Caderno de Eixos Temáticos // Erea Recife 2018

Page 1

CADERNO DE EIXOS TEMÁTICOS EREA RECIFE // 2018 /////////////////////////////////////////////////////////

SEMANA DE ENCONTRO JANEIRO 19 a 26 /////////////////////////////////////////////////////////

EREA 18 RECIFE


"Minha cidade menina dos olhos do mar dos rios que levam meu coração do sol que começa a raiar é por você que eu peço na minha loa por essa gente tão boa abre um sorriso e canta Minha cidade das vilas, dos manguezais dos altos e dos coqueiros da fé que move o futuro oh, Conceição, Senhora, abençoai essa cidade que só quer crescer e ser feliz Recife eu te dou meu coração Recife eu te dou meu coração Olha o Recife da grande festa popular dos bravos guerreiros que a história nos deu dos arranha-céus e sobrados Minha cidade menina dos olhos do mar dos mascates, dos mercados das pontes dos tempos de Holanda oh, Conceição, senhora, abençoai o meu Recife que só quer crescer e ser feliz

Teus bairros mostram a coragem residente e reflete a luta no olhar dessa gente humilde que procura vencer ensina ao Recife e ao mesmo tempo aprender minha cidade em evidência, silêncio e harmonia com a beleza da noite e a intensidade do dia vamos lembrar dos mestres e poetas vamos lembrar dos que fizeram do Recife essa festa vamos lembrar frei caneca, Ascenço Ferreira Nelson Ferreira, Brennand, Canibal, Capiba, João Cabral, Chico Science, Josué, vamos lembrar dos batutas de São José Mestre Salú, Ariano, Zero Quatro, Roger daqui do Alto Zé do Pinho, mandando prá você da Nação Zumbi, Nação Pernambuco, mangaba, faceta, Faces do Subúrbio... é o Recife que o povo daqui descobriu do marco zero para o ano 2000 Recife eu te dou meu coração meu coração vai nas águas do rio…” Minha Cidade (Menina dos Olhos do Mar) Lenine


RESISTÊNCIA CULTURAL E CONSTRUÇÃO DA CIDADE CONTEMPORÂNEA

A cidade se impõe. Aqui por dentro dela há novos, há velhos, há pequenos, há grandes, há cachorros, gatos e ônibus. Antre todos estes em comum só a cidade. Pensamos que a cidade forma e é formada. Quem estuda a cidade, sinceramente, está perdido, num grave problema, está inserido no próprio objeto de estudo. Cá dentro. Cidade do Recife. também há muitos, e diversos. E justamente, em comum entre todos nós, só a cidade do Recife. Feito este assentamento, devemos dizer: igual a terra que se pisa, mas que difícil a partilha que é feita. Vamos finalmente chegando ao tutano desta conversa, ao gostosinho do osso. Na cidade, das muitas partilhas malfeitas algumas viram físicas, de pedra mesmo, soltas assim, pra todo mundo ver esteja claro que ver não é um interesse geral. Vocês não estranhem mas há também as que todo mundo pode ver mas nem são de pedra, são, como dizia uma velha amiga, umas idéias. Acreditamos que tanto as ideias como as pedras se conhecem e trabalham juntas, conversando todo o tempo. A outra coisa é a seguinte. Quando encontramos dessas construções, as malfeitas mesmo, se olhando com calma, dá pra ver as linhas divisórias direitinho, claro, é mais fácil ver o lado - as vezes são alguns que pegam a maior parte, mas ali, apertado sempre tem alguém se segurando com o que ficou sobrando. Aquela mesma amiga comentou que esse pessoal é uma palavra conhecida em alguns lugares como resistência, nós entendemos que resistência é se segurar com pouco, mas fazer um bocado. Cá entre nós, temos visto cade vez mais, construções do lado de cá, de quem resiste - as construções, de novo, de pedra e as ideias. É necessário construir em resistência. EREA Recife 2018


foto: Pamella Clericuzzi


PATRIMÔNIO DA PAISAGEM Recife, amor concreto Para Miró da Muribeca

“Minha garganta, tijolo a tijolo, enormes arranha-céus Minhas veias entupidas de cimento até a cobertura, De frente para o Capibaribe. E eu resisto.”

Cada um tem dentro de si sua própria paisagem. Essa paisagem que foi construída pela memória e que guarda a identidade daquele lugar. É a cidade registrada no subconsciente de cada cidadão, daquelas áreas que transmitem ou carregam algum significado próprio. Imagens afetivas que consolidam o caráter de marcos da paisagem urbana. O estudo da conservação da paisagem no processo de desenvolvimento das cidades passa a ser a cada dia mais crucial, na medida em que a legislação urbanística define os parâmetros para construção da cidade contemporânea, muitas vezes agindo de forma negligente para com o patrimônio da paisagem.

O Recife, a nossa “Veneza Brasileira”, dispõe em abundância de áreas de frentes d’água consideradas privilegiadas e ocupadas por uma população igualmente privilegiada no âmbito econômico e social. As empreiteiras cravaram seus espigões de quarenta andares na Beira-mar e na Beira-rio, venderam um suposto desenvolvimento que devorou cada centímetro de terra e afastou a população de baixa renda, que de fato utiliza o Rio Capibaribe como sustento a partir da pesca. Nos últimos anos, tem-se travado um constante debate acerca da conservação da paisagem e das áreas que ainda resistem e que são de interesse de investimento do setor imobiliário, como o Cais José Estelita, Santo Amaro, Brasília Teimosa e Coque, e os remanescentes de áreas verdes como a Ilha do Zeca e o Parque dos Manguezais. Assim, estudantes, paisagistas, arquitetos e urbanistas, juntamente com o Direitos Urbanos, os movimentos sociais e a sociedade civil, vêm lutando em todas as instâncias no intuito de preservar essas áreas para que continuem sendo arrecifes por essência. Dessa forma iremos debater quais os impactos dos empreendimentos imobiliários nas áreas históricas, nas áreas de ZEIS e na (des)construção de uma memória da paisagem do Recife.


foto: Pamella Clericuzzi


PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL “Eu vi o modernismo nascer… Foi no Recife”

O significado de resistência é bem presente no Recife, seja por sua cultura popular, pelos rios que cortam a cidade e também na arquitetura. Nesse âmbito, podemos citar a Arquitetura Moderna, que na cidade teve uma ampla visibilidade, sendo possível considerar a existência de uma Escola de Arquitetura Pernambucana. Arquitetos como Acácio Gil Borsoi, Delfim Amorim e Mário Russo foram profissionais chave na renovação e firmação do ideário moderno na região. Os edifícios modernos das décadas de 1950 e 1960 – e até antes, veja-se o exemplo do Reservatório d’Água em Olinda, de 1936, e da atual sede do IAB-PE, de 1937, ambos de Luiz Nunes – resistem e, até hoje, aparecem como referência para a arquitetura local. Apesar de toda a consagração da arquitetura moderna, as políticas públicas não são suficientes para proteção, preservação e restauro do acervo modernista presente na cidade. Assim como em vários outros bairros, as edificações existentes que compunham a paisagem urbana no centro do Recife

vêm sofrendo alterações ao decorrer do tempo. As demandas do crescimento populacional e demográfico da cidade, junto com os parâmetros legislativos, fizeram com que o local, ultimamente, seja alvo da especulação imobiliária e esteja sofrendo um processo de adensamento vertical. Além disso, o processo de constante renovação de áreas não preservadas termina por descaracterizar edificações antigas e de caráter histórico. A degradação e falta de manutenção são evidentes e aparecem com mais frequência em muitas das edificações que ali se encontram. Esse é o cenário ameaçador em que se encontra o conjunto de edificações históricas do Recife. Como futuros, arquitetos devemos discutir acerca do patrimônio moderno e refletir: quantos ainda cairão para que torres passem a compor o novo skyline da cidade contemporânea, como o caso do Edifício Caiçara? Quantos ainda sofrerão as irreversíveis descaracterizações, como sofreu o Edifício Debret? Quantas marcas históricas ainda serão apagadas pelo cimento e pelo concreto em nome da “modernização”, como os antigos trilhos da Avenida Rio Branco escondidos pelo asfalto? Quantos ainda terão que lutar para se manter de pé, há anos abandonados, e à espera da prometida reforma, como o Teatro do Parque? Quantos ainda irão sofrer a pressão da especulação imobiliária que anseiam por construir seus empreendimentos, como o Cais José Estelita e a ZEIS de Santo Amaro com o projeto da Vila Naval? A resistência dessas edificações se faz necessária para manter viva a história da cidade.


foto: Pamella Clericuzzi


REFORMA URBANA “O homem coletivo sente a necessidade de lutar”

O sistema capitalista exibe friamente a distinção entre classes e a imposição do mais forte sobre o mais fraco, dentro de qualquer âmbito. O poder move e molda as relações sociais e, como mecanismo de dominação, sustenta a estrutura do capital. Dessa maneira se desenvolvem as nossas cidades, sempre de acordo com as relações de poder e atendendo ao interesse econômico. O meio urbano se torna um ambiente hostil à medida que o capital imobiliário ganha força, construindo espaços acessíveis para um pequeno contingente de pessoas mais abastadas, ignorando as necessidades manifestas da outra (grande) parte da população. A carência de políticas públicas efetivas e a falta de voz, frente ao Estado, de movimentos sociais e dos cidadãos e cidadãs, de maneira geral, resulta em uma cidade segregada, cheia de vazios (com o perdão da contradição de termos), que não respeita o direito à moradia e as condições essenciais para a habitabilidade de um espaço.

O Povo precisa de casa, mas não só de casa, precisa de equipamentos urbanos de qualidade, de infraestrutura; precisa de posto de saúde, de escola, de meio de vida; o Povo precisa de espaço dentro da cidade. E quando a maioria da população de uma cidade precisa lutar por espaço e condições de vida, vemos que há um problema estrutural muito sério. Na cidade do Recife, como em muitas outras cidades, é muito claro e definido para quem as cidades são construídas. Quem detém o poder econômico controla também o direito sobre o espaço urbano, que se desenvolve de forma desordenada e segregadora, sem atentar para o bem estar das pessoas e às necessidades da população. Diante disso e na posição de estudantes de arquitetura e urbanismo, se faz essencial que compreendamos a dinâmica socioeconômica da cidade e como ela molda a construção dos espaços, para que possamos nos posicionar e ter a capacidade de intervir de maneira consciente, pela construção de uma realidade de cidade democrática e justa.


foto: Pamella Clericuzzi


LEI DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA “O povo quer casa”

O ofício da construção existe desde que o mundo é mundo. Veio atender à necessidade do ser humano de criar abrigo, a partir de um instinto de sobrevivência e, posteriormente, também como forma de se estabelecer em um espaço e assumi-lo como seu. No processo de urbanização das cidades, a prioridade de ocupação dos espaços sempre é dada a quem detém maior poder econômico. A parcela da população não contemplada acaba por ocupar os espaços residuais não urbanizados e carentes de infraestrutura. A necessidade de se estabelecer em um espaço, de habitar um lugar, aflora o ofício da construção, muitas vezes na forma de construção de guerrilha - constrói-se como pode, com o que se tem à mão. As favelas se formam a partir de uma necessidade de espaço não suprida. A construção passa a simbolizar uma presença, a marca da pessoa no local, seu espaço adquirido dentro de um contexto que lhe hostiliza. Apesar do admirável simbolismo envolvido no processo, por vezes tal prática, baseada em um conhecimento puramente empírico, e diante da falta de recursos, acarreta em construções precárias no sentido estrutural e de instalações, que comprometem a integridade física de quem as habita.

Habitar é um direito humano inalienável, porém não plenamente respeitado. Na cidade do Recife, como em muitas outras cidades mundo afora, a carência por habitação é uma realidade gritante - grande parcela da população reside em assentamentos precários, sem infraestrutura urbana adequada. A discrepância entre bairros para a população de alta e baixa renda é clara e marcante na paisagem urbana. A cidade é cortada por barreiras invisíveis, que separam e categorizam pessoas e definem até onde vai o fazer arquitetônico, até onde chegam os projetos de engenharia, quem merece ou não viver numa área com infraestrutura urbana, habitação apropriada e equipamentos públicos de qualidade. As barreiras definem quem tem ou não direito à cidade. A arquitetura tem o papel social de garantir espaços apropriados para todas as pessoas. Apropriados no sentido de integridade estrutural e de instalações; no sentido de definir um programa de necessidades adequado, a fim de atender propriamente a quem irá habitá-los; no sentido de ouvir a demanda da população e permitir sua participação no processo. Como meio de garantir esse direito à população de baixa renda, que dificilmente tem acesso a projetos de arquitetura e engenharia devido ao custo elevado e às barreiras sociais, existe a Lei de Assistência Técnica, que prevê fundos para assistência gratuita dada por engenheiros(as) e arquitetos(as) a pessoas e famílias que recebam até três salários mínimos. É uma forma de exercer o ofício da arquitetura de maneira socialmente consciente, rompendo as barreiras invisíveis da cidade e atendendo a uma demanda real, vinda dessa parcela da população que, embora numerosa, é parcamente assistida. Diante disso, cabe a reflexão: até onde chega a arquitetura e o urbanismo? quem de fato tem direito à cidade?


foto: Pamella Clericuzzi


MULHER E ESPAÇO URBANO “Deixa ela em paz” Todos os dias alguém aponta que lugar de mulher não é na rua. Diariamente tentam medir o tamanho de suas vestes, onde não devem amamentar seus filhos, o transporte ideal para se locomoverem e a que horas têm de ir e vir. O espaço público tem sido pensado por homens e para homens há muito tempo, logo, não é de se espantar que as cidades estejam pouco preparadas para receber as mulheres, já que não foram feitas nem por elas, nem para elas. Mais de 86% das brasileiras já foram vítimas de assédio em espaços públicos, pois seus corpos são tratados e reconhecidos como um. Para que as mulheres se apropriem dos ambientes urbanos, elas precisam poder acessá-los. Sendo assim, seu deslocamento não pode ser restrito pelo horário e meio de transporte em que utilizam, apesar das tentativas de segregação por vagões de metrôs exclusivos e em horários específicos. Ao observarmos a exclusão das mulheres dos espaços coletivos, a segurança entra como fator primordial. O percentual de mulheres é usado como um indicador de segurança nos espaços públicos. Não porque a presença delas torna o lugar mais seguro, mas porque um local seguro é aquele capaz de atrair também os indivíduos do sexo feminino.

Espaços públicos com iluminação e manutenção adequadas, localizados próximos a áreas com vida urbana vibrante e diversidade de usos, tendem a ser ocupados pela população como um todo e constituem um ambiente mais seguro em sua totalidade. As relações de gênero, marcadas por controle e submissão das mulheres, não podem ser reproduzidas na cidade. Toda mulher tem direito à cidade e todo homem tem a obrigação de respeitar esse direito. Quando falamos de direito à cidade estamos também falando de gestão democrática das cidades, visto que as pessoas que decidem sobre os espaços públicos geralmente não sentiram o medo de andar na rua a noite, ou não sabem o que é um contato íntimo e indesejado em um ônibus. Ser mulher na contemporaneidade é lutar por uma cidade democrática e segura, onde se pode ir onde quiser, usar o que quiser, fazer o que quiser, sem que isso a exponha a alguma forma de violência física/moral ou constrangimento apenas por exercer seu pleno direito de que lugar de mulher é onde ela quiser, especialmente na rua.


foto: reprodução//Youtube//BayanaSystem-invisível


NEGRITUDE “A carne mais barata do mercado”

“Ser negra e estudar arquitetura e urbanismo é bem conflitante quando se estuda as minorias e você se sente incluído nelas, quando você trabalha o periférico e você se torna estudo na diversidade de clientes que o curso aborda. A dificuldade de se manter bem psicologicamente e a luta diária pra estar na média do rendimento da turma, a questão de saber que eu não tenho o poder financeiro de ter as xerox e um computador para realizar as atividades, estudar parece um abismo que me separa do restante da turma. Enquanto muitas vezes eu arrumo alternativas de me manter financeiramente no curso os outros alunos concluem seus períodos tranquilamente. A questão de ser negra nesse curso é bem assustador às vezes quando se toca no ponto do urbanismo da cidade e você vai ao Museu da Cidade (forte das 5 pontas) e seus antepassados são mostrados construindo a cidade com pedras na cabeça, sendo 24 horas tratados como bicho, acorrentados, e toda a beleza da cidade, do Recife Antigo, se mancha de sangue negro, uma angústia ver a história da cidade e as pessoas falarem do negro como falam dos animais nos zoológicos. Estudar a história e não se sentir bem de passar por alguns lugares que você já foi vendido por ter os dentes bonitos, por ser forte, por ser negro.

Quantas vezes eu me perguntei quantos de mim foram vendidos no Bom Jesus e tive angústias que nunca foram minhas, mas que me fazem não acreditar muitas vezes que as pessoas realmente acreditam no meu potencial como futura arquiteta e urbanista. A questão do movimento negro é muito importante, mas ainda me choca. As vezes tenho medo de enxergar o que está bem na minha frente no meu caminhar entre bairros. Seja zona norte ou Sul, se eu estiver "mal vestida" certeza alguém vai olhar pra trás assustado. Não preciso nem dizer o motivo e é assim que a cidade me evita, me escanteia. Zona norte, jaqueira, preta que entra no prédio é perguntada se é empregada, eu respondo "sou afilhada de fulana" aí sim eu posso entrar. Ser algo de fulano é o ponto chave pra você ser alguém mesmo que você não seja ninguém. Recife você ou é sobrenome ou é num sei o que de fulano, só assim pra ter privilégio ou nascer branco e eu nem um nem outro. Nasci preta, pobre e sim já um dia periférica, mas me orgulho de fazer meu nome em cima das minhas conquistas sem depender de A e B. Ser negra e fazer arquitetura ainda vai me deixar muito assustada, mas um dia eu vou poder ajudar a incluir pessoas como eu em muitos lugares pela cidade, desconstruindo as barreiras que criaram com os meus antepassados.” Relato de Magdala Gomes Bezerra, estudante de Arquitetura e Urbanismo, cursando o sexto período da Universidade Católica de Pernambuco, Comorg de Infraestrutura do EREA Recife 2018.


foto: Google


MOVIMENTO LGBT (in)visibilidade

A homossexualidade é tão antiga quanto a heterossexualidade. Mesmo considerando que a resistência à heterossexualidade compulsória atravessa, de algum modo, diferentes períodos da história humana, somente a partir das últimas décadas é que surgem movimentos sociais em defesa dos direitos da população LGBT, colocando em evidência a estrutura de um sistema coerente de dominação que liga Estado e libido, expresso pela definição de maternidade, paternidade e família com base na premissa heterossexual. Ao longo do tempo, a comunidade LGBT vem sendo marginalizada, criminalizada e excluída, por divergentes discursos patológicos, sociais, religiosos e intolerantes. A parada do orgulho LGBT é o marco e o grito de todos que compõem o meio por aceitação, direitos, respeito e vem em crítica a essas fragmentações e exclusões da vida social todos os dias. Os jovens homossexuais que têm a felicidade de não serem insultados, agredidos, apartados e expulsos de casa, se vêem, entretanto, na situação de clandestinidade afetiva na maior parte dos espaços públicos e privados, omitindo sua verdadeira essência em prol de segurança e integridade.

Os lugares que apresentam de maneira significativa a heteronormatividade, como igrejas, bares e escolas podem ser considerados como os principais espaços onde as famílias homoafetivas vivenciaram situações de exclusão, desconforto e preconceito. Esta realidade segregada acarreta a formação de microterritórios voltados predominantemente para o público LGBT. Temos como exemplo a implementação de banheiros sem gênero em instituições de ensino, shoppings, parques e demais espaços coletivos. A liberdade de escolher que banheiro frequentar é uma questão que vai muito além da maneira como o indivíduo se identifica sexualmente. Travestis, transgêneros e transexuais, assim como todas as pessoas, apresentam e reivindicam a necessidade de utilização do banheiro público e a estas/estes deve ser garantido esse uso, em conformidade com sua identidade de gênero, como forma de se preservar a dignidade humana desses indivíduos. Apesar de permanecer a consciência de que esta não é a solução para o preconceito presente nestes espaços. A banalização da homoafetividade nos demais espaços é emergencial para a saúde mental e física da população gay, lésbica, bissexual, travesti, transgênero e transexual. A resistência LGBT dentro de casa, nas escolas, nas universidades, nas instituições religiosas, nos espaços de lazer e demais espaços públicos e privados é nada menos que maior a luta de enfrentamento contra a hegemonia heteronormativa padronizadora de corpos da contemporaneidade.


foto: Damaris Alves Vicente


FORMAÇÃO DO ARQUITETO ‘’uma pergunta me aflige há algum tempo. é não saber muito bem em que momento um alguém, este alguém fazedor de algo pode afirmar, mão no peito que é fazedor. explico, em que acontecimento, fogos de artifício, este que constrói objetos pode dizer de si que é um construtor? e como cá estamos pergunto, se, diverso do que costuma fazer - construir - certo dia amanhece em seu peito essa estranha vontade, e dando vazão, resolve de quebrar objetos, perderia ele - que ninguém mais é que nós, eu e você - o recém alcançado nome de construtor?’’ Definir o que faz o arquiteto é uma questão-base. Se a cidade - e o mundo - tem seu tempo de constante modificação, é de se esperar que essas mudanças demandem alterações no modo de operar. Reside nesse aumento de possibilidades o problema e força. Problema porque não se trata de um aumento a toa, é necessário discutir a cidade, e enxergar como se colocar. A força porque oferece caminhos novos de trabalho e de aprendizado. As diversas crises que se superpõe sobre a cidade brasileira hoje, afetam diretamente o processo de formar-se arquiteto, afetam pois deixam expostas muitas das mazelas e erros históricos de nossas cidades. O Recife, mesmo lidando com níveis de desigualdade social, violência urbana e pobreza cada vez maiores mantém a imagem do arquiteto como profissão destinada a uma classe

específica, clientela essa que fomenta os velhos escritórios, velhos modelos de se fazer arquitetura e fazer cidade. Por isso se diz: a base é modificar o que é um arquiteto. É necessário estar atento, nos mais diversos âmbitos; aos novos formatos de organização: coletivos de arquitetura que tem se formado mundo afora, principalmente na América do sul; atentos a toda a população antes renegada do trabalho da arquitetura; é necessário estar atento a modelos de construir cidade mais comunitários e com base no trabalho coletivo; atentos as áreas de conhecimento que se somam a arquitetura; ao trabalho em conjunto com a população; é necessário o abandono de estruturas incrustadas no fazer arquitetônico e urbano. Ver o processo de formação como este contínuo é importante sem perder de vista a parcela basilar que pertence ao ensino acadêmico, esse também com necessidades urgentes de abertura, abertura ao trabalho interdisciplinar que retire o ensino de arquitetura e urbanismo ambiente uniforme; abertura à cultura popular, o seu estudo valorização e diálogo; abertura aos debates sociais, de gênero, aos debates externos do arcabouço engessado dos cursos de arquitetura e urbanismo. É preciso escapar em parte a bibliografia tradicional, esgotada em muitos aspectos e com falhas de adoração ao nosso espaço e realidade e dialogar mais com o realmente próximo. Essa dilatação se trata antes de tudo de investigar novas ferramentas, novos terrenos e novos companheiros para trabalhar o espaço e a cidade, de maneira social, econômica e política.


REALIZAÇÃO:

EREA 18 RECIFE PROMOÇÃO:


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.