau de precaução 247
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. Gestão Financeira
sem, contudo, permitir a criação de reservas ocultas, provisões excessivas, a deliberada quantificação de activos e proveitos por defeito, ou de passivos e custos por excesso. g) Princípio da materialidade – As demonstrações financeiras devem evidenciar todos os elementos relevantes, e que possam afectar avaliações ou decisões pelos utentes interessados. h) Princípio da não compensação – Regra geral, não se deverão compensar saldos de contas activas com contas passivas (balanço), de contas de custos e perdas com contas de proveitos e ganhos (demonstração de resultados) e (em caso algum), de contas de despesas com contas de receitas (mapas de execução orçamental). Actividade Entreviste um funcionário responsável pela elaboração do orçamento, num serviço com autonomia administrativa e financeira, e faça perguntas sobre o balanço analítico e a demonstração de resultados desses serviço, relativamente ao último ano.
TESTE FORMATIVO 1. Quais são as grandes diferenças entre a metodologia tradicional e a actual na preparação do orçamento? 2. Quais são os elementos mais importantes que entram na definição do conceito de orçamento? Descreva-os. 3. O que é o duplo cabimento? 4. Que compreende a Conta Geral do Estado? 5. Que se entende por serviços com autonomia administrativa e financeira? 6. Quais os mapas que apoiam o acompanhamento da execução orçamental?
RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. A metodologia tradicional assentava numa óptica de obtenção de verbas julgadas indispensáveis ao funcionamento dos respectivos serviços. O método incremental dominou no processo de elaboração do orçamento a partir de 1987, quando o Governo estabeleceu que os serviços teriam de preparar os seus orçamentos, a partir da identificação e justificação das actividades a 248
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2.
3.
4.
5. 6.
realizar, subdividindo-as em actividades em curso e actividades novas, imputando-lhes as respectivas despesas. O elemento económico, que é a previsão da gestão orçamental do Estado. O elemento político, que é a autorização política desse projecto ou plano de gestão. O elemento jurídico, que é o instrumento pelo qual se processa a limitação dos poderes dos órgãos da administração financeira. Considera-se duplo cabimento, quando há consignação de receitas, e as despesas têm de caber, não só nos créditos orçamentais (primeiro cabimento), mas ainda no produto das receitas que lhes foram afectadas (segundo cabimento). A Conta Geral do Estado compreende: o relatório do Ministro das Finanças sobre os resultados da execução orçamental; o mapa da conta geral dos fluxos financeiros do Estado; os mapas referentes à execução orçamental; os mapas relativos à situação de tesouraria; e os mapas referentes à situação patrimonial. São os serviços que, além de gozarem de autonomia administrativa, dispõem de receitas próprias, o que lhes permite autorizar, com essas receitas, os pagamentos das despesas previstas no seu orçamento. O controlo orçamental – despesa; o controlo orçamental – receita e os fluxos de caixa.
L EITURAS C OMPLEMENTARES FRANCO, Sousa – Direito Financeiro e Finanças Públicas. Lisboa: Vega, 1982. COSTA, A Carvalho; TORRES, Maria Rosário – Controlo e Avaliação da Gestão Pública. Lisboa, Rei dos Livros CUNHA, Silva – Direito Económico. Porto: Universidade Livre, s/d. FERREIRA, Rogério Fernandes – O Plano Oficial de Contabilidade: ensaios e estudos críticos. Lisboa: Escher, 1992. LOCHARD, Jean – Compreender a Contabilidade Geral. Lisboa: Prisma,
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10. A REFORMA ADMINISTRATIVA E A QUALIDADE EM SERVIÇOS PÚBLICOS
SUMÁRIO Objectivos 1. A Modernização e a Reforma Administrativa 2. O Processo de Mudança 3. Evolução do Conceito de Qualidade 4. As Normas ISO 9000 e a Certificação 5. A Satisfação dos Clientes como Medida 6. A Qualidade nos Serviços Públicos 7. O Modelo de Auto-avaliação da EFQM 8. O Modelo de Auto-avaliação da CAF Teste Formativo Respostas ao Teste Formativo Leituras Complementares
OBJECTIVOS
DA UNIDADE
No final do processo de aprendizagem desta unidade o estudante deverá estar apto a: • identificar as características da envolvente da administração pública que mais exigem a reforma administrativa; • identificar os princípios constitucionais da reforma administrativa; • discutir a reforma da administração pública; • relacionar as diversas fases de evolução do conceito de qualidade; 251
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• • • • •
distinguir a definição de qualidade nos principais autores; identificar o novo e o velho conceito de qualidade; indicar as diferenças existentes na família das Norma ISO 9000; exemplificar como é que o cliente pode ser a medida da qualidade; caracterizar o Sistema de Qualidade em Serviços Públicos (SQSP).
1. A MODERNIZAÇÃO
E A
REFORMA ADMINISTRATIVA
As reformas da Administração Pública assumiram premência nos últimas três décadas como instrumentos destinados a resolver problemas tais como: Combate à corrupção; Superação do formalismo; Redução do clientelismo; Diminuição de desigualdades; Absorver os impactos da revolução tecnológica; Aumentos de eficiência sistémica do sector público; Má imagem dos serviços prestados e baixa qualidade; Peso excessivo do sector público e da folha de salários face ao PIB; Opacidade aos olhos do cidadão; Falta de recursos qualificados; Falta de meritocracia; Desmotivação de funcionários; Controlo de custos; Ausência de pensamento estratégico e visão; Fraca gestão. Transformações recentes nas administrações públicas dos países da OCDE estão marcadas por: Políticas – Retórica anti “Big Government” Sociais – Crise do Estado de Bem-Estar Social Económicas – Desregulação, privatização, flexibilização do trabalho, e globalização Institucionais – Novas constelações de relações inter e intra governamentais Tecnológicas – Revolução nas tecnologias da informação e comunicação Culturais – “Westernization” e “Americanization”. A reforma administrativa apoia-se directamente na Lei fundamental do país, tal como evidenciam os artigos da CRP a seguir transcritos: “art.º 266.º-1 – A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. 2 – Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e boa-fé. art. 1 – A Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocratização, a aproximar os serviços das populações e a assegurar a participação dos interessados na sua gestão efectiva (…)”. 252
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Estes princípios têm inspirado as medidas de modernização e reforma da administração pública que, na sequência do que tem vindo a ser feito nos países da OCDE, em Portugal, tem sido uma preocupação constante de todos os governos. Os princípios constitucionais sobre a reforma administrativa que visam a desburocratização são, em síntese: o princípio da desburocratização; o princípio da aproximação dos serviços às populações; o princípio da participação dos interessados na gestão da Administração Pública; o princípio da descentralização; o princípio da desconcentração. A aplicação destes princípios obriga a Administração Pública a canalizar as suas energias para um esforço constante de adaptação ao meio envolvente. Este pode ser caracterizado por desequilíbrios e rupturas mundiais, e por profundas e contínuas transformações económicas, sociais, culturais e tecnológicas. Além disso, a envolvente está marcada por restrições económicas, pelas necessidades de conter os défices orçamentais e pelas exigências de maior produtividade, melhor qualidade dos bens e produtos oferecidos pelos serviços públicos e pela existência de funcionários motivados e altamente qualificados. Ela impõe, ainda, o recurso a tecnologias de informação avançadas, e uma maior desburocratização, racionalização e simplificação de estruturas e procedimentos administrativos, garantes de uma maior flexibilidade e autonomia de gestão O resultado global da economia e do desenvolvimento social depende da interligação e complementaridade entre sectores público, privado e social. Da capacidade de cooperação entre eles, e do comportamento da Administração, depende o desenvolvimento económico-social dos países, a criação de riqueza equitativamente distribuída, e a qualidade de vida das populações. A resposta a estes novos desafios, colocados pela envolvente, passa pela reforma da administração que, como acabámos de ver, tem em Portugal o imperativo da Lei fundamental a dar-lhe força e dinamismo. A desburocratização como princípio dinamizador da reforma da administração pública vem já de muito longe. A necessidade de desburocratizar é quase tão antiga como o próprio governo. Hoje, a burocracia é o problema não a solução 118. Por isso, a questão mais importante já não é a de saber se a desburocratização é um imperativo, ou seja se a burocracia administrativa deve ser reformada. A questão é de saber se: é possível governar através de organizações tradicionais burocráticas; as burocracias tradicionais podem ser suficientemente reformadas, ao ponto de servirem como instrumento de governo; entre os diversos modelos propostos e em discussão algum pode servir melhor para governar.
118
Joaquim Araújo – Da Nova Gestão Pública à Nova Governação Pública: pressões emergentes da fragmentação das estruturas da Administração Pública. In Hugo Silvestre: Joaquim Araújo – Coletânea em Administração Pública. Lisboa: Escolar Editora, 2012, pp. 25-63.
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Há quem defenda, actualmente, a mudança de fundo e a introdução de um novo modelo, por achar que a reforma da burocracia tradicional não constitui uma solução adequada à complexidade deste século. Preconizam, pois, a total revisão da administração pública, e não apenas a introdução de pequenas melhorias. Neste grupo encontra-se Guy Peters 119 que na obra The Future of Governing descreve e examina quatro modelos alternativos que, em seu entender, emergem das muitas reformas actualmente em curso. Esses modelos são por ele designados por: governo de mercado, governo participativo, governo flexível, e governo desregulamentado. Os pressupostos de cada um destes modelos sãos os seguintes: Mercado
Participativo
Desregulamentado
Estabilidade
Regulação interna
Fonte de Problemas Estrutura
Mercado
Descentralização Plana, com poucos níveis
Não tem preferências
Melhorias da Gestão através de Acção Política
Pagar de acordo com a performance. Incentivos de mercado Mais barato
Maior liberdade
Benefícios
Hierarquia
Flexível
Redes e organização virtual Envolvimento dos funcionários em funcionários regime laboral temporário Consulta e Experimentação negociação Maior Baixo custo envolvimento
Governação empreendedora Criatividade e activismo
Outros, porém, acham que é, apenas, necessário dar alguns retoques na máquina burocrática, aperfeiçoando-a, para que ela seja um bom instrumento ao serviço dos cidadãos. Paul Light 120, na sua obra The Tides of Reform: making government work, inclina-se para esta perspectiva. Neste caso, a desburocratização passa pela introdução de novas modas de administração, dos PPBS, aos Orçamentos de Base Zero (budget base Zero – BBZ), da Gestão por Objectivos (management by objectives – MBO), à cultura organizacional, até à gestão pela qualidade total (total quality management – TQM). Nos últimos 40 anos, facilmente, encontramos as seguintes modas de gestão: • 1960: GpO (MBO); teorias X e Y da gestão, formação de sensibilidade; enriquecimento de funções; PERT e a matriz BCG.
119 120
Guy Peters – The Future of Governing. Lawrence, KS: University Press of Kansas, 1996. Paul Light – The Tides of Reform: making government work. New London: Yale University Press, 1997.
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• 1970: Planeamento estratégico centralizado; matrizes organizacionais; gestão por comités; horários flexíveis; orçamentos de base zero; • 1980: empreendedorismo interno; círculos de qualidade; teoria Z; Just in time; 14 princípios de Deming; equipas autogeridas; • 1990: Alianças estratégicas; competências nucleares (core business); total Quality Management; reengenharia de processos; liderança carismática, visionária, emocional; organizações em rede; organizações aprendentes; gestão de livro aberto; carreiras autogeridas; externalização (outsourcing); capacitação (empowerment); ambientes de trabalho 24/7; • 2000: equilíbrio entre trabalho e família; capital social; organizações virtuais; gestão do conhecimento, entre outras modas. As marés de reforma no Reino Unido, começam nos anos sessenta do século passado com o relatório do Committee on Civil Service, presidido por Lord Fulton, tornado público em Junho de 1968. Em Portugal, esta maré começa na execução do Plano Intercalar de Fomento (1965-67) e na preparação do III Plano de Fomento (1968-1973) criou-se o Grupo de Trabalho 14 vocacionado para a Reforma Administrativa. Foi o Grupo de Trabalho 14 que elaborou o decreto-lei que abriu a possibilidade de ampla delegação de competências e a proposta de criação do Secretariado da Reforma Administrativa, publicado a 23 de Novembro de 1967, exactamente 32 anos depois da grande reforma de Salazar contida no Decreto-Lei n.º 26115. Em Portugal as sucessivas reformas: Visam resolver a crise do Estado de Bem-Estar Social; Levam à substituição da “administração profissional” (1945-1975) pela política e pela governança; nos termos do Diagnóstico do Grupo de Trabalho 14 têm em vista substituir “estruturas rígidas, ancilosadas, altamente centralizadas, indiferentes ao meio ambiente; práticas repetitivas e métodos ultrapassados, desinteresse pelas novas tecnologias, lentidão marasmo; costas voltadas para um público quase esquecido; e factor humano pode dizer-se que destroçado, desmotivado e mal preparado”. Em Portugal, a modernização administrativa durante a década de noventa do século passado foi orientada pela mudança por “pequenos passos”, como mudança incremental ou de melhorias contínuas. Não importa, nesta alternativa, a reforma e a substituição de um modelo por outro, mas apenas proceder a melhoramentos e terapias no modelo burocrático. A aproximação dos serviços às populações e a melhoria da participação do público na administração pública, por exemplo, exigindo o abandono da postura estática e reactiva em favor de uma postura mais dinâmica, 121 expressam bem a 121 Recomenda-se a leitura o artigo de Cheryl Simrell King, et al. – The Question of participations: Toward authentic public participation in public administration. Public Administration Review, vol. 58, n.º 4, 317-326.
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crença de que o sistema burocrático é válido e precisa, apenas, de pequenos acertos. Em Portugal, as tentativas de modernização da administração remontam, pelo menos, aos anos sessenta. No entanto, só em 1999 foram, através do Decreto-lei n.º 135/99, de 22 de Abril, compiladas as orientações dispersas, e estabelecidas as medidas de modernização administrativa. Com este diploma, o Governo procurou superar a dispersão das medidas e diplomas que foram publicados durante as últimas duas décadas do século XX em matéria de modernização administrativa. Esta publicação teve em vista racionalizar, sistematizar e inovar, num único diploma, as normas de âmbito geral aplicáveis à Administração Pública. Foi a forma de facilitar o acesso às mesmas, por parte dos destinatários, e de torná-las mais conhecidas e transparentes aos cidadãos, clientes dos serviços públicos. A modernização administrativa levada a efeito (n.º 1 do art. 1 Decreto-lei n.º 135/99, de 22 de Abril) incidiu sobre: acolhimento e atendimento dos cidadãos e dos agentes económicos; comunicação administrativa; simplificação de procedimentos; audição dos utentes; sistema de informação para a gestão. De acordo com o diploma referido, os organismos da Administração Pública estão ao serviço do cidadão, e devem orientar a sua acção de acordo com os seguintes princípios: qualidade protecção e confiança; comunicação eficaz e transparente; simplicidade; responsabilidade; gestão participativa. Os princípios orientadores e as medidas propostas pelo Decreto-lei n.º 135/99, de 22 de Abril, expressam a crença, de que é possível governar através da burocracia. Isto, impondo-lhe apenas pequenos retoques na fachada, pequenos passos destinados a limar arestas, e uma melhor adaptação às novas exigências da envolvente. Tratou-se de dar ao termo modernização o significado de recente, actual, e não de pôr em causa o modelo em si mesmo, ainda que não estivesse na moda. As reformas, na primeira década do século XXI lidam com uma forte tensão entre duas racionalidades a jurídica de matriz europeia continental e a da gestão por objectivos ou técnica de matriz anglo-saxónica. Atributos
Jurídica
Gestão /técnica
Legitimidade
Lei, norma, regulamento
Eficiência, eficácia, qualidade
Primazia
Meios
Fins
Prioridade
Estabilidade
Mudança
Organização
Vive para si
Vive para os cidadãos
Autoridade
Topo/base
Negociação
Controlo
Cibernético
Melhoria contínua
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Assiste-se, desde o final dos anos 70, a uma mudança de foco: da public administration para a public management 122, no espírito de aquilo que nos países anglo-saxónicos se convencionou chamar «governance» 123 Esta mudança de foco insere-se na filosofia do managerialism, ou seja, na crença de que a gestão constitui a solução para os vários problemas que assolam as organizações e as sociedades. Por managerialism entende-se em geral um conjunto de crenças e práticas, que tem como centro uma postura de princípio, raramente testada, de que uma melhor gestão será a solução eficaz para um amplo campo de males económicas e sociais. 124 Dentro desta filosofia de gestão pública ou de nova “governance” a OCDE tem recomendado às administrações públicas que pautem a sua actuação por 4E: eficiência; eficácia; economia; ética. Na mesma linha de orientação define os novos indutores “drivers” deste processo de mudança: mudança de regras; enfoque nos cidadãos; meritocracia (gestão do desempenho); competição e incentivos; cidadania activa (envolvimento dos cidadãos; redes e parcerias. Ora, a gestão moderna foi inventada, precisamente, para resolver o problema da ineficiência, marca negativa das administrações públicas que nunca primaram por serem exemplos de eficiência, pelo menos na Europa do Sul. Acontece que os primeiros esforços de Taylor, há cem anos, destinaram-se a reduzir o desperdício, a precisar os modelos de desempenho, a articular remuneração e produtividade. Para Taylor a eficiência surgia de “saber exactamente o que se quer que os homens façam e depois conseguir que o façam da melhor maneira e mais barata”. Desde então o segredo reside na gestão sistémica que apresenta como resultado cem anos de produtividade crescente. Ora, é esta atitude que os reformadores actuais das administrações públicas estão a tentar introduzir com mais ou menos sucessos nos seus países. Acresce que após a II Guerra Mundial a gestão não é apenas gestão de negócios (business). É parte integrante de todas as iniciativas humanas que reúnam numa organização pessoas com diversos conhecimentos e competências. Tem de ser aplicada a todas as instituições do sector terciário, como hospitais, universidades, associações privadas sem fins lucrativos, organismos públicos. Por todo o mundo a gestão tornou-se numa função social. Se os processos de reforma das administrações públicas visam a substituição do tradicional modelo jurídico pelo modelo de gestão técnica, afinal o que é a gestão? A gestão tem a ver com os seres humanos; Lida com a integração de 122
A diferenciação entre public administration e a public management tem a ver com a busca de modelos de gestão inspirados no sector privado alternativos aos tradicionais públicos. 123 «Governance» – atribui-se ao termo o sentido adoptado pela OCDE: o acto de governar, num sentido lato. O termo abrange a administração pública e as instituições, métodos e instrumentos de governo. Assume ainda as relações entre o governo, o cidadão e os agentes económicas, bem como o papel do Estado, consulte-se: OCDE – Governance in Transition: Public Management Reforms. In OECD Countries. Paris -. OECD, 1994. p. 158. 124 Christopher Pollitt. ob. cit., p. 1.
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pessoas num empreendimento comum; Todos os empreendimentos exigem um compromisso com metas, objectivos comuns e valores partilhados; A gestão tem de permitir que o empreendimento e as pessoas cresçam e se desenvolvam com a mudança das necessidades e oportunidades; Todos os empreendimentos integram pessoas com diferentes competências, conhecimentos e realizam diferentes tipos de trabalho; Os resultados por si só não são um indicador único do desempenho da gestão e do empreendimento; O resultado de um empreendimento é externo: um utente/cliente satisfeito (doente curado, aluno instruído). Dentro do empreendimento apenas existem custos 125. Importa reter que este processo de substituição de um paradigma jurídico tradicional de administração pública por outro de tipo gestionário como acabámos de descrever não é tarefa fácil sobretudo em virtude de este último parecer ser um pouco alheio aos traços da cultura latinos são é o caso de Portugal. Aliás, sendo a cultura americana mais propícia à adopção de um modelo do tipo de gestão por objectivos, o próprio Peter Drucker, em 1980, avaliando a forma como a administração pública americana aplicava a gestão por objectivos, concluía que esta revelava erros importantes: Imprecisão na definição dos objectivos, programas e acções; Indefinição quanto a prioridades; Gastos de tempo e recursos de forma desnecessária; Exagero na composição das equipas de trabalho; Apego a dogmas para justificar os maus resultados; Incapacidade ou falta de vontade política para aprender com o erro; Resistência em abandonar programas e acções reconhecidas como erradas 126. Actividade 1 Confronte as recomendações da OCDE com o programa de reforma do Governo de Portugal e evidencie as semelhanças e as diferenças.
2. O PROCESSO
DE
MUDANÇA
Uma das maiores questões dos estudos organizacionais é a análise da mudança, e uma das dificuldades reside no que se entende por mudança. Esta questão foi identificada por Parsons como o problema da mudança dentro do sistema, enquanto problema oposto à mudança do próprio sistema. Este problema radica na dificuldade que existe em determinar o tipo de mudança que resulta em 125
Peter Drucker – Petre Drucker – O essencial de Drucker: um selecção das melhores teorias do pai da gestão. Lisboa: Actual Editora, 2008. 126 Peter Drucker – The Deadly Sins in Public Administration. Public Administration Review, Vol. 40, n.º 2, Mar- Apr., 1980, pp. 103-106.
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mudança do sistema organizacional. Novas técnicas podem ser introduzidas, novos modelos podem ser experimentados, e novas normas e políticas podem ser formuladas, mas tudo isto poderá não significar uma mudança do sistema. É a baixa performance em termos de eficiência, eficácia e qualidade que está na base do desequilíbrio e da mudança organizacional. Não se muda ou reforma a administração por reformar. Muda-se e reforma-se para que haja maior e melhor serviço prestado aos cidadãos, isto é, cumprimento dos objectivos definidos. Para que haja mudança é necessário que o nível de eficácia ou de performance organizacional atinja tão baixo nível que coloca em risco a sobrevivência do sistema e é este risco de extinção ou incerteza que obriga a procurar a procurar um novo equilíbrio. A baixa eficácia causa desadaptação e esta provoca e obriga a nova adaptação organizacional, mas, pelo contrário, a alta performance estimula o crescimento que se expressa no aumento de empregados, melhoria da qualidade, etc. Uma organização mal adaptada à sua envolvente, com uma performance inferior ao nível aceitável pelos principais interessados (stakeholders), procederá à adaptação da sua estrutura aos factores da envolvente interna e externa de forma a sobreviver. Uma organização mal adaptada cuja performance é média ou alta (acima do nível desejado pelos principais interessados) vai continuar mal adaptada. Para uma organização bem adaptada, quanto mais alta for a sua performance mais elevado será o seu grau de crescimento. Acontece que, teoricamente, a base política de sustentação das organizações públicas, as quais dispõem sempre do orçamento do Estado e não dependem das leis de mercado, pode prolongar o seu horizonte vital mesmo quando tais organizações não cumpram a sua missão e as suas principais atribuições e competências. Assim, se a causa da mudança radica na performance, a natureza da mudança a implementar pode ser de dois tipos bem diferentes: a mudança incremental, e a mudança profunda. A primeira veicula apenas a ideia de mudança episódica, incremental ou evolutiva, enquanto a segunda aponta para a ruptura com os padrões do passado e é descontínua. Lançando mão da terminologia de Parsons trata-se da mudança dentro do sistema ou da mudança do próprio sistema. A mudança incremental é definida enquanto uma ruptura no interior de um sistema organizacional marcado pela inércia, ou seja, o sistema organizacional ao desalinhar-se, relativamente à percepção que alguns dos seus elementos têm, face às exigências da envolvente, pressupõe uma intervenção, com vista à sua readaptação. Ela assenta num processo de evolução permanente, sustentado em ciclos curtos, progressivos e localizados, de adaptações e alterações, ou seja, numa série de acomodações, através das quais a organização se adapta à realidade envolvente, em permanente mudança. 127 127
Miguel Dinis e Cunha; Arménio Rego – “As Duas Faces da Mudança Organizacional”. (http://fesrvsd. fe.unl.pt/WPFEUNL/wp407.pdf.
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A mudança incremental possui um carácter operacional, dizendo respeito apenas a novos sistemas, procedimentos, estruturas ou tecnologia, os quais terão um efeito de curto prazo na actividade da organização, mas cujo efeito sobre o comportamento na organização é de extrema importância. A mudança profunda é de tipo estratégico e, por definição, descreve as características mais importantes da relação da organização com a sua envolvente, o que leva a que a mudança estratégica tenha a ver com as mudanças mais importantes e de longo prazo que ocorram em tal relação. A mudança profunda e a mudança estratégica são idênticas e implicam a transformação do próprio sistema e a ruptura com os padrões de actuação do passado. Iniciar processos de mudança estratégica não é fácil. As organizações possuem conhecimentos, valores, pressupostos, regras e competências que fazem o que elas são, actualmente. Todavia, com a mudança do mundo à sua volta, perdem o sentido do alinhamento e começam a ter problemas, de baixa eficácia ou, então, funcionam tão bem que precisam de crescer. Em ambos os casos, há mudança e resolvem-se estes problemas, fazendo pequenos ajustamentos. Todavia, por vezes, as organizações têm necessidade de alterar os seus pressupostos fundamentais, regras, paradigmas e desenvolver novas teorias acerca da sua actividade e da relação com a sua envolvente. Quando isto acontece, está-se perante uma necessidade de mudança profunda ou estratégica. Quando se fala de mudança organizacional, refere-se, por norma, à mudança incremental. Esta é fruto da análise racional e de um processo de planeamento. Existe uma meta desejável, e um conjunto específico de etapas indispensáveis para a atingir. Este tipo de mudança é limitado na sua finalidade e, normalmente, reversível. Se a mudança implementada não der bom resultado, é sempre possível, voltar ao ponto inicial, ao modelo antigo. Este tipo de mudança, normalmente, não rompe com os padrões de actuação passada, sendo um prolongamento desse mesmo passado. Além disso, neste tipo de mudança, quem a dirige sente que possui o controlo sobre o que está a acontecer, sendo o futuro susceptível de previsão. Um processo de mudança eficaz segue, normalmente, os seguintes seis passos: mobilizar as pessoas para a mudança através da análise conjunta dos problemas da competitividade; desenvolver uma visão partilhada sobre como organizar e gerir para a competitividade; incentivar o consenso acerca desta nova visão, formando as pessoas para a acção, e fomentando a coesão; espalhar a revitalização por todos os departamentos, sem pressionar do topo; institucionalizar a revitalização através de políticas formais, sistemas e estruturas; controlar e ajustar estratégias, em resposta aos problemas do processo de revitalização. A mudança profunda, ou seja, a mudança do próprio sistema, exige uma nova maneira de pensar e de se comportar na organização. É mais ambiciosa na sua finalidade, descontínua em relação ao passado e geralmente irreversível. A mudança 260
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profunda rompe com os padrões de acção e envolve um assumir de riscos e uma certa perda de controlo. Para Robert Quinn a mudança profunda ocorre com o processo transformacional o qual possui quatro fases distintas: Iniciação; Incerteza; Transformação; Rotina. Todo o sistema de acção deve expandir-se e crescer ou contrair-se e entrar em agonia. Para permanecer saudável o sistema deve percorrer permanentemente este ciclo de quatro fases. Todavia, não é fácil manter o sistema em movimento, dado que existe quatro armadilhas: ilusão, pânico, exaustão, estagnação. Na fase da iniciação, deseja-se mudar e melhorar e, por isso, desenvolve-se a visão do que se quer a longo prazo depois assume-se o risco da iniciativa. O perigo é agir a partir de uma visão que não possa ser implementada, caindo-se na armadilha da ilusão e da decepção. Na fase da incerteza, os participantes comprometem numa acção intensa e de experimentação intuitiva. Se esta acção falha os participantes podem cair na armadilha do pânico. Todavia, se forem persistentes e vencer o desconforto e continuarem a experimentação, poderão ganhar o insight que os guiará à fase seguinte. Na fase transformacional, a aprendizagem intuitiva e obtida através da experimentação poderá levar a reformular o problema e uma nova teoria ou paradigma emerge. Esta fase é o momento essencial da mudança profunda. Para Kurt Lewin o processo de mudança passa por três fases seguintes: Descongelamento – alteração do estado presente de equilíbrio, responsável pela sustentação dos actuais comportamentos e atitudes. Este processo deve tomar em atenção as ameaças que a mudança poderá suscitar, e a necessidade de motivar os que integram o novo processo. Mudança – desenvolvimento de novas respostas, com base em nova informação. Recongelamento – estabilização da mudança pela introdução de novas respostas.
3. EVOLUÇÃO
DO
C ONCEITO
DE
QUALIDADE
Nas suas diversas facetas, o conceito de qualidade torna-se mais compreensível, se analisarmos a forma como, através dos tempos, tem vindo a ser aplicado. Até ao final da Segunda Guerra Mundial, a tecnologia evoluía lentamente, e a noção de qualidade resumia-se à preocupação com as características físicas do produto, com a sua conformidade final às especificações técnicas do protótipo industrial.
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Até ao final dos anos cinquenta do Século XX a procura era superior à oferta, e a produção era orientada para uma sociedade monopolista. Havia um alheamento total relativamente às necessidades do mercado, e um fraco rigor na definição dos processos. Era fácil o escoamento da produção, o mercado era aberto e não havia preocupação com a colocação dos produtos. Entretanto, o mercado foi se tornando mais exigente e, de uma fase em que se abordou a qualidade, tendo em vista a produtividade, passou-se a outra, que conduziu à criação dos círculos de qualidade. Depois da Segunda Guerra Mundial muitas indústrias japonesas, influenciadas por W. Deming e J. Juran, incorporaram o princípio da qualidade total (QT) nas suas organizações. Os Círculos de Qualidade do Japão chegaram à Europa, e foram implementados na indústria, particularmente na indústria automóvel. Entretanto, a oferta e a concorrência aumentaram, e os consumidores passaram a interrogar-se sobre se os produtos são adequados à utilização pretendida, ou se estão, apenas, em conformidade com a especificação técnica. Surgiram, também, os primeiros estudos de mercado, e teve lugar a revolução do marketing. Saiu-se da fase apenas comercial, e nasceu um novo conceito: as actividades transfuncionais de Feigenbaum. Foi este autor que realçou a necessidade dos produtos estarem bem concebidos, bem distribuídos e dirigidos a mercados certos, com acompanhamento pós-venda, para que haja qualidade. Encontramo-nos, aqui num mercado fechado, com concorrência apoiada em circunstâncias semelhantes, perante a necessidade de encetar o esforço de vendas. Esta nova exigência levou ao aparecimento de um novo sistema de produção. A ênfase maior passou a ser colocada no controlo do processo produtivo, e não na inspecção. Este novo sistema consiste em dividir o processo por etapas e inspeccionar o produto no final de cada uma, só passando à etapa seguinte, aquele que estiver em condições, e mantiver ainda assim, a inspecção final. Este sistema diminui o desperdício e as peças rejeitadas, mas aumenta o custo dos retoques. Para resolver este problema, passou-se a envolver os operários na concepção e melhoria do processo produtivo. As organizações que, desta forma, atingiram o nível de qualidade da conformidade ao custo, obtiveram produtos mais fiáveis e a baixo custo. Nos anos oitenta do século passado, surgiu um novo desafio, e a Coreia do Sul, Hong Kong e Singapura, imitando a tecnologia ocidental, conseguiram colocar no mercado produtos de boa qualidade, a baixos custos de produção. A procura, nos anos oitenta, foi inferior à oferta, o mercado estava saturado, a concorrência era feroz, e surgiu a necessidade de fidelizar os clientes. A qualidade tornou-se, assim, a principal exigência dos clientes. 262
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Este facto obrigou à renovação do conceito de qualidade, a introduzir o cliente na definição da qualidade, e a abandonar a perspectiva focalizada no produto. Uma organização que consiga identificar as necessidades de um segmento de mercado e satisfazê-las, poderá funcionar, durante algum tempo, como fornecedor exclusivo, praticar preços elevados e obter alta rentabilidade. Os anos oitenta foram, do ponto de vista industrial, marcados pela lean production, pela robotização e pela flexibilidade, que permitia a produção de pequenas séries, através do uso de CAD/CAM, just in time, e de outras tecnologias da gestão industrial. Nos anos noventa, a concorrência foi implacável, ao ponto de só os melhores sobreviverem, e de todas as áreas de actividade mais apetecíveis sofrerem violentos ataques. Nessa década, o progresso técnico encontrava-se, em permanente aceleração, disponível e acessível a todos, com vantagens para quem o usasse em primeiro lugar. Verifica-se, ainda, que nesta década o custo dos erros foi elevado. Dispondo de alternativas, o cliente tornou-se exigente, a ponto de não aceitá-los e, em contrapartida, os melhores pretenderam produzir com zero erros. É por isso que faz sentido dizer que, a qualidade total nos anos noventa, foi essencial para a sobrevivência das organizações e para a sua continuação no jogo. Entrou-se numa fase, em que o cliente passou parra primeiro lugar e manda na organização, prevalecendo os seus gostos nas características dos produtos que a organização lhes oferece. Esta nova filosofia pressupõe que todos são, simultaneamente, clientes e fornecedores, internos e externos, que todos são clientes de todos. Evolução do conceito de qualidade De acordo com alguns autores, nomeadamente, Crosby, Deming, Feigenbaum, Ishikawa e Juran, a qualidade é CROSBY Definição de Qualidade
Filosofia
DEMING
Conformidade Três pilares com os da qualidade: requisitos. produto, utilidade, uso. Sem defeitos. Constância nos objectivos e análises.
FEIGENBAUM
ISHIKAWA
JURAN
Aquilo que o cliente define.
Satisfatório Adequação ao para o cliente. uso.
Completa satisfação do cliente a baixo custo.
Controle da Abordagem qualidade em de projecto. toda a organização.
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CROSBY
DEMING
FEIGENBAUM
ISHIKAWA
Abordagem Motivar as pessoas.
Técnicas estatísticas.
Abordagem de sistemas ao controlo da qualidade.
falar através dos dados.
Mecânica
14 obrigações Os nove “M”. da gestão.
Sete ferramentas estatísticas.
14 degraus.
JURAN Filosofia da qualidade planeamento, controle, melhoria. Jornadas de diagnóstico e melhoria.
Assim, de acordo com o velho conceito, qualidade significa: a) apenas qualidade nos produtos; b) conformidade aos requisitos (a opinião do cliente não conta); c) ênfase na detecção dos problemas de qualidade e não na prevenção; d) algo que só ao director de produção diz respeito; e) é uma função organizacional; f ) ferramenta estatística; g) departamento de qualidade, (quando existe, é o campeão da qualidade); h) medida dos atributos dos produtos. O novo conceito de qualidade baseia-se, como se viu, em valores que realçam: a) a satisfação do cliente. O cliente, interno ou externo, encontra-se no centro de todas as actividades de uma cultura de qualidade 128. b) a melhoria contínua. Existe uma postura que leva os grupos e os indivíduos a desejarem e aceitarem, como normal, a melhoria contínua em todos os aspectos organizacionais. Esta postura faz com que cada um participe na identificação e na implementação de soluções, que favorecem a introdução de melhorias graduais na realização das suas actividades. c) a capacitação “empowerment” e o trabalho em equipa. O desenvolvimento de processos de melhoria contínua pressupõe a participação e o envolvimento de todos os colaboradores, pelo que, requer a implementação de grupos de trabalho. Deste modo, é colocada grande ênfase na socialização dos colaboradores, e a gestão de recursos humanos tem um papel crítico no sucesso desta característica. d) a liderança e o planeamento estratégico. Sem o envolvimento directo da gestão de topo, não é possível uma cultura de qualidade, nem no momento do seu nascimento, nem ao longo dos momentos de gestão do seu ciclo de vida. Sem profundos programas de mudança cultural, não é possível implementar, com êxito, culturas de qualidade. e) a consolidação de novos valores, normas e crenças. Entre estes são de destacar as situações em que: as pessoas possam trabalhar em equipa; as 128
A temática ligada à participação dos cidadãos encontra expressão actualmente na sua participação na definição da qualidade do serviço a ser-lhe prestado.
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equipas trabalhem com outras equipas; os erros sejam admitidos sem reclamações; as pessoas se envolvem na actividade da organização através do modo de tomas decisões; as ideias sejam activamente procuradas por todos; o desenvolvimento do pessoal seja uma prioridade; sejam encontradas soluções sustentáveis para os problemas; não existam fronteiras departamentais entre funções. De acordo com estes princípios, cada trabalhador é o responsável pela qualidade no seu posto de trabalho, e qualidade é a palavra-chave para a satisfação de todos, fornecedores e clientes.
4. A S NORMAS ISO 9000
E A
C ERTIFICAÇÃO
A certificação da organização, como corolário da reorganização da sua estrutura, avança desde finais da década de 80, primeiro timidamente e, depois com imposições voluntárias a sectores inteiros. No caso dos sub-empreiteiros das áreas da construção/manutenção de linhas de condução de electricidade, gás, água, esgotos e actividades relacionadas, não estar certificado significa, a curto prazo, estar fora do mercado. As normas da série NP EN ISO 9000 vieram normalizar o percurso para a reorganização, e são, neste momento, uma ferramenta extremamente útil, a indicar os caminhos da almejada certificação. Antes de iniciar qualquer tipo de actividades relacionadas com o processo que conduzirá à certificação, é vital que a alta direcção da organização compreenda bem as diferentes etapas a percorrer, e defina os objectivos a atingir, bem como os meios disponíveis para os alcançar. Na negociação dos objectivos é fundamental que se esclareça que um Sistema da Qualidade, estabelecido segundo as normas indicadas é uma forma da organização garantir a qualidade dos seus produtos e estabelecer, junto dos seus clientes, a confiança na reprodutibilidade da qualidade negociada ou da qualidade de um modelo certificado. Deverá, também, constituir um meio de diminuição dos custos de exploração, e estabelecer uma aproximação aos seus clientes. Na fase de início de processo, é fundamental o levantamento exaustivo da situação da organização, não só quanto à organização da qualidade, mas também quanto às funções de cada sector, às relações entre eles e aos recursos humanos e materiais. O planeamento deve ser antecedido de uma alargada discussão, com a alta direcção, com vista a mostrar ao restante pessoal o seu envolvimento no processo,
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e a sua colaboração nas decisões ao nível estratégico e na definição das áreas funcionais. Após esta discussão/sensibilização, alargada a toda a organização durante o desenrolar do processo, desenha-se, então, o planeamento das acções que vão constituir o concretizar do processo. Este contemplará, necessariamente, a data/ objectivo de término de concepção e montagem do Sistema da Qualidade específico para a organização. O tempo é um dos principais problemas, senão o principal, durante a execução do trabalho. A escassez de tempo não se refere, somente, ao período em que decorre o processo mas, também, à necessidade permanente de envolvimento de todos e de cada um dos elementos que constituem a equipa de desenvolvimento. Apesar da importância do tempo, outros recursos são, ainda, necessários, alguns mesmo essenciais, como o orçamento próprio para o projecto. O Sistema da Qualidade a desenvolver nas organizações costuma seguir uma das três alternativas dos sistemas ISO, a saber: • NP EN ISO 9001 – modelo de garantia da qualidade na concepção/desenvolvimento, produção, instalação e assistência após venda; • NP EN ISO 9002 – modelo de garantia da qualidade na produção, instalação e assistência após venda; • NP EN ISO 9003 – modelo de garantia da qualidade na inspecção e ensaios finais. A selecção do modelo deve ter em atenção: a complexidade dos processos, as características do produto/serviço, e os factores associados à segurança e economia. Após a escolha do modelo, é importante dar início ao processo de formação/ sensibilização de modo a permitir a uniformidade no entendimento de conceitos chave na área da Qualidade. Assim, é importante informar sobre: • • • • •
o que é a Qualidade, vista de uma forma integrada; quais as suas vantagens; qual o papel de cada agente no processo de melhoria; qual o papel da organização na sociedade; que relações se esperam estabelecer entre clientes, fornecedores e organismos certificadores.
Durante a aplicação dos critérios da norma escolhida, não se deve perder de vista que, a qualidade é um processo contínuo, auto regenerador, que se deverá implantar de uma forma dinâmica. Contudo, a resposta rápida aos critérios
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impostos pela norma, não deve inviabilizar, nem dificultar as melhorias posteriores. A nosso ver, a grande vantagem da criação de um Sistema da Qualidade prende-se, essencialmente, com questões de organização e de eficiência do seu funcionamento.
5. A SATISFAÇÃO
DOS
C LIENTES
COMO
MEDIDA
Um dos principais objectivos de uma organização pública ou privada de prestação de serviços deverá ser a garantia de que os clientes/ cidadãos/utentes hão-de voltar, ou seja, a sua fidelização ou lealdade. E para tanto a organização terá de garantir uma qualidade de serviço compatível com a expectativa dos seus utilizadores 129. O foco do conceito de qualidade de serviço radica na relação entre padrão esperado de serviço e padrão de serviço recebido. São os clientes que fazem viver as organizações, públicas ou privadas e são eles quem permite que os serviços evoluam. Juízes da qualidade, são os clientes que dizem o que é a qualidade. Um serviço diz-se de qualidade quando a percepção do cliente/cidadão/utilizador é a de que o serviço recebido está em harmonia com aquilo que era esperado. O padrão de qualidade passa a ser objecto de litígio quando o consumidor esperava algo que não obteve, ou seja, ficou frustrado nas suas expectativas ou percepções. As organizações públicas ou privadas têm de gerir as expectativas dos seus consumidores. Trata-se de um delicado jogo de equilíbrios este processo de gestão que passa pela forma como a organização constrói a sua imagem de qualidade. Toda a vez que um cidadão volta a usar um determinado serviço público é uma oportunidade de pôr à prova tal imagem 130. A qualidade de um serviço depende da correspondência entre expectativas e realidades, ou seja, entre o que o cidadão deseja e o que a organização pública lhe oferece. A ausência de qualidade, pelo contrário, é o resultado da falta de tal correspondência entre expectativas do cidadão e o desempenho da organização. Quando não existe tal correspondência importa encetar processos de mudança ou de reforma da Administração.
129
A.. Parasuraman, et al. – A conceptual Model of Service quality and its implications for future research. Journal of Marketing, Vol. 49, Fall, 1985, pp. 41-50. 130 C. Gronroos – Service management: a management focus for service competition. In C.H. Lovelock (ed.) – Managing services Marketing: marketing operations, and human resources (pp. 9-16). Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hal, 1992.
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Importa, entretanto, salientar que, no sector privado, entre 65% a 85% dos clientes, que mudam para a concorrência, afirmam que estavam satisfeitos. Isto significa que uma organização não se pode deixar adormecer à sombra tépida da satisfação dos clientes. Tem de ultrapassar essa zona própria da indiferença, atingir o seu afecto, e converter os clientes em fiéis apóstolos. Já lá vão os tempos, em que as grandes organizações de serviços, actuando em regime de monopólio, total ou parcial, assumiam posturas majestáticas face ao mercado, obrigando os clientes a comprar de acordo com padrões de qualidade e preço que não haviam escolhido. Nas sociedades abertas e democráticas de tipo ocidental já não se aceita, quer no sector privado ou públicos, que alguém decida pelos clientes. O primado do valor já não reside no processo – no fazer as coisas bem e da maneira certa (eficiência) –, mas nos clientes e daí a importância em fazer as coisas certas (eficácia). Durante décadas, na Europa continental, as grandes organizações do sector público, influenciadas pelo tipo de administração pública onde se inseriam, valorizaram, em absoluto, a eficiência, isto é, o realizar os procedimentos administrativos, da maneira certa. A cultura de gestão administrativa, então em vigor, pouca ou nenhuma importância atribuía aos clientes. Com as mudanças surgidas nos anos oitenta, as novas preocupações estratégicas de administração e gestão vieram a pôr em causa os valores da cultura administrativa anterior, e valorizar em contrapartida o primado do cliente. Actualmente, antes de se proceder à produção de um bem ou serviço, procura-se saber com que qualidade e a que preço um segmento de clientes está disposto a aderir à nossa oferta. Só depois, olhando para os factores produtivos e esmagando as margens de lucro se conclui se é viável tal produção ou entrega de serviços. Não se parte da organização para o mercado, mas do mercado para a organização, e desta novamente para o mercado. Significa isto, que o cliente está no centro de tudo. Há cinco fontes de falta de correspondência ou diferenciais (gap) entre as expectativas do cliente e o serviço proporcionado, que são geradoras de ausência de qualidade 131. Tais diferenciais ou descontinuidades são: a) Entre as expectativas do consumidor e as percepções da gestão. As percepções dos gestores raramente estão de acordo com as expectativas dos clientes. O problema da falta de qualidade tem origem neste hiato. b) Entre a percepção dos gestores e as especificações de qualidade. Aqui radicam os desfasamentos entre os objectivos da gestão e os seus resultados. O que a organização se propõe realizar em matéria de padrões de qualidade não chega a ser implementado e há um desfasamento entre o discurso e a prática. 131
A.. Parasuraman, et al. – ob. cit.
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c) Entre as especificações de qualidade e o serviço prestado. Razões ligadas à fraca qualificação dos recursos humanos, perfis profissionais e de formação desadequados e recurso a tecnologia pouco fiável poderão impedir que uma determinada boa política de gestão de qualidade definida pela gestão não tenha condições, nem meios no terreno para poder ser levada à prática. d) Entre a prestação do serviço e as comunicações externas. A organização não deve criar expectativas acima do que pode oferecer. Tem de gerir as expectativas. A comunicação externa institucional e o marketing de serviços em especial a publicidade devem ser usados também para gerir as especulativas dos clientes. e) Entre o serviço prestado e o esperado. A percepção de que o serviço não corresponde àquilo que era esperado tem como consequência a falta de qualidade. Uma organização para evitar estas descontinuidades (gap) tem de adoptar uma postura sistémica e gerir as variáveis determinantes da qualidade tais como: acesso, comunicação, competência, cortesia, credibilidade, fidelidade, capacidade de resposta, segurança. Todos elementos muito tangíveis que exigem uma compreensão/conhecimento dos seus clientes. Actividade 1 Entreviste um cliente /utente de um serviço público e, numa escala de 1 a 5, procure avaliar o seu grau de satisfação pelo serviço prestado. Use os seguintes indicadores: tempo de espera; cortesia/simpatia; disponibilidade para tratar dos seus assuntos; competência/ conhecimentos; clareza/utilidade das informações prestadas e classificação global.
6. A QUALIDADE
NOS
SERVIÇOS PÚBLICOS
A filosofia da qualidade não se confina às organizações, passou a ser considerada fomentadora do desenvolvimento económico e social, em geral. Todavia, na administração pública era visto como um conceito distante, aplicável à indústria e a outros sectores lucrativos. A administração pública parecia estar condenada a viver num modelo burocrático, pouco racional, em que não se colocavam os problemas da qualidade 132. 132
João Bilhim – A Construção da Função Qualidade nos Tribunais Portugueses: uma abordagem à luz da teoria institucional. Scientia Jurídica, Julho/Setembro, Tomo LVII, n.º 315, 2008, pp. 509-517.
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A adaptação do sistema produtivo de bens e serviços aos objectivos económicos e sociais da política dos Governos, necessita da Qualidade como instrumento. Acresce, ainda, que a consciência crítica dos cidadãos, o seu maior grau de educação e cidadania, vieram colocar novos desafios aos serviços públicos. Actualmente, os cidadãos teriam grande relutância em aceitar uma administração autoritária, arrogante e divorciada da sociedade, e exigem uma administração prestadora de serviços de qualidade, que não seja empecilho, mas antes, motor do desenvolvimento social cultural e económico do País. Na maioria dos países, a administração pública constitui o sector económico de maior peso no emprego, e com maior oferta de bens e serviços. Por isso, não pode ficar indiferente a todo este movimento da qualidade nos serviços públicos. Acresce que não foi fácil deslocar o conceito de qualidade nascido no seio das fábricas para o centro das organizações de serviços. O sector dos serviços tem adquirido uma importância crescente no quadro das economias desenvolvidas. Aliás, em termos de emprego, é o sector terciário o que emprega a maior taxa da população activa e a tendência é no sentido do seu crescimento. A lógica de serviço rompe radicalmente com a lógica de produto o que expressa a necessidade de se implementar um clima de serviço e de evitar introduzir na Administração Pública uma cultura de qualidade com os traços culturais dos ambientes fabris. A Administração Pública, como sector por excelência de serviços deve seguir as melhores práticas da gestão da qualidade originária do sector privado dos serviços, mas contextualizando as suas técnicas aos requisitos específicos do sector público. Os serviços distinguem-se dos produtos porque implicam as seguintes características: intangibilidade; participação do consumidor na produção; simultaneidade. A intangibilidade prende-se com o facto do resultado final ser uma experiência e não algo material. Eu posso emprestar um lápis, mas não posso emprestar a minha experiência de ter assistido a um espectáculo. Quanto à participação do consumidor verifica-se que quando o cidadão requer um documento na loja do cidadão ele de alguma forma participa na produção final do serviço. Por fim, com a simultaneidade quer dizer-se que por norma um serviço é produzido e consumido em simultâneo, tal como acontece com um concerto musical. Nos anos noventa do século passado, a qualidade passou a ser uma necessidade de todos. Assim, a Administração Pública viu-se na necessidade de transformar, os métodos de funcionamento de forma a aumentar a qualidade do serviço prestado aos cidadãos que progressivamente se apresentam com expectativas mais exigentes e sofisticadas. A tradicional burocracia, ineficácia e lentidão dos serviços públicos, tende a desaparecer, para dar lugar à modernização administrativa. Com uma noção inovadora: a de que o utente/cliente dos serviços públicos, e as suas necessidades, devem constituir a preocupação fundamental da administração pública. 270
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Do ponto de vista da ciência política é o cidadão/pessoa que deve estar no centro de toda a oferta política. No sector empresarial quem eventualmente tenha abandonado o cliente para áreas mais periféricas das suas preocupações é natural que esteja a atravessar grandes dificuldades de mercado. No sector público passa-se o mesmo. A queda da importância das ideologias redobrou de importância o cidadão tal como é, como parte integrante de grupo de consumidores ou segmentos de mercado para certos produtos políticos ou de políticas públicas. Já Albert Gore 133, faz referência à qualidade ao mencionar os princípios da National Performance Review, faz-lhe uma referência clara, ao afirmar a necessidade de estimular a qualidade, criando um claro sentido de missão (pilotando melhor e remar menos); delegando poderes e responsabilidades; substituindo regulamentos por incentivos e avaliando o sucesso pela satisfação dos clientes. Pelo Decreto-lei n.º 166-A/99, de 13 de Maio, o Governo Português aprovou o Sistema de Qualidade em Serviços Públicos (SQSP). Neste diploma, o Governo reconhece que a “a qualidade é, hoje, universalmente reconhecida e aceite como a satisfação do cliente a custos adequados, e tornou-se um imperativo para todas as organizações públicas e privadas, face à crescente consciencialização que os consumidores e utentes de bens ou serviços possuem dos direitos que lhes estão atribuídos”. E acrescenta mais adiante “A Administração Pública não pode ficar imune a esta forma de gestão, uma vez que está sujeita ás mesmas pressões e aos mesmos constrangimentos que as organizações, o que a obriga a reconverter métodos de gestão e funcionamento, sistemas de organização e principalmente de legitimação, tendo em vista a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos cidadãos e á acção governativa”. Por isso, hoje se impõe a personalização do serviço que acarreta um conjunto de benefícios, designadamente: maior rapidez na resposta; resolução atempada dos utentes insatisfeitos; maior envolvimento e implicação dos trabalhadores na qualidade do serviço; melhor atendimento, surgimento de mais ideias inovadoras; maior fidelização dos utentes. Importa, no entanto, salientar que este aumento da qualidade pode exigir investimentos maiores em selecção e formação dos funcionários. No que toca à metodologias de gestão e avaliação da qualidade de serviço, há diversas ferramentas. Por exemplo, os serviços públicos no Brasil seguem um método muito comum nos EUA o Baldrige e são certificados pela normas da família ISO 9000. O Baldrige Award é um modelo dos critérios de performance usado para avaliar os sistemas de gestão e identificar as áreas principais de melhoria. O Baldrige Award foi estabelecido pelo Congresso dos E.U. em 1987. Lançado em 1987, integrando uma campanha nacional de melhoria da qualidade, o Malcom Baldrige Award é o maior reconhecimento que as organizações 133
Albert GORE – Reinventar a Administração Pública, Lisboa: Quetzal Editores, 1995, p. 45.
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americanas podem receber. Malcom Baldrige foi secretário do Comércio, de 1981 até à sua trágica morte em 1987. Gerido pelo National Institute of Standards and Technology, do Departamento do Comércio o prémio de qualidade avalia sete critérios: gestão do processo de qualidade; desenvolvimento dos recursos humanos; planeamento da qualidade; informação e análise; enfoque no cliente e sua satisfação; qualidade e resultados operacionais. Na avaliação, um item sobressai por valer mais pontos do que qualquer outro, o enfoque no cliente e na sua satisfação (300 pontos). A primeira triagem é feita por uma equipa de examinadores que visita a organização para verificar a informação e clarificar alguma questão. Todas as candidaturas são analisadas por, pelo menos, oito examinadores e recebem um relatório com a descrição dos pontos fortes e das áreas susceptíveis de melhoria dentro do programa de gestão de qualidade. Em Portugal, no sector da saúde, a Direção Geral de Saúde, herdeira das atribuições e competências do anterior Instituto da Qualidade em Saúde (IQS), está a usar o método do King’s Fund Health Quality Service (KFHQS) 134. Através do Programa Nacional de Acreditação dos Hospitais (PNAH) o DQS tem, desde os finais dos anos noventa do século passado, desempenhado um papel estratégico na implementação da gestão da qualidade nos hospitais portugueses. Na última década a avaliação da satisfação com os cuidados de saúde ganhou grande importância como medida da qualidade na prestação de cuidados de saúde públicos, de tal forma que de uma forma gradual as actividades de garantia e melhoria da qualidade tem vindo a ser encarada como fazendo parte dos processos de cuidados médicos e mesmo dos programas políticos. No entanto em Portugal e na Europa em geral o método mais usado é o da European Foundation for Quality Management (EFQM) 135 seguido pelo método Common Assessment Framework (CAF) desenvolvido após a cimeira de Lisboa de 2000. Em resumo as ferramentas de gestão da qualidade mais usadas são: Modelo de Excelência da EFQM (versão sector público e voluntário); Normas da Família ISO 9001; Balanced Scorecard; CAF. Como mede, então, o cliente a qualidade que lhe é prestada? A medição é o resultado de uma relação de expectativas e percepções 136. Assim, o cliente avalia negativamente a qualidade, quando a sua expectativa é superior à qualidade que ele percepciona. Avalia, positivamente, quando as suas expectativas são inferiores ao que percepciona ao que está a receber. Quando o que espera é o que recebe o cliente mantém-se indiferente. 134
Consultar http://www.iqs.pt/pdf/pag16-19.pdf; http://www.kingsfund.org.uk/. Consultar: http://www.efqm.org/Default.aspx?tabid=35. 136 A.. Parasuraman, et al. – A conceptual Model of Service quality and its implications for future research. Journal of Marketing, Vol. 49, Fall, 1985, pp. 41-50. 135
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Que espera, então, o cidadão/cliente dos serviços públicos? As principais preocupações a ter com o cidadão/cliente, na prestação de um serviço de qualidade total são, em síntese, as seguintes: Confiança: consistência nas realizações da instituição ao longo do tempo; Segurança: confiança na integridade e confidencialidade; Acessibilidade: estar próximo e facilitar o acesso ao serviço; Rapidez: cumprimento de prazos e prontidão na resposta; Tangibilidade: boa apresentação do pessoal e dos espaços físicos da instituição; Competência: capacidade de executar bem as tarefas; Fiabilidade: fazer sempre bem; Conhecimento: tratar o cidadão/cliente como uma pessoa e não como um número, individualizando e personalizando; Comunicação: saber ouvir e transmitir; Cortesia: respeito pelo cliente; Excelência: ter prazer em dar ao cliente mais do que ele espera. Um serviço de qualidade é aquele que se revela capaz de satisfazer as expectativas dos cidadãos, entendendo-se por satisfação a confirmação por parte do cidadão/ utente das suas expectativas acerca do serviço que a Administração lhe presta 137.
7. O MODELO
DE
AUTO - AVALIAÇÃO
DA
EFQM
O modelo da European Foundation for Quality Management (EFQM), é um modelo, não normativo, destinado a medir e a promover a excelência nas organizações de serviços, em especial nas entidades públicas e sem fins lucrativos. Este modelo, conhecido por auto-avaliação é um instrumento regular de avaliação das actividades e dos resultados de uma organização, que tem como referência um modelo de excelência no contexto do PEX-SPQ, e tem sido aplicado em Portugal, graças à intervenção do Instituto Português da Qualidade (que está sujeito à tutela do Ministério da Economia). No sector público administrativo (SPA), tem sido o Secretariado para a Modernização Administrativa, quem tem protagonizado a aplicação deste modelo na administração pública e, particularmente, a atribuição anual do prémio da qualidade em serviços públicos. O modelo de auto-avaliação permite às organizações determinarem, com clareza, os seus pontos fortes e as áreas onde podem ser alcançadas melhorias. 137
João Bilhim – A Construção da Função Qualidade nos Tribunais Portugueses: uma abordagem à luz da teoria institucional. Scientia Jurídica, Julho/Setembro, Tomo LVII, n.º 315, 2008, pp. 509-517.
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Permite, ainda, o planeamento de acções de melhoria, cuja implementação será posteriormente controlada, de forma a avaliar os progressos obtidos. Esta metodologia tem representado, para as organizações que a adoptaram, muitas vantagens, nomeadamente por constituir uma abordagem estruturada e rigorosa, e uma forma de dinamizar a organização. Constitui, também, uma motivação adicional para os colaboradores, e de fazer benchmarking interno e com as restantes organizações congéneres, externas. Para ser eficaz, o processo de auto-avaliação terá de respeitar certas exigências, nomeadamente a criação de motivação e empenho nos funcionários. Para que isso aconteça, os gestores de topo têm de ser sensibilizados para a importância e necessidade deste processo e liderá-lo e apoiá-lo, claramente. Em segundo lugar, há que planear a auto-avaliação e, por isso, devem ser identificados os sectores da organização, da direcção geral, ou do instituto público, mais adequados para se começar a aplicação desta metodologia. Em terceiro lugar, há que definir as equipas de intervenção para executar a auto-avaliação, escolher e formar os colaboradores a envolver e identificar, no estudo a levar a cabo, os pontos e as áreas de melhoria. Em quarto lugar, há que comunicar o plano de auto-avaliação, definir o conteúdo da mensagem, os meios de comunicação e os alvos a atingir. Nesta fase deve-se realçar a ideia de que o objectivo do processo é a satisfação dos clientes e o enriquecimento do serviço. A etapa seguinte consiste em realizar a auto-avaliação, elaborar o plano de acção e, se necessário, consolidar os resultados dos diferentes sectores. Deve-se, ainda, avaliar as áreas a abordar, estabelecer prioridades e objectivos e comunicar o plano de acção e a orientação estratégica. Por último, há que implementar o plano de acção, constituir equipas de melhoria e disponibilizar os recursos adequados. Este modelo baseia-se nos oito conceitos fundamentais, que se seguem: 1.º Focalização no cliente: o cliente é o juiz final da qualidade dos produtos e dos serviços. As necessidades e requisitos dos clientes, e as formas de lhes responder, estão perfeitamente compreendidos. A satisfação dos clientes é medida e analisada, assim como os factos que influenciam a fidelização. 2.º Alianças com fornecedores: as alianças com os fornecedores são estabelecidas com base na confiança, e numa integração apropriada, para incentivar a melhoria e criar valor, tanto para o cliente como para o fornecedor. 3.º Desenvolvimento e envolvimento das pessoas: o pleno potencial das pessoas liberta-se através de valores comuns, e de uma cultura de confiança e de autonomia de acção. Existe uma participação e comunicação alargadas, que se baseiam na formação e no desenvolvimento das capacidades. 4.º Processos e factos: as actividades são geridas sistematicamente em termos de processo. Os processos têm responsáveis, são bem compreendidos, e 274
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5.º
6.º
7.º 8.º
existem actividades de melhoria no trabalho diário de cada um. Os factos, os indicadores e a informação, constituem a base da gestão. Melhoria contínua e inovação: existe uma cultura de melhoria contínua e a aprendizagem contínua é a base do aperfeiçoamento. Atitudes como pensar e inovar, com originalidade, são encorajadas. O benchmarking é usado para apoiar a inovação e o aperfeiçoamento. Liderança e consistência de objectivos: os líderes desenvolvem a cultura das organizações, conduzem os recursos e os esforços na direcção da excelência. A política e a estratégia são implementadas de uma forma estruturada e sistemática e todas as actividades da organização são coordenadas. O comportamento das pessoas estará, pois, em harmonia com os valores organizacionais, a política e a estratégia. Responsabilidade pública: a organização e as pessoas que nela trabalham adoptam uma abordagem ética, e esforçam-se por exceder as exigências legais e regulamentares aplicáveis. Orientação para os resultados: o sucesso depende do equilíbrio e da satisfação dos objectivos de todos os interessados na organização: clientes, fornecedores, colaboradores, partidos políticos, autarquias, movimentos sociais, elites e associações de diversos tipos, relacionadas com essa actividade.
O modelo que a seguir se apresenta está dividido em nove blocos, em que quatro englobam os meios, e cinco têm a ver com os resultados. Os meios compreendem as seguintes variáveis: liderança, gestão das pessoas, política e estratégia, e recursos. Os resultados integram as variáveis: processos, satisfação dos colaboradores, satisfação dos clientes, impacto na sociedade e resultados. Satisf. Colabor. Ad. 90
Gestão das Pessoas 90 Liderança 100
Política e Estratégia 80
Processos 140
Satisfação Clientes 200
Recursos 90
Impacte Sociedade 600
Meios 500
Resultados 500
Resultados do Negócio 150
Como se pode observar, cada um dos critérios (ou variáveis), possui uma determinada pontuação, num total de 1000 pontos, sendo 500 para os meios e 500 s para os resultados. 275
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Salientamos que, a aplicação deste modelo exige a consulta ao manual, que se encontra disponível no Instituto Português da Qualidade, ou no Secretariado para a Modernização Administrativa. Critério 1: Liderança – como é que os comportamentos e as acções da equipa de gestão e dos restantes lideres inspiram, suportam e promovem, a cultura da gestão pela qualidade total. Critério 2: Política e Estratégia – como a organização formula, implementa e avalia, a política e a estratégia, e as traduz em planos e acções. Critério 3: Gestão de pessoas – como a organização aproveita todo o potencial dos seus colaboradores. Critério 4: Recursos – como a organização gere, eficaz e eficientemente, os recursos. Critério 5: Processos – como a organização identifica, gere, avalia e aperfeiçoa os seus processos. Critério 6: satisfação dos clientes – que resultados tem a organização alcançado, relativamente à satisfação dos seus clientes externos. Critério 7: Satisfação dos colaboradores – que resultados tem a organização alcançado, relativamente à satisfação dos seus colaboradores. Critério 8: Impacto na sociedade – que resultados têm a organização alcançado, relativamente à satisfação das necessidades e expectativas das comunidades local, nacional e internacional. Inclui a percepção da forma como a organização trata as questões da qualidade de vida, do ambiente, da preservação dos recursos naturais e, ainda, a forma como avalia, internamente, a eficácia dos seus programas. Inclui, ainda, a forma de relacionamento da organização com as autoridades, e organizações que regulam e condicionam a sua actividade. Critério 9: Resultados da actividade – que resultados tem a organização alcançado relativamente aos objectivos da actividade, e à satisfação das necessidades de todas as entidades interessadas (políticas, económicas, sociais e culturais). De acordo com o Sistema de Gestão da Qualidade Fundamentos e Vocábulos (Norma NP ISO 9000:2005) foram identificados oito princípios de gestão da qualidade: Focalização no cliente: as organizações dependem dos seus clientes, deverão compreender as suas necessidades, actuais e futuras, satisfazer os seus requisitos e esforçar-se por exceder as suas expectativas. Liderança: os líderes estabelecem unidade no propósito e orientação na organização. Deverão criar e manter o ambiente interno que permita o pleno envolvimento das pessoas para se atingirem os objectivos da organização. Envolvimento das pessoas: as pessoas, em todos os níveis, são a essência de uma organização e o seu pleno envolvimento permite que as suas aptidões sejam utilizadas em benefício da organização. Abordagem por processos: um resultado desejado é atingido de forma mais eficiente quando as actividades e os recursos associados são geridos como um processo. 276
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Abordagem da gestão como um sistema: identificar, compreender e gerir processos inter-relacionados como um sistema, contribui para que a organização atinja os seus objectivos com eficácia e eficiência. Melhoria contínua: melhoria contínua do desempenho global de uma organização deverá ser um objectivo permanente dessa organização. Abordagem á tomada de decisões baseada em factos: as decisões eficazes são baseadas na análise de dados e de informações. Relações mutuamente benéficas com fornecedores: uma organização e os seus fornecedores são interdependentes e uma relação de benefício mútuo potencia a aptidão de ambas as partes para criar valor. Estes oito princípios de gestão da qualidade constituem a base das normas de sistemas de gestão da qualidade da família ISO 9000. Em resumo: o serviço é o foco dos objectivos de qualquer organização pública. A qualidade do serviço é impossível se não houver qualidade no processo e esta é impraticável sem uma organização adequada, e sem uma liderança eficiente. Por outro lado, o forte empenhamento, da base ao topo, é o pilar de apoio da organização. O sucesso de cada organização baseia-se numa série de pilares interligados e interdependentes. Se há uma falha no papel e função de cada pilar, é toda a organização que fracassa.
8. O MODELO
DE
AUTO - AVALIAÇÃO
DA
CAF
A Common Assessment Framework (CAF) Estrutura Comum de Avaliação da Qualidade das Administrações Públicas. 138 A CAF é um modelo de auto-avaliação através do qual uma organização procede a um diagnóstico das suas actividades e resultados com base em evidências. Foi construída com base no Modelo de Excelência da EFQM (Fundação Europeia para a Gestão da Qualidade) e no modelo da Universidade Alemã de Ciências Administrativas (Speyer). Trata-se de um modelo adequado às especificidades dos organismos públicos. A sua utilização constitui o ponto de partida para Melhoria Contínua da organização. A adaptação da EFQM protagonizada pela U.E., através da CAF, visou sobretudo alcançar por um lado, uma maior pertinência e adequação às características específicas dos organismos públicos e por outro a construção de uma abordagem que fosse compatível com os principais modelos organizacionais utilizados pelas
138
Ver o sítio electrónico da Direcção-geral da Administração e do Emprego público onde se encontra o modelo da CAF – http://www.caf.dgaep.gov.pt/.
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organizações públicas e privadas na Europa, procurando-se uniformizar um instrumento que seja comum a todas. Um dos principais objectivos da CAF. é o de servir como um instrumento de partida, com vista à realização de uma auto-avaliação simples na organização à luz de critérios de qualidade pré-definidos. Além disso, visa-se com a CAF obter de forma relativamente fácil comparações dos resultados dos diversos organismos da Administração Pública dos diversos países que integram a EU. Ora, já existem resultados de cerca de 200 organismos oriundos de países da EU. A CAF é uma ferramenta mais ligeira do que um modelo de gestão da qualidade totalmente desenvolvido. Esta característica permite manter um grau de comparabilidade com os principais modelos existentes. As diferenças existentes, entre o modelo E.F.Q.M. e a abordagem/adaptação deste mesmo modelo feita U.E. não são muito significativas. A CAF procurou medir os 9 critérios do E.F.Q.M. através de 42 sub-critérios de análise numa linguagem a todos acessível, sem termos muito técnicos ou sem grandes formulações estatísticas, tendo por exemplo retirado da abordagem, as ponderações e todos os termos que pudessem ser difíceis de compreender pela generalidade dos intervenientes. A CAF procurou a máxima justificação das notas dadas em cada um dos 42 sub-critérios de análise que permitem avaliar o estado actual da gestão do organismo e posiciona-lo face ao que deveria ser uma gestão de excelência. A avaliação, segundo a abordagem CAF, é simples e não tem ponderações diferentes em cada critério. É orientada pelos critérios de meios e de resultados que, por sua vez, se dividem em sub-critérios aos quais deverá ser aplicada uma pontuação de 0 a 5 (CAF 2002) ou uma pontuação 0 a 100 (CAF 2006). O total da pontuação por critério consiste no somatório da pontuação atribuída a cada sub-critério dividindo-a pelo número de sub-critérios. A pontuação global da organização consiste no somatório das médias obtidas em cada critério. Neste sentido supondo uma optimização de resultados, haveria um máximo de 5 pontos (CAF 2002) em cada critério, logo, 45 pontos (dado que são 9 critérios). A pontuação final procurou adoptar uma escala de 1 a 45 para que seja mais perceptível do que a pontuação original do E.F.Q.M. que vai de 1 a 1000. Actualmente, com a CAF 2006 esta questão já não se coloca, pois a pontuação final é sempre apresentada sob a forma de média, ou seja a pontuação dos subcritérios é dada de 0-100, a pontuação do critério será, por exemplo, o da liderança – 4 subcritérios – Total /400 (1.1+1.2+1.3+1.4) Pontuação do Critério = Média dos SC (1.1+1.2+1.3+1.4 / 4)). A evolução da CAF: 2000; 2002; 2006. Principais alterações introduzidas com a CAF 2006: Integração da inovação e modernização (objectivo da Estratégia de Lisboa) nos diversos critérios do modelo; 2 formas de pontuar, mudança da escala (0 a 100), focalização no ciclo PDCA; Linhas de orientação para apli278
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cação da CAF mais detalhadas; Orientações para desenvolver bench learning com a CAF.
A CAF serve para conhecer os pontos fortes e oportunidades de melhoria (pontos críticos) das organizações públicas; revelar as percepções das pessoas em relação à sua própria organização; aumentar a mobilização interna para a mudança e acrescentar mais-valias no sentido da auto-responsabilização dos gestores; construir projectos de mudança sustentados, com base no conhecimento do estado de saúde da organização. Actividade 2 Entreviste um dirigente administrativo e questione sobre o programa de qualidade. Veja se há diferenças entre as suas informações e o que acabou de ler neste manual.
TESTE FORMATIVO 1. Quais são os cinco princípios da desburocratização? 2. Quando é que o cliente se torna a medida da qualidade? 3. “A qualidade vista como algo que só ao director de produção diz respeito” pertence ao antigo ou ao novo conceito de qualidade? 4. Para que servem as Normas da série NP EN ISO 9000? 5. Qual o papel do cliente na definição do que é a qualidade? 6. O que se entende por satisfação do cliente? 7. Qual a definição de qualidade constante no diploma que aprovou o SQSP? 8. Quais são os critérios constantes no modelo da EFQM? 279
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RESPOSTAS
AO
TESTE FORMATIVO
1. Princípio da desburocratização; princípio da aproximação dos serviços às populações; princípio da participação dos interessados na gestão da Administração Pública; princípio da descentralização e princípio da desconcentração. 2. A partir dos anos noventa do passado século. 3. Ao antigo conceito de qualidade. 4. Para normalizar o percurso da reorganização e servissem de ferramenta à certificação. 5. O cliente exerce o papel de juiz. 6. Satisfação do cliente é a confirmação das suas expectativas acerca do serviço que lhe foi fornecido. Neste sentido um serviço de qualidade é aquele que se revela capaz de satisfazer as expectativas do cliente/cidadão /utente. 7. De acordo com o referido diploma: “a qualidade é hoje universalmente reconhecida e aceite como a satisfação do cliente a custos adequados e tornou-se um imperativo para todas as organizações públicas e privadas, face à crescente consciencialização que os consumidores e utentes de bens ou serviços possuem dos direitos que lhes estão atribuídos”. 8. Os critérios apontados são: liderança, gestão de pessoas, política e estratégia, recursos, processos, satisfação de colaboradores, satisfação de clientes, impacto na sociedade, e resultados.
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JOÃO ABREU DE FARIA BILHIM
João Abreu de Faria Bilhim Agregado em Sociologia das Organizações, Doutor em Ciências Sociais (Sociologia), Mestre em Ciências Antropológicas, Licenciado em Ciências Antropológicas e Etnológicas pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), da Universidade Técnica de Lisboa (UTL), Formado em Filosofia e Licenciado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa. É Professor Catedrático e preside à CRESAP. Foi Presidente do ISCSP/UTL. Presidiu à Comissão Técnica do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE). Foi Subdirector do Departamento de Gestão da Universidade Lusíada (Responsável pela Licenciatura em Gestão de Recursos Humanos) e Vice-Presidente do Instituto Superior Politécnico Internacional. Foi também Responsável de Recursos Humanos da Direcção Regional de Correios de Lisboa, Responsável de Comunicação e Investigador do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (INESC); Director de Formação e Desenvolvimento e Director de Comunicação Interna nos CTT. Exerceu as funções de Director do Gabinete de Auditoria e Modernização do Ministério da Justiça.
Ciência da Administração
DE
FARIA BILHIM
ISBN
978-989-646-087-7
Ciência da Administração
JOÃO ABREU
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