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Maffei, Lamberto Elogio da Rebeldia, Lisboa Edições 70, 2020

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Lamberto Maffei é um médico e cientista italiano que reflete desencantadamente sobre o atual estado do mundo marcado pela velocidade da comunicação que favorece o pensamento rápido em detrimento da reflexão, do pensamento lento. Um mundo caracterizado pelo ruído, pela tagarelice babélica das redes sociais, em que pulula uma multidão de imbecis incapazes de se projetarem para além do comprimento dos seus umbigos. Neste mundo o indivíduo que se julga livre está, no entanto, submetido a um fluxo contínuo de sugestões e ordens, particularmente dos gurus dos mercados soberanos e das grandes marcas, transformando-se em escravo de um consumismo que lhe dá a ilusão da livre escolha, mas que o exonera da capacidade de pensar, do juízo crítico e da capacidade de decisão. A cultura poderia contribuir para orientar e transferir os desejos do consumismo alienante para o pensamento e a reflexão crítica. No entanto, também ela foi capturada. Que dizer dos que Maffei designa por “servos cultos” (p. 124), que proliferam nos mass media e sobretudo nos ‘think tanks’ conservadores para se porem ao serviço dos poderosos que os pagam principescamente para defenderem os seus interesses e privilégios e, sobretudo, uma ideologia segundo a qual nada devem ao mundo e o mundo tudo lhes deve pelos seus elevados méritos? A liberal democracia também se torna cada vez mais refém de uma plutocracia que dispõe de enormes capitais para condicionar e influenciar as decisões políticas que afetam a vida de todos. Os que labutam duramente todos os dias para viverem cada vez pior estão cada vez mais afastadas do poder e influência políticos. Basta ter em conta que no país mais poderoso do mundo, os EUA, os 250 membros do Congresso são todos milionários e 57 pertencem ao 1% mais rico do mundo. E se analisarmos os membros do parlamento e dos executivos de outros países, chegar-se-á à conclusão que grande parte deles provém das profissões liberais e das classes média alta e alta. Segundo o sociólogo L. Galino, citado por Maffei, “hoje, as classes dominantes mobilizaram-se e encetaram uma luta de classes a partir do topo, de maneira a recuperarem o tempo perdido” (p. 141). O “sábio de Omaha”, o multimilionário Warren Buffet pensa basicamente o mesmo quando afirma: “Existe uma luta de classes, é verdade, mas é a minha classe, a classe abastada que está na ofensiva, e estamos a ganhá-la”. Em suma, a luta de classes já não é o que era, pois quem está na defensiva são as classes trabalhadoras e não os grandes proprietários e gestores de topo que os representam nas empresas. Pelo menos por enquanto. Que rebeldia resta então nesta paisagem desoladora? Maffei defende o que designa por “rebelião da razão” que não usa armas nem palavras ofensivas ou ameaças, mas consiste “na marcha das pessoas que se dão as mãos, que dialogam, que formam um grande cérebro coletivo que pregam que tu és igual a mim em direitos e deveres; a marcha de homens que querem partilhar e que desejam coisas e bens desde que os outros também os tenham” (p. 141). Mas o que é que reivindica a rebeldia da razão? Não utopias revolucionárias que prometiam o paraíso na terra, mas degeneraram em ditaduras, mas apenas mais direitos contra os privilégios da riqueza e da opulência: “educação igual para todos, saúde e justiça iguais para todos.” Talvez esta seja a grande ‘revolução’ que ainda falta fazer.

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