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Eptic On Line, v. XI, n. 3, sep.-dic. 2009 1. Expediente 2. Presentación Artículos 3. Nigerian and Ghanaian film industry: creative capacities of developing countries Alessandra Meleiro

4. O paradoxo da internet regulada: a desregulação dos serviços de valor adicionado no Brasil Miriam Wimmer; Octavio Penna Pieranti

5. Anotações sobre a consolidação do mercado de videocassete no Brasil Zuleika de Paula Bueno

Entrevista 6. As rádios comunitárias como espaços contra-hegemônicos: entrevista com Raquel Paiva Maria Moraes Luz

Especial Rádio Comunitária, política e cultura: reflexões teóricas e desafios metodológicos 7. El oyente comprometido: teorías y preceptos fundadores de las radios participativas en América Latina Isabel Guglielmone

8. Rádios Livres e Comunitárias, Legislação e Educomunicação Cicília M.Krohling Peruzzo

9. Diversidade cultural, cidadania e esfera pública: um olhar sobre as rádios comunitárias no Brasil Sayonara Leal


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10. Diversité culturelle, interculturalité et radios associatives en France, l’exemple Bordelais Jean-Jacques Cheval; Sheila Vanessa Sevilla Zeballos

11. La stratification générationnelles de la radio en France Hervé Glevare

12. La radiodiffusion a Madagascar et son cadre reglementaire: les cas de la «RNM» Et des stations locales privees Solange Razafimbelo-Bruyeron

Investigación 13. Digitalização e estratégias do mercado de TV por assinatura no Brasil Valério Cruz Brittos; Rafael Cavalcanti Barreto; Tamires Gomes

14. TICs e gestão pública em planos diretores de cidades brasileiras Othon Jambeiro; Rosane Sobreira; Priscila Rabelo

15. Coletivos inteligentes: produção colaborativa na Camiseteria.com Cibele Bastos da Costa

Reseña/Nota de Lectura 16. Rádios comunitárias no Brasil e na França: desafios da esfera pública contemporânea Danielle Azevedo Souza


EXPEDIENTE Periódico oficial ULEPICC Revista de Economía Política de las Tecnologías de la Información y Comunicación Volume XI, Numero 3, Sep. a Dic. de 2009

http://www.eptic.com.br ISSN 1518-2487

Revista avaliada como “Nacional A” pelo Qualis/Capes Director César Bolaño (UFS - Brasil) Editor Valério Cruz Brittos (UNISINOS – Brasil) Editores Adjuntos Luis A. Albornoz (Un. Carlos III de Madrid Espanha) Francisco Sierra (Un. Sevilla – España) Apoio Técnico Danielle Azevedo Souza (UFS – Brasil) Elizabeth Azevêdo Souza (UFS - Brasil) Rafael Silva Bispo (UFS - Brasil) Rodrigo Braz (UFS-Brasil) Consejo Editorial Abraham Sicsu (Fund. Joaquim Nabuco – Brasil) Alain Herscovicci (UFES – Brasil) Alain Rallet (Univ. Paris - Dalphine-França) Anita Simis (UNESP - Brasil) Cesare G. Galvan (UFPb - Brasil) Delia Crovi (UNAM - México) Dênis de Moraes (UFF - Brasil) Diego Portales (Univ. del Chile) Dominique Leroy (Un. Picardie – França) Edgar Rebouças (UFPE - Brasil) Enrique Bustamante (UCM – Espanha) Enrique Sánchez Ruiz (UG – México) Francisco Rui Cádima (UNL – Portugal) Gaëtan Tremblay (Un. de Québec - Canadá) Gilson Schwartz (USP - Brasil) Giovandro Marcus Ferreira (UFES - Brasil)

Graham Murdock (Loughbrough Univ. - UK) Guillermo Mastrini (UBA – Argentina) Hans - Jürgen Michalski (Univ. Bremen - Alemanha) Helenice Carvalho (UNISINOS – Brasil) Isabel Urioste (Un. Compiègne – França) Jean-Guy Lacroix (Un. de Québec - Canadá) Jorge Rubem Bitton Tapia (UNICAMP - Brasil) Joseph Straubhaar (Univ. Texas - EUA) Juan Carlos de Miguel (Un. Pais Vasco - Espanha) Luiz Guilherme Duarte (UOPHX - EUA) Manuel Jose Lopez da Silva (UNL - Portugal) Márcia Regina Tosta Dias (FESPSP - Brasil) Marcial Murciano Martinez (UAB – Espanha) Marcio Wohlers de Almeida (UNICAMP - Brasil) Murilo César Ramos (UnB – Brasil) Nicholas Garham (Westminster Unv. - UK) Othon Jambeiro (UFBa - Brasil) Pedro Jorge Braumann (UNL – Portugal) Peter Golding (Loughborough Univ. - UK) Philip R. Schlesinger (Stirling Univ. - UK) Pierre Fayard (Un. Poitiers – França) Ramón Zallo (Un. Pais Vasco – Espanha) Reynaldo R. Ferreira Jr. (UFAL – Brasil) Roque Faraone (Um. de la República - Uruguai) Sérgio Augusto Soares Mattos (UFBA - Brasil)

Sergio Caparelli (UFRGS - Brasil) William Dias Braga (UFRJ - Brasil)


PRESENTACIÓN

O terceiro número da Revista Eptic On Line do ano de 2009 traz um dossiê especial sobre as rádios livres e comunitárias a partir de análises de experiências brasileiras, latinoamericanas, francesas e uma africana. Os estudos foram realizados por experientes pesquisadores brasileiros na temática e contou com a participação especial de um grupo de estudiosos franceses que tem se dedicado ao assunto nos últimos anos. Como é próprio da Economia Política, os trabalhos têm o mérito de articular teoria e análise empírica. O objetivo desta edição da Revista Eptic On Line é contribuir para o debate sobre as rádios livres e comunitárias, ou associativas como são denominadas na França, por meio de análises que mostram a importância desses meios para a democracia, além estudá-las a partir das relações de poder em que estão inseridas. No Brasil, a edição que antecede a realização da primeira Conferência Nacional de Comunicação, espera dar sua contribuição e colocar novos elementos para o debate da temática. Nesse sentido, o número atual conta com uma entrevista com Raquel Paiva, professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO/UFRJ) e fundadora do Laboratório de Estudos em Comunicação Comunitária (LECC), sobre o papel das rádios comunitárias enquanto espaços contra-hegemônicos. A entrevista foi feita por Maria Moraes Luz, mestre em comunicação pela Universidade de Brasília (UnB). No artigo “Rádios Livres e Comunitárias, Legislação e Educomunicação”, Cicília Krohling Peruzzo, professora do Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo e coordenadora do grupo de pesquisa de Comunicação Comunitária e Local, faz um estudo sobre práticas comunitárias de comunicação de dimensão política e educacional, e mostra como a fragilidade da legislação e a lógica capitalista têm dificultado essas práticas, que, segundo a autora, são características da comunicação comunitária. Além disso, a pesquisadora trabalha elementos do conceito de rádio comunitária a partir de uma aproximação histórica com as rádios livres.


Em “Diversidade cultural, cidadania e esfera pública: um olhar sobre as rádios comunitárias no Brasil”, Sayonara Leal, professora do departamento de sociologia da Universidade Brasília e coordenadora do Laboratório de Políticas de Comunicação (Lapcom/UnB), estuda as rádios comunitárias brasileiras entendendo-as como meios de comunicação referenciados na prática comunicativa enquanto ação social que se desdobra tanto em ações de caráter cívico, dialógico, opinativo e criativo, como em ações estratégicas e instrumentais. Para a realização do trabalho, a professora utilizou métodos da pesquisa qualitativa e tomou como objeto de análise 22 rádios comunitárias do Distrito Federal, que foram analisadas a partir de um referencial teórico habermasiano e arendtiano. Isabel Guglielmone, professora do departamento de Tecnologias e Ciências do Homem da Universidade de Compiège (França), em “El oyente comprometido: teorías y preceptos fundadores de las radios participativas en América Latina” mostra como as características que marcaram o surgimento das rádios livres latino-americanas na década de 1940, que incorporaram ao longo dos últimos 60 anos diversas contribuições teóricas do pensamento comunicacional crítico latino-americano, foram impactadas pelo surgimento de novas tecnologias e da convergência. Com o texto “Diversité Culturelle, Interculturalite et Radios Associatives en France, o caso Bordelais”, Jean-Jacques Cheval e Sheila Sevilla Zeballos, professor e estudante de mestrado da Universidade de Bordeaux Michel de Montaigne, respectivamente, fazem um estudo da vocação das rádios associativas francesas para expressar as diferenças e, freqüentemente, apoiar a comunicação intercultural. Os pesquisadores analisam as rádios associativas da cidade de Bordeaux e observam como essas emissoras trabalham e produzem por meio do rádio atores, culturas e identidades acerca de assuntos interculturais. O trabalho “La stratification générationnelles de la radio en France”, de autoria de Hervé Glevare e Michel Pinet, doutores em sociologia e pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa Científica (França), faz um panorama, a partir de dados estatísticos, da rádio francesa nos anos 2000. Para os estudiosos, a idade aparece como variante mais importante para descrever esse campo, sobretudo por conta do modo como a rádio musical privada francesa foi estruturada na década de 1980. Assim, variáveis como classe social,


gênero e cultura ficam em segundo plano, o que comprova uma fragmentação da audiência radiofônica francesa. O artigo “La radiodiffusion a Madagascar et son cadre reglementaire: les cas de la RNM

et

des

stations

locales

privees”

encerra

o

dossiê

sobre

as

Rádios

Comunitárias/Associativas. Elaborado por Solange Razafimbelo-Bruyeron, doutoranda da Universidade de Paris II, o trabalho analisa o atual crescimento das rádios em Madagascar, mostrando que embora esse fato seja motivado pela importância que os serviços oferecidos pelo rádio têm adquirido naquela sociedade, sobretudo após o final da censura e de três décadas de monopólio estatal, as rádios seguem operando de acordo com interesses políticos e comerciais, negligenciando o quadro regulatório e sendo beneficiadas pela não intervenção estatal. Além do especial sobre Rádios Comunitárias, a nova edição da Eptic On Line conta com outros três artigos, três relatos de pesquisa e um resenha bibliográfica. O artigo que abre a atual edição da revista, de autoria de Alessandra Meleiro, pesquisadora pósdoutoral do programa de estudos em Mídia e Filme da Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, faz uma análise das condições de produção cinematográfica na África sub-Sahariana (com exceção da África do Sul) e analisa os fatores determinantes para que essa produção permaneça apoiada por subsídios, equipamentos, expertise e platéias ocidentais. Miriam Wimmer, Octávio Penna Pierante e Márcio Iorio Aranha contribuem com o artigo “O paradoxo da internet regulada: a desregulação dos serviços de valor adicionado no Brasil”. O texto faz uma análise sobre a adequação do conceito de valor adicionado (SVA) ao cenário de convergência entre setores de telecomunicação, mídia e internet, sobretudo no que concerne aos serviços que distribuem conteúdo audiovisual sobre a plataforma da internet. No artigo “Anotações sobre a consolidação do mercado de videocassete no Brasil”, Zuleika Bueno, professora do departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá, faz uma recuperação da história do período de formação e consolidação do mercado de videocassetes no Brasil, reconstruindo o conjunto de práticas econômicas que


definem o videocassete como um novo bem de consumo eletrônico, assim como um novo espaço de ação de políticas cinematográficas. A autora entende que o videocassete é simultaneamente uma tecnologia e uma forma cultural. A sessão de Pesquisa – Investigación- é composta por três relatos que tratam, de maneira geral, do impacto do desenvolvimento das tecnologias da comunicação e da informação na sociedade. A pesquisa “Digitalização e estratégias do mercado de TV por assinatura no Brasil”, desenvolvida por Valério Brittos, professor da Universidade do Vale do Rio Sinos (Unisinos), juntamente com os estudantes de Comunicação Social da mesma universidade, Rafael Cavalcanti Barreto e Tamires Gomes, analisa as novas estratégias mercadológicas desenvolvidas pelo setor de radiodifusão por assinatura para evitar a estagnação do mercado após o advento da digitalização. A investigação realizada por Othon Jambeiro, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Rosane Sobreira, graduada em Arquivologia pelo Instituto de Ciência da Informação/UFBA, e Priscila Rabelo, estudante do Instituto de Ciência da Informação/UFBA, trata do tratamento dado às tecnologias da informação e da comunicação nos planos diretores de cidades brasileiras. O objeto empírico da pesquisa foi constituído pelas duas cidades mais ricas e pelas duas mais pobres de cada Estado brasileiro. A última pesquisa da nova edição da Eptic On Line, intitulada “Coletivos Inteligentes: Produção Colaborativa na Camiseteria.com”, de autoria de Cibele Costa, professora da Faculdade de Administração e Economia do Paraná (Unifae), analisa como as tecnologias da informação e da comunicação têm redefinido a relação entre produtor e consumidor. A autora faz um estudo de caso do blog corporativo camiseteria.com, que utiliza o processo participativo em rede para desenvolver seus produtos. Fechando a última edição Eptic de 2009, Danielle Azevedo Souza, estudante de mestrado do programa de pós-graduação em Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), faz uma resenha do livro “Rádios comunitárias no Brasil e na França: desafios da esfera pública contemporânea”, de autoria da professora Sayonara Leal, que também participa dessa edição da revista. A obra é fruto da tese de doutoramento da pesquisadora


no âmbito do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade de Brasília (UnB). O livro é a oitava obra lançada pela biblioteca Eptic, em parceria com a Fundação Ford. De acordo com Danielle Souza, aliando o arcabouço teórico das Ciências Sociais e a experiência adquirida em suas renomadas pesquisas na área das políticas de comunicação, a autora consegue estabilizar as tensões conceituais existentes nas relações entre Estado, comunidade, espaço público e espaço privado. Apresentada a presente edição da Revista Eptic On Line, desejamos a você, caro leitor, um bom aproveitamento desse material. Esperamos que os trabalhos aqui dispostos provoquem e alimentem novos debates e questionamentos. Não esqueça de enviar novas colaborações para as próximas edições da Revista Eptic. Até Breve, César Bolaño

Valério Brittos

Diretor Eptic On Line

Editor Eptic On Line


Nigerian and Ghanaian film industry: creative capacities of developing countries Dr. Alessandra Meleiro1 meleiro@usp.br

Palavras-chave economia política do audiovisual/ políticas culturais/ cinema: mercado África economia política del audiovisual/ politicas culturales/ cine: mercado en África political economy of audiovisual communication/ cultural policies/ cinema: African market Summary In sub-Sahara Africa - with the possible exception of South Africa - the prohibitive expense of producing films, the poor state of cinema houses, the absence of government support for filmmaking, and the widespread availability of foreign films have tied many filmmakers to foreign funding, equipment, expertise, and audiences. Without question, the emergence of local video industries in Ghana and Nigeria over the past decade represents the most important development in African cinema. 1

Post-Doctoral Researcher at the Media and Film Studies Programme (University of

London/School of Oriental and African Studies. Currently, Research Fellow at the Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). Editor of the series “World Cinema: Industry, Politics and Market” and member of the Editorial Board of “Journal of African Cinemas”; Intellect Publishers, Bristol/ UK.


Resumo Na África sub-Sahariana, com exceção da África do Sul, os gastos proibitivos para se produzir filmes, o péssimo estado das salas de exibição, a ausência de apoio governamental para a atividade, e a disponibilidade ilimitada de filmes estrangeiros, fizeram com que cineastas africanos permanecessem dependentes de apoio, equipamento, expertise e platéias ocidentais – principalmente em festivais europeus e norte-americanos. Neste contexto, a indústria cinematográfica - e do vídeo - em Gana e Nigéria representa o mais importante passo dado pelo cinema africano na última década.

Resumen En la África Subsahariana,con excepción de Áfica del Sur, los gastos prohibitivos para producir filmes, el pésimo estado de las salas de exhibición, la ausencia de apoyo gubernamental para la actividad, y la disponibilidad ilimitada de filmes extranjeros, hicieron con quue cineastas africanos permanecieran dependientes de apoyo, equipamento, experteza y plateas occidentales - principalmente en festivales euopeos y norteamericanos. En este contexto, la industria cinematográfica - y del video - en Gana y Nigeria representan el más impotante paso dado por el cinema africano en la última década.


In April 2008, I took part in the “Creative Africa Initiative” launched at UNCTAD XII, in Ghana, and that fruitful setting, generated synergies between African audiovisual producers and a Brazilian Institute that resulted in an effective international cooperation: the project “Audiovisual Observatory for south-south cooperation”, put into practice by the Instituto Iniciativa Cultural, with the support of the Brazilian Ministry of Culture

and several

international collaborators such as correspondents, academics, analysts and policymakers. The strategy chosen to install this debate on audiovisual policies implies the concept of an internet portal to be used by public, private and third sector organisations, enabling the accomplishment of agreements between Brazilian and African producers, creating a suitable atmosphere for partnerships and agreements of co-production in order to really enable, Brazil, at very low costs, to take part in this kind of market. The guiding principle for the application and development of an internet portal in order to broaden the control over the international distribution of films (which is a basic need for the television and cinematographic industry) is the improvement in the use of information. In this sense, the Internet is presented as an important arena, where the actors of the society and the companies can benefit from the most horizontal and interactive communication provided by the new information technologies in order to set communicative links and, as a result, articulate specific demands from the several social actors and the government. The debate on African audiovisual policies in Brazil started with the launching of the series “World Cinema: Industry, Politics and Market”, which brings specific analysis of Africa. Under a political economy perspective, the series introduces a critical view of the economic issues and social and power relations that surround production, distribution, exhibition and consumption of film as a cultural product. In sub-Saharan Africa - with the possible exception of South Africa - the prohibitive cost to produce films, the poor state of cinema houses, the absence of governmental support for filmmaking, and the large offer of foreign films have tied many filmmakers to foreign funding, equipment, expertise, and audiences.


Thus, African films have been dependent on overseas financial support which conduces to a type of cinematography not always well-received by African audiences. On the other hand, video technology, brought a real cinematic revolution in Ghana and Nigeria in the late 1980s, allowing video-makers to create a tremendously popular cinema for local audiences: features made on video. In the first half of 2007, more than a thousand films were produced, outnumbering all previous records, according to the National Film and Video Censors Board. Undoubtfully, the emergence of local video industries in Ghana and Nigeria over the past decade represents the most important development in African cinema. Although video films have, for a long time, been considered second-rate products of the film industry, the mode of production and distribution of digital video films in Nigeria and Ghana is socially, politically and economically significant. They are sold for home viewing on web sites, showing an online dimension for this phenomenon. The digital video films are also broadcast sold via satellite, as well as at small media outlets which serve the diasporic communities in metropolitan cities, such as New York and London. Freed from the requirements for cultural and economic capital imposed by the film medium and encouraged by new media technologies, international and independent video industries based in Ghana and Nigeria have flourished. The proliferation of video films that satisfy the tastes of African viewers counterbalances the production of “art films”, more or less required by outsiders. The videos locally produced and consumed, basically changed this cultural landscape: the video production is an economic response to a craving for images to which a popular audience can relate. Nollywood – the so-called Nigerian film industry – produces more than a thousand feature films annually, shot on micro budgets and sold to audiences on DVDs, VCDs and video cassettes. Prolifically is not only measured by the number of features produced annually, but


also how some outstanding directors have adopted various formulas to create new markets and attract more audience to their films. In 1989, some Nigerian video-makers began producing their own video features, first in Yoruba, and later in Igbo, Hausa, and English, creating, what soon came to be a vast and prolific industry. In 2000, 20.000 copies of each video produced were distributed within and outside of the country. Nollywood is not dominated by a single popular genre. Instead, themes are affected by regional cultures as much as they are by tastes. The only 35mm film in 2006 was The Amazing Grace, screened at the Cannes market. It was subsequently distributed in Nigeria and South Africa through Nu-Metro cinemas, which have shown a renewed interest in screening films at cinemas before they are released on DVD. Another new format that has allowed films to receive theatrical distribution was used by the director Tunde Kelani, who created an ingenious Mobile Cinema project. For a foreign audience, African films are not frequently shown, or they are screened with limited publicity at alternative venues such as film festivals, museums, universities and independent movie theaters. Nevertheless, Nollywood is also counting on the African Diaspora, particularly in the United Kingdom. To many producers distributing 35mm or high-end digital productions to cinema abroad will hopefully cut out piracy. The film Twisted, was the first film to win a distribution deal with the Odeon cinema chain. Similarly, two other movies, on HD, Mission to Nowhere and Mirror of Beauty, were screened at seven Odeon and Cineworld cinemas in London. The videos are produced as quickly and inexpensively as possible. The Ghanaian director Socrate Safo’s 2005 production, Amsterdam Diary was shot in six days, but, in the same year, Nigerian films had almost destroyed local production. Currently, many producers prefer to trade Nigerian videos rather than to make their own. Distributors, who once bought the duplication rights from Nigerian producers and copied the videos in Ghana, now travel to Nigeria to buy large quantities of video cassettes and carry them into the country to avoid duplication costs. Of course, a weak system for policing piracy laws means that many Ghanaian distributors do not have any incentive to actually buy the rights to the videos.


The cases of Ghana and Nigeria illustrate how the film and video industry, if properly developed, can be indeed a potential source of employment generation, wealth creation and skill development. Positive steps taken by the Nigerian Government to create the necessary policy environment for the growth of the film industry, are evidences that some developing countries have started benefiting from the dynamism of creative economy and allocated policies to enhance their film industry. Also, four directors (Chico Ejiro, Fidelis Duker, Charles Novia and Fred Amata) formed “Project Nollywood” in mid-2007. With assistance from banks, they plan to produce and distribute movies using the local bank branches across Nigeria as sales outlets. Ghana and Nigeria are also examples of how new production and business models have been emerging as alternatives, and how developing countries can harness their creative capacities for development gains. These countries are incorporating technological tools to create their own networks for the production, distribution and consumption of culture, detached from the regulated sectors of cultural production. Bibliography Balogun, Françoise. “A explosão da videoeconomia: o caso da Nigéria”. In Meleiro, Alessandra. Cinema no mundo: indústria, política e mercado. Vol. I: África, São Paulo, Ed. Escrituras, 2007 Garritano, Carmela. Ghanaian Video Goes Global: An Itinerant Cinema of Exile. Paper apresentado na 2007 SCMS Conference (Society for Cinema and Media Studies), Hilton Chicago, Chicago, 2007. Meleiro, Alessandra. “Cinema no mundo: indústria, política e mercado”. Vol. I: África, São Paulo, Ed. Escrituras, 2007


Smith Haydn. International Film Guide 2008, 44th Edition, Wallflower Press, 2008, London United Nations/ UNCTAD. Creative Economy Report 2008: the challenge of assessing the Creative Economy: towards informed Policy-making, 2008, Genebra.


O paradoxo da internet regulada: a desregulação dos serviços de valor adicionado no Brasil

Miriam Wimmer 1 Universidade de Brasília miriam.wimmer@yahoo.com.br

Octavio Penna Pieranti 2 Fundação Getulio Vargas octavio.pieranti@gmail.com

Márcio Iorio Aranha 3 University of Southern California / Universidade de Brasília iorio@unb.br

ABSTRACT The article examines to which extent the concept of value-added services (VAS) remains adequate in a scenario of convergence between telecommunications, media and the internet, specifically as far as audiovisual content distribution services over the internet are concerned, having in view that in Brazil, the characterization of a service as VAS implies exclusion from the ordinary regulatory jurisdiction. Such characterization and consequent immunity to general regulatory rules tend to become more controversial as new services emerge that are 1

Miriam Wimmer é doutoranda em Comunicação na Universidade de Brasília, mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e bacharel em direito formada pela mesma instituição. É pesquisadora do Grupo de Estudos em Direito das Telecomunicações da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (GETEL/UnB) e autora de artigos publicados em revistas nacionais e estrangeiras. 2

Octavio Penna Pieranti é doutorando em Administração, mestre em Administração Pública pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV) e jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É autor do livro Políticas Públicas para Radiodifusão e Imprensa (Ed. FGV, 2007) e organizador e autor dos livros Estado e Gestão Pública: Visões do Brasil Contemporâneo (Ed. FGV, 2006) e Democracia e Regulação dos Meios de Comunicação de Massa (Ed. FGV, 2008). 3

Márcio Iorio Aranha é Visiting Fellow na University of Southern California. Professor de Direito Constitucional e Administrativo da Universidade de Brasília. Coordenador do Grupo de Estudos em Direito das Telecomunicações da UnB (GETEL) e Membro fundador do Centro de Políticas, Direito, Economia e Tecnologias das Comunicações da UnB (CCOM).

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increasingly similar to traditional (tele)communication services, subject to State regulation. Underlying the research is the question if and to which degree State regulation of the internet is legitimate, considering that for many, a high level of freedom and the absence of rules are central elements for the configuration of the internet as a democratic space. KEY-WORDS Mass communication; internet; regulation. Value-added services.

RESUMO O trabalho examina até que ponto o conceito de serviço de valor adicionado (SVA) permanece adequado num cenário de convergência entre setores de telecomunicação, mídia e internet, notadamente no que se refere a serviços que distribuem conteúdo audiovisual sobre a plataforma da internet, tendo em vista que, no Brasil, a caracterização de determinado serviço como SVA implica sua exclusão da jurisdição regulatória comum. Essa caracterização e a conseqüente imunidade às regras regulatórias gerais tendem a se tornar mais controversas na medida em que surgem e se fortalecem serviços que guardam cada vez mais semelhanças com serviços tradicionais de (tele)comunicações, objeto de regulação estatal. Subjacente ao problema de pesquisa está a questão de saber se e até que ponto é legítima a incidência de regulação estatal sobre a internet, tendo em vista que, para muitos, um elevado grau de liberdade de expressão e ausência de regras são elementos centrais para sua configuração como espaço democrático.

PALAVRAS-CHAVE Comunicação de massa; internet; regulação; serviços de valor adicionado. RESUMEN En el texto se cuestiona si el concepto de servicio de valor añadido (SVA) aún es apropiado en un escenario de convergencia entre los sectores de telecomunicaciones, medios de comunicación y de Internet, especialmente con respecto a los servicios que distribuyen contenidos audiovisuales en la plataforma de Internet. En Brasil, la caracterización de determinado servicio como SVA implica su exclusión de la jurisdicción común de reglamentación de los servicios de telecomunicaciones. Esta caracterización y la consiguiente 2


inmunidad a las normas generales de regulación tienden a ser más controvertidas en un escenario en lo cual se consolidan, en Internet, plataformas similares a otras tradicionales en las (tele) comunicaciones, sujetas a la regulación estatal. El problema subyacente de la investigación es la legitimidad de la regulación estatal en Internet, ya que, para muchos, un alto grado de libertad de expresión y la ausencia de normas son elementos claves para la configuración de la red como un espacio democrático.

Comunicación de masas; internet; regulación; servicios de valor añadido. Introdução

No contexto dos debates sobre o futuro da regulação das tecnologias de informação e comunicação (TICs), tem ganhado importância a discussão sobre como regular serviços inovadores que se caracterizam por sua semelhança com serviços de (tele)comunicações tradicionais e pela especificidade de serem prestados, em geral, com base em redes caracterizadas por progressiva ubiquidade (Saccol e Reihnard, 2007) e modularidade (Cowhey e Aronson, 2009), capazes de trafegar inúmeros serviços de telecomunicações por comutação de pacotes em banda larga na internet. As dúvidas acerca do tema decorrem, entre outros motivos, da dificuldade de conciliar a lógica da regulação setorial típica do setor de telecomunicações com a lógica da internet, muitas vezes compreendida como um território essencialmente livre. O Brasil experimenta um fenômeno global, na medida em que serviços prestados com suporte na internet têm sido, em geral, compreendidos como serviços de valor adicionado (SVA), ou seja, serviços que acrescentam, a um serviço de telecomunicações que lhes dá suporte e com o qual não se confundem, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento,

apresentação,

movimentação

ou

recuperação

de

informações.

Tradicionalmente essa interpretação tem ocasionado um vácuo regulatório, representado pela ausência de obrigações sobre as prestadoras, visto que os SVA não se sujeitam à regulação típica dos serviços de telecomunicações e de radiodifusão. Em outras palavras, um site que distribua conteúdos audiovisuais em formato semelhante ao de uma emissora de televisão não

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se submete à regulação aplicada sobre a radiodifusão. Este trabalho examina até que ponto o conceito de SVA permanece adequado num cenário de convergência entre setores de telecomunicações, mídia e internet, notadamente no que se refere a serviços que distribuem conteúdo audiovisual, tendo em vista que, no Brasil, a caracterização de determinado serviço como SVA implica sua exclusão da jurisdição regulatória comum. Essa caracterização e a consequente imunidade às regras regulatórias gerais tendem a se tornar mais controversas na medida em que surgem e se fortalecem serviços que guardam cada vez mais semelhanças com serviços tradicionais de telecomunicações e de comunicação de massa, objeto de regulação estatal. Subjacente ao problema de pesquisa está a questão de saber se e até que ponto é legítima a incidência de regulação estatal sobre a internet, tendo em vista que para muitos um elevado grau de liberdade de expressão e ausência de regras quanto a conteúdos veiculados são elementos centrais para sua caracterização como espaço democrático de discussão pública. Dentre as principais considerações do estudo, encontra-se a constatação de que, no Brasil, o tráfego de serviços de (tele)comunicações tradicionais sobre a internet tem gerado efeitos variados no que se refere ao postulado jurídico de caracterização da internet como livre e desregulada, abrindo-se espaço para novas abordagens regulatórias incidentes sobre os serviços de valor adicionado.

Por que regular a comunicação de massa? Antes do debate sobre a regulação de novos meios, é preciso explorar uma outra questão: por que a comunicação de massa deve ser regulada? A despeito de outras tantas respostas possíveis, este texto concentra-se em quatro interpretações não excludentes. A primeira diz respeito à força dos meios de comunicação de massa na contemporaneidade. Evidências desse poder não faltam: no século XX, o rádio chegou a promover pânico ao anunciar uma invasão extraterrestre, no célebre caso protagonizado por Orson Welles; jornais e revistas impulsionaram a queda de presidentes nos Estados Unidos (Richard Nixon), no Brasil (Fernando Collor) e em outras nações; e a televisão serviu e serve de sustentáculo a diversos regimes políticos, dita costumes e preferências, cria mitos e estimula críticas e elogios.

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No plano teórico, não há consenso sobre a real dimensão de poder dos meios de comunicação. Durante décadas, ganhou relevância a interpretação largamente defendida pela Escola de Frankfurt de que as mensagens dos meios de comunicação eram absorvidas, de forma pouco crítica, pela sociedade. Com o tempo, fortaleceram-se teses cujo enfoque centrava-se na possibilidade de resistência por parte da sociedade ou nas fragilidades inerentes aos próprios meios de comunicação. Na primeira categoria enquadra-se, por exemplo, Habermas (2003) e sua defesa dos meios como instâncias de mediação das demandas originadas na esfera pública. Na segunda, figuram Luhmann (2005), ao entender que os meios são herméticos à participação da sociedade e que a esfera pública é um espaço para a disputa por poder, e autores brasileiros que, a exemplo de Sodré (1999) e Barbosa (2004), preferiram enfatizar a dependência que a imprensa mantém em relação a recursos públicos graças a uma permanente penúria financeira. Por mais que sejam diferentes as interpretações, nenhuma corrente teórica relevante ousou negar o poder, em maior ou menor grau, dos meios de comunicação e ignorá-los como ator social importante para a compreensão da contemporaneidade. Assim, ao regular a comunicação de massa, o Estado assim procede menos por fé cega na regulação, e mais pela convicção de que uma exploração não apropriada dessa atividade ameaça, além dos cidadãos, o seu próprio status quo. É falsa, portanto, a percepção de que regular a comunicação é o mesmo que regular os setores de cosméticos ou de fabricação de biscoitos, dentre outros exemplos similares. Como nenhum desses pode induzir caminhos e descaminhos de uma nação, a eles se aplicam exclusivamente regras naturais da regulação; o mesmo, porém, não é recomendável em relação à comunicação de massa. Como explicita Canela: “A diferença entre regular a mídia e regular outras indústrias reside, sobretudo, no conteúdo veiculado e nas suas implicações: a oferta de acesso às telecomunicações a uma região remota traz impactos para milhares de pessoas e para a economia local; a oferta de cobertura midiática equilibrada acerca das diferentes opções político-partidárias que se apresentam em uma eleição presidencial pode alterar os rumos do país e de sua democracia” (CANELA, 2008, p. 152-3).

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A segunda justificativa para a regulação da comunicação de massa é quase a negativa da primeira: se a regulação é pensada como forma de proteger Estado e cidadãos, a não regulação pode implicar em prejuízos a direitos fundamentais. Sucintamente, o reconhecimento da liberdade de expressão como um dos pilares das sociedades modernas costuma ser identificado com a reflexão de John Stuart Mill no texto Da Liberdade, de 1859. Nesse escrito, Mill aponta a falibilidade humana, principalmente porque a verdade depende do contexto em que cada indivíduo está inserido. Daí advém uma necessária abertura ao permanente questionamento de manifestações individuais: “A completa liberdade para contradizer e refutar nossa opinião é a genuína condição que nos autoriza a considerá-la verdadeira para objetivos de ação: e não há outras condições que permitam a um ser com faculdades humanas ter qualquer garantia racional de estar certo” (Mill, 1974, p. 7).

Originalmente a liberdade de imprensa seria uma extensão da liberdade de expressão: como cada indivíduo podia imprimir seu próprio jornal, a ser lido por uma minoria alfabetizada e preponderantemente residente no meio urbano, a imprensa deveria ser defendida como alternativa para a expressão individual. Com o passar do tempo, no entanto, a atividade de imprensa ganha complexidade e demanda recursos crescentes, tornando-se empreitada para poucos. Alguns autores, percorrendo trilha inicialmente esboçada por Marx, passam, então, a descolar a liberdade de imprensa moderna da concepção de liberdade de expressão própria do século XIX. Para Lenin (1976), em nações capitalistas a liberdade de imprensa era entendida apenas como a ausência de censura explícita, o que garantia a publicação de jornais produzidos por empresas grandes e lucrativas. Restava ao Estado, para intervir no setor, a alternativa de deter o monopólio da publicidade, recurso essencial ao financiamento da comunicação de massa. Para garantir a liberdade de expressão como um direito fundamental e dar voz a todos os cidadãos, cabia ao Estado proporcionar alternativas à concentração dos meios de comunicação de massa nas mãos de poucos proprietários. Para a corrente marxista, isso significava a expropriação dos meios de produção e a estatização da comunicação de massa,

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considerando-se que o Estado era o legítimo representante da sociedade. Para as democracias formais ocidentais, por óbvio, a interpretação desse objetivo dizia respeito ao máximo de pluralismo possível, sem que isso implicasse em estatização. Note-se que mesmo autores liberais, a exemplo de Kelley e Donway (1990), reivindicavam o pluralismo; no entanto, entendiam que a simples existência simultânea de diversos jornais, emissoras de radiodifusão e de outros meios já garante o pluralismo objetivado por uma regulação democrática. Uma terceira justificativa para a regulação da comunicação de massa, também relacionada com a primeira, é a percepção de que a atuação livre dos meios poderia impactar a defesa nacional, na medida em que expõe o país a um ideário nem sempre amigável do ponto de vista da diplomacia. Essa preocupação ganhou relevância com o desenvolvimento de meios de comunicação de longa distância, a exemplo de emissoras de rádio em ondas curtas. Na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, a BBC inglesa produzia programas em cinco idiomas e, em pouco tempo, acrescentaria outros 38 à lista inicial; a Alemanha transmitia em seis idiomas; a Itália, em dezoito; e a União Soviética, em sessenta – em vários casos, as emissoras fingiam ser estações de países inimigos, destinando-se a atividades de propaganda e contrapropaganda (Romais, 1994). No presente, resistem ao tempo antigos serviços nacionais de divulgação por ondas curtas, como, por exemplo, a Voz da América, e propaganda anticomunista continua sendo destinada, a partir de países vizinhos, a nações como Cuba e Coréia do Norte. Note-se que as emissões em ondas curtas guardam uma interessante similaridade com novos meios de comunicação, como a internet: ambas ignoram fronteiras físicas e cruzam nações com informações originadas em países vizinhos. No caso das ondas curtas, isso não significou um abandono da regulação por parte do Estado, mas o estudo de alternativas à regulação tradicional; no caso da internet, tampouco devem ser abandonados os mecanismos regulatórios, ora submetidos a um novo enfoque. Por fim, uma quarta justificativa para a regulação, nesse caso, da comunicação de massa eletrônica é a escassez de recursos. O espectro eletromagnético é finito, logo nem todas as emissoras podem instalar-se livremente sob pena de haver interferência na programação e consequente prejuízo para a comunicação de massa. A responsabilidade de regulá-lo é do Estado, já que a ONU entende o espectro como bem natural integrante do patrimônio de cada nação. No caso da imprensa, a defesa de uma regulação técnica similar à da radiodifusão é

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pouco frequente, principalmente porque inexistem elementos que possam ser definidos consensualmente como “escassos”. O Estado não precisa obstaculizar a ação de novos entrantes, logo todos os interessados podem operar o serviço, e é recorrente a concepção de que não são válidos modelos como o trusteeship model (Geller, 1990), apesar de alguns autores, baseados em teorias econômicas, argumentarem que todos os recursos são escassos – a começar pelos investimentos necessários à produção de jornais e revistas (Lichtenberg, 1990). No caso da internet, existem, ainda, outros recursos escassos, como nomes de domínio e endereços IP, o que gera uma demanda por regulação técnica. Com base em justificativas de natureza similar a essas, a grande maioria dos países hoje regula os meios de comunicação de massa tanto com relação à sua estrutura e propriedade, quanto com respeito ao próprio conteúdo veiculado. Embora no Brasil, por força de circunstâncias históricas, políticas, econômicas e sociais, a regulação dos meios de comunicação de massa tenha se dado de forma limitada e parcial, deve-se registrar que a Constituição Federal de 1988, com base nos seus artigos 221 e 222, §3º, prevê regras e princípios claros relativos à produção e à programação de todos os meios de comunicação social eletrônica com vistas a assegurar preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; adequado grau de regionalização e de produção independente; e respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Regulação da Internet: Evolução no mundo e no Brasil

Embora haja relativo consenso de que é legítimo que os meios de comunicação de massa tradicionais, como a televisão, sejam submetidos a algum grau de regulação quanto ao conteúdo veiculado e quanto à estrutura de propriedade, tal concepção ainda gera polêmicas quando aplicada aos conteúdos veiculados por meio da internet. As resistências à regulação de conteúdo na internet explicam-se pela própria história de desenvolvimento da rede, marcada, pelo menos inicialmente, por um forte espírito colaborativo e dedicação a finalidades não comerciais, notadamente à pesquisa acadêmica e a aplicações militares. Foi com esse espírito que John Barlow (1996) escreveu seu conhecido manifesto pela independência do ciberespaço, no qual proclama aos “governos do mundo

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industrial” que o espaço cibernético, o “novo lar da Mente”, é imune à soberania, à tirania e às regras que os governos tentam fazer prevalecer. A concepção “libertária” da internet teve forte acolhida durante vários anos, compreendendo-se a rede como o espaço da cultura livre, do anarquismo, da total liberdade individual para postar, acessar, copiar e distribuir qualquer tipo de conteúdo, gratuitamente. Visualizava-se a rede como um espaço onde o poder econômico não teria vez, um espaço regulado somente pelas novas regras que seriam definidas pelos próprios internautas. A popularização e a massificação da rede, entretanto, que se intensificou a partir da segunda metade da década de 1990, teve por efeito revelar sua atratividade do ponto de vista comercial. Começaram a se formar alianças estratégicas entre grandes grupos de comunicação e empresas de internet com vistas à disponibilização de “conteúdo online” que, com lógica muito parecida à da TV aberta, serviria para a conquista do público e consequentemente para a intermediação de negócios e arrecadação de receitas publicitárias. Verificou-se, igualmente, a maciça reformulação de estratégias empresariais com vistas à inserção nesse novo mercado mundial, livre de barreiras físicas e, em alguns casos, jurídicas. Em 1998, o governo Clinton publicou um documento no qual, reconhecendo a força dos interesses comerciais presentes na internet e a necessidade de que os mecanismos de registro de domínios tivessem uma estrutura mais competitiva, se propunha à completa reformulação dos mecanismos de financiamento e de direção da internet. A criação da Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (ICANN), em 1998, uma empresa privada norte-americana responsável pelo sistema de registro de nomes de domínio da internet, pode ser compreendida como o marco da morte da visão ingênua da internet como um ambiente estritamente colaborativo, reconhecendo-se definitivamente a lógica mercantil que passou a permear e orientar a grande rede. Alguns autores, como Bolaño (2007), denominam essa fase como a da privatização da grande rede. A década de 1990 foi, também, o período em que ganhou força a privatização de antigos monopólios estatais, tais como as redes de telecomunicações. Em meio à pressão por parte de organismos internacionais como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e sob a lógica de que a introdução da competição traria efeitos positivos no que concerne à universalização e à modicidade dos serviços, muitos países, inclusive o Brasil, promoveram

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processos de desestatização e abertura do setor de telecomunicações ao capital privado e estrangeiro. Nesse processo, a própria OMC, ao pressionar por amplos compromissos de abertura de mercados nacionais, adotou diferenciação entre os serviços telefônicos básicos, compreendidos como todos os serviços de telecomunicações, públicos ou privados, que envolvam transmissão de informações dos consumidores ponto-a-ponto; os serviços de valor adicionado, definidos como todos aqueles que acrescentam valor à informação do consumidor, incrementando sua forma ou conteúdo (como as mensagens SMS) ou fornecendo seu armazenamento ou recuperação (como caixas postais); e os serviços audiovisuais, abrangendo serviços de produção e distribuição de conteúdo audiovisual, como cinema, vídeo, rádio e televisão (OMC, 1991; 1998). Enquanto muitos compromissos de liberalização foram ofertados com relação aos serviços de telecomunicações e de valor adicionado, diversos países têm se mostrado refratários à plena remoção de barreiras de acesso ao setor dos serviços audiovisuais, notadamente em razão de sua forte relação com aspectos culturais e de soberania das nações, caracterizando-se como um dos setores tipicamente mantidos no âmbito da “exceção cultural”. No Brasil, o tratamento da internet seguiu, grosso modo, a lógica internacional. Por ocasião da privatização do antigo monopólio estatal de telecomunicações – o Sistema Telebrás –, a lei promulgada para regular o setor explicitamente distinguiu entre serviços de telecomunicações4 e serviços de valor adicionado5, esclarecendo que apenas os primeiros se submeteriam à jurisdição da agência reguladora criada em 1997. Mesmo antes disso, as primeiras normas a tratar da internet no Brasil, em 1995, definiam o Serviço de Conexão à Internet como um serviço de valor adicionado, incluindo no mesmo grupo serviços de informação acessíveis por telefone, como serviços de “disque-piada”, “hora-certa” e “disquehoróscopo”. Pretendia-se, assim, separar nitidamente a exploração do serviço telefônico 4

Lei n.º 9.472/97. Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação. § 1° Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza. (...). 5 Lei n.º 9.472/97. Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações. § 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.

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público – o serviço básico – e a prestação de SVA – serviços adicionais –, que agregariam à rede pré-existente de telecomunicações meios ou recursos que criavam novas utilidades específicas, ou novas atividades produtivas, relacionadas com o acesso, armazenamento, movimentação e recuperação de informações sem, entretanto, caracterizar-se como serviço de telecomunicações. Não há, no Brasil, regras definidas sobre como devem ser prestados serviços de valor adicionado, nem órgão governamental dotado de competências explícitas para regulá-los. A própria regulação da internet no Brasil seguiu um caminho parecido com aquele trilhado nos EUA. Em 1995 foi criado, por simples Portaria Interministerial, o Comitê Gestor da Internet (CGI), entidade dirigida por um colegiado formado por representantes do setor público e privado e da sociedade, incumbido de gerenciar a alocação de nomes de domínios na internet no Brasil. Embora o modelo tenha evoluído em anos mais recentes, críticas foram levantadas contra a forma como essa regulamentação ocorreu, fundada sobre peculiaridades técnicas e impulsionada pelas urgentes demandas dos interesses sociais e econômicos envolvidos, passando, porém, ao largo da reflexão e escrutínio dos canais democráticos, como mereceria uma questão estratégica e importante para o desenvolvimento do país (Lemos, 2005). Além disso, chama atenção que, de forma análoga ao que ocorria no setor de telecomunicações, houve preocupação com a regulação da estrutura que daria suporte à internet – no primeiro caso, o sistema físico denominado rede; no segundo, o sistema de indexação e endereçamento denominado sistema de nomes de domínio – mas não com o conteúdo que seria por ela veiculado, compreendido, de modo geral, como serviço de valor adicionado. De certa forma, essa preocupação com a infraestrutura e o descaso com a regulação de conteúdo encontra precedente, também, na radiodifusão. Digno de nota, também, é o fato de que não obstante a visão de segmentos da sociedade civil de que o futuro estava nas redes convergentes de alta velocidade – naquela época conhecidas como redes digitais de serviços integrados (Ramos, 1999) –, os setores de telecomunicações, informática e comunicação de massa permaneceram sujeitos a tratamento normativo inteiramente distinto6. 6

Observe-se que tal diferenciação produz inclusive impactos tributários distintos para serviços de telecomunicações e de valor adicionado.

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Regulação da Internet face à emergência de serviços inovadores de distribuição de conteúdo

A cristalização de tal concepção no cenário regulatório brasileiro tem suscitado novos desafios na medida em que surgem serviços inovadores de transmissão de conteúdo sobre a internet, dificilmente enquadrados nos compartimentos estanques e incomunicáveis criados pela regulamentação nacional. Exemplos muito comentados em todo o mundo são as diversas variantes do uso da tecnologia de voz sobre protocolo IP para comunicação interpessoal e as complexas questões associadas à interconexão com a rede comutada, à tarifação, à regulação de preço e qualidade, à neutralidade de rede e ao próprio regime de licenciamento. A depender das características do serviço, ele pode ser classificado como mero serviço de valor adicionado prestado sobre a internet – teoricamente imune, portanto, às exigências regulatórias de qualidade e preço a que estão sujeitos os serviços de telecomunicações convencionais –, ou como tecnologia de suporte a serviços tradicionais de telefonia, não isentando a prestadora do cumprimento das exigências pertinentes ao regime regulatório geral. Questão mais emblemática para a discussão neste artigo é o tratamento regulatório a ser dado a serviços de distribuição de conteúdo audiovisual pela internet. Diversos modelos se anunciam. Em uma vertente, é consolidada a tendência de produção e distribuição de conteúdo audiovisual pelo próprio usuário. De outra, é amplamente conhecida a possibilidade de acessar, na internet, conteúdos ou pacotes de conteúdos “por demanda”, em um modelo assemelhado ao tradicional pay-per-view da TV por assinatura. Ganham força modelos emergentes de distribuição contínua de conteúdo audiovisual na forma de “canais” televisivos que podem ser acessados (ou “digitalmente sintonizados”) na internet. Verifica-se tanto a distribuição dos canais “abertos” de televisão, quanto a distribuição dos canais “fechados” veiculados pelos serviços de TV por assinatura. O acesso a esses canais e pacotes de conteúdo na internet pode se dar conforme diferentes modelos de negócios, como a gratuidade de acesso suportada por receitas publicitárias, a exemplo do que ocorre na radiodifusão; o acesso mediante assinatura mensal, nos moldes do que ocorre com a TV paga tradicional; ou modelos

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híbridos, combinando conteúdos gratuitos e onerosos. Observa-se que serviços dessa natureza guardam notáveis semelhanças com os serviços tradicionais de distribuição de conteúdo audiovisual – radiodifusão e TV por assinatura –, deles se diferenciando pouco quanto à essência, mas significativamente quanto à forma pela qual são acessados pelo usuário. Enquanto os serviços tradicionais são distribuídos sobre uma rede de telecomunicações – física ou radioelétrica – que pode ser acessada diretamente pelos usuários, gratuitamente ou mediante contratação, os serviços inovadores de distribuição de conteúdo poderiam ser chamados de “meta-serviços”, na medida em que sua fruição é condicionada à prévia contratação de serviços de acesso à internet, a chamada “rede das redes”. Em um cenário de convergência entre setores, em que a internet substitui a infraestrutura básica de telecomunicações como suporte para a prestação de serviços de distribuição de conteúdo, é necessário questionar (i) até que ponto o conceito de serviço de valor adicionado permanece adequado, considerando seus efeitos limitadores no que diz respeito à possibilidade de regulação estatal de tais serviços; e (ii) que efeitos se produzem no que se refere ao postulado jurídico de caracterização da internet como essencialmente livre e desregulada. É preciso, nesse sentido, realçar alguns pontos. Em primeiro lugar, quando se considera a tendência de migração de serviços tradicionais de telecomunicações e de distribuição de conteúdo para a plataforma da internet, o conceito de serviço de valor adicionado, se interpretado da forma totalitária que tem prevalecido ao longo do último decênio, produz o efeito de que cada vez menos serviços serão regulados, deslocando-se o objeto de regulação estatal dos serviços prestados ao usuário final para a simples infraestrutura física que os suporta. Em segundo lugar, a persistir tal interpretação, os serviços de distribuição de conteúdo audiovisual, quando prestados sobre a internet, tendem a ser absorvidos pelo conceito de serviços de valor adicionado, suprimindo-se da regulação estatal uma seara sobre a qual tradicionalmente os países têm lutado para manter soberania, em razão das fortes implicações para a cultura local, soberania nacional e democracia, como exposto na primeira parte deste artigo. Cabe, nesse sentido, questionar se os serviços de distribuição de conteúdo sobre a

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internet possuem diferenças estruturais com relação aos serviços de distribuição de conteúdo tradicionais que justifiquem tal supressão de competências. É pertinente, ademais, indagar se os serviços de distribuição de conteúdo pela internet constituem um “valor adicionado” a um serviço básico de telecomunicações, como pressupõe o conceito de SVA, ou se, ao contrário, constituem o próprio serviço buscado pelo cidadão. Pelo que se procurou esboçar nos parágrafos anteriores, a segunda opção é a mais provável. Por fim, deve-se ressaltar que a própria discussão teórica sobre a natureza supostamente livre e desregulada da internet advogada pela corrente liberal tem sofrido um recuo, reconhecendo-se a necessidade de regras para endereçar temas tão diversos como direitos autorais, e-commerce, tributação, resolução de conflitos sobre nomes de domínio, crimes digitais, pluralismo e democracia. Autores como Lessig (2006) afirmam que mesmo que não haja regulação estatal explícita, a própria arquitetura do ciberespaço se constitui em regulador, na medida em que determina – guiada, em geral, por interesses comerciais – o nível de privacidade do usuário, as informações a que ele tem acesso, suas possibilidades de ação, sua conduta pretérita e futura e sua própria identidade. Biegel (2003), por sua vez, comenta que o grau de liberdade que um usuário experimenta na internet resulta de escolhas conscientes por parte dos diversos órgãos governantes e gestores no sentido de manter determinado nível de independência e autonomia para os cidadãos virtuais. A questão, ao seu ver, não é se o ciberespaço como um todo deve ou não ser regulado, mas apenas se e em que medida áreas problemáticas pontuais devem ser endereçadas via ação regulatória. Sunstein (2001), por fim, voltando sua atenção para os impactos potencialmente antidemocráticos da possibilidade de filtragem e seleção de informações aberta pela internet, sustenta que essa rede, assim como outras formas de comunicação de massa, deve estar sujeita a certas regras de convivência, de modo a permitir uma comunicação democrática e equilibrada. Nesse sentido, abordando o importante papel do pluralismo de informações em um regime democrático, propõe alternativas como o estabelecimento de regras de “must carry” na forma de links de inclusão obrigatória em páginas da internet.

Necessidade de novas abordagens regulatórias

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As ponderações precedentes conduzem à conclusão de que a tendência de transposição dos serviços de distribuição de conteúdo audiovisual para a plataforma da internet abre espaço para novas abordagens regulatórias quanto à regulação da internet, apontando a necessidade de repensar o conceito de serviço de valor adicionado à luz da evolução da tecnologia e das cambiantes necessidades sociais, considerando as especificidades dos serviços de distribuição de conteúdo audiovisual. Em outras palavras, é relevante repensar a regulação da internet de acordo com parâmetros inerentes aos meios de comunicação de massa tradicionais. Cabe, nesse momento, uma ressalva: tanto a internet tem suas próprias peculiaridades que precisam ser levadas em consideração, quanto o debate sobre a sua regulação não pode ser confundido com outro referente às falhas da regulação no âmbito da radiodifusão. Por um lado, algumas questões relativas à comunicação de massa, como a expedição de outorgas em função da escassez do espectro, não se aplicam à internet (por mais que haja recursos escassos, o cenário presente ainda comporta uma quantidade significativa de novos entrantes). Por outro, a regulação de conteúdo disponível na internet, que vez ou outra já é evocada no Brasil, deve ser efetiva, também, em relação à radiodifusão. Vale, assim, lembrar que o país ainda precisa avançar muito no que se refere à regulamentação da Constituição Federal e à revisão dos instrumentos normativos ora vigentes para garantir direitos fundamentais e assegurar a observância de princípios constitucionais que dependem da ação dos meios de comunicação de massa. Em vista das regras legais e constitucionais que estabelecem regras e princípios aplicáveis à comunicação eletrônica de massa, impõe-se a necessidade de avaliação de mecanismos que permitam aplicar tais normas também à internet, endereçando, quando cabível, questões como licenciamento, qualidade, remuneração e direitos dos usuários; e possibilitando o cumprimento de princípios constitucionais relativos, por exemplo, à proteção da infância e da família contra conteúdos inapropriados, a um adequado grau de promoção da cultura nacional e regional, a regras com relação à veiculação de propaganda de produtos, práticas e serviços nocivos à saúde e ao meio ambiente e à limitação ao monopólio e ao oligopólio. O esmaecimento de fronteiras entre setores e o surgimento de novos serviços que desafiam a estrutura regulatória vigente constitui uma oportunidade para abandonar antigos

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dogmas e redefinir conceitos que não mais se mostram adequados ao cenário que hoje se apresenta. Assim, um desafio de pesquisas futuras é sugerir alternativas à regulação da internet que, mesmo respeitando as suas especificidades, sejam capazes de inseri-la no ordenamento regulatório natural à comunicação de massa.

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Anotações sobre a consolidação do mercado de videocassete no Brasil Zuleika de Paula Bueno*

Resumo É objetivo deste artigo recuperar o momento histórico de formação e consolidação do mercado de videocassetes no Brasil. A proposta é reconstruir o conjunto de práticas econômicas que definem o videocassete como um novo bem de consumo eletrônico, assim como um novo espaço de ação de políticas cinematográficas. Define-se, deste modo, o videocassete simultaneamente como uma tecnologia e como uma forma cultural. Palavras-chave: videocassete; política cinematográfica brasileira; práticas culturais.

Resumen

El presente trabajo pretende recuperar la historia de la formación y consolidación del mercado de vídeo en Brasil. La propuesta consiste en reconstruir el conjunto de prácticas económicas que definen el vídeo como un nuevo producto de la electrónica de consumo, así como una nueva esfera de formulación de políticas cinematográficas. Por eso, se define el video como tecnología y como prácticas culturales.

Palabras-clave: VCR; política cinematográfica en Brasil; prácticas culturales

Abstract

This article takes a comprehensive approach to examining the historical formation of the video cassette recorder (VCR) business in Brazil. It is studied the economical practices that define the video as a new electronic product and a particular field of cinematographic power. It is concluded that the VCR is a technology and as well a cultural form.

Keywords: VCR; Brazilian cinema politics; cultural practices *

Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá, zupbueno@uol.com.br, zubueno@hotmail.com

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Introdução

Num momento em que se discute a divulgação de filmes via programas de compartilhamento de arquivos em rede, abordar o contexto econômico e político de consolidação do videocassete1 no Brasil parece uma preocupação ultrapassada pelos avanços tecnológicos.. Contudo, os debates ocorridos há cerca de duas décadas envolvendo o mercado de vídeo e fitas cassetes e abordando questões como o desenvolvimento de novos suportes de gravação e reprodução de imagens e sons, o controle estatal sobre a circulação desses suportes, as formas alternativas de acesso às produções culturais ou a legalidade e ilegalidade de trocas mostram-se extremamente contemporâneos quando analisados. O videocassete inventou a partir dos anos 80 uma nova forma de distribuir e assistir cinema, reorganizando economicamente, redefinindo os processos de administração e os movimentos de concentração da indústria cinematográfica (MICHALET, 1987; BONNELL, 1989; BENHAMOU, 2007; HAMEL & PRALAHAD, 1995). É objetivo deste artigo, como sugere Patrice Flichy (1995), recuperar um momento histórico em que “uma velha tecnologia era nova” e reconstruir, com base em pesquisa realizada em arquivos, o conjunto de práticas sociais a ela relacionadas. Define-se, deste modo, o videocassete simultaneamente como uma tecnologia e como uma forma cultural (WILLIAMS, 1989).2 O Brasil da década de 1980, espaço e período abordado neste estudo, vivencia no campo tecnológico e cultural três principais processos articulados: a emergência de redes e artefatos multimídia decorrentes da reorganização mundial das indústrias de conteúdo e de hardware; as pressões que tais indústrias exercem num mercado regulado por leis de incentivo e proteção à indústria nacional; e as ansiedades de uma sociedade ávida por conquistas simbólicas e materiais proporcionadas pela continuidade do processo de modernização capitalista (MELLO & NOVAIS, 1998). Sob essa perspectiva, o videocassete é analisado como um componente tecnológico que, associado aos lançamentos da indústria fonográfica, ao emergente mercado de jogos eletrônicos e à difusão dos computadores de uso pessoal, complementou as formas de entretenimento doméstico e incrementou o consumo de produções culturais industrializadas no Brasil de fins do século XX.

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Padrões incompatíveis “A transferência de tecnologia fala, cada dia mais claramente, da importação não de aparelhos mas de modelos globais de organização do poder” (BARBERO, 2004).

A indústria eletrônica foi o segmento produtivo responsável pelos principais índices de inovação tecnológica das últimas décadas do século XX, sustentada por uma dinâmica empresarial eminentemente competitiva (HAMEL & PRALAHAD, 1995). O videocassete é um dos artefatos gerados nesse processo e como tal seu lançamento no mercado consumidor foi acompanhado por uma intensa disputa econômica e política conduzida por duas das principais corporações detentoras de patentes do produto: a Sony e a Matsushita. O litígio foi motivado pelo domínio do padrão de fitas adotado para o consumo doméstico. A Sony lançou em 1975 o primeiro modelo comercial de aparelhos e cassetes, o qual empregava o sistema de acoplagem de fita em forma de U, conhecido como Betamax. Esse sistema derivava do modelo empregado nos equipamentos profissionais de gravação e reprodução. No ano seguinte, a Matsushita lançava pela marca JVC um sistema concorrente, conhecido como VHS (Video Home Sistem), cuja disposição da fita na caixa se dava na forma de M. Os dois sistemas eram incompatíveis, ou seja, a fita Betamax não se produzia num equipamento VHS e tampouco o inverso. Apesar das pesquisas industriais e do desenvolvimento de outros sistemas de gravação e reprodução em vídeo3, os modelos da Sony e da Matsushita foram os que conquistaram maior parcela do mercado por se mostrarem mais leves e portáteis (embora os primeiros equipamentos de videocassete chegassem a pesar 15 kilos4) e, portanto, mais práticos para o uso doméstico. Os dois sistemas partilharam o mercado até meados da década de 80, quando o VHS se tornou mundialmente dominante. Líder no mercado norte-americano, principal produtor cinematográfico e consumidor do novo bem eletrônico, a Matsushita avançou na imposição do seu padrão. Conforme destaca Vieira Sá : “Com sua vasta rede, a Matsushita teve condições, junto com a JVC, de estabelecer o projeto dominante do videocassete nos anos 1980. A disputa envolvia os padrões Betamax da Sony e o Video Home System (VHS) da Matsushita. Disputa que, até certa

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altura, contava com padrões de reprodução/ gravação de imagem e som da Philips (V2000), e da RCA (VideoDisc). Mas, apesar da superioridade técnica do Betamax, a Matsushita fez do VHS o padrão com uma estratégia baseada em sua rede e em contratos de licença com outras firmas. Dentre as licenciadas para comercializar e produzir o VHS, estavam a Tokyo Sanyo e a Sharp, de peso na linha marrom do Japão, e a Hitachi e a Mitsubishi Electric, gigantes da indústria de computadores, que começavam sua aventura no ramo de TVs e já tinham também redes de distribuição globais. Assim, o VHS logrou chegar ao consumidor mais rapidamente, com uma maior opção de aparelhos – dos mais baratos até aqueles mais sofisticados ofertados pela JVC, que tinha prestígio junto a esse público.” (2004, p.77):

Lançado pela indústria brasileira no início dos anos 80, os primeiros equipamentos de videocassete no Brasil foram fabricados por empresas nacionais que utilizavam tecnologia licenciada por fornecedores estrangeiros (VIEIRA SÁ, 2004). Filiadas a corporações mundiais, as empresas brasileiras tinham pouco ou nenhum controle sobre disputas de patentes e tecnologias eletrônicas, organizando-se basicamente como reprodutoras dos formatos e padrões desenvolvidos externamente. No caso dos videocassetes, as empresas dominantes no mercado brasileiro reproduziram o sistema VHS.5 Empregando a tecnologia da japonesa Mitsubishi, a Sharp lançou o modelo pioneiro no mercado brasileiro, o VC-8510 que chegou às lojas no segundo semestre de 1982.6 Nas semanas seguintes, as vitrines exibiam também o modelo da Philco, que empregava tecnologia Hitachi e era composto por parte do excedente de componentes fabricados no Japão, utilizando apenas 15% de componentes nacionais. 7 O segmento produtivo de bens eletrônicos no Brasil caracterizava-se então por uma presença marcante de empresas líderes no mercado mundial e pela ampla utilização de tecnologia estrangeira concentrada em zonas de produção específicas, como a Zona Franca de Manaus (GONÇALVEZ, 1997). A eletrônica de consumo, com destaque para a produção de áudio, constituía o segmento mais antigo do complexo eletrônico no Brasil. A instalação das primeiras empresas do setor se deu na década de 1970, contando com forte apoio governamental. Nos anos seguintes, a Sharp (do grupo Machline), a Philco (do grupo Itaú), a Gradiente e a Philips (filial da multinacional holandesa), asseguravam mais de 50% de participação nos mercados de televisores em cores, videocassetes, sintonizadores, gravadores e rádios portáteis (NASSIF, 2002).

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Embora divulgado como “uma das mais sensacionais conquistas da tecnologia eletrônica dos nossos tempos”, a venda de videocassetes não se mostrou significativa até meados da década de 808. Em 1985, três anos após o lançamento do produto, a produção de aparelhos era de pouco mais de 60.000 unidades anuais. A maior parte dos aparelhos em circulação no país naquele momento eram obtidos via contrabando. O fato é que o videocassete chegou ao mercado oficial brasileiro por um preço extremamente elevado: cerca de três mil dólares. As empresas alegavam que os custos finais eram altos devido às obsoletas condições do parque industrial nacional, que não permitiam uma produção em larga escala de produtos de avançada tecnologia. 9 Concorrente das empresas dominantes no mercado brasileiro, o modelo SL-5400ND da Sony inseriu no mercado brasileiro o primeiro modelo Betamax legalmente comercializado. Em relação à disputa do mercado com os modelos VHS, a comunicação institucional da Sony se dizia tranqüila a respeito da melhor escolha adotada, afinal, afirmava, o Betamax, era uma tecnologia mais “profissional”, oferecendo melhor qualidade para o consumidor doméstico. Além disso, a empresa mostrava-se confiante na sua aposta uma vez que o mercado de videocassete apenas começava a ser explorado no país. A Sony pretendia expandir o uso do aparelho investindo em uma publicidade que veiculasse as vantagens e o conforto que o videocassete trazia para o consumidor. Diante desse desafio, a Sony anunciava que pretendia colocar “à disposição um grande volume de fitas no formato Beta, com um preço menor que o das fitas VHS.” O modelo da Sony também chegava ao mercado brasileiro por um preço extremamente elevado. A razão para isso, justificava a empresa, era o repasse para o consumidor final das taxas de impostos de importação cobrados pelo governo brasileiro.

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Questionada a respeito da implementação de

uma linha de produção de videocassetes no Brasil, a Sony argumentava que somente “uma demanda real dos consumidores” justificaria um alto investimento no parque tecnológico da indústria brasileira e uma conseqüente ampliação produtiva.11 Assim, a Philco e a Sharp, detentoras de 40% do mercado de videocassetes no Brasil, fortaleciam sua presença por meio de um forte esquema publicitário, da oferta de garantia e da ampliação da rede assistência técnica especializada no país, estratégias adotadas principalmente para fazer frente ao comércio contrabandista e à comercialização de produtos importados da Sony. Contudo, também as empresas brasileiras reforçavam que essas medidas somente seriam efetivas se combinadas com a formação de um amplo mercado de fitas no

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país.12 Do contrário, o investimento necessário para a produção industrial seria incompatível com o retorno do mercado. Obviamente, tais empresas, que há tempos fabricavam no Brasil, conheciam previamente os custos, as necessidades de investimento e outras características do mercado brasileiro, não ingressando como aventureiras num espaço de produção altamente regularizado e concentrado. No entanto, justificavam sua limitação produtiva com o conhecido argumento do “atraso” da própria indústria e do mercado brasileiro.13 O que estava em jogo no caso da produção dos bens de consumo eletrônico era a pressão por parte das empresas mundiais fornecedoras de tecnologia para a ampliação da cota de importação, a redução dos impostos e a entrada maciça do capital estrangeiro no setor eletrônico e de comunicação. No caso brasileiro, portanto, as disputas políticas sobre a fabricação de videocassetes não envolviam tanto questões de incompatibilidade tecnológicas quanto uma suposta incompatibilidade de modelos econômicos de produção industrial. Na década de 1980 a política industrial brasileira sustentava-se fortemente apoiada em medidas de reservas de mercado para a implementação de estratégias de inovação em áreas dinâmicas da produção capitalista, dentre quais as quais se destacavam as tecnologias de imagem, som e informática (TAPIA, 1995) Contudo, a reserva de mercado e os programas governamentais de apoio ao desenvolvimento industrial em vigor se chocavam claramente com as perspectivas dos conglomerados industriais eletrônicos de avanço no mercado brasileiro sem a necessidade de intermediários, ou seja, de empresas nacionais licenciadas. No que se referia às disputas tecnológicas, esses grupos mundiais não tratavam o Brasil como um agente industrial mas como um território de comércio. Assim, entendiam que cabia ao Estado brasileiro somente favorecer o campo de circulação dos equipamentos e dos novos suportes a eles associados.

Maravilhas tecnológicas

Mesmo apartado como agente de desenvolvimento tecnológico, o Brasil estava integrado como espaço de disputa das grandes corporações mundiais. Para grande parte dos veículos de comunicação brasileiros, essa já era uma posição satisfatória. Os meios de divulgação e informação das novidades eletrônicas – sobretudo os suplementos jornalísticos e

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as revistas especializadas - anunciavam com excitação os últimos movimentos da guerra pelo domínio de patentes e tecnologias eletrônicas e aguardavam a chegada de novos produtos ao mercado brasileiro. 14 O desejo em antecipar, informar, preparar o consumidor, descrever os mínimos detalhes dos produtos e aparelhos era nítido em todas as reportagens da época que anunciavam os novos “milagres” das tecnologias de áudio e vídeo (entre elas, o videocassete), difundindo também o diagnóstico de“atraso” do mercado brasileiro frente às novas tecnologias eletrônicas. 15 Os novos bens de consumo eletrônicos, portanto, eram conhecidos antes mesmo da comercialização de equipamentos e suportes no Brasil. Além das revistas e jornais, as feiras de informática, de produtos eletrônicos e utilidades domésticas promoviam uma espécie de “pré-estréia” dos equipamentos tecnológicos de uso privado, funcionando como uma grande vitrine de promessas de um futuro modernizado.16. Nesses eventos, cada novo lançamento ou desenvolvimento de recursos eletrônicos era noticiado como “ousadia” das grandes empresas e “evolução” dos aparelhos no sentido de ampliar as possibilidades de entretenimento doméstico concentradas em um número cada vez menor de equipamentos.17 Por ocasião do lançamento do modelo VC-8510 da Sharp, por exemplo, o tom das reportagens

era

de

euforia

explícita,

mesclando

informação

e

publicidade

do

produto,destacando a versatilidade e praticidade dos equipamentos. Os recursos de slow motion, timers (programador de gravação), a transformação automática de leitura dos sistemas de cor (NTSC e PAL-M), o still (pausa), o tracking (botão de correção da imagem), eram descritos com detalhes e adjetivos18. Por meio de reportagens como essas o consumidor brasileiro se informava sobre as características tecnológicas de seus equipamentos domésticos, tinha acesso a dados técnicos sobre os padrões de cores processado em seus televisores e sobre os diversos sistemas de gravação e reprodução de imagens, ou seja, se tornava uma espécie de “especialista” no consumo dos equipamentos.

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Essa descrição

detalhada de componentes e características tecnológicas se associava a uma suposta dimensão “democrática” da nova era eletrônica. O videocassete era divulgado como um aparelho que se combinava a um novo estilo de sociabilidade, mais livre e democrático20 A nova tecnologia permitia maior liberdade de escolha para os consumidores, permitindo que estes se transformassem em “donos da sua tevê”, gravando os programas favoritos, determinando o melhor horário para vê-los, revendo

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os programas sempre que desejassem sem estarem restritos aos horários das emissoras.O lançamento das produções cinematográficas no formato de fitas também ampliava o “poder” do consumidor ao oferecer a este “uma nova forma de ver cinema” a partir da compra ou aluguel dos filmes em lojas especializadas ou mesmo por meio de uma rede de amigos. Como se todas essas facilidades não bastasse, o aparelho poderia ainda ser utilizado nas produções pessoais e amadoras se combinado com uma filmadora de uso doméstico. 21 Considerando que na época o regime econômico e político do país era marcado pela centralização e controle de um Estado autoritário, o acesso a tal tecnologia , principalmente após o estabelecimento de redes de troca e locação de fitas cassetes, foi facilmente divulgado e interpretado como um meio de eliminar o controle da censura sobre os produtos culturais consumidos. Consideradas pela censura federal como artigos de consumo privado e doméstico, os filmes lançados em fitas cassetes sofriam restrições mais brandas . 22 Porém, como a comercialização oficial de fitas e aparelhos tardava a se concretizar no mercado oficial brasileiro, as importações ilegais foram se estabelecendo no início dos anos 80 como a principal forma de acesso aos aparelhos eletrônicos, organizadas por redes informais de fornecimento alimentadas pelos consumidores, fomentando uma economia ilegítima promissora para as iniciativas individuais e justificada pela defesa da liberdade de consumo.23 Adquirido por vias legítimas ou ilegítimas, o videocassete se inseriu nos lares brasileiros como um componente que se articulou a novas e velhas práticas de consumo e entretenimento domésticos. Em parte a nova tecnologia se sustentava em práticas de lazer já bastante reforçadas pelas velhas tecnologias, como as do rádio e da própria televisão (FLICHY, 1995). O equipamento, porém, divulgava uma noção que apenas começava a se tornar familiar ao consumidor na sua relação com os produtos eletrônicos: a interatividade (VILCHES, 2003).

Dos videoclubes às videolocadoras “O vídeo é atraente sobretudo porque seu aluguel custa geralmente o mesmo ou menos que uma entrada de cinema. Além disso, cada vídeo costuma ser usado por várias pessoas, e, ao assistir ao filme em casa, alguns inconvenientes são evitados: insegurança urbana, filas,

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gastos complementares (transporte, comidas) e outros incômodos. Ainda que os espectadores de maior idade, acostumados às salas, lamentem a perda do espetáculo e da qualidade do filme na tela da TV, muitos usuários de vídeo celebram a possibilidade de eles mesmos manejarem a projeção, congelando ou repetindo cenas, mas, principalmente, não sofrendo cortes comerciais. É lógico que amplos setores preferem a projeção em casa a terem que atravessar a cidade. Mas o fato do cinema – tradicional estímulo para sair de casa e usar a cidade, lugar de tematização do urbano – se converter num impulso de recolhimento na privacidade doméstica indica uma mudança radical nas relações entre cinema e vida pública” (CANCLINI, 1997, p.178)

A interatividade estava associada a um novo sistema de distribuição de filmes: o homevideo. A promessa do “cinema em casa” era atraente: todos os filmes já produzidos estariam disponíveis para os fiéis consumidores da arte cinematográfica. Os acervos antes restritos, fragmentados, disponíveis apenas para os estúdios, as emissoras de televisão ou cinematecas estariam, finalmente, disponíveis para o grande público. Mais do que uma promessa, esse era um eficiente sistema de marketing. Mercado controlado pelas grandes distribuidoras cinematográficas norte-americanas, a venda e o aluguel de fitas já representava em meados dos anos 80 uma parcela considerável dos lucros da indústria cinematográfica, tornando-se um fator decisivo nos processos de fusão das indústrias do entretenimento. O homevideo era um elemento estratégico na articulação de ações políticas multimídias das grandes empresas globais (CANCLINI, 1997). Como o homevideo a espectatorialidade cinematográfica se convertia de espetáculo coletivo para fruição doméstica, não raramente individualizada. É bem verdade que a televisão já havia transformado os filmes em produtos de consumo doméstico e que o videocassete, embora se promovesse como um aparelho de lazer para toda a família, surgia num momento em que as formas de ver televisão se tornavam cada vez mais “pessoais” (FLICHY, 1995), principalmente entre as famílias de alta renda, principais consumidoras das novidades tecnológicas Porém, por mais individualizadas que fossem, as novas formas de

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fruição promovidas pelo videocassete também demandavam uma estrutura coletiva de oferta de fitas. Essa veio pela forma dos videoclubes e videolocadoras. O videoclube, forma de troca de vídeos que no Brasil antecedeu as locadoras, foi criado como uma associação especializada no intercâmbio de fitas comuns.24 Nesses clubes, os associados contribuíam com uma taxa mensal revertida na compra de novos títulos colocados à disposição dos usuários. A associação aos videoclubes exigia do associado uma contribuição mensal e taxa de associação que lhe custava cerca de 200 dólares mensais, o equivalente na época a duas fitas gravadas. O custo bastante elevado dos aparelhos e das taxas dos clubes restringia aos consumidores de alta renda a “nova forma de assistir cinema” contudo, no final do primeiro biênio da década de 80 os videoclubes já anunciavam o “aumento vertiginoso do número de sócios”, o que incentivava a expansão dos negócios e a abertura de filiais e franquias nas principais cidades brasileiras, reduzindo os custos mensais de associações e tornando os videoclubes numa organização mais semelhante às locadora do que exatamente à associação civil de cinéfilos que caracterizou seus primeiros anos. O aumento de estabelecimentos durante a década de 1980 é realmente impressionante. Em 1982, ano em que se estima que houvesse cerca de 150 mil aparelhos domésticos em circulação no país, os dados levantavam a existência de 200 videolocadoras e videoclubes no Brasil , a maior parte deles em São Paulo. Em 1983 já eram 550 os estabelecimentos de empréstimos de fitas identificados no país, número que saltaria para 1300, no ano seguinte, chegando a 4500 clubes e locadoras em 1987. (SIMIS & PELLEGRINI, 1998). Observando os dados estatísticos de produção de aparelhos de videocassetes no Brasil nesses mesmos anos, encontra-se a cifra de 61.071 unidades em 1985, 161.300 unidades em 1986, fechando a década com 541.479 unidades produzidas. Circulavam por tais estabelecimentos cerca de 40 mil fitas.25 O “pioneiro” Vídeo Clube do Brasil, no bairro de Pinheiros em São Paulo, possuía em maio de 1982, momento de levantamento desses dados, 26

cerca de dois mil títulos disponíveis para seus associados.

Alguns estabelecimentos ofereciam, além do acervo de fitas cassetes, cartuchos de

videogames e diversos álbuns no novíssimo suporte de compact discs para os seus associados. Em geral, os videoclubes apostavam nas fitas alternativas, ou seja, aquelas copiadas a partir de uma matriz original cuja empresa detentora do direito autoral não possuía representação no mercado brasileiro.

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Recém definido o VHS como

tecnologia

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predominante no mercado brasileiro, os sócios proprietários de aparelhos importados, muitos deles empregando o sistema Betamax, contavam com o serviço de conversão de cópias de um formato para outro. Em São Paulo, principal mercado de vídeo no Brasil, as lojas de música ofereceriam as tais fitas originais e importadas a seus clientes, na maior parte, “(...) pessoas de alto poder aquisitivo, geralmente aficionados pelo cinema (...)”, além de proprietários de videoclubes .. As lojas contavam em seu catálogo inclusive com as cópias norte-americanas de filmes brasileiros, como Bye Bye Brasil e Dona Flor e seus Dois Maridos, “(...) todos falados em português e com legendas em inglês.”28 Por não promover o aluguel de fitas mas de comprá-las para uso privado, os videoclubes não feriam diretamente leis de direitos autorais e funcionavam num certo limite de legalmente. Obviamente, a reprodução de filmes, a transformação e outras vantagens oferecidas para os sócios nem sempre eram plenamente legais, uma vez que a Resolução no. 98 de novembro de 1983 do Concine determinava que todas as sociedades comerciais ou civis, com ou sem fins lucrativos, que atuassem na revenda, locação ou sublocação de vídeos somente poderiam oferecer a seus sócios e clientes cópias produzidas no Brasil, autenticadas e etiquetadas pelo órgão, portanto, segundo essa resolução, as fitas produzidas no exterior, ainda que regularmente importadas, ficavam proibidas de serem certificadas, sendo a sua troca,

comércio ou aluguel impedidos. Essa medida seria reforçada por resoluções

subseqüentes, como a Concine no. 106/ 1984 e a Concine no.136/1987 que mantinha o não fornecimento de etiquetas para cópias produzidas no exterior. Contudo, até meados da década de 80 as ações de fiscalização contra a circulação de fitas importadas não eram intensas, uma vez que grande parte dessas fitas não contava com registros de direitos no Brasil. Somente com a entrada de empresas licenciadas representantes das majors no mercado de vídeo brasileiro o controle sobre as formas de comercialização e circulação de fitas“alternativas” (piratas ou importadas) seria fortemente exercido. Em 1987, momento em que o mercado de vídeo atingia as marcas de 3 milhões de aparelhos de videocassetes vendidos, 5 mil pontos de locação, 60 empresas distribuidoras e 2500 títulos credenciados, o Concine emitia nova resolução, a no.136/87 reforçando as medidas anteriores e restringindo a circulação de fitas produzidas no exterior, “ainda que regularmente importadas e requeridas por titular de direitos de sua utilização no Brasil e acompanhadas da nota fiscal de compra emitida no País de origem, ficando o uso dessas

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cópias restrito à exibição privada e sendo-lhes vedada qualquer utilização ou circulação pública através da venda, locação ou permuta” (SIMIS, 1989, p.68). Olhando de forma retrospectiva, os videoclubes parecem pertencer a uma era “romântica” de associação e sociabilidade relacionada à cinefilia diante do poder que as grandes redes de locadoras passariam a assumir no empréstimo de fitas. Enquanto o mercado de vídeo esteve restrito à importação de fitas e aparelhos, os videoclubes predominaram; porém, com a expansão da oferta de aparelhos e fitas produzidos em território nacional e a consolidação de distribuição comercial das obras cinematográficas, as locadoras se tornaram predominantes no comércio e circulação de vídeos. As locadoras ofereciam maior vantagem ao consumidor que desejava ver alguns filmes de sucesso esporadicamente, sem que tivesse que arcar com o pagamento de mensalidades.29.Em meados da década de 80, o valor da locação de um filme era aproximadamente ¼ do valor do ingresso da sala de cinema. Essas características, porém, não foram as determinantes na consolidação das videolocadoras como estabelecimentos exclusivos de acesso a fitas de vídeo. As locadoras, diferentemente dos videoclubes, estavam diretamente subordinadas ao controle da recém-criada Associação Brasileira dos Distribuidores de Videocassete (ABDV), posteriormente denominada União Brasileira de Vídeo (UBV), a qual tinha por objetivo “ proteger os consumidores contra videoclubes clandestinos e criar normas gerais de funcionamento para essas entidades (...)”30A ABDV, como se vê, era um agrupamento mais poderoso do que os clubes. Com a sua criação, a regulamentação das práticas de empréstimo de fitas passou a contar com a interferência direta e cada vez mais poderosa das grandes companhias de distribuição que incluíam o mercado brasileiro em suas estratégias de marketing e controle de mercado mundial. A“criatividade” dos primeiros estabelecimentos de permuta e empréstimo foi rapidamente substituída por uma estrutura organizada em grandes redes, processo que eclodiu no final da década em intensas disputas envolvendo os proprietários dos pequenos estabelecimentos e representantes das grandes redes de locação31 Obviamente, não se trata aqui de defender uma suposta “autenticidade”, “liberdade” ou “inocência” dos primeiros estabelecimentos em oposição a uma suposta vilania dos segundos. Ambos eram negócios que se formavam a fim de explorar comercialmente o empréstimo de filmes no suporte eletrônico. Trata-se, apenas, de perceber os processos de concentração desse mercado.

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A Warner seria uma das primeiras distribuidoras a interferir diretamente estratégias de marketing das locadoras, agindo sobretudo na substituição das chapeiras pela caixa original das fitas. Devido ao grande número de fitas piratas, os clubes e locadoras disponibilizavam aos clientes um conjunto de fichas explicativas (a chapeira) a partir do qual estes escolhiam os filmes a serem retirados. A estratégia adotada pela Warner foi promover o contato direto com a caixa original do filme, o que exigiria, necessariamente, que a cópia disponível fosse selada. Essa estratégia intensificou também a visita dos revendedores aos estabelecimentos, aumentando o poder de fiscalização do acervo das locadoras. As cópias paralelas, ou seja, piratas, eram vistas pela indústria como um dos principais problemas do mercado de vídeo brasileiro. O problema, contudo, não era exclusivo do Brasil. Segundo uma pesquisa encomendada pela Warner Communications Inc. no início dos anos 80, o mercado da pirataria de fitas de áudio e vídeo em solo norte-americano envolvia bilhões de dólares32. Embora tenha se tornado um dos principais focos de conflito do mercado de vídeo brasileiro, a pirataria contribuiu nos primeiros anos da década de 80 para a consolidação das práticas de consumo do homevideo no Brasil, reforçando, inclusive, o “favoritismo” do consumidor pelas produções das grandes companhias hollywoodianas. Em meados daquela década, quando se deu a entrada das grandes distribuidoras norte-americanas no mercado de vídeo no Brasil, o público consumidor estava totalmente preparado para a recepção calorosa dos grandes blockbusters lançados em vídeo. Para obter a licença de comercialização dos “mais pedidos”, as locadoras deviam aceitar das distribuidoras a imposição de pacotes fechados de títulos para comercialização, ou seja, para obter a licença de exploração de um título de forte apelo comercial, os estabelecimentos deveriam adquirir a licença de outros tantos de menor interesse. Outro mecanismo de controle do mercado aplicado pelas majors era a fixação de altos juros para a manutenção dos acervos, ação que estimulava o investimento em lançamentos, a redução dos acervos em variedade de títulos e a ampliação de ofertas de cópias de um mesmo filme. Desta forma, no início dos anos 90 o mercado de distribuição de vídeos estava amplamente estruturado, profissionalizado e organizado segundo os interesses das grandes distribuidoras. Em 1987, a UBV, juntamente com a Associação Brasileira de Empresas de Vídeo Comunicação (ABEVC), promovia o 1º. Encontro Nacional do Mercado de Vídeo; no ano seguinte essas mesmas associações organizavam a I Vídeo Trade Show, realizada em São

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Paulo, no Anhembi, divulgando a profissionalização do setor e fortalecendo as frentes de combate aos “aventureiros” desse mercado, isto é, os pequenos empresários não associados aos grupos de regulação e controle da exploração comercial das obras cinematográficas no suporte eletrônico.

As competências do Estado

As leis de incentivo e proteção industrial e comercial brasileiras exigiam que as grandes distribuidoras estrangeiras se associassem a representantes nacionais na transcrição e reprodução de obras para o suporte de vídeo ao determinar que somente as matrizes que atendessem esse requisito seriam reconhecidas legalmente. A exigência, que estendia para a exploração do vídeo a legislação já vigente na indústria cinematográfica, visava estimular o desenvolvimento da infra-estrutura dos laboratórios de revelação e copiagem do país.33 Diante da medida protecionista, a reação das corporações mundiais de entretenimento foi alegar – assim como já faziam em relação à produção de aparelhos - as dificuldades para o cumprimento da lei devido ao obsoletismo do parque industrial brasileiro34 Segundo elas, o caráter protecionista “atrasava” a entrada das grandes produções cinematográficas no mercado de vídeo brasileiro e favorecia as práticas de pirataria. Como forma de pressão, as distribuidoras multinacionais passaram a exigir do Estado brasileiro a aplicação de ações de fiscalização mais rígidas e o “saneamento” do mercado de vídeo para a garantia de sua entrada definitiva na exploração comercial desse setor 35. O Conselho Nacional de Cinema (Concine), estrutura estatal responsável pela normatização e fiscalização das atividades cinematográficas no país (SIMIS, 2008), assumiria essa incumbência e cumpriria com as exigências de combate à pirataria. Já em 1983, na formulação da primeira resolução de legislação sobre o mercado de videocassetes no Brasil, o Concine determinava que os estabelecimentos comerciais (videolocadoras) ou associações civis (videoclubes) estariam sujeitos a visitas de fiscalização da sua documentação e dos seus estoques de vídeo. A resolução determinava que todos os negócios envolvendo venda, locação ou sublocação de obras em vídeo deveriam manter atualizada a relação dos títulos e de videocassetes em carteira e os demonstrativos de entrada e saída das fitas.Além disso, somente seriam consideradas legais as fitas que possuíssem a etiqueta de controle emitida pelo órgão fiscalizador. Multas e sanções seriam aplicadas contra aqueles que impedissem ou

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dificultassem a fiscalização dos agentes do Concine bem como aos estabelecimentos que apresentassem irregularidades nas suas práticas

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. Reforçando o controle sobre as cópias, em

31 de agosto de 1984, a resolução Concine no. 106 determinava o registro obrigatório de “prestadores de serviços de laboratório de som e imagem, nisso incluído os de produção de matrizes em vídeo-tape para reprodução em videocassete”( SIMIS, 1989, p. 55) O rigor na fiscalização aumentaria nos próximos anos, sobretudo após a entrada de algumas das principais companhias cinematográficas mundiais no negócio de distribuição de vídeo no território brasileiro. Por meio da CIC Vídeo do Brasil, a Paramount e a Universal ingressaram no mercado nacional em 1985, mesmo ano em que a Warner Home Video abriu seu escritório de representação no Rio de Janeiro, embora sua entrada definitiva no mercado somente ocorre em 1987.

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A RCA-Columbia passou a distribuir sua produção por meio da

LK-Tel em 1988. A Columbia atuava juntamente com a sua representante no mercado fonográfico, a BMG-Ariola. É nesse momento que a UBV se alia ao Concine, promovendo uma série de blitz e fiscalizações em estabelecimentos comerciais, punindo proprietários de locadoras e videoclubes e causando grande impacto no mercado de vídeo.38 Se esses órgãos eram aliados no combate à pirataria, se opunham diretamente no que se referia a outra determinação da legislação nacional sobre o mercado para videocassetes: a reserva de 25 % do mercado de fitas para filmes nacionais. Com milhares de aparelhos de videocassetes presentes nas residências brasileiras, a garantia de presença de fitas de filmes nacionais nas prateleiras das locadoras se configurava como uma ação estratégica fundamental para a manutenção econômica do cinema brasileiro. O crescimento dos videoclubes e das locadoras propiciou, de maneira semelhante ao que já ocorria com o cinema, a criação das listas dos filmes mais populares - expressão aqui entendida como os mais vistos ou procurados. A primeira lista desse tipo foi elaborada pela revista Som Três em maio de 1982 trazendo, segundo a revista, “um fato interessante de ser salientado”: três filmes nacionais compondo a lista do hit-parade - Pixote e Lúcio Flávio de Hector Babenco, respectivamente o sétimo e oitavo lugar, e Bye Bye Brasil, de Carlos Diegues, na nona posição. Nas estatísticas publicadas dos meses seguintes, Pixote continuava presente como um dos mais retirados pelos sócios e clientes. Essa forma de consumo alertou os produtores brasileiros para a importância de garantir a presença da produção cinematográfica nacional no suporte videográfico .

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É importante destacar que a consolidação do videocassete no Brasil intensificou um processo de reorganização e reestruturação das salas de exibição, caracterizado pela “ (...) transferência das salas das áreas centrais e periféricas das grandes cidades para os shopping centers, seguido do aumento considerável do preço do ingresso, que afastou ainda mais dos cinemas as camadas mais populares” (SIMIS & PELLEGRINI, 1998, p.20 ) . Considerada uma medida que visava a “proteção e o desenvolvimento da indústria nacional”, a Resolução Concine no. 98 de 25 de novembro de 1983 estipulava a reserva de mercado para videocassete e determinava um percentual mínimo para obras cinematográficas nacionais gravadas nesse suporte. Por “obra cinematográfica” entendia-se todo registro prévio de imagens em movimento, independentemente da tecnologia empregada e do sistema ou suporte de gravação e reprodução de som e imagem ou ainda da forma de exibição (cinema, televisão ou qualquer outro veículo). Assim, a resolução estabelecia o mínimo de 25% do total da carteira (conjunto de títulos oferecidos) de distribuidores e de fitas oferecidas pelos videoclubes e videolocadoras reservadas para obras cinematográficas nacionais. Tais obras deveriam contar com o Certificado de Produto Brasileiro ou Certificado de Obrigatoriedade. Enquanto as multinacionais rejeitavam a reserva de mercado e afirmavam que a medida era uma das razões que as afastava da distribuição em vídeo no Brasil, as empresas brasileiras de comunicação e entretenimento se beneficiavam do sistema de cotas e utilizavam

seu poder televisivo como principal forma de avançar também sobre esse

mercado. A Abril associou-se à Touchstone e à Disney, de quem já detinha os direitos de publicação no Brasil, distribuindo grande parte das produções cinematográficas de interesse infanto-juvenil39. A Manchete entrou no mercado distribuindo filmes nacionais e programas da própria emissora, direcionando as vendas diretamente para o consumidor. A Globo Vídeo, que estava no mercado desde 1982 atuando no segmento de balés, óperas, programas carnavalescos e especiais da própria emissora, aliou-se à Som Livre- braço fonográfico das empresas Globo - e passou a distribuir filmes nacionais de forte apelo comercial, como a produção cinematográfica da Xuxa e dos Trapalhões.40 Essa ação jogou a companhia em confronto direto com a CIC, que ampliava a negociação com as produtoras brasileiras para o licenciamento de títulos brasileiros considerados de grande relevância no mercado de vídeo.41. Acordos futuros entre as distribuidoras, bem como a extinção das leis de

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obrigatoriedade após o governo Collor, levariam à retirada da Globo do mercado de vídeo nos anos 90. Em meados da década de 80, porém, a cota não era a única questão que necessitava ser discutida e resolvida pelas produtoras cinematográficas brasileiras. A entrada dos filmes nacionais no formato cassete carecia ainda do estabelecimento de um prazo entre o lançamento dos filmes no cinema e sua chegada em videoclubes e locadoras, bem como a fixação de um tempo determinado entre o lançamento para locação e a exibição na televisão. Tais determinações, que já chegavam praticamente resolvidas para as realizações estrangeiras, passavam por uma longa e, muitas vezes, difícil negociação no caso das produções nacionais. Além disso, sem as cotas seria muito difícil a entrada dos filmes nacionais no mercado de vídeo, uma vez que seu espaço de ação ficava restrito ao território brasileiro, diferentemente dos grandes sucessos norte-americanos, distribuídos em espaço global Contudo, conforme o mercado de vídeo brasileiro foi se tornando mais complexo e estruturado segundo os interesses das companhias estrangeiras no decorrer daquela década, a reserva de mercado mostrava também alguns reveses para as produções cinematográficas brasileiras. A principal delas, talvez, tenha sido a transformação do cinema brasileiro nas prateleiras das locadoras em um gênero à parte. Se a denominação “cinema brasileiro” como gênero específico funcionava com relativo sucesso para filmes como Dona Flor e seus Dois Maridos (Bruno Barreto, 1976) ou Bye Bye Brasil (Carlos Diegues, 1979), ela prejudicava a circulação de produções nacionais que necessitavam se integrar a outras classificações de “gênero” para atingir seu público alvo, como era o caso das produções juvenis, de terror ou policial, para citar apenas alguns exemplos. Ao integrar-se ao “gênero” do cinema nacional, tais produções diferenciavam-se de produtos dos quais não deveriam se distinguir e perdiam grande parte de sua atração de público. Independentemente dos possíveis “efeitos colaterais” da reserva, a inserção do cinema brasileiro no mercado de vídeo era uma preocupação central na formulação de políticas e estratégias adotadas a favor deste cinema. Essa era uma questão que atravessava todos os segmentos de produção cinematográfica brasileira. O segmento erótico e pornográfico, por exemplo, buscava nas regulamentações da censura federal brechas que favorecessem sua entrada no mercado de vídeo, a fim de explorar a crescente procura por filmes do gênero.42

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Os embates entre distribuídos estrangeiros e produtores brasileiros a respeito da reserva de mercado foram tamanhos que o Concine publicou uma instrução específica para a aplicação da lei em 22 de janeiro de 1988, “tendo em vista as dúvidas levantadas por diversos distribuidores de vídeo quanto ao cumprimento de Reserva de Mercado prevista na Resolução Concine no.98/83” (SIMIS, 1989:53). A instrução reforçava a exigência de 25% de títulos e cópias de filmes nacionais sobre o total em carteira, mantinha a exigência dos Certificados de Produto Brasileiro e de Obrigatoriedade, porém, tornava tal reserva isenta do Certificado de Censura Federal, ampliando a possibilidade de integrar nessa cota a oferta de filmes pornográficos. Enquanto o Estado reforçava a ação na regulamentação do mercado de vídeos, as distribuidoras avançavam sobre esse mercado e se organizavam a favor da derrubada da cota. No final da década de 80, a tensão entre as empresas estrangeiras e o Concine, motivado em grande parte por conta da reserva de mercado, foi assumindo o caráter de uma disputa pública. Nesse momento, com o mercado de fitas estruturado justamente pelas fortes ações estatais, intensificaram-se os ataques das distribuidoras à presença do Estado na área. Conforme descreve Simis: “Várias foram as críticas feitas ao Concine: burocracia excessiva, falta de fiscais, lentidão na emissão dos selos colados nos videocassetes, entre outras. Até a legitimidade do órgão para controlar o mercado de videocassetes foi posta em dúvida, com o argumento de que o Concine havia sido criado para controlar o mercado cinematográfico e não o de vídeo” (2008, p.50).

Segundo as empresas distribuídas, que unificavam seu discurso por meio da UBV, o vídeo exigiria uma estrutura independente de fiscalização. Em 1989, diante dos atrasos na liberação dos selos de controle, representantes da UBV afirmavam que a lentidão na liberação das fitas era um incentivo à pirataria.O Jornal do Vídeo, porta voz dessa associação, passou a publicar ininterruptamente artigos e editoriais defendendo a retirada do Concine do mercado de vídeo

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Uma vez que a comercialização e distribuição de fitas já se encontrava

“domesticada” pelas ações governamentais, a redução da intervenção estatal e a ampliação da “liberdade de empreender”, passaram a ser entendidas como expressão de relações mais “democráticas” entre o Estado e o mercado. A ação final a favor de tal “democracia” seria dada no governo Collor, com a extinção do Concine e de toda estrutura estatal de regulamentação, fomento e controle do mercado cinematográfico brasileiro

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Considerações finais

A chegada do videocassete nas casas brasileiras consolidou uma nova forma de consumo e circulação de filmes, que adquiriu uma dimensão privada tanto quanto a comercialização de um livro ou disco, integrando economicamente o cinema à dinâmica doméstica e familiar (BENHAMOU, 2007) Nesse momento, portanto, a criação de condições de competição no meio audiovisual não se limitava à inserção da produção cinematográfica nas salas de exibição. No final dos anos 80, o cinema havia se tornado um processo multimídia, “acompanhado por espectadores multimídia” (CANCLINI, 2008). Com o mercado de vídeo, o cinema encontrava um novo suporte para a sua circulação e, conseqüentemente, um novo campo de luta. Essa situação, na perspectiva de Nestor Garcia Canclini (1997) representou um revés para o cinema brasileiro e latino-americano em geral: quanto mais dependente das novas tecnologias, mais esse cinema viu reduzida sua capacidade de produção. O cinema brasileiro foi preterido na formulação de grandes estratégias empresariais, políticas e tecnológicas articuladas em direção a uma concentração industrial. Mundialmente, essa situação reforçou a hegemonia dos filmes-eventos produzidos pela cinematografia clássica dominante (CRETON,1997; MICHALET, 1987) . Nas gôndolas dos videoclubes, como constantou Canclini (1997) a pluralidade de produções e práticas cinematográficas foram organizadas segundo critérios que classificaram cinematografias heterogêneas em conjuntos homogêneos. No contexto multimidiático do final dos anos 80, portanto, a pluralidade conquistada pelo cinema brasileiro ao longo da segunda metade do século XX se transformou num

gênero único, “cinema nacional”,

afetando a sua diversidade, complexidade e desenvolvimento em relação às formas e práticas culturais mundializadas. A análise da consolidação do videocassete no mercado brasileiro confirma a análise de Jesús Martin-Barbero quando este afirma que: “(...) as tecnologias não são meras ferramentas dóceis e transparentes, e não se deixam usar de qualquer modo, são em última instância a realização de uma cultura, e dominação das relações culturais” (2004, p.192).

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Notas 1 O videocassete é um equipamento eletrônico utilizado na gravação e reprodução de imagens e sons registrados em fitas magnéticas. Na produção industrial é classificado como um bem de consumo eletrônico, ou seja, um produto destinado ao uso doméstico (VIEIRA SÁ, 2004). O videocassete é o desdobramento de uso doméstico do videoteipe, equipamento desenvolvido pela empresa norte-americana Ampex, no final da década de 1950, para a gravação e montagem de programas televisivos e destinados ao uso das emissoras (HAMEL & PRALAHAD, 1995). 2 Não serão abordados nesse texto os movimentos da videoarte. Sobre as expressões artísticas decorrentes do uso de vídeo ver MACHADO (2007). 3 Também a Philips participou da disputa pelo domínio do padrão, porém, diante dos avanços da Matsushita no mercado europeu, incorporou o modelo VHS(HAMEL & PRALAHAD, 1995). 4 Os VCRs nacionais, de ontem e de hoje. Íris Foto, no.394, pp.62-65, julho 1986. 5 Os VCRs nacionais, op. cit.. 6 A nova paixão, agora também Made in Brasil. Som Três, no. 40,pp.15-21, abril 1982. 7 Novo lance na guerra do vídeo: chegou o da Philco. Som Três, no.46, pp.20-22, outubro 1982. 8 É interessante notar que o lançamento do videocassete no Brasil era anunciado pela imprensa desde o final da década de 1970, permanecendo nas notícias e reportagens como uma novidade tecnológica até meados da década de 1980. 9 A nova paixão, agora também Made in Brasil. Som Três, no. 40,pp.15-21, abril 1982. 10 Agora começa de verdade a briga do vídeo no Brasil. Som Três, no.45, pp.20-22, setembro, 1982. 12

Novo lance na guerra do vídeo, op. cit. O país onde não se pode planejar nada. Som Três, pp.61-63, setembro de 1983. 14 Agora começa de verdade a briga do vídeo no Brasil, op. cit. 15 O futuro do mercado de fitas de áudio & vídeo. Som Três, no.47, pp.26-29, novembro 1982. 16 A luz do laser aposenta o velho diamante da agulha. Som Três, no. 49, pp. 36-63, janeiro de 1983; Novidades, surpresas e mistérios ao redor da UD 85. Som Três, no.76, p.55, abril de 1985; UD: todas as novidades de áudio & vídeo. Som Três, no.90, junho de 1986; Las Vegas: o grande espetáculo da comunicação eletrônica. Íris, no.382, , pp. 44-50, junho de 1985; O avanço japonês na feira de Dallas. Íris, no. 404, pp. 60-63, junho de 1987. 17 A transformação do vídeo.Som Três, no. 43, pp. 20-21, julho de 1982. A JVC chega ao Brasil. Íris, no.390, pp. 54-55, março de 1986.Mitsubishi na frente. Foto Iris , no. 388,p.53, dezembro de 1985. 18 Íris, fevereiro de 1987; A disputa entre National e JVC. Íris, no.393, pp. 48-49, junho de 1986. 19 Um guia para conhecer melhor o videocassete. Som Três, no.43, p.26, julho 1982. 20 A nova paixão, agora também Made in Brasil. Som Três, no. 40,pp.15-21, abril 1982. 21 Sobre os diversos usos do videocassete, ver SANTORO (1989). 22 A nova paixão, agora também Made in Brasil, op. cit. 23 Processo semelhante é descrito por MATTELART, Tristan. “Pre-1989 East-West Video Entertainment Without Borders”. Réseaux, no.2, vol.2, 1994, pp. 267-280. 13

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Vídeo clube nacional: o sucesso das fitas originais. Som Três, no.43, pp.22-24, julho 1982. Vídeo Clube do Brasil, o pioneiro. Som Três, no.40, pp.20-22, maio 1982 26 Vídeo Clube do Brasil, o pioneiro, op. cit.. 27 Nas locadoras do país, 80% das fitas são „piratas‟. Folha de São Paulo, São Paulo, 20 mai. 1987, Informática, p.B-6; Concine quer o fim da pirataria até 1988. Folha de São Paulo, São Paulo, 4 jun.1987, Ilustrada A-44.. 28 “A Máxi espeta também o vídeo”. Som Três, pp. 54-55, abril de 1983. 29 Outra opção no reino do vídeo: as locadoras. Som Três, no.46, pp.26-28, outubro 1982; Explosão de imagens. Isto É, pp. 49-51, 12 de agosto de 1987. 30 .Videoclubes de São Paulo e Rio começam a se unir. Som Três,no.48, p.52, dezembro de 1982. 31 Estadão, 1987. 32 “O futuro do mercado de fitas de áudio & vídeo”. Som Três,no.47, pp.26-28, novembro de 1982,. 33 Ver Resolução INC no. 101 de 09 de outubro de 1974. 34 CIC: três anos de Brasil. Jornal do Vídeo,pp.50-51, ano 4, 1988. 35 Um mercado de 50 milhões de dólares, sem lei. Foto Íris, no.285, pp.56-57, setembro 1985. 36 Ver Resolução Concine no. 98 de 25 de novembro de 1983. 37 Warner Home Vídeo oficializa sua entrada no Brasil. Folha de São Paulo, São Paulo, 2 dez.1987, Ilustrada, A-37; Warner Home Vídeo, um ano de Brasil. Jornal do Vídeo, no.9, ano V, janeiro de 1989, p.30-31. 38 Blitz da Fazenda apreende dez mil filmes de vídeo em situação irregular. Folha de São Paulo, 26 de agosto, 1987, p. B-1.; Concine envia técnicos paulistas ao Rio para apreensão de vídeos piratas. O Globo, 10 de setembro, 1987, p.13; A guerra dos selados. Isto É, 1º. de julho de 1987, pp. 50-51; As locadoras de vídeo voltam a abrir. Jornal da Tarde, 28 de agosto de 1987, p.18; Um mercado, literalmente, sem alternativas. Jornal da Tarde, 17 de novembro de 1987, p.25; Concine deixa locadoras sem as melhores opções. Correio Brasiliense, 03 de outubro de 1987, p.28. 39 Abril Vídeo distribuíra filmes dos Estúdios Disney. Jornal do Vídeo, no.9, ano IV, 1988, p.30. 40 Opera, grande sucesso de público também em vídeo. O Globo, Rio de Janeiro, 16 jan. 1987, 2º. Caderno, p. 2; Globovídeo sofre reestruturação. Jornal do Vídeo, 1988, no. 9, ano IV, p. 26. 41 Globovideo vs Cic Vídeo [2]. Íris Foto, no.392, p. 49, maio de 1986. 42 O vídeo pornô made in Brasil. SomTrês, no.51, pp.16-18, março de 1983. 43 Mercado quer fim de taxação. Jornal do Vídeo, no.9, ano IV, 1988; Mercado: de olho no futuro. Jornal do Vídeo, ano V, janeiro de 1988; Concine gera crise no mercado de vídeo. Jornal do Vídeo, ano V, 20 de junho de 1989, pp. 5-6; Em defesa do mercado. Jornal do Vídeo, ano V, 20 de junho de 1989. 25% de reserva gera polêmica. Jornal do Vídeo, ano V, 20 de junho de 1989. 25

Referências Bibliográficas BENHAMOU, F. Economia da Cultura. São Paulo: Ateliê Editorial, 2007. BONNELL, R.. La vingt-cinquième image , Paris, Gallimard, 1989.

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As rádios comunitárias como espaços contra-hegemônicos: entrevista com Raquel Paiva Na era do lucro e de uma hegemonia fincada por traços individualistas e laços meramente contratuais, surgem alternativas à produção e ao conteúdo dos mass media Por Maria Moraes Luz1

As rádios comunitárias surgem na década de 1970 engendradas em movimentos sociais contra-hegemônicos a favor do mundo com muitas vozes, abaixo ditaduras. Com o passar dos anos, essas emissoras sofrem metamorfoses significativas que modificam suas finalidades, o público, o conteúdo e até mesmo sua própria definição merece ser revista. A revisita de conceitos que remetem a fenômenos sociais históricos em suas versões contemporâneas é fundamental para não perdermos de vista a dinâmica da própria sociedade, especificamente no caso dos veículos comunitários que são marcados socialmente. O que se apresenta na contemporaneidade é uma diversidade de emissoras com fins não só comunitários, mas também político-partidários, econômicos, religiosos e até ilícitos, em alguns casos. Para analisar a atual conjuntura desse universo de emissoras comunitárias tão contraditório e diversificado, a revista EPTIC entrevista uma das pesquisadoras de maior referência na área, a professora Dra. Raquel Paiva, criadora do Laboratório de Estudos em Comunicação Comunitária (LECC), do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Escola de Comunicação e Artes (ECO), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O LECC realiza pesquisas de campo em rádios, jornais e televisões comunitários do estado do Rio de Janeiro, estudos teóricos com interpretação de textos importantes para a temática toda quinta-feira, cursos de formação de repórteres populares em vários bairros da cidade do Rio e Baixada Fluminense. O Laboratório já publicou a Cartilha do Repórter Comunitário e em integração com a graduação, idealizou e criou o jornal O Comum, produzido pelos alunos da disciplina Imprensa Comunitária, cujo objetivo é ressaltar o caráter social, político e cultural das rádios comunitárias. O periódico é bimestral e está sob a responsabilidade de Raquel e outro acadêmico, André Esteves. O LECC tornou-se parceiro do Observatório de Favelas no projeto Escola de Comunicação Crítica e ultrapassa os limites da universidade, com pesquisadores cujas produções são referência para a área, tanto nacional como internacional. Raquel também é autora de publicações sobre Comunicação Comunitária, como O Espírito Comum: Comunidade, Mídia e Globalismo, O Retorno da Comunidade: os novos caminhos do social e Comunidade e Contra-Hegemonia: Rotas de Comunicação Alternativa. Sempre com o conceito sobre Comunidade permeando todas as discussões, a pesquisadora não perde de vista a importância de a humanidade realizar trocas simbólicas, com o verdadeiro dar e receber, identificar e diferenciar-se. Algo 1

Jornalista e Assistente Social. Mestre em Comunicação pela Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília. Email: moraesluz@gmail.com


praticamente extinto na pós-modernidade, em que a troca existente é basicamente a monetária. Os laços são jurídicos e os indivíduos vivem isolados uns dos outros. Por isso, nada mais do que essencial discutirmos novos conceitos e novas alternativas contrahegemônicas a essa modelo neoliberal. O “outro” precisa ser compreendido pelo “eu”, compartilhar valores, idéias e comportamentos em um perfil comunitarista e não individualista e mecanicista. Raquel elucida conceitos relacionados ao de comunidade, práticas no âmbito das rádios comunitárias e perspectivas de ações propositivas em relação a esses veículos. Por meio da sua vasta produção acadêmica e experiência prática com comunicação comunitária, ela esclarece várias questões sobre a temática, falando da construção de um fórum de debate em que nem sempre o consenso é o esperado, mas sim a discussão que pode ou não levar a este. EPTIC- Com o avanço do neoliberalismo, a partir do final da década de 70, nos países centrais e no final dos anos 80 na América Latina, o Estado passa a não mais regular o mercado e os gastos sociais reduzem-se com a formação de um Estado Social Mínimo. No Brasil, os serviços sociais nas áreas de saúde, previdência social e comunicação são privatizados e a globalização passa a padronizar valores e identidades. Contudo, ao mesmo tempo em que o neoliberalismo compromete negativamente o social e tenta padronizar comportamentos, há a busca pelo local, por valores compartilhados e ações comunitárias contra-hegemônicas, como as realizadas por muitas emissoras comunitárias. Diante desse panorama complexo e contraditório, qual seria um conceito (ou conceitos) mais próximo e representativo do que venha a ser uma rádio comunitária na atualidade? RP- Sem dúvida alguma muito preciso e necessário este enquadramento histórico que você conferiu à pergunta, porque para analisarmos a presença da proposta alternativa temos que considerar esse contexto. O que temos chamado de rádios comunitárias anteriormente eram nomeadas e auto-designadas por rádios piratas, substituídas por rádios alternativas e emissoras populares. Poderíamos avaliar a pertinência e as implicações de cada uma dessas designações, entretanto, respondendo diretamente à sua questão, acredito que o conceito mais significativo e apropriado para o que venha ser uma rádio comunitária na atualidade é o seu papel e lugar contra-hegemônico no contexto hegemônico, caracterizado como midiático, ou se quiser, mass midiático. Esse papel se caracteriza pela necessária e imprescindível contraposição ao sistema vigente de produção, de representação, de apropriação, identificação e significação em vigor nas sociedades atuais. E note que podemos até mesmo metaforizar a expressão “emissoras comunitárias”, porque se trata na verdade de uma disposição política mais que qualquer outra coisa. E esta disposição deve ser engendrada por um grupo organicamente organizado, este sim é o componente importante. A rádio atua como dispositivo, por isso pode-se metaforizá-lo. Poderíamos falar de um grupo de teatro comunitário, uma tevê comunitária, uma escola comunitária, etc. EPTIC- Segundo o sociólogo Boaventura de Sousa Santos é preciso na “pósmodernidade” encontrar novas formas de cidadania coletiva e não meramente


individuais, que incentivem a autonomia, combatendo a dependência burocrática, além de tentar personalizar as competências interpessoais em vez de as sujeitarem aos padrões abstratos. Para Santos, o neoliberalismo apropriou-se desta categoria (cidadania) para avançar com seu projeto político, econômico, cultural e social. Os cidadãos passam a entender suas obrigações políticas para com o Estado, mas não compreendem e desobedecem a “obrigação” política horizontal, o compromisso para com o outro. De que forma as emissoras comunitárias podem então contribuir para o exercício desta cidadania coletiva? RP- Muito propícia a abordagem a partir do pensador português Boaventura de Souza Santos. Eu concordo integralmente com ela, basta ver, exemplificando e aplicando a sua avaliação aos estudos desenvolvidos na nossa área. É surpreendente o boom de pesquisadores e pesquisas atualmente na área da comunicação comunitária no país. Evidentemente nem todos seguem esta nomeação, mas estão atuando com este enfoque ainda que se auto-intitulem alternativos, minoritários, etc. Eu me preocupo um pouco com isto por alguns motivos. O primeiro é se de fato estejam trabalhando com esta perspectiva. Se assim for, será muito positivo tanto para quem atua como para quem pesquisa na área porque passamos a ter novos lugares de fala, novas possibilidades de diálogo e a multiplicidade sempre pode ser muito positiva, em especial por poder aportar novas saídas. Entretanto, caso seja apenas uma maquiagem, em função da urgência da temática em especial para os países periféricos ou por se supor a existência de financiamentos, então nós corremos o risco de estarmos diante de um abismo, um desgaste da temática e consequentemente seu enfraquecimento como dispositivo dentro do que o próprio Boaventura Souza Santos chamou de “Sociologia das Ausências”, ou seja, uma racionalidade preguiçosa que produz como ausente uma realidade que poderia estar presente. Diante desse quadro, eu me recordo do filósofo romântico alemão, Friedrich Schleiermacher, com a sua distinção nos seus “Monólogos” entre os “filhos do espírito” e os “filhos do mundo”, conferindo ao primeiro grupo a autenticidade na busca das palavras apropriadas para cada expressão e ao segundo grupo um certo tipo de usurpação dos achados do primeiro. Acredito que é uma maneira singela, mas efetiva para explicar o que ocorreu com relação à categoria cidadania, como você trouxe. Diante desse quadro, acho que o papel das emissoras e dos trabalhos que de fato estão organicamente relacionados às atividades dos veículos comunitários continuará atuando no sentido de fomentar a consolidação da cidadania coletiva, por meio da sua disposição fundamentalmente educativa. Nós acreditamos cada vez mais nisso e este será o enfoque dos estudos do Laboratório de Estudos em Comunicação Comunitária para os próximos anos: o investimento real e efetivo no viés educacional. Acreditamos que esta é atualmente a única maneira pela qual se pode aceder à condição de cidadãos plenos. O que precisamos agora é qualificar esta educação.

EPTIC- As rádios comunitárias podem ser compreendidas pela senhora como uma “comunidade gerativa”, por estar em consonância com a estrutura comunitária que a abriga; por haver uma dinâmica de diferenciação e identificação, do dar e receber, uma relação entre sujeitos individuais que buscam um “espírito comum”, em uma troca


relativa à obrigação originária que se tem para com o outro. Como fica essa relação entre os atores envolvidos no processo de comunicação comunitária com o advento da internet? RP- Há alguns anos pensei nessa categoria “comunidade gerativa” precisamente porque tinha a preocupação operativa do empenho comunitário e vinculativo. Sendo assim, compreendemos que o processo entre todos os atores envolvidos no propósito do bem comum - o comum entendido como categoria ordinária, quotidiana, visceral e imprescindível para o cidadão - é o que determina e qualifica o pertencimento. Por esta razão, os meios, instrumentos tecnológicos ou não, que propiciem o estreitamento desta conexão só podem e devem ser comemorados. Não apenas o seu uso, mas e principalmente a posse e manipulação das inovações tecnológicas. EPTIC- A comunidade que pleiteia o serviço de comunicação vive em consonância com a sociedade, onde as relações são contratuais e menos marcadas por vínculos. Os indivíduos são autônomos e isolados, mas juridicamente relacionados. A troca é monetária, colocada sob a égide de um mercado absoluto. Entretanto, na contemporaneidade, muitas emissoras legalizadas não objetivam o bem comum e sim interesses individuais, dirigismos religiosos ou político-partidários. De acordo com Venício Artur de Lima e Cristiano Lopes, em pesquisa realizada em 2007, das 2.205 rádios comunitárias legalizadas até 2004, 1.106 (50,2%) são controladas, direta ou indiretamente, por políticos locais – vereadores, prefeitos, candidatos derrotados a esses cargos e líderes partidários. E entre os anos de 2003 e 2004, dos 1.822 processos que não tinham um “padrinho político”, apenas 146 foram aprovados e dos 1.010 processos apadrinhados, 357 foram aprovados, tendo suas outorgas garantidas. Muitas emissoras criam inclusive as associações apenas para conseguirem a outorga. Será que o processo de legalização e após o contrato firmado as relações nesses meios passam a ser societárias em vez de comunitárias? E até que ponto é interessante a legalização? RP- De fato, como em todos os casos, em especial em lugares com sistema pouco igualitário, com excesso de procedimentos burocráticos e um alto índice de corrupção, como no caso brasileiro, constata-se procedimentos dos mais absurdos. Existem casos de emissoras que estão vinculadas com o tráfico de drogas? Sim existem. Existem emissoras cujos objetivos são apenas financeiros? Existem. Existem emissoras vinculadas apenas a igrejas das mais diferentes seitas? Existem. Cito estes exemplos deixando de comentar as práticas de distorção consagradas como a utilização por partidos políticos. Todos estes casos estão cadastrados em levantamentos que o LECC realiza e monitora, mas não divulga por razões óbvias. Entretanto, este tipo de uso, este mau uso, digamos assim, não pode servir de justificativa para a política ainda em vigor com as rádios comunitárias. Uma política persecutória com inúmeros casos de lideranças tendo sido presas diante de seus vizinhos e familiares; com todo o equipamento apreendido e ainda respondendo a processos. No momento, nós estamos trabalhando com uma emissora específica do Rio de Janeiro, fazendo exatamente este levantamento, com uma descrição de todo o percurso, antes, durante e posterior ao fechamento da emissora. Em países com um quadro político e civil caótico como o nosso parte-se sempre do princípio que o cidadão é culpado. Sendo assim, e respondendo diretamente à sua pergunta: a legalização é


necessária e já tardia. Temos também cadastrado muitos casos em que depois do fechamento da emissora, os grupos prosseguiram realizando suas atividades e alguns derivaram para outras mídias, como a internet. EPTIC- A comunidade é a razão de ser das rádios comunitárias. É para aquela que estas trabalham, ou deveriam trabalhar. Mas será que os atores sociais envolvidos nas emissoras têm discernimento do papel que exercem, da influência que possuem? E a comunidade? Ela enxerga os meios comunitários como meros veículos de comunicação ou como seus porta-vozes? Nesse sentido, quais os desafios metodológicos para se realizar pesquisas qualitativas no âmbito do emissor, que é o próprio público, já que faz parte da comunidade? E os desafios para os estudos de recepção? Porque mesmo sabendo que o público é o alvo das emissoras comunitárias não há estudos sobre a receptividade da comunidade perante esses meios? RP- As pesquisas na área da comunicação sofrem de um sintoma muito freqüente: todos são inovadores. Ou seja, nenhuma pesquisa ou pesquisador quer absorver e dar continuidade ao que o colega realizou. E obviamente esta é a maneira de se gerar conhecimento. E dessa maneira a pesquisa progride com maior velocidade. Sem realizar esta etapa do processo, tudo fica mais lento e os trabalhos em comunicação comunitária não fogem a esta regra. Muito pouco ou quase nada se avança, todo mundo pesquisa o que todo mundo já pesquisou. A única variação refere-se a referencias bibliográficas. Por outro lado, tem um pessoal muito ativo, a parte da academia que prossegue com uma pratica intensa junto aos grupos de comunicação comunitária. Eventualmente esses grupos tangenciam com os núcleos de pesquisa das universidades e aí sim é possível realizar pesquisas aplicadas realmente interessantes, testando-se metodologia, aplicando procedimentos novos e antigos. Das áreas mais carentes de pesquisa está a da recepção realmente, embora alguns grupos de pesquisa no paíss já comece a realizar e o que é interessante é que tem havido um dialogo neste sentido, talvez porque estes trabalhos estejam sendo feito por pesquisadores jovens – mestrandos e doutorandos – e todos nós, que estamos na área acabamos sendo convocados a dialogar no momento da qualificação ou defesa. Recentemente participei de uma qualificação de um mestrando da UFCE com uma pesquisa de recepção muito interessante em desenvolvimento e o momento da qualificação foi muito bom porque discutimos os procedimentos metodológicos mais convenientes para aquele trabalho especifico. É assim que o conhecimento se consolida. Não adianta nada termos um boom de pesquisadores entrando para a área se eles não têm efetivo compromisso com a geração de conhecimento no setor e isso só é possível recuperando o que tem sido feito, acessando a bibliografia especifica e propondo, finalmente projetos nas áreas ainda carentes de estudos. EPTIC- Para a senhora, o jornalismo é a grande narrativa da atualidade. Uma narrativa aparentemente fragmentada, mas que representa os anseios, desejos e temores da civilização atual. O jornalismo é promotor e gerenciador de uma ordem exclusivista, concentracionista e correlacionada com os propósitos consumistas da atualidade. Por isso, é importante a pesquisa e a experimentação em direção a um jornalismo relacional, interativo com a realidade atual e em benefício da agregação de valor humano à ordem


social. Como se poderia definir, então, esse jornalismo comunitário ou inclusivo? E em que sentido ele pode ser praticado nas rádios comunitárias (rotinas produtivas, estrutura organizacional e cultura profissional)? Trata-se de uma exclusividade desses meios ou uma proposta maior de renovação do jornalismo atual? RP- Uma das aplicações da temática da comunicação comunitária que mais me interessa é a relativa à narrativa. Essa pergunta traz a urgência de uma proposta desenhada. Uma proposta que eu consigo realizar metodológica e detalhadamente e que pode ser implementada com sucesso. Pelo menos é o que acredito e em todas as instancias trazidas por você, ou seja, nas rotinas produtivas e em especial na cultura profissional, não sei se afetaria, entretanto a estrutura organizacional, em especial para os veículos de grande porte, já que a narrativa inclusiva não está afeita apenas à comunicação comunitária. Talvez ela esteja mais na ótica das urgências (as urgências a que faz menção Boaventura de Souza Santos) afeita aos veículos e profissionais da grande mídia. Neste sentido, eu acredito que se trata muito mais de uma proposta de renovação do jornalismo atual como você muito apropriadamente supôs. EPTIC- Os meios de comunicação tradicionais são os mediadores de consenso e respondem pela articulação da hegemonia, sendo responsáveis pela formulação da teoria revolucionária, segundo a senhora. Logo, a mídia e sua estrutura de produção incorpora o intelectual coletivo gramsciano na atualidade. As rádios comunitárias podem ser espaços de formação e atuação para atores envolvidos nestas se tornarem intelectuais orgânicos, a longo prazo? De que forma isso pode acontecer? RP- Hoje, diferentemente do que ocorria nos anos 80 ou mesmo 90 - quando se visualizavam apenas algumas possibilidades de exercício da profissão do comunicador social, o recém formado num curso de jornalismo, por exemplo – hoje temos um número significativo de pessoas que buscam trabalhar com “empregadores altenativos”, digamos assim, não apenas para especificar as milhares de ongs existentes e que atuam na área da comunicação, mas também com veículos e propostas comunitárias. Esse novo cenário de empregabilidade teve dentre seus grandes agenciadores a nova mídia, a internet, gerando novas possibilidades de atividade profissional. Temos registro também de casos em que o estudante ao terminar a faculdade ingressa tanto numa empresa jornalística de grande porte, trabalhando num canal de tevê, por exemplo, e ao mesmo tempo atuando com jornais comunitários, ou pré-vestibulares comunitários, grupos de música, dança e teatro comunitários. Este é um cenário. O outro é que hoje e nos últimos cinco anos temos convivido tanto na graduação, como no mestrado e doutorado com alunos que atuam de maneira sistemática e profissional em projetos de comunicação comunitária e a relação com a academia produz uma troca intensa e benéfica para todos. EPTIC- E para finalizar, a dinâmica contemporânea remete a novos olhares, novas perspectivas e inquietações sobre mídias comunitárias, entre elas as rádios com fins comunitários. Tanto os conceitos, todos relacionados com o de comunidade, como cidadania, esfera pública e hegemonia, quanto as práticas, merecem novas reflexões. Com isso, surgem diferentes desafios teóricos e metodológicos para mergulharmos no


universo dos veículos comunitários. Quais seriam, então, os obstáculos – teóricos e metodológicos? RP- O maior obstáculo para os estudos de comunicação comunitária certamente seria a apropriação e o esvaziamento da temática. Este cenário seria uma lástima e representaria anos de retrocesso para uma temática que é tão urgente.


El oyente comprometido: teorías y preceptos fundadores de las radios participativas en América Latina Isabel Guglielmone1

Abstract THE COMMITTED LISTENER: Theory and founding precepts in participative LatinAmerican radio The appearance, towards the end of the 1940’s, of « free » radios emitting programmes aimed at proselytising, education or agricultural development, is a peculiarity of Latin American radio broadcasting. In this way, over the last six decades, radios emanating from trade unions, local communities or ethnic groups have constituted an important experiment in participatory communication, incorporating theoretical elements from the “Latin-American critical school” of social communication. This school gives a wide diffusion to papal encyclical letters on communication and the media, the theory of dependence, and the communicational component of programmes of agricultural development. As a result of the evolution of society and economic transformations, a certain number of the pioneering radio stations have disappeared. Over the last ten years, intercontinental radio networks linked by satellite and new radio stations have appeared, using Internet and being addressed to a more heterogeneous, fragmented urban population. Key words: Communications, radio, participation, Latin-American critical school. Résumé L'AUDITEUR ENGAGE : théories et precepts fondateurs des radios participatives en Amérique Latine

L'apparition, vers la fin des années 1940, de radios "libres" diffusant des émissions destinées à l'évangélisation, l'éducation ou le développement agricole, est une singularité de la radiodiffusion latino-américaine. De telle sorte, et au long des six dernières décennies, les radios syndicales, communautaires, religieuses, ont constitué des importantes expériences de communication participative, en incorporant des éléments théoriques de l' « école critique latino-américaine » en communication sociale. Cette école brasse largement les contenus des encycliques papales sur la communication et les médias, la théorie de la dépendance et la composante communicationnelle des programmes de développement agricole. Résultat de l'évolution de la société et des transformations économiques, quelques-unes des radios pionnières ont disparu. Dans les derniers dix ans ont été crées des réseaux radiophoniques intercontinentaux reliés par voie satellitaire et des nouvelles stations de radio ont vu le jour, utilisant Internet et s'adressant à un public plus vaste, hétérogène, fragmenté et urbain. 1

Maître de Conférences du Département de Technologie et sciences de l’homme de l´Université de Technologie de Compiège ( Francia). www.utc.fr

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Resumo EL OYENTE COMPROMETIDO: teorías y preceptos fundadores de las radios participativas en América Latina

La aparición, hacia fines de los años 1940 de radios libres que difundieron programas destinados a la reevangelización, la educación o el desarrollo agrícola es una singularidad de la radiodifusión latinoamericana. Es así como a lo largo de las últimas seis décadas, radios sindicales, comunitarias, étnicas constituyeron importantes experiencias de comunicación participativa, incorporando elementos teóricos de la llamada “escuela critica latinoamericana” de comunicación social. Esta escuela reúne contenidos de las encíclicas papales acerca de la comunicación audiovisual, la teoría de la dependencia et el componente comunicacional de programas de desarrollo agrícola. Como resultado de la evolución de la sociedad y de transformaciones económicas, algunas de las radios pioneras desaparecieron. Durante los últimos diez años fueron creados nuevas redes radiofónicas intercontinentales, ligadas por vía satélite y nuevas estaciones de radio aparecieron, utilizando Internet et dirigiéndose a un público más heterogéneo, fragmentado y urbano

Resumo O OUVINTE COMPROMETIDO: teorías e preceitos fundadores das rádios participativas na América Latina A aparência, em relação ao final da década de 40, das rádios livres era de programas voltados para o proselitismo, a educação ou ao desenvolvimento agrícola. Uma peculiaridade da transmissão radiofônica na América Latina. Desta maneira, nas últimas seis décadas, as rádios que emanavam de sindicatos, comunidades locais ou grupos étnicos constituíam-se em importantes experimentos na comunicação participativa, incorporando elementos teóricos da “Escola Crítica Latino-Americana” da comunicação social. Essa escola deu uma ampla difusão para os encíclicos papais na mídia, a teoria da dependência e componentes comunicacionais para programas de desenvolvimento agrícola. Como um resultado da evolução das transformações sociais e econômicas, um certo número de estações de rádios pioneiras desapareceram. Nos últimos dez anos, surgiu uma rede intercontinental de rádios ligadas por satélite e novas estações que utilizam a Internet e voltadas para uma população urbana mais fragmentada e heterogênea. Palavras-Chave: Comunicações, rádio, participação, Escola Crítica Latino-Americana.

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Introducción En los años sesenta y principios de los setenta del siglo XX, en algunos países del Oeste de Europa, como Dinamarca, Inglaterra, Francia, e Italia las radios llamadas “libres” o “piratas”, salieron al aire y constituyeron una alternativa al monopolio de la radiodifusión de servicio público. “Good morning England”, el reciente filme de Richard Curtis ilustra a través de una crónica simpática, alegrías y sinsabores de los animadores de una cierta “Radio Rock” en la ficción. Se trata de la radio “Caroline”, en la realidad, que desde un barco anclado en aguas internacionales, desde 1966 y durante tres décadas, con reiteradas interrupciones debidas a naufragios o a la intervención policial, fuera escuchada por millones de oyentes, y difundiera día y noche rock y música pop, cuando durante la misma época, la radioemisora BBC consagrara

solamente

dos

horas

semanales

a

este

tipo

de

música.

Recreativas y festivas, o militantes y comprometidas, muchas de estas radios se transformaron o desaparecieron paulatinamente con la liberalización de la comunicación audio visual que se inició, en general, a partir de los años 80. Actualmente, en Francia, quinientas radios asociativas, comerciales o no, siguen emitiendo y examinan, no sin ambigüedades, el paso completo a la radio digital que se anuncia entre los años 2011-2012. Con veinte años de anticipación a la referida experiencia europea de las otrora “radios libres”, en algunos países de América Latina, la aparición de radios alternativas a un panorama radiofónico dominado por la presencia de radios privadas y comerciales, tuvo lugar a fines de los años 1940 y a comienzos de los 50. En otra época y en otro contexto al europeo, las radios participativas en América Latina se involucraron

directa o accesoriamente en el

ámbito político con la intención de promover el cambio social. A lo largo de seis décadas, radios religiosas, comunitarias, étnicas, o sindicales pusieron en el éter programas destinados a la evangelización, la educación, la alfabetización, a

la divulgación de

prácticas agropecuarias, higiene familiar y desarrollo integral y

constituyeron importantes experiencias de participación democrática en las comunicaciones. Citadas, narradas, valoradas, a veces idealizadas, sin dejar casi ninguna huella sonora, esas 3


experiencias expresadas inicialmente de modo eminentemente pragmático y con visos políticos, recurrieron luego a la teoría, dando lugar al paradigma de la comunicación participativa. De esta manera, el interés por establecer una relación simétrica y horizontal entre emisor y receptor, el rol activo, aunque en grados diferentes, de los oyentes comprometidos en

hacer oír su voz

y opinar en la situación radiofónica, permitió el

despliegue de la radiodifusión participativa. Congregaciones

religiosas,

sindicatos

u

organizaciones

no

gubernamentales

difundieron mensajes que aspiraron mejorar la vida cotidiana de oyentes pertenecientes a los grupos más desfavorecidos de la sociedad, y, en ciertos casos, reformar, cambiar y hasta tratar de

voltear el orden social y económico

establecido y resistir a los gobiernos

dictatoriales. ¿Cómo aparecieron, progresaron y se transformaron las experiencias prácticas de comunicación participativa

y cuáles fueron las premisas y los principios teóricos del

paradigma de la comunicación participativa? ¿Es posible establecer une relación entre los modelos de desarrollo implementados y los paradigmas de comunicación utilizados para sostenerlos? ¿Cuál es la nueva situación de la radiodifusión participativa en un mundo desde ahora globalizado y con el concurso de las tecnologías de la información y de la comunicación?

1. La radiodifusión participativa antes de la teoría En las primeras experiencias de radiodifusión participativa, se perciben en filigrana, referencias al texto fundador

que Bertold Bretch escribiera entre 1929 y 1933. El

pensamiento de vanguardia del dramaturgo y poeta alemán consideró que la radio no debería solamente emitir, ser escuchada, sino recibir, hacer intervenir al oyente, y ponerlo en relación con los demás. Esta posibilidad de dejar de ser un aparato de distribución de mensajes y convertirse en factor de comunicación (Bretch 2006), de modificar el carácter unilateral del mensaje radiofónico, y poner sobre las ondas la palabra de la audiencia debió resonar y propagarse en los pensamientos de vanguardia en aquel entonces.

2. Radio Sutatenza en Colombia 4


La delgada silueta de un cura colombiano con ancestros anglosajones, evoca la primera experiencia práctica y personalizada de radiodifusión participativa en el subcontinente. Desde la parroquia de San Bartolomé de Sutatenza, situada en el valle de Tenza a la que se accede aun actualmente por un “camino sin pavimentar y lleno de huecos (Fraser y Restrepo Estrada 1998) José Joaquín Salcedo Guarín, llamó “la revolución de la esperanza” a esta misión de utilizar la tecnología para educar y alfabetizar. El joven radioaficionado que había leído a hurtadillas Hegel, Marx y Engels utilizó el transistor, aporte tecnológico de la época, para hacer llegar mensajes radiofónicos a sitios sin servicio electricidad y habitado por campesinos pobres. Equipado con un transmisor de 90 vatios, Salcedo puso sobre las ondas, en el año 1947 radio Sutatenza, una estación que funcionaba con una dinámica de “micrófono abierto”.Esto permitió la participación de los oyentes de esta localidad y sus alrededores, que totalizaban ocho mil personas. Como los receptores à transistor faltaban, la empresa General Electric suministró, en calidad de donación, una centena de radio a transistor y financió al mismo tiempo un transmisor de 1000 vatios. La experiencia radiofónica de Salcedo adquirió impulso con rapidez. En cambio, el principio de “micrófono abierto” fue progresivamente modificándose porque la radio debió adaptarse a una estructura más grande y centralizada. Instalada luego en Bogotá, la capital de Colombia, radio Sutatenza constituyó la red

radiofónica “Acción Cultural y Popular”

(ACPO) la más extendida en Colombia entre los años 1970 y 1980. El programa de instrucción basado en : alfabetización, cálculo, salud, trabajo y formación espiritual fue combinado con la utilización del diario impreso “El Campesino”, por bibliotecas rurales, escuelas y programas de educación destinado al campo y el uso de cartillas (Gumucio Dagrón, 2001).Según las épocas el proyecto fue sostenido, por la Iglesia Católica Alemana, la empresa General Electric, el Banco Mundial y el BID (Banco Interamericano de Desarrollo), y logrará a través de ese dispositivo de educación a distancia involucrar gran parte de la población. (Fraser y Restrepo-Estrada, 1998; Arboleda H., 2007). La constitución y evolución de la red de radios participativas colombianas, según un estudio reciente, que analiza el rol de sus protagonistas “radialistas” (Guevara, 2008) no se produjo de manera espontánea sino con el aporte progresivo y mancomunado de sus actores. Las radios fueron educativas, ciudadanas o militantes, arbolaron intereses diferentes modificando, por consiguiente, los efectos en la radio audiencia. 5


La acción de radio Sutatenza también cosechó críticas adversas: en 1960 el sacerdote y sociólogo Camilo Torres, convertido luego en “cura guerrillero”, condujo una evaluación de ACPO-Sutatenza. Según su estudio, el programa era perjudicial para sus destinatarios. Torres acusó a Salcedo de practicar un anticomunismo “ciego y ridículo” (Dargón, ob.citada). El desacuerdo entre Salcedo y sectores políticos de la izquierda radicalizada habría hecho que estos últimos hagan explotar una bomba en la vivienda de Salcedo en Bogotá, mientras este se encontraba ausente (Arboleda R. 2007). Otros autores como el sociólogo y economista colombiano Antonio García calificaron la radio como “desmovilizadora” por haber tratado de ejercer el control de la natalidad y por haber promovido la utilización de fertilizantes de origen químico producido por las empresas transnacionales (García, 1965). A fines de la década del 80 la dirección de la radio debió afrontar problemas financieros, y Radio Sutatenza fue comprada

por la red Caracol, una poderosa cadena

comercial colombiana. Sin lugar a dudas, este ejemplo precursor estimuló, entre 1950 y 1960, la aparición de otras radios educativas en la esfera de influencia católica: Radio San Gabriel en Bolivia (1955), Radio Huayacocotla en Méjico (1965), Radio Quillabamba en el Perú (1969). Estas experiencias prácticas de radiodifusión destinadas a campesinos pobres se inspiraron en la Doctrina Social de la Iglesia de la época, como la Encíclica papal Miranda Prorsus escrita por el Papa Pío XII en 1957 que consagra un acápite a la radio. Esta carta papal que se propone combinar descubrimientos tecnológicos con valores cristianos, culturales y morales considera como “maravillosos progresos técnicos” el cine, la radio y la televisión, porque tienen la particularidad de alcanzar directamente las masas, instar la vida espiritual, y elevar el espíritu humano si son utilizados “por el bien”. La misma encíclica dedica un párrafo a los misioneros, y eso se comprende cuando muchas de las citadas radios fueron fundadas por religiosos provenientes del extranjero y considera también que en la época de las tecnologías audio visuales, “la verdad”, en lugar de ser transmitida a través del “del paso del apóstol por los senderos ásperos del viejo mundo” o mediante el libro, puede atravesar fronteras con rapidez mediante la radio y dirigirse a millones de personas en todo el planeta. De este modo, la enseñanza del Evangelio es la función mayor dada por esta encíclica a los medios de comunicación audiovisuales y la evangelización es entonces considerada como un modo de difundir la formación cristiana “base fundamental de

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todo progreso auténtico” y para contrarrestar “el comunismo ateo” de ciertas naciones que utilizan los medios audiovisuales de comunicación “para extirpar la religión de las almas”. La más antigua de las tres citadas experiencias radiofónicas como continuación de Sutatenza, la de la radio San Gabriel, ilustra este interés reflejado en la citada encíclica por utilizar la radio como vehículo educador de masas. Inicialmente administrada por la congregación religiosa misionera de la orden de Maryknols que representaba una tendencia moderna en el seno de la iglesia católica, la radio San Gabriel 2en Bolivia, autodenominada “La voz del pueblo aymara”, empezó a emitir desde “Peñas”, una localidad situada en el altiplano boliviano. Las grandes transformaciones económicas: reforma agraria, nacionalización de las minas, provocados a partir de la Revolución Nacional de 1952, trajeron como consecuencia cambios en el orden social y educativo. En este ámbito jugó un rol importante la alfabetización. Los responsables de la radio San Gabriel consideraron que el acceso de la población a la enseñanza pública no era suficiente, según lo afirmara al director de la radio de entonces, José Canut en una entrevista efectuada en 1978 y que “era necesario llevar a cabo una campaña de alfabetización de adultos al mismo tiempo que otra campaña de evangelización, respetando la

cultura aymara” (Guglielmone, 1985). Otro cambio

importante de la época, fue el uso extendido de las lenguas indígenas en las radioemisoras. Sin embargo, los testimonios no concuerdan en cuanto al momento y las circunstancias en las cuales la radiodifusión aymara comenzó en Bolivia3. Desde la década de 1950, radio San Gabriel, 4 difundió la mayor parte de sus programas en lengua aymara. Según los documentos encontrados en los archivos de la radioemisora, la noción de fraternidad, “hermandad de raza y de religión”, fue la piedra angular del universo de símbolos explicitados por radio San Gabriel. Con el transcurso de los años, la audiencia ascenderá a dos millones de oyentes entre el altiplano y la ciudad de La Paz. Por otro lado, dicha radio fue la precursora de la red ERBOL (Escuelas radiofónicas de Bolivia) iniciada en 1967 y que reúne actualmente 27 radioemisoras en todo el país. 2

El ángel mensajero, portador de la Anunciación. Los testimonios no coinciden con respecto a los primeros programas difundidos en lengua aymara en Bolivia. Los responsables de la radio “Aspiazu” conocida entre 1937 y 1945 como radio “Cultura” declaran haber comenzado a difundir en aymara en 1950 veinte horas diarias. Por su parte, los responsables de la radio “Cruz del Sur” emisora con vocación religiosa perteneciente a la Unión Bautista Boliviana, fundada en 1949, considera que fue esta radio que comenzó a emitir en esta lengua indígena. (TIRADO,CZAPLICKI, MORELLO 1983). Las radios urbanas y comerciales también difunden espacios en lengua aymara. Raúl Salmon, el “escribidor” de carne y hueso que inspirara la novela de Vargas Llosa ( Vargas Llosa 1977) director comercial de radio “Altiplano” programó, desde 1957 emisiones en esta lengua vernácula, dirigidas a una audiencia con raíces aymaras y dotada de poder adquisitivo. 4 El ángel mensajero, portador de la Anunciación. 3

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3. Las radios de las minas bolivianas En los contrafuertes de la Cordillera de los Andes, algunas radios pertenecientes a sindicatos de trabajadores bolivianos de minas de estaño5 realizaron en aquella época, una experiencia participativa singular: lograr

la autogestión completa. Las radios fueron

administradas y sostenidas económicamente por la participación de sindicatos y, de acuerdo con la legislación del trabajo, el aporte obligatorio del 0,2 % de las empresas a partir del monto de sus beneficios

para la acción sindical según un documento del sindicato de

periodistas mineros de 1983. La formación de periodistas y locutores se realizó, de modo general, localmente. La primera estación Radio La Voz del Minero comenzó a emitir en 1949 en la mina Siglo XX. El origen de las radios mineras remonta a 1947, cuando comienza a funcionar en la localidad de Catavi, la radioemisora “Sucre”, cuyos responsables eran maestros normales con una posición nacionalista y hostil a la dominación de los llamados “barones del estaño” de entonces. El más célebre de entre ellos

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poseedor de una inmensa fortuna que, ante él “ se

inclinaban emperadores y reyes, jefes políticos y gobiernos” ( Céspedes 1978) destruyó la radio en 1949 y envió estos radialistas al exilio. Los historiadores, aun si divergen acerca del nombre de las estaciones pioneras, consienten acerca del objetivo principal de las radios en aquella época: la difusión de las Tesis de Pulacayo. Este documento histórico de referencia del movimiento obrero latinoamericano, redactado en 1946 desde la localidad minera que le da el nombre, es el corolario del pensamiento y de la pertenencia al movimiento sindical trotskista y fue escrito por los dirigentes del POR (Partido obrero revolucionario) y en especial por su dirigente, Guillermo Lora, fallecido en avanzada edad, en mayo del 2009.

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Por su carácter sindical, estos

principios superan los instaurados por la triunfante y populista Revolución Nacional de 1952, una de cuyas principales acciones fue la nacionalización de las minas y la creación de una empresa estatal (COMIBOL) para administrarlas. Según los resultados de las elecciones sindicales las radios mineras siguieron la línea política trazada por el Partido Comunista Boliviano o la línea trotskista del citado POR,

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Simón Patiño. Considerando que Bolivia “es un país capitalista atrasado” las citadas tesis indican que la revolución democrático-burguesa es solo una fase de la revolución proletaria “que incluye la alianza del proletariado con los campesinos, los artesanos y los sectores de la pequeña burguesía ciudadana”. 7

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funcionaron generalmente en los locales del sindicato, y permanecieron muy desconfiados ante las tentativas de recuperación del partido político en el poder, el MNR 8. Con la nacionalización, indemnización mediante,

de las minas de estaño, y el

restablecimiento de la libertad sindical, en 1952, la radio La Voz del minero, que ya emitía desde la localidad de Siglo XX se consolidó y la radio 21 de diciembre, pudo expresar desde el centro minero de Catavi la línea radical y los principios ideológicos y políticos de la Secretaría de Cultura del sindicato local. Hacia 1956 una red de radioemisoras mineras se estableció mediante la apertura de 19 otras estaciones en otros distritos mineros, funcionando con equipos de mediana potencia de 220 vatios y un esquema de programación simple: comunicado sindical cada hora y mucha música. Este estilo cambió a partir de la influencia de la radio Illimani, la radio estatal con alcance nacional, que se inspirara en el modelo de la radiodifusión argentina 9 (Lozada; Kuncar, 1983). Durante los años 1960 las radios mineras constituyeron una red que contó hasta 23 estaciones y la fiabilidad de las informaciones era muy apreciada en periodos de movilización social. Esta red incorporo también la radio Fides, instalada en La Paz, y propiedad de los padres Jesuitas .En diferentes períodos, las radios fueron objeto de ataques y destrucciones de parte del ejército. (O’Connor, 2006). Las huellas del concilio Vaticano II se manifestaron también en el ámbito de las radios establecidas en las minas. En el año 1953 los padres Oblatos religiosos de la orden María Inmaculada de Canadá, se instalaron en Bolivia, representando la tendencia conservadora en el seno de la iglesia de entonces, y, con la intención de responder a la radio “La Voz del minero” se propusieron crean una radio nueva “para combatir la silicosis10, el alcoholismo y el comunismo” (Lozada Kuncar, ob.citada)

que se llamó radio Pío XII, precisamente, el

Papa que los apoyara. La radioemisora comenzó a emitir con una potencia de 2 Kws lo que le permitió llegar más allá de los centros mineros. Radio Pío XII y radio La voz del minero se enfrentaron frecuentemente y de modo virulento a través de las ondas. En marzo de 1965, la reducción del 40 % del salario de los mineros, para colmar el déficit de la empresa pública COMIBOL,11 generó muchas protestas.

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Movimiento Nacionalista Revolucionario. Las radios argentinas « El Mundo » y “ Belgrano” trascendían las fronteras del país y eran escuchadas en los países limítrofes y hasta en Perú. 10 Enfermedad pulmonar profesional provocada por la inhalación de polvo de silicio, que reduce la esperanza de vida de un minero a 35 años. 11 El « Plan Triangular » (1961) fue un plan de estabilización financiera de la empresa COMIBOL sostenida por prestamos europeos y estadounidenses que exigió la racionalización de la mano de obra. 9

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Asimismo, las ideas del concilio Vaticano II hicieron su camino. La encíclica Inter Mirifica de Pablo VI (1967) consagrada a los medios audiovisuales de comunicación, consideraba los mismos como vectores de propagación del diálogo sobre problemas de la actualidad mundial.12 También, el contacto cotidiano con la realidad de la mina transformó y proletarizó a algunos sacerdotes quienes participaron, junto con los mineros, en las duras labores en el fondo de las galerías. La convergencia de todos estos hechos hicieron que la estación Pío XII abandonase su línea “clerical”13 para alinearse según la Doctrina social de la Iglesia de la época, integrando la red de estaciones mineras. La estación será completamente destruida en 1967, cuando después de la intervención del ejército durante la llamada «masacre de San Juan” (O’Connor, 2006) denunció con detalles la intervención y represión militar14. La participación directa de los oyentes no siempre fue estrictamente militante. Las radios fueron también relevos distendidos abiertos a todos, difundiendo canciones dedicadas a personas del entorno y constituyeron en el ámbito deportivo, social y cultural de la vida de la gente una alternativa a los servicios telefónicos y postales y dedicaron igualmente espacios a programas de salud, a menudo, preparados o con el apoyo del personal médico de los hospitales de las minas.15 A partir de 1985 y como consecuencia de medidas gubernamentales en concordancia con la nacionalización de las economías y el advenimiento de la globalización, las minas de la empresa estatal cerraron una detrás de otras y las radios de los distritos mineros desaparecieron también. Otras pasaron al patrimonio de cooperativas de pequeños propietarios mineros. Actualmente, quedan solamente tres radios sindicales

16

. Según el

diagnóstico mas reciente, para sobrevivir, desarrollarse y alcanzar “nuevos universos comunitarios”, “la renovación tecnológica es urgente”. Las radios mineras deben adaptarse a la competencia con otras estaciones, remozar su programación y adecuarse a las expectativas de oyentes más urbanos y expuestos a una oferta amplia y variada. (Herrera, 2006) 12

En este marco las Conferencias generales del Episcopado latinoamericano (CELAM), reunidas a lo largo de varias décadas en Medellín (Colombia, 1968), Puebla (Méjico, 1979), Santo Domingo (República Dominicana 1992) representaron momentos claves en la acción evangelizadora durante el periodo posterior al Concilio Vaticano II. 13 Sindicato de periodistas mineros 1980. 14 En el año 1967, durante el gobierno del General Barrientos, y mientras las operaciones de guerrilla el “Che” Guevara se desarrollaron en el oriente boliviano, une huelga ilimitada tuvo lugar en las minas. En la madrugada del 24 de junio, cuando persistían algunas de las fogatas de la noche de San Juan, unidades del regimiento “Rangers” y la policía minera ocuparon los distritos mineros de Catavi y Siglo XX. La sede sindical y la radio La Voz del minero fueron tomadas luego de un corto enfrentamiento con los trabajadores que defendieron las instalaciones. 15 En el mes de agosto de 1976 tuve la oportunidad de realizar emisiones de educación sanitaria en la radio Viloco, situada en la localidad minera del mismo nombre, a 70 Kilómetros al sudoeste de la ciudad de La Paz. 16 Radio Vanguardia, radio 16 de marzo et Radio Nacional de Huanuni.

10


Otras experiencias radiofónicas de carácter comunitario tuvieron lugar en otros países del continente. En El Salvador, a través de radio Izcanal o en numerosas radios haitianas. Esta iniciativa se manifestó también en países africanos, donde la radio utilización de la radio comunitaria es más reciente, pero con muchas posibilidades de evolución, con radios pertenecientes a asociaciones campesinas (Burkina-Fasso, Mali, Ghana), de pescadores (Ghana) de comerciantes (Togo), de cultivadores de algodón (Burkina-Fasso), de cacao (Ghana) y de pecuarios (Mali). (Damone, 2008).

4. Los paradigmas de comunicación Esta

tradición de cincuenta años de radiodifusión participativa en América Latina,

basadas a menudo en experiencias empíricas, aunque con una base sustentada en principios expresados por encíclicas papales o documentos sindicales, es tributaria igualmente aunque modo desigual y disperso, de dos paradigmas de comunicación. Cronológicamente, primero se implementó la comunicación para el desarrollo según el modelo “difusionista" basado en el individuo y luego el modelo “participativo” de la escuela crítica de la comunicación social latinoamericana fundamentado en la sociedad.

4.1-La comunicación y el modelo de « difusión de innovaciones » En 1949, en plena Guerra Fría, el presidente norteamericano H. Truman empleó por primera el término “subdesarrollo. La concepción del desarrollo como principal línea de fuerza de la política internacional estadounidense se concretizó con la creación de la agencia internacional United States Agencia for International Development (USAID) en 1953. Esta agencia estaba destinada a la transferencia de conocimientos científicos y tecnológicos aplicados a las prácticas agrícolas y sanitarias de países “desarrollados” hacia los países “no desarrollados” o también llamados “ en vías de desarrollo”. El paradigma de comunicación que acompañó el modelo de desarrollo de difusión de innovaciones en los años 1950-60, se basó en las premisas de la corriente funcionalista norteamericana de comunicación,

con principios

tomados

de la psicología del

comportamiento y de la sociología empírica. Este modelo de tipo asistencial, se ocupó de difundir y hacer adoptar técnicas y tecnologías para la agricultura. Por otra parte, la implementación en 1961 de la “Alianza para el Progreso”

programa decenal de desarrollo

11


socio-económico auspiciado por el presidente John Kennedy

17

contribuyó a afianzar esta

visión instrumental de la comunicación, destinada a crear o modificar comportamientos y actitudes a través de la persuasión. De acuerdo con este paradigma lineal, el rol del receptor, depositario del proceso, se limita a escuchar y a actuar en consecuencia y el feed-back no es empleado para promover el diálogo sino para rectificar o medir la eficacia, o utilizando la metáfora balística, calcular el “impacto” de la estrategia de comunicación. De tal suerte, el interés acerca de los efectos y la retroalimentación de los mensajes focalizaron la atención científica sobre una audiencia considerada como « blanco ». El modelo de difusión de innovaciones tecnológicas para la agricultura, los proyectos de salud destinados a las poblaciones desfavorecidas, en especial el mundo rural pobre, sostuvieron una concepción del desarrollo fundado en el crecimiento de la producción y el consumo de bienes y servicios. La tecnología de la época, la utilización generalizada de la radio a transistor permitió que la audiencia se extendiera a sitios desprovistos de servicios de electricidad. La agencia norteamericana USIA jugó un rol importante durante dos décadas en la expansión del modelo radiofónico estadounidense en América Latina. Dinámico y ameno, este modelo se extendió en el continente partir del equipamiento técnico, la formación de recursos humanos y la distribución gratuita de programas radiales grabados

a estaciones privadas

y también

públicas. Los teóricos de la comunicación de la época adscriptos a la Mass Communication Research, inspirada en la sociología funcionalista, contribuyeron

con sus aportes

d a

incentivar la “difusión” de innovaciones. Al final de los años 1950, el sociólogo Daniel Lerner inscribió las funciones de la comunicación social en el proceso del paso

de una sociedad de tipo tradicional a la

modernización (Lerner 1958). Everet Rogers consideró que para hacer aceptar una innovación, esta debería ser difundida según etapas: percepción, interés, evaluación, prueba de eficacia y adopción, ajustadas a tipos de comportamiento (Rogers 2006) y Wilbur Schramm quien otorgó gran importancia a las particularidades culturales pensó que preparar 17

El programa de la Alianza para el Progreso fue aprobado por la Organización de Estados Americanos, con la excepción de Cuba el 17 de agosto de 1961, en Montevideo, (Uruguay) y se propuso implementar un plan de desarrollo socio-económico destinado a conservar la democracia y a oponerse a la propagación de regímenes pro-soviéticos como el imperante en Cuba de entonces, que contaba con simpatizantes en el subcontinente.

12


la atmósfera propicia para la aceptación del cambio era una de las funciones esenciales de la comunicación de masas. (Schramm, 1963) Numerosas experiencias de campo, demostraron la escasa viabilidad del modelo “difusionista” y la concepción del desarrollo evolucionaría hacia el conocimiento más profundo de cada caso. La consideración del contexto y las particularidades locales, antes de la implementación de proyectos promovería la participación de los destinatarios en las tomas de decisiones para co-elaborar sus propios proyectos con una visión integral.

4.2- La escuela critica latinoamericana de comunicación social La década 1960-70 conoció cantidad de repercusiones debidas a la evolución de las radios educativas para el desarrollo, el auge de la « teología de la liberación”, la repercusión del modelo cubano triunfante en 1959 y los movimientos populares de oposición a los regímenes dictatoriales. Interpelados por ese contexto e interesados por el lazo existente entre cada experiencia y su inserción local, muchos autores criticaron el carácter vertical e impuesto del paradigma funcionalista originario de los Estados Unidos y aplicados en la educación a distancia, la agricultura o el control de la natalidad. Investigadores como Luis Ramiro Beltrán (Bolivia), Antonio Pasquali (Venezuela), Mario Kaplun (Uruguay), Juan Díaz Bordenave (Paraguay), José Marqués de Melo (Brasil) o el investigador franco-belga Armand Mattelart, pertenecientes a la corriente del « pensamiento crítico latinoamericano » en el ámbito de la comunicación social criticaron el paradigma “difusionista”18. En contrapartida, propusieron la explotación de enfoques ajustados al análisis de la realidad del contexto socio económico latinoamericano, destacando la democratización de las comunicaciones y de las sociedades. Los principios de esta comunicación « participativa » se sustentaron en la propiedad comunitaria de los medios de comunicación, en los contenidos favorables a los cambios sociales y en una comunicación de tipo “horizontal”.

18

El paradigma funcionalista de comunicación fue también criticado en los Estados Unidos por una voz disidente, la de Wright Mills (19161962) y en Europa por la de Georges Friedmann (1902-1918). (Mattelart et Mattelart 2002). El investigador norteamericano Everett Roggers, uno de los representantes de la Communication Rersearch, critico' más tarde, en 1976, los propósitos tenidos por esta corriente acerca de la comunicación y el desarrollo. ( Beltrán, 2000).

13


Las premisas y bases teóricas de estas reflexiones se combinaron con corrientes de pensamiento diversas y no todas originarias de América Latina. Las manifestaciones del contexto internacional jugaron igualmente un rol (Guglielmone, 2008). Entre las fuentes que nutrieron el pensamiento latinoamericano del paradigma de la comunicación participativa se encuentran la proposición de un nuevo orden mundial de la información y de la comunicación propuesto por la UNESCO en la conferencia general de Nairobi (Kenya) en 1976. Esta proposición fue reforzada luego por la Declaración sobre los medios informativos de la XX sesión de Conferencia General de la UNESCO en 1978 y consolidada con la centena de recomendaciones del informe Mc Bride titulado “Un solo mundo voces múltiples” (UNESCO 1980) a propósito del intercambio de información entre los países del hemisferio norte y sur, la educación y el uso adecuado de la tecnología. Al criticar el desequilibrio en materia de información a nivel internacional esta posición es la continuación de la Conferencia de Belgrado, fundadora del Movimiento de países no alineados19 que había tenido lugar en la exYugoeslavia en 1961. La noción de “imperialismo cultural” ejercido por los Estados Unidos, en detrimento de las particularidades culturales de los países alimento múltiples obras. (Beltran L.R., Fox E. 1980). La escuela crítica latinoamericana se inspiró también en el principio de “reciprocidad” entre el emisor y el receptor, característica del pensamiento del pedagogo católico Paulo Freire, preconizando, a través del diálogo y la educación, la liberación de los “oprimidos” (Freire, 1974) y proponiendo la comunicación en lugar de la extensión. Freire fue uno de los pilares de la “teología de la liberación”, un movimiento eclesiástico y cultural complejo del cristianismo del siglo XX, originario de América Latina. Inspirado por los grandes movimientos sociales de los años 60, refractario a la jerarquía de la iglesia Católica de entonces este movimiento incorporó en sus análisis el lenguaje de las ciencias sociales y algunos criterios del análisis marxista. El aspecto principal del paradigma de la comunicación participativa fue considerar la comunicación “como un proceso de interacción social democrática que se basa sobre el intercambio de símbolos por los cuales los seres humanos comparten voluntariamente sus 19

En los años 1950, en un contexto geopolítico de descolonización y de declaraciones de independencia, los países no alineados optaron por una postura de independencia política ante los bloques políticos antagonistas de la época: los países Occidentales y los países de la ex Union Soviética. El impulsor del movimiento y creador de su denominación fue el líder hindu Jawaharlal Nehru (1889-1964) Durante la conferencia de Argel en 1973 estos países propusieron la instauración de un nuevo orden económico mundial. La organización continua vigente a pesar de la caída del muro de Berlin.

14


experiencias en condiciones de acceso libre e igualitario, de diálogo y participación” (Beltrán, 1980). Este mismo autor califica como “la década del fuego”, los años 1970 en América Latina, cuando muchos estudiosos se comprometieron en cambiar las prácticas de comunicación y estas prácticas acompañaron periodos de resistencia política a las dictaduras (Beltrán, 2006). Otra influencia en la consolidación de este paradigma fueron los análisis de orden político, filosófico y sociológico provenientes de la “teoría de la dependencia” .Esta teoría, expuesta en una época en la cual la mundialización económica no había alcanzado las dimensiones actuales, proponía la industrialización de los países de la « periferia » tradicionalmente proveedores de materias primas, con el fin de reducir las importaciones y contribuir a un intercambio más equilibrado. Este mismo pensamiento consideraba que la clave de las condiciones futuras de desarrollo radicaba en la industrialización de países « periféricos » para facilitar la igualdad de intercambios con países ya industrializados del « centro » (Cardoso; Faletto, 1978). Las lecturas de autores extranjeros como Antonio Gramsci, Samir Amin, André Gunter Franck o de los filósofos de la primera época de la escuela de Francfort ejercieron también una influencia en la construcción del paradigma de la comunicación participativa, influencia a la cual se agrega la

concepción de desarrollo de la comisión económica para

América Latina (CEPAL). Este organismo de las Naciones Unidas fundado en 1948 en el cual el economista argentino R. Prebisch 20 jugó un rol decisivo en la puesta en práctica de las ideas fundadoras ha sido un vector esencial para la aplicación de los criterios propuestos por la “teoría de la dependencia”. Para la CEPAL, el “desarrollo” implica un cambio estructural de las estructuras económicas a nivel mundial. De este pensamiento institucionalizado, la escuela latino americana de comunicación traspuso al ámbito de las comunicaciones de masas la intención constante de sostener la democracia y alentar el cambio social trabajando de manera asociada con organizaciones sociales y religiosas de vanguardia de la época. Teniendo como telón de fondo estos principios, no utilizados de manera sistemática y coordinada, las experiencias de aplicación teórica del modelo de comunicación participativa fueron tan distintas como los espacios culturales y políticos en las cuales se desplegaron. En este contexto, la radio participativa y comunitaria jugó siempre un rol importante y en un recuento no exhaustivo podemos citar: 20

radio Enriquillo, (República Dominicana), radio

Secretario general de la CEPAL entre 1948 et 1962.

15


Cultural campesina de Teocelo (Méjico), ERBOL, (Escuelas Radiofónicas de Bolivia);las radios

comunitarias haitianas , la FGER

Radiofónica y, a nivel continental,

la Federación guatemalteca de Educación

ALER (Asociación latinoamericana de educación

radiofónica).

4.4-

El

paradigma

de

la

comunicación

participativa

en

un

mundo

globalizado:Transformaciones esenciales América Latina, compuesta por estados fundados en su gran mayoría hacia la primera mitad del siglo XIX está lejos de constituir un conjunto homogéneo. Caracterizaba por una vasta diversidad geográfica y humana, el sub continente es una de las regiones del mundo donde el proceso de internacionalización económica, instalado en torno del sector privado, cobró gran influencia. Las democracias están consolidadas y una izquierda heterogénea, cuya aspiración principal es limitar y negociar las políticas neoliberales en vigencia desde 1980, gobierna en la mayor parte de los países. A lo largo de cinco décadas, los cambios constatados son importantes. En el plano económico, la mundialización de las economías desbarató el principio de sustitución de importaciones, elemento clave de la teoría de la dependencia. Además, y como lo señala Alain Rouquié, la relación “ centro- periferia” parece ser menos operativa ante la globalización financiera, la mundialización de intercambios y implantada en diferentes sitios del planeta

y la emergencia de

una cadena productiva países situados en el

hemisferio Sur económicamente fuertes. (Rouquié, 1998) En otros ámbitos, es posible constatar otros cambios significativos tales como la desaprobación por parte del Vaticano, de la teología de la liberación así como los compromisos tomados por nuevas alianzas comerciales regionales que proponen una visión ecológica y a largo plazo del desarrollo. Los medios de comunicación audiovisuales se multiplicaron y se concentraron en redes privadas y algunos conglomerados mediáticos, como Televisa en México o la red O Globo en Brasil adquirieron proporciones gigantescas. Actualmente, en el mundo globalizado del periodo de « la post guerra fría”, la implantación de las tecnologías de la información y de la comunicación cambió la situación. En el caso particular de la radio, y gracias a la tecnología satelital, las radios comunitarias constituyeron redes. Es así como ALER a través del satélite PAS-3, y su sistema SIRC conformado por ocho estaciones satelitales que emiten una señal con “ up-links” (unidades 16


terrestres) desde cinco países. Del mismo modo, y con el concurso de siete estaciones terrestres, el sistema cubre el centro y el sur del continente con 187 receptores del satélite emplazados en 18 países. En los países de la Cordillera de los Andes, la Red radiofónica “Quechua satelital” reúne las estaciones radiales de esta comunidad étnica de Bolivia, Perú y Ecuador. La combinación del uso de la radio y de Internet, servicio del cual cada vez más las radios disponen, permite también múltiples intercambios entre el emisor y los oyentes- internautas modificando de ese modo la comunicación horizontal en beneficio de procesos abiertos en múltiples direcciones.

Audiencias heterogéneas En ese contexto, existe también un cambio de talla para la comunicación de las radios comunitarias: las audiencias radiofónicas son heterogéneas y superaron ampliamente las nociones de pertenencia a una clase social, en especial a las categorías “radios campesinas o radios obreras y sindicales”. En el marco del abundante panorama radiofónico latinoamericano, las radios comunitarias deben dirigirse a una audiencia entremezclada. Heterogéneas, financiadas en algunos casos por organismos internacionales, hoy por hoy se encuentran radios destinadas a las mujeres, a diferentes etnias, radios pertenecientes a grupos religiosos no católicos, a los movimientos ecologistas de desarrollo sostenible a ciertas categorías de cultivadores, a asociaciones de desocupados, a comunidades inmigrantes o a municipios y hasta a radios animadas por los pacientes actuales o antiguos de un hospital psiquiátrico.21 Las audiencias son múltiples aunque mejor definidas, superpuestas y móviles y sintonizan redes que trascienden las fronteras territoriales En el marco de esta nueva manera de comunicar, la práctica precede una vez más, la teoría. La enunciación de un nuevo paradigma de comunicación integrando a la situación actual, no ha cristalizado aun. Con el idéntico mérito del sacerdote colombiano de los años 1940 o de los militantes de las tesis de Pulacayo, una nueva generación de « radialistas » poseedores de diplomas universitarios en ciencias sociales se ejercitan también la práctica, combinando nuevos formatos, lenguajes radiofónicos, géneros inéditos

algunas experiencias de radiodifusión pionera, la de los

21

Radio La Colifata es un proyecto de Salud Mental clínica comunitaria que existe desde hace 15 años en el marco del hospital psiquiátrico José T. Borda (Buenos Aires, Argentina).

17


“micrófonos abiertos” a las modalidades de la radio comunitaria. Esto se armoniza con la gran apertura hacia el mundo, exhortado por el uso combinado del satélite y de Internet, ante un panorama poblado por tecnologías nuevas, nuevos radioescuchas, ante unas nuevas formas de espacios públicos abiertos al debate Esos nuevos circuitos pueden despertar nuevas formas de interacción y de encuentros, y representarían de este modo, la otra cara de la mundialización: múltiple, construida en redes, con aspectos comunes que superarían un espacio geográfico determinado, conservando al mismo tiempo el impulso originario (Hardt; Negri 2004).

5. El aporte de las tecnologías de comunicación en la evolución de la radio La convergencia de la utilización de Internet y las radios comunitarias modificó y amplió las bases de la comunicación participativa.

La creación de centros multimedia,

permiten a las comunidades locales el acceso gratuito a Internet. Además del “cybercafé”, la radio comunitaria puede establecer portales de acceso gratuito en bibliotecas o centros multiculturales. La radio puede actualizar su base de datos recopilando las informaciones solicitadas por los miembros de la comunidad y halladas en los portales web. Esos centros de acceso gratuitos sirven igualmente de lazo entre la estación de radio para producir y difundir programas en directo. En este contexto, el proceso de interacción el eje del paradigma de comunicación participativa experimenta una apertura. Si bien es cierto que la distribución de Internet es desigual entre países y al interior de un mismo país, y que, en los centros multimedia, los representantes de la clase media alfabetizada: maestros, dirigentes, sectores intermediarios, tienen más posibilidades de aprovechar del uso de esta tecnología, es una realidad el refuerzo de la comunicación participativa a partir de la convergencia de la radio y de Internet. Las experiencias de comunicación participativa inherente a la combinación de la radio e Internet, contribuyen a reforzar, en grados diversos, probablemente de un modo difuso y no localizable en un sitio preciso, el poder en las manos de los destinatarios abriendo a ellos una mayor participación. El acceso de los “radioescuchas internautas” al soporte digital puede modificar, en grados diversos y según múltiples factores. Tanto más que el acceso al soporte digital puede volver a configurar la lógica de las interrelaciones entre actores colectivos: “radialistas” y radioescuchas, agentes de desarrollo y líderes de opinión local, en fin, entre gobernantes y gobernados. Y, estos nuevos usos y nuevas prácticas sociales de soporte digital acoplado a la 18


radio, pueden provocar otros intercambios y transformaciones en la siempre presente preocupación de asociar el “oyente comprometido” en el proceso de participación.

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20


Rádios Livres e Comunitárias, Legislação e Educomunicação Cicília M.Krohling Peruzzo1 Universidade Metodista de São Paulo kperuzzo@uol.com.br

Resumo Estudo sobre a caracterização de uma rádio comunitária que parte de um breve resgate de sua aproximação histórica às rádios livres. O objetivo do texto é apontar algumas pistas sobre as práticas comunitárias de comunicação a partir do rádio e, principalmente, às suas dimensões política e educativa e às limitações legais impostas aos grupos civis que procuram exercitar o direito à comunicação. De fato, há leis isoladas, como as da radiodifusão comunitária e dos canais comunitários no sistema cabo de televisão, mas não uma política pública que favoreça essa modalidade comunicativa. Tendo por base uma pesquisa bibliográfica, conclui-se que o rádio, apesar de nascer com um perfil local e educativo-cultural, no Brasil, tem esse sentido ameaçado ao ser transformado em mercadoria. As rádios livres e comunitárias provocam a reinvenção de um modelo de comunicação de interesse público.

Abstract Free and community radios, legislation and education-communication Study about the characterization of a community radio, from a brief overview of its historic proximity to free radio. The objective of the paper is to point out indicators of community communication practices departing from the radio and, most importantly, the political and educational dimensions, as well as the legal limitations imposed on civil groups which try to exercise the right to communication. In fact there are isolated laws, such as the ones related to community radio diffusion and community channels in the cable television system, but not a public policy which supports this mode of communication. Based on bibliographical research, we conclude that the radio, being born with a local and cultural-educational profile in Brazil, has this essence threatened when it is transformed into a product. Free radio and community radio promote the re-invention of a communication model of public interest.

Resumen 1

Docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade Metodista de São Paulo. Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Autora dos livros Relações públicas no modo de produção capitalista; Comunicação nos movimentos populares: a participação na construção da cidadania; e Televisão Comunitária: dimensão pública e participação cidadã na mídia local. Coordenadora do GT Comunicación Popular, Comunitária y Ciudadanía da ALAIC-Asociación Latinoamericana de Investigadores de la Comunicación e do Núcleo de Pesquisa de Comunicação Comunitária e Local (COMUNI). E-mail: kperuzzo@uol.com.br


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Radios libres y comunitarias, legislación y educación-comunicación Estudio sobre la caracterización de una radio comunitaria que parte de un breve rescate de su aproximación histórica a las radios libres. El objetivo del texto es apuntar algunos aportes sobre las prácticas comunitarias de comunicación partiendo de la radio y, principalmente, de sus dimensiones política y educativa y de las limitaciones legales impuestas a los grupos civiles que buscan ejercitar el derecho a la comunicación. De hecho, hay leyes aisladas, como las de la radiodifusión comunitaria y de los canales comunitarios en el sistema de televisión por cable, pero no hay una política pública que favorezca esa modalidad comunicativa. Teniendo por base una investigación bibliográfica, se concluye que la radio, a pesar de nacer con un perfil local y educativo-cultural, en Brasil, ese sentido ha sido amenazado al ser transformada en mercancía. Las radios libres y comunitarias provocan la reinvenção de un modelo de comunicación de interés público. Résumé Etude sur la caractérisation d'une radio communautaire à partir d'une brève description de son rapprochement avec les radios libres. Le but du texte est de proposer quelques pistes d'analyse sur les pratiques de communication communautaires à partir de la radio, plus particulièrement quant à leurs dimensions politiques et éducatives, voire aux limites légales imposées aux groupes civils qui cherchent à exercer un droit à la communication. en effet, il existe des lois isolées, comme celles concernant la radiodiffusion communautaire et les chaînes cablées communautaires, mais il n'y a pas de politique publique qui favorise ce type de communication. A partir d'une recherche bibliographique, il est évident, qu'au Brésil, la radio est menacée et risque de se transformer en marchandise, même si elle reste locale, éducative et culturelle. Les radios libres et communautaires amènent donc la réinvention d'un modèle de communication d'intérêt public. Introdução A grande mídia tem um papel tão preponderante na sociedade que acaba sendo vista, pela maioria das pessoas, quase como se existisse um sistema único de comunicação. Outras modalidades de processos comunicacionais, como os comunitários e alternativos tendem a ser desconsiderados ou menosprezados por suas configurações simplórias e de baixo alcance ou pouca audiência. No entanto, a importância desses meios não é compreendida se forem olhados por esses critérios. O objetivo deste texto é apontar algumas pistas sobre outros ângulos das práticas comunitárias de comunicação a partir do rádio e, principalmente, no que se refere às dimensões política e educativa e às limitações impostas aos grupos civis que procuram exercitar o direito à comunicação.


3

1. Rádios comunitárias e livres em suas origens Rádios livres e rádios comunitárias têm pontos em comum, mas também suas especificidades. No Brasil, as rádios comunitárias em freqüência modulada(FM) nasceram no contexto dos movimentos populares e como rádios livres (transmissão pelo dial sujeita a enquadramento legal) ou têm suas origens na ―rádio‖ de altofalantes, também chamada de Rádio Poste ou de Rádio Popular (transmitida através de caixas de som e bocas amplificadoras, e não sujeitas à legislação impeditiva para transmissão). Rádio livre é aquela que entra no ar sem permissão legal, ou seja, ocupa certa freqüência do dial mesmo sem possuir (e nem mesmo pedir) a concessão de canal por órgãos governamentais competentes. Suas origens remetem ao século passado, 1925, ano da primeira experiência na Áustria, seguida de várias outras tanto na Europa como na América Latina. Na América Latina a primeira rádio livre foi a Rádio Sucre, na Bolívia, em 1947. No Brasil, pelo que se tem registrado até o momento, a Rádio Paranóica foi a primeira a entrar no ar, em Vitória, estado do Espírito Santo, precisamente em outubro de 1970. Na segunda metade dos anos 1970 e nos anos 1980, outras pequenas rádios livres também ousaram contestar o sistema de controle dos meios de comunicação de massa e irradiaram seus sons no estado de São Paulo e em Santa Catarina2. Para Felix Guatarri, no prefácio do livro ―Rádios livres: a reforma agrária no ar‖ (1986, p.11), as primeiras rádios livres do Brasil foram acolhidas com uma certa reserva. Alguns recearam que sua aparição pudesse servir de pretexto para uma repressão violenta; outros só viram nelas um repley dos movimentos dos anos 60 [belle époque]. [...] O movimento das rádios livres pertence justamente àqueles que o promovem, isto é, potencialmente, a todos aqueles [...] que sabem que não poderão jamais se exprimir de maneira conveniente nas mídias oficiais. Não se trata [as primeiras manifestações de rádios livres no Brasil], portanto, de um movimento esquerdista, mesmo se são os esquerdistas os primeiros a se engajar corajosamente nessa perspectiva.

Fazer rádio livre significa ―reinventar o sistema das mídias, desconstruindo a pragmática que nos é imposta de cima, [...] já a partir da concepção da tecnologia. Ao mesmo tempo, reintegrá-lo de forma sadia na vida da comunidade, para que ele seja instrumento da criatividade coletiva e não a prisão do imaginário‖ (MACHADO; MAGRI; MASAGÃO, 1986, p.33). O tipo de reinvenção aventada acima desabrochou nas rádios comunitárias. A rádio livre que começou com transmissões isoladas e feitas por jovens, sem nem mesmo possuir as menores 2

Ver Peruzzo (2004, p.216-258) e Machado, Magri e Masagão(1986).


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pretensões políticas de esquerda, foi apropriada por grupos comunitários

que colocaram a

tecnologia em benefício das lutas coletivas populares. Ou seja, no Brasil surgem também emissoras livres no âmbito de movimentos sociais. A primeira deve ter sido a Rádio Teresa, em 1985, ligada ao movimento sindical dos bancários. Surgem também a Rádio Patrulha em Ermelino Matarazzo, Zona Leste de São Paulo; a Rádio Livre Paulicéia, em Piracicaba, São Paulo; e a Rádio Novos Rumos, na Baixada Fluminense no Rio de Janeiro, no início da década de 19903 como precursoras do movimento de rádios comunitárias4 que se forjou no País nos anos seguintes e que perdura neste início de século. A maioria5 das rádios livres comunitárias esteve ou está em situação de ilegalidade em decorrência da lentidão e/ou distorção no âmbito do governo federal quanto às decisões sobre os processos em andamento solicitando autorização para funcionamento. Em 1998 foi promulgada uma lei de radiodifusão de baixa potência na tentativa de atender a demanda social pelo acesso às ondas. A tentativa de se legalizar provocou a entrada de cerca de 20 mil processos de rádios comunitárias nas salas do Ministério das Comunicações ao longo de mais ou menos uma década. As rádios comunitárias não querem ser ilegais, são as circunstâncias que as levam ou as mantém nessa situação. Os grupos comunitários que pleiteiam autorização para funcionamento das mesmas o fazem porque as vêem como canais de comunicação facilitadores do trabalho comunitário visando a ampliação da cidadania e o desenvolvimento local. Porém, muitas das rádios comunitárias existentes já não se encontram mais na categoria de rádios livres, pois têm autorização e, portanto, se enquadraram legalmente. Em outras palavras, foram absorvidas pelo sistema. Já as rádios comunitárias da modalidade alto-falante foram, de fato, as precursoras das rádios transmitidas em freqüência modulada. Elas tiveram e continuam tendo um papel importante enquanto meio popular de comunicação, dependendo da realidade em que se inserem, pela facilidade que representam em razão dos baixos custos de equipamentos e por estarem livres de perseguição dos órgãos fiscalizadores dos serviços de radiodifusão e, ao mesmo tempo, servirem aos propósitos de conscientização e mobilização social local.

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Idem. Estimativas chegaram a apontar a entrada no ar de entre 10 e 20 mil emissoras comunitárias, entre pedidos em andamento, emissoras funcionando e fechadas pela polícia ou por estratégia própria, enquanto aguardavam a outorga. 5 Não são todas porque também há emissoras desse tipo que não querem ser legalizadas, não desejam se enquadrar em parâmetros legais para não perderem a autonomia e o sentido político que lhe deu origem. 4


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Contudo, as rádios comunitárias foram marcadas pelos estereótipos de rádios ―piratas‖ ou ―clandestinas‖, já que inicialmente não tinham respaldo legal para funcionamento. O preconceito foi cunhado pelas forças favoráveis à continuidade do oligopólio das rádios comerciais e do modelo mercadológico do sistema midiático, em alusão às transmissões de rádios livres ocorridas a partir de barcos, na Inglaterra, nos 1950, e que tinham objetivos comerciais. O que não é o caso das comunitárias brasileiras. Não se levam em conta a necessidade de democratizar a radiodifusão brasileira, as limitações legais e operacionais do serviço de radiodifusão de baixa potência, nem o importante trabalho de desenvolvimento comunitário que esse tipo de rádio costuma desenvolver (PERUZZO, 2006, p.116). 2. O que caracteriza uma rádio como comunitária? Há diferentes matizes de rádio sob a denominação de comunitária. Algumas se dizem comunitárias porque se valem da lei 9.612/98 para operar, mas estão mais próximas às rádios convencionais, tanto comerciais como religiosas. São de caráter comercial (rádio local como negócio) e/ou vinculadas a igrejas6 e políticos ―profissionais‖. Há, portanto, casos de apropriação privada de um serviço legalmente estabelecido como de uso público e participativo por comunidades, o que contribui para gerar distorções e incompreensão por parte da sociedade. Apesar deste tipo de emissora prestar serviços em benefício das localidades onde atua, não se caracteriza propriamente como rádio comunitária.

Não pertence a ela, não tem sua

programação e administração conduzidas por organizações coletivas representativas locais, tende a não priorizar a educação, informação e cultura e assim por diante. Rádios comunitárias7 são aquelas que possuem um caráter público, ou seja, são sem fins lucrativos e comprometidas com a melhoria das condições de vida e o desenvolvimento da cidadania por meio do envolvimento direto dos cidadãos. Espera-se, portanto, que uma rádio comunitária seja canal para o exercício da liberdade de expressão da população local, favoreça a participação ativa dos moradores da localidade na emissora, desenvolva um trabalho de informação, educação informal e não-formal, desenvolvimento da cultura e mobilização social na direção da auto-emancipação cidadã. Caso contrário, tende a reproduzir estilos de programação e 6

O vínculo em si com alguma igreja não quer dizer que a emissora não seja ou não possa ser comunitária, pois, em muitos casos são justamente esses laços que impulsionam o trabalho comunitário. É um conjunto de fatores que deve ser levados em conta. 7 Ver Peruzzo (1999; 2004); Amarante (2004); Detoni (2004), Lahni (2005) e Bahia (2006), entre outros.


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tendências das rádios comerciais, tanto pela ênfase em conteúdo musical condicionado pela indústria cultural, como no alinhamento político a ocupantes de cargos nas instâncias legislativas e do poder executivo municipal em contrapartida a apoios financeiros. Sem falar nas emissoras de caráter religioso, principalmente evangélicas, que primam por irradiar suas pregações no mesmo estilo dos seus templos. A rádio comunitária, não precisa se privar de inserções de programas religiosos, mas há que

manter um caráter plural oferecendo espaço às diferentes igrejas

(PERUZZO, 2006, p. 116). 3. Educomunicação na rádio comunitária Embora a tendência predominante seja tratar a educomunicação a partir das inter-relações entre Comunicação e Educação na educação formal, ou seja, no âmbito das instituições de ensino, sabe-se que ela também se desenvolve nos processos de comunicação comunitária, e o rádio tem um potencial especial para ajudar o crescimento intelectual de pessoas. A ―educomunicação define-se como um conjunto das ações destinadas a integrar às práticas educativas o estudo sistemático dos sistemas de comunicação [...]‖ (SOARES, s./d., p.1). A educomunicação comunitária8 que ocorre no nível da educação informal (adquirida no dia-a-dia a partir das práticas sociais) e não-formal9 (formação estruturada e pode levar a uma certificação, mas difere da educação formal10 ou escolar) se manifesta de diferentes maneiras. Numa rádio comunitária, por exemplo, ela se concretiza tanto no nível dos conteúdos transmitidos como das práticas comunicacionais desencadeadas no cotidiano. Os relacionamentos sociais, reuniões e demais trabalhos em equipes, treinamentos formais e informais, as práticas de coleta de matérias jornalísticas, o ato de se expressar pelos meios de comunicação etc. se constituem em evidentes mecanismos de formação cidadã11. Como já dissemos em outro texto (PERUZZO, 2007, p.83-84), as pessoas que se envolvem diretamente na produção comunicativa comunitária passam a compreender melhor a 8

Discussão inicial sobre educomunicação comunitária foi feita pela autora () no texto ―Comunicação comunitária e educação para a cidadania‖ (2002). Disponível em: http://www2.metodista.br/unesco/PCLA/revista13/revista13.htm 9 Fundamenta-se nos conceitos de Almerindo Janela Afonso (1989) (apud CARNICEL, 2005, p.48), para quem, ―por educação formal entende-se o tipo de educação organizada como uma determinada seqüência e proporcionada pelas escolas, enquanto que a designação de educação informal abrange todas as possibilidades educativas no decurso da vida do indivíduo, constituindo-se um processo permanente e não organizado. A educação não-formal, embora obedeça também a uma estrutura e a uma organização (distintas, porém, das escolas) e possa levar a uma certificação (mesmo que não seja essa a finalidade), diverge ainda da educação formal no que respeita a não fixação de tempos e locais e à flexibilidade na adaptação dos conteúdos de aprendizagem a cada grupo completo‖. 10 No âmbito escolar entende-se a educação formal constituída a partir de instituições de ensino (Colégios, Universidades etc.) 11 Ver Peruzzo (2007).


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realidade e o mundo que as cercam. Aprendem também a trabalhar em grupo e a respeitar as opiniões dos outros, aumentam seus conhecimentos técnicos, filosóficos, históricos e legais, ampliam a consciência de seus direitos. Desenvolvem a capacidade de expressão verbal, além de conhecerem o poder mobilizatório e de projeção que a mídia possui, em geral simbolizado no atendimento a reivindicações e ao reconhecimento público pelo trabalho de locutores. Aprendem ainda a entender os mecanismos de funcionamento de um meio de comunicação – desde suas técnicas e linguagens, até os mecanismos de manipulação a que estão sempre sujeitos. De posse desse conhecimento, melhoram a auto-estima e um possível interesse em crescer e colaborar para que mudanças sociais ocorram, além de formularem espírito crítico capaz de compreender melhor a lógica da grande mídia. Uma forma de entender a mídia é fazer mídia. Porém, o potencial das rádios comunitárias - participativas e orgânicas às realidades das comunidades – em contribuir para transformar a dura realidade das classes empobrecidas brasileiras não se constitui em argumento capaz de sensibilizar favoravelmente o Ministério das Comunicações, as agências reguladoras e as grandes empresas midiáticas nacionais e regionais em relação à necessidade de políticas públicas e leis propícias ao seu funcionamento.

4. Aspectos da lei de radiodifusão comunitária A institucionalização da radiodifusão comunitária de baixa potência ocorre no Brasil com promulgação da lei 9.612, de 19 de fevereiro de 1998 (regulamentada pelo decreto 2.615/98) que institui o Serviço de Radiodifusão Comunitária, sonora, em freqüência modulada (FM) e permite a irradiação a uma potência de 25 watts ERP

e antena não superior a 30(trinta) metros.

Estabelece ainda: somente uma emissora pode ser instalada numa mesma localidade; canal único na faixa de freqüência para todo o País (o que se mostrou inviável para São Paulo); não podem transmitir em rede; não podem inserir anúncios publicitários (só é permitido o patrocínio na forma apoio cultural); não possuem direito à proteção contra eventuais interferências causadas por outras emissoras, entre outros aspectos que serão discutidos mais adiante. Outro agravante é que a legislação da radiodifusão comunitária está atrelada a outros textos legais como Código Brasileiro de Telecomunicações (lei 4.117/1962), a Lei Geral de Telecomunicações (lei 9.472/1998) e do decreto lei nº 2.848/1940 do Código Penal Brasileiro,


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permitindo enquadramentos penais rigorosos àqueles que operam emissoras sem autorização oficial12. Como se pode observar, a radiodifusão comunitária está submetida a uma legislação que dificulta seu funcionamento, a qual tem sido motivo de protestos e de reivindicações de mudanças por parte do movimento social do setor. Este é canalizado pela Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (ABRAÇO) e suas associações congêneres nos estados, bem como por entidades aliadas como Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC), entre outras. Já se acenou com possíveis mudanças na lei e na sistemática de autorização de funcionamento de emissoras. Até uma Comissão Interministerial foi criada com a finalidade de analisar a situação e propor soluções, mas nada tem mudado em dez anos de vigência da referida lei, a não ser o aumento do número de emissoras fechadas e de prisões e indiciamentos de lideranças populares. No Parlamento Nacional também há tentativas de modificar a legislação, o que não tem surtido efeito devido a força do lobby contrário13. Outros aspectos previstos na lei 9.612/98 são positivos para preservar o caráter comunitário das emissoras, tais como a exigência de serem concedidas somente em nome de fundações e associações comunitárias sem fins lucrativos; a obrigatoriedade de que no mínimo cinco entidades do tipo associações de classe, beneméritas, religiosas ou de moradores, legalmente instituídas, subscreverem o pedido de autorização; a necessidade de se instituir um Conselho Comunitário composto por representantes de entidades da comunidade local com o objetivo de acompanhar a programação da emissora; e a explicitação de suas finalidades como forma de preservar o sentido público e pluralista. O artigo 3º estabelece, por exemplo, entre outros aspectos, que o Serviço de Radiodifusão Comunitária tem por finalidade o atendimento à comunidade beneficiada, com vistas a: dar oportunidade à difusão de idéias, elementos de cultura, tradições e hábitos sociais da comunidade; prestar serviços de utilidade pública, integrando-se aos serviços de defesa civil, sempre que necessário; permitir a capacitação dos cidadãos no exercício do direito de expressão da forma mais acessível possível (BRASIL.Lei 9.612, 1998).

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Como já foi dito, o Ministério das Comunicações não atende de modo ágil à demanda por rádios comunitários. As organizações comunitárias se vêem levadas a operar emissoras de baixa potência, mesmo sem a autorização. porque o serviço de informação e mobilização prestado às localidades não pode esperar. 13 Ver o projeto de lei 4.186 de 1998 que apensa outros projetos similares e modifica a lei 9.612/98.


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No entanto, uma falha da lei é a de restringir o serviço a comunidades territoriais não estendo-o a outros tipos de comunidades, como as étnicas e de outros tipos de afinidades identitárias. Os princípios (art. 4º) orientadores da ação das rádios comunitária são: dar preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas em benefício do desenvolvimento geral da comunidade; promover atividades artísticas e jornalísticas na comunidade e a integração dos membros da comunidade atendida; respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família; não discriminar por raça, religião, sexo, preferências sexuais, convicções político-ideológicopartidárias e condição social nas relações comunitárias. Estabelece ainda que as emissoras devem garantir a todo cidadão o direito a emitir opiniões sobre quaisquer assuntos abordados na programação da emissora, bem como manifestar idéias, propostas, sugestões, reclamações ou reivindicações; a obrigatoriedade de preservar a pluralidade de opinião e a difusão de diferentes interprestações de assuntos polêmicos; mas veta o proselitismo de qualquer natureza (BRASIL. Lei 9. 612, 1998). Enfim, as dificuldades das rádios comunitárias, dos canais comunitários na televisão a cabo, bem como as distorções no sistema de concessão de canais e no conteúdo da programação do rádio e da televisão em escala nacional, vêm motivando a explicitação de uma demanda pela organização de uma Conferência Nacional de Comunicação na tentativa de se construir políticas democráticas de comunicação para o País. Políticas públicas de comunicação se constituem em um conjunto de princípios e dispositivos processuais consubstanciados, em última instância, em leis, normas e demais mecanismos regulatórios que orientam o funcionamento dos meios de comunicação, das tecnologias a eles associados e de seu papel público na sociedade. No Brasil não há política nacional de comunicação formulada e expressa e, muito menos, para a radiodifusão comunitária. As ―políticas‖ de comunicação são implícitas e favoráveis aos grandes grupos de mídia e ao mercado das comunicações do ponto de vista prioritário do negócio. As rádios comunitárias vêm sendo tratadas como ―casos de polícia‖, sob o comando da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e da Polícia Federal. Em outras palavras, há leis isoladas, como as da radiodifusão comunitária e dos canais comunitários no sistema cabo de televisão, mas não uma política implementadora que conduzisse à práticas e regulamentações facilitadoras do exercício do direito de comunicar por parte do


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cidadão, comunidades e das organizações civis coletivas e sem finalidade de lucro. Até no âmbito dos debates das forças progressistas sobre políticas nacionais de comunicação e democratização da mídia se privilegia o sistema midiático de grande porte, portanto, deixando de fora – ou nas rabeiras - as questões da comunicação popular e comunitária, exceto por parte de iniciativas isoladas de alguns militantes. As reivindicações, denúncias e propostas dos etor comunitário têm sido conduzidas pelas próprias lideranças das associações do setor, como a Abraço e seus aliados.

Considerações finais O rádio nasce local e com um sentido educativo-cultural. Este perfil só foi ameaçado quando transformado em mercadoria, ou quando seu poder de transportar sinais e sons é transformado em meio de negócio, sobrepondo-se ao interesse público. As rádios livres e comunitárias provocam a reinvenção desse tipo de modelo de comunicação. Suas práticas forçam a elaboração e modificação de leis, além de forjarem sinais de processo de trabalho e de propriedade coletivos dos meios de comunicação, entre outros aspectos.

Referências AMARANTE, Maria Inês. Rádio comunitária na escola: protagonismo adolescente e dramaturgia na comunicação educativa. São Bernardo do Campo: UMESP, 2004. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social). BAHIA, Lílian Claret M. A reconfiguração da esfera pública local pelas rádios comunitárias Inter-FM e União na região metropolitana de Belo Horizonte. São Bernardo do Campo: UMESP, 2006. 189 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social). BRASIL. Lei 9.612 de Radiodifusão Comunitária (1998). República Federativa do Brasil. Brasília-DF, 1998. DETONI, Márcia. Radiodifusão comunitária: baixa potência, grandes mudanças? – estudo do potencial das emissoras comunitárias como instrumento de transformação social. São Paulo: ECA-USP, 2—4.136 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social). LAHNI, Cláudia Regina. Possibilidades de cidadania associadas à rádio comunitária Juizforana Mega FM. São Paulo: ECA-USP, 2005. 289 f. Tese (Doutorado em Comunicação Social). MACHADO, Arlindo: MAGRI, Caio: MASAGÃO, Marcelo. Rádio livres: a reforma agrária no ar. São Paulo, Brasiliense, 1986.


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PERUZZO, Cicilia M. K. Comunicação nos movimentos populares: a participação na construção da cidadania. 3.ed. Petrópolis: Vozes, 2004. ________. Rádios comunitárias: entre controvérsias, legalidade e repressão. Portal Mídia Cidadã. São Bernardo do Campo: Cátedra Unesco-Umesp, 2005. Disponível em: http://www2.metodista.br/unesco/agora/agora_agora.htm . Acesso em: 02 mar.2006. ________. Rádio Comunitária na Internet: empoderamento social das tecnologias Versão revista e ampliada publicada na Revista Famecos. Porto Alegre: PUCRS, v.30, p.115-125, 2006. ________. Rádio comunitária, educomunicação e desenvolvimento local. In: PAIVA, Raquel (Org.). O retorno da comunidade: os novos caminhos do social. Rio de Janeiro: Mauad, 2007. p.69-94. ________. Participação nas rádios comunitárias no Brasil. In: MELO, José Marques de; CASTELO BRANCO (Orgs.) Pensamento Comunicacional brasileiro. São Bernardo do Campo: UMESP, 1999. p.405-423 SOARES, Ismar de O. Mas, afinal, o que é educomunicação? Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo. Disponível em: http://www.usp.br/nce/wcp/arq/textos/27.pdf. Acesso em: 11 nov.2008.


Diversidade cultural, cidadania e esfera pública: um olhar sobre as rádios comunitárias no Brasil1 Sayonara Leal2 sayonaraleal@uol.com.br

Resumo Este trabalho tem como objetivo fundamental abordar as rádios comunitárias no Brasil como meios de comunicação referenciados na prática comunicativa como ação social que se desdobra tanto em ações de caráter cívico, dialógico, opinativo e criativo, como em ações estratégicas e instrumentais. Nos dois casos há implicações em termos da qualidade do espaço público configurado nas rádios comunitárias e, conseqüentemente, na disposição desses espaços como lugares comuns abertos aos cidadãos de comunidades atendidas pelo serviço de comunicação de proximidade e à diversidade cultural e opinativa do público que acessa esses meios. Para realização deste trabalho utilizou-se estratégias metodológicas da pesquisa qualitativa - tais como: entrevistas semi-estruturadas, análise documental, análise de grade de programação - aplicadas ao universo de 22 rádios comunitárias no Distrito Federal, Centro-Oeste do Brasil. Abstract This paper aims at addressing the Brazilian community radio stations as means of communication inserted in the communicative practice as social action which unfolds into actions with civic, dialogical, opinionative and creative characteristics as well as into actions of strategic and instrumental ones. In both cases there are implications in terms of the quality of the public space depicted in the community stations and, as a consequence, of the disposition of such spaces as common places available for the citizens of the communities which are assisted by the proximity communication service and for the cultural and opinionative diversities of those who access these means. In order to accomplish this study, methodological strategies of qualitative research were carried out, such as - semi-structured interviews, documental analysis, programming analysis – applied within 22 community radio stations in the Federal District, located in the Midwest of Brazil.

Résumé

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Este paper foi apresentado no Colóquio Brasil-Espanha, realizado na Universidade de Brasília, em agosto de 2008. Mesa temática: Diversidade cultural e realidades regionais. 2 Doutora em Sociologia. Professora do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília- UnB. Coordenadora e pesquisadora do Laboratório de Políticas de Comunicação do LapCom/UnB.

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Ce travail a pour principal objectif de réaliser une étude des radios communautaires brésiliennes en tant que moyens communications d'actions sociales qui présentent un caractère civique, de dialogue, d'opinion et de création, mais également d'actions stratégiques et instrumentales. Dans ces deux cas, il existe des implications en termes de qualité de l'espace public, configuré par les radios communautaires, et donc de disposition de ces espaces en tant que lieux ouverts aux membres des communautés concernées par ce service de communication proximité et par la diversité culturelle et d'opinion du public ayant accès à ces médias. Pour effectuer ce travail nous avons eu recours à des stratégies de recherches qualitatives, comme : des entretiens dirigés, des analyses de documents, des analyses de grilles de programmation. Ce travail a été appliqué aux 22 radios communautaires du District Fédéral, Centre-ouest du Brésil. Resumen Este documento tiene como objetivo principal plantear las rádios comunitarias de Brasil como medios de comunicación citados en la práctica comunicativa como acción social que se desarolla tanto en las acciones de carácter cívivo, dialógico, creativo y de opinión como en acciones estratégicas y instrumentales. En ambos los casos hay implicaciones en términos de la calidad del espacio público establecido en las radios comunitarias y, consecuentemente, en la prestación destes espacios como sítios abiertos a los ciudadanos de comunidades atendidas por el servicio de comunicación de corto alcance y a la diversidad de cultura y de opinión del publico que utiliza estes médios. Para llevar a cabo este trabajo, fueron utilizadas estratégias metodológicas de investigación cualitativa, - entre ellas entrevistas semi-estructuradas, análisis documentales, análisis de la rejilla de programación - en un universo de 22 radios comunitarias del Distrito Federal, alrededor de la capital de Brasil, Brasília. Introdução O binômio cidadania e espaço público aparece como conteúdo fundamental para abordagem crítica das bases normativas da democracia contemporânea, em especial no que concerne aos direitos fundamentais. Tanto em sociedades avançadas como naquelas em fase de desenvolvimento, parece incontornável a discussão sobre o universalismo dos direitos

fundamentais

e

especificidades

da

diversidade

cultural

assentada

no

reconhecimento de diferenças sócio-culturais tão recorrentes em espaços de comunicação oficiais e alternativos. Para esta análise, consideramos que as rádios livres, também denominadas de comunitárias, oferecem a possibilidade de realização de uma democracia republicana ancorada no princípio de heterogeneidade ideológica e cultural, na doutrina do bem comum e nos direitos fundamentais à comunicação e à informação.

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As rádios de proximidade, chamadas de comunitárias no Brasil, são consideradas, em muitos países, uma alternativa ao processo generalizado de padronização da cultura e da comunicação perpertuado pela adoção de modelos hegemônicos no modo de produção de conteúdos. Essas rádios são também apontadas como materialização dos direitos fundamentais, como o direito à comunicação3 e à cultura. Neste sentido, a rádio comunitária cumpre um importante papel na formação de um lugar comum de comunicação e difusão de diferentes práticas culturais e sociais podendo favorecer experiências de democracia comunicativa e de efetivas comunidades discursivas, remetendo, em certa medida, ao que Habermas (1997, 2007) e Hannah Arendt (2007) chamariam de esfera pública. Mas, por outro lado, é preciso considerar que essas mídias são espaços cobiçados por poderes locais constituídos que ao se apropriarem desses meios de comunicação fazem usos estratégicos e instrumentais em favor de interesses privados que perpassam a comunidade4. Neste caso, elas são suscetíveis de se tornar espaços sistêmicos5. Com base na aplicação de questionários, em análise documental, de grades de programação radiofônica e em entrevistas semi-estruturadas, foram pesquisadas 22 rádios comunitárias legalizadas na região do Distrito Federal6, no Centro-Oeste do Brasil, deste universo selecionamos cinco rádios para estudo mais aprofundado7. As emissoras estudadas prestam um serviço de comunicação de proximidade e são juridicamente representadas por associações. Propõe-se aqui uma discussão sobre a paisagem das rádios comunitárias brasileiras, em suas adversidades e diversidade cultural.

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A abordagem do conceito de direito à comunicação está referenciada nas formulações de Boris Libois (2002) e Aluízio Ferreira (1997) para os quais trata-se fundamentalmente de um direito do homem. Direito de participar no processo da comunicação, comportando o direito ao uso e ao acesso equilibrado aos recursos da comunicação e não apenas obter programas e serviços dados, respeitando contextos sócio-culturais específicos como os de comunidades, podendo também se configurar em resistência a modelos culturais hegemônicos. Para alcançar esse direito é preciso ultrapassar o conceito liberal de direito, ultrapassando o viés mercantil dos serviços de comunicação e recorrer à noção republicana do bem comum. 4 No Brasil, a designação de comunidade expressa o sentido espacial de pequeno território. 5 Referência ao mundo sistêmico de Habermas em a Teoria da ação comunicativa (1987). 6 Foram pesquisadas rádios comunitárias em outras regiões do Brasil como São Paulo e Bahia, como estudos complementares. 7 Rádios comunitárias pesquisadas em profundidade no DF: rádio Comunidade FM, no Gama; rádio Utopia, em Planaltina; rádio Paranoá, no Paranoá; rádio Líder, no Recanto das Emas e rádio Sobradinho, em Sobradinho.

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O trabalho está estruturado em quatro partes, além desta introdução. Inicialmente, discute-se à luz de uma reflexão conceitual as rádios comunitárias como espaços comuns. Em seguida, é apresentada uma paisagem das rádios comunitárias no Brasil e depois no Distrito Federal, apontando especificidades dessas mídias em seus contextos social e cultural de manifestação. Depois as rádios comunitárias no DF são analisadas de acordo com o eixo temático Rádio comunitária como espaço da diversidade cultural. Por fim, as considerações finais que trazem algumas questões que podem inspirar políticas de comunicação que contribuam para a ação dessas rádios como efetivos espaços democráticos, instrumentos da cidadania para a intervenção em processos da vida social local e regional. 1. A rádio comunitária como “espaço comum” de comunicação Caracterizar e compreender configurações locais de espaços públicos dialógicos, fundados no debate de opiniões entre indivíduos reunidos em torno de comunidades localizadas geograficamente, implica encontrar denominações para suas ações, seja no amplo espaço de suas vidas cotidianas, de seus locais de reunião de debate, como, em especial, das juridicamente denominadas mídias comunitárias. Tais mídias ora se voltam para temas de interesse comum a toda a comunidade, ora difundem opiniões privadas dos seus detentores e aliados. Neste sentido, são espaços públicos comunitários que não necessariamente se dedicam à causa do interesse comum, por mais que portem a denominação de mídias comunitárias. São comunitárias quando se ocupam da tematização de identidades, valores, idéias, pensamentos e opiniões que remete diretamente à comunidade dos indivíduos que constituem seu público ativo ou receptor; quando buscam a formação de consensos pela via das afinidades de interesses e da formulação de objetivos e práticas sociais. Este espaço público comunitário promovido pelas pequenas mídias pode ser marcado pela diferença de posicionamentos, pelo pluralismo de opiniões, pela heterogeneidade e conflito de posições, pela publicização e visibilidade de argumentos. É possível nesse espaço a construção de um ou mais consensos, provisórios ou relativamente permanentes, mas depende essencialmente da afinidade na busca da proposição de

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representações e entendimentos que sejam válidos para a comunidade em geral, comuns à maioria. A divergência de opiniões e a tentativa de construção de uma discursividade pelo viés procedimental são os fatores que fortalecem a noção de público comunitário, fundamental para tornar possível a comunicação dialógica nesse espaço. Ou seja, a esfera pública comunitária pode gerar processos democráticos dos quais resultam opiniões públicas que favorecem ou representam. No espaço público comunitário a opinião se apresenta a partir da solidariedade entre indivíduos ativos que partilham interesses semelhantes, comuns a um determinado grupo. Nestes ambientes comunitários, retorna-se às premissas do espaço público enquanto espaço formador de cidadania, de indivíduos politicamente ativos e autônomos, em busca de modelos societários democráticos, igualitários e emancipatórios. Tassin (1991) esclarece que é na coexistência cotidiana que se reforça o “ser em comum”, que se constrói a retórica ontológica da comunidade. Aqui a exposição da palavra traduz um posicionamento a respeito de um objeto comum a um grupo. Essa exposição pública se dá em nome do corporativismo de interesse particular que forma a base de uma solidariedade orientada por um “principio superior comum”8 entre os participantes de uma comunidade de comunicação. Ao contrário disso, a esfera pública se viabiliza pela exposição de elaborações subjetivas que se tornam públicas ao serem objetivadas no ato da palavra pronunciada na cena pública. Percebe-se, assim, que o espaço público não é um evento dado, natural, que simplesmente se manifesta fisicamente em um determinado local. Esse espaço resulta da organização política para tornar possível, entre outras coisas, um lugar comum de comunicação. Na verdade, o que vai definir um espaço público são as formas e as condições de outorga da palavra concedida tanto ao indivíduo anônimo como a entidades 8

Na definição de Boltanski e Thevénot (1991), o princípio superior comum designa uma espécie de valor a qual se chega ao ultrapassar as particularidades das pessoas e se firma na constituição de fundamentos de um acordo. Esse princípio se exprime pela vontade coletiva ou pela universalidade de bens negociados. Os autores consideram também que há uma esfera subjetiva de choque ou de negociação entre as particularidades individuais e um certo nível de generalidade superior que remete ao âmbito da coletividade. Essa relação entre individual e coletivo é arbitrada por regras as quais se traduzem em forma universal que transcende as particularidades das pessoas e dos mundos dos atores.

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representativas da sociedade civil. O caráter público e político deste espaço será tanto maior quanto mais visibilidade for dada aos processos discursivos, às críticas ao poder e à diversidade de conteúdos opinativos e temáticos, gerados a partir da liberdade política e individual, da qual deve ser garantida pelo Estado de direito a todo cidadão. A liberdade privada é o primeiro passo para garantir o direito político à associação de indivíduos privados em contextos de manifestação pública. Nesse sentido, não existe liberdade pública sem antes desfrutarmos da liberdade privada. É importante para a consolidação de uma esfera pública evitar a entropia, a partir da realização de trocas de informações, relacionamento com o universo institucional exterior a esse espaço, assim como com outros espaços de deliberação e comunicação (como associações, clubes, centros e movimentos sociais, outros veículos de comunicação). O problema da entropia e a falta de engajamento são dois dos problemas que dificultam a configuração e permanência de esferas públicas, como novos espaços políticos e sociais. Nos termos de Georges Labica (1995), os três fatores de engajamento que tornam possível o espaço público - comunidade, identidade e individualidade - estão diretamente associados ao processo de busca pelo reconhecimento de diferenças sócio-culturais de minorias (FRASER, 2005) ou até mesmo do indivíduo anônimo que deseja visibilidade na cena pública (HONNETH, 2002). Esses fatores, por sua vez, podem também se desdobrar em causas públicas sustentadas por ações políticas protagonizadas por pessoas físicas e entidades civis no espaço público. A questão da comunidade e da identidade está atrelada ao sentimento de pertencimento a um local, cultura, nação ou etnia. O local, nesse sentido, refere-se não apenas a um território, mas também à noção de lugar onde se vive, não diz respeito somente ao vínculo territorial do habitat, “mas, sobretudo o lugar, não obrigatoriamente, territorializado, onde se manifestam conflitos e o efeito das decisões em termos de desigualdade de todas as ordens, de emprego (ou desemprego), de transporte, de acesso à cultura (de escolaridade), de saúde etc.” (TETÚ, 1995, p. 290). O local, nesses termos, é um lugar onde se faz política, se produz e reproduz culturas, opiniões, onde se configura a realidade da ação social e política. É o locus de vida totalmente penetrado pela comunicação através da qual tudo pode ser compartilhado, tornado comum. Os vínculos

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solidários se dão para a aproximação de pensamentos e opiniões. Já a individualidade diz respeito à participação do sujeito motivada pelo interesse em um determinado debate que traduza necessidades ou demandas social, cultural ou política que podem se tornar causas coletivas. Esse processo se dá em geral pela via da denúncia (BOLTANSKI, 1984), pelo testemunho de experiências vividas que dizem respeito à insatisfação do indivíduo diante da sua vida social ao perceber e refletir criticamente sua realidade objetiva ou simplesmente a motivação vem do desejo em publicizar anseios de sua intimidade, percursos de vida. Os espaços públicos como espaços comuns, nas suas mais variadas versões e estruturas, com suas qualidades e limitações, traduz-se em fator fundamental para garantir a dinâmica e vigência de práticas democráticas e processos de transformação social e política. Para além da atuação restrita de espaços públicos comunitários e da sua ocupação por interesses comuns, é importante não perder de vista a importância dos demais espaços comunicativos, e o grau de comprometimento de suas representações de temas e questões vinculadas ao interesse comum da maioria. O mais importante a enfocar neste momento é a comunicação como instrumento de diálogo e de troca de experiências que se traduz, de certa forma, em um indício de organização de esferas discursivas pautadas, em certa medida, em uma racionalidade comunicativa. A mediação de opiniões e debates de atores sociais pertencentes à comunidade torna possível o desenvolvimento de espaços públicos animados por valores éticos e morais compartilhados por cidadãos que participam do processo democrático de interpretação e leitura da realidade local ou comum. É a consciência associativa de grupo que nutre as ações coletivas organizadas em prol do reconhecimento de demandas e necessidades, não necessariamente universais, mas às vezes específicas à cada comunidade. Os espaços para tornar visíveis debates e reivindicações de uma justiça social podem estar nos veículos alternativos e comunitários de comunicação. Cabe à comunidade a escolha deliberada de ser protagonista ou destinatária de programas e de projetos que se deseja levar adiante. Nesse sentido, as rádios comunitárias, nos termos suscitados por Cecília Peruzzo (2004), apresentam-se como meios de veiculação de conteúdos que expressam interesses e demandas de minorias em uma linguagem que representa a diversidade cultural, étnica, opinativa e territorial, a qual muitas

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vezes é negligenciada pela indústria da comunicação de largo alcance, como se pode testemunhar no Brasil. Alicerçado em bases patrimoniatistas, o sistema brasileiro de comunicação, em especial, de radiodifusão, está centralizado nas mãos de poucos grupos familiares, religiosos, representantes das elites econômica e política deste país. A criação de um sistema de radiodifusão comunitária aponta para um certo alargamento da democracia no Brasil, em consonância com a tendência de fortalecimento das instituições públicas e de organização da sociedade civil em esferas discursivas de representação de interesses de diferentes públicos, com suas opiniões e gostos estéticos próprios, nem sempre homogêneos ou negociáveis entre si. 2. Alguns aspectos das emissoras comunitárias no país: diversidade de projetos e usos Apreender a paisagem das rádios comunitárias no Brasil é tarefa que se traduz em um grande desafio metodológico por se tratar de mídias difusas em contextos sócioculturais e econômicos distintos e, sobretudo, pela dificuldade em mapear as emissoras não autorizadas e em funcionamento, na verdade, elas são a maioria no país. No Brasil existem cerca de 30 mil rádios livres e deste universo 3.030 foram autorizadas pelo Ministério das Comunicações9 a funcionarem como rádios comunitárias. Historicamente, as rádios comunitárias brasileiras não estão vinculadas a guerrilhas, movimentos revolucionários, sindicatos ou à atuação educativa da Igreja Católica, como grande parte das emissoras comunitárias da América Latina. No entanto, não podemos desvinculá-las de movimentos políticos, como a luta pela democratização das comunicações no país, ou ainda de lutas sociais. A origem das rádios comunitárias no país é marcada por diferentes motivações: pelo amadorismo na operação dos equipamentos radiofônicos, muitas vezes, como bricolage, pela demanda de um sistema local de difusão de informações de utilidade pública, sobretudo nas periferias urbanas, mas também em zonas rurais. Do ponto de vista normativo, as rádios comunitárias brasileiras são de alcance restrito, não se confundem com as rádios públicas e nem privadas comerciais, prestam 9

Dados de 2007.

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serviços de informação e comunicação local, não contam com recursos públicos e são administradas por associações de direito privado sem fins lucrativos. Elas propõem serviços de informações e de comunicações públicas locais e são obrigadas a difundir uma programação pluralista no que concerne à política, culturas, crenças religiosas, como também a admitirem a participação dos habitantes locais na concepção das emissões. A organização de redes ou a concentração de várias rádios sob coordenação da mesma associação é proibida, assim como relações financeiras ou adesão ideológica com a administração pública local, políticos, igrejas e comerciantes. Como não recebem subsídios públicos e o financiamento publicitário é proibido, os recursos financeiros e meios de funcionamento dessas rádios repousam, em grande parte, sobre o voluntariado, patrocínio cultural, doações, cotizações entre sócios da associação gestora da rádio e simpatizantes. No entanto, não se pode afirmar que essas rádios seguem orientações morais e legais de acordo convenções jurídicas ou sociais. De acordo com Nunes (2001), é importante destacar em relação às rádios comunitárias brasileiras que apesar das normas legais, a maioria das emissoras que se dizem comunitárias não o é. Pode-se dizer que os indícios da performance das rádios comunitárias podem ser compreendidos a partir de seu projeto de concepção. Os projetos radiofônicos das rádios comunitárias outorgadas pelo Estado brasileiro apresentam como principais características: religiosidade associada à filantropia; lutas sociais como habitação, cultura; difusão de músicas temáticas e ações e projetos comunitários. Muitas dessas mídias são portadoras de denúncias de injustiças sociais e protestos coletivos protagonizados por populações locais urbanas e rurais. Segmentos mais pauperizados da sociedade brasileira têm pouco acesso a instâncias decisórias do poder público, à fala plena em cenas públicas. São marginalizadas de processos oficiais da formação de opinião e vontade e, em alguns casos, são pessoas excluídas da sociedade produtiva, como as populações dos quilombolas, de assentamentos rurais, favelas e indígenas brasileiros. “O mais marcante que a rádio comunitária faz é o atendimento à comunidade, beneficiando a população, dando cadeiras de rodas, ajuda de alimentos, remédios, internação em hospitais, consultas ...”, diz Francisco Monteiro, presidente da rádio Comunidade FM da cidade satélite de Ceilândia em Brasília. Para Gerônimo Barbosa,

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diretor da rádio Heliópolis, situada na favela de Heliópolis em São Paulo, a rádio comunitária cumpre o papel de espaço de sociabilidade.“Aqui as pessoas se encontram, se comunicam entre si. Há casos em que a rádio serve de alto-falante para pessoas encontrarem um parente, um amigo quando chega à favela é difícil localizar endereços”, comenta Gerônimo a propósito da rádio Heliópolis. Já para Neuma de Jesus, secretaria geral da Associação Avante Lençóis que administra a rádio comunitária Laúza, localizada na cidade de Lençóis na Bahia, a rádio comunitária tem um papel político importante podendo ser um espaço para refletir a coisa pública. “A rádio surgiu de um movimento social local cujo propósito foi a cassação do prefeito da cidade de Lençóis envolvido com desvio de recursos públicos”, lembra Neuma. A rádio comunitária brasileira assume diferentes papéis sociais oscilando entre espaços de práticas estratégicas e instrumentais e ações comunicativas apoiadas no sentido republicano de iniciativas cívicas, criativas, opinativas. 2.1 Uma tipologia das emissoras comunitárias no Distrito Federal A partir de um universo diversificado de projetos radiofônicos, pode-se dizer que as rádios comunitárias estudadas se enquadram na seguinte tipologia: generalista particular (são aquelas que seguem o modelo de comunicação comercial das rádios privadas comerciais, a direção da emissora é centralizada nas mãos de um político ou empresário, veiculam informações locais, mas a grade de emissões não é plural, está a serviço de interesses particulares); generalista comunitária (são as emissoras que seguem o formato standard das rádios comerciais, apesar de apresentarem suas especificidades, mas têm projetos radiofônicos orientados pelos interesses públicos da localidade, apresentam emissões e conteúdos de interesse apenas local), confessionais (são aquelas emissoras comprometidas com a orientação de apenas uma crença religiosa, tem direção centralizada pelos membros de uma determinada prática confessional, os conteúdos exibidos são de interesse apenas da comunidade religiosa, podendo também apresentar vínculos com um partido político) e intercultural comunitária (são mídias que adotam um modelo próprio de programação, sem estar presas a formatos standard, a gestão da mídia é descentralizada e é dada prioridade para necessidades e demandas locais, em termos de informação e difusão

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de diferentes práticas culturais que convivem na localidade, valorização da diversidade cultural local e são também espaços ecumênicos). 3. Rádio comunitária como espaço da diversidade cultural As rádios estudadas aparecem, por vezes, como espaços de manifestação de interesses e práticas comunicativas contraditórias que se dispõem em uma mesma comunidade. Essa constatação tem como fonte fundamental de evidência entrevistas narrativas com locutores e análise da grade de programação. A pluralidade na programação das rádios locais está diretamente vinculada à democratização do espaço comunicativo das emissoras no sentido de incorporar em sua programação elementos que compõem a paisagem diversificada das comunidades atendidas pelo serviço de radiodifusão local, a saber: tendências ideológicas, religiosas, diferentes opiniões, gostos, lutas sociais, formatos de programas e a presença do tecido associativo e institucional local. A avaliação feita apóia-se na observação da freqüência de emissões apresentadas por diferentes atores sociais; programas que apresentam diferentes gêneros musicais, inclusive referentes à diversidade cultural local; programas com formatos e gêneros distintos (musicais, informativas, opinativas, entrevistas) e emissões de diferentes religiões. Tratar das diferenças em sua grade de programação remete diretamente ao reconhecimento do direito à palavra pública no espaço comunicativo da rádio comunitária o qual diz respeito a todo ouvinte-cidadão. A rádio comunitária é palco e agente ao mesmo tempo de um duplo desdobramento do processo de reconhecimento10: quando a direção da rádio reconhece as diferentes expressões culturais e ideológicas na comunidade garantido suas representações na grade de programação e quando aos serem publicizadas nesses espaços essas diferenças ganham visibilidade e maiores chances de serem reconhecidas pela população local.

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O reconhecimento aparece estritamente relacionado às práticas discursivas e manifestações culturais que remetem à representatividade e valorização de práticas e expressões sócio-culturais de minorias religiosas, segmentos sociais oriundos de culturas de outras regiões do país que convivem na localidade onde essas rádios se encontram e para qual devem prestar um serviço de comunicação de proximidade levando em consideração a pluralidade da formação social em questão.

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Nas rádios estudadas a grade de programação apresenta, em grande parte, emissões essencialmente musicais, com participação esporádica do ouvinte-cidadão. Em termos de preferências e gostos musicais, a programação das emissoras apresenta ritmos de sucesso do momento e alguns estilos pouco difundidos nas rádios públicas e comerciais. O locutor, em geral, exprime em sua emissão o seu gosto musical. Mesmo com o propósito de projetar sua imagem na comunidade, saindo assim do anonimato, quando diferentes animadores difundem programas de gêneros musicais variados tem-se uma certa pluralidade na grade de programação da rádio comunitária. Nos termos de um locutor da rádio Líder FM, Eu toco muita música brega, mas muito mesmo, na programação é essencial, principalmente o brega, brega com a discussão no ar, o que é brega? Eu acho que brega é você fazer sucesso ... Para mim, na verdade, o brega não existe, que o mundo pichou de brega, na realidade o brega não existe, ele é para se vestir quando é sucesso. O Odair José foi sucesso ... ele é sucesso para as empregadas domésticas, então ele é cantor brega, na realidade isso não existiu, para mim ele foi sucesso, independe de quem ouviu, eu acho que ele não seria sucesso só de empregada doméstica. De repente posso estar no Lago Sul e ouvir Amado Batista. Amado Batista eu faço o programa de 10:00 às 13:00 horas aos domingos, em três horas de programação tocando músicas, eu nunca esqueço, não tenho um número menor do que 100 participações. Então eu vejo o seguinte, Brasília está muito brega.

Como uma tendência generalizada de apresentação de conteúdos musicais, as rádios estudadas apresentam grande preocupação em difundir estilos musicais veiculados por outras mídias com a justificativa do “gosto das massas”, no entanto algumas emissoras vão divulgar em sua grade de programação gêneros musicais que remetem ao universo controverso do que se chama “cultura popular”. As emissoras Paranoá FM e Utopia FM apresentam programas que valorizam a música caipira, especialmente títulos, intérpretes e compositores que não estão nas “paradas de sucesso”, ou são “ilustres desconhecidos” dos ouvintes. Os diretores de todas as rádios pesquisadas declararam que têm sempre espaços garantidos em suas grades de programação para propagação de tendências musicais que refletem o gosto da população local e, sobretudo, para divulgação de artistas locais. Três das cinco emissoras pesquisadas, apresentam um quadro específico, curiosamente, com o mesmo nome “prata da casa” para prestigiar os novos talentos locais que não encontram 12


oportunidade de divulgar seus trabalhos em outras mídias. Para um dos locutores da Sobradinho FM, a rádio comunitária é designada: Para estar do lado da comunidade, do lado do cidadão, é para ouvir, é para dar chance a um cara que está começando numa banda agora, para o artista da cidade, tanto é que nós temos um programa aqui que é chamado Prata da Casa que valoriza o artista aqui da cidade, então a rádio comunitária é o primeiro empurrão daquele cara que está começando agora, o cantor, a dupla sertaneja, então a rádio comunitária é para isso.

Verificou-se ao longo da pesquisa o predomínio de músicas e formatos de programas comerciais, mas, no entanto, não se pode dizer que essas rádios não apresentem conteúdos e formatos originais de programas, de acordo com a identidade cultural e social de cada locutor representando naquele espaço uma certa “comunidade estética”, nos termos de Bauman, 2003. Nas rádios Comunidade FM, Líder FM e Utopia FM são apresentados programas específicos voltados para os apreciadores de estilos musicais como, hip hop, rapp e funk, os quais, em geral, de acordo com locutores e diretores de rádio, são gostos musicais segmentados, pouco contemplados na mídia oficial. Segundo o diretor de programação da Utopia FM, apesar da direção da emissora receber inúmeras reclamações dos moradores da região que julgam aqueles estilos musicais inadequados para uma rádio comunitária, as emissões de rapp e funk são mantidas em função da pluralidade na grade de programação. “Hoje, por exemplo, temos o hip-hop e o rapp, a Utopia FM é a única das 11 emissoras que chegam à Planaltina que tem programa de rapp diário e aí é interessante quando você pega dois gêneros musicais tão diferentes”, comenta o diretor da Utopia. Ele ainda explica: Você tem que tirar a impressão de que o cara do hip hop é um cara que não quer estudar, que não quer nada, que é um vagabundo e marginal, você só vai conseguir isso se você promover o cara do hip hop, não é. A visão da sociedade é a de um cara do hip hop só se droga e com certeza é uma visão equivocada. O cara do hip hop vive até de subemprego, o cara deve escutar a música que ele gosta, mas precisa ter um bom emprego. Tem determinados conceitos na linguagem regional do hip hop. Tem o hip hop do morro e o hip hop da elite, ou do cara do morro é diferente do nosso, é diferente, não tem jeito ...

A partir das entrevistas foi possível depreender que muitos membros das rádios comunitárias justificam a veiculação de emissões voltadas tanto para temas marginais como

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para gostos musicais que fogem ao padrão da mídia oficial pela importância da comunidade contar com um espaço aberto para divulgação de opiniões e práticas culturais de segmentos da população local que não são contemplados na grande mídia. A rádio Comunidade FM veicula um programa semanal voltado para a difusão da cultura hip hop, Comunidade Hip Hop, dirigido por um grupo de jovens do Gama. No programa abre-se espaço para depoimentos de jovens ex-viciados em recuperação. Na verdade, a partir da música e de suas experiências eles buscam reconhecimento da cultura hip hop, tentando dissociá-la da criminalidade e uso de drogas. Nas rádios estudadas não encontramos presença significativa de emissões apresentadas por representantes do tecido associativo local. A emissora Paranoá veicula uma emissão patrocinada pela associação de comerciantes locais. Na rádio Líder constantemente difunde comunicados e debates protagonizados pela cooperativa de habitação da região. Nas rádios Comunidade, Sobradinho e Utopia são realizados programas voltados para o público infantil, emissões produzidas por estudantes do ensino fundamental. Em relação à presença de diferentes práticas confessionais nas emissoras, como foi dito antes, as rádios Sobradinho FM e Comunidade FM são as que mais apresentam vínculos com religiosidade, apresentando, respectivamente, emissões evangélica e católica. Entretanto, a rádio Paranoá, apesar de não ter em sua origem laços com religiões, atualmente mantém em sua programação apenas uma emissão de caráter evangélico. A Utopia FM apresenta em sua grade três emissões religiosas, uma católica, uma espírita e outra evangélica. Esta rádio é também a que mais apresenta maior variedade de estilos musicais (jazz,samba, sertanejo, forró, clássica e outros). Todas as emissoras veiculam programas musicais, informativos e opinativos, mas algumas se destacam mais pela pluralidade de temas, formatos de programas e gêneros musicais e expressões culturais em relação às outras. Em termos de acesso ao espaço comunicativo da rádio, liberdade do locutor inovar em formatos de programas, linguagens e diversidade cultural, as rádios Utopia, Líder e Comunidade FM seriam as mais plurais. As emissoras Paranoá e, sobretudo a Sobradinho FM por estarem mais atreladas a uma forma de gestão mais empresarial, portanto, têm funcionamento pautado mais em uma

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racionalidade técnica e profissional, cedem menos espaço para criatividade e diversidade de emissões. Apesar de se mostrarem as mais plurais das emissoras pesquisadas, os diretores da Utopia, Líder e Comunidade FM pretendem uma aproximação maior com o que “se espera de uma rádio comunitária”; reconhecem que esses espaços podem apresentar mais a diversidade cultural, ideológica, social de suas regiões, a partir da inserção de novas modalidades de emissões. Nesse sentido, o diretor da rádio Utopia admite: “Nesse momento a emissora, a identidade dela não está muito clara, está um pouco indefinida. Uma parcela realmente da programação ainda tem um cunho unicamente igual às outras rádios. Procuramos ter uma maior diversidade na grade”. Foi constatada nas entrevistas, a preocupação dos diretores das emissoras em afirmar a identidade da rádio como uma mídia “espelho” da comunidade, não amadora, apesar de não ser pública e nem comercial. Sabese que aquilo que torna um espaço comunicativo plural é justamente a manifestação não de uma, mas de várias identidades, as quais resultam das expressões culturais que reforçam entre si em um mesmo lugar comum (HALL, 2000). Pluralidade nas rádios comunitárias significa diversidade de conteúdos ou de temas, culturas, opiniões, gostos estéticos presentes na programação das emissoras. No universo das rádios comunitárias pesquisadas, a programação plural é mais efetiva quanto se trata de mídias generalistas comunitárias e interculturais comunitárias (emissoras que priorizam a diversidade cultural). As emissoras generalistas comunitárias e interculturais comunitárias apresentam conteúdos que remetem à diversidade de gostos, vários estilos musicais e práticas culturais locais, como emissões de diferentes religiões e são aquelas mais abertas às intervenções do público. Pode-se dizer ainda que, em termos de programação, essas rádios fizeram a opção, de maneira deliberada ou não, de adotar um formato musical, com certos espaços para a livre expressão da palavra dos convidados, das associações locais, dos habitantes, dos atores sociais e culturais locais. Elas visam, em certa medida, uma audiência alvo, sobretudo no caso das emissões temáticas e vários públicos na sua zona de cobertura. As rádios, em geral, tratam de questões culturais, sociais, políticas e econômicas, em graus diferenciados, que afetam a realidade local. De um lado, essas emissoras abordam temas polêmicos, conflitos locais. Elas são também espaços onde situações conflituosas, dissensos

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se manifestam. Por outro, algumas delas pretendem ser um lugar convival e assim optam pela não difusão de programas de debates políticos que possam gerar e estimular disputas ideológicas no espaço associativo da rádio ou na comunidade de auditores. A performance das emissoras enquanto mídias locais sem fins lucrativos, as quais devem se pautar pelo interesse público local, é tanto mais atrelada aos pressupostos normativos de uma “mídia comunitária”, como a pluralidade que está condicionada ao grau democrático participativo admitido pelas rádios, quanto menor for a intervenção nesse espaço das lógicas mercantil e industrial em relação às lógicas cívica, inspiracional e opinativa.

Considerações finais As rádios comunitárias, do ponto de vista dos princípios democráticos e republicanos, são tanto mais pluralistas à medida que admitem diversidades e divergências de toda ordem e, assim, algumas delas correspondem a pressupostos da esfera pública, no sentido habermasiano e arendtiano (diálogo, pluralismo, participação). No entanto, o status de esfera pública exige que esses espaços transponham dois desafios fundamentais: o de conjugar o imperativo da interculturalidade com os princípios democráticos da liberdade e da igualdade e o de refutar as intervenções sistêmicas da política partidária e da esfera econômica, o que se configuraria, nos termos weberianos, em instrumentalização desses espaços. Os meios de comunicação considerados para este estudo, em suas controvérsias, apresentam manifestações sistêmicas e cívicas, neste último caso, cumprem um requisito fundamental da esfera pública enquanto espaço comum do trato comunicativo e racional entre as pessoas. Nesse sentido, as rádios comunitárias no Brasil têm se revelado um fenômeno multicultural e multiforme, traduzindo-se tanto em protagonistas de processos de ampliação de participação de cidadãos em contextos de comunicação local, mesmo que em muitos casos, se constate uma cidadania assistida, devido ao serviço social prestado pelas rádios, notadamente aquelas localizadas em zonas de riscos, como distribuição de alimentos, roupas, remédios, assistência médica e humana (serviço de auto-ajuda). Por outro lado, algumas têm se traduzido em meios de comunicação a serviço de lógicas mercantis e político-partidárias, dificultando, assim, a configuração em seu interior de um

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ethos público, capaz de orientar a sua performance de acordo com pressupostos democráticos e cívicos. Por último, pode-se inferir que se trata de um espaço comum habitado por distintas orientações de ações e motivações de engajamentos o que torna as rádios comunitárias um universo híbrido de práticas comunicativas, às quais somente é possível compreender e nomear a partir de pesquisa empírica.

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DIVERSITE CULTURELLE, INTERCULTURALITE ET RADIOS ASSOCIATIVES EN FRANCE, L’EXEMPLE BORDELAIS Jean-Jacques CHEVAL1 (jjcheval@msha.fr) Sheila Vanessa SEVILLA ZEBALLOS2 (vanesscita@hotmail.com)

Résumé La radio résiste et reste le média le plus répandu à travers le monde et elle participe à l’expression médiatique de la diversité culturelle. Le modèle radiophonique français donne une place particulière aux radios associatives du tiers secteur. C’est une réalité et appellation française de ce que l’on nomme ailleurs les radios communautaires. Diverses structurellement et dans leur nature, ces radios ont une vocation spéciale à exprimer les différences et, souvent, à favoriser la communication interculturelle. À travers une étude portant sur les radios associatives de Bordeaux (une grande ville du sud-ouest de la France) nous observons comment ces radios mettent en jeu, et en ondes, des acteurs, cultures et identités autour de sujet interculturels. Resumen La radio resiste y queda el medio de comunicación de masa la más desarrollado a través del mundo y participa en la expresión mediática de la diversidad cultural. El modelo radiofónico francés da un papel particular a las radios asociativas del tercer sector. Es una realidad y una denominación francesa de lo que se llama en otro lugar las radios comunitarias. Diversas estructuralmente y en su naturaleza, estas radios tienen una vocación especial para expresar las diferencias y, a menudo, favorecer la comunicación intercultural. A través de un estudio que se refiere a las radios asociativas de Burdeos (una ciudad grande del sudoeste de Francia) observamos cómo estas radios ponen en juego, y en ondas, actores, culturas y identidades en torno a temas interculturales. Abstract

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Professeur à l’Université de Bordeaux - Michel de Montaigne, en Sciences de l’Information et de la Communication. Membre du laboratoire MICA. Fondateur et président du GRER (Groupe de Recherches et d'Etudes sur la Radio), association nationale française de recherche sur la radio ( http://www.grer.fr ). Il a notamment publié : Les radios en France. Histoire, état et enjeux, (Rennes : Editions Apogée, 1997) et a dirigé récemment la publication du dossier « La radio : paroles données, paroles à prendre » (Paris : Médiamorphoses, n° 23, juin 2008). 2 étudiante en Master 2 à l’Université Michel de Montaigne – Bordeaux, à l’Institut des Sciences de l’Information et de la Communication (ISIC) où elle poursuit, sous la direction de Jean-Jacques Cheval, une recherche sur le thème : « La communication interculturelle et la radio associative : études de cas à Bordeaux ». Diplômée en communication sociale, journalisme et enseignement supérieur de l’Université Catholique Bolivienne, de l’Université Mayor de San Simon et de l’Université Mayor Real y Pontificia San Francisco Xavier de Chuquisaca – Bolivie.


Diversité culturelle, interculturalité et Radios Associatives en France, l’exemple bordelais

The radio resists and remains the most widespread media throughout the world and it takes part in the mediatised expression of cultural diversity. The French radio model gives a particular place to the associative radios of the third sector. It is a reality and French name of what one names elsewhere the Community radios. Various structurally and in their nature, these radios have a vocation to express the differences and, often, to support the intercultural communication. Through a study concerning the associative radios of Bordeaux (a big city in the south-west of France) we observe how these radios bring into play and produce on radio waves actors, cultures and identities around intercultural subjects. Resumo O rádio resiste e permanece a mídia mais difundida por todo o mundo e isso toma parte na expressão midiática da diversidade cultural. O modelo francês de rádio dá um lugar particular às rádios associativas do Terceiro Setor. Isso é uma realidade e um nome francês para o que em outros lugares denomina-se rádios comunitárias. Estruturalmente variadas e na natureza delas, essas emissoras têm uma vocação para expressar as diferenças e, freqüentemente, apoiar a comunicação intercultural. Por meio de um estudo sobre as rádios associativas de Bordeaux (uma grande cidade no sudoeste da França), nós observamos como essas emissoras trabalham e produzem nas ondas do rádio atores, culturas e identidades acerca de assuntos interculturais.

Introduction Présentant les tendances récentes de l’écoute de la radio en France (2003-2008), un dossier du CSA 3

(le Conseil Supérieur de l’Audiovisuel) rappelle que 98,3 % des foyers français disposent d’au moins

un récepteur radio, et que plus de huit personnes sur dix écoutent la radio au moins une fois par jour en France actuellement. Le rapport du CSA précise que pour les Français, en 2007-2008, « l’écoute de la musique motive la consommation radio de 60,7 % des auditeurs. L’information motive l’écoute radio chez 55,2 % des auditeurs [...]. Les auditeurs considèrent la radio comme le média le plus crédible en ce qui concerne l’information. » Cette audience représente près de 42 millions et demi de personnes ayant écouté la radio au moins une fois sur une journée de la semaine. Si le temps consacré à son écoute représente en moyenne près de trois heures d’écoute quotidienne par individu, l’audience de la radio est toutefois orientée vers une légère baisse depuis cinq ans. Néanmoins, et compte tenu d’une concurrence médiatique sans cesse accrue, on peut estimer que la radiodiffusion française se maintient dans une situation de relative bonne santé générale qui témoigne d’un intérêt durable du public pour ce média plus que centenaire, mais qui a su s’adapter, se recomposer et qui s’apprête à entrer, en France, dans la nouvelle ère de la diffusion numérique. L’écoute de la radio sur de nouvelles plates-formes de diffusion diversifiées et 3 Le CSA est l’instance étatique française de régulation de l’audiovisuel. La Lettre du CSA, n° 228 - Juin 2009. http://www.csa.fr/actualite/dossiers/dossiers_detail.php?id=128857

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Jean-Jacques Cheval - Sheila Vanessa Sevilla Zeballos

hybrides (notamment sur les ordinateurs via Internet, les postes de télévision - via la réception câblée ou satellitaire -, les baladeurs MP3 ou les téléphones mobiles...), l’audience sans cesse plus mobile, constituent des tendances très notables des nouvelles pratiques radiophoniques. Et on annonce aujourd’hui la naissance de la post-radio, comme une nouvelle étape d’existence de ce média qui ne se décide décidément pas à céder la place 4. Premier média à travers le monde (en terme quantitatif au moins) la radio est concernée par l’ensemble des questions qui touchent à la communication médiatique, que celles-ci soient sociales, économiques, politiques et, bien sûr culturelles. De fait, la notion d’interculturalité s’insère dans les champs de la radiodiffusion de manière particulièrement pertinente. Chacun des trois grands secteurs du système radiophonique français (service public appartenant à l’État, radios commerciales privées et tiers secteur associatif) est concerné par cette problématique devenue transversale et particulièrement prégnante dans les dernières années. Sous le troisième secteur de la radio française se rassemble les radios associatives, réalité françaises de ce que l’on nomme communément ailleurs les radios communautaires. En France, certaines radios revendiquent ce terme de radios communautaires, mais la majeure partie d’entre elles, et une grande majorité de la société avec elles, rejettent cette appellation qui apparaît teintée d’une signification anglo-saxonne. Elle semble renvoyer à la notion, péjorative en France, de communautarisme qui peut aller à l’encontre des idéaux républicains constitutifs de la nation française, depuis 1789, en particulier les principes d’égalité de tous ses citoyens et d’unité du pays, de la République. En effet, comme l’indique Pascal Ricaud, « le terme « radio communautaire » est peu utilisé et apprécié en France. Ailleurs [...] cette appellation est bien perçue, assumée et régulièrement utilisée par les radios de communautés immigrées ou minoritaires. En France – où l’Etat-nation s’est construit et consolidé autour d’une identité et d’une langue unitaires - notre tradition républicaine et universaliste nous interdit presque d’utiliser ce terme trop connoté et vite assimilé à un communautarisme cloisonné, exclusif. Les Français parlent plus volontiers de radios libres, associatives, locales ou de proximité alors que presque partout ailleurs dans le monde - dans les domaines anglo-saxons ou hispaniques, mais aussi au Québec ou en Afrique francophone – l’expression de radio communautaire est employée sans nécessaire préalable ».5 Le terme communauté s’insère néanmoins peu à peu dans le vocabulaire français, mais c’est sous l’appellation de radios associatives que nous aborderons celles qui constituent une composante 4 « Vers la Post Radio, Enjeux des mutations des objets et formes radiophoniques » sera d’ailleurs le titre du colloque international qu’organise le GRER (Groupe de Recherches et d'Etudes sur la Radio) à Paris, les 26, 27 et 28 novembre 2009 ( http://www.grer.fr/agenda.php?id=27 ) 5 Pascal Ricaud, « les radios communautaire de la FM à Internet », pp. 45-48, in « La radio : paroles données, paroles à prendre », Paris : Médiamorphoses, n° 23, juin 2008

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importante de l’audiovisuel français. Dans des environnements marqués par des tendances à la concentration, à la simplification de l’offre, la nature et l’organisation structurelle de ce secteur continuent à présenter une grande diversité laissant une place réelle au pluralisme des acteurs et à leur expression. Elles restent ouvertes à l’expression des groupes et des minorités, que celles-ci soient géographiques, sociales ou culturelles. Numériquement, leur nombre ne décroît pas et, après près de trois décennies d’existence, dans leur globalité, les radios associatives françaises ont acquis une réelle légitimité.

1. LE MODELE RADIOPHONIQUE FRANÇAIS L’architecture actuelle du modèle radiophonique français actuel remonte à la fin des années 70. Auparavant, le monopole de la radio et de la télévision avait été instauré en France à la fin de la Seconde Guerre Mondiale et il avait été appliqué, avec un contrôle politique fort, jusqu’en 1981. Dans les années 70, les radios libres ont constitué une alternative à cette situation. C’était un mouvement de contestation, inspiré pour partie des idées de Mai 1968 et constat de son échec. À l’heure des « révolutions minuscules », n’ayant pas pu transformer la société dans son ensemble, ceux qui contestaient la société et ses institutions se tournèrent vers des expérimentations réduites, segmentées, mais tangibles. Les militants des radios libres contestaient politiquement le monopole de l’Etat sur la communication audiovisuelle du service public, ainsi que la publicité, symbole d’une société de consommation. Ils dénonçaient les inégalités sociales face aux médias. Il fallait supprimer la rupture entre émetteurs et récepteurs, entre professionnels et amateurs ; donner la parole à tous, mais en premier lieu aux minorités, aux exclus, aux dominés ; construire des radios populaires et innovantes à la fois, créatives, culturelles et anticonformistes ; diverses dans leurs origines, leurs acteurs et leurs propos. Illégales, interdites et poursuivies par la police et la justice, les radios libres sont alors devenues un enjeu politique. Dans leur ascension vers le pouvoir, François Mitterrand et la Gauche en on fait un élément de projet et lorsqu’ils accèdent au pouvoir en 1981, ces stations parviennent à la légalité. Le mouvement acquière une importance indéniable : des centaines puis des milliers de stations locales sont créées. On en compte jusqu’à 3 500 entre 1983 et 1984, nouvellement baptisées radios locales privées. Selon la loi, pour être autorisées, elles sont toutes obligatoirement des radios associatives. Ce cadre doit les obliger à une transparence et à une gestion démocratique de leurs actions et leur interdit de poursuivre des buts lucratifs. Initialement, elles n’ont pas accès aux financements publicitaires, ce sont des radios uniquement locales, indépendantes les unes des autres, sans possibilité de se rassembler en réseaux. 4


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Mais très vite ces dispositions évoluent, sous l’influence de mouvements et de pressions internes et externes. Derrière les premiers projets sociaux, associatifs, culturels ou politiques, des ambitions d’entrepreneurs, des appétits commerciaux se manifestent. Les autorités sont placées devant des campagnes d’opinion aux accents libertaires, mais qui sont libérales en fait. En 1984 et en 1986, des modifications législatives permettent d’abandonner le statut associatif, autorise le financement publicitaire et la création de réseaux, entraînant la majeure partie des nouvelles radios dans une compétition économique et vers la concentration. Les échecs sont nombreux. Un nouveau secteur de radiodiffusion commerciale puissant en résulte qui s’organises autour de quelques groupes radiophoniques. Les stations associatives, restant fidèles aux engagements initiaux, sont marginalisées et étaient moins de 300 à la fin des années 80. Mais c’est à ce moment que la création d’une nouvelle instance de régulation, le Conseil Supérieur de l’audiovisuel (CSA) ouvre une nouvelle période qui se poursuit depuis. Le CSA a eu d’emblée la volonté de construire en France un paysage radiophonique équilibré et diversifié. Cette position volontariste, qui est une décision politique sur le long terme, a protégé depuis 1989 le secteur des radios associatives en France et lui a même permis de se développer à nouveau. En 2000, la loi est venue épauler et légitimer cette démarche, elle précise désormais que : “ Le Conseil supérieur de l'audiovisuel veille, sur l'ensemble du territoire, à ce qu'une part suffisante des ressources en fréquences soit attribuée aux services édités par une association et accomplissant une mission de communication sociale de proximité ”6. Au 1er janvier 2007, elles étaient 552 en France métropolitaine, et près de 700 au total, en ajoutant les 143 stations se situant dans les collectivités d’Outre-mer 7. Associant le secteur public de la radio, les radios privées commerciales et les stations associatives non commerciales, le schéma directeur mis en place par la loi et par le CSA, permet l’existence de près de 1000 opérateurs radiophoniques, publics et privés, en France métropolitaine. De fait, le mot clé du système radiophonique français pourrait être diversité : diversité des statuts des opérateurs radiophoniques et de leurs modes de fonctionnement, de leur économie ; diversité des programmes et diversité des logiques intrinsèques propres qui les sous-tendent ; diversité des publics également.

2. LES RADIOS ASSOCIATIVES, ELEMENT DU PLURALISME RADIOPHONIQUE FRANÇAIS

6 Article 29, loi n° 2000-719 du 1er août 2000, Journal Officiel du 2 août 2000. 7 Sources : Conseil Supérieur de l’Audiovisuel (CSA), http://www.csa.fr Depuis cette date le Csa n’a pas publié de nouvelle recension précise des opérateurs radiophonique en France. Globalement les chiffres sont essentiellement restés les mêmes.

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Sous le vocable général de « radios associatives » se rassemblent des stations très différentes les unes des autres. Si, en général, leur première similitude est de demeurer des radios locales, parmi elles il y a des radios rurales, d’autres situées dans de grandes villes (d’où des audiences potentiellement très dissemblables). Elles peuvent être des radios de communautés nationales, culturelles ou linguistiques particulières (radio de l’immigration, de groupes parlant une langue régionale faisant partie du patrimoine français, tel le basque, l’alsacien, l’occitan, le breton…), mais aussi des radios d'associations socioculturelles, des radios de quartiers, des radios de pays, des radios rurales, des radios militantes et politiques, des radios confessionnelles ou laïques, des radios scolaires ou universitaires... Le plus souvent, elles mettent l’accent sur leur caractère local et se revendiquent comme des radios généralistes à cet échelon. Héritières des radios libres, les radios associatives françaises maintiennent pour beaucoup d’entre elles également un discours alternatif à la communication de masse. Elles se proclament citoyennes, démocratiques, indépendantes et solidaires. Elles déclarent vouloir favoriser la prise de parole, la participation des auditeurs, l’apprentissage aux médias audiovisuels, le service public local. Ces préoccupations rencontrent assez souvent des prises de positions sociales et politiques. Et ces radios

font souvent références à des principes fondamentaux démocratiques,

civiques, professionnels, ou sociaux de fraternité (notamment l’antiracisme, la lutte contre l’exclusion et l’intolérance). En 1998, le Ministère de la Culture s’était essayé à classer près de 550 radios associatives selon la nature de leurs activités, les publics auxquels elles s’adressaient ou leurs structures internes 8. Les radios associatives “ généralistes ” à vocation locale, les plus nombreuses, représentaient environ 55% de l’ensemble. Elles diffusaient des émissions de service, de divertissement, d’information, de la musique, destinées à un public local indifférencié et multiple. Une centaine de radios (18,6%) étaient qualifiées de radios confessionnelles ; le plus souvent catholiques. Les autres étant protestantes ou juives, quelques-unes œcuméniques, mais aucune ne se revendiquait musulmane. Les radios scolaires de collèges, les radios étudiantes ou d’universités représentaient 7,4%. Dans des proportions égales (5,6%), l’étude mentionnait deux autres catégories : une trentaine de radios qualifiées ici de communautaires, émanation d’une ou plusieurs communautés d’origine étrangère, vers lesquelles elles diffusaient des émissions en rapport avec la culture des pays d’origine, et qui employaient souvent les langues de ces pays (on trouvait ici des stations arabophones) et une trentaine de stations dites régionales, c’est-à-dire des radios se basant sur des identités culturelles régionales fortes où existent des langues régionales propres, différentes du français (elles se situaient principalement en Alsace, en Bretagne ou au Pays Basque français). 8 Info-médias, Service Juridique et Technique d’Information (SJTI), décembre 1998

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Cette nomenclature était forcément réductrice, mais elle montrait que les domaines des radios associatives françaises étaient larges, divers et ne se réduisaient pas seulement à l'expression de communautés retranchées - et dissociées de ce fait - de l'ensemble du corps social français. Depuis les chiffres ont pu varié, mais les proportions restent probablement sensiblement les mêmes. Les radios associatives françaises sont le miroir et le réceptacle d’une véritable diversité culturelle et sociale que l’on constate beaucoup moins dans les autres secteurs de l’audiovisuel. Ainsi on retrouve des radios associatives citées en grand nombre dans « Le répertoire des media des diversités » publié à l’été 2007 par l’Institut Panos 9. On peut avancer que la cohérence et la justification du secteur radiophonique associatif français reposent sur un mode d'organisation et de financement spécifique, alternatif aux autres. Et aussi une logique différente : ce n'est pas prioritairement parce qu'il existe un droit à écouter les programmes de son choix (droit des auditeurs) que les radios associatives existent, mais parce que l’on reconnaît un droit à l'expression médiatisée (droit du citoyen). De ce fait, ce tiers secteur reste le garant d’un droit d’entrée de l’ensemble de la population dans l’espace de la communication audiovisuelle, ce qui constitue l’expression d’un droit démocratique. Il s’agit d’une possibilité d’apprentissage, de formation réelle à des techniques et technologies modernes d’expression. De plusieurs points de vue, ces stations se rapprochent plus du service public que des radios privées commerciales nationales. Elles remplissent des missions qui s'apparentent au premier et s'y substituent parfois. On peut ici évoquer le cas des radios qui consacrent un temps d'antenne important, ou même prépondérant, aux langues régionales ou bien à des langues parlées par des populations migrantes. Ainsi, elles comblent des lacunes dans l'expression médiatique globale

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. Ces missions d’ailleurs leur ont été reconnues et

même assignées explicitement, depuis 2000, par la loi sur la liberté de la communication. Leurs missions y sont définies comme le fait de “ favoriser les échanges entre les groupes sociaux et culturels, l'expression des différents courants socioculturels, le soutien au développement local, la protection de l'environnement ou la lutte contre l'exclusion ”

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. L’apport de ces précisions

correspondaient aux revendications de nombreuses radios qui souhaitaient que soit reconnue l’importance de leur existence et ainsi leur pérennité. L'économie des radios associatives française est modeste même si, rassemblées, elles constituent un ensemble non négligeable, et bien qu’il soit difficile de quantifier exactement l'économie sociale des radios associatives. Se situant autour de 60 à 65 millions d’Euros, leur poids financier chiffrable est 9 Institut Panos, MediaDiv. Le répertoire des media des diversités, Edition 2007, Paris : Editions l’Harmattan, 2007, 232 p. 10 Jean-Jacques Cheval, “ Local radio and regional languages in Southwestern France ” p. 165-195 in Ethnic Minority Media : An International Perspective / Stephen H. Riggins (Ed.), Newbury Park (California) : Sage Publications, 1992, 296 p. 11 Article 29, alinéa 5, loi n° 2000-719 du 1er août 2000, Journal Officiel du 2 août 2000.

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habituellement évalué à un pourcentage oscillant entre 4 et 5% de l’économie totale de la radiodiffusion française 12. Comme pour toute activité associative, une grande part de leur économie échappe aux indicateurs financiers classiques. L’économie et les finances des radios locales associatives recourent pour partie à des ressources associatives, (cotisations, donation, autofinancement, publicité locale13). Le travail bénévole et non rémunéré y joue une part très importante, mais est forcément très difficile à évaluer de manière financière. En France, les différentes radios associatives rassembleraient entre 20 et 25 000 bénévoles. Et une part essentielle de l’économie du tiers secteur provient d’une source parfaitement identifiée : le Fonds de Soutien à l'Expression Radiophonique (FSER). Il représente en moyenne plus d’un tiers des budgets annuels des radios associatives en France et constitue une clé essentielle du dispositif réglementaire et pratique du pluralisme radiophonique français

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. Un système par ailleurs

très original en Europe, même si des dispositifs comparables ont été créés en Belgique, Hollande ou au Danemark. Le FSER a été créé en 1982. Il s’agissait d’une taxe prélevée sur les recettes des régies publicitaires des radios et des télévisions qui se finançaient grâce à la publicité et dont les recettes étaient reversées aux radios associatives alors totalement interdites de ressources publicitaires. Depuis cette époque, le principe de base est resté sensiblement le même, bien que les mécanismes pratiques, de collecte et d’attribution du fonds aient été souvent modifiés. Aujourd’hui, il en résulte une aide principale qui est la subvention de fonctionnement. Son attribution se fait selon des critères objectifs qui lui donnent un caractère presque automatique pour les radios qui se conforment aux obligations légales. En outre, une majoration peut venir s’ajouter à la subvention de base selon des critères qualitatifs à travers desquels il s’agit de valoriser les stations qui font preuves d’inventivité, d’activités et de qualités particulières 15.

12 Qui est elle-même une activité au périmètre modeste. En 2006, l’économie globale de la radio en France, tous secteurs confondus, se situait à environ 1 397 millions d’Euros, publicité, redevance et subventions comprises (alors que la télévision représentait un marché de 5 419 millions d’Euros), dont environ 40% revenaient au service public et 55% au secteur privé commercial. Albino PEDROIA, « la radio privée commerciale, un acteur central », p. 33-37 in « La radio : paroles données, paroles à prendre », Paris : Médiamorphoses, n° 23, juin 2008. 13 La publicité était interdite sur les radios associatives françaises à l’origine ; elles ont obtenue par la suite la possibilité d’y recourir mais dans la proportion de seulement 20% de leur budget total. Dans la réalité les ressources commerciales sont inexistantes ou représentent beaucoup moins que cela dans la très grande majorité de ces radios. 14 Pour plus de précisions sur cet aspect voir : Jean-Jacques Cheval, « L’expérience française des radios locales associatives, un modèle économique ? » in La longue marche des télévisions associatives, sous la direction de Bruno Cailler, Guy Pineau et Christian Pradié, Nice : les Cahiers de Champs Visuels, (annoncé pour 2009) 15 Ces sept critères sont désormais les suivants : 1 - La diversification des ressources des stations postulantes ; 2 - Leurs actions de formation professionnelle en faveur de leurs salariés et de la consolidation des emplois au sein des services ; 3 - Leurs actions culturelles et éducatives ; 4 - Leur participation à des actions collectives en matière de programmes; 5 - Leurs actions en faveur de l’intégration et de la lutte contre les discriminations ; 6 - Leurs actions en faveur de l’environnement et du développement local ; 7 - La part d’émissions autoproduites au sein de la grille de programme des stations.

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Depuis 1982, le FSER a connu des évolutions quantitatives importantes ; en premier lieu, depuis les années 1980, le montant de ses recettes est en nette progression. Entre 1988 et 2007, il est passé de 6,7 Millions d’Euros à 25,5 Millions d’Euros. En 2007, sur les 609 dossiers de demandes de financement déposés, 588 ont été retenus. Pour les 588 radios bénéficiaires, la subvention moyenne de fonctionnement s’est élevée à 34 481 Euros. De plus, pour 543 stations (92,3%), une majoration est venue s’ajouter à la subvention de base. Elle a été d’un peu plus de 8 000 Euros en moyenne. Ainsi, au total, l’apport moyen du FSER pour l’ensemble des radios subventionnées a été d’environ 42 500 Euros en 2007. Il s’agit donc d’un apport considérable qui explique pour beaucoup la vivacité et la longévité des radios associatives en France. Pour autant, les radios associatives doivent bien sûr compléter leur budget par la quête d’autres subventions, d’autres ressources. De fait, la situation économique de nombreuses radios associatives en France reste souvent précaire et la défense du FSER, la revendication de son augmentation est un thème d’actualité récurant. À l’inverse, une partie de la classe politique, ou bien les chaînes de radio et de télévision qui abondent la taxe, ne l’entendent pas ainsi. L’un des arguments principaux avancé est celui de la faible audience des radios associatives. Il est vrai que globalement les résultats d’audience des radios associatives restent modestes dans les enquêtes générales de mesures de l’écoute de la radio. Sur les dernières années, en données absolues ou relatives, ils se situent entre 2 à 3% en moyenne de l’audience quotidienne ou des parts d’écoute nationales de la radio

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. L’audience des radios associatives apparaît faible par rapport à celle des

autres radios privées ou publiques. Contestée dans ses méthodes et ses résultats, Médiamétrie peut faire remarquer que ces chiffres restent relativement stables dans leur ordre de grandeur au niveau national. Mais, il se peut qu’ils traduisent en partie le fait qu’il s’agit essentiellement de radios de rendez-vous et non pas de radios de flux. Cette hypothèse est confirmée par les études longitudinales. Quand elle mesure l’audience de la radio non pas sur l’écoute de la veille, mais sur des périodes plus longues, Médiamétrie révèle des perspectives un peu plus optimistes. Ainsi, par exemple, en 2008/2009, il apparaissait que, sur une durée de 3 semaines, les radios associatives françaises étaient écoutées par 7,7% de la population résidant en France

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. Et on constate aussi que chaque

agglomération ou terroir peut révéler des particularités radiophoniques, dans l’offre des programmes et leur réception, ce qui joue aussi pour les radios associatives.

16 L’audience de la radio en France est principalement mesurée par la société d’enquête et de sondage Médiamétrie : www.mediametrie.fr 17 Panel radio 2008/2009, Septembre-Octobre 2008 / Janvier-Février 2009, Médiamétrie, communiqué de presse du 27 avril 2009

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On peut enfin penser qu’héritières des radios libres des années 70, la logique fondatrice et intrinsèque des radios associatives françaises demeure une logique d’expression - dont l’expression des différences, des particularités - plutôt qu’une logique d’audience. Ainsi, elles justifient l’espace qu’elles occupent par leur capacité à donner la parole, à fournir un accès direct à l’expression radiophonique plus que dans la compétition avec les autres secteurs radiophoniques dans les sondages d’écoute.

3. RADIO ET DIVERSITE CULTURELLE La radio demeure au début du XXIème siècle le média qui bénéficie de la plus large implantation à travers le monde, celui dont l'internationalisation et la globalisation ont été effectuées le plus rapidement. Les équipements radiophoniques varient encore largement selon les pays ou les régions, les continents, mais, malgré ces inégalités, la radio continue à être l'instrument de communication moderne la plus accessible aux populations du monde, tant au Nord qu’au Sud. Et presque partout, la démultiplication et la diversification de stations émettrices se sont imposées dans les dernières décennies ; ce fut le cas en Europe de l’Ouest puis de l’Est engendrées par la dérégulation, mais aussi en Afrique sub-saharienne depuis les années 90 accompagnant un mouvement de démocratisation, ou bien dans de nombreux pays d’Amérique Latine. Ceci ne veut pas dire que des phénomènes de concentration, que de grands groupes radiophoniques ou que des groupes multimédias intégrant une forte dimension radiophonique, n'existent pas. Dans beaucoup de pays, les domaines traditionnels des radiodiffusions publiques, souvent gage d’une ambition culturelle, ont été attaqués par la progression des secteurs privés et commerciaux (offrant des programmes plus stéréotypés), comme ce fut le cas dans les pays de l'ancien bloc soviétique. Mais étant donné la modicité des investissements initiaux nécessaires, la multiplication de stations de radios, en particulier au niveau local, a été aisément possible quand ne s’interposaient plus des obstacles politiques – il restait ensuite bien sûr à dépasser le cadre de la création des infrastructures, pour passer à celui du fonctionnement soutenable et durable 18. La radio, dans ses aspects culturels, touche à l'alphabétisation. Ce média permet l'expression directe des langues nationales et celles moins répandues ou langues minoritaires et agit de ce fait même comme un instrument de résistance contre la globalisation, outil de défense du pluralisme culturel. Média de communication orale, par nature, les méthodes et les codes d'expression de la radio sont inévitablement liés aux différentes réalités linguistiques. De fait, les radios restent les moyens de 18 Souvent encore, le troisième secteur radiophonique doit combattre pour conquérir une place, une légitimité et garantir ses moyens d'existence. Sans parler du reste du monde, dans certains pays européens, il n'existe pas encore de tiers secteur audiovisuel.

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communication les plus accessibles pour l'expression médiatisée des cultures minoritaires, les cultures des populations d'émigrants et les diasporas. À l’inverse, la radio, à travers la musique diffusée peut tout aussi bien se convertir en vecteur de mode et d’uniformisation culturelle. Mais il n'y a pas de fatalité non plus. Si un genre musical comme le rock and roll, s'est en effet transformé en un mode dominant d'expression mondiale

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; la radio, avec le disque, a été un de ses vecteurs privilégiés. Mais

partout à travers le monde le rock a été domestiqué, a été interprété, adapté - le Rock latin en est un bon exemple. Jesús Martín-Barbero par exemple écrit en ce qui concerne le rock colombien : « Dans le rock aujourd'hui s’hybrident les sons et les bruits de nos villes avec les sonorités et les rythmes de musiques indigènes et noires et les esthétiques du jetable avec les utopies fragiles qui surgissent de la fadeur morale et du vertige audiovisuel » 20. Il est certain que multiplicité n’est pas synonyme de réelle diversité et il est peut-être vrai aussi, comme l’avançait, lors de la sixième rencontre biennal internationale de radio au Mexique en 2006, Benjamín Fernández Bogado, directeur de l'institut Presse Liberté au Paraguay, que « nous venons d'un monde où on écoute beaucoup, mais on écoute réellement beaucoup de bruit et peu de sons » 21. Mais l’omniprésence de la musique rock et de ses dérivés, sur les ondes et ailleurs, n'a pas empêché, la conservation, le développement ou l'apparition et d'autres courants musicaux, et en particulier la nébuleuse très riche de la « World Musique » ou des « Musiques du Monde » qui trouvent, elles aussi, sur les radios des canaux de diffusion. En France, les débats nouveaux à propos de la diversité culturelle ont été lancés de manière passionnée dans les dernières années. Sous des angles très distincts, ce sujet s'est converti en débat permanent – et souvent en terrain de confrontations – dans la vie sociale et politique française. Pour Serge Regourd, la diversité culturelle est devenue « un thème central du débat public ». Un thème à la mode aussi, c’est « un "mot-valise" dit-il utilisé sans grande rigueur sémantique dans les médias, les professions de foi des acteurs politiques, les revendications professionnelles du monde artistique », et sans doute parfois aussi dans le monde académique... L’expression est invoquée selon « une approche d'autant plus consensuelle qu'un tel concept paraît lui-même intrinsèquement consensuel ». C’est peutêtre là le problème d’ailleurs : « Qui pourrait, a priori, contester le bien-fondé de la diversité culturelle ? » Et on peut se demander, ajoute Regourd, si l’invocation de ce concept part d'un simple constat, d'un état des lieux déjà accompli, ou bien d'un projet, d'une revendication ? C’est sans doute 19 Selon l'historien anglais Eric J. Hobsbawm, durant le court vingtième siècle, « le rock-and-roll, langage directement issu du blues noir américain, devint le langage universel de la culture des jeunes ». Eric J. Hobsbawm, L’âge des extrêmes, histoire du court XX° siècle, Paris : Editions Complexe, 1999. 20 Jesús Martín-Barbero, “Medios y culturas en el espacio latinoamericano”, Pensar iberoamérica, n° 5, Janvier-Avril 2004 [ http://www.oei.es/pensariberoamerica/ric05a01.htm ] 21 Benjamín Fernández Bogado, “Radio y democracia: la valoración de la palabra”, pp. 85-30, in Rodriguez Reséndiz Perla Olivia & Ortega Carmona Leopoldo (Ed.), Memorias de la Sexta Bienal Internacional de Radio, México, Radio Educación, 2006

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un peu tout cela à la fois : la diversité culturelle exprime une situation à sauvegarder d’une part et une aspiration à promouvoir à la fois. « Par-delà le "flou" de cette notion, par-delà l'apparente mollesse de son contenu immédiat, un certain nombre d'éléments structurants incontestables se dégagent : la problématique a pris naissance dans le contexte des processus de mondialisation et de globalisation économique caractérisés notamment par l'émergence d'une culture de masse, d'une industrie des loisirs exprimant les tendances hégémoniques d'une culture nord-américaine, menaçant le périmètre, voire la survie, des expressions culturelles des "dominés" ». Le concept a acquis un statut international avec l’engagement de pays, de la Communauté européenne et, surtout enfin, de l’UNESCO avec l’adoption, à Paris en octobre 2005, de la « Convention sur la protection et la promotion de la diversité des expressions culturelles ». La France a été très engagée dans ces débats, notamment à travers le concept lié d’exception culturelle

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. Elle l’a abordé d'un point de vue international, devant les phénomènes associés à la

globalisation, de manière défensive ou parfois conquérante, notamment à travers le thème de la francophonie. Mais la société française a aussi dû faire front à cette question de manière interne. L’idée de diversité culturelle fait références en effet aux différences nées de la présence de cultures étrangères sur les territoires nationaux. Et elle peut s’appliquer aussi aux renouveaux ou aux réinventions de cultures identitaires territoriales traditionnelles au sein d’ensembles plus vastes – comme, par exemple, les Basques ou les Catalans en France (comme en Espagne) 23. Les questions récurrentes de l'intégration des populations étrangères, ou de celle des Français originaires de l'immigration ou des territoires et départements d'outre-mer, croisent inévitablement les concepts d'exclusion, d'assimilation ou de la construction d'une société diverse, voire multiculturelle. Un multiculturalisme qui peut aisément renvoyer négativement en France, là encore, à la notion d’une collection composite de particularismes culturels se côtoyant sans cohérences et parfois avec hostilité, notamment quand ce multiculturalisme prend une dimension religieuse. Si, pour certains, la diversité religieuse participe de la diversité culturelle, elle paraît s'opposer aux concepts de laïcité de la République Française, c'est-à-dire non seulement la séparation de l’Église et de l'État, mais aussi le respect dû à chaque religion et la nature privée des croyances et de leurs manifestations. Sur le sujet du voile islamique dans les écoles françaises ou sur le sujet des émeutes dans les banlieues à l'automne 2005 et depuis, les médias ont été accusés de ne pas refléter la diversité française et d'offrir une image imparfaite, ou même délibérément négative de cette réalité. Les représentations 22 Ce n’est pas le lieu ici de revenir précisément sur ces concepts qui ne sont pas équivalents et peuvent même avoir été opposés l’un à l’autre, mais on peut aussi penser qu’ils peuvent être associés dans une relation naturelle : « La diversité culturelle est un objectif, l’exception culturelle est son instrument » Laurent Heynemann (cinéaste français) 23 Lluis Bonet y Emmanuel Négrier (Ed.), La fin des cultures nationales ? Les politiques culturelles à l'épreuve de la diversité, Paris : La Découverte, 2008

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partielles ou partiales des minorités dans les médias français est un sujet de débat courant qu'engendrent des préconisations comme la discrimination positive pour effacer rapidement les déséquilibres constatés ou supposés. Sans être exclue, la radiodiffusion a été impliquée de manière moins virulente dans ces controverses. Elle n’en est pas moins concernée par ceux-ci. Dans son rapport 2008, sur « La diversité dans les médias », le Club Averroes souligne que la loi pour l’égalité des chances du 31 mars 2006, donne pouvoir au Conseil supérieur de l’audiovisuel de veiller à ce que la programmation des radios reflète la diversité de la société française. Or, dans le même, il remarque l’ignorance de cette loi par les opérateurs privés des radios nationales. « L’ensemble des radios privées conventionnées par le CSA dispose d’un cahier des charges et des obligations identiques à celui des télévisions en matière de respect de la Diversité. Or, à ce jour, elles semblent l'ignorer. [...] L'état de la diversité sur les réseaux musicaux est alarmant. En particulier dans les radios musicales destinées à un public jeune » 24. La situation n’est pas la même pour les radios publiques qui font figurent d’exception. Le groupe Radio France est crédité comme ayant été « le seul à avoir oeuvré de manière structurante sur cette question ». Depuis 2004, Radio France a adopté la « Charte de la diversité dans l’entreprise », qui a pour objet de témoigner de l’engagement de la société « en faveur de la diversité culturelle, ethnique et sociale au sein de l’entreprise » et la société dispose d’un chargé de mission pour la diversité culturelle et l’intégration. Dans une tribune publiée par le journal Le Monde, le 17 janvier 2009, JeanPaul Cluzel alors PDG de Radio France, défendait l’idée que « la nation allait devoir intégrer une réalité nouvelle pour la France, celle des communautés. Si nous ne faisons pas de la diversité de nos origines une richesse, le pacte républicain sera ébranlé par les oppositions communautaires. L'audiovisuel public, sa radio au premier rang, ont un rôle à jouer ». Il s’agissait à la fois pour lui de promouvoir la diversité et « lutter contre le risque de déchirures irréparables au sein du pays et prendre sa part dans l'affirmation de la cohésion nationale, indissociable de la prise en compte d'une diversité qui est, plus que jamais, une richesse de la France ». Outre une politique de formation et d’embauche spécifique, le 19 janvier 2009 par exemple, veille de l’accession officielle de Barak Obama à la présidence des Etats-Unis, toutes les stations de Radio France étaient associées, dans une opération commune destinée à contribuer au débat sur la représentation des minorités dans les médias et dans la société française. Ce jour-là les programmes furent exceptionnellement modifiés pour donner une place particulière à l'expression de la différence. Le Club Averroes, est surtout attentif à 24 http://blog.clubaverroes.com/?p=140 Le Club Averroes est une structure informelle fondée en 1997, qui regroupe près de 350 professionnels des médias et du spectacle pour promouvoir la diversité dans les médias français. Ses rapports annuels sont devenus une des références de l’avancée ou des résistances à la diversité dans les médias français.

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l’action des médias nationaux en la matière. En 2008, il ne mentionnait pas l’action des radios associatives, mais il réclamait du CSA que la problématique de la diversité soit un préalable pour la sélection des candidats à la radio numérique en France 25. À l’évidence, les politiques publiques de communication peuvent aider à la défense ou au maintien d'expression culturelle particulière. En France, une manifestation de l'exception culturelle concernant la radio est constituée par la législation, déjà ancienne, sur la programmation musicale sur ce média. Depuis 1994, la loi garantie la diffusion sur les radios françaises d’une proportion substantielle d'œuvres musicales d'expression française ou interprétées dans une langue régionale en usage en France. Initialement, elle devait atteindre un minimum de 40% de chansons d'expression française, dont la moitié au moins provenant de nouveaux talents ou de nouvelles productions, diffusées aux heures d'écoute significatives. Cette règle initiale adoptée pour freiner l’omniprésence de la musique anglo-saxonne sur les radios privées, et pour favoriser l’émergence de nouveaux interprètes, a été ensuite modulée. Aujourd’hui, par dérogation, le Conseil supérieur de l'audiovisuel peut autoriser, pour des formats spécifiques, les proportions suivantes : - soit pour les radios spécialisées dans la mise en valeur du patrimoine musical : 60% de titres francophones, dont un pourcentage de nouvelles productions pouvant aller jusqu'à 10 % du total ; - soit pour les radios spécialisées dans la promotion de jeunes talents : 35% de titres francophones, dont 25% au moins du total provenant de nouveaux talents

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. Législation contestée au départ, elle est aujourd’hui bien acceptée et, de l’avis général, a

contribué à la défense de la production musicale française. C’est une expression d’une mise en pratique politique de l’exception culturelle, dont l’UNESCO a depuis reconnu le bon droit à travers la reconnaissance de la légitimité des politiques publiques et étatiques culturelles en ce sens. 4. RADIOS ASSOCIATIVES ET INTERCULTURALITE, L’EXEMPLE BORDELAIS Bordeaux et la Gironde

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se sont signalés dès l’Entre-deux-guerres, puis dans les années 1970 et

1980 comme des pôles radiophoniques particulièrement actifs. Aujourd’hui encore la densité du paysage radiophonique est très forte. Les acteurs de la radiodiffusion française, dans leur ensemble, sont présents sur l’agglomération. Parmi eux, six radios associatives, ce qui représente un cinquième des radios autorisées. Une étude récente illustre leurs conceptions et pratiques de la diversité culturelle et de la communication interculturelle. Cinq radios associatives ont été plus particulièrement étudiées 25 Mais, en 2009, à la suite des premières autorisations octroyées à 160 radios pour émettre à Paris, Marseille et Nice, le Club s’est déclarée « extrêmement déçu par la décision du Conseil supérieur de l’audiovisuel de n’autoriser « aucun nouveau format ouvert sur la diversité française ». 26 Article 28, Loi n° 86-1067 du 30 septembre 1986, modifiée en 1994 et en 2000. 27 La ville de Bordeaux, grande ville du Sud-ouest de la France est peuplée de plus de 230 000 habitants (2006), tandis que son agglomération urbaine compte environ 750 000 habitants (ce qui la place au 7ème rang français). Elle est la préfecture du département de la Gironde, une division administrative française.

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et, à travers elles, les émissions qu’elles proposent centrées sur les cultures hispaniques (Espagne, Portugal et Amérique Latine) 28. De manière générale, les mots clés des objectifs de ces radios associatives sont souvent pluralisme, ouvertures et proximité ainsi que pédagogie. Les missions qu’affichent ou s’assignent ces différentes radios sont les suivantes : Pour R.I.G., il s’agit de contribuer au développement social, culturel et économique de sa zone de diffusion, en relation avec la population, en partenariat avec des associations, des collectivités locales et les acteurs économiques locaux. Elle représente assez bien la conception d’une radio généraliste locale et associative. Sans être réservée aux seuls auditeurs chrétiens, RCF, radio confessionnelle, se veut une radio chrétienne et généraliste, pour tous publics, avec des émissions culturelles, informatives et musicales. Radio engagée à Gauche depuis ses origines (« la radio qui se mouille, pour que demain il fasse beau »), La Clé des Ondes se veut une radio associative militante et pluraliste, sans publicité aucune, antiraciste, anticapitaliste... Elle n’est pas affiliée à un syndicat ou parti politique particulier. O2 Radio installée dans un quartier populaire, parfois qualifié de sensible, de l’agglomération bordelaise, qui héberge de nombreuses populations immigrées d’origine diverses, se dé clare être une radio plurielle, multiculturelle, donnant la possibilité à chacun de s’exprimer sans aucune discrimination. Radio Campus Bordeaux, radio universitaire, n’est pas a proprement parlé une radio étudiante, mais elle fonctionne grâce au dynamisme des étudiants. Elle se veut au service de la communauté universitaire et au-delà être un service public local en développant une communication sociale de proximité tout en restant ouverte au monde ; former ses salariés et ses animateurs en insistant sur les fonctions éducatives et culturelles, internes et externes, de l’activité radiophonique. Elles sont diverses par leur moyens, notamment humains. La Clé des Ondes emploie un salarié ; pour Radio Campus Bordeaux, RCF Bordeaux et R.I.G. le nombre des salariés est de quatre et O2 Radio dispose de six employés. La presque la totalité des émissions de ces radios associatives sont produites par leurs bénévoles ; les salariés assurant plus l’encadrement technique et administratif des stations. Cette force bénévole des radios associatives reste partout significative : Radio Campus Bordeaux accueille 88 bénévoles ; ils sont entre 70 et 90 à La Clé des Ondes ; 70 à RCF ; entre 30 et 40 à R.I.G. et O2 Radio compte une quarantaine de bénévoles.

28 Sheila Vanessa Sevilla Zeballos, La communication interculturelle et la radio associative : études de cas à Bordeaux, Mémoire de Master 2, Université Michel de Montaigne – Bordeaux, Institut des Sciences de l’Information et de la Communication (ISIC). Les radios associatives étudiées (qui sont toutes présentes sur Internet) furent les suivantes : Radio La Clé des Ondes ( www.lacdo.org ) , R.I.G. ( www.rigfm.fr ), RCF Bordeaux ( www.rcf.fr/rubrique.php3?id_rubrique=37 ), appartenant au réseau associatif Radio Chrétiennes de France), Radio Campus Bordeaux ( www.bordeaux.radio-campus.org ) et 02 Radio ( www.o2radio.net ). Les trois premières sont des radios créées dès le début des années 80, les deux autres dans les années 90.

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L’importance du thème de la communication interculturelle apparaît de manière variable selon chacune, mais est toujours évoquée avec intérêt et souvent avec une intentionnalité déclarée, mais aussi une certaine imprécision dans les définitions ou concepts que l’on peut y rattacher. Pour RCF toutefois, peu d’émissions se rattachent véritablement à cette ambition, sinon à travers une programmation musicales diversifiée et quelques émissions ouvertes à d’autres expressions religieuses. RCF se centre avant tout sur sa vocation confessionnelle et les émissions réalisées en local mettent l’accent sur la position chrétienne de la radio. Les émissions clairement orientées sur des sujets interculturels existent dans les quatre autres radios étudiées, se référant à des situations culturelles en rapport à des pays étrangers, des minorités ethniques en France ou des pratiques et opinions sur les réalités diverses du monde... O2 Radio ajoute explicitement à cette dimension internationale des émissions qui expriment une diversité intergénérationnelle, abordent les situations des minorités en France ou encore les questions de genres, les différences entre hommes et femmes. Bordeaux est naturellement tourné vers la péninsule ibérique proche, mais aussi, parce que la ville a été un port colonial vers l’Afrique, l’Afrique du nord et les Antilles, des traditions et une immigration toujours présentes nourrissent cette encore son ouverture au monde. Ville universitaire elle accueille de nombreux étudiants étrangers. L’affichage interculturel de Radio Campus est remarquable dès l’écoute de ses jingles d’identification qui sont présentés en plusieurs langues depuis de longues années (grâce aux étudiants étrangers justement). La radio défend une position à la fois universelle (au sens universitaire) et didactique. C’est donc une de ses missions de proposer de nombreuses émissions abordant des sujets interculturels. Pour O2 Radio qui est née et se conçoit comme une radio multiculturelle proposer des émissions interculturelles est aussi une évidence. Exprimer la diversité des cultures figure parmi ses objectifs et missions, le sujet est donc central pour la radio. L’interculturalité est également prise en compte par La Clé des Ondes et R.I.G, mais plus, sans doute dans un souci d’information générale ou et de connaissance, ou bien avec l’objectif premier d’accorder la parole à tous. Interrogés à ce sujet, les responsables des radios associatives ou les producteurs n’énoncent pas de définitions très précises des concepts de culture et d’interculturel. Leurs approches semblent personnelles de diverses. Pour Radio Campus Bordeaux, par exemple, ces concepts sont implicitement inscrits dans certains des objectifs de la radio qui défendent la création et les musiques indépendantes. De par son ouverture sur le monde, universitaire ou pas, l’interculturalité se doit de participer à la culture qu’ils diffusent. Pour le directeur de O2 Radio, l’interculturalité est la confrontation, la rencontre entre différentes cultures, en complète réciprocité. Pour ceux de La Clé des Ondes, culture et 16


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interculturalité s’inscrivent dans une vision militante du monde et s’oppose à toute forme de marchandisation commerciale. Les émissions hispaniques qui ont été plus précisément étudiées peuvent se distinguer les unes des autres en plusieurs catégories. Pour certaines le prétexte de base est musical, mais il est souvent outrepassé. « Puntos Latinos » (O2 Radio) est un magazine musical sur le rock sud-américain présenté par Oscar Rojas Medina, un Bolivien qui habite à Bordeaux depuis plus de 8 ans. « Falseta » proposé par Ludovic Pautier sur Radio Campus, un Français amoureux de l’Espagne, tourne autour du Flamenco, mais l’émission s’ouvre à d’autres thèmes : la culture andalouse, la littérature espagnole ou la gastronomie par exemple. Pour d’autres programmes l’affichage est de se présenter avant tout comme émission culturelle. On peut range ici le programme « Olympica Latina » (O2 Radio) qui traite de l’information, de la musique et des événements se déroulant à Bordeaux, mais en référence à l’Amérique Latine ; « Brésil en Noir & Blanc » (Radio Campus Bordeaux) est une autre émission culturelle, animée par la Brésilienne Marta Fantini qui habite en France depuis 22 ans ; ou encore « La Lucarne » sur Radio Campus, qui est une chronique sur un thème d’actualité latino-américain. « Onda Latinoamericana”, est une production collective s’étalant sur 4 heures chaque samedi après-midi sur La Clé des ondes. Animée par une douzaine de personnes, elle est à la fois culturelle et musicale. La plus ancienne était “Voces Españolas ». Diffusée depuis 25 ans sur La clé des ondes, elle est proposée par un groupe d’Espagnols et d’enfant d’émigrés espagnols qui se sont installés ou sont demeurés à Bordeaux. Cette dernière, rendez-vous hebdomadaire de gens qui se connaissent par ailleurs, s’apparente sans doute plus exactement au registre des émissions communautaires. Dans ces programmes, les pratiques linguistiques varient d’une radio à l’autre. Si, sur 02 Radio des émissions en langues étrangères sont autorisées, ailleurs on privilégie plutôt les traductions, le bilinguisme ou simplement le français, même quand il s’agit d’évoquer des réalités étrangères. Outre la nécessité de contrôler ce qui passe à l’antenne, il s’agit de favoriser la compréhension commune de ce qui est diffusé et de favoriser précisément l’interculturalité. Mais ces pratiques radiophoniques la favorise-t-elle vraiment ? Il serait hasardeux en l’état de répondre de manière assurée à cette question. Les retours sur chacun des programmes existent, mais ils sont difficilement quantifiables et encore plus qualifiables. Dès lors, il est difficile de savoir par qui et comment ces programmes sont reçus, entendus, assimilés. Les pratiques d’interaction existent entre ces radios et leurs publics, mais elles semblent limitées en particulier dans les directs à l’antenne. De plus, il est difficile de mesurer quantitativement les retours, audiences de ces émissions. Les radios associatives n’apparaissent pas dans les sondages globaux qu’elles ne peuvent commanditer étant donné leurs coûts très élevés.

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Diversité culturelle, interculturalité et Radios Associatives en France, l’exemple bordelais

Avec Ludovic Pautier, le producteur de « Falseta », on peut poser l’hypothèse qu’en instruisant et en partageant avec des auditeurs, son émission doit au moins contribuer à transformer les idées reçues, les visions faites de clichés, d’idées reçues sur l’Espagne et la culture Flamenca. Informer et éduquer sur une réalité autre, pour lui, c’est en soit un élément manifeste d’interculturalité. Polymorphe et alternative, l’offre radiophonique ainsi proposée constitue certainement un élément de diversité dans le paysage radiophonique bordelais, elle montre, démontre et laisse à entendre sur les ondes une altérité du monde et permet aux auditeurs potentiels d’en prendre connaissance, que ce soit à travers des contenus culturels (dont la musique) ou informationnel, documentaire.

CONCLUSION Selon Geneviève Vinsonneau « La notion d’interculturel est chargée de multiples significations. Elle renvoie aussi bien à la comparaison transculturelle qu’aux relations que peuvent établir, par-delà les frontières de leurs groupes d’appartenance supposés homogènes, des individus porteurs des cultures distinctes ». 29 Dans cette optique, l’« intercuturel » se présente comme un moyen de promouvoir la dimension « multiculturelle » des sociétés. Il procède d’une « problématisation des appartenances », intervenant à la fois au niveau des relations interpersonnelles et intersubjectives, au niveau des relations sous-jacentes entre les groupes, institutions et au niveau des superstructures, c'està-dire des représentations sociales et idéologiques. Gina Stoiciu avance que la communication interculturelle « est définie comme une rencontre entre porteurs de cultures différentes, mais c’est aussi une rencontre qui peut avoir lieu dans le contexte de l’immigration, des relations internationales ou des entreprises multinationales. En élargissant ainsi la perspective, on peut charger le préfixe inter avec trois des enjeux majeurs de la communication : une rencontre avec, une rencontre entre et une rencontre agissant sur » 30. Les émissions interculturelles des radios associatives de Bordeaux – et d’ailleurs - mettent en jeu des acteurs, des cultures et des identités. Ce qui suppose avec et entre eux des dynamiques relationnelles et identitaires et des échanges ponctués d’interactions, de positionnements, de négociations, d’actions et de réactions. Faute de pouvoir les mesurer précisément, il est difficile d’évaluer les dynamiques de changement engendré par leur présence sur leurs publics potentiels et les sociétés qu’ils représentent, mais on peut postuler qu’elles existent. Ces changements en l’occurrence ne sont pas à l’évidence unilatéraux et non pas forcément bénéfiques, du moins dans leur perception. Évoquant les thèmes de la communication et culture, le 29 VINSONNEAU, Geneviève. L’identité culturelle. Paris : 2002. Page. 50. 30 Gina Stoiciu, « L’émergence du domaine d’étude de la communication interculturelle », in Hermès. L’épreuve de la diversité culturelle. n° 51, CNRS Editions, Août 2008. Pp 33-36.

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Colombien Jésus Martin Barbero avance que : « La reconfiguration des cultures locales et régionales est liée dorénavant spécialement à l'intensification de la communication et à l'interaction de ces communautés avec les autres cultures de chaque pays et du monde. Du point de vue des communautés locales, les processus actuels de communication sont perçus à la fois comme une forme de menace pour la survie de leurs cultures en même temps que comme expérience d'interaction qui comporte des risques mais qui ouvre aussi les voies de l'avenir. [...] la communication conjugue dans un double mouvement les effets pervers et les opportunités. [...] Nous sommes confrontés en même temps à des tendances à l'uniformisation culturelle et à d'autres qui vont vers la différenciation, c'est-à-dire d'affirmation de la différence à tous les niveaux et dans tous les espaces sociaux »

31

. Le Français

Dominique Wolton pense que « La cohabitation culturelle constitue le paradigme de la troisième mondialisation » et que la société de l’information annoncée ou promise « butte sur la diversité culturelle, car de toute façon il n’y a pas d’information sans culture, et plus les informations sont nombreuses, plus se posera la question de leur réception, donc de l’altérité, et de la diversité culturelle. L’abondance d’informations ne supprime pas les différences culturelles ; elle les rend visibles » 32. Il nous faut aborder cette réalité sans angélisme. Si comme l’écrit le professeur espagnol Mariano Cebrián, « l'interculturalité exige de reconnaître et communiquer à égalité de droits pour toutes les cultures et tous les processus informatifs et communicatifs et de développer des échanges d'expériences en respectant les différences de chacun »

33

. Il faut aussi prendre en compte, comme le

rappelle Katérina Stenou, que: « tout dialogue comporte le risque de poser, d'un commun accord, les sujets de discorde en même temps qu'il offre la chance de l'ouverture. Le dialogue sans risque n'est que bavardage ; le dialogue sans opportunités n'est qu'autosuffisance dont les causes, extrêmement variables, vont de la paresse intellectuelle à la volonté de domination »

34

. La radio en général et les

radios associatives en particulier participent sans nul doute à ces débats et à ces problématiques.

31 Forum Permanent sur le pluralisme culturel. « Maîtriser la mondialisation culturelle : un forum de débat et de propositions ». http://www.planetagora.org/theme4_note.html 32 Dominique Wolton, « De la société de l’information, à la cohabitation culturelle », Libération, 2 mars 2003 33 Mariano Cebrián Herreros, La información en televisión. Obsesión mercantil y política, Barcelona : Gedisa, 2004 34

Katérina Stenou, Rencontre européenne sur le dialogue interculturel, http://www.planetagora.org/theme5_suj1_note.html Katérina Stenou est directrice de la division des politiques culturelles et du dialogue interculturel à l’UNESCO

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REFERENCES BIBLIOGRAFIQUES BERNARD François de (Ed.), Europe, diversité culturelle et mondialisation, Paris : L’Harmattan, 2005. CHEVAL Jean-Jacques, Les radios en France : Histoire, état et enjeux, Rennes : Editions Apogée, 1997 DEBRAY Régis, Un Mythe contemporain : le dialogue des civilisations, Paris : CNRS Editions. France, 2007 FARCHY Joëlle, La fin de l’exception culturelle, Paris : Editions CNRS, 1999 GARCIA CANCLINI Néstor, Culturas Hibridas, México : Grijalbo, 1990 GOURNAY Bernard, Exception culturelle et mondialisation, France : Presses de la Fondation Nationale des Sciences Politiques, 2002 « La Radio : Paroles données, paroles à prendre », sous la responsabilité de Jean-Jacques Cheval, MédiaMorphoses, Paris : Armand Colin / INA, n° 23, Juin 2008 MARTIN-BARBERO Jesús, Des médias aux médiations : Communication, culture et hégémonie, Paris : CNRS Editions, 2002 MATTELART Armand, Diversité culturelle et mondialisation, Paris : La Découverte, 2005 MATTELART Armand, La Mondialisation de la Communication, Paris : PUF (Que sais-je ?), 1996 REGOURD Serge (Ed.), De l’exception à la diversité culturelle, Paris : La Documentation Française, Collection Problèmes politiques et sociaux, n° 904, 2004 « L’épreuve de la diversité culturelle ». Hermès, Paris : CNRS Editions, n° 51, Août 2008 VINSONNEAU Geneviève, L’identité culturelle, Paris : Armand Colin. 2002 WARNIER Jean-Pierre, La mondialisation de la culture, Paris : La Découverte, 2008 WOLTON Dominique, L’autre mondialisation, Paris : Flammarion, 2003 WEBGRAPHIE Groupe d’Etudes et de recherches sur les mondialisations (GERM) : http://www.mondialisations.org/php/public/index.php Groupe d’Etudes et de Recherches sur la Radio GRER : http://www.grer.fr/ PlanetAgora, forum permanent sur le pluralisme culturel : 20


Jean-Jacques Cheval - Sheila Vanessa Sevilla Zeballos

http://www.planetagora.org/espanol/index.html UNESCO. Convention sur la protection et la promotion de la diversitĂŠ des expressions culturelles : http://portal.unesco.org/culture/fr/ev.phpURL_ID=11281&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html

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La stratification générationnelles de la radio en France

Hervé GLEVAREC1 Centre National de la Recherche Scientifique Laboratoire Communication et Politique herve.glevarec@lcp.cnrs.fr Michel PINET2 Centre National de la Recherche Scientifique Centre Lillois d'Etudes et de Recherches Sociologiques et Economiques michel.pinet@gmail.com Résumé Le champ des pratiques culturelles et médiatiques a été abordé jusqu'à très récemment comme un champ culturel structuré par les variables socio-économiques de position sociale et de capital culturel. Dernièrement une série de travaux ont révélé la force structurante de la variable de l'âge dans le champ des consommations musicales. Cette nouvelle valeur de l'âge semble fortement induite par la place prise par la culture dite de masse et par les industries culturelles. La radio est un objet privilégié de cette nouvelle structuration en tant qu'elle est, historiquement, un média au cœur d'un processus de différenciation des publics par la classe d'âge et par les "générations culturelles". Sur la base d'une exploitation inédite de l'enquête longitudinale Panel Médiamétrie 2000-2001, nous utilisons la méthode de modélisation loglinéaire qui, par sa capacité à synthétiser l'information, permet de mesurer le poids relatif des grand déterminants sociographiques afin de décrire les choix radiophoniques des auditeurs français. La position sociale est secondaire dans l'ordre des variables structurantes de cet univers. A l'inverse, la variable d'âge est indispensable pour restituer la logique de cet espace. Abstract Based on statistical data, this paper examines the French radio landscape at the beginning of the 2000's. It appears that age is the most determinant variable to describe this field. Social class, sex and cultural capital are less important. This result is correlated with the

1

Docteur en Sociologie. Chercheur au Centre National de la Recherche Scientifique Laboratoire Communication et Politique. 2 Docteur en Sociologie. Chercheur au Centre National de la Recherche Scientifique, Centre Lillois d'Etudes et de Recherches Sociologiques et Economiques.


place taken by private music radio in France since eighties. It indicates a relative fragmentation of radio audiences in national context.

Resumo Baseado em dados estatísticos, esse artigo examina o panorama da rádio francesa no início dos anos 2000. Ele apresenta que idade é a variável mais determinante para descrever esse campo. Classe social, gênero e cultura são menos importantes. Esse resultado está relacionado com o espaço que a rádio musical privada francesa passou a ocupar desde os anos 80. Isso indica uma relativa fragmentação da audiência da rádio no contexto nacional. Resumen Basado en datos estadísticos, este artículo examina el panorama de la radio francesa en los años 2000. Demuestra que la edad es la variable más importante para describir este campo y la clase social, género y cultura son menos importantes. Este resultado está relacionado al espacio que la radio musical privada francesa se ha movido desde los años 80. Esto indica una relativa fragmentación de la audiência de la radio en el contexto nacional.

Introduction Si

l'analyse statistique appliquée

aux

pratiques

culturelles

est

ancienne

et

dense (Bourdieu, 1979 ; Donnat et Cogneau, 1990 ; Donnat, 1998 ; Coulangeon, 2005), la même appliquée aux publics des médias demeure plus marginale dans la sociologie française. En effet, l'audience des médias a été pensée comme un cas particulier de l'univers culturel, à savoir structurée par l'appartenance socio-économique ou par le capital culturel. Dans son article séminal sur le "marché des biens symboliques", P. Bourdieu traite des radios comme d'un bien culturel identique à n'importe quel autre (Bourdieu, 1971). Il le dira à nouveau plus tard: "Mais pour revenir aux variations des goûts selon les conditions sociales, écrivait Bourdieu, je n'apprendrai rien à personne en disant qu'on peut repérer aussi infailliblement la classe sociale d'appartenance ou si l'on veut la «classe» (il a de la «classe») à partir des musiques préférées (ou, plus simplement, des chaînes de radio écoutées) qu'à partir des apéritifs consommées, Pernod, Martini ou whisky" (Bourdieu, 1984: 158). Ecouter telle radio est susceptible de signifier socialement comme le goût pour un bien artistique aussi bien qu'alimentaire. Le modèle de Bourdieu est un modèle général d'analyse et de structuration des pratiques par la position sociale accompagnée d'une théorie du marché des biens symboliques


distinguant un champ de production pour spécialistes et un champ de grande production qui correspond dorénavant aux industries culturelles (Bourdieu, 1971). Une autre représentation du monde social émerge des analyses statistiques récentes des pratiques et des goûts culturels qui ont fait place à des variables comme l'âge et la génération que la sociologie n'avait guère l'habitude de mettre en avant (Van Rees et Van Eijck, 1999 ; Coulangeon, 2003; Van Eijck et Knulst, 2005; Gayo-Cal, et al., 2006; Approche générationnelle des pratiques culturelles et médiatiques, 2007; Chan et Goldthorpe, 2007). Les travaux les plus récents sur la musique montrent la bipartition qui s'opère dans les goûts musicaux entre deux univers de goûts, sinon de légitimités, entre ceux qui aiment le rock, la musique électronique et la musique urbaine et ceux qui aiment le jazz et la musique classique (Savage, 2006). Assez logiquement du fait de la place qu'y occupe la musique, l'âge est aussi pour le monde radiophonique la variable déterminante. En effet, en matière de choix des radios, les auditeurs ont le goût de leur âge. Ceci tient à deux raisons principales : la montée des musiques populaires depuis l'après-guerre et celle des radios dites de "format". Les industries culturelles que sont les radios ont profondément modifié le champ culturel en se structurant autour des catégories d'âge et des générations de goûts. Les radios, depuis les années 1950 aux Etats-Unis (McCourt et Rothenbuhler, 2002), les années 1980 en France (Cheval, 1997), sont au cœur d'un processus de différenciation des publics. Plus que tout autre média, la radio est associée à la jeunesse puis à l'adolescence qui émergent dans les années 1960. Elle a contribué à transformer les générations historiques en générations de goûts. Et elle est un des acteurs historiques centraux d'une extension de la place prise par les genres populaires et, ce faisant, elle a joué un rôle double dans la montée de l'éclectisme musical et dans les transformations de la légitimité dite "culturelle", voire plus radicalement encore dans les façons de goûter. En effet, derrière le débat très prolifique sur le thème de "l'omnivorité", qui désigne, selon R. Peterson, la propension plus grande au mixage des genres classiques et populaires chez les catégories supérieures et indique ainsi le passage d'une hiérarchie culturelle élite/masse à une hiérarchie omnivore/univore (Peterson, 1992 ; Peterson et Simkus, 1992 ; Peterson et Kern, 1996 ; Chan et Goldthorpe, 2007), il y a la montée en puissance de tous les genres et objets "populaires" liés aux industries culturelles et aux médias. La diffusion des genres populaires dans les catégories supérieures (modalité essentielle de leur extension) a par ailleurs réévalué la valeur sociale de ces genres.


Comme dans la plupart des pays européens, la France se caractérise par la coexistence récente d'un secteur privé et d'un secteur public de radiodiffusion. La place prise, depuis la libéralisation des ondes en 1981, par les acteurs privés a profondément modifié le profil des auditeurs. En France, le champ radiophonique a maintenant atteint une relative stabilité. Aux anciennes radios généralistes d'information, France Inter, Europe 1 et RTL, sont venues s'ajouter les radios musicales jeunes, NRJ, Fun radio, Skyrock des années 1980, puis les radios des âges intermédiaires, Nostalgie, Chérie FM, Europe 2, RTL 2 3. Les genres populaires (rock, rap, r&b, dance, chansons) sont les genres dominants en radio ; ils sont articulés à l'âge, via le "format", c'est-à-dire à des cibles définies par la tranche d'âge et la génération "musicale". Il y a à la fois des radios jeunes programmant des titres récents et des radios adultes programmant des titres de l'adolescence passée des auditeurs. Par ailleurs, les musiques populaires ont acquis un statut social et culturel, notamment du fait de leur canonisation et de leur persistance auprès des baby-boomers (Bennett, 2008 (forthcoming))

qu'elles

n'avaient

pas

auparavant,

a

fortiori

dans

la

théorie

sociologique (Glevarec, 2005a). Que se passe-t-il quand une pratique culturelle comme la consommation radiophonique ou musicale n'est plus liée prioritairement à la position sociale, comme l'ont avancé précédemment l'analyse et la théorie ? Si c'est l'âge qui est déterminant, il faut envisager deux hypothèses : l'une, structurelle, qui avance que l'âge au sens socio-biologique est déterminant, l'autre, culturelle, que c'est la génération culturelle - la socialisation générationnelle et culturelle - qui est déterminante. Dans un cas comme dans l'autre c'est l'explication du goût qui est affectée, puisqu'il renvoie moins à la position sociale qu'à la position générationnelle. Nous nous proposons ici de chercher quelles sont les variables qui structurent une pratique médiatique comme celle de la radio en France. Pour avancer dans notre démonstration, nous nous appuierons sur une exploitation originale d'une des deux enquêtes que la société Médiamétrie réalise chaque année sur l'audience de la radio en France4. Médiamétrie réalise en effet deux grandes enquêtes sur l'audience de la radio en France, la "126 000" (enquête auprès de 126 000 personnes par téléphone sur l'écoute des 24 heures

3

Pour une présentation des radios nationales françaises, nous renvoyons à l'annexe. Médiamétrie est la société qui a le monopole de la mesure de l'audience des radios et des télévisions en France. Nous remercions ici les responsables de la Société de nous avoir permis cette exploitation originale et inédite d'une ancienne base de données produite par leurs soins. 4


précédentes durant la période Septembre-Juin), et l'enquête "Panel" par Carnet d'écoute (dairy) sur 21 jours. C'est cette dernière, longitudinale, qui nous servira ici de base de données quantitatives. Elle porte sur un panel de 18 radios nationales françaises 5. La sociologie de l'audience radiophonique appelle un modèle à la fois pertinent et synthétique afin de faire apparaître les principales variables et leur éventuelle combinaison dans l'explication de l'audience d'une radio. Le recours à la modélisation log-linéaire permet de démontrer ce poids relatif des variables. Une fois la variable de l'âge mise en évidence, nous préciserons la structure sociale de chacune des radios du Panel à travers une série de tableaux de composition de l'audience selon différentes variables. Dans le cas de la radio, l'analyse statistique de l'audience permet de mettre à jour une structuration des pratiques et des goûts qui fait écho aux débats actuels sur les nouvelles hiérarchies culturelles (Frow, 1995: 95-156) et sur l'éclectisme des goûts (Peterson, 2004). La réflexion à partir des données statistiques de déclarations de contacts pose la question sociologique de la distribution des pratiques. Elle amène par exemple à formuler les descriptions dans un modèle de la stratification et/ou dans un modèle de la segmentation (Glevarec et Pinet, 2007a). A la différence de la télévision, la radio manifeste une fragmentation des sociétés occidentales, notamment par l'âge, que la télévision dissimule sans doute encore par un certain malthusianisme de ses chaînes accessibles à tous, au moins en France. On sait que l'avènement des chaînes du câble et de la T.N.T. au cours des années 1990 et 2000 a déjà provoqué une baisse de l'audience des télévisions nationales hertziennes françaises. Mesurer une pratique médiatique par la modélisation comparative C'est le raisonnement "toutes choses égales d'ailleurs" propre à la modélisation loglinéaire qui nous a semblé le mieux répondre à un tel questionnement sur le degré de dépendance entre le "choix" des auditeurs et les grands déterminants sociographiques qui décrivent la population. On sait que ce type de méthode, dans sa version de comparaison de modèles hiérarchiques (voir la présentation ci-après), est utilisé classiquement pour exprimer l'influence des variables présumées explicatives sur une variable "à expliquer" par quelques coefficients d'effet de certaines modalités des variables, simples, ou croisées si le modèle l'exige. Ici, il s'agirait donc de s'interroger pour chaque radio, sur un modèle qui expliquerait 5

Cf. annexe.


la variable dichotomique "être ou ne pas être auditeur de cette radio", et dont on rendrait compte par les coefficients d'effet indispensables pour reconstituer correctement la distribution de chaque profil sociographique entre ces deux possibilités. La propension à être auditeur plutôt que non-auditeur d'une radio pour une personne donnée résultant alors du "cumul" de tous les effets liés à ses caractéristiques individuelles. C'est effectivement ce long cheminement que nous avons fait, en comparant tous les modèles possibles pour chaque radio, en retenant le plus pertinent, et en prenant note des effets simples ou croisés qu'il comporte. Mais nous avons choisi de résumer cette large quantité d'information à l'indication de la liste des effets présents dans le modèle retenu pour chaque radio, c'est-à-dire à la seule "structure" de ce modèle, en renonçant à l'examen trop volumineux des "coefficients d'effets" simples ou composés qu'il permet de quantifier. On sait que de telles modélisations, utiles pour pointer de grandes dominantes, obligent à travailler avec un petit nombre de variables - et de catégories. Si nul ne s'étonnera de voir retenues trois variables sociographiques des plus classiques (Age, PCS du chef de ménage, Niveau scolaire), on pourrait en revanche être surpris de l'absence de cet autre grand classique qu'est le genre. En fait, tout notre travail préalable de tabulation sur les données Médiamétrie montrait assez clairement le rôle presque toujours très secondaire de la coupure hommes / femmes. Comme il s'agit ici de pointer de grands déterminants, ajouter cette quatrième variable peu discriminante aux modèles n'aurait servi, en multipliant par deux le nombre de "cases" à modéliser, qu'à faire baisser la fiabilité globale de la méthode en multipliant les petits effectifs - problème évité avec trois variables… L'indispensable prise en compte de la PCS du chef de ménage a posé un problème pratique qui nous a amenés à devoir ne tenter cette modélisation que sur une partie du panel. La PCS est utilisée ici plus dans sa signification d'indicateur de position sociale que comme une donnée socioprofessionnelle immédiate. Or, pour les retraités, le panel de Médiamétrie ne permet pas de prendre en compte l'ancienne profession. Devant l'importance de l'âge dans l'univers de l'écoute radio, et le danger de redondance presque systématique entre une catégorie d'âge et une catégorie de PCS qu'aurait représenté le maintien d'une modalité spécifique "Retraités", nous avons décidé de n'opérer cette modélisation que sur les ménages "actifs", c'est-à-dire ceux dont le chef est actif au moment du panel. Le problème était le même pour une catégorie moins nombreuse : celle des "ménages dont le chef est étudiant", dans la plupart des cas des étudiants vivant seuls. Ils ont eux aussi été sortis de la


modélisation par le parti que nous avons dû prendre de ne retenir que les ménages actifs. Ils ne représentaient que 12 % des étudiants, ce qui tempère l'impact éventuel de cette restriction contrainte. Au regard de la précision visée par cette méthode (pointer de grands déterminants), les inconvénients de cette limitation de champ nous ont semblé moins décisifs que ses avantages. Simplement doit-on l'avoir en tête en lisant cette partie, notamment parce qu'il donne probablement un écho minoré aux effets de persistance de l'ancien paysage radiophonique (celui d'avant la libéralisation de la bande FM) sur les pratiques des plus âgées. Sans doute certains contrastes auraient-ils été plus forts si nous avions pu disposer de l'ancienne profession des retraités pour les garder ici dans l'échantillon. Cela étant fixé, nous avons travaillé avec les taxinomies suivantes pour les variables retenues. - La "variable à modéliser" "Auditeur" est la simple dichotomie "écoute / n'écoute pas" la radio modélisée, au sens de l'audience cumulée. - pour l'âge, et compte tenu de la limitation de champ qui vient d'être pointée, nous avons retenu les trois catégories 11-24 ans, 25-44 ans, 45 ans et plus ; - pour la PCS du chef de ménage, nous avons opéré une trichotomie Catégories populaires, Catégories Moyennes, Catégories aisées6 - Pour le Niveau scolaire, trois modalités aussi : Primaire, Technique/Professionnel, Secondaire / supérieur. Ce sont les variables ainsi agrégées que nous avons soumises à la modélisation log-linéaire.

Cadre méthodologique Le parti méthodologique retenu - celui des modèles log-linéaires hiérarchiques comparés - a été préféré à d'autres approches modélisantes (comme la régression logistique) parce qu'il peut permettre une présentation synthétique et malgré tout nuancée lorsqu'il y a comme ici un grand nombre de situations à résumer. Comme dans toute modélisation, il s'agit de comparer les données réelles issues de l'enquête aux données théoriques qu'on calcule en supposant un 6 Ouvriers et Employés pour la première, Professions intermédiaires et "indépendants" (agriculteurs et artisans/commerçants) pour la seconde, Cadres et Professions libérales pour la troisième.


certain type de liens entre les variables – cette démarche étant considérée comme acceptable quand ces deux jeux de données, le réel et le théorique, sont proches l'un de l'autre. Plutôt que d'exprimer les influences recherchées sur le fait d'être auditeur ou non d'une radio, au travers du jeu des coefficients d'effet (propres au modèle retenu) de chaque item des variables explicatives pour chaque radio (ce qui aurait conduit à un nombre de coefficients très important en s'en tenant aux effets simples de ces items, et dissuasif si l'on avait voulu rendre compte de leurs éventuels effets croisés), nous avons décidé de résumer l'information à la simple structure du "bon modèle" (tous les croisements d'effet étant envisagés) à retenir pour chaque radio. Par "bon modèle", nous entendons ici ce que permet de désigner comme tel la modélisation log-linéaire. Notons que l'usage qui est fait ici de ces modèles contourne le caractère indifférencié du statut des variables qui est à leur principe. L'objectif est en effet de permettre à l'une des variables – la dichotomie auditeur / non auditeur – d'être testée comme dépendante des autres présumées explicatives. Classiquement, ce type d'approche – souvent utilisée comme une alternative aux modèles logit dont elle constitue un équivalent théorique – passe par la construction d'un premier modèle "de base", dont on sait qu'il a peu de chances d'être fidèle, mais dont l'écart aux données d'enquête servira d'étalon pour le jugement de l'apport d'autres modèles, plus "réalistes" ceux-là. Ce qui nous importe ici est la liaison aux autres variables de la variable à expliquer R(adio) (le fait d'être auditeur de la radio "modélisée"), indépendamment (mais sans les éliminer de la modélisation) des liens entre elles de ces autres variables A(ge), C(S du chef de ménage), N(iveau scolaire). Il faut donc prendre comme modèle de base un modèle qui "neutralise" en quelque sorte ces liens des variables explicatives, en en faisant le socle d'où dérivent ensuite, comparativement et par addition d'effets à tester, tous les autres modèles. Ce modèle de base, qui comporte donc, outre bien sûr la variable à expliquer, l'ensemble des autres variables et de leurs liens de tous ordres, peut s'écrire selon les conventions usuelles des modèles hiérarchiques : {A}{C}{N}{AC}{AN}{CN}{ACN}{R}

(1) (Modèle de base)

Du point de vue de la modélisation de R, ce modèle de base est en fait un modèle d'indépendance : s'il apparaissait suffisamment ajusté aux données d'enquête - ce qui, on s'en doute, a peu de chances de se produire - cela signifierait que ni l'âge, ni la CS, ni le niveau scolaire n'ont d'influence sur le fait d'écouter ou non une radio.


Il faut ensuite lister l'ensemble des modèles (cela en fait au maximum 18 avec 3 variables "explicatives") qui ajoutent progressivement à ce modèle de base tous les jeux possibles d'influences directes puis d'interactions des variables explicatives, dont il s'agit par différence de tester l'effet de rapprochement de la table de contingence étudiée. Ainsi, si on veut tester un modèle se limitant à l'influence directe de l'âge sur l'écoute d'une radio suffit-il de rajouter à la liste du modèle (1) la liaison {RA}, de vérifier qu'il a une qualité d'ajustement suffisante, et que les gains de qualité que lui apporterait l'ajout d'autres liaisons ne sont pas suffisamment significatifs pour justifier ce surcroît de complexité explicative. Le processus peut être mené jusqu'à atteindre le modèle dit "saturé" qui envisage toutes les influences directes et croisées de toutes les variables (modèle parfaitement fidèle, mais sans intérêt heuristique puisqu'il est aussi complexe que le jeu de données dont on est parti… pour en trouver une structure simplifiée…). A l'inverse d'une hypothétique radio qui serait fidèlement décrite par le modèle de base, à l'auditoire indépendant de toute considération d'âge, de CS ou de niveau scolaire, une radio pour laquelle il n'y a pas de modèle satisfaisant dans notre processus avant le modèle saturé nécessite pour une bonne modélisation de prendre en compte tous les effets simples et interactions de niveau 2 et 3. Autrement dit, pour une telle radio chaque effet d'une variable est modulé par les deux autres, sans possibilité de "simplifier" l'explication. En résumé, la démarche revient à repérer quelles influences sont d'un apport indispensable pour passer d'un modèle très vraisemblablement à rejeter – le modèle de base – à un modèle suffisamment fidèle pour être accepté. Pour chacun de ces modèles, son ajustement global est reflété par deux indicateurs qui mesurent l'écart entre les données observées et celles qui résulteraient d'une application stricte du modèle - le Rapport de Vraisemblance (G2) et le Chi-Deux de Pearson. Dans ce cas de modèles emboîtés (hiérarchiques), l'intérêt de travailler avec le G2 est le caractère additif de cette quantité : la différence de G2 entre un modèle et un autre dans lequel il est emboîté représente exactement l'apport des influences qui différencient les deux modèles. Il est dès lors aisé de repérer l'apport d'une variable ou d'une combinaison à la modélisation, et de tester s'il faut encore enrichir une modélisation qui atteint une qualité globale d'ajustement suffisante. C'est en appliquant à chacune des 20 radios ces mêmes principes d'enrichissement progressif et de sélection que nous avons pu choisir pour elle, de façon globalement homogène, le modèle à retenir, meilleur compromis entre fidélité et complexité. Il est représenté dans le tableau, sur


la ligne de chaque radio, par une case colorée pour chaque effet retenu dans le modèle et présumé par là "indispensable à une bonne modélisation". Pour être plus informatif sans rentrer dans le détail, nous avons "coloré" chacune de ces cases plus ou moins (par un dégradé) selon l'importance relative de l'effet correspondant dans le modèle.

Le tableau ci-dessous résume l'examen de plus de 300 modèles, et permet de façon très synthétique de pointer les différences entre radios du point de vue des influences nécessaires à une bonne modélisation sociographique de leur public. S'il y a là une forte réduction de l'information disponible, il s'agit de ne pointer que les grandes influences, et la réduction des variables retenues à des taxinomies simples (trois classes d'âge, de PCS ou de Niveau scolaire) est cohérente avec la précision des conclusions. Tableau 1 : Modélisation des principales variables déterminantes de l'écoute de chaque radio Tableau résumé des modèles choisis Radio CHERIE FM EUROPE 1 EUROPE 2 FR CULTURE FR INFO FR INTER FRMUSIQUE FUN MFM NOSTALGIE NRJ FR BLEU RFM RMC RTL RTL 2 SKY ROCK SUD RADIO AUTRES Total TV

Pour une modélisation suffisamment fidèle… Influences simples nécessaires…

Age

CS (P)

Niveau

= + =(-) + =+ + + -

+ + +(=) + + + -

-= + + + + + +

+ + = + + =(-) + -(=) -

-= + =-

= = = = += += =+ =

Influences combinées nécessaires… Age x CS

…d'ordre 2 Age Niveau x Niveau x CS

…d'ordre 3 Age x CS x Niveau

Légendes Couleurs = Indication de "degré de nécessité" de la variable Dans le modèle retenu, la variable est…

Couleur

"Indispensable" "Nécessaire" "Tout juste nécessaire" Opérateurs arithmétiques = modalité(s) de la variable de plus forte influence sur l'écoute de la radio 11-24 ans Catégorie d'âge = 25 à 44 ans + 45 ans et plus Catégories Populaires CS du chef de famille = Catégories Moyennes + Catégories Aisées Primaire Niveau scolaire = Technique/Professionnel Secondaire/Supérieur +

Exemples de lecture : Dans l'écoute de Chérie FM, il y a : - un effet de l'âge mais dépendant du niveau scolaire (ou ce qui revient au même, un effet du niveau scolaire mais dépendant lui-même de l'âge) puisque la case (Age x Niveau) est cochée (en noir) en plus des cases Age (en noir) et Niveau scolaire (en gris foncé), - un effet propre de la CS du chef de ménage (peu dépendant des autres variables puisque les cases (Age x CS) et (Niveau x CS) ne sont pas cochées). Hiérarchiquement (dégradé du noir au gris clair) c'est l'âge, puis le niveau scolaire, puis la CS, qui sont le plus décisifs dans le modèle. Enfin, ce sont les catégorie d'âge moyen (signe =), les CS "populaires" (signe -), et (dans cet ordre mais de façon assez similaire car le signe = n'est pas entre parenthèses) les catégories de niveau scolaire Primaire (signe -) et Technique/Professionnel (signe =), qui sont le plus corrélées à l'écoute de Chérie FM.

Pour l'écoute de RTL, l'âge est un critère suffisant toutes choses égales d'ailleurs pour opérer une bonne modélisation (case noire de l'âge à l'exclusion de toute autre). Avec l'indication (signe +) sur les coefficients d'effet, on peut donc dire un peu abruptement que RTL est "une radio de vieux", d'une manière qui est peu sensible aux différences de position sociale ou de niveau scolaire,


Les déterminants sociographiques des radios : la force de l'âge et du diplôme Le premier trait évident – qui ne surprendra pas, mais qu'il est permis d'examiner ici sous l'angle du "toutes choses égales d'ailleurs" - est l'omniprésence de la variable âge, que cette analyse confirme comme la dimension la plus structurante du paysage radiophonique. Du coup, le seul cas qui échappe à cette détermination, celui de MFM, est particulièrement notable, d'autant plus que le modèle retenu pour cette radio est aussi l'un des rares qui se contente d'une seule variable explicative, en l'occurrence le niveau scolaire. Dans l'univers descriptif qui se limite à nos trois variables découpées chacune en trois modalités 7, on peut donc dire que MFM est une radio dont le public se caractérise principalement par le niveau scolaire, et cela d'une manière qui est relativement peu sensible aux différences d'âge ou de position socioprofessionnelle Pour toutes les autres radios, l'âge est toujours une variable active dans le partage auditeur / non auditeur – et la plupart du temps la plus active, comme le révèle la couleur foncée presque uniforme de la première colonne. Mais là encore, il y a un petit nombre de radios qui se distingue bien des autres : pour RMC et RTL, l'âge seul suffit, les autres variables n'étant même pas nécessaires à une bonne modélisation 8. Autant dire que la caractérisation de ces radios comme "des radios de vieux" ne nécessite pas d'être tempérée par la prise en considération d'une dimension sociographique complémentaire. Pour la très grande majorité des radios donc, l'âge est présent dans les influences indispensables mais sans être le seul à agir. Pour deux seulement, il ne constitue pas la plus active des variables. France Info d'abord, montre une influence légèrement plus forte du niveau scolaire, mais il faut dire qu'il s'agit là d'une radio un peu à part dans notre analyse, peu propice à une bonne lisibilité au prisme de cette méthode. Cela au regard d'une audience sans doute "plurimodale" dans sa structure (comme le laisse supposer aussi sa position dans l'analyse hiérarchique du champ des radios faite par ailleurs) (Glevarec et Pinet, 2008): un 7 Le "toutes choses" évoqué par l'expression "toutes choses égales d'ailleurs" se limite strictement à l'univers des variables retenues et de leurs modalités, et ne préjuge pas de ce que pourraient dire "d'autres" variables. 8 Notre présentation écrasant forcément les éventuelles hésitations quant au choix final du modèle, il n'est peutêtre pas inutile de préciser ici que cette fidélité du modèle "âge seul" est particulièrement incontestable dans les deux cas. Avec un G2 (indicateur de la qualité du modèle qui vaudrait zéro pour un modèle parfaitement ajusté) de 13 pour 21 degré de liberté (p=0.91) dans le cas de RTL, et un G2 de 15 pour 21 degré de liberté (p=0.83) dans le cas de RMC, le choix n'était pas difficile (dans le cas de RTL en particulier, l'ajout des 2 autres variables au modèle n'améliore le G2 que de 20% pour 4 degré de liberté…).


auditeur qui cherche un complément systématique à une "musicale" pauvre en informations n'ayant pas forcément le même profil qu'un sportif à la recherche d'un résultat de match ou qu'un insatiable passionné d'information fraîche qui cherche "le dernier bulletin" dès qu'il monte dans sa voiture. Du coup, France Info est l'une des trois radios qui ne laisse voir aucun modèle satisfaisant en dehors du "modèle saturé"9, c'est-à-dire aucune possibilité de simplifier l'univers des effets 10. France Inter ensuite, malgré l'importance des catégories âgées dans son audience pointée dans les tabulations précédemment commentées ou dans l'analyse hiérarchique, montre une influence du niveau socioprofessionnel similaire à celle de l'âge – et s'il faut retenir pour cette radio une influence d'ordre 2, c'est celle qui croise les deux autres variables. Pour toutes les autres radios, l'âge est bien "la plus influente des variables" qui déterminent l'audience. On peut distinguer sur cette base parmi elles quatre configurations de modèles explicatifs. Pour France Culture, Fun et Sud Radio, l'influence de l'âge est bien prépondérante mais peu modulée par les autres déterminations, puisqu'il n'y a pas d'effet d'ordre 2 associant l'âge à autre chose. La PCS et le niveau scolaire (le niveau scolaire seul pour Sud Radio) ajoutent leurs effets à ceux de l'âge sans venir les "moduler", il y a juste cumul d'effets simples. Dit de façon plus didactique, si l'âge est bien le déterminant le plus fort de l'appartenance à "l'audience" de ces radios, il produit ses effets (positifs ou négatifs) de manière similaire pour les trois catégories de niveau scolaire et/ou de position socioprofessionnelle. Pour Chérie FM, Europe 1, Europe 2 et Nostalgie, l'effet de l'âge ne peut être envisagé en lui-même puisque les modèles retenus impliquent qu'il soit modulé selon le niveau scolaire (mais pas la PCS). Il y a bien un effet dominant de l'âge, cet effet est peu dépendant de la position sociale, mais il varie significativement selon le niveau d'étude. RTL 2, France Musique et Skyrock obéissent à une logique similaire au cas précédent, à ceci près que PCS et Niveau scolaire voient leur rôle inversé. L'effet toujours dominant de l'âge est peu dépendant du niveau d'étude, mais il varie significativement selon la position

9 Voir encadré méthodologique. Le choix de ce modèle comme le seul suffisamment fidèle peut traduire soit une forte dépendance relative des effets de variables par ailleurs importantes au regard de la chose modélisée, soit une "résistance" de la méthode à un choix de variables un peu décalées au regard de ce qui est modélisé. 10 Le seul modèle qui approche, mais de trop loin, un semblant de réalisme, comporte les trois effets simples plus l'effet croisé PCS x Niveau scolaire – qui peut donc apparaître quand même comme "le plus explicatif" dans cet univers qui l'est peu…


sociale. Notons au passage la différence entre les deux grandes radios musicales jeunes thématiques. Si, comme nous l'avons noté un peu plus haut pour Fun, l'effet de l'âge ne fait que s'ajouter sans s'y composer à l'effet de position sociale, pour Skyrock le modèle est plus complexe, à la fois puisqu'il y a en plus un effet propre de niveau scolaire, et puisque surtout l'effet de l'âge est modulé par la position sociale. Pour RFM et NRJ enfin, si l'âge apparaît prépondérant, la modélisation ne permet pas de suggérer d'explication satisfaisante faisant intervenir un nombre raisonnablement limité d'effets, puisque le modèle retenu est finalement le modèle saturé. Pour NRJ, radio "jeune" mais dotée d'une audience sensiblement plus large que ceux qui en sont le cœur de cible car beaucoup de panélistes y font au moins un bref passage (ce qui en fait le point nodal du "modèle jeune à vocation dominante"), cette impossibilité de trouver un modèle simple suffisamment fidèle renvoie à une certaine vocation à "ratisser large" en terme d'audience cumulée. Il faut noter quand même pour NRJ que les modèles simples intégrant l'âge, même s'ils n'atteignent jamais une fidélité satisfaisante, sont toujours nettement meilleurs que ceux qui l'excluent (c'est bien la logique d'âge qui domine, mais elle se combine de manière complexe avec les autres déterminants), et que le seul modèle qui approchait d'un peu plus près la réalité associait aux effets simples la liaison âge / position sociale. Qu'en est-il de la dernière ligne du tableau consacrée à la télévision ? Peut-être est-il utile de s'interroger au préalable sur ce que signifie la modélisation d'une pratique quasiuniverselle : dans la logique du log-linéaire qui exprime toujours des variations relatives à une situation arbitrairement prise comme référence, il est préférable de considérer qu'on modélise alors le cas de la petite minorité qui n'a pas cette pratique (ici les "rares" non téléspectateurs). Aucun modèle simple n'approche (même de loin) la signification avant un modèle comportant au moins les effets d'âge et de position sociale (mais pas de niveau scolaire) et leur très indispensable croisement. Ce modèle n'ayant quand même pas une fidélité suffisante, il suffit de tester ce qu'y ajoute l'apport du niveau scolaire comme effet simple pour disposer d'une excellente modélisation des "téléphobes"... Dans la détermination des ingrédients qui expliquent l'appartenance à la toute petite cohorte des "sans télé", il y a donc à la fois un effet propre de niveau scolaire, et un effet touchant certaines classes d'âge pour certaines CSP. P. Coulangeon a affiné cette analyse en en montrant l'effet générationnel majeur, à savoir d'appartenir aux générations les plus récemment nées, sur la probabilité d'être forts téléspectateurs de télévision (Coulangeon, 2007).


Structure des auditoires des radios : des goûts de position aux goûts de génération L'auditoire radiophonique est le groupe social défini par sa ou ses radios. Un auditoire a donc une définition minimale qui est d'ordre logique, c'est l'ensemble de tous les auditeurs ayant eu un contact avec telle radio. Ce n'est pas un "public" constitué réflexivement, mais ce n'est pas non plus un "grand public", parce qu'il n'est pas transversal. La notion d'auditoire d'une radio est statistiquement élaborée comme la relation entre une radio et une catégorie sociale d'affiliation de l'auditeur : âge, sexe, PCS, etc… Chaque auditoire peut être comparé à la structure de l'auditoire d'une autre radio et à la structure de la population de référence du Panel (c'est-à-dire à la population française des 11 ans et plus). La représentation de chaque catégorie par rapport à sa part dans la structure du Panel indique alors des "sur" ou des "sous-représentations" de chacune dans l'auditoire de chaque radio. Notons tout d'abord qu'il n'y a que d'infimes écarts entre la structure de l'échantillon représentatif de la population des plus de 11 ans et la structure de l'auditoire de la radio en général. Autrement dit, au niveau d'agrégation de tous les postes radiophoniques et de trois semaines d'écoute auquel se situe cette enquête, il n'y a pas "d'effet radio" sur le rapport des différentes catégories sociales à ce média. Dans les tableaux qui suivent nous avons mis en gras les parts de chaque catégorie supérieures à leur part dans la structure du Panel et mis en italique les pourcentages inférieurs à leur part dans la structure du Panel. Enfin, nous avons ordonné les radios selon la proximité de structure de leurs auditoires, ce qui produit dans le cas présent des effets de regroupements très suggestifs de la structuration du champ de l'audience en France. Ainsi, le tableau de la structure des auditoires radiophoniques selon l'âge laisse d'emblée apercevoir une très forte structuration des radios par cette variable. Il suffit de regarder le tableau de structure des auditoire selon l'âge pour constater que cette seule variable provoque de forts écarts de sur et sous-représentation de catégories par rapport à leur part dans la population.


Tableau 2 : Structure des auditoires radiophoniques sur 21 jours selon l'âge Skyrock

Fun radio

NRJ

MFM

Chérie Europe RTL 2 FM 2

RFM

Nostalgie

France Bleu

Sud Radio

RTL

France Info

RMC

Age moyen

28,90

31,70

32,20

39,50

38,20

36,40

36,80

40,60

42,10

45,10

47,10

47,10

45,80

47,80

48,30

52,90

50,50

51,80

11-14 Ans

16,0

11,7

10,9

6,8

5,5

4,7

4,3

4,7

4,7

4,8

2,9

3,2

2,9

3,7

2,8

2,4

1,7

1,3

6,0

15-19 Ans

22,0

18,0

14,7

8,6

8,3

9,0

8,2

5,6

5,7

6,4

4,3

4,1

4,2

5,0

4,6

2,5

3,4

2,6

20-24 Ans

14,6

14,8

13,6

9,6

11,5

14,8

14,1

8,3

7,4

6,4

4,0

5,1

6,9

4,9

6,0

3,4

4,8

Part de chaque catégorie (%) dans l'auditoire de

Europe France 1 Musique

France France Inter Culture

Panel (ref)

Total Radios

Total TV

42,40

43,20

6,2

5,8

7,6

7,8

7,7

5,3

7,3

7,5

7,4

25-29 Ans

7,3

9,9

9,9

7,7

9,0

11,4

11,3

7,8

6,1

5,1

5,6

4,8

6,3

4,4

4,7

3,4

3,9

4,5

6,7

6,9

6,4

30-34 Ans

9,3

9,2

11,4

10,6

11,4

13,2

12,9

11,5

10,5

8,3

7,9

8,3

9,4

7,3

8,5

5,0

7,5

6,6

9,4

9,6

9,2

35-39 Ans

6,8

7,9

9,9

9,1

11,1

11,3

11,4

12,3

11,0

9,8

11,3

10,1

10,8

8,5

7,8

6,8

7,6

7,0

9,4

9,6

9,4

40-44 Ans

7,5

7,6

8,7

10,1

10,1

8,3

9,5

11,3

11,0

9,2

8,1

10,0

9,2

9,7

8,6

8,1

8,9

8,4

8,7

8,9

8,7

45-49 Ans

4,6

4,5

5,8

7,4

7,8

6,3

6,1

8,3

9,5

7,7

10,7

8,3

7,7

7,6

7,6

7,1

7,8

7,5

6,9

7,0

7,0

50-54 Ans

4,0

5,7

5,6

8,9

8,6

6,2

7,0

11,3

11,3

9,9

9,8

11,4

9,6

10,6

10,5

11,8

11,9

10,4

8,8

8,9

8,8

55-59 Ans

1,8

1,8

3,3

5,7

4,2

3,2

4,1

4,9

6,2

6,1

7,1

7,9

6,4

9,5

7,1

8,3

7,1

7,4

5,6

5,5

5,7

60-64 Ans

1,7

2,7

1,9

4,6

3,5

2,6

3,0

4,3

5,0

5,9

6,7

5,9

6,3

5,5

6,8

9,0

6,8

7,2

5,1

4,9

5,3

65-69 Ans

2,3

2,5

2,1

4,7

4,1

3,5

3,2

4,8

5,4

8,9

11,1

9,5

8,9

9,9

10,0

12,7

11,6

13,1

7,7

7,3

7,9

70-74 Ans

1,1

2,3

1,4

3,1

3,0

2,9

3,4

2,8

4,1

6,2

6,9

6,5

6,4

7,2

7,3

9,8

8,7

8,4

5,7

5,3

5,7

75 Ans et +

1,1

1,5

0,9

3,1

2,0

2,7

1,3

2,3

2,4

5,3

3,8

5,0

5,0

6,2

7,7

9,7

8,2

10,4

5,2

4,7

5,2

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Source : Panel Radio Médiamétrie 2000-2001/Clersé-Ifresi ; Champ : Univers des 11 ans et plus. Base : Auditeurs. Sont surlignés en gras les % de chaque catégorie supérieurs à leur part dans la structure du Panel (i. e. échantillon représentatif de la population des 11 ans et plus) et sont mis en italique les % inférieurs à leur part dans la structure du Panel. Nota : Nous avons conservé la structure de la population des 11 ans et plus (structure du Panel) plutôt que la structure sociale des auditeurs de radio en général, de façon à "accuser" la part des "absents" au média radio.

Très manifestement, la composition générationnelle des auditoires différencie fortement les radios en quatre "types" très disjoints : radios d'adolescents et jeunes adultes, radios de trentenaires, radios des âges intermédiaires (35-45) et radios des plus de 45 ans. Les radios généralistes (RTL, France Inter, Europe 1 et RMC) ne sont "généralistes" que de contenu, certainement pas de public. Elles sont tout autant media de niches que NRJ ou Skyrock. Et si FIP est la radio la plus "généraliste" musicalement parlant (Glevarec, 2005b ; 2008), France Bleue est le réseau le plus "généraliste" quant à la composition de son auditoire. L'expression "radio généraliste" est un abus de langage chaque fois qu'elle laisse entendre par là qu'elle a un public plus généraliste que les autres radios, le plus généraliste. Si l'on entend par "généraliste" un public le plus proche de la structure de la population française, seule définition véritablement sensée, alors – sous l'angle de l'âge - France Inter est par exemple moins généraliste que France Info. Skyrock, Fun Radio et NRJ forment le trio des radios "jeunes". Comme l'analyse des modèles

nous

l'a

montré

précédemment,

NRJ

a

cependant

un

auditoire

plus


transgénérationnelle que Skyrock, qui apparaît véritablement la radio des adolescents. Il y a ensuite un second ensemble de radios, comprenant MFM, Chérie FM, Europe 2, Nostalgie, RFM et RTL 2 ; ce sont des radios où les jeunes adultes et une partie des quarantenaires sont surreprésentés. Les locales de France Bleu, Sud radio, RTL, France Info et RMC, qui forment un troisième ensemble, ont des auditoires relativement proches du point de vue de la composition générationnelle, comprenant une surreprésentation des 35-55 ans. Leur auditoire possède aussi une part élevée d'auditeurs âgés de plus de 55 ans. Enfin, le quatrième grand ensemble de radios dont les auditoires ont des profils semblables comprend des radios généralistes et/ou de service public : Europe 1, France Inter, France Musique et France Culture. Ces radios possèdent une surreprésentation des individus âgés de plus de 45 ans, davantage encore des plus de 65 ans, et une sous-représentation forte des catégories jeunes. La seule radio "nationale" qui soit la plus isomorphe de la population française est le réseau des radios locales dit "France Bleue" de Radio France. Cette caractéristique tient au fait qu'elle n'est justement pas une radio nationale et que - donc - sa composition tient à ce qu'elle réussit à agréger des auditeurs jeunes en tant que "locale" et des auditeurs plus âgés Ce tableau nous en dit beaucoup sur la structuration du monde radiophonique et d'une certaine manière sur le monde social. Il renforce la très forte structuration de l'audience radiophonique par l'âge indiquée par la modélisation. Du point de vue de l'âge toujours, il indique assez clairement, à travers ses sous-représentations, les radios et les auditoires qui ne se "rencontrent" pas. On voit ainsi très bien comment les trentenaires et quarantenaires n'ont aucune radio "généraliste" quant au contenu qui leur corresponde. A l'inverse, les plus de 45 ans n'ont, en dehors de Nostalgie et de France Musique, aucune radio nationale de musique actuelle qui leur réponde

11

. Du point de vue du marché radiophonique, ce fait est autant un

résultat qu'une construction. Tant que Nostalgie satisfait et/ou n'a pas de concurrent musical sur ces tranches d'âges, elle recueille logiquement un assentiment par goût et par défaut. Le clivage selon l'âge renvoie à une différenciation très forte des radios selon leur genre, musicales ou "parlées". De l'un à l'autre, le clivage est très net, et tout se joue autour de 45 ans, véritable clivage radiophonique et générationnel. En 2000, la génération des individus nés entre 1950 et 1960 est au cœur d'un changement de radios.

11 Si l'hypothèse d'une structuration identique du champ de l'audience radiophonique suisse est vérifiée, on comprend alors que les responsables de la radio musicale jeune du service public, Couleur 3, envisage dorénavant d'en faire une "généraliste".


Que signifie la composition sociale des pratiquants d'une activité ou des consommateurs d'un produit ? C'est une image relative (le choix des poids relatifs nous semble ici préférable) mise en rapport d'une autre représentation (l'échantillon établi comme représentatif d'une population-source). L'écart entre les deux permet de qualifier non plus des affinités particulières entre une catégorie et une radio, mais une image sociale d'une radio. Dire que France Inter est une radio où les plus de 40 ans sont surreprésentés ce n'est pas seulement dire que ces catégories ont une affinité certaine avec cette radio (ce que dit le taux de pénétration mieux encore) mais surtout que France Inter est une radio des plus de 40 ans (ou des retraités, des professions intellectuelles). Ceux-ci définissent la "capacité" que la radio a de les avoir dans son auditoire par rapport à une autre situation de hasard (ou de stricte équiprobabilité).

Une accentuation de l'âge en terme de durée d'écoute Mais le tableau de structure par l'âge est une représentation en partie biaisée d'une pratique qui se caractérise par des investissements en durées d'écoute variables selon les auditeurs. C'est pourquoi dans le graphique n°1 nous avons mis en regard de la structure des auditoires des différentes radios la structure de leur écoute. Deux types de quartiles des âges ont été calculés pour chaque radio. Dans les deux cas, la procédure considère les auditeurs (au sens de la population constituant l'audience cumulée de la radio) rangés par âge croissant. La barre de gauche de chaque graphique correspond directement aux quartiles d'âge des effectifs : on cherche les âges limites en dessous desquels il y a respectivement 25 % (Q1), 50 % (Q2, médiane), 75 % (Q3) des effectifs d'auditeurs. La barre de droite s'appuie sur les calculs de cumuls de temps d'écoute des auditeurs (chaque personne compte "pour sa consommation") : les quartiles correspondent aux âges limites en dessous desquels il y a respectivement 25 % (Q1), 50 % (Q2), 75 % (Q3) de l'écoute cumulée. Cette deuxième manière de calculer les quartiles rend directement compte de la structure de ceux qui sont "derrière le poste" à un instant moyen. La première traduit fidèlement la structure par âge de ceux qui sont en contact – même peu souvent – avec la radio. Par exemple, s'il faut aller jusqu'à 39 ans pour avoir les 3/4 des auditeurs de Skyrock, il suffit d'aller jusqu'à 23 ans seulement pour cumuler les 3/4 de l'écoute.


Graphique 1 : Structures par âge de l'auditoire et de l'écoute des radios

Source : Panel Radio Médiamétrie 2000-2001/Clersé-Ifresi ; Champ : Univers des 11 ans et plus. Base : Auditeurs. Lecture : 3/4 des auditeurs de Skyrock ont moins de 39 ans, tandis qu'il suffit d'aller jusqu'à 23 ans seulement pour avoir les 3/4 de l 'écoute.

On voit sur le graphique que pour les "radios jeunes", la deuxième barre de quartiles est tirée vers le bas, et inversement pour les radios à public plus âgé : les "noyaux durs" d'auditeurs fidèles sont plus jeunes pour les radios jeunes, et inversement, confirmant que les auditeurs éloignés du profil d'âge type sont plus souvent de "petits auditeurs". Skyrock par exemple a un noyau dense de moins de 20 ans mais recrute aussi des trentenaires – mais qui


sont plus souvent des "occasionnels". La bascule se fait autour de Europe 2 et RTL 2, radios musicales de jeunes adultes pour lesquelles la prise en compte de la consommation ne modifie que peu la médiane d'âge. En résumé, prendre le volume de consommation comme variable descriptive de l'auditoire des radios accroît considérablement les écarts de générations entre les radios par rapport au simple comptage de leurs effectifs.

Le faible poids du genre et les radios du compromis familial Le champ de la radio n'est pas fortement structuré par le sexe des auditeurs, constat qui a légitimé un peu plus haut nos choix des variables pour la modélisation. La tendance est seulement à une légère surreprésentation des hommes. Toutefois, trois radios sont plus typiquement marquées par le genre : tendanciellement, France Info et Sud Radio sont masculines (il faudrait ajouter ici la radio Rire et chansons dont les données sont agrégées à la catégorie "autres radios" dans l'enquête Panel de 2000-2001) et Chérie FM une radio féminine. Tableau 3 : Structure des auditoires radiophoniques sur 21 jours selon le sexe Chérie FM

NRJ

RFM

Nostalgie

MFM

France Bleu

RTL

RTL 2

France Culture

Fun radio

Skyrock Europe France 2 Musique

RMC

France Europe France Inter 1 Info

Sud Structur Radio e du Panel

Total radio

Total TV

Part de chaque catégorie (%) dans l'auditoire de Sexe Femmes

54,1

52,6

50,9

50,7

50,4

50,2

49,6

49,1

49,0

49,0

48,7

48,2

48,1

48,0

47,3

44,7

41,7

38,3

51,5

51,0

51,7

Hommes

45,9

47,4

49,1

49,3

49,7

49,9

50,4

50,9

51,0

51,0

51,3

51,8

51,9

52,0

52,7

55,3

58,3

61,7

48,5

49,1

48,3

Auditoire

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Source : Panel Radio Médiamétrie 2000-2001/Clersé-Ifresi ; Champ : Univers des 11 ans et plus. Base : Auditeurs.

L'appariement des auditoires selon la part relative qu'y représente chaque PCS dessine un monde quadripartite : 1. les radios musicales jeunes et populaires ; 2. les radios musicales populaires et de classe moyenne ; 3. les radios locales et généralistes populaires et d'inactifs ; 4. les radios généralistes et thématiques de cadres et de retraités.


Tableau 4 : Structure des auditoires radiophoniques sur 21 jours selon la PCS de l'individu NRJ

Fun Skyroc RTL 2 Europe Chérie MFM radio k 2 FM

RFM

Nos- France Sud talgie Bleu Radio

RTL

RMC France France Europe France France Structur Total Total Culture Inter 1 Info Mue du Radios TV sique Panel

Agriculteurs

1,0

0,5

0,2

0,5

0,4

1,0

1,1

1,0

1,2

1,7

3,4

1,3

1,3

1,3

1,3

0,8

0,6

0,9

1,2

1,2

1,2

Retraités

5,6

7,4

5,3

9,1

10,5

10,8

13,3

12,6

14,5

23,5

28,1

23,5

24,8

33,4

30,9

28,1

23,7

34,9

20,8

19,6

21,2

Artisans et commerçants

2,3

1,8

1,5

2,5

1,7

2,5

3,2

3,8

3,8

2,8

2,4

3,5

3,8

3,0

3,9

3,7

3,3

3,4

2,9

2,9

2,9

Cadres et Prof libérales

4,7

4,9

3,9

8,7

8,5

7,2

6,2

9,5

7,2

5,3

7,2

7,5

7,6

12,2

13,0

9,6

12,9

13,3

6,9

7,1

6,6

Prof Intermédiaires

9,4

8,8

7,2

13,1

13,4

11,7

12,6

13,3

12,5

10,9

11,4

11,6

12,0

13,8

15,2

12,1

15,3

12,8

10,3

10,6

10,2

Employés

16,9

14,5

13,3

17,4

16,2

18,5

16,5

18,5

17,6

14,4

15,0

16,2

12,8

10,6

10,4

11,7

11,8

9,7

15,3

15,5

15,2

Ouvriers

17,9

15,7

14,7

17,7

17,3

16,1

17,1

16,1

18,0

15,3

16,6

15,6

13,1

8,2

8,4

12,3

11,5

7,8

14,3

14,6

14,3

Etudiants

24,0

28,5

31,6

19,0

19,7

17,1

15,2

11,9

11,2

11,5

7,6

7,6

9,3

7,0

7,0

9,3

10,2

4,7

13,0

13,4

13,1

Autres Inactifs

18,2

17,9

22,3

12,1

12,3

15,1

14,8

13,5

13,9

14,6

8,3

13,2

15,2

10,6

9,9

12,4

10,7

12,7

15,4

15,3

15,3

Auditoire

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Part de chaque catégorie (%) dans l'auditoire de PCS de l'individu

Source : Panel Radio Médiamétrie 2000-2001/Clersé-Ifresi ; Champ : Univers des 11 ans et plus. Base : Auditeurs.

D'un point de vue général, tout laisse penser qu'avoir engagé des études supérieures (audelà du baccalauréat) provoque une forte rupture dans le choix des radios écoutées par rapport aux catégorie de niveau de diplôme inférieur. De surcroît, le niveau de diplôme dissimule ici encore la variable de l'âge puisque l'effectif des détenteurs de niveau scolaire primaire augmente avec l'âge, d'où l'intérêt de notre approche préalable "toutes choses égales d'ailleurs" par les modèles. Dans le champ de l'audience radiophonique, diplôme et âge autorenforcent leurs effets. On ne voit jamais aussi bien qu'à l'aide du tableau de la structure des auditoires selon le diplôme le grand écart sociologique qui caractérise Europe 1 sur ce point. Tableau 5 : Structure des auditoires radiophoniques sur 21 jours selon le niveau de diplôme RTL

France Bleu

RMC

Europe 1

MFM

Sud Radio

Nostalgie

RFM

Primaire

17,1

16,8

Tech./Prof.

23,1

23,2

Secondaire

35,0

Supérieur Auditoire

Europe RTL 2 Skyrock 2

16,1

15,1

12,3

13,9

13,1

10,4

7,4

8,8

5,4

22,5

18,6

25,0

25,6

25,3

25,3

22,3

21,8

20,6

36,1

36,7

33,7

36,8

31,1

34,7

34,2

33,6

33,9

50,4

24,6

23,9

24,6

32,2

25,6

29,1

26,7

30,1

36,5

35,3

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

NRJ

Fun radio

Chérie FM

France Inter

France Musique

France France Structur Info Culture e du Panel

Total radio

Total TV

7,3

6,8

10,0

12,9

11,9

9,1

12,7

23,9

22,0

22,1

16,0

15,3

17,2

14,9

14,9

13,9

15,1

21,4

21,7

42,5

43,5

38,0

30,7

32,3

32,2

21,6

30,5

37,0

37,2

23,5

26,1

27,7

29,7

40,1

40,1

37,1

41,3

41,6

26,5

27,0

100

100

100

100

100

100

26,1

100

100

100

100

100

Part de chaque catégorie (%) dans l'auditoire de Niveau instruction

Source : Panel Radio Médiamétrie 2000-2001/Clersé-Ifresi ; Champ : Univers des 11 ans et plus. Base : Auditeurs. NB : 0,2 % des individus du Panel ont refusé de répondre à cette question.

Les radios généralistes et/ou de service public se différencient assez nettement des radios musicales sous l'angle de la structure de leur auditoire au foyer. L'âge des auditeurs joue ici le


rôle de variable cachée puisque dès trois personnes, l'essentiel des personnes supplémentaires sont des enfants, ce qui tend à tirer les auditoires vers les radios musicales. C'est ce qu'indique le tableau n°6 sur le nombre de personnes au foyer. Tableau 6 : Structure des auditoires radiophoniques sur 21 jours selon le nombre de personnes au foyer France France Culture Musique

France Europe Inter 1

RMC

France Info

Sud radio

RTL

France Bleu

Nostalgie

RFM

Europe 2

MFM

Chérie FM

RTL 2

Fun radio

NRJ

Skyrock Structur e du Panel

Total radio

Total TV

Part de chaque catégorie (%) dans l'auditoire de Nb de personnes du foyer 1 personne

22,4

20,1

18,6

16,5

15,8

15,4

12,9

14,8

13,5

12,7

13,9

13,1

12,8

13,0

13,8

9,7

9,3

7,0

14,8

14,3

14,6

2 personnes

38,5

41,4

38,3

36,4

34,2

34,6

37,1

35,3

32,3

28,7

27,5

26,6

26,1

26,0

25,6

21,2

20,1

19,7

30,6

30,1

30,6

3 personnes

14,1

13,3

16,6

17,9

18,6

17,5

21,6

19,1

18,1

20,6

18,3

21,2

19,8

20,2

22,6

21,9

22,1

21,7

19,4

19,6

19,5

4 personnes

15,7

14,8

15,5

16,6

17,2

19,3

19,4

18,7

21,3

22,1

24,0

23,9

23,8

24,1

22,3

26,3

27,3

26,3

20,3

20,8

20,5

5 personnes et plus

9,5

10,5

11,0

12,6

14,1

13,3

9,0

12,1

14,8

15,9

16,4

15,3

17,5

16,8

15,6

21,0

21,2

25,4

15,0

15,2

14,8

Auditoire

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Source : Panel Radio Médiamétrie 2000-2001/Clersé-Ifresi ; Champ : Univers des 11 ans et plus. Base : Auditeurs.

Notons ici deux traits forts : le lien qui semble unir France Culture et le fait d'être auditeur seul et celui qui lie France Musique au couple de personnes. Quelque chose d'une France Culture "briseuse de solitude" est fortement confirmée par la structure et la pénétration de la catégorie de personnes seules dans son auditoire (Glevarec et Pinet, 2007b). Un lien associe fortement les radios de service public à des auditeurs refusant (on peut le supposer fortement) la télévision. Associé à une solitude au foyer, c'est un "lien social" qui se donne à voir ici sous la forme sans doute d'un individualisme cultivé (lié éventuellement à des âges très différents, retraités ou actifs jeunes). Une façon complémentaire de lire le tableau de "structure familiale" des radios consiste à voir dans l'opposition entre radios thématiques pour personne seule (France Culture, France Musique) et radios musicales jeunes (Skyrock, NRJ) une propension plus ou moins forte des radios au compromis familial.

Conclusion : composition des effets sociologiques et lecture générationnelle du monde médiatique Dans notre analyse, nous avons montré que le choix des radios nationales du Panel est, lui aussi, un choix déterminé en premier instance par l'âge, puis par le diplôme. Cette structuration par l'âge s'explique par le rôle des radios de format qui se sont articulées depuis


les années 1980 en France aux générations, puis plus précisément encore aux "générations culturelles" à travers les styles musicaux d'époques différentes. On pourrait penser alors que, dans le cas de la radio, la structuration en âges est un effet de l'offre. Or, cet effet est aussi présent dans les goûts musicaux comme nous venons de le rappeler. En 2000 et 2001 l'ancien duopole radios privées / radios publiques a laissé la place à un monde bipolaire, où les radios jeunes musicales se distinguent des radios âgées généralistes. L'âge et la génération sont les facteurs centraux de structuration de ce monde médiatique puisque la correspondance entre un âge et des ensembles de radios est la plus forte corrélation qui soit. Nous avons vu que la prise en compte de la durée d'écoute accentue encore sa valeur. Si, au demeurant, les modèles montrent que l'effet de l'âge se compose souvent avec celui du niveau d'éducation ou de la catégorie socio-professionnelle, il s'agit alors d'échapper à la caricature inverse à celle de l'affinité sociale au principe de la théorie de l'habitus que serait un modèle de l'affinité d'âge (ou de génération, ce qui est, ceci étant, une hypothèse en soi des plus fortes). Autant dire que la "composition" est ici la meilleure analyse une fois mentionnée la valeur première de l'âge. Du coup, les radios françaises "généralistes" ont tout du mythe, en ce sens que de "généraliste" les radios ainsi dénommées, RTL, RMC, Europe 1, France Inter, Sud radio, n'en ont sans doute plus que le "texte" et non le "lectorat", pour reprendre les catégories des chercheurs anglo-saxons sur les médias (Morley, 1980 ; Moores, 1990). On note que le champ de l'audience radio reflète une situation générationnelle tout à fait notable, à savoir que deux groupes générationnels semblent avoir trouvé leur radios : les moins de 25 ans avec les radios musicales jeunes (Glevarec, 2005b) et les cinquantenaires avec les radios dites "généralistes". Trentenaires et quarantenaires n'ont pas, en France, leurs radios, et celle qui leur correspond le moins mal, à savoir Nostalgie, est une radio dont la programmation est appuyée sur le patrimoine musical. Les trentenaires et quarantenaires en 2000 n'ont pas de radios "généralistes" pour lesquelles on puisse reconnaître une affinité catégorielle marquée. Tout porte ainsi à la lecture générationnelle du monde contemporain de la radio et au constat d'une forme "d'absence médiatique" de deux générations entières.


Annexes L'enquête Panel de Médiamétrie sur 21 jours L'enquête dite Panel de Médiamétrie est une enquête par carnet d'écoute sur trois semaines auprès d'un échantillon représentatif de la population française. Il est demandé aux gens de remplir un carnet d'écoute hebdomadaire (renvoyé à la fin de chaque semaine) qui croise en ligne la journée divisée en quarts d'heure et en colonne 18 radios nationales, les locales de Radio France, celles du groupement des Indépendants et de IP France 12, Radio Classique (d'après leur audience quand elle est significative selon les Médialocales urbaines de Médiamétrie), et les "autres stations" entendues dans la région de l'enquêté. La base de données exploitée comprend, elle, 18 stations nationales et les locales de Radio France ("nationalisé" en une catégorie unique "France bleu") et une catégorie "autres radios" constituée essentiellement des radios locales. Le carnet d'écoute est décliné en 16 zones "régionales" et il fait l'objet d'une permutation circulaire des radios de façon à ce que l'ordre dans la disposition graphique des radios ne privilégie aucune radio. En fonction des réponses incomplètes sur 21 jours, le panel constant d'individus est redressé selon les variables de sexe, d'âge, de profession et de région (Tassi, 2005: 22-25). En 2000 et 2001, 9 985 individus ont remplis ce carnet auto-administré sur toute la durée de 23 jours. L'enquête a été menée en deux vagues : une première du 9 au 29 octobre 2000, une seconde du 15 janvier au 4 février 2001. Les deux périodes sont ensuite compilées pour former trois semaines moyennes. A la différence de la "126 000" 13, l'autre enquête menée en continue par Médiamétrie, qui consiste à interroger par téléphone tout au long de l'année environ 126 000 individus sur leur écoute de la veille, l'enquête "Panel" sur 21 jours comprend moins de personnes enquêtées et une méthodologie qui a aussi ses limites, mais possède le très grand avantage d'être une enquête saisissant la pratique temporelle de mêmes individus. De plus, son échantillon de près de 10 000 personnes est suffisamment grand pour permettre des tris fins sur des audiences ou des auditoires de faible taille. Pour une discussion sur la notion d'audience et la mesure d'audience, nous renvoyons à (Glevarec, 2007).

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IP France est la régie publicitaire de RTL, RTL2, Fun Radio, Sud Radio, Wit FM et MFM. Ex-"75 000 +", devenue depuis la vague 2004-2005 la "126 000".


Tableau 7 : Catégories et format des radios françaises nationales du Panel Médiamétrie

Radios Chérie FM Europe 1 Europe 2 Locales de Radio France - France Bleu France Culture France Info France Inter France Musique(s) Fun radio MFM Nostalgie NRJ RFM RMC RTL RTL 2 Skyrock Sud Radio

Date de création 1987 1955 1986 1980 1963 1987 1947 1963 1985 1983 1984 1981 1981 1943 1931 1995 1986 1966

Statut juridique radio privée radio privée radio privée service public service public service public service public service public radio privée radio privée radio privée radio privée radio privée radio privée radio privée radio privée radio privée radio privée

Catégorie de service (CSA) C ou D E C ou D

C ou D C ou D C ou D C ou D C ou D E E C ou D C ou D B

Format (CSA)

Cible (CSA)

Régie publicitaire

Musicale Généraliste Musicale Adulte Thématique (culture) Thématique (info) Généraliste Thématique (musique) Musicale Musicale Musicale Musicale Musicale Généraliste Généraliste Musicale Musicale Généraliste

Adulte (25-50 ans) Généraliste Jeune adulte (25-34 ans) Adulte Thématique Thématique Généraliste Thématique Jeune (15-24 ans) Adulte (40 ans et +) Adulte (35-49 ans) Jeune (15-34 ans) Adulte (35-49 ans) Généraliste Généraliste Jeune adulte (25-34 ans) Jeune (15-24 ans) Généraliste

NRJ Régies Lagardère Active Publicité Lagardère Active Publicité Radio France Publicité Radio France Publicité Radio France Publicité IP IP NRJ Régies NRJ Régies Lagardère Active Publicité RMC Régie IP IP Skyrégie IP

Source : Clersé-Ifresi/CSA (www.csa.fr), 2004 Légende des catégories de service : A : radios associatives ; B : stations locales indépendantes et commerciales ; C : stations locales ou régionales affiliées à des réseaux nationaux ; D : stations qui reprennent le signal des réseaux thématiques nationaux ; E : radios généralistes nationales, Europe 1, RTL et RMC Info.


Références

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LA RADIODIFFUSION A MADAGASCAR ET SON CADRE REGLEMENTAIRE : LES CAS DE LA « RNM » ET DES STATIONS LOCALES PRIVEES

Solange RAZAFIMBELO-BRUYERON Doctorante au CARISM/IFP - Université Paris II, en co-direction avec le Département d’Histoire de l’Université d’Antananarivo courriel : s.razafimbelo_bruyeron@yahoo.fr adresse : 6, rue Régley – 93220 Gagny (France)

RESUME La profusion actuelle des radios à Madagascar est une réalité qui s’explique certainement par l’importance des services qu’elles offrent et des missions parfois vitales qu’elles assurent auprès de la population. Mais ce foisonnement ne peut plus être interprété naïvement comme la manifestation d’une liberté retrouvée, après des années de censure et trois décennies de monopole étatique dans le domaine de l’audiovisuel. En regardant de près, l’ensemble renvoie l’image d’un certain « capharnaüm radiophonique » généralisé où les dirigeants sont en partie responsables – voire complices. Tant que la loi n’est pas scrupuleusement respectée par les opérateurs et les professionnels du privé et que le pouvoir ne fait pas montre d’une volonté politique réelle pour jouer jusqu’au bout son rôle, il sera toujours difficile de garantir un cadre serein de développement des radios et de les rendre plus professionnelles à Madagascar. Et cela d’autant plus que leur survie est souvent menacée par des problèmes économiques chroniques auxquels s’ajoute, selon les chaînes, une forte politisation de la radio : les chaînes locales privées comme la RNM en sont toutes concernées. RESUMEN La profusión actual de radios en Madagascar es un hecho que ciertamente se explica por la importancia de los servicios que ofrecen y por el papel, a veces vital, que desempeñan para la población. Pero esa abundancia no puede interpretarse ingenuamente como la manifestación de un reencuentro con la libertad, tras años de censura y tres décadas de monopolio del estado en el ámbito audiovisual. Si se mira más de cerca, el conjunto parece un desbarajuste radiofónico generalizado, en el que los dirigentes son en parte responsables, y hasta cómplices. Mientras que los operadores y los profesionales del sector privado no respeten escrupulosamente la ley y el poder no muestre una voluntad política real y cumpla su papel completamente, siempre será difícil garantizar un marco sereno de desarrollo de las radios en Madagascar y hacerlas más profesionales. Máxime teniendo en cuenta que su supervivencia suele verse amenazada por problemas económicos crónicos, a los que se añade una fuerte politización de la radio, algo que afecta a todas las cadenas locales privadas, como la RNM. ABSTRACT The multiplication of radios in Madagascar nowadays is a reality which certainly can be explained by the relevance of the services offered by those radios and by the their function

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towards the population. However the service offered by those radios can’t be naively interpreted as an action of reconnection with freedom, after years of censorship and tree decades of monopoly of the state in the production of sound and video in Madagascar. If observed closer, this scenery refers to a generalized problem in the country, in which the radio managers are, in certain measure, responsible and partners of this system. This way, the technicians and professionals of the private sector violate the law and the public power doesn’t show real political will to make this media perform as it should. Without this, it will always be hard to guarantee a coherent development to the radios from Madagascar and to turn them more professionally qualified. We consider that their survival is continuously threatened by chronical economic problems, to which can be added a strong association between radio and politics (in an electoral way), thing that affects all the private local networks, as the RNM. RESUMO A proliferação atual de rádios em Madagascar é uma realidade que certamente se explica pela importância dos serviços que essas oferecem e pelo papel, às vezes vital, que desempenham para a população. Mas essa prestação de serviço não pode ser interpretada ingenuamente como a manifestação de um reencontro com a liberdade, após anos de censura e três décadas de monopólio do Estado no âmbito do audiovisual malgache. Se observado mais de perto, esse cenário remete a um desajuste radiofônico generalizado, no qual os dirigentes são em parte responsáveis e, em certa medida, cúmplices desse sistema. Assim, os operadores e os profissionais do setor privado não respeitam escrupulosamente a lei e o poder público não demonstra vontade política real para fazer com que esses meios de comunicação cumpram seu papel completamente. Sem isso, sempre será difícil garantir um marco coerente de desenvolvimento das rádios em Madagascar e tornando-as mais profissionais. Consideramos que sua sobrevivência é constantemente ameaçada por problemas econômicos crônicos, aos quais se somam uma forte politização (no sentido partidário) da rádio, algo que afeta todas as cadeias locais privadas, como a RNM.

Introduction

La radio connaît un développement sans précédent à Madagascar depuis la libération des ondes en 1992. Aujourd’hui, la DIRM (Direction de l’Information et de la Régulation des Médias), une direction au sein du MTPC (Ministère des Télécommunications, de la Poste et de la Communication) en charge des radios et télévisions privées à Madagascar, fait état de 240 radios1. Cette prolifération des radios distingue la Grande Île de certains de ses voisins africains où les chiffres sont moins élevés tel au Congo qui ne compte que « plus de 100

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« Synthèse synoptique des stations de radios et télévisions existantes à Madagascar »,MTPC/SG/DIRM/CSCA, deuxième semestre 2005, Antananarivo, 14 novembre 2005.

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stations de radios privées »2 tandis qu’au Zimbabwe3, celles-ci ne sont pas autorisées. Trois entités se partagent le paysage radiophonique malgache actuel : le réseau des radios d’Etat RNM (Radio Nasionaly Malagasy), détenant encore aujourd’hui l’exclusivité de la diffusion nationale ; quelques stations internationales dont les plus effectives sont RFI (sur une dizaine de sites) et la BBC (dans la capitale) ; et enfin, les stations locales privées. La première radio privée RFV (« Radio Feon’ny Vahoaka »)4 est née à Antananarivo en 1991, après soixante ans de monopole de la radio d’Etat5 sur le territoire national. Sa création s’est faite au lendemain de l’annonce de l’abolition de la censure qui est une promesse électorale du président sortant de l’époque, Didier Ratsiraka, en 19896. Mais cette fin de la censure n’a été officialisée qu’en 1992 avec la dérégulation. La RFV voit le jour au cœur d’un vaste mouvement de protestation populaire exigeant le changement de la Constitution et demandant le départ du président de l’époque, Didier Ratsiraka, maintenu au pouvoir depuis une quinzaine d’années. La station acquit sa légitimité en diffusant quotidiennement les discours politiques des leaders de l’opposition qui se relayaient sur le podium de la place du « 13 mai »7 ainsi que les témoignages de quelques militants arrivant des provinces. En réalité, l’enjeu est d’« équilibrer » les informations diffusées par la RNM, alors entièrement acquise à la cause du président Didier Ratsiraka. De cette manière, la petite FM artisanale privée qui rayonnait à peine sur une trentaine de kilomètres, a permis à certains habitants de la capitale qui ne pouvaient se rendre au meeting populaire de suivre au jour le jour les événements et les programmes de la manifestation. La RFV s’est donc inscrite dès le départ, dans un rôle politique en appuyant le mouvement. De manière générale, la radio prend une part importante dans le quotidien des Malgaches car elle constitue une source d’information primordiale : plusieurs régions de 2

« Les médias publics face à la prolifération des chaînes privées », de Flory Ngono et Rose lukano, extrait de « République démocratique du Congo : les médias sur la voie de la restructuration », co-publication hors-série d’Africentr@lemedias et des Cahiers des médias pour la paix, éd. Institut Panos Paris, p.18, Mars 2004. 3 « Renegotiating Tradition on Radio Zimbabwe », communication de Winston Mano, University of Westminster, London, à l’Université internationale d’été de la radio à Sienne (Italie), juillet-août 2004. 4 Radio voix du peuple. 5 Le poste colonial (1931-1960) fut le premier poste dans l’île. Il est remis entre les mains de la nouvelle administration malgache à l’indépendance du pays en 1960. Et depuis, la chaîne publique de l’Etat a régné seule sur le territoire national jusqu’au début des années 1990. 6 Une promesse officialisée seulement le 21/12/1990, in « Problème d’objectivité dans la presse écrite malgache. Cas des quotidiens Midi Madagasikara et Madagascar Tribune », Mémoire de Maîtrise en journalisme de Soavelo F. Solange, Université d’Antananarivo, 1996-1997. 7 La place symbolise le lieu d’une importante et tragique grève des étudiants en médecine en 1972 devenu depuis un lieu symbolique de protestation sociale. Initialement, c’est à cet endroit que se trouva l’Hôtel de Ville, incendié au cours de cette grève.

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l’île reçoivent à peine les journaux et le plus souvent, quand elles en reçoivent, c’est souvent avec des jours de retard faute de route et de réseau professionnel de distribution. Ce succès de la radio tient probablement du fait que le journal parlé tient une place importante dans la grille, aussi bien à la RNM que dans ces chaînes locales privées : c’est un des rares modules programmés invariablement et quotidiennement. Il est suivi régulièrement par les auditeurs. La particularité de la radio à Madagascar repose sur l’usage intensif du malgache car plus de 90% des programmes sont diffusés dans la langue nationale aussi bien sur les ondes du réseau national que dans les chaînes privées. Une poignée de stations seulement, localisées dans la capitale d’ailleurs, diffusent quelques émissions en langue française - une des trois langues officielles de Madagascar8. En comparaison avec la presse locale, les plus grands quotidiens par exemple sont souvent bilingues (français / malgache) et les pages en langue malgache n’obtiennent qu’une portion congrue de l’édition. Par ailleurs, les radios privées ne pouvant faire qu’une diffusion locale, en FM, proposent une programmation de proximité qui assure souvent une fonction utilitaire avec des sujets touchant de près le quotidien des auditeurs. Et enfin, on peut avancer que le succès de la radio, dans un pays comme Madagascar où 85% de la population vivent avec moins de US2$ par jour9 (PNUD), repose également sur son coût peu élevé par rapport à la presse écrite. En effet, un quotidien s’achète autour de 500 Ariary (0,2 €) à Madagascar, alors que la rémunération minimum « officielle » est de 32 € par mois : un journal représente donc un budget de 16% par mois sur ce salaire.

1. Le cadre réglementaire La loi n°90/031 du 21 décembre 1990 régit la communication audiovisuelle. De manière générale, le contexte juridique des médias est assez permissif à Madagascar : les démarches administratives ne sont pas particulièrement contraignantes et les demandes sont rarement refusées. Le Code de la communication confirme cette liberté d’entreprendre dans son article 13, selon lequel : « Toute personne physique ou morale de nationalité malagasy ou de nationalité étrangère, résidant sur le territoire national, a le droit d'émettre et de recevoir, d'entreprendre, de créer des services de communication. » Tandis que l’ordonnance n°92/039 du 14 septembre 1992 sur la communication audiovisuelle réitère dans son article 4 que : 8

Le trilinguisme (malgache, français et anglais) malgache est institué par la nouvelle Constitution, votée au dernier référendum du 4 avril 2007 durant le régime du président Marc Ravalomanana. Néanmoins, il faut souligner que très peu de Malgaches parlent le français et l’anglais. 9 <http://www.snu.mg/new/sites/pnud/article.php?article_id=769&lang=fr>, consulté le 24/08/2009.

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« Les médias audiovisuels dûment autorisés apprécient, en toute indépendance, l’opportunité d’émettre toute opinion, tous signes, signaux, écrits, images, sons ou messages de toute nature, et de rapporter publiquement tout fait et événement. … ». Cette ordonnance mentionne aussi le cahier des charges, le code de déontologie du journalisme ainsi que la charte du journaliste et des professionnels du secteur à Madagascar. En outre, elle définit les rôles des instances, sensées coordonner les activités audiovisuelles dans le pays comme le HCA (Haut Conseil de l’Audiovisuel), organe de régulation et de contrôle de l’audiovisuel à Madagascar et dont l’organisation, le fonctionnement ainsi que les membres sont établis par décret gouvernemental. Quelques zones d’ombre persistent toutefois sur le nouveau projet de loi sur la communication. Les dissensions portent, entre autres, sur la création du HCA qui n’est toujours pas opérationnel à ce jour puisque c’est une structure provisoire qui le remplace. Autorité indépendante, le HCA est normalement l’organe de coordination et de contrôle du secteur privé en matière de radios et de télévisions à Madagascar. C’est lui qui traite les dossiers de demande de licence d’exploitation des entreprises audiovisuelles - en l’occurrence les radios et télévisions privées - aux côtés du CCTM (Comité de Coordination des Télécommunications à Madagascar). C’est le HCA qui avalise également toutes les décisions techniques de ce comité quant à l’attribution des fréquences et à l’usage des bandes autorisées. En tant qu’organe de contrôle, le haut conseil détient le pouvoir de suspension des activités en cas de non respect des termes du cahier des charges par l’exploitant ou en cas d’usage de bandes de fréquence non autorisées. Son budget de fonctionnement est inscrit au Budget général de l’Etat. Les onze membres devront être nommés par décret en conseil de gouvernement, pour un mandat de six ans renouvelable une seule fois. Ceux-ci ne doivent pas être membres d’une institution de la République, ni exercer un mandat électif quel qu’il soit, et encore moins appartenir à un parti ou groupement politique : dans le cas contraire, ils sont déclarés démissionnaires d’office. Son opérationnalité est d’ailleurs une des pierres d’achoppement au cœur des débats sur le projet de nouveau Code de la communication à Madagascar qui a fait l’objet de multiples séminaires réunissant membres ministériels, patrons des médias et journalistes. Ceux-ci demandent par exemple l’introduction des professionnels issus du secteur privé au sein de l’entité. Ils revendiquent aussi, désormais, la possibilité pour les radios privées de faire une couverture du territoire national ; ce qui annule définitivement les

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prérogatives monopolistiques de l’Etat sur le secteur. Les journalistes exigent enfin, au titre de ce projet de nouveau code, la dépénalisation des délits de presse. En attendant la mise en place du HCA donc, c’est une structure provisoire qui le représente : la CSCA (Commission Spéciale à la Communication Audiovisuelle). Créée par le décret n°94-133 du 22 février 1994, elle est « composée de hauts fonctionnaires des Ministères chargés respectivement de la Communication et des Télécommunications »10. Cette commission réunit en son sein la DIRM (Direction de l’information et de la régulation des médias) qui représente le Ministère en tant qu’autorité d’Etat chargée de la tutelle des secteurs des Télécommunications, de la Poste et de la Communication à Madagascar. Cette direction est chargée administrativement des dossiers de soumission pour la création des chaînes de radios et de télévisions privées. La CSCA compte aussi au sein de sa structure l’OMDA (Office malgache des droits d’auteurs) qui gère toutes les questions relatives à l’exploitation des œuvres artistiques audiovisuelles ainsi que l’OMERT (devenue plus tard ARTC), qui est l’instance techniquement compétente de l’Etat malgache pour la gestion des fréquences et l’évaluation technique des matériels de studio de ces chaînes privées. En réalité, la commission est « un organe consultatif […]. Le pouvoir de décision appartient aux deux ministres de tutelle qui sont les co-présidents. L’exploitation relève de la compétence du Ministère chargé de la Communication, […] ». La composition des membres se rajoute d’ailleurs aux discussions car la partie civile souhaite une réelle « dépolitisation » de l’organe de contrôle des médias privés à Madagascar. Autrement dit, à travers cette CSCA, l’Etat détient encore beaucoup de pouvoir sur le secteur de l’audiovisuel – une incursion qui devrait disparaître à la création du HCA.

2. Qui sont ces radios ? 2.1. La RNM (Radio Nasionaly Malagasy) La radio nationale malgache est née en 1960, à l’indépendance du pays. C’est une radio de service public appartenant à l’Etat malgache, et qui a hérité des infrastructures et des matériels de son ancêtre, la « Radio Tananarive », qui était alors le poste colonial de l’administration coloniale, créé dans la capitale en 1931. La Grande Île fut la première colonie 10

« Procédure de création, de régularisation et de obligations des entreprises audiovisuelles privées, Ministère de l’Information, de la Culture et de la Communication, S.G., Direction de l’Information et de la communication, Service des relations avec les organismes de presse, D.L.E., n°01, septembre 2000.

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francophone de la région d’Afrique à avoir son poste colonial à cette période de l’occupation française (A.J.Tudesq, p.15, 1999)11. Depuis l’indépendance donc, la radio nationale a régné seul au sein du paysage audiovisuel local avant la naissance de la télévision nationale (TVM) en décembre 1967 et avant celle de la première chaîne privée, RFV, en 1991. Et malgré l’officialisation de la dérégulation en 1992, la chaîne d’Etat – qui émet aussi bien en FM, en OM qu’en OC détient jusqu’à aujourd’hui le monopole de la diffusion nationale. Cette situation est semblable à celle de quelques pays africains voisins où les radios nationales étatiques « conservent une place prépondérante disposant le plus souvent seules des longueurs d’onde permettant d’être entendues sur tout le territoire. » (A.J. Tudesq, op. cit. ; p.15, 1999). Placée sous la tutelle directe du Ministère des Télécommunications, des Postes et de la communication (MTPC), la chaîne d’Etat est toutefois une entité qui fait partie de l’ORTM (Office de la radio et de la télévision de Madagascar) et ses agents sont des fonctionnaires de l’Etat. C’est un

EPIC (Etablissement Public d’Intérêt Commercial) dont les moyens de

fonctionnement relèvent du budget général du Ministère des Finances. Cette structure met l’audiovisuel public malgache dans un cadre institutionnel qui, le plus souvent, répond à la ligne politique du pouvoir en exercice. Ce dernier s’octroie, et cela dès le début de la radio à Madagascar, un droit de contrôle sur les médias publics. Cette pratique donne à la chaîne nationale l’image d’une réplique parfaite du régime en place, comme si elle devait perpétuer cette pratique longtemps héritée du passé. La chaîne fait souvent les frais de cette allégeance au pouvoir en perdant sa crédibilité, elle devient alors le théâtre d’attaques envers le bâtiment et le matériel de la Maison lors de crise sociopolitique12. La radio constitue donc un véritable terrain d’affrontement des protagonistes politiques, cela s’explique sans doute par le fait qu’elle est la seule plate-forme d’expression pour une diffusion d’envergure nationale et dénote l’importance que le média radiophonique revêt. Et dernièrement encore, lors des émeutes de février 200913, le bâtiment a été réduit en cendres par une population aux abois contre le régime du président Marc Ravalomanana. La RNM est une radio généraliste dont l’essentiel du programme est produit localement. Elle diffuse en malgache, la langue nationale, et se déploie en une quinzaine de 11

Les médias en Afrique, André-Jean TUDESQ, éd. Ellipses, 1999. « « Coup » Broadcast », Africa Research Bulletin, August 15, 1989, p. 9345-9346. 13 Toute l’historique de la manifestation est disponible sur le site du quotidien L’Express de Madagascar : <http://www.lexpressmada.com>, consulté le 24/08/2009. 12

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bureaux régionaux dont chaque équipe rédactionnelle constitue l’ensemble de réseau de correspondants pour le siège. Chacune de ces antennes régionales de la RNM possède sa propre grille de programmation. Néanmoins, en tant qu’élément constitutif du réseau national de la chaîne publique, chacune doit inscrire dans sa diffusion quelques émissions produites par le siège. Celles-ci consistent notamment en éditions d’information dont le grand journal de 12h30, ou encore la séquence quotidienne d’informations et d’annonces régionales « Ampitampitao » [faites passer (l’information)] à 10h, alimentée par les correspondants.

2.2 Les radios privées Le cahier des charges des radios privées à Madagascar limite leur diffusion en modulation de fréquences et leur émetteur à une puissance maximale de 500 Watt. La licence d’exploitation est valable six ans, elle est renouvelable. Par « radio privée », nous entendons ici toute station qui n’appartient pas à l’Etat, ni à une institution publique. Par abus de langage donc et pour simplifier nos propos, nous intégrons dans cette classification aussi bien les radios commerciales parce qu’elles appartiennent le plus souvent à des opérateurs économiques ou à des hommes politiques, les radios religieuses en ce qu’elles sont les propriétés d’une communauté confessionnelle tout comme les radios communautaires en ce qu’elles reviennent à une association réunissant, par exemple, une profession indépendante donnée. Ces radios peuvent être classées en radios politiques, commerciales, confessionnelles et en moindre proportion, en radios associatives rurales même si cette classification n’est pas aussi tranchée. A Madagascar, les radios survivent financièrement car le marché publicitaire est très restreint – on peut dire qu’il se concentre dans la capitale - et les fonds privés des propriétaires ne sont pas intarissables. Ainsi, la plupart de ces radios sont amenées à des activités commerciales telles que publireportage, vente de tranche horaires à des ONG ou à des associations religieuses même si tout ceci va à l’encontre de leur cahier des charges. Les propriétaires de radios utilisent leur fonds propres au départ mais très vite cet investissement s’arrête pour des raisons financières, et parfois par désintérêt du propriétaire à l’opération. Ceci oblige les radios privées à s’autofinancer à travers les recettes publicitaires et les annonces et cela d’autant que le système de fonds de soutien pour certaines radios comme en France, n’existe pas. Ce qui n’est pas sans poser de problème au sein du personnel souvent sous-payé, voire bénévole et qui se trouve en même temps dans des conditions de travail médiocres (absence de contrat de travail, manque crucial de matériels …). Quant à la 8


programmation, la majorité des stations font une programmation généraliste avec diverses émissions éducatives (santé, cuisine, conseils divers…), de divertissement (appel des auditeurs, dédicaces, art et culture…), et différents magazines d’information (sport, politique, économique…). La musique est très présente à l’antenne dès la période d’essai de l’antenne jusqu’à son autorisation définitive d’émettre. Pour la plupart d’entre elles, les programmations musicales sont un moyen pour « remplir » l’antenne faute de moyens pour payer des professionnels formés, ou pour se procurer des émissions de bonne qualité. L’information est un autre élément récurrent de la grille de programme des radios privées à Madagascar où il y a au moins deux éditions quotidiennes de journal parlé ; pour les radios locales privées, les reportages locaux mais aussi la RNM constituent les principales sources, parfois les journaux qui parviennent à la rédaction peuvent être exploités aussi. La majorité des émissions sont d’ailleurs produites localement et en interne. Et enfin, dernière caractéristique des radios privées à Madagascar est l’usage du malgache - langue nationale, qui domine l’antenne, toutes stations et toutes régions confondues même si de rares émissions et quelques éditions du journal parlé – généralement localisées à Antananarivo d’ailleurs – sont en français et exceptionnellement en anglais. Légalement, les radios privées ne peuvent faire qu’une diffusion locale mais des stations ont bravé la loi en se déployant en réseau dans plusieurs villes du pays. Le principe repose sur la création d’une équipe de relais locale gérant chacune leur antenne avec un programme indépendant de la « station mère », sise dans la capitale. En exploitant le réseau satellitaire, les stations diffusent en direct quelques émissions communes depuis le siège : les auditeurs de ces antennes locales respectives accèdent donc à la même émission au même moment sur toutes les ondes du réseau national. Ainsi, plus le réseau de radios est étendu, plus la diffusion est importante : le procédé est analogue à celui de la radio nationale avec ses bureaux régionaux. La chaîne de radios du groupe MBS (Madagascar Broadcasting System), appartenant au président Marc Ravalomanana14 procède de cette façon avec une « station mère » à Antananarivo et une douzaine de communes à travers le pays. Le groupe utilise le réseau satellitaire pour insérer ou diffuser des programmes de la station de la capitale. Les radios catholiques procèdent de la même façon avec le Re-Sat, après avoir reçu une 14

Pour les besoins du présent article, nous maintenons ce titre malgré les derniers événements (janvier-février 2009) qui ont secoué le pays et « démis » M. Ravalomanana de ses fonctions. Le pays est actuellement sous la direction provisoire d’une HAT (Haute Autorité de Transition), dirigée par Andry Rajœlina et son gouvernement - (Cf. supra la référence sur L’Express de Madagascar).

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« autorisation d’essai »15 pour faire fonctionner le réseau composé d’une quinzaine de radios diocésaines et de la station de la congrégation salésienne, RDB (Radio Don Bosco)16. Celle-ci est basée dans la capitale, elle est le principal serveur du réseau. Les radios politiques : Elles appartiennent à des hommes politiques en mal d’espace de communication et voient souvent le jour à des moments cruciaux comme ceux précédant des élections. Ces radios sont de véritable instrument politique qui assoit la légitimité d’une (nouvelle) figure politique auprès de l’auditoire. En effet, à Madagascar, il est fréquent qu’un individu – généralement méconnu - qui veut faire de la politique commence d’abord par créer sa radio. Les notoriétés politiques actuelles sont pour la plupart propriétaires d’une station FM comme le président Marc Ravalomanana avec la MBS (Madagascar Broadcasting System) – groupe de radios et une chaîne de télévision ; la « Radio Antsiva »17 à Antananarivo était la propriété de l’ancien ministre de l’économie et candidat malheureux aux présidentielles de 1995 Tovonanahary Rabetsitonta. La dernière née du lot dans la capitale est « Viva » appartenant à Andry Rajoelina, actuel président de la HAT (Haute Autorité de Transition). Il s’agit d’un phénomène national puisque la situation est la même dans les provinces : à Mananara Nord (Est), par exemple, le député de l’opposition, Zakahely Boniface a sa radio, la « Radio Fanantenana Vaovao » [radio du nouvel espoir]. Dans le district d’Amboasary (Sud), le député Reboza – proche de l’opposition – crée « Radio Ravenara » et dans la province de Mahajanga (Ouest) l’ancien maire, Claude Pagès, a également créé sa radio, « Radio Kalizy » alors qu’il prenait la mairie au milieu des années 1990. Le bâillonnement d’une voix différente de celle autorisée, c’est-à-dire, celle du régime en place ou encore, le manque de diversité d’opinion dans le débat politique, sont le plus souvent les arguments invoqués pour justifier la création de radio pour la plupart de ces politiciens. La RNM est alors la cible désignée pour être la cause de cette situation. Pour ces propriétaires, leur station incarne la vérité c’est-à-dire, la leur. Cette accusation à l’encontre de la radio nationale est souvent utilisée par un opposant au régime pour argumenter ses entreprises dans le secteur des médias, ces radios se donnent l’ambition de « libérer » des voix dissidentes. Et cette situation apparaît souvent au moment de vive tensions politiques ou à l’approche d’élections. Il est peu fréquent 15

Interview de Jean-Paul RANDRIANIAINA, journaliste de la RDB – Antananarivo, 30/06/2006. La RDB n’est pas une radio diocésaine, elle appartient à la congrégation salésienne Don Bosco. 17 La station fait désormais partie du groupe L’Express de Madagascar appartenant à l’opérateur économique, Edgard Razafindravahy. 16

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d’ailleurs de voir apparaître une radio de la même obédience que le régime à cette période. Cela signifie aussi que l’enjeu est crucial lorsque l’adversaire politique est un membre du régime au pouvoir. Les émissions politiques sont d’ailleurs très fédératrices sur ces chaînes. Le principe repose souvent sur l’invitation d’une personnalité politique qui répond aux questions des journalistes et parfois à celles des auditeurs. Elles sont, par ailleurs, un outil de propagande par excellence. L’ancienne RTV (Radio Tsioka Vao) [radio du nouveau souffle] de l’ex-président Didier Ratsiraka, créée en 1992 au lendemain des événements de 1991, était finalement un outil d’existence fictive du personnage alors que celui-ci était exilé en France. En effet, pendant une heure dans le journal du midi les trois journalistes présentaient quotidiennement l’actualité et commentaient avec beaucoup de cynisme les actions du régime de l’époque (Zafy Albert) en faisant des comparaisons aux réalisations du président déchu. Ils entretenaient ainsi le mythe du personnage de Ratsiraka en le citant systématiquement, en en faisant une référence positive. Parfois, celui-ci intervient sur les ondes en direct de son lieu d’exil. Cette propagande à outrance voulait sans doute préparer le retour du candidat déchu au pouvoir et aujourd’hui si rien ne permet de l’affirmer, l’accueil triomphant de ses partisans à son retour en 1996 et sa réélection la même année sont un fait. L’existence de cette catégorie de radio atteste indéniablement la liberté d’expression dans un pays comme Madagascar : la politique n’est pas un sujet tabou et la loi l’autorise. Parallèlement, les journalistes jouissent d’une liberté de ton et les citoyens ont droit à la parole. Mais cette situation montre aussi ses limites. Sans s’étendre sur les dangers d’une propagande excessive, la question de l’éthique journalistique se pose et peut remettre en cause la pratique professionnelle. En outre, cette catégorie de radio est finalement très fragile car sa longévité se fait au gré du contexte politique qui l’a créé : la RFV dont la mission initiale en 1991 était d’accompagner les protestations populaires n’existe plus et cela après l’aboutissement politique du mouvement. La formule est très fragile également car son succès dépend finalement du parcours politique de son fondateur : en 2002, pendant la grande crise électorale opposant cette fois-ci Ratsiraka à Ravalomanana, la RTV « a été incendiée par des sympathisants de Marc Ravalomanana. Les locaux de la station ont été totalement détruits

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par les flammes. »18. Aujourd’hui, elle a disparu. De même que la MBS a subi une violence analogue lors des derniers événements du début de l’année 2009, la chaîne ne diffuse plus. Les radios commerciales : Elles proposent une grille généraliste et se caractérisent par des émissions de divertissement. Cependant, l’information est privilégiée à travers les éditions de journal parlé et les magazines d’information mais ces stations font notamment une large part aux émissions de service. A Madagascar, les radios commerciales se définissent par des programmes qui sont financés au moins à 60% par de la publicité (Art.166 du Code de la Communication, 2003). Les propriétaires sont souvent des opérateurs économiques. Ces stations sont très souvent à l’origine d’un événement social (culturel, économique, sportif) ou tout au moins elles en sont des partenaires privilégiés, c’est leur fond de commerce. Grâce à ces activités, il apparaît que ces chaînes se spécialisent dans la communication sociale. En effet, pour des opérations d’envergure telles que des campagnes nationales de vaccination ou de lutte contre le SIDA, l’organisation de foire économique ou encore des mobilisations diverses à la demande d’associations par exemple, très vite ces radios deviennent incontournables car elles relaient facilement les messages. Elles sont indispensables pour faire un écho de ces initiatives attestant un savoir-faire dans la communication, acquis globalement dans les publireportages. Il est à signaler cependant que la plupart des radios commerciales à Madagascar n’ont pas commencé dans cette prestation. Elles étaient d’abord des radios politiques, mais en perte de vitesse, elles changent de formule en abandonnant peu à peu cette position très partisane et se tournent davantage vers une forme de programmation commerciale ; ou tout simplement, elles sont rachetées par un opérateur. Ces radios ont toutefois une particularité : les magazines d’information politiques sont maintenus, voire ils deviennent une des émissions-phares de la chaîne. Le contenu est plus nuancé toutefois et moins tendancieux ; ces émissions connaissent un réel succès populaire et constituent souvent une source d’information non négligeable, utilisée parfois par les journalistes des autres médias. Les radios confessionnelles : Ces radios se sont imposées dans le paysage radiophonique avec un effectif de 57 sur un total de 240 radios, soit 24% des chaînes diffusant sur le sol malgache. Nous entendons par radio religieuse ou confessionnelle celle « créée et dirigée par une personne morale 18

Source : AFP citée par Reporter Sans Frontière sur le www.rsf.fr du 10/04/2002.

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religieuse, quelle que soit sa confession »19, cette définition intègre donc pour nous les radios protestantes et évangéliques dans leur plus grande diversité à Madagascar, ainsi que les radios catholiques, adventistes et musulmanes. Pour notre étude, nous avons une classification simplifiée de cette catégorie de radios avec les radios évangéliques – une catégorie qui intègre ici les stations protestantes et adventistes – les radios catholiques et les radios musulmanes. A Madagascar, comme dans d’autres pays africains voisins d’ailleurs, la situation des radios religieuses reflète un contexte social où « Les Eglises sont partie intégrante du paysage malgache, et nul ne songerait à les dissocier de l’évolution de la vie nationale. […]. »20 Pour Madagascar précisément, des historiens ont montré que les Eglises ont toujours été au cœur de l’histoire politique et culturelle du pays dès les premières heures de contact de l’île avec les occidentaux. Cette situation a bouleversé la vie et toute la culture locale avec l’installation au XIXè siècle des missionnaires de la LMS qui ont introduit l’écriture latine, le christianisme etc. Les périodes suivantes ont montré le lien privilégié qu’ont eu ces missionnaires avec le royaume merina de telle sorte qu’ils ont réussi à convertir la reine Ranavalona II (1868-1883) et son époux, le Premier Ministre Rainilaiarivony le 21 février 1869 : le protestantisme revient ainsi « officieusement » une religion d’Etat. Et sur d’autres périodes plus proches, on a vu le rôle joué par les Eglises lors des crises politiques qui ont secoué le pays telle celle de 1991 par la FFKM, la fédération des églises chrétiennes de Madagascar où on retrouve la FJKM – l’église protestante réformée calviniste, l’église catholique apostolique romaine, l’église épiscopale anglicane et l’église luthérienne de Madagascar. Parallèlement, de nouvelles religions voient le jour, créées et pratiquées par de groupements religieux pas spécifiquement répertoriés et qui sont désignés sociologiquement en tant que sectes, en ce qu’ils constituent une « association volontaire de croyants qualifiés regroupés autour d’un leader charismatique »21. Ils opèrent efficacement auprès de ses fidèles, se diversifient et touchent toutes les couches sociales. Et si leurs lieux de culte ne sont pas tous officiellement connus, la présence et la multiplication des radios évangéliques permet

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DAMOME Etienne (2007), « Radio et religion en Afrique : information, communication et/ou prosélytisme ? Analyse comparée des cas du Bénin, du Burkina Faso, du Ghana et du Togo », Thèse de doctorat en SIC, Université Michel de Montaigne Bordeaux 3, novembre, p.46. 20 Urfer Sylvain [1993 a] cité par ROUBAUD François, « Religion, identité sociale et transition démocratique à Tananarive : de fidèles en citoyens », in Autrepart, Editions de l’Aube, IRD, Cahier des Sciences Humaines, nouvelle série, n°10, « Afrique : les identités contre la démocratie ? », p. 135. 21 Damome (E.), op. cit. p.41.

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d’identifier une partie de leur existence et confère d’ailleurs un rôle aussi singulier que fantaisiste parfois à ce type de radio. Le fait d’investir ce média n’est pas propre à ces communautés puisque les catholiques s’y attèlent depuis quelques années avec la puissante Radio Don Bosco (RDB) de la congrégation salésienne, basée à Antananarivo. Et depuis cinq ans, la Commission pour la Communication Sociale au sein de la Conférence épiscopale malgache a décidé de créer une quinzaine de radios locales dans les diocèses de l’île avec comme enjeu majeur la mise en place d’un réseau satellitaire des radios catholiques à Madagascar : la RDB en est le serveur principal22. Les catholiques (21,23% contre 20,5% pour les protestants)23 constituent ainsi la première communauté chrétienne la plus importante de l’île à détenir un tel projet ; à la différence de la catégorie précédente, les radios catholiques proposent une programmation généraliste et plus diversifiée ainsi qu’un fonctionnement plus professionnel où le personnel est salarié de la chaîne. Et enfin plus récemment, et sans doute de façon moins significative, les musulmans se sont également lancés dans l’aventure radiophonique. Mais à l’image de l’expansion de leur religion qui a connu un essor moins important que le christianisme dans l’île puisque la communauté musulmane ne compte que près de 7% de la population, non seulement les radios musulmanes sont venues tardivement dans le paysage médiatique, mais elles ne sont que deux sur tout le territoire national. La première station, « Radio Feon’ny Silamo » [voix de l’Islam] est née à Antsiranana (Nord) en 2000 et la seconde et dernière née de la catégorie est celle de la capitale « Radio Voix de la Sagesse ». Comme les radios évangéliques, l’essentiel de la diffusion de ces deux radios porte notamment sur l’Islam et la vie en général des fidèles autour de cette religion. Les radios associatives : Par radios associatives, nous désignons les stations non commerciales – en ce qu’elles ne vivent pas essentiellement de la publicité, et privées - en ce qu’elles appartiennent et sont gérées par une association (rurale ou professionnelle). Leur vocation première est d’être le moyen de communication et d’informations entre les membres dans un souci de désenclavement de leurs communes, mais aussi de développement de leur métier grâce aux

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Site récent : <http://radiodondbosco.org/Default_fr.aspx>, consulté le 13/08/2009. <http://www.madanight.com/articles/religion/441-le-pape-jean-paul-ii-a-laisse-un-souvenir-pieux-etimperissable-a-madagascar.html>, en date du 11/04/2005 (Consulté le 14/05/08) 23

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échanges de procédés entre techniciens et paysans et entre les paysans eux-mêmes, qui nourrissent une large part des émissions. Les radios associatives sont très peu nombreuses à Madagascar. A ce jour, on n’en compte plus que deux sur les trois stations initiées par la Coopération Suisse, à savoir « Radio Mampita » à Fianarantsoa (centre sud) et « Radio Magneva » à Morondava (ouest), qui se sont constituées en réseau sur le plan national. Outre des plages de divertissement, le programme repose sur un contenu très ciblé portant sur des aspects techniques des métiers des paysans tandis que la programmation musicale s’inspire majoritairement du terroir et la langue de diffusion est le parler local. Le personnel est constitué de paysans, autrement dit, ce ne sont pas des professionnels, toutefois, ils maîtrisent parfaitement les sujets traités et en assurent la pertinence. En outre, la plupart sont connus des auditeurs car ils sont des leurs : toutes les conditions sont réunies pour asseoir une vraie radio de proximité pour les auditeurs des communes de diffusion. Ces radios voient le jour et vivent grâce aux aides des ONG ou des institutions étrangères dans le cadre de leur programme de développement de la communication dans le monde rural. Les appuis consistent, de façon générale, en dotations de matériels mais aussi – pour le cas de la Coopération Suisse à Fianarantsoa – en subventions financières à hauteur de 80% du budget général de la station. Le reste du budget doit être couvert par les droits d’adhésion et les cotisations annuelles des membres de l’association, en plus de petites recettes générées par les annonces et quelques prestations de la station. Et pourtant, la survie de ces radios rurales reste problématique pour des raisons économiques. A Madagascar, elles peuvent « se nourrir » d’achat de tranches horaires par des organismes ou ONG internationaux mais qui, finalement, ne sont pas économiquement fiables car il y a très peu d’engagement pour l’année. La radio ne peut donc jamais prévoir à l’avance ses activités et prétendre tenir, de façon autonome, sur une année. Par ailleurs, les subventions ne sont pas non plus sans poser de problème car de façon générale, elles ont une durée limitée. « Radio Mampita », par exemple, devrait être autonome trois ans après son démarrage en 1997 et pourtant, la station n’y parvient pas encore car elle n’a pas été préparée à cette prestation et cela d’autant plus que le marché publicitaire est quasi-inexistant dans les milieux ruraux malgaches : les entreprises commerciales ou de service sont concentrées dans les grandes villes et les petits commerçants de la localité n’ont pas besoin de communiquer. Et enfin, il manque au personnel de la radio un savoir-faire dans le domaine commercial et celui

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du marketing, la troisième chaîne du réseau, « Radio Tia » à Behenjy (centre), a d’ailleurs fermé pour cause de mauvaise gestion. Le financement des radios est un problème généralisé à Madagascar. Si la formation professionnelle de l’équipe d’antenne est, à juste titre, souvent placée au cœur des préoccupations dès que l’aide aux radios est évoquée à Madagascar, le cas de ces radios rurales illustre bien aussi la nécessité d’encadrer d’urgence l’équipe managériale et cela, pour la survie de la radio qui occupe une place centrale au sein d’une communauté entière. 3. Enjeux des radios à Madagascar 3.1. Un lien social Les radios publiques et privées émettent près de 95% de leur programme en malgache, la langue nationale. Comparé à ses voisins africains, Madagascar est un des rares pays de la région d’Afrique où une langue unique existe et est parlée par toute la population. Cependant, il faut distinguer le malgache officiel, la langue nationale et administrative, des dialectes régionaux24 utilisés quotidiennement par les autochtones. Les intonations distinguent très nettement ces derniers du malgache officiel et quelques vocabulaires varient mais elles appartiennent exactement à la même famille linguistique. Dans chaque province, c’est le dialecte local qui domine la conversation : il est très rare de voir par exemple à Tuléar (Sud) deux autochtones discuter entre eux en malgache officiel, la conversation se fera exclusivement dans leur dialecte ; de même qu’ils répondront facilement dans leur dialecte à une question en malgache officiel. L’existence et l’usage d’une langue unique qu’est le malgache présentent des enjeux sociaux importants de la radio à Madagascar. Et au milieu des dialectes, le malgache officiel joue donc le rôle d’une langue intermédiaire pour « traduire » un ou plusieurs dialectes entre eux. Du point de vue de l’offre de programme, cela laisse la latitude de proposer diverses émissions dans une grille et évite entre autres les contraintes de la traduction, ce qui n’est pas le cas par exemple au Mali (avec 13 langues nationales) où la grille du lundi de la station régionale de Mopti contient des émissions en langues peuhl, bozo, bambara et dogon 25 probablement par souci d’équilibre ethnique. Du côté des auditeurs, l’existence d’une langue

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Variante locale du malgache officiel et le dialecte est différent pour chaque province. « Rapports sur les radios publiques et privées dans trois pays africains et à Madagascar : Constat », Mission de J.-M. Brosseau au Cameroun, Mali, Côte-d’Ivoire et à Madagascar, Min. de la Coopération, OFREDIA, 1996. 25

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unique facilite l’accès aux émissions qui deviennent moins discriminatoires puisqu’elles sont diffusées dans la langue nationale. Cette dimension linguistique est importante car elle pourrait renforcer l’unité nationale ; elle raffermit également un sentiment d’appartenance à une même culture et la radio pourrait alors jouer un rôle d’unificateur. Sous cet aspect, le rôle de la RNM (seule habilitée à faire une diffusion nationale) est majeur car le malgache officiel est de rigueur au sein de la station, même dans ses antennes régionales. Ce parler constitue un compromis intéressant pour les auditeurs de Madagascar car une production radiophonique diffusée sur le territoire en malgache officiel est plus accessible pour tous que si elle était faite en dialectes (ou en langues étrangères) car il y aurait une menace d’exclusion pour ceux qui ne les parlent pas. 3.1 Un enjeu démocratique La RNM a longtemps été le média le plus répandu et le plus accessible pour l’ensemble de la population, mais les radios privées l’ont rejoint et ont permis d’élargir le choix d’écoute. Le média radio présente un enjeu démocratique indéniable car elle donne une chance égale aux citoyens d’accéder aux informations. En effet, la radio d’Etat RNM permet à tous les Malgaches d’accéder à un média26 – notamment ceux des contrées éloignées des grandes villes – grâce à sa diffusion nationale ; elle permet l’accès à la culture, aux divertissement et notamment permet d’obtenir les mêmes messages d’information. La censure économique de la presse écrite est ainsi contournée27 et il en est de même de la censure intellectuelle grâce à la programmation en malgache et c’est d’autant plus démocratique qu’il n’exclut pas les 33% d’adultes analphabètes (UNICEF, 2004)28 que compte le pays. La radio est une véritable plate-forme d’expression et d’opinion à Madagascar. Nous avons indiqué que le journal parlé est un programme très répandu sur les FM ; les magazines politiques et la parole aux auditeurs sont des émissions fédératrices à l’antenne – les stations privées se copient et se rivalisent entre elles pour déployer la formule. On peut avancer que trois possibilités de débats existent à partir de ces structures : un débat national

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La distribution de la presse écrite dans tout le pays est encore un problème : les réseaux routiers ne sont pas encore très développés : certains endroits ne peuvent être atteints, ou bien les quotidiens arrivent toujours avec des jours de retard et la plupart des entreprises de presse ne peuvent pas encore investir dans la distribution nationale. 27 49% des Malgaches ont moins de US 1$ par jour selon l’UNICEF. Et la Banque Mondiale établit que près de 70% de la population vivent en-dessous du seuil national de pauvreté. 28 www.unicef.org/infobycountry/madagascar.html

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suscité par les citoyens qui suivent la RNM, ses émissions à diffusion nationale donnent la possibilité à des auditeurs séparés géographiquement de débattre ou d’entendre les mêmes émissions. Une autre possibilité d’échange d’idées régional peut aussi avoir lieu avec cette même formule mais cette fois-ci la RNM peut être concurrencée par les radios privées qui oeuvrent désormais sur place et offrent la même possibilité à ses auditeurs en adoptant le même principe d’émission (talk-show, parole aux auditeurs…) ; mais il n’est pas rare que les mêmes acteurs/invités dans les émissions nationales de la RNM sont par la suite invités dans ces radios, le débat peut donc être repris et ramené au contexte précis de l’endroit où l’invité intervient. Et une troisième opportunité est le débat local que peuvent offrir les radios privées qui ne diffusent que dans une localité précise. 4. Lien fort entre la politique et la religion : quels rôles pour la radio ? Une caractéristique proéminente de la vie sociopolitique malgache est l’implication de l’Eglise dans les affaires politiques du pays. Les crises politiques majeures qui ont secoué la Grande Ile (événements de 1991 et 2002 par exemple) ont toujours vu les interventions de la FFKM - Fédération des Eglises Chrétiennes de Madagascar (Anglicane, Catholique, Luthérienne et Protestante) - et il semblerait que le candidat politique aux présidentielles soutenu par la fédération est « sûr » d’être élu. C’était le cas par exemple pour le professeur Zafy Albert en 1992. Il apparaîtrait alors que l’Eglise est une caution électorale sûre et l’alliance avec elle – et plus particulièrement avec la FFKM pourrait être une stratégie pour un candidat afin de s’assurer une victoire aux élections. Cette intrication entre la vie politique et la religion se traduit également par l’identité des hommes politiques dans le pays, c’est le cas précisément de Richard Andriamanjato, pasteur d’une église protestante de la capitale et en même temps leader indétrônable du parti historique AKFM/Fanavaozana, non moins président de l’Assemblée Nationale au milieu des années 1990 et candidat malheureux aux présidentielles de la même période. Marc Ravalomanana alors qu’il est chef de l’Etat est en même temps secrétaire général de la FJKM – une branche de l’église protestante à Madagascar et dans un discours officiel défend cette « collaboration » entre l’Etat et l’Eglise29; il a d’ailleurs fait de l’Evangile de St Marc « Minoa fotsiny ihany » ["tout est possible à celui qui croit" (Evangile de Marc 9:23)] son leitmotiv pour ses premières 29

« Etat – Eglise Ravalomanana en croisade. Synode à Ambatondrazaka : Ravalomanana persiste et signe pour la collaboration entre l’Etat et l’Eglise », par Iloniaina Alain, L’Express de Madagascar du jeudi 19 août 2004 (source : www.lexpressmada.com)

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campagnes présidentielles en 2001. Tout ceci se fait au détriment de l’article premier de la Constitution de la République de Madagascar qui stipule la laïcité de l’Etat (« Le Peuple Malagasy constitue une Nation organisée en Etat souverain et laïc »), texte sur lequel Ravalomanana a prêté serment à sa prise de fonction en 2002, avant qu’il ne le modifie par voie référendaire en avril 2007 où cette laïcité de la République n’apparaît plus.

* * * Les radios à Madagascar – quelle que soit leur identité – essaient de remplir des missions (informations, libre expression, lien social, développement communautaire …). Leur existence ne doit plus être remise en cause car elles ont largement contribué à la démocratie en terme de liberté d’expression, de construction d’une conscience citoyenne, de diversification des sources d’information mais aussi de divertissement. Cependant les responsables des stations doivent toujours être vigilants pour éviter tout risque de débordement de la part de ses journalistes par exemple d’autant que, historiquement, le journalisme malgache se caractérise par un aspect très militant30 et cela ne s’est pas démenti à ce jour, les événements de ces dernières années confirment la situation. Par ailleurs, la formation du personnel est souvent privilégiée pour asseoir une radio responsable et professionnelle mais tout ceci ne pourra se faire sans garantir un cadre serein de travail à commencer par l’assurance de viabilité de la station. Cela passe par la prise de conscience par les propriétaires de radio de leur rôle dans le processus en rémunérant correctement le personnel et en inscrivant les employés dans un cadre légal d’exercice de leurs métiers. Mais sans doute faut-il commencer aussi par former les patrons de radio eux-mêmes à la gestion managériale d’une chaîne car la plupart se lancent dans l’aventure sans en connaître précisément les enjeux ? Radios politiques, commerciales, religieuses, associatives, sont toutes concernées, et cela est vital pour la survie de la radio pour garantir finalement cette démocratie traduite par la diversité et la profusion actuelle des chaînes à Madagascar. Quant à la RNM, il apparaît que l’arrivée des radios concurrentes bousculent l’offre et les techniques radiophoniques mais aussi les habitudes d’écoute des auditeurs. Considérée

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La presse d’opinion à Madagascar de 1947 à 1956. Contribution à l’histoire du nationalisme malgache du lendemain de l’insurrection à la veille de la Loi cadre, Lucille RABEARIMANANA, Librairie Mixte, Antananarivo, 1980.

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finalement comme l’ « égérie » de toutes ces radios privées, elle devrait sans doute redéfinir le rôle d’une radio d’Etat, celui d’une radio de service public qui détient encore toute sa place dans le paysage radiophonique actuel, elle doit la défendre. Encore faut-il que le gouvernement lui donne les moyens techniques et financiers pour le faire. Il faudrait aussi renouveler du personnel en insistant sur la formation pour donner un nouveau visage à la radio d’Etat : celui d’une radio non partisane du régime. Mais il faudrait surtout pour cela que les régimes qui se succèdent admettent qu’une radio de service public est une radio au service des citoyens, toutes origines et toutes appartenances politiques confondues, et qu’elle doit le refléter dans les messages qu’elle diffuse. Et enfin, il est temps que le pouvoir à Madagascar statue définitivement sur le nouveau Code de la communication – un véritable serpent de mer qui a vu défiler jusqu’ici une dizaine de ministres. Cela doit se faire en concertation mûre et sereine avec les différentes parties concernées en commençant, par exemple, par la mise en place du HCA (Haut Conseil de l’Audiovisuel), l’organe officiel et indépendant de régulation et de contrôle de l’audiovisuel à Madagascar. Ces années de libéralisation des ondes ont montré que la CSCA (Commission Spéciale à la Communication Audiovisuelle) - une structure provisoire créée par décret il y a quinze ans - est dépassée par le « capharnaüm radiophonique » actuel où les stations (surtout politiques) naissent comme elles meurent au gré des événements, les radios illégales de tous genres fleurissent librement et les dirigeants politiques, ceux propriétaires de radio, montrent ouvertement la possibilité de contourner « officiellement » la loi en vigueur. Aujourd’hui, il est temps que le pouvoir à Madagascar fasse preuve de maturité politique et donc d’une capacité de gouverner qui, au-delà des compétences (intellectuelles, politiques et techniques …) attendues d’une équipe de dirigeants, ne peut se faire qu’à force de lucidité , de courage et surtout de volonté politique sincère.

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Digitalização e estratégias do mercado de TV por assinatura no Brasil Valério Cruz Brittos Rafael Cavalcanti Barreto*** Tamires Gomes**** Resumo Com a chegada da tecnologia digital na radiodifusão brasileira, o setor de televisão por assinatura passa a disponibilizar novos produtos e reforçar seus pacotes de canais, visando o aumento do número de assinantes, para, com isso, buscar evitar a estagnação do mercado. Interatividade, multiprogramação e alta definição tornaram-se elementos indispensáveis na oferta de produtos, que, num ambiente de convergência tecnológica e re-regulamentação, pode em breve enfrentar maior disputa, começando pela TV aberta, em virtude de sua digitalização, e, principalmente, das empresas de telecomunicações, altamente capitalizadas para participar de um setor em que atuam agentes com diferentes potenciais. Entender o comportamento das principais empresas de televisão paga nesse cenário é o objetivo central do presente artigo. Palavras-chave Digitalização e audiovisual; processos midiáticos; políticas públicas. Abstract With the arrival of digital technology in Brazilian broadcasting, the pay television sector starts offering new products and reinforcing their channel packages, aiming at the increasing of subscriber’s size so that it avoids market stagnation. Interactiveness, multiprogramation and high definition became indispensable elements of product offering which, in an environment of technological convergence and re-regulation, may soon face more rivalry. A likely vie is the open TV, due to its digitalization process and, majorly, to the Texto desenvolvido no âmbito do projeto “Convergência digital: ações com horizonte nas tecnologias e conteúdos de informação e comunicação”, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Comunicação, Economia Política e Sociedade (CEPOS) e financiado pela da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), coordenador do Grupo de Pesquisa CEPOS (apoiado pela Ford Foundation), doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Faculdade de Comunicação (FACOM) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e vice-presidente da Unión Latina de Economía Política de la Información, la Comunicación y la Cultura (ULEPICC-Federación). E-mail: <val.bri@terra.com.br>. *** Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), membro do Grupo de Pesquisa CEPOS (apoiado pela Ford Foundation) e graduando em Comunicação Social – Jornalismo na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). E-mail: <butigahn@hotmail.com>. **** Graduanda em Comunicação Social – Jornalismo na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). E-mail: <mirescg@gmail.com>.


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telecommunication companies, highly capitalized to incorporate a sector in which there are agents with different potentials. The main objective of this article is to comprehend the pay television companies’ behavior in this scenario. Keywords Digitalization and audiovisual; media processes; public policies Resumen Con la llegada de la tecnología digital en la radiodifusión brasileña, el sector de televisión por firma pasa a disponer de nuevos productos y reforzar sus paquetes de canales, visando el aumento del número de subscriptores, para, con eso, buscar evitar la estagnación del mercado. Interactividad, multiprogramación y alta definición se hicieron elementos indispensables en la oferta de productos, que, en un ambiente de convergencia tecnológica y re-reglamentación, puede en breve enfrentar mayor disputa, comenzando por la tele abierta, en virtud de su digitalización, y, principalmente, de las empresas de telecomunicaciones, altamente capitalizadas para participar de un sector en que actúan agentes con diferentes potenciales. Entender el comportamiento de las principales empresas de televisión pagada en ese escenario es el objetivo céntrico del presente artículo. Palabras-clave Digitalización y audiovisual; procesos mediáticos; políticas públicas. Introdução O objetivo deste trabalho é pesquisar e analisar o processo de digitalização da televisão por assinatura no Brasil. Com a revolução tecnológica pela qual o país passa, o tema digitalização televisiva tem gerado uma série de discussões e medidas, idealmente visando o interesse público. Este processo, devido à sua amplitude e lentidão, é acompanhado na expectativa de garantir decisões com os melhores resultados para todos os agentes envolvidos. Tendo em vista a introdução da TV digital aberta, considerou-se profícuo estudar a digitalização do mercado de televisão por assinatura, trabalhando especialmente as adaptações previstas no campo tecnológico e os conteúdos prioritários, frente às proximidades entre os dois setores. A digitalização da televisão paga gera controvérsias, devido à reconfiguração no sistema operacional e de veiculação de conteúdos, juntamente com a introdução de empresas de telefonia no segmento de televisual por assinatura. O sistema digital, já empregado em outros países, chega ao Brasil com o projeto, por parte dos radiodifusores, de especialmente transportar som e imagem em alta definição (high definition – HD), além de viabilizar serviços com interatividade, portabilidade e mobilidade.


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Para veicular programas em HD é preciso produzir conteúdo nesse formato, o que requer mudança nos processos de realização, já que muitos detalhes imperceptíveis no modelo analógico são realçados no digital. Abre-se também a exigência de produzir mais conteúdo, para incluir opções de interatividade, o que afeta TVs aberta e a pagamento. Na conjuntura atual, as programadoras estão intensificando o desenvolvimento de canais em alta definição, enquanto as operadoras buscam digitalizar suas redes o máximo possível, em substituição às analógicas. Perante a modernização tecnológica que gradualmente avança na televisão aberta, as operadoras de TV por assinatura estão tomando providências para não haver decréscimos no número de seus assinantes e, mais do que isso, ampliar a base. Mesmo com essa mudança no sistema de comunicação e a crise econômica que atingiu o mercado mundial, enfaticamente no primeiro semestre de 2008, as operadoras e programadoras estão otimistas para os próximos anos. Pacotes e canais Atualmente três sistemas de transmissão de televisão paga destacam-se no Brasil: cabo, direct to home (DTH, com distrbiuição por satélite) e multipoint multichannel distribution system (MMDS). Há ainda o Serviço Especial de Televisão por Assinatura (TVA), que utiliza a faixa de UHF (ultra high frequency, canais de 14 a 69) para transmissão de conteúdo pago (podendo haver emprego parcial sem codificação). O serviço de TVA é periférico, remetendo ao início da televisão paga no Brasil, não havendo, portanto, novas autorizações. O número de assinantes que usam TV a cabo representa a maior parte no consumo de conteúdo pago. Na seqüência vem o modo via satélite, com metade de usuários, e, a seguir, com uma fatia bem menor, o MMDS. Em 2009, o número de assinantes chegou a mais de 6,5 milhões em abril, conforme assinala a tabela 1. Tabela 1. Número de assinantes de TV paga por tecnologia (2009) Tecnologia

Número de assinantes

Cabo

3.962.115

60,13%

Satélite

2.211.869

33,57%

MMDS

391.384

5,94%

TVA

23.529

0,36%

Total

6.588.897

100%

Fonte: BRASIL. AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES. Dados estatísticos da TV por Assinatura Abril/2009. Disponível em: <http://www.anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao=227987&assuntoPubli cacao=Dados%20Estatísticos%20dos%20Serviços%20de%20TV%20por%20Assinatura%20-


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%20Cap.%2001%20-%2037.ª%20Edição&caminhoRel=null&filtro=1&documentoPath=227987.pdf>. em: 20 set. 2009.

Acesso

O MMDS já foi um sistema com adesão mais baixa, porém, vem crescendo, não só em popularidade, mas também em qualidade. Um grande avanço tecnológico possibilitou o aumento de canais disponíveis; com a introdução do sistema digital de microondas, hoje é possível oferecer em torno de 180 canais digitalizados. Uma vantagem desse sistema é que proporciona portabilidade, pois o sinal é transmitido através de microondas terrestres, semelhante ao modo de difusão da televisão aberta, e passível de ser recebido em aparelhos móveis. Em caso de troca de residência no interior da mesma área de cobertura, é possível seguir recebendo o sinal sem maiores contratempos.1 No entanto, é a transmissão tipo DTH que permite afirmar que a digitalização na TV paga já existia antes mesmo da escolha do modelo japonês pelo Governo Federal, para a televisão aberta. O DTH, por ser via satélite, é completamente digital desde 1996, quando a Sky passou a operar em território nacional. Os sistemas a cabo e MMDS ainda estão se adaptando ao processo de digitalização, mas já trabalham com conteúdo digital. No Brasil, mais de 100 mil assinantes de TV por assinatura têm serviços em alta definição. Cerca de 60 mil são clientes da Sky e aproximadamente 40 mil, da Net. A segunda operadora vem aumentando sua base em quase 10 mil usuários por mês.2 A Net foi beneficiada com um aumento de 50% das vendas após o início da campanha publicitária da Sky, abordando a digitalização. A expectativa é de que o número de assinantes de pacotes digitais chegue a 400 mil no final de 2010, como aponta a tabela 2. Tabela 2. Crescimento do número de assinantes de pacotes digitais no Brasil Período

Número de assinantes

Dezembro 2009

150 mil

Junho 2010

300 mil

Dezembro 2010

400 mil

Fonte: LAUTERJUN, Fernando. TV paga tem mais de 100 mil assinantes em HD; Brasil lidera digitalização na América Latina. Tele Time, São Paulo, 13 ago. 2009. Disponível em: <http://www.teletime.com.br/News.aspx?ID=143055>. Acesso em: 18 set. 2009.

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DIGITALIZAÇÃO revigora TV por assinatura via microondas. Clic RBS, Porto Alegre, 21 jul. 2008. Disponível em: <http://www.clicrbs.com.br/especiais/jsp/default.jsp?template=2095.dwt&newsID=a2058197.htm&tab=00052& order=datepublished&espid=56&section=Not%EDcias&subTab=04441>. Acesso em: 23 out. 2008. 2 LAUTERJUN, Fernando. TV paga tem mais de 100 mil assinantes em HD; Brasil lidera digitalização na América Latina. Tele Time, São Paulo, 13 ago. 2009. Disponível em: <http://www.teletime.com.br/News.aspx?ID=143055>. Acesso em: 18 set. 2009.


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A empresa Net Serviços, pertencente à Telmex (também detentora da Embratel) e à Globopar, é a principal operadora de televisão a cabo no país. Fundada em 1993, ela também oferece serviços de banda larga e voz por IP (VoIP), atingindo, assim, uma clientela maior nos 14 estados onde atua. As operadoras da Net trabalham com dois pacotes de alta definição (Net Digital HD e Net Digital HD Max), além do tradicional Net Digital. O serviço Net Digital possui as três vantagens básicas dos serviços de TV paga: diversidade de programas, qualidade de som e imagem e interatividade. São dezenas de canais dos mais variados temas, com imagem comparável à do DVD. As opções interativas vão do guia eletrônico de programação, no sistema mosaico, que permite a exibição de 12 canais simultâneos, à escolha de idiomas. Os assinantes ainda podem optar pelo modelo de compra pay-per-view (pagar para ver) para filmes, séries, games e jogos de futebol, bloquear canais (parental control) e recorrer a aplicativos relacionados à previsão do tempo, jornalismo e horóscopo.3 Já o pacote Net Digital HD diferencia-se do primeiro serviço por possuir canais em alta definição e áudio Dolby Digital 5.1, que permite a sensação de surround. Faz parte de sua programação os canais da Globosat HD, Telecine HD, Fox HD, National Geographic HD e os de rede aberta Globo HD, Band HD e RedeTV! HD. O pacote passou a ser vendido em 2004, com a finalidade de modernizar os serviços oferecidos pela operadora, de modo a antecipar a superação da transmissão analógica. O pacote Net Digital HD Max equivale ao Net Digital HD com acréscimo de uma memória que viabiliza os efeitos mais atrativos da tecnologia digital até o momento. Com capacidade para gravar 100 horas de conteúdo, o público pode armazenar em pastas diversos programas para acompanhá-los quando quiser, tal como no computador. Também se torna possível dar replay, avançar e pausar a programação, independente de ser gravado ou ao vivo. Para receber o conteúdo de alta definição e todas as ferramentas interativas, a operadora usa um decodificador desenvolvido pela fabricante Pace, que possui um modem interno. A intenção é que, no futuro, este decodificador também possa ser útil para receber novidades no campo da interatividade.4 Se o decodificador é novidade para a operadora Net, o mesmo não se pode dizer quanto à Sky. Por trabalhar com transmissão via satélite através da banda Ku, a primeira 3

NET. TV Digital. Disponível em: <http://netcombo.globo.com/netPortalWEB/index.portal?_nfpb=true&_ pageLabel=tv_digital_hd_max_home_page> Acesso em: 28 maio 2009. 4 RIBEIRO, Evelin. Net amplia oferta de serviço digital com novos canais em alta definição. IDG Now, São Paulo, 23 jun. 2009. <http://idgnow.uol.com.br/telecom/2009/06/23/net-amplia-oferta-de-servico-digital-comnovos-canais-em-alta-definicao/> Acesso em: 24 jun. 2009.


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empresa de TV por assinatura digital do Brasil possui uma experiência de 13 anos com decodificadores digitais similares a pequenas antenas parabólicas. No país, a Sky é controlada pelo Grupo DirecTV e pelas Organizações Globo, somando ao todo cerca de 1,8 milhões de assinantes. A operadora possui serviços digitais bem parecidos com os da Net, incluindo diversidade de programas, alta definição de imagem e som e recursos interativos a partir do aparelho, que, no caso, é cedido ao cliente através de venda ou comodato. O melhor pacote da empresa é o Sky HDTV, que oferece um serviço de alta definição por satélite em todo o país.5 Por fim, a operadora TVA, comandada pelo Grupo Abril e pela Telefônica de Espanha, que atua com serviços digitais nas regiões Sul e Sudeste, é a pioneira no segmento de digitalização a cabo de TV paga, com o lançamento, em 2004, do TVA Digital. Em 2006, os assinantes puderam acompanhar a Copa do Mundo de futebol com maior qualidade de som e imagem.6 Já em março de 2008, a operadora, que também atua no segmento de MMDS, ganhou judicialmente o direito de veicular os canais SporTV, SporTV2, Globo News, GNT e Multishow, além do Premiere Futebol Clube, de pay-per-view, produtos até então exclusivos da Globosat.7 Em setembro de 2009, a TVA incluiu em seu line-up8 mais quatro canais em alta definição, um segundo HBO HD, Rush HD, Fox/Natgeo HD e SBT HD, os quais serão logo acrescidos do Telecine HD. A TVA destaca-se entre as operadoras pelo serviço de Locadora Virtual, que permite ver seriados e filmes como se tivessem sido alugados em uma loja de locação de vídeos. A diferença para o pay-per-view é que o usuário não precisa esperar por um horário específico para acessar o que deseja. As operadoras de televisão por assinatura já esperavam pela digitalização da TV aberta. Frente a essa modernização, foram estimuladas a apresentar outros diferenciais. Mas a concorrência da televisão aberta digital deve ser relativizada, pois a principal motivação dos assinantes continua sendo a diversidade de canais, que oferece programas para todos os gostos. Assim como Net, Sky e TVA, as programadoras de canais pagos também estão em alerta quanto à modernização de conteúdo. Com isso, sentem a necessidade de produzir maior quantidade de produtos no formato digital, de modo a manter o setor abastecido. A Globosat é 5

SKY. TV Digital. Disponível em: <http://www.sky.com.br/sonasky/tecnologia/tv_digital.aspx> Acesso em: 28 maio 2009. 6 TVA. Histórico. Disponível em: <http://www.tva.com.br/institucional/quemsomos/Historico.jsp>. Acesso em: 30 out. 2008. 7 NALDONI, Thaís. TVA anuncia canais Globo em sua grade. Portal Imprensa, São Paulo, 14 mar. 2008. Disponível em: <http://portalimprensa.uol.com.br/portal/ultimas_noticias/2008/03/14/imprensa17894.shtml>. Acesso em: 10 ago. 2009. 8 Conjunto de canais oferecido por uma operadora.


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a maior programadora do Brasil e, conseqüentemente, a que mais tem feito investimentos na área. São de sua responsabilidade os canais de alta definição Globosat HD, GNT HD, Megapix HD, Brasil HD, Mutishow HD, SporTV HD, Combate HD, Playboy TV HD, muitos deles desenvolvidos em parceria com outros grupos. Em sua estréia, em 1991, exercia função de distribuidora, porém, com a criação da Net Brasil, destinada somente à venda, distribuição e prestação de serviços na área de televisão por assinatura, em 1993, a Globosat destinou seu segmento exclusivamente à programação e a geração de conteúdos.9 Os canais de jornalismo Globo News e Fox News disponibilizam um menu para o usuário navegar e acessar notícias enquanto assiste aos telejornais. As informações são atualizadas em tempo real, dividindo-se em temas como plantão, esportes, indicadores, econômicos, política, tecnologia, reportagens com personalidades e destaques da programação. No caso da Fox, o conteúdo é atualizado pela equipe de redação do próprio canal, sediado em Miami, nos Estados Unidos. Não há custos adicionais para estes serviços interativos. O programa TVZ, do canal Multishow, também oferece alguns recursos. Ele conta com a exibição de videoclipes e conteúdo ligado à cultura pop e torna possível o acesso de notícias na tela, além de letras de músicas em ordem cronológica de exibição, programação da semana e ranking de clipes do Top TVZ. Há também o programa Happy Hour, exibido pelo canal GNT, onde é permitida interação ao vivo mais avançada. É possível saber mais sobre a atração e os apresentadores, visualizar em tempo real as mensagens enviadas pelos internautas através do site da emissora e obter informações adicionais sobre o tema de cada edição, assim como a agenda dos próximos programas. Dois dos produtos mais vendidos na TV por assinatura também possuem tecnologia de interatividade. No canal Premier Interativo, podem ser encontradas informações adicionais às transmissões de futebol na Net e Sky, como resultados, escalações de times, tabela completa de jogos, classificação e mapa dos canais onde os jogos serão transmitidos. Já para os que gostam do reality show Big Brother Brasil, os assinantes do pay-per-view da Net têm acesso a um conteúdo interativo exclusivo, que traz notícias atualizadas, enquetes, resultados das votações e um breve histórico de cada participante. Regulamentação e tecnologia O avanço da digitalização da TV por assinatura acontece em um novo momento da regulamentação da comunicação audiovisual brasileira de acesso condicionado. Por acesso 9

GLOBOSAT. Quem Somos. Disponível em: <http://globosat.globo.com/internas/quemsomos.asp>. Acesso em: 22 nov. 2008.


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condicionado entenda-se qualquer distribuição de conteúdo audiovisual eletrônico dependente de contratação remunerada prévia por assinantes. Em 2007, o deputado federal Paulo Bornhausen (DEM-SC) lançou o projeto de lei nº 29 (PL 29), que promove mudanças na organização e exploração das atividades do setor. Pela sua importância social, o projeto recebeu diversas emendas, especialmente na fase de relatoria da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, quando ficou sob responsabilidade do parlamentar Jorge Bittar (PT-RJ). Um texto substitutivo foi desenvolvido a partir do estudo das propostas, que acabou tomando ares polêmicos, devido à inserção de cotas de programação brasileira na televisão paga e à abertura do mercado para as empresas de telefonia fixa, as chamadas teles. A Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA) afirma que as obrigações relacionadas às cotas podem inviabilizar as operações de televisão paga. Isso porque a alta definição ocupa mais espaço na plataforma operacional, comparativamente com a definição padrão, havendo ainda a necessidade de uso da faixa de transmissão para efetivar a interatividade. Assim, as empresas entendem que precisariam abdicar de canais de grande audiência, para atender os requisitos legais, acarretando na perda de assinantes.10 A dificuldade aumenta com a obrigatoriedade de transmitir gratuitamente a programação das emissoras geradoras locais, cujo sinal alcance a área de prestação de serviço de acesso condicionado, e mais 10 canais obrigatórios de controle público ou estatal. Contra a manutenção do texto, as empresas alegam que por um longo período as operadoras de TV por assinatura terão de disponibilizar espaço na sua infra-estrutura para transmitir os sinais do mesmo canal nas freqüências analógica e digital. Além do risco de perder assinantes com a mudança na programação, as empresas ainda terão de preparar os cofres para o pagamento de um segundo tributo específico, a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine), que tem por fato gerador a distribuição de conteúdo audiovisual. O tributo visa o financiamento da produção brasileira, em uma tentativa de buscar uma compensação do setor nacional, a partir dos lucros obtidos pelos oligopólios midiáticos transnacionais. As empresas querem que o novo tributo seja retirado do projeto, substituindo-o, para tal finalidade, por uma melhor aplicação do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações 10

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TV POR ASSINATURA. Considerações da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA), do Sindicato das Empresas de TV por Assinatura (SETA) e do Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Sistemas de TV por Assinatura e Serviços Especiais de Telecomunicações (SINCAB) acerca das disposições contidas no Substitutivo ao PL 29/2007. Disponível em: <http://tvporassinatura.bizsolution.com.br/portals/0/Comentarios_da_ABTA_ao_PL29_23032008_2.pdf>. Acesso em: 18 out. 2008. p. 2.


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(Fust), pago pelas operadoras e destinado exclusivamente para a telefonia. Contudo, nada provoca tantos temores para as empresas de pay TV quanto a possibilidade das teles entrarem no mercado. No texto substitutivo de Bittar, são revogadas as restrições legais e contratuais para estas prestarem serviço de radiodifusão a cabo.11 A ABTA, juntamente com o Sindicato das Empresas de TV por Assinatura (SETA) e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Sistemas de TV por Assinatura e Serviços Especiais de Telecomunicações (SINCAB), entende que, para manter o desenvolvimento do setor, é necessária a preservação da não-competição das operadoras de televisão paga com as teles. As empresas de telefonia fixa são redes extremamente desenvolvidas, em virtude da alta capilaridade no território brasileiro, pelo seu trabalho no serviço de telecomunicação. Segundo as três entidades, tal estrutura de rede trará desequilíbrio para a concorrência. Com este receio, elas defendem o estabelecimento de medidas como implementação da desagregação de redes, efetivação da portabilidade numérica e aplicação da assimetria tarifária. Os cuidados evitariam a concentração da rede em grandes conglomerados econômicos. A primeira medida, inclusive, é prevista no art. 150 da Lei n.º 9.472/97 (Lei Geral de Telecomunicações).12 A ABTA, o SETA e o SINCAB também se manifestam contra o controle das diferentes plataformas tecnológicas, como MMDS, cabo e DTH, por uma concessionária de telefonia fixa, na sua área de concessão.13 O controle de todas as plataformas desarmonizaria o mercado, a ponto de extinguir empresas prestadoras de serviço, como as que até hoje investiram no desenvolvimento da TV por assinatura, e as pequenas operadoras. As entidades acreditam que a entrada das teles não resultará na redução do preço de serviço de televisão paga, estipulada hoje em aproximadamente R$ 7,00 mensais para cada canal. Apostam que menos ainda resultará na universalização do serviço, limitado a 8% da população brasileira.14 Muito pelo contrário: compreendem que a possibilidade atrapalha a segurança em investimentos de alto peso, como os valores exigidos para a digitalização do

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BRASIL. COMISSÃO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA, COMUNICAÇÃO E INFORMÁTICA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei nº 29, de 2007. Disponível em: <http://www.deputadobittar.com.br/pdf/080502_ef_pl29.pdf>. Acesso em: 18 out. 2008. 12 BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9472.htm>. Acesso em: 19 out. 2008. 13 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TV POR ASSINATURA. Projeto de Lei nº 29, de 2007. Disponível em: <http://tvporassinatura.bizsolution.com.br/portals/0/Comentarios_da_ABTA_ao_PL29_23032008_2.pdf>. Acesso em: 18 out. 2008. p. 4. 14 BRITTOS, Valério Cruz; SILVA JÚNIOR, Ary Nelson. PL-29: conteúdo nacional e mais diversidade. Observatório do Direito à Comunicação, São Paulo, 3 set. 2008. Disponível em: <http://www.direitoacomunicacao.org.br/novo/content.php?option=com_content&task=view&id=3949>. Acesso em: 2 out. 2008.


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serviço. As especulações sobre o futuro do mercado devem continuar por um bom tempo. Após ficar por quase um ano na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara e mais seis meses na Comissão de Defesa do Consumidor da mesma Casa, e tendo recebido diversos pedidos de vista do substitutivo apresentado pelo deputado Vital do Rego Filho (PMDB-PB), a expectativa é que o PL 29 seja levado à votação ainda na atual legislatura. No texto do deputado paraibano, relator na Comissão de Defesa do Consumidor, foram mantidas algumas propostas de Bittar, como a exigência de cotas para a produção nacional e independente. Rego Filho também adicionou regras para a distribuição de audiovisual pela internet e a compra avulsa de canais pelos consumidores. O relator mexeu ainda na regra do must carry, de modo a reforçar o poder das radiodifusoras, e passou para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) a responsabilidade de eleger os canais obrigatórios, no caso de tecnologias que não comportem a distribuição dos sinais regionais. A demora na elaboração da lei da convergência em telecomunicações e comunicação de massas (radiodifusão), representada pelo PL 29, também atrapalha a liberalização de licenças. Cerca de 500 solicitações para operar televisão paga adormecem nos arquivos da Anatel, desde 2001.15 Outras 25 licenças de TV por assinatura, emitidas três anos antes, na condição de “serviço especial”, estão vencidas, colocando os responsáveis pela transmissão na ilegalidade. A própria Anatel está esperando a posição do Congresso para regulamentar o Serviço de Comunicação Eletrônica de Massa, que unificaria a legislação de todas as tecnologias de televisão paga, com exceção do serviço a cabo, por este já possuir uma lei específica. O uso da tecnologia nacional na implantação da TV digital no Brasil é aguardado com expectativa por parte do empresariado nacional e, especialmente, por pesquisadores que defendem o desenvolvimento de hardwares e softwares nacionais. Ao contrário do que ocorreu com a televisão paga, em que todo o investimento realizado pelas operadoras foi em equipamentos e materiais importados, espera-se que a digitalização da TV aberta brasileira trabalhe com um índice maior de componentes e equipamentos produzidos no país. 16 O componente nacional de maior destaque é o Ginga, um software intermediário (middleware) aberto do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (SBTVD), responsável por aplicações interativas para a nova televisão. Além de atuar de forma independente à 15

MORAIS, Márcio de. Mais 500 municípios querem TV paga. Abert, Brasília, 19 set. 2008. Disponível em: <http://www.abert.org.br/D_mostra_clipping.cfm?noticia=119971>. Acesso em: 13 out. 2008. 16 BOLAÑO, César Ricardo Siqueira; BRITTOS, Valério Cruz. A televisão brasileira na era digital: exclusão, esfera pública e movimentos estruturantes. São Paulo: Paulus, 2007. p. 211.


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plataforma de hardware dos fabricantes dos terminais de acesso (set-top boxes ou aparelhos receptores da televisão digital), ele reúne um conjunto de tecnologias e inovações brasileiras que o tornam a especificação mais avançada e de melhor adequação à realidade do país. Para entender a qualidade tecnológica do Ginga, basta estar atento às recentes negociações relacionadas à interatividade digital. A Comcast, principal operadora de TV a cabo dos Estados Unidos, anunciou uma parceria com o Yahoo e a Intel, com a finalidade de oferecer pequenas janelas interativas, conhecidas por widgets, em televisores, decodificadores e outros aparelhos conectados a eles. As widgets permitem que os telespectadores, através do controle remoto, conversem ou troquem e-mails, assistam a vídeos, acompanhem ações ou placares esportivos e mantenham-se atualizados em termos de notícias.17 O software brasileiro é capaz de realizar todas essas ações apenas com o uso do Ginga-NCL, como foi demonstrado no Congresso da Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão, em 2008. O Fórum do SBTVD anunciou que os primeiros conversores com Ginga estarão prontos para entrar no mercado ainda em 2009.18 A fabricante norte-americana de softwares Sun Microsystems liberou em março de 2009 as especificações gratuitas do módulo Java para serem reproduzidas a partir de dezembro do mesmo ano, permitindo aos fabricantes de conversores e radiodifusores usarem os aplicativos interativos da plataforma baseada em NCL e em Java sem o pagamento de royalties. Entretanto, a primeira leva de conversores com o middleware nacional deve usar apenas o Ginga-NCL, pois não haverá tempo hábil para o desenvolvimento do Ginga completo. Caso as empresas de televisão por assinatura apóiem o Ginga, a indústria local receberá um importante incentivo para o aperfeiçoamento da tecnologia, reforçando a escala de produção, que já ocorrerá com a definida adesão ao middleware pelas emissoras de radiodifusão aberta. Como conseqüência, a exportação do Ginga pode crescer, principalmente para países da América Latina, tornando o Brasil tão pioneiro na área quanto o foi no processo de automação bancária. Considerações conclusivas As transmissões digitais em sinal digital aberto começaram em dois de dezembro de 2007 para a Grande São Paulo e têm junho de 2013 como teto para todas as geradoras e 17

LUCA, Cristina de. É hora de o Brasil ficar à reboque na TV digital? Convergência Digital, Porto Alegre, 23 set. 2008. Disponível em: <http://www.convergenciadigital.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=15993&sid=54>. Acesso em: 20 out. 2008. 18 LUCA, Cristina de. Conversores com Ginga deverão entrar no mercado até maio. Convergência Digital, Porto Alegre, 30 set. 2008. Disponível em: <http://www.convergenciadigital.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=16087&sid=8>. Acesso em: 20 out. 2008.


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retransmissoras do país aderirem ao novo modelo, segundo a portaria do Ministério das Comunicações nº 652, de 10 de outubro de 2006. A TV por assinatura deve crescer com esse avanço, na medida em que passa a haver escala de produção e de aparelhos receptores adequados à tecnologia. Em médio prazo, a televisão digital paga deverá ser mais do que transmissão em alta definição. Assim como na radiodifusão, a interatividade assumirá a posição de grande novidade, por oferecer, no futuro, serviços como bate-papo virtual, troca de e-mails, acesso a vídeos especiais, placares esportivos, previsão do tempo e notícias de agências eletrônicas. Tudo isso através do controle remoto, o que é inédito para a maioria dos brasileiros. A adesão à tecnologia brasileira desenvolvida pelo SBTVD e representada pelo middleware Ginga também será uma importante surpresa. Ao contrário do que aconteceu na chegada da televisão paga ao Brasil, a digitalização da TV tem a chance de incentivar a indústria brasileira a exportar o Ginga para outros países, visto a qualidade do produto e o custo zero em royalties para fabricantes ou radiodifusores. As empresas do setor estão com muitas expectativas, devido ao Projeto de Lei nº 29, que regulamenta a área. Se, por um lado, o incentivo à produção nacional e regional é importante para a sociedade brasileira, por outro significa riscos para as empresas, que podem perder público consumidor nas classes A e B, além de ter seus custos acrescidos. Da mesma forma, a entrada das teles será saudável para a ampliação da concorrência, mas altamente danoso para o atual oligopólio do setor, caso não haja medidas preventivas que segurem o ímpeto das poderosas empresas de telefonia fixa. O fato é que o avanço da digitalização é imprescindível para que o serviço televisivo pago continue interessante aos usuários, assim como no sistema aberto. Aproximar televisão e internet será o horizonte dessa atividade nos próximos anos, a ponto de revolucionar todo um formato de produção de conteúdo para atender às demandas da convergência, incluindo os recursos de interatividade. Resta saber quais caminhos garantirão aos agentes do mercado a certeza do lucro, bem como à sociedade brasileira um serviço de qualidade, voltado para a democratização de seu principal meio de informação e entretenimento. Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TV POR ASSINATURA. Considerações da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA), do Sindicato das Empresas de TV por Assinatura (SETA) e do Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Sistemas de TV por Assinatura e Serviços Especiais de Telecomunicações (SINCAB) acerca das disposições contidas no Substitutivo ao PL 29/2007. Disponível em: <http://tvporassinatura.bizsolution.com.br/portals/0/Comentarios_da_ABTA_ao_PL29_23 032008_2.pdf>. Acesso em: 18 out. 2008.


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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TV POR ASSINATURA. Projeto de Lei nº 29, de 2007. Disponível em: <http://tvporassinatura.bizsolution.com.br/portals/0/Comentarios_da_ABTA_ao_PL29_23 032008_2.pdf>. Acesso em: 18 out. 2008. BOLAÑO, César Ricardo Siqueira; BRITTOS, Valério Cruz. A televisão brasileira na era digital: exclusão, esfera pública e movimentos estruturantes. São Paulo: Paulus, 2007. BRASIL. AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES. Dados estatísticos da TV por Assinatura Abril/2009. Disponível em: <http://www.anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao =227987&assuntoPublicacao=Dados%20Estatísticos%20dos%20Serviços%20de%20TV %20por%20Assinatura%20-%20Cap.%2001%20%2037.ª%20Edição&caminhoRel=null&filtro=1&documentoPath=227987.pdf>. Acesso em: 20 set. 2009. BRASIL. COMISSÃO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA, COMUNICAÇÃO E INFORMÁTICA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei nº 29, de 2007. Disponível em: <http://www.deputadobittar.com.br/pdf/080502_ef_pl29.pdf>. Acesso em: 18 out. 2008. BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9472.htm>. Acesso em: 19 out. 2008. BRITTOS, Valério Cruz; SILVA JÚNIOR, Ary Nelson. PL-29: conteúdo nacional e mais diversidade. Observatório do Direito à Comunicação, São Paulo, 3 set. 2008. Disponível em: <http://www.direitoacomunicacao.org.br/novo/content.php?option=com_content&task=vi ew&id=3949>. Acesso em: 2 out. 2008. DIGITALIZAÇÃO revigora TV por assinatura via microondas. Clic RBS, Porto Alegre, 21 jul. 2008. Disponível em: <http://www.clicrbs.com.br/especiais/jsp/default.jsp?template=2095.dwt&newsID=a2058 197.htm&tab=00052&order=datepublished&espid=56&section=Not%EDcias&subTab=0 4441>. Acesso em: 23 out. 2008. LAUTERJUN, Fernando. TV paga tem mais de 100 mil assinantes em HD; Brasil lidera digitalização na América Latina. Tele Time, São Paulo, 13 ago. 2009. Disponível em: <http://www.teletime.com.br/News.aspx?ID=143055>. Acesso em: 18 set. 2009. GLOBOSAT. Quem Somos. Disponível <http://globosat.globo.com/internas/quemsomos.asp>. Acesso em: 22 nov. 2008.

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Acesso em: 13 out. 2008. NALDONI, Thaís. TVA anuncia canais Globo em sua grade. Portal Imprensa, São Paulo, 14 mar. 2008. Disponível em: <http://portalimprensa.uol.com.br/portal/ultimas_noticias/2008/03/14/imprensa17894.sht ml>. Acesso em: 10 ago. 2009. NET. TV Digital. Disponível em: <http://netcombo.globo.com/netPortalWEB/index.portal?_nfpb=true&_pageLabel=tv_digi tal_hd_max_home_page> Acesso em: 28 maio 2009. RIBEIRO, Evelin. Net amplia oferta de serviço digital com novos canais em alta definição. IDG Now, São Paulo, 23 jun. 2009. <http://idgnow.uol.com.br/telecom/2009/06/23/netamplia-oferta-de-servico-digital-com-novos-canais-em-alta-definicao/> Acesso em: 24 jun. 2009. SKY. TV Digital. Disponível em: <http://www.sky.com.br/sonasky/tecnologia/tv_digital.aspx> Acesso em: 28 maio 2009. TVA. Histórico. Disponível em: <http://www.tva.com.br/institucional/quemsomos/Historico.jsp>. Acesso em: 30 out. 2008.


TICs e Gestão Pública em Planos Diretores de Cidades Brasileiras Othon Jambeiro1, Rosane Sobreira2, Priscila Rabelo3 Resumo – o texto resulta de pesquisa sobre os planos diretores de cidades brasileiras, nos quais se procurou identificar como as tecnologias de informação e comunicações são abordadas. A metodologia foi montada a partir da obrigação constitucional de os municípios que têm 20 mil ou mais habitantes serem obrigados a ter plano diretor de desenvolvimento. A pesquisa analisou os planos das duas cidades mais pobres e das duas mais ricas de cada estado brasileiro, todas abrangidas pela obrigação constitucional. O resultado mostrou pouca preocupação das cidades com as tecnologias avançadas de informação e comunicações, embora quase todas tenham fixado em seus planos a proposta de construção de sistemas de informação. Inclusão digital e transparência de gestão são valores pouco considerados nos planos. Palavras-Chave – Cidades. Planos Diretores. Tecnologias de informação e comunicações. Transparência de gestão. Eficiência de gestão. Abstract – This paper results from a research about Brazilian cities master plans, focused on identifying how they value information and communications technologies. Methodology is based on the constitutional requirement for municipalities with 20 thousand inhabitants and more to have master plans. The plans of the two poorest and the two richest cities in each Brazilian state were examined. The results showed low level of municipalities concern with advanced information and communication technologies, even though most of them have put in their plans proposals for the creation of information systems. Digital inclusion and accountability are values without much importance in the master plans. Key-Words – Cities. Cities master plans. Information and communications technologies. Accountability. Public Management efficiency. RESUMEN – el texto resulta de una investigación acerca de los planes directores de ciudades brasileñas, en donde se buscó identificar cómo se enfocan las tecnologías de información y comunicación. La metodología se estableció teniendo en cuenta una exigencia constitucional respecto a los municipios con veinte mil habitantes y más, puesto que a ellos se les obliga a tener un plan director de desarrollo. La investigación analizó los planes de las dos ciudades más pobres y de las dos más ricas de cada Estado brasileño, todas implicadas en la obligación constitucional. Los resultados enseñan poca preocupación por parte de las ciudades con las tecnologías avanzadas de información y comunicación, aunque casi todas fijen en sus planes propuestas de construcción de sistemas de información. Inclusión digital y gestión transparente son valores que conllevan poco interés en los planes. Palabras claves – Ciudades. Planes directores. Tecnologías de información y comunicación. Transparencia de la gestión. Eficiencia de la gestión.

1 INTRODUÇÃO Este trabalho se situa na perspectiva teórica da relação entre cidades, cidadania, democracia, informação e comunicações, no contexto da chamada Sociedade da

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Mestre em Ciências Sociais (USP), PhD em Communication Studies (University of Westminster, Londres), Professor Titular ICI/UFBA, pesquisador IB CNPq. othon@ufba.br 2 Bolsista de Apoio Técnico, CNPq, Graduada em Arquivologia pelo Instituto de Ciência da Informação/UFBA. rosanevs@yahoo.com.br. 3 Bolsista de Iniciação Científica, CNPq, aluna do Instituto de Ciência da Informação/UFBA. rabelo.priscila@yahoo.com.br.


Informação. Do ponto de vista conceitual são assumidas duas premissas básicas: (1) as instituições políticas, econômicas e sociais do município são focadas como loci primários de prática democrática e, como tais, formadoras de cidadãos; (2) informação e comunicações são consideradas fatores-chave para o exercício da cidadania e conseqüente ampliação e aprofundamento da participação social e política dos cidadãos. A pesquisa tem como universo municípios brasileiros cujas configurações – ter mais de 20 mil habitantes ou possuir as características previstas no art. 41 do Estatuto das Cidades4 – os obrigam a ter planos diretores. A base legal dessa obrigação está naquele Estatuto (Lei nº 10.257/2001) e nos arts. 182 e 183 da Constituição Federal. Tanto a Lei quanto posteriores resoluções do Conselho das Cidades − órgão vinculado ao Ministério das Cidades − advogam insistentemente a livre circulação de informações e a participação popular como imprescindíveis para a boa gestão pública dos recursos municipais. No mundo contemporâneo isto só pode ser alcançado plenamente – embora não exclusivamente - por meio do uso de tecnologias de informação e comunicações. A contribuição do cidadão na construção de um governo mais eficiente depende essencialmente do seu acesso à informação pública. É a partir dela que pode instrumentar-se para propor ações, expor criticas, acompanhar o cumprimento de metas, e fiscalizar as ações do governo e a gestão dos recursos do município. Aos governantes cabe manter suas gestões em permanente transparência e assegurar dispositivos que possibilitem e estimulem a participação da população. Consideradas, hoje, aliadas - não exclusivas, mas imprescindíveis - no processo de construção de governos eficientes, transparentes e democráticos, as TICs necessitam, para bem operarem, de ações favorecedoras de inclusão digital da população e investimentos em infra-estrutura tecnológica. Com isso os governantes podem aumentar: a eficiência administrativa,

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Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades: I – com mais de vinte mil habitantes; II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal; IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico; V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional. § 1o No caso da realização de empreendimentos ou atividades enquadrados no inciso V do caput, os recursos técnicos e financeiros para a elaboração do plano diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas. § 2o No caso de cidades com mais de quinhentos mil habitantes, deverá ser elaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o plano diretor ou nele inserido.


inclusive com o trabalho em rede; a oferta de serviços on-line; a divulgação de informações para a população; e o recebimento de sugestões, críticas e apoios. Este texto busca verificar se e quão presentes estão as tecnologias de informação e comunicações (TICs) nos Planos Diretores de uma amostra de 98 municípios, selecionados dentre os 1.651 que compõem o universo considerado. A variável principal é o PIB desses municípios, segundo pesquisa do IBGE. Para efeito de comparação foram escolhidos os dois mais ricos e os dois mais pobres do universo de cada Estado. A metodologia, abrangendo todos os procedimentos utilizados está explicada na seção 3 Métodos.

2 ASPECTOS TEÓRICOS 2.1 Sobre eficiência e transparência de gestão pública Os governos, em nível federal, estadual e municipal, estão, cada dia mais, diante de possibilidades e desafios para a promoção de eficiência e transparência da administração pública. Isto significa incluir, em seus processos decisórios, a mais ampla gama de representações da sociedade civil, e os cidadãos em particular, assegurando os meios para que “todos os segmentos da sociedade estejam representados e possam participar da gestão” (TEIXEIRA, 2004, p. 14). São múltiplas as ações para alcançar eficiência – que abrange economia de custos e racionalidade administrativa e operacional – e transparência de gestão – que depende de fluxos de informação multidirecionais e canais de comunicação de vários níveis, que permitam participação social e política. Na gestão participativa, as decisões são tomadas em consonância com as opiniões dos cidadãos, ou seja, a democracia não se expressa somente nas eleições periódicas, mas também durante o mandato, nos processos decisórios sobre o que, quando e como fazer. As propostas são submetidas à discussão pública e todos podem criticar, sugerir e julgar. Tem-se tornado evidente que se a população participa do processo decisório, aumenta a possibilidade de se ter uma gestão mais eficiente. Para que as pessoas possam opinar e interferir é preciso, contudo, que disponham de informações, adequadas em quantidade e qualidade, em linguagem compreensível, facilmente acessáveis a qualquer tempo, com base nas quais poderão desenvolver seu senso crítico. A transparência de gestão tem aí importante papel, garantindo os fluxos de informação e canais de


comunicação necessários para assegurar que os cidadãos possam e queiram participar, opinar e partilhar as decisões. Quando um governo expõe suas ações e presta contas, submete-se à avaliação da população e se distancia de uma forma autoritária de governo. O diálogo constante e direto com a população permite-lhe detectar falhas na gestão e corrigi-las, assim como obter resposta rápida sobre aceitação ou recusa de novos programas e projetos. Num governo autoritário, ao contrário, as decisões e informações são mantidas sob sigilo, ficando os cidadãos à margem do processo decisório. A transparência nas decisões confere ao governo maior credibilidade e inibe a corrupção, pois “quanto maior for a quantidade de informação disponível abertamente pelo governo e sobre o governo, menor será a possibilidade deste governo conseguir ocultar atos ilegais, corrupção e má administração” (UHLIR, 2006, p. 14). A transparência, portanto, estimula a democratização, dando a todos a possibilidade de conhecer, criticar e opinar sobre as ações do governo, otimizando-o e reduzindo caminhos de autoritarismo, corrupção e ineficiência. Como dito acima, condição primordial para uma gestão democrática é que informações relevantes que envolvem o governo possam ser acessadas facilmente e de forma compreensível pelos cidadãos. A Constituição Brasileira de 1988, no artigo 216, § 2º, assegura ao cidadão o direito de acesso a essas informações e designa a administração pública como responsável por garantir esse acesso: “cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem”. Dowbor (2004, p. 3) chama a atenção para o fato de que “na ausência de informações articuladas para permitir a ação cidadã informada, geramos pessoas passivas e angustiadas.” Neste sentido, uma política de informação deve ser concebida para orientar as ações que estejam focadas na “produção e disseminação da informação pública, que satisfaça as necessidades dos cidadãos [...]” (UHLIR, 2006, p. 17). É importante a existência desta política, porque “a informação é um recurso efetivo e inexorável para as prefeituras e cidades, principalmente quando planejada e disponibilizada

de

forma

personalizada,

com

qualidade

inquestionável

e

preferencialmente antecipada, para facilitar as decisões dos gestores locais e também dos seus munícipes” (REZENDE, 2005, p. 1).


Em suma, só é possível participar daquilo que se conhece. O cidadão que desconhece as ações e as informações governamentais não tem instrumentos para interferir na gestão pública, ainda que lhe seja dada a oportunidade. O governo que não promove o acesso nem põe em debate público suas ações e informações, está dificultando o exercício da democracia. Uhlir (2006, p. 37) afirma que “a maximização do fluxo aberto e irrestrito de informação entre o governo e o público é um aspecto fundamental para uma sociedade democrática e para a promoção de uma boa governança”. Pode-se mesmo afirmar que o nível de democratização de um Estado é proporcionalmente direto ao nível de transparência do seu governo. Ou, como diz Jardim: “[...] maior o acesso à informação governamental, mais democráticas as relações entre o Estado e sociedade civil” (1999, p. 49).

2.2 O papel das tecnologias de informação e comunicações A transparência da gestão vem se beneficiando, nos últimos anos, do crescente uso de tecnologias de informação e comunicações (TICs), especialmente da Internet, por vários segmentos de governo. É significativa a presença na Web de informações sobre ações governamentais, prestação de contas de gastos e investimentos, oferta de serviços online, dentre outras aplicações. Conforme Teixeira (2004), essas tecnologias se constituem num poderoso instrumento de apoio à administração pública, pois permitem: a oferta de novos serviços; a ampliação da eficiência e da eficácia dos serviços públicos; a melhoria da qualidade dos serviços prestados; a construção de novos padrões de relacionamento com cidadãos e de novos espaços para a promoção da cidadania. Ele adverte, contudo, que é preciso garantir o acesso às informações a todos os cidadãos, evitando uma segregação entre os que podem e sabem usar as tecnologias de informação e os que não têm esta possibilidade (TEIXEIRA, 2004, p. 9). As TICs permitem interação mais rápida, prática e dinâmica entre governo e sociedade e podem ser utilizadas pelo poder público para disponibilizar informações confiáveis e tematicamente organizadas, para que sejam rapidamente localizadas e utilizadas. Portanto, um dos desafios dos gestores municipais é a “organização da informação segundo as necessidades práticas dos atores sociais que intervêm no processo de desenvolvimento social” (DOWBOR, 2004, p. 4). Sorj (2003) afirma que o uso da Internet contribui para a reforma e democratização do Estado, destacando-se entre seus benefícios a “redução da corrupção,


da apropriação privada dos bens públicos e o enorme desperdício e ineficiência aos quais o estado e o funcionalismo público estiveram associados” (SORJ, 2003, p. 88). O certo é que, com o desenvolvimento das TICs, principalmente da Internet, a disponibilidade de informações e serviços de caráter público, em meio eletrônico, aumentou significativamente nos últimos anos. Os governos parecem buscar cada vez mais a informatização dos seus serviços. No entanto, a simples criação de Websites e a divulgação, por meio deles, de informações do governo, não garantem uma gestão transparente. Divulgar relatórios ou notícias promocionais na Internet não é exatamente promover cidadania. Devem ser fornecidas informações sobre os distintos aspectos da gestão, claras, de relevância e de fácil compreensão por todos. A adoção das TICs não é um objetivo em si mesmo e sim um método. Ou seja, elas são ferramentas fundamentais para alcançar objetivos previamente definidos, particularmente dois, considerados primordiais, do ponto de vista da gestão pública, que são a transparência e a eficiência da gestão.

2.3 Sobre capacitação de cidadãos As TICs estão criando novas possibilidades para o exercício da cidadania, sendo que o acesso à informação constitui a condição sine qua non para que os cidadãos possam cumprir seus deveres e usufruir de seus direitos, bem como para solucionar seus problemas. Elas permitem que informações produzidas por diversas instituições, governamentais

ou

não,

sejam

amplamente

e

rapidamente

divulgadas.

Conseqüentemente, a utilização das TICs, especialmente da Internet, pode aumentar a eficácia dos serviços, desenvolver ou reforçar a sociedade civil e fortalecer as relações entre governo e sociedade. Isto vale também para as relações de trabalho dos cidadãos. As mudanças que as TICs propiciam implicam no treinamento tanto dos servidores públicos quanto dos cidadãos. É essencial, pois, que o poder público desenvolva políticas amplas de inclusão digital, que permitam inserir ambos os segmentos na chamada Sociedade da Informação. No caso da inclusão digital dos cidadãos, em particular, Santos (2005) adverte que ela resulta de vários fatores, entre os quais: políticas públicas voltadas para os direitos dos cidadãos; capacitação destes, para que possam transformar a realidade, “interferindo nos espaços democráticos existentes ou criando novos espaços para o desenvolvimento da justiça, da paz e da igualdade, através do uso das tecnologias de


informação e comunicação” (SANTOS, 2005, p. 89); e disponibilização a todos, sem exceção, de acesso a essas tecnologias. No entanto, grande parte da população não dispõe de recursos para utilizar essas facilidades, não tem capacitação adequada e, muitas vezes, não tem conhecimento sobre seu potencial. Na verdade, o grau de acessibilidade à informação e aos serviços públicos, independentemente do uso das TICs, varia de cidadão para cidadão. Escolaridade, poder aquisitivo, posição social ou inserção em determinados grupos de referência, são fatores que levam distintos cidadãos a terem diferentes condições de acesso. Grande parte da população está mal posicionada nessas variáveis: são os excluídos sociais, quase sempre também excluídos digitais. Em conseqüência, a Internet garante mais disponibilidade de informações públicas, mas pode aumentar as desigualdades de acesso à informação e aos serviços públicos, por absoluta ou relativa ausência de condições de muitos indivíduos para utilizarem essa tecnologia e mesmo para o exercício pleno da cidadania. Abolir a realização presencial de alguns serviços, disponibilizando-os somente pela Internet, por exemplo, restringe o serviço a um único meio de acesso e aqueles que não dispõem de Internet podem ser prejudicados. Para reduzir a distância entre os “privilegiados” e os “não privilegiados” é necessária a intervenção dos governos e de organizações da sociedade civil, visando, por um lado, o aperfeiçoamento dos mecanismos sobre os quais se pode construir uma sociedade democrática, e, por outro, expandir os meios de estímulo ao exercício da cidadania e da gestão participativa. No que diz respeito aos municípios, esta nova situação, caracterizada por acelerada expansão das TICs, tem feito com que o poder público local esteja mais envolvido na concepção de políticas voltadas para permitir o acesso democrático à informação, bem como montar estruturas e serviços de informação. Há crescente reconhecimento de que o livre acesso à informação pública é um direito do cidadão, cabendo ao poder público desenvolver ações para assegurá-lo. Por outro lado, isso implica na capacitação e qualificação dos cidadãos. Porque para incluí-los, particularmente os que se situam nas camadas desfavorecidas, "[...] não basta disponibilizar o acesso à Internet ou preços acessíveis para aquisição de computadores, se problemas como analfabetismo e o baixo nível da educação de base e renda ainda afligem significava parcela da sociedade" (SILVA et al, 2004, p. 42).


Inclusão digital é capacitação dos indivíduos na utilização das tecnologias de informação e comunicações, de modo a que participem mais ativamente nos processos decisórios da sociedade. O que depende fortemente de educação formal e nível de renda apropriado. De fato, além de preparo tecnológico, as pessoas precisam saber acessar as informações de que necessitam, compreendê-las e usá-las em benefício seu, de sua família e amigos, e de sua comunidade. Isto significa que, juntamente com o treinamento dos indivíduos para o domínio tecnológico, haja também capacitação de cidadãos, conscientes de seu papel na sociedade e aptos para identificar e localizar a informação de que necessitam. Inclusão digital e inclusão social são, pois, duas faces de um mesmo problema. Borges e Machado ressaltam que há “um círculo vicioso entre exclusão digital e social: sem acesso aos recursos econômicos e educacionais para utilizar-se dos benefícios do mundo digital, o indivíduo enfrenta dificuldades para inserir-se socialmente” (2004, p. 181). Políticas públicas voltadas para a inclusão digital devem, portanto, mesclar-se com outras políticas da área social, porque só assim serão eficazes no combate à exclusão social e na construção da democracia e da cidadania.

2.4 Sobre Planos Diretores Realizado histórica e eventualmente por iniciativa própria de municipalidades, o planejamento urbano foi incluído na Constituição de 1988 (Capítulo II, Da Política Urbana) como obrigação para cidades com mais de 20 mil habitantes. O artigo n. 182 remete a obrigatoriedade para uma lei posterior, que fixou as diretrizes gerais e “tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”. A Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001, denominada Estatuto da Cidade (Art. 1º, parágrafo único), além de estabelecer as diretrizes gerais das políticas urbanas dos municípios, cria a figura do Plano Diretor. Com determinação de que seja aprovado por lei municipal, ele é estabelecido como “o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana” (Art. 40). Dele devem necessariamente derivar os planos plurianuais, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual do município. Como vimos anteriormente, indo adiante da Constituição, o Estatuto da Cidade estende a obrigatoriedade do plano para além das cidades com mais de 20 mil


habitantes. Conforme o artigo 41, estão também obrigados a tê-lo municípios que: (1) sejam integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; (2) pretendam utilizar os instrumentos previstos no § 4º. do art. 182 da Constituição5; (3) sejam integrantes de áreas de especial interesse turístico; (4) sejam inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional. Com a extensão da obrigatoriedade, passaram a ser 1.6516, de um total de 5.564 (IBGE, 2006) os municípios que devem ter planos diretores. Em termos percentuais, representam 29,67% das cidades brasileiras. Por determinação do Estatuto da Cidade esses planos devem ser elaborados de maneira participativa, por meio de: audiências públicas e debates, com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; publicidade de todos os documentos e informações que forem produzidas, a que qualquer interessado poderá ter acesso.

3 MÉTODO Os procedimentos utilizados neste trabalho foram os seguintes: 1 - O aporte teórico foi concebido a partir de revisão de literatura, com base em levantamento bibliográfico que abrangeu livros, periódicos eletrônicos e impressos acerca do tema estudado. 2 - A seleção dos municípios analisados, de cada região e estados brasileiros, obedeceu aos seguintes critérios: a) Excluíram-se as capitais, que, por serem atípicas, estão sendo objeto de estudo específico; b) Dentre os municípios que são obrigados a ter Plano Diretor foram escolhidos os dois mais ricos e os dois mais pobres de cada Estado, com base no Produto Interno Bruto - PIB, tendo com fonte o IBGE. O resultado desta escolha está no Quadro I. 5

Art. 182, Parágrafo 4º. : É facultado ao Poder Público Municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I – parcelamento ou edificação compulsórios; II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. 6 Segundo mapeamento feito pelo Ministério das Cidades, em 2006 e não alterado posteriormente.


Quadro I – Municípios Selecionados na Amostra Estados Rondônia Acre Amazonas Roraima Pará Amapá Tocantins Alagoas Bahia Ceará Maranhão Paraíba Pernambuc o Piauí Rio Grande do Norte Sergipe

Espírito Santo Minas Gerais Rio de janeiro São Paulo Mato Grosso do Sul Mato Grosso Goiás

REGIÃO NORTE Municípios selecionados Maior PIB Menor PIB Ji-Paraná Vilhena Presidente Colorado do Médici Oeste Cruzeiro do Sena Feijó Tarauacá Sul Madureira Coari Itacoatiara Jutaí Tapauá Somente a capital é obrigada a ter o Plano Diretor Barcarena* Paraupebas Curralinho Santa Bárbara do Pará Santana Laranjal do Jarí Araguaína Gurupi* Tocantinópolis Araguatins REGIÃO NORDESTE Arapiraca Marechal Paripueira Coqueiro Seco Deodoro* Camaçari* São Francisco Tremendal Boa Nova do Conde Maracanaú Sobral Farias Brito Guaiúba Imperatriz* Balsas Santa Rita Icatu Campina Cabedelo Cruz do Lucena Grande Espírito Santo Jaboatão dos Ipojuca Flores Araçoiaba Guararapes Parnaíba* Picos Coivaras Miguel Leão Mossoró* São Gonçalo São Miguel Santo Antônio do Amarante Canindé de São Nossa Senhora Poço Redondo Nossa Senhora Francisco* do Socorro das Dores REGIÃO SUDESTE Serra Vila Velha Fundão* Pancas Betim

Contagem*

Rio Manso

Duque de Campos de Iguaba Grande Caxias Goytacazes* Guarulhos* Campinas* Canas REGIÃO CENTRO-OESTE Dourados Corumbá* Bela Vista

Rondonópolis

Várzea Grande

Poconé

Anápolis

Catalão*

Mimoso de Goiás

Taquaraçu de Minas Silva Jardim Dumont* Ivinhema

Peixoto de Azevedo Santo Antônio de Goiás


Paraná

Araucária*

Santa Catarina Rio Grande do Sul

Joinville Canoas

REGIÃO SUL São José dos Pinhais* Blumenau* Caxias do Sul*

Ângulo Doutor Pedrinho Itati

Tunas do Paraná Santa Rosa de Lima Dom Pedro de Alcântara

* Municípios que possuem plano diretor disponibilizado em websites do governo municipal Fonte: IBGE, 2006.

3 - Após a seleção dos municípios, buscou-se localizar os planos diretores nos websites das prefeituras e câmaras de vereadores. Isto foi feito por meio das ferramentas de busca disponíveis na Internet. Dos 98 municípios selecionados apenas 20 disponibilizam seus planos diretores nos portais de governo (assinalados no Quadro I, com asterisco). 4 – Desenvolveu-se, em seguida: um instrumento de coleta de dados; e um banco de dados on-line, para permitir o trabalho concomitante dos três pesquisadores. O instrumento de coleta tem 39 ítens, divididos em seis campos. Com ele buscou-se: caracterizar o município; conhecer os papéis que o Plano Diretor atribui às TICs; conhecer os papéis destinados ao poder público com relação às TICs; identificar as propostas relativas à eficiência e transparência de gestão por meio do uso das TICs; e as propostas relativas à capacitação dos cidadãos. 4.1 - A caracterização do município compõe-se de, entre outros dados: Estado e Região em que se situa; Produto Interno Bruto - PIB (em 2005), de acordo com o IBGE; existência de website da Prefeitura e da Câmara de Vereadores; presença do Plano Diretor nesses websites. 4.2 No segundo campo buscou-se verificar se o poder público municipal trata das TICs: como agregadoras dos órgãos municipais; como facilitadoras das relações com os cidadãos; como facilitadoras das relações com os outros níveis de governo; como facilitadoras das relações com os empresários; como facilitadoras das relações com outros atores externos. E também se as vincula: ao desenvolvimento econômico; ao desenvolvimento social; ao desenvolvimento político/institucional. 4.3 No terceiro campo buscou-se conhecer os papéis destinados ao poder público municipal, com relação às TICs, como provedores de: equipamentos; serviços; informações; políticas e regulamentos.


4.4 No quarto campo buscou-se identificar as propostas relativas às TICs para a eficiência de gestão, por meio de: treinamento de servidores; uso das TICs; construção de infra-estrutura tecnológica; oferta de serviços de informação e comunicação; implantação de sistemas de informação. 4.5 O quinto campo cuidou de identificar as propostas relativas às TICs para a transparência de gestão, por meio de: acesso às informações da gestão; ações para a implantação de infra-estrutura tecnológica; serviços de informação e comunicação; ações para a divulgação das atividades de governo. 4.6 O último campo foi dedicado a conhecer as propostas relativas à capacitação dos cidadãos, por meio da oferta de: treinamento em informática (inclusão digital); acesso gratuito à Web; e treinamento em informática (inclusão digital) no sistema de ensino. 5 – Os dados colhidos foram, em seguida, apurados, cruzados e tabulados, procedendo-se então a sua interpretação. Os cruzamentos visaram compreender a relação existente entre as variáveis consideradas. Os resultados e as conclusões a que se chegou são apresentados a seguir.

4 RESULTADOS 4.1 Quantidade de websites por região A região Sudeste se destaca das demais tanto pelo número de municípios que disponibilizam websites quanto pela quantidade de websites localizados (78,12%). Em segundo lugar está à região Centro-Oeste (62,50%) seguida das regiões Sul (58,33%), Nordeste (48,31%) e Norte (36,36%). A quantidade total de websites por região corresponde ao somatório de websites das prefeituras e câmaras de vereadores dos municípios que compõem a amostra, sendo, portanto, oito o número máximo de websites por estado. Por exemplo, no Estado da Bahia, os quatro municípios analisados (os dois mais ricos e os dois mais pobres) poderiam ter, no máximo, oito websites: quatro das prefeituras e quatro das câmaras de vereadores. A pesquisa não levou em conta possíveis websites de secretarias e outros órgãos públicos municipais, mas apenas os portais dos dois poderes. Quadro IV – Quantidade de websites por região Região

Municípios analisados

Municípios c/ Website

%

Total de Websites*

%


Norte Nordeste CentroOeste Sudeste Sul Total

22 36 12

12 26 10

54,54 72,22 83,33

16 35 15

36,36 48,31 62,50

16 12 98

15 8 71

93,75 66,67 ─

25 14 105

78,12 58,33 ─

* Soma dos websites das prefeituras e das câmaras de vereadores. Fonte: pesquisa documental nos websites dos municípios, 2009.

De modo geral verificou-se que as prefeituras investem mais na criação e disponibilização de informações e serviços na Web do que as Câmaras de Vereadores. Em dois municípios, um no Nordeste e o outro no Sudeste, apenas as câmaras de vereadores têm websites, o que, a julgar pelos dados da pesquisa, é um fato bastante incomum. Ressalte-se também que menos de 50% dos municípios dispõem de portais governamentais disponibilizados tanto pela Prefeitura e como pela Câmara de Vereadores. Quadro V – Uso de Websites pelos Municípios Estados

Rondônia Acre Amazonas Roraima Pará Amapá Tocantins Alagoas Bahia Ceará Maranhão Paraíba Pernambuco Piauí Rio Grande do Norte Sergipe Mato Grosso do Sul

CEN TROOES TE

NORDESTE

NORTE

Região

O município possui Website da Prefeitura Câmara Prefeitura e Câmara 2 1 1 0 1 1 2 0 1 1 3 1 3 2 4

0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0

0 0 0 0 2 0 2 1 1 3 1 2 0 0 0

Total de municípios com Website 2 1 1 0 3 1 4 2 2 4 4 3 3 2 4

1 2

0 0

1 2

2 4


SUL

SUDESTE

Mato Grosso Goiás Espírito Santo Minas Gerais Rio de janeiro São Paulo Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul Total de municípios com Website

2

0

2

4

1 0

0 1

1 3

2 4

2

0

2

4

1

0

2

3

1 0 2

0 0 0

3 2 2

4 2 4

0

0

2

2

35

2

34

71

Fonte: pesquisa documental nos websites dos municípios, 2009.

No plano ideal, o fato de haver 71 municípios com pelo menos um website deveria implicar na existência de 71 planos disponibilizados. Mas foram localizados apenas 20. Os demais 51 websites deixam, portanto, de permitir aos cidadãos o acesso a informações sobre a gestão, inclusive um documento de vital importância para o desenvolvimento e a organização econômica e social do município, que é o Plano Diretor. Cruzando-se a situação econômica dos municípios com a disponibilização dos planos diretores nos portais de governo, vê-se que os municípios que se encontram em melhor situação econômica, com maior PIB, investem mais na disponibilização dos Planos via Web (36%), que os municípios que possuem menor PIB (4,17%). Mas, ainda assim, o relativamente baixo índice alcançado pelos mais ricos demonstra que os gestores municipais não estão dando ampla publicidade aos documentos que devem estar sempre disponíveis para consulta pública. Isso dificulta o acompanhamento, por parte do cidadão, das ações do poder público, bem como o cumprimento das ações definidas na política urbana.

4.2 A importância das TICs, segundo os Planos Diretores O Quadro XI mostra os resultados obtidos na análise dos itens agrupados pelos seus respectivos campos. A cada item identificado no plano diretor o município recebe


um ponto. Os itens do primeiro campo destinam-se apenas à caracterização dos municípios e não foram contabilizados para que não alterassem o real desempenho de cada município. Quadro VI – Desempenho dos municípios de acordo com os campos

SUL

SUDEESTE

CENTRO – OESTE

NORDESTE

NORTE

Região

Município (UF) Barcarena (PA)

2º 3

Campos 3º 4º 5º 0 1 0

Total

%

6º 0

4

16

Gurupi (TO)

7

1

2

3

0

13

52

Marechal Deodoro (AL) Camaçari (BA) Imperatriz (MA) Parnaíba (PI) Mossoró (RN) Canindé de São Francisco (SE) Corumbá (MS)

2

0

2

0

0

4

16

4 2 2 3 3

3 0 0 0 0

2 3 3 1 1

3 1 0 1 0

3 0 0 0 0

15 6 5 5 4

60 24 20 20 16

2

0

1

0

0

3

12

Catalão (GO)

3

0

1

2

0

6

24

Fundão (ES) Contagem (MG) Campos de Goytacazes (RJ) Guarulhos (SP) Campinas (SP) Dumont (SP) Araucária (PR) São José dos Pinhais (PR) Blumenau (SC) Caxias do Sul (RS)

0 1 8

0 0 1

0 1 3

0 1 4

0 0 2

0 3 18

0 12 72

1 1 0 6 0

2 0 1 0 0

1 3 1 4 0

0 1 1 2 0

1 0 1 2 0

5 5 4 14 0

20 20 16 56 0

2 8

0 2

3 2

2 2

0 0

7 14

28 56

Fonte: pesquisa documental nos planos diretores dos municípios, 2009.

No segundo campo, composto por oito itens, buscou-se conhecer os papéis que os planos diretores atribuem às TICs. A análise dos 20 planos mostrou o seguinte: a) a visão delas como agregadoras dos órgãos municipais foi assinalada em oito planos; b) como facilitadoras das relações com os cidadãos também em oito; c) como facilitadoras das relações com os outros níveis de governo em seis; d) como facilitadoras das


relações com os empresários em cinco; e e) como facilitadoras das relações com os atores externos em quatro. Em termos de vinculação conceitual das TICs, 14 as vinculam ao desenvolvimento político-institucional, sete ao desenvolvimento social e seis ao desenvolvimento econômico. Em síntese, portanto, os municípios atribuem às TICs principalmente os papéis de agregadoras dos órgãos municipais e facilitadoras das relações com os cidadãos. E para eles essas tecnologias estão vinculadas predominantemente ao desenvolvimento político-institucional. Observe-se que a maioria dos municípios quase não trata da conceituação das TICs, dos papéis que podem desempenhar e de suas vinculações com o desenvolvimento. As exceções são Gurupi (Tocantins), Campos de Goytacazes (Rio), Araucária (Paraná) e Caxias do Sul (R.G. do Sul) em cujos planos diretores esta questão aparece mais consistentemente. Todos quatro estão entre os mais ricos de seus respectivos estados. No terceiro campo, com quatro itens, verificou-se os papéis que os planos diretores atribuem ao poder público, no se refere às TICs: quatro dos 20 municípios destinam ao poder público o papel de provedores de informações; outros quatro o de provedor de políticas e regulamentos; e dois o de provedores de equipamentos e serviços. Ao se analisar este campo percebe-se que, também aqui, poucos municípios tratam dessas questões em seus planos. Apenas Camaçari (Bahia), Guarulhos (São Paulo) e Caxias do Sul (R.G. do Sul) abordam mais tal aspecto. Também neste caso todos estão entre os municípios mais ricos de seus respectivos estados. Os municípios, pois, não se vêem com qualquer papel no tocante às infraestruturas e serviços de informação e comunicações. Uma minoria se vê como provedores de informações e de políticas e regulamentos. No que se refere às propostas de utilização das TICs, visando eficiência de gestão, contemplada no quarto campo, os dados mostram que o objetivo mais freqüente é a implantação de sistemas de informação: 18 dos 20 planos contêm esta proposta. Com o mesmo objetivo, nove municípios propõem a oferta de serviços de informação e comunicações; dois propõem o treinamento dos servidores; e um propõe a construção e manutenção de infra-estrutura para as TICs. Ressalte-se, contudo que apenas cinco dos


20 planos mencionam explicitamente a existência de relação direta entre essas tecnologias e a eficiência da gestão. No que concerne à vinculação das TICs com transparência de gestão, contemplada no quinto campo, 11 planos prometem a oferta de serviços de informação e comunicações para o aumento da transparência; seis prometem garantia do acesso às informações produzidas pela administração municipal; três prometem divulgação das ações do poder público. Observe-se que apenas em três planos as TICs estão mencionadas explicitamente como relacionadas à transparência da gestão. Nenhum dos municípios propõe ações para a construção e/ou manutenção de infra-estrutura de TICs, visando à transparência de gestão. Campos de Goytacazes (Rio) é o que se destaca dos demais, seguido de Gurupi (Tocantins) e Camaçari (Bahia), todos situados entre os municípios mais ricos de seus estados. E como promover a capacitação de cidadãos, isto é, como estimular e garantir o exercício da cidadania via tecnologias avançadas de informação e comunicações? Esse é o questionamento do sexto e último campo. Cinco planos diretores propõem incluir o treinamento em informática (inclusão digital) nos seus sistemas de ensino; três prometem instituir acesso gratuito à Web para os seus cidadãos; e apenas um promete oferecer cursos públicos e gratuitos de treinamento em informática. Como se vê, não há, de fato, preocupação maior com a construção de cidadania, com a formação do cidadão, e, consequentemente, com a transparência efetiva e a participação plena dos munícipes na gestão dos municípios. No geral, Campos de Goytacazes (72%) é o município que obteve melhor desempenho, seguido por Camaçari, Araucária, Caxias do Sul e Gurupi, que obtiveram pontuação acima de 50%. Todos situados entre as municípios mais ricos de seus respectivos estados. Três quartos (75%) dos municípios encontram-se muito baixo da média. Nos planos de Fundão (Espírito Santo) e São José dos Pinhais (Paraná) - o primeiro entre os mais ricos e o segundo entre os mais pobres - o poder público trata apenas da questão do zoneamento municipal e não há qualquer menção ao uso das TICs para o desenvolvimento econômico e social do município.

5 CONCLUSÕES As

municipalidades

pesquisadas

parecem

reconhecer,

embora

não

enfaticamente, que, ao integrar secretarias, departamentos e órgãos, por meio do


trabalho em rede, assegura-se que haja um fluxo continuo de informações dentro das instituições. Ressai dos planos a concepção de que a implantação de Sistemas de Informação, sobre finanças públicas, saúde, educação, saneamento básico, demografia, meio ambiente, transporte, dentre outras, é essencial à gestão pública, como base para tomadas de decisão. A freqüente proposta de criação desses sistemas (18 dos 20 planos propõem criá-los) certamente objetiva reunir e disponibilizar informações municipais para auxiliar no planejamento, implantação, monitoramento e avaliação das políticas de desenvolvimento municipal. Os dados mostram também que é freqüente a concepção de que esses sistemas servem ao objetivo de facilitar a relação da municipalidade com outros níveis de governo e empresários que atuam ou desejam atuar no âmbito do município. A inclusão digital da população não parece ser percebida como um fator que pode contribuir para o desenvolvimento do município. Tampouco é vista como imprescindível à formação de cidadãos e ao incremento da participação social. No que se refere ao acesso do cidadão às informações, algumas municipalidades se comprometem a dar ampla publicidade aos documentos e informações que foram produzidos ao longo do processo de elaboração do Plano Diretor, assim como garantir que o cidadão continue tendo acesso a eles para o futuro controle e fiscalização da sua implementação. O uso intensivo dos meios de comunicação é apontado como forma de aumentar a divulgação de informações. Quando se trata de desenvolvimento social, o poder público quer investir sobretudo na divulgação de informações municipais por meio de suas webpages. Mas há propostas também – reduzidas em número, ressalte-se – para: estimular inclusão digital da população; disponibilizar equipamentos de acesso à Internet nas escolas e em espaços públicos; ampliar a rede de telefonia e de telefones públicos no município; ampliar os canais de comunicação entre o governo e a sociedade. No Plano Diretor de Campos dos Goytacazes (Rio), o poder público propõe ações que vão além das que são propostas nos demais planos. Em seus artigos 43 e 44, constam ações que contemplam inclusive a área da saúde pública, como são exemplos: a implantação do Cartão de Saúde, que facultará a informatização do agendamento de consultas; a Central de Internações informatizada; e uma central de serviços e chamadas de ambulâncias, funcionando 24 horas por dia, para a remoção de pacientes para as unidades de serviço de saúde do município. Mas isto é exceção.


No que se refere às políticas e regulamentos relacionados às TICs, poucos municípios se propõem a estabelecê-los. Na verdade, a análise dos planos diretores mostra que existe maior preocupação com a garantia da prestação dos serviços, principalmente os de comunicações. Embora não fique claro, deve-se presumir que acreditem estar fora de sua alçada regular e fixar políticas para infra-estrutura e serviços de informação e comunicações, área tradicionalmente de responsabilidade do governo federal. Apesar das TICs serem consideradas grandes aliadas da administração pública, a pesquisa mostrou que os gestores municipais ainda não estão atentos aos benefícios que podem advir de sua utilização. De fato, as menções ao uso das TICs, nos planos diretores, ainda são bastante tímidas. A inexistência de propostas mais concretas com relação a elas talvez se deva ao fato de os governos municipais desconhecerem seu próprio papel como provedores de infra-estrutura e serviços de informação e comunicações. Isto se revela claramente quando se verifica que, mesmo havendo, nos planos, vinculação conceitual das TICs ao desenvolvimento político/institucional e social, é quase inexpressiva a frequência de previsão de ações para a construção e/ou manutenção de infra-estrutura tecnológica nos municípios. Por fim, o fato de 70% dos municípios pesquisados (20 entre 98) não utilizarem os portais de governo para possibilitar o acesso do cidadão aos seus planos diretores mostra, por si só, que os gestores municipais estão ainda muito distantes do ideal de transparência governamental e plena participação popular.

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Coletivos Inteligentes: Produção Colaborativa na Camiseteria.com Cibele Bastos da Costa1

RESUMO: O desenvolvimento da tecnologia tem redefinido os processos comunicativos entre os atores de produção e consumo. Este artigo tem como objetivo analisar a interação entre os participantes de uma produção colaborativa na web. O objeto do estudo foi o blog corporativo da Camiseteria.com, uma empresa virtual que comercializa camisetas na web e utiliza o processo participativo em rede como ferramenta de construção coletiva no desenvolvimento de seus produtos. Palavras-chave: produção colaborativa, comunicação organizacional, interatividade. ABSTRACT: The development of technology has redefined communication processes between the actors of production and consumption. The aim of this paper is to analyze the interaction between the participants of the collaborative web. The object of the study was Camiseteria.com corporate blog, a virtual company that sells T-shirts on the web and uses participatory networking as a tool for collective construction in the development of their products. Keywords: collaborative production, organizational communication, interactivity. RESUMEN: El desarrollo de la tecnología ha redefinido los procesos de comunicación entre los actores de la producción y del consumo. Este artículo pretende analizar la interacción entre los participantes de la red de colaboración. El objetivo del estudio fue el blog corporativo Camiseteria.com, una empresa virtual que vende camisetas en la web y utiliza las redes de participación como un instrumento para la construcción colectiva en el desarrollo de sus productos. Palabras claves: producción colaborativa, comunicación organizacional, interactividad.

INTRODUÇÃO A interconexão promovida pelas tecnologias de informação reflete nos indivíduos e na forma como o coletivo se comporta quando se constitui em redes. Estes efeitos têm caracterizado um desafio para a compreensão dos processos comunicativos envolvidos na construção colaborativa. As significativas transformações e avanços tecnológicos no campo da comunicação repercutiram diretamente na configuração das relações dentro da sociedade e, 1

Docente na Faculdade de Administração e Economia do Paraná (UNIFAE). Mestranda do curso de Comunicação e Linguagem da Universidade Tuiuti do Paraná. Consultora em Desenvolvimento Pessoal e Organizacional de empresas como: Itaipu, Petrobras, Copel, Volvo, Embraco, Docol, Electrolux, Unimed, Sebrae e Federação das Indústrias do Paraná.


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consequentemente, nas organizações como parte da mesma. Como forma de ajustar-se às constantes mudanças, sejam elas tecnológicas, sociais, econômicas ou culturais, as organizações contemporâneas buscam novos modelos de relações e práticas de produção dentro da gestão organizacional. Sem desconsiderar as circunstâncias críticas envolvidas no desenvolvimento tecnológico (BARBERO, 2006; BAUMAN, 1999), a proposta deste trabalho é discorrer sobre os processos comunicativos em novas formas de produção viabilizadas pelas tecnologias digitais de informação, numa perspectiva das possibilidades trazidas por elas ao mundo do trabalho e das organizações. Nesse sentido, o objetivo é analisar os processos comunicativos por meio da interação entre os atores de um processo participativo de produção de bens de consumo que ocorre na comunicação mediada por computador. O estudo dos processos interativos possibilita investigar as características das dimensões pessoais e interpessoais nos processos de produção na web. Com isso, é possível levantar informações que subsidiem ações de gestão organizacional e dos próprios interagentes para favorecer a comunicação no cenário corporativo. O blog corporativo Camiseteria.com foi o objeto deste estudo de caso. A Camiseteria.com caracteriza-se como uma organização virtual que produz e comercializa camisetas na web. Ao capitalizar o ambiente da web 2.0, por meio do blog corporativo, este espaço interativo possibilitou a criação de comunidades constituídas por consumidores que são também produtores das estampas fabricadas pela Camiseteria de forma terceirizada. As estampas são enviadas pelos internautas e entram em votação pela comunidade. Aquelas mais votadas são impressas e são vendidas pelo canal on-line. Os criadores das estampas eleitas recebem um valor em dinheiro pela sua participação e bônus para suas futuras compras. A empresa utiliza vários sistemas de comunicação, como blog, Twitter, Facebook, para que os interagentes contribuam na divulgação e no fortalecimento da marca. Quanto aos procedimentos metodológicos, a pesquisa realizada definiu-se de natureza qualitativa, descritiva e exploratória pelo método de estudo de caso. Os dados foram coletados por meio de questionários com os proprietários da empresa e com designers que participam do processo colaborativo de produção das estampas de camisetas, da observação simples da comunicação entre os interagentes da comunidade virtual da Camiseteria.com e da análise documental e de mensagens ou conversações armazenadas no blog da empresa.


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Os dados coletados foram analisados mediante uma matriz de categorias fundamentada na proposição teórica de um modelo interacional de Aubrey Fisher (1994). Buscou-se proceder à identificação e categorização dos dados levantados e analisá-los à luz das teorias estudadas e do método de análise textual discursiva. ECONOMIA DA INTELIGÊNCIA COLETIVA Durante um grande período histórico, as relações exigiam proximidade espaço-temporal porque se estabeleciam face a face. Assim se caracterizavam os relacionamentos e os intercâmbios de formas simbólicas. A comunicação mediada por computador passou a disponibilizar inúmeras possibilidades de interconexão e suas características de reorganização de espaço e tempo ampliam as possibilidades de formas de relação e construção conjunta, que antes se limitava aos espaços físicos bem definidos. “o desenvolvimento dos meios de comunicação cria novas formas de ação e de interação e novos tipos de interação sociais – formas que são bastante diferentes das que tinham prevalecido durante a maior parte da história humana. Ele faz surgir uma complexa reorganização de padrões de interação humana através do espaço e do tempo”. (THOMPSON, 1998, p 77).

Para definir as características deste processo de comunicação que se desenvolve no ciberespaço, Pierre Lévy apresenta o conceito de Inteligência Coletiva. Considera que esta possibilita colocar em sinergia os saberes no ciberespaço e a define como sendo, “uma inteligência distribuída por toda parte, incessantemente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta em uma mobilização efetiva das competências”. (LÉVY, 2003, p 28). Na economia da inteligência coletiva, proposta pelo autor, o conhecimento e as qualidades humanas são valorizados. Com as possibilidades geradas pelas redes de comunicação, mesmo as pessoas sem emprego assalariado podem dispor de suas competências, interagindo e participando de construções coletivas, o que alimenta a dinâmica do mercado. Sugere que os grupos humanos que conseguirem se constituir em coletivos inteligentes, com abertura, imaginação e rapidez, tendem a estar mais preparados para o atual ambiente competitivo. Não se trata, contudo, de entender a Inteligência Coletiva como uma massa única, uniforme, indiferenciada, mas como um processo de crescimento, que contempla a diversidade e as singularidades em trocas contínuas. Nesse contexto, o papel das tecnologias digitais de informação e comunicação seria promover a construção de coletivos inteligentes para que “as potencialidades sociais e cognitivas de cada um se desenvolvam e se ampliem de


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maneira recíproca.” (LÉVY, 2003, p25). O autor caracteriza esses grupos como autoorganizados e que se configuram em comunidades desterritorializadas promovidas por uma engenharia de laços sociais que permitem que diferentes competências e qualidades individuais entrem em sinergia, favorecendo o trabalho conjunto. Tapscott e Williams (2007) chamam de Era da Participação essa época caracterizada pela facilidade de acesso a tecnologias de comunicação e informação. Para os autores, infraestruturas colaborativas de baixo custo são suportes que possibilitam o compartilhamento de conhecimento e capacidade produtiva entre pessoas e grupos dispersos por todo o mundo. Nesse sentido, a arquitetura de participação, entre as demais características, configura o ciberespaço como um ambiente profícuo para inter-relações globais, compartilhamento de informações e conhecimentos, flexibilização das fronteiras entre papéis antes opostos como produtor e consumidor. Fatores esses que se definem como elementos facilitadores do coletivo inteligente que se estabelece por meio das comunidades virtuais da rede. A abordagem sistêmico-relacional, trazida por Alex Primo (2007) para analisar os processos interativos na comunicação mediada por computador evidencia a complexidade da construção negociada dos relacionamentos interpessoais. Explica que os “intercâmbios mantidos entre os dois interagentes (seres vivos ou não) serão sempre considerados formas de interação, devendo apenas ser distinguidas em termos qualitativos”. (idem, p.56). O autor enfatiza a idéia de que interação deve ser entendida como “ação entre” e comunicação “ação compartilhada”. Sua proposta teórica define-se a partir do estudo sobre o que se passa entre os participantes da interação aos quais chama de interagentes. A interatividade também pode ser entendida a partir dos conceitos teóricos de comunicação interpessoal de Aubrey Fisher (1978). Com uma visão pragmática defendeu a idéia de que o processo de comunicação não se trata de um somatório de contribuições individuais, mas de ações integradas entre os participantes. O enfoque relacional de Fischer valoriza o próprio processo interativo, pois oferece fundamentos para o estudo da interação mediante a inter-relação entre seus elementos: participantes, relação e contexto cultural. (FISHER, 1978). Contrapondo-se a um entendimento linear e unilateral do processo comunicacional, Fisher apresenta a idéia de que a relação entre os participantes da comunicação vai se definindo através de um processo de negociação entre os mesmos que criam mutuamente um padrão de relacionamento (FISHER, 1994, p209). Esse padrão pode ser descrito pelo que o


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autor denomina dimensões negociadas das relações interpessoais: integração-desintegração e comunhão-individualismo e que se definem a partir dos conceitos de características qualitativas primárias e secundárias do relacionamento (idem). As características primárias descrevem a interação em termos de eventos e sua relação temporal com eles. São elas: 1) Descontinuidade: lapso de tempo entre um evento e outro (mensagens, conversação); 2) Sincronia: padrão interativo reconhecível relativo a uma progressão lógica entre os eventos, sabendo-se a partir desta, o que é adequado ou não dizer ou responder; 3) Recorrência: eventos assimilados no passado auxiliam em situações com alguma semelhança, que são vividas no futuro. Os interagentes ao se conhecerem podem estabelecer uma linguagem própria (gírias, abreviaturas) que não são reconhecidas por iniciantes ou por outras pessoas do grupo; 4) Reciprocidade: qualidade da interação em que um interagente responde ao entendimento ou expectativa do outro sobre a interação. Por exemplo: é possível fazer brincadeiras sobre histórias ou gafes cometidas entre dois interagentes e ambos se divertem. A interação apresenta alta reciprocidade. Mas se ao ouvir uma determinada brincadeira ou história um dos dois não se diverte mais e fica aborrecido e irritado, a reciprocidade fica restrita e diminui nesta interação. As características secundárias relacionam-se às questões emocionais e o elo interpessoal criado na interação. São definidas como derivadas das características primárias e denominadas de intensidade, intimidade, confiança e compromisso. 1) Intensidade refere-se à força do relacionamento, elo que aproxima os interagentes; 2) Intimidade descreve o grau de proximidade entre os participantes do relacionamento; 3) Confiança explica o quanto um parceiro confia no outro e se arrisca por ele, e 4) Compromisso é o grau em que cada interagente se inclui no relacionamento e se compromete com ele. As características qualitativas das interações relacionadas com a intersecção de cada uma das dimensões, definindo padrões específicos para as mesmas, descritos no quadro a seguir, como as dimensões negociadas das relações interpessoais. Quadro I – Dimensões negociadas das Relações Interpessoais Características qualitativas das interações COMUNHÃO INDIVIDUALISMO

INTEGRAÇÃO

Relacionamentos integrados e comunais; altos níveis de reciprocidade; interações frequentes; alta sincronia nos padrões interacionais; alta intimidade,

Relacionamentos bem definidos, mas não muito próximas. Conhecidos que interagem com freqüência, mas que estão satisfeitos de não serem tão próximos.


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comprometimento e confiança. Ex. amigos próximos e família.

DESINTEGRAÇÃO

Relacionamentos comunais em desintegração. Relacionamentos antes muito integrados, mas que entram em crise ou diminuição de interações, tornando-se menos familiares e confiantes. Ex. divórcios

Comprometimento baixo entre eles. Relacionamentos com alto grau de reciprocidade, recorrência, continuidade e sincronia. Pouca intimidade, compromisso. Relacionamentos individualistas, em desintegração. Interações breves e pouco frequentes (baixa continuidade), sabe-se pouco sobre o outro (baixa reciprocidade) e raramente acontece algum encontro (baixa recorrência). Baixas intimidade, intensidade, sensibilidade e comprometimento. Ex. encontros casuais, encontros com pessoas com quem não se interagirá novamente.

Fonte: Baseado em FISHER (1994) A abordagem teórica relacional e pragmática de Fisher e a definição que o autor dá às características qualitativas do relacionamento interpessoal contribuíram com a pesquisa para uma análise qualitativa dos padrões interacionais presentes em processos colaborativos A INTERATIVIDADE NA CAMISETERIA.COM A Camiseteria.com é uma empresa virtual que, mediante suas estratégias de comunicação interativa, promove processos participativos de criação de estamparias para as camisetas que produz. Fundada em 2005, a empresa possui uma estrutura organizacional enxuta, com um pequeno escritório físico no Rio de Janeiro para atividades nas áreas de operação, logística, atendimento. A produção e distribuição são terceirizadas. A empresa recebe cerca de 15.000 usuários no site por dia e cresce em média 35% ao ano. Comercializa, atualmente, cerca de 3.500 camisetas por mês. Ao utilizar as possibilidades interativas do ciberespaço, a empresa estimula o processo colaborativo através de concursos lançados em seu site. Qualquer pessoa pode participar dos concursos, criando um desenho e submetendo-o à avaliação da comunidade participante do site. (DAVID, 2009).


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A empresa possui cerca de 116.000 pessoas cadastradas e o site já recebeu, aproximadamente, 13.000 estampas nos últimos quatro anos, sendo que 124 designers foram aprovados em seus concursos. O designer aprovado tem seus desenhos estampado pela Camiseteria e recebe um prêmio em dinheiro e o restante em bônus para compras na Camiseteria, mas não possui vínculo empregatício. Entre os links da página de abertura do site da empresa, encontram-se os que possibilitam acesso ao blog corporativo da Camiseteria, blog pessoal dos participantes, ao Blogbox2 e a Twiteria3 que são espaços para participação e interação entre os membros da comunidade e a empresa. A comunidade camiseteria reúne pessoas interessadas em moda, arte, internet e cultura em geral. Elas participam votando, comprando, dando sugestões para os produtos quanto à modelagem, cores e divulgando a marca. A empresa também não precisa contratar modelos para mostrar as fotos de sua coleção, pois seus clientes se oferecem para fazer a publicidade e a propaganda. O blog pessoal, oferecido pela própria empresa, permite que o “proprietário” use esse espaço para disponibilizar, compartilhar, atualizar comentários, opiniões, informações, fotos, imagens e vídeos. É no blog pessoal que aparecem mensagens que sinalizam relações pessoais off-line, como convites e relatos de encontros, pedido de conselhos e ajuda pessoal para emprego, estágio ou para melhorar o trabalho de designer quanto à criação. Nesse espaço as pessoas conversam sobre diversos assuntos, inclusive sobre as estampas em votação e o “clima é de cooperação”. Os participantes se ajudam mutuamente, mesmo aqueles que poderiam ser considerados concorrentes, por competirem em um mesmo concurso, pedem comentários e sugestões sobre os desenhos antes de encaminhá-los à empresa. Já o blog corporativo da Camiseteria, definido como o objeto central deste estudo, pode ser considerado como um espaço com características organizacionais. Nele são postados apenas conteúdos referentes à empresa. Entre eles, avisos sobre os concursos; promoções, votação das estampas, lançamentos de produtos e informações sobre os produtos ou serviço. O blog corporativo pode ser considerado um ambiente estratégico, pois por meio desta interação dissemina informações sobre a empresa e recebe de seus públicos, aquelas que podem influenciar processos de tomada de decisão de negócios. De acordo com Cipriani, difere-se do website porque este pode ser “apenas uma vitrine da empresa” (2008, p.40). Contém informações da empresa que o cliente acessa e 2 3

http://www.camiseteria.com/blogbox.aspx http://www.camiseteria.com/twitter/


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consulta seu conteúdo. No blog corporativo, além de consultar o que a empresa tem a dizer, o cliente pode “conversar” com ela. Uma de suas características, segundo o autor, é promover uma “sensação de intimidade com a empresa: o blog é uma gigantesca porta aberta para que o cliente, o parceiro ou o funcionário entre, sente e se sinta à vontade”. (idem, p.39) Com uma interface simples e fácil de usar, o blog Camiseteria proporciona uma comunicação sem formalidades. A abertura e respostas aos comentários, idéias, sugestões possibilitam um ambiente de colaboração e interação que constituem os aspectos problematizados por esta pesquisa. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Ao realizar a pesquisa no blog corporativo constatou-se que os nicknames usados pelos interagentes configuravam-se em links para os blogs pessoais dos mesmos. Esta característica de hipertextualidade dos documentos analisados possibilitou a observação de uma interação paralela, de cunho mais pessoal, que se estabelece entre os participantes da comunidade. Os documentos digitais analisados foram nove postagens realizadas pela empresa entre maio e junho de 2009, no blog Camiseteria. O conjunto de documentos analisados teve na sua somatória um total de 376 comentários como respostas decorrentes das postagens feitas pela empresa e que se configuraram nas interações analisadas. Essas interações foram investigadas à luz da análise textual discursiva e interpretadas por categorias fundamentadas no modelo pragmático de relacionamento interpessoal de Aubrey Fisher, que deram suporte teórico à busca de conhecimento do fenômeno estudado. As categorias pelas quais as interações foram investigadas foram criadas a partir das características qualitativas primárias e secundárias que resultam nas dimensões negociadas do relacionamento interpessoal, conforme já descritas anteriormente. As características de confiança e intensidade não foram consideradas pela dificuldade em elaborar indicadores que pudessem representá-las nesse ambiente virtual com segurança. Análise e Resultados A questão enunciada pelo problema desta pesquisa refere-se ao entendimento de como ocorre a interação entre os atores do processo participativo de produção considerados: os


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designers, a empresa (tendo como representantes seus proprietários) e os participantes em geral da comunidade camiseteria. Segundo o modelo de Fisher, a análise das interações constituídas no blog corporativo revelou uma maior ocorrência das características primárias de continuidade, sincronia, recorrência e reciprocidade e menor emergência das características secundárias de intensidade, intimidade e compromisso. Essa evidência possibilitou classificar as referidas interações em outro nível de categoria, do citado modelo teórico, apresentando predominância da dimensão individualismo e integração. O olhar qualitativo, sobre as citadas constatações revela que os interagentes estabelecem relações de continuidade por meio de contatos virtuais freqüentes, em intervalos cuja periodicidade depende das postagens feitas pela empresa e que podem ser semanais ou até diárias. Se usarmos a analogia do contexto do blog corporativo com ambiente organizacional, as interações acontecem sempre quando há “expediente”. Com isto, cria-se um histórico de relações no qual a repetição de processos interativos (recorrência) define referências que subsidiam interações subseqüentes. Isso é percebido com o uso de linguagens próprias, brincadeiras, expressões que remete a situações já acontecidas ou vivenciadas conjuntamente, mensagens que só os envolvidos ou pessoas com conteúdos anteriores entendem. A sincronia demonstra que os interagentes se expressam adequadamente no grupo, sabendo quais comportamentos são mais apropriados em diferentes situações. Tendo em vista que as postagens no blog corporativo são relativas a notícias, lançamentos de produtos ou temas que reportam à empresa, os comentários são, essencialmente, relacionados a esses. Nesse sentido, os participantes tecem comentários, dão sugestões, fazem elogios ou críticas quanto ao tema postado, geralmente, com adequação. Deve-se considerar que o clima é de descontração e informalidade. As brincadeiras são aceitas e tratadas como tal na conversação (sincronia e reciprocidade). Em raras ocorrências de não adequação, ou seja, quando não há sincronia, o próprio grupo manifesta sua não aceitação e “enquadra” o interagente, mesmo que informalmente. Nas interações que ocorrem no blog corporativo, os interagentes não demonstram muita proximidade pessoal, seus laços relacionais revelam baixa intensidade e compromisso entre eles. Esse cenário é perceptível no blog corporativo onde a maior parte das mensagens entre os interagentes referem-se ao tema postado ou são respostas ou comentários


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encaminhados à empresa. Geralmente, as interações que envolvem comentários mútuos ou brincadeiras são relacionadas aos conteúdos postados ou relativos ao produto, a empresa. Logo, mesmo com comentários informais, é mantida certa distância parecendo que as brincadeiras são feitas com alguma moderação, assim como as críticas. As interações não apresentam indicativos de intimidade e compromisso entre os interagentes, embora alguns designers relatem terem amizade com algumas pessoas da comunidade. Isso vai se confirmar em outros espaços interativos, conquanto não se manifestem de forma significativa no blog corporativo. Quanto às características de Integração e Individualismo, presentes no blog corporativo, são identificadas por Fisher (1994) e Primo (2007) como pertinentes às relações que se estabelecem em locais de trabalho presenciais. Dessa forma, pode-se relacionar que as interações estabelecidas no blog corporativo são similares às relações que se desenvolvem em ambientes organizacionais no mundo físico. Esta percepção torna-se mais clara ainda quando se compara com as relações que se estabelecem nos espaços dos blogs pessoais. Muitos dos interagentes do blog corporativo são os mesmos que interagem nos blogs pessoais disponibilizados pela Camiseteria, ou seja, fazem parte da mesma rede social que se estabelece nos espaços interativos do site da empresa. Contudo, as características qualitativas das interações mostram-se diferentes nos dois espaços citados. Nas interações desenvolvidas nos blogs pessoais foi possível perceber indícios de características primárias de continuidade, recorrência, sincronia e reciprocidade como as identificadas no blog corporativo. Contudo, também aparecem indicativos da presença de características secundárias de intimidade, intensidade e compromisso, praticamente ausentes no corporativo. Nos blogs pessoais, as interações ocorrem com freqüência, havendo relatos de designers que os visitam diariamente. Com a recorrência das interações, alguns padrões interativos se formam entre os interagentes e a sincronia pode ser identificada à medida que esses percebem o que ou como expor suas idéias ou opiniões, quais as brincadeiras permitidas, o que pode ofender ou não, embora, às vezes, surjam conflitos ou divergências. Nas mensagens aparecem códigos, expressões, linguagens que são próprias, compartilhadas, compreendidas e, geralmente, aceitas pelos envolvidos. A reciprocidade aparece à medida que as expectativas são atendidas e o relacionamento é percebido de forma equivalente pelos envolvidos.


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Os graus de compromisso e intensidade aparecem em relatos de pessoas que formaram e mantiveram amizades e até namoros por meio dos contatos estabelecidos nas conversas que acontecem nos blogs pessoais e, posteriormente, em encontros offline marcados online. Nos blogs pessoais os participantes da comunidade, incluindo os designers aprovados e, portanto, que fazem parte do processo colaborativo, compartilham momentos de alegria e realização pessoal, aflição, pedem ajuda para dificuldades pessoais. É nesse espaço que a intensidade também aparece nas divergências e conflitos. Algumas manifestações chegam a sofrer mediação por parte da empresa que estabelece regras de etiqueta, como não permitir o uso de palavras de baixo calão ou ofensas pessoais. Pode-se perceber nos blogs pessoais, indicativos de laços sociais mais fortes, o que não aparece de forma significativa no blog corporativo. Não significa que não existam, até porque as pessoas são fundamentalmente as mesmas. Reitera-se aqui que ao realizar uma análise da qualidade das interações, estas, durante sua ocorrência no blog corporativo, não apresentam sinais significativos de laços sociais fortes. De acordo com Recuero: “Laços fortes são aqueles que se caracterizam pela intimidade, pela proximidade e pela intencionalidade em criar e manter uma conexão ente suas pessoas. Os laços fracos, por outro lado, caracterizam-se por relações esparsas que não traduzem proximidade ou intimidade. (RECUERO, 2009, p.41)”

E é nos blogs pessoais que aparecem as trocas que sinalizam ajuda mútua, cooperativa, companheirismo e até mesmo suporte emocional. Segundo a autora, esses são valores constituintes do capital social, ou seja, dos recursos construídos coletivamente e passíveis de serem utilizados pelo grupo. É no blog pessoal que ocorre solicitações de feedback para desenhos postados, sendo que alguns recebem tantas contribuições a ponto do trabalho final ser uma construção coletiva. É aí que se desenvolve todo um processo conjunto de geração de idéias e sugestões configurando um espaço de suporte técnico, visto que muitos comentários são feitos por profissionais experientes dirigidos a principiantes. De acordo com o descrito, as interações que ocorrem nos blogs pessoais dos participantes da comunidade Camiseteria estariam mais próximas da dimensão Comunhão e Integração, apresentada por Fisher (1994). Esta define interações caracterizadas por relacionamentos freqüentes, integrados e comunais, com alta reciprocidade e sincronia, assim como por relações de proximidade ou intimidade e compromisso entre os interagentes, típicas de relações de amizade ou familiares.


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Por mais que se questione a intensidade dessas características, a categorização dos dados obtida no blog corporativo e a observação dos blogs pessoais constatam presença qualitativamente diferente nos dois contextos. Tal situação parece criar um espaço onde as pessoas se comunicam de maneira mais informal e se nutrem de relações mais pessoalizadas e próximas. Expressam tanto sentimentos positivos de atração, de afeto, de solidariedade, cooperativos quanto de conflitos, divergências, críticas e brincadeiras com mais intensidade. O contexto sugere que isso lhes dá sustentação para interagirem de maneira mais convencional, ou seja, dentro de convenções explícitas ou consensadas implicitamente nas relações estabelecidas no blog corporativo. Por meio das análises dos dados obtidos na pesquisa constatou-se que os interagentes dos processos participativos de produção da Camiseteria,com, desempenham papel no consumo dos produtos, na divulgação e promoção da marca, na produção das camisetas por meio direto da realização dos designers próprios e contribuindo com o aperfeiçoamento do trabalho de outras pessoas. As

práticas

interativas

de

compartilhamento

que

se

desenvolvem

na

Camiseteria.com, qualificam-na como uma empresa que utiliza os recursos de comunicação da web 2.0 para promover processos de colaboração em massa, conforme conceito apresentado por Tapscott e Williams (2007). As ações coletivas e globais, de geração e compartilhamento de idéias e conhecimento, que ocorrem por meio das interações entre os membros da comunidade Camiseteria, conforme exemplo no Quadro II, ilustram também alguns aspectos contidos no conceito apresentado por Lévy de Inteligência Coletiva (2003). Com ele, o autor expõe a idéia da existência de saberes no ciberespaço que podem ser transformados em recursos para construção coletiva de novos saberes. Quadro II- Exemplo de interação colaborativa Fonte: Blog Pessoal de designer da comunidade Camiseteria.com_postado em 25/07/2009 Que acham? (Imagem do desenho) B0-Isto é o teste de layout da estampa que to pensando...queria saber se tá legal, já que não tá muito no estilo das minhas anteriores...vlw comentários aí! B1 - é um ótimo começo. gosto do conceito. B2- se precisar de uma mão com a tipo! =] rsrs ta muito massa mesmo! =] B3- A idéia tá boa. Acho que o 'making' tá meio longe do 'real boys' e essa moldura e essa linha da mesa não me agradam muito, como estampa assim. Mas essa é a minha opinião...vamos ver o que a galera diz.


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B4- Acho que o centro do desenho deve ser o Geppeto e o robozinho, sem essas molduras, valorizar mais essa ilustra que pode levantar bastante a estampa, mas acho que esse negocio de escrever alguma sacadinha é sempre bem vindo, alias, esse Geppeto tá meio Hi-tech! =] Finalizando, eu acho que tem que dar uma coloridinha boa ae mano! Boa Sorte! B0- Obrigado ae, ainda nem pensei em cor ainda, mas vou colorir sim. Vlw! B5- Gui, se tu desenhasse a tipo na mesma linguagem da tua ilustra, ficaria lindão. =) ao meu ver, só isso que está faltando para dar um toque tschururu! Hehe =* B6- Está ficando bacana... Só achei que o "Geppeto's" ficou em desarmonia... Tipo se você deixar o S no mesmo tamanho do G e fizer como se fosse uma curva acho que ficaria mais "centralizado".... O mesmo vale para o texto embaixo, tenta dar um posicionamento

Legenda: B0 – interagente designer que solicita feedbacks para sua produção.B1,2,3...diferentes interagentes designers Por meio das interações cooperativas que se manifestam na Camiseteria.com designers profissionais, amadores, pessoas interessadas disponibilizam seus conhecimentos, experiências, percepções, opiniões e idéias para contribuir com trabalhos realizados por outros designers, assim como, para propor melhorias aos produtos e serviços da empresa. As competências individuais transformam-se em competências coletivas. Contribuem, assim, para o capital social cujos recursos são disponibilizados para a comunidade Camiseteria.com, da qual a empresa é um dos interagentes que deles se apropriam para seu crescimento. Considerações A facilidade de acesso as tecnologias com sua infra-estrutura colaborativa são suportes que possibilitam o compartilhamento de conhecimento e capacidade produtiva entre pessoas e grupos dispersos por todo o mundo. Contudo, no contexto da inteligência em rede, a visão deve ser na organização em rede de seres humanos por meio da tecnologia e não apenas no aparato material tecnológico que a possibilita. Nessa perspectiva, passam a existir inúmeras possibilidades para combinar conhecimentos, inteligência e criatividade na criação de riquezas e desenvolvimento social, podendo se caracterizar como um tempo de muitas oportunidades. É possível capitalizar essas oportunidades e atuar como agente na construção de sentidos comuns, baseados em participação e colaboração por meio de práticas comunicativas. Os suportes tecnológicos viabilizam oportunidades para que as relações sociais se estabeleçam de forma interconectada, porém a dinâmica que se constitui, a partir daí, depende da apropriação feita pelos indivíduos ou grupos que por meio deles se manifestam e interagem.


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Na presente pesquisa surgem indicativos de diferentes intensidades nos laços sociais que se apresentam nos distintos espaços, contudo trata-se das mesmas pessoas. No “ambiente corporativo” aparecem sinais de laços sociais mais fracos e no “ambiente interpessoal”, fortes laços sociais. Nessa perspectiva, o virtual e o presencial se espelham o que pode contribuir para corroborar a idéia de que o virtual é o real, em uma forma específica. REFERÊNCIAS BARBERO, Jesus Martin. Tecnicidades, identidades, alteridades:mudanças e opacidades da comunicação no novo século. In: Sociedade Midiatizada, Dênis de Moraes (org), Rio de Janeiro: Mauada, 2006. BAUMANN, Zigmunt. Globalização: as consequências humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1999. CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. A Era da Informação: economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e Terra, 2005. CIPRIANI, Fábio. Blog Corporativo. São Paulo: Novatec Editora, 2008. DAVID, Rodrigo. Entrevista concedida à Cibele Bastos, por e-mail, em 2009. FISHER, Aubrey B. Perspectives on Human Communication. New York: Macmillan Plubishing Co., 1978. FISHER, Aubrey B. ADAMS, Katherine.Interpersonal Communication: pragmatics of human relationship.2nd ed. New York: Mc Graww-Hill,Inc,1994. LÉVY, Pierre. Inteligência Coletiva: por uma antropologia do ciberespaço.São Paulo: Ed. Loyola,2003. PRIMO, Alex. Interação mediada por computador: comunicação, cultura, cognição.Porto Alegre: Sulina, 2007. RECUERO, Raquel. Comunidades Virtuais-uma abordagem teórica. Disponível em:www.bocc.ubi.pt/pag/recuero-raquel-comunidades-virtuais.pdf. Acesso em: 20/08/08. TAPSCOTT, Don; WILLIAMS, Anthony. Wikinomics: como a colaboração em massa pode mudar seu negócio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007. THOMPSON, John B. A mídia e a Modernidade: uma nova teoria social da mídia. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 1998.


Revista Eptic On Line Resenha Rádios comunitárias no Brasil e na França: desafios da esfera pública contemporânea Danielle Azevedo Souza1

LEAL, Sayonara. Rádios comunitárias no Brasil e na França: democracia e esfera pública. Aracaju: Editora UFS, 2008, 436 p.

O livro „Rádios comunitárias no Brasil e na França‟, da Coleção Biblioteca Eptic, é resultado da tese de doutoramento de Sayonara Leal, defendida no segundo semestre de 2007, no âmbito do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília. O lançamento da obra, às vésperas da Conferência Nacional de Comunicação, representa uma grande contribuição aos debates preparatórios acerca da radiodifusão comunitária, da pluralidade dos meios de comunicação e da liberdade de expressão. A pesquisa sociológica revela que há, nos espaços públicos disponibilizados pelas rádios comunitárias e associativas, potencialidades de democratização, sendo necessária a efetivação de políticas públicas para o setor e maior envolvimento da comunidade de ouvintes concernida na gestão dessas mídias. O trabalho resulta de um estudo comparativo, para o qual a autora mobilizou os recursos metodológicos de pesquisa qualitativa como aplicação de questionários, realização de entrevistas narrativas e de análises documental e de grade de programação das rádios estudadas, viabilizando o método de estudo de caso. A autora realizou um trabalho de campo junto a 15 rádios comunitárias no Brasil e 22 rádios associativas na França, sendo que em cada país cinco emissoras foram investigadas em profundidade, como estudos de caso. O trabalho levou em consideração rádios locais sem fins lucrativos e de caráter jurídico privado, nos dois países. Ao procurar investigar a variedade de lógicas de ação nessas rádios e como essas viabilizam ou não a manifestação de esferas públicas, Sayonara chegou à conclusão de que, tanto 1

Jornalista formada pela Universidade Federal de Sergipe. Mestranda em Comunicação Social da Universidade de Brasília (UnB). E-mail: danielle_azevedo@yahoo.com.br


nas cidades satélites de Brasília quanto na região francesa de Nord-Pas-de-Calais, as práticas discursivas das rádios comunitárias estão atreladas aos domínios da vida privada, dando maior visibilidade aos problemas da sociedade civil e sediando a transição do privado ao público, do espaço social para o político. No caso francês prevalece a demanda por reconhecimento de direitos culturais e no caso brasileiro, o reconhecimento de direitos sociais. Vislumbra-se nos dois casos apelos à justiça social, tanto no sentido da economia política, quando atores sociais tratam de assuntos vinculados à redistribuição de renda, como no sentido culturalista dos processos de reconhecimento de identidades étnica, racial, religiosa, via respeito às diferenças sócioculturais. Neste último caso figuram também questões sociais e políticas que se reportam ao debate do pertencimento de imigrantes que se encontram em território estrangeiro na condição, em muitos casos, de cidadãos franceses ainda em construção, os quais se encontram fortemente vinculados aos valores e costumes de seus Estados nacionais de origem. As tensões e conflitos sociais, nesse sentido, estão na base dos processos de reconhecimento em todas as suas dimensões sociais. Com levantamento de dados empíricos para o confronto entre os dois contextos políticos e culturais distintos, os estudos de casos retratam as mesmas dificuldades enfrentadas pelos dirigentes das emissoras comunitárias no Brasil e das rádios associativas na França para subsidiar sua manutenção, desde a falta de financiamento e de profissionais capacitados até o excesso de programas de música, em detrimento da oferta de programas de debates públicos. Além de construir a imagem dos processos da vida social local para o exterior e valorizar o sentimento de pertencimento de seus habitantes, as rádios comunitárias e associativas pesquisadas teriam o objetivo de valorizar o voluntariado, estimular as interações sociais e publicizar o discurso calcado nos fatos, eventos e dilemas da sociedade. No que diz respeito à rádio enquanto espaço democrático-participativo, os estudos revelam que a participação dos atores locais está atrelada principalmente a pedidos de música, à divulgação de iniciativas de associações e a reclamações dirigidas ao poder público. O ouvinte não intervém nas decisões inerentes à programação e atuação da rádio. Aliando o arcabouço teórico das Ciências Sociais e a experiência adquirida em suas renomadas pesquisas na área das políticas de Comunicação, Sayonara Leal consegue estabilizar as tensões conceituais existentes nas relações entre Estado,


comunidade, espaço público e espaço privado em seu trabalho de doutoramento. Ela revisita as interpretações de Arendt e Habermas quanto à esfera pública, faz uma revisão das teorias sobre democracia, passando por clássicos das Ciências Sociais como Tocqueville até chegar a autores importantes do pensamento social contemporâneo como Gauchet, Lefort, Boltanski, Thevenot, ressaltando processos de demandas sociais pautados em lutas por reconhecimento, a partir das abordagens de Honneth, N. Fraser e Bauman. As reflexões dos conceitos chaves de seu trabalho estão elencadas às categorias de análise como participação, pluralidade, diálogo, reconhecimento e lógicas de ação. O livro traz uma retrospectiva histórica das rádios livres na Europa e na América Latina, que se firmaram como movimento pela democratização dos meios de comunicação na década de 70 e que, nos anos 80, foram reconhecidas como mídias de contra-poder, de cunho participativo. Entretanto, a autora chama a atenção para o fato de que as rádios de proximidade contemporâneas não podem ser confundidas com as antigas rádios livres, marcadas pela militância política de esquerda e espírito de contestação e provocação social, como enfatizado por Félix Guattari. Tais espaços comunicativos são disputados pelas diferentes lógicas de ação, que podem representar, em uma mesma localidade, campos contrários de interesses. Tomando como base a análise dos conteúdos das entrevistas realizadas com locutores e diretores das emissoras, a autora evidencia que as rádios comunitárias no Brasil e as rádios associativas da França, em geral, carecem de projetos que orientem sua política de comunicação e, em termos de programação, optaram por adotar, um formato musical, com alguns espaços para a livre expressão social. Em ambos os países, elas apresentam estrutura organizacional calcada em certa lógica industrial, a exemplo de preocupações com inovações tecnológicas, e na lógica mercantil, como veiculação de publicidade comercial. Sayonara Leal explica, de forma crítica, que a preocupação com a captação de aportes materiais compromete o caráter democrático e participativo da emissora, que passa a assumir compromissos com seus financiadores. Do caráter democrático à busca pelo reconhecimento, da legislação aos processos de outorga, da capacidade de rentabilidade à participação, o quadro histórico e normativo no qual se debruça a pesquisadora permite identificar elementos que indicam a efetividade das emissoras comunitárias e associativas enquanto espaços de


configuração de esferas públicas. Como a própria autora conclui, “não se pode garantir que as rádios locais, em suas variadas denominações e perfis de atuação, encarnem o ideal de um modelo de esfera pública plena. Mas percebe-se que esses meios resguardam em si o potencial de realização de uma interatividade comunicativa mais democrática entre diferentes atores sociais” (LEAL, 2008, p. 409), sobretudo quando se constata a hegemonia dos meios de comunicação comerciais, considerados espaços oficiais de comunicação.


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