FabioAraujoSantos

Page 1

ZERO HORA RESPEITABILIDADE

Viagens ao exterior para se atualizar

Recebendo Médici em Porto Alegre

CONHECIMENTO

DEMAIS REGIÕES

- R$ 3,50 URUGUAI - $ 48 R$

2,00

Amigos elogiam posturas firmes e a coerência

REPRESENTATIVIDADE

LIDERANÇA

Fábio Araújo Santos, maior liderança do Rio Grande do Sul por duas décadas

FAMÍLIA ARQUIVO DA FAMÍLIA

Nos 37 anos em que esteve no comando da JH Santos, transformou uma pequena loja na maior rede do varejo no Sul do país. Presidiu a Associação Comercial e a Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul em cinco mandatos e nos

SC/PR - R$ 2,50

www.zerohora.com

POR TO ALE GRE, QUINTA-FEIRA, 12 DE MARÇO DE 2009

Ao lado de Castello Branco, um “estadista”

ANO 28 ESPECIAL

Filhos lembram os melhores momentos

momentos mais críticos da história do país, nos primeiros anos da Revolução de 64. Foi o empresário mais influente do Estado durante 20 anos. Foi interlocutor de presidentes da República e dos ministros mais importantes de seu tempo. Páginas 2 a 8

Fábio, pai exemplar e sempre presente, deixou lembranças fortes na família. Contracapa

OTIMISTA POR NATUREZA ARQUIVO DA FAMÍLIA

INOVAÇÃO

J.H. Santos teve crescimento baseado na inovação Fábio Araújo Santos foi o precursor do sistema de franquias, criando postos de vendas para crescer no interior. Pág. 6

ACAMPAMENTO ARQUIVO DA FAMÍLIA

Fábio sabia saborear a vida, era otimista por natureza. Foi um grande privilégio conviver com ele por 22 anos, diz a esposa Wilma. Pág. 3

Um defensor incansável da livre iniciativa

Só com o lucro pode haver desenvolvimento Páginas 4 e 5

Férias nas praias desertas de Quintão O acampamento próximo ao Farol da Solidão era o momento exclusivo da família. Pág. 8


|2|

ZERO HORA > QUINTA | 12 | MARÇO | 2009

O Homem > ➧ especial@zerohora.com.br

Presidente da Sears, um grande amigo nos EUA

Mais vale um minuto de leão, que vida de cordeiro

Relações internacionais

Pensamentos Editoria Especial de Zero Hora > 3218-4300.

Perfil Interlocutor de quatro presidentes, o mais influente líder empresarial gaúcho era bom ouvinte. E muito simples

Homem de metas

O sonho com uma quinta

A trajetória vitoriosa de Fábio Araújo Santos Última lembrança ARQUIVO DA FAMÍLIA, JANEIRO DE 1981

Determinado. Trabalhador incansável. Otimista. Metódico. Coerente. Bom ouvinte. Organizado. Sério. Amante das flores, um romântico e um grande pé de valsa.

E

Final de semana em casa, ao lado do chorão, a árvore preferida de Fábio Logotipo ARQUIVO ZERO HORA

ssas são algumas características do homem especial e inesquecível que foi Fábio Araújo Santos. O fato de ter se tornado um dos mais influentes líderes empresariais gaúchos, interlocutor de todos os presidentes, não fez com que perdesse a simplicidade que o acompanhou por toda a vida. Fábio nasceu em 1º de Novembro de 1926 em Porto Alegre e teve uma grande convivência, em seus primeiros anos de vida, com os avós maternos, Fábio Araújo – que lhe deu o nome – e Ernestina Barcelos de Araújo, em sua fazenda de Osório, a Casqueiro. Os momentos que ali passou, percorrendo a região com o avô, marcaram sua vida. E explicam por que gostava de passar suas férias nas praias desertas de Quintão. Foi o mais velho dos onze filhos de José Honorato Santos com Alice Araújo. E o sucessor do pai na J.H. Santos e Cia, uma loja de couros que ele havia comprado em 1915. Começou a trabalhar ali em 1944 como Auxiliar de Escritório. Evoluiu como Técnico em Contabilidade, Contador e Chefe de Escritório. Em 1950, formado em Economia, passou a ocupar o cargo de Diretor-Superintendente e, por fim, presidente da J.H. Santos S/A Comércio e Indústria. O respeito à tradição, levou-o a adotar um hábito de seu pai: a gravata borboleta. Dizia que era seu “logotipo”. Porque era mais prática e estava sempre à mão. O empresário Paulo Vellinho, que tinha o mesmo hábito de Fábio, diz que, quando deixou de usar a gravata borboleta, não tinha a quem dar sua grande coleção, porque ninguém mais usava. Então, deu ao amigo Fábio suas 50 gravatas borboleta. Fábio estudou até o antigo científico no Colégio do Rosário e cursou Contabilidade e Economia na PUCRS. Sempre foi um estudioso. Para onde viajasse, estava sempre acompanhado de livros. Queria aprender, entender tudo. No final da década de 1950, começou a estudar inglês no Instituto Cultural Brasileiro Norte-Americano, o Cultural. Foi lá que conheceu a mineira de Estrela do Sul, no Triângulo Mineiro, Wilma Resende, encarregada da área social e cultural, atividades que sempre foram uma marca forte do ICBNA.

Após ler “Jantar no Antoine’s”, de Frances Parkinson Keys, em 1953, Fábio queria, em algum dia de sua vida, jantar no Antoine’s, conhecido restaurante de New Orleans, nos EUA.

D

emorou, mas conseguiu. Em 10 de setembro de 1973, vinte anos depois, lá estava ele e a esposa Wilma, jantando no Antoine’s, com direito a um show de jazz. Foram à cidade apenas para o jantar. Metas como essa sempre estiveram presentes, de uma ou outra forma, em sua vida. Ele as colocava em um papel e não esquecia. Uma delas era a de, ao completar 50 anos de J.H. Santos – o que ocorreria em 1994 –, alugar uma quinta e passar um ano em Portugal. Wilma sempre ouviu o marido comentar o plano e verificou a força desse sonho quando, após sua morte, foi vasculhar a famosa gaveta do meio, em seu escritório na J.H. Santos. - Ali, em um envelope, encontrei vários recortes de jornal com anúncios de aluguel de quintas em Portugal. O Fábio metódico e de rotinas resultou em cenas inesquecíveis pela esposa. Em uma delas, que lembra rindo, Wilma foi deixada no meio de um salão de dança em Torres, durante uma excursão, para Fábio poder ouvir o “noticioso” no rádio do carro. Era 1º de novembro de 1957 e ele estava de aniversário. Naquele dia, começaram a namorar.

Aos domingos, era Fábio que apanhava a correspondência da J. H. Santos na caixa postal 60, do Correio; e, às 19h, era o momento de ir para casa, pois “domingo é dia de dormir mais cedo, para poder começar a semana mais bem disposto”, lembra a esposa. Suas viagens nunca eram de turismo, mas de negócios e estudos. E foram muitas: segundo o currículo que distribuía, houve seis para os Estados Unidos, duas para o Canadá, três para a Europa Ocidental e uma por quatro países da América Latina. Em cada viagem, a mesma rotina de sempre: contatos previamente agendados com grandes redes de varejo e lideranças empresariais. Em lá chegando, um caderno sempre à mão para fazer anotações de tudo o que via, de idéias, de novidades. Construiu assim muitas amizades, principalmente nos Estados Unidos. Um de seus amigos era o presidente da Sears, que um dia recebeu Fábio e Wilma para um jantar com direito a dança no último andar da torre que sediava a empresa, em Chicago. Fábio, destaca Wilma, “sabia saborear todos os momentos da vida. Sempre dizia que mais vale um minuto de leão, do que uma vida de cordeiro”. Fábio foi um otimista inveterado. Mas não um otimista que se limitava a acreditar que as coisas poderiam melhorar. Ele trabalhava para que as coisas melhorassem. “Transmitia para a gente que não há nada impossível. Era destemido. Não havia plateia que o assombrasse”, lembra a esposa. E isso valia para tudo. Não se negava a ouvir e dialogar mesmo com quem discordava de suas ideias. Sabia ouvir. E se numa discussão aceitava a argumentação do interlocutor, levantava a mão e dizia: touchê!

A MORTE, EM SANTA CATARINA

Queda de avião abreviou uma grande história

Gravata borboleta, um acessório inseparável

- Eu tinha pouco mais de 24 anos e ele 30. Já usava gravata borboleta. E eu o chamava de senhor – lembra Wilma. Os dois se conheceram em 1957 e casaram em 1959. - Ele era considerado um solteirão. E resistiu – acrescenta ela. O pedido de casamento ocorreu em um jantar no antigo Restaurante Renner, que existia no prédio das Lojas Renner da Otávio Rocha. Mas a oficialização do pedido e o noivado foram mais formais, na casa dos pais de Fábio, num casarão da Rua Florêncio Ygartua, no Moinhos de Vento. - Fábio era muito romântico. Tenho uma pilha de cartões que ele sempre me mandava com as flores que, invariavelmente, eram cravos vermelhos. Sempre me mandou duas dúzias de

cravos vermelhos, ao longo de todos os 22 anos que vivemos juntos – lembra Wilma. Noivos, Fábio e Wilma frequentavam os bons restaurantes da época. Fábio gostava de se alimentar bem, mas nunca fez um prato de comida, embora gostasse de ensinar pratos e passar receitas. Também saíam muito para dançar, principalmente no Cotillon Club, na Rua General Câmara, no Centro. “Era um pé de valsa”, diz Wilma. Quando jovem, Fábio chegou a fazer aulas de dança de salão. Adorava samba. - Em uma ocasião estávamos em uma boate no México. Tocaram um samba e, quando vi, estávamos os dois sambando no meio do salão, com todos em volta, aplaudindo – lembra a esposa.

A vida de Fábio foi interrompida às 17h30 do dia 23 de setembro de 1981, quando o avião que o transportava perdeu a rota em decorrência de uma forte neblina e bateu em um morro na cidade de Concórdia, onde pouco depois deveria inaugurar a primeira loja da J. H. Santos em Santa Catarina. Também morreram no acidente o secretário gaúcho de Indústria e Comércio, Antônio Carlos Berta, um diretor da MPM Propaganda e os dois pilotos. Meia hora depois morreu em outro acidente aéreo em Chapecó, o irmão de Fábio, Félix, que acompanhava para o evento o secretário de Indústria e Comércio de Santa Catarina, Hans Dieter Schmidt,um outro empresário e os dois pilotos, todos mortos. No dia do acidente, antes da viagem, Fábio fez algo que não era usual: ligou inúmeras vezes, durante todo o dia, insistindo para que a esposa, Wilma, o acompanhasse na viagem. Houve luto oficial de três dias nos

dois estados e uma grande cerimônia fúnebre em Porto Alegre. Os presidentes Figueiredo e Aureliano Chaves, que estava no exercício da Presidência, enviaram como representante a Porto Alegre o ministro da Indústria e Comércio, Camilo Penna, velho amigo de Fábio.


ZERO HORA > QUINTA | 12 | MARÇO | 2009

Respeito Empresários, políticos e amigos falam de Fábio Araújo Santos e do papel que ele desempenhou no Estado

Depoimentos de quem conviveu com Fábio FOTOS DO ARQUIVO DA FAMÍLIA

Fábio, com dois de seus ídolos: o presidente Castello Branco (esq.) e o poderoso ministro Roberto Campos

Fábio Araújo Santos teve uma vida intensa nos meios empresariais do Rio Grande do Sul. Pelo sucesso que conquistou na J. H. Santos, transformando uma pequena loja em uma das maiores redes do varejo no Sul do país. E pelo papel que desempenhou, como a mais influente liderança do Estado por mais de duas décadas.

G

raças a suas posições políticas claras e a uma defesa incansável dos interesses do Rio Grande do Sul, Fábio conviveu com as pessoas mais importantes e mais influentes do país em sua época. Respeitado por todos, foi uma unanimidade nos meios empresariais e políticos, sendo respeitado até por correntes contrárias a seu pensamento. Confira, nesta página, depoimentos de algumas pessoas que conviveram com ele. > É esta Associação um reduto de homens decididos, comandados por um administrador de alto gabarito. (Cordeiro de Farias, um dos líderes da Revolução de 64, mas que participou de todas as grandes rebeliões e revoluções ocorridas no país desde a década de 20). > Movido por uma energia pessoal realmente extraordinária, Fábio, tanto como principal gestor da rede de lojas de departamentos da família ou como líder empresarial do setor de serviços, foi uma figura de grande influência no Rio Grande do Sul. (Luiz Fernando Cirne Lima, amigo pessoal e ex-presidente da Copesul). > Fábio foi conceituadíssimo no Estado e um líder desde os primórdios de sua atividade comercial. Não era uma liderança que decorria das causas que ele defendia, mas uma liderança natural. Foi um homem extraordinário para o seu tempo, com uma visão larga, moderna e que acreditava no sucesso do trabalho. Foi um homem que deixou saudades por tudo o que realizou. (Jair de Oliveira Soares, político, ex-ministro da Previdência Social e primeiro governador eleito no Estado após a redemocratização). > A rede J.H. Santos usava com modernidade os instrumentos então disponíveis de comunica-

ção. Em especial os meios de massa: rádio, jornal e televisão. Foi aí, no começo do que é hoje a RBS, que Mauricio (Sirotsky Sobrinho) e eu o conhecemos. Éramos, então, apenas a Rádio e TV Gaúcha. Sob a liderança do Fábio, a J.H. Santos transformou-se num dos grandes anunciantes do nosso mercado. (Jayme Sirotsky, presidente do Conselho de Administração do Grupo RBS).

Saiba mais Liderança jovem, que marcou época nos meios empresariais: > Fábio começou a trabalhar em 1944 na pequena loja de seu pai, José Honorato Santos, um caixeiro viajante de Tijucas-SC. Ele se mudou para Porto Alegre no início do século passado, comprando em 1915 uma loja de couros na Vigário José Inácio. Tornou-se a J. H. Santos e Cia. > Com 30 anos, em 1956, Fábio já era Diretor Secretário da Associação Comercial de Porto Alegre e da Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul. > Em 1963, aos 37 anos, tornou-se presidente das duas entidades. Foi a liderança empresarial mais jovem do Rio Grande do Sul. E a mais influente por 20 anos.

> Ele sabia ouvir e perguntar, o que não é muito comum. Era muito coerente com suas ideias e muito firme em suas convicções e seus princípios.. Tinha um sentido de agregação. Quando herdou a empresa do pai como filho mais velho, herdou também a responsabilidade por toda a família. Ele tinha um sentido de família muito forte e era, antes de tudo, um pai de família. Foi uma pessoa completa, aberta às mudanças e à inovação (Sulamita Gif- árvores e de esquecer o interesse pessoal em befoni, amiga, confidente e companheira de jardina- nefício dos valores públicos por ele postulados. (Barbosa Lessa, folclorista falecido em 2002, escrigem de Fábio). tor e amigo de Fábio). > Fábio foi um ícone da minha geração. Lí> Admirava Fábio pela vida que levava e o der jovem, acompanhei-o pela mídia, até que um dia, na Springer, minha secretária anunciou que que representou como exemplo para todos que o Dr. Fábio Araújo Santos em pessoa, desejava conviviam com ele. Ele foi um homem público falar-me. É obvio que emocionei-me, pois iria que marcou com sua ação e otimismo contagianconhecer a pessoa que eu admirava pelo que vi- te o tempo que esteve conosco. Fazia bem para a nha realizando como homem de negócios e líder gente falar com ele. (Geraldo Tollens Linck, já faempresarial. Fábio representava naquela época, lecido, fundador do Projeto Pescar). segundo minha lembrança, a fábrica de alumí> Ele foi o grande expoente da geração – honio do Grupo Votorantin, além de liderar a J.H. Santos. Fizemos uma bela amizade, nos identifi- je infelizmente quase extinta – dos empresários camos pelo fato de ser ele uma liderança ativa, e armados de espírito público, capazes de enxergar eu mal sabia que estaria entrando na sua escola. muito além dos problemas cotidianos do seu ne(Empresário Paulo Vellinho, ex-diretor da Springer, gócio, sensíveis aos grandes desafios nacionais. Coemsa, Avipal e dirigente de diversas entidades (Advogado Couto e Silva, um amigo de Fábio). empresariais nacionais). > Ele adorava política. Tinha diversos amigos > Sua visão como empresário prova-se a si políticos, que muitas vezes pediam sua opinião e mesma na esplêndida obra que deixou: soube ele os orientava com sua sabedoria. Em relação à viver seu sonho no tempo certo e convertê-lo em empresa que presidia, ele era o seu cérebro. Com realidade. Seu otimismo, talvez simbolizado na sua direção, um pequeno negócio expandiu-se alegre gravata borboleta que usava, contagiava em uma rede de lojas. Seu estilo de liderança a tudo e a todos: foi a vara mágica que ajudou era democrático e firme. Reunia os gerentes e os a construir o seu tempo e sua vida (...). Ele não ouvia para a tomada de decisões. Mas não se exifoi ainda superado na condução dos destinos da mia da responsabilidade de decidir. Possuía uma classe empresarial (...). Somava ao dinamismo visão abrangente da empresa e segurança sobre otimista, os dons de tomar decisões de risco nos as metas a alcançar. (Glecy Linhares da Fontoura, momentos exatos, de enxergar a floresta além das secretária de Fábio por 25 anos).

Especial >

|3|

| Artigo | Edmundo Giffoni |

JORNALISTA E AMIGO DE FÁBIO POR CERCA DE 40 ANOS

Junto ao Farol da Solidão A convivência com Fábio era de muitos anos, talvez uns 40 anos. Praticamente vi nascerem todos os seus filhos. Daí o contato cotidiano das duas famílias. E daí a ideia de passarmos juntos as férias quase paradisíacas, na praia desértica rumo ao Farol da Solidão, quando nossa alegria era uma só: desfrutar a natureza como se fossemos uma só família. Fábio levava um enorme trailer, veículo de muito conforto que ainda possuía um “avancê” para nos dar sombra e abrigo. O ritmo do nosso acampamento era quase febril, com muito esporte, viagens à praia do Quintão, aos lagos, às pescarias que não davam resultado algum mas divertiam. Chegávamos a ter 18 pessoas no acampamento, todas elas tratadas na base das brincadeiras, gozações, trotes e principalmente muito amor. Este autor que, pela sua idade e experiência, liderava muitas das atividades, principalmente esportivas, teria que possuir um apelido, como todos os demais e sua ambição era a de ser, por suas aventuras bem ou malsucedidas, o Robinson Crusoé. Lamentavelmente a numerosa gurizada modificou o seu apelido para Zé do Contra, quando o próprio Robinson Crusoé já tinha nomeado como o Sexta-Feira o filho mais velho do Fábio, o Fábio Filho ou familiarmente o Fabinho, grande auxiliar nas nossas aventuras. Mais tarde seu apelido foi trocado para “Friday”. E agora vamos mostrar toda a nomenclatura dos numerosos participantes do Acampamento, inclusive de alguns visitantes, uns ilustres , outros nem tanto. Apenas um intróito para explicar o apelido ou a denominação da figura principal do acampamento: Fábio, que nas suas numerosas atividades em Porto Alegre chegava a se barbear duas vezes por dia mas que, ao chegar ao acampamento, desligavase totalmente, aproveitando o justo descanso da liberdade. Vestia-se completamente livre e deixava a barba crescer. Este autor, vendo-o assim barbado e livre de roupas convencionais, inteiramente à vontade, lembrou-se da figura famosa de um dos mais importantes personagens da obra de Victor Hugo, Os Miseráveis: Jean Valjean, que era o rei do bando. Então o título principal que coube ao Fábio foi, naturalmente, o de Rei. E em seguida o título dos demais componentes do acampamento: a mulher do Rei era a Querida Mamãe, que naturalmente açambarcava todo o sentido carinhoso da turma. Depois vinha a Bela, a filha mais velha do

casal e em seguida a Gazela, muito freqüentadora das dunas. E como irmãos do Sexta-Feira vinha o Zé do Arroz, caçula da família e muito reclamão; o Cacá, o Tatuíra e o Mãe D’Água, que certo dia veio reclamar de seu apelido alegando questão de sexo, já que sendo homem não lhe cabia um apelido feminino. Sua reclamação ainda está nos arquivos, mas lhe foi dada razão. O Zé do Arroz, passados uns tempos, teve seu apelido alterado para Zé Lamento, tal os apelos que fazia de minuto a minuto à Querida Mamãe. Um outro protesto foi o deste autor, que nunca concordou com seu apelido de Zé do Contra. Mas foi em vão. Permaneceu mesmo como Zé do Contra. Acho que havia nesse apelido alta dose de vingança e ciúme, já que ganhava todas as partidas olímpicas: no carteado, no tênis etc. A pessoa mais chegada à Querida Mamãe era a Tia Sula, uma amiga do peito. Outra integrante do acampamento era a MR, companheira pra tudo. Complementando a turma das competições, também é obrigatório registrar a figura do Chan-Chan, que atrapalhava todo o mundo no meio do caminho para o trailer, com os seus quatro ou cinco anos de idade. Objeto do carinho de todos, era filho da querida Marisa, que ajudava no tratamento da rapaziada e na assistência à Ivone na deliciosa comida que preparavam para a gente faminta que éramos. Lembramos também do Dudu Chevrolet, dedicadíssimo a qualquer problema automobilístico. Um dos mais famosos visitantes do acampamento era o Tio Pal, adorado por sua ranzinice, que deixava saudades em toda a meninada. Entre toda essa gente não havia ninguém com mais de 17 anos, motivo por que levavam pau doTio Pal e do Zé do Contra, com permissão da Querida Mamãe e do Rei, este nas raras horas e momentos em que deixava suas leituras. E, por falar em leituras, não é demais lembrar aqui o que aconteceu com o Rei. Lendo há horas, sem parar, dentro da Veraneio, não notava a chuva que caía copiosamente na praia. O espanto foi grande entre todo o pessoal do acampamento, quando se via a água se infiltrando na areia movediça e a caminhonete começando a sumir, com o Rei empolgado em suas leituras lá dentro. Foi a nossa maior aventura a salvação do Rei, com a Veraneio sumindo ali na nossa frente. O socorro só pode livrar a caminhonete com um trator pertencente à fazenda do ex-deputado Zaire. O único jornal a registrar esse fato inédito foi O Clubinho, em edição especial. Era o órgão especial dedicado exclusivamente aos acontecimentos do acampamento, cujos assinantes, ao lerem este artigo, poderão atestar a veracidade das notícias ali registradas pelo Zé do Contra.


|4|

ZERO HORA > QUINTA | 12 | MARÇO | 2009

A Liderança > ➧ especial@zerohora.com.br

Capas de Zero Hora mostraram, ao longo de 20 anos, uma atuação intensa Em defesa do Rio Grande Editoria Especial de Zero Hora > 3218-4300

M

onetarista convicto, adepto das teorias e dos pensamentos de Milton Friedman e do brasileiro Roberto Campos, teve participação ativa em todos os grandes acontecimentos políticos e econômicos desses vinte anos – os mais conturbados e de maiores transformações ocorridas em toda a história da vida brasileira. Coerente e destemido, elogiava e apoiava sempre que considerava adequado, e criticava quando os interesses da sociedade, do Estado e do país eram colocados em risco em decorrência de ações e medidas equivoca-

das dos governos. Foi, por exemplo, um dos críticos do aumento do então ICM pretendido pelo governador Leonel Brizola, não se intimidando pelas ameaças de seu secretário de Justiça que, em ligação para a Associação Comercial, disse que não conseguia mais “conter as massas”, que ameaçavam se deslocar em direção ao prédio da entidade. Foi necessário fazer barricadas na parte interna para reforçar a porta que, minutos depois, era pressionada por uma multidão furiosa. Nos anos em que liderou as entidades do comércio gaúcho, encontravase e trocava correspondências regularmente com presidentes, ministros e as mais importantes autoridades federais. Era convidado para falar a estudantes, políticos, em clubes como o Rotary. As suas manifestações, claras, objetivas e sempre apresentando sugestões, formam o melhor retrato de seu pensamento (próxima página).

11/08/1977 11/06/1981

Acumulou as presidências da Associação Comercial de Porto Alegre e da Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul por cinco mandatos: quatro deles consecutivos, entre 1963 e 1970, tendo feito seus sucessores nos anos seguintes, e retornou em 1980.

Um homem à frente dos acontecimentos 24/11/1966

Liderando o comércio por cinco mandatos

Imagens de um líder, através das capas de Zero Hora

15/08/1980

Duas décadas Fábio foi o principal líder empresarial gaúcho entre 1960 e 1981

FOTOS DO ARQUIVO DA FAMÍLIA

Fábio na posse de 1980, ao lado do ministro Camilo Penna (E), da Indústria e Comércio, e do governador Amaral de Souza (D)

Monumento no Parcão para homenagear Castello

Ao lado de Figueiredo, discursando na inauguração do monumento no Parcão

O ex-presidente Humberto de Alencar Castello Branco, o primeiro presidente da Revolução de 64, era uma referência constante para Fábio. Por sua seriedade, por seu espírito democrático e por ter tido a capacidade de tirar em mil dias o país do caos em que se encontrava, alinhando-o com a tranqüilidade, segurança e os princípios econômicos das economias mais desenvolvidas. Fábio considerava-o um estadista e o brasileiro mais importante do século, comparando-o a De Gaulle, Roosevelt e Winston Churchill. A admiração era tão forte, que Fábio liderou um movimento empresarial para a construção de um monumento em homenagem a Castello Branco, inaugurado no Parque Moinhos de Vento, o Parcão, na esquina das Avenidas Goethe e 24 de Outubro. Onde demonstrou, mais uma vez, seu prestígio. Compareceram à

inauguração o então presidente Figueiredo, vários ministros e os ministros do governo de Castello Branco. - Sua visão de estadista, sua convicção de ideais e seu espírito reformista, modernizaram o Brasil, preparando-o para enfrentar a nova realidade mundial – discursou Fábio, durante a inauguração do monumento, em 25 de abril de 1979. Fábio encontrou-se com Castello Branco em diversas ocasiões, em Brasília e quando o recebeu em Porto Alegre. O relacionamento estreito com os presidentes da República continuou, nos anos que se seguiram à morte de Castello, com Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici e João Baptista Figueiredo. Também foi interlocutor constante de seus ministros, como Roberto Campos, Delfim Netto e Mário Henrique Simonsen, entre outras autoridades.


Especial >

ZERO HORA > QUINTA | 12 | MARÇO | 2009

Pensamento Econômico

UMA VISÃO LIBERAL SOBRE A SOCIEDADE E A ECONOMIA

Críticas

Democracia e liberdade ou democrata e, apesar de vivermos numa época em que democracia sofre vários qualificativos, ainda assim acredito que o termo por si só encerra um conceito acabado e absoluto. (Discurso de paraninfo, 1964). Cremos na democracia e, por isto, cremos na livre empresa. (...) E, porque assim acreditamos, temos fé que com o esforço de todos e de cada um, este país encontrará o caminho para também demonstrar ao mundo que a liberdade é a mais copiosa fonte de progresso e da justiça social. (Em 5/8/1964, ao tomar posse para o segundo mandato na Associação Comercial de Porto Alegre e na Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul.

Monopólio do petróleo Já é tempo de quebrarmos esse tabú, e fazer com que outras pessoas do porte moral de V. Sa. venham de público expor suas ideias para que possamos ver definitivamente resolvido esse fundamental problema. (Correspondência a A. J. Renner, referindo-se ao monopólio estadual do petróleo, em 9/4/1955).

A empresa deve ser democratizada. Sem a quebra da unidade de direção, a administração deve ser descentralizada ao máximo, para que os colaboradores melhores e mais eficientes possam exercer suas habilidades e ascenderem na escala da administração, realizando-se assim como homens. (Palestra para estudantes de Administração da PUCRS, na década de 70).

ARQUIVO ZERO HORA

Última posse de Fábio na Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul, em 1980. O que falou sobre as pequenas e médias empresas: - São os expoentes mais legítimos e, por isso, representativos da expressão essencial e inerente ao homem, que é a

Independência Embora um revolucionário de primeira hora, Fábio Araújo Santos (na foto entre os generais Costa e Silva e Castello Branco, na Associação Comercial) deixava clara sua independência mesmo quando elogiava as primeiras medidas pós-Revolução de 64.“Assim como aplaudimos sem restrições, conquistamos a força moral para criticar sem concessões”, disse.

Fé “Só em clima de liberdade de iniciativa, pela variedade de oportunidades e escolhas que oferece (a livre empresa), o desenvolvimento econômico e o bemestar social podem ser alcançados da forma mais eficiente e segura.

liberdade. Liberdade de opção, liberdade de iniciativa. Sobre sua atividade na entidade: - Os momentos aqui vividos ficaram marcados (...), obrigaram ao empresário que sou uma vivência bem maior do que o mundo de seu próprio negócio.

- Não estávamos à beira do caos. Já tínhamos entrado nele. O governo não dispunha das condições mínimas para o exercício da autoridade e, acumulando erros e desmandos, a par de uma nítida tendência esquerdista, chegou a março de 1964 completamente desmoralizado - disse ele, explicando por que apoiou a Revolução de 64 desde o primeiro momento.

Apesar de interlocutor privilegiado nas altas esferas do poder, em razão de sua grande representatividade no Estado, Fábio Araújo Santos não poupava críticas ao governo como instituição: é empreguista e ineficiente. Foi um incansável defensor da redução de impostos: - Está na hora de alertarmos as autoridades responsáveis de que esperamos, para o próximo ano, não só a eliminação já prevista dos adicionais dos impostos de Consumo, Selo e Renda, mas também uma redução nestes mesmos tributos disse ele em 1966, tendo na platéia o o então ministro da Fazenda e futuro senador, Roberto Campos.

Isenção Para Fábio, o bem do país era mais importante que os interesses pessoais. Por isso defendeu medidas anti-inflacionárias em junho de 1974, mesmo reconhecendo que “provocarão uma redução no consumo de eletrodomésticos”.

VAPT-VUPT ◆ Não cremos na

liberdade civil sem a liberdade econômica. ◆ Não é possível a promoção do social sem o desenvolvimento econômico. A tentativa da divisão da riqueza antes de sua criação, resulta numa simples socialização da miséria. ◆ A livre iniciativa, antes de tudo, é aceitação de riscos. Mas é também um estado de espírito aberto à idéia de que somente dissociada de favores, a empresa tem condições plenas de comprovar a sua eficiência (1970).

ARQUIVO DA FAMÍLIA

Empresa democratizada

ARQUIVO DA FAMÍLIA

S

ÚLTIMA POSSE

|5|

Consumidor Muito antes de se falar em direitos do consumidor, Fábio (na foto, avaliando produtos na J. H. Santos) defendia incansavelmente a necessidade de surpreendêlo. “Na atualidade, o processo econômico é comandado pelo consumidor, que se tornou um verdadeiro ditador, cabendo ao comércio facilitar esta tarefa de comando, colocando à disposição do consumidor os mais diversos produtos, as mais diversas marcas e nas mais variadas condições”, disse ele em palestra no Rotary.

J.H. Santos, a 20ª maior empresa do Rio Grande do Sul Em pouco mais de trinta anos, Fábio Araújo Santos transformou a J. H. Santos na 20ª maior empresa do Rio Grande do Sul. Se as ações inovadoras e a consequente preferência dos consumidores são explicações importantes para esse crescimento, também teve relevância especial a abertura do capital da empresa em 1971 e a grande receptividade obtida no mercado capitais pelas suas ações. Os papéis da J. H. Santos normalmente se situavam entre os mais procurados entre as organizações do Estado.

E os resultados para os investidores não podiam ser melhores, como informou Fábio em sua última manifestação pública antes de morrer, em nota enviada para a coluna Informe Econômico, de Zero Hora, publicada na edição de 20 de setembro de 1981. Fábio destacava que, entre 1972 e 1981, as ações da empresa, com rentabilidade de 19.673%, foram o melhor investimento do país. As razões para esse “excelente desempenho”, segundo o presidente da J. H. Santos, foram: - Trabalho, muito trabalho.


|6|

ZERO HORA > QUINTA | 12 | MARÇO | 2009

A Obra > ➧ especial@zerohora.com.br

Crescimento baseado em franquias

Propaganda intensa foi ferramenta estratégica

Visão de negócio

Inovação Editoria Especial de Zero Hora > 3218-4300

Visão Como um pequeno negócio se transformou na maior rede do varejo

Dois momentos do trabalho de toda uma vida

ARQUIVO ZERO HORA

A construção da J.H. Santos

F

oi sua visão de que o mercado mudava rapidamente que o levou a alterar o ramo de atividades da então J. H. Santos e Cia., voltando-a para o segmento que a levou para o crescimento nas décadas seguintes. Começou com o Departamento de Cortinas, Decorações e Móveis. E evoluiu, em 1970, para a venda dos eletrodomésticos, por indicação do representante da Philco. A filial da GE, ao lado da loja, foi outro incentivo para a expansão dos negócios. Era respeitado e teve crédito fácil para ampliar seu comércio no endereço mais tradicional do varejo, no nº 204 da Rua Dr. Flores, unificada depois com a Galeria J. H. Santos. Treze anos após assumir o comando do pequeno negócio, abriu em 1963 a primeira filial em Porto Alegre, na Av. Presidente Roosevelt e, em 1967, iniciou a expansão pelo interior, com a inauguração de uma filial em Uruguaiana. A chegada da J. H. Santos à cidade revolucionou o comércio na fronteira, onde ainda não havia sinal de TV e a programação era recebida por fita, chegando só no dia seguinte. Mas a população adorou poder comprar sua televisão. A árvore na frente da loja chegou a ser decorada com as caixas das embalagens dos aparelhos de TV. Vinham compradores da vizinha Argentina e os estoques não eram suficientes pra tanta demanda. Os aparelhos eram levados direto da fábrica para a filial e retirados diretamente do caminhão. Nem havia tempo para descarregá-los. O sucesso dessa loja fez Fábio perceber o potencial de crescimento que existia no Interior do Estado. E também o fez perceber que era necessário ser criativo para crescer rapidamente. Se os investimentos teriam que ser

muito altos para chegar às principais cidades com lojas próprias, desenvolveu um modelo exclusivo de franquia, quando esse termo nem mesmo existia. Tratava-se de um processo simples, explica o consultor Hermes Ghidini, que foi admitido na J. H. Santos justamente nessa época, em 1967, como auxiliar de escritório do recém criado Departamento de Vendas do Interior e cinco anos depois foi promovido a Gerente de Promoções e Propaganda. Fábio detectava bons comércios no Interior e convidava os proprietários das lojas a se tornarem postos de venda da J. H. Santos, usando sua marca e vendendo seus estoques, remunerando-os com uma comissão de 6 a 8%. Isso garantiu uma expansão muito rápida. E quando percebia que o interesse dos parceiros diminuía e as vendas podiam cair, criou uma evolução do modelo: assumia os postos como lojas próprias, alugando as dependências. Fosse posto ou filial, Fábio sempre comparecia para as inaugurações, que se transformavam em um evento importante nas cidades, com direito a cortar a fita em solenidade que reunia prefeito e todas as autoridades locais. À noite seguia-se uma festa comemorativa, com jantar e baile, muitas vezes aberto por Fábio e a esposa, Wilma. Seus discursos em todas essas inaugurações tinham um tema comum: a importância de atender bem o cliente e a integração da J. H. Santos com a comunidade. Fábio, diz Ghidini, “não ficava esperando as coisas acontecerem; sabia como se movimentar”. Mas não bastava

WILMA ARAÚJO SANTOS, ESPOSA DE FÁBIO

“Na J. H. Santos Fábio era o líder, o idealizador, o sonhador e sonhos não se delegam.” antecipar movimentos e ter um foco muito claro e de absoluta correção em relação aos consumidores. Também era necessário chegar ao consumidor com eficiência. E Fábio soube fazer isso como ninguém, valorizando a comunicação e a propaganda como uma ferramenta estratégica de seu negócio.

Antiga J.H. Santos, quando ainda vendia só couros, no momento em que foi assumida por Fábio

Galeria J.H. Santos, uma repaginação total do negócio que levou a empresa ao topo do varejo no Sul do país

A alegria do empreendedor inaugurando lojas... ARQUIVO FAMILIAR E ZERO HORA

Um homem de visão, que enxergava muito além de seu tempo. Um estudioso dos rumos do varejo, no Brasil e em inúmeras viagens pela Europa, Estados Unidos, Canadá e por diversos países da América Latina. Um admirador da inovação. Com posições muito claras em relação à importância do consumidor e da necessidade de atendêlo com excelência e seriedade. E um parceiro sério. Com esses ingredientes, Fábio Araújo Santos transformou a J. H. Santos de uma simples loja de artigos de couro na maior rede do varejo em todo o Sul do país, em pouco mais de trinta anos.

... em Cruz Alta ...

... e em outra cidade do interior, lançando o conceito de franquia.

Sucesso baseado na boa relação com o cliente Foi de Fábio a concepção das grandes campanhas institucionais e do patrocínio à música e cultura gaúchas, criando uma relação afetuosa com os consumidores. A J. H. Santos foi a primeira rede a utilizar artistas nacionais em suas campanhas, com destaque especial para Jô Soares, o garoto propaganda das Barbadíssimas, em novembro. A empresa tornou-se a maior anunciante do Rio Grande do Sul, sempre sob o comando da MPM Propaganda, a maior agência de publicidade do país e que tinha sede em Porto Alegre. Havia lá um batalhão de publicitários trabalhando em tempo integral para a J. H. Santos. Daí também surgiu uma grande amizade com um dos sócios da agência, Antônio Mafuz, e com seu superintendente, Adão Juvenal de Souza, que morreu junto com Fábio no acidente aéreo em Santa Catarina. O crescimento da J. H. Santos foi reforçado por uma inovação introduzida por Fábio no mercado: a expansão do

crédito, com prazos longos para o pagamento. Nos anos 70 o parcelamento chegou a 48 prestações fixas, o que era possível graças à credibilidade construída pela empresa e por seu presidente. Em igualdade de importância com as inovações e a boa relação com os consumidores, Fábio destacava a valorização do colaborador. Com frequência, lembrava lições recebidas de seu pai: - A lição mais profunda que recebemos de José Honorato dos Santos foi que a atividade empresarial é, antes de tudo, uma atuação conjunta, e que somente o colaborador respeitado moral e materialmente tem condições de oferecer o seu trabalho com eficiência e dedicação. A atenção aos colaboradores não é uma atitude paternalista, mas uma postura consciente de entrosá-los no ambiente da empresa e de fazê-los participar, de maneira efetiva, em todos os aspectos de nossa atividade. Em 1981, quando houve o acidente, a J. H. Santos contava com 59 unidades,

presente em todas as principais cidades gaúchas. Os anos que se seguiram ao acidente continuaram sendo de crescimento, mas o cenário do comércio tornou-se outro. A crise do petróleo, no início da década de 80, trouxe uma forte inflação. A economia se desacelerou e isto ainda coincidiu com a chegada de players nacionais ao Estado. A J. H. Santos chegou a ter mais de 90 lojas em seu auge. Mas a falta do carisma, da liderança e da visão de Fábio começaram a fazer diferença. O crédito diminuiu e a empresa começou a encolher. Em meados da década de 90 precisou fazer um acordo operacional com a Lojas Colombo, passando a utilizar seus estoques. Em 1997, aos 82 anos, suas últimas 36 lojas foram vendidas para o Ponto Frio e para a Lojas Arno, posteriormente vendida para o Magazine Luíza. Estava encerrada a história da empresa que foi a precursora do varejo moderno no Sul do país.


|7|

ZERO HORA > QUINTA | 12 | MARÇO | 2009

A Família > ➧ especial@zerohora.com.br

Muita diversão em ponto remoto do litoral

Governador Guazzelli visitou Fábio em Quintão

Férias de verão

Importância Editoria Especial de Zero Hora > 3218-4300

Lazer Acampamentos de verão fortaleciam o convívio familiar, com muita diversão

Uma vida em fotos

Férias, nos confins de Quintão

P

A felicidade com um acampamento no meio do nada

Formando de Contabilidade (1946)

A visita ilustre do governador Synval Guazzelli ARQUIVO DA FAMÍLIA

Formando de Economia (1950)

A foto de despedida, para registrar a barba ARQUIVO DA FAMÍLIA

ara Fábio, além do descanso, o tradicional acampamento de todos os anos representava também um retorno aos alegres tempos da infância, quando percorria a região com seu avô Fábio, que lhe deu o nome e ao qual era muito ligado, tendo convivido com ele até os 12 anos. Para Fábio Araújo Santos não havia nada melhor do que levantar-se da cama, na barraca, e pisar a areia com os pés descalços. E com a barba por fazer, porque essa era uma tarefa exclusiva da cidade. Por isso a foto oficial do levantamento do acampamento era sempre uma pose para mostrar a barba crescida. E, claro, sem a gravata borboleta. Sua alimentação era frugal. Pela manhã, uma maçã. À noite, geralmente, maçã, salsicha e tomate. O almoço era convencional, mas moderado, na praia e na cidade. As reminiscências do passado e as aventuras com o avô, eram transformadas nos causos do Romualdo, que contava animado nas rodas de conversas com os filhos, após horas de leitura na Veraneio, ou nos passeios com o inseparável filho mais novo, Daniel. Fábio levava uma mala de livros

para a praia e saía de lá com todos lidos ou consultados. Certa vez, absorvido por inteiro na leitura, não percebeu que a forte chuva que caía estava levando a caminhonete a afundar na praia. Foi necessário chamar um trator de uma fazenda vizinha para evitar que a Veraneio fosse perdida. Enquanto Fábio lia, os sete filhos divertiam-se com as brincadeiras, os jogos e as olimpíadas organizadas por Giffoni, um colunista de esportes da Folha da Tarde. E nas idas diárias, com a Veraneio ou de Gurgel (alugado por Fábio), para buscar pão, peixe e gelo em Quintão, um pequeno percurso que se transformava numa demorada viagem, cheia de aventuras. Giffoni dava um jeito de atolar para que, a seguir, as crianças se divertissem desatolando o veículo com uma pá que estava sempre à mão. Levaram anos para perceber que era uma encenação. Os visitantes do acampamento naquela praia desolada de Quintão eram raros. Mas em algumas ocasiões famosos. Foi o caso do então governador Synval Guazzelli, acompanhado de alguns assessores. Ele viu ali o Fábio Araújo Santos em uma versão que poucos tiveram o privilégio de conhecer: a do poderoso empresário e do líder empresarial mais influente do Rio Grande do Sul em trajes simples, com a barba por fazer há dias e a mesma simplicidade de sempre. E onde os ares e os ventos da infância lhe davam forças para enfrentar o restante do ano com sua maratona de compromissos.

ARQUIVO DA FAMÍLIA

Incansável e em constante movimento durante o ano, Fábio parava por cerca de quinze dias durante o verão. E se transformava. Com a Veraneio da família, dois trailers, o fusca do amigo Edmundo Giffoni e um Gurgel, esse curto período de descanso tinha um endereço certo: um ponto deserto na praia de Quintão, no caminho para o Farol da Solidão.

Primeiros anos na Federasul (1966)

O hobby da jardinagem nos finais de semana Fábio sempre teve os pés no chão. Quando se casou com Wilma, optou por uma vida modesta, mesmo sendo Diretor da J.H. Santos e da Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul. Por isso o primeiro endereço da vida de casados foi um apartamento alugado de 3 dormitórios na Rua Ferreira Viana, no Edifício Marrocos, bairro Petrópolis. Com os filhos chegando foi necessário mais espaço e alugaram uma casa, também em Petrópolis. Já com seis filhos é que houve a mudança para a Zona Sul, em 1968. A cerca de 800 metros da casa onde há um ano já moravam

os amigos da família, Edmundo e Sulamita Giffoni, que também eram vizinhos em Petrópolis. Ali, na Zona Sul, surgiu o jardineiro. Vendo Sulamita organizar o seu jardim, Fábio também quis, ele mesmo, preparar o seu. Gostava muito de folhagens e arbustos coloridos (foto). E logo encontrou os preferidos: os crótons, que plantou com toda a sua variedade de cores. E as Bougainvilles, também conhecidas como Primaveras. Sábados e domingos eram os dias de pegar a tesoura e ir para o jardim, seja para plantar alguma coisa ou para aparar os galhos. Passava horas nessa ati-

vidade. E contemplando sua árvore preferida, um chorão que havia no quintal da casa. Mas, à tarde, muitas vezes havia uma visita aos Giffoni, onde gostava de ver os jardins de Sulamita e tomar uma cerveja bem gelada oferecida por Edmundo. Nos sábados pela manhã, no início do casamento, nos tempos do apartamento da Rua Ferreira Viana, o compromisso era político, com os integrantes do Partido Libertador, quando compareciam, entre outros, nomes que ficariam famosos no futuro, como Paulo Brossard e Romeu Ramos. Não havia almoço, mas um “prato” era obrigatório: a salada de frutas.

Empresário de sucesso (década de1970)

5ª posse na Federasul (1980)


POR TO ALE GRE QUINTA-FEIRA 12 DE MARÇO DE 2009 HORÁRIO DE FECHAMENTO DESTA EDIÇÃO

DEPOIMENTOS MÁRCIA

“Meu pai era uma pessoa de princípios e valores muito claros e fortes. Dedicado à J.H., trabalhava muito. Nos finais de semana tomávamos café da manhã juntos e, no domingo, o almoço era sagrado e a festa era geral. Nossa família continuou unida e até hoje nos reunimos aos domingos.”

ZERO HORA FILIADA AO IVC

- INSTITUTO VERIFICADOR DE CIRCULAÇÃO E ASSOCIADA À ANJ - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE JORNAIS

A receita de Fábio para a família Fábio sempre dizia que era fácil educar filhos. “Bastava dar muito amor e bom exemplo”, resume a esposa, Wilma Araújo Santos, com quem esteve casado por 22 anos. Mesmo com os compromissos da empresa em crescimento e a presença diária na Associação Comercial, nada o afastava de seu compromisso de todos os dias: levar os filhos no Colégio João XXIII. “Saía às 7h já com as crianças no carro. Deixava-as no colégio e depois é que ia para a empresa. Foi um pai muito presente. Gostava de conversar com as crianças. Sabia ouví-las”, lembra Wilma.

FÁBIO

“Sempre tinha uma atitude positiva. Transmitia confiança e carinho. Após meu acidente de carro, ele passou uma semana comigo no hospital, em SP. Nunca falamos tanto. Deixou-me para inaugurar a loja em SC. Aquela semana juntos foi uma jornada especial de despedida.”

DONA WILMA E FILHOS, NO INÍCIO DE 2009

CARLOS

“Era um homem diferenciado. Prestava atenção em tudo e em todos, conversando com a boca e os olhos. Lembro dele como se tivesse me deixado ontem e tenho um orgulho tão grande, como se estivesse comigo até hoje. Deixou um legado de valores profundo e admirável.” HELENA

“Era um porto seguro. Quando criança, era ele quem cortava as nossas unhas, secava os nossos cabelos. Era uma fila na porta do gabinete de leitura dele. O amor e o orgulho que ele tinha pela família, eram os mesmos que ele tinha pela J.H. Santos. Imensos! Foi um excelente pai.” ANDRÉ

“O Pai nos deixou bem claras as noções de valores dentro do nosso núcleo familiar, o que foi importante para a formação do nosso caráter. Uma lembrança feliz era, em dezembro, trabalhar com ele na J.H. Santos, montando bicicletas, ajudando no movimento de Natal.”

A família Fábio Araújo Santos se reúne em uma foto para a posteridade

AV. FÁBIO ARAÚJO SANTOS, EM PORTO ALEGRE Uma avenida em Porto Alegre, no bairro Nonoai, e uma rua em Caxias do Sul, no bairro Delazzer são algumas das homenagens do Estado a Fábio Araújo Santos. A proposta na Capital foi apresentada pelo vereador Luiz Vicente Dutra, com a lei sendo sancionada pelo prefeito Guilherme Socias Villela em 24/12/1982. A inauguração ocorreu em 23/9/1983, quando o prefeito era João Dib. Já em Caxias do Sul, a lei foi sancionada em 30/12/1981. Na Federasul, presidida por Fábio por quase nove anos, a sala de reuniões da diretoria também recebeu seu nome.

FELIPE

“As grandes lições que tive com meu pai foram sua paixão pelo trabalho, a liderança e o carisma junto a seus colaboradores; e, como pai, o caráter e a enorme fidelidade aos amigos. Aos 9 anos eu o acompanhava na jardinagem com um mini-podão, como querendo, no futuro, ser como ele.” DANIEL

“Meu pai morreu quando eu tinha 10 anos. Eu o conheci aos poucos, tamanhas as homenagens após a morte. Lendo um diário do início de sua atividade, vi que era uma pessoa normal, com ansiedades e inseguranças, mas uma vontade enorme de dar certo. É um grande exemplo.”

Avenida Fábio Araújo Santos, no bairro Nonoai.

Sala Fábio Araújo Santos, na Federasul.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.