9 minute read

CONSUMO E DESCARTE DE PRODUTOS TÊXTEIS NA CIDADE DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS

Thiago Mioni de Godoi Vieira; Universidade Estadual de Londrina; thiago.mioni.godoi@uel.br Suzana Barreto Martins; Universidade Estadual de Londrina; suzanabarreto@uel.br Fernanda de Oliveira Massi; Universidade Estadual de Londrina; fernanda.massi@uel.br

Resumo: Este ensaio aborda os resultados das pesquisas realizadas na cidade de São José dos Campos-SP, a respeito do consumo e descarte de resíduos têxteis pós uso. Para tal, valeu-se de dados obtidos a partir de pesquisa desk por meio de questionário disponibilizado na plataforma “Google Forms”, bem como de dados fornecidos pela URBAM e pelo FSS.

Palavras-chave: Resíduos têxteis, sustentabilidade, economia circular.

INTRODUÇÃO

De acordo com levantamento realizado, 8% de todo o resíduo sólido da cidade de Londrina que é encaminhado para o aterro sanitário é resíduo têxtil, o que equivale a 8.884 toneladas descartadas anualmente (PMGRIS, SEMA, 2022). Por sua vez, Ramos (2019) ressalta que uma cooperativa da cidade de Londrina, localizada no norte do Paraná, recebe mensalmente mais de uma tonelada deste resíduo, representando, portanto, uma quantidade alarmante de resíduo descartado; mas também uma oportunidade econômica de reinserção deste material na cadeia produtiva, por meio de ações que visem a sustentabilidade. Dessa forma, o grupo de pesquisa Design, Sustentabilidade e Inovação - DeSIn desenvolveu o Banco de Resíduos Têxteis – BRT em uma cooperativa da cidade. O BRT consiste em um sistema de coleta, separação, processamento e venda deste material, hoje em fase de implementação em uma cooperativa de materiais recicláveis de Londrina, com objetivo de solucionar um problema ambiental, gerar renda para os catadores e reinserir o resíduo têxtil desde a perspectiva da economia circular. Um dos aspectos do BRT é sua replicabilidade, uma vez que o modelo foi desenvolvido para ser passível de implementação em outras cidades brasileiras. Para averiguar sua replicabilidade em outros contextos, foi realizada pesquisa inicial referente a quantidade de resíduos têxteis descartados pela população no interior de São Paulo, na cidade de São José dos Campos.

DESENVOLVIMENTO

Para analisar a possibilidade de implementar o modelo BRT em São José dos Campos, foram realizadas visitas à Cooperativas de reciclagem, coleta de dados sobre a forma em que se dá o descarte têxtil bem como informações a respeito das doações realizadas na cidade, além de suas respectivas quantidades. Para tal, contou-se com dados oriundos do questionário realizado pelo “Google Forms”, URBAM (Urbanizadora Municipal S.A.) e do FSS (Fundo Social de Solidariedade).

O FSS do município de São José dos Campos é uma entidade pública de apoio social para populações que se encontram em vulnerabiiade social, com o propósito de contribuir na costrução de uma sociedade mais justa, igualitária e solidária por meio do incentivo a prática da generosidade e apreço ao próximo. Para tanto, como forma de salientar e complementar essa pesquisa, uma vez que não há apenas o descarte como meio para destinar as vestimentas não utilizadas, foram coletados alguns dados junto a instituição supracitada no que tange ao número de doações, as regiões da cidade que mais são beneficiadas, a ocorrência das campanhas e as entidades parceiras que auxiliam na realização efetiva da doação. O Centro de Distribuição, local onde são recolhidas as doações dos munícipes, localiza-se na região norte de São José dos Campos e conta com mais de 110 entidades beneficentes de apoio social, como a Sociedade São Vicente de Paulo ou Vicentinos, Obras Sociais e Assistenciais, Comunidade Espírita Maria João de Deus (CEMAJODE), Tenda de Umbanda Mãe Maria e Ação Solidária Adventista (ASA). Ademais, além das entidades, durante o período de Campanha do Agasalho, entre os meses de maio a julho, o FSS conta com lojas solidárias instaladas pelo governo municipal em escolas de ensino fundamental nas mais diversas regiões da cidade e distritos. A principal intenção dessa proposta é entregar ao público vulnerável a oportunidade de escolher as peças que deseja, fazendo com que se sinta acolhido e aconchegado.

Após contato com as cooperativas de reciclagem, constatou-se que não há uma grande quantidade de têxteis que chegam até elas bem como uma grande dificuldade em as contatar para agendar uma visita ao local. Assim, foi necessário solicitar dados fornecidos diretamente da Urbanizadora para verificar a existência de algum órgão especializado em cuidar deste tipo de resíduo e da análise da quantidade que chega até os aterros sanitários (análise gravimétrica), quais as regiões da cidade que mais produzem esse tipo de resíduo, o estado que estes chegam e se já houve algum tipo de problema no aterro sanitário originário do descarte incorreto dos resíduos têxteis. Foi solicitado também para FSS dados sobre a doação de roupas (vestimenta, cama e banho) e qual região mais recebe as doações e qual mais as realiza.

Ademais, o questionário realizado virtualmente teve como objetivo averiguar como os cidadãos lidam com o descarte de seus têxteis e como é o seu consumo. A pesquisa contou com perguntas diretas de múltipla escolha onde os próprios residentes da cidade cederam informações a respeito.

RESULTADOS

Por meio do questionário foram analisadas as relações de consumo entre a pessoa e a vestimenta, valendo-se de perguntas específicas como a exemplo: “Qual peça de roupa é mais consumida?; Qual a mais descartada?; Quantas peças em média são compradas?; Quantidade de peças descartatadas e como são descartadas?”; questionamentos esses relevantes para alcançar os resultados esperados.

Foram coletadas 115 respostas sendo que destas, 85% afirmaram que a peça mais consumida são camisetas ou camisas, esse padrão também é observado em relação às peças mais doadas, onde 70% dos respondentes alegaram descartar mais camisas e camisetas. 66% informaram adquirir entre uma e três peças por período (bimestral), em contrapartida são descartadas entre 4 a 6 peças, segundo 39% dos entrevistados; demonstrando assim que o descarte é maior que o consumo.

Em relação a periodicidade, 37% alegaram comprar roupas semestralmente, enquanto o descarte é realizado, em sua maioria, anualmente, conforme 50% das respostas coletadas. O descarte das peças, segundo 82 dos respondentes, observou-se que é realizado somente por meio de doações, seguido de 31 pessoas que doam e mas também jogam no lixo, mas não foi informado quantas peças possuem este destino.

Por outro lado, ressalta-se que esse dado pode ser alterado pela própria pessoa entrevistada seguindo o pensamento de que “doar é mais bem visto pela sociedade”.

Ademais realizou-se pesquisa via e-mail com a urbanizadora do município de São José dos Campos, com objetivo de entender como se dá o descarte têxtil na cidade. Segundo a instituição não há um descarte específico de têxteis na cidade, logo os têxteis são destinados ao lixo comum e seguem até o aterro sanitário ao mesmo tempo em que reforçou que todas as coletas (seletiva, comum e de limpeza urbana) somam um total de 793.605 kg de lixo têxtil que são destinados ao aterro todos os meses, o que equivale a um pouco mais de 10% de todo o lixo que chegam aos centros de coleta sem contabilizar os têxteis que não chegam até tais centros de coleta, uma vez que não há dados sobre estes. Segundo a URBAM esses têxteis pós uso chegam em péssimas condições de uso, considerando que são destinados em lixo comum e acabam contaminados por líquidos, químicos e restos de alimentos e como não ocorre a separação destes, seguem para o aterro, segundo

a empresa. De outro lado, não houve relatos de problemas com esses resíduos, a exemplo da obstrução dos dutos que drenam o chorume. Também foi solicitado uma pesagem individual de cada região da cidade, mas não obteve-se dados a respeito.

O gráfico abaixo apresenta a quantidade de roupas doadas ao FSS de janeiro ao mês de novembro de 2021.

Figura 1: Quantidade de roupas doadas ao FSS de janeiro à novembro de 2021.

▪ Peças de Roupa 88%

▪ Pares de Sapato 8%

▪ Roupas de Cama, Mesa e Banho 4%

Fonte: Autores (2022)

Até o mês de novembro, segundo a diretoria do FSS, a instituição recebeu aproximadamente noventa mil peças de roupas, como camisetas, bermudas e calças, além de oito mil e quinhentos pares de sapatos e quatro mil e seiscentas peças de roupa de cama, banho e mesa. O recebimento de tais itens ocorre de forma diária, tendo elevação durante o período de Campanha do Agasalho, cabendo corroborar que foram recebidos aproximadamente 270 peças de roupa, 25 pares de sapato e 13 peças de cama, mesa e banho por dia durante os meses de janeiro a novembro de 2021. Ademais, a doação per capita no município foi alredor de 0,123 peças de roupa, de acordo com o censo 2020 do IBGE, onde a cidade conta com 729.737 habitantes; o que corresponde a doações de 123 peças de roupas para cada cada mil habitantes, sendo que as regiões mais assistidas da cidade são a Leste e Sul, que mais recebem as doações do FSS.

Uma importante inovação no FSS foi o desenvolvimento do aplicativo e-SGS (Sistema Gestor de Solidariedade) lançado em 2018. A ferramenta gerencia, segundo a jornalista Bianca de Aquino, o destino de todas as doações e contabiliza os donativos recebidos no Centro de Distribuição. A proposta principal do sistema é a aproximação dos doadores às entidades, com o intuito de aumentar a credibilidade sobre o uso do que é doado. Os dados coletados são disponibilizados semestralmente no site da instituição com objetivo de fornecer transparência às ações sociais realizadas na cidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos dados apresentados, foi possível concluir que a replicabilidade do Banco de Resíduos Têxteis da cidade de Londrina que se encontra em fase de implementação, pode ser viável e vantajoso na cidade de São José dos Campos, uma vez que há uma grande quantidade de resíduo têxtil sendo encaminhado para o aterro sanitário mensalmente, o que soma quase 10 mil toneladas de material têxtil anualmente. Entretanto faz-se necessário uma análise mais aprofundada de dados no que tange a quantidade de resíduo oriundo de cada região da cidade, pois para a localização de um BRT, é necessário que esteja próximo aos locais onde são originados a maior quantidade de resíduo têxtil. Por outro lado, é também uma estratégia necessária para que não dificulte o acesso oriundo das outras regiões, além de um possível mapeamento das doações para que seja observado o destino final das peças doadas (pós-uso). Para finalizar, ressalta-se também a importância do papel do poder público em promover a criação de sistemas eficientes de coleta e logística reversa de resíduos têxteis, ainda não contemplados pela PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos), no sentido de ampliar o tempo de vida dos aterros sanitários, traduzindo em economia para os municípios, ao mesmo tempo em que minimiza os impactos ambientais destes resíduos no meio ambiente.

Portanto, é premente a necessidade de investimento em pesquisas nessa área, promover aproximação da academia e setor privado, bem como a criação de políticas públicas que visem a sustentabilidade e o destino correto desse material têxtil, que pode e deve ser tratado para que haja o descarte correto e a possibilidade de reuso do mesmo com foco na economia circular.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DOA SÃO JOSÉ. Entidades. Doa São José, 2022. Disponível em: http://doasaojose.com. br/entidades. Acesso em 15 de junho de 2022

SEMA. Repositório Londrina, 2022. Disponível em: http://repositorio.londrina.pr.gov.br/ index.php/menu-ambiente/dca/residuos/40705-anexo-ii-relatorio-gravimetria-realizada-na-ctr/file. Acesso em 15 de junho de 2022

Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, PMGRIS, 2021. Disponível em: https://portal.londrina.pr.gov.br/gestao-de-residuos-ambiente/pmgirs. Acesso em 15 de junho de 2022

MARTINS, Suzana Barreto.; SAMPAIO, Cláudio Pereira de. Grupo de Pesquisa em Design, Sustentabilidade e Inovação (DeSIn). Logística reversa em resíduos têxteis industriais e pós-consumo: proposta de sistemas com base em design. 2017. Acesso em 03 de junho de 2022. Disponível em: https://drive.google.com/drive/u/0/folders/1WGsmRlIZnTzUOlfb3PcyTY49Dmb-eeoy

RAMOS, Brunna G.; SAMPAIO, Claudio Pereira de; MARTINS, Suzana Barreto. Aplicabilidade do conceito de Economias Distribuídas no Banco de Resíduos Têxteis, 2019. In: 15º Colóquio de Moda, 12º Edição Internacional, Anais... Porto Alegre, 2019.

SANTOS, Aguinaldo dos; CESCHIN, Fabrizio; MARTINS, Suzana Barreto; VEZZOLI, Carlo. A design framework for enabling sustainability in the clothing sector.In: Latin American J. Management for Sustainable Development, Vol. 3, No. 1, 2016. pp. 47-65. Inderscience Publishers, 2016.

This article is from: