WORKING PAPER LINHA DE PESQUISA: ARQUEOLOGIA PORTUÁRIA APLICAÇÃO: O PORTO DO RIO DE JANEIRO COMO COMPLEXO ARQUEOLÓGICO Erika M. Robrahn-González1 Paulo DeBlasis2 Dagoberto Lopes Oliveira3 Pedro Miguel da Silva Narciso4 Luis Vinicius Sanches Alvarenga5
RESUMO Compreender os processos de formação e transformação histórica da região portuária do Rio de Janeiro enquanto uma Paisagem Cultural, onde diferentes sociedades humanas interagiram através de seu conhecimento, ou ainda, de sua “sabedoria ambiental”. Esse é o enfoque e principal objetivo do Programa de Gestão do Patrimônio Arqueológico das Obras de Revitalização da AEIU que se encontra em andamento, abrangendo obras viárias em uma área de 5 milhões de m2. O entendimento do design apresentado pela paisagem cultural da região portuária do Rio de Janeiro, formado por diferentes assinaturas antrópicas deixadas pelas comunidades ao longo do tempo e resultando em um conjunto único, indissociável e em perpétua evolução, necessita de uma abordagem integrada e transdisciplinar, aderente aos pressupostos da Consiliência. Assim, o estudo de seu patrimônio arqueológico, histórico, cultural e paisagístico busca, em essência, os pontos de interação entre as disciplinas, a complementaridade entre ciência e tradição, o reconhecimento da Ecologia dos Saberes. O Programa contempla a participação da comunidade portuária no reconhecimento de seu patrimônio, considerando as singularidades das experiências históricas de cada cultura e de cada grupo social. Desta maneira, busca-se compreender o patrimônio cultural como algo vivo e integrado às sociedades, elemento fundamental na manutenção da coesão social e da preservação das culturas.
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Historiadora, Mestre em Antropologia Social com Doutoramento, Pós Doutoramento e Livre Docência em Arqueologia (USP). Pesquisadora do NEPAM/UNICAMP. Membro do Comité Executivo da Union Internationale des Sciences Proto et Prehistoriques (UISPP). Tem dezenas de publicações científicas nacionais e internacionais. É sócia diretora e cientista master da empresa DOCUMENTO Ltda. 2 Historiador, Mestre em Antropologia Social com Doutoramento e Livre Docência em Arqueologia (USP). Arqueólogo e Professor Associado no Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE-USP). Professor visitante da University of Arizona/EUA (2009/10), com dezenas de publicações científicas nacionais e internacionais. 3 Historiador (FURG), Mestrando em Patrimônio Cultural (UFSM). Tem especialização em Arqueologia Histórica e Arqueologia de sítios Sambaqui. Participou e coordenou dezenas de campanhas arqueológicas de campo por todo o território brasileiro. Integrou equipes de produção de Mapas e Cartas arqueológicas no Sul do Brasil. 4 Arqueólogo (Universidade Nova de Lisboa/Portugal), com diversas experiências de pesquisa em Portugal e no Brasil, incluindo atividades de turismo arqueológico e educação patrimonial. Experiências diversas em políticas públicas de tratamento do patrimônio arqueológico. Especialização em restauro. 5 Historiador (Universidade Santo Amaro/SP), com mais de 10 anos de prática em projetos de Arqueologia e Patrimônio Cultural. Técnico em Naufrágios e Arqueologia Subaquática, participou de dezenas de campanhas arqueológicas de campo por todo o território brasileiro. WORKING PAPER – Linha de Pesquisa: Arqueologia Portuária Aplicação: O Porto do Rio de Janeiro como Complexo Arqueológico Versão Julho/2012
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O presente material é apresentado no formato de um “Working Paper” a ser desenvolvido, aprimorado e complementado ao longo dos 5 anos de atuação do Programa (2011/2015), acompanhando a evolução de seus resultados. Visa integrar a comunidade científica nacional/internacional e os interessados em geral na construção do conhecimento e na reflexão sobre o patrimônio arqueológico envolvido, inclusive aderente à política do IPHAN sobre acesso à informação instituída pela Portaria n. 211, de 16.05.2012.
DIRETRIZES Os tempos contemporâneos exigem novos posicionamentos das Ciências Sociais em relação aos seus objetos de estudo. Estas mudanças levaram a Arqueologia a ampliar seus horizontes de atuação, dando maior robustez e consistência ao seu papel social e, também, gerando novas interfaces de trabalho, ou determinando novas configurações àquelas já existentes. Hoje, não há como realizar pesquisa arqueológica sem uma perspectiva transdisciplinar no tratamento do patrimônio cultural, em seu latu sensu. Na prática, isto demanda pesquisadores voltados a integrar o relacionamento entre a pesquisa, a gestão de bens culturais e os grupos sociais envolvidos, visando contribuir para o fortalecimento de vínculos existentes entre a sociedade e passado, ampliando o interesse sobre o patrimônio e criando, paralelamente, a sustentação necessária às atividades de preservação. Assim, além da prática da pesquisa científica, o papel social do arqueólogo leva-o a realizar ações que envolvem a compreensão do presente, visto como história contínua (e não uma história do “outro”), e do futuro. Neste enfoque, a Arqueologia contribui na busca da sociedade em ampliar sua relação com o passado envolvendo inúmeras dimensões, as quais, muitas vezes, refletem tensões e dinâmicas sociais mais amplas. Elas dizem respeito aos procedimentos de identificação, incorporação, negação, preservação, destruição, promoção, recuperação ou esquecimento dos marcos históricos e culturais presentes na região, que dependem das populações locais, amparadas por iniciativas públicas e/ou privadas para se manterem vivos. Isso quer dizer que cada item do patrimônio se envolve em tramas específicas das sociedades exigindo, portanto, tratamento diferenciado e singular. Dessa forma, e conforme define a UNESCO (Convenção do Patrimônio Mundial, 1972), o patrimônio cultural envolve a análise dos processos de formação e transformação de uma comunidade a partir de uma perspectiva dinâmica. Neste enfoque é fundamental conhecer os atores do processo cultural, seja no papel de produtores, de consumidores ou de gestores, visando ampliar sua valorização e proteção. Somente através de um tratamento que abranja o conjunto dos diferentes aspectos relacionados ao que, em síntese, é aqui definido como “Patrimônio Cultural” (integrando o Patrimônio Arqueológico, Histórico, Cultural Material e Imaterial e Patrimônio Paisagístico) é que se poderá dar conta da diversidade e complexidade do desenvolvimento pré-histórico e histórico regional. Com o objetivo de contribuir na gestão, presente e futura, do patrimônio cultural abrangido pela área deste Programa, está sendo também paralelamente elaborado um Master Plan de acordo com modelos estabelecidos pela UNESCO e IFC (International Finance Corporation/ World Bank Group), que visa integrar os resultados das pesquisas com as políticas públicas e as iniciativas científicas e socioculturais vigentes e/ou em planejamento. Este Master Plan incorpora, ainda, subsídios para implementação de Plano de Ação através de prognósticos de cenários para curto, médio e longo prazo com base no conceito de Resiliência Cultural, conforme detalhado mais adiante. WORKING PAPER – Linha de Pesquisa: Arqueologia Portuária Aplicação: O Porto do Rio de Janeiro como Complexo Arqueológico Versão Julho/2012
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CONCEITUAÇÃO A conceituação teórica da pesquisa está apoiada no tratamento de Paisagens Culturais, voltada para a análise dos processos e formas de apropriação do espaço ao longo do tempo. O entendimento dispensado ao que passaremos a chamar de “patrimônio paisagístico” necessita recuperar alguns elementos da conceituação de cultura e de patrimônio, pois é à luz da confluência entre estes dois conceitos que se esclarece e sustenta a definição de “paisagem”. Emprega-se, aqui, a conceituação ampla de cultura como “forma de fazer”, expressão múltipla do estar no mundo, ocupar, transformar, valorar, significar, construída cotidianamente pelas pessoas e em eterna mutação. Como “patrimônio”, dentro da trajetória de construção e transformação do conceito, adotou-se aquilo que é herdado, que é transmitido através do tempo e valorado por cada geração, ainda que essa valoração seja absolutamente dinâmica. Com isso temos outra dimensão da questão, a da paisagem. Paisagem é, a priori, um conceito que advém da dimensão cultural da existência. Alguns teóricos tendem a classificá-la como “espaços-marca” ou “espaços-matriz”, buscando encontrar nela características consolidadas, modelares, de espaços “intocados” – portanto “naturais” – e outros espaços “apropriados” – portanto “culturais”. Todavia, é a integração entre “natural” e “cultural” que, precisamente, estabelece a abordagem adotada neste projeto, superando em uma visão unificada essa dicotomia que, de uma perspectiva humanística, resulta tão frágil e insustentável. O ato de olhar é, por si, tanto natural (por conta de suas características biológicas, fisiológicas etc.) quanto cultural, dada a diversidade sensorial permitida pela imensa variabilidade cognitiva promovida pelas culturas. Em suma: nem todos os seres humanos, vivendo num mesmo tempo, em lugares e culturas distintas, ou mesmo ao longo do tempo, veem da mesma forma, atentam para as mesmas coisas, percebem as mesmas nuanças ou, até mesmo, as mesmas formas e cores. Determinar, então, uma paisagem como “matriz”, por ser supostamente mais “natural”, e outra como “marca”, por ser mais “cultural”, ocultaria o fato de que, novamente, a paisagem como elemento inerente às culturas carrega “valorações” de múltiplas ordens, materiais, simbólicas, etc., e é, justamente, a presença desses valores no conjunto de itens que compõe uma cultura que torna alguma coisa um “patrimônio”. Natureza e cultura, assim, não podem ser compreendidas nem tratadas como dimensões independentes, mas como interdependentes e indissociáveis. A “paisagem” enquanto “forma”, ou “objeto”, tem ainda uma segunda esfera de complicações, pelo fato de, embora seja formada e conformada pelo (e no) meio físico, só é apreensível através do filtro cognitivo do qual tratamos acima. Uma fotografia, um quadro, um vídeo de uma paisagem não o é em si, mas somente uma “representação” da mesma, pois, como “ambiente”, carrega todas as dimensões sensoriais que as representações captam apenas de forma lacunar e fragmentada. A paisagem é formada pela morfologia do espaço, pelas características topográficas, hidrográficas, etc., mas, também, pelos sons, texturas, fenômenos óticos. Além disso, as paisagens recebem valorações, significações simbólicas na estruturação das relações sociais, econômicas e políticas, incorporam mentalidades, mitologias. As paisagens são “bens” de valor inestimável aos povos que nelas vivem por estarem na base de suas vidas, tocando sempre nas dimensões materiais e simbólicas delas. Portanto, não há paisagem sem um observador.
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Nessa perspectiva, os estudos buscam contar com o envolvimento da comunidade diretamente relacionada à área de pesquisa, sobretudo no reconhecimento e identificação dos vários elementos constituintes da paisagem, nos quais se incluem componentes do patrimônio cultural imaterial. Para os períodos de tempo mais antigos (estudados pela Arqueologia), as paisagens culturais são inferidas a partir da análise dos remanescentes físicos e locacionais dos vestígios identificados (incluindo os ecofatos), bem como pelo seu padrão de distribuição no espaço. Em seu desenvolvimento conceitual, a ideia de paisagem passa a constituir matéria de análise e interesse das mais diversas áreas do conhecimento como a geografia, antropologia, arquitetura e turismo, dentre outras. Isso acaba por lhe conferir diversas interpretações e graus de importância, tanto em seus aspectos naturais como culturais. No caso da Arqueologia, situada na confluência das disciplinas humanas e naturais e, por isso mesmo, dotada de uma vocação intrínseca para a interdisciplinaridade, apoia a convergência de todas estas perspectivas. Considerando que a paisagem não é estática e está sujeita a constantes processos de transformação, sobretudo pela ação do homem, ela pode ser considerada como fonte de conhecimento histórico. Nesse caso muitas vezes apresenta, como comentado, várias assinaturas antrópicas que constituem, em conjunto ou separadamente, o objeto de estudo da denominada Arqueologia da Paisagem. “A paisagem oferece pistas materiais que permitem perceber seu caráter histórico. São esses “traços fósseis” que conduzem ao entendimento da formação geomorfológica e social da paisagem contemporânea e de suas sucessivas fisionomias anteriores ao longo do tempo” (Meneses 2002:30). Nessa diretriz, Criado (1999:6) assinalou que a Arqueologia da Paisagem pode ser vista como uma linha de pesquisas arqueológicas orientadas para “... el estúdio y reconstrucción de los paisajes arqueológicos o, mejor, el estúdio com metodologia arqueológica de los procesos y formas de culturización del espacio a lo largo de la historia”. Desta maneira, a abordagem ecossistêmica encontra relação com a perspectiva integrada, pois, ao invés do estudo individualizado de cada componente do sistema, procura entender seus componentes em interação. Assim, estruturas ou sítios arqueológicos devem ser tratados enquanto documentos, vetores de informação que conduzem inicialmente às atividades cotidianas, mas que, em última análise, só podem ser entendidos na totalidade do(s) sistema(s) sociocultural (ais) a que se relacionam. Esta perspectiva vem sendo amplamente adotada no tratamento do patrimônio arqueológico urbano, como mostra, por exemplo, o trabalho desenvolvido em Salvador/BA na região do Pelourinho pelo Programa Monumenta/ IPHAN6. Em resumo, as pesquisas objetivam propiciar uma melhor compreensão sobre a formação e evolução histórica da região portuária do Rio de Janeiro, enfocando as alterações na paisagem em função da ocupação do local e do conjunto de relações sociais, econômicas e culturais que delinearam e nortearam as características de apropriação de seu espaço. O Programa se insere na linha de pesquisa intitulada Arqueologia Portuária, criada como resultado dos debates científicos promovidos no “Seminário Internacional de Arqueologia Portuária” realizado na Oficina del Historiador, Havana/Cuba, em junho/2009. Este Seminário contou com a participação de 8 especialistas em pesquisas arqueológicas de regiões portuárias, incluindo a Dra. Erika M. Robrahn-González, que apresentou trabalhos realizados no Porto de Santos/SP. A Arqueologia Portuária traz, dentre suas especificidades: 6
NAJJAR, Rosana (Org.) – Arqueologia no Pelourinho. Brasília, DF: IPHAN / Programa Monumenta, 2010. WORKING PAPER – Linha de Pesquisa: Arqueologia Portuária Aplicação: O Porto do Rio de Janeiro como Complexo Arqueológico Versão Julho/2012
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A configuração de uma paisagem cultural a partir de uma dupla perspectiva estratégica (a perspectiva marítima e a perspectiva terrestre); A necessidade de se lidar com uma contextualização científica que considere os parceiros marítimos de interação (locais, regionais, nacionais e internacionais); O pressuposto da formação de sociedades multiculturais e as implicações nas características e na dinâmica de seu patrimônio material e imaterial.
Desta maneira, o presente Programa considera a região portuária do Rio de Janeiro como um Complexo Cultural/Arqueológico, definindo estratégias específicas de pesquisa, conforme análise que segue.
ESTRATÉGIAS CIENTÍFICAS DE PESQUISA Certamente, todos os processos de ocupação histórica e pré-histórica na região portuária do Rio de Janeiro deixaram grande quantidade e diversidade de vestígios físicos (na forma de estruturas e vestígios arqueológicos e/ou históricos) e paisagísticos, resultando em um Complexo Cultural/Arqueológico unificado, onde o tempo e os espaços se misturam. Todos estes fatores, iniciados milênios antes da chegada do colonizador europeu através das ocupações de grupos indígenas, definem a região como um porto vivo onde vestígios materiais, paisagens, tradições e memórias compõem os marcos para a existência, produção e reprodução cultural de seus habitantes. No tratamento deste patrimônio delineiam-se estratégias científicas que visam contribuir com o conhecimento arqueológico regional definindo-se, como temas de pesquisa do presente Programa:
Abordar a própria construção/evolução das estruturas portuárias de uma perspectiva arqueológica de transformação da paisagem. Embora se trate de um fenômeno bem contextualizado historicamente, deverá ser arqueologicamente caracterizado, em termos de constituição material, estratigrafia e, nos aterros mais antigos principalmente, composição. Nestes, os sedimentos mobilizados na construção deverão trazer evidências arqueológicas da ocupação da zona portuária em momentos anteriores (louças, cerâmicas, entre outros), tornando-os sítios arqueológicos secundários (isto é, que contém evidências arqueológicas remobilizadas, removidas de seus contextos originais de deposição), portanto, passíveis de resgate. Em síntese, cabe tratar o porto como um todo na qualidade de um sítio arqueológico, caracterizando as diversas fases de sua construção e definindo diferentes graus de valoração (e intervenção) em função de seu conteúdo informativo em potencial.
Por outro lado, considerando a sobreposição entre terrenos da antiga linha da costa com presença de vestígios arqueológicos, é possível que se conte com contextos originais (sítios primários), mesmo que bastante alterados pela sequência de intervenções e dinâmica de ocupação da área. Portanto, a metodologia de pesquisa realizará procedimentos que permitam identificar também contextos desta natureza.
Em função disso, será definido (cartograficamente) o processo formativo do porto, sequenciando os episódios de construção. Isto abrange traçar a linha de contato entre solo antrópico (aterro portuário) e a antiga linha de costa através de dados de seu posicionamento in situ, conferidos através de escavações, de modo a referenciá-la com precisão.
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As pesquisas deverão ser especialmente detalhadas nos locais onde se tem informação da presença de edifícios históricos antigos, alguns deles construídos com materiais de menor resistência arqueológica (como os trapiches em madeira). Será utilizada aplicação de testes GPR (geofísica terrestre) nos locais de maior sensibilidade visando não apenas identificar estruturas enterradas, mas, também, direcionar as próprias escavações arqueológicas através da indicação de locais mais preservados e que necessitarão de maior acuracidade.
Finalmente, tem-se a perspectiva de que o subsolo da região portuária do Rio de Janeiro apresente estruturas arqueológicas bem preservadas. Assim, as estratégias de pesquisa deverão privilegiar medidas de preservação, sempre que possível e analisadas conjuntamente com os órgãos de proteção ao patrimônio cultural federal, estadual e municipal. Por outro lado, a documentação da pesquisa e a coleta de acervos considerará a possibilidade de reconstrução de cenários museológicos de forma a ampliar as possibilidades e ferramentas de fruição dos resultados da pesquisa pela comunidade.
ARQUEOLOGIA COLABORATIVA Na compreensão e estudo do patrimônio arqueológico da região portuária do Rio de Janeiro e de suas especificidades, a comunidade portuária deve ser vista como agente histórico fundamental na construção da Paisagem Cultural desta região. Para tanto, a conceituação do Programa se baseia nos pressupostos da Arqueologia Colaborativa, que parte de alguns princípios basilares no pensamento contemporâneo do tratamento das questões patrimoniais culturais: Democratizar as práticas para o reconhecimento e identificação do patrimônio cultural, observando as diversas possibilidades de visão e interpretação a respeito deste. Ampliar as possibilidades morfológicas que norteiam o reconhecimento do patrimônio, respeitando as singularidades das experiências históricas de cada cultura e de cada grupo social. Desenvolver práticas de identificação, proteção, recuperação e fomento dos patrimônios que sejam compartilhadas entre os grupos científicos e as comunidades, atuando de modo coordenado e solidário. Compreender o patrimônio cultural como algo vivo e integrado às sociedades, como elementos fundamentais na manutenção da coesão social e da preservação das culturas. Adotar o princípio de que somente com o envolvimento da sociedade, sobretudo das comunidades locais (inclusive atuando como parceiros e observadores dos demais atores sociais), é possível uma política patrimonial que seja durável e sustentável. Para que isso seja real e eficaz, o patrimônio deve ser visto e incorporado como elemento componente das sociedades e não para além delas, com funções reconhecidas, como vetor de seu desenvolvimento e do bem estar coletivo (HAMAN, 2008: 42-48, CONVENÇÃO UNESCO, 1972, 2003). Para tanto, o Programa compreende a realização de diversas atividades presenciais com as comunidades locais, incluindo Oficinas Culturais, Oficinas de Território e a implantação de um Centro de Inclusão Arqueológica para atendimento permanente dos interessados.
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Adicionalmente são empregados canais de comunicação direta com todos os envolvidos, as chamadas “mídias sociais” as quais promovem, além da interação com o projeto, a democratização da informação e a criação de redes colaborativas que envolvem cientistas, a comunidade local e interessados em geral. Para o presente Programa estão sendo consolidadas as seguintes ferramentas: Arqueo Parque Museu Virtual Ensino à Distância Blog da Comunidade Fale Conosco Cartilha Patrimonial Divulgação Científica, incluindo ferramenta de E-Science Estas ferramentas vêm sendo adotadas com sucesso pela DOCUMENTO em seus mais variados projetos de pesquisa ao longo dos anos. Para consulta em contexto similar (Porto de Santos/SP) sugerimos navegar pelo endereço eletrônico http://documentoculturalsantos.ning.com, a partir do qual se tem acesso também às plataformas de Museu Virtual, cartilha patrimonial eletrônica, publicação científica em formato E-Book e outros. A divulgação institucional do Programa pode também ser acessada através do site da CODESP (www.portodesantos.com.br) e do IBAMA (http://siscon.ibama.gov.br). Por estes canais é mantido o diálogo contínuo com todos os parceiros, de um modo transparente e democrático. Para consolidar essa rede de trabalho (consulta, comunicação, cooperação) criou-se um conjunto de ferramentas para internet – blog, site, twitter – que visa dialogar nas mais diversas formas de linguagem, com os mais diversos públicos e responder aos mais diversos anseios e expectativas. Com isso, o tratamento proposto para o relacionamento entre os parceiros busca continuamente se manter alinhado com as tendências globais no que tange à comunicação, à participação da comunidade, à proteção e gestão do patrimônio, à sustentabilidade e ao desenvolvimento humano como meta final dos esforços.
OS CENÁRIOS E OCUPAÇÃO HUMANA NA REGIÃO PORTUÁRIA DO RIO DE JANEIRO O Rio de Janeiro reúne a experiência das diferentes comunidades que, ao longo de milênios, ocuparam e transformaram sua paisagem, nela deixando as mais variadas marcas: sítios arqueológicos, ruínas históricas, edifícios atuais, paisagens urbanas, memórias e tradições. Em sua trajetória de expansão econômica o município presencia o desaparecimento e/ou descaracterização gradativa de seu patrimônio cultural, dentre os quais se inserem vários exemplares do patrimônio edificado que testemunhavam as formas de uso e ocupação do espaço ocorridas na região. Em meio a este intenso processo de transformação do espaço destaca-se a área onde estão implantadas as várias instalações do porto, palco de uma intensa transformação diretamente associada aos processos de “modernização” da urbis e avanços tecnológicos, constituindo um dos principais agentes nas dinâmicas de transformação da paisagem.
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No desenvolvimento das pesquisas previstas pelo Programa, as páginas que seguem trazem quatro exemplares de estruturas que vêm sendo estudadas. Vale salientar que, em todos os casos, as pesquisas se encontram em andamento, portanto as informações apresentadas representam o estágio atual do conhecimento, devendo evoluir com a própria continuidade das investigações. Estes quatro exemplares são:
Praça Mauá Rua Primeiro de Março Via A1 (Morro da Saúde) Rua Venezuela
A Figura 1 traz sua localização dentro da área geral de desenvolvimento do Programa que, conforme indicado anteriormente, abrange 5 milhões de m2. Esta Figura traz, ainda, o Zoneamento Arqueológico Preditivo realizado como uma das atividades iniciais do Programa, quando foram entrecruzadas variáveis ambientais e variáveis de patrimônio cultural conhecidos para a região, indicando a potencialidade preliminar que a área possui. No caso da Praça Mauá e da Rua Primeiro de Março os trabalhos de campo já foram encerrados. Já nos demais dois casos (Via A1 – Morro da Saúde e Rua Venezuela) encontramse em pleno andamento, mas já trazem elementos de destaque que contribuem no maior entendimento da história local e regional. Já os trabalhos em laboratório, para todos os casos, se encontram em andamento, e seus resultados certamente ampliarão as análises científicas. Estes quatro exemplares são apresentados dentro da seguinte estrutura: Apresentação de Ficha Técnica sumária; Figura com localização do exemplar sobre imagem Google, sobreposta a cartas históricas; Prancha com registros visuais dos trabalhos e resultados atuais. No caso das figuras que trazem sobreposição de imagem Google a cartas históricas, os ajustes nem sempre são perfeitos, considerando a falta de georreferenciamento destas últimas. Todavia, fornecem dados preciosos para evolução de hipóteses de pesquisa. A figura aqui apresentada traz a sobreposição com apenas uma figura histórica, como modelo de apresentação, embora as pesquisas lidem com sobreposições múltiplas com diversas cartografias históricas, gerenciadas através de layers em programa GIS. Finalmente, todas as estruturas e vestígios identificados pelo Programa estão sendo incorporados na plataforma Arqueo Parque, que estará sendo disponibilizada nos próximos meses em ambiente internet e onde os interessados poderão navegar por cenários elaborados a partir de cartografias históricas da região portuária do Rio de Janeiro, sobre as quais são inseridas as estruturas arqueológicas trabalhadas, incluindo fichas de pesquisa, fotos dos trabalhos e do acervo gerado, vídeos com aulas explicativas, entre outros. Assim, o conhecimento gerado pelas pesquisas pode ser acompanhado através de diferentes produtos, alcançando os diferentes públicos envolvidos no Programa, onde inclusive se insere o presente Working Paper.
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Figura 1 – Área de pesquisa com Zoneamento Arqueológico Preditivo e localização das estruturas arqueológicas pesquisadas
Via A1 Morro da Saúde
Praça Mauá Rua Venezuela
Primeiro de Março
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Escavações arqueológicas na Praça Mauá Dados Gerais Tipo de macro-vestígios identificados: Pavimentos recentes da Praça Trecho da linha do bonde Parte de arruamento em “pé-de-moleque” e respectivo passeio público Remanescente de paredes e alicerces de um grande armazém Depósitos tecnogênicos diversos Remanescentes de duas embarcações soçobradas Fundo marinho Cronologia: século XVIII ao século XXI Estratigrafia e vestígios arqueológicos identificados Estratigrafia: 0 a 1 m : ocupações recentes da Praça Mauá (século XX); 1,50 a 1,80 m: estrada do período de Pereira Passos (1903 a 1906); 1,20 a 3,50 m: estruturas relacionadas com um Armazém da 1ª metade do século XIX; 1,60 a 3,50 m: aterro da 2ª metade do século XIX, com abundantes fragmentos de faiança inglesa, grés, vidro, pederneiras, cordas, piaçaba, 2 âncoras, 3 canhões do século XVIII (descarte), etc. Peças em geral muito fragmentadas; 3,50 a 4 m: camada de seixos rolados; 4 a 6 m e 5 a 9 m: localizado nas metades Sul e Norte respectivamente. Materiais da 1ª metade do século XIX, alguns possivelmente anteriores. Quase não surgem materiais, para além de abundantes solas de couro e escassas cerâmicas. Vestígios de duas embarcações soçobradas – fundo marinho; 6 a 7 m : metade Sul, baixando de cota em direção a Norte. Sedimento de matriz arenosa e grosseira, com abundantes fragmentos malacológicos – origem natural; Após 7 m: metade Sul, baixando de cota em direção a Norte. Surge a rocha em desagregação estéril do ponto de vista da cultura material. Materiais a destacar: 2 âncoras do tipo Almirantado (4,30 m e outra com 3,40 m de comprimento), localizada dentro do aterro da 2ª metade do século XIX; 3 canhões, em bom estado de conservação, dentro do aterro da 2ª metade do século XIX, mas tendo possível cronologia do século XVIII; Abundantes fragmentos de faiança inglesa e vidro do século XIX, localizados dentro do aterro da 2ª metade do século XIX; Elementos de construção naval, pertencentes a duas pequenas embarcações soçobradas, possivelmente da 1º metade do século XIX. Contribuições para a história do Porto do Rio de Janeiro Documentação dos vários momentos de ocupação humana do espaço, incluindo a confirmação de que a linha de costa se encontrava mais recuada (a Sul), da área intervencionada, até à 1ª metade do século XIX. Ficou também confirmado que o avanço da linha de costa sobre a Baía de Guanabara resultou de um processo antrópico planejado e de grande esforço, datável de meados do século XIX. O espesso e extenso depósito tecnogênico resultou da deposição intencional de um grande volume de sedimentos repletos de materiais arqueológicos muito fragmentados (devolutos), tanto inorgânicos (cerâmicas, vidros etc.) como orgânicos (osteológicos, sobretudo).
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Figura 2 – Praça Mauá: Mapa da Evolução da Linha de Costa e Sobreposição da Planta Régia da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, datada de 1812 à imagem de satélite de 2009.
Vista geral do trecho de rua em “pé-de-moleque” e respectivo passeio público
PROGRAMA DE GESTÃO DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO DAS OBRAS DE REVITALIZAÇÃO DA AEIU PORTUÁRIA/RJ. MAPA DE EVOLUÇÃO DE LINHA DE COSTA, PRAÇA MAUÁ Linha de Costa 1758 Linha de Costa 1803 Linha de Costa 1886 Linha de Costa 1913 Bens Tombados Bens Não Tombados ou Desaparecidos
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Prancha 1 – Aspectos diversos da intervenção arqueológica na área do poço de obra da Praça Mauá
Vista do cais da Prainha e possível armazém de café, à direita na foto do início do século XX, com fachada orientada para o cais. A linha de cais era recuada e ao fundo se observa o antigo Liceu Literário Português datado de 1868, onde em 1930 surgiu o edifício “A Noite”.
Cavernas de embarcação exposta a cerca de 5 m de profundidade, sobre a camada natural conchífera. A mesma foi desenhada e foi feito o seu levantamento topográfico.
(APERJ, Eavygdio Ribeiro, s/d, 1904-1910) Fotografia aérea durante a escavação, observando-se o trecho de rua em “pé-de-moleque”, o passeio público e trecho de parede de um armazém.
Acima: Remoção de canhão. Abaixo: exemplares de cultura material, século XIX (moeda imperial, faiança inglesa, tinteiro em grés e pederneira).
Desenho georreferenciado do arruamento construído em técnica de “pé-de-moleque”, com passeio público adjacente e arranque de parede de armazém. Entre [ ] encontram-se os códigos de cada unidade estratigráfica.
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Perfil SE da trincheira, observando-se a grande estrutura central do armazém [64], sobre o respectivo alicerce [66] e o entroncamento do mesmo [86] o qual surgiu sob o lençol freático. Observa-se ainda uma grande tora de madeira, possivelmente um andaime para a construção de [64] e [69] ao lado da mesma e encostado a [69] surgiu um dos canhões coletados.
Perfil SE da quadrícula C16, aberta na área do calçamento [11], observando-se a cerca de 40 cm abaixo do topo do calçamento (cerca de 2 m abaixo da superfície), um pavimento em terra batida e após esse, logo abaixo, o aterro correspondente à 2ª metade do século XIX.
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Escavações arqueológicas na Rua Primeiro de Março
Dados Gerais Tipo de macro-vestígios identificados: Pavimentos recentes da Rua 1º de Março e estacionamento da Marinha Trecho da linha “do Arsenal” (Bonde) Remanescente de paredes e alicerces de diversos edifícios do Arsenal da Marinha Depósitos tecnogênicos diversos Pavimento original da Rua Direita, em terra batida Areia de praia natural Cronologia: século XVIII ao século XXI
Estratigrafia e vestígios arqueológicos identificados Estratigrafia: 0 a 0,20 m: ocupações recentes (século XX e XXI); 0,20 a 2,00 m: estruturas diversas relacionadas ao Arsenal da Marinha e datadas do século XVIII a XIX (ex.: poço, oficinas, edifícios da Superintendência, Pagadoria, Ministério da Marinha, muro de perímetro). Surgem camadas de aterro e níveis de ocupação, muitas vezes revolvidos por interferências posteriores; Cerca de 1,20 a 2,50 m : camada arenosa de praia, eolizada, com origem natural, surgindo a sua superfície a cerca de 1,20 m da superfície do terreno. Apresenta nos primeiros níveis materiais arqueológicos de origem colonial, muito rolados, documentando a influência da maré até esse ponto. Acerca de 2,20 m, já sob o lençol freático, os materiais arqueológicos desaparecem. Materiais a destacar: 1 canhão, em razoável estado de conservação, identificado durante a monitoria, sendo datável do século XVIII; Faiança portuguesa e porcelana chinesa do século XVIII, localizados ao longo das camadas de ocupação mais antigas; Fragmentos de cerâmica comum e vidrada do século XVIII.
Contribuições para a história do Porto do Rio de Janeiro A intervenção arqueológica na área da Rua 1º de Março permitiu documentar com exatidão os macros momentos de ocupação humana do espaço alocado pela obra citada, bem como, compreender os processos de transformação que deram origem às ocupações distintas do local. Foi possível confirmar que a linha de costa se encontrava mais avançada (a Oeste), indicando que o movimento da maré se fazia sentir até as proximidades da estrutura de perímetro do Arsenal da Marinha, fundado em 1763, pelo menos sazonalmente e durante as fases de lua cheia, quando a maré se encontra mais elevada. Essa constatação foi possível através da análise dos materiais arqueológicos que surgiam na camada de areia natural de praia, metade Leste da escavação, sempre muito rolados, o que se deve à sua eolização e boleamento pelo contato direto com o vento e água da maré. O número considerável de materiais arqueológicos, bastante fragmentados, tanto inorgânicos (cerâmicas, vidros, etc.) como orgânicos (osteológicos, sobretudo), permitirá restaurar a memória do quotidiano e a dieta alimentar da população que trabalhava no Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro. Por fim, as estruturas encontradas documentam a evolução de uma ocupação humana complexa numa área portuária do Rio de Janeiro.
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Figura 3 – Rua Primeiro de Março: Mapa da Evolução da Linha de Costa e Sobreposição da Planta Régia da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, datada de 1812 à imagem de satélite de 2009.
Limpeza da estrutura e varrimento fotográfico da mesma, para posterior desenho arqueológico em CAD sobre fotografias obtidas à escala 1:1.
PROGRAMA DE GESTÃO DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO DAS OBRAS DE REVITALIZAÇÃO DA AEIU PORTUÁRIA/RJ. MAPA DE EVOLUÇÃO DE LINHA DE COSTA, RUA 1º. DE MARÇO Linha de Costa 1758 Linha de Costa 1803 Linha de Costa 1886 Linha de Costa 1913 Bens Tombados Bens Não Tombados ou Desaparecidos
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Prancha 2 – Aspectos diversos da intervenção arqueológica na área do mergulhão da Rua Primeiro de Março
Estrutura de perímetro Oeste do Arsenal da Marinha ([76]), observando-se parte da mesma de Norte para Sul. Esta estrutura é datada de meados do século XIX, tendo substituído a original de 1763, da origem do Arsenal.
Estruturas identificadas na escavação arqueológica Superintendência: Vermelho (Estrutura [21]) Azul (Estrutura [88]) Verde (Estrutura [29]) Pagadoria: Laranja (Estrutura [23]) Amarelo (Estrutura de S.7) Ministério e Secretaria: Roxo (Estrutura do poço do lava-rodas) Muro: Azul marinho (Estrutura [76]) (Autor desconhecido, cerca de 1920)
Pesquisa de fontes manuscritas, impressas, cartográficas e iconográficas no arquivo documental do Mosteiro de São Bento.
Acima: Remoção de canhão encontrado durante monitoramento. Abaixo: exemplares de cultura material, século XVIII (porcelana chinesa dinastia Quing, faiança portuguesa, cachimbo decorado com sigla e roldana em ferro).
Levantamento topográfico da estrutura de perímetro do Arsenal da Marinha e da escavação arqueológica realizada.
Estrutura circular relativa a um poço artesiano localizado na área interna do Arsenal da Marinha e datado, pelo menos, do início do século XIX.
Possível pavimento em terra batida, que poderá corresponder à antiga Rua Direita, identificado acerca de 1 m abaixo do pavimento atual da Rua 1º de Março.
(Escala 1:400)
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Escavações arqueológicas na Via A1 - Morro da Saúde (em andamento) Dados Gerais Tipo de macro-vestígios identificados: Pavimento recente do terreno relacionado com a Polinter e a estrutura de incineração do Banco Central Ramais ferroviários do Moinho Fluminense do século XX Remanescente de paredes ou pilastras relacionadas ao Armazém e Trapiche de Antônio Leite do século XVIII Depósitos tecnogênicos diversos Substrato rochoso de base do Morro da Saúde Cronologia: século XVIII ao século XXI
Estratigrafia e vestígios arqueológicos identificados Estratigrafia: 0 a 0,10 m: camada asfáltica de superfície relacionada com a ocupação da Polinter e Banco Central; 0,10 a 0,30 m: aterro recente para subida de cota acima da ferrovia e nivelamento do terreno; 0,30 a 0,80 m: ramais ferroviários do Moinho Fluminense; 0,80 a 1,70 m: estruturas diversas relacionadas ao trapiche e armazéns de Antônio Leite e camadas de origem natural do terreno com descarte de materiais arqueológicos nos níveis mais elevados das mesmas; Abaixo de 0,70 m: substrato rochoso do Morro da Saúde que surge somente na área mais próxima ao mesmo, diminuindo de cota de Oeste para Leste. Materiais a destacar: Fragmentos de materiais culturais recentes na primeira camada de aterro; Fragmentos de materiais culturais recentes até meados do século XX, na camada de brita grossa que suporta e envolve a ferrovia; Abundantes fragmentos de telha capa e canal, a partir dos níveis em que surgem as estruturas; Diversas balas de canhão em ferro, do século XVIII; Alguns fragmentos de faiança portuguesa do século XVIII, localizados a partir das camadas mais antigas, que surgem ao nível das estruturas; Alguns fragmentos de cerâmica comum e vidrada do século XVIII.
Contribuições para a história do Porto do Rio de Janeiro A intervenção arqueológica na área da futura via B1 (Polinter), permitiu documentar com exatidão os macro momentos de ocupação humana do espaço, bem como, compreender os processos de transformação que deram origem às ocupações distintas do local. No final da escavação (que se encontra em andamento) será possível traçar com exatidão qual era a antiga linha de costa no local, dadas as estruturas estarem edificadas no limite dessa área. Por se tratar de um sítio aparentemente bem preservado e com contextos in situ, esta área arqueológica poderá dar subsídios sobre o passado pouco conhecido daquela micro-região, a qual se localizava nos arrabaldes da cidade no período colonial.
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Figura 4– Via A1 (Morro da Saúde) - Mapa da Evolução da Linha de Costa e Sobreposição da Planta Régia da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, datada de 1812 à imagem de satélite de 2009.
Trabalhos de escavação arqueológica atualmente em andamento.
PROGRAMA DE GESTÃO DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO DAS OBRAS DE REVITALIZAÇÃO DA AEIU PORTUÁRIA/RJ. MAPA DE EVOLUÇÃO DE LINHA DE COSTA, VIA A1 Linha de Costa 1758 Linha de Costa 1803 Linha de Costa 1886 Linha de Costa 1913 Bens Tombados Bens Não Tombados ou Desaparecidos
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Prancha 3 – Aspectos diversos da intervenção arqueológica na área da Polinter – Morro da Saúde (via B1)
Morro da Saúde e seus inúmeros trapiches no início do século XX. (APERJ, Emygdio Ribeiro, s/d, 1904-1910)
Topo do calçamento de paralelepípedo do século XX que se localizava na envolvente a cada linha ferroviária. No local passavam 4 trilhas distintas pertencentes ao Moinho Fluminense, as quais faziam o transporte de granel entre os silos e o cais do porto (J-2 / N2).
Trincheira mecânica realizada após finalização e controle estratigráfico fornecido por sondagens manuais contíguas. A ação foi devidamente acompanhada por arqueólogo e documentada através de registro fotográfico e vídeo.
Vista geral da área a partir da Igreja de Nossa Senhora da Saúde, no início dos trabalhos de campo.
Topo de uma das estruturas do século XVIII possivelmente, identificada abaixo da ocupação ferroviária do local, datada do século XX. Observa-se uma madeira associada ao topo da estrutura, a qual pode ser um remanescente da estrutura perecível que encimava as estruturas de alvenaria de pedra (I15 / N10).
Topo de uma das estruturas do século XVIII possivelmente, identificada abaixo da ocupação ferroviária do local, datada do século XX. As estruturas encontram-se preservadas sob a ferrovia existente (J20 / N11).
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Decapagem manual da trincheira mecânica da linha D, a partir do nível 9 (topo aos 80 cm) até ao nível 12, de forma a interceptar o topo das estruturas que pudessem cruzar a trincheira.
Exemplares de cultura matéria dos séculos XVIII e XIX (faiança inglesa, telha capa e canal, faiança portuguesa e balas de canhão em ferro de dois calibres distintos).
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Escavações arqueológicas na Rua da Venezuela (em andamento)
Dados Gerais Foram abertas 8 sondagens de 1X3 m e manteve-se média em de 2,00 m (trabalhos em andamento). Este perímetro tem como limites as Ruas Venezuela ao Norte e Rua Edgard Gordilho ao Oeste; Rua Sacadura Cabral ao Sul e “prédios” a Leste. Coordenadas da sondagem 08 onde apareceram vestígios mais relevantes direcionando a prospecção à etapa de escavação, 23K E 686.384.991/E 7.466.736.168.
Estratigrafia e vestígios arqueológicos identificados As sondagens 06, 07 e 08 mostram em suas camadas sucessivas de aterro, evidenciam a cultura material remanescente dos séculos XIX e XVIII, também estruturas alicerçadas e calçamentos. Sond. 06 - Estruturas encontradas compondo um amontoado de seixos rolados de vários tamanhos dando a ideia de material para consolidação de aterros ou retentor artificial de área alagadiça. Sond. 07 - A equipe encontrou alicerces em pedra (alinhamento) com vestígios de argamassa alaranjada usado nos séculos XIX e XVIII. Sond. 08 - Nesta sondagem encontraram primeiramente vestígios de muro ou parede com reboco característico de construções do século XVIII e ou XIX, mais abaixo encontramos um calçamento (capistrana) aparentemente do século XVIII. Entre a diversidade de material arqueológico encontrado em prospecção, destaque para faiança inglesa e portuguesa, bem como estruturas em pedras alinhadas, neste caso alicerces, calçamentos e ou muros.
Contribuições para a história do Porto do Rio de Janeiro
Cadastro da antiga linha da costa;
Avaliação de estruturas e alicerces relacionados a edifício representado na cartografia histórica de 1812; Análise da formação do aterro local, tanto através da análise do perfil estratigráfico como dos materiais presentes.
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Figura 5 – Rua Venezuela - Evolução da Linha de Costa e Sobreposição da Planta Régia da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, datada de 1752 à imagem de satélite de 2009.
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Prancha 4 – Aspectos diversos da intervenção arqueológica na área da Rua Venezuela
Acima: Área da pesquisa, estacionamento localizado na Rua Venezuela nº 31. Abaixo: Vestígios estruturais encontrados na sondagem 08, parede ou muro com evidência de reboco nas camadas mais profundas. Calçamento em pedras (capistrana), junto à estrutura na base.
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Acima: Área da pesquisa, ao fundo Igreja de São Francisco da Prainha, construída em 1704, bem tombado pelo S.P.H.A.N. Abaixo: Edificação formada por pequenas, médias e grandes pedras sobrepostas rejuntados com argamassa alaranjada, também encontrada em subsolo, como parte de construções e alicerces.
Acima: Estruturas encontradas em prospecção arqueológica, A- Parede ou muro com evidência de reboco a 1,40 m. B- Calçamento em pedras (capistrana), junto à base, 1,80 m. Abaixo: Pequena base de utensílio cerâmico
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SUSTENTABILIDADE E CONSILIÊNCIA Desde a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento ocorrido no Rio de Janeiro, em 1992, “desenvolvimento sustentável” se tornou palavra-chave de um discurso político internacional voltado à qualidade de vida, conservação dos recursos naturais e responsabilidade para gerações futuras. Apesar das discussões terem sido inicialmente voltadas às ciências naturais e análises de crescimento populacional, relaciona-se a uma discussão baseada na definição social, histórica e cultural do problema: a viabilidade de serem mantidas relações socialmente definidas entre a natureza e a comunidade durante longos períodos de tempo. Desta forma, o discurso sobre sustentabilidade é basicamente público e estreitamente vinculado a problemas como justiça social e regulamentação política. Sustentabilidade ou não sustentabilidade corresponde a uma qualidade de condições e processos dentro de um continuum de condições e processos possíveis. Neste sentido, não se pode considerar a sustentabilidade ambiental e a sustentabilidade social de forma isolada. Ao contrário, o foco deve recair na interação entre elas, buscando a viabilidade de suas relações durante longos períodos de tempo. Por outro lado, considerando a rápida transformação por que as sociedades passam atualmente, a sustentabilidade necessita ser concebida dentro de uma perspectiva dinâmica. Dentro desta perspectiva a cidade do Rio de Janeiro teve, a partir de iniciativa do IPHAN e neste mês de Julho/2012, o merecido reconhecimento enquanto Paisagem Cultural, constando agora na lista de Patrimônio Mundial. Os critérios adotados na proposição deste bem incluem o reconhecimento da cidade como criação humana em suas edificações e paisagens dentro de um contexto universal. A perspectiva do presente Programa, sintetizada ao longo deste texto, é aderente ao conceito e visa contribuir e ampliar seus resultados. Para o alcance de nossos objetivos é também amplamente empregada a perspectiva fornecida pelos estudos de resiliência, que representa capacidade de grupos sociais ou indivíduos em superarem situações críticas e utilizá-las em seus processos de desenvolvimento. Tem como perspectiva final obter uma evolução socioecológica sustentável de longa duração. O tema da resiliência já está sendo aplicado e desenvolvido em projetos da DOCUMENTO Ecologia e Cultura de forma global, aderente à perspectiva da Ciência Aplicada e integrando as práticas tradicionais das comunidades brasileiras na gestão da paisagem cultural. A consolidação de seu estudo contou, no primeiro semestre de 2012, com visitas científicas feitas a dois institutos de referência nestes estudos, a saber, o Stockholm Resilience Centre, sediado na Stockholm University, na Suécia, e a Universidade de Santa Fe/EUA. Todas estas iniciativas são, finalmente, tratadas dentro de uma perspectiva holística e transdisciplinar (Consiliência), de forma a integrar os conhecimentos a partir do conjunto de disciplinas envolvidas (arqueologia, arquitetura, história, ecologia, geografia, educação, marketing cultural, entre outras). O resultado final é a prática de uma Ciência Aplicada em constante evolução. Finalmente, as pesquisas buscam explorar, ao longo de todo o seu desenvolvimento, diferentes formas de musealização do conhecimento, tanto em circuitos internos como externos, a exemplo dos mais diversos Museus a Céu Aberto, Museus de Território e Museus de Vivência Histórica existentes em diversas partes do mundo, como apoio e continuidade natural da pesquisa arqueológica (vide exemplos tratados pela Expedição Excelência realizada pela DOCUMENTO, pelo endereço www.arqueologiapublica.com).
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