Argumento
Quando a atraente Caroline Trent é sequestrada por Blake Ravenscroft ela não tenta evitar a este perigoso e bonito agente da coroa. Depois de tudo, ela esteve a maioria de seus dias fugindo das ofertas indesejadas de matrimônio do filho de seu guardião. Sim, Blake acredita que ela é uma espiã chamada Carlotta de Leão, mas só será por seis semanas, até seu vigésimo primeiro aniversário, então ela terá o controle de sua fortuna. Enquanto se ocultasse na companhia de seu captor misterioso e sombrio, isto será muito conveniente e romântico. A missão de Blake Ravenscroft é levar Carlotta à justiça, não apaixonar-se. Seu coração se endureceu durante anos por causa da perda de sua noiva querida. Mas esta pequena tentadora garota prova ser estranhamente tenra e deliciosamente adorável. E repentinamente, o inconcebível se converte em possível. Será que este casal tão diferente está destinado ao amor?
Capítulo 1
Com-tu-ber-nal (nome) que ocupa a mesma morada, morada de companheiros, camaradas. O conceito do Percy Prewitt como meu camarada (meu contubernal) provoca a ruptura de meus esquemas. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent.
Hampshire, Inglaterra 3 de Julho de 1814 Caroline Trent não pretendia atirar em Percival Prewitt, mas o fez, e agora ele estava morto. Ou ao menos ela pensou que estava morto. Certamente, havia bastante sangue. Gotejava das paredes, o chão estava salpicado, os lençóis estavam totalmente manchados. Caroline não sabia muito de medicina, mas estava segura de que um corpo não podia perder tanto sangue e seguir com vida. Agora tinha um grande problema. —Maldição — murmurou. Embora ela fosse uma autêntica senhorita, nunca teve uma vida muito fácil, e sua linguagem, às vezes, deixava muito a desejar. —Estúpido — disse ao corpo que havia no chão. — Por que me agarrou dessa maneira? Por que não te afastou de mim e me deixou tranquila? Disse a seu pai que não me casaria contigo, disse que não me casaria mesmo que fosse o último idiota da Grã-Bretanha. Faltou pouco para lhe dar um pontapé de frustração. Por que nenhuma vez a entenderam? —O que eu quis dizer é que você é idiota, — disse ao Percy, que, surpreendentemente (obviamente), nem respondeu. —E que não me casaria contigo nem que fosse o último homem na Grã-Bretanha, e oh diabos, que estou fazendo te falando, de toda forma? Está morto. Caroline gemeu. Que diabos se supunha que devia fazer agora? O pai do Percy voltaria em menos de duas horas e não se requeria um título em Oxford para deduzir que Oliver Prewitt não ficaria feliz de encontrar a seu filho morto no chão. —Que incômodo é seu pai — agachou-se — este é seu defeito, se não estivesse tão obcecado te procurando uma herdeira... Oliver Prewitt era o tutor de Caroline, ou ao menos o seria durante as próximas seis semanas, até que fizesse vinte e um anos. Esteve contando os dias que lhe faltavam até 14 de agosto de 1814,
desde em 14 de agosto de 1813, quando completou os vinte. Só faltavam quarenta e dois dias, quarenta e dois dias e por fim teria o controle de sua vida e de sua fortuna. Nunca quis saber o quanto gastaram os Prewitt de sua herança. Atirou a arma em cima da cama, colocou as mãos sobre seus quadris e olhou fixamente ao Percy. E então... os olhos dele se abriram. —Ahhhhhh! — Caroline soltou um forte grito, deu um salto e agarrou sua arma. —Você b... — Começou Percy. —Não diga nada — advertiu-lhe — ainda tenho uma arma. —Não deveria usá-la — disse com um grito sufocado, tossindo e agarrando seu ombro ensanguentado. —Você me perdoe! Mas as evidências parecem indicar outra coisa. Os finos lábios de Percy se fecharam fortemente em uma linha reta. Amaldiçoou violentamente, e então dirigiu seu furioso olhar para Caroline. —Disse a meu pai que não queria me casar contigo, — chiou, — Deus! Você imagina? Passar contigo o resto de minha vida? Deixaria-me louco, se não me matasse primeiro, claro. —Se não queria te casar comigo não deveria ter tentado me forçar. Ele encolheu os ombros, então uivou quando o movimento produziu uma fisgada de dor em seu ombro. Olhou-a bastante furioso e lhe disse: —Você tem dinheiro, mas, sabe? Acredito que não o vale. —Amavelmente, eu disse a seu pai — respondeu bruscamente. —Disse que me deserdaria se não me casasse contigo. —E não pôde lhe fazer frente, por uma vez em sua patética vida? Percy grunhiu ao ser chamado patético, mas em suas débeis condições, não estava em situação de reagir. —Poderia ir a América — murmurou— certamente os selvagens têm que ser melhor opção que você. Caroline não fez conta. Percy e ela sempre se estranharam desde que Caroline foi viver com os Prewitt um ano e meio antes. Percy sempre esteve bastante dominado por seu pai e a única vez que mostrou alguma coragem foi quando Oliver abandonou sua casa. Desgraçadamente, sua coragem era normalmente mesquinha, pequena, e em opinião de Caroline, bastante débil. —Suponho que terei que te salvar agora — ela se queixou.
—Pode estar segura de que não irá à forca. —É muito amável. Caroline sacudiu um travesseiro, e a tirou de sua capa, dobrou-o, notando a boa qualidade do linho, provavelmente comprado com seu dinheiro, e pressionou com ela sobre a ferida do Percy. —Temos que parar a hemorragia — disse. —Parece que diminui agora — admitiu Percy. —A bala te atravessou totalmente? —Não sei. Dói como o diabo, mas não sei se dói mais porque me atravessou ou porque ficou encaixada no músculo. —Imagino que ambas as coisas são bastante dolorosas, — disse Caroline levantando a capa que usou e examinando a ferida. Deu-lhe a volta brandamente e olhou suas costas. —Acredito que te atravessou, tem um buraco atrás do ombro também. —Tenha em conta que me feriste por duas vezes. —Atraiu-me ao seu quarto fingindo que necessitava uma xícara de chá para acalmar seu resfriado — respondeu bruscamente, — e então tentou me violar! O que esperava? —Por que diabos levava uma arma? —Sempre a levo —respondeu. — Tenho-a desde... bom, não te importa. —Eu não ia atirando com ela. — murmurou. —Como é que imaginaria? —Bom, você sabe que nunca te gostei. Caroline pressionou sua improvisada bandagem contra o ombro ensanguentado do Percy, possivelmente com mais força do que era necessário. —O que eu sei — cuspiu — é que seu pai e você sempre gostaram bastante da minha herança. —Acredito que eu não gosto tanto de sua herança como você me desgosta. — queixou-se Percy. — É muito mandona, não é tão bonita, e tem a língua própria de uma serpente. Caroline apertou sua boca, em uma linha severa. Se tinha uma língua afiada, isso não era um defeito. Aprendera rapidamente que esse talento era sua única defesa contra o desfile de tutores horríveis, aos que teve que suportar desde o falecimento de seu pai, quando ela tinha dez anos. Primeiro foi George Liggett, um primo de seu pai. Não foi tão mau tipo, mas certamente não sabia o que fazer com uma jovenzinha. Assim, lhe sorriu uma vez (só uma vez, Por Deus) disse-lhe que era
muito feliz por encontrar-se com ela, e a levou a um imóvel afastado com uma babá e uma instrutora. E então começou a esquecer-se dela. Mas George morreu e a tutoria passou a seu primo, que nunca teve relação com ela nem com seu pai. Miles Wickham era um velho avaro e mesquinho que via uma pupila como um bom substituto de criada, e imediatamente lhe dera uma lista de tarefas mais longa que seus braços. Caroline precisava cozinhar, limpar, engomar, lustrar, esfregar e varrer. Quão único ela não precisava fazer era dormir. Miles, de qualquer maneira, engasgou-se com um osso de frango, pôs a cara de uma cor arroxeada, e morreu. Os tribunais já não sabiam o que fazer com Caroline, que com quinze anos parecia muito culta e enriquecida para colocá-la em um orfanato, assim passaram a tutoria ao Archibald Prewitt, segundo primo do Miles. Archibald era um velho sujo, que achou Caroline muito atraente para sua tranquilidade, e foi então quando começou seu hábito de levar sempre uma arma consigo. Mas Archibald tinha um coração débil, assim Caroline só teve que viver com ele durante seis meses antes de assistir a seu funeral e despedir-se para ir viver com seu irmão mais novo, Albert. Albert bebia muito e a espancava, por isso Caroline aprendeu rapidamente a correr e esconderse bem. É possível que Archibald a tivesse procurado às cegas muitas vezes, mas Albert era um pobre bêbado e quando a golpeava, doía. Chegou a ser bastante hábil encontrando licores dentro de uma sala. Albert nunca levantou sua mão contra ela quando não estava bêbado. Mas, infelizmente, Albert raramente estava sóbrio, e em uma de suas furiosas bebedeiras deu um pontapé tão forte em seu cavalo que o animal lhe devolveu um coice. Justo na cabeça. Naquela época Caroline já estava acostumada a mover-se de um lado para outro, assim, tão logo o médico colocou o lençol sobre o rosto do Albert, fez sua bagagem e esperou a que os tribunais decidissem onde enviála agora. Logo se encontrou vivendo com o irmão mais novo de Albert, Oliver e seu filho Percy, que neste momento estava sangrando. A princípio, Oliver lhe parecera o melhor de todos, mas Caroline rapidamente percebeu que Oliver não queria a ela a não ser a seu dinheiro. Uma vez que ele descobriu que sua pupila vinha com uma soma bastante importante, decidiu que Caroline (e seu dinheiro) não escapariam de suas garras. Percy era só uns anos mais velho que Caroline, assim Oliver lhes anunciou que se casariam. Nenhum dos dois estava de acordo com este plano, e assim o fizeram saber, mas ao Oliver não importou; provocou ao Percy até que consentiu, e então se dispôs a convencer a Caroline de que ela devia chegar a ser uma Prewitt. —Te convença — impunha a gritos, esbofeteava-a, a fazia passar fome, encerrando-a em seu quarto, e por último, ordenou ao Percy que a deixasse grávida e assim eles teriam que casar-se.
—Antes criaria a um bastardo que a um Prewitt, — disse Caroline entre dentes. —O que foi isso? — perguntou Percy. —Nada. —Precisa ir. — disse bruscamente mudando de assunto. —Está claro. —Meu pai me disse que se não te deixasse grávida ele mesmo o faria. Caroline por pouco não vomitou. —Tenho que te suplicar o perdão? — disse ela com voz excepcionalmente instável. Até Percy era preferível ao Oliver. —Não sei aonde pode ir, mas precisa desaparecer até que complete os vinte e um anos. Que é... quando?... Logo, conforme acredito. —Seis semanas— sussurrou Caroline — seis semanas exatamente. —Pode fazê-lo? —Me esconder? Percy assentiu com a cabeça. —Terei que fazê-lo, Verdade? Embora necessitarei de dinheiro. Tenho um pouco de dinheiro solto, mas não tenho acesso a minha herança até meu aniversário. Percy fez uma careta de dor quando Caroline desprendeu a bandagem de seu ombro. —Posso te ajudar um pouco — disse ele. —Devolverei-lhe isso. Com juros. —Bem, precisa ir esta noite. Caroline deu uma olhada ao quarto. —Mas... a desordem... Precisamos limpar o sangue. —Não, deixa-o. Melhor dizer que eu te deixei escapar porque você atirou em mim, que eu simplesmente arruinei o plano. —Um dia destes terá que fazer frente a seu pai. —Será mais fácil quando for. Há uma garota estupenda duas cidades mais à frente a que tenho em mente cortejar. Ela é calada e obediente. E não é tão franca como você. Caroline imediatamente sentiu lástima da pobre garota.
—Espero que tudo te saia bem - mentiu. —Não, não o espera, mas não importa. Realmente, não haverá nenhum problema assim que vá. —Sabe Percy? O que sinto exatamente por ti? Assombrosamente, Percy sorriu e pela primeira vez nos oito meses desde que Caroline foi viver com o sucessor mais jovem dos Prewitt, ela experimentou uma sensação de afinidade por este moço que era virtualmente de sua idade. —Onde iras? perguntou ele. —É melhor que não saiba. Desta forma seu pai não poderá te chatear para que o conte. —Bem pensado. —Além disso, não tenho nem ideia. Não tenho parentes, já sabe. Por isso vim aqui com vocês. Mas depois de dez anos de defender a mim mesma contra meus "maravilhosos" tutores, deveria acreditar que posso me guiar no mundo durante seis semanas. —Se alguma mulher pode fazê-lo, essa é você. Caroline elevou suas sobrancelhas. —Percy, Porquê? Era um galanteio? Deixa-me pasmada. —Não era nem o mais parecido a um galanteio. Que tipo de homem quereria a uma mulher que pode arrumar-se sem ele? —Pelo que poderia prescindir o tipo de seu pai — replicou Caroline. Percy franziu o cenho quando girou a cabeça para sua escrivaninha. —Abre a gaveta de cima, não, a primeira da direita... —Percy, esta são suas cuecas! — exclamou Caroline fechando de repente a gaveta com repugnância. —Você quer que te empreste dinheiro ou não? Aí é onde o escondo. —Claro, guarda-o aí porque ninguém quereria olhar nesse lugar — murmurou ela — possivelmente se te lavasse mais frequentemente... —Deus! — gritou ele violentamente — estou desejando que vá. Você, Caroline Trent, é a própria filha do diabo, uma praga, a peste, é... —Oh... fecha a boca! — voltando a abrir a gaveta de repente, desgostada com suas palavras maldosas. Ela gostava tanto de Percy como ele gostava dela, mas quem gostaria de ser comparado com lagostas, mosquitos, rãs, a peste, e rios emanando sangue? —Onde está o dinheiro? — exigiu
ela. —Em minha meia, não... o negro... não, esse negro não... sim, em cima, perto de... sim, é esse. Caroline encontrou a meia em questão e tirou algumas cédulas e moedas. —Meu Deus, Percy, aqui deve ter umas cem libras.Onde conseguiu tanto? —Estive economizando durante algum tempo e pego de meu pai uma ou duas moedas ao mês em seu escritório. Sempre que não pegue muito, ele não se inteira. Caroline achou isto difícil de acreditar. Oliver Prewitt estava tão obcecado com o dinheiro que ela se perguntava como era possível que sua pele não tivesse a cor das cédulas de libra. —Pode pegar a metade — disse Percy. —Só a metade? Não seja estúpido Percy, tenho que me esconder durante seis semanas, pode ser que tenha gastos inesperados. —Eu posso ter gastos inesperados. —Você tem um teto sobre sua cabeça! — gritou ela violentamente. —Pode ser que não, assim que meu pai descubra que te deixei partir. Caroline teve que lhe dar a razão, Oliver Prewitt não ia ser muito amável com seu único filho. Ela se desfez da metade do dinheiro e o voltou a meter na meia. —Muito bem — disse, colocando apressadamente sua parte no bolso. — Tem sua ferida sob controle? —Não será acusada por assassinato, se for isso o que a preocupa. —É difícil que acredite, Percy, mas não quero que morra; não quero me casar contigo e certamente não lamentarei não ter posto nunca meus olhos em ti, mas não quero que morra. Percy a olhou estranhamente, e por um momento Caroline pensou que nesse momento ele ia dizer lhe algo agradável ( ou ao menos tão agradável como o que lhe havia dito) em resposta, mas ele só bufou. —Tem razão, é difícil de acreditar para mim. Nesse momento, Caroline decidiu prescindir de qualquer sentimentalismo que pudesse sentir e saiu com passo decidido até a porta. Com a mão na maçaneta disse: —Verei-te dentro de seis semanas, quando deva recolher minha herança. —E me devolverá o dinheiro — recordou-lhe ele.
—E te devolverei o dinheiro, com juros — acrescentou ela antes de que ele o fizesse. —Vale. —Por outro lado — disse, principalmente para si mesmo. — É possível que haja um modo de resolver meus assuntos sem me encontrar de novo com os Prewitt. Poderia fazer tudo através de um advogado e... —Seria inclusive melhor — interrompeu-a Percy. Caroline soltou um grito muito zangada, despediu-se e saiu do quarto. Percy nunca mudaria, era mal educado, egoísta, embora fosse duvidosamente mais agradável que seu querido pai ainda seria um caipira grosseiro. Saiu correndo pelo corredor escuro e subiu voando as escadas até seu quarto. Era engraçado que seus tutores sempre lhe deixassem o quarto no sótão. Oliver foi o pior de todos, relegando-a a um canto poeirento com tetos baixos e beirais profundos. Mas se o que ele queria era mudar seu caráter, equivocou-se. Caroline amava seu quarto acolhedor. Estava mais perto do céu, podia ouvir a chuva contra o teto e podia ver os ramos das árvores brotar na primavera. Os pássaros se aninhavam por fora de sua janela e de vez em quando, os esquilos brincavam de correr por seu batente. Tão logo colocou seus mais apreciados pertences dentro de uma bolsa, parou para dar uma olhada por fora da janela. Era um dia espaçoso e agora o céu estava extraordinariamente claro. De algum modo, era de esperar que esta seria uma noite cheia de estrelas. Caroline tinha poucas lembranças de sua mãe, mas ela podia recordar quando se sentava sobre seu colo nas noites de verão, olhando fixamente as estrelas. —Olhe essa — sussurrava Cassandra Trent — acredito que é a mais brilhante do céu— e olhe ali, pode ver o urso? Seus passeios sempre terminavam quando Cassandra dizia: —Cada estrela é especial Sabia? Acredito que às vezes todas parecem a mesma, mas cada uma é especial e diferente, como você. Você é a moça mais especial do mundo, nunca o esqueça. Caroline era muito jovem para dar-se conta de que Cassandra estava morrendo, mas agora ela o via como o último presente de sua mãe. Mas não importava quão só e triste se sentia (e nos últimos dez anos de sua vida teve muitas razões para sentir-se só e triste), Caroline só olhava o céu para ter um momento de paz. Se uma estrela brilhava ela se sentia a salvo e reanimada. É possível que não se sentisse igual a quando era pequenina e estava sobre o colo de sua mãe, mas ao menos as estrelas lhe davam esperança, se aguentavam, ela também poderia aguentar. Fez uma última inspeção para certificar-se que não deixava nada, jogou umas poucas velas de
sebo em sua bolsa se por acaso as necessitasse e saiu precipitadamente. A casa estava tranquila, já que a todos os criados deram a noite livre, provavelmente, porque assim não haveria testemunhas quando Percy a agredisse. Era a obrigação de Oliver pensar a frente. A Caroline só a surpreendia que não tivesse tentado antes esta tática. Deve ter pensado a princípio que conseguiria casá-la com o Percy sem recorrer à força. Agora que se aproximava seu aniversário, seu desespero ia aumentando. E assim discorria a vida de Caroline, se casava com o Percy morreria, e lhe dava igual quão melodramático isso soava, quão único podia ser pior que lhe ver cada dia durante o resto de sua vida seria ter que escutá-lo cada dia durante o resto de sua vida. Já partia atravessando o vestíbulo que levava a porta principal, quando observou o novo candelabro de Oliver majestosamente colocado na mesa que havia ao lado. Esteve se gabando toda a semana dessa peça de prata autêntica, como ele dizia, o mais fino artesanato, Caroline emitiu um grunhido; Oliver nunca poderia conseguir candelabros de prata autêntica, antes de que lhe nomeassem seu tutor. Verdadeiramente, era irônico, ela teria sido feliz de dividir sua fortuna, ou a dar de presente inclusive, se encontrasse uma casa com uma família que a amasse e a protegesse; alguém que visse nela algo mais que uma criada com uma conta no banco. Impulsivamente, Caroline agarrou de um puxão as velas de cera de abelha do candelabro e as trocou pelas de sebo de sua bolsa; se precisava acender uma vela em suas viagens, ela teria o aroma doce que desprende a cera de abelha e que Oliver reservava para ele. Saiu correndo, murmurando um pequeno agradecimento pelo bom clima. —Menos mal que Percy não decidiu me atacar no inverno — murmurou, enquanto dava largos passos em direção à rua. Teria preferido cavalgar um pouco para sair mais rápido de Hampshire, mas Oliver só tinha dois cavalos, e neste momento se achavam atrelados a sua carruagem, e a levara consigo para ir a sua reunião semanal de jogos de cartas, à casa do patrão. Caroline tentou olhar para a parte luminosa da trilha e se recordou que se esconderia mais facilmente se fosse a pé. Teria que ir mais devagar, embora, corria através dos atalhos... Estremeceu-se; uma mulher só chamaria muito a atenção, e seu cabelo castanho e brilhante, refletiria muito a luz da lua, embora a maior parte tivesse escondido dentro de um gorro. Esteve tentada de disfarçar-se como um menino, mas não teve tempo suficiente. Possivelmente seguiria pela costa para o porto ativo mais próximo, não estava muito longe; poderia viajar mais rápido por mar, levaria-a o suficientemente longe para que Oliver não pudesse encontrá-la nas seis semanas. Sim, teria que ir pela costa, mas não poderia ir pelos caminhos principais, já que certamente alguém a veria; assim girou para o sul, e começou a abrir caminho através do campo. Portsmouth só estava a quinze milhas, se caminhasse rapidamente durante toda a noite, poderia estar ali pela manhã;
então tiraria uma passagem em qualquer tipo de navio que a levasse a outra parte da Inglaterra. Caroline não queria abandonar o país, não quando precisava reclamar sua herança em escassas seis semanas. Mas que se supunha que devia fazer durante esse tempo? Esteve isolada da sociedade há muito tempo, nem sequer sabia se estaria qualificada para algum trabalho singelo. Pensou que podia ser uma boa instrutora, mas o mais provável é que demorasse seis semanas para encontrar esse posto. E então... Bom, não seria justo conseguir um posto de instrutora e deixa-lo simplesmente umas semanas depois. Sabia cozinhar, e seus tutores se asseguraram de que soubesse limpar; ela podia trabalhar em troca de um quarto e comida em alguma estalagem pouco conhecida e bastante fora de sua rota. Assentiu para si mesma, limpar o que sujavam desconhecidos não era muito atraente, mas parecia ser sua única esperança de sobrevivência nas semanas seguintes. De qualquer modo, precisava desaparecer de Hampshire e seus condados vizinhos; podia trabalhar em uma estalagem, mas precisava estar muito longe de Prewitt Hall. Assim aumentou sua velocidade para Portsmouth, a grama sob seus pés era suave e seca, e as árvores a resguardavam da vista do caminho principal; não havia muito trânsito a estas horas da noite, mas precaução nunca era demais. Movia-se rapidamente, o único som eram suas pegadas ao tocar o chão. Até... O que foi isso? Caroline girou , mas não viu nada; seu coração se acelerou, teria jurado que ouviu algo. —Seria um ouriço — sussurrou para si mesma — ou possivelmente uma lebre — mas não via nenhum animal, e não se sentia tranquila. —Segue andando — disse-se — deve chegar a Portsmouth pela manhã — e continuou sua marcha; agora ia tão veloz, que começou a respirar cada vez mais depressa, e então... Voltou a voltar-se sobre si mesma, instintivamente, sua mão procurou alcançar sua pistola. Agora, definitivamente, ouvira algo. —Sei que está aí — disse com um desafio na voz que não estava segura de sentir. — Mostre seu rosto ou fique aí como um covarde. Ouviu-se um rangido, e então um homem saiu de entre as árvores. Ia vestido completamente de negro, desde sua camisa até as pontas de suas botas, inclusive seu cabelo era negro. Era alto, e com uns ombros muito largos. Era o homem de aspecto mais perigoso que Caroline vira em sua vida. E tinha uma pistola que apontava diretamente a seu coração.
Capítulo 2
Pug-na-cious (adjetivo). Disposto a lutar, dado ao combate, lutador. Posso ser lutador (pugnacious) quando estou em apuros. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent Blake Ravenscroft não estava seguro do aspecto que ele pensou que teria a mulher, mas certamente não era este. Pensou que pareceria doce, tímida, manipuladora. Em troca, ela permaneceu em pé, manteve seus ombros retos e o olhou fixamente aos olhos. E tinha a boca mais fascinante que jamais vira. Não sabia como descrevê-la, exceto que seu lábio superior se arqueava da forma mais deliciosa e... —Acredita que existe a possibilidade de que aponte com a pistola para outra parte? Blake despertou bruscamente de seu sonho, horrorizado por sua falta de concentração. —Gostaria disso, verdade? —Pois sim, em efeito, tenho um pouco de mania, sabe? Não entendo muito bem as armas, precisamente; são boas para alguns fins, suponho que para caçar e isso, mas não desfruto especialmente quando me apontam diretamente, e... —Silêncio! Ela fechou sua boca. Blake a estudou durante uns minutos. Algo nela não estava certo, Carlotta De Leão era espanhola... bom, meio espanhola pelo menos, e esta garota parecia inglesa por toda parte; seu cabelo não podia dizer-se que era loiro, mas certamente tinha um matiz claro de castanho e inclusive na noite escura pôde ver que seus olhos eram de um claro verde-azulado. Sem mencionar sua voz, que tinha certo sotaque com o acento inglês da nobreza britânica, mas ele a vira sair às escondidas da casa do Oliver Prewitt, a altas horas da noite, com todos os criados de licença; precisava ser Carlotta De Leão, não havia outra explicação. Blake e o Ministério de Defesa, no qual não estava precisamente trabalhando, mas lhe deram ordens em referência a uma carta de câmbio incomum, de um banco que esteve procurando o Oliver Prewitt durante aproximadamente seis meses. As autoridades locais sabiam há algum tempo que Prewitt fazia um importante contrabando da França, mas foi recentemente, que começaram a suspeitar
sobre o enredo que permitia aos espiões de Napoleão usar seu pequeno navio para levar mensagens diplomáticas, segredos junto com sua carga habitual de conhaque e seda; desde que o navio do Prewitt navegava de uma baía pequena ao sul da costa entre Portsmouth e Bournemouth, o Ministério de Defesa a princípio não lhe prestara muita atenção; a maioria dos espiões faziam suas travessias a partir de Kent, que estava muito mais perto da França. A aparentemente inconveniente localização de Prewitt, foi um excelente estratagema, e o Ministério de Defesa temia que as forças de Napoleão a estiveram usando para suas mensagens mais importantes; fazia um mês que descobriram que o contato do Prewitt era Carlotta De Leão, meio espanhola, meio inglesa e cem por cento letal. Blake esteve em alerta toda à tarde, mal averiguou que todos os criados dos Prewitt tinham a noite livre, um gesto nada comum para um homem tão notoriamente miserável como Oliver Prewitt; sem dúvida algo estava tramando, e as suspeitas de Blake foram confirmadas, quando viu a garota sair furtivamente da casa coberta pela escuridão; Era tão jovenzinha que supôs que não a deixaria aparentar inocência para dissuadi-lo; provavelmente mostraria esse olhar de jovem condenada. Quem suspeitaria que uma jovenzinha tão encantadora fosse capaz de alta traição? Seu cabelo comprido estava estirado para trás em uma trança juvenil, suas faces tinham esse rubor, essa aparência de limpeza, e... E sua delicada mão estava descendo lentamente para seu bolso. Blake finalmente se deixou levar pelos instintos, seu braço esquerdo se estendeu com uma velocidade surpreendente golpeando a mão dela para mudar sua trajetória ao mesmo tempo que se equilibrava para frente; chocou-se contra ela com todo seu peso e os dois caíram ao chão. Ele sentiu sua suavidade debaixo dele, exceto é obvio, pela dura pistola de metal de seu bolso oculto. Se ele tinha alguma dúvida de sua identidade antes, esta desapareceu. Pegou a pistola e a colocou no cinto da calça, e ficou de pé voltando-se para trás, deixando-a atirada no chão. —Muito pouco profissional, meu amor. Ela piscou e então resmungou. —Vale, sim, isto é o que se esperava já que mal sou uma profissional neste tipo de coisas, embora tenha tido alguma experiência com... Suas palavras foram apagando-se até converter-se em um murmúrio ininteligível e ela não estava totalmente seguro se para ele ou para si mesma. —Estive atrás de você durante aproximadamente um ano, — disse bruscamente e com isto atraiu sua atenção. —Esteve atrás de mim?
—Não soube quem era até o mês passado, mas agora que a tenho, não a deixarei escapar. —Não me deixará escapar? Blake a olhou fixamente, irritado pela confusão. Qual era seu jogo? —Acredita que sou idiota? — cuspiu. —Não — disse ela. — Acabo de fugir de uma guarida de idiotas, estou bem familiarizada com essa raça, e você é um pouco mais que isso. De qualquer maneira, espero que não seja um bom atirador. —Eu nunca falho. Ela suspirou. —Sim, estou me assustando muito; olhe como estou. Incomodo se me jogo para trás? Ele moveu a arma menos de uma polegada, o suficiente para lhe recordar que estava apontando ao coração. —Neste momento, acredito que prefiro sua postura no chão. —Pressinto o que é que preferiria — murmurou — não acredito que me deixe seguir meu caminho. Sua resposta foi uma risada. —Temo que não, meu amor, seus dias como espiã terminaram. —Meus dias como o quê? —O governo Britânico sabe tudo sobre você e sobre suas maquinações de traição, senhorita Carlotta De Leão, acredito que se dará conta de que nós não olhamos muito amavelmente aos espiões espanhóis. Seu rosto era um quadro perfeito de incredulidade. —Deus! Miúda era essa mulher. O governador me conhece? — perguntou, — espere um momento. Conhece quem? —Não se faça de estúpida, senhorita De Leão, sua inteligência é bem conhecida aqui e em todo o continente. —Esse é um galanteio muito bonito, seguro, mas temo que houve um engano. —Não há engano. Vi quando abandonava Prewitt Hall. —Sim, é obvio, mas...
—De noite... — continuou — com todos os criados de licença, não se deu conta que estivemos vigiando a casa, verdade? —Não, não, é obvio, não me dei conta. — respondeu Caroline piscando furiosamente. Alguém esteve vigiando a casa? Como não o notara? — Durante quanto tempo? —Duas semanas. Isto explicava, esteve em Bath durante os últimos quinze dias, atendendo à solteirona e doentia tia de Oliver, e acabava de retornar esta tarde. —Mas estava o suficientemente longe, — continuou — confirma nossas suspeitas. —Suas suspeitas? — repetiu. Que diabos estava dizendo este homem? Se estava louco, ela tinha um grave problema, porque ele ainda lhe apontava com a pistola no meio de seu corpo. —Temos suficiente para acusar ao Prewitt, seu testemunho assegura que o pendurem, e você, meu amor, aprenderá a amar a Austrália. Caroline sufocou um grito, seus olhos se iluminaram com encanto. Estava Oliver envolto em algo ilegal? Oh, isto era maravilhoso! Perfeito! Ela estava certa de que não era mais que um pobre estelionatário. Sua mente ia à máxima velocidade; apesar de tudo o que havia dito o homem de negro, ela duvidava que Oliver fizesse algo tão mau para pendurá-lo. Possivelmente o enviassem a prisão, ou o obrigariam a fazer trabalhos forçados, ou... —Senhorita De Leão? — disse o homem de maneira cortante. A voz de Caroline era ofegante e muito emocionada quando perguntou. — O que esteve fazendo Oliver? —Pelo amor de Deus, mulher, já tive suficiente de sua farsa, venha comigo. Deu um passo para diante com um grunhido ameaçador e a agarrou pelos pulsos. —Agora. —Mas... —Nenhuma palavra a menos que seja uma confissão. —Mas... —Isso é tudo! — colocou um trapo em sua boca. — Terá tempo de sobra para falar mais tarde senhorita De Leão. Caroline tossiu e grunhiu furiosamente quando ele atou seus pulsos com um áspero pedaço de
corda; então, para seu assombro, pôs dois dedos dentro de sua boca e deixou sair um profundo assobio. Um magnífico cavalo castrado negro saiu fazendo cambalhotas dentre as árvores, com passos largos e elegantes. Enquanto ela ficava boquiaberta observando ao cavalo, que devia ser o animal mais tranquilo e melhor amestrado na história da criação, o homem a levantou e colocou sobre a sela. —Mmm. fffl... — grunhiu, lhe sendo completamente impossível falar com o trapo imundo dentro da boca. —O quê? — ele a olhou por cima e desviou seu olhar a suas saias que deixavam as pernas à vista. —Oh, suas saias, posso as cortar se você pode prescindir delas com decoro. Ela o olhou ferozmente. —Fora com o decoro, então — disse, e empurrou suas saias para cima para que ela pudesse montar no cavalo com mais comodidade. —Sinto muito, não pensei em trazer uma sela de mulher, senhorita De Leão, mas confie em mim quando te digo que tem maiores preocupações que o fato de que eu esteja vendo suas pernas nuas. Ela lhe deu um chute no peito. Ele fechou sua mão ao redor de seu tornozelo lhe causando dor. —Nunca — espetou-lhe — dê um chute em um homem que está lhe apontando uma pistola. Caroline ergueu o nariz e afastou o olhar. Esta tolice chegou muito longe; logo que se livrasse desta condenada mordaça, diria a este bruto que nunca ouviu falar de sua senhorita De Leão, ela enviaria os policiais tão rápido que teria que suplicar pela corda para enforcar-se. Mas enquanto isso, faria o possível por lhe fazer a vida impossível; logo que montou no cavalo e se colocou na sela atrás dela, empurrou-lhe o cotovelo nas costelas, duramente. —O que passa agora? — disse ele secamente. Ela encolheu os ombros inocentemente. —Outro movimento como esse e lhe coloco outro trapo na boca, e este estará menos limpo que o primeiro. Como se isso fosse possível, pensou Caroline furiosamente, não quis pensar onde esteve o trapo antes de estar em sua boca; Tudo o que ela podia fazer era olhá-lo ferozmente, e pela forma em que lhe falava bufando, ela temeu que não parecesse o suficientemente furiosa. Mas então ele pôs o cavalo a meio galope e Caroline se deu conta de que enquanto eles fossem
cavalgando para Portsmouth, estariam se afastando de Prewitt Hall. Se ela não estivesse com as mãos atadas teria batido palmas de alegria; não poderia ter escapado tão rápido se tivesse planejado a viagem ela mesma. Este homem podia pensar que ela era alguma outra, uma criminosa espanhola, para ser precisa, mas ela podia esclarecer tudo isto uma vez que ele a tivesse levado longe, muito longe. Enquanto isso, estaria calada e tranquila, e lhe deixaria que levasse a cavalo rapidamente. Trinta minutos mais tarde um Blake Ravenscroft muito receoso desmontou diante de Seacrest Manor, perto de Bournemouth, Dorset. Carlotta De Leão, que elaborara todo tipo de impropérios, até para as unhas dos dedos de seus pés quando a derrubou no prado, não devotara a menor resistência em toda a viagem a cavalo pela costa, não lutara nem tratara de escapar; de fato, esteve tão calada, que devido A seu lado cortês, "ele deixava ver seu lado mais cortês muito frequentemente", esteve tentado a lhe tirar a mordaça, só por carinho. Mas reprimiu o impulso de ser agradável; o marquês de Riverdale, seu melhor amigo e frequente companheiro na prevenção do crime, teve relações com a senhorita De Leão e dissera ao Blake que ela era enganosa e letal. Não lhe tiraria a mordaça e as amarras até que estivesse bem encerrada sob chave. A fez descer do cavalo, segurando seu cotovelo com firmeza para que entrasse em sua casa. Blake só tinha três criados em sua casa, todos eles de uma discrição incomparável, e estavam acostumados a visitantes estranhos a meia-noite. —Suba as escadas — grunhiu empurrando-a para atravessar o vestíbulo. Ela assentiu com a cabeça alegremente, (Alegremente?!) e subiu com cuidado. Blake a dirigiu para o andar de cima e a colocou a empurrões em um dormitório pequeno, mas mobiliado confortavelmente. —Assim não terá a ideia de escapar — disse asperamente mostrando duas chaves — a porta tem duas fechaduras. — Ela jogou uma olhada a maçaneta da porta, mas foi outra artimanha que tampouco causou reação. —E — acrescentou, — há 15 metros até chegar ao chão, assim lhe recomendaria que não o tentasse pela janela. Encolheu os ombros, como se não tivesse considerado em nenhum momento a janela, como uma opção viável de fuga; Blake a olhou com o cenho franzido, irritado por sua indiferença, atou seus pulsos ao pé da cama. —Não quero que tente nada enquanto estou ocupado. Ela lhe sorriu, o que era uma verdadeira proeza com o trapo sujo em sua boca. —Diabos! — murmurou ele; o confundira totalmente, e não gostava nada dessa sensação. Deteve-se para certificar-se de que as marras eram seguras e começou a inspecionar o quarto,
assegurando-se de não deixar objetos que ela pudesse utilizar como armas, ouvira que Carlotta De Leão era engenhosa, e não planejara ser recordado como o idiota que a subestimara. Guardou no bolso uma pena e um peso de papel antes de levar uma cadeira até o corredor; não acreditava que ela fosse tão forte para quebrar uma cadeira, mas se de algum modo a manejasse e lhe quebrasse uma perna, a madeira estilhaçada seria uma arma perigosa. Ela piscou quando ele retornou. —Se quer sentar-se, — disse bruscamente — pode fazê-lo na cama. Ela inclinou sua cabeça de um modo encantador e se sentou na cama; tampouco tinha muita escolha, já que suas mãos estavam amarradas ao pé da cama, depois de tudo. —Não tente me enfeitiçar para que a ajude — advertiu-lhe — sei tudo sobre você. Ela deu de ombros. Blake bufou com grande desgosto e se voltou de costas para ela, já que terminara sua inspeção do quarto; finalmente, quando ele se convenceu de que o quarto seria uma prisão aceitável, ficou de frente para ela e colocou suas mãos firmemente sobre seus quadris. —Se leva alguma arma consigo, me deve dar agora, porque depois terei que revistá-la. Ela cambaleou mostrando seu horror, e Blake agradeceu que finalmente conseguira ofendê-la; quem quer que fosse, era uma atriz prodigiosa. —Bom, não tem nenhuma arma? Asseguro-lhe que serei menos amável se descobrir que tentou me ocultar algo. Ela sacudiu sua cabeça freneticamente e estirou suas amarras, como se tratasse de afastá-lo o máximo possível. —Eu não vou gostar disto — murmurou. Tratou de não parecer um completo descarado já que ela fechou seus olhos fortemente com temor e resignação. Sabia que as mulheres podiam ser tão malvadas e perigosas como os homens (sete anos de trabalho com o Ministério de Defesa o convenceram sobre isto), mas nunca realizara esta parte de seu trabalho; o educaram para tratar às mulheres como damas, e ia contra sua moral as revistar contra sua vontade. Cortou e liberou um de seus pulsos para poder tirá-los da frente e procedeu a esvaziar seus bolsos; não continham nada interessante, salvo umas cinquenta libras em notas e moedas, o que lhe pareceu uma soma insignificante para uma espiã notável; então lhe chamou a atenção sua pequena bolsa e esvaziou o conteúdo sobre a cama. Duas velas de cera de abelha (só Deus sabia para que queria ela isso), uma escova para o cabelo com o dorso de prata, uma Bíblia pequena, um caderno com a capa de couro e algumas coisas de menos valor que não pegou para não manchar-se ao tocá-
las. Supôs que todo mundo merecia um pouco de privacidade, inclusive os espiões traidores. Recolheu a Bíblia e passou as folhas rapidamente assegurando-se de que não havia nada colocado entre suas páginas. Satisfeito de que o livro não tivesse nada adverso, voltou-o a atirar sobre a cama, notando com interesse que ela se sobressaltava enquanto o fazia. Então agarrou o caderno e olhou em seu interior, só algumas páginas continham alguns garranchos. —Contubernal — leu em voz alta — Halcyon, Diacritical, Titivate, Umlaut. Levantou suas sobrancelhas e seguiu lendo; três páginas cheias do tipo de palavras que aprendeu no primeiro curso em Oxford ou Cambridge. —O que é isto? Ela sacudiu seu ombro para sua boca, assinalando o trapo. —De acordo — disse ele com um movimento brusco de cabeça, colocando o caderno perto da Bíblia — mas antes de tirá-la terei que... — suas palavras foram se desvanecendo pouco a pouco, deixando sair um suspiro desventurado. Ambos sabiam o que precisava fazer. —Se não opor resistência, farei o possível por terminar mais rápido — disse severamente. Seu corpo inteiro estava tenso, mas Blake tentou ignorar sua angústia conforme passava suas mãos até chegar a suas pernas. —Bom, já está — disse mal-humorado. — Devo dizer que estou bastante surpreso de que não leve nenhuma outra pistola. Ela o olhou ferozmente em resposta. —Tirarei-lhe o trapo agora, mas um ruído forte e o volto a pôr. Ela moveu a cabeça bruscamente, tossindo quando lhe tirou o trapo. Blake se apoiou descaradamente contra a parede e perguntou: —Bem? —De toda forma, ninguém me ouviria se eu gritasse. —Isso é muito certo — concedeu. Seus olhos se desviaram para o caderno de couro e o agarrou. —Agora, suponho que me explicará o que é tudo isto. Ela deu de ombros. —Meu pai sempre me animou a aumentar meu vocabulário. Blake a olhou fixamente em sinal de incredulidade; então voltou a abrir as páginas outra vez, isso era algum tipo de código, precisava ser isso, mas estava cansado e sabia que se ela confessasse
algo essa noite, não ia ser algo tão perigoso como a chave de seu código secreto, assim atirou o livro em cima da cama e disse: —Falaremos disto amanhã. Ela realizou outro desses incômodos encolhimentos de ombros. O fez ranger seus dentes. — Tem algo a dizer de você? Caroline esfregou os olhos, recordando-se que precisava permanecer ao lado deste homem; parecia perigoso e apesar de seu evidente mal-estar por revistá-la, ela não tinha dúvida de que a machucaria se considerasse que era necessário para sua missão; faria qualquer coisa. Ela estava jogando a um jogo perigoso e sabia; queria permanecer aqui nesta agradável casa, tanto tempo como fosse possível, (certamente era mais quente e mais seguro que qualquer outro lugar que ela mesma tivesse conseguido). Feito isto, de qualquer maneira, ela precisava lhe deixar que continuasse acreditando que ela era a tal Carlotta De Leão; não tinha nem ideia de como fazê-lo, não sabia espanhol, e com segurança, não sabia como se supunha que atuava uma criminosa quando a capturavam e a atavam ao pé de uma cama. Supôs que Carlotta tentaria negar tudo. —Equivocou-se de pessoa — disse, sabendo que ele não acreditaria e lhe causando um prazer perverso pelo fato de que estava dizendo a verdade. —Já! — bramou — seguro que pode sugerir algo um pouco mais original. —Pode acreditar o que quiser. —Parece que atua com muita confiança para ser alguém que está claramente em desvantagem. Caroline teve que lhe dar a razão nisso, mas se Carlotta era realmente uma espiã, ela precisava ser uma mestra em valentia. —Já não me importa ser atada, amordaçada, arrastada por todo o campo, e atada ao pé de uma cama; sem mencionar — afirmou — ser forçada e me submeter a sua revista insultante. Ele fechou os olhos por um momento, e se Caroline não o tivesse conhecido melhor, teria pensado que lhe doía algo; então, abriu-os e a voltou a olhar com um olhar duro e intransigente. Disse: —Acho difícil de acreditar, senhorita De Leão, que tenha chegado tão longe em sua profissão favorita sem que a tenham revistado ainda. Caroline não sabia que dizer a isto assim só o olhou ferozmente. —Ainda estou esperando que fale. —Não tenho nada que dizer — isto, ao menos, era certo.
—Pode ser que mude de opinião depois de alguns dias sem comida nem água. —Então planeja me matar de fome? —Homens mais duros que você tem caído. Ela não considerou isto, pensou que gritaria, pensou que ele poderia inclusive golpeá-la, mas não lhe ocorreu que poderia negar comida e água. —Vejo que não lhe entusiasma o panorama — disse lenta e pesadamente. —Me deixe sozinha. Deu um golpe seco; precisava elaborar um plano. Precisava resolver quem diabos era esse homem; mais que tudo, o que precisava era tempo. Olhou-o aos olhos e disse: —Estou cansada. —Estou seguro disso, mas não estou particularmente inclinado a deixá-la dormir. —Não precisa preocupar-se por meu bem-estar; não é provável que me sinta bem descansada, depois de passar a noite atada ao pé da cama. —Oh, isso, — disse ele, velozmente e com um movimento rápido de seu pulso a liberou. —Porquê fez isso? — perguntou desconfiadamente. —Agrada-me fazê-lo; além disso, não tem armas, dificilmente me pode vencer e não tem forma de escapar. Boa noite, senhorita De Leão. Sua boca se abriu de repente. —Já vai? —Dava-lhe boa noite. Voltou-se sobre seus calcanhares e abandonou o quarto deixando-a boquiaberta na porta. Ouviu girar duas chaves nas duas fechaduras antes de recuperar a compostura. —Meu Deus, Caroline —sussurrou a si mesma— No que te colocaste? Seu estômago retumbou e ela desejou ter pego algo para comer antes de escapar essa noite. Seu sequestrador parecia um homem de palavra, e se lhe disse que não ia dar comida nem água, ela acreditava. Correu até a janela e olhou para fora; não lhe mentira, havia ao menos 15 metros até o chão; mas havia um suporte, se ela encontrasse algum tipo de recipiente, poderia colocá-lo fora e recolher chuva e orvalho. Passou fome antes, e sabia que ela podia lidar com isto. Mas junto com a sede, era muito. Encontrou um recipiente pequeno, cilíndrico, usado para segurar as penas na escrivaninha. O
céu ainda estava claro, mas o tempo inglês era como era; Caroline imaginou que haveria uma mudança decente, e choveria antes que fosse manhã, assim colocou o recipiente no batente, no caso de chover. Então cruzou até sua cama e voltou a colocar seus pertences dentro da bolsa. Graças ao céu, seu sequestrador não percebeu o nome do titular que estava escrito dentro da Bíblia. Sua mãe lhe dera o livro quando morreu, e certamente ele desejaria saber por que o nome de Cassandra Trent estava escrito na parte interior da capa. E a reação dele a seu pequeno dicionário pessoal... céus, teria problemas para explicar isso. Então ela teve uma sensação muito estranha... tirou os sapatos e deslizou fora da cama, caminhando em silêncio, só calçada com as meias, até que ela alcançou a parede pegada ao vestíbulo. Moveu-se grudada ao longo da parede até que alcançou a porta, inclinando-se e olhando com curiosidade através do buraco da fechadura. Ahá! Justo o que pensou. Um olho grande e cinza também a olhava curiosamente. —E boa noite a você! — disse ela em voz alta. Então pegou seu chapéu e o pendurou sobre a maçaneta de modo que tampasse o buraco da fechadura. Não queria dormir com seu único vestido, mas certamente não havia forma de despir-se com a possibilidade de que ele estivesse vendo-a. Ouviu-o amaldiçoar uma vez, e duas vezes. Então seus passos ressoaram dirigindo-se até atravessar o vestíbulo. Caroline tirou sua saia e se meteu na cama; olhou fixamente o teto e começou a pensar, e então começou a tossir.
Capítulo 3
A-quim-bo (adjetivo). Dos braços. Em uma posição em que os dois descansam sobre os quadris, e os cotovelos ficam para fora. Não posso contar o número de vezes que fiz isso antes. Braços em jarras (aquimbo). De fato, estremeço-me inclusive pensando-o. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Caroline tossiu durante toda a noite, durante todo o amanhecer, até que o céu voltou a ficar azul claro; parando somente para verificar seu recipiente para água que estava sobre o suporte. Maldição, nada; bastava-lhe umas poucas gotas de líquido, sentia como se houvesse fogo em sua garganta. Mas com dor de garganta ou sem ela, o plano que tramara parecia atraente; quando abriu a boca para comprovar sua voz, o som que chegou envergonharia a uma rã. Em realidade, pensou que as rãs se envergonhariam de fazer um som como esse, não o duvidava. Caroline precisava fazer-se temporariamente muda. Esse homem poderia lhe perguntar o que quisesse, que não lhe seria possível responder a nada. Seguro que seu sequestrador não pensaria que estava fingindo a doença; abriu muito sua boca e olhou ao espelho, inclinando sua cabeça de forma que o sol iluminasse sua garganta; avermelhada; pareceu-lhe definitivamente monstruosa; e as olheiras começaram a aparecer sob seus olhos, por seguir sem deitar-se por toda a noite, faziam-na parecer ainda pior. Caroline quase saltou de alegria. Se houvesse alguma maneira de fingir febre para que parecesse ainda mais debilitada. Supôs que podia pôr seu rosto perto de uma vela com a esperança de que sua pele se esquentasse anormalmente; mas se ele chegasse nesse momento, custaria-lhe muitíssimo explicar porque tinha uma vela acesa, com uma manhã tão luminosa. Não, a garganta muda teria que ser suficiente; e inclusive se não o fosse, ela já não tinha nenhuma escolha quanto a isso, porque podia ouvir seus passos soando ruidosamente abaixo, no vestíbulo. Atravessou correndo o quarto e se meteu depressa na cama, puxando as mantas até seu queixo. Tossiu um par de vezes, e beliscou suas faces para lhes dar a aparência de estar acalorada; então tossiu um pouco mais. Tosse, tosse, tosse. A chave girou na fechadura. Tosse, tosse, tosse, tosse, TOSSE. Estava matando a sua garganta, mas Caroline queria fazer uma
estupenda atuação porque ele já estava entrando. Então outra chave girou em outra fechadura. Diabos, esquecera que havia duas fechaduras na porta. Tosse, tosse, tosse, tosse seca, tosse seca, tosse, TOSSE FALSA. —Meu Deus! O que é esse ruído infernal? Caroline levantou os olhos, se não já estivesse muda teria perdido sua voz. Seu sequestrador parecia arrogante e perigoso na escuridão, mas de dia envergonharia até mesmo Adonis. De um modo ou outro ele parecia maior quando havia luz; mais forte também, como se suas roupas mal refreassem o poder de seu corpo. Seu cabelo negro estava arrumado cuidadosamente, mas uma mecha solta caía para sua sobrancelha esquerda. E seus olhos que eram cinzas e claros, mas isto era tudo de inocente neles, pareciam olhar mais à frente, muito longe de onde se encontravam. O homem a agarrou no ombro, seu toque queimava sua pele apesar de ter posto o vestido; sufocou um grito e o escondeu com outra tosse. —Acredito que ontem à noite disse que me cansei de sua comédia. Ela sacudiu sua cabeça rapidamente, agarrou sua garganta com as mãos e tossiu outra vez. —Não pense nem por um momento que acredito. Ela abriu muito a boca e apontou a sua garganta. —Não vou olhar sua garganta, pequena. Ela mostrou de novo, esta vez golpeando com o dedo em sua boca. —Oh, muito bem. — Seus lábios se fecharam firmemente em uma linha inflexível quando se voltou sobre seus calcanhares, cruzando a largos passos o quarto, e arrancando uma vela fora de seu suporte. Caroline olhou com grande interesse como ele tropeçava com a vela e cruzava por detrás da cama. Sentou-se perto dela e o peso de seu corpo fez baixar seu lado do colchão; ela rodou um pouco para ele e pôs suas mãos por fora para parar a descida. Ao fazer isto tocou sua coxa. TOSSE! Esteve a ponto de voar ao outro lado da cama. —Oh, pelo amor de Deus, hão-me tocado mulheres mais atraentes e mais interessantes que você — disse bruscamente, — não deve ter medo; posso lhe fazer passar fome para que diga a verdade, mas não a violarei. Embora pareça mentira, Caroline acreditou. Além de suas inclinações para o sequestro, não
parecia do tipo dos que tomam a uma mulher contra sua vontade. De alguma estranha maneira, ela confiava neste homem. Podia havê-la ferido, podia inclusive havê-la matado, mas não o fez. Sentiu que ele tinha um código de honra e moralidade, que esteve ausente em seus tutores. —E bem? — Insistiu. Ela retrocedeu até onde acabava a cama e colocou suas mãos delicadamente sobre seu colo. —Abra. Ela clareou sua garganta (como se isso fosse necessário) e abriu sua boca; ele pôs a chama da vela perto de seu rosto e olhou dentro. Depois de um momento se retirou, e ela fechou sua boca de repente, olhando-o fixamente nos olhos com grande expectativa. Ficou sério. —Parece como se alguém tivesse metido uma navalha em sua garganta, espero que saiba. Ela assentiu com a cabeça. —Suponho que esteve toda a noite tossindo. Assentiu de novo. Ele fechou os olhos durante uma fração de segundo maior do que era necessário, antes de dizer: —Não estou disposto a admirá-la por isso; causar-se tanta dor para evadir-se de umas quantas perguntas que mostrem sua verdadeira dedicação pela causa. Caroline lhe pôs sua melhor expressão de escândalo. —Infelizmente para você, escolheu a causa equivocada. Ela conseguiu um olhar inexpressivo, mas era um olhar honesto; não tinha nem ideia da causa da que lhe estava falando. —Estou seguro de que ainda pode falar. Ela sacudiu sua cabeça negativamente. —Tente-o — inclinou-se e a olhou fixamente e de uma forma tão dura que ela se retorceu. — Por mim. Negou com sua cabeça de novo, esta vez rapidamente, muito rapidamente. Ele se inclinou ainda mais perto, até que seu nariz esteve quase encostado no seu. —Tente-o. —Não! — Ela abriu sua boca e lhe gritou, mas realmente não saiu nenhum som.
—Verdadeiramente não pode falar — disse, totalmente surpreso. Ela tentou lhe lançar seu melhor olhar de "Que diabos acredita que estive tentando lhe dizer se pudesse falar?"; mas teve a sensação de que os sentimentos eram muito complicados para uma singela expressão facial. Repentinamente, ele se levantou. —Volto em seguida. Caroline não pôde fazer nada, só lhe olhou fixamente as costas quando abandonava o quarto. Blake suspirou irritado quando abriu a porta de seu escritório. Diabos, era já muito velho para isto; com vinte e oito anos podia ser relativamente jovem, mas sete anos com o Ministério de defesa eram suficientes para deixar a qualquer um cansado e farto. Vira morrer a amigos, sua família sempre se perguntava por que desaparecia durante tanto tempo, e sua prometida... Blake fechou os olhos com dor e remorso. Marabelle fazia muito tempo que já não era sua prometida; ela não era a prometida de ninguém e não estava seguro de que o tivesse sido. Enterrada como estava na casa de sua família em Cotswolds. Fora tão jovem, tão bela, tão extraordinariamente brilhante. Fora assombroso, realmente, apaixonar-se por uma mulher cujo intelecto superava o seu próprio. Marabelle foi de certo modo um prodígio, um gênio dos idiomas, e era por esta razão que foi recrutada tão jovem no Ministério de Defesa. E então ela recrutou ao Blake, seu vizinho de tantos anos, coproprietário das melhores casinhas em árvores mobiliadas da Inglaterra, e companheiro em lições de baile. Cresceram juntos, apaixonaram-se, mas Marabelle morreu sozinha. "Não", pensou, "isso não era de todo certo". Marabelle só morrera, ele era o único ao qual deixaram sozinho. Continuara trabalhando para o Ministério de Defesa durante alguns anos, disse-se que devia vingar sua morte, mas frequentemente se perguntava, se não o faria porque não sabia que mais fazer com sua vida, e seus superiores não lhe queriam deixar partir. Depois da morte de Marabelle se tornou temerário; não lhe importava muito se vivia ou morria, arriscou-se estupidamente em nome de seu país e esses riscos deram resultado. Nunca falhara em nenhuma de suas missões. É obvio, também lhe dispararam, envenenaram, e abandonaram ao lado de algum navio, mas isto não era tanto incômodo para o Ministério de defesa como a perspectiva de perder a seu agente mais destacado. Mas agora Blake tentava deixar para trás sua ira. Não havia forma de que pudesse enterrar sua dor, parecia que mudaria o fim deste ódio que varre o mundo que lhe roubara a seu
verdadeiro amor e sua melhor amiga; e a única maneira em que podia fazê-lo era abandonar o Ministério de defesa e tentar ao menos levar uma vida normal. Mas primeiro precisava terminar este último caso. O responsável pelo falecimento de Marabelle fora um traidor como Oliver Prewitt; esse traidor fora executado, e Blake estava resolvido a que Prewitt também visse a forca. Feito isto, de qualquer modo, precisava conseguir alguma informação mais da Carlotta De Leão. Diabo de mulher. Não acreditou nem por um momento que repentinamente ela tivesse começado a padecer de algo estranho. Uma enfermidade horrorosa que lhe tirara a fala. Não, a pequena provavelmente levou meianoite tossindo ao bruto. Fora quase autêntico, ver sua expressão de susto quando tentava lhe gritar "Não". Teve a sensação de que ela esperava que algum som saísse e ele riu. Esperava que sua garganta queimasse como os fogos do inferno. Ela não merecia menos. Até tinha um trabalho que fazer; esta missão seria a última para o Ministério de defesa, e embora não queria nada mais que retirar-se definitivamente à paz e tranquilidade de Seacrest Manor, não estava disposto a permitir que esta missão não fosse um êxito. Carlotta De Leão falaria, e Oliver Prewitt seria enforcado. E então Blake Ravenscroft se converteria em um simples fazendeiro cavalheiresco e aborrecido para terminar sua vida em solitária tranquilidade. Possivelmente começaria a pintar, ou a criar cães de caça. As possibilidades eram intermináveis, e interminavelmente aborrecidas. Mas por agora, tinha um trabalho que fazer. Com severa determinação recolheu três penas, um tinteiro e algumas folhas de papel; se Carlotta De Leão não podia lhe contar tudo o que sabia, poderia escrevê-lo condenadamente bem. Caroline estava sorrindo de orelha a orelha. Até aqui sua manhã foi um completo êxito, seu sequestrador estava agora convencido de que não podia falar, e Oliver... Oh, isto fez que sorrisse ainda mais, pensando no que Oliver deveria estar fazendo nesse preciso momento. Gritando suas grosserias, o mais provável, e atirando um vaso a seu filho; nada de grande valor, é obvio, Oliver era muito ardiloso em seus ataques de ira para destruir algo de grande valor monetário. Pobre Percy, Caroline quase sentia lástima por ele, quase. Era duro evocar muita simpatia pelo caipira cabeçudo que tentara forçá-la a noite anterior. Estremeceu ao pensar como se sentiria se realmente tivesse acontecido. Mais ainda, tinha a sensação de que Percy nunca conseguiria sair debaixo de seu pai, ficaria a meio caminho de converter-se em um ser humano decente. Ela não queria ver isso como algo natural, mas em realidade ele não sairia agredindo a mulheres inocentes se seu pai não o ordenasse.
Foi então quando ouviu as pisadas de seu sequestrador no vestíbulo; rapidamente eliminou o sorriso de seu rosto e colocou uma mão sobre seu pescoço. Quando ele voltou a entrar no quarto, ela estava tossindo. —Tenho um presente para você — disse com voz suspeitosamente alegre. Ela inclinou sua cabeça em resposta. —Olhe isto, papel, penas, tinta. Não é emocionante? Ela piscou, fingindo não compreender. Oh, maldição, não considerara isto. Não havia forma de lhe convencer de que não sabia escrever, claramente ela era uma mulher culta, e sem dizer, não lhe ia ser possível torcer o pulso nos seguintes três segundos. —Oh, é obvio — disse com preocupação exagerada — necessita algo sobre o que apoiar-se. Que desconsiderado por minha parte não ter em conta suas necessidades. Aqui, me deixe lhe trazer um apoio da escrivaninha; aí tem, justo em seu colo, está cômoda? Ela o olhou furiosamente, preferindo sua cólera a seu sarcasmo. —Não? Aqui, me deixe amaciar seus travesseiros. Inclinou-se para diante, e Caroline que realmente teve suficiente de sua atitude doce e melosa, tossiu sobre sua boca e nariz. Então ele se retirou o suficientemente longe para olhá-la ferozmente; seu rosto era um quadro de completo arrependimento. —Vou esquecer que fez isso — disse apertando os dentes — por isso você deveria estar eternamente agradecida. Caroline olhou então fixamente o equipamento de escritura que tinha em seu colo, desesperadamente, tentando imaginar um plano novo. —Agora começaremos? Sua têmpora direita começou a lhe arder, e levantou sua mão para coçar-se. Sua mão direita. Aí foi quando se deu conta. Sempre foi mais hábil com sua mão esquerda; seus primeiros professores lhe repreendiam, gritavam e empurravam, tentando que aprendesse a escrever com sua mão direita; a chamaram estranha, antinatural e profana. Um professor particularmente religioso se referiu a ela inclusive como a semente do diabo. Caroline tentara escrever com sua mão direita "Oh, Senhor, como o tentara", mas embora podia segurar a pena de maneira natural, nunca foi possível dominar nada mais que um garrancho ininteligível. Mas todos escreviam com sua mão direita, seus professores insistiram, certamente ela não queria ser diferente.
Caroline tossiu tampando seu sorriso; nunca antes esteve tão encantada de ser "diferente". Este tipo esperaria que escrevesse com sua mão direita, já que ele e o resto de seus conhecidos sem dúvida o fariam. Bem, ela estaria feliz por lhe dar o que ele queria. Esticou sua mão direita, pegou uma pena, molhou-a na tinta e o olhou com aborrecida expectativa. —Alegra-me que tenha decidido cooperar — disse — estou seguro de que o encontrará mais benéfico para sua saúde. Ela bufou e revirou os olhos. —Agora — disse, olhando-a intensamente com perspicácia. — Conhece Oliver Prewitt? Não podia negar isso; a viu abandonando a casa a noite anterior. Mesmo assim, não teria que desprezar sua arma secreta com uma questão tão simples, e assentiu com a cabeça. —Quanto tempo faz que o conhece? Caroline pensou sobre isso. Não tinha nem ideia do tempo que Carlotta De Leão esteve trabalhando com o Oliver, isso sim que era um problema, mas também suspeitava que o homem que tinha de pé frente a ela de braços cruzados, tampouco sabia. Melhor dizer a verdade, sua mãe sempre o havia dito e Caroline não viu nenhuma razão para mudar de atitude agora. Seria mais fácil manter suas singelas histórias tão verídicas como fosse possível. Vamos ver, esteve vivendo com o Oliver e Percy durante ano e meio, mas os conheceu um pouco antes; Sacou quatro dedos ainda querendo salvar sua escritura para dar uma resposta que fosse prazerosa e complicada. —Quatro meses? Moveu sua cabeça negativamente. —Quatro anos? —Meu deus — Blake respirou. Não tinham nem ideia de que Prewitt fizesse contrabando de informação diplomática durante tanto tempo. Dois anos, pensaram, possivelmente dois e meio. Quando pensou em tudo o que esta missão pôs em perigo... sem mencionar as vidas que se perderam, como resultado da traição de Prewitt. Muitos colegas mortos, seu próprio amor... Blake explodiu em cólera e sentindo-se culpado. —Me diga exatamente que tipo de relação tinham — ordenou-lhe com voz grave. "Que lhe diga?" gesticulou com a boca. —Escreva-o! — bramou. Ela respirou profundamente, como preparando-se para alguma terrível tarefa e começou a
escrever com dificuldade. Blake piscou. Piscou outra vez. Ela o olhou e sorriu. —Que linguagem está diabo escrevendo? — perguntou. Retrocedeu, muito ofendida. —Que conste que eu não leio espanhol, assim, amavelmente escreva as respostas em inglês, ou se o prefere, francês ou latim. Ela agitou seus dedos e fez uns movimentos que lhe foram difíceis interpretar. —Repito — disse apertando os dentes — escreva exatamente que tipo de relação tinha com o Oliver Prewitt! Ela anotou um montão de garranchos (ele não aceitava que isso fossem palavras) devagar e cuidadosamente, como se estivesse mostrando algo novo a um menino. —Senhorita De Leão! Ela suspirou, e nesse momento lamentou fazer esses garranchos. —Não leio os lábios, mulher. Deu de ombros. —Escreva-o outra vez. Seus olhos resplandeceram de irritação, mas fez o que lhe pedia. Os resultados foram ainda piores que os anteriores. Blake fechou seus punhos para evitar envolver suas mãos ao redor do pescoço dela. — Nego-me a acreditar que não sabe escrever. Sua boca se abriu pelo ultraje e golpeou furiosamente as marcas de tinta no papel. —Chamar a isto escritos, senhora, é um insulto às penas e a tinta de todo o mundo. Pôs sua mão sobre a boca e tossiu. Ou estava rindo? Blake entrecerrou seus olhos; então se levantou e cruzou o quarto para a mesa de asseio. Agarrou seu livrinho que estava cheio de palavras muito intelectuais e o agitou no ar. —Se tem uma caligrafia tão espantosa, então explique isto! — ameaçou-lhe. Olhou-o fixamente sem compreender, o que fez que se enfurecesse mais ainda; voltou para seu lado e se inclinou até ficar muito juntos. —Estou esperando — grunhiu. Ela retrocedeu e moveu a boca dizendo algo que ele não pôde decifrar.
—Temo-me que não a compreendo — agora sua voz deixara o campo do aborrecimento para aventurar-se no perigoso. Ela começou a fazer todo tipo de gestos soltos, destacando-se a si mesma e sacudindo a cabeça violentamente. —Tenta me dizer que você não escreveu estas palavras? Ela assentiu energicamente. —Quem então? Ela moveu a boca dizendo algo que ele não entendeu. Tinha a sensação de que não estava destinado a compreender. Respirou fatigadamente, e voltou a caminhar até a janela para tomar um pouco de ar fresco. Não fazia sentido que ela não pudesse escrever de maneira legível, mas se realmente não podia, quem escreveu no caderno e que significaria? Havia-lhe dito (quando ainda falava) que não eram mais que uma coleção de um vocabulário de palavras, que era claramente uma mentira, mesmo assim... Deteve-se, tinha uma ideia. —Escreva todo o alfabeto — ordenou-lhe. Ela revirou os olhos. —Agora! — rugiu. Ela franziu o cenho com desgosto, já que seus recursos estavam se esgotando. —O que é isto? — perguntou, segurando o frasquinho que encontrou sobre o batente da janela. "Água", gesticulou com a boca. Era divertido como ela tentava fazer-se compreender algumas vezes. Burlou-se e voltou a pô-lo sobre o batente. —Qualquer idiota veria que não vai chover. Encolheu os ombros como se dissesse "Pode ser". —Tem-no feito? Assentiu com a cabeça, conseguindo olhar muito irritada e aborrecida ao mesmo tempo. Blake voltou de novo para seu lado e olhou para baixo. A M, a N e a O eram mal legíveis, e a C, supôs que podia havê-la escolhido se sua vida dependesse disso, mas fora disso... Estremeceu. Nunca mais. Nunca arriscaria sua vida, e neste assunto, sua prudência, pelo bem da mãe pátria; jurou ao Ministério de Defesa que já acabou, mas se queixaram e lhe adularam até que
esteve de acordo em levar o assunto desta última parte da missão. Haviam-lhe dito seus superiores que era porque ele vivia tão perto de Bournemouth. Podia investigar as atividades do Prewitt sem despertar suspeitas. Insistiram, precisava ser Blake Ravenscroft, ninguém mais podia fazer o trabalho. Assim Blake concordara. Mas nunca sonhara que terminaria cuidando de uma estranha atraente espiã meio espanhola com a pior escritura da história do mundo civilizado. —Eu gostaria de encontrar a sua instrutora — murmurou — e eu gostaria de lhe dar um tiro. A senhorita De Leão fez outro ruído estranho, e esta vez estava seguro que era uma risada; para ser uma espiã traidora, tinha bastante senso de humor. —Você— disse, apontando — não se mova. Ela colocou suas mãos em seus quadris e lhe pôs um olhar tolo, como dizendo; "Onde iria?" —Voltarei. Saiu com passo irado do quarto, recordando só no último minuto de trancar a porta atrás dele. Diabos. Estava sendo brando; era porque ela não parecia uma espiã, raciocinou. Havia algo diferente nela; a maioria da gente em seu tipo de trabalho eram vazios ao olhá-los, como se tivessem visto muito. Mas esses olhos verdes azulados como um manancial, se pudesse deixar passar o fato de que estavam um pouco vermelhos devido a sua falta de sono. Eram... eram... Blake ficou mais rígido e desprezou o pensamento de sua mente. Não precisava pensar em seus olhos. Não precisava pensar em nenhuma mulher. Quatro horas mais tarde admitira a derrota. Metera seis xícaras de chá através de sua garganta, já que ela não fizera mais que provocá-lo, com os movimentos loucos com suas mãos, que interpretou finalmente como "Abandone o quarto para que possa utilizar o urinol" Mas sua voz não voltava, ou se o fez, ela era bastante hábil para ocultá-la. Fora bastante estúpido tentar aproximar a pena e a tinta uma vez mais. Sua mão se moveu com graça e velocidade, mas os traços que deixava no papel não pareciam mais que rastros de pássaro. E, maldita menina, parecia estar fazendo de propósito. O pior é que o estava conseguindo. Enquanto ele se queixava pela ausência de sua habilidade comunicativa, ela dobrara uma das folhas que escrevera com garranchos em forma de pássaro e procedeu a lançá-lo diretamente para ele. Planou brandamente pelo ar, e uma vez que Blake se esquivou de seu caminho, aterrissou devagar no chão. —Bem feito— disse Blake, impressionado a seu pesar; sempre gostara dos pequenos objetos como esse. Ela sorriu orgulhosamente; pegou outro pássaro de papel e este saiu diretamente pela janela. Blake sabia que devia repreendê-la por perder tempo, mas queria ver como saía seu trambolho.
Foi da mesa até a janela para ver a queda em espiral dentro de uma roseira. —Caiu entre as flores, temo — disse, voltando o rosto para ela. Ela lhe lançou um olhar de irritação e foi até a janela. —Vê — disse Blake. Ela sacudiu sua cabeça em sinal negativo. Apareceu ficando perto dela. —Justo aí — disse, apontando — na roseira. Ela se estirou, colocou as mãos em seus quadris e lhe lançou um olhar sarcástico. —Atreve-se a burlar-se de minha roseira? Fez um movimento como de tesouras com seus dedos. —Acredita que necessitam uma poda? Afirmou com a cabeça de modo cortante. "Uma espiã que gosta dos jardins" disse Blake a si mesmo, "alguma vez deixará de me assombrar?" Colocou sua mão perto de sua orelha para lhe fazer saber que não o tinha ouvido. —Preciso supor que você poderia fazer um trabalho melhor? — disse humoristicamente. De novo ela afirmou com a cabeça, retrocedeu até a janela para jogar outro olhar aos arbustos, mas Blake não a vira vir e se dirigiu ali mesmo , exatamente no mesmo momento; chocaram-se, um contra o outro e ele tentou agarrar a parte superior dos braços para evitar que caísse. E então cometeu o engano de olhá-la aos olhos. Eram suaves e claros, e que o céu lhe ajudasse mas não lhe estavam dizendo "não". Inclinou-se menos de uma polegada, querendo beijá-la mais que queria respirar. Os lábios dela se abriram, e um pequeno grito sufocado de surpresa escapou de sua boca. Ele se aproximou mais, desejava-a, desejava a Carlotta. Desejava a Carlotta. Diabos. Como podia havê-lo esquecido sequer por um segundo? Ela era uma espiã, uma traidora, completamente sem moral nem escrúpulos. Empurrou-a longe dele e caminhou a largos passos para a porta. —Isto não acontecerá outra vez — disse baixando a voz. Ela o olhou muito aturdida para responder.
Blake amaldiçoou sob sua respiração e saiu com passo irado, batendo a porta e trancando-a atrás dele. Que diabos que ia fazer com ela? Pior ainda, que diabos que ia fazer consigo mesmo? Blake moveu a cabeça negativamente enquanto colocava o ferrolho e desceu as escadas. Isto era ridículo. Não lhe interessavam as mulheres para nada mais que a mais básica das razões, e inclusive para isso Carlotta De Leão era enormemente inapropriada. Ele não desejava despertar com um corte em sua garganta. Ou não despertar absolutamente, que seria o mais provável. Precisava recordar quem era ela. E precisava recordar a Marabelle.
Capítulo 4
Nos-trum (nome). Um medicamento, ou aplicação médica, preparado para a pessoa recomendando, um remédio curandeiro. Ele não parece ter muita confiança em seus remédios caseiros (nostrums) mas ainda os coloca pela força em minha garganta. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent Blake a deixou sozinha durante o resto do dia. Estava muito enfurecido para confiar em si mesmo estando ela perto. Ela e sua maldita garganta muda o estavam tirando de sério, mas o certo era que, a maioria de sua cólera estava dirigida para si mesmo. Como podia ter pensado em beijá-la? Inclusive durante um segundo? Podia ser meio espanhola, mas também era meio inglesa e isto a convertia em uma traidora. E foi uma traidora que assassinara a Marabelle. Assim que o sol se pôs começou a chover, como se seu humor se refletisse; e Blake começou a pensar no pote para as penas que ela deixara no suporte para recolher água. Bufou, como se ela fosse morrer de sede depois de todo o chá que lhe fez engolir essa tarde. Mais ainda, enquanto tomava seu lanche em silêncio, não podia ajudá-la mas pensava nela, vamos, encerrada no pequeno quarto; precisava estar morta de fome, não comeu em todo o dia. —Qual é o problema contigo? — disse em voz alta. Sentindo lástima pela ardilosa e pequena espiã. Ora! Não dissera que a ia matar de fome? Nunca fazia promessas que não mantivesse. Além disso, ela era uma coisinha fraca, e seus olhos... seguia-os vendo em sua mente. Eram enormes, tão claros que virtualmente resplandeciam. E Blake pensou com uma mescla de irritação e remorso, que se os olhasse agora diretamente, o mais provável é que tivessem olhar de fome. —Diabos! — murmurou, ficando de pé tão rápido que golpeou sua cadeira. Podia também lhe dar um pãozinho; precisava haver uma melhor maneira de conseguir que lhe desse a informação que necessitava que matando-a de fome. Possivelmente se repartia a comida de forma avarenta, ela estaria tão agradecida pelo que lhe desse que começaria a sentir-se agradecida a ele. Ouvira situações onde os cativos começaram a olhar a seus sequestradores como heróis. Não lhe importaria ver esses olhos azul esverdeados lhe olhando como um adorado herói. Blake pegou um pãozinho da bandeja que havia sobre a mesa, então o voltou a colocar para pegar outro maior; e talvez um pouco de manteiga. Certamente não podia lhe fazer mal. E geleia...
não. Não chegou à geleia. Ela era uma espiã depois de tudo. Quando o ouviu na porta, Caroline estava sentada sobre sua cama, entortando os olhos enquanto olhava a chama de uma vela. O ruído de uma fechadura aberta, depois outro, e ali estava ele, ocupando completamente a entrada. Como era que cada vez que o olhava parecia inclusive mais atraente que antes? Em realidade isso não era justo. Toda essa beleza desperdiçada sobre um homem, e bastante chato, além disso. —Trago-lhe um pedaço de pão — disse bruscamente, oferecendo. O estômago de Caroline deixou sair um ruído forte quando pegou o pãozinho de sua mão. "Obrigado" gesticulou com a boca. Ele se apoiou ao final da cama enquanto ela devorava o pãozinho com pouca intenção de guardar maneiras ou decoro. —De nada. Oh, quase o esqueci — disse — também lhe trago manteiga. Ela olhou tristemente o pingo de pão que ficara em sua mão e suspirou. —Ainda quer? Ela assentiu com a cabeça, agarrou a pequena terrina de barro e molhou o último bocado na manteiga. Colocou-o rapidamente em sua boca e o mastigou lentamente, saboreando cada bocado. Graças a Deus! "Acreditei que me ia matar de fome" moveu a boca vocalizando sem sair sons. Negou com a cabeça em sinal de incompreensão. —Posso entender "Obrigado", mas isto é superior a mim; a menos que sua voz voltasse a estar em perfeito estado e pudesse realmente dizer essa frase em voz alta. Moveu sua cabeça em gesto negativo, o qual não era tecnicamente uma mentira; Caroline não provou sua voz desde que ele a deixou. Não queria saber se havia tornado ou não. De qualquer modo parecia melhor ignorar o problema. —Piedade— murmurou. Ela revirou os olhos em resposta, então deu um tapinha em seu estômago e olhou as mãos dele com ilusão. —Temo que só trouxe um pãozinho. Caroline olhou sua pequena terrina de manteiga, encolheu os ombros e cravou seu dedo nela. Quem sabia o que ia fazer quando decidiu alimentá-la? Ela precisava conseguir seu sustento de onde
pudesse, inclusive se isso significava comer manteiga pura. —Oh, Por Deus! — disse — não coma isso. Não pode ser bom para você. Caroline lhe lançou um olhar sarcástico. —Como vai? — perguntou ele. Ela agitou as mãos em todas direções. —Aborrecida? Assentiu com a cabeça. —Bem. Ela franziu o cenho. —Não tenho intenção de entretê-la. Não é uma convidada. Ela revirou os olhos e deixou sair um pequeno suspiro. —Faz tempo que não se levanta esperando sete pratos de comida. Caroline se perguntou se o pão e a manteiga contariam como dois pratos. Se era assim, ainda ficavam cinco. —Quanto tempo vai continuar com esta charada? Piscou e moveu silenciosamente os lábios. —O quê? —Certamente sua voz já tornou. Ela moveu negativamente a cabeça, tocou sua garganta e pôs uma cara tão triste que ele riu. —Isso dói, né? Ela agitou a cabeça afirmando-o. Blake passou a mão removendo seu cabelo negro, zangando-se um pouco porque esta mentirosa lhe havia feito rir mais em todo o dia, que em todo o ano anterior. —Sabe, se não fosse uma traidora, seria bastante divertida. Ela encolheu os ombros. —Alguma vez teve em conta suas ações? O que custaram? A gente a que fez mal? Blake a olhou nos olhos intensamente. Não sabia por que, mas estava resolvido a que esta pequena espiã tivesse consciência. Podia ter sido uma boa pessoa, estava seguro disso. Era elegante, e divertida, e... Blake moveu sua cabeça negativamente para desprezar seus pensamentos
caprichosos. Via-se como seu salvador? Não a havia trazido até aqui para sua redenção. Quão único queria era a informação que acusaria ao Oliver Prewitt. Então a levaria às autoridades. É obvio, provavelmente ela também veria a forca. Era um pensamento sensato, mas de certo modo, não gostava. —Que esbanjamento — murmurou. Ela elevou suas sobrancelhas a modo de pergunta. —Nada. Seus ombros subiram e baixaram com um movimento ao estilo francês. —Que idade tem? — perguntou precipitadamente. Ela tirou de repente seus dez dedos duas vezes. —Só vinte? — perguntou com incredulidade. — Não é que pareça mais velha, mas eu pensei... Rapidamente ela levantou outra vez uma mão, com os cinco dedos estendidos como uma estrela do mar. —Vinte e cinco, então? Afirmou com a cabeça, mas olhava para a janela enquanto o fazia. —Deveria estar casada com meninos enganchados a suas saias, e não tentando trair à coroa. Ela baixou a vista, e seus lábios se alisaram em uma expressão que só podia ser triste. Então retorceu suas mãos em um movimento interrogativo e o apontou. —Eu? Ela afirmou com a cabeça. —O que passa comigo? Ela apontou o quarto dedo de sua mão esquerda. —Por que não estou casado? Afirmou, esta vez com muita ênfase. —Não sabe? Olhou-o sem compreender, e depois de alguns segundos moveu negativamente sua cabeça. —Por pouco me caso — Blake tentou que soasse pouco sério, mas qualquer idiota poderia ouvir a dor em sua voz. "O que aconteceu?" moveu a boca sem falar.
—Morreu. Ela tragou saliva e colocou sua mão sobre ele em um gesto de simpatia." Sinto muito " Negou com sua cabeça afastando-se dela e fechou os olhos durante um segundo. Quando os abriu, estavam desprovidos de emoção. —Não, você não sente — disse. Ela voltou a pôr as mãos sobre seu colo e esperou para escutá-lo. De algum modo não parecia correto entremeter-se em sua dor. Entretanto, ele não disse nada. Sentindo-se incômoda com o silêncio, Caroline se levantou e foi andando até a janela. Chovia muito do outro lado da janela, e se perguntou quanta água teria podido recolher em seu potinho. Provavelmente não muita e certamente não a necessitaria depois de todo o chá que lhe dera hoje, embora ainda estava impaciente por ver como funcionara seu plano. Fazia muito que aprendera como entreter-se da maneira mais singela. Um pequeno cálculo aqui e lá, examinando as formas do céu noturno que muda de mês em mês. Possivelmente se ele a mantinha aqui durante algum tempo ela poderia medir semanalmente a quantidade de chuva. E pelo menos, isto a ajudaria a manter sua mente ocupada. —O que está fazendo? — exigiu-lhe. Ela não respondeu, nem verbal nem de outra forma e tratou de agarrar-se ao final da janela com seus dedos. —Perguntei-lhe o que esta fazendo? — Seus passos acompanharam sua voz, e Caroline soube que estava se aproximando. Ela ainda não girou; a janela subiu com facilidade e a garoa soprou dentro do quarto, umedecendo a parte dianteira de seu vestido. —Tonta — disse, segurando com suas mãos as dela. Ela girou rapidamente surpresa. Não esperava que a tocasse. —Vai se impregnar toda até os ossos. — com um delicado empurrão baixou a janela. —E então estará realmente doente. Ela moveu sua cabeça negativamente e assinalou o potinho do suporte. —Certamente não estará sedenta? "Que curioso" gesticulou com a boca. —O quê? Não entendi isso. "Quuuuueeeeeee ccccuuuurrriiiiooosssoooo" gesticulou alargando as palavras esta vez,
esperando que tivesse podido ler seus lábios. —Se falasse alto — disse ele pronunciando lenta e pesadamente - poderia compreender o que está dizendo. Caroline deu um chute de frustração, mas quando tocou o chão, o fez sobre algo menos plano que o piso. —Auuuuuuuu! — gritou ele. OH, seu pé," perdão, perdão, perdão, perdão, perdão, perdão" gesticulou com a boca, "não era minha intenção ". —Se pensa que posso entender isso — grunhiu ele — está mais louca do que acreditei a princípio. Ela mordeu seu lábio inferior com remorso; então pôs sua mão sobre seu coração. —Suponho que está tratando de me convencer de que foi um acidente? Ela afirmou com a cabeça com a maior seriedade. —Não acredito. Ela franziu o cenho e suspirou com impaciência. Esta mudez estava chegando a ser incômoda, mas não via de que outra forma comportar-se. Exasperada, apontou seu pé. —O que significa isso? Ela moveu rapidamente seu pé, o pôs no chão, e o pisou muito forte com seu outro pé. Ele a olhou completamente confuso. —Está tentando me convencer de que é algum tipo de masoquista? Odeio desiludi-la, mas nunca me dediquei a esse tipo de coisas. Ela agitou seus punhos no ar e o apontou a ele, e depois apontou a seu pé. —Quer que eu a pise? — Perguntou com incredulidade. Ela afirmou com a cabeça. —Por quê? "Sinto-o" movendo os lábios. —Realmente sente? — perguntou, sua voz saia perigosamente baixa. Ela afirmou com a cabeça. Ele se inclinou aproximando-se mais.
—Seriamente? Afirmou de novo. —Está resolvida a me demonstrar isso? Ainda afirmou de novo, mas esta vez seus movimentos careciam de convicção. —Não vou pisar-lhe o pé — sussurrou. Ela piscou. Blake lhe tocou a face, sabendo que era uma insensatez, sem poder evitá-lo. Seus dedos desceram para sua garganta, deleitando-se com o calor de sua pele - terá que demonstrar-me de maneira diferente. Ela tentou dar um passo atrás, mas tinha sua mão estendida rodeando sua cabeça e a segurava firmemente. —Um beijo, acredito — murmurou — Só um. Só um beijo. Seus lábios se abriram com surpresa e lhe olhou tão condenadamente assustada e inocentemente que lhe foi possível enganar a si mesmo, se só por um momento ela não fosse Carlotta De Leão, se não fosse uma traidora ou uma espiã; só era uma mulher (uma mulher bastante atraente) e estava aqui, em sua casa, em seus braços. Ele cortou a distância entre eles, e roçou sua boca docemente contra a dela. Ela não se moveu, mas ele ouviu um suave grito afogado de assombro passar através de seus lábios. O barulhinho o encantou (o primeiro que havia feito em todo o dia, salvo por uma tosse), e fez mais profundo o beijo, acariciando a suave pele de seus lábios com sua língua. Ela era doce e salgada, como só uma mulher sabe ser, e Blake estava tão comovido que não se deu conta que não lhe estava devolvendo o beijo. Mas logo notou que estava totalmente quieta em seus braços. Por alguma razão, aquilo o enfureceu. Odiou desejá-la dessa maneira, e queria que ela sentisse a mesma tortura. —Me beije — grunhiu, as palavras abrasavam contra sua boca — sei que o deseja, vi-o em seus olhos. Durante uns segundos, ela não reagiu, mas então ele sentiu sua mão pequena movendo-se lentamente ao longo de todas suas costas. Ela se aproximou mais a ele, e quando Blake sentiu o calor de seu corpo pressionando brandamente contra ele, pensou que poderia estalar. Sua boca não se movia com o mesmo ardor que a dele, mas seus lábios se abriram tacitamente encorajando-o a fazer o beijo mais profundo. —Deus santo — murmurou, falando sozinho quando parou para respirar — Carlotta.
Ela ficou rígida em seus braços e tentou afastar-se bruscamente. —Ainda não — protestou Blake. Sabia que isto precisava acabar, sabia que não podia permitir que aquilo fosse mais à frente como seu corpo estava suplicando, mas não estava preparado para liberá-la; precisava sentir seu ardor, tocar sua pele, utilizar seu calor para recordar que estava vivo, e ele... Ela o empurrou para afastar-se e recuou uns passos para trás, até pegar-se contra a parede. Blake amaldiçoou baixo, e colocou suas mãos nos quadris lutando por recuperar sua respiração. Quando a olhou, seus olhos estavam quase frenéticos, e negou com a cabeça com insistência. —Foi repugnante? — disse mordazmente. Ela moveu sua cabeça negativamente outra vez, um movimento pequeno, mas rápido. "Não posso", gesticulou com a boca. —Bem, eu tampouco posso — disse, com clara aversão a si mesmo em sua voz — mas o fiz de toda forma, assim, que diabos significa isto? Seus olhos se abriram enormes, mas fora disso, não respondeu. Blake a olhou fixamente aos olhos durante um longo momento antes de dizer: —A deixarei sozinha então. Ela afirmou muito lentamente. Perguntou-se por que se mostrava tão pouco disposto a deixá-la sozinha. Finalmente, depois de murmurar umas quantas maldições, cruzou a largos passos o quarto até chegar à porta. —A verei pela manhã. A porta se fechou de repente, e Caroline ficou olhando o lugar onde ele esteve durante uns segundos, antes de sussurrar: —Oh, Meu Deus. À manhã seguinte, Blake se dirigiu ao piso de baixo antes de ir ver sua "convidada". Conseguiria que falasse hoje até se isso acabasse com ele. Este disparate fora muito longe. Quando entrou na cozinha, a senhora Mickle, sua governanta e cozinheira, estava ocupada mexendo algo em uma sopeira. —Bom dia, senhor — disse. —Então é assim uma voz feminina? — murmurou Blake — quase o esqueci. —Como diz? —Não importa. Faria a gentileza de pôr a ferver um pouco de água para chá?
—Mais chá? — perguntou — pensava que gostava mais do café. —Sim, mas hoje quero chá. — Blake estava completamente seguro de que a senhora Mickle sabia que havia uma mulher acima, mas trabalhava para ele durante vários anos, e tinham um acordo tácito, lhe pagava bem e com o máximo respeito, e lhe correspondia não fazendo perguntas nem contando intrigas. Era igual com todos os criados. A governanta afirmou com a cabeça e sorriu. —Então quererá outra grande panela? Blake lhe devolveu o sorriso com ironia. É obvio este silêncio pormenorizado não significava que à senhora Mickle não gostasse de irritá-lo quando podia. —Uma panela muito grande — respondeu. Enquanto ela servia o chá, Blake se desviou em busca do Perriwick, seu mordomo; o encontrou polindo a alguma prata que não necessitava absolutamente. —Perriwick — gritou Blake— preciso enviar uma mensagem a Londres. Imediatamente. Perriwick afirmou com a cabeça com muita pompa. —Ao marquês? — supôs. Blake afirmou com a cabeça. A maioria de suas mensagens urgentes eram enviadas ao James Sidwell, o Marquês de Riverdale. Perriwick sabia exatamente como enviá-los a Londres pela rota mais rápida. —Se me entregar — disse Perriwick — deixarei em seu destino imediatamente. —Primeiro preciso escrever — disse Blake distraidamente. Perriwick franziu o cenho. —Posso lhe sugerir que escreva suas mensagens antes de me pedir que as leve, senhor? Seria um uso muito mais eficiente de seu tempo e do meu. Blake abriu um sorriso pela metade para dizer: —É um insolente descarado para ser um criado. —Só desejo facilitar o governo afável e elegante de sua casa, senhor. Blake moveu sua cabeça negativamente, maravilhando-se da capacidade do Perriwick para conter a risada. —Espera um momento e a escreverei agora. — Inclinou-se sobre uma escrivaninha, tomou um papel, pena e tinta e escreveu: J.
Tenho à senhorita De Leão e apreciaria sua ajuda com ela imediatamente. B. James teve relações anteriormente com a espiã meio espanhola. Ele saberia como fazê-la falar; enquanto isso, Blake só teria que lhe dar muito chá e esperar a que recuperasse a voz. Francamente, não tinha outra opção, seus olhos lhe doíam muito de olhar sua escritura. Quando Blake chegou até a porta do quarto de Carlotta, pôde ouvi-la tossindo. —Diabos — murmurou. Louca. Deve ter começado a recuperar sua voz e decidido tossir para perdê-la de novo. Manteve em equilíbrio o jogo de chá habilmente enquanto abria com chave a porta e a empurrava para abri-la. —Tossindo ainda, já ouço, — disse lenta e pesadamente. Estava sentada sobre a cama, afirmando com a cabeça, e seu cabelo marrom claro parecia de um tato flexível. Ela não tinha boa cara. Blake se queixou. —Não me diga que agora está doente de verdade? Afirmou com a cabeça, esperando, quase como se fosse chorar. —Assim admite que ontem fingia sua enfermidade? Olhou envergonhada enquanto sua mão se moveu rapidamente como dizendo "de certo modo" —Fingia ou não fingia? Ela o afirmou tristemente, mas apontou sua garganta. —Sim, já sei que realmente ontem não podia falar, mas agora ambos sabemos que não foi um acidente, verdade? Ela baixou o olhar. —Tomarei como um sim. Ela apontou à bandeja e moveu os lábios. "Chá? " —Sim. — depositou o serviço de mesa e pôs a mão em sua fronte. —Pensei que lhe ajudaria a recuperar sua voz. Diabos, tem febre. Ela suspirou. —O tem merecido.
"Sei" gesticulou com a boca, parecendo completamente arrependida. Nesse momento quase lhe pareceu simpático. —Aqui — disse, sentando-se na borda da cama — deveria tomar um pouco de chá. "Obrigado" —Serve? Ela afirmou com a cabeça. —Bem, sempre fui torpe neste tipo de coisa. Marabelle sempre dizia: "Te deixará inválido". Como podia inclusive pensar em falar de Marabelle com esta espiã? "Quem é Marabelle?" gesticulou com os lábios. —Ninguém — disse bruscamente. "Sua prometida?" gesticulou com a boca, seus lábios se moviam cuidadosamente ao pronunciar suas palavras silenciosas. Não lhe respondeu, levantou-se e andou a largos passos até a porta. —Beba o chá — ordenou-lhe — e toque a campainha se começar a sentir-se doente. Saiu do quarto, batendo a porta atrás dele antes de girar as duas chaves e as fechou com um cruel golpe seco. Caroline olhou fixamente à porta e pestanejou. O que significava tudo isto? Este homem era tão inconstante como o vento. Um minuto ela juraria que lhe tinha carinho, e no seguinte... Bem, pensou, enquanto alcançou o chá e se serviu uma xícara; ele acreditava que era uma espiã traidora, isso devia explicar porquê frequentemente era tão brusco e insultante. Embora (tomou um gole profundo do chá fumegante e suspirou com prazer) não se explicava por que a beijara; e isso certamente não explicava por que deixara. Deixar? Diabos, desfrutara, nunca experimentara nada como isso, muito melhor que o calor e a segurança que ela conhecera quando seus pais ainda viviam, mais do que tudo que ela sentira antes. Foi uma faísca de algo diferente e novo, algo excitante e perigoso, algo muito belo e selvagem. Caroline estremeceu ao pensar o que aconteceria se ele não a chamasse de Carlotta, foi o que lhe devolveu o seu sentido comum. Esticou a mão para servir-se outra xícara de chá, e no processo, roçou ao passar um guardanapo de tecido que cobria um prato. O que era isso? Levantou o guardanapo. Torta doce! Era o paraíso na terra, em um prato de bolachas. Mordeu um pedaço e deixou que se derretesse em sua boca; se perguntou se ele saberia que havia lhe trazido sua comida. Duvidou que lhe tivesse preparado o chá; possivelmente sua
governanta tivesse posto a torta na bandeja sem que ele o tivesse ordenado. Melhor comer rápido, disse a si mesma. Quem sabe quando voltaria ele? Caroline colocou outro pedaço de torta em sua boca, sufocando um risinho tolo e em silêncio enquanto as migalhas caíam sobre a cama. Blake não lhe fez o menor caso durante o resto do dia e à manhã seguinte, só foi para assegurarse de que não tinha piorado e lhe trazer um pouco mais de chá. Parecia aborrecida, faminta e encantada de lhe ver; mas não houve outra coisa que silêncio ao deixar o jogo de chá sobre a mesa e tocar sua testa em sinal de febre. Sua pele estava um pouco quente, mas não parecia arder mais, assim lhe disse outra vez que fizesse soar a campainha se sentia-se doente, e abandonou o quarto. Deu-se conta que a senhora Mickle acrescentara um prato de sanduíches na bandeja, mas não teve coração para levar-lhe. Decidira que não seria necessário matá-la de fome, certamente o Marquês de Riverdale chegaria logo, e não lhe seria possível manter o silêncio com ambos, quando a interrogassem. Realmente, não havia nada que fazer, só esperar. O marquês chegou no dia seguinte estacionando sua carruagem na parada diante de Seacrest Manor, pouco antes de anoitecer. James Sidwell desceu de um salto, vestido elegantemente como sempre. Seu cabelo castanho escuro era um pouquinho comprido para a moda. Tinha uma reputação que ruborizaria ao diabo, mas daria sua vida pelo Blake, e Blake sabia. —Vejo-te perigoso — disse James com franqueza. Blake moveu a cabeça negativamente. —Depois de passar estes últimos dias encerrado com a senhorita De Leão, considero-me um candidato digno de uma casa de loucos. —Tão mal é? —Prometo-lhe isso, Riverdale — disse — poderia te beijar. —Espero que não cheguemos a isso. —Quase me deixa louco. —Ela? — Respondeu James olhando de esguelha. — Como? Blake o olhou com o cenho franzido. O tom sugestivo do James estava muito perto da verdade ao assinalar: —Não pode falar. —Desde quando? —Desde que ficou acordada a noite toda tossindo até ficar afônica. James sufocou uma risada.
—Nunca disse que não fosse engenhosa. —Lhe dá terrivelmente bem não poder escrever. —Encontro isto difícil de acreditar, sua mãe era filha de um barão e seu pai estava muito bem relacionado na Espanha. —Me permita me expressar de outra maneira. Ela pode escrever, mas lhe desafio a que decifre os sinais que ela apontou sobre o papel. Além disso, tem um livro cheio de palavras das mais raras, e te garanto que não lhes encontrei nenhum sentido. —Porquê não me leva a vê-la? É possível que a convença para que recupere sua voz. Blake moveu negativamente a cabeça e revirou os olhos. —Toda tua; de fato, pode te fazer cargo desta condenada missão por completo se quiser. Se nunca voltasse a ver essa mulher... —Vamos, Blake. —Eu lhe disse que queria estar fora disto - murmurava Blake enquanto se aproximava com passos pesados às escadas. —Mas me escutaram? Não, e o que consigo? Nem emoção, nem fama, nem fortuna. Não, consegui-a a ela. James o olhou atentamente. —Se não te conhecesse pensaria que estás apaixonado. Blake bufou, afastando-se para que James não pudesse ver o ligeiro rubor que coloriu suas faces. —E se eu não desfrutasse de sua companhia não te chamaria para este assunto. James riu a gargalhadas e olhou ao Blake quando este parou diante de uma porta e girou as chaves nas fechaduras. Blake empurrou a porta aberta e entrou, com as mãos em seus quadris se dirigiu à senhorita De Leão com expressão agressiva. Ela estava ajeitada na cama, lendo um livro como se não se importasse com nada. —Está aqui Riverdale — disse em tom brusco. — Verá que seu joguinho terminou. Blake se voltou para James com júbilo, disposto a ver como a fazia em pedaços; mas a expressão de James, que em geral era controlada e cortês, foi de total e absoluta comoção. —Não sei o que te dizer — disse James — exceto claramente que ela não é Carlotta De Leão.
Capítulo 5
Pule (verbo). 1.-Chorar com voz frouxa ou débil, como um menino. 2. - Piar lastimosamente como uma galinha. Fiquei sem voz, estou segura de que teria que ter gemido (puled). — Do dicionário pessoal de Caroline Trent —Ai, Deus! — grunhiu Caroline, esquecendo que supostamente estava muda. —E quando diabos tornou sua maldita voz? — exigiu seu sequestrador. —Eu, né... realmente não muito. —Verdadeiramente, Blake — disse o segundo homem — poderia cuidar de sua linguagem. Há uma senhorita presente. —Merda! — explodiu Blake. — Sabe quanto tempo gastei com esta mulher? Provavelmente a verdadeira Carlotta De Leão está agora a meio caminho da China. Caroline tragou nervosamente; então seu nome era Blake, de algum modo era apropriado para ele, curto e conciso. Perguntou-se se seria seu nome de batismo ou seu sobrenome. —E — continuou em um arranque de fúria —posto que obviamente, você não é a mulher que disse, quem diabos é você? —Nunca disse que era Carlotta De Leão— insistiu. —Ao diabo que não disse! —Nunca disse que eu não era. —Quem é você? Caroline meditou com cuidado esta pergunta e decidiu que o único recurso era a franqueza absoluta. —Meu nome é Caroline Trent — respondeu. Seus olhos se encontraram com os de Blake pela primeira vez em sua conversa. —Oliver Prewitt é meu tutor. Houve um momento de silêncio em que ambos ficaram olhando-a fixamente com surpresa. Finalmente, Blake se voltou para seu amigo e lhe disse gritando. —Por que diabos não sabíamos que Prewitt tinha uma pupila? O outro homem amaldiçoou baixo, voltou a amaldiçoar, a segunda vez muito mais alto.
—Maldição se sei. Alguém vai responder por isso. Blake se dirigiu a Caroline e lhe pediu: —Se seriamente for a pupila do Prewitt, onde esteve os últimos quinze dias? Nós estivemos vigiando a casa dia e noite e você, minha menina, seguro que não esteve vivendo nela. —Estava em Bath, Oliver me enviou para cuidar de sua tia de idade avançada. Chama-se Marigold. —Não me importo como se chama. —Não pensei que lhe importasse — disse entre dentes — pensei que deveria dizer algo. Blake a agarrou pelos ombros e a olhou aos olhos. —Há muitas coisas que vai ter que nos contar, senhorita Trent. —Solta-a — disse o amigo de Blake em voz baixa — não perca a paciência. —Não perder a paciência? — disse Blake gritando, soando tão forte como se já a tivesse perdido. — Entende o que... —Pensa — disse o outro homem atentamente — tem sentido. Prewitt teve um envio que chegou a semana passada. Quereria que ela estivesse fora da cena. Obviamente ela é suficientemente perspicaz para desprezar o que ele está fazendo. Caroline sorriu alegremente pelo galanteio, mas Blake não parecia preocupar-se por sua inteligência de um modo ou outro. —Era a quarta vez que Oliver me enviava a visitar sua tia — acrescentou amavelmente. —Vê? — disse o amigo do Blake. Caroline sorriu um pouco insegura ao Blake, esperando que tivesse aceito fazer as pazes, mas tudo o que ele fez foi pôr suas mãos em seus quadris e com as piores maneiras disse: —Que diabos fazemos agora? O outro homem não tinha uma resposta, e Caroline aproveitou seu momentâneo silêncio para perguntar: —Quem são? Ambos. Os dois homens se olharam um ao outro, como se tentassem decidir se revelavam suas identidades, e então, o recém-chegado fez um imperceptível gesto afirmativo com a cabeça antes de dizer: —Sou James Sidwell, marquês de Riverdale e ele é Blake Ravenscroft, segundo filho do visconde Damsby. Caroline sorriu ironicamente ante tal avalanche de títulos.
—Que bom para vocês. Meu pai era comerciante. O marquês soltou uma forte gargalhada antes de voltar-se ao Blake e dizer: —Por que não me disse que era tão divertida? Blake franziu o cenho. —Como ia saber? Não falou duas palavras desde a noite em que a capturei. —Isso não é de todo certo. — protestou Caroline. —Quer dizer que esteve pronunciando discursos e eu fiquei surdo? — respondeu Blake. —Não, é obvio que não. Simplesmente quis dizer que estive bastante entretida. O marquês tampou a boca com a mão, provavelmente para sufocar uma risada. Caroline gemeu. Outra em uma longa lista de frases que ela soltava equivocadamente. Santo Deus! O senhor Ravenscroft deve pensar que se estava referindo ao beijo. —O que quis dizer foi... Bom, não tenho nem ideia do que quis dizer, mas deve admitir que gostou de meus passarinhos de papel, ao menos até que se chocaram contra a roseira. —Pássaros de papel? — perguntou o marquês confuso. —Os... Oh, não importa, a nenhum dos dois importa, — disse Caroline com um suspiro e um lento movimento negativo de sua cabeça. —Peço desculpas por qualquer frustração que possa ter causado. Blake a olhou como se pudesse atirá-la pela janela alegremente. —Só que... —Só que, o que?— disse ele bruscamente. —Detenha seu mau gênio, Ravenscroft — disse o marquês — pode ainda nos ser de utilidade. Caroline tragou saliva, isso soou bastante sinistro, e o marquês, pensou que era mais afável e amistoso que o senhor Ravenscroft; parecia como se pudesse ser bastante desumano quando a ocasião o justificava. —O que sugere Riverdale? — Perguntou Blake em voz alta. O marquês encolheu os ombros. —Poderíamos resgatá-la, e quando Prewitt venha a recolhê-la... —Não! — gritou Caroline, levando uma mão a sua garganta pela explosão de dor que lhe provocou o grito.
—Não vou voltar, não me importa qual seja o risco, eu não me importo se isso significa que Napoleão tome a Inglaterra, não me importa se quer dizer que ambos percam seus trabalhos ou o que seja que vocês façam para o governo. Nunca voltarei. E então, no caso deles serem enormemente obtusos, repetiu: —Nunca. Blake apoiou o pé sobre a cama, com uma expressão dura. —Então lhe sugiro que comece a falar, senhorita Trent. Rápido. Caroline lhes contou tudo. Falou-lhes da morte de seu pai e seus cinco tutores posteriores; contou-lhes os planos do Oliver para conseguir o controle permanente de sua fortuna, que o malogrado Percy tentou violá-la, e por que ela precisava passar as seguintes seis semanas escondendo-se. Falou tanto que sua voz começou a desaparecer outra vez, e teve que anotar o último terço de sua história. Blake observou severamente que quando ela utilizou sua mão esquerda para escrever sua caligrafia era maravilhosa. —Pensei que disse que não podia escrever — disse James. Blake lhe olhou fixamente aos olhos com pura ameaça. —Não quero falar disso, e você - apontando a Caroline — deixe de sorrir. Ela lhe lançou um olhar fugaz, elevando as sobrancelhas em uma expressão inocente. —Certamente pode permitir sua nota de orgulho ao te haver enganado — disse James. Esta vez Caroline nem sequer tentou esconder seu sorriso. —Continua com sua história — grunhiu Blake. Ela assentiu, e ele leu cada linha de sua história com severa indignação, aborrecido pelo modo em que Oliver Prewitt a tratou. Ela podia havê-lo mandado ao diabo durante os últimos dias, tanto física, como mentalmente, mas não podia negar em pequena medida que esta garota o levou a frustrar-se totalmente. Este homem que se supunha ser seu tutor, a tratou tão abominavelmente... Isto fez que se sacudisse com fúria. —O que sugere que façamos com você? — perguntou quando finalmente parou de rabiscar a história de sua vida. —Pelo amor de Deus, Ravenscroft — disse o marquês — dê um pouco de chá à garota, não vê que não pode escrever? —Dê você um pouco de chá. —Não vou deixar-te só com ela. Não seria apropriado.
—Oh, e suponho que seria apropriado para ti permanecer com ela? — zombou Blake. —Sua reputação é mais negra que a peste. —É obvio, mas... —Fora! — grunhiu Caroline. — Os dois. Ambos se voltaram de cara a ela, esquecendo aparentemente que o motivo de sua discussão ainda estava no quarto. —Suplico-lhe seu perdão — disse o marquês. "Eu gostaria de estar uns minutos a sós", escreveu, pondo o papel diante de seus narizes, e precipitadamente rabiscou "senhores". —Me chame James— replicou — todos meus amigos o fazem. Lançou-lhe um olhar irônico, duvidando claramente de que qualificasse como amizade, sua estranha situação. —E ele é Blake — acrescentou James — Suponho que chamarei vocês dois pelo nome de batismo? "Não soube seu nome até agora mesmo" escreveu. —Que vergonha, Blake— disse James — que maneiras. —Vou esquecer que disse isso — grunhiu Blake — porque se não o faço, terei que te matar. Caroline sufocou uma risada para seu pesar. Dissesse o que quisesse sobre o homem enigmático que a sequestrara, ele tinha um senso de humor que igualava ao seu próprio. Ela o olhou outra vez de relance, esta vez duvidando. Ao menos esperava que ele fosse brincalhão. Lançou-lhe outra olhada inquieta. O atroz olhar que ele estava jogando ao marquês, derrubaria a Napoleão, ou ao menos deixaria uma ferida extremamente dolorosa. —Não faça conta — disse James alegremente — tem um mau gênio próprio do diabo, sempre o teve. —Suplico seu perdão — replicou Blake, muito irritado. —Conheço-o desde que tínhamos doze anos — disse James — estudamos juntos em Eton. —Sim? — disse com voz rouca, provando sua voz outra vez — que agradável para ambos. James disse: —A parte desta frase não expressa, é obvio, é que nos merecemos um ao outro. Vamos, Ravenscroft, vamos dar a pobre garota sua intimidade, estou seguro de que quererá vestir-se e lavar-
se e fazer todas essas coisas que as garotas gostam de fazer. Blake deu um passo adiante. —Ela já está vestida e nós precisamos lhe perguntar a respeito de... Mas James levantou uma mão. —Temos todo o dia para obter sua submissão. Caroline tragou saliva. Não gostou como soou isso. Os dois homens abandonaram o quarto, e ela ficou de pé de um salto, jogou um pouco de água sobre seu rosto, e colocou os sapatos; era estupendo levantar-se e estirar seus músculos. Esteve metida na cama durante os últimos dois dias e não estava acostumada a tanta inatividade. Caroline corrigiu sua aparência como melhor pôde, que já era dizer muito, já que esteve vestindo as mesmas roupas durante quatro dias, estavam horrivelmente enrugadas, mas pareciam suficientemente limpas, assim ajeitou seu cabelo em uma única trança grossa; então verificou a porta, ficou encantada ao ver que não estava fechada. Não foi difícil encontrar o caminho para a escada e rapidamente desceu correndo até o piso inferior. —Vai a algum lugar? Ela levantou a vista bruscamente. Blake estava apoiado descaradamente contra a parede, arregaçou as mangas e cruzou seus braços. —Chá — sussurrou ela — disse que poderia tomar um pouco. —Disse? — disse lenta e pesadamente. —Se não o fez, estou segura de que teve intenção de fazê-lo. Os lábios dele se curvaram em um sorriso disposto. —Tem um código de palavras. Ofereceu-lhe um sorriso muito doce. —Estou praticando, depois de tudo, não as utilizei há dias. —Não me pressione, senhorita Trent. Meu humor pende de um fio muito fino. —Mas bem acreditei que já se havia quebrado — respondeu — e a respeito disso, se eu o chamo Blake, você também poderia me chamar Caroline. —Caroline lhe assenta muito melhor que Carlotta. —Assim seja. Não tenho nenhuma gota de sangue espanhol, um pouco de francesa— acrescentou, sabendo que estava tagarelando, mas muito nervosa em sua presença para parar — mas não
espanhola. —Pôs totalmente em perigo nossa missão, deste conta? —Posso-lhe assegurar que não era minha intenção. —Estou seguro de que não, mas segue sendo um fato que vai ter que compensar. —Se minhas compensações fizerem com que Oliver passe o resto de sua vida na prisão, pode garantir minha completa colaboração. —A prisão seria improvável, a forca é uma probabilidade muito mais clara. Caroline tragou saliva e afastou o olhar, de repente se deu conta de que sua implicação com estes dois homens podia enviar Oliver à morte. Detestava a esse homem, seguro, mas a ela não agradava ser a causa da morte de ninguém. —Precisará descartar seu sentimentalismo — disse Blake. Chocada, elevou o olhar. Seu rosto era tão fácil de ler? —Como sabia o que estava pensando? Deu de ombros. —Qualquer um que tenha consciência deve enfrentar-se com este dilema quando entra neste negócio. —Como você? —É obvio, eu passei por essa etapa rapidamente. —O que aconteceu? Ele levantou uma sobrancelha. —Pergunta muito. —Nem a metade do que você fez — respondeu ela. —Tinha uma ordem ministerial que aprovava as razões de fazer tantas perguntas. —Por isso morreu sua prometida? Fixou seus olhos nela com tanta fúria que ela afastou o olhar. —Não importa — murmurou ela. —Não volte a mencioná-la. Caroline deu um passo atrás involuntário pela dor áspera em sua garganta. —Sinto muito — murmurou.
—Por quê? —Não sei — disse, contrária a mencionar a sua prometida depois do modo em que reagira a última vez — Algo lhe faz tão infeliz. Blake a olhou fixamente nos olhos com interesse, parecia sincera, e lhe surpreendeu; fora muito pouco considerado com ela nestes últimos dias, mas antes de que pudesse pensar em uma resposta, ouviram que o marquês entrava no vestíbulo. —Maldição, Ravenscroft — disse James — Não poderia contratar mais criados? Blake sorriu abertamente ante a visão do elegante marquês de Riverdale fazendo equilíbrios com um serviço de chá. —Se pudesse encontrar outro em quem confiar, contrataria no momento. De qualquer forma, logo que acabe minhas obrigações com o Ministério de Defesa, a discrição de meus criados não terá por que ser tão grande. —Então, ainda está decidido a deixá-lo? —Precisa perguntá-lo? —Acredito que quer dizer que sim — disse James a Caroline — embora com Ravenscroft, nunca se sabe. Tem o horroroso costume de responder às perguntas com outras perguntas. —Sim, notei — murmurou ela. Blake se separou da parede. —James? —Blake? —Te cale. James sorriu amplamente. —Senhorita Trent, por que não nos retiramos ao salão? O chá deve ajudá-la a recuperar a voz ao menos um pouco; uma vez que não doa ao falar, poderíamos resolver que diabos faremos com você. Blake fechou os olhos um momento, enquanto Caroline saía detrás de James escutando como lhe dizia com voz áspera: —Deveria me chamar Caroline, ao senhor Ravenscroft já dei permissão para fazê-lo também. Blake esperou um ou dois minutos antes de segui-los, necessitava uns momentos de solidão para pôr em ordem seus pensamentos, ou ao menos tentá-lo. Nada estava claro no concernente a ela; sentira um alívio tão grande quando descobriu que Carlotta De Leão não era realmente Carlotta De
Leão. Caroline. Caroline Trent. E não gostava de manter relações com uma traidora. Moveu sua cabeça negativamente com aversão. Como se esse fosse o único problema que enfrentava agora. Que diabos se supunha que ia fazer com ela? Caroline Trent era inteligente, muito inteligente, isto estava bastante claro, e ela odiava Oliver Prewitt o suficiente para ajudá-lo a apresentá-lo ante a justiça. Poderia custar um pouco convencê-la para que lhe ajudasse a tirar sua aversão pela espionagem, mas não muito. Depois de tudo, Prewitt tinha ordenado a seu filho que a violasse. Não era provável que Caroline desse a outra face depois de algo como isso. A solução óbvia era que permanecesse aqui, em Seacrest Manor. Certamente teria muita informação que eles poderiam utilizar contra Prewitt. Era duvidoso que ela não estivesse a par de seu tráfico ilegal. Mas com as perguntas apropriadas, James e ele poderiam descobrir pistas que ela provavelmente nunca se deu conta que sabia. Se, além disso, ela pudesse lhes proporcionar um esboço de Prewitt Hall, seria uma informação incalculável no caso de que James e ele decidissem entrar a força. Assim, se ela era tão bom acréscimo a sua equipe, por que estava tão pouco disposto a lhe pedir que ficasse? Sabia a resposta, não queria olhar profundamente dentro de seu coração para admiti-lo. Chamou-se covarde de sete maneiras diferentes, mas pôs em movimento seus calcanhares e caminhou a grandes passos para a porta principal. Necessitava um pouco de ar. — O que supõe que está observando nosso bom amigo Blake? Caroline elevou o olhar para ouvir a voz do James, enquanto lhe servia o chá. —Certamente, não é meu bom amigo — respondeu. —Bom, eu não o chamaria seu inimigo. —Não, não é. É só que não acredito que os amigos atem a seus amigos ao pé de uma cama. James se engasgou com seu chá. —Caroline, não tem nem ideia. —A questão é discutível, de qualquer modo — disse, jogando um olhar pela janela — está se afastando. —O que? — James se levantou do sofá e cruzou a sala — que covarde. —Certamente não me tem medo — brincou ela. James girou sua cabeça para olhá-la, seus olhos perfuravam de uma maneira tão aguda seu rosto, que ela ficou muito incômoda. —Possivelmente sim — murmurou mais para si mesmo que para ela.
—Senhor? James agitou a cabeça, para clarear seus pensamentos, mas não deixou de olhá-la fixamente. —Disse que me chamasse James — sorriu com picardia — ou "querido amigo" se acredita que James for muito familiar. Ela deixou escapar um bufo muito feminino. —Ambos são muito familiares, como bem sabe. Entretanto, dada minha extraordinária situação, parece tolo discutir sobre detalhes sem importância como este. —Uma mulher eminentemente prática — disse com um sorriso — o melhor tipo. —Sim, bom, meu pai era comerciante — disse, fazendo uma piada (com humor) — alguém deve ser prático para alcançar o êxito em seus propósitos. —Ah, sim, é obvio, comerciante, recordaste-me isso. Que tipo de comércio? —Construção de navios. —Já vejo, então, deve te haver criado perto da costa. —Sim, em Portsmouth até mi... por que me olha tão curiosamente? —Perdoa, estava te olhando fixamente? —Sim — disse francamente. —Simplesmente é que recorda a alguém que conheci, não na aparência, nem nos gestos, é mais um... — elevou sua cabeça como se procurasse a palavra correta - é mais uma semelhança de espírito, se existe tal coisa. —Oh! — respondeu Caroline, a falta de algo mais inteligente que dizer — já vejo, espero que ela seja alguém agradável. —Oh, sim, a mais agradável, mas isso não importa— James voltou a atravessar a sala e se sentou em uma cadeira ao lado dela. —Estive meditando sobre a nossa situação. Caroline bebeu seu chá. —Ah, sim? —Sim, acredito que deveria ficar aqui. —Não há problema. —Inclusive por sua reputação?
Caroline encolheu os ombros. —Como diz, sou prática, o senhor Ravenscroft já mencionou que seus criados são discretos e minhas outras opções são voltar com o Oliver. —O que realmente não é uma opção absolutamente — interrompeu James — a menos que queira acabar te casando com o tolo de seu filho. Ela afirmou com a cabeça. —Ou posso voltar para meu plano original. —Qual? —Pensei procurar trabalho em uma estalagem. —Não é precisamente uma perspectiva segura para uma mulher sozinha. —Sei — aceitou Caroline — mas realmente não tenho outra escolha. James acariciou a mandíbula pensativamente. —Estará a salvo aqui, em Seacrest Manor, asseguro-te que não lhe vamos fazer retornar com o Prewitt. —O senhor Ravenscroft não está de acordo em me deixar permanecer aqui — recordou-lhe — e esta é sua casa. —Ele o fará. Caroline pensou que James estava sendo muito crédulo, mas não obstante ele não sabia nada sobre o beijo entre Blake e ela, Blake parecia bastante aborrecido por isso. James voltou o rosto para ela repentinamente. —Gostaríamos que nos ajudasse a levar seu tutor ante a justiça. —Sim, o senhor Ravenscroft também disse. —Não te disse que o chamasse Blake? —Sim, mas de algum jeito, parece muito... Intimo. A palavra estava suspensa em sua mente, formando a imagem de seu rosto, sobrancelhas escuras, maçãs do rosto formadas elegantemente, um sorriso que raramente aparecia... Oh, mas quando o fazia... Era realmente embaraçoso. Caroline pensou, que um de seus sorrisos podia fazê-la sentir-se muito aturdida. E seu beijo! Meu Deus, lhe fizera sentir que possivelmente não podia ser bom para sua prudência. Inclinou-se sobre ela, e simplesmente, paralisou-se, hipnotizada por seu olhar de
grossas sobrancelhas. Se ele não tivesse perturbado o momento chamando-a Carlotta, só o céu saberia o que lhe teria deixado fazer. O mais assombroso foi que ele também pareceu desfrutar do beijo. Percy sempre disse que ela era a terceira garota mais feia de toda Hampshire; entretanto, Percy era um idiota, e seu apetite sempre se dirigiu para as loiras gordinhas... —Caroline? Ela levantou os olhos repentinamente. Os lábios de James se curvaram em um sorriso divertido. —Está embevecida. —Oh, sinto muito, ia dizer que o senhor... er... quero dizer, Blake, já me contou a respeito de lhes ajudar a prender o Oliver. Devo dizer, que é bastante desconcertante saber que ele poderia ir à forca como resultado direto de minha intervenção; mas, se como você diz, esteve dirigindo atividades de traição... —Tem-no feito, estou seguro disso. Caroline franziu o cenho. —É um calhorda. Foi bastante cruel por sua parte que ordenasse ao Percy que me agredisse, mas pôr em perigo a milhares de soldados britânicos, não posso compreendê-lo. James sorriu lentamente. —Prática e patriota. Você, Caroline Trent, é um prêmio. Se Blake também pensasse o mesmo. Caroline deixou sua xícara de chá estrepitosamente sobre o pires; não gostava do curso que estavam tomando seus pensamentos em respeito a Blake Ravenscroft. —Ah, olhe — disse James levantando-se de supetão — nosso anfitrião errante retorna. —Como diz? James fez uns gestos em direção à janela. —Parece ter mudado de ideia; possivelmente decidiu que nossa companhia não é realmente tão má. —Ou poderia ser a chuva — replicou Caroline — começou a garoar. —Então garoa, a Mãe Natureza está claramente de nosso lado. Um minuto mais tarde Blake entrou no salão com passo irado, com seu cabelo negro úmido.
—Riverdale — vociferou. — Estive pensando a respeito dela. —Ela está no salão— disse Caroline secamente. Se Blake a ouviu, ele a ignorou. —Ela se vai. Antes que Caroline pudesse protestar, James cruzara seus braços. — Não estou de acordo. Absolutamente. —É muito perigoso. Não arriscarei sua vida. Caroline não estava segura de que era um elogio ou uma ofensa. Decidiu-se por "ofensa"; geralmente, sua opinião parecia ser mais o resultado de uma pobre opinião sobre o gênero feminino que uma entristecedora preocupação por seu bem-estar. —Não acredita que devo decidi-lo eu? — disse ela metendo-se na conversação. —Não - disse Blake aceitando finalmente sua presença. —Blake pode ser bastante protetor com as mulheres — disse James, quase à parte. Blake o olhou com ferocidade. —Não deixarei que a matem. —Não a matarão— respondeu James. —E como sabe? — perguntou-lhe Blake. James riu entre dentes. —Porque, meu querido menino, confio que você não permitirá. —Não seja tão condescendente comigo — grunhiu Blake. —Minhas desculpas pelo "querido menino", mas sabe que digo a verdade. —Há alguma coisa em relação com o que passa aqui que eu deveria saber? — perguntou Caroline movendo sua cabeça de um homem a outro. —Não — disse Blake sem rodeios, mantendo sua vista umas polegadas por cima da cabeça dela. Que diabos se supunha que devia fazer com ela? Era mais que muito perigoso que ela ficasse, precisava assegurar-se de que ela iria antes que fosse muito tarde. Embora ela já despertara essa parte dele que parecia manter imperturbável, a parte que lhe importava; e a razão pela que não queria que ela ficasse era singela: assustava-o, tinha gasto uma grande quantidade de sua energia emocional mantendo-se afastado das mulheres que lhe provocavam
algo mais que desinteresse ou luxúria. Caroline era inteligente. Era graciosa, condenadamente atraente, e Blake não a queria a menos de dez milhas de Seacrest Manor. Tentara ser compassivo com ela antes. Isso quase o destruíra. —Ah, diabos — disse finalmente— fica, então, mas que ambos saibam que estou totalmente em desacordo. —Um fato que deixaste totalmente claro — disse James com voz cansada. Blake o ignorou e se aventurou a olhar Caroline. Má ideia. Ela lhe sorriu. Sorriu de verdade, e isso fez que se iluminasse todo seu rosto e parecia tão endemoniadamente doce, e... Blake amaldiçoou entre dentes, sabia que isto era um grande engano. O modo em que lhe sorriu, como se pensasse que realmente pudesse iluminar os cantos mais longínquos de seu coração... Deus, ela o aterrava.
Capítulo 6
In-com-se-quen-ti-al-i-ty (substantivo). A qualidade de não ser consequente. Não há nada mais perturbador que sentir-se pouco consequente (inconsequentiality), exceto possivelmente, a vergonha que alguém sente ao tentar pronunciá-lo. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent Caroline estava tão contente de poder permanecer em Seacrest Manor, que até a manhã seguinte não se deu conta de um fato bastante importante, ela não tinha informação que compartilhar, não sabia nada sobre os negócios ilegais de Oliver. Em conclusão, era desnecessária. Eles não entenderam ainda. Blake e James provavelmente pensaram que ela armazenava todos os segredos do Oliver ordenados em seu cérebro, mas a verdade era que ela não sabia nada. E seus anfitriões imaginavam que o diria logo, e então estaria de volta onde começara. A única maneira de guardar-se de ser jogada no frio, era fazer-se útil. Possivelmente se ela ajudasse ao redor da casa e o jardim, Blake lhe deixaria permanecer em Seacrest Manor, inclusive depois de que ele percebesse que ela não tinha nada a oferecer ao Ministério de Defesa. Não era como se ela necessitasse uma casa permanente, só um lugar onde esconder-se durante seis semanas. —Que fazer, que fazer — dizia a si mesma entre dentes, passeando de um lado para outro, dentro da casa, como procurando uma tarefa adequada. Precisava encontrar um plano, que lhe levasse muito tempo terminar, algo que requeresse sua presença ao menos durante alguns dias, possivelmente uma semana. Para então, ela poder convencer ao Blake e ao James de que era uma convidada educada e divertida. Entrou passeando sem rumo no inerte quarto de música e moveu suas mãos ao longo da madeira lisa do piano. Era uma lástima, não sabia como tocar, seu pai sempre desejara que tomasse umas lições, mas morreu antes de levar a cabo seus planos; nem precisa dizer que seus tutores nunca se incomodaram em lhe buscar um professor. Levantou a tampa e golpeou ligeiramente seu dedo contra uma das teclas de marfim, sorrindo pelo som que emitia. De algum modo a música iluminava a manhã inteira. Não é que seus leves golpes pudessem ser chamados música sem insultar gravemente as obras dos grandes compositores, mas apesar disso, Caroline se sentiu melhor depois de fazer um pouco de barulho. Tudo o que ela necessitava agora para iluminar o dia era em realidade conseguir um pouco de luz dentro do quarto. O quarto de música obviamente não foi usado ainda esta manhã, já que as
cortinas estavam ainda fechadas, ou possivelmente ninguém usava este quarto com regularidade, e as mantinham às vezes fechadas para manter o piano afastado do sol. Nunca teve um instrumento musical; Caroline não podia estar segura se muita luz do sol podia ser danoso. Fosse o que fosse, decidiu que o poder do sol de uma manhã não poderia danificar muito, assim se dirigiu a grandes passos para a janela e abriu as cortinas de damasco. Quando o fez, foi recompensada com a visão mais esplêndida. Rosas. Centenas delas. —Não me dei conta, estava justo debaixo de meu pequeno quarto — murmurou abrindo a janela e tirando a cabeça fora para olhar para cima. Estas devem ser as roseiras que ela podia ver de sua janela. Uma inspeção mais próxima lhe confirmou que estava certa; os arbustos estavam terrivelmente descuidados e muito crescidos, como ela recordava e viu um resplendor branco, localizando-se fora de seu alcance que parecia suspeitosamente seu passarinho de papel. Inclinou-se um pouco mais para fora para ter uma melhor visão. Hmmmm. Provavelmente poderia alcançá-lo do exterior. Uns minutos mais tarde Caroline tinha seu pássaro de papel na mão, que estava seco, em relação às roseiras que estavam ao outro lado. —Necessita de uma poda urgentemente — disse em voz alta. Alguém lhe disse uma vez que as flores reagiam bem à conversação, e ela sempre acreditou de coração. Não era difícil falar com as flores quando se tinha tutores como os seus. Comparando-os, as flores resultavam inevitavelmente mais agradecidas. Pôs as mãos sobre seus quadris, levantou sua cabeça, e estudou atentamente os arredores. O senhor Ravenscroft não era do tipo que a despediria enquanto estivesse pondo em ordem seu jardim, verdade? E Deus sabia, o jardim necessitava um acerto. Além das roseiras, havia madressilva que precisava ser recortada, sebes que deveriam estar decorados e um precioso arbusto púrpura que começava a florescer, cujo nome não sabia e estava convencida que cresceria melhor a pleno sol. Evidentemente este jardim a necessitava. Sua decisão estava tomada. Caroline voltou a entrar na casa e se apresentou à governanta, que, bastante interessada, não demonstrou a menor surpresa por sua presença. A senhora Mickle estava totalmente entusiasmada com os planos de Caroline para o jardim, e lhe ajudou a encontrar um par de luvas de trabalho, uma pá, e umas tesouras grandes de podar. Arremeteu contra as roseiras com grande entusiasmo e energia, recortando aqui, e podando
por lá, tagarelando sem parar a si mesma e às flores ao mesmo tempo. —Aqui está, será muito mais feliz sem — (tesourada) — este ramo, e estou segura de que estará melhor se estiver menos denso — (tesourada) — justo aqui. Depois de um momento, entretanto, as tesouras se fizeram mais e mais pesadas e Caroline decidiu as pôr no chão, sobre a grama, enquanto desenterrava a planta que florescia cor púrpura e a mudava para um lugar mais ensolarado. Parecia prudente cavar um novo buraco para a planta antes de mudá-la, assim examinou o local, e selecionou um lugar precioso que seria visível das janelas. Mas então, viu algumas outras plantas que floresciam muito belas. Estas estavam dedilhadas com flores brancas e rosas, mas parecia como se devesse produzir mais flores. O jardim poderia ser uma exibição encantadora de cores se alguém o cuidasse adequadamente. —Estas também deveriam ter um pouco mais de sol — disse em voz alta; cavou alguns buracos mais, e outros mais, por precaução. —Isso devia fazê-lo — Com um suspiro de satisfação inspecionou o arbusto de flores púrpuras que a cativou a princípio e começou a desenterrá-lo. Blake foi à cama de mau humor e se despertou à manhã seguinte inclusive pior. Este trabalho (seu último trabalho, se é que tinha algo que dizer sobre isso) tornou-se um fracasso. Um pesadelo, um desastre andante com olhos verde-azulados. Porquê o estúpido filho do Prewitt escolheu essa noite para atacar a Caroline Trent? Porquê tinha ela que sair correndo no meio da noite, a mesma tarde que ele estava aguardando a Carlotta De Leão? E o pior de tudo, como diabos supunha que ia se concentrar em levar ante a justiça Oliver Prewitt com ela correndo sob seus pés? Ela era uma constante tentação, e um aviso doloroso de tudo o que lhe foi roubado. Alegre, ingênua, e otimista, era tudo o que esteve ausente de seu coração fazia muito. Desde que Marabelle fora assassinada, para ser preciso. Toda a condenada situação parecia demonstrar a existência de um poder maior cujo único propósito era conduzir ao Blake Ravenscroft absoluta e irrevogavelmente à loucura. Blake saiu pisando forte de seu quarto, com expressão carrancuda. —Como sempre, risonho. Levantou o olhar para ver James de pé ao final do vestíbulo. —Espiões nos cantos escuros espreitando para me incomodar? — resmungou. James soltou uma gargalhada. —Tenho gente muito mais importante que você a que incomodar, Blake Ravenscroft. Só ia de
caminho para tomar o café da manhã. —Estive pensando nela. —Não me surpreende. —Que diabos se supõe que quer dizer? James encolheu os ombros, com uma expressão mais que inocente. A mão do Blake desceu pesadamente sobre o ombro de seu amigo. —Me diga — ordenou-lhe. —Simplesmente— replicou James desprendendo-se da mão de Blake e deixando-a cair — que você a olha de maneira inconfundível. —Não seja estúpido. —Tenho muitas más qualidades, mas a estupidez não esteve nunca entre elas. —Está louco. James ignorou seu comentário. —Parece uma garota muito linda. Possivelmente deveria conhecê-la melhor. Blake se voltou para ele com fúria. —Ela não é o tipo de garota que eu procuraria conhecer melhor— bramou, dizendo a última palavra em tom zombador. — A senhorita Trent é uma dama. —Nunca disse que não o fosse. Deus, o que acreditava que estava insinuando? —Riverdale — advertiu-lhe Blake. James agitou sua mão no ar. —Somente estava pensando que faz já bastante tempo desde que cortejou a uma mulher, e convenientemente ela se encontra aqui em Seacrest Manor. —Não estou interessado em Caroline — disse Blake mordazmente — inclusive se estivesse, sabe que nunca me casarei. —Nunca é uma palavra muito forte, nem sequer eu vou de um lugar para outro dizendo que nunca me casarei, e Deus sabe que tenho mais razões para evitar essa instituição que você. —Não comece, Riverdale — advertiu Blake. James o olhou duramente aos olhos. —Marabelle está morta.
—Acredita que não sei? Acredita que não recordo isso cada um dos malditos dias de minha vida? —É possível que já seja hora de que deixe de recordar isso cada um dos malditos dias de sua vida; faz cinco anos, Blake, quase seis. Para de fazer penitência por um crime que não cometeste. —Ao inferno se não o fiz! Teria que havê-la detido. Sabia que era perigoso. Sabia que ela não devia... —Marabelle tinha uma mente própria — disse James com uma gentileza surpreendente. — Não poderia detê-la. Ela tomava suas próprias decisões. Sempre fez. —Jurei protegê-la — disse Blake em voz baixa. —Quando? — perguntou James impertinente - não recordo assistir a bodas entre vocês dois. Em meio segundo Blake o erguera apertando-o contra a parede. —Marabelle era minha prometida, tinha minha palavra de matrimônio— colocou-o no chão — jurei que a protegeria, e de meu ponto de vista, esta declaração é mais comprometedora que qualquer juramento ante Deus e a Inglaterra. —Marabelle não está aqui. Está Caroline. Blake o soltou bruscamente. —Que Deus nos ajude. —Temos que mantê-la em Seacrest Manor até que esteja livre da custódia de seu tio — disse James esfregando os ombros por onde Blake o pegara — é o mínimo que podemos fazer depois de que a sequestraste e a ataste ao pé da cama. Atou-a ao pé da cama, né? Eu teria gostado de vê-lo. Blake o olhou com uma ferocidade que poderia ter derrubado a um tigre. —E, além disso — acrescentou James — ela pode nos ser muito útil. —Não quero utilizar a uma mulher. A última vez que fizemos isso em nome do Ministério de defesa, ela acabou morta. —Pelo amor de Deus, Ravenscroft. O que lhe acontecerá aqui, em Seacrest Manor? Ninguém sabe que ela está aqui vivendo, e não é como se fôssemos enviá-la para realizar missões. Estará muito bem. Certamente mais segura que se a deixássemos sozinha na rua. —Estaria muito melhor se a enviássemos a algum de meus parentes — resmungou Blake. —Oh, e como vais explicar? Alguém vai se perguntar como chegou a estar em posse da pupila de Oliver Prewitt, e então qualquer esperança que nós tenhamos de confidencialidade, será destruída.
Blake grunhiu zangado, James tinha razão, não podia deixar que sua conexão com Caroline Trent se fizesse pública, se a ia proteger do Prewitt, precisava fazê-lo aqui, em Seacrest Manor. Era isso, ou jogá-la à rua. Estremeceu ao pensar no que lhe aconteceria, só pelas ruas de Portsmouth, que era onde ela esteve a princípio, quando ele a sequestrou. Era uma população perigosa, cheia de marinheiros, de maneira nenhuma era um lugar seguro para uma moça. —Já vejo que reconhece que tenho razão — disse James. Blake moveu a cabeça afirmando secamente. —Bem. Interromperemos nosso jejum? Encontro-me babando ao pensar em uma das omeletes da senhora Mickle. Podemos discutir que faremos com nossa encantadora convidada enquanto comemos. Blake deixou James descer primeiro as escadas, mas quando chegaram ao piso de baixo, não havia sinais de Caroline. —Acredita que estará dormido? — perguntou James— imagino que deve estar bastante cansada depois de sua dura experiência. —Não foi uma dura experiência. —Para ti, possivelmente. A pobre garota foi raptada. —A "pobre garota" como você tão docemente a chama, esteve me dando voltas durante dias, se alguém aguentou uma dura experiência — disse Blake bastante firme — fui eu. Enquanto eles estavam discutindo a ausência de Caroline, a senhora Mickle entrou apressadamente na sala com um prato de ovos mexidos. Ela sorriu e disse: —Oh, aí estão, senhor Ravenscroft, encontrei-me com sua nova convidada. —Esteve aqui? —Que garota tão encantadora. Tão educada. —Caroline? —É agradável encontrar a uma pessoa jovem, com um caráter tão doce. Evidentemente, ensinaram-lhe boas maneiras. Blake elevou uma sobrancelha. —À senhorita Trent a criaram os lobos. A senhora Mickle deixou cair os ovos. —O quê? Blake fechou os olhos um pouco para não ver os ovos amarelos, salpicados sobre suas botas
perfeitamente abrilhantadas. —O que quis dizer, senhora Mickle, é que ela poderia também ter sido criada por lobos, dado a quantidade de tutores aos que ela esteve submetida. Então, a governanta estava no chão, com um guardanapo de tecido tentando limpar a sujeira. —Oh, mas a pobre encantadora — disse com clara preocupação — não tinha nem ideia de que teve uma infância difícil. Deveria fazer um pudim especial esta noite. Os lábios de Blake se abriram pelo desconcerto, como tentando recordar a última vez que a senhora Mickle fez o mesmo por ele. James, que esteve rindo-se na entrada, caminhou um pouco para diante e perguntou. —Tem alguma ideia de aonde foi, senhora Mickle? —Acredito que está trabalhando no jardim, levou consigo algumas ferramentas. —Ferramentas? Que tipo de ferramentas? — A mente de Blake cintilava com horrorosas imagens de árvores mutiladas e plantas destroçadas. — Onde encontrou ferramentas? —Eu as dei. Blake se voltou sobre seus calcanhares e saiu a largos passos. —Que Deus nos ajude. Ele não estava preparado para o que viu. Buracos. Grandes. Buracos abertos, por todos os lados, aonde anteriormente ele teve grama sempre. Ou ao menos pensou que esteve sempre. Para falar a verdade, nunca prestou muita atenção; mas sabia que não era parecido com isto. Com montões marrons de terra por toda a grama. Não viu Caroline, mas sabia que precisava estar ali. —O que fez? — rugiu. Uma cabeça saiu de repente de detrás de uma árvore. —Senhor Ravenscroft? —O que está fazendo? Isto é um desastre, e você — disse ao James que não fizera ruído — para de rir. Caroline saiu detrás da árvore, seu vestido estava generosamente coberto de sujeira. —Estou arrumando seu jardim. —Está arrumando... Está o que — Isto não me parece nem um pouquinho arrumar.
—Isto não vai parecer tão maravilhoso até que acabe com meu trabalho, mas quando fizer... —Seu trabalho? Tudo o que vejo são dúzias de buracos. —Duas dúzias. —Se eu fosse você, não teria dito isso. — comentou James de uma distância segura. Caroline fincou a ponta de sua pá no lixo e se apoiou sobre ela como se ralhasse com Blake. —Uma vez que você ouça minha explicação, estou segura de que compreenderá. —Não entendo nada! —Sim — suspirou — os homens em geral não o fazem. Blake começou a olhar ao redor do jardim, sua cabeça ia freneticamente de um lado para outro como tentando avaliar o dano. —Vou ter que chamar um perito de Londres para reparar o que fez. Bom Deus, mulher, vai custar-me uma maldita fortuna. —Não seja tolo —replicou— todos estes buracos estarão tampados ao entardecer; simplesmente estou mudando suas plantas em flor para o sol. Brotarão muito melhor, exceto essas não-meesqueces{1}, é obvio —adicionou apontando às preciosas flores rosas e brancas que estavam plantadas junto à casa, essas florescem à sombra. —Digo-te, Ravenscroft não-me-esqueces—disse James — que possivelmente deveria deixá-la continuar. —Estavam recebendo muito sol— explicou Caroline — os brotos estavam abrasando-se antes de ter oportunidade de florescer. James se voltou para Blake e disse: —Isso soa como se soubesse o que está fazendo. —Não me importa se ela conseguiu um maldito doutorado em horticultura, não tem direito de destroçar meu jardim. Caroline plantou sua mão livre sobre o quadril, começava a estar mais que farta com sua atitude. —Isto não estava como se você dedicasse cuidados antes que eu começasse meu trabalho aqui. —E por que acreditaria você isso? —Qualquer um com um pingo de percepção em jardinagem se teria horrorizado ante o estado de suas roseiras — burlou-se — e as sebes necessitam urgentemente uma poda. —Não toque em minhas sebes — advertiu-lhe.
—Não estava em meus planos, de qualquer maneira, cresceram tão alto que possivelmente não poderia alcançar a parte mais alta; ia pedir que o fizesse você. Blake se voltou para James. — De verdade estou de acordo em deixá-la que fique? James moveu a cabeça afirmativamente. —Diabos. —Simplesmente estava tentando ser de alguma ajuda — disse ela arrepiando-se por seus insultos. Ele a olhou abrindo a boca, e depois olhou para os buracos. —Ajuda? —Só considerei cortês para ganhar meu sustento. —Ganhar seu sustento? Levaria dez anos ganhar seu sustento depois deste dano! Caroline esteve tentando conter seu temperamento, de fato, esteve se felicitando por permanecer tão sensata e risonha contra a ira dele. Já não mais. —Você, senhor — explodiu resistindo ao desejo de girar a pá sobre ele — é o homem mais grosseiro, o mais mal educado de toda a criação. Ele levantou uma sobrancelha —Certamente pode fazê-lo melhor. —Posso — grunhiu — mas há uma pessoa educada presente. —Não se referirá ao Riverdale? — disse Blake com uma risada enquanto movia a cabeça para seu sorridente amigo — ele é a pessoa quase menos educada que conheço. —De qualquer forma — interrompeu o marquês — coincidiria com a senhorita na valorização de seu caráter, Ravenscroft — voltou-se para Caroline— é um bruto. —Deus me livre dos dois — murmurou Blake. —O mínimo que poderia fazer— disse Caroline sorvendo um pouco pelo nariz - é me agradecer isso. — De nada — disse rapidamente — agora, gostaria de me ajudar mudando essas plantas a suas novas posições? —Obrigado? —De nada — disse rapidamente— agora, gostaria de me ajudar mudando essas plantas a suas novas localizações?
—Não. James deu um passo adiante — eu estaria encantado. —É muito amável, senhor — disse ela com um sorriso radiante. Blake franziu o cenho a seu amigo. — Temos trabalho que fazer, Riverdale. —Nós? —Trabalho importante — Blake virtualmente rugiu. —O que poderia ser mais importante que ajudar a uma senhorita enquanto ela está trabalhando com um sol abrasador? Caroline se voltou para Blake com um sorriso interrogante e olhos travessos. —Sim, senhor Ravenscroft, o que poderia possivelmente ser mais importante? Blake a olhou fixamente nos olhos completamente incrédulo. Ela era uma convidada em sua casa (uma convidada!) e não só cavara seu jardim, também ralhou com ele como a um colegial desafiante. E Riverdale, que se supunha que era seu melhor amigo, permanecia de seu lado, rindo como um idiota. —Tornei-me louco — murmurou— tornei-me louco, ou você se tornou louco ou possivelmente todo mundo se tornou louco. —Voto por ti — disse James fazendo uma piada. — Eu estou bastante são, e a senhorita Trent não mostra sinais de transtorno mental. —Não acredito, não posso acreditar nisso — Blake levantou os braços enquanto se afastava a largos passos. —Cavem o jardim inteiro! Acrescentem uma extensão nova à casa! O que importa eu? Só sou o dono do lugar. Caroline se voltou para James com preocupação ao desaparecer Blake quando chegou à esquina. —Quanto de zangado supõe que está? —Em uma escala de um aos dez? —Er... se acreditar que seu estado de ânimo se mediria em tal escala. —Não se poderia. Ela mordeu o lábio inferior. —Assusta-me isso.
—Eu não me preocuparia — disse James com um gesto tranquilizador de suas mãos. — Venha — disse-lhe — me diga o que necessita que te faça. Caroline lhe deu instruções para cavar sob a planta que florescia púrpura e fincou os joelhos no chão para observar seu trabalho. —Tome cuidado de não romper as raízes — disse. E um momento depois: —Sabe por que sempre está tão zangado comigo? James não respondeu durante uns minutos e a pá ficou quieta em suas mãos enquanto ele, obviamente, pensava como responder a sua pergunta. —Ele não está zangado contigo — disse finalmente. Ela soltou uma risada. —Evidentemente, não estamos falando da mesma pessoa neste momento. —Digo-lhe isso a sério. Não está zangado contigo — pisou no extremo da pá e a colocou ainda mais para dentro da terra — ele tem medo de você. Caroline começou a tossir tão forte que James teve que golpeá-la fortemente em suas costas. Quando conseguiu respirar disse: —Me perdoe. Houve outro longo momento de silêncio, e então James disse: —Esteve prometido uma vez. —Sei. —Sabe o que aconteceu? Ela negou com a cabeça. — Só que ela morreu. —Blake a amava mais que a sua vida. Caroline tragou saliva, surpresa pela dor que apertava seu coração produzida pela declaração de James. —Conheciam-se de toda a vida — continuou — trabalharam juntos para o Ministério de defesa. —Oh, não — sua mão se moveu até sua boca. —Marabelle foi assassinada por um traidor. Ela saíra a realizar uma missão em lugar de Blake, ele tinha a garganta muito mau ou algo parecido — James se deteve para enxugar com um lenço um pouco de suor de sua fronte — proibiu-lhe que fosse, ele proibiu completamente, mas ela nunca foi do tipo que escuta ultimatos. Só riu e lhe disse que o veria mais tarde ao anoitecer.
Caroline tragou saliva, mas o gesto foi pequeno para facilitar o nó em sua garganta. —Ao menos sua família pôde ter consolo pelo fato de que ela morreu por seu país — ofereceu ela. James negou com sua cabeça. —Eles não souberam. Disseram (alguém lhes disse) que morreu em um acidente de caça. —Eu, eu não sei que dizer. —Em realidade não há nada que dizer. Ou fazer. Esse é o problema — James desviou o olhar por um momento, seus olhos enfocaram algum lugar sobre o horizonte, então perguntou: —Recorda quando lhe disse que lembrava a alguém? —Sim — disse Caroline lentamente começando a aparecer o horror em seus olhos. — Oh, não, não a ela... James moveu afirmativamente a cabeça. —Não estou seguro de por que, mas o faz. Ela mordeu o lábio e olhou fixamente os pés "meu Deus, isso era pelo qual Blake a beijou? Porque ela de algum jeito se parecia com sua prometida morta?" De repente, sentiu-se muito pequena e muito insignificante. E muito indesejada. —Não passa nada — disse James, claramente preocupado por sua expressão desventurada. —Eu nunca aceitaria um risco como esse— disse Caroline firmemente. — Não se tivesse alguém a quem amar — tragou saliva— não se tivesse alguém que amasse a mim. James tocou sua mão. —Estes últimos anos foram uma época solitária para ti, verdade? Mas Caroline não estava preparada para comentários compassivos. —O que aconteceu ao Blake? — perguntou bruscamente — depois dela morrer. —Estava desolado, bebeu durante três meses, jogou-se a culpa. —Sim, estou segura de que o faria; é do tipo dos que toma responsabilidade por todo mundo, verdade? James afirmou com a cabeça. —Mas certamente agora se dá conta de que não foi por sua culpa. —Em sua cabeça, possivelmente, mas não em seu coração.
Houve uma longa pausa enquanto os dois olhavam fixamente ao chão. Quando finalmente Caroline falou, sua voz era suave e estranhamente vacilante. —De verdade acredita que ele pensa que eu me pareço com ela? James negou com a cabeça. — Não. E não te parece com ela. Marabelle era bastante loira, em realidade, com olhos azuis pálido, e... —Então por que disse...? —Porque é raro encontrar a uma mulher de espírito semelhante. — Quando Caroline não disse nada, James sorriu e acrescentou. — Era um elogio, por certo. Caroline moveu seus lábios de uma forma que estava a meio caminho entre uma careta e um sorriso abjeto. —Obrigado então, mas ainda não vejo porque ele está sendo tão bruto. —Considere a situação sob seu ponto de vista; primeiro pensou que era uma traidora, o mesmo tipo de gente que assassinou Marabelle; depois se encontrou na posição de seu protetor, o que só pode lhe recordar como falhou a sua prometida. —Mas não falhou! —É obvio que não — replicou James — mas ele não sabe, e além disto, é realmente óbvio que te acha bastante atraente. Caroline se ruborizou e imediatamente se enfureceu consigo mesma por fazê-lo. —Isso, acredito — disse James — é o que mais lhe assusta. E que" horror dos horrores", seria se tivesse apaixonado por ti? Caroline não viu como o pior horror do mundo, mas guardou o que pensava para ela. —Pode contar de quantas formas ele acreditou que estava traindo Marabelle? Nunca poderia viver com isso. Ela não sabia o que dizer em resposta, assim, apontou a um buraco do chão e disse: —Ponha a planta aí. James agitou a cabeça em sinal de afirmação. —Você não lhe falaria de nosso pequeno bate-papo? —É obvio que não. —Bem — e fez o que lhe pediu.
Capítulo 7
Di-a-crit-i-cal (Adjetivo). Distintivo, característico. A gente não pode negar que a marca diacrítica (diacritical) do jardim do senhor Ravenscroft é uma completa falta de ordem. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. No final do dia, Caroline tinha o jardim com o aspecto que ela pensava que deveria ter. James estava de acordo com ela, felicitando-a pelo excelente sentido do desenho paisagístico. Blake por outro lado, não podia estar animando-a, nem pronunciando sequer as palavras de elogio menos generosas. De fato, o único ruído que fez foi um gemido bastante estrangulado, que soou um pouco como: — minhas rosas. —Suas rosas se tornaram silvestres — lhe respondeu ela, completamente irritada com este homem. —Eu gostava de silvestres — respondeu-lhe. E dessa maneira foi. Mas ele a surpreendeu encomendando dois novos vestidos, para substituir o único que ela trouxe de Prewitt Hall. Esse pobre farrapo durou já tempo suficiente, com o fato de ser raptada, dormindo durante dias, e cavando na terra. Caroline não estava segura de quando ou onde eles conseguiram dois vestidos prontos para levar, mas pareciam adaptar-se a ela razoavelmente bem; assim o agradeceu graciosamente e não se queixou de que a bainha arrastasse no chão. Jantou em seu quarto, não sentindo-se capaz de outra batalha de vontades com seu anfitrião um tanto resmungão. E, além disso, conseguiu uma agulha e linha da senhora Mickle, e queria ficar trabalhando, cortando seus novos vestidos. Dado que era meio verão, o sol permanecia no céu bem passada a hora em que ela jantava, e quando seus dedos estiveram já cansados, deixou a costura e foi caminhando até a janela. As sebes estavam impecáveis e as rosas arrumadas à perfeição; James e ela haviam feito sinceramente um trabalho excelente com os jardins. Caroline sentiu uma sensação de orgulho por si mesma que não experimentara a muito tempo. Passou-se muito tempo desde que ela teve o prazer de começar e terminar uma tarefa que lhe interessasse. Mas não estava convencida de que Blake tivesse chegado a apreciar ainda seu valor como convidada cortês e útil, de fato, estava bastante segura disso. Assim, pela manhã teria que procurar outra tarefa, preferivelmente outra que lhe levasse um pouco mais de tempo.
Ele dissera que podia permanecer em Seacrest Manor até que cumprisse os vinte e um anos, e que a condenassem se ia permitir que ele evitasse sua promessa. À manhã seguinte, Caroline explorava Seacrest Manor com o estomago cheio. A senhora Mickle, que agora era sua maior defensora, reuniu-se com ela na sala do café da manhã, e a abasteceu com um sem-fim de aprimoramentos e obséquios. Omeletes, embutidos, uma espécie de bolo; Caroline inclusive não reconhecia alguns dos pratos que embelezavam o aparador. Parecia que a senhora Mickle preparara comida para um exército completo. Depois do café da manhã começou a procurar um novo projeto para manter-se ocupada enquanto permanecesse aqui. Olhou para ver o que havia dentro de uma e outra sala, e finalmente foi parar à biblioteca; não era tão grande como o de alguns dos imóveis mais importantes, mas ostentava várias centenas de volumes. As capas de couro, resplandeciam à primeira luz da manhã, e a sala mantinha o aroma de limão da madeira recém esfregada. Mas um exame mais de perto das estantes revelava que foram colocados sem nenhuma ordem. Voila! —Evidentemente — disse Caroline à sala vazia — necessita seus livros postos em ordem alfabética. Tirou uma pilha de livros, deixou-os cair ao chão e examinou os títulos com tranquilidade. —Não sei como conseguiu durante tanto tempo com tal caos. Mais livros foram deixados no chão. —É obvio — disse com um enorme gesto de sua mão. - Não tenho necessidade de ordenar estes montões agora; terei tempo de sobra para fazê-lo depois de que acabe de baixá-los das estantes; estarei aqui durante cinco semanas mais, depois de tudo. Fez uma pausa para olhar um volume ao azar; era um tratado sobre matemática. —Fascinante — murmurou, folheou as páginas a fim de dar uma olhada nessa prosa incompreensível. — Meu pai sempre me disse que devia aprender mais aritmética. Riu tolamente; era assombroso quão devagar se podia trabalhar quando realmente se fica interessado. Quando Blake desceu para tomar o café da manhã encontrou um banquete como não vira nunca desde que vivia em Seacrest Manor. Seu café da manhã consistia em um prato de ovos fritos, uma ou duas fatias de presunto e alguma torrada fria. Esses mantimentos estavam bem visíveis, mas estavam acompanhados por carne assada, linguado de Dover, e uma variedade de bolachas e bolos que o deixaram pasmado. A senhora Mickle encontrou claramente uma nova inspiração culinária, e Blake não duvidava
que seu nome era Caroline Trent. Decidiu não irritar-se mais pelo modo em que sua governanta dirigia suas predileções, e em troca, decidiu simplesmente encher seu prato e desfrutar do prêmio. Estava comendo ruidosamente o bolo de morangos mais delicioso que já experimentara, quando James entrou perambulando na sala. —Bom dia— disse o marquês— Onde está Caroline? —Diabos se sei, mas falta a metade do presunto, assim imagino que ela está indo e vindo. James assobiou. —Evidentemente a senhora Mickle se superou esta manhã, Verdade? Deveria ter trazido a Caroline antes. Blake lhe lançou um olhar irritado. —Vale, deve admitir que sua governanta nunca chegou tão longe para te manter tão bem alimentado. Blake gostaria de ter respondido com algo absolutamente inflamado e cortante, mas antes que pudesse pensar em algo, ao menos um pouco ocorrente, eles ouviram um golpe tremendo, seguido de um grito feminino de... era surpresa? Ou era dor? Fosse o que fosse, definitivamente vinha de Caroline, e o coração de Blake golpeava em seu peito enquanto se precipitava para a biblioteca e abria a porta de repente. Ele pensava que estava chocado por seu jardim escavado no dia anterior; isto era pior. —Que diabos acontece? — sussurrou, muito pasmado para falar com normalidade. —O que acontece? — perguntou James, escorregando para parar em seco detrás dele. —Oh, Meu deus, Que diabos...? Caroline estava sentada no centro da biblioteca, rodeada de livros. Ou possivelmente seria mais acertado dizer que ela estava largada sobre o chão da biblioteca, coberta com livros. Uma escada-tamborete derrubada descansava a seu lado, e pilhas elevadas de livros estavam amontoadas em cada mesa e boa parte do tapete. De fato, nem um só volume permanecia sobre as estantes. Parecia como se a convidada de Blake de alguma forma, tivesse conseguido invocar um ciclone, com o único propósito de despedaçar sua biblioteca. Caroline levantou a vista para eles e pestanejou. —Suponho que estarão sentindo um pouco de saudades. —Er... sim — replicou Blake, pensando que deveria estar lhe gritando por algo, mas não seguro do que, e ainda um pouco surpreso para fazer uma boa reprimenda.
—Pensei em pôr seus livros em ordem. —Sim — disse ele lentamente, tentando só pensar o alcance da desordem.— Parecem muito bem ordenados. Detrás dele, James deixou escapar uma risada, e Caroline plantou suas mãos nos quadris e disse: —Não tire sarro! —Ravenscroft nem sonharia em zombar — disse James — Verdade? Blake moveu sua cabeça em sinal negativo. —Não sonharia com isso. Caroline os olhou com o cenho franzido. — Um dos dois poderia me ajudar a me levantar? Blake ia colocar-se a um lado para deixar passar Riverdale, mas o marquês lhe deu um empurrão para diante até que ele teve que dar sua mão à garota ou parecer insuportavelmente descortês. —Obrigado — disse ela, levantando seus pés torpemente. — Sinto de... Ai! — caiu para diante entre os braços de Blake, e por um momento ele pôde esquecer quem era e o que fez, e simplesmente saboreou seu contato. —Está ferida? — perguntou com voz rouca, estranhamente pouco disposto a soltá-la. —Meu tornozelo, devo ter torcido quando caí. Ele baixou o olhar para vê-la com uma expressão divertida. —Isto não é outra enfermidade inventada para conseguir que não a forcemos a ir daqui agora. Verdade? —É obvio que não! — replicou, claramente ofendida. — Como se deliberadamente eu me fizesse mal para... — levantou o olhar timidamente. — Oh, sim, destrocei totalmente minha garganta o outro dia, verdade? —ele afirmou com a cabeça, os extremos de sua boca vacilaram para um sorriso. —Sim, vale, tive uma boa razão... Oh, estava zombando, verdade? Ele afirmou com a cabeça de novo. —É difícil de dizer, sabe? —Difícil de dizer o que? —Quando tira sarro — replicou ela — você está muito sério a maioria das vezes. —Vai ter que deixar descansar esse tornozelo — disse Blake precipitadamente. — Ao menos,
até que o inchaço diminua. A voz dela foi suave quando disse: —Não respondeu a minha pergunta. —Você não me perguntou. —Ah, não? Suponho que não fiz, mas você mudou de assunto. —Um cavalheiro não gosta de falar sobre quão sério é. —Sim, sei — suspirou. — Gostam de falar de cartas e cães de caça e cavalos e de quanto dinheiro perderam nos jogos de cartas da noite anterior. Acabo de encontrar um cavalheiro verdadeiramente responsável, além de meu querido pai, é obvio. —Não somos tão maus - disse, voltando-se ao James para insistir a que lhe ajudasse a defender seu gênero, mas James desaparecera. —O que aconteceu ao marquês? — inquiriu Caroline estirando o pescoço. —Diabos se sei — seu rosto ruborizou como se recordasse suas maneiras. — Perdoe minha linguagem. —Não parecia ter problemas quando amaldiçoava diante da Carlotta De Leão. —A real Carlotta De Leão, imagino, poderia me ensinar uma ou duas coisas sobre como amaldiçoar. —Não sou tão delicada como pareço - disse com um encolhimento de ombros. — Meus ouvidos não vão arder pelo uso ocasional da palavra diabos. Deus sabe que minha língua não vai cair por pronunciá-la. Os lábios dele se curvaram por desgosto em um honesto sorriso. —Está dizendo, senhorita Caroline Trent, que não é totalmente uma dama? —Absolutamente — disse maliciosamente. — Sou toda uma dama, mas uma que... ah... ocasionalmente utiliza uma linguagem um pouco menos que apropriada. Ele prorrompeu em uma risada inesperada. —Meus tutores não foram sempre homens dos mais recatados — explicou ela. —Já vejo. Ela levantou a cabeça e o olhou aos olhos pensativamente. —Deveria rir mais frequentemente.
—Há um montão de coisas que eu deveria fazer — disse simplesmente. Caroline não sabia que dizer a esse comentário. —Er... Deveríamos tentar encontrar o marquês? —Evidentemente, ele não quer que o encontrem. —Por que não? —Não tenho a mínima ideia — disse, em um tom como dizendo que tinha ideia. — Riverdale é bastante dado a desaparecer quando tem em mente fazê-lo. —Suponho que é útil no campo de trabalho em que se movem. Blake não respondeu. Não desejava discutir seu trabalho para o Ministério de defesa com ela; as mulheres tinham inclinação a encontrar suas façanhas elegantes e sedutoras e sabia que eles eram qualquer coisa menos isso. Não havia nada elegante e sedutor em relação à morte. Finalmente Caroline rompeu o longo silencio. —Estou segura que pode me deixar ir agora. —Pode caminhar? —É obvio, eu.. Ow! Mal dera um passo uivou de dor outra vez. Imediatamente Blake a envolveu entre seus braços. — Eu a levarei ao salão. —E meus livros! — protestou. —Acreditava que eram meus livros — disse ele com um pequeno sorriso. — E enviarei a um de meus criados para que venha e os volte a colocar. —Não, não, por favor, não faça isso; voltarei-os a colocar eu mesma. —Se perdoar que o diga, senhorita Trent, não pode nem caminhar como pensa pôr de novo em ordem uma biblioteca? Caroline voltou a cabeça para observar o caos que produzira enquanto ele a tirava da sala. —Não poderia deixá-los assim durante uns dias? Prometo me encarregar da desordem uma vez que meu tornozelo se cure; tenho grandes planos para a biblioteca, já verá. —Ah, sim? — perguntou em dúvida. —Sim, pensei pôr todos seus livros sobre temas científicos juntos, e agrupar as biografias em uma prateleira, e, bom, estou segura de que vê qual é minha ideia. Será muito mais fácil encontrar
seus livros. —Certamente vai ser mais fácil do que é agora, com todos pelo chão. Caroline o olhou franzindo o cenho —Estou lhe fazendo um favor tremendo, se não pode ser agradecido, ao menos poderia tentar não ser tão ingrato. —Muito bem, declaro-lhe minha mais eterna gratidão. —Isso não soa nada sincero — murmurou. —Não era—admitiu. — Mas terei que fazê-lo. Muito bem, já estamos - colocou-a no sofá. Levantamos sua perna? —Não sei, nunca torci um tornozelo antes. É isso o que preciso fazer? Afirmou com a cabeça e colocou almofadões suaves sob sua perna. —Reduz o inchaço. —O inchaço é incômodo, mas, é a dor o que eu gostaria de reduzir. —Vão unidos. —Oh, quanto tempo terei que permanecer assim? —Acredito que ao menos durante o resto do dia, possivelmente amanhã também. —Hmmmm... isto é totalmente horrível, suponho que não poderia ir me buscar um pouco de chá? Blake deu um passo para trás e a olhou. —Pareço uma babá? —Quem irá? -—replicou reprimindo claramente uma risada. — É só que a senhora Mickle foi ao povoado depois de preparar esse encantador café da manhã; só o céu sabe onde está seu mordomo e não acredito que seu valete vá procurar o chá. —Se eu posso ir buscá-lo, ele também pode — murmurou Blake. —Oh, bom - exclamou ela aplaudindo. — Então, trará algum chá para mim? —Suponho que devo fazê-lo, e como diabos chegou a ter tão boas relações com meus criados em tão somente um dia? Ela encolheu os ombros. —Realmente, eu só conheci a senhora Mickle. Sabia que tem uma neta de nove anos que vive no povoado? Comprou-lhe uma boneca adorável para o seu aniversário, eu desejaria uma boneca como
essa quando era uma menina. Blake moveu a cabeça negativamente com assombro. A senhora Mickle esteve trabalhando para ele durante aproximadamente três anos e nunca mencionou que tinha uma neta. —Voltarei com o chá — disse. —Obrigado, e não esqueça de fazer o bastante para você também. Ele parou na porta. — Eu não tomarei com você. Caroline baixou o rosto. —Não? —Não, eu... — gemeu. Batalhou contra alguns dos criminosos mais matreiros do mundo, mas era impotente ante seu cenho franzido. —Muito bem, tomarei com você, mas só um pouquinho. —Estupendo, estou segura de que passará um momento agradável; e encontrará esse chá delicioso para seu estado de ânimo. —Meu estado de ânimo! —Esqueça o que disse — murmurou. A senhora Mickle não estava por nenhum lado quando Blake chegou à cozinha. Depois de chamar a gritos à governanta durante um ou dois minutos, recordou que Caroline lhe dissera que foi ao povoado. —Maldita mulher! — murmurou, sem estar seguro se referia-se a Caroline ou à senhora Mickle. Blake pôs um pouco de água a ferver e procurou pelos armários o chá; diferente da maioria dos homens de sua época, ele sabia se mover em uma cozinha. Com frequência, os soldados e os espiões precisavam aprender a cozinhar se queriam comer, e Blake não era uma exceção. Comida de gourmet, estava além de seu repertório, mas é obvio podia preparar chá e bolachas, especialmente desde que a senhora Mickle fizesse as bolachas; tudo o que Blake precisava fazer era colocá-los sobre o prato. Sentia-se muito estranho por estar fazendo isto para Caroline Trent; fazia muito tempo que não cuidava de ninguém exceto de si mesmo, e havia algo reconfortante em escutar o chiado do bule e o bramido da água fervendo. Reconfortante e ao mesmo tempo perturbador, preparar chá, inclinar seu tornozelo torcido, eram ações terrivelmente íntimas, e ele ainda podia as sentir lhe atraindo para mais perto dela. Lutou com a necessidade urgente de golpear-se na cabeça, estava ficando muito filosófico; ele
não estava íntimo de Caroline Trent, e certamente não desejou fazê-lo; compartilharam um beijo, e foi um impulso estúpido por sua parte; em respeito a ela, provavelmente não conheceu nada melhor, apostaria sua casa e sua fortuna que nunca a beijaram antes. A água começou a ferver e Blake a jogou em um bule de porcelana Chinesa, farejando o fragrante aroma que o chá começava a desprender. Depois de colocar uma jarra de leite e uma de açúcar sobre a bandeja, agarrou-a e se dirigiu de volta ao salão. Realmente não prestou muita atenção a pôr o chá; havia algo bastante tranquilizador em realizar uma tarefa de forma automática, mas a senhorita Trent ia ter que compreender com sua teimosa cabecinha que ele não ia desempenhar o papel de babá e ir lhe buscar cada capricho e desejo enquanto estivesse vivendo em Seacrest Manor. Ele não queria atuar como um cachorrinho doente de amor, não queria que Caroline acreditasse que estava atuando como um cachorrinho doente de amor, e é obvio não queria que James o visse atuando como um cachorrinho doente de amor. Não importava que não estivesse ao menos um pouco apaixonado, James nunca lhe deixaria esquecê-lo. Blake virou a última esquina e entrou no salão, mas quando seus olhos se dirigiram ao sofá, estava vazio onde Caroline deveria estar, e havia uma grande desordem no chão. E então ouviu uma voz bastante envergonhada dizer: —Foi um acidente. Juro.
Capítulo 8
Quaff (verbo). Beber intensamente, tomar um gole comprido. Dei-me conta de que quando um cavalheiro fica de mau humor, frequentemente o melhor antídoto é convidá-lo a beber muito (quaff) uma xícara de chá. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Flores recém cortadas estavam pulverizadas pelo chão, um floreiro de grande valor estava derrubado, mas graças a Deus, não estava quebrado; e uma mancha úmida se estendia até o novo e muito caro tapete Aubusson de Blake. —Só queria as cheirar — disse Caroline de sua posição no chão. —Supunha-se que devia permanecer quieta! — gritou Blake. —Vale, sei, mas... —Não tire sarro! — rugiu ele — examinando-a para ver se seu tornozelo não se torceu outra vez. —Não há necessidade de gritar. —EU GRITO SIM... — parou, clareou sua garganta, e continuou em um tom mais normal. —Gritarei se me der vontade, e falarei desta maneira se me der vontade, e se quero sussurrar... —Estou segura de entender o que quer dizer. —Posso lhe recordar que esta é minha casa, e posso fazer o que quiser? —Não necessito que me recorde disso — disse ela agradavelmente. Seu tom amistoso e resignado lhe chateou. —Senhorita Trent, se for permanecer aqui... —Estou muito agradecida de que me deixe permanecer aqui— exclamou. —Não me importa seus agradecimentos. —Não obstante, sou feliz ao oferecer-lhe. O fez ranger os dentes. —Precisamos estabelecer umas quantas regras.
—Bom, sim, é obvio, o mundo necessita umas quantas regras, do contrário, surgiria o caos, e então... —Poderia parar de me interromper? Ela recuou sua cabeça menos de uma polegada. —Acredito que você interrompeu a mim. Blake contou até cinco antes de dizer: —Ignorarei isso. Os lábios dela se curvaram em algo que uma pessoa otimista poderia chamar sorriso. —Acredita que poderia me dar uma mão? Olhou-a fixamente aos olhos, incompreensivo. —Preciso me levantar — explicou Caroline. — Eu... — ela se interrompeu, sem saber como dizer a este homem que permanecendo estirada no chão, estava molhando-se. — Isto está molhado— murmurou finalmente. Blake disse algo grunhindo que ela duvidou querer compreender e virtualmente soltou o serviço de chá, que francamente ele já esquecera que ainda estava segurando, deixando-o em uma mesa que havia a um lado. Antes que Caroline tivesse tempo de pestanejar pelo choque da bandeja contra a mesa, a mão direita dele já a impulsionara permanecendo diante de seu rosto. —Obrigado — disse com tanta dignidade como pôde reunir, a qual, reconhecia que não era muita. Ajudou-a a voltar para o sofá. —Não se levante outra vez. —Não, senhor — deu-lhe um beijo na face, um ato que não pareceu ter nenhum efeito para melhorar seu humor. —Não pode ser alguma vez séria? —Perdão? —Me beijando, atirando todos meus livros, passarinhos de papel — não pode levar nada a sério? Caroline entrecerrou os olhos, olhando como ele agitava seus braços grosseiramente enquanto falava. Ela o conhecia só a alguns dias, mas isto era mais que suficiente para saber que esta explosão de emoções não era normal. Mesmo assim, não apreciaria muito ter um gesto de amizade e cortesia dele, quando estava dando-lhe um banho de água fria.
—Quer saber como defino sério? — disse ela com voz baixa e zangada. — Sério é um homem que ordena a seu filho que viole a sua pupila, séria é uma garota que não tem um lugar aonde ir, sério não é um vaso derrubado, e um tapete molhado. Ele só franziu o cenho em resposta, assim que ela acrescentou: —E no que se refere a meu pequeno beijo, só estava tentando ser sociável. —Não quero ter amigos — disse ele mordazmente. —Sim, agora vejo. —Você está aqui por duas razões, e só duas razões, e faria melhor em não esquecê-lo. —Importaria de explicá-lo? —Uma: está aqui para nos ajudar na captura de Oliver Prewitt. Dois: — clareou sua garganta e realmente ruborizou ao repetir a palavra. — Dois: está aqui porque, depois de sequestra-la até aqui sem ter você nenhuma culpa, bom, é minha forma de pagar-lhe. —Já vejo, nesse caso, faria melhor em não tomar o chá comigo. —Ah, ou seja, que eu não procure ajudar na casa, nem no jardim, nem de nenhuma forma para combinar com os criados? Ele a olhou ferozmente, mas não lhe respondeu, Caroline tomou essa resposta como uma afirmação, e ela realizou uma inclinação com a cabeça que teria sido o orgulho de uma rainha. —Já vejo, nesse caso, faria melhor em não tomar o chá comigo. —Perdão? —Tenho este costume horrível, já vê. —Só um? —Só um que lhe ofenderia, senhor— lançou-lhe como resposta, com um tom particularmente não muito agradável. — Quando tomo o chá com outras pessoas, tenho a tendência de conversar com elas; e quando converso com as pessoas, provavelmente o faço de forma amistosa e educada, e quando isso ocorre... —O sarcasmo não combina com você. —E quando isso ocorre — continuou ela com voz mais forte — acontecem às coisas mais estranhas, não sempre, olhe, e não precisamente com você, senhor Ravenscroft, mas estou segura de que não gostaria de prová-lo. —Provar o que?
—Vá, chegar a ser meu amigo. —Oh, pelo amor de Deus — murmurou. —Me aproxime o serviço de chá, se me fizer o favor. Blake a olhou atentamente aos olhos antes de fazer o que lhe pediu. —Gostaria de uma xícara? —Não - disse ele com perseverança. — Ficarei aqui. —As consequências poderiam ser mortais. —Parece-me que as consequências poderiam ser inclusive mais funestas para meu mobiliário se deixá-la sozinha. Caroline o olhou ferozmente e soltou ruidosamente a xícara de chá no pires. —Leite? —Sim, sem açúcar, e tente ser cuidadosa com a porcelana Chinesa, é herança de família, agora que penso... —Agora que pensa o quê? — disse ela de repente. —Em realidade deveria fazer algo com relação à desordem que há sobre o tapete. —Limparia eu mesma — disse ela docemente. —Mas me ordenou que não ajude em nada relacionado com a casa. Blake não lhe fez o menor caso enquanto se levantava e cruzava até a porta aberta. —Perriwick! — gritou. Perriwick apareceu de forma repentina como se Blake o tivesse invocado. —Sim, senhor Ravenscroft? —Nossa convidada teve um pequeno percalço — disse Blake, movendo suas mãos para o lugar úmido do tapete. —Nossa convidada invisível, quer dizer? Caroline olhou ao mordomo com grande curiosidade. Tudo o que Blake fez foi dizer. —Desculpe? —Se posso ser tão atrevido para fazer uma dedução apoiada em seu comportamento dos últimos dias, senhor Ravenscroft. —Leva razão, Perriwick.
—Você evidentemente não quis fazer público que a senhorita... ah... senhorita... er... deveríamos chamá-la senhorita invisível. —Senhorita Trent — substituiu Caroline serviçalmente. —A senhorita Trent está aqui? —Sim, bom, ela está aqui, e já que está— disse Blake muito zangado. — Não precisa fingir que não a vê. —Oh, não, senhor Ravenscroft, ela é francamente visível agora. —Perriwick, um destes dias te vou estrangular. —Não duvido, senhor, mas se me permite a ousadia... —O quê, Perriwick? —Somente queria averiguar a respeito de se a visita da senhorita Trent a Seacrest Manor pode já ser do domínio público. —Não! — respondeu Caroline em voz muito alta. — Isto é, preferiria que mantivesse essa informação em segredo, ao menos durante as próximas semanas. —É obvio — respondeu Perriwick com uma elegante inclinação de cabeça. — Agora, se me desculparem, verei a bagunça. —Obrigado, Perriwick — disse Blake. —Se me permitir a ousadia, senhor Ravenscroft. —O que passa agora, Perriwick? —Só desejava lhes sugerir que a senhorita Trent e você poderiam estar mais cômodos tomando o chá em outra sala, enquanto ponho esta em ordem. —Oh, ele não está tomando o chá comigo — disse Caroline. —Sim, se o estiver — disse Blake lhe tirando importância. —Não vejo por que. Você mesmo disse que não queria ter nada que ver comigo. —Isso não é de todo certo - respondeu Blake com rapidez. — Desfruto muito contradizendo-a. —Sim, isso é muito evidente. A cabeça de Perriwick se movia de um lado a outro, como um espectador de um partido de Badminton{2}, e o ancião começou a rir. —Você! — disse Blake de repente apontando ao Perriwick. — Te cale. Perriwick levou sua mão diretamente ao coração em um gesto dramático de consternação.
—Se me permitir... —Perriwick, é o mordomo condenadamente mais ousado da Inglaterra, e sabe muito bem. —Só pretendia — respondeu o mordomo, olhando bastante orgulhoso de si mesmo. — Perguntar se gostariam que lhes levasse o serviço de chá a outra sala. Eu lhes sugeri que poderiam estar mais cômodos, se você o recordar. —É uma ideia excelente, Perriwick — disse Caroline com um sorriso ofuscante. —Senhorita Trent, sinceramente é você uma mulher de grandes maneiras, bom humor e uma mente excelente. —Oh, pelo amor de Deus — murmurou Blake. —Sem mencionar — Perriwick continuou. — Um gosto e um refinamento excelentes. Foi você a responsável pela primorosa remodelação de nosso jardim ontem? —Sim, fui eu - disse encantada. — Você gostou da nova disposição? —Senhorita Trent, evidentemente se refletiu a mão de alguém com um excepcional sentido do bom gosto, verdadeiro resplendor e o justo toque caprichoso. Blake o olhou como se pudesse claramente enviar com alegria seu mordomo a Londres. —Perriwick, a senhorita Trent não é uma candidata à santidade. —Infelizmente não — admitiu Perriwick— não, entretanto, não considerei nunca a igreja para ser justo, quando penso em alguns dos que eu santifiquei, porque eu... A risada de Caroline encheu a sala. —Perriwick, acredito que te amo, onde esteve toda minha vida? Ele sorriu modestamente. —Servindo ao senhor Ravenscroft, e a seu tio antes dele. —Espero que seu tio fosse mais risonho do que ele. —Oh, o senhor Ravenscroft não foi sempre de tão mau humor, porque quando ele era jovem... —Perriwick — bramou Blake — está perigosamente perto de ser despedido sem referências. —Senhor Ravenscroft! — disse Caroline com reprovação. — Não pode pensar em despedi-lo. —Oh, não importa, senhorita Trent — interrompeu Perriwick. — Ele ameaça acabar meu emprego aqui quase todos os dias. —Esta vez, digo a sério — disse Blake rangendo seus dentes.
—Ele diz isso também todos os dias — disse Perriwick a Caroline, que o recompensou com uma risada nervosa. —Eu não acho divertido— anunciou Blake, mas ninguém parecia estar lhe escutando. —Levarei isto à outra sala — Perriwick retornou, empilhando de novo as xícaras na bandeja. — O serviço estará na sala verde, se por acaso vocês desejarem tomá-lo. —Inclusive não tomei nem um gole — murmurou Caroline enquanto via o mordomo desaparecer pelo corredor. — Ele é bastante.Oh! Sem dizer uma palavra, Blake a levantou rapidamente nos braços e disse a gritos fora da sala: —Se quiser chá — resmungou — terá chá, embora tenha que seguir a esse maldito mordomo até Bournemouth. —Não tenho nem ideia do que poderia fazer, enquanto seja agradável — disse com voz irônica. —Não me tente, senhorita Trent. Se por acaso não notou, meu humor está pendendo de um fio muito fino. —Oh, notei. Blake a olhou aos olhos com total incredulidade. —É um milagre que ninguém te tenha assassinado antes. Caminhou a longos passos através do corredor, com Caroline aferrando-se a seus ombros, e entrou na sala verde. Não havia sinais do serviço de chá. —Perriwick! — rugiu Blake. —Oh, senhor Ravenscroft — só chegava a voz sem corpo do mordomo. —Onde está? — não pôde evitar perguntar Caroline, movendo sua cabeça para olhar para trás. —Só Deus sabe — murmurou Blake, e gritou. — Onde diabos, Oh, está aqui, Perriwick. —Aproxima-te sigilosamente como um espírito — disse Caroline com um sorriso. —É uma de minhas aptidões mais úteis — respondeu Perriwick da entrada. — Tomei a liberdade de levar o serviço de chá à sala azul. Acreditei que a senhorita Trent poderia desfrutar de uma vista do mar. —Oh, isso eu gostaria mais que tudo — disse Caroline com uma fascinação óbvia. — Obrigado Perriwick. É tão inteligente. Perriwick sorriu alegremente. Blake franziu o cenho.
—Há alguma coisa mais que possa fazer para vê-la cômoda, senhorita Trent? — inquiriu Perriwick. —Ela está bem — grunhiu Blake. —Evidentemente, ela... —Perriwick, não há fogo na ala oeste? Perriwick piscou, sorveu ar, e olhou fixamente a seu patrão com abatimento. —Não entendo, senhor. —Se não houver um fogo que precise extinguir-se — disse Blake — certamente que pode encontrar alguma outra tarefa que terminar. —Sim, é obvio, senhor Ravenscroft — com uma pequena inclinação de cabeça, o mordomo abandonou a sala. —Não deveria ser tão perverso com ele — disse Caroline. —Não deveria me dizer como levar minha casa. —Não estava fazendo tal coisa. Simplesmente lhe estava dizendo como ser uma pessoa mais agradável. —Isso é inclusive mais impertinente. Ela encolheu os ombros, tentando ignorar o modo em que se apertou contra ele enquanto a levou por toda a casa. —Frequentemente sou impertinente. —Não se precisa estar muito tempo a seu lado para dar-se conta disso. Caroline permaneceu em silêncio. Provavelmente não deveria falar tão descaradamente a seu anfitrião, mas muito frequentemente sua boca criava as palavras sem a permissão do cérebro; além disso ela estava bastante segura agora de que sua permanência em Seacrest Manor era segura durante as próximas cinco semanas. Blake Ravenscroft não a queria aqui ( podia inclusive não gostar) mas sem dúvida alguma se sentia culpado por havê-la sequestrado equivocadamente, e seu sentido da honra lhe exigia provê-la de um lugar onde permanecer até que estivesse a salvo de Oliver Prewitt. Caroline sorriu a si mesma. Um homem com grande sentido da honra era algo muito bom, certamente. Algumas horas mais tarde Caroline ainda estava na sala azul, mas a habitação azul era pouco menos aborrecida que a primeira em que ela entrara esse dia. Perriwick, em seu desejo de pôr à linda e graciosa senhorita Trent tão cômoda e feliz como fosse possível, havia trazido várias bandejas de comida, um sortido de livros e jornais, uma equipe de aquarelas, e uma flauta. Quando
lhe assinalou que não sabia tocar a flauta, Perriwick se ofereceu para ensiná-la. Blake finalmente perdeu a paciência quando Perriwick ofereceu colocar o piano dentro da sala (ou melhor, ofereceu que o levasse Blake, que era muito mais jovem e mais forte que ele para fazêlo). Isso, foi suficientemente ruim, mas quando Caroline perguntou se Perriwick ia tocar para ela, Perriwick respondera: —Meu Deus, não, não sei tocar, mas estou seguro de que o senhor Ravenscroft estará feliz de tratá-la com atenção esta tarde. Nesse momento, Blake levantou seus braços com violência e saiu ofendido da sala, resmungando algo sobre como seu mordomo nunca foi tão cortês nem se preocupou por ele. E isso foi quão último Caroline vira dele. De qualquer forma, dedicou-se a permanecer totalmente feliz essa tarde, comendo bolos e passando rapidamente o olhar pelos números mais recentes do London Time. Realmente, ela podia acostumar-se a essa vida. Nem sequer seu tornozelo já lhe doía tanto. Estava bastante maravilhada com as páginas de sociedade tendo em conta que ela não tinha nem ideia de sobre a quem se referiam, exceto possivelmente, o "Elegante e Perigoso senhor R.", que Caroline estava começando a suspeitar que poderia ser seu novo amigo James, quando o marquês em pessoa entrava na sala. —Foi-se durante um bom momento — disse ela. — Gostaria de um bolo? James olhou por toda a sala sem ocultar sua curiosidade. — Organizamos outro banquete sem meu conhecimento? —Simplesmente Perriwick queria assegurar-se de que estava cômoda — explicou Caroline. —Ah, sim, o mordomo parece bastante impressionado contigo. —Isso está deixando Blake louco. —Bom — James pegou um bolo de um prato e disse. — Adivinha o que encontrei? —Provavelmente não poderia. Ele sustentava uma folha de papel. — A ti. —Desculpe? —Ao que parece seu tutor está te procurando. —Bom, não me surpreende — comentou ela, pegando a nota e olhando-a. — Eu valho bastante dinheiro para ele. Oh, isto é gracioso. —O que?
—Isto — Caroline assinalou o desenho dela, situado debaixo de um titulo que dizia: GAROTA DESAPARECIDA. — Desenhou-o Percy. —Percy? —Sim, deveria ter sabido que Oliver utilizaria ao Percy para fazê-lo. É muito miserável para gastar dinheiro em um artista apropriado. James levantou a cabeça e olhou o desenho um pouco mais atentamente. —Não está muito parecido. —Não, é verdade, mas acredito que Percy o fez a propósito. Em realidade ele é bastante hábil com lápis e papel; mas recordo que ele quer encontrar a alguém melhor que eu. —Que bobo — murmurou James. Caroline levantou a vista surpresa, segura de que devia ter ouvido mal. —Perdão? —Percy, está bastante claro para mim desde que disse que provavelmente quer a alguém melhor que você. Se eu fosse ele, certamente não me teria queixado da escolha de prometida de meu pai. —Se você fosse Percy — disse Caroline ironicamente. — Percy seria muito mais estupendo. James riu nervosamente. —Além disso — continuou. — Percy acredita que sou a mais feia, pessimamente aficionada aos livros, e nunca deixou de queixar-se de que eu não posso estar quieta. —Bom. Não pode. —Estar quieta? —Sim. Basta olhar seu tornozelo. —Isso não tem nada que ver. —Isso tem tudo que ver. —Caramba! Caramba! — ouviu-se uma voz lenta e pesada da entrada — estamos cômodos? James elevou o olhar — Oh, bom dia, Ravenscroft. —E onde foi esta manhã? James sustentou o pôster que trouxe do povoado. —Saí a investigar sobre nossa senhorita Trent. —Ela não é nossa senhorita Tr...
—Me desculpe — disse James com um sorriso pérfido. — Sua senhorita Trent. Imediatamente Caroline se sentiu ofendida. — Eu não sou... —Esta é uma conversação extremamente estúpida — interrompeu Blake. —Penso exatamente o mesmo— murmurou Caroline, então apontou a nota que se referia a ela e disse. — Olhe o que trouxe o marquês. —Acreditei te dizer que me chamasse James — disse James. —Marquês é perfeito — grunhiu Blake. — E que diabos é isto? James lhe passou o papel. Blake o desprezou imediatamente. —Não se parece em nada com ela. —Você acredita que não? — perguntou James, com uma expressão absolutamente angélica. —Não. Qualquer tolo poderia ver que o artista pôs seus olhos muito juntos, e a boca está totalmente mal, se realmente o artista queria capturá-la no papel, deveria havê-la mostrado sorridente. —Você crê? — perguntou Caroline, encantada. Blake franziu o cenho, claramente irritado consigo mesmo. —Não me preocuparia que alguém vá encontrá-la apoiando-se nisto; e além disso, ninguém sabe que está aqui, e não espero convidados. —Certo — murmurou James. —E — acrescentou Blake. — Porque se preocuparia alguém? Não se fala de uma recompensa. —Não há recompensa? — exclamou Caroline. — Vá, que troca. James riu em voz alta, e inclusive Blake, resmungão que era, explodiu em uma risada. —Bom, não me importa — anunciou ela. — Não me importa nada que não ofereça recompensa, de fato, estou contente. Sou muito mais feliz aqui do que estava com qualquer de meus tutores. —Eu também estaria — disse Blake com ironia. — Se Perriwick e a senhora Mickle me tratassem assim. Caroline se voltou para ele com um sorriso travesso, o desejo de brincar com ele era muito forte para ignorá-lo. —Vamos, vamos... não fique tão brusco porque seus criados gostam mais de mim.
Blake começou a dizer algo, e nesse momento riu. Caroline sentiu imediatamente que uma feliz satisfação se estendia por dentro dela, como se seu coração reconhecesse que ela fez algo muito bom ao conseguir que esse homem risse. Ela necessitava ao Blake, e o abrigo de sua casa, mas suspeitava que talvez ele necessitasse a ela só um pouquinho também. Ele tinha a alma ferida, como a sua. Sorriu aos olhos e murmurou. —Quem dera risse mais frequentemente. —Sim — disse ele asperamente — o disse mais de uma vez. —Está certo — em um impulso, deu-lhe um tapinha na mão. — Aceitarei que estou equivocada em muitas coisas, mas estou segura de ter razão nisto. Uma pessoa não pode estar tanto tempo sem rir, como você compreenderá. —E você como sabe? —Que uma pessoa não pode estar tanto tempo sem rir ou que você faz muito, muito tempo que não ri? Ela pensou nisto por um momento e disse: —Com respeito a você, bom, tudo o que posso dizer é o que hei dito; sempre parece um pouco surpreso quando ri, como se não esperasse ser feliz. Os olhos de Blake se dilataram imperceptivelmente, e sem pensar, sussurrou: —Não. —E em relação à outra questão — disse Caroline enquanto em seu rosto aparecia um sorriso triste e melancólico. Houve um longo silêncio, como se tentasse pensar as palavras corretas — sei o que é não querer rir, sei como dói. —Seriamente? —E sei que tem que aprender a encontrar sua risada, e sua tranquilidade, ali onde possa. Eu a encontro em... — ruborizou-se — não importa. —Não — disse ele com urgência — me diga. Caroline olhou ao redor. —O que aconteceu ao marquês? Parece que sumiu outra vez. Blake ignorou sua pergunta. James tinha um talento natural para desaparecer quando era conveniente, não ficaria diante de seu amigo para fazer de casamenteiro. —Me diga— repetiu.
Caroline olhou fixamente à direita do rosto dele, sem compreender porque se sentia tão obrigada a despir sua alma ante este homem. —Encontro minha tranquilidade no céu noturno, é algo que me ensinou minha mãe; nada mais que um pequeno truque — ela mudou seu olhar até encontrar-se com seus olhos. — Provavelmente acredita que isto é ridículo. —Não — disse Blake, sentindo ao redor de seu coração algo muito estranho e quente. — Acredito que poderia ser a coisa menos estúpida que ouvi há anos.
Capítulo 9
E-gre-gious (adjetivo). Digno de menção em um mal significado; vulgar, flagrante, escandaloso. Frequentemente minha boca faz um grande desdobramento de uma desatenção ilustre (egregious) por qualquer tipo de discrição, recato e bom tino. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. O tornozelo de Caroline estava muito melhor no dia seguinte, embora ela ainda necessitasse uma bengala para caminhar. Acabar seu trabalho na biblioteca, entretanto, estava fora de questão, ela estava o suficientemente torpe sem tentar mover as imensas pilhas de livros, enquanto se equilibrasse sobre um pé; não terei que dizer a desordem que poderia ocasionar enquanto estivesse impossibilitada por seu tornozelo inchado. Durante o jantar da noite anterior, James mencionou que ela poderia desenhar uma planta de Prewitt Hall. Blake, que esteve mais reservado durante todo o jantar, resmungou uma resposta afirmativa quando lhe perguntou se pensava que era uma boa ideia. Desejosa de impressionar a seu anfitrião, sentou-se em uma mesa na sala azul e começou seu esquema. Organizar a planta do chão, não obstante, demonstrava que era mais difícil do que ela pensou, e logo o chão ficou esparso de papéis enrugados e amassados cujos desenhos lhe pareceram inaceitáveis. Depois de trinta minutos de tentativas infrutíferas, finalmente ela declarou, a si mesma e em alta voz: —Tenho uma nova apreciação e respeito pelos arquitetos. —Desculpe? Caroline levantou a vista sufocada ao ter sido flagrada falando a si mesma. Blake permanecia na entrada, mas ela não podia dizer se sua expressão era divertida ou incômoda. —Estava falando comigo mesma — titubeou ela. Ele sorriu e ela determinou com alívio que estava contente. —Sim, isso está muito claro — disse — referente aos arquitetos, não? —Estou tentando desenhar uma planta de Prewitt Hall para você e o marquês — explicou. — Só que não me saí bem. Ele foi caminhando para a mesa e se inclinou sobre o ombro dela, para analisar seu último
desenho. —Qual é o problema? —Não consigo aplicar as dimensões exatas das habitações, Eu... eu... — ela tragou saliva, ele estava terrivelmente perto, e sua fragrância lhe trouxe de volta a poderosa lembrança de seu beijo roubado. Cheirava a sândalo e hortelã e a algo mais que ela não pôde identificar. —Sim? — insistiu ele. —Eu... er... bom, verá, é terrivelmente difícil aplicar a configuração e as dimensões corretas das habitações ao mesmo tempo — apontou o esquema. — Comecei desenhando todas as habitações do lado oeste do vestíbulo principal, e pensei que as tinha posto bem... Ele se inclinou um pouco mais perto, o que provocou que ela perdesse o fio de seus pensamentos. —Então que acontece? — murmurou ele. Ela tragou saliva. —Pus a última habitação antes de desenhar a parede sul, e me dava conta que não deixei suficiente espaço — ela indicou com um movimento brusco do dedo a diminuta sala de trás. —Parece que aqui não há nada mais que um armário, mas em realidade é maior que esta sala — ela apontou outro quadro no esquema. —Que sala é essa? —Esta? —- perguntou Caroline ocupando ainda com seu dedo o quadro maior. —Não, que diz que deveria ser maior. —Oh, esse é o salão da ala sul. Não sei muito sobre a parte que deveria ser maior que o que eu lhe mostrei. Não me estava permitido ir ali. Blake aguçou o ouvido imediatamente. —Não me diga!? Ela afirmou com a cabeça. —Oliver a chamava sua Casa do Tesouro, o que eu sempre pensei que era bastante tolo, vendo que não era absolutamente uma casa, a não ser uma sala. —Que tipo de tesouros guardava ali? —Isso é o estranho — replicou Caroline. — Não sei. Em qualquer momento, comprava algo
novo, coisa que fazia frequentemente, e eu tendia a pensar que ele estava lançando mão de meu dinheiro, —ela piscou, perdendo a pista completamente do que estava falando. —Quando comprava algo novo... — Blake insistiu, com o que lhe parecia uma paciência assombrosa. —Oh, sim— respondeu ela. — Bom, quando comprava algo novo gostava de alardear disso e admirá-lo durante semanas; e sempre se assegurava de que Percy e eu também o admirássemos. Assim, se comprava um novo candelabro, a gente podia estar seguro de que seria exibido no salão de jantar; e se comprava um vaso de grande valor, bom vale, estou segura de que entende o que quero dizer. Não lhe sentaria nada bem adquirir algo caro e excepcional e escondê-lo fora da vista. Blake não disse nada, assim ela acrescentou: —Estive divagando, verdade? Ele olhou o esquema atentamente, depois olhou fixamente a ela. —E diz que mantém esta sala fechada? —Todo o tempo. —E ao Percy não está permitido entrar tampouco? Ela moveu a cabeça negativamente. —Não acredito que Oliver tenha em muita estima ao Percy. Blake fez uma pausa, sentindo como um arrebatamento familiar de excitação o atravessava. Era em ocasiões como esta, que recordava porque se envolveu a princípio com o Ministério de Defesa, e o porquê permaneceu nele durante muitos anos, inclusive pensou que demorou muito tempo em sair dele. Deu-se conta faz muito tempo que gostava de resolver problemas, unir as peças de um quebracabeças até expor o quadro completo em sua mente. E Caroline Trent lhe acabava de dizer onde escondia Oliver Prewitt seus segredos. —Caroline — disse sem pensá-lo. — Poderia te beijar. Ela o olhou de repente. —Como? Mas a mente de Blake já dera um salto e não só não ouviu Caroline, nem sequer percebeu que lhe dissera que podia beijá-la. Ele já estava pensando na pequena sala do canto do Prewitt Hall, e como ele a vira de fora quando esteve espiando a casa, e qual era o melhor caminho para entrar , e... —Senhor Ravenscroft!
Ele piscou e levantou o olhar para Caroline. —Acreditei te dizer que me chamasse Blake — disse distraidamente. —O fiz — replicou ela. — Três vezes. —Oh, sinto muito— então ele voltou a olhar o mapa e a ignorou outra vez. Caroline franziu seus lábios em uma careta que estava entre meio irritada e meio divertida, recolheu sua bengala do chão e se encaminhou para a porta. Blake estava tão concentrado em seus pensamentos que provavelmente não notaria que ela estava ausente; mas no momento em que sua mão tocou a maçaneta da porta, ela ouviu sua voz. —Quantas janelas há nesta sala? Ela se voltou confusa. — Perdão? Esta sala secreta dos Prewitt, quantas janelas tem? —Não estou segura, exatamente, apenas estive dentro algumas vezes, mas com certeza conheço bem o terreno, e... me deixe pensar — Caroline começou a assinalar com seu dedo como se mentalmente contasse as janelas por fora de Prewitt Hall. — São três no salão de jantar — murmurou ela. — E duas em... Uma! — Exclamou. —Só uma janela? Na sala do canto? —Quis dizer que só há uma janela na parede oeste, mas na sul — começou outra vez a agitar seu dedo no ar. — Na parede sul há uma também. —Excelente — disse ele, principalmente para si mesmo. —Mas lhes levará um montão de tempo entrar, se essa for sua intenção. —Por quê? —Prewitt Hall não foi construído no nível do chão — explicou-lhe. — Inclina-se baixando ao sul e ao oeste, assim nesse canto há uma boa quantidade de alicerces descoberto, desde que eu me encarreguei dos jardins e plantei alguns arbustos florescentes ali para cobri-los, é obvio, mas... —Caroline. —Sim, é obvio — disse ela timidamente terminando com suas divagações. — O que quis dizer é que as janelas estão bastante acima da altura do chão. Seria muito difícil saltar através delas. Ele lhe brindou um sorriso torcido. —Onde há vontade, senhorita Trent, há uma possibilidade.
—Realmente acredita nisso? —Que tipo de pergunta é essa? Ela ruborizou e afastou o olhar. —Uma bastante impertinente, suponho, por favor, esquece o que perguntei. Houve um longo silêncio, durante o qual ele a olhava fixamente os olhos de uma maneira embaraçosa e finalmente, perguntou-lhe: —A que altura acima do chão? —Que? Oh, as janelas — Cerca de três metros e meio a quatro metros, suponho. —Três metros e meio? ou quatro? —Não estou totalmente segura. —Diabos — murmurou ele. Ele falou tão decepcionado que Caroline sentiu como se ela tivesse perdido uma guerra para Grã-Bretanha. —Eu não gosto de ser a parte fraca — disse a si mesmo. —Que diz? Ela golpeou sua bengala contra o chão. —Vem comigo. Ele fez um gesto com a mão para que se fosse enquanto voltava a examinar o esquema da planta que ela desenhou. Caroline descobriu que não desfrutava ser ignorada por este homem. POM! Ela golpeou com a bengala contra o chão. Ele levantou a vista com surpresa. —Desculpe? —Quando disse "vem comigo" quis dizer "agora". Blake a olhou intensamente por um momento claramente desconcertado pela nova atitude autoritária. Finalmente cruzou seus braços, olhou-a como um pai poderia olhar a sua filha. — Caroline, se for formar parte desta operação até na próxima semana, mais ou menos... —Cinco semanas — recordou-lhe ela. —Sim, sim, é obvio, mas vais ter que aprender que seus desejos não podem ser sempre os
primeiros. Caroline acreditava que estava sendo irritavelmente condescendente, e teria gostado de lhe dizer assim, mas em lugar disso, de sua boca brotaram violentamente as seguintes palavras: —Senhor Ravenscroft, você não conhece nem o menor de meus desejos. Ele se endireitou em toda sua estatura, e em seus olhos apareceu um brilho diabólico que ela nunca vira antes. —Bom — disse ele lentamente. — Isso não é totalmente certo. As faces dela virtualmente explodiram em chamas. —Estúpida, estúpida boca — murmurou ela— sempre dizendo... —Estás falando comigo? — perguntou-lhe sem sequer incomodar-se em esconder seu sorriso arrogante. Não havia nada que fazer a não ser defender-se com argumentos descarados. — Estou enormemente envergonhada senhor Ravenscroft. —Seriamente? Não me dei conta. —Se fosse um cavalheiro — disse fazendo ranger os dentes. — Faria-o. —Mas eu não sou sempre um cavalheiro — interrompeu ele. — Só quando me apetece. Evidentemente, agora não apetecia. Ela resmungou umas quantas palavras sem sentido baixinho, e então disse: —Acredito que poderíamos sair para que possa comparar a altura destas janelas com as de Prewitt Hall. Ele ficou de pé de repente. —Essa é uma excelente ideia, Caroline — ofereceu-lhe seu braço. — Necessita ajuda? Depois de sua vergonhosa reação ao beijá-lo uns dias antes, Caroline era da opinião de que tocá-lo era sempre uma má ideia, mas isto era um comentário bastante embaraçoso para fazê-lo em voz alta, assim negou com a cabeça e disse: —Não, vou bastante rápido com esta bengala. —Ah, sim, a bengala, parece a antiguidade que meu tio George trouxe do Oriente. Onde a conseguiu? —Perriwick me deu isso. Blake moveu sua cabeça negativamente enquanto mantinha aberta a porta para ela. —Deveria tê-lo suspeitado.
—Perriwick te daria a escritura desta casa se soubesse onde encontrá-la. Ela soltou uma risada travessa por cima de seu ombro enquanto coxeava até o vestíbulo. —E onde disse que estava? —Raposa enganosa, tive-a sob chave desde o dia em que chegou. A boca de Caroline se abriu de repente e riu. —Tão pouco confia em mim? —Em ti, confio. Quanto ao Perriwick... Para então, eles já saíam à porta traseira do jardim, Caroline estava rindo tolamente tão forte que teve que sentar-se nos degraus de pedra. —Deve admitir — disse com um movimento magnânimo de sua mão. — Que os jardins se veem bastante esplêndidos. —Suponho que devo— sua voz era em parte um grunhido e em parte uma risada, assim Caroline soube que não estava zangado com ela realmente. —Sei que só leva dois dias — disse entrecerrando os olhos para as plantas. — Mas estou convencida de que as flores estão mais saudáveis em sua nova localização. Quando ela olhou Blake seu rosto mantinha uma expressão curiosamente terna. O coração dela se enfraqueceu, sentiu-se tímida de repente. —Vamos examinar as janelas — disse ela precipitadamente, dando a volta. Ela foi coxeando por cima da grama e parou em frente a janela do escritório. Blake a observou enquanto ela levantava a cabeça para calcular a altura da janela. O rosto dela resplandecia de viço e rubor pelo ar matutino, e seu cabelo era quase loiro com o sol de verão. Parecia tão condenadamente impetuosa e inocente, que isso lhe produzia dor no coração. Ela disse que precisava rir mais; estava certa, ele se deu conta, foi maravilhoso rir junto a ela esta manhã; mas isso não era nada comparado com o prazer que ele havia sentido quando a fizera rir. Fazia tanto tempo que ele não conseguira a felicidade de alguém, que esquecera quão agradável era. Havia certa liberdade em permitir-se ser claramente estúpido de vez em quando. Blake decidiu não esquecer isso, quando finalmente rompesse seus vínculos com o Ministério de Defesa. Talvez fosse o momento de deixar de ser tão endemoniadamente sério todo o tempo, talvez fosse o momento de permitir um pequeno prazer. Ou melhor...
O melhor só era ser fantasioso, Caroline podia ser a pessoa mais irritantemente divertida, e poderia estar aqui em Seacrest Manor durante as próximas cinco semanas, mas logo se iria, e não era o tipo de mulher com quem alguém perderia o tempo, era o tipo com a quem alguém se casaria. Blake não ia se casar, nunca, assim ia ter que deixá-la sozinha. Mesmo assim, ele pensou com o típico raciocínio machista, não lhe faria nenhum dano olhar... Ele olhava descaradamente seu perfil enquanto ela estudava a janela, o braço direito dela se levantava e baixava como se mentalmente medisse sua altura; voltando seu rosto para ele repentinamente, ela quase perdeu o equilíbrio sobre a suave relva. Ela abriu sua boca, piscou e depois a fechou, então a voltou a abrir para dizer: —O que estava olhando? —A ti. —A mim? — disse com voz estridente — por quê? Ele encolheu os ombros. —Não há muito mais que olhar agora, já deixamos claro que é melhor para meu humor não prestar muita atenção ao jardim. —Blake! —E mais, estou desfrutando bastante olhando como trabalha. —Perdoa, mas não estava trabalhando, estava medindo a janela mentalmente. —Isso é trabalho. Sabia que tem um rosto muito expressivo? —Não, eu... o que tem isso que ver? Blake riu. Era mais divertida se ficava nervosa. —Nada — respondeu — simplesmente que podia seguir os processos de sua mente enquanto examinava a janela. —Oh, e isso é mau? —Absolutamente. Embora suponha que você não quererá ganhar a vida sendo apostador profissional. Ela riu com isso. —Certamente que não, mas eu... — entrecerrou seus olhos. — Se pode dizer tão bem o que eu estou pensando, o que acreditava que estava pensando eu exatamente? Blake se sentiu jovem e sem preocupações que lhe refreassem, algo que ele não sentia em todos
estes anos desde a morte de Marabelle, e inclusive embora sabia que isto não podia chegar a nenhum lugar, foi impossível parar, assim deu um passo adiante e disse: —Estava pensando que você gostaria de me beijar outra vez. —Não! Ele afirmou com a cabeça lentamente. —Sim. —Nem sequer um pouquinho, possivelmente quando estávamos no escritório - ela se mordeu o lábio. —Aqui, no escritório, importa em realidade? Ela plantou sua mão livre sobre o quadril. —Estou tentando ser uma colaboradora para sua missão ou operação ou como quer que você queira chamá-lo, e você está falando de me beijar! —Não precisamente, em realidade, estava falando de que você queria me beijar. Sua boca se abriu de repente. —Deve estar louco. —Certamente — aceitou ele cortando a distância entre eles. — Fazia muito tempo que não me comportava assim. Ela o olhou no rosto, a boca dele se estremecia enquanto ela sussurrava. —Ah não? Ele fez um gesto negativo com a cabeça muito solene. —Exerce um efeito muito peculiar em mim, senhorita Caroline Trent. —Efeito bom ou mau? —Depende do momento — disse com um sorriso travesso. — É duro dizê-lo, mas tendo a pensar que é bom. Ele se inclinou e roçou seus lábios com os dela. —O que estava me dizendo referente à janela? — sussurrou ele. Ela pestanejou. —Esqueci. —Bom — e então ele a beijou de novo, esta vez mais profundamente, e com mais emoção do que
ele acreditava ter em seu coração; ela suspirou e se apoiou nele, permitindo que seus braços a envolvessem completamente. Caroline deixou cair sua bengala, estendeu seus braços ao redor de seu pescoço, e deixou de tentar pensar. Quando os lábios dele estavam sobre os seus, e estava abraçada tão calidamente, parecia-lhe que não tinha muito sentido tentar entender se era uma ideia tão boa que ele a beijasse. O cérebro dela, que fazia uns segundos esteve procurando deduzir se o mais provável seria que ele rompesse seu coração, estava agora completamente ocupado procurando a maneira de manter este beijo e seguir, e seguir, e seguir... Ela se colocou mais perto, ficando nas pontas dos pés e então... —Ouuuu... — ela teria caído se Blake não a tivesse segurado. —Caroline? — perguntou com expressão aturdida. —Meu estúpido, estúpido tornozelo — murmurou — esqueci-o e tentava... Ele pôs um dedo meigamente sobre os lábios dela. —É melhor assim. —Eu não acredito — disse ela abruptamente. Cuidadosamente Blake tirou seus braços de seu pescoço e se afastou; moveu seu braço rápida e elegantemente para baixo, para recuperar a bengala que ela esquecera no chão. —Não quero me aproveitar de ti — disse delicadamente — e em meu atual estado de ânimo e fisicamente, sou propenso a isso. Caroline queria gritar que não lhe importava, mas segurou sua língua, chegaram a um equilíbrio delicado e não queria fazer nada que o pusesse em perigo. Sentia algo quando estava perto deste homem, algo quente, carinhoso e bom, e sabia que se o perdesse nunca se perdoaria. Passou-se tanto tempo desde que ela tivesse uma sensação de pertencer, e que o céu a ajudasse, seu lugar estava nesses braços. Ele não se deu conta ainda. Ela respirou profundamente, podia ser paciente, porque, ela inclusive tinha uma prima chamada Patience{3}, certamente que isso deveria servir para algo. É obvio, Patience vivia bastante longe com seu puritano pai em Massachusetts, mas... Ela quase se esbofeteia na cara, o que estava fazendo pensando em Patience Merriwether? —Caroline? Está bem? Ela levantou o olhar e piscou. —Muito bem, estupendamente, nunca estive melhor, é só..., simplesmente...
—Simplesmente o quê? — perguntou ele. —Pensava. — disse mordendo seu lábio inferior— faço-o às vezes. —Um passatempo digno de elogio — disse, assentindo com a cabeça lentamente. —Tendo a me distrair de vez em quando. —Já me dava conta. —Ah, sim?! Oh, sinto muito. —Não importa. É bastante curioso. —Em realidade acredita assim? —Raramente minto. Os lábios dela se moveram em uma careta ambígua. —Raramente, não é nada tranquilizador. —Em meu campo de trabalho não se pode sobreviver muito tempo sem uma mentirinha ocasional. —Hmmmm. Suponho que se o bem deste país está em jogo... —Oh, sim — disse ele com uma sinceridade tão absoluta, que ela não podia acreditá-lo. Realmente não pôde pensar em nada mais que dizer além de: —Homens! — e não disse isto com muita graça e bom humor. Blake riu entre dentes e a puxou pelo braço para voltar seu rosto para o edifício. —Agora, quer me dizer algo a respeito das janelas? —Oh, sim, é obvio, eu poderia estar enganada, mas estimaria que o fundo do batente da janela ao sul do salão de jantar de Prewitt Hall é tão alto como o terceiro batente da janela do escritório. —De baixo ou de cima? —De cima. —Hmmmm... — Blake examinou a janela com olho perito — isto seriam uns três metros e meio de altura, não é uma tarefa impossível, mas possivelmente um pouco chata. —Essa parece uma maneira estranha de descrever seu trabalho. Ele se voltou para ela com uma expressão um tanto cansada. —Caroline, a maioria do que eu faço é chato.
—Ah, sim? Teria pensado que é mais intrépido. —Não é — disse asperamente — confia em mim sobre isto, e não é um trabalho. —Não é? —Não - disse com voz muito enérgica — é só algo que eu faço, algo que não vou fazer por muito mais tempo. —Oh. Depois de um momento de silêncio, Blake clareou sua garganta e perguntou: —Como está esse tornozelo? —Está muito bem. —Estas segura? —De verdade. Não deveria me haver posto nas pontas dos pés. O mais provável é que esteja completamente curado pela manhã. Blake se agachou a seu lado e, para grande surpresa dela, agarrou o tornozelo entre suas mãos, apalpando-o cuidadosamente antes de deixá-lo onde estava. —Amanhã poderia ser um pouco otimista, mas o inchaço diminuiu muito. —Sim — ela fechou a boca repentinamente por uma perda completa de palavras, era um assunto do mais incomum. O que era que se supunha que teria que dizer em tal situação? Obrigado pelo encantador beijo. Seria possível que nos déssemos outro? De algum jeito, Caroline não acreditava que isso soasse especialmente apropriado, embora fosse o mais sincero. Paciência, paciência, paciência disse a si mesma. Blake a olhou com curiosidade. —Parece um pouco alterada. —Eu? —Me perdoe — disse ele imediatamente — era só que parecia tão séria. —Estava pensando em minha prima — disse ela abruptamente, pensando que soava muito tola. —Sua prima? Ela afirmou com a cabeça vagamente. — Chama-se Patience.
—Já vejo. Caroline se assustou do que fez ele. Os extremos da boca dele tremeram. —Deve ser um modelo a imitar para ti. —Não, absolutamente. Patience é uma bruxa — mentiu. Em realidade, Patience Merriwether era uma combinação irritante de recato, piedade e decoro. Caroline não se encontrou nunca com ela em pessoa, mas suas cartas eram sempre imensamente formais, ou em opinião de Caroline, de cortesia. Mas Caroline esteve escrevendo para ela durante anos, desde que as cartas de qualquer um, converteram-se em uma diversão bem-vinda por seus horríveis tutores. —Hmmmm... — disse ele vagamente — mas bem cruel, diria eu, colocar em uma menina um nome como esse. Caroline pensou nisso um momento. —Sim, é bastante duro viver de acordo com os pais. Imagina ter que viver de acordo com a gente mesmo? Suponho que teria sido pior chamar-se Fé, Esperança, ou Caridade. Ele moveu sua cabeça negativamente. —Não. Para ti, acredito que Paciência teria sido o mais difícil. Ela lhe deu um murro no ombro. —Falando de nomes raros, como conseguiu o teu? —Refere-se ao Blake? Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça. —Era o sobrenome de solteira de minha mãe. É um costume em minha família dar ao segundo filho o sobrenome de solteira da mãe. —Ao segundo filho? Blake encolheu os ombros. —Normalmente o primogênito consegue algo importante por parte do pai. Trent Ravenscroft, pensou Caroline, não soaria muito mal. Ela sorriu. —Do que te está rindo? — perguntou ele. —Eu? — ela tragou saliva. —Só que... bom...
—Solta, Caroline. Ela voltou a tragar saliva, seu cérebro ia ao triplo de sua velocidade. Não havia forma de que lhe confessasse o que estava imaginando a respeito de seus descendentes. —Que estava pensando — disse lentamente ela. —Sim? É obvio! —Estava pensando — repetiu, voltando sua voz um pouco mais confiada. — Que é muito afortunado de que sua mãe não tivesse um desses sobrenomes separados com hífens. Imagina que seu nome fosse algo como Fortescue-Hamilton Ravenscroft? Blake riu. —Acredita que me chamariam Fort ou Ham para abreviar? —Oh... — Caroline continuou com uma risada, desfrutando completamente agora — e se chamasse Welsh? Teria sido completamente sem vogais. —Aberystwyth Ravenscroft — disse, recordando o nome de um castelo famoso. — Tem certo encanto. —Ah, mas então todos lhe deveriam chamar Stwyth, e soaria como se estivéssemos sussurrando. Blake riu. —Uma vez, perdi a cabeça loucamente por uma garota chamada Sarah Wigglesworth, mas meu irmão me convenceu de que devia ser sério e deixá-la. —Sim — meditou Caroline — já vejo onde poderia estar a dificuldade para um menino que se chamasse Wigglesworth Ravenscroft. —Mas bem acredito que meu irmão a queria para ele, antes de seis meses eles já estavam comprometidos. —Oh, perfeito! — exclamou Caroline dando uma gargalhada. — Mas não tem que chamar a seus meninos Wigglesworth agora? —Não, só nossos segundos filhos estão obrigados a seguir a tradição. —Mas seu pai não é um visconde? Por que precisa seguir a tradição? —Meu pai em realidade era um segundo filho. Seu irmão mais velho morreu à idade de cinco anos, por essa época, meu pai já nascera e lhe tinham posto nome. Caroline riu.
—E qual era seu nome? —Temo que meu pai não foi tão afortunado como eu. O sobrenome de solteira de minha avó era Petty{4}. Ela aplaudiu com sua mão sobre a boca. —Oh, querido, não deveria rir. —Sim, deveria, nós o fazemos. —Como o chama você? —O chamo pai, outros simplesmente lhe chamam Darnsby, que é seu título. —O que fez ele antes de conseguir o título? —Acredito que ensinava a todos a chamá-lo Richard. —Esse é um dos nomes que lhe puseram? —Não — disse Blake com um encolhimento de ombros. — Mas ele o preferia a Petty. —Oh, que curioso — disse, enxugando uma lágrima da risada de seu olho. — O que aconteceria se um Ravenscroft não tivesse um segundo filho? Ele se inclinou para diante com um brilho decididamente rápido de seus olhos. —Nós continuamos tentando, tentando, até que conseguimos. As faces de Caroline avermelharam. —Sabe — disse apressadamente. — De repente me sinto muito cansada. Acredito que entrarei e descansarei um momento. É obvio, pode me acompanhar. Entretanto, ela não esperou sua resposta, girou seus calcanhares, e se foi coxeando muito rapidamente de fato, para alguém que necessitava de bengala. Blake viu como desaparecia dentro da casa, seu rosto não podia abandonar o sorriso que apareceu, por causa desta grande troca de palavras entre eles. Passou algum tempo desde que ele pensasse na tradição do nome da família. O sobrenome de Marabelle era George, e eles sempre tinham brincado que eles se casariam unicamente por esta razão. George Ravenscroft. Quase fora uma pessoa real na mente de Blake, com seus cachos negros como o azeviche e os olhos azul pálido de Marabelle. Mas não existia George Ravenscroft. —Sinto, Marabelle — sussurrou. Lhe falhou de tantas maneiras. Não lhe foi possível protegê-la, e pensou que tentou ser fiel a sua memória, nunca teve controle sobre isso tampouco.
E hoje em dia, sua indiscrição lhe levara além da simples necessidade de seu corpo. Desfrutara com Caroline, verdadeiramente deleitado pelo puro prazer de sua companhia. A culpabilidade perfurava seu coração. —Sinto muito, Marabelle — sussurrou de novo. Desta forma, enquanto caminhava de volta à casa, ouviu que dizia a si mesmo. — Trent Ravenscroft. Fez um movimento negativo com a cabeça, mas o pensamento não desapareceria.
Capítulo 10
Um-laut (substantivo). 1. Uma mudança no som de uma vogal, produzido pela assimilação parcial a um som adjacente (parecido, contiguo). 2. Sinal diacrítico (ex. u), colocado sobre uma vogal para indicar que a mudança foi realizada, especialmente em Alemão. Sabendo o que sei sobre o senhor Ravenscroft, francamente devo agradecer a meu pai não ser alemã , com um trema (umlaut) em meu nome. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. No meio da tarde, Caroline compreendera duas coisas. Uma, James desaparecera uma e outra vez, provavelmente indo a alguma parte para investigar a Oliver e suas atividades traidoras. E dois, estava apaixonada por Blake Ravenscroft. Bom, isto não era totalmente certo. Para ser mais precisa, ela acreditava que podia estar apaixonada por Blake Ravenscroft. Custava-lhe um pouco confiar em si mesma, mas não parecia haver outra explicação para as recentes mudanças em sua personalidade e comportamento. Caroline tinha frequentemente o defeito de falar sem pensar antes o que ia dizer, mas hoje parecia estar deixando escapar palavras sem nenhum sentido. E mais, perdera completamente seu costumeiro bom apetite. Sem mencionar o fato de que esteve sorrindo como a maior das tolas. E se por acaso isto não fosse suficiente, surpreendia-se mesmo sussurrando "Caroline Ravenscroft, Caroline Ravenscroft, a mãe de Trent Ravenscroft, Caroline Ravenscroft, esposa do Oh... Basta! Podia perder a paciência inclusive consigo mesma. Mas se Blake lhe correspondia em algum de seus sentimentos, não lhe deu nenhum indício. O certo é que ele não estava saltando por toda a casa como um tolo doente de amor, proferindo a grito odes a sua beleza, seu encanto e sua inteligência. Ela duvidava totalmente que ele estivesse sentado atrás da escrivaninha em seu escritório, rabiscando distraidamente as palavras "Senhor e Senhora Blake Ravenscroft". E se o estivesse fazendo, não havia uma verdadeira razão para pensar que ela poderia ser "a Senhora Blake Ravenscroft" em questão. Só o céu saberia quantas mulheres lá em Londres fantasiariam estar apaixonadas por ele, e se ele fantasiasse apaixonando-se de alguma delas? Essa era uma reflexão séria. É obvio, não podia absolutamente deixar de lado os beijos, ele desfrutara claramente com seus beijos, mas os homens eram diferentes das mulheres. Caroline se criara em uma
relativa inocência, mas esta oportuna circunstância, a havia feito amadurecer. Um homem pode gostar de beijar a uma mulher embora não sinta nada por ela. Por outro lado, uma mulher... Bom, Caroline não pretenderia falar por todas as mulheres, mas sabia que provavelmente ela não poderia beijar a um homem da maneira em que beijou ao Blake essa tarde, se não lhe gostasse muito. O que a voltava a levar a sua principal hipótese: que estava apaixonada por Blake Ravenscroft. Enquanto Caroline estava ocupada aprofundando-se nos tortuosos abismos de seu coração, Blake estava sentado na borda de sua escrivaninha, lançando dardos ao alvo de seu escritório. O esforço lhe caia bem em seu estado de ânimo. —Não — fiuuuuuu.... — voltarei a beijá-la. —Não — zac... (golpe seco ao se chocar com o alvo) — eu gostei. —Vale, de acordo, eu gostei, mas só um pouco — fiuuuuuu... — a nível físico. Ficou de pé com determinação. —É uma garota estupenda, mas não significa nada para mim. — Apontou, lançou, e viu com consternação como o dardo fazia um buraco em sua parede, recentemente pintada. —Diabos, diabos, diabos — murmurou, andando a largos passos para observar o dardo que ficou um pouco solto. Como pôde ter falhado? Nunca falhava. Lançava estes dardos quase todos os dias e nunca falhava. —Merda. —Um pouco zangado hoje, verdade? Blake levantou a vista e viu James na porta. —Onde diabos estiveste? —Completando nossa investigação de Oliver Prewitt, que é mais do que posso dizer de ti. —Estive mais que ocupado com sua pupila. —Sim, já imaginava. Blake puxou com força o dardo meio solto, deixando cair uns pedacinhos de gesso ao chão. —Sabe o que quero dizer. —Totalmente — disse James sorrindo lentamente. — Mas não estou totalmente seguro de que você saiba o que quer dizer. —Deixa de ser tão endemoniadamente chato, Riverdale, e me diga o que tem descoberto.
James se ajeitou em uma cadeira de couro e afrouxou a gravata. —Fui a Prewitt Hall vigiar um pouco mais. —Por que não me disse que ia? —Desejaria vir comigo. —Está totalmente certo. Eu... —Alguém — interrompeu James — tem que permanecer aqui com nossa convidada. —Nossa convidada— respondeu Blake com sarcasmo— é uma mulher adulta. Não vai morrer abandonada se nós a deixamos fazer o que lhe dê vontade durante umas quantas horas. —Certo, mas poderia voltar a encontrar qualquer uma de suas salas em ruínas. —Não seja imbecil, Riverdale. James fingiu estudar suas unhas. —É afortunado de que não me ofenda com esses comentários. —Você é afortunado de que não coloque sua língua até o fundo de sua garganta. —É comovedor ver-te tão defensor de uma mulher — disse James com um vago sorriso. —Não a defendo. E deixa de pilhar-me. James deu de ombros. —De todos os modos, um pode espiar com mais sigilo que dois. Não quis chamar a atenção. —Riverdale, você vive para passar despercebido. —Sim, é bastante divertido transformar-se pouco a pouco no mobiliário de vez em quando, verdade? É bastante assombroso o que as pessoas dizem quando não sabem quem é, ou — acrescentou com um sorriso malvado — quando inclusive nem sabem quem está ali. —Descobriu algo? —Nada importante. Embora Prewitt definitivamente esteja vivendo acima de suas possibilidades, ou ao menos, acima do que deveriam ser suas possibilidades. Blake recolheu outro dardo do chão e apontou. —Te afaste. James o fez, olhando sem muito interesse como o dardo voava da mão do Blake até o centro do alvo. —Assim está melhor — murmurou Blake, voltou-se para James e lhe disse. — O problema, é
que nós não podemos automaticamente supor que seu dinheiro provém de atividades relativas à traição; se realmente transmitia mensagens para Carlotta De Leão, estou seguro de que lhe pagaram generosamente por isso. De qualquer maneira, também sabemos que faz contrabando de brandy e seda, ele esteve vivendo desta forma durante anos, e certamente pôde estar roubando a herança de Caroline sem que ela saiba. —Surpreenderia-me enormemente que não o tivesse feito. —Mas casualmente — disse Blake com um sorriso um tanto presumido — fiz algumas investigações por minha conta. —E? —Resulta que Prewitt tem um escritório que mantém fechado todo o tempo. A Caroline não estava permitida a entrada, e a seu filho tampouco. No rosto de James se desdobrou um enorme sorriso. —Diana. —Exatamente — Blake lançou o dardo, mas sua pontaria sumiu. —Bom, não sempre exatamente. —Acredito que já é hora de fazer uma pequena visita clandestina a Prewitt Hall — sugeriu James. Blake assentiu. Só queria abreviar este assunto, retirar-se do Ministério de Defesa e empreender sua nova, respeitável e aborrecida vida. —Não poderia estar mais de acordo. Encontraram a Caroline na biblioteca, sentada debaixo de uma mesa. —Que diabos está fazendo aí debaixo? — perguntou Blake. —O que? Oh, bom dia — saiu engatinhando. — Seus criados tiram o pó daqui debaixo? Estive espirrando uma barbaridade. —Não respondeu a minha pergunta. —Simplesmente estou apenas passando por essas pilhas. Estou tentando reunir todos seus livros de história. —Acreditava que não fosse continuar com isto até que seu tornozelo estivesse melhor - disse Blake com um grande tom de recriminação, na opinião dela. —Não estou voltando a colocar os livros na estante ainda — replicou ela — só estou agrupando-os por matérias. Não estou utilizando meu tornozelo absolutamente, que, por certo, está quase curado; não usei a bengala nem uma vez em todo o dia e não me doeu para nada— voltou-se
para James e exclamou resplandecente. — Oh, e é tão maravilhoso vê-lo de novo, senhor. O marquês sorriu e fez uma reverência em direção a ela. —Sempre um prazer, minha querida Caroline. Blake franziu o cenho. —Estamos aqui com um objetivo, senhorita Trent. —Nuca me ocorreria que não fosse assim — ela mudou seu olhar para James. — Deste-te conta como me chama Senhorita Trent quando está zangado comigo? —Caroline — disse Blake incluindo claramente em sua voz uma advertência. —É obvio — acrescentou ela despreocupadamente — quando está totalmente zangado muda ao Caroline, o mais provável é que encontre muito difícil expressar com um grunhido meu nome e sobrenome. James tinha sua mão sobre a boca, certamente para conter a risada. —Caroline — disse Blake com voz muito forte, ignorando com grande esforço as brincadeiras dela. — Necessitamos de sua ajuda. —Seriamente? —É hora de que reunamos provas contundentes contra Prewitt. —Bom — replicou Caroline. — Eu gostaria de vê-lo pagar por seus delitos. James riu e disse. —Garota sedenta de sangue. Ela se voltou para ele com uma expressão ferida. —É horrível dizer isto. Não estou nem um pouquinho sedenta de sangue, simplesmente é que se Oliver esteve fazendo todas essas terríveis coisas que dizem que ele esteve fazendo... —Caroline, só estava brincando — disse James. —Oh, vale, então sinto muito por minha reação exagerada. Acreditei que queria dizer... —Se podem deixar passar sua mútua admiração — disse Blake mordazmente — temos assuntos importantes que discutir. Caroline e James se voltaram para ele com a mesma expressão incomodada. —Riverdale e eu vamos entrar incógnitos em Prewitt Hall — disse Blake a ela. — Necessitaremos que nos dê todos os detalhes sobre os horários da família e dos criados para
evitarmos ser detectados. —Não necessitarão todos os detalhes — disse ela com um prosaico encolhimento de ombros. — Simplesmente, deveriam ir esta noite. Ambos os cavalheiros se inclinaram para diante e a olharam intensamente com olhos interrogantes. —Oliver joga cartas todas as quartas-feiras de noite, ele nunca perde uma partida, sempre ganha. Eu acredito que trapaceia. James e Blake se olharam, e Caroline virtualmente pôde ver seus cérebros entrando em ação, planejando sua missão. —Se recordarem — continuou — foi uma quarta-feira de noite quando escapei, faz exatamente uma semana. Evidentemente, Oliver escolheu a noite de cartas para que Percy tentasse me violar. Sem dúvida ele não queria que meus gritos lhe chateassem. —Percy estará em casa? — perguntou James. Caroline negou com a cabeça. —Quase sempre se vai e se embebeda. Oliver não pode suportar que seja tão pobre de espírito, diz que isso faz a um homem débil, assim Percy se embebeda as quartas-feiras de noite, quando ele pode escapar do olho vigilante de seu pai. —E os criados? Quantos há? — desta vez foi Blake quem fez a pergunta. Caroline refletiu sobre isto durante uns minutos. —Cinco no total, é provável que a maioria esteja na casa; a semana passada Oliver deu a noite livre a todos, mas estou segura que o fez só com o fim de que nenhum se precipitasse para me ajudar quando Percy me atacasse. É terrivelmente miserável quando se trata de alguém que não seja ele mesmo, assim duvido que lhes dê outra vez um tempo livre sem uma boa razão. —Que agradável saber que sua violação é qualificada como uma boa razão — murmurou Blake. Caroline o olhou e ficou pasmada, e um pouco agradada ao ver quão zangado ele parecia por ela. —Mas se forem cuidadosos — acrescentou — não deveriam lhes inquietar para evitá-los. Poderia ser um tanto desconcertante lhes guiar pelo vestíbulo, mas assim que me levem com... —Não lhe levamos — disse Blake mordazmente. —Mas... —Disse que não lhe levamos.
—Estou segura de que se o consid... —NÃO virá— rugiu, e inclusive James piscou com surpresa pelo volume de sua resposta. —Muito bem — disse Caroline com voz irritada. Estava convencida de que Blake se equivocava, mas não lhe pareceu prudente ou benéfico para sua saúde discutir nada mais. —Não esqueça que tem um tornozelo lesado — disse James brandamente. — Não te seria possível te mover a sua velocidade habitual. Caroline teve a sensação de que James estava totalmente de acordo com Blake, e só tentava fazêla sentir-se melhor (especialmente tendo em conta que lhes havia dito que seu tornozelo estava bastante curado) mas ela apreciou seu esforço. —A governanta está totalmente surda e se retira cedo — disse-lhes— não terão que se preocupar com ela. —Excelente — disse Blake — e o resto? —Há dois criados, mas vivem no povoado e vão todas as noites dormir em suas casas. Estarão longe quando Oliver for jogar às cartas. O moço dos estábulos dorme nos estábulos, assim provavelmente não lhe incomodarão se aproximarem-se da casa pelo lado oposto. —E o mordomo? — insistiu Blake. —Tarnsworth será o mais difícil, tem um ouvido muito afiado e é terrivelmente fiel ao Oliver. Seu quarto está no terceiro piso. —Então esse não deveria ser um problema muito grande — declarou James. —Bom, não, mas... — as palavras de Caroline se desvaneciam pouco a pouco, e fechou a boca até convertê-la em uma linha severa. Blake e James falavam intensamente entre eles, e ela poderia ter sido uma peça do mobiliário por toda a atenção que lhe emprestavam. E então, sem sequer despedir-se, foram andando até o escritório do Blake, e deixaram a Caroline sentada entre seus livros. —Que grosseiros. —Oh, Caroline? Ela levantou o olhar com otimismo. Blake voltou sua cabeça para a biblioteca. É possível que tivesse decidido que ela poderia ir com eles a Prewitt Hall, depois de tudo. —Sim? —Sabe? Esqueci te perguntar sobre a curiosa caderneta que levava.
—Como? —A das palavras estranhas. Tem algo que ver com o Prewitt? —Oh, não, em realidade, eu disse a verdade quando me perguntou sobre ele a primeira vez; só é um pequeno dicionário pessoal, eu gosto de escrever palavras novas. O único problema é que frequentemente esqueço o que significam depois de a escrever. —Poderia tentar as utilizar no contexto, é a melhor maneira de recordar o que significam — deu meia volta e desapareceu. Precisava conceder que a ideia era boa, mas tudo isto a deixou com um fervente desejo de usar insofrível, arrogante e irritante, em uma só frase. Seis horas mais tarde, Caroline estava extremamente mal-humorada, Blake e James permaneceram toda a tarde encerrados no escritório do Blake, planejando o "ataque" a Prewitt Hall. Sem ela. E agora partiam, Precisavam sair cavalgando ao abrigo da noite sem lua. Inclusive as estrelas se esconderam oportunamente por detrás das nuvens. Esses condenados homens. Acreditavam que eram invencíveis, mas Caroline sabia mais, alguém podia se machucar. O pior de tudo era que eles atuavam como se tudo isso fosse endiabradamente divertido. Discutiram seus planos animadamente, debatendo sobre o tempo, o transporte e a melhor aproximação; e para cúmulo nem se incomodaram em fechar a porta do escritório do Blake. Caroline ouvira tudo da biblioteca. Neste momento, estariam provavelmente aproximando-se de Prewitt Hall, preparando-se para irromper pelo salão da ala sul... Sem ela. —Estúpidos, estúpidos homens — grunhiu. Dobrou seu joelho, nem sequer um mínimo incômodo — evidentemente, poderia tê-los acompanhado. Não lhes faria diminuir o passo. Vestidos totalmente de negro, eles pareciam arrumados para romper corações; e quando os viu partir, Caroline se sentiu insuportavelmente desalinhada. Vestia um dos vestidos novos que Blake adquiriu para ela, mas ainda se sentia como uma vulgar pomba ao lado destes dois elegantes corvos. Sentou-se em uma mesa da biblioteca sobre a qual empilhou todas as biografias. Planejou passar a tarde as ordenando por temas segundo a ordem alfabética; uma tarefa que ia realizar agora com mais energia do que era realmente necessário. Platão antes que Sócrates, Cromwell antes que Fawkes... Ravenscroft e Sidwell antes que Trent. Caroline pôs de repente Milton antes do Machiavell. Isto não estava bem. Não deveriam ter ido sem ela. Lhes desenhara a planta de Prewitt Hall, mas nada podia substituí-la por conhecimentos de
primeira mão. Sem ela, corriam o perigo de entrar na sala equivocada, de despertar a um criado, de (tragou saliva com medo) conseguir que os matassem. A ideia de perder a seus recém descobertos amigos foi como gelo ao redor de seu coração. Passou toda uma vida à margem de uma família, e agora, que finalmente encontrou a duas pessoas que a necessitavam (embora fosse puramente a nível de segurança nacional) não queria ficar de braços cruzados e vê-los meter-se de cabeça no perigo. O próprio marquês lhe dissera que ela era de grande importância para a investigação. E quanto ao Blake, bom, Blake não queria admitir que de algum jeito, ela estava implicada em seu trabalho para o Ministério de Defesa, mas lhe dissera que ela fez um bom trabalho lhes dando um breve relatório sobre a casa dos Prewitt e seus costumes. Sabia que lhes iria muito melhor com sua ajuda em pessoa. Porque, eles não sabiam nem sequer que... Caroline levou a mão a sua boca com horror. Como podia ter esquecido de lhes falar sobre o chá da noite do Farnsworth? Era um ritual para o mordomo. Cada noite, como um relógio, tomava um chá às dez. Era um costume excêntrico, mas sobre o qual Farnsworth insistia. Chá, quente e fumegante, com leite e açúcar, torta de manteiga e geleia de morango, ele exigia seu refrigério noturno, e lhe doía que alguém lhe interrompesse. Caroline lhe pediu emprestado uma vez o bule e se encontrou sem mantas durante uma semana. Em Dezembro. Os olhos de Caroline se dirigiram velozmente para o relógio de pé. Eram nove e quinze, Blake e James se foram quinze minutos antes, chegariam a Prewitt Hall às... Oh, Meu Deus, chegariam justo quando Farnsworth estivesse preparando seu refrigério. O mordomo poderia lhes adiantar em anos, mas certamente não era débil, e era bastante hábil com armas de fogo; e ele precisava passar no salão da ala sul no caminho de seu quarto à cozinha. Caroline permanecia de pé, com os olhos enormemente abertos e expressão decidida. Necessitavam-na. Blake a necessitava. Não poderia viver consigo mesma se não fosse avisá-los. Sem prestar atenção a seu tornozelo, saiu violentamente da sala, dirigindo-se diretamente para os estábulos. Cavalgou como o vento, não era o melhor cavaleiro, em realidade, a maioria de seus tutores não lhe deram muitas oportunidades de praticar, mas ela era capaz e podia manter-se na cela. Sem dúvida nunca teve uma razão tão boa para galopar. Quando ela alcançou os confins da propriedade de Oliver, o relógio de bolso que pegou do escritório de Blake dava exatamente dez em ponto. Atou a égua (que também pegou emprestada do Blake) a uma árvore, e avançou agachada para a casa, escondendo-se por detrás das altas sebes que estavam colocadas ao lado do caminho. Quando chegou a Prewitt Hall se agachou; duvidou que
houvesse alguém acordado, salvo Farnsworth na cozinha, mas parecia prudente manter sua silhueta longe de qualquer janela. —Blake teria que ter isto muito em conta — sussurrou para si mesma. Não só parecia totalmente estúpida, andando de quatro, lhe acabava de ocorrer que estava de volta a Prewitt Hall, certamente o único lugar no qual ela não queria estar durante as seguintes cinco semanas. E havia tornado por sua própria vontade! Que idiota. Se Oliver punha suas mãos sobre ela... "Está Oliver jogando cartas. Está trapaceando com as cartas. Oliver não estará de volta durante algumas horas". Era fácil murmurar esses pensamentos, mas isso não a fazia mais segura, de fato, sentia seu estômago como se tivesse tragado um par de cães de caça. —Me recorde que não me incomode se me deixam sozinha — disse a si mesma. Irritou-se muito quando Blake e James foram sem ela, mas agora que estava aqui, no âmago da ação, tudo o que queria era estar de volta em Seacrest Manor, possivelmente com uma xícara de chá quente, e se possível com uma grande fatia de torrada... Chegado este ponto, Caroline decidiu que não estava apta para uma vida de espionagem. Alcançou a esquina noroeste da casa e jogou uma olhada ao redor, seu olhar percorreu a extensão do muro da parte oeste. Não viu nem ao Blake nem ao James, o que provavelmente significava que estavam acessando à sala pela janela do lado sul. Se eles não já tinham conseguido. Caroline mordeu o lábio. Se estavam dentro do salão da ala sul, Farnsworth certamente os ouviria, e Oliver guardava uma arma carregada em um armário da sala. Se Farnsworth suspeitasse que havia intrusos, seguro que agarraria a arma antes de investigar e Caroline duvidava bastante que o mordomo lhes fizesse perguntas antes de apertar o gatilho. Um novo pânico nasceu em seu interior, deslizou ao lado da grama, movendo-se mais rápido do que pensou que podia fazê-lo engatinhando. E então dobrou a esquina. —Ouviu algo? James baixou o olhar de seu posto no trinco da janela e negou com a cabeça. Estava sobre os ombros de Blake para poder alcançar a janela. Enquanto James continuou com sua tarefa, Blake olhou a direita e esquerda, e voltou a ouvi-lo outra vez, um ruído como de escapulir-se, golpeou ligeiramente ao James nos pés e pôs seu dedo indicador sobre os lábios. James assentiu e parou um momento, causando o ocasional tinido e choque, quando golpeou o trinco com sua lima. Saltou silenciosamente ao chão enquanto Blake se agachava e instantaneamente adotou uma postura de alerta. Blake tirou sua pistola uma vez que avançava lentamente até a esquina, pregando as costas contra
a parede, aproximava-se uma pequena sombra. Não teria sido perceptível se alguém não tivesse deixado uma vela acesa em uma das janelas da parede da parte oeste. E essa sombra crescia ao ir aproximando-se. O dedo do Blake se fechou sobre o gatilho. E uma mão apareceu à volta da esquina. Blake se equilibrou.
Capítulo 11
Pleth-o-ra (substantivo). Muito cheio desde qualquer ponto de vista, superabundância. Blake insiste em que há uma verdadeira superabundância (plethora) de razões para não pôr nada importante no que escrevo, mas não posso acreditar que haja nada em meu pequeno dicionário que possa ser incriminatório. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Um momento Caroline estava engatinhando, e ao seguinte estava tão plana como um crepe, com um grande, pesado e estranhamente quente peso sobre suas costas. Isto, de qualquer forma, era menos desconcertante que a arma que lhe pressionava contra as costelas. —Não te mova — grunhiu-lhe uma voz ao ouvido. Uma voz familiar. —Blake? — grunhiu ela. —Caroline? — Ele pronunciou essa palavra de uma forma tão estúpida como nunca antes a ouviu ela, e acreditou as haver ouvido todas de seus diferentes tutores. —A mesma — replicou tragando saliva — e em realidade, não posso me mover, de toda forma. É bastante pesado. Ele rodou afastando-a e a perfurou com um olhar que era um terço de incredulidade e dois terços de fúria total. Caroline desejou nesse momento que as coisas não fossem assim. Blake Ravenscroft definitivamente não era um homem com o qual pode cruzar-se. —Te vou assassinar — chiou ele. Ela tragou saliva. —Não me vais exortar primeiro? Olhou-a intensamente com uma enorme dose de estupefação. —Retrato-me - disse querendo abreviar. — Primeiro vou te estrangular, e depois te assassinarei. —Aqui? — perguntou ela em dúvida, olhando a seu redor. — Não parecerá suspeito meu cadáver pela manhã? —Que diabos está fazendo aqui? Tinha ordens explícitas de ficar... —Sei — sussurrou, pressionando seu dedo contra seus lábios. — Mas recordei algo, e...
—Dá-me igual se recordou completo o segundo evangelho da Bíblia, dissemo-lhe... James pôs uma mão sobre o ombro do Blake e disse: —Escuta-a até o final, Ravenscroft. —É o mordomo — adicionou Caroline rapidamente, antes que Blake mudasse de ideia e decidisse estrangulá-la depois de tudo. — Farnsworth, esqueci de seu chá, ele tem um costume muito raro, sabe. Toma chá às dez todas as noites, e passa justamente por... — sua voz se foi desvanecendo conforme via um raio de luz mover-se no salão de jantar. Tinha que ser Farnsworth, segurando uma vela enquanto caminhava através do corredor. As portas do salão de jantar se deixavam normalmente abertas, por isso sua vela era bastante luminosa, seria possível ver seu resplendor através da janela. A menos que tivesse ouvido algo e estivesse no salão de jantar investigando... Os três se atiraram no chão com grande presteza. —Tem um ouvido muito afiado — sussurrou Caroline. —Então fecha a boca — chiou-lhe Blake como resposta. E ela o fez. A luz trêmula desapareceu por um momento, e reapareceu no salão da ala sul. — Acreditei que disse que Prewitt mantinha essa sala fechada com chave — sussurrou Blake. —Farnsworth tem uma chave — respondeu-lhe ela. Blake lhe indicou com a mão que se afastasse da janela do salão da ala sul, assim que ela se arrastou até estar perto do salão de jantar. Blake estava logo atrás dela. Ela procurou ao redor ao James, mas ele se foi perto da esquina em direção oposta. Blake apontou o edifício e gesticulou com os lábios. —Mais perto da parede. Caroline seguiu suas instruções até que esteve colada à fria pedra exterior de Prewitt Hall; de um lado, entretanto, seu outro lado estava aprisionado contra o quente corpo do Ravenscroft. Caroline ficou sem fôlego. O homem estava deitado sobre ela! Ela teria lhe quebrado os tímpanos, se não fosse porque sabia que precisava manter a voz baixa. Sem mencionar o fato de que estava deitada de barriga para baixo sobre a terra e não desejava comer um bocado de grama. —Quantos anos tem o mordomo? Ela quase ofegou, sentia a respiração dele quente contra sua face, e podia jurar que sentiu o contato dos lábios dele contra sua orelha.
—Ao, ao menos cinquenta — sussurrou — mas é um atirador formidável. —O mordomo? —Serviu no exército — explicou ela — nas Colônias. Acredito que foi concedida uma medalha de honra. —Só acontece comigo — murmurou Blake — suponho que não é tão hábil com um arco e uma flecha. —Tomara que não, mas eu o vi uma vez atirando a uma árvore uma faca com vinte passos de distância. —O quê? — Blake conjurou baixo, outra dessas esplêndidas maldições criativas que tanto a impressionavam. —Estou de brincadeira— disse ela rapidamente. O corpo dele se esticou completamente de fúria. —Este não é o momento nem o lugar para... —Sim, já me dei conta — resmungou. James apareceu pela esquina, andando sobre suas mãos e seus joelhos, olhando-os com interesse. —Não tinha nem ideia de que estavam se divertindo tanto aqui. —Não estamos nos divertindo — Blake e Caroline chiaram ao uníssono. James fez um gesto negativo com sua cabeça com tal solenidade, deixando claro que estava zombando deles. —Não, obviamente não. — então centrou seu olhar no Blake, que ainda permanecia deitado sobre Caroline. — Voltemos para o trabalho, o mordomo se foi a seu quarto. —Está seguro? —Vi a luz desaparecer do salão, depois se foi pelas escadas. —Há uma janela no topo da escada — explicou Caroline— podem vê-la do lado sul. —Vale — disse Blake rodando para tirar-se de cima dela e agachando-se. — Voltemos para o trabalho abrindo essas janelas. —Má ideia — disse Caroline. Ambos se voltaram a olhá-la, e na escuridão ela não podia estar segura se suas expressões eram de estar interessados ou desdenhosas. —Farnsworth lhes ouvirá em seu quarto — disse — só são dois pisos e como faz calor, o mais
provável é que ele tenha aberto as janelas; se lhe ocorre olhar para fora, o mais seguro é que lhes vejam. —Poderia nos dizer isto antes que tentássemos entrar pela força? — disse Blake bruscamente— ainda te posso levar de volta. Ela respondeu cortante. —Como? Obrigado, Caroline — disse ela sarcasticamente. — É muito considerado de sua parte. Claro, de nada, Blake, não é nenhum problema te ajudar. Ele não parecia divertido. —Não temos tempo para brincadeiras, Caroline. Nos diga que fazer. —Podem forçar uma fechadura? Parecia ofendido porque ela inclusive o perguntasse. —É obvio, Riverdale é o mais rápido, acredito. —Estupendo. Me sigam. Ele apoiou sua mão fortemente sobre o ombro direito dela. —Você não vai entrar. —Suponho que devo permanecer aqui fora sozinha? Onde qualquer um que passe me reconheceria e me levaria para o Oliver? Por não falar de ladrões, bandidos,... —Desculpe, Caroline— interrompeu-a James. — Mas nós somos os ladrões e bandidos neste pequeno cenário. Caroline conteve a risada. Blake estava furioso. James olhou de um lado a outro aos dois com aberto interesse. Finalmente disse: —Ela tem razão, Ravenscroft, não podemos deixá-la só aqui fora. Anda, Caroline. Blake amaldiçoou o que parecia sapos e cobras, mas caminhou penosamente atrás de James e Caroline sem comentar nada mais negativo. Ela os levou a uma porta lateral parcialmente oculta por um grande arco inglês. Então se agachou e pôs seu dedo sobre seus lábios, indicando que deviam permanecer quietos. Os dois homens a olharam com confusão e interesse enquanto ela se endireitava e golpeava a porta com seu ombro, ouviram abrir um trinco, e Caroline balançando a porta aberta. —O mordomo não terá ouvido isto? — perguntou James.
Ela negou com a cabeça. —Seu quarto está muito longe. A única pessoa que vive neste lado do corredor é a governanta, e ela é totalmente surda. Eu saio e entro furtivamente desta maneira muitas vezes. Nunca ninguém me pegou. —Poderia nos ter dito isto antes — disse Blake. —Não o entendeste bem. Tem que golpear a porta exatamente assim. Levou-me semanas aprender. —E que fazia escapando furtivamente pelas noites? — reclamou-lhe. —Isso não é teu assunto. —Converteu-te em assunto meu quando ficou vivendo em minha casa. —Vale, eu não me teria mudado, se você não me tivesse raptado! —Não te teria raptado se você não tivesse estado perambulando pelo campo, sem pensar em sua própria segurança. —Certamente estava mais segura no campo que o estive em Prewitt Hall, e você bem sabe. —Você não estaria a salvo nem em um convento — murmurou ele. Caroline revirou os olhos. —Se isso não for o mais ridículo... Oh, não importa, se estiver tão chateado porque eu não te deixei abrir a porta, venha, fecharei de novo e poderá tentá-lo. Ele deu um passo ameaçador adiante. —Sabe? Se eu te estrangulasse agora mesmo, não haveria nenhum tribunal neste país que não me absolvesse. —Se ambos os apaixonados podem deixar de falar-se em tom brusco — cortou James — eu gostaria de investigar o escritório antes que Prewitt volte para casa. Blake olhou enfurecido a Caroline como se todo o atraso fosse por sua culpa, o que a levou a chiar. —Não esqueça que se não fosse por mim... —Se não fosse por ti — respondeu-lhe — seria um homem muito feliz. —Estamos perdendo tempo — recordou-lhes James — vocês podem permanecer aqui, se não pararem de discutir, mas eu vou investigar o salão. —Eu irei na frente — anunciou Caroline — posto que sei o caminho.
—Você irá atrás de mim — contradisse-a Blake — e me dirá para onde nos dirigiremos. —Pelo amor de Deus — soltou James finalmente — mostrando a exasperação em cada fibra de seu corpo. — Eu irei a frente, se os dois fecharem o bico. Caroline, me siga e vai guiando. Blake, você protege-a por detrás. O trio se encaminhou até entrar na casa, assombrosamente sem pronunciar outra palavra salvo as instruções sussurradas por Caroline. Logo se encontraram em frente da porta do salão da ala sul. James tirou uma estranha ferramenta plana e a meteu na fechadura. —Essa coisa na realidade funciona? — sussurrou Caroline ao Blake. Ele afirmou com um movimento de cabeça brusco. —Riverdale é o melhor, ele pode forçar uma fechadura com mais rapidez que qualquer um, olhe, observa, três segundos mais, um, dois... Clique. A porta de repente se abriu. —Três — disse James com um sorriso ligeiro de satisfação para si mesmo. —Bem feito — disse Caroline. Ele se voltou para lhe sorrir. —Nunca encontrei uma mulher ou uma fechadura que resista. Blake murmurou algo entre dentes e passou diante deles a largos passos. —Você — disse voltando-se e apontando para Caroline — não toque nada. —Quer que te diga também o que Oliver não queria que tocasse? — perguntou com um sorriso evidentemente falso. —Não tenho tempo para jogos, senhorita Trent. —Oh, nunca me ocorreria te fazer perder tempo. Blake se voltou para James. —Vou matá-la. —E eu vou matar-te — respondeu-lhe James aos dois passou por diante deles bruscamente e se dirigiu diretamente para a escrivaninha. — Blake, você examina as estantes. Caroline, você... bom, não sei que deveria fazer mas tenta não gritar com o Blake. Blake sorriu satisfeito. —Ele gritou comigo primeiro — murmurou Caroline, totalmente consciente de que estava
comportando-se como uma menina. James moveu sua cabeça negativamente e ficou a trabalhar sobre as gavetas fechadas do escritório. Com muito cuidado abriu cada uma das fechaduras, e examinou o conteúdo de cada gaveta, arrumando tudo depois para que Oliver não percebesse que as haviam forçado. Quando passou aproximadamente um minuto, entretanto, Caroline se compadeceu dele e lhe disse: —Deveria te concentrar na última à esquerda. Ele se voltou para olhá-la com interesse. Ela deu de ombros, inclinando a cabeça para o lado. —É aquela com que Oliver sempre foi mais obsessivo. Uma vez quase arranca a cabeça do Farnsworth por polir a fechadura. —Não podia haver-lhe dito antes que examinasse outras gavetas? — perguntou Blake furiosamente. —Tentei — replicou-lhe ela — e você ameaçou me matar. James ignorou a troca de insultos entre os dois e forçou a fechadura da gaveta do fundo do lado esquerdo. A gaveta deslizou de repente, deixando ver um montão de pastas, todas elas etiquetadas com datas. —O que é isso? — perguntou Blake. James deixou sair um profundo assobio. —É o bilhete do Prewitt para a forca. Blake e Caroline se amontoaram ao redor, impaciente por dar uma olhada. Havia possivelmente umas três dúzias de pastas, cada uma delas cuidadosamente registrada com uma data. James tinha uma delas aberta em cima da escrivaninha e estava examinando seu conteúdo com grande interesse. —O que tem? — perguntou Caroline. —São documentos das atividades ilegais do Prewitt — respondeu Blake— o imbecil as pôs por escrito. —Oliver é muito organizado — disse ela — sempre que lhe ocorre qualquer tipo de projeto o põe por escrito para segui-lo à perfeição. James apontou uma frase que começava pelas iniciais CDL. —Deve ser Carlota — sussurrou — mas de quem serão estas?
Os olhos de Caroline seguiram seu dedo ao MCD. —Milhares Dudley — disse ela. Os dois homens voltaram seu rosto para ela. —Quem? — perguntaram os dois. —Acredito que é Milhares Dudley, não conheço sua inicial do meio, mas é o único com iniciais MD em quem posso pensar. É um dos companheiros de maior confiança do Oliver. Conhecem-se há anos. — Blake e James se olharam. —Acho-o detestável — continuou Caroline — sempre babando atrás das criadas, e atrás de mim. Sempre consigo estar ausente quando vem. Blake se voltou para o marquês. — Há suficiente nesta pasta para deter o Dudley? —Haveria — respondeu James — se pudéssemos estar seguros de que MCD é realmente Milhares Dudley. Não se pode ir encarcerando as pessoas apoiando-se em suas iniciais. —Se detiver o Oliver — disse Caroline — estou segura de que ele incriminaria ao senhor Dudley, eles são muito bons amigos, mas duvido que a lealdade do Oliver se mantenha firme sob tais circunstâncias. Quando as coisas ficam mal, Oliver não mantém uma verdadeira lealdade com ninguém, exceto com ele mesmo. —Isso não é um risco, estou preparado para assumi-lo — disse Blake severamente — não descansarei até ver esses dois traidores na prisão ou pendurados, precisamos pegá-los em ação. —Há algum modo em que possa determinar quando planeja Oliver sua próxima ação de contrabando? — perguntou Caroline. —Não — respondeu James, olhando o montão de pastas — a menos que tenha sido totalmente estúpido. Caroline se inclinou para diante. —O que me diz desta? — perguntou ela, tirando uma pasta quase vazia marcada com 31-7-14. Blake a arrebatou, olhou o conteúdo. —Que idiota! —Em realidade não discutirei contigo sobre a idiotice do Oliver— cortou-lhe Caroline — mas devo dizer que estou segura de que não esperava que revistassem seu escritório. —Ninguém poria esse tipo de informação por escrito — disse Blake. —Claro, Ravenscroft — disse James arqueando suas sobrancelhas maliciosamente - com um
raciocínio como esse, seria um criminoso excelente. Blake estava tão absorto com a pasta, que nem sequer se incomodou em olhar com ferocidade a seu amigo. —Prewitt está planejando algo grande, a julgar pelas aparências, maior que tudo que tenha feito antes; menciona CDL e MCD e "o resto", também assinala uma grande soma de dinheiro. Caroline colocou cuidadosamente a cabeça por cima do braço dele para ver a cifra escrita na pasta. —Oh, Meu Deus — disse em voz baixa — com esse dinheiro, para que queria minha herança? —Há quem pensa que nunca tem suficiente — replicou Blake mordazmente. James clareou sua garganta. —Então, acredito que deveríamos esperar no fim do mês, e atacar quando pudermos pegar a todos; eliminamos a toda a equipe de uma só vez. —Soa a bom plano — assentiu Caroline — embora tenhamos que esperar três semanas. Blake se voltou para ela com uma expressão de fúria. —Você não participa. —Ao diabo o que você diga! — respondeu secamente com as mãos sobre seus quadris. — Se não fosse por mim, nem sequer saberia que está planejando algo para essa quarta-feira — fechou os olhos um momento, meditando. —Caramba, você acredita que não passou todas essas quartas-feiras jogando cartas? Me pergunto se esteve fazendo contrabando partindo dessa base. Cada quarta-feira e tal. Caroline ficou a olhar todas as pastas, revisando as datas, e somando e subtraindo mentalmente sete, a cada uma delas. Olhe! Todas são para o mesmo dia da semana. —Duvido que faça contrabando todas as quartas-feiras — disse James meio distraído — mas é uma cobertura excelente para quando ele realiza atividades ilegais. Com quem joga ele as cartas? —Milhares Dudley, o primeiro. Blake moveu sua cabeça afirmativamente. —É provável que todos os que jogam estejam envolvidos. Quem mais? —Bernard Leeson. Ele é o médico de nosso povoado. —Tem sentido — murmurou Blake — odeio as sanguessugas. —E Francis Badeley — terminou ela — o magistrado.
—Então suponho que não nos dirigiremos a ele para que nos ajude em nossa detenção — disse James. —Provavelmente se deterá ele mesmo — respondeu Blake — teremos que avisar aos de Londres. James assentiu. —Moreton quererá alguma evidência antes de desdobrar a seus homens a tão elevada escala. Vamos precisar levar estas pastas. —Se eu fosse você, não levaria todas — interpôs-se Caroline. — Oliver passa nesta sala quase diariamente, estou segura de que dará conta se lhe faltarem pastas. —Te cai bem isto — respondeu James com uma risada — está segura que não quer um contrato? —Ela não está trabalhando para o Ministério de Defesa— grunhiu Blake. Caroline teve a sensação que ele diria a gritos essa afirmação se não estivesse rondando pelo estúdio do Oliver. —Levaremos um par delas— replicou James, ignorando a intromissão de Blake. — Mas não podemos levar esta — levantou a pasta da próxima missão. — Quererão revisá-la um pouco antes. —Dê a Caroline um pedaço de papel — disse Blake falando lenta e pesadamente — estou seguro de que será feliz de anotar a informação. Depois de tudo, tem uma caligrafia maravilhosa. —Não sei onde tem Oliver papel — respondeu Caroline, ignorando seu sarcasmo, quase nunca me permitiu entrar nesta sala. De qualquer modo, sei onde conseguir um pouco, abaixo no vestíbulo, e também pena e tinta. —Boa ideia — disse James — quanto menos revistarmos aqui, menos mudanças notará Prewitt de que alguém esteve olhando suas coisas. Caroline, vá conseguir o papel e a pena. —De acordo — despediu-se com garbo, e saiu correndo para a porta. Mas Blake se moveu rapidamente. —Você não vai sozinha — sibilou — devagar. Caroline não diminuiu seu passo absolutamente, não duvidava de que ele a seguiria até o vestíbulo, e até entrar no salão da ala leste, era a sala que precisava usar para receber às senhoritas da vizinhança. Não é que tivessem vindo muitas, mas de toda forma, Caroline manteve papel, penas e tinta ali, em caso de que alguém precisasse escrever uma nota ou correspondência. No momento em que ia entrar na sala, ouviu um ruído que vinha da porta principal. Um ruído que soava suspeitosamente como uma chave girando em uma fechadura. Voltou-se para Blake e sibilou.
—É Oliver! Ele não perdeu tempo falando. Antes que Caroline percebesse o que estava acontecendo, empurrou-a dentro do salão da ala leste e a agachou atrás do sofá. Seu coração pulsava tão ruidosamente, que se surpreendeu de não despertar à casa inteira. —O que acontece a James? — sussurrou ela. Blake pôs seu dedo nos lábios dela. —Saberá o que fazer, agora te cale, está entrando. Caroline apertou os dentes para evitar que rangessem de medo, enquanto escutava o som dos sapatos do Oliver sapateando pelo vestíbulo. O que aconteceria se James não o ouvira entrar? E se o tivesse ouvido mas não lhe desse tempo de escapar? E se lhe tivesse dado tempo de escapar mas esquecesse de fechar a porta? Doía-lhe a cabeça com a miríade de possibilidades para um desastre. Mas os calcanhares do Oliver não se dirigiam para o salão da ala leste, dirigiam-se diretamente para ela! Caroline sufocou um grito e deu uma cotovelada em Blake nas costelas. Ele não teve nenhuma reação salvo que ainda ficou mais rígido do que já estava. Caroline jogou uma olhada por cima de uma mesa próxima. Seus olhos caíram sobre uma garrafa de brandy. Oliver gostava de levar uma taça à cama; se ele não se voltasse enquanto se servia, não os veria, mas se voltasse... Aterrorizada profundamente, tocou o ombro de Blake. Rígido. Ele não se moveu. Com movimentos frenéticos ela golpeava no peito dele e apontava a garrafa de brandy. —O quê? — gesticulou Blake com os lábios. —O brandy — respondeu ela na mesma forma, apontando a garrafa furiosamente com movimentos bruscos de seu dedo. Os olhos do Blake se abriram desmesuradamente, e percorreu com o olhar toda a sala, procurando outro lugar para esconder-se. A luz era débil, por isso era difícil ver. Caroline tinha vantagem, de qualquer maneira, ao conhecer a sala como a palma de sua mão. Sacudiu sua cabeça para um lado, em gesto para que Blake a seguisse, e avançou agachada para o outro sofá, agradecendo a seu criador, o momento que Oliver escolheu colocar um tapete. Um piso nu teria ressonado cada um de seus movimentos, e então seguro que estariam perdidos. Nesse momento Oliver entrou na sala e se serviu um brandy. Alguns segundos mais tarde ela ouviu cair com um ruído surdo o copo sobre a mesa, seguido do som de servir-se mais brandy.
Caroline mordeu o lábio confusa. Era muito raro que Oliver bebesse mais de uma taça antes de ir à cama. Mas Oliver devia ter tido uma noite muito dura, porque sussurrou: —Deus, que desastre. E então, para cúmulo, ele deixou cair seu corpo pesadamente diretamente sobre o sofá o qual eles se achavam escondidos, e deixou cair suas pernas sob a mesa. Caroline ficou gelada, ou pensou freneticamente que estaria se não fosse por que já estava paralisada pelo medo. Disso não tinha nenhuma dúvida. Foram apanhados.
Capítulo 12
Pal-li-a-tive (substantivo). O que dá alívio temporário ou superficial. Um beijo, estou descobrindo que é um débil paliativo (palliative) quando o coração de um está destroçado. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Blake segurou firmemente com sua mão a boca de Caroline. Ele sabia como permanecer calado. Levava anos de experiência cultivando a arte de manter-se totalmente silencioso, mas só Deus sabia o que faria Caroline. A louca poderia espirrar em qualquer momento, ou dar um soluço, ou ficar nervosa. Ela o olhou com ferocidade por cima de sua mão. Sim, pensou Blake, ela estaria muito nervosa. Ele moveu sua outra mão para o braço mais elevado dela e o segurou com firmeza, resolvido a mantê-la quieta. Ele não se preocupou se por acaso ela teria machucados durante uma semana. Não terei que dizer o que Prewitt faria se encontrasse a sua rebelde pupila escondida detrás de um sofá do salão. Depois de tudo, quando Caroline escapou, efetivamente, levou sua fortuna com ela. Prewitt bocejou e ficou em pé, e por um momento o coração de Blake pulsou rapidamente com esperança, mas o condenado só cruzou à mesa do lado e se serviu outro brandy. Blake olhou Caroline. Ela não lhe disse uma vez que Prewitt nunca tomava álcool em excesso? Ela encolheu os ombros, claramente tão perplexa como ele pelo que seu tutor estava fazendo. Prewitt voltou a sentar no sofá com um forte grunhido, e murmurou: —Maldita garota. Os olhos de Caroline aumentaram. Blake a assinalou e gesticulo com a boca: —Você? Ela elevou os ombros e piscou. Blake fechou os olhos por um momento e tentou compreender a quem se referia Prewitt. Não havia maneira de estar seguro, podia ser Caroline, podia ser Carlotta De Leão. —Onde diabos pode estar? — disse Prewitt, seguido de um som como de tragar, que devia ser o brandy.
Caroline destacou a si mesma, e Blake sentiu que sua boca formava a palavra eu? Sob sua mão, embora ele não respondeu; estava muito ocupado concentrando-se em Prewitt, se os bastardos traidores os descobriam agora, a missão estaria arruinada. Bom, não de todo. Blake estava seguro de que James e ele poderiam deter facilmente a Prewitt essa noite se fosse necessário, mas isso significaria que seus sócios poderiam ficar livres. O melhor seria ser paciente e esperar que passassem as próximas três semanas. Então a equipe de espionagem ficaria definitivamente fechada para sempre. Justo quando Blake sentiu que seus pés começavam a ficar dormentes, Prewitt deixou cair o copo com força sobre a mesa e saiu a grandes passos da sala. Blake contou até dez, e então tirou a mão da boca de Caroline e exalou um suspiro de alívio. Ela suspirou também, mas foi algo mais rápido e seguido de uma pergunta. —Acredita que estava falando de mim? —Não tenho nem ideia — disse Blake honestamente — mas não me surpreenderia se o tivesse feito. —Acredita que descobrirá ao James? —Ele moveu a cabeça negativamente — se o tivesse descoberto, teríamos ouvido algum alvoroço. Embora isso não significa que estejamos a salvo ainda. Pelo que sabemos, Prewitt está dando um passeio tranquilo pelo corredor antes de entrar no salão da ala sul. —Que fazemos agora? —Esperaremos. —Para que? Ele voltou seu rosto bruscamente para ela. —Perguntas muito. —É a única maneira de aprender algo útil. —Esperaremos — disse Blake com um suspiro impaciente — até que Riverdale nos faça um sinal. —E se ele esta esperando que nós façamos o sinal? —Não espera isso. —Como pode estar seguro? —Riverdale e eu trabalhamos juntos durante sete anos, conheço seus métodos. —Em realidade, não vejo como podem estar preparados para esta operação em particular.
Ele lançou-lhe um olhar com tal irritação que ela fechou sua boca de repente, mas não antes de lhe revirar os olhos. Blake a ignorou durante alguns minutos, o que não foi fácil; o simples som de sua respiração o excitava. Sua reação era completamente inapropriada dadas as circunstâncias, e algo com o que não tinha experiência inclusive com Marabelle. Infelizmente, não parecia haver nada que pudesse fazer para evitá-lo, o que empurrava a seu mau gênio a ser inclusive ainda mais detestável. Então ela se moveu, e seu braço acariciou acidentalmente o quadril dele; e Blake se negou totalmente a deixar que o pensamento chegasse mais longe. Bruscamente a agarrou pela mão e ficou de pé. —Vamos. Caroline olhou ao redor confusa. —Recebemos algum tipo de sinal do marquês? —Não, mas já estivemos escondidos o tempo suficiente. —Mas, acreditei que havia dito... —Se quer ser parte desta operação — sibilou — precisa aprender a receber ordens. Sem perguntar. Ela elevou as sobrancelhas. —Estou tão contente de que tenha decidido me deixar participar. Se Blake tivesse podido lhe arrancar a língua nesse momento, o teria feito, ou ao menos o teria tentado. —Me siga — ordenou-lhe bruscamente. Caroline lhe deu um pequeno beijo e realizou uma pequena marcha nas pontas dos pés atrás dele até a porta. Blake acreditou que merecia uma medalha por não levantá-la pelo pescoço e atirá-la pela janela. Ao menos, ia solicitar algum tipo de bônus por periculosidade ao Ministério de defesa; se não podiam lhe dar dinheiro, teria que ser alguma pequena propriedade em algum lugar que tivesse sido confiscado a um criminoso. Certamente merecia algum pequeno extra por esta missão; Caroline podia ser um encanto para beijá-la, mas para lhe atribuir uma missão era endiabradamente incômoda. Ele chegou até a porta aberta, e lhe fez um gesto para que ela permanecesse atrás dele. Com a mão sobre a arma, apareceu para ver no corredor, descobrindo que estava vazio, e saiu andando com rapidez, Caroline lhe seguiu sem que lhe desse instruções verbais, já que ele sabia que lhe seguiria. Nisso certamente não
precisava lhe cutucar para que caminhasse de frente ao perigo. Ela era muito impetuosa, muito imprudente. Isso lhe trazia lembranças. Marabelle. Fechou seus olhos com força durante uma fração de segundo, tentando tirar sua falecida prometida de sua mente. Ela poderia viver em seu coração, mas não tinha lugar aqui, esta noite, em Prewitt Hall, não se Blake queria que saíssem os três vivos. A lembrança de Marabelle, de toda forma, foi rapidamente afastada pelas incessantes cotoveladas de Caroline na parte superior de seu braço. —O que passa agora? — disse bruscamente. —Não deveríamos ao menos pegar o papel e as penas? Não é isso pelo que viemos aqui a princípio? Blake flexionou suas mãos as estirando como uma estrela de mar e disse muito devagar: —Sim, sim, seria uma boa ideia. Ela cruzou a toda velocidade a sala e recolheu o material enquanto ele amaldiçoava entre dentes. Estava sendo brando, voltando-se débil. Não o fazia graça esquecer algo tão singelo como uma pena e tinta. O que ele queria mais que nada era sair do Ministério de defesa, longe de todo o perigo e a intriga. Queria viver uma vida onde não tivesse que preocupar-se por ver assassinar a seus amigos, onde não precisasse fazer nada, a não ser ler e levantar-se tarde, cuidar de cães de caça e... —Tenho tudo o que necessitamos — disse Caroline ofegante, rompendo o fio de seus pensamentos. Blake assentiu, e se dirigiram para o vestíbulo. Quando chegaram à porta do salão da parte sul, Blake golpeou sete vezes na madeira, seus dedos encontraram o ritmo familiar que James e ele tinham praticado fazia anos, quando eram alunos em Eton. A porta se moveu para dentro, só um pouquinho, e Blake a empurrou abrindo-a o suficiente para que Caroline e ele passassem por ela apertados. James tinha as costas contra a parede e seu dedo imóvel sobre o gatilho de sua pistola. Ele respirou aliviado quando viu que só eram Caroline e Blake entrando na sala. —Não reconheceu o toque? — perguntou Blake. James fez um movimento brusco afirmando com a cabeça. —Nunca se peca sendo muito cuidadoso. —É claro que sim! — disse Caroline estando de acordo. Todo seu trabalho como espião estava deixando seu estômago bastante débil. Era excitante, seguro, mas nada no que ela desejasse participar regularmente. Ela não tinha nem ideia de como os dois permaneceram tanto tempo sem perder seus nervos completamente.
Ela se voltou para James. —Oliver veio aqui? James moveu negativamente a cabeça — mas o ouvi pelo corredor. —Ficamos presos durante uns minutos no salão da ala leste — ela se estremeceu — foi assustador. Blake lhe lançou um olhar estranhamente avaliador. —Trouxe o papel, penas e tinta — continuou Caroline, pondo o material de escrita sobre a escrivaninha do Oliver. —Copiaremos os documentos agora? Eu gostaria que nos puséssemos em marcha. Em realidade, nunca desejei passar tanto tempo em Prewitt Hall de novo. Havia só três páginas na pasta, assim cada um pegou uma página e tomou nota apressadamente em uma nova folha de papel. Os resultados não foram nada elegantes, com mais de uma mancha de tinta danificando o resultado, mas eram legíveis e isso era tudo o que importava. James devolveu cuidadosamente a pasta à gaveta e voltou a fechar. —Está a sala em ordem? — perguntou Blake. James assentiu. —Arrumei tudo enquanto se foram. —Excelente. Escapemos. Caroline se voltou para o marquês. —Lembrou-te de pegar uma pasta das mais velhas como prova? —Estou seguro de que sabe fazer seu trabalho — disse Blake de maneira cortante, então, voltouse para James e lhe perguntou. — Lembrou-te? —Deus Santo! — disse James com voz desgostada— são pior que um par de bebês. Sim, é obvio que tomei a pasta e se não deixarem de discutir um com o outro, lhes vou encerrar aqui e lhes deixar para Prewitt e seu mordomo franco-atirador. A mandíbula de Caroline caiu ante o ataque de cólera do normalmente agradável marquês. Ela olhou de soslaio ao Blake e se deu conta de que ele olhava bastante surpreso também, e possivelmente um tanto sobressaltado. James franziu o cenho a ambos antes de posar um intenso olhar sobre Caroline e perguntar: —Como vamos sair daqui?
—Não podemos sair pela janela pelo mesmo motivo que não pudemos entrar por ela. Se Farnsworth ainda está acordado, certamente nos ouviria, mas podemos ir por onde viemos. —Não suspeitará ninguém amanhã quando a porta não esteja fechada com chave? — perguntou Blake. Caroline negou com a cabeça. —Sei como fechar a porta para que o ferrolho se feche sozinho. Ninguém saberá nunca. —Bom — disse James — escapemos. O trio se moveu silenciosamente pela casa, parando um momento fora do salão da ala sul, de maneira que James pudesse voltar a fechar a porta, e saíram para o pátio do lado. Uns minutos mais tarde se encontravam junto aos cavalos dos homens. —Meu cavalo está ali sozinho — disse Caroline, apontando um pequeno grupo de árvores do outro lado do jardim. —Suponho que quer dizer meu cavalo — disse Blake em tom brusco — do qual te apropriaste oportunamente. Ela bufou de irritação. —Peço desculpas por meu uso impreciso do inglês, senhor Ravenscroft, eu... Mas tudo o que ela ia dizer (e Caroline ainda não estava segura do que seria) perdeu-se sob o som das maldições de James. Antes que ela ou Blake pudessem dizer nada, ele os chamou aos dois cabeças de vento, idiotas, e algumas coisas mais, que Caroline não compreendeu absolutamente. Estava completamente segura, de qualquer forma, que isso era um insulto. E então, antes que algum deles tivesse oportunidade de responder, James montara em seu cavalo, e se afastava para a colina. Caroline piscou e se voltou para Blake. —Está bastante zangado conosco, verdade? A resposta do Blake foi levantá-la pondo-a em cima de seu cavalo e saltou detrás dela. Cavalgaram rodeando a propriedade de Prewitt Hall até alcançar as árvores onde ela havia atado seu cavalo e logo Caroline esteve em cima de sua própria cela. —Me siga — ordenou Blake e saiu a meio galope. Uma hora mais tarde, Caroline seguia a Blake atravessando a porta principal de Seacrest Manor. Ela estava cansada e dolorida, e não queria mais que arrastar-se até a cama; mas antes que ela pudesse chegar correndo até as escadas, ele a agarrou pelo cotovelo e a conduziu até o escritório. Ou possivelmente a empurrou, seria um termo mais preciso.
—Isto não pode esperar até amanhã? — perguntou Caroline bocejando. —Não. —Tenho muito sono. Sem resposta. Caroline decidiu tentar uma tática diferente. —O que supõe que aconteceu ao marquês? —Particularmente não me preocupa. Ela piscou. Que raro. Ela bocejou outra vez, incapaz de defender-se. —É sua intenção brigar comigo?— perguntou— porque se é, também poderia te advertir que não me sinto com forças para isso. —Que não se sente com forças para isso? — disse a gritos. Ela negou com a cabeça e se dirigiu para a porta. Não tentaria dialogar com ele quando estava de semelhante humor. —Verei-te pela manhã, estou segura de que o que quer que seja que te deixa tão alterado, poderá esperar até então. Blake a agarrou pelo tecido de sua saia e a arrastou de costas até o centro da sala. —Você não vai a nenhuma parte — resmungou. —Desculpa. —Que diabos pensava que estava fazendo esta noite? —Salvando sua vida? — brincou ela. —Não se engane. —Não o fazia. Salvei-lhes a vida. E não recordo de ouvir nenhuma palavra de agradecimento por isso. Ele murmurou algo entre dentes, seguido de: —Não salvou minha vida, tudo o que fez foi pôr em perigo a tua. —Não farei objeções à última frase, mas estou segura de que lhes salvei a vida esta noite. Se não tivesse ido a toda pressa a Prewitt Hall para lhes acautelar sobre o Farnsworth e seu chá das dez, certamente lhes teria atirado. —Isso é discutível, Caroline.
—É obvio que é — respondeu respirando desdenhosamente — salvei suas desgraçadas vidas o Farnsworth nunca teve a oportunidade atirar em vocês. Blake lhe dirigiu um olhar longo e duro. —Vou dizer isto só uma vez mais, você não armou uma confusão em nosso trabalho para levar a seu antigo tutor à justiça. Caroline permaneceu em silêncio. Depois de um momento, Blake perdeu completamente a paciência ante a ausência de uma resposta por parte dela, assim perguntou. —Bom, não tem uma resposta? —Tenho, mas você não gostaria. —Maldição! Caroline — enfureceu-se Blake — alguma vez pensa em sua própria segurança? —É obvio que o faço, acredita que gostei de arriscar meu pescoço por ti esta noite? Poderia ter sido assassinada. Ou pior, você podia ter sido assassinado, Oliver podia me ter capturado e obrigado a me casar com Percy. Ela estremeceu. — Meu Deus, provavelmente terei pesadelos da última cena durante semanas. —Realmente parecia estar desfrutando. —Bom, pois não. Senti-me doente todo o tempo. Sabendo que estávamos em perigo. —Se estava tão aterrada, por que não chorou ou atuou como uma mulher normal? —Uma mulher normal? Senhor, está me ofendendo. Ofende a todo o gênero feminino. —Deve admitir que a maioria das mulheres teriam necessitado sais aromáticos esta noite. Ela o olhou com ferocidade, seu corpo inteiro se agitou com fúria. —Devo me desculpar porque eu não me deprimi, nem ri, nem chorei durante toda a operação? Estava assustada, não... estava aterrorizada, mas o que teria passado se não tivesse mantido uma aparência valente? Além disso — Acrescentou, com uma expressão cada vez mais mal-humorada. — Estava tão zangada contigo que a maior parte do tempo esqueci quão assustada estava. Blake afastou o olhar. Ouvi-la admitir seu medo lhe fez sentir inclusive pior. Se tivesse acontecido algo a ela essa noite, teria sido por sua culpa. —Caroline — disse em voz baixa — não deixarei que te ponha em perigo, te proíbo. —Não tem direito a me proibir nada. Um músculo começou a crispar-se em seu pescoço.
—Todo o tempo que esteja vivendo em minha casa. —Oh, pelo amor de Deus, soa como um de meus tutores. —Agora me ofende você. Ela deixou escapar um suspiro frustrado. —Não sei como suporta, viver constantemente com tanto perigo, não sei como o suporta sua família, devem preocupar-se terrivelmente por ti. —Minha família não sabe. —O que? — sibilou ela. — Como é possível? —Nunca disse. —Isso é detestável — disse ela com grande sentimento. — Realmente detestável. Se eu tivesse uma família nunca os trataria com tanta falta de respeito. —Não estamos aqui para discutir sobre minha família— corrigiu-a. — Estamos aqui para discutir seu comportamento temerário. —Nego-me a admitir que meu comportamento foi temerário. Você teria feito exatamente o mesmo se estivesse em minha pele. —Mas eu não estava em sua pele, como você diz tão delicadamente, e além disso, eu levo quase uma década com esses problemas, você não. —O que é que quer de mim? Quer que prometa que nunca interferirei outra vez? —Esse seria um excelente começo. Caroline colocou as mãos sobre seus quadris e levantou o queixo. —Vale, não o farei, nada me agradaria mais que me manter fora de perigo durante o resto de minha vida, mas se você estiver em perigo e eu puder fazer algo para ajudar, certamente não permanecerei imóvel. Como poderia viver comigo mesma se tivesse sido ferido? —É a mulher mais cabeçuda que tive a desgraça de conhecer —passou a mão pelo cabelo e murmurou algo baixinho antes de dizer. — Não pode ver que estou tentando te proteger? Caroline sentiu como algo quente fazia cócegas em seu interior e as lágrimas apareceram em seus olhos. —Sim — disse ela. — Mas você não pode ver que eu estou tentando fazer o mesmo? —Não — essa palavra foi fria, cortante e dura, tão dura, que em realidade Caroline deu um passo para trás.
—Por que está sendo tão cruel? — sussurrou ela. —A última vez que uma mulher pensou me proteger... Sua voz desaparecia, mas Caroline não necessitava palavras para compreender a excessiva pena que refletia seu rosto. —Blake— disse ela docemente. — Não quero discutir por isso. —Então me prometa algo. — Ela tragou saliva, sabendo que lhe ia pedir algo com o que ela não poderia estar de acordo. —Não se ponha em perigo de novo. Se te acontecesse algo, eu... eu não poderia suportá-lo, Caroline. Ela girou afastando-se, seus olhos começavam a chorar e ela não queria que ele visse sua resposta emocional a essa declaração. Havia algo em sua voz que lhe comoveu o coração, algo na forma em que se moveram seus lábios um momento antes que ele falasse, como se estivesse procurando em vão as palavras corretas. Mas então, ele disse: —Não posso deixar que morra outra mulher — e se deu conta que não era por ela, era por ele, e a cansativa culpabilidade que sentia pela morte de sua prometida. Ela não conhecia todos os detalhes que giravam em torno da morte de Marabelle, mas James lhe contara o suficiente para saber que Blake se culpava pela morte dela. Caroline sufocou um soluço. Como podia ela competir com uma mulher sem vida? Sem olhá-lo, dirigiu-se debilmente até a porta. —Vou subir, se tiver algo mais que me dizer, pode fazê-lo pela manhã— mas antes que ela pudesse pousar sua mão sobre a maçaneta, ouviu que lhe dizia. —Espera. Nada mais que uma palavra e ela foi incapaz de resistir. Deu meia volta. Blake a olhou com grande intensidade, incapaz de desviar o olhar de seu rosto. Ele desejava dizer algo, milhares de palavras cruzavam sua mente, mas não podia criar uma só frase; e então, sem dar-se conta do que estava fazendo, deu um passo para ela, e outro, e outro, e ela se encontrou em seus braços. —Não me volte a dar um susto — murmurou entre seus cabelos. Ela não respondeu, mas sentiu como seu corpo se esquentava e se relaxava contra o dele. Ouviua suspirar, foi um som suave, mal audível, mas foi doce e isso lhe dizia que ela o desejava. É possível que não fosse da mesma forma em que ele desejava a ela, diabos, duvidava que fosse possível; mas ainda assim, ela o desejava, disso estava seguro. Seus lábios encontraram os dela, e a
devoravam com todo o temor e o desejo que esteve sentindo durante toda a noite. Ela o saboreava tal e como sonhara e a fazia sentir-se no paraíso. E Blake soube que estava condenado. Nunca poderia possuí-la, nunca a amaria do modo que ela merecia, mas ele era muito egoísta para deixá-la. Neste momento poderia e fingiria que ela era dele, que ele era dela, e que seu coração não estava destroçado. Deixaram-se cair sobre o sofá, Caroline se colocou brandamente em cima dele, que sem perda de tempo trocou sua posição com ela. Queria senti-la mover-se embaixo dele, retorcendo-se com o mesmo desejo que lhe estava consumindo. Desejava ver como seus olhos se obscureciam e ardiam de necessidade. Suas mãos deslizaram sigilosamente por debaixo da camisa dela, oprimindo de forma atrevida sua ágil perna, antes de deslizar-se até sua coxa suave. Ela gemeu sob ele, um som delicioso que podia ter sido seu nome, ou podia ter sido só um gemido, mas ao Blake não importou. Tudo o que ele queria era a ela. Toda ela. —Deus me ajude, Caroline — disse ele, quase sem reconhecer o som de sua própria voz — necessito-te, esta noite, agora. Necessito-te. As mãos dele se dirigiram para os botões de sua calça, movendo-se freneticamente para liberarse deles. De toda forma, precisava sentar-se para tirá-la, foi o tempo suficiente para que ela o olhasse, para vê-lo realmente, e nessa fração de segundo sua nuvem de paixão desapareceu e ela saiu cambaleando do sofá. —Não — disse boquiaberta. — Eu não gosto disto, não sem... não. Blake a viu ir-se, odiando-se por equilibrar-se sobre ela como um animal. Mas ela o surpreendeu parando na porta. —Vá — disse ele com voz rouca. Se ela não fosse da sala nesse instante, sabia que a seguiria, e então não haveria escapatória. —Estará bem? Ele a olhou fixamente chocado. Quase a desonrara. Teria tomado sua virgindade sem olhar atrás. —Por que pergunta? Você ficará bem? Ela não ia ficar sem responder, assim afirmou com a cabeça. —Vale, verei-te amanhã. E ela partiu.
Capítulo 13
Dith-er (substantivo). Um estado de excitação tremente ou temor; também vacilação, um estado de confusão. Só uma palavra dele me faz tremer (dither), e juro que eu não gosto de nada. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. O maior desejo de Caroline era evitar a Blake durante os próximos quinze anos. Mas com a sorte que tinha, à manhã seguinte chocou-se literalmente com ele; desgraçadamente para seu orgulho, este "choque" foi acompanhado com a queda de uma meia dúzia de livros grossos sobre o chão, alguns dos quais golpearam as pernas e pés de Blake ao cair. Ele uivou de dor, e ela só queria gritar de vergonha, mas em lugar disso, começou a falar com incoerência pedindo desculpas e se deixando cair ao tapete para recolher os livros. Ao menos desse modo ele não veria o vívido rubor que tingia suas faces no momento de estatelar-se com ele. —Acreditei que estava limitando seus esforços a redecorar a biblioteca. Que raios está fazendo com esses livros aqui fora, no corredor? Ela o olhou diretamente em seus claros olhos cinzas. Merda! Se precisava vê-lo esta manhã, porque precisava ser engatinhando? —Não estou redecorando — disse ela com voz altiva. — Estou voltando a levar estes livros a meu quarto para ler. —Seis? — perguntou em dúvida. —Sou bastante culta. —Nunca duvidei. Ela franziu seus lábios, querendo lhe dizer que escolhia ler porque poderia permanecer em seu quarto e não teria que vê-lo de novo, mas teve a sensação que isso conduziria a uma longa e interminável discussão, que era quão último ela queria. —Desejava você algo mais, senhor Ravenscroft? Ela ruborizou, ruborizou verdadeiramente. Ele deixara bastante claro a noite anterior que a desejava. Agitou suas mãos com um movimento expansivo que lhe pareceu incomodamente condescendente. —Nada — disse ele — nada absolutamente, se quer ler, por favor, sinta-se como em sua casa,
leia todos os malditos livros se isso te satisfizer. Pelo menos isso te manterá longe de problemas. Ela conteve outra réplica, mas se fazia cada vez mais difícil manter a boca fechada. Apertou os livros contra os quadris, e perguntou: —O Marquês já se levantou essa manhã? A expressão de Blake se obscureceu antes de dizer: —Se foi. —Foi? —Foi, — e então, como se ela não pudesse captar o significado das palavras, acrescentou: — Exatamente, se foi. —Mas onde iria? —Imagino que agora iria a qualquer lugar que o afastasse de nossa companhia, mas dá a casualidade de que foi a Londres. Os lábios dela se separaram devido ao assombro. —Mas isso nos deixa sozinhos. —Exatamente sozinhos — assentiu, lhe oferecendo uma folha de papel. — Você gostaria de ler sua nota? Ela assentiu, tomou a nota de suas mãos e leu: Ravenscroft. Fui a Londres com o propósito de avisar Moreton de nossos planos. Levo a cópia da pasta do Prewitt. Dou-me conta que isto te deixa só com Caroline, mas sinceramente, isso não é mais inapropriado que o fato de que ela conviva em Seacrest Manor com os dois. Além de que ambos me estavam deixando louco. Riverdale. Caroline o olhou com uma expressão precavida. —Você não gosta desta situação. Blake refletiu sobre a declaração dela. Não, não gostava desta situação. Não gostava de tê-la sob seu teto, ao alcance de sua mão. Não gostava de saber que o objeto de seu desejo seria dele se o quisesse.
James não esteve muito tempo fazendo guarda, e naturalmente não havia ninguém que a pudesse salvar. —Estou bem — disse ele. —É realmente admirável quão bem pode pronunciar inclusive quando fala entre dentes, mas ainda assim, não parece estar bem. Possivelmente deveria te levar a cama. De repente na sala se sentia um calor asfixiante e Blake disse bruscamente : —Isto não é muito boa ideia, Caroline. —Sei, sei, os homens são os piores pacientes. Imagina se tivesse que parir bebês? —A raça humana se teria extinto. Ele se voltou sobre seus calcanhares. —Vou ao meu quarto. —Oh, bem, deveria fazê-lo. Estou segura de que se sentirá muito melhor se descansar um pouco. Blake não lhe respondeu, partiu a largos passos para a escada. Entretanto, quando chegou ao primeiro degrau, deu-se conta de que ela estava justo detrás dele. —O que está fazendo aqui? — disse-lhe bruscamente. —Estou te seguindo ao seu quarto. —Faz isso por alguma razão em particular? —Estou velando por seu bem-estar. —Pois faça-o em qualquer outro lugar. —Isso — disse ela firmemente — é totalmente impossível. —Caroline — arreganhou-lhe os dentes, acreditando que sua mandíbula se partiria em duas em qualquer momento. — Me está tirando totalmente do sério. —É obvio. Qualquer um em sua situação estaria assim. Sem dúvida padece algum tipo de enfermidade. Ele subiu dois degraus. —Não estou doente. Ela subiu um. —É obvio que está, poderia ter febre ou possivelmente a garganta muito mau. Ele girou violentamente.
—Repito: não estou doente. —Não me faça repetir minha frase também. Parecemos meninos, e se não me permite te ajudar, só conseguirá te pôr mais doente. Blake sentiu como uma pressão subia dentro dele (algo que lhe era impossível de conter). —Não estou doente. Ela deixou sair um suspiro de frustração. —Blake, eu... Ele a agarrou por debaixo dos braços e a elevou até que estiveram nariz com nariz, os pés dela penduravam no ar. —Não estou doente, Caroline — disse ele, baixando um pouco o volume — e não tenho febre, e não tenho mal a garganta, e estou tão estupendamente bem, que não precisa preocupar-se por mim. Compreende? Ela afirmou com a cabeça. —Seria possível que me baixasse? —Vale — colocou-a no chão com surpreendente gentileza, deu a volta e subiu as escadas. Não obstante, Caroline ia justo atrás dele. —Acreditei que queria me evitar — disse ele bruscamente, dando a volta e encarando-a quando chegou em cima. —O fazia, quero dizer, faço. Mas está doente, e... —Não estou doente! — gritou. Ela não disse nada, e estava bastante claro que não acreditava. Ele pôs as mãos em seus quadris e se inclinou até que seus narizes estiveram escassamente a umas polegadas. —Direi isto lentamente para que até uma intrometida como você me entenda. Vou a meu quarto agora. Não me siga. Não lhe escutou. —Meu Deus, mulher! — exclamou não mais de dois segundos depois, quando ela se chocou com ele virando a esquina. — De que forma se pode conseguir que chegue uma ordem a seu cérebro? É como a peste, você... Oh, Jesus o que passa? O rosto de Caroline, que permanecera combatente e determinada em seus esforços por cuidá-lo,
chateou-se totalmente. —Nada — disse ela fungando. —Obviamente acontece algo. Seus ombros se elevaram e caíram em um movimento de menosprezo para si mesmo. —Percy me dizia o mesmo. Ele é idiota, eu sei, mas apesar disso, dói. É só, que eu acreditava... Blake se sentiu como a pior das bestas. —O que acreditava, Caroline? — perguntou cortesmente. Ela negou com a cabeça e começou a afastar-se. Ele a observou por um momento, tentado de deixá-la partir. Depois de tudo, tinha sido como um espinho cravado em seu flanco (por não mencionar outras partes de sua anatomia) essa manhã. A única maneira em que conseguiria um pouco de paz seria mantê-la fora de sua vista. Mas o lábio inferior dela tremera, e seus olhos lhe parecera que começavam a umedecer-se, e... —Diabos — murmurou. — Caroline volta aqui. Ela não o escutou, assim ele correu pelo corredor, alcançando-a justo quando ela estava chegando às escadas. Com rápidas passadas se colocou entre ela e a escada. —Para, Caroline. Agora. Ele ouviu como ela fungava, e então se voltou. —O que quer, Blake? Realmente devo ir. Estou segura de que você pode cuidar de si mesmo. Você disse também, e estou segura de que não me necessita. —Porquê de repente parece como se fosses chorar? Ela tragou saliva. —Não vou chorar. Ele cruzou os braços e a olhou como dizendo que não acreditava nem por um momento. —Disse que não passava nada — resmungou. —Não vou deixar você descer estas escadas até que me diga o que acontece. —Vale, então irei a meu quarto — deu a volta e deu um passo, mas ele a segurou pela camisa e a atraiu para ele. —Suponho que agora vais dizer que não vais me deixar ir até que lhe diga — grunhiu ela. —Está te voltando perspicaz com a idade.
Ela cruzou seus braços de forma rebelde. —Oh, pelo amor de Deus. É totalmente ridículo. —Você disse uma vez que é minha responsabilidade, Caroline, e levo a sério minhas responsabilidades. —O que significa? —O que significa que se está chorando, desejo pôr fim a isso. —Não estou chorando — murmurou ela. —Ia fazê-lo. —Oh! — exclamou ela, abrindo os braços de exasperação. —Alguém já disse alguma vez que é tão teimoso como... como... —Como você? — disse-lhe serviçalmente. Seus lábios se fecharam em uma linha firme e ligeiramente arqueada ao mesmo tempo que o apunhalava com o olhar. —Fala, Caroline, não te deixarei passar até que o faça. —Vale! Quer saber por que mudei bruscamente? Está bem, direi-lhe isso. — Ela tragou saliva, reunindo a coragem que não sentia. — Você se deu conta que me comparou com a peste? —Oh, pelo amor de... — mordeu o lábio, provavelmente para não amaldiçoar diante dela. Caroline pensou mordazmente, que amaldiçoando, ele nunca se deteve antes. —Deve saber — disse ele — que não queria dizer isso literalmente. —Ainda me dói. Ele a olhou intensamente. —Admitirei que esse não é o comentário mais agradável que fiz e peço desculpas por isso, mas te conheço o suficiente para saber que só isso não seria o que te fez chorar. —Não estava chorando—- disse ela automaticamente. —Quase chorando — corrigiu — e eu gostaria que me contasse a história completa. —Oh, muito bem. Percy estava acostumado a me chamar pestilência e peste a cada minuto. Era seu insulto favorito. —Você o mencionou. Tomarei isso como outro sinal de que falei de forma estúpida. Ela tragou e afastou o olhar.
—Eu nunca dava importância a suas palavras, era Percy depois de tudo, e ele era tonto. Mas então você o disse, e... Blake fechou os olhos durante um longo segundo, sabendo o que diria depois, e lhe deu autêntico pavor. Um som ligeiramente afogado surgiu da garganta de Caroline antes de dizer: —E então acreditei que provavelmente seria certo. —Caroline, eu... —Porque você não é louco, e sei até melhor do que ninguém, que Percy era. —Caroline — disse ele firmemente. — Sou tolo, absolutamente tolo e estúpido ao me referir a ti com algo que não seja o maior dos elogios. —Não precisa mentir para me fazer sentir melhor. Olhou-a com o cenho franzido. Ou melhor dizendo, à parte superior de sua cabeça, desde que ela olhava os pés. —Você disse que nunca minto. Ela o olhou desconfiada. —Disse-me que raramente mente. —Minto quando está em jogo a segurança da Grã-Bretanha, não seus sentimentos. —Não estou segura de se isso é ou não um insulto. —De maneira nenhuma é um insulto, Caroline. E porque acreditaria que estava mentindo? Ela revirou os olhos para ele. —Você foi menos que afetuoso comigo ontem à noite. —Ontem à noite, eu queria te estrangular — admitiu — põe sua vida em perigo sem razão. —Acreditei que te salvar a vida era uma razão bastante boa — disse-lhe bruscamente. —Não quero discutir sobre isso neste momento. Aceita minhas desculpas? —Por quê? Ele ergueu uma sobrancelha. —Isto quer dizer que tenho mais de um motivo pelo que devo me desculpar? —Senhor Ravenscroft, faltam-me números para contar... Ele sorriu abertamente.
—Agora sei que me perdoaste, se está de brincadeira. Desta vez foi ela quem ergueu a sobrancelha, e ele percebeu que ela as arrumou para parecer quase tão arrogante como ele quando o fazia. —E que te faz pensar que estou de brincadeira? — Mas então ela riu, o que arruinou bastante o efeito. —Estou perdoado? Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça. —Percy nunca pediu desculpas. —Percy é claramente um idiota. Ela sorriu então (um sorriso triste e pequeno que quase fundiu seu coração). —Caroline — disse, quase sem reconhecer sua própria voz. —Sim? —Oh, diabos — inclinou-se e roçou seus lábios contra os dela com o mais ligeiro e delicado dos beijos. Não era que ele queria beijá-la, ele precisava beijá-la. Necessitava-o da forma que necessitava o ar, e a água, e o sol do entardecer em seu rosto. O beijo foi quase espiritual, o corpo inteiro dele se estremeceu com o leve roçar de seus lábios. —Oh, Blake — suspirou, tão aturdida como ele. —Caroline — murmurou, percorrendo com seus lábios ao longo da esbelta linha de seu pescoço — não sei por quê... não entendo, mas... —Dá-me igual — disse ela, com voz totalmente decidida para alguém que a respiração passava já a ser irregular. Jogou os braços ao redor de seu pescoço e lhe devolveu o beijo com natural desenvoltura. A pressão cálida de seu corpo contra o dele era mais do que Blake podia suportar, levantou-a rapidamente entre seus braços e a levou pelo corredor do piso superior até seu quarto. Deu um chute na porta, que estava fechada, e se jogaram na cama; seu corpo cobriu o dela com uma possessividade como nunca sonhou que poderia voltar a sentir. —Desejo-te — murmurou — desejo-te agora, de todas as formas — o suave ardor dela o atraía, e seus dedos se dirigiram com urgência para os botões do vestido, passando-os através das casas depressa e com desenvoltura. —Me diga o que quer — sussurrou. Ela só moveu a cabeça em gesto negativo.
—Não sei. Não sei o que quero. —Sim — disse ele, empurrando o vestido para baixo para deixar descoberto um ombro sedoso. — Você sabe. Nesse instante, os olhos dela voaram para seu rosto. —Sabe que nunca fiz... Ele pôs meigamente um dedo sobre os lábios dela. —Sei, mas não importa, vou saber o que te faz sentir bem. —Blake, eu... —Cala — Ele fechou os lábios dela com um ardente beijo e os voltou a abrir com um ligeiro e apaixonado toque de sua língua. — Por exemplo — disse contra sua boca — quer mais disto? Ela ficou quieta um momento, e depois, ele sentiu que seus lábios se moviam acima e abaixo, afirmando. —Então o terá. — Beijou-a com ferocidade, percebendo o sutil sabor a hortelã que ela exalava. Gemeu baixo, e colocou com indecisão a mão em sua face. — Você gosta disso? —- perguntou ela tolamente. Ele grunhiu enquanto arrancava a gravata. —Pode me tocar onde você queira, pode me beijar onde você queira, ardo só em ver-te, pode imaginar o que me faz seu contato? Com doce indecisão, lhe beijou a face perfeitamente barbeada; depois se moveu até sua orelha, e seu pescoço, e Blake acreditou que certamente morreria em seus braços se continuasse sem satisfazer sua paixão. Continuou lhe baixando o vestido descobrindo um pequeno, mas em sua opinião, perfeitamente formado seio. Inclinou sua cabeça para ele, e tomou o mamilo com sua boca, apertando ligeiramente o rosado broto entre seus lábios. Ela gemia debaixo dele, gritando seu nome, e ele soube que ela o desejava. E a ideia o excitou. —OH Blake!OH Blake! OH Blake! — gemia — pode fazer isso? —Asseguro-te que posso — disse, afogando uma risada profunda. Ela ofegava enquanto ele chupava com um roçar firme. —Não, mas está permitido? Sua risada se converteu em uma risada gutural.
—Tudo está permitido, meu amor. —Sim, mas eu... ooooooooOhhhhhhhhhh. Blake riu abertamente com um ar de satisfação muito masculino, enquanto as palavras dela foram perdendo a coerência. —E agora — disse com um malvado olhar lascivo — posso fazê-lo com o outro. Suas mãos se dedicaram a lhe baixar o vestido para descobrir o outro ombro, mas justo antes de que seu prêmio se deixasse ver, ele ouviu o som mais desagradável. Perriwick. —Senhor? Senhor? Senhor! — isto acompanhado das batidas mais molestamente insuportável. —Blake! — Caroline sufocou um grito. —Shhh — ele pôs sua mão segurando a boca dela. — Ele se afastará. —Senhor Ravenscroft! É muito urgente! —Não acredito que se vá — sussurrou ela, amortecendo as palavras sob a palma da mão. —Perriwick! — bramou Blake — estou ocupado. Vá embora! Agora! —Sim, acredito — disse o mordomo através da porta - é só que estou muito assustado. —Sabe que estou aqui — sibilou Caroline. Então, repentinamente ela ficou vermelha como uma framboesa. —Oh, Deus santo, sabe que estou aqui. Que farei? Blake blasfemou entre dentes. Caroline tinha recuperado com grande esforço o bom senso, e recordou que uma senhorita de sua categoria não faria o tipo de coisas que ela fizera. E, diabos, isso fez a ele recordar também que não podia aproveitar-se dela enquanto tivesse um pouco de consciência. —Não posso deixar que Perriwick me veja — disse ela desesperadamente. —Só é o mordomo — replicou Blake, sabendo que não levava razão, mas muito frustrado para preocupar-se. —Ele é meu amigo, e sua opinião de mim importa. —A quem? —A mim, cabeça de vento— ela tentava arrumar sua aparência com tanta pressa que seus dedos escorregavam sobre os botões do vestido. —Aqui — disse Blake lhe dando um empurrãozinho. — Dentro do quarto de banho.
Caroline se lançou violentamente dentro do diminuto quarto com prontidão, agarrando suas sapatilhas no último momento, mal a porta se fechou atrás dela, ouviu como Blake puxava com força para abrir a porta de seu quarto e dizer, com maus modos: —O que quer, Perriwick? —Se perdoar meu atrevimento, senhor... —Perriwick — a voz de Blake ia ligada a uma dura advertência. Caroline temeu pela segurança do mordomo se ele não fosse diretamente ao assunto. A esta velocidade, era provável que Blake o jogasse com um chute diretamente pela janela. —Bem, senhor. É a senhorita Trent. Não a encontro em nenhum lugar. —Não estava informado de que a senhorita Trent precisasse te advertir de seu paradeiro a cada momento. —Não, é obvio que não, senhor Ravenscroft, mas encontrei isto no alto das escadas e... Instintivamente Caroline se inclinou aproximando-se à porta, perguntando-se que seria "isto". —Estou seguro de que caiu — disse Blake. — Os laços caem do cabelo das damas continuamente. A mão dela voou para sua cabeça "quando perdeu o laço? Passou Blake sua mão por seu cabelo quando a estava beijando no corredor?" —Entendo — respondeu Perriwick — não obstante, estou preocupado, se soubesse onde está, estou seguro de que poderia acalmar meus temores. —Casualmente — ouviu-se a voz do Blake. — Sei exatamente onde se encontra a senhorita Trent. Caroline ficou boquiaberta, sem dúvida ele não a delataria. Blake disse. —Decidiu aproveitar o bom tempo, e foi a passear pelo campo. —Mas acreditei que você disse que sua presença aqui, em Seacrest Manor era um segredo. —É, mas não há razão para que não possa sair enquanto que não se afaste muito. Há muito poucos veículos circulando por esta estrada, provavelmente ninguém a verá. —Já vejo. Então, darei uma olhada por fora a ver se a vejo. Possivelmente gostaria de comer algo quando voltar. —Estou seguro de que isso gostaria mais que qualquer outra coisa.
Caroline apalpou o estômago, estava um pouco faminta, e para ser totalmente sincera, a ideia de um passeio pela praia soava estupendo. Justamente o que necessitava para clarear suas ideias, Deus sabia que precisava clarear. Ela se afastou um passo da porta, e as vozes do Blake e Perriwick se desvaneceram, deu-se conta então de que do outro lado do quarto de banho havia outra porta; provou a maçaneta cuidadosamente, e se surpreendeu agradavelmente ao observar que o outro lado da porta dava ao interior vazio da escada (uma que normalmente era usada pelos criados), olhou por cima do ombro, para Blake, mesmo que ela não podia vê-lo. Ele disse que ela podia ir passear, inclusive embora tivesse sido parte de uma mentira elaborada e planejada para enganar ao pobre Perriwick. Caroline não via nenhuma razão para não seguir adiante e fazer precisamente isso. Em segundos, lançou-se escada abaixo e estava no exterior. Um minuto mais tarde ela estava fora da vista da casa e caminhava a grandes passos ao longo da borda do penhasco do qual se divisava o azul-cinzento do Canal da Mancha. O ar do mar era tonificante, mas não tanto como pensar em que Blake ia estar completamente confuso quando olhasse dentro do quarto de banho e percebesse que ela desaparecera. Que aporrinhação de homem, de toda forma. Não lhe faria mal alguma confusão em sua vida.
Capítulo 14
Nic-tate (verbo). Pestanejar (piscar). Dei-me conta que as situações nas que me ponho nervosa frequentemente me causam pestanejos (nictate) ou gagueira. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Uma hora mais tarde Caroline sentiu que se refrescou bastante, ao menos no sentido físico. O ar salgado e vivificante possuía assombrosas propriedades reconstituintes para os pulmões; desgraçadamente, não era tão eficaz para o coração e a cabeça. Amava ela ao Blake Ravenscroft? Naturalmente esperava que assim fosse. Gostaria de acreditar que não se teria comportado de maneira tão injustificável por um homem por quem ela não sentia um afeto profundo e duradouro. Sorriu ironicamente, o que devia considerar era se Blake a amava. Acreditava que sim, ao menos um pouquinho. Sua preocupação por seu bem-estar a noite anterior foi evidente; e quando a beijou... Bom, ela não sabia muito de beijos, mas pôde perceber um apetite nele, e instintivamente soube que esse apetite estava reservado exclusivamente para ela. E podia lhe fazer rir, isso contava para algo. Então, quando começava a fazer racional sua situação, ouviu um golpe tremendo, seguido pelo som de madeira estilhaçada, e por um chiado decididamente feminino. As sobrancelhas de Caroline se ergueram. O que acontecera? Queria averiguá-lo, mas supunha que sua presença aqui em Bournemouth não devesse chegar a conhecer-se. Não era provável que um dos amigos do Oliver passasse por esta estrada tão pouco usada, mas se a reconhecessem, seria um desastre. Apesar disso, alguém poderia ter problemas... A curiosidade ganhou da prudência, e saiu correndo para o som do golpe, reduzindo sua velocidade e parando no caso de mudar de opinião e decidia esconder-se. Ocultando-se atrás de uma árvore, olhou o que acontecia na estrada. Uma magnífica carruagem se encontrava recostada totalmente no barro, com uma roda totalmente feito em pedaços. Três homens e duas damas estavam em círculo, nenhum parecia estar ferido, assim Caroline decidiu permanecer atrás da árvore até que pudesse avaliar a situação. Rapidamente o cenário chegou a ser um enigma fascinante. Quem eram essas pessoas e o que aconteceu? Caroline resolveu com rapidez quem estava no comando (era a mais bem vestida das duas damas). Era absolutamente adorável, com negros cachos que saíam derramando-se sob seu chapéu, e dava ordens de uma maneira que revelava que esteve tratando com criados durante toda sua vida.
Caroline julgou que sua idade rondaria os trinta, possivelmente algo mais. A outra mulher que provavelmente seria sua donzela, e os cavalheiros (Caroline especulou que alguém seria o condutor e os outros dois seriam escoltas. Os três homens estavam vestidos com librés azul escuro combinando. Quem quer que fossem essas pessoas, vinham de uma casa extremamente enriquecida. Depois de discutir durante uns minutos, a dama que estava a cargo de tudo, enviou ao condutor e a um dos escolta para o norte, provavelmente para ir procurar ajuda; olhou ao baú que caíra da carruagem e disse: —Poderíamos usá-los como assento — e os três viajantes que ficaram, sentaram-se, ruidosamente para esperar. Depois de alguns minutos sentados e sem fazer nada, a dama se voltou para sua donzela e disse; —Suponho que meu bordado não estará empacotado em algum lugar acessível? A donzela sacudiu negativamente a cabeça. —Está na metade do baú maior, senhora. —Ah, esse seria o que milagrosamente ainda está preso no alto da carruagem. —Sim, senhora. A dama deixou sair um longo suspiro. —Suponho que deveríamos estar agradecidos de que não faça muito calor. —Ou que chova — adicionou o escolta. —Ou que neve — disse a donzela. A dama lhe lançou um olhar de contrariedade. —Em realidade, Sally, isso é bastante difícil nesta época do ano. A donzela deu de ombros. —Coisas mais estranhas acontecem. Depois de tudo, quem teria pensado que perderíamos uma roda pelo caminho; e isso sendo a carruagem mais cara que se possa comprar. Caroline sorriu e se afastou pouco a pouco, evidentemente essas pessoas estavam ilesas, e o resto dos viajantes voltariam logo com ajuda. Melhor manter sua presença em segredo. Quanto menos pessoas soubessem que estava aqui em Bournemouth, melhor, depois de tudo, e se essa dama fosse amiga de Oliver? Provavelmente não o seria, é obvio, a garota parecia ter senso de humor e tato, o que imediatamente eliminaria ao Oliver de seu círculo de amizades. Ainda assim, devia ser muito
cuidadosa. Ironicamente, isso era o que Caroline sempre dizia a si mesma (nunca se era muito cuidadoso) quando deu um passo em falso e foi pisar em um graveto seco que rompeu pela metade com um rangido extremamente sonoro. —Quem está aí? — perguntou com rapidez a senhorita. Caroline ficou gelada. —Saia imediatamente. Poderia correr ela mais que o escolta? Improvável. O homem se dirigia já resolutamente em sua direção, com a mão sobre um vulto de sua calça e Caroline teve a estranha suspeita de que se tratava de uma arma. —Só sou eu — disse com rapidez saindo ao espaço aberto. A dama ergueu sua cabeça, e entrecerrou seus olhos cinzas ligeiramente. —Bom dia, eu, quem é você? —Quem é você? — disse Caroline em contraposição. —Eu perguntei primeiro. —Ah, mas eu estou sozinha, e você está a salvo entre seus companheiros de viagem. portanto, por simples cortesia estimaria que se desse a conhecer você antes. A mulher jogou para trás sua cabeça com admiração e surpresa. —Minha querida jovem, está dizendo a maior das tolices, sei tudo o que teria que saber sobre simples cortesia, temo que você não poderia dizer o mesmo. —Por não mencionar — continuou a dama — que de nós duas, eu sou a única acompanhada por um criado armado, assim você deveria ser primeira em revelar sua identidade. —Tem razão— concedeu Caroline, jogando uma olhada à arma com gesto receoso. —Poucas vezes falo para ouvir minha própria voz. Caroline suspirou. — Quem dera pudesse dizer o mesmo. Frequentemente falo sem refletir primeiro em minhas palavras, é um horrível costume — mordeu seu lábio dando-se conta de que estava contando seus defeitos a uma total desconhecida. —Como neste momento — acrescentou timidamente. Mas a dama só riu. Era um tipo de risada alegre, amistosa, e isso aliviou a Caroline, o suficiente
para que dissesse — Meu nome é senhorita... Dent. —Dent? Não me resulta familiar esse nome. Caroline encolheu os ombros. —Não é muito comum. —Já vejo. Eu sou a condessa do Fairwich. Uma condessa? Pelo amor de Deus, parece que um bom número de aristocratas estavam neste pedacinho da Inglaterra ultimamente. Primeiro James, agora esta condessa, e Blake embora não tivesse título, era o segundo filho do Visconde do Darnsby. Caroline jogou uma olhada ao céu e mentalmente deu as graças a sua mãe, por assegurar-se de que sua filha aprendesse as regras da etiqueta antes de morrer. Com um sorriso e uma reverência disse: —Encantada de conhecê-la, senhorita Fairwich. —E eu a você, senhorita Dent. Vive na região? Oh, Deus! Como responder a isso? —Não muito longe — disse com uma evasiva - só dou longos passeios quando faz bom tempo. E você, também é daqui? Caroline mordeu o lábio por um momento. Que pergunta mais tola, se a condessa era realmente da região de Bournemouth, todos deveriam conhecê-la, e Caroline seria imediatamente descoberta como uma impostora. Não obstante, a sorte estava de seu lado, e a condessa disse: —Fairwich está em Somerset, mas hoje venho de Londres. —Seriamente? Eu nunca estive em nossa capital. Eu gostaria de ir algum dia. A condessa deu de ombros. —Aumenta um pouco mais o calor no verão com toda a multidão; não há nada como o fresco ar do mar para fazer que alguém se sinta bem de novo. Caroline lhe sorriu. —É obvio. Ai! Que pena, se isso pudesse arrumar um coração quebrado... Oh, estúpida, estúpida boca. Porquê dissera isso? Ela queria fazer uma brincadeira, agora a condessa sorria maliciosamente e a olhava dessa maneira tão maternal, como querendo dizer que ia perguntar-lhe algo extremamente pessoal. —Oh, querida. Tem o coração quebrado? —Digamos que está um pouco machucado — disse ela, pensando que estava chegando a ser
bastante boa na arte de mentir. — Só é um menino que conheço de toda a vida. Nossos pais esperavam que fôssemos casar, mas... — encolheu os ombros deixando à condessa tirar suas próprias conclusões. —Lástima, é uma garota encantadora, deveria lhe apresentar a meu irmão, vive bastante perto. —Seu irmão? — sibilou Caroline, percebendo de repente as cores que levava a condessa. Cabelo negro. Olhos cinzas. OH, não. —Sim, é Blake Ravenscroft de Seacrest Manor. Conhece-o? Caroline virtualmente se asfixiou com a língua, e conseguiu arrumar-lhe para dizer: —Fomos apresentados. —Ia visitá-lo neste momento, estamos muito longe de sua casa? Nunca estive nela. —Não, não, é... é justo ali sobre a colina — apontou em direção a Seacrest Manor, e deixou cair a mão com rapidez quando se deu conta de que estava tremendo. O que ia fazer? Não podia permanecer em Seacrest Manor vivendo com a irmã de Blake. Oh, maldito homem, podia ir ao inferno! Por que não lhe dissera que sua irmã lhe faria uma visita? A menos que ele não soubesse. Oh, não, Blake ia ficar furioso. Caroline tragou saliva nervosamente e disse: —Não sabia que o senhor Ravenscroft tivesse uma irmã. A condessa agitou sua mão de uma forma que Caroline recordou imediatamente ao Blake. —É um miserável, sempre nos ignorando. Nosso irmão mais velho acaba de ter uma filha. Vim a lhe dar a notícia. —Oh, eu... eu... eu estou segura de que ele estará encantado. —Então é a única. Estou totalmente segura de que ficará mais que contrariado. Caroline piscou com fúria, sem compreender a esta mulher em nada. —Me... me... desculpa-me? —David e Sarah tiveram uma filha, sua quarta filha, o que significa que Blake ainda é o segundo na linha para o viscondado. —Já... vejo — em realidade, ela não entendia mas era tão feliz por não ter gaguejado, que não lhe importou. A condessa suspirou.
—Se Blake chegar a ser Visconde de Darnsby, o que não é provável absolutamente, teria que casar-se e ter um herdeiro. Se viver neste lugar, estou segura de que sabe que é um solteiro consumado. —De fato, realmente não o conheço muito bem — Caroline se perguntava se soaria muito decidida de querer convencê-la, assim acrescentou. — Só em... nos atos locais e tudo isso. Já sabe, o baile do condado, etc. —Seriamente? — perguntou a condessa com aberto interesse. — Meu irmão assistiu ao baile do condado da região? Não imagino. Suponho que o agora vai dizer-me que recentemente a lua caiu sobre o Canal. —Bom — acrescentou Caroline, tragando saliva dolorosamente. — Só assistiu uma vez. Em... uma pequena aldeia, aqui, perto de Bournemouth, e naturalmente por isso sei quem é. Todos sabem quem é. A condessa guardou silêncio por um momento, e logo disse bruscamente: —Diz que a casa de meu irmão não está muito longe? —Oh! não, senhorita. Não lhe levaria mais que um quarto de hora chegar até ali — Caroline olhou o bagageiro. — Teria que deixar as coisas aí atrás, é obvio. A condessa moveu sua mão no ar no que Caroline denominava agora a onda Ravenscroft. —Simplesmente farei que meu irmão envie a um homem para as buscar mais tarde. —Oh, mas ele... — Caroline começou a tossir imprudentemente, tentando ocultar que esteve a ponto de soltar que Blake só tinha três criados, e deles, só o valete era o suficientemente forte para levantar algo pesado. A condessa a golpeou fortemente nas costas. —Está totalmente bem, senhorita Dent? —Só... só traguei um pouco de pó, isso é tudo. —Soava igual a uma tormenta. —Sim, bom, de vez em quando sou propensa aos ataques de tosse. —De verdade? —Uma vez inclusive fiquei sem voz. —Sem voz? Não posso imaginá-lo. —Ninguém podia — disse Caroline honestamente. — Até que aconteceu. —Bom, estou segura de que sua garganta deve estar muito machucada. Me acompanhará a casa
de meu irmão, uma xícara de chá a deixará como nova. Caroline voltou a tossir, esta vez de verdade. —Não, não, não, não, não, não, não — disse mais rapidamente do que lhe teria gostado. — Não é necessário, eu não gostaria de abusar. —Oh, mas não estaria abusando; depois de tudo, necessito-a para que nos leve a Seacrest Manor e oferecer uma xícara de chá e algum alimento é o mínimo que posso fazer para recompensar sua amabilidade. —Em realidade não é necessário — apressou-se a dizer Caroline. — E a direção para Seacrest Manor é bem simples; tudo o que tem que fazer é seguir o... —Tenho muito mau sentido de orientação — interrompeu a condessa. — A semana passada me perdi em minha própria casa. —Encontro isso difícil de acreditar, senhorita Fairwich. A condessa encolheu os ombros. —É um edifício grande, estou casada com o conde há dez anos, e ainda não pisara na ala leste. Caroline tragou com dificuldade e sorriu fracamente, sem ter nem ideia de como responder a isso. —Insisto em que nos acompanhe — disse a condessa, enlaçando seu braço ao redor do de Caroline — e lhe advirto que não vamos discutir; sempre saio ganhando. —Isso, senhorita Fairwich, não encontro difícil de acreditar absolutamente. A condessa emitiu uma risada vibrante. —Senhorita Dent, acredito que você e eu vamos nos dar estupendamente. Caroline tragou saliva. —Então pensa permanecer em Bournemouth durante algum tempo? —Oh, uma semana mais ou menos. Seria tolo fazer todo o percurso até aqui e então nos voltar outra vez. —Todo o caminho? Não são umas cem milhas? — disse Caroline franzindo o cenho. Não era isso o que Blake havia dito esta manhã? —Cem milhas, duzentas milhas, quinhentas milhas... — a condessa fez o gesto da mão dos Ravenscroft - se tiver que empacotar, que diferença há? —Eu, eu, eu, acredito que não sei — respondeu Caroline, sentindo como se tivesse sido
demolida por um ciclone. —Sally! — gritou a condessa, voltando-se para sua donzela. — A senhorita Dent vai levar-me a casa de meu irmão, por que não fica aqui com o Félix e cuida de nossas bolsas? Enviaremos a alguém por ti em seguida. —A condessa deu um passo em direção a Seacrest Manor, arrastando Caroline virtualmente com ela. —Possivelmente meu irmão se assombre ao ver-me— tagarelava ela. Caroline se moveu para diante cambaleando. —Possivelmente esteja certa. Blake não estava de bom humor. Evidentemente perdeu o pouco juízo que alguma vez teve. Não havia outra explicação para levar Caroline a seu quarto e quase violá-la a plena luz do dia. E se por acaso isso não fosse suficientemente mau, agora estava dolorido por suas necessidades insatisfeitas, graças a seu intrometido mordomo. Mas o pior (o francamente pior) de tudo era que agora Caroline desapareceu de repente. Revistou a casa de cima a baixo, de diante a atrás, e ela não se encontrava em nenhum lugar. Não acreditava que escapou, tinha muito juízo para fazer isso. Provavelmente estaria fora passeando pelo campo, tentando limpar sua cabeça. O que teria sido perfeitamente compreensível e uma tarefa certamente digna de elogio, se não houvesse pôsteres pregados por todo o condado com uma cara tão parecida com a sua. Não era muito parecido, estava seguro (Blake ainda pensava que o artista deveria havê-la pintado sorrindo); mas mesmo assim, se alguém a encontrasse e a levava até Prewitt... Tragou saliva nervosamente. Não gostou da sensação de vazio que sentiu ao pensar que ela partira. Diabo de mulher! Não tinha tempo para complicações como esta, e certamente não havia capacidade para outra mulher em seu coração. Blake amaldiçoou entre dentes e colocou a um lado uma parte de cortina transparente examinando o jardim lateral. Caroline deve ter partido através das escadas dos criados, era a única saída para a que teve acesso do quarto de banho. Explorou o terreno totalmente, mas inspecionou esse lado mais frequentemente; por alguma razão acreditava que ela voltaria pelo mesmo lugar pelo qual partiu. Não sabia por que. Parecia do tipo de pessoas que faria isso. Entretanto, não havia nem rastro dela, assim Blake voltou a amaldiçoar e deixou cair a cortina. Foram batidas bastante estridentes e fortes de homem, o que ouviu na porta principal. Blake amaldiçoou pela terceira vez, incompreensivelmente irritado por haver-se adiantado equivocadamente ao comportamento dela. Caminhou até a porta com passos largos e rápidos, seu cérebro cheio a transbordar com a bronca que lhe ia dar. Quando tivesse terminado com ela, não se
atreveria a fazer esse tipo de façanhas outra vez. Sua mão agarrou a maçaneta e a abriu com força, sua voz era um grunhido zangado quando disse: —Onde diabos... Sua aflição aumentou notavelmente. Piscou. Abriu bruscamente sua boca para voltar a fechá-la. —Penélope?
Capítulo 15
So-ror-i-cide (substantivo). Ação de assassinar à irmã da gente mesmo. Eu temia um fratricídio (sororicide). Sinceramente. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Penélope sorriu despreocupadamente, e a grandes passos entrou no vestíbulo. —É tão agradável ver-te, Blake. Estou segura de que está surpreso. —Sim, sim, pode estar segura. —Teria vindo antes. — Antes? —Mas tive um leve acidente de carruagem e se não fosse pela querida senhorita Dent aqui presente. Blake voltou a olhar para a porta e viu Caroline. Caroline? —Estaria completamente desamparada. É obvio, não tinha nem ideia de que estávamos tão perto de Seacrest Manor, e como estava dizendo, se não tivesse sido pela amável senhorita Dent. Ele se voltou para olhar a Caroline, que estava sacudindo freneticamente a cabeça para ele. —Senhorita Dent? —Quem sabe o tempo que teria permanecido sentada sobre minha bagagem a um lado da estrada, a uns poucos minutos de meu lugar de destino? Penélope parou para respirar e sorriu com prazer. —Não é para morrer de risada essa ironia? —Isso não é o único — murmurou Blake. Penélope ficou nas pontas dos pés e o beijou na face. —O mesmo de sempre, irmão, sem senso de humor. —Tenho um perfeito senso de humor — disse, um pouco à defensiva. — É só que ser surpreendido (totalmente surpreendido poderia acrescentar) por um hóspede inesperado. E você trouxe até aqui à senhorita... diabos... como a chamaste? —Dent — contribuiu Caroline serviçalmente — senhorita Dent.
—Ah, e fomos apresentados? Sua irmã lançou um olhar de desgosto em sua direção, que não lhe surpreendeu o mínimo. Supunha-se que um cavalheiro não esquecia a uma dama e Penélope gozava de um bom repertório de boas maneiras. —Não o recorda? — disse em voz muito alta, — foi no baile do outono passado do condado. A senhorita Dent me falou dele. O baile do condado? Que tipo de contos esteve contando Caroline referente a ele? —É obvio — disse com voz suave. — Não recordo quem nos apresentou, mas bem, foi seu primo? —Não — replicou Caroline, com uma voz tão doce que bem poderia ter estado empapada de mel. — Foi minha tia avó, a senhora Mumblethorpe, a recorda? —Ah, sim! — disse efusivamente, lhe fazendo indicações para que entrasse no vestíbulo. — A excelente senhora Mumblethorpe como poderia esquecê-la? É uma dama peculiar. A última vez que jantamos juntos ela mostrou sua nova habilidade de cantar ao modo tirolês. Caroline tropeçou ao andar. —Sim — disse ela entre dentes, apoiando seu braço contra o marco da porta para evitar a queda. — Teve uma época estupenda quando viajou a Suíça. —Mmmmm, sim, de fato, ela disse quando acabou sua demonstração; acredito que o condado por completo se inteirou de quanto desfrutara ela em suas viagens. Penélope escutava o intercâmbio com interesse. —Terá que me apresentar a sua tia, senhorita Dent, parece muito interessante, eu gostaria tanto de conhecê-la enquanto estou em Bournemouth. —Quanto tempo pensa ficar exatamente? — interrompeu Blake. —Temo que não possa lhe apresentar a tia Hortense — disse Caroline a Penélope. — Desfrutou tanto com suas viagens a Suíça que decidiu embarcar em outra viagem. —Aonde? — perguntou Penélope. —Sim, aonde? — repetiu Blake, deleitando-se do momentâneo olhar de pânico no rosto de Caroline enquanto pensava no país adequado. —Islândia— disse abruptamente. —Islândia? — disse Penélope— que estranho. Não conheço ninguém que esteve antes na Islândia.
Caroline sorriu um pouco e explicou. —Ela sempre teve uma grande fascinação pelas ilhas. —O que explicaria — disse Blake com uma perfeita voz seca. — Sua recente excursão a Suíça. Caroline se voltou para ele e disse a Penélope. —Deveríamos enviar a alguém para que vá a procurar seus pertences, senhorita. —Sim, sim — murmurou Penélope — em um momento, mas primeiro, Blake, esqueci de responder a essa pergunta tua tão grosseira. Direi-te que prevejo permanecer aqui aproximadamente uma semana, possivelmente algo mais, sempre que for de seu agrado, é obvio. Blake lhe deu uma olhada divertida e de descrédito. —E quando me concedeste decidir seus atos? —Nenhuma vez — respondeu Penélope com um encolhimento de ombros despreocupado. —Mas devo ser educada e dissimular, não? Caroline via como irmão e irmã discutiam, um amontoado de melancólica inveja se formou em sua garganta. Blake estava claramente irritado pela chegada sem avisar de sua irmã, mas estava claro que a amava imensamente. É obvio que Caroline não conheceu jamais o companheirismo afetuoso dos irmãos, nunca o viu antes desse dia. Seu coração lhe doía pelo desejo enquanto escutava aos dois. Ela desejava que alguém lhe tirasse brincadeiras, desejava que alguém pegasse sua mão quando tivesse medo ou se sentisse insegura. Mas mais que tudo, desejava que alguém a amasse. Caroline aguentou a respiração ao dar-se conta que estava perigosamente perto de chorar. —Preciso ir — disse bruscamente, encaminhando-se diretamente para a porta. Escapar era a primeira coisa que tinha em mente. Quão último desejava era encontrar-se soluçando na porta principal de Seacrest Manor, justo diante de Blake e Penélope. —Mas não tomaste chá! — protestou Penélope. —Em realidade não tenho muita sede. Eu, eu, eu devo ir para casa. Estão me aguardando. —Sim, estou seguro disso— disse Blake com voz lenta e pesada. Caroline se deteve sobre os degraus da fachada, perguntando-se a qual lugar sobre a terra partiria. — Não quero que ninguém se preocupe comigo. —Não, estou seguro disso — murmurou Blake.
—Blake, querido — disse Penélope. — Insisto em que acompanhe à senhorita Dent a sua casa. —Uma ideia estupenda — assentiu ele. Caroline assentiu com a cabeça em sinal de gratidão, ela não sabia muito bem como encarar a situação agora, mas a alternativa era vagar pelo campo sem nenhum lugar aonde ir. —Sim, eu o agradeceria. —Excelente. Disse que não estava longe, não? — seus lábios se curvaram tão brandamente como nunca fizeram, e Caroline desejou que lhe dissesse se seu sorriso era simples ironia ou suprema irritação. —Não, não está longe absolutamente. —Então proponho que vamos passeando. —Sim, provavelmente isso seria o mais conveniente. —Espera aqui, então — interrompeu Penélope. — Sinto não poder te acompanhar a sua casa, mas estou muito cansada devido à viagem, seria maravilhoso me reunir contigo em outra ocasião, senhorita Dent. Oh! Mas não sei seu primeiro nome. —Me chame Caroline. Blake lhe lançou um olhar de soslaio, um pouco surpreso e desconcertado por ela não ter usado um falso. —Se for Caroline — respondeu Penélope. — Então eu sou Penélope — agarrou suas mãos e as oprimiu carinhosamente. — Tenho a sensação de que vamos ser muito amigas. Caroline não estava segura, mas acreditou ouvir Blake murmurar — que Deus me ajude — entre dentes, e então ambos sorriram a Penélope e saíram da casa. —Onde vamos? — sussurrou Caroline. —A merda com isso — respondeu sibilando, deu uma olhada por cima de seu ombro para assegurar-se de que estavam fora do alcance do ouvido da casa. Mesmo que soubesse que fechara a porta principal atrás dele. —Quer me dizer que diabos está acontecendo aqui? —Não foi por minha culpa — disse ela com rapidez, lhe seguindo enquanto se afastava da casa. —Porque eu me pergunto. Tenho que me preocupar aceitando esta situação? —Blake! — exclamou ela apertando com força seu braço e lhe empurrando furiosamente para que parasse. — Que acredita? Que eu enviei a sua irmã uma nota lhe dizendo que te fizesse uma visita? Não tinha nem ideia de quem era. Nunca soube que tinha uma irmã, e ela não me teria visto se eu não tivesse pisado em um galho seco.
Blake suspirou, começando a dar-se conta do que aconteceu. Foi um grande percalço; um grande, tremendo, enormemente inconveniente e chato percalço. Sua vida parecia uma confusão nestes dias. —Que vou fazer contigo? —Não tenho nem ideia. Certamente, não posso permanecer na casa enquanto sua irmã esteja de visita. Você mesmo me disse que sua família não sabia nada de seu trabalho no Ministério de defesa. Presumo que isso inclui Penélope? — Ante um brusco assentimento de Blake, ela acrescentou: —Se ela descobrir que estive vivendo em Seacrest Manor, sem dúvida descobrirá suas atividades clandestinas. Blake amaldiçoou baixo. —Não estou de acordo com que oculte suas atividades a sua família — disse Caroline. — Mas respeito seus desejos. Penélope é uma dama encantadora, não desejaria preocupá-la por ti, isso a alteraria, e isso alteraria a ti. Blake a olhou fixamente, incapaz de falar. De todas as razões pelas quais Caroline não deveria deixar que sua irmã soubesse que permanecera em Seacrest Manor, ela escolheu quão única não tinha nenhum interesse; poderia dizer que estava preocupada com sua reputação, poderia dizer que temia que Penélope a voltasse a levar com o Oliver, mas não, ela não estava preocupada por isso, estava preocupada se por acaso sua forma de atuar o machucava. Ele tragou saliva, sentindo-se repentinamente torpe ante ela; Caroline o olhava no rosto, evidentemente esperando uma resposta, e ele não tinha nem ideia do que dizer. Por fim, depois que ela o atingisse com uma pergunta. —Blake? Conseguiu responder. —Isso é muito considerado por sua parte, Caroline. Ela piscou assombrada. —Oh! —Oh? — imitou-a puxando seu queixo ligeiramente para ela de maneira interrogante. —OH. OH... OH. — sorriu-lhe fracamente. — Imagino que acreditava que fosse brigar comigo. mais tarde. —Eu também acreditei que o faria — disse tão surpreso como ela. —Oh — reteve-se e disse. — Sinto muito. —Ohs à parte, vamos ter que resolver o que fazemos contigo. —Não se supõe que você tem algum lugar aonde guardar a caça por aqui perto?
Ele negou com a cabeça. —Não há um lugar na região aonde possa te esconder, suponho que poderia te enviar em uma carruagem a Londres. —Não! — respondeu Caroline. Fez caretas, um pouco envergonhada pela energia de sua resposta. — Agora mesmo não posso ir a Londres. —Por que não? Ela franziu o cenho. Essa era uma boa pergunta, mas não ia dizer que sentiria falta dele. Finalmente disse: —Sua irmã espera ver-me, estou segura de que me convidará. —Uma manobra certamente difícil, considerando que você não tem casa aonde ela possa enviar um convite. —Sim, mas ela não sabe. Naturalmente perguntará por meu endereço, e então o que lhe dirá? —Sempre poderia dizer que foste a Londres. Em geral, a verdade é sempre a melhor opção. —Não seria maravilhoso? — disse ela com um sarcasmo mais que evidente em sua voz. — Com minha sorte, ela retornará a Londres e me buscará ali. Blake deixou sair um suspiro irritado. —Sim, minha irmã é suficientemente obstinada para fazer precisamente isso. —Suponho que isso vem de família. Ele só riu. —É isso, meu amor, mas os Ravenscrofts não chegam à sola dos sapatos dos Trents quando se trata de ser obstinado. Caroline grunhiu, mas não retrucou porque sabia que era certo. Por fim, totalmente irritada pelo sorriso presumido dele, ela disse: —Podemos discutir tudo o que queiramos sobre nossos respectivos maus hábitos, mas isso não soluciona o problema. Onde vou? —Acredito que terá que retornar a Seacrest Manor. Não posso pensar em outra alternativa mais adequada. Você pode? —Mas ali está Penélope! —Teremos que te esconder. Não há outra opção. —Oh, Meu deus - murmurou ela. — Isto é um desastre. Um incrível desastre. —Nisso, estamos completamente de acordo, Caroline.
—Os criados estarão a par do engano? —Acredito que deveriam estar. Eles já lhe conhecem. Menos mal que só há três... meu Deus! —O que? —Os criados. Eles não sabem que não têm que lhe mencionar diante de Penélope. Caroline empalideceu. —Não se mova. Nenhuma polegada. Agora mesmo retorno. Blake se lançou à carreira, mas mal fez dez metros, sobre a mente de Caroline apareceu outro desastre potencial. —Blake! — gritou. — Espera! Fez uma derrapagem para deter-se e deu a volta. —Não pode ir pela porta principal. Se Penélope te vir, se perguntará como conseguiste me acompanhar a minha casa tão rapidamente. Ele amaldiçoou baixinho. —Terei que usar a entrada lateral. Percebo que está familiarizada com ela. Caroline lhe lançou um olhar de desgosto. Sabia muito bem que ela usou essa entrada para fazer sua anterior escapada. —Poderia vir também comigo agora — disse Blake. — Passaremos furtivamente até acima pela lateral e já resolveremos que fazer contigo mais tarde. —Em outras palavras, quer me dizer que espere em seu quarto de banho indefinidamente? Ele sorriu maliciosamente. —Nada mais longe de meus planos, mas agora que o menciona, sim, é uma ideia excelente. Nesse momento, Caroline decidiu que tinha uma boca muito grande. Felizmente, antes que pudesse facilitar qualquer outra má ideia, Blake agarrou sua mão e saiu correndo, virtualmente arrastando-a atrás dele. Rodearam os limites da propriedade até ficarem escondidos entre as árvores que ficavam em frente da porta lateral. —Vamos ter que fazer uma corrida através da clareira em direção a porta— disse Blake. —Que probabilidades acredita que tem que ela esteja neste lado da casa? —Muito poucas. Deixamo-la na saleta da parte dianteira, se não estiver, provavelmente tenha subido e procurado seu quarto.
Caroline ficou boquiaberta. —E se encontrar o meu? Minha roupa está ali. Só tenho três vestidos, mas evidentemente não pertencem a ti. Blake voltou a amaldiçoar. Ela ergueu suas sobrancelhas. —Sabe? Começo a achar suas maldições mais bem reconfortantes; se não amaldiçoasse, a vida pareceria quase antinatural. —É uma mulher rara — Blake puxou sua mão, e antes que Caroline se desse conta do que estava acontecendo, ia rápida cruzando a relva, repetindo com sua mente uma fileira de orações para que Penélope não os visse. Nunca foi particularmente de uma crença religiosa, mas este parecia um bom momento para desenvolver um caráter piedoso. —Eles barram ao outro lado da porta lateral, teremos que nos empoleirar com muito esforço, já que os colocaram sobre as escadas. —Você — disse Blake. — Sobe ao quarto de banho. Eu encontrarei aos criados. Caroline afirmou com a cabeça e se lançou violentamente a subir as escadas, escondendo-se silenciosamente dentro de seu quarto de banho. Olhou a seu redor com uma boa dose de desgosto. Só Deus sabia quanto tempo ia estar encerrada. —Bem — disse em voz alta. — Poderia ser pior. Três horas mais tarde Caroline descobriu que o único modo de evitar o aborrecimento no banheiro, era entreter-se fazendo uma lista de todas as situações que poderiam ser o pior que lhe tivesse acontecido. Não era fácil. Descartou imediatamente todo tipo de cenários fantásticos, como ser pisoteada por uma vaca de duas cabeças, e em troca, se concentrou em possibilidades mais realistas. —Ele poderia ter um quarto de banho pequeno — dizia a seu reflexo no espelho. — Ou poderia estar muito sujo. O... O... O... O... ou ele poderia esquecer-se de me alimentar —seus lábios se torceram em uma linha de irritação. O maldito homem se esqueceu de lhe dar de comer! —O quarto poderia não ter janelas — tentou, jogando uma olhada para a abertura. Fez caretas. Terei que ter um extraordinário caráter otimista, para chamar janela a esse pedacinho de vidro. —Poderia ter um ouriço como mascote — disse — que mantivesse na bacia. —Não é provável — chegou-lhe a voz de um homem. — Mas é possível. Caroline ergueu o olhar para ver o Blake na porta. —Onde estiveste? — sibilou. — Estou faminta.
Entregou-lhe um pão-doce. —É muito amável — murmurou escondendo-lhe se isso era seu prato principal ou simplesmente um aperitivo. —Ficará satisfeita, te tranquilize. Acreditei que Perriwick ia ter palpitações quando ouviu onde estava escondida. Imagino que ele e à senhora Mickle estão preparando um banquete enquanto nós falamos. —Sinceramente, Perriwick é um homem mais agradável que você. Ele deu de ombros. —Sem dúvida. —Conseguiu interceptar a todos os criados, antes que eles falassem de mim a Penélope? —Sim. Estamos a salvo, não tenha medo. E tenho suas coisas. Troquei-as a meu quarto. —Eu não estou em seu quarto! — disse ela, muito zangada. —Nunca disse que estava. Naturalmente, é livre para permanecer aqui no quarto de banho. Encontrarei algumas mantas e um travesseiro para ti. Com um pouco de criatividade, podemos fazer este lugar bastante confortável. Seus olhos se entrecerraram perigosamente. —Você está desfrutando com isto, verdade? —Só um pouco, asseguro-lhe. —Perguntou Penélope por mim? —Efetivamente. Já te tem escrito uma carta te pedindo um encontro para amanhã pela tarde colocou a mão em seu bolso, tirou um pequeno envelope e o deu. —Bom, isto sim que é um presente— resmungou Caroline. —Se eu fosse você, não me queixaria. Ao menos isto significa que pode sair do quarto de banho. Caroline o olhou fixamente, verdadeiramente incomodada com seu sorriso, ficou de pé e colocou as mãos em seus quadris. —Caramba, estamos procurando guerra esta tarde, verdade? —Não seja condescendente comigo. —É que isto é tão engraçado. Jogou-lhe violentamente o urinol.
—Pode usar isto em seu próprio quarto. Blake se esquivou e riu, quando o urinol se fez em pedaços ao se chocar contra a parede. —Bom, suponho que posso estar agradecido de que não estivesse cheio. —Se estivesse cheio — sibilou ela— teria apontado para sua cabeça. —Caroline, esta situação não é por minha culpa. —Sei, mas eu não tenho que me alegrar por isso. —Agora, está sendo pouco razoável. —Dá-me igual — atirou uma barra de sabão, ficou grudada na parede. —Tenho todo o direito a ser irracional. —Oh? — Esquivou-se de sua lâmina de barbear que voava pelo ar. Ela o olhou com raiva. —Para sua informação, a semana passada, fui, Oh, me deixe ver, quase violada, raptada, atada ao pé de uma cama, forçada a tossir até ficar sem voz. —Isso foi por sua culpa. —Por não mencionar o fato de que embarquei em um ato criminoso ao irromper em meu anterior lar, a ponto de ser apanhada por meu detestável tutor. —Não esqueça seu tornozelo torcido — acrescentou ele. —OoooOhhhh! Poderia te matar — outra barra de sabão voou para sua cabeça roçando sua orelha. —Senhora, certamente está fazendo boas tentativas. —E agora! — gritou ela. — E agora, como se tudo isso não fosse o suficientemente indigno, vejo-me obrigada a viver durante uma semana em um quarto de banho asqueroso. Visto assim, Blake considerou que a situação era condenadamente engraçada. Mordeu seu lábio, tentando controlar sua risada. Não teve êxito. —Não ria de mim! — soluçou ela. —Blake? Ficou absolutamente sério em menos de um segundo. —É Penélope! — sussurrou. —Blake? O que são todos esses gritos?
—Rápido! — sibilou ele, empurrando-a pelas costas até o vão da escada. —Te esconda! Caroline se afastou a toda pressa, e ao mesmo tempo, Penélope abria a porta do quarto de banho, enquanto ela fechava a do vão das escadas. —Blake? — perguntou Penélope pela terceira vez. — O que é todo este alvoroço? —Não é nada, Penny, eu... —O que aconteceu aqui? — sibilou ela. Blake olhou ao redor e tragou saliva. Esquecera a desordem que havia pelo chão. Pedaços do urinol, sua lâmina de barbear, uma toalha ou duas... —Eu, er... — pareceu-lhe que era mais fácil mentir para a segurança nacional que para sua irmã mais velha. —É isso uma barra de sabão grudada na parede? — perguntou Penélope. —Um... sim, parece que é isso. Ela apontou para o chão. —E é isto outra barra de sabão? —Er... sim, devo estar bastante torpe esta manhã. —Blake, há algo que me esteja ocultando? —Há umas quantas coisas que te oculto — disse com absoluta honestidade, tentando não pensar em Caroline sentada no vão da escada, provavelmente rindo ao escutá-lo evitar sua difícil situação. —O que é isto que há no chão? — Penélope se agachou e recolheu algo branco. —Vá! É a nota que escrevi à senhorita Dent! O que faz aqui? —Não tive oportunidade de enviar-lhe ainda, "graças a Deus, Caroline esqueceu de abri-la". —Pelo amor de Deus! Não a deixe no chão — entrecerrou seus olhos e levantou a vista para olhá-lo. —Já vejo. Blake te passa algo? —Em realidade, não — respondeu, aproveitando a oportunidade que lhe oferecia. — Estive um pouco enjoado há mais ou menos uma hora. Assim é como derrubei o urinol. Ela tocou sua fronte. — Não tem febre. —Estou seguro que não é nada que não se cure com uma boa noite de sono.
—Suponho — Penélope franziu os lábios. — Mas se amanhã não se sentir melhor, vou chamar ao doutor. —Estupendo. —Possivelmente deveria te deitar agora mesmo. —Sim—disse ele — virtualmente empurrando-a para fora do quarto de banho. — Essa é uma excelente ideia. —De acordo, então. Voltarei depois para colocar compressas. Blake deixou sair um enorme suspiro, ao mesmo tempo que fechava a porta do quarto de banho atrás dele. Certamente não era feliz pelo último giro dos acontecimentos. A última coisa que ele queria era que sua irmã mais velha estivesse continuamente se queixando. Mas sem dúvida, era preferível isso que descobrir a Caroline em meio aos pedaços do urinol e as barras de sabão. —Senhor Ravenscroft? Ele levantou a vista. Perriwick permanecia de pé na porta, levando uma bandeja de prata carregada com um verdadeiro banquete. Blake começou negar com a cabeça freneticamente, mas era muito tarde, Penélope já estava de volta. —Oh, Perriwick — disse ela. — O que é isto? —Comida — revelou-lhe totalmente confuso com sua presença. Jogou uma olhada a seu redor. Blake franziu o cenho. O condenado mordomo estava obviamente procurando Caroline; Perriwick podia ter sido discreto, mas era absolutamente torpe quando se tratava de dissimular. Penélope olhou a seu irmão com olhos interrogantes: —Tem fome? —Er... Sim, pensei em fazer um lanche. Ela levantou a tampa de uma das terrinas, deixando ver uma porção de carne assada muito grande. —Isto é mais que um bocado. Os lábios do Perriwick se estiraram em um débil sorriso meloso. —Pensamos lhe dar algo substancial agora, já que pediu uma refeição ligeira para jantar. —Que considerado — resmungou Blake, teria apostado seus dentes dianteiros a que essa carne era a que em princípio foram preparar para jantar. Provavelmente Perriwick e a senhora Mickle
teriam acordado enviar a comida melhor a Caroline, e dar papa de aveia aos "reais" ocupantes de Seacrest Manor. O mais seguro é que eles não mantiveram em segredo sua desaprovação quando Blake lhes informou do novo domicílio de Caroline. Perriwick se voltou para Penélope enquanto deixava a bandeja sobre a mesa. —Se me permitir, senhorita. —Perriwick! —- rugiu Blake. — Se ouvir a frase "se me permitir" uma vez mais, tão certo como Deus existe, vou jogar-te no Canal. —Oh, vá — disse Penélope. — Possivelmente tenha febre, depois de tudo. Perriwick, você o que acredita? O mordomo se dirigiu à fronte do Blake, quando sua mão esteve a ponto de ser mordida. —Me toque e morrerá— grunhiu Blake. —Um pouquinho resmungão esta tarde, né? — disse Perriwick com um sorriso zombador. —Estava estupendamente bem até que chegaste. Penélope disse ao mordomo. —Está agindo de maneira muito estranha toda a tarde. Perriwick afirmou com um movimento régio da cabeça. —Possivelmente deveríamos deixá-lo descansar um pouco, poderia ser o que necessita. —Muito bem— Penélope seguiu ao criado até a porta. — Deixaremo-lhe só, mas se me inteiro de que não tiraste uma sesta, vou zangar-me muito contigo. —Sim, sim — disse Blake apressadamente, tentando encaminhá-los para fora do quarto. — Prometo que descansarei, não me incomodem, tenho o sono muito leve. Perriwick deixou escapar um forte bufo que não guardava de maneira nenhuma relação com seu habitual semblante solene. Blake fechou a porta atrás deles e se apoiou contra a parede dando um enorme suspiro. —Bom Deus— disse-se para si. — A este passo me converterei em um velho retardado antes de cumprir os trinta. —Hmmmm — ouviu-se uma voz do quarto de banho. — Diria que já vai por bom caminho. Levantou a vista para ver Caroline na porta com um fastidioso e enorme sorriso em seu rosto. —O que quer? — disse zangado. —Oh, nada — disse ela ingenuamente. — Só queria te dizer que o fez estupendo.
Ele entrecerrou os olhos de forma suspeita. —O que quer dizer? —Vamos dizer que descobri o humor em nossa situação. Grunhiu e deu um passo ameaçador adiante. Mas ela não parecia acovardada. —Em realidade, não recordo a última vez que ri tanto — disse ela, agarrando a bandeja de comida. —Caroline, você aprecia seu pescoço? —Sim, tenho-lhe carinho, Por quê? —Porque se não fechar o bico, vou te estrangular. Ela voltou rapidamente para o quarto de banho. —Você ganha — e fechou a porta, deixando-o soltando fumaça em seu quarto. E se por acaso isto não fosse suficientemente mau, o seguinte som que ele ouviu foi um forte estalo. A maldita mulher lhe fechou a porta. Levou toda a comida e lhe fechou a porta. —Pagará por isso! — gritou-lhe à porta. —Te cale — chegou-lhe uma resposta amortecida. — Estou comendo.
Capítulo 16
Ti-ti-vate (verbo). Fazer pequenas mudanças ou apliques ao traje de um mesmo. Apanhada como estou no quarto de banho, ao menos tenho tempo para efetuar algumas mudanças (titivation). Juro que meu cabelo nunca se viu tão elegante. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Mais tarde, enquanto estava jantando essa noite, a Blake lhe ocorreu que adoraria assassinar à senhorita Caroline Trent. Também pensou que não era um sentimento novo. Ela pôs sua vida de pernas pro ar, penetrou-se nela, voltando-a do avesso, e certamente em incontáveis vezes, acendia um fogo interior. Apesar disso, pensou generosamente, que possivelmente matá-la seria uma palavra um pouco forte. Ele não era tão orgulhoso para não admitir que gostava dela cada vez mais. Mas sem dúvida alguma, queria amordaçá-la. Sim, uma mordaça seria ideal. E assim ela não poderia falar. Genial. —Ouça, Blake — disse Penélope com um olhar receoso. — Isto é sopa? Ele fez um gesto afirmativo. Ela olhou o caldo quase transparente de seu prato. —Tem certeza? —Tem gosto de água salgada — disse ele de forma lenta e cansada. — Mas a senhora Mickle me assegura que é sopa. Penélope engoliu uma colherada, indecisa, e tomou um comprido gole de vinho tinto. —Suponho que não tem nada do presunto que sobrou de seu lanche? —Asseguro-te que nos seria totalmente impossível comer algo desse presunto. Se sua irmã achou sua forma de falar um pouco estranha, não disse. Em lugar disso, deixou sua colher e perguntou: —Trouxe Perriwick algo mais? Um pedaço de pão, possivelmente. Blake negou com a cabeça. —Você sempre come tão... pouco de noite? De novo, ele moveu a cabeça negativamente.
—Oh, então isto é uma ocasião especial? Ele não tinha nem ideia de como responder a isso, assim se limitou a tomar outra colherada da deplorável sopa. Seguro que teria que ter algum tipo de valor nutricional em algum lado. Mas então, para sua grande surpresa, Penélope se deu uma palmada sobre a boca, ficou tão vermelha como uma beterraba, e disse: —Oh! Quanto o sinto! Ele deixou sua colher lentamente. —Perdoa? —É obvio que é uma ocasião especial. Esqueci completamente. Quanto sinto. —Penélope. De que diabos está falando? —Marabelle. Blake sentiu que uma emoção estranha lhe aprisionava no peito. Por que mencionaria Penélope a sua falecida prometida agora? —O que acontece a Marabelle? — perguntou com uma voz totalmente tranquila. Ela piscou. —Oh, Oh, então, você não recorda. Não importa. Por favor, esquece o que disse. Blake olhou a sua irmã com desconfiança, enquanto ela arremetia contra o prato de sopa como se tratasse de maná vindo do céu. —Em nome de Deus, Penélope. O que quer que seja que estava pensando, diga. Ela mordeu o lábio com indecisão. —Hoje é onze de Julho, Blake — sua voz era suave e cheia de compaixão. Ele a olhou fixamente sem compreender durante um momento, até que recordou. Em onze de Julho. O aniversário da morte de Marabelle; ficou de pé tão bruscamente que sua cadeira se derrubou. —Verei-te amanhã — disse com voz cortante. —Espera Blake! Não vá! Ela se levantou e correu atrás dele, que se encaminhava a grandes passos para seu quarto. —Não deveria estar só precisamente agora! Ele se deteve no caminho, mas não voltou a lhe olhar o rosto enquanto dizia: —Não entende, Penélope, eu sempre estarei sozinho.
Duas horas mais tarde, Blake se encontrava bem, e bêbado. Sabia que isso não lhe faria sentir-se melhor, mas pensava que um gole a mais poderia lhe fazer sentir menos. Entretanto, não funcionou. Como esquecera? Cada ano a recordara e celebrara com um presente especial, algo para honrar sua morte, da forma em que ele tentara e falhara, honrá-la em vida. O primeiro ano foram flores em sua tumba. Vulgar, sabia, mas seu sofrimento era enorme ainda, e ele era ainda jovem, e não sabia que mais fazer. Ao ano seguinte, plantou uma árvore em sua honra no lugar onde foi assassinada, de algum modo lhe pareceu apropriado. Quando jovenzinha, para Marabelle teria sido possível subir a uma árvore mais rápida que a qualquer menino da comarca. Os anos seguintes, foi rememorada com uma doação a uma casa para meninos órfãos, uma oferenda de livros a seu antigo colégio, e um cheque bancário anônimo a seus pais, que sempre se empenharam em viver por seus próprios meios. Mas este ano... nada. Foi dando tombos descendo pelo caminho da praia, utilizando um braço para manter o equilíbrio, enquanto com o outro, segurava com força sua garrafa de uísque. Quando chegou ao final do atalho, deixou-se cair de forma muito pouco elegante sobre o chão. Havia uma parte coberta de erva, antes que a terra dura cedesse o passo à areia delicada, pela qual Bournemouth era famosa. Sentou-se aí, fixando o olhar para o Canal, perguntando-se, que diabos ia fazer consigo mesmo. Saíra para evadir-se e tomar ar fresco. Não queria que Penélope ou suas perguntas bem intencionadas invadissem sua amargura. Mas o ar salgado fazia pouco para aliviar sua culpabilidade. Tudo o que fazia era lhe recordar Caroline. Ela chegou a casa essa tarde com a fragrância do mar em seu cabelo e o leve toque do sol em sua pele. Caroline. Fechou os olhos com angústia. Sabia que Caroline era a razão pelo qual esquecera Marabelle. Serviu mais uísque em sua garganta, bebendo diretamente da garrafa. Isso lhe ardia no acidentado caminho para o estômago, mas Blake aceitava a dor, Sentia-se bruto e pouco digno, e de algum jeito, isso lhe parecia apropriado. Essa noite não se sentia de todo um cavalheiro. Tombou-se de costas sobre a relva e contemplou o céu. Saíra a lua, mas não brilhava o suficiente, para atenuar as luzes das estrelas. Pareciam quase felizes, ali acima. Cintilando como se não lhes importasse nada no mundo. Quase sentia como se estivessem zombando dele. Blasfemou. Cada vez era mais imaginativo. Isso, ou sentimental. Ou possivelmente só fosse a bebida. Sentou-se e tomou outro gole. O uísque embotou seus sentidos e obscureceu sua mente, por isso provavelmente não ouviu pisadas até que estiveram quase em cima dele.
—Quem está aí? — pronunciou de forma incorreta, levantando-se torpemente com ajuda de seus cotovelos. — Quem é? Caroline deu um passo adiante, a luz das estrelas iluminava seu cabelo castanho claro. —Só sou eu. —O que está fazendo aqui? —Vi-te da minha janela — sorriu com ironia. — Me perdoe, sua janela. —Deveria retornar. —É provável. —Não sou uma companhia adequada. —Não — assentiu ela — estás bastante bêbado. Não é bom beber com o estômago vazio. Deixou sair um curto estalo de risada vazia. —E de quem é a culpa que meu estômago esteja vazio? —Sabe guardar rancor, verdade? —Senhora, asseguro-te que tenho uma enorme memória — estremeceu ao dizer essas palavras, sua memória sempre lhe funcionara bem (até esta noite). Ela franziu o cenho. —Trago-te comida. Ele não disse nada durante um momento, depois, e com voz muito baixa disse: —Volta para dentro. —Por que está tão alterado? — Ele não disse nada, só limpou o nariz com sua manga depois de beber outro gole de uísque. —Nunca te vi bêbado antes. —Há um montão de coisas que não sabe sobre mim. Ela deu outro passo para diante, seus olhos o desafiaram a que ele desviasse o olhar. —Sei mais do que você acredita. Isso obteve sua atenção. Os olhos dele brilharam com uma ira momentânea, nesse momento ficou em branco enquanto dizia: —Compadeço-te então. —Vamos, deveria comer algo — lhe ofereceu algo envolto em um guardanapo de tecido. Absorverá o uísque.
—Isso é quão último quero fazer. Ela se sentou a seu lado. —Isso não te vai cair bem, Blake. Ele girou para ela com seus olhos cinzas furiosamente avermelhados. —Não me diga o que me faz e não me faz bem — sibilou. — Não tem direito. —Como amiga tua — disse delicadamente — tenho todo o direito. —Hoje — anunciou Blake com um desconcertante floreio de seu braço— é onze de Julho. Caroline não disse nada, não sabia que dizer ante uma declaração tão evidente. —Em onze de Julho— repetiu — caí em desonra na história do Blake Ravenscroft como o dia em que ele... o dia em que eu... Ela se inclinou para frente, pasma e comovida pelo som estrangulado de sua voz. —O que aconteceu esse dia, Blake? — sussurrou. —Esse dia deixei morrer a uma mulher. Ela empalideceu pela dor que continha sua voz. —Não, não foi tua culpa. —Que diabos sabe você? —James me falou sobre Marabelle. —Maldito bastardo intrometido. —Eu me alegro de que o fizesse, falou-me muito de ti. —Por que diabos queria saber mais? — perguntou mordazmente. —Porque eu lhe am... — Caroline se deteve, horrorizada pelo que quase havia dito. —Porque me agrada, porque é meu amigo. Não tive muitos em minha vida, assim possivelmente me estou dando conta de quão especial é a amizade. —Eu não posso ser seu amigo— disse com uma voz insuportavelmente áspera. —Não pode? — ela conteve sua respiração esperando uma resposta. —Você não deseja que seja seu amigo. —Não acredita que isso eu tenha que decidir? —Pelo amor de Deus, mulher, quer me escutar? Pela última vez, não posso ser seu amigo, nunca
poderia ser seu amigo. "Porque te desejo". Ela se conteve para não lhe empurrar, foi tão descortês, sua necessidade tão evidente, que quase a assustou. —Isso é o que diz o uísque — disse apressadamente. —Isso acredita? Conhece muito pouco aos homens, meu amor. —Conheço a ti. Ele riu. —Nem a metade do que eu sei sobre ti, minha adorável senhorita Trent. —Não zombe de mim — sussurrou. —Ah, mas te estive observando. Quer que demonstre? Todas as coisas que sei, todas as pequenezas que notei, poderia encher um desses livros aos que você é tão aficionada. —Blake, acredito que deveria... Mas ele a interrompeu colocando um dedo em seus lábios. —Começarei por aqui — murmurou — com sua boca. —Minha b...? —Shhhh... toca-me — seu dedo riscou o delicado arco de seu lábio superior. —Tão cheios, tão rosa, nunca os pintaste, verdade? Ela negou movendo a cabeça, mas o movimento produziu a tortura sensual dos dedos dele acariciando sua pele. —Não — murmurou — não o faria. — Nunca vi uns lábios como estes, não te disse que foi a primeira coisa que me fixei? Ela permanecia sentada, absolutamente quieta, muito nervosa para voltar a negar com a cabeça. —Seu lábio inferior é adorável, mas este — riscou de novo a linha do lábio superior. — É delicioso. Suplica ser beijado. Quando acreditei que fosse Carlotta... inclusive então desejava cobrir seus lábios com os meus. Deus, como me odiei por isso. —Mas eu não sou Carlotta — sussurrou ela. —Sei. Isso é pior. Porque agora não posso justificar que te necessito. Posso... —Blake? — sua voz era suave, mas premente, e acreditou que morreria se não terminasse seus pensamentos.
Mas ele só moveu sua cabeça negativamente. —Estou divagando. Moveu seu dedo para os olhos dela, quase roçando a borda das pálpebras, enquanto ela os fechava. —Aqui há outra coisa que conheço de ti. Ela sentiu como se abriam seus lábios e sua respiração cada vez era mais áspera. —Seus olhos, com umas pestanas tão divinas. Um pouco mais escuras que seu cabelo — moveu seus dedos para as têmporas — mas acredito que eu gosto mais abertos que fechados. Seus olhos se elevaram para abrir-se. —Ah, assim está melhor. A cor mais maravilhosa do mundo, nunca estiveste no mar? —Não desde que era muito pequena. —Aqui, na costa, a água é cinza e tenebrosa, mas uma vez que te afasta da contaminação da terra, é maravilhosa e limpa. Sabe do que estou falando? —Cr... acredito que sim. Ele deu de ombros repentinamente e deixou cair sua mão. —Nem sequer te chega à sola dos sapatos. Ouvi que a água nos trópicos é inclusive mais impressionante. Seus olhos devem ser da cor exata do oceano que roça o Equador. Ela sorriu indecisa. —Eu gostaria de ver o Equador. —Meu amor, não acredita que primeiro deveria ao menos tentar ver Londres? —Agora está sendo cruel, e em realidade não quer fazê-lo. —Não? —Não — disse, acessando ao interior de si mesma, para encontrar a coragem que necessitava e lhe falar claramente. —Você não está zangado comigo. Está zangado contigo mesmo, e eu estou ao alcance. Ele inclinou a cabeça ligeiramente em sua direção. —Você se acredita muito observadora, verdade? —Como se supõe que devo responder a isso? —É observadora, mas acredito que não o suficiente para te liberar de mim.
Ele se inclinou para frente com um sorriso perigoso. —Sabe quanto te desejo? Ela perdeu a voz e negou agitando a cabeça. —Desejo-te tanto que quando me deito e ainda estou acordado cada noite, meu corpo se endurece e dói pela necessidade. A garganta dela ficou seca. —Desejo-te tanto que seu aroma faz que minha pele se estremeça de desejo. Ela entreabriu seus lábios. —Desejo-te tanto — o ar noturno se encheu com sua zangada risada — desejo-te imensamente tanto, que me esqueci de Marabelle. —Oh, Blake. Sinto muito. —Me economize sua compaixão. Ela começou a levantar-se. —Irei. Isso é o que quer, e evidentemente não está em condições de conversar. Mas ele a agarrou e puxou para que retrocedesse. —Não me ouviste? —Ouvi cada palavra — sussurrou ela. —Não quero que vá. — Ela não disse nada. —Desejo-te. —Blake, não. —Não o que? Que não te beije? — Desceu subitamente e a beijou muito forte na boca. —Muito tarde. Ela o olhou atentamente, sem estar segura de se estava assustada ou encantada. Ela o amava, estava segura disso agora. Mas ele não estava atuando como era em realidade. —Que não te toque? — sua mão avançou sobre seu diafragma e ao longo de seu quadril — cheguei muito longe para isso. Os lábios dele encontraram sua mandíbula, depois seu pescoço e começou a lhe mordiscar a orelha. Ela era doce e pura; e cheirava vagamente como a espuma que ele utilizava para barbear-se. Perguntou-se o que teria estado fazendo ela acima no quarto de banho, para logo decidir que não lhe importava. Havia algo grosseiramente satisfatório em cheirar seu próprio perfume sobre ela.
—Blake — disse ela com uma voz carente de convicção. — Não estou segura de que isto seja o que realmente quer. —Oh, eu estou seguro — disse com uma risada masculina — estou muito seguro. Ele apertou os quadris dela contra os seus, enquanto dirigia seu cabelo para deixá-lo livre de fitas. —Pode sentir o seguro que estou? Levava sua boca para a dela e a devorava. Sua língua passava quase roçando primeiro ao longo da linha de seus dentes, e depois movendo-se pela suave pele do interior de sua face. —Desejo te tocar — disse-lhe com palavras que eram um suave fôlego contra a boca dela — em todas partes. Seu vestido era leve, com poucos botões e laços, o que levou pouco tempo a ele levantá-lo por cima de sua cabeça, deixando-a somente vestida com uma fina camisa. O corpo dele se esticava de novo, enquanto seus dedos enganchavam os nós do fino cinturão que segurava para evitar o suave deslizamento da seda. —Comprei isto para ti? — perguntou sem reconhecer sua rouca voz. Ela fez um gesto afirmativo, ofegando quando uma de suas grandes mãos se fechou sobre seu seio. —Quando você me conseguiu vestidos. Estava em uma das caixas que trouxe da cidade. —Bem — disse, e colocou o cinturão sobre o ombro dela. Seus lábios encontraram o laço esmeradamente costurado, que bordeava seu sutiã, e o seguiu enquanto ia empurrando para baixo, parando-se só quando chegou a borda rosada de seu mamilo. Ela sussurrava seu nome enquanto ele beijava a escura auréola, e então quase gritou seu nome quando fechou sua boca ao redor do mamilo e começou a chupar. Caroline nunca sentira nada tão maravilhosamente primitivo como as sensações que arrepiavam seu ventre. O prazer e a necessidade se desdobravam dentro dela, pulverizando-se do mesmo centro de seu ser, a cada polegada de pele. Acreditava haver sentido o desejo quando ele a beijou essa manhã, mas isso não era nada comparado com o que a estava devorando agora. Baixou a vista para a cabeça dele em seu seio. Meu Deus, ele a estava devorando. Estava ardente, tão ardente que acreditou que se abrasaria ali onde ele a tocava. Uma de suas mãos avançava agora lentamente subindo por sua panturrilha, enquanto que com o joelho coberto pelas calças, exercia uma suave pressão para abrir suas pernas. Colocou seu peso entre elas e a dura prova de sua excitação pressionava contra ela intimamente. Sua mão se movia para cima, além de seu
joelho, ao longo da suave pele do interior de sua coxa, e aí parou um momento, como se lhe desse uma última oportunidade para negar-se. Mas Caroline chegara muito longe. Não podia lhe negar nada, porque queria tudo. Possivelmente fosse caprichosa, possivelmente fosse desavergonhada, mas ela desejava cada pecaminoso toque de suas mãos e sua boca. Desejava que o peso dele a pressionasse sobre o chão. Desejava o rápido batimento do coração dele e seu fôlego áspero e confuso. Ela desejava seu coração, e desejava sua alma; mas sobre tudo, desejava entregar-se a ele, curar qualquer ferida que se encontrasse por debaixo da superfície de sua pele. Por fim encontrou o lugar aonde pertencia (com ele) e queria lhe mostrar sua própria sorte. Assim, quando seus dedos encontraram o centro de sua feminilidade, nenhuma palavra de negativa ou protesto passou por seus lábios. Entregou-se ao prazer do momento, gemendo seu nome e aferrando-se a seus ombros enquanto ele atormentava seu desejo em um torvelinho sem compaixão. Ela se aferrava a ele enquanto girava e se movia fora de controle, a pressão dentro dela ficava ao vermelho vivo. Sentiu-se tensa, expandida até o limite, quando ele deslizou um dedo dentro dela enquanto com seu polegar continuava a tortura sensual sobre sua pele ardente. Seu mundo explodiu em um instante. Saltou bruscamente debaixo dele, erguendo-se do chão, e de fato levantando-o no ar. Gritou seu nome e o alcançou freneticamente enquanto ele rodava afastando-se dela. —Não — ofegou ela — volta. —Shhh... — acariciou seu cabelo, e depois sua face — estou bem aqui. —Volta. —Peso muito para ti. —Não. Quero te sentir. Quero... — tragou saliva — quero te agradar. A cara dele ficou mais tensa. —Não, Caroline. —Mas... —Não chegarei mais longe contigo — disse com voz firme. — Não deveria ter feito o que fiz, mas me condenaria se tomo sua virgindade. —Mas eu quero lhe dar isso— sussurrou ela. Ele se voltou para ela com uma ferocidade repentina. —Não — bramou — guarda-a para seu marido, é muito boa para desperdiçá-la com outro.
—Eu... — interrompeu-se para não mortificar-se dizendo que esperou que ele fosse esse marido. Mas, obviamente ele pôde ler seus pensamentos, para afastar-se dela dizendo: —Eu não me casarei contigo. Não posso me casar contigo. Ela fez um novelo com sua roupa, suplicando a Deus para não começar a chorar. —Nunca lhe disse que precisasse fazê-lo. Ele se voltou. —Você me compreende? —Em inglês, sou totalmente capaz — contraiu sua voz. — Conheço todas as palavras importantes recorda? Ele contemplou seu rosto, que não estava tão sério como ela teria esperado. —Céus! Nunca tive intenção de te fazer dano. —É um pouco tarde para isso. —Você não entende. Não posso me casar. Meu coração pertence à outra. —Seu coração pertence a uma mulher falecida — cuspiu e imediatamente levou a mão a boca, horrorizada por seu tom venenoso. — Me perdoe. Ele deu de ombros com fatalidade ao mesmo tempo que lhe entregou uma de suas sapatilhas. —Não há nada que perdoar. Aproveitei-me de ti, por isso te peço perdão. Só me alegra ter tido o suficiente sangue-frio para parar quando o fiz. —Oh, Blake — disse ela tristemente— com o tempo, terá que deixar de te fazer dano. Marabelle se foi, você ainda está aqui, e há gente que te ama. Foi o mais próximo a uma declaração que ela queria fazer. Conteve a respiração esperando sua resposta, mas ele só lhe entregou a outra sapatilha. —Obrigado — murmurou ela — agora entrarei. —Sim— mas quando ela se levantou lhe perguntou. — Pensa dormir no quarto de banho? —Em realidade, não pensei nisso. —Deixaria-te minha cama, mas não confio em que Penélope não vá comprovar como estou no meio da noite. Às vezes esquece que seu irmão pequeno cresceu. —Deve ser estupendo ter uma irmã. Ele desviou o olhar.
—Pega o travesseiro e os cobertores de minha cama. Estou seguro de que pode acomodá-los para que lhe resultem confortáveis. Ela fez um gesto afirmativo e começou a afastar-se. —Caroline? Ela girou vertiginosamente, com a esperança resplandecendo em seus olhos. —Fecha a porta quando entrar.
Capítulo 17
Es-cu-lent (adjetivo). Conveniente como comida. Comestível. Frequentemente, escutei que inclusive a comida mais repugnante parece melhor e apetecível (esculent) quando se tem fome, mas não estou de acordo. As papas são papas, por muito que o estômago ronque. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Caroline despertou à manhã seguinte com um golpe na porta do quarto de banho. Por ordem de Blake, fechou a porta com chave a noite anterior; não porque ela acreditasse que ele tentaria forçá-la de noite, mas sim porque se não o fizesse, ele passaria para revisar a porta para ver se ela seguiu suas instruções, e evidentemente não queria lhe dar a satisfação de escancará-la. Dormiu com a camisa, e se envolveu no cobertor antes de abrir a porta só um pouco e aparecer fora. Um dos olhos cinza de Blake a estava olhando. —Posso entrar? —Isso depende. —Do que? —Trouxeste o café da manhã? —Senhora, não tenho acesso a uma comida decente há quase vinte e quatro horas. Estava esperando se por acaso Perriwick havia te trazido algo de comer. Ela abriu a porta. —Não é justo que os criados castiguem a sua irmã, ela deve estar faminta. —Imagino que ela comerá estupendamente bem à hora do chá. Está convidada a visitá-la, recorda? —Oh, sim. Como faremos isso? Ele se apoiou contra uma pia de mármore. —Penélope já me encarregou de enviar para te recolher minha melhor carruagem. —Acreditei que só tinha uma carruagem. —Já. Isso não vem ao caso. Vou enviar-te uma carruagem a você... ah... casa para te recolher.
Caroline revirou os olhos. —Eu gostaria de ver o enredo, uma carruagem chegando ao quarto de banho. Me diga, passará de caminho por seu quarto ou pela escada dos criados? Ele lançou um olhar que dizia que isso não era divertido. —Tenho que te trazer a tempo para uma visita as quatro em ponto. —Que se supõe que devo fazer até então? —Te assear? —Isso não tem graça, Blake. Houve um momento de silêncio, e logo ele disse tranquilamente. —Sinto o que aconteceu ontem à noite. —Não peça desculpas. —Mas eu devo fazê-lo, aproveitei-me de ti, aproveitei-me de uma situação que não podia chegar a nenhuma parte. Caroline fez ranger seus dentes; sua experiência da noite anterior fora o mais próximo que sentira de ser amada em anos. Que lhe dissesse que sentia o acontecido, era insuportável. —Se te voltar a desculpar, gritarei. —Caroline, não seja... —Digo-lhe isso a sério! Ele afirmou com a cabeça. —Muito bem, deixarei-te sozinha, então. —Ah, sim — disse com um movimento ondulante de seu braço. — Minha fascinante vida. Há tanto que fazer aqui. Em realidade, não sei por onde começar, acredito que poderia lavar minhas mãos, e depois as pontas de meus pés, e se realmente me empenho, poderia tentá-lo com minhas costas. Ele franziu o cenho. —Você gostaria que te trouxesse um livro? O comportamento dela mudou imediatamente. —Oh, faria-me o favor? Não sei onde deixei o montão que pensava subir ontem. —Encontrarei.
—Obrigado. Quando deveria... ah... aguardar sua carruagem? —Suponho que devo pedir a carruagem um pouco antes das três e meia, assim porque não está esperta a essa hora exata para que eu te faça aparecer nos estábulos? —Posso surgir nos estábulos por minha conta. Melhor, te assegure de que Penélope está ocupada em outra parte da casa. Ele fez um gesto afirmativo. —Fique segura que direi ao moço de estábulos que lhe espere a essa hora. —Então todo mundo está consciente de nossa farsa? —Acredito que seria possível deixá-lo nos três criados da casa, mas agora parece como se o pessoal do estábulo tivesse que sabê-lo também — deu um passo para afastar-se, logo girou e lhe disse. —Recorda, sou pontual. Ela jogou uma olhada a seu redor com uma expressão indecisa. —Supõe-se que não tenha nenhum relógio aqui. Ele procurou com a mão seu relógio de bolso. —Usa este, embora terá que lhe dar corda dentro de umas horas. —Trará os livros? Ele afirmou com um gesto. —Que não se diga que não sou o mais amável dos anfitriões. —Embora confine a um convidado ocasional a seu quarto de banho? —Inclusive então. Exatamente às quatro em ponto dessa tarde, Caroline batia na porta principal de Seacrest Manor; sua excursão até esse lugar foi bastante extravagante, por dizê-lo assim. Escapuliu do quarto de banho, descendo pelas escadas de serviço, lançando-se à carreira até o outro lado da grama exatamente às três em ponto, saltando dentro da carruagem para a seguir passear sem rumo fixo até que o moço dos estábulos a trouxe de volta à casa às quatro em ponto. Certamente, teria sido mais direto, ter saído do quarto de Blake e descer a escada principal, mas depois de passar todo o dia sem companhia salvo por um lavabo e uma tina, a Caroline não importou desfrutar de um pouco de excitação e paisagem. Perriwick saiu a responder à porta tão rápido como nunca o fizera, lhe piscando um olho e dizendo:
—É um prazer vê-la de novo, senhorita Trent. —Senhorita Dent — sibilou ela. —Certo— disse, saudando-a. —Perriwick! Alguém poderia estar olhando. Ele olhou furtivamente ao redor. —Certo! Caroline gemeu. Perriwick se agradara do engano. O mordomo clareou sua garganta e disse em voz muito alta. —Me permita lhe mostrar o salão, senhorita Dent. —Obrigado... er... Qual disse que era seu nome? Ela sorriu enormemente com aprovação. —É Perristick, senhorita Dent. Esta vez Caroline não pôde evitá-lo, deu-lhe um tapa no ombro. —Isto não é um jogo — sussurrou. —É obvio que não — abriu a porta do salão, o mesmo onde lhe devotara um banquete enquanto seu tornozelo estava arrumando. —Direi à senhorita Fairwich que você está aqui. Ela moveu sua cabeça negativamente ante seu entusiasmo e foi andando até a janela; parecia como se fosse chover mais tarde essa noite, o que era melhor para Caroline, que se veria provavelmente encerrada no quarto de banho de Blake toda a noite. —Senhorita Dent, Caroline! Que agradável vê-la de novo. Caroline se voltou para ver a irmã do Blake entrando silenciosamente na sala. —Senhorita Fairwich, foi muito amável me convidando. —Tolices, e acredito que ontem insisti em que me chamasse Penélope. —Muito bem... Penélope— disse Caroline, e lhe indicou com a mão a seu redor. — É uma sala preciosa. —Sim, verdade que tem um aspecto impressionante! Sempre sinto inveja do Blake, por viver aqui no mar; e agora acredito que devo sentir inveja por você, também — disse sorrindo. — Gostaria de um pouco de chá?
Se a comida foi enviada ao quarto que em outro tempo fora de Caroline, de algum modo, Blake as teria habilmente interceptado, e o estômago dela esteve vociferando todo o dia. —Sim — disse ela — eu adoraria um pouco de chá. —Excelente, pediria umas bolachas também, mas — Penélope se inclinou como se fosse lhe contar um segredo. — A cozinheira de Blake é realmente terrível. Acredito que deveríamos tomar unicamente o chá, por precaução. Enquanto Caroline estava ocupada tentando pensar uma forma correta para dizer à condessa que morreria de fome se não deixasse à senhora Mickle lhe enviar algumas bolachas, Blake entrou na sala. —Ah, senhorita Dent — disse — bem-vinda, confio em que seu passeio de carruagem até aqui foi cômodo. —Certamente foi, senhor Ravenscroft, sua carruagem é excepcionalmente cômoda. Ele fez um gesto afirmativo distraidamente e percorreu a sala com o olhar. —Vá, Blake — disse Penélope — está procurando algo? —Estava me perguntando se possivelmente a senhora Mickle enviou um pouco de chá, e... — Acrescentou energicamente — bolachas. —Justamente agora chamava para pedir um pouco, embora não é seguro o das bolachas. depois da refeição da última noite... —A senhora Mickle faz umas bolachas excelentes — disse Blake. — Farei-lhe que envie o dobro da quantidade. Caroline suspirou aliviada. —Suponho— admitiu Penélope. — Que depois de tudo, tive um maravilhoso café da manhã esta manhã. —Tomaste o café da manhã? — disseram Blake e Caroline em uníssono. Se Penélope acreditava que era estranho que sua convidada questionasse sobre seus hábitos de refeição, ela não disse, ou possivelmente foi que não ouviu. Encolheu os ombros e disse: —Sim, foi do mais curioso em realidade, encontrei uma bandeja perto de meu quarto esta manhã. —De verdade? — disse Caroline, tentando que soasse como se perguntasse só por educação, teria apostado sua vida a que essa refeição era para ela. —Bom, para ser sincera, não estava exatamente junto a meu quarto. Em realidade, estava mais perto do teu, Blake, exceto que eu acreditei que você já estava levantado; acredito que os criados não
desejaram chegar tão perto de meu quarto por medo de me despertar. Blake lançou tal olhar de descrédito a Penélope, que esta se viu forçada a colocar suas mãos em uma postura mais cômoda e dizer: —Eu não sabia que outra coisa pensar. —Acredito que possivelmente meu café da manhã estava nessa bandeja também — disse. —Oh sim, sim, isso teria sentido. Só pensei que havia muita comida aí, mas estava tão faminta depois do jantar de ontem à noite, que sinceramente não parei para pensar. —Não acontece nada— disse Blake. Nesse momento seu estômago o deixou por mentiroso ao roncar tão forte. Ele se sobressaltou. — Irei ver esse chá. E... ah... as bolachas adicionais. Caroline tossiu. Blake se deteve nesse ponto e deu a volta. —Senhorita Dent, também tem você fome? Ela sorriu lindamente. —Estou esfomeada. Tivemos um contratempo na cozinha de nossa casa e não tomei nada em todo o dia. —Oh, querida! — exclamou Penélope, abraçando com suas mãos as de Caroline. —Que horror, Blake, por que não vê se sua cozinheira pode preparar algo mais substancial que bolachas? Se acredita que ela pode, claro. Caroline acreditou que deveria dizer algo educado como "Não deveriam preocupar-se", mas temia que Penélope tomasse a sério. —Oh, e Blake — pediu a gritos Penélope. Ele parou na porta e deu a volta muito lentamente, claramente irritado por voltar a deter-se. —Sopa não. Nem sequer se dignou a responder. —Meu irmão é um pouco resmungão — disse Penélope uma vez que ele desapareceu de sua vista. —Os irmãos o são — conveio Caroline. —Oh, então você tem um irmão? —Não — disse ela tristemente — mas conheço gente que os tem. —Em realidade, Blake não é má pessoa — continuou Penélope, indicando a Caroline que se
sentasse enquanto ela o fazia. — Inclusive devo admitir que é diabolicamente charmoso. Os lábios de Caroline se abriram com surpresa. Estava Penélope tentando fazer de casamenteira? Oh, Deus, que grande ironia. —Você crê? Caroline piscou e se sentou. —Perdão? —Acredita que Blake é charmoso? —Bom, sim, é obvio. Qualquer um diria. Penélope franziu o cenho, não muito satisfeita com sua resposta. Caroline se poupou de ter que dizer algo mais devido a um pequeno alvoroço no vestíbulo. Ela e Penélope levantaram a vista ao ver a senhora Mickle na porta, acompanhada por um carrancudo Blake. —Está satisfeita agora? — resmungou ele. A senhora Mickle olhou diretamente a Caroline antes de dizer: —Só queria estar segura. Penélope girou para Caroline e sussurrou: —Vá, ao que se referia? Blake voltou a entrar no salão e se sentou, dizendo: —Por mim não interrompam sua conversação. —Tolices — disse Penélope — é só que... hmmm. —Por que eu não gosto como isso soa? — murmurou Blake. Penélope se levantou de um salto. —Simplesmente, tenho algo que devo mostrar a Caroline. Blake, far-lhe-á companhia enquanto eu o trago de meu quarto? Em um abrir e fechar de olhos, ela partiu, e Blake perguntou: —A que se referia? —Temo que sua irmã leva a ideia de se fazer de casamenteira. —Contigo?
—Eu não sou tão má — interrompeu bruscamente. — Há quem me considera um bom partido. —Me desculpe - disse ele rapidamente. — Não tencionei te ofender; é só que isso deve significar que ela está muito desesperada. Ela o olhou com a boca aberta. —Se deste conta quão grosseiro soa isso? Ele ruborizou ligeiramente. —Uma vez mais, devo me desculpar. É só que Penélope esteve tentando me buscar uma esposa durante anos, mas normalmente se limita a procurar senhoritas de cujas famílias pode investigar até a invasão da Normandia. Não — apressou-se a dizer — que sua família seja inapropriada, simplesmente que Penélope não pode seguir sua procedência. —Estou segura de que se o fizesse, encontraria-os inadequados — disse Caroline mal-humorada. — Eu posso ser uma herdeira, mas meu pai era comerciante. —Sim, mantém o refrão. Nada disto teria acontecido se Prewitt não tivesse decidido pescar a uma herdeira para seu filho. —Não acredito que eu goste que me comparem com um peixe. Blake a olhou com compaixão. —Já sabe o que a gente pensa sobre as herdeiras, são como uma presa para ser pescada. — Como ela não respondia, acrescentou. — De qualquer forma, em realidade não tem sentido. Nunca me casarei. —Sei. —Apesar de tudo, deveria te sentir adulada. Isto quer dizer que a Penny agrada muito. Caroline se limitou a lhe lançar um olhar glacial. —Blake — disse finalmente— acredito que te está passando dos limites. Houve um silêncio embaraçoso, e logo Blake tentou arrumar as coisas. —A senhora Mickle se negou a preparar qualquer refeição a menos que soubesse que estava aqui. —Sim, suponho. É muito simpática. —Esse não é de todo o adjetivo que eu usaria para descrevê-la, mas posso ver de onde o tiraria. Houve outro incômodo silêncio, e esta vez foi Caroline a que o rompeu. —Entendo que seu irmão teve uma filha recentemente.
—Sim, a quarta. —Deve estar muito contente. Ele a olhou de forma azeda. —Por que diz isso? —Acreditava que seria adorável ter uma sobrinha. É obvio, ao ser filha única, nunca serei tia — seu olhar se voltou triste. — Adoro as crianças. —Possivelmente tenha um você. —Duvido. Caroline sempre esperou casar-se por amor, mas dado que o homem que ela amava pretendia ir à tumba solteiro, parecia-lhe que ela permaneceria solteira também. —Não seja boba. Não pode saber o que te proporciona o futuro. —Por que não? — opôs-se ela— você parece conhecê-lo. —É verdade — olhou-a atentamente por um momento, então seus olhos se encheram de algo que parecia suspeitosamente arrependimento, e disse. — Eu desfruto muito de minhas sobrinhas. —Então porque está tão alterado com a mais recente? —Por que acredita nisso? Ela se burlou. —Oh, por favor, Blake. É bastante óbvio. —Não estou aborrecido absolutamente com minha nova sobrinha. Estou seguro de que a adorarei — clareou a garganta e sorriu com ironia. — Quem dera ela tivesse sido um menino. —A maioria dos homens se emocionariam ante a esperança de ser o seguinte na linha para ter um viscondado. —Eu não sou a maioria dos homens. —Sim, isso está muito claro. Blake entreabriu seus olhos e a olhou fixamente. —O que quer dizer? Ela só deu de ombros. —Caroline — advertiu-lhe. —É bastante óbvio que adora as crianças, e mesmo assim está decidido a não ter nenhum; essa
linha de raciocínio tão particular se mostra inclusive menos lógica que a que usualmente demonstram os homens de nossa espécie. —Agora está começando a falar como minha irmã. —Tomarei isso como um elogio. Agrada-me sua irmã. —E a mim. Mas isso não quer dizer que sempre faça o que ela diz. —Já estou de volta! - Penélope entrou tranquilamente na sala. — Do que estão falando? —De crianças — respondeu Caroline sem rodeios. Penélope começou a andar, e seus olhos mostraram uma evidente alegria. —Seriamente? Que emocionante! —Penélope — disse Blake com voz pesada. — O que era que queria mostrar a Caroline? —Oh, isso... —disse ela distraidamente. — Não pude encontrá-lo. Terei que olhar mais tarde e pedir a Caroline que volte amanhã. Blake quis queixar-se, mas sabia que o chá com Caroline era a única maneira que tinha de conseguir uma refeição decente. Caroline sorriu e se dirigiu a Penélope. —Seu irmão e sua esposa batizaram já a sua nova filha? —Oh, estavam falando dessas crianças — disse Penélope, soando algo mais que desiludida. — Sim, eles já o fizeram. Daphne Georgiana Elizabeth. —Todos esses nomes? —Oh, isso não é nada. As maiores têm ainda mais nomes. A mais velha de todas se chama Sophie Charlotte Sybilla Aurelia Naihanaele, mas ao David e Sarah lhes esgotaram. —Se tiverem outra filha— disse Caroline com um sorriso. — Terão simplesmente que chamá-la Mary e deixá-lo nisso. Penélope riu. —Oh, não, isso seria totalmente impossível, eles já utilizaram Mary; sua segunda filha se chama Katharine Mary Claire Evelina. —Não me atrevo a adivinhar qual é o nome de sua terceira filha. —Alexandra Lucy Caroline Vivette. —Ah, Caroline, que encantador.
—Estou assombrado — disse Blake — de que possa recordar todos esses nomes. Tudo o que eu posso recordar é Sophie, Katharine, Alexandra, e agora Daphne. —Se você tivesse um filho... —Sei, sei, querida irmã, não faz falta que o repita. —Só ia dizer que se você tivesse meninos, não teria nenhum problema em recordar os nomes. —Sei o que quiseste dizer. —Você tem crianças, Lady Fairwich? — perguntou Caroline. Um gesto de dor cruzou pelo semblante de Penélope antes de responder docemente. —Não, não, não tenho. —Oh, sinto muito — balbuciou Caroline. — Não deveria ter perguntado. —Não passa nada — disse Penélope com um sorriso vacilante — o conde e eu ainda não fomos abençoados com meninos. Possivelmente por isso mimo tanto a minhas sobrinhas. Caroline tragou saliva sentindo-se incômoda, totalmente consciente de que iniciou inadvertidamente um tema doloroso. —O senhor Ravenscroft diz que também ele mima em excesso a suas sobrinhas. —Sim, é certo. Ele é um tio admirável. Seria um exc... —Não o diga, Penélope — interrompeu-a Blake. A conversação não foi mais à frente graças à entrada de Perriwick, que cambaleava pelo peso de um serviço de chá sobrecarregado. —Oh, meu Deus! —Sim —disse Blake lentamente. —Isto é todo um banquete de lanche e jantar juntos. Verdade? Caroline só sorriu e nem sequer se incomodou em envergonhar-se pelo modo em que roncava seu estômago. Durante os dias seguintes ficou bastante claro que Caroline estava em posse de um importante ás sob a manga. Os criados se negavam a preparar uma refeição decente, a menos que estivessem seguros de que ela tomaria parte nele. Assim ela se encontrou "convidada" a Seacrest Manor com crescente regularidade. Penélope chegou inclusive tão longe para sugerir a Caroline que passasse a noite ali, em uma ocasião que chovia. Em realidade, não chovia tão forte, mas Penélope não era tola. Percebeu os peculiares hábitos dos criados, e gostava de tomar o café da manhã tão bem como qualquer um. Caroline logo chegou a ter uma grande amizade com a irmã do Blake, apesar de que lhe foi difícil postergar cada
uma das vezes que ela sugeriu ir passear em Bournemouth. Havia muita gente que podia reconhecer Caroline na pequena cidade. Por não mencionar o fato de que Oliver aparentemente pregara o pôster com seu retrato em todas as praças, e Blake lhe informou que a última vez que fora à cidade, deu-se conta que estavam oferecendo agora uma recompensa pela volta de Caroline sã e salva. A Caroline não agradaria explicar isso a Penélope. Entretanto, não via muito ao Blake, ele nunca perdia a hora do chá, era a única oportunidade de tomar uma refeição decente depois de tudo; mas além disso, ele evitava a companhia de Caroline, salvo pela visita ocasional ao quarto de banho para lhe dar outro livro. E assim transcorria a vida nesta rotina extravagante e ainda assim, estranhamente confortável, até um dia, quase uma semana depois da chegada de Penélope. O trio estava empanturrando-se com uns sanduíches no salão, cada um esperando que os outros não se dessem conta de sua lamentável ausência de boas maneiras. Caroline já ia agarrar seu terceiro sanduíche, Penélope comia o segundo, e Blake deslizava o sexto dentro de seu bolso, quando ouviram pisadas que soavam no vestíbulo. —Me pergunto quem será? — perguntou Penélope, ruborizando ligeiramente quando uma migalha saía voando de sua boca. Sua pergunta recebeu a resposta um momento depois, quando o marquês de Riverdale entrou com longos passos na sala. Observou o panorama, piscou surpreso e disse: —Penélope, que gosto ver-te, não tinha nem ideia de que conhecesse Caroline.
Capítulo 18
Ar-is-tol-o-gy (substantivo). A arte ou a ciência de comer. Como um campo de investigação e estudo, a aristología (aristology) é extremamente menosprezada. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent Fez-se silêncio absoluto, seguido de uma explosão de falatório nervoso tão forte e violento, que de fato, Perriwick colocou sua cabeça na sala para ver que estava acontecendo; o fez com o pretexto de entrar e levar o que restava do chá e as bolachas, o que deu pé a um motim, e Blake, virtualmente arrancou a bandeja de suas mãos antes de tirá-lo do salão. Se Penélope se deu conta de que o marquês de Riverdale foi tão atrevido para chamar à senhorita Dent por seu nome de batismo, ela não mencionou, comentando em vez disso, quão surpresa estava de que eles se conhecessem. Caroline falava muito forte sobre como os Sidwell tinham uma grande amizade com os Dents, e James se achava totalmente de acordo com tudo o que ela dizia. A única pessoa que não se adicionava à farra era Blake, apesar de que emitiu um forte gemido; não sabia o que era pior, o fato de que James tivesse chegado e quase voasse para Caroline, ou a nova e aguda atividade como casamenteira que cintilava nos olhos de sua irmã. Agora que ela descobrira que a família de Caroline estava de algum modo (embora fosse tênue) conectada com a do marquês, obviamente decidira que Caroline seria um excelente par para Ravenscroft. Ou isso, pensou ele com desagrado, ou decidira concentrar suas prodigiosas artes casamenteiras para Caroline e James. Em definitivo, Blake resolveu que isto ia se converter em um verdadeiro e colossal desastre. Seus olhos realizavam um lento varrido por toda a sala, observando a Penélope, James e Caroline, e pensou que quão único o mantinha controlado para não desatar sua violência era que não podia decidir a qual deles estrangular primeiro. —Oh, já era hora, Caroline — estava dizendo James, desfrutando agora, evidentemente. — Quase cinco anos, acredito; está muito diferente desde a última vez que nos vimos. —Seriamente? — perguntou Penélope — Tanto? Posto nessa difícil situação, James balbuciou durante um momento, e disse:
—Bom, seu cabelo está mais longo, e... —Seriamente? — disse Penélope outra vez. — Que interessante, deve ter tido um cabelo muito curto, Caroline, porque agora não está muito longo. —Foi um acidente — improvisou Caroline. — "Tive que cortá-lo totalmente". Blake mordeu o lábio contendo-se para não lhe pedir que lhes contasse o "acidente". —Oh, sim, isso lembro — disse James com grande entusiasmo. — Algo referente a mel e ao pássaro de seu irmão. Caroline tossiu sobre o chá, e enganchou um guardanapo de tecido para não cuspi-lo todo sobre Blake. —Acreditei que não tinha irmãos nem irmãs — disse Penélope enrugando sua fronte. Caroline limpou a boca, reprimindo a urgência de emitir uma risada nervosa e disse : —Em realidade, era o pássaro de meu primo. —Isso — disse James, dando uma palmada na fronte — Que parvo sou. Como se chamava? —Percy. —Meu bom Percy, como vai? Ela sorriu mal-humoradamente. —Como sempre, temo. Faço o possível por evitá-lo. —Isso é provavelmente um bom método de atuação — conveio James. — Recordo-o como o tipo de gente de coração mesquinho, sempre puxando o cabelo da gente, mas como... —Riverdale! — disse Penélope com desaprovação. — Está falando de um parente da senhorita Dent. —Oh, não me importa — assegurou-lhe Caroline. — Estaria encantada de deserdar ao Percy. Penélope sacudiu sua cabeça com grande confusão e olhou a seu irmão com uma expressão fracamente acusadora. —Não posso acreditar que não me contasse que nossa querida Caroline tem amizade com Riverdale. Blake deu de ombros e se obrigou a relaxar os punhos. —Não sabia. Perriwick entrou na sala sem a obstrução que era característica, e começou a retirar o que
restava do meio-devorado lanche. —NÃO! — Gritaram Blake, Penélope e Caroline em uníssono. James os olhou com curiosidade e desconcerto. —Algo está errado? —Estamos só... — disse Penélope. —Um pouco... — interrompeu Caroline. —Famintos — terminou Blake com ênfase. James piscou. —Já vejo. Penélope encheu o seguinte momento de calma dirigindo-se a James e perguntando: —Se alojará conosco, senhor? —Foi o que pensei, sim, mas só se houver um quarto de sobra para mim — ele deu uma olhada em Caroline — não me dei conta que a senhorita Dent estava aqui. Penélope quebrou totalmente sua fronte enrugando-a. —Mas certamente percebeu que a senhorita Dent só nos visita de dia, ela vive a quase uma milha daqui. —Papai comprou uma casa de veraneio perto de Bournemouth o outono passado — soltou Caroline bruscamente, temo que ainda não conseguimos informar a todo mundo da mudança. —Hmmm... — meditou Penélope, entrecerrando seus olhos por momentos. — tinha a impressão de que você viveu em Bournemouth durante algum tempo. Caroline sorriu fracamente. —Visitávamos muito frequentemente. —Sim — disse Blake, pensando que deveria fazer algo para salvar a situação, mesmo estando muito furioso com Caroline e James. —Não disse que seu pai alugou a casa durante algumas temporadas antes de comprá-la? Caroline fez um gesto afirmativo. —Assim é, exatamente. Blake lhe lançou o mais arrogante dos sorrisos. —Possui uma memória extraordinária.
—Disso não tenho a menor dúvida. Houve um enorme e embaraçoso silêncio, e logo Caroline ficou de pé. —Teria sido melhor conseguir uma casa. Está se fazendo tarde, e... ah... acredito que o cozinheiro está preparando algo especial para jantar. —Que afortunada — murmurou Penélope. —Perdão? —Não, nada —disse Penélope rapidamente lançando um olhar entre James e Blake. — Mas estou segura de que um destes dois cavalheiros estará encantado de acompanhá-la. —Em realidade, não é necessário. Não está muito longe. James saltou. —Tolices, eu adoraria passear com você. Estou seguro de que há uma grande quantidade de temas para pôr em dia. —Sim — assentiu Caroline. — Provavelmente muito mais do que nunca se imaginou. No momento em que a porta se fechou atrás deles, Caroline se voltou para James e disse: —Tem algo comestível em sua carruagem? —Um pouco de pão e queijo que trouxe comigo da estalagem, por quê? Mas Caroline já estava revolvendo dentro do veículo. —Onde está? — perguntou jogando para trás a cabeça. —Por Deus, mulher, não estiveram dando de comer? —Em realidade, não; e é pior para Penélope e Blake, embora ultimamente tenho sentido um pouco de compaixão por eles. James se meteu dentro e agarrou um pedaço de pão de uma bolsa que havia no assento. —Que diabos está acontecendo? —Mmmble yyy mmmque. —Perdoa? Ela engoliu a comida. —Contarei-lhe isso em um momento. Tem algo de beber? Ele tirou um pequeno frasco de seu bolso. —Só um pouco de brandy, mas não acredito que isso seja o que você...
Mas ela já o pegara e tomara um gole. James esperou pacientemente enquanto ela tossia, balbuciava e se calava, então disse : —Estava dizendo que não acreditava que o brandy fosse precisamente o que você necessitava. —Que disparate — disse ela com voz rouca — qualquer líquido me serve. Ele voltou a agarrar o frasco, enroscando a tampa, e disse: —Suponho que me contará por que os três estão magros e esfomeados. E por que diabos está aqui Penélope? Ela arruinará toda a operação. —Então lhe deram permissão em Londres para continuar com seus planos? —Não vou responder a uma só de suas perguntas até que você responda às minhas. Ela deu de ombros. —Fingiremos passear então. Temo que isto nos poderá levar uma grande quantidade de tempo. —Fingir passear? —Naturalmente vai levar-nos uma hora me levar de volta ao quarto de banho do Blake. A boca do James se abriu de repente. —O quê? Ela suspirou. — Prefere a versão longa ou a versão curta? —Como devo te acompanhar de alguma forma durante uma hora até o quarto de banho do Ravenscroft, optarei pela versão longa; de toda forma, promete ser mais que interessante. Ela saltou fora da carruagem, segurando com força o pedaço de queijo que encontrou com o pão. —Não tem nem ideia. Duas horas mais tarde, Blake estava de muito mau humor. Estava muito enfurecido, de fato. James e Caroline se foram durante muito tempo (durante mais tempo que lhes teria levado chegar ao quarto de banho). Blake se amaldiçoava. Inclusive seus pensamentos estavam começando a parecer absurdos. Mesmo assim, James só precisava passar uma hora para continuar com o engano de acompanhar a Caroline a sua casa. Não é que ninguém, inclusive Caroline, tivesse ideia do longe que se supunha que estava sua casa, mas ao Blake nunca levou mais de uma hora ir procurá-la para o chá. Passou tanto tempo andando daqui para lá em seu quarto de banho, que Penélope acreditou que padecia de algum tipo de cruel doença estomacal.
Ao final, enquanto ele se encarapitava na borda do lavabo, ouviu risadas e pegadas que vinham das escadas. Saltou ao chão, fechando sua boca em uma linha sombria e cruzou os braços. Um momento mais tarde a porta se abriu de repente, e Caroline e James quase caíram, ambos rindo tão forte, que mal podiam manter-se de pé. —Onde diabos estiveste? — exigiu Blake. Eles o olharam como se tentassem lhe responder, mas ele não podia compreender o que diziam entre as risadas. —E de que diabos estão rindo? —Ravenscroft, fizeram coisas realmente estranhas — James ofegava. —- Mas isto... — ele fez um gesto com o braço no quarto de banho — não tem comparação. Blake unicamente lhe olhou com o cenho franzido. —Embora— disse James dirigindo-se a Caroline. — Você fez de fato um estupendo trabalho mudando este lugar na casa, a cama tem um toque encantador. Caroline olhou para baixo ao montão de mantas e travesseiros limpos que colocara no chão. —Obrigado. Faço o melhor que posso, com o que tenho para utilizar— ela voltou a rir nervosamente. —Onde estivestes? — repetiu Blake. —Poderia colocar mais algumas velas — disse Caroline a James. —Sim, posso ver que aumenta muito a escuridão aqui — respondeu ele. —- Essa janela é muito pequena. —Onde ESTIVESTE? — rugiu Blake. Caroline e James o olharam com idêntica expressão em branco. —Está nos exortando? — perguntou James. —Perdão? — disse Caroline justo no mesmo instante. —Onde — disse Blake através dos dentes apertados — estiveste? Olharam-se e encolheram os ombros. —Não sei — disse James. —Oh, aí fora passeando — acrescentou Caroline. —Durante duas horas? —Eu precisava lhe contar todos os detalhes — disse ela. —Depois de tudo, você não gostaria
que dissesse algo inapropriado a Penélope. —Eu podia lhe haver contado todos os dados oportunos em menos de quinze minutos — resmungou Blake. —Estou seguro de que podia fazê-lo — respondeu James — mas não seria tão entretido. —Bem, Penélope quer saber onde estiveste — disse Blake irritado. — Quer fazer uma festa em sua honra, Riverdale. —Mas eu acreditei que pensava ir-se em dois dias— disse Caroline. —Pensava - interrompeu-a bruscamente. — Mas agora que nosso querido amigo James está aqui, alongará sua permanência; diz que não é todos os dias que hospeda a um marquês. —Ela está casada com um maldito conde — disse James. — O que lhe importa? —Não lhe importa — respondeu Blake. — O que ela quer é nos casar a todos. —A quem? —Preferivelmente a cada um de nós. —Aos três? — Caroline passou o olhar de um homem a outro. — Não é isso ilegal? James riu. Blake lhe lançou o mais desdenhoso dos olhares, e então disse: —Temos que nos desfazer dela. Caroline cruzou os braços. —Nego-me a fazer algo contra sua irmã, ela é uma pessoa amável e gentil. —Já! — sibilou Blake — gentil, sandices; é a mulher mais teimosa e intrometida que conheço, exceto possivelmente, você. Caroline lhe mostrou a língua. Blake a ignorou. —Precisamos encontrar uma maneira de conseguir que volte para Londres. —Seria fácil falsificar uma mensagem de seu marido — disse James. Blake negou com um gesto. —Não é tão fácil como acredita, ele está no Caribe. Caroline sentiu uma pontada de tristeza. Ele havia descrito uma vez seus olhos como da cor da água nos trópicos. Era uma lembrança que levaria consigo o resto de sua vida, como se cada vez fosse mais óbvio que nunca, possuiria a esse homem.
—Vale, então — disse James — e se a nota é de sua governanta ou seu mordomo? Algo dizendo que a casa está em chamas. —Isso é muito cruel — disse Caroline. — Ela se preocuparia. —Esse é o propósito — acrescentou Blake. — Queremos que se preocupe o suficiente para ir. —Não poderíamos nos referir a uma inundação? — perguntou ela. — É muitíssimo menos preocupante que um incêndio. —Enquanto isso — disse James. — Por que não lançamos uma praga de roedores? —Então nunca irá! — exclamou Caroline. — Quem quereria ir a uma casa com ratos? —Algumas mulheres que conheço o fazem— disse Blake secamente. —Isso é algo terrível! —Mas certo — acordou James. Nenhum disse nada durante uns minutos, e logo Caroline sugeriu: —Suponho que nós poderíamos continuar como estávamos — Não foi tão mal estar aqui no quarto de banho agora que Blake começou a me trazer material de leitura. Embora apreciaria se pudéssemos fazer novos acertos no que se refere as refeições. —Posso te recordar— disse Blake. — Que em duas semanas Riverdale e eu lançaremos nosso ataque sobre o Prewitt? —Ataque? — exclamou Caroline sinceramente horrorizada. —Ataque, prisão — disse James com um gesto de sua mão. — Equivale ao mesmo. —Em qualquer caso — disse Blake em voz alta, tentando captar sua atenção. — Quão último precisamos é a presença de minha irmã — dirigiu-se a Caroline. —Importa-me pouco se passa as próximas duas semanas encadeada a meu quarto de banho, mas... —Que hospitaleiro por sua parte — murmurou ela. Ele a ignorou. —Por minha vida se permito que Prewitt me escorra entre os dedos por causa do inoportuno desejo de minha irmã de ver-me casado. —Não me agrada a ideia de fazer uma brincadeira cruel a Penélope — disse Caroline. — Mas estou segura de que se os três nos unirmos, podemos imaginar algum tipo de plano aceitável.
—Tenho a sensação de que sua definição de "aceitável" e a minha são imensamente diferentes — comentou Blake. Caroline lhe olhou com o cenho franzido, logo se dirigiu ao James e sorriu. —Você, o que acredita James? Ele deu de ombros, olhando com mais interesse na forma em que Blake olhava aos dois com raiva, que nas palavras dela. Mas isso foi antes que ouvissem alguém golpeando a porta. Ficaram gelados. —Blake! Blake! Com quem está falando? Penélope. Blake começou a mover-se freneticamente para a porta que estava ao lado das escadas, enquanto James empurrava Caroline para fora. Mal a porta se fechou atrás dela, Blake abriu a porta do quarto de banho, e com uma expressão totalmente doce disse: —Sim? Penélope olhou para dentro, seus olhos passaram de um canto a outro. —O que passa aqui? Blake piscou. — Desculpe? —Com quem estava falando? James saiu rapidamente de detrás de um biombo. —A mim. Os lábios de Penélope se abriram com surpresa. —O que faz aqui? Não me dava conta que já havia retornado. Ele se apoiou contra a parede, como se fosse o mais natural do mundo estar no quarto de banho de Blake. —Voltei faz dez minutos. —Tínhamos uns assuntos que discutir — acrescentou Blake. —No quarto de banho? —Traz-me lembranças de Eton e tudo isso - disse James com um sorriso devastador. —Seriamente? — disse Penélope não muito convencida.
—Ninguém tinha privacidade ali, já sabe — disse Blake. — Era verdadeiramente desumano. Penélope apontou para o montão de cobertores no chão. —O que faz isso aqui? —O quê? — perguntou Blake, retardando a resposta. —Os cobertores. —Esses? Não tenho nem ideia. —Tem um montão de cobertores e travesseiros no chão de seu quarto de banho e não sabe por quê? —Suponho que Perriwick poderia as haver deixado aí. Talvez quer dizer que as limpou. Penélope franziu o cenho. —É um mentiroso aborrecível. —Em realidade, minto muito bem, é só que me falta um pouco de prática. —Então admite que está mentindo? —Não acredito ter admitido tal coisa. Ele se voltou para James com um olhar cândido. —Verdade, Riverdale? —Acredito que não. Você o que acredita, Penélope? —Eu acredito — resmungou Penélope. — Que nenhum dos dois vai deixar este quarto até que me conte o que está acontecendo. Caroline escutava a conversação através da porta, contendo a respiração, enquanto Penélope interrogava aos dois cavalheiros com a habilidade de um verdugo. Caroline expulsou um suspiro silencioso e se sentou. Pelo que acontecia no quarto de banho, poderia estar metida no vão da escada durante horas. Certamente, Penélope não apresentava sinais de dar-se por vencida no interrogatório. Ao mesmo tempo que olhava o ponto de luz, decidiu descartar o fato de que o vão da escada estava tão escuro como a fuligem, poderia ser apanhada na mais extravagante das situações, mas preferia estar muda e não ter nem cabeça nem pés, que estar com os Prewitt. Céus! Se não tivesse escapado, provavelmente agora seria uma Prewitt. Que pensamento tão horrível. Mas não tão horrível como o que aconteceu a seguir. É possível que ela tivesse revolvido o pó quando se sentou, ou podia ser que os deuses simplesmente se aliaram contra ela, mas seu nariz
começou a sentir cócegas. Depois lhe começou a arder. Tampou com seu dedo indicador uma das fossas nasais, mas não deu resultado. O comichão picor, comichão, picor. Ah... Ah... Ah... AH-CHISSS! —O que foi isso? — perguntou Penélope. —O que foi o que? — respondeu Blake ao mesmo tempo que James começava a espirrar incontrolavelmente. —Para de fazer o ridículo — disse Penélope bruscamente a James. — Ouvi espirrar a uma mulher, e a ouvi claramente. James começou a espirrar fazendo muito ruído. —Para! — ordenou Penélope caminhando rapidamente para a porta das escadas. Blake e James saltaram violentamente para ela, mas foi muito tarde. Penélope já abrira a porta bruscamente. E aí, no patamar, estava sentada Caroline, encolhida, com todo seu corpo dolorido pelos espirros.
Capítulo 19
Lat-i-tu-di-nar-i-an (adjetivo). Permitir, favorecer, ou caracterizar liberdade de opinião ou ação. Não insistir na justiça estrita conformando-se com um código estabelecido. Em Bournemouth (ao contrário que em Londres), a gente pode atuar de forma mais liberal (latitudinarian), inclusive quando na comarca, há certas normas de conduta que alguém deve acatar. — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. —Você! — acusou Penélope. — O que está fazendo aqui? Mas sua voz se perdeu por baixo da de Blake, que estava gritando a Caroline. —Por que diabos não desceu correndo as escadas quando nos ouviu vir? Sua única resposta foi um espirro. James, que normalmente não se irritava por nada, elevou uma sobrancelha e disse: —Parece que está um pouco incapacitada. Caroline espirrou outra vez. Penélope se dirigiu a James com expressão furiosa. —Suponho que você está de algum modo unido ao engano também. Ele deu de ombros —De algum modo. Caroline espirrou. —Pelo amor de Deus — disse Penélope de mau humor — tirem-na do vão da escada; evidentemente há algo daninho entre o pó que lhe está provocando convulsões. —Ela não tem um ataque convulsivo absolutamente — disse Blake — só está espirrando. Caroline espirrou. —Bom, dá igual o que seja, leva-a a seu quarto. Não! A seu quarto não, leva-a a meu quarto. Penélope colocou as mãos em seus quadris e os olhou jogando fogo pelos olhos primeiro a um, e depois ao outro. —E que diabos está acontecendo aqui? Quero que me informem da situação neste mesmo
momento. Se alguém não... —Se me permitir... — interrompeu James. —Fecha a boca, Riverdale — Blake o cortou bruscamente enquanto levantava Caroline — falas como o maldito mordomo. —Estou seguro de que Perriwick estaria mais que encantado com a comparação — disse James — entretanto, simplesmente ia comentar a Penélope que não tem nada de mau que Caroline esteja em seu quarto, dado que ela e eu estamos também presente. —Muito bem — concedeu Penélope— coloca-a em seu dormitório Blake, depois quero saber que é o que está passando; e não mais sandices sobre mel e pássaros. Caroline espirrou. Blake se dirigiu a sua irmã e lhe sugeriu: —Poderia trazer um pouco de chá? —Já! Você acredita que vou deixá-la só aqui com vocês dois? —Eu trarei um pouco de chá — interrompeu James. Mal se foi, Penélope entrecerrou os olhos ao Blake e Caroline e perguntou: —Têm um romance? —Não! — Caroline exclamou entre espirros. —Então será melhor que comece a explicar sua presença. A julguei como a uma senhorita com uma personalidade de moral severa; e se requer toda minha tolerância e uma mentalidade aberta para não mudar essa opinião. Caroline olhou ao Blake. Ela não ia revelar seus segredos sem sua permissão; mas ele unicamente gemeu, revirou os olhos e disse. —Poderíamos também lhe dizer a verdade. Deus sabe que à larga o vai descobrir. A história completa levou vinte minutos. Provavelmente só teria requerido quinze, exceto porque James voltou com o chá (que felizmente ia acompanhado com pães-doces frescos) e a história, naturalmente, fez-se mais lenta enquanto eles lanchavam. Penélope não perguntou nada durante o relato exceto: —Leite? ou Açúcar? O que em realidade não importava já que ela estava servindo o chá. Blake, James e Caroline entretanto, interromperam-se de forma assombrosa. Apesar disso,
depois de um quarto de hora, e para satisfação de todos, conseguiram relatar o acontecido nas últimas semanas. Quando estavam pela metade, Caroline observou o semblante impassível de Penélope, com uma mescla de curiosidade e temor. Acostumou-se muito à irmã de Blake e lhe rompia o coração em dois pensar que a condessa a isolasse completamente. Mas Penélope os surpreendeu ao murmurar um tranquilo: —Já vejo — seguido de um inclusive mais tranquilo — Hmmm... Caroline se inclinou para frente. James se inclinou para frente. Blake começava a inclinar-se para frente, parou e bufou de desgosto. Estava bem acostumado às táticas de sua irmã. Por fim Penélope respirou profundamente, voltou-se para Blake e disse: —É um bruto por não ter informado à família de suas atividades governamentais, mas não te vou insultar agora. —Que amável de sua parte — murmurou ele. —Seriamente que é uma sorte para ti — continuou ela — que a desconsideração de seu segredo tenha sido eclipsada por um assunto de grave preocupação. —Certo. Penélope o olhou furiosamente enquanto assinalava com seu primeiro dedo ao marquês, e logo outra vez a seu irmão. —Um de vocês — anunciou — vai se casar com ela. Caroline, que esteve examinando com esmero a ponta de seus sapatos para não dizer ao Blake um "lhe disse", sorrindo satisfeita quando Penélope repreendeu a ele sobre seu segredo, sacudiu com força sua cabeça para cima. A visão que lhe esperava não era tranquilizadora. Penélope estava assinalando com seu longo dedo indicador diretamente para ela, e Blake e James ficaram absolutamente brancos. Essa tarde Blake se encontrou mantendo uma conversação extremamente desagradável com sua irmã. Ela o tentava convencer de que se casasse com Caroline com toda a rapidez possível, e ele fez o melhor que podia para ignorá-la. Ele não estava muito preocupado pelas consequências deste último desastre. Jurou que nunca se casaria; Penélope sabia, Caroline sabia, James sabia. Merda, o mundo inteiro sabia. E James não era do tipo que consentia à irmã de seu melhor amigo lhe forçar a fazer algo que não queria fazer. De fato, a única maneira em que Penélope podia garantir que Caroline se casasse com rapidez, seria
contar intrigas e criar um escândalo monumental. Blake estava seguro de que isso não era um perigo. Penélope estaria desejosa de criar uma pequena intriga, mas não o faria para arruinar à mulher que agora chamava" minha querida, minha mais próxima amiga" Penélope podia, entretanto, esforçar-se por criar um mal-estar geral e incomodar até que todos em Seacrest Manor os mandassem aos diabos. E no caso do Blake, ela estava triunfando habilmente. —Blake — disse — sabe que necessita uma esposa. —Sei que não a necessito. —Caroline esteve irrevogavelmente comprometida. —Só se você decide contar intrigas em Londres. —Isso não vem ao caso. —Esse é exatamente o assunto — resmungou Blake. — Esteve vivendo aqui para proteger a segurança nacional. —Oh, por favor — disse Penélope desdenhosamente — ela está vivendo aqui para escapar das garras desse tutor dela. —Um tutor que é uma ameaça para a segurança nacional — respondeu Blake — e Caroline esteve nos ajudando em sua captura. Um esforço do mais nobre, se for o que me pergunta. —Eu não lhe perguntei isso — disse Penélope sorvendo ar pelo nariz. —Deveria — cortou-lhe Blake bruscamente — a presença de Caroline aqui é vital para a segurança da Inglaterra, somente o pior dos mequetrefes antipatrióticos usaria isso para arruinar sua reputação. Desta maneira ele estava exagerando um pouco sobre a segurança nacional. Os momentos desesperados exigiam de vez em quando medidas desesperadas. James escolheu esse momento para divagar. —Suponho que ainda está dando voltas ao futuro de Caroline — disse. Ambos dirigiram seus olhares incomodados em direção a ele. —Vale— disse James, estirando seus braços como um gato e bocejando enquanto se afundava em um sofá. — Estive pensando em me casar com ela. —Oh, é fantástico! —exclamou Penélope aplaudindo, mas seu comentário foi afogado pelo grito do Blake.
—O QUE? James deu de ombros. —Por que não? Algum dia preciso me casar. —Caroline merece a alguém que a ame — disse Blake mordazmente. —Estou seguro que eu lhe agrado. Isso é mais do que muitos matrimônios podem afirmar. —Isso é certo — disse Penélope. —Você — disse Blake bruscamente — te cale. E você — Dirigiu seu furioso rosto para o marquês, mas o discurso inteligente lhe esfumou, assim só bramou. —Te cale também. —Muito bem — James ria entre dentes. Blake o olhou com ferocidade, sentindo-se totalmente capaz de matar. —Me fale mais — rogou-lhe Penélope. — Acredito que Caroline será uma excelente marquesa. —Efetivamente o seria — respondeu James— e faríamos um casal muito conveniente. Preciso me casar em algum momento, e parece que Caroline precisa casar-se logo. —Não há razão para que ela se case — grunhiu Blake — enquanto minha irmã mantenha sua boca fechada. —Penélope seguro que é discreta — continuou James com uma voz que Blake estava começando a encontrar irritantemente alegre — mas ela não pode garantir que ninguém se dará conta de nosso peculiar acerto. Caroline poderia não ser um membro da alta sociedade, mas isso não quer dizer que ela mereça que seu nome seja arrastado pela lama. Blake saltou sobre seus pés e bramou: —Não te atreva a me acusar de querer manchar seu bom nome. Tudo o que tenho feito... —O problema — interrompeu Penélope com suavidade — é que você não tem feito nada. —Nego-me a me sentar aqui e... —Está de pé —assinalou Penélope. —James — disse Blake com uma voz perigosamente baixa — se não me prender, certamente cometerei muitíssimos crimes nos próximos dez segundos, sendo que me arrependa menos, no que concerne à dolorosa morte de minha irmã. —Er... Penélope — disse James — se eu fosse você, mudaria de sala para estar fora de seu alcance, acredito que o diz a sério. —Ora! — foi a resposta de Penélope — Só está zangado porque sabe que estou certa.
Um músculo começou a crispar-se na mandíbula de Blake e nem sequer se incomodou em olhar ao James quando disse: —Você não tem uma irmã, verdade, Riverdale? —Não. —Te considere afortunado Então deu meia volta e se afastou com passo majestoso. James e Penélope olharam para a porta pela que Blake acabava de sair até que Penélope finalmente piscou várias vezes, dirigiu-se ao James e lhe disse: —Não acredito que esteja muito agradado conosco agora mesmo. —Não. —Falava você a sério? —Sobre me casar com Caroline? Penélope moveu a cabeça afirmativamente. —Dificilmente faria uma declaração assim se não estivesse disposto a cumpri-la. —Mas você não quer casar-se com ela — disse Penélope entrecerrando os olhos. —Certamente não da mesma forma que Blake. —Hmmm... — ela cruzou o quarto e se sentou. —É bastante perspicaz, Riverdale, mas seu plano pode não sair bem. Blake pode ser muito obstinado. James se sentou frente a ela. —Um fato de que sou totalmente consciente. —Estou segura que o é — ela curvou seus lábios, sem ser um sorriso em realidade. —E é também consciente de que eu também compartilho essa peculiaridade? —Quer dizer, obstinação? Minha querida Penélope, correria nu por toda a Inglaterra ao acabar o inverno, só para escapar de batalhas de vontades como a sua. —O diz estupendamente, mas se sua pequena declaração fracassa e não produz os resultados desejados, você se casará com Caroline. —Não duvido que manterá uma pistola em minhas costas até que o faça. A voz de Penélope se elevou.
—Não é uma brincadeira, Riverdale. —Sei, mas queria mesmo dizer o que disse antes, preciso me casar eventualmente, e Caroline tem muito melhor presença que provavelmente a que encontre se for caçar uma esposa em Londres. —Riverdale! Ele deu de ombros. —É certo, eu gosto bastante de Caroline, e se tiver que me casar com ela porque Blake é muito covarde para fazê-lo ele mesmo, bem, que assim seja. Francamente, posso pensar em piores destinos. —Que confusão — suspirou Penélope. —Não importa, Blake se adiantará - disse James fazendo uma onda com sua mão. - Morreria ao ver-me casado com ela. —Espero que tenha razão, Deus sabe que necessita um pouco de felicidade. Penélope suspirou e relaxou suas costas contra o respaldo de sua cadeira. —Só quero que seja feliz. É pedir muito? Fora, na porta, Caroline permanecia com a mão sobre a boca aberta, acreditou que sua humilhação era completa quando Penélope pediu que alguém (qualquer!) se casasse com ela. Mas isto... Afogou um soluço. Isto ia além da humilhação, a humilhação era algo com o que ela podia viver, algo que podia aguentar e com o tempo, deixar para trás. Mas isto era diferente, algo dentro dela estava morrendo, e Caroline não estava segura se era seu coração ou sua alma. Não importava o que, ela se deu conta enquanto corria de volta a seu quarto. Tudo o que importava era que estava lhe fazendo mal, e a dor perduraria para o resto de sua vida. Levou duas horas, mas finalmente Caroline foi capaz de recompor-se. Um pouco de água fria reduziu o inchaço ao redor de seus olhos, e alguns minutos de profundos suspiros conseguiram fazer desaparecer o tremor em sua voz. Infelizmente, não havia muito que ela pudesse fazer para que seu coração não se refletisse em seus olhos. Encaminhou-se para as escadas e não se surpreendeu ao encontrar James e Penélope ainda sentados no salão. Sua conversação chegava até o vestíbulo e Caroline agradeceu ouvir que eles mudaram a outros temas mais correntes. Estavam discutindo de teatro quando ela chegou à porta, e chamou brandamente sobre a dobradiça da porta. James se levantou imediatamente quando a viu. —Posso entrar? — perguntou ela. —É obvio — disse Penélope — aqui, sente-se a meu lado.
Caroline negou com a cabeça. —Estou melhor de pé, obrigado. —Como queira. —Sabem onde está Blake? — perguntou Caroline com uma postura tão régia como a de uma rainha. —Desejo dizer algo só uma vez. —Estou justo aqui. Caroline voltou sua cabeça de repente. Blake estava de pé junto à porta, seu corpo estava um pouco rígido e fatigado ao mesmo tempo. Suas faces mostravam um pouco de cor e ela se perguntou se esteve passeando ao frio ar da noite. —Bom, eu gostaria de dizer algo, se puder. —Por favor — disse Blake. Caroline avaliou com o olhar a cada um dos ocupantes do salão, e finalmente disse: —Não necessito um marido. Em realidade, não necessito um marido que não necessite uma esposa. Tudo o que desejo é que me permita permanecer aqui, às escondidas, até que faça vinte e um anos. —Mas Caroline! — protestou Penélope — estes cavalheiros se comprometeram com você, deve permitir que um deles faça o correto. Caroline tragou saliva. Não tinha muito na vida, mas possuía seu orgulho e não ia deixar que Blake Ravenscroft a humilhasse mais do que já o fez. Olhou-o diretamente, mesmo enquanto dirigia suas palavras para sua irmã. —Lady Fairwich, estes cavalheiros não fizeram nada para me comprometer. —Nada? — perguntou Blake. Caroline o olhou furiosamente, perguntando-se que diabos o teria impulsionado a falar, quando era tão eloquente para esquivar o matrimônio. —Nada que signifique algo — disse ela mordazmente. Seus olhos se encontraram, e ambos sabiam que ela se referia a seu encontro na praia. A diferença era que só Caroline sabia que estava mentindo. Seu tempo com Blake significou tudo para ela. Cada minuto de cada encontro estava guardado em seu coração. Ela piscou para retirar as lágrimas; logo teria partido e tudo o que ela teria para animar-se eram
as lembranças. Nenhum homem que a sustentasse, nenhum amigo que brincasse com ela, nenhuma casa na costa que, em umas poucas semanas, chegasse a ser sua casa. Mas de todas as coisas que perderia, a ausência que mais lhe doeria seria o sorriso de Blake, era tão estranho, mas quando seus lábios se estiravam para os lados... e depois, quando verdadeiramente ria, a pura alegria do som a fazia querer cantar. Mas ele não sorria agora. Seu rosto era severo, olhava-a furiosamente, como se fosse algum tipo de antídoto, e ela sabia que se não saía da sala nesse instante ia parecer uma exímia tola. —Perdão — disse rapidamente apressando-se para a porta. —Não pode ir agora! — exclamou Penélope ficando em pé de um salto. Caroline não girou enquanto lhe dizia. —Falei o que devia falar. —Mas aonde vai? —Para fora. —Caroline. Era a voz de Blake, e só esse som fez que seus olhos se enchessem de lágrimas. —O que? — Ela conseguiu dizer. Possivelmente foi uma resposta brusca, mas era o melhor que ela podia fazer. —Lá fora está escuro. Ou não se deu conta? —Vou olhar as estrelas. Ela ouviu suas pegadas e sentiu a mão dele sobre seu ombro, afastando-a lentamente da porta. —Está nublado — disse com voz surpreendentemente amável — não te será possível ver as estrelas. Ela nem sequer se voltou para lhe dizer. —Sei que estão aí, isso é tudo o que importa. Blake fechou os olhos enquanto ela saía da sala, por alguma razão não querendo ver como se retirava. —Agora olhe o que fez — ouviu que dizia sua irmã — quebrou o coração dessa pobre garota. Ele não respondeu, não sabendo, diabos, não querendo saber se as palavras de sua irmã eram certas. Se ele destroçou seu coração, era o pior dos bastardos. E se não era certo, gostaria de dizer que Caroline não importava a ele, que sua única noite de paixão não significou nada para ela. E que
não era apenas doloroso de suportar. Não queria pensar no que ele sentia por ela, não queria analisá-lo, classificá-lo por partes ou tentar etiquetá-lo. Porque lhe aterrorizava que se o fizesse, a única palavra que lhe seria possível descrever seria amor e isso seria a brincadeira mais cruel. Blake abriu os olhos justo no momento de ver a expressão no rosto de Riverdale quando lhe dizia: —É um asno, Ravenscroft. Blake não disse nada. —Marabelle está morta — sibilou James. Blake se voltou para seu amigo com tal violência que Penélope deu um salto. —Não a mencione — disse com voz ameaçadora - ela não tem lugar nesta conversa. —Exatamente — respondeu James — ela está morta e você não pode levar seu luto sempre. —Você não sabe — disse Blake sacudindo sua cabeça — não sabe o que é amar. —E você sabe tudo muito bem — murmurou James — de fato, soubeste-o duas vezes. —Blake — disse Penélope com suavidade, pondo sua mão sobre seu braço. — Sei que a amava, todos a amávamos, mas Marabelle não gostaria que atuasse assim, você é só uma casca, enterrou sua alma junto à dela. Blake tragou saliva convulsivamente, querendo mais do que tudo, sair correndo da sala, mas de algum modo, seguia parado em seu lugar. —Deixea-a ir — sussurrou Penélope — já é hora. E Caroline te ama. Sua cabeça girou de repente. —Ela disse isso? Penélope queria mentir. Ele podia ver em seus olhos, mas finalmente ela negou com sua cabeça. —Não, mas é fácil de ver. —Não lhe farei mal — prometeu ele — ela merece algo melhor. —Então te case com ela — rogou-lhe Penélope. Ele fez um gesto negativo. —Se me casar com ela... Deus, a machucaria de mais formas do que possa imaginar. —Diabos! — prorrompeu James — deixa de ser tão teimoso, tem medo de amar, e tem medo de viver, o único que não teme é à morte; darei-te uma noite, uma só noite.
Blake entrecerrou seus olhos. —Para que? —Para reorganizar sua mente, mas te prometo isto: Eu me casarei com Caroline se você não o fizer. Assim, pergunte a ti mesmo se será possível suportar isso durante o resto de sua vida. James deu meia volta e saiu com passo majestoso da sala. —Ele não está fazendo uma ameaça frívola — disse Penélope — entusiasmou-se com ela. —Sei — disse Blake bruscamente. Penélope lhe fez uma leve inclinação de cabeça, e se encaminhou para a porta. —Deixarei-te só com seus pensamentos. Isso, pensou Blake amargamente, era a última coisa que ele queria.
Capítulo 20
Hal-cy-on (adjetivo). Repousado, quieto, pacífico, sereno. Não olharei atrás nesses dias tão tranquilos (halcyon). — Do dicionário pessoal de Caroline Trent. Caroline estava sentada sobre a areia da praia, contemplando o céu. Como Blake lhe dissera, estava nublado, assim tudo o que ela podia ver era o pálido e impreciso fulgor da lua. Rodeou com os braços seus joelhos flexionados e se aconchegou contra a brisa fria, com os sapatos a seu lado. —Não importa — dizia a si mesma, movendo os dedos de seus pés na areia grossa — simplesmente não importa. —O que não importa? Ela levantou a cabeça com um movimento brusco. Blake. —Como chegou até aqui sem que te ouvisse? Ele indicou com a mão para trás dele. —Há outro caminho cinquenta metros mais atrás. —Oh, bom, se tiver vindo para me inspecionar, verá que estou perfeitamente bem, e pode voltar para casa. —Caroline — clareou sua garganta — há algumas coisas que preciso te contar. Ela desviou o olhar. —Não me deve nenhuma explicação. Sentou-se junto a ela, adotando a mesma postura inconscientemente, acomodou seu queixo sobre seus joelhos e disse: —Havia razões pelas quais jurei que nunca me casaria. —Não quero ouvi-lo. —Ainda assim, lhe preciso dizer isso. Ela não disse nada, assim que ele continuou.
—Quando Marabelle morreu... — sua voz se contraiu. —Não tem que fazer isto — disse ela rapidamente — por favor. Ele a ignorou. —Quando ela morreu, acreditei, senti, Deus... é tão duro dizer com palavras. Ele soprou; um monte de angústia nessa rajada de ar. —Estava morto por dentro. Essa é a única forma de descrevê-lo. Caroline tragou, mal podia resistir ao impulso de lhe oferecer o consolo de colocar sua mão sobre o braço dele. —Eu não posso ser o que te faz falta. —Sei - disse ela asperamente — não posso competir com uma mulher morta, depois de tudo. Ele se sobressaltou por suas palavras. —Jurei que nunca me casaria. Eu... —Nunca te pedi isso, eu posso ter... Não importa. —Você pode ter o que? Caroline só negou com a cabeça, não disposta a lhe dizer que ela podia ter desejado isso. —Por favor, continua — disse ela com voz distraída. Ele fez um gesto afirmativo, embora estava claro que sentia curiosidade pelo que ela quase dissera. —Sempre me disse mesmo que não podia me casar por respeito a Marabelle, que não queria ser desleal a sua memória, e penso que realmente acreditei. Mas esta noite me dei conta que não era certo. Ela voltou seu rosto para o dele, com mil perguntas em seus olhos. —Marabelle está morta — disse ele com voz sepulcral. — E sei que... Não posso trazê-la de volta. Nunca pensei que poderia, é só que... —É só o que, Blake? — urgiu-lhe com voz baixa e premente. — Por favor, me conte, faz-me compreender. —Sentia que não podia lhe falhar morta, como o fiz em vida. —Oh, Blake, nunca falhaste a ninguém— ela tocou seu braço. — Algum dia terá que te dar conta disso.
—Sei— ele fechou os olhos por um momento — sempre soube, no mais profundo de minha alma. Ela era tão intransigente, não poderia tê-la parado. —Então por que está tão decidido a ser infeliz? —Já não é por Marabelle. É por mim. —Não entendo. —Em algum ponto do caminho, perdi algo de mim mesmo. Não sei se foi o sofrimento ou o despeito, mas deixei de me importar. —Isso não é certo. Conheço-te melhor do que acredita. —Caroline, não sinto nada! — exclamou ele — nada profundo e significativo, ao menos. Não vê que estou morto por dentro? Ela negou com a cabeça. —Não diga isso. Não é certo. Ele aferrou seu ombro com urgente necessidade. —É certo, e você merece mais do que eu te posso dar. Ela fixou os olhos em sua mão. —Não sabe o que está dizendo — sussurrou. —Uma droga que não sei. Afastou-se violentamente dela e se levantou, adotando uma atitude fria enquanto olhava fixamente as ondas. Depois de um momento de silêncio disse: —James disse que se casará contigo. —Já vejo. —Isso é tudo o que tem que dizer? Ela soltou um suspiro exasperado. —O que me quer dizer, Blake? Faça-me saber, e eu lhe direi isso; mas não sei o que quer, nem sequer sei o que eu quero. Ela ocultou o rosto entre os joelhos. Isso era mentira, ela sabia exatamente o que queria, e ele estava de pé a seu lado, lhe dizendo que se casasse com outro homem. Não estava surpresa, mas não esperava que isso doesse tanto. —Ele cuidará de ti — disse Blake em voz baixa.
—Estou segura de que o fará. —Aceitará? Ela o olhou de repente. —Importa-te? —Como pode perguntar isso? —Acreditei que não sentia, que não te importava nada. —Caroline, importa-me seu futuro. É só que eu não posso ser o que você necessita em um marido. —Isso é uma desculpa— ela ficou de pé, em atitude de combate. — É um covarde, Blake Ravenscroft. Começou a afastar-se, mas seus pés se enterravam na areia, e ele pôde alcançá-la rapidamente. —Não me toque! — gritou ela quando ele fechou a mão ao redor de seu braço. —Me deixe sozinha. Ele não a deixou partir. —Quero que aceite a proposta de Riverdale. —Você não tem direito a me dizer o que tenho que fazer. —Sei. Mas ainda assim, estou lhe pedindo isso. Caroline voltou a cabeça; sua respiração era curta, e ofegava ligeiramente, apertou seus olhos fechando-os por um momento enquanto as emoções explodiam em sua mente. —Vá plantar batatas! — conseguiu dizer finalmente. —Não até que tenha sua palavra de que te casará com Riverdale. —Não! — gritou — Não! Não me casarei com ele! Não o amo, e ele não me ama, e isso não é o que eu quero. Ele segurou seu braço fortemente. —Caroline, deve me escutar, Riverdale... —Não! Com uma força nascida da fúria e a angústia, puxou com força o seu braço afastando-se e saiu correndo para a praia. Correu até que seus pulmões arderam, até que seus olhos estiveram tão cheios de lágrimas que ela não podia ver. Correu até que a dor em seu corpo eclipsou finalmente o que
havia em seu coração. Tropeçou sobre a areia, tentando ignorar o som das pegadas do Blake aproximando-se; o corpo dele golpeou violentamente o seu com uma força enorme, fazendo-os cair a ambos ao chão de repente. Caroline ficou tombada sobre suas costas com o corpo do Blake cobrindo-a intimamente. —Caroline — disse ele com fortes ofegos. Ela o olhou com intensidade, seus olhos procuraram grosseiramente algum sinal de que ele a amasse, logo se ergueu tratando de agarrar a parte de trás de sua cabeça e atraiu a boca dele para a sua, beijando-o com todo o amor e desespero de seu coração. Blake tentou resistir. Não podia possuí-la, ele sabia. Ela ia se casar com seu melhor amigo; mas seus lábios eram doces e exigentes, e a pressão do corpo dela contra o seu converteu seu sangue em chamas. Ele sussurrava seu nome uma e outra vez, como um mantra{5}. Tentou ser nobre, tentou afastar-se dela, mas não foi o suficientemente forte para dizer "não", quando a língua dela se achava sobre seus lábios e seus pés nus lhe roçavam ao longo de suas panturrilhas. Suas mãos foram ágeis e rápidas, e lhe tirou o vestido em menos de dez segundos. Colocou-o por debaixo dela para protegê-la da areia, e esse foi o último pensamento racional antes que todo seu ser fosse ultrapassado pela necessidade de possuí-la. —Terei-te — jurava, acariciando-a com as pontas de seus dedos dos pés, desde as panturrilhas até suas coxas. —Terei-te — prometia, puxando com força sua camisa e colocando sua mão sobre o coração dela. —Terei-te — gemia, justo antes que sua boca se apropriasse de seu mamilo. Tudo o que ela dizia era: —Sim. E o coração do Blake remontou. Caroline arqueava suas costas enquanto gritos de desejo escapavam de sua boca, parecia que por cada desejo que ele enchia, criava dois mais, atormentando o corpo dela em um frenesi de necessidade. Ela não estava segura do que fazer, mas sabia que queria sentir a pele dele contra a sua, assim dirigiu suas mãos para os botões da camisa dele, seus movimentos eram rudes e torpes. Não obstante, em algum momento Blake a empurrou a um lado, para rasgar o objeto com um grito selvagem. Um segundo mais tarde, Blake estava em cima dela, o calor de seu peito nu contra o dela, sua boca se inclinava sobre a dela e a devorava por toda a parte. Ela gemia sobre ele, aferrando-se a suas costas, para depois passar suas mãos para baixo, logo que lhe roçando, para o cinto de suas calças. Deteve-se, armou-se de coragem e passou um dedo por
debaixo, tocando a suave pele de suas nádegas. Os lábios do Blake se deslizaram por sua face até a orelha murmurando: —Quero te sentir — contra sua pele; seu fôlego era quente e úmido e muito, muito erótico. Ela pôde sentir cada uma de suas palavras, inclusive mais do que as podia escutar. —Eu também quero te sentir — sussurrou. —Oh, o fará. Você o fará. Deu a volta para separar-se dela, justo o tempo de tirar o resto da roupa, e se colocou sobre ela outra vez; com toda a quente e nua longitude dele, queimando sua pele. As ondas estavam subindo, e a água fria fazia cócegas nas pontas dos pés nus. Caroline tremeu, mas o movimentou só para esfregar-se mais intimamente contra Blake, e ouviu que ele gemia de desejo. —Vou tocar te — sussurrou-lhe ele, com voz cálida contra sua face. Sabia o que ele queria dizer, mas ainda assim se sobressaltou quando ele passou roçando seus dedos contra sua zona mais íntima. Ficou tensa, relaxou quando os lábios dele pressionaram contra seu ouvido com suavidade. —Shhh... Deslizou um dedo em seu interior, e ela ofegou de prazer. —Eu também quero te tocar — disse-lhe. Ele deixou sair um desastroso suspiro. —Provavelmente morreria se o fizesse. Os olhos dela virtualmente voaram para seu rosto. —Quero-te tanto — tentou ele explicar — creio que explodirei se me toca, e não posso... —Shhh... Agora foi seu turno confortá-lo e ele colocou um tenro dedo sobre seus lábios. —Só me ensine. Me ensine tudo. Quero te agradar. Um som rouco chegou do fundo da garganta de Blake e com o cotovelo separou suas pernas. Tocou-a com a ponta de seu pênis e quase se sobressaltou pelo prazer desse contato. Ela estava tão ardente e desejosa, e sabia que ela o queria. Ela fazia mal a alma e a tudo. —Oh, Caroline, farei isto bom para ti — jurou — Farei-te desfrutar. Dou-te minha palavra. —Já o faz — disse ela docemente.
Começou a ofegar quando ele começou a penetrá-la. Tomou lentamente, lhe dando a seu corpo tempo para que se adaptasse a seu tamanho e a sua força. Era tão difícil conter-se quando cada fibra de seu ser queria empurrar dentro dela, marcando-a como dele. Algo muito primitivo despertou dentro dele. Não queria unicamente lhe fazer amor. Ele queria devorá-la, possuí-la, lhe dar tal prazer que ela nem sequer pudesse sonhar dando-se a outro. Mas ele se conteve, esforçando-se por manter um suave contato. Ela não estava preparada para a ferocidade de seu desejo. Não o compreenderia. E lhe importava muito para assustá-la. Ela lhe importava. Teve uma revelação maravilhosa, e seu corpo inteiro ficou gelado. —Blake? Deu-se conta que lhe agradava, deu-se conta que a desejava. Mas foi neste momento de intimidade quando percebeu que suas emoções eram muito mais intensas. Ele, que acreditou ter perdido o poder de sentir algo profundamente, foi comovido por esta mulher, e... —Blake? Ele baixou o olhar. —Algo vai mal? —Não — disse com um pouco de assombro em sua voz. — Não, de fato, acredito que tudo poderia ser perfeito. Um indício de sorriso surgiu nos lábios dela. —O que quer dizer? —Depois lhe direi isso — disse ele, preocupado porque este mágico sentimento pudesse desaparecer se o analisasse muito de perto. — Mas agora... Ele empurrou para frente. Caroline ficou sem fôlego. —Fiz-te mal? — perguntou-lhe. —Não, é só que... sinto-me tão... bem, tão cheia por dizê-lo de algum jeito. Blake soltou uma gargalhada. —Não estou nem sequer na metade do caminho aí — disse com um sorriso divertido. Sua aflição cessou de repente. —Não?
—Ainda não — disse ele solenemente. —Embora isto — apressou-se a empurrar para frente, produzindo um movimento de fricção maravilhoso para ambos — falta uma parte menor. Ela tragou saliva. —Uma parte menor? Não termina aí? Ele sorriu lentamente e negou com a cabeça. —É obvio, se fizesse isto— deu um pequeno empurrão com seu quadril. —Estaria quase aí. —Mas você... Sou ainda...? —Virgem? — terminou por ela — tecnicamente, suponho que sim; quanto ao que a mim concerne, é minha. Caroline tragou, e piscou para reter suas lágrimas, mal capaz de conter suas emoções. Era assombroso que uma simples frase pudesse lhe fazer isso. É minha. Oh, como desejava que fosse certo. Para sempre. —Me faça tua — sussurrou ela — por completo. Ela pôde ver em seu rosto como lhe custava controlar-se. O ar noturno era gelado, mas a fronte do Blake estava perolada de suor e os músculos de sua garganta se sobressaíam de forma perceptível. —Não quero te fazer mal — disse-lhe com voz muito tensa. —Não me fará mal. E então, como se tivesse consumido o último pingo de reserva, ele soltou um rouco grito e se afundou para frente, embainhando-se dentro dela completamente. —Bom Deus — ofegou ele — Caroline. Ela não pôde evitar o louco impulso de rir. —Oh, Blake — gemeu— agora vejo a diferença. —Vê? —Há mais? Ele afirmou com a cabeça. — Espera e verá. E então começou a mover-se.
Mais tarde Caroline não podia decidir o que gostara mais. Se foi o sentimento de plenitude que sentira quando eles eram só um? Foi o ritmo primitivo de seu corpo enquanto ele a reclamava como dele? Em realidade, não podia descartar o clímax explosivo que havia sentido, imediatamente seguido pelo grito de paixão do Blake no momento de deixar sua semente. Mas agora, jazia em seus braços, a brisa marinha acariciava seus corpos, e ela acreditou que isto poderia ser o melhor de tudo. Ele estava tão quente, e tão perto, e ela podia ouvir como seu batimento reduzia a velocidade até ser tranquilo e regular. Podia cheirar o sal sobre sua pele e a paixão no ar, e havia algo tão certo em tudo isto, como se estivesse esperando este momento durante toda sua vida. Mas mesclá-lo com sua felicidade lhe produzia um temor inquietante. O que aconteceria agora? Significava isto que ele queria casar-se com ela? E se o fazia, faria só porque era o correto? E se esse fosse o caso lhe importaria? Bem, é obvio que lhe importaria... Queria que ele a amasse com uma emoção tão intensa como ela sentia por ele. Mas talvez aprendesse a amá-la se casassem. Ela poderia ser infeliz se casasse com um homem que não a amasse, mas sabia que seria infeliz sem ele. Talvez só deveria fechar os olhos, saltar e esperar o melhor. Ou talvez, pensou franzindo o cenho, deveria recordar que não lhe dissera nada mais que duas palavras desde que fizeram amor, e certamente, nenhuma referente ao matrimônio. —Por que está preocupada? — perguntou Blake lhe acariciando lentamente o cabelo com seus dedos. Ela negou com um gesto de sua cabeça. —Por nada. Estava sonhando. —Comigo, suponho — disse sossegadamente — e minhas intenções. Ela se voltou para trás horrorizada. —Nunca sonharia te manipulando... —Shhh... — disse com suave autoridade. — Sei. —Sabe? —Casaremos logo que obtenha uma licença especial. O coração dela deu um salto. —Está seguro? —Que tipo de pergunta é essa? —Uma estúpida — murmurou ela.
Não decidira que não lhe importaria se ele queria casar porque era o correto? Não, isso não estava bem, lhe importava, ia se casar com ele de toda forma. —Caroline? — Era evidente que havia diversão em sua voz. —Sim? —Vais responder a minha pergunta? Ela piscou. —Fez-me uma? —Perguntei se você... — fez uma pausa. —- Não, em realidade, não lhe perguntei isso. Antes que Caroline se desse conta do que estava fazendo, ele rodou até erguer-se sobre um joelho. —Caroline Trent, dentro de pouco Ravenscroft — disse. — Me fará a honra de ser minha esposa? Se seus olhos não estivessem cheios com tantas lágrimas, poderia ter rido ante o espetáculo de sua proposta que lhe fez nu em pelo. —Sim — disse afirmando furiosamente com a cabeça — Sim, sim, sim. Ele levantou a mão dela para sua boca e a beijou. —Bem. Caroline fechou seus olhos durante uns segundos. Queria desconectar todos seus sentidos, para poder saborear o momento em sua mente. Nenhuma visão, nenhum contato, nenhum aroma que a distraísse desse prazer maravilhoso em seu coração. —Caroline? —Shhh... Fez-lhe um gesto com a mão e uns segundos mais tarde, abriu os olhos e disse. - Bom, o que ia me dizer? Ele tinha uma expressão de curiosidade. —O que acontece? —Nada, eu... Oh, olhe! — assinalou ao céu. —O que? — perguntou-lhe ele seguindo o dedo com seus olhos. —O céu clareou, saíram às estrelas.
—Assim são elas — murmurou algo parecido a um sorriso em seus lábios. — Depois de tudo, foi você a quem dizia que sempre estavam aí. Caroline apertou a mão dele com a sua. —Sim — assentiu — aí estavam. Uma meia hora mais tarde, eles se vestiram apesar de estar um pouco desarrumados e tentaram deslizar-se dentro da casa o mais silenciosamente possível. Entretanto, James estava esperando na porta principal. —Você disse que deveríamos ter utilizado as escadas traseiras — murmurou Caroline. —Dou por fato que voltam porque é muito tarde? — disse James brandamente. — Perriwick queria fechar a porta, mas eu não estava seguro de que tivessem chave. —Decidimos nos casar — disse Blake bruscamente. James simplesmente elevou uma sobrancelha e murmurou. —Foi o que pensei.
Capítulo 22
Con-tu-ma-cious (adjetivo). Obstinadamente oposto à autoridade. Teimosamente perverso. Há vezes que alguém deve atuar de uma forma contumaz (contumacious), embora seu marido esteja enormemente descontente. — Do dicionário pessoal de Caroline Ravenscroft. Em alguns dias, a lua de mel terminou. Era hora de capturar Oliver, Blake nunca se havia ressentido de seu trabalho no Ministério de Defesa. Ele não queria perseguir criminosos até dar com eles, queria passear ao longo da praia com sua esposa; não queria evitar projéteis, queria rir enquanto fingia evitar os beijos de Caroline. Mas, sobretudo, queria mudar o espinhoso medo ao descobrir a maravilhosa sensação de apaixonar-se. Finalmente, terminou admitindo que se sentia bem. Estava se apaixonando por sua esposa. Sentia-se como se estivesse sobre um escarpado, sorrindo ao mesmo tempo que olhava como se precipitava para o chão. Sorria nas ocasiões mais estranhas, ria inadequadamente, e se encontrava curiosamente desolado quando não sabia onde estava ela. Era como ser coroado rei do mundo, inventar um remédio para o câncer e descobrir que podia voar, tudo no mesmo dia. Ele nunca sonhou que poderia estar fascinado por outro ser humano. Amava observar o conjunto de emoções no rosto dela, a doce curva de seus lábios quando estava contente, o franzimento de sua sobrancelha quando estava perplexa. Até gostava de observá-la quando dormia. Seu suave cabelo castanho espalhado como um leque sobre seu travesseiro. Como se erguia e baixava seu peito ao ritmo de sua respiração, e ela parecia tão nobre e em paz. Lhe perguntara uma vez se seus demônios desapareciam quando estava dormindo. A resposta dela lhe derreteu o coração. —Eu não tenho demônios — respondera. E Blake se deu conta que seus demônios estavam desaparecendo também. Decidiu que era a risada o que os expulsava. Caroline tinha uma habilidade assombrosa para encontrar o humor no mais mundano dos temas. Também descobriu que ela se orgulhava de fazer um pouco de mímica. O que lhe faltava de talento, ela supria com seu entusiasmo, e frequentemente, Blake se encontrava rompendo em risadas. Ela estava pronta para ir à cama justo em seguida, cantarolando no quarto de banho, o quarto de banho dela.
O isolou desde que vivia aí fazia uma semana. Seu material de asseio feminino já não era o que ela teve antes que Penélope a tivesse levado as lojas; apertavam os pertences dele, empurrando seu barbeador para um canto. E Blake adorava isso. Amava cada intrusão que ela fazia em sua vida; da nova disposição de seu mobiliário ao perfume indefinido dela que flutuava no ar por toda a casa, pegando-o desprevenido e fazendo que lhe doesse querê-la. Ele já estava na cama essa noite, apoiado contra os travesseiros enquanto escutava como ela se asseava. Era trinta de Julho. Amanhã James e ele capturariam ao Oliver Prewitt e a seus comparsas traidores. Planejaram a missão até o último detalhe, mas Blake ainda estava incomodado. E nervoso. Muito, muito nervoso. Sentia-se preparado para o trabalho do dia seguinte, mas ainda havia muitas variáveis, muitas coisas que poderiam sair mal. E nunca antes, Blake sentira que tinha tanto a perder. Quando Marabelle estava viva, eram jovens e se acreditavam imortais. As missões para o Ministério de Defesa foram grandes aventuras. Nunca lhes ocorrera que suas vidas pudessem dirigirse a qualquer outro lugar que à felicidade depois disso. Mas então Marabelle foi assassinada e não importava se Blake acreditava que era imortal ou não, mas deixou de lhe importar sua própria vida. Ele não ficou nervoso em anteriores missões porque em realidade, já não lhe importavam as consequências. Oh, ele queria ver os traidores da Inglaterra levados ante a justiça, mas se por alguma razão, não vivia para vê-los pendurados... Bom, não seria uma grande perda para ele. Mas agora era diferente. Importava para ele. Queria mais que tudo fazê-lo por meio desta missão e construir seu matrimônio com Caroline, queria vê-la vagar pelo jardim de rosas, e queria ver seu rosto cada manhã sobre o travesseiro perto do dele. Queria lhe fazer o amor com selvagem desenvoltura e queria lhe tocar o ventre enquanto se fazia grande e redondo com suas crianças. Ele queria cada vida que tinha para oferecer. Até o último pedacinho de maravilha e alegria. E estava apavorado, porque sabia quão fácil tudo poderia lhe ser arrebatado. Só seria necessária uma bala certeira. Blake se deu conta que Caroline terminara de lavar-se e olhou para a porta do quarto de banho, que estava um pouquinho aberta. Ouviu um pequeno splash, e logo um silêncio suspeito. —Caroline? — chamou-a. Ela enfiou na cabeça um tecido de seda negra. —Ela não está aqui.
Blake ergueu uma sobrancelha. —Quem tem a intenção de ser? E o que fazia com minha esposa? Ela sorriu de forma muito sedutora. —É obvio, eu sou Carlotta De Leão. E zssi você não me bezssas agora, senhor Ravenscroft, terei que recorrer a minhas táticas mais desagradáveis. —Estremeço só de pensar. Ela escorregou dentro da cama e piscou. —Não pense. Só bézssame. —Oh, mas não poderia. Sou um homem de princípios, honesto, nunca sairia do juramento do matrimônio. Ela franziu o cenho. —Estou segura de que sua esposa lhe perdoará só por está vez. —Caroline? — Ele agitou sua cabeça negativamente. — Nunca. Tem o caráter do diabo. Aterroriza-me por completo. —Não deveria falar dela dessa maneira. —É muito pormenorizada para ser uma espiã. —Eu sou única — disse com um encolhimento de ombros. Ele chupou os lábios para não rir. —Você não é espanhola? Ela levantou um braço a modo de saudação. —Viva a Rainha Isabel! —Já vejo. Então por que fala com acento francês? Ela impressionada, disse com voz normal: —Seriamente? —Sim, mas era um acento francês excelente — mentiu-lhe. —Nunca conheci a um espanhol. —E eu nunca conheci a ninguém que falasse como você. Ela tentou lhe golpear o ombro.
—Em realidade, tampouco conheci a um francês. —Não! —Não te incomode, só estava brincando. —E triunfando habilmente — Ele tomou sua mão e passou roçando seu polegar pela palma da mão dela. Os olhos dela começaram a umedecer suspeitosamente. —Por que isto soa a prelúdio de más notícias? —Temos alguns assuntos sérios que discutir. —Isto está relacionado com a missão para capturar ao Oliver amanhã, verdade? Ele afirmou com a cabeça. —Não te mentirei e não te direi que não será perigoso. —Sei — disse ela em voz baixa. —Tivemos que mudar alguns dos nossos planos quando Oliver descobriu nosso matrimônio. —O que quer dizer? —Moreton, que dirige o Ministério de Defesa, nos ia enviar uma dúzia de homens para nos respaldar. Agora não pode. —Por quê? —Não queremos que Oliver aumente suas suspeitas. Estará me vigiando. Se doze funcionários governamentais se introduzirem em Seacrest Manor, ele saberá que há algo em andamento. —Por que não podem fazê-lo na clandestinidade? —Sua voz se elevou. — Não é isso o que se supõe que vocês fazem no Ministério de Defesa? Fazer algo furtivamente sob o abrigo da noite? —Te tranquilize, querida. Ainda temos um par de homens para nos apoiar. —Quatro pessoas não são suficiente! Não tem nem ideia de quantos homens trabalham para o Oliver. —De acordo com seu histórico — disse ele com paciência — só quatro. Estaremos em igualdade de condições. —Eu não quero que estejam em igualdade de condições. Têm que superá-los em número. Ele se estirou para acariciar seu cabelo, mas ela se afastou. —Caroline — disse-lhe — precisa ser assim.
—Não — disse ela desafiante — assim não. Blake a olhou atentamente enquanto se formava um mau pressentimento em seu estômago. —O que quer dizer? —Eu vou contigo. Ele ficou rígido. —Uma droga que você vai! Ela saiu da cama a toda pressa e pôs suas mãos sobre os quadris. —Como vais fazer isto sem mim? Eu posso identificar a todos os homens. Conheço a situação do terreno, você não. —Você não vem, e acabou. —Blake, não está pensando com clareza. Ele saltou e ficou diante dela ameaçadoramente. —Não te atreva a me acusar de não pensar com clareza. Acredita que eu te poria em perigo voluntariamente? Nem sequer durante um minuto? Pelo amor de Deus, mulher, poderiam lhe matar. —A ti também — disse ela brandamente. Se a ouviu, não deu nenhuma amostra disso. —Não vou passar por isso de novo — disse — se tiver que te amarrar ao pé da cama, o farei, mas você não vai a nenhum lugar próximo à costa amanhã à noite. —Blake, nego-me a esperar aqui em Seacrest Manor, roendo as unhas e me perguntando se ainda tenho ou não tenho um marido. Ele passou a mão pelo cabelo com um gesto de impaciência. —Acreditei que odiava esta vida, o perigo, a intriga. Disse-me que se sentiu doente todo o tempo quando irrompemos em Prewitt Hall, por que quer se envolver agora? —Eu odeio! — exclamou ela — odeio-tanto que me corrói por dentro. Sabe o que significa sentir-se assim? Realmente preocupada? De maneira que arde fazendo um buraco através de seu estômago e te faz querer gritar? Ele fechou os olhos por um momento e disse brandamente: —Agora sim. —Então compreenderá porque não posso me sentar aqui e não fazer nada. Não importa o quanto eu odeie. Não importa que esteja aterrorizada. Não entende isso?
—Caroline, possivelmente se estivesse treinada pelo Ministério de Defesa, se soubesse disparar uma arma, e... —Eu posso disparar uma arma. Disparei em Percy. —O que tento te dizer, é que se for, não me seria possível me concentrar na missão; se estou preocupado por ti, provavelmente cometerei mais enganos e conseguirei que me matem. Caroline mordeu o lábio inferior. —Tem razão — disse lentamente. —Vale— interrompeu secamente — então está combinado. —Não, não está, fica o fato de que eu posso ser de grande ajuda, e poderiam me necessitar. Ele a agarrou pela parte superior dos braços e fechou seus olhos frente a ela. —Necessito-te aqui, Caroline. Sã e salva. Ela o olhou e viu algo em seus olhos cinzas que nunca esperou, desespero. E tomou uma decisão. —Muito bem — sussurrou — permanecerei aqui, mas não sou feliz assim. Suas últimas palavras se amorteceram enquanto ele a aproximava para apertá-la com um abraço. —Obrigado — murmurou, e não estava segura de se ele o dizia a ela ou a Deus. A noite seguinte foi a pior que Caroline já passou. Blake e James partiram pouco tempo depois do jantar, antes que o céu tivesse começado a escurecer. Afirmaram que precisavam avaliar a situação do terreno. Quando Caroline protestou que alguém lhes veria, só riram. Responderam-lhe que Blake era conhecido como latifundiário no distrito, porque não daria uma volta com um de seus amigos? Inclusive planejaram parar em um bar da vizinhança e tomar uma bebida para favorecer o engano de que eram simplesmente um par de nobres de farra. Caroline precisava admitir que suas palavras faziam sentido, mas não podia parar o tremor que sentia em seu ventre. Sabia que devia confiar em seu marido e em James; depois de tudo, eles trabalharam para o Ministério de Defesa durante anos, sem dúvida, eles sabiam o que estavam fazendo. Mas ela pressentia algo ruim, isso era tudo. Uma sensação incômoda que simplesmente não se encaixava. Caroline tinha poucas lembranças de sua mãe, salvo suas saídas para olhar as estrelas; mas recordava uma vez suas risadas com seu marido e comentários sobre que a intuição feminina era tão consistente como o ouro. Enquanto passeava pelos arredores de Seacrest Manor, Caroline olhava a lua e as estrelas e dizia:
—Sinceramente, espero que não tivesse nem ideia do que dizia, mãe. Esperou para sentir a tranquilidade que normalmente encontrava no céu noturno, mas pela primeira vez em sua vida, falhou-lhe. —Droga — murmurou. Apertou os olhos fortemente olhando para cima outra vez. Nada. Ainda se sentia mal. —Está dando muita importância a isto — disse-se a si mesma — Não tiveste em toda sua vida nenhum pouco de intuição feminina. Nem sequer sabe se seu próprio marido te ama. Acredita que uma mulher com intuição não saberia ao menos isso? Mais que tudo, o que ela queria era saltar sobre um cavalo e cavalgar para resgate de Blake e James. Exceto que eles provavelmente não necessitavam que os resgatasse, e ela sabia que Blake nunca a perdoaria. A confiança era algo tão prezado, e ela não queria destruir a sua poucos dias depois de casar-se. Talvez se ela fosse à praia, onde ela e Blake fizeram amor pela primeira vez; talvez ali pudesse encontrar um pouco de paz. O céu estava cada vez mais escuro, mas Caroline deu a volta e se encaminhou ao atalho que se dirigia para a água. Atalhou atravessando o jardim e estava passando pelo caminho empedrado, quando ouviu algo. Seu coração se congelou. —Quem está aí? — perguntou. Nada. —Está tola — murmurou — só vou a p... Aparentemente, como caída do céu, uma força cegadora a golpeou nas costas e a atirou ao chão. —Não diga uma palavra — grunhiu uma voz em sua orelha. —Oliver? — disse ela chocada. —Disse que não fale! — Com sua mão lhe tampou a boca. Fortemente. Era Oliver. A mente dela ia a toda velocidade "Que diabos fazia ele aqui?" —Vou te fazer algumas perguntas— disse com uma voz aterradora — e você vai dar algumas respostas. Afastando o pânico, ela afirmou com a cabeça. —Para quem trabalha seu marido? Seus olhos aumentaram, e lhe agradeceu que levasse algum tempo para tirar a mão de sua boca,
porque não tinha nem ideia do que dizer. Quando finalmente lhe deixou falar, seu braço ainda a rodeava brutalmente ao redor do pescoço. Ela disse: —Não sei do que me está falando. Ele puxou com força, de modo que a parte superior do braço lhe estava oprimindo a traqueia. —Me responda! —Não sei! Juro! Se lhe dizia que Blake se encontrava longe, toda sua operação se arruinaria. Ele poderia perdoála, mas ela não o perdoaria nunca. Oliver mudou de posição bruscamente enquanto retorcia o braço dela por detrás das costas. —Não acredito — grunhiu ele. — Você é um montão de coisas, a maioria delas incômodas como o diabo, mas não é estúpida. Para quem trabalha? Ela mordeu o lábio, Oliver não ia acreditar que ela não soubesse absolutamente nada, assim disse: —Não sei. Embora às vezes ele se vai. —Ah, agora estamos nos entendendo. Aonde vai? —Não sei. Ele puxou o braço tão forte que estava segura de que o ombro sairia de seu lugar. —Não sei! — disse ela a gritos — Seriamente, não sei! Ele a girou. —Sabe onde está agora? Ela negou com a cabeça. —Eu sim. —Você sim? — disse com voz estrangulada. Fez um gesto afirmativo entrecerrando seus olhos malevolamente. —Imagina minha surpresa quando o descobri tão longe esta noite. —Não sei o que me quer dizer. Ele começou a arrastá-la para o caminho principal. —Saberá. Foi empurrando até que chegaram a um pequeno calesín{6} estacionado ao lado da estrada. O
cavalo estava mastigando pacificamente a grama até que Oliver o golpeou em sua pata. —Oliver! — disse Caroline. —- Estou segura de que isso não era necessário. —Te cale — espremeu-a contra a lateral do calesín e lhe atou as mãos com um pedaço de corda grossa. Caroline olhou suas mãos e notou com exasperação que era tão bom atando nós como fora Blake. Seria afortunada se o sangue conseguisse chegar até suas mãos. —Onde me leva? — perguntou-lhe. —A ver seu querido marido! —Já disse. Não sei onde está. —E eu disse. Eu sim. Ela tragou saliva, achando cada vez mais difícil manter-se nesse plano tão prepotente. —Bom, então... Onde está? Ele a empurrou para que subisse ao calesín, sentou-se detrás dela e chicoteou ao cavalo para que entrasse em marcha. —O senhor Ravenscroft está neste preciso momento em algum penhasco escarpado observando o Canal da Mancha. Tem uma luneta na mão e está acompanhado pelo marquês de Riverdale e dois homens que não conheço. —Possivelmente tenham saído para algum tipo de expedição científica. Meu marido é um naturalista estupendo. —Não me ofenda. Tem a luneta fixada em meus homens. —Seus homens? — repetiu ela. —Acreditava que só era outro estúpido folgado guardando sob chave seu dinheiro, verdade? —Bom, sim — Caroline reconheceu antes de ter oportunidade de frear sua língua. —Tinha planos para sua fortuna, sim, e não creia que te perdoei por sua traição, mas eu estive trabalhando por minha conta, também. —O que quer dizer? —Já! Você não gostaria de sabê-lo. Ela aguentou a respiração enquanto viravam em uma curva a uma velocidade perigosa. —Oliver, se insistir em me sequestrar desta maneira, parece que vou saber muito em breve.
Olhou-a calculadoramente. —Olhe a estrada! — sibilou ela quase a ponto de esvaziar seu estômago ao mesmo tempo que se bamboleavam para evitar uma árvore. Oliver puxou com muita força as rédeas, e o cavalo, um pouco furioso já por ter sido chutado bufou e se deteve. Caroline foi jogada para frente ao parar bruscamente. —Acredito que vou ficar enjoada — murmurou. —Não creia que vou limpar a sujeira se começar a vomitar tudo — ralhou Oliver, açoitando ao cavalo com seu chicote. —Para de golpear a esse pobre cavalo! Ele agitou sua cabeça frente ao rosto dela enquanto seus olhos brilhavam perigosamente. —Posso te recordar que você está atada e eu não? —O que quer dizer? —Eu dou as ordens. —Bom, não te surpreenda se a pobre criatura te chuta a cabeça quando não estiver olhando. —Não me diga como tratar a meu cavalo — rugiu, e logo descarregou o chicote outra vez sobre as costas do animal. Continuaram com seu movimento estrada abaixo, uma vez que Caroline estava segura de que Oliver conduzia a um ritmo mais lento, disse-lhe: —Estava me falando de seu trabalho. —Não — disse ele — Não o fazia. E fecha o bico. Ela manteve sua boca fechada. Oliver não ia dizer nada, e ela também podia utilizar o tempo para urdir um plano. Moviam-se paralelamente à costa, bordeando a parte mais próxima de Prewitt Hall, e a baía que Oliver escrevera em seus relatórios clandestinos. A mesma baía onde Blake e James estavam esperando. Deus Santo, lhes iam fazer uma emboscada. Algo ia mal. Blake sentia em seus ossos. —Onde está ele? — sussurrou. James meneou negativamente a cabeça e tirou seu relógio de bolso. —Não sei. O bote chegou faz uma hora. Prewitt deveria estar aqui para encontrar-se com eles. Blake amaldiçoou entre dentes.
—Caroline me disse que Oliver sempre é pontual. —Poderia saber que o Ministério de Defesa lhe está seguindo? —Impossível — Blake levantou sua luneta para o olho e enfocou para a praia. Um pequeno bote deixou cair à âncora umas vinte metros dentro do mar. Não havia muita tripulação, até o momento viram só a dois homens sobre a coberta. Um deles segurava um relógio de bolso e o comprovava de vez em quando. James lhe deu uma cotovelada e Blake lhe entregou a luneta. —Deve ter acontecido algo hoje — disse Blake — não há forma de que ele soubesse que foi detectado. James só afirmou com a cabeça enquanto examinava o horizonte. —A menos que esteja morto, ele virá, joga-se muito dinheiro. —E onde diabos está seu outro homem? Supõe-se que são quatro. James deu de ombros, com a luneta ainda em seu olho. —Talvez estejam esperando algum sinal do Prewitt, ou poderia haver... Espera! —O que? —Alguém se aproxima pela estrada. —Quem? — Blake tentou agarrar a luneta, mas James se negou a entregar-lhe. — Carlotta De Leão — predisse Blake. —É Prewitt — disse— vem em um calesín, e traz uma mulher com ele. —Carlotta De Leão — predisse Blake. James baixou a luneta lentamente. Seu rosto se tornou completamente branco. —Não — sussurrou — é Caroline.
Capítulo 21
Prov-e-nance (substantivo). Origem, derivação. Não posso afirmar saber ou compreender a origem (provenance) do amor romântico, mas estou segura de que não é algo que exija ser compreendido, unicamente apreciado e valorizado. — Do dicionário pessoal de Caroline Ravenscroft. Casaram-se uma semana depois, muito para o regozijo de Penélope, que se obstinou em comprar todo o enxoval para a noiva. Caroline acreditou que os dois vestidos já feitos que lhe comprou Blake eram um luxo, mas nada podia comparar-se à ideia que tinha Penelope de um vestuário adequado. Já que logo seria sua irmã, Caroline lhe permitiu escolher tudo com uma só exceção. A costureira tinha um cilindro de seda azul-esverdeada da cor exata ao de seus olhos, e Caroline insistiu em ter um vestido de noite elegante à parte. Nunca pensou antes em seus olhos, mas depois que Blake acariciasse com seus dedos as pálpebras e declarasse que eram da cor exata do oceano no Equador... Bom, em realidade não podia estar mais orgulhosa deles. As bodas foram curtas e privadas, com a única assistência de Penélope, James e os criados de Seacrest Manor. O irmão mais velho de Blake, queria estar presente, mas uma de suas filhas ficou doente, e não quis deixá-la sozinha. Caroline acreditou que ele fez o que devia, e lhe escreveu para lhe expressar seu desejo de reunir-se com ele em outra ocasião melhor. Perriwick conduziu à noiva até o altar, a senhora Mickle estava tão ciumenta que insistiu em fazer o papel de mãe da noiva, ainda quando esse papel não implicava formar parte da cerimônia. Penélope foi madrinha de honra e James o padrinho, e lhes acompanhou um tempo completamente maravilhoso. Caroline sorria pelo rumo que seguiria nos próximos dias. Nunca poderia recordar ter sido tão feliz como quando era Caroline Ravenscroft em Seacrest Manor, tinha um marido e uma casa e sua vida era quase tão perfeita como ela a imaginara. Blake nunca lhe professara seu amor, mas ela supunha que era muito esperar de um homem que até recentemente esteve tão doído emocionalmente. Enquanto isso, faria-lhe tão feliz como pudesse, e que o tempo deixasse a ele fazer o mesmo com ela. Agora que realmente Caroline pertencia a Seacrest Manor e vice-versa, decidiu pôr sua marca na pequena propriedade. Estava vagando pelo jardim quando Perriwick se aproximou. —Senhora Ravenscroft — disse-lhe — tem uma visita. —Sim? —perguntou surpresa. Quase ninguém sabia que ela era a senhora Ravenscroft.
—Quem? —Um tal senhor Oliver Prewitt. Ela empalideceu. —Oliver? Mas por que... —Deseja que lhe despeça? Ou poderia enviar ao senhor Ravenscroft, se quiser. —Não, não — disse ela rapidamente, não queria que seu marido visse o Oliver, provavelmente Blake perderia a compostura e ele se odiaria mais tarde por isso. Ela sabia quão importante era para ele capturar ao Oliver e seu círculo de espiões, se escapasse de seu esconderijo agora, nunca teria outra oportunidade. —Eu o verei — disse ela com voz firme. Respirou limpa e profundamente e deixou suas luvas de trabalho. Oliver não tinha poder sobre ela agora, e se negava a assustar-se por sua causa. Perriwick lhe indicou com a mão para que lhe seguisse ao interior da casa, e fizeram o trajeto até o salão. Enquanto ela passava pela porta, viu as costas de Oliver e seu corpo inteiro se esticou. Quase esqueceu quanto o odiava. —O que quer, Oliver? — disse com voz plena. Ele levantou a vista para ela, com sete tipos diferentes de ameaça espreitando em seus olhos. —Esse não é um recebimento muito carinhoso para seu tutor. —Meu anterior tutor. —Um detalhe sem importância — disse, com um pequeno movimento de sua mão. —Vá direto ao ponto, Oliver — ordenou-lhe. —Muito bem — caminhou devagar para ela até que estiveram nariz com nariz. — Você tem uma dívida comigo — disse em voz baixa. Ela não se amedrontou. —Eu não te devo nada. Permaneceram assim de pé, olhando-se fixamente um ao outro, até que ele se separou e caminhou para a janela. —Tem aqui um bom pedaço de propriedade. Caroline sufocou o impulso de gritar de frustração. —Oliver — advertiu-lhe — minha paciência se esgotou, se tiver algo que me dizer, diga-o; do
contrário, sai daqui. Ele realizou um giro vertiginoso. —Deveria te matar — sibilou-lhe. —Poderia — disse-lhe tentando não mostrar reação alguma a sua ameaça—- Mas iria à forca, e não acredito que queira isso. —Danificaste tudo. Tudo! —Se refere a sua pequena montagem para me fazer a próxima Prewitt — cuspiu ela — então sim, danifiquei. Envergonho-me de ti, Oliver. —Eu te alimentei, dava-te proteção, e você me recompensa com a pior das traições. —Ordenou a seu filho que me violasse! Ele se adiantou, apontando com seu rechonchudo dedo em direção a ela. —Isso não teria sido necessário se tivesse cooperado. Sempre soube que tínhamos a intenção de te casar com o Percy. —Nunca soube tal coisa. E Percy não desejava o matrimônio mais que eu. —Percy faz o que eu lhe digo. —Sei — disse com voz desgostada. —Tem ideia dos planos que eu tinha para sua fortuna? Devo dinheiro, Caroline. Um montão de dinheiro. Ela piscou surpresa. Ela não tinha nem ideia de que Oliver tivesse dívidas. —Esse não é meu problema nem minha culpa. E em realidade viveu bastante bem a custa de meu dinheiro enquanto fui sua pupila. Ele deixou sair uma gargalhada enfurecida. —Seu dinheiro estava bem sujeito a uma obrigação específica e mais apertado que um cinturão de castidade; eu recebia uma pequena atribuição cada três meses para cobrir seus gastos, mas não era mais que uma miséria. Ela o olhou chocada. Oliver vivera sempre tão bem, e insistia em ter o melhor de tudo. —Então de onde vinha todo seu dinheiro? — perguntou ela. — O candelabro novo, a carruagem de luxo..., como os pagou? —Isso foi com — seus lábios se uniram em uma linha firme e contrariada. — Isso não é de sua incumbência. — Os olhos dela se abriram enormemente, Oliver quase admitira que fazia
contrabando, estava segura disso. Blake estaria muito interessado. —O verdadeiro poder ia chegar quando te casasse com Percy — continuou — então eu teria todo o controle. Ela fez um gesto negativo com sua cabeça, ficando imóvel durante um momento, pensando em comentar algum enredo que pudesse incitá-lo a incriminar-se ele mesmo. —Nunca o faria— disse ao final bruscamente sabendo que precisava dizer algo para evitar que começasse a suspeitar. — Eu nunca teria casado com ele. —Faria o que eu te dissesse! — rugiu. — Se tivesse conseguido antes que esse idiota ao que chama marido, te teria pisado na cabeça com minha bota até que tivesse obedecido. Caroline ficou vermelha, uma coisa era ameaçá-la, mas ninguém chamava idiota a seu marido. —Se não for neste momento, jogarei-te à força. Já não lhe importava se ele se incriminasse ou não, só o queria fora de sua casa. —Jogarei-te à força — imitou-a ele, abrindo seus lábios em um sorriso ameaçador. —Certamente, pode fazê-lo melhor, Caroline, ou deveria dizer senhora Ravenscroft? Meu Deus! As voltas que dá o mundo. Os jornais mencionavam que seu novo marido é o filho do Visconde Darnsby. —Houve um anúncio no jornal? — murmurou ela totalmente pasma; ela se perguntava como soube encontrá-la Oliver. —Não te faça a surpresa, cadela. Sei que você pôs esse anúncio aí para que eu o visse. Não é que tenha muitos amigos aos que queria notificar. —Mas quem... — ela aguentou a respiração. Penélope. É obvio. Em seu mundo, os matrimônios eram anunciados imediatamente no jornal. Provavelmente ela teria esquecido tudo sobre a necessidade de mantê-lo em segredo. Ela franziu seus lábios e reprimiu um suspiro, não querendo mostrar nenhum sinal de debilidade. Oliver não deveria ter se informado de sua relação com Blake até depois de sua detenção, mas não havia nada que fazer agora. —Já disse que partisse de uma vez — disse ela tentando ser paciente— não me faça repetir. —Não vou a nenhum lugar até que não me encontre bem e disposto. Você tem uma dívida comigo, moça. —Eu não te devo nada exceto uma bofetada. Agora, vá plantar batatas. Ele cortou a distância que os separava, agarrando-a com força. —Quero o que é meu.
Ela abriu a boca surpresa enquanto tentava liberar-se de seu aperto. —Do que está falando? —Vai dar a metade de sua fortuna, como pagamento pelos tenros cuidados te educando para que maturasse. Ela riu. —Cadela— chiou. E antes que ela tivesse tempo de reagir, levantou sua mão livre e a esbofeteou. Saiu despedida para trás dando tombos, e possivelmente teria caído ao chão se não lhe tivesse seguro o braço tão forte. Ela não disse nada, não confiava em si mesma para falar, e sua face lhe ardia. Oliver estava acostumado a ter posto um anel, e temia estar sangrando. —Enganou-lhe para casar? — recriminou-lhe. — Deitou-te com ele? A fúria lhe deu forças para separar seu braço, e tropeçou contra uma cadeira. —Sai de minha casa. —Não até que você não me demonstre isso. —Não poderia nem que quisesse — disse ela com um sorriso de auto-satisfação. —Quando me casei com o senhor Ravenscroft, minha fortuna passou a ser dele, conhece as leis da Inglaterra tão bem como eu. Oliver começou a estremecer com fúria, e Caroline aumentou seu atrevimento. —Pode perguntar a meu marido pelo dinheiro, mas te advirto que ele tem o temperamento do diabo, e — ela olhou de cima a baixo o corpo magro de Oliver de uma forma insultante. — É muito maior que você. Oliver se enfureceu com a dedução dela. —Pagará pelo que me fez. Avançou para ela de novo, mas antes que seu braço descesse para golpeá-la, ouviram um rugido que provinha da porta. —Que diabos está acontecendo aqui? Caroline olhou nessa direção e suspirou com alívio. Blake. Aparentemente Oliver não sabia que dizer, simplesmente ficou gelado com seu braço ainda em alto preparado para golpeá-la. —Pensava golpear a minha esposa? — a voz do Blake era baixa e mortífera, parecia sereno,
muito sereno. Oliver não disse nada. O olhar do Blake se dirigiu ao golpe na face de Caroline. —Golpeou-a já, Prewitt? Caroline, golpeou-te? Ela afirmou com a cabeça, hipnotizada pela mal contida fúria dele. —Já vejo — disse Blake brandamente, tirando as luvas enquanto passava à sala. As entregou na mão de Caroline, que as recolheu sem dizer uma palavra. Blake girou para o Oliver. —Isso, temo que foi um engano. Os olhos de Oliver saíram de suas órbitas. Era claro que estava aterrorizado. —Perdão? Blake deu de ombros. —Em realidade, odeio ter que lhe tocar, mas... PUM! O punho de Blake entrou em contato com a concha do olho do Oliver; o ancião cambaleou até cair ao chão. A boca de Caroline se abriu de par em par. Sua cabeça girava olhando primeiro ao Blake, depois ao Oliver e de novo ao Blake. —Parecia tão tranquilo. Seu marido unicamente a olhou. —Fez-te mal? —Fez-me... não, bom sim, só um pouquinho— ela colocou sua mão na face. POM! Blake deu no Oliver um chute nas costelas e se voltou para ela. —Isso por machucar a minha esposa. Ela tragou saliva. —Em realidade foi mais a comoção que qualquer outra coisa, Blake, talvez não deveria... POM! Blake deu no Oliver um pontapé no quadril. —Isso — disse repentinamente — por assustá-la. Caroline pôs a palma de sua mão na boca afogando uma risada nervosa.
—Há algo mais que precise me dizer? Ela negou com a cabeça, temendo que se voltasse a abrir a boca outra vez, ele mataria ao Oliver. Não é que esse não fosse o melhor lugar para fazê-lo, mas não desejava que Blake fosse à forca. Blake levantou ligeiramente sua cabeça para um lado enquanto a olhava mais atentamente. —Estás sangrando — sussurrou. Ela levou sua mão para a face e a olhou. Havia sangue em seus dedos, não muito, mas sim o suficiente para pressionar instintivamente sua mão contra a ferida. Blake tirou um lenço e ela esticou a mão para pegá-lo, mas ele esquivou sua mão para passar com suavidade o linho, branco como a neve, sobre sua face murmurando. —Me deixe fazer. Caroline nunca teve a ninguém que curasse suas feridas antes, grandes ou pequenas, e achou o contato estranhamente apaziguador. —Deveria trazer um pouco de água para limpar isto — disse secamente. —Estou segura de que está bem. Só é um corte superficial. Ele fez um sinal afirmativo com a cabeça. —Por um momento acreditei que te deixara cheia de cicatrizes. O teria matado por isso. Oliver emitiu um gemido do chão. Blake olhou Caroline nos olhos. —Se me pedir isso, o matarei. —Oh, não, Blake. Não. Assim não. —Que diabos quer dizer com" assim não"? — espetou Oliver. Caroline olhou para baixo. Evidentemente ele recuperou os sentidos, ou possivelmente nunca o perdeu. Ela disse: —Entretanto, não me importaria se o jogasse da casa a chutes. Blake afirmou com a cabeça. —Com muito prazer. Levantou o Oliver pela gola da camisa e pelos fundilhos da calça e se encaminhou a largos passos para o vestíbulo. Caroline o seguia a toda pressa dando um chute quando Oliver bramou: —Chamarei o magistrado! Verá se o faço! Pagará por isso!
—Eu sou o magistrado — disse Blake mordazmente. — E se voltar a entrar outra vez em minhas propriedades te prenderei eu mesmo. Dizendo isso, jogou-o sobre os degraus da entrada e bateu a porta. Deu meia volta e observou a sua esposa, que permanecia de pé no vestíbulo lhe olhando boquiaberta; ainda ficava um pouco de sangue em sua face e um pouco mais na ponta de seus dedos, e ele encolheu o coração. Sabia que ela não sofrera uma ferida grave, mas de algum modo isso não importava. Prewitt a feriu e ele não esteve ali para impedi-lo. —Sinto muito — disse com uma voz que estava entre um sussurro e um gemido. Ela piscou. —Mas por quê? —Deveria estar aqui. Nunca devia te deixar vê-lo a sós. —Mas você nem sequer sabia que ele estava aqui. —Isso não vem ao caso, você é minha esposa e eu jurei te proteger. —Blake — disse delicadamente — você não pode salvar a todo mundo. Ele deu uns passos para ela, sabendo que seu coração se refletia em seus olhos, mas por alguma razão não lhe importou esta debilidade. —Sei. Só quero salvar a ti. —Oh, Blake. Abraçou-a pegando-se a ela, sem prestar atenção ao sangue de sua face. —Não te falharei outra vez — jurou. —Você nunca poderia me falhar. Ele ficou rígido. —Falhei a Marabelle. —Disse-me que por fim aceitou que sua morte não foi por sua culpa — disse ela com um ligeiro rebolado. —É verdade, o fiz. Ele fechou os olhos por um momento. —Ainda me obceca, se a tivesse visto...
—Oh, não — gemeu ela— Eu não sabia que estava ali, não sabia que você viu como a assassinavam. —Eu não vi — disse ele rotundamente— estava na cama com a garganta doendo. Mas quando ela não retornou a sua hora, Riverdale e eu saímos a procurá-la. —Sinto muito. A voz dele ia se fazendo cada vez mais vazia ao mesmo tempo que avançava nas lembranças. —Havia muito sangue, dispararam-lhe quatro vezes. Caroline pensou no sangue que emanou da ferida pouco profunda de Percy. Nem sequer se podia imaginar quão terrível tivesse sido ver a pessoa amada ferida de morte. —Quem dera soubesse o que dizer, Blake. Ele dirigiu seu rosto para ela bruscamente. —Você a odeia? —A Marabelle? — perguntou ela surpresa. Ele fez um movimento afirmativo com a cabeça. —É obvio que não! —Disse-me uma vez que não desejava competir com uma mulher morta. —Bom, estava ciumenta —disse ela timidamente — não a odeio, isso seria intolerável por minha parte, não acredita? Ele agitou sua cabeça em gesto negativo, como se descartasse o assunto. —Só estava perguntando, não me zangaria se o fizesse. —Marabelle é uma parte de sua vida — disse — Como posso odiá-la quando ela foi tão importante para fazer de ti o homem que é agora? Ele observou seu rosto, procurando algo com seus olhos; Caroline se sentiu nua sob seu olhar. Ela disse brandamente: —Se não fosse por Marabelle, pode ser que não fosse o homem que eu... — tragou saliva, reunindo sua coragem. — Pode ser que não fosse o homem que eu amo. Ele a olhou atentamente durante um longo momento e depois tomou sua mão. —Este é o sentimento maior que jamais me tenha mostrado alguém. Ela o olhou fixamente a ele através de seus olhos úmidos aguardando, esperando, rezando por
que lhe devolvesse o sentimento. Olhou-a como se queria lhe dizer algo importante, mas depois de uns segundos simplesmente clareou a garganta e disse: —Estava trabalhando no jardim? Ela fez um gesto afirmativo, tragando o nó de desilusão que se formou em sua garganta. Ofereceu-lhe seu braço. —Escoltarei-te de volta. Eu gostaria de ver o que fez. Paciência, disse Caroline. Recorda, paciência. Mas era mais fácil dizê-lo que fazê-lo quando a gente estava cortejando um coração quebrado. Mais tarde essa noite, Blake estava sentado em seu escritório às escuras, olhando pela janela. Ela dissera que o amava. Essa era uma tremenda responsabilidade. No mais profundo de seu ser, sabia que lhe importava enormemente, mas fazia muito tempo que ele não acreditava no conceito do amor; não pensou que o reconheceria quando surgisse, mas existia, e ele se dava conta, e sabia que os sentimentos de Caroline eram verdadeiros. —Blake? Ele levantou o olhar. Caroline permanecia de pé na porta erguendo de novo sua mão para bater sobre a porta. —Por que está sentado aí na escuridão? —Só estou pensando. —Oh — Ele sabia que ela queria perguntar algo mais. Em lugar disso, ela sorriu indecisa e disse: —Você gostaria que te acendesse uma vela? Ele moveu sua cabeça em atitude negativa, ficando lentamente de pé. Teve o imperioso desejo de beijá-la. Não era estranho que quisesse beijá-la, ele sempre queria beijá-la. O que era estranho era a intensidade dessa necessidade. Era quase como se absolutamente, definitivamente ele soubesse que se não a beijasse a cada minuto, sua vida mudaria para sempre, e não para melhor. Precisava beijála. Isso era tudo o que sabia. Ele caminhou cruzando a sala como em um transe. Ela disse algo, mas ele não ouviu suas palavras, só seguia movendo-se lentamente, inexoravelmente para ela. Os lábios de Caroline se abriram ligeiramente com surpresa. Blake se comportava de forma muito estranha, era como se sua mente estivesse em outra parte, e ainda assim ele a olhava com uma intenção das mais estranhas. Ela sussurrou seu nome pelo que acreditava ser a terceira vez, mas ele não respondia, e chegou até a colocar-se frente a ele.
—Blake? Ele tocou sua face com uma ternura que lhe fez estremecer. —Acontece algo mau? —Não — murmurou — não. —Então o que... Algo que ela desejasse dizer se perdeu enquanto ele a puxava para ele, capturando com sua boca a dela com enorme delicadeza. Ela sentiu como uma das mãos dele se afundava em seu cabelo, enquanto a outra percorria as costas em toda sua longitude antes de posar-se sobre a curva de seu quadril. Logo a deslocou até onde começa o traseiro, empurrando-a contra seu corpo até que ela pôde sentir a força de sua ereção. Ela recostou sua cabeça para trás enquanto gemia seu nome e os lábios dele sulcavam a linha de sua garganta, beijando pelo caminho até chegar ao corpete de seu vestido. Ela deixou escapar um pequeno grito quando a mão dele se deslizou desde seu quadril até suas nádegas e apertou, e o som deve ter quebrado o feitiço em que ele se encontrava, porque repentinamente ficou congelado, sacudiu a cabeça um pouco e se retirou para trás. —Sinto muito — disse piscando — não sei o que me aconteceu. Ela abriu a boca de repente. —Sente? Ele a beijou até que ela mal podia manter-se de pé e depois parou e disse que "sentia"? —Foi a coisa mais estranha — disse, mais para si mesmo que para ela. —Eu não acreditei que isso fosse estranho — murmurou ela. —Precisava te beijar. —Isso é tudo? — deixou escapar ela. Ele sorriu lentamente. —Bom, a princípio sim, mas agora... —Agora o que? — perguntou ela. —É uma raposa impaciente. Ela bateu o pé. —Blake, se você não...
—Se eu não o que? — perguntou com um sorriso absolutamente malvado. —Não me faça dizê-lo — murmurou recuperando-se pouco a pouco de um tom totalmente vermelho. —Acredito que deixaremos isso para a semana que vem — murmurou — depois de tudo, você ainda é inocente. Mas por agora acredito que deveria te apressar. —Me apressar? Ele afirmou com um gesto. —Rápido. —Por que? —Está a ponto de descobri-lo. Ela deslizou para a porta. —E se quero ser pega? —Oh, definitivamente, você quer ser pega— respondeu ele avançando para ela com a ágil elegância de um autêntico predador. —Então por que deveria me apressar? — perguntou ela sem fôlego. —Em realidade é mais divertido desse modo. —É? Ele afirmou. —Confia em mim. —Hmmm... Notáveis últimas palavras— mas inclusive enquanto ela dizia isso, estava já no vestíbulo caminhando de costas para a escada com uma velocidade admirável. Ele lambeu os lábios. —Oh, então seria melhor que eu... Deveria... Ele começou a mover-se mais depressa. —Oh, Deus— ela saiu à carreira rindo enquanto subia as escadas. Blake a alcançou quando chegaram ao piso superior, levantando-a sobre seus ombros e levandoa com protestos pouco convincentes e outros, a seu dormitório. Depois de dar um chute à porta para abri-la, procedeu a lhe mostrar o por que ser pega era frequentemente inclusive mais divertido que a perseguição.
Capítulo 23
San-guine (adjetivo). Esperançado ou crédulo com respeito a algum tema em particular. sanguin-ar-y (adjetivo). Está presente nos derramamentos de sangue, caracteriza-se por quem mata com brutalidade. Depois desta noite, não voltarei a confundir as palavras sanguíneo (sanguine) e sanguinário (sanguinary). — Do dicionário pessoal de Caroline Ravenscroft. Caroline entrecerrou os olhos para ver o horizonte, mas com a bruma escura da noite não podia ver nada; isto não a surpreendeu. Blake e James nunca seriam tão estúpidos para usar uma lanterna; provavelmente estariam escondidos detrás de uma rocha ou um arbusto usando a débil luz da lua para espiar as atividades que aconteciam abaixo na praia. —Não vejo nada — disse ao Oliver. — Deve estar equivocado. Ele moveu sua cabeça muito lentamente para o rosto dela. —Em realidade, você acredita que sou idiota, verdade? Ela meditou. —Não, não um idiota. Muitas outras coisas, mas não um idiota. —Seu marido — disse ele apontando para frente —está escondido entre essas árvores. —Possivelmente deveríamos lhe avisar de nossa presença? — perguntou ela com esperança. —Oh, nós os avisaremos, não tema. Oliver deteve o calesín com um puxão cruel das rédeas e a empurrou para o chão. Caroline caiu de lado, tossindo, sobre a sujeira e a grama. Ela levantou a vista só para ver seu anterior tutor tirar uma arma. —Oliver... Ele apontou com a arma a sua cabeça. Ela fechou sua boca. Ele começou a caminhar sacudindo sua cabeça à esquerda. —Começa a caminhar. —Mas isto é o escarpado.
—Há um caminho. Segue-o. Caroline olhou abaixo. Um atalho estreito foi construído na colina íngreme. O caminho ziguezagueava descendo para a praia, e não precisava muito mais que um vento forte para jogar pedrinhas colina abaixo. Não parecia seguro, mas era muito mais atraente que uma bala da arma do Oliver. Ela decidiu seguir suas instruções. —Necessitarei que desate minhas mãos— disse ela —para me equilibrar. Ele franziu o cenho, depois acessou murmurando: —Não me serve morta. Ela começou a respirar com um suspiro de alívio. —Ainda não. O estômago dela se agitou. Ele terminou de desatar suas mãos e a empurrou até a borda, pensando em voz alta. —Em realidade poderia ser mais útil como viúva. Esta vez, o estômago dela ia arrojar seu conteúdo, mas ela tragou a bílis, tossindo pelo gosto ácido de sua boca. Seu coração podia ir a toda velocidade, ela podia sentir-se aterrorizada, mas precisava ser forte pelo Blake. Ela deu uns passos sobre o atalho e começou a descer. —Não tente nenhum movimento em falso — disse ele — seria inteligente se recordasse que tenho uma arma apontada para suas costas. —Não é provável que esqueça— disse ela mordazmente— tocando com a ponta dos pés a sua frente para notar as pedras que se desprendiam. Maldição, mas este atalho era traiçoeiro de noite. Ela realizou grandes caminhadas em atalhos parecidos durante o dia, mas a luz do sol era um aliado poderoso. Ele apertou o cano da pistola contra as costas. —Mais rápido. Caroline balançou seus braços grosseiramente para manter o equilíbrio. Quando ficou tranquila de que já não ia cair para morrer, disse-lhe bruscamente. —Não vou morrer com o pescoço quebrado, e me acredite, se começar a cair, a primeira coisa que vou segurar é a sua perna. Isso fechou a boca dele, e não a voltou a incomodar até que estivessem a salvo na praia. —Vou matá-la — disse Blake em voz baixa.
—Perdoa, mas a terá que resgatar primeiro — recordou-lhe James — e poderia querer guardar suas balas para o Prewitt. Blake lhe lançou um olhar decididamente nada divertido. —Vou amarrá-la estupendamente bem ao poste da cama. —Já o tentou uma vez. Blake girou violentamente. —Como pode permanecer aí e fazer malditas piadas? — perguntou-lhe — Tem a minha esposa. Minha esposa! —E qual, perdoa que te diga, é a utilidade de catalogar o modo e o método de castigá-la? Como é que pensa resgatá-la? —Eu disse que ficasse ali — resmungou Blake. — Jurou que não abandonaria Seacrest Manor. —Possivelmente te escutou, possivelmente não; de qualquer modo, não há a mínima diferença ante esta situação. Blake se dirigiu para seu melhor amigo, mantendo em seu rosto uma estranha combinação de medo e arrependimento. —Temos que resgatá-la. Não me importa se perdermos ao Prewitt, não me importa se a maldita missão se arruína por completo. Nós... James estendeu sua mão sobre o braço do Blake. —Sei. Blake indicou com a mão aos outros dois homens do Ministério de Defesa que dessem a volta e lhes explicou a situação. Não tinham muito tempo para planejar. Oliver já estava obrigando Caroline a descer para a praia, mas fazia muito tempo que Blake aprendera que não havia um substituto para a boa comunicação, assim se reuniram para ficar de acordo na estratégia. Desgraçadamente, esse foi o momento em que os homens do Oliver escolheram para atacar. Uma vez na praia, Caroline se deu conta de que a água do Canal não era tão tranquila como ela acreditava; e não era o vento o que originava essa agitação. Um pequeno barco que ela reconheceu como do Oliver estava amarrado perto da praia. —Onde diabos estiveste? Caroline girou e piscou surpresa. A voz soou como se pertencesse a um tipo de pessoa grande e corpulento; mas o tipo que andava
sob a luz da lua era magro e de uma elegância perturbadora. Oliver sacudiu sua cabeça dirigindo-se para o barco e se equilibrou dentro da água, arrastando Caroline com ele. —Detive-me necessariamente. O outro homem examinou Caroline com atenção e de forma descortês. —É muito atraente, embora não precisamente irresistível. —Não é tão atraente — disse Oliver maliciosamente— mas está totalmente casada com um agente do Ministério de Defesa. Caroline ficou sem fôlego e tropeçou caindo de joelhos, encharcando a saia de cima a baixo. Oliver deixou escapar uma gargalhada triunfante. —Simplesmente uma teoria, minha querida Caroline, e uma que acaba de confirmar. Ela cambaleou para trás, balbuciando e amaldiçoando-se todo o tempo. Como podia ter sido tão estúpida? Ela sabia que devia reagir melhor, mas Oliver a surpreendera. —É idiota? — sibilou o outro homem — O francês nos paga suficiente por este carregamento para nos deixar bem de vida. Se tiver comprometido nossa oportunidade... —Carregamento? — perguntou Caroline. Ela acreditava que Oliver estivesse levando mensagens e documentos secretos, mas a palavra carregamento parecia indicar algo maior. Poderiam estar fazendo contrabando de munição? Armas? O barco não parecia suficientemente grande para transportar algo tão grande. Os homens a ignoraram. —A esposa de um agente — murmurou o desconhecido. — Por todos os diabos, você é estúpido. Quão último precisamos é a atenção do Ministério de Defesa. —Nós já tínhamos essa atenção — Oliver se lançou para trás, puxando Caroline e metendo-se mais profundamente na água. —Blake Ravenscroft e o marquês de Riverdale estão no escarpado; estiveram te observando toda a noite, se não tivesse sido por mi... —Se não tivesse sido por ti — interrompeu o outro homem, puxando Caroline contra ele — nunca teríamos sido descobertos, em primeiro lugar. Seguro que Ravenscroft e Riverdale não se inteiraram de nossa tarefa por mim. —Conhece meu marido?—disse Caroline, muito surpresa para lutar. —Sei dele — respondeu. —- E amanhã, saberá dele toda a França.
—Deus bendito — sussurrou ela. Oliver deve contrabandear uma lista dos agentes. Agentes que então seriam alvos dos assassinos. Agentes como Blake e James. Ela pensou em dez planos diferentes, e descartou todos. Um grito parecia menos útil; se Blake estava observando a praia, certamente já a teria visto e não precisaria alertá-lo de sua presença; e atacando ao Oliver ou ao agente francês só conseguiria que a matassem. A única possibilidade era ficar quieta algum tempo, até que Blake e James chegassem. Mas então o que aconteceria? Eles não teriam o elemento surpresa. Oliver sabia que eles estavam ali. Ela conteve a respiração. Oliver parecia totalmente despreocupado pela presença do Ministério de Defesa. Sem pensar, ela olhou para o topo do escarpado, mas não viu nada. —Seu marido não vai te resgatar — disse Oliver com uma cruel satisfação. — Meus homens os estão vigiando inclusive enquanto falamos. —Então por que me trouxe aqui? — sussurrou com o coração destroçado dentro do peito. — Não me necessitava. Ele deu de ombros. —Por capricho. Queria que ele soubesse que te tinha. Queria-a para que me visse te deixar com o Davenport. O homem ao qual chamou Davenport riu e a puxou para ele. —Ela pode tentar me entreter. Oliver franziu o cenho. —Antes de deixar você levá-la, devemos escapar. —Não posso ir a nenhum lugar até que chegue o carregamento — espetou Davenport. —Onde diabos está ela? Ela? Caroline piscou e tentou não mostrar nenhuma reação. —Está chegando — disse Oliver de repente. — E quanto tempo faz que conhece o Ravenscroft? —Alguns dias, possivelmente uma semana, você não é meu único meio de transporte. —Você deveria ter dito isso — grunhiu Oliver. —Não me deste nenhuma razão para confiar em ti com nenhuma outra coisa que não seja fornecer-me um barco. Caroline se aproveitou de que um dos homens estava discutindo, para percorrer a praia e o escarpado com o olhar procurando algum sinal de movimento. Blake estava ali em cima lutando por
sua vida e não havia nenhuma maldita coisa que ela pudesse fazer a respeito disso. Nunca se sentira tão desesperada em sua vida, nem sequer com o desfile de seus horríveis tutores, ela sempre se obstinou à esperança de que finalmente sua vida seria normal, mas se matassem ao Blake... Sufocou um soluço. Era horrível até de pensar. E então, pelo canto do olho, viu movimento ao fundo do atalho pelo que acabava de descer; lutou com a urgência de voltar a cabeça e olhar se por acaso eram Blake e James que vinham a resgatá-la, mas não queria arruinar o elemento surpresa. Mas pela figura que se aproximava arrastando-se, Caroline percebeu que era muito pequena para ser Blake ou James, ou qualquer homem desse tamanho; de fato, movia-se de um modo decididamente feminino. Seus lábios se abriram com surpresa. Carlotta De Leão. Tinha que ser. A ironia era assombrosa. Carlotta se aproximava, silenciosamente clareando sua garganta uma vez que esteve ao alcance do ouvido. Oliver e Davenport pararam a discussão imediatamente e se dirigiram para ela. —Tem-no? — perguntou-lhe Davenport. Carlotta afirmou com a cabeça e falou; sua voz tinha um acento indefinido e alegre. —Era muito perigoso trazer a lista, mas a tenho na memória. Caroline olhou à mulher que, de certo modo, era a responsável por seu matrimônio com Blake. Carlotta era pequena, com pele de alabastro e cabelo negro, seus olhos tinham um olhar envelhecido, como se pertencessem a alguém muito mais velho. —Quem é esta mulher? — perguntou Carlotta. —Caroline Trent — respondeu Oliver. —Caroline Ravenscroft — espetou ela. —Ah, sim, Ravenscroft, que tolo me esquecer que você agora é uma esposa — Oliver tirou seu relógio de bolso e o abriu de repente. — Me perdoe, agora uma viúva. —Verei-te no inferno — sibilou ela. —Disso não tenho dúvida, mas acredito que antes achará muito mais interessante a presença do senhor Davenport. Caroline esqueceu completamente que o mencionado senhor Davenport estava segurando seu braço e investiu contra Oliver. Davenport se manteve firme, mas ela conseguiu dar um soco no estômago do Oliver. Ele se dobrou de dor, mas infelizmente não perdeu o controle de sua pistola. —Minhas felicitações — disse Davenport em voz baixa e zombadora — esperei fazer isso
durante meses. Caroline deu meia volta. —De que lado está você? —Do meu. Sempre. Então levantou seu braço, mostrando pela primeira vez uma pistola negra e reluzente e disparou ao Oliver na cabeça. Caroline gritou. Seu corpo se sacudiu pelo impacto da arma, e seus ouvidos zumbiam e soavam pela explosão. —Oh, Meu Deus — gemia — Oh, Meu Deus. Ela não gostava muito do Oliver, inclusive estava de acordo em proporcionar ao governo informação que o pudesse enviar à forca, mas isto... isto era muito. Sangue em seu vestido e nas ondas cheias de espuma, o corpo do Oliver flutuando de barriga para baixo na água... Ela se afastou de Davenport retorcendo-se e vomitou. Quando pôde erguer-se de novo, dirigiu-se para seu novo sequestrador e simplesmente perguntou: —Por quê? Ele deu de ombros. —Sabia muito. Carlotta olhou Caroline e de forma lenta e proposital, mudou seu olhar para Davenport. —Assim — disse nesse delicado acento espanhol que Caroline começava a detestar. —É ela. A primeira coisa que pensou Blake quando ouviu o disparo foi que sua vida terminara. Seu segundo pensamento foi exatamente o mesmo, embora não pela mesma razão. Mal se deu conta de que não estava morto, e que James trazia o rufião que tentava acertar uma bala certeira na sua cabeça, lhe ocorreu que o disparo que ouviu não foi o suficientemente forte para ter sido disparado sobre a colina. Vinha da praia, e isso só podia significar uma coisa, Caroline morreu, e sua vida se acabou. A arma caiu das mãos, e por um momento ficou débil, incapaz de mover-se. Pelo canto de sua visão, viu um dos homens de Prewitt caminhando para ele, e só no último momento recuperou o suficiente sangue-frio para voltar-se e golpear ao homem no estômago. Agachou-se com um grunhido de dor enquanto Blake o vigiava, com o som do balaço da praia ainda em sua mente. Meu Deus, nunca disse que a amava. James chegou correndo pelo outro lado com um pedaço de corda pendurado em suas mãos.
—Este é o último deles — disse ajoelhando-se para atar ao homem que caíra. Blake não disse nada. James não parecia dar-se conta da angústia de seu amigo. —Derrubamos um homem, mas acredito que viverá. Só tem uma ferida de faca no ombro, a hemorragia está quase sob controle. Blake via o rosto dela, seus risonhos olhos azul-esverdeados e o lábio superior delicadamente arqueado que suplicava ser beijado. Podia ouvir sua voz, sussurrando palavras de amor, palavras que nunca lhe devolvera. —Blake? A voz de James o tirou de seus pensamentos e de sua continua dor, e baixou a vista. —Temos que começar. Blake só voltou a olhar à praia. —Blake? Blake? Está bem? — James ficou de pé e apalpava a seu amigo por cima da roupa, procurando alguma ferida. —Não, eu... E então viu, um corpo flutuando na praia, sangue na água. E Caroline viva! A mente de Blake voltou a vida de repente, e seu corpo também. —Qual é a melhor forma de descer? — perguntou bruscamente. —Não temos muito tempo. James sopesou a maneira em que o homem e a mulher que mantinham a Caroline sequestrada, estavam discutindo. —Não — assentiu — não temos. James recuperou sua arma do chão e se dirigiu ao James e ao William Chartwell, o homem ileso do Ministério de Defesa. —Temos que descer o mais silenciosamente possível. —Há dois atalhos — disse Chartwell — examinei ontem o terreno. Este que usou Prewitt para obrigar a ela a descer à praia, e outro, mas... —Onde está? — interrompeu Blake. —Lá — respondeu Chartwell sacudindo sua cabeça. — Mas...
Blake já saíra correndo. —Espera! — sibilou Chartwell — esse é muito escarpado, será impossível descer à noite. Blake se agachou onde começava o atalho e entrecerrou os olhos, a luz da lua lhe proporcionava uma bonita e pequena claridade. Ao contrário do outro caminho, este estava protegido por árvores e arbustos. —É nossa única esperança de descer sem que nos descubram! —É um suicídio! — exclamou Chartwell. Blake se voltou vertiginosamente. —Minha mulher está a ponto de ser assassinada. E sem esperar para ver se seus outros companheiros o seguiam, começou o percurso lento e traiçoeiro até a praia. Era cansativo não poder correr apressadamente pela ladeira, cada segundo era crucial se queria voltar para sua casa em Seacrest Manor com Caroline segura em seus braços; mas o terreno não permitia nenhuma outra coisa que diminutos passos de bebê. Fosse como fosse, ele precisava fazer a maioria do trajeto de lado para não perder o equilíbrio. Ouviu um pequeno cascalho rodar pelo pendente atalho e então sentiu como se golpeasse seu tornozelo. O alvoroço só podia significar (graças a Deus) que James o seguia. Com respeito ao Chartwell, Blake não o conhecia o suficientemente bem para predizer o que faria, mas tinha suficiente confiança no Ministério de Defesa, para saber que ao menos não faria nada que arriscasse o resgate de Caroline. Enquanto descia, o vento mudou e começou a levar sons da praia. O homem e a mulher que tinham a Caroline sequestrada estavam discutindo. A voz de Prewitt estava claramente ausente e Blake só podia dar por fato que ele era o corpo que flutuava na praia. Então foi quando ouviu o pranto brusco de Caroline. Blake se obrigou a tranquilizar-se. O pranto dela era mais de surpresa que de dor e precisava manter a cabeça fria se queria chegar ao final do atalho inteiro. Chegou a uma pequena saliência e parou para recuperar a respiração e analisar a situação. Uns segundos mais tarde, James estava a seu lado. —O que acontece? — perguntou James. —Não estou seguro. Ela parece ilesa. Mas ainda não sei como podemos chegar lá e salvá-la. Especialmente quando todos estão de pé na água. —Ela sabe nadar? —Diabos, não tenho nem ideia. —Bom, ela cresceu ao lado da costa, podemos pensar que sim, e... meu Deus!
—O que? A cabeça de James se voltou lentamente para olhá-lo. — Essa é Carlotta De Leão. —Está seguro? —Definitivamente. Blake intuía que seu amigo tinha mais que dizer. —E...? —E isso significa que temos um problema pior de que temíamos - James tragou saliva. —Carlotta De Leão é tão cruel como os que a acompanham e uma fanática da causa. Teria disparado em Caroline com uma mão e usado a outra para passar as páginas da Bíblia. Caroline sabia que o tempo se acabava, Davenport não tinha nenhuma razão para mantê-la com vida; evidentemente só se propunha ter o que ele considerava um pequeno jogo com ela. Provavelmente acreditou que seria interessante tomar a sua maneira à esposa de um agente da coroa. Carlotta, por outro lado, estava mais motivada por razões políticas, a maioria das quais implicavam a queda do Império Britânico. E era óbvio que a mulher acreditava apaixonadamente em sua causa. Seus dois sequestradores estavam discutindo pelo destino de Caroline, e ela não tinha dúvida de que a discussão ia subindo de tom até que só se ouvissem gritos dentro de pouco. Tampouco duvidava que Carlotta sairia vitoriosa, era simples chegar a esta dedução, Davenport sempre poderia encontrar outra mulher a que importunar, e não era provável que Carlotta encontrasse outro país para destruir. E isso significava que Caroline acabaria morta se não fizesse algo logo. Ainda estava presa firmemente pelas garras de Davenport, mas se retorceu até encarar-se com a Carlotta e lhe disse bruscamente. —Eles vão atrás de ti. Carlotta ficou gelada e se dirigiu a Caroline. —O que quer dizer exatamente? —Sabem que está no país. Querem ver-te pendurada. Carlotta riu. —Nem se quer sabem quem sou eu. —Oh, sim, sabem — respondeu Caroline — a senhorita De Leão.
Os dedos da Carlotta ficaram brancos ao redor de sua pistola. —Quem é você? Esta foi a vez de Caroline rir. —Acreditaria que sou a mulher que confundiram contigo? Divertido mas certo. —Só há um homem que me viu. —O marquês de Riverdale— acrescentou Caroline, Oliver já dissera seu nome e o do Blake, assim não parecia que precisasse estar em segredo. —Se pudesse interromp... — chegava a voz sarcástica de Davenport. Bang! A força foi tão grande que Caroline esteve segura de que foi um disparo, mas então ela se deu conta de duas coisas, que não lhe doía, e que a garra de Davenport se afrouxava totalmente. Ela tragou saliva convulsivamente e deu a volta, dois corpos estavam flutuando na água. —Por que fez isso? —Ele me irritava. O estômago vazio de Caroline se agitava quase a ponto de vomitar. —Nunca soube seu nome — disse Carlotta brandamente. —Quem? —O marquês. —Bom, certamente ele sabe o teu. —Por que me conta isto? —Auto conservação, simples e pura. —E com isto pretende te salvar? Os lábios de Caroline se curvaram em um enigmático sorriso. —Se eu sei tanto, só pensa em que mais poderia te dizer. O olhar da mulher espanhola era duro e mordaz. —Se sabe tanto — disse com arrepiante suavidade — então por que não deveria te matar agora mesmo? Caroline lutou por manter a compostura.
Seus joelhos estavam tiritando, e suas mãos tremiam, mas esperava que Carlotta atribuísse isso à água fria que formava redemoinhos ao redor de suas pernas; não tinha nem ideia de se Blake estava vivo ou morto, mas de qualquer forma, ela precisava ser forte. Se ele houvesse (Deus não o quisesse) sido assassinado sobre a colina, ela não ia deixar que o trabalho de sua vida fosse completamente destruído por esta mulher pequena e de grande juba morena. Não lhe importava se morria no processo, mas não ia deixar que essa lista de agentes do Ministério de Defesa saísse do país. —Não digo que saiba muito — disse Caroline finalmente. — Mas poderia saber exatamente o que quer. Houve um momento de silêncio espantoso, e logo Carlotta levantou a arma. —Arriscarei-me. Nesse momento Caroline se deu conta de que lhe ia disparar, não queria morrer, não estava ainda preparada para deixar este mundo. Não queria sentir a dor de uma ferida por arma de fogo, saber que uma bala rasgava sua pele e seu sangue fluía até mesclar-se com a água fria do Canal da Mancha. E que Deus a ajudasse, não podia morrer sem conhecer o destino de Blake. —Não pode! — sibilou. — Não pode me matar! Carlotta sorriu. —Oh? —Não tem balas. —Tenho outra pistola. —Nunca fugirá sem mim. —Como é isso? Caroline afirmou com a cabeça freneticamente, então se deu conta de uma dificuldade para a Carlota, e esteve tão agradecida por isso, que esteve a ponto de fazer uma doação a um convento, só para mostrar sua gratidão. —E por que, rogo-te que me diga isso? —Porque o barco está se afastando. Carlotta deu a volta rapidamente, viu o barco do Oliver que se dirigia para o mar aberto e soltou uma palavra que Caroline nunca ouvira antes uma mulher dizer. Quando os pés de Blake pisaram na praia arenosa, tudo o que pôde fazer foi não correr até o mar e puxar sua esposa para salvá-la. Mas ele escolheu o atalho mais escarpado para não estragar o elemento surpresa e sabia que precisava proceder com cuidado e precaução. James se lançou
brandamente seguindo-o pouco depois, e juntos observaram a cena. Carlotta parecia estar completamente descontrolada, movendo seu punho e gritando maldições ao barco que se afastava; e Caroline muito lentamente se retirava afastando-se pela margem da praia. Mas justo quando imaginou ter chegado o suficientemente longe para que pudesse sair correndo e salvar-se, Carlotta deu meia volta e levantou a arma justo ao peito de Caroline. —Você não vai a nenhum lugar — disse-lhe com voz venenosa. —Não poderíamos ao menos sair da água? — respondeu Caroline. — Já não posso sentir meus pés. Carlotta afirmou secamente com um gesto. —Se mova muito lentamente. Um passo em falso e te matarei, juro que o farei. —Acredito-te — respondeu Caroline com um olhar significativo ao corpo do Davenport. Lentamente, sem afastar os olhos uma da outra, as duas mulheres saíram da água até pisar na praia. Do seu esconderijo entre as árvores, Blake observava toda a conversação, sentia ao James colado a seu lado, e ouviu que lhe murmurava na orelha. —Espera que elas venham um pouco mais perto. —Por quê? — perguntou Blake em resposta. Mas o marquês não respondeu. Blake observava Carlotta como um falcão, esperando o momento certo para disparar a arma e desprendê-la de sua mão. Não havia atirador mais certeiro que ele em toda a Inglaterra, e Blake era consciente de que podia fazê-lo, mas não enquanto Caroline bloqueasse sua trajetória. Mas então, antes que Blake pudesse pará-lo, James começou a andar repentinamente, saindo à zona livre, com ambas as mãos no ar. —Deixa-a ir — disse o marquês em voz baixa. — Eu sou o único que quer. A cabeça da Carlotta se voltou com uma pequena oscilação. —Você! —Em pessoa. A boca de Caroline se abriu de repente. —James? A arma de Carlotta realizou um arco no ar como se ela mudasse seu objetivo. — Estive sonhando com este dia — sibilou ela.
James sacudiu sua cabeça para assinalar a Caroline que saísse dali. —Isto é tudo com o que estiveste sonhando? — ronronou. Caroline reteve sua respiração, James parecia absolutamente sedutor. Que diabos teria acontecido entre esses dois? E onde estava Blake? —Caroline — disse James em um tom firme — te afaste, isto é entre a senhorita De Leão e eu. Caroline não tinha nem ideia do que estava tramando, mas ela não ia deixá-lo a mercê de uma mulher que parecia como se quisesse esfolá-lo vivo. —James — disse ela — talvez eu... —Te mova! — Bramou. Ela o fez, e em menos de um segundo soou um disparo. Carlotta uivava de dor e surpresa, e James atacou para frente e atirando-a ao chão; houve uma briga, mas James pesava uns quarenta quilos mais que a pequena espanhola, e ela não tinha nenhuma possibilidade. Caroline correu para ajudar, mas antes que ela chegasse aonde estavam eles, também foi abordada de onde se encontrava. —Blake? Oh, Blake! — Ela se lançou a seus braços. — Acreditei que nunca te voltaria a ver. Esmagou-a contra ele e a sustentou com todas suas forças. —Caroline — ofegou ele. — Quando vi... quando ouvi... —Acreditei que estava morto. Oliver me disse isso. Blake se aferrou a ela, ainda incapaz de acreditar que estava a salvo; sabia que a segurava apertando muito, que sua delicada pele se machucaria por isso, mas não podia soltá-la. —Caroline— disse-lhe roucamente. — Tenho que te dizer... —Eu não saí de Seacrest Manor — interrompeu-lhe ela apressando-se para falar. — Juro, queria fazê-lo, mas não o fiz porque não queria trair sua confiança, mas então Oliver me sequestrou, e... —Não me importa — meneou sua cabeça negativamente, sabendo que as lágrimas rolavam por suas faces, mas completamente a mercê de suas emoções. — Não me importa nada disso. Eu acreditei que irias morrer, e... Ela sussurrou seu nome e acariciou sua face; e ele estava desfeito. —Amo-te, Caroline. Amo-te, e você ia morrer, e tudo o que eu pensava... —Oh, Blake.
Ele a pegou nos braços mantendo o equilíbrio com todo seu corpo. —Tudo o que pensava era que nunca poderia lhe dizer isso, e que você nunca poderia me ouvir dizer isso e... Caroline colocou um dedo sobre seus lábios. —Amo-te, Blake Ravenscroft. —E eu te amo, Caroline Ravenscroft. —E eu não amo a Carlotta De Leão — resmungou James. — Assim, se algum de vocês se dispor a me ajudar, eu gostaria de imobilizá-la e terminar com ela. Blake se separou de sua esposa com uma expressão de vergonha em seu rosto. —Perdoa, Riverdale. Caroline os seguiu e viu como a espiã espanhola estava atada e amordaçada. —Como pensam subir a colina? —Oh, merda — murmurou James. — Eu não quero carregá-la. Blake suspirou. —Suponho que poderíamos mandá-la em um barco amanhã. —Oh! — exclamou Caroline — acabo de me recordar! Quase me esqueci, vi às pessoas no bote do Oliver antes de que se fossem navegando. Era Milhares Dudley, justo o que pensávamos. Não reconheci ao outro homem, mas estou segura de que se prenderem o senhor Dudley, os conduzirá ao outro. Nesse momento, Chartwell deslizou colina abaixo. —O que aconteceu?— perguntou ele. —Surpreende-me que não visse tudo da segurança do escarpado — disse Blake acidamente. Mas o rosto de James se iluminou. —Não, não, Ravenscroft, não jogue a bronca ao menino. Chega bem a tempo. Chartwell olhou de forma desconfiada. —Bem a tempo para que? —Por que você vigia à senhorita De Leão; nós vamos enviar um barco que venha a lhes buscar pela manhã. E enquanto está aqui, pode tirar esses dois corpos fora da água. Chartwell só afirmou com a cabeça, sabendo que não tinha escolha. Blake olhou a colina.
—Diabos, estou cansado. —Oh, não temos que ir pelo atalho — disse Caroline apontando para o leste. — Se não lhes importa passear uma meia milha mais ou menos pela praia, a colina desaparece, e o caminho é relativamente plano até a estrada. —Eu tomarei o atalho — disse James. —Está seguro? — perguntou ela franzindo o cenho. — Deve estar terrivelmente fatigado. —Alguém precisa ir pegar os cavalos, vocês vão na frente, nos encontraremos na estrada. E antes que algum dos Ravenscrofts pudesse discutir, James partiu e estava brigando com o escarpado atalho. Blake sorriu e pegou a mão de Caroline. —Riverdale é um homem muito inteligente. —Oh, Seriamente? — Caroline ia atrás dele, deixando Chartwell vigiando à prisioneira. —E o que te incitou a fazer essa observação esta vez? —Tenho a sensação de que seria um pouco incômodo que nos acompanhasse. —Oh. Por quê? Blake lhe mostrou sua expressão mais ardente. —Bom, como sabe, há certos aspectos do matrimônio que requerem intimidade. —Já vejo — disse ela gravemente. —Poderia te beijar uma ou duas vezes pelo caminho. —Só duas vezes? —Possivelmente três vezes. Ela fez como quem pensava nisso. —Acredito que três vezes será pouco. —Quatro? Ela riu, negando com sua cabeça e começou a correr pela praia. —Cinco? — propôs ele continuando a seu lado com seus largos passos. —Seis. Prometo seis, e tentarei sete... —Oito! — gritou ela — mas só se me pegar. Ele se forçou a correr e a abordou até acabarem em terra.
—Peguei-te! Ela tragou saliva, e seus olhos se encheram de lágrimas. —Sim, o fez. É muito divertido, em realidade. Blake tocou sua face, sorrindo com todo o amor do mundo. —O que? —Oliver saiu para pegar uma herdeira, você saiu para pegar uma espiã, e ao final... Arrastava as palavras, e sua voz se afogava com a emoção. —E ao final? —Ao final, eu peguei a ti. Ele a beijou uma vez, suavemente. —Certamente que o fez, meu amor. Certamente que o fez.
Seleção do Dicionário Pessoal De Caroline Ravenscroft Julho 1815 non-par-eil (substantivo). Uma pessoa ou coisa que não tem igual. Algo único. Um ano de matrimônio e ainda acredito que meu marido não tem igual (é nonpareil).
Novembro 1815 e-da-cious (adjetivo). Consagrado à comida. Voraz. Estou totalmente faminta agora e levo uma criança dentro de mim, mas ainda não sou tão voraz (edacious) como o estava naqueles dias, enquanto estava presa no quarto de banho do Blake.
Maio 1816 trea-tise (substantivo). Um livro ou escrito que trata de algum tema em particular. Blake encontra tantas coisas das que gabar-se em nosso filho de dois dias que prevejo um tratado (treatise) sobre o tema da mente do David e o encanto de algum dia agora.
Janeiro 1818 col-la-tion (substantivo). Uma refeição ligeira ou refeição. Esta reclusão não é como a última. É um dia abençoado quando não posso nem sequer me arrumar para participar de uma refeição ligeira (collation) fria.
Agosto 1824 cur-sive (adjetivo). De escrita, escrito com uma mão rápida, tanto que os caracteres são velozmente formados, sem elevar a pluma, e em consequência, os ângulos estão arredondados e se forma separando-o por golpes, e se inclina bastante. Hoje tentei lecionar ao Trent na arte da escrita itálica (cursive), mas Blake interveio, afirmando (bastante impertinentemente, em minha opinião) que tenho a escrita de um frango.
Junho 1826 prog-e-ny (substantivo). Descendência, família, prole. Nossa descendência (progeny) insiste em que os buracos espalhados pela parede ao redor do alvo do Blake, foram feitos por um pássaro selvagem que apanharam em casa, mas acho inverossímil esta explicação.
Fevereiro 1827 em-pho-ni-ous (adjetivo). Agradável ao ouvido. Chamamo-la Cassandra em honra a minha mãe, mas ambos estamos de acordo em que tem um agradável som (enphonious) quando soa.
Junho 1827 be-a-ti-fic (adjetivo). Benzendo, dando a conhecer a felicidade suprema. Possivelmente sou uma mulher tola e sentimental, mas às vezes me paro a olhar a meu redor para ver tudo o que é tão prezado para mim ( Blake, David, Trent, Cassandra), e me sinto tão cheia de alegria, que devo sorrir beatificamente (beatific) durante dias. A vida, acredito (sei!) é boa, muito, muito, muito boa.
Fim
A Autora
Julia Quinn começou a trabalhar em seu primeiro romance um mês depois de terminar a faculdade e nunca mais parou de escrever. Seus livros já atingiram a marca de 8 milhões de exemplares vendidos, sendo 3,5 milhões da série Os Bridgertons. É formada pelas universidades Harvard e Radcliffe. Seus livros já entraram na lista de mais vendidos do The New York Times e foram traduzidos para 26 idiomas. Foi a autora mais jovem a entrar para o Romance Writers of America’s Hall of Fame, a Galeria da Fama dos Escritores Românticos dos Estados Unidos, e atualmente mora com a família no Noroeste Pacífico.
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{1}
Flor azul pequena, que requer cuidados especiais, por sua sensibilidade ao clima.
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É um desporto individual ou de duplas, semelhante ao tênis, praticado com raquete e uma peteca.
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Paciência
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Insignificante
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Palavras que se repetem uma e outra vez para aumentar a concentração durante a meditação ou oração.
{6}
Tipo de carruagem