Em constante
adaptação
Você pode moldar seu cérebro da forma que quiser, mas precisa dos estímulos certos (e cometer alguns erros também)
O
s neurônios consistem na unidade básica do sistema nervoso. São eles os responsáveis em receber, processar e enviar informações a outras células, através de sinais elétricos ou substâncias químicas. Aos 17 anos, estima-se que, de toda nossa capacidade intelectual (ou seja, a capacidade de troca de informações entre os neurônios), apenas 30% seja inata, vinda da herança genética. Os 70% restantes teriam se constituído por meio de experiências e aprendizados adquiridos ao longo dos anos de vida. Isso só é possível graças a uma das maiores habilidades do corpo humano: a neuroplasticidade.
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TEXTO E ENTREVISTAS AUGUSTO BIASON/COLABORADOR DESIGN JAMILE CURY GANDARA
Segredos da Mente - O PODER DO CÉREBRO | 15
A plasticidade cerebral é a capacidade que o sistema nervoso central possui de modificar suas propriedades morfológicas e funcionais em resposta às experiências do indivíduo. Ela permite a criação e o fortalecimento das sinapses — as ligações feitas pelas bilhões de células neurais que possuímos. Com isso, pode-se, inclusive, moldar nosso intelecto da maneira que quisermos!
Rumo à superação
Esse processo é mais intenso em nossos primeiros anos, mas ocorre durante toda a vida. Aprender a dar os primeiros passos ou decorar um novo caminho para chegar ao trabalho só é possível graças a essa destreza do cérebro. “O sistema nervoso modifica-se continuamente, já que a plasticidade está associada a cada estímulo sensorial (olfato, tato e audição, por exemplo) e à atividade motora (como equilíbrio e coordenação) que o indivíduo é exposto”, explica a psicóloga cognitivo-comportamental e neurocientista Renata Alves Paes. Isso significa que, apesar da idade avançada, qualquer pessoa pode desenvolver seu cérebro. É como se a ideia de que se está velho demais
Um dos aspectos fortalecidos pela plasticidade é conhecido como resiliência. O termo é oriundo da física e se refere ao nível de resistência à pressão que um material pode sofrer sem que perca suas características e, assim, possa voltar ao seu estado original. Na psicologia, o conceito pode ser definido como a capacidade das pessoas responderem às frustrações diárias, ou seja, é a aptidão de recuperação emocional frente às adversidades. “Indivíduos resilientes conseguem resolver problemas de forma mais adequada, são mais habilidosos em suas ações e lidam com as adversidades sem ressaltar ou destacar os aspectos negativos da situação”, descreve a psicóloga. Como a neuroplasticidade está associada à criação e ao fortalecimento de conexões neurais, e ao consequente processo de transformação e adaptação, fica fácil entender a ligação entre
TORNANDO-SE RESILIENTE Se você chegou até aqui e percebeu que (ainda) não tem essa capacidade de superação, fique tranquilo! A resiliência é uma habilidade construída com o tempo, e você pode começar a mudar esse panorama quando quiser. “O primeiro passo é a autopercepção. Comece a observar como você age no seu dia a dia, tome consciência de seus comportamentos. Esteja aberto para ouvir, sentir e identificar as respostas. São um treino e um aprendizado constantes”, garante a especialista em autoconhecimento e inteligência comportamental Heloísa Capelas. A profissional garante que, ao
fazer isso, é possível atingir a consciência e a aceitação das imperfeições de cada um. Outro ponto importante para essa “transformação” passa pela mudança de postura em relação às adversidades, não se fazendo de impotente frente aos obstáculos. “Mudar o foco é preciso, e isso, muitas vezes, envolve sair da posição de vítima para assumir a responsabilidade pelos acontecimentos”, alerta Heloísa. Para a psicóloga Renata Alves Paes, um ser resiliente “não busca um culpado pelos seus problemas, embora perceba que outras pessoas contribuíram para a situação”.
Sempre presente
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para aprender determinadas coisas caísse por terra. Para tal, é necessário apenas botar a cuca para trabalhar, com treinamentos de repetição e tarefas específicas, por exemplo. “A estimulação deve ser criativa e com aspecto motivacional intenso, já que algo monótono não estimula o cérebro”, assegura Renata.
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os dois termos. Sabe aquele velho ditado que diz que só sabemos fazer boas escolhas se tivermos experiência, e que essa bagagem só é adquirida ao fazermos más escolhas? Troque escolhas por momentos e tudo fará sentido! Só conseguiremos ter momentos positivos se soubermos, com a experiência, superar os acontecimentos negativos. Imagine você se deparando com um grande problema que lhe cause incômodo. A resiliência permite que, ao encontrá-lo em uma segunda ocasião, a solução para essa questão seja encontrada mais facilmente. “Cada comportamento novo ou fortalecido é como se ficasse ‘gravado’. Assim, cada vez que estiver em situações semelhantes, estas conexões serão estabelecidas com maior velocidade e de forma muito natural”, exemplifica Renata. Tudo graças àquela capacidade de adaptação de seu cérebro: a plasticidade.
A necessidade da resiliência
A correria do dia a dia, aliada ao caráter de urgência de diversas situações cotidianas, favorece o surgimento de uma quantidade
significativa de problemas, que podem contribuir para uma instabilidade emocional. Como consequência, um pequeno contratempo pode passar a ser visto de forma catastrófica ou mais complexo do que realmente é, ou então de uma maneira estritamente passiva, deixando a pessoa paralisada diante da questão. O resultado disso pode ser a manifestação de comportamentos agressivos ou de vitimização. Para a coach e especialista em autoconhecimento e inteligência comportamental Heloísa Capelas, “desenvolver a lucidez emocional é um passo importantíssimo e essencial para que a capacidade de superação se torne ainda mais efetiva”. Um dos pontos principais para atingir esse objetivo passa pelo reconhecimento das habilidades de cada indivíduo. Para isso, lembra a profissional, é necessário levar em conta as diversas inteligências que o ser humano possui, como a emocional, espiritual e física, além da supervalorizada capacidade intelectual. “Quando há um equilíbrio, ou seja, quando estamos prontos para ouvir o que dizem as inteligências, ganhamos um poder muito maior frente aos desafios”, frisa.
“Indivíduos resilientes conseguem resolver problemas de forma mais adequada, são mais habilidosos em suas ações e lidam com as adversidades sem ressaltar os aspectos negativos” Renata Alves Paes, psicóloga cognitivocomportamental e neurocientista
CONSULTORIAS Heloísa Capelas, coach, especialista em autoconhecimento e inteligência comportamental e diretora no Centro Hoffman no Brasil, em São Paulo (SP); Renata Alves Paes, psicóloga cognitivo-comportamental e neurocientista.
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