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Onipotência e descoberta do espaço

“Através da magia do desejo, podemos dizer que o bebê tem a ilusão de possuir uma força criativa mágica, e a onipotência existe como um fato, através da sensível adaptação da mãe 13 ”.

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Ao levantar muros, criar e enrijecer os limites que nos separam dos outros e das intrusões do mundo podemos negar todas essa intromissões e filtrar apenas aquilo que nos interessa, reestabelecendo essa ilusão de independência e poder. Porém, esse espaço fechado só se tornará um espaço de potência se responder prontamente às vontades de seu dominador. Além de limitar a possibilidade de contingências, também é preciso reinstaurar esse cuidado mágico que dá a ilusão de onipotência. É preciso que haja nutrição e cuidado com mínimo esforço, realizados pela simples vontade que eles se realizem.

É interessante notar o quanto esse modelo topológico se assemelha com algumas configurações arquitetônicas e urbanísticas.

58Garantir essa ilusão de poder é uma das mais frutíferas e patéticas funções da sociedade e as formas como esse sentimento de poder podem se reafirmar percorrem todas as escalas. Como é impossível controlar imperiosamente a natureza o ser humano passou a criar espaços limitados e controlados onde seu poder é consequentemente maior. Na história das construções há diversos exemplos desses limites que abrigam e delimitam um poder superior. A muralha da cidade não serve apenas para proteção, ela limita também o espaço de potência do ser humano, fora da muralha há apenas a "lei da nautureza". Já dentro dos muros da cidade a vontade do rei é a lei. Na cidade onde quem governa é um rei, toda uma classe de subalternos: escravos e soldados são mantidos para garantir o sentimento de onipotência ao governante supremo. Na escala da cidade há sempre uma figura que impera, seja o rei, o monarca, o presidente, o prefeito, entre outros.

"A máquina brasileira de morar, ao tempo da colônia e do império, dependia dessa mistura de coisas, de bicho e de gente, que era o escravo. Se os casarões remanescentes do tempo antigo parecem inabitáveis devido ao desconforto, é porque o negro está ausente. Era ele que fazia a casa funcionar: havia negro para tudo – desde negrinhos sempre à mão para recados, até negra velha, babá. O negro era esgoto; era água corrente no quarto, quente e fria; era interruptor de luz e botão de campainha; o negro tapava goteira e subia vidraça pesada; era lavador automático, abanava que nem ventilador. Mesmo depois de abolida a escravidão, os vínculos de dependência e os hábitos cômodos da vida patriarcal de tão vil fundamento, perduraram, e, durante a primeira fase republicana, o custo baixo da mão de obra doméstica ainda permitiu à burguesia manter, mesmo sem escravos oficiais, o trem fácil da vida do período anterior 21 ".

Para muitas pessoas esse é o sentido primeiro da própria casa. O espaço fechado, desde um quarto até um país, existe como forma de estabelecer os limites dessa potência e garantir "um lugar no mundo". "Posso ser rei de um reino muito pequeno, mas ainda rei".

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