Índice de Transparência da Moda Brasil 2020

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ÍNDICE DE DA MODA EDIÇÃO 2020 Uma análise de 40 grandes marcas e varejistas do mercado brasileiro, classificadas de acordo com a quantidade de informações disponibilizadas sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais.


FASHION REVOLUTION | ÍNDICE DE TRANSPARÊNCIA DA MODA BRASIL 2020

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SUMÁRIO 02 04

DESCOBERTAS PRINCIPAIS SUMÁRIO EXECUTIVO

12 13 14 15 17 18 19 20 22 23 24 25

SOBRE O RELATÓRIO por que transparência importa para a indústria da moda? O que significa transparência Ponto de vista: Como sobreviver a uma pandemia Objetivo da pesquisa Sobre a metodologia Como as marcas e varejistas são pontuadas Atualizações anuais da metodologia O peso da pontuação Como a pesquisa é conduzida Critério de seleção das marcas As 40 marcas elecionadas

26 27 28 29

OS RESULTADOS FINAIS Guia para os resultados Os resultados finais Descobertas rápidas

62 75

OS RESULTADOS FINAIS POR SEÇÃO Pontuações médias ao longo das seções 1. Políticas e compromissos Ponto de vista: Mais mulheres, mesmos desafios: até onde chegam as políticas de inclusão 2. Governança Ponto de vista: No brasil, a desigualdade tem raça 3. Rastreabilidade Estudos de Caso 4. Conhecer, comunicar e resolver Ponto de vista: A gestão dos impactos em direitos humanos e a devida diligência 5. Tópicos em destaque Estudo de Caso

76 77 77 77 78 79 80 82 83 84

RECOMENDAÇÕES FINAIS O que fazer com estas informações? Marcas e varejistas Governos e legisladores Cidadãos Ongs, sindicatos e instituições de pesquisa Agradecimentos ANEXO definições Aviso Legal Sobre o Fashion Revolution

30 31 32 40 41 45 46 52 54 61

O conteúdo desta publicação não pode, de forma alguma, refletir as opiniões de qualquer dos financiadores do Fashion Revolution CIC ou do Instituto Fashion Revolution Brasil. © Fashion Revolution CIC 2020. Todos os direitos reservados. Este documento não deve ser copiado ou adaptado sem a permissão do Fashion Revolution CIC.


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DESCOBERTAS PRINCIPAIS PONTUAÇÃO MÉDIA EM CADA SEÇÃO

21%

pontuação média geral das 40 marcas analisadas

Aumento de 5 pontos percentuais desde 2019 (30 marcas)

POLÍTICAS E COMPROMISSOS

GOVERNANÇA

RASTREABILIDADE

CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER

TÓPICOS EM DESTAQUE

32%

24%

25%

14%

11%

Aumento de 4 pontos percentuais desde 2018 (20 marcas)

5

13

MAIORES PONTUAÇÕES

Brooksfield

0

Carmen Steffens

0

Cia. Marítima

59% 59%

C&A

74%

Malwee

68%

Renner Youcom Hering

MARCAS NÃO PONTUARAM

57%

5

MAIORES SALTOS DE DESEMPENHO* (% DE DIFERENÇA DE 2019 PARA 2020)

Melissa

+36

0

Hering

+31

Colcci

0

John John

+21

Colombo

0

Di Santinni

0

Le Lis Blanc

+21

Fórum

0

Marisa

+15

Leader

0

Lojas Avenida

0

Lojas Pompéia

0

Moleca

0

Olympikus

0

TNG

0

*Na edição passada consideramos a variação percentual para calcular as diferenças entre as pontuações de 2018 e 2019. Neste ano, estamos considerando a diferença de pontos percentuais entre um ano e outro. Caso fosse utilizada a metodologia de cálculo baseada na variação, como no ano passado, os valores indicados na tabela corresponderiam a um aumento de: 1385% para Melissa, 119% para Hering, N/A para John John e Le Lis Blanc, que zeraram em 2019, e 76% para Marisa.


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5 MAIORES PONTUAÇÕES DESDE 2018

Marcas que publicam listas de fornecedores 2020

2018

(20 marcas)

2019

(30 marcas)

2020

(40 marcas)

Fornecedores nível 1 (tier 1) 25% 33% 43%

Instalações de processamento/ beneficiamento 25% 33%

2019

C&A

74%

C&A

64%

Malwee

68%

Malwee

55%

Renner

59%

Renner

52%

Youcom

59%

Osklen

49%

Hering

57%

Havaianas

47%

2018

C&A

53%

Malwee

51%

Zara

40%

Havaianas

36%

Osklen

34%

33%

Fornecedores de matérias-primas 15% 17% 20%

23%

pontuação média geral das 30 marcas analisadas desde 2019 Aumento de 7 pontos percentuais desde 2019

32%

pontuação média geral das 20 marcas analisadas desde 2018 Aumento de 15 pontos percentuais desde 2018

Na edição passada consideramos a variação percentual para calcular as diferenças entre as pontuações de 2018 e 2019. Neste ano, estamos considerando a diferença de pontos percentuais entre um ano e outro. Caso fosse utilizada a metodologia de cálculo baseada na variação, como no ano passado, os valores indicariam um aumento de 39% de 2019 para 2020 e um aumento de 91% de 2018 para 2020.


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SUMÁRIO EXECUTIVO Sobre o Índice de Transparência da Moda Brasil 2020 Chegamos à terceira edição do Índice de Transparência da Moda Brasil com a análise da divulgação pública de dados sobre políticas, práticas e impactos sociais e ambientais de 40 grandes marcas e varejistas presentes no mercado brasileiro. Em 2020, foram adicionadas 10 novas empresas à pesquisa, incluindo marcas que operam via e-commerce e também no segmento de underwear. A análise abarca 221 indicadores que cobrem uma ampla gama de tópicos relacionados a questões sociais e ambientais, como condições de trabalho, trabalho escravo contemporâneo1, salário justo para viver, liberdade de associação, igualdade de gênero, igualdade racial, listas de fornecedores, devida diligência (due diligence), práticas de compra, bem-estar animal, biodiversidade, uso de químicos, emissões de GEE (gases de efeito estufa), descarte de resíduos têxteis, reciclagem e circularidade, entre outros.

Vale notar que este relatório não tem a intenção de ser um guia de compras. O Índice foi projetado para ser uma ferramenta que incentiva, progressivamente, grandes marcas e varejistas a divulgarem mais informações sobre suas cadeias de fornecimento. A transparência possibilita enxergar e proteger as pessoas vulnerabilizadas ao longo da cadeia, assim como a natureza, ao passo que responsabiliza as marcas por suas práticas e ações. O Índice de Transparência da Moda Brasil 2020 foi elaborado pelo Fashion Revolution CIC e Instituto Fashion Revolution Brasil e contou com a parceria técnica da ABC Associados, consultoria especializada em metodologias para análises do desempenho e perfil de empresas no campo da sustentabilidade empresarial.

Por que focamos a análise em grandes marcas e varejistas? De muitas maneiras, as grandes empresas da indústria da moda, do Brasil e do mundo, tiveram - e têm um papel importante na aceleração

da crise climática e, como se sabe, são responsáveis por muitos dos abusos dos direitos humanos que persistem nas cadeias de fornecimento globais.

Mais da metade das marcas e varejistas analisadas são pouco ou nada - transparentes em relação às questões sociais e ambientais

O modelo atual de produção e consumo em grande escala certamente não é benéfico nem para o meio ambiente nem para o grande número de pessoas que trabalha, muitas vezes, por salários extremamente baixos e em condições precárias, para abastecer as demandas de um mercado veloz. Mas isso pode mudar e as grandes empresas têm um papel importante a desempenhar, tendo em vista que de onde surgem os grandes impactos também podem vir as grandes soluções.

Mais da metade das marcas analisadas, 21 de 40 (53%), pontuaram abaixo de 15%. No total, 13 marcas não pontuaram. No entanto, proporcionalmente há menos marcas que zeraram suas pontuações em relação a 2018 e 2019, correspondendo a 33% em 2020, contra 43% em 2019 e 40% em 2018.

Essas renomadas marcas e varejistas têm a responsabilidade diretamente proporcional ao seu tamanho, alcance e impactos sociais e ambientais que são capazes de causar. Ao passo que possuem a capacidade e os recursos necessários para gerar mudanças benéficas, em escala nacional e/ou global, tanto para as pessoas como para a natureza. Tais condições colocam essas empresas em uma posição realmente poderosa e, portanto, é para elas que precisamos olhar.

Entre as 10 novas empresas acrescentadas à pesquisa em 2020, 7 pontuaram abaixo de 10% ou não pontuaram, são elas Lupo (9%), Centauro (3%), Netshoes (2%), Puket (1%), Di Santinni (0%), Forum (0%) e Lojas Pompéia (0%). As marcas das edições anteriores que continuam com a pontuação zerada são Brooksfield, Carmen Steffens, Cia. Marítima, Colcci, Colombo, Leader, Lojas Avenida, Moleca, Olympikus e TNG.

1. Devido aos debates e a falta de conceituação e definições comuns para termos como trabalho forçado e formas de escravidão moderna e, ainda, considerando reivindicações de movimentos e organizações negras em relação ao uso do termo trabalho escravo, optamos por usar as terminologias ‘trabalho escravo contemporâneo’, na versão em português do relatório, e ‘forced labour’, na versão em inglês. Ambos termos se alinham e são reconhecidos por referências internacionais como a OIT. Sabemos que a discussão é complexa e, assim, continuaremos abertos a ouvir e aprofundar as discussões acerca do tema e, se necessário, aprimorar as nomenclaturas em próximas edições.


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O Índice de Transparência da Moda pode ser uma ferramenta útil para incentivar maior transparência na cadeia de fornecimento Apesar do nível de informações publicadas ainda ser muito baixo para mais da metade das empresas, o Índice de Transparência da Moda Brasil tem sido uma ferramenta útil para abrir diálogo com algumas das maiores marcas e varejistas do país. Acreditamos que levar o debate sobre transparência para dentro dessas empresas seja o primeiro passo para que elas comecem a prestar contas publicamente sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais. Para o Fashion Revolution, transparência é o início e não um fim, ou seja, é o primeiro passo de uma jornada que leva à responsabilização e prestação de contas que, por sua vez, levam a mudanças na prática. Sabemos que a transparência sozinha não representa o tipo de mudança sistêmica e estrutural que queremos ver dentro da indústria da moda, mas ela ajuda a revelar as estruturas em vigor para que possamos entender como mudá-las. Transparência não significa sustentabilidade, mas uma importante ferramenta que joga luz ao longo de todas as etapas da cadeia de valor da indústria da moda – desde a extração da matéria-prima até o descarte. Somente trazendo à tona os desafios e problemas

sociais e ambientais presentes nos bastidores da indústria, será possível agir de forma eficaz em prol dos direitos humanos e da natureza. Não há como responsabilizar empresas e governos se não pudermos ver o que realmente está acontecendo. E por isso transparência é tão importante. Por exemplo, a divulgação das listas de fornecedores é fundamental para o exercício dos direitos humanos, assim como um passo necessário em direção à responsabilização no caso de violações desses direitos. A transparência na cadeia de fornecimento permite que os trabalhadores, seus sindicatos e outros defensores dos direitos trabalhistas saibam para quais marcas os trabalhadores estão produzindo, dando a eles a oportunidade de levantar queixas diretamente às marcas. Além disso, como consumidores, temos o direito de saber que o nosso dinheiro não está apoiando abusos de direitos humanos ou a destruição ambiental. Nesse sentido, podemos ver uma evolução na divulgação de listas de fornecedores por parte das marcas desde 2018. Se considerarmos fornecedores de nível 1 (tier 1) houve um aumento de 25% (5 marcas) em 2018, passando por 33% (10 marcas) em 2019, até chegar em 43% (17 marcas) em 2020. Olhando para os fornecedores além do nível 1, que abrange instalações de processamento e beneficiamento,

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o crescimento partiu de 25% (5 marcas) em 2018, para 33% (10 marcas) em 2019 e 33% (13 marcas) em 2020. Por fim, com resultados mais baixos, mas ainda apontando um leve crescimento, a divulgação das listas de fornecedores de matérias-primas subiu de 15% (3 marcas) em 2018, para 17% (5 marcas) em 2019, alcançando 20% (8 marcas) em 2020. Veja mais adiante no relatório quatro estudos de caso ao redor do mundo que destacam como jornalistas e organizações trabalhistas estão usando listas de fornecedores para identificar e remediar más condições de trabalho nas cadeias de fornecimento de grandes marcas.

A participação no Índice de Transparência da Moda pode influenciar marcas a divulgarem mais informações a cada ano Embora as médias gerais apresentadas não revelem uma evolução considerável (com exceção da seção 3 - Rastreabilidade), por meio de outro recorte observamos que as marcas incluídas no Índice e que aceitam participar do processo de pesquisa, preenchendo o questionário e auxiliando nossa equipe na busca por informações, alcançam melhores resultados. Se considerarmos a pontuação média geral das 21 marcas que se envolveram com a pesquisa em 2020, encontramos

o resultado de 38%, enquanto as 19 marcas que não responderam nosso convite ou declinaram da oportunidade de participar, tiveram uma média geral de apenas 2%. Todas as marcas (8) com pontuação média acima de 40% em 2020 participaram preenchendo os questionários. É possivel perceber uma notável evolução por parte de algumas marcas, com destaque para a Melissa, com um aumento de 36 pontos percentuais, seguida pela Hering, com aumento de 31 pontos percentuais, a John John e a Le Lis Blanc, ambas com aumento de 21 pontos percentuais, e a Marisa, com 15 pontos percentuais a mais de 2019 para 2020. Pela primeira vez, desde sua inclusão em 2018, as marcas John John e Le Lis Blanc passaram a divulgar informações referentes aos temas pesquisados em seus sites e saíram do resultado de 0%. Além disso, ao analisar somente o grupo de 20 marcas presentes na primeira edição, em 2018, podemos notar uma melhora na média geral a cada ano, visto que, em 2020, elas apresentam uma média geral de 32% (17% em 2018). Ao mesmo tempo, as 30 marcas avaliadas em 2019 alcançaram, em 2020, uma pontuação média geral de 23% (16% em 2019) - contra a média geral de 21% entre as 40 marcas analisadas neste ano.


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Por outro lado, marcas como Brooksfield, Carmen Steffens, Colcci, Colombo, Leader, Lojas Avenida, Lojas Pompéia, Moleca, Olympikus e TNG continuam sem responder os nossos contatos ou declinando da oportunidade de participar do processo de pesquisa, desde sua inclusão nos índices dos anos anteriores.

2020: os impactos da COVID-19 nos trabalhadores no Brasil e no mundo O ano de 2020 ficará marcado na história. Estamos, desde o início do ano, enfrentando uma crise global extrema causada pela pandemia do coronavírus, com consequências e impactos negativos - imediatos e de longo prazo - para a vida das pessoas e para o planeta. Crises como essa exponencializam os desafios, desigualdades e injustiças nas esferas sociais, ambientais e econômicas, fragilizando ainda mais os grupos já vulnerabilizados. Tudo isso em meio a uma emergência climática que se faz sentir cada vez mais ao redor do mundo e que também atinge com muito mais força esses grupos.

A indústria da moda, por sua vez, carrega sua parcela de responsabilidade em meio a este cenário. Considerada uma das grandes poluidoras do mundo, ela também expõe trabalhadoras e trabalhadores a um risco cada vez maior de exploração em sua cadeia de fornecimento global. Sabe-se que muitas marcas e varejistas ainda não estão assumindo compromissos suficientes em relação ao pagamento de salários justos e condições dignas de trabalho em suas fábricas e fornecedores, aos impactos ambientais dos materiais e processos que utilizam ou por como seus produtos afetam a saúde das pessoas, dos animais e do planeta. A pandemia escancara ainda mais as desigualdades e injustiças presentes na indústria da moda. A forma como as empresas escolheram gerenciar essa crise diz muito sobre as estruturas de poder e as verdadeiras intenções que conduzem seus negócios. Desde o início da pandemia, acompanhamos os impactos devastadores causados por grandes

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marcas e varejistas, cancelando seus pedidos (incluindo aqueles que já estavam em produção) e atrasando pagamentos2. Muitas delas se apoiaram em cláusulas de força maior para se esquivarem da responsabilidade contratual junto a seus fornecedores3. Uma vez que esses gigantes da moda cancelaram pedidos somando mais de 1 bilhão de dólares4, trabalhadores de países asiáticos, que já eram mão de obra barata, passaram a lutar ainda mais por sua sobrevivência. Bangladesh, um dos grandes parques de confecção do mundo, que depende mais da indústria do vestuário do que de qualquer outra e tem nesse setor uma parcela de 84% de suas exportações, foi um dos países mais impactados pela pandemia5. Estimativas indicaram que no Sul e Sudeste Asiático os trabalhadores do setor de confecção receberam 38% a menos do que sua renda normal e, em algumas regiões da Índia, esse número passou de 50%. Foi estimado também que na Indonésia e Bangladesh houve uma perda de salários de mais de 400 milhões e 500 milhões de dólares, respectivamente, durante março,

abril e maio. Por fim, considerando a indústria global de vestuário, estimase que os salários perdidos em todo o mundo, excluindo a China, ao longo dos mesmos três meses, totalizariam entre 3,19 e 5,79 bilhões de dólares.6 Aqui no Brasil não foi diferente e a crise também atingiu fortemente diversos trabalhadores da indústria. Em São Paulo, por exemplo, a pandemia agravou a exploração de migrantes bolivianos, que se viram obrigados a produzir máscaras a R$ 0,10, enquanto costureiras passaram dois meses fechadas em uma oficina, trabalhando 14 horas por dia e recebendo menos do que um salário mínimo. Além de violações trabalhistas, costureiras bolivianas, que geralmente estão sujeitas à violência doméstica, em momentos como esse, ainda vêem suas famílias correndo o risco de serem despejadas7. Veja mais informações atualizadas sobre os impactos da pandemia nas trabalhadoras e trabalhadores do setor em nossa matéria especial sobre o tema: Trabalhadores e indústria da moda: um semestre de pandemia no Brasil.

2. Com as lojas fechadas e as vendas online desaceleradas por conta da crise econômica global causada pela pandemia, muitas das grandes marcas e varejistas cancelaram seus pedidos em fornecedores, cessaram o pagamento de pedidos prontos ou em produção ou exigiram descontos em troca de aceitá-los, não assumindo qualquer responsabilidade pelo impacto que isso tem nas pessoas que trabalham em suas cadeias de fornecimento. Vale lembrar que, normalmente, as empresas pagam seus fornecedores semanas ou até meses após o término da produção e não mediante a entrega do pedido. Já os fornecedores, geralmente, pagam adiantado pelos materiais ou tecidos necessários para essas produções. 3. A pandemia expôs as fragilidades e desigualdades nas cadeias globais de fornecimento de vestuário. O documento Farce majeure: How global apparel brands are using the COVID-19 pandemic to stiff suppliers and abandon workers desenvolvido pelas organizações ECCHR, ILAW e Worker Rights Consortium explora os desequilíbrios de poder entre marcas e fornecedores e o que revelam seus contratos. O documento examina a lei de força maior, seus princípios e como se aplicam às circunstâncias em questão. O material também explica como as marcas violam suas obrigações de devida diligência ao cancelar pedidos e pede um melhor acesso aos mecanismos de prestação de contas para as marcas cumprirem práticas responsáveis em ​​ suas cadeias de fornecimento. Disponível em: https://www.ecchr.eu/fileadmin/ECCHR_PP_FARCE_MAJEURE.pdf 4. https://www.bloomberg.com/news/articles/2020-03-23/europe-retailers-cancel-1-billion-of-bangladesh-garment-orders 5. https://www.courrierinternational.com/article/pret-porter-au-bangladesh-cest-lapocalypse-pour-les-ouvrieres-du-textile 6. https://cleanclothes.org/news/2020/garment-workers-on-poverty-pay-are-left-without-billions-of-their-wages-during-pandemic 7. https://reporterbrasil.org.br/2020/06/trabalho-escravo-despejos-e-mascaras-a-r-010-pandemia-agrava-exploracao-de-migrantes-bolivianos-em-sp/?fbclid=IwAR2uxhhtFFruf8R3PKTgLMu0K6C55GqOwQ96BfpRqzeF3IHC8wedsUOJDNI


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O que pandemia pode nos dizer sobre as práticas de compra das empresas? Práticas de compra responsáveis caminham lado a lado com a capacidade dos fornecedores de pagarem salários justos aos seus trabalhadores. No entanto, observamos que a grande maioria das marcas não divulga informações sobre suas parcerias de negócio com seus fornecedores. Das 40 marcas analisadas, somente 2 informam o método que utilizam para calcular e isolar os custos de mão de obra de seus pedidos (incluindo salários, horas extras, encargos sociais, licença médica, férias e licenças, bem como o custo da mão de obra indireta e aumentos salariais). Apenas 5 empresas divulgam suas políticas de pagamento de fornecedores, com prazos máximos estipulados, enquanto somente 3 publicam o percentual de pagamentos aos fornecedores realizados dentro do prazo e de acordo com os termos acordados. Por fim, apenas 1 empresa entre 40 divulga os feedbacks dos fornecedores sobre suas práticas de compra por meio de um processo formal (ex.: por meio de encontros/eventos de fornecedores e pesquisas internas com fornecedores sobre as práticas de compra da marca).

Esta é a primeira edição em que uma marca ultrapassou a casa do 70%. A C&A atingiu 74% de pontuação média geral. No entanto, apesar de as empresas estarem melhorando seu nível de transparência a cada ano, sabemos que ainda há muito a ser feito. Por exemplo, logo no começo da pandemia, ainda em março, a C&A e outras grandes varejistas globais cancelaram pedidos em fornecedores de países asiáticos, afetando principalmente a Birmânia, Camboja e Bangladesh8. Em nossa pesquisa notamos que, assim como outras marcas, a C&A não divulga sua política de pagamento de fornecedores, com prazos máximos estipulados. Mesmo divulgando suas políticas para fornecedores em relação a contratos e termos empregatícios ou a salários e benefícios financeiros, a empresa ainda não publica o percentual de pagamentos aos fornecedores realizados no prazo e de acordo com os termos acordados em contrato. Isso parece indicar que as políticas nem sempre são colocadas em prática ou seguidas com rigor por parte das marcas. Em momentos como esse, as marcas não podem se esquivar de suas responsabilidades enquanto esperam que seus fornecedores garantam a seus

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trabalhadores todas as disposições legalmente exigidas, incluindo salários e benefícios integrais. De acordo com a campanha #PayUp9 e a organização Worker Rights Consortium (WRC)10, somente no dia 30 de outubro, a C&A se comprometeu publicamente a pagar integralmente todos os pedidos que estavam em produção ou concluídos no início da crise11. Muitas marcas já se comprometeram publicamente a pagar ou já pagaram integralmente seus fornecedores. Mas foi necessária a criação de campanhas e a atuação de organizações em prol dos direitos humanos/trabalhistas para que, em muitos casos, isso acontecesse. É surpreendente que mesmo depois de 7 ou 8 meses muitos trabalhadores - que já ganhavam muito pouco e não têm economias para garantir seu sustento em situações como essas - ainda estejam esperando pelo que lhes é devido. Negócios justos e sustentáveis são extremamente importantes para gerar renda e condições decentes de trabalho, garantindo dignidade e bem-estar, assim como o acesso a serviços básicos como moradia, alimentação, saúde e educação para os trabalhadores e suas famílias. Porém, à medida que marcas

e varejistas tentam lidar com a crise econômica causada pela pandemia do coronavírus, suas práticas de compra têm sido fortemente questionadas. Assim, é essencial que essas empresas compartilhem mais informações sobre suas relações de negócio com seus fornecedores, para que possam ser responsabilizadas e cumpram com seus compromissos a fim de evitar que seus trabalhadores e suas famílias sejam prejudicados. Portanto, para que todos se beneficiem, a indústria da moda precisa adotar uma abordagem holística e transparente, estando atenta a todos ao longo da cadeia de valor. Publicar informações sobre suas práticas de compra permite que grandes marcas e varejistas prestem contas pela segurança, saúde e bem-estar dos trabalhadores em suas cadeias, inclusive em momentos como o que estamos vivendo agora.

Ainda não há transparência sobre salários justos para viver na cadeia de fornecimento Além da importância de se isolar os custos de mão de obra no fechamento dos pedidos junto a fornecedores, é preciso atentar para o fato de que esse valor pode ainda não ser o suficiente para cobrir custos de vida básicos.

8. https://www.courrierinternational.com/article/pret-porter-au-bangladesh-cest-lapocalypse-pour-les-ouvrieres-du-textile e https://www.workersrights.org/updates-and-analysis/#May27CA 9. A campanha #PayUp se formou a partir da decisão catastrófica da indústria da moda de recusar pagar pedidos já concluídos adentrando a pandemia e exige que as marcas sejam transparentes e se comprometam publicamente a pagar os pedidos feitos antes da pandemia, incluindo aqueles que foram cancelados ou pausados por ​​ conta do coronavírus. 10. A Worker Rights Consortium (WRC) é uma organização independente de monitoramento de direitos trabalhistas que investiga condições de trabalho em fábricas em todo o mundo com o objetivo de documentar e combater as condições de exploração; identificar e expor as práticas de marcas e varejistas globais que perpetuam abusos de direitos trabalhistas; e proteger os direitos dos trabalhadores que fazem roupas e outros produtos. 11. Dados coletados nas páginas https://www.workersrights.org/updates-and-analysis/#Oct30CA and https://payupfashion.com/project/ca/ durante o período de elaboração do relatório (outubro/2020).


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Um salário capaz de cobrir os custos de vida básicos ou “salário justo para viver” é aquele que permite um padrão de vida decente para o trabalhador e sua família. Ele é tipicamente maior que o salário mínimo e visa garantir as condições e recursos necessários para viver dignamente, como moradia, alimentação, educação, saúde, transporte, etc. A estimativa de um salário justo para viver varia de acordo com a região, e a orientação sobre esse respeito é oferecida por agências governamentais e internacionais, organizações acadêmicas e/ou ONGs. Assim como nas edições anteriores do Índice, foi identificado que quase nenhuma empresa publica seus esforços e estratégias para melhorar a remuneração e assegurar salários dignos em sua cadeia de fornecimento. Somente 4 marcas (10%) divulgam seu compromisso de garantir um salário capaz de cobrir os custos de vida básicos dos trabalhadores de toda sua cadeia de fornecimento. Apenas 1 marca relata, de forma mensurável, seu progresso anual para cumprir com esse compromisso. Nenhuma empresa divulga uma estratégia mensurável, e com prazo determinado, sobre como fará para garantir o salário justo para viver em sua cadeia.

Aqui também notamos que a C&A, apesar de ser a marca mais bem pontuada e divulgar seu compromisso para garantir um salário capaz de cobrir os custos de vida básicos dos trabalhadores de toda sua cadeia de fornecimento, não publica uma estratégia mensurável e com prazo definido sobre como fará para garantir esse compromisso ou qual o percentual acima desse valor que esses trabalhadores recebem. Essa é uma questão urgente para muitos trabalhadores que lutam para suprir suas necessidades básicas. Embora seja uma questão complexa de resolver, sem a promoção de ações coletivas e maior transparência por parte de marcas e varejistas, demorará muito tempo para que essas pessoas recebam salários realmente dignos.

A pandemia prova por que transparência é tão vital A falta de transparência também não fará bem para os negócios. Para o diretor de sustentabilidade da Fundação Dom Cabral, Heiko Spitzeck, as empresas que não apresentarem transparência nos temas sociais e ambientais ficarão em desvantagem para obter financiamento internacional. Outros especialistas também apontam a importância que questões socioambientais adquiriram diante da crise e que as empresas mais engajadas nesse processo serão as que sobreviverão e ganharão relevância a médio prazo12.

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No entanto, notamos em nossa pesquisa que essa prática ainda não é comum entre as marcas analisadas, tendo em vista que somente 6 marcas (15%) publicam um relatório anual de sustentabilidade ou de responsabilidade social corporativa auditado ou verificado por uma terceira parte independente. Ainda, de acordo com dirigentes empresariais e investidores internacionais, a estratégia das empresas em um cenário pós-pandemia tende a acelerar a busca por certificações voltadas à sustentabilidade, destacando o aumento do interesse nos últimos meses por empresas que colocam o desenvolvimento social e ambiental como definição de sucesso para seus modelos de negócio13. Com isso, espera-se mais do nível de transparência das empresas e da qualidade de suas informações públicas. Apesar do contexto atual e das expectativas para o futuro, de maneira geral, as marcas ainda não apresentam grandes progressos desde nossa primeira edição do Índice no Brasil. Enquanto que em 2018 a média geral das 20 marcas revisadas foi de 32% para Políticas e Compromissos, 30% para Governança, 12% para Rastreabilidade, 11% para Conhecer Comunicar e Resolver e 12% para os Tópicos em Destaque, os resultados de 2020 apresentaram os seguintes números, respectivamente: 32%, 24%, 25%, 14% e 11%.

12 e 13. https://valor.globo.com/live/noticia/2020/06/18/nao-podemos-deixar-temas-sociais-e-ambientais-perderem-relevancia-diz-presidente-da-gerdau.ghtml 14. https://inpacto.org.br/segundo-relatorio-da-onu-covid-19-pode-intensificar-a-escravidao-no-mundo/

A pandemia aumenta o risco de trabalho escravo contemporâneo no mundo Relatório apresentado entre os meses de setembro e outubro de 2020, na 45ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, aponta que as consequências econômicas da crise gerada pela pandemia do coronavírus afetam diversos segmentos da população e que serão piores para os grupos que já estavam vulnerabilizados antes da pandemia. Assim, se elevaram os grandes níveis de pobreza e desigualdade social, aumentando ainda mais a probabilidade de casos de trabalho escravo contemporâneo14. Em 2020, incluímos em nosso questionário novos indicadores, abordando mais profundamente o combate ao trabalho escravo contemporâneo. Por meio deles, observamos que somente 6 marcas (15%) publicam dados sobre a existência de violações relacionadas ao trabalho escravo contemporâneo nas instalações dos fornecedores, como, por exemplo, liberdade de movimento restrita, retenção de passaportes ou outros documentos dos trabalhadores, horas extras forçadas, salários retidos, servidão por dívidas ou queixas e reclamações relacionadas às práticas de recrutamento.


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Apenas 5 empresas (13%) divulgam sua abordagem sobre taxas de recrutamento na cadeia de fornecimento, informando se exigem que não sejam cobradas dos trabalhadores taxas ou custos relacionados aos processos de recrutamento ou garantindo que eles sejam reembolsados caso haja esse tipo de cobrança. À medida que o mundo tenta sair desta crise, é essencial que os governos e empresas busquem construir novos e melhores sistemas, colocando economias em um caminho sustentável, de modo a reduzir a vulnerabilidade humana e as ameaças à saúde e bemestar das pessoas e do meio ambiente.

A mudança do clima poderá aumentar as chances de pandemias futuras A crise climática, assim como a crise causada pelo coronavírus, afeta muito mais profundamente as populações vulnerabilizadas. A prevenção do coronavírus, assim como a proteção contra catástrofes do clima, é um luxo para grande parte das pessoas do Brasil e do mundo, muitas das quais não têm sequer acesso à água limpa, a um sistema de saúde eficaz ou a condições dignas de trabalho, estudo e moradia.

Da mesma forma, inúmeros trabalhadores na cadeia global de fornecimento da moda se encontram em situação vulnerável e carecem, por exemplo, de licença saúde, assistência médica adequada ou qualquer tipo de estrutura que os permita enfrentar situações drásticas como essas. Vale lembrar que os trabalhadores que se encontram nessas condições também não ganham o suficiente para garantir seu sustento durante períodos de crises, e aqueles que vivem em dormitórios ou moradias lotadas estão ainda mais expostos a riscos como o de contaminação. Além disso, a ONU e a OMS alegam que pandemias são consequências da destruição da natureza15 e a comunidade científica tem estudado como as pressões humanas sobre o meio ambiente aumentam os riscos de futuras pandemias. O aquecimento global, o aumento da população humana, a poluição e a destruição dos habitats naturais estão entre os fatores que aumentam o risco de doenças zoonóticas passadas dos animais para os humanos16.

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De acordo com a socióloga argentina Maristella Svampa, é necessário assumir as causas ambientais da pandemia, juntamente com as sanitárias, e colocá-las na agenda política para enfrentar o enorme desafio da humanidade, representado pela crise climática, por meio de um grande pacto ecossocial e econômico17. Ao analisarmos as marcas e varejistas, observamos o que elas estão fazendo em prol de ecossistemas naturais, como por exemplo, para o combate ao desmatamento ou conservação de oceanos, e descobrimos que 25% das empresas analisadas divulgam políticas referentes às suas próprias gestões em relação à biodiversidade e conservação. Por outro lado, quando essas mesmas políticas são voltadas aos fornecedores, o número cai para 15%. No entanto, apesar de não encontrarmos um alto número de políticas, quando se trata de apresentar procedimentos e iniciativas práticas em relação ao mesmo tema, identificamos que 43% das marcas divulgam suas informações.

Nossos biomas estão em chamas O Brasil continua em chamas. No relatório do ano passado trouxemos dados relatando a tragédia causada por um dos maiores números de focos de incêndio registrados nos últimos anos na Floresta Amazônica. Sinalizamos também que o desmatamento da Amazônia tem como maior responsável a geração de áreas de pastagem para gado18 e pontuamos que a pecuária não é somente voltada para a produção e consumo de carne, mas também para o couro, que movimenta uma importante área dentro do mercado de moda. De acordo com o diretor-executivo da Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, Mauro Armelin, o fogo é a forma mais barata de se ampliar pastagens.19 Em 2020, infelizmente, os números sobre queimadas no Brasil são ainda mais alarmantes. Diante do contínuo desmonte dos órgãos de fiscalização ambiental por parte do governo federal, o mês de setembro bateu recordes de incêndio, não só na região Amazônica, com o pior registro desde 2010, mas também no Pantanal, sendo o pior mês da história do bioma20. Neste mês, o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) identificou 32.017 focos de

15. https://super.abril.com.br/sociedade/onu-e-oms-alegam-que-pandemias-sao-resultados-da-destruicao-da-natureza/?fbclid=IwAR08uFF-R59H4k81ngtSntFICIGqFLe-gZBuGEteTPAUp_m2lzvHg0vRAbM 16. https://www.climatechangenews.com/2020/04/23/next-un-climate-science-report-consider-pandemic-risk/ 17. https://editoraelefante.com.br/reflexoes-para-um-mundo-pos-coronavirus/?utm_source=Not%C3%ADcias+da+Editora+Elefante&utm_campaign=569713036c-EMAIL_CAMPAIGN_2019_12_06_02_24_ COPY_01&utm_medium=email&utm_term=0_3b69653244-569713036c-361491794&goal=0_3b69653244-569713036c-361491794&mc_cid=569713036c&mc_eid=3563d4ac14 18. https://www.greenpeace.org/usa/wp-content/uploads/legacy/Global/usa/report/2010/2/amazon-cattle-footprint.pdf 19. https://reporterbrasil.org.br/2020/09/fogo-no-pantanal-mato-grossense-comecou-em-fazendas-de-pecuaristas-que-fornecem-para-gigantes-do-agronegocio/ 20. https://climainfo.org.br/2020/10/02/setembro-bate-recordes-de-incendio-na-amazonia-e-no-pantanal/


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calor na Amazônia, um aumento de 60% com relação a setembro de 201921. Em relação ao Pantanal, o aumento foi de 180% comparado ao mesmo período do ano passado, totalizando 8.106 focos22. Normalmente, o Pantanal já sofre com incêndios e graves períodos de estiagem - em 2020 está passando pela maior seca dos últimos 60 anos23 - mas apesar de o fogo poder acontecer de forma natural na região, sua propagação indica que houve incêndios criminosos, segundo a Polícia Federal, que investiga se aconteceu no Pantanal algo como o ‘Dia do Fogo’, quando fazendeiros e empresários de Novo Progresso, no Pará, organizaram queimadas na Amazônia nos dias 10 e 11 de agosto de 201924. Ainda, de acordo com um levantamento feito pela Repórter Brasil, entre julho e a primeira metade de agosto de 2020, queimadas iniciadas em cinco propriedades pecuaristas do Mato Grosso respondem pela destruição de uma área equivalente à cidade do Rio de Janeiro, o que corresponde a 36% da área total atingida por incêndios no Pantanal no mesmo período. Tais propriedades pertencem a fornecedores indiretos de gigantes do agronegócio.25 Para Mauro Armelin, frigoríficos também deveriam analisar seus fornecedores indiretos com o intuito de impedir o desmatamento e as queimadas

provocadas pela ação humana e explica que “se os frigoríficos não fizerem a análise completa e monitorarem os [fornecedores] indiretos, eles nunca poderão dizer que suas cadeias de produção são livres de desmatamento”.26 Assim como na indústria da moda, reconhecemos a importância da transparência e rastreabilidade ao longo de toda a cadeia de fornecimento, incluindo a origem das matériasprimas utilizadas pelas marcas. Dessa forma, buscamos saber se as empresas estão rastreando a origem de uma ou mais matérias-primas por meio de certificações/padrões reconhecidos ou iniciativas próprias como blockchain, por exemplo. Descobrimos que apenas 15% das marcas divulgam tal informação. Também identificamos que nenhuma empresa publica um compromisso mensurável e com prazo determinado para o desmatamento zero.

A moda e a crise climática Por mais que a crise climática seja uma questão urgente, ainda há pouca transparência sobre o que as marcas estão fazendo para reduzir seus impactos no clima. A indústria da moda global contribui consideravelmente para essa questão, tendo sido responsável por cerca de 2,1 bilhões de toneladas métricas de emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 2018, cerca de

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4% do total global, o que corresponde a aproximadamente a mesma quantidade de GEE emitida por ano pela França, Alemanha e Reino Unido juntos.27 Assim como nas edições anteriores do Índice, as empresas tendem a divulgar mais informações sobre suas políticas do que sobre como elas são colocadas em prática. Observamos que 33% das marcas possuem políticas sobre energia e/ou emissões de carbono considerando suas próprias instalações. Uma evolução muito pequena se comparada aos 30% do ano passado.

que ultrapassará a marca limite de 1,5 ºC para mitigar as mudanças climáticas estabelecida pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e ratificada no acordo de Paris de 2015. Para que isso não aconteça, a indústria precisará cortar suas emissões de GEE para 1,1 bilhão de toneladas métricas de CO2 equivalente até 2030.28 Trazendo para o contexto do Brasil, o país foi responsável pela emissão de 1,3 bilhões de toneladas de GEE em 2016, sendo 22% dessas emissões referentes ao uso do solo e às mudanças do uso do solo, que englobam, majoritariamente, as emissões decorrentes do desmatamento. Infelizmente o Brasil, que já foi protagonista em negociações climáticas globais, atualmente apresenta a retomada da derrubada de florestas e a ausência de políticas climáticas bem definidas, especialmente em nível federal29.

No que diz respeito à publicação anual da pegada de carbono ou das emissões de gases de efeito estufa (GEE) de suas próprias instalações, identificamos que 25% das marcas publicam essas informações. Apenas 2 empresas (5%) publicam anualmente a pegada de carbono ou as emissões de GEE de sua cadeia de fornecedores - onde se concentra a maior proporção de emissões de carbono dentro do ciclo de vida de uma peça de roupa.

O formato da divulgação de informações continua problemático

São 5 as marcas (13%) que publicam metas relacionadas à gestão do clima e/ou outros tópicos ambientais, com bases científicas (como as aprovadas pela Science Based Targets Initiative SBTi). Apesar dos esforços para reduzir as emissões, a indústria da moda está contribuindo com uma trajetória

Apesar das melhorias observadas, foi notado que desde a primeira edição em 2018 (e também no Índice global), as marcas divulgam dados e informações sem que haja muito cuidado com a organização, formato, local ou até mesmo qualidade do que está sendo divulgado.

21 e 22. http://queimadas.dgi.inpe.br/queimadas/portal-static/estatisticas_estados/ - 23. https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2020/10/amazonia-tem-2o-pior-setembro-de-queimadas-da-decada-e-pantanaltem-pior-mes-da-historia.shtml - 24, 25 e 26. https://reporterbrasil.org.br/2020/09/fogo-no-pantanal-mato-grossense-comecou-em-fazendas-de-pecuaristas-que-fornecem-para-gigantes-do-agronegocio/ 27 e 28. https://www.mckinsey.com/industries/retail/our-insights/fashion-on-climate?cid=other-eml-alt-mip-mck&hlkid=7e94b203469c42ba841624b01947be6b&hctky=11307401&hdpid=105befba-40b8-4132-858b-647d1b6365d1# 29. https://pp.nexojornal.com.br/linha-do-tempo/2020/O-Brasil-e-as-mudan%C3%A7as-clim%C3%A1ticas


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Por vezes, marcas usam grandes textos, explicações ou palavras bonitas e de efeito, mas que acabam não apresentando dados realmente relevantes e úteis sobre determinado assunto. Foram encontrados até casos de fatos e dados conflitantes divulgados pela mesma empresa. Sejam quais forem as razões para que isso aconteça, fica extremamente difícil para as pessoas entenderem quais informações divulgadas pelas marcas são de fato importantes, além de ser contraproducente do ponto de vista da transparência e prestação de contas. Às vezes, dependendo do assunto e da abordagem utilizada, é preciso de horas e até mesmo dias para decifrar o que as marcas estão divulgando efetivamente e para saber como usar essas informações de maneira eficaz. As empresas que melhor comunicam suas informações são aquelas que demonstram o que estão fazendo de forma objetiva, lógica e, ainda assim, suficientemente detalhada, evitando o uso de jargões da indústria difíceis de serem compreendidos ou mecanismos de storytelling (narrativa) que na verdade não têm muito a dizer.

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Agindo sobre essas descobertas

O Índice de Transparência da Moda nos permitiu criar diálogos construtivos com algumas das maiores marcas e varejistas do Brasil sobre o que eles podem fazer para ser mais transparentes. Acreditamos que a transparência é o primeiro passo para responsabilizar essas grandes empresas pelos impactos de seus negócios nos direitos humanos e meio ambiente.

Por isso, continuaremos a usar o Índice como uma ferramenta para medir o progresso anual do nível de transparência das empresas participantes para encorajá-las, cada vez mais, a assumir maior responsabilidade e prestar contas de suas políticas, práticas e impactos referentes a questões sociais e ambientais. Por fim, esperamos que outras organizações, sindicatos e trabalhadores usem cada vez mais dados disponíveis publicamente para levantar questões e reivindicar melhorias em toda a cadeia. Assim, coletivamente, poderemos responsabilizar as marcas e varejistas por suas condutas e avançar na necessária transformação desse importante setor.

Convidamos você a ler o restante do relatório para um mergulho mais profundo nos resultados de 2020.

" Transparência é respeito ao consumidor, pois ele deve ter acesso às informações sobre aquilo que compra." Cida Trajano

Presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Vestuário


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1 SOBRE O RELATÓRIO

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POR QUE TRANSPARÊNCIA IMPORTA PARA A INDÚSTRIA DA MODA? A falta de transparência pode custar vidas Quando o edifício Rana Plaza desabou há mais de sete anos em Daca, capital de Bangladesh, matando e ferindo milhares de trabalhadores, as pessoas tiveram que vasculhar os escombros à procura das etiquetas das roupas para descobrir quais marcas estavam ligadas às cinco confecções instaladas no prédio. Em alguns casos, levou semanas para que algumas marcas e varejistas pudessem explicar como suas etiquetas haviam sido encontradas entre as ruínas e que tipo de contrato de compra elas tinham com aqueles fornecedores. Isso ocorre porque a grande maioria das marcas e varejistas não possui fábricas próprias, o que dificulta o monitoramento e o controle da segurança, das condições de trabalho e da gestão ambiental ao longo de uma cadeia de fornecimento altamente globalizada e fragmentada.

Para a produção de suas coleções, as grandes empresas podem trabalhar com centenas de fábricas ao mesmo tempo, considerando apenas os fornecedores diretos que cortam, costuram e dão acabamento às roupas. Mas, além dessas instalações, há muitas outras mais abaixo na cadeia de fornecimento que tecem, tingem e beneficiam materiais, até chegar nas fazendas que cultivam as fibras usadas no vestuário. Desde o desabamento do Rana Plaza, poucas práticas de fato mudaram: incêndios, acidentes trágicos e fatais em fábricas, condições de trabalho precárias e abusivas, poluição e degradação ambiental continuam sendo comuns na cadeia de fornecimento da moda global. Se não sabemos onde, por quem e sob quais condições nossas roupas são feitas, fica extremamente desafiador, se não impossível, que as partes interessadas relevantes trabalhem em conjunto para resolver os problemas antes que eles terminem em tragédia.

Transparência importa porque, simplesmente, a falta dela pode custar vidas. Sem transparência, não podemos ver ou proteger o planeta e as pessoas mais vulneráveis. Com maior transparência, sindicatos, ONGs, jornalistas e consumidores podem fazer a conexão entre as políticas de responsabilidade social corporativa e seus impactos na prática.

Os consumidores querem saber #QuemFezMinhasRoupas O Business of Fashion1 , reconhecida plataforma jornalística global, publicou recentemente que "As empresas de moda devem aceitar o fato de que um consumidor mais desconfiado espera transparência total em toda a cadeia de valor... os consumidores se tornaram mais ativos na investigação das marcas que consomem”.

1. https://www.mckinsey.com/~/media/mckinsey/industries/retail/our%20insights/thestateoffashion2019ayearofawakening/the-state-of-fashion-2019-final.pdf

Quando os consumidores estão munidos de mais informações – de melhor qualidade e credibilidade – sobre os impactos sociais e ambientais das roupas que compram, eles são capazes de fazer escolhas mais conscientes. Dessa forma, entendemos que a transparência constrói a imagem da marca e aumenta a confiança dos consumidores e que a falta dela pode prejudicar a reputação das empresas.


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O QUE SIGNIFICA TRANSPARÊNCIA? TRANSPARÊNCIA Para o Fashion Revolution, transparência é a divulgação pública de dados confiáveis, detalhados e comparáveis sobre políticas, compromissos, práticas e impactos de uma empresa em toda a sua cadeia de valor.

Transparência significa a divulgação pública de dados Transparência não se trata apenas de compartilhar as boas histórias ou o bom trabalho que as marcas estão fazendo. Frequentemente, vemos marcas se vangloriando de seus valores corporativos e de seus avanços positivos, sem compartilhar muito sobre as coisas que dão errado, os desafios complexos com os quais se deparam. Esse tipo de marketing pode ser considerado greenwashing, ou lavagem verde, que é quando a marca apenas conta sobre seus aspectos positivos, aparentando ser sustentável, sem também contar sobre seus desafios.

Da mesma forma, não é suficiente divulgar informações importantes sobre a cadeia de fornecimento somente internamente ou de forma seletiva apenas para stakeholders específicos. Algumas marcas e varejistas fazem isso há muitos anos como forma de gerenciar seus riscos e resolver eventuais problemas. No entanto, sentimos que isso não é suficiente, visto que abusos generalizados ainda acontecem de forma sistêmica por toda a indústria e, possivelmente, poderiam ser resolvidos mais rapidamente se as informações estivessem disponíveis mais livremente. A verdadeira transparência requer divulgação pública de dados.

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Se bem feita, a transparência deve possibilitar a prestação de contas

Transparência é um meio para a mudança, não um fim

A transparência permite que outros examinem o que as empresas dizem que estão fazendo para tratar de assuntos relacionados aos direitos humanos e proteger o meio ambiente. Isso significa que há informações disponíveis pelas quais outras pessoas (consumidores, investidores, legisladores, jornalistas, ONGs, sindicatos e os próprios trabalhadores) podem responsabilizar marcas e varejistas por suas políticas e práticas, especialmente quando as coisas dão errado, como o ocorrido no Rana Plaza.

A transparência, por si só, não é suficiente para resolver os vários problemas complexos e profundamente sistêmicos da indústria global da moda. No entanto, a transparência abre uma janela para observarmos as condições nas quais as nossas roupas estão sendo feitas e permite nos posicionarmos sobre essas condições de maneira mais rápida e colaborativa.

Ser transparente não significa que as empresas estão agindo de maneira responsável e sustentável. Uma marca pode publicar uma quantidade considerável de informações e dados sobre suas políticas, práticas e impactos e ainda estar contribuindo para más condições de trabalho e degradação ambiental. Por outro lado, as marcas podem estar fazendo um excelente trabalho de melhorias nos bastidores, mas se elas não compartilham publicamente essas informações, ninguém ficará sabendo e esse aprendizado não poderá ser compartilhado, e até replicado, por outras marcas e pessoas que possam vir a se interessar.

Não queremos transparência pela transparência. Os dados e informações divulgados pelas empresas precisam ser acessíveis, práticos e detalhados o suficiente para que todos possam interpretar e agir. O que cada um de nós faz com as informações disponíveis publicamente, como as usamos para gerar mudanças positivas, é o que mais importa. Nesse sentido, vemos a transparência como um importante primeiro passo para uma mudança sistêmica e estrutural na indústria da moda.


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PONTO DE VISTA:

COMO SOBREVIVER A UMA PANDEMIA: TRABALHADORES IMIGRANTES E OS IMPACTOS DA COVID-19 Foto: Nilton Vargas Aroquipa arquivo pessoal

"A transparência na cadeia da moda deveria ser uma obrigação, pois é vergonhoso perceber que ainda não conseguimos saber de onde vêm nossas roupas, como são produzidas. Não temos um rastreamento de peças ou tecidos e isso dificulta muito a nossa escolha por produtos com trabalho digno. É mais triste ainda saber que um dos melhores e mais rentáveis ramos, a indústria da moda, não conseguiu fazer com que os costureiros da ponta não passem necessidades na pandemia. Muitos costureiros que fazem milhares de peças por mês passaram fome e na primeira quinzena da pandemia já tínhamos imigrantes nos pedindo ajuda! Triste realidade a da indústria têxtil e de confecção com lucros altos e péssimas distribuições de renda. A transparência nos ajudaria a monitorar, qualificar e prevenir o trabalho análogo ao de escravo. Chamo atenção para que grandes marcas apoiem mais projetos que trabalham diretamente com esse público e valorizem aqueles que mantêm essa cadeia produtiva tão rica." Carla Aguilar, assistente social e assessora do Centro de Apoio e Pastoral do Migrante (CAMI1)

O que os trabalhadores têm a dizer Nilton Vargas Aroquipa, da Bolívia, vive há dez anos no Brasil. Ele começou a costurar sozinho e hoje tem 7 funcionários e uma produção [de vestuário] variada, no Bom Retiro, bairro que abriga diversas confecções na cidade de São Paulo. Para eles a pandemia foi um pesadelo, explica o costureiro, que completa: "No início ficamos felizes pois descansamos por uma semana. Depois tive que procurar fazer máscaras e aventais, mas o preço era muito baixo; fui vender na Estação da Sé (SP) e com isso consegui comprar comida e algumas coisas. Também saí para vender na Feira da Madrugada2 e consegui pagar umas dívidas. Sobrevivemos. Hoje a produção de vestuário já aumentou, mas [as condições de trabalho] mudaram muito. Alguns clientes abaixaram o preço, mas todos estavam desesperados para trabalhar. Tinha um valor de R$15,00 reais por camiseta e agora a mesma camisa está R$ 2,00 reais a menos. Eles [clientes] te cobram muito, mas quando fecharam tudo na pandemia, esqueceram de nós. Depois voltaram, e eu disse: ‘não é bem assim, quando começou nem ligaram e agora vocês querem que trabalhemos sábado e domingo?’. Então me coloquei firme. Infelizmente acontece muito, mas tenho que dar valor ao meu trabalho e me manter firme. Colocar o preço justo, se o cliente não topar, bato em outra porta.”

1. O Centro de Apoio e Pastoral do Migrante (CAMI), fundado em 2005, atua na promoção e proteção dos direitos humanos fundamentais, igualdade de gênero, integração social, prevenção do trabalho escravo e tráfico de pessoas. Visa a inclusão social, econômica, política e cultural dos imigrantes e dos refugiados para construir um mundo onde pessoas sejam prioridade e mulheres não sejam expostas a qualquer tipo de violência de gênero. Tem como objetivos acolher e mobilizar imigrantes e refugiados na luta por seus direitos, cidadania e empoderamento social, cultural e político; combater o trabalho escravo, a violência contra as mulheres, a xenofobia e o tráfico de seres humanos; promover o trabalho decente e o reconhecimento e fortalecimento da identidade da diversidade cultural. 2. A Feira da Madrugada começou na rua 25 de Março, no centro da cidade de São Paulo e logo em seguida migrou para a região do Brás, um dos grandes pólos de confecção da cidade . Era uma feira de rua e funcionava antes do horário das lojas abrirem e por isso ficou conhecida como ‘Feira da Madrugada’. Em 2006 a feira deixou as ruas e ocupou um antigo estacionamento de ônibus. Em 2018 foi realocada para um novo espaço conhecido como Amarelão.


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PONTO DE VISTA:

COMO SOBREVIVER A UMA PANDEMIA: TRABALHADORES DO CAMPO E OS IMPACTOS DA COVID-19 As estruturas de poder da moda foram escancaradas durante a pandemia e a classe trabalhadora, já vulnerável, ficou ainda mais suscetível às desigualdades. Grandes marcas e varejistas cancelaram pedidos prontos ou em andamento, deixando à deriva, sem salário e renda, aqueles que sustentam seu negócio. E outras médias e pequenas empresas, com muita dificuldade em equilibrar a balança, também deixaram de realizar demandas. No campo, a realidade parece ser mais facilmente contornada, mas a crise também desenha seu impacto.

Foto: Rita Ambrosio - arquivo pessoal

Foto: Francisco Renê Mora - arquivo pessoal

O que os trabalhadores têm a dizer Rita Ambrosio, de 41 anos, mora na comunidade da Cachoeira do Peixe, Ceará, desde pequena. Ela vive da agricultura e teve conhecimento e passou a produzir algodão há alguns anos. Como provedora da família, encara com muita dificuldade os impactos da pandemia e relata: "Hoje sabemos o valor que nós, agricultores, temos e nosso trabalho é fundamental; meu filho fala que se a gente não trabalha, a cidade não come. No início [da pandemia], foi muito difícil, porque a gente estava no período de plantação, então ficava muito reservado e com medo que doença se espalhasse em nosso interior; mexeu muito com a estrutura da produção e rendemos menos".

Francisco Renê Mota, da comunidade agroecológica de Crateús, no sertão do Ceará, sempre trabalhou com agroecologia e em 2017 teve contato com o Esplar1 que possibilitou ao agricultor conseguir uma certificação orgânica. De acordo com Francisco: "A agroecologia envolve toda a vida, não só ser orgânico e não ter agrotóxico. Tem muitas lutas constantes contra o Estado, contra os patrões e os grandes latifundiários, mas já evoluímos muito, passamos de uma condição bem explorada para uma condição de vida melhor. Quem vai pro campo é nossa família: eu, minha mãe, meus irmãos, então não teve muito essa coisa de parar, não [durante a pandemia]. Nossa mão de obra somos nós mesmos, é uma agricultura de subsistência."

1. O Esplar é uma organização não governamental, sem fins lucrativos, fundada em 1974, no município de Fortaleza, estado do Ceará. A organização atua diretamente em municípios do semiárido cearense, desenvolvendo atividades para a agroecologia e da agricultura familiar.


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OBJETIVO DA PESQUISA O Fashion Revolution pede maior transparência ao longo de toda a indústria da moda desde 2013 e a nossa campanha #quemfezminhasroupas nas mídias sociais já inspirou milhões de pessoas ao redor do mundo a agirem. Visando fortalecer esse trabalho, nossa comunidade pediu que a ajudássemos a interpretar informações sociais e ambientais que vêm sendo compartilhadas por grandes marcas e varejistas. Nossa comunidade quer saber quais informações devem esperar que as grandes marcas divulguem publicamente, o que essas informações significam, como colocá-las em um contexto mais amplo e como usá-las para gerar mudanças. Nós criamos o Índice de Transparência da Moda com esse objetivo.

Desenvolvemos o Índice para: •

Comparar o nível de transparência entre as maiores marcas e varejistas de moda que atuam no Brasil; Incentivar as grandes marcas e varejistas a divulgar mais informações críveis, comparáveis e detalhadas, ano a ano;

Analisar as tendências sobre transparência em todo o setor de moda nacional;

Formar o nosso próprio entendimento sobre o que é transparência e usar esse conhecimento para ajudar a definir nossos esforços contínuos de campanhas.

Embora não tenha sido necessariamente a nossa intenção, as marcas e varejistas participantes nos relatam que o Índice se tornou um exercício útil para que elas façam um balanço do que já estão divulgando e onde existe espaço para melhorias.

transparência prestação de contas

Este não é um guia de compras O Índice de Transparência da Moda não é uma indicação de quais marcas são “boas” ou “ruins”. Não estamos recomendando ou endossando nenhuma das marcas e varejistas pesquisadas, independentemente de suas pontuações. O objetivo é entender a quantidade de informações sobre impactos sociais e ambientais que são compartilhadas pelas maiores marcas que operam no Brasil, impulsionando uma maior divulgação pública sobre elas e usando essas informações a fim de responsabilizá-las, quando necessário.

mudança


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SOBRE A METODOLOGIA

O Índice de Transparência da Moda usa uma metodologia que classifica as empresas de acordo com a divulgação pública de suas informações dentro de cinco seções que abordam: •

Políticas e compromissos sociais e ambientais

Governança

Rastreabilidade da cadeia de fornecimento

A metodologia foi desenvolvida em 2017 por meio de um processo consultivo de quatro meses. Contamos com a contribuição pro-bono de um grupo diversificado de especialistas de diversas áreas da indústria como academia, movimentos sindicais, organizações da sociedade civil, investidores socialmente responsáveis, consultores de negócios e jornalistas. Entre outros, o grupo de especialistas incluiu: •

Dr. Mark Anner, Diretor do Centro dos Direitos dos Trabalhadores Globais, da Penn State University

Aruna Kashyap, Human Rights Watch

Kate Larsen, SupplyESChange Initiative

Conhecer, comunicar e resolver (devida diligência e remediação de assuntos ligados à cadeia de fornecimento)

Neil Brown, Liontrust Asset Management PLC

Dr. Alessandra Mezzadri, SOAS, Universidade de Londres

Katie Shaw, Open Apparel Registry

Tópicos em destaque (condições de trabalho, consumo, composição de materiais/produtos e clima)

Professor Ian Cook, Universidade de Exeter

Subindu Garkhel, Fairtrade Foundation

Francois Souchet, Ellen MacArthur Foundation

Christina Hajagos-Clausen, IndustriALL Global Union

Joe Sutcliffe, conselheiro do Trabalho Digno, CARE International

Kristian Hardiman, Good On You

Ben Vanpeperstraete, especialista em direitos humanos


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COMO AS MARCAS E VAREJISTAS SÃO PONTUADAS Os pontos são concedidos apenas com base nas informações divulgadas publicamente por meio dos seguintes canais: •

Site da marca/varejista;

Site do grupo ao qual a marca/ varejista pertence (desde que esteja vinculado ao site principal da marca/varejista);

Site de relações com investidores da marca/varejista (desde que esteja vinculado ao site principal da marca/varejista); Sites de terceiros (mas apenas quando vinculados diretamente ao site da marca/varejista); Relatórios anuais de sustentabilidade ou de responsabilidade social, publicados pela marca/varejista (desde que estejam vinculados ao site principal da marca/varejista e tenham sido publicados depois de janeiro de 2018);

Demonstrativos financeiros publicados pela marca/varejista (desde que estejam vinculados ao site principal da marca/varejista);

Documentos que estejam disponíveis ao público e possam ser baixados de forma livre e acessível no(s) site(s) da marca/varejista.

Não são concedidos pontos com base nas informações divulgadas por meio dos seguintes canais: •

Etiquetas ou tags de produtos;

Lojas ou outros locais físicos;

Aplicativos de smartphone;

Canais de mídia social;

Sites ou documentos de terceiros em que não haja nenhum link do site da própria marca, incluindo artigos de imprensa;

Documentos para download em que o link não pode ser encontrado no site da marca.

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Adaptação da metodologia ao contexto brasileiro Para a implementação da primeira edição do Índice de Transparência da Moda Brasil, em 2018, o Fashion Revolution Brasil contou com a parceria técnica do FGVces (Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas), que atuou tanto na adaptação da metodologia ao contexto brasileiro como na realização da pesquisa. Essa adequação ocorreu principalmente na seção ‘Tópicos em Destaque’, onde há a possibilidade de se eleger novos assuntos, emergentes e urgentes, para o contexto local. Naquela ocasião, após pesquisarmos e consultarmos diferentes especialistas da indústria brasileira, definimos que seria importante trazer à pauta questões de igualdade racial e condições de trabalho de imigrantes contratados na cadeia da moda. Foram poucos os ajustes, de forma que os processos de análise foram rigorosamente mantidos sem prejudicar a comparação dos resultados com a metodologia global. Desde 2019, demos continuidade ao trabalho de revisão do conteúdo e da estrutura do questionário com a mesma equipe técnica parceira, que agora atua pela consultoria ABC Associados. Assim como em 2018, essa equipe também nos apoiou nas etapas de identificação e avaliação das marcas a serem apresentadas no Índice.

Além disso, é importante notar que é possível haver diferentes informações para marcas incluídas em ambos os Índices, global e brasileiro, devido ao período do ano em que a pesquisa foi realizada para cada relatório. Cada análise utilizou as informações mais recentes disponíveis no momento em que foi realizada, o que pode ter resultado em diferenças na pontuação final das marcas.

Para maiores detalhes, acesse aqui o modelo do questionário brasileiro enviado para as marcas nesta edição.

Reconhecemos que a metodologia não é perfeita e que pode sempre ser melhorada. Portanto, comentários e sugestões de como aprimorá-la são bem-vindos e podem ser enviados para educacional.brasil@fashionrevolution.org


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ATUALIZAÇÕES ANUAIS NA METODOLOGIA Todos os anos, nossa equipe analisa todos os indicadores presentes no questionário enviado às marcas com o intuito de deixar sua redação mais clara, identificar novos ‘Tópicos em Destaque’, considerando as tendências mais importantes do setor, e reavaliando a metodologia de forma a garantir que ela permaneça atualizada e continue atuando como propulsora das melhores práticas da indústria em relação à transparência. A metodologia se baseia em padrões e referências internacionais como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos da ONU, as Diretrizes de Due Diligence da OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, as convenções da Organização Internacional do Trabalho e o Guia de Recrutamento Responsável do Instituto de Direitos Humanos e Negócios (IHRB). Ela também foi desenvolvida com a intenção de se alinhar ao máximo a outras referências e iniciativas relevantes do setor, como a Transparency Pledge, a Corporate Human Rights Benchmark e a Know The Chain.

Atualmente, existem 220 indicadores na metodologia do Índice de Transparência da Moda global e 221 no Índice brasileiro21. A ponderação das pontuações procura recompensar os maiores níveis de detalhamento das informações, especialmente quando se trata da publicação de listas de fornecedores, dos resultados de suas avaliações e auditorias, dados salariais etc. Em outras palavras, recompensamos a divulgação de dados que permitam que atores externos interessados os utilizem de forma significativa para responsabilizar as marcas. Lembrando que quando as marcas zeram a pontuação não significa necessariamente que não tenham iniciativas, programas ou políticas implementadas. Isso pode significar apenas que não estejam divulgando suas ações publicamente. Mudanças na metodologia podem afetar a comparabilidade ano a ano dos resultados. Para os casos de marcas que podem ter pontuado um ou dois pontos percentuais para cima ou para baixo em

2. Saiba mais em ‘Adaptação da metodologia ao contexto brasileiro’

comparação ao ano passado, isso pode ocorrer devido a pequenas mudanças na metodologia, como inclusão ou exclusão de perguntas, ou ajuste na sua pontuação. Nossa equipe de pesquisa se empenhou para realizar a análise da maneira mais completa, precisa e imparcial possível, mas é importante lembrar que existem limitações para uma pesquisa de base documental como esta. Em primeiro lugar, o erro humano é inteiramente possível, sendo que existem 221 indicadores na metodologia brasileira de 2020, aplicados em 40 marcas, somando mais de 8 mil dados individuais. Além disso, algumas empresas produzem relatórios anuais que possuem mais de 400 páginas, cada um com seu formato específico, o que abre espaço para uma margem de erro tanto na coleta como na comparação de dados. Em segundo lugar, esta pesquisa captura informações disponíveis em apenas um momento no tempo e as marcas e varejistas podem retirar ou divulgar novas informações a qualquer momento.

Por isso, preferimos enfatizar no relatório as faixas de pontuação em que as marcas se encontram e não suas pontuações individuais. As faixas revelam padrões de divulgação e tendências da indústria em relação à transparência, em vez de medições precisas sobre o desempenho específico de cada marca. Por fim, gostaríamos de enfatizar que o Índice de Transparência da Moda não oferece uma análise detalhada do conteúdo, qualidade ou precisão das políticas, procedimentos, desempenho e progresso das marcas em qualquer área específica. A verificação de alegações feitas pelas marcas e varejistas está além do escopo desta pesquisa. Por isso, incentivamos outros stakeholders a acessarem e avaliarem as informações encontradas. Essa é uma importante maneira de responsabilizar publicamente essas grandes empresas por suas práticas e processos. Esperamos que você use essas informações para questionar e cobrar que as declarações feitas pelas marcas sejam colocadas em prática.


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Como calculamos os resultados: • Todas as pontuações foram calculadas com duas casas decimais (na versão completa do dataset) e depois foram arredondadas para o ponto percentual inteiro mais próximo (o que você lerá neste relatório). • Na maioria das vezes, as diferenças anuais nas pontuações são descritas por meio da diferença em pontos percentuais, que significa o valor real do que mudou, ao invés da variação da porcentagem, que significa uma taxa de variação (a menos que seja explicitamente declarado de outra forma). Por exemplo, se uma marca atingiu 30% em um ano e 45% no próximo, geralmente relatamos que a marca aumentou 15 pontos percentuais (45-30 = 15), ao invés de dizer que a marca teve uma melhoria de 50% no seu desempenho (45/30 = 1,5).

• Todos as médias apresentadas neste relatório representam seus valores reais. • Quando uma pontuação tiver sido arredondada para o ponto percentual mais próximo nas edições anteriores, calculamos a diferença de ano a ano de acordo com os números arredondados e não com as casas decimais exatas. Por exemplo, quando a pontuação média em uma seção específica é 17,74%, arredondamos para 18%. Se em algum relatório anterior a pontuação média nessa seção foi de 12,41%, arredondamos para 12% no relatório. Portanto, a diferença ano a ano tecnicamente é de 5,33 pontos percentuais, mas, se considerarmos os números arredondados mais próximos, ela aparecerá como 6 pontos percentuais.

21

“ Transparência é o primeiro passo para uma cultura diferente, onde as marcas se tornam abertas e responsáveis, e os consumidores estão prontos para ficar vigilantes e perguntar quem fez minhas roupas“ Orsola de Castro

Cofundadora, Fashion Revolution


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O PESO DA PONTUAÇÃO 1.

2.

POLÍTICAS E COMPROMISSOS

GOVERNANÇA

Esta seção explora as políticas de direitos humanos e meio ambiente das marcas para seus próprios funcionários e fornecedores, como essas políticas são implementadas, como a empresa prioriza determinadas questões, quais objetivos ela tem estabelecidos e se ela está relatando seu progresso anual.

PESO (%)

3.

18.8%

Aqui buscamos por quem da diretoria executiva da marca tem a principal responsabilidade por questões de direitos humanos e meio ambiente, como isso é implementado, se o departamento e a pessoa responsáveis por essas questões podem ser facilmente contactados pelo público e como o programa de benefícios dos funcionários, CEO e fornecedores estão ligados a melhorias na gestão de direitos humanos e meio ambiente.

4.8%

4.

5.

RASTREABILIDADE

CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER

TÓPICOS EM DESTAQUE

Nesta seção, buscamos pela publicação das listas de fornecedores dos três níveis de fornecimento das empresas: unidades de produção, instalações de processamento e produção de matérias-primas. Também procuramos pelo detalhamento de informações, como endereço do fornecedor, número de trabalhadores, distribuição por gênero e raça, número de trabalhadores migrantes, representação sindical e quando a lista de fornecedores foi atualizada pela última vez.

Aqui analisamos quais informações a empresa publica sobre seus processos de devida diligência ambiental e de direitos humanos, com seus respectivos resultados, o que a empresa está fazendo para remediar quaisquer problemas identificados, como ela avalia a implementação de suas políticas na cadeia de fornecimento, e como ela assegura que as reclamações relacionadas a direitos humanos e meio ambiente feitas por funcionários próprios e outros trabalhadores sejam ouvidas e sanadas.

Nesta seção final, exploramos o que as marcas estão fazendo para lidar com questões como o combate ao trabalho escravo contemporâneo, igualdade de gênero, igualdade racial e não discriminação entre nacionalidades, pagamento de salários dignos, liberdade de associação, desperdícios de produção, circularidade, superprodução, uso de materiais mais sustentáveis, microplásticos, desmatamento, mudanças climáticas e uso da água.

31.6%

25.2%

19.6%


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23

COMO A PESQUISA É CONDUZIDA

PROCESSO DE PESQUISA E ENGAJAMENTO

O processo de pesquisa é organizado em três fases. Na primeira, a equipe realiza um levantamento preliminar dos dados disponíveis publicamente sobre cada marca avaliada e os inclui na planilha onde o questionário é apresentado. Em seguida, na segunda fase, os questionários com essas informações preliminares são enviados às marcas para que cada uma possa identificar e incluir informações que eventualmente não foram encontradas. Para esta versão do Índice, as marcas tiveram aproximadamente um mês para revisar e preencher o questionário. Na terceira fase, os questionários preenchidos pelas marcas foram novamente avaliados por nossa equipe e, somente quando apropriado, as informações incluídas pelas marcas foram aceitas e as novas pontuações foram concedidas.

Agosto - Novembro 2019 Atualizações da metodologia global: revisão anual, incluindo ajustes, quando necessários, nos indicadores existentes no questionário, bem como a seleção de novos Tópicos em Destaque.

Algumas marcas optaram por não participar da segunda fase do processo de avaliação. Entretanto, destacamos que nossos pesquisadores revisaram e pontuaram todas as marcas, independentemente de terem recebido o retorno dos questionários preenchidos por elas. Nesse sentido, é importante lembrar que a metodologia se baseia somente na análise de informações públicas. A pesquisa de dados foi conduzida pelas equipes do Fashion Revolution Brasil, Fashion Revolution e ABC Associados. Caso alguma imprecisão seja notada, sugerimos entrar em contato conosco pelo educacional. brasil@fashionrevolution.org e levaremos os comentários em consideração para a próxima edição.

Agosto - Setembro Revisão final dos questionários: após aproximadamente um mês, as marcas retornam os questionários preenchidos e a equipe de pesquisa analisa cada resposta, fornecendo pontos adicionais, desde que as novas informações tragam evidências suficientes para o que estamos buscando. Nessa etapa são realizadas várias rodadas de revisão pela equipe, para garantir a acuracidade dos dados antes que as pontuações de cada marca sejam fechadas.

Abril Atualizações da metodologia brasileira: revisão anual, considerando os ajustes feitos na metodologia global e a necessidade de possíveis adaptações para o contexto brasileiro. Seleção das 10 novas empresas incluídas na pesquisa.

Julho Questionários enviados para as marcas: as marcas são convidadas a preencher os questionários com dados que eventualmente nossa equipe de pesquisa não tenha encontrado e/ou com informações públicas mais atualizadas.

Setembro - Novembro Os dados são compilados, a análise é concluída e o relatório é preparado: os dados de todos os questionários das marcas são transpostos para uma ferramenta de análise conjunta dos dados completos (dataset). O dataset é utilizado como base para a produção deste relatório final.

Maio - Junho

Pesquisa e engajamento com as marcas e varejistas selecionadas: a equipe de pesquisa analisa cada marca, preenchendo previamente o questionário do Índice com todas as informações públicas encontradas. Na sequência, é feita uma rodada de revisão para verificar a precisão das respostas encontradas. Em paralelo, são realizados 2 encontros com os representantes das marcas para apresentar o projeto, promover reflexões sobre a importância de maior transparência para o setor e detalhar a metodologia e processo de análise do Índice.

Novembro Lançamento do Índice de Transparência da Moda Brasil: a edição de 2020 é lançada online em parceria com o Rio Ethical Fashion.


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CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DAS MARCAS O processo de seleção das marcas31 avaliadas foi realizado conjuntamente pelas equipes do Fashion Revolution Brasil e da ABC Associados, tendo como premissa que esta terceira edição do Índice de Transparência da Moda Brasil revisaria 40 marcas. Entendemos que o volume da amostra ainda não é suficiente para representar o mercado de moda brasileiro como um todo e, por isso, procuramos selecionar marcas de diferentes segmentos com o objetivo de abranger a diversidade do setor. Assim, a distribuição incluiu os segmentos de varejo, jeans, jovem, casual, luxo, adulto, calçados, esporte, praia e moda íntima. A definição das marcas de cada segmento foi baseada em pesquisas sobre a relevância de cada uma, tendo como referência três fatores: o volume de negócios anual, a diversidade de segmentos de mercado e o posicionamento como top of mind4.2

Com relação ao volume de negócios, foram avaliadas informações referentes ao desempenho financeiro das marcas e varejistas, divulgadas publicamente nos sites das empresas. No entanto, algumas empresas são de capital fechado e não divulgam seus resultados financeiros. Nesses casos, nos baseamos em publicações de terceiros, com grande veiculação nacional, com estimativas de faturamentos e volumes de negócios. Nos casos em que as informações encontradas dizem respeito a um grupo detentor de diferentes marcas, selecionamos a marca, ou marcas, que aparentam ser mais significativas em termos de faturamento e reconhecimento pelos consumidores (top of mind). Listamos propositadamente marcas e não os grupos controladores, pois é com as marcas que os consumidores estão mais familiarizados.

3. Geralmente usamos somente o termo 'marcas' para indicar marcas e varejistas. 4. Top of Mind é um termo em inglês utilizado como uma maneira de qualificar as marcas que são mais populares entre os consumidores.

24

As 30 marcas e varejistas revisadas no relatório de 2019 permaneceram nesta edição, e somamos outras 10. Pretendemos, em 2021, continuar expandindo o número de empresas revisadas. Este ano 52,5% das marcas participaram da segunda fase do processo de avaliação, devolvendo o questionário preenchido. Incluímos marcas no Índice, independentemente de recebermos o retorno dos questionários preenchidos por elas ou não. No entanto, as marcas que participam normalmente recebem pontuações mais altas, pois são capazes de identificar divulgações relevantes que nossos pesquisadores podem não ter encontrado.

Q UA N TA S M A R C A S PA R T I C I PA R A M E M 2020

52,5%

35%

Preencheram o questionárioo

Não responderam

12,5%

Declinaram a oportunidade de responder o questionário


FASHION REVOLUTION | ÍNDICE DE TRANSPARÊNCIA DA MODA BRASIL 2020

AS 40 MARCAS SELECIONADAS

25

= marcas que responderam o questionário

Animale (Grupo Soma)

Farm (Grupo Soma)

Moleca (Calçados Beira Rio S. A.)

Arezzo (Arezzo&Co)

Forum (AMC Têxtil)

Netshoes (Magazine Luiza)

Brooksfield (Grupo Via Veneto)

Havaianas (Alpargatas)

Olympikus (Vulcabrás)

Carmen Steffens (Couroquímica/Carmen Steffens)

Hering (Cia Hering)

Osklen (Alpargatas)

C&A

Ipanema (Grendene)

Pernambucanas

Centauro

John John (Restoque)

Puket (Grupo Uni.co)

Cia. Marítima (Grupo Rosset)

Le Lis Blanc Deux (Restoque)

Renner (Lojas Renner S.A.)

Colcci (AMC Têxtil)

Leader

Riachuelo (Grupo Guararapes)

Colombo

Lojas Avenida (Grupo Avenida)

TNG

Dafiti (GFG LatAm)

Lojas Pompéia (Grupo Lins Ferrão )

Torra

Decathlon

Lupo

Youcom (Lojas Renner S.A.)

Di Santinni

Malwee (Grupo Malwee)

Zara (Inditex)

Dumond (Grupo Paquetá)

Marisa

Ellus (InBrands)

Melissa (Grendene)


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2 OS RESULTADOS FINAIS

26

Para baixar a planilha completa com os resultados, acesse aqui.


FASHION REVOLUTION | FASHION TRANSPARENCY INDEX 2020

27

GUIA PARA OS RESULTADOS 0—10%

11—20%

21—30%

Os questionários enviados para as marcas possuem uma pontuação máxima de 250 pontos, os quais são convertidos em porcentagens e arredondados para o número inteiro mais próximo. Escolhemos intencionalmente agrupar as marcas em faixas de porcentagem para que os leitores se concentrem nos padrões e tendências emergentes de divulgação por parte das empresas, ao invés de focar em seus resultados individuais.

31—40%

41—50%

51—60%

61—70%

71—80%

81—90%

91—100%

TRANSPARÊNCIA Marcas com pontuação entre 0 e 5% não divulgam quaisquer informações relacionadas ao Índice ou somente um número muito limitado de políticas, que muitas vezes estão relacionadas a práticas de contratação de funcionários ou a atividades de envolvimento com a comunidade local. Nesse sentido, as marcas com pontuação entre 5% e 10% tendem a publicar algumas políticas para seus próprios funcionários e para fornecedores.

As marcas com pontuação entre 11% e 20% estão mais propensas a publicarem diversas políticas e algumas informações sobre seus procedimentos e relacionamentos com fornecedores. Porém, é provável que essas marcas não estejam divulgando suas listas de fornecedores, processos de avaliação de fornecedores e outras práticas mais avançadas, como as encontradas na seção ‘Tópicos em Destaque’.

As marcas com pontuação entre 21% e 30% geralmente publicam informações mais detalhadas sobre suas políticas, procedimentos, metas sociais e ambientais e processos de avaliação e remediação de fornecedores. No entanto, essas marcas não compartilham informações sobre os resultados de suas avaliações de fornecedores. Elas podem estar publicando uma lista de alguns fornecedores, principalmente os de nível 1, mas não necessariamente com muitos detalhes além do nome e endereço das fábricas. Normalmente, essas marcas não divulgam informações amplas sobre os ‘Tópicos em Destaque’.

Marcas com pontuação entre 31% e 40% são as que geralmente publicam listas de fornecedores, além de informações mais detalhadas sobre suas políticas, procedimentos, metas sociais e ambientais, avaliação de fornecedores e processos de remediação. Essas marcas também têm maior propensão a abordar alguns dos ‘Tópicos em Destaque’, como igualdade de gênero, soluções para lidar com resíduos têxteis, uso de materiais sustentáveis e dados sobre a pegada de carbono de suas próprias instalações.

Marcas com pontuação entre 41% e 50% são as que tendem a publicar listas de fornecedores de nível 1 e instalações de beneficiamento mais detalhadas. Além disso, divulgam informações detalhadas sobre suas políticas, procedimentos, metas sociais e ambientais, processos de avaliação e resolução de problemas com os fornecedores e resultados gerais dessas avaliações. É provável que essas marcas também estejam abordando algumas questões dos ‘Tópicos em Destaque’, como a disparidade salarial entre homens e mulheres, a negociação coletiva, uso de materiais sustentáveis, as soluções para lidar com resíduos têxteis, circularidade e a pegada de carbono e hídrica das suas próprias instalações. Em 2020, apenas uma empresa se posicionou nesta faixa.

Marcas com 51% a 60% dos pontos tendem a divulgar todas as informações já descritas nas outras faixas e também listas mais detalhadas de fornecedores, do nível 1 às fontes de matériaprima. Provavelmente essas marcas publicam informações mais detalhadas sobre os resultados de suas avaliações de fornecedores e atendem a mais questões dos ‘Tópicos em Destaque’, como combate ao trabalho escravo contemporâneo, negociação coletiva, disparidade salarial entre homens e mulheres, uso de materiais sustentáveis, desperdício de produtos têxteis e pegadas hídrica e de carbono.

Marcas que pontuam entre 61% a 70% divulgam todas as informações já descritas nas outras faixas e publicam listas mais completas de fornecedores, desde o nível 1, até instalações de processamento e beneficiamento e fornecedores de matérias-primas como algodão e viscose. Essas marcas provavelmente compartilham relativamente mais informações do que as demais na seção dos ‘Tópicos em Destaque’. Em 2020, somente uma marca se posicionou nesta faixa.

Marcas com pontuação entre 71% a 80% divulgam todas as informações já descritas anteriormente, além de publicar informações mais detalhadas sobre fornecedores, desde o nível 1 até as matériasprimas. Além disso, essas marcas publicam informações mais detalhadas sobre seus processos e resultados de devida diligência, avaliações de fornecedores e processos de remediação. Essas marcas divulgam informações e dados comparativamente mais abrangentes e detalhados do que as outras marcas na seção dos ‘Tópicos em Destaque’. Na versão 2020 do Índice brasileiro, apenas uma empresa se posicionou nesta faixa.

Nenhuma marca obteve pontuação acima de 80%, mas, se o fizessem, divulgariam todas as informações já descritas anteriormente, além de publicar informações mais detalhadas sobre resultados de avaliações e soluções para instalações específicas e listas mais detalhadas de fornecedores para pelo menos 95% de todos os fornecedores, desde o nível 1 até as matérias-primas. Essas marcas provavelmente mapeariam os impactos sociais e ambientais dentro da perspectiva financeira de seus modelos de negócio e divulgariam dados mais amplos sobre o uso de materiais sustentáveis. Seria possível encontrar mais detalhes sobre as disparidades salariais entre homens e mulheres e como as questões relacionadas a gênero estão sendo abordadas na cadeia de fornecimento. Essas marcas divulgariam informações detalhadas sobre suas práticas de compra, seu progresso no combate ao trabalho escravo contemporâneo e o pagamento de um salário justo para viver para os trabalhadores de sua cadeia de fornecimento. Além disso, essas marcas divulgariam suas emissões de carbono, o uso de energia renovável e a pegada hídrica de suas próprias operações até as instalações no nível de obtenção de matéria-prima.


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28

OS RESULTADOS FINAIS 0 - 10%

11 - 20%

LUPO

9%

ELLUS

AREZZO

21 - 30%

31 - 40%

41 - 50%

RIACHUELO

30%

ZARA

40%

5%

DECATHLON

24%

MELISSA

CENTAURO

3%

FARM

24%

DUMOND

3%

ANIMALE

NETSHOES

2%

TORRA

2%

PUKET

1%

BROOKSFIELD

0%

CARMEN STEFFENS

0%

CIA. MARÍTIMA

0%

COLCCI

0%

COLOMBO

0%

DI SANTINNI

0%

FÓRUM

0%

LEADER

0%

LOJAS AVENIDA

0%

LOJAS POMPÉIA

0%

MOLECA

0%

OLYMPIKUS

0%

TNG

0%

12%

DAFITI

51 - 60%

61 - 70%

RENNER

59%

39%

YOUCOM

59%

IPANEMA

38%

HERING

57%

21%

PERNAMBUCANAS

38%

HAVAIANAS

55%

JOHN JOHN

21%

MARISA

34%

OSKLEN

51%

LE LIS BLANC

21%

42%

MALWEE

71 - 80% 68%

* As marcas são classificadas em ordem numérica dentro de uma pontuação máxima de 250 pontos e apresentadas aqui em forma de porcentagem arredondada. Quando as marcas têm a mesma pontuação percentual, elas são listadas em ordem alfabética.

C&A

81 - 90% 74%

91 - 100%


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29

DESCOBERTAS RÁPIDAS Nenhuma marca pontou acima de 80%

13 marcas (33%) não pontuaram

Pontuação média geral foi 52 (21%) de 250 pontos

Apenas 1 marca pontuou acima de 70%

Nº DE MARCAS

15

10

5

0

1-10

11-20

21-30

31-40

41-50

51-60

61-70

71-80

81-90

91-100

PONTUAÇÃO FINAL (%)

TRANSPARÊNCIA


FASHION REVOLUTION | ÍNDICE DE TRANSPARÊNCIA DA MODA BRASIL 2020

3 OS RESULTADOS FINAIS POR SEÇÃO

30


FASHION REVOLUTION | ÍNDICE DE TRANSPARÊNCIA DA MODA BRASIL 2020

31

PONTUAÇÕES MÉDIAS AO LONGO DAS SEÇÕES 1.

32%

POLÍTICAS E COMPROMISSOS As marcas que mais pontuaram nesta seção foram C&A, Zara, Hering e Malwee com, respectivamente, 93%, 87%, 80% e 80%, ou seja, 44, 41 e 38 de 47 pontos. Somente 12 marcas (30%) pontuaram acima de 50%. Apesar de 17 (43%) marcas estarem localizadas na faixa mais baixa de pontuação (0-10%), houve um aumento de 4 pontos percentuais na média geral desta seção de 2019 para 2020. Se compararmos somente o desempenho das 20 marcas analisadas desde 2018, é possível observar um aumento de 15 pontos percentuais na seção 1. Comparando esta seção com as demais, notamos que as marcas continuam divulgando mais sobre suas políticas e compromissos do que sobre os outros assuntos deste relatório.

2.

24%

3.

25%

GOVERNANÇA

RASTREABILIDADE

A Malwee foi a marca que mais pontuou nesta seção, atingindo 92% dos pontos disponíveis. A C&A e a Zara alcançaram a segunda melhor pontuação, ambas com 83%, e uma grande concentração de marcas pontuadas (9 marcas) ficou na faixa de 31% a 40%.

Observamos um aumento positivo no número de marcas que publicaram suas listas de fornecedores este ano. Em 2020, 17 (43%) marcas publicaram suas listas de fornecedores nível 1, 13 (33%) divulgaram suas instalações de processamento/beneficiamento, e 8 (20%) publicaram contatos de seus fornecedores de matériasprimas. As cinco marcas que mais pontuaram nesta seção foram a Havaianas, com 95%, seguida pela Malwee com 94% e pela C&A, Renner e Youcom, todas com 82%.

No total, 19 marcas zeraram essa seção. Isso indica uma falta de divulgação pela maioria das marcas sobre quem são os responsáveis pelas questões sociais e ambientais dentro das empresas e quais são as suas informações de contato. Também pouco se divulga sobre quem assume responsabilidades no nível do conselho e como as equipes (além da equipe de sustentabilidade) e os fornecedores são incentivados a melhorar seu desempenho social e ambiental. Em comparação ao resultado de 2019, houve um leve aumento de 3 pontos percentuais na média geral desta seção. Entretanto, se compararmos somente o desempenho das 20 marcas analisadas desde 2018, é possível observar um aumento de 9 pontos percentuais.

Entre 2019 e 2020, esta foi a seção que apresentou maior evolução considerando o número total de marcas, obtendo um aumento de 8 pontos percentuais na média geral de um ano para o outro. Se levarmos em conta somente as 20 marcas analisadas em 2018, esse aumento se torna bastante significativo, apresentando uma evolução de 28 pontos percentuais na média geral das marcas de um ano para o outro. Ao compararmos com os resultados do Índice global, esta é a única seção que coloca o Brasil em posição de liderança, com a média geral de 25% contra 16%.

4.

14%

CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER Metade da marcas analisadas se encontra na faixa de 0 a 10% nesta seção, divulgando pouquíssimo, ou nada, sobre os processos de devida diligência e ações corretivas junto a seus fornecedores. Somente uma marca (C&A) pontuou acima de 50% e 5 marcas (Malwee, Havaianas, Hering, Osklen e Zara) pontuaram na faixa de 41 a 50%. O restante das marcas (14 marcas) ficou na faixa entre 11% e 30%. Identificou-se que as marcas normalmente divulgam seus procedimentos de avaliação de fornecedores. Porém, ainda compartilham poucas informações sobre os resultados desses esforços e o que fazem quando não conformidades são identificadas em suas cadeias de fornecimento. Esta seção teve um suave aumento de 4 pontos percentuais em comparação a 2019. Porém, se compararmos apenas as 20 marcas analisadas desde 2018, podemos observar um aumento de 11 pontos percentuais na média geral.

5.

11%

TÓPICOS EM DESTAQUE Esta é a seção com a menor pontuação média esse ano, e com o menor aumento em relação a 2019: somente 2 pontos percentuais. As marcas que mais se destacaram aqui foram a C&A, com 59%, e a Zara, com 45%. Foram 31 (78%) as marcas que ficaram abaixo de 20% e, dessas, 18 zeraram. Isso significa que essas marcas publicam pouquíssima ou nenhuma informação relacionada a suas condições de trabalho (alinhada ao ODS 8: Trabalho decente e crescimento econômico), igualdade de gênero (alinhada ao ODS 5: Igualdade de gênero) e igualdade racial e discriminação entre nacionalidades (alinhada ao ODS 10: Redução das desigualdades). Além disso, carecem informações sobre como as marcas abordam questões relacionados a consumo e sobre a composição de seus materiais/produtos (alinhada ao ODS 12: Consumo e produção responsáveis) e suas medidas para trabalhar para uma gestão sustentável e eficiente dos recursos naturais (alinhada ao ODS 13: Ação contra a mudança global do clima).

Na edição passada consideramos a variação percentual para calcular as diferenças entre as pontuações de 2018 e 2019. Neste ano, estamos considerando a diferença de pontos percentuais entre um ano e outro.


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1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS ABORDAGEM Quais políticas e procedimentos de direitos humanos e meio ambiente as marcas e varejistas divulgam publicamente? Nesta seção, pesquisamos quais políticas e procedimentos as marcas divulgam tanto no nível da empresa (relacionadas aos funcionários das próprias operações em sedes, lojas, armazéns e instalações de produção próprias) e no nível dos fornecedores (por meio de um código de conduta ou outro documento de orientação para fornecedores).

Prioridades sociais e ambientais com metas mensuráveis e de longo prazo Nesta seção, também analisamos se as marcas e varejistas estão divulgando a forma como priorizam aspectos relacionados a direitos humanos e questões ambientais. Esses tipos de priorização costumam ser encontrados na forma de matrizes de materialidade, ressaltando quais temas são considerados mais relevantes ou de maior risco para as marcas e seus stakeholders.

Além disso, pesquisamos se as marcas estão publicando metas ou planos estratégicos para diminuir seus impactos sociais e ambientais ao longo de suas cadeias de fornecimento. Essas metas somente foram contabilizadas pela pesquisa quando apontavam para o futuro de forma clara, mensurável e com prazos definidos para um período de 2020 em diante. As empresas também marcaram um ponto adicional no caso desse progresso ser relatado anualmente. Por fim, analisamos se as marcas e varejistas têm seus relatórios anuais de sustentabilidade ou de responsabilidade social corporativa (RSC) auditados por terceira parte independente.

Analisamos as seguintes questões: • Antissuborno, corrupção e apresentação de informações falsas • Assédio e violência

• Horas de trabalho e intervalos de descanso • Liberdade de associação, direito de organização e negociação coletiva

• Aviso prévio, demissão e sanção disciplinar • Lista de substâncias restritas • Bem-estar animal

• Mão de obra estrangeira e migrante

• Biodiversidade e conservação

• Pagamento de horas extras

• Condições de habitações/dormitórios • Contratos e termos empregatícios

• Resíduos e/ou reciclagem (embalagem/escritório/varejo)

• Direitos relacionados à maternidade e licença parental

• Resíduos e/ou reciclagem (produtos/têxteis)

• Discriminação

• Salários e benefícios financeiros (ex.: bônus, seguro, previdência social, pensão)

• Diversidade e inclusão • Efluentes líquidos e tratamento • Energia e/ou emissões de carbono • Engajamento com a comunidade • Equiparação salarial • Férias anuais e feriados públicos

• Saúde e segurança • Subcontratação, terceirização e pessoal que trabalha em casa • Trabalho escravo contemporâneo • Trabalho infantil • Uso de água e/ou pegada hídrica


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1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS RESULTADOS 0 - 10%

11 - 20%

CENTAURO

9%

TORRA

DUMOND

21 - 30%

31 - 40%

41 - 50%

51 - 60%

61 - 70%

71 - 80%

81 - 90%

AREZZO

29%

FARM

40%

IPANEMA

48%

RIACHUELO

59%

DAFITI

69%

HERING

80%

9%

ANIMALE

27%

MARISA

37%

MELISSA

48%

HAVAIANAS

55%

OSKLEN

67%

MALWEE

80%

NETSHOES

5%

ELLUS

24%

LUPO

34%

JOHN JOHN

46%

DECATHLON

62%

RENNER

76%

CIA. MARÍTIMA

2%

LE LIS BLANC

45%

YOUCOM

76%

MOLECA

2%

PERNAMBUCANAS

73%

PUKET

2%

LOJAS POMPÉIA

1%

BROOKSFIELD

0%

CARMEN STEFFENS

0%

COLCCI

0%

COLOMBO

0%

DI SANTINNI

0%

FÓRUM

0%

LEADER

0%

LOJAS AVENIDA

0%

OLYMPIKUS

0%

TNG

0%

13%

* As marcas são classificadas em ordem numérica dentro de uma pontuação máxima de 47 pontos e apresentadas aqui em forma de porcentagem arredondada. Quando as marcas têm a mesma pontuação percentual, elas são listadas em ordem alfabética.

ZARA

91 - 100% 87%

C&A

93%


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34

1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS DESCOBERTAS Q UA N TAS M A R C AS P U B L I C A M S UAS P O L Í T I C AS ?

Trabalho escravo contemporâneo Trabalho infantil Discriminação Saúde e segurança Liberdade de associação, direito de organização e negociação coletiva Antissuborno, corrupção e apresentação de informações falsas Assédio e violência Subcontratação, terceirização e pessoal que trabalha em casa Aviso prévio, demissão e ação disciplinar Efluentes líquidos e tratamento Horas de trabalho e intervalos de descanso Mão de obra estrangeira e migrante Pagamento de horas extras Condições de habitação/dormitórios Contratos e termos empregatícios Equiparação salarial Salários e benefícios financeiros (ex.: bônus, seguro, previdência social, pensão) Uso de água e/ou pegada hídrica Energia e/ou emissões de carbono Resíduos e/ou reciclagem (produtos/têxteis) Resíduos e/ou reciclagem (embalagens/escritório/varejo) Direitos relacionados à maternidade e licença-parental Engajamento com a comunidade Férias anuais e feriados públicos Biodiversidade e conservação para fornecedores para empresas procedimentos

Diversidade e inclusão Lista de substâncias restritas Bem-estar animal 0

20

40

1. Gráfico ordenado pelas políticas mais comuns aplicadas aos fornecedores / 2. Políticas sobre trabalho escravo contemporâneo; trabalho infantil; mão de obra estrangeira e migrante; pagamento de horas extras; subcontratação, terceirização e pessoal que trabalha em casa; condições de habitação/dormitórios; e efluentes líquidos e tratamento foram analisadas somente quando aplicadas aos fornecedores. Enquanto as políticas sobre bem-estar animal; diversidade e inclusão e lista de substâncias restritas foram analisadas somente na esfera de políticas destinadas aos funcionários diretos da empresa.

60


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35

1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS DESCOBERTAS I M P L E M E N TAÇ ÃO D E P O L Í T I C AS

BEM-ESTAR ANIMAL

BIODIVERSIDADE E CONSERVAÇÃO

ENGAJAMENTO COM A COMUNIDADE

10%

15%

25%

15%

50%

18%

divulgam uma política para orientação de seus funcionários diretos

divulgam como essa política é implementada na prática

divulgam uma política para orientação de seus funcionários diretos

divulgam uma política para seus fornecedores

divulgam uma política referente à sua própria gestão

divulgam uma política para seus fornecedores

DIVERSIDADE E INCLUSÃO

ASSÉDIO E VIOLÊNCIA

TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO

40%

35%

45%

10%

58%

25%

divulgam uma política para seus funcionários diretos

divulgam como essa política é implementada na prática

divulgam uma política para seus fornecedores

divulgam como essa política é implementada na prática

divulgam uma política para seus fornecedores

divulgam como essa política é implementada na prática


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36

1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS DESCOBERTAS P R O G R E S S O A N UA L

RESÍDUOS E/OU RECICLAGEM

SALÁRIOS E BENEFÍCIOS

(PRODUTOS/TÊXTEIS)

LISTA DE SUBSTÂNCIAS RESTRITAS

EQUIPARAÇÃO SALARIAL

48 38 30

33

30

30

25

20

20

25

20 10

2018

2019

2020

% de marcas que divulgam uma política para orientação de seus funcionários diretos

2018

2019

2020

% de marcas que divulgam uma política para seus funcionários diretos

2018

2019

2020

% de marcas que divulgam uma lista de substâncias restritas

2018

2019

2020

% de marcas que divulgam uma política para seus funcionários diretos


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1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS ANÁLISE Mesmo com a maior média geral, a seção Políticas e Compromissos cresceu pouco ao longo dos anos Apesar da seção Políticas e Compromissos ser a mais bem pontuada pelas marcas desde 2018, podemos notar que não houve evolução na pontuação média da seção desde a primeira edição do Índice de Transparência da Moda Brasil. Em 2020, a média geral da seção entre as 40 marcas e varejistas analisadas no Índice brasileiro foi de 32%, contrastando com a média de 52% das 250 marcas analisadas pelo Índice de Transparência da Moda Global. Dessa forma, apesar de as marcas analisadas na edição nacional continuarem divulgando mais informações sobre suas políticas e compromissos do que sobre os outros temas abordados pelo Índice, ainda há um longo caminho a ser percorrido para que essas marcas aumentem essa divulgação e a forma como essas políticas são implementadas na prática, tanto em relação a seus próprios funcionários quanto a seus fornecedores.

As marcas que mais pontuaram na seção Políticas e Compromissos foram a C&A, com 93% e a Zara, com 87%, o que significa que estão divulgando amplas informações sobre suas políticas, procedimentos e metas sociais e ambientais. Na sequência, vieram a Hering e a Malwee, ambas com 80%. No total, somente 12 marcas (30%) pontuaram acima de 50% nesta seção, o que indica que ainda há um enorme espaço para melhorias em relação à transparência das empresas revisadas. Além disso, serão necessários muito mais esforços para que as marcas revelem informações sobre como são priorizadas as questões ambientais e sociais em seus negócios, bem como suas metas para melhorar aspectos de direitos humanos e de impactos ambientais a longo prazo.

Como as marcas e varejistas priorizam os direitos humanos e as questões ambientais Durante a pesquisa, nossa equipe procurou informações sobre como as empresas identificam e priorizam as questões ambientais e de direitos humanos relacionadas aos modelos de negócios das empresas, que normalmente são resultantes de processos de análise de materialidade. Constatamos que somente 35% das marcas divulgam seus processos para fazer esse tipo de análise, assim como os seus resultados. Apesar de ainda ser um resultado baixo, observamos um aumento de 8 pontos percentuais em relação ao resultado de 2019 (27%).

Sabe-se pouco sobre o progresso das marcas em relação a metas para melhorar questões relativas a direitos humanos e impactos ambientais No que se refere aos compromissos ou metas mensuráveis, de longo prazo e com prazos estabelecidos pelas

empresas, observamos que somente 20% delas publicam seus planos voltados para a melhoria de questões relacionadas aos direitos humanos e 33% indicam seus planos para reduzir seus impactos ambientais. Quando buscamos pela atualizacão do progresso desses compromissos ou metas, apenas 15% das empresas atualizam anualmente seus avanços relacionados a direitos humanos e 28% divulgam seus avanços referentes a questões ambientais. Apesar de ainda serem resultados muito baixos, observamos que as marcas estão divulgando mais sobre seus avanços referentes a questões ambientais, já que houve um crescimento de 15 pontos percentuais em relação ao resultado de 2019 (13%).

Estagnação das políticas relacionadas a trabalho infantil e trabalho escravo contemporâneo Quando se trata de políticas voltadas à cadeia de fornecimento, os temas mais divulgados são trabalho infantil (58%) e trabalho escravo contemporâneo (58%).


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1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS ANÁLISE Embora esses sejam os tópicos mais abordados dentro das políticas para fornecedores, 58% ainda é um percentual baixo, considerando sua gravidade. Além disso, notamos uma grande diferença em comparação com o resultado do Índice global, no qual 92% das empresas estão divulgando suas políticas relacionadas a trabalho escravo contemporâneo. Observamos também um inexpressivo crescimento na divulgação dessas informações ao longo dos anos. Em 2018, 60% das 20 marcas analisadas divulgavam suas políticas dentro dessas temáticas, passando para 53% de 30 marcas analisadas em 2019 e 58% das 40 marcas analisadas neste ano, o que pode demonstrar pouca preocupação por parte de algumas marcas em abordar um tema tão sensível. Notamos ainda que somente 23% das marcas analisadas relatam seus procedimentos para garantir que suas políticas de combate ao trabalho infantil sejam colocadas em prática e apenas 25% informam suas práticas de combate ao trabalho escravo contemporâneo.

Igualdade de gênero Notamos que apenas 30% das marcas divulgam suas políticas para equiparação salarial entre homens e mulheres em relação a seus funcionários diretos e aos trabalhadores de sua cadeia de fornecimento. Apesar dessa média de pontuação ter aumentado em expressivos 15 pontos percentuais desde 2018 (15% naquele ano), podemos observar que somente 3 marcas (8%), C&A, Pernambucanas e Zara, informam como essas políticas estão sendo colocadas em prática. É importante ressaltar que muitas marcas apostam na meritocracia como critério para balizar a igualdade salarial ou a promoção de seus funcionários. No entanto, apesar de se tratarem de políticas legítimas estabelecidas pelas empresas para seus funcionários ou fornecedores elas não são capazes de atuar na causa raiz da desigualdade entre gêneros de forma eficaz, visto que quem consegue largar na frente nessa corrida são as pessoas que já partem de privilégios garantidos por sua classe, raça ou gênero.

Quando olhamos para as políticas relacionadas a assédio e violência, 53% das marcas analisadas divulgam suas políticas aplicadas aos funcionários diretos e 45% em relação aos trabalhadores da cadeia de fornecimento. Entretanto, somente 10% das marcas divulgam seus procedimentos para garantir que essas políticas sejam implementadas. Além disso, 33% das empresas publicam políticas relacionadas à maternidade e licença-parental para seus funcionários e somente 18% divulgam essas políticas voltadas para seus fornecedores e trabalhadores da cadeia. Quando se trata informar sobre como essas políticas são colocadas em prática, observamos que 23% das marcas divulgam seus procedimentos.

Discriminação e diversidade Quando buscamos pelas politicas das marcas aplicadas aos funcionários diretos, os temas mais divulgados foram sobre questões críticas como discriminação (60%), práticas antissuborno e corrupção (60%) e saúde e segurança (58%).

Com relação aos resultados de 2019, as marcas estão divulgando mais sobre suas políticas relacionadas a discriminação. No ano passado, 40% divulgavam suas políticas para os fornecedores e, em 2020, esse número subiu para 53% das marcas analisadas. Apesar desse crescimento positivo, apenas 28% das marcas relatam como estão colocando em práticas suas políticas anti-discriminatórias tanto para funcionários próprios quanto para fornecedores. Menos da metade das marcas (40%) divulgam políticas sobre diversidade e inclusão voltadas a seus funcionários e apenas 35% divulgam quais ações estão sendo implementadas para garantir o aumento da diversidade e a inclusão internamente.


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1. POLÍTICAS E COMPROMISSOS ANÁLISE Políticas relacionadas ao meio ambiente Notamos um expressivo crescimento em relação às políticas das marcas sobre questões voltadas ao meio ambiente, como energia e emissão de carbono, uso de água ou pegada hídrica e gestão de resíduos e/ ou reciclagem de produtos e têxteis. Em 2019, somente 10% das marcas analisadas publicaram suas políticas sobre energia e emissão de carbono em suas cadeias de fornecimento e em 2020 esse número subiu para 28%. Mesmo sendo um número ainda baixo devido à urgência climática que estamos enfrentando, notamos que 43% das marcas divulgam seus procedimentos para garantir que essas políticas sejam colocadas em prática. Entre os procedimentos destacados, encontramos aumento de uso de energia de fontes renováveis, transição para uso de lâmpadas LED, aumento da eficiência energética de processos produtivos e aumento de uso de materiais mais sustentáveis.

Quando analisamos as políticas das marcas sobre uso de água ou pegada hídrica para seus fornecedores, encontramos uma evolução similar à destacada acima: 10% das marcas analisadas em 2019, evoluindo para 30% das marcas analisadas neste ano. Sobre os procedimentos para garantir que as políticas de uso de água ou pegada hídrica sejam colocadas em prática, 43% das marcas divulgaram suas ações, que incluem diminuição de uso de água em processos internos, aumento de uso de materiais que consomem menos água em sua fabricação e reaproveitamento de água. Desde 2018, observamos também um aumento gradual na divulgação das políticas das empresas sobre resíduos e/ ou reciclagem de produtos e têxteis em suas próprias instalações. Na primeira edição do Índice, em 2018, somente 6 marcas (15%) publicaram suas políticas sobre essa temática e, em 2020, esse número aumentou para 15 marcas (38%). Quando se trata de iniciativas que visem colocar essas políticas em prática para reduzir, reutilizar ou ressignificar

desperdícios e resíduos têxteis, estoques defeituosos, amostras de produção e/ ou resíduos pós-consumo, notamos que 45% das empresas divulgam informações.

28%

Apesar dos avanços citados, as políticas menos divulgadas pelas marcas sobre suas próprias operações são bem estaranimal e lista de substâncias restritas. Apenas 10 marcas (25%) divulgam suas listas de substâncias restritas e as evidências de testes de tais substâncias.

das marcas divulgam uma política sobre energia e emissão de carbono para seus fornecedores

Em relação a bem-estar animal, somente declarar a proibição de uso de fibras derivadas de animais não é suficiente para pontuar. Buscamos por políticas com uma abordagem mais ampla como, por exemplo, a das "Cinco Liberdades", que cobrem questões como o uso de materiais derivados de animais e a criação livre de fome e sede, desconforto, dor, medo e com liberdade para expressar o comportamento natural da espécie. Nesse sentido, somente 4 marcas (10%) publicam sua abordagem para garantir o bem-estar animal e 6 marcas (15%) divulgam como essa política é implementada na prática.


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PONTO DE VISTA:

MAIS MULHERES, MESMOS DESAFIOS: ATÉ ONDE CHEGAM AS POLÍTICAS DE INCLUSÃO

NANA LIMA DIRETORA DE IMPACTO THINK EVA E THINK OLGA

Nos últimos anos, o termo "empoderamento feminino" tem sido amplamente divulgado pela mídia e adotado como slogan por diversas marcas. A sociedade se conscientizou sobre os obstáculos e violências que as mulheres sofrem simplesmente por serem mulheres. Tivemos conquistas importantes como a lei da Importunação Sexual, a lei Maria da Penha e a possibilidade de ampliação da licença-maternidade para mães que trabalham em regime CLT. Também vimos o aumento do número de mulheres em cargos de liderança e sua participação em quase todos os mercados.

Apesar de assumir cargos de liderança e de corresponder a 50% dos empreendedores em estágio inicial no Brasil1, as mulheres ainda dedicam 61 horas semanais ao trabalho do cuidado da família e das tarefas domésticas2. Ao redor do mundo, elas dedicam 12,5 bilhões de horas, todos os dias, ao trabalho de cuidado não remunerado – uma contribuição de pelo menos US$ 10,8 trilhões por ano à economia global3. A pandemia, por sua vez, também comprova que ainda estamos longe de um equilíbrio social. Mesmo com todos os avanços e conquistas, o número de feminicídios aumentou 2% no primeiro semestre de 20204, sendo que mulheres negras foram as principais vítimas. Os casos de violência doméstica aumentaram com as medidas de combate ao coronavírus e a participação das mulheres no mercado de trabalho é a menor desde 1990. Algumas empresas do setor privado já entenderam que se desejam reter e ampliar o potencial feminino, suas

políticas internas e ações afirmativas devem ir além do “cumprir a lei”. Porque a existência de uma lei não garante que ela será respeitada por todos. No Brasil, 48% das mulheres são demitidas após a licença-maternidade5. Estamos em 2020 e esses benefícios ainda são interpretados como vantagens e não como ferramentas para equiparar um desequilíbrio social. As mães que se mantém no cargo são avaliadas com a mesma régua de performance que seus colegas. A responsabilidade e o cuidado com o filho ainda recaem inteiramente sobre as mulheres e isso é algo que a política interna das empresas precisa levar em consideração. Essas medidas são cruciais para que a cultura corporativa tenha a inclusão como valor e possa eliminar obstáculos e atender as necessidades de todos os colaboradores. Seguir acreditando no mito da meritocracia em um país onde as condições socioeconômicas e o acesso à educação é tão desigual, é seguir privilegiando quem tem menos barreiras para chegar lá.

Políticas internas e ações afirmativas não funcionam se não houver um trabalho prévio de sensibilização da liderança e dos colaboradores sobre os preconceitos e as barreiras – visíveis e não visíveis – que as mulheres enfrentam. Segundo uma pesquisa sobre igualdade de gênero elaborado pela Ipsos, 27% dos brasileiros se sentem desconfortáveis quando a chefe é uma mulher. Em abril de 2020, a Think Eva e a Think Olga criaram o relatório Mulheres em Tempos de Pandemia, onde alertamos o setor privado sobre o impacto desproporcional que a pandemia teria sobre as mulheres, principalmente mulheres negras. E agora, seis meses depois, seguimos alertando e pedindo a todos que assumam seus papéis e reforcem o compromisso – e a ação - com todas as mulheres.

1. https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/UFs/GO/Sebrae%20de%20A%20a%20Z/Empreendedorismo%20Feminino%20no%20Brasil%202019_v5.pdf 2. https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=34450 - 3. https://www.oxfam.org.br/justica-social-e-economica/forum-economico-de-davos/tempo-de-cuidar/ 4. https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2020/09/16/assassinatos-de-mulheres-sobem-no-1o-semestre-no-brasil-mas-agressoes-e-estupros-caem-especialistas-apontam-subnotificacao-durantepandemia.ghtml - 5. https://portal.fgv.br/sites/portal.fgv.br/files/the_labor_market_consequences_of_maternity_leave_policies_evidence_from_brazil.pdf


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2. GOVERNANÇA ABORDAGEM Quem é responsável pelos impactos sociais e ambientais da empresa? Nesta seção, procuramos pelo departamento, nome e cargo da pessoa que assume a principal responsabilidade pelo desempenho das questões relacionadas aos direitos humanos e meio ambiente da empresa. Esses detalhes de contato são importantes porque demonstram um canal aberto de comunicação entre a marca, seus clientes e outras partes interessadas. Também procuramos em nossa pesquisa pelo nome de um membro do conselho da empresa, ou de um comitê do conselho, que seja responsável por questões de direitos humanos e meio ambiente e também pelo modo como a supervisão desses assuntos é implementada. Além disso, também buscamos pelo contato direto com o departamento responsável como, por exemplo, o time de sustentabilidade ou o de responsabilidade social corporativa.

Os impactos sociais e ambientais da empresa são normalmente tratados por um comitê de ética ou de sustentabilidade, que responde diretamente ao conselho. Atribuir a responsabilidade pelas práticas socioambientais da empresa ao conselho demonstra o nível de seriedade que esses assuntos são tratados internamente, tanto em relação à sua própria gestão, quanto aos impactos ao longo de sua cadeia de fornecimento.

Incentivos a executivos, funcionários e fornecedores como forma de melhorar o desempenho socioambiental Analisamos se as marcas estão divulgando como seus funcionários, para além da equipe de sustentabilidade/responsabilidade social corporativa (RSC), como, por exemplo, equipes de compras, estilo, desenvolvimento de produto etc, são incentivados por meio de bônus

e gratificações, atrelados a metas de desempenho, para alcançar reduções nos impactos sociais e ambientais. Procuramos as mesmas informações, observando a divulgação dos salários e incentivos do CEO e dos demais executivos, relacionadas à gestão ambiental e aos impactos sobre direitos humanos causados pelas empresas. Por fim, também procuramos informações sobre como esse mesmo tipo de incentivo está vinculado a melhorias de aspectos sociais e ambientais dos fornecedores como, por exemplo, compromissos de compras em longo prazo e aumento de pedidos.

38%

das marcas divulgam o nome e contato da pessoa responsável pelas questões de direitos humanos e ambientais de suas operações


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2. GOVERNANÇA RESULTADOS 0 - 10%

11 - 20%

21 - 30%

31 - 40%

41 - 50%

51 - 60%

AREZZO

8%

DECATHLON

17%

ANIMALE

33%

DAFITI

50%

BROOKSFIELD

0%

LUPO

17%

FARM

33%

PERNAMBUCANAS

50%

CARMEN STEFFENS

0%

HAVAIANAS

33%

CENTAURO

0%

IPANEMA

33%

CIA. MARÍTIMA

0%

JOHN JOHN

33%

COLCCI

0%

LE LIS BLANC

33%

COLOMBO

0%

MARISA

33%

DI SANTINNI

0%

MELISSA

33%

DUMOND

0%

RIACHUELO

33%

ELLUS

0%

FÓRUM

0%

LEADER

0%

LOJAS AVENIDA

0%

LOJAS POMPÉIA

0%

MOLECA

0%

NETSHOES

0%

OLYMPIKUS

0%

PUKET

0%

TNG

0%

TORRA

0%

HERING

61 - 70% 58%

OSKLEN

* As marcas são classificadas em ordem numérica dentro de uma pontuação máxima de 12 pontos e apresentadas aqui em forma de porcentagem arredondada. Quando as marcas têm a mesma pontuação percentual, elas são listadas em ordem alfabética.

71 - 80% 67%

81 - 90%

91 - 100%

RENNER

75%

C&A

83%

YOUCOM

75%

ZARA

83%

MALWEE

92%


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2. GOVERNANÇA DESCOBERTAS CONSEGUIMOS ENTRAR FACILMENTE EM CONTATO COM AS MARCAS?

PRESTAÇÃO DE CONTAS

48%

38%

8%

20%

divulgam informações de contato direto com o departamento de sustentabilidade/RSC

divulgam o nome e os contatos diretos da pessoa com maior responsabilidade pelas questões de direitos humanos e impactos ambientais

divulgam o nome do membro do conselho ou comitê do conselho responsável por questões de direitos humanos e meio ambiente

divulgam uma descrição de como a prestação de contas do conselho é implementada na prática

INCENTIVOS PARA MELHORAR O DESEMPENHO

18%

15%

15%

divulgam como os incentivos de fornecedores estão ligados a melhorias na gestão de boas práticas trabalhistas e meio ambiente (ex.: compromissos de compra a longo prazo, contratos mais longos, aumento de pedidos)


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2. GOVERNANÇA ANÁLISE Permitindo que clientes e outras partes interessadas entrem em contato Um simples ato de transparência que as marcas podem adotar é fornecer uma maneira fácil de se entrar em contato direto com o departamento de responsabilidade social corporativa ou sustentabilidade. Isso permite uma linha aberta de comunicação entre a marca, seus clientes e outras partes interessadas que queiram fazer alguma pergunta ou levantar algum tipo de preocupação. Por isso, analisamos se as marcas estão compartilhando um endereço de e-mail ou número de telefone direto para esse departamento, e notamos que 48% das marcas o fazem. Nesse sentido, identificamos que 38% das empresas divulgam o nome e os contatos diretos da pessoa com maior responsabilidade pelas questões de direitos humanos e impactos ambientais de suas operações, representando um crescimento de 11 pontos percentuais em relação a essa divulgação em 2019 (27%).

Somente 7 marcas (18%) pontuaram acima de 50% nesta seção, sendo que as maiores pontuações deste ano são a Malwee, com 92% e a C&A e a Zara, ambas com 83%. Além disso, 48% das marcas zeraram, ressaltando como ainda é muito difícil para os consumidores estabelecerem uma comunicação direta com as marcas e varejistas que muitas vezes divulgam somente contatos relacionados aos canais de venda e trocas de produtos como, por exemplo, e-mails de SAC e de atendimento de loja virtual.

Prestação de contas do conselho sobre direitos humanos e impactos ambientais Diversos CEOs estão começando a perceber como as questões de sustentabilidade são críticas para o futuro de seus negócios. Um estudo recente com 1.000 executivos globais conduzido pela consultoria Accenture e pelo Pacto Global da ONU1, mostra que a comunidade empresarial pode e deve dar uma contribuição muito maior para que alcancemos os Objetivos de

1. https://www.accenture.com/_acnmedia/PDF-109/Accenture-UNGC-CEO-Study.pdf#zoom=40

Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030. Surpreendentemente, esse estudo também demonstrou que 88% dos CEOs “acreditam que nossos sistemas econômicos globais precisam se concentrar novamente no crescimento eqüitativo.” Neste tópico, somente 8% das empresas divulgam informações sobre o membro do conselho, ou sobre o comitê do conselho, responsável por questões de direitos humanos e meio ambiente, enquanto 20% publicam uma descrição sobre como essa responsabilização é implementada pelo conselho na prática.

Incentivo a melhorias em direitos humanos e impactos ambientais Buscamos informações sobre como as empresas estão incentivando seus funcionários diretos, incluindo os executivos, e fornecedores a melhorarem suas performances atreladas a aspectos de direitos humanos e impactos ambientais por meio de análises de desempenho, salários, bônus e incentivos.

Observamos que apenas 18% das marcas divulgam como programas de benefícios de outras áreas que não só a de sustentabilidade (áreas de compras, desenvolvimento de produto, estilo etc) estão ligados a melhorias na gestão de direitos humanos e meio ambiente. Apenas 15% das marcas relatam como os benefícios de seus executivos (ex.: CEO, CFO, diretores) estão vinculados a essas melhorias, um aumento de 8 pontos percentuais em relação ao relatório do ano passado. Mesmo apresentando um leve crescimento, tais números nos fazem questionar o quão seriamente as empresas estão abordando esses problemas. Em relação aos fornecedores, observamos que somente 15% das marcas divulgam descrições de como esses incentivos estão ligados a melhorias na gestão de boas práticas trabalhistas e meio ambiente como, por exemplo, por meio de compromissos de compra a longo prazo, contratos mais longos e aumento de pedidos.


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PONTO DE VISTA:

NO BRASIL, A DESIGUALDADE TEM RAÇA

VIVIANA SANTIAGO PROFESSORA, COLUNISTA E CONSULTORA EM RELAÇÕES ETNICORRACIAIS E DE GÊNERO

A agenda 2030 do Desenvolvimento Sustentável nos comunica que o modelo de desenvolvimento em curso atualmente nos coloca em risco. É preciso um novo modelo que permita atender as necessidades da geração atual sem ameaçar a capacidade do planeta de atender as necessidades das gerações futuras. E nos anuncia: é preciso não deixar ninguém para trás. Um ponto chave da agenda 2030 é o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 10 (ODS 10), que desafia o mundo a reduzir as desigualdades dentro dos países, reconhecendo que ela atinge hoje seu ponto máximo: desde 19401 nunca houve tanta concentração de renda, má distribuição da riqueza e falta de oportunidades para todas e todos. Um desenvolvimento sustentável será aquele

que consiga visibilizar as especificidades de todas as populações e reduzir desigualdades.

compõem a sociedade? Como a moda pode ser inclusiva se as empresas que a constroem não são?

No contexto brasileiro é impossível pensar a desigualdade sem trazer para o centro a questão racial: aqui a desigualdade tem raça. A população negra vem sendo historicamente negligenciada.

Quando conversamos sobre novas formas de consumo e novas formas de produção, estamos tratando sim da questão racial. Novas formas de consumo implicam em reconhecer pessoas que consomem em sua totalidade e diversidade, assim como novas formas de produção requerem que essas pessoas sejam representadas em tudo que é criado e oferecido.

As pessoas negras são mais da metade da população brasileira2. E eu me pergunto, seria inteligente deixar mais da metade de um país para trás? Como podemos garantir crescimento se continuamos não investindo para que todas as pessoas possam desenvolver plenamente seus potenciais, acessar oportunidades de compor mercados de trabalho e trazer abordagens disruptivas e diversas para tudo o que pode ser feito? Como podemos falar de uma revolução na moda, de uma moda que seja disruptiva, que inspire a construção de um mundo melhor se ela não é construída por todas as pessoas que

1. https://gtagenda2030.org.br/relatorio-luz/ - 2. https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6403#resultado

Essa mudança de mentalidade começa no reconhecimento da desigualdade e na tomada de decisão para a mudança. Desagregar dados e apresentá-los é um primeiro passo. Como mudar uma realidade sobre a qual não se geram informações? Utilizar dados desagregados por raça e por gênero nos possibilita identificar as lacunas existentes nas realidades e que, muitas vezes inconscientes, não permitem que sejam endereçadas. Lançar luzes sobre áreas que devem ser melhoradas

de modo a reduzir desigualdades é essencial, principalmente para expressar a responsabilidade de quem se compromete com uma revolução que mude e melhore o mundo. Como é possível ter políticas, práticas e definir cursos de ações sem dados? Como medir progresso? Como celebrar boas práticas? Desagregar e apresentar dados de raça e gênero significa trazer o imenso desafio – e dívida - para frente e lidar com objetividade na busca de soluções. Sabemos que hoje as pessoas negras são deixadas para trás na moda. Pessoas brilhantes, cheias de talentos e potencialidades, cuja inclusão digna na moda será capaz sim de revolucionála. Quaisquer esforços que sua marca esteja fazendo serão insuficientes se não forem feitos desde uma perspectiva interseccional que traga o enfrentamento ao racismo como ponto central.


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3. RASTREABILIDADE ABORDAGEM As marcas publicam suas listas de fornecedores? Qual o nível de detalhamento dessas informações? Esta seção analisou se as marcas publicam listas de fornecedores e em que nível de detalhamento essas informações são divulgadas.

Procuramos saber se as marcas compartilham informações como: •

Endereço das instalações dos fornecedores

Tipos de produtos/serviços feitos nessas instalações

Representação sindical ou entidade independente de trabalhadores na instalação

Nome da empresa controladora de cada instalação

Lista de fornecedores atualizada há pelo menos 6 meses

Número aproximado de trabalhadores em cada instalação

Lista disponível em formato pesquisável (CSV ou Excel)

Percentual de instalações de fornecedores publicada

Relação comercial entre instalações de diferentes níveis da cadeia de fornecimento

Distribuição dos trabalhadores por gênero

Distribuição dos trabalhadores por raça

Percentual de trabalhadores migrantes ou com contrato temporário

Divulgação de confecções, instalações de processamento e beneficiamento e fornecedores de matérias-primas Buscamos por listas de fornecedores em três níveis. O primeiro indica onde as marcas e varejistas produzem suas roupas, ou seja, as instalações com as quais as marcas têm um relacionamento direto e que normalmente fazem o corte, a costura e os acabamentos finais dos produtos. No segundo nível, buscamos saber se as marcas estão divulgando informações sobre as instalações de processamento e beneficiamento, como por exemplo, de descaroçamento e fiação, passando por subcontratados, tinturarias, lavanderias, processos úmidos, bordados, estamparia e acabamento dos tecidos. E no último nível, analisamos se as marcas estão divulgando informações sobre seus fornecedores de matériasprimas como, por exemplo, fibras, couros, borracha, corantes, produtos químicos, metais etc.

As marcas também pontuam quando as listas de fornecedores são disponibilizadas em um formato pesquisável, como Excel ou CSV, se abrangem mais de 95% de seus fornecedores e se foram atualizadas nos últimos 6 ou 12 meses, no caso dos fornecedores de matérias-primas. Além disso, analisamos se as marcas estão rastreando pelo menos uma matériaprima, como algodão, couro ou lã.

43% das marcas publicam listas de fornecedores de nível 1


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3. RASTREABILIDADE RESULTADOS 0 - 10%

11 - 20%

21 - 30%

31 - 40%

41 - 50%

51 - 60%

DECATHLON

1%

ANIMALE

29%

PERNAMBUCANAS

42%

ZARA

1%

FARM

29%

RIACHUELO

41%

AREZZO

0%

JOHN JOHN

BROOKSFIELD

0%

LE LIS BLANC

CARMEN STEFFENS

0%

CENTAURO

0%

CIA. MARÍTIMA

0%

COLCCI

0%

COLOMBO

0%

DI SANTINNI

0%

DUMOND

0%

ELLUS

0%

FÓRUM

0%

LEADER

0%

LOJAS AVENIDA

0%

LOJAS POMPÉIA

0%

LUPO

0%

MOLECA

0%

NETSHOES

0%

OLYMPIKUS

0%

PUKET

0%

TNG

0%

TORRA

0%

MARISA

61 - 70%

71 - 80%

OSKLEN

66%

DAFITI

22% 22%

56%

91 - 100%

C&A

82%

HAVAIANAS

95%

63%

RENNER

82%

MALWEE

94%

IPANEMA

61%

YOUCOM

82%

MELISSA

61%

* As marcas são classificadas em ordem numérica dentro de uma pontuação máxima de 79 pontos e apresentadas aqui em forma de porcentagem arredondada. Quando as marcas têm a mesma pontuação percentual, elas são listadas em ordem alfabética.

HERING

81 - 90% 75%


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3. RASTREABILIDADE DESCOBERTAS QUEM PUB LIC A LIS TA DE FORNECEDORES NÍVEL 1?

43%

43%

35%

23%

8%

18%

23%

publicam lista de fornecedores de nível 1

incluem na lista o endereço dos fornecedores

incluem na lista o número aproximado de trabalhadores em cada local

incluem na lista a distribuição por gênero em cada local

incluem na lista a distribuição por raça em cada local

incluem na lista se a instalação possui uma comissão de trabalhadores ou sindicato

publicam pelo menos 95% de seus fornecedores na lista

QUEM PUB LIC A LIS TA DE INSTALAÇÕES DE P ROCESSAMEN TO E B EN EF IC IAMEN TO ?

QUEM PUBLICA LISTA DE FORNECEDORES DE MATÉRIAS-PRIMAS?

33%

33%

18%

8%

20%

18%

15%

publicam lista de instalações de processamento /beneficiamento

incluem na lista o endereço dos fornecedores

incluem na lista a distribuição por gênero em cada local

incluem na lista a distribuição por raça em cada local

publicam lista de fornecedores de matérias-primas

atualizaram a lista nos últimos 12 meses

publicam se estão rastreando uma ou mais matérias-primas específicas


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3. RASTREABILIDADE ANÁLISE Como Jenny Holdcroft da IndustriALL Global Union1, explicou em edições anteriores do Índice de Transparência da Moda:

“Saber os nomes das grandes marcas que compram das fábricas fortalece trabalhadores e seus sindicatos, permitindo encontrar soluções mais rápidas para conflitos, tanto em casos em que os sindicatos não são reconhecidos, quanto em casos de demissões ilegais de trabalhadores por exigirem seus direitos. Também oferece a possibilidade de criar um elo entre o trabalhador e o consumidor e, possivelmente, chamar a atenção da mídia para esses tipos de problemas.” A divulgação pública das listas de fornecedores pode ajudar sindicatos e grupos da sociedade civil a identificar e solucionar problemas enfrentados pelos trabalhadores ao longo da cadeia de produção das marcas e varejistas.

Rastreabilidade: Progresso da pontuação média geral ano a ano

2018

2019

2020

12%

de 20 marcas

Além disso, quando as marcas divulgam suas listas de fornecedores, elas mostram às partes interessadas que estão dispostas a serem abertas e honestas sobre onde seus produtos são feitos, gerando um aumento de confiança de investidores e consumidores.

Divulgação de fornecedores de nível 1 (tier 1)

17%

de 30 marcas

25%

de 40 marcas

Publicar listas de fornecedores também pode beneficiar as próprias empresas. Esse tipo de transparência ajuda as marcas a se envolverem e colaborarem mais com sindicatos e organizações da sociedade civil ligadas a questões trabalhistas e de direitos humanos. A divulgação de listas de fornecedores pode facilitar também o diálogo direto entre organizações locais e empresas no que diz respeito a problemas que envolvem os direitos dos trabalhadores e que uma auditoria padrão geralmente não consegue identificar, como por exemplo, subcontratações não autorizadas.

Fornecedores de nível ou tier 1 são as unidades de produção responsáveis pelo corte, montagem e acabamento dos produtos. Neste ano, 43% das marcas (17 das 40 analisadas) publicam suas listas de fornecedores de tier 1, incluindo o endereço das instalações e o tipo de produto ou serviço prestado. Além disso, 35% divulga o número aproximado de trabalhadores em cada local e 18% publica a porcentagem de trabalhadores migrantes ou com contrato temporário. Para nos alinharmos com requisitos da Transparency Pledge2 e da Open Apparel Registry3, buscamos por detalhes adicionais nas listas de fornecedores das marcas. Constatamos que 18% incluem

o nome da empresa controladora de cada instalação, quando aplicável, e 35% publicam sua lista de fornecedores de nível 1 em formato pesquisável como documentos em Excel ou CSV. Pedimos pela divulgação das listas por meio de formatos pesquisáveis para facilitar o acesso aos dados bem como sua pesquisa, manuseio e o uso dessas informações por sindicatos e ONGs. Apenas 12 marcas (30%) informam qual a porcentagem de fornecedores nível 1 (tier 1) está incluída nessa lista, e 9 marcas (23%) informam que 95% ou mais de seus fornecedores são divulgados. Por fim, 40% das marcas divulgam que a lista de fornecedores foi publicada ou atualizada nos últimos seis meses. Além disso, 5 marcas que estão presentes desde a primeira edição do Índice de Transparência da Moda divulgaram seus fornecedores de nível 1 pela primeira vez neste ano. São elas: Animale, Farm, John John, Le Lis Blanc e Melissa.

1. Organização que representa mais de 50 milhões de trabalhadores em 140 países nos setores de mineração, energia e manufatura, apoiando a busca por melhores condições de trabalho e direitos sindicais em todo o mundo. Para saber mais, acesse: http://www.industriall-union.org 2. Coalizão de nove organizações trabalhistas e de direitos humanos formada para defender a transparência nas cadeias de fornecimento de vestuário. Para saber mais, acesse: https://transparencypledge.org 3. Fonte de referência para identificar fábricas de roupas e suas afiliações, agrupando listas de fábricas distintas em um mapa central de código aberto, listando nomes de fábricas, endereços e afiliações. Para saber mais, acesse: https://openapparel.org


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3. RASTREABILIDADE ANÁLISE

Divulgação de instalações de processamento e beneficiamento Instalações de processamento e beneficiamento são as responsáveis por diversas partes do processo produtivo, como descaroçamento e fiação, processos úmidos, bordados, tecelagem, subcontratados, estamparia, acabamento, curtumes, tinturarias e lavanderias. Observamos que 33% das marcas divulgam suas listas de fornecedores de instalações de processamento, incluindo o endereço destas instalações e o tipo de produto ou serviço prestado. Das marcas analisadas, 25% divulgam o número aproximado de trabalhadores em cada instalação e 18% publicam a porcentagem de trabalhadores migrantes ou com contrato temporário. Além disso, 13% incluem o nome da empresa controladora de cada instalação, quando aplicável, e 30% publicam sua lista de fornecedores além do nível 1 em formato pesquisável.

Apenas 28% informam qual a porcentagem de instalações de processamento está incluída nessa lista, e 8 marcas (20%) informam que 95% ou mais de seus fornecedores são divulgados. Por fim, 30% das marcas divulgam que a lista de fornecedores foi publicada ou atualizada nos últimos seis meses. Neste ano, incluímos um novo indicador para descobrir se as marcas divulgam com qual(is) instalação(ões) de nível 1 a instalação de processamento trabalha conjuntamente. Como resultado, descobrimos que apenas 10% das empresas analisadas possuem essa prática. Este dado é importante porque indica a relação entre diferentes níveis da cadeia de fornecimento e permite que fornecedores, sindicatos e organizações de direitos dos trabalhadores tomem as melhores decisões conjuntas para a resolução de possíveis problemas.

Divulgação de fornecedores de matéria-prima Essas instalações são aquelas que fornecem às marcas e aos seus fabricantes matérias-primas como fibras, couro, borracha, corantes, metais, fornecedores de produtos químicos, entre outros. Observamos que apenas 20% das marcas publicam alguns de seus fornecedores de matéria-prima, incluindo o endereço de suas instalações e o tipo de produto que fornecem. Entre os fornecedores divulgados, identificamos fornecedores de químicos, viscose, resinas e filamentos. Apenas 13% das marcas divulgam o número aproximado de trabalhadores em cada instalação listada e 18% divulgam a lista em um formato pesquisável como Excel ou CSV e que tenha sido publicada ou atualizada nos últimos doze meses.

Poucas informações são divulgadas sobre os fornecedores de matéria-prima É possível observar que as marcas publicam mais informações sobre seus fornecedores de nível 1 e que essas informações vão ficando mais escassas conforme analisamos níveis mais distantes na cadeia de fornecimento. As listas de fornecedores de matériaprima são as menos divulgadas e que possuem menor detalhamento de informações. No próximo ano, esperamos ver mais marcas publicando suas listas de fornecedores, para todos os níveis de fornecimento. Sabemos que a exploração de trabalhadores e as más condições de trabalho tendem a ocorrer mais em lugares remotos, e é por isso que o foco na transparência da divulgação de fornecedores além do nível 1 é muito importante.


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3. RASTREABILIDADE ANÁLISE Distribuição das trabalhadoras e trabalhadores da cadeia de fornecimento por gênero e raça4 Buscamos pela distribuição por gênero e raça (sendo esse segundo item específico ao questionário brasileiro) em cada uma das instalações de fornecedores, do nível 1 ao nível da matéria-prima. A divulgação de listas de fornecedores com esses recortes é essencial para que se possa criar um diagnóstico mais preciso e então atuar, se necessário e de forma mais eficaz, no combate a desigualdades e injustiças relacionadas a gênero e raça ao longo de toda a cadeia de fornecimento, evitando riscos de violação dos direitos humanos como, por exemplo, assédio, violência e discriminação. Apenas 9 marcas (23%) divulgam a distribuição por gênero entre seus fornecedores de nível 1. Apesar de esse número ainda ser baixo, podemos observar um expressivo aumento de 13 pontos percentuais em relação aos resultados de 2019, quando apenas 3 marcas (10% naquela edição) pontuaram. 4. Saiba mais no texto Ponto de Vista da página 45

Com relação ao recorte racial, somente 3 marcas (Havaianas, Malwee e Osklen), divulgaram a distribuição por raça de seus fornecedores diretos. Conforme buscamos por informações detalhadas nos níveis mais distantes de fornecedores, como instalações de processamento e de fornecimento de matéria-prima, observamos que a divulgação dos recortes de gênero e raça diminui ainda mais. Nesse sentido, apenas 18% das marcas divulgam a distribuição de gênero nas suas instalações de processamento e beneficiamento e só 8% divulgam a distribuição racial entre os trabalhadores dessas instalações. Somente duas marcas, a Havaianas e a Malwee, divulgam tanto a distribuição por gênero quanto por raça de seus fornecedores de matéria-prima.

Sindicatos e entidades independentes de trabalhadores Podemos observar que apenas 18% das marcas e varejistas analisadas informam se as instalações de seus fornecedores

nível 1 possuem uma entidade independente de trabalhadores ou sindicato. Quando analisamos esses dados para os fornecedores além do nível 1, observamos uma queda no porcentual para 13%. Ainda assim, apesar da informação sobre os sindicatos e entidades de trabalhadores ser pouco divulgada pelas marcas, ao compararmos com os resultados do Índice Global, notamos que esse número cai para 4% das empresas analisadas em relação a seus fornecedores diretos e para 1% em relação aos fornecedores além do nível 1.

Bom progresso, mas a maioria das marcas ainda não divulga suas listas de fornecedores Apesar de observarmos progresso na disponibilização de detalhes sobre suas cadeias de fornecimento, a maioria das empresas ainda não divulga qualquer informação sobre quem são seus fornecedores. Das 40 marcas analisadas, 21 (53%) zeraram a pontuação nesta seção. As marcas que mais pontuaram nesta seção foram Havaianas (95%), Malwee (94%), C&A (82%), Renner (82%) e Youcom (82%).

8% das marcas divulgam a distribuição por raça de seus fornecedores diretos


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ESTUDOS DE CASO: A transparência na prática

Foto (direita): Trabalhadora do vestuário em Lesoto ©ALAFA

Foto (esquerda): Trabalhadores do setor de confecção de Bangladesh durante um protesto em Savar, nos arredores de Daca, Bangladesh, © 2019 AP

Worker Rights Consortium

International Labor Rights Forum

LESOTO

BANGLADESH

Em 2019, foi constatado pelo Worker Rights Consortium1 (WRC) que em três fábricas no Lesoto, todas pertencentes ao mesmo fornecedor, as trabalhadoras eram regularmente forçadas a se relacionar sexualmente com supervisores como condição para manter seus empregos ou obter promoções. Quase dois terços das trabalhadoras do setor de vestuário entrevistadas pelo WRC relataram ter sofrido assédio e abuso sexual ou ter conhecimento dessas práticas sofridas por colegas de trabalho. Devido ao fato de marcas como a VF Corporation e a Levi Strauss & Co. publicarem em seus sites as listas de seus fornecedores, o WRC conseguiu

identificar que essas marcas estavam comprando dessas fábricas do Lesoto. Assim, o WRC facilitou discussões entre sindicatos locais, ONGs e as duas empresas, resultando em um acordo inovador e legalmente obrigatório para resolver esse sério problema. Como parte do acordo, uma organização investigativa independente foi estabelecida para receber reclamações de trabalhadores, realizar investigações e avaliações, identificar violações de um código de conduta desenvolvido em conjunto e direcionar e aplicar as medidas judiciais de acordo.

Em dezembro de 2018, o governo de Bangladesh aumentou o salário mínimo mensal dos trabalhadores do setor de vestuário para 8.000 Tk (aproximadamente R$ 535), mas esse novo salário mínimo correspondia à metade do valor exigido pelas organizações de direitos dos trabalhadores e sindicatos. Como, segundo os trabalhadores, esse valor não era suficiente para cobrir o aumento dos custos de vida na região, eles foram às ruas e realizaram greves pacíficas. Nos dois meses seguintes, 65 trabalhadores foram presos, enquanto outras centenas enfrentaram acusações infundadas de proprietários de fábricas. Cerca

de 11.600 trabalhadores foram demitidos ilegalmente, a maioria dos quais não conseguiu encontrar outros empregos devido a uma lista negra criada para prejudicá-los. Por meio da divulgação pública de listas de fornecedores, o International Labor Rights Forum identificou as principais marcas de vestuário que estavam vinculadas a fábricas com processos infundados contra trabalhadores. Como resultado de seus esforços de campanha, as acusações apresentadas por 14 fábricas foram retiradas.

1. WORKER RIGHTS CONSORTIUM - Worker Rights Consortium Assessment Re: Gender-based Violence And Harassment At Nien Hsing Textile Co., Ltd (Lesotho) - 2019 - https://www.workersrights.org/wp-content/ uploads/2019/08/WRC-Factory-Assessment-re-Nien-Hsing-08152019.pdf


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ESTUDOS DE CASO: A transparência na prática

Foto (direita): Trabalhadores do vestuário de Bangladesh preenchem seus diários de trabalho como parte do projeto Garment Worker Diary ©Microfinance Opportunities Foto (esquerda): Trabalhadores do vestuário em uma fábrica da Malásia ©giz.de

Garment Worker Diaries, Microfinance Opportunities BANGLADESH De acordo com a pesquisa Garment Worker Diaries (2019), projeto do qual o Fashion Revolution é parceiro, trabalhadores de fábricas de Bangladesh que fazem parte das listas de fornecedores divulgadas publicamente pelas marcas são mais bem remunerados mensalmente do que os trabalhadores de fábricas que não são divulgadas nessas listas.

Esses trabalhadores ganham Tk. 5 (aproximadamente R$0,35) a mais por hora do que trabalhadores de fábricas que não são divulgadas publicamente, o que resulta em Tk. 1.040 (aproximadamente R$73) extras em um mês com 208 horas trabalhadas. Esse valor equivale a cerca de um terço do custo médio mensal de aluguel na região.

Transparentem MALÁSIA Na Malásia, uma investigação de vários anos da Transparentem identificou abusos de direitos trabalhistas de trabalhadores migrantes em cinco fábricas. Nessas fábricas, os trabalhadores migrantes eram recrutados de forma enganosa, pagavam taxas de recrutamento exorbitantes e tinham seus passaportes confiscados, restringindo assim sua liberdade de movimento. Por meio dos dados divulgados publicamente pelas marcas sobre suas cadeias de fornecimento e por outras fontes de evidência, a Transparentem conseguiu identificar essas fábricas e relacioná-las a 23 marcas e varejistas globais.

Dentro de dois anos, a investigação e o engajamento colaborativo das marcas levou à devolução de 1.600 passaportes dos trabalhadores e a compromissos de reembolso dos US$ 1,75 milhão pagos por eles em taxas de recrutamento. Em outubro de 2018, foi estabelecido um novo protocolo da indústria, denominado Compromisso da Indústria de Vestuário e Calçado com o Recrutamento Responsável da American Apparel and Footwear Association (AAFA) / Fair Labor Association (FLA). Até o momento, esse protocolo foi assinado por 139 marcas, o que, potencialmente, ajuda a proteger 1,5-2 milhões de trabalhadores do trabalho escravo contemporâneo.


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4. CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER ABORDAGEM O que as marcas e varejistas comunicam sobre seus processos de devida diligência (due diligence1) ambiental e de direitos humanos? Como eles estão avaliando a implementação de suas políticas na cadeia de fornecimento?

Concedemos pontos se as marcas divulgam: • Como fazem para identificar riscos, impactos e violações ambientais e de direitos humanos em suas cadeias de fornecimento (sua abordagem para realizar a devida diligência) • Como representantes dos trabalhadores/produtores/agricultores, sindicatos e outros stakeholders afetados estão envolvidos no processo de devida diligência • Como avaliam a implementação de suas políticas na cadeia de fornecimento • Quais os critérios para assumir novas instalações antes do início da produção • Qual a política sobre a frequência das avaliações (ex.: anualmente) • Se o escopo das avaliações das instalações vai além das instalações de fornecedores de nível 1 • Se as avaliações de fornecedores incluem entrevistas com trabalhadores fora do local de trabalho e, se incluírem, qual o número ou porcentagem de trabalhadores entrevistados 1. Veja mais a seguir em: Processos de devida diligência ambiental e de direitos humanos

CONHECER

COMUNICAR

Neste ano, introduzimos novos indicadores focando especificamente nos processos de devida diligência ambiental e de direitos humanos para entender como as marcas identificam riscos, impactos e violações ambientais e de direitos humanos em suas cadeias de fornecimento de forma mais ampla, indo além da identificação e gerenciamento de riscos materiais somente para a própria empresa.

Verificamos se as marcas divulgam os resultados de suas avaliações de fornecedores, tanto por meio de resumos dos problemas encontrados, quanto em um nível mais detalhado, relatando os problemas encontrados em cada fábrica individualmente.

Também buscamos informações sobre como as marcas avaliam os fornecedores para garantir que estejam cumprindo suas políticas e padrões éticos (normalmente por meio de auditorias em fábricas) e quais padrões de auditoria externa ou de terceiros são utilizados.

RESOLVER Por fim, analisamos o que as marcas publicam em relação à remediação de problemas encontrados em suas cadeias de fornecimento por meio de processos de avaliação. Além disso, verificamos se as marcas disponibilizam procedimentos confidenciais de denúncia de irregularidades para seus funcionários diretos e trabalhadores de suas cadeias de fornecimento. Procuramos ainda pela divulgação dos resultados dos processos de remediação quando são encontradas não conformidades nas instalações, geralmente conhecidos como Planos de Ação Corretiva.


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4. CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER RESULTADOS 0 - 10%

11 - 20%

21 - 30%

31 - 40%

41 - 50%

51 - 60%

CENTAURO

6%

DAFITI

17%

RENNER

29%

MALWEE

46%

NETSHOES

5%

IPANEMA

17%

YOUCOM

29%

HAVAIANAS

46%

DUMOND

3%

MELISSA

17%

MARISA

25%

HERING

41%

TORRA

3%

ANIMALE

16%

PERNAMBUCANAS

24%

OSKLEN

41%

BROOKSFIELD

0%

FARM

16%

DECATHLON

22%

ZARA

41%

CARMEN STEFFENS

0%

AREZZO

14%

CIA. MARÍTIMA

0%

JOHN JOHN

14%

COLCCI

0%

LE LIS BLANC

14%

COLOMBO

0%

RIACHUELO

14%

DI SANTINNI

0%

ELLUS

0%

FÓRUM

0%

LEADER

0%

LOJAS AVENIDA

0%

LOJAS POMPÉIA

0%

LUPO

0%

MOLECA

0%

OLYMPIKUS

0%

PUKET

0%

TNG

0%

C&A

61 - 70% 59%

* As marcas são classificadas em ordem numérica dentro de uma pontuação máxima de 63 pontos e apresentadas aqui em forma de porcentagem arredondada. Quando as marcas têm a mesma pontuação percentual, elas são listadas em ordem alfabética.

71 - 80%

81 - 90%

91 - 100%


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4. CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER DESCOBERTAS CONHECER: PROCESSOS DE DEVIDA DILIGÊNCIA

CONHECER: AVALIAÇÃO DE FORNECEDORES

15%

5%

5%

50%

45%

30%

divulgam como identificam riscos, impactos e violações ambientais e de direitos humanos em suas cadeias de fornecimento

divulgam como representantes dos grupos afetados estão envolvidos nos processos de devida diligência

divulgam os riscos, impactos e violações ambientais e de direitos humanos identificados e sua priorização

publicam uma descrição dos processos de avaliação das instalações dos fornecedores

divulgam o(s) padrão(ões) de auditoria externa/ de terceiros utilizados

publicam se as avaliações das instalações dos fornecedores vão além do nível 1

COMUNICAR: DIVULGAÇÃO DE RESULTADOS

RESOLVER: REMEDIAÇÃO DE PROBLEMAS

25%

10%

8%

40%

50%

10%

publicam o resumo das descobertas das avaliações das instalações no nível 1

publicam a avaliação das instalações no nível 1, identificando as instalações individualmente

publicam relatórios completos de auditoria identificando instalações individuais de nível 1

publicam o processo de remediação quando são encontradas não conformidades em uma instalação de fornecedor

publicam uma descrição dos mecanismos de denúncia ou reclamação para trabalhadores de suas cadeias de fornecimento

publicam dados sobre reclamações/violações submetidas, em análise e resolvidas por trabalhadores da cadeia de fornecimento


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4. CONHECER, COMUNICAR E RESOLVER ANÁLISE CONHECER Processos de devida diligência ambiental e de direitos humanos Devida diligência ou due diligence é o processo pelo qual as empresas identificam, previnem, mitigam e remediam seus impactos adversos reais e potenciais. A devida diligência pode ser incluída em sistemas mais amplos de gerenciamento de riscos corporativos, desde que vá além da simples identificação e gerenciamento de riscos materiais para a própria empresa e inclua problemas que ocorrem em sua cadeia de fornecimento, focando na identificação dos riscos mais impactantes para trabalhadores, agricultores e outros stakeholders. Segundo o guia de orientações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)2 sobre devida diligência para cadeias de fornecimento responsáveis no setor de vestuário e calçados, as medidas de uma empresa para conduzir a devida diligência

devem ser proporcionais à probabilidade e severidade dos danos. Por exemplo, se uma empresa está comprando de um país com leis trabalhistas mais fracas, as medidas que a empresa precisará tomar para prevenir o trabalho infantil, trabalho escravo contemporâneo e outros impactos relacionados a condições de trabalho serão mais extensas do que as medidas de uma empresa que opera com fornecedores de países com leis mais severas. É importante ressaltar que a devida diligência deve ser um exercício contínuo das marcas, reconhecendo que os riscos de danos podem mudar ao longo do tempo, conforme as operações da empresa e o contexto operacional evoluem. No entanto, apenas 15% das marcas divulgam como identificam de forma proativa os riscos, impactos e violações ambientais e de direitos humanos em suas cadeias de fornecimento, ou seja, suas abordagens para realizar a devida diligência. Ao invés da realização de um amplo trabalho de devida diligência, a maioria das marcas analisadas ainda se baseia somente em processos de

auditoria para compliance (conformidade) para monitorar suas cadeias de fornecimento.

de 2020, que aponta 92% para esse indicador, notamos que a média brasileira está consideravelmente baixa.

Além disso, somente 2 marcas, C&A e Zara, informam como os representantes dos trabalhadores, produtores, agricultores, sindicatos e outros stakeholders afetados estão envolvidos em seus processos de devida diligência. Observamos também que somente essas duas marcas divulgam os riscos, impactos e violações ambientais e de direitos humanos que foram identificados, quais as suas priorizações (baixa, média, alta) e os resultados das medidas tomadas para cessar, prevenir, mitigar e remediar tais questões.

Neste ano, incluímos um novo indicador para buscar qual padrão de auditoria externa ou de terceiros as empresas utilizam, como, por exemplo, Abvtex, BSCI, Higg Index, SAI/SAAS, SMETA, WRAP, entre outros. Observamos que 45% das marcas analisadas divulgam esses dados, o que nos permite entender mais detalhadamente quais critérios são usados para medir a conformidade dos fornecedores em relação a padrões sociais e ambientais.

Avaliação de fornecedores Observamos que 50% das empresas (20 marcas) divulgam a descrição do processo de avaliação das instalações dos fornecedores, normalmente realizado por meio de auditorias especializadas. Há uma melhora muito pequena nesse resultado em comparação a 2019, que indicava 47%. Em relação ao Índice global

Além disso, 48% das empresas divulgam seus critérios para assumir novas instalações antes do início da produção, assegurando que elas atendam aos padrões exigidos. Isso geralmente ocorre por meio de algum tipo de autoavaliação aplicado aos fornecedores ou de processos de homologação de fornecedores que incluam requisitos de auditoria de pré-produção. Esses resultados demonstram uma evolução de 11 pontos percentuais entre 2019

2. https://www.oecd-ilibrary.org/docserver/9789264290587-en.pdf?expires=1602697369&id=id&accname=guest&checksum=32DF42B0B0EE3A6949252FA735A65DE2


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e 2020. Também identificamos que 50% das empresas declaram a frequência das avaliações de fornecedores, que geralmente ocorrem pelo menos uma vez por ano, dependendo do nível dos riscos identificados. Identificamos que 33% das marcas divulgam se as avaliações de fornecedores são conduzidas de maneira anunciada, parcialmente anunciada ou não anunciada. A Supplier Ethical Data Exchange3 (Sedex), organização criada para promover a convergência em padrões de auditoria social e práticas de monitoramento em cadeias de fornecimento globais, sugere que a melhor prática é utilizar uma combinação de auditorias anunciadas, parcialmente anunciadas e não anunciadas para mitigar o risco de os fornecedores se prepararem especificamente para a auditoria, encobrindo violações de direitos humanos, de segurança e de meio ambiente.

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entender as reais condições de trabalho sob as quais estão submetidos. Dessa forma, os funcionários têm oportunidade de falar livremente, sem temer por represálias de superiores que possam estar ouvindo seus relatos ou vir a saber o que foi relatado. Por fim, 30% divulgam se o escopo das avaliações das instalações dos fornecedores vai além do nível 1 como, por exemplo, subcontratados, instalações de processamento e beneficiamento, fornecedores de tecidos e de matériasprimas. Essa divulgação indica que as marcas estão trabalhando para garantir que suas políticas, padrões éticos e de meio ambiente sejam aplicadas por toda a cadeia de fornecimento e não somente nas instalações com as quais possuem uma relação mais direta.

Apenas 13% das marcas divulgam que suas avaliações de fornecedores incluem entrevistas com trabalhadores fora do local de trabalho e somente 3 marcas (8%) - Havaianas, Hering e Osklen - informam o número ou percentual desses trabalhadores entrevistados. Nesse sentido, é importante lembrar que conversar diretamente com os trabalhadores fora dos seus locais de trabalho é uma prática crucial para 3. https://cdn.sedex.com/wp-content/uploads/2017/04/Smeta-6.0-BPG.pdf

" O segredo é a base do abuso de poder... sua força capacitadora. A transparência é o único antídoto real."

Glen Greenwald

Advogado e jornalista


FASHION REVOLUTION | FASHION TRANSPARENCY INDEX 2020

COMUNICAR Divulgação de resultados das avaliações de fornecedores Um quarto das marcas compartilham o resumo das descobertas das avaliações das instalações de fornecedores no nível 1 e além do nível 1, enquanto apenas 2 marcas (5%) divulgam essas informações sobre seus fornecedores de matériaprima. Basicamente, não houve uma grande evolução nesse cenário desde o Índice de 2018, quando 20% das marcas divulgavam essas descobertas no nível 1, 15% além do nível 1 e 5% no nível de matéria-prima. Muitas marcas e varejistas operam com um sistema de classificação (por exemplo, Ouro, Prata, Bronze ou A, B, C) para avaliar a conformidade social e ambiental de seus fornecedores. No entanto, apenas 4 marcas (10%) divulgam essas classificações para fornecedores de nível 1 e além do nível 1, identificando as instalações específicas. Para fornecedores do nível de matériaprima, apenas 1 marca divulgou seu sistema de classificação.

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Neste ano, em relação a relatórios completos de auditoria que identificam instalações específicas, 3 marcas Ipanema, Malwee e Melissa - divulgaram seus resultados pela primeira vez. No Índice Global nenhuma das 250 marcas analisadas realizou essa divulgação. Buscamos por essa divulgação dos resultados completos das auditorias porque há evidências de que isso pode gerar mudanças positivas para os trabalhadores nas cadeias de fornecimento. Por exemplo, a Better Factories Cambodia (BFC)4 lançou um banco de dados de transparência on-line, apresentando as avaliações das condições de trabalho de suas fábricas de roupas. Um terço das 51 fábricas incluídas no banco de dados referente a "Problemas Críticos" realizaram melhorias em 21 requisitos legais básicos devido à antecipação da divulgação pública desses dados. O número total de violações de "Problemas Críticos" nesse grupo de fábricas caiu de 59 para 34, entre dezembro de 2013 e fevereiro de 2014 - uma melhoria de 42%.

Identificamos que somente 3 marcas (8%) divulgam resultados selecionados de auditoria por instalação de fornecedor do nível 1, uma marca publica essa informação além do nível 1 e nenhuma marca publica esse dado no nível de matéria-prima. 4. https://www.ilo.org/global/about-the-ilo/%20newsroom/news/WCMS_237913/lang--ja/index.htm

T R A N S PA R Ê N C I A

B E M - E S TA R COMÉRCIO JUSTO SALÁRIOS JUSTOS EMPODERAMENTO IGUALDADE DE GÊNERO S U S T E N TA B I L I D A D E S O C I A L S U S T E N TA B I L I D A D E A M B I E N TA L RESPONSABILIDADE EMPRESARIAL CONDIÇÕES DECENTES DE TRABALHO

UMA INDÚSTRIA DE MODA MAIS JUSTA, SEGURA E LIMPA


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RESOLVER Planos de remediação de fornecedores Observamos que 40% das marcas divulgam seus processos de remediação quando são encontradas não conformidades em uma instalação, como jornadas excessivamente longas de trabalho, falta de contratos formais de emprego, ausência de saídas de emergência ou extintores de incêndio etc. Normalmente, as empresas realizam esses processos de remediação por meio de planos de ação corretiva, nos quais as fábricas tem um período de tempo determinado para resolver os problemas detectados. Apenas 3 marcas (8%) divulgam explicações sobre como os representantes dos trabalhadores, sindicatos e outros stakeholders afetados estão envolvidos no desenvolvimento e implementação desses planos de remediação. Os planos de remediação tendem a ser mais eficazes quando as partes interessadas afetadas estão envolvidas, garantindo que os esforços de remediação alcancem os resultados pretendidos para os trabalhadores.

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Quando buscamos pelas marcas que divulgam a porcentagem ou número de instalações com planos de remediação e seus respectivos status, descobrimos que 9 marcas (23%) divulgam esses dados em relação aos fornecedores de nível 1 e 7 marcas (18%) em relação às instalações além do nível 1. Nenhuma marca divulga tais informações para fornecedores de matérias-primas.

exclusivo para denúncias/reclamações) para seus funcionários diretos e 50% para trabalhadores da cadeia de fornecimento.

Das 40 marcas analisadas, somente 5 divulgam suas estratégias para encerrar o relacionamento com instalações que continuam em não conformidade. Uma estratégia de saída responsável é importante para gerenciar os possíveis impactos e riscos adversos para os trabalhadores, como a perda repentina de seus empregos, sem qualquer indenização e não pagamento de salários atrasados.

Enquanto metade das marcas descreve o mecanismo de denúncia existente para os trabalhadores da cadeia de fornecimento, apenas 20% divulgam como esses trabalhadores são informados sobre a existência dos canais de denúncias e reclamações, seja por meio de postagens nos murais de informes das instalações, treinamentos ou outras práticas. É essencial que os trabalhadores estejam cientes da existência e funcionamento desses mecanismos para assegurar que suas reclamações sejam ouvidas e sanadas sem medo de sofrerem demissões ou outros tipos de punições.

Como as empresas lidam com reclamações e denúncias dos trabalhadores No que diz respeito aos canais de denúncia ou reclamações que possibilitam que problemas sejam identificados e sanados, 53% das marcas divulgam uma descrição do canal (ex.: formulário on-line, e-mail, telefone

Somente 4 marcas (10%) divulgam dados sobre o número de reclamações ou denúncias de violações submetidas por seus funcionários diretos e trabalhadores da cadeia de fornecimento, e se elas estão em análise ou já foram resolvidas.

Empresas ainda divulgam pouco sobre seus processos de devida diligência, avaliação de fornecedores e seus resultados

A pontuação média geral desta seção foi de 14%, representando um leve aumento de 4 pontos percentuais em relação a 2019 (10%). Nem mesmo as marcas com maior pontuação nesta seção – C&A (59%), Malwee (48%) e Havaianas (46%) – alcançaram 60% dos pontos possíveis. Além disso, das 40 marcas analisadas, 29 (73%) pontuaram menos que 20% nesta seção, sendo que 16 delas zeraram a pontuação. Isso demonstra que há necessidade de maiores esforços da indústria em relação à divulgação do que está sendo feito para melhorar as condições de trabalho e segurança dos trabalhadores ao longo da cadeia de fornecimento.

40% das marcas divulgam seus processos de remediação quando são encontradas não conformidades em uma instalação.


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PONTO DE VISTA:

A GESTÃO DOS IMPACTOS EM DIREITOS HUMANOS E A DEVIDA DILIGÊNCIA FLÁVIA SCABIN, TAMARA BREZIGHELLO HOJAIJ E VICTORIANA LEONORA GONZAGA CENTRO DE DIREITOS HUMANOS E EMPRESAS DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

Uma pesquisa realizada pelo British Institute of International and Comparative Law em parceria com a Norton Rose Fulbright LLP com 152 representantes de empresas, de diferentes tamanhos e países, mostrou que cerca de 49% nunca realizaram uma devida diligência em direitos humanos1. Dados de 2019 do Corporate Human Rights Benchmark (CHRB), índice que avalia o desempenho corporativo em relação aos direitos humanos obteve resultado semelhante, com 49% de 200 empresas pontuando zero em indicadores relacionados. Prevista nos Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos da ONU, a Devida Diligência em Direitos Humanos (DDDH) é uma ferramenta para identificar, prevenir, mitigar e prestar contas sobre os riscos e impactos nos direitos humanos dos negócios, sendo o principal instrumento para as empresas implementarem a sua obrigação de respeitá-los.

Essa obrigação, de acordo com os Princípios, significa que as empresas devem (i) se abster de abusar dos direitos humanos relacionados diretamente com suas atividades e operações e (ii) enfrentar os impactos adversos nesses direitos com os quais tenham algum envolvimento, por exemplo, por meio de suas relações comerciais. É dizer que, independentemente do dever dos Estados de proteger os direitos humanos, eles devem ser observados nos processos e práticas empresariais, no próprio ambiente de trabalho, no entorno das operações da empresa e em sua cadeia de valor. Essa obrigação é devida pelas empresas em relação à Carta Internacional de Direitos Humanos, que inclui a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, e as Convenções Fundamentais da Organização Internacional do Trabalho.

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A DDDH é uma ferramenta que deve ser aprimorada continuamente. Isso porque precisa acompanhar a evolução das atividades e operações da empresa; bem como responder à dinamicidade do contexto desses direitos nos territórios em que opera para que os impactos do negócio nessa esfera sejam efetivamente enfrentados. No entanto, não há uma fórmula única para a DDDH. Ao contrário, ela pode variar conforme o tamanho, a capacidade e o contexto operacional das empresas; o que é um desafio. Para contribuir a superá-lo, alguns Estados têm buscado consolidar diretrizes sobre a DDDH em suas legislações, criando obrigações jurídicas correspondentes. Exemplos são a França, a Holanda e, a nível regional, a União Europeia, cujo Parlamento debate um projeto de lei sobre a temática. Nesse movimento, a prevenção dos impactos nos direitos dos trabalhadores em cadeias de valor tem sido central. São redes cada vez mais complexas e fragmentadas, organizadas em diferentes níveis e dispersas geograficamente, em que se diluem não apenas as vantagens e riscos econômicos, como também a responsabilidade pelos direitos dos trabalhadores. Em 2013, o colapso do edifício Rana Plaza mostrou que isso é evidente na indústria da moda: mais

de 1.100 trabalhadores que estavam no local morreram e etiquetas de grandes marcas foram encontradas nos escombros. Para que os impactos nos direitos humanos em cadeias de valor sejam efetivamente enfrentados, é preciso adotar uma abordagem sistêmica, capaz de aprofundar o conhecimento sobre as relações comerciais e de trabalho e o contexto socioeconômico e normativo em que se inserem. Além disso, é necessário adotar uma abordagem de direitos humanos, assumindo que as empresas, independentemente de seu porte, possuem uma responsabilidade em relação a esses direitos, que pode ser efetivada justamente por meio da DDDH. O Centro de Direitos Humanos e Empresas da FGV conduz um projeto que avança nesse sentido, com o desenvolvimento de soluções colaborativas voltadas à promoção de melhores condições de trabalho nas cadeias de valor da indústria da moda nacional. Resultados preliminares serão lançados em breve.

1. MCCORQUODALE, R. et al. Human Rights Due Diligence in Law and Practice: Good Practices and Challenges for Business Enterprises. Business and Human Rights Journal, v. 2, n. 2, p. 195–224, jul. 2017.


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ABORDAGEM A cada ano, o Índice de Transparência da Moda aborda e explora com maior profundidade um conjunto de questões consideradas importantes para a indústria da moda. Em 2020, o relatório brasileiro, assim como o global, dá destaque a quatro áreas estratégicas que chamamos de os 4 C's: condições de trabalho, consumo, composição e clima.

Os indicadores foram selecionados e formulados por meio de consultas com especialistas do setor e estão alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU, que visa reunir as nações para construir um mundo melhor para as pessoas e o planeta até 2030.

CONDIÇÕES DE TRABALHO

CONSUMO

COMPOSIÇÃO

CLIMA

O que as marcas e varejistas estão fazendo para melhorar as condições dos funcionários próprios e dos trabalhadores de suas cadeias de fornecimento? Olhamos especificamente para:

O que as empresas estão fazendo para lidar com a superprodução, minimizar o desperdício e avançar em direção à circularidade? Buscamos especificamente por:

O que as marcas estão fazendo para aumentar o uso de materiais sustentáveis e diminuir o uso de plásticos virgens e de produtos químicos perigosos? Aqui olhamos para:

Quantidade de produtos produzidos durante o período do relatório anual

Estratégias e progressos para a gestão de materiais sustentáveis

As grandes marcas e varejistas estão tomando medidas urgentes para combater a crise climática e avançar em direção à gestão sustentável dos recursos naturais? Aqui procuramos pela divulgação de: •

Quantidade de resíduos têxteis gerados e o quanto foi destruído ou reciclado

Estratégias e progressos para a redução do uso de plásticos virgens

Metas, com base científica, cobrindo clima e/ou outros tópicos ambientais

O que a empresa está fazendo para minimizar o impacto das microfibras

Compromisso para o desmatamento zero

Estratégias e progressos para eliminar o uso de produtos químicos perigosos

Pegada de carbono dentro da própria empresa e nas instalações dos fornecedores

Quantidade de energia proveniente de fontes renováveis dentro de suas próprias instalações e dos fornecedores

Pegada hídrica da própria empresa e das instalações de fornecedores

Relatório que vincule os impactos ambientais das operações aos resultados financeiros da empresa

Combate ao trabalho escravo contemporâneo e práticas de recrutamento nas cadeias de fornecimento Pagamento de um salário capaz de cobrir os custos de vida básicos dos trabalhadores Práticas de compra e o que as marcas estão fazendo para serem boas parceiras de negócios para seus fornecedores

Sindicalização e negociação coletiva

Equidade de gênero e igualdade salarial dentro da própria empresa e nas instalações dos fornecedores

Equidade racial e não discriminação entre nacionalidades

Estratégia e progresso para a redução do excedente/desperdício pré-consumo e para a reciclagem de resíduos pós-consumo Investimentos em soluções circulares que permitam a reciclagem de produtos têxteis


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE RESULTADOS 0 - 10%

11 - 20%

21 - 30%

31 - 40%

41 - 50%

DAFITI

10%

OSKLEN

20%

DECATHLON

31%

MALWEE

39%

FARM

10%

HAVAIANAS

8%

IPANEMA

18%

HERING

24%

RENNER

39%

LUPO

8%

PERNAMBUCANAS

14%

MELISSA

22%

YOUCOM

39%

ANIMALE

6%

AREZZO

12%

MARISA

6%

RIACHUELO

6%

PUKET

4%

JOHN JOHN

2%

LE LIS BLANC

2%

BROOKSFIELD

0%

CARMEN STEFFENS

0%

CENTAURO

0%

CIA. MARÍTIMA

0%

COLCCI

0%

COLOMBO

0%

DI SANTINNI

0%

DUMOND

0%

ELLUS

0%

FÓRUM

0%

LEADER

0%

LOJAS AVENIDA

0%

LOJAS POMPÉIA

0%

MOLECA

0%

NETSHOES

0%

OLYMPIKUS

0%

TNG

0%

TORRA

0%

ZARA

51 - 60% 45%

C&A

61 - 70% 59%

* As marcas são classificadas em ordem numérica dentro de uma pontuação máxima de 49 pontos e apresentadas aqui em forma de porcentagem arredondada. Quando as marcas têm a mesma pontuação percentual, elas são listadas em ordem alfabética.

71 - 80%

81 - 90%

91 - 100%


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE DESCOBERTAS SALÁRIO JUSTO PARA VIVER

PRÁTICAS DE COMPRA

COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO

10%

3%

13%

8%

13%

15%

divulgam seu compromisso de garantir um salário justo para viver dos trabalhadores da cadeia de fornecimento

somente 1 marca divulga seu progresso anual para cumprir o compromisso de pagar um salário justo para viver em toda a cadeia de fornecimento

divulgam sua política de pagamento de fornecedores, com prazos máximos estipulados

publicam o percentual de pagamentos aos fornecedores realizados no prazo e de acordo com os termos acordados

divulgam sua abordagem sobre taxas de recrutamento na cadeia de fornecimento

publicam dados sobre a existência de violações relacionadas a trabalho escravo contemporâneo

IGUALDADE DE GÊNERO

IGUALDADE RACIAL

15%

35%

3%

0%

10%

18%

publicam as diferenças salariais entre mulheres e homens dentro da empresa

publicam a distribuição de gênero dentro da empresa considerando diferentes níveis hierárquicos

somente 1 marca publica dados sobre violações trabalhistas relacionadas a gênero nas instalações dos fornecedores

nenhuma marca publica as diferenças salariais sob a perspectiva racial dentro da empresa

publicam a distribuição por cor ou raça dentro da empresa considerando diferentes níveis hierárquicos

publicam ações com foco na promoção de igualdade racial entre seus funcionários


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE DESCOBERTAS RESÍDUOS E RECICLAGEM

PLÁSTICOS

MATERIAIS SUSTENTÁVEIS

10%

15%

8%

15%

18%

15%

divulgam o percentual, ou as toneladas, de produtos/resíduos têxteis gerados durante o período do relatório anual

divulgam a forma como investem em soluções circulares, que permitam a reciclagem de peças e que vão além da reutilização e do downcycling

divulgam o que estão fazendo para minimizar o impacto das microfibras

publicam progressos mensuráveis no sentido de reduzir o uso de plásticos virgens

publicam uma estratégia ou roteiro, de forma mensurável e com prazo determinado, para gestão sustentável de materiais

publicam seu progresso anual no alcance de metas de materiais sustentáveis

PRODUTOS QUÍMICOS PERIGOSOS

EMISSÕES DE CARBONO

USO DE ÁGUA

10%

13%

25%

5%

23%

3%

divulgam um compromisso ou roteiro, com prazo determinado, para eliminar o uso de produtos químicos perigosos

divulgam progressos mensuráveis no sentido de eliminar o uso de produtos químicos perigosos

publicam anualmente a pegada de carbono ou as emissões de gases de efeito estufa (GEE) de suas próprias instalações

publicam anualmente a pegada de carbono ou as emissões de GEE de suas cadeias de fornecedores

publicam anualmente a pegada hídrica de suas próprias instalações

somente uma marca publica anualmente sua pegada hídrica no nível da produção de fibras e/ou matérias-primas


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE CONDIÇÕES DE TRABALHO Trabalho escravo contemporâneo Em 2020, foram incorporados novos indicadores a este tema na seção Tópicos em Destaque. Aqui estamos analisando, de forma mais aprofundada, os passos que as marcas estão tomando para lidar com os riscos de trabalho escravo contemporâneo, particularmente em relação às práticas de recrutamento na cadeia de fornecimento. Em 2020, foram incorporados novos indicadores a este tema na seção Tópicos em Destaque. Aqui estamos analisando, de forma mais aprofundada, os passos que as marcas estão tomando para lidar com os riscos de trabalho escravo contemporâneo, particularmente em relação às práticas de recrutamento na cadeia de fornecimento.

Observamos que apenas 6 marcas (15%) publicam dados sobre a existência de violações relacionadas à trabalho escravo contemporâneo nas instalações de seus fornecedores, que podem incluir liberdade restrita de movimento, retenção de passaportes ou outros documentos dos trabalhadores, horas extras forçadas e excessivas, retenção de salários, servidão por dívida e, conforme comentado acima, queixas relacionadas a práticas de recrutamento. Como explica o Institute for Human Rights and Business (IHRB), “os trabalhadores migrantes são uma característica sempre presente nas cadeias de fornecimento globais, encontrados em todos os setores e geografias. Os trabalhadores migrantes de baixa renda estão entre os mais vulneráveis à exploração e ao abuso e frequentemente são os menos capazes de fazer valer seus direitos. Para muitos, a falta de opções viáveis para sustentar a vida em casa aumenta sua disposição para aceitar más condições de trabalho no exterior”1. Baseamos a metodologia desta subseção no trabalho do IHRB, que se concentra, em grande parte, em

como os trabalhadores são recrutados e, principalmente, no pagamento de taxas de recrutamento para que os trabalhadores possam garantir o emprego.

publicam suas ações relacionadas à regularização de trabalhadores migrantes estrangeiros em suas cadeias de fornecimento.

Para realmente entender se os trabalhadores estão pagando taxas de recrutamento ou quaisquer custos relacionados a isso, eles precisam ser entrevistados. Nesse sentido, apenas 5 empresas (13%) divulgam se realizam entrevistas com trabalhadores para obter informações sobre sua jornada de recrutamento. Normalmente, para evitar que isso aconteça, as empresas definem uma política para garantir que nada seja pago pelos trabalhadores como parte de seu processo de recrutamento ou que, em caso de gastos, eles sejam reembolsados.

Salário justo para viver

Além disso, apesar de 33% das marcas possuírem uma política referente à mão de obra estrangeira e migrante em suas cadeias de fornecedores, somente 23% divulgam como estão colocando em prática essa política. Descobrimos também que apenas 15% das empresas

Ainda há muito a ser feito no que tange ao pagamento de um salário justo para viver aos trabalhadores da cadeia de fornecimento da moda. Enquanto somente 10% das marcas do Índice brasileiro (C&A, Renner, Youcom e Zara) divulgam seus compromissos para garantir esse salário aos trabalhadores de suas cadeias, o Índice global apontou um resultado de 23% para o mesmo indicador. Normalmente, as marcas divulgam essas informações por conta sua da participação em iniciativas focadas em salário justo para viver, como ACT2, Wage Ladder da Fair Wear Foundation3, Fairtrade Textile Standard4 e Fair Compensation Strategy da Fair Labour Association5. Até o momento, não temos conhecimento sobre organizações ou iniciativas similares no Brasil, infelizmente.

1. https://www.ihrb.org/focus-areas/migrant-workers/ - 2. https://actonlivingwages.com/ - 3. https://www.fairwear.org/resources-and-tools/wage-ladder - 4. https://www.fairtrade.net/standard/textile 5. https://www.fairlabor.org/report/2020-fair-compensation-strategy


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE SALÁRIO JUSTO PARA VIVER Um salário capaz de cobrir os custos de vida básicos ou ‘salário justo para viver’ é aquele que permite um padrão de vida decente para o trabalhador e sua família. Ele é tipicamente maior que o salário mínimo e proporciona condições para se obter todos os recursos necessários para viver, como alimentação, moradia, educação, saúde, transporte, roupas e outras necessidades essenciais, assim como provisão para eventos inesperados. A estimativa de um salário justo para viver varia de acordo com a região, e a orientação a esse respeito é oferecida por agências governamentais e internacionais, organizações acadêmicas e/ou ONGs. Em relação a uma estratégia mensurável e com prazo determinado para o pagamento do salário justo para viver, os resultados são ainda mais desanimadores, já que nenhuma marca incluída no Índice brasileiro disponibiliza essa informação, em comparação com as 5 marcas (2%) do Índice global. De acordo com um relatório da organização Labor Behind the Label6, de 2019, há uma diferença de 2 a 5 vezes entre os salários mínimos, ou salários padrão da indústria, e os valores de

referência para um salário justo para viver. Na Índia, por exemplo, o valor do salário mínimo é a metade do valor que os sindicatos reivindicam e apenas um terço do determinado pela Asia Floor Wage7, uma aliança social e trabalhista global que envolve países produtores de vestuário (como Bangladesh, Camboja, Índia, Indonésia, Paquistão e Sri Lanka) e regiões consumidoras (EUA e Europa) para tratar de questões como salários, gênero e liberdade de associação em redes globais de produção de vestuário.

6. http://labourbehindthelabel.net/wp-content/uploads/2019/06/TailoredWagesUK-FP.pdf 7. https://asia.floorwage.org/

Por fim, nenhuma marca publica informações sobre o percentual acima do salário justo para viver que os trabalhadores em suas cadeias de fornecimento recebem, comparado a 5 marcas (2%) da análise global.

Práticas de compra As práticas de compra responsáveis andam de mãos dadas com a capacidade dos fornecedores de pagarem aos seus trabalhadores salários adequados e dignos. Ainda assim, no geral, as empresas divulgam muito pouco sobre o que estão fazendo para serem boas parceiras de negócio para seus fornecedores. Mesmo havendo uma leve diferença em relação a 2019, quando nenhuma marca divulgava o método utilizado para calcular e delimitar os custos trabalhistas ao negociar os valores de produção com seus fornecedores, no Índice deste ano apenas 2 marcas (5%), C&A e Zara, divulgaram a realização dessa prática. Isso demonstra que este tema ainda está bastante oculto pela maioria das

empresas, inclusive se considerarmos que nenhuma delas divulga o percentual de seus pedidos em que os salários e outros custos de mão de obra foram calculados separadamente. Idealmente, esses custos trabalhistas devem cobrir tanto o salário quanto horas extras, previdência social, licença médica e outros tipos de licença, férias, custo da mão de obra indireta e aumentos salariais planejados ou potenciais. Esse cálculo garante que os custos da mão de obra não sejam negociáveis e permite que os fornecedores paguem salários justos aos seus trabalhadores. Quando os pagamentos aos fornecedores atrasam, pode haver um impacto direto em seus fluxos de caixa, afetando sua capacidade de pagar os trabalhadores em dia. Isso ficou mais claro após o início da pandemia do coronavírus, quando acompanhamos grandes marcas cancelarem seus pedidos e deixarem milhões de trabalhadores ainda mais vulneráveis ao redor do mundo. Esses trabalhadores, que produzem roupas para algumas das empresas mais lucrativas da indústria da moda, foram demitidos ou temporariamente suspensos sem


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE receber o pagamento a que têm direito por lei. Para a maioria deles, que não possui economias ou proteção social, a pobreza e a fome podem representar uma ameaça ainda maior às suas vidas do que o próprio vírus. Por isso, atualmente, as práticas de compra das marcas têm sido questionadas. É vital que as empresas compartilhem mais informações sobre como fazem negócios com seus fornecedores, para que possam assumir suas responsabilidades e cumprir seus compromissos, a fim de evitar que os trabalhadores e suas famílias sofram ainda mais as consequências dessa crise. Por fim, identificamos que apenas 1 marca (3%) divulga feedbacks de fornecedores sobre suas práticas de compra por meio de um processo formal, em comparação a 13 marcas (5%) no Índice global. Esses feedbacks são normalmente coletados por meio de pesquisas internas, de eventos organizados pelas marcas em suas regiões de fornecimento ou da participação em iniciativas como o Better Buying8, um sistema para fornecedores

comunicarem aos seus compradores as práticas de compra que estão funcionando bem e as que precisam de melhorias, sem arriscar sua relação comercial. Essas informações são úteis porque indicam se as marcas estão dispostas a ouvir e fazer mudanças para serem melhores parceiras de negócios de seus fornecedores. Até o momento, não soubemos de iniciativas semelhantes a essa no Brasil.

Sindicalização e negociação coletiva A liberdade de associação, incluindo o direito de formar e aderir a sindicatos e de negociar coletivamente, são direitos trabalhistas fundamentais consagrados em vários acordos internacionais e legislações locais, inclusive no Brasil. São considerados direitos fundamentais porque quando os trabalhadores podem se unir para falar e negociar com seus empregadores por melhores condições de trabalho, eles podem abordar as questões que mais os preocupam, como salários, saúde e segurança, direitos relacionados à maternidade, entre outros.

8. https://betterbuying.org/ - 9. https://abit.org.br/cont/perfil-do-setor

Por isso, é chocante que apenas 4 marcas (10%) divulgam o número ou porcentagem de instalações de fornecedores que possuem sindicatos independentes eleitos de forma democrática. Na pesquisa global esse percentual é ainda menor: somente 9 marcas (4%) entre 250 analisadas. Além disso, apenas 5 empresas (13%) divulgam o número ou porcentagem de trabalhadores na cadeia de fornecimento que contam com a cobertura de acordos de negociação coletiva em comparação a 22 marcas (9%) no Índice global.

Igualdade de gênero A indústria da moda global emprega milhões de mulheres, desde as fazendas de algodão, passando pelas fábricas e chegando ao varejo. No Brasil, estima-se que 75% da mão de obra do setor seja feminina9. Por isso, a cada ano, exploramos políticas, procedimentos (vide Seção 1) e outros dados relacionados a gênero divulgados pelas grandes marcas e varejistas.

15% das marcas publicam a diferença salarial de seu quadro de funcionários sob a perspectiva do gênero

Na Seção 4, abordamos processos de devida diligência que incluem questões de direitos humanos e meio ambiente. Nesse sentido, buscamos saber se as marcas estão divulgando como incluem mulheres potencialmente fragilizadas, organizações de mulheres, mulheres defensoras de direitos humanos e especialistas em gênero em todas as etapas de sua devida diligência e, para nossa surpresa, nenhuma empresa publica tais informações. Esse resultado também é irrisório na pesquisa global, contando com somente 3% das marcas.


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE Apesar de diferentes pesquisas e relatórios indicarem a frequência em que as trabalhadoras estão sujeitas à ocorrência de assédio e violência na indústria têxtil e de confecção, apenas 1 marca (3%) publica dados sobre violações trabalhistas relacionadas a gênero nas instalações dos fornecedores, em comparação a 2 marcas (1%) do Índice global. Essas violações podem estar relacionadas a questões como: assédio sexual e outras formas de violência de gênero; tratamento inadequado e demissão de trabalhadoras grávidas; não cumprimento de licença-maternidade; intervalos limitados para ir ao banheiro; desigualdade de gênero em cargos de supervisão e gerência; disparidade salarial; ausência de mulheres em organizações sindicais etc. Dados divulgados pela CARE International indicam que 50% das trabalhadoras da indústria do vestuário no sudeste asiático sofreram assédio sexual no local de trabalho entre 2016 e 201910. Além disso,

há denúncias recentes de violência sexual em fábricas de jeans de Lesoto, na África, que produzem para renomadas marcas internacionais11. Enquanto isso, a realidade brasileira mostra que mulheres são as maiores vítimas do trabalho escravo contemporâneo e estão frequentemente expostas à violência de gênero na cadeia de fornecimento da moda12. Assim, esperamos que em breve as marcas comecem a publicar mais informações sobre como estão trabalhando para lidar com este tópico tão importante. Além disso, mulheres que trabalham na confecção de roupas também tendem a ser empregadas nas funções de menor remuneração, enquanto os homens costumam ser supervisores e gerentes de fábrica. Embora haja essa desigualdade, apenas 1 marca publica a distribuição de gênero por cargo como, por exemplo, auxiliares, costureiras, supervisores e gerentes nas instalações dos seus fornecedores.

Por outro lado, as marcas são um pouco mais transparentes quanto à igualdade de gênero (ou a falta dela) no que se refere à distribuição de homens e mulheres por cargos dentro das suas próprias instalações, totalizando 35% das empresas analisadas. Mas esse percentual ainda se encontra bem abaixo dos 52% encontrados na análise global. Entretanto, somente 15% das marcas publicam a diferença de salários entre mulheres e homens dentro de suas instalações, contra 34% das empresas revisadas no Índice global. Regulamentações públicas podem auxiliar nessa área como, por exemplo, no Reino Unido, onde as empresas são obrigadas por lei a relatar publicamente esses dados desde 2018.

Igualdade racial Apesar da população negra no Brasil somar mais da metade dos habitantes (55%)13, sabemos que aqui a desigualdade tem cor. De acordo com dados do IBGE referentes ao mercado de trabalho brasileiro em 2018, 68,6% dos cargos gerenciais são ocupados por brancos, em comparação a 29,9% ocupados por pretos ou pardos. Em relação a pessoas em ocupações informais, 34,6% são brancas e 47,3% são pretas ou pardas. O relatório também indica que "o diferencial por cor ou raça é maior do que o diferencial por sexo. Enquanto as mulheres receberam 78,7% do valor dos rendimentos dos homens, em 2018, as pessoas de cor ou raça preta ou parda receberam apenas 57,5% dos rendimentos daquelas de cor ou raça branca"14.

10. https://care.org/wp-content/uploads/2020/06/mbw_impact_report_2019_final.pdf - 11. https://www.theguardian.com/news/2020/aug/20/fashion-industry-jeans-lesotho-garment-factory-workers-sexual-violence 12. https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2020/08/29/moda-escrava-setor-textil-e-o-que-mais-recruta-mulheres-em-sao-paulo.htm e http://escravonempensar.org.br/trabalho-escravo-e-generoquem-sao-as-trabalhadoras-escravizadas-no-brasil/ - 13. https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6403#resultado - 14. https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE Por isso é tão importante e urgente que joguemos luz sobre essa questão dentro da indústria da moda. Descobrimos que apenas 18% das empresas publicam suas ações com foco na promoção de igualdade racial entre seus funcionários como, por exemplo, a criação de uma cultura que favoreça a diversidade racial, a inclusão de trabalhadores negros em cargos executivos e de gerência ou a promoção de igualdade racial na integração de novos funcionários. Somente 10% das marcas divulgam informações sobre a divisão por cor ou raça de seus funcionários, considerando dados de diferentes níveis hierárquicos, e nenhuma publica as diferenças salariais de seu quadro de funcionários sob a perspectiva racial. Apesar de representar um leve aumento em relação a 2019, quando apenas 3% das empresas publicavam informações sobre suas ações para promoção de igualdade racial e 7% apresentavam dados sobre a divisão por cor ou raça de seus funcionários, os resultados mostram que ainda existe um evidente desafio para superar as desigualdades raciais em suas variadas dimensões.

A necessidade de combater as desigualdades raciais no Brasil tem apoiado a elaboração de estudos e a formulação de políticas públicas com foco no diagnóstico e execução de medidas para a redução das severas desvantagens das pessoas pretas, pardas e indígenas em relação às pessoas brancas. É preciso reparar nossa história e reverter séculos de injustiças e violências. Aguardamos melhores resultados no ano que vem.

" Se você não enfrenta as desigualdades, você as reproduz e fortalece."

Viviana Santiago

0% das marcas publica a diferença salarial de seu quadro de funcionários sob a perspectiva racial

Professora, colunista e consultora

em relações etnicorraciais e de gênero


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE CONSUMO O consumo global de roupas mais do que dobrou em menos de duas décadas, de 74,3 bilhões de itens de roupas e calçados em 2005 para 130,6 bilhões em 201915. Isso equivale a cada pessoa no planeta comprando 15 peças de roupa e 2 pares de sapatos anualmente embora os padrões de compra variem consideravelmente entre os países. Com essa taxa de crescimento do consumo, juntamente com o crescimento populacional e o aumento da riqueza nas economias emergentes, podemos esperar que a produção e o consumo de roupas e calçados triplique até 205016. Tendo em vista a crise climática que estamos enfrentando, não podemos continuar fabricando, comprando e descartando roupas conforme as taxas atuais. É por isso que demos destaque para questões relacionadas a superprodução, consumo excessivo

e resíduos nesta subseção, buscando por informações como a quantidade de produtos produzidos anualmente pelas marcas, dados sobre resíduos têxteis gerados e estratégias para reduzir desperdícios e garantir o prolongamento da vida útil dos produtos.

Quantidade de produtos produzidos anualmente Observamos que 7 marcas (18%) publicam a quantidade de produtos (por exemplo, roupas, sapatos, acessórios) produzidos durante o período do relatório anual. Notamos também que apenas 4 marcas (10%) divulgam a porcentagem ou volume de resíduos têxteis gerados anualmente e que 5 marcas (13%) divulgam a quantidade de produtos que são enviados para aterros sanitários ou destruídos, geralmente por meio de incineração ou co-processamento.

É importante ressaltar que concentrar esforços para minimizar os impactos no nível do produto, sem avaliar o aumento da quantidade de roupas novas produzidas a cada ano, fará com que o setor continue a gerar impactos negativos no meio ambiente de maneira insustentável.

2019. Esses resultados estão acima do encontrado no Índice global, em que 27% das marcas analisadas em 2020 divulgaram suas estratégias. Apesar desse crescimento, apenas 6 marcas (15%) divulgaram, de forma mensurável, seu progresso real para a redução desses excedentes e desperdícios pré-consumo.

Resíduos, reparos e reciclagem

Em relação ao manejo de resíduos pósconsumo, notamos que 20% das marcas divulgam se disponibilizam sistemas permanentes de devolução de peças para reciclagem em suas lojas - o que representa um aumento de 7 pontos porcentuais em relação a 2019 e fica abaixo do Índice global 2020, que obteve 30% nesse indicador.

Segundo um estudo da Global Fashion Agenda, cerca de um quarto dos recursos da indústria têxtil e de vestuário são desperdiçados todos os anos17, razão pela qual buscamos informações sobre como as marcas estão abordando publicamente essa questão. Identificamos que 35% das empresas divulgam suas estratégias para reduzir o excedente ou desperdício pré-consumo, como sobras e aparas, estoques não vendidos ou defeituosos, amostras de produção etc. – um aumento de 5 pontos percentuais em comparação a

Neste ano, pela primeira vez uma marca analisada no Índice brasileiro, a Decathlon, divulgou que oferece serviços de reparo de peças para os clientes da marca, a fim de ajudar a prolongar a vida útil dos produtos. No Índice global, 16% das marcas oferecem esses serviços,

15. EUROMONITOR INTERNATIONAL - Apparel and Footwear Industry, 2020 Edition - 2020 - 16. https://www.ellenmacarthurfoundation.org/ assets/downloads/publications/A-New- Textiles-Economy_Full-Report.pdf 17. https://www.globalfashionagenda.com/download/10961


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE Foto: Roupas descartadas são reunidas em grandes armazéns em Panipat, Tim Mitchell

sendo a maioria delas marcas de luxo, que possibilitam o reparo de calçados, bolsas ou outros artigos de alto valor. O objetivo de soluções circulares é garantir que as fibras e os tecidos usados nas roupas possam ser reutilizados repetidamente e por muito mais tempo, reduzindo drasticamente a necessidade de criar novas roupas a partir de recursos virgens. Notamos que apenas 15% das marcas divulgam a forma como investem em soluções circulares além da reutilização ou do downcycling como, por exemplo, por meio de processos de reciclagem de peças em ciclo fechado (nesse caso, apenas o uso de materiais reciclados não é suficiente para pontuar). Somente 8% (3 marcas) divulgam o percentual ou a quantidade de produtos projetados para permitir o circuito fechado ou a reciclagem das peças ao final de sua vida útil.

Devido à pandemia do coronavírus, lojas de varejo em todo o mundo foram forçadas a fechar as portas e demitir funcionários, o que significa que as roupas não foram vendidas. Com a reabertura das lojas, esses produtos podem ser considerados "fora de moda" e isso levanta importantes questionamentos: o que acontecerá com todos esses materiais em perfeito estado? Eles serão vendidos, reutilizados, doados a instituições de caridade, irão para aterros sanitários, serão incinerados ou reciclados? A indústria da moda já enfrenta um grande problema de superprodução e desperdício e ainda não existe tecnologia para reciclar têxteis de uma forma verdadeiramente circular e em escala. É preocupante que as consequências da pandemia possam tornar esse problema ainda pior.

Considerando que cerca de 80% de todas as roupas produzidas no mundo terminam incineradas ou em aterros e somente 20% são reutilizadas ou recicladas18, é fundamental e urgente que as grandes marcas e varejistas revelem mais informações sobre como empregam esforços para reduzir a geração de resíduos e excedentes têxteis para caminhar em direção a sistemas mais circulares. 18. https://www.globalfashionagenda.com/download/10958


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE COMPOSIÇÃO

Plásticos

Estratégias para o uso de materiais sustentáveis

Todas as vezes que lavamos uma peça de roupa feita de material sintético, principalmente poliéster, minúsculas partículas de plástico - muito pequenas para serem capturadas pelo tratamento convencional de água - entram em nosso sistema hídrico, terminando em rios, lagos e oceanos.

Algumas marcas estão aumentando o uso de materiais mais sustentáveis em seus produtos como, por exemplo, algodão orgânico e certificado, couro curtido sem cromo, tecido reciclado/ reaproveitado, tecidos originados de manejo sustentável ou de comércio justo. Entretanto, o uso desses materiais ocorre muitas vezes somente em coleções cápsulas ou sazonais das marcas comercializadas como "sustentáveis" ou "conscientes". Observamos que apenas 7 marcas (18%) publicam uma estratégia ou metas para gestão sustentável de materiais de forma mensurável e com prazo determinado - o que representa uma queda de 15 pontos percentuais em relação a 2019. Apenas 6 marcas (15%) publicaram seu progresso anual no alcance dessas metas.

Estima-se que até 700.000 microfibras podem se desprender de nossas roupas em uma lavagem19. Por conta disso, os têxteis são considerados a maior fonte de poluição micro plástica primária e já foram encontrados nas partes mais profundas do oceano20. Esperávamos que as marcas abordassem esse problema alarmante, mas descobrimos que apenas três marcas (8%) - Decathlon, Hering e Zara - publicam informações sobre o que estão fazendo para minimizar o impacto das microfibras.

Quando se trata de reduzir o uso de plástico de forma mais geral, descobrimos que somente 8% das marcas publicam metas mensuráveis e com prazo definido para a redução do uso de plásticos virgens (incluindo têxteis à base de plástico, acessórios, cabides, embalagens) e que 15% publicam progressos mensuráveis no sentido dessa redução.

Uso de produtos químicos perigosos Alguns dos produtos químicos usados nas roupas, como chumbo (tintas), NPE (lavagem industrial), ftalatos (impressão), compostos PFC (revestimento repelente de água) e formaldeído (tratamento antirugas), são tóxicos e podem causar sérios problemas de saúde. Considerando que a indústria têxtil contribui significamente para a poluição da água em todo o mundo devido à falta de descarte adequado dos produtos químicos, achamos surpreendente que

19. https://www.sciencedirect. com/science/article/abs/pii/S0025326X16307639 - 20. https://portals.iucn.org/library/sites/library/files/ documents/2017-002-En.pdf

apenas 4 marcas (10%) publicam seus compromissos com prazos determinados para a eliminação do uso de produtos químicos perigosos e que somente 5 marcas (13% ) relatam seus progressos para atingir essas metas. Quando as marcas estão tomando medidas para eliminar o uso de produtos químicos perigosos em seus produtos, geralmente isso acontece por meio de programas de padrões internacionais como o Zero Discharge of Hazardous Chemicals (ZDHC), Roadmap to Zero (Descarga Zero de Químicos Perigosos, Roteiro para Zero).


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5. TÓPICOS EM DESTAQUE ANÁLISE CLIMA Emissões de carbono Ainda existe um longo caminho a ser percorrido em relação a mitigar os grandes impactos que a indústria da moda tem na crise climática. Considerando que o colapso do clima está se acelerando e que temos cerca de uma década para conter os impactos mais catastróficos do aquecimento global, seria de se esperar que marcas e varejistas de moda estivessem se movendo muito mais rapidamente para zerar suas emissões de carbono. Apenas 25% das empresas publicam anualmente suas pegadas de carbono ou emissões de gases de efeito estufa (GEE) de suas próprias instalações e somente 5% publicam anualmente a pegada de carbono ou as emissões de GEE de sua cadeia de fornecedores – onde ocorre a maior proporção das emissões do setor21. Números bastante abaixos dos analisados no Índice global, que indicaram 58% e 16% respectivamente para esses indicadores.

Limitar o desmatamento também é uma parte crucial da mitigação de emissões globais de carbono. Considerando os incêndios na Amazônia e no Cerrado, é chocante que nenhuma marca publique um compromisso mensurável, e com prazo determinado para o desmatamento zero. Também no Índice global os resultados são preocupantes, com apenas 4 marcas de 250 divulgando esse compromisso.

Uso de energia renovável Ao buscarmos dados sobre o percentual de uso de energia proveniente de fontes renováveis, observamos que 30% das marcas divulgam essa informação com relação às suas próprias instalações e que nenhuma delas realiza essa divulgação referente à sua cadeia de fornecedores. No Índice global esses resultados também foram baixos, respectivamente, 33% e 6%.

Uso de água Observamos que 9 marcas (23%) publicam anualmente a pegada hídrica de suas próprias instalações, como sedes administrativas, lojas de varejo, centros de distribuição, depósitos etc. Quando buscamos por esse dado no nível das instalações de processamento e beneficiamento, observamos que apenas 2 marcas (6%) realizam essa divulgação e somente 1 marca divulga sua pegada hídrica no nível da produção de fibras e/ou matérias-primas. No Índice global esses resultados são, respectivamente, 31%, 14% e 4%. Considerando que uma crise hídrica global foi classificada entre os 5 principais riscos globais22, é surpreendente ver pouco progresso na divulgação de dados de uso de água pelas empresas, especialmente no nível de matéria-prima.

21. https://quantis-intl.com/measuring-fashion-report-2018/ - 22. http://www3.weforum.org/docs/WEF_Global_Risk_Report_2020.pdf

Nenhuma marca publica seus impactos ambientais em suas demonstrações financeiras Notamos que nenhuma empresa publica em suas demonstrações financeiras informações que indiquem diretamente seus impactos ambientais. Existem hoje algumas metodologias para calcular esse tipo de informação como, por exemplo, a Environmental Profit & Loss (E P&L). Metodologias como essa propõem uma análise monetária dos ganhos e perdas ambientais das operações de uma empresa e de sua cadeia de fornecimento. O Índice global revelou que somente 7 marcas de 250 (3%) mapeiam seus impactos ambientais diretamente em suas demonstrações financeiras. As marcas que mais pontuaram a seção Tópicos em Destaque foram: C&A (59%), Zara (45%), Malwee (39%), Renner (39%) e Youcom (39%).


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ESTUDO DE CASO:

Repensar os laços entre artesãos, designers e consumidores é o desafio que a marca abraça, tendo a transparência como uma das formas de conseguir conversar sobre desafios e, junto com a comunidade de consumidores, reinventar as relações.

A transparência na prática

Nos dois primeiros anos de projeto, a marca teve um crescimento de 7 para 35 artesãs em seu grupo principal. Junto com isso, o faturamento também quintuplicou. Além disso, a Catarina Mina ganhou dois prêmios nacionais. Tudo isso foi possível pois sua proposta de transparência, valores e propósitos foram compartilhados com os consumidores, que se sensibilizaram e se propuseram a fazer parte daquilo que a marca acreditava.

Fotos: arquivo pessoal

Transparência para empoderar artesãs BRASIL Em 2015 a Catarina Mina lançou a proposta: #umaconversasincera, cuja principal motivação foi a vontade de chamar o consumidor para perto, abraçando junto com a marca sua razão central para existir: tornar o artesanato e as artesãs mais fortes. Com a proposta de uma moda mais transparente, a Catarina Mina abriu seus custos, disponibilizando em seu

site tudo que compõe o preço final de cada peça. Junto com isso, foram implementados modelos produtivos e novas metodologias de trabalho. Além disso, toda peça vem assinada pela artesã que a fez e um sistema de QR Code está sendo implementado para possibilitar o rastreio e para dar acesso às informações contidas na página da artesã (ou artesãs) no site.

Após mais de 10 anos trabalhando com artesãs e artesanato (desde 2005), estava clara a importância de dividir com o consumidor os desafios que a marca enfrentava no dia a dia: entender o artesanato como possibilidade de fonte de renda contínua para muitas famílias e pensar no impacto a longo prazo para muitos grupos produtivos e tipologias (por ex.: renda de bilro, labirinto, palha, crochet e outros). Hoje, a Catarina Mina se desdobra para além da moda, como uma rede, assessoria e plataforma que se propõe a inventar novos modos de trabalho envolvendo artesãos e designers e,

com isso, viabilizar e valorizar junto aos consumidores a longevidade dos saberes artesanais. Por meio de outra frente de trabalho, as Oficinas Catarina Mina, são implementadas as metodologias de trabalho do projeto #umaconversasincera em outros grupos, criando oportunidades para o lançamento de outros projetos em parceria com grupos de artesãs como o Projeto Ará (em Aracati, que envolve mais de 150 artesãs e mais de 5 tipologias artesanais); Projeto Uru (em Moitas); Projeto Fia Oficina de Artesãs (em Sobral, que envolveu mais de 30 artesãs e 4 tipologias artesanais); Projeto Olê Rendeiras de Bilro (no Trairi, que envolve mais de 100 artesãs e 1 tipologia artesanal), todos no Ceará, totalizando uma rede com mais de 300 artesãs. Os modelos de trabalho da Catarina Mina envolvem também o compartilhamento de metodologias de preço, branding, comunicação, organização e gestão com grupos de artesãs. Além disso, durante a pandemia, a política do e-commerce da marca sobre a porcentagem das vendas online destinada às artesãs garantiu, mesmo durante períodos onde não era possível produzir e quando havia dificuldade para a compra de linhas, um faturamento extra para os grupos de artesãs.


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4 RECOMENDAÇÕES FINAIS

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O QUE FAZER COM ESTAS INFORMAÇÕES Marcas e Varejistas Esperamos que o Índice de Transparência da Moda Brasil influencie as marcas e varejistas a serem mais transparentes sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais. Pedimos que as empresas publiquem essas informações de forma acessível, compreensível, honesta e abrangente. As grandes marcas e varejistas têm poder, recursos e o imperativo moral para garantir que cada pessoa trabalhando em suas cadeias seja paga de maneira justa, tratada com dignidade e em condições seguras. Diante da crise climática que estamos enfrentando, essas empresas têm uma enorme responsabilidade em acelerar o processo de redução do consumo de recursos finitos da Terra e criar modelos de negócios regenerativos, em vez de destrutivos e lineares. Ao serem mais transparentes sobre suas políticas, práticas e impactos, as marcas podem trazer seus consumidores e stakeholders para acompanhá-las nessa jornada, comemorando e apoiando o que estiver certo e questionando as áreas que poderiam estar melhores.

Nos próximos 12 meses, incentivamos as grandes marcas e varejistas a:

Mapear e divulgar listas de fornecedores de toda a sua cadeia de fornecimento, do nível 1 ao nível da matéria-prima;

Honrar seus contratos, se comprometer a apoiar seus fornecedores e trabalhadores da cadeia de fornecimento, neste momento de crise causada pela pandemia do coronavírus e após, e publicar mais informações sobre suas práticas de compra;

Divulgar mais dados sobre seus impactos ambientais, incluindo suas emissões de carbono, consumo de água, poluição e resíduos gerados ao longo de toda a sua cadeia de valor e o que está sendo feito para reduzir sua pegada ambiental e regenerar recursos.

Governos e Legisladores O Fashion Revolution acredita que leis e regulamentações, com implementação e fiscalização eficazes, são fundamentais para transformar a indústria da moda. Algumas marcas e varejistas estão liderando no quesito da transparência e realizando mudanças para serem mais sustentáveis e responsáveis, mas a maioria das marcas ainda está divulgando e fazendo muito pouco. Essas retardatárias não se moverão sem serem forçadas a agir por meio de legislação.

Nos próximos 12 meses, incentivamos os governos e legisladores a: Implementar e reforçar as leis já existentes que visam proteger os trabalhadores e o meio ambiente; Ratificar a Convenção 190 da OIT: eliminação da violência e assédio no mundo do trabalho; Colocar a devida diligência ambiental e de direitos humanos na agenda legislativa e avançar no sentido de propor, aprovar e adotar essa legislação; Fazer com que as empresas e seus executivos sejam responsabilizados pelo que acontece em suas cadeias de fornecimento, independentemente do lugar do mundo em que os abusos possam ocorrer.


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O QUE FAZER COM ESTAS INFORMAÇÕES Cidadãos Esperamos que o Índice de Transparência da Moda Brasil tenha ajudado os leitores a entenderem mais sobre as políticas de direitos humanos e meio ambiente, assim como as práticas e impactos de algumas das maiores marcas e varejistas do mercado brasileiro. Com isso, convidamos as pessoas a perguntarem às marcas #QuemFezMinhasRoupas, exigindo mais transparência. Fazemos essa pergunta pois ela passa uma importante mensagem para as marcas: que as pessoas se preocupam com a forma como suas roupas são feitas e querem garantir que os trabalhadores foram pagos de maneira justa, tratados com dignidade e que o meio ambiente não foi destruído durante o processo.

Os consumidores têm o direito de saber que o seu dinheiro não está apoiando a exploração, os abusos dos direitos humanos e a destruição do meio ambiente. Não há como responsabilizar as marcas e os governos se as informações sobre o que compramos forem mantidas em segredo. Ao serem mais transparentes sobre suas políticas, práticas e impactos, as marcas podem trazer seus consumidores e stakeholders para acompanhá-las nessa jornada, comemorando e apoiando o que estiver certo e questionando as áreas que poderiam estar melhores.

Veja como participar da campanha:

fashionrevolution.org/south-america/brazil/

Nos próximos 12 meses, incentivamos os cidadãos a: Sempre perguntar #QuemFezMinhasRoupas às marcas que consomem. Você pode fazer isso usando as mídias sociais para estimular que as marcas façam mais divulgações públicas, ou enviar um e-mail para entrar em contato diretamente com a empresa. Pedir que seus governantes e legisladores façam 2 coisas: Exijam que as marcas sejam transparentes, divulguem seus fornecedores e relatem anualmente seus impactos sociais e ambientais ao longo de toda a cadeia de valor, adotando uma estrutura em comum de publicação; Responsabilizem legalmente as marcas pelos impactos que causam em nossos ecossistemas e na vida das pessoas que trabalham em suas cadeias de fornecimento, no próprio país e no exterior.


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O QUE FAZER COM ESTAS INFORMAÇÕES Ongs, Sindicatos e Instituições de Pesquisa Esperamos que o Índice de Transparência da Moda Brasil seja útil para ONGs, sindicatos e instituições de pesquisa que atuem diretamente com produtores e trabalhadores da cadeia de fornecimento na proteção ambiental e de direitos humanos. Esta pesquisa pode ajudar a enxergar quais marcas estão publicando suas listas de fornecedores, que tipo de informações estão sendo divulgadas, onde as marcas estão produzindo e quais políticas e procedimentos elas dizem ter em vigor para proteger os trabalhadores e o meio ambiente.

Convocamos outras organizações a usarem as informações deste relatório para averiguar os dados divulgados publicamente pelas marcas e o real impacto das ações que estão colocando em prática. Acreditamos que essa colaboração é essencial para impulsionar outras iniciativas que possam ajudar a mitigar os impactos ambientais e sociais adversos da moda e gerar valor positivo para toda a cadeia produtiva.

Convidamos ONGs, sindicatos e instituições de pesquisa a entrarem em contato conosco para discutir nossas descobertas. Escreva para educacional.brasil@fashionrevolution.org

Nos próximos 12 meses, convidamos as ONGs, sindicatos e instituições de pesquisa a: Juntarem-se a nós para incentivar as marcas a publicarem informações mais detalhadas e suas listas de fornecedores; Juntarem-se a nós para reivindicar aos legisladores a obrigatoriedade de auditorias e relatórios padronizados; Usarem os dados deste relatório para averiguar as informações divulgadas publicamente pelas marcas; Usarem os dados deste relatório como base para a criação de novas iniciativas, estudos complementares ou reivindicações em prol de melhorias para a indústria da moda; Enviarem informações sobre como gostariam que a indústria da moda melhorasse. Vamos trabalhar juntos!


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OBRIGADA!

O Índice de Transparência da Moda Brasil foi escrito por Eloisa Artuso, diretora educacional, Isabella Luglio, gerente de projeto do Fashion Revolution Brasil, e Sarah Ditty, diretora de políticas, com o apoio da Ilishio Lovejoy e Sienna Somers, coordenadoras de políticas e pesquisa do Fashion Revolution global. O projeto contou com a parceria técnica de Aron Belinky, Renato Moya e Helton Barbosa da ABC Associados. O design foi elaborado por Emily Sear, coordenadora de design, com o apoio de Bronwyn Seier, designer e coordenadora de mídias sociais do Fashion Revolution global, e adaptado por Igor Arthuzo, coordenador de design do Fashion Revolution Brasil. A versão em inglês deste relatório foi traduzida por OYA.OJU. Um enorme agradecimento ao comitê de consulta pro bono, que tem sido fundamental em guiar e acompanhar o desenvolvimento e evolução da metodologia do Índice de Transparência da Moda: Dr. Mark Anner, Neil Brown, Ian

Cook, Subindu Garkhel, Kristian Hardiman, Christina Hajagos-Clausen, Aruna Kashyap, Kate Larsen, Dr. Alessandra Mezzadri, Katie Shaw, Francois Souchet, Joe Sutcliffe e Ben Vanpeperstraete. Além de um grande agradecimento a todos que contribuíram com feedbacks informais para a metodologia. Estendemos a gratidão a Carla Aguilar, Celina Hissa, Francisco Renê Mota, Nana Lima, Nilton Vargas Aroquipa, Rita Ambrosio, Viviana Santiago e Flávia Scabin, Tamara Brezighello Hojaij e Victoriana Leonora Gonzaga do Centro de Direitos Humanos e Empresas da Fundação Getulio Vargas, por suas generosas colaborações para este relatório. Agradecemos a Laudes Foundation por seu apoio financeiro e a Aliança Empreendedora, Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Associação Brasileira do Varejo Têxtil (Abvtex), COPPEAD - UFRJ, InPACTO, Rede Brasil do Pacto Global e Sebrae por seu apoio institucional.

Gostaríamos de agradecer também Fernanda Simon, diretora executiva, Mariana Chaves, coordenadora de comunicação, Bárbara Poerner, redatora e Dandara Valadares, assessora de imprensa do Fashion Revolution Brasil por seu apoio e importantes contribuições ao projeto. Agradecemos à Ana Fernanda Souza, Carolina Terrão, Elisa Tupiná, Fabrício Vieira, Loreny Ielpo, Paula Leal e Taya Nicaccio da equipe Fashion Revolution Brasil, por caminharem ao nosso lado com tanta energia e dedicação. Somos gratas às marcas e seus representantes por dedicarem seu tempo para participar dos nossos encontros e preencher os questionários de pesquisa. Sabemos que as marcas recebem solicitações frequentes de diferentes organizações, sendo difícil responder a todas elas. Seu envolvimento foi muito importante e apreciado.

Por fim, um grande agradecimento aos nossos representantes locais, estudantes embaixadores e professores, assim como a todos os outros voluntários do movimento no país, que impulsionam e fortalecem cada vez mais a atuação do Fashion Revolution no Brasil.

E finalmente, gostaríamos de agradecer a você por ler este relatório!


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Apoiadores:

O Fashion Revolution é uma organização sem fins lucrativos, portanto tudo o que produzimos só é possível por meio do apoio de financiadores e doações de pessoas como você. Com uma pequena doação para o Instituto Fashion Revolution Brasil você estará colaborando com o fortalecimento do movimento no país em prol de uma indústria mais limpa, segura, justa e transparente, e com a criação de mais projetos como o Índice de Transparência da Moda Brasil. Vamos juntos desencadear uma conversa ainda mais ampla sobre os impactos de nossas roupas.

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Com o seu apoio, poderemos continuar criando mudanças positivas e transformar a indústria da moda! Obrigada!

Fashion Revolution Foundation: Instituição de Caridade registrada na Inglaterra e País de Gales sob o número 1173421; Empresa Registrada na Inglaterra e País de Gales sob o número 10494997; Fashion Revolution CIC: Empresa Registrada sob o número 08988812; Endereço Registrado: 19 Dig Street, Ashbourne, Derbyshire, DE6 1GF, UK. Instituto Fashion Revolution Brasil, registrado sob o CNPJ 30.852.175/0001-98.

O ITM Brasil recebeu apoio financeiro da Laudes Foundation e apoio institucional da Abit, Abvtex, Aliança Empreendedora, COPPEAD - UFRJ, InPACTO, Rede Brasil do Pacto Global e Sebrae. O seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do Fashion Revolution e não reflete necessariamente as opiniões de seus apoiadores.

Parceiro técnico:


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ANEXO: DEFINIÇÕES Auditoria é o processo de analisar as finanças, as condições de trabalho e as práticas ambientais de uma empresa. Ela revela riscos de segurança dos trabalhadores e oportunidades de melhoria das condições de trabalho. (Fonte: Walk Free Foundation) Avaliação de materialidade é um exercício elaborado para reunir insights sobre a importância relativa de questões ambientais, sociais e de governança específicas. O insight é mais comumente usado para recolher informações para relatório de sustentabilidade e planejamento estratégico. (Fonte: FIESP e Greenbiz) Cadeia de fornecimento / cadeia de valor referem-se a todos os passos necessários para produzir e vender um produto, desde a fazenda até o guarda-roupa. (Fonte: OCDE) Cinco liberdades animais propõe que sejam definidas diretrizes para garantir a qualidade de vida do animal ao longo de sua vida na fazenda, durante o transporte e no matadouro. A vida de um animal deve seguir 5 princípios básicos: (1) ser livre de fome e sede (com fácil acesso àa água e uma dieta para manter a saúde e o vigor), (2) ser livre de desconforto e com um ambiente adequado e com espaço suficiente, (3) ser livre de dor, lesão ou doença (com prevenção ou diagnóstico e tratamento rápidos), (4) liberdade para expressar o comportamento animal normal da própria espécie e (5) ser livre de medo e angústia, (garantindo condições e tratamento que evitem o sofrimento mental). (Fonte: FAWC) Circularidade (ou Economia Circular) é uma alternativa à economia linear tradicional (produzir, usar, descartar), na qual mantemos os recursos em uso pelo maior tempo possível, extraímos o valor máximo deles enquanto em uso e, então, recuperamos e regeneramos produtos e materiais ao final de sua vida útil. (Fonte: Ellen Macarthur Foundation)

Devida Diligência (Due Diligence) é o processo pelo qual as empresas avaliam seus impactos sobre os direitos humanos e o meio ambiente e tomam providências para reduzir os impactos negativos. (Fonte: Secretaria da Fazenda e Pacto Global da ONU)

Downcycling é reciclar algo de forma que o produto resultante tenha um valor inferior ao do original. Os exemplos incluem a reciclagem de têxteis para isolamento de edifícios, trapos ou forro de carpete. (Fonte: Merriam Webster) Emissão de carbono significa a liberação de dióxido de carbono (CO2), um gás de efeito estufa (GEE), na atmosfera em um período específico. Os GEE ocorrem naturalmente na atmosfera da Terra, mas as atividades humanas, como a queima de combustíveis fósseis, estão aumentando seus níveis, causando aquecimento global e mudanças climáticas. (Fonte: OECD e Ecometrica) Igualdade salarial entre gêneros significa que homens e mulheres com o mesmo emprego e ocupando o mesmo cargo têm que receber remuneração igual. Isso vale não só para o salário, mas também para todos os termos e condições contratuais de trabalho, como direito a férias, bônus, planos de pagamento e recompensa, pagamentos de pensão e outros benefícios. (Fonte: Comissão de Igualdade e Direitos Humanos)

Instalações de processos úmidos estão envolvidas na produção de roupas cujas atividades tipicamente são: lavanderia, clareamento, tinturaria, estamparia, tratamento ou beneficiamento de tecidos. (Fonte: Garment Merchandising)

Liberdade de Associação é o direito dos trabalhadores de formarem e fazerem parte de grupos de sua própria escolha para tomar ações coletivas em favor dos interesses dos membros do grupo. (Fonte: OIT)

Lista de substâncias restritas define as substâncias químicas específicas que não podem ser usadas nos produtos ou nos processos de manufatura. As substâncias perigosas típicas que são restritas incluem chumbo, corantes AZO, dimetilformamida (DMF), hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAHs), ftalatos, ácido perfluorooctanessulfônico (PFOS), liberação de níquel, etc. (Fonte: CIRS-REACH) Microfibras são fibras que se desprendem das roupas durante a produção, uso pelo consumidor ou no final da vida e viram poluição no meio ambiente. Microfibras de roupas sintéticas (como poliéster) são a maior fonte de microplásticos primários que poluem nossos oceanos. Microplásticos são quaisquer partículas de plástico menores que 5 mm. (Fonte: IUCN) Negociação coletiva é um processo no qual os empregadores e os sindicatos negociam para estipular condições de trabalho e salários justos. (Fonte: OIT)

Práticas de compra referem-se aos processos adotado por uma empresa para comprar bens e serviços. Podem incluir atividades como planejamento e previsão, projeto e desenvolvimento, negociação de custos, fornecimento e pedidos, gerenciamento da produção, pagamentos e condições. (Fonte: Better Buying)

Remediação refere-se ao processo de correção de impactos nos direitos humanos e aos resultados que podem neutralizar ou compensar tais impactos. Esses resultados podem assumir várias formas, como desculpas, restituição, reabilitação, compensação financeira ou não financeira e sanções punitivas ou a prevenção de danos por meio de obrigações ou garantias de não repetição. (Fonte: Office of the United Nations High Commissioner for Human Rights - OHCHR)

Resíduos pré-consumo são gerados por fabricantes de têxteis e vestuário durante qualquer fase da produção de roupas. Os resíduos préconsumo incluem sobras de tecidos após o corte de peças, sobras de amostras têxteis, ourelas, resíduos de fim de rolo, materiais danificados e amostras de roupas parcialmente acabadas ou acabadas. (Fonte: Dobilaite et al., 2017) Salário justo para viver é o salário recebido pelo trabalhador em uma semana de trabalho padrão que é suficiente para prover as necessidades básicas dele e da família, incluindo alimentação, habitação, vestuário, educação e saúde. (Fonte: Clean Clothes Campaign)

Stakeholder ou parte interessada é o indivíduo ou grupo que tem um interesse em quaisquer decisões ou atividades de uma organização. (Fonte: Inmetro / ABNT NBR ISO 26000)


FASHION REVOLUTION | ÍNDICE DE TRANSPARÊNCIA DA MODA BRASIL 2020

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Realização Este trabalho é de propriedade do Fashion Revolution CIC (número da empresa: 8988812) e Instituto Fashion Revolution Brasil e foi escrito por Sarah Ditty, Eloisa Artuso e Isabella Luglio. A pesquisa foi conduzida por Eloisa Artuso, Isabella Luglio, Renato Moya, Helton Barbosa, Ilishio Lovejoy e contou com o apoio de Aron Belinky, Sarah Ditty e Sienna Somers entre maio e julho de 2020. A Laudes Foundation apoiou o Instituto Fashion Revolution Brasil, que por sua vez, financiou a pesquisa para este Ìndice. O conteúdo desta publicação é de única responsabilidade do Fashion Revolution.

O Índice de Transparência da Moda Brasil está licenciado sob a Licença de Atribuição Não Comercial Sem Derivações 4.0 Internacional do Creative Commons. Essa não é uma Licença de Cultura Livre. Consultar o link para mais informações: https://creativecommons.org/ licenses/by-nc-nd/4.0/deed. pt_BR Não concedemos nenhuma licença de uso dos dados brutos que compilamos para produzir este Índice e que disponibilizamos no arquivo de dados brutos. Esses dados só estão disponíveis para visualização. É permitido copiar e redistribuir o Índice de Transparência da Moda Brasil em qualquer mídia ou formato, desde que os créditos sejam dados ao Fashion Revolution e Fashion Revolution Brasil por criá-lo. Essa licença não dá o direito de alterar, mixar, transformar, traduzir ou modificar o conteúdo de qualquer forma. Isso inclui não o fornecer como parte de um serviço pago, nem como parte de uma consultoria ou outra oferta de serviço. Se quiser comercializar a totalidade ou parte deste Índice, você deve entrar em contato com o Fashion Revolution em: legal@fashionrevolution.org para obter uma licença. © Fashion Revolution CIC 2020 Publicado em 27 de novembro de 2020


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SOBRE O FASHION REVOLUTION O Fashion Revolution é o maior movimento de ativismo da moda do mundo. Somos uma campanha global que trabalha em prol de uma reformulação sistêmica da indústria da moda, com foco na transparência. Acreditamos em uma indústria da moda global que conserva e restaura o meio ambiente e valoriza as pessoas acima do crescimento e do lucro. Os problemas na indústria da moda nunca recaem sobre uma única pessoa, marca ou empresa e por isso que nos concentramos em usar nossas vozes para transformar todo o sistema. Com uma mudança sistêmica e estrutural, a indústria da moda pode tirar milhões de pessoas da pobreza, proporcionar-lhes um meio de vida decente e digno e pode também conservar e restaurar nosso planeta. A moda pode aproximar pessoas e ser uma grande fonte de alegria, criatividade e expressão para indivíduos e comunidades. No Brasil, operamos desde 2014 desenvolvendo projetos, realizando atividades e fomentando a união de uma rede de pessoas, iniciativas e organizações do setor. Em 2018, nos tornamos Instituto Fashion Revolution Brasil, uma organização não governamental sem fins lucrativos.

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" Se quisermos evoluir desta pandemia global para nos tornarmos uma indústria de moda mais equilibrada e consciente, temos que fazer da escuridão uma coisa do passado e abraçar a transparência radical como nossa luz guia."

Orsola de Castro

Cofundadora, Fashion Revolution


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