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CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO CAMPUS ENGENHEIRO COELHO/SP CURSO DE DIREITO
FÁBIO JOSÉ RIBEIRO
A INFLUÊNCIA DO TEMPO NA EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA EM FACE DO FISCO
ENGENHEIRO COELHO/SP 2012
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FÁBIO JOSÉ RIBEIRO
A INFLUÊNCIA DO TEMPO NA EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO: PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA EM FACE DO FISCO
Trabalho de Conclusão de Curso do Centro Universitário Adventista de São Paulo do Curso de Direito, sob orientação da Professora Eliane Gonsalves.
ENGENHEIRO COELHO/SP 2012
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Trabalho de Conclusão de Curso do Centro Universitário Adventista de São Paulo, do Curso de Direito apresentado e aprovado em 01º/11/2012.
_________________________________________________ Profa. Eliane Gonsalves Orientadora
________________________________________________ Prof. Misael Lima Barreto Júnior 1º Leitor
________________________________________________ Prof. José de Freitas Guimarães 2º Leitor
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Dedico a finalização deste trabalho a minha doce esposa Vera Lúcia, a quem chamo carinhosamente de Linda, pois ela foi meu apoio nas horas que mais precisei, cuidou de nossas filhas enquanto eu me dedicava nesta empreitada, e o meu sucesso é apenas o reflexo do sucesso dela como minha companheira e ajudadora.
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AGRADECIMENTOS
A premissa dos meus agradecimentos eu dirijo ao Pai das Luzes, a meu bom Deus, pois é dEle que vem toda boa dádiva, e é Ele que concede com liberalidade a sabedoria a todos quanto lhe pedem. Agradeço ao Centro Universitário Adventista de São Paulo, Campus Engenheiro Coelho, na pessoa de seus Diretores, Mestres e Colaboradores, pois foi neste agradável ambiente que vivenciei excelente aprendizado nestes anos de preparação acadêmica. Agradeço a Professora Eliane Gonsalves, nossa querida Professora Lia, que com abnegação e carinho investiu seu precioso tempo em me orientar e ajudar a transpor essa etapa do curso. Agradeço a cada Colega de Classe, que de uma forma ou de outra contribuíram para que eu pudesse cumprir essa tarefa, ao chegar ao final do curso, não lhes chamo tão somente de colegas, mas de amigos. Agradeço a meus colegas de trabalho na pessoa de Wagner Medeiros Fernandes Gonçalves, patrão e amigo, meu grande incentivador, sem ele talvez eu jamais houvesse iniciado este curso. Agradeço ao Dr. Alceu Jorge Vieira e a Dra. Bárbara Krishna Garcia Fischer, dois profissionais que estiveram ao meu lado no início de minha caminhada forense. Agradeço ao Dr. Levy Ferreira de Souza Júnior, advogado por profissão e Pastor por vocação, a quem, tanto por um quanto outro ofício me ajudou a chegar até aqui. E por falar em Pastor, não posso me esquecer do Pr. Roberto Cardoso, conselheiro e amigo, receba minha gratidão. Agradeço a meus pais, José Ribeiro e Dirce Silveira Ribeiro, juntamente com meus irmãos Rodrigo e Mário, pois foram eles os escolhidos por Deus para me ampararem como família; não existem palavras para expressar a gratidão que sinto por vocês existirem. Agradeço a meus filhos, Victor Vinícius, Laura Fábia e Valentina, três razões que me levam a andar a segunda milha (Mt. 5:41) e a me esforçar sempre mais. Quero ser um exemplo para vocês. Por fim, mas não menos importante, agradeço a minha esposa Vera Lúcia, a quem já dediquei com exclusividade este trabalho, alguém por quem sou tão apaixonado que se editassem uma Lei que proibisse um homem de amar sua esposa, ela teria que me visitar na prisão.
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Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Rei Salomão (Eclesiastes 3:1) O exercício de direitos deve ser uma consequência e garantia de uma consciência de cidadania, e não uma ameaça eterna contra os sujeitos obrigados, que não devem estar submetidos indefinidamente a uma espada de Dâmocles sobre suas cabeças. Rodolfo Pamploma Filho
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RESUMO
Este trabalho de conclusão de curso se propõe a analisar os institutos da decadência e da prescrição como fundamentos para extinção do crédito tributário. No capítulo introdutório é abordado um breve histórico da tributação no Brasil até chegar-se a conquista do princípio da segurança jurídica, que dentre outras coisas ressalta a influência do tempo sobre a exigência tributária. Uma vez que o princípio da segurança jurídica impõe que as relações entre o Fisco e o contribuinte sejam pacificadas, o sujeito passivo da relação tributária não pode ficar sujeito indefinidamente à cobrança do Fisco. Antes de adentrar na análise temática específica, delineiam-se os conceitos de obrigação tributária, fato gerador e hipótese de incidência, crédito tributário, lançamento tributário e suas formas, com o claro intuito de lançar luz para o tema central. Na sequência, vem à apresentação dos institutos da decadência e da prescrição, demonstrando-se as semelhanças e diferenças entre sua aplicação no direito civil e no direito tributário. A comparação segue, porém entre os institutos em si, suas similitudes e principais diferenças, com destaque para o marco do lançamento tributário na diferenciação dos institutos. No estudo específico, dedica-se um capítulo para as hipóteses de aplicação da decadência contra o Fisco, bem como outro para as hipóteses de aplicação da prescrição contra o Fisco, destacando a confrontação da doutrina e da jurisprudência, sempre se destacando as teses mais benéficas ao contribuinte. Por fim, embora não exaurindo o tema, dedica-se um capítulo ao estudo de algumas discussões que foram ou estão sendo enfrentadas nos Tribunais Superiores, onde em sede de considerações finais, demonstra-se que embora com muita polêmica, e, nunca sem grande embate, o princípio da segurança jurídica vem sendo prestigiado.
Palavras Chave: Tempo; Tributo; Crédito Tributário; Lançamento; Decadência; Prescrição.
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ABSTRACT
The aim of this course conclusion work is to analyze the decay of institutions as grounds for termination of the (a) tax credit. The introductory chapter discusses a brief history of taxation in Brazil up to the completion of the principle of legal certainty, which among other things emphasizes that the passage of time has on tax requirement(s). The principle of legal certainty requires that the relationship between Revenue
authorities
and
the
taxpayer
are
satisfied,
the
taxpayer's
taxable obligation cannot be subject to indefinite inquiry by tax collection authorities. Before embarking on specific thematic analysis, outline the concepts of tax obligation, generate facts and hypothesis of incidence, tax credit tax assessment and their forms, with the clear intention of shedding light on the central theme. What follows is a presentation of the institutions of the decadence and prescription showing the similarities and differences between their application in civil law and tax law. The comparison follows, however among the institutions themselves, the similarities and key differences are notable such as the landmark release in the differentiation of tax institutions. In the specific study, a chapter is devoted to the application of decay hypotheses against the revenue and another for the chance to apply the prescription against the tax collector, highlighting the confrontation of doctrine and jurisprudence, always highlighting the most beneficial situation to the taxpayer. Finally, while not exhausting the topic, a chapter is devoted to the study of certain discussions that have been, or are being addressed in the Superior Courts, where in place of final remarks, demonstrates that although very controversial, and often with significant confrontation, the principle of legal certainty has been prominent.
Keywords: Time, Tribute, Tax Credit; Release; Decay/Decadence, Prescription
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LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS OU TERMOS OPERACIONAIS AC – Apelação Cível AgRg - Agravo Regimental Art. - Artigo CC/16 – Código Civil de 1916 (revogado) CC/02 – Novo Código Civil de 2002 CDA – Certidão de Dívida Ativa CF/88 – Constituição Federal de 1988 CTN – Código Tributário Nacional DCTF – Declaração de Créditos Tributários Federais GIA – Guia de Informação de Apuração IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano IPVA – Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores ITBI – Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis ITR – Imposto Territorial Rural LEF – Lei de Execução Fiscal (Lei nº 6.830/80) REsp – Recurso Especial STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça
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SUMÁRIO RESUMO..................................................................................................................... 7 LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS OU TERMOS OPERACIONAIS ...................... 9 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12 1 TRIBUTAÇÃO NO BRASIL E A SEGURANÇA JURÍDICA .................................... 15 1.1 O Tributo no Tempo ......................................................................................... 15 1.2 O Tempo no Tributo ......................................................................................... 22 1.2.1 A influência do tempo nas relações jurídicas ............................................. 22 2 CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA O ESTUDO DA DECADÊNCIA E DA PRESCRIÇÃO........................................................................................................... 25 2.1 Obrigação Tributária ........................................................................................ 25 2.1.1 Obrigação Principal e Obrigação Acessória .............................................. 27 2.2 Fato Gerador e Hipótese de Incidência............................................................ 27 2.3 Crédito Tributário ............................................................................................. 29 2.3.1 Constituição do Crédito Tributário.............................................................. 31 2.4 Lançamento Tributário ..................................................................................... 32 2.4.1 Definição .................................................................................................... 32 2.4.2 Natureza e Efeitos do Lançamento ............................................................ 33 2.5 Modalidades de Lançamento Tributário ........................................................... 35 2.5.1 Lançamento de Ofício ................................................................................ 35 2.5.2 Lançamento por Declaração ...................................................................... 36 2.5.3 Lançamento por Homologação .................................................................. 37 2.6 Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário............................................ 39 2.7 Extinção do Crédito Tributário .......................................................................... 42 2.8 Exclusão do Crédito Tributário ......................................................................... 43 3 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA ............................................................................ 45 3.1 A Prescrição e a Decadência no Direito Privado.............................................. 45 3.1.1 Na visão do revogado Código Civil de 1916 .............................................. 47 3.1.2 Na visão do atual Código Civil de 2002 ..................................................... 48 4 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO DIREITO TRIBUTÁRIO ............................... 50 4.1 Distinção entre Prescrição e Decadência no Direito Tributário ........................ 50 4.2 A Natureza Jurídica da Prescrição e Decadência em face do Crédito Tributário ............................................................................................................................... 51 4.3 A Competência Legislativa em Matéria de Prescrição e Decadência .............. 53
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5 DECADÊNCIA DO DIREITO DO FISCO ................................................................ 55 5.1 Hipóteses de Decadência contra o Fisco ......................................................... 55 5.1.1 Decadência do direito de lançar nos casos de pagamento antecipado ..... 55 5.1.2 Decadência do direito de lançar quando não há pagamento antecipado .. 56 5.1.3 Decadência do direito de lançar quando se anula o lançamento anterior .. 58 5.1.4 A Regra do Parágrafo Único do art. 173 do CTN, e os Casos de dolo, fraude ou simulação (art. 150, § 4º, CTN) .......................................................... 60 5.2 A Decadência e a Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário .............. 63 6 A PRESCRIÇÃO DO DIREITO DO FISCO ............................................................ 65 6.1 A Prescrição no Direito Tributário .................................................................... 65 6.2 A Prescrição e a Suspensão do Crédito Tributário .......................................... 66 6.3 Interrupção da Prescrição ................................................................................ 67 6.4 Prescrição Intercorrente ................................................................................... 69 6.4.1 Prescrição Intercorrente no Curso do Processo Administrativo ................. 70 6.4.2 Prescrição Intercorrente no Curso da Execução Fiscal ............................. 74 7 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NOS TRIBUNAIS ............................................... 79 7.1 A Tese dos Dez Anos (5+5) ............................................................................. 79 7.2 Súmula Vinculante nº 08 .................................................................................. 85 7.3 Prazo para Redirecionamento da Execução em Face dos Sócios................... 87 7.4 Cabimento da Exceção de Pré-Executividade na Execução Fiscal ................. 90 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 92 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 97
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INTRODUÇÃO A tributação é um dos principais, senão que o principal instrumento que o Estado tem utilizado para sobreviver, sem ela não se desenvolveria as atividades financeiras do Estado, tão pouco se poderia realizar os seus fins sociais. A tributação é legitimada pelo povo a medida que encontra previsão constitucional e regulação infraconstitucional, no entanto, quando a mão pesada do Estado insiste em cobrar tributos de forma desordenada e durante um lapso de tempo indeterminado ou mesmo muito extenso, o ordenamento jurídico precisa possuir dispositivos que possam proteger o cidadão do arbítrio do Fisco. O presente estudo tem por objetivo trazer algumas luzes a um assunto que muito se tem discutido tanto na doutrina, quanto nos Tribunais pátrios. A influência do tempo na extinção do crédito tributário. Pois desde que o Código Tributário Nacional elencou a decadência e prescrição como causas para a extinção do crédito tributário, doutrina e jurisprudência se debatem em teses e mais teses, ora favoráveis, ora desfavoráveis ao contribuinte, sujeito passivo na relação tributária. Os efeitos da decadência e da prescrição sobre o crédito tributário são um dos temas tormentosos em que navegam o Fisco, os contribuintes, a jurisprudência e a doutrina, todos com posições divergentes e sujeitas a mutações. Os contribuintes tentam buscar na doutrina o apoio necessário para sustentar a redução do tempo de exigência do crédito tributário, tal como se demonstra na polêmica
aplicação
da
prescrição
intercorrente,
sobretudo,
no
processo
administrativo, como se demonstra no capítulo seis deste trabalho. Por outro lado, e, paralelamente, o Fisco, deseja prolongar o tempo em que poderá exercer o direito de cobrar tributos, tal qual se demonstra na exposição da Tese dos Dez anos tratada no capítulo sete adiante. No meio de toda esta discussão, doutrina e jurisprudência digladiam-se, ora em favor do Fisco, ora em favor do contribuinte. A jurisprudência, especialmente a do Superior Tribunal de Justiça, com a função de padronizar a aplicação do direito, já mudou de posição algumas vezes, isso sem falar na divergência entre suas Turmas, o que contribuiu para insegurança jurídica, já que é imprescindível a definitividade para gerar a segurança necessária nas relações entre o Fisco e os contribuintes.
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Neste sentido, torna-se importante a possibilidade de julgamento em sede de recursos repetitivos, criada com a edição da Lei nº 11.672/2008 que acresceu o artigo 543-C no Código de Processo Civil. Desta forma, um recurso é escolhido como representativo de controvérsia e é submetido a julgamento pela Corte que estabelece os rumos da aplicação do direito, inclusive nos demais recursos e lides pendentes. O presente trabalho estudou algumas questões já decididas por está nova sistemática e outras questões que estão pendentes de julgamento, mas que refletirão sobre o tema estudado. Por sua vez, o estudo da doutrina aponta para os fundamentos que servem para sustentar as diversas teses e posições, existindo, ainda que se queira negar, uma tênue divisão entre doutrinadores que são pro-fisco e doutrinadores que são pro-contribuintes, sendo que os primeiros na essência buscam demonstrar a prevalência do princípio do interesse público que justifica a cobrança de tributos pelo Fisco por um prazo dilatado, e os demais, privilegiando o princípio da segurança jurídica, defendem a sanções a serem aplicadas em relação à inércia do Fisco, tais como a extinção do crédito tributário em razoável transcurso de tempo, não concordando com a exposição do contribuinte aos abusos da administração tributária. A espinha dorsal do presente estudo é o efeito do tempo, este agente implacável, que sempre irá produzir efeitos nas relações humanas, especialmente na seara do direito, onde os institutos da decadência e da prescrição são corolários da segurança jurídica. Pois, como se verificou, num Estado Democrático de Direito nenhuma relação jurídica poderá se eternizar indefinidamente no tempo. Fazer a correta identificação do exato instante em que se encerra o direito do Fisco constituir, cobrar ou executar o crédito tributário é o desafio que se busca enfrentar no presente trabalho. O presente estudo realizou uma confrontação de posições advindas da mais ilibada doutrina da lavra dos consagrados Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins, Aliomar Baleeiro, bem como de expoentes do direito tributário tais como Eurico Marcos Diniz de Santi, Leandro Paulsen, José Hable, dentre outros. Na jurisprudência, foi inevitável a transcrição de várias ementas, pois foi na divergência ou na pacificação de temas em nossos tribunais que se guiou a confrontação da temática.
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A abrangência do tema não permite um enfrentamento detalhado de todas as correntes e posições, de tal forma que o que se faz é um voo panorâmico sobre toda a controvérsia, e isto por meio de uma incursão teórica e farto exame jurisprudencial, procura-se verificar a existência de eventuais posições favoráveis ao contribuinte e que possam ajudar o advogado militante na seara tributária a apresentar defesa consistente em favor de seus clientes, respaldada na segurança jurídica advinda da inclusão da decadência e da prescrição como causas de extinção do crédito tributário.
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1 TRIBUTAÇÃO NO BRASIL E A SEGURANÇA JURÍDICA
1.1 O Tributo no Tempo A história nos demonstra que onde quer que se erguesse um poder político, quase como uma sombra, aparecia o poder de tributar1. Qualquer que seja a concepção de Estado que se venha a adotar, é inegável que ele desenvolve atividade financeira2. O Estado existe para a consecução do bem comum, porém para atingir tal objetivo, precisa obter recursos financeiros, o que faz, basicamente através da tributação. A tributação é o instrumento mais importante utilizado pelo Estado para sobreviver, sem ela não seria possível realizar os fins sociais3. De um modo geral, é possível afirmar que o tributo está presente em todo o tempo da existência do Brasil, e por conta disto, pode-se contar um pouco da história deste país através de seus tributos. O processo de arrecadação e o sistema tributário no Brasil nos remetem a sua formação histórica e cultural. A maneira como o nosso Estado foi estabelecido reflete diretamente na sua organização econômica, jurídica e social. Assim, a maneira exploratória com a qual o Brasil foi colonizado ainda apresenta resquícios na atual organização tributária e orçamentária. O Brasil é um exemplo de Estado Federal, ou Federação, embora a centralização do poder político e especialmente a centralização das rendas tributárias, antes da Constituição de 1988, fossem de tal ordem a caracterizar o Brasil como Estado Unitário4. Nos anos de 1500 a 1822, quando o Brasil era apenas uma colônia de Portugal, vivia sobre a égide do Direito Português e, nesta época de "primeiras expedições", não existiam condições que sustentassem um sistema tributário, dada a escassez de população5. Todavia, pode-se encontrar neste período o primeiro 1
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009, p. 4. 2 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 23. 3 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 32. 4 MACHADO, Op. Cit., p. 23. 5 SOUZA, Eliziane Mara de. Aspectos destacados acerca da tributação no Brasil Colônia. In: BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 87-104.
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ônus fiscal, que incidia sobre a indústria extrativista, ainda no princípio da exploração do pau-brasil, adveio à cobrança do “quinto do pau-brasil”, uma espécie de primeira exação fiscal nas terras brasileiras6. Souza elucida o contexto da época: Como o rei não tinha dinheiro suficiente para iniciar e manter a atividade de exploração da madeira, passou a conceder a exploração a países estrangeiros, principalmente à Inglaterra, por meio de contrato celebrado com a coroa portuguesa, detentora do monopólio real do pau-brasil, a terceiro, por prazo determinado, mediante o pagamento de uma determinada quantia. O concessionário obrigavase a defender as terras sob sua posse dos ataques inimigos, a construir fortificações ao longo do litoral e a pagar o quinto do paubrasil ao soberano, em espécie, tendo em vista a inexistência de circulação monetária na colônia.7
Cabe observar que o período do Brasil colônia não conheceu muitos tributos tradicionais em Portugal, como os foros de julgada, a fossadeira, o relego, as portagens, as açougagens, o montado e a coima, dentre outros8. Desta forma, o primeiro tributo que surgiu no país foi o quinto ou vintena (20%), tributo antigo, cobrava a quinta parte de todas as tomadas, tesouros ou descobertas, presente em Portugal desde 1316, sendo cópia e instituição muçulmana que buscava recursos nos despojos dos inimigos vencidos em batalhas9. Entre os anos de 1532 e 1548, quando preponderavam as Capitanias Hereditárias, os tributos pagos ao Rei foram determinados pelas "Cartas de Foral" que instituía uma alíquota de 10% (dízimo) sobre o pescado, colheita, comércio exterior e escravos, e de 20% (quinta parte) sobre metais e pedras preciosas10. No Governo Geral de 1548 a 1763, existiam tributos ordinários e extraordinários, sendo que os primeiros incidiam sobre o comércio do pau-brasil, especiarias e drogas, direito de alfândega, metais, pedras preciosas, pescado e colheitas e o último se destacava pelo caráter urgente e transitório, pois eram 6
CAMPOS, Hélio Sílvio Ourem. O Brasil: uma breve visão histórica do Estado, das constituições e dos tributos. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, Recife, n. 6, p. 75-123, abr. 2004. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27710>. Acesso em: 8 fev. 2010. 7 SOUZA, Eliziane Mara de. Aspectos destacados acerca da tributação no Brasil Colônia. In: BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 88. 8 CAMPOS, Op. Cit., 2004. 9 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de Direito Tributário. 6º ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000 apud SOUZA, Op. Cit., 2006, p. 89. 10 CAMPOS, Op. Cit, 2004.
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destinados a despesas excepcionais, tais como para fazer frente aos gastos com tropas ou construções de fortalezas ou cidades11. Já no período dos Vice-Reis, 1763 a 1808, originaram-se figuras fiscais distintas, tais como o subsídio literário sobre o gado abatido ou aguardente destilada, subsídio de direito de pólvora estrangeira, subsídio de açúcar e algodão, do tabaco em pó, imposto sobre ouro, botequim e taberna12. Quando Dom João veio para o Brasil em 1808 (até 1815), criou o Tesouro Nacional, extinguindo as Juntas das Fazendas. Os tributos instituídos que tiveram mais relevância nesta época foram os incidentes sobre o direito de importação, de guindaste, imposto sobre prédio urbano, imposto sobre transmissão imobiliária, "meia sisa" dos escravos, décima da herança e do legado, de selo sobre papel, de entrada de novos escravos, imposto de indústria e profissões, sobre a carne e lã e de 10% sobre o vencimento dos funcionários da Fazenda e Justiça 13. Durante o período colonial, verifica-se, segundo Souza14, a existência de uma política fiscal injusta, que se contrapõe aos princípios tributários elencados na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, podendo ser citado, a título de ilustração, o princípio da isonomia, da capacidade contributiva e progressividade. O período de governo de Dom Pedro I ao II (1822 a 1889) não evidenciou qualquer modificação com relação ao sistema tributário. Porém, os tributos não passaram imunes ao movimento de independência e pela Constituição de 25 de março de 1824, que continha o ideal liberal de que toda tributação precisaria passar pela representação. Era o princípio da legalidade. Esta Constituição não continha apenas este princípio tributário, comportando o da capacidade contributiva, o da isonomia, o da irretroatividade, etc15. Outra peculiaridade foi a de que, mesmo sendo o Brasil um Estado unitário, existiam, ao lado da central, a receita provincial e a
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CAMPOS, Hélio Sílvio Ourem. O Brasil: uma breve visão histórica do Estado, das constituições e dos tributos. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, Recife, n. 6, p. 75-123, abr. 2004. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27710>. Acesso em: 8 fev. 2010. 12 TAKEDA, Tatiana de Oliveira. Como nasceu e se desenvolveu a tributação até a CF/88. Clipping Biblioteca, Poder Judiciário de Goáis, 03/12/2008, p. 7-9, formato do arquivo: Microsoft Word. Disponível em < www.go.trf1.gov.br/setoriais/.../clipping%5Cclipping_2008_12_03.d..> Acesso em 28/08/2012. 13 Ibdem. 14 SOUZA, Eliziane Mara de. Aspectos destacados acerca da tributação no Brasil Colônia. In: BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 103. 15 ZAVARIZI, Índio Jorge. A fiscalidade no Brasil República In: BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 126.
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municipal. Eram cerca de 151 (cento e cinquenta e uma) rubricas, com denominações assistemáticas, além das provinciais e municipais16. De 1822 a 1831 os tributos continuavam a ser lançados e arrecadados sem métodos uniformes e racionais. Já na época da regência (1831 a 1840), vieram algumas inovações, como por exemplo, a que objetivou uniformizar a arrecadação e evitar a multiplicidade de taxas17. A ligação entre Estado e Igreja era tão forte que se permitia a cobrança de tributos para a construção de Igrejas. Em troca, o Imperador obtinha o direito de escolher os ocupantes de cargos eclesiásticos, dependendo, tão somente em relação a altos cargos, da confirmação do Papa18. O Império chegou ao fim, sem instituir um sistema tributário que permitisse uma distribuição e arrecadação baseadas nas condições econômicas do país e uma divisão razoável das contribuições públicas, entre a receita geral do Império e a receita particular das províncias19. Com o advento da Constituição de 1891, foram consignadas três áreas de competência tributária na legislação preponderante, adotou-se a norma da discriminação e se estabelecia imunidade entre os Estados Federativos e a União20. A Constituição de 24 de fevereiro de 1891 pretendeu firmar um sistema rígido de discriminação de competências tributárias, distribuindo receitas entre a União e os Estados, pois ficavam excluídos os Municípios. Fixou, também, a imunidade recíproca, proibindo aos Estados tributarem bens e rendas federais ou serviços a cargo da União, e reciprocamente (art. 10). Vedava-se, ainda, à União e aos Estados a prescrição de Leis retroativas. Contudo, no art. 12, considerava lícito aos Estados e à União, cumulativamente ou não, criar outras fontes de receitas, desde que não colidisse com as vedações nela fixadas. Esta competência concorrente
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CAMPOS, Hélio Sílvio Ourem. O Brasil: uma breve visão histórica do Estado, das constituições e dos tributos. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, Recife, n. 6, p. 75-123, abr. 2004. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27710>. Acesso em: 8 fev. 2010. 17 TAKEDA, Tatiana de Oliveira. Como nasceu e se desenvolveu a tributação até a CF/88. Clipping Biblioteca, Poder Judiciário de Goiás, 03/12/2008, p. 7-9, formato do arquivo: Microsoft Word. Disponível em < www.go.trf1.gov.br/setoriais/.../clipping%5Cclipping_2008_12_03.d..> Acesso em 28/08/2012. 18 BALTHAZAR, Ubaldo Cesar. Tributos no Brasil Império. In: BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 112. 19 ZAVARIZI in BALTHAZAR, Op. Cit., 2006, p. 128. 20 TAKEDA, Op. Cit.
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permaneceu sendo objeto de severas críticas, e serviu de anteparo para a criação do imposto de renda no Brasil pela via subconstitucional21. Segundo Sampaio Dória apud Zavarizi: [...] se esboçou um federalismo financeiro centrífugo, com predomínio de ampla autonomia estadual e dependência municipal aos Estados. Não se vislumbrava em seu texto a cooperação e solidariedade financeiras. Obstáculos ao comércio interestadual traduziam-se na incidência do imposto de exportações sobre as circulações de mercadorias nas operações interestaduais. A competência concorrente possibilitava a bitributação22.
Durante a chamada “República Velha”, a economia agrícola sentiu-se sufocada, tirando o seu apoio do Governo; o que contribuiu para redundar na “Revolução de 30”. No período revolucionário, foram criados novos tributos, entre eles a contribuição de melhoria (Decreto nº 21.930, de 11 de maio de 1932) 23. Em 1934, momento em que mais uma Constituição nascia, foi consagrado o Princípio da Igualdade de todos perante a Lei (art. 113), sedimentando a competência tributária privativa da União, contemplando os Estados e Municípios com o imposto de vendas, sendo o primeiro também com consignações e vedando a bitributação24. Instituiu o imposto de vendas e consignações para os Estados e o imposto sobre o consumo para a União, elevando a nível constitucional o imposto de renda, também federal25. Destaque na Carta de 1934 é que os Municípios foram agraciados com impostos privativos e definidos26. A Constituição de 1937 não trouxe nenhuma novidade, apelidada de “a polaca”, trouxe pequenas alterações no campo tributário. Foi durante a sua vigência que surgiu um adicional ao imposto de renda, motivando-o na proteção à família. Ele
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CAMPOS, Hélio Sílvio Ourem. O Brasil: uma breve visão histórica do Estado, das constituições e dos tributos. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, Recife, n. 6, p. 75-123, abr. 2004. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27710>. Acesso em: 8 fev. 2010. 22 DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Discriminação de rendas tributárias. São Paulo: José Bushatsky Editor, 1972, p. 43 apud ZAVARIZI, Índio Jorge. A fiscalidade no Brasil República In: BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 130. 23 CAMPOS, Op. Cit., 2004. 24 TAKEDA, Tatiana de Oliveira. Como nasceu e se desenvolveu a tributação até a CF/88. Clipping Biblioteca, Poder Judiciário de Goiás, 03/12/2008, p. 7-9, formato do arquivo: Microsoft Word. Disponível em < www.go.trf1.gov.br/setoriais/.../clipping%5Cclipping_2008_12_03.d..> Acesso em 28/08/2012. 25 CAMPOS, Op. Cit., 2004. 26 ZAVARIZI in BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 131.
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incidia sobre pessoas solteiras, viúvas e sobre casais sem filhos (Decreto nº 3.200, de 19 de abril de 1941) 27. A Constituição de 1946 adotou o Princípio da Competência Remanescente (competência extraordinária, concorrente) paralelo ao discriminativo (art. 21). Ressalte-se que o sistema tributário aparecia totalmente discriminado, definindo o campo e isolando cada uma das pessoas jurídicas de Direito Público. Procurou-se solucionar o problema das finanças locais, outorgando aos Municípios elementos para o fortalecimento de suas finanças. O imposto de indústria e profissões, que era de competência privativa dos Estados, passou totalmente para os Municípios28. A Constituição de 1946 não conceituou imposto, taxa e contribuição de melhoria. Além disso, consagraram-se os Princípios da Anualidade e Capacidade Contributiva e firmou-se a imunidade tributária em situações necessárias ao exercício de valores fundamentais29. Grande é a importância do Sistema Tributário Nacional, que até 1943, aparecia na verdade como um amontoado desorganizado de normas absolutamente obscuras e totalmente divorciadas da ciência jurídica, sendo de extrema relevância o enorme trabalho de Rubens Gomes de Souza que, em 1952, concluiu o anteprojeto do Código Tributário Nacional, que sendo promulgado em 1966, sob a égide da Constituição de 1946, na qual não existia a figura da Lei Complementar 30. A Constituição de 1967 e a Emenda n.º 1 de 1969 também adotaram a competência remanescente (§5º do art. 8 da Constituição de 1967) e definiram maior unicidade da competência tributária com ascendência da União Federal. Ainda, foi praticamente instituído o Sistema Tributário Nacional, recepcionou a Lei n.º 5.172/66 que instituiu o Código Tributário Nacional como Lei Complementar em virtude da matéria. Dentro de um planejamento rigoroso, estabelecendo a unidade econômicofinanceira, bem como a competência tributária do poder de tributar e passou-se a 27
CAMPOS, Hélio Sílvio Ourem. O Brasil: uma breve visão histórica do Estado, das constituições e dos tributos. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, Recife, n. 6, p. 75-123, abr. 2004. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27710>. Acesso em: 8 fev. 2010. 28 ZAVARIZI in BALTHAZAR, Ubaldo Cesar (org.). O Tributo na História: Da antiguidade à Globalização. Florianópolis/SC: Fundação Boiteux, 2006, p. 135. 29 TAKEDA, Tatiana de Oliveira. Como nasceu e se desenvolveu a tributação até a CF/88. Clipping Biblioteca, Poder Judiciário de Goiás, 03/12/2008, p. 7-9, formato do arquivo: Microsoft Word. Disponível em < www.go.trf1.gov.br/setoriais/.../clipping%5Cclipping_2008_12_03.d..> Acesso em 28/08/2012. 30 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 17.
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conceituar as espécies de tributos denominadas como taxa e contribuição de melhoria (incisos I e II do art. 18 da Emenda n.º 1/69), porém, não conceituou o imposto31. A novidade trazida ao conceito constitucional de taxa traduziu-se no fato de ampliação do conceito clássico doutrinário, pois sua cobrança dava-se pelo simples poder de polícia exercido pelo Estado. Além disso, o princípio da legalidade vinha formulado com ressalvas somente pertinentes ao aumento dos tributos32. A Constituição Federal de 1988, apelidada de Constituição cidadã, instituiu explicitamente o princípio da estrita legalidade, bem como o princípio constitucional da vedação ao confisco, o qual deu ao Poder Judiciário um novo instrumento de controle de voracidade fiscal, pois o conceito deste instituto foi elaborado através da provocação do poder jurisdicional pelo interessado. Além dos impostos, trouxe imunidade para taxas e contribuições33. A Constituição de 05 de outubro de 1988 consagrou um Título para a “Tributação e o Orçamento”, o Título VI, destinando o Capítulo I para o Sistema Tributário Nacional. Este Capítulo está dividido em três partes: a) trata dos princípios gerais e das limitações do poder de tributar; b) discrimina as receitas dos impostos pela União, por Estados e o Distrito Federal e pelos Municípios; c) dispõe sobre a repartição das receitas tributárias34. Percebe-se que através do tempo, o tributo ajudou a escrever a história do Brasil, e que o poder de tributar sempre foi legitimado pelo nosso ordenamento jurídico, os princípios implantados, progressivamente, pela axiologia do justo foram se incorporando: capacidade contributiva, como fundamento para a tributação; igualdade de todos perante a Lei; a Lei feita por representantes do povo como único veículo para instaurar a tributação (legalidade); a descrição pormenorizada dos fatos tributáveis (tipicidade) para evitar o subjetivismo do Fisco e para garantir a certeza e a segurança dos contribuintes; a proibição do confisco por meio da tributação; a absoluta irretroatividade das Leis fiscais e da jurisprudência tributária, dentre outras 31
TAKEDA, Tatiana de Oliveira. Como nasceu e se desenvolveu a tributação até a CF/88. Clipping Biblioteca, Poder Judiciário de Goiás, 03/12/2008, p. 7-9, formato do arquivo: Microsoft Word. Disponível em < www.go.trf1.gov.br/setoriais/.../clipping%5Cclipping_2008_12_03.d..> Acesso em 28/08/2012. 32 Ibdem. 33 Ibdem. 34 CAMPOS, Hélio Sílvio Ourem. O Brasil: uma breve visão histórica do Estado, das constituições e dos tributos. Revista Esmafe: Escola de Magistratura Federal da 5ª Região, Recife, n. 6, p. 75-123, abr. 2004. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27710>. Acesso em: 8 fev. 2010.
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conquistas35, sendo de especial relevância para o atual trabalho a segurança jurídica advinda da fixação de um tempo hábil para que os direitos relacionados ao direito tributário sejam exercidos.
1.2 O Tempo no Tributo
1.2.1 A influência do tempo nas relações jurídicas
O tempo exerce influência praticamente sobre tudo o que existe, até mesmo as mais duras rochas são afetadas pelo decurso do tempo, os seres humanos nascem, crescem, envelhecem e morrem enquanto o tempo passa. Basta imaginar os acontecimentos da última década, quantas novidades tecnológicas, quantas tragédias, quantos avanços, quantas mudanças na economia brasileira, e muito mais na global. É impossível ignorar a influência do tempo nas relações humanas, principalmente no que concerne ao Direito36. Com o transcurso do tempo, qualquer ação ou omissão podem trazer consequências sobre as relações entre os indivíduos, o que é a causa de grande repercussão nas relações jurídicas37. O tempo constrói tanto o berço, como a sepultura de direitos, e isso a quem quer que seja, e a efetivação desse direito é inerentemente relacionada a uma conduta do homem tendente a fazer valer seu direito ou ainda impedir ou fazer cessar a lesão a tal direito38. A inércia ou a ação do individuo portador de um direito irá sofrer forte influência do tempo, determinando a validade ou ineficácia de tal direito. Como o objetivo magno do Direito é a busca da paz social, é fundamental que o ordenamento jurídico estipule um lapso temporal suficiente para que o detentor de um direito o exercite, bem como também é importante que este mesmo direito
35
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009, p. 4. 36 HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, pp. 1-6. 37 ALVES, Vilson Rodrigues Alves. Da Prescrição e da Decadência no Código Civil de 2002. 4ª ed. Campinas: Servenda, 2008, p. 5-12. 38 Ibdem, p. 11.
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garanta aos demais sujeitos da relação jurídica que tal direito não poderá ser exercitado quando bem entender o seu titular39. A estabilidade do Direito está na fixação de prazos justos e apropriados para o exercício de determinado direito, assim sendo, não havendo o exercício pelo titular de um direito no tempo estabelecido pela Lei, o mesmo não poderá mais exercitá-lo, regra essa que assegura a continuidade da ordem jurídica e a paz social entre os membros de uma sociedade civilizada40. Desta forma, a segurança jurídica encontra-se no fundamento da estabilidade do direito, e é o ponto de partida dos institutos da prescrição e decadência que serão adiante estudados41. O Princípio da Segurança Jurídica encontra-se diretamente vinculado ao Estado de Direito, que surgiu na metade do século XIX, sendo um dos princípios basilares que lhe dão sustentação42. Souto Maior escreve que “a segurança jurídica transcende o próprio direito positivo, posto estar tal princípio ligado à inspiração da própria criação da norma”
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Desde o seu nascimento o ser humano, como cidadão, já se encontra vinculado a diversas relações jurídicas, pois está cercado e amparado por uma sociedade civilizada, e é desde esse momento que o mesmo precisa ter estabilidade nestas relações, sob pena de não tendo, não ser capaz de desenvolver-se. Daí, não se pode deixar de observar que “não há justiça materialmente eficaz se não for assegurado aos cidadãos, concretamente, o direito de ser reconhecido a cada qual o que é seu aquilo que, por ser justo, lhe compete”44. No presente trabalho será feita uma análise da influência do tempo na extinção do crédito tributário, de tal modo que os institutos da prescrição e da decadência serão observados sob a ótica de sua inclusão no rol das formas de extinção previstas no artigo 156 do Código Tributário Nacional, especificamente em
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HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, pp. 1-6. 40 RIBEIRO, Maria de Fátima (coord.). Direito Tributário e Segurança Jurídica. São Paulo: MP, 2008. 41 Ibdem. 42 SOUTO, Maior Borges. O princípio da segurança jurídica na criação e aplicação do Tributo. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, n. 13, abril-maio, 2002. Disponível na Internet: http://www.direitopublico.com.br. Acesso em: 21 de maio de 2011. 43 Ibdem. 44 SOUZA, Carlos Aurélio Mota de. Segurança jurídica e jurisprudência: Um enfoque filosófico-jurídico. São Paulo: Ltr, 1996. p 17-18.
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seu inciso V, sendo que tal inclusão visa garantir a segurança jurídica nas relações entre o contribuinte e o Fisco. Assim, no Estado Democrático de Direito, o Princípio da Segurança Jurídica deve sempre ser observado e aplicado. Se certa é a garantia constitucional de recebimento pelo Fisco de seus direitos decorrentes do crédito tributário, certo é também que o instrumento para a busca desse direito deve sempre observar todo o procedimento previsto nos diplomas legais, sem ferir qualquer preceito, bem como a certeza jurídica das relações45. Ademais, é conveniente salientar que o conceito de Justiça no Estado Democrático de Direito, deve estar associado ao conceito da Segurança Jurídica, sob pena de as relações jurídicas existentes entre as partes perderem credibilidade e estabilidade, tanto que a Constituição Federal de 1988 elenca o Princípio da Segurança Jurídica, em várias passagens, o que pode ser observado desde o preâmbulo até o título II dos Direitos e Garantias Fundamentais46. E, utilizando-se das sábias palavras de Evandro Silva Barros: é necessário lembrar que o texto constitucional ao introduzir a segurança jurídica como um dos seus princípios, empreendeu - lhe conotação de direito fundamental, uma vez que detém a função de garantir, tutelar e proteger os direitos conferidos aos sujeitos de direito47.
Dessa forma, o tempo dá imunidade a novos ataques para aquela relação jurídica que vigeu por certo lapso temporal, mas que por negligência do titular do direito, este não foi exercitado, prestigiando assim o princípio da segurança jurídica e estabilizando as relações jurídicas.
45
HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, pp. 1-6. 46 RIBEIRO, Maria de Fátima (coord.). Direito Tributário e Segurança Jurídica. São Paulo: MP, 2008. 47 BARROS, Evandro Silva. “Coisa Julgada Inconstitucional e Limitação Temporal para a Propositura da Ação Rescisória”. Revista de Direito Constitucional e Internacional, ano 12, n. 47, abril-junho de 2004. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 85.
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2 CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA O ESTUDO DA DECADÊNCIA E DA PRESCRIÇÃO
2.1 Obrigação Tributária O Código Tributário Nacional48 traz em seu Título II, Capítulo I, especificamente em seu artigo 113 que “a obrigação tributária é principal ou acessória”. Ora, mas antes de discutir-se o que é a principal e o que a acessória, deve-se responder o que é a obrigação tributária? O saudoso Aliomar Baleeiro49 considerava a obrigação tributária como o núcleo do Direito Tributário, porém já advertia que não existe um conceito próprio de obrigação tributária, devendo-se buscar detalhes nas construções do Direito em geral, especialmente no Direito Privado, que desde os romanos já construía o conceito geral de obrigação, definindo-a como o vínculo jurídico que nos obriga a prestar algo (dar, fazer ou não fazer) a outrem. Barsani50 leciona que para se buscar esta resposta precisamos ter uma clara noção do que seja uma relação jurídica obrigacional, isto é, aquela que se estabelece entre sujeito ativo da obrigação e o sujeito passivo dessa mesma obrigação, pois a obrigação tributária, segundo a referida doutrinadora, “não se difere conceitualmente das obrigações em geral”, e apresenta uma definição bem simples, citando Souza: O poder jurídico, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir de um particular (sujeito passivo) uma prestação positiva ou negativa (objeto da obrigação), nas condições definidas pela lei tributária (causa da obrigação).51
Portanto, a obrigação tributária principal é uma relação jurídica ex leg de direito público. Segundo Falcão: Por meio dela, o Estado, ou outra pessoa de direito público, exige a prestação de tributos. Predomina na doutrina a orientação de
48
BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 49 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010 (Atualizado por Misabel Abreu Machado Dersi), p. 697. 50 BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, pp. 5-6. 51 SOUZA, Rubens Gomes de, 1975 apud BARSANI, Op. Cit., 2006, p. 6.
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considerar de natureza obrigacional a relação jurídica tributária, pelo menos no que diz respeito à obrigação principal de prestar tributos. 52
Quanto à obrigação acessória, o § 2º do artigo 113 do CTN estabelece que “a obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou na fiscalização dos tributos”. Kfouri Jr. elucidamo-nos que “não está o cidadão obrigado apenas ao pagamento de tributos (obrigação de dar), possuindo ainda outras obrigações de natureza tributária, tais como entregar declarações, escriturar livros, manter documentos arquivados, emitir notas fiscais, dentre outras inúmeras obrigações de fazer e de não fazer”53. Desta forma, a tributação tem como objetivo primordial a arrecadação de tributos. Mas, para viabilizá-la, muitas relações jurídicas de natureza distintas são estabelecidas, envolvendo tanto contribuintes como não contribuintes. Os primeiros são obrigados ao pagamento de tributos e também ao cumprimento de deveres formais (obrigações acessórias), por outro lado, os não contribuintes, por vezes são obrigados a colaborar com a Administração Tributária tomando medidas que, por exemplo, facilitem a fiscalização, minimizem a sonegação ou assegurem o pagamento dos tributos54. Assim, há relações de natureza contributiva fundadas no dever fundamental de pagar tributos e que só vinculam o contribuinte ao Fisco, como existem outras de natureza não contributiva, fundadas no dever de colaboração, que podem vincular qualquer pessoa ao Fisco, e, por fim, existem ainda relações de natureza sancionadora, que só podem ser estabelecidas entre a Administração Tributária e o infrator55. Em síntese, o objeto da obrigação tributária se refere à prestação a que deve se submeter o contribuinte ou responsável. Sendo que tal prestação pode ser de
52
FALCÃO, Amílcar. Fato Gerador da Obrigação Tributária. 6º ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997 apud SILVA, Volney Zamenhof de Oliveira. Código Tributário Nacional: Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966: comentado e anotado. 2º ed. Campinas: CS Edições, 2002, p. 303. 53 KFOURI JR., Anis. Curso de Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 158. 54 PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 133. 55 PAULSEN, Loc. Cit.
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cunho pecuniário ou de cunho não pecuniário, o que por si só define o que seja obrigação principal e acessória56.
2.1.1 Obrigação Principal e Obrigação Acessória Hugo de Brito Machado57 apresentando a distinção entre obrigações principais e acessórias esclarece que a obrigação tributária principal é de natureza patrimonial, sendo sempre representativa de uma quantia em dinheiro. Em contrapartida, a obrigação tributária acessória é sempre não patrimonial. O que implicaria dizer, em termos de direito privado, que a obrigação principal é uma obrigação de dar, enquanto a obrigação acessória é uma obrigação de fazer.
2.2 Fato Gerador e Hipótese de Incidência
Em sua sistemática o Código Tributário Nacional divide, como visto anteriormente, as obrigações tributárias em principal ou acessória, e obedecendo a mesma sistemática apresenta respectivamente o fato gerador de ambas as obrigações (art. 114 e 115). A Lei define as situações ou hipóteses que sujeitam alguém à obrigação de pagar tributo. Geralmente o legislador escolhe certas manifestações positivas e concretas de capacidade econômica da pessoa, como patrimônio, a renda, o emprego deste surpreendido através de um ato, fato material ou negócio jurídico 58. O artigo 114 do Código Tributário Nacional59 estabelece que “fato gerador da obrigação principal é a situação definida em Lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”. Faz-se uma diferenciação entre fato gerador e hipótese de incidência, sendo que está última correspondente à previsão em Lei, abstrata, da situação que implica a incidência da norma tributária. A hipótese de incidência tributária representa, desta forma, o momento abstrato, previsto em Lei, hábil a deflagrar a relação jurídico 56
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 628. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 122. 58 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010 (Atualizado por Misabel Abreu Machado Dersi), p. 703. 59 BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 57
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tributária60. Enquanto o fato gerador é a própria concretização da hipótese de incidência no plano fático61. Para Sabbag, “o fato gerador ou ‘fato imponível’ é a materialização da hipótese de incidência, representando o momento concreto de sua realização, que se opõe à abstração do paradigma legal que o antecede.”62 Quanto ao fato gerador da obrigação acessória, é a previsão legal que obriga alguém a praticar ou abster-se de certos atos diversos do pagamento de tributo ou de pena pecuniária. Sendo que o Código Tributário Nacional estatui, em seu artigo 115, que o fato gerador da obrigação acessória “é qualquer situação, que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou abstenção do ato [...]”, porém, Balleeiro63 defendia que da definição deste fato gerador há de constar expressa e especificamente quais as práticas e abstenções impostas ao sujeito passivo delas, pois do contrário o cidadão poderia ficar ao arbítrio da autoridade fiscal. Importante destacar que a Lei instituidora do tributo define não apenas a hipótese de incidência (antecedente) como os sujeitos e o conteúdo da obrigação que decorre da incidência da norma (consequente), portanto, trata-se da descrição legislativa (necessariamente hipotética) de um fato a cuja ocorrência in concreto a Lei atribui a força jurídica de determinar o nascimento da obrigação tributária64. Leandro Paulsen65, bem lembra que é errado falar-se em ‘hipótese de não incidência’, pois a não incidência é definida por exclusão. Deste modo, tecnicamente, só há hipóteses de incidência, pois a não incidência é mera consequência, dizendo respeito ao que se situa fora dos limites da norma. Assim sendo, a expressão fato gerador designa a ocorrência, no mundo real, da hipótese abstrata prevista na legislação (hipótese de incidência), ensejando, por conseguinte, o nascimento da obrigação tributária e, posteriormente ou em ato contínuo, o respectivo lançamento e exigência do crédito tributário66.
60
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 613. PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 861. 62 SABBAG, Op. Cit., 2009, p. 614. 63 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010 (Atualizado por Misabel Abreu Machado Dersi), p. 709. 64 PAUSEN, Op. Cit., 2007, p. 861. 65 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 136. 66 KFOURI JR., Anis. Curso de Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 167. 61
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2.3 Crédito Tributário
Conforme a teoria adotada no Código Tributário Nacional, quando verificada no mundo dos fatos a situação definida em Lei como fato gerador do tributo, nasce à obrigação tributária. Tal obrigação consiste num vínculo jurídico transitório entre o sujeito ativo (credor) e o sujeito passivo (devedor) e tem por objeto, quando obrigação principal, uma prestação em dinheiro67. Para muitos, se já há credor e devedor, já há crédito, de forma que o nascimento do crédito tributário seria concomitante ao surgimento da obrigação tributária68. Ferreira Jardim assevera que: [...] o crédito tributário exsurge no exato lapso temporal em que nasce a obrigação tributária, porquanto é por meio da obrigação tributária que a Fazenda Pública fica investida do direito subjetivo de exigir do sujeito passivo uma prestação representada pelo crédito tributário. Por conseguinte, ao contrário do quanto apregoa o Código, o crédito tributário é imanente à obrigação e, por isso, com ele nasce, subsiste e extingue. Simultaneamente, é claro: nem antes, nem depois69.
Para outros, no entanto, a relação obrigacional tributária, de pagar tributo ou penalidade, tem duas faces: obrigação e crédito70. Com o nascimento da obrigação tributária, a pessoa jurídica de direito público (sujeito ativo) adquire direito subjetivo de exigir do passivo (contribuinte ou responsável tributário) o cumprimento daquela obrigação. A este direito subjetivo dáse o nome de crédito tributário71. Assim sendo, o crédito tributário é conceituado como: [...] o vínculo jurídico, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir do particular, o contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária (objeto da relação obrigacional)72.
Ou ainda: 67
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 349. ALEXANDRE, Loc. Cit. 69 FERREIRA JARDIM, Eduardo Marçal. Manual de direito financeiro e tributário. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 243. 70 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 165. 71 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 249. 72 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 173. 68
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[...] o direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que lhe permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em dinheiro73.
O Código Tributário Nacional, em seu artigo 142, dá, à expressão crédito tributário sentido muito específico, pressupondo certeza e liquidez decorrentes da formalização do crédito tributário mediante a verificação de que o fato gerador ocorreu, a identificação do sujeito passivo e a apuração do montante devido 74. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta. Mas ele passa a ter vida própria. Por isso, encontram-se três situações para o crédito tributário: Crédito tributário existente que é igual a lei mais fato gerador; crédito tributário exigível que corresponde à lei mais fato gerador mais lançamento; crédito tributário exequível ou executável. E tem-se lei, tudo isso é cumulativo, mais fato gerador mais lançamento mais inscrição em dívida ativa75.
Portanto, se o crédito tributário decorre da obrigação tributária, conclui-se que esta obrigação pode se dar sem crédito, porém não há que se falar em crédito sem a respectiva obrigação76. Ocorrido o fato gerador, é necessário definir, com precisão, o montante do tributo ou penalidade, o devedor e o prazo para pagamento, de forma a conferir certeza (quanto à existência) e liquidez (quanto ao valor) à obrigação 77. Significa dizer que, enquanto a obrigação tributária surge com o fato gerador, o crédito tributário somente se considera constituído com a produção do ato que formaliza a sua existência e lhe dá exigibilidade78, ou seja, ocorrido o fato gerador, imediatamente surge o vínculo obrigacional de ordem tributária, e inicia-se a relação jurídica impositiva, a qual numa segunda etapa definir-se-á, formalizando-se por meio do lançamento79, ou seja, o crédito tributário representa o momento de exigibilidade da relação jurídico tributária, nas palavras de Eduardo Sabbag,
73
CARVALHO, Paulo de Barros apud PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 935. 74 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 165. 75 BRITO, Edvaldo apud PAUSEN, Op. Cit., 2007, p. 936. 76 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 249. 77 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 349. 78 PAULSEN, Op. Cit., 2012, p. 165. 79 CASTRO; SOUZA, Op. Cit., 2010, p. 250.
31
“obrigação tributária lançada ou, com maior rigor terminológico, obrigação tributária em estado ativo”80.
2.3.1 Constituição do Crédito Tributário
A constituição do crédito tributário é realizada mediante o lançamento que é um ato administrativo vinculado, privativo do fisco, com natureza mista, pois declara a obrigação tributária decorrente do fato gerador e constitui o crédito tributário 81. Desta forma, a constituição é feita pelo Fisco através da lavratura de auto de lançamento, auto de infração ou notificação fiscal de lançamento de débito, sendo o nome do ato constitutivo, neste caso, irrelevante, pois importa tão somente que se cuide de ato da autoridade através do qual tenha sido verificado que o fato gerador e a infração ocorreram, calculando o tributo e a penalidade e notificado o contribuinte para pagar82. O lançamento tributário, por se constituir em ato administrativo plenamente vinculado, está sujeito aos princípios constitucionais da legalidade e da publicidade, nos termos do disposto na Constituição Federal, sendo que qualquer vício em sua constituição faz com que o lançamento seja nulo83. O fisco não tem o direito de decidir sobre a conveniência e oportunidade de realizar o lançamento, ele deve seguir a ordem expressa da Lei tributária (princípio da legalidade). Uma vez ocorrido o fato gerador, deve ser efetuado o lançamento, sob pena de responsabilização daquele agente fiscal que deixar de efetuá-lo84. Leandro Paulsen faz questão de lembrar que: A constituição ou formalização do crédito tributário, ou seja, a representação documental de que o crédito existe em determinado montante perante um certo contribuinte ciente da sua obrigação pode se dar de várias maneiras, não estando, de modo algum, restrita ao lançamento por parte da autoridade85. 80
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 693. DALVI, Luciano. Direito Tributário Avançado: teoria, processo e prática tributária. São Paulo: LTr, 2009, p. 147. 82 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 166. 83 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 252. 84 BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 28. 85 PAULSEN, Op. Cit., 2012, p. 166. 81
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De fato, é importante destacar-se que a constituição do crédito tributário igualmente pode ser feita pelo contribuinte, e isto quando cumpre suas obrigações acessórias de apurar e declarar os tributos devidos. O Código Tributário Nacional não regula a constituição ou formalização do crédito tributário através de declaração ou confissão do contribuinte, pois está a tratar, tão somente, da constituição do crédito tributário através de ato da autoridade em seu art. 142, ou seja, por lançamento86. Por isso mesmo, Hugo de Brito Machado assevera que: A constituição do crédito tributário é de competência privativa da autoridade administrativa. Só esta pode fazer o lançamento. Ainda que ela apenas homologue o que o sujeito passivo efetivamente fez, como acontece nos casos do art. 150 do CTN, que cuida do lançamento dito por homologação. Sem essa homologação não existirá, juridicamente, o lançamento, e não estará por isto mesmo constituído o crédito tributário [...]87
De qualquer forma, a questão da constituição do crédito tributário é muito importante para o estudo dos institutos da prescrição e da decadência no Direito Tributário, razão pela qual necessária é uma análise sobre o lançamento tributário e suas formas.
2.4 Lançamento Tributário
2.4.1 Definição A doutrina define o lançamento tributário como: Ato jurídico administrativo vinculado e obrigatório, de individualização e concreção da norma tributária ao caso concreto (ato aplicativo), desencadeando efeitos confirmatórios – extintivos (no caso de homologação do pagamento) ou conferindo exigibilidade ao direito de crédito que lhe é preexistente para fixar-lhe os termos e possibilitar a formação do título executivo88.
Sendo muito elucidativo o conceito e definição expresso por Roque Carrazza: O lançamento nada mais é que um ato administrativo de aplicação da norma tributária material ao caso concreto. Não faz nascer o 86
PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 165. 87 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 174. 88 DERZI, Misabel Abreu Machado, 1998, p. 355 apud BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 25.
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tributo, mas declara o montante do crédito tributário, dando resposta, em caráter oficial, às seguintes indagações: 1ª) Quem é o contribuinte?; 2ª) Quanto ele deve ao Fisco?; 3ª) Onde ele deve efetuar o pagamento do tributo?; 4ª) Como ele deve efetuar o pagamento d tributo?; 5ª) Quando ele deve efetuar o pagamento do tributo?89
Lembra-se, contudo, que não obstante as definições apresentadas pela doutrina, no ordenamento jurídico brasileiro, o lançamento tributário encontra-se expressamente definido no artigo 142, caput, do Código Tributário Nacional, que assim dispõe: Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.90
Destaca-se na definição legal do referido artigo 142 a palavra ‘procedimento administrativo’, tão importante na questão do estudo da natureza jurídica do lançamento tributário. Na verdade, afirma Hugo de Brito Machado, “não existe tributo sem lançamento, pelo menos enquanto o tributo for prestação pecuniária compulsória e a determinação do valor dessa prestação puder ser feita unilateralmente pela Fazenda Pública”91.
2.4.2 Natureza e Efeitos do Lançamento Não existe convergência nas posições defendidas, pois nem doutrina, nem jurisprudência se entendem quando o assunto é a natureza jurídica do lançamento tributário92. Seria um ato ou um procedimento administrativo? Seu efeito é constitutivo ou declaratório? O caput do artigo 142 do Código Tributário Nacional reza, literalmente, que o lançamento é procedimento administrativo. Neste caso, a parte da doutrina que entende tratar-se de procedimento, enxerga no lançamento um conjunto de atos,
89
CARRAZZA, Roque, 2006, p. 506-507 apud HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, pp.18-19. 90 BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 91 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 178. 92 HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p.19.
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concatenadamente organizados, tendentes a uma finalidade identificada, no caso a constituição do crédito tributário93. Entretanto, como é comum no direito, não existe unanimidade, e a maioria da doutrina entende que o lançamento é tão somente um ato administrativo, e não um procedimento (conjunto de atos), portanto, é irrelevante a sequência de atos conducentes à realização do ato final, sendo importante, neste modo de ver, o momento em que se individualiza o crédito tributário94. A divergência é ainda maior, pois uma vez que a legislação criou o lançamento tributário como algo que depende da atuação de certos direitos do sujeito ativo, acabou por ensejar que a doutrina se estendesse em intermináveis discussões sobre a natureza jurídica do lançamento, sendo que de um lado, alguns sustentam que ele é constitutivo da obrigação tributária, já outros afirmam que ele tem natureza meramente declaratória95. A grande maioria, com fundamento nos artigos 113, § 1º, e 114 do Código Tributário Nacional, pela ótica da obrigação tributária, extrai a conclusão pelo efeito constitutivo do fato gerador e pela eficácia declaratória do lançamento 96. No entanto, em relação ao crédito tributário, entendem que o efeito do lançamento seria constitutivo, e isto com fulcro no artigo 142 do mesmo Codex. Para tais doutrinadores97, uma vez que o lançamento confere liquidez e exigibilidade ao crédito tributário, acaba-se modificando uma situação anterior, razão pela qual se atribui a natureza constitutiva ao mesmo98. Destaca-se que o entendimento, acima referido, também é seguido no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, o qual já afirmou textualmente, pela Primeira Turma no julgamento do REsp 250.306/DF, de relatoria do Ministro Garcia Vieira, que “o crédito tributário não surge com o fato gerador. Ele é constituído com o lançamento”99.
93
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 695. Ibdem, p. 696. 95 AMARO, Luciano da Silva. Direito Tributário Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 336. 96 BORGES, José Souto Maior, 1999, p. 425 apud HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p.19. 97 Dentre os quais: José Souto Maior Borges; Luiz Emygdio F. da Rosa Júnior; Paulo de Barros Carvalho e Seabra Fagundes. Todos citados por BARSANI, Op. Cit., 2010, pp. 33-34. 98 BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 34. 99 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 350. 94
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Portanto, tendo diante de tal entendimento, em relação ao crédito tributário, o lançamento possui natureza jurídica constitutiva, pois o crédito só existe quando reconhecido por meio do ato do lançamento100. No entanto, Eduardo Sabbag101 sustenta ser defensável a natureza jurídica mista ou dúplice para o lançamento, isto é, constitutiva do crédito tributário e declaratória da obrigação tributária, agora exigível.
2.5 Modalidades de Lançamento Tributário Como visto, o lançamento é ato ou procedimento privativo do Fisco. O que pode ocorrer, em seu processamento, é um auxílio maior ou menor do contribuinte no ato de constituição do crédito tributário. Hugo de Brito Machado leciona que com certeza o contribuinte pode participar da execução do lançamento. Entretanto, segundo o referido autor, mesmo nos casos em que o contribuinte pratica todos os atos materiais de determinação do crédito tributário, o lançamento permanece sempre sendo uma atividade privativa da autoridade administrativa fiscal, e isto no sentido de que é sempre do Fisco a palavra final a respeito da existência e do montante do crédito exigível 102. Conhecendo, ainda que superficialmente o que seja lançamento tributário, basta observar o Código Tributário Nacional para se visualizar a existência de três tipos, ou modalidades de lançamento, a saber: (i) o lançamento de ofício; (ii) o lançamento por declaração; e (iii) o lançamento por homologação. 2.5.1 Lançamento de Ofício O lançamento de ofício é aquele realizado direta e exclusivamente pelo Fisco103 quando a Lei assim o determine ou quando o tributo seja submetido por Lei a uma das outras duas modalidades, mas o contribuinte não tenha realizado os atos que lhe cabiam, neste caso, diz-se que são lançamentos de ofício todos aqueles que começam com a lavratura do auto de infração104. 100
CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 252. 101 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 696. 102 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 178. 103 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 170. 104 MACHADO, Op. Cit, 2011, p. 179.
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O lançamento de ofício puro, efetuado originalmente pela Fazenda Pública, encontra-se previsto no inciso I do artigo 149 do Código Tributário Nacional, pois se vincula a determinação da Lei105. O mesmo artigo 149 elenca outros oito incisos para garantir a atuação do Fisco quando o contribuinte, por inércia ou omissão, deixar de efetuar o lançamento que lhe cabe, ou mesmo o fazendo, quando o faça de forma incorreta. Desta forma, Kfouri Jr.106 conclui que a modalidade de ofício visa muito mais corrigir o contribuinte do que apurar o tributo originalmente. Destaque-se que os impostos sobre a propriedade imobiliária (IPTU e ITR) geralmente são lançados de ofício. As Fazendas Públicas competentes para a cobrança de tais tributos mantêm cadastros dos proprietários de imóveis, e com base nestes fazem, anualmente, o lançamento do imposto devido a cada um 107. Outro exemplo é o IPVA.
2.5.2 Lançamento por Declaração Nesta modalidade de lançamento o contribuinte fornece ao Fisco elementos para que se apure o crédito tributário e o notifique para pagar 108. Ou seja, diz-se o lançamento por declaração nos casos em que a Lei do Tributo impõe ao contribuinte, ou melhor, ao sujeito passivo da obrigação tributária correspondente a declaração das informações quanto aos fatos necessários para a determinação do valor do tributo em cada caso109. Nem sempre o Fisco disporá de dados bastantes para proceder ao lançamento, como no caso do Lançamento de Ofício, nestes casos, a administração tributária visa suprir sua deficiência de informação através da declaração prestada pelo particular, em pleno cumprimento de uma obrigação acessória ou colateral (art. 113, § 2º, CTN). Portanto, o sujeito passivo informa ao Fisco “matéria de fato” na declaração prestada, e com base nisto, a entidade tributante calcula o gravame e o notifica para pagar a exação tributária110. 105
KFOURI JR., Anis. Curso de Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 180. KFOURI JR., Loc. Cit. 107 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 179. 108 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 169. 109 MACHADO, Op. Cit., 2011, p. 179. 110 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 711. 106
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Deve-se observar que não se cuida de declaração em que o contribuinte reconheça o débito, pois, se fosse o caso, seria dispensável o lançamento pelo Fisco, desta forma, ao contribuinte cumpre informar, porém deve aguardar a notificação quanto ao montante a ser pago111. À declaração do Contribuinte é conferida a presunção de veracidade, só autorizando sua alteração pelo próprio declarante, caso acompanhada pela demonstração de erro em que se fundamente e que seja impreterivelmente apresentada antes do lançamento112, pois neste caso, será fulminado o direito à retificação, restando ao interessado, tão somente, a possibilidade de revisão, conforme as possibilidades legalmente previstas (cf. art. 145, I, II e III, CTN)113. Portanto, por contemplar a participação tanto do particular e da administração tributária, alguns doutrinadores costumam chamar o lançamento por declaração de lançamento misto114. Apenas para ilustrar, são exemplos de tributos sujeitos ao lançamento por declaração, o imposto de importação, imposto de exportação e o ITBI.
2.5.3 Lançamento por Homologação No chamado lançamento por homologação todo procedimento é realizado pelo
próprio
contribuinte,
cabendo
à
administração
fazendária
apenas
a
homologação ou, ainda, a exigência de importância complementar, mediante o lançamento de ofício, caso constate, dentro do prazo decadencial, alguma irregularidade na apuração do montante do tributo devido, e isto, independente da existência de dolo115. Em outras palavras, é o contribuinte quem apura e paga o tributo, ou pelo menos deveria pagar, cabendo ao Fisco simplesmente chancelar tal apuração quando entenda correta, mediante homologação expressa ou tácita, sendo que nenhum ato é exigido do Fisco para que o crédito tributário seja reconhecido e
111
PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 169. 112 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 261. 113 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 711. 114 Cf. SABBAG, Op. Cit., 2009, p. 711; DALVI, Luciano. Direito Tributário Avançado: teoria, processo e prática tributária. São Paulo: LTr, 2009, p. 149. 115 KFOURI JR., Anis. Curso de Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 181.
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pago116, desta forma, quando a autoridade fazendária toma conhecimento homologando o pagamento, pode-se dizer que ocorre, concomitantemente, a constituição e a extinção do crédito tributário117, exatamente por isso, este tipo de lançamento enfrenta grande crítica feita por Paulo de Barros Carvalho118: A conhecida figura do lançamento por homologação é um ato jurídico administrativo de natureza confirmatória, em que o agente público, verificado o exato implemento das prestações tributárias de determinado contribuinte, declara, de modo expresso, que obrigações houve, mas que se encontram devidamente quitadas até aquela data, na estrita consonância dos termos da lei. Não é preciso despender muita energia mental para notar que a natureza do ato homologatório difere da do lançamento tributário. Enquanto aquele primeiro anuncia a extinção da obrigação, liberando o sujeito passivo, estoutro declara o nascimento do vínculo, em virtude da ocorrência do fato jurídico. Um certifica a quitação, outro certifica a dívida. Transportando a dualidade para outro setor, no bojo de uma analogia, poderíamos dizer que o lançamento é a certidão de nascimento da obrigação tributária, ao passo que a homologação é a certidão de óbito.
A dualidade apontada no dito lançamento por homologação alcança ressonância em outras vozes da doutrina119, pois, entendem que o Fisco somente realiza a homologação quando não cabe o lançamento de ofício de qualquer diferença ou irregularidade, o que significa, para esta vertente, que lançamento e homologação de lançamento são realidades jurídicas antagônicas, não podendo subsistir debaixo do mesmo epíteto120. Outro ponto de divergência na doutrina está na questão da nomenclatura utilizada, pois devido à tamanha participação do próprio contribuinte, há quem denomine esta modalidade de lançamento de ‘auto-lançamento’. No entanto, defendem, os mais conservadores121, que a denominação ‘auto-lançamento’ é equívoca, pois dá ensejo à interpretação de que o sujeito passivo lança o tributo contra ele mesmo, algo que não se coaduna com a definição legal de lançamento 116
PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 169. 117 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 270. 118 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 1993, pp. 282-283. 119 Vide. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009, p. 699; MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 180-182. 120 CARVALHO, Op. Cit., p. 283. 121 Vide: ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 371.; BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010 (Atualizado por Misabel Abreu Machado Dersi), pp. 826-827.
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privativo da autoridade administrativa tributária (art. 142, CTN). Neste sentido, o lançamento somente ocorreria, de fato, no momento da homologação (expressa ou tácita), caracterizando-se os atos do contribuinte, mera antecipação dos valores pagos antes disso122. Sobre a questão do pagamento antecipado, Luciano Amaro leciona que: Antecipar seria pagar antes do momento em que o pagamento seria devido. Mas o pagamento, no caso, é devido na data em que a lei determinar, e, portanto, não é antecipado (salvo, se o devedor quiser fazê-lo antes daquela data.). [...] na prática, o ‘dever de antecipar’ significa que o sujeito passivo tem o encargo de valorizar os fatos à vista da norma aplicável, determinando a matéria tributável, identificar-se como sujeito passivo, calcular o montante do tributo e pagá-lo, sem que a autoridade precise tomar qualquer providência123.
Importante notar que maioria dos impostos são calculados - inclusive por força de Lei - pelos próprios contribuintes e pagos sem prévio exame do Fisco. Coêlho124 destaca que a autoridade administrativa tributária jamais homologa expressamente esta atividade do contribuinte, deixando em aberto o prazo que possui para rever o pagamento, de modo que possa, durante este período tão importante para o estudo da decadência, fiscalizar o contribuinte, quantas vezes forem necessárias, concordando ou discordando do seu proceder, sendo que em caso de discordância, efetua lançamento de ofício, lavrando autos de infração. Devido a tantas particularidades, a modalidade de lançamento prevista no artigo 150 do Código Tributário Nacional, chamada por homologação, é, talvez, a que mais interesse para o estudo dos institutos da decadência e da prescrição, razão pela qual será mais bem esmiuçada em questões específicas no capítulo 5 adiante.
2.6 Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário A constituição do crédito tributário tem como principal efeito tornar líquida, certa e exigível a obrigação já existente. A exigibilidade, desta forma, impõe ao sujeito passivo o dever de adimplir a obrigação e, em caso de descumprimento, permite ao Fisco que realize os atos executivos necessários para a satisfação do
122
KFOURI JR., Anis. Curso de Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 181. AMARO, Luciano da Silva. Direito Tributário Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 364. 124 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009, p. 698. 123
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crédito125. Existem, no entanto, hipóteses legais em que a exigibilidade do crédito tributário pode ser suspensa. No artigo 151 do Código Tributário Nacional126 estão arroladas as causas de suspensão do crédito tributário, in verbis: Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: I - moratória; II - o depósito do seu montante integral; III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança. V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001) VI – o parcelamento. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001) Parágrafo único. O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das obrigações assessórios dependentes da obrigação principal cujo crédito seja suspenso, ou dela consequentes.
Depois o Códex prossegue até o artigo 155 detalhando cada uma das situações que suspendem a exigibilidade do crédito tributário. A suspensão é da exigibilidade e não do crédito tributário em si, sendo que Paulo de Barros Carvalho define exigibilidade, neste caso, como sendo “o direito que o credor tem de postular, efetivamente, o objeto da obrigação, e isso tão só ocorre, como é óbvio, depois de tomadas todas as providências necessárias à formalização da dívida, com a lavratura do ato de lançamento tributário”127. As causas de suspensão do crédito tributário não operam apenas nos casos em que o lançamento já foi efetuado128. A suspensão, nos termos estabelecidos no CTN, pode dar-se inclusive durante o procedimento de constituição, antes de sua constituição definitiva, pelo ato administrativo que o declara, encerrando o procedimento administrativo de lançamento, por isso, é possível dizer que existem causas de suspensão prévias, operando-se antes do surgimento da exigibilidade, e formas de suspensão posteriores, que por óbvio, operam-se após a constituição do crédito tributário, e sua consequente exigibilidade129.
125
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 375. BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 127 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 292. 128 ALEXANDRE, Op. Cit., p. 376. 129 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 186. 126
41
Neste diapasão, importante observar que o que Hugo de Brito Machado130 denomina de causas prévias de suspensão, a exemplo das reclamações e os recursos administrativos, ocorrem antes da constituição completa do crédito tributário, pois do contrário tais medidas não seriam comportáveis. Portanto, o que o referido autor denomina de suspensão prévia, para ele não deveria ser denominado de suspensão, mas sim de impedimento, pois as reclamações e os recursos não suspendem a exigibilidade, mas sim impedem que ela surja. Por conta disto, a antiga norma que exigia a necessidade de depósito prévio como condição para o conhecimento de reclamações e recursos administrativos, além de ser inconstitucional, porque restringia indevidamente o exercício da ampla defesa (vide Súmula Vinculante nº 21)131, contraria ainda, o próprio espírito do Código Tributário Nacional132. De qualquer modo, as hipóteses formam um rol exaustivo, sendo que a taxatividade da lista do artigo 151 é reforçada pelo artigo 111, inciso I, do CTN, que determina a interpretação literal da legislação que disponha sobre a suspensão do crédito tributário133. A suspensão da exigibilidade do crédito tributário impede que ele venha a ser exigido judicialmente, mediante os atos executivos previstos na Lei nº 6.830/80 (LEF), através da execução fiscal, sendo importante destacar que, além disso, enquanto perdurar a suspensão o contribuinte tem direito a obter certidão positiva com efeito de negativa134. Entretanto, a suspensão da exigibilidade não impede, via de regra, o lançamento do crédito tributário, conforme se pode verificar do entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, na ementa que se colaciona a título de exemplificação de tal entendimento: TRIBUTÁRIO. ICMS. PRAZO DECADENCIAL. LANÇAMENTO NÃO EFETUADO. LIMINAR CONCEDIDA. 1. A Fazenda Pública tem o prazo decadencial de cinco anos para constituir o crédito tributário pelo lançamento, sem o qual não há que se falar em suspensão ou interrupção do prazo. A medida liminar concedida em mandado de segurança não tem o condão de paralisar o lançamento, mas sim a sua exigibilidade, ou seja, a sua cobrança. 130
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 186-187. É INCONSTITUCIONAL A EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO OU ARROLAMENTO PRÉVIOS DE DINHEIRO OU BENS PARA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO ADMINISTRATIVO. 132 MACHADO, Op. Cit., 2011, pp. 186-187. 133 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 376. 134 KFOURI JR., Anis. Curso de Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 210. 131
42
O Judiciário pode anular o lançamento já constituído, mas não impedir a sua constituição. Precedente da Turma: REsp nº 119.986/SP, Relatora Min. Eliana Calmon. 2. Recurso especial improvido.135
Exatamente por esta questão, não impedir o lançamento, a suspensão da exigibilidade é bastante importante para o estudo dos institutos da decadência e da prescrição, especialmente no que concerne a contagem dos prazos e ao instituto aplicado, razão pela qual a temática será retomada em momento oportuno adiante.
2.7 Extinção do Crédito Tributário De forma simples, a “extinção do crédito tributário é o desaparecimento deste” 136
. O artigo 156 do CTN137 dispõe sobre as diversas modalidades de extinção do
crédito tributário, in verbis: Art. 156. Extinguem o crédito tributário: I - o pagamento; II - a compensação; III - a transação; IV - remissão; V - a prescrição e a decadência; VI - a conversão de depósito em renda; VII - o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do disposto no artigo 150 e seus §§ 1º e 4º; VIII - a consignação em pagamento, nos termos do disposto no § 2º do artigo 164; IX - a decisão administrativa irreformável, assim entendida a definitiva na órbita administrativa, que não mais possa ser objeto de ação anulatória; X - a decisão judicial passada em julgado. XI – a dação em pagamento em bens imóveis, na forma e condições estabelecidas em lei. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001) Parágrafo único. A lei disporá quanto aos efeitos da extinção total ou parcial do crédito sobre a ulterior verificação da irregularidade da sua constituição, observado o disposto nos artigos 144 e 149.
O Código Tributário Nacional, no supracitado artigo, estabelece dez modalidades extintivas do liame obrigacional tributário, além do pagamento, que
135
STJ - REsp 157908/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/05/2005, DJ 01/08/2005, p. 366. 136 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 200. 137 BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
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como nas obrigações, em geral a forma mais comum de extinção é o pagamento, que significa a satisfação do direito creditório138. Castro e Souza139 criticam a falta de rigor científico do legislador do CTN, pois o mesmo teria mesclado, entre as várias hipóteses extintivas do crédito tributário, diversos momentos dentro do vínculo obrigacional tributário. Pois, ora indica como fim da obrigação impositiva o exato instante em que o crédito tributário é fulminado, como e quando do pagamento; ora aponta como extintivo da obrigação um momento anterior ao próprio lançamento, ou seja, antes de sua constituição, como é o caso da decadência ocorrida pela inércia do Fisco, assunto que será mais bem tratado em tópico próprio. Em suma, o crédito tributário se extingue quando for140: - Satisfeito, mediante pagamento, pagamento seguido de homologação, no caso dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, compensação, conversão em renda de valores depositados ou consignados, ou dação em pagamento de bens imóveis na forma e nas condições estabelecidas em Lei (cf. incisos I, II, VI, VIII e XI), ainda que mediante transação (cf. inciso III); - Desconstituído, através de decisão administrativa ou judicial (cf. incisos IX e X); - Perdoado, pela remissão prevista no inciso IV; - Precluso o direito do Fisco de lançar ou de cobrar o crédito tributário judicialmente, neste caso, através da decadência e da prescrição, previstas no inciso V, e que são objeto deste estudo. 2.8 Exclusão do Crédito Tributário O artigo 175 do CTN apresenta as causas de exclusão do crédito tributário: a isenção e a anistia. Tanto uma como outra dependem de Lei específica, o que decorre direta e expressamente do artigo 150, § 6º, da Constituição Federal. Mas, a exclusão do crédito não dispensa o sujeito passivo de cumprir as obrigações tributárias acessórias, é o que fica expresso no parágrafo único do mencionado
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MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 200. CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 290. 140 PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 187. 139
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artigo 175, desta forma, mesmo as pessoas isentas continuam sujeitas aos deveres de colaboração com a administração e à fiscalização tributária141. Castro e Souza142 defendem que não existe uma diferença ontológica entre as formas de exclusão e extinção do crédito tributário quanto aos efeitos delas decorrentes. Sendo que nas hipóteses de exclusão, os efeitos são alcançados através de uma espécie de renúncia do credor em receber o valor de seu crédito. Sacha Coêlho143 de forma incisiva aponta o que a seu ver é uma impropriedade gritante, pois, segundo ele, a isenção não exclui crédito algum, pois é fator impeditivo do nascimento da obrigação tributária, ao subtrair fato, ato ou pessoa da hipótese de incidência da norma impositiva. Para o referido autor “é erro rotundo considerar a isenção dispensa legal do pagamento de tributo devido”, pois tal conceito é exatamente o que corresponde à remissão do pagamento de tributo devido, que é forma de extinção prevista no inciso IV do anteriormente citado artigo 156 do CTN. De qualquer modo, apegando-se ao texto legal, a isenção e a anistia são normas desonerativas de deveres patrimoniais do contribuinte, atingindo-se o tributo, no caso de uma Lei isentante (isencional ou isentiva) ou a multa (no caso de uma Lei anistiadora). Nas palavras de Eduardo Sabbag, “isenta-se o tributo, e anistia-se a multa”144. O Código Tributário Nacional segue tratando das causas de exclusão do artigo 175 ao 182, e é interessante destacar que Hugo Machado de Brito 145 entende, que a rigor, a decadência estaria melhor colocada no artigo 175, como causa de exclusão, do que no artigo 156 como causa de extinção, pois para ele, a decadência exclui o crédito tributário, evitando que ele sequer seja constituído, no entanto, uma vez que tal instituto será amplamente estudado na sequência deste trabalho, entende-se, por bem, que basta conhecer-se o conceito básico de das formas de exclusão.
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PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 183. 142 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 342. 143 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009, p. 792. 144 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 815. 145 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 229.
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3 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA Conforme visto alhures, o artigo 156 do CTN dispõe sobre as diversas modalidades de extinção do crédito tributário, entre as quais as relacionadas ao aspecto temporal previstas no inciso V, a saber, a decadência e a prescrição, sendo que se pode incluir neste tipo a homologação tácita do lançamento 146, nos termos do disposto no artigo 150, § 4º do mesmo Códex. O instituto da decadência, estudado de forma mais pormenorizada no capítulo 5, deste trabalho, vem disciplinado no artigo 173 do CTN; já o da prescrição, analisado de maneira específica no capítulo 6, infra, está regrado no artigo 174 do CTN, enquanto a questão da homologação tácita do lançamento estará permeando todas as questões intrincadas deste estudo. Antes de adentra-se na análise de ambos os institutos previstos no inciso V do artigo 156 do CTN, necessário se faz, e é de bom alvitre traçar, ainda que de forma superficial, os contornos basilares de tais institutos na seara privada, para depois, sedimentadas tais características, estudá-los à luz do Direito Tributário.
3.1 A Prescrição e a Decadência no Direito Privado Tanto a prescrição como a decadência são institutos próprios do Direito Civil, fundamentam-se notadamente no brocardo romano “dormientibus non succurrit jus”, que basicamente quer dizer que: o direito não socorre aos que dormem. Ou seja, o direito positivo não coaduna com o portador de um direito que permanece inerte. Dessa maneira, passado certo lapso de tempo previsto em Lei, os fatos, ante o princípio da segurança jurídica, devem se tornar estáveis, alcançando a imutabilidade necessária para uma efetiva e perene paz social147. Desta forma, em certas ocasiões a influência do tempo repercutirá de forma distinta, como defende Caio Mário da Silva Pereira148, pois em algumas situações será requisito de nascimento de direitos; em outras será condição de seu exercício; e finalmente, causas de extinção de direitos. 146
HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p. 33. 147 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 295. 148 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: introdução ao direito civil e teoria geral do direito civil. v1. 5ª ed. 3º tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1980, p. 586.
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Assim, a propriedade e outros direitos reais podem ser adquiridos pelo transcurso dos prazos de usucapião; e a pretensão de exigir a prestação inadimplida se extingue se o credor não aciona o devedor dentro do prazo estipulado em Lei; e, ainda, extingue-se o próprio direito subjetivo se, nascido com previsão de prazo certo para seu exercício, o titular deixa exaurir dito prazo sem exercitá-lo149. Fala-se, por isso, em prazos aquisitivos (usucapião ou prescrição aquisitiva) e prazos extintivos (prescrição liberatória e decadência). Silvio Rodrigues ressalta que o tempo é o personagem principal dentro do instituto jurídico da prescrição150, e se pode ampliar o ilustre doutrinador, afirmando que o tempo também é o protagonista na decadência. Para Washington de Barros Monteiro151, foi com Justiniano que a prescrição destacou seu duplo efeito, a aquisição e a extinção de direitos. A aquisição referiase à forma de se adquirir a propriedade imóvel pela posse em certo lapso temporal, onde o novo possuidor adquiria a posse e o antigo a perdia. Já na modalidade extintiva, era o meio onde alguém estava liberado de prestar uma obrigação antes assumida, em decorrência de sua inadimplência e a inércia do credor em exigi-la. Alguns Códigos reúnem todos esses fenômenos temporais numa disciplina única, como, por exemplo, o Código Civil argentino (arts. 3.947 a 4.041), o francês (arts. 2.219 a 2.281) e o espanhol (arts. 1.930 a 1.975). Contudo, não é o critério observado por Códigos mais modernos, que cuidam do usucapião dentro do direito das coisas e reservam as figuras da prescrição e decadência apenas para casos de extinção dos direitos e ações, como se dá com o Código português (arts. 300 a 333) e o italiano (arts. 2.934 a 2.969).152 Para estes últimos, afirma Humberto Theodoro Júnior, “não há que se cogitar de prescrição aquisitiva e de prescrição extintiva. O termo prescrição sem qualquer qualificativo se emprega apenas para casos de extinção ou liberação de vínculos jurídicos por decurso do tempo”153.
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao Novo Código Civil, v.3, t. 2: Dos atos jurídicos lícitos. Dos atos ilícitos. Da prescrição e da decadência. Da prova. 1ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 153. 150 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: parte geral. v1. 34ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 323. 151 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: parte geral. v1. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 1985, p. 286. 152 ALVES, Vilson Rodrigues Alves. Da Prescrição e da Decadência no Código Civil de 2002. 4ª ed. Campinas: Servenda, 2008, passim. 153 THEODORO JÚNIOR, Op. Cit., 2008, p. 153
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Theodoro Júnior154 destacando que o Brasil, desde o Código revogado (1916) já adotava o padrão mais moderno, ressalta que o novo Código Civil (2002) permanece fazendo a clara separação do decurso do tempo em relação à usucapião, e justifica: [...] porque, ao contrário do usucapião (prescrição aquisitiva), que somente se aplica ao direito das coisas, a prescrição e a decadência são eventos que afetam as relações jurídicas pertinentes a todos os setores do direito privado (obrigações, família, sucessões e até mesmo direitos reais) e que se estendem inclusive ao direito público. Sua sede natural no Código Civil, portanto, é a Parte Geral. Sem falar na completa diversidade de efeitos (cria e extinguir direitos), os fatos básicos de cada instituto não são os mesmos: na prescrição a ideia central se localiza na inércia do titular do direito, enquanto no usucapião o elemento fundamental é a posse. Tão notáveis são as diferenças entre as duas figurar jurídicas que se tem condenado, nas lições mais atuais, a unidade do conceito de prescrição.
Importante destacar que embora nosso Código Civil trabalhe bem no que concerne a questão de prescrição e usucapião precisa-se lembrar de que tal distinção nem sempre existiu em relação à distinção existente entre prescrição e decadência, pois uma grande deficiência do Código velho (1916) se fazia sentir no tratamento dos prazos extintivos, já que eram todos eles englobados sob o nomen iuris de prescrição e, por isso, literalmente se regiam pelos mesmos princípios e regras155, assunto este que é essencial para prosseguir-se neste estudo.
3.1.1 Na visão do revogado Código Civil de 1916 Uma grande deficiência do Código Civil revogado (CC/16) se fazia sentir no tratamento dos prazos extintivos, já que eram todos englobados sob o nomen iuris de prescrição e, por isso, literalmente se regiam pelos mesmos princípios e regras. Como a Lei não pode contrariar a natureza das coisas coube à doutrina e a jurisprudência a árdua tarefa em distinguir os prazos prescricionais e os decadenciais, uma vez que ambos estavam na Lei como sendo de prescrição, e assim, apontavam o que entendiam ser de decadência156. No entanto, tal tarefa se demonstrava por demais espinhosa, pois, THeodoro Júnior157 lembra que entre os
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Comentários ao Novo Código Civil, v.3, t. 2: Dos atos jurídicos lícitos. Dos atos ilícitos. Da prescrição e da decadência. Da prova. 1ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 154. 155 Ibdem, p. 154. 156 Ibdem, p. 155. 157 Ibdem, p. 155.
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nossos doutrinadores estabeleceu-se uma divisão de teses entre os que se mantinham fiéis às tradições romanas, para defender a prescrição como causa de extinção apenas da ação, e os que a qualificavam como causa de extinção dos próprios direitos. Tais divergências se arrastaram até a promulgação do Novo Código Civil.
3.1.2 Na visão do atual Código Civil de 2002 Para melhor compreender as alterações e inovações advindas com a edição do Código Civil de 2002, é importante verificar o que se colocou na Exposição de Motivos, no Anteprojeto de Código Civil158, de 16 de janeiro de 1975, onde Miguel Reale, Supervisor da Comissão Elaboradora e Revisora do Código Civil, assim se expressou sobre os institutos sob estudo: 18. Menção à parte merece o tratamento dado aos problemas da prescrição e decadência, que, anos a fio, a doutrina e a jurisprudência tentaram em vão distinguir, sendo adotadas, às vezes, num mesmo Tribunal, teses conflitantes, com grave dano para a Justiça e assombro das partes. Prescrição e decadência não se extremam segundo rigorosos critérios lógico-formais, dependendo sua distinção, não raro, de motivos de conveniência e utilidade social, reconhecidos pela Política legislativa. Para pôr cobro a uma situação deveras desconcertante, optou a Comissão por uma fórmula que espanca quaisquer dúvidas.
E prossegue o saudoso jurista na exposição da solução ofertada: Prazos de prescrição, no sistema do Projeto, passam a ser, apenas e exclusivamente, os taxativamente discriminados na Parte Geral, Título IV, Capítulo I, sendo de decadência todos os demais, estabelecidos, em cada caso, isto é, como complemento de cada artigo que rege a matéria, tanto na Parte Geral como na Especial.
Arrematando no item 19 da Exposição de Motivos: 19. Ainda a propósito da prescrição, há um problema terminológico digno de especial ressalte. Trata-se de saber se prescreve a ação ou a pretensão. Após amadurecidos estudos, preferiu-se a segunda solução, por ser considerada a mais condizente com o Direito Processual contemporâneo, que de há muito superou a teoria da ação como simples projeção de direitos subjetivos.
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SENADO FEDERAL. Novo Código Civil: Exposição de Motivos e Texto Sancionado. Brasília, 2005, pp. 38-39. Disponível em < http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/70319> Acesso em 08/09/2012.
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Portanto, conforme destaca José Hable159, pode-se verificar que a escolha de se determinado prazo seria de prescrição ou de decadência foi puramente política. De qualquer modo, o exercício de um direito não pode ficar pendente indefinidamente. Deve ser posto em prática pelo titular dentro de determinado prazo. O tempo exerce abrangência no Direito em todos os campos. A tendência moderna é restringir o lapso do tempo para o exercício de direitos, fixados em 20 anos (art. 177) no Código Civil de 1916, para as ações pessoais. Em um passado remoto esse prazo era ainda maior, de 30 anos. Esse prazo mostrava-se exagerado mais atualmente foi restringido pelo atual Código. Os artigos 205 e 206 do novo Código Civil elencam quais os prazos prescricionais para ingressar com ação desejada. O prazo geral é de 10 (dez) anos, mas há prazos especiais. Os demais prazos contidos em outros artigos do Código Civil são decadenciais, por serem de natureza constitutiva. Em síntese, na prescrição civil há a extinção da pretensão, o direito continua a existir, tanto que se considera válido o pagamento de dívida prescrita, cuja restituição não pode ser reclamada; já na decadência há a extinção do próprio direito potestativo. O prazo prescricional decorre apenas da Lei, não há prazo prescricional voluntário nem tal prazo poderá ser alterado pelas partes; já no prazo decadencial pode ser estabelecido pela Lei ou pela vontade unilateral ou bilateral das partes160.
159
HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p. 37. 160 Ibdem, pp. 37-38.
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4 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO DIREITO TRIBUTÁRIO O artigo 109 do CTN161 estabelece que o Direito Tributário pode se utilizar dos institutos do Direito Civil, porém os seus efeitos serão próprios do direito privado. Desta forma, é exatamente o que ocorre com a decadência e a prescrição que, apesar de institutos nascidos no campo do direito civil, quando aplicados no direito tributário, possuem características próprias desse direito162. Na seara tributária, Ives Gandra da Silva Martins nos conduz ao entendimento de que: Decadência e prescrição punem a desídia, a imperícia, a negligência, a omissão da Administração Pública e garantem segurança jurídica, dando estabilidade às relações entre Fisco e contribuinte, impedindo que, após determinado prazo, possam ser alteradas163.
Esses institutos, contudo, diferem quanto ao seu objeto e ao momento de atuação. Na decadência, diz-se que a inércia refere-se ao exercício do direito, e os efeitos do tempo agem desde o seu nascimento. Já na prescrição, a inércia diz respeito ao exercício da ação e o tempo opera os seus efeitos desde o nascimento desta, que, em regra, é posterior ao nascimento do direito por ela protegido. Por isso é que o prazo de decadência começa com o nascimento do direito, enquanto o prazo de prescrição começa com o nascimento da ação, sendo impossível ocorrer a simultaneidade, ou seja, a sobreposição desses intervalos164.
4.1 Distinção entre Prescrição e Decadência no Direito Tributário É praticamente impossível versar sobre um instituto sem falar do outro. Tanto decadência como prescrição opera-se com o transcurso do tempo, e, por vezes, provocam situações que guardam certa analogia. Ambos os institutos confundem-se por vezes e até mesmo mostram-se interligados, principalmente quando a legislação não os distingue com a necessária clareza.
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Art. 109 CTN. Os princípios gerais do direito privado utilizam-se, para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para a definição dos respectivos efeitos tributários. 162 BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 71. 163 MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 21. 164 MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e Prescrição no Direito Tributário Brasileiro. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Curso de Direito Tributário. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 223-225.
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No Direito Tributário, a distinção entre decadência e prescrição não é assim tão difícil, tanto que Hable165 afirma que “diferentemente do que se verifica no Direito Civil, há um evento marcante e significativo, denominado ato de lançamento, que irá separar, de forma nítida, os prazos decadencial e prescricional”. Existe um ponto de interseção. A notificação do lançamento é o marco divisório entre decadência e a prescrição. Antes da notificação do lançamento só é possível correr o prazo decadencial, sendo que após o crédito tributário ser definitivamente constituído, isto é, tornar-se líquido, certo e exigível, somente há que se falar em prazo prescricional166. Assim, o lançamento é o fator distintivo entre o que seja prazo decadencial e o que seja prazo prescricional, ou seja, pela sistemática do CTN, os institutos da decadência e da prescrição estão condicionados ao lançamento, sendo que em síntese, a decadência tributária somente ocorre antes do lançamento, resultando na extinção do direito de constituir o crédito tributário pelo seu não exercício durante determinado tempo (art. 173, CTN), e a prescrição tributária somente ocorre após o lançamento, ou melhor, após a constituição definitiva do crédito tributário (art. 174, CTN)167. 4.2 A Natureza Jurídica da Prescrição e Decadência em face do Crédito Tributário Os atos jurídicos sujeitados a tempo certo, se não praticados, precluem. Os direitos, se não exercidos no prazo assinalado aos seus titulares pela Lei, caducam ou decaem. As ações judiciais, quando não propostas no espaço de tempo prefixado legalmente, prescrevem. Em face do crédito tributário, a decadência atinge a existência do direito, retirando-lhe seus efeitos, entre os quais a relação jurídica tributária. A prescrição, por sua vez, atinge a eficácia e não propriamente o direito, atingindo a relação jurídica de originada, retirando-lhe a exigibilidade, extinguindo, dessa forma, o crédito tributário168. 165
HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p. 35. 166 BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 72. 167 HABLE, Op. Cit., p. 35. 168 BARSANI, Op. Cit., 73.
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Desta forma, tem-se que a obrigação tributária passa a existir quando o sujeito passivo pratica o fato gerador, que como visto alhures, ocorre quando a hipótese de incidência torna-se real, por seu turno o crédito tributário surge após o ato do lançamento, sendo que se este lançamento não é praticado a tempo, ocorre à decadência daquele direito de lançar. No entanto, se ocorre o lançamento, e o crédito tributário é constituído definitivamente, resta ao sujeito passivo pagá-lo, sendo que na hipótese deste não pagar, só resta ao sujeito ativo (Fisco) ir ao Judiciário com uma ação de execução lastreada numa certidão de dívida ativa para obriga-lo a pagar, porém, se o Fisco por inércia não ajuíza a execução fiscal no tempo estipulado em Lei, ocorre a prescrição, que foi elencada como causa da extinção do crédito tributário169. A decadência opera na fase da constituição administrativa do crédito tributário, enquanto a prescrição, no momento do exercício do direito de ação 170. Por fim, quanto à questão relativa se os institutos da decadência e da prescrição, no direito tributário, são institutos de direito material ou processual, preciosa é a Lição de Sacha Calmon Navarro Coelho e Eduardo Junqueira Coêlho171: A decadência ou caducidade bem como a prescrição são, no direito tributário brasileiro, institutos de direito material, porque dizem com a perda de direitos subjetivos. No caso da decadência dá-se o perecimento do direito ao crédito tributário em si mesmo, seja ele devido à Fazenda Pública em razão da ocorrência do fato gerador no mundo fático seja ele devido ao sujeito passivo, por ter direito a crédito indevido já pago, por inocorrência do fato gerador (crédito já pago ou pago a maior). Noutras palavras, o sujeito passivo faz jus ao indébito. No caso da prescrição o direito que perece é o de agir, porque a Constituição assegura a todos o direito de pedir ao Judiciário o que lhe é devido (direito material ao processo), observados os prazos fixados em lei, porquanto o direito não socorre aos que dormem. Contudo, tecnicamente, a decadência e a prescrição não caracterizam normas sancionantes ou punitivas, vez que as sanções, as penas de toda ordem, são utilizadas apenas para castigar os atos de ilicitude, ou seja, contrários às leis, sentenças (normas individuais) e obrigações. Nulidades, prêmios, a decadência 169
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário brasileiro. 10ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2009, p. 775. 170 DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 154. 171 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; COÊLHO, Eduardo Junqueira. Decadência e Prescrição in MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 79.
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e a prescrição formam outros institutos, não vindo ao caso descalválos agora.
Decadência e prescrição são preceitos de ordem pública, institutos de direito material, que objetivam impedir que certos direitos perdurem para sempre, quando os titulares desses direitos já não demonstram mais interesse por eles, mostrandose inertes. São, portanto, institutos que servem de instrumento para garantir a segurança jurídica e a pacificação social através da estabilização das relações jurídicas172.
4.3 A Competência Legislativa em Matéria de Prescrição e Decadência Competência Legislativa é a regra que dá a cada ente federativo o poder de editar Leis. Em questão de Direito Tributário sabe-se que é a Constituição Federal que atribui a cada ente competência para criar tributos através da Lei, sendo que em relação à decadência e prescrição em matéria tributária, o artigo 146 da Carta Magna deixa claro que cabe à Lei Complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação que trate de prescrição e decadência, conforme se vê na leitura do artigo 146, inciso III, alínea “b”, in verbis: Art. 146. Cabe à lei complementar: [...] III- Estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: [...] b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;173
Leandro Paulsen sustenta que “após o advento da CF/88, com previsão expressa nesta alínea no sentido de que se trata de norma geral em matéria tributária, têm-se todos os elementos para afirmar, categoricamente, que estão sob reserva de lei complementar”174. Importante relembrar que o Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25/10/1966) foi instituído por Lei Ordinária, pois, não existia a Lei Complementar no processo legislativo constitucional vigente na época, porém é entendimento unânime 172
BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, 73. 173 BRASIL. Constituição Federal. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pp. 3-135. 174 PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 90.
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da doutrina e da jurisprudência que, o CTN, formalmente criado como Lei Ordinária, é materialmente, Lei Complementar e, sem sombra de dúvidas, é a principal fonte de regras sobre prescrição e decadência no Direito Tributário175. Ainda, quando tratar-se sobre a questão da Súmula Vinculante nº 8, será retomada a presente questão sobre a competência tributária.
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BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 85.
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5 DECADÊNCIA DO DIREITO DO FISCO
5.1 Hipóteses de Decadência contra o Fisco A decadência é definida como fato jurídico que faz perecer o dever-poder da administração de proceder ao lançamento, e isto devido ao decurso de certo lapso de tempo, desta forma, ocorrendo à decadência, desaparece o direito subjetivo de exigir a prestação tributária, extinguindo-se por consequência o débito do sujeito passivo176. O prazo de decadência é de cinco anos (art. 173, CTN). Em cada uma das hipóteses que serão adiante estudadas é importante observar a variação do termo inicial do prazo decadencial em cada circunstância. As hipóteses estudadas encontram previsão nos artigos 150, § 4º, e 173, incisos I, II e parágrafo único, do Código Tributário Nacional.
5.1.1 Decadência do direito de lançar nos casos de pagamento antecipado O artigo 150, § 4º do CTN é considerado a regra especial de decadência. Tal regra alcança exclusivamente os tributos lançados por homologação, o que permite a antecipação do pagamento, sendo de 5 (cinco) anos o prazo decadencial nele previsto, que passa a contar do fato gerador, e não no primeiro dia útil do exercício financeiro seguinte, como prevê o artigo 173, inciso I, do CTN177. Importante lembrar que só poderá haver pagamento antecipado do crédito tributário nas circunstâncias em que o legislador tributário expressamente o determinou. Desta forma, qualquer pagamento antecipado sem previsão legislativa passa a ser tão somente hipótese de simples pagamento irregular, sem o condão de realizar a extinção do crédito tributário178. Dito isto, a hipótese de ocorrência da decadência do direito de lançar aqui estudada versa sobre a combinação, de quatro critérios que são apresentados por Eurico Marcos Diniz De Santi179, (i) previsão de pagamento antecipado; (ii) 176
CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 333. 177 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 724. 178 DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 121. 179 DE SANTI, Loc. Cit.
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ocorrência do pagamento antecipado; (iii) não ocorrência de dolo, fraude ou simulação; e (iv) não ocorrência da notificação por parte do Fisco. No lançamento por homologação, havendo a antecipação do pagamento, resta ao Fisco conferir a exatidão de tal pagamento num prazo decadencial de 5 (cinco) anos, contados a partir do fato imponível. O transcurso in albis do quinquênio decadencial, sem que se faça uma conferência expressa, provocará o procedimento homologatório tácito, segundo o qual o Fisco perde o direito de lançar, ainda que seja qualquer diferença suplementar, em caso de pagamento insuficiente180. Frise-se, que, uma vez antecipado o pagamento, restará extinto desde então o crédito tributário a ele correspondente, conforme o artigo 156, inciso VII, do CTN, porém, o pagamento efetuado está sujeito à homologação, expressa ou tácita, realizada pela autoridade administrativa, que se limita a verificar se o pagamento efetuado foi ou não suficiente, realizando o lançamento de ofício no caso de insuficiência181. Neste caso, no lançamento por homologação, quando há o pagamento antecipado, inexiste decadência, em si, mas sim a decadência do direito de a Fazenda exigir (constituir), por meio do lançamento de ofício, o resíduo tributário, relativo à eventual pagamento insuficiente182.
5.1.2 Decadência do direito de lançar quando não há pagamento antecipado Naquelas hipóteses em que não há o pagamento antecipado e sem a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, no lançamento de ofício ou por declaração, aplica-se a regra do artigo 173, inciso I, do CTN, pois tal dispositivo é considerado a regra geral de decadência tributária, embora dele não conste textualmente, o vocábulo ‘decadência’183. Ainda, no caso dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, no caso do sujeito passivo não efetuar pagamento algum, Luciano Amaro 184 e outros doutrinadores julgam que a regra decadencial aplicável é a mesma do artigo 173, I,
180
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 725. BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 94. 182 SABBAG, Op. Cit., 2009, p. 725. 183 Ibdem., p. 723. 184 AMARO, Luciano da Silva. Direito Tributário Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 412. Vide ainda, BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, pp. 95-96. 181
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do CTN, ou seja, é a regra geral. De Santi185 diz que, além do inciso I, também pode incidir o parágrafo único do artigo 173. Todos os doutrinadores que defendem que ao não se realizar o pagamento, independente do caráter inicial de lançamento de homologação, é no sentido de que se não houve pagamento, não há o que homologar, não se aplicando, por isso, a regra especial do artigo 150 do CTN. Hugo de Brito Machado186, Francisco dos Santos Júnior187, Hugo de Brito Machado Segundo e Paulo Ramos188, em uma posição intermediária, defendem que a aplicação do termo inicial previsto no § 4º do artigo 150 do CTN depende do fato de o sujeito passivo prestar informação quanto à ocorrência do fato gerador. Isto quer dizer que se o sujeito passivo declarar o valor do tributo (por meio, por exemplo, de DCTF189 ou GIA190), mas não recolhê-lo, o prazo decadencial aplicável é o de tributos sujeitos ao lançamento por homologação; mas, se não houver nem mesmo a declaração, deve-se seguir a regra do artigo 173 do CTN. Paulo de Barros Carvalho191, por sua vez, entende que quando o tributo é sujeito a lançamento por homologação, deve-se aplicar a regra do § 4º do artigo 150 do CTN, mesmo nos casos de falta de pagamento total ou mesmo parcial, só devendo ser afastada tal incidência com a comprovação de dolo, fraude ou simulação. Confrontando-se as posições com a jurisprudência, pode-se notar que o Egrégio Superior Tribunal de Justiça vem adotando a primeira posição, qual seja a de que a regra do § 4º do artigo 150 do CTN, só se aplica quando há algum pagamento, ainda que seja mínimo e insuficiente. Conforme se pode notar da ementa colacionada abaixo: 185
DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 120. 186 MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Lançamento Tributário e Decadência. São Paulo: Dialética, 2002, p. 236. 187 SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 139. 188 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito; RAMOS, Paulo de Tarso Vieira. Lançamento Tributário e Decadência. In: MACHADO, Hugo de Brito (Coord.). Lançamento Tributário e Decadência. São Paulo: Dialética, 2002. p. 266. 189 DCTF – Declaração de Créditos e Débitos Tributários Federais, vide < http://www.receita.fazenda.gov.br/principal/informacoes/infodeclara/declaradctf.htm> Acesso 14/09/2012. 190 GIA – Guia de Informação de Apuração, vide < http://www.fazenda.sp.gov.br/download/download_gia.shtm> Acesso 14/09/2012. 191 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. 2º ed. São Paulo: Noeses, 2008, P. 492.
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TRIBUTÁRIO DECADÊNCIA LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO (ART. 150 § 4º E 173 DO CTN). 1. Nas exações cujo lançamento se faz por homologação, havendo pagamento antecipado, conta-se o prazo decadencial a partir da ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CNT). 2. Somente quando não há pagamento antecipado, ou há prova de fraude, dolo ou simulação é que se aplica o disposto no art. 173, I, do CTN. 3. Em normais circunstâncias, não se conjugam os dispositivos legais. 4. Precedentes das Turmas de Direito Público e da Primeira Seção. 5. Recurso especial provido192.193
Este é, no entanto, um típico caso onde a jurisprudência caminha no sentido de favorecer o Fisco, aumentando o prazo decandecial em favor do mesmo, pois melhor seria adotar a posição defendida por Paulo de Barros Carvalho 194, isto porque, muito embora a homologação tenha por objeto o pagamento, a definição jurídica a que está sujeito o tributo se dá em etapa anterior à verificação do pagamento, sendo fixado já quando a Lei atribui ao sujeito passivo o dever de recolhimento antes e independente de emissão de lançamento pela Autoridade Administrativa Tributária. Pois a ausência de pagamento só impede a ocorrência de homologação (por falta de objeto), mas não afasta a possibilidade de haver extinção do crédito tributário pelo decurso do tempo.
5.1.3 Decadência do direito de lançar quando se anula o lançamento anterior O inciso II do artigo 173 do CTN estabelece que o prazo decadencial de 5 (cinco) anos somente passa a fluir, nos casos de anulação por vício formal do lançamento anterior, da data em que se tornar definitiva a decisão que declarou a nulidade. A
presente
hipótese
ocorre
quando
o
sujeito
passivo
discute
administrativamente ou judicialmente o lançamento realizado pelo Fisco, geralmente 192
REsp 512840/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/04/2005, DJ 23/05/2005, p. 194. 193 Ainda, como exemplo, é possível citar os seguintes julgados: EDcl no REsp. 947988, 2º Turma, relator Ministro Castro Meira, DJe 19/12/2008; Ag Rg no REsp. 790875, 1º Turma, relatora Ministra Denise Arruda, DJe 11/02/2009; Ag Rg no REsp. 965489, 2º Turma, relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 13/02/2009; e REsp. 989421, 1º Turma, relator Ministro Luiz Fux. 194 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. 2º ed. São Paulo: Noeses, 2008, P. 492.
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um lançamento de ofício, e consegue mediante a comprovação cabal da existência de qualquer vício formal no ato do lançamento, anulando desta forma seus efeitos. Nesse caso, conta-se o prazo decadencial a partir da data em que se tornar definitiva tal decisão. Tal dispositivo enfrenta duras críticas, pois beneficia o Fisco, em vez de puni-lo por seu erro. Luciano Amaro195 com maestria apresenta o problema: O dispositivo comete um dislate. De um lado, ele, a um só tempo, introduz, para o arrepio da doutrina, causa de interrupção e suspensão do prazo decadencial (suspensão porque o prazo não flui na pendência do processo em que se discute a nulidade do lançamento, e interrupção porque o prazo recomeça a correr do início e não da marca já atingida no momento em que ocorreu o lançamento nulo). De outro, o dispositivo é de uma irracionalidade gritante. Quando muito, o sujeito ativo poderia ter a devolução do prazo que faltava quando foi praticado o ato nulo.
Explicando algumas diferenças entre a decadência no Direito Tributário e no Direito Civil, especialmente na hipótese em análise, Leandro Paulsen anota que: Este inciso constitui paradoxal hipótese de interrupção do prazo decadencial. Aliás, o instituto da decadência, no direito tributário, possui elementos que o diferenciam da decadência no direito privado: a) o termo inicial, no direito privado, coincide com o nascimento do direito subjetivo (no campo tributário isso acontece somente com os tributos sujeitos ao lançamento por homologação), e; b) o prazo que culmina com o fato jurídico da decadência não se interrompe nem se suspende (no direito tributário há causa interruptiva – CTN, art. 173, II). 196
Importante observar que o dispositivo trata do vício formal, que é aquele inerente ao procedimento e ao documento que tenha formalizado a existência do crédito tributário197. Desde a atividade de fiscalização até a notificação do lançamento ao sujeito passivo, e não a insubsistência do lançamento por vício material, que são os relacionados à validade e à incidência da Lei198. Independente de se aprofundar no estudo da questão se tal dispositivo impõe ou não a interrupção da decadência, algo que por si só demandaria um estudo a parte, tem-se que no caso em comento confere-se uma excessiva elasticidade ao
195
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 7º ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 398 apud BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 97. 196 PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 1112. 197 PAUSEN, Loc. Cit. 198 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 733.
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prazo decadencial, beneficiando, sem dúvida, ao Fisco, algo que não se justifica ainda que se leve em conta a supremacia do interesse público sobre o privado, pois como dito anteriormente, tal dispositivo premia a desídia e imperícia da administração tributária e prestigia o desacerto199. Por fim, a revolta dos contribuintes se justifica pelo fato que algumas decisões sobre a nulidade formal do lançamento chegam a demorar mais de 10 (dez) anos para serem definitivas200, o que implica em insegurança jurídica, visto que o prazo decadencial nestes casos chega próximo de 20 (vinte) anos.
5.1.4 A Regra do Parágrafo Único do art. 173 do CTN, e os Casos de dolo, fraude ou simulação (art. 150, § 4º, CTN) Dois dispositivos que despertam acirradas discussões doutrinárias são o art. 150, § 4º do CTN, que destaca que não haverá homologação tácita, contada da data do fato gerador, se comprovada à ocorrência de dolo, fraude ou simulação; e o art. 173, parágrafo único do mesmo Codex, que estabelece como marco inicial o envio de notificação, pelo Fisco, ao sujeito passivo ou o início de qualquer medida indispensável ao lançamento. A problemática encontra-se no fato de uma possível flexibilização ou mesmo alongamento do prazo decadencial no direito do Fisco constituir o crédito tributário. Quando o Fisco toma ciência de que o sujeito passivo agiu com dolo, fraude ou simulação deverá fazer-lhe uma notificação formalizando o ilícito tributário. Nestes casos, preceitua o parágrafo único do artigo 173 do CTN que o Fisco poderá efetuar o lançamento no prazo de 5 (cinco) anos, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação ou de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento201. Percebe-se que este dispositivo tem uma aplicação limitada, apenas incidindo aos casos em que o Fisco, durante o período de tempo que fica entre a ocorrência
199
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 734. Baseado na experiência prática do Pesquisador, mas que pode ser confirmada através de consulta ao site do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) disponível em < http://www.fazenda.sp.gov.br/tit/>, ou no site do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) disponível em < http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/index.jsf>. 201 BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 102. 200
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do fato gerador e o início da fluência do prazo decadencial para lançar da regra geral (art. 173, inciso I, CTN), toma alguma providência preparatória para o lançamento. Quando, então, o sujeito passivo é notificado da medida adotada pelo Fisco, inicia-se a contagem do prazo decadencial, sendo este início, como se percebe, em momento anterior ao momento em que se daria o início da fluência do prazo pela regra do inciso I do artigo 173 do Código Tributário Nacional. Entretanto, o que dizer quando a notificação ocorre após o 1º dia útil do exercício seguinte? Em uma análise isolada do parágrafo único do artigo 173, pode-se chegar à conclusão de que o termo a quo do prazo decadencial se dá com a aludida notificação, independentemente de ocorrer antes ou depois do início do prazo previsto no inciso I do mesmo artigo 173. De acordo com essa interpretação, seria permitido à Fazenda Pública depois de passados 4 (quatro) anos e 11 (onze) meses contados do início do prazo decadencial do artigo 173, inciso I do CTN, efetivar a notificação do sujeito passivo para que este entregasse seus documentos fiscais, para só então iniciar a fiscalização, sendo com isso beneficiada com mais 5 (cinco) anos para efetuar o lançamento. Entretanto,
tal
interpretação
é
grosseira
e
absurda,
pois
estaria
desequilibrando a segurança jurídica que o instituto da decadência visa conceder. Cabe esclarecer que o prazo decadencial só se inicia com a notificação se esta ocorrer antes de 1º de janeiro seguinte ao fato gerador. Se o prazo já tiver começado a fluir, como no caso do § 4º do artigo 150 do CTN, ou se tiver passado de 1º de janeiro do ano seguinte ao do fato gerador, a notificação não interromperá o prazo decadencial202. Trata-se, portanto, de hipótese de antecipação do início do prazo decadencial marcado pela notificação enviada ao sujeito passivo, ou de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. A decadência, neste caso, não vai esperar o fim do exercício financeiro, mas se consumará antes, porque a constituição do crédito tributário também antes se iniciara203. Frise-se, que a interpretação mais favorável ao contribuinte está longe de ser uma unanimidade entre os juristas, tanto que existem aqueles que defendem com
202
BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, pp. 102-104. 203 PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 1113.
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veemência que ainda que passados 4 (quatro) anos e 11 (onze) meses, o período transcorrido deverá ser desprezado no cômputo do prazo decadencial 204. Christine Mendonça205 entende que “da leitura do parágrafo único do artigo 173 do CTN não é possível afirmar que o enunciado se refere à notificação feita antes de iniciado o prazo do artigo 173, I, do CTN”. Segundo ela, o “dies a quo é a data da notificação, independentemente se antes ou depois de iniciado o prazo do inciso I, do artigo 173 do CTN”. No caso de ser depois, a autora entende que se trata de uma hipótese de interrupção do prazo decadencial. Cumpre ainda trazer à baila entendimento ainda mais agressivo, que relaciona os casos de dolo, fraude ou simulação a legislação penal, e defende a aplicação do prazo de 12 (doze) anos do artigo 109, inciso III, do Código Penal: [...] a hipótese de decadência tributária do caso maligno (dolo, fraude ou simulação no lançamento fiscal) não mora no artigo 173 (CTN). Jamais morou. Nem pode morar [...] Dado o crime, qualquer crime, o Código Penal é que há de ser chamado a cuidar da decadência, prescrição, atenuantes, agravantes, dosimetria, etc. [...] a matéria é tributária, mas é também penal; logo, as regras do penal hão de ser dadas pelo Código Penal . [...] a maioria dos crimes fiscais (Lei nº 8.137/90, art. 1º) é contemplada com pena de reclusão de dois a cinco anos. Pelo Código Penal, eis a regra emprestada ao Código Tributário Nacional no caso de dolo, fraude ou simulação no lançamento fiscal: Art. 109. A prescrição [...] regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: [...] III- em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito.206
No direito, nem sempre é possível encontrar a solução ideal para as questões discutidas, mas a interpretação consubstanciada no sistema estabelecido pelo CTN e o uso dos princípios norteadores do direito ajudam nestas horas, neste sentido é perspicaz a lição de Luciano Amaro207. [...] a solução é aplicar a regra geral do art. 173, I. Essa solução não é boa, mas continuamos não vendo outra, de lege lata. A possibilidade de o lançamento poder ser feito a qualquer tempo é repelida pela interpretação sistemática do Código Tributário Nacional 204
Vide, p. ex., OLTRA, Maíra Braga. Decadência do Fisco nos casos de Dolo, Fraude e Simulação. In CARVALHO, Aurora Tomazini (org). Decadência e Prescrição em Direito Tributário. São Paulo: MP, 2008, p. 99. 205 MENDONÇA, Christine. Decadência e Prescrição em Matéria Tributária. In DE SANTI, Eurico Marcos Diniz (coord.). Curso de Especialização em Direito Tributário: Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005, P. 663. 206 FEITOSA, Francisco José Soares. Prazo para Lançar Tributos, no caso de fraude, dolo ou simulação. RDDT 134, nov/06 apud PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 966. 207 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 2º ed. São Paulo: Saraiva, 1998 apud PAUSEN, 2007, Op. Cit., p. 965.
63
(arts. 156, V, 173, 174 e 195, parágrafo único). Tomar de empréstimo prazo do direito privado também não é solução feliz, pois a aplicação supletiva de outra regra deve, em primeiro lugar, ser buscada dentro do próprio sistema normativo, vale dizer, dentro do Código. Aplicar o prazo geral (5 anos, do art. 173) contado após a descoberta da prática dolosa ou simulada igualmente não satisfaz, por protrair indefinidamente o início do lapso temporal. Assim, resta aplicar o prazo de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido feito. Melhor seria não se ter criado a ressalva.
Desta forma, nos casos de dolo, fraude ou simulação a regra aplicada, pela maioria da doutrina, é a geral (art. 173, I, CTN), no entanto, caso o Fisco tome ciência da prática ilícita antes do 1º dia do exercício seguinte ao fato gerador, deve ser aplicada a regra do parágrafo único do artigo 173 do CTN.
5.2 A Decadência e a Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário As causas de suspensão da exigibilidade do crédito tributário previstas no artigo 151 do CTN, e vistas rapidamente no tópico “3.6” deste trabalho, objetivam suspender o direito de exigir o crédito tributário, porém, não impedem o lançamento, por isso se dizer de suspensão da exigibilidade e não do lançamento. Quando se suspende a exigibilidade do crédito tributário inibem-se a formação da Certidão da Dívida Ativa (CDA), que é o título executivo extrajudicial que
embasa
a
Execução
Fiscal,
nos
termos
da
Lei
nº
6.830/80,
e,
consequentemente, impede o ajuizamento de tal execução, e já que tal suspensão não impede o lançamento, não há que se falar em suspensão do prazo decadencial do direito do Fisco208. Segundo a doutrina e jurisprudência predominante, lavrado o auto de infração, não se há de cogitar mais da decadência do direito de lançar, posto que tal direito já teria sido exercido. E não se poderia cogitar de prescrição, visto que o Fisco está impedido de exercer o seu direito de cobrança, neste sentido, tomando, por exemplo, um caso de impugnação administrativa do auto de infração, todo o tempo que se demorar para que o crédito tributário seja de fato constituído, é como um “limbo”, onde não existe decadência e tão pouco prescrição209.
208
BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 104. 209 MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e Prescrição no Direito Tributário Brasileiro. In MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Curso de Direito Tributário. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 229.
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Neste sentido a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. CITAÇÃO POR EDITAL. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO PENDENTE DE JULGAMENTO. 1. [...] 2. 'Estabelece o art. 174 do CTN que o prazo prescricional do crédito tributário começa a ser contado 'da data da sua constituição definitiva'. Ora, a constituição definitiva do crédito tributário pressupõe a inexistência de discussão ou possibilidade de alteração do crédito. Ocorrendo a impugnação do crédito tributário na via administrativa, o prazo prescricional começa a ser contado a partir da apreciação, em definitivo, do recurso pela autoridade administrativa. Antes de haver ocorrido esse fato, não existe 'dies a quo' do prazo prescricional, pois, na fase entre a notificação do lançamento e a solução do processo administrativo, não ocorrem nem a prescrição nem a decadência (art. 151, III, do CTN)" (cf. REsp 32.843-SP, Min. Adhemar Maciel, in DJ de 26.10.1998). 3. Recurso especial provido.210 (destacou-se)
Desta forma, entre a notificação do lançamento tributário e a solução do processo administrativo fiscal, ou o cessar da causa de suspensão da exigibilidade, não há qualquer prazo extintivo, nem decadencial nem prescricional211, sendo que tal questão será retomada no item “6.4.1”, quando se tratará da possibilidade de ocorrência da prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal.
210
REsp 822705/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/04/2006, DJ 02/05/2006, p. 297 211 HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p. 74.
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6 A PRESCRIÇÃO DO DIREITO DO FISCO
6.1 A Prescrição no Direito Tributário O artigo 174 do Código Tributário Nacional trata da prescrição da ação para a cobrança do crédito tributário e fixa o início da contagem do prazo a partir da constituição definitiva do crédito tributário: Art. 174 – A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos contados da data da sua constituição definitiva.
Diante da leitura do aludido dispositivo legal a primeira questão que salta aos olhos é saber quando o crédito tributário é considerado definitivamente constituído. Barsani212 destaca que para a maioria da doutrina e mesmo para a jurisprudência, o crédito tributário está definitivamente constituído quando não couber mais recurso na esfera administrativa ou quando o contribuinte deixou de recorrer no prazo legal. No entanto, a síntese acima expressa parece bastante simplória diante do amplo debate que é travado na doutrina, ainda que para chegar à mesma conclusão, principalmente no que diz respeito à discussão se existe uma constituição provisória do crédito tributário213. Em termos práticos, ao receber a notificação, através da qual a Fazenda Pública efetua o lançamento, abre-se ao contribuinte um prazo de 30 (trinta) dias, dentro do qual poderá ele proceder ao pagamento do valor lançado, impugnar o lançamento dando início ao procedimento administrativo 214 ou, ainda, reclamar esse valor via ação judicial. Durante esse período, portanto, não se pode atribuir inércia ao sujeito ativo, visto que não dispunha ele de condições para exigir aquele valor215. A jurisprudência tem se consolidado que se cuidando de cobrança de tributo exigido mediante auto de infração, “considera-se como termo quo do prazo
212
BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 119. 213 Vide: DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 152-153; HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, pp. 130-131, autores que fazem importantes contraposições de diversos outros doutrinadores. 214 Vide, no âmbito federal, ao Decreto nº 70.235/72. 215 CASTRO, Alexandre Barros. SOUZA, Luís Henrique Neris de. Código Tributário Nacional Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 336.
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prescricional o 31º dia a partir da notificação, conforme artigo 15 do Decreto nº 70.235/72, caso não haja impugnação administrativa pelo contribuinte”.216 Nestes termos, o E. STJ já se manifestou: TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. DATA DA CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. 1. A constituição definitiva do crédito tributário depende do comportamento do contribuinte em face do lançamento. Caso o contribuinte, não o impugne, a constituição definitiva ocorrerá ao término do prazo previsto na lei. Na esfera administrativa federal, o prazo é de trinta dias para que seja protocolizada a impugnação. Nesse caso, a constituição definitiva ocorrerá após o trintídio, a partir da intimação do lançamento definitivo. 2. A notificação de autuação foi realizada em 23.02.90, o contribuinte permaneceu revel, sendo lavrado o respectivo termo. Nessa data, portanto, constituiu-se definitivamente o crédito tributário, com o início do prazo prescricional. [...]217 (destacou-se)
Tal entendimento guarda sintonia com o que já decidiu o E. STF: Com a lavratura do auto de infração consuma-se o lançamento tributário. Por outro lado, a decadência só é admissível no período anterior a essa lavratura. Depois, entre a ocorrência dela e até que flua o prazo para o recurso administrativo, ou enquanto não for decidido o recurso dessa natureza, de que se tenha valido o contribuinte, não mais corre o prazo para a decadência e ainda não se iniciou a fluência do prazo para prescrição. Decorrido o prazo para a interposição de recurso administrativo sem que ele tenha ocorrido, ou decidido o recurso administrativo interposto pelo contribuinte, há a constituição do crédito administrativo a que alude o artigo 174, começando a fluir daí o prazo da prescrição da pretensão do fisco. 218 (destacou-se)
Portanto, apoiando-se na maioria da doutrina e na jurisprudência, sem adentrar-se nas profundas discussões sobre a questão da definitividade do crédito tributário, que não interessa a este momento do presente estudo, cumpre saber se a constituição definitiva do crédito tributário e, respectivamente, o termo inicial do prazo prescricional dão-se no momento em que o Fisco adquire condições de diligenciar sobre seu crédito. 6.2 A Prescrição e a Suspensão do Crédito Tributário 216
TRF3 – Terceira Turma – AI nº 0007658-70.2011.4.03.0000/SP, Rel. Des. Fed. Nery Junior, d.j. 18/08/2011. STJ - REsp 675.106/SE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/12/2005, DJ 06/02/2006, p. 254 (negritado) 218 STF - ERE nº 94.462- 1/SP, Rel. Min. MOREIRA ALVES j. de 17.12.82 fls. 105 (negritado). 217
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Como não se adentrou na profunda discussão sobre a constituição definitiva do crédito tributário, é importante destacar-se que a prescrição só vai ocorrer se o crédito tributário for exigível durante esses 05 (cinco) anos que o art. 174 prevê, ou seja, ocorrendo qualquer causa suspensiva da exigibilidade previstas no artigo 151 do CTN, não há falar em prescrição, enquanto não cessada tal causa, pelo menos essa é a posição majoritária da doutrina, e que por sinal é desfavorável ao contribuinte. Desta forma, para que se inicie o prazo prescricional tributário, além de estar o crédito tributário constituído definitivamente e de haver a violação do direito (não pagamento), o titular do direito, no caso o Fisco, não pode estar impedido de atuar, porquanto a prescrição não corre contra quem não pode agir (agere non valenti non currit praescriptio)219. A questão da suspensão da exigibilidade do crédito tributário frente a prescrição é por demais relevante para o estudo da possibilidade da aplicação da prescrição intercorrente no âmbito do processo administrativo fiscal, razão pela qual será retomada no item “6.4.1” adiante.
6.3 Interrupção da Prescrição O parágrafo único do artigo 174 do CTN dispõe sobre a possibilidade de interrupção da prescrição, e apresenta as seguintes hipóteses: Parágrafo Único – A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; II – pelo protesto judicial; II – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.
Desta forma, a interrupção implica no reinício da contagem de todo o prazo, desprezando-se o período já decorrido. A mais polêmica hipótese de interrupção, e a que mais interessa a este estudo é a prevista no inciso I, que dispõe da interrupção que se dá quando o juiz determina a citação do devedor. O referido inciso ganhou a atual redação através da vigência da Lei Complementar nº 118, de 09/02/2005, pois antigamente o texto 219
HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p. 139.
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estabelecia a interrupção da prescrição somente mediante a citação pessoal do devedor. Antes da edição da LC 118/05 existia um conflito entre o CTN e a Lei nº 6.830/80 (LEF), pois enquanto o primeiro dizia que era necessária a citação pessoal do devedor, a LEF em seu art. 8º, §2º estabelecia que o despacho do juiz, que ordenar a citação, era suficiente para interromper a prescrição, sendo que naquela época, prevalecia o entendimento da aplicação do CTN, enquanto o Fisco se debatia pela aplicação da LEF220. Leandro Paulsen221 destaca que a nova redação deste inciso I, atribuída pela LC 118/05, acabou com a polêmica gerada pela diferença entre o previsto na redação original do CTN (interrupção pela citação pessoal) e o previsto na LEF (interrupção pelo despacho que ordena a citação). Pois, agora, também o CTN atribui tal efeito ao simples despacho inicial que ordena a citação. No entanto, resta uma questão, o que dizer das Execuções Fiscais propostas antes do ano de 2005 e que tiveram o despacho inicial determinando a citação do devedor antes da edição e vigência da LC 118/05? A resposta foi dada pelo E. STJ que se manifestou sobre o tema e decidiu: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS SOBRE A MATÉRIA. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. DESPACHO DO JUIZ QUE ORDENA A CITAÇÃO. ALTERAÇÃO DO ART. 174 DO CTN ENGENDRADA PELA LC 118/2005. APLICAÇÃO IMEDIATA. 1. A prescrição, posto referir-se à ação, quando alterada por novel legislação, tem aplicação imediata, conforme cediço na jurisprudência do Eg. STJ. 2. Originariamente, prevalecia o entendimento de que o artigo 40 da Lei nº 6.830/80 não podia se sobrepor ao CTN, por ser norma de hierarquia inferior, e sua aplicação sofria os limites impostos pelo artigo 174 do referido Código. 3. Nesse diapasão, a mera prolação do despacho ordinatório da citação do executado não produzia, por si só, o efeito de interromper a prescrição, impondo-se a interpretação sistemática do art. 8º, § 2º, da Lei nº 6.830/80, em combinação com o art. 219, § 4º, do CPC e com o art. 174 e seu parágrafo único do CTN. 4. A Lei Complementar 118, de 9 de fevereiro de 2005 (vigência a partir de 09.06.2005), alterou o art. 174 do CTN para atribuir ao despacho do juiz que ordenar a citação o efeito interruptivo da
220
BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, pp. 123-124. 221 PAUSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário a Luz da Doutrina e Jurisprudência. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 1.124.
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prescrição. (Precedentes: REsp 860128/RS, DJ de 782.867/SP, DJ 20.10.2006; REsp 708.186/SP, DJ 03.04.2006). 5. Destarte, consubstanciando norma processual, a referida Lei Complementar é aplicada imediatamente aos processos em curso, o que tem como consectário lógico que a data da propositura da ação pode ser anterior à sua vigência. Todavia, a data do despacho que ordenar a citação deve ser posterior à sua entrada em vigor, sob pena de retroação da novel legislação. 6. In casu, o Tribunal a quo assentou que o IPTU relativo a 1999 teve sua constituição definitiva em 05.01.1999. A execução fiscal foi proposta em 11/12/2002 (fl. 02); o despacho que ordenou a citação foi proferido em 17.04.2003 (fl. 8), anteriormente à vigência da LC 118/05; e a citação por edital não tinha se dado até a decisão de extinção do processo, em 26/01/2007. 7. Consectariamente, ressoa inequívoca a ocorrência da prescrição em relação ao crédito tributário constituído em 05/01/1999, porquanto decorrido o prazo prescricional quinquenal entre a data da extinção do processo, sem que tivesse ocorrido a efetiva citação do executado, e a data da constituição do crédito tributário, nos termos da redação original do art. 174, § único, I, do CTN, uma vez que o despacho ordinatório da citação foi proferido ainda antes da vigência da LC 118/05. 8. Recurso especial desprovido.222 (Destacou-se)
Portanto, ainda que a nova redação do inciso I do art. 174 do CTN tenha recebido aplicação imediata, somente seria capaz de atingir as Ações de Execução Fiscal onde não houvesse sido proferido o despacho inicial ordenando a citação.
6.4 Prescrição Intercorrente Espinhoso tema é a possibilidade de aplicação da prescrição intercorrente no Direito Tributário. Pode-se definir prescrição intercorrente como sendo a perda da pretensão de atuar ou agir no processo, em virtude da inércia de seu titular, ao deixar de praticar os atos processuais necessários ao seu andamento, durante certo lapso de tempo223. Nos termos propostos por Ernesto Toniolo224 “a expressão intercorrente é empregada em execução fiscal para designar a situação na qual a prescrição, anteriormente interrompida, volta a correr no curso do processo, nele completando o fluxo de seu prazo”. Diz ainda que “trata-se da mesma prescrição prevista no CTN, 222
STJ - REsp 1015061/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/05/2008, DJe 16/06/2008 (grifado e negritado). 223 HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, 2009, p. 161. 224 TONIOLO, Ernesto José. A Prescrição Intercorrente na Execução Fiscal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 102.
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[...] que pode voltar a fluir no curso da execução fiscal, geralmente em virtude da inércia do exequente em fazer uso, durante o processo de execução, dos poderes, das faculdades e dos deveres inerentes ao exercício do direito de ação” 225. Rodrigues de Souza conceitua prescrição intercorrente como “aquela cujo curso se inicia após a citação, se o processo de execução permanecer parado por desídia do credor”226. Eurico Diniz De Santi julga não haver prescrição intercorrente, sob a justificativa de que a prescrição extingue o direito de ação, e não o processo, que decorre do exercício do direito de ação. Diz também o autor que o processo executivo fiscal não pode ser extinto pela omissão do Fisco, pois é movido por impulso oficial do juiz, e arremata que “a prescrição corre entre Fisco e Estado-Juiz, e só pode ocorrer antes do processo de execução fiscal: nem durante nem depois”227. Não obstante, existirem na doutrina posições contrárias à ocorrência da prescrição intercorrente228, o Superior Tribunal de Justiça por meio da Súmula 344, encerra o assunto afirmando que: Súmula 344 – Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual iniciase o prazo de prescrição quinquenal intercorrente.
No entanto, resta a questão da análise da prescrição intercorrente no curso do processo administrativo fiscal e no curso da Ação de Execução Fiscal.
6.4.1 Prescrição Intercorrente no Curso do Processo Administrativo No processo administrativo fiscal a alegação da prescrição intercorrente tem como fundamento legal o parágrafo único do art. 173 do CTN, em razão de a Fazenda Pública paralisar o andamento do processo por mais de cinco anos, a partir da sua entrada no órgão incumbido de julgá-lo.
225
TONIOLO, Ernesto José. A Prescrição Intercorrente na Execução Fiscal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 103. DE SOUZA, Fátima Fernandes Rodrigues. Decadência e Prescrição In MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 137. 227 DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 168. 228 Vide ainda: MENDONÇA, Christine. Decadência e Prescrição em Matéria Tributária. In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Curso de Especialização em Direito Tributário: Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005. pp. 655-676. 226
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De fato não é incomum ouvir-se sobre processos administrativos fiscais que tramitam por muitos anos a fio, sem ter uma resolução definitiva229. No entanto, a despeito da insegurança jurídica que essa demora causa, a maioria da doutrina e a jurisprudência afirmam não existir prescrição intercorrente na esfera administrativa. Eurico De Santi230 sustenta que “não pode haver prescrição intercorrente no processo administrativo porque, quando há impugnação ou recurso administrativo durante o prazo para pagamento do tributo, suspende-se a exigibilidade do crédito, o que simplesmente impede a fixação do início do prazo prescricional”. No mesmo sentido, José Hable231 destaca que “entre o lançamento tributário contestado até a decisão final do contencioso administrativo, independente do prazo transcorrido, não há qualquer prazo extintivo de crédito tributário pelo transcurso do tempo”. Quase com as mesmas palavras, Sacha Calmon Coêlho232 afirma que "entre os dois momentos não corre nem o prazo de decadência (que já acabou) nem o da prescrição (que ainda não se iniciou) o que corre são os consectários do crédito, os juros e a correção monetária [...]". O Superior Tribunal de Justiça233 e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF)234 também não admitem a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal. O principal argumento utilizado para sua não admissão é a suspensão da exigibilidade do crédito e a consequente suspensão da prescrição no curso do processo administrativo.
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O Autor, por sua experiência prática, tem conhecimento de processos administrativos que levaram mais de 05 anos para terem a primeira decisão, que ainda comportava outros recursos na esfera administrativa (como exemplo, cita o Processo Administrativo nº 10830.001981/2004-25, que depois de 07 anos teve decisão na 5º Turma da DRJ/SP2, e agora aguarda há cerca de 01 ano julgamento perante o CARF. 230 DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 169. 231 HABLE, José. A extinção do crédito tributário por decurso do tempo. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2009, p. 162. 232 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Decadência e prescrição contra a Fazenda Pública, Revista de Direito Tributário. São Paulo, RT, 1979 (III) 9/10:295-303. p. 21-22, apud HABLE, José. A demora na decisão do contencioso administrativo-fiscal. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1705, 2 mar. 2008 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/11002>. Acesso em: 22 set. 2012. 233 Vide: REsp. 706175/RS, 1ª Turma, Relatora Ministra Denise Arruda, DJ 10.09.2007; REsp. 784353/RS, 1ª Turma, Relatora Ministra Denise Arruda, DJe de 24.04.2008; REsp 651198/RS, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe de 30.09.2008; REsp. 1006027/RS, 1ª Turma, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJe de 04.02.2009. 234 O 1º Conselho emitiu a Súmula 11 e o 2º Conselho a Súmula 7, ambas com a mesma redação: “Não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal” (negritado). Essas súmulas também vêm sendo aplicadas pelo 3º Conselho, como se verifica do julgamento do Recurso 130777, Processo 10830.001146/97-13, Acórdão 303-35120, Relator Nilton Luiz Bartoli, julgado em 27.02.2008.
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De qualquer modo, ainda que o STJ e o CARF se posicionem e decidam pela não existência da prescrição intercorrente na seara do processo administrativo fiscal, o que demonstra uma clara posição pró-Fisco, não faltam vozes para defender a possibilidade de sua aplicação, e isto em prestígio da segurança jurídica 235, sendo que destaca-se a posição pró-contribuinte de Ives Gandra da Silva Martins: A nossa posição é de que, uma vez constituído o crédito tributário pelo lançamento, começa a correr um prazo fatal de cinco anos para prescrever o direito à ação, a não ser que seja interrompido por uma das quatro hipóteses mencionadas no parágrafo único do art. 174. [...] Entendemos, por outro lado, que a suspensão da exigibilidade do crédito tributário com efeitos apenas administrativos não tem o condão de paralisar a fluência do prazo prescricional, para tanto, devendo a Fazenda se suspensa a exigibilidade do crédito tributário, utilizar-se do protesto judicial, como forma interruptiva da prescrição. Entendemos que somente neste contexto pelo legislador no item II (do parágrafo único do art. 174), eis que, se não suspensa a exigibilidade do crédito tributário, a Fazenda não tem que protestar o seu direito, mas executá-lo, sendo inócua nesta hipótese, a enunciação legislativa do protesto.236
Por esse entendimento, bem mais favorável ao contribuinte, a simples suspensão da exigibilidade não impediria a fluência do prazo prescricional, que somente se interromperia por uma das hipóteses do parágrafo único do art. 174 do CTN, em especial, conforme defende o doutrinador em comento, pelo protesto judicial. Do contrário, segundo o Prof. Ives Gandra, mesmo no processo administrativo fiscal haveria a fluência do prazo prescricional. Pela visão mais favorável ao contribuinte, destaque-se, pela que não é adotada, o Fisco teria 5 (cinco) anos para resolver o processo administrativo fiscal, inscrever em dívida ativa, obter a CDA e ajuizar a Execução. Frise-se, por fim, que a eficiência é um dos deveres da Administração Pública que se impõe a todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento funcional.
235
Vide: FANUCCHI, Fábio. Decadência e Prescrição. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. Decadência e Prescrição. Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 13. São Paulo: Centro de Estudos de Extensão Universitária/Resenha Tributária, 1976, p. 109-136. E ainda, MACHADO, Hugo de Brito; MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Decadência de Prescrição. Prazos. Contagem. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 91, pp. 133-142, abr. 2003. 236 MARTINS, Ives Gandra da Silva apud RODRIGUES, Marilene Talarico Martins. Decadência e Prescrição In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. Decadência e Prescrição. Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 13. São Paulo: Centro de Estudos de Extensão Universitária/Resenha Tributária, 1976, pp. 176-177.
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Neste sentido a Lei nº 11.457, de 16/03/2007237, em seu artigo 24, determina ser “obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos de contribuintes”. No entanto, por ser uma determinação sem qualquer previsão de sanção, a Administração Fiscal não a cumpre. Ademais, tratase de uma lei ordinária, o que provoca a reflexão sobre a necessidade de tal prazo ter sido fixado por meio de lei complementar, nos termos do artigo 146, III, “b”, da CF/88. De qualquer modo, o contribuinte tem direito de ver o seu processo administrativo examinado pela Administração Pública, de forma eficiente e em prazo razoável, para que não venha a sofrer danos por ter exercido o seu direito constitucional de discutir amplamente no processo administrativo238. Em que pese o consolidado posicionamento da jurisprudência desfavorável ao contribuinte, com base na segurança jurídica é possível sustentar a extinção do crédito tributário pela prescrição intercorrente, ainda que em sede de processo administrativo, pois em casos especialíssimos, em que o Fisco simplesmente paralisa o andamento do processo administrativo previamente à execução do crédito tributário, prolongando ad infinitum uma situação desfavorável ao contribuinte, há decisões de nossas Cortes declarando a prescrição do direito de ação do Fisco, conforme precedente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, nos autos da Apelação Cível nº 596038166, cuja ementa colaciona-se: Prescrição Intercorrente no Processo Administrativo – Art. 151, III, do CTN – Durante a reclamação ou recurso administrativo, está suspensa a exigibilidade do crédito administrativo, não correndo prescrição – Entretanto, quando se está diante de incomum inércia, com a paralisação incompreensível do procedimento durante sete anos, sob pena de se aceitar a própria imprescritibilidade, não há como deixar de reconhecer a prescrição.
E ainda, na vanguarda do direito o E. TJRS, em julgado recentíssimo assim se posicionou: AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. PRESCRIÇÃO 237
BRASIL. Lei nº 11.457, de 16 de março de 2007. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pp. 17311733. 238 RODRIGUES, Marilene Talarico Martins. Decadência e Prescrição In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. Decadência e Prescrição. Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 13. São Paulo: Centro de Estudos de Extensão Universitária/Resenha Tributária, 1976, p. 176.
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ADMINISTRATIVA. Paralisado o procedimento administrativo ou a demora em sua solução, que, no caso, levou mais de seis anos, impõe-se o reconhecimento da prescrição. Após o decurso de determinado tempo sem promoção da parte interessada, deve-se estabilizar o conflito, pela via da prescrição, impondo segurança jurídica aos litigantes. Suspensão da exigibilidade do crédito tributário em razão da do recurso administrativo (art. 151, III, do CTN) que tem natureza jurídica diversa da interrupção/suspensão do prazo prescricional, não incluída esta no rol do parágrafo único, do art. 174, do Código Tributário Nacional. Uma vez interposto o recurso administrativo ou a reclamação, tem a autoridade administrativa o prazo previsto em lei para o julgamento respectivo, pena de prescrever o crédito tributário por força de lei complementar à Constituição Federal. Afronta os princípios informadores do sistema tributário a prescrição indefinida. RECURSO PROVIDO. VOTO VENCIDO.239
Desta forma, ainda que insegurança jurídica pareça imperar no processo administrativo fiscal, não faltam argumentos, tais como o do Prof. Ives Gandra e dos Desembargadores gaúchos, para os advogados militantes nesta seara forçar a reflexão dos julgadores.
6.4.2 Prescrição Intercorrente no Curso da Execução Fiscal A Lei nº 6.830/80 (LEF)240 estabelece em seu artigo 40: Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. § 1º - Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública. § 2º - Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos. § 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. § 4o Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051, de 2004) § 5o A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4o deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda. (Incluído pela Lei nº 11.960, de 2009) [Destacou-se]
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Agravo de Instrumento Nº 70046523973, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 21/03/2012. 240 BRASIL. Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. Vade Mecum. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, pp. 1330 – 1333.
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O supracitado artigo 40 da LEF estabelece que suspenso o processo de execução pela não localização do devedor ou de bens penhoráveis, a prescrição não volta a correr de plano, pois se inicia, a partir de então, o período regular, tolerado pelo procedimento, em que o credor exequente estará, ou pelo menos deveria estar, a diligenciar a fim de apresentar ao juízo elementos que permitam a aferição de patrimônio do devedor suficiente à retomada da marcha processual. Tal prazo resta estabelecido por inferência no § 1º, como sendo de 01 (um) ano. Importante destacar que a prescrição intercorrente somente terá lugar quando houver a suspensão do curso da execução fiscal por um fato anormal que impeça a tramitação do feito, como é o caso da inexistência de bens penhoráveis. Se o processo estiver suspenso em decorrência do oferecimento de embargos, por exemplo, não se há de cogitar de prescrição intercorrente, ainda que a ação desconstitutiva demore muito a ser julgada, pois “suspensa a execução pela ação de cognição que é a natureza jurídica dos embargos do devedor, não há que se pretender que aquela – a execução suspensa – sofra os efeitos de prescrição intercorrente pela demora desta”241. Em uma leitura literal do disposto no § 2º, ter-se-ia o requisito da ordem do Juiz no sentido de arquivar os autos, fazendo parecer que somente depois desta ordem é que voltaria a correr o prazo prescricional. Entretanto, ainda que o juiz não ordene o referido arquivamento, pode-se iniciar a contagem da prescrição quando finalizado o prazo de um ano de suspensão do processo, previsto no § 1º do art. 40. É que, conforme explica Mauro Lopes242, “em muitos casos, o juiz considera prejudicial à administração cartorária a remessa dos autos ao arquivo judicial, não tendo cabimento deixar de computar a prescrição intercorrente em razão de motivo tão prosaico”. O § 3º do art. 40 deixa claro que enquanto não transcorrer o prazo prescricional, a marcha da execução pode ser retomada, tão logo o exequente localize bens do devedor. Transcorridos o prazo de cinco anos, sem que sejam encontrados bens passíveis de garantir a execução, deve o Juiz, nos termos do § 4º do art. 40, dar vista ao Fisco Exequente, para que demonstre a existência de eventual causa 241
STF – RE nº 101.094/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Moreira Alves, Dj 10/8/84, p. 2.450, RTJ 110/870) LOPES, Mauro Luís Rocha. Processo Judicial Tributário. 6ª ed., rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2011, p. 231. 242
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suspensiva ou interruptiva do prazo. Não havendo tal demonstração, a prescrição intercorrente deve ser reconhecida, extinguindo-se a execução. Leandro Paulsen243 destaca que eventual ausência de intimação do Exequente “só implicaria nulidade da sentença quando demonstrado, em apelação, a ocorrência de efetivo prejuízo, ou seja, quando o Exequente demonstrar que havia causa suspensiva ou interruptiva que não tenha sido considerada pela ausência da intimação para demonstrá-la”, sendo que do contrário a sentença deve ser mantida. Em posição contrária, em favor da nulidade da sentença, quando o Fisco não é intimado a se manifestar, está a jurisprudência do STJ que entende ser nula a sentença ainda que em razões de recurso a Fazenda Exequente deixe de apontar eventual causa suspensiva ou interruptiva do prazo prescricional. A exemplo disto colaciona-se a seguinte ementa: PROCESSO CIVIL - TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - TERMO INICIAL - SÚMULA 314/STJ - ARGÜIÇÃO PELO EXECUTADO - OITIVA DA FAZENDA PÚBLICA - INEXISTÊNCIA - CONTRADITÓRIO - DESRESPEITO. 1. A prescrição intercorrente, passível de ocorrência no bojo do processo executivo, conta-se da data do arquivamento da execução fiscal, após findo o prazo de um ano da suspensão determinada pelo magistrado. Inteligência da Súmula n. 314/STJ. 2. O contraditório é princípio que deve ser respeitado em todas as manifestações do Poder Judiciário, que deve zelar pela sua observância, e não só nas hipóteses de declaração da prescrição ex officio. 3. Cabível a prescrição intercorrente em execução fiscal desde que a Fazenda Pública seja previamente intimada do decreto que a declarar, para opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição. 4. Recurso especial provido.244 (Destacou-se)
Hugo de Brito Machado245 entende que a verdadeira inovação do § 4º, “consiste apenas em permitir a decretação da prescrição de ofício”, e explicando tal possibilidade assim se posiciona: Quem conhece a realidade das varas de execução fiscal em geral facilmente percebe que essa norma teve o objetivo de eliminar a enorme quantidade de processos inúteis nelas existentes. Quando exige seja ouvida a Fazenda Pública está apenas dando a esta uma 243
PAUSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 4ª ed. rev., atual. e ampli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 199. 244 REsp 963317/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/08/2008, DJe 01/09/2008. 245 MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e Prescrição. In MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 73.
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última chance para demonstrar a utilidade da execução, apontando bens do executado.246
Por fim, cumpre analisar a constitucionalidade da previsão de prescrição intercorrente no § 4º do art. 40 da Lei nº 6.830/80 (LEF), por ser a mesma Lei Ordinária, e desta forma não se adequar formalmente ao que determina o art. 146, inciso III, “b”, da Constituição Federal, que exige Lei Complementar ao se dispor sobre normas gerais em matéria tributária, quanto ao instituto da prescrição. Maria Fernandes Rodrigues de Souza247 afirma categoricamente que “o fato de a lei ordinária regular a matéria não representa qualquer vício”. E explica: A possibilidade de o juiz reconhecer ou não, de ofício, a prescrição é disposição de natureza processual, passível de ser veiculada por ato legislativo dessa modalidade. Por outro lado, a norma não modifica o prazo prescricional do crédito tributário, que continua regido pelo Código Tributário Nacional. Assim, não se verifica invasão de matéria, de competência da lei complementar pela lei ordinária248.
Claro que, como quase tudo em direito, a posição não é unânime, existindo na doutrina defensores da inconstitucionalidade da referida norma 249. De qualquer modo, como dito alhures, o Superior Tribunal de Justiça coloca termo a discussão com a edição e costumeira aplicação da Súmula 314, razão pela qual se conclui pela existência da prescrição intercorrente no âmbito da Execução Fiscal, estando afastada a questão da inconstitucionalidade. Por fim, o § 5º estabelece que a exigência de oitiva prévia da Fazenda será dispensada, no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda, sendo que tal parágrafo foi introduzido com a edição da Lei nº 11.960/2009. A regulamentação de tal dispositivo materializou-se, conforme destaca Mauro Lopes250, com a edição da Portaria nº 227/2010, cujo artigo 1º contém disposição dispensando, para fins de decretação ex officio da prescrição intercorrente, a 246
MACHADO, Hugo de Brito. Decadência e Prescrição. In MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 73. 247 DE SOUZA, Fátima Fernandes Rodrigues. Decadência e Prescrição In MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 137. 248 DE SOUZA, Loc. Cit. 249 Vide: DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 170. E ainda, RODRIGUES, Marilene Talarico Martins. Decadência e Prescrição In MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Coord.). Decadência e Prescrição. Pesquisas Tributárias, Nova Série, n. 13. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 174; dentre outros. 250 LOPES, Mauro Luís Rocha. Processo Judicial Tributário. 6ª ed., rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2011, p. 232.
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manifestação prévia da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) nas execuções fiscais cuja dívida consolidada tenha valor, atualizado até a data da ocorrência da prescrição, igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Analisados cada parágrafo do art. 40 da LEF, e verificando-se a existência da prescrição intercorrente no Processo de Execução Fiscal, finaliza-se com os dizeres do Ministro José Delgado, para quem “após o decurso de determinado tempo sem promoção da parte interessada, deve-se estabilizar o conflito, pela via da prescrição, impondo segurança jurídica aos litigantes”251.
251
Extraído da ementa do REsp 208345/PR da Primeira Turma do STJ. Julgamento em 08/06/1999.
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7 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NOS TRIBUNAIS É compreensível que neste curto espaço não seria possível esgotar todos os temas relacionados aos institutos da Prescrição e da Decadência, ainda que limitados à seara do Direito Tributário. Desta forma, neste capítulo, escolheram-se alguns dos temas que movimentaram ou ainda movimentam nossos Tribunais, em especial os Superiores, e far-se-á um breve estudo sobre as temáticas escolhidas, ressaltando-se que, mesmo em relação a estes, é impossível a exaustão.
7.1 A Tese dos Dez Anos (5+5) A partir de 1995 surgiu uma tese que ficou conhecida como a Tese dos Dez Anos, ou Tese dos Cinco mais Cinco. Pois foi naquela época que o Superior Tribunal de Justiça passou a adotar o entendimento que ampliava o prazo para o Fisco efetuar o lançamento, no caso dos tributos sujeitos a pagamento antecipado, ou seja, ampliou o prazo para constituição de créditos tributários relativos a diferenças apuradas na sistemática do lançamento por homologação. A importância da análise deste posicionamento do Superior Tribunal de Justiça se justifica pelo fato de ser este Tribunal, por força constitucional, o responsável pela unificação da interpretação e aplicação da legislação nacional. Importante à citação da ementa do acórdão paradigma da referida tese, para maior entendimento: TRIBUTARIO CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA CONSTITUIÇÃO DO CREDITO TRIBUTARIO - DECADENCIA PRAZO (CTN ART. 173). I - O ART. 173, I DO CTN DEVE SER INTERPRETADO EM CONJUNTO COM SEU ART. 150, PAR. 4. II - O TERMO INICIAL DA DECADENCIA PREVISTA NO ART. 173, I DO CTN NÃO E A DATA EM QUE OCORREU O FATO GERADOR. III - A DECADENCIA RELATIVA AO DIREITO DE CONSTITUIR CREDITO TRIBUTARIO SOMENTE OCORRE DEPOIS DE CINCO ANOS, CONTADOS DO EXERCICIO SEGUINTE AQUELE EM QUE SE EXTINGUIU O DIREITO POTESTATIVO DE O ESTADO REVER E HOMOLOGAR O LANÇAMENTO (CTN, ART. 150, PAR. 4.). IV - SE O FATO GERADOR OCORREU EM OUTUBRO DE 1974, A DECADENCIA OPERA-SE EM 1. DE JANEIRO DE 1985.252 (Destacou-se)
Conforme destaca Ricardo Alexandre: 252
REsp 58918/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/05/1995, DJ 19/06/1995, p. 18646.
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A tese era engenhosa e decorria do entendimento de que as regras relativas à decadência do direito de lançar eram exclusivamente aquelas constantes do caput, alíneas e parágrafo único do art. 173 do CTN. Nessa linha, a regra relativa ao prazo para homologação (CTN, art. 150, § 4º) deveria ser complementada pela constante do art. 173, inciso I, do mesmo Código. 253
Desta forma, a decadência somente se verificaria com o decurso de cinco anos, contados do exercício seguinte àquele em que se extinguiu o direito potestativo que possui o Estado para rever o lançamento, ou seja, o STJ criou uma regra específica de decadência, através do somatório dos prazos dos artigos 150, § 4º, e 173, inciso I, ambos do CTN254. Conforme explica Barsani255, a tese se fundava na análise do verbo poder, citado no artigo 173, inciso I, do CTN: Art. 173 – O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário, extingue-se após 5 anos contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. (grifado e negritado)
Consubstanciado na utilização do verbo poder em seu modo condicional, o Ministro Humberto Gomes de Barros entendeu que o termo inicial da contagem do prazo da decadência se daria no 1º dia do exercício seguinte ao que houvesse transcorrido o direito do Fisco de homologar o pagamento feito pelo contribuinte, nos termos do art. 150 do CTN. Essa decisão alterou o entendimento em matéria de decadência, como se vê, pela interpretação do vocábulo poderia inserido no inciso I do art. 173 do CTN. A aludida tese sempre foi alvo de acaloradas discussões doutrinárias, sendo combatida por quase todos os doutrinadores, por se tratar de norma que afeta a segurança das relações jurídicas, ao dobrar o prazo que de cinco para dez anos, e isto tão somente com base na interpretação de um verbo, em completo arrepio aos princípios da segurança jurídica até aqui apresentados, e aos direitos de cidadania dos contribuintes. Um dos doutrinadores que refutam a tese em comento, e que, sem dúvida, merecer menção é Alberto Xavier, que assim disse:
253
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, p. 445. BARSANI, Margarete Gonçalves. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2010, p. 108. 255 Ibdem, pp. 108-109. 254
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A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da ampliação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173 resulta ainda evidente da circunstância de o § 4º do art. 150 determinar que se considera ‘definitivamente extinto o crédito’ no término do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o lançamento já não poderá ser efetuado em razão de já se encontrar ‘definitivamente extinto o crédito’? Verificada a morte do crédito no final do primeiro quinquênio, só por milagre poderia ocorrer sua ressurreição no segundo. 256
Eurico de Santi257 contesta a teoria sob três fundamentos específicos: i) que o verbo poder é mero modalizador da conduta lançar (tal como é proibido lançar, é permitido lançar, é obrigatório lançar), e não a própria conduta, motivo pelo qual, por si só, não produz sentido. Assim, “a norma que tem como consequência a decadência toma, como hipótese, o descumprimento da conduta de lançar, nunca a extinção do poder (permissão), que modaliza a conduta de lançar”; ii) este uso indevido do verbo modalizador poder como objeto de conduta gera uma recursividade, eis que após o transcurso de cada período de 5 anos a Fazenda perderia o seu poder lançar, dando início a novo prazo quinquenal, ao final do qual, novamente a Fazenda não poderá mais lançar, fazendo renascer novamente o seu direito, e assim sucessiva e infinitamente; iii) além de não ser possível a aplicação de duas regras extintivas cumulativamente, diz o autor, o § 4º do art. 150 do CTN não é aplicável quando não há pagamento antecipado, tendo em vista que não há o que se homologar. De tanto ser combatida, e, após a edição da Lei Complementar 118/05 – que pôs fim a Tese semelhante que favorecia o Contribuinte nas ações de repetição de indébito – Os julgados mais recentes do STJ passaram a adotar um entendimento mais consentâneo com o caminho apontado com a doutrina majoritária, que Ricardo Alexandre258 sintetizou assim: a) Se o tributo não foi declarado nem pago, o termo inicial do prazo decadencial é o primeiro dia do exercício seguinte (aplicação do art. 173, I, do CTN); [...] b) Se foi realizado um pagamento, a Fazenda Pública tem o prazo de cinco anos, contados da data do fato gerador, para homologar 256
XAVIER, Alberto. Do lançamento. Teoria geral do ato, do procedimento e do processo tributário. 2º ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998 apud SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 731. 257 DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição no Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 133 – 141. 258 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário esquematizado. 3ª ed. São Paulo: Método, 2009, pp. 446-448.
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tal pagamento expressamente ou realizar eventual lançamento suplementar (de ofício), caso contrário, ocorrerá homologação tácita e o crédito estará definitivamente extinto (aplicação pura e simples do art. 150, § 4º do CTN); [...] c) Se o tributo foi declarado e não pago, não há que se falar em decadência, pois o crédito tributário estará constituído pela própria declaração de débito do contribuinte, sendo possível a imediata inscrição em dívida ativa e posterior ajuizamento da ação de execução fiscal (a preocupação passa, portanto, a ser com o prazo prescricional, contado a partir do vencimento do prazo para pagamento).
Importante destacar que uma vez que tais posicionamentos não foram sumulados, tal como ocorre com a Súmula Vinculante nº 08 que será estudada adiante, ainda existe insistência por parte do Fisco para que a Tese dos Dez Anos retorne. Mesmo com a consolidação, em março de 2008, do entendimento dos ministros quanto ao prazo máximo de cinco anos, uma decisão da 2ª Turma novamente desafiou os contribuintes ao conjugar artigos do Código Tributário Nacional e estender o prazo decadencial259, conforme segue a ementa: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO - ICMS - DECADÊNCIA PREQUESTIONAMENTO - EXISTÊNCIA - PRAZO DECADENCIAL DECENAL. 1. O Tribunal de origem abordou a questão da decadência do direito de o Fisco constituir o crédito tributário, na hipótese de lançamento por homologação, entendendo que o prazo respectivo é cinco anos. Assim, nada obstante a ausência de menção expressa dos dispositivos tidos por violados, houve seu prequestionamento. 2. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que, no caso de tributo lançado por homologação, em que não houve o pagamento antecipado, o prazo decadencial é contado cinco anos, após o fato gerador, mais cinco anos depois dessa data. Aplica-se conjuntamente os arts. 173, I e 150, § 4º do CTN. 3. Não ocorreu in casu a decadência do direito de constituir o crédito tributário, pois o período de apuração do ICMS, objeto do auto de infração, compreende-se entre junho de 1983 a setembro de 1985, enquanto que o mencionado auto de infração foi lavrado em 25.6.1990. Com efeito, houve o lançamento, por intermédio da lavratura do auto de infração, dentro do aludido prazo decenal. Agravo regimental provido.260 (Destacou-se)
259
CRISTO, Alessandro. STJ ressuscita prazo de dez anos para cobrar tributo. Revista Consultor Jurídico. 15/03/2009. Disponível em < http://www.conjur.com.br/2009-mar-15/stj-ressuscita-tese-fisco-dez-anoscobrar-tributos> Acesso em 22/09/2012. 260 STJ - AgRg no Ag 410358/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/05/2008, DJe 28/05/2008.
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A decisão que ressuscitou a discussão foi dada pela 2ª Turma do STJ em maio, sob a relatoria do ministro Humberto Martins. Por unanimidade, os ministros confirmaram que o direito de a Fazenda cobrar débitos atrasados expira só em dez anos a partir da data do fato gerador do tributo, contrariando entendimento que havia enterrado a Tese dos Dez Anos, pois até então, a jurisprudência dizia exatamente o contrário do que decidido pela 2ª Turma, que teria misturado entendimentos diversos para chegar a essa conclusão. Dois meses antes, a 1ª Seção do tribunal — que inclui a 1ª e a 2ª Turmas — resolveu a questão no sentido oposto. Conforme ementa: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO. APLICAÇÃO DO ART. 173, I, DO CTN. INEXISTÊNCIA DE PRAZO DECENAL PARA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CONCESSÃO DE LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. MEDIDA QUE NÃO IMPEDE A REALIZAÇÃO DO LANÇAMENTO. JURISPRUDÊNCIA DA PRIMEIRA SEÇÃO/STJ QUE SE FIRMOU NO MESMO SENTIDO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NA SÚMULA 168/STJ. EMBARGOS NÃOCONHECIDOS.261
A decisão da 2ª Turma no AgRg no Ag 410358/SP, acima citado, é um incidente isolado, pois em uma pesquisa feita no site do Superior Tribunal Justiça, se comprovou a pacificação do assunto tanto na 1ª Seção como na 1ª e 2ª Turmas. Importante destacar que com a edição da Lei nº 11.672, de 08/05/2008, que introduzido o sistema de julgamento uniforme de recursos repetitivos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, a questão foi pacificada, pois em 12/08/2009 foi julgado o REsp 973733/SC, de relatoria do então Ministro daquela Corte, Dr. Luiz Fux, cuja ementa, pela sua extrema importância, transcreve-se: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TERMO INICIAL. ARTIGO 173, I, DO CTN. APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS 261
STJ - EREsp 575991/SP, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/03/2008, DJe 07/04/2008 (negritado destaque).
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PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN. IMPOSSIBILIDADE. 1. O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito (Precedentes da Primeira Seção: REsp 766.050/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.11.2007, DJ 25.02.2008; AgRg nos EREsp 216.758/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 22.03.2006, DJ 10.04.2006; e EREsp 276.142/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 13.12.2004, DJ 28.02.2005). 2. É que a decadência ou caducidade, no âmbito do Direito Tributário, importa no perecimento do direito potestativo de o Fisco constituir o crédito tributário pelo lançamento, e, consoante doutrina abalizada, encontra-se regulada por cinco regras jurídicas gerais e abstratas, entre as quais figura a regra da decadência do direito de lançar nos casos de tributos sujeitos ao lançamento de ofício, ou nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em que o contribuinte não efetua o pagamento antecipado (Eurico Marcos Diniz de Santi, "Decadência e Prescrição no Direito Tributário", 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs.. 163/210). 3. O dies a quo do prazo quinquenal da aludida regra decadencial rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o "primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado" corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação, revelando-se inadmissível a aplicação cumulativa/concorrente dos prazos previstos nos artigos 150, § 4º, e 173, do Codex Tributário, ante a configuração de desarrazoado prazo decadencial decenal (Alberto Xavier, "Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro", 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2005, págs.. 91/104; Luciano Amaro, "Direito Tributário Brasileiro", 10ª ed., Ed. Saraiva, 2004, págs.. 396/400; e Eurico Marcos Diniz de Santi, "Decadência e Prescrição no Direito Tributário", 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs.. 183/199). 5. In casu, consoante assente na origem: (i) cuida-se de tributo sujeito a lançamento por homologação; (ii) a obrigação ex lege de pagamento antecipado das contribuições previdenciárias não restou adimplida pelo contribuinte, no que concerne aos fatos imponíveis ocorridos no período de janeiro de 1991 a dezembro de 1994; e (iii) a constituição dos créditos tributários respectivos deu-se em 26.03.2001. 6. Destarte, revelam-se caducos os créditos tributários executados, tendo em vista o decurso do prazo decadencial quinquenal para que o Fisco efetuasse o lançamento de ofício substitutivo. 7. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.262 262
STJ - REsp 973733/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/08/2009, DJe 18/09/2009.
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Portanto, para prestígio da segurança jurídica, a Tese dos Dez Anos (5+5) parece estar morta e enterrada.
7.2 Súmula Vinculante nº 08 Inicialmente, para fins didáticos, cabe comentar sobre o que seja Súmula Vinculante. O artigo 103-A da Constituição Federal, acrescentado pela Emenda Constitucional 45/2004 e regulado pela Lei nº 11.417, de 19/12/2006, dispõe que: Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (grifado) [...]
Com a inclusão desse dispositivo na Constituição, a súmula, antes simplesmente consultiva, agora pode ter efeito vinculante. Cláudio Carneiro263 destaca que “se está buscando assegurar o princípio da igualdade, evitando que uma mesma norma seja interpretada de formas distintas para situações fáticas idênticas”. O referido autor prossegue em sua explanação lembrando que ainda que a Súmula editada pelo Supremo tenha efeito vinculante, tal efeito somente é aplicável em casos de fatos idênticos, pois, se o juiz, ao constatar a ausência de similitude entre a matéria apreciada por ele no caso concreto e aquela objeto da súmula de efeito vinculante, poderá concluir, desde que devidamente fundamentado, pela não aplicação da súmula264. Feita está pequena apresentação da Súmula Vinculante, cabe analisar a primeira súmula deste tipo relacionada ao Direito Tributário, e que guarda interesse ao tema estudado neste trabalho, qual seja, a Súmula Vinculante nº 08. A Súmula Vinculante nº 8 do STF foi aprovada em 12/6/2008 e publicada em 20/6/2008, com o seguinte enunciado:
263
CARNEIRO, Cláudio. Processo Tributário Administrativo e Judicial. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 405. 264 Ibdem, pp. 405-406.
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São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei 1.569 /77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212 /91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário.
O art. 146, inciso III, alínea “b”, da Constituição Federal de 1988, conforme visto alhures, é bastante claro ao determinar que prescrição e decadência são matérias cujo tratamento deve ser feito por Lei Complementar. Igualmente visto antes, esse disciplinamento, atualmente, se acha contido nos artigos 150, § 4º, 173 e 174, todos do Código Tributário Nacional, o qual, como já dito, tem status de Lei Complementar. Mesmo diante da expressa previsão constitucional o legislador ordinário federal cuidou do assunto, fixando prazos de decadência e prescrição de 10 (dez) anos, ampliando em 05 (cinco) anos os prazos do CTN, relativamente ao crédito tributário de contribuições previdenciárias. A inconstitucionalidade de tais disposições era evidente, e há tempo vinha sendo proclamada pela doutrina265. O Superior Tribunal de Justiça, através de sua Corte Especial já havia se manifestado e reconhecido a inconstitucionalidade, conforme se vê na ementa abaixo: CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. DO ARTIGO 45 DA LEI 8.212, DE 1991. OFENSA AO ART. 146, III, B, DA CONSTITUIÇÃO. 1. As contribuições sociais, inclusive as destinadas a financiar a seguridade social (CF, art. 195), têm, no regime da Constituição de 1988, natureza tributária. Por isso mesmo, aplica-se também a elas o disposto no art. 146, III, b, da Constituição, segundo o qual cabe à lei complementar dispor sobre normas gerais em matéria de prescrição e decadência tributárias, compreendida nessa cláusula inclusive a fixação dos respectivos prazos. Consequentemente, padece de inconstitucionalidade formal o artigo 45 da Lei 8.212, de 1991, que fixou em dez anos o prazo de decadência para o lançamento das contribuições sociais devidas à Previdência Social. 2. Arguição de inconstitucionalidade julgada procedente.266
Já no âmbito do Supremo Tribunal Federal, os precedentes para a Súmula Vinculante em comento, foram os RE 560.626; RE 556.664; RE 559.882; RE 559.943, todos publicados em 2008, bem como o RE 138.284 e RE 106.217, sendo
265
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito tributário nas súmulas do STF e STJ. São Paulo: Atlas, 2010, 158. 266 STJ - AI no REsp 616348/MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/08/2007, DJ 15/10/2007, p. 210.
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estes últimos, respectivamente, publicados em 1992 e 1986267. Desta forma, era esperado que o Supremo se manifestasse pela inconstitucionalidade gritante, de maneira que o texto da súmula não causou grande surpresas, o que chamou atenção foi à questão da modulação de seus efeitos, conforme destaca Machado Segundo268: Não houve grande surpresa, portanto, quando o STF, apreciando a questão, confirmou o que a doutrina e os demais tribunais do país já vinham afirmando. A surpresa, em verdade, decorreu da “modulação” de efeitos feita pela Corte, que afirmou inconstitucionais os prazos mais longos previstos em tais diplomas legais, mas deu efeito ex nunc a essa declaração, de modo a não permitir que contribuintes que já tivessem pago (em 19/6/2008) a contribuição cobrada nos moldes das normas consideradas inconstitucionais pudessem pleitear a restituição. Foram beneficiados apenas aqueles ainda não autuados, ou os que, não obstante já autuados, não tivessem pago a quantia correspondente, seja por conta de parcelamento ainda em curso, pela apresentação de impugnações ou recursos administrativos, propositura de ação judicial, etc.
O citado autor, bem como a maioria dos contribuintes, se sentiram lesados pela modulação de efeitos, que não possui justificativa nenhuma, senão que favorecer a Fazenda Pública. De qualquer modo, a Súmula Vinculante nº 8 serve como instrumento de pacificação social, ainda que com efeitos doravante a sua edição.
7.3 Prazo para Redirecionamento da Execução em Face dos Sócios Não obstante a sociedade empresária possuir personalidade jurídica distinta da de seus sócios, podem eles vir a ser responsabilizados pelos débitos tributários gerados pela sociedade que titularizam. A cada ano que passa, o Fisco busca cada vez mais obter êxito no recebimento de seus créditos, com o uso da Desconsideração da Personalidade Jurídica das empresas, redirecionando os executivos fiscais contra os sócios, numa total desconsideração dos dispositivos legais que regulam a matéria.
267
Informações obtidas junto ao site do STF disponível em < http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=8.NUME.%20E%20S.FLSV.&base=base SumulasVinculantes> Acesso em 22/09/2012, sendo possível, inclusive, consultar a íntegra de cada acórdão. 268 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito tributário nas súmulas do STF e STJ. São Paulo: Atlas, 2010, 158.
88
No
campo
do
direito
tributário,
o
fundamento
legal
de
referida
responsabilização encontra-se estampado nos artigos 134, VII e 135, III, do CTN que dispõem, in verbis: Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis: [...] VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas. Parágrafo único. O disposto neste artigo só se aplica, em matéria de penalidades, às de caráter moratório. Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: [...] III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Assim, a desconsideração da Personalidade Jurídica das sociedades empresárias em matéria tributária é medida excepcional, que só pode ser admitida após a comprovação de uma das hipóteses previstas no citado dispositivo legal, não podendo ser aplicada a bel-prazer do Fisco. Os principais abusos do Fisco consistem na questão da não comprovação dos requisitos estabelecidos na Lei, entre eles, o redirecionamento é requerido sem qualquer prova de omissões, bem como de atos praticados com excesso de poderes ou infração de Lei, contrato social ou estatutos. Pois, a simples inadimplência quanto ao pagamento de tributos não é capaz de gerar a responsabilização dos sócios, nestes termos a Súmula 430 do STJ: Súmula 430: O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sóciogerente.
E ainda, o Fisco redireciona a execução em face de sócio que sequer participou da relação jurídica geradora do crédito tributário, e cujo nome sequer constou da Certidão de Dívida Ativa (CDA). Mas, o abuso que interessa ao presente estudo é a questão do prazo prescricional que o Fisco tem para redirecionar a execução em face dos sócios.
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É importante destacar que existe discussão em andamento sobre a aplicação da prescrição quinquenal em relação à possibilidade do Fisco redirecionar a execução em face dos sócios e administradores. A discussão transcorre através do REsp nº 1201993/SP de relatoria do Ministro Herman Benjamin, da Segunda Turma do STJ, sendo que o assunto debatido está ementado no site de consulta do andamento processual como: DIREITO TRIBUTÁRIO - Obrigação Tributária - Responsabilidade tributária Responsabilidade Tributária do Sócio-Gerente / Diretor / Representante269. O cerne da discussão está na impossibilidade do redirecionamento da Execução Fiscal em face dos sócios e administradores após o transcurso do prazo de 05 (cinco) anos do ajuizamento da Execução. O julgamento do referido REsp nº 1201993/SP estava designado para o dia 14 de setembro de 2011, porém, foi retirado de pauta por pedido de vista pelo Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, sendo que aguardam os Ministros Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Cesar Asfor Rocha, Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima e Humberto Martins. Destaque-se que uma vez que o referido Recurso Especial foi escolhido como representativo para a decisão de Recursos Repetitivos nos termos do art. 543-C, do Código de Processo Civil, por cautela, a jurisprudência tem suspendido o trâmite de ações e recursos que versem sobre o mesmo tema, conforme é possível na ementa abaixo: Trata-se de recurso especial interposto com fundamento no artigo 105, III, da Constituição Federal contra acórdão de Órgão Colegiado desta Corte versando sobre a prescrição para o redirecionamento da execução fiscal. Considerando a seleção do REsp nº 1201993 como recurso repetitivo, que se encontra sob análise do Superior Tribunal de Justiça, impõe-se, consoante a sistemática prevista no art. 543-C do CPC e artigos 307 a 313 do Regimento Interno do TRF 4ª Região, o sobrestamento do presente recurso até que aquela Corte Superior se manifeste sobre o mérito da referida questão. Remetam-se os autos à Secretaria de Recursos. Intimem-se.270 (grifado e negritado)
269
Consulta disponível no site do STJ em < http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/detalhe.asp?numreg=201001275952&pv=010000000000&tp=5 1> Acesso 22/09/2012. 270 TRF4 - 00048 RECURSO ESPECIAL EM AC Nº 0012960-63.2010.404.9999/RS (negritado e grifado)
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Existe a possibilidade de o referido Recurso ser julgado ainda este ano (2012), e assim que o STJ se posicionar nesta questão, poder-se-á verificar se haverá prestígio ao princípio da segurança jurídica.
7.4 Cabimento da Exceção de Pré-Executividade na Execução Fiscal De nada adiantaria os institutos da decadência e da prescrição, como corolários do princípio da segurança jurídica, se não houvesse um instrumento processual que possibilitasse sua arguição. Neste sentido, se faz relevante o destaque para a Exceção de Pré-Executividade271. Ao propor a Execução Fiscal a Fazenda Pública submete, necessariamente, sua petição inicial ao crivo do Juízo Executor, a quem compete aferir a respeito da sua viabilidade formal, e, em seguida, examinar a existência dos pressupostos processuais e das condições da ação, em suma: ao Juízo da admissibilidade, tal como acontece com as exordiais dos ritos ordinários272. A Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80) estabelece como regra, em seu art. 16, que os Embargos à Execução é meio hábil para o devedor opor-se à execução. Assim sendo, uma vez que a LEF é Lei Especial e se sobrepõe ao Código de Processo Civil, os Embargos somente podem ser oferecidos após a garantia do juízo. Diante da previsão legal, em tese, na execução fiscal, o devedor não pode defender-se diretamente da tentativa de constrição de seu patrimônio sem antes garantir o juízo. No entanto, uma vez que a decadência e a prescrição são matérias de ordem públicas, e podem, inclusive, serem reconhecidas de ofício, a Exceção de Pré-Executividade serve como importante ferramenta na defesa dos interesses do executado273. A ministra Denise Arruda, relatora do recurso (REsp 1.104900), ressaltou ser certo que, apesar de serem os embargos à execução o meio de defesa próprio da execução fiscal, a orientação do STJ firmou-se no sentido de admitir a exceção de 271
O Autor sequer entrou na discussão sobre o nome da Defesa Processual, ou seja, achou por bem não discutir se é Objeção ou Exceção de Pré-Executividade, e tomou tal decisão respaldado no fato do STJ ter adotado o nome Exceção de Pré-Executividade, o que por hora, basta. 272 CARNEIRO, Cláudio. Processo Tributário Administrativo e Judicial. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, pp. 246-247. 273 LOPES, Mauro Luís Rocha. Processo Judicial Tributário. 6ª ed., rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2011, pp. 122-126.
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pré-executividade nas situações em que não se faz necessário prazo para produção de provas, ou em que as questões possam ser conhecidas de ofício pelo magistrado, como as condições da ação, os pressupostos processuais, a decadência, a prescrição, entre outras. Com base nesse julgamento e nos vários precedentes, a Seção aprovou a Súmula nº 393, segundo a qual: A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.
Machado Segundo274 ressalta que “podem ser citadas como exemplos de situações nas quais a exceção de pré-executividade pode ser manejada, em matéria tributária, aquelas nas quais se acha consumada a decadência, ou a prescrição”. Portanto, diante da ocorrência da extinção do crédito tributário nos termos do art. 156, V, do CTN, ou seja, pela ocorrência da decadência ou da prescrição, e da existência de execução fiscal cobrando tal crédito, o executado pode se valer da Exceção de Pré-Executividade com fundamento na Súmula 393 do STJ, sendo está uma ferramenta capaz de assegurar a segurança jurídica quando o crédito tributário estiver extinto pelo transcurso do tempo.
274
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Direito tributário nas súmulas do STF e STJ. São Paulo: Atlas, 2010, p. 226.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS No campo jurídico das obrigações, quer sejam as de origem no direito privado ou no direito público, tal como as obrigações tributárias, tem-se atribuído grande relevância à questão do tempo e dos institutos que tratam da extinção dos respectivos prazos estipulados para o exercício dos remissivos direitos, bem assim para a interposição de ações que garantam às pessoas o gozo de suas pretensões resistidas. Os institutos da decadência e prescrição, firmados nos pressupostos da inércia e do tempo, são limites estabelecidos pelo próprio ordenamento jurídico, e uma conquista que traz segurança jurídica, para que as relações jurídicas não se perpetuem, estabilizando-se no tempo. No Direito Tributário é concedido tanto à decadência, quanto à prescrição a capacidade de extinguir o crédito tributário, sendo que na primeira, fulmina-se a possibilidade do lançamento, e na segunda, ao Fisco fica vedada a possibilidade de exigência, e como estudado, em qualquer das hipóteses o crédito tributário da respectiva Fazenda Pública desaparece, deixa de existir e não serve para mais nada, tanto que nos casos de pagamento de crédito prescrito, o contribuinte tem direito a repetição do indébito. Ocorrido o fato gerador nasce à obrigação tributária, e o lançamento é imprescindível para que surja o crédito tributário, este último deve ser exigido, cobrado em prazo razoável. Não é o que ocorre na prática, como visto alhures, o Fisco demora anos e mais anos para lançar ou propor as ações competentes, e quando são propostas, às vezes se arrastam por diversos anos, contribuindo para um cenário de incerteza e insegurança, razão pela qual se destaca a importância da decadência e da prescrição como institutos que trazem a tão almejada segurança jurídica. Desta forma, onde houver ordenamento jurídico, haverá sempre a decadência ou a prescrição como formas de extinção do direito. Tais institutos podem ser vistos como iníquos pelo credor inerte, mas, sem dúvidas, são vistos como instrumento de justiça por devedores impossibilitados de arcarem com suas obrigações tributárias, quer seja por razões econômicas, quer seja pela dura carga tributária imposta.
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Embora não abordado no presente trabalho, não se pode deixar de mencionar que tais institutos também socorrem ao Fisco, quando se trata, por exemplo, do direito de repetição de indébito pelos contribuintes. Neste trabalho, diante da amplitude do tema, optou-se por delimitar o estudo da decadência e da prescrição em face do Fisco, buscando-se verificar a existência das posições doutrinárias e jurisprudenciais que fossem mais benéficas ao contribuinte, nunca se eximindo, ainda que superficialmente, de confrontar com as posições Pro-Fisco que são igualmente defendidas por muitos. Metodicamente analisaram-se dois direitos inerentes ao Fisco, quais sejam, (i) o direito do Fisco praticar o lançamento tributário; e (ii) o direito do Fisco cobrar o crédito tributário. Mais especificamente, procurou-se enfocar as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça, que vem inovando a jurisprudência no que tange à interpretação dos dispositivos do Código Tributário Nacional, desta forma chegou-se a alguns resultados de pesquisa que trouxeram luz sobre as principais indagações propostas: - Sobre o ato do lançamento: Digno de toda relevância é o lançamento tributário, pois como ficou demonstrado ao longo do presente estudo, no Direito Tributário existe um evento marcante e significativo que separa, de forma nítida, os prazos decadenciais e prescricionais, evento este que é exatamente o lançamento tributário, sendo impossível a sobreposição dos referidos prazos. Desse modo, antes que o ato de lançamento seja efetuado, só se pode cogitar do prazo de decadência e, depois de realizado, apenas terá sentido pensar no prazo de prescrição, o que faz concluir que para haver uma adequada interpretação da doutrina e dos decisórios de nossos tribunais, é necessário um conhecimento aprofundado do ato do lançamento tributário, em especial do lançamento dito por homologação. - Sobre a aplicação da decadência e da prescrição: Os institutos da decadência e da prescrição previstos no CTN, diferentemente do que se verifica na regra geral do direito privado (CC/02), possuem especificidades e particularidades próprias, aplicáveis ao Direito Tributário, e que devem ser observadas no estudo da influência do tempo na extinção do crédito tributário.
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Merece destaque o fato de que a distinção dos institutos, feita pelo objeto, tal qual preconiza o direito civil, perde relevância no direito tributário, uma vez que no inciso V do art. 156 do CTN, está determinado expressamente que tanto a decadência quanto a prescrição extinguem o crédito tributário, significando dizer que o objeto da prescrição em matéria tributária não se resume a atingir apenas a ação ou a pretensão, como queiram, mas também o próprio direito, como ocorre na decadência. - Sobre a competência legislativa: Restou claro que nos termos da alínea “b”, inciso III, do art. 146 da CF/88, cabe a Lei Complementar tratar sobre normas gerais de decadência e prescrição, tanto que a estuda Súmula Vinculante nº 8 (STF), possui fundamento nesta premissa. Têm-se entendido que regras de aplicação, como a prevista no art. 40 da LEF, não ferem a competência legislativa supramencionada, à medida que não tratam de prazos extintivos, mas tão somente regulam institutos e prazos já previstos no CTN, que como visto, apesar de ser formalmente Lei Ordinária foi recepcionado pela CF/88 com força de Lei Complementar. - Sobre as hipóteses de decadência contra o Fisco: O
ponto
de maior destaque,
diz respeito às inovações legais e
jurisprudenciais acerca do prazo decadencial que o Fisco dispõe para lançar os tributos sujeitos ao lançamento por homologação, questionando se é aplicável o marco inicial disposto no art. 150, § 4º, do CTN ou o art. 173, inciso I, do mesmo Códex, ou a cumulação destes. Conclui-se que se aplica ao tributo sujeito a homologação o art. 154, § 4º, iniciando-se a contagem do prazo a partir do fato gerador, em se tratando do disposto no art. 173, I, do CTN, aplica-se aos tributos sujeitos a lançamento de ofício, ou seja, aplica-se a regra geral nos casos em que o lançamento por homologação se torna de ofício pela constatação de irregularidade pelo Fisco, jamais devendo haver cumulação dos prazos, conclusão está adotada pelo STJ e que derrubou por terra a Tese dos Dez anos. - Sobre as hipóteses de prescrição contra o Fisco: Em relação à prescrição, os pontos de maior polêmica são referentes a constituição definitiva do crédito tributário, portanto, o marco inicial da contagem do prazo prescricional de 05 (cinco) anos, bem como a possibilidade de aplicação da
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prescrição intercorrente no processo administrativo, uma vez que ficou clara a sua aplicabilidade no processo judicial. Pode-se dizer que as duas questões relevantes, acima citadas, estão vinculadas, e que embora existam posições pro-contribuinte, como visto alhures, a maioria da doutrina e da jurisprudência tem entendido que entre o lapso de tempo do lançamento impugnado e a sua constituição definitiva, não corre qualquer prazo extintivo de crédito, nem de decadência, nem de prescrição, razão pela qual, entende tal posição que não há se falar em prescrição intercorrente no processo administrativo. - Sobre o reconhecimento da extinção do crédito tributário pela influência do tempo: Restou demonstrado que, no Direito Tributário, tanto a decadência como a prescrição podem ser reconhecidas de ofício, em qualquer momento e instância, tanto pela autoridade judiciária quanto pela própria autoridade administrativa, tanto que a prescrição assim podia ser reconhecida mesmo antes das alterações do CPC e do CC/02, independente de invocação da parte interessada, e isto com fundamento nos artigos 113, § 1º, e 156, inciso V, ambos do CTN, o que evita maior desgaste da máquina pública em busca de um direito já extinto, e traz segurança jurídica a milhares de devedores que não possuem condições de liquidar seus débitos fiscais. - Sobre a aplicação dos institutos da decadência e da prescrição tributária nos Tribunais: Conclui-se, pela exposição de apenas alguns temas discutidos nos Tribunais, que a previsão da edição de Súmulas Vinculantes, trazida pela Emenda Constitucional 45/2004, que acrescentou o art. 103-A na Carta Magna de 1988, e, principalmente, pela promulgação da Lei nº 11.672/2008 que acrescentou o art. 643C, no CPC, trazendo previsão do julgamento de recurso representativo de controvérsia, para por fim aos recursos repetitivos, que nosso judiciário possui subsídios e instrumentos para pacificar temas tormentosos, e que o julgamento de tais controvérsias poderá trazer a tão esperada segurança jurídica. Por fim, percebe-se que o ordenamento jurídico brasileiro não irá mais tolerar a inércia do Fisco, que promete ser sancionado com a extinção de milhões em crédito tributário, se não exercer seu direito nos prazos razoavelmente previstos em
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nossa Legislação, o que, em última instância, favorece o contribuinte que pode gozar de segurança jurídica. Portanto, verificou-se tanto na doutrina como na jurisprudência uma forte defesa do princípio da segurança jurídica, o que consequentemente significa uma proteção ao contribuinte que, salvo na questão da demora do processo administrativo, goza de meios para se impor contra a demora do Fisco.
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