TFG // Cidade Adversidade - Os espaços livres como promotores de cidadania no Sertão Cearense

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

ADVER[CIDADE] Os espaços livres como promotores de cidadania no Sertão Cearense

por

ELTON SALES MARTINS

sob orientação do

PROF. DR. JOSÉ ALMIR FARIAS FILHO



ELTON SALES MARTINS

ADVER[CIDADE] Os espaços livres como promotores de cidadania no Sertão Cearense

21 de julho de 2016

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. José Almir Farias Filho (orientador) Universidade Federal do Ceará

Profª. Zilsa Maria Pinto Santiago Universidade Federal do Ceará

Arq. Newton Célio Becker de Moura Bezerra & Becker Arquitetura Paisagística



AGRADECIMENTOS Ao professor Almir pela disponibilidade em orientar esse trabalho, dedicando sempre sua atenção e paciência; Aos professores do núcleo de urbanismo do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (DAUUFC) por despertarem, em mim, o interesse em estudar a cidade. Especialmente aos professores Clarissa Sampaio e Renato Pequeno que me apresentaram a dimensão “social” do urbanismo, através das suas aulas e atuação junto às comunidades de Fortaleza. Ao professor José Gigante, da Universidade do Porto (UP), que tem uma maneira singular de transmitir os seus conhecimentos e uma postura profissional inspiradora, já que se trata de um mestre divertido, humano e inteligente. À equipe de profissionais da MC Arquitetos e Associados, na figura da arquiteta Márcia Cavalcante, que foram acolhedores e compreensivos com o período de elaboração do trabalho. À minha amiga Fernanda Lessa que me acompanhou nesse percurso de graduação de uma forma tão intensa, não somente dentro do meio acadêmico, se mostrando sempre uma grande companheira e confidente. Aos amigos queridos Pedro Belo, Alice Maria, Lana Soares, Janaína Castelo, Jéssica Mota e Bruno Raviolo, que também estiveram presente durante todo esse percurso, dentro e fora da faculdade. À Marina Rodrigues e ao Paulo André que me ajudaram, pacientemente, com a diagramação; à Sabine Ramos e a Mariana Quezado que se dispuseram a me ajudar com as ferramentas de geoprocessamento (GIS); ao amigo Cícero Antônio que me ajudou com as correções; ao meu cunhado Saul Martins que se disponibilizou a viajar comigo para que eu pudesse fazer fotos e colher dados em campo. Aos meus pais que desde sempre não só me apoiam nas minhas decisões, como também lutam por elas. À minha avó Zélia Maria, de quem sempre tive apoio e atenção incontestáveis durante toda minha vida. À minha irmã Lays, pelo amor, carinho e paciência ao longo de todos esses anos de convívio, e, especialmente, nesse período de produção do trabalho final de graduação.



SUMÁRIO RESUMO 9 TÍTULO 15 INTRODUÇÃO 17

01 02 03 04 05 06 07

IMPRESSÕES 20 // INTERVIR NA CIDADE

ENSAIOS 30 // A LEITURA DO ESPAÇO URBANO

CONCEITUAÇÃO 42 // O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES (SEL) COMO ESTRUTURADOR DO AMBIENTE URBANO

CONTEXTUALIZAÇÃO 56 // A CIDADE DO SERTÃO CEARENSE

O MUNICÍPIO DE PENTECOSTE

74

// DE BARRA DA CONCEIÇÃO À TERRA DO PEIXE

DIAGNÓSTICO 84 // PERÍMETRO DE ESTUDO DA SEDE DO MUNICÍPIO DE PENTECOSTE

PROGRAMA DE INTERVENÇÃO

120

// SETORIZAÇÃO, ORDENAMENTO E PROJETOS DE ESTRUTURAÇÃO DO ESPAÇO URBANO

CONSIDERAÇÕES FINAIS

165

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

166



RESUMO

A intervenção nos espaços livres de uma cidade, em geral, se propõe a uma reestruturação da paisagem urbana através de projetos que buscam sua organização e qualificação. A implementação de projetos como esses em contextos específicos agregam muitas outras variáveis e desafios. Este trabalho tem por objetivo apresentar uma proposta de intervenção nos espaços livres da sede urbana do município de Pentecoste, no interior do Ceará, que se configura como uma resposta a uma análise de um determinado perímetro de estudo delimitado na cidade. A proposta está elaborada em três escalas, desde dimensão do planejamento urbano até a dimensão do projeto circunscrito aos equipamentos urbanos, além de uma terceira intermediária. O que se configura como uma proposta estruturante daquele contexto urbano, que objetiva remodelar seu sistema de espaços livres, principalmente, no que diz respeito às suas áreas livres de lazer, à mobilidade urbana e acessibilidade universal. No intuito de promover e consolidar um modelo de cidade socialmente inclusivo e ambientalmente responsável, que fortifique a dimensão de cidadã dos seus habitantes. Palavras chave: Pentecoste; Cidade do Sertão Cearense; Sistema de Espaços Livres (SEL); Áreas livres de convívio e lazer; Mobilidade Urbana; Acessibilidade

9


// LISTA DE MAPAS Mapa 1. Compartimentação Geoambiental.

57

Mapa 2. Município de Pentecoste.

75

Mapa 3. Ocupação do Município de Pentecoste.

80

Mapa 4. Perímetro urbano e recorte espacial.

84

Mapa 5. Bairros.

86

Mapa 6. Unidades de vizinhança.

87

Mapa 7. Densidade.

89

Mapa 8. Renda Média.

89

Mapa 9. Acesso à rede geral de esgoto.

90

Mapa 10. Coleta de lixo.

90

Mapa 11. Iluminação pública.

91

Mapa 12. Passeio.

91

Mapa 13. Arborização.

91

Mapa 14. Uso e Ocupação do Solo.

92

Mapa 15. Vazios Urbanos.

94

Mapa 16. Sistema de Espaços Livres.

98

Mapa 17. Hierarquia do Sistema Viário.

107

Mapa 18. Pólos Geradores de Tráfego (PGTs).

111

Mapa 19. Esquema de Intervenção.

120

Mapa 20. Nova divisão dos bairros.

124

Mapa 21. Zoneamento urbano.

126

Mapa 22. Plano de áreas livres de lazer.

137

Mapa 23. Novo sistema viário.

140

Mapa 24. Ciclovias e sistema de bicicletas compartilhadas.

140


// LISTA DE FIGURAS Fig. 1. Pintura de 1880 que recria a Grécia Antiga.

21

Fig. 2. Roma Antiga.

21

Fig. 3. O palácio em 1617, quando Jean-François de Bagni era vicelegado, desenhado pelo padre jesuita Martellange. 21 Fig. 4. Gravura de Gustave Doré sobre a Didley Street, em 1872. 22 Fig. 5. Plan Voisin de Paris - Le Corbusier

23

Fig. 6. Vista da linha férrea cortando o lado oeste de Manhattan, na altura da Rua 17; à esquerda, a 10ª Avenida (circa 1934) 23 Fig. 7. Anhangabaú, 1969 - visão de cima do Viaduto Sta Efigênia 23 Fig. 8. Brasília, 1960.

23

Fig. 9. Via - Rua N Sra. de Fátima - Pentecoste, Ceará

33

Fig. 10. Limite - Avenida XV de Novembro - Pentecoste, Ceará

33

Fig. 11. Bairro - Vista para o bairro Planalto - Pentecoste, Ceará 33 Fig. 12. Ponto Nodal - Cruzamento entre a Rua N. Sra. de Fátima com Av. José de Borba Basconcelos - Pentecoste, Ceará 35 Fig. 13. Marco - Torre da Igreja Matriz de N. Sra. da Conceição Pentecoste, Ceará 35 Fig. 14. Praça do Ferreira, Fortaleza.

44

Fig. 15. Marco Zero, Recife

44

Fig. 16. Arco Nossa Senhora de Fátima, Sobral

44

Fig. 17. Margem esquerda do Rio Acaraú, Sobral

44

Fig. 18. Fortaleza de São Sebastião (1613).

58

Fig. 19. Varal de charque no Ceará.

59

Fig. 20. Colheita de algodão.

61

Fig. 21. Fábrica têxtil Progresso, Fortaleza-CE.

61

Fig. 22. Antiga sede do Banco do Nordeste do Brasil - atual Justiça Federal do Ceará. 65 Fig. 23. Sede do DNOCS em Fortaleza.

65

Fig. 24. Fábrica da Grendene em Sobral.

66


Fig. 25. Fábrica de calçados Paquetá de Pentecoste

66

Fig. 26. UFC - Campus de Quixadá.

67

Fig. 27. Faculdade de Medicina da UFC - Campus de Sobral

67

Fig. 28. Quixadá.

70

Fig. 29. Pentecoste.

70

Fig. 30. Santa Quitéria.

70

Fig. 31. Canindé.

71

Fig. 32. Crato.

71

Fig. 33. Apuiarés.

71

Fig. 34. Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição após a primeira reforma 76 Fig. 35. Construção do Açude Pereira de Miranda.

78

Fig. 36. Dia simbólico da inauguração do Açude Pereira de Miranda com a presença do presidente JK. 78 Fig. 37. Máquinas e homens que trabalharam na construção do açude. 78 Fig. 38. Açude Pereira de Miranda e a região do Centro de Pesquisas Ictiológicas. 79 Fig. 39. Inauguração do Mercado Público de Pentecoste em 1971. 79 Fig. 40. Feira de Pentecoste.

96

Fig. 41. Feira de Pentecoste.

96

Fig. 42. Feira de Pentecoste.

96

Fig. 43. Feira de Pentecoste.

97

Fig. 44. Feira de Pentecoste.

97

Fig. 45. Feira de Pentecoste.

97

Fig. 46. Mercado de Pentecoste.

101

Fig. 47. Mercado de Pentecoste.

101

Fig. 48. Mercado de Pentecoste.

101

Fig. 49. Mercado de Pentecoste.

102

Fig. 50. Mercado de Pentecoste.

102

Fig. 51. Mercado de Pentecoste.

102

Fig. 52. Mercado de Pentecoste.

103

Fig. 53. Mercado de Pentecoste.

103

Fig. 54. Mercado de Pentecoste.

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Fig. 55. Passeio como unidade de convívio.

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Fig. 56. Passeio como unidade de convívio.

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Fig. 57. Passeio obstruído.

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Fig. 58. Passeio obstruído.

113

Fig. 59. Passeio obstruído.

113

Fig. 60. Referência 01.

134

Fig. 61. Referência 02.

134

Fig. 62. Referência 03.

135

Fig. 63. Referência 04.

135

Fig. 64. Bicicletas compartilhadas.

142

Fig. 65. Bicicletas compartilhadas.

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Fig. 67. Trecho 1A - Corte

147

Fig. 66. Trecho 1A - Planta

147

Fig. 69. Trecho 1B - Corte

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Fig. 68. Trecho 1B - Planta

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Fig. 71. Trecho 1C - Corte

151

Fig. 70. Trecho 1C - Planta

151

Fig. 72. Trecho 2 - Planta

153

Fig. 73. Trecho 2 - Corte

153

Fig. 75. Trecho 3 - Corte

155

Fig. 74. Trecho 3 - Planta

155

Fig. 76. Trecho 4 - Planta

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Fig. 77. Trecho 4 - Corte

157

Fig. 78. Trecho 5 - Planta

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Fig. 79. Trecho 5 - Corte

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Fig. 80. Zona Compartilhada do Mercado - Planta

161

Fig. 81. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 01

162

Fig. 82. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 02

162

Fig. 83. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 03

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Fig. 84. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 05

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Fig. 85. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 05

163

// LISTA DE TABELAS Tab. 1. Taxa média de Crescimento Anual do PIB

65

Tab. 2. PGTs.

110

Tab. 3. Diretrizes de planejamento.

117



TÍTULO

O título principal do trabalho é uma jogo de palavras que associa o termo “cidade” à “adversidade” de forma espontânea, não seguindo, propriamente, a regra gramatical. Essa escolha está relacionada a um certo grau de singularidade que se atribui ao trabalho e, naturalmente, as interpretações que essa articulação de termos possa sugerir. O termo “cidade” remete diretamente ao elemento básico do urbanismo como um objeto de estudo e intervenção que, quando se relaciona com o termo “adversidade”, que agrega uma noção de “infortúnio” ou de “situação desfavorável”, sugere uma ideia de um espaço urbano adverso ou que está submetido a uma situação de adversidade. É objeto de análise do trabalho, também, o contexto ambiental, político e econômico do sertão cearense (ou nordestino), o que se traduz diretamente na escolha desse título. Já que se trata de um contexto ambiental reconhecido pelo seu grau de resistência à ocupação humana, associado, principalmente, à escassez de recursos básicos como a água; e, ainda, a um estado de pobreza e miseralização que são resultados de um processo histórico de marginalização e exploração, relacionadas à insuficiência de políticas públicas estruturais para esse cenário. O que justifica essa ideia de adversidade associada à formação de um núcleo urbano. O subtítulo “os espaços livres como promotores de cidadania no Sertão Cearense” surge, justamente, como uma contraposição a essa ideia pessimista, em certo grau, de adversidade, ao trazer consigo a possibilidade de desenvolver, nesse contexto, um trabalho que promova algum grau de inclusão e cidadania à sua população no que concerne, no caso, à atuação de um arquiteto e urbanista.

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INTRODUÇÃO

O interesse pelas questões que abrangem a escala urbana foi a primeira decisão assumida para a elaboração do trabalho. A possibilidade de estudar o espaço urbano e intervir na sua estrutura, no sentido de atenuar os seus conflitos e construir um ambiente urbano mais democrático e funcional são algumas das motivações que se sobressaem nessa abordagem. A opção pelo município de Pentecoste veio, primordialmente, de uma identificação pessoal com aquele contexto. Depois, à observação das inúmeras problemáticas socioeconômicas que se rebatem na construção do espaço urbano e dificultam a vida dos seus habitantes. Um cenário que é, de certa forma, negligenciado por diversos setores da sociedade. Diante disto, o ponto inicial da proposta de intervenção foi conceber a ideia de um projeto com um perfil estruturante para aquele espaço urbano, que remodelasse e revitalizasse suas áreas públicas e consolidasse um modelo de cidade sustentável. O trabalho, portanto, inicia-se com uma fundamentação teórica que aborda, basicamente, o papel do arquiteto e urbanista ao intervir em centros urbanos, a leitura e manuseio dos elementos da paisagem urbana, segundo a obra do autor Kevin Lynch, e a conceituação de Sistemas de Espaço Livres, como estruturadores do espaço urbano público. Depois, objeto de estudo é contextualizado e seus aspectos de geografia física territorial e histórico são analisados, tanto em uma perspectiva regional, quando em uma perspectiva local (do município). Em seguida, é feita, na etapa de Diagnóstico, uma caracterização mais minuciosa do recorte urbano escolhido para estudo, buscando gerar um banco de dados e informações, colhidas através de dados oficiais como os disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ou de visitas em campo, das problemáticas identificadas que justifiquem uma proposta de intervenção. As respostas a essas informações vem, justamente, na última parte, denominada Programa de Intervenção, que articula planos, estratégias e projetos de intervenção desde a escala macro, quando se tem uma leitura territorial da cidade, até a escala micro, quando se trabalha com a dimensão mais elementar do seu espaço urbano para o uso de um indivíduo. 17


01

IMPRESSÕES

// INTERVIR NA CIDADE



IMPRESSÕES // INTERVIR NA CIDADE

O presente capítulo trata de aspectos gerais associados ao exercício da profissão de arquiteto e urbanista, especialmente, da responsabilidade atribuída à sua atuação na escala urbana, quando sua atividade impacta na vida de milhares de pessoas. O texto traz a elaboração de duas linhas de raciocínio. A primeira se dá através da construção de uma linha do tempo geral que trata do reconhecimento da função do arquiteto e urbanista ao longo da história ocidental, pontuando períodos chave, desde a antiguidade até a contemporaneidade, dando um certo enfoque para a disciplina do urbanismo a partir da Revolução Industrial. A segunda, dando continuidade, traz aspectos importantes do processo de urbanização das cidades contemporâneas, identificando seus agentes, seus princípios e que tipo de ambiente urbano vem-se produzindo para, a partir de então, propor reflexões sobre essa atuação.

1.1. O ARQUITETO E A CIDADE A cidade é um objeto complexo, erguido pelas mãos de várias pessoas, logo, é um produto dinâmico que nasce da construção cotidiana coletiva. Com a consolidação desse espaço físico de interações, que reflete algum nível de organização social e política da sua população, surge a necessidade de uma figura que o estude e proponha soluções para seus problemas no sentido de qualificálo, atuando tanto nos espaços abertos, quanto nos fechados, tanto na esfera pública, quanto na privada, nas mais diversas escalas. É essa porção espacial a matéria prima do seu trabalho. Há controvérsias quanto à data de surgimento da denominação arquiteto com sua função estabelecida como conhecemos hoje, mas sabe-se que essa é uma profissão antiga que permeia a história da humanidade desde as civilizações mais antigas. Na cultura ocidental, por exemplo, civilizações como a grega e, posteriormente, a romana já apresentavam um nível de refinamento da sua arquitetura e de lógica na organização dos seus espaços públicos. Ainda que o ofício 20


em si, com o passar do tempo, tenha mudado para se adequar às novas conformações sociais que se sucederam.1 O historiador italiano Giulio Carlo Argan define a arquitetura à partir, justamente, do desenho. Sabe-se que gregos e romanos desenhavam, tendo a tradição construtiva latina nos legados, através de Vitrúvio, uma nomenclatura ligada à sua prática: ichnographia, orthographia e scaenographia, traduzidos, respectivamente, por planta, elevação e perspectiva.2 Enquanto, para os arquitetos gregos e romanos coube esse título mais nobre, para os medievais coube o de mestres-construtores. O que associa a sua atuação a uma experiência mais empírica de construção das edificações. (Fig. 1 a 3) Há, também, o caso de Argan, que elenca a figura de Brunelleschi, do período renascentista, como o fundador da arquitetura, isto é, como aquele que separou definitivamente o momento da criação daquele ligado à execução, a partir da criação do “projeto”. Uma definição que se aproxima da função que conhecemos hoje. Brunelleschi percebeu que, para substituir uma prática esquecida, era necessário criar um sistema; que, não podendo contar com a perícia tradicional dos mestres-deobras, o projeto deveria eliminar a priori todo imprevisto ou acidente; que, sobretudo, devia sub-rogar uma experiência e um engajamento individuais. (SILVA, 1991, p. 120)

Da esquerda para a direita:

Fig. 1. Pintura de 1880 que recria a Grécia Antiga. Fonte: Universal History Archive

Fig. 2. Roma Antiga. Fonte: tudodeconcursosevestibulares. blogspot.com.br

Fig. 3. O palácio em 1617, quando Jean-François de Bagni era vice-legado, desenhado pelo padre jesuita Martellange. Fonte: wikipedia.com

Depois, as profundas transformações sociais, econômicas e tecnológicas ocorridas na Europa, com o advento da revolução industrial, em meados do séc. XVIII, lançou-se para a figura do arquiteto, junto a de outros profissionais, outras desafios. Durante algum tempo, nos séculos seguintes, muitos estudos foram desenvolvidas nas faculdades europeias em resposta ao fenômeno da industrialização de um centro urbano. Em um primeiro instante houve respostas meramente estéticas ligadas a períodos importantes como o da própria idade média e do renascimento e, logo em seguida, uma necessidade de rompimento essa proposta. [...] como se sabe, este revival, apesar da sua consolidação acadêmica, estava fadado a durar pouco. Não houve romantismo que pudesse legitimar construções góticas em plena Era Industrial, e, o que um dia foi compreendido como uma espécie de “liberdade estética de escolha”

1  DEBRAY, Régis. Vida e morte da imagem: uma breve ocidente. Petrópolis, Vozes, 1989, p.102.

história

do

olhar

no

2  LIMA, Adson Cristiano Bozzi Ramatis. Arquitetura, a historicidade de um conceito: um breve estudo sobre a mitologia da fundação da arquitetura. Revista Vitrúvius 123.01, ano 11, 2010. 21


tornou-se um vício insuportável para os estetas arautos do Modernismo. (LIMA, 2010)

É justamente no contexto pós Segunda Guerra Mundial, através dos grandes planos de reconstrução das cidades europeias que se viu espaço para a aplicação dos princípios elaborados nas décadas anteriores, fazendo emergir o ideário Modernista na arquitetura, onde o arquiteto tem um papel centralizador no processo de construção do espaço, empregando, entre outros valores, o racionalismo e funcionalismo. Quando se fala de arquitetura moderna, para muitos autores, ainda hoje vivemos uma modernidade moldada à realidade contemporânea. Porém, quando se trata de urbanismo, o modelo de cidade moderna tem se comprovado insustentável e ineficaz, portanto, vem sofrendo duras críticas desde o final do séc. XX e se configura cada vez mais como um anti modelo. O movimento moderno segue presente como repensamento total que foi da arquitetura e o urbanismo a partir da modernidade, com as vanguardas nas artes, o novo protagonismo das metrópoles, e a disponibilidade das novas tecnologias da construção. Muitos conceitos foram revisados e superados, mas dificilmente podemos sair da esfera da arquitetura industrializada a partir do início do século XX. (MONTANER, 2016)

Ainda que durante esse percurso de especialização do ofício de arquiteto sua atividade estivesse alicerçada na elaboração do espaço em diversas escalas, é só com o advento da revolução industrial, de fato, que se passa a elaborar respostas mais sistemáticas à escala urbana de forma mais aprofundada. Pois ficou claro que os centros urbanos submetidos ao processo de industrialização estavam sujeitos a alterações radicais nas suas dinâmicas, que os levavam rapidamente a um estado de pracarização e caos. (Fig. 4) A partir do século XIX surgiram vários modelos de desenvolvimento urbano, em busca de solução para os

Fig. 4. Gravura de Gustave Doré sobre a Didley Street, em 1872. Fonte: arquiteturadaliberdade. wordpress.com

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problemas decorrentes do grande processo de urbanização das cidades europeias, na tentativa de se criar a cidade ideal, tidos como teorias, que se tornaram utópicas, a exemplo das ideias de Fourier, com o falanstério, de Howard que idealizava a Cidade-jardim, e de Tony Garnier, com a teoria da cidade industrial. (CHOAY,1965) LIMA, 2002.

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Fig. 5. Plan Voisin de Paris - Le Corbusier Fonte: glennwalls.com

Fig. 6. Vista da linha férrea cortando o lado oeste de Manhattan, na altura da Rua 17; à esquerda, a 10ª Avenida (circa 1934) Fonte: The High Line

Fig. 7. Anhangabaú, 1969 - visão de cima do Viaduto Sta Efigênia Fonte: richardjakubaszko.blogspot.com.br

Logo, em meados do século XIX, Ildefonso Cerdá utiliza os termos urbanização e urbanismo com sentido de planejamento urbano pela primeira vez, em sua obra Teoria Geral da Urbanização. À vista disso, Leopoldo Mazzaroli, citado por Mukai3, definiu o urbanismo como “a ciência que se preocupa com a sistematização e desenvolvimento da cidade, buscando determinar a melhor posição das ruas, dos edifícios e obras públicas, de habitação privada, de modo que a população possa gozar de uma situação sã, cômoda e estimada”. Mais adiante, ainda sob a onda de teorização sobre os efeitos da industrialização nos centros urbanos, surge o Urbanismo Moderno. Que se baseia em premissas generalistas específicas que consideravam, por exemplo, intervenções pontuais para amenizar os “males” advindos da própria urbanização, onde se eliminam espaços degradados, lhes dando um tratamento mais belo e salubre. (Fig. 5 a 8) Este modelo denominado de Urbanismo Moderno sofreu muitas críticas pelo racionalismo e o reducionismo trazidos dos modelos teóricos criados, já que não seriam aplicáveis a qualquer parte do mundo como premissas universais para a “modernização do espaço urbano”, pois cada lugar tem suas necessidades e problemas específicos, passíveis de análise e intervenções que podem ser diferentes de um lugar para outro. (SOUZA, 2003)

Fig. 8. Brasília, 1960. Fonte: blogdoramonpaixao18. blogspot.com.br

3  MUKAI, Toshio. Direito e legislação urbanística no Brasil. São Paulo: Editora Saraiva, 1988.

23


O que se apresenta hoje, de maneira geral, ainda está fortemente relacionado com a desconstrução desse modelo de cidade em diversos segmentos do urbanismo. Pois ele não se trata de uma resposta pontual ao fenômeno da industrialização como algo isolado, mas de uma resposta a todas as transformações sociais, econômicas, políticas e culturais associadas a ela. A crítica condena, por exemplo, o modelo de valorização do automóvel no processo de planejamento urbano e a subvalorização dos espaços públicos de convivência, que gera a sua degradação e abandono, para favorecer o setor automobilístico, por exemplo. [...] o maior destruidor dessas comunidades não foram nem as drogas nem a televisão, mas o automóvel. A modernização por meio da renovação urbana destruiu comunidades ao arrasar bairros antigos para a passagem de highways e expressways. Estes, por sua vez, induziam a expansão, com a construção de subúrbios que se alternavam com shopping centers. (JACOBS, 2000) [...] Além disso, o espaço público já não propiciava mais o encontro de pessoas, um ponto fundamental na formação e na ação das comunidades. (JACOBS, 2000)

No Brasil, no entanto, o Urbanismo sempre foi visto como um ramo complementar a Arquitetura. Existem poucos registros de discussões mais aprofundadas sobre o Urbanismo enquanto um campo do conhecimento mais autônomo no começo do século XX. É só no final desse mesmo século, na década de 90, que se tem alcançado um nível de discussão teórica e conceitual mais amplo que, inclusive, tem avançado fortemente no século XXI. O autor Villaça (1999) aponta que houve três períodos principais de planejamento das cidades brasileiras, que, neste caso, demonstram como o Urbanismo se desenvolveu historicamente aqui. O primeiro do séc. XIX até 1930, um período marcado pelos planos de embelezamento e melhoramentos, herdeiros da forma urbana monumental que exaltava a burguesia e destruiu a forma urbana medieval (ou colonial, no caso do Brasil); O segundo, entre as décadas de 30 até a década de 90, do séc. XX – o planejamento enquanto técnica de base científica, indispensável para a solução dos chamados “problemas urbanos” com enfoque para o zoneamento e organização físico-territorial das atividades no espaço urbano em decisões centralizadas; E o terceiro da década de 90 até os dias atuais: o período que seria marcado pela reação ao anterior. Período pós Reforma Urbana. É importante ressaltar que neste período supramencionado a influência do conceito de Urbanismo Moderno foi tão significativo, que, mesmo havendo em períodos posteriores uma busca por uma aproximação mais crítica na maneira de pensar a cidade, ainda evidencia-se como o conceito tradicional e predominante quando se fala de Urbanismo. (SANTOS, 2006) [...] Porém atualmente aproxima-se de um novo paradigma para o Urbanismo dentro de um contexto, em que se busca, a partir de políticas urbanas democráticas, planejar e gerir a cidade, afastando-se do cientificismo e do paradigma modernista. (SANTOS 2006)

Hoje, o profissional de arquitetura e urbanista brasileiro tem formação acadêmica multidisciplinar que forma profissionais voltados para a atuação em diversas áreas de projeto e planejamento da construção civil e seus desdobramentos. 24


O arquiteto e urbanista é um profissional liberal, nos termos da doutrina trabalhista brasileira, o qual exerce atividades intelectuais de interesse público e alcance social mediante diversas relações de trabalho. Portanto, esse profissional deve deter, por formação, um conjunto sistematizado de conhecimentos das artes, das ciências e das técnicas, assim como das teorias e práticas específicas da Arquitetura e Urbanismo. (CAU-BR, 2013)

A matéria prima do seu trabalho continua sendo o espaço a ser modificado e a sua atuação, que tem uma relação direta com projeto e planejamento, está sujeita aos aspectos de ordem político, econômico e ambiental que configuram a situação do sítio onde se intervém.

1.2. A CONDUÇÃO DO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO DA CIDADE Para além das atribuições e responsabilidades formais concedidas ao arquiteto e urbanista, existem questões específicas, pontuadas adiante, que considero relevantes para atuação do arquiteto e urbanista quando se trata do processo que objetiva a intervenção no meio urbano.

POLÍTICA DE URBANIZAÇÃO A política de urbanização objetiva dar respostas ao processo de desenvolvimento e expansão da cidade ao estudar, rever e propor soluções para o seu espaço físico e organização territorial no sentido de beneficiar a população em médio e longo prazo. Uma política de urbanização, em sua essência, visa resolver os problemas de uma sociedade em determinada área ou espaço e numa época específica, levando-se sempre em consideração que a sociedade e seu espaço se transformam continuamente no tempo, sem que seja observado, entretanto, um mínimo de sincronismo entre eles. (SANTOS, 2006)

A ausência de planejamento urbano nesse processo de crescimento da cidade, por exemplo, ocasiona o seu mau funcionamento, a degradação dos seus espaços públicos e uma exposição ainda maior das camadas mais vulneráveis da população às injustiças de diversas naturezas, entre inúmeros outros problemas. Como sabemos, historicamente, é quase inexistente uma cultura de planejamento urbano contundente no Brasil, logo, é comum que a administração pública, na figura dos seus representantes (e, na maioria das vezes, de acordo com os seus interesses pessoais), faça intervenções pontuais, que as julgam boas, no espaço urbano sem considerar uma lógica abrangente que entenda a cidade em uma perspectiva mais sistemática. O Urbanismo no Brasil ainda é pensado e praticado muitas vezes dentro de uma concepção tradicional, que o considera apenas como técnica de planejamento físicoterritorial visando o ordenamento morfológico do espaço urbano, dentro de princípios estéticos e construtivos, essencialmente de projeto, o que pode levar muitas vezes a uma visão limitada do espaço urbano que se quer planejar, [...] (SANTOS, 2006)

O processo de planejamento urbano é algo complexo e que deve mobilizar diversos setores da sociedade para dar respostas 25


positivas à expansão dos seus centros urbanos. De preferência, materializado em uma legislação que traduza as necessidades da sua população e garanta a elaboração de parâmetros que possibilitem uma vida urbana saudável e democrática.

DIREITO À CIDADE O direito urbanístico é entendido como um conjunto de regras das quais se vale a administração pública para o ordenamento do território, seja ele urbano ou não, motivado pelo interesse coletivo, mas delimitado, em certo ponto, pelo direito individual à propriedade. Sua formação, ainda em processo de afirmação, decorre da nova função do Direito, consistente em oferecer instrumentos normativos ao poder público, a fim de que possa, com respeito ao princípio da legalidade, atuar no meio social e no domínio privado, para ordenar a realidade no interesse da coletividade. (SILVA, 1995)

As primeiras manifestações dessa natureza surgiram na Inglaterra, no começo do séc. XX, quando o país efetivou sua primeira legislação sobre planejamento urbano, The Town Planning Act, que estimulava os governos locais a elaborarem planos de ordenação do solo, saneamento básico e de proteção da sua imagem enquanto cidade. No nosso caso, porém, as normas urbanísticas ainda não adquiriram unidade substancial, portanto tem seu efeito comprometido. Lima (2002) diz que “elas aparecem de maneira dispersa em diversas instituições, guardando entre si, aspectos relacionados apenas em função do objeto regulado”, ainda que tenhamos registrado conquistas recentes no âmbito nacional, no sentido de dar a devida importância à essas políticas, na Constituição de 1988 e com o advento do Estatuto da Cidade, de 2001. As nossas cidades precisam dar essa resposta à dimensão política da democracia, garantindo direitos aos grupos historicamente mais vulneráveis. Logo, é importante que os municípios formulem os seus planos diretores a partir de um diagnóstico abrangente, democrático e completo, garantindo o cumprimento das normas estabelecidas e entendendo a sua necessidade de revisão e atualização de tempos em tempos, para acompanhar as mudanças sociais associadas ao seu contexto de atuação.

COMPONENTES DA PAISAGEM URBANA Em uma abordagem mais específica, sob a ótica da morfologia urbana, destaco aqui a importância do processo associado à leitura da cidade a partir da sua composição urbana, isso é, da investigação e do reconhecimento dos elementos que lhe conferem uma identidade ou uma imagem global. Todo o espaço urbano é impregnado da sua própria dinâmica e cabe ao arquiteto e urbanista compreender o que ali ocorre e o que, dali, pode resultar. Os bairros, as vias e os espaços de interação social são alguns dos elementos que configuram a cidade, além, ainda, das fachadas, dos gabaritos e da conformação dos passeios que, em uma escala mais minuciosa, estão associadas às edificações, por exemplo. Lynch (1997, p.51) reforça que “no designe atual, a forma deve ser usada para reforçar o significado, e não para negar”. O que 26

LIMA, 2002.


reafirma a importância dessa leitura que antecede a intervenção, já que o propósito deve ser a elaboração de um projeto que evoque e revigore a identidade local, em que se evite seguir uma cartilha monótona ou previsível que gere um produto que se distancie do perfil dos habitantes. O pensar nestas condições de vida deve abranger fatores diversos que não são apenas técnicos e estéticos, ou estético-funcionais. Isto não quer dizer que as questões técnicas e estéticas deixem de ter importância, pelo contrário, devem ser objeto de análise, pois interferem diretamente na estrutura, na paisagem, e na qualidade de vida do espaço urbano, porém não devem ser o centro da questão urbanística, numa perspectiva reducionista, como muitos consideram. (SANTOS, 2006)

REFLEXÕES A intervenção no meio urbano requer muita cautela e responsabilidade de quem se destina a fazê-la. O arquiteto e urbanista, na essência do seu ofício, deve compreender e conduzir o processo que vai desde os estudos iniciais da área e coleta de dados até a implementação do projeto, estando, inclusive, atento aos seus impactos pós implementação. O interessante é que sob uma visão mais ampla devese buscar entender o Urbanismo como o conjunto de ações voltadas ao planejamento, a gestão da cidade e ao ordenamento do uso e ocupação do solo urbano em várias escalas desde a escala local à regional, porém devendo haver uma abordagem multidisciplinar acerca do território (sob seus aspectos históricos, culturais, econômicos), de maneira transversal e multirreferencial, envolvendo várias áreas do conhecimento e, sobretudo as questões políticas, de maneira que se possa alcançar a sustentabilidade socioambiental urbana. (SANTOS, 2006)

É essencial que ele, junto de outros profissionais, das diversas outras áreas, que também colaboram com esse processo, compreendam as demandas da população e as especificidades locais, seus aspectos funcional e estético, para que traduzam isso em um projeto eficaz, que esteja associado a uma prática contínua de planejamento da cidade, e não como algo isolado que tenha por si só a missão de promover mudanças estruturais. Desse prisma percebe-se então que Urbanismo ultrapassou largamente a esfera do ordenamento morfológico, não se limitando a uma simples técnica do engenheiro ou do arquiteto. Ele passaria a abarcar o campo da comunidade, da planificação social, pois a cidade reflete o estado da sociedade e nela é expressa também uma determinada concepção do mundo, devendo basear-se sempre, em primeiro plano, na melhoria das condições de vida aos habitantes da cidade (BONET CORREA, 1989).

É necessário, ainda, estimular o processo participativo, no sentido de proporcionar espaços mais adequados aos usos desejados pelas pessoas. Porém, não se resumindo a um mero processo de captação de demanda, mas buscando uma motivação maior, como a construção de uma razão pública. Quando se sobressaem as discussões e decisões coletivas, que geram um grau de conscientização sobre a relevância dos espaços públicos e o reconhecimento de direitos e deveres atribuídos ao seu papel de cidadão dentro da cidade. 27


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ENSAIOS

// A LEITURA DO ESPAÇO URBANO



ENSAIOS // A LEITURA DO ESPAÇO URBANO

O presente capítulo objetiva discorrer sobre as questões de percepção e reconhecimento da cidade, através da identificação de elementos que compõem a sua paisagem e constituem a sua forma. É um capítulo que segue rigorosamente a linha de raciocínio construída em uma parte da obra “A Imagem da Cidade”, do autor Kevin Lynch, ainda que visite outros autores.

2.1. A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DA CIDADE O termo “imagem” por si só é bastante recorrente no vocabulário popular e está possui alguns significados. Para o presente trabalho é necessário entender seu conceito quando está associado à ótica da percepção, do reconhecimento e da identidade da paisagem e dos elementos que a compõem. A definição genérica encontrada no dicionário diz que: Imagem s.f. 1 Representação de pessoa ou coisa; 2 Figura ou efígie de um santo; 3 Semelhança; 4 Representação de uma ideia; 5 Pessoa formosa; 6 Metáfora.1 Inicialmente, é importante alguma compreensão da imagem através de uma dimensão mais filosófica, já que, dessa forma, pode-se explorar algum entendimento mais substancial dessa possibilidade assegurada basicamente pelo sentido da visão. Um meio pelo qual se revela uma das mais súbitas e impactantes formas de reconhecimento e apropriação da paisagem. As imagens ambientais são o resultado de um processo bilateral entre o observador e seu ambiente. Este último sugere especificidades e relações, e o observador – com grande capacidade de adaptação e à luz de seus objetivos – seleciona, organiza e confere significado àquilo que vê. A imagem assim desenvolvida limita e enfatiza o que é visto,

1  Dício – Dicionário online de português www.dicio.com.br 30


enquanto a imagem em si é testada, num processo constante de interação, contra a informação perceptiva filtrada. Desse modo, a imagem de uma determinada realidade pode variar significativamente entre observadores diferentes. (LYNCH, 1997, p. 7)

Em outro nível de análise, é indissociável da leitura da imagem o efeito associado à dimensão temporal, através do contato periódico que leva à criação de uma identidade. O objeto, situado em um contexto, adquire e reforça um significado a cada contato. No caso da leitura da imagem do ambiente, esse reconhecimento é compreendido pela sua identificação – bem como das partes que a compõem, que, em si, também conferem significado próprio. Para isso, LYNCH (1997) designou que: Imaginabilidade: a característica num objeto físico que lhe confere uma alta probabilidade de evocar uma imagem forte em qualquer observador dado. É aquela forma, cor ou disposição que facilita a criação de imagens mentais claramente identificadas, poderosamente estruturadas e extremamente úteis do ambiente. (LYNCH, 1997, p. 11)

Em muito colabora o conceito de imaginabilidade para uma leitura mais didática da paisagem da cidade, pois os elementos que a constituem, para além da sua forma física pura, expressam uma construção social e resguardam algum valor histórico que reforçam a sua singularidade e o seu simbolismo dentro do seu contexto. A paisagem urbana é a expressão da ordem e do caos, manifestação formal da produção do espaço urbano, colocando-se no nível do aparente e do imediato. O que importa considerar é como essa forma será compreendida e, consequentemente, analisada. Uma vez que o aspecto fenomênico se coloca como elemento visível, como dimensão do real que cabe intuir, analisar e compreender. (CARLOS, 1994, p. 44)

A cerca do conteúdo levantado anteriormente, é inevitável que se questione quais seriam esses elementos que dão forma à paisagem urbana; quais as suas funções primordiais; quais funções eles passam a assumir para se adequar ao perfil metamórfico da cidade; e em que medida se relacionam entre si. LYNCH (1997: 51), à partir de um estudo prévio de algumas cidades americanas, que considerou, inclusive, informações coletadas em entrevistas, com enfoque em uma análise puramente ligada às formas físicas perceptíveis, concluiu que existem cinco grupos de objetos que se destacam e os classificou em: vias, limites, bairros, pontos nodais e marcos. A sua análise serviu de base para nosso estudo, visto que esses objetos tem um caráter universal na estruturação da paisagem urbana, portanto, apesar de ter sido elaborada no contexto norte americano, ela, em muito, serve para embasar a análise de, quase, qualquer outra cidade ocidental. 31



VIAS Com a atribuição fundamental de possibilitar os deslocamentos, as vias são os canais de circulação por onde o observador se locomove de modo habitual, ocasional ou potencial, e, de onde, ele pode observar os outros elementos da paisagem, que se organizam e se relacionam entre si. As vielas, ruas, avenidas e rodovias são exemplos desses canais que se relacionam, formando a malha viária, e que, apesar da função básica em comum de promover a locomoção, acabam por assumir configurações diversas. Parte da importância das qualidades espaciais da largura e da estreiteza provinha da costumeira associação das ruas principais e da estreiteza com as ruas laterais. (LYNCH, 1997, p. 56)

Fig. 9. Via - Rua N Sra. de Fátima - Pentecoste, Ceará Fonte: Acervo do autor

LIMITES Os limites, talvez um pouco mais difíceis de serem percebidos, estão associados às barreiras físicas que demarcam alguma quebra de continuidade do tecido urbano. Logo, por vezes, tem uma relação direta com as características geográficas do sítio, por exemplo, quando uma encosta, uma margem de rio ou uma praia se relaciona diretamente com o meio urbano demarcando alguma linearidade; em outras vezes, quando não estão diretamente submetidos às características naturais do sítio, alguns elementos como ferrovias, rodovias ou avenidas que, de fato, demarcam alguma ruptura podem vir a assumir esse papel de limite. É preciso não perder de vista a capacidade de ruptura de um limite. (LYNCH, 1997, p. 71)

Fig. 10. Limite - Avenida XV de Novembro - Pentecoste, Ceará

Muitos limites são uma costura, muito mais do que barreias que isolam, e é importante perceber as diferenças de efeito. (LYNCH, 1997, p. 71)

Fonte: Acervo do autor

BAIRROS O bairro é uma área percebida a partir de uma óptica bidimensional. É uma zona penetrável e abrangente que compreende alguma homogeneidade no seu conteúdo, portanto, possuem uma extensão reconhecível, que causa no observador uma sensação de “familiarização” com o ambiente. As suas fronteiras podem ser sólidas e facilmente perceptíveis ou sugeridas e menos perceptíveis em algumas áreas de interseção com outros bairros, por exemplo. Fig. 11. Bairro - Vista para o bairro Planalto - Pentecoste, Ceará Fonte: Acervo do autor

As características físicas que determinam os bairros são continuidades temáticas que podem consistir numa infinita variedade de componentes: textura, espaço, forma, detalhe, símbolo, tipo de construção, usos, atividades, habitantes, estados de conservação, topografia. (LYNCH, 1997, p. 74)

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PONTOS NODAIS Os pontos nodais são locais estratégicos dentro da cidade que atraem e concentram pessoas, estão intimamente ligados com a atividade humana e também são penetráveis. Esses locais se dispõem necessariamente no eixo das rotas por onde o observador se desloca. Podem ser um cruzamento de ruas, uma esquina, uma praça, uma zona de conversão de transporte, uma zona de interrupção do fluxo etc. Tem uma relação imediata com alguma concentração de pessoas que ocupam um lugar seja pelos serviços que oferece, seja por alguma característica física que impulsione sua utilização ou qualquer outra particularidade que possibilite o encontro. São, tipicamente, conexões de vias ou concentrações de alguma característica, mas ainda que sejam pequenos pontos da imagem da cidade, na verdade podem ser grandes praças, formas lineares de uma certa amplitude ou mesmo bairros centrais inteiros, quando a cidade está sendo considerada num nível suficientemente amplo. (LYNCH, 1997, p. 80)

Fig. 12. Ponto Nodal - Cruzamento entre a Rua N. Sra. de Fátima com Av. José de Borba Basconcelos - Pentecoste, Ceará

As pessoas ficam mais atentas em tais lugares e percebem os elementos circundantes com clareza incomum.(LYNCH, 1997, p. 81)

Fonte: Acervo do autor

MARCOS Os marcos, assim como os pontos nodais, são referências, porém, se distinguem por serem apreendidas pelo seu exterior. Se relacionam com o observador de uma maneira muito simples, basicamente através do contato visual, são objetos físicos marcantes, edifícios, torres de telecomunicação, cúpulas de igrejas, anúncios comerciais ou montanhas. Sua distância é variável, não está necessariamente ao alcance imediato do observador. Uma vez que o uso de marcos revela a escolha de um elemento dentre um conjunto de possibilidades, a principal característica física dessa classe é a singularidade, algum aspecto que seja único ou memorável no contexto. Os marcos se tornam mais fáceis de identificar e mais passíveis de serem escolhidos por sua importância quando possuem uma forma clara. (LYNCH, 1997, p. 88)

Fig. 13. Marco - Torre da Igreja Matriz de N. Sra. da Conceição - Pentecoste, Ceará Fonte: Acervo do autor

O autor explorou cada uma dessas classes, sempre associando seu vasto repertório a respeito do tema às suas percepções como observador e às percepções dos entrevistados. Os elementos configuram arranjos diversos, dando forma, assim, a uma infinidade de cenários. Essa infinidade é reforçada, ainda, pelo fato de que a imagem da cidade é mutável e que, a todo instante, pode somar ou subtrair significados. Estando sujeita à ação de fatores “externos” habituais como o passar das horas do dia ou eventos promovidos pelos seus usuários, por exemplo.

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2.1. A FORMA DA CIDADE A forma da cidade começa a ser apreendida, do ponto de vista do observador, à medida que ele a permeia e assimila a sucessão de suas paisagens. Ou seja, essa leitura da forma, assim como a da imagem, reforça o caráter da compreensão da cidade como um fenômeno essencialmente espacial, a partir do nosso texto. No entanto, é importante salientar que a cidade é objeto de múltiplas leituras. A busca pela sua compreensão da perspectiva da forma não se restringe meramente a entender a relação de percepção do observador com o espaço que ele ocupa, como exposto anteriormente na parte sobre a construção da imagem da cidade. Há uma diversidade de outros aspectos a serem explorados a respeito desse tema que dão margem para a elaboração de teorias fundamentadas em várias linhas de estudo. [...] Conhecemos os objetos e sua forma, mas tal conhecimento refere-se fundamentalmente a um instrumento de leitura - visual - exterior que não revelará certamente todos os conteúdos da forma. A descoberta de outros conteúdos implica outros instrumentos de leitura. (LAMAS, 1997, p. 41)

É interessante, para o trabalho, compreender o conceito de forma da cidade sob a ótica da morfologia urbana proposta pelo autor José M. Ressano Garcia Lamas, que, também, se concentra essencialmente nos aspectos exteriores do meio urbano e as suas relações entre si, definindo e explicando a paisagem e sua estrutura. A morfologia urbana estuda a forma do meio urbano nas suas partes físicas exteriores e nos seus elementos morfológicos, e na sua produção e transformação no tempo. Todavia, é necessário sublinhar que um estudo morfológico não se ocupa no processo de urbanização, quer dizer, no conjunto de fenômenos sociais, econômicos e outros motores da urbanização. Estes convergem na morfologia como explicação da produção da forma, mas não como objeto de estudo. (LAMAS, 1997, p. 38)

Assim como fez o autor Kevin Lynch no seu estudo d’A construção da imagem da cidade em que, para uma mais leitura mais didática do conteúdo da paisagem urbana, identificou elementos recorrentes, os agrupou, para, depois explorar suas funções isoladas, o autor José M. Ressano Garcia Lamas, ao tratar de morfologia urbana na obra Morfologia Urbana e Desenho da Cidade, identifica elementos morfológicos, os agrupa e estuda suas funções, bem como suas relações com o meio urbano no intuito de reconhecer quais as partes da forma urbana e como elas se estruturam nas diferentes escalas e situações da cidade. Logo, ele identifica o solo; os edifícios; o lote; o quarteirão; a fachada; o logradouro; o traçado; a praça; o monumento; a vegetação; e o mobiliário urbano como tais elementos. Certamente, todos esses elementos são de domínio popular, logo, remetem imediatamente a uma ideia do que são, portanto, evocam suas formas físicas e suas funções dentro do contexto urbano. Se distinguindo, nesse caso, da abordagem do autor Kevin Lynch que faz uma classificação em uma escala mais geral, dando margem para alguma subjetividade. São, justamente, esses, os elementos passíveis de intervenção, dentro dessa abordagem que considera, inclusive, que a produção do espaço urbano passa - ou deveria passar -, necessariamente, pela disciplina de arquitetura e urbanismo. O que os caracteriza 36


também, portanto, como a matéria-prima do ofício do arquiteto e urbanista que trabalha com essa escala, no espaço público, manuseando sua forma e sua disposição, no intuito de dar qualidade à forma urbana. Diante dessa explanação, fica o questionamento, então o que seria uma boa forma para a cidade? Que aspectos devem ser considerados para alcançá-la? De que forma e até que pontos esses elementos são manuseáveis? De volta à obra do autor Kevin Lynch, com propriedade, ele diz que: [...] Uma cidade é uma organização mutável e polivalente, um espaço com muitas funções, erguido por muitas mãos, num período de tempo relativamente rápido. A espacialização completa e o entrelaçamento definitivo são improváveis e indesejáveis. A forma deve ser de alguma maneira descompromissada e adaptável aos objetivos e às percepções de seus cidadãos. Existem, porém, algumas funções que fundamentais que as formas das cidades podem expressar: circulação, usos principais do espaço urbano, pontos focais chaves. As esperanças, os prazeres, e o senso comunitário podem concretizar-se. Acima de tudo, se o ambiente for visivelmente organizado e nitidamente identificado, o cidadão poderá impregná-lo de seus próprios significados e relações. Então se tornará um verdadeiro lugar, notável e inconfundível. (LYNCH, 1997, p. 103)

Logo, ao retomar a classificação dos elementos da paisagem urbana feitas pelo autor e considerando a relevância da imaginabilidade para a qualidade do ambiente urbano, percebemos que, no caso das vias, por exemplo, dentro da sua hierarquia, as principais teriam que ter características específicas que as diferenciassem das adjacentes não só pela demanda que comporta, mas pela concentração de usos específicos, por uma qualidade especial inerente, uma textura singular de pavimento, uma sucessão de fachadas harmônicas, uma iluminação notável ou uma vegetação típica. As vias, redes de linhas habituais ou potenciais de deslocamento através do complexo urbano são os meios mais poderosos pelo qual o todo pode ser ordenado. (LYNCH, 1997, 106)

No caso dos limites, sua visibilidade teria que ser aumentada, para tanto seria necessário aumentar o seu uso e suas condições de acesso. O limite também adquire força se for lateralmente visível a alguma distância, se assinalar um claro gradiente das características de uma área e se ligar claramente duas regiões limítrofes. (LYNCH, 1997, p. 111)

Por outro lado, a característica essencial de um marco é sua singularidade e o seu contraste com o contexto em que está inserido. Não compete ao arquiteto e urbanista projetar um marco propriamente, pois a sua construção está mais associada ao reconhecimento, à identificação e à apropriação espontânea dos usuários da cidade por um espaço específico que passe a assumir esse papel. Portanto, cabe ao projetista, ao intervir na paisagem urbana, estar atento à preservação dos marcos consolidados e aos marcos potencias.

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Um marco será ainda mais forte se for visível se for visto durante um tempo e uma distância maiores, e mais útil se a direção em que se encontra for percebido com nitidez. (LYNCH, 1997, p. 112)

Já os pontos nodais se destacam por serem os pontos de referência conceituais do meio urbano. Eles serão melhor definidos se tiverem uma limitação espacial nítida e objetos que reforcem sua percepção. Esses pontos de condensação podem, por radiação, podem organizar grandes bairros ao seu redor; para tanto, é necessário que sua presença seja sinalizada no entorno. Um gradiente de uso ou outra característica pode levar ao ponto nodal, ou o espaço deste pode torna-se eventualmente visível à partir do exterior, ou, ainda, ele pode conter marcos altos. (LYNCH, 1997, p. 114) É possível ordenar um conjunto de pontos nodais de modo a formarem uma estrutura. (LYNCH, 1997, p. 115)

Por fim, o bairro, que é reconhecido, no geral, por ser uma área homogênea, que mantém na sua extensão indicadores sociais semelhantes, ao mesmo tempo que destoa de áreas adjacentes, ainda que não exista, necessariamente, um limite espacial rígido e variedade das classes sociais que o compõem. Essa homogeneidade pode ser identificada pelo gabarito das edificações, pela sua cor, por um cheiro específicos que elas, junto com outros elementos da paisagem urbana, produzem, pela predominância de um uso específico. Quando adequadamente diferenciado em seu interior, um bairro pode expressar ligações com outras características da cidade. Para tanto, o limite deve ser penetrável: uma costura, não uma barreira. Um bairro pode ligar-se a outro por justaposição, intervisibilidade, relação com uma linha ou algum outro tipo de relação, como um cruzamento intermediário, uma via ou um pequeno bairro. (LYNCH, 1997, p.116)

Assim, no contexto complexo da cidade contemporânea, que requer uma certa continuidade para obter uma forma mais apreensível, surge, também, uma necessidade de quebra, de uma certa caracterização das suas partes que garanta sua singularidade e sua apreensão. A cidade não é construída para uma pessoa, mas para um grande número delas, todas com grande diversidade de formação, temperamento, ocupação e classe social. Nossas análises apontam para uma substancial variação do modo como as diferentes pessoas organizam a sua cidade, de quais elementos mais dependem ou em quais formas as qualidades são mais compatíveis com elas. O designer deve, portanto, criar uma cidade que seja pródiga em vias, limites, marcos, pontos nodais e bairros, uma cidade que não use apenas uma ou duas qualidades de forma, mas todas elas. Se assim for, diferentes observadores terão a seu dispor um material compatível com seu modo específico de ver o mundo. (LYNCH, 1997, p. 123)

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03

CONCEITUAÇÃO

// O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES (SEL) COMO ESTRUTURADOR DO AMBIENTE URBANO



CONCEITUAÇÃO // O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES (SEL) COMO ESTRUTURADOR DO AMBIENTE URBANO

O presente capítulo objetiva dar o suporte necessário para o entendimento do conceito de Sistema de Espaços Livres, investigando as teorias relativas à sua concepção e a sua aplicação no espaço construído. Como se trata de um conceito abrangente e de múltiplas interpretações, foram eleitos três subsistemas principais que se relacionam diretamente com a esfera pública e com a construção de um ambiente urbano democrático, que oferece uma série de elementos para o exercício da plena cidadania dos seus cidadãos.

3.1. SISTEMAS DE ESPAÇOS LIVRES (SEL) Os espaços livres, para Miranda Magnoli (1982), são definidos sumariamente como “os espaços livres de edificações, ou livres de urbanização, ou seja, todo espaço descoberto, urbano ou não, vegetado ou não, público ou privado”. Para poder compreender essa dimensão a partir da sua relação sistêmica, dentro de um determinado recorte espacial, é interessante atentar para a definição de Morin (2008), quando ele diz que “o conceito de sistema exprime ao mesmo tempo unidade, multiplicidade, totalidade, diversidade, organização e complexidade. Um sistema é um objeto complexo, suficientemente aberto, pois estabelece relações com outros sistemas, e suficientemente fechado”. Entende-se, portanto, que os espaços livres se estruturam a partir de uma relação sistêmica entre as partes (ou subsistemas) que o compõem, dentro de um recorte urbano ou da totalidade de uma cidade, independente da dimensão, da qualificação estética, funcional ou fundiária deles. O que confere a esses espaços a relevância de ser um dos principais estruturadores do meio urbano, onde acontece grande parte da vida cotidiana e de atividades eventuais. Os espaços livres tem grandes probabilidades de transformação no processo de construção da paisagem. 42


Conformam o componente mais flexível da estrutura do território, seja funcional ou espacialmente. São também os lugares mais frágeis e um dos mais promissores tendo em conta a possibilidade de reestruturação do território, já que podem assumir algumas importantes funções, por exemplo, como lugar dos ecossistemas, da percepção da paisagem e como possível lugar para o futuro da ocupação urbana. (TARDIN, 2008, p. 42)

Os espaços livres de uso privado, exemplificados por aqueles onde ocorrem as atividades ao ar livre do cotidiano da habitação e do trabalho, voltados para descanso, recreação e contemplação como jardins, quintais, pátios, estacionamentos, entre outros, exercem uma função de complementaridade junto aos espaços de uso públicos que, por sua vez, apresenta-se, via de regra, pelo sistema viário que conecta os demais espaços como as praças, os parques, as lagoas, as praias etc. Pode-se afirmar, desse modo, que qualquer cidade é dotada de sistema de espaços livres. No caso, os de uso público, objeto de estudo do presente trabalho, constituem o principal subsistema voltado à esfera de vida comunitária. As decisões políticas, a disponibilidade de recursos e os padrões culturais são determinantes para que a experiência de qualificação desses sistemas, sob a influência dos diversos agentes sociais, seja bem sucedida. Combate-se as noções reducionistas dos espaços livres que deixam de lado as características fundamentais do espaço urbano, como a complexidade e a diversidade das formas de apropriação e apreensão social. (QUEIROGA, 2014)

A ideia de desenvolvimento urbano sustentável, que ganhou força no séc. XX com a “explosão” das cidades, tem feito refletir em muitos planos a proposta do sistema de espaços livres como um mecanismo de ordenação que busca conciliar os danos da urbanização com a preservação dos recursos naturais disponíveis, desde então. [...] a explosão das cidades, a partir da década de setenta, teve impacto em diversas instancias: a perda da qualidade de vida nos centros urbanos, a tendência geral à degradação dos espaços livres e o crescimento intenso e descontrolado que resultou na dispersão urbana pelo território. (TARDIN, 2008, p. 41)

A vegetação apresenta um papel fundamental nesse quadro, pois é um elemento simbólico do embelezamento da cidade que promove, entre outros benefícios, a drenagem urbana e a manutenção de microclimas mais amenos, além do que, produz, na paisagem urbana, um embelezamento através das suas cores e texturas. Para Caldas (2006), o aproveitamento das características e qualidades da vegetação, mediante uma clara intenção de desenho, consegue identificar lugares, assim como também, conformar e hierarquizar espaços, o que permite orientar a percepção espacial e conforto ambiental do ambiente. Porém, a arborização de algumas áreas por si só não é capaz de garantir a qualificação delas, como muitas vezes se acredita. A concepção de um sistema de espaços livres de qualidade parte do ideal de um planejamento mais abrangente, que contemple outros aspectos como uma rede de drenagem pluvial, um sistema de mobilidade urbana sustentável e a criação de espaços adequados para o convívio público, por exemplo, dando uma resposta da construção de ambiente urbano funcional e saudável como um todo. 43


Questiona-se o modelo hegemônico de espaços livres e verdes contínuos, advindo de conceitos modernistas e/ ou norte-americanos de valorização do subúrbio. Propõese uma ideia mais abrangente, não há tipo único ou ideal de sistema, cada lugar urbano possui características específicas de formação histórica e de relacionamento com o suporte biofísico. (QUEIROGA, 2014)

Por outro lado, os espaços não vegetados tem igual importância frente ao desenvolvimento da cidade, pois abrigam realizações culturais que reforçam a identidade cultural local como feiras ao ar livre, festas populares e manifestações políticas, além da valorização de paisagens e edifícios de valor histórico e patrimonial. (Fig. 14 a 17) Ainda que seja incipiente a prática de um planejamento consistente de sistema de espaços livres, no Brasil, já se tem noção da sua importância para o desenvolvimento das cidades, o que não se restringe apenas aos grandes centros urbanos. Com a ascensão do discurso ambiental das últimas décadas, viu-se nessa área a vasta possibilidade de dinamizar e qualificar a vida urbana à partir de projetos que congreguem várias propostas com enfoque na construção desses espaços democráticos, funcionais e convidativos onde pulsam a dinâmica da vida urbana. Nesse processo, se faz necessária a identificação dos seus subsistemas predominantes, aqueles que posição de destaque na estruturação do espaço urbano, para a avaliação do seu funcionamento e, em seguida, a elaborações de proposições que qualifiquem o seu uso e os integre aos demais subsistemas. 44

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Fig. 14. Praça do Ferreira, Fortaleza. Fonte: governodoce.gov.br

Fig. 15. Marco Zero, Recife Fonte: meteopeviagem.com

Fig. 16. Arco Nossa Senhora de Fátima, Sobral Fonte: wikimapia.org

Fig. 17. Margem esquerda do Rio Acaraú, Sobral Fonte: www.skyscrapercity.com


3.2. SUBSISTEMAS PREDOMINANTES 3.2.1. ÁREAS LIVRES PÚBLICAS As áreas livres públicas, nas figuras de praças, parques e jardins, são elementares na construção da concepção de espaços livres, sob a importância da função de promover o convívio e o lazer no ambiente urbano. Ainda que haja uma pluralidade de outras áreas como essas, no caso, os pátios, bosques, recantos, centros esportivos, campos de futebol comunitários etc., em diversos níveis de formalidade e estados de conservação. É interessante observar o caráter híbrido de muitos desses espaços, não se restringindo às suas denominações e funções de maneira rigorosa, no contexto das cidades brasileiras. Pois, eles se revelam equipamentos polifuncionais quando assumem funções complementares, que englobam, no caso, tantos as funções habituais como as de convívio e lazer, quanto às de realização de eventos mais específicos como feiras e manifestações políticas, religiosas e culturais. Os espaços livres urbanos, diferentemente dos espaços edificados, formam um sistema, um objeto complexo. Afastando-se das determinações legais, de seu raciocínio classificatório e “separatista”, observa-se forte hibridismo entre espaços livres que integram oficialmente um ou outro subsistema de espaços livres (viário, de lazer, de conservação ambiental, etc.), na prática a maioria dos espaços livres urbanos desempenha mais de um papel. (QUEIROGA, 2014)

É uma atribuição legal, prevista na Lei nº 6766/79, a destinação de uma porcentagem, em torno de 10%, varia com a legislação de cada município, da área da gleba aos “espaços livres de uso público”, que se materializam, geralmente, na construção de praças. Logo, as praças se constituem elementos simbólicos desse subsistema, por serem, essencialmente, concebidas para promover a socialização dos habitantes da cidade, com esse propósito bastante arraigado à cultura popular e afeito à fomentação da cidadania. Para Sun (2008), as transformações nas praças “afetam diretamente o convício social e, portanto, o exercício da cidadania, assim como a construção da democracia.” Além do que, elas representam, também, marcos relevantes na paisagem urbana. Há, porém, uma degradação física, ambiental e social dos espaços livres públicos, entre eles a praça, que tem afastado seus usuários, os quais encontram no ambiente privado, edificado ou não, as opções de socialização, entretenimento, descanso e realização de atividades físicas que aqueles espaços já não conseguem oferecer. O que estimula e reflete algum nível de segregação sócio espacial, já que esses espaços na opinião de Leitão (2002) “proporcionam um determinado tipo de encontro e convivência, entre pessoas de uma determinada camada social, incompatível, portanto, com a ideia de publicização que caracteriza o espaço abertos e acessível a todos”. Em contraponto a esse processo, existe uma grande crítica aos seus efeitos na cidade. Em uma sociedade na qual cada vez mais a vida diária acontece na esfera privada - em casas privadas, com computadores e carros privados e em centros comerciais estritamente controlados e privatizados - existem sinais claros que a cidade e os espaços urbanos receberam um novo e influente papel como espaço e fórum público. (GELH, 2002) 45


A diversidade, a pluralidade e o “imprevisto” encontram nos espaços livres públicos a maior capacidade para acolher suas presenças, tornando a vida pública mais rica. Para Queiroga, “essa característica permite evidenciar aspectos da dialética socioespacial por meio da qual contradições e conflitos, presença e ausência, riqueza e pobreza, força e fragilidade, violência e solidariedade são manifestações acolhidas o tempo todo por esses espaços, notadamente os de maior apropriação pública.” Enquanto os espaços edificados abrigam a vida privada, que não, necessariamente, se opõem a outra esfera, mas se relaciona e a complementa. Interferindo diretamente na dinâmica e no ambiente urbano, o que lhes confere, inclusive, uma relevância pública. A larga utilização desses espaços, sobretudo em áreas centrais, está muito associada à existência de atividades comerciais como a dos próprios estabelecimentos ao longo do eixo viária, dos quiosques, de feiras ou até do comércio informal. É uma atividade que motiva o convívio em ruas, praças e bairros e, dessa forma, caracteriza suas dinâmicas. O atravessamento dos processos sociais sobre os sistemas de espaços livres inclui dinâmicas capazes de transformar espaços públicos que se “privatizam”, assim como, por outro lado, espaços privados ou propriedades públicas destinadas a usos bastante específicos que fortemente se “publicizam”. Não se trata de desafetações ou desapropriações fundiárias, mas da dinâmica das apropriações sociais de tais espaços ao longo do tempo. (QUEIROGA, 2014)

Se por um lado, a urbanização brasileira passa por um processo de fragmentação associado à supervalorização da esfera privada em detrimento da pública, o incremento dos comércios locais, a expansão das políticas de mobilidade e a crescente mobilização em eventos públicos, tantos culturais, quanto políticos, tem resignificado a apropriação desses espaços por parte da população, dando-lhes um uso mais efetivo. Segundo Gehl e Gemzoe (2002) “a sociedade da informação está fornecendo novos sentidos e significados à cidade como lugar de encontro”. É atribuição da administração pública o gerenciamento, manutenção e incremento das atividades nas áreas livres públicas. Portanto, é importante que o Município, na figura dos seus representantes, esteja compromissado em construir cidades mais humanas a partir da valorização desses espaços. Um plano que considere esses subsistemas deve ser abrangente no sentido de identificar ações cotidianas e articular diferentes políticas públicas como educação, saúde, cultura e transporte à sua função de promover convívio, lazer e preservação ambiental. Queiroga coloca que “os espaços livres não se prestam apenas para as funções, usos e apropriações comentados, eles vão além, “são uma reserva de imaginação” e isso, efetivamente, não é pouco”. Logo, deve-se garantir o livre acesso a eles, em adequadas condições espaciais e ambientais.

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3.2.2. MOBILIDADE URBANA A mobilidade urbana é condição em que se realizam as locomoções de pessoas e cargas dentro do meio urbano de um município, segundo Gollnick (2014). Ela está diretamente relacionada com sistema viário chegando, muitas vezes, a se confundir com o próprio quando seu entendimento é reduzido à sua estrutura física. Assim, é um aspecto fundamental do funcionamento da cidade que afeta todos os seus setores sociais, na figura de pedestres, ciclistas, usuários de transporte público, motoristas, entre outros, independente de idade, sexo, renda e capacidade de mobilidade provisória ou permanente. No Brasil, o artigo 24 da Lei n. 12.587/2012, do Estatuto da Cidade, determina que os municípios acima de 20 mil habitantes e os demais obrigados por lei elaborem seus Planos de Mobilidade Urbana, associado a um Plano Diretor, como requisito para que acessem recursos federais para investimento no setor. O desempenho desse tipo de plano está associado a capacidade de resposta que ele dar ao sistema viário de uma determinada cidade, considerando seus fluxos, as características físicas do seu território, seu serviço de transportes regulares e a sua sinalização. O que implica na adoção de medidas que garantam a acessibilidade de todos aos serviços oferecidos na sua extensão, assumindo um compromisso com a segurança no trânsito, com as questões ambientais, como redução de poluição e desperdício de energia, com a potencialização da economia, promovendo a articulação entre diversos segmentos sociais, e priorizando a acessibilidade de pessoas com mobilidade reduzida. É uma característica marcante, no Brasil, que as legislações municipais estabeleçam o predomínio do sistema viário sobre os demais usos do espaço público. Desde 1979, as legislações referentes ao parcelamento do solo, incidentes nos municípios brasileiros, exigem que 35% da área da gleba seja destinada às áreas públicas, sendo que 20% ou mais acaba por se constituir em espaços do sistema viário, restando aos “espaços livres de uso público” (praças, parques e congêneres) parcelas em torno dos 10% da área da gleba. (QUEIROGA, 2014)

Assim, dentro da conformação do próprio sistema viário predomina uma estrutura que beneficia o uso dos transportes motorizados particulares, como carros e motocicletas, em detrimento de modais alternativos, como as bicicletas e os transportes motorizados coletivos, que são menos nocivos ao ambiente urbano. O alargamento viário que sacrifica o seu entorno, na figura de calçadas e reservas biofísicas, com a justificativa de dar mais fluidez ao trânsito de automóveis é um exemplo recorrente dessa política de favorecimento que reforça os conflitos na caixa de rolamento das vias, a precarização da infraestrutura para modais mais frágeis e, em uma óptica mais abrangente, a perda da escala humana da cidade. Para construir um entendimento mais completo do conceito de mobilidade urbana, se faz necessária a identificação e a compreensão, em algum nível, dos componentes que se articulam nesse cenário. Logo, adiante são apresentadas as características de alguns tipos de transportes que se sobressaem em um contexto como o do nosso estudo. 47


// PEDESTRES A primeira possibilidade de deslocamento do homem no meio urbano é a caminhada, quando ele percorre o sistema viário disponível através de passeios, calçadões ou passarelas. Podendo esse deslocamento, que também engloba transeuntes com mobilidade reduzida, ser uma parte do seu percurso, quando alterna com outros modais, ou a totalidade dele quando o trajeto é todo feito de uma única forma. É notório que se reduz, na nossa cultura, o conceito de rua ao seu leito carroçável, como se a calçada fosse uma categoria à parte. Esses deslocamentos são negligenciados pelos técnicos envolvidos nas decisões de planejamento urbano, o que implica na existência de poucos bons exemplos de passeios com boas dimensões, arborizados e acessíveis no nosso quadro urbano, como deveriam ser por regra. A inclusão destes deslocamentos no cerne do planejamento urbano e no planejamento dos transportes, bem como na gestão da mobilidade urbana, respeitando as suas características e necessidades particulares, além de reparar o erro de desconsiderar essa expressiva parcela das viagens urbanas, significa também contribuir para o processo de inclusão social de parte da população brasileira que se desloca, prioritariamente, por modos não motorizados. (SeMob, 2013, p. 37)

A circulação do pedestre no meio urbano remete às necessidades de andar, descansar, observar e usufruir dos serviços ofertados ao longo dos eixos viários, inclusive. Portanto, além de promover o resgate de uma escala humana para a cidade através dessa forma de ocupação, o que gera, ainda, uma sensação maior de segurança, a estruturação de zonas para pedestres incentiva, também, a promoção de usos mistos, comerciais e oferta de serviços que dinamizam o mercado e constituem um aspecto importante para o fortalecimento da economia local.

// BICICLETAS A bicicleta é um dos meios de transportes que se tem mostrado mais eficientes dentro do meio urbano, segundo estudos realizados pelo Portal Mobilize, que trata de Mobilidade Urbana Sustentável. Ainda que tenha perdido adeptos nas últimas décadas para modais motorizados particulares, a cultura cicloviária é uma realidade em pequenos centros urbanos do país e em zonas periféricas das grandes metrópoles brasileiras, em ambos, até então, associada às camadas menos favorecidas da população. Os municípios, de uma maneira geral, não possuíam políticas públicas específicas ou mesmo intenções direcionadas a expansão do uso desse modal. Porém, nos últimos anos, tem crescido o debate em torno da importância da cultura cicloviária no desenvolvimento das cidades associado, inclusive, a setores da classe média. O que tem levado algumas prefeituras a reavaliarem a estruturação do espaço urbano dos seus municípios a partir dessa perspectiva, mesmo que isso não tenha sido materializado em uma política mais efetiva como um plano cicloviário propriamente. Porém, se resumem às iniciativas pontuais como a instalação de paraciclos, de sistemas de bicicletas compartilhadas ou de ciclovias (ainda que em muitos casos elas sejam desconectadas).

PORTAL MOBILIZE BRASIL


De acordo com o PlanMob (2013), a bicicleta oferece a tecnologia mais apropriada para distâncias curtas, com baixíssimo custo operacional. Uma pessoa pedalando viaja duas vezes mais rápido, carrega quatro vezes mais carga e cobre três vezes a distância percorrida por uma pessoa caminhando. É uma opção de deslocamento que incentiva a prática de exercícios físicos, que não emite poluentes e que resgata o sentido de escala humana da cidade. Do ponto de vista urbanístico, o uso da bicicleta nas cidades reduz o nível de ruído no sistema viário; propicia maior equidade na apropriação do espaço urbano destinado à circulação; libera mais espaço público para o lazer; contribui para a composição de ambientes mais agradáveis, saudáveis e limpos; contribui para a redução dos custos urbanos devido à redução dos sistemas viários destinados aos veículos motorizados; e aumenta a qualidade de vida dos habitantes, na medida em que gera um padrão de tráfego mais calmo e benefícios à saúde de seus usuários. (SeMob, 2013, p. 42)

// VEÍCULOS COM TRAÇÃO ANIMAL Os veículos com tração animal são umas das formas mais antigas de locomoção que existe para o homem e, ao contrário do que se pensa, o número de carroças, charretes e similares é relevante como transporte alternativo no contexto de pequenos centros urbanos e como estratégia de sobrevivência de setores excluídos da população nas grandes metrópoles. Neste caso, quando associadas ao trabalho do homem enquanto condutor (para realizar mudanças de casas ou coletar lixo reciclável, por exemplo). Apesar da previsão na legislação e da constante incidência de conflitos com outros modais na caixa viária, poucos municípios praticam políticas específicas que garantam sua proteção no trânsito. [...] a regulamentação do uso e da circulação dos veículos de tração animal e a sua inclusão no planejamento da mobilidade urbana devem ser preocupações das autoridades públicas. Isso envolve medidas dirigidas aos veículos, aos condutores, às normas de circulação e aos cuidados com os animais e com a saúde pública. (SeMob, 2013, p. 43)

Logo, a regulamentação desse tipo de transporte deve estar vinculada a uma política maior de inclusão social e de geração de emprego e renda que incluam os carroceiros em um mercado formal. As condições de trabalho devem ser consideradas e debatidas previamente com os interessados, abordando os perigos a que estão sujeitos, as condições de vida dos animais e os problemas ambientais que a prática pode causar. Entre outras medidas, a redução do limite de velocidade nas vias é uma opção que gera fluidez ao trânsito e proporciona mais segurança para esse e outros meios de locomoção mais frágeis, como para os pedestres e as bicicletas. A integração da malha cicloviária a esta, seja ela segregada ou compartilhada, é outra estratégia interessante que oferece, também, um maior nível de segurança a quem necessita utilizar esse meio de transporte.


// TRANSPORTE COLETIVO MOTORIZADO O transporte motorizado coletivo mais utilizado no meio urbano é o ônibus (e suas variações) sob diversas formas de atuação. Em geral, ele está associado a uma rede de serviços de natureza particular que atua vinculado à administração pública. A sua presença, dessa forma, é tímida ou quase inexistente em pequenos centros urbanos, incipiente em médios, e massiva nos grandes centros e regiões metropolitanas. No caso dos municípios de pequeno ou médio porte, por exemplo, é inviável investir em um aparato estrutural que exige um sistema como esse, seja pela falta de capital ou pela falta de demanda. Porém, existem outras formas de utilização de transporte coletivo, no caso, de uma maneira mais pontual, como os ônibus escolares ou como os ônibus que promovem deslocamentos pendulares entre as localidades de um município (sedes urbanas e zona rural). Nas grandes metrópoles brasileiras é um meio de transporte largamente utilizado e esse uso tem sido reforçado pelas políticas de criação de faixas exclusivas e sistemas de BRTs (Bus Rapid Transit), por exemplo. A implantação de outras modalidades de transporte coletivo motorizado como metrôs e VLTs (Veículo Leve sobre Trilhos) ainda aparecem em um segundo plano nesse contexto, pois, apesar configurem uma alternativa interessante para o transporte de massa, são uma opção que exigem muito investimento do setor público para sua construção e manutenção. A capacidade de transporte dos sistemas de transporte urbano depende do tipo de veículo adotado (capacidade unitária do veículo) e da frequência de viagens realizadas. Portanto, a especificação do tipo de veículo a ser utilizado em uma determinada situação depende da combinação de uma série de fatores: o número de passageiros a serem transportados, os intervalos pretendidos entre viagens e as características do sistema viário, de modo que o atendimento aos usuários seja feito da forma mais racional possível, atendendo as suas expectativas de conforto, segurança e rapidez, com a máxima produtividade e agredindo o mínimo possível o meio ambiente, utilizando preferencialmente o mais eficiente combustível à disposição. (SeMob, 2013, p. 45)

// MOTOCICLETAS O crescimento do uso de motocicletas nas cidades brasileiras nas duas últimas décadas é algo notório. O Observatório das Metrópoles relata que houve um incremento de quase quatro vezes no número de veículos como esse no país, passando de 5,6 milhões em 2001 para 22,5 milhões em 2011. As motocicletas estão presentes em cerca de 20% dos lares brasileiros, percentual que tende a crescer rapidamente, principalmente nas camadas mais pobres, em função dos menores preços dos veículos de baixa cilindrada. (PORTAL BRASIL, 2013)

Esses números se especializam em centros urbanos de uma maneira específica. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), um dos principais fatores desse aumento é o incremento na renda das camadas mais pobres da sociedade, onde se destacam os moradores das regiões mais periféricas das grandes metrópoles de todo Brasil e das cidades de pequeno e médio porte de regiões como a Norte e a Nordeste.


Para essa parcela da população a motocicleta representa uma opção mais viável por ser de baixo custo de aquisição e manutenção, que economiza combustível e é eficaz em promover deslocamentos rápidos, independente do grau de congestionamento. Associada a um contexto como esse, existe, ainda, possibilidade de utilizar o veículo para gerar renda através de atividades como moto táxi ou office-boy. Porém, apesar de ser um transporte econômico e eficaz para o seu proprietário, a motocicleta é um grande emissor de poluentes que supera, inclusive, o automóvel, segundo um estudo realizado pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) em 2011. Além do que se tem se mostrado um meio de transporte bastante perigoso ao envolver o maior número de vítimas em acidentes de trânsito, como foi apresentado 1º Fórum Nacional da Cruz Vermelha Brasileira sobre Segurança Viária no Rio de Janeiro, em 2015. O que se configura, portanto, como uma alternativa precária a quem não tem outras opções de meios de locomoção. As políticas públicas em atenção a esse modal devem ser cautelosas ao evitar promover a expansão do seu uso. A segurança dos motociclistas deve ser assegurada enquanto, porém, outras opções de meio de transporte de qualidade devam ser ofertadas. Além da regulamentação e da fiscalização, é fundamental o trabalho de conscientização da sociedade quanto aos riscos das motocicletas no trânsito. Campanhas e programas de educação dirigidas aos motociclistas, aos demais condutores e aos pedestres devem difundir normas de circulação específicas e princípios gerais de redução de conflitos de comportamentos mais seguros na circulação. (SeMob, 2013, p. 44)

// AUTOMÓVEIS O automóvel assumiu um papel central no planejamento das nossas cidades ao longo do último século, mesmo que nunca tenha representado o meio de transporte mais economicamente viável para maior parte da população brasileira. A associação a esse símbolo de modernidade, liberdade e sofisticação, somado ao status social que se agrega aos seus proprietários, criou uma verdadeira cultura do automóvel. O que legitimou a vocação política em priorizar a destinação de recursos públicos para atender a demanda desse modal. A circulação de automóveis é o que pauta o projeto da imensa maioria das vias brasileiras, desde a segunda metade do século XX, quando a indústria automobilística impôs à cultura, e em particular à cultura urbanística praticada no país, o automóvel como meio de locomoção privilegiado no território, sinônimo de status e de modernidade. Não faltam críticas e ações contrárias a essa posição que, no entanto, permanece hegemônica até, pelo menos, a primeira década do século XXI. (QUEIROGA, 2014)

Existe um consenso para os estudiosos da área em dizer que esse modelo rodoviarista está esgotado. Segundo o Gorz (PlanMob), “não há recursos, e se houvesse, não haveria espaço para alimentar a contínua massificação do uso do automóvel implementada a partir da virada do século XIX”. Os fenômenos como o da demanda induzida, onde se constroem e se alargam mais vias, o que estimula a introdução de mais carros em circulação, aumentando, ao invés de diminuir os problemas de congestionamento e poluição, e o do espraiamento urbano, onde se estimula o crescimento horizontal das cidades, onde as distâncias são multiplicadas, em um processo retroalimentativo que a torna cada


vez mais dependente da figura do automóvel reforçam essas críticas ao modelo. Além das questões básicas de poluição atmosférica, sonora e visual, da potencialização dos casos de acidentes fatais no trânsito (por ser um transporte rápido e bastante associado ao uso de bebidas alcoólicas) e a contradição de gerar cidades cada vez mais congestionadas ao invés de fluidas. A ideia de que o automóvel é a melhor solução para o transporte, além de injusta, é falsa verdade, pois, em longo prazo, a opção pelo transporte individual promove o colapso viário e a saturação do sistema, além da altíssima poluição. [...] Cidades com bons sistemas de transporte público rápido de massa oferecem, sem dúvida, qualidade de vida significativamente maior a seus moradores. (FERREIRA, 2012)

Os municípios tem que reverter os danos dessas políticas que centram no automóvel a importância de todo um sistema de locomoção, garantindo a infraestrutura necessária para que modais alternativos e menos agressivos ganhem espaço como uma opção viável no cotidiano dos cidadãos. A contínua construção do ambiente urbano, através das questões de mobilidade, deve favorecer o resgate da escala humana, a segurança nos deslocamentos e a sustentabilidade do ponto de vista ambiental, considerando todas as variantes sociais dos contextos onde se atua. Os Planos de Mobilidade Urbana devem tratar da circulação de pessoas e bens e não só dos veículos, priorizando o pedestre e o transporte coletivo e não só o automóvel e administrando todo o sistema viário e não apenas a pista de rolamento. O planejamento viário deve estar acompanhado e intimamente ligado ao planejamento e às políticas urbanas, envolvendo os instrumentos de regulação urbanística, as preocupações ambientais e os princípios da acessibilidade universal. (SeMob, 2013, p. 69)


3.2.3. ACESSIBILIDADE URBANA A acessibilidade urbana visa garantir a realização de percursos e a utilização de equipamentos urbanos por qualquer pessoa, independente da sua condição de mobilidade física ou da sua idade, no ambiente urbano. É algo que envolve uma escala mais minuciosa, ainda que esteja associado a uma lógica maior de planejamento, que objetiva a superação de eventuais obstáculos que restringem a livre utilização dos espaços urbanos pelos seus cidadãos. Apesar de existirem leis que assegurem o direito de ir e vir de todos os cidadãos, várias barreiras físicas são encontradas no espaço urbano e nas edificações. É um problema cultural da população aliado a falta de ordenamento, planejamento e fiscalização dos órgãos competentes no sentido de proporcionar condições mínimas de acessibilidade para todos. (SANTIAGO, 2009) Além destes problemas no caminhar pelas calçadas, encontramos obstáculos também nas travessias das ruas e nas edificações. Raras são as faixas de pedestre na cidade que possuem as guias rebaixadas, ou por vezes, encontramos as guias rebaixadas fora da faixa. (SANTIAGO, 2009)

As políticas que garantem a acessibilidade tem um papel importantíssimo como fator de inclusão social no ambiente urbano. Especialmente por contemplar a parcela da população que tem mobilidade reduzida, que é, historicamente, privada de usufruir plenamente dos espaços urbanos e dos direitos básicos associados à garantia do acesso a eles, como educação, saúde e lazer. Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU) aproximadamente 10% da população dos países em desenvolvimento demonstra algum tipo de deficiência, permanente ou temporária. No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que 14,5% da população são portadores de alguma deficiência. Logo, os projetos devem contemplar a criação de ambientes e equipamentos que possibilitassem a utilização de um grande arranjo de pessoas já na sua concepção. Colocando, portanto, as necessidades das pessoas com mobilidade reduzida como parâmetro no processo de reestruturação do espaço urbano. Vescovo (apud PREISER, 2001) reforça a importância desse novo paradigma ao dizer que “estas pessoas devem ser consideradas como parte do mundo, e não como um mundo à parte”. O que constitui um aspecto chave do conceito de Desenho Universal, já que se trata de uma abordagem política e integrada do designe, desde a escala do objeto, passando pela da arquitetura, até a do planejamento urbano, considerando, ainda, campos como o de transportes e tecnologia. No Decreto Federal nº. 5.296, de 2 de dezembro de 2004, encontramos a definição de desenho universal como sendo a concepção de espaços, artefatos e produtos que visam atender simultaneamente todas as pessoas, com diferentes características antropométricas e sensoriais, de forma autônoma, segura e confortável, constituindo-se nos elementos ou soluções que compõem a acessibilidade. (SANTIAGO, 2009)

São indissociáveis das questões de acessibilidade universal os debates em torno da importância da escala humana dos centros urbanos. Uma cidade que considera a escala do ser humano em suas decisões cria um ambiente mais democrático, mais seguro e mais significativo, do ponto de vista afetivo, para seus habitantes. As leis que garantem as políticas de acessibilidade representam importantes conquistas no sentido da construção dessa cidade inclusiva, que fazem valer o sentido do direito básico de circular e o exercício da plena cidadania. 53


04

CONTEXTUALIZAÇÃO

// A CIDADE DO SERTÃO CEARENSE



CONTEXTUALIZAÇÃO // A CIDADE DO SERTÃO CEARENSE

O presente capítulo se trata de um primeiro esforço de contextualização do objeto de estudo, através de uma análise a nível regional das zonas onde predominam o clima semiárido no estado Ceará. O primeiro tópico trata dos aspectos físicos a partir da caracterização espacial geográfica de todo território do estado; o segundo trata do processo de ocupação dos seus núcleos urbanos, em uma perspectiva histórica, relacionando o seu processo de formação às atividades econômicas predominantes de cada período; o terceiro, e último, trata, através de uma abordagem fundamentada no conceito de rede de cidades, de um recorte espacial “tipo”, quem se observam em diversas cidades desse contexto, já que eles estão submetidos à condições ambientais, políticas e econômicas semelhantes. O que permite identificar falhas e potencialidades para o seu desenvolvimento urbano.

4.1. CARACTERIZAÇÃO REGIONAL O Ceará é um estado situado na porção norte da região Nordeste do Brasil, uma região conhecida pela simplicidade e hospitalidade do seu povo, pela persistência de elevadas temperaturas durante quase todo o ano e pela diversidade das suas paisagens naturais, que vão desde a beleza do seu litoral de praias de claras até a singularidade do seu sertão, que é onde residem os símbolos mais fortes da sua cultura popular, entre outras características marcantes. A área do estado corresponde a uma extensão de 146.817 km², fazendo fronteira a leste com os Estados do Rio Grande do Norte e Paraíba, ao sul com o Estado de Pernambuco e a oeste com o Estado do Piauí. Ao norte é banhado pelo oceano Atlântico numa extensão de 573 km, com litoral pouco recortado, onde aparecem planícies costeiras e praias cobertas por dunas de beleza única. Nessa área, as altitudes não ultrapassam 100 metros. Em direção ao interior, no entanto, o terreno assume características de 56


CONVENÇÕES Macrorregião de Planejamento

4

Hidrografia 1

Baturité

2

Cariri / Centro Sul

3 6

Litoral Leste / Jaguaribe

4

Litoral Oeste

5

RMF

6

Sertão Central

7

Sertão dos Inhamuns

8

Sobral / Ibiapaba

8

5

1

3 6

DOMÍNIOS NATURAIS Faixa Praial Tabuleiros Costeiros Tabuleiros Interiores

7

Planície Ribeirinha Planalto da Ibiapaba

2

Chapada do Araripe Chapada do Apodi Serras Úmidas Serras Secas Sertões Mapa 1. Compartimentação Geoambiental. Fonte: IPECE editado pelo autor

MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES

planalto, alcançando altitudes médias de 400 a 500 metros. O que configura uma parcela do Planalto Nordestino, uma das unidades do Planalto Atlântico, cuja monotonia é quebrada em certos pontos, por blocos elevados de rochas mais resistentes, entre os quais se destaca a Serra de Baturité, com altitudes que chegam a mais de 1.000 metros. Esse complexo inclui a Serra Grande ou Chapada do Ibiapaba, a oeste; a Chapada do Araripe, ao sul; e a Chapada do Apodi, a leste. Com exceção desses trechos de altitude mais acentuada e da extensão da costa litorânea, o clima, em boa parte do território do estado, é semiárido, com médias pluviométricas inferiores a 600 mm e irregularidade nas precipitações, o que ocasiona secas periódicas. Em consequência desse fenômeno, os cursos d’água são temporários, permanecendo secos ao longo de todo o verão, e a vegetação dominante é a das caatingas, com sua paisagem típica, de pequenas árvores retorcidas. A área ocupada por caatingas no Ceará atinge 129.162,7 km², o que corresponde a 88 % da área total do Estado, a maior dentre os estados brasileiros. As temperaturas médias são elevadas, oscilando entre 24º e 30º C. Existem 701 açudes no Estado, com capacidade para 10 bilhões e 610 milhões de metros cúbicos (m³) de água. A existência de tais reservatórios hídricos permite o desenvolvimento agrícola e a criação pecuária nas regiões semiáridas, onde a escassez de água é frequente. 57


4.2. SÍNTESE HISTÓRICA DO DESENVOLVIMENTO E CONSOLIDAÇÃO DOS NÚCLEOS URBANOS Ainda que o foco do trabalho seja explorar a ocupação e o crescimento dos núcleos urbanos da porção semiárida do território cearense, é importante destacar que é impossível dissociar esse processo do de consolidação dos núcleos urbanos do litoral. Já que ambos desenvolviam atividades econômicas complementares e estiveram sujeitos a um grau de dependência ao longo da ocupação do território do estado.

PECUÁRIA E CHARQUE Historicamente, a capitania do Ceará foi uma das que mais demorou a ser colonizada pelos europeus. Em 1603, somente, a Coroa Portuguesa esboçou algum interesse em colonizar o áspero território, quando enviou tropas sob o comando de Pero Coelho de Sousa, que obteve algum êxito ao combater piratas franceses e ao estabelecer o forte de São Lourenço às margens do Rio Jaguaribe, mas que foi um fracasso em sua missão maior de conquistar o litoral cearense até chegar ao Maranhão. Pois, ainda no Piauí, a missão encontrou uma forte resistência dos povos nativos, o que os obrigou a voltar e se estabelecerem no forte de São Tiago às margens do Rio Ceará, onde, também, sofreram com a resistência dos povos nativos, o que os obrigou a recuarem ainda mais, e, voltarem a ocupar a foz do rio Jaguaribe, por onde começou a expedição. Lá, também, sofreram ataques frequentes dos indígenas, além da severa seca que assolou a região entre os anos de 1605 a 1607, o que selou de vez o fracasso da primeira expedição de colonização do território cearense, obrigando-os a fugirem. Outras expedições foram enviadas e, igualmente, fracassadas nos anos posteriores. Sempre desafiados pelas condições severas que o clima os impunha, pela invasão de piratas de outras partes da Europa e pela forte relutância dos povos nativos em ceder as terras que habitavam e em dobrar-se a culturas estrangeiras.

Fig. 18. Fortaleza de São Sebastião (1613). Fonte: fortalezaemfotos.com.br

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Em 1612, Martins Soares Moreno, um dos soldados de Pero Coelho de Sousa, regressou à capitania, construiu, novamente, o forte de São Sebastião, na foz do Rio Ceará (Fig. 18). Após combates com franceses no Maranhão e tentativas rechaçadas de invasão dos holandeses, o considerado “fundador” do Ceará, depois de conseguir alguma estabilidade na região, foi a Portugal e obteve, em 1619, a carta régia como senhor da capitania do Siará, para onde retornou em 1621, para fixar-se por vários anos, consolidando e fazendo florescer sua capitania. Os holandeses de Pernambuco, que já dominavam a região até o Rio Grande do Norte, em 1644, depois de algumas invasões falhas ao território cearense, sempre derrotados pelos portugueses e pelos índios, que, por muitas vezes, foram aliados em expulsálos, construíram na enseada do Mucuripe, junto ao rio Pajeú, uma fortificação, a qual chamaram Schoonenborch, em homenagem ao governador de Pernambuco. O forte tornou-se centro de atividades militares e dos trabalhos de exploração de minas de prata na serra do Maranguape. Em 1654, no entanto, os holandeses foram expulsos do Brasil pelos portugueses e, assim, entregaram o forte a eles, mudando o nome para Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, o nome que daria origem a futura capital cearense. Nessa fase inicial, o pouco desenvolvimento que houve ficou restrito ao litoral da capitania. Só no final do século XVII, a partir da última década, a sua interiorização ocorreu de fato, se consolidando a partir de uma economia essencialmente pecuarista. Os exploradores que se aventuraram na região descobriram nas áreas de várzea dos rios, terras com características propícias para o desenvolvimento dessa atividade e, lá, se estabeleceram. Foi uma questão de tempo para que seus currais dessem origem às fazendas e que, mais tarde, vilarejos começassem a se conformar em torno delas. O boi virou valiosa moeda de troca na região, garantindo a alimentação e subprodutos baseados no seu couro, como roupa, sapato, chapéu, gibão e perneira. O acúmulo do excedente da carne bovina levou à sua comercialização com locais mais distantes.

Fig. 19. Varal de charque no Ceará. Fonte: IBGE

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Posteriormente, os criadores, que submetiam sua criação às longas jornadas sob o sol escaldantes entre um ponto comercial e outro, encontraram uma forma aproveitar melhor o rendimento da carne do seu gado, ao abatê-lo previamente, para depois salgá-lo e, então, transportá-lo. Eis que surgem as charqueadas. Houve duas frentes de ocupação portuguesa do território cearense: a do sertão-de-fora, controlada por pernambucanos que vinham pelo litoral; e a do sertãode-dentro, dominada por baianos. Graças à pecuária e aos deslocamentos de pessoas das áreas então mais povoadas, praticamente todo o Ceará foi ocupado ao longo do tempo, levando ao nascimento de várias cidades importantes nos cruzamentos das principais estradas utilizadas pelos vaqueiros, como Icó. Ao longo do século XVIII, a principal atividade econômica cearense foi a pecuária, levando muitos historiadores a falarem que o Ceará se transformou em uma “Civilização do Couro”, pois a partir do couro se faziam praticamente todos os objetos necessários à vida do sertanejo através de um rico artesanato. (FARIAS, 2014)

A partir de então, estavam plantadas as sementes que fariam florescer os primeiros centros regionais do território cearense. As vilas de Icó, Sobral e Camocim, são alguns dos exemplos, bem como a principal, Aracati, que teve uma função central no contexto econômico desse período, que surgiram das rotas de comercialização e do escoamento do produto que dominou economia regional ao longo do século XVIII. Em perspectiva histórica, cabe destacar que algumas das principais cidades que atualmente exercem papel de lugar central na rede urbana do Ceará tiveram sua fundação e/ ou elevação à categoria de vila ao longo do século XVIII, em decorrência do desenvolvimento da pecuária extensiva que promoveu a ocupação do interior do que é hoje seu território estadual. Reproduziram-se em terras cearenses as características socioeconômicas da civilização do couro a partir do povoamento às margens dos rios Aracaú (na região ao norte, na parte ocidental do estado) e Jaguaribe, que corta o Ceará de norte a sul, em sua porção oriental. Ao longo do primeiro, destaca-se o município de Sobral; na foz do segundo, Aracati. (ABREU, 1999)

A era do charque se finda depois das secas de 1790 a 1793, que devastaram região e impossibilitaram a continuação da pecuária cearense. Com este evento, a produção do charque decaiu no Ceará e mudou para o Rio Grande do Sul. Portanto, é nesse contexto, com um Ceará voltado para a pecuária e agricultura de subsistência, sem grandes plantações de açúcar, sem ouro ou outras riquezas de seu tempo, em um segundo plano, a capitania atravessou obscuramente esse período que marca sua colonização, dependendo diretamente de outras capitanias como Maranhão, Grão-Pará e Pernambuco. Se em seus primórdios a lógica originária da rede urbana cearense não difere de suas congêneres (nasce como suporte à circulação de excedentes produzidos e reproduzidos sob a hegemonia do capital mercantil), quando comparada, no entanto, aos demais espaços brasileiros e nordestinos em particular, sua rede de cidades se constitui de forma tardia. (MACEDO, JÚNIOR e MORAIS, 2012, p. 72)

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ALGODÃO Em 1799, o rei nomeou o primeiro governador, Bernardo Manuel de Vasconcelos, tornando o Ceará administrativamente independente de Pernambuco. Instalou-se a primeira capital em Aquiraz, que posteriormente foi transferida, em 1810, para Fortaleza. Outras vilas, no entanto, começaram a se formar junto às fazendas e encruzilhadas no interior. Uma das regiões mais prósperas se tornou o Cariri, tendo como centro a vila do Crato, fundada por uma missão franciscana; Icó prosperou como entreposto comercial, entre o Cariri e o litoral; e Aracati era o porto, que ainda exercia forte influência no cenário regional atribuída ao, já decadente, ciclo do charque. Outras cidades nasceram a partir de aldeamentos indígenas, onde os nativos eram confinados sob o controle de jesuítas, responsáveis por sua catequização e aculturação. Este foi o caso de cidades importantes como Caucaia, Crato, Pacajús, Messejana e Parangaba.

Nesse período, início do século XIX, o cultivo do algodão começou a despontar como uma importante atividade econômica, gerando um período de prosperidade para a capitania por um longo período. Foi quando Fortaleza se tornou o maior centro coletor da produção algodoeira interiorana, fato que contribuiu para consolidá-Ia como principal núcleo urbano do Ceará, desbancando Aracati, na segunda metade do século XIX. (Fig. 20 e 21) Ainda que o Ceará tenha sua ocupação territorial iniciada com maior vigor a partir do interior, a exemplo do Piauí e diferente dos demais estados nordestinos, o predomínio litorâneo na rede urbana cearense logo se faria sentir. Fortaleza iniciaria, ainda no século XVIII, seu papel de entreposto comercial, consolidando-se contínua e progressivamente nos subsequentes, em decorrência do avanço de outra atividade estruturadora de seu território que se desenvolveu a partir da segunda metade daquele século e com maior vigor no seguinte: o algodão. (MACEDO, JÚNIOR e MORAIS, 2012, p. 73)

Fig. 20. Colheita de algodão. Fonte: IBGE

Fig. 21. Fábrica têxtil Progresso, Fortaleza-CE. Fonte: fortalezaemfotos.com.br

O ciclo econômico do algodão fez florescer, nesse período, importantes núcleos urbanos no sertão cearense - como, por exemplo, Iguatu, Quixadá, Quixeramobim e Crato, bem como Icó, que consolidou sua vocação como referência na região centro-sul do estado, como entre ponto comercial, o que favoreceu ainda mais o seu desenvolvimento urbano. As ferrovias construídas no século XIX reforçaram a importância desses centros urbanos do interior, assim como a de Fortaleza 61


como o centro de exportação, além de, principalmente, terem dado feições mais estruturadas ao território cearense, de uma forma mais consolidada e duradoura do que as antigas rotas do gado. Essa estrutura, também, deu condições para a inserção do espaço cearense à lógica de acumulação que alinharia com a industrialização brasileira no século seguinte. De certa maneira, nesse período específico, em muito, a história do Ceará se confunde com a história de Fortaleza. A cidade que ia assumindo feições de uma grande metrópole era o polo comercial responsável pela centralização e intermediação da produção algodoeira sertaneja (além de outras mercadorias de menor relevância) para o mercado nacional e internacional. O que fez com que se refletisse uma estruturação territorial, em todo o estado, decorrente do binômio pecuária e algodão, intermediado pela capital mercantil que, também, sediava a função portuária. Além da sua importância econômica, as condições climáticas, a extrema pobreza e a baixa produtividade das cidades interioranas, inseridas em um contexto de forte concentração latifundiária, contribuíram para um aumento significativo da população da capital nos séculos seguinte. A imigração de milhares de retirantes em busca de condições mínimas de sobrevivência na capital era constante e incrementada, principalmente, nos períodos das estiagens que assolavam o sertão. Vale mencionar que um fator de ordem climática - a seca aprofundava a vulnerabilidade do sistema agrário, provocando migrações cujo destino eram os municípios médios marginais à rede ferroviária para, posteriormente, dirigirem-se à Fortaleza. (MACEDO, JÚNIOR e MORAIS, 2012, p. 75)

É no decorrer desse período que Fortaleza começa a se caracterizar por esse perfil macrocefálico que pendura, inclusive, até os dias atuais. As origens do padrão que caracteriza a rede urbana cearense, marcado pela excessiva centralização de sua capital remonta ao assentamento das bases de suporte à circulação do excedente gerado pelo complexo pecuário-algodoeiro. Entretanto, é a partir do avanço da atividade industrial que o intenso crescimento de Fortaleza e, posteriormente, de sua Região Metropolitana, irá delinear os aspectos macrocefálicos que persistem até os dias de hoje. (MACEDO, JÚNIOR e MORAIS, 2012, p. 74)

INDUSTRIALIZAÇÃO I O processo inicial de industrialização do Ceará, que remontam do final do século XIX e início do século XX, teve como base os produtos derivados da sua base primária tradicional, que se sustentava no algodão, na pecuária e em alguns produtos extrativistas oleaginosos. A implementação de unidades de beneficiamento desses produtos ocorreram principalmente em Fortaleza, por conta da privilegiada localização próxima ao porto e das casas de intermediação comercial, o que centralizava, ali, o excedente das atividades coletoras do estado. Ainda que, a partir desse século, se observe o começo de um processo lento de descentralização econômica para fora da capital e da sua região metropolitana, na tentativa de refrear sua concentração excessiva. Instalaram-se estabelecimentos de produção têxtil, óleos vegetais e beneficiamento de couros e peles, indústrias alimentares e de bebidas, prevalecendo nestes empreendimentos o capital de origem local. [...] (AMORA, 2007) 62


De uma maneira geral, nesse primeiro momento, a indústria cearense se caracterizou com uma forte dependência das atividades primárias, baixa competitividade e produção restrita ao escoamento local, tento pouco destaque mesmo no cenário nacional. Só em um momento seguinte, a partir da metade do século XX, meados de 1950, a industrialização do estado aconteceu de uma maneira mais ordenada, se concentrando na capital e nos municípios do seu entorno. O que aconteceu, é que a nível nacional, houve alterações na estrutura do setor industrial ao direcionarem investimentos e recursos para o desenvolvimento de regiões historicamente mais sacrificadas como é o caso do Nordeste, saindo um pouco do eixo Centro-Sul. O que culminou, por exemplo, com a criação do Banco do Nordeste (Fig. 22), com sede em Fortaleza; a criação da Universidade Federal do Ceará; e a transferência da sede do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca - DNOCS (Fig. 23), do Rio de Janeiro para Fortaleza. E ainda nesse sentido, começam os movimentos para a criação da Companhia de Desenvolvimento do Ceará - CODEC, da Superintendência de Desenvolvimento do Ceará - SUDEC e o Banco do Estado do Ceará - BEC, que viria para facilitar o acesso ao crédito e incentivar o investimento para amenizar a ausência de um mercado interno consolidado que assegurasse mais dinamismo à economia e possibilidades de investimento à população. Portanto, uma das características desta fase marcada pela modernização industrial do Ceará foi o alinhamento dos governos estaduais à planificação desenvolvimentista, promovendo a implantação/melhoria de infraestruturas (eletrificação, saneamento básico, abastecimento de água), decisivas não apenas para a acumulação emergente como também para a estruturação dos espaços urbanos. Estas medidas foram particularmente importantes no avanço do crescimento da capital do estado, já que grande parte das realizações ocorreu aí, indicando que a excessiva concentração econômica em Fortaleza não foi resultado apenas das forças de mercado, mas da ação conjunta (e de certa forma coordenada) dos Estados (o nacional e o subnacional). (BERNAL, 2004) Assim, alguns planos foram implementados pelos sucessivos governos estaduais, com prioridade na criação de instrumentos de incentivo à atividade industrial, somando-se ao esforço promovido pela SUDENE. O ápice deste movimento está localizado na década de 1970, quando têm impulso os investimentos do II PND que viabilizaram a implantação do III Pólo Industrial do Nordeste, localizado em Fortaleza. Nele, destacaram-se os setores tradicionais (têxtil, couro e calçados e alimentos) seguindo a particularidade cearense na qual, diferentemente dos casos baiano e pernambucano, observase predomínio do capital local oriundo dos excedentes gerados pela atividade agrário-mercantil, diante do baixo interesse dos capitais do Centro-Sul pelo espaço cearense naquele momento. (AQUINO, 2000)

Nessa sequência, em 1979, esse esforço de industrialização ganhou um novo impulso com a criação da Política de Atração de Investimentos e criação do Fundo de Desenvolvimento Industrial - FDI, que viria a criar estímulos à atração de capitais de fora do estado. Essa etapa da industrialização cearense é vista como bem sucedida e isso se pode comprovar quando se observam as taxas de crescimento desse setor comparadas as de outros estados e à média nacional (ver tabela 01). A Região Metropolitana de Fortaleza - RMF, criada em 1973, agora, exercia um papel central dentro desse contexto onde a economia cearense tinha relevância a nível nacional e, de fato, estava integrada à economia brasileira. 63


TAXA MÉDIA DE CRESCIMENTO ANUAL DO PIB - BRASIL, NORDESTE E CEARÁ POR SUBPERÍODO INDICADO (EM %) Região

1970 - 1980

1980 - 1990

1990 - 1999

1970 - 1999

Ceará

10,8

4,7

4,6

6,8

Nordeste

8,7

3,3

3,0

3,1

Brasil

8,6

1,6

2,7

4,4

Assim, em um cenário com a atividade industrial consolidada, as atividades primárias iniciaram um processo de declínio, enquanto a atividade comercial iniciou um processo de ascensão. O que, aos poucos, viria a dar forma à diferenciada organização e relação regional entre capital e interior. Onde, agora, se observam funções complementares à rede urbana do estado, que é composta por uma metrópole de porte regional, alguns centros médios e uma infinidade de pequenas cidades e vilarejos marcados por um baixo dinamismo e pouco ou, muitas vezes, nenhum atrativo aos investimentos externos.

INDUSTRIZALIZAÇÃO II E TURISMO Já na década de 90 o Ceará, de fato, aderiu ao modelo de modernização do Estado capitalista dando continuidade a reformas administrativas, patrimoniais e financeiras iniciadas por um grupo de empresários com representatividade política ainda na década anterior. Essa postura trouxe uma série de investimentos que estruturaram e modernizaram o setor industrial, o que representou uma nova fase da indústria do estado. Esse período, que teve início em 1987, apresenta-se emblemático para o estado do Ceará, pela capacidade do novo governo em formular e implementar um projeto estadual de crescimento e maior diversificação, com foco na criação de infraestrutura, atração de investimentos e tentativas de espraiamento da atividade econômica para além da Região Metropolitana de Fortaleza. (MACEDO, JÚNIOR e MORAIS, 2012)

O governador Tasso Jereissati, nesse período, adotou um programa de gestão para o setor industrial, chamado “A nova política industrial do Ceará: interiorização do desenvolvimento” baseado nos seguintes frentes: programa de interiorização; programa de promoção industrial; programa mineral; programa de desenvolvimento tecnológico industrial; e projetos especiais. A proposta tinha como meta principal, e ambiciosa, a erradicação da miséria do Ceará através da criação desses postos 64


Fig. 22. Antiga sede do Banco do Nordeste do Brasil - atual Justiça Federal do Ceará. Fig. 23. Sede do DNOCS em Fortaleza. Fonte: guiaarquiteturamodernafortaleza. arquitetura.ufc.br

Tab. 1. Taxa média de Crescimento Anual do PIB Fonte: SUDENE / Agregados Regionais

de trabalho ligados ao setor secundário. Depois, como consequência, o objetivo era desconcentrar a atividade industrial da capital e sua região metropolitana, o que rebateria na mudança dos indicadores sociais de outras áreas do estado e também no fluxo urbano que, necessariamente, convergia para a capital Fortaleza. O programa garantiu uma série de investimentos no estado, motivados polo binômio incentivos fiscais e ampla oferta de mão de obra barata disponível. Ainda na década de 90, outras atividades começaram a despontar e conseguir destaque no cenário econômico do estado. Como é o caso do turismo e do agronegócio. Além do crescimento industrial, a modernização da economia cearense está assentada em mais dois outros vetores que têm rebatimentos importantes sobre a estruturação da rede urbana estadual: o turismo e o agronegócio. O primeiro, com características espacialmente concentradoras na RMF e nas cidades litorâneas; o segundo, de caráter mais interiorizado. (MACEDO, JÚNIOR e MORAIS, 2012)

No caso do turismo, pode-se dizer que é uma atividade que se concentrou quase que na sua totalidade faixa litorânea e que, na contra mão do que objetivava a gestão com outros programas, fermentou a centralidade da região metropolitana de Fortaleza, já que era a área que dispunha de melhor infraestrutura de acesso, hospedagem, transporte e lazer. Já o agronegócio, contribuiu, de fato, para a interiorização das atividades econômicas do estado. [...] os vales úmidos (vales do Jaguaribe e do Acaraú) passam a ser a vitrina do desenvolvimento da fruticultura irrigada, como também as áreas serranas (Baturité e Meruoca) para o cultivo de flores para exportação. Mais recentemente, no final dos anos noventa, a carcinicultura (criação de camarão em cativeiro) nas áreas de mangues e na extensão da planície aluvial do baixo curso do rio Jaguaribe e rio Aracaú, passa a ser a mais nova estratégia de uma artificializarão do espaço agrário cearense, onde ciência, tecnologia e informação. (LIMA, XXXX)

Dessa forma, o Ceará se consolidou como atrativo para o capital nacional e internacional. Alguns centros urbanos diferenciados se destacaram e se consolidaram como polos mesorregionais, ainda que o reconhecimento dessa estrutura não signifique uma descentralização significativa, ainda, da capital. As cidades de Sobral e Tianguá na região norte do estado, a conurbação configurada por Juazeiro do Norte, Barbalha e Crato na região do Cariri, Iguatu na região centro-sul, além das cidades imediatamente periféricas à RMF, como Pentecoste, no Vale do Curú, receberam empresas dos setores de calçados, têxtil e alimentos vindas da região Sul do país. Já, Limoeiro do Norte, na região do Jaguaribe, avançou no ramo da fruticultura irrigada. (Fig. 24 e 25) Os reflexos da reestruturação na economia cearense derivadas das novas políticas e dos movimentos gerais das economias brasileira e mundial são observados nestes deslocamentos, tendo em vista a ênfase na interiorização do desenvolvimento industrial que começa a afetar, ainda que lentamente, a macrocefalia antes referida. No entanto, esse processo se expressa menos na reversão da concentração metropolitana – visto que a RMF recebeu a maior parte dos projetos incentivados – e mais numa lenta diversificação do terciário que surge como exigência da maior conexão dos “espaços eleitos” do interior aos circuitos de valorização do capital. Não por acaso, a participação do interior é crescente nas exportações estaduais. (PONTES, 2010)

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DIVERSIFICAÇÃO DA ECONOMIA O Ceará adentra o século XXI usufruindo das bases administrativas, políticas e econômicas construídas ao longo das décadas de 80 e 90, agora com o incremento das políticas sociais que, com programas de transferência direta de renda, por exemplo, auxiliaram no combate à miséria e à pobreza. O que sugere uma organização diferenciada do seu território que começa a tomar forma - inclusive, até os dias atuais, já que os programas sociais causam um impacto direto na economia local, possibilitam um comercio interno mais forte e diversificado, e, consequentemente, dão à população alguma condição de permanecerem na sua cidade de origem, ao invés de migrarem obrigatoriamente para os centros urbanos já saturados. As políticas de descentralização de serviços públicos, a maior formalização do mercado de trabalho, além dos programas de transferência de renda a partir da segunda metade da década de 1990, e especialmente a partir de 2003, têm impacto importante sobre áreas interioranas. (CANO, 2007)

É essa a conjuntura política, econômica e social que serve de cenário para o Ceará atualmente e, como vem sendo abordado na construção desse capítulo, são justamente as vocações econômicas, as decisões políticas e a disponibilidade de recursos naturais que orientam, com um importante peso, a forma como o território do estado vai sendo ocupado. (Fig. 26 e 27) A descentralização continua sendo entendida como algo necessário para um desenvolvimento mais sustentável, tanto do posto de vista social quanto do ambiental. A capital Fortaleza ainda apresenta um perfil macrocefálico, e ela, junto da sua região metropolitana, continua atraindo a maior parte dos investimentos, ainda que tenha havido, nos últimos anos, iniciativas que descentralizem os investimentos para além do incentivo à criação de indústrias por parte dos governos Estadual e Federal e que refletem algum nível de descentralização, ainda que muito sutil. A construção de escolas técnicas e campi universitários, por exemplo, comprovam essa política de interiorização do investimento, que qualificam a educação local, gerando postos de trabalho e incrementando a economia local através das verbas repassadas pelos governos Estadual e Federal. Os setores de produção estão mais diversificados e tem apresentado números instigantes nos últimos anos, quase sempre com médias de crescimento acima das médias nacionais. Sendo baseados, hoje, principalmente na exportação de calçados de borracha e couro, de 66

Fig. 24. Fábrica da Grendene em Sobral. Fonte: neacontece.blogspot.com

Fig. 25. Fábrica de calçados Paquetá de Pentecoste Fonte: blogdomardem.blogspot.com


couros preparados de bovinos e equinos, além dos produtos alimentícios à base da cultura de arroz, feijão, milho, banana, laranja, coco, caju e melão, entre outros. Atividades, essas, que permeiam várias áreas do território do estado, garantindo a consolidação e o desenvolvimento de diversos centros urbanos que, mesmo quando menos relevantes e mais remotos, estão sob a área de influência de uma cidade mediana, que desempenha um papel de polo regional, como é o caso de Quixadá no Sertão Central, de Juazeiro do Norte no Cariri, de Crateús no Sertão dos Inhamuns e de Sobral na Região Noroeste, ou mesmo de cidades menores, que não tem tanta relevância no cenário estadual, mas que tem um papel importante na sua microrregião, como é o caso de Pentecoste, no Vale do Curú.

4.3. REDE DE CIDADES E SEUS RECORTES SOCIOESPACIAIS É comum que, quando se trata de grandes metrópoles, uma vasta produção acadêmica e científica esteja disponível para embasar estudos dessa mesma área. É, de fato, a metrópole que desperta o interesse da maior parte dos teóricos do urbanismo e um dos motivos, certamente, é de que, aqui no Brasil, estamos vivendo em uma sociedade cada vez mais urbana e, em consequência disso, os conflitos e problemas sociais se acumulam em ambientes como esse. De maneira oposta, quando tratamos de centros menores e menos influentes, a disponibilidade dessa produção cai consideravelmente. É notório, ainda, que quando esses centros tem recursos econômicos limitados e estão em áreas mais remotas, mais distantes dos interesses do grande capital, esse quadro se agrava

Fig. 26. UFC - Campus de Quixadá. Fonte: vidaarteedireitonoticias. blogspot.com.br

Fig. 27. Faculdade de Medicina da UFC - Campus de Sobral

À vista disso, é importante destacar que esse subcapítulo, que constitui um esforço de contextualização do objeto de estudo em um aspecto mais geral, é introduzido pela explanação do conceito básico de redes de cidades, já que esse tema constitui uma forma eficaz de caracterizar uma determinada realidade a partir das semelhanças de centros urbanos, de pequeno e médio porte, como esses e os vínculos estabelecidos entre si. O termo “rede” remete, basicamente, à existência de pontos, que, se relacionam entre si através de conexões que se cruzam em um determinado espaço físico ou conceitual. Uma definição genérica encontrada no dicionário aponta, por exemplo, que:

Fonte: encontrocomsaude.blogspot.com

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Rede s.f. 1 Tecidos de malhas com aberturas regulares; 6 Qualquer trançado de fios de qualquer material; 9 Infraestrutura, conjunto de estradas, de caminhos de ferro, de canais.1 Em um primeiro momento, ao analisar o termo sob a perspectiva das relações humanas, isto é, de um elemento básico da estruturação da sociedade, Asher (2010, pág. 46) diz que a sociedade é estruturada e funciona como uma rede, ou, melhor, como uma série de redes interligadas que asseguram uma mobilidade acrescida às pessoas, aos bens e à informação. Em uma observação mais aprofundada, Santos (1997), apesar de considerar que as definições e conceituações sobre redes se multiplicam, aborda este conceito sob duas grandes matrizes: a que leva em consideração as realidades material e social. A rede observada sob o aspecto material refere-se à infraestrutura que permite o transporte de matéria, energia ou informação, enquanto que a rede analisada a partir de uma perspectiva social refere-se às pessoas e seus valores que se utilizam desta infraestrutura. Dias (1995), ao relacionar o seu significado com o fenômeno da urbanização, diz que “o termo rede não é recente, tão pouco a preocupação de compreender seus efeitos sobre o território”. Portanto, não é nova a importância dada a essa análise que estuda a relação entre cidades a partir de uma rede de interações com seus diversos desdobramentos. Nesse sentido, a abordagem desse conceito no âmbito das cidades é, antes de mais nada, a adequação do seu significado básico, que consiste no estabelecimento de interações diversas, à escala regional em suas diversas esferas (municipal, estadual e nacional). O município elencado para o estudo, por exemplo, configura, dentre outras redes, uma com outros centros urbanos daquela mesma região, com quem estabelece relações comerciais, culturais e políticas “de igual para igual”. Essa rede, porém, se encontra marginalizada em relação às outras conformadas por centros mais relevantes, que possuem uma dinâmica mais complexa. As redes urbanas tradicionais do Nordeste, comandadas por capitais estaduais que concentram, com poucos centros intermediários, a oferta de equipamentos e serviços, exercem forte polarização em suas áreas e reproduzem, em escala menor, a continuidade espacial e o adensamento físico do fenômeno urbano encontrado nas maiores aglomerações do país. Estas redes apresentam duas dinâmicas distintas, a do Litoral com Fortaleza, Recife e Salvador, subordinando diretamente os centros de hierarquia inferior e a do interior como Juazeiro do Norte-Crato-Barbalha, Mossoró, Campina Grande, Caruarú, Juazeiro-Petrolina, Feira de Santana, Ilhéus e Vitória da Conquista. (O’NEILL, 2008)

No entanto, tem ocorrido uma ampliação da importância das redes relacionadas aos centros intermediários, que possuem influência a um nível de subregião. Sobre isso, CORRÊA (1999) diz que “um traço contemporâneo da rede urbana brasileira é a refuncionalização pela qual centros intermediários assimilam novas funções, antes restritas aos centros de maior hierarquia”. O que indica, portanto, uma diversificação da hierarquização desses polos de influência, no sentido de incluir centros menores.

1  Dicionário Michaelis – Dicionário online de português UOL http://michaelis.uol. com.br/ 68


A rede urbana se torna mais complexa com um maior número de centros garantindo os fluxos que viabilizam a produção e a reprodução social. Neste contexto, a diferenciação hierárquica passa a ser medida muito mais pela intensidade dos relacionamentos entre os lugares do que pela presença de funções sofisticadas. (O’NEILL, 2008)

Esses centros são bem caracterizados quando Beatriz Soares e Nágela Aparecida de Melo (2009, p. 36) colocam que, em síntese, as pequenas cidades no Brasil, entendidas enquanto espacialidades que compõem a totalidade do espaço brasileiro, na condição de partes integrantes e interagentes, são marcadas pela diversidade. Tal característica pode ser entendida a partir do contexto regional em que estão inseridas, pelos processos promotores de sua gênese, bem como no conjunto de sua formação espacial. (Fig. 28 a 33) As cidades pequenas da região semiárida do Nordeste tem algumas similaridades marcantes estabelecida pela forte relação entre o campo e a cidade que se revela na economia do município, onde a agricultura e a pecuária constituem atividades econômicas de destaque, seguidas da incipiente oferta de serviços e ainda de um comércio restrito, especialmente naquelas de menor contingente populacional. Vale acrescentar, inclusive, que parte da economia dos municípios cujas sedes apresentam contingente populacional inferior a 20 mil habitantes provém da gestão da economia rural ou de recursos da União. Enquanto em cidades maiores, com uma população acima de 50 mil habitantes, ditas de médio porte, tanto os serviços quanto os comércios são mais diversificados, o que lhes confere um status de maior centralidade. A economia frágil é uma característica das cidades pequenas e estas dependem quase que exclusivamente apenas dos recursos oriundos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). (SILVA, 2009)

É prognosticado que essas cidades, por historicamente disporem de poucos recursos, ofertem um serviço público precário aos seus cidadãos. Logo, as práticas associadas a uma cultura de planejamento urbano não fogem à regra e são quase inexistentes. O que se constata, em recortes espaciais de núcleos como esses, com a produção predominante de espaços precários e algumas raras intervenções pontuais ligeiramente mais qualificadas. É interessante observar que a paisagem urbana edificada desses centros urbanos, independente das suas características naturais locais, produzem um modelo de cidade que se assemelha em vários aspectos a partir das técnicas de construção empregadas na construção dos seus prédios e da sua forma de urbanização empírica, como mostram as fotos na página a seguir. O próprio Estatuto da Cidade define a obrigatoriedade dos centros com mais de 20 mil habitantes formularem e atualizarem seus planos diretores, negando seu o período de formação e crescimento inicial. O que os distancia da efetivação de políticas urbanas mais consistentes. O ideal é que essa situação fosse revertida e, para além da importância de um planejamento urbano que considere as demandas locais de forma mais direta, se desse a devida atenção às relações que se desenvolvem com os centros urbanos vizinhos, que acontecem, principalmente, através de prestação de serviços públicos, operações comerciais e fluxo de atividades culturais. Em um contexto marginalização como a desses centros, é uma postura que fortalece a dinâmica intermunicipal e sedimenta, por exemplo, a cultura da construção de cidades menos informais, que garantem mais direitos aos seus cidadãos.

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Fig. 28. Quixadá. Fonte: wikipedia.com

Fig. 29. Pentecoste. Fonte: mapio.net

Fig. 30. Santa Quitéria. Fonte: wikipedia.com


Fig. 31. Canindé. Fonte: wikipedia.com

Fig. 32. Crato. Fonte: bahia.ws

Fig. 33. Apuiarés. Fonte: Prefeitura de Apuiarés


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O MUNICÍPIO DE PENTECOSTE

// DE BARRA DA CONCEIÇÃO À TERRA DO PEIXE



O MUNICÍPIO DE PENTECOSTE // DE BARRA DA CONCEIÇÃO À TERRA DO PEIXE

O presente capítulo trata de um grau de contextualização mais específico, que tem como objeto principal a sede municipal de Pentecoste. Em uma abordagem que, também, trata dos aspectos físicos a partir de uma caracterização espacial geográfica do seu território e analisa o processo de ocupação do seu núcleo urbano, em uma perspectiva histórica, relacionando sua formação às atividades econômicas predominantes em períodos específicos.

5.1. CARACTERIZAÇÃO DO TERRITÓRIO DO MUNICÍPIO O município de Pentecoste, situado ao norte do estado do Ceará, na mesorregião Norte e microrregião do Médio Curú, possui uma população de, aproximadamente, 35 mil habitantes, segundo os dados do SENSO 2010 realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), distribuídos ao longo dos seus quase 1.400km² de área. O seu território está dividido em quatro sub-regiões: Sede, Porfírio Sampaio, Sebastião de Abreu e Matias, sendo a Sede o núcleo mais habitado e urbanizado - com, aproximadamente, 20.000 habitantes. Os seus municípios limítrofes são, ao norte, São Gonçalo do Amarante, São Luís do Curú e Umirim; ao sul, Caridade; ao leste, Caucaia e Maranguape; e, ao oeste, Apuiarés e Itapajé. (Mapa 2) A formação geomorfológica predominante na sua extensão é a depressão sertaneja, complementada por uma mancha de tabuleiro ao norte do município e pela planície fluvial ao longo do percurso dos rios e riachos que a permeiam; estando situado, portanto, na Bacia Hidrográfica do Rio Curú, tem seus corpos hídricos definidos pelo fluxo sazonal característico da região; o clima é o tropical quente semiárido na maioria da sua área e tropical quente subúmido no seu extremo sul, nas proximidades do Maciço de Baturité; a vegetação predominante é a caatinga, que pode assumir uma forma mais arbórea nas zonas mais férteis. O município possui uma das maiores reservas hídricas do estado, o Açude Pereira de Miranda, com uma capacidade de armazenamento de 74

GORAYEB, 2005


Mapa 2. MunicĂ­pio de Pentecoste. Fonte: IPECE


395.638.000m³, que foi construído pelo DNOCS1, entre 1950 e 1957, no leito do Rio Canindé. A barragem tem como objetivo o controle das cheias do rio Canindé, a regularização do rio Curú, a irrigação das terras de jusante, a geração de energia elétrica, a piscicultura e o aproveitamento para culturas diversas nas áreas de montante.

5.2. SÍNTESE HISTÓRICA: SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DA CIDADE Por volta de 1862, no perímetro da fazenda Barrinha, situada na vasta campina que permeava a barra dos rios Curú e Canindé começaram a se fixar pessoas que buscavam as terras irrigadas às margens dos rios para praticar atividades de subexistência como agricultura e pecuária, além da pesca. Não demorou muito para que, em 1864, os moradores do pequeno vilarejo, já conhecido como Barra da Conceição, erguessem uma pequena capela em devoção a Nossa Senhora da Conceição e celebrasse, naquele mesmo ano, a sua missa inaugural, na área onde, hoje, se localiza a sede do município de Pentecoste. Os moradores, liderados por mestre Bernardino Gomes Bezerra, lançaram a pedra fundamental para construção de uma capela dedicada ao culto de Nossa Senhora da Conceição. Achando-se a povoação colocada a poucos metros da junção dos rios Canindé e Curú, deram-lhe o nome de Barra da Conceição. Rezou-se a primeira missa naquelas paragens, no domingo de Pentecoste de 1864, o Padre Manuel Lima. (ZUZA, 2013)

Em 1869, quando o arraial já apresentava uma quantidade considerável de casas de tijolos construídas, alguns cidadãos, interpretando a vontade dos demais moradores, foram ao encontro das autoridades representantes da Província de Canindé para discutir a elevação do povoado à condição de Freguesia. (Fig. 34) O distrito foi criado com a denominação de Pentecoste, que faz alusão à data do calendário cristão, na qual ocorreu a celebração da primeira missa, pela lei provincial ou Resolução Provincial nº 1283, de 1869. (IBGE)

1  DNOCS. 2. D.R. Arquivo Técnico. Processos do Açude Público Pereira de Miranda S.n.t.

Fig. 34. Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição após a primeira reforma Fonte: Prefeitura de Pentecoste

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Já alguns anos depois viria a ser elevado à categoria de Vila, se desmembrando de Canindé pela Lei Provincial nº 1542, de 1873. A vigência dessa lei foi suprimida e restaurada diversas vezes e, durante esse tempo, o vilarejo foi anexado e desmembrado configurando distintos arranjos territorial-administrativos com outras freguesias da região até que, em 1935, a lei foi de fato restaurada pelo decreto nº 1540, o que garantiu sua a condição de Vila. Ainda que, pouco tempo depois, em 1938, a proclamada Vila viesse a ser elevada à categoria de Município definitivamente. Nos anos seguintes, a sua subdivisão também assumiria diversas configurações até que, em 1964, através da lei estadual nº 7852, alcançaria a conformação atual, dividida em quatro subrregiões: Sede, Porfírio Sampaio, Sebastião de Abreu e Matias. A segmentação do território em sesmarias e freguesias, ou seja, a sua ocupação por indivíduos de etnias de origem caucasiana, ocorreu de forma mais efetiva a partir do período descrito anteriormente, de meados do século XIX. Até então, a área da bacia do Curú era ocupada predominantemente por índios das etnias anassé, apuiaré e tapuia. Durante esse período, a atividade econômica no Ceará já estava mais consolidada e diversificada do que nos dois séculos anteriores que remontam da sua colonização, ainda que não tivesse pouca expressão no cenário nacional, o ciclo econômico do algodão estava em alta e gerava dividendos para o estado. Na dinâmica econômica do Vale do Curú se reproduzia a vocação econômica do estado, no caso, primária, com base na agronomia e na pecuária. As regiões das bacias hidrográficas do Jaguaribe e do Acaraú foram os primeiros pontos de colonização do Estado do Ceará, ocupados através da expansão pecuária. Na bacia do Curú, além da pecuária, a ocupação deu-se, principalmente, pela expansão das divisas agrícolas. Posteriormente, essa ocupação foi intensificada pela operacionalização de obras de infraestrutura hídrica, como açudes e projetos de irrigação. (GORAYEB, 2005)

A agropecuária sempre se configurou como uma atividade importante para o município. As políticas governamentais cada vez mais estruturantes, ao longo dos séculos XX e XXI, deram condições para o desenvolvimento e especialização do trabalho no campo, seja para a agricultura familiar, seja para o agronegócio. Hoje o município tem como principais produtos o milho, o coco, a banana e o caju, além de uma posição relevante na criação de gado bovino na região. A construção do açude Pereira de Miranda, na década de 50 (Fig. 35 a 37), é um marco no processo de desenvolvimento do município. Sua instalação garantiu o fornecimento de infraestrutura urbana básica como sistema de abastecimento de água e energia elétrica para a sede urbana do município, além de uma infraestrutura mais especializada como a construção de canais de irrigação que permeavam uma parte do território do município. Essa estrutura de canais, que a princípio era privada, foi incorporada a um projeto do governo, no qual lançaria as bases para o desenvolvimento ambicioso da agricultura irrigada nos anos seguintes. Desde as décadas de 1950 e 1960, já existiam canais de irrigação particulares em Pentecoste, mas foi somente na década de 1970 que o Governo Federal, através do DNOCS, investiu no sistema, denominando-o “Perímetro Irrigado Curú-Recuperação”. Os serviços de administração, operação e manutenção da infraestrutura de uso comum foram iniciados em 1975 (DNOCS, 2004). (GORAYEB, 2005)

Portanto, a criação do escritório do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS) em Pentecoste trouxe investimentos diretos 77


Fig. 35. Construção do Açude Pereira de Miranda. Fonte: DNOCS

Fig. 36. Dia simbólico da inauguração do Açude Pereira de Miranda com a presença do presidente JK. Fonte: DNOCS

Fig. 37. Máquinas e homens que trabalharam na construção do açude. Fonte: DNOCS

por parte do Estado. O que se caracteriza com a criação de postos de trabalhos formais e fornecimento de infraestrutura urbana, que, associados às atividades informais relacionadas à instalação do açude, fortaleceram a economia local e atribuíram um novo perfil a cidade. Ainda nesse sentido, a construção do açude possibilitou, também, o desenvolvimento da pesca continental. Quando, a partir de então, o município passou a ser reconhecido gradativamente como a “Terra do Peixe”. Uma designação que remete a sua larga produção de alevinos e à exportação de tecnologia de desenvolvimento de criatórios, através do Centro de Pesquisa Ictiológica (Fig. 38), um dos maiores da América Latina. Ambos, tanto o açude, quanto o centro de pesquisas, se tornaram símbolos da cidade. Já a atividade secundária começou a tomar forma, no município, com a implantação da fábrica Paquetá Calçados. A indústria, que é originária do Rio Grande do Sul, veio para o Ceará naquele contexto de incentivos fiscais e procura por mão de obra barata em cidades que margeavam a RMF, do governo Tasso Jereissati, na década de 90, e se instalou na sede do município chegando a criar 2.000 postos de trabalho diretos além de, mais tarde, outros 300 postos terem sido criados em um anexo da fábrica na Serrota, um aglomerado urbano da sub-região de Porfírio Sampaio, ambas, com uma produção inteiramente voltada para o mercado exterior. Em um segundo patamar, está a KM Cacau Indústria e Companhia de Laticínios LTDA, fundada no final da década de 90 por um empresário cearense de Caucaia, que gera cerca de 30 postos diretos de emprego, e abastece a região com leite de vaca empacotado, além de produtos como manteiga, creme de leite, bebida láctea, entre outros. 78


Fig. 38. Açude Pereira de Miranda e a região do Centro de Pesquisas Ictiológicas. Fonte: DNOCS

A atividade terciaria permeou, inevitavelmente, todo o processo de expansão da cidade. Ainda que, inicialmente, de uma maneira informal e com estabelecimentos de pequeno porte voltados para necessidades mais básicas da população, como alimentação e vestimenta. A partir de então, o comércio foi se desenvolvendo, conforme a cidade foi crescendo. Nas últimas décadas, portanto, o comércio tem crescido e se diversificado bastante para atender à demanda de consumo da população. Uma quantidade considerável de estabelecimentos de pequeno e médio porte tem surgido, desde lojas de variedades a mercadinhos, permeando a extensão das principais avenidas e mudando o seu perfil de uso e ocupação. A feira semanal, que ocorre aos sábados, nas intermediações da do Centro de Abastecimento (Mercado) (Fig. 39) é um aspecto da atividade terciaria que vale destacar, pois é um evento bastante diversificado e que atinge, cada vez mais, proporções maiores, atraindo pessoas de toda região e dinamizando a economia local. Além do que, representa um símbolo importante da cultura popular local. Diante disso, para compreensão das questões que constituem o cenário urbano atual do município, devem-se considerar também as políticas de distribuição de renda, como o Bolsa Família, associadas, principalmente, ao governo do Partido dos Trabalhados (PT), a partir de 2002, que favoreceram as cidades como Pentecoste. Segundo um levantamento do IBGE, em outubro de 2013, o programa ultrapassou a número de 5.500 famílias beneficiadas no município, o que gera um impacto de quase 7,5 milhões de reais mensais no seu produto interno, o que fermenta sua economia, criando condições propícias para a inclusão e o desenvolvimento social em diversos setores.

Fig. 39. Inauguração do Mercado Público de Pentecoste em 1971. Fonte: Prefeitura de Pentecoste

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5.3. EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO DO NÚCLEO URBANO DE PENTECOSTE 01. 1864 - Pedra fundamental da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, onde, mais tarde, é celebrada a primeira missa (com a capela apenas começada) e quando o povoado começa a tomar forma; 02. 1869 - O povoado é elevado da categoria de Povoação à Freguesia; 03. 1873 - Construção do Cemitério; 04. 1878 - Construção da Cadeia Velha; 05. 1878 - Construção Câmara ocupada pela Comissão de Socorros; 06. 1878 - Construção da estrada que ligava à Vila de São Francisco (Itapajé); 07. 1879 - Construção do Posto de Saúde no Sítio Raposa; 08. 1950 - Escola Francisco Sá; 09. 1951 - Acampamento do Açude Pereira de Miranda; 10. 1954 - Grupo Escolar de Pentecoste (Escola Tabelião Francisco Alves); 11. 1957 - Açude Pereira de Miranda; 12. 1963 - Centro Educacional João XXIII; 13. 1971 - Centro de Abastecimento (Mercado Público); 14. 1974 - Hospital Maternidade Regional Vale do Curú; 15. 1982 - Conjunto Habitacional (COHAB) Santa Inês; 16. 1982 - Rádio Difusora Vale do Curú; 17. 1997 - Fábrica de Calçados Paquetá.

Mapa 3. Ocupação do Município de Pentecoste. Fonte: Elaborado pelo autor

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EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO DO CENTRO URBANO 1864 - 1878 (Pedra fundamental da Capela N. Sra. da Conceição) 1878 - 1957 (Construção da Câmara) 1957 - 1996 (Construção do Açude) 1996 - Atualmente (Instalação da Fábrica Paquetá Calçados)

06 15

03

05

02

01 04

12

17

10 13 14 15 09

07 08

11


06

DIAGNÓSTICO

// PERÍMETRO DE ESTUDO DA SEDE DO MUNICÍPIO DE PENTECOSTE



DIAGNÓSTICO // PERÍMETRO DE ESTUDO DA SEDE DO MUNICÍPIO DE PENTECOSTE

RECORTE ESPACIAL A área adotada para estudo corresponde à zona urbana da sede do município de Pentecoste, com exclusão do bairro Ombreiras, que fica para além da barragem do Açude Pereira de Miranda, ao sul. A opção por trabalhar com esse recorte advém da sua continuidade e da possibilidade apreensão da paisagem e da forma urbana pelos seus habitantes, através dessa escala. Nesse sentido, ao avaliar a qualidade do seu sistema de espaços livres, entendido, basicamente, entendidos principalmente pelos subsistemas de áreas livres de lazer, mobilidade e acessibilidade, optou-se, então, por esse perímetro onde pulsa, mais vibrante, a vida urbana do município, atingindo, diretamente e indiretamente um número relevante de usuários.

Mapa 4. Perímetro urbano e recorte espacial. Fonte: Elaborado pelo autor

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Açude Pereira de Miranda

PENTECOSTE

Sede Urbana do Município Recorte Espacial Área: 5km População: 18.830 hab Fonte: IBGE 2010


BAIRROS A zona de estudo abrange a extensão de cinco bairros. São eles: Centro, Planalto, Acampamento, Pedreira e XV de Novembro. Como a Prefeitura Municipal não possui um setor de planejamento urbano nas suas dependências ou mesmo um plano diretor finalizado com um zoneamento definido, essa divisão foi produzida pelo Setor Tributário, atendendo aos critérios desse domínio específico. O que se configura como problemático, já que essa é a única divisão técnica encontrada nos órgãos do poder municipal, não correspondendo, portanto, às questões essenciais das demais áreas da administração pública. Mapa 5. Bairros. Fonte: Elaborado pelo autor

4 1

5 3 2

BAIRROS 1

Centro

4

Pedreira

2

Planalto

5

XV de Novembro

3

Acampamento


Essa divisão não corresponde, necessariamente, a uma leitura que traduza as especificidades das partes da cidade ou a percepção dos seus habitantes em relação ao espaço em que vivem. Alguns nichos que permeiam todo esse perímetro urbano, colocados aqui como unidade de vizinhança, estão definidos no imaginário popular e acabam por referenciar a leitura da cidade, tomando para si, muitas vezes, a importância de um bairro, por exemplo. No caso, foi realizada uma entrevista com moradores tradicionais da cidade1, que ajudaram a formular a delimitação aproximada dessas porções territoriais. Elas refletem diversas variantes do processo de urbanização da cidade, como a forma e o período de ocupação, a adaptação aos aspectos naturais locais, além das transformações ocorridas ao longo da sua estruturação, quando são incorporadas novas funções e características sócio-espaciais as suas diferentes áreas.

Mapa 6. Unidades de vizinhança. Fonte: Elaborado pelo autor

1  Julieta Braga de Azevedo e Zélia Maria Pessoa Sales.

4 3

9

1

8

7

2

10 5

11

6

UNIDADES DE VIZINHANÇA 1

Matriz

4

Pedreira de Cima

7

Ipaze

10 Itamaraty

2

Mercado

5

Ruela

8

Barreiros

11 XV de Novembro

3

Pedreira de Baixo

6

Acampamento

9

Conjunto Santa Inês


CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA A área do município de Pentecoste abrange 57 setores censitários, estando 26 englobadas no perímetro de estudo. A divisão desses setores é feita a partir de fatores que, invariavelmente, seguem uma lógica sistemática de levantamento e organização de dados. Logo, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Setor Censitário é unidade territorial de coleta das operações censitárias, definido pelo instituto, com limites físicos identificados, em áreas contínuas e respeitando a divisão político-administrativa do Brasil. As definições territoriais das áreas de abrangência têm sido estabelecidas com base nos setores censitários definidos pelo IBGE, sendo constituídas por um agrupamento de setores contíguos, respeitando-se os seus limites. A definição dos setores censitários que formam uma determinada área é feita através de avaliação pelas equipes locais e distritais, considerando a demanda atendida, o perfil epidemiológico da região, o acesso à unidade de saúde, a existência de barreiras geográficas, o tamanho populacional, o fluxo de transporte etc. (IBGE, 2002)

A partir de então, algumas informações foram consideradas:

DENSIDADE A densidade demográfica desse recorte espacial se configura como razoável, com um número aproximado de 3.950 habitantes para cada quilometro quadrado. Vale ressaltar que esse valor está circunscrito à área urbanizada da sede do município, que se configura como sua porção territorial mais povoada e densa. Se considerasse os outros pequenos núcleos urbanos e a sua extensa zona rural, esse número cairia vertiginosamente. Uma característica que acaba por se reproduzir em outros núcleos urbanos da sua mesma região, por exemplo, que se assemelham pelo seu processo de formação, além do porte reduzido e presença de baixos indicadores sociais. Em geral, a suas formas de ocupação do território apresenta uma predominância de residências unifamiliares, em detrimento da irrisória quantidade de multifamiliares; uma incidência razoável de vazios urbanos, principalmente nas áreas mais periféricas, menos consolidadas; com presença pontual de aglomerados urbanos, em contra ponto, que também estão associados à população periférica, porém incrementando os dados de densidade.

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DENSIDADE (hab./km²) 9.000 - 12.000 6.000 - 9.000 3.000 - 6.000 0 - 3.000

Mapa 7. Densidade. Fonte: Elaborado pelo autor

RENDA Para analisar essa variante, recorreu-se basicamente ao dado rendimento médio mensal por pessoas responsáveis por domicílios particulares permanentes (com e sem rendimento), da base de dados do IBGE. Para que essa informação traduza a realidade de uma maneira mais leal, é importante estar atento ao fato de que o perímetro estudo tem um perfil homogêneo, portanto, o que ocorre é que a espacialização desses “valores médios” pelos setores censitários, por vezes, pode ser generalizadora. A renda média da sua população é de aproximadamente 670,00 reais, uma quantia razoavelmente menor do que o salário mínimo, que em 2016, está avaliado em 880,00 reais. Esse é um dado importante que revela um aspecto muito elementar da economia local, denunciando o nível de precariedade a que sua população está exposta. Mesmo nas áreas mais consolidadas, associadas às famílias mais abastardas, a renda média não chega a ultrapassar os 3 salários mínimos. O que não se configura, propriamente, como uma situação de precariedade total, já que essas mesmas famílias concentram uma parte razoável do capital, enquanto as famílias carentes permeiam todo o espaço urbano, sem restrições.

RENDA MÉDIA (SM) mais que 1,5 1 - 1,5 0,5 - 1 menos que 0,5

Mapa 8. Renda Média. Fonte: Elaborado pelo autor

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INFRAESTRUTURA BÁSICA DOMICILIAR Os dados de infraestrutura domiciliar revelam como se especializam esses indicadores sociais, de uma maneira geral, já que as áreas mais consolidadas estão associadas a uma rede mais ampla de infraestrutura, enquanto às áreas menos consolidadas à negação desse recurso básico. Como o acesso à rede de água e energia elétrica atendem à, praticamente, toda totalidade do perímetro de estudo, optou por espacializar outros aspectos, como o acesso à rede de esgoto e a coleta de lixo, da oferta de infraestrutura básica associada aos domicílios.

ACESSO À REDE DE ESGOTO (%) 80 - 100 50 - 80 20 - 50 0 - 20

Mapa 9. Acesso à rede geral de esgoto. Fonte: Elaborado pelo autor

COLETA DE LIXO (%) 100 95 - 100 90 - 95

Mapa 10. Coleta de lixo. Fonte: Elaborado pelo autor

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INFRAESTRUTURA BÁSICA DO ENTORNO A espacialização dos dados de infraestrutura básica do entorno contribui, da mesma forma, para a análise do espaço urbano, porém, em sua dimensão pública, já que dizem respeito à esfera do ambiente urbano comunitário. O que amplia a possibilidade de compreensão do rebatimento dos indicadores sociais na construção do espaço urbano, entre outros aspectos.

ILUMINAÇÃO PÚBLICA (%) 100 95 - 100 90 - 95

Foi pesquisado se na face em trabalho ou na sua face confrontante, existia pelo menos um ponto fixo (poste) de iluminação pública.

Mapa 11. Iluminação pública. Fonte: Elaborado pelo autor

PASSEIO (%) 80 - 100 50 - 75 20 - 50 0 - 20

Pesquisou-se se, somente na face, existia alçada/passeio, ou seja, caminho calçado ou pavimentado, destinado à circulação de pedestres, quase sempre mais alto que a parte do logradouro em que trafegam os veículos.

Mapa 12. Passeio. Fonte: Elaborado pelo autor

ARBORIZAÇÃO (%)

Foi pesquisado se na face ou na sua face confrontante ou no canteiro central existia arborização, ou seja, existia árvore ao longo do calçada/passeio e/ou em canteiro que divida pistas de um mesmo logradouro, mesmo que apenas em parte. Considerou-se também a arborização quando existente em logradouros sem pavimentação e/ou sem calçada/passeio.

100 90 - 100 80 - 90

Mapa 13. Arborização. Fonte: Elaborado pelo autor

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USOS O mapeamento dos usos do solo é feito no sentido de reconhecer os resultados das dinâmicas estabelecidas na escala da vivência urbana. É uma prática que auxilia na compreensão da distribuição dos diversos usos ao longo do território urbano, dos vetores de expansão da cidade e do grau de consolidação associado à cada área, bem como outras questões que auxiliam no planejamento da cidade. O processo histórico de ocupação da zona urbana é, também, uma ferramenta fundamental para compreender a caracterização atual dos seus usos do solo. Especialmente quando se trata de cidades como Pentecoste, onde não se pode recorrer aos órgãos públicos para buscar documentos que auxiliem na construção dessa análise, pelo fato delas não possuírem uma cultura de planejamento urbano. O uso residencial está presente em toda extensão do território urbano. No entanto, as áreas centrais, associadas às porções mais consolidadas do território, são onde se encontram os elementos com características que mais se aproximam do perfil de uma cidade “formal”. Já que possuem residências razoáveis; lotes regulares; infraestrutura básica como rede de água, luz e esgoto; uma estrutura viária mais elaborada e espaços públicos minimamente estruturados. O que contrasta com as áreas mais periféricas da cidade, que estão associadas às áreas menos consolidadas, que possuem residências mais humildes ocorrendo, inclusive, incidência de casas de taipo; lotes genéricos; um ambiente urbano precário, onde predominam as vielas mais orgânicas, com passeios inadequados e a quase inexistência de espaços livres tratados. A área do Mercado, como é conhecida a zona comercial mais expressiva da cidade, foi um dos principais vetores de expansão daquele núcleo original, quando, inicialmente, demonstrou sua vocação para o comércio como um ponto de pequenas feiras e trocas. A consolidação da sua atividade foi definitiva a partir do ano de 1971, quando foi finalizada construção do Centro de Abastecimento. Hoje, a sua área de influência imediata abrange cerca de 9 quarteirões, no bairro Centro, abrigando, predominantemente, os usos mistos e comerciais. Além de eventos populares como a Feira de Pentecoste, que acontece aos sábados, e serviços importantes como o Banco do Brasil, as Lotéricas e os Correios. É, portanto, uma zona consolidada, que cumpre sua função com primazia se estabelecendo como a região comercial mais pujante do município, dando pouca margem, inclusive, para o surgimento de outras centralidades com a mesma expressão em outras localidades.

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Mapa 14. Uso e Ocupação do Solo. Fonte: Elaborado pelo autor


USO E OCUPAÇÃO Residencial Misto Comercial / Serviços Industrial Institucional Saúde Educação Vazios Urbanos Áreas Livres de Lazer Áreas Vegetadas Hidrografia


O uso comercial se expande, justamente, a partir dessa região do Mercado, ocorrendo com mais frequência ao longo de algumas vias mais movimentas que estruturam a cidade. No mais, alguns estabelecimentos de pequeno porte surgem para atender à demanda cotidiana local, a nível de vizinhança, por toda extensão da sua zona urbana. É muito comum que atividades como essas surjam como um “puxadinho”, se enquadrando no uso misto, porém, muitas vezes, em uma situação estritamente informal. Para evitar a cobrança de impostos sobre o estabelecimento, muitos comerciantes optam por manter suas atividades dentro da própria casa. O uso institucional constituiu, também, esse núcleo originário da cidade, ocorrendo com as funções públicas básicas que estruturavam a sociedade à época do seu surgimento, como Casa de Câmara e Cadeia ou como a Prefeitura Municipal, por exemplo. Igualmente, conforme houve a expansão desse núcleo, houve a distribuição das instituições necessárias à população ao longo do seu território, no sentido de consolidar os novos vetores de expansão da cidade e democratizar o acesso aos serviços públicos em geral. Já os vazios urbanos, como foi colocado na caracterização da densidade demográfica, estão associados às áreas periféricas, no caso, as menos consolidadas do contexto urbano. Ocorrendo de forma pontual nas áreas mais centrais, na figura, principalmente, de grandes terrenos pertencentes ao poder público ou instituições religiosas.

USO E OCUPAÇÃO Vazios Urbanos Áreas Vegetadas

Mapa 15. Vazios Urbanos. Fonte: Elaborado pelo autor

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// FEIRA DE PENTECOSTE A Feira de Pentecoste conta com a atividade de aproximadamente 230 feirantes fixos cadastrados pelo município, além dos temporários, que tem se multiplicado ano após ano com o incremento da economia local, além dos comércios estabelecidos nos pontos fixos. O evento, que acontece nas manhãs de sábado, ocupa a caixa de rolamento e uma parte dos passeios de algumas ruas nas proximidades do Centro de Abastecimento (Mercado). Onde são comercializados, principalmente, os alimentos básicos fornecidos pelos agricultores, pecuaristas e pescadores da região; os produtos de couro manufaturados que também são feitos por produtores da região; e as roupas adquiridas nos feirões populares do Centro de Fortaleza; além do comercio de produtos importados de menor qualidade como brinquedos, eletrônicos portáteis e acessórios em geral. O público que vai à feira é bastante diversificado. O evento acaba por atrair pessoa de todas as classes sociais, faixas etárias, gêneros e regiões, sem restrições, que, além irem para adquirir mercadorias e produtos, vão para utilizar o espaço como ponto de convívio e socialização. O número de visitantes é alto, o que torna o ambiente um tanto caótico. É elevado o fluxo de pedestres entre as barracas e os galpões, remontando, de fato, da atmosfera típica de feiras populares; além do que a crescente quantidade de vendedores ambulantes ocupando os passeios tem comprometido a qualidade de circulação dos transeuntes; as motocicletas, os carros e os transportes coletivos em geral (na figura dos paus-de-arara, vans e ônibus), que trazem pessoas de outras localidades e municípios, se amontoam no leito carroçável da rua ao estacionarem de forma desordenada nas intermediações da feira, não sendo raras as vezes em que estão estacionados, também, sobre o passeio. Portanto, apesar de representar um evento de importância indiscutível para a economia e para a cultura popular local, a feira acaba por produzir um ambiente caótico e insalubre, associado aos conflitos criados pelos seus usuários ao utilizar o espaço público, que comprometem a acessibilidade, a segurança e a funcionalidade dos seus serviços. É atribuição do município buscar meios que amenizem esses conflitos e garantam o pleno funcionamento da feira em um ambiente adequado, seja por meio de uma legislação que estabeleça parâmetros de utilização daquele espaço ou por meio de intervenções que traduzam e organizem as demandas que surgem naquele contexto.


Fig. 40. Feira de Pentecoste. Fig. 41. Feira de Pentecoste. Fig. 42. Feira de Pentecoste. Fonte: Acervo do autor


Fig. 43. Feira de Pentecoste. Fig. 44. Feira de Pentecoste. Fig. 45. Feira de Pentecoste. Fonte: Acervo do autor


SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES O sistema de espaços livres públicos do perímetro de estudo na sede urbana de Pentecoste se constitui principalmente pelas suas áreas livres de descanso e lazer, como praças e polos; pelas áreas de intenso convívio social associada às funções de comércio e serviços como a da região do Mercado; pelo seu sistema viário; e pelas áreas que abrangem os seus recursos naturais, geralmente associadas às margens dos corpos hídricos e às porções de vegetação nativa

ÁREAS LIVRES PÚBLICAS PRAÇAS E POLOS DE LAZER As praças e polos de lazer surgem com a finalidade básica de promover o convívio social e o lazer no ambiente urbano. Para Robba e Macedo (2003), “as praças são espaços livres públicos urbanos destinados ao lazer e convívio da população, acessíveis aos cidadãos e livre de veículo”. Foram contabilizadas sete unidades como essas no perímetro de estudos, localizadas em três dos cinco bairros de sua abrangência, sendo eles Centro, Acampamento e XV de Novembro. No caso, os equipamentos existentes são razoavelmente estruturados, ainda que estejam degradados, necessitando de manutenção, reforma e projetos de acessibilidade. Suas características gerais se assemelham por apresentar uma composição em que se segue uma linguagem formal simples, com pavimentação em pedra portuguesa, por vezes, arriscando alguns mosaicos, a utilização predominante de vegetação nativa e mobiliários urbanos préfabricados básicos de materiais como madeira e ferro. O perfil dos seus usuários varia de acordo, basicamente, com as atividades atribuídas a esses equipamentos e a possibilidade de acesso a eles. Para Leitão (2002), nas cidades, as praças são fundamentais para o desenvolvimento da vida urbana, graças ao papel social que desempenham, além do que “a praça, como unidade urbanística, tem funções específicas definidas pelo uso e pela forma como os cidadãos se apropriam deste espaço”. Portanto, elas acabam por desempenhar funções complementares, não menos importantes do que sua função primordial de convívio e lazer, quando, por exemplo, promovem a prática de atividades físicas; abrigam manifestações culturais, políticas e religiosas; estão associadas a uma rede de comércio e serviços que fortalecem a vida urbana de uma determinada área; ou estão em uma situação geográfica favorável que possibilita a contemplação de paisagens diversas. É interessante observar como esses espaços podem ter uma área de influência menor, atraindo um público mais local ou ter uma área de influência maior, atraindo pessoas de áreas mais remotas. Segundo Berke (2006), o raio de influência de uma praça ou um polo de lazer com estruturação básica é de aproximadamente 400 metros. Para a análise foi adotado que todas as praças identificadas tem um raio mínimo de alcance de 400 metros relacionado à sua atividade básica de promover o convívio e o lazer nas suas intermediações, como está representado no Mapa 9. No mais, de acordo com o 98

Mapa 16. Sistema de Espaços Livres. Fonte: Elaborado pelo autor


1 PRAÇA DA MATRIZ SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES Mercado

2 PRACINHA DA TELECEARÁ

Vazios Praças Raio de Abrangência 3 PRAÇA DO JOÃO XXIII

Áreas Vegetadas Hidrografia ESTADO DE CONSERVAÇÃO Precário

4 PRAÇA DO IPAZE

Degradado Regular Adequado ATIVIDADES Convívio e Lazer Eventos Religiosos Eventos Culturais Atividades Físicas Grandes Shows Contemplação Serviços

6 PRAÇA XV DE NOVEMBRO

5 PRAÇA DO CSU

7 PÓLO DE LAZER


seu porte e com as funções que acumula, o seu raio de influência pode atingir um alcance maior. No caso de um centro como este, de pequeno porte, o raio de influência de uma praça relevante, que desempenha muitas funções e abriga diversos eventos pode alcançar toda a extensão da sua zona urbanizada, como acontece com a praça do CSU. Observa-se nesse contexto, ainda, uma má distribuição desses equipamentos, já que eles estão concentrados nas áreas mais consolidadas e praticamente ausentes na áreas periféricas. Da mesma forma que ocorre em qualquer outra cidade brasileira, os espaços residuais formados nas zonas centrais tendem a receber um tratamento paisagístico e serem transformados em pequenas praças ou jardins, enquanto os mesmos espaços das zonas periféricas tendem a permanecer abandonados. No que se refere ao seu estado de conservação e linguagem estética. Os equipamentos identificados são razoavelmente estruturados, ainda que uma grande parte esteja degradada, necessitando de manutenção, reforma e projetos de acessibilidade. As suas características gerais se assemelham por apresentar uma composição em que se segue uma linguagem formal simples, geralmente, com pavimentação em pedra portuguesa, por vezes, arriscando alguns mosaicos, a utilização predominante de vegetação nativa e mobiliários urbanos pré-fabricados básicos de materiais como madeira e ferro. Para um pleno funcionamento desses espaços, é importante que eles estejam articulados e bem distribuídos na malha urbana, assim como devem estar aparelhados e bem cuidados, dando condições de acesso, permanência e usufruto aos seus usuários.

MERCADO A área do Mercado merece destaque na abordagem sobre áreas livres públicas, já que ela estabelece uma dinâmica social intensa, associada ao comércio e a prestação de serviços, que possibilita diversas interações cotidianamente. O seu caráter de centralidade urbana é notório, já que atrai pessoas de todas as partes do município e da região, gerando uma demanda considerável. O leito viário, os passeios e os “barracões” são os principais espaços onde essas diversas relações acontecem. Porém, a infraestrutura viária já dá sinal de esgotamento, o que se constata pelos conflitos gerados pela falta de organização e ordenamento do seu território, bem como pelo seu estado de degradação física e ausência de acessibilidade; da mesma forma, os “barracões” se encontram em estado precário, sem manutenção. [...] observam-se várias apropriações privadas de espaços livres públicos. Algumas dessas situações fortalecem a vida pública, como a presença de atividade comercial em ruas, praças e parques, desde que não prejudiquem as demais atividades próprias de tais espaços (circulação, convívio, fruição da paisagem, etc). (QUEIROGA, 2014)

Houve uma reforma recente, associada a projetos de acessibilidade, mudança de pavimentação e iluminação, que não foi suficiente para resolver os conflitos existentes ou qualificar esteticamente aquela área. O que aponta para a necessidade de uma qualificação mais ampla, que integre a sua área com o entorno, que reforce o valor da escala humana e que organize e qualifique aquele espaço no sentido de garantir o seu bom funcionamento. 100


Fig. 46. Mercado de Pentecoste. Fig. 47. Mercado de Pentecoste. Fig. 48. Mercado de Pentecoste. Fonte: Acervo do autor


Fig. 49. Mercado de Pentecoste. Fig. 50. Mercado de Pentecoste. Fig. 51. Mercado de Pentecoste. Fonte: Acervo do autor


Fig. 52. Mercado de Pentecoste. Fig. 53. Mercado de Pentecoste. Fig. 54. Mercado de Pentecoste. Fonte: Acervo do autor


PASSEIOS O passeio é um elemento do sistema viário que tem como função primordial promover o deslocamento de pedestre de maneira segura. Existe, porém, um aspecto específico de cidades interioranas do Nordeste brasileiro, como Pentecoste, de reconhecer o passeio como uma unidade de espaço livre importante enquanto promotor da vida social no ambiente urbano. O que ocorre quando os cidadãos se apropriam da sua estrutura, ocupando-a, para interagir com seus familiares e sua vizinhança, o que se configura, inclusive, um aspecto cultural fortíssimo dessa realidade. O que reforça e ideia de Queiroga (2014) quando ele relaciona esse aspecto dos passeios à superação da sua função primordial e, até então exclusiva, o que reforça o caráter mutável desses elementos. Nesse caso, portanto, é importante reconhecer e incorporar no processo de planejamento da cidade esse aspecto, bem como outros semelhantes que venham a promover a ocupação do espaço público e fermentar a vida da cidade. Quando se trata de intervir nas áreas livres públicas, independente da sua natureza, para além da manutenção e do tratamento paisagístico individual que eles devem receber, é importante atentar para sua distribuição ao longo do espaço urbano e como eles se articulam com as unidades de vizinhança e os demais equipamentos públicos. Santos (1998, p.158) sugere que áreas livres devem: [...] ser pequenas, servindo a grupos de vizinhança ou quarteirões (ver proposta de utilização do miolo dos quarteirões); ser ruas tratadas como “praças lineares”; ser praças de bairro ou centrais abrigando ou se interligando a atividades recreativas (escolas, campos de esporte. igrejas, mercados. quiosques malocões, bares e restaurantes, cinemas sorveterias etc; e ser faixas lineares arborizadas a partir das margens de rios, córregos, igarapés. (SANTOS, 1988)

Fig. 55. Passeio como unidade de convívio. Fig. 56. Passeio como unidade de convívio. Fonte: Acervo do autor

104



SISTEMA VIÁRIO A cidade é marcada por uma estrutura viária que reflete um tecido urbano com certo nível de regularidade no desenho apenas nas áreas centrais, ocorrendo, por vezes, com configurações que remontam das tradicionais quadras 100x100 metros e, em outras, com um perfil mais longitudinal. No mais, mesmo nas áreas mais consolidados, as vias assumem uma característica mais orgânica, que sugere um processo de parcelamento e urbanização mais empírico, geralmente, sujeita a variantes naturais como a incidência de uma topografia mais acentuada ou a presença de alagadiços e corpos hídricos como lagos, lagoas e rios. Quanto a suas dimensões, o sistema viário de Pentecoste não está classificado rigidamente em uma hierarquia. A sua ordenação é dada, basicamente, pelo Código de Obras e Posturas do município, que data do ano 2000, quando, no capítulo VI, o texto, de uma maneira bem básica, discorre sobre suas larguras e arborização. Art. 43 – As ruas, avenidas e praças, reger-se-ão pelo disposto neste Capítulo quer seja construídos pelo Poder Público ou pela iniciativa privada: I- Quanto às avenidas, estas terão uma largura mínima de 15 (quinze) metros, quando se destinarem a um maior trânsito; II- Quanto às ruas, terão uma largura mínima de 9 (nove) metros, em se tratando de via dominante; III- As demais ruas terão no mínimo de 6 (seis) metros, quando se tratar de vias públicas secundárias. Parágrafo Primeiro - No centro das avenidas, serão construídos canteiros em toda sua extensão, que se destinam ao ajardimento das vias públicas e a iluminação pública será colocada no centro dos canteiros. Parágrafo Segundo - A arborização das ruas será feita nas margens esquerda e direita, com o afastamento de 50 (cinquenta) centímetros do meio-fio.

É indiscutível que, para uma análise mais eficaz do sistema viário de uma cidade, seja necessária uma sistematização da sua estrutura que se inicia, basicamente, pelo reconhecimento de suas características e seu agrupamento. Todavia, não existe, no município, nenhum tipo de hierarquização oficial do seu sistema viário. O Plano Diretor Participativo de Pentecoste, de 2009, apesar de incompleto, sugere no título III, do capítulo II, Artigo 47º, sobre Circulação, Transporte e Tráfego, a necessidade dessa hierarquização: III- Estabelecer hierarquização da rede viária de modo a possibilitar critérios diferenciados de projeto para cada categoria de via, otimizando a estrutura viária;

O presente trabalho propõe, porém, analisar essas vias, considerando a sua estrutura física e a suas demandas cotidianas para classificá-las, como se observa no Mapa 10, a partir do princípio de Hierarquização Funcional, que se aproximam das definições do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). 106


SISTEMA VIÁRIO 5 CE-3

Estruturante Complementar Local

4 62

-1

CE

41

-3

CE

Mapa 17. Hierarquia do Sistema Viário. Fonte: Elaborado pelo autor

»» Vias estruturais: predominam fluxos de passagem; atendem grandes deslocamentos; »» Vias complementares: ligam vias locais às vias estruturais; »» Locais: restringem fluxo de passagem. As três rodovias estaduais que penetram o espaço urbano da cidade (as CE-341, CE-354 e CE-162) desempenham um papel estruturante no seu sistema viário e recebem, junto das vias estruturantes complementares, a maior demanda de fluxo da cidade, formando uma rede de vias principais. Que é permeado, em quase toda sua extensão, pelas vias que promovem os deslocamentos e acessos locais. A rodovia Jackson Pereira, CE-341, que liga Pentecoste à BR222, que dá acesso à capital Fortaleza acaba, naturalmente, se sobressaindo em importância. O que se reflete na sua estrutura física, que tem dimensões mais generosas e é asfaltada em toda sua extensão. As demais rodovias tem uma função secundária atribuída a uma demanda mais específica. Direcionada, no caso, para o transporte entre as localidades da zona rural e da sede urbana do município, além do transporte intermunicipal regional. O que, também, se reflete na sua estrutura física, um tanto mais modesta, com caixas viárias mais estreitas e vias parcialmente asfaltadas, por exemplo. 107


MOBILIDADE URBANA Os meios de transporte que predominam na paisagem urbana são automóveis de pequeno e médio porte, motocicletas, bicicletas e transportes movidos por tração animal, todos de natureza particular. O pedestre ocupa um lugar de relevância nesse cenário, já que está associado a esse contexto de uma zona urbana relativamente pequena, que favorece a escala humana, ainda que as condições de acessibilidade, no geral, sejam precárias. A bicicleta também tem um papel relevante nesse contexto, já que representa um transporte de fácil aquisição, de baixo custo de manutenção e igualmente beneficiado pela escala humana de um centro urbano pequeno. Ainda que divida a estrutura viária com os veículos automotores, não possuindo uma infraestrutura específica ou políticas públicas que incentivem o seu uso. No caso os veículos de tração animal, que, nesse contexto, estão associados principalmente à figura tradicional dos carroceiros, a situação é similar a das bicicletas, pelos ricos associados ao compartilhamento do leito viário com os veículos automotores e, mais especificamente, à falta de informação dos motoristas em não reconhecer espaço dos carroceiros no leito viário. A quantidade de motocicletas e automóveis tem aumentado em todas as cidades do Brasil, como foi colocado no capítulo 3, na parte que trata de mobilidade urbana, e no caso de Pentecoste não é diferente. O veículo individual motorizado, de um modo geral, tem assumido um status de “sonho de consumo” expressivo que tem se rebatido dentro do ambiente urbano de cidades de variados tamanhos. Ainda que a infraestrutura viária do município se apresente como precária de uma forma geral, no tocante à caixa de rolamento, isto é, onde esses veículos circulam, as condições de acesso e deslocamento são muito superiores, por exemplo, a dos passeios, destinados ao uso dos pedestres. Apesar disso, esse modelo de transporte tem dado sinais de esgotamento, já que tem se mostrado um grande emissor de poluente, que sobrecarrega o sistema viário e está ligado a casos graves de acidentes associados a alta velocidade que atingem. O transporte coletivo, geralmente associado aos ditos “paus-dearara”, ônibus e micro-ônibus, utilizam o sistema viário da cidade se deslocando, basicamente, nos eixos de acesso e evacuação do município, pelas vias estruturantes. Exceto pelos transportes escolares particulares que, por vezes, penetram as vias locais. A empresa privada de ônibus Guanabara, junto à Cooperativa de Transporte e Turismo do Estado do Ceará – COOTTRECE, são as únicas a atuar na modalidade de transporte coletivo intermunicipal da cidade, ambas fazendo percurso no eixo que vai de Fortaleza ao município de General Sampaio, também situado no Vale do Curú, diariamente. Já, o “pau-de-arara” é o modal que desempenha o papel de transporte coletivo entre a zona urbana e zona rural, através das estradas vicinais do município, diariamente, mas, especialmente, nos dias de sábado, quando ocorre a feira. No mais, não há transporte coletivo interbairro na cidade. Para além dos acessos ao centro da cidade pelas estradas vicinais e rodovias intermunicipais, os fluxos internos geram uma demanda significativa que tem uma relação direta com os usos estabelecidos ao longo das vias. A partir disso, pode-se constatar a incidência dos pólos geradores de tráfego, que atuam em vários níveis. 108


// ACIDENTES COM MOTOCICLETAS Acidentes envolvendo motocicletas e motonetas correspondem a quase 35% do total de ocorrências no Estado. Os dados são do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) registrados até agosto do ano passado. No período de 2003 a 2012, o número de vítimas fatais neste tipo de acidente cresceu 187%. Para a coordenadoria de fiscalização do Departamento, as estatísticas são preocupantes. A principal causa desses acidentes, de acordo com o órgão, é a imprudência. Segundo o Detran, é no interior do Estado que há maior concentração de condutores de motocicleta sem habilitação. A frota de veículos de duas rodas é de pouco mais de 1,1 milhão, havendo registros de aproximadamente 600 mil pessoas habilitadas com a Carneira Nacional de Habilitação (CNH) na categoria A (exigida para conduzir moto). Até agosto de 2013 foram contabilizados, em todo o Ceará, 6.164 acidentes envolvendo apenas motocicletas, contra 17.617 envolvendo outros veículos, como carros, caminhões etc. Esse valor representa 34,75% do total de acidentes ocorridos em apenas oito meses. Da última estatística até o momento, o Departamento não atualizou os números, não sendo possível saber se as ocorrências cresceram ou diminuíram no último ano. O coordenador de equipe de fiscalização do Detran, Ribamar Diniz Bacelar, avalia que as estatísticas preocupantes de vítimas de acidentes de trânsito envolvendo motocicleta resultam da falta de responsabilidade de uma parcela dos motociclistas. Além disso, ele ressalta que os moradores das cidades distantes da Capital substituíram o animal ou mesmo a bicicleta pela moto. “A exigência da habilidade para conduzir motocicleta é inúmeras vezes maior que a de um condutor de bicicleta ou um montador de cavalo ou jumento”, acrescentou. Diário do Nordeste (Limoreiro do Norte, Ceará 04/09/2014)

O trânsito resulta das necessidades de deslocamento das pessoas por motivo de trabalho, de negócios, de educação, de saúde e de lazer e acontece em função da ocupação do solo pelos diferentes usos. Desta forma, os municípios devem promover iniciativas visando garantir ao cidadão o seu direito de ir e vir, de forma segura e preservando a sua qualidade de vida. (DENATRAN, 2001)

A sua classificação, apresentada no Mapa 18, foi elaborada com base na Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS) de Fortaleza, de 1996. Ela categoriza três níveis de polos geradores de tráfego (PGT1, PGT2 e PGT3), de uma forma detalhada, a partir das funções e dimensões físicas atribuídas às edificações. Para o trabalho, no entanto, foi formulada uma tabela de classificação mais genérica, que agrupa os PGTs do perímetro de estudo de acordo com a atividade que os seus equipamentos desempenham (comercial, industrial, institucional, de lazer e de serviços públicos e privados), com as características do fluxo que geram e com o seu porte físico. Excluindo, portanto, o uso residencial, que nesse contexto, está associado predominantemente com o perfil unifamiliar, se distribuindo de maneira homogênea no território e se configurando como um polo de impacto pouco relevante. É importante ressaltar que todos os equipamentos destacados estão sujeitos a uma demanda de fluxo contínuo, seja ele baixo, moderado ou intenso. Enquanto alguns deles estão sujeitos a “picos” de fluxo concentrado que se observam de acordo com seu horário de funcionamento naquele contexto. E que isso também foi considerado na hora de elaborar a tabela e o mapa.

109


PÓLOS GERADORES DE TRÁFEGO equipamento

característica do fluxo

escolas e creches

Fluxo contínuo baixo + Fluxo concentrado no começo e no fim do horário das aulas

hospitais e postos de saúde

Fluxo contínuo intenso

instituições públicas em geral

Fluxo contínuo baixo + Fluxo moderado no começo e no fim do horário de trabalho

lazer

Fluxo contínuo baixo + Fluxo moderado nos horários extra comercial

comércio e serviços

Fluxo contínuo moderado

indústria

Fluxo contínuo baixo + Fluxo concentrado no começo e no fim do horário de trabalho

porte classificação P

PG2

M

PG1

G

PG1

P

PG2

M

PG2

G

PG1

P

PG3

M

PG3

P

PG3

M

PG2

G

PG1

P

PG2

M

PG1

G

PG1

Tab. 2. PGTs. Fonte: Elaborado pelo autor

a) os Polos Geradores de Tráfego - PGT, que são as edificações onde se desenvolvem atividades geradoras de grande número de viagens, e cuja implantação provoque impacto no tocante à saturação da capacidade viária do entorno, na circulação circunvizinha, na acessibilidade à área, na qualidade ambiental, na segurança de veículos e pedestres e na capacidade da infraestrutura existente. b) os equipamentos de impacto que são empreendimentos públicos ou privados que possam vir a representar uma sobrecarga na capacidade da infraestrutura urbana ou ainda que possam vir a provocar danos ao meio ambiente natural ou construído. (LEI DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DE FORTALEZA, 1996)

110


PÓLOS GERADORES DE TRÁFEGO (PGTs) PGT1 PGT2 PGT3

Mapa 18. Pólos Geradores de Tráfego (PGTs). Fonte: Elaborado pelo autor


ACESSIBILIDADE É perceptível em um pequeno trecho que se percorre “a pé”, em qualquer parte da cidade, que os princípios básico de acessibilidade e desenho universal não são atendidos minimamente. Em toda extensão do recorte de estudo, poucos percursos garantem um deslocamento seguro, ocorrendo, na maioria das vezes, a existência de passeios subdimensionados, descontínuos ou mesmo inexistentes, o que obriga os pedestre a transitar pela caixa de rolamento destinada aos automóveis e motocicletas. Já que essa medida, apesar de gerar conflitos e riscos graves à integridade física do pedestre, garante um deslocamento mais contínuo por uma estrutura mais ordenada. Da mesma forma, a sinalização horizontal e as rampas de acessibilidade são insuficientes e comprometem o deslocamento das pessoas com mobilidade reduzida.

Atendendo à concepção de desenho universal, os espaços e mobiliários devem ser criados na cidade para atender à todos (gestantes, idosos, criança, pessoas com deficiência permanente ou temporária, etc) de forma simples e segura. O desenho também deve ser facilmente percebido pelas pessoas vindas de outras cidades, países. O desenho destes espaços e mobiliários tem que ser funcional e de fácil percepção. A norma 9050/2004 é válida para todo território nacional, mas respeita parâmetros internacionais para que atenda à todos. Manual de Acessibilidade (2011) - Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis

Sabe-se que os problemas sociais e políticos se rebatem de uma forma direta na construção do espaço urbano. E, não é novidade, em uma lógica que atinge todas as regiões do país, que as questões de acessibilidade básica tenham sido negligenciadas em detrimentos de outras questões, com a da promoção de infraestrutura rodoviária, por exemplo. Ainda que a Lei nº 10.098/2000, ou Lei de Acessibilidade seja um marco no sentido de institucionalizar a importância dessas políticas, para que se possa efetivar medidas concretas. O seu alcance em um município de pequeno porte, em uma situação relativamente periférica, como Pentecoste, é bastante delicada. Já que as gestões públicas de contextos como esses são pouco cientes da importância dessa dimensão básica do direito de ir e vir e, portanto, descompromissadas com a promoção dessas políticas. 112


Fig. 57. Passeio obstruído. Fig. 58. Passeio obstruído. Fig. 59. Passeio obstruído. Fonte: Acervo do autor


LEGISLAÇÃO URBANA A legislação urbana de Pentecoste, bem como de outras cidades daquele contexto geográfico, de realidades semelhantes, é precária e, na maior parte da sua história, inexistente. Observa-se que a sua organização inicial, que remonta do seu tempo de vila, no final do século XIX, deve ter sofrido influência das Cartas Régias que ordenaram o espaço de vilas importantes como Aracati e Icó na sua estruturação. Não há, todavia, registro de documentos oficiais que comprovem a existência ou mesmo a influência de um plano como esse. Porém, a configuração original da sede do município remete a esses princípios, pois a disposição da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, naquela época uma capela, da praça adjacente, da Casa de Câmara e Cadeia e das residências segue um traçado que remontam da lógica de organização do espaço urbano daquela época. Depois disso, a expansão da zona urbana da cidade se deu, a partir desse núcleo, através da abertura de avenidas, como a Tabelião Francisco Alves e a José de Borba Vasconcelos, e do parcelamento das glebas adjacentes a essas vias. Esses projetos não integravam, necessariamente, uma lógica maior de planejamento urbano, assumindo um caráter mais empírico e isolado, bem como o próprio processo de urbanização da cidade que se sucedeu. Somente no ano 2000, na administração de Antônio Braga de Azevedo, que Pentecoste veio a possuir um Código de Obras e Posturas, através da Lei N.º 504/2000 de 10/05/2000, que legislasse, minimamente, na organização do seu espaço público e privado, ainda que de uma maneira bastante limitada. Pois seu texto aborda somente questões básicas que, muitas vezes, beiram a obviedade. Por exemplo, no capítulo IV, DAS ZONAS DO MUNICÍPIO, que divide toda a extensão territorial do município em apenas três partes: zona urbana, zona rural e sede de distrito; ou no capítulo VI, DA LARGURA E ARBORIZAÇÃO DOS LOGRADOUROS PÚBLICOS, que discorre sobre a importância do dimensionamento das vias, porém, sem estabelecer parâmetros, e da presença de vegetação nas vias. Com o advento do Estatuto da Cidade, Lei Federal nº 10.257/2001, a elaboração de um plano diretor por parte dos municípios com mais de vinte mil habitantes se tornou obrigatória. No caso de Pentecoste, o rascunho do seu Plano Diretor Participativo, já que não foi finalizado e, muito menos, implementado, data do ano de 2009. O material dá diretrizes gerais no âmbito do planejamento urbano da cidade, não chegando a se aprofundar nas esferas do planejamento urbano ou, muito menos, dar parâmetros específicos para seus desdobramentos.

114


DA POLÍTICA URBANA Capítulo 1 - Diretrizes Gerais Artigo 6 - A Política urbana será orientada por pelas seguintes diretrizes: I. Orientar o crescimento da cidade para que seja realizado dentro dos limites do perímetro urbano, em seus Distritos e Áreas Urbanas Isoladas, principalmente da sede; II. Aumentar a eficácia e otimizar os investimentos em infraestrutura urbana, através da priorização de investimentos imobiliários em áreas já servidas por infraestrutura básica, desestimulando a ocupação para fins urbanos em áreas não atingidas pela rede de infraestrutura urbana básica; III. Estimular a ocupação dos vazios urbanos, e desestimular a formação dos mesmos no processo de expansão urbana, visando coibir a especulação imobiliária; IV. Compatibilizar o adensamento do uso do solo urbano com a capacidade de atendimento dos equipamentos sociais e comunitários básicos; V. Promover a recuperação paisagística e ambiental de áreas públicas degradadas; VI. Promover a preservação do patrimônio ambiental, histórico e paisagístico do município; VII. Prever a universalização dos equipamentos sociais e urbanos, dando prioridades às áreas mais carentes do município; VIII. Impedir a ocupação intensiva em áreas de alta declividade, áreas de preservação ambiental, solos suscetíveis à erosão ou inundação e de áreas arborizadas.

Quanto ao zoneamento, por exemplo, estabelece-se uma classificação mais completa do que a disposta no Código de Obras e Posturas, com seis zonas a nível do território municipal ou macrozoneamento e mais seis na escala do território urbano, mas não se aprofunda na definição e espacialização dessas zonas, deixando em aberto para um futuro estabelecimento desses parâmetros. O mesmo ocorre com os trechos que dizem respeito às questões ambientais, quando citam a importância da diminuição dos impactos causados pela vocação turística do Açude Pereira de Miranda, ou a importância de utilizar uma vegetação condizente para arborizar vias e praças ou a importância da proteção das reservas ambientais e corpos d’água, por exemplo, mas não estabelecem parâmetros específicos para tanto. O município não possui propriamente uma legislação ambiental que identifique e reconheça os recursos naturais na extensão do seu território, na figura de rios, lagos ou florestas, como áreas de preservação. Existem, porém, as leis estaduais e federais que acabam por incidir sobre a preservação desses recursos de uma maneira indireta, já que a fiscalização é escassa. No entanto, é interessante destacar que o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) tem uma legislação específicas no seu raio de atuação e um papel importante no zoneamento relacionado às margens dos açudes e de outros recursos hídrico do município. Existe, portanto, uma deficiência notável no segmento legislativo de controle territorial e urbano do município, já que os poucos os poucos instrumentos que existem são bastante limitados. Logo, não são capazes de gerir com capacidade as diversas questões que se rebatem na sua extensão territorial. 115


DIRETRIZES DE INTERVENÇÃO O recorte espacial da sede urbana de Pentecoste apresenta problemáticas intrínsecas a situação geográfica adversa em que está inserida, o que se presume na dificuldade de acesso a recursos naturais elementares para o desenvolvimento pleno de uma sociedade. O que, nesse caso, se resume, principalmente, à escassez de água. Ainda que essas questões tenham sido parcialmente resolvidas ou, pelo, menos amenizadas, ao longo dos anos, existe um estigma de pobreza, marginalização e negligência que ainda paira sobre a maioria dos municípios do sertão cearense. Essa concepção está associada, de fato, ao histórico de dificuldades dessas populações de se estabelecerem e prosperarem nesse contexto de adversidades naturais e negligência do poder público, o que se constata pelo número significativo de migrações que ocorreram ao longo do séc. XX para a capital Fortaleza e para estados da região sudeste do país. Há mesmo, nas últimas décadas, um movimento de descentralização que se consolidaram através de políticas inclusivas que tem modificado, aos poucos, o perfil dessas cidades. Porém, muitos dos seus problemas históricos persistem e, naturalmente, se rebatem na construção do seu espaço urbano. A sua falta e ordenamento e a precariedade da sua infraestrutura básica são aspectos sintomáticos de centros como esses que, historicamente, não possuem uma cultura de planejamento urbano. A análise feita no perímetro de estudo propõem reflexões sobre a eficiência dos seus espaços livres, em um trajeto que, para além das suas questões isoladas, avalia a cidade como um objeto dinâmico, mutável e fruto de um contexto histórico complexo. Dando, ainda, a devida importância a um modelo de planejamento democrático, inclusivo e responsável com questões ambientais. As proposições feitas, sistematizadas na tabela XX, envolvem diversas escalas e estratégias de intervenção, que afeta toda extensão territorial do perímetro urbano de estudo.

116


planejamento urbano (escala macro) planos complementares (escala intermediária) planosde intervenção (escala micro)

planejamento territorial

reorganização dos bairros

propor uma redivisão dos bairros que reconhaça o seu real processo de formação

zoneamento urbano

propor um zoneamento urbano que reconheça as peculiaridades de cada área da cidade

plano de acessibilidade universal

infraestrutura dormiciliar e urbana

plano de saneamento

plano de iluminação pública

propor o desenvolvimento de planos complementares que permeem todo os espaço urbano, construindo um ambiente funcional, seguro e, esteticamente, notável

plano de arborização

morfologia urbana e uso & ocupação do solo

estratégia de recuperação da paisagem urbana

regulamentar parâmetros urbanísticos que regulem os padrão básico de uso e ocupação

estratégia de uso e ocupação do solo

incentivar usos comerciais nas vias estruturais

plano de áreas livres de lazer

criar novas áreas livres de lazer e reformar as existentes, favorecendo a sua conexão e distribuição equitativa na extensão da zona urbana

elaborar o projeto da zona compartilhada da área do mercado e de reestruturação do eixo de mobilidade

sistema de espaços livres plano de mobilidade urbana

reestruturar o sistema viário

elaborar um plano cicloviário

Tab. 3. Diretrizes de planejamento. Fonte: Elaborado pelo autor

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07

PROGRAMA DE INTERVENÇÃO

// SETORIZAÇÃO, ORDENAMENTO E PROJETOS DE ESTRUTURAÇÃO DO ESPAÇO URBANO



PROGRAMA DE INTERVENÇÃO // SETORIZAÇÃO, ORDENAMENTO E PROJETOS DE ESTRUTURAÇÃO DO ESPAÇO URBANO

A proposta de intervenção contempla três segmentos projetuais que oscilam entre escalas distintas. O primeiro propõem o reconhecimento e controle normativo sobre o território do município como um todo, ainda que o foco seja a extensão do recorte de estudo; o segundo trata do fornecimento de infraestrutura básica e, também, do controle normativo, porém, desta vez, sobre a forma urbana e os padrões de uso e ocupação do solo, ambos voltados para o perímetro urbanizado; e o terceiro trata de intervenções mais específicas que visam remodelar o espaço urbanizado, tendo como principal objeto de intervenção as vias estruturantes do espaço urbano os espaços residuais das suas intermediações, além da região comercial do Mercado. No que se refere à transição das escalas, a macroescala trata da apreensão do espaço urbano através das grandes unidades de ocupação urbana - núcleos ou estruturas lineares, considerando as características físicas do território como fatores condicionantes do uso do solo e da sua organização espacial, além dos seus níveis de acessibilidade e dos fatores âncora da sua dinâmica de crescimento. Enquanto a microescala trata de uma abordagem mais circunscrita à forma urbana, isto é, que corresponde à avaliação do modo como os espaços livres públicos foram dando resposta às necessidades dos habitantes, como o edificado foi se transformando com o tempo, seja ao nível formal ou ao volumétrico. Existe, ainda, uma escala intermediária que varia entre as outras duas e não possui uma limitação rígida, mas que, como coloca a tabela de diretrizes de intervenção, se orienta pela ideia de padrão de infraestrutura, morfologia e ocupação na paisagem urbana. O percurso traçado entre a macroescala e a microescala, no desenvolvimento dessas propostas de intervenção, tem como objetivo a apropriação do processo de formação daquele núcleo urbano, compreendendo os principais elementos que delimitam a sua atual configuração. O que reforça a importância dessa interdisciplinaridade que se estabelece no cenário urbano, para que se possa intervir, no sentido de propor uma reformulação do seu espaço físico, em uma escala mais minuciosa, ciente dos efeitos aos diversos contextos em que a cidade está inserida. 120

Mapa 19. Esquema de Intervenção. Fonte: Elaborado pelo autor



PLANEJAMENTO URBANO Antes de propor resoluções que atenuem os problemas relacionados à dimensão pública do sistema de espaços livres de uma cidade como Pentecoste em uma escala mais específica, é importante compreender sua estruturação territorial e sua dinâmica a partir de uma abordagem mais ampla, que contemple toda a extensão urbanizada. No Brasil, a política de controle do território urbano é feita, basicamente, através do Plano Diretor, que oferece toda a base legal para o processo de ocupação e urbanização de um centro com mais de vinte mil habitantes, como determina o Estatuto da Cidade (2001). E, ainda, fortalece o caráter de autonomia da esfera municipal, já que o plano é elaborado a partir de características socioeconômicas, geográficas e políticas específicas de cada município em um processo que deve contemplar a participação popular. Cada município possui suas próprias regras e essas são definidas normalmente no Plano Diretor, na Lei de Uso e Ocupação do Solo e no Código de Obras (ou de Edificações). Os princípios que orientam este Plano Diretor e demais documentos estão definidos no Estatuto da Cidade, o Plano Diretor é o instrumento básico para orientar a política de desenvolvimento e ordenamento da expansão urbana do município, garantindo o interesse maior no uso do solo e dos bens urbanos.

Entende-se que o Estatuto da Cidade trouxe uma série de inovações para a gestão urbana, especialmente, as relacionadas à ampliação da abrangência dos Planos Diretores e o alcance dos princípios que norteiam a sua função, atualmente, mais voltados para fazer cumprir a função social da cidade e da propriedade. De acordo com seu o Art.2º, a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais, das quais se destacam como relevante para o presente trabalho: I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações; II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social; 122


IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente; V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais; VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar: a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos; b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes; c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana; d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente; e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização; f) a deterioração das áreas urbanizadas; g) a poluição e a degradação ambiental; h) a exposição da população a riscos de desastres. (Incluído dada pela Lei nº 12.608, de 2012) VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob sua área de influência; XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;

O primeiro esforço de aplicação de tais diretrizes se dá na formulação do Plano Diretor que, para Machado (2007), tem dimensão jurídica considerável, pois é um Plano criado pela Lei para dirigir e fazer com que outras Leis Municipais, Decretos e Portarias, tenham que se ajustar a ele. Como foi colocado no capítulo de Diagnóstico, o município de Pentecoste não finalizou a elaboração do seu Plano Diretor Participativo, de 2009. Portanto não possui um plano como esse vigente, o que deixa o seu espaço urbano sujeito às normas de um Código de Obras e Posturas limitado, que cumpre uma função mais simbólica do que legislativa para aquela realidade. O presente trabalho não se compromete com a produção de um Plano Diretor ou a formulação de leis para a gestão do território de Pentecoste, ainda que alerte para a sua necessidade. Porém, assume a importância das diretrizes propostas para a estruturação do espaço urbano e da concepção básica que envolve o processo de organização desse mesmo espaço. As respostas dadas à leitura do recorte espacial determinado para o estudo apontam, portanto, para duas propostas de setorização do seu território que se constituem como uma primeira reação à leitura desse objeto. Uma que sugere a reestruturação dos bairros, alterando sua divisão atual e reconhecendo fatores determinantes na sua construção; e outra que aponta para a elaboração de um zoneamento urbano, reconhecendo as partes e especificidades que compõem o mesmo perímetro urbano, a partir do reconhecimento dos seus potenciais de preservação e ocupação. 123


REVISÃO DOS LIMITES DOS BAIRROS A redivisão dos bairros foi entendida como necessária pelo caráter limitado e ultrapassado da divisão atual, que está atribuída a, apenas, um setor da administração pública municipal. No caso, o Setor de Tributos. O que não se traduz, portanto, em uma apropriação eficaz da gestão pública em relação a esse aspecto da composição territorial da cidade e em uma preocupação com a relação de identidade e afetividade dos habitantes com a área que habitam. É a partir do reconhecimento e da identificação com o espaço em que vivemos que passamos a interagir com esse local, o que serve de motivação para a organização coletiva e a demanda por melhorias, reforçando a cidadania. (CAZOLLATO, 2005, p. 31)

Além do que, de uma forma mais prática, reconhecer um determinado território como uma unidade de bairro pode significar que alguns serviços básicos, como equipamentos de educação, saúde e lazer, devem ser oferecidos para aquela área e para um determinado número de habitantes, que reforça a importância de manter equidade territorial. A nova configuração do recorte urbano de estudo teve como parâmetro principal o reconhecimento das unidades de vizinhança e elementos da paisagem urbana, que refletem questões específicas do seu processo de formação, como foi colocado no diagnóstico. Cazollato (2005) alerta que “em primeiro lugar, é importante que os limites respeitem os elementos da paisagem e sejam de fácil percepção, com uma geometria o mais simples possível e bem definida. Portanto, agora, o Centro abrange a parte mais antiga e consolidada da cidade; o Planalto teve o seu limite norte ligeiramente ajustado para a Rua Francisco Moreira, excluindo a área de influência do Mercado, que agora pertence exclusivamente ao Centro; o limite norte do bairro Acampamento foi estendido até a Rua Padre Sinval Facundo, ampliando a sua área de abrangência; uma porção de área foi acrescida ao lado leste do bairro Pedreiras, enquanto uma porção do seu lado oeste foi desmembrada para dar origem ao bairro Conjunto Santa Inês; e, por fim, o bairro XV de Novembro permanece com os mesmos limites.

Mapa 20. Nova divisão dos bairros. Fonte: Elaborado pelo autor

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4 5

1 3 6

2

BAIRROS 1

Centro

4

Pedreira

2

Planalto

5

Conjunto Santa InĂŞs

3

Acampamento

6

XV de Novembro


ZONEAMENTO URBANO No município, atualmente, não existe uma proposta de zoneamento urbano que monitore e proponha parâmetros de ocupação e preservação das suas áreas de acordo com suas especificidades. O gesto que existe, nesse segmento, está determinado no Código de Obras e Posturas do Município e é bastante limitado, e se configura como ineficiente para esse propósito. Portanto, entende-se como necessária a elaboração de uma proposta de zoneamento urbano, associada à elaboração e regulamentação de um Plano Diretor, que, em um momento inicial, reconheça e agrupe as áreas daquele perímetro urbano a partir de suas características específicas. Identificado, assim, aspectos como o padrão atual de ocupação, a disponibilidade de infraestrutura urbana, o potencial de preservação de recursos naturais, como corpos hídricos e mata ciliar, além dos vetores de expansão da cidade. O perímetro de estudo corresponde às porções do território caracterizadas pela significativa presença do ambiente construído, a partir da diversidade das formas de uso e ocupação do solo, subdivide sua área nas seguintes zonas, como apresenta o Mapa 21. A elaboração dos seus parâmetros normativos foi referenciada livremente no Plano Diretor Participativo de Fortaleza (2009) e estão expostos na página sucede a da sua espacialização. »» A Zona de Ocupação Preferencial 1 (ZOP 1) caracterizase pela disponibilidade de infraestrutura e serviços urbanos e pela presença de imóveis não utilizados e subutilizados; destinando-se à intensificação e dinamização do uso e ocupação do solo. »» A Zona de Ocupação Preferencial 2 (ZOP 2) caracterizase pela disponibilidade parcial de infraestrutura e serviços urbanos e áreas com disponibilidade limitada de adensamento; destinando-se à intensificação condicionada da ocupação do solo. »» A Zona de Requalificação Urbana 1 (ZRU 1) caracteriza-se pela insuficiência ou precariedade da infraestrutura e dos serviços urbanos, principalmente de saneamento ambiental, carência de equipamentos e espaços públicos, pela presença de imóveis não utilizados e subutilizados e incidência de núcleos habitacionais de interesse social precários; destinando-se à requalificação urbanística e ambiental, à adequação das condições de habitabilidade, acessibilidade e mobilidade e à intensificação e dinamização do uso e ocupação do solo dos imóveis não utilizados e subutilizados. »» A Zona de Requalificação Urbana 2 (ZRU 2) caracteriza-se pela insuficiência ou precariedade da infraestrutura e dos serviços urbanos, principalmente de saneamento ambiental, carência de equipamentos e espaços públicos e incidência de núcleos habitacionais de interesse social precários, destinando-se à requalificação urbanística e ambiental e à adequação das condições de habitabilidade, acessibilidade e mobilidade. »» A Zona de Preservação Ambiental (ZPA) se destina à preservação dos ecossistemas e dos recursos naturais, especificamente à faixa de Faixa de Preservação Permanente dos Recursos Hídricos. 126

Mapa 21. Zoneamento urbano. Fonte: Elaborado pelo autor


ZONEAMENTO ZOP 1

ZRU 1

ZPA

ZOP 2

ZRU 2

ZPA (Centro de Pesquisas Ictiolรณgicas Federal)


PLANOS COMPLEMENTARES Os planos complementares são uma resposta às problemáticas levantadas no diagnóstico a respeito da precariedade da infraestrutura domiciliar e urbana, recorrentes no perímetro de estudo, bem como os conflitos relativos à morfologia urbana e uso e ocupação do solo que degradam sua paisagem urbana. Suas prerrogativas objetivam alcançar todo o território do perímetro de estudos, ainda que se tratem de mudanças percebidas na escala da vivência e da percepção do espaço urbano.

PLANO DE INFRAESTRUTURA Em uma perspectiva de planejamento urbano, a oferta de infraestrutura domiciliar básica e a infraestrutura urbana (ou do entorno) são variáveis fundamentais para o reconhecimento do grau de consolidação e estruturação de uma zona da cidade. Logo, segundo a leitura do zoneamento urbano proposto para o perímetro de estudo, as zonas com infraestrutura (domiciliar ou urbana) precária ou inexistente, reconhecidas como Zona de Requalificação Urbana (I e II), recebem um tratamento diferenciado frente às zonas mais estruturadas. Quando se destinam, primeiramente, à requalificação urbanística e ambiental, à adequação das condições de habitabilidade, acessibilidade e mobilidade para, depois, incentivar a intensificação e dinamização do uso e ocupação do solo dos imóveis não utilizados e subutilizados. Um estudo que se propõem a elevar a qualidade de vida dos habitantes de uma cidade e promover a sua cidadania, através da interferência no seu espaço público, estaria sendo contraditório se não levantasse as questões relacionadas a essa problemática que atinge uma parcela considerável da população. O que se caracteriza, inclusive, como uma violação grave dos seus direitos básicos. De acordo com Firillo (2008), a função social da cidade é cumprida quando garante a seus habitantes condições adequadas de moradia, satisfazendo os direitos fundamentais. Pontua-se aqui, portanto, a necessidade dessa qualificação das áreas de infraestrutura precária ou inexistente para que se crie condições mínimas de moradia na sua abrangência. Especialmente da variável de rede de esgoto, articulada com um Plano de Infraestrutura Domiciliar Básica, e das variáveis de iluminação pública, arborização urbana e acessibilidade universal, articuladas a um Plano de Infraestrutura Urbana.

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PLANO DE QUALIFICAÇÃO DO AMBIENTE URBANO Nessa escala da percepção da cidade, isto é, do contato visual estabelecido pelo usuário com a paisagem urbana, algumas proposições foram feitas no sentido de melhorar essa relação. O que se dá a partir de normas que tem como premissas a construção de um espaço urbano contínuo e integrado com a escala humana e que tem o potencial de promover, ainda, um convívio social pujante nos seus domínios. Essas normas, aplicadas à esfera da macroescala, contribuem no sentido de prever o resultado formal para o nível da microescala. Logo, para Sampaio (2005), essa condução “significa regular a arquitetura a partir de normas urbanísticas, ao invés de regular a forma urbana a partir de normas arquitetônicas”. Os códigos são parte da ‘linguagem oculta da produção do lugar’. Eles têm uma influência direta sobre “a estrutura do comum” - onde comum conota não algo insignificante, mas algo que representa a grande maioria do tecido urbano. Códigos urbanos são, portanto, de suma importância porque eles moldam significativamente o caráter de nossas áreas urbanas - para melhor ou pior. (MARSHALL, 2011)

ESTRATÉGIAS DE RECUPERAÇÃO DA PAISAGEM URBANA »» Criar parâmetros urbanísticos que reduzam os conflitos no espaço urbano, através de um padrão de ocupação associado ao zoneamento urbano proposto. As medidas devem buscar a construção de um espaço urbano contínuo, que estabeleça a harmonia entre as áreas edificadas e não edificadas, entre o meio natural e o meio construído e, ainda, amenize os conflitos associados aos domínios público e privado; »» Criar parâmetros urbanísticos de ocupação que, ao modelar o espaço urbano, priorizem a escala humana. Evitando, por exemplo, edificações de gabaritos destoantes, caixas viárias de largura desproporcional ou um desenho de áreas livres de lazer que favoreça o automóvel em detrimento do pedestre; »» Criar parâmetros urbanísticos que valorizem a paisagem natural. Considerando as condições do ecossistema local e a capacidade do suporte de infraestrutura, além da delimitação de áreas: de restrição ambiental, de preservação permanente, de recuperação, de utilização e conservação de recursos naturais, de risco, e da zona de transição entre as áreas a serem preservadas, conservadas e ocupadas.

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ESTRATÉGIAS DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO RESIDENCIAL »» Incentivar a instalação do uso residencial multifamiliar em zonas consolidadas, no sentido de promover um adensamento moderado dessas áreas e evitar a subutilização da sua infraestrutura. »» Criar de parâmetros urbanísticos que valorizem a ideia de “olhos na rua”, onde se incentiva a permeabilidade e a proximidade da residência com a caixa viária, evitando grandes muros cegos e recuos exagerados. O que promove uma maior integração com o espaço urbano, promovendo sua vitalidade e, por consequência, uma maior sensação de segurança. COMERCIAL E MISTO »» Incentivar a instalação do uso comercial que favoreçam a escala do pedestre ao longo do eixo viário das vias estruturantes do espaço urbano e nas cercanias das áreas de lazer livres, com o objetivo de fermentar o convívio social e garantir a vitalidade urbana nessas áreas; »» Criar medidas de resolução para os conflitos existentes entre os usos estabelecidos ao longo da caixa viária e sua relação imediata com ela. Para isso, considerando a sua função e seu o porte para projetar o seu impacto para uma determinada área como polo gerador de tráfego. »» Incentivar a instalação do o uso misto nas áreas mais consolidadas determinadas pelo zoneamento urbano proposto. No sentido de adensar essas áreas, para melhor aproveitar sua infraestrutura, além de buscar o incremento da dinâmica urbana associado à presença de atividades de comércio e serviços. »» Incentivar a instalação do o uso misto, também, nas áreas mais periféricas. No sentido de consolidar essas áreas, através do seu adensamento, da garantia de uma maior oferta de serviços e infraestrutura. INSTITUCIONAL »» Incentivar a instalação do uso institucional em áreas mais periféricas e pouco dotadas de infraestrutura. No intuito de promover a inclusão social e a equidade da distribuição dos serviços públicos em todo território urbanizado, consolidando, assim, as zonas mais periféricas. VAZIOS »» Incentivar a ocupação dos vazios urbanos nas áreas mais consolidadas, que dispõem de maior infraestrutura urbana básica. Evitando, assim, o espraiamento da cidade e encurtando, portanto, os seus percursos. O que incentiva a produção de uma cidade funcional e sustentável do ponto de vista dos deslocamentos cotidianos. »» Incentivar a ocupação dos vazios urbanos nas áreas menos consolidadas e periféricas através de usos complementares, geralmente ausentes, que promovem a inclusão social como os serviços básicos de educação, saúde, cultura e lazer. 130


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PROPOSTA DE INTERVENÇÃO A proposta tem duas linhas de intervenção no Sistema de Espaços Livres do perímetro de estudo, atuando, nos subsistemas das áreas livres de lazer e da mobilidade urbana. Cada um com um plano de estruturação específico, além de dois projetos de intervenção, denominados Eixo de Mobilidade e Zona Compartilhada do Mercado, que englobam ambos os subsistemas na sua concepção. O próprio título do trabalho traz o Sistema de Espaços Livres como um promotor da cidadania no ambiente urbano, o que justifica, em muito, as motivações dessa proposta de intervenção. Optouse, portanto, pela reestruturação dos subsistemas que dão uma resposta direta à qualidade de vida dos habitantes daquele centro, através do ordenamento do seu espaço público. Reforçando a promoção do deslocamento, da socialização e do lazer. O que se afirma, ainda, a motivação de qualificar equipamentos urbanos que tem como função essencial promover o deslocamento, a socialização e o lazer, fortalecendo o papel do cidadão como um membro ativo na construção e na apropriação dos bens públicos. A esfera de vida pública é própria da vita activa (ARENDT, 1958)1, da ação política, entendida em sentido amplo, envolve a produção cultural e a construção da cidadania. Na esfera pública as diferenças e divergências têm possibilidade de se apresentar através dos discursos comunicativos (visando o entendimento mútuo, uma verdade processual), daí decorrendo o acordo político em seu sentido maior, a noção de interesse público, de bem público, constituído socialmente diante do conflito de interesses. (QUEIROGA, 2007)

Os projetos associados ao eixo de mobilidade e à zona compartilhada tiveram como justificativa principal a demanda associada às suas estruturas físicas, que desempenham um papel estruturador dentro daquele contexto urbano, alcançando um grande número de usuários. Para. Logo, o projeto “Entre os morros e o rio”, feito por arquitetos colombianos, foi uma referência pragmática importante, pois ele concebe a questão da estruturação do espaço urbano através da requalificação de um eixo viário e de suas áreas adjacentes.

1  ARENDT, Hannah. A condição humana. Tradução de Roberto Raposo. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. 132


// REFERÊNCIAS PRAGMÁTICA A proposta intitulada ‘Entre os morros e o rio’ é o fruto da união entre os escritórios colombianos Espacio Colectivo Arquitectos e Opus, que obteve o primeiro lugar um concurso de projetos para o corredor verde que transformará a antiga via férrea de Cali em um parque linear. O corredor verde é uma oportunidade para impulsionar um modelo de cidade que aposta na articulação dos sistemas urbanos com os sistemas naturais para melhorar a qualidade de vida das pessoas e recuperar valores ambientais e paisagísticos que caracterizaram Cali. O projeto propõe aproveitar a margem da antiga linha férrea para recompor uma rede ecológica urbana entre os morros e o rio; integrar social e espacialmente a cidade, equilibrar a conectividade com um corredor de transporte público limpo e renovar a cidade com projetos estratégicos que acionem processos de transformação a partir desta margem da linha férrea.

1. RECOMPOR UMA REDE ECOLÓGICA URBANA Os setores da cidade com maior desigualdade social coincidem com uma menor concentração de áreas verdes e arborização. Associar a recuperação ambiental com a melhora das condições sociais conduz a construção de uma cidade mais sustentável. Uso da vegetação nativa e tradicional: o corredor verde é uma oportunidade para enriquecer a biodiversidade urbana incluindo vegetação de bosque seco tropical ao norte e bosque úmido ao sul. Consideramos a relação entre a cidade e a zona agrícola como um aspecto essencial frente a um futuro desenvolvimento urbano sustentável.

2. INTEGRAR SOCIAL E ESPACIALMENTE A CIDADE Potencializar organizações de base comunitária: fortalecer o tecido social com organizações comunitárias que apoiem o processo de transformação do corredor verde. Melhorar o habitat: operações de renovação e re-densificação. Além disto, ações de melhoramento integral de bairros nas áreas de influência direta.


3. EQUILIBRAR A CONECTIVIDADE COM UM CORREDOR VERDE DE TRANSPORTE PÚBLICO LIMPO. A continuidade espacial do corredor verde é um elemento fundamental para equilibrar a conectividade do sistema de transporte integrado da cidade, já que intersecta todos os fluxos no sentido leste-oeste. Planejamos então um sistema de transporte limpo que busca articular as lógicas dos fluxos dos sistemas naturais com os sistemas urbanos. Harmonizar os fluxos: a infraestrutura da cidade deve permitir o movimiento harmônico dos fluxos dos sistemas naturais e os sistemas urbanos. Veículos, pedestres, fauna, água e redes de serviços públicos devem coexistir em equilíbrio. Humanizar a infraestrutura: O projeto tem como objetivo que a infraestrutura viária permita o desenvolvimento harmônico da paisagem urbana, a qualidade espacial da cidade, a acessibilidade, a continuidade de corredores ecossistêmicos, além da eficiência nos sistemas de transporte.

Fig. 60. Referência 03. Fig. 61. Referência 04. Fonte: Archidaily.com


Fig. 62. Referência 01. Fig. 63. Referência 02. Fonte: Archidaily.com

4. RENOVAR A CIDADE COM PROJETOS ESTRATÉGICOS QUE ACIONEM PROCESSOS DE TRANSFORMAÇÃO A PARTIR DA ÁREA CENTRAL. Associado com o sistema de transporte limpo e melhora do espaço público, o corredor verde possui um grande potencial de renovar amplos setores da cidade com projetos de re-densificação, serviços e equipamentos com capacidade de transformação e fortalecimentos de novas centralidades. Desenvolver as bordas do corredor: como um elemento para consolidar um modelo de cidade denso e compacto, o corredor terá ações de melhora do público, que devem articular com processos de redensificação nas bordas, que permitam gerar oportunidades de negócios e recursos econômicos para as obras públicas. Inserir projetos chave: partindo de vocações, potenciais e carências dos diferentes âmbitos se localizam projetos que consigam acionar processos de transformação. Definir etapas de execução e fontes de financiamento mistas: o projeto foi dividido em etapas e em sub-etapas, de modo que as unidades de atuação, para facilitar sua gestão e sua vocação. Para cada unidade um instrumento de gestão pontual que permita a execução dos projetos. Implementar uma gestão participativa: o projeto planeja uma série de premissas, etapas e ações gerais que se articula com o modelo de cidade definido pelo POT de Cali, mas é de fundamental importância o desenho de um plano de gestão participativa que reconheça e convoque os atores sociais. Este processo garantirá governabilidade necessária para desenvolver as obras.


PLANO DE ÁREAS LIVRES DE LAZER O plano de áreas livres de lazer visa reestruturar tal subsistema no sentido de redistribuir equitativamente os seus equipamentos ao longo da extensão territorial urbana do recorte de estudos, bem como propor a requalificação dos existentes. Buscando, portanto, corrigir o forte déficit de equipamentos como esses nas zonas periféricas da cidade e consolidar os existentes. Segundo Caporusso e Matias, (2008), as áreas verdes amenizam as consequências negativas da urbanização e interfere diretamente na qualidade de vida. Seu estudo pressupõe uma análise cuidadosa de caráter qualitativo e quantitativo dos diversos sistemas que a compõe. Além da correção desse déficit, a criação dessas novas áreas de livres de lazer está direcionada, também, às zonas com maior densidade demográfica, além de considerar fatores como a disponibilidade de espaços residuais ociosos e o grau de eficiência que alguns equipamentos existentes possam vir a oferecer. Foi proposta, portanto, a criação de outras quatro áreas livres de lazer, das quais uma foi indicada como necessária no bairro Conjunto Santa Inês; três foram detalhadas e estão associadas ao projeto do Eixo de Mobilidade, todas no bairro XV de Novembro; além da outra associada ao projeto de toda a Zona Compartilhada do Mercado, que é entendida, também, como uma unidade de área livre de convívio e lazer. Os projetos para as áreas livres devem estar conectados ao perfil da população e, na sua concepção devem ser considerados fatores como adequação social, funcional, ambiental e estética, de modo que as praças possam estar em perfeita integração com o público alvo para serem devidamente apropriadas pela comunidade. (SOUSA, 2008)

No caso específico do bairro XV de Novembro, vale destacar que o Polo de Lazer desempenha uma função muito específica voltada para a contemplação do Açude Pereira de Miranda, não sendo, propriamente, um espaço de convívio para a população de suas intermediações; enquanto a Praça XV de Novembro tem problemas relacionados ao seu próprio desenho, que abriga dois prédios públicos e uma quadra esportiva no seu interior, comprometendo a sua continuidade visual, a instalação de mobiliários urbanos e até sua arborização, além do que seu estado manutenção está em péssimas condições. Isto, somado ao fato do bairro ser o mais denso do município (especialmente a sua porção leste), bem como a disponibilidade de espaços ociosos - que, inclusive, são passíveis de invasão, relacionados à “zona de amortecimento” da CE-341 contribuíram para a proposição de outros três equipamentos em sua abrangência. Sugere-se, ainda, que o desenho e as funções da praça XV de Novembro sejam revistas e que ela possa agregar, por exemplo, atividades como a de hortas urbanas coletivas. Espera-se que as intervenções consolidem um modelo de cidade funcional, inclusivo e visualmente harmônico, que organiza os seus espaços livres através de uma malha viária contínua, como a rede de articulação das áreas livres identificada no perímetro de estudo. Na visão de Tardin (2008), os espaços livres relacionam-se entre si e com seu entorno, consolidando uma ocupação da cidade ou reestruturando o território, garantindo funções urbanas referentes ao suporte biofísico e à sua percepção visual. 136


PLANO DE ÁREAS LIVRES DE LAZER Equipamentos Existentes Equipamentos Propostos Divisão dos Bairros Rede de Articulação das Áreas Livres de Lazer

Mapa 22. Plano de áreas livres de lazer. Fonte: Elaborado pelo autor

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PLANO DE MOBILIDADE O plano de mobilidade urbana visa promover a reestruturação do sistema viário através da sua reorganização e da requalificação das suas vias, além do incentivo a modais sustentáveis e seguros como a bicicleta, criando a infraestrutura necessária à sua utilização a partir de um estudo de Plano Cicloviário.

REESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA VIÁRIO O sistema viário do município de Pentecoste se organiza, basicamente, a partir das rodovias estaduais que permeiam o seu espaço urbano, como foi colocado capítulo de Diagnóstico. Ainda que o seu perímetro urbanizado não possua uma hierarquização oficial definida, o presente trabalho se propôs a desenvolver uma com base no conceito de Hierarquização Funcional, como foi colocado no Mapa 17 do mesmo capítulo. A partir dessa base, propõem-se algumas alterações pontuais na sua configuração, no sentido de reconhecer outras vias que possam auxiliar na sua estruturação, além de mudar a classificação de vias que necessitam se adequar a áreas com características específicas. As mudanças relacionadas a essas proposições devem estar associadas a um conjunto maior de normas como as de localização e acesso das edificações ao sistema viário, por exemplo, como, também, a algumas estratégias de uso e ocupação do solo que foram definidas nos Planos Complementares. Em um centro urbano de porte reduzido e com poucos instrumentos de controle do espaço urbano como Pentecoste, o reconhecimento da infraestrutura e da dinâmica associadas ao seu sistema viário e, a partir disso, a sistematização dessas informações se sobrepõem em importância às propostas que remodelem sua estruturação propriamente. Já que se trata de um centro com processo de urbanização em consolidação, em um contexto que não apresenta grandes conflitos e em um espaço físico que não comporta ou absolve grande alterações. Observou-se, lá, que grande parte das barreiras à acessibilidade do pedestre existente nas ruas com grande demanda de uso é consequência do tráfego de automóvel, seja devido às situações de conflito em potencial, seja pelas consequências diretas sobre os espaços destinados às pessoas. O que interfere diretamente na qualidade do ambiente urbano, com a redução da largura dos passeios, com a incidência de estacionamento abusivo, além das

»» Embora oriente a ação da Engenharia de Tráfego, a definição da classe funcional de uma via não é suficiente para estabelecer os objetivos e estratégias recomendáveis em uma via; é importante pelo menos reconhecer também seu ambiente operacional (isto é, as características de seu entorno que afetam aspectos essenciais da sua função); »» As questões relacionadas com a operação do sistema viário não são as únicas consideradas pelos agentes sociais ao discutir as ações da Engenharia de Tráfego; em particular, a lógica da hierarquização funcional pode chocar-se com a lógica da ocupação urbana, na qual os agentes sociais buscam extrair os maiores retornos (em termos financeiros ou em qualidade de vida) de qualquer ação que os afetem. Módulo de Engenharia de Tráfego e Transportes Urbanos, Hierarquização Funcional das Vias e Objetivos da Engenharia de Tráfego - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2006.

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poluições sonora e atmosférica relacionadas aos modais individuais motorizados. O plano propõe, portanto, a alteração do perfil de duas estruturas viárias. Logo, a Rua Antônio Martins Bandeira, reconhecendo o seu potencial de infraestrutura e conexão, passa a ser classificada como via Complementar, visando receber uma parte do fluxo associado ao deslocamento norte-sul da Av. José de Borba Vasconcelos, que tem uma alta demanda associada sua conectividade e aos polos geradores de tráfego estabelecidos na sua extensão; enquanto alguns trechos das ruas associadas às intermediações do Mercado passam a se caracterizar como [Vias Compartilhadas], dando uma resposta à predominância do uso comercial naquela região, valorizando, portanto, a escala do pedestre e desestimulando a utilização do automóvel como medidas de favorecimento à atividade comercial Mapa 23. Segundo Gehl (2013), a instalação de zonas para pedestres valoriza o espaço público, o comércio de rua, as áreas de passeio, reduzindo, assim, as distâncias e obstáculos para o seu fluxo, através de projetos que priorizam o conforto e a segurança destes usuários. Em uma perspectiva geral, a estruturação do sistema viário, mesmo em um nível mais abstrato, deve ponderar entre as determinações técnicas e os agentes sociais daquele contexto urbano para orientar minimamente a proposição de um plano adequado para definição de objetivos e ações direcionadas a cada via ou área. Absolvendo, ainda, o caráter mutável e complexo da cidade, estando atento às diferentes demandas que possam surgir cotidianamente e suas manifestações no espaço urbano.

PLANO CICLOVIÁRIO O outro do aspecto do Plano de Mobilidade Urbana proposto para o presente trabalho é a elaboração da base de um Plano Cicloviário, que se compromete em reconhecer e expandir a infraestrutura associada à cultura cicloviária da cidade. Ainda que os deslocamentos associados à bicicleta sejam relevantes naquele contexto e que esse modal tenha se mostrado cada vez mais como uma opção de transporte seguro e sustentável, ao contrário da motocicleta, por exemplo, não existe propriamente uma infraestrutura disponível ou políticas de incentivo à utilização desse modal. Sabe-se, porém, que, para a construção de centros urbanos com padrões elevados de qualidade de vida, se faz necessário à promoção da mudança dos padrões de deslocamento através do uso de modais não motorizados e integrados à estrutura de mobilidade urbana de um dado contexto. No âmbito Federal, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) regulamenta a bicicleta como meio de transporte, portanto, como veículo possui o direito de circulação pelas ruas e prioridade sobre os automotores. Já a Lei nº 12.587, de 3 de janeiro 2012, que institui diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana é um marco na consolidação das políticas de incentivo aos modais sustentáveis como nos seguintes trechos. »» Prioridade dos modos de transportes não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado; »» Integração entre os modos e serviços de transporte urbano; »» Reduzir os custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade. 139


Considerando a necessidade de dispor de espaços confortáveis e seguros para o deslocamento dos ciclistas, de preferência segregado do tráfego motorizado nas vias mais movimentadas, propõem-se a criação de uma rede cicloviária articulada, principalmente, às vias estruturantes e complementares da cidade (como mostra o Mapa 24), o que garante a sua integração ao sistema viário. É indispensável considerar os trajetos naturais praticados e infraestrutura existente na concepção da rede, procurando criar mecanismo de interligar adequadamente as ciclovias disponíveis com a implantação de trechos por onde os ciclistas já costumam utilizar, aumentando a continuidade da rede. Só assim, este tipo de transporte terá o seu uso estimulado de forma a atrair quantidade considerável de usuários, inclusive para deslocamentos diários e pendulares e que optem por deixar meios de transportes mais caros e pesados em prol do uso da bicicleta. (Plano Cicloviário

Integrado de Fortaleza, 2015, pág. 62)

A instalação dessa infraestrutura deve atender às recomendações dos manuais técnicos nacionais, levando em consideração as características de cada via, principalmente com relação à geometria, fluxo, velocidade e composição do tráfego, no sentido de incentivar o uso da bicicleta. O Caderno de Referência do Governo Federal de 2007 destaca que os principais fatores que influenciam na decisão de utilizar a bicicleta como meio de transportes são a qualidade física da infraestrutura cicloviária; a qualidade ambiental dos trajetos; a continuidade da infraestrutura; a facilidade para guardar a bicicleta; e a integração da bicicleta com outros modos de transporte. Propõe-se, ainda, a instalação de um sistema de bicicletas públicas compartilhadas com pontos fixos associados às áreas livres de lazer, permeando todo espaço urbanizado da sede do município, o que se configura como uma opção de deslocamento prática, barata e eficaz.

Mapa 23. Novo sistema viário. Mapa 24. Ciclovias e sistema de bicicletas compartilhadas. Fonte: Elaborado pelo autor

140


SISTEMA VIÁRIO Estruturante Complementar Local Compartilhada Vias alteradas

MOBILIDADE URBANA Ciclovia Estação de bicicletas compartilhadas

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Fig. 64. Bicicletas compartilhadas. Fonte: Diário do Nordeste

// CULTURA CICLOVIÁRIA E SISTEMA DE BICICLETAS COMPARTILHADAS As razões para implantar um programa de bicicletas compartilhadas geralmente têm a ver com metas de aumento do uso urbano da bicicleta, redução do congestionamento, melhoria da qualidade do ar e aumentar a oferta de opções opções de transporte não motorizados (TNM). O compartilhamento de bicicletas tem duas vantagens principais, quando comparado a outros projetos de transportes: baixo custo de implementação e menor prazo de implantação. É possível planejar e implementar um sistema durante o mandato de um único prefeito (ou seja, entre 2 a 4 anos), o que significa que os benefícios serão percebidos pelo público de forma mais imediata do que para outros modais de transportes. »» Reduzir os congestionamentos e melhorar a qualidade do ar: Bicicletas públicas constituem um meio alternativo de transportes para viagens mais curtas que, de outra forma, seriam feitas por veículos motorizados. Até novembro de 2011, os 22.000 usuários do sistema de bicicletas compartilhadas de Washington, D.C. reduziram em quase 7,1 milhões de quilômetros a distância percorrida por veículos motorizados (LDA Consulting 2012). »» Melhorar a acessibilidade geral: A implementação de um sistema de bicicletas compartilhadas dá aos usuários maior acesso a locais que estavam fora de seu alcance, enquanto pedestres. »» Aumentar o alcance dos sistemas de transporte de massa: Os sistemas de compartilhamento de bicicletas preenchem uma lacuna crítica, que é o trajeto entre a estação de transporte público mais próxima e o destino final do passageiro. Como pedalar é mais eficiente do que caminhar, o compartilhamento de bicicletas incrementa a mobilidade e custa menos à prefeitura do que ampliar o serviço de transporte público. »» Melhorar a imagem do ciclismo: O sistema de bicicletas compartilhadas transmite a imagem de uma cidade dinâmica, moderna e ajuda a fortalecer a cultura de bicicleta de uma cidade.


Fig. 65. Bicicletas compartilhadas. Fonte: cearanews.com.br

»» Fornecer serviços complementares ao transporte público: Bicicletas compartilhadas oferecem uma alternativa para viagens curtas que, de outra forma, as pessoas fariam de transporte coletivo. »» Melhorar a saúde dos moradores: Pedalar é um transporte mais ativo, que traz benefícios tanto à saúde física quanto mental. Há estudos que mostram que pedalar por apenas vinte minutos por dia tem um impacto positivo significativo sobre a saúde mental (Obis 2011, p. 41). »» Atrair novos ciclistas: Sistemas como esses permitem o fácil a uma bicicleta, para aqueles que não dispõem de uma ou que não tem onde estacioná-la. Em Lyon, na França, houve um aumento de 44% do uso da bicicleta no primeiro ano após a implementação do Velo’v, o sistema local de compartilhamento de bicicletas. Em uma pesquisa feita entre os usuários do Capital Bikeshare, sistema em Washington, D.C., 80% dos entrevistados declarou pedalar com mais frequência agora do que antes,, e 70% disse que o Capital Bikeshare tinha sido importante nesse processo (LDA Consulting 2012). »» Melhorar a imagem e identificação da marca de uma cidade: Pedalar é uma opção transporte de baixo impacto ambiental e uma cidade que implementa um sistema de bicicletas compartilhadas pode consolidar sua imagem de cidade moderna e sustentável. Em 2007, o sistema Vélib’ de Paris ganhou o prêmio de Melhor Projeto de Turismo Mundial da organização British Guild of Travel Writers. »» Gerar investimentos na indústria local: Sistemas de compartilhamento de bicicletas públicas precisam de diferentes equipamentos e softwares, impulsionando o desenvolvimento de novos produtos e aquecendo a economia local pela demanda de novos serviços em suas operações. Guia de Planejamento de Bicicletas Compartilhadas (2014)


PROJETO DO EIXO DE MOBILIDADE URBANA O projeto de intervenção denominado de Eixo de Mobilidade Urbana tem uma motivação primordial comprometida com a promoção da mobilidade urbana e da acessibilidade através de um eixo viário circundante que é composto por algumas das vias estruturantes do espaço urbano. As motivações secundárias, não menos importantes, partem das especificidades de cada um dos cinco trechos que compõem o seu percurso em uma escala mais minuciosa. A escolha desse circuito se deve, justamente, a alta demanda de fluxo associada, cotidianamente, à sua estrutura; ao seu potencial de articulação naquele contexto urbano; ao grande raio de influência que exerce no território urbanizado, alcançando, praticamente, toda a extensão da cidade; e à diversidade associada ao perfil econômico dos usuários que o utilizam, já que percorre os cinco bairros do perímetro de estudo, desde a zonas mais precárias até as zonas mais consolidadas. O projeto se propõe a garantir a continuidade e acessibilidade desse circuito, solucionando, ainda, as problemáticas associadas à priorização do uso do automóvel em detrimento da estrutura do pedestre e do ciclista, como passeios estreitos e ausência de ciclofaixas; à falta de arborização; à falta de iluminação pública; à subutilização dos espaços residuais nas margens das vias; à ausência de espaços livres em áreas periféricas; aos conflitos que ocorrem na caixa viária relacionados aos usos estabelecidos na sua margem; à demanda por zonas de trafic calming associadas à áreas conflitos entre pedestre e automóveis na caixa viária; entre outros. Trata-se, portanto, de um projeto complexo, que tem diversas vertentes de atuação, em diversas escalas e com status de estruturante do espaço urbano, abrangendo as dimensões social, política, econômica e ambiental daquele contexto urbano. O percurso é dividido em cinco trechos, mas existem sete pontos de detalhamentos, representados em plantas e cortes, já que só o trecho 01 possui três dessas áreas detalhadas.

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TRECHO 01 O trecho 01 está estruturado ao longo da CE-341, principal via de acesso à capital Fortaleza, que, no espaço urbano de Pentecoste, é denominada como Av. XV de Novembro. A sua extensão divide o bairro de mesmo nome em duas porções, leste e oeste. Como se trata de uma rodovia estadual, há uma legislação específica que ordena a sua estruturação dentro do espaço urbanizado. Nesse caso, é regulamentada uma zona de amortecimento de 15 metros, isto é, não pode haver qualquer tipo de edificação nos 15 metros adjacentes a borda da pista. Uma medida, esta, para garantir a segurança dos moradores que habitam nas suas imediações, já que as rodovias são associadas à tráfego de transportes velozes e pesados. Ainda que algumas partes dessa zona de amortecimento tenham sofrido invasões de moradores que ampliam o lote da sua residência no sentido longitudinal, predominam, ainda, as partes onde o recuo é respeitado. Ocorrendo, inclusive, alguns trechos em que o recuo chega a 30 metros, o que possibilita a formação de grandes espaços residuais subutilizados e desconectados da paisagem urbana. O XV de Novembro, como foi colocado anteriormente, se trata de um bairro denso, onde a maior parte da população é de baixa renda, portanto, há uma grande incidência de habitações e lotes precários, em um ambiente urbano predominantemente insalubre. A avenida acaba sendo uma espécie de “alívio” a essa realidade caótica que permeia, praticamente, todo o bairro, por se configurar como um espaço aberto, contínuo, com dimensões generosas e com grande potencial paisagístico. A sua porção leste, especialmente, entre a avenida e as margens do açude, acumula a maior parte dos problemas relacionados à falta de infraestrutura básica e urbana da cidade, o que se agrava com a elevada densidade associada aquela porção territorial. Então, para além das resoluções relacionadas às problemáticas de mobilidade urbana e acessibilidade do seu sistema viário, inclusive com a presença de infraestrutura cicloviária (ciclovias, paraciclos e estações de bicicletas compartilhadas), o trecho 01 tem como objetivo a construção de áreas livres de lazer junto às áreas residuais associadas à zona de amortecimento da rodovia estadual. Visando, portanto, consolidar essas áreas como ambientes urbanos atrativos, livres de invasões, através da instalação de espaços de convívio e lazer de qualidade para a população daquela região. Esse trecho possui três detalhamentos associados às três unidades de áreas livres de lazer criadas. Cada equipamento possui características e atividades específicas, fruto da leitura do seu entorno. 145


TRECHO 1A A primeira unidade de área livre de lazer proposta fica próxima a entrada principal da cidade, no extremo norte da avenida XV de Novembro, com acesso também pela Rua Padre Sinval Facundo, logo é de fácil acesso para os moradores dos bairros XV de Novembro e Conjunto Santa Inês. A sua instalação está vinculada a uma área de terreno baldio dentro do quarteirão, somada à área de recuo da margem da via, estando associada, principalmente, à população de baixa renda. O terreno possui um potencial de articulação com os dois bairros, promovido pelas duas vias que lhe dão acesso, e um potencial de utilização pelas suas populações, especialmente, pela presença de equipamentos como as escolas de ensino fundamental Balbina Moreira de Azevedo e Edson Tabosa, o posto de Saúde XV de Novembro e a Igreja de São Francisco nas suas proximidades. Além da promoção do convívio, possibilitada pela existência de áreas generosas de socialização, dotadas de arborização e iluminação pública, e com a presença de quiosques de vendas, a sua instalação tem uma motivação principal relacionada à prática esportiva. Portanto o espaço possui um passeio apropriado para prática de caminhadas e de cooper, uma quadra de futebol de areia, uma quadra de vôlei de areia, equipamentos de academia ao ar livre, mesas de tabuleiros de xadrez fixas e uma área livre para a prática de diversas atividades.

Escola de Ensino Fundamental Edson Tabosa Anexo da Fábrica de Calçados Paquetá Área do projeto Escola de Ensino Fundamental Balbina Moreira de Azevedo

146


Fig. 66. Trecho 1A - Planta Escala: 1.500

Fig. 67. Trecho 1A - Corte Escala: 1.250


TRECHO 1B A segunda unidade de área livre de lazer proposta se localiza em uma parte intermediária da avenida XV de Novembro, na sua porção leste, com acesso exclusivo por ela. Logo é de fácil acesso para os moradores dessa região, principalmente. A sua instalação está vinculada a uma grande área de amortecimento da rodovia estadual, que, inclusive, possui um recuo aproximado de 30 metros. É uma área que também está associada às populações de baixa renda, com incidência de habitações precárias, possuindo um grande potencial de articulação dentro do bairro XV de Novembro. Além da promoção do convívio, possibilitada pela existência de áreas generosas de socialização, que abrigam quiosques de vendas e são dotadas de arborização e iluminação pública, a sua instalação tem uma motivação principal relacionada à promoção da cultura e do lazer. Portanto, a essa unidade de área livre de lazer possui um anfiteatro para manifestações de cunho cultural e religioso, área de playgrounds, áreas livres para práticas de diversas atividades e um redário. Esse trecho possui a especificidade, ainda, da criação de uma via local compartilhada entre as casas e a praça possibilitada pela sua largura generosa, o que garante o acesso de transportes e um certo grau de privacidade e isolamento relativos às habitações daquela vizinhança do equipamento público.

Fábrica de Calçados Paquetá O

BR

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A

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A

148

XV

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Área do projeto


Fig. 68. Trecho 1B - Planta Escala: 1.500

Fig. 69. Trecho 1B - Corte Escala: 1.250


TRECHO 1C A terceira e última unidade de área livre de lazer proposta fica ao sul da avenida XV de Novembro, também na sua porção leste, com acesso pelas ruas da “Parede do Açude” e José de Paula Filho (Rua do Itamaraty), logo estabelece uma relação direta com o bairro que está inserida e com o Açude Pereira de Miranda, devido à sua proximidade. A sua instalação está vinculada, também, à uma grande área de amortecimento da rodovia estadual, que, igual ao trecho 02, possui um recuo aproximado de 30 metros. É uma área que está associada às populações de baixa renda, mas com uma incidência mais relevantes de classes mais favorecidas, possuindo um grande potencial de articulação, relativo às vias estruturantes que lhe dão acesso, além do potencial de utilização relacionado à presença dos serviços associados à região do açude (Polo de Lazer), além da presença de equipamentos como a Secretaria de Cultura e Turismo que abriga diversas atividades vinculadas ao seu funcionamento. Além da promoção do convívio, possibilitada pela existência de áreas generosas de socialização, com a presença dos quiosques de vendas, dotadas de arborização e iluminação pública, a sua instalação tem uma motivação principal relacionada, também, à prática esportiva, já que sua demanda de utilização maior é por parte da população daquele bairro. Portanto o espaço possui um passeio apropriado para prática de caminhadas e de cooper, uma quadra de vôlei de areia, uma meia quadra de basquete, equipamentos de academia ao ar livre e uma área livre para a prática de diversas atividades. Vale ressaltar que essa unidade de espaço livre deve se integrar às unidades da praça XV de Novembro e Polo de Lazer no sentido de promoverem atividades complementares. Esse trecho também possui a especificidade relativa à criação de uma via local compartilhada entre as casas e a praça possibilitada pela sua largura generosa, garantindo o acesso de transportes e um certo grau de privacidade e isolamento relativos às habitações daquela vizinhança.

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M

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BARRAGEM DO AÇUDE

150

XV

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Estabelecimentos comerciais relativos ao Açude (restaurantes, peixarias, etc.) Área do projeto DNOCS Secretaria de Cultura e Turismo Pólo de Lazer Açude Pereira de Miranda


Fig. 70. Trecho 1C - Planta Fig. 71. Trecho 1C - Corte Escala: 1.250

Escala: 1.500


TRECHO 2 O detalhamento do trecho 02 está situado nas intermediações da Rua José de Paula Filho (rua do Itamaraty), uma via que tem uma característica peculiar dentro daquele contexto urbano por estar situada entre dois barrancos, sustentada em uma estrutura que se assemelha a de uma ponte. As intervenções feitas na sua estrutura são propostas no sentido de promover a acessibilidade e a equidade de oferta de infraestrutura viária para os modais predominantes naquele contexto, no caso, para pedestres, ciclistas e modais motorizados. Foi observado que a via não possui largura que comporte a instalação de estruturas nas dimensões mínimas adotadas para o projeto, como passeios (1,20 + 1,20 metros), ciclovias bidirecionais isoladas (2,40 metros) e caixa de rolamento (3,50 + 3,50 metros). Como se trata de uma “ponte”, alterar a dimensão da sua largura requer uma grande disponibilidade de recursos financeiros, o que não é compatível com a realidade do município. Foram adotadas, portanto, propostas de infraestruturas fundidas e com dimensões mais modestas que se adequam a aquela largura. Logo, a caixa de rolamento foi reduzida para 6,40 metros (3,20 metros de cada lado); e a ciclovia foi fundida com o passeio formando um passeio compartilhado (com incidência de barreiras como os portes), para manter as dimensões mínimas necessárias. Desconsiderando, ainda, a necessidade de arborização que, nesse caso, é incompatível com o espaço disponível. Deve, ainda, haver uma normatização e uma sinalização específica para os deslocamentos efetuados nesse trecho, já que se trata de uma infraestrutura subdimensionada e adaptada em relação ao padrão adotado pelo projeto.

R. JOS

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152

AULA

Lagoa do Itamaraty (R. DO

ITAMA

RATY)


Fig. 72. Trecho 2 - Planta Escala: 1.500

Fig. 73. Trecho 2 - Corte Escala: 1.300


TRECHO 3 O detalhamento do trecho 03 está situado nas intermediações da rua Nossa Senhora de Fátima, uma via que também possui características peculiares dentro daquele contexto urbano, por ser uma das principais vias de acesso à maior praça da cidade (Praça do CSU), que abriga o maior número de atividades e, logo, tem o maior fluxo de pessoas. As intervenções feitas na sua estrutura são propostas a partir do reconhecimento da relação dessa praça com a outra margem da rua, que abriga estabelecimentos comerciais diversos com funcionamento diurno e, especialmente, noturno, como bares e lanchonetes ligados à vida noturna da cidade. O que gera um conflito intenso nos finais de semana, principalmente, já que esse trecho, mesmo no período da noite, possui um grande fluxo de automóveis e motocicletas que se choca com o fluxo de pedestres que se deslocam, também intensamente, entre a praça e os estabelecimentos comerciais. Foi criado, portanto, um trecho compartilhado, que eleva o nível da via ao da praça e do passeio, com uma pavimentação e sinalização específica (trafic calming) que alertam o motorista para a prioridade do pedestre naquele percurso. Além de iluminação e arborização adequadas. No que diz respeito à estruturação do sistema viário como um todo, as demais intervenções são propostas, também, no sentido de promover a acessibilidade e a equidade de oferta de infraestrutura viária para os modais predominantes naquele contexto, no caso, para pedestres, ciclistas e modais motorizados.

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Praça do CSU

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Área com predominância de estabelecimentos comerciais associada à praça

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Fig. 75. Trecho 3 - Corte Escala: 1.300

Fig. 74. Trecho 3 - Planta Escala: 1.500


TRECHO 4 O detalhamento do trecho 04 está situado nas intermediações da Avenida José de Borba Vasconcelos, que está inserida em uma das zonas mais consolidadas da cidade, sendo uma via que concentra o maior número de polos gerados de tráfego, e alguns dos mais relevantes, do perímetro de estudo, portanto, que possui um fluxo cotidiano intenso dentro daquele contexto urbano. As intervenções feitas na sua estrutura são propostas, também, no sentido de promover a acessibilidade e a equidade de oferta de infraestrutura viária para os modais predominantes naquele contexto, no caso, para pedestres, ciclistas e modais motorizados. Considerando, no caso, a forte presença da atividade comercial na sua extensão, o que está associado à incidência de vários conflitos no sistema viário, como o estacionamento abusivo, que interferem diretamente na qualidade do ambiente urbano e se agravam, ainda, com a ineficácia de uma infraestrutura urbana precária, como passeios estreitos, ausência de infraestrutura cicloviária e arborização irregular (situada em calçadas apertadas). O trecho, portanto, foi reformulado com o intuito de ampliar a calçada, para que acomode as estruturas de passeio, iluminação pública e arborização urbana; e de implantar uma ciclovia bidirecional arborizada no canteiro central.

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Borda da via com predominância de estabelecimentos comerciais

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156


Fig. 76. Trecho 4 - Planta Escala: 1.500

Fig. 77. Trecho 4 - Corte Escala: 1.300


TRECHO 5 O detalhamento do trecho 05 está situado nas intermediações da Avenida Padre Sinval Facundo, quando a rua começa a sair da zona consolidada em direção às zonas mais periféricas da cidade. Ela possui a característica de ser a via menos consolidada de todo o circuito, por estar associada aos bairros mais periféricos e menos consolidados, onde há uma grande incidência de vazios urbanos. É, porém, uma via que vem aumentando a sua demanda e utilização, associado ao principal vetor expansão da cidade, no caso, o norte, e ao processo de consolidação de bairros como Pedreiras e o Conjunto Santa Inês. As intervenções feitas na sua estrutura são propostas, também, no sentido de promover a acessibilidade e a equidade de oferta de infraestrutura viária para os modais predominantes naquele contexto, no caso, para pedestres, ciclistas e modais motorizados. Considerando, no caso, a precariedade e descontinuidade do seu espaço urbano como um todo. Onde os passeios são subdimensionados, a infraestrutura cicloviário é inexistente e a arborização e a iluminação pública são insuficientes. O trecho, portanto, foi reformulado com o intuito de ampliar a calçada, para que acomode as estruturas de passeio, iluminação pública e arborização urbana; e de implantar uma ciclovia bidirecional arborizada no canteiro central.

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158

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Creche-escola Maria Flor L FAC

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Fig. 78. Trecho 5 - Planta Escala: 1.500

Fig. 79. Trecho 5 - Corte Escala: 1.300


ZONA COMPARTILHADA DO MERCADO O projeto de intervenção denominado de Zona Compartilhada do Mercado tem motivações primordiais comprometidas com a consolidação da escala do pedestre e a promoção da acessibilidade universal na região comercial mais pujante do município, o Mercado. A cidade para os pedestres é, segundo Paulhans Peters, a reação frente à cidade ordenada, e também a resposta à cidade que prioriza o uso do automóvel. Seu princípio de ordenação se orienta pelo cotidiano do homem contemporâneo, suas necessidades e prioridades habituais, numa tentativa de conciliação e coexistência entre pedestres e motoristas, pedestres e ciclistas. (HAZAN, 2009)

A escolha dessa área se deve, principalmente, à grande representatividade que esse espaço tem dentro da dinâmica da cidade e à alta demanda de uso associada à sua estrutura física, que alcança pessoas de todas as partes do município e de regiões vizinhas, especialmente aos sábados, quando é realizada a feira popular. Como foi colocado no capítulo de Diagnóstico, esse mesmo espaço está sujeito a conflitos diários resultantes, basicamente, de uma demanda crescente associada a uma estrutura saturada, somadas à ausência de políticas de ordenamento do espaço urbano, que acabam por degradá-lo e precarizar as atividades exercidas nele.

RUA LUÍS SOARES

160

NEIRO

Escola de Ensino Média Tabelião Francisco Alves

DO CARMO

RUA ADOLFO CAR

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RUA JOSÉ SALÚ

RUA TETÉ BEZERR

RUA AGAPITO CORDEIR

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O projeto se propõe, então, a remodelar o perfil de trechos das vias adjacentes ao Centro de Abastecimento (prédio do Mercado Municipal), transformando-as em vias compartilhadas. Sendo elas as ruas Teté Bezerra, Luís Soares do Carmo, Agapito Cordeiro, José Salú e Adolfo Carneiro, o intuito é igualar o nível da caixa de rolamento ao nível do passeio, demarcando a sua divisória através de

Centro de Abastecimento (Mercado Municipal) Hospital Maternidade Regional Vale do Curú


Fig. 80. Zona Compartilhada do Mercado - Planta Escala: 1.750


balizadores, da troca de pavimento e da sinalização horizontal; criar estacionamentos para o modais motorizados nas áreas adjacentes ao perímetro da zona compartilhada; instalar mobiliários urbano de convívio e lazer; melhorar a infraestrutura de iluminação pública e arborização urbana. Trata-se, portanto, de um projeto concentrado nessa área, mas que repercute em toda extensão do territorial da cidade, já que configura uma quebra de paradigmas na maneira de elaborar a cidade, com foco na valorização do escala do pedestre, logo, da humanização do espaço urbano. A circulação de pedestres pela cidade remete às necessidades básicas de comer, beber, olhar, andar e descansar. A rua e suas extensões devem reforçar este caráter de lugar de relações, que garantem não só a vitalidade do lugar, como sua sustentabilidade e manutenção. A diversidade e a vitalidade do espaço são – segundo Eike Schmidt e Gerrit Stahr – o estímulo da alma, da fantasia e da criatividade de ações sobre o espaço, possibilitando a convivência entre o usuário e o espaço público. (HAZAN, 2009)

Fig. 81. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 01 Escala: 1.250

Fig. 82. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 02 Escala: 1.250


Fig. 83. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 03 Escala: 1.250

Fig. 84. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 05 Escala: 1.250

Fig. 85. Zona Compartilhada do Mercado - Corte 05 Escala: 1.250



CONSIDERAÇÕES FINAIS

A decisão de se aprofundar, minimamente, em um contexto urbano de uma cidade como Pentecoste comprova o quão desafiador é o caminho dos gestores públicos, planejadores urbanos, geógrafos e outros agentes sociais que se propõem ao estudo dessas cidades e que objetivam contribuir com o seu processo de formação. Por se tratar de um centro urbano de pequeno porte em uma situação relativamente periférica, o que se traduz em uma escassez expressiva de material de pesquisa, o processo de elaboração do trabalho trouxe ganhos significativos em relação aos métodos de pesquisa, levantamento e sistematização de informação, além da aplicação de uma metodologia de projeto urbano que exige o reconhecimento e a articulação de diversas escalas, já que se trata de um contexto onde quase inexiste uma cultura de planejamento urbano ou instrumentos que atuem sobre o espaço urbano. Ainda que se trate de um centro urbano com problemas estruturais históricos, foi motivador, entre outros aspectos, observar como algumas mudanças de postura do poder público, em relação à promoção de políticas urbanas, podem resultar em ganhos significativos para a qualidade de vida da população. Foi instigante, durante todo o percurso de produção, elaborar planos, estratégias e propostas que visassem a qualificação daquele ambiente urbano, especialmente, por se tratar de uma realidade de certo modo “inexplorada”, que está aberta a inúmeras possibilidades. E levar, ainda, as questões de urbanização contemporânea que estão sendo discutidas no mundo todo, como por exemplo, um modelo de cidade sustentável, que valoriza a escala humana e que incentiva os modais não motorizados para aquela realidade e deduzir que todas essas proposições são perfeitamente adequáveis a seu espaço urbano.

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CAPÍTULO 06 // DIAGNÓSTICO BERKE, Philip; GODSCHALK, David R.; KAISER, Edward J.; RODRIGUEZ, Daniel. Urban land use planning. 5th edition. Urbana: University of Illinois Press, 2006. DENATRAN. Manual de procedimentos para tratamento de pólos geradores de tráfego. Denatran / FGV, 2001. IBGE. Censo Demográfico 2000: Resultados do Universo. Agregado de Setores Censitários – Síntese. Documentação do Arquivo. Rio de Janeiro. 2002. LEITÃO, Lucia. As Praças que a gente tem, as praças que a gente quer: Manual de Procedimentos de Intervenção em Praças. Recife: Prefeitura de Recife, 2002.

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CAPÍTULO 07 // PROGRAMA DE INTERVENÇÃO AVELAR, Bruna Carvalho Moura; PASCHOAL, Sandra Regina Remondi Introcaso; DIAS SARQUES, Waleska. Política Ambiental Municipal: importância do Plano Diretor em normatizar a ocupação e expansão urbana no que tange ao desenvolvimento sustentável e recuperação ambiental. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 101, jun 2012. ARCHDAILY. Segunda fase do Corredor Verde de Cali na Colômbia. Publicado em 2, fev. 2016. http://www.archdaily.com.br/br/781254/assimsera-a-segunda-fase-do-corredor-verde-de-cali-em-colombia BARROS, Sandra Augusta Leão. O que são Bairros: Limites PolíticoAdministrativos ou Lugares Urbanos da Cidade? O caso de Apipucos e Poço da Panela no Recife. Editora Livro Rápido/Fapesp/UFRPE. Recife 2004. BRASIL. Lei 10.257, 10 de julho de 2001. Estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Brasília, Câmara dos Deputados, 2001, 1a Edição. BRASIL. Lei 12.608, 10 de abril de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil - PNPDEC; dispõe sobre o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil - CONPDEC; autoriza a criação de sistema de informações e monitoramento de desastres. Brasília, 2012. CAZOLLATO, José Donizete. Os bairros como instância territorial local o Contribuição Metodológica para o caso de São Paulo. Dissertação do programa de pós graduação em Geografia Humana (pág. 31) - Universidade de São Paulo. São Paulo, 2005. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 9 ed.São Paulo: Saraiva, 2008. INSTITUTO DE POLÍTICAS DE TRANSPORTE E DESENVOLVIMENTO. Guia de Planejamento de Bicicletas Compartilhadas. Rio de Janeiro, 2014, p. 16 - 18. MALTA, Candido. Reinvente seu Bairro. Editora 34. São Paulo, 2003. MARSHALL, S. (Org.). Urban Coding and Planning.Oxfordshire: Routledge, 2011. SPOSATI, Aldaíza. Cidade em Pedaços. Editora Brasiliense. São Paulo, 2001. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Brasileiro Ambiental. 15 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 9 ed.São Paulo: Saraiva, 2008. VITRUVIUS. Entrevista de Yannis Tsiomis à Adalberto da Silva Retto Junior sobre o livro “Anatomie du Projets Urbains”. Publicado em 13, jun. 2012. www.vitruvius.com.br

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