UNIVERSIDADE LUSÍADA DO PORTO
A REABILITAÇÃO COMO PRESERVAÇÃO E TRANSMISSÃO DA HISTÓRIA E DA MEMÓRIA Uma Adega em Casas Novas
Felisberto Manuel de Pinho Rodrigues
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre
Porto, 2012
Agradecimentos Á Professora Doutora Suzana Faro e ao Professor Arquitecto João Rapagão, pelo empenho, dedicação e contributo indispensável na realização desta dissertação. Ao gabinete Castanheira & Bastai Arquitectos, pela atenção e disponibilidade no fornecimento de material gráfico e escrito solicitado. Aos professores e arquitectos Jorge Amaral, Pedro Francisco, Jorge Carvalho, Teresa Novais e João Rapagão, pela sua dedicação no ensino da arquitectura, que me influenciam na minha formação como arquitecto. Aos meus Pais e Avós por todo apoio e tolerância, e por me possibilitarem a frequência do curso. Às minhas irmãs por toda a perseverança que foram demonstrando ao longo destes anos. Á minha namorada por todo o apoio, compreensão e estímulo durante todo percurso académico.
Índice
V
Resumo e Palavras-chave
IX
Abstract and Keywords
XI
I_ Introdução
13
II_ Arquitectura
21
II.1_ Dimensões e propósitos
25
II.2_ Lugar
31
II.2.1_ Lugar natural
37
II.2.2_ Lugar construído
41
II.3_ Arquitectura popular e vernacular
45
III_ Princípios metodológicos para a reabilitação
53
Princípios, regras e ferramentas III.1_ Património
57
III.2_ Reabilitação
59
III.2.1_ Conservação e restauro
63
III.2.1.1_ Eugène Viollet-le-Duc e o restauro estilístico
67
III.2.1.2_ John Ruskin e o anti-restauro
71
III.2.1.3_ Camillo Boito e o restauro moderno
73
III.3_ Organizações e orientações
77
III.3.1_ Cartas e convenções internacionais sobre o património
77
IV_ Obras de referência
93
IV.1_ Reconversão de Moinho. Arquitecto José Gigante
97
IV.2_ Reabilitação e ampliação da Adega Casa da Torre. Arquitecto Carlos Castanheira
101
IV.3_ Construção da Adega Mayor . Arquitecto Álvaro Siza Vieira
107
V
V_ Caso de estudo Uma Adega em Casas Novas
115
V.1_ Enquadramento programático
119
V.1.1_ Adega enquanto espaço de produção e promoção do vinho
119
V.1.2_ Enoturismo
123
V.2_ Enquadramento territorial
127
V.2.1_ Chaves
127
V.2.2_ Aldeia Casas Novas
131
V.2.3_ Conjunto vitivinícola e agrícola
137
V.3_ Reabilitação e ampliação da Adega Casas Novas
139
VI_ Conclusão
153
Bibliografia
159
Índice de Imagens
167
VII
Resumo A investigação proposta aborda o tema da reabilitação enquanto instrumento de preservação da história e da memória, social e cultural, e simultaneamente enquanto especialidade da arquitectura, com o objectivo de compreender os intervalos de actuação do arquitecto perante o lugar e as construções preexistentes, recorrendo-se à investigação teórica e paralelamente à experimentação prática num lugar real, onde a reabilitação é essencial. Constrói-se uma base teórica onde se abordam os valores da arquitectura e a sua constante relação com o lugar e, com o intuito de adquirir os procedimentos e instrumentos metodológicos necessários, estuda-se o conceito de património e os diversos caminhos para a sua reabilitação. Ainda antes da aplicação prática, são analisados estudos e projectos que se consideram relevantes na acção de integração com o lugar, na reabilitação e na aproximação ao tema da adega e do enoturismo. É com esta investigação e com o conjunto de conhecimentos adquiridos que se inicia a contextualização temática e patrimonial, social e cultural, capaz de fundamentar e estruturar os valores teóricos e práticos no domínio da reabilitação, associado à sua capacidade de validação e das arquitecturas abandonadas, como o caso de estudo na Aldeia de Casas Novas. Considera-se que o património é importante para conservar a memória e descrever a história das sociedades. Assim, a reabilitação revela-se indispensável e desejável, permitindo deste modo, a validade e vitalidade do território, representativo do crescimento social e cultural. No entanto, é a sociedade que deve ter a iniciativa e o interesse de preservar e reabilitar o património, apoiada e incentivada pelas organizações responsáveis pela identificação e preservação do património.
Palavras-chave Reabilitação; Preservação; Adega; Enoturismo; Aldeia de Casas Novas
IX
Abstract The proposed investigation issues the subject of building rehabilitation as a means of preserving both social and cultural historical and memory values and as an architectural specialty, with the purpose of understanding the range of the architect’s actions in relation to the pre-existent constructions. For this purpose, a theoretical investigation is applied, together with the practical experimentation in a real spatial context, where rehabilitation is essential. A theoretical basis is drafted, in which architectural values and their constant relation to the site are issued and, with the purpose of acknowledging the necessary procedures and methodological instruments, the concept of heritage is studied, together with the multiple paths for its rehabilitation. Prior to the practical application, studies and projects considered to be relevant to the role of site integration, rehabilitation and to access the cases of the cellar and wine tourism are analyzed. This investigation, with the collection of acknowledgements it brings forth, launches the thematic and patrimonial sociocultural contextualization, capable of affirming and structuring the theoretical and practical values in the context of building rehabilitation. The latter is paired whit the ability to validate abandoned architectures, as in the case study of the Village of Casas Novas. Heritage is considered to play an important role in preserving the memory and describing the history of societies. Therefore, building rehabilitation is indispensable and advisable, making way for the validity and vitality of the territory, which is representative of social and cultural growth. It is society, however, who should have the initiative and the interest to preserve and rehabilitate the patrimony, supported and powered by the organizations responsible for the identification and the preservation of the heritage.
Keywords Architecture; Preservation; Rehabilitation; Cellar, Wine tourism. Village of Casas Novas; XI
I_ Introdução
A investigação que se propõe é uma abordagem ao tema da reabilitação, enquanto especialização da arquitectura que promove a reutilização e validação dos recursos patrimoniais, naturais e construídos preexistentes no território. Reparar, regenerar, renovar, ajudar à reinserção social e reanimação cultural, são sinónimos que definem reabilitação, mas que em arquitectura podem ganhar outra dimensão, traduzindo-se na transformação e modificação do espaço preexistente, na sua reutilização equilibrada como ferramenta capaz de atribuir qualidade ao espaço natural e construído dos lugares, que por diversos motivos tenham sido desprovidos ou tenham perdido as qualidades físicas e arquitectónicas. Importa, sobre este assunto, reflectir sobre qual deverá ser a participação do arquitecto perante a preexistência no território. O abandono e desertificação dos sítios, promovido pela sobrecarga de usos ou mesmo o desajustamento do espaço para responder aos novos padrões de conforto e qualidade de vida, são os principais geradores da degradação e do envelhecimento do património construído e não construído – estruturas naturais e edificadas, de lazer e trabalho – originando o empobrecimento histórico, social, cultural do território, ficando apenas representações de uma realidade que já não existe. Este esquecimento do território pode subsistir por falta de apoio político e económico capaz de promover a conservação do património, originando o desinteresse social e cultural. O recurso à reabilitação permite valorizar o espaço onde o homem se move, se relaciona e, principalmente, habita, recriando os sítios, os usos e as formas da arquitectura. A preexistência no território é a memória e a história do lugar, e reabilitar pode permitir que o passado se transforme em futuro através do desenvolvimento de novas oportunidades e capacidades concretas que respondam às exigências da vida contemporânea. Estas oportunidades são ainda mais consideráveis e visíveis quando se trata de uma arquitectura popular e vernacular, fortemente enraizada numa determinada região.
O interesse por esta especialidade da arquitectura e a não abordagem da mesma ao longo do percurso académico, foram as primeiras motivações para a escolha do tema. Mas, a noção da forte presença do abandono do espaço construído e do elevado número de construção desqualificada em Portugal – consequência dos 15
problemas políticos, económicos, sociais e culturais do país –, afirma a importância na abordagem ao tema da reabilitação. Ao preparar-se a visita aos concelhos de Chaves e Montalegre, proporcionado no ano lectivo de 2010/2011, e consciente da realidade territorial portuguesa, concentra-se as atenções nos sítios com qualidades arquitectónicas e com necessidade de serem reabilitados. A conjuntura territorial e patrimonial em estudo, com uma forte presença de sítios devolutos, descaracterizados e com todos os problemas por estes proporcionados, originam o desinteresse social e cultural do lugar, confirmando o quanto é oportuna esta reflexão sobre o tema.
No âmbito da Unidade Curricular de Projecto III do Mestrado Integrado em Arquitectura da Universidade Lusíada do Porto, é-nos proposta uma investigação teórica e uma materialização prática nos territórios de Chaves e Montalegre, com a temática enquadrada na investigação desenvolvida pelo CITAD – Centro de Investigação em Território, Arquitectura e Design – desta universidade, em que se deve abordar áreas do conhecimento do Território e Cidade, da Cultura Arquitectónica e da Construção e Tecnologia. Chaves é o concelho eleito para esta investigação, pela sua oportunidade territorial para abordar o tema em estudo, mas também pela sua localização estratégica, com boas ligações ao restante país e proximidade à fronteira com Espanha, e pela sua importância cultural, histórica e turística. O sítio, Casas Novas, é uma pequena aldeia deste concelho, a pouca distância do centro da cidade de Chaves e da Vila de Boticas. O seu carácter singular e rural mantém-se. No entanto, encontram-se algumas construções envelhecidas, em ruína, e outras descaracterizadas por intervenções desajustadas. Nesse contexto, uma pequena adega abandonada é o que se propõe reabilitar. O programa, esse, mantém-se como pequena exploração e produção vinícola que tem a potencialidade de se tornar num ponto de Enoturismo. Este interesse turístico é também sustentado pela existência do Hotel Rural Casas Novas, recente reabilitação de um solar do século XVIII, funcionando assim como valência complementar e de valorização do sítio.
16
Abordar a temática da reabilitação é um objectivo e uma oportunidade de ampliar e aprofundar o conhecimento em arquitectura, nesta área específica, pela necessidade de estudar e conhecer o património e a história dos espaços produzidos e habitados pelo homem. Pretende-se investigar e reflectir sobre o que é a reabilitação enquanto ferramenta social, cultural, de memória e história, não apenas no património classificado, mas de todos os lugares em que o processo de abandono provocou a perda das suas qualidades físicas e arquitectónicas. Ao mesmo tempo, importa estudar o tema enquanto especialidade disciplinar, instrumental e profissional, adquirindo os princípios fundamentais a seguir, e perceber como deve o arquitecto intervir perante esta realidade, ou seja, construir no espaço construído. Enquanto instrumento que constrói memória e história no território ao longo dos tempos, a reabilitação implica reflectir e responder a algumas questões antes e aquando de uma intervenção no território. Quais as oportunidades para estes lugares esquecidos, abandonados? Qual o futuro para estes espaços? Que reflexões deve o arquitecto fazer? Que instrumentos estão à disposição do arquitecto? Que ferramentas deve usar? Quais as limitações na intervenção? Quais as consequências da actuação no construído, a partir das potencialidades e capacidades existentes?
O propósito do estado da arte é a sólida fundamentação da investigação. Para a sua elaboração, é necessário o recurso a documentos de referência sobre a reabilitação e as disciplinas a ela associadas. O tema tem sido muito estudado ao longo dos tempos e, acompanhando a evolução do conceito de património, tornou-se numa preocupação e interesse da sociedade actual. Deste estudo contínuo no tempo resultam inúmeros documentos e projectos, seleccionando-se alguns dos mais relevantes para esta dissertação. Os livros Da Organização do Espaço, de Fernando Távora, Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture de Norberg-Schulz, Arquitectura Popular em Portugal, da Associação dos Arquitectos Portugueses e o Arquitectura Popular Portuguesa de Mário Moutino, são publicações fundamentais para a sustentação e construção teórica sobre a arquitectura e o lugar. A reabilitação, sempre associada à recuperação e ao restauro de património classificado, é um tema estudado. As Cartas e Convenções internacionais na área do 17
restauro, o livro Teoría de la Restauración de Cesare Brandi, e o livro Metamorfosis de Monumentos y Teorias de la Restauración de Antón Capitel, são exemplares importantes na teoria do restauro. Construir no Tempo e Territórios Reabilitados, são duas publicações de Fátima Fernandes e Michele Cannatà, referências importantes na apologia de que a reabilitação não se limita ao património classificado. A Reconversão de um Moinho, da autoria do arquitecto José Gigante, e a Reabilitação e ampliação da Adega Casa da Torre, da autoria do arquitecto Carlos Castanheira, ambos projectos de reabilitação, são referências de actuação em contextos preexistentes. A Construção da Adega Mayor, projecto da autoria do arquitecto Álvaro Siza Vieira, é objecto de estudo como referência dos novos padrões de qualidade e necessidade relativa à especificidade do programa. A Associação para a Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica (AESBUC), assim como a Sogrape Vinhos, são importantes contributos para a investigação programática. Para a compreensão e interpretação do território de Chaves, na descrição física, histórica e cultural do concelho, recorre-se a informações recolhidas no sítio da internet da Câmara Municipal de Chaves.
O processo metodológico para a elaboração deste trabalho, apoia-se numa investigação teórica e prática. A investigação passa pela interpretação, análise e síntese dos dados teóricos referentes à reabilitação, recolhidos em bibliografia como livros, documentos oficiais para a identificação e preservação do património, de publicações periódicas e fontes informáticas. As bibliotecas universitárias, municipais e nacionais, são os recursos a usar para esta recolha bibliográfica, assim como o uso da internet. Recorre-se também à análise e síntese de três casos de referência, dois de reabilitação e um de raiz, permitindo assim que se identifiquem os diferentes tipos de actuação. É junto dos gabinetes e dos seus autores que se procura obter informações referentes aos estudos e projectos seleccionados para a análise, para além das informações recolhidas nas suas publicações. Na Câmara Municipal de Chaves procurou-se obter cartografia actual, factos históricos, regionais e locais tais como registos gráficos e fotográficos.
18
Esta investigação assenta numa estrutura que procura criar um percurso coerente, de articulação e relação das disciplinas abordadas, para responder aos objectivos propostos para o tema, organizando-se em quatro etapas correlacionadas. Numa primeira etapa, abordar-se-ão os valores essenciais da arquitectura e a sua importância na organização do espaço, em constante relação com o lugar. A construção popular será também abordada, com o objectivo de estudar a arquitectura de cariz marcadamente regional e local. A temática da reabilitação é a segunda fase da análise, como aproximação e sistematização dos conceitos, das regras e instrumentos disciplinares à disposição do arquitecto na sua actuação. A terceira etapa assenta na observação e comparação pormenorizada dos casos de referência, sendo esta a primeira aproximação e compreensão da experimentação prática, reflectindo sobre a investigação teórica. A componente prática da investigação, um estudo e projecto de reabilitação e ampliação de uma adega preexistente, antecedida por uma breve introdução sobre o programa, o território e o sítio a intervir, é a quarta etapa. A última fase é a conclusão, onde se procura responder a todas as questões necessárias para compreender o acto de reabilitar, enunciadas nos objectivos da introdução, e expressas nas premissas do caso prático.
19
II_ Arquitectura
O capítulo que se inicia, aborda o tema da arquitectura e qual a sua importância, baseando-se no estudo das suas dimensões e dos seus propósitos. O lugar, como suporte da arquitectura, é também objecto de estudo, percorrendo a definição de lugar natural e construído. A finalizar o capítulo, estuda-se a arquitectura popular como exemplo da essência da arquitectura, nomeadamente a de produção, e também como base de conhecimento arquitectónico do lugar objecto de estudo. 23
1. Arquitectura condicionada pela circunstância territorial. Capela Netos. Figueira da Foz. Arquitecto Pedro Maurício Borges.
2. Tempos diferentes da arquitectura. Edifício Habitacional. Vila do Conde. Arquitecto José Cadilhe. 24
II.1_ Dimensões e propósitos “Arquitectura (tè), (latim architectura, -ae) s. f. Arte de projectar e construir edifícios; Contextura; (Figurado) Forma, estrutura.”1 Embora com a consciência de que esta definição de arquitectura seja elementar e redutora, é-lhe reconhecida alguma verdade, reafirmada e completada pela definição de arquitectura de Eugène Viollet-le-Duc, que defende que “A arquitectura é a arte de construir. Compõe-se de duas partes: teoria e prática. A prática é a construção efectiva, a teoria é o conjunto das regras derivadas da Tradição, das Técnicas, da Ciência, da Sociedade e da História.”2 Ainda que estas definições sejam o ponto de partida para uma pequena reflexão sobre o que é a arquitectura, e suas dimensões e propósitos, tem-se como base teórica, os pensamentos do arquitecto Fernando Távora, expressos no livro Da Organização do Espaço. A arquitectura, enquanto construção que organiza o espaço – e por espaço pode entender-se a forma, o uso, o tempo, a sua proporção e a sua materialização, o ambiente expresso nas cidades, nas praças e nas ruas, nas construções – é intervenção no território em resposta às necessidades da sociedade. No entanto, no decorrer de todo o processo de ordenamento, é condicionada pela circunstância do território (ilustração 1), e por circunstância podem entender-se os factores naturais, sociais e culturais que dele fazem parte. O ambiente, a edificação, os costumes e os usos, entre muitos outros, são elementos presentes na sociedade e no seu meio, são condicionantes e ao mesmo tempo geradores de arquitectura. O tempo é um factor importante, constante e inseparável da participação na construção do espaço, do lugar. Neste sentido, podem considerar-se “dois tipos de participação na organização do espaço; uma organização a que chamaremos horizontal, que se realiza por homens de uma mesma época, uma outra a que chamaremos vertical que se realiza entre homens de épocas diferentes”3 (ilustração 2). Assim, pode dizer-se que a arquitectura vive no tempo, e com o tempo se
1
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa – “Arquitectura”. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/> 2 RODRIGUES, Maria – O que é Arquitectura. s/l: Quimera Editores, 2002. p. 13. 3 TAVORA, Fernando – Da Organização do Espaço. 6ª ed. Porto: FAUP Publicações, 1962. p. 20. 25
3. Geometria na procura da implantação no lugar. Piscina das Marés. Matosinhos. Arquitecto Álvaro Siza Vieira. 26
transforma como resposta às diferentes situações. Deste modo, constrói a história do lugar e das sociedades. A continuidade do espaço – no tempo – é uma característica que deve estar presente na organização do espaço, para que este seja coerente e equilibrado. Esta permanência temporal do espaço, pressupõe também a existência de uma irreversibilidade, uma vez que o que já foi não mais poderá voltar a ser, porque mudou toda a circunstância urbana e humana para sempre.4 Esta organização do espaço, regulada pelo contexto do lugar e do homem – no tempo –, tornar-se-á também circunstância, ou seja, será também condicionante no território. Então, a permanente relação e participação activa do homem na organização do espaço, faz com que a arquitectura seja também um reflexo político, económico, social e cultural da sociedade, em que o passado, o presente e o futuro fazem parte da sua história, podendo assim afirmar-se que “a sociedade é geradora de arquitectura.”5 A forma é a representação da ordenação do espaço, que através da ordem geométrica (ilustração 3), consegue estabelecer a estrutura e a materialização que responde às necessidades da sociedade e do território. Neste sentido, podemos dizer que “ (…) – vivendo – o homem organiza o espaço que o cerca, criando formas, umas aparentemente estáticas, outras claramente dinâmicas.”6 Enquanto geometria, estrutura, superfície, matéria, espaço e estética, a forma é a materialização e composição do espaço, é o elemento que expressa as relações básicas entre o homem e o seu contexto. Assim sendo, pode dizer-se que “a arquitectura é geometrizar”7, e a forma é a sua característica estrutural, funcional e formal que, para além de todas as circunstâncias sociais e territoriais, obedece a questões programáticas, técnicas e estéticas. O programa, enquanto orientador de funcionalidade e utilidade do espaço, é essencial para a sua organização, pois estabelece regras, condições e proporções para responder aos propósitos do uso. Uma casa, um restaurante, uma biblioteca, uma igreja, um hospital ou uma fábrica, são exemplos de usos com significações e sensações diferentes, influenciando deste modo a forma arquitectónica. A escala é a dimensão real do espaço natural e construído, sendo o homem a sua principal medida de referência, enquanto produtor e utilizador da arquitectura. A
4
TAVORA, Fernando – Da Organização do Espaço. 6ª ed. Porto: FAUP Publicações, 1962. p. 19. RODRIGUES, Maria – O que é Arquitectura. s/l: Quimera Editores, 2002. p. 33. 6 TAVORA, Fernando – Da Organização do Espaço. 6ª ed. Porto: FAUP Publicações, 1962. p. 14. 7 GIANGREGORIO, Guido – Álvaro Siza, Imaginar a evidência. 2ª ed. Lisboa: Edições 70, 2009. p. 27. 5
27
4. Le Modulor. Arquitecto Le Corbusier.
5. Luz. Casa Ferreira da Costa. Matosinhos. Arquitecto Ă lvaro Siza Vieira. 28
proporção é o que impõe a relação entre as dimensões do homem e a forma, definindo deste modo uma relação em harmonia, qualificada e equilibrada com toda a circunstância. O le modulor (ilustração 4), estudo desenvolvido pelo arquitecto Le Corbusier, é o arquétipo da importância desta investigação e relação da escala da arquitectura com o homem. Enquanto elemento valorativo, revelador e modelador da arquitectura, a luz, para além de responder à necessidade primária de iluminação, tem a capacidade de organizar
diferentes
espaços
(ilustração
5),
recorrendo
à
intensidade,
à
transparência, aos contrastes e aos reflexos, permitindo a continuidade e a divisão dos espaços, possibilitando assim a sua identificação, estimulando emoções e sensações. Detém tal importância na definição da forma na arquitectura que Le Corbusier define que “a arquitectura é o jogo sábio, correcto e magnifico dos volumes reunidos sob a luz.”8 Então, pode dizer-se que a forma não é totalmente livre, mas sim guiada pela percepção e interpretação do arquitecto perante todas as condicionantes – territoriais, sociais, culturais, programáticas, técnicas e criativas – com o propósito de gerar e organizar espaços com qualidade e originalidade, espaços onde o homem habite e com os quais se identifique. É o jogo compositivo, organizativo e geométrico, associado a intenções artísticas e plásticas, que distingue a arquitectura da simples construção, sem esquecer as preocupações práticas e programáticas da sociedade.9 Após esta exposição sobre as dimensões e os propósitos da arquitectura, pode dizer-se que esta, enquanto acto com a ambição de organizar e ordenar o espaço, está ao serviço do homem, das suas necessidades e vontades, e para tal deve ser estável, utilitária e bela, em equilíbrio com a sua circunstância, assim como defendia Marco Vitruvio Polião (século I a.C), ao referir-se ao Firmitas, Utilitas, Venustas,10 como atributos indissociáveis à arquitectura.
8
LE CORBUSIER – Hacia una arquitectura. 2ª ed. Barcelona: Ediciones Apóstofre, S.L, 1998. p. 16. Tradução livre: “La arquitectura es el juego sabio, correcto y magnífico de los volúmenes reunidos bajo la luz.” 9 COSTA, Lúcio – O que é arquitectura. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.iabsp.org.br/oqueearquitetura.asp> 10 DIAS, Manuel Graça – “ É porque queremos continuar ” in FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – Territórios Reabilitados. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2009. p. 17. 29
6. Entre o cĂŠu e a terra. 30
II.2_ Lugar “Lugar s. m. Espaço ocupado ou que pode ser ocupado por um corpo; Ponto (em que está alguém); Localidade; Pequena povoação; Trecho, passo (de livro); Posto, emprego; Dignidade; Profissão; Ocasião; Vez; Azo; Dever, obrigação; Situação, circunstâncias; Posto de venda; em primeiro lugar: antes de tudo, antes de mais nada; lugar geométrico: linha cujos pontos satisfazem às condições exigidas.”11 O conceito de lugar é amplo, bastante abrangente e complexo na sua definição teórica. Pretende-se estreitar essa abrangência à especificidade da arquitectura, enquanto espaço físico organizado e humanizado, e da antropologia, enquanto estudo da relação entre o homem e o espaço. Neste sentido, recorre-se essencialmente às ideias do arquitecto, historiador e investigador Christian NorbergSchulz e do etnólogo Marc Augé, que abordaram profundamente o tema. O lugar, enquanto território encontra-se entre o céu e a terra (ilustração 6), onde o homem habita, se move e se relaciona.12 No seu dia-a-dia “consiste em pessoas, em animais, em flores, em árvores e florestas, em pedras, em terra, em madeira e em água, em cidades, em ruas e em casas, em portas, em janelas e em móveis. E consiste em sol, lua e estrelas, em nuvens passando de dia e noite, de mudanças de estação. Mas inclui também fenómenos mais intangíveis, tais como sentimentos.”13 Neste sentido, pode-se depreender que o lugar, enquanto ambiente físico, é formado por diversos elementos de carácter natural e construído directamente relacionado com a sociedade e os seus modos de vida. É aqui que a antropologia se define, isto é, na relação do homem com o sítio ao nível social, cultural e político, definindo os factores sentimentais representativos do indivíduo – enquanto ser inteligente, emocional – e relacionando-os com as características do local. Deste modo, pode dizer-se que todos os lugares “querem-se (querem-nos)
11
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa – “Lugar”. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/> 12 NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 23. 13 Idem, ibidem. p.6. Tradução livre: “Our everyday life-world consists of concrete "phenomena". It consists of people, of animals, of flowers, trees and forests, of stone, earth, wood and water, of towns, streets and houses, doors, windows and furniture. And it consists of sun, moon and stars, of drifting clouds, of night and day and changing seasons. But it also comprises more intangible phenomena such as feelings.” 31
7. Orientação do homem no espaço.
8. Carácter urbano.
9. Carácter rural. 32
identitários, relacionais e históricos.”14 A estrutura e o genius loci são os factores que Norberg-Schulz15 propõe que se estude, para um melhor entendimento do fenómeno do lugar. Neste sentido, para o entendimento da sua estrutura, é necessário perceber o espaço organizado e desorganizado e o seu carácter. Enquanto elemento fundamental da arquitectura, o espaço é um lugar organizado geometricamente por construções e formas, condicionado por diferentes circunstâncias físicas e humanas. Assim sendo, o homem deve saber orientar-se e identificar-se com o espaço e o seu ambiente. O “(…) “nó”,(“marco ”), “caminho”, “limite” e “região”, (…)”16 são elementos caracterizadores do sítio e do quotidiano humano, referidos por Kevin Lynch – urbanista e investigador – como factores importantes para a relação e orientação do homem no espaço (ilustração 7). É esta analogia que define o lugar antropológico de Marc Augé17, essencialmente geométrico, pois associa a linha ao percurso do homem, a intersecção das linhas aos seus cruzamentos e o ponto de intersecção às praças de convívio da sociedade. O carácter é também um factor que, em paralelo com o espaço, define o lugar. Entendido como atmosfera e ambiente que abrange todo e qualquer local, o carácter é constituído e construído pela imagem formal e pelo entendimento e conhecimento do sítio. Deste modo, pode dizer-se que cada sítio tem um carácter individual (ilustração 8 e 9). “A habitação tem que ser “protectora”, um escritório “prático”, um salão de baile “festivo” e uma igreja “solene". (…) As paisagens também possuem propriedades, algumas das quais são de um determinado tipo “natural”. Assim, falamos de paisagens “estéreis” e “férteis”, “sorridentes” e “ameaçadoras”.”18 Em suma, a estrutura do lugar é a relação entre os lugares naturais e construídos, conseguida pelos elementos espaço e carácter. É uma relação conquistada por três níveis, segundo Norberg-Schulz. Em primeiro, o homem constrói o que viu, ou seja, o que conhece da sua experiência. Em segundo, procura perceber 14
AUGÉ, Marc – Nao-lugares, Introdução a uma antropologia da Sobremodernidade. Lisboa: Editora 90º. 1992. p. 47. 15 NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 6 a 23. 16 LYNCH, Kevin, cit in NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p.12. Tradução livre: “(…) "node" ("landmark"), "path", "edge" and "district", (…)”. 17 AUGÉ, Marc – Nao-lugares, Introdução a uma antropologia da Sobremodernidade. Lisboa: Editora 90º. 1992. p. 50. 18 NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 14. Tradução livre: “A dwelling has to be "protective", an office "practical", a ball-room "festive" and a church "solemn" (...) Landscapes also possess character, some of which are of a particular "natural" kind. Thus we talk about "barren" and "fertile", "smiling" and "threatening" landscapes.” 33
10. Inverno n贸rdico. 34
quais as carências do lugar e completa-o, como resposta às suas necessidades. Por fim, procura simbolizar o seu conhecimento do sítio, e de si próprio. Ainda segundo Norberg-Schulz, o genius loci é um termo latino relacionado com o espírito do lugar, fundamental para perceber as suas relações naturais com o homem. Entende-se pelo carácter das suas paisagens e ambientes, pela imagem que o identifica e expressa os modos de vida do indivíduo. Habitar, isto é, viver, povoar, estar presente num espaço, é a base da relação do homem com o lugar e pressupõe a sua identificação. Neste sentido, do mesmo modo que a sociedade imprime carácter ao sítio quando o organiza, este, com o seu espírito, também molda a sua identidade. O carácter – abordado anteriormente – e a identificação do lugar, são os conceitos necessários para o entendimento do seu espírito. Por identificação, compreende-se que o homem deve entender-se com as suas circunstâncias e adquiri-las como expressões únicas do lugar, assim como “o homem nórdico tem que ser amigo do nevoeiro, do gelo e dos ventos frios; ele tem que desfrutar do som da neve rangendo sob os pés quando anda, ele tem de experimentar o valor poético de estar imerso de nevoeiro (…) ”19 (ilustração 10). A história da sociedade, ao longo dos tempos, é também elemento de identificação e relação com o espaço, e exemplo disso é que “se tivéssemos de fazer a exegese de todos os nomes de rua de uma metrópole como Paris, seria toda a história de França que teríamos que reescrever”20. Então, o genius loci é entender e adquirir os seus valores físicos, sociais e culturais, como identidade ou imagem que representa o seu carácter único. “Se um lugar se pode definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que não pode definir-se nem como identitário, nem como relacional, nem como histórico, definirá um não-lugar.”21 No sentido antropológico, que estuda a relação da sociedade com o lugar, este só existe quando existe uma relação de convívio entre os dois, assim sendo, os espaços que respondem puramente à necessidade de locomoção e transição, como estações de metro, aeroportos, auto-estradas, sem carácter identitário ou histórico, são não-lugares. No entanto, embora a arquitectura 19
NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 21. Tradução livre: “Nordic man has to be friend with fog, ice and cold winds; he has to enjoy the creaking sound of snow under the feet when he walks around, he has to experience the poetical value of being immersed in fog ( …)” 20 AUGÉ, Marc – Nao-lugares, Introdução a uma antropologia da Sobremodernidade. Lisboa: Editora 90º. 1992. p. 60. 21 Idem, ibidem. p. 67. 35
11. Alentejo.
12. Douro. 36
tenha como referência o homem, e seja necessária a sua relação e identificação com o lugar os não-lugares – definidos por Marc Augé – enquanto espaços geométricos, estão sempre presentes e são necessários, devendo manter-se apenas como complemento da vida da sociedade. Norberg-Schulz diz que o espaço natural e construído são dois fenómenos que, por meio das suas estruturas e do seu genius loci, permitem um melhor entendimento do lugar. Com este propósito, é necessário estudar separadamente estes dois fenómenos, distintos e ao mesmo tempo inter-relacionados. II.2.1_ Lugar natural Adoptando o pensamento de Norberg-Schulz22, a compreensão do espaço natural, como fenómeno do lugar, deve partir da experiência dos sentidos e da compreensão das diferentes realidades, que pode ser feita por diferentes elementos, que passam pela experiência imediata, a orientação solar, a estrutura e a escala, a topografia, a luz e o tempo. A experiência primitiva, sensorial, é o meio para chegar a esse entendimento e conhecimento da natureza que influencia directamente a vida do homem, onde este adquire objectos de orientação e identificação que permitem o reconhecimento do lugar. A orientação solar é um dos momentos de grande importância, associada a diferentes qualidades e significados relacionados com o universo, assumindo assim os pontos cardeais enorme importância para o homem. Exemplo disso é que “no antigo Egipto, a leste, a direcção do sol nascente foi associada ao nascimento e à vida, enquanto a oeste foi associada à morte.”23 A estrutura geográfica e topográfica (ilustração 11 e 12), mais regular ou irregular, imprime um carácter individual a cada sítio, promovendo deste modo a sua identificação e uma orientação precisa na vivência do lugar pelo homem. Micro, macro e média são as diferentes escalas da estrutura que cada sítio pode assumir. Por um lado, a microestrutura é excessivamente pequena para o homem habitar, por outro a macroestrutura é excessivamente grande, onde o indivíduo pode sentir-se
22
NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 23 a 48. 23 Idem, Ibidem. p. 28. Tradução livre: “In ancient Egypt, thus, the east, the direction of the sun's rising, was the domain of birth and life, whereas the west was the domain of death.” 37
13. Régates à Argenteuil, 1872. Cloude Monet. 38
perdido, sem elementos capazes de o orientar e situar. Neste sentido, para habitar em harmonia com o lugar natural, é necessária uma estrutura com uma escala humana capaz de servir os seus interesses. “A estrutura pode ser descrita em termos de nós, caminhos e domínios, ou seja, elementos que "centralizem" o espaço, como montes isolados e montanhas ou bacias circunscritas, elementos que orientem o espaço, como vales, rios e barrancos, e os elementos que definem um padrão espacial estendido, como um conjunto relativamente uniforme de campos ou colinas.”24 Constituído por diferentes escalas, desde os continentes e países, até aos mais pequenos lugares, todos têm propriedades e carácteres específicos definidos pelas condições topográficas, e pela sua vegetação. A luz é também um valor presente no espaço, característica indissociável do lugar natural pela sua constante variação ao longo do dia, numa determinada estação do ano, conforme as características geográficas e morfológicas. É por este motivo, também, um modo de compreender a realidade, tendo esta, enorme importância ao longo das épocas e civilizações. “Na civilização grega, (…), a luz era entendida como um símbolo do conhecimento artístico, bem como intelectual, (…). No Cristianismo, a luz tornou-se um "elemento" de importância primordial (…)”25.O tempo está directamente relacionado com o elemento luz, e é igualmente importante na compreensão do sítio natural, como notam os pintores do impressionismo do final no século XIX que defendiam a luz e o seu tempo, como elementos fundamentais para captar cada momento (ilustração 13). Compreende-se, então, que a estrutura, a escala, a luz, são factores importantes que caracterizam o lugar natural, e definem o seu genius loci, capaz de transmitir sensações e impressões – medo, alegria, entre outros sentimentos – pelas variações do relevo, da cor e da textura, da terra, da água, da vegetação e de todos os elementos inerentes ao espaço natural.
24
NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 32. Tradução livre: “The structure may be described in terms of nodes, paths and domains, that is, elements which "centralize" space such as isolated hills and mountains or circumscribed basins, elements which direct space such as valleys, rivers and wadis, and elements which define an extended spatial pattern, such as a relatively uniform cluster of fields or hills.” 25 Idem, Ibidem. p. 31. Tradução livre: “In Greek civilization, (…), light was understood as a symbol of knowledge, artistic as well as intellectual, (…). In Christianity light became an "element" of prime importance (…)” 39
14. Lugar construĂdo. Nova Iorque, EUA. 40
II.2.2_ Lugar Construído Ainda apoiado essencialmente nas reflexões de Norberg-Schulz26, o lugar construído (ilustração 14) deve partir da compreensão do espaço natural. Deste modo, traduz os seus significados e estrutura na arquitectura, por meio da visualização, complementação e simbolização. O primeiro acto de construção é a representação das coisas naturais por meios artificiais. A arquitectura mediterrânica é exemplo desta materialização, usando grandes blocos de pedra que representam a solidez e a permanência das montanhas, fortemente representada pela arquitectura egípcia, através da construção das pirâmides.27 Enquanto base existencial do homem, a arquitectura é também representação do seu carácter – parte integrante da natureza – e, por isso, pressupõe uma linguagem e imagem formal simbólica que depende da procura de uma ordem e articulação espacial com o lugar natural. O tempo, a forma, a luz, a escala e a proporção são também arquitectura, elementos caracterizadores do espaço construído, que representam e simbolizam a relação do homem com a natureza. Com
este
sentido,
os
aglomerados
populacionais,
constituídos
por
construções de carácter individual, como as habitações urbanas ou rurais, ou de carácter colectivo, como museus, teatros, igrejas, entre outros, são todos lugares artificiais, construídos pelo homem que procuram um entendimento e relacionamento harmonioso com o espaço natural. Estas construções artificiais têm genius loci próprios, fortemente enraizadas e evidenciadas nos sítios em que estão inseridas, quando falamos de arquitectura popular, mas na arquitectura contemporânea é uma compreensão de diversos interesses, podendo por vezes aplicar-se a diferentes locais. “O genius loci construído depende de como esses lugares são, em termos de espaço e carácter, isto é, em termos de organização e articulação.”28 Do mesmo modo que no espaço natural existe uma hierarquização de diferentes espaços e escalas, no construído essa variação ou diversificação também
26
NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 50 a 78. 27 Idem, ibidem. p. 51. 28 Idem, ibidem. p.69. Tradução livre: “The man-made genius loci depends on how these places are in terms of space and character, that is, in terms of organization and articulation.” 41
15. Quotidiano urbano. 42
existe, percorrendo desde as cidades, as vilas, as aldeias, as habitações, até às escalas interiores. É o limite que separa os espaços construídos e não construídos, o interior e o exterior, que determinam a qualidade espacial do lugar construído e a sua relação com o natural. Este limite ou fronteira pode ser mais fechado ou aberto, reagindo de forma diferente na relação do interior com o exterior, assumindo-se como importante e estruturante na arquitectura. As paredes funcionam como elemento de fronteira entre o construído e o natural, e as aberturas para o lugar natural são os factores preponderantes e estruturantes para a relação entres ambos. No entanto, o espaço edificado é mais do que as relações entre o interior e o exterior. É também determinado pelo modo como se caracteriza, como faz parte da cidade, como a representa e permite a identificação e referenciação do homem. “O plano da casa, as regras da residência, os quarteirões da aldeia, os altares, as praças públicas, o recorte do território, correspondem para cada um a um conjunto de possibilidades, de prescrições e de interditos cujo conteúdo é ao mesmo tempo espacial e social.” 29 Anteriormente, foram referidas as diferentes escalas dos lugares construídos, e todos estes lugares têm sub-lugares como ruas, bairros, habitações, entre outras construções. Todos são interiores urbanos ou interiores de construções aos quais Leon Battista Alberti – arquitecto renascentista, filósofo de arquitectura e urbanismo e teórico de arte – chama de small city
30
, definidos pelas finalidades distintas das
edificações. Neste sentido, “na realidade concreta do mundo de hoje, os lugares e os 31
espaços, os lugares e não-lugares, emaranham-se, interprenetram-se” , e tornam-se características dos diferentes espaços e escalas do lugar construído, reflexo da compressão do lugar natural feito pelo homem e pela sociedade, e a expressão do seu modo de viver e habitar (ilustração 15) que os distinguem, e permitem que se interliguem.
29
AUGÉ, Marc – Nao-lugares, Introdução a uma antropologia da Sobremodernidade. Lisboa: Editora 90º. 1992. p. 47. 30 ALBERTI, Leon Battista. cit in NORBERG-SCHULZ, Christian – Genius Loci, Towards a Phenomenology of Architecture. New York: Rizzoli, 1980. p. 58. 31 AUGÉ, Marc – Nao-lugares, Introdução a uma antropologia da Sobremodernidade. Lisboa: Editora 90º. 1992. p. 90. 43
16. Ilustração da página de rosto do livro “Essai sur l’Architecture” do abade Marc-Antoine Laugier, 1753.
17. Relevo do território português.
44
II.3_ Arquitectura popular e vernacular Desde que o homem sentiu a necessidade de abrigo, surgiu a arquitectura (ilustração 16), e esta tem vindo a acompanhar a evolução do homem. A sua história evidencia essa evolução e transformação, relatando os diferentes períodos pelos quais a arquitectura passou, classificando-os em diferentes estilos, mas de um modo geral existem dois tipos de arquitectura: a popular e vernacular e a erudita. Pretende-se com esta reflexão fazer uma aproximação à arquitectura popular portuguesa – caso de estudo – e perceber o que a distingue de toda a outra arquitectura. Analisado por diferentes factores – tais como o relevo, o clima, as formas de povoamento, os tipos de construção, os materiais e as cores predominantes – Portugal continental é dividido em quatro regiões – Norte, Centro Litoral, Alentejo e Algarve – as quais estão associadas a um tipo de arquitectura.32 No entanto, a divisão mais evidente e clara do território é entre o litoral e o interior, pelo seu afastamento e desenvolvimento económico, político, social e cultural, resultado do seu relevo (ilustração 17). Pode-se, assim, dizer que existe um país que se divide em duas realidades, afastadas por um desenvolvimento e crescimento assimétrico. Por um lado, observamos o litoral, em que as condições naturais – o solo, o clima, o relevo e a vegetação – são mais regulares, equilibradas, sem grandes diferenças abruptas, favorecendo deste modo uma maior fixação da população, e por consequência um maior desenvolvimento e crescimento, com acessibilidade ao exterior pelo mar. Por outro lado, a existência do interior que se contrapõe ao litoral, também pelas suas características naturais – território com um relevo marcado por retalhos de planaltos, conjuntos elevados, depressões – diversificadas e bastante irregulares. O clima, aqui, é também mais específico, com mais e maiores acentuações e variações entre as diferentes estações do ano. Todas estas particularidades propiciam um maior afastamento e isolamento relativamente ao litoral.33
32
MOUTINHO, Mário – Arquitectura Popular Portuguesa. 3ª ed. s/l: Editorial Estampa, 1975. p. 37. ARROTEIA, Jorge - “Introdução” In MOUTINHO, Mário – Arquitectura Popular Portuguesa. 3ª ed. s/l: Editorial Estampa, 1975. p. 37. 33
45
18. Quotidiano rural. 46
Embora as características naturais do território sejam um factor importante para perceber a irregular distribuição da população no país, estas não são os únicos factores. Neste contexto assimétrico, a ocupação por diferentes civilizações, consoante as suas necessidades, e a facilidade na comunicação e no transporte marítimo, promoveram e
concorreram para
o
desenvolvimento
estratégico,
económico e social do litoral. No entanto, estas condicionantes não são sinónimo nem significam a existência de arquitectura popular apenas no interior do país. Esta arquitectura existe por todo o território, com a particularidade de reflectir as circunstâncias de cada lugar, as necessidades e costumes do homem, e acusando a distância e acesso aos centros urbanos. Então, para estudar e entender a arquitectura popular, é necessário perceber – além da desigual distribuição dos povoamentos, do seu isolamento e desenvolvimento – o ambiente natural do lugar e a sua população, como vivem e do que vivem. Desta forma, pode-se dizer que a arquitectura popular vive do lugar e do homem que a ele pertence. Do lugar, porque aceita com humildade a sua natureza, cede aos seus imperativos e deixa-se guiar pela formação e condição do território. É, também do lugar, determinada pelo afastamento e isolamento, que não lhe permite acesso a recursos técnicos e materiais para lá do seu mundo. A estes, contrapõe-se a verdade e rusticidade dos materiais encontrados e retirados do sítio – pedra, madeira, colmo – e a técnica e mão-de-obra local, desenvolvida e aperfeiçoada pelo homem ao longo dos tempos. Este respeito perante a natureza cria uma arquitectura que nasce equilibrada e integrada, com carácter permanente na paisagem. Do homem, porque reflecte fielmente o seu carácter utilitário, como resposta às suas necessidades e hábitos (ilustração 18). Sem desenho prévio, e construídas por fases, representam as gentes e os seus modos de vida, a sua economia local de auto-subsistência. Neste sentido, a criação de gado, a produção agrícola e vitivinícola são as suas principais actividades de produção, e por consequência as principais influências desta arquitectura vernacular, que são evidentes até nas geometrias usadas, com bases circulares, quadrangulares e rectangulares, que muitas vezes cediam aos imperativos da natureza. Resumindo, esta arquitectura que é definida pelo lugar e pelo homem, é então uma questão de factores naturais e humanos, económico-sociais e etno-históricos, convertendo-se num indicador cultural da população de uma dada aldeia e de uma
47
19. Casa minhota.
20. Planta da casa minhota.
21. Casa serrana.
22. Planta da casa serrana.
23. Igreja em Pi贸d茫o. Arganil. 48
região.34 Exemplo desta evidência é a divisão do país por diferentes regiões arquitectónicas, em que cada uma expressa as suas características naturais e humanas. Neste sentido, é também importante compreender a relação entre os lugares, os modos de vida da população e a arquitectura vernacular. Aproximando à região Norte, área objecto de estudo, podem encontrar-se povoamentos dispersos ou aglomerados, servidos por arruamentos geralmente estreitos e entalhados directamente no solo, acusando os percursos que lhes eram mais convenientes. São povoamentos com construções de diferentes tipos, relacionados com a produção e com a habitação que por vezes se fundem numa só, e ainda as edificações religiosas.35 As casas minhota (ilustração 19 e 20) e serrana (ilustração 21 e 22) são as mais frequentes na região norte, e embora apresentem características diferentes, na generalidade predomina uma organização semelhante. No piso térreo encontram-se todos os compartimentos relacionados com a produção e criação animal, e no andar os de habitação. A cozinha, os quartos e salas são os espaços de habitação. Nas produções podem encontrar-se as cortes, os currais, as pocilgas, as arrumações, as adegas e lagares. Separados das habitações, podem encontrar-se ainda os sequeiros, os espigueiros, as eiras, os abrigos, as azenhas, os moinhos e os fornos. Estes espaços de produção encontram-se geralmente dispostos em volta de um pátio, e muitas vezes têm um carácter de uso colectivo, evidenciando a importância da coesão social presente nestas populações. Evidenciando o carácter religioso, encontram-se capelas ou igrejas junto das povoações, que muitas vezes eram mandadas construir pela própria população.36 O conhecimento, a globalização e a internacionalização atravessaram as fronteiras do isolamento e influenciaram a arquitectura, estando assim presentes, a par da arquitectura popular, exemplos de arquitectura erudita, senhorial. Deste modo, é-nos possível perceber o que as distingue. É uma arquitectura com raízes económicas, sociais e culturais que tem como ponto de partida o uso do desenho, na procura de uma organização do espaço equilibrada e qualificada, e ao mesmo tempo com preocupações estéticas e estilísticas (ilustração 23). Esta, sobrepõe-se à natureza pela elevação do domínio da técnica.
34
OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, GALHANO, Fernando – Arquitectura tradicional portuguesa. 2ªed. Lisboa: Publicações Dom Quixote Lda, 1994. p. 17. 35 MOUTINHO, Mário – Arquitectura Popular Portuguesa. 3ª ed. s/l: Editorial Estampa, 1975. p. 41. 36 Idem, Ibidem. p. 41. 49
24. Casa de emigrante.
50
Por oposição à arquitectura popular, esta desprende-se do lugar e do homem, servindo-se principalmente do conhecimento científico e artístico. No entanto, não deixam de existir interferências e influências recíprocas entre as duas arquitecturas, pois estes lugares resultam destes dois tipos de arquitectura.
Hoje, a evolução do homem e do seu conceito de habitar, organizados e associados ao desenvolvimento técnico e tecnológico como “(…) a introdução da luz eléctrica e a evolução da hidráulica determinaram a transformação dos hábitos de higiene, assim como a exigência de fazer frente às péssimas condições de vida das sociedades (…)”37. Esta evolução com intuito de melhorar a qualidade de vida do homem é imprescindível e essencial para a continuação destes lugares e destas arquitecturas. “O comboio, o automóvel, o avião, transportam-nos em poucas horas a terras longínquas, que se tornaram, assim, efectivamente, mais próximas e acessíveis.”38 É a velocidade e facilidade de comunicação e de transporte, que permite que o desenvolvimento e conhecimento dos materiais chegue aos lugares mais longínquos. O problema é, quando mal usados – os novos materiais e as novas técnicas – podem confundir as relações naturais do território, e causar perturbações profundas nas arquitecturas preexistentes e nos lugares, descaracterizando-os e empobrecendo-os. A edificação de uma casa por um emigrante retornado (ilustração 24), que procura afirmar o seu triunfo e a sua nova condição social trazendo influências do país onde esteve e recorrendo aos materiais industrializados, e a consequente reprodução por parte da vizinhança, revela-se um exemplo de como a facilidade de comunicação e transporte se podem tornar numa ameaça para estes lugares e estas arquitecturas.39 É necessária uma reflexão sobre a reabilitação do território, como fonte de preservação da cultura, do lugar e da arquitectura, evitando assim a perda do carácter e identidade das sociedades.
37
MILANO, Maria – Do habitar. Porto: Edições ESAD – Escola Superior de Artes e Design, Matosinhos, 2005. p. 13. 38 ANTUNES, Alfredo da Mata, et al – Arquitectura Popular em Portugal. Volume 1. 3ª ed. Lisboa: Associação dos Arquitectos Portugueses, 1988. p. 3. 39 OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, GALHANO, Fernando – Arquitectura tradicional portuguesa. 2ªed. Lisboa: Publicações Dom Quixote Lda, 1994. p. 369. 51
III_ Princípios metodológicos para a reabilitação Princípios, regras e ferramentas
Neste capítulo, pretende-se fazer um percurso pelos conceitos de património e de reabilitação, com o objectivo de conhecer e entender a sua definição actual, e qual o meio para a sua manutenção. Enquanto métodos de preservação, são também estudados os conceitos de conservação e restauro. Neste sentido, são abordados os mais importantes autores e doutrinas disciplinares sobre o tema. A finalizar, são estudadas cartas e convenções de restauro, com o intuito de perceber a evolução da protecção do património. 55
25. Fado.
26. Padr達o dos Descobrimentos, 1940. Lisboa. Arquitecto Cottinelli Telmo e escultores Leit達o Barros e Leopoldo de Almeida. 56
III.1_ Património “Património, nome masculino herança paterna; bens que se herdaram dos pais ou avós; bens de família; zonas, edifícios e outros bens naturais ou materiais de determinado país que são protegidos e valorizados pela sua importância cultural; RELIGIÃO dote necessário para a ordenação de um eclesiástico; figurado riqueza; (Do latim patrimonĭu-, «idem»).”40 Esta definição, embora reduzida, demonstra o quanto o conceito de património tem uma interpretação e ambição bastante abrangente, embora, permaneça em constante transformação. Pode ser entendido como tudo o que é de propriedade privada, de herança familiar, e que é ao mesmo tempo parte integrante do património cultural de pertença colectiva, representativo da história e memória da sociedade, que aqui importa estudar. Neste sentido, o património pode ser um conjunto de bens imateriais (ilustração 25) – incorpóreos, sem matéria, tais como costumes ou tradições – e materiais (ilustração 26) – corpóreos, objectos isolados ou agregados, como os monumentos, conjuntos ou sítios – assumindo registos dos tempos, testemunho de diferentes épocas. É uma herança de identidade nacional e civilizacional imbuída de uma mensagem do passado que perdura para as gerações do presente e do futuro, que pode ser classificada ou não, mediante o reconhecimento da sua importância com significação e referenciação colectiva. O monumento, enquanto património classificado, reserva-se a todos os bens de
“interesse
cultural
relevante,
designadamente
histórico,
paleontológico,
arqueológico, arquitectónico, linguístico, documental, artístico, etnográfico, científico, social, industrial ou técnico, dos bens que integram o património cultural reflectirá valores de memória, antiguidade, autenticidade, originalidade, raridade, singularidade ou exemplaridade.”41 É também todo o património natural, das áreas naturais de valor excepcional do ponto de vista da ciência e beleza, constituídos por formações físicas, biológicas e geológicas. Aqui, importa desenvolver a noção de património material, físico, que se relaciona directamente com a disciplina da arquitectura, isto é, de todos os bens 40
Enciclopédia e Dicionários Porto Editora – “Património”. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/>. 41 Lei de Bases da Politica e do Regime de Protecção e Valorização do Património Cultural. In Diário da República Electrónico. [em linha]. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.dgarq.gov.pt/files/2008/10/107_2001.pdf>. 57
27. Vista do Porto. 58
construídos, classificados ou não, pois agora “(…) todas as formas da arte de edificar, eruditas e populares, urbanas e rurais e todas as categorias de edifícios, públicos e privados, sumptuários e utilitários, foram anexadas sob novas denominações: arquitectura menor, (…) usada para designar as construções privadas não monumentais (…); arquitectura vernacular, (…) usada para distinguir os edifícios característicos dos diversos territórios; arquitectura industrial das fábricas, das estações, dos altos-fornos (…)”42, são património, contrapondo-se deste modo ao conceito de património de outras épocas, anteriores ao final da Segunda Guerra Mundial, que se limitava aos monumentos isolados de valor artístico excepcional, esquecendo-se de todos os outros valores que fazem parte das cidades e das sociedades. “Enfim, o domínio patrimonial deixou de estar limitado aos edifícios individuais; ele compreende daqui em diante, os conjuntos edificados e o tecido urbano: quarteirões e bairros urbanos, aldeias, cidades inteiras e mesmo conjuntos de cidades (3), como demonstra «a lista» do Património Mundial estabelecida pela UNESCO.”43 Hoje, neste sentido, todo o património construído necessário para o homem se mover, viver e conviver, faz parte do crescimento social, da memória e da história (ilustração 27), sendo importante não só pela sua qualidade artística, técnica e singularidade, mas também pela sua importância no bem-estar da sociedade, como seu reflexo, identificador e caracterizador colectivo.
III.2_ Reabilitação “Reabilitar, (re- + habilitar). v. tr. Restituir direitos e prerrogativas (que se tinham perdido por sentença judicial); Declarar que o sentenciado está inocente; Ajudar à reinserção social de: Reabilitar um toxicómano; Reparar, renovar (um imóvel, um bairro antigo); Restituir a estima pública, regenerar moralmente; v. pron. Ser Reabilitado; Regenerar-se.”44 Esta definição de reabilitar demonstra o carácter geral que este termo tem. No entanto, interessa-nos a sua particular aproximação à disciplina da arquitectura. Ao
42
CHOAY, Françoise – Alegoria do Património. 3ª ed. Lisboa: Edições 70, 1999. p. 12. Idem, Ibidem. p. 12 e 13. 44 Dicionário Priberam da Língua Portuguesa – “Reabilitar”. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/>. 43
59
28. Reabilitação. Casa da Arquitectura. Matosinhos. Arquitecto Álvaro Siza Vieira.
29. Porto. 60
falar-se de reabilitação em arquitectura, somos logo induzidos para o domínio estrito do património classificado, do monumento histórico.45 Este pensamento advém de toda uma ideia desenvolvida ao longo do tempo, associada directamente ao estrito universo do restauro. É, por isso, importante dizer que tal como a definição de património, reabilitar também evoluiu e se transformou, tendo agora uma aplicação mais vasta, balizada e orientada por limites disciplinares, que integram todo o património construído e natural. “A história das cidades dá-nos conta de quanto hoje é actual construir no construído, (…)”46 pois “(…) apesar de “o futuro ser o único sítio onde podemos ir” como nos lembra Renzo Piano, “o passado é uma tentação constante””47. Reabilitar, como processo de regeneração e reutilização do espaço construído e natural, promove o uso contínuo das preexistências (ilustração 28) e tem estas como ponto de partida para responder às constantes exigências e necessidades do habitar. Negam-se assim as teses mais conservadoras, que defendem que “(…) à medida que se afirmam as tendências de embalsamento do património, acentua-se a desertificação
dos
lugares
da
história,
acabando
por
transformá-los
em
representações fantásticas de uma realidade jamais existente.”48 (ilustração 29) Neste sentido, modificando, transformando ou actualizando, o património construído adquire qualidades arquitectónicas perdidas com o tempo, e promove a sua continuação no tempo, de acordo com as vontades e necessidades e os novos padrões de habitabilidade e qualidade da sociedade actual. Assim sendo, só um trabalho colectivo de relação interdisciplinar e de interacção com os cidadãos, possibilita o incremento e prosseguimento de um projecto em equilíbrio capaz de atravessar os problemas políticos, económicos, sociais e culturais, em benefício da qualidade do território e de uma “(…) cultura contemporânea do habitar”49, ao mesmo tempo que, por vontade e utilidade cultural da sociedade, se preserva a memória e a história inscrita no património. 45
FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – “Reciclar o existente e requalificar o território” In FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – Territórios Reabilitados. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2009. p. 9. 46 FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – “Construir no tempo” In FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – Construir no tempo. Lisboa: Estar-editora, 1999. p. 7. 47 PEDREIRINHO, José Manuel – “O novo e o antigo contemporâneo” In Arquitectura Ibérica – N.º 36 Reabilitação. Casal de Cambra: Caleidoscópio. Março 2011. p. 10. 48 FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – “Construir no tempo” In FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – Construir no tempo. Lisboa: Estar-editora, 1999. p. 7. 49 FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – “Reciclar o existente e requalificar o território” In FERNANDES, Fátima, CANNATÁ, Michele – Territórios Reabilitados. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2009. p. 9. 61
30. Mosteiro de Santa Maria da Vitoria, 1386 a 1517. Batalha. 62
Em suma, perante a arquitectura, reabilitar o território construído e natural – classificado ou não – é uma acção disciplinar de manutenção, renovação, requalificação, reconstrução, conservação e restauro, mas também de importância social e cultural, capaz de promover o equilíbrio do antigo com o novo, e a sua vivência e permanência. III.2.1_ Conservação e restauro “Conservação s. f. Acto de Conservar; conservar v. tr. Manter em bom estado; Manter no estado actual; Guardar; Preservar; Continuar a ter; Reter (na memória); Não perder; Não desistir; v.pron. Durar; Permanecer; Não Expor a saúde, a vida; Ficar (a distância).”50 O acto de conservar o património deve ser o primeiro modo de preservar e salvaguardar o seu valor histórico, social e cultural. Assim, impõe-se a sua permanente manutenção com o objectivo de lhe prolongar a existência, de o transmitir ao longo dos tempos (ilustração 30). Em arquitectura, e como define a Carta de Veneza51, além de todas as operações de manutenção e preservação, conservar pode implicar a adaptação da construção a uma nova função necessária à sociedade, resultado da evolução dos usos e costumes. Neste sentido, a demolição ou adição de uma nova construção são também elementos do acto de conservar. No entanto, é necessário um conhecimento disciplinar e um sentido ético capaz de revelar e respeitar o carácter e a identidade da preexistência, não deturpando a sua realidade e verdade histórica com acções de preservação impróprias. A conservação é então um instrumento na preservação do território, assegurando a identidade e cultura dos lugares, das cidades e das sociedades. É, portanto, um assunto de interesse e valor colectivo em que se deve envolver toda a população. “Restauro (derivação regressiva de restaurar) s. m. Acto ou efeito de restaurar. = Restauramento; Conjunto de técnicas e operações para conserto ou reparação uma obra de arte ou de uma estrutura arquitectónica; Recuperação de 50
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa – “Conservação”. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/>. 51 Carta de Veneza. [em linha]. II Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos de Monumentos Históricos/ICOMOS.1964. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CartadeVeneza.pdf>. 63
31. Restauro industrial.
32. Restauro artístico.
33. Restauro arquitectónico. Adaptação de Palacete a Private Baking. Porto. Arquitectos António Portugal e Manuel Maria Reis. 64
algo que está em mau estado de conservação; [Encadernação] Operação que consiste em eliminar de um livro os estragos causados pelo tempo e incúria.” 52 O restauro, assim como a conservação, é também uma ferramenta importante e essencial da reabilitação. Enquanto técnica que procura restabelecer o bom estado de um objecto, o restauro pode ser genericamente de dois tipos: industrial e diário (ilustração 31) – recuperando valores estritamente funcionais, como o restauro de um automóvel, calçado, entre outros – ou artístico (ilustração 32) que recupera os valores estéticos e históricos de uma obra de arte.53 No entanto, é o restauro artístico que verdadeiramente define o conceito de restauro, e Cesare Brandi descreve-o como o “(…) momento metodológico de reconhecimento da obra de arte, na sua consistência física e na sua dupla polaridade estética e histórica, em sintonia com a sua transmissão no futuro.”54 Do mesmo modo, destaca dois princípios: “Só se restaura a matéria da obra de arte”55 e “o restauro deve dirigir-se ao restabelecimento da unidade potencial da obra de arte, sempre que possível sem fazer uma falsificação artística e uma falsificação histórica, sem apagar o percurso da obra de arte no tempo.”56 No primeiro, o autor sugere que só a imagem, como objecto físico e palpável, é passível de ser restaurada, e por isso é o elemento primordial do restauro. No entanto, o segundo princípio defende que o restabelecimento da obra de arte deve ser coerente para que não falsifique a imagem, e ao mesmo tempo, a história que ela transmite do passado para o presente e para o futuro, devendo permanecer presente a marca de todos os tempos, como registo da sua vida. Quando se fala de restauro em arquitectura, podem-se aplicar os princípios gerais do restauro artístico.57 No entanto, e apesar de histórica e estética, como as obras de arte, a arquitectura enquanto construção que organiza o espaço com o propósito de ser vivido, habitado, é também funcional, útil (ilustração 33). O lugar, enquanto suporte da arquitectura, é outro valor e factor que a distingue da obra 52
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa – “Restauro”. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.priberam.pt/dlpo/>. 53 BRANDI, Cesari – Teoria de la Restauración. 4ª ed. Madrid: Alianza Editorial, 1995. p. 13. 54 Idem, Ibidem. p. 15. Tradução livre: “(…) momento metedologico del reconocimiento de la obra de arte, en su consitencia física y en su doble polaridad estética e histórica, en orden a su tranmisíon al futuro.” 55 Idem, Ibidem. p. 16. Tradução livre: “Se restaura sólo la matéria de la obra de arte.” 56 Idem, Ibidem. p. 17. Tradução livre: “La restauración debe dirigirse al restablecimeiento de la unidad potencial de la obra de arte, siempre que esto sea posible sin cometer una falsificación artística o una falsificación histórica, y sin borrar huella alguna del trascurso de la obra de arte a través del tiempo.” 57 Idem, Ibidem. p. 77. 65
34. Retrato de Eugène Viollet-le-Duc. 66
de arte, pois influencia e condiciona o seu nascimento e desenvolvimento, tornando-a parte integrante do sítio. Assim, o restauro arquitectónico implica ter em atenção o contexto social e espacial, partilhado nas actuais definições e classificações de património. Tendo em conta estas diferenças, a renovação arquitectónica exige que além da unidade artística e estética, se deve ter em atenção também a sua contextualização e relação com o lugar em que se insere e inseriu no passado, assim como a sua funcionalidade, pois são factores importantes para manter a verdade artística e histórica, a transmitir ao longo do tempo. Neste sentido, pode dizer-se que a recuperação arquitectónica e também urbanística, é essencialmente fundamentada nos princípios do restauro artístico, mas também com uma vertente de restauro industrial, na medida em que a arquitectura contém também um objectivo utilitário. É ainda importante referir que o restauro, como ferramenta da reabilitação é, antes de tudo, uma questão de vontade, de querer manter e defender a memória de determinada época e sociedade. Eugène Viollet-le-Duc, Jonh Ruskin e Camillo Boito foram notáveis vultos que se destacaram na procura de uma definição do conceito de restauro, procurando ao mesmo tempo estabelecer os princípios para a sua boa prática. É neste sentido que se desenvolve o estudo sobre a recuperação, através das suas teorias. III.2.1.1_ Eugène Viollet-le-Duc e o restauro estilístico Eugène Viollet-le-Duc (ilustração 34) foi arquitecto e teórico francês (1814 1879). A sua imensa cultura e capacidade de crítica e de desenho são características da sua personalidade ímpar, que se estende e identifica na sua obra construída e teórica. Fruto da sua formação académica, recusa o neo-classicismo definindo-se como eclético, pois a sua arquitectura percorre o neo-gótico e neo-renascimento. No entanto, destacou-se pela sua dedicação e investigação ideológica na temática do restauro. 58 Seguindo as reflexões de Antón Capitel, a sua arquitectura é a expressão da sua formação, dos seus ideais, e apresenta um carácter de relação entre o uso e o 58
Enciclopédia Britânica – “Eugene-Emmanuel-Viollet-le-Duc”. [em linha]. [consultado em 06 de Fevereiro 2012]. Disponível em: <http://www.britannica.com/EBchecked/ topic/629711/Eugene-Emmanuel-Viollet-leDuc>. 67
35. Restauro estilístico. Catedral de Notre-Dame. Paris, França. Arquitecto Eugène Viollete-le-Duc. 68
estilo. Com isto, procura uma arquitectura avançada e própria do seu tempo. Foi dos primeiros que, ao dedicar-se ao estudo do restauro, procurou estabelecer princípios e metodologias de actuação e intervenção. O convite de Prosper Mérimée – inspectorgeral dos monumentos franceses – a Viollet-le-Duc como seu colaborador executivo, para dirigir e mesmo realizar a recuperação de “Catedrais góticas, Cidades amuralhadas, Abadias e Castelos”59, permitiu-lhe pôr em prática os seus pensamentos sobre a preservação dos monumentos. Ao mesmo tempo que o seu trabalho prático era conhecido, surgem também publicadas as suas reflexões e pensamentos teóricos sobre arquitectura. O Dicionário Analítico da Arquitectura Francesa do Século XI ao Século XVI, é o livro que aqui interessa referenciar, pois para além de estudar a arquitectura francesa, é aqui que aparece o conceito moderno de recuperação. “Restaurar um edifício não significa conservá-lo, repará-lo ou refazê-lo, mas obter a sua forma primitiva, mesmo que nunca tenha sido assim”60. Esta afirmação de Viollet-le-Duc caracteriza o seu pensamento sobre o restauro, que recusa qualquer alteração ao desenho original e defende a eliminação de qualquer acrescento ao edifício inicial, sempre na procura do carácter original – por meio de uma extensa análise de todos os elementos presentes – que corresponde ao estilo mais marcante do mesmo.61 Este modelo, apesar de estritamente rigoroso, poderia levar o edifício a um falso original, pois na procura do seu estilo único, iriam apagar-se as marcas da construção durante o tempo de vida do monumento, e por consequência a história das diferentes épocas e sociedades que o viveram e percorreram (ilustração 35). Então, pode dizer-se que estes ideais conservadores tenderiam a que os resultados fossem o oposto do pretendido. Não o restauro de um monumento como memória da história, mas sim a reconstrução de um novo edifício, em que o ponto de partida é o património.
59
CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 18. Tradução livre: “ Catedrales Góticas, Ciudades amuralhadas, Abadías y Castilhos (…)”. 60 VIOLLET-LE-DUC, Eugène, cit in CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 19. Tradução livre: “Restaurar un edificio no significa conservlo, repararlo o rehacelo, sino obtener su complena forma pristina, incluso aunque nunca hubiera sido asi.” 61 CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 20. 69
36. Auto-retrato de John Ruskin.
37. Ciclo biol贸gico da arquitectura. Convento das Bernardas, 1509 a 1530. Tavira. 70
III.2.1.2_ John Ruskin e o anti-restauro John Ruskin (ilustração 36), escritor, sociólogo e crítico de arte inglês (1819 1900) revela uma paixão por desenho, embora como ferramenta de estudo econhecimento, e extremamente ligado ao pensamento romântico da época, relaciona-se com diferentes movimentos artísticos como a pintura, a literatura e a arquitectura. O seu interesse pela arquitectura e o restauro foi expresso nos livros The Seven Lamps of Architecture e The Stones of Venice, onde estabeleceu as suas teorias de intervenção de restauro.62 “Cuidem dos nossos Monumentos e não haverá necessidade de restaurálos.”63 Acrescenta ainda que “o verdadeiro sentido da palavra restauro não é compreendido nem pelo público nem pelos que cuidam dos nossos Monumentos. Significa a mais completa destruição que um edifício pode sofrer, destruição que se acompanha de uma falsa restituição do Monumento destruído.”64 Com estas afirmações, Ruskin assumiu-se um defensor da verdade histórica e arquitectónica, pelo que defendeu a conservação estritamente necessária ao prolongamento da vida do edifício, em oposição aos pensamentos de Viollet-le-Duc sobre a arquitectura e o restauro. Entende que a arquitectura tem um carácter biológico, natural, e como tal tem um ciclo de vida como o ser humano, determinado pelo seu nascimento, o tempo de vida e a sua inevitável morte (ilustração 37).65 Enquanto expressão que eterniza e representa a evolução histórica do homem no tempo, a arquitectura deve permanecer intocada, envelhecendo. Neste sentido, a ruína é entendida como a morte do monumento, consequência do ciclo natural da vida do edifício. Ruskin acredita que a importância do património está relacionada com o seu tempo, o seu povo, e que pertence a quem o construiu. Por este motivo, defende que o restauro é errado, pois este vai criar um falso histórico, uma falsa memória, 62
Enciclopédia Britânica – “John Ruskin”. [em linha]. [consultado em 06 de Fevereiro 2012]. Disponível em: <http://www.britannica.com/EBchecked/topic/513091/John-Ruskin>. 63 RUSKIN, John, cit in CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 23. Tradução livre: “Cuidad de nuestros Monumentos y no tendréis necessidade de restauralos.” 64 Idem, Ibidem. p. 27. Tradução livre: “El verdadero sentido de la palabra restauración no lo comprende ni el publico ni los que tienen el cuidado de velar nuestros Monumentos. Significa la más completa destrucción que pueda sufrir un edificio, destrucción que se acompaña de una falsa restitución del Monumento destruído.” 65 CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 24. 71
38. Retrato de Camillo Boito. 72
destruindo assim a sua marca do tempo, reveladora de diferentes momentos na história. Neste sentido, sendo o tempo característica essencial da arquitectura, e a morte o seu fim, recuperar o património “… é impossível, tão impossível como ressuscitar um morto (…)”66. III.2.1.3_ Camillo Boito e o restauro moderno Camillo Boito (ilustração 38), arquitecto, teórico, historiador e crítico italiano (1936 - 1914), dedicou-se à arquitectura de edificações novas, mas foi no restauro de monumentos que se distinguiu, e deu a conhecer o seu pensamento e conhecimento sobre esta temática.67 Segundo Antón Capitel, Boito propõe uma conciliação da verdade histórica defendida por John Ruskin, com a oportunidade de restaurar o património. No entanto, a sua teoria pode definir-se melhor pela oposição de Boito ao extremismo estilístico de Viollet-le-Duc e ao conservadorismo e fatalismo de Ruskin, desenvolvendo assim uma nova ideologia sobre o restauro. Os Restauradores68, é o livro em que Boito expõe o seu pensamento sobre o restauro. Faz a distinção entre o restauro de Viollet-le-Duc e a conservação de Ruskin, demonstrando tratar-se de actos contrários, mas ao mesmo tempo ambos necessários, não esquecendo os perigos do restauro, e enaltecendo os benefícios da conservação. Afasta-se de Ruskin por não aceitar a morte das edificações, mas também se distancia de Viollet-le-Duc ao não compreender que o restauro conduza a construção ao que nunca foi. Embora recusasse os radicalismos destas teorias, o restauro moderno de Camillo Boito é influenciado por Ruskin, na conservação dos sinais do tempo de vida da construção, e por Viollete-le-Duc no estudo e respeito pela edificação original. É, portanto considerado o entendimento entre as duas teorias antagónicas, que se unem essencialmente na vontade de valorizar o património. Mantendo o ideal de valorização do património, Boito defende a conservação como acção de preservar o património. No entanto, se necessário para a sua 66
RUSKIN, John, cit in CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 27. Tradução livre: “… es imposible, tan imposible como resucitar a un muerto, restaurar nada que haya sido grande o hermoso en arquitectura (…)”. 67 CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p. 31. 68 BOITO, Camillo – Os Restauradores. [em linha]. Brasil: Atelié Editorial. 2002. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível na internet em: <http://books.google.pt/books?id=ZKZyMwEY6agC&printsec= frontcover&dq=os+restauradores&hl=pt-PT&sa=X&ei=PnjxT_PhJIT80QXA0_2LDg&ved=0CDUQ6AEwAA#v= onepage&q=os%20restauradores&f=false>. 73
39. Reabilitação e ampliação da Igreja de Figueiredo. Braga. Arquitecto Paulo Providência. 74
consolidação e uso pela sociedade, permite a adição de novas construções, deste modo marcando as diferentes épocas de vida da edificação. É esta relação da edificação com o tempo, revelando a constante evolução do homem e da sociedade que Boito pretende transmitir. Baseando-se numa posição analítica, diferenciadora, Boito descreve os seus princípios e condições imprescindíveis para a conservação e ampliação: “1.º Diferença de estilo entre antigo e novo; 2.º Diferença de material na sua construção; 3.º Omissão de molduras e decoração nas partes novas; 4.º Exposição das partes materiais que tenham sido eliminadas, num lugar contíguo ao monumento restaurado; 5.º Incisão da data de actuação ou um sinal convencional na parte nova; 6.º Legenda descrita da actuação fixada ao monumento; 7.º Descrição e fotografias das diversas fases dos trabalhos, depositadas no próprio monumento ou num lugar público próximo (condição substituível pela publicação); 8.º Notoriedade visual das acções realizadas.”69 A acção mínima no restauro e a admissão de novos volumes (ilustração 39), quando necessário para a sua consolidação, garantindo que estes se diferenciem da preexistência, são as noções gerais defendidas por Boito para a recuperação, não esquecendo que este deve ser um recurso de uso extremo, e que a premissa deve ser sempre a conservação. Segundo Antón Capitel, estes oito pontos definidos por Camillo Boito, que foram apresentados no III Congresso de Arquitectos e Engenheiros Civis de Roma em 1883, são entendidos como a primeira carta de restauro, e orientação para legislação em alguns países. Neste sentido, esta nova perspectiva inicia uma nova forma de ver a recuperação como especialidade importante da arquitectura, sendo também um importante estímulo para o desenvolvimento das primeiras cartas e convenções.
69
BOITO, Camilo. Cit in CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p.31 e 32. Tradução livre: “1º Diferencia de estilo entre lo antiguo y lo nuevo; 2º Diferencia de materiales en sus fábricas; 3º Supresión de molduras y decoración en las partes nuevas; 4º Exposición de las partes materiales que hayan sido eliminadas en un lugar contiguo al monumento restaurado; 5º Incisión de la fecha de la actuación o de un signo convencional en la parte nueva; 6º Epígrafe descriptivo de la actuación fijado al monumento; 7º Descripción y fotografías de las diversas fases de los trabajos depositadas en el propio monumento o en un lugar público proximo. (Condición sustituible por la publicación); 8º Notoriedad visual de las acciones realizadas.” 75
40. Ruínas de Conímbriga. Coimbra. 76
III.3_ Organizações e Orientações III.3.1_ Cartas e convenções internacionais sobre o património O património cultural e natural é a expressão e testemunho de um passado de várias gerações. Neste sentido, a sua degradação ou desaparecimento significa a perda da memória e da história das sociedades. Por este motivo, a necessidade e vontade de preservar e conservar os edifícios, os lugares e os conjuntos arquitectónicos que identificam a sociedade numa determinada época (ilustração 40), é uma característica inerente ao homem, tão antiga como a própria arquitectura. Reflexo disto é a existência, desde muito cedo, de diferentes teóricos que defendem diferentes modos de actuar perante a preexistência, como os anteriormente abordados Viollete-Le-Duc, John Ruskin e Camillo Boito, que se destacam pelas suas ideologias díspares, úteis à orientação e estabelecimento de doutrinas de intervenção. No entanto, a existência de teorias de restauro não é sinónimo da sua actuação e aplicação por parte das nações. Verificando uma insuficiência de recursos económicos, científicos e técnicos ao nível dos países capazes de promover uma preservação cada vez mais eficaz, e perante o crescimento das ameaças – que para além das causas de degradação naturais, comportam também as resultantes da acção e evolução do modo de vida social, cultural e económico – nasce o sentido de responsabilidade colectiva para a preservação. Nos anos 30 do século XX, são publicadas as primeiras cartas de conservação e restauro que têm como objectivo um acordo internacional dos conceitos e métodos de restauro. Em 1945, com a criação da Organização das Nações Unidas70, é fundada a Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura 71, cujo objectivo é manter a segurança e paz no mundo, e defesa dos direitos fundamentais do homem, por meio da promoção da educação, ciência e cultura. Esta organização é fundamental na defesa do património mundial, contribuindo com o apoio e criação de cartas e convenções internacionais de promoção e divulgação da conservação e do restauro do património, em que cada país se deve responsabilizar
70 71
UN - United Nations Organization UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization 77
41. Regi達o Vinhateira do Alto Douro. 78
pela sua aplicação, e criando a distinção de Património da Humanidade (ilustração 41) assinalando a sua importância.72 Conta, para esta missão, com o apoio de diversas organizações, onde se destacam o Concelho Internacional de Museus73, o Concelho Internacional de Monumentos e Sítios74 e a União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais75. Em Portugal, tem a cooperação da Direcção Geral do Património Cultural para a identificação e manutenção do património, sendo anteriormente gerido pelo Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (IGESPAR). Foram seleccionadas algumas das referidas cartas por se considerarem importantes para esta investigação, desde a sua aplicação global até à especificidade do património popular, evidenciando o que cada uma acrescenta, ao nível instrumental e disciplinar. A Carta de Atenas76, assinada em 1931 pela Sociedade das Nações, é o primeiro documento internacional de referência que serve como base de acção, orientação e instrumentalização na área do restauro, com o objectivo de salvaguardar o património. Estabelece doutrinas, princípios e técnicas para o restauro e conservação dos monumentos históricos, promove a sua valorização e rejeita a sua degradação, propondo para o efeito uma colaboração institucional e internacional. O abandono de reconstruções integrais e o desenvolvimento de uma manutenção regular são princípios defendidos para assegurar a conservação dos monumentos. No caso do restauro ser a acção necessária, recomenda respeito pela autenticidade do património – sem recusar elementos de diferentes épocas –, mesmo quando estes adquirem novas utilizações como meio de continuidade de vida. No que respeita à legislação, esta tem como objectivo proteger o monumento histórico, artístico e científico. Perante o interesse na preservação do património privado, deve conciliar as diferenças entre os direitos públicos e privados, evitando conflitos com os proprietários em proveito dos benefícios públicos, e conflitos públicos 72
United Nations Organization. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.un.org/en/> 73 ICOM - International Council of Museums 74 ICOMOS - International Council of Monuments and Sites 75 IUCN - International Union for Conservation of Nature 76 Carta Internacional para a Salvaguarda das Cidades Históricas. [em linha] ICOMOS. 1987. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/ media/uploads/cc/CARTAINTERNACIONALPARASALVAGUARDDASCIDADESHISTORICAS.pdf> 79
42. Arco do Triunfo, 1806 a 1836. Paris, Franรงa.
80
em benefício privado. O mesmo documento, ainda, defende que a valorização dos monumentos é tida pelo respeito na construção de edifícios nas cidades e em especial na vizinhança de monumentos, onde se deve ter um perímetro de protecção de monumento, ficando este isolado e demarcado (ilustração 42). Esta valorização implica uma atenção especial à envolvente próxima, na construção e materialização das edificações, assim como a todos os objectos urbanos perturbadores e dissonantes. Recomenda ainda o uso de materiais e técnicas modernas quando necessário, desde que o seu uso seja cauteloso. No entanto, todos os materiais resistentes devem ser dissimulados, para poder manter a identidade do edifício. Devido às condições da vida moderna e às condições atmosféricas, os monumentos encontram-se cada vez mais ameaçados. Deve-se, por isso, desenvolver
uma
colaboração
interdisciplinar
–
arquitectos,
arqueólogos,
historiadores, entre outros – para conseguir alcançar metodologias de intervenção úteis e aplicáveis a diferentes casos. Quanto às técnicas de conservação definidas, impõe-se uma manutenção rigorosa. Em caso de ruína, defende o recurso à anastilose, entendida pela reposição de partes existentes. Todos os materiais novos que sejam necessários a estas técnicas de conservação devem ser claramente identificáveis. Quando a conservação de ruínas ou escavações é impossível, devem ser de novo enterradas, após serem feitos registos rigorosos do património encontrado. Todos estes trabalhos devem ser feitos em colaboração com os diferentes especialistas como arquitectos, arqueólogos, entre outros. A Carta de Atenas, propõe ainda a colaboração internacional técnica, moral, no intercâmbio de especialistas com instrumentos e conhecimentos de diferentes países. Defende que a educação sobre o respeito pelo património é a técnica de conservação mais eficaz, no entanto é necessária uma documentação internacional capaz de orientar a colaboração internacional. Em 1964, pela mão do ICOMOS, surge a Carta de Veneza77. É uma actualização à Carta de Atenas que se revela muito limitada, comparativamente com o tempo e os novos ideais em que é elaborada esta nova Carta, no entanto, é importante por dar início ao debate desta temática. Esta modificação é sobretudo 77
Carta de Veneza. [em linha]. II Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos de Monumentos Históricos/ICOMOS.1964. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CartadeVeneza.pdf> 81
43. Convento de Nossa Senhora da Arrábida, século XVI. Serra da Arrábida. 82
de conceitos e definições de património, conservação e restauro, permitindo que todas as regras definidas pela Carta de Atenas tenham uma diferente aplicação, ou seja, uma orientação alargada ao enquadramento do monumento. Com este sentido, a primeira e mais significativa actualização à Carta de Atenas é a definição de monumento histórico, que agora não se refere só ao monumento em si, mas também a todo o conjunto e sítio (ilustração 43) – rural ou urbano – que testemunha a sociedade no seu tempo. Aqui, importam também todas as obras modestas que adquirem importância histórica, social e cultural com o tempo, por serem a expressão e materialização de um momento em determinada sociedade. No que respeita à conservação, a Carta mantém a preferência de uma manutenção regular, e também uma relação científica e técnica interdisciplinar. Contudo, defende a adaptação do monumento a uma função útil, em resposta às necessidades da sociedade, desde que respeite a originalidade do edifício. Como resultado da modificação da definição de monumento histórico, a conservação deve ser alargada à envolvente próxima, pois o monumento é inseparável da sua contextualização, que o sustenta. A Carta de Veneza, revela ainda que o restauro, cujo objectivo é conservar e revelar os valores do monumento, se baseia no respeito pela antiguidade e pela autenticidade, deixando de ter significado quando se pretende a reconstituição. Se é indispensável ao nível técnico e estético, deve então demarcar-se a modernidade de forma equilibrada, exigindo-se previamente um estudo arqueológico e histórico. Quando existam contributos de diferentes épocas num imóvel, estas devem permanecer todas, pois não é o estilo que se quer recuperar mas sim a história do monumento, sendo reprovável a eliminação de algum elemento, com a excepção dos que tenham pouco interesse ou estejam em mau estado de conservação. No entanto, a decisão de eliminação não pode ser tomada com base na única opinião do autor do estudo e projecto. Durante o restauro, todos os elementos apostos devem distinguirse do original, e todos os acrescentos, quando necessários, devem respeitar os interesses do edifício, o equilíbrio da sua composição e a sua relação com o sítio. Todos estes princípios de conservação e restauro enunciados nesta Carta, devem aplicar-se também aos sítios monumentais, que até então eram esquecidos e deixados ao abandono. Tal como a anterior Carta de restauro, esta propõe que se faça uma documentação de todos os trabalhos e a sua publicação para que estejam acessíveis a todos, servindo de exemplo. 83
44. Paisagem Cultural de Sintra. 84
A Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural78 assinada em 1972 pela UNESCO e em simultaneidade com o ICOMOS e IUCN, é mais um contributo para a conservação do património. Esta Convenção procurou estabelecer definições claras de património, fazendo-o de forma rigorosa e descritiva do que pode ser considerado património cultural e natural. Assim, permite uma maior e melhor actuação na identificação e protecção do património (ilustração 44). Neste sentido, incentiva a protecção nacional e internacional do património cultural e natural, atribuindo a obrigação da identificação e preservação do património por parte de cada Estado-membro desta Convenção, através de políticas de integração social e cultural, de medidas jurídicas, administrativas e financeiras, e do desenvolvimento de estudos científicos e técnicos, assim como o incentivo à informação e formação técnica. Ainda, neste documento, é também criado um Comité do Património Mundial, com carácter intergovernamental, essencialmente com dois objectivos. O primeiro é a criação de uma lista de património em risco, elaborada em constante colaboração com os Estados-membros. O segundo, e não menos importante, é a assistência artística, científica e financeira em benefício da salvaguarda do património. No entanto, para obter esta assistência, os Estados que o desejem têm de apresentar os estudos referentes ao imóvel ou aos sítios em causa. Em contrapartida, a assistência deve criar programas educativos que permitam dar a conhecer a importância do património cultural, e da sua conservação, enquanto preservação da história de um tempo e de uma sociedade. No seguimento da Carta de Veneza, em que já se aborda o sítio como valor a preservar – não se reduzindo ao monumento em si – o ICOMOS aprova, em 1987, a Carta Internacional para a Salvaguarda das Cidades Históricas79 que se distingue de todas as outras pela sua escala de abrangência – a cidade –, apesar da sua identificação com as cartas e convenções anteriores. A salvaguarda das cidades e dos bairros históricos deve estar presente nos planos de ordenação e de urbanização, de modo a preservar o carácter histórico das
78
Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural. [em linha]. UNESCO. 1972. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/ media/uploads/cc/ConvencaoparaaProteccaodoPatrimonioMundialCulturaleNatural.pdf> 79 Carta Internacional para a Salvaguarda das Cidades Históricas. [em linha] ICOMOS. 1987. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CARTAINTERNACIONALPARASALVAGUARDDASCIDADESHIST ORICAS.pdf> 85
45. Centro Hist贸rico de Guimar茫es.
46. Pi贸d茫o. Arganil. 86
cidades e o conjunto de elementos materiais e imateriais que a caracterizam (ilustração 45). Estes são expressos nas relações das cidades com o seu enquadramento natural e construído, pela forma urbana do território, pelas diferentes relações entre os espaços construídos e não construídos, livres e cultivados, a forma e as condições das edificações, e as diferentes vocações abraçadas e protagonizadas pela cidade. Neste sentido, é essencial a cooperação e envolvimento da população das cidades para a sua salvaguarda, pois está directamente relacionada com eles em termos sociais e culturais. Os métodos e instrumentos de salvaguarda segundo esta Carta devem ser pluridisciplinares, devendo fazer-se a análise de dados arqueológicos, históricos, arquitectónicos, sociológicos e económicos, de modo a conseguir uma articulação disciplinar harmoniosa, determinando o que e como proteger, devendo todos estes estudos e projectos estarem e serem documentados antes de qualquer intervenção. Estes princípios e métodos devem respeitar a Carta de Veneza, devendo sempre existir um equilíbrio entre as necessidades da vida contemporânea, como costumes, novos usos, preexistência e infra-estruturas contemporâneas. Devem também ser tomadas medidas de prevenção de catástrofes, assegurando a salvaguarda do património. A Carta do Património Vernacular Construído80, de 1999, proposta e desenvolvida pelo ICOMOS, surge como uma expansão da Carta de Veneza e das cartas posteriores, com o objectivo de proteger o património popular construído. Esta intenção existe, pois a arquitectura vernacular ou popular tem um carácter singular (ilustração 46). Aparenta ser irregular e desordenada, no entanto, é o reflexo do seu carácter utilitário em resposta às necessidades da sociedade rural, e de adaptação perante a natureza, com recurso aos materiais locais e técnicas tradicionais, assumindo-se assim como identidade da comunidade. Com a globalização económica, social e cultural, facilitada pela comunicação generalizada, estas regiões, assim como as suas arquitecturas, estão mais acessíveis, e com isso mais vulneráveis a acções de desequilíbrio e de desintegração. Os princípios de conservação desprendem-se dos definidos pelas cartas e convenções anteriores, no que diz respeito aos valores culturais e tradicionais dos conjuntos e sítios. Neste contexto, a conservação tem uma orientação particular.
80
Carta sobre o Património Construído Vernáculo. [em linha]. ICOMOS. 1999. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.international.icomos.org/charters/vernacular_sp.pdf> 87
47. Mosteiro de Santa Maria de Alcobaรงa, 1178. Alcobaรงa. 88
Na sua intervenção, deve respeitar a integridade e organização dos conjuntos, mantendo a sua relação com a paisagem. Para uma resposta mais adequada na intervenção, é necessário conhecer os sistemas e as técnicas tradicionais de construção vernacular. Quando se exige a adaptação aos usos contemporâneos, e a consequente substituição de parte da preexistência, deve respeitar-se a sua integridade e configuração, recorrendo ao uso de técnicas e materiais que mantenham melhor o equilíbrio e expressão. Como defendido em cartas anteriores, as contribuições de diferentes épocas devem manter-se, pois são parte da história e memória da construção e da sociedade em que se inserem. À semelhança de outras cartas e convenções, esta defende que é necessária uma investigação e documentação prévia, e a criação de programas educativos e de promoção e animação cultural destas regiões vernaculares e rurais. Em síntese, para a conservação do património popular e vernacular, deve terse especial atenção aos seus valores culturais e tradicionais, às estruturas, aos valores espaciais e materiais, e ao modo como estes são usados pela população, pois revelam a sua identidade social e cultural, resultando da relação de intimidade entre a natureza, o lugar e o modo de vida local.
A abordagem cronológica de algumas cartas e convenções tem o objectivo de compreender o desenvolvimento das ideias e conceitos relacionados com o crescente interesse pela identificação, preservação e divulgação do património, e ao mesmo tempo, qual o compromisso assumido pela sociedade na sua salvaguarda e valorização (ilustração 47). Esta evolução é imediatamente perceptível, desde a definição de monumento histórico introduzida pela Carta de Veneza até às definições de património das actuais cartas. Deste modo, aumentou as áreas de intervenção e, por sua vez, a forma como são aplicadas as doutrinas de conservação e restauro por parte dos responsáveis, onde se incluem os arquitectos. O conceito de património continua a evoluir e a especificar-se, assim como as doutrinas na procura da diminuição das agressões aos nossos sítios, cidades e conjuntos rurais, pois uma intervenção de reabilitação ou restauro envolve actos muitas vezes irreversíveis, devendo por isso ser acções bem pensadas.
89
48. Desrespeito pelo patrim贸nio. 90
Cada novo documento confirma, e ao mesmo tempo actualiza, os conceitos e orientações defendidos nas anteriores cartas e convenções, pois cada documento é criado de acordo com os pensamentos e ideologias individuais e colectivos de cada sociedade, balizados nos acontecimentos que marcam a sua época. Assim, tal como a sociedade continua em constaste evolução política, económica, social e cultural, as cartas e convenções tendem a desenvolver-se e a complementar-se de acordo com as vontades das sociedades. Estes documentos e organizações criados em prol do património, necessitam do envolvimento da sociedade na sua preservação, e devem ter como base de sustentação a educação cultural, sobre o que é o património e qual o seu significado, pois só deste modo é possível que se crie uma relação de proximidade e respeito, que incentive uma conservação preventiva, capaz de manter a identidade cultural e criativa das diferentes épocas históricas, e se previna o seu abandono e desrespeito (ilustração 48). Do ponto de vista mais técnico, as cartas e convenções internacionais são documentos de orientação disciplinar e instrumental que motivam a reflexão sobre o património e a sua preservação e conservação. No entanto, e dependendo do pensamento ideológico individual de cada arquitecto – que importa estudar – as orientações ideológicas e instrumentais de conservação e restauro, da manutenção ou alteração dos usos, dos materiais e técnicas utilizados, podem revelar-se fundamentais para a sua actuação no património, ou pelo contrário, podem mostrarse limitações à sua intervenção.
91
IV_ Obras de referĂŞncia
A finalidade deste capítulo é estudar e interpretar três projectos de arquitectura que constituem fontes na aplicação das metodologias de intervenção no património e de aproximação ao programa vitivinícola. A reconversão de um Moinho em Vilar de Mouros, a reabilitação e ampliação da Adega Casa da Torre em Vila Nova de Famalicão e a construção da Adega Mayor em Campo Maior são os estudos e projectos seleccionados. O primeiro está especialmente dirigido à aplicação das ideologias do restauro, o segundo à relação da reabilitação e da ampliação com o programa vinícola, e o terceiro ao novo programa vinícola. A abordagem é realizada de acordo com os temas apontados até então, isto é, cada caso é analisado segundo o lugar, a arquitectura e as metodologias de intervenção no património, diferenciando e evidenciando a sua importância individual. 95
49. Reconstrução do Sequeiro. Guimarães.
50. Casa Cristina Silva. Porto.
51. Reconversão do Moinho. Vilar de Mouros.
52. Localização do Moinho. Vilar de Mouros. 96
IV.1_ Reconversão de Moinho. Arquitecto José Gigante A obra do arquitecto José Gigante é marcada pela sua diversidade projectual, e é com facilidade que encontramos uma forte relação disciplinar e instrumental com a temática da reabilitação. Encontramos ainda valores importantes e estruturantes como a construção e a pormenorização, pensada e destinada a cada obra. A sua forma de ver e pensar a arquitectura, e a sua interpretação do espaço preexistente altera-se ao longo do tempo de projecto para projecto, no entanto, é possível observar um equilíbrio e respeito pelo património nas suas intervenções, quer pela sua interpretação do antigo como matéria-prima de estudo e projecto, quer também na relação do passado com os materiais e os sistemas construtivos contemporâneos. Como afirmação desta coerência projectual, pode destacar-se, entre os projectos de reabilitação que traçou ao longo do tempo, a Reconstrução do Sequeiro (Guimarães, 2002-2005) (ilustração 49), a Casa Cristina Silva (Porto, 20032006) (ilustração 50) e, a mais antiga, seleccionada como referência de estudo, a Reconversão do Moinho (Vilar de Mouros, 1989-1996) (ilustração 51). Vilar de Mouros (ilustração 52) situa-se entre os montes de Goios, Pena, Gávea e Viso, no litoral norte do país, no concelho de Caminha. A agricultura e a pecuária ainda fazem parte do sector laboral, mas também existe o comércio tradicional e a pequena indústria, em resposta às necessidades e anseios da população local. Rica em património natural e cultural, mantém o seu carácter rural, vernacular e singular, apesar da evidente evolução do território e da sociedade ao longo do tempo.81 É neste contexto, ainda rural, inserido no terreno de uma habitação existente, que se encontra um moinho, outrora degradado. É uma construção simples, utilitária, associada à arquitectura de produção local. A implantação apresenta uma forma circular que origina um volume cilíndrico, construído com materiais retirados do lugar – pedra e madeira – e sistemas construtivos tradicionais que imprimem uma identidade própria e, ao mesmo tempo, uma harmonia com o sítio. A vontade de transformar o moinho em espaço de estar e dormir, dependente de uma habitação recuperada anteriormente, promoveu o prolongamento da sua vida
81
Junta de Freguesia de Vilar de Mouros. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.jf-vilardemouros.com/> 97
53. Plantas e cortes do moinho.
54. Entrada.
55. Cobertura em cobre.
56. Piso tĂŠrreo.
57. Piso superior.
98
e a preservação da sua história e memória. A intenção de lhe dar uma nova função (ilustração 53) é, por si só, o primeiro acto de reabilitação do moinho, ao qual se juntam as motivações ideológicas de actuação que passam pelas opções organizacionais e materiais. Com o sentido da preservação e reabilitação autêntica, de algum modo relacionada com o pensamento menos fatalista de John Ruskin, que defende a acção mínima de conservação para prolongamento da vida da construção, desenha e constrói o projecto com a manutenção da topografia e dos muros em pedra associados, que definem e apoiam o pódio natural em que o moinho se encontra, comprovando a importância do lugar. O perímetro exterior do moinho é preservado, sem nada lhe demolir ou ampliar. Mantém a marca do tempo na pedra, vestígio do seu ciclo de vida, e o recorte dos vãos. A madeira, pela sua forte ligação com a pedra, é seleccionada e usada para fazer a porta e as janelas (ilustração 54), para além da sua extensão para o interior. A cobertura é reinterpretada, adoptando a contemporaneidade e diferenciando a data da intervenção no tempo, como defende Camillo Boito. Agora, é plana, com pouca presença no perfil do moinho, e a sua estereotomia converge para o centro numa clara alusão à cobertura anterior (ilustração 55). O material é o cobre que, com a sua oxidação no tempo, cria uma relação de equilíbrio, proximidade e intimidade com a construção em pedra e o lugar em que se insere. Na transição para o espaço interior, onde se exige uma nova função, mantémse a coerência e o equilíbrio do espaço, mas assumindo a contemporaneidade da intervenção, como defende a Carta de Veneza82, devendo ter-se sempre em atenção a essência patrimonial e cultural. Assumindo a modernidade e qualidade do espaço que é agora para habitar, a parede interior é rebocada e pintada. Conservando a relação com o exterior do moinho, a madeira, material de todos os tempos, prolonga-se das janelas e portas para o interior, e enquanto material construtivo, organiza e materializa todo o espaço em dois pisos. Constrói o piso térreo (ilustração 56), o piso superior (ilustração 57) – que se prologa até à janela, apropriando-se da espessura da parede – e a escada que os liga. A sua versatilidade e modularidade permitem apropriar-se do espaço disponível, organizando-o. No espaço de entrada, localiza-se uma instalação sanitária 82
Carta de Veneza. [em linha]. II Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos de Monumentos Históricos/ICOMOS.1964. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CartadeVeneza.pdf> 99
58. Casa da Costa Grande. Baião.
59. Adega Quinta da Faísca. Alijó.
60. Adega Casa da Torre. Vila Nova de Famalicão.
61. Localização da Adega Casa da Torre. Vila Nova de Famalicão. 100
e uma área de estar, onde o sofá pode adoptar a função de cama, e, no piso superior, um armário e um estrado-cama integrado no piso, proporcionam um habitar mínimo conotado com as ideologias da contemporaneidade. Na preservação do moinho, por meio da sua reconversão, a madeira assume claramente a responsabilidade de ligação entre as diferentes épocas de intervenção, entre a preservação do antigo e a criação do novo, permitindo manter a identidade do moinho, sem descaracterizar ou deformar a sua identidade popular e vernacular. Os materiais e as técnicas associadas, reveladas e evidenciadas pelos detalhes e apoiadas na interpretação e construção a partir do lugar preexistente mas com valores marcados pela contemporaneidade, em sintonia com as ideologias da reabilitação e do restauro, fazem com que a reconversão do moinho se revele um bom exemplo de preservação e valorização do património.
IV.2_ Reabilitação e ampliação da Adega Casa da Torre. Arquitecto Carlos Castanheira A obra do arquitecto Carlos Castanheira é essencialmente dedicada à construção nova, e muito relacionada com o tema da habitação. No entanto, no seu percurso arquitectónico também existem obras com carácter mais colectivo e de reabilitação que, dependendo das condicionantes espaciais e funcionais, exige a consequente necessidade de ampliação. A madeira é o material evidente e constante nos seus projectos e obras, pois o arquitecto constrói em madeira porque gosta83, mas também porque o lugar assim o exige. O seu uso é obsessivo, podendo afirmar-se que é protagonista, mesmo quando se relaciona com outros materiais, transmitindo equilíbrio, tranquilidade e autenticidade à obra que se apresenta inserida e relacionada com o lugar, da construção nova à reabilitação. A Casa da Costa Grande (Baião, 2008-2009) (ilustração 58) é um bom exemplo de reabilitação e ampliação do existente, associada ao uso da habitação. Ainda associado ao mesmo tema e, simultaneamente à produção vinícola que também importa estudar, encontram-se as obras da Adega Quinta da Faísca (Alijó, 2008-…) (ilustração 59), e a Adega Casa da Torre (Vila Nova de Famalicão, 2008-2009) (ilustração 60), seleccionada e aqui abordada.
83
CASTANHEIRA, Carlos – “Construir em madeira – porque eu Gosto!” In CASTANHEIRA, Carlos – Carlos Castanheira arquitecto. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2011. p. 8. 101
62. Adega antes da intervenção.
63. Implantação da adega.
64. Plantas da reabilitação e ampliação da adega. 102
O lugar em que se insere a Adega Casa da Torre tem o contexto natural da freguesia de Louro (ilustração 61), no concelho de Vila Nova de Famalicão situado a norte de Portugal. A sua paisagem é dominantemente natural, atravessada pelo rio Este, e é rica em terrenos férteis, utilizados para a agricultura e viticultura. Este facto revela-se e sustenta-se com a presença de uma arquitectura rural de produção.84 A Adega Casa da Torre é uma construção de cariz popular e vernacular (ilustração 62), numa propriedade com cinco hectares de vinha. É marcada por diferentes fases de construção que evidenciam o seu carácter utilitário, em resposta às necessidades de produção, que correspondem à exploração de mais duas propriedades da mesma família. Na sua origem, era composta por uma única edificação com uma planta rectangular de nove metros de largura e dezoito metros de comprimento. No entanto, na década de 90 do século XX, com o intuito de aumentar e modernizar a adega, esta foi recuperada e ampliada, permanecendo até 2009 com uma planta quadrada de dezoito metros de lado. Existem, nesta propriedade vinícola, ainda, mais duas construções independentes. Uma, com a função de apoio a esta, e outra com capacidades e funcionalidades agrícolas.85 A actualização e modificação da adega continua, acompanhando a evolução programática e tipológica produtiva até aos dias de hoje. “A vontade de produzir mais, melhor e de acordo com as novas regras, obrigou a repensá-la e obrigatoriamente a aumentá-la.”86 Este desejo tinha, ainda, como estímulo, a expansão internacional da produção vinícola e a associação ao enoturismo. Como sustenta a Carta de Veneza87, o património não está isolado, integra-se na sua envolvente. Neste sentido, quando se pensa intervir no património, não se pode esquecer o meio em que está inserido, como acontece nesta actualização da adega. O espaço exterior foi redesenhado para responder às novas exigências, mantendo a implantação da vinha e os espaços de apoio vinícola e agrícola, assim como a sua base material e formal, a pedra (ilustração 63). A adega, conserva a orientação e organização da implantação (ilustração 64), 84
Junta de Freguesia de Louro. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.freg-louro.pt/> 85 Adega Casa da Torre. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.adegacasadatorre.com/> 86 CASTANHEIRA, Carlos – “Adega Casa da Torre” In CASTANHEIRA, Carlos – Carlos Castanheira arquitecto. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2011. p. 123. 87 Carta de Veneza. [em linha]. II Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos de Monumentos Históricos/ICOMOS.1964. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CartadeVeneza.pdf> 103
65. Vista frontal da adega.
66. Escrit贸rio.
67. Escada.
68. Passadi莽o.
69. Laborat贸rio.
70. Espa莽o interior da adega. 104
parcialmente encastrada no terreno, e amplia o espaço necessário, sempre com respeito pela preexistência. A área de implantação da adega foi aumentada, recorrendo a sistemas estruturais e materiais contemporâneos, no entanto, no exterior, a parede foi revestida com pedra existente, garantindo a unidade e continuidade da textura e expressão existente. Esta forma de intervir, procurando modernizar sem desrespeitar a identidade da construção e do lugar, vai ao encontro do que aconselha a Carta de Atenas88, e também a Carta do Património Vernacular Construído89. A transformação mais evidente acontece na cobertura. Reduzem-se as quatro águas resultantes do crescimento da adega por etapas, a apenas duas águas (ilustração 65). Simplifica-se a estrutura e, ao mesmo tempo, são criadas oportunidades para novos espaços, permitidos pelo aumento do pé-direito, e pelo avanço da cobertura sobre o lajeado da entrada. Assim, cumprindo a Carta de Veneza90, este aumento de um piso em parte da adega, permitido pela nova configuração da cobertura e ditado pela necessidade programática, distingue-se do original e, ao mesmo tempo, respeita a composição da edificação existente, pela sua simplicidade formal e material. O escritório, ligado à adega por uma escada e à cota alta do terreno por um passadiço longitudinal que atravessa toda a adega (ilustração 66, 67 e 68), é um dos espaços novos. Destacam-se ainda o laboratório (ilustração 69), em forma de barril, e o vestiário dos funcionários, implantado no lajeado da entrada. Na ampliação e adição, a madeira faz a ligação à pedra, pela integração e associação identitária com a arquitectura popular, mantendo uma harmonia espacial e material com a estrutura preexistente (ilustração 70). No interior, o espaço da adega é marcado pela presença de pilares centrais com quatro escoras que apoiam a cobertura, surgindo entre eles o passadiço longitudinal. A madeira, transita do exterior e predomina no interior, usada na estrutura da cobertura, no passadiço e no ripado de madeira usado na ampliação, para responder à necessidade de filtrar a luz e reduzir a insolação e sobreaquecimento do espaço interior. O mesmo ripado constrói o laboratório e o vestiário.
88
Carta de Atenas. [em linha]. Escritório Internacional dos Museus/Sociedade das Nações. 1931. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CartadeAtenas.pdf> 89 Carta sobre o Património Construído Vernáculo. [em linha]. ICOMOS. 1999. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.international.icomos.org/charters/vernacular_sp.pdf> 90 Carta de Veneza. [em linha]. II Congresso Internacional de Arquitectos e Técnicos de Monumentos Históricos/ICOMOS.1964. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/media/uploads/cc/CartadeVeneza.pdf> 105
71. Casa de Chá da Boa Nova. Matosinhos.
72. Adega Quinta do Portal. Sabrosa.
73. Adega Mayor. Campo Maior.
74. Localização da Adega Mayor. Campo Maior. 106
Devido às necessidades específicas do programa, e aos novos padrões de higiene, manutenção e conservação, os materiais do pavimento e das paredes são estudados para responder às exigências de salubridade, revelando-se claramente contemporâneos. As paredes são rebocadas e pintadas de branco, e o piso é cerâmico. As cubas, agora em aço inoxidável, são também elementos que evidenciam a evolução dos tempos, com a modernidade e actualidade tecnológica. Importa nesta intervenção destacar a forma como foram solucionados os problemas de ordem técnica no universo da produção vinícola, sem esquecer a relação com a preexistência. A madeira e a pedra são os elementos que protagonizam as renovações estruturais e espaciais da ampliação e reinterpretação do espaço, respeitando as cartas e convenções Internacionais sobre o Património, permitindo manter a identidade e unidade da adega e do lugar popular e vernacular.
IV.3_ Construção da Adega Mayor. Arquitecto Álvaro Siza Vieira Álvaro Siza Vieira é um arquitecto premiado nacional e internacionalmente, com uma numerosa e diversificada obra construída em todo mundo, que percorre variados programas e escalas, de carácter privado ou público. De entre essa multiplicidade projectual, podem encontrar-se projectos de reabilitação, mas, como o próprio sugere, a arquitectura de implantação nova também é reabilitação do sítio, do lugar, pois “a relação entre natureza e construção é decisiva na arquitectura.”91 A sua arquitectura é marcada pela importância que atribui à interpretação e compreensão do lugar, revelando-se francamente integrada e relacionada com o espaço em que se insere, e associada às influências da arquitectura popular portuguesa, embora interpretada pelos princípios do modernismo internacional. Cria assim uma linguagem arquitectónica própria, simples e útil, e ao mesmo tempo complexa, de enorme riqueza construtiva, material e cultural, com recurso às cores e texturas dos materiais tradicionais e contemporâneos, com a luz como elemento primordial da construção. A Casa de Chá da Boa Nova (Matosinhos, 1958-1963) (ilustração 71) é um belo exemplo dessa relação e fusão entre a sua arquitectura e o lugar. Ainda na sua obra, e associado ao programa vinícola que aqui importa estudar, destacam-se a Adega da Quinta do Portal (Sabrosa, 2008) (ilustração 72), e a Adega Mayor (Campo Maior, 2003-2007) (ilustração 73), seleccionada para este estudo. 91
GIANGREGORIO, Guido – Álvaro Siza, Imaginar a evidência. 2ª ed. Lisboa: Edições 70, 2009. p. 17. 107
75. Implantação da Adega Mayor.
108
A Adega Mayor situa-se no concelho de Campo Maior (ilustração 74), no sul do país. O lugar, com valores naturais e patrimoniais excepcionais, é marcado pela horizontalidade da topografia, suave, ondulada, composta por colinas e montes alentejanos e pontuada por espelhos de água para uso agrícola. A fertilidade do território propicia a actividade agrícola e vitivinícola que funciona como forma de manutenção e ordenação deste território, onde predominam os vinhedos e os sobreiros.92 Embora a sua envolvente predominante seja uma paisagem agrícola e vinícola, na sua vizinhança existe uma unidade industrial de torrefacção de café. A adega é uma implantação nova no lugar, de inspiração na arquitectura regional alentejana e em relação com essa envolvente. “Siza espraia o seu volume numa das colinas da propriedade, evocando a linearidade e a unicidade dos “montes alentejanos”, (…) “o edifício assume uma monumentalidade próxima da de uma fortaleza ou de um mosteiro, emergindo na planície como um guardião de preciosos tesouros “sacros””93 É com um sentido de total respeito pela paisagem – enquanto património natural e cultural – que o arquitecto Álvaro Siza Vieira desenvolve o projecto e obra da adega, pois, como ele afirma, “não é fácil encontrar a oportunidade de construir no interior de uma paisagem bela e incólume. E é também uma enorme responsabilidade.”94 A implantação (ilustração 75) é determinada por uma estrada de acesso à propriedade, relacionada com a indústria cafezeira – e respectivo museu – e ao mesmo tempo pela existência de um afloramento argiloso, cavado e utilizado como depósito de entulho. Assim, o volume rectangular, maioritariamente de dois pisos, é encastrado no suave declive do terreno, permitindo o acesso aos dois pisos, respeitando a integridade do território envolvente que permanece aparentemente inalterado. Neste sentido, pode dizer-se que esta intervenção no lugar está em sintonia com a orientação da Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural,95 que defende a preservação da paisagem enquanto bem patrimonial. Apesar do incontestável valor morfológico e arquitectónico desta adega, de “(…) um arquitecto de cujo lápis têm saído alguns dos edifícios mais marcantes dos 92
Câmara Municipal de Campo Maior. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível na internet em: <http://www.cm-campo-maior.pt/> 93 GRANDE, Nuno – “Esfinge Mayor” In GUERRA, Fernando – Adega Mayor. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível na internet em: <http://ultimasreportagens.com/mag/entrada.html>. p. 13. 94 SIZA, Álvaro – “A adega” In GUERRA, Fernando – Adega Mayor. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível na internet em: <http://ultimasreportagens.com/mag/entrada.html>. p. 10. 95 Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural. [em linha]. UNESCO. 1972. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.igespar.pt/ media/uploads/cc/ConvencaoparaaProteccaodoPatrimonioMundialCulturaleNatural.pdf> 109
76. Esquema programático da adega.
77. Recepção.
78. Sala de reuniões.
79.Nave das barricas.
80. Jardim.
110
nossos tempos (…)”96, o que importa estudar e aprofundar para esta investigação, além da reabilitação no sentido de apropriação territorial e promoção patrimonial, é o programa vinícola de uma adega contemporânea, pensada e desenhada de acordo com as necessidades técnicas, tecnológicas e arquitectónicas actuais, sem as eventuais limitações de uma construção preexistente. Com este propósito, ao estudar o projecto, verifica-se que o programa pode ser dividido em três grupos de usos principais (ilustração 76), como o de administração e gestão, o de produção e o de promoção turística. Aos usos de administração, podem associar-se essencialmente a recepção (ilustração 77), o vestíbulo, os escritórios (ilustração 78) e os vestiários. Estes espaços, distribuídos em dois pisos do volume, localizados no topo de acesso à adega, estão inter-relacionados por escadas e circulações. O mármore preenche os pavimentos e os lambris, alternado com a madeira dos soalhos, e as paredes e os tectos são estucados, conferindo qualidade e conforto aos espaços. Todas as áreas destinadas ao processo de transformação da uva em vinho, desde a recepção, o desengace e o esmagamento, a fermentação, até ao armazenamento e envelhecimento (ilustração 79), ao engarrafamento e à expedição do vinho, estão associados ao programa de produção, organizados segundo o processo de vinificação. Contrastando com os espaços de gestão, na sua maioria, estes espaços apresentam um pé-direito duplo e são acabados com betão aparente, com a excepção do laboratório que adquire características específicas de higiene. Situados no topo de acesso à adega, surgem a loja, a copa e a sala de provas com vista para o jardim localizado na cobertura, aberto sobre paisagem alentejana (ilustração 80) e as vinhas, destinado em exclusivo à promoção do vinho, nomeadamente pelos visitantes do universo do enoturismo.97 Comuns a todos os programas, e necessários ao funcionamento da adega, encontram-se instalações sanitárias, espaços de geradores e depósitos de água, em pontos estratégicos da adega. A Adega Mayor é um excelente exemplo de relação e integração com o lugar, permitindo estimular a sua valorização, preservação e conservação ao logo do tempo. É também importante realçar neste exemplo de arquitectura vínica a sua organização programática, que embora seja em sectores, os diferentes programas cruzam-se em
96
NABEIRO, Rui – “Adega Mayor” In GUERRA, Fernando – Adega Mayor. [em linha]. [consultado em Outubro 2011]. Disponível na internet em: <http://ultimasreportagens.com/mag/entrada.html>. p. 8. 97 SIZA, Álvaro – “Memória descritiva” In GUERRA, Fernando – Adega Mayor. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível na internet em: <http://ultimasreportagens.com/mag/entrada.html>. p. 78 a 80. 111
81.Esquiço da reconversão do Moinho.
82. Esquiço da reabilitação e ampliação da Adega Casa da Torre.
83. Esquiço da construção da Adega Mayor. 112
pontos úteis e necessários, permitindo o funcionamento contínuo, equilibrado e articulado de toda a adega, e da adega com a sua envolvente.
A investigação e interpretação de três obras de arquitectura revelam princípios estratégicos e metodológicos de actuação distintos que, no entanto, se completam e articulam, tendo como objectivo a compreensão e absorção de cada lição. É importante realçar que apesar das propostas e obras terem conceitos e ideias distintos, revelam ter uma disciplina ideológica, instrumental e profissional que vai ao encontro das cartas e convenções internacionais sobre o património, revelando capacidades e qualidades arquitectónicas, instrumentais e culturais indissociáveis, quer na sua relação com a paisagem quer na sua relação espacial, funcional e material. Na Reconversão do Moinho (ilustração 81) adquire-se um conhecimento mais próximo das regras do restauro, embora não o seja, e percebe-se a capacidade de adaptação e transformação dos espaços, sem os descaracterizar. Na Reabilitação e ampliação da Adega Casa da Torre (ilustração 802, onde o tema da exploração e produção vitivinícola já está associado, estuda-se a necessidade de ampliação, com integração e continuação espacial e temporal. Nestes dois exemplos, é visível a importância da materialidade na afirmação das intervenções e na reabilitação das construções. Na Adega Mayor (ilustração 83), entre a reabilitação do lugar e a integração da arquitectura de raiz, aborda-se o programa funcional e formal vinícola de uma adega contemporânea, sem as restrições e condições de uma preexistência. No seu conjunto, estes casos de referência permitem orientar e sustentar um programa de usos e formas vitivinícolas que respondam às vontades e necessidades contemporâneas, e que ao mesmo se ajustem à realidade da arquitectura popular e vernacular, respeitando os seus valores e a sua verdade e identidade singular, permitindo a sua continuação e evolução no tempo.
113
V_ Caso de estudo Uma Adega em Casas Novas
Caso de estudo da Adega em Casas Novas é o capítulo onde se aplicam os conhecimentos contidos e adquiridos na investigação produzida anteriormente, no universo dos princípios orientadores das cartas e convenções, e dos teóricos que se dedicaram a esta temática, com a realização de um estudo e projecto de reabilitação e ampliação em contexto rural e vernacular. É necessário um desenvolvimento e enquadramento programático ao tema, relacionado com a arquitectura de produção e promoção vinícola, abordando o espaço formal e funcional de uma adega e o conceito do enoturismo. É também indispensável caracterizar e interpretar o lugar de intervenção, do concelho e cidade de Chaves à aldeia de Casas Novas, especialmente a sua arquitectura popular e os seus interesses culturais e sociais, enquadrando as opções e soluções tomadas. 117
84. Esquema de produção vinícola. 118
V.1_ Enquadramento programático V.1.1_ Adega enquanto espaço de produção e promoção do vinho As adegas contemporâneas constituem, para além de uma construção de produção vinícola, uma manifestação e actuação turística, tanto pelo interesse pelo vinho como pelo interesse patrimonial e cultural dos lugares. Enquanto exploração e produção vinícola, a adega requer características espaciais e funcionais específicas – como qualquer arquitectura – directamente relacionas com o processo de transformação da uva em vinho. Importa, então, antes de qualquer gesto na concepção e organização de uma adega, adquirir um conhecimento sobre o processo de transformação, produção e comercialização do vinho. Neste sentido, com base nos conhecimentos recolhidos na AESBUC98, na Sogrape Vinhos99 e na dissertação Adegas contemporâneas, um novo discurso na arquitectura vernacular ou o boom do Eno-arquitecturismo?100, procura-se compreender as principais etapas necessárias na produção vinícola (ilustração 84). Numa primeira abordagem, verifica-se que existem diferentes métodos de vinificação, que correspondem a diferentes tipos de vinho, tais como o branco e o tinto, o verde e o maduro, o do Porto e o da Madeira, o espumante, entre outros. Contudo, após um estudo mais aprofundado, entende-se que os espaços necessários à sua produção são os mesmos, pois são o tipo de uva e o processo de vinificação necessário que especificam cada vinho, para além da localização geográfica e do clima do lugar de plantação.101 A vindima, o transporte e o desengace da uva são as primeiras fases de produção do vinho. Segue-se o esmagamento e a prensagem das uvas, de onde é extraído o seu sumo. A fermentação é o processo natural pelo qual o açúcar do sumo de uva é transformado em álcool, desencadeando a libertação de gases. Após o período de fermentação, é necessário proceder-se a uma prévia clarificação – 98
Associação para a Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica. [em linha]. [consultado em 09 de Fevereiro 2012]. Disponível em: <http://www.aesbuc.pt/twt/ETGI/MyFiles/MeusSites/Enologia/2005/index.htm> 99 Sogrape Vinhos. [em linha]. [consultado em 09 de Fevereiro 2012] Disponível na internet em: <http://www.sograpevinhos.eu> 100 MARGARIDO, Raquel Joana Freitas Gírio – Adegas contemporâneas, um novo discurso na arquitectura vernacular ou o boom do Eno-arquitecturismo? Coimbra: Departamento de Arquitectura da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. 2009. Dissertação para a Obtenção de Grau de Mestre em Arquitectura. pp. 18 a 28. 101 Associação para a Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica. [em linha]. [consultado em 09 de Fevereiro 2012]. Disponível em: <http://www.aesbuc.pt/twt/ETGI/MyFiles/MeusSites/Enologia/2005/index.htm> 119
85. Espaço de recepção, desengace e esmagamento.
86. Área de fermentação.
87. Nave das barricas.
88. Sala de controlo de qualidade.
89. Espaço de engarrafamento e rotulagem do vinho. 120
eliminação das impurezas do vinho – através da filtragem ou da colagem, de modo a que se assegure a sua estabilidade, evitando o risco de uma nova fermentação. O vinho é então transferido para as barricas – em madeira ou em aço inoxidável – onde permanecem em estágio ou ficam a envelhecer. Depois do período de maturação, o vinho é engarrafado. Fruto da evolução nos processos de produção vinícola, com a necessidade de responder a progressivos e elevados padrões de qualidade, durante todo o processo de vinificação deve ser feito um controlo de qualidade ao vinho. Esta cadeia de espaços necessários e inter-relacionados entre si, que segue o processo de transformação da uva em vinho, desde a recepção da uva até à expedição do vinho, gera uma organização espacial específica, e exige, na criação e organização de uma adega, o conhecimento de todas as especificidades de cada fase de produção do vinho, pois estas definem os espaços fundamentais da adega e as suas características arquitectónicas determinadas pelo seu uso, e caracterizadas pela escala, pelos materiais e pela luz. Seguindo o encadeamento e desenvolvimento da produção vinícola, uma adega tem uma área de recepção, desengace, esmagamento e prensagem da uva (ilustração 85), em que as suas especificidades são essencialmente na organização funcional e sequencial do espaço, condicionando particularmente a sua criação espacial e formal, tendo que respeitar a escala, a higiene e a segurança, valores fundamentais e transversais a todos os espaços. A zona de fermentação (ilustração 86) assume características mais específicas e relevantes, resultantes do seu uso. Obriga a uma boa fenestração, proporcionando a constante renovação de ar e a expulsão de gases produzidos no processo, nocivos e perigosos para o homem. A nave das barricas (ilustração 87), onde é armazenado e envelhecido o vinho, é um espaço específico na sua relação com a temperatura e a humidade, devendo ser estável e fresca, evitando deste modo a sua evaporação. A forma como as barricas são dispostas é também importante, estas não devem ter contacto com o solo, evitando assim mudanças bruscas de temperatura. A luz, mínima, deve ser constante e a essencial ao trabalho na nave. Com estas características, define-se como um espaço fechado, recolhido, silencioso, de repouso do vinho. O laboratório de controlo de qualidade detém igualmente particularidades, não estando estas relacionadas com o vinho, mas sim com as especificidades de um laboratório científico (ilustração 88), expressas pela escolha dos materiais que devem ser duradouros e salubres. O engarrafamento e rotulagem (ilustração 89) finalizam o ciclo de produção vinícola, 121
90. Visitação das vinhas.
91. Apanha da uva.
92. Pisar da uva.
93. Prova do vinho.
94. Visita de conhecimento da regiĂŁo.
122
com o intuito da expedição. Esta etapa final exige uma nave ampla, mais mecanizada e autónoma, em que o vinho é a matéria-prima que a distingue de qualquer outra produção. Como referido inicialmente, hoje uma adega é mais do que a exploração e produção de vinho. É, também, uma atracção turística de exaltação do vinho e, ao mesmo tempo, de promoção e animação do lugar e da cultura em que a adega está inserida. Deste modo, além dos espaços de produção, exige-se um programa de carácter lúdico, onde devem estar presentes a sala de degustação de vinhos, a sala gastronómica e a loja. Este turismo classifica-se como enoturismo, pela sua directa relação com o vinho, não sendo no entanto este o seu único factor de interesse. V.1.2_ Enoturismo A “visitação a vinhedos, adegas, festivais de vinho e mostras de vinhos para degustação e ou experimentação dos atributos de uma região de vinho, são os principais factores de motivação para os visitantes”102, como defende Michael Hall para classificar o enoturismo. Neste sentido, enquanto conceito que abarca a exploração e produção vitivinícola e o turismo, determinado essencialmente pelo interesse público pelo conhecimento sobre o vinho, importa também o interesse pelas suas regiões. É nestas, geralmente em lugares de meio rural, que o visitante descobre o ambiente de produção do vinho – visita a vinha (ilustração 90) e a adega, apanha e pisa a uva (ilustração 91 e 92) – participando e convivendo em festas e eventos vínicos, onde prova e conhece o vinho (ilustração 93) e descobre a relação com a gastronomia regional. O visitante e utente pode fluir pelo espaço rural, descobrindo e apreciando o património natural e cultural (ilustração 94), através dos habitantes, da arquitectura vernacular e popular, da história, das tradições e costumes, da gastronomia, do artesanato, entre outros valores identitários de um povo e de uma região. Deste modo, pode definir-se o turismo vinícola como uma tipologia apoiada nos meios rurais e ambientes vernaculares onde os turistas estão interessados no conhecimento sobre o vinho, mas também motivados pela experiência do meio rural.
102
HALL, C. Michael – Wine Tourism around the World: Development, Management and Markests. 3ªed. Nortolk: Great Britain by Biddles, 2002. p.3. Tradução livre: “visitation to vineyards, wineries, wine festivals and wine shows for which grape wine tasting andlor experiencing the attributes of a grape wine region are the prime motivating factors for visitors” 123
95. Adega Dominus, Napa Valley, Calif贸rnia . Arquitectos Jacques Herzog e Pierre de Meuron.
96. Quinta do Vallado. Douro. Arquitectos Francisco Vieira de Campos e Cristina Guedes.
124
Como meio de expansão e promoção deste tipo de turismo, foi criada em 2006 a Carta Europeia do Enoturismo,103 no âmbito da Rede Europeia das Cidades do Vinho. O documento defende que os territórios do vinho têm um papel fundamental na preservação e conservação da região, permitindo dar-se a conhecer aos visitantes, ao mesmo tempo que melhora a qualidade de vida aos seus habitantes. O enoturismo deve, por isso, ter um desenvolvimento apoiado e sustentado por uma gestão ecológica, social e cultural. Neste sentido, a carta tem como objectivo a promoção do vinho e do lugar, contribuindo para o progresso de quem vive e trabalha nesses territórios. Para tal, ajuda a criar uma estratégia comum para desenvolver o turismo com um programa de actividades, que devem abarcar os subsistemas do enoturismo, que se entendem por território, cultura vinícola e turismo. Esta estratégia deve ter como base a melhoria contínua da qualidade da oferta turística, com respeito pela capacidade do território, controlando o fluxo e a consciencialização social, pela defesa e valorização de todo o património, desde a divisão dos campos e a sua cultura, às construções de habitação e produção associados aos modos de vida e às suas tradições, que definem a paisagem do lugar. O desenvolvimento económico, social e cultural, e a protecção e melhoria das condições de vida dos habitantes, são também pontos estratégicos importantes. Em suma, pode dizer-se que o enoturismo é um importante instrumento de reabilitação e preservação do património histórico, natural e cultural, permitindo que este seja transmitido às gerações futuras. No entanto, face a todo este interesse e ao consequente desenvolvimento em torno da produção vinícola – associado a um lugar – e toda a procura turística, lúdica e cultural que conjuga estes dois factores – vinho e turismo – as adegas têm a necessidade de criar outros factores de atracção. A arquitectura é, cada vez mais, usada como imagem da adega e do seu vinho – nomeadamente pelo uso identitário e publicitário, designadamente nos rótulos de garrafas, entre outros produtos – e da sua região, convertendo-se cada vez mais num agente de promoção e sustentação desta tipologia de turismo. A Adega Dominus (ilustração 95) dos arquitectos Jacques Herzog e Pierre de Meuron e a Adega Quinta do Vallado (ilustração 96) dos arquitectos Francisco Vieira de Campos e Cristina Guedes são exemplos da importância da arquitectura no enoturismo. Embora se implantem em lugares com características diferentes, ambos os projectos e obras 103
Carta Europeia de Enoturismo. [em linha]. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.turismodeportugal.pt/Portugu%C3%AAs/AreasAtividade/ProdutoseDestinos/ReuniaoTecnicaEnot urismo/CataEuropeiadoEnoturismo/Anexos/Carta%20Europeia%20Enoturismo.pdf> 125
97. Limites do concelho de Chaves. 98.
98. Localização de Chaves em Portugal. 97.
99. Freguesias do concelho de Chaves.
126
procuram a integração e identificação com a paisagem, ao mesmo tempo que procuram a exaltação do vinho e da sua região.
V.2_ Enquadramento territorial V.2.1_ Chaves Situado no extremo Norte de Portugal continental, Chaves confronta-se com a Galiza na fronteira com Espanha (ilustração 97). É um concelho do distrito de Vila Real, situado na região do Alto Tâmega, delimitado a Este pelos municípios de Vinhais e Valpaços, a Sul por Vila Pouca de Aguiar, e a Oeste por Boticas e Montalegre (ilustração 98). Com 41.444 habitantes (Censos 2011), o concelho é constituído por 51 freguesias – entre elas Redondelo onde se insere o caso de estudo – dispersas em 591,32 km2 de área territorial. Os aglomerados populacionais mais importantes (ilustração 99) são a vila de Vidago e a cidade de Chaves, sede de concelho. Ligada ao Sul pela auto-estrada A24 e ao litoral pela A7, atravessada pela estrada nacional N103 que liga Bragança a Braga, a menos de 8 km da fronteira com Espanha, e com um aeródromo, Chaves e o seu concelho, estão bem conectados com o restante país, contrariando a interioridade e aparente isolamento que a sua geografia revela.104 A sua localização geográfica insere-a numa importante rota comercial nacional e internacional, apoiada pelo Parque Empresarial de Chaves, que integra um parque de actividades, um mercado abastecedor e um centro de logística.105 O município de Chaves é amplamente marcado pela sua diversidade natural e cultural. No âmbito natural, essa multiplicidade é expressa pelo seu relevo diversificado, o seu clima particular, e a sua fauna e flora específicas, preponderantes em diversas condições estratégicas e políticas, que serão aprofundadas no texto sempre que se justifique. No contexto patrimonial e cultural, Chaves é rica na sua história, assinalada pelas várias civilizações que nela se fixaram. Prova desta riqueza é o vasto património cultural existente, disperso um pouco por todo o território, onde se destaca o centro histórico da cidade de Chaves.
104
Câmara Municipal de Chaves. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.cm-chaves.pt pdf> 105 Idem, ibidem. 127
100. Ruínas das Termas Romanas.
101. Ponte Romana de Trajano.
103. Igreja de Santa Maria Maior.
104. Forte de S. Neutel.
106. Câmara Municipal de Chaves.
107. Paço dos Duques de Bragança. 128
102. Torre de Menagem.
105. Pelourinho de Chaves.
Chaves é hoje um concelho em crescimento e desenvolvimento, graças ao aproveitamento de toda a sua variedade natural e cultural. As suas paisagens e o património são usados como promoção turística, recorrendo a uma diversidade de espaços públicos e uma rede de museus, que exibem a sua história e memória. As ruínas das Termas Romanas (ilustração 100) – encontradas recentemente – a Ponte Romana de Trajano (ilustração 101), a Torre de Menagem e o jardim envolvente (ilustração 102), a Igreja de Santa Maria Maior (ilustração 103), o Forte de S. Neutel (ilustração 104), o Pelourinho de Chaves (ilustração 105), a Câmara Municipal de Chaves (ilustração106), e o Paço dos Duques de Bragança (ilustração107), onde está instalado o Museu da Região Flaviense que expõe a sua história, desde o Paleolítico até às obras do arquitecto e pintor Nadir Afonso, são alguns dos monumentos e equipamentos colectivos que se encontram no centro histórico de Chaves. A par destas atracções históricas e patrimoniais, são igualmente importantes, enquanto atracção turística, as actuais Termas de Chaves que são hoje a imagem de promoção do concelho. Com menor relevância, mas não menos importante para a promoção de Chaves, encontra-se o turismo em espaço rural, como fonte de conhecimento da natureza e das tradições populares da região. Neste sentido, as várias aldeias de Chaves possuem um enorme património popular e vernacular, caracterizado por aglomerados concentrados de construções associadas à habitação, produção e religião, e à natureza, que respondem às necessidades da comunidade. Como resultado da actividade humana associada à agropecuária e à agricultura, enquanto meio de subsistência, a fauna e a flora têm características específicas. A paisagem natural de Chaves tem várias espécies de invertebrados e vertebrados. No entanto, importa salientar as raças autóctones relacionadas com a auto-suficiência popular e vernacular – equinos, caprinos, ovinos, bovinos e suínos – perfeitamente adaptadas às condições naturais da região. Na flora, embora também com enorme diversidade florestal de influência atlântica e mediterrânica, predomina a vegetação relacionada com a ocupação humana, que serve de alimentação animal, e também para consumo humano.106 A aldeia de Casas Novas é um exemplo representativo das características naturais, culturais e tradicionais populares. Beneficiando do facto de Chaves se apropriar do seu património cultural e natural, com o intuito de o promover e de se dar a conhecer através do turismo,
106
Câmara Municipal de Chaves. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.cm-chaves.pt pdf> 129
108. Mapa com Regiões Vitivinícolas em Portugal continental, com destaque para a região de Trás-osMontes: a) Chaves; b) Valpaços; c) Planalto Mirandês.
109. Vista aérea da Aldeia de Casas Novas. 130
importa abordar o tema em estudo – a reabilitação e ampliação do existente – associado à exploração e produção vinícola. Chaves é uma região demarcada de vinho (ilustração 108), com tradição na cultura do vinho, pois “já durante a ocupação dos romanos se cultivava a vinha e se produzia vinho na região de Trás-os-Montes, tornando-se estes conhecidos e apreciados pelas suas qualidades.”107 Com características desiguais entre si, os vinhos da região de Trás-os-Montes são a expressão da diversidade territorial. O relevo é marcado por montes, serras, pequenas elevações e colinas que delimitam o vale do Tâmega, designado por Veiga de Chaves. O clima, de influência atlântica e continental, caracteriza-se por invernos frescos e verões moderados. No inverno, a precipitação é elevada (de 700 a 1200 mm), onde a formação de geada e de orvalho é significativa, e a ocorrência de neve nas terras com altitudes superiores ou iguais a 800 metros é normal108. Para além de Chaves, Valpaços e o Planalto Mirandês, são também sub-regiões que produzem vinho de Denominação Original Protegida (DOP), geralmente designado como vinho regional transmontano, contribuindo para o seu crescimento e divulgação. Fazendo uso da tradição vitivinícola da região de Trás-os-Montes, à qual Chaves pertence, e do seu património popular, pretende-se, com esta intervenção de reabilitação, estimular Chaves para um novo modo de promover o seu património natural e cultural de carácter vernacular – pela cultura do vinho, até então pouco utilizada – colocando-a ao nível de outras regiões vitivinícolas, interligadas pelas rotas do vinho. Assim, ao dar-se a conhecer Chaves rural, estimula-se a preservação da memória e da história desses lugares e dessas gentes. V.2.2_ Aldeia Casas Novas Casas Novas (ilustração 109), é uma aldeia da freguesia de Redondelo que dista 11,8 km a Sudoeste da cidade de Chaves à qual se liga pela estrada municipal N103. Está igualmente próxima de Boticas (12,7 km), e ainda próxima do nó de acesso à A24.
107
Instituto da Vinha e do Vinho. [em linha]. [consultado em 12 de Janeiro 2012]. Disponível em: <http://www.ivv.min-agricultura.pt/np4/home.html> 108 Câmara Municipal de Chaves. [em linha]. [consultado em 07 de Outubro 2011]. Disponível em: <http://www.cm-chaves.pt pdf> 131
110. Ruas em Casas Novas.
111. Casa de dois pisos.
112. Hotel Rural Casas Novas.
113. Solar dos Vilhenas.
114. Capela N. Sr. dos Aflitos. 132
115. Capela de S. Bernardino.
Implantada numa pequena colina com uma altitude compreendida entre os 480 e os 500 metros, tem uma topografia pouco acentuada, ainda influenciada pelas margens do rio Tâmega, fazendo com que o território seja fértil e propício a diferentes tipos de cultivo. Essa diversidade de terrenos agrícolas – usados para plantação de legumes, de pomares, de vinhas e de pastagens e terrenos devolutos, cria uma paisagem rica, com diferentes cores e ritmos. Ainda importante no desenho desta paisagem assinala-se a divisão dos campos, umas vezes com muros baixos, outras com caminhos vicinais. O povoamento de Casas Novas é concentrado, composto por construções de habitação, produção e religião, directamente relacionadas com os modos de vida social, à base da exploração agropecuária, agrícola e vitivinícola, expressão do seu carácter vernacular e popular. Neste contexto rural, podem ainda encontrar-se exemplos de arquitectura erudita, em menor quantidade e, por consequência, com menor presença no conjunto da aldeia. As ruas, estreitas e sinuosas, pavimentadas com granito ou em terra batida (ilustração 110), são definidas por construções – em pedra, madeira e barro – constituídas maioritariamente por habitações de dois pisos (ilustração 111). O rés-do-chão destina-se aos trabalhos de produção e de criação animal, e o piso superior à habitação. O seu acesso faz-se por uma escada exterior e, por vezes, por uma varanda associada. Apesar da dualidade de funções descrita, existem construções unicamente destinadas à agropecuária, agricultura e viticultura. Além destas construções correntes de habitação e produção, as ruas são ainda definidas por pequenos largos marcados por fontes de água – directamente relacionados com a vivência do lugar – e também por edificações de carácter erudito, como a Escola Primária, o Solar Viscondessa do Rosário, recentemente reconvertido em Hotel Rural Casas Novas (ilustração 112), o Solar dos Vilhenas (ilustração 113), e de carácter religioso, como a Capela de Nossa Senhora dos Aflitos (ilustração 114) e a Capela de S. Bernardino (ilustração 115). Além destes valores expressivos da humanização da paisagem e da relação do homem com a natureza em resposta às suas necessidades económicas e sociais, existem também outros elementos que permanecem e definem o ambiente rural da aldeia. Ao percorre-la, o cheiro da terra e da criação animal, revelam que a agricultura e a agropecuária ainda subsistem. A presença de tractores que substituíram as tradicionais ferramentas agrícolas, e o gado nas ruas – embora menos expressivo
133
116. Vista panorâmica sobre o sĂtio, o edificado e a vinha. 134
que noutros tempos – reafirmam a sua continuidade, embora agora como actividades secundárias. As festas e romarias que preservam e demonstram o modo de vida social popular, estão também presentes, assim como nas aldeias vizinhas, que em cumplicidade demonstram a riqueza de uma região. Aqui, em Casas Novas destacase, a festa em honra de S. Bernardino, celebrada a 20 de Maio. A gastronomia é também um bom promotor de uma cultura, e aqui na aldeia destaca-se o fumeiro e o folar. Beneficiando da proximidade com Chave e Boticas, podem destacar-se ainda dois eventos de promoção da região rural. Sabores e Saberes de Chaves, um evento anual cujo objectivo é dar a conhecer a gastronomia, as tradições, os cantares e danças populares da região, e também a Feira Gastronómica do Porco e a rede de tabernas na vila de Boticas. Como acontece na maioria das aldeias rurais, e apesar dos valores mencionados, característicos do seu ambiente natural e patrimonial, e da proximidade a Chaves e Boticas, esta aldeia apresenta um contínuo processo de despovoamento e enfraquecimento económico causado pelo abandono das gerações mais novas e, por consequência, pelo envelhecimento das gerações actuais. Este facto reflecte-se no estado de conservação das construções e dos terrenos associados que permanecem abandonados e, cada vez mais, deteriorados e degenerados. Neste sentido, existe a necessidade de criar um valor distinto e atractivo que, em cumplicidade com as aldeias mais próximas, atraiam novos visitantes para fixação temporária, e posteriormente novos habitantes.
Fazendo uso da reabilitação enquanto especialidade da arquitectura, e como instrumento de reanimação e valorização dos lugares e dos seus valores, recorre-se a um conjunto de edificações (ilustração 116) onde a intervenção seja motor de revitalização. Aliando a promoção turística de Chaves à presença do Hotel Rural Casas Novas e aos valores de interesse cultural, patrimonial e natural da aldeia de Casas Novas anteriormente mencionados, em cumplicidade com as aldeias vizinhas, torna-se evidente que a resposta à necessidade de desenvolvimento económico, social e cultural da aldeia passa por um programa relacionado com o turismo. A forte presença de campos vitivinícolas que confirmam a tradição vinícola da região, e a existência de um conjunto de imóveis relacionados com a exploração e 135
117. Vista aĂŠrea do conjunto vitivinĂcola.
118. Coberto. 136
produção de vinho, em avançado estado de degradação, confirmam a escolha do lugar e definem a estratégia de intervenção. Neste contexto, a reabilitação de um agregado de construções associadas a uma tradição, como atracção turística, além do desenvolvimento económico e consequentemente cultural e social, pretende fomentar a preservação e conservação patrimonial, motivados pela habitação permanente dos trabalhadores, ou temporária dos turistas, permitindo assim a sua continuidade para as gerações futuras. Propõem-se, então, a reabilitação e ampliação de uma pequena adega vinícola e vinha associada abandonadas, actualizando a sua função de exploração e produção vinícola para os padrões de qualidade e conforto actuais, modificando-a e transformando-a num ponto de enoturismo, exaltando e promovendo a tradição local e regional. V.2.3_ Conjunto vitivinícola e agrícola O sítio (ilustração 117) é composto por um conjunto de diversas construções, com diferentes usos e escalas, que configuram um pátio entre si. Contíguos, e a sustentarem a existência desta exploração e produção vitivinícola, encontram-se terrenos vitícolas, marcados pela horizontalidade e linearidade da implantação da vinha, limitada por pequenos muros e caminhos vicinais. Numa relação de proximidade com este conjunto vitivinícola e agrícola, separada pela rua de acesso com o mesmo nome, está a Capela de S. Bernardino que, segundo os populares, foi mandada instituir e construir como agradecimento à protecção das colheitas. O granito, a madeira e o barro são os materiais que predominam na edificação e materialização deste conjunto popular e vernacular, à semelhança do que acontece na aldeia, identificando e marcando a sua paisagem. O granito constrói as paredes que se revelam robustas, de aparência inacabada e tosca, e a madeira, mais leve e macia, faz os pisos e a estrutura das coberturas, para além das portas e janelas. O barro das telhas, marselha e meia cana, faz os telhados essencialmente de duas águas. Junto à vinha, encontra-se um coberto porticado (ilustração 118), voltado para o pátio e encerrado para a vinha. Existe ainda, associado ao terreno vinícola e agrícola, uma construção de pequena escala maioritariamente encerrada, com pequenos vãos para entrada de ar e uma porta relacionada com o pátio. Aqui 137
119. Lagares.
120. Adega e palheiro.
121. Armazém e sequeiro.
122. Forno e arrecadação
123. Pátio e espigueiro. 138
encontram-se dois lagares (ilustração 119) e um canal em granito para o escoamento do vinho, ligado por um vão à adega, localizada na construção contígua (ilustração 120). Essa edificação de dois pisos está relacionada com a rua de acesso ao conjunto agrícola e vinícola. O rés-do-chão, encerrado e com um acesso directo da rua, é a adega, dividida em dois espaços, posteriormente adaptados a pocilga. O andar superior, acessível por uma escada interior em granito, tem o piso em madeira e é aberto, naturalmente ventilado e iluminado, respondendo à função de palheiro. Relacionada com a mesma rua, existe outro volume, maior, parcialmente dividido e organizado em dois pisos (ilustração 121. O rés-do-chão é dividido em dois armazéns e o piso superior constitui o sequeiro, amplo e aberto em dois alçados. Adossada a este corpo, existem mais duas edificações de um piso (ilustração 122), directamente relacionadas com o pátio, com as funções de forno e de arrumo. O pátio (ilustração 123), com dois acessos, funciona como sala exterior, de circulação e ligação à vinha e aos diferentes espaços de trabalho, respondendo às necessidades exigidas. Em terra batida, desnivelado, é limitado pelos volumes, mas também por muros baixos que fazem a divisão e separação da vinha. Apesar das diferentes escalas, articulações e relações com o lugar, reflexo da sua construção conforme os seus usos e necessidades, todas estas edificações organizam e resultam num conjunto vinícola e agrícola equilibrado, entre si e entre este e o lugar, representando bem o carácter da arquitectura popular e vernacular da aldeia. No entanto, apesar da sua riqueza formal e patrimonial, encontram-se degradadas e em risco de ruir, observando-se já a inexistência de alguns pavimentos e coberturas.
V.3_ Reabilitação e ampliação da Adega Casas Novas Partindo do contexto vernacular e rural em geral, e vitivinícola em especial, associado ao conceito de enoturismo, existiu a necessidade de se desenvolver um programa funcional e sequencial. Com base na pesquisa sobre a produção vitivinícola e o enoturismo, e relacionando com o estudo do projecto da Adega Casa da Torre da autoria do arquitecto Carlos Castanheira, e da Adega Mayor da autoria do arquitecto Álvaro Siza Vieira, foi definido e organizado um programa distribuído por três sectores: o de administração e gestão, o de produção e o de enoturismo.
139
124. Programa de administração e gestão.
125. Programa de produção vinícola.
126. Programa de enoturismo. 140
O programa de administração e gestão (ilustração 124), a que correspondem a recepção, o gabinete administrativo, a arrecadação e a cozinha, é organizado no antigo armazém e sequeiro, e o vestiário e balneário dos funcionários dispõe-se numa nova construção. O de produção (ilustração 125), composto pelo pátio de trabalho, o armazém agrícola, a recepção e esmagamento da uva, a prensagem e fermentação, o estágio e o controlo de qualidade, o envelhecimento do vinho, o engarrafamento e o embalamento do vinho, o armazém de expedição, divide-se entre a antiga adega e o lagar, e a nova edificação adjacente a Este. O programa de enoturismo (ilustração 126) – enquanto turismo especializado, com o propósito de conhecer a cultura do vinho e da sua região – abrange todos os espaços de produção. No entanto, a loja e a sala gastronómica, no sequeiro, e a sala de degustação, no palheiro, são espaços que respondem a esta valência programática. Utilizando o pensamento de Camillo Boito quando defende a diferença dos estilos e dos materiais, e a clara marcação das acções realizadas109, e recorrendo às cartas e convenções internacionais sobre o Património, a elaboração deste estudo e projecto procura ser coesa, desde a acção de organização e adequação dos usos aos espaços preexistentes, até à forma como estes se articulam e originam a sua ampliação. Fazendo uso das linhas de acção da Carta do Património Vernacular Construído, nomeadamente quando defende que a “adaptação e reutilização das estruturas vernaculares deve ser levada a cabo de modo a que respeite a sua integridade e configuração”110, a distribuição e organização funcional do programa, em equilíbrio com a escala da preexistência, procura a directa relação com algumas funções já existentes e também a melhor adequação dos espaços aos novos usos, aproveitando as capacidades e qualidades espaciais e materiais das construções. A apropriação do espaço é também inspirada e aconselhada na capacidade de adaptação espacial na reconversão do moinho do arquitecto José Gigante. Com este sentido, o coberto preexistente (ilustração 127) adopta a função de armazém agrícola, e pela sua necessidade de guardar as máquinas e ferramentas agrícolas, é encerrado com madeira.
109
CAPITEL, Antón – Metamorfosis de monumentos y teorias de la restauración. Madrid: Alianza Editorial. 1988. p.31 e 32. 110 Carta sobre o Património Construído Vernáculo. [em linha]. ICOMOS. 1999. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.international.icomos.org/charters/vernacular_sp.pdf> 141
127. Esquema de evolução de intervenção. Reabilitação. Legenda: 1. Armazém agrícola; 2. Espaço de fermentação do vinho; 3. Sala de controlo de qualidade; 4. Sala das barricas; 5. Sala de degustação; 6. Recepção e loja; 7. Gabinete administrativo; 8. Sala gastronómica; 9. Cozinha; 10. Loja.
128. Vista sobre o conjunto vinícola.
129. Vista sobre a capela S. Bernardino. 142
A edificação de transformação da uva em vinho (ilustração 127) mantém o programa anterior, validando os lagares e o canal em pedra de ligação à adega para escoamento do vinho, embora seja necessária a adaptação tecnológica, para o esmagamento e prensagem da uva, e a bombagem do vinho para as cubas. A área livre contígua permite ainda a colocação de uma prensa. A antiga adega actualiza a sua função. No rés-do-chão, instala-se a sala das barricas e a sala de controlo de qualidade. O seu carácter encerrado permite responder às exigências térmicas e lumínicas, mas também ao ambiente recolhido e calmo que o vinho exige. No piso superior – palheiro – com acesso pela escada preexistente na sala das barricas, surge agora a sala de degustação, com relação visual com a sala de controlo de qualidade. As suas características espaciais singulares – ventilação e iluminação – exigem que a preexistência, rasgada de Sul a Este, seja encerrada com madeira e vidro. Um ripado de madeira, sugerido fundamentalmente pelos espigueiros e sequeiros tradicionais, e desenvolvido na Adega Casa da Torre, foi a solução adoptada para filtrar a luz, e controlar a temperatura por meio da redução da incidência solar directa. Deste modo, é também conseguido um espaço de culto, um ambiente destinado à degustação do vinho, com apenas duas janelas, uma em cada fachada, relacionadas com o exterior, a Sul, com o conjunto vitivinícola (ilustração 128), a Oeste, com a Capela de S. Bernardino (ilustração 129). Mantendo os princípios de respeito na adequação de novos usos à preexistência, a construção que anteriormente foi armazém e sequeiro (ilustração 127), assume agora as funções de recepção, loja e gabinete no rés-do-chão. O andar superior é agora cozinha e sala gastronómica, apropriando-se da escala popular do espaço, que lhe confere um ambiente acolhedor e familiar, e das vistas sobre todo o espaço de exploração e produção vinícola. A multiplicidade de espaços nesta construção é permitida e conseguida pela sua configuração regular e liberdade espacial. No entanto, a necessidade de conexão interior entre os espaços originou a abertura de duas portas em paredes preexistentes, evoluindo e assumindo objectivos programáticos. Aproveitando o facto de, no rés-do-chão, existir um vão obstruído por uma pequena construção dissonante, demole-se e abre-se uma porta de ligação ao pátio. Uma pequena pála simboliza esta passagem para o pátio, e assume a contemporaneidade da acção. O antigo forno, adossado a esta construção, é agora a continuação da loja. Recorrendo ao ripado de madeira usado na sala de degustação, encerra-se a sala gastronómica. No entanto, por não ter as mesmas exigências térmicas e 143
130. Esquema de evolução de intervenção. Ampliação. Legenda: 1. Recepção da uva; 2. Engarrafamento e embalamento do vinho; 3. Armazém e expedição; 4. Espaço de apoio a funcionários; 5. Vestiário e balneário. 144
lumínicas que a adega, abre-se sobre o pátio e as vinhas. O necessário encerramento das fachadas cumpre as exigências e valências funcionais e, ao mesmo tempo, a expressão da linguagem vernacular e popular, com recurso a um material intemporal e à reinterpretação de uma técnica tradicional, como é defendido pela Carta sobre o Património Construído Vernacular111. Estas acções de conservação e reabilitação, com o sentido de adaptação ao uso contemporâneo, em sintonia com a Carta de Veneza, tiveram sempre presente o sentido de respeito pela preexistência através da conservação da sua identidade. Embora tenha existido a necessidade de adaptação de usos e materiais, em alguns espaços recuperados, mantêm-se os valores identitários da arquitectura popular e vernacular, com a manutenção da sua forma e escala, mas também pelas cores e texturas das estruturas e materiais preexistentes reutilizados e aplicados na solução adoptada. Distribuído e organizado o programa, verifica-se a insuficiência de área necessária para o completo funcionamento da adega. Esta circunstância determina o aparecimento de novas construções, de modo a permitir responder às novas necessidades programáticas que correspondem essencialmente à produção vinícola. Estas novas edificações são adições no tempo, à semelhança do que ocorreu no aglomerado de edificações e construções existentes, mas assumindo claramente a modernidade do seu tempo. A implantação do volume ampliado (ilustração 130) é a consequência de diferentes intenções. A de resposta a uma lógica de construção modular e sequencial, conforme as necessidades, e o prolongamento do programa de produção. A sua forma é o reflexo do modo de produção do vinho. Assume, na sua maioria, a industrialização da produção vinícola actual, definindo os espaços de engarrafamento e embalamento do vinho, armazém e expedição. No entanto, define também o espaço de recepção da uva, antecedido de um espaço exterior de trabalho, diminuindo o impacto da escala do volume. O espaço interior é livre, bem iluminado e com forte relação visual com o exterior. Independente desta ampliação, mas orientada pela direcção da vinha e no limite a Norte do terreno vinícola, surge outra construção de raiz, de menor escala (ilustração 130), de apoio aos funcionários, com o vestiário e balneário, e com um espaço de estar que se estende para o exterior. A tensão criada por estes dois
111
Carta sobre o Património Construído Vernáculo. [em linha]. ICOMOS. 1999. [consultado em: 25 de Janeiro 2011]. Disponível em: <http://www.international.icomos.org/charters/vernacular_sp.pdf> 145
131. Esquema de evolução de intervenção. Pátios. Legenda: 1. Pátio do visitante; 2. Pátio de trabalho; 3. Pátio de estar do trabalhador. 146
volumes cria um pátio de entrada para uma parcela agrícola que ainda pertence à propriedade em estudo. É apoiado nos princípios de restauro e conservação de Camillo Boito e na Carta de Veneza que as novas construções exigidas pela evolução dos usos no tempo, assumem a sua contemporaneidade e se distinguem da preexistência. No entanto, mantêm uma relação de equilíbrio e harmonia com o lugar, respeitando a escala das construções preexistentes, do lugar, e a sua relação com o todo. O espaço exterior (ilustração 131), definido pelas construções envolventes e pelos muros preexistentes, é um elemento comum, unificador e comunicador com todos os espaços. Apresenta diferentes momentos, essencialmente marcados por três pátios. Um pátio central, de forma poligonal definido pelas construções preexistentes, e de pendente irregular, é agora regularizado e dirigido ao visitante. Um novo pátio e o seu acesso, com um carácter mais regular, é destinado ao trabalho, relacionado com as vinhas e os volumes de produção. Permite a circulação de máquinas agrícolas e o transporte de expedição do vinho. Um terceiro pátio, ligado ao vestiário, balneário e ao espaço de estar de uso dos funcionários, está intimamente relacionado com a vinha. A vinha mantém a sua implantação e orientação, realçando e preservando o relevo natural do sítio, e marcando e identificando a paisagem. O lugar e a sua natureza são também respeitados, na medida em que o seu uso agrícola e vitivinícola é mantido, assim como a orientação das vinhas e o relevo associado, como aponta a Convenção para a Protecção do Património Mundial, Cultural e Natural, na definição global de património, que procura manter a sua estrutura e a identidade natural e cultural do lugar. Materializando e pormenorizando a ideia (ilustração 132), o granito, a madeira e o barro, materiais preexistentes, predominam no conjunto, evocando os valores culturais e naturais das construções de cariz popular e vernacular. Simultaneamente, recorrem-se a técnicas e materiais actuais – betão armado aparente e reboco – como forma de revelar os diferentes tempos da intervenção. Esta distinção material é apoiada pela conciliação dos princípios definidos nas cartas de restauro, em sintonia com os princípios de Camillo Boito, na procura da harmonia material e formal. O granito, elemento estrutural, continua aparente no exterior e no interior das construções preexistentes. No entanto, existem espaços que, por actualização dos padrões de qualidade, exigência e valência técnica – cozinha, sala de controlo de 147
132. Materialização e pormenorização.
148
qualidade e instalações sanitárias – requerem outro revestimento interior, assumindo a sua contemporaneidade e salubridade. A madeira é igualmente importante, em “que o exterior é tantas vezes parte do interior, sem problemas de pontes térmicas obsessivas; que a viga se confunde com o caixilho e o caixilho funciona, também, como viga; o tecto é chão e o chão tecto, assim sem mais nada”112. Assume um protagonismo estrutural e espacial importante na construção dos pisos das salas de degustação e de gastronomia, e de todas as coberturas preexistentes recuperadas. Estas assentam sobre as espessas e robustas paredes de granito, ficando a viga visível pelo exterior. No interior, a estrutura de madeira é aparente na sua totalidade. As portas e janelas, também em madeira, são fixadas no entalhe da pedra. Relativamente às janelas de correr, propostas nas salas de degustação e de gastronomia, assentam sobre o soalho e fixam-se lateralmente à parede, recusando a sua irregularidade dos topos. O ripado de madeira é fixo na parede e na viga, permitindo revelar os pilares de pedra preexistentes, como memória visual e material. Nas novas construções, onde o betão armado é estrutural, as paredes são rebocadas no interior e exterior, contrastando com o aspecto irregular das construções antigas. Os pisos são em betão afagado e os tectos em betão aparente. Embora a construção antiga e nova se diferenciem na linguagem formal e material, também se cruzam de modo disciplinar e intencional nos valores das suas arquitecturas. Nesta união, entalha-se uma caleira que recolhe as águas das duas construções. O granito e a madeira propagam-se para as novas construções, desenhando o lambrim, o rufo, as portas e janelas. Os materiais actuais também invadem as preexistências. O betão afagado e o reboco prolongam-se para a sala de controlo de qualidade, a sala de barricas, a cozinha e as instalações sanitárias. No exterior, os três pátios, embora com usos e utentes distintos, têm a mesma materialização, prolongada da rua para o pátio com cubos de granito, apenas interrompidos pelas guias e rampas definidas por lagetas de granito. Guias e rampas têm como objectivo regularizar e dignificar o espaço exterior, criando domínios visuais e espaciais, quando estes se transformam em bancos ou muros, e definem os lambris em granito das novas construções.
112
CASTANHEIRA, Carlos – “Construir em madeira – porque eu Gosto!” In CASTANHEIRA, Carlos – Carlos Castanheira arquitecto. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2011. p. 8. 149
133. Maqueta da reabilitação e ampliação da Adega Casas Novas. 150
“Uma adega já não é o que era. Está melhor, assim como o vinho.”113 Esta convicção é consequência da tranformação do processo de produção e promoção vinícola que acompanha a evolução da sociedade no tempo. Uma aldeia também já não é o que era. Está esquecida, abandonada, perdida no tempo. A arquitectura deve, então, associada aos valores construídos e não construídos dos lugares da aldeia, ser uma ferramenta de preservação patrimonial e de desenvolvimento económico, social e cultural, sempre em equilíbrio com a sua identidade – aqui vernacular e popular – contrariando os princípios de restauro defendidos por Eugène Viollet-le-Duc que se revelam descaracterizadores, e recusando o fim das construções preexistentes como sustentam as teorias mais fatalistas de Jonh Ruskin. Contudo, ambas as teorias contribuem para a preservação da história e memória dos lugares, e, no estudo e projecto da Adega Casa Novas (ilustração 133), pode associar-se a conservação e a preservação de alguns elementos identitários a Viollet-le-Duc, e a preservação das marcas do tempo na pedra e na madeira a Ruskin. Camillo Boito é, no entanto, o teórico mais influente nesta intervenção, sendo ele simultaneamente conservador e transformador, permitindo a conservação e evolução do conjunto vitivinícola reabilitado e ampliado. São também lições úteis, as cartas e as convenções sobre o património e os casos de referência seleccionados.
113
CASTANHEIRA, Carlos – “Adega Casa da Torre” In CASTANHEIRA, Carlos – Carlos Castanheira arquitecto. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2011. p. 123. 151
VI_ Conclus達o
O conceito de reabilitação aplicado em arquitectura é contemporâneo, devendo-se o seu entendimento actual à evolução da definição de conservação e restauro ao longo dos tempos. Enquanto ferramenta que permite a recuperação e reutilização do espaço que é memória e história de uma sociedade, e permite a sua transmissão no tempo continuando assim a acrescentar valor com a qualidade e a identidade das diferentes épocas que atravessa, a reabilitação define-se como meio de preservação social e cultural do património, dependente da necessária acção técnica, disciplinar, instrumental e profissional do arquitecto. A abordagem ao tema da reabilitação proposta nesta dissertação teve como principal objectivo compreender qual a posição do arquitecto perante o território não construído e construído preexistente. Com este sentido, é necessário responder às interrogações que se enunciaram e colocaram no início desta investigação, e que se relembram. Quais as oportunidades para estes lugares esquecidos, abandonados? Qual o futuro para estes espaços? Que reflexões deve o arquitecto fazer? Que instrumentos estão à disposição do arquitecto? Que ferramentas deve usar? Quais as limitações na intervenção? Quais as consequências da actuação no construído, a partir das potencialidades e capacidades existentes? A concretização desta investigação teórica e experimentação prática permitiu afirmar e confirmar a importância do património na identificação e caracterização das sociedades e dos seus tempos, mais evidente em ambientes rurais, populares e vernaculares, onde a arquitectura de habitação e produção é a expressão da forte relação de afinidade e conformidade entre o homem e a natureza. A verificação da continuada e acelerada degradação da aldeia de Casas Novas, assim como de tantas outras que se visitaram nos concelhos de Montalegre e Chaves, aquando da pesquisa territorial, revelou que o território do interior português está desertificado e deteriorado, deixando ao abandono os campos e as construções associadas, o que origina a consequente perda das tradições e dos costumes da cultura popular e vernacular. Esta constatação permite concluir que a consciencialização da importância do património natural e cultural pela sociedade é o primeiro passo para que esta e o arquitecto identifiquem e valorizem as oportunidades, promovendo e sustentando um futuro para estes lugares e para estas arquitecturas, permitindo a sua preservação e evolução no tempo. Torna-se necessário identificar e evidenciar os valores de cada lugar e dos seus habitantes, revelando o que melhor os identifica e distingue, recuperando e acrescentando novos interesses, promovendo assim a 155
continuação e apresentação dos valores tradicionais e culturais da região. Conclui-se assim que a reabilitação é indispensável e imprescindível para manter a memória e historia do passado e, ao mesmo tempo, proporcionar um futuro a estes lugares, a estas construções e a estes habitantes, seja pela evolução e adaptação dos usos seja pela sua musealização. O caso de estudo na aldeia de Casas Novas revela-se um exemplo de manutenção e promoção da permanência patrimonial, através da sua reabilitação, evidenciando todos os seus valores construídos e não construídos. A vontade e, aqui, a necessidade de manter uma cultura que já existiu, e, ao mesmo tempo, acrescentar-lhe conceitos e ideias actuais como o enoturismo, através de espacialidades e materialidades contemporâneas protagonizadas pela arquitectura, é um exemplo de como o futuro destes lugares está neles próprios. A reabilitação, além de um acto de interesse social e cultural, tem a necessária intervenção disciplinar, instrumental e profissional, recorrendo ao conhecimento da arquitectura e de outras disciplinas. Assim, como cidadão da sociedade, mas com responsabilidades acrescidas e exigidas na organização do espaço, o arquitecto tem de apreender o que é o património e a sua importância, reflectindo caso a caso. Quais são os valores fundamentais e essenciais do lugar e da sua arquitectura? Quais são os princípios fundadores e estruturadores? Quais são os materiais e técnicas de construção associadas e utilizadas? Estas são as perguntas que concorrem para a reabilitação e construção do lugar e da arquitectura, ajudando a compreender o que fazer aquando de uma acção ou intervenção, seguindo a via da preservação e não da destruição. As teorias, as cartas e as convenções de restauro são instrumentos que o arquitecto tem à sua disposição, auxiliando na investigação e compreensão do património a intervir, indicando e sugerindo metodologias de intervenção. Enquanto ferramentas de reabilitação, estes instrumentos constituem orientações intelectuais e culturais a ter em consideração nos intervalos entre a conservação e o restauro, que se revelam nas adições e subtracções, nas técnicas e nos materiais usados na acção, sempre com preocupação pela identidade e verdade do património, assumindo sempre a actualidade da intervenção, que passa, assim a constituir registo de cada tempo e momento da acção. Perante a liberdade metodológica, instrumental e profissional expressa nestes documentos, é o arquitecto que define o 156
caminho a adoptar e quais as ferramentas usar, seguindo os seus ideais de preservação e actuação no património. Na reabilitação da Adega Casas Novas, assumiu-se a preservação máxima dos usos, das formas, dos materiais e dos pormenores, mas quando necessário recorreu-se a uma adição e ampliação com materiais de linguagens e imagens novas, considerando-se e sustentando-se ser a resposta mais adequada para a preservação e evolução do património. Embora cada arquitecto tenha a sua identidade de intervenção e manipulação do património, a sua actuação é orientada e gerida pelas organizações de identificação e protecção do património. Com a consciência de que sempre que intervêm no património algo se perde, estas orientações e gestões prendem-se essencialmente nas acções que possam ser irreversíveis, como a demolição ou ampliação de novos espaços, de modo a evitar que o património perca os seus interesses e valores essenciais, ficando desvalorizado e descaracterizado, incapaz de afirmar o seu passado e, consequentemente, o seu futuro. Construir no construído, apropriando-se das potencialidades e capacidades existentes nos lugares e nas arquitecturas, valida a continuação e transmissão da história e memória de outros tempos às gerações presentes e futuras, para que estas não percam o contacto com o passado e possam desfrutar e reinventar o futuro. Reabilitando, consegue-se um território capaz de se transformar e reutilizar, respondendo com equilíbrio às exigências políticas, económicas, sociais e culturais da sociedade, tornando-se assim na sua identidade.
Concluindo a investigação em torno da preservação da história e da memória, que aqui se associa à arquitectura enquanto geradora, transformadora e mediadora cultural, popular ou erudita, a reabilitação torna-se indispensável e imprescindível. Revelando-se um conceito com intervalos dilatados e diversificados capazes de apelar e motivar a imaginação do arquitecto, apresenta-se em constante evolução e adaptação ao pensamento de cada sociedade e de cada época. A capacidade de reutilização na reabilitação, dos usos aos materiais, permite inúmeras opções e soluções de intervenção, balizadas e orientadas – mas não limitadas – pelas cartas e convenções dedicadas ao património. Com este sentido, é a concepção, a 157
imaginação, o conhecimento e, ainda, o bom senso do arquitecto que definem como agir caso a caso, pois cada arquitecto tem a sua identidade, a sua forma de pensar e desenhar o espaço em arquitectura. Contudo, é necessário que o interesse pelo património motive efectiva e afectivamente a sociedade em geral, e os cidadãos com responsabilidades políticas, técnicas e económicas, sociais e culturais. Com este sentido, é essencial que as organizações internacionais referidas na investigação, como o ICOMOS, a UNESCO, o Conselho da Europa, entre outras, e as organizações nacionais como a Direcção Geral do Património Cultural, desenvolvam instrumentos de formação e educação cívica e técnica que animem e incentivem o interesse pelo conhecimento do património e pela importância na sua preservação e transmissão futura, permitindo a qualidade e vitalidade do tecido rural e urbano, dos sítios, evitando que deste modo de percam valores únicos, insubstituíveis e imprescindíveis, reflexo do crescimento das sociedades.
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Ă?ndice de imagens
I _ Introdução. Ilustração composta pelas imagens 1, 6, 19, 27, 28, 32, 34, 60 e 116. II _ Arquitectura. Ilustração composta pelas imagens 1, 3, 11, 12, 14, 19 e 23. 1. Arquitectura condicionada pela circunstância territorial. Capela Netos. Figueira da Foz. Arquitecto Pedro Maurício Borges. In Ultimas reportagens. [em linha]. [consultado
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III_ Princípios e metodologias para a reabilitação Princípios, regras e ferramentas. Ilustração composta pelas imagens 27, 28, 30, 32, 34, 36, 38 e 40. 25. Fado. In Wikipedia. [em linha]. [consultado em 03 de Novembro 2011]. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Am%C3%A1lia_Rodrigues>. 26. Padrão dos Descobrimentos, 1940. Lisboa. Arquitecto Cottinelli Telmo e escultores
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O presente documento encontra-se escrito conforme o antigo acordo ortogrĂĄfico da lĂngua portuguesa. 11 de Julho de 2012