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LIKES, TRENDS E FAST FASHION A MOEDA DE TROCA DO MUNDO PÓS-PANDEMIA

Juliano Gabriel Michelli; Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC); julianomichelli@outlook.com

Resumo: As redes sociais influenciam diretamente na vida social de seus usuários, porém por trás do glamour dos likes, existem problemas de proporções interseccionais, o trabalho busca olhar de forma consciente para o contexto envolvendo o uso patológico das Redes Sociais, o impacto do Fast Fashion e a Ansiedade gerada pela busca do glamour digital na vida off-line.

Palavras-chave: Transtornos de Ansiedade. Moda. Uso de Mídias Sociais. Saúde Mental. Fast Fashion.

FEAR OF MISSING OUT

Vivemos em uma época de urgências, onde as pessoas não conseguem ficar desconectadas e nem sozinhas, sentem a necessidade de sempre consumir algo e consumir rápido. A fear of missing out (FOMO), é um fenômeno da atualidade, em português significa “medo de ficar de fora”, ele se caracteriza por uma necessidade constante de saber o que outras pessoas estão fazendo, sempre associado a sentimentos de ansiedade, que impactam fortemente as atividades de vida diária. Pessoas com FOMO sentem a necessidade de sempre estarem conectadas, se atualizando nas redes sociais, esses comportamentos acabam causando ansiedade, estresse e desconforto (ROZGONJUK, 2020).

FOMO tomou proporções maiores no pós-pandemia, o isolamento social fez as pessoas ficaram mais reclusas e voltadas para dentro de si, usando as redes sociais para ter o mínimo de contato com o mundo externo, nessas situações, não havia um contato social direto, causando uma ansiedade constante de verificar as redes sociais e se ficar por dentro das trends. A FOMO é o princípio de todo o problema, com o isolamento social, redes sócias e pós-pandemia, os usuários acabam desenvolvendo Transtornos reais, associando o medo e ansiedade ao uso patológico das redes sociais.

A ANSIEDADE, A HERANÇA PÓS PANDEMIA

A saúde mental é um fator em destaque na atualidade, segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS (2022), no primeiro ano da pandemia de COVID-19, a

prevalência global de ansiedade e depressão aumentou em 25%, tornando-se assim importante ser estudada (OPAS, 2022). Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM - 5) (2014), existem diversas categorias de Transtornos de Ansiedade, podemos citar a Fobia social, Síndrome do Pânico, Agorafobia, Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) entre outros, todos compartilham características de medo e ansiedade excessivos e perturbações, “Medo é a resposta emocional a ameaça iminente real ou percebida, enquanto ansiedade é a antecipação de ameaça futura” (DSM – 5, 2014 p.181), o que diferencia eles são as situações, gatilhos que acionam esse medo, ansiedade ou comportamento.

Nos transtornos de Ansiedade as preocupações são sempre maiores, levando o indivíduo a ter mal desempenho social, no trabalho, na escola. O corpo pode também manifestar sintomas físicos, incluindo irritabilidade, sudorese excessiva, perturbações no sono, entre outros.

USO PATOLÓGICO DAS REDES SOCIAIS

Concomitante com o pós-pandemia, aumentou-se a adesão das redes sociais e tecnologias como ferramentas eficientes para promover a comunicação, elas permitem a criação de meios de comunicação mais interativos, e menos limitações de espaço e tempo, tornando a comunicação mais rápida e flexível. Um estudo promovido pela empresa We are Social (2017,s.p), apontou que o número de jovens conectados nas redes sociais, teve um aumento de em média, três horas por dia, aplicativos como TikTok e Instagram ganharam forças e grandes seguidores. Esse crescimento exacerbado fez um grande número de usuários ganharem a vida como Influencers. Esse novo ramo de profissão acaba ditando padrões de beleza e perfeição, criando até mesmo um clima de competição em relação à estética corporal, gerando uma forte não aceitação nos jovens que utilizam dessas redes. (AMPER, 2021)

O mesmo estudo aponta que “90% das jovens estão descontentes com o corpo, no Instagram são publicados cerca de 10 milhões de novas publicações a cada hora, o que gera infinitas comparações baseadas em aparência” (AMPER, 2021,s.p), isso levou o Instagram em 2019 ocultar as curtidas nas publicações da plataforma, com o intuito de minimizar os efeitos colaterais e fazer seus usuários se sentirem mais livre para publicar seu conteúdo (O GLOBO, 2019). Um estudo realizado pela instituição Royal Society for Public Health (RSPH), apurou que as redes sociais mais usadas, como TikTok, Instagram e Snapchat, provocam efeitos positivos ou nocivos à saúde humana, a diretora-executiva da RSPH comenta “A mídia social tem sido descrita como mais viciante do que cigarros e ál-

cool […] ambas as plataformas são muito focadas na imagem e parece que podem estar gerando sentimento de inadequação e ansiedade.” (CRAMER, 2017)

FAST FASHION, CONSUMISMO E IMPACTO SOCIAL

O psicólogo Abraham Maslow (2013, p.12) entende que “o ser humano tem necessidade de pertencer a um grupo, amar e ser amado, o que conhecemos como necessidade de pertencimento”. Na medida em que se está em um meio social, em que o consumo é idolatrado, sobretudo de roupa, o consumidor passa a reproduzir essa cultura automaticamente e inconscientemente. Isto é, vive com a preocupação de estar dentro das trends, justificando o alcance de marcas como a Shein crescerem e tornarem o fast fashion.

Dados analisados pelo Business of Fashion, atestam que “a Shein vem se tornando o maior varejista online, de 2018 para 2021, a marca cresceu exponencialmente sua receita em 700%, passando de US$2 para US$15,7 bilhões” (KENNEDY, 2022 s.p). Diariamente são liberados modelos novos dentro do seu site, com preços extremamente baixos quando comparados ao mercado e economia atual. A produção dessa marca é extremamente rápida, criando coleções completas em menos de uma semana.

Além da qualidade e durabilidade baixa das peças, fica o questionamento em saber o impacto da moda no adoecimento mental de uma geração. A Shein representa essa cultura em que vivemos imersos e pela qual somos bombardeados a todo tempo por diversos tipos de estímulos, tendências das passarelas e que estão à venda em tempo recorde, entrega rápida e preços baixos comparados ao mercado. Segundo Zygmunt Bauman (2008), atualmente vive-se em uma “sociedade líquida”, na qual as pessoas vivem em uma constante fantasia de que suas vidas devem ser uma obra de arte. Desse modo, constantemente fazem comparações com a vida dos outros e buscam incessante alcançar aquilo que não têm. Por sua vez, a vida que visualizam nas mídias sociais é editada, mostrando apenas a realidade. Portanto, concorda-se com Bauman (2008, p.8) quando ele afirma que essa “é uma vida de consumo. É uma vida precária, vivida em condições de incerteza constante. Significa constante autoexame, autocrítica e autocensura. Um tipo de vida que alimenta a insatisfação do eu consigo mesmo.” (BAUMAN, 2008, p.8) Percebe-se que consumir se tornou não apenas um propósito para existência, mas também uma condição para fazer parte de um meio social. Nesse sentido concorda-se com Kar Marx (1985, p.8) quando ele afirma “Sem necessidade não existe produção, E o consumo reproduz a necessidade”.

As trends veiculadas pelo fast fashion crescem em importância como moeda das trocas simbólicas. É justamente nas redes sociais que esse consumidor encontra um espaço de socialização. O consumo desenfreado, de uma excitação temporária, muitas vezes irracional, torna-se virtude, ainda que não necessariamente corresponda com a sua condição social. Vive-se em um ciclo em que a satisfação nunca é alcançada, porque os padrões de felicidade se movem incessantemente e são sempre maiores do que se pode atingir, atribuindo assim ao consumo um papel de detentor da felicidade, tornando uma felicidade líquida e artificial.

CONCLUSÃO

O presente projeto visou compreender o impacto que as redes sociais causaram na saúde mental dos jovens e na forma de consumir moda, no período pós pandêmico da Covid-19. Desta forma, constatou-se que a saúde mental é um tópico muito pautado nos assuntos atuais e se apresenta com mais relevância atualmente. Esta temática relaciona-se ao estado mental o qual o sujeito está suficientemente bem para lidar com as situações do cotidiano, estresse, trabalho e ao modo como consolida seus desejos, ideias e emoções.

Através de análises de pesquisas e conteúdo teórico de psicologia, foi constatado um impacto considerável na saúde mental dos jovens à medida que acessar as redes se tornou algo natural e considerado até uma ação necessária. Todavia, o acesso frequente as redes sociais causam impactos na saúde mental, revisitando gatilhos que despertam medo e ansiedade nos usuários; idealização do corpo, da vida perfeita, e projeção de desejos que nem sempre são compatíveis com o do sujeito, mas por influências acaba se tornando um falso ideal de consumo. A FOMO pode também ser entendido no mundo da moda, como uma forma patogênica de estar sempre a par das trends e tendências, essa relação do indivíduo com a constante necessidade de pertencimento, faz com que os usuários das redes adentrem o mundo da moda através de marcas fast fashion que vendem majoritariamente de forma online, acarretando uma “irracionalidade racional”.

A moda na atualidade é constantemente remodelada, inserindo novas tendências, ocasionando no usuário a constante necessidade de acompanhar a moda.

Logo, necessita-se de uma reeducação em relação a atitudes sociais e uso saudável das redes sociais. A moda também é a arte em que o indivíduo encontra sua forma de se expressar, externalizando o interno para o exterior, percebe-se então que os impactos do fast fashion na saúde mental são uma externalização de um pedido de ajuda, de calmaria, de consciência em meio de uma civilização acelerada e devoradora.

REFERÊNCIAS

ROZGONJUK, Dmitri et al. Fear of Missing Out (FOMO) and social media’s

impact on daily-life and productivity at work: Do WhatsApp, Facebook, Instagram,

and Snapchat Use Disorders mediate that association. Addictive Behaviors. Vol.110. 2020. Disponível em:<https://www.sciencedirect.com/journal/addictive-behaviors/vol/110/ suppl/C> Acesso em: 09 jun. 2022

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5 (5ªed; M. M. M. Nascimento, Trad.) Porto Alegre, RS: Artmed

WORLD HEALTH ORGANIZATION (OMS). A prevalência global de ansiedade e depressão. OPAS, [s. l.], 2 mar. 2022. Disponível em: < https://www.paho.org/pt/noticias/ 2-3-2022-pandemia-covid-19-desencadeia-aumento-25-na-prevalencia-ansiedade-e-depressao-Acesso em: 29 maio 2022.

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