Erika Soniele Cardoso Kuhn
A Histรณria do Design de Joias
“A História do Design de Joias” faz parte da coleção “Luz de Cristal”, composta por 4 títulos publicados. O editorial visa informar às pessoas sobre o mundo da joias e atrair novos clientes para Loja Crystal Light. Shopping Pelotas - Av. Ferreira Viana, 1526 - Areal, Pelotas - RS. Diretoria editorial: Jéssica Esteves. Editora executiva: Erika Kuhn. Produção Editorial: Erika Kuhn. Diretora de produção gráfica: Erika Kuhn. Revisão: Vinicius Costa, Tabata Costa. Preparação de texto: Erika Kuhn. Diagramação: Erika Kuhn. Imagens e textos: google.com wikipedia.com pexels.com biography.com Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional
KUHN, Erika Coleção Luz de Cristal: A História do Design de Joias / Erika Soniele Cardoso Kuhn. Pelotas: 2018. 40 f.; 20x20cm; Orientador: Jéssica Esteves, Tabata Costa e Vinicius Costa; Trabalho de conclusão de curso (Técnico Integrado) - Instituto Federal Sul-Rio-Grandense, 2018. 1. A história através dos anos 2. A simbologia para os egípcios 3. A joia na contemporaneidadae 4. Etéreo: Uma paixão pelo corpo, I. Kuhn, Erika. II. Instituto Federal Sul-Rio-Grandense. III. Coleção Luz de Cristal - A História do Design de Joias
Coleção Luz de Cristal
A HISTÓRIA DO DESIGN DE JOIAS
A SIMBOLOGIA PARA OS EGÍPCIOS
No egito Joias da 12° dinastia
A HISTÓRIA ATRAVÉS DOS ANOS Pré história Idade média Idade Contemporânea
ETÉREO: UMA PAIXÃO PELO CORPO Quando a arte começa no corpo A dicotomia na criação de joias Uma linguagem corporal elevada
A JOIA NA CONTEMPORANEIDADE Novos paradigmas de inovação O impacto da industrialização
A HISTÓRIA ATRAVÉS DOS ANOS A joia, entendida comumente como ornamento em material nobre, utilizado para embelezar o corpo, vêm sendo produzida pela humanidade desde tempos imemoráveis , ela preserva, através dos tempos, os aspectos históricos mundiais.
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A histĂłria atravĂŠs dos anos
O INÍCIO DA JOALHERIA NA PRÉ HISTÓRIA As joias sempre existiram de certa forma na história da humanidade. Os adornos estão presentes desde a pré-história, quando eram feitos com ossos, pedras, dentes, conchas e madeira. Sua finalidade era ressaltar o status e o papel de cada um na sociedade ou servirem como amuletos protetores. Para os egípcios, as joias representavam suas crenças e seus deuses. Os acessórios eram lapidados em formato de animais mitológicos como escaravelhos, serpentes e dragões que associados aos seus poderes simbólicos, funcionavam como proteção e força. As joias egípcias destacavam-se pela sua riqueza de cores, obtidas de minérios como feldspato e lápis-lazúli. Para os celtas, povo que habitava parte da Alemanha, Suíça e Áustria – fabricavam joias em bronze e ouro, como colares, broches, braceletes e fivelas. Tinham grande desenvoltura na gravação em metal e na esmaltação, usavam padrões circulares, espirais e formas em “S”. Já os gregos fabricavam peças com formas geométricas e retratavam cenas mitológicas em braceletes, brincos e colares. A joalheria romana teve influência dos gregos, etruscos, egípcios e outros povos. Os romanos dominavam a técnica de filigrana com maestria – trata-se de usar fios muito finos e bolinhas de metal, para compor uma joia. Os estilos provindos de origens diversas sobrepunham-se na mes-
ma peça. Os romanos não eram tão detalhistas quanto os gregos, mas também passaram a utilizar policromia, folheando de ouro uma superfície de madeira e depois aplicando esmalte por cima. As esmeraldas prevaleciam e apareciam junto com pérolas. Pedras como safira, topázio e diamantes também eram apreciadas. A bulla romana era uma espécie de cápsula que acompanhava a criança do nascimento até os dezessete anos, dentro da qual colocava-se substâncias protetoras. Outras formas utilizadas eram a roda, o alfinete grego conhecido como fibulae e a barra horizontal à qual unem-se dois ou três pendentes verticais, de origem asiática. Para os camafeus, pedras lapidadas de maneira a formar uma figura humana – também foram muito usados pelos romanos. Tiaras com pérolas enfeitavam os penteados das senhoras da aristocracia e, posteriormente, veio o costume de usar moedas e medalhas em anéis masculinos ou como distinção militar. Se usadas em colares ou broches, as moedas eram uma forma de adulação ao rosto estampado em sua superfície. Depois surgiram os braceletes em ouro maciço e uma versão maior do alfinete grego, semelhante às atuais fivelas redondas usadas em cintos, para prender os mantos. Muito da estética desses povos ainda acompanha as criações dos designers contemporâneos.
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JOIAS COMO OBRA DE ARTE NA IDADE MÉDIA Na Idade Média a arte sofre grande influencia religiosa. Deus é o centro do universo (teocentrismo) e a Igreja, como representante de Deus na Terra, possuía poderes ilimitados. Esta influencia marcante na vida da sociedade, também influenciou a joalheria. Os ourives combinavam formas intrincadas com arabescos em filigrana de ouro, diamantes, esmeraldas, pérolas, rubis, safiras, turquesas e topázios. O Império Bizantino se destacava por suas joias. Depois da época iconoclasta que proibia o culto às imagens foi inventado o ouro fundido com o vidro esmaltado, uma técnica que logo se tornou sua especialidade. Neste período, na cultura oriental o imperador era considerado a representação da figura divina na Terra, por isso quando ele era homenageado com um objeto artístico, este objeto, na maioria das vezes apresentava um fundo religioso. A expressão da arte bizantina podia ser observada na arquitetura das igrejas e palácios. As igrejas se sobressaíram pelos mosaicos dos vitrais, paredes e tetos. Isso se refletiu também na joalheria. As joias eram muito valorizadas neste período, usadas tanto nas vestimentas – em sapatos, vesti-
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A história através dos anos
dos, e fivelas- como em adornos para o corpo com coroas, colares, anéis, pulseiras. Ao analisarmos variadas civilizações encontraremos um ponto em comum entre elas: a mesma carga mística que depositaram nos adornos e em determinados metais. Mesmo não tendo contato umas com as outras, tiveram o mesmo comportamento e através dos tempos, desenvolveram técnicas de fabricação que utilizamos até hoje, como a filigrana e o cloisonné. Atravessando as fronteiras do império, a joalheria bizantina conquistou vastos territórios com seus adereços de ouro e seus ícones com o cloisonné enamel. No período Renascentista a joalheria deixou de ser patrocinada pelo clero e passou a ser patrocinada pela burguesia. O ofício de ourives começou a ganhar status de arte assim como a pintura e escultura. No final do século 14, o ourives cede lugar ao joalheiro, que introduziria novas modas, com desenhos elegantes e poéticos, flertando com temas da natureza para seus camafeus. Durante a renascença as joias conquistam status de obras de arte, tanto que os mecenas passaram a contratar ourives para novas criações.
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A idade contemporânea foi marcada pela inovação, que acontece até os dias de hoje. mutável, criativa, ora exaregada, ora minimalista, mas sempre inovadora. 14
A história através dos anos
IDADE CONTEMPORÂNEA E A INOVAÇÃO O Estilo Barroco foi marcado pelos conflitos espirituais da humanidade. O homem se colocava entre o paganismo e o cristianismo, assim como entre a matéria e o espírito, o antropocentrismo e o teocentrismo.
uma linha de joias mais acessíveis e versáteis. Com o fim da guerra, a Europa voltou a abrir suas portas para o glamour e as mulheres, ansiosas para mostrar um aspecto renovado, aguardavam inquietas pelas novidades.
As linhas curvas e os temas de natureza eram usados com uma nova linguagem. As inspirações vinham das flores e dos pássaros das Américas. Outro tema muito presente na joalheria desta época foram os laços. No século XX, o estilo Art Nouveau ou Belle Époque como ficou conhecida na França, marcou o retorno da arte barroca, a reinterpretação da natureza em formas delicadas de flores estilizadas e utilização da platina e elementos como o marfim.
O ouro seguia gozando de popularidade, agora com texturas nas superfícies e gemas em combinação de cores turquesa e coral. Porém, a gema preferida das mulheres seguia sendo a pérola. Até os anos 50 existiam duas formas de fabricação de joias: as industrializadas, feitas com gemas raras e as joias artesanais, feitas com materiais mais acessíveis e a estética e a arte eram mais importantes que os materiais.
Na década de 30, atrizes de Holywood ditavam a moda. Com a crise econômica em 1929 materiais sintéticos foram empregados na joalheria para compor o “look”. O novo estilo ficou conhecido como Art Déco, evidenciando as formas geométricas inspiradas no Cubismo de Pablo Picasso. Ainda no século XX, graças a estilistas como Coco Chanel, novas joias conquistaram o coração das mulheres: a “Bijuterie Fantasie”, com design especial, feitos com materiais não preciosos em contraposição à ostentação das peças de joalherias. Era um período de início da II guerra Mundial e as mulheres tinham um novo papel social neste contexto, por isso a necessidade de se criar
Nos anos 60 e 70 a forma era mais valorizada que o material. O design passa a ser valorizado pelo conceito e o uso de plástico e até papel eram utilizados na composição das peças. As joias dos anos setenta eram puramente bijoux caracterizadas por três tendências: flores no início da década, linhas geométricas e referências a moda indiana. Colares, pulseiras, anéis e brincos de metal com muitos fios que foram enfeitados com pérolas, encantos ou flores de plástico ou metal. É o período de exagero, a grande jóia flashy, tecidos, laminados. Os anos 90, ao contrário da década anterior, são caracterizados por um retorno ao minimalismo em relação a joias e roupas. As joias são inspiradas nos estilos do passado: civilização grega e romana, Art Nouveau e Art Deco.
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A SIMBOLOGIA PARA OS EGÍPCIOS É inegável o reconhecimento do papel singular das joias como objeto simbólico, que tem como função ser porta-voz de um discurso que leva às complexas relações construídas pelos homens que as criaram.
Desde o quarto milénio a.C. existem evidências de construção de jóias no antigo egito. Este povo dava enorme importância ao significado religioso de certos objetos sagrados refletindo e influenciando os motivos para aplicar as suas jóias. Começaram fazendo jóias de simples materiais naturais como por exemplo ramos de plantas, pérolas, pedras sólidas ou ossos. Estes materiais eram colocados em fios de linho ou em pêlos de vaca e para da cor começaram a pintá-los com substâncias extraídas de plantas e pedras. O trabalho dos ourives egípcios era dominado pelo uso de amuletos. Apesar do repertório limitado de motivos decorativos, a criatividade, o domínio de técnicas de ourivesaria, o uso de cores fortes e a repetição de formas e desenhos mostram a maestria dos ourives, que confeccionavam jóias contendo mais do que um simples efeito decorativo: os motivos possuíam significados religiosos ou mágicos. No antigo Egito, a jóia era tão importante quanto a sua cor e nenhum símbolo foi tão importante para os egípcios como o escaravelho que significava ao mesmo tempo o sol e a criação, também haviam joias como a cruz ansata, ou ankh, sendo um dos mais importantes símbolos da cultura egípcia. Possívelmente surgido na Quinta Dinastia (2.498-2.345 aC), o ankh consistia em um hieróglifo representando a regeneração e a vida eterna e a idéia expressa em sua simbologia era a da força da vida reinando sobre
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A simbologia para os egípcios
a superfície da matéria inerte. O olho udjat (olho do deus Horus) protegia contra a inveja e as flores de lótus simbolizavam ressurreição. O enorme simbolismo das jóias antigas egípcias também se refletia no uso de determinadas cores. De acordo com o Livro dos Mortos, sabemos que o azul-escuro representava o céu quando noite, o verde a ressurreição e a renovação, e o vermelho o sangue, a energia e a vida. A joalharia dos talismãs era destinada para os mortos, como forma de protecção para a outra vida. As jóias dos faraós eram preparadas desde o momento de posse do trono ocupando constantemente os Joalheiros. Os acessórios encontrados e que faziam parte da ornamentação egípcia eram pulseiras, peitorais decorativos suspensos por corrente ou fita e decorado para representar várias divindades, formava uma espécie de peruca exterior que influi como as ondas do cabelo em fios longos e flexíveis de contas de ouro sendo mantido no lugar por um diadema de ouro de forma a manter a peruca durante as cerimónias.Os diademas eram utilizados também pela múmia para proteger a testa do rei no além. A maioria dos objectos domésticos tais como vasos, placas e móveis eram feitos de ouro batido enfeitado com jóias. Embora alguns tesouros egípcios se tenham perdido ou sido roubados, o tesouro do famoso faraó Tutacâmon, filho de Almenhotep III herdado e acumulado ao longo dos tempos, como o de Seti I ou Ramsés ainda permanece vivo.
NO EGITO
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JOIAS DA DÉCIMA SEGUNDA DINASTIA 20
A simbologia para os egípcios
A genialidade e a habilidade dos artesãos do Médio Império têm sua máxima nas jóias criadas para as rainhas e as princesas da 12ª dinastia. O requinte e as cores vivas das coroas, colares, pulseiras, tornozeleiras e anéis que adornam essas mulheres estão entre as melhores conquistas da joalheria egípcia. Os joalheiros reais da 12ª dinastia dependiam principalmente de alguns materiais para a confecção de suas criações: ouro, faiança, ametista, lápis-lazúli, cornalina, turquesa e feldspato. As obras resultantes combinam disposições resplandecentes de cores profundas e vivas. Os elementos individuais também eram criados com apenas um material, como o ouro ou a ametista, adornados com decorações chanfradas ou entalhadas. Esses componentes eram então montados em finas peças de joalheria, com a adição de uma variedade de contas, feitas com pedras semipreciosas. As jóias das princesas e das rainhas do Médio Império eram decoradas com desenhos e símbolos que protegiam quem as usava e ao mesmo tempo demonstravam sua condição social. Os uraeus e o ornamento peitoral, incorporam os nomes e as imagens do rei, definindo o proprietário como um membro da família real. Outros tipos de jóias eram usadas pelos homens e mulheres da classe alta. Apesar dos esconderijos, dos quais muitas jóias reais da 12ª dinastia foram recuperadas, não
terem sido descobertas por ladrões de tumbas, a deterioração dos fios que uniam os elementos dessa joalheria resultou na perda de sua disposição original. O conhecimento de como essas jóias foram compostas e usadas foi entendido a partir de pinturas, relevos e esculturas que retratam as mulheres, reais ou súditas, adornadas com uma variedade de ornamentos. Apenas alguns diademas reais sobreviveram, cada qual com uma disposição exclusiva de motivos florais. As flores adornam as cabeças femininas com grande frequência nas pinturas, relevos e nas esculturas e tais diademas reais supostamente representam uma versão, confeccionada em um material permanente, de ornamentos que eram feitos com flores frescas. Além dos elementos florais, o diadema de Sithathoriunet inclui também um uraeus, enquanto que um dos diademas de Khnumet têm um abutre de asas abertas. A descoberta de uma coleção intacta de jóias do Médio Império, revelaram um pequeno esconderijo de jóias em 1994. Os objetos encontrados pertenceram à rainha Weret, mulher que supostamente foi uma das esposas de Senusret III. As jóias estavam escondidas em um pequeno nicho no fundo do poço vertical que levava até os apartamentos funerários. A localização incomum desse esconderijo, pode explicar porque os ladrões, durante a brutal destruição da câmara funerária da rainha, não encontraram as jóias.
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A JOIA NA CONTEMPORANEIDADE Tradicionalmente, a joalheria é vinculada com a ideia de durabilidade eterna. no entanto, em virtude da tecnologia, tudo é rápido, e por isso, a durabilidade foi quebrada e a joia, apesar de ser mais refinada, é instável.
NOVOS PARADIGMAS DE INOVAÇÃO Há alguns anos a joalheria vem se deparando com uma nova realidade e, quem sabe mesmo, uma revalorização de seu estatuto enquanto objeto simbólico. Depois de viver um longo período como objeto-investimento, a jóia redescobriu e resgatou seus outros papéis, abrindo-se para performances cada vez mais diversificadas. Objeto de design, objeto de arte ou objeto de consumo, a jóia passou a trajar, como a moda, um vestuário variável, capazes de assegurar o seu aspecto como objeto único e precioso e manter o seu caráter de legítima representante do seu tempo. Da antiguidade aos nossos dias, o valor simbólico ampliou seus significados. Os signos a elas incorporados tanto podem ser de poder, riqueza, prestígio, fidelidade, amor e honra, quanto de distinção, magia, humor, ou sedução, entre outros. Todos esses significados não são aleatóriose; sempre estarão em sintonia com seu tempo e atendendo às expectativas do público. Foi a partir da década de 1990 que se inaugurou uma nova dinâmica no consumo de jóias que observa Costanza Pascolato, “revolucionou o comércio e
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A joia na contemporaneidade
tirou da letargia o design, inovando-o”. O evento responsável por essa transformação tem as mulheres como protagonistas, quando elas passam a comprar suas próprias jóias, não mais dependendo da prática até então usual de recebê-las de presente, principalmente do público masculino. Cada vez mais atuantes e independentes, as mulheres influenciaram a mudança no design das jóias. Embora usando o mesmo luxo dos materiais, ficaram atuais, despojados, práticos e esportivos. Outro movimento importante, tem sido a aproximação da jóia com a moda e as tensões decorrentes do antigo antagonismo que ligava a primeira à eternidade e a segunda à efemeridade. Uma pesquisa realizada pelo Observatório de Sinais também localiza esse início de diálogo através de duas principais tendências denominadas: a “lógica do eterno”, em que a joalheria corresponde aos modelos mais tradicionais e luxuosos, e a “lógica da moda”, ligada ao ritmo acelerado das mudanças e das tendências. Neste grupo, a pesquisa situa a joalheria mais leve e acessível, as jóias com materiais não-convencionais e as jóias com design diferenciado.
MUTÁVEL
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A joia na contemporaneidade
IMPACTO DA INDUSTRIALIZAÇÃO NA PRODUÇÃO DE JOIAS Ao longo do século XIX, a sociedade sofreu o impacto de uma avalanche de espetaculares avanços tecnológicos, decorrentes da Revolução Industrial. Esses avanços permitiram que as fábricas almejassem maiores níveis de eficiência em seu desempenho e muitos artigos, anteriormente fabricados à mão, perderam suas características rudimentares e artesanais para entrarem numa linha de montagem cada vez mais veloz, com custo reduzido. Na joalheria, Clare Phillips comenta que:
estavam reservados a poucos privilegiados, pertencentes a uma camada especial e superior das sociedades.
“Crucial para o desenvolvimento de jóias produzidas em massa foi o aplicação de vapor a máquinas de estampagem que perfurou tanto a forma básica e o detalhamento da superfície uma peça em uma ação rápida.”
Essa popularização, que percorre todas as cores do prisma social, acompanha os mesmos movimentos adotados pela moda, entre a alta costura e o prêt-à-porter. Porém, se a produção em massa tornou os bens acessíveis a um mercado mais amplo, seus operários e exartesãos acabaram alienados e distantes de todo o processo de fabricação, passando a atuar em apenas uma etapa reduzida, anônima e repetitiva na maioria das vezes, da cadeia produtiva.
Essas mudanças causaram um especial impacto na joalheria entre ourives e artesãos que, tradicionalmente, criavam e executavam suas jóias. Na Antigüidade, o ourives era considerado um ser especial, dotado de poderes que o levavam a manipular metais preciosos com maestria e técnicas sofisticadas, concebendo objetos impregnados de símbolos místicos e sagrados. Tanto o domínio dessas técnicas quanto a posse desses objetos
A jóia, cuja nobreza a distinguia enquanto modelo absoluto e transcendente, encontra na industrialização a possibilidade de seu desdobramento em séries, extrapolando o seu caráter de objeto de casta, único e singular. É através da difusão serial que a joalheria alarga seu potencial de abrangência, tornando-se acessível a todos, por direito.
Na civilização das máquinas, o artesão não tem mais a posse de suas ferramentas, de seus meios de produção, passando a ser apenas mais um operário dentro de uma indústria.
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ETÉREO: UMA PAIXÃO PELO CORPO No universo subjetivo das pessoas, a arte é talvez o principal elemento de aproximação entre os homens. Nesse sentido, o corpo torna-se o croqui, porque é dele que advem a arte e todos as outras joias, e assim, ana aproxima as pessoas.”
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Etéreo: Uma paixão pelo corpo
KHOURI
QUANDO A ARTE COMEÇA NO CORPO Ana Khouri passou seus anos de formação entre a sua terra natal, o Brasil e os Estados Unidos. Ana primeiro estudou Belas Artes especializada em escultura em São Paulo, na Fundação Armando Alvares Penteado. Foi na escola de arte que ela começou a pensar criticamente sobre esculturas e jóias, mais precisamente sobre as maneiras pelas quais ela poderia fazer peças que falassem diretamente ao corpo. Em Nova York, ela obteve diplomas no GIA (Instituto Gemológico da América) e Parsons, antes de viajar para Londres para estudar na Central Saint Martins. Seu passado e amor pela escultura agora fariam muito a seu favor, permitindo-lhe uma compreensão mais rica das possibilidades criativas que não estavam sendo exploradas no design de joias. Como designer, ela está desequilibrada de quaisquer restrições técnicas e, como artista, exige, sempre, que os materiais se curvem à sua visão criativa. Para Khouri, projetar jóias é sobre as
inúmeras maneiras e possibilidades que uma peça pode tomar forma no usuário e o equilíbrio que o trabalho cria com o corpo. Outro princípio Khouri é uma insistência em trazer jóias de alta para o século XXI. Essa atitude formou uma batida constante em sua ascensão nos últimos anos. Sua linha homônima baseada em Nova York, que ela lançou em 2013 - depois de fazer sua primeira peça em 2002 - tem crescido constantemente desde que atraiu uma longa lista de mulheres afins e, no processo, levou o design de jóias a um salto gigantesco, pois é uma das poucas designers a romper padrões de joias tradicionais. O design da assinatura de Ana é inspirado em sua busca pela Pureza. Apresentando uma linha contínua, sem base, deixando apenas o que é mais essencial - a pureza dos materiais utilizados. Toeing a linha entre escultura e jóias, seus projetos destinam-se a ser extensões orgânicas do corpo, com fluidez e suavidade.
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A DICOTOMIA NA CRIAÇÃO DE JOIAS O que é considerado bonito depende de seu contexto, mas onde reside a beleza? É nos materiais de que é feito? Está na sua utilidade? Está em seu design? Às vezes, as coisas mais bonitas são aquelas que são as mais comuns e, às vezes, as coisas que são automaticamente ditas, porque são preciosas, não são. Se beleza é algo fluido e abstrato, então não é intrínseco a nenhuma coisa em particular. Também não está vinculado à qualidade dos materiais encontrados em um objeto, mas está em seu design. Crescendo no Brasil, aprende-se a abraçar essa dicotomia. Nós vemos a beleza em objetos e materiais do cotidiano e os usamos com o mesmo interesse daqueles que são de alta qualidade. Muitas dessas coisas têm uma qualidade inata que é separada de sua utilidade, embora muitas vezes não seja reconhecida. Quando Ana estava desenhando essas peças, ela continuou voltando para essas idéias. Se a beleza é tão vibrante e presente em um pedaço de Corian quanto é um colar artesanal, então por que não encontrar uma maneira de demonstrar isso? coisas têm uma qualidade inata que é separada de sua utilidade, embora muitas vezes não seja reconhecida. Quando Ana desenhava essas peças, ela voltava para essas ideias. Se a beleza é tão vibrante e presente em um pedaço de Corian quanto é um colar artesanal, então por que não encontrar uma maneira de demonstrar isso? Ao
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Etéreo: Uma paixão pelo corpo
justapor cada uma das peças com esses objetos comuns, a esperança é reorientar a atenção para o que torna uma coisa bonita. Muitos desses itens não são aqueles que seriam descritos usando essa palavra, mas quando eles estão neste espaço e em um contexto com outros objetos, eles estão associados com a beleza, ou seja, jóias, eles parecem atraentes. Por meio desse foco renovado, essas coisas se tornam desequilibradas de qualquer associação que se possa ter e se tornar nova novamente. Isso é o que Ana acha tão convincente: “que essa mudança na forma como avaliamos as coisas cotidianas também afeta o modo como o espectador vê meu trabalho”. As peças não são mais simplesmente belas porque se espera que as jóias sejam ou por causa dos materiais usados para produzi-las, apesar delas. Da mesma forma que um objeto comum pode ser elevado ao nível da arte. Segundo Ana, essas peças são significativas por causa de sua conexão com as linhas do corpo feminino e o que os desenhos fazem com o corpo. Eles se tornam vivos e se mostram quando usados não apenas porque se alinham com a forma humana, mas porque se complementam, aumentando a beleza de ambos. Especialmente quando há movimento - todo dia, todo movimento de ocasião - eles se mostram. Eles se conectam ao corpo como o corpo faz para si mesmo, destinado a escrever a história da mulher que os usa
A dicotomia vê a alma como um lugar privilegiado da razão, da sabedoria e da ciência. Filosofos com suas teorias optam pela mente, e ao corpo dão significados que diminuem sua importância na sociedade. 33
Ana aspira a criar uma joia que fale ao corpo, às vezes ela reconfigura completamente a linha onde a escultura termina e a jóia começa. Ela faz suas peças como extensões do corpo, fluidas e quentes.
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ENTREVISTA
Etéreo: Uma paixão pelo corpo
ETÉREO, UMA LINGUAGEM CORPORAL ELEVADA SEGUNDO ANA KHOURI; Como um designer de jóias, você deve encontrar uma maneira de acentuar a elegância natural do que são indiscutivelmente os materiais mais bonitos encontrados na Terra. O trabalho deve ter uma qualidade eterna, mas também se deve aspirar a imbuir as peças com outra essência que, para mim, é muito mais consequencial: quero que meu trabalho seja etéreo. É irônico, talvez, que a pedra e o metal retirados da Terra possam ser etéreos, mas as joias há muito estão associadas às estrelas. Eu acho que jóias finas devem sempre aspirar a rivalizar com o temor que experimentamos quando voltamos nossos olhos para cima. Não quero simplesmente que essas peças adornem ou que sejam objetos bonitos. Eu quero que eles sejam o mais perfeitos possível. Quero que meus projetos evoquem sua conexão com o espaço - sua vastidão, sua majestade e sua forma superlativa.
O próprio processo e propósito de projetar jóias - de refinar e reinventar a assinatura de alguém - é para mim, eventualmente, localizar essa qualidade fina e ilusória. É assim que eu gostaria que todo mundo se sentisse quando visse essa coleção. Meu objetivo é transformar esses materiais preciosos em algo que é muito mais do que um acessório extravagante. A jóia é o meu meio e, por natureza, é para ser consciente de suas técnicas e do valor de tais materiais finos. Mas isso é secundário. A sensação que desejo transmitir é de radiância, em todos os sentidos: a da luz, da emoção, da energia e, claro, da beleza. Tanto na técnica como no design, sou inspirada a criar uma joia moderna que fale ao corpo. As vezes reconfiguro completamente a linha onde a escultura termina e a jóia começa. Faço minhas peças como extensões do corpo, fluidas e quentes, demonstrando través da forma, uma compreensão sublime da anatomia e do movimento.
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Instituto Federal Sui-rio-grandense - Campus Pelotas Curso Técnico em ComunicaçãoVisual Trabalho acadêmio desenvolvido no primeiro semestre de 2018 para a disciplina de Design Editorial ministrada por Jéssica Esteves, Tabata Costa e Vinicius Costa. Impressão: Gráfica IFSul Pelotas/RS Capa dura: Impressão a laser em papel couchê 120g/m² Miolo: Impressão a laser em papel sulfite 115g/m² Tipografias utilizadas: Cormorant, para títulos; Minion pro, para corpo de texto e destaques. Erika Soniele Cardoso Kuhn erikackuhnn@gmail.com
A joia, entendida comumente como ornamento em material nobre, utilizado para embelezar o corpo, vêm sendo produzida pela humanidade desde tempos imemoráveis, havendo indícios de produção de ornamentação pessoal desde a pré- história. Parece ser inegável o reconhecimento do papel singular das joias como objeto simbólico, que tem como função ser porta-voz de um discurso que leva às complexas relações construídas pelos homens que as criaram, as possuíram e usaram. Ela preserva, através dos tempos, os aspectos históricos e socioculturais. LUCIANA JACOCIUNAS CERATTI