PALÁCIO dos AZULEJOS Cenas de ressignificação e ocupação popular de um prédio histórico em Campinas
Martinho Caires | José Pedro Soares Martins C A M P I N A S | 2021
Palácio dos Azulejos: Cenas de ressignificação e ocupação popular de um prédio histórico em Campinas" Um ícone arquitetônico no centro da cidade, um emblema do poder polí co e econômico local e um espaço com enorme capacidade de reinvenção, de ressignificação, agora aberto às múl plas linguagens ar s cas. O Palácio dos Azulejos, plantado no coração de Campinas, tem uma trajetória marcada pela resistência. Poucos conhecem a sua verdadeira saga, muitos não sabem que ele apenas está de pé em função de um grande movimento da sociedade civil. Este livro é um tributo à inteligência, à urgência da preservação da memória, mais um grito pela proteção do patrimônio cultural material e imaterial que é a própria razão de ser de um povo, de uma comunidade. Deleite-se com as belas imagens e com a narra va de uma utopia.
PALÁCIO dos AZULEJOS Cenas de ressignificação e ocupação popular de um prédio histórico em Campinas
Martinho Caires | José Pedro Soares Martins
1ª EDIÇÃO
I N D I C E 6 CAPÍTULO I 8 C A P Í T U L O I I 26 C A P Í T U L O I I I 38 C A P Í T U L O I V 48 C A P Í T U L O V 66
INTRODUÇÃO
74 C O N C L U S Õ E S 82 CAPÍTULO VI
Introdução O poder do café no século 19 A construção do Palácio dos Azulejos O Palácio vira Paço Tombamentos do Palácio dos Azulejos Os planos de “Juscelininho” para o Palácio dos Azulejos O Museu da Imagem e do Som Projeções futuras de uso do Palácio dos Azulejos, no cenário de uma cidade sempre em transformação
86 BIBLIOGRAFIA
INTRODUÇÃO
A trajetória de um espaço de múltiplas identidades
ntre 1878 e 1908 o Palácio dos Azulejos foi residência da família de Joaquim Ferreira Penteado, o Barão de Ita ba. De 1908 a 1968 foi o Paço Municipal, a sede da Prefeitura de Campinas, abrigando também durante um bom período a Câmara Municipal e o Fórum. De 1968 a 1996 foi a sede da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento SA (Sanasa), que se tornou um dos principais serviços municipais do país em seu segmento. Desde 1996 é o endereço do Museu da Imagem e do Som (MIS-Campinas), espaço estratégico para a documentação, produção e disseminação de múl plas linguagens ar s cas, na terra que foi moradia dos “pais da fotografia e do rádio”, Hércules
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Florence e Padre Roberto Landell de Moura. Um edi cio, composto originalmente por duas residências geminadas, diferentes iden dades, uma vocação singular para a ressignificação, para a reconstrução de sen do, no decorrer dos tempos. De ícone majestoso da riqueza do café, construída à base da exploração da mãode-obra escrava ao longo de grande parte do século 19, a território privilegiado para a criação, para a ousadia. Uma viagem do privado para o público, em um país onde as tentações oligárquicas e cartoriais con nuam muito fortes em pleno século 21. Uma aventura cultural e um desafio permanente para a proteção do patrimônio histórico, em uma nação acostumada a banir com rapidez a
própria memória e em uma cidade trauma zada pela demolição de ícones arquitetônicos. A história do Palácio dos Azulejos é uma narra va com muitas camadas, todas repletas de simbolismo. Um prefeito apaixonado por sua cidade percebeu logo cedo essa riqueza polissêmica do edi cio mais do que centenário e queria transformá-lo em vér ce de um grande movimento de valorização do centro histórico de Campinas, pois entendia que a decadência da região estava ferindo de morte a própria alma do seu povo. O prefeito arquiteto deu passos decisivos para o resgate da importância esté ca e urbanís ca do casarão, mas acabou não vendo o seu sonho totalmente concre zado, por ter a vida ceifada em um crime absurdamente ainda não esclarecido. Permanece então como um grande desafio para as novas gerações olhar com mais atenção e gen leza para
esse belo patrimônio localizado no coração da cidade, felizmente tombado em três esferas de governo, cuidando para que ele tenha sempre a atenção que merece. Mas o primeiro passo é conhecer essa trajetória. Este livro é um convite para que todos leitores conheçam a biografia do Palácio dos Azulejos, o que ele representa para a memória e a iden dade de Campinas. É igualmente um brinde a todos os historiadores, sociólogos, antropólogos, cien stas polí cos, jornalistas e ar stas em geral que já lutaram de alguma forma pela valorização e preservação desse patrimônio, que ainda demanda um restauro completo e a atenção que merece. Bem-vindas e bem-vindos, pois, que essa leitura es mule novas pesquisas, com novas abordagens, novos olhares, sobre o Palácio dos Azulejos.
CAPÍTULO I O poder do café no século 19 Palácio dos Azulejos foi construído, como residência da família de Joaquim Ferreira Penteado, o Barão de Ita ba, no auge do poder polí co e econômico da elite cafeeira de Campinas e outras cidades do interior de São Paulo, como Itu e Piracicaba. Era a década de 1870, quando Campinas passou a ser sede de um dos principais polos ferroviários do país, com a inauguração da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em 1872, e da Companhia Mogiana, em 1875. Os dois empreendimentos foram fundamentais para alavancar a produção e exportação de café e, com isso, consolidar a força polí ca dos cafeicultores. A história do café em Campinas representa
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um capítulo especial para a vinculação entre a economia e a polí ca. A força do café, construída na base da exploração da mão-deobra escrava.
A introdução do café em Campinas Uma vertente da historiografia aponta que o primeiro pé de café teria sido plantado na região de Campinas no final do século 18, em Jundiaí, pelo sargento-mor Raimundo Alvares dos Santos Prado, que man nha vinculação com o governador da Província, capitãogeneral Antônio Manuel de Melo Castro e Mendonça. Os relatos de estudiosos como o botânico Joaquim Corrêa de Melo indicam que o empreendimento em Jundiaí não teve êxito. Contudo, um evento marcante para a história do Brasil teria sido a mola propulsora, ou uma delas, para a expansão do café, primeiro no Rio de Janeiro e, depois, em São Paulo, a par r do Vale do Paraíba e, a seguir, na região de Campinas. 9
Em 1808, a Corte Portuguesa foi transferida para o Rio de Janeiro, em função das guerras napoleônicas na Europa. Justamente em razão da invasão do território português pelas tropas de Napoleão Bonaparte, a corte de D.João VI passou a buscar novas alterna vas de renda e a exploração do café, que encontrava preços crescentes no mercado internacional, se mostrou muito promissora. Por sua localização estratégica, e por fatores como condições geológicas e abundância de água, as regiões do Vale do Paraíba e Campinas se tornaram especialmente interessantes para a produção de café, dando sequência ao Ciclo da Cana, que há havia sido vital para a economia da Corte. Em 1809 teriam sido plantados os primeiros cafezais na Vila de São Carlos, o segundo nome de Campinas, fundada em 1774 como Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas do Ma o Grosso. Esses cafezais pioneiros teriam sido plantados próximo a um dos três pousos de tropeiros que deram origem ao núcleo urbano, localizado nas vizinhanças do atual estádio Brinco de Ouro da Princesa, do Guarani Futebol Clube. Esse pouso de tropeiros estava situado no percurso do Caminho de Goiás, a estrada que ligava São
Paulo ao interior do Brasil e que foi aberta pelos bandeirantes em sua busca do ouro. O que prevaleceu na região de Campinas foi, entretanto, o ouro negro do café. Os cafezais pioneiros, já voltados de fato para uma grande produção, foram plantados em 1817, nas propriedades do capitão Francisco de Paula Camargo e do tenente-coronel Joaquim Aranha Barreto de Camargo. A informação é do mesmo botânico Joaquim Correa de Melo. Consta que Paula Camargo se encantou com o potencial econômico do café quando visitou o Rio de Janeiro, por ocasião do casamento do príncipe e depois imperador D.Pedro I. De volta a Campinas, o produtor rural, que antes se dedicava à cana-deaçúcar, começou um plan o do café em suas terras. O primo-irmão Barreto de Camargo seguiu o mesmo caminho. As terras que pertenciam a Barreto de Camargo são aquelas da Fazenda do Mato Dentro, onde depois seria montado o Parque Ecológico Monsenhor Emílio José Salim. Pelas condições favoráveis e em função da dinâmica do mercado nacional e internacional, o café encontrou rápida expansão na Vila de São Carlos. Em 1836, a produção local já chegava a 8.800 arrobas. O crescimento foi tão rápido que logo a Vila
de São Carlos virou a cidade de Campinas, a 5 de fevereiro de 1842. Foi consequência do crescimento urbano impulsionado pela economia cafeeira e, também, uma manobra do governador da Província, Barão de Monte Alegre, para tentar esvaziar os impactos da Revolução Liberal de 1841-42, que teve diversas lideranças de Campinas, como a do ex-regente padre Diogo Feijó. A produção de café em Campinas não parou mais de crescer. Foi de 335 mil arrobas em 1854 e na década de 1870, de 1,3 milhão de arrobas. Uma consequência natural foi a expansão demográfica. Em 1870 Campinas registrava 33 mil moradores população superior à da capital, que nha 26 mil habitantes. Como o Colégio Eleitoral de Campinas também era maior do que o da capital, e em razão do poder dos cafeicultores, a cidade aspirava a superar São Paulo em vários segmentos. E de fato Campinas recebeu obras notáveis no período, como o próprio Teatro São Carlos, que já nha sido inaugurado em 1850. Depois vieram outras realizações e, como símbolo da dinâmica urbana, surgiram os primeiros jornais. O pioneiro foi a "Aurora Campineira", que circulou de 1858 a 1860, seguindo-se "O Conservador" (1860), "Gazeta de Campinas" (1869 a 1889), "O
Cons tucional" (1874 a 1876), "A Mocidade" (1 874 a 1 875), "Atualidade" (1875), "Diário de Campinas" (1875 a 1 901), "Opinião Liberal" (1876 a 1883) e, também, "Correio de Campinas' (1885 a 1919). Outros melhoramentos urbanos foram a Companhia de Iluminação a Gás e Gasômetro (1875), a Companhia Campineira de Carrís de Ferro, com bondes de tração animal (setembro de 1879), Empresa Telefônica Campineira e as linhas inaugurais de telefone (1884) e a primeira rede elétrica (em 1886). As agências bancárias pioneiras foram as do Banco Colonial do Estado de São Paulo (1871), Banco Mercan l de Santos (1873), London Brazilian Bank Limited (1873), Banco do Comércio e Indústria, Banco União de São Paulo e Banco dos Lavradores (1883). Por outro lado, ao mesmo tempo que a aristocracia cafeeira comemorava esses empreendimentos, que para ela tornavam Campinas uma cidade quase europeia em solo tropical, a cidade não se preocupou com as suas condições sanitárias e ambientais. “Os esgotos ainda eram lançados sem tratamento e a céu aberto, nos riachos que cortavam o núcleo urbano, principalmente no caso do Córrego Tanquinho, que nasce na altura do atual Largo do Pará, segue pela rua Barão de Jaguara e desce até a avenida 11
Anchieta. Do mesmo modo, o lixo ainda era depositado igualmente sem maiores cuidados técnicos. O Largo Carlos Gomes era, originalmente, um grande depósito de lixo, que também era acumulado no Largo do Jurumbeval, atual praça do Mercado Municipal”, afirma José Pedro Mar ns, no livro “Vocação Solidária – Flashes da história da assistência social em Campinas” (Editora Fundação Educar DPaschoal, Campinas, 1998). De qualquer modo, o aparecimento dos jornais contribuiu para a formação de uma elite intelectual campineira. Com a inauguração da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em 1872, e da Companhia Mogiana, a elite cafeeira aumentou ainda mais o seu poder, ao mesmo tempo em que a chegada dos trilhos, junto com a ascenção da imprensa, favoreceu a circulação de ideias, algumas subversivas para a época, como as da Abolição e da República.
O Colégio Florence Uma realização emblemá ca nessa Campinas contraditória, que aspirava à modernidade mas ao mesmo tempo man da a exploração da mão-de-obra escrava, foi fundação, no dia 3 de novembro de 1863, do Colégio Florence, fruto da inicia va do casal Carolina Krug
Florence e Hércules Florence, que nutriam ideias liberais para a época. Carolina Krug nasceu a 21 de março de 1828, em Kassel, cidade no Sul da Alemanha que hoje é palco de uma das mais badaladas mostras de artes plás cas. Ela estudou na Suíça, no Ins tuto de Madame Niederer, em La Serve e, na região de Genebra, onde manteve contato com o método pedagógico de Pestalozzi, como conta Arilda Inês Miranda Ribeiro, em “A Educação Feminina Durante o Século XIX: O Colégio Florence de Campinas 18631889" (Centro de Memória da Unicamp, Coleção Campiniana, Campinas, 1996). A família Krug chegou ao Brasil em setembro de 1852, já com a intenção de moradia em Campinas, onde residida o irmão mais velho de Carolina, o farmacêu co Jorge Krug, um membro da maçonaria que par cipou da fundação em 1869 do Colégio Culto à Ciência, exemplo da vocação campineira para a ciência e tecnologia. Em 1854, quando nha 24 anos, Carolina se casou com o francês Hércules Florence. Cien sta que integrou a Expedição do Barão Langsdorf, de 1825 a 1829, Florence é para muitos autores o grande “pai” da fotografia, em razão de suas experiências pioneiras com câmara escura e fixação de imagens, antes até dos estudos de Daguerre, a quem se
TEATRO SÃO CARLOS
atribui a invenção. Hércules Florence era viúvo quando se casou com Carolina. Ele mesmo produtor de café, o casal viveu por muitos anos na zona rural, até que resolveu se instalar na área urbana, em 1863. Em pouco tempo evoluiu a ideia de criação de uma escola com novas ideias, em sintonia com o processo de rápida transformação que Campinas experimentava. O colégio foi implantado em um prédio de Jorge Krug, na rua das Flores atual José Paulino, na quadra onde funcionaram as instalações da Telesp. Foram sete alunas inicialmente, mas logo o Colégio se tornou referência, entre outros fatores pela excelência do corpo docente. Entre outros, foram professores o próprio Hércules Florence, o austríaco Emílio Henking, o jornalista Francisco Rangel Pestana (que se tornaria um dos grandes nomes do movimento republicano), o músico italiano Emílio Giorge , o educador Miguel Alves Feitosa (autor de "A Gramá ca das EscoIas", uma das mais respeitadas na época no Brasil) e o escritor e jornalista Júlio Ribeiro, autor de uma Gramá ca Portuguesa igualmente relevante e do romance "A Carne". O livro é um espelho do Brasil da época, com as injus ças derivadas da escravidão.
Imprensa em Campinas O inquieto Hércules Florence, criador com a segunda esposa Carolina do Colégio Florence, nasceu em Nice em 1804. Com apenas 20 anos embarca para o Brasil, a bordo de uma fragata francesa. Chegando ao Rio de Janeiro, logo está empregado com o livreiro-impressor Pierre Planchet, que seria o fundador do “Jornal do Commercio”. Estava selada a ligação de Florence com o ramo da impressão, que retomaria quando se estabeleceu em Campinas, logo após a aventura da Expedição Langsdorff. Inventor nato, e refinado observador da natureza, o que aprofundou durante os anos da Expedição, Florence desenvolveu por exemplo o método que denominou Zoofonia, de registro dos sons dos animais. Ação pioneira, do processo que levou ao desenvolvimento da moderna bioacús ca. Florence também concebeu uma sexta ordem arquitetônica que, inspirada na natureza brasileira, dos lugares onde passou durante a Expedição Langsdorff, ele ba zou de Ordem Palmiana. Uma referência à enorme diversidade de palmeiras que encontrou pelo caminho e registrou com esmero em seu caderno de desenhos, hoje uma das grandes peças históricas das viagens de cien stas estrangeiros pelo Brasil
sobretudo no século 19. O inventor franco-brasileiro, que faleceu em Campinas, em 27 de março de 1879, desenvolveu, igualmente, várias tecnologias de imprimir e uma delas foi a u lizada para a impressão do primeiro jornal lançado em Campinas, o "Aurora Campineira", que circulou de 1858 a 1860. O lançamento do jornal que abriu um dos importantes capítulos da história da imprensa no interior do Brasil coube aos irmãos João e Francisco Teodoro de Siqueira e Silva, que compraram uma pografia de Hércules Florence para viabilizar o empreendimento. O tabloide de quatro páginas teve sua primeira edição lançada a 4 de abril de 1858. O jornal chegou a ter 120 assinantes. João Teodoro de Siqueira e Silva foi o primeiro jornalista do “Aurora Campineira” e, portanto, o profissional pioneiro da trajetória da imprensa local. Em 10 de janeiro de 1860 o jornal passou a ter nova nomenclatura, “O Conservador”, que teve vida curta, sob a direção de Francisco Antônio de Araújo. Foi encerrado a 11 de novembro de 1860. A redação do “Aurora Campineira” ficava na rua do Pór co, depois rua Ferreira Penteado, a poucos metros de onde seria construído o Palácio dos Azulejos da família Penteado.
João Teodoro foi alvo de muitos processos na Jus ça em razão de seus ar gos. Além de escrever, dava aulas par culares de Gramá ca. Nessa fase pioneira da imprensa campineira, que coincidiu com o momento áureo do café e início do polo ferroviário, destacou-se a “Gazeta de Campinas”, publicada de 1869 a 1889 sob a direção de Francisco Quirino dos Santos, o redator do periódico, e José Maria Lisboa, gerente do empreendimento e responsável pelas correspondências. Nascido em Campinas, em 1841, filho do fazendeiro do açúcar e depois do café Joaquim Quirino dos Santos e de Manoela Joaquina, Francisco Quirino dos Santos era bacharel em Direito pela Faculdade do Largo de São Francisco e logo adotou o ideário abolicionista e republicano. Em 1869, ano de fundação da “Gazeta”, assinou vários ar gos em apoio ao Centro Liberal, de inspiração abolicionista. Também foi autor de livros de poemas (“Estrelas errantes”, com vários poemas an escravidão), peça de teatro (“A Judia”) e romance (“A nova louzã”). Com esse perfil, Quirino dos Santos foi um ícone daquele momento histórico em que parte da aristocracia cafeeira aspirava a um novo modelo polí co e social, com reflexos 15
TEATRO CARLOS GOMES
na própria concepção urbanís ca de Campinas. Um grupo social que sonhava com a modernidade, sim, mas que não deixava de exibir suas contradições e idiossincrasias, como é possível verificar nas próprias páginas da “Gazeta de Campinas”. No primeiro número do jornal, publicado a 31 de outubro de 1869, Quirino dos Santos assinala, no editorial indicando os propósitos da publicação, que a “Gazeta”, “no exercício deste importan ssimo direito da crí ca, a independência e a dignidade a um tempo serão os polos cardeais sobre os quais se moverão todos os nossos conceitos”. Mais à frente, afirma: “Desdobram-se as páginas da Gazeta de Campinas para todos os talentos e para todas as questões na variada arena da sciencia e da arte. Tragam simplesmente um cunho que é o da boa moeda autorizada pela competência do valor intrínseco: homenagem à verdade e fundo acatamento à jus ça”. “Acatamento à jus ça”, uma expressão que adquire maior significado vinda de um profissional do Direito, imbuído de ideais avançados para o seu tempo. Pois nessa primeira edição da “Gazeta de Campinas”, na página 3, a publicação de um edital assinado pelo presidente da Câmara Municipal e juiz de órfãos Antonio Egydio de Souza Aranha, que desmascara a realidade que ainda era
vivida pela cidade candidata à modernidade: “Faço saber, aos que o presente edital de praça virem e delle no cia verem, que na publicação do mesmo a tres dias, o por teiro deste juizo ou quem suas vezes fizer, hade trazer a pregão de venda e arrematação, por espaço de oito dias, a excepcão dos domingos e dias feriados, a escrava, crioula Josepha, de vinte e oito annos de idade, cosinheira, avaliada por um conto e duzen tos mil réis, a qual pertence aos orphãos Antonio, José e Umbelina, filhos dá finada d. Carolina Amélia dos Santos Cruz, como consta do bilhete de praça que com este se entregará ao porteiro, a quem darão seus lanços nos referidos dias, logar e hora para isso designados. E para que chegue ao conhecimento de todos, mandei passar três de um só theor, que serão fixados nos logares do costume e publicados pela imprensa, de que se lavrarão as necessarias cer dões onde convier. Dado e passado nesta cidade de Campinas, sob meu signal e sello, aos vinte e sete dias do mez de outubro de mil oito centos e sessenta o nove”. O anúncio do leilão de uma escrava, confirmando como Campinas, aspirante a novos tempos, ainda nha em suas entranhas e em suas raízes a marca de uma das maiores chagas da história da humanidade. Um edital ra ficando como 17
ainda seria longo o caminho para a superação desse crime estrutural que está na base da formação da sociedade brasileira.
Campinas como polo ferroviário Logo na segunda edição da “Gazeta de Campinas”, de 3 de novembro de 1869, o jornal publicava uma no cia sobre o grande projeto que defini vamente colocaria a cidade na rota da modernidade pretendida pela elite cafeeira, e claro da forma que ela entendia como modernidade. Era uma no cia sobre o projeto de construção de uma ferrovia entre Campinas e Jundiaí, o que viabilizaria o transporte do café produzido na região para o Porto de Santos, pela ligação com a The São Paulo Railway: Estrada de ferro - A Companhia Paulista que tenta levantar o seguimennto da via-ferrea de Jundiahy a esta cidade, anuuncía nas folhas de S. Paulo que a respec va directoria resolveu convocar uma assembléia geral extraordinárioa afim de discu r-se as bases que deviam regular os contractos de empreiteiros na construcção da estrada projectada, e resolver sobre os seguintes pontos: 1. Possibilidade de ser o accionista representado em assembléa geral por procurador que não seja accionista. 2.°
Possibilidade de reunir em si o procurador mais de quarenta votos com as procurações de que for portador. A reunião terá lugar no dia 28 do corrente às 10 horas da manhã, em a cidade de S. Paulo e no escriptorio da Companhia ã rua do Carmo n. 72. Primeira ferrovia em território paulista, entre Santos e Jundiaí, a The São Paulo Railway nha sido inaugurada a 16 de fevereiro de 1867, em um empreendimento liderado por Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, com jus ça considerado o “pai” do transporte ferroviário no Brasil. Na realidade, Mauá “herdou” o empreendimento, já que a primeira concessão para a construção de uma ligação ferroviária entre Santos e Jundiaí nha sido dada à empresa Aguiar, Viúva & Filhos, em 1838. Essa inicia va não foi materializada, em razão da falência de um dos sócios da empresa, Frederico Fomm, mas os estudos de viabilidade que já haviam sido iniciados, pelo engenheiro inglês Mornay, chegaram ao poder de Mauá, através do Marquês de Monte Alegre. Os dois, Mauá e Monte Alegre, associaram-se a José Pimenta Bueno, o Marquês de São Vicente. Finalmente, os sócios ob veram a 26 de abril de 1856 a concessão para a instalação da ferrovia Santos-Jundiaí.
Para viabilizar a instalação dos trilhos em plena Serra do Mar, Mauá convocou como parceiro o engenheiro britânico James Brunlees, que aceitou a proposta e viajou ao Brasil com Daniel Makinson Fox e outros especialistas com rica trajetória em ferrovias. Fox nha no seu currículo a construção de ferrovias nos Pirineus e nas montanhas do País de Gales e sua experiência foi determinante para a superação do desafio que era, naquela época, implantar uma estrada de ferro na grande barreira que era a Serra do Mar. O empreendimento de Mauá e parceiros britânicos chamou a atenção de cafeicultores de São Paulo e região de Campinas, que se uniram para criar a Companhia Paulista, visando instalar a ferrovia inicialmente entre Jundiaí e Campinas. Os mesmos James Brunlees e Daniel Fox foram contatados ainda em 1861 por um grupo de empreendedores da região de Campinas, como o senador Souza Queiroz, João Ribeiro dos Santos e Joaquim Bonifácio do Amaral, interessado na ligação ferroviária entre Jundiaí e Campinas. Na edição de 6 de fevereiro de 1863, o “Correio Paulistano” informou sobre relatório que Brunlees havia encaminhado aos empreendedores de Campinas, com detalhes do projeto e o orçamento para a
obra. O empreendimento acabou sendo “congelado”, entretanto, por fatores como a eclosão da Guerra do Paraguai (1865-1870), que desviou recursos, atenção e prioridade polí ca na Província de São Paulo. A 29 de agosto de 1867, entretanto, o mesmo “Correio Paulistano” já relatava a “organização de uma empreza par cular para realizar o prolongamento da via férrea” da recém-inaugurada Santos-Jundiaí até Campinas. Seriam sócios na nova inicia va os Barões de Itape ninga, Piracicaba e Limeira, o mesmo senador Queiroz, o Comendador Souza Barros, Dr.Mar nho Prado e Thomaz Luiz Álvares. Depois de novos impasses polí cos e econômicos, o projeto da ligação ferroviária Jundiaí-Campinas adquiriu impulso com a posse do novo presidente da província, Joaquim Saldanha Marinho, a 24 de outubro de 1867. No dia 14 de dezembro de 1867, Marinho viajou de Santos a Jundiaí pelos trilhos da The São Paulo Railway e de Jundiaí a Campinas pela estrada de terra em carruagem. Foi um gesto polí co para reafirmar o seu apoio ao projeto da nova ligação ferroviária. Um fato curioso ocorrido no trajeto Jundiaí-
Campinas reforçou o desejo generalizado pela nova ferrovia. A estrada de terra “estava em tão máo estado de transito, que entre Rocinha e os Dous Corregos, a diligencia em que viajavam o exm. Barão de Limeira, José Maria de Andrade, engenheiro N. Bennaton, dr. Antonio Aguiar de Barros, e dr. Henrique Cezar Muzio, quebrou-se com estrepito ficando inu lizada para con nuar a viagem até Campinas”, segundo narrou o “Correio Paulistano” de 20 de dezembro de 1867, sobre a saga dos companheiros de viagem do presidente da província. No dia 16 de dezembro de 1867 aconteceu em Campinas, com a par cipação de Saldanha Marinho, assembleia de possíveis interessados em inves r na ferrovia. No mesmo dia foram subscritas 5.000 ações, correspondendo a um quinto do capital previsto para dar início ao empreendimento. A primeira diretoria foi eleita a 30 de janeiro de 1868, tendo Clemente Falcão de Souza Filho na presidência e, como diretores, Inácio Wallace da Gama Cochrane, Bernardo Avelino Gavião Peixoto, Francisco Antonio de Souza Queiroz e Mar nho da Silva Prado. A autorização imperial para o funcionamento da empresa e para o início das obras foi dada a 28 de novembro de 1869, pelo decreto 4283. Vários outros grandes capitalistas, como os barões de Limeira, de Itape ninga e
de Antonina, e o Visconde de Vergueiro, par ciparam do empreendimento. As obras foram iniciadas a 15 de março de 1870. A “Gazeta de Campinas” tornou-se uma espécie de “Diário Oficial” do projeto, sempre publicando no cias sobre o desenvolvimento da inicia va. Por exemplo, em várias edições do jornal, no início de 1870, como a 17 de março, foi publicado o anúncio da “Companhia Paulista – A directoria da Companhia Paulista necessita contractar o fornecimento de 47.000 dormentes de madeira de lei, cujas dimensões no mínimo devem ser as seguintes: ...” Na edição de 20 de março de 1870, na página 4, o jornal publica por sua vez o anúncio “Estrada de Ferro Jundiahy a Campinas – Contratam-se trabalhadores para a construção da dita estrada com o sr.Carlos Dulley, no logar denominado – Leitão – ou com o emprezario em Jundiahy”. Os avanços da cidade rumo à modernidade, esperados com a implantação da Companhia Paulista, con nuavam sendo simultâneos à barbárie da escravidão, que prosseguia exibindo as suas mazelas, inclusive na própria “Gazeta de Campinas”. Em sua edição de 01 de janeiro de 1871, o jornal publicava o anúncio: “Quem quizer alugar, por mez, 21
escrava que cosinha, lava e engomma; procure na rua de Baixo n.23, para tratar com o seu senhor”. A relação de propriedade, a negação do outro como ser humano, explícita em um anúncio de quatro linhas. O contraponto ao que a elite campineira previa que aconteceria com a chegada da estrada de ferro: o portal para novos tempos, em uma cidade que já aspirava a ares europeus desde meados do século 19, com realizações como a inauguração do Teatro São Carlos, em 1850. Mas o projeto da ferrovia prosseguia e na edição de 3 de agosto de 1871 a “Gazeta de Campinas” informava, ao comentar o mais recente relatório apresentado aos acionistas pela Companhia Paulista: “Em Setembro, diznos o mencionado documento, havemos de ter prompto todo o movimento de terra da linha inteira; em Janeiro hade ser inaugurado o transito. O material comprado na Europa está chegando com presteza ao porto de Santos, de sorte que, dentro em pouco, está desembarcando o trem necessário: navios fundeados já seis; esperado a todo momento o sé mo. E querem saber? esta compra effectuou-se com uma economia extraordinária, enorme para os cofres da companhia, apezar dos maus espíritos agoureiros terem presagiado o contrário”.
Nesta comunicação que não esconde a euforia com o empreendimento, e pela qual sabemos que havia opositores, os “maus espíritos agoureiros”, está todo um pensamento majoritário em Campinas, quanto a proximidade da inauguração da ferrovia e de sua Estação Central. O início das operações não aconteceria, como indicado no comentário da “Gazeta”, em janeiro de 1872, mas em agosto, mas o o mismo era reinante. O projeto animava vários interesses, não apenas em Campinas mas em toda a região. Na edição de 24 de agosto de 1871, a “Gazeta de Campinas” publicava a solicitação vinda de moradores de Amparo: “Daquelle importan ssimo município nos escrevem pedindo instantemente que intercedamos junto á directoria da Companhia Paulista, afim de esta ilustre corporação interpôr os seus bons officios para com o governo provincial, no sen do de obter um grande melhoramento. Trata-se da estrada que se projecta abrir entre Campinas e o Amparo. Há immensa vantagem não só para o publico em geral, como especialmente para aquella empreza em levar-se a cabo este desideratum. Por esta estrada tem de passar mais de 300 mil arrobas de productos agrícolas e naturalmente outro tanto ou mais em gêneros de commercio que se hão de
importar”. Havia muita expecta va, portanto, em relação à ligação ferroviária entre Jundiaí e Campinas, consolidando o fluxo do café até Santos e daí para o mercado internacional. A região que já nha sido inserida no mercado global durante o Ciclo do Café se firmaria nesse sen do, com o trem de ferro que mais do que tudo simbolizava o advento de novos tempos. E a inauguração da ferrovia foi devidamente comemorada, nas páginas da “Gazeta de Campinas”. Assim Francisco Quirino dos Santos descreveu o evento histórico: “Contavam-se três horas e meia quando um estremecimento estranho veio eletrizar em todos os sen dos aquela reunião enorme: ouvia-se longínquo um ruído estridente e os ecos repercu am pelas nossas belas campinas o férreo galopar do misterioso hipogrifo. O que se passou nesse instante foi uma coisa que não se diz: sonha-se ou vê-se. Girândolas, foguetes, baterias, aclamações, música, tudo isso ergue-se num ímpeto tão sublime como a própria alma do povo a perder-se uma ver gem de alegria indefinida. Espetáculo maravilhoso! Entusiasmo assim não se prepara, nasce de si mesmo, como a lava no seio dos vulcões para esbrasear a face das montanhas e derramar calor e o brilho pela atmosfera incendiada”.
Assim o redator-chefe da “Gazeta de Campinas” iniciava a narra va do episódio da inauguração da Estação Central da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, a 11 de agosto de 1872. Depois de uma década de estudos e negociações, envolvendo os empreendedores locais e os inves dores e engenheiros ingleses, chegava o grande momento de início das operações da ferrovia que, inicialmente ligando Jundiaí a Campinas, consolidava a integração da região à nova ordem do capitalismo mundial. As palavras de Francisco Quirino dos Santos contam muito sobre o que significava aquele dia para Campinas em geral e para a elite polí ca e econômica local em par cular. Uma elite que, tendo a sua riqueza fundamentada na cultura do café e na exploração da mãode-obra escrava, cul vava valores picos da ordem burguesa de matriz europeia. Ainda assim, a narra va de Francisco Quirino dos Santos indica que a chegada da ferrovia a Campinas deixava no ar a incógnita: o que aconteceria depois daquele dia? “Ouvia-se longínquo um ruído estridente e os ecos repercu am pelas nossas belas campinas o férreo galopar do misterioso hipogrifo”, escreve o jornalista, sinalizando que um grande barulho estava para sacudir e 23
a mudar o panorama local. Uma explosão de modernidade, trazida pelo “férreo galopar do misterioso hipogrifo”. O trem de ferro não deixava de representar um enigma a ser decifrado. Ele estava chegando como um Cavalo de Troia. Era aguardado, mas não se sabia o que con nha dentro dele. Havia muitas promessas, mas para onde aquela máquina levaria a cidade? O certo é que ele chegava com a força de um vulcão, “para esbrasear a face das montanhas e derramar calor e o brilho pela atmosfera incendiada”, palavras que prenunciam o que de fato aconteceria, com o fogo das caldeiras que alimentavam e movimentavam os trens, mas ao mesmo tempo espalhando fagulhas e queimando as matas ao longo do percurso. Para além do sen do literal, de devastação da vegetação na va, o “vulcão” trazido pelos trens de ferro significava o “estremecimento” das bases e valores daquela sociedade agrária que sonhava ser um microcosmo europeu no meio do calor tropical. Isso era certo: depois daquela erupção, nada mais seria como antes na Campinas que já havia perdido o Ma o Grosso e que, entre 1797 e 1842, se chamou Vila de São Carlos. É o que as palavras de Quirino dos Santos parecem apontar, traduzindo as expecta vas
e sen mentos da sociedade campineira, na hora de inauguração da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. E, a par r dali, a Estação Central, ou Estação Campinas, da Companhia Paulista seria o vér ce principal da dinâmica de crescimento da cidade e da região. Com sua arquitetura majestosa, a Estação estava pronta para cumprir o papel de plataforma privilegiada para o intercâmbio, o diálogo e a mes çagem cultural e étnica, com a chegada e par da de brasileiros das mais diversas origens e de cidadãos de tantas partes do mundo que aqui vieram buscar a materialização de novos projetos de vida.
Companhia Mogiana No mesmo ano de inauguração da Companhia Paulista, começou a trajetória da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro e Navegação, nome original do empreendimento. A 21 de março de 1872 foi concedida a um grupo de empreendedores a construção da nova ferrovia, pela Lei Provincial número 18. A concessão previa a extensão dos trilhos de Campinas até a bacia do Rio Grande na divisa de São Paulo e Minas Gerais. Entre os empreendedores, o Antônio de Queirós Teles, o Barão e Visconde de
Parnaíba, que seria o primeiro presidente da diretoria, eleita a 1º de julho de 1872. Ainda na primeira diretoria da Mogiana estavam outros grandes cafeicultores: Tenentecoronel José Egídio de Sousa Aranha; Antônio Pinheiro de Ulhoa Cintra (Barão de Jaguara); Capitão Joaquim Quirino dos Santos; e Antônio Manuel Proença. No dia 2 de dezembro de 1872 foram iniciadas as obras de instalação da ferrovia, inaugurada oficialmente a 27 de agosto de 1875 com a presença do Imperador D.Pedro II, um grande entusiasta dos trilhos. E rapidamente os trilhos da Mogiana foram ampliados, chegando a Casa Branca, a 172 quilômetros do ponto inicial, já em janeiro de 1878. Daí a malha seguiu até o Sul de Minas Gerais, o que depois teria muita influência na migração de mineiros até Campinas. Os trilhos da Mogiana também chegariam a Ribeirão Preto e ao Triângulo Mineiro. Uberabinha, atual Uberlândia, foi alcançada em 1895. As margens do Rio Grande, obje vo inicial do projeto, foram a ngidas antes, em 1888. Um ano depois, o da Proclamação da República, a ferrovia chegou a Franca. A úl ma estação instalada da Companhia Mogiana seria a de Passos (MG), em 1921. Uma enorme disputa geopolí ca foi deflagrada, quando os empreendedores da Companhia Mogiana projetaram a extensão
da ferrovia até o Porto de Santos, através da Serra da Man queira, o que representaria o rompimento do monopólio britânico que acontecia por meio da ligação Santos-Jundiaí. A intenção não foi materializada porque os controladores da São Paulo Railway inves ram na aquisição da Estrada de Ferro Bragan na, situada no trajeto idealizado pelos donos da Mogiana. Com essa compra, foi inviabilizada a ligação entre CampinasA baia-Santos.De qualquer modo, a instalação e o crescimento da Companhia Paulista e Companhia Mogiana representavam a consolidação de Campinas como um dos principais polos ferroviários do Brasil. Foi o primeiro passo no processo que tornaria a região um dos principais hubs de logís ca do país. A construção do Solar da família de Joaquim Ferreira Penteado, futuro Barão de Ita ba, foi inserida no contexto de euforia alimentado pela disseminação da malha ferroviária. Os grandes cafeicultores, projetando a sua riqueza e poder polí co, passaram a construir residências majestosas na área urbana. As cidades de São Paulo e Campinas receberam algumas das maiores e mais representa vas obras nesse sen do. Foi o caso da residência dos Ferreira Penteado, que passaria para a história como o Palácio dos Azulejos. 25
CAPÍTULO II A construção do Palácio dos Azulejos ascido em São Roque, a 10 de fevereiro de 1808, Joaquim Ferreira Penteado era filho único de Ignácio Ferreira de Sá, que foi capitão-mor da Vila de São Carlos, depois cidade de Campinas, e de Delfina de Camargo Penteado. Ignácio era viúvo da a de Delfina, Teresa de Camargo Penteado, com quem teve duas filhas, Bárbara (esposa de João Ferraz de Campos) e Rita (casada com o alferes Joaquim Pedroso de Barros e depois com o tenente João Leite de Freitas). Joaquim chegou a Campinas com 22 anos, fazendo fortuna com os negócios agrícolas. Ele casou-se a 15 de maio de 1830 com sua prima-segunda Francisca de Camargo Andrade, com quem teve 13 filhos.
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A família era uma da lista de grandes proprietários de terra de Campinas na metade do século 19. Uma das propriedades era uma chácara localizada no bairro do Bonfim, resultante da Fazenda Boa Vista. Outras propriedades eram a Fazenda Duas Pontes e a Fazenda das Cabras, onde havia o plan o de café e outras culturas. Na área da chácara, depois denominada República por um dos proprietários seguintes, o senador Bento Augusto de Almeida Bicudo, seria instalado no início do século 20 o Asylo dos Inválidos, depois Lar dos Velhinhos de Campinas. O respeito que Joaquim Ferreira Penteado nha no município de pouco mais de 30 mil habitantes no início da década de 1870, quase metade deles de escravos, pode ser dimensionado por alguns textos da “Gazeta de Campinas”. Como o relacionado à troca de correspondências, tornada pública, entre Ferreira Penteado e os Irmãos Bierrembach. Na edição 221, de 1872, consta uma carta dos Bierrembach a Ferreira Penteado, 27
indagando se ele estava sa sfeito com as máquinas agrícolas fabricadas pela empresa dos irmãos e vendidas ao proprietário rural. A resposta de Penteado, datada de 30 de novembro de 1871, foi que as máquinas “estão funcionando muito a minha sa sfação”. Essa singular troca de correspondências, tornada pública, foi divulgada em outras edições da “Gazeta de Campinas”, servindo como propaganda para o negócio dos Bierrembach e mostrando como a opinião de Joaquim Ferreira Penteado era respeitada na comunidade. O nome de Ferreira Penteado aparece em várias outras edições da “Gazeta”. Na edição de 5 de outubro de 1871, ele foi citado entre os proprietários rurais que contribuíram para o conserto da estrada entre Campinas e Mogi Mirim. Na edição de 7 de agosto de 1873, o seu nome foi iden ficado entre os a vos par cipantes das festas a Nossa Senhora do Carmo, na Matriz de Santa Cruz (atual Basílica do Carmo). Em diversas edições, a “Gazeta de Campinas” publica nomes de escravos que faleceram, e vários deles eram de Ferreira Penteado de acordo com o jornal.
A construção do Palácio dos Azulejos A família de Joaquim Ferreira Penteado era proprietária de alguns imóveis na área
urbana de Campinas, que no início da década de 1870 nha cerca de 15 mil moradores. Uma das propriedades era um terreno na rua Regente Feijó, número 88, esquina com a rua do Pór co, que nha essa nomenclatura por ter recebido um pór co, ou arco decora vo, quando o Imperador D.Pedro II fez sua primeira visita à cidade, em 1846. Por ocasião dessa visita, inclusive, membros da comi va imperial se hospedaram na residência onde a família de Joaquim Ferreira Penteado morava antes da mudança para a rua Regente Feijó. A residência ficava na rua Barão de Jaguara, an ga rua de Cima, esquina com a rua Barreto Leme. O projeto de Penteado era construir não uma, mas duas grandes residências, sendo a outra para a sua filha Francisca, casada com o Tenente-Coronel Pacheco e Silva. E de fato isto aconteceria, com a construção do outro imóvel no número 90 da rua Regente Feijó. O terreno em que as residências foram construídas nha cerca de 1.100 metros quadrados. Quando as obras foram concluídas, os dois palacetes somavam em torno de 2.100 metros quadros, distribuídos entre os 1.185 m2 do sobrado da esquina e os 915 m2 do imóvel con guo. Não existe planta original e não se sabe quem de fato construiu as casas, que depois
se uniriam para formar o Palácio dos Azulejos. Em sua antológica tese de mestrado, “Palácio dos Azulejos: De residência a Paço Municipal – 1878-1968”, Maria Joana Tonon indica como um provável construtor o arquiteto português Manoel Gonçalves da Silva Cantarino, que nha escritório na então rua do Rosário, atual avenida Francisco Glicério, e que havia assinado obras como uma grande reforma no Teatro São Carlos. Cantarino é apontado como um dos introdutores do es lo neoclássico em São Paulo. “Habituado a grandes obras neoclássicas, é possível que tenha sido o construtor não só do sobrado de Joaquim Ferreira Penteado, como do filho Estanislau Ferreira de Camargo Andrade, pela semelhança existente entre ambos”, diz Tonon (página 94). Os dois casarões foram erguidos com técnica mista, em taipa de pilão e em jolos, que começavam a ser mais u lizados pelos construtores. Na realidade, o Palácio dos Azulejos foi construído, na década de 1870, justamente no momento de transição entre a taipa de pilão e os jolos. Vários elementos arquitetônicos e es lís cos u lizados confirmam a riqueza histórica do edi cio. No pavimento térreo, por exemplo, foram u lizados elementos da ordem dórica, em contraponto a ingredientes da ordem
jônica encontrados no pavimento superior, “demonstrando a perfeita aplicação das an quíssimas regras ´vitruvianas`, de ordens sobrepostas ver calmente, em fachadas”, como nota Tonon na citada tese. Do mesmo modo, Tonon nota na tese que a construção do Palácio dos Azulejos “foi feita sobre o alinhamento da via pública, mais especificamente, de duas vias muito significa vas – an ga rua do Pór co com Regente Feijó – com paredes laterais sobre o limite do terreno vizinho, obedecendo ao Código de Posturas vigente na época (…) [e] Tendo a possibilidade de ser levantado sobre o alinhamento das ruas Ferreira Penteado e Regente Feijó, os construtores do sobrado (..) elaboraram duas fachadas com generosas dimensões, propiciando, com isso, um desenho de talhado com quatro águas, adaptado para um prédio com formato em ‘U’, diferenciando-se da maioria dos esquemas comuns de planta e telhado, onde aparecia no casario simples, a cobertura com apenas duas águas”. A iden dade do Palácio vem dos azulejos portugueses que cobrem as fachadas, inclusive na pla banda onde foi aplicada louça branca. São azulejos de vários pos, com frisos gregos, do po tapete e com rosáceas de quatro pétalas, entre outros. O Barão de Ita ba foi ousado em sua escolha, 29
porque o uso de azulejos como reves mento externo era desconhecido nos casarões dos grandes proprietários rurais do século 19. Das sete esculturas de figuras mitológicas, colocadas no alto da pla banda, sobraram cinco, duas voltadas para a rua José Paulino e, para as ruas Regente Feijó e Ferreira Penteado e avenida Moraes Salles, uma cada. Azulejos, a configuração da pla banda e esculturas, entre outros ornamentos, são detalhes que encantam qualquer observador mais atento, que para alguns minutos, no meio da correria da metrópole, para contemplar a joia arquitetônica que é o Palácio dos Azulejos. A claraboia com vidros coloridos é outro ingrediente que chama a atenção, assim como os pisos de mármore ou marchetados com vários pos de madeira e mo vos islâmicos. Elementos que também permaneceram da construção original são os gradis de ferro fundido no balcão do segundo pavimento. As pinturas murais nas paredes internas, infelizmente, sofreram com a ação do tempo e tantas mudanças no uso do espaço, sem o devido e necessário cuidado. Uma enorme escadaria construída com a técnica de taipa de mão, enormes janelas e portas-balcões para as ruas Regente Feijó e Ferreira Penteado, ex-rua do Pór co, esculturas e cristais importados da Bélgica
são outros elementos que se destacam. Ferreira Penteado também importou mármore italiano para soleiras e áreas internas. Uma porta interna no pavimento térreo, que serve de acesso à sala nobre do casarão da esquina, foi feita com pinho de Riga. No fundo do lote estavam localizadas a casinha de funções sanitárias e a cavalariça, onde ficavam os cavalos u lizados no transporte dos membros da família. Na esquina das ruas Ferreira Penteado, então do Pór co, e José Paulino, um filho do Barão de Ita ba, o coronel Elisiário, plantou um jardim sob os cuidados do jardineiro francês Benoit Fôret. Entre as muitas espécies plantadas estava a Gingko biloba, planta de origem oriental e que ainda era pouco conhecida no Brasil.
Apenas seis anos As obras do futuro Palácio dos Azulejos foram concluídas em 1878, quando os familiares de Joaquim Ferreira Penteado se mudaram para os dois casarões. Penteado já nha recebido nessa altura o tulo de Comendador da Ordem Imperial Ordem das Rosas, pela sua atuação em relação à Guerra do Paraguai, ocorrida entre 1865 e 1870. Logo no ano seguinte à mudança da família
para o novo endereço, Penteado deu início a um outro an go projeto, a construção de uma escola para crianças pobres. A escola foi construída em um terreno ao lado do casarão dos Ferreira Penteado, na rua Regente Feijó. A construção coube ao engenheiro-arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo, que acabava de chegar da Bélgica para iniciar em Campinas uma carreira de sucesso, que inclui obras como o Teatro Municipal de São Paulo. A inauguração da escola aconteceu no dia 15 de maio de 1880, mesmo dia de comemoração dos 50 anos de casamento de Joaquim e Francisca. A solenidade de abertura teve benção pelos religiosos presentes e discurso de Cândido Ferreira, um dos filhos de Joaquim, em homenagem ao arquiteto Ramos de Azevedo. Como acompanhamento, uma mesa com vários quitutes e bebidas. Como parte da programação, Joaquim Ferreira Penteado ofereceu um banquete no seu casarão. A Escola Ferreira Penteado começou a funcionar a 7 de junho de 1880. No ano seguinte, mais exatamente a 23 de maio de 1881, o vereador Francisco Glicério propôs em sessão do Legisla vo que a rua do Pór co passasse a ser denominada rua Ferreira Penteado. No dia 18 de março de 1882 foi a vez do
Imperador D.Pedro II conceder a Joaquim Ferreira Penteado o tulo de Barão de Ita ba, e de Baronesa de Ita ba a sua esposa. Foi um reconhecimento às realizações sociais do casal, e par cularmente em função da escola popular. A escola foi legada aos filhos homens do Barão, de acordo com o seu testamento. Após o seu falecimento, a esposa passou a ser a mantenedora da ins tuição e o filho Cândido, o seu diretor. A escola foi doada pelos filhos ao Município após a morte de Dona Francisca. Outras escolas foram criadas e man das pela família por muitos anos, como informou Tonon em sua tese. No auge de sua vida social, polí ca e econômica, o Barão de Ita ba faleceu no dia 6 de junho de 1884. Foram pouco mais de seis anos usufruindo do palacete. Cinco anos depois, exatamente a 16 de agosto de 1889, falecia Dona Francisca. No ano em que Campinas atravessava o pior surto da epidemia de febre amarela que devastou a cidade. Com a morte dos pais, um dos filhos, Elisiário, passou a residir com a família no casarão do casal Ferreira Penteado. Depois ele se mudaria para São Paulo e no casarão se instalou a filha, Alzira Ferreira Penteado,
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casada com o coronel Francisco de Andrade Cou nho. No sobrado con guo, onde originalmente morou a filha Francisca de Joaquim Ferreira Penteado, depois passaria a residir outro filho, Ignácio Ferreira Penteado, um dos acionistas da Companhia Paulista de Vias Férreas e Fluviais. Mas Ignácio viveu pouco no casarão. Ele faleceu em Paris, em 1894, aos 42 anos de idade. Dona Brandina Emilia Leite Penteado, sua viúva, herdou a Fazenda Duas Pontes e casou-se com Arthur Furtado de Albuquerque Cavalcan . Ele era um dos proprietários da empresa Byington, Cavalcan e Companhia, do então emergente setor de energia elétrica e que construiu a usina do Salto Grande, originalmente fornecedora de eletricidade para Ita ba e Sousas. Em 1906 a empresa uniu-se à Companhia Campineira de Iluminação a Gás, dando origem à Companhia Campineira de Iluminação e Força, depois Companhia Campineira de Tração, Luz e Força, que também exploraria os bondes elétricos inaugurados em 1912. Essa empresa passou em 1929 ao controle da CPFL que, já sob controle da norteamericana AMFORP, transferiu a sede para Campinas.
O casal Arthur Cavalcan e Dona Brandina permaneceu no sobrado até 1916, quando o imóvel foi a leilão, sendo adquirido pela Prefeitura de Campinas, na gestão de Heitor Penteado, para compor o novo Paço Municipal. A Campinas da eletricidade e dos automóveis despontava. Em sintonia com sua vocação mul funcional, o Palácio dos Azulejos estava pronto para começar uma nova era.
CAPÍTULO III O Palácio vira Paço o início do século 20, Campinas ainda se recuperava da epidemia de febre amarela. A cidade procurava renascer, retomar o ritmo e o dinamismo da época de ouro do café, nas décadas de 1870 e 1890, período de fortalecimento do poder polí co dos cafeicultores. Esse poder era tão grande que os dois primeiros presidentes civis do Brasil eram nascidos na região e nham vinculação direta com a cafeicultura. Foram o ituano (mas que fez toda a sua carreira polí ca e profissional em Piracicaba) Prudente de Morais, presidente de 15 de novembro de 1894 a 14 de novembro de 1898, e Manuel Ferraz de Campos Salles, campineiro, maçom, membro do grupo que criou o Colégio Culto à Ciência,
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presidente de 15 de novembro de 1898 a 14 de novembro de 1902. Um campineiro na presidência da República, na emblemá ca virada dos séculos 19 e 20. Uma atmosfera de renascimento tomava conta da cidade. O resgate do crescimento econômico aconteceu por vários fatores. Um deles foi o fortalecimento do parque industrial, instalado de forma incipiente desde a década de 1850, através de empreendimentos como a fábrica de velas de cera de Gil Vasconcelos, em 1852, e a marcenaria da viúva Krug, no ano seguinte. Em 1857 foi fundada a Fábrica de Bierrenbach & Irmãos, que seria um marco na história industrial da cidade. No período de 1852-1886 apareceram 35 indústrias na cidade. De modo concomitante com a expansão do parque industrial, Campinas sen u os impactos da consolidação da economia algodoeira. O Ins tuto Agronômico de Campinas (IAC), que havia sido criado a 27 de junho de 1887 como Estação Agronômica, 39
pelo Imperador D.Pedro II, foi determinante nesse sen do, em função das pesquisas implementadas com o algodão. Na região de Campinas, propriedades rurais que antes eram cobertas por cafezais passaram a se dedicar ao plan o do algodão, que alimentava as primeiras fábricas de tecidos. Uma das fábricas pioneiras de tecido seria abastecida desde 1902, por uma usina própria de energia elétrica. Foi o ponto de par da para a estruturação da Companhia Campineira de Iluminação e Força, que no início do século 20 implantaria redes elétricas em vários pontos da cidade. Com o devido es mulo pela Prefeitura, a Companhia aplicou tarifas reduzidas, fomentando a dilatação do parque industrial na cidade. Do mesmo modo, e de maneira indireta, a industrialização em Campinas e região também receberia o fomento da subs tuição de importações, ocorrida durante a 1ª Guerra Mundial, de 1914 a 1918. Em 1920, a Resolução 606, da Prefeitura, consolida a concessão de incen vos à instalação de indústrias no Município. Em outras palavras, a Campinas dependente do café (que con nua por algum tempo com algum peso econômico, até a Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas) vai sendo subs tuída por um novo po de cidade, que
não se restringia mais ao rocio demarcado pelas ruas de Cima, de Baixo e do Meio, como eram denominadas as atuais ruas Barão de Jaguara, Dr.Quirino e Luzitana. Com as ferrovias o espaço urbano já havia se ampliado e, com o parque industrial, foram sendo criados os primeiros bairros operários. Vila Industrial à frente. Nesse cenário, medidas voltadas para assegurar a qualidade de vida nessa cidade que retomava o crescimento foram tomadas no início do novo século. Em 1905 é materializado o primeiro projeto de arborização urbana, na avenida Andrade Neves. O primeiro projeto de ajardinamento na praça Carlos Gomes, originalmente um local de depósito de lixo, acontece em 1913, na gestão do prefeito Heitor Penteado. Duas obras que haviam sido indicadas no final do século 19 pelo sanitarista Saturnino de Brito - o mesmo responsável pelo saneamento de Santos e outras grandes cidades brasileiras que conviviam com as doenças tropicais - seriam realizadas em 1923 pela Prefeitura. Foram o prolongamento da avenida Anchieta e a canalização do córrego Tanquinho, que antes corria a céu aberto desde o Largo do Pará até onde está hoje o prédio da Prefeitura. Essas duas obras foram um marco arquitetônico para a cidade. A natureza
estava sendo sepultada, de modo defini vo e literal, para dar lugar ao concreto e às vias pavimentadas, sinais picos da cidade que, sob o impulso da indústria, começava a se agigantar. A população não parava de crescer, pra camente duplicando, de pouco mais de 67 mil moradores em 1900 para 115 mil em 1920. A migração europeia contribuiu muito para o crescimento populacional. Somente entre 1882 e 1900 Campinas recebeu mais de 10 mil imigrantes, sendo quase 8 mil de italianos, de acordo com os registros da Hospedaria dos Imigrantes do Estado de São Paulo, citados por Rosana Baeninger, em “Espaço e Tempo em Campinas – Migrantes e a expansão do pólo industrial paulista” (Coleção Campiniana, Centro de Memória da Unicamp, Campinas, 1996). Maior população, maiores desafios sociais e o crescimento do con ngente de mendigos era especialmente preocupante, o que mo vou ações como a criação da Sociedade Protetora dos Pobres em 1903 e um movimento resultando na fundação em 25 de julho de 1904 do Asilo dos Inválidos. Adquirida em outubro de 1905 do coronel Bento Bicudo, a chácara “República” abrigaria a nova ins tuição, que teve como primeiro presidente Orosimbo Maia, eleito em 1907 o primeiro prefeito de Campinas.
Antes, os chefes do Execu vo Municipal eram denominados Intendentes. Em sintonia com o momento intelectual do País, Campinas vivia uma fase de renovação e modernização também em termos culturais. A 11 de maio de 1905, o Teatro São Carlos foi palco da primeira exibição de um filme na cidade. Em 1901 nasceria a Sociedade Dançante Familiar União da Juventude, que também ficou conhecida como União ou União da Juventude. A Sociedade também man nha um perfil cultural, recrea vo e social. Uma das principais ins tuições negras criadas no período foi a Federação Paulista dos Homens de Cor, de 1902. Nesse contexto, Campinas necessita com urgência de ampliar os espaços de sua estrutura administra va, o que levou à decisão do governo local de adquirir um novo Paço Municipal. Até então o Paço Municipal funcionou, muitas vezes em prédios alugados, em vários endereços no centro histórico, sempre junto com a Cadeia Pública ou com o Fórum. Originalmente, o prédio da Câmara Municipal, a quem cabia administrar a cidade até a Proclamação da República, quando foram criados os cargos de intendentes, depois prefeitos, estava situado, junto com a 41
Cadeia, em frente à então Matriz de Nossa Senhora da Conceição, atual Basílica do Carmo. É o local onde atualmente está situado o monumento-túmulo do maestro Antônio Carlos Gomes. O úl mo endereço do Paço, junto com o Fórum, nha sido na rua Dr.Quirino, 65, de propriedade de Bento da Silva Braga. O edi cio escolhido para a nova sede do Paço não poderia ser mais simbólico da história campineira: o Palácio dos Azulejos.
O Paço no Palácio Foram dois momentos de instalação do Paço Municipal no Palácio dos Azulejos, o que significou em alterações em sua estrutura original. O primeiro momento foi a aquisição em 1908, por 50 contos de reis, da residência localizada no número 100 da rua Regente Feijó, esquina com rua Ferreira Penteado, então de propriedade da neta do Barão de Ita ba, Alzira Ferreira Penteado, e do marido, Coronel Francisco de Andrade Cou nho. A busca de um novo Paço Municipal foi um dos primeiros gestos do novo prefeito, Orosimbo Maia, um empresário visionário, sempre de olho no futuro. Inicialmente foram cogitados o palacete do Barão de Itapura e um imóvel do Barão de Ataliba Nogueira, na mesma rua Regente Feijó. Mas
a escolha recaiu sobre a residência da família Ferreira Penteado, em condições consideradas vantajosas para o município. Em sua tese de mestrado, Tonon relata que, “imediatamente à efe vação da compra, o prefeito Orosimbo Maia tratou de elaborar o di cil projeto de adaptação do novo Paço Municipal, chamando para a responsabilidade da tarefa a Repar ção de Obras, sob orientação do engenheiro Dr.José Rios Rebouças, a princípio e, posteriormente, do Dr.Acrisio Paes Cruz. Contavam também com a colaboração do arquiteto Bruno Simões Magro, desenhista de inúmeras plantas, a par r desta data. Levados à apreciação da Câmara Municipal o levantamento de uma planta completa do edi cio com os devidos orçamentos, foi aberta concorrência pública e, dentre as seis apresentadas, saiu vencedora aa proposta apresentada pelos proponentes Vergniand Veger e Luz Dame, por ser a mais conveniente e barata” (Tonon, página 210). As obras de adaptação foram realizadas entre janeiro e julho de 1909. No térreo foi instalada a Prefeitura e, no piso superior, a Câmara Municipal (com acesso pela rua Regente Feijó) e o Tribunal de Júri (com acesso pela rua Ferreira Penteado). No segundo pavimento foram abrigadas outras repar ções ligadas à Prefeitura e a sala de
sessões do Legisla vo Municipal. Em prédio vizinho foi montado o Corpo de Bombeiros, em endereço onde está até hoje. Como a cidade con nuava crescendo e a estrutura administra va demandava novas ampliações, em 13 de julho de 1916 o novo prefeito, Heitor Penteado, que tomara posse em 1911, adquiriu, em Hasta Pública, o sobrado da Família Penteado, con guo ao Paço Municipal, agora de propriedade do agricultor Arthur Furtado de Albuquerque Cavalcan . Novas obras foram realizadas, para adaptação do novo edi cio ao Paço. Sob a gestão de Heitor Penteado, o Palácio dos Azulejos já nha sofrido várias intervenções. Ainda em 1911, foram re rados todos os azulejos do piso terreno, com a sua subs tuição por alvenaria de jolos. No ano seguinte foram realizadas melhorias na rede de eletricidade. Em 1928, novas adaptações, com a transferência do Fórum para a rua Dr.Quirino. Em seu lugar foi abrigada a Repar ção de Água e Esgotos, antecessora da Sanasa. A par r de 1933, novas adaptações, como relata Tonon: "O obje vo era que o prédio se transformasse em uma repar ção moderna, à altura de sua importância e de seu movimento sempre crescente. Assim sendo, todas as instalações das repar ções
arrecadadoras, em contato direto com os contribuintes, foram adaptadas no pavimemnto térreo”. Tonon prossegue afirmando que data de 1934 "a construção do chanfro na esquina da Rua Regente Feijó com Ferreira Penteado" que exigiu dos técnicos a alteração de "estruturas das paredes mestras do edi cio"; uma exigência que se originou do Código de Obras Arthur Saboya da Prefeitura de São Paulo e que se referia à circulação do automóvel. (TONON) Segundo TONON: "Apesar da perda de alguns metros com a construção do chanfro, a edificação ganhou uma monumentalidade até então existente, após a demolição de uma parede interna, na entrada, transformando os dois ves bulos das an gas residências em apenas um, tornando-se uma área muito mais espaçosa, iluminada e arejada, facilitada com a abertura de uma terceira porta de acesso pela rua Regente Feijó. Pode ser desta época o nascimento de sua iden dade como Palácio dos Azulejos". Mas a cidade con nuava crescendo e diversos setores da administração municipal passaram a ocupar endereços dispersos pelo centro, alugados ou em imóveis desapropriados. Em 1960 veio a decisão de construção de um novo e moderno Paço Municipal, impera vo para uma cidade que
já chegava a 220 mil moradores. Desde então floresceram os boatos e as intenções concretas de demolição do Palácio dos Azulejos. Essas ameaças ao prédio histórico alimentaram o movimento que resultou no seu tombamento, nas três esferas de governo.
Testemunha da história Durante as seis décadas em que sediou o Paço Municipal, de 1908 a 1968, o Palácio dos Azulejos foi “testemunha” de momentos e eventos marcantes para a história de Campinas, do Brasil e do mundo. O Solar do Barão de Ita ba “viu” o crescimento da cidade ainda acanhada do início do século 20 até a explosão populacional deflagrada na década de 1960, rumo à metropolização. Neste período, foram prefeitos de Campinas, portanto despachando e tomando decisões importantes no Palácio dos Azulejos: Orosimbo Maia (1908-1910), Heitor Teixeira Penteado (1911-1920), Raphael de Andrade Duarte (1920-1922), Miguel de Barros Penteado (1º de janeiro a 30 de setembro de 1922 e de 1923 a 1925), Celso da Silveira Rezende (1º de janeiro a 31 de março de 1926), Orosimbo Maia (1926 a 1930), José Pires Ne o (11 de novembro de 1930 a 27 de março de 1931), Orosimbo Maia (28 de
março de 1931 a 3 de setembro de 1932), Alberto de Cerqueira Lima (1932-1933), Perseu Leite de Barros (1934), José Pires Neto (1º de outubro de 1934 a 1936), João Alves dos Santos (1º de junho de 1936 a 16 de julho de 1938), Euclides Vieira (1938 a 1941), Lafaye e Álvaro de Souza Camargo (17 de julho de 1941 a 27 de julho de 1943), Perseu Leite de Barros (1943-1945), Euclides Vieira (1º de junho a 10 de outubro de 1945), Joaquim de Castro Tibiriçá (11 de outubro de 1945 a 31 de dezembro de 1946), Admar Maia (Janeiro de 1947), Luiz de Tella (1º de fevereiro a 31 de março de 1947), Manoel Alexandre Marcondes Machado (1º de abril de 1947 a 30 de janeiro de 1948), Miguel Vicente Cury (31 de janeiro de 1948 a 19 de maio de 1951), Arlindo Joaquim de Lemos Júnior (20 de maio a 31 de dezembro de 1951), Antônio Mendonça de Barros (1952 a 1958), Ruy Hellmeister Novaes (1956 a 31 de janeiro de 1959), José Nicolau Ludgero Maselli (1º de fevereiro a 31 de dezembro de 1959), Miguel Vicente Cury (1960 a 30 de janeiro de 1964) e novamente Ruy Novaes (1º de fevereiro de 1964 a 30 de janeiro de 1969), período em que foi construído e instalado o novo Paço Municipal, no Palácio dos Jequi bás. Foram 60 anos em que grandes eventos globais veram impacto enorme em 45
Campinas e no Brasil todo, como as duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945), a pandemia de Gripe Espanhola (1917-1918), a profunda crise econômica deflagrada pela queda da Bolsa de Nova York (1929) e o início da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Sovié ca, perdurando desde o final da Segunda Guerra Mundial até 1990. No plano nacional, momentos convulsivos a ngiram diretamente as decisões tomadas no Palácio dos Azulejos, como o golpe militar de 1930 que levou Getúlio Vargas ao poder, a Revolução Cons tucionalista de 1932, o suicídio de Vargas em 1954, o golpe militar de 31 de março de 1964, que foi apoiado por grande parcela da elite econômica e polí ca campineira. A cidade passou por outros grandes traumas no período, como a destruição por um incêndio do Cine República em 1944, a demolição dos teatros São Carlos (em 1922) e Carlos Gomes (em 1965), o desabamento do Cine Rink na tarde de 16 de setembro de 1951 (que provocou a morte de 40 pessoas). Por outro lado foram muitas as alegrias, como a inauguração do Estádio Moisés Lucarelli, da Ponte Preta, em 1948, e do Brinco de Ouro da Princesa, do Guarani, em 1953; o início das operações da Via Anhanguera, em 1948, e do Aeroporto de
Viracopos, em 1960; a fundação da PUCCampinas como Faculdades Campineiras, em 1942, e da Unicamp, em 1962; a primeira reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), no Ins tuto Agronômico de Campinas (IAC), em 1949; a criação da Fundação FEAC, em 1964. Boa parte do perfil metropolitano e internacional adquirido por Campinas, como polo logís co, de educação, ciência e tecnologia, mas também como cidade com vocação solidária, foi desenhado, portanto, nas seis décadas em que o Palácio dos Azulejos foi a sede do Paço Municipal e, desta maneira, o vér ce do poder polí co local. Pois apesar de sua enorme importância histórica, já anunciada pela sua construção singular, o Palácio dos Azulejos por muito pouco não foi literalmente ao chão, como era o desejo de muitos poderosos locais. Apenas a reação da cidadania impediu esse desfecho, possibilitando que o an go Solar do Barão de Ita ba adquirisse novos significados, ganhasse novas camadas simbólicas, em sua trajetória.
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CAPÍTULO IV O tombamento do Palácio dos Azulejos Palácio dos Azulejos é o único monumento histórico de Campinas tombado nas esferas federal, estadual e municipal. E as deliberações pelo tombamento, nos âmbitos federal e estadual, foram tomadas após fortes movimentos locais, envolvendo historiadores, organizações sociais e cidadãos preocupados com o des no do edi cio cuja demolição foi cogitada em vários momentos. A preservação do solar do Barão de Ita ba é fruto, portanto, de uma consistente ação de cidadania, sem a qual provavelmente seu belo conjunto não estaria mais de pé, a poucos metros da Catedral de Nossa Senhora Conceição, um marco na região central da cidade. O movimento que resultou no tombamento,
O
inicialmente pelo Iphan, órgão federal, do Palácio dos Azulejos, na realidade teve início com a campanha pela criação de um Museu Histórico Cidade de Campinas. Essa discussão se arrastava desde 1949, quando o presidente da Câmara Municipal, Arlindo de Lemos Júnior, chegou a nomear uma comissão para estudar um local adequado para receber o desejado Museu Histórico. A Comissão, presidida pelo historiador Celso Maria de Mello Pupo, teve entre seus integrantes o jornalista Luso Ventura, redator-chefe do “Correio Popular”. Também integravam a Comissão: Azael Lobo, Celso Ferraz, Floriano Azevedo Marques, João Lourenço Rodrigues, Castro Mendes, José Dias Leme e Teodoro de Sousa Campos, tendo como assistentes e conselheiros o historiador e romancista Afonso de Taunay (1876-1958), que integrou a Academia Brasileira de Letras, e o advogado e historiador Pelágio Lobo. O relatório final da Comissão con nha um anteprojeto de instalação do Museu, que 49
seria criado com a finalidade de ser “um centro de estudos e inves gações, um relicário de preciosidades, de documentos, de reconstruções, de registros, que permi ssem compor um relato histórico de Campinas”, como descrito no ar go “Uma Ideia em Marcha”, assinado pelo próprio Luso Ventura e publicado na edição de 7 de julho de 1957 do “Correio Popular”. Na realidade, esse ar go foi um dos textos que integraram forte campanha do “Correio Popular”, no es lo das campanhas que a imprensa brasileira realizava até as úl mas décadas do século 20, quando o jornalismo passou a adquirir uma tonalidade majoritariamente imedia sta e factual. Essa tradição da imprensa brasileira, infelizmente abandonada, foi inaugurada com a grande campanha pela Abolição da Escravatura, vitoriosa no final do século 19 e conduzida de modo mais ou menos simultâneo ao da Proclamação da República. A campanha do “Correio Popular” foi deflagrada com o ar go “O museu que não temos”, assinado pelo mesmo Luso Ventura, a 30 de junho de 1957. No texto, o jornalista retoma a defesa da criação do Museu Histórico Cidade de Campinas, lembrando que o assunto já vinha sendo discu do há anos por ins tuições como o Rotary Club e o Centro de Ciências, Letras e Artes.
Ventura também citou o poeta campineiro Guilherme de Almeida, que, referindo-se ao Palácio dos Azulejos, “certa vez, dedicou-lhe uma crônica primorosa, realçando suas caracterís cas, pondo em evidência o que representa o edi cio para o patrimônio histórico nacional. Ali, sim, Campinas poderia instalar condignamente o seu museu, aliando-o, sob as mesmas telhas, ao museu da Diocese — que é um dos sonhos de D. Paulo de Tarso Campos, o culto e eminente bispo que tanto se preocupa com os fatos históricos de nossa lande”. O redator-chefe do “Correio Popular” propõe então que seria “de conveniência que as en dades culturais campineiras se movimentassem, desde já, com o obje vo de recolher fundos para a aquisição daquele prédio a fim de nele ser oportunamente instalado o nosso museu histórico. E Os poderes públicos municipal, estadual e federal poderiam ser mobilizados para coadjuvar o empreendimento, dando à cidade os recursos financeiros para a realização de uma inicia va de indiscu vel finalidade cívica e educa va”. Após a publicação do ar go, o “Correio Popular” passou a divulgar vários depoimentos de personalidades e profissionais, defendendo a criação do Museu Histórico Cidade de Campinas no
Palácio dos Azulejos. Na edição de 7 de julho de 1957, o jornal publicou o depoimento de Celso Maria de Mello Pupo, um dos mais importantes historiadores locais e que presidiu a Comissão criada em 1949 pelo legisla vo local. Pupo relembrou o trabalho da Comissão que ele havia presidido e sustentou; “Conservar o Palácio dos Azulejos é um ato de acrisolado amor à cidade. É este prédio um dos mais indicados para a sede do museu, embora não nos faltem nobres edi cios para tal fim”. O historiador concluiu seu depoimento com a convocação: “Que se alistem os campineiros nesta cruzada, antes da destruição completa do nosso documentário ao passado glorioso de Campinas". Para o historiador, proteger o Palácio dos Azulejos e criar o Museu Histórico representava, assim, uma verdadeira “cruzada”, e esse foi mais ou menos a tônica da campanha man da pelo “Correio Popular” e que mobilizou vários segmentos sociais. Na mesma edição de 7 de julho, o jornal também divulgou o depoimento de outro historiador lendário para Campinas, João Ba sta de Sá, que assinava seus textos como “Jolumá Brito”. Afirmou Jolumá: “Excelente a idéia do Luso Ventura, muito bem lembrada em seu ar go lançado há alguns dias pelas
colunas de seu jornal. Aliás, o Luso tem se ba do pela criação do um Museu em Campinas, que há tanto tempo eu sonhei, primeiro, fundado no an go prédio do "Raimundinho", que exis u no bairro do Guanabara”. Sobre a ideia de instalação do Museu no Palácio dos Azulejos, Jolumá Brito assinalou que Luso Ventura “em bom instante teve sua memória voltada para o velho casarão que tende a desaparecer, se ninguém for de encontro à sua idéia. Ele tem de tudo para se tornar no recinto sagrado que guardará para sempre os despojos de tanta riqueza que esta terra teve no passado e que estão desaparecendo”. Ainda na edição de 7 de julho de 1957, o “Correio Popular” ouviu a opinião do livreiro João Amêndola, que destacou, emocionado: "Antes de mais nada, devo dizer que seria mais um crime contra a alma de Campinas a demolição do Palácio dos Azulejos. Ele é inegavelmente uma das provas (das poucas que ainda restam) vivas da nossa história de cidade. Num lugar onde tudo é igual e uniforme, onde tudo fala uma linguagem só o interesse acaba logo e o sen mento não tem em que se fixar”. É possível perceber nas palavras dos entrevistados um claro temor gerado pela possibilidade de demolição do Palácio dos 51
Azulejos. O medo era derivado de uma visão de progresso então reinante na cidade e que resultou na demolição de vários prédios históricos na região central, como parte da implantação do Plano de Melhoramentos Urbanos de 1938, do arquiteto Prestes Maria, contratado quatro anos pelo município para elaborar um novo plano urbanís co para a cidade. O Plano Prestes Maia, como ficou conhecido, resultou de fato na derrubada de vários edi cios históricos, como a Igreja do Rosário, em 1956, para viabilizar a implantação de avenidas mais largas na região central. Era a ascenção da sociedade do automóvel, da velocidade, colocada na prá ca. O ritmo dos trens que nham feito a riqueza de Campinas no período do café não era mais suficiente. Neste cenário, também havia o interesse da especulação imobiliária, que projetava novos arranha-céus para a região central, como um ícone dessa nova visão de progresso. O primeiro arranha-céu de Campinas foi o Sant´Ana, projetado em es lo Art Déco pelo arquiteto e engenheiro Lix da Cunha e inaugurado em 1935, na esquina das ruas Barão de Jaguara e César Bierrenbach. O próprio Oscar Niemeyer assinou o projeto de um edi cio singular para a região central de Campinas, o Ita aia, construído na Praça Carlos Gomes, de frente para as históricas
palmeiras imperiais, e inaugurado em 1957. Outro ingrediente que atuava como um fantasma a assombrar o futuro do Palácio dos Azulejos era a própria tradição de derrubada de prédios históricos na região central de Campinas. Foi o caso espetacular do Teatro São Carlos, inaugurado em 1850 como um símbolo do dinamismo da elite cafeeira mas demolido em 1922, o ano da Semana de Arte Moderna. No lugar do Teatro São Carlos foi erguido o Teatro Carlos Gomes, que seria igualmente demolido, em 1965, no contexto da implantação do Plano Prestes Maia na região central. Ambos os teatros estavam localizados a poucos metros do Palácio dos Azulejos. De modo específico, pesava como uma ameaça ao futuro do Palácio dos Azulejos a ideia de transferência do Paço Municipal para outro espaço, mais adequado a uma cidade em franco crescimento. De pouco mais de 100 mil moradores em 1920, a população cresceu para 130 mil em 1940 e mais de 150 mil em 1950. A área ocupada pela cidade triplicou entre 1945 e 1954, evoluindo de 16 milhões para 53 milhões de metros quadrados. Toda essa conjuntura servia como pano de fundo para a campanha do “Correio Popular”, deflagrada pelo redator-chefe Luso Ventura. Na edição de 9 de julho de 1957, novos
depoimentos, como o do genealogista e historiador Teodoro de Sousa Campos Júnior, que era delegado em Campinas do Ins tuto Genealógico do Brasil e integrou a Comissão criada em 1949 pela Câmara Municipal. Campos Júnior de fato resgatou os trabalhos da Comissão e reiterou a importância de criação do Museu Histórico Cidade de Campinas: “E nós campineiros já devíamos, sem dúvida, contar com o Museu Histórico da cidade há muitos anos atraz, porque assim teríamos impedido, de fôrma irremediável. a dispersão de preciosos documentos e objetos históricos, que desapareceram uns peia ação do tempo e outros pela cobiça de colecionadores e negociantes de an guidade”. O genealogista prosseguiu: “Há muitos anos atraz, ainda quando o dr. Perseu Leite de Barros era diretor do D.O.V. (Departamento de Obras Viárias, Nota do Autor), vemos ocasião de externar o nosso ponto de vista, com relação à escolha do Palácio dos Azulejos para sede do Museu. Não mereceu, no entanto, o nosso alvitre o acolhimento devido, por julgar aquele engenheiro a edificação. imprópria para a finalidade. Portanto, não é recente o nosso modo de pensar com referência a que seja o vetusto edificado aproveitado para tão nobre e elevado come mento. Não podemos,
porisso, deixar de endossar a inicia va, ora lançada pelo redator-chefe do "Correio Popular", uma vez que razões existem de sobejo não só para louvá-la, como também para a apoiarmos com a máxima sa sfação”. Na mesma edição, o jornal publicou o comentário de outra personalidade local, o ar sta plás co e escritor José de Castro Mendes, idealizador e diretor do Museu Carlos Gomes e Museu Campos Salles, ambos então e ainda hoje localizados no Centro de Ciências, Letras e Artes (CCLA). Sobre o Palácio dos Azulejos e o Museu Histórico, disse Castro Mendes, que depois seria homenageado com um teatro em seu nome na Vila Industrial: “Datado de 1S78, o vetusto sobrado de linhas nobres e sóbrias, com seus azulejos, gradis de ferro trabalhado e alegorias de louça portuguesa, por si só cons tui uma peça valiosa e representa va de uma época de prosperidade agrícola que deu a Campinas pres gio ímpar entre as demais cidades da província. Nada melhor portanto do que ali para se efe var a nossa casa de história. Porém, caso isso não fosse viável por qualquer circunstância, mesmo assim o Museu deveria ser instalado em outro lugar qualquer, provisoriamente, tornando-se uma realidade a confirmar por nossos foros de cultura e apega às nossas tradições. Com um pouco de boa vontade, e 53
cooperação dos poderes competentes, estamos certos que a idéia magnífica sob todos os aspectos, desta vez não perecerá". No dia 11 de julho de 1957, foi a vez do “Correio Popular” divulgar a opinião de dois professores sobre o assunto. Docente do Ins tuto de Educação “Carlos Gomes”, de preparação de profissionais para o magistério, Celso Ferraz de Camargo manifestou o apoio à criação do Museu Histórico e à escolha do Palácio dos Azulejos para sediá-lo: “Quanto a escolha do local, não poderia ser mais feliz, um velho solar que relembra o esplendor an go de Campinas, e que deve ser conservado com carinho e amor. Assim, só aplausos e apoio de todos, merece a idéia, e que se torne em breve realidade, é o que se deve aspirar." De sua parte, o professor de História Amaral Santos, do Colégio Campineiro, declarou, sobre a hipótese de demolição do Palácio dos Azulejos, após a transferência do Paço Municipal a outro local: "Que façam alto as picaretas diante do Palácio dos Azulejos, que se respeitem aquelas paredes solarengas e, quando se levantar o Novo Paço Municipal, que haja aí alguém com os pulsos fortes e a coragem necessária para concre zar esse ideal que eleva e dignifica um povo. Campinas merece ter o seu Museu". Na época, a Prefeitura já nha a intenção de
conceder o Palácio dos Azulejos para a Santa Casa de Misericórdia, no acordo para a aquisição da área onde seria instalado o novo Paço Municipal, na avenida Anchieta. O negócio apenas não prosperou pela firme reação da sociedade.
Finalmente, o tombamento A campanha do “Correio Popular’ teve prosseguimento, assim como a mobilização popular pela proteção do Palácio dos Azulejos e criação do Museu Histórico Cidade de Campinas. Enquanto isso, era levado adiante o projeto de construção de um novo Paço Municipal, o que seria concre zado em terreno originalmente de propriedade da Santa Casa de Misericórdia de Campinas. O novo Paço Municipal teve suas obras iniciadas em 1966 e foi inaugurado a 28 de outubro de 1968, no mandato de Ruy Novaes, com o nome de Palácio dos Jequi bás, em referência às árvores centenárias localizadas no an go terreno da Santa Casa e que foram preservadas para a construção. Chegou a ser aventada na época a possibilidade de derrubada do Palácio dos Azulejos para a instalação de uma praça, com garagem subterrânea, o que para alguns gestores seria um indicador da modernidade
de Campinas. Com a proximidade da transferência do Paço, do Palácio dos Azulejos para o Palácio dos Jequi bás, evoluía o temor de demolição do Solar do Barão de Ita ba. Mas o movimento pela preservação do Palácio dos Azulejos teve finalmente uma boa no cia, com a divulgação em novembro de 1967 da decisão da Diretoria do Patrimônio Histórico e Ar s co Nacional, de tombamento do edi cio. A decisão foi comunicada ao prefeito Ruy Novaes pela no ficação 1002, datada de 23 de novembro de 1967, nestes termos: «Senhor Prefeito: Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Exa., para os fins estabelecidos no ar go 5º do Decreto-Lei n. 25, de 30 de novembro de 1937, que foi determinada a inscrição nos Livros de Tombo do Patrimônio Histórico e Ar s co Nacional, a que se refere o ar go 4º do mesmo diploma legal, da seguinte obra de arquitetura, pertencente à municipalidade de Campinas, de que V. Exa. é digno representante legal: Edi cio sito à rua Regente Feijó, esquina de rua Ferreira Penteado, em Campinas, Estado de São Paulo, conhecido como Palácio dos Azulejos, atual sede da Prefeitura Municipal. Solicitando o obséquio a V. Exa. de acusar o recebimento da presente no ficação, apresento-lhe os protestos de meu elevado
apreço. Renato Soeiro — Diretor do Patrimônio Histórico e Ar s co Nacional”. De fato, o processo de tombamento pelo órgão federal recebeu o número 0736-T-1964 e a deliberação foi inscrita no Livro Histórico sob número 409, volume 1, Folha 066, de 20 de dezembro de 1967. Naturalmente a no cia foi muito bem recebida pelo movimento favorável à preservação. Várias vozes reiteraram o apoio à preservação do edi cio, como a do poeta campineiro Guilherme de Almeida. Na edição de 26 de novembro de 1967, o “Diário do Povo” publicou depoimento do poeta a respeito. Assim ele se referiu ao Palácio dos Azulejos e à possibilidade de sua demolição: “Era aquela nobre mansão, exatamente aquele que há quase vinte anos eu evocara e invocara nos meus ar gos do Diário de S. Paulo, como modelo perfeito da nossa melhor arquitetura monárquica, no qual se instalou a Prefeitura Municipal de Campinas, e hoje secundo me informam ("horresco referens") as picaretas oficiais estão querendo trabalhar, digo "trebelhar". Será possível?... Não posso crer. Campinense, por mercê de Deus, embora, distante, estou presente aí, mercê do meu sangue, do meu pensamento e da minha fé, ao lado de vocês, para o que der e vier. "Campinas é bom pra nascer" — dizia o meu velho parente Rafael 57
Duarte. Tinha razão. Tão bom mesmo que, onde, porque, como e "quando quer que seja, sempre ao inimigo soube dizer "Não". E o dirá desta vez também''. E realmente a resistência “às picaretas” de que fala Guilherme de Almeida foi necessária, porque o governo municipal chegou a manifestar a intenção de lutar judicialmente pela anulação do tombamento pelo órgão federal. Sucessor de Ruy Novaes, e tomando posse a 31 de janeiro de 1969, Orestes Quércia estava imbuído dessa determinação, conforme divulgou o jornal “Diário do Povo”, na edição de 13 de fevereiro de 1970. Sob o tulo “Prefeitura tentará anulação de tombamento”, o jornal informava: “A Prefeitura vai tentar de junto ao tombamento Serviço do Patrimônio Ar s co e Histórico Nacional seja reconsiderado o tombamento do Palácio dos Azulejos, ex.sede de governo municipal. Nesse sen do, a pedido do prefeito Orestes Quércia, o advogado Hélio de Moraes Siqueira, especializado em Direito Administra vo, está estudando o assunto nos seus diversos aspectos, quer legais quer quanto ao mérito. Nestes próximos dias um relatório será encaminhado ao chefe do Execu vo, para sua apreciação e medidas posteriores. O advogado Hélio de Moraes Si. queira já está de posse de várias cer dões
extraídas do processo que deu origem ao tombamento, as quais estão sendo examinadas. Como se sabe, deu origem à medida tomada pelo SPAHN sugestão feita pelo ex-vereador Eder Leme que argumentou, através de requerimento apresentado à Câmara, as condições históricas do Palácio dos Azulejos. CONSEQÜÊNCIAS - Como conseqüência do tombamento, em uma área que circunda o Palácio dos Azulejos está proibida a construção de edi cios de altura superior à an ga sede da Prefeitura. Essa área compreende todos os quarteirões que circundam o ex.Paço Municipal. Assim, muitos par culares que têm terrenos no zoneamento estabelecido estão sendo prejudicados coma desvalorização automá ca de suas propriedades e também impedidos de construir prédios com vários pavimentos. No caso está o Banco do Estado de São Paulo que tem projetada a construção de um edi cio de 20 andares na avenida Francisco Glicério esquina de Ferreira Penteado. Segundo o dr. Hélio de Moraes Siqueira os estudos por ele feitos estão analisando igualmente a restrição que se impes ao direito de propriedade”. Em um tom francamente simpá co à intenção do Execu vo Municipal, a no cia do “Diário do Povo” concluía: “Argumenta-se
contra o tombamento, que o prédio do Palácio dos Azulejos no decorrer destes úl mos anos sofreu várias reformas em seu interior a que lhe rou toda a caracterís ca histórica. Pisos foram trocados, paredes foram abertas, telhados foi trocado e mais uma série de modificações foram introduzidas, não com o fim de restauração mas de reforma pura e simples”. O empenho da Prefeitura mo vou uma forte reação da sociedade civil campineira. Uma das organizações que se manifestaram foi a Sociedade Campineira de Artes, Cultura e Ensino. Em carta datada de 20 de fevereiro de 1970, a diretoria da Sociedade encaminhou seus argumentos aos membros do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Ar s co e Turís co do Estado de São Paulo. Na carta, os dirigentes da Sociedade pedem aos membros do Condephaat “no sen do de interferir, a quem de direito, para que não se obje ve a ameaça de destombamento, formulada por interessados que não sabem dar valor às tradições da história e aos an gos patrimônios que cons tuem o remanescente da cidade, esta lande de Barreto Leme”. O documento é assinado pelo presidente da ins tuição, Ataliba Amadeu Sevá, e pelo secretário, João Ba sta de Sá. A polêmica prosseguiu, com fortes pressões
pelo destombamento, de setores interessados em construir novos edi cios na região central, e por outro lado com a resistência por parte de historiadores, alguns jornalistas, outros profissionais e organizações da sociedade civil.
Tombamento pelo órgão estadual O movimento favorável à preservação do Palácio dos Azulejos tornou-se mais fortalecido, com a abertura do Processo 17270/70, solicitando autorização dos membros do Condephaat “obje vando firmar convênio, com a Diretoria do Patrimônio Histórico e Ar s co Nacional, evitando o destombamento do edi cio conhecido como "Palácio dos Azulejos", em Campinas”. Diz um documento do Processo: “O Processo de 28 de fevereiro de 1970, da Presidência do CONDEPHAAT, para o estudo da conveniência de ser firmado um CONVÊNIO com o Ins tuto do Patrimônio Histórico e Ar s co Nacional (IPHAN) (capítulo IV, art.28 do Decreto de 19 de dezembro de 1969), visando uma ação conjunta impedi va do DESTOMBAMENTO do "PALÁCIO DOS AZULEJOS. Em 25 de maio de 1972, es veram presentes ao gabinete do Prefeito Municipal de Campinas, Arnaldo D'Ávila Florence, do 59
Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Ar s co, Arqueológico e Turís co do Estado; Paulo Silveira Santos, do Serviço de Museus Históricos do Estado; e Celso Maria de Mello Pupo, respondendo pela direção do Museu Histórico e Pedagógico Campos Sales. Exposto pelo primeiro o obje vo da visita que era reafirmar a impossibilidade de cancelar-se o tombamento do Palácio dos Azulejos em Campinas, era a sua restauração e conservação, e a reunião nele, mediante convênio, dos museus históricos da cidade, foi a exposição ouvida com interesse pelo Prefeito Orestes Quércia. Afirmou o Prefeito que desocupara, pela metade do ano, o Palácio, ficando o mesmo para ser restaurado, para o que, entretanto, não dispõe a Prefeitura da verba necessária. Não podendo o Estado fazer obras em prédio alheio, sugeriu o Conselheiro Arnaldo D'Ávila Florence a doação do Palácio ao Estado, no que encontrou o Prefeito impossibilidades. Por Celso Maria de Mello Pupo foi lembrada a fórmula de permuta, com a qual concordou o Prefeito, manifestando muito interesse por área de terras na Fazenda Santa Elisa, propriedade do Estado. Nestas bases, e depois de longa e detalhada conversação, resolveram os presentes a con nuidade dos entendimentos, ficando escolhido para a ligação entre os poderes estadual e
municipal, Celso Maria de Mello Pupo que recebeu, desde logo, do Prefeito Municipal, a incumbência de ter entendimentos com o secretário municipal de Educação e cultura”. A reunião com a presença de representante do Condephaat gerou uma reação nos setores favoráveis à demolição do Palácio dos Azulejos. Na sessão de 29 de maio, vários vereadores se manifestaram nesse sen do na sessão da Câmara Municipal, como informou o Correio Popular na edição do dia seguinte, na reportagem “Vereadores pedem derrubada do Palácio dos Azulejos”. A reportagem informava que “O destombamento do Palácio dos Azulejos, com a sua posterior derrubada, a fim de possibilitar a construção., no local, de uma ampla e moderna praça pública, foi reclamada ontem, na Câmara Municipal, pelo vereador Lindenberg da Silva Pereira (ARENA) que recebeu apartes favoráveis de vários colegas. O orador disse que o velho edi cio, onde, por muitos anos, funcionou a Prefeitura se encontra em situação precária, caindo aos pedaços, exigindo mesmo uma imediata vistoria para salvaguardar a integridade sica dos funcionários que ali trabalham, pertencentes ao Departamento de Águas e Esgotos. Teceu considerações sobre o assunto afirmando que a instalação do Museu Histórico naquele local exigiria o
dispêndio de uma fabulosa importância em reforma, sendo muito mais lógico a derrubada do prédio e o aproveitamento da área para a construção de uma praça, melhorando consideravelmente o aspecto central da cidade. Os vereadores que se manifestaram a respeito — inclusive o presidente Natal Gale — apoiaram o orador e foram unanimes em defender a instalação do Museu Histórico no prédio da Delegacia Seccional de Polícia — uma bela construção de Ramos de Azevedo — o que será possível com a permuta em estudos, com uma área na praça Corrêa de Melo onde seria construído o novo prédio da Delegacia. Um apelo foi formulado ao prefeito Orestes Quércia no sen do de que consiga o destombamento do Palácio dos Azulejos pelo Patrimônio Histórico e Ar s co, a fim de que possa ser demolido, pois nas condições atuais nem ao menos oferece requisitos de segurança aos que nele trabalham”. A manifestação dos vereadores, refle ndo a opinião dos favoráveis à demolição, não passou desapercebida no Condephaat. No dia 13 de junho de 1972, o secretárioexecu vo do Condephaat, Ruy de Azevedo Marques, encaminhou o cio ao professor Luiz Saia, chefe do 4º Distrito do Iphan, solicitando cer dão do tombamento do Palácio dos Azulejos, “para cumprimento da
legislação aplicável à espécie”. Depois de vários procedimentos técnicos, o tombamento pelo Iphan foi então inscrito no Livro Tombo pelo Condephaat. No dia 25 de março de 1981, o Condephaat decidiu pelo tombamento Ex-Officio do Palácio dos Azulejos, no âmbito do Processo nº 17270/70. A inscrição na página 27 do Livro Tombo aconteceu a 22 de dezembro de 1981, sob o número 147. A par r daí, teve início o processo de regulamentação das Áreas Envoltórias do Palácio dos Azulejos e Catedral de Campinas. Esse trabalho foi aprovado por unanimidade a 9 de junho de 1986, em sessão ordinária do Condephaat, de acordo com a Ata 717. A regulamentação foi encaminhada à Prefeitura Municipal de Campinas. Com o tombamento em esferas federal e estadual, estava finalmente garan da a proteção do Palácio dos Azulejos. As manifestações pela sua demolição nham cessado. Faltava o tombamento em nível local.
Tombamento pelo Condepacc O tombamento na esfera local, em caráter Ex-Officio, veio logo em seguida à regulamentação da Área Envoltória do Palácio dos Azulejos e Catedral. A medida foi 63
tomada pela Resolução número 001 do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (Condepacc), de 19 de dezembro de 1988, que incluiu o tombamento de outros bens de interesse cultural, histórico, arquitetônico e ambiental, como o Solar do Visconde de Indaiatuba na rua Barão de Jaguara, o Solar do Barão de Itapura (campus centro da PUC-Campinas) na rua Marechal Deodoro e a própria Catedral Metropolitana. A mesma resolução do Condepacc, assinada pelo secretário municipal de Cultura, Antônio Augusto Arantes, indica que “o Centro Histórico de Campinas, a que se refere o "caput" deste ar go, fica delimitado pela poligonal que começa no início da Rua Major Solon, segue por esta rua até a Av. Anchieta, deflete à direita e segue por esta avenida até encontrar a Rua Irmã Serafina, segue por esta rua até encontrar a Av. Dr. Moraes Sales, deflete à direita e segue por esta avenida até encontrar a Rua José de Alencar, deflete à direita e segue por esta rua até encontrar a Rua Ferreira Penteado, deflete à direita e segue por esta rua até encontrar a Rua José Paulino, deflete à esquerda e segue por esta rua até encontrar a Av. Benjamin Constant, deflete à direita e segue por esta avenida até encontrar a Av. Francisco Glicério, deflete à esquerda e segue por esta avenida até
encontrar a Rua Isolete Augusta de Souza Aranha, deflete à direita e segue por esta rua até a divisa do imóvel nº 710 com os da Pon cia Universidade Católica de Campinas, segue por esta divisa até a divisa do imóvel nº 415 com o imóvel nº 407 que faz frente para a Rua Sacramento, segue por esta divisa em linha reta até alcançar a Rua 14 de Dezembro, segue por esta rua até encontrar a Rua Dr. Quirino, deflete à esquerda e segue por esta Rua até encontrar a Rua Major Solon, ponto inicial deste perímetro” A resolução lista ainda vários imóveis que não poderiam ser demolidos ou modificados sem a autorização prévia do Condepacc e assinala que “Toda a área definida como Centro Histórico de Campinas deverá passar por um processo de recuperação, revitalização e planejamento visual para que se permita o seu reconhecimento e ambientação enquanto centro histórico e para garan r visibilidade adequada aos imóveis preservados por esta Resolução”. Os termos da Resolução número 001/1988 do Condepacc deixam claro que a preservação do Palácio dos Azulejos, assegurada por tombamento nas três esferas, federal, estadual e municipal, e fruto de um movimento histórico de resistência envolvendo diversos protagonistas, foi fundamental para todo o processo de
valorização do Centro Histórico de Campinas. Todos os esforços pela proteção dos bens históricos localizados nessa região passariam necessariamente pela conservação do an go Solar do Barão de Ita ba. Permanecia o desafio de seu restauro e novos movimentos seriam exigidos para que isso acontecesse nos anos seguintes. Os desafios aumentaram depois que intervenções arquitetônicas incompletas, entre 1998 e 2000, resultaram em muitas avarias no edi cio. Era preciso um prefeito visionário para o resgate da relevância do Palácio dos Azulejos e foi isso o que aconteceu.
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FOTO LUIZ GRANZOTO
CAPÍTULO V Os planos de “Juscelininho” para o Palácio dos Azulejos arquiteto Antônio da Costa Santos foi consagrado prefeito de Campinas, nas eleições municipais de 2000, como uma grande esperança para a cidade que estava prestes a iniciar um novo século. Filho de um português, Joaquim da Costa Santos, que se estabeleceu na cidade e se tornou industrial na área de alimentação, Toninho, como era conhecido, foi um campineiro que amava o lugar onde nasceu. A arquitetura foi um caminho natural, para um apaixonado por história, construções an gas e paisagens. Toninho formou-se pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) em 1974 e no ano seguinte já se radicou novamente em Campinas, com escritório
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próprio e admi do como professor assistente na PUC-Campinas, no recém-criado curso de Arquitetura e Urbanismo. Desde o início da carreira se dedicou a projetos sociais. Já em 1975, ano em que o pai faleceu, contribuiu com o projeto do Centro Comunitário ligado à Paróquia São João Vianney Cura D´Ars, no Jardim São Gabriel, construído em regime de mu rão. Naquela época, a Igreja Católica vivia a efervescência das comunidades eclesiais de base (CEBs) e movimentos populares de contestação ao regime militar. A oposição à ditadura crescia no país, sobretudo após a morte, naquele mesmo ano de 1975, do jornalista Vladimir Herzog, assassinado nas dependências do DOI-CODI em São Paulo. Em Campinas, além da contestação do regime, os movimentos sociais nham uma agenda própria, par cularmente nas áreas da saúde e da moradia. No campo da saúde, jovens médicos formados pela Unicamp, com as ideias do professor Sergio Arouca, nham
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ido à periferia instalar e operar Centros de Saúde com uma metodologia par cipa va. Na esfera da habitação, era o momento do crescimento das favelas, em um período de explosão populacional em Campinas, que recebia migrantes de várias partes do país. Neste cenário cresceu e evoluiu a Assembleia do Povo, uma forma de organização popular que reunia representantes de vários bairros. Esse contexto turbulento e rico em mobilização social foi determinante para a formação polí ca e ideológica de Toninho, que par ciparia na década de 1980 da fundação e estruturação do Par do dos Trabalhadores em Campinas. Em 1985, foi o idealizador do grupo Febre Amarela, criado para a defesa do patrimônio ar s co e cultural da cidade pela qual o arquiteto era cada vez mais apaixonado. As ações do Febre Amarela veram enorme influência na criação em 17 de dezembro de 1987, pela Lei Municipal nº 5.885, assinada pelo prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico e Ar s co de Campinas, depois Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (Condepacc). Assim, a trajetória de Toninho foi toda marcada por engajamento em projetos sociais e, ao mesmo tempo, na defesa do
patrimônio ar s co e arquitetônico de Campinas. Foi com essa marca que, eleito prefeito de Campinas, se empenhou especialmente na proteção do Palácio dos Azulejos, localizado no coração da cidade que tanto amava.
Projetos de “Juscelininho” Logo que foi eleito, Toninho levou para o Palácio dos Azulejos as reuniões do Orçamento Par cipa vo (OP), na época uma das principais bandeiras do Par do dos Trabalhadores. Medida que obviamente reflete os impactos da fase de formação do novo chefe do Execu vo Municipal. Além disso, Toninho anunciou que iria transferir o seu gabinete para o Palácio dos Azulejos, que seria devidamente restaurado. Ele se empenhou, então, por buscar apoios para o restauro, por meio da Lei Rouanet de Incen vo à Cultura. Com esse obje vo, teve muitos contatos com a Associação Comercial e Industrial de Campinas (ACIC), visando garan r o apoio da ins tuição e sensibilizar eventuais empresários interessados em contribuir com o restauro do prédio histórico. E de fato a ACIC assumiu o compromisso com o restauro. Como não pôde assinar o projeto, se empenhou junto ao Clube de Diretores
Lojistas (CDL), que se tornou o proponente para o Ministério da Cultura. A assinatura do projeto, no próprio Palácio dos Azulejos, com a par cipação do presidente da ACIC, Mario Dino Gadioli, ainda contou com a presença de Toninho, que no entanto não veria a sua aprovação, nos termos da Lei Rouanet, o que aconteceria em novembro de 2001. Antes, no dia 10 de setembro, Toninho foi assassinado quando se dirigia da Prefeitura para a sua casa. As circunstâncias do crime nunca foram devidamente esclarecidas. A cidade entrou em estado de choque com a no cia. Foi um dia antes da comoção mundial com os atentados em Nova York, a 11 de setembro de 2001, que derrubaram o World Trade Center. Estava interrompido um dos grandes projetos de Toninho, que era o de transformar o Palácio dos Azulejos, devidamente restaurado, como um vér ce de um projeto maior, de requalificação da região central de Campinas. Ele acreditava que, com a nova ocupação do an go solar do Barão de Ita ba, toda a área do Centro próxima à residência, principalmente, poderia ser beneficiada com novos inves mentos. Com a devida jus ça, em 2002 o edi cio passou a ser denominado Palácio dos
Azulejos Antônio da Costa Santos. O reconhecimento a quem teve a ousadia e visão sobre a importância do edi cio para a historia social e cultural da cidade. Em seu curto mandato, Toninho tomou decisões importantes. Uma delas, relacionada a uma de suas preocupações, a questão ambiental. A 7 de junho, assinou a Lei Municipal nº 10.850, regulamentando a APA de Sousas e Joaquim Egídio.
Teatro de Ópera Um dos grandes projetos pensados por Toninho, nesse sen do, era o de construção nas proximidades de um Teatro de Ópera. O tão sonhado teatro para Campinas, cidade que no século 20 assis u, estarrecida, à demolição de dois deles, os históricos Teatro São Carlos e o Teatro Carlos Gomes. Ambos localizados a poucas quadras do Palácio dos Azulejos. Localizado ao lado da Catedral de Nossa Senhora da Conceição, que ainda estava em construção, o Teatro São Carlos foi inaugurado em 1850, como um dos símbolos da aristocracia cafeeira que ganhava crescente poder polí co e econômico. Em 1846, foi cons tuída a Associação Campineira de Theatro São Carlos, criada com o propósito de viabilizar a construção do 69
edi cio. O seu nome é explicado porque Campinas, entre 1797 e 1842, teve o nome de Vila de São Carlos, o segundo nome da localidade, depois de Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas do Ma o Grosso, fundada a 14 de julho de 1774. O Teatro São Carlos deixou suas marcas na história cultural local. A sua primeira orquestra foi dirigida por José Pedro de Sant´Anna Gomes, irmão do compositor e maestro Antônio Carlos Gomes, o Tonico de Campinas. Entre os grandes nomes da área ar s ca que es veram no palco do Teatro São Carlos esteve a francesa Sara Berhanrdt. Em 1922, o ano da Semana de Arte Moderna, o Teatro São Carlos foi demolido. O prefeito Raphael Duarte era par dário da tese de que o teatro era muito an go e deveria ser demolido para a construção de um novo, o que de fato ocorreu. No mesmo lugar foi erguido o Teatro Municipal Carlos Gomes, que por quatro décadas foi o principal endereço ar s co da cidade, até sua demolição, em 1965. Desta vez o argumento era o de que estava deteriorado e que suas estruturas danificadas representavam uma ameaça para os cidadãos. Assim Campinas perdeu dois teatros, o que sempre representou um trauma para a
cidade. Desde a demolição do Carlos Gomes, o anseio de construção de um grande teatro sempre esteve presente na agenda local. Novos espaços surgiram, como o teatro de arena e o teatro interno do Centro de Convivência Cultural, inaugurado em 1976, com projeto do arquiteto Fabio Penteado, e o Teatro Municipal Castro Mendes, instalado nas dependências do an go Cine Casablanca, na Vila Industrial, e inaugurado antes, em 1970. Também apareceram as salas de teatro em shopping centers. Contudo, o sonho de um grande teatro permaneceu. Pois o prefeito Antônio da Costa Santos, o arquiteto Toninho, também nutria o desejo de promover a construção de um novo e adequado teatro durante a sua gestão, e ele projetava o edi cio para uma área ao lado justamente do Palácio dos Azulejos. Mais especificamente, o novo teatro de ópera, com capacidade para 1.400 pessoas e que teria instalações mul uso, seria localizado onde estava situado um terminal de ônibus, entre o Palácio dos Azulejos, a avenida Moraes Salles e as ruas Regente Feijó e José Paulino. Como um possível responsável pela assinatura do projeto, Toninho procurou ninguém menos que Oscar Niemeyer, o maior nome da arquitetura brasileira. Conhecendo os sonhos do prefeito para sua cidade, que
eram os de uma verdadeira renascença, Niemeyer o ba zou carinhosamente de “Juscelininho”, uma referência e tributo ao presidente Juscelino Kubitscheck. Aquele que queria ver o Brasil crescendo “50 anos em 5”. Niemeyer tem uma relação an ga com Campinas. Ele assinou o projeto de um dos prédios mais peculiares da cidade, o Edi cio Ita aia, localizado na Praça Carlos Gomes, na região central. Inaugurado em 1957, o Edi cio Ita aia tem muitas semelhanças com o Copan, também projetado por Niemeyer, em São Paulo. Único projeto de Niemeyer em Campinas, o prédio foi tombado em 2011 pelo Condepacc. O tombamento considerou sua relevância histórica e a observação, em sua edificação, dos conceitos defendidos pelo franco-suíço Le Corbusier (1887-1965). Entre esses conceitos, o dos pilo s, pilares que sustentam o prédio para que seja permi da a livre circulação sob o edi cio. Certamente Niemeyer considerou essa sua passagem por Campinas, quando ainda estava iniciando sua carreira de sucesso mundial, quando conheceu as ideias de Antônio da Costa Santos. Inspirado pelo entusiasmo de Toninho, o autor da Igreja da Pampulha, em Belo Horizonte (MG), e o Memorial da América
La na, em São Paulo (SP), entre outros marcos arquitetônicos, formulou então um projeto de teatro construído com estrutura piramidal, com lados em curva. “O estacionamento seria subterrâneo. Um elevador levaria os visitantes a um foyer que daria acesso ao teatro e a uma galeria para múl plas exposições”, destaca um dos trechos do ar go “Juscelininho queria um teatro novo. O mago Niemeyer rou o projeto da cartola”, assinado por José Pedro Mar ns e publicado na edição de 14 de julho de 2002 no “Correio Popular”. Toninho não conheceu, entretanto, a forma final do projeto, nem sua maquete, que passou a figurar no escritório de Niemeyer no Rio de Janeiro. Os dois teriam uma reunião em Campinas no dia 13 de setembro de 2001. O encontro foi acertado na manhã do fa dico dia 10 de setembro. No início da noite, quando retornava para casa, e depois de passar rapidamente em um shopping center, Toninho foi morto e, com ele, abortados muitos sonhos para a região central de Campinas, tendo o Palácio dos Azulejos restaurado como um dos principais fundamentos. O projeto do Teatro de Ópera assinado por Niemeyer foi entregue no início de 2002. Na sessão de 28 de março de 2002, os conselheiros do Condepacc examinaram um 71
projeto de revitalização do centro de Campinas, apresentado pelo secretário municipal de Planejamento e Desenvolvimento Urbano, Araken Mar nho. No dia 23 de agosto de 2002, por meio da Portaria n0 485, o projeto de restauração do Palácio dos Azulejos é aprovado pelo Ministério da Cultura. As inscrições para interessados no restauro do edi cio foram anunciadas pelo Diário Oficial do Município na edição de 9 de janeiro de 2003. A proposta vencedora foi do Estúdio Sarasá, credenciado pelo Iphan e responsável pelo restauro da Pinacoteca do Estado e do Forte São João de Ber oga, entre outros. As obras da primeira parte do restauro começaram a 6 de outubro de 2003. Essa etapa foi concluída em 15 de setembro de 2004, com a reabertura oficial do Palácio para visitação pública e acesso ao MIS. O restauro teve a coordenação do arquiteto e ar sta plás co Marco do Valle. Assim a primeira parte do restauro do Palácio dos Azulejos, um dos sonhos do prefeito Toninho, efe vamente aconteceu, com o apoio da Petrobrás e intermediação da ACIC e Clube dos Diretores Lojistas. Mas o an go solar do Barão de Ita ba ainda demanda muitas intervenções, para que o restauro completo se concre ze, como sonhava Antônio da Costa Santos, o prefeito arquiteto de Campinas.
CAPÍTULO VI MIS | Museu da Imagem e do Som s cenas foram no mínimo insólitas, naquelas noites de 14 e 15 de abril de 2016. Vários ar stas da Família Burg, tradicional grupo circense de Campinas, e também da Dupla Companhia, trajando roupas de época e apresentando o texto da comédia fantasmagórica “Campignólia” pelos vários e imensos aposentos do Palácio dos Azulejos, no centro da cidade. O roteiro contemplava a história do Barão Despenteado que, para agradar a esposa Magnólia, queria reba zar Campinas como “Campignólia”. Além do casal protagonista, outras figuras desfilavam pelo casarão, em uma comédia próxima do borlesco e com muita sá ra à sociedade campineira do final do século 19, quando o café fazia a riqueza
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local e a elite aspirava tornar a cidade uma réplica europeia em pleno calor tropical. O texto era entremeado com citações de lendas campineiras, como a história muito conhecida do Boi Falô, pica do Distrito de Barão Geraldo. Reza a lenda que um boi, não aceitando trabalhar em dia santo, explicou o mo vo da recusa ao proprietário. Claro, o Barão Despenteado é uma clara referência a Joaquim Ferreira Penteado, o Barão de Ita ba, o proprietário original do Palácio dos Azulejos. Uma licença poé ca para, brincando-se, resgatar um tempo importante para a histórica de Campinas. “Magnólia” foi um exemplo emblemá co da ressignificação do Palácio dos Azulejos depois que o casarão foi ocupado por órgãos ligados à Secretaria Municipal de Cultura, em 1996: o Museu da Imagem e do Som, o Arquivo Histórico de Campinas e a Coordenadoria Setorial do Patrimônio Cultural, órgão técnico do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas
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(Condepacc). Essa reocupação do casarão, que já havia sediado o Paço Municipal e a Sanasa, por órgãos do setor cultural reafirma, na prá ca, a vocação do espaço como um dos mais significa vos bens patrimoniais, materiais e imateriais, da história de Campinas. Desde o primeiro momento em que, em meados da década de 1950, se cogitou a transferência do Paço Municipal para outro local, pois o casarão não comportava mais as diversas instâncias da Prefeitura e da Câmara Municipal, estava ní da a tendência de transformação do Palácio dos Azulejos em um território privilegiado para as diferentes linguagens ar s cas.
Museu da Cidade Em um primeiro momento, como se viu, falou-se muito na transformação do Palácio dos Azulejos, após a transferência do Paço Municipal, em sede do pretendido Museu Histórico Cidade de Campinas. Este desejo de vários intelectuais e organizações não se concre zou, mas a vocação para receber órgãos da Cultura prosseguiu e finalmente, com a mudança da Sanasa para a avenida da Saudade, em julho de 1996 o Palácio dos Azulejos passou a
sediar órgãos das Secretaria Municipal de Cultura: Arquivo Histórico, Coordenadoria do Patrimônio Cultural (CSPC) e Museu da Imagem e do Som. De modo muito expressivo, portanto, entre eles estava o Arquivo Histórico de Campinas. O Arquivo contempla um acervo de milhares de documentos, com vários aspectos relevantes da história local. Uma fonte inesgotável para historiadores, acadêmicos e pesquisadores de várias áreas. Com o tempo, um dos segmentos mais preciosos desse Arquivo, o das coleções fotográficas, passou a ser ligado diretamente ao Museu da Imagem e do Som de Campinas, também instalado no Palácio dos Azulejos. As coleções sob a guarda do acervo fotográfico do MIS Campinas são constantemente procuradas por historiadores, jornalistas e pesquisadores em geral, para compor teses de mestrado e doutorado e outras finalidades. De certa forma, é um resgate da vocação do Palácio dos Azulejos para recepcionar “um centro de estudos e inves gações, um relicário de preciosidades, de documentos, de reconstruções, de registros, que permi ssem compor um relato histórico de Campinas”, como previsto no relatório da Comissão que estudou a criação do Museu
Histórico Cidade de Campinas.
O Museu da Imagem e do Som A instalação do Museu da Imagem e do Som, em 1996, representou o passo defini vo para a ressignificação do Palácio dos Azulejos como território privilegiado para recursos de preservação da memória da cidade, de forma simultânea com a vocação campineira para a inovação, para a criação do novo. Como muitos outros grandes eventos na área da cultura da cidade, o MIS-Campinas nasceu depois de muita luta de ar stas e intelectuais. No caso, o Museu da Imagem e do Som era o sonho de um movimento liderado por Dayz Peixoto Fonseca e Henrique de Oliveira Júnior, um nome fundamental na história do cinema na cidade. Nascido em Valinhos, a 13 de setembro de 1920, Oliveira Júnior teve uma paixão precoce pelo mundo das imagens. Com a mudança da família para Campinas, quando ele nha cinco anos, logo o menino passou a assis r e se encantar com os filmes no Cine Coliseu. Aos oito anos, o futuro cineasta ganhou uma máquina fotográfica dos irmãos. Logo aprendeu a projetar filmes e em 1939 já estava exibindo as mais recentes produções
do cinema em Sousas, onde montou o Cine Santo Antônio, no espaço onde depois funcionaria a Sociedade Italiana Lavoro e Progresso. Autodidata, Oliveira Júnior fez com as próprias mãos várias máquinas de filmagem e projeção. Em 1952 rodou “Lição Merecida” em Valinhos. Seriam mais de 80 filmes no currículo, que inclui a criação de vários cineclubes e o protagonismo no movimento que resultou na criação do MIS-Campinas. A oficialização aconteceu com a edição da Lei Municipal 4.576/1975, de 30 de dezembro de 1975, que criou a Secretaria Municipal de Cultura. Até então a Cultura era uma diretoria da Secretaria Municipal de Educação. A Lei 4.576 contemplou os setores que comporiam a Secretaria, incluindo a Orquestra Sinfônica Municipal, o Museu de Arte Contemporânea, os Serviços de Museus Históricos, de Bibliotecas e Patrimônio Histórico e Cultural e o Museu da Imagem e do Som, entre outros. Com grande jus ça, os primeiros diretores do MIS foram os líderes do movimento que resultou na sua criação, Henrique de Oliveira Júnior, de 1975 a 1979, e Dayz Peixoto Fonseca, de 1979 a 1987. Os diretores seguintes seriam 1987 – 1989: Carlos Rafael Vasconcellos (1987-1989), Suzana Barre o
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Ribeiro (1989-1990), Orestes Augusto Toledo (1991-1993), Sônia Aparecida Fardin (19942001), Maria do Carmo Cassaniga (20012002), Adriana Verri Maciel (2002-2015) e, desde 2015, Alexandre Sônego de Carvalho. Antes de chegar ao Palácio dos Azulejos o MIS-Campinas teve outros endereços. Entre a criação e 1976 esteve provisoriamente no subsolo do Palácio dos Jequi bás, portanto no novo Paço Municipal. De 1976 a 1991 funcionou no Centro de Convivência Cultural, no bairro Cambuí. Concomitantemente, e até 1987, sessões do Cinema de Arte vinculado ao MIS aconteceram no Teatro Castro Mendes, na Vila Industrial. Entre 1991 e 1994 a sede do MIS funcionou em endereços das ruas Regente Feijó e Cesar Bierrenbach, no centro histórico, e depois no Casarão do Lago do Café, no Taquaral. Em 1996, finalmente o MIS chegou com toda a sua estrutura ao Palácio dos Azulejos. A sua reabertura, agora ocupando todo espaço do edi cio, aconteceu no dia 15 de setembro de 2004, com a entrega do restauro. O Museu responsável pela guarda da imagem e som de Campinas, a poucos metros de onde funcionou, na an ga rua do Pór co e atual rua Ferreira Penteado, a redação do primeiro jornal de Campinas, que funcionou com uma impressora que nha sido de propriedade do “pai da fotografia”, Hércules
Florence. O Palácio dos Azulejos não está muito longe, igualmente, da Basílica do Carmo, a sucessora da Igreja de Santa Cruz que teve como pároco, em 1896, o padre Roberto Landell de Moura, para muitos pesquisadores o verdadeiro “pai do rádio”. Landell de Moura fez experiências pioneiras em transmissão de rádio, anteriores às realizadas por Guglielmo Marconi, em Pontechio, na cidade de Bolonha, em 1895. Como se sabe, Marconi é considerado o “pai do rádio”, embora os registros históricos deem conta da primazia do padre brasileiro. Marconi obteve uma patente sobre seu invento, anterior à patente ob da pelo brasileiro, em 1900. Imagem e som não faltam na trajetória do MIS-Campinas. Seu enorme acervo reúne milhares de itens. Apenas o arquivo de fotografias reúne mais de 75.000 imagens, do século 19 aos dias atuais. São dezenas de coleções, frutos do trabalho de uma vida de pesquisadores, historiadores, fotógrafos e outros profissionais, como Roberto De Biasi e Maria Luiza Pinto de Moura, durante muitos anos responsável pelos arquivos do Centro de Ciências, Letras e Artes. O acervo musical, denominado Discoteca Rynaldo Ciasca, também é composto por milhares de discos em vinil, CDs, gravações em rolo e outras tecnologias, cobrindo todos
os gêneros musicais. O acerto do MISCampinas abrange, ainda, centenas de equipamentos ligados a imagem e som espelhando as mudanças tecnológicas através dos tempos, como aparelhos de televisão, gramofones, câmeras e projetores cinematográficos. A agenda do MIS-Campinas é diversificada. São palestras, debates, seminários, workshops sobre temas diversos. A a vidade cineclubista sempre foi um ponto forte da programação. Mesmo durante a pandemia de Covid-19, essas a vidades não foram paralisadas, com o funcionamento do Cineclube Remoto. A primeira sessão do Cineclube Remoto aconteceu no dia 24 de junho de 2020, às 20 horas, com a exibição pela plataforma Meet Google da animação “O Burrico e o Bem-TeVi”, de Maurício Squarisi. Como sempre ocorre nas a vidades de cinema promovidas pelo Museu, a exibição foi seguida de debate com a par cipação da pesquisadora de cinema e professora colabora va na Unicamp, Claudia Amoroso Bortolato; Lara Ziggia Monteiro, violoncelista da Sinfônica de Campinas, Sinfônica da Unicamp, do Quarteto Darcos e diretora do Conservatório Carlos Gomes; e Maurício Squarisi, cineasta e cofundador do Núcleo de Cinema de Animação de Campinas, que sempre realizou
muitos eventos no MIS-Campinas. Exposições de fotografia e outras mídias são também uma constante na trajetória do MISCampinas. Exposições permanentes contam a história do próprio Museu e do Palácio dos Azulejos. E as exposições i nerantes ou temporárias valorizam a pluralidade e a diversidade de olhares e gêneros. De modo muito significa vo, refle ndo o olhar atento do MIS e seus gestores para questões emergentes, uma das úl mas a vidades abertas ao público no Palácio dos Azulejos, antes do fechamento imposto pela pandemia, foi a exibição do projeto i nerário “Biosfera – a mul plicidade da vida”. Produzido pela fotógrafa Márcia Nora, a exposição contava com 23 fotografias apresentando múl plas espécies da fauna e da flora. O projeto i nerário já nha percorrido dezenas de cidades do Estado de São Paulo, antes de chegara à Região Metropolitana de Campinas. Segundo a coordenação da mostra, antes de chegar a Campinas a exposição nha sido vista por mais de 100 mil pessoas, cumprindo o obje vo de conscien zar os visitantes sobre a preservação da vida. Como se sabe, a pandemia de Covid-19, por todas as evidências cien ficas, é resultado justamente do desequilíbrio ambiental no planeta e das a tudes permanentes de agressão aos 79
recursos naturais. Desta forma o MIS tem cumprido o seu papel, de proteção da memória audiovisual de Campinas, mas também de espaço para discussões de temas emergentes. É a ressignificação do Palácio dos Azulejos de forma completa. Depois de sede do Paço Municipal e de vários órgãos públicos, território para as múl plas linguagens ar s cas, para os legí mos bens comuns que são as produções culturais. Parte singular da alma de Campinas está no Palácio dos Azulejos.
CONCLUSÕES
Projeções futuras de uso do Palácio dos Azulejos, no cenário de uma cidade sempre em transformação
s desaos para a proteção e conservação do patrimônio histórico em uma cidade de Campinas, que chega a 2021 com mais de 1 milhão de habitantes e como metrópole ocialmente declarada pelo IBGE, não são nada pequenos, muito pelo contrário. Sempre houve e provavelmente haverá um embate entre aqueles que cultivam a memória e identidade de um local, de um povo, e aqueles que, geralmente motivados por interesses políticos mesquinhos e por interesses imobiliários e econômicos, querem o contrário, são partidários de uma suposta “modernização” a qualquer preço. Ainda antes da polêmica sobre o Palácio dos Azulejos, houve uma
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grande controvérsia a respeito envolvendo ninguém menos que a escritora Rachel de Queiroz (19102003). E tudo pelas páginas da revista “O Cruzeiro”, na época um dos principais e mais respeitados veículos de comunicação do país. Na edição de 24 de maio de 1952 da revista, a escritora cearense assinou a crônica “Rumo ao Sul (II)”, parte de um relato de viagem. Nesse texto ela trata especicamente da viagem de São Paulo a Campinas, passando por Jundiaí. Sobre Campinas, ela escreve: “Quem conhece Campinas pela sua fama de progresso e riqueza, por aquele título de Princesa do Oeste – e espera, portanto, no primeiro encontro, deparar com uma cidade violentamente moderna, febril de construções, abrindo ruas às pressas, disputando o primeiro lugar
na corrida das cidades paulistas, tem uma grande surpresa. Campinas é uma dalga consciente dos seus pergaminhos, e não tem preocupações de novo-rico com fachadas e aparências. Mantém caprichosamente os seus casarões do tempo do Imperador (grifo por José Pedro Soares Martins), suas ruas estreitíssimas, seus jardins públicos à moda antiga. Campinas sabe o que vale, Campinas não entra em páreo nenhum. E só isso já é motivo para um caso de amor à primeira vista. Outro motivo é o bosque, chamado dos Jequitibás, oresta emaranhada e linda, rasgada de veredas e recantos, que é o orgulho dos campineiros. E com todo o fundamento. O velho teatro, a velha estação do trem, são mantidos tais como os zeram, no século passado. Ninguém achou necessário derrubá-lo (grifo por José Pedro Soares Martins) construir estação
nova de cimento e vidro; assim sempre foi, assim que está bem. Fora do centro é que a cidade se rasga em amplos planos, constrói casas modernas, ricas, algumas bonitas, adere ao progresso”. A crônica de Rachel de Queiroz calou fundo nos campineiros. Muitos aplausos, pela defesa romântica do ideal conservacionista que ela arma ter identicado na cidade, mas também críticas. A escritora recebeu várias cartas lamentando que ela tenha destacado a Campinas “do passado”, e que não tinha realçado as conquistas da Campinas “moderna, do progresso”. Rachel não teve dúvidas e a 19 de julho de 1952 publicou outra crônica, com o título “Recado para a cidade de Campinas”, comentando as críticas recebidas. A autora do antológico “O Quinze”, de 1930, e de “Memorial de Maria Moura”, de 1992, entre tantos outros livros, não 83
economiza palavras e conclui: “a esses só tenho uma coisa a dizer: vocês não mereciam a honra de ser campineiros...” Controvérsia que soa tão atual, considerando os debates muito recentes sobre vários itens do patrimônio cultural de Campinas. Neste contexto, de conito permanente, a trajetória do Palácio dos Azulejos é um exemplo de vitória da visão conservacionista e preservacionista, apesar de todos os percalços e limitações, é claro. Uma forte e constante movimentação da opinião pública resultou no tombamento do edifício histórico nas esferas federal, estadual e municipal, o que não é muito comum no Brasil. Mas permanecem muitos desaos para a valorização do Palácio dos Azulejos como ele merece. A conclusão e efetiva estruturação de uma sala de cinema à altura, resgatando-se a tradição dos cinemas de arte na região central da cidade, são alguns desses desaos.
A movimentação constante do MIS, mantida mesmo durante a pandemia, indica que o espaço continuará sendo estratégico para abrigar parcela relevante da vocação campineira para a inovação, para a criação do novo. Com múltiplos signicados e camadas de sentido ao longo de sua caminhada, o Palácio dos Azulejos é um espelho, reetindo a contraditória e complexa história campineira. A sua ressignicação é um sinal de esperança de que os pobres de espírito apontados por Rachel de Queiroz não prevalecerão. Pelo contrário, vencerão e brilharão os criativos, solidários e preocupados com a memória da cidade.
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FICHA TÉCNICA Martinho Caires Produtor, coautor e pesquisa José Pedro Soares Martins Coautor e pesquisa Luiz Arkhan Projeto gráfico e editoração Editora PCN Comunicação Aquarela da capa: José de Castro Mendes Fotos: Martinho Caires Imagens históricas e aquarela da capa: Acervo MIS Campinas Projeto realizado com o apoio do Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Cultura e Economia Criativa
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Caires, Martinho Palácio dos Azulejos : cenas de ressignicação e ocupação popular de um prédio histórico em Campinas / Martinho Caires, José Pedro Soares Martins. -- 1. ed. -- Campinas, SP : PCN Comunicação, 2021. Bibliograa. ISBN 978 - 85- 66141- 10- 8 1. Arquitetura - Brasil 2. Palácio dos Azulejos Campinas (SP) - História 3. Patrimônio histórico Conservação e restauração - Campinas (SP) 4. Prédios históricos - Campinas (SP) I. Martins, José Pedro Soares. II. Título. 21- 91877
CDD - 720.288098161 Índices para catálogo sistemático:
1. Palácio dos Azulejos : Prédio histórico : Campinas : São Paulo : Estado : Arquitetura : História 720.288098161 Eliete Marques da Silva
- Bibliotecária
- CRB- 8/9380
Mar nho Caires é Produtor Cultural, Jornalista, escritor, fotógrafo, profissional de Marke ng, professor de fotografia e linguagem visual. Coautor do livro "República de Campinas - Cenas da memória afe va e polí ca da cidade" (Com José Pedro Mar ns, PCN Comunicação 2015). Recebeu em 2018 o Prêmio FEAC de Jornalismo, Categoria Fotojornalismo. Desde o início dos anos 80 constrói seu percurso como fotógrafo autoral, já par cipou de mais de 70 exposições entre individuais e cole vas dentre as quais, MAC de Campinas (prêmio FICC – 2014 e 2015), Itaugaleria de São Paulo, Brasília e Campinas e Galeria de fotografia da Funarte no Rio de Janeiro. Trabalhou em vários veículos de comunicação. Atualmente é sócio da Agência Social de No cias (agenciasn.com.br)
José Pedro Soares Mar ns é jornalista, escritor, pesquisador e produtor de conteúdo, autor de livros em história, meio ambiente, cidadania e cultura. Autor, entre outros tulos, de "Ecologia ou Morte" (FTD, 1987), "Terra Cantata - Uma história da sustentabilidade" (Komedi, 2007), "Campinas, Imagens da História" (Komedi, 2007), "FEAC 50 Anos: Uma história de inovação e solidariedade" (Arte & Escrita, 2014) e "República de Campinas - Cenas da memória afe va e polí ca da cidade" (Com Mar nho Caires, PCN Comunicação, 2015). Recebeu entre outros os prêmios Ethos de Jornalismo (2003), Cidades Iberoamericanas de Paz (2018), Prêmio Jornalista Tropical (2018) e Prêmio ABAG-Ribeirão Preto de Jornalismo (2017 e 2020).