ELO ENTRE RESISTÊNCIA E RESILIÊNCIA. Arquitetura local na Comunidade Remanescente Quilombola da Caçandoca
EVELYN SOUZA DA SILVA
São Paulo, 2023 Orientadores: Prof. Me. Ricardo Carvalho Lima Ramos Profª. Drª. Vera Lucia Domschke
Monografia apresentada à disciplina Trabalho Final de Graduação ll da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como parte dos requisitos para aquisição do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.
EVELYN SOUZA DA SILVA
ELO ENTRE RESISTÊNCIA E RESILIÊNCIA. Arquitetura local na Comunidade Remanescente Quilombola da Caçandoca
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço aos meus pais, Elizabete Souza e José Roberto por todo apoio, motivação, e por sempre acreditarem em mim, além de todo o suporte ao longo da minha trajetória acadêmica. Aos professores, Ricardo Ramos e Vera Domschke, por abraçarem a mim e meu tema, sou grata por todas as trocas e lições aprendidas durante o processo. Agradeço também, o professor Alexandre Martins, por me auxiliar em questões estruturais iniciais do projeto. Agradeço a Neimar Lourenço, líder da Associação da Caçandoca, e a Jurandir Doprado, que também faz parte da liderança, juntamente com os moradores, por me receberem tão bem na
comunidade do quilombo da Caçandoca e por me proporcionarem conversas, passeios e experiências que foram primordiais para o desenvolvimento deste trabalho. Agradeço a Alex Garrido pelas conversas e reflexões que compartilhamos sobre o quilombo. E ao Junior Machado, pela troca e por permitir o uso de suas fotografias para o trabalho. Agradeço a Amanda Duarte por me inspirar com seu trabalho audiovisual sobre a vida quilombola e caiçara e por me apresentar o Robson Fernandes, que faz parte do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), onde se tornou uma pessoa importante no início e ao longo do desenvolvimento deste trabalho por despertar
em mim o interesse de pesquisar mais a fundo todas as praias de Ubatuba, do Norte até o Sul, chegando por fim, no quilombo da Caçandoca. Agradeço a Andrei da Silva pelas conversas que foram de forte combustível para a construção dos projetos propostos. E agradeço a Rodrigo Ohtake, por proporcionar-me a experiência em minha fase de estágio, de entrar em contato com os moradores de uma comunidade local (Heliópolis) com o objetivo de diagnosticar suas demandas e necessidades. Neste processo, pude compreender e presenciar a real importância da participação da comunidade no processo de construção de um projeto. Por fim, sou grata a todos que de alguma forma, direta
ou indiretamente, participaram da realização desse trabalho.
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HERANÇA QUILOMBOLA
O SER HUMANO E A RESILIÊNCIA NA ARQUITETURA
UBATUBA: QUILOMBO DA CAÇANDOCA
2.1 Mudanças climáticas globais
3.1 A formação, desenvolvimento e a colonização do Litoral Norte Paulista e Ubatuba
1.1 Contextualização dos quilombos no Brasil 1.2 Legislação, políticas públicas e o reconhecimento do Estado 1.3 A contribuição das civilizações antigas africanas 1.3.1 A arquitetura contemporânea africana
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2.2 Arquitetura bioclimática para o desenvolvimento sustentável da população
3.2 Ubatuba Hoje 3.3 A territorialidade no Quilombo da Caçandoca 3.4.1 A subjetividade do espaço e o modo de morar na Caçandoca
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ESTUDOS DE CASO
O PROJETO
4.1 Parâmetros de análise 4.2 Comunidade Residencial Benga Riverside 4.3 Pavilion Kalì 4.4 Centro Comunitário de Camburi 4.4.1 Análise comparativa
5.1 Masterplan - Plano de desenvolvimento 5.2 Sistema construtivo 5.2.1 Paredes - tijolo solocimento, de barro comprimido ou ecológico Reafirmar, educar, 5.3 hospedar e comercializar
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
7 REFERÊNCIAS
5.3.1 Espaço voltado para áreas recreativas e de lazer 5.3.2 Escola de ensino médio e fundamental 5.3.3 Centro comunitário 5.3.4 Hospedaria 5.3.5 Mercado local 5.3.5.1 Cooperativa de pesca 5.3.5.2 Píer ancoradouro 5.4 Habitar: As moradias 5.4.1 Moradia unifamiliar 5.4.1.1
Sistema Construtivo e Materialidades
5.4.1.2 Análise de Tipos de Coberturas para o Projeto 5.4.2 Moradia tipologia II
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INTRODUÇÃO O tema deste trabalho abrange uma variedade de programas e projetos arquitetônicos, a partir de um masterplan, para a comunidade do quilombo da Caçandoca, localizada no quilômetro 5,1 da BR-101, na parte sul do município de Ubatuba. Essa comunidade é composta por aproximadamente 50 famílias, que representam uma mistura de quilombolas e caiçaras. A motivação para trabalhar com este tema surgiu de forma pessoal. Desde criança, visito Ubatuba com minha família e tenho um grande afeto pela cidade. Foi lá que tive a oportunidade de conhecer o quilombo da Caçandoca, uma comunidade com uma história e cultura rica e única, que considero extremamente valiosa e digna de estudo e valorização. A proposta e as ideias surgiram a partir do meu envolvimento com a comunidade e de uma visita realizada em 09/10/2022. Durante essa visita, tive a oportunidade de 8
conversar com o presidente da Associação da Caçandoca, chamado Neimar Lourenço, e outros moradores. Através dessas interações, pude compreender a luta pela preservação do território, os conflitos enfrentados e a importância da manutenção e conservação do espaço. Além disso, pude perceber as diversas demandas que a comunidade busca atualmente, como a necessidade de espaços edificados para vivências, aulas práticas, eventos e a busca pela autossuficiência dentro do quilombo. Fiquei impressionada com a forte conexão e integração das pessoas nas relações e atividades da comunidade. A vida em comunidade é valorizada e considerada o elemento mais importante para o grupo. Essa compreensão foi fundamental para a construção do projeto proposto, uma vez que o estilo de vida coletivo é essencial na construção social quilombola. O objetivo deste projeto é atender às demandas da comunidade estudada e utili-
zar a arquitetura bioclimática e a bioconstrução como referências para resgatar as técnicas tradicionais de construção e integrá-las às tecnologias contemporâneas. É importante lembrar que cada comunidade é única e possui suas particularidades. Portanto, ao desenvolver o projeto, é fundamental compreender e respeitar as especificidades da comunidade do quilombo da Caçandoca. O objetivo é evitar a descaracterização e o distanciamento da estética que a identidade e cultura quilombola carregam, valorizando e promovendo a reafirmação do direito à moradia, o modo de habitar e a identidade na arquitetura. Dessa forma, busca-se gerar visibilidade e valorização da cultura local. A importância de estudar esse tema reside na sua relevância na atualidade, especialmente diante das mudanças climáticas. Além disso, as comunidades tradicionais do Brasil, além da Caçandoca, ainda enfrentam os impactos da especulação imobiliária, bem como autoritarismo ambiental e o turismo predatório. Esses fatores prejudicam o processo de reconhecimento
e pertencimento dessas comunidades em seus territórios. No entanto, embora esse tema seja muito relevante em nosso cenário atual conforme apresentado no estudo de Gunter Weimer, Ailton Krenak, Laurentino Gomes e Eduardo Galeano, faz-se necessário ampliar o conhecimento sobre esse tema. Contribuindo não só para as comunidades quilombolas, mas também para tantas outras que também sofrem com o processo de resgatar o fomento da sua identidade e cultura. Para a melhor compreensão da aplicação e estudo do projeto, foi realizado uma breve revisão de literatura sobre a escravidão e a formação social e econômica no Brasil, a construção da identidade quilombola a partir da constituição de 1988, como as mudanças climáticas interferem na arquitetura e o contexto histórico e atual de Ubatuba. Assim, foi realizado uma busca de artigos, livros, dissertações e teses nas bases de dados google acadêmico, publicados entre o ano 1975–2023. Utilizando as palavras chaves: quilombo, comunidade, Caçandoca, Ubatuba, arquitetura. 9
Figura 1 – Morador do quilombo da Caçandoca, navegando no mar pelos arredores do território Fonte: Junior Machado (2018)
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HERANÇA QUILOMBOLA
1.1. CONTEXTUALIZAÇÃO DOS QUILOMBOS NO BRASIL Para entendermos as problemáticas em relação a comunidade estudada, a história dos povos quilombolas, e o termo ‘’quilombo’’ é primordial antes entender as condições que permitiram (ou exigiram) sua formação. Essa história remonta aos primórdios da colonização das Américas e durou quase 400 anos, deixando marcas profundas na sociedade até os dias de hoje que foram conduzidas pelo homem branco europeu, envolvendo 3 continentes: Europa, África e América (GOMES, 2021). A fase expansionista do capitalismo comercial europeu levou portugueses, espanhóis, e outros povos, a criarem um ambicioso projeto de exploração de novas terras 14
e povos fora da Europa, sendo estes especialmente, indígenas e africanos (GOMES, 2021). Formou-se na América tropical uma sociedade agrária na estrutura, escravocrata na técnica de exploração econômica, híbrida de índio – e mais tarde de negro – na composição. Sociedade que se desenvolveria defendida menos pela consciência de raça. Quase nenhuma no português cosmopolita e plástico, do que pelo exclusivismo religioso desdobrado em sistema de profilaxia social e política (FREYRE, 2009, p. 65).
Durante o período XVI ao XIX, o Brasil vive o contexto do trabalho compulsório, com a mão de obra indígena sendo substituída pela africana, e foi a maior nação a importar mão de obra forçada, aonde mais
de 4,9 milhões de africanos foram capturados na costa da África e colocados nos porões dos navios (fig. 2), para assim serem importados ao Brasil, com apenas 4 milhões desembarcados nos três portos principais de entrada da época, que eram Recife, Salvador e Rio de Janeiro, equivalente a 40% dos 12,5 milhões que embarcaram na África (GOMES, 2021), estes,
em 1544 atravessaram o atlântico da forma mais precária e insalubre possível, e foram traficados e pressionados a trabalhar em fazendas, minas, garimpos e a aceitar as novas imposições culturais, religiosas e morais sem questionar. Essa atividade comercial é chamada pela historiografia brasileira de tráfico negreiro, via oceano atlântico.
Figura 2 – Interior de um navio negreiro, pintura do artista alemão Johann Moritz Rugendas (aprox. 1830).
Fonte: https://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2007/06/navio-negreiro.jpg 15
Em relação a esse tipo de comercialização e escravidão de pessoas, Orlando Patterson, define o acontecimento como uma ‘’morte social’’ pois o escravizado é literalmente arrancado e extraviado de seu lar, sua família, suas crenças e suas raízes, com isso, sua identidade se transforma para uma nova totalmente diferente da qual era antes, e esta é regida pelo seu senhor, com o escravo não tendo mais vontade ou escolha própria (PATTERSON, 2011, p. 105 apud GOMES, 2011, p. 254).
Analisando o conceito do autor, podemos dizer que dado as circunstâncias impostas aos cativos, acabou gerando uma nova cultura brasileira, no qual hábitos africanos se misturaram a outros, de raiz europeia ou indígena, e influenciando aspectos do Brasil colonial, como os costumes, religiões, culinária, festas, entre outras questões regionais. Acrescenta-se também que, o regime escravocrata foi causa notória do viés político econômico dessas 2 oligarquias, sendo elas, Portugal
Figura 3 – Pintura feita pelo alemão Johann Moritz Rugendas, onde representa uma cena de desembarque de africanos após a travessia do Atlântico, em 1835. Fonte: https://revistapesquisa. fapesp.br/wp-content/uploads/2021/01/SITE_ChegadaEscravos-1-1140.jpg 16
e Espanha, esse tipo de mercantilismo baseado na exploração foi fundamental para que o sistema econômico da época pudesse existir, alavancando cada vez mais o capitalismo europeu com a ampliação e comercialização da mão de obra escrava, acarretando em um novo sistema econômico mundial, e para garantirem que esse lucro continuasse, foi instaurado o tráfico e a escravização descontrolada de homens e mulheres dentro do Brasil (LEITE, 2017). “O desenvolvimento desenvolve a desigualdade” (GALEANO, 2017, p. 15). A presença forte de africanos no Brasil se deu em muitos lugares quanto a ocupação por colonizadores europeus alcançou, desde os primeiros séculos de colonização, chegando muitas vezes a superar a população de brancos. Atualmente, somos uma das maiores nações com descendentes de africanos do mundo (CARVALHO; LIMA, 2013). Nesse sentido, de acordo com Stanchi (2022), todo esse lucro foi ganho pelos braços dessas pobres pessoas que aravam a terra, semeavam, colhiam, capinavam, moíam,
torravam e faziam outras inúmeras tarefas. Não para si próprios, não para enriquecimento pessoal, mas para outros, que os recompensavam com repressão de suas tradições culturais e religiosas, essas pessoas ‘’foram diretamente responsáveis pela construção do país. Eles nos deram um povo’’ (FILHO, 2011). As condições de vida e saúde dessas pessoas, eram cruéis, o que os europeus impuseram aos africanos contou com características e dimensões únicas e tinham o princípio social racial1 como forma de motivo para a violência e tortura. Quase sempre os negros cativos estavam desnutridos e doentes, sem receber quaisquer assistências médicas (STANCHI; PIRES, 2022). 1 O Darwinismo social é uma ideologia que surgiu no final do século XIX, e que tentou aplicar os princípios da seleção natural e da sobrevivência do mais capacitado à sociedade. Isso levou a ideias equivocadas de que algumas raças humanas eram superiores a outras e que a competição entre elas era necessária para garantir a sobrevivência das mais capacitadas. Essa interpretação distorcida das teorias de Darwin foi bastante utilizada para justificar políticas racistas e discriminatórias, e teve impacto negativo em muitas sociedades ao redor do mundo.
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Figura 4 – Gravura de africanos em fila acorrentados com ferro sob as mãos e pescoço. Fonte: https://www.uff. br/?q=noticias/13-10-2016/ escravidao-sob-otica-filosofica-e-tema-de-pesquisas-na-uff-de-macae
No entanto os af ricanos não contribuíram apenas no âmbito do trabalho, mas marcaram a sociedade brasileira em outros aspectos: na forma como se organizavam em “nações”, na constituição de famílias (muitas vezes simbólicas), nas manifestações de religiosidade (catolicismo, islamismo e candomblé e da cultura (língua, lundu, batuque e capoeira) (MATTOS, 2007, p.13).
Todavia, foram anos de muitas lutas e resistência pelo Brasil por parte dos escravos também, desde rebeliões, insur18
reições, assassinatos e morosidade na execução de tarefas que os seus senhores solicitavam. Porém, o ato de maior resistência no Brasil foi majoritariamente a fuga, que também era um risco e ameaça para o fugitivo, pois se o seu senhor o recapturasse, a pena seria grande, a ponto de serem marcados a ferro quente, presos com correntes e colares de ferro ou até mesmo serem mortos (GOMES, 2021). A fuga, foi acompanhada das formações dos quilom-
bos (fig. 5), também conhecidos como mocambos, a conceituação desse termo em si, foi ressignificado de diversas formas na história brasileira e teve reinterpretações diferentes por diversos personagens e autores que estudam a história dos povos negros no Brasil. Laurentino Gomes (2021, p. 337) ressalta a origem do termo trazendo atributos da África “A palavra kilombo, transcrita para o português como quilombo, vem do quimbundo, um dos idiomas falados em Angola, e originalmente significava acampamento, arraial, união ou cabana”. A primeira definição imposta, segundo o Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), aconteceu em 1740, no período colonial como uma resposta ao rei de Portugal, e foi emitida pelo Conselho Ultramarino (CU) como “toda a habitação de negros fugidos, que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e nem se achem pilões nele” (ALMEIDA, 2002, p. 47). A segunda, entre 1930 e 1950,
no governo ditatorial de Getúlio Vargas, na época da República, o termo começou a ser atribuído a outro significado e vinculado a uma visão culturalista, como diz Gilberto Freyre (1936), preservando as questões étnico culturais. A terceira, aconteceu entre 1960 e 1970, aproximando o termo de uma visão materialista, trazendo um adendo ao regime escravocrata e a resistência política dos escravos (GOMES, 2021). Importante ressaltar que, todas essas readaptações aconteceram em um momento da história turbulenta e em um período ditatorial, aonde no final dele começa a surgir o desejo pela “redemocratização” do país. Logo, em 1988, o termo atribui um novo significado, o Estado cria uma lei com a intenção de dar visibilidade para essas populações que nunca tiveram atenção para com seus direitos básicos, no artigo 68 da Constituição, que irá ser mais bem discutido no próximo tópico. Atualmente, de acordo com a Associação Brasileira (ABA), remanescente de quilombo determina “a situação pre19
sente dos seguimentos negros em diferentes regiões e contextos e é utilizada para designar um legado, uma herança cultural e material que lhe confere uma referência presencial no sentimento de ser e pertencer a um lugar’’. Além disso, existem vários quilombos espalhados pelo Brasil, principalmente nas margens litorâneas e mais isoladas, como é o caso da comunidade estudada, Caçandoca.
Entretanto, o quilombo mais conhecido, não só em Pernambuco e região, mas em todo o Brasil, foi o de Palmares, situado na serra da Barriga, este resistiu durante mais de um século até a morte de seu último líder da comunidade chamado Zumbi e se tornou referência para todos os outros quilombos que foram criados (GOMES, 2021). É essencial atentar para o fato de que não devemos
Figura 5 – Gravura ilustrando uma comunidade quilombola e seus moradores.
Fonte: https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/quilombos-urbanos-os-focos-de-resistencia-na-luta-abolicionista.phtml 20
romantizar o termo quilombo ou até mesmo as próprias comunidades quilombolas, pois cada uma tem suas subjetividades, cada uma tem suas vivências, costumes, e modos de morar. Dado que, a folclorização dessa cultura e identidade é um desafio enfrentado por essas pessoas na luta por seus direitos, como diz Ilka Boaventura (1999) em seu artigo, ou seja, a folclorização é um meio de estereotipar e simplificar questões que são relevantes dentro das comunidades e usa-las para fins de exploração comercial ou de mídia, aonde por consequência, traz uma demanda turística e de consumo, enxergando essas comunidades apenas pelo seus artesanatos, vestimentas, rituais, lendas e não por suas tradições, atrapalhando e invisibilizando assim, ser enxergada como uma identidade política que luta por seus direitos.
marcas e lutas, e que se modifica conforme a época e o contexto a que estamos relatando.
Com isso, conforme o termo foi ressignificado diversas vezes na história como foi exemplificado anteriormente, nos dias de hoje consequentemente, continua sendo, já que é um termo vivo, que resplandece em corpos cheios de 21
1.2 LEGISLAÇÃO, POLÍTICAS PÚBLICAS E O RECONHECIMENTO DO ESTADO O reconhecimento e importância desses grupos para a sociedade e o conhecimento da legislação é um instrumento importante e fundamental para a luta das comunidades tradicionais por seus territórios, em específico neste trabalho, as comunidades quilombolas. Pensando nisso, a seguir será abordado a contextualização e as principais etapas do processo de titulação das terras de quilombo, e seu reconhecimento como território, além das políticas públicas, conforme a regulamentação federal. Primeiramente, para contextualizar, 28 anos após a Independência do Brasil, em 1850 foi elaborada a primeira Lei de Terras, nº 601, estabelecendo que a aquisição de terra 22
apenas poderia ser feita através da compra ou por doação do Estado, e não por meio da posse da área que ainda não foi apropriada (SILVA, 1996). Esta lei impossibilitou essas comunidades de ficarem em seus territórios, com essas terras ficando pela responsabilidade do Estado e fazendeiros latifundiários usufruírem como quiserem. Por consequência disto, os negros, ex-escravos, ou cativos excluídos do sistema atual, foram condenados não apenas à exclusão do direito e acesso legal à terra, mas também do direito ao emprego, a saúde, educação ou moradia. Esta forma de exclusão social, é a construção da ideologia que tratava o negro como uma raça inferior, aliada à tentativa de invisibili-
dade e embranquecimento da população (SILVA, 1996). A marca dessa opressão escravista não acabou ou desapareceu com a lei Áurea instituída em 1888, assinada pela Princesa Isabel decretando a imediata abolição da escravatura. Ao contrário disso, a libertação dos escravos apresentou uma barreira cruel que foi chamada de ‘’mito da democracia racial’’ e que nos segue até os dias de hoje pelo racismo estrutural. Visto que, se tratou de um momento contraditório no qual o negro, em vez de entrar no sistema como trabalhador livre foi substituído pelo trabalhador branco e posto seu corpo à margem da sociedade (BRAGA; MILANI, 2019). Em 1988, para propagar o fomento e a preservação da cultura afro-brasileira no Brasil, a Fundação Cultural Palmares (FPC) foi criada, pela Lei n.º 7.668/88, decreto n.º 418/92, sendo um dos principais órgãos federais junto com o Ministério da Cultura (MinC) por viabilizar as questões de reconhecimento e delimitação de terras dos quilombos, que será abordado mais adiante.
Logo depois, foi instaurada a lei n° 9649 (com a Redação dada pela Medida Provisória nº 2.216-37, de 2001) art. 14 que determinou que caberia ao MinC “aprovar a delimitação das terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos, bem como, determinar as suas demarcações, que serão homologadas mediante decreto” (BRASIL, 1988; SBDP, 2002). No mesmo ano, foi elaborado o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal (ADCT), que relata “Aos remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos” (BRASIL, 1998). Apesar da visibilidade que o ADCT trouxe para as comunidades quilombolas de garantirem seu direito e trazendo consigo o aparecimento de outros sujeitos em prol de fazer valer seus direitos mais para a frente, as únicas pessoas que foram beneficiadas com esta lei, como a própria já diz ‘’Aos remanescentes das comunidades de quilombo que este23
jam ocupando suas terras’’ (BRASIL,1998), foram apenas os povos que ainda permaneciam no mesmo terreno.
com o artigo 2 do decreto n° 4.887:
Acarretando assim, em uma exclusão, afetando a outra parte da população que também fez parte tanto da origem, quanto do desenvolvimento do quilombo, essas, migravam para outra região, seja por melhores condições de vida, ou por questões pessoais, e se outrora, decidissem voltar a morar ou solicitar o direito à propriedade, era instantaneamente negado (SOUZA FILHO, 2011).
Art. 2o Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sof rida;
A partir do século XXI, ocorreram diversas melhorias e implementações no âmbito federal em relação a melhores condições de vida e necessidades dos quilombolas, principalmente guiados pelo órgão FCP, que ficou responsável por promover o reconhecimento das terras e o registro dos títulos como já foi dito, além de outras funções que serão mencionados a seguir (SILVA, 2018). Logo, em 2003, foi regulamentado administrativamente os processos para regularização, reconhecimento, e identificação dessas terras 24
§ 1o Para os fins deste Decreto, a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos será atestada mediante autodefinição da própria comunidade; § 2o São terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural; § 3o Para a medição e demarcação das terras, serão levados em consideração critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sendo facultado à comunidade interessada apresentar as peças técnicas para a instrução procedimental (BRA-
SIL, 2003).
Vale ressaltar, que no mesmo decreto existe regras para viabilizar a “identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras” que são utilizadas pelas comunidades quilombolas, estas, sendo delegadas e asseguradas ao Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (INCRA) com o acompanhamento da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) e da FCP. Que diz: Art. 3o Compete ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sem prejuízo da competência concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. § 1o O INCRA deverá regulamentar os procedimentos administrativos para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, dentro
de sessenta dias da publicação deste Decreto. § 2o Para os fins deste Decreto, o INCRA poderá estabelecer convênios, contratos, acordos e instrumentos similares com órgãos da administração pública federal, estadual, municipal, do Distrito Federal, organizações não-governamentais e entidades privadas, observada a legislação pertinente. § 3o O procedimento administrativo será iniciado de of ício pelo INCRA ou por requerimento de qualquer interessado. § 4o A autodefinição de que trata o § 1o do art. 2o deste Decreto será inscrita no Cadastro Geral junto à Fundação Cultural Palmares, que expedirá certidão respectiva na forma do regulamento (BRASIL, 2003).
No contexto geral, este decreto, preserva o papel e dispõe o direito das comunidades, em ter acesso à educação, saúde, moradia e saneamento, tem o objetivo de tornar realidade a regularização fundiária que as comunidades tanto almejam. Em 2007, foi criada mais uma política para a concreti25
zação dos direitos quilombolas, através do Decreto 6.040. A Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais tem foco na promoção do desenvolvimento sustentável com ênfase na garantia de direitos territoriais, sociais, ambientais, culturais e econômico, buscando a valorização da identidade dos povos (SILVA, 2018). No que diz respeito a educação, em 2003 foi alterada a Lei n. 9.394/96 referida à Diretrizes e Bases da Educação Nacional pela Lei n. 10.639/2003 que aprova as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História para a Educação Escolar Quilombola, e esta, determina a obrigatoriedade do ensino da cultura afro-brasileira e africana dentro do ambiente escolar a qualquer nível e modalidade da educação brasileira. Foi um progresso muito importante em relação à garantia de direitos, no quesito acadêmico, essencial para que as comunidades quilombolas insiram no currículo a cultura, a memória e a tradição das comunidades afro-brasileiras e africa26
nas, um ensino para além dos “genéricos “negros” ao pisar em solo brasileiro” (PEREIRA, 2011; MOURA, 2007). Em relação as políticas públicas voltadas para os povos quilombolas, que vigoraram a partir dos anos 2000, podemos falar do Programa Brasil Quilombola (PBQ), a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PNPIR) e da SEPPIR. A primeira, criada em 2004, foi primordial para a construção das outras, que tem como objetivo efetivar essas políticas públicas, com o Decreto Federal 6.261 sendo elaborado em 2007, e este, parte de alguns eixos norteadores para tratar das seguintes ações sob a coordenação da SEPPIR: a) acesso à terra; b) infraestrutura e qualidade de vida; c) desenvolvimento local e inclusão produtiva; d) direitos e cidadania (SILVA, 2018). A CONAQ (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos), criada em 1996, é uma organização e um movimento político social associado a entidades relacionadas a questões negras e também rurais, que tem como finalidade representar todas as comunidades quilombo-
las do Brasil, e dar voz a elas a partir de reuniões e eventos. O representante da CONAQ de São Paulo, Neimar Lourenço, por coincidência, é presidente da Associação do Quilombo da Caçandoca, e se articula em todos os episódios nacionais do movimento para lutar por seus direitos à garantia de terra e políticas públicas. Como tantos outros quilombolas e não quilombolas, de todo o Brasil.
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1.3 A CONTRIBUIÇÃO DAS CIVILIZAÇÕES ANTIGAS AFRICANAS É preocupante a falta de ementas e debates sobre a arquitetura dessas comunidades tradicionais nas instituições de Arquitetura e Urbanismo, esse fato pode levar a uma negligência em relação aos conhecimentos e práticas construtivas locais, que são fundamentais para a preservação e valorização da cultura dessas comunidades. Além disso, a falta de discussão sobre a arquitetura popular tradicional pode reforçar o eurocentrismo na arquitetura, desvalorizando e marginalizando a diversidade de formas de morar e construir presentes no Brasil. Desta forma, para entender o modo de morar dos descendentes de africanos no Brasil é imprescindível compreen28
der como a herança e a contribuição das civilizações antigas africanas influenciaram na arquitetura quilombola no Brasil. Com o tráfico negreiro e a exploração forçada de escravos para a América no período XV, somada com a estratégia dos escravistas brasileiros de capturarem os africanos em pontos de embarque diferentes no continente da África, separando-os logo depois para dificultar a comunicação entre eles com medo de fugas ou rebeliões, acabou culminando em um processo de diferenças étnicas em solo brasileiro, onde os escravos perderam sua identidade. Isto foi influenciado na própria arquitetura desses povos, forçando-os á se adaptarem e
a se reordenarem dentro do Brasil (WEIMER, 2012). “O quilombo como espaço criado pela instituição da escravidão foi palco da materialização da cultura construtiva africana na concepção das estruturas arquitetônicas e nos usos atribuídos a cada espaço” (FARIA, 2006, p. 151). Importante ressaltar que, segundo Branco (2007), há relatos de alguns moradores da Caçandoca de memórias relacionadas à sua ancestralidade voltadas a região da África Centro-Ocidental, além de comprovações documentais de que muitos escravos trabalharam e moraram no território, além de terem sido posseiros das terras. As populações negras da África, são divididas em grupos linguísticos. Os escravos que vinham da ‘’costa’’ (Angola) e da ‘’contra costa’’ (Moçambique), sendo os bantos, desembarcavam no sudeste do Brasil (Rio de Janeiro e Santos), enquanto os que vinham das margens do golfo da Guiné, Daomei, Nigéria e Costa de Ouro, sendo os sudaneses, desembarcavam em Pernambuco e Bahia.
Os que vieram em maior número para a região sudeste do Brasil foram majoritariamente os bantos, e em segundo os sudaneses. Vale dizer que, pela diversidade étnica que existe na região, um número grande de culturas arquitetônicas diferentes foi contemplado no território (RODRIGUES, 1990, p.40-9 Apud WEIMER, 2012, p.117). Levando essas questões em consideração, a leitura arquitetônica irá se dar por essas duas etnias e culturas que mais foram migradas da África para o Brasil na metade do século XIX. Usando como parâmetro o tipo de clima de cada região, pois este é um fator crucial e decisivo para a diversidade das construções. A tipologia arquitetônica mais antiga dos bantos era simples, e em curvas cônicas, que eles o chamavam de cubata (casa), com coberturas cônicas de materiais vegetais variados, a largura do beiral variava de acordo com a incidências de chuvas na região e o tipo de material e técnica construtiva das paredes. A construção tinha geralmente apenas uma porta (em algumas culturas, nem mesmo 29
porta tinha) e nenhuma janela, as paredes eram revestidas de taipa ou de palha, e as moradias eram formadas pela composição diversa de edificações independentes, dispondo de apenas um ambiente interno (WEIMER, 2012). Levando em consideração o clima, nas regiões úmidas eram usadas as palhas amarradas como acabamento, e as vezes estas, eram reforçadas com algum outro tipo de material, sendo usadas para regiões de fortes ventanias (FARIAS, 2011).
Nas regiões de seca, eram usados como acabamento a argamassa feita de barro misturado com esterco de vaca, para o revestimento de paredes e piso. Mesmo que o material tenha baixa resistência em relação à água, não implica em problemas futuros exatamente por conta do clima seco (WEIMER, 2012). Nos climas tropicais, mais quentes e secos, eram usados o pau-a-pique para a construção de paredes, sem nenhum fechamento nas laterais, onde denominavam o espaço de
Figura 6 – Kraal dos povos Zulus da África do Sul, 1857. Fonte: https://fineartamerica. com/featured/south-africa-zulu-kraal-1857-british-library.html 30
‘’gaiolas’’, pelas laterais ficarem com pequenas aberturas (WEIMER, 2012). Na cultura dos bantos, existia o ‘’kraal’’, que significa um terreno que é cercado por arbustos espinhosos ou galhos, e dentro deste terreno, ficavam as cubatas (casas), estruturadas por grupos familiares, além de hortas e gados (onde ficavam no meio do kraal), como podemos ver na figura 6. Na aldeia Ajauá, no norte de Moçambique, por exemplo, as casas ficavam em cima de um pequeno patamar no solo de terra batida,
cada uma servindo para uma atividade. O objetivo do kraal é que ele tenha tudo para que a família seja autossuficiente (WEIMER, 2012). Devido a emigração europeia no continente africano desde o período colonial e suas influências, nos dias de hoje, a planta das casas de formato retangular, se tornou a mais comum e usada, inclusive no Brasil. As áreas que podem ser encontradas casas retangulares, é no norte de Moçambique, de clima seco, e no Sul em Luanda, onde os quimbundos
Figura 7 – Croqui ilustrando um mocambo de Recife de tipologia moçambicana ou angolana. Fonte: Gunter Weimer, livro Arquitetura Popular Brasileira. 31
vivem, com o clima sendo subtropical e temperado. Nas casas que se encontram no Sul, ao longo das margens do litoral, os beirais são consideravelmente compridos, se abrindo em uma varanda. Além disso, são dispostos quintais ou pátios, funcionando como uma ampliação da casa para o manuseio de diversas atividades sociais (figura 7) (WEIMER, 2012). O pau-a-pique também é usado para construir as casas, com o barro e o capim sendo usado para revestir as paredes. Normalmente, eram construídas no nível do solo ou elevadas sobre um patamar (figura 8) (WEIMER, 2012). Os sudaneses, que vivem pelos países das margens da Guiné (África Ocidental), até o Senegal e Cabo Verde, também foram muito importantes no quesito da emigração para o Brasil, principalmente pela diversidade de culturas e tipologias arquitetônicas, que eram mais diferentes devido à variedade dos ecossistemas em que habitam, e se encaixa na área de clima tropical (WEIMER, 2012). No litoral de Guiné-Bissau, 32
o material construtivo usado para as casas é o barro, com a cobertura sendo de quatro águas e coberta por palhas de palmeira. As varandas fechadas e o corredor que interliga os quartos são elementos importantes da arquitetura tradicional de Guiné-Bissau, proporcionando áreas de convívio e circulação de ar dentro da casa. Esses espaços também podem ter funções importantes na vida cotidiana das pessoas, como a realização de atividades domésticas e sociais. Podemos ver essas características em muitas comunidades quilombolas pelo Brasil, como por exemplo, no Quilombo de Praia Grande, em Iporanga (figura 8) e no Quilombo de Mumbuca, em Tocantis (figura 9). Em Gana, na área do norte, há uma incidência curta de estação de chuvas, com o resto do ano sendo muito seco, por consequência das influências do deserto do Saara que está próximo e traz variedades de temperaturas, com isso, cria-se bolsões na terra onde são encontradas argila, e está, é usada como material construtivo para as casas (WEIMER,
Figura 8 – Casa de taipa, com cobertura de 2 águas e telha cerâmica, Quilombo de Praia Grande – Iporanga.
Fonte: http://alain-mantchev.com/materiais/taipa-de-mao.html
2012). Em contraponto, nas áreas do Centro da África, como Gana e Costa do Marfim, o clima quente e úmido e a estação de chuvas mais longa influenciam diretamente na
escolha dos materiais e técnicas construtivas utilizados na arquitetura local. A abundância de árvores e a vegetação rica da região podem influenciar a utilização de materiais como a madeira 33
Figura 9 – Casa de tijolos solo-cimento, estrutura de madeira, com cobertura de 2 águas revestida de palha e elevada sobre um patamar, Quilombo Mumbuca – Mateiros, Tocantins.
Fonte: https://viajarverde.com.br/quilombos-para-visitar-no-brasil/
e o bambu, que são mais leves e adaptáveis às condições climáticas locais. O beiral das construções é prolongado para proteger as paredes da 34
chuva, e na parte frontal das fachadas, no sentido para a rua, estes avançam mais ainda, se dispondo de uma varanda para diversas ativida-
des. O esquema de aberturas, e ventilação cruzada para evitar o aquecimento solar por conta do excesso de umidade na edificação é observado também nestas construções (WEIMER, 2012). Além disso, Costa e Machado (2018, p. 50), citam em seu artigo, como a herança africana é pertinente até os dias de hoje no Brasil, evidenciando a comunidade remanescente de quilombo de Iguape, localizada na Bahia. Onde relata que: (...) os quilombolas da comunidade do Iguape desenvolveram sua cultura, baseada na tradição dos diversos grupos que formaram o quilombo, onde há a presença de elementos de diversas etnias af ricanas. Fazendo uso do barro como matéria de base e de acabamento, através de técnicas construtivas adquiridas, como a taipa de pilão, muitas são as construções da comunidade de Santiago do Iguape. O uso dessa técnica construtiva, também chamada de pau-a-pique, taipa de sopapo, taipa de sebe, barro armado, origina a construção de casas de moradia e locais de apoio para suas atividades coletivas e de produção. Cenário que demonstra persistência das técnicas construtivas tradicionais para a concepção do
espaço dessa comunidade.
Pode-se concluir então que, os diversos povos tanto os quimbundos de origem banto, quanto os eves de origem sudanese, e tantos outros foram obrigados a se reordenarem e a reencontrarem um novo modo de morar no Brasil, diante das circunstâncias impostas, acarretando assim, em uma gama de diversidade cultural em solo brasileiro e nas comunidades quilombolas. Também vimos que, cada população de diferente etnia na África pré-colonial conserva particularidades em seus métodos construtivos e em sua arquitetura construída através de suas narrativas socioculturais, que estão intrinsecamente ligados às condições naturais e culturais da região em que vivem. São várias as evidências da influência da arquitetura africana no Brasil, por mais que em algumas comunidades quilombolas hoje não demonstrem tanto isso construtivamente, guardam em suas memórias passadas, a ancestralidade dos que ali já passaram.
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1.3.1 A ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA AFRICANA Na arquitetura contemporânea africana, podemos notar a introdução da diversidade das novas tecnologias e técnicas locais sem deixar de lado a memória ancestral e estética das próprias construções que já existem há muito tempo dentro dessas comunidades. Aonde elas emergem, por exemplo, na materialidade, na técnica construtiva, ou outrora pelas amplas varandas, pátios ou quintais que as famílias constroem para as atividades sociais em suas casas ou até mesmo para vendas, além da preservação florestal e seu manuseio como sustento e geração de renda, como o cultivo de hortas, agricultura, pesca, artesanato, e suas relações com o território (ANJOS, 2011). A cultura desses povos é ampla e com uma diversidade 36
muito grande como já vimos, influenciando diretamente na arquitetura brasileira. Como diz Rafael Sanzio (2011, p. 35), “os quilombos, como unidade básica de resistência, irão se configurar como os maiores exemplos de reelaboração territorial dos registros das matrizes africanas no Novo Mundo’’. Francis Kéré, Nicholas Plewman, Nadia Peruggi, e Toshiko Mofi são um dos poucos arquitetos que buscam trazer técnicas vernaculares introduzindo-a às novas tecnologias no continente africano. Eles combinam o conhecimento tradicional com as novas tecnologias e materiais, criando soluções arquitetônicas inovadoras que respeitam a cultura e o meio ambiente local.
Figura 10 – Escola projetada pelo arquiteto Diébédo Francis Kéré, localizada em Benga Riverside, Moçambique Fonte: https://viajarverde.com. br/quilombos-para-visitar-nobrasil/ 37
O SER HUMANO E A RESILIÊNCIA NA ARQUITETURA
2.1 MUDANÇAS CLIMÁTICAS GLOBAIS
O efeito estufa é um fenômeno natural importante que ocorre no planeta que vivemos. Porém, por ações especialmente antrópicas, acaba desencadeando o aumento da emissão de gases de efeito estufa (GEE) de maneira descontrolada, especialmente pela queima de combustíveis fósseis, queimadas, desmatamentos e decomposição de lixo, aonde estes, acarretam na formação de uma camada de poluentes no ar, agravando o efeito estufa e provocando o aquecimento global no planeta (MOLION, 2008). Em 1995, 62% de energia elétrica mundial era gerada por usinas termelétricas, acarretando numa imensa poluição ambiental, juntamente, com o alto crescimento desordenado 40
da população, que atualmente já conta com 7,6 bilhões de habitantes e deve subir para 8,6 bilhões em 2030, com o grande consumo de produtos de fontes de energia (CUNHA, 2006). Como consequência, temos como resultado de todo esse processo, as recorrentes mudanças climáticas, que trazem consigo o derretimento das camadas polares, aumento do nível do mar, secas, enchentes, tempestades e tornados. Desse modo, esses eventos climáticos extremos podem afetar os ecossistemas naturais, causando a extinção de plantas e animais que não conseguem se adaptar rapidamente às mudanças (CUNHA, 2006). Frédéric Bessat (2003) estima algumas previsões da temperatura global em seu artigo,
aonde, em uma delas relata que nos próximos anos, entre 1990 e 2100, a variedade vai estar em média em 2ºC, além da maior incidência de secas e inundações. Além disso, foi confirmado pela Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (NASA) e a Organização Meteorológica Mundial (OMM), que o período entre os anos 2019 e 2022 foi considerado o mais quente da história do mundo. O secretário-geral da Organização Mundial de Meteorologia (OMM), Petteri Taalas, traz evidências disso isso em sua fala: Em 2022, enf rentamos vários desastres climáticos dramáticos. Grandes áreas do Paquistão foram inundadas, com grandes perdas econômicas e baixas humanas. Ondas de calor recorde foram observadas na China, na Europa, na América do Norte e na América do Sul. A longa seca no Chif re da Áf rica ameaça uma catástrofe humanitária.
Atualmente, no Brasil, em fevereiro de 2023, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), foi o mês que mais houve abundância de chuva em todo o país. A alta densidade
de volume da chuva ocasionou em muitos deslizamentos e desmoronamentos em várias áreas íngremes do Litoral Norte Paulista onde moravam mais de 1.000 pessoas, sendo São Sebastião a região mais afetada. Mais de 49 pessoas morreram e muitas perderam suas casas (MIATO, 2023). Importante ressaltar que, essa não foi a primeira tragédia que acontece no litoral norte, sendo lembrados também, os acontecimentos em Franco da Rocha (2022), Guarujá (2021), Vale do Ribeira (2014) e tantos outros, que também foram desastrosos no território brasileiro. Mesmo que, cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) relatam que, ainda é possível ‘’reduzir pela metade as emissões até 2030 e evitar os piores cenários, já que há evidências de crescentes ações globais contra o aquecimento do planeta’’, ações urgentes e imediatas precisam ser adotadas hoje para estabilizar as emissões de GEE, pois o benefício do ‘’fazer agora’’ para mitigar a mudança do clima vale a nossa própria vida, das gerações futuras e da nossa mãe terra. 41
2.2 ARQUITETURA BIOCLIMÁTICA PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA POPULAÇÃO Diante das questões abordadas no tópico anterior, neste atual, olhando para o campo da arquitetura, faz-se necessário e imprescindível considerar o clima do local na concepção de qualquer projeto arquitetônico. O clima influencia diretamente nas condições de conforto ambiental, como temperatura, umidade, ventilação e iluminação natural, além de interferir na escolha de materiais e sistemas construtivos. A origem do termo Bioclimática surgiu na década de 60, e vem do vocábulo ‘’bioclima’’ (‘’que significa um tipo de clima definido em relação ao desenvolvimento dos seres vivos em determinando lugar’’), trazido da biologia pelos irmãos Victor e Aladar
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Olgyay, aonde foram os primeiros a discutirem o tema (OLGYAY, 2015). O princípio base da arquitetura bioclimática, traz elementos naturais a serem tratados em relação ao local e o entorno do edifício a ser construído, e como este irá se comportar levando como condicionantes algumas variáveis climáticas, como: a iluminação, os ventos predominantes, insolação, precipitações da chuva, umidade e temperatura, questões que influenciam diretamente no bem-estar do ser humano e consequentemente, na sua forma de construir. É fundamental considerar o equilíbrio entre esses fatores para uma situação ideal para o corpo humano e para a efetivação de
construções sustentáveis, permitindo a permanência e convivência das pessoas dentro dos edifícios (CUNHA, 2006). Cada região tem suas particularidades, por exemplo, no Brasil, a variedade de climas é grande, mesmo sendo predominantemente um país tropical, existe regiões que o clima é equatorial (Amazonas), semiárido (Bahia), tropical de altitude (São Paulo), tropical atlântico (Ubatuba) e subtropical (Santa Catarina), sendo usado diferentes soluções para as moradias, o que torna a cultural local única. Mesmo que, os locais sejam diferentes e cada um tenha a sua particularidade, existe a possibilidade de encontrar as mesmas soluções adotadas para um mesmo clima, mas é importante tomar cuidado e não generalizar. A região da comunidade estudada, Caçandoca, que se encontra no Litoral Norte, por exemplo, se encaixa no clima de tropical úmido, sendo uma região com abundantes chuvas em torno de todo ano, por conta disso, de acordo com estudos de Eduardo da Cunha (2006), é fundamental que a cobertura do edifício seja bem
inclinada e que tenha beirais longos para não ocorrer infiltrações e problemas futuros. Como vemos anteriormente, as civilizações antigas africanas dotadas de um continente amplamente diverso em relação ao clima, se assemelha ao Brasil pela maior parte do continente ser majoritariamente de clima tropical úmido (mesmo com a influência do Saara). Estes povos, consideraram amplamente o clima local para construir suas moradias e seus espaços de convivência. Especificamente, através da arquitetura vernacular, usufruindo dos materiais locais, como a terra crua, o barro, a palha, a madeira ou o bambu, que para Silva e Sirgado (2015, p.15) representa ‘’o bom aproveitamento dos recursos locais para satisfação das necessidades comuns a uma comunidade e está adequadamente adaptada ao clima do lugar’’. Desse modo, a arquitetura bioclimática caminha lado a lado com a arquitetura vernacular e com a bioconstrução, portanto, é fundamental sabermos brevemente o conceito destes termos. 43
Vernaculu vem do latim, e em Roma, significava o escravo nascido na casa do senhor, ou seja, no seu país de origem. Nos dias de hoje, tem o significado de língua ou costumes de uma região (OLIVER, 1978).
gicos que não agridam o seu entorno, é adepta das construções ancestrais, que usavam matérias locais em suas moradias, com isso, construindo com um baixo custo econômico e oferecendo um bem-estar ao morador.
Paul Oliver (2005, p. 40), diz que arquitetura vernacular é uma
Neste sentido, a ideia da bioconstrução traz métodos construtivos dos materiais naturais de recursos disponíveis no local, em favor de uma maior integração e harmonia entre o homem e a natureza.
Arquitetura que compreende as habitações e outras construções dos povos, relacionadas aos seus contextos ambientais e recursos disponíveis, costumeiramente construídas por seu proprietário ou pela comunidade, utilizando tecnologias tradicionais. São formas construídas para atender as necessidades específicas, acomodar valores, economias e modos de vida das culturas que as produzem.
Já a bioconstrução, Obata e Ghattas (2012, p. 148) caracteriza como “(..) o sistema construtivo que se apropria de materiais naturais e ou materiais industrializados, analisando o impacto ambiental gerado em todo seu ciclo de vida, da extração descarte pós consumo.’’ Além disso, por também usar materiais ecoló44
Os principais materiais usados nessas construções, vem da terra crua que é a base para essas, onde são o superadobe, adobe (figura 11), COB, taipa de pilão e pau a pique, e os aditivos geralmente é esterco de vaca, folhas secas, palhas, entre outros (VIEIRA, 2015). Ainda temos o tijolo de solo-cimento ou ecológico (figura 12), que é pouco conhecido pela população, e que será utilizado na proposta projetual do trabalho e mais bem aprofundado no capítulo 5. As principais vantagens de adotar esses sistemas, é a economia pelo material ser local, ou seja, não há a necessidade de transporte, a energia usada
Figura 11 – Tijolos de adobe sendo fabricados Fonte: https://museudecacule. wordpress.com/2016/03/01/construcao-em-adobe/
Figura 12 – Tijolos modulares de solo cimento. Nota-se os dois furos internos, estes servem para embutir as colunas de sustentação e auxiliam na passagem de instalações elétricas e hidráulicas. Fonte: https://revistaadnormas. com.br/2019/09/17/os-ensaios-em-tijolos-de-solo-cimento 45
no processo de produção é menor, e consequentemente menores emissões de gás carbono é emitido no ar, são materiais naturais, muitas das vezes orgânicos, renováveis e biodegradáveis (VIEIRA, 2015). Podemos notar essas características, nos projetos de Francis Kéré, Irene Librando em parceria com Nadia Peruggi, e Sven Mouton, este último sendo do escritório CRU! Arquitetos, que também se dedica a comunidades locais, numa arquitetura de grande impacto social para a vida dos moradores. Os respectivos projetos irão ser estudados e analisados no capítulo 4 deste trabalho. Portanto, conforme exposto neste capítulo, podemos concluir que, antes da concepção do projeto arquitetônico, o arquiteto e urbanista deve estudar o clima e o local da futura edificação, para assim construir um projeto de arquitetura resiliente que se abstenha de uma infraestrutura que seja capaz de absorver quaisquer impactos naturais a longo prazo. Além de considerar as condições de conforto térmico, que podem ser melhoradas apenas com o 46
emprego de técnicas construtivas simples e de materiais de uso comum.
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UBATUBA: QUILOMBO DA CAÇANDOCA
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3.1 A FORMAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E A COLONIZAÇÃO DO LITORAL NORTE PAULISTA E UBATUBA Neste capítulo, irá ser abordado a formação, desenvolvimento e os primórdios da colonização do Litoral Norte Paulista, que engloba Ubatuba e seus municípios vizinhos: Caraguatatuba, São Sebastião e o arquipélago de Ilha Bela (figura 13). Logo depois, será apresentado o contexto atual de Ubatuba, até chegar no quilombo da Caçandoca, sendo o local de estudo do presente trabalho (do macro para o micro). Seguindo o contexto da colonização no Brasil do capítulo anterior, mas especificamente agora, no Litoral Norte Paulista, as margens das costas litorâneas foram habitadas através de núcleos de povoamento pré-colombiano, e logo depois, foram ocupa50
Ubatuba
Caraguatatuba
São Sebastião
Ilha Bela
30km
Figura 13 – Mapa do litoral norte paulista Fonte: autoria própria 51
Figura 14 – Pintura representando a chegada dos portugueses no litoral brasileiro, em encontro com os índios que ocupavam o local Fonte: https://www.cidadeecultura.com/historia-de-ubatuba/
das e exploradas pelos colonizadores europeus, que procuravam o Litoral Norte interessados nas matérias-primas de tipo tropical (figura 14) (PRADO JUNIOR, 1956). Os colonizadores se apuseram da região e criaram núcleos urbanos coloniais, aonde este, seria um ‘’eixo centralizador’’ que mais tarde se tornaria uma forma de rede para a expansão das cidades ao seu redor, isso impactou negativamente o meio ambiente, trazendo desmatamento e queimadas pela instalação de engenhos e 52
fazendas. A formação do litoral norte está diretamente ligada com esses núcleos de povoamentos, dito anteriormente, que remete a ocupação histórica da região e com os ‘’sambaquis’’ litorâneos (figura 15), que são testemunhos essenciais de uma civilização pré-colombiana, encontrados ao longo do litoral paulista, carioca, nordestino, até o litoral gaúcho (AFONSO, 2017). Os sambaquis são sítios arqueológicos formados pelo acúmulo de conchas
Figura 15 – Ilustração de população litorânea descartando restos de mariscos, conchas e ossos de peixe, com o sambaqui em vista Fonte: http://marianamassarani. blogspot.com/2018/10/sambaqui.html
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podendo ter metros de altura de grandes dimensões, formando imensas montanhas. Eles foram muito explorados ao longo dos anos, principalmente pelos colonizadores, sendo usados como material de construção para as cidades coloniais, o que acarretou a destruição de incontáveis sambaquis, nos dias de hoje, ainda são pouco preservados (AFONSO, 2017). Em 1563, os padres jesuítas, Manoel da Nóbrega e José de
Anchieta descobriram a Aldeia Iperoig (atual Ubatuba), formada pelos indígenas pertencentes ao grupo Tupinambá (figura 16) e Tupiniquins, de língua Tupi-guarani, que habitavam o litoral de Ubatuba e São Sebastião, estes, foram as primeiras pessoas a ocuparem as margens das costas brasileiras desde o período pré-colonial (FUNDART). Vale dizer que, os indígenas foram essenciais no surgimento do termo étnico ‘’cai-
Figura 16 – Gravura mostrando povos Tupinambás em um acampamento no Litoral de Ubatuba.
Fonte: https://naturam.com.br/indios-em-ubatuba/ 54
çara’’ que também é de origem mestiça com o negro e de diversos povos que ocuparam o espaço litorâneo. Trouxeram muitas contribuições para o Brasil, como a forma de lidar com as florestas, a roça, suas adaptações ecológicas e a cultura material. Durante os séculos XVI e XVII, em 1608, o primeiro lugar ocupado pelos colonos portugueses no Litoral Norte foi a Ilha de São Sebastião afastada
do continente. E logo depois, em 1610, Ubatuba foi povoada, onde surgiu os primeiros núcleos de ocupação (na região do Centro), estes, formaram-se em torno da capela Matriz Exaltação da Santa Cruz (fig. 17), aonde, em 1637, a aldeia de Iperoig seria elevada à categoria de vila com o nome de ‘’Vila Nova da Exaltação da Santa Cruz do Salvador de Ubatuba’’, fundada por Jordão Albernaz Homem da
Figura 17 – Igreja da Exaltação da Santa Cruz - Ubatuba, SP, 2022
Fonte: https://mapio.net/pic/p-43018514/ 55
Costa (SILVA, 1975). Atentar para o fato de que, os europeus sempre conseguiam encontrar aliados entre os próprios indígenas, os que resistiam, fugiam para dentro da mata. Esse fator incitava intrigas e inimizades entre as tribos. Como descreve Claudia Pilan (2006, p. 15): Os europeus, principalmente portugueses e f ranceses, quando aqui chegaram no século XVI, a fim de colonizar a terra e explorar suas riquezas, tentaram escravizar os indígenas e, para isso, lançaram mão de todos os recursos possíveis. Os portugueses, em São Vicente, procuraram manter relações de amizade com os tupiniquins, mantendo-os a seu lado e a favor de seus interesses. Os franceses fizeram o mesmo com os tupinambás.
Os Tupinambás, em combate com os franceses, montaram um acampamento em Ubatuba (figura 16) que teria sido erguido para uma invasão guerreira em Bertioga (os índios se transportavam e se reuniam através das ‘’canoas de voga’’) (SILVA, 1975). Isto foi evidenciado pelo alemão Hans Staden (1557) em seu livro ‘’Duas Viagens ao Brasil’’, 56
ele foi aprisionado pelos Tupinambás, no acampamento em Bertioga por meses, mas conseguiu escapar. Essas lutas sempre resultavam na captura e aprisionamento de viajantes europeus (portugueses, franceses e holandeses) aonde depois, a tribo o isolava-os para devorá-los, com a prática do canibalismo, de acordo com Staden. Com a chegada dos europeus, houve o auge da exploração econômica marinha, através do aparecimento de engenhos de açúcar, aguardente, de fumo e anil na região. Além da concessão de sesmarias, que eram sítios de terras distribuídos a um beneficiário, com o objetivo de cultivá-las (FRANÇA, 1975). Nesse sentido, a exploração econômica também foi consequência da criação de núcleos urbanos coloniais, e estes, como diz Armando Silva (1975), ficaram conhecidos como o “tabuleiro de xadrez”, conceito urbano imposto às novas cidades criado por Hernán Cortéz, e que remete a “(…) quarteirões idênticos, geralmente, com forma quadrada, definidos por ruas ortogonais e retilíneas. O centro da cidade é
ocupado por grandes edifícios públicos, tais como: a catedral, o tribunal, o paço municipal e as residências dos espanhóis mais ricos” (DANTAS, 2004). E do outro lado destas cidades coloniais, ficava a organização dos povos da periferia excluídas à margem do centralismo monárquico. Dada todas essas circunstâncias, o avanço econômico de São Sebastião e Ubatuba entraram em desenvolvimento. Além disso, os portos dessas duas cidades foram importantes para que o desenvolvimento econômico da época pudesse existir, aonde tudo acontecia ao redor e em função deles, sendo um eixo norteador comercial central, junto com os núcleos urbanos (SILVA, 1975). Durante o século XVI e XVII, conforme o desenvolvimento econômico foi se elevando, essas povoações foram elevadas a vilas, como dito anteriormente, aonde o aumento da população foi grande e as costas do litoral norte começaram a estabelecer várias vilas de povoamento, sendo evidenciado com várias construções, como por exemplo, no ano de 1664, em São Sebastião, o Con-
vento de Nossa Senhora do Amparo (SILVA, 1975). No entanto, no século XVII, levando em consideração a abundância dos engenhos de açúcar da Bahia e Pernambuco, que ficam na região Nordeste, e o olhar atrativo dos colonizadores para esses estados, a exploração econômica no Litoral diminuiu, por conta da baixa densidade demográfica. Porém, em 1694 a 1704, outra fase de prosperidade apareceu na região, que foi a fase do ouro, aonde os portos de Ubatuba e São Sebastião foram os protagonistas por terem sido os receptores diretos da circulação entre os portos de mineração com o exterior que vinha de Minas Gerais para Taubaté, localizado no Vale do Paraíba, e que depois descia para Ubatuba (SILVA, 1975). A partir do século XVIII, o desenvolvimento econômico do litoral norte voltaria a trabalhar melhor, e Ubatuba praticava a agricultura de subsistência, através da implementação das armações e pesca à baleia, arroz, mandioca e açúcar (CERQUEIRA, 1966), 57
esta última especificamente, em São Sebastião e Ubatuba, aonde as regiões se encheram de engenhos de açúcar e aguardente, para o abastecimento das áreas de Minas Gerais. Porém, a partir de 1789, o governador da província de São Paulo decretou a utilização do porto de Santos para as atividades de escoamento. A partir disso, Ubatuba entrou em decadência (PILAN, 2006). Mas, com a chegada da família real ao Brasil e a abertura dos portos em meados de XIX, a produção de cana-de-açúcar seria substituída rapidamente pela produção de café, com Ubatuba e São Sebastião sendo dois portos importantes para a expansão econômica do Litoral Norte. Na região de Ubatuba, continha 18 fábricas de fumo, e em 1830, a região tornou-se um porto de desembarque clandestino de escravos, destinado não apenas ao trabalho local, mas, principalmente, ao trabalho no Vale do Paraíba e Minas Gerais como já foi citado anteriormente. E em São Sebastião, no ano de 1854, possuía 106 fazendas de café, onde trabalhavam 2.185 escravos (BORELLI, 2010; ITESP, 2000; 58
SILVA, 1975). Com a chegada dos colonos franceses, e conforme o aumento dos produtos agrícolas nas regiões foi crescendo, consequentemente, também aumentou a urbanização de Ubatuba e o número de escravos. Com isso, em 1855, Ubatuba foi elevada à categoria de cidade, com aproximadamente 8 mil habitantes. Pilan (2006, p. 18) aponta que: Apesar da promulgação da Lei Eusébio de Queiroz de 1850, que proibia o tráfico negreiro, esta prática perdurou clandestinamente em algumas praias de Ubatuba. Em sua maioria, o desembarque acontecia em praias mais afastadas, como Fortaleza, Caçandoca do Sul e Ubatumirim. A partir dali os negros eram conduzidos às fazendas do Vale do Paraíba através de veredas nas matas. Neste destino final, eram comercializados a altos preços.
A partir de 1867, com a construção e inauguração da ferrovia, que ligava São Paulo Santos, e logo depois, em 1877, da ligação da ferrovia que aconteceu entre São Paulo Rio de Janeiro, Ubatuba e São Sebastião entrou em declínio
(PILAN, 2006). A ligação desta última ferrovia contribuiu para os interesses do sudeste brasileiro, e para a marginalização do litoral norte. O século XIX, foi marcado por essa alternância de fases de estagnação e outrora progressos. Importante dizer que, muitas tentativas foram feitas em Ubatuba para ligar o litoral norte ao planalto pela ferrovia. Só em 1933, com a abertura da estrada que liga Ubatuba-Taubaté (denominada Rodovia Osvaldo Cruz em 1970), e da construção do ano de 1939 da ligação rodoviária São José dos Campos-Caraguatatuba na região, traria condições que tirariam o litoral norte da atual situação de marginalização. No ano de 1940, a população era de, aproximadamente 3 mil habitantes (BISCHOF, 2016). Desde a década de 1950, a população e as cidades do Litoral Norte têm enfrentado um grande crescimento demográfico, o que tem ocasionado o crescimento urbano desequilibrado, seja por migrações do campo para a cidade ou do Planalto para o Litoral (SILVA, 1975). Em 1970, com a inauguração da Rodovia Rio-Santos
(BR-101), a abertura das estradas possibilitou que uma nova atividade econômica se destacasse nessa região, que foi o turismo. E em 1975 de acordo com a Prefeitura de Ubatuba, a cidade foi elevada à categoria de Estância Balneária de Ubatuba e passou a considerar o turismo como principal fonte de renda municipal (PILAN, 2006). Em 1977, foi criado o Parque Estadual da Serra do Mar, Decreto nº 10.251, este, representa a maior porção contínua preservada de Mata Atlântica no Brasil, e em 1979, foi criado o Núcleo Picinguaba, que engloba Ubatuba. Nos períodos de 1980 a 1990, foram os anos que tiveram a maior incidência de construção de casas de veraneio ou ‘’segunda casas’’ pelo Litoral Norte, foi um fator local crucial que trouxe muita urbanização e ocupação para a região, até os dias de hoje, trazendo consigo migrantes de várias outras regiões. Acarretando a mudança da paisagem natural, juntamente com a melhoria do acesso e a construção de loteamentos, com o turismo se tornando a principal fonte de renda para a população local.
59
3.2 UBATUBA HOJE
Ubatuba é um município localizado no litoral norte de São Paulo, com uma área ocupando 711km², formado pelo distrito de Picinguaba e cercado pela Serra do Mar. De acordo com a Prefeitura Municipal de Ubatuba, o município possui 102 praias, e mais de 20 ilhas fazendo divisa ao norte com o município de Paraty, e ao sul com Caraguatatuba (figura 18). De acordo com o último Censo Demográfico do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2010, a população de Ubatuba era de 78.801 pessoas e a densidade demográfica de aproximadamente, 108,87 hab/km². Porém, com os dados prévios do Censo de 2020, chegou à 92.819 habitantes, com 14.018 60
a mais que no levantamento de 2010, sendo a quinta maior cidade da região metropolitana do Vale do Paraíba. Podemos considerar que, atualmente em 2023, Ubatuba chegue à marca de 100.000 habitantes, devido a sua alta taxa de crescimento populacional.
Paraty
Ubatuba
Caraguatatuba
20km
Figura 18 – Localização de Ubatuba Fonte: autoria própria 61
Figura 19 – Paisagem da estância balneária de Ubatuba, com Praia do Itaguá à direita e Praia Grande à Esquerda.
Fonte: https://www.ubatuba.sp.gov.br/a-cidade/
O PIB (Produto Interno Bruto) da cidade de acordo com o IBGE em 2020, é de cerca de R$ 2,4 bilhões de reais, sendo que 66,1% do valor adicionado advém dos serviços, na sequência aparecem as participações da administração, defesa, educação, saúde pública e seguridade social (19,6%), da indústria (19,6%) e da agropecuária (1,8%) (IBGE, 2020). Ubatuba é uma área com 87,04% de vegetação nativa, ou seja, está dentro de uma área de domínio da Mata Atlântica. A geografia é repleta de planícies estreitas se ligando com as praias e costões rochosos, 62
além de manguezais que ocupam os cursos de alguns rios, com a existência de uma rica biota marinha. Esses foram os motivos e a justificativa da criação de diversas unidades de conservação no Município de Ubatuba como o: Parque Estadual da Serra do Mar (PESM) e Núcleo Picinguaba, Parque Estadual da Ilha Anchieta (PEIA), Parque Nacional da Serra da Bocaina (PNSB), Estação Ecológica Tupinambás (ESEC), APA Marinha Litoral Norte Setor Cunhambebe e Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) - Morro do Curussu Mirim) (PÓLIS et al., 2011).
Figura 20 – Gráfico de temperatura em Ubatuba.
Fonte: https://weatherspark.com/y/30388/Average-Weather-in-Ubatuba-Brazil-Year-Round
Ainda considerando os dados do IBGE, o PESM, tem uma área de 475 km² (67,9%) da área do município de Ubatuba que é de 711 km², restando apenas, 225 km² (32,1%) que é fora dos limites do Parque, aonde nesta área, também existem outros instrumentos legais, como, a preservação ambiental e de restrições de uso e ocupação do solo (PÓLIS et al., 2011)
De acordo com relatórios gráficos climáticos (figuras 20, 21 e 22) da empresa Weather Spark, a temperatura de Ubatuba ao longo do ano, varia de 17 °C a 32 °C, com a temperatura máxima atingindo principalmente no verão, entre os meses de dezembro e fevereiro. Já a temperatura mínima, é atingida no inverno (fig. 20).
63
Figura 21 – Gráfico de precipitação diária de chuva em Ubatuba.
Fonte: https://weatherspark.com/y/30388/Average-Weather-in-Ubatuba-Brazil-Year-Round
Figura 22 – Gráfico de direção do vento em Ubatuba.
Fonte: https://weatherspark.com/y/30388/Average-Weather-in-Ubatuba-Brazil-Year-Round 64
A região de Ubatuba se tornou um local conhecido pela grande abundância de chuva ao longo do ano, sem estação seca, por conta da presença da Mata Atlântica e das serras junto com o clima tropical úmido. Considerando isso, os períodos de maior precipitação de chuva de acordo com o gráfico (figura 21), ocorrem entre novembro e fevereiro. Assim, o mês com menor precipitação é julho, no inverno. Já em relação ao vento (figura 22) a direção predominante é o Leste. Em relação à economia, atualmente, as principais atividades econômicas são baseadas no intenso turismo e comércio local, aonde o auge de volume de vendas se encontra nas temporadas, quando a população de outras regiões vem para a região, além da construção civil e a pesca (IPT, 2022). Quanto ao uso do solo voltado para a agricultura, tanto de subsistência, quanto comercial, existem áreas em determinadas regiões voltadas para o cultivo de milho, mandioca, batata-doce, abóbora, banana, feijão e muitos outros alimentos (IPT, 2022).
Além da produção agrícola, destacando o sertão de Ubatumirim, onde foi criado no bairro a Cooperativa Agrícola da Pupunha (COAP), incentivando o plantio na região. De acordo com o Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) do Litoral Norte, elaborado pelo Gerenciamento Costeiro (GERCO) em 2017, decreto Estadual nº 62.913, Ubatuba se encontra com o maior número de parcelamento do solo comparado aos outros municípios, com um índice de ocupação elevada. A grande parte do uso do solo é pela área central, onde compreende a maioria dos estabelecimentos de comércio e serviços, com as áreas do Norte (próximo a Lagoinha) e sul com bastante terrenos vazios (JORGE, 2004). No que diz respeito à infraestrutura de saneamento básico, que é executada pelos serviços da concessionaria SABESP (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), o trabalho é feito apenas na região do Centro de Ubatuba, com o resto das outras áreas ficando à mercê de outros métodos para o tratamento do esgoto (JORGE, 2004). Por conta da falta de 65
recursos públicos de algumas localidades, isto impacta diretamente no esgoto doméstico e na qualidade de vida dessas pessoas, aonde em geral, fazem o tratamento por meio de fossa séptica. Além do abastecimento de água, que é igualmente carente na região, sendo também restrito apenas onde tem a maior densidade populacional. Assim, a outra parte da população (das áreas do Sul e Norte) se abastece a partir de ‘’soluções individuais ou coletivas, captando água diretamente de nascentes e córregos das encostas, através de mangueiras, ou lençol freático, com a perfuração de poços’’ (JORGE, 2004). Portanto, mesmo com a preservação do PESM no município de Ubatuba, o elevado índice de urbanização e ocupação na região, a exploração ilegal e o turismo de veraneio ainda são um problema sério a ser enfrentado, este último, sendo mais evidenciado principalmente em épocas de verão (dezembro a março) aonde a população flutuante de cerca de 300 mil pessoas procura o litoral por sua exuberância de praias cris66
talinas e paisagens de tirar o folego (MELO; FURLAN, 2017). Todas essas questões trazem consigo a alta demanda por residências secundarias, além de hotéis e pousadas (normalmente de luxo), ocasionando na especulação imobiliária, e na descaracterização e destruição dessas paisagens naturais. Por meio de deslizamentos da mata na Serra do Mar, desmatamento, inundações, derrubada de árvores e muitos outros desastres naturais que já são frequentes nos dias de hoje. Podemos comprovar as consequências disso, por exemplo, no acontecimento do mês de fevereiro de 2023, que segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), foi o mês que mais houve abundância de chuva na região e em todo o país. Foi evidenciado muitos deslizamentos em várias áreas do Litoral Norte, sendo São Sebastião a região mais afetada (O GLOBO, 2023). Tudo isso ocasionado por uma implementação turística mal gerenciada por parte da Prefeitura Municipal local. ‘’Precisamos ser críticos a essa ideia plasmada de humanidade homogênea na qual
há muito tempo o consumo tomou o lugar daquilo que antes era a cidadania’’ (KRENAK, 2019, p. 12).
67
3.3 A TERRITORIALIDADE NO QUILOMBO DA CAÇANDOCA O território do quilombo da Caçandoca, com uma área de 890 hectares, está situado na região sul do município de Ubatuba, fazendo divisa com Caraguatatuba (fig. 23), próximo a praia da Maranduba. O acesso é feito por uma estrada de terra pela rodovia Rio-Santos (BR-101). De acordo com Haesbaert (2004, p. 3), território é ‘’em diferentes combinações, funcional e simbólico, pois exercemos domínio sobre o espaço tanto para realizar “funções” quanto para produzir significados. O território é funcional a começar pelo território como recurso, seja como proteção ou abrigo. Já para Santos (2011, p. 80-81) “O modelo cívico forma-se, entre outros, de dois com68
ponentes essenciais: a cultura e o território.’’ Enquanto a territorialidade, para Duarte (2009, p. 5) significa ‘’além de incorporar uma dimensão estritamente política, diz respeito também às relações econômicas e culturais, pois está intimamente ligada ao modo como as pessoas utilizam a terra, como elas próprias se organizam no espaço e como elas dão significado ao lugar”. Silva (1996, p. 2) compartilha do mesmo pensamento quando afirma que ‘’a territorialidade apresenta-se como uma criação da mente, no esforço mental, de indicar uma relação homem-natural, que implica em um sentimento de posse e afeição’’ Portanto, a territorialidade
Paraty
Ubatuba
Caraguatatuba
20km
Figura 23 – Localização do quilombo da Caçandoca, em relação à Ubatuba e seus municípios vizinhos Fonte: autoria própria.
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Praia Figueirda a
Praia Ponta da Aguda
Praia Lagoa da 2.000m
do Tamanduá Figura 24 – Localização aproximada do quilombo da Caçandoca, mostrando o entorno, sistema viário, e as curvas de níveis Fonte: autoria própria.
70
LEGENDA Estrada de acesso Rodovia RioSantos (BR-101) Área do quilombo Curva de nível
Figura 25 – Núcleos e praias do quilombo da Caçandoca, e estrada/trilhas (em vermelho)
Praia da Caçandoca Praia da Caçandoquinha Ponta do Tapuá x100
Praia Saco da Raposa
x200
Ponta do meio
x300 x500
x400
Ponta Lisa
Ponta Grossa Praia Saco das Bananas x180
Praia Saco do Morcego
Praia do Simão ou Praia Brava do Frade Ponta do Frade
LEGENDA Estrada e trilhas Curva de nível
Fonte: autoria própria. 71
Figura 26 – Praia da Caçandoca Fonte: https://www.curiosidadesdeubatuba.com.br/quilombo-da-cacandoca/
Figura 27 – Praia da Caçandoquinha Fonte: https://www.curiosidadesdeubatuba.com.br/quilombo-da-cacandoca/
Figura 28 – Praia Saco da Raposa Fonte: https://www.curiosidadesdeubatuba.com.br/trilha-do-saco-das-bananas/ 72
Figura 29 – Praia Saco das Bananas, com construções remanescentes Fonte: https://www. curiosidadesdeubatuba. com.br/trilha-do-saco-dasbananas/
Figura 30 – Praia do Simão ou Praia Brava do Frade, com Ilha do Tamanduá em vista Fonte: https://www. curiosidadesdeubatuba. com.br/praia-do-saco-dasbananas/ 73
LEGENDA Zona 1 Zona 2 Zona 3 Curva de nível
Figura 31 – Zoneamento do quilombo da Caçandoca Fonte: autoria própria.
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em si traz a ideia de pertencimento a um território, e a preocupação com o destino e construção de um futuro, atrelado a um determinado espaço, trazendo características baseadas nos costumes, cultura, identidade da população e suas relações sociais. A comunidade é formada por 50 famílias, sendo distribuída por 8 núcleos habitacionais, sendo: a Caçandoca, Sertão da Caçandoca, Bairro Alto, Saco da Raposa, Ponta Grossa, São Lourenço, Saco das Bana74
nas, e Praia do Simão ou Brava do Frade (figura 25). Em relação ao uso e ocupação do solo do território, de acordo com a revisão do Zoneamento Ecológico-Econômico do Setor do Litoral Norte, foi estabelecido normas de uso e ocupação do solo e de manejo dos recursos naturais na área do quilombo, como mostra o mapa de zoneamento (fig. 31). A maior parte da área da Caçandoca, pertence à Zona 1, a qual o seu uso é permitido
para pesquisa científica; manejo sustentável; sistemas agroflorestais, beneficiamento e processamento artesanal de seus produtos, assim como atividades relacionadas à cultura e ao modo de vida das comunidades tradicionais, garantindo que não prejudique a função ambiental da área; educação ambiental; ecoturismo com a infraestrutura necessária às atividades; pesca artesanal; e ocupação humana de baixos efeitos impactantes e de características rurais. A região da Praia Saco das Bananas e Praia Saco da Raposa se encontra na Zona 2, que permite as atividades da Zona 1 e também aquicultura, mineração e assentamentos humanos dispersos com pouca população e pouca integração entre si. Já a região do sertão e da Praia da Caçandoca se encontra na Zona 3, a qual permite, além dos citados anteriormente na Zona 1, atividades agropecuárias e silvicultura, desde que sejam compatíveis com as características ambientais da região. Importante ressaltar que, a área da Praia do Pulso, que se encontra ao norte da praia da Caçandoca (como mostra na figura 24), onde existe um condo-
mínio de luxo no qual alguns quilombolas trabalham, não foi reivindicada na proposta de titulação, mas apesar disso, fazia parte das terras tradicionais destes. No século XIX, a comunidade era uma fazenda de café, e estava sob o regime escravagista, época que o porto de Ubatuba estava no auge, e vários escravos chegavam clandestinamente, aonde normalmente vinham da África e Minas Gerais, desembarcando nas costas do solo brasileiro, como também, na própria fazenda da Caçandoca, como foi citado no capítulo anterior por Pillan. Em 1858, essa fazenda foi comprada por José Antunes de Sá, no local era produzido cana-de-açúcar e aguardente, onde depois, eram comercializados. A fazenda abrangia 3 engenhos, onde se localizavam na Caçandoca, Saco da Raposa e Saco da Banana, e estes, eram administrados por três filhos do proprietário, chamados: Idísio, Marcolino e Simphonio. Os três, acabaram se relacionaram com algumas escravas da fazenda, que futuramente, engravidaram e tive75
ram numerosos filhos. Logo após a abolição da escravatura em 1888, os descendentes, ex-escravos e netos legítimos do José Antunes de Sá, tirando os que se mudaram para outras regiões vizinhas, se tornaram posseiros ou trabalhadores das terras da fazenda (SCHIMITT, 2000). A comunidade foi sendo formada a partir desses núcleos familiares citados, por consequência, da relação inter-racial entre famílias que descendem de uniões entre homens brancos e mulheres negras, como por exemplo, o Gabriel de Oliveira dos Santos e Rosária Vitória, moradores da comunidade, que descende de dois escravizados. Além de indígenas que também entraram no grupo (INCRA et al., 2016). Pela decadência do café no litoral, nos fins do século XIX, o proprietário da fazenda, José de Sá, abandonou a mesma em 1881, e a partir daí a comunidade aderiu o cultivo da banana e mandioca onde eram trocados ou vendidos entre as comunidades vizinhas. Além de que, para sua subsistência, os moradores usufruíam da pesca, caça e manejavam a mata plantando 76
roças para consumo próprio (SCHIMITT, 2000). Durou muitos anos na comunidade, este modo de vida muito semelhante ao da caiçara, do começo do século até meados da década de 1960, quando novos processos de uso do território desestruturaram uma antiga ordem vigente. Mais para a frente, os 8 núcleos habitacionais mencionados ao longo da costa do quilombo, foram se tornando bairros rurais onde cada família tinha sua posse de terra e roça, que compartilhava uma área da floresta. Em 1960, segundo o instituto Pólis (2013), estima-se que na comunidade da Caçandoca moravam 70 famílias, com 800 pessoas, em sua maioria afrodescendentes (negros e mestiços), este número diminuiu absurdamente ao passar dos anos, onde a comunidade começa a passar por sérios conflitos relacionados as terras do território e seu modo de vida. Consequência disto, foi a abertura da rodovia Rio-Santos em 1970, que permitiu o acesso a comunidade, onde trouxe grileiros e especulado-
Figura 32 – Moradora da Caçandoca segurando um cacho de banana
Fonte: Junior Machado (2018).
77
res imobiliários para dentro do território, expulsando os moradores a força. Fato esse que, foi marcado e traz fortes resquícios, memórias e instabilidades até hoje na comunidade feitos pela empresa Urbanizadora Continental. Onde, representantes dessa empresa fizeram propostas de compra do território da Caçandoca aos moradores, e foi prometido por essas pessoas, que não pediriam para a comunidade sair do local (não foi feito nenhum contrato e nada foi assinado), e parte dos moradores não concordaram com a proposta. Mas, a promessa por parte da empresa não foi cumprida, durante um tempo depois, agentes imobiliários voltaram a comunidade, e pediram para os moradores se retirarem da região, quando notaram que as pessoas não iriam sair, começaram a fazer fortes ameaças, e quando estes resistiam, ateavam fogo nas casas, onde acarretava no final, na população desalojada na estrada sem ter para onde ir. Parte das famílias foram morar em regiões vizinhas do litoral, como Caraguatatuba, Santos, Vale do Paraíba, Gua78
rujá e outros lugares próximos (SCHIMITT, 2000). Inclusive, as ruinas da casa-grande foram demolidas em 1974 pela empresa Urbanizadora, a qual também tentou demolir a Igreja que se encontra na orla da praia da Caçandoca, que é considerada um patrimônio histórico coletivo por parte dos moradores. A Igreja foi fechada pela empresa, e os moradores resistiram, se juntaram e criaram em 1987, a Associação para Melhoramentos da Caçandoca, com o objetivo de reabri-la, assim, afirmando a posse de terra no território (SCHIMITT, 2000). Outro acontecimento que foi marcado dentro da comunidade, foi a criação do Parque Estadual da Serra do Mar, e do núcleo Picinguaba que se encontra dentro do município de Ubatuba, essas implementações por parte do Estado, impossibilitaram as práticas tradicionais e o modo de vida da comunidade e de tantas outras que vivem as margens e bordas do PESM. As leis ambientais que abrangem o PESM, restringe os moradores de diversas atividades,
que antes eram feitas normalmente pelo seus ancestrais, aonde o arcabouço jurídico e fiscais começaram a entrar e fiscalizar o território. Tornou-se ilegal a queimada e derrubada de áreas (prática chamada de Tiguera ou Pousio pelos moradores da Caçandoca), e a atividade de plantio e roça (técnica da Coivara). Com isso, a atividade agrícola que era o meio de subsistência da comunidade, voltou-se para o comércio urbano, onde os moradores procuram alimentos, especificamente em Caraguatatuba por ser o centro urbano mais próximo. Como relata Neimar Lourenço, uma das lideranças da comunidade Caçandoca e integrante da Coordenação Nacional da CONAQ: O nosso maior sonho é sermos respeitados enquanto quilombolas. Existe hoje um racismo institucional que vem condenando as práticas e os saberes tradicionais, principalmente nas áreas de parque e reserva. Práticas da agricultura, da pesca, da construção das casas são criminalizadas. As comunidades não destroem o território, ele é preservado por causa das práticas quilombolas. Agora, as comunidades crescem, tem filhos, precisam construir mais casas para viverem
ali. Como explicar para uma pessoa de 88 anos que ela não pode viver segundo seus modos tradicionais? O saber tradicional também tem que ser mais valorizado, nossos chás e ervas. É necessário mais fomento para a cultura da comunidade para que ela não se perca’’ (INCRA et. al., 2016, p.17).
Após a elaboração e o lançamento do artigo 68 do ADCT de 1988, surgiu a necessidade da comunidade se fortalecer de alguma forma, então em 1998, foi fundada a Associação dos Remanescentes da Comunidade do Quilombo da Caçandoca (ARCQC), e os grupos entraram em contato com o Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva” (ITESP), onde deu início ao processo de regularização fundiária da área solicitada pelos moradores. A população ocupou pela primeira vez parte da área reivindicada. E só em 2000, segundo dados analisados dentro da comunidade pela ITESP, como foi dito, a Fundação Cultural Palmares reconheceu a comunidade como Remanescente de Quilombo, com uma área de 890 hectares, o resto, que seria 210 hectares, estavam ainda, ocupados pela Urbani79
Figura 33 – Neimar Lourenço no Centro Comunitário ‘’Flavio Firmino dos Santos’’. Fonte: autoria própria. 80
zadora Continental. Em 2001, com a garra e vontade de lutar por seu território, algumas famílias voltaram para um trecho ao longo da estrada de acesso que liga Caçandoca à rodovia Rio-Santos, mais para a frente, outras 30 pessoas iriam se juntar ao grupo também, porém, vivendo em condições precárias. Tiveram o apoio do Ministério Público Federal neste momento, e o órgão requereu ao juiz de Ubatuba que fosse revogada a liminar de reintegração de posse, que antes, foi concedida a Urbanizadora (SCHIMITT, 2000). Foram várias as tentativas da empresa imobiliária de retomar as terras dos quilombolas e expulsá-los, mas estas, eram sempre revogadas e adiadas. Apenas em 2005, ocorreu de fato a reintegração de posse para a Urbanizadora Continental, pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). No entanto, a ameaça de despejo aos moradores da Caçandoca chamou a atenção de muitas pessoas que se sensibilizaram pela situação, como associações de quilombos e entidades do Movimento Negro, como por exemplo, os representan-
tes da CONAQ que entregaram uma carta, em 2005, para a Secretaria Estadual de Justiça (SCHIMITT, 2000). Em junho de 2005, o Tribunal de Justiça de São Paulo, suspendeu a liminar de reintegração de posse da área da Caçandoca cedida para a Urbanizadora. Logo depois, o INCRA elaborou o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), ‘’o relatório é constituído por um conjunto de peças técnicas e antropológicas que documentam a história da comunidade, sua formação e ocupação do território’’ (FCP, 2005), que foi escrito pela antropóloga Alessandra Schmitt, no ano de 2000. Com isso, a Caçandoca recebeu da FCP a certidão de autorreconhecimento como comunidade remanescente de quilombo, conforme o Decreto Federal 4887/2003. E em dezembro, logo após o RTID da comunidade ser publicado no Diário Oficial da União pela Portaria da presidência e pelo INCRA, no dia 5 de dezembro de 2005, fez-se o reconhecimento das terras como pertencente aos quilombolas, pela Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cida81
dania. Este marco abriu novos caminhos para a comunidade. Em 2006, o TJSP decretou os 210 hectares como área de interesse social, com isso, desapropriando a empresa Fazenda Maranduba. Porém, atualmente, a comunidade ainda não tem a titulação dos 890 hectares reconhecidos e garantidos por lei, encontrando-se ainda na posse de 410 hectares, ficando à mercê do governo estadual e federal finalizar a regularização de suas terras (SCHIMITT, 2000). Atualmente, a comunidade guarda características da vida caiçara, que foi o resultado do encontro de várias culturas diferentes no território. Muitos moradores da Caçandoca vivem do turismo para a geração de renda, aonde alguns, construíram quiosques na orla da praia e trabalham recebendo os turistas, oferecendo o serviço de guia de base comunitária, outros administram os estacionamentos, além da venda de artesanato (fig. 34) que se encontra na sede do Centro Comunitário na entrada da comunidade e em outros edifícios dispostos ao longo do quilombo. 82
Ainda tem outros que trabalham na sede da Prefeitura, e em condomínios pelas regiões vizinhas, como por exemplo, no condomínio da Praia do Pulso, que fica ao lado da Caçandoca. Outros moradores praticam a pesca artesanal e coleta de mariscos, além do cultivo da banana (fig. 35), que é uma importante fonte de renda no território desde o século XIX, juntamente, com a mandioca. A religião e a festividade dentro da comunidade é algo forte no modo de vida tradicional dos quilombolas, onde predominam tanto católicos, quanto evangélicos, mesmo a primeira sendo a mais predominante na comunidade desde o passado. Os moradores realizam festas religiosas como as de ‘’Santana, São Benedito, São João, Santo Antônio, São Pedro, São Bom Jesus, Nossa Senhora do Carmo e São Gonçalo. Danças de matriz afro-brasileira, como o Moçambique, faziam parte das festas de santo, especialmente as dedicadas a santos negros’’ (INCRA et al., 2016, p. 7). Em relação a educação, no território funcionava duas escolas de ensino primário, em 1994, no Saco das Bananas, e
Figura 34 – Venda de artesanato no Centro Comunitário ‘’Flávio Firmino dos Santos’’
Fonte: Helena Sanchez 83
Figura 35 – Morador da Caçandoca trabalhando com o plantio da banana Fonte: Wendell Marques (2012). 84
Figura 36 – Santuário quilombola
Fonte: Isabela Rojo (2021)
em 1997, na Praia da Caçandoca. As duas escolas municipais foram fechadas, pela quantidade insuficiente de alunos para a permanência das atividades, como relatou a Prefeitura de Ubatuba. De acordo com o mapa (figura 37), as únicas escolas mais próximas fora da comunidade é a Escola Áurea Moreira Rachou e a Escola Virgínia Lefevre que se localiza no bairro Sertão da Quina, em Maranduba, aonde os alu-
nos se locomovem para o local com um ônibus escolar municipal. Quando o ônibus não está disponível, como por exemplo, em dias de chuva, por conta de algumas partes da estrada que liga a rodovia Rio-Santos não ser asfaltada, as crianças e jovens são deixadas na entrada do condomínio do Pulso pelo motivo do ônibus não conseguir transitar, onde elas são obrigadas a percorrerem 2km para chegar até suas casas. 85
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Estrada de acesso Rodovia Rio-Santos (BR-101) Área do quilombo Escolas Ponto de Ônibus
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Figura 37 – Mapa mostrando a distância das 2 escolas e o ponto de ônibus mais próximo em relação ao quilombo da Caçandoca. Fonte: autoria própria 87
Além disso, existe o trajeto de 5 km até o ponto de ônibus mais próximo, consequentemente dificultando ainda mais o acesso à educação para quem não possui transporte próprio. Hoje, a comunidade reivindica a reativação da escola na Caçandoca, tanto para o ensino primário quanto para o ensino de jovens e adultos com cursos profissionalizantes (LUCCHIARI; ISOLDI, 2015). Porém, há um fator preocupante e circundante nessas questões, que é a escolha do professor para ensinar as crianças e jovens na escola, vemos que em sala de aula não são tratados os temas referentes à realidade local, como a história e formação do quilombo, o significado da resistência e da posse da terra. Alex Garrido, biólogo, pesquisador de currículo e educação decolonial, participa desse processo formativo junto com a comunidade da Caçandoca, criando comitês de educação dentro do território. Em uma entrevista elaborada pela CENPEC (Centro de Referências em Educação Integral) em 2021, o Portal faz a seguinte 88
pergunta para Alex: ‘’(...) como se estabelece o diálogo entre o currículo escolar e os saberes tradicionais quilombolas e caiçaras?’’. Alex, responde: Uma das atividades, Contação de Histórias, Oralidade e Arte, desenvolvida na Escola do Quilombo da Caçandoca em Ubatuba (litoral norte do estado de São Paulo), acerca da Educação Diferenciada. Tivemos a presença do Mestre Griô Senhor Horácio Marcolino que no campo da oralidade nos abrilhantou com os conhecimentos históricos de sua infância, adolescência e juventude. Destacou o período escolar e suas brincadeiras vivenciadas na escola do Quilombo da Caçandoca. Trouxe elementos significativos de como fazer a roça, o que era uma rama de mandioca, plantio agroecológico. Relatou ainda sobre a casa de farinha e toda a sua produção para geração de renda e da importância da farinha de mandioca para a relação socioeconômica das famílias no território quilombola. Busquei interpolar informações do Ensino de Ciências e apresentar e elementos conceituais acerca da alfabetização científica, sobre o conteúdo de Botânica, respiração celular das plantas, nutrientes do solo, questões de sustentabilidade no plantio agroecológico
e as relações socioeconômicas advindas da cultura quilombola. Entre outras narrativas, o Mestre Griô Horácio contou sobre a ciranda que faziam em frente à escola. Enquanto aprendíamos e ensinávamos, as educandas e os educandos desenhavam a história em papéis, que depois foram projetados em desenhos no pano e pintados pelos educandos, que recontaram as histórias apresentadas na oralidade do Mestre Griô Horácio Marcolino (CENPEC, 2021).
de vida dessa população, restando apenas o passado como marco presente na memória dos mais velhos que vivenciaram a vida coletiva na comunidade para contar aos seus filhos e netos. Kretutz (1999, p. 17) ressalta que “(...) a identidade étnica vai se reconstruindo e reconfigurando ao longo do processo histórico. Não se pode entendê-la como algo dado, definido plenamente desde o início da história de um povo”.
Portanto, é necessário e fundamental que entre o ensinar e aprender, exista uma escola dentro da comunidade, cujos professores façam parte da realidade local e que estejam preparados para tratar dos temas relevantes as situações da Caçandoca e da população negra em geral. Como diz, Paulo Freire, ‘’o diálogo é um instrumento potente e construtor de novas sínteses. Não há saber mais ou menos, há saberes diferentes’’ (1987, p. 78).
Mesmo assim, a comunidade ainda luta pelos seus direitos, pelo seu desenvolvimento a partir de políticas públicas e pela titulação do seu território.
Atualmente, por conta das atividades que foram restritas na comunidade, acabou trazendo consigo um sentimento de afastamento comunitário, impactando no modo 89
Figura 38 – Criança estudando, morador da Caçandoca.
Fonte: Junior Machado (2018)
90
Figura 39 – Painel criado pelos moradores no Centro Comunitário, com o intuito de deixar a memória da comunidade viva, através de registros do quilombo de anos atrás até os dias de hoje
Fonte: autoria própria 91
3.3.1 A SUBJETIVIDADE DO ESPAÇO E O MODO DE MORAR NA CAÇANDOCA (...) morar, residir e habitar são verbos que possuem significados semelhantes, mas que se diferem pelos valores que cada cultura lhes atribui. Os termos expressam duas características inerentes a todas as habitações: a sua condição constitutiva, a qual se refere aos aspectos materiais, e a sua condição simbólica, que engloba a construção cultural de cada sociedade refletida na natureza de sua ocupação (FARIAS, 2011, p. 20).
Reconhecer o modo de habitar de um determinado grupo é de extrema importância, para que não ocorra imposições controversas e autoritárias, não sendo ligadas com a cultura do local, como já foi mencionado no presente trabalho inúmeras vezes. Portanto, ‘’O sentimento de per92
tencimento e vivencias destes lugares é o elo para as identificações e construções identitárias’’. Diante disso, neste tópico será analisado o levantamento da área projetual deste trabalho, sendo a área do sertão e praia da Caçandoca, por meio de mapas e fotografias da comunidade. Juntamente, considerando o relatório e mapa de reconhecimento elaborado pelo INCRA e ITESP em 2018. Foram notados aspectos característicos das construções e do modo de morar da comunidade. Como citado anteriormente o acesso viário à comunidade se dá pela Estrada da Caçandoca, aonde em sua predominância é de terra (figura 41) se estendendo por 5km, com
o início localizado em uma entrada na BR-101, do trecho da Rio-Santos. Devido às condições topográficas, a Estrada não possui capacidade para a passagem de transporte público coletivo, assim, os moradores da comunidade
que não possuem veículos, consequentemente precisam realizar uma caminhada de 5km, até chegar no ponto de ônibus mais próximo, localizado no encontro da Estrada da Caçandoca com a BR-101, como mostra o mapa (figura 40).
Figura 41 – Estrada e placa de entrada do quilombo da Caçandoca
Fonte: autoria própria
93
Praia da Caç Sertão da Caçandoca
94
LEGENDA Estrada de acesso Rodovia Rio-Santos (BR-101) Área da Caçandoca Ponto de ônibus
çandoca
2.000m
Figura 40 – Sistema viário e mobilidade Fonte: autoria própria 95
x100
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Área historicamente ocupada comunidade do quilombo
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Sertão da Caçandoca
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LEGENDA
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aça 500m
Moradia Associação e escola Igreja, casas de culto e de reza Infraestrutura (garagens, depósitos, caixas d’ água, banheiros, etc...) Comércio (quiosques, bares, trailers, mercearias, etc...) Edifício construído em taipa de mão pelos moradores Área destinada para multiuso Área destinada para edificação Área de camping Áreas de cultivo (roça, plantas medicinais) Produção (hortas, galinheiros) Estrada Trilhas Córrego e nascentes Curva de nível
Figura 42 – Mapa de levantamento do uso do solo no sertão e na praia da Caçandoca Fonte: autoria própria, usando de base os dados elaborados pelo relatório da ITESP em 2018. 97
A primeira edificação que as pessoas se deparam ao chegar à entrada do quilombo é o Centro Comunitário (figura 43), que se encontra à alguns metros antes da orla da praia. O espaço é distribuído em 2 ambientes com uma mescla de materiais construtivos. Um ambiente foi construído com
material local, de pau a pique e o outro recente, de alvenaria cerâmica, com a cobertura de telha de fibrocimento. O espaço com os fechamentos em taipa é voltado tanto para reuniões e apresentações quanto para atividades escolares, oficinas e vendas de artesanato (figura 44). O
Figura 43 – Fachada de acesso do Centro Comunitário ‘’Flavio Firmino dos Santos’’. Fonte: autoria própria. 98
ambiente recentemente construído de alvenaria, se dispõe de uma cozinha de apoio e é organizada em seu interior por bancadas e um forno a lenha construído de alvenaria (figura 46).
Ao lado do Centro Comunitário, está sendo construído um novo edifício que será complementar a ele, o objetivo é que sirva de escritório à Associação da comunidade (fig. 47)
Figura 44 – Espaço do Centro Comunitário voltado para oficinas, reuniões e exposição/venda de artesanatos. Observa-se na mesa a variedade de artesanatos como: bonecas amigurumis e abayomis, colares confeccionados com escamas de peixe, bordado com fibra de bananeira, colares de missangas, filtros do sonho e tantos outros.
Fonte: autoria própria. 99
Figura 45 – Aberturas e fechamentos com tecidos e materiais locais
Fonte: autoria própria.
100
Figura 46 – Cozinha de apoio do Centro Comunitário.
Fonte: autoria própria.
101
As técnicas construtivas e os materiais usados na comunidade são variados. A primeira técnica construtiva utilizada foi a taipa-de-mão e a
madeira, sendo muito evidenciados no Centro Comunitário como foi mostrado anteriormente, quiosques e nas construções mais antigas da região.
Figura 47 – Construção do novo escritório para complementar o Centro Comunitário, mostrando as fundações e estrutura.
Fonte: autoria própria. 102
Hoje, existem muitas construções mistas na Caçandoca, mas em geral, a maioria dos moradores usam a alvenaria nas construções (figuras 49, 51, 54, 55 e 61), com o uso da madeira, taipa de mão ou
pau a pique (figuras 50, 52, 56 e 63) sendo vista em menor quantidade, parte disso, na maioria das vezes é por conta da influência de fatores externos, legislações ambientais e a crença que os materiais são
Figura 48 – Um dos acessos às casas e loja de artesanato. Fonte: autoria própria. 103
Figura 49 – Detalhe da materialidade da casa construída de bloco cerâmico. Fonte: Junior Machado (2018) 104
ultrapassados para os dias de hoje, contribuindo para esse fator. Portanto, a alvenaria é o material mais predominante na região.
O sertão é predominantemente residencial, na área da estrada municipal contém edificações residenciais e institucionais, sendo o Centro Comunitário e a gruta de Nossa Senhora.
Figura 50 – Casa construída de madeira e alvenaria cerâmica
Fonte: Junior Machado (2018) 105
Figura 51 – Sala de estar no acesso da casa, com morador descansando na rede, que se encontra na área externa
Fonte: Junior Machado (2018)
106
Figura 52 – Casa antiga construída de barro e madeira.
Fonte: Wendell Marques (2012)
107
Figura 53 – Cozinha externa de apoio com fogão a lenha
Fonte: Wendell Marques (2012)
108
Figura 54 – Casa construída de alvenaria. Nota-se a predominância de beirais longos, janelas de madeira tipo veneziana, e varandas extensas, servindo como ponto de descanso e convivência
Fonte: autoria própria
109
Figura 55 – Casa antiga construída de alvenaria na praia da Caçandoquinha. Podemos observar a pequena elevação da casa do solo, a predominância de janelas de madeira tipo veneziana, e a varanda servindo como ponto de convivência e descanso
Fonte: Isabela Rojo (2021)
110
Figura 56 – Moradores construindo um restaurante usando a técnica de pau a pique. Observa-se as estruturas de madeira, e paredes com reboco, feito de cimento barro e areia, e cobertura com telha de fibrocimento
Fonte: Isabela Rojo (2021) 111
Na chegada da orla da praia, podemos observar vias e trilhas espontâneas de terra, variando de 3 a 4 metros de largura para os pedestres e 10 metros para os carros. A área é grande e de grama baixa e ras-
teira, com a paisagem longa e circundante. Na orla e beira da praia, contém muitos quiosques (fig. 57, 58, 59 e 64), além do uso institucional e misto, que também são presentes na região,
Figura 57 – Vista aérea da praia da Caçandoca, mostrando a ocupação
Fonte: https://caminhosdosup.com.br/maranduba-quilombo-mosteiro-e-praia-deserta/ 112
como a Escola Municipal (fig. 62) que está em processo de reativação como foi citado anteriormente, a Igreja Nossa Senhora Aparecida (fig. 59), uma pequena garagem de depósito de canoas (fig. 60),
camping, estacionamento e alguns espaços para a infraestrutura voltada ao turismo, como banheiros, garagens e caixas d’água.
Figura 58 – Vista aérea da praia da Caçandoca, mostrando a ocupação
Fonte: https://caminhosdosup.com.br/maranduba-quilombo-mosteiro-e-praia-deserta/ 113
Figura 59 – Vista aérea da praia da Caçandoca. Nota-se alguns quiosques, e ao fundo a Igreja Nossa Senhora Aparecida
Fonte: https://caminhosdosup.com.br/maranduba-quilombo-mosteiro-e-praia-deserta/
114
Figura 60 – Depósito/garagem de barcos, construído com estrutura de bambu e madeira com uma mescla de tijolos.
Fonte: autoria própria. 115
Figura 61 – Casas construídas de alvenaria com extensas varandas, em frente a orla da praia da Caçandoca
Fonte: autoria própria
116
Figura 62 – Escola que está em processo de reativação
Fonte: Isabela Rojo (2021). 117
Existe um pequeno edifício que foi construído pelos moradores, com a ajuda de alguns estudantes fora da comunidade (fig. 63). Em especial, com a técnica da taipa de mão, para servir como casa de artesanato e mostrar às crianças a técnica historicamente utilizada no território. No que se refere, a infraestrutura da comunidade, segundo Laura Cerutti (2022), as regiões mais afastadas da orla da praia, que é a parte do sertão, próximas a estrada
municipal, apresentam a maior escassez de energia elétrica, em contraponto das áreas próximas da praia, que tem total disponibilidade de energia elétrica. Diante disso, podemos concluir que o uso das edificações e uso do solo na área da praia da Caçandoca é de predominância residencial e com a técnica construtiva mista. A alvenaria se tornou o material mais predominante na região, sendo as vezes usado com mesclas de outros materiais
Figura 63 – Espaço construído com a técnica da taipa de mão pelos moradores junto com estudantes de fora da comunidade, localizado na orla da praia da Caçandoca.
Fonte: autoria própria 118
construtivos. Juntamente, com as edificações voltadas ao uso comercial e serviços como
é notado no mapa de levantamento (figura 42).
Figura 64 – Quiosque próximo ao Rio Grande. Fonte: autoria própria. 119
Figura 65 – Croquis realizados no dia da visita à comunidade. O primeiro representa o Centro Comunitário "Flávio Firmino dos Santos", e o segundo retrata o espaço criado pelos moradores em colaboração com estudantes de fora.
Fonte: autoria própria. 120
Figura 66 – Croquis realizados no dia da visita à comunidade. O primeiro croqui retrata a casa de um morador, o segundo representa a Igreja Nossa Senhora Aparecida e o terceiro descreve a Escola.
Fonte: autoria própria. 121
122
ESTUDOS DE CASO
123
4.1 PARÂMETROS DE ANÁLISE
- Estejam inseridas em um contexto rural, a fim de aproximar, de modo comparativo, com o território da Caçandoca; - Empreguem técnicas mistas de construção (tradicionais e contemporâneas); - Disponham de técnicas de ventilação e iluminação natural; - Façam uso de cobertura treliçada e beirais longos. Foram escolhidas três obras para a análise, sendo um projeto de habitação acompanhada por um masterplan, uma sala de aula e um centro comunitário. Das 3 obras, 2 estão localizadas no continente africano, e a outra, no Brasil. A primeira obra é das residências da comunidade de 124
Benga Riverside de Moçambique, projetada pelo arquiteto Diébedo Francis Keré; A segunda é o Pavilhão Kali em Uganda, sendo uma pequena sala de aula de ensino médio elaborado pelas arquitetas Irene Librando e Nadia Peruggi; E por último, o Centro Comunitário de Camburi, localizado em Ubatuba, no Brasil e projetada pelo arquiteto Sven Mouton. As obras escolhidas dialogam com a região da Caçandoca, seja pelo clima, contexto inserido, cultura, materialidade da construção, ou tradições do local.
4.2 COMUNIDADE RESIDENCIAL BENGA RIVERSIDE Local: Tete, Moçambique Ano: 2014 Arquitetura: KéréArchitecture Área total: 10000m2 Tempo de execução: em construção
O projeto está localizado nas margens do rio Revúobé e Zambezi, e foi pensado e projetado a partir de demandas da comunidade local de Tete, onde os moradores necessitavam de uma nova tipologia de moradia coletiva para o bairro,
Figura 67 – Render de uma das habitações mostrando o pátio central.
Fonte: KéréArchitecture 125
por consequência do crescente investimento de indústrias que existe na região. Diante desse contexto, Francis Kéré propôs soluções de casas econômicas, com preços acessíveis e de qualidade para as famílias locais e migrantes, colocando como ponto crucial a sustentabilidade e questões a serem implantadas de médio à longo prazo. Além de que, o objetivo é que as construções novas se integram com o seu entorno atual, com as necessidades educacionais e recreativas da população sendo o foco principal do projeto, fomentando a vida coletiva e comunitária da comunidade. Como por exemplo, por meio de instalações esportivas, uma escola primária, restaurantes, praça pública, centro comunitário e as mais de 100 residências, todos estes edifícios unem as necessidades privadas e públicas. Podemos observar este contexto no masterplan do projeto (figura 68). Numa implantação modular e formato em “L”, cada tipologia das unidades habitacionais propostas (figuras 69 e 70) são organizadas em seu interior por uma grande 126
cozinha, duas salas comuns, um banheiro e duas suítes. As dimensões dos ambientes são bem generosas e isso faz com que os moradores possam dar usos variados para cada espaço, se abrindo para a área externa onde se encontra o pátio, servindo como um ponto de encontro para as famílias. Este sistema de ser aberto para o exterior desafia a atual tipologia popular de condomínio fechado que isola os residentes da paisagem, aonde neste projeto de Benga Riverside, a paisagem se torna um eixo norteador para o projeto com os moradores usufruindo de vistas panorâmicas. As residências foram projetadas levando em consideração que podem ser implantadas em configurações variadas em relação ao norte do lugar e a direção dos ventos, com isso, garantindo unicidade por meio de diferentes orientações, permitindo um processo de construção padronizado e econômico.
Figura 68 – Masterplan do desenvolvimento do projeto proposto.
Fonte: KéréArchitecture
127
Figura 69 – Planta tipo 1 de uma das moradias.
Fonte: KéréArchitecture 128
Figura 70 – Planta tipo 2 de uma das moradias.
Fonte: KéréArchitecture 129
Figura 71 – Implantação com as moradias, a escola, o clube esportivo e a praça pública.
Fonte: KéréArchitecture
130
Figura 72 – Desenho esquemático das moradias, mostrando os caminhos e integrações entre elas.
Fonte: KéréArchitecture
131
As moradias são levemente elevadas do solo, sustentadas por uma fundação de concreto, evitando possíveis problemas futuros. A estrutura e o fechamento são em tijolos
e concreto, janelas piso-teto com caixilhos de aço e coberturas independentes metálicas, sustentada por uma treliça metálica e apoiada em lajes abobadadas (figura 73).
Figura 73 – Axonometria Explodida Fonte: KéréArchitecture
132
O uso de técnicas para melhorar o conforto térmico e a ventilação natural nas áreas internas, através da cobertura, disposição dos ambientes e materialidade são observados no projeto (figura 74). Por meio da inserção das lajes abobadadas de tijolo coloca-
das em cima das paredes de tijolos, favorecendo a circulação e o resfriamento do ar nos ambientes, esse sistema de resfriamento pode reduzir temperaturas de até 15 graus. E acima das lajes, a elevação da cobertura metálica permite que o ar quente saia.
Figura 74 – Desenho esquemático de uma moradia mostrando as soluções de ventilação natural
Fonte: KéréArchitecture
133
Figura 75 – Interior da casa. Pode-se notar a relação das aberturas através das janelas pivotantes e da iluminação com o espaço interno. Fonte: KéréArchitecture. Foto tirada por Jaime Herraiz 134
Com isso, os custos de longo prazo para os moradores são consideravelmente reduzidos ao minimizar o controle artificial do clima e a manutenção do edifício. O uso das grandes janelas na área interna e dos tijolos
vazados nas paredes de circulação externa de separação das principais áreas de estar e dormir, também são pontos que garantem um bom conforto térmico, além da entrada de iluminação natural (figuras 75 e 76).
Figura 76 – Pátio externo. Pode-se notar a relação da abertura entre os tijolos para trazer melhor iluminação e ventilação no ambiente,
Fonte: KéréArchitecture. Foto tirada por Jaime Herraiz 135
Figura 77 – Espaço externo de uma das residências. Mostra a materialidade, aberturas, cobertura, e a relação com o seu entorno.
Fonte: KéréArchitecture. Foto tirada por Jaime Herraiz
136
Figura 78 – Espaço externo de uma das residências. Mostra a materialidade, aberturas principais e a relação com o seu entorno.
Fonte: KéréArchitecture. Foto tirada por Jaime Herraiz
137
4.3 PAVILION KALÌ Local: Koforidua, Gana Ano: 2018 Arquitetura: Irene Librando e Nadia Peruggi Área construída: 66m2 Orçamento: 9000 euros
O Pavilion Kali, se localiza em um vilarejo na zona rural de Gana, e foi construído em 90 dias sem fins lucrativos com a ajuda de voluntários internacionais junto com a mão de obra local, onde levou à construção de uma pequena
Figura 79 – Espaço externo da entrada da sala de aula, mostrando a materialidade e aberturas
Fonte: Archdaily 138
sala de aula de ensino médio. Outros projetos sociais também foram implantados nesta comunidade, como um edifício destinado a oficinas, depósito e uma quadra de futebol (figuras 80 e 81). O objetivo principal do projeto foi solucionar o problema
que as crianças enfrentavam na vila, onde tinham que andar nove quilômetros todos os dias sob o sol ou a chuva para ir para a escola, o que fazia com que a maioria decidisse trabalhar nas plantações de cacau ao invés de continuar estudando.
Figura 80 – Implantação geral da escola e dos outros edifícios complementares.
Sala de aula Kali Sala de aula Aulaterra Oficina e armazenamento Edifícios da escola primária Outros
Fonte: Archdaily 139
Figura 81 – Implantação aproximada mostrando a integração com a quadra poliesportiva
Fonte: Archdaily
140
Figura 82 – Planta da sala de aula.
Fonte: Archdaily
141
Importante ressaltar que, o projeto traz características e materiais fortes da arquitetura tradicional da África Subsaariana, levando em consideração o clima e seu contexto, onde em Gana, é predominantemente tropical seco. Podemos notar essas carac-
terísticas na escolha das arquitetas pelos materiais locais para construir a escola, como a terra, madeira e palha, remetendo à um grande símbolo de tradições unindo técnicas antigas (citados no capítulo 2), juntamente, com a inserção e melhoria de novas tecnologias,
Figura 83 – Elevação Norte e Sul. Nota-se nas fachadas o uso da materialidade de madeira feito pelas mulheres da comunidade, utilizando técnicas de artesanato local.
Elevação norte
Elevação sul
Fonte: Archdaily 142
criando um elo entre o atual modo de habitar e o antigo, e emergindo assim, numa construção de qualidade, duradoura e de longo prazo. Em relação à materialidade dita anteriormente, são definidas duas paredes de taipa,
com 3m de altura e 8m de comprimento (figuras 84 e 88), onde se encontram as mesas dos alunos, enquanto a frente e trás é feita com painéis de ripas de madeira, que pode ser modulado por materiais feitos de tecidos tradicionais.
Figura 84 – Elevação Oeste e Leste. Nota-se nas fachadas laterais o uso da técnica de taipa de mão e o uso do artesanato para fechamento nas aberturas da treliça
Elevação oeste
Elevação leste
Fonte: Archdaily 143
As aberturas das fachadas norte e sul (figura 83 e 94), trazem consigo o artesanato
local, com a presença forte dos tecidos produzidos pelas mulheres do vilarejo.
Figura 85 – Corte A.A. Evidencia a estrutura treliçada elevada possibilitando que o ar quente saia pelo espaço entre as treliças e com isso melhorando o conforto térmico do ambiente
Corte A.A.
Fonte: Archdaily
A estrutura é concebida pelas paredes e pilares de madeira, que são estruturais, recebendo o teto que é elevado e levemente inclinado, sustentado por treliças de madeiras (figura 86) que recebem a cobertura de telha de ferro, sendo esta, composta por uma camada de espuma feita manualmente, ajudando a isolar o espaço das telhas utilizadas para cobrir a sala de aula. 144
As espessas paredes de taipa (fig. 86) de baixo consumo energético, absorvem a luz solar e a umidade, impedindo que o espaço interno fique muito quente, enquanto as telas de madeira permitem que a ventilação retire e forneça o ar do espaço interno para o externo, além da iluminação natural. A elevação das treliças, permitem a entrada de ar frio e saída de ar quente, ocasionando em uma melhora do ar interno no ambiente.
Figura 86 – Terças, treliça de madeira, cobertura e telha de ferro.
Fonte: Archdaily
145
Figura 87 – Início das fundações no solo
Fonte: Archdaily
146
Figura 88 – Levantamento das paredes laterais em terra crua
Fonte: Archdaily
147
Figura 89 – Inserção da cobertura e telhas metálicas
Fonte: Archdaily
148
Figura 90 – Fechamento frontal em telas de madeira
Fonte: Archdaily
149
Figura 91 – Fechamentos com materiais provenientes de artesanato local da comunidade, sendo colocados nas aberturas entre as treliças
Fonte: Archdaily
150
A intenção das arquitetas com esse projeto era além de, ajudar as crianças e estimular a própria população a construir a escola através do traba-
lho em mutirão, capacitando-os para futuras construções, conseguiram também, trazer fortemente a cultura africana e os materiais presentes na região.
Figura 92 – Piso sendo concretado Fonte: Archdaily 151
Figura 93 – Área externa da escola. Fonte: Archdaily 152
Figura 94 – Telas de madeiras revestidas com artesanato local e abertura nas treliças para a passagem de iluminação e ventilação natural Fonte: Archdaily
Figura 95 – Área interna da escola. Fonte: Archdaily 153
4.4 CENTRO COMUNITÁRIO DE CAMBURI Local: Ubatuba, Brasil Ano: 2018 Arquitetura: CRU! Arquitetos Área construída: 175m²
A comunidade de Camburi está localizada ao norte de Ubatuba, na fronteira com o município de Paraty. Nele, vivem quilombolas e caiçaras
Figura 96 – Vista do novo Centro Comunitário se integrando com a quadra esportiva e escola existente
Fonte: Archdaily 154
que seguem a vida baseada na pesca, agricultura, roçado e extrativismo. É uma, dentre outras comunidades de Ubatuba que sofrem com as restrições florestais, como a comunidade da Caçandoca, por conta da criação do Parque Estadual da Serra do Mar em 1977 e das Unidades de Conservação, que tem como objetivo proteger e preservar os ecossistemas naturais. Essa implementação acabou impactando diretamente no modo de vida dessa população e colocando em risco esse modo de vida tradicional. O Centro Comunitário foi pensado para ser um projeto de desenvolvimento social para os moradores, a partir de três requisitos e demandas principais desejadas pela população: criar um espaço comunitário para reuniões e atividades escolares, formar uma percepção de centro geográfico do bairro, que se tornasse ao mesmo tempo um ponto de encontro e integrar o edifício dentro da paisagem existente, junto com a escola e quadra localizada no mesmo terreno. Além de melhorar a infraestrutura da comunidade,
um dos objetivos da organização Bamboostic que ajudou na construção do edifício era treinar as pessoas da comunidade para se tornarem construtores de bambu a fim de futuramente encontrarem empregos na região. Hoje, os homens treinados são frequentemente contratados para construir estruturas de bambu nas cidades vizinhas (ROSA, 2018). Semelhante ao projeto anterior (Pavilhão Kali) por ser construído em mutirão, todas essas questões, trazem para a comunidade local uma maior capacitação para os moradores construírem o próprio edifício, além da formação de renda, incentivando o ecoturismo e a venda de trabalhos manuais. Ele é composto por dois edifícios maiores que são o centro comunitário em si, um grande pátio, área externa coberta, espaço de emergência, uma padaria com cozinha de apoio, que serve como fonte de renda para a comunidade, espaço de armazenamento e centro administrativo. Além disso, criaram uma
155
loja de artesanatos na entrada da vila, de onde vendem artefatos para os turistas (figura 97 e 98).
O centro é orientado e voltado ao oceano, no sentido leste para aproveitar a direção do vento predominante e a brisa do mar.
Figura 97 – Área da padaria do centro comunitário.
Fonte: Archdaily
156
Figura 98 – Planta do Centro Comunitário
Fonte: Archdaily
157
Seguindo as técnicas tradicionais e naturais, a construção foi feita com materiais locais. A estrutura, consiste em bambu e madeira, e as fundações em alvenaria, com bases de pedra para evitar o contato do bambu com o solo, garantindo a preservação
deste. Os pilares em bambu recebem um auxílio de estruturas metálicas em sua parte inferior, ligadas diretamente à fundação para contribuir na sustentação da cobertura. As paredes foram feitas em terra batida (taipa de pilão), tijolo e adobe (figura 100).
Figura 99 – Perspectiva mostrando o acesso principal
Fonte: Archdaily 158
A cobertura é elevada, evitando paredes perpendiculares que podem bloquear o fluxo do ar no interior do edifício, permitindo a passagem do vento, além de criar um sistema de ventilação que faz com que o ar fresco entre, enquanto o ar quente interno
saia pela parte superior. Acima da cobertura, o telhado consiste em telhas de barro e metálicas, que é sustentado por treliças de bambu. Entre o telhado e os fechamentos em taipa, há janelas que permitem maior ventilação (figura 100).
Figura 100 – Fundação em pedra, e encontro de estruturas e materialidade entre bambu e tijolo de adobe
Fonte: Archdaily 159
Figura 101 – Corte mostrando o sistema estrutural
Fonte: Archdaily
160
Figura 102 – Área interna da padaria.
Fonte: Archdaily
161
Figura 103 – Área de circulação externa
Fonte: Archdaily
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Figura 104 – Área de circulação externa
Fonte: Archdaily
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Figura 105 – Área de circulação interna
Fonte: Archdaily
164
Figura 106 – Área de circulação externa
Fonte: Archdaily
165
4.4.1
ANÁLISE COMPARATIVA
Cada projeto analisado serviu como referência para o projeto e o plano de desenvolvimento deste trabalho, tanto em suas formas construtivas e estéticas quanto em sua concepção e na sua forma sensível de olhar para a comunidade. Ao comparar as 3 obras, podemos concluir que em relação ao sistema construtivo, a cobertura e a modularidade das construções são os elementos comuns e mais proeminentes em todas, permitindo flexibilidade e adaptabilidade para atender às necessidades dos usuários, se tornando protagonista na própria arquitetura. A materialidade usada nas construções das duas obras africanas e a brasileira, buscam a cultura local e ancestral da comunidade, e a forte integração com seu entorno e clima, através do uso da terra local como material principal. As três obras foram iniciadas com a intenção de impactarem positivamente dentro da comunidade, melhorando 166
a educação das crianças locais, promovendo envolvimento social dentro da comunidade e gerando oportunidades de trabalho para estimular a economia local. É interessante notar que, embora os projetos tenham utilizado diferentes técnicas de materiais de construção, como: taipa de pilão ou pau a pique, tijolo de adobe, tijolo cerâmico, tijolo de solo-cimento, bloco comprimido (BTC) ou ecológico, eles foram capazes de se conectar à identidade e ao senso de pertencimento das comunidades locais. Abaixo foram listados conceitos e características notadas e apreendidas nos projetos mencionados, levando em consideração as demandas da comunidade da Caçandoca, sendo estes a: - Capacitação e a utilização da mão de obra local por meio de mutirões (a população da Caçandoca já constrói as próprias casas, mas seria qualificada para fazê-las com maior qualidade arquitetônica;
- Criar espaços que permitam que a população consiga produzir para se sustentar, como é o caso do Centro Comunitário de Camburi que acomoda uma padaria, servindo como fonte de renda da comunidade; - Importância de se pensar o projeto a curto, médio e a longo prazo para evitar problemas futuros e diminuir possíveis manutenções no edifício, criando uma arquitetura resiliente;
- Estudo do clima local, direção dos ventos e insolação para dispor o edifício; Processo construtivo como parte da concepção de projeto. Todas essas questões mencionadas foram absorvidas, adaptadas e implementadas no projeto proposto do presente trabalho, levando em consideração o contexto atual do quilombo da Caçandoca e sua subjetividade.
- Implantação dos edifícios levando em consideração a situação existente para garantir, a identidade, pertencimento e o reconhecimento pelos moradores através da arquitetura; - Implementação de técnicas de ventilação natural e sustentabilidade, pensando no conforto térmico e acústico da edificação; - Melhoramento de técnicas vernaculares com materiais contemporâneos que leve em consideração o atual modo de morar da comunidade, não se distanciando da estética quilombola;
167
O PROJETO
168
169
5.1 MASTERPLAN – PLANO DE DESENVOLVIMENTO Logo depois, de toda a análise realizada na área da Caçandoca (levando em consideração o levantamento realizado pela ITESP em 2018), observou-se a partir do diagnóstico feito, a necessidade de novos espaços para suprir a demanda da comunidade à curto, médio e longo prazo. Foi pensado em um novo espaço para áreas recreativas e de lazer; uma nova escola para atender a demanda de crianças e adolescentes; um novo centro comunitário; uma hospedaria; uma cooperativa de pesca junto com um mercado local para escoar e receber os produtos advindos da pesca e agricultura; um píer ancoradouro e novas opções de tipologia de casas para o quilombo. Primeiramente, para dispor a proposta de implantação dos edifícios, foi pensado antes na integração com o seu entorno e contexto atual, deixando ao máximo a vegetação preservada e evitando abertura de clareiras. 170
Diante disso, foram pensadas em formas de implantação a partir de um eixo norteador, criando caminhos e qualificando os existentes, aonde todos os edifícios propostos fizessem parte de um percurso, e que se integrassem pela área central da orla da praia, que será o espaço voltado para áreas recreativas, lazer e de recuperação da vegetação (fig. 107). Todos os edifícios têm uma característica em comum, que é a modularidade, a cobertura, a materialidade, a elevação do solo e o pátio central, que será visto melhor ao decorrer do trabalho. Todos esses itens juntos, acabam fomentando a vida coletiva e comunitária da comunidade. Além dos edifícios propostos, também foram pensados na recuperação da vegetação a partir do sistema agroflorestal e restinga. E também, no melhoramento do sistema de mobilidade e viário do quilombo (fig. 108).
A implantação das casas, se encontram em uma possibilidade de organização levando em consideração o crescimento da comunidade,
permitindo a construção de novas unidades habitacionais em configurações diferentes conforme a necessidade e demanda futura.
Figura 107 – Concepção projetual Fonte: autoria própria.
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LEGENDA Multiuso Destinada para as moradias Feiras e vendas Recuperação da vegetação
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LEGENDA Intenso Intermediário Baixo
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LEGENDA Integração Escola existente Edíficio de taipa construído pelos moradores
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LEGENDA Edifícios existentes Edifícios e equipamentos propostos Melhoramento da estrada municipal através de pavimentação drenante Caminhos e trilhas existentes Propostas de trilhas para pedestres
Figura 108 – Masterplan proposto Escala: 1/6000 Fonte: autoria própria. 177
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Área historicamente ocupada pela comunidade do quilombo
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LEGENDA 1- Quadra poliesportiva com infraestrutura (vestiário, arquibancada..) 2- Quadra de vôlei de praia 3- Sala de aula para ensino de surf e depósito 4- Parquinho 5- Academia ao ar livre 6- Praça central 7- Escola de ensino médio e fundamental 8- Centro comunitário 9- Hospedaria 10-Mercado local e cooperativa de pesca 11- Pier ancoradouro e garagem/depósito de barcos 12- Moradias Recuperação da vegetação (sistema agroflorestal e restinga)
Figura 109 – Masterplan aproximado proposto Escala: 1/3000 Fonte: autoria própria. 179
5.2 SISTEMA CONSTRUTIVO 5.2.1 PAREDES - TIJOLO SOLO-CIMENTO, DE BARRO COMPRIMIDO OU ECOLÓGICO O tijolo ecológico (fig. 108) é um material pouco conhecido pela população. A terra é o principal elemento da composição deste e podem ser usados para erguer paredes, fundações e pisos. Em geral, a composição do tijolo BTC é constituída por: argila, areia, água e estabilizadores, podendo ser eles: cimento, cal ou ambos. O tijolo pode ser utilizado para a construção após 7 dias depois de prensado, sendo necessário até 30 dias para a cura total. Para a prensagem dos blocos são utilizadas máquinas manuais, onde a prensagem é mais simples e feita pelo operador que utiliza uma alavanca para comprimir a mistura dentro do molde, ou máquinas hidráulicas que são mais avançadas e rápidas, onde a prensagem é feita com o acionamento de uma prensa hidráulica, que utiliza placas 180
de aço para comprimir a mistura dentro do molde (LIMA, 2007). Além disso, a produção dos tijolos ecológicos consome menos energia e gera menos resíduos do que outros materiais de construção convencionais, como os tijolos cerâmicos ou blocos de concreto. Por conta de serem feitos sem necessidade de queima, não existe emissão de gases, além de ser mais econômico em relação à alvenaria tradicional, reduzindo o tempo de obra. As características do tijolo dependem das propriedades do solo e compactação utilizada como já foi dito. Por conta da comunidade da Caçandoca estar situada na praia, a facilidade de encontrar o solo para a confecção do tijolo é fácil, facilitando assim, a sua fabricação. Ademais, seu desempenho térmico é superior, graças à
Figura 110 – Tijolos modulares de solo-cimento. Nota-se os dois furos internos, e as colunas de sustentação e instalações elétricas e hidráulicas.
Fonte: https://civilizacaoengenheira.wordpress.com/2018/12/14/tijolo-solo-cimento/
sua alta inércia térmica, atendendo às normas técnicas para o clima severo da região de Ubatuba. Em relação ao sistema construtivo das paredes dos projetos propostos, as duas amarrações escolhidas foram a amarração do tipo ajuste corrente (figura 111) e a amarração com espaçamento entre os tijolos (figura 112).
Em 2022, foi realizado no canteiro experimental da Universidade Presbiteriana Mackenzie, uma experimentação com blocos de tijolo maciço com as duas amarrações, onde foi erguido pequenas paredes para demonstração. Apesar do tipo de tijolo experimentado não ser ecológico, as amarrações analisadas são viáveis para a construção com o tijolo ecológico e para o projeto proposto. 181
A amarração do tipo ajuste corrente consiste em colocar o tijolo seguinte encaixado na junta da fileira anterior, formando uma espécie de cunha. Isso aumenta a resis-
tência da parede, pois proporciona uma junta estreita e um encaixe firme entre os tijolos, formando uma parede mais compacta e resistente.
Figura 111 – Amarração de tijolos tipo ajuste corrente
Fonte: autoria própria
Já a amarração com espaçamento entre os tijolos consiste em deixar um pequeno espaço entre os tijolos de cada fileira, formando uma espécie de grade na parede. Essa técnica tem como objetivo permitir que a parede respire e minimize o aparecimento de trincas ou fissuras, já que os tijolos 182
podem se ajustar às variações de temperatura e umidade. Essas duas técnicas de amarração são comuns na construção com tijolos de solo-cimento e podem influenciar na estabilidade e resistência das paredes construídas.
Figura 112 – Amarração com espaçamento entre os tijolos
Fonte: autoria própria 183
5.3 REAFIRMAR, EDUCAR, HOSPEDAR E COMERCIALIZAR ‘’[...] tradicional é uma maneira de ser, uma maneira de existir, é uma maneira de demandar, de ter identidade coletiva’’. (ALMEIDA, 2006, p. 67).
A ideia é que todos os projetos propostos sejam modulares a partir do tijolo ecológico, abrindo mão de longos prazos para construção, e possibilitando o controle total de gastos. Além de, também serem elevados do solo, prevendo futuros problemas de umidade por conta do clima tropical úmido. Como também, promover que seja construído por meio de mutirão, gerando autonomia aos moradores e garantindo o desenvolvimento sustentável da comunidade, além de trazer o senso de pertencimento. Todo o planejamento do projeto foi pensado para questões à curto, médio e longo prazo, como a expansão da comunidade. 184
pertencer educa
habitar
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hospedar
encontrar
reafirmar ancorar
comercializar
Figura 113 – Projetos propostos Fonte: autoria própria 185
186
5.3.1 ESPAÇO VOLTADO PARA ÁREAS RECREATIVAS E DE LAZER Inserção de novos programas e equipamentos ao longo da orla da praia voltados a atividades esportivas e de lazer, se integrando com os espaços existentes, como a escola que está em processo de reativação e o edifício construídos pelos moradores da comunidade juntamente com estudantes de fora. Assim, melhorando a qualidade de vida dos moradores e trazendo de volta o sentimento de pertencimento.
Figura 114 – Axonométrica da área recreativa e de lazer Fonte: autoria própria
187
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Córrego da Caçandoc
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Planta chave
LEGENDA 1- Parquinho (930m²) 2- Sala de aula para ensino de surf (100m²) 3- Quadra de vôlei de praia (363m²) 4- Quadra poliesportiva (628m²) 5- Vestiário (100m²)
Figura 115 – Planta da área recreativa e de lazer Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 189
190
Figura 116 – Parquinho Fonte: autoria própria 191
192
Figura 117 – Quadra poliesportiva, com arquibancada, vestiário e quadra de vôlei em vista Fonte: autoria própria 193
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194
Córrego da Caçandoc
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Planta chave
LEGENDA 6- Academia ao ar livre (244m²) 7- Praça (575m²)
Figura 118 – Planta da área recreativa e de lazer Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 195
196
Figura 119 – Praça central Fonte: autoria própria 197
198
5.3.2 ESCOLA DE ENSINO MÉDIO E FUNDAMENTAL A escola foi disposta o mais próxima possível da existente, e a intenção é que o ensino seja livre para além da sala de aula e que ensine a educação ambiental para as crianças e jovens, que já é uma prática feita pela comunidade, mas dentro de um espaço limitado (na escola que está em processo de reativação), juntamente, se integrando com os espaços voltados ao esporte e lazer em frente, valorizando e melhorando assim a vida das crianças e adolescentes da comunidade. A escola preza pela valorização da cultura e identidade quilombola e no ensino dos saberes tradicionais. Área construída: 690m²
Figura 120 – Axonométrica da Escola Fonte: autoria própria 199
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Figura 121 – Planta da Escola de Ensino Médio e Fundamental Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 200
11
Figura 122 – Corte A.A. da Escola
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0,00 -0,60
Planta chave
Escala: 1/250 Fonte: autoria própria
LEGENDA 1- Sala de aula ensino fundamental (45m²) 2- Sala de aula ensino médio (45m²) 3- Depósito (10m²) 4- Banheiro feminino (17m²) 5- Banheiro masculino (17m²) 6- Biblioteca (45m²) 7- Cantina (32m²) 8- Cozinha (12m²) 9- Sala dos professores (22m²) 10- Secretária (12m²) 11- Diretoria (12m²) 12- Sala livre para oficinas e outros usos (50m²)
201
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202
Figura 123 – Fachada frontal da Escola Fonte: autoria própria 203
204
Figura 124 – Circulação externa do corredor Fonte: autoria própria 205
5.3.3 CENTRO COMUNITÁRIO Atualmente, o centro comunitário existente não oferece espaço suficiente para comportar todas as atividades da comunidade, além de ser utilizado principalmente para discussões administrativas da associação de moradores, como foi visto no capítulo 3. Com a implementação do novo centro comunitário, a comunidade poderá contar com um espaço mais amplo e adequado para a realização de diversas atividades, como reuniões, eventos culturais, oficinas e exposições. Além disso, o novo edifício pode contribuir para a valorização da cultura local, oferecendo um espaço para a preservação e divulgação da história e tradições da comunidade. Área construída: 340m²
Figura 125 – Axonométrica do Centro Comunitário Fonte: autoria própria 206
207
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Figura 126 – Planta do Centro Comunitário Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 208
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Figura 127 – Corte A.A. do Centro Comunitário
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Escala: 1/250 Fonte: autoria própria
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Planta chave
LEGENDA 1- Pátio para atividades (140m²) 2- Sala de oficinas (95m²) 3- Sala de reunião (65m²) 4- Escritório (13m²) 5- Depósito (15m²)
209
210
Figura 128 – Fachada frontal do Centro Comunitário Fonte: autoria própria 211
212
Figura 129 – Pátio externo para atividades Fonte: autoria própria 213
214
5.3.4 HOSPEDARIA A implementação da hospedaria tem como objetivo qualificar o turismo local, melhorando a captação de renda da comunidade, além de criar experiências e intercâmbio cultural entre visitantes, estudantes, pesquisadores e moradores locais. Importante ressaltar que, muito além de impulsionar a dinâmica no território, é a necessidade de pessoas interessadas em conhecer a cultura e as tradições locais, além de se envolverem em atividades que beneficiem a comunidade da Caçandoca, e não apenas passar o dia nas praias do quilombo. Por isso, é fundamental que a hospedaria seja gerenciada de forma responsável, valorizando a cultura local e promovendo a integração entre visitantes e moradores. Área construída: 630m²
Figura 130 – Axonométrica da Hospedaria Fonte: autoria própria 215
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-0,60
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Figura 131 – Planta da Hospedaria Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 216
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A.A.
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A.A.
Figura 132 – Corte A.A. da Hospedaria
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Escala: 1/250 Fonte: autoria própria
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Planta chave
LEGENDA 1- Quarto (48m²) 2- Sala de estar compartilhada (30m²) 3- Lavanderia compartilhada (7m²) 4- Cozinha compartilhada (12m²) 5- Estacionamento (132m²)
217
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218
Figura 133 – Fachada frontal da Hospedaria Fonte: autoria própria 219
220
Figura 134 – Área central e circulação externa Fonte: autoria própria 221
222
5.3.5 MERCADO LOCAL A inserção do mercado proposto é voltada para o escoamento da produção local, como alimentos/pesca artesanal e de materiais advindos da agrofloresta, com o intuito de incentivar o consumo de produtos da Caçandoca e reduzir a dependência de produtos vindos de fora. Logo, ajudando a impulsionar a economia local e a melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem na região. Além disso, a comercialização local de produtos pode ser uma forma de valorizar a cultura e as tradições da região, fortalecendo a identidade local e promovendo um turismo mais sustentável e consciente. Área construída: 205m²
Figura 135 – Axonométrica do Mercado local e da Cooperativa de Pesca Fonte: autoria própria 223
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Figura 136 – Planta do Mercado local e Cooperativa de pesca Escala: 1/250 Fonte: autoria própria
12 Planta chave rego
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LEGENDA
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Cooperativa de Pesca
1- Área de venda (144m²) 2- Área de refrigeração (20m²) 3- Câmara fria (14m²) 4- Vestiário func. (10m²) 5- Banheiro func. (8m²)
1- Acesso func. (50m²) 2- Escritório (12m²) 3- Recepção matéria-prima (14m²) 4- Área de filetagem de peixe (14m²) 5- Preparo e processamento (15m²)
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224
Mercado
6- Comercialização (20m²) 7- Área para reuniões (52m²) 8- Câmara frigorífica (20m²) 9- Almoxarifado (14m²) 10- Vestiário func. (10m²) 11- Banho func. (8m²)
5.3.5.1 COOPERATIVA DE PESCA A cooperativa de pesca proposta está integrada ao mercado e ao píer ancoradouro, que está localizado na beira da orla da praia e será mostrado mais adiante. A cooperativa contribuirá para aumentar a visibilidade do trabalho pesqueiro, já que será o local de tratamento e venda de peixes, incentivando a população local a consumir mais pescados da região. Com isso, impulsionando outras atividades econômicas e trazendo desenvolvimento para a região.
Além disso, foi proposto um espaço para feiras temporárias de produtos orgânicos, comercialização de mudas, pequenas barracas para venda de produtos e atividades culturais em frente aos dois edifícios. Isso poderá atrair mais público para o comércio de pescados, aumentando a renda dos cooperados e da comunidade em geral, promovendo a economia local. Área construída: 205m²
Figura 137 – Corte do Mercado local e da Cooperativa de Pesca
0,00
-0,60
Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 225
226
Figura 138 – Fachada frontal do Mercado local à esquerda e da Cooperativa de Pesca à direita Fonte: autoria própria 227
228
Figura 139 – Ponto de comercialização da Cooperativa de Pesca Fonte: autoria própria 229
5.3.5.2 PÍER ANCORADOURO O píer, como já mencionado, está integrado com o mercado e a cooperativa de pesca, que se encontram a poucos metros de distância deste, e servirá como um ancoradouro para embarque e atracação, além de fornecer duas garagens para barcos com 50m² cada, e espaço para manutenção e depósito. Com isso, facilitando e aumentando a produtividade na vida dos pescadores com embarcações, e ajudando no escoamento de produções, melhorando as condições de trabalho. Área construída: 600m²
Figura 140 – Axonométrica do Píer Fonte: autoria própria 230
231
A.A.
A.A. Figura 141 – Planta do Píer Ancoradouro Escala: 1/500 Fonte: autoria própria 232
EducationalVersion
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Córrego da Caçando
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LEGENDA Acesso - 1 Depósito (50m²) - 2 Garagem de barcos (100m²) - 3 Pier (310m²) - 4 Atracadouro (70m²) - 5
Figura 142 – Planta da Garagem de Barcos Escala: 1/250 Fonte: autoria própria
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Figura 143 – Planta do Píer e Atracadouro Escala: 1/250 Fonte: autoria própria 233
0,00
0,00 -0,60
234
-0,30
Figura 144 – Corte A.A. do Píer Ancoradouro Escala: 1/250 Fonte: autoria própria
235
236
Figura 145 – Píer ancoradouro, com garagem de barcos em vista Fonte: autoria própria 237
238
Figura 146 – Píer e atracadouro Fonte: autoria própria 239
240
Figura 147 – Área de circulação externa da garagem de barcos Fonte: autoria própria 241
5.4 HABITAR: AS MORADIAS 5.4.1 MORADIA UNIFAMILIAR Figura 148 – Moradora da Caçandoca em sua casa
Fonte: Junior Machado (2018) 242
As 2 moradias propostas foram pensadas prevendo o crescimento da comunidade e na possibilidade futura de expansão, de modo a reafirmar e garantir o direito à moradia. Além disso, o uso de materiais de baixo custo e facilidade de construção é notado nos projetos, sendo uma forma de tornar as moradias acessíveis e sustentáveis, minimizando os impactos ambientais e econômicos. Importante destacar que, em áreas de comunidades tradicionais como o quilombo da Caçandoca, o uso coletivo da terra é um aspecto fundamental da cultura e da organização social. Nesse sentido, o projeto para as moradias não prevê uma demarcação de lotes, uma vez que a comunidade compartilha o território como um bem comum, conforme o título que lhe foi concedido, isso se reflete em todos os projetos propostos.
No entanto, para garantir a privacidade das famílias, é possível que futuras divisões de propriedades sejam feitas com a utilização de vegetação ou cercas vivas, conforme as residências forem sendo construídas. Essa é uma solução que pode garantir a individualização das propriedades, sem comprometer o uso coletivo da terra e a identidade cultural do quilombo. Além disso, foram consideradas soluções de infraestrutura adequadas, como o abastecimento e tratamento de água potável em pontos específicos distribuídos pela Caçandoca, bem como o saneamento básico por meio do uso de fossas sépticas ecológicas. Adicionalmente, também foi pensado na possibilidade de instalar painéis solares nos telhados no futuro, com o objetivo de aproveitar a energia solar e melhorar a eficiência energética dos edifícios. 243
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Figura 149 – Planta de localização Escala: 1/500 Fonte: autoria própria 244
Buscou-se elaborar um projeto de habitação que ressalte a importância de incorporar e resgatar as qualidades da arquitetura e, características familiares aos dos moradores da própria comunidade, permitindo que se identifiquem com a casa e sintam que ela realmente faz parte de seu entorno e de sua cultura. Isso pode aumentar o senso de pertencimento e a qualidade de vida dos moradores, além de promover a preservação da cultura local.
i= 5%
A casa elevada para diferentes terrenos, tem uma arquitetura simples, aberta e funcional, que busca resgatar as características das moradias do quilombo da Caçandoca. É dividida em três partes principais: a área comum, que inclui a sala e a cozinha, a área íntima, onde ficam os quartos voltados para o sentido leste e oeste, e o pátio/jardim, que é a parte central e dá acesso ao banheiro.
A varanda extensa acompanhando os beirais generosos também é um elemento importante, pois além de proteger a entrada da casa contra as intempéries do clima, também pode ser utilizada como espaço de convívio e recepção de visitas, valorizando a integração com a natureza e a convivência familiar. O pátio/jardim é um elemento fundamental, pois serve como um espaço de transição entre as áreas comuns e as mais íntimas. Além disso, contribui para o conforto térmico da casa, permitindo a ventilação natural entre os ambientes. Além disso, o uso das plantas pode ajudar a melhorar a qualidade do ar interno. Por isso, integrar o jardim no projeto não só contribui para o conforto térmico, mas também para a saúde e o bem-estar das pessoas que ali habitam.
245
Figura 150 – Croquis iniciais de possibilidades e estudo preliminar
Fonte: autoria própria. 246
Figura 151 – Croqui inicial de possibilidade e estudo preliminar
Fonte: autoria própria. 247
Figura 152 – Axonométrica da moradia
simplicidade
distribuição
Varanda Cozinha Sala Banheiro Quartos
pátio interno
GSEducationalVersion
ventilação interna
248
sombra e ventilação
insolação
249
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A.A.
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Sumidouro
Córrego da Caçandoc
a
Planta chave
LEGENDA 1- Acesso/varanda (38m²) 2- Cozinha/sala (33m²) 3- Banheiro (7m²) 4- Lavanderia 5- Fogão a lenha 6- Pátio interno/jardim (30m²) 7- Área de descanso (12m²) 8- Quarto 1 (12m²) 9- Quarto 2 (12m²)
O projeto também foi pensado para promover o conforto térmico e a iluminação de maneira natural. Por isso, foram inseridas janelas tipo veneziana, dobráveis e basculante com articulado de ventilação móvel, com o morador podendo ter o total controle da entrada de vento e iluminação. A ventilação cruzada é um recurso importante para dissipar o calor e manter uma temperatura agradável dentro da casa. Além da inserção de elementos vazados (cobogós) com fechamento em vidro, e das aberturas na cobertura para entrada de iluminação. A escolha dos tijolos ecológicos, de solo-cimento ou barro comprimido (BTC), como material de construção, foi por além de ser um material mais sustentável, pode ser produzido localmente, o que valoriza a economia da comunidade. Além disso, o uso desse tipo de tijolo permite uma boa inércia térmica da construção, o que ajuda a manter a temperatura interna mais estável.
A estrutura do telhado, feita de madeira de eucalipto, é outra escolha sustentável. Além de ser elevado da laje pré-moldada, o que acaba melhorando o conforto térmico no interior da casa. A telha metálica sanduíche utilizada na cobertura também é um material eficiente para o isolamento térmico, ajudando a manter a temperatura interna mais agradável. No geral, a construção privilegia a sustentabilidade e o conforto térmico de maneira natural, sem abrir mão do desempenho acústico e de um processo construtivo mais rápido e eficiente. Área construída: 132m²
Figura 153 – Planta da Moradia Escala: 1/125 Fonte: autoria própria 251
i= 5%
+2,88
0,00
-0,01
-0,60
Figura 154 – Corte A.A. Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
+2,88
252 0,00
0,00
-0,01
-0,60
+2,88
0,00 -0,60
GSEducationalVersion
Figura 155 – Corte B.B. Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
253
Figura 156 – Fachada Norte Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
Figura 157 – Fachada Sul Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
254
Figura 158 – Fachada Leste Escala:1/125 Fonte: autoria própria
GSEducationalVersion
Figura 159 – Fachada Oeste Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
255
5.4.1.1 SISTEMA CONSTRUTIVO E MATERIALIDADES
7. telha sanduíche, termoacústica inclinação 5%
6. estrutura da cobertura em madeira de eucalipto
5. laje pré-moldada 4. paredes em tijolo ecológico dimensões: 7 x 12,5 x 25cm 3. piso em cimento queimado 2. portas e janelas de madeira tipos: - janelas tipo veneziana com articulado de ventilação móvel - janelas dobráveis com articulado de ventilação móvel - janela basculante com articulado de ventilação móvel 1. fundação elevada em pedra h= 60cm
Figura 160 – Axonométrica explodida mostrando o sistema construtivo Fonte: autoria própria 256
5.4.1.2 ANÁLISE DE TIPOS DE COBERTURAS PARA O PROJETO
Figura 161 – Telhado tipo borboleta Fonte: autoria própria.
- A água da chuva não é direcionada imediatamente do edifício. Em vez disso, a água é descarregada no eixo central da construção da superfície do telhado, para depois ser drenada através de uma calha comum, que geralmente se abre para um tubo
de descarga. Em chuvas muito fortes, pode acontecer que a calha esteja subdimensionada e nem todo a água possa ser absorvida;
- Telhado com aberturas laterais que permitem a entrada de iluminação e ventilação natural;
- Alto custo de manutenção;
-
O
design do telhado se torna caro, por não ser convencional; - Alto custo de manutenção.
Figura 162 – Telhado com átrio central Fonte: autoria própria.
- Telhado não convencional.
257
Figura 163 – Telhado com uma inclinação
Fonte: autoria própria.
Conclusão: Logo depois da análise feita em diferentes desenhos de cobertura, o tipo de telhado escolhido para o projeto foi a cobertura de uma só inclinação. A escolha desse tipo de cobertura traz diversas vantagens, como a facilidade de escoamento da água da chuva e a redução de custos de manutenção. Além disso, a elevação da cobertura em rela-
ção à laje pré-moldada pode contribuir para o conforto térmico no interior do edifício, reduzindo a incidência direta da luz solar e permitindo a ventilação natural. Além de que, permite que tenha uma abertura/claraboia na cobertura, como é o caso das moradias propostas, criando pátios internos bem iluminados e ventilados.
Figura 164 – Telha sanduíche
A telha sanduíche, com revestimento interno de poliuretano e pintura, com inclinação de 5%. Permite melhor vedação, conforto acústico, térmico, e rápida instalação. Fonte: autoria própria.
258
Figura 165 – Ampliação da cobertura
telha sanduíche telha sanduíche telha sanduíche termoacústica termoacústica termoacústica terças terças terças det. 0101 det. det. 01
5% 5% 5% i=i= i=
det. 02 det. 02 det. 02
mão mão mão francesa francesa francesa estrutura do telhado estrutura do telhado estrutura do telhado em madeira de em madeira de em madeira de eucalipto eucalipto eucalipto parede de tijolo parede de tijolo parede de tijolo ecológico ecológico ecológico
Escala: 1/50 Fonte: autoria própria
laje pré-moldada laje laje pré-moldada pré-moldada
Figura 166 – Detalhes construtivos.
parafuso metálico parafuso parafuso metálico metálico Ø= 5mm Ø= Ø= 5mm 5mm telha sanduiche telha telha sanduiche sanduiche terça terça terça empena empena empena ligações com cavilhas ligações ligações com com cavilhas cavilhas de madeira de de madeira madeira Ø= 5mm Ø= Ø= 5mm 5mm diagonal diagonal diagonal montante montante montante
Detalhe 01 Escala: 1/20 Fonte: elaborado com base no livro: Caderno de Projetos de Telhados em Estruturas de Madeira, Antonio Moliterno (2010).
montante montante montante diagonal diagonal diagonal banzo inferior banzo banzo inferior inferior ligações com cavilhas ligações ligações com com cavilhas cavilhas de madeira de de madeira madeira Ø= 5mm Ø= Ø= 5mm 5mm laje pré-moldada laje laje pré-moldada pré-moldada h= 8cm h= h= 8cm 8cm Detalhe 02 Escala: 1/20 Fonte: elaborado com base no livro: Caderno de Projetos de Telhados em Estruturas de Madeira, Antonio Moliterno (2010). 259
260
Figura 167 – Integração entre as casas Fonte: autoria própria 261
262
Figura 168 – Fachada de acesso. Fonte: autoria própria 263
264
Figura 169 – Área de descanso na varanda. Observa-se as aberturas de elementos vazados com fechamento em vidro, para entrada de iluminação, além das janelas Fonte: autoria própria 265
266
Figura 170 – Cozinha Fonte: autoria própria 267
268
Figura 171 – Sala de estar integrada com a cozinha Fonte: autoria própria 269
270
Figura 172 – Cozinha integrada com sala de estar Fonte: autoria própria 271
272
Figura 173 – Espaço de convivência e serviço: lavanderia, fogão a lenha, e jardim/horta Fonte: autoria própria 273
274
Figura 174 – Espaço de convivência e serviço: lavanderia, fogão a lenha, e jardim/horta Fonte: autoria própria 275
276
Figura 175 – Espaço de convivência e serviço: lavanderia, fogão a lenha, e jardim/horta Fonte: autoria própria 277
278
Figura 176 – Pátio interno com área de descanso Fonte: autoria própria 279
280
Figura 177 – Quarto Fonte: autoria própria 281
Figura 178 – Maquete volumétrica da moradia Fonte: autoria própria
Figura 179 – Maquete volumétrica da moradia Fonte: autoria própria
282
Figura 180 – Maquete volumétrica da moradia Fonte: autoria própria
Figura 181 – Maquete volumétrica da moradia Fonte: autoria própria
283
Figura 182 – Maquete volumétrica noturna da moradia Fonte: autoria própria
284
Figura 183 – Maquete volumétrica noturna da moradia Fonte: autoria própria
285
5.4.2 MORADIA TIPOLOGIA II Figura 184 – Croquis iniciais de possibilidades e estudo preliminar para a tipologia ll
Fonte: autoria própria. 286
Figura 185 – Croquis iniciais de possibilidades e estudo preliminar para a tipologia ll
Fonte: autoria própria. 287
Figura 186 – Axonométrica da moradia
simplicidade
288
distribuição
Varanda Cozinha Sala Depósito Banheiro Circulação Quartos
pátio interno
ventilação interna
sombra e ventilação
insolação
289
A.A.
Sumidouro
Fossa séptica
FACHADA SUL 15,00 4,37
3,00
3,80
0,00
-0,02
3 -0,01
5
11
9
0,00
8 2
12
6
3,00
-0,02 0,00
0,00
2,06
1
0,00 4D
1
1,20
3 2
B.B. 11,25
0,00
i= 8% S
FACHADA NORTE
A.A.
-0,60
290
FACHADA LESTE
10
7
2,87
B.B.
6
4
2,80
FACHADA OESTE
0,50
3,80
Córrego da Caçandoc
a
Planta chave
LEGENDA 1- Acesso/varanda (38m²) 2- Pátio interno/jardim (32m²) 3- Fogão a lenha 4- Lavanderia 5- Cozinha/sala (32m²) 6- Depósito (4m²) 7- Banheiro reservado (3m²) 8- Box chuveiro (3m²) 9- Circulação íntima (12m²) 10- Quarto 1 (12m²) 11- Quarto 2 (12m²) 12- Quarto 3 (12m²)
Figura 187 – Planta Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
Como foi dito no projeto anterior proposto, nesta segunda tipologia, além de todas as técnicas e materiais construtivos citados, a integração da varanda com os programas de uso comum e de serviços também é notado, permitindo que os moradores tenham acesso fácil aos ambientes de convivência e de trabalho. Os quartos foram posicionados voltados para o leste, para aproveitar a incidência da luz solar durante o período da manhã e a cozinha para o oeste, trazendo iluminação natural para esses ambientes. A integração dos ambientes de sociabilidade voltados para o exterior, como a varanda e o pátio interno, conforma um núcleo particular para as atividades de trabalho e para receber amigos e visitantes. Essa integração entre os espaços internos e externos também favorece a ventilação e iluminação natural, além de permitir que os moradores desfrutem das atividades ao ar livre e da paisagem local. Área construída: 160m²
291
i= 5%
+2,88
0,00 -0,60
Figura 188 – Corte A.A. Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
+2,88
292
0,00 -0,60
+2,88
0,00 -0,60
Figura 189 – Corte B.B. Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
GSEducationalVersion
293
Figura 190 – Fachada Norte Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
,
Figura 191 – Fachada Sul Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
294
Figura 192 – Fachada Leste Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
GSEducationalVersion
Figura 193 – Fachada Oeste Escala: 1/125 Fonte: autoria própria
295
296
Figura 194 – Fachada frontal Fonte: autoria própria 297
298
Figura 195 – Acesso e a integração com a área de convivência Fonte: autoria própria 299
300
Figura 196 – Cozinha Fonte: autoria própria 301
302
Figura 197 – Cozinha integrada com a sala de estar Fonte: autoria própria 303
304
Figura 198 – Sala integrada com a cozinha Fonte: autoria própria 305
Figura 199 – Maquete volumétrica mostrando o contexto e projetos propostos Fonte: autoria própria
306
Figura 200 – Maquete volumétrica mostrando o contexto e projetos propostos Fonte: autoria própria
307
Figura 201 – Maquete volumétrica mostrando o contexto e projetos propostos Fonte: autoria própria
308
Figura 202 – Maquete volumétrica mostrando o contexto e projetos propostos Fonte: autoria própria
309
Figura 203 – Sobreposição dos projetos propostos na Caçandoca Fonte: autoria própria 310
311
312
CONSIDERAÇÕES FINAIS
313
O objetivo deste trabalho foi estudar e reunir questões sobre a formação dos quilombos no Brasil, chegando à comunidade da Caçandoca, para analisar o histórico da formação do grupo e sua ocupação territorial, os processos abusivos que resultaram na perda parcial desse território e as condições atuais da comunidade com base em levantamentos e registros fotográficos. Durante o desenvolvimento da pesquisa, foi possível constatar, por meio de conversas pessoais com os moradores, as inúmeras pressões às quais eles são submetidos. Por exemplo, observou-se a diminuição das áreas destinadas às roças, a proibição das técnicas de cultivo antigas, como a coivara e o pousio, e até mesmo a construção de novas moradias. Reunindo todas essas questões, pude notar a desvalorização da cultura quilombola no Brasil e a gravidade disso para o nosso país. É preocupante que ainda carregamos um senso comum de preconceito e racismo estrutural, o que atrasa e inibe qualquer sentimento de união e coletividade entre o povo brasileiro. 314
O objetivo do partido projetual desde o início, foi além de seguir os princípios da arquitetura bioclimática como parâmetro com o emprego de técnicas construtivas simples, de materiais locais e de baixo custo, foi também seguir a idealização da arquitetura projetada de acordo com as necessidades da comunidade e do usuário. A partir disso, e após a visita à comunidade, realização do diagnóstico e seus desdobramentos, o resultado do projeto resultou em um plano de desenvolvimento com variados programas distribuídos em edifícios modulares, que se adequam às necessidades do usuário e ainda permite que sejam feitas modificações e personalizações. Além de também trazer um impacto positivo profundo na comunidade, melhorando a educação das crianças e jovens locais, proporcionando melhores perspectivas de emprego para os moradores, promovendo envolvimento social e cívico dentro da comunidade e gerando oportunidades de trabalho para estimular a economia local. Ademais, todos os projetos propostos servem como modelo de práticas de construção sustentável para a comunidade local.
Portanto, apesar da maioria das construções executadas nas cidades brasileiras ainda seguirem o modelo da visão progressista de uso ilimitado dos recursos naturais e muitas das vezes não sendo apropriadas para o lugar e muito menos para as pessoas que ali moram, o papel do arquiteto e urbanista é de trabalhar de forma colaborativa com os moradores locais para garantir que suas necessidades sejam atendidas e que o projeto tenha um impacto positivo na vida das pessoas. Além de construir cidades que sejam resilientes e sustentáveis, através de construções com infraestrutura capaz de absorver quaisquer impactos naturais ou sociais Diante de todas as questões abordadas, concluo minhas reflexões destacando a importância de nos descolonizarmos diante da sociedade e sistema civilizatório aos quais estamos inseridos. É crucial compreendermos que o que vivenciamos é uma urgência, onde de um lado existe a tentativa de silenciamento e, do outro, a árdua luta por superação, que precisa ser mobilizada por diversas pessoas e entidades. Precisamos compreender que conhecer os quilombos significa valorizar a cultura negra para
além da escravidão e do mito da democracia racial. Devemos reconhecer que, mesmo atualmente, muitos desses povos e comunidades tradicionais em todo o Brasil estão lutando coletivamente por seus direitos à terra, cultura e identidade. Além disso, futuramente, o presente trabalho poderá ser utilizado como base ou referência para outras pesquisas, trabalhos, estudos acadêmicos e políticas públicas a serem realizadas, como por exemplo: no conhecimento da história, edificações e materialidades do quilombo da Caçandoca, contribuindo para o conhecimento e preservação desse patrimônio cultural. E, no aprendizado de novos sistemas construtivos tradicionais e contemporâneos, que não é ensinado nas escolas de Arquitetura e Urbanismo pelo Brasil, ampliando o repertório de conhecimento nessa área. A ideia é que este trabalho inspire outros estudantes e profissionais a explorar alternativas de construção mais sustentáveis, resgatando técnicas tradicionais e promover a inovação no campo da arquitetura. 315
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
316
317
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