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STUART BLACK ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 9099 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE

Corunha TAP Principe di Savoia Goût de France VW Scirocco

Bordéus A Bela Adormecida acordou e agora é o destino europeu do ano

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015

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O gato das botas Miguel Esteves Cardoso

Contra a negrura tóxica dos detergentes caseiros, marcha o incontestável campeão das limpezas desde 1900: o savon noir da Marius Fabre

ueríamos limpar a casa de produtos tóxicos antes da Primavera e parece que vamos conseguir. Depois de muitas experiências, chegámos à conclusão que o melhor produto de limpeza para a casa toda começou a ser fabricado...em 1900. Trata-se do sabão negro líquido da Marius Fabre, uma das mais antigas fábricas de sabão de Marselha (na foto). Vale a pena ir ao site porque é bonito e tem toda a gama mas é escusado tentar encomendar porque não enviam para Portugal. O sabão negro líquido não só substitui todos os detergentes e produtos de limpeza da casa como deixa tudo mais limpo e mais brilhante. Como é biodegradável, não tem solventes, colorantes ou perfume e é saudável, ao contrário da concorrência moderna. Tem um cheiro próprio — o cheiro honesto de um sabão à base de azeite — que é mais agradável do que os mil cheiros artificiais que nos assaltam as narinas, vindas de marcas diferentes de detergentes, cada um irritantemente especializado. Serve para lavar louça — é usada na fábrica de Limoges para limpar porcelana dourada — e até roupa, embora seja arriscado usar com roupa branca. Serve para lavar janelas: dilua uma colher de sopa em meio litro de água, usando (ou reciclando) um pulverizador de plástico. Serve para limpar móveis, cabedais, pratas, animais...não há nada que não possa limpar. Para os jardineiros há uma versão forte da Marius Fabre que dá para atacar as cavalariças e tudo. Como a Internet está cheia

PASCAL PARROT/REUTERS

Q

de elogios deste incrível sabão, vou seguir a sugestão de vários leitores e indicar onde se pode comprar. Desconheço se a Marius Fabre tem representante em Portugal. Sei é que o YouTube está cheio de vídeos de demonstração que ensinam a fazer sabão líquido para limpar a casa, usando até óleos de cozinha usados. Cinco litros de bom sabão líquido (mesmo perfumando-os com umas gotas de verdadeiros óleos essenciais) podem custar menos de 5 euros. As versões brasileiras são as mais espectaculares mas, segundo vi, quase todas parecem utilizar um álcool usado como combustível para automóveis, difícil de encontrar aqui. O certo é que o sabão da Marius Fabre tem uma fórmula fantástica e continua a ser fabricada em caldeirão, tal e qual como há 115 anos. Tem azeite mas é provável que tenha também outros óleos mais baratos.

Não faz mal. O que interessa é o resultado — perfeito — e a longevidade, que é espectacular. Mesmo abusando das limpezas (limpa fogões sozinho, de um dia para o outro, deixando-os impecáveis), um garrafão de 5 litros dura pelo menos seis meses. Vejamos onde se compra. Na Amazon.co.uk 500ml custam 14 euros, fora os portes. Cinco litros sairiam por 140 euros, mais os portes. É ridículo. O melhor lugar para comprar é na www.magasino.com. É um grande armazém em Hanôver que cobra 12,50 euros pelos portes, por muito pesadas e volumosas que sejam as encomendas. O magasino.com cobra os mesmos preços que a Marius Fabre em França. Um litro custa apenas 7,90 euros. Um garrafão de 5 litros custa 35 euros. Uma maneira económica é comprar dois garrafões por 70 euros. Incluindo os portes, fica-se com 10 litros (o suficiente para mais de um ano) por 82,50 euros. O garrafão de 5 litros de

sabão líquido para o jardim — para pulverizar flores e árvores e matar os bichinhos devoradores — custa 28 euros. Está conforme o regulamento CE 834/2007 para a agricultura biológica. Como a Marius Fabre tem muitos produtos tentadores, aconselho a recusar os mais modernos e perfumados e a concentrar-se no mais barato e antigo de todos: o sabão de Marselha “brut”. Um quilo cortado em bocados manuseáveis (cerca de 10 sabonetes) custa 7,50 euros. O que sai a 75 cêntimos por sabonete, pelo melhor sabão de Marselha do mundo. Já usei o Magasino.com três vezes e posso recomendá-los absolutamente. Podem ser lentos — usam os correios nacionais — mas são seguríssimos. Conte com dez dias úteis. A Magasino.com tem a particularidade de contar com toda a gama da Marius Fabre, em todos os tamanhos possíveis e imaginários. Força!

Queríamos limpar a casa de produtos tóxicos antes da Primavera e parece que vamos conseguir. Depois de muitas experiências, chegámos à conclusão que o melhor produto de limpeza para a casa toda começou a ser fabricado...em 1900. Trata-se do sabão negro líquido da Marius Fabre, uma das mais antigas fábricas de sabão de

FICHA TÉCNICA Direcção Bárbara Reis Edição Sandra Silva Costa e Luís J. Santos (Online) Edição fotográfica Miguel Madeira e Manuel Roberto (adjunto) Design Mark Porter, Simon Esterson Directora de Arte Sónia Matos Designers Daniela Graça, Joana Lima e José Soares Infografia Cátia Mendonça, Célia Rodrigues, Joaquim Guerreiro e José Alves Secretariado Lucinda Vasconcelos Fugas Praça Coronel Pacheco, 2, 4050-453 Porto. Tel.: 226151000. E-mail: fugas@pu bli co.pt . fugas.publico.pt Fugas n.º 773

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Capa Bordéus

O despertar da Bela Adormecida Superando Lisboa e sucedendo ao Porto, Bordéus, Melhor Destino Europeu em 2015, apresenta-se de cara lavada, orgulhosa da sua aura vinícola mas com outros argumentos de peso para seduzir os turistas após dez anos marcados por uma transformação radical. Entre eles, um notável conjunto arquitectónico do século XVIII e quase 400 edifícios classificados pela UNESCO, ocupando quase metade da superfície total da cidade. Sousa Ribeiro

G

wenaëlle Towse-Vallet já viveu em Paris, em Londres, em Nova Iorque e em Montreal. - Agora, depois dessas experiências, sem dúvida enriquecedoras, moro em Bordéus há dez anos. E sabe que mais? Não troco esta cidade por nenhuma delas. Quando me apetece, vou à praia, em Arcachon, aqui bem próxima, ou em passeio até à região basca. E, tanto San Sebastian, como Paris, estão apenas a três horas de comboio, a duas em 2017, admite a responsável do turismo para as relações com a imprensa. Bordéus, a urbe do sudoeste de França que abriga 750 mil almas, acaba de conquistar o título de Melhor Destino Europeu 2015, superando Lisboa, segunda classificada, e sucedendo ao Porto, a vencedora em 2014. Na base deste sucesso, numa grande competição com outras cidades, entre elas Roma, Amesterdão, Paris, Londres, Bruxelas, Milão, Viena, Istambul, Madrid e Berlim, uma fantástica mobilização desde a

primeira hora e durante a maratona de três semanas da votação online (a participação registou um aumento de 6% face ao ano anterior e abrangeu 113 países) que se traduziu em números nunca vistos — Bordéus obteve 42.396 votos, o que corresponde a 17% de um total de 244.696, contra os 37.621 da capital portuguesa. - É uma grande honra para nós e, ao mesmo tempo, muito excitante, assume Gwenaëlle Towse-Vallet, relativizando a importância do trabalho desenvolvido e altamente elogiado pelas autoridades locais e pela European Best Destination (EBD), uma organização com sede em Bruxelas que tem como objectivo promover e desenvolver o turismo na Europa. Se o dinamismo da equipa promocional do turismo da cidade e o envolvimento de Alain Juppé, antigo primeiro-ministro e presidente da câmara de Bordéus, são apontados como relevantes no êxito da campanha, ninguém se cansa de valorizar o papel desempenhado pelos meios de comunicação social e a importância

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de acordos estabelecidos, em tempo oportuno, com clubes desportivos, com restaurantes, com hotéis, bem como instituições locais e regionais, celebridades e os cidadãos anónimos — todos eles contribuindo, de uma forma ou de outra, para tornar mais radioso o futuro de Bordéus, como perspectiva Gwenaëlle TowseVallet. - Esperamos atrair muitos mais turistas. Veja-se o caso do Porto. A analogia com a cidade portuense parece estar sempre presente e assenta num crescimento de 16% no número de turistas e num encaixe financeiro na ordem dos dez milhões de euros após ser coroada rainha da Europa. Para chegar a este patamar de excelência, Bordéus pretende confirmar a sua posição como destino internacional e se, por um lado, acredita que, de agora em diante, terá ainda uma maior cobertura mediática, por outro, sente que, graças ao novo estatuto, tem argumentos mais válidos para convencer os operadores turísticos


REGIS DUVIGNAU/REUTERS

Durante as três semanas de votação online, Bordéus mobilizou-se e conseguiu o título de Destino Europeu do Ano. Agora, o centro da cidade e as margens do Garonne aguardam a chegada de mais turistas

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Capa Bordéus

REGIS DUVIGNAU/REUTERS

A Pont de Pierre, inaugurada em 1822, é hoje cruzada por modernos eléctricos movidos a energia solar; em baixo, o Grand Théâtre, mandado erguer em 1770

americanos, chineses, japoneses e brasileiros, sem ignorar que contará com o forte apoio e promoção em www.europeanbestdestination.org e nas redes sociais, atraindo mais facilmente agências de viagens e companhias aéreas.

Retalhos do céu manchado de meiadúzia de farrapos de nuvens brilham nas águas serenas do Garonne e o Quai de la Douane, colonizado pelo silêncio, revela-se um lugar aprazível para perscrutar o rio ou, nas minhas costas, a magnificência da elegante Place de la Bourse. De olhar ora fixo no horizonte, ora no pequeno caderno de apontamentos pousado sobre os joelhos, um jovem solitário absorve os prazeres da manhã, de uma luz límpida. - Estive uma vez em Bordéus mas era criança e não guardo uma única memória dessa viagem feita na companhia dos meus pais. Mais tarde, na minha adolescência, li ocasionalmente um ou outro artigo dedicado à cidade, sentindo-me atraído pela forma tão pungente como descreviam o conjunto arquitectónico do século XVIII, as fachadas clássicas dos seus edifícios, das mais belas em todo o país. Mas, por esta ou por aquela razão, sempre fui adiando a viagem, o regresso, digamos. Até ontem, conta Sylvain Serge Mignon. Um pássaro pousa ao nosso lado, ergo o olhar e avisto uma chaminé fumegante; não corre um fio de vento na manhã que avança lentamente na sua quietude de fim-de- semana. - Não posso dizer que Bordéus me esteja a surpreender porque, pelo conhecimento que tinha, já esperava encontrar toda esta grandiosidade que nos rodeia. Mas está a superar as minhas expectativas – isso tenho de admitir. À nossa frente, estendendo-se para um lado e para o outro, num total de quatro quilómetros, um longo passeio ribeirinho bordejando a margem esquerda do Garonne, irreconhecível se comparada com um tempo, não tão distante como isso, em que uma palavra resumia na perfeição o quadro que se deparava neste mesmo espaço: negligência. Parques de estacionamento caóticos, gruas e hangares delapidados moldavam a paisagem, em claro contraste com os dias de hoje: o verde sobrepondo-se

REGIS DUVIGNAU/REUTERS

O tempo da negligência

tes e está dotado de pistas para bicicletas, um pouco como Amesterdão. E não deixe de dar um passeio à noite, a iluminação é simplesmente soberba - convencera-me, umas horas antes, Gwenaëlle Towse-Vallet.

A importância do porto

ao cinzento, na forma de um parque onde não faltam as árvores, áreas reservadas aos jogos que seduzem as crianças, trilhos que cada vez cativam mais ciclistas e toda uma sensação de bem-estar que se dissipa com

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mais dificuldade do que as brumas que pairam sobre o rio. - Bordéus tem monumentos grandiosos, edifícios, praças, cais. Todas as fachadas foram limpas, o centro histórico é perfeito para os transeun-

Fundada pelos romanos no século III a.C., Bordéus conheceu nos últimos anos uma verdadeira metamorfose, semelhando-se a uma bela mulher que foi descurando a sua aparência até ao dia em que, olhando-se ao espelho, viu no rosto os contornos bem definidos desse desleixo e, decidida a não esperar mais tempo, sentiu necessidade de recorrer a um lifting capaz de lhe garantir uma segunda vida. Qual Bela Adormecida, a cidade, visitada por cerca de 2,5 milhões de turistas por ano, assiste a uma espécie de retorno a uma época dourada, mas um retorno ainda mais ambicioso e sustentado nos

seus quase 400 monumentos classificados como Património Mundial da UNESCO que abarcam uma área de 1800 hectares (quase metade da superfície total). Definida, ao longo dos séculos, como a grande rival de Paris, Bordéus, com a sua beleza clássica, é um exemplo de estética que atinge a sua expressão máxima nas jóias da Place de la Bourse, dominada pela Fonte das Três Graças, e nas fachadas que, de olhos postos no Garonne, se projectam contra o céu numa extensão de um quilómetro e meio, transformando esta verdadeira continuidade estilística num caso único no continente europeu — e se estão viradas para o rio, logo de costas voltadas para a cidade, é porque foram idealizadas, desde finais do século XVII (e os trabalhos na praça prolongaramse por dois decénios) para produzir nos visitantes uma impressão de imponência e de prosperidade.


Bordéus tem monumentos grandiosos, edifícios, praças. O centro histórico é perfeito para os transeuntes Bordéus vivera, no período medieval, um tempo de pujança que se apoiara no comércio com a Inglaterra e o Norte da Europa. Sob o domínio dos ingleses, a quem devem a reputação internacional do vinho de grande qualidade produzido na região — do outro lado do Canal da Mancha designado vulgarmente por clarete — , a cidade prosperou entre 1154 e 1453 mas é em pleno século XVIII, período em que conhece um segundo renascimento, que verdadeiramente se afirma. Se o vinho continua, por essa altura, a ser a alma de Bordéus, o comércio com as Antilhas e a África, das especiarias e dos escravos, tornase no seu coração, com batimentos cada vez mais fortes. Negociantes,

marinheiros e armadores, todos eles têm, por essa altura, os olhos plantados na cidade, que não tarda a abrigar o porto mais importante de toda a França e o segundo no mundo, logo a seguir a Londres. Sentindo uma premente necessidade de rasgar novos horizontes, Bordéus começa, gradualmente, a desfazer-se do seu legado medieval e, obedecendo aos impulsos futuristas e visionários dos intendentes Claude Boucher e LouisUrbain-Aubert de Tourny, com a promessa de recorrerem aos serviços de Jacques Gabriel, Primeiro Arquitecto de Luís XV, o Parlamento e os vereadores aceitam com benevolência a decisão de derrubar uma boa parte das muralhas seculares, de cobrir os fossos e de destruir as suas fortifica-

ções. A cidade-medieval, a cidadefortaleza, caminhava com passos sólidos para se tornar na cidadeclássica: em poucos anos, Bordéus adorna-se com novas avenidas, parques, pavilhões e hotéis ligados ao sector privado, como se a metrópole se transformasse, de um momento para o outro, numa Primavera onde todas as flores desabrochavam.

Grandes obras E como é agradável, a qualquer hora do dia, vê-las florir no Jardin Public, o elegante jardim inaugurado nessa época de glória, em 1746, mas desenhado de acordo com o estilo inglês um século mais tarde. A uns escassos 200 metros, integrado na área (um total de onze hectares) ocupada pelo

pulmão verde da cidade, despontava o ainda mais idoso Jardin Botanique, catalogado meticulosamente e com quase 400 anos de existência (foi fundado em 1629), hoje transferido para o Bairro de la Bastide; já no regresso, quase à saída deste espaço banhado de tranquilidade e tão do agrado dos locais, o Museu de História Natural, alvo de obras de restauro e com reabertura agendada para 2016 — o famoso teatro de marionetas Guignol Guérin, o mais antigo (1853) de França, está por ali perto e é uma alternativa para as crianças e os adultos. Um pequeno desvio, para oeste, conduz os meus passos pela Rue de Fondaudège e, virando à esquerda, alcanço a Rue du Dr. Albert Barraud,

ao encontro do Palais Gallien, as ruínas de um anfiteatro do século III e o mais impressionante de todos os vestígios romanos em Bordéus, uma cidade que a cada esquina, a cada olhar mais demorado, me vai parecendo mais encantadora do que nunca. Aqui e acolá, enquanto as sombras nocturnas avançam rapidamente, vou recordando palavras de Gwenaëlle Towse-Vallet. - Gosto deste estilo de vida, do clima, da descontracção das pessoas, dos muitos lugares onde se pode apreciar bom vinho e a gastronomia. Bordéus é uma cidade deslumbrante, segura e na moda. De novo a caminho da Place de la Bourse, volto a passar pela PUBLICIDADE

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Capa Bordéus

Place de la Comédie, para admirar calmamente a perfeição de um rectângulo que domina a praça, o Grand Théâtre, mandado erguer em 1770, outra obra desse tempo de esplendor. Financiado pelos negociantes de Bordéus da loja maçónica L’Amitié e levantado sob a direcção do arquitecto parisiense, Victor Louis, durante o reinado de Luís XVI, o teatro acabaria por inspirar, anos mais tarde, em 1860, a construção da ópera Garnier, em Paris, um dos monumentos mais emblemáticos do Segundo Império e símbolo de ostentação e do poderio de Napoleão III. A sala de espectáculos do Grand Théâtre (no interior do edifício há cafés que nos transportam no tempo) é uma das mais impressionantes do século XVIII e frequentemente comparada às óperas de Versalhes e de Turim, uma beleza que esmaga e que, de tão assombrosa, quase faz esquecer a sua efémera vocação política — em circunstâncias trágicas, em 1870, 1914 e 1941, com Bordéus elevada a capital, foi sede da Assembleia Nacional.

A noite tomba sobre a cidade, caminho na direcção do Garonne e não tardo a escutar o marulho das suas águas, onde já se espalham as luzes amareladas, contorcendo-se como malabaristas ao sabor da corrente. Mesmo à minha frente, mas ali desde 2006, incluído no projecto de requalificação dos cais e concebido por Michel Corajoud (com a colaboração de Jean Max Llorca e do arquitecto Pierre Gangnet), está o maior espelho de água do mundo, com uma área de 3450 m2, a simbiose perfeita entre água e neblina sobre lajes de granito e tão apreciado pelos mais pequenos e pelos casais de namorados — seguramente ainda mais sedutora no Verão, quando o sol castiga a cidade, do que por estes dias, que não são mais do que um anúncio da Primavera. É com alguma dificuldade que me desprendo daquela espécie de magnetismo que emana do rio mas logo me deixo enfeitiçar uma vez mais, no momento em que me viro para a cidade, para a Place de la Bourse, de olhos pousados nas luzes cintilantes, iluminando para a direita e para a esquerda as fachadas harmoniosas na sua beleza eterna e intacta de dois séculos. Gwenaëlle Towse-Vallet já me pre-

venira mas, no meu cepticismo, em momento algum admitira que Bordéus se transfigurasse num lugar tão mágico quando o dia se extingue. Mas transfigura-se. Lentamente, as suas artérias vão abandonando aquela paz crepuscular para dar lugar, mal a lua se levanta, cheia e pálida, a um formigueiro impetuoso, a uma maré que vai rugindo cada vez mais forte, quando os estudantes, na incessante procura dos prazeres mundanos, enchem a atmosfera com suas vozes. Alguns deles dão início a esta peregrinação nocturna com um copo de Lillet, um aperitivo tradicional feito à base de vinho branco, sumo de laranja e quinino, no Le Régent, na Place Gambetta, hoje uma espécie de ilha esverdeada no meio do intenso movimento do centro da cidade mas

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IVAN VDOVIN/CORBIS

Mágica é a noite

ligada, durante o Reinado do Terror que se seguiu à Revolução, à infame recordação de uma guilhotina que cortou as cabeças de 304 alegados contra-revolucionários, dos quais quase meia centena de mulheres. À medida que a noite avança e a lua sobe no céu, os jovens parecem acompanhar o ritmo de uma e outra, invadindo lugares como a Place de la Victorie, a de St. Pierre, a Place du Parlement e a Camille Julian, muitas vezes antes de um regresso ao ponto de partida, a Place Gambetta, à qual se pode chegar utilizando a Rue de la Porte Dijeaux (uma designação que presta homenagem a uma antiga porta construída em 1748), uma artéria pedonal e paraíso de compras que rivaliza, em termos de comércio, com a Cours de l’Intendance, a


ERIC BOULOUMIÉ/CORBIS

MIAMI HAVANA CANCÚN SANTO DOMINGO PUNTA CANA

SAN JUAN (PUERTO RICO)

CARACAS

A Place de la Comédie situa-se no casco classificado como Património da Humanidade pela UNESCO; em baixo, o Palais Gallien, as ruínas de um anfiteatro do século III e o mais impressionante de todos os vestígios romanos em Bordéus

Place des Grands Hommes e a Rue Ste.Catherine, que corre paralela ao Garonne ao longo de mais de um quilómetro entre a Place de la Victorie e a Place de la Comédie. Quando a manhã desperta, o profano não é mais do que uma memória e, sob uma imponderável luminosidade, recorta-se o sagrado, representado pela Cathédrale St. André, já Património da UNESCO (1998) quando a cidade ainda sonhava com essa classificação e o lugar onde, em 1137, o futuro rei Luís VII casou com Eleanor da Aquitânia (bem como Ana da Áustria e Luís XIII). A parede exterior da nave da catedral data de 1096 mas a maior parte da estrutura foi erguida entre os séculos XIII e XIV; bem mais recente, a renovação do portal do lado norte pôs a nu admiráveis es-

culturas vestidas de sujidade durante séculos — um paradoxo se pensarmos que muitas delas foram pintadas com cores garridas para atrair um maior número de devotos. Tristemente, a catedral, localizada perto do edifício da Câmara Municipal e considerada, justamente, o mais belo de todos os monumentos religiosos da cidade, serviu de armazém de forragem durante os tempos conturbados da Revolução Francesa e, já mais tarde, no século XIX, foi devastada por um incêndio (o mobiliário actual pertencia a outras igrejas espalhadas pela cidade).

A aura vinícola - Não, felizmente Bordéus não é apenas vinho, é uma maneira de viver, como São Francisco, nos Es-

tados Unidos, assume Gwenaëlle Towse-Vallet. Bordéus organiza, de dois em dois anos, a Festa do Vinho (em 2016 terá lugar entre 23 e 26 de Junho e também para o ano está prevista a inauguração do Museu do Vinho) e, por essa altura, as ruas enchem-se de apreciadores e simples curiosos. Com ou sem celebração, em Bordéus bebe-se e respira-se vinho e as possibilidades de o turista se embrenhar neste admirável mundo velho de séculos, tão íntimo da cidade e da região como um cordão umbilical de um filho e de uma mãe, multiplicamse como as vinhas em terrenos que se perdem para lá do horizonte. O posto de turismo propõe um grande número de circuitos, de carro, de bicicleta ou de barco, degustações, visitas clássicas aos châteaux, dias gastronómicos em Margaux, descoberta de três diferentes vinhas ou de vinhas classificadas, como o Médoc 1855, uma variedade de ofertas que certamente deixará os admiradores ébrios de… felicidade. Eu, talvez mais seduzido pela lenda, prefiro percorrer os poucos quilómetros que me separam de Saint-Emilion, a charmosa aldeia medieval onde a proeminente arquitectura e a reputação dos vinhos são como irmãos inseparáveis. Permito que a lenda reze. No século VIII, um monge bretão fugiu de Vannes, a sua cidade-natal, para procurar refúgio numa das grutas de um lugar chamado Ascum bas (o antigo nome da aldeia). Emilion era o nome desse monge em fuga. Vivendo a sua vida de eremita, Emilion realizou alguns milagres e rapidamente se tornou famoso na região e mesmo para lá das suas fronteiras. Com a mesma celeridade, o monge viu-se rodeado de muitos discípulos e, com a ajuda destes, evangelizou o lugar e transformou-o num importante centro religioso. Em Saint-Emilion, o trabalho do homem e a natureza sempre viveram numa perfeita harmonia, como harmonioso é o quadro composto por vinhedos e conjunto arquitectónico. Em 1999 e pela primeira vez, umas vinhas passaram a integrar a lista de Património Mundial da UNESCO como Paisagem Cultural — as de Saint-Emilion. Ergo o copo contra os raios té-

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Capa Bordéus

REGIS DUVIGNAU/REUTERS

Guia prático

pidos do sol. É tempo de regressar a Bordéus e de redescobrir ainda, durante mais umas horas, uma boa parte do seu legado.

Pontes sobre o Garonne Património Mundial da UNESCO desde 2007, permanece a dúvida se esta classificação é a causa ou o efeito deste rejuvenescimento da cidade. A sua monumentalidade nunca a abandonou mas a imagem que guardo de Bordéus, dos últimos anos do século passado, está mais associada a uma atmosfera decrépita, como uma idosa cansada da vida, às suas ruas estreitas que, embora protegidas por André Malraux, o escritor que foi ministro da cultura (o primeiro da era moderna depois de Charles de Gaulle ter criado a pasta, em 1958, quando regressou à presidência da república), pouco mais tinham para oferecer do que fachadas negras e gastas pelo tempo. Como um sol resplandecente que ocupa um espaço onde antes cavalgavam nuvens cinzentas, Bordéus sai da penumbra e potencia a infinitude da sua beleza, tão bem expressa na histórica Esplanade des Quincones, uma praça idealizada em 1820, com a sua elegante fonte que é um monumento aos Girondinos, um

grupo de deputados, moderados e burgueses, da Assembleia Nacional durante a Revolução Francesa — 22 dos quais executados em 1793 depois de serem acusados de actividades contra-revolucionárias. Regresso ao rio e caminho ao longo da margem esquerda até me surgir no campo visual a Pont de Pierre, a primeira em Bordéus, autorizada por Napoleão Bonaparte e inaugurada em 1822. Até essa altura, a travessia entre as duas margens do Garonne era feita de barco e, após a sua construção, permaneceu durante 150 anos como a única a ligar o centro histórico ao bairro de La Bastide. Nos dias de hoje, a ponte de pedra, com os seus 17 arcos, tantos como as letras do nome do imperador, é cruzada por modernos eléctricos movidos a energia solar mas continua a ter um lugar muito especial no coração dos habitantes da cidade. Situada entre esta e a Pont d’Aquitaine, a Jacques-Chaban Delmas (a quinta a ser erguida sobre o rio e assim denominada para prestar tributo ao antigo general da Resistência durante a II Guerra Mundial que mais tarde se tornou presidente da câmara de Bordéus), com o seu toque de modernidade, é uma rival à altura, especialmente

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à noite, quando a iluminação lhe transmite ainda mais encanto e uma imponência que as suas medidas ajudam a exacerbar — 575 metros de comprimento e 77 de altura, o que lhe confere o estatuto de ponte levadiça mais alta da Europa. O Garonne corre silencioso e reflecte uma vez mais o brilho das luzes, as estrelas brilham e até a lua, sempre cheia, lança sobre a cidade uma luz menos amedrontada. Gwenaëlle Towse-Vallet já visitou Lisboa, o ano passado, por esta mesma altura, acabando por se render à maior concorrente de Bordéus na corrida pelo estatuto de Melhor Destino Europeu 2015. - As condições atmosféricas não eram as ideais mas adorei a atmosfera, os bares de vinho no Bairro Alto; pareceu-me uma cidade muito autêntica, com os antigos eléctricos amarelos e pessoas simpáticas. E o facto de, tal como Bordéus, também ter um rio. Não cheguei a perguntar mas fiquei com a impressão de que, a exemplo do que acontece com Paris, Londres, Nova Iorque e Montreal, Gwenaëlle Towse-Vallet não trocava Bordéus por Lisboa. Talvez porque tudo brilha no reino da Bela Adormecida.

COMO IR

ONDE COMER

A partir de Lisboa, a TAP voa directa e diariamente para Bordéus com tarifas (tendo por base a última semana de Março) a rondar os 190 euros (ida e volta). Mais barata (depende das datas escolhidas), também a easyJet faz a ligação entre a capital portuguesa e aquela cidade francesa, com preços (igualmente ida e volta) próximos dos 120 euros. Embora, tal como a easyJet, não ofereça voos diários, a Ryanair pode constituir alternativa bem mais barata para quem pretende visitar Bordéus — se bem que o faça apenas com partida do Porto (ida e volta por cerca de 70 euros). Para quem preferir utilizar veículo próprio, Bordéus dista 1150 quilómetros de Lisboa, um trajecto que pode percorrer quase sempre em autoestrada (custo das portagens a rondar os 50 euros), a exemplo do que acontece desde o Porto (qualquer coisa como 33 euros e uma distância de mil quilómetros).

O que não falta em Bordéus são bons restaurantes mas um dos melhores, também pela sua localização, nos Quais des Queriés, 33, construído sobre pilares que se debruçam (na margem direita) sobre o Garonne e mesmo em frente à Place de la Bourse, é o L’Estacade (www. estacade-restaurant.com), um espaço agradável que mistura os sabores do Mediterrâneo e do Atlântico. Outro lugar que não desilude — e a um preço acessível — é o Le Saint-Georges, na Place Camille Jullian, 2, com uma cozinha típica do sudoeste da França e uma decoração focada na Sétima Arte. Mas, melhor ainda, a La Brasserie Bordelaise (www.brasserie-bordelaise. fr), na Rue Saint-Rémi, 50, um autêntico templo da gastronomia do sudoeste (não deixe de provar, quando possível, os espargos de Blayais ou as ostras de Oléron ou, ainda, o carpaccio de pato com azeite e trufas) aberto diariamente para jantares.

QUANDO IR

ONDE DORMIR

Bordéus pode ser visitada em qualquer altura do ano mas a melhor época é durante a Primavera ou nas primeiras semanas do Outono, quando as temperaturas são mais amenas. A cidade, situada perto da costa, beneficia de um clima temperado por influência do Oceano Atlântico e do estuário do Gironde, com invernos não muito frios e verões cada vez mais quentes.

Bordéus é uma cidade que proporciona agradáveis surpresas para quem viaja com orçamentos mais reduzidos. Entre elas, o Auberge de Jeunesse (www. auberge-jeunesse-bordeaux. com), na Cours Barbey, 22, com uma tarifa diária de 23 euros que inclui, entre outras facilidades (café-bar, cozinha, lavandaria e Internet), pequeno-almoço. O albergue de juventude, situado no coração do bairro de SaintJean, a apenas dez minutos a pé da estação ferroviária com o mesmo nome, a 15 do centro histórico e também próximo da Place de la Victoire, aceita reservas para um longo período mas somente a quem apresentar


prova de estar a estudar na cidade — todos os outros, de passagem, não poderão prolongar a sua estada mais do que três noites. Para aqueles que, em viagem, não abdicam de um certo luxo, a cidade oferece alternativas verdadeiramente sumptuosas, como a Maison Fredon (www.latupina.com/ maison-d-hotes-fredonbordeaux), na Rue Porte de la Monnaie, 5 (a recepção funciona no restaurante La Tupina, mesmo em frente), num elegante imóvel do século XVIII inteiramente renovado, com preços entre os 180 e os 250 euros na época alta (varia consoante a dimensão do quarto escolhido e, no total, são apenas cinco) e com a possibilidade de, mediante o pagamento de mais 140 euros, jantar no referido restaurante, uma tarifa que corresponde a uma ocupação dupla e com direito a vinho e ao pequenoalmoço no dia seguinte. Um pouco mais barato, com tarifas entre os 90 e os 130 euros (150 para a Suite Prestige), o Hôtel des 4 soeurs, um dos históricos de Bordéus, está situado a dois passos da Place des Quincones e do Grand Théâtre, contando com 34 quartos que foram alvo de uma completa reforma em 2007 e onde, em 1850, ficou alojado o compositor alemão Richard Wagner, dividido entre compor a Lohengrin (que estreou nesse ano) e a sua relação com a jovem — e casada — pianista Jessie Taylor, que ele conhecera dois anos antes em Dresden.

ALEMANHA BÉLGICA Paris FRANÇA OCEANO ATLÂNTICO

Bordéus

SUÍÇA ITÁLIA

ESPANHA

A VISITAR

desde os primórdios, com artefactos que incluem algumas esculturas em pedra de mulheres e uma importante colecção de estelas galo-romanas, estátuas e cerâmicas. A não perder, também, o Museu de Artes Decorativas, instalado numa casa senhorial cuja construção data de 1779, o de Belas Artes, para uma aproximação aos nomes mais sonantes da pintura europeia, a Basílica de St. Michel e a sua torre sineira (a segunda mais alta do país com 114 metros), a de SaintSeurin (do século VI e a mais

antiga de Bordéus), bem como a Porte Cailhau, uma entrada real da cidade construída em 1494 e com uma altura de 35 metros, e o Grosse Cloche, o sino que toca seis vezes por ano (grandes eventos) e pesa 7750 quilos.

INFORMAÇÕES ÚTEIS

556 00 68 20), com um horário de atendimento em dias úteis entre as 9h e as 15h, excepto às quintas-feiras (encerra às 13h). Com preços a partir de 21 euros, o City Pass (disponível para um, dois ou três dias) é uma das formas mais económicas para visitar a cidade e arredores, incluindo museus e transportes.

Os cidadãos portugueses apenas necessitam de um documento de identificação (passaporte, cartão de cidadão ou bilhete de identidade) para entrar em França. Bordéus tem um consulado português, na Rue Henri Rodel, 11 (telemóvel + 33

Construído em 1824 como armazém para os raros e exóticos produtos (café, cacau, amendoins, baunilha, especiarias, açúcar e madeiras preciosas) provenientes das colónias francesas, do Brasil ou da República Dominicana, o entreposto Lainé acolhe no seu amplo espaço o CAPC, o Museu de Arte Contemporânea, com instalações e exposições temporárias da corrente artística dos últimos 40 anos. Outro museu — coexistem onze na cidade — que justifica amplamente uma vista é o Musée d’Aquitaine, na Cours Pasteur, 20, com uma mostra da história e da etnografia de Bordéus

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 11


Viagem Espanha

Dois dias na Corunha, a vaguear entre lendas e mares

Torre de Hércules A cabeça do gigante Afonso X de Espanha, avô de D. Dinis de Portugal, inspirou-se na mitologia grega para contar a história do farol que chegou aos nossos dias com o nome do herói clássico muito por conta disso. Numa altura em que a Península era dominada pelo terror do gigante Gerião, Hércules, filho do deus grego Zeus e da humana Alcmena, veio a esta região para confrontar o tirano. A luta durou três dias e três noites com Hércules, no final, a cortar a cabeça ao gigante e a enterrá-la junto ao mar. Para que a sua vitória não fosse esquecida, o semideus começou a construir uma torre, que viria a ser terminada pelo sobrinho, Hispán, e fundou a cidade, baptizando-a com o nome da mulher pela qual se enamorou durante a sua breve estada: Crunia. E se, como reza a lenda tornada famosa pelo monarca do século XIII, a cidade nasceu aqui, deverá ser este o primeiro ponto obrigatório de passagem numa visita, mesmo tendo em conta que a tarefa de escalar ao topo do único farol romano em actividade não é menos hercúlea. São 242 degraus em caracol, pelo coração da torre, cuja recuperação datada do século XVIII é bem visível nas marcas deixadas pela intervenção de forma a distinguir o original — um projecto que tem nome luso associado, o do arquitecto de Conímbriga Gaio Sevio Lupo — das partes restauradas. No edifício romano, explica o

guia, entre lições arqueológicas e históricas, não haveria uma escada, mas uma rampa que circundaria a torre e que assim facilitava as cargas e descargas por aquilo que hoje nos parecem janelas, mas que eram na realidade entradas. Mas voltemos aos degraus. É que se a história e toda a carga mitológica associadas à Torre parecem ganhar vida entre paredes, no topo, junto ao posto de vigia, aguardam-nos largas vistas para o presente e futuro da Corunha, delineada a baías e enseadas, a portos e praias. Na impossibilidade de subir a imensa escadaria, vale a pena o passeio pelo espaço verde do parque que protege a torre e que inclui percurso escultórico com diversas peças. O monumento está aberto ao público o ano inteiro — no Inverno, das 10h às 18h; no Verão, das 10h às 21h. As entradas custam 3€, excepto às segundas e no Dia Internacional dos Museus em que as visitas são gratuitas. Há visitas guiadas promovidas pela Prefeitura sem pagamento extra mediante reserva.

Aquário Finisterrae Ode ao mar Haja tempo e vontade, e a Corunha é uma cidade que apetece conhecer a caminhar. Tendo como ponto de partida a Torre de Hércules, seguimos pelo Paseo Marítimo com o centro da cidade como destino final, mas com vários pontos de paragem obrigatória. Um deles é o Aquário Finisterrae,

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onde a cidade homenageia o mar que lhe dá vida. Inaugurado em 1999, o espaço não só alberga uma panóplia de espécies marinhas como, assim que entramos, se encarrega de nos transportar numa viagem pela história da urbe e das suas gentes, não tivessem sido o mar e a ria os grandes motores económicos. Ainda hoje o são. Pela pesca, também, mas mais ainda por causa dos navios de cruzeiro que aportam diariamente por aqui, atraídos pelos mistérios da cidade, e pelo transporte de carvão e de petróleo. A localização estratégica, no entanto, também foi ao longo dos anos fruto de dissabores. Nem o Atlântico da Costa da Morte dá tréguas nem a ria

MARCO MAURICIO

Em apenas 48 horas deixámo-nos levar pelas lendas, pelo mar e pelo desafio do “conhece-te a ti mesmo”. No fim, (re)descobrimos uma cidade que continua tão abraçada ao Atlântico como sempre. Um miniguia de como aproveitar um fim-de-semana n’ A Coruña. Carla B. Ribeiro


SÉRGIO AZENHA

é de fácil navegação e na história da Corunha pesam os casos de acidentes ambientais como o do navio grego Mar Egeu, com mais de 79 mil toneladas de petróleo a bordo, que encalhou frente à Corunha em 1992. Dez anos depois, a cidade voltou a ser fustigada com o Prestige. Alertas presentes um pouco por todo o aquário fazem questão que nenhum destes casos seja esquecido. Aparentemente alheios a todas estas questões parecem estar os seres que habitam o circular tanque em exposição no centro do aquário e que reproduz a vida a 400m de profundidade, com raias-de-dois olhos, tamboris, sapateiras, lagostins, caranguejos… As salas percorrem-se de

aquário em aquário (naturalmente, os peixinhos coloridos que povoam o imaginário infantil desde o filme Nemo também cá estão) até chegarmos aos grandes tanques por onde as moreias parecem encetar um bailado e tudo à volta nos remete para o interior do imaginário de Júlio Verne. Mas a estrela deste espaço é Gastón, um tubarão-touro de três metros e mais de cem quilos. Enquanto isso, lá fora as focas exploram a piscina natural que aproveita as escarpas para recriar um ambiente divertido para estes animais. O aquário está aberto todo o ano (encerra apenas no Natal, Ano Novo e Dia de Reis), de segunda a sexta entre as 10h e as 18h e aos fins-de-

Do Monte San Pedro tem-se uma vista alargada sobre a baía de Orzán, em redor da qual se ergue a cidade; na foto de baixo, a Torre de Hércules

semana e feriados das 11h às 20h. A entrada tem um custo de 10€.

Domus, Casa do Homem Conhece-te a ti mesmo

Mercado de Santa Lucía Festim de cor

Apresenta-se como o “primeiro museu interactivo do mundo dedicado ao ser humano” e foi projectado por um dos maiores arquitectos vivos, o japonês Arata Isozaki. O prédio impõe-se frente ao mar como uma vela enfunada pelo vento, erguida num “navio” de rocha, sabiamente aproveitada na estrutura do edifício, revelando-se, aqui e ali, naturalmente húmida e limosa. Como se o prédio fosse em si um ser vivo que por acaso a rocha deu à luz. Lá dentro, o espaço expositivo não surpreende tanto quanto o esqueleto arquitectónico, traçado a grandes aberturas, ligações, interligações e corredores verticais. Ainda assim,

Valorizar o mar poderia ser um lema no Mercado de Santa Lucía, onde logo pela manhã fomos encontrar um verdadeiro banquete marinho. Assim que se entra é uma festa. De cor, de brilhos dos peixes frescos ainda por escamar, de cheiros. Pelas bancas deste mercado novinho em folha e forrado a vidro, uma amostra da fauna que povoa a ria da Corunha e o mar da Galiza. Todos expostos com o cuidado e com o gosto de quem vê naquele pedaço de balcão uma montra viva por onde se podem apreciar polvos, mexilhões, perceves, santolas, amêijoas, berbigões. O colorido do mercado manifestase no que se vende e em quem aqui faz vida. É o caso de Bea, 59 anos, com três décadas de mercado no currículo, que vai trauteando uma cançoneta enquanto amanha o pescado de uma fiel cliente. Acorda todos os dias pelas 3h para chegar à lota às 5h. Só assim se consegue o peixe mais fresco. Passeamo-nos de banca em banca, sem o que comprar. Não somos os fregueses ideais, mas nem por isso os sorrisos se desvanecem. É que a boa disposição também faz parte do negócio. “Temos que nos divertir enquanto trabalhamos, se não é uma tristeza”, resume Bea com uma ampla gargalhada. O novo edifício, que poderia ser confundido com um qualquer centro comercial — o antigo, opina a nossa guia corunhesa, “era muito bonito”, mas não só “não tinha condições” como “a reconstrução exigia um custo demasiado elevado” —, divide-se em mais pisos além deste dedicado ao mar. Há um só para frutas e vegetais e outro que se divide entre talhos e charcutarias. Num destes, o queijo típico da Galiza que não costuma deixar os turistas indiferentes graças à sua forma semelhante a um seio feminino. O queijo Tetilla, diz-se, começou a ser cozinhado com este formato depois de as autoridades religiosas terem ordenado o corte das curvas do peito da estátua da rainha Ester na Catedral de Santiago.

há diversão didáctica por todo o lado — e peças marcantes das mais diversas áreas. É que o Domus, que tem por mote Nosce te ipsum (latim para “Conhece-te a ti mesmo”), reparte-se por umas duas centenas de pontos relacionados com a Inteligência, a Genética e a Evolução. Querendo ser um museu interactivo (atenção ao slogan: “É proibido não tocar”), tão científico quanto pop (e acessível: 2 euros), dá-nos logo dois sinais de que é possível ser sério sem deixar de brincar. Há logo sexo e cinema: lembra-se Marilyn Monroe de saia a subir com mãos de vento. Há logo vida e morte, pensamento e arte: um esqueleto azul sobre pedestal de estátua em posição d’ O Pensador de Rodin. Por todo o lado há informação e há “brincadeiras”: são dezenas

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Viagem Espanha A Praça de María Pita é um lugar amplo, que convida a pausas de esplanada; em baixo, Bea, na sua banca de peixe no Mercado de Santa Lucía

SÉRGIO AZENHA

de jogos, aparelhos, instrumentos de medição, etc., etc., tudo posto à disposição para usarmos. Podemos medir-nos de todas as formas e feitios, pôr as mãos sobre a barriga de uma mãe-modelo para sentir como um bebé se mexe e dá pontapés, testar a rapidez do nosso pontapé. No fim, não se pode deixar de tirar a fotografia de família com os nossos antepassados: um Neanderthal, um Erectus ou um Australopithecus. Instalado no edifício de Isozaki há outro Domus, um restaurante que tem na ementa o cunho do chef Eduardo Pardo e um gostinho da Casa Pardo, sítio afamado e estimado com meio século e estrelas Michelin na sua história. O Domus de Eduardo Pardo não vira as costas ao museu nem à sua história (prova disso são os croquetes, uma receita da avó) mas tem, literalmente, os olhos postos no mar, com uma corrida varanda transformada em sala de refeições, e no futuro, criando um menu que baseia a sua essência nas raízes e nos produtos locais para depois se atrever a umas fusões mais cosmopolitas. O preço médio de uma refeição varia entre os 20€ e os 44€. Um conselho: se for primeiro ao restaurante e depois ao museu, salte alguns dos aparelhos de medições, especialmente a balança…

SÉRGIO AZENHA

Monte de San Pedro Varanda sobre o Atlântico

Praça de María Pita Vida na rua “Nas veias corre-nos o sangue de María Pita.” É assim que a nossa guia descreve as mulheres corunhesas. María Pita, nome de praça ampla a convidar a pausas de esplanada e de uma panóplia de outras coisas (pastelarias, restaurantes, hotéis…), foi uma heroína do século XVI, sendo-lhe atribuído o feito de ter derrotado o soldado inglês que, durante o cerco britânico à cidade, em 1583, empunhava a bandeira. Com a bandeira dos invasores na sua posse, María Pita terá liderado um movimento popular contra os militares ingleses gritando “Quen teña honra, que me siga”. Mas María Pita, de nome completo María Maior Fernandes da Camara Pita, não ficou na história da Galiza apenas pelo seu acto heróico. Em pleno século XVI, casou-se quatro vezes, tendo enviuvado todas elas. Dizem as más-línguas que não pro-

brir histórias religiosas, como a de Santiago, do século XII, a mais antiga da cidade.

priamente por causas naturais. A história de María Pita pode começar por ser estudada na sua praça, onde uma estátua representa a mulher com o inglês que comandou o ataque à cidade derrotado aos seus pés. A praça, construída entre 1860 e 1926, desenha-se num quadrado dentro do qual se encontra o Palácio Municipal da cidade. Mas o que se

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torna imperdível nesta praça são as pessoas que lhe dão vida. Haja um pouquinho de sol e a praça enche-se de gente que ocupa as muitas esplanadas, entre petiscos e conversas barulhentas. É também um bom ponto de partida para descobrir a zona velha, onde o reencontro com María Pita é inevitável junto à Casa-Museu em que se transformou a proprie-

dade do seu primeiro marido, Juan Alonso de Rois. Mas antes há tempo para nos perdermos pelas ruas íngremes de calçada irregular, para passear pelos pequenos jardins por onde vamos passando, como o Jardín de San Carlos, onde se encontra o túmulo do general Sir John Moore, e do qual voltamos a defrontar-nos com o azul do mar, ou para desco-

A Corunha fica a cerca de cem quilómetros do Cabo Finisterra, mas aqui, como lá, a história é marcada pelo fim do plano que se imaginava que era o planeta, com o horizonte completamente recto embrenhado numa mística neblina. A imagem é ainda mais forte no alto do Monte de San Pedro, de onde vão abrindo asas coloridos parapentes num espectáculo que até nos distrai da paisagem. Esta redescobre-se assim que um dos aparelhos consegue por fim apanhar a corrente de ar certa e o seguimos com o olhar. Em baixo, toda a baía de Orzán, ao redor da qual se ergue a cidade A Coruña, escrita na forma original galega. Do lado de lá, a costa do município de Ferrol, terra que viu nascer duas personalidades muito distintas que marcaram o século XX espanhol: Pablo Iglesias, fundador do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), e Francisco Franco, o Generalísimo que ocupou com punho de ferro o lugar de Chefe de Estado entre 1939 e 1975, depois de ter saído vencedor da sangrenta Guerra Civil (1936-1939). O passado beligerante do país e da cidade está bem patente neste antigo campo militar defensivo pela imponente presença de canhões que hoje têm mera função decorativa no gigantesco complexo de lazer em que se transformou o Monte de San Pedro. E até a chegada aqui pode ser vivida em momento de lazer se se optar pelo elevador que, desde 2007, se ergue em forma de bola envidraçada, penhasco acima, a partir do passeio marítimo da cidade. No topo, além de todas as actividades propostas ao ar livre, é possível visitar a Cúpula Atlântica, um miradouro coberto com vistas em 360º, ou o Centro de Interpretação do Monte de San Pedro. O parque está aberto a visitas o ano inteiro; o ascensor panorâmico (3€/ bilhete) funciona no Inverno entre as 11h30 e as 19h30 (sábados até às 21h30) e no Verão entre as 11h30 e 21h, encerrando às segundas-feiras para manutenção. A Fugas viajou a convite da Ibis


A ligação ao mar está presente no mobiliário, nas cores seleccionadas, nas obras que decoram as paredes

A economia com novo estilo Continua a ser um Ibis e a apresentar tarifas económicas, sobretudo devido à sua pouco atractiva localização, no parque empresarial La Grela, perto da fábrica de cerveja Estrella Galicia, mas apresenta-se com “estilo” e várias nuances que o distinguem das unidades tradicionais da rede da cadeia Accor. O Hotel Ibis Styles A Coruña, a primeira unidade desta submarca na Galiza (em Portugal ainda não há nenhuma unidade do género), abriu portas no fim do ano passado e propõe-se a ser uma alternativa a quem procura a Corunha quer em passeio quer em trabalho, apostando num ambiente requintado e confortável. Com um detalhe importante: é único. Cada Ibis Styles tem uma identidade muito própria, com um temabase sempre ligado de certa forma ao local onde o hotel é erigido. Na Corunha, a temática que lhe serve de fio condutor é a água. A ligação ao mar está presente no mobiliário, nas cores seleccionadas, nas obras que decoram as paredes. Os 84 alojamentos, entre quartos com duas camas individuais, triplos, superiores com cama dupla e terraço e suites familiares com dois quartos com ligação, também se distinguem dos Ibis convencionais, a começar pelas dimensões. No caso do superior, este é dividido entre zona de dormir e de estar e de vestir, além de ser servido por um gigantesco terraço, forrado a tapete verde, a imitar relva, quase do tamanho do próprio quarto. Na casa de banho, com banheira, o investimento no espaço também é evidente, assim como nos produtos de higiene de qualidade superior.

DR

HOTEL IBIS STYLES A CORUÑA

Uma coisa, porém, mantém-se: as camas Sweet Bed by Ibis, que primam pelo conforto e garantia de noite repousada. Todos os quartos dispõem de TV e ar condicionado. De sublinhar que o acesso à Internet sem fios é gratuito por todo o hotel, quartos incluídos. Também no serviço encontram-se diferenças — o pequeno-almoço, por exemplo, está incluído no preço do quarto e não fica a dever nada a qualquer unidade mais estrelada. O restaurante é, aliás, uma das apostas da unidade, não só a pensar nos hóspedes como nos corunheses — nem

FRANÇA

Corunha

PORTUGAL

de propósito, na noite em que chegámos um grupo de amigos ocupava uma grande mesa no centro do restaurante. O hotel oferece ainda duas salas de reuniões com capacidade para até 120 pessoas, um centro de negócios, espaço de brincadeiras para as crianças e parque de estacionamento. Um quarto reserva-se desde 49€ para uma pessoa e 57€ para duas. Um superior reserva-se a partir de 63€.

COMO IR A TAP voa nos novos ATR 42-600 para a Corunha a partir de Lisboa desde cerca 70€/trajecto. A partir do Porto, o carro poderá ser uma opção — são 300km, menos do que uma viagem até Lisboa.

Madrid ESPANHA

Mar Mediterrâneo

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 15


Efeméride Aviação

Nos 70 anos da TAP, também voamos pela história em terra

C

aminhamos em terra mas assim que entramos no Museu do Ar, junto à Base Aérea N.º1, em Sintra, parece que não paramos de voar. Num imenso hangar onde os olhos passeiam por aviões e partes de aviões por todo o lado, recebemnos os pioneiros da aviação — ali uma passarola, ali o João Torto que tentou voar com as suas próprias asas, além imagens, quadros, fotos históricas que percorrem a história da TAP e da aviação. O Museu do Ar, com sede principal aqui, inclui muito mais aviação mas hoje celebramos a TAP e é o seu núcleo histórico, que aqui se estreou em 2012, que nos faz voar até estas paragens. Quando por cá passeámos, estávamos a dias da comemoração da data fundadora da companhia aérea nacional, 14 de Março de 1945, data em que Humberto Delgado assinou a ordem que criou os Transportes Aéreos Portugueses. Este sábado, é com festa e muitas memórias que se celebram, também aqui no museu, os 70 anos da TAP. Não é só o núcleo histórico da companhia que estará sob o foco: é inaugurada uma grande exposição dedicada à lendária Linha Imperial, iniciada a 31 de Dezembro de 1946, e mostra-se um monumental trabalho, o do restauro de um DC3 Dakota, preparado ao milímetro para nos fazer viajar a esses tempos primordiais por uma equipa de voluntários dedicados. É ele o centro deste espaço e em seu redor há ainda muita gente a aperfeiçoá-lo e a ultimar preparativos

enquanto outra equipa vai terminando detalhes da mostra histórica, mais um pormenor que explica por que é que a TAP está interligada com a identidade nacional. Como se estivéssemos também prestes a levantar voo, ao longo do passeio por esta casa em base aérea nunca deixamos de ter os aviões nem no olhar nem nos ouvidos. Lá dentro, num cubículo, Adelina Arezes, responsável pelo Museu da TAP, escolhe peças que são réplicas de fardas dos anos de 1940. “Qual é o número da Cristina?”, pergunta. Ainda ninguém sabe. Adelina, que foi assistente de terra mas é também licenciada em história de arte, dedica-se agora à história da companhia e aos objectos que a mostram. Passeamos com a especialista por entre narizes de aviões, velhos aparelhos de controlo, grandes e cinematográficos painéis, carros de ensaio de pista, malas repletas de aparelhos ou precursores dos simuladores de voos (ali um parece quase uma diversão infantil vintage). Além um poster promete “samba holidays” no Rio com a TAP, ao fundo desfilam anos de fardas (e “que marcavam também as modas cá fora”, confirmanos Adelina). O conjunto de fardas acompanha também os tempos, as modas e as necessidades, das mais antigas (como as réplicas dos fardamento da equipa de voo da Linha Imperial, com ar de gente aventureira dos anos 1940, que inclui botas “para os mosquitos e os escorpiões não lhes morderem”), até aos tempos mais modernos, passando por peças assinadas por estilistas. “É uma pequena mostra do que há, há muitos mais uniformes, claro.” Muitos deles, tal como loiças e muitas

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outras peças, poderão igualmente ser vistos em breve numa grande exibição da imagem da TAP ao longo dos anos no Mude — Museu do Design e da Moda. Curiosos são também os serviços de refeições usados. Do plástico das classes económicas às porcelanas e vidros para as superiores. Até barro: tempos houve em que o caldo verde era servido na sua tradicional malga, assim como até o frango na púcara tinha direito ao seu recipiente vermelhinho com o nome da especialidade em letras branquinhas. Ou aquele serviço em alpaca, uma liga de prata, para as linhas de África, que incluía conjunto para servir caviar. No hangar museológico, admiramos maquetas. “São muito delicadas e estragam-se com facilidade, ou vêm com uma janelinha mal colocada. Mas os modelistas e voluntários dedicam-se com ‘paixão’ a restaurar e solucionar tudo”, explica a responsável. Pelas paredes, toda a história da TAP é lembrada. E há momentos emocionantes (não) perdidos no tempo. Como a foto do Almirante Gago Coutinho, o homem que com Sacadura Cabral fez a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, em 1922, sentado num avião moderno durante uma viagem experimental pré-estreia da rota Lisboa-Rio. Tinha 86 anos. “Já muito velhinho, foi convidado como consultor técnico, era uma viagem experimental e ainda foi fazendo cálculos…” Enquanto nos distraímos na história, Adelina continua a trabalhar na finalização da mostra A Linha Imperial - uma ponte entre a Europa e África. “Era uma aventura”, resume. Imagine-se um voo de 24.540km, em

DR

A TAP celebra hoje 70 anos. Juntamo-nos à festa com um voo pela sua história no Museu do Ar, onde hoje é inaugurada uma mostra dedicada à lendária Linha Imperial que ligava Lisboa-Luanda-Lourenço Marques. A estrela da festa: um Dakota DC3 desses dias, restaurado com rigor por quase duas centenas de voluntários. Luís J. Santos

12 escalas, num destes DC3 que estão a restaurar à nossa frente. Materiais históricos ajudam-nos a perceber melhor este milagre aéreo, intrinsecamente ligado à história do país. Ali vemos o relatório de viagem do serviço inaugural ou talões de embarque (um dá conta do pagamento de quase 30 contos por passagens). E veja-se o horário: na quarta-feira às 14h saía de Lisboa, na terça às 18h

aterrava em Lourenço Marques. Foi você que pediu uma volta a África? Ia parando, Marrocos, Senegal, Gana, Gabão, Luanda (sendo algumas paragens apenas técnicas)… Até Maputo, ainda haveria paragens no Congo ou Zimbabué. O preço total do voo de Portugal a Moçambique não era low cost: 14.470 escudos ($9,607 para Luanda) — e como mandava a tradição então, lê-se,


ENRIC VIVES-RUBIO DR

O Dakota DC3 foi restaurado e está agora em exposição no Museu do Ar, em Sintra; em baixo, algumas fotos históricas da TAP

estas tarifas eram “oneradas por taxas de aeroporto e imposto do sêlo”.

O avião da história “Isto é tudo muito bonito. Mas se não houvesse o grupo de voluntários não havia avião restaurado nem havia festa”, lembra Adelina. É que o avião no centro deste mundo, o Douglas DC3, C3-TDE, é a menina do olho da celebração e foi

restaurado graças ao trabalho árduo de quase duas centenas de voluntários e à iniciativa do comandante Carlos Tomás, na TAP desde 2001, que coordena a equipa de recuperação do Dakota. É “o homem do avião”, dizem-nos. A “paixão” chegou a tal ponto que o grupo criou uma associação a partir do projecto, o Vintage AeroClub. Em redor do avião, os voluntários ultimam os trabalhos e

sente-se ainda o cheiro das tintas que ajudam a devolver ao aparelho o exacto aspecto que teria um exemplar igual que voasse na Linha Imperial. Este aparelho em específico nunca voou comercialmente na TAP mas teve uma grande vida: bateu-se pelos Aliados na Segunda Guerra Mundial (Carlos sonha trazer cá se não quem o usou pelo menos familiares desses militares), passou pela Aer Lingus e Israel e chegou à Direcção-Geral de Aviação Civil, que o passaria à TAP para funções paralelas, como voos técnicos e de treino. Nos anos 1980 foi para o museu. “Estava todo cinzento, o tecto estava a cair.” Vale a pena consultar o site do AeroClub (vintageaeroclub. wordpress.com), que acompanha a recuperação passo a passo, para ter uma ideia do “milagre” aqui feito. Propôs-se à TAP a recuperação do avião, mas “não havia pessoal, não havia dinheiro”, conta-nos Carlos. Depois “apareceram voluntários cheios de vontade de mexer num avião” e criou-se o grupo. A TAP apoiou a ideia, cedendo materiais e

oficinas. Mas mesmo trabalhadores da empresa trabalham voluntariamente, fazendo as partes do restauro que lhe cabem fora das horas de trabalhos de manutenção e outros. No grupo, contam-se 71 voluntários fora da TAP, 96 que trabalham para companhia. Houve ainda outras ajudas, como visitas de escolas, alunos que colocaram parafusos e aprenderam história ao vivo. O avião foi estudado de alto a baixo, dos detalhes mais técnicos às molduras de madeira das janelas ou às formas das alcatifas usadas. Para conseguir “rigor e realismo”, agarraram em referências conhecidas mas também tiveram que “inventar” outras. “Esta curvinha na linha azul da pintura é o que nós achámos que numa época retro se faria assim, porque não há fotografias deste sítio”, “só há três fotografias dentro de uma cabine destas num avião da TAP a preto e branco”. Foram procurar instrumentos antigos, os bancos, os tecidos, as cores, refez-se a casa de banho (era com balde…). Mas “não se sabe tudo”, será este azul, não será?. Mas tenta-se respeitar a história ao pormenor — “o melhor que sabemos”. “Limpou-se a corrosão, levantou-se o chão, andou-se dentro das entranhas do avião.” E optou-se por um aparelho de duas faces, duas histórias: de um lado, o aparelho voltou ao cinzento metalizado que os seus “irmãos” ostentavam noutros tempos e lê-se Transportes Aéreos Portugueses – Secretariado da Aeronáutica Civil; do outro, mantém-se a imagem da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil. Agora estará restaurado e visitável para “40 ou 50 anos”. Ou mais. O certo é que ninguém resistirá a entrar avião adentro e sentar-se num dos bancos durante a visita guiada para sentir-se passageiro desses anos de 1940 (e apostamos que ninguém vai resistir à respectiva selfie..). E será que este avião ainda poderia voar, perguntamos? “Tudo é possível”, responde Carlos. Enquanto deixamos esta TAP museológica, Adelina, Carlos e companhia continuam atarefados no seu trabalho de preservação da nossa memória colectiva. Cá fora, na parede do museu, uma frase eterna inscrita na fachada deixa o aviso para os tempos que passaram e para os que aí vêm: “O dever da memória”.

TAP 70 ANOS O programa de celebrações da TAP inclui várias iniciativas, como o concurso de ideias TAP Creative Lauch (www. tap70.com/creativelaunch), passatempos e promoções, ou a preparação de uma outra grande exposição no Mude Museu do Design e da Moda dedicada ao “design, identidade e imagem da companhia aérea nacional”. Para esta mostra, a empresa está a pedir a todos que tenham “cartazes, objectos ou indumentária da TAP” para entrarem em contacto com os responsáveis pela selecção (via tap70anos.mude@ gmail.com ou Tel :218171898).

MUSEU TAP NO MUSEU DO AR Granja do Marquês, 2715-021 Pêro Pinheiro, Sintra Horários: De terça-feira a domingo, das 10h às 17h. Encerra à segunda-feira. Tel.: 219678984 www.emfa.pt/www/po/musar

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Dormir Principe di Savoia

Um clássico italiano de luxo Tem uma das mais célebres suites presidenciais do mundo — 500 metros quadrados com piscina privada num spa a evocar Pompeia antiga. O Principe é um grand hotel — um clássico com opulência de velho mundo. Vanessa Rato

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oi a pergunta do mundo da hotelaria — mas também da moda e dos direitos humanos — ao longo de 2014: qual, afinal, o impacto do boicote à Dorchester Collection? Proprietária e gestora de 10 dos melhores e mais conhecidos hotéis do mundo ocidental, a Dorchester Collection agrupa oito negócios na Europa e dois nos Estados Unidos: o The Dorchester e o 45 Park Lane em Londres, o Coworth Park em Ascot, o Le Meurice e o Plaza Athénée em Paris, o Principe di Savoia em Milão, o Le Richemond em Genebra, o Bel-Hair, em Los Angeles, e o The Beverly Hills em Beverly Hills. É uma espécie de família. Que por detrás tem a Agência de Investimentos do Brunei, braço operativo do Ministério das Finanças deste sultanado do sudoeste asiático regido por Hassanal Bolkiah. Tido como o quarto monarca mais rico do mundo, Bolkiah tem uma fortuna pessoal estimada em pelo menos 20 mil milhões de dólares. Tomou posse em 1967, quando o pai abdicou e, desde então, o seu poder é absoluto. Mas só no final de 2013, com quase meio século de regência em mãos, anunciou a intenção de o seu país adoptar a lei da sharia, prevendo, nomeadamente, a morte de adúlteros e homossexuais por lapidação ou chicoteamento.

As reacções internacionais não se fizeram esperar, com o nascimento de um boicote à Dorchester Collection. E a adesão de cada vez mais nomes da carteira de clientes de classe A da cadeia. Anna Wintour, a conhecida editora da Vogue norte-americana, anunciou não só o fim da sua tradicional estadia no Le Meurice durante a semana da moda de Paris como a adesão de todas as publicações da Condé Nast ao boicote à cadeia. O multimilionário britânico Richard Branson fez o mesmo, tanto em nome da sua família como do grupo Virgin. E figuras públicas como Paul McCartney, Stella McCartney, Jay Leno, Ellen DeGeneres, Sharon Osbourne, François-Henri Pinault e outros fizeram o mesmo a título pessoal. De repente, uma passagem por um dos hotéis da Dorchester Collection tornou-se motivo de vergonha. E nas semanas que se seguiram ao lançamento do boicote a imprensa californiana reportou o impacto: o vazio nos bares e restaurantes do Beverly Hills Hotel, antes espaços onde ver e ser visto. Num só mês este hotel terá perdido cerca de dois milhões de dólares em cancelamentos de reservas — o “efeito Hollywood”: de luxo a lixo em menos de nada. Mas, meses depois, em Milão, nada deixa adivinhar esse grande acidente em curso: no Principe di Savoia a vida flui com toda a normalidade. Seis da tarde de uma quarta-feira. Lá fora, é noite escura e a chuva cai densa, uma cortina. Cá dentro, o

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imenso lustre em cristal de Murano do Il Salotto espalha uma luz quente e dourada sobre o lounge do lobby deste hotel de estilo oitocentista, com as suas poltronas fundas e os seus sofás de veludo verde. Tal como o mais nocturno Principe Bar, que fica mesmo ao lado, dominado por um piano de cauda e o ir e vir de DJ, o Il Salotto, especializado em pastelaria e chás de fim de tarde ao estilo inglês, é um dos espaços frequentados pela Milão afluente. Uma tradição que sobe ao rubro na altura dos muitos eventos internacionais da capital italiana da moda e do design e que se vem mantendo desde o final dos anos 1920, quando o Principe foi inaugurado e nomes como Aga Khan, Aristóteles Onassis, Maria Callas, Erich Maria Remarque, Charles Chaplin, Josephine Baker e Eva Perón começaram a tornar-se presenças habituais. A inauguração foi a 6 de Abril de 1927. Nesse dia, segundo os arquivos

HOTEL PRINCIPE DI SAVOIA Piazza della Repubblica, 17 20124, Milão, Itália Tel.: +39 02 62301 Email: info.hps@ dorchestercollection.com www.dorchestercollection.com/ en/milan/hotel-principe-di-savoia Preços: a partir de 300€

do Principe, o jornal de negócios Il Sole publicava um anúncio de página inteira em que se publicitavam “todos os confortos que se possa imaginar”. Entre eles, uma orquestra a animar diariamente a hora do

jantar e uma rede de ligação telefónica directa entre todos os quartos — uma extravagância tecnológica para a época. Era o tempo em que Milão começava a construir a sua reputação como centro financeiro internacional. A própria localização do hotel foi escolhida em função dessa realidade: uma imensa fachada neoclássica a dominar a Piazza della Repubblica, então chamada Piazza Fiume. Não era — tal como não é ainda hoje — o coração turístico e comercial da cidade, que se concentra em torno da Piazza del Duomo, a emblemática igreja-símbolo de Milão. Na altura, a Piazza Fiume ficava junto à zona industrial, ao lado da então principal estação ferroviária, entretanto secundarizada. Uma geografia que se veria profundamente alterada durante os anos da II Guerra Mundial. Primeiro tomado como sede pelo exército nazi e depois pelos Alia-


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Guia prático

ONDE IR

NIALL CLUTTON

Duomo Com as suas 3400 estátuas e grandes vitrais, o Duomo é a terceira maior igreja do mundo e o principal símbolo turístico de Milão. Foi começada em 1386 e completada no final do século XIX, ficando ao centro de uma das zonas comerciais da cidade, com a conhecida galeria Vittorio Emanuele, ao lado.

dos, quase 100 anos volvidos sobre a inauguração do Principe, a zona transformou-se entretanto numa série de bairros de avenidas largas. O hotel, que quando foi criado ficava a dez minutos em caleche do La Scala, permite agora fugir à agitação do centro. Raros hotéis serão, aliás, tão silenciosos. Para lá do bulício da entrada em mármore, com a recepção, o lounge do Il Salotto e o clássico balcão da conciergerie — uma figura hoje ausente da maioria dos hotéis —, as espessas alcatifas dos corredores e as paredes apaineladas a madeira abafam quaisquer sons. Nenhum ruído do exterior chega também aos quartos, perfeitamente isolados. Actualmente — e depois de várias intervenções de renovação, a última das quais em 2006 —, o Principe tem 301 quartos, 44 dos quais suites. É um grand hotel — o contrário dos hotéis de luxo mais recentes, que normalmente apostam numa lógica

de exclusividade, com um número reduzido de quartos em edifícios o mais centrais possível. O Principe vale-se de outros trunfos. Um deles é a quantidade e qualidade das suas suites. Outro é a fama da sua suite presidencial, uma das maiores e mais célebres do mundo. São 500 metros quadrados com três quartos, sala de jantar com espelhos venezianos do século XIX e sala de estar com mobiliário de estilo Império original, lareira e piano de cauda. Depois há o spa privado: piscina, jacuzzi, sauna e banho turco — um pastiche dos banhos tradicionais da Pompeia antiga numa sala de 100 metros quadrados com tectos abobadados, paredes decoradas com frescos e janelas panorâmicas para a cidade e as montanhas nevadas que envolvem Milão. Uma vez chegados ao décimo andar, que tem o seu próprio elevador, as portas vão-se abrindo — um ambiente por quarto: paredes em tecido

verde-esmeralda e animal prints no primeiro quarto (normalmente ocupado por seguranças), frescos com vistas dos famosos jardins Bagatelle de Paris no segundo (normalmente ocupado por crianças) e, por fim, o amarelo-palha do quarto principal, com as paredes integralmente forradas a damasco produzido pela Casa Rubelli. Na suite presidencial do Principe já ficaram de Isabel II de Inglaterra a Lady Gaga, passando por Madonna, Bill Gates, George W. Bush, Vladimir Putin, Woody Allen, George Clooney e Francis Ford Coppola. Foi também nesta suite presidencial que Sophia Coppola filmou grande parte de Algures. E, tal como todos os nomes que por lá têm vindo a passar, também o seu se tornou em mais um dos cartões-de-visita do hotel. Mas não é de presenças como esta que se faz o dia-dia do Principe. Manhã de uma quinta-feira no Acanto, o restaurante de paredes de

vidro abertas para o jardim. À noite, com o exterior e a fonte do século XVIII iluminados, o Acanto serve cozinha italiana clássica. Ao pequenoalmoço recebe a luz natural vinda de fora. E abre uma montra sobre os clientes comuns do hotel, a ir e vir entre as suas mesas redondas e o buffet. São sobretudo empresários em viagem de trabalho e jovens casais do Médio Oriente, asiáticos e russos. Quer fiquem num dos 257 quartos simples ou numa das 44 suites, movimentam-se em ambientes que cruzam o clássico e o contemporâneo, sempre em materiais de luxo — mármores de Lasa, mosaicos de vidro feitos à mão, painéis de parede em nogueira. Em todos os quartos, também, produtos de toilette da marca-emblema italiana Acqua di Parma, que em 2001 foi adquirida pelo grupo Louis Vuitton e tem hoje a sua sede em Milão. A Fugas esteve alojada a convite do Principe di Savoia

A Última Ceia Numa das paredes do que foi em tempos o refeitório do mosteiro de Santa Maria delle Grazie está a mais conhecida das obras de Leonardo da Vinci e uma das mais conhecidas, estudadas e reproduzidas pinturas do mundo. Devido à afluência de turistas, a visita — restrita a uma permanência de 15 minutos — deve ser marcada com a maior antecedência possível. Via della Spiga É provavelmente a mais conhecida rua de Milão, famosa pela sua concentração de lojas de moda de luxo. É uma das vias que limitam o Quadrilatero della Moda — também conhecido como Fashion District Via Monte Napoleone — juntamente com a Via Monte Napoleone, que lhe dá nome, a Via Manzoni e o Corso Venezia. Pinacoteca di Brera Com obras de Rafael, Mantegna e Caravaggio, entre muitos outros, a Pinacoteca di Brera, que guarda uma das mais importantes colecções de arte em Itália, traçando um arco temporal que arranca no século XIII e chega até ao século XX. Corso Como District A cinco minutos a pé do Principe di Savoia fica o novo bairro boémio da moda de Milão, agora conhecido como Corso Como District, espalhando-se em torno da rua com o mesmo nome. Os restaurantes, bares e discotecas da zona são a novidade trendy da cidade.

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Gastronomia Goût de France

Um jantar à grande e à francesa Mais de mil chefs em cinco continentes vão cozinhar na mesma noite uma refeição inspirada pela gastronomia francesa. Ocasião para a França lembrar que a sua “escola” está na base de muito do que se cozinha no mundo. Alexandra Prado Coelho

É

um projecto ambicioso: dia 19 de Março, 1300 chefs em cinco continentes vão cozinhar uma refeição francesa. A ideia foi inspirada pelos Jantares de Epicuro, organizados no início do século XX pelo famoso chef Auguste Escoffier com o objectivo de divulgar a cozinha francesa no mundo. No primeiro participaram mais de quatro mil pessoas e no último — em 1914, nas vésperas da I Guerra Mundial — dez mil, espalhadas por 147 cidades. Agora, no século XXI — e numa altura em que tanto se fala da gastronomia espanhola, da nórdica ou da peruana —, a França recupera o projecto de um jantar global, a que chamou Goût de France/Good France, e no qual junta a filosofia da refeição francesa (já lá vamos) às actuais preocupações com a saúde e uma alimentação equilibrada. Por isso, os chefs participantes foram convidados a apresentar a sua candidatura com um menu que cumprisse estes dois requisitos. As candidaturas, vindas de todo o mundo, foram avaliadas por um júri dirigido por outro chef famoso, Alain Ducasse. O que se pretende com esta iniciativa que foi proposta por Ducasse ao Governo francês, está, aliás, resumido nesta frase do chef: “Falar de cozinha — da cozinha francesa — é também falar da alegria de viver, da elegância, do optimismo e do prazer — ideias que são cruciais para a imagem da França.” Será também ocasião para lembrar que a refeição francesa faz parte da lista de Património Ima-

terial da Humanidade da UNESCO. Em Portugal são 17 os restaurantes participantes: Adlib, Anfiteatro, Arcadas da Capela, Belcanto, Bistro 100 Maneiras, Cafetaria Mensagem, De Castro Flores, Eleven, Fortaleza do Guincho, Largo, Lisboète, Mesa do Bairro, O Nobre, Poivron Rouge, Casa de Pasto, Varanda (do Ritz) e Vila Joya. Não sendo possível falar com todos os participantes, a Fugas optou por conversar com os dois que são franceses — Vincent Farges, da Fortaleza do Guincho, e Pascal Meynard, do Varanda, o restaurante do Hotel Ritz Four Seasons — para lhes perguntar o que é, afinal, a tão falada “escola francesa”.

Língua comum na cozinha Em primeiro lugar, há a formação. “A escola lá é completamente diferente”, diz Vincent Farges. “O problema aqui é que não existe um programa, não há um livro único sobre as bases da cozinha. Em França, cada chef, seja em que lugar for, se você lhe pedir para fazer um determinado molho sabe exactamente o que fazer. E o mesmo para as técnicas de corte, as sopas, as saladas, a forma de trabalhar o peixe, ou a carne. Aqui, se pedir a qualquer cozinheiro para fazer uma sopa da pedra não há uma receita oficial.” No fundo, a escola francesa baseiase num cânone de receitas e técnicas base que criam uma “língua comum” entre todos os que se dedicam à cozinha. “Há uma linha condutora, há termos técnicos. Se pedimos a alguém para cortar uma juliana, tem que ser uma juliana. Tem que haver uma certa disciplina para se ser bom.” Pascal Meynard fala também da importância da aprendizagem. “Em França, é mais longa. Ninguém se considera um chef com 20 anos. O

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importante são as bases, a cultura e a aprendizagem. Noutros países as pessoas aprendem aqui e ali, o resultado não é igual. Na escola de hotelaria em França há muito mais rigor. É preciso uma boa base para se ser sólido. A criatividade vem depois. Os jovens têm tendência para ultrapassar etapas, mas é preciso trazê-los de volta às bases, como se faz um molho, como se prepara um peixe.” Ambos falam também do “respeito pelo produto”. “Trabalho os legumes de uma maneira que aqui há pessoas que nunca viram. A técnica francesa liga-se muito a isso: há uma forma de sublimar os legumes que por sua vez vai sublimar o prato principal”, diz Vincent Farges. E tudo isto é potenciado pela enorme diversidade de legumes que se encontra num mercado francês, sublinha. “Se formos a uma feira de rua, em qualquer época do ano, temos legumes diferentes. Aqui, estamos na Primavera e não há nada de especial. Há brócolos, batatas, nabos, cenouras… é a mesma coisa o ano inteiro. Em França já há os espargos, as alcachofras, as favas, as ervilhas, uma variedade que nos abre o espírito e a criação.” Tanto Vincent como Pascal procuram, por isso, produtores que lhes ofereçam produtos excepcionais, como os legumes biológicos de Maria José Macedo, da Quinta do Poial, em Azeitão, ou os citrinos exóticos do Lugar do Olhar Feliz, no Alentejo. Quer uns quer os outros estarão presentes nos menus que os dois chefs prepararam para o Goût de France, no dia 19 — no Ritz o menu fica disponível até dia 26. “Quis trabalhar sobretudo a frescura”, afirma o chef do Ritz, referindose à entrada fria (cada menu tem que ter obrigatoriamente um aperitivo, uma entrada fria, outra quente, um


prato de peixe, outro de carne, queijo francês e uma sobremesa) que vai apresentar: carabineiro marinado com citrinos, legumes crocantes e azeite de basílico. Com excepção do aperitivo de foie gras com crocante de chocolate 70% e gelatina de Porto Tawny, e do queijo (que tem que ser francês), Pascal vai trabalhar produtos portugueses, do salmonete com crocante de azeitona, mariniére de bivalves e emulsão de clorofila à vitela de leite com uns toques orientais dados pela combava (citrino), beringela lacada com miso, e estaladiço de kumquat (outro citrino) e sésamo preto (o menu custará 75 euros). Vincent vai usar os pequenos legumes da Quinta do Poial com buntan (também um citrino) e nozes de macadâmia, seguido por um prato que considera um pouco mais arriscado para o gosto dos portugueses, as molejas com alcachofras. Terá ainda um robalo — ambos os chefs fazem grandes elogios ao peixe português — cozinhado ao vapor de algas frescas, e um borrego de leite dos Pirenéus com presunto Pata Negra (na Fortaleza do Guincho, o menu tem um preço de 125 euros). Para finalizar, ambos escolheram sobremesas nas quais trabalham o chocolate. E a manteiga e as natas, tão presentes quando de fala de cozinha francesa clássica, que lugar têm elas numa refeição que quer promover a alimentação saudável? “Já não é nada como era há dez anos”, garante Pascal. “Antes faziam-se muitos molhos com manteiga e natas. Hoje os molhos são muito mais ligeiros, com infusões, com azeite, tudo muito menos pesado. Nós aqui cortámos na manteiga cerca de 80%.” Vincent explica por seu lado que, na questão da manteiga e das natas, a França sempre foi dividida ao meio. “No Norte há pouco azeite, e por isso usa-se muito natas e manteiga, no Sul é que há oliveiras. Até há uns anos, a minha mãe, por exemplo, trabalhava com pouco azeite, eu chegava a casa e perguntava ‘não há azeite?’. Na região onde morei desde a infância não havia muito azeite, o que fazia dele um produto caro. Hoje em dia é diferente e cada vez mais os chefs usam o azeite.” Mas com mais ou menos azeite ou manteiga, o que faz a gastronomia francesa é, de acordo com os dois

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PEDRO MAIA

“Falar da cozinha francesa é também falar da alegria de viver, da elegância, do optimismo e do prazer”

A FESTA DOS SABORES DE FRANÇA

À esquerda, Vincent Farges; em cima, Pascal Meynard e um dos pratos que vai servir no âmbito do Goût de France

chefs, a ideia de uma refeição onde o convívio e a partilha são fundamentais, a par da tal escola de técnicas rigorosas. Quanto ao resto do mundo, não estão preocupados. “Os chefs de que se fala muito hoje têm todos como base a cozinha francesa.” Vincent não podia estar mais de acordo: “Os chefs nórdicos, que estão agora em foco, onde é que foram aprender? A França. A base que a

gente ensina em França é cozinhar com alma, com sentimentos, com sensibilidade. Os espanhóis vieram com técnicas novas de desestruturação, mas para se ter uma desestruturação é preciso ter uma base sólida. E para se ter um bom molho tem que se ter um bom caldo no início.” Por tudo isto, não tem dúvidas: “A cozinha francesa continua a ser uma das maiores do mundo.”

Dia 19 será a data da refeição francesa a uma escala global, mas desde o início do mês que há outros acontecimentos ligados aos “sabores de França”. Até dia 18 pode ser vista no Instituto Francês, em Lisboa, uma exposição fotográfica em torno do tema A Refeição Gastronómica Francesa e outra sobre as Artes da Mesa à Francesa. Também até dia 18, a La Pétillante, loja lisboeta de produtos franceses, vai fazer degustações de vinhos e outras especialidades de várias regiões de França. E a Nouvelle Librairie Française terá um espaço dedicado à edição francesa especializada em gastronomia. Ainda no Instituto Francês há cinema (entrada livre): no dia 18 passa o filme Como um Chef, de Daniel Cohen. E para dia 16 está prevista uma Grande Noite dos Sabores de França com uma conferência/degustação sobre pão, vinho e queijos franceses (entre as 19h e 22h, aconselha-se marcação prévia), que terá como moderador Julien Letartre (da cadeia de padarias Eric Kayser) e, entre os oradores, Mouette Barboff, especialista em cultura do pão em França e na Europa, e profunda conhecedora do pão português. Dia 17 há outra conferência, esta sobre a Arte de Bem Comer. A festa francesa inclui ainda um concurso gastronómico nas Escolas de Hotelaria e Turismo de Lisboa e Porto e uma conferência sobre queijos na Escola de Lisboa. Os 17 restaurantes portugueses que participam na iniciativa Gôut de France comprometem-se a entregar 5% das receitas desse jantar à Associação Portuguesa Contra a Obesidade Infantil.

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Gastronomia Receitas

O peixe também se dá bem em tostas

TOSTA DE CENTEIO COM SALMÃO BRASEADO Ingredientes: 3 lombos de salmão 1 laranja 1 limão 2 colheres de sopa de azeite 4 colheres de sopa de farinha de centeio 4 colheres de sopa de água Sal q.b.

Preparação

TOSTA DE MASSA FILO COM CAVALA Ingredientes

Preparação

4 folhas de massa filo

a Corte a massa filo em quadrados pequenos. Pincele tudo com azeite e faça montinhos de 5 ou 6 quadradinhos. Leve ao forno a dourar. a Corte os legumes em cubos pequenos, escalde-os durante três minutos em água a ferver temperada com sal, escorra e junte o peixe previamente arranjado em filetes e cortado em cubos. a Coloque o peixe numa taça, tempere com sal, sementes de mostarda, regue com o sumo de limão, as natas ligeiramente batidas e deixe a marinar durante cerca de uma hora. a Sirva os montinhos de massa filo com uma colher de marinada de cavala e decorado com ovas de peixe.

2 cavalas 1 cenoura 1 alho francês 1 curgete 2 dl de natas 1 colher de sobremesa de sementes de mostarda Sumo de 1/2 limão Ovas de peixe q.b.

a Regue com azeite o salmão e junte as rodelas de laranja e de limão. Tempere com sal a gosto. Cubra com película aderente e leve ao frigorifico durante cerca de uma hora. a Misture a farinha de centeio com a água e um pouco de sal a gosto. Deve obter um creme e, caso seja necessário, acrescente um pouco mais de água. a Num papel vegetal ou num tapete de silicone espalhe o creme numa camada fina e leve cozer ao forno durante cerca de cinco a 10 minutos. a Retire os lombos de salmão e com a ajuda de um maçarico braseie toda a superfície do mesmo. Corte em pequenos pedaços e sirva em cima de tostas de centeio.

Produção e fotografia: Hugo Campos hugocampos@feedme.com 22 | FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015


TOSTA DE MASSA FOLHADA COM TAMBORIL Ingredientes 400 g de tamboril 300 g de massa folhada 300 g de camarão 2 dl de natas 300 g de cogumelos 1 colher de sopa de manteiga Sal q.b. Colorau picante q.b. Cebolinho q.b.

Preparação a Leve a massa folhada ao forno entre dois tabuleiros para não crescer demasiado. Ferva as natas com a cascas do camarão e os cogumelos picados. Escorra, reduza e reserve o caldo. a Numa frigideira anti-aderente, com a manteiga frite pequenos escalopes de tamboril e junte os camarões. Tempere a gosto. a Sirva a massa folhada cortada em quadrados com o tamboril e os camarões. a Regue com o molho de natas e finalize com cebolinho picado e colorau.

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Crítica gastronómica Bem-Me-Quer

Bem-querer e com vontade de voltar Na capital do Minho, a cozinha tradicional continua a ditar as suas leis e a ser feita “à moda de Braga”. Receitas centenárias confeccionadas com critério, rigor e também muito orgulho, como é o caso das típicas papas de sarrabulho com rojões e o bacalhau à Narcisa. José Augusto Moreira (texto) e Nelson Garrido ( fotos)

A

par da monumentalidade histórica, Braga é hoje uma cidade viva e palpitante e onde a dinâmica que anima o seu centro histórico merece ser realçada. É comum dizer-se que tem a mais alargada zona pedonal do país e que o conjunto das suas ruas e ruelas, pejadas de comércio e actividade, constitui também um atractivo centro comercial. Ao ar livre e com uma invulgar e cativante dinâmica, onde história e tradição se cruzam com modernidade e cosmopolitismo em contexto deveras convidativo. Estamos na cidade da porta aberta, como é também conhecida por a dita nunca ter sido instalada naquela que ficaria como a mais famosa entrada da urbe na sequência da revolução urbanística levada a cabo há cinco séculos pelo bispo D. Diogo de Sousa. A Porta Nova, que rasgava os muros do burgo romano e medieval para poente, viria no século seguinte a ser coroada com o monumental arco de granito que é hoje o emblema e símbolo da cidade. É mesmo em frente que fica o Campo das Hortas, com um não menos monumental e artístico chafariz de pedra, mas também com outros

símbolos da tradição de acolhimento de portas abertas que é característica da capital minhota: a restauração farta e forte e com base nos produtos e receitas regionais. É na fachada sul que encontramos uma série dessas casas de comidas tradicionais e que, umas a seguir às outras, ocupam quase todo o velho casario da praça. Dirigimo-nos, desta vez, ao Restaurante Bem-MeQuer, casa bem-posta e com evidente preocupação na conjugação dos valores da tradição com as mais modernas exigências de apresentação e serviço. A função vem já desde meados do século passado, quando “no ano de 1953 nasce a Pensão Casa de Pasto Bem-Me-Quer pela mão de Joaquina Maria Soares Gomes”, como informa o texto de apresentação do estabelecimento. O restaurante ocupa actualmente o piso de entrada e o primeiro andar do pequeno edifício, com dois espaços complementares e acolhedores. Mais intimista e ao estilo de salão de família o do piso superior, com decoração e mobiliário de época; mais dinâmico e movimentado o espaço de entrada, onde fica também a cozinha e o balcão de serviço. Mesas espaçadas, toalhas e guardanapos de algodão, baixela cuidada e com o evidente propósito de introduzir alguma discreta modernidade em contexto de tradição.

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RESTAURANTE BEM-ME-QUER Campo das Hortas, 5/6 4700-210 Braga Tel.: 253 262 095 www.restbemmequer.com Fecha à quinta-feira e jantar de domingo. Aceita cartões de débito e crédito. Estacionamento abundante mas nem sempre fácil nos arruamentos circundantes.

Tradicional e de temporada A carta é um repositório de pratos tradicionais e de temporada, com destaque para as papas de sarrabulho e o bacalhau “à moda de Braga”, com não poderia deixar de ser. Com o pão, em fatias de duas qualidades, veio à mesa também um prato com rodelas de chouriça, paio, salame

e fatias grossas de presunto seco e falho de gordura, ao estilo regional. Tudo resfriado e pouco apelativo, a denunciar a prévia estadia em ambiente frigorífico. Logo se aqueceram os ânimos com os solicitados bolinhos de bacalhau (6€), que vieram na companhia de pequeninos rissóis de camarão, croquetes de vite-

la e chamuças. Fritos na hora e tudo muito bem executado, com destaque para o rigor na receita dos bolinhos, incluindo o gostinho a pimenta que nem sempre aparece. Oferecia-se lampreia, em arroz ou à bordalesa, arroz de polvo com filetes do mesmo, pescada à moda da casa, meia desfeita e sável do rio


Outras mesas

Minho (doses entre 14 e 15€), mas optou-se pelo polvo grelhado (15€) e o tal bacalhau à Bem-Me-Quer (17€). Saboroso e afinado nos sabores o polvo, acompanhado com rodelas de batata, cenoura e metades de ovo cozido e grelos salteados. Conjunto ainda afinado com alho picado e azeite, cujo apuro e acerto deixa a ideia de ter passado pelo forno antes de vir à mesa. O bacalhau deriva da celebrizada receita do restaurante Narcisa, agora replicada por todo o país, normalmente com a designação “à Braga”. Mas é claro que não há nada como o original e em pouco locais será servido com o mesmo cuidado e esmero com que o fazem na cidade dos arcebispos. No caso do Bem-Me-Quer, trata-se mesmo de uma receita que foi premiada já por diversas vezes. A posta, de lombos altos, começa por ser rapidamente alourada em azeite na frigideira, praticamente só para ganhar cor. E o mesmo se passa com as rodelas de batata. No mesmo

azeite, é salteada a cebola, com alho picado, e todo o molho é depois derramado sobre o bacalhau e batatas na assadeira, que vai ao forno para acabar de cozinhar. Fofo e carnudo, o bacalhau desmonta-se em lascas uniformes e impregnadas de gelatina e sabor que inundam o palato. Notável a uniformidade nos sabores e consistência, tanto nas partes altas como nas mais finas da posta, que se envolvem com o amido que persiste na batata e a leve doçura da cebola caramelizada. Uma espécie de prazerosa sinfonia, no nosso caso pontualmente interrompida por sobressaltos ácidos dos pickles com que o bacalhau é polvilhado antes de vir à messa. Percebe-se o propósito de fornecer ao prato alguma frescura, mas que se nos afigura contraproducente. A persistir na prática, o melhor seria mesmo perguntar se é do gosto do cliente, ou então servir em separado. Receita centenária é a das papas de sarrabulho à moda de Braga (20€),

que por aqui são engrossadas com pão para comer com garfo e como prato de resistência. Servem-se com os rojões, bucho e tripas enfarinhadas como manda o mais rigoroso receituário tradicional. Aromatizadas com cominhos, textura e sabores afinados e a denotar a mão certeira e a competência culinária. Grande apuro também com o cabrito assado no forno (17€), tanto na cozinha como na escolha do produto. Animal do leite, com as costelinhas gordurosas a desfazemse na boca e a pedir para serem debulhadas e saboreadas à mão. Arroz do forno, batatinha assada e grelos tenros e gordurosos, a mostrar que a cozinha tradicional e o seu centenário receituário continuam a ditar as leis na restauração minhota. Assim é também com a doçaria. No Bem-Me-Quer faz-se gala de confeccionar um pudim com a receita do abade de Priscos que tem sido reconhecido como vencedor em várias edições do respectivo concurso. A não perder também a sopa dourada (4,50€) com que no deliciámos no final da refeição. Pão-de-ló, doce de ovos e amêndoa em perfeito casamento com gelado de baunilha. Oferta criteriosa e receituário centenário, com comidas fartas e fortes que pedem vinhos a condizer. Carta alargada a todas as regiões, com opções sensatas e sem cair no vício dos vinhos de preço exibicionista. A permitir mesmo algumas escolhas bem interessantes e fora do mainstream, como foi o caso dos excelentes Quinta de Arcossó Branco 2012 (14€) e o tinto Cem Reis Reserva Syrah (24€), também de 1012, que acompanharam (e valorizaram) um repasto cheio de exigência. Louvese a proposta alargada de vinhos da região, incluindo seis espumantes da região dos Vinhos Verdes. Reparo para a ausência de qualquer espumante da Bairrada, ainda por cima com o lapso de a lista propor três de outra região com a indicação de serem bairradinos. Com serviço dedicado e atencioso e uma oferta que prima por respeitar e valorizar a mais rica e valiosa tradição culinária regional, bem se pode dizer que este Bem-Me-Quer encarna a melhor tradição de bem receber da cidade. É justo que lhe fiquem a querer bem e com vontade de voltar.

ROTA DAS ESTRELAS ARRANCA ESTE FIM-DE-SEMANA NO FUNCHAL São dezasseis estrelas Michelin, vinhos e produtos gastronómicos das melhores referências, e um ambiente de festa e celebração que fazem com que a Madeira se converta por estes dias na capital gastronómica da Europa. É a sexta edição do festival gastronómico Rota das Estrelas, um encontro que todos os anos vem juntando um alargado conjunto de chefs cozinheiros de prestígio tendo como denominador comum o facto de as suas cozinhas serem galardoadas com o símbolo das estrelas do guia Michelin. Um aliciante extra é o facto de tudo decorrer em ambiente de festa e partilha, permitindo não só conversar e trocar ideias com os chefs, conhecer técnicas e preparações, degustar produtos e vinhos de prestígio, ao mesmo tempo que se se puxa pelo brilho da alta restauração, vinhos e outros produtos de origem nacional. Como é habitual, tudo decorre em torno do restaurante Il Gallo d’Oro, no hotel The Cliff Bay, Funchal, há vários anos com referência estrelada no mais famoso guia gastronómico. Consequência do trabalho do chef Benoît Sinthon, que este ano convocou colegas do prestígio de Thomas Bühner (La Vie, Alemanha), Erlantz Gorostiza (M.B.,Espanha), Michel Van der Kroft (‘t nonnetje, Holanda), Jordi Esteve (Nectari, Espanha), Olivier Barbarin (Châteaux d’Audrieu, França) e Jacqueline Pfeiffer (Le Ciel, Áustria), cujos restaurantes representam um total de onze estrelas.

Juntam-se-lhes os nossos conhecidos Dieter Koschina (Vila Joya, Albufeira), Hans Neuner (Ocean, Porches), Joachim Koerper (Eleven, Lisboa), Miguel Laffan (L’And, Montemor-o-Novo), João Rodrigues (Feitoria,Lisboa), Paulo Morais (Umai, Lisboa), Ljubomir Stanisic (100 Maneiras, Lisboa) e Albano Lourenço (Arcadas, Coimbra. Além da festa de abertura (na última noite), numa espécie de folia gastronómica com a participação de todos os chefs e em espaço alargado que vai dos jardins até à cozinha do hotel, onde entre os cozinheiros se instala um DJ, o programa inclui workshops de cozinha, provas de vinhos, demonstrações culinárias e visitas de interesse gastronómico. Nas próximas segunda e terça servem-se os jantares de degustação, com pelo menos seis pratos, acompanhados por uma selecção de grandes referências de vinhos nacionais, que são o ponto alto do encontro. Como é já habitual, o festival madeirense abre o ciclo da Rota das Estrelas, que percorre a quase totalidade dos restaurantes nacionais com estrela Michelin e este ano tem a novidade de se alargar à Galiza, em Espanha. A calendarização está já praticamente definida e pode ser consultada no site www. rotadasestrelas.com. J.A.M.

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 25


Vinhos que contam histórias Rui Falcão

Uma nova estratégia para a Austrália

urante anos, os mentideros e os círculos mais informados do negócio do vinho do velho mundo pouco mais discutiam que a temível ameaça australiana, o pavor europeu ao avanço aparentemente imparável dos vinhos australianos no mundo. Os argumentos sobre os méritos e deméritos dos planos a vinte anos que a indústria do vinho australiano tinha desenhado para conquistar o mundo eram analisados até à exaustão perante o medo dos países clássicos europeus… e de muitos dos países do novo mundo, para quem a Austrália era igualmente uma ameaça. Os vinhos tinham rótulos apelativos, eram desenhados para satisfazer os desejos e gostos dos consumidores, sobretudo os emergentes, que ainda tinham pouca experiência com o mundo do vinho, eram simples, fáceis de entender, descontraídos e sem a fleuma e a pomposidade de regras complicadas que era imposta aos neófitos do vinho. Tornou-se desnecessário aprender o nome de dezenas de regiões e sub-regiões de nomes estranhos, passando apenas a ter de memorizar o nome de três ou quatro castas e uma dúzia de nomes de marcas, muitas delas associadas a animais exóticos que ajudavam na memorização. A produção era mais ou menos coesa nos objectivos e nos fundamentos, unida e concordante na estratégia de promoção internacional dos vinhos australianos. Em poucos anos, a Austrália passou a ocupar com grande estrondo o universo dos vinhos populares, ganhando uma quota de mercado que fazia tremer de medo e inveja os produtores europeus. Tal como hoje tanto se fala da ameaça chinesa, há poucos anos, no mundo do vinho, só se falava da ameaça australiana e de como seria possível fazer

MATT TURNER/REUTERS

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face às ambições de um país que conquistava mercado numa tomada relâmpago imparável. De uma simples ameaça intimidatória, a perspectiva transformou-se rapidamente em pesadelo, quando os vinhos australianos ganharam uma quota de mercado tamanha que os converteu no principal exportador para o decisivo mercado inglês, destronando assim a França, que ocupava esse posto durante os derradeiros três séculos. Ao mesmo tempo, produtores como a Yellow Tail, um dos símbolos mais destacados do ciclo expansionista dos vinhos australianos, multiplicava tranquilamente a sua produção de um milhão de garrafas para o incrível número de 60 milhões de garrafas no curto espaço de cinco anos, acabando por fixar-se numa produção de 145 milhões de garrafas anuais. A estratégia global passava pela multiplicação da área plantada, pela promoção de duas ou três castas que conseguiram associar ao país, nomeadamente o Shiraz, pela simplificação das regras que permitiram aos produtores vender

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o nome Austrália em detrimento de qualquer regionalismo ou de terroir. Mas também pela liberalização das regras e o pragmatismo que fomentaram a criação de empresas genéricas de enorme dimensão que ofereciam prestação de serviços em dezenas de tarefas e procedimentos como engarrafamento, rotulagem, armazenagem ou fiscalidade e exportação. Condições que permitiram não só a criação de preços extremamente competitivos como vinhos verdadeiramente homogéneos e consistentes, sem a variação qualitativa inerente ao ciclo agrícola que em cada ano revela colheitas de padrões climáticos diferentes. E foi essa estratégia aparentemente de sucesso que ditou o gigantesco trambolhão internacional dos vinhos australianos. Deixou de se dar destaque aos pequenos produtores de qualidade, deixou de se falar dos produtores que faziam vinho de enorme personalidade e carácter, deixou de se falar de outras variedades para além das duas ou três castas

Da afirmação pelo preço e por um nome genérico, a Austrália passou a abraçar os princípios que sempre regeram os vinhos europeus e, de uma forma ainda mais pronunciada, os vinhos portugueses

bandeira e deixou de se apontar as diferenças e originalidades que ajudavam a colocar a Austrália entre os grandes países produtores do mundo. O país passou a vender preço e uniformidade, perdendo o brilho que tanto tinha custado a ganhar. Ao contrário do que os produtores acreditavam, as vendas começaram a decair e a influência australiana começou a decrescer de forma exponencial. Muitos dos colossais grupos que tinham nascido e conquistado o mundo ameaçaram falência e tiveram de ser desmantelados e vendidos em fatias mais pequenas e humanas. E a Austrália teve de mudar a agulha e desenhar um novo plano que reformasse a percepção internacional sobre os seus vinhos. A mudança não poderia ser mais radical e é reveladora dos perigos reais que advêm da perda de identidade. Da afirmação pelo preço e por um nome genérico, Austrália, a política oficial dos vinhos australianos passou a privilegiar a afirmação e valorização do terroir, a valorização do nome das regiões, o enaltecimento de castas alternativas e, o que é inacreditável por parte de um país que sempre desvalorizou o princípio, a elogiar e a promover o conceito de lote. Ou seja, a Austrália passou a abraçar os princípios que sempre regeram os vinhos europeus e, de uma forma ainda mais pronunciada, os vinhos portugueses. Uma boa lição para quem pretende criar e colar uma imagem de preço acessível aos vinhos portugueses, para quem quer desvalorizar o nome das regiões, para quem quer reduzir Portugal a uma dúzia de castas, para quem quer desvalorizar a ideia de lote que nos é tão querida e tão natural. Mas igualmente uma boa lição para quem não se preocupa em defender as grandes distinções que nos separam do resto do mundo, as vinhas misturadas, os lagares ou a fermentação em talhas de barro, entre tantos outros exemplos da nossa riqueza vinícola.


Vinhos Provas

a Mau

mmmmm Razoável mmmmm Bom mmmmm Bom Mais mmmmm Muito Bom mmmmm Excelente

Um grande tinto depurado por uma década de garrafa

TRÊS BAGOS GRANDE ESCOLHA 2005 - ESTÁGIO PROLONGADO

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Lavradores de Feitoria decidiu lançar no mercado nacional e internacional mil garrafas do seu Três Bagos Grande Escolha de 2005, apondo-lhe como subtítulo a designação “Estágio Prolongado”. A iniciativa é uma jogada contra a corrente e tem um mérito indiscutível: o de proporcionar aos consumidores a experiência de prova de vinhos velhos e de apaziguar a tese dominante em Portugal de que os vinhos, brancos ou tintos, são melhores enquanto conservam o fulgor da sua juventude. Não são, e basta avaliar os aromas e a complexidade deste Três Bagos para se perceber que os grandes vinhos só cumprem o seu destino após alguns anos de garrafa. A Lavradores de Feitoria, uma associação original de 15 produtores donos de 18 quintas no Douro, começou a produzir o Três Bagos Grande Escolha na vindima de 2000. Para esse efeito, recorreu às melhores fracções das vinhas velhas dos seus produtores. O resultado desta aposta manifesta-se na criação de vinhos intensos, opulentos, com uma estrutura poderosa e um bouquet de arbustos e frutas silvestres que o tempo torna mais sofisticado e complexo. O 2005 é neste particular um belo caso de um vinho que conserva potência e expressividade, revelando uma enorme harmonia e complexidade nas suas notas de especiaria e de fruta vermelha que, espantosamente, ainda se mantêm. Entre as edições deste topo de gama da Lavradores de Feitoria no período 2001-2005, talvez o 2005 não seja tão elegante e harmonioso como o 2004, que é sem dúvida um vinho estratosférico. E talvez não exiba o mesmo fulgor do 2003. Mas é no seu próprio carácter um vinho magnífico, com um excelente balanço, que se afirma nos sentidos com uma garra e um leque de subtilezas capaz de fazer pensar toda a gente sobre o que perdemos com a pressa de consumir vinhos acabados de nascer. M.C.

Lavradores de Feitoria, Paços, Sabrosa Castas: Touriga Nacional e Cabernet Sauvignon Graduação: 14% vol Região: Douro Preço: 60€

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Proposta da semana

SAGRADO BRANCO 2013 mmmqm Quinta do Sagrado, SA, Porto Castas: Rabigato (62%), Gouveio (23%), Viosinho (12.5%), Códega do Larinho (2.5%) Graduação: 13% vol Região: Douro Preço: 8,70€ (no vinhoweb.pt) A Quinta do Sagrado, na encosta que serve de cenário ao encontro do rio Pinhão com o Douro, está na posse da família Cálem há mais de 50 anos. Os seus vinhos são por regra aprimorados e complexos e este branco cumpre a tradição. Aromas intensos e deliciosos de fruta fresca, notas de alperce, bom volume de boca, profundidade e óptimo equilíbrio com uma secura final e um toque apimentado que lhe ampara a exuberância da fruta. Um belo branco. M.C.

MARQUÊS DE BORBA TINTO 2013 mmqmm João Portugal Ramos, Estremoz Castas: Alicante Bouschet, Touriga Nacional, Trincadeira e Aragonez Graduação: 14% vol Região: Alentejo Preço: 4,85€ Vinho ainda jovem, mais fechado na boca do que no nariz, onde estão bem salientes os caracteres típicos da Touriga Nacional (fruta silvestre, notas de violeta) e do Alicante Bouschet (fruta preta, sobretudo). Face aos seus 14% graus e à redondez dos taninos, era de esperar um vinho mais guloso e capitoso. Talvez lhe falte mais e melhor barrica — e tempo. Com comida, no entanto, a sua relativa austeridade até funciona bem. P.G.

PREGUIÇA RESERVA 2011

VT’08

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António Augusto Teixeira Fraga, Leça do Balio Castas: Touriga Nacional, Tinta Roriz, Touriga Franca Graduação: 14% vol Região: Douro Preço: 3,50€

Quinta do Sagrado, Vinhos SA, Porto Castas: Touriga Nacional (50%), Touriga Franca (5%), Tinto Cão (5%), Vinhas Velhas (40%) Graduação: 14% vol Região: Douro Preço: 27,53€ (no vinhoweb.pt)

Este vinho de uma zona mais alta do Baixo Corgo aparenta, pelo aroma de fruta vermelha muito madura, com presença mais intensa de amora e notas de fumo, um perfil pesado que a prova acaba por desmentir. Estão lá as boas características do ano, mas há também um tempero de frescura e harmonia que o tornam muito apetecível. Proveniente de vinhas com idades superiores a 20 anos, é um tinto directo, despretensioso, sem artifícios de enologia e que expressa bem a jovialidade das zonas frescas do planalto e a riqueza e diversidade que pequenos produtores podem trazer aos vinhos durienses. Vale a pena experimentar — está presente em poucas garrafeiras, mas o produtor vende directamente. M.C.

Ao seu sétimo ano de vida, este vinho deixa nos sentidos os defeitos que lhe marcaram a origem: uma concentração excessiva, dureza e falta de frescura. O tempo concedeulhe uma maior complexidade, e suavizou-lhe os taninos, mas sob uma estrutura mais aprimorada denotam-se ainda alguns dos seus pecados originais. Não se pense que é um vinho sem sentido – tem dimensões que o recomendam. Mas não é um exemplo de elegância nem de requinte, como se exige a esta fabulosa quinta duriense e aos pergaminhos da família que a detém. M.C.

Os vinhos aqui apresentados são, na sua maioria, novidades que chegaram recentemente ao mercado. A Fugas recebeu amostras dos produtores e provou-as de acordo com os seus critérios editoriais. As amostras podem ser enviadas para a seguinte morada: Fugas - Vinhos em Prova, Praça Coronel Pacheco, n.º 2, 3.º 4050-453 Porto

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Vinhos Alves de Sousa

O Abandonado já tem uma adega nova Na Quinta da Gaivosa, o velho e o novo fazem a modernidade do Douro. Na base da propriedade, ergue-se a nova adega, um edifício belíssimo desenhado por António Belém Lima. No topo, há uma vinha meio abandonada que dá origem a um dos grandes tintos do Douro. Pedro Garcias (texto) e Nelson Garrido ( foto)

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uem vai de Vila Real pela Cumieira é confrontado a dada altura com a visão ao fundo de um edifício negro plantado em forma rectangular mesmo junto à estrada. A geometria rectilínea da nova adega da Quinta da Gaivosa, a sua cor e a enorme pala pendurada ao centro possuem uma força extraordinária no contexto do vale, cujo elemento físico dominante é a silhueta do Marão — o rio Douro corre uns montes abaixo, mas perscruta-se nas águas do afluente que corre a pouca distância. O impacto da construção é sublimado ainda mais pelos tons amarelados das “velhas” estruturas da propriedade, num enorme contraste de cores que se insere na mesma linha da opção antagónica seguida, por exemplo, na nova adega da Quinta do Vallado. No caso da nova adega da família Alves de Sousa, a opção pelo preto proposta pelo arquitecto

António Belém Lima pretende emular o mesmo mistério que se esconde por trás de cada garrafa de vinho. Quando transpomos as portas do edifício somos surpreendidos com uma alvura imaculada e um infindável caleidoscópio de panorâmicas do espaço envolvente. No interior, o desenho segue à risca o percurso do vinho, começando com a recepção das uvas mesmo junto às vinhas e a escombro de xisto, continuando com a vinificação e o estágio no piso anterior. Na hora de ser engarrafado, o vinho sobe de novo ao piso superior, e a sua glorificação é deixada para o deck instalado no topo do edifício com uma visão panorâmica de 360 graus. Da terra ao céu num abrir e fechar de olhos. Com a nova adega — cujo projecto esteve na corrida ao prémio de arquitectura contemporânea Mies van der Rohe —, os vinhos Alves de Sousa passam a dispor de um espaço moderno e funcional, com capacidade para vinificar e estagiar cerca de 600 mil garrafas. A anterior adega já era demasiado exígua para os cerca de 130 hectares de vinho que o produtor duriense detém no conjunto das suas várias quintas e estava longe de corresponder à imagem de ex-

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celência que os vinhos possuem em Portugal e nos mercados externos. A modernização do processo produtivo não colide, no entanto, com as opções tradicionais seguidas em muitas parcelas vizinhas da nova adega. Alguns dos melhores vinhos da família Alves de Sousa continuam a ter origem em vinhas muito velhas. Uma delas, situada no topo da Quinta da Gaivosa, possui uma decrepitude que contrasta de forma flagrante com a “juventude” e a modernidade da nova adega. Mas os vinhos que saem daquelas cepas quase moribundas estão na linha da frente dos grandes tintos do Douro. Esta parcela de três hectares esteve para ser arrancada e reestruturada em 2004. Muitas das cepas tinham mais de 100 anos e o número de falhas era enorme. Nesse ano, antes de arrancar a vinha, Domingos Alves de Sousa fez um vinho, que ficaria como testemunho das diversas gerações ligadas ao seu cultivo e granjeio. Como a vinha estava mais ou menos abandonada, o vinho ganhou o nome de Abandonado. O vinho irrompeu como um meteorito na cena vínica nacional, conquistou inúmeros prémios em Portugal e no

Na nova adega da família Alves de Sousa, a opção pelo preto proposta pelo arquitecto António Belém Lima pretende emular o mesmo mistério que se esconde por trás de cada garrafa de vinho

estrangeiro e a ideia de arrancar a vinha desapareceu. A vinha continua meio abandonada, com cada vez mais falhas, mas já não é vista como um fardo. Embora não permita produzir mais do que quatro mil garrafas, assumiu o estatuto de jóia, de museu vivo. O Abandonado é o vinho mais exclusivo dos Alves de Sousa e só se produz nos melhores anos. Além do primeiro, de 2004, voltou a ser produzido em 2005, 2007, 2009 e 2011. Uma prova recente de todos eles deixou, desde logo, uma certeza: o vinho está para durar. A ideia de que os vinhos, por serem bastante maduros (entre os 14 e os 15%

de álcool), iriam envelhecer mal, não se confirma. Além da sua robustez tânica, os vinhos possuem uma magnífica frescura balsâmica, muito influenciada pela altitude e pela proximidade do Marão. Mesmo os mais antigos ainda dispõem de mais uma ou duas décadas de vida, no mínimo. Nesta fase, os que mais se destacam são o 2004, o 2007 e o 2011. O 2005 está muito expressivo e mais fácil de beber e de entender. O 2009 ainda precisa de integrar melhor a madeira. Para beber já, o melhor é o 2004 e o 2007. Mas o vinho que talvez tenha nascido mais perfeito e que mais promete é o 2011, um ano antológico no Douro. Demonstra um afinamento tânico notável e, apesar dos 15% de álcool, possui uma enorme frescura, do tipo balsâmico, que contrasta com as notas mais quentes que sobressaem no aroma (fruta preta, café, alcatrão) e na prova de boca. Profundo e denso, surpreende pela forma harmoniosa como integra todos os elementos, num prodigioso jogo de nuances sensoriais (madureza/ frescura, músculo/elegância) que é a imagem de marca dos grandes tintos do Douro (85 euros PVP).


Vinhos Prova

DR

Quando os Porto Colheita se provam na Feitoria Britânica Os vinhos desta categoria estão, definitivamente, a ganhar mais e mais adeptos, o que justifica a aposta das marcas no segmento. E até a Feitoria Britânica lhes abriu as suas portas, o que há uns anos era impensável. Manuel Carvalho

E

les andam por aí. A cada ano que passa, os Porto Colheita ganham protagonismo e aproximam-se do primeiro lugar do estatuto das categorias especiais. Agora, já não são apenas os consumidores, os provadores especializados ou os críticos a reclamar mais atenção para este estilo de vinhos tradicionalmente confinado a meia dúzia de casas. Também as grandes empresas perceberam que os Porto Colheita têm tudo para se tornar num caso de sucesso. Na semana passada, organizaram uma prova de Colheitas com datas situadas entre 1957 e 2002 na até agora fortaleza inexpugnável do Porto Vintage, a Feitoria Britânica. Uma ousadia impensável há apenas uma década que diz muito sobre a redescoberta desta categoria. A prazo, tudo indica que a preferência dos nacionais pelos Porto tawny (os Colheita ou vinhos com indicação de idade, como o 10 ou o 20 anos, por exemplo) e a dos britânicos pelos estilos ruby (LBV e Vintage, principalmente) se dilua com a crescente valorização dos Colheita. A prova da Feitoria é uma consequência desse percurso. Os Symington apostaram definitivamente nesta categoria e estão a apresentar vinhos de grande classe. A Fladgate Partnership (das marcas Taylor’s, Fonseca e Croft) adquiriu a Wiese & Krohn com o confessado objectivo de garantir uma imensidão de colheitas antigas de grande qualidade. A Gran Cruz tem surpreendido

com excelentes Colheitas brancos e dedicou-se a descobrir nos seus armazéns vinhos velhos de óptima qualidade. Depois, a este grupo há que acrescentar os Colheita da Poças, o segmento no qual esta pequena empresa familiar melhor se destaca, os extraordinários Kopke e Cálem, da renascida Sogevinus, os Andresen, os singulares vinhos com a chancela da Niepoort e, indiscutivelmente, os Noval que continuam a disputar o prémio dos melhores entre os melhores. Na prova da Feitoria participaram 11 vinhos de seis marcas em representação de cinco décadas de produção. No geral, todos se impuseram com elevadas classificações. Mas, como não podia deixar de ser em empresas que conservam tradições enológicas aprimoradas ao longo de gerações, é possível identificar o carácter de cada uma. É difícil numa competição dizer quais são os que se apresentaram em melhor forma. Ainda assim, é impossível não sublinhar particularidades. O Niepoort 1957, apesar de um aroma mais preso e não tão rico como os seus pares, apresenta um belo volume de boca e uma frescura final notáveis. O Noval de 1964 revela uma enorme complexidade e uma secura deliciosa. O Taylor’s de 1964 é um daqueles vinhos com vários andamentos na boca, deixando um rasto de frutos secos no final admirável. O Graham’s de 1972 é muito expressivo e, apesar de um ataque inicial menos intenso, é daqueles vinhos que se instalam nas papilas e por lá ficam tempos intermináveis. E, sendo já de outra geração, o Dow’s de 1992 é um Colheita extraordinário, um vi-

nho denso e voluptuoso, com uma complexidade notável na qual os tradicionais aromas de fruta seca se complementam com especiaria e sugestões balsâmicas. Engarrafado no mínimo sete anos após o estágio em casco, os Colheita são vinhos de uma versatilidade que se ajusta aos dias de hoje — ao contrário dos vintage, podem ser abertos e consumidos ao longo de duas ou três semanas. Ostentam datas que nos remetem para um tempo preciso — o dos aniversários, por exemplo. E a sua complexidade e profundidade são únicos. Não se admirem se no prazo de uma geração disputarem ombro-a-ombro o estatuto imperial que hoje os vintage mantêm.

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 29


Bar aberto LisBeer

Mais bares em fugas.publico.pt

A cerveja é quem mais ordena

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Beco do Arco Escuro 1, Lisboa Tel.: 21 886 40 21 Email: lisbeerbar@gmail.com www.facebook.com/lisbeerbar Horário: de terça a quinta e domingo das 16h às 2h; sexta e sábado das 16h às 3h.

e manter o espaço minimalista, sem exagerar nem meter coisinhas bonitas de mais”, conta Diogo Coelho, gerente do novo espaço. As músicas do mundo que agitaram a casa nos últimos três anos deram lugar ao som ambiente, mas por aqui ainda se viaja pelo globo, agora nos paladares de uma extensa lista de cervejas de 21 países, desde Alemanha, Bélgica ou Estados Unidos à China, Austrália ou Rússia. Afinal de contas, a cerveja é quem mais ordena, com um lema que se faz sobretudo de números: “Ter a maior oferta do país, tanto em quantidade como em qualidade.” São mais de 200 rótulos em garrafa e seis de pressão, entre uma grande diversidade de estilos e de origens. O objectivo, avança Diogo, é “educar o consumidor sobre os vários tipos de cerveja que existem” e “alterar um pouco a imagem que as pessoas têm desta bebida”. “A maioria acha que há cerveja branca e preta ou que existem apenas a alemã e a belga, mas não é bem assim, há dezenas e dezenas de estilos de cerveja diferentes.” A confirmá-lo está o menu, numa ver-

são de 50 páginas que se assemelha ao folhear de uma revista, onde vem explicado cada tipo e subtipo de cerveja, seguido da listagem dos rótulos disponíveis (com indicação do país de origem, estilo, taxa de alcoolemia, quantidade e preço). A ideia, confessa, é “converter as pessoas”, tal como lhe aconteceu em 2009, quando fez Erasmus na Alemanha. “Antes também bebia a cerveja ‘normal’, mas quando lá estive, e em

Preços: cerveja de pressão desde 2€ a 7,50€; cerveja de garrafa entre 1,70€ e 34€; whisky de 3,50€ a 16€; vodkas entre 3,50€ e 9,50€; rum e tequilla a partir de 3,50€; martinis a 3€; cocktails a 6€; sumos a 2€; água e café a

1€; chá a 2€; tostas desde 3,50€ a 4,50€; tábua de queijos ou enchidos entre 6€ e 8€; especial de degustação a 18€; salgados e snacks a 1€.

viagens posteriores, descobri que havia cervejas diferentes e melhores do que aquelas a que estava habituado”, conta. No entanto, a carta inclui igualmente as marcas mais comuns, como a Cristal, a Coral, a Sagres, a Corona ou a Heineken, e outras bebidas, entre whiskies e vodkas. O objectivo é, por um lado, “não excluir ninguém”, tentando converter a pouco e pouco cada cliente, e, por outro, mostrar “que todas as cervejas têm o seu lugar”. FOTOS: NUNO FERREIRA SANTOS

esde o início do mês que Lisboa tem mais um bar inteiramente dedicado à cerveja. Depois da Cerveteca, na Praça das Flores, nasce a Lisbeer às portas de Alfama, numa estreita viela junto à Rua dos Bacalhoeiros, onde até finais de Dezembro funcionava o Adufe Bar. Ao entrarmos quase não damos pela mudança. O mobiliário é o mesmo, deixado nos antigos recantos, dos velhos sofás de cabedal aos cadeirões cobertos de notas de música, das cadeiras ao aparador de madeira pintada. Apenas as paredes denunciam a alteração do conceito: os instrumentos musicais foram substituídos por quadros de diferentes marcas de cerveja. “Foi uma opção minha, primeiro por questões financeiras e depois porque o espaço já estava interessante, não valia a pena alterar muito. Queria apenas pôr algumas referências à cerveja

LISBEER

30 | FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015

Há muitas artesanais, que estão cada vez mais em voga em Portugal (com a ascensão de várias marcas portuguesas), mas também várias produtoras industriais ou comerciais, porque entre elas estão também algumas “das melhores do mundo”. Há marcas com dezenas de anos e outras acabadas de nascer, há lagers (“as mais normais”), weissbiers (à base de trigo), ales (“que podem ser belgas ou anglo-saxónicas”), stouts e porters (“as pretas”), IPA (“as mais amargas”) e as abadias e trapistas (“feitas em mosteiros belgas e holandeses”). Na lista cabem ainda cervejas pretas com “toques de chocolate, frutos secos ou café”, fumadas, semelhantes a champanhe, com sabor a frutas, sem glúten e sem álcool. E ainda algumas “exclusivas no país”, como a Anchor Old Foghorn Ale — “uma barley wine norte-americana com quase 10% de teor alcoólico e por isso para beber devagar e degustar, com um sabor muito específico”; ou as Emelisse, “uma marca artesanal holandesa”, que Diogo pensa “também ser novidade em Portugal”. Além da extensa oferta de cervejas em garrafa, há ainda seis de pressão, que vão sendo alteradas a cada dois ou três meses. São estas que compõem o especial de degustação, principal destaque da ementa de comidas, feita de tostas, tábuas e pequenos snacks. À mesa chegam seis copos de 10cl com as variedades disponíveis em pressão, cada uma acompanhada por um queijo diferente. “A ideia é degustar uma evolução de sabores cada vez mais elaborados, complexos e intensos, ora contrastando, ora juntando cada cerveja e cada queijo.” Eis a sugestão por estes dias: comece com a Budwiser Budvar e duas fatias de gouda, que são sabores “mais simples e de base”; continue com a Samuel Adams e queijo brie, “um bocadinho mais elaborados mas ainda fáceis”; depois a Paulaner e chèvre, cujo “sabor amanteigado vai combinar com o trigo da cerveja”; de seguida a KWAK, com edam ou castelões, e a Anchor Porter com “uma fatia de queijo de cabra mais curado e salgado para contrastar com o doce da cerveja preta”; termine com a Punk IPA e queijo da ilha, porque “uma cerveja forte e amarga combina bem com um queijo igualmente forte e com toques picantes”. Mara Gonçalves


Jardinagem

PEDRO CUNHA

Outras peras tradicionais portuguesas: também as quer em sua casa? Já aqui falámos de peras, concretamente das famosas Rocha. Hoje damos atenção às variedades de pereiras antigas, que normalmente dão frutos saborosos, aromáticos e suculentos, de pequeno calibre, e disponíveis apenas em mercados locais. Rui Maia de Sousa

Q

uem esteve ou está ligado ao campo recorda com saudosismo algumas variedades de pereiras antigas, cujos frutos eram saborosos, aromáticos e suculentos. Actualmente, essas peras de pequeno calibre são difíceis de encontrar, principalmente nas grandes superfícies…A maioria de nós, consumidores, quando compramos fruta, seleccionamos os frutos sem qualquer defeito, bonitos, que nos parecem saborosos e que tenham um baixo preço. Quando chegamos a casa apreciamos o sabor e por vezes temos surpresas…

Variedades São peras com a designação de Carapinheira, Pérola, Lambe-lhe os dedos, Amêndoa, Marquesa, Marmela e muitas outras que só consegue encontrar à venda nos mercados locais. De qualidade superior, amadurecem na pereira, ficando amanteigadas, aromáticas,

nome da variedade, porta-enxerto e por um certificado fitossanitário. As árvores para plantar, das variedades tradicionais, são por vezes difíceis de encontrar, pelo que devem ser encomendadas com alguma antecedência (um ano). As pereiras, em geral, são vendidas de raiz nua, sem qualquer protecção nas raízes.

Quando e como plantar A plantação deve ser efectuada preferencialmente durante o mês de Janeiro e, o mais tardar, até meados de Fevereiro. Plantações precoces podem originar perda das árvores devido à madeira estar ainda muito herbácea e poder ser “queimada” pelo gelo. As plantações tardias podem originar perdas, devido às pereiras começarem a ganhar folhas e a perder água antes de as raízes estarem em condições de absorver água do solo. Imediatamente a seguir à plantação, mesmo que esteja a chover, é necessário regar, no mínimo com cinco litros de água.

Cuidados a ter doces e suculentas. Quando as trincamos ou cortamos, o sumo escorre pelas mãos, que ficam a pegar. A tendência no curto prazo, devido à massificação da produção de peras, será o abandono dessas variedades, ficando unicamente preservadas em colecções de uso restrito. Se dispõe de um pequeno espaço que permita cultivar algumas árvores de fruto, está na hora de as plantar para passar a saboreá-las.

Acompanhar o desenvolvimento da pereira, regando, fertilizando, observando e controlando as pragas e as doenças e esperar dois anos para obter alguns (poucos) frutos. À medida que os anos vão passando a produção vai aumentando.

Colher

A pereira As pereiras são exigentes em frio durante o Inverno para serem produtivas e necessitam de tempo ameno e seco nas fases de floração e de desenvolvimento dos frutos. As pereiras preferem os terrenos frescos, fundos e férteis, de pH neutro e com um bom teor de matéria orgânica (≥ 1,5 %). Muitas vezes não frutificam, não por falta de cuidados, mas sim por não se adaptarem às condições do local.

Época de maturação Conhecendo a época de maturação das peras regionais acima referidas, pode seleccionar as que mais lhe interessam, em função da maturação e do espaço de que dispõe.

No início de Julho pode colher as elegantes peras, de coloração amarela, manchadas de vermelho da Pérola. No final do mês pode deliciar-se com as sumarentas peras Carapinheira, que são redondas, de coloração amarela, por vezes rosadas na face exposta ao sol. Já em meados de Agosto pode saborear as inconfundíveis peras Amêndoa, de forma idêntica às anteriores, mas de coloração amarela. No final de Agosto as pequenas peras Lambe-os-dedos ou Amorim, que são redondas, amarelas, por vezes rosadas na face exposta ao sol, podem proporcionar-lhe um momento único devido a serem sumarentas, doces mas com um ácido pronunciado. Na mesma

época de maturação pode também apreciar as peras Marquesa, que são de calibre grande, amarelas, por vezes rosados do lado do sol. Chegado o início de Setembro, pode desfrutar as peras Marmela, que têm uma forma achatada, coloração amarela e o pedúnculo inserido numa elevação. Existem muitas outras variedades de pereiras regionais com épocas de maturação distintas e formas, cores e sabores diferentes, no entanto as referidas são singulares.

Onde comprar Pode adquirir as suas pereiras num viveirista especializado, devendo cada planta estar identificada pelo

A colheita das peras deve efectuar-se pela manhã, evitando que o pedúnculo se parta. Se possível coloque-as em caixas numa camada única para que os pedúnculos, que são rijos, não firam as peras vizinhas. Separar os frutos “tocados” dos sãos. Após a colheita, os frutos devem ser transportados para um local seco, arejado e abrigado do sol. Espere um a dois dias para os consumir.

Atenção Em geral, uma pereira sozinha não produz, sendo necessário ter mais do que uma variedade de pereiras, em que a floração coincida parcialmente, para que ocorra a polinização e formação dos frutos. Durante a floração devemos favorecer a presença de abelhas. Engenheiro Agrícola e da Associação Portuguesa de Horticultura

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 31


Zoom Mais notícias em fugas.publico.pt/

A

agência de viagens Pinto Lopes lançou o projecto Viagens com Arte e História. Arranca este ano com um total de 14 périplos com sete especialistas, entre historiadores, arqueólogos ou arquitectos, que prometem guiar pelos pormenores histórico-culturais de diferentes locais na Europa, Ásia e África. O egiptólogo Luís Manuel Araújo, por exemplo, partirá nos passos de Eça de Queiroz na viagem que o escritor fez pela Terra Santa quando representou Portugal na inauguração do canal do Suez em 1869. Já Anísio Franco, conservador no Museu Nacional de Arte Antiga, conduz a redescoberta de cidades como Paris, Amesterdão e Barcelona, cidade que será igualmente guiada pelo olhar da arquitecta Ana Maio. “São viagens temáticas, acompanhadas por um especialista no tema para o qual a viagem está direccionada e com um carácter mais científico”, resume Teresa Neves, representante comercial da Pinto Lopes

Viagens em Lisboa. A ideia nasceu por “sugestão de vários clientes”, conta a responsável, numa filosofia semelhante às Viagens de Autor que a agência organiza desde 2012, guiadas por personalidades como Gonçalo Cadilhe ou José Luís Peixoto e, a partir deste ano, também José Rodrigues dos Santos e os chefs Hélio Loureiro e Henrique Sá Pessoa. O resultado destas novas Viagens com Arte e História são 14 périplos ao longo de 2015, não só na redescoberta de algumas cidades europeias mas também de destinos como Índia, Sudão ou Istambul, e guiadas por sete peritos: a arquitecta Ana Maio, o arqueólogo Álvaro Figueiredo, os historiadores Anísio Franco, Luís Filipe Thomaz e Ricardo Presumido, a escritora Esther Mucznik e o egiptólogo Luís Manuel Araújo. Álvaro Figueiredo — que a 4 de Março deu início ao ciclo de conferências que acompanhará o novo projecto — será o guia pela Argélia e pelo Sudão, dois destinos que entram pela primeira vez no mapamundo da agência portuguesa e que já estão “quase esgotados”. No ano em que se assinalam 70 anos após o final da Segunda Guerra Mundial, também uma das viagens decorrerá

Há uma nova taberna portuguesa em São Paulo Depois de uma tasca, eis uma Taberna da Esquina, repleta de atracções lusas, dos vinhos aos petiscos e conservas, dos pratos às conservas ou sobremesas, das loiças Vista Alegre à cortiça e ao mármore de Estremoz. Vítor Sobral começou por levar a sua “interpretação de tasca” para São Paulo, com a Tasca da Esquina. Agora, o chef renova a aposta e abre uma “irmã” da primeira casa, versão Taberna da Esquina, repleta de detalhes recriados de antigas casas de taberneiros: paredes com pipas, balcão de madeira e bancos altos de cortiça, caixas nos tectos, “parede” de conservas. Faz tudo parte do projecto dos arquitectos portugueses Sofia Duarte e João Mota, que inclui ainda cozinha envidraçada e à vista ou mármore de Estremoz no bar. Nas mesas,

brilha Vista Alegre com copos e talheres de design português a combinarem com travessas de inox, “inspiradas nas que são usadas nas tabernas portuguesas mais populares”. Há vinhos portugueses e muito petisco e prato: pataniscas de bacalhau, orelha de porco, filetes de cavala, bacalhau à taberneiro, bife do patrão. E termine com uma baba de camelo, café Delta e ginja de Óbidos. www.tabernadaesquina.com

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BAZ RATNER/REUTERS

Viajar pelo mundo seguindo especialistas em arte, história ou arquitectura

“pelas memórias do Holocausto e pela compreensão da vivência das comunidades judaicas”, com Ricardo Presumido, vice-presidente da Associação Memória e Ensino do Holocausto (também a presidente, Esther Mucznik, conduz uma viagem pelos passos de Grácia Nasi em Istambul).

A última viagem, já a entrar em 2016, é conduzida por Luís Manuel Araújo, seguindo as Notas de Viagem que Eça de Queiroz escreveu sobre a viagem à Terra Santa, aquando da inauguração do Canal do Suez em 1869. “Vamos onde o Eça foi”, garante, desde o Cairo a Jerusalém, passan-

Portugália voa para Oriente No Planetário, Miguel Claro e estreia-se em Macau leva-nos ao céu Não é a primeira vez que a Portugália viaja para fora do país. Já houve uma em Luanda, em regime de parceria, entretanto fechada. Agora, a Portugália, nascida há quase um século num anexo à Fábrica de Cerveja na Almirante Reis, em Lisboa, volta à internacionalização e num território marcado pela herança cultural portuguesa. A casa de Macau tem por pilar a “portugalidade”, serve todos os clássicos da cervejaria e é gerida por profissionais que foram de Portugal. Em três pisos — decorados a azulejos, cortiças, imagens antigas da cervejaria — está na vila da Taipa, na Rua dos Mercadores. www.portugalia.com.mo

Uma exposição no Planetário de Lisboa mostra-nos, em cerca de três dezenas de imagens de grande formato, autênticas maravilhas celestiais em grandes cenários e paisagens. É a astrofotografia de Miguel Claro, que tem publicado em várias revistas e sites internacionais as suas obras, e que é fotógrafo oficial da Reserva Dark Sky do Alqueva. O Céu Visto da Terra, depois do Porto, pode ser admirado até 10 de Maio no Planetário Calouste Gulbenkian. www.miguelclaro.com

do por cidades como Belém ou Jericó. Todas as viagens têm um máximo de 30 participantes por grupo, variando, as internacionais, entre os 1075 euros de Barcelona e os 3625 euros do Sudão. Mara Gonçalves www.pintolopesviagens.com

Esta semana na Fugas online Fotogalerias A cor do tempo A grande festa da cor, o Holi hindu, que celebra a Primavera e a vida. A Índia é o epicentro desta explosão de cores que oferece sempre imagens surpreendentes.

A nova esfinge E agora a China “copiou” a grande esfinge e em tamanho real. É mais um prodígio chinês, num parque turístico.


As fugas dos leitores

As 5 coisas de que eu mais gosto...

...em Kristiansand

urbana, com inúmeras fachadas antigas restauradas. Contudo, há vozes descontentes com a intervenção feita na Praça do Toural. Eu prefiro realçar a estética do busto dedicado ao professor Abel Salazar, um ilustre filho da terra. A gastronomia é do melhor! O restaurante Migas apresenta picanha e rodízio de chorar por mais. O Picadeiro dá-nos bacalhau com broa e folhado de pato na mais fina apresentação e paladar. O toucinho do céu e a torta de Guimarães são de comer e presentear os amigos. A concluir, deixo aqui um reparo: os turistas teriam a vida mais facilitada se o executivo camarário de Guimarães adoptasse o sistema de placas identificativas dos monumentos e equipamentos mais emblemáticos da cidade. Ademar Costa

Patrícia Gouveia, professora associada na Noroff University College, Kristiansand, Noruega. É também coordenadora do curso de bacharelato em Interactive Media (Games and Animation).

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Mais viagens em fugas.publico.pt PAULO PIMENTA

A cidade de Guimarães é conhecida pela sua história e pelo bairrismo da sua população, orgulhosa de a sua urbe ter sido o “Berço de Portugal”. Esse bairrismo estende-se ao futebol, com o incondicional apoio ao Vitória de Guimarães, quando a designação registada é Vitória Sport Club. O Castelo de Guimarães é de visita obrigatória. As igrejas de São Pedro, de Nossa Senhora do Carmo, da Misericórdia e de Nossa Senhora da Oliveira, locais de fé que não devemos esquecer. O Paço dos Duques de Bragança, a Plataforma das Artes, a Sala Museu José de Guimarães, o Museu de Cultura Castreja e o Museu Alberto Sampaio demonstram que a cultura afirma-se em consonância povo/cidade. Não é por acaso que Guimarães foi Capital Europeia da Cultura 2012. No seguimento dessa distinção, inaugurou inúmeras exposições, instalações e espectáculos musicais. No decurso do honroso título foram feitas várias intervenções arquitectónicas e de preservação

LARS VERKET

Guimarães, berço e cultura

Fish Market Sábado de manhã uma visita ao Fish Market é obrigatória. Depois, claro, de se passar pelo Vinmonopolet, uma loja do estado norueguês e o único sítio onde se podem comprar bebidas alcoólicas, sem ser cerveja ou sodas, em Kristiansand. Bebidas até 4,75% de álcool há sempre à venda em qualquer supermercado e algumas marcas de cerveja locais são bastante boas. No Fish Market, um mercado gourmet situado no centro da cidade, encontram-se deliciosos camarões, patas de sapateira muito frescas, mexilhão, salmão fumado através de vários processos distintos e tantas outras iguarias. À volta existem alguns restaurantes onde se pode pedir para cozinhar o peixe seleccionado no mercado mas os preços raramente compensam a experiência.

2 Os textos, acompanhados preferencialmente por uma foto, devem ser enviados para fugas@publico.pt. Os relatos devem ter cerca de 2500 caracteres e as dicas de viagem cerca de 1000. A Fugas reserva-se o direito de seleccionar e eventualmente reduzir os textos, bem como adaptá-los às suas regras estilísticas. Os melhores textos, publicados nesta página, são premiados com um dos produtos vendido juntamente com o PÚBLICO. Mais informações em fugas.publico.pt

Cinemateca Não trabalha com grande regularidade mas é normal ter de

uma a três projecções semanais. Tem uma programação muito variada que tanto abrange o circuito independente como o comercial. Os filmes são legendados em inglês e ali podem-se passar estreias ou clássicos, filmes de animação ou documentários. Está sediada num edifício antigo que contrasta com o moderno “Kino”, com as respectivas pipocas e Coca Cola, bem perto dali. A programação é trimestral, em catálogo impresso, e a newsletter digital é enviada semanalmente. Assim, conseguem-se atrair alguns cinéfilos assíduos. O espaço é informal, pode-se beber um café ou um chá (incluído no preço do bilhete) antes da projecção do filme que conta sempre com uma apresentação improvisada (em norueguês). No início adquire-se um cartão de aproximadamente 10 euros e, depois, cada sessão custa apenas 5 euros. Naquele espaço os estrangeiros sentem-se um pouco em casa dada a informalidade e leveza geral do grupo de cinéfilos angariados pela instituição, de todas as idades, géneros e classes.

3 Vung Tau A variedade do supermercado asiático contrasta com a falta de variedade de produtos dos supermercados noruegueses. Na Noruega todos os supermercados têm uma oferta muito semelhante e assaz reduzida, quando comparada com os países da UE. Nos supermercados noruegueses a maior variação está nos preços, o mesmo produto pode oscilar, por vezes, para metade, de um dia para o outro. Descobrir o Vung Tau é um prazer, produtos da Índia, Tailândia, Japão, China, Filipinas, Turquia…

4 Do museu à biblioteca O Museu de Arte Contemporânea e a biblioteca local no centro de Kristiansand são dois lugares que vale a pena visitar. O Museu, em 2013/14, comemorou os cem anos do movimento sufragista na Noruega com exposições que davam ênfase ao contributo das mulheres para a História de Arte nacional. Com o cartão da biblioteca local tem-se acesso a livros, filmes, séries e outros artefactos culturais de uma rede extensa de bibliotecas na Noruega. Um serviço social todo informatizado de grande qualidade e diversidade, com opções para todos os gostos.

5 Parques e zoo Para quem gosta de vida selvagem, o Jardim Zoológico, a vinte minutos de autocarro de Kristiansand, surpreende. Os animais estão na sua maioria integrados na paisagem e não enclausurados em jaulas. Andam-se quilómetros a pé à procura de todas as espécies existentes. O zoo, tal como os parques da cidade ou a praia, também é um local muito interessante para se ir fazer um piquenique na Primavera e no Verão. Podem-se levar sandes do delicioso pão de especiarias local recheado com as várias saladas nórdicas, de batata, beterraba, camarão, entre outras, e degustar a refeição com uma vista bucólica. Nada de bebidas alcoólicas, pois é proibido beber no espaço público.

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 33


Motores Teste Volkswagen Scirocco 2.0 TSI DSG 220cv

Quando potência é sinónimo de diversão O coupé desportivo da Volkswagen renovou as suas roupagens de 2008 e integrou as novidades tecnológicas que dão cartas noutros modelos da marca. E com o bloco 2.0 a gasolina com 220cv revela-se divertido à medida da sua potência. Carla B. Ribeiro (texto) e Miguel Manso ( foto)

O

Scirocco não tem tido uma vida fácil, como em 1988, quando se viu substituído pelo Corrado. Até que, vinte anos depois, renasceu para dar cartas entre os fãs do espírito aguerrido do coupé desportivo. Agora, a Volkwagen não apontou baterias a uma nova geração, mas antes a uma renovação completa que vai desde uma redesenhada imagem até novos blocos. E, sete anos depois do lançamento desta geração, o Scirocco revelase totalmente actual e com o mesmo fervor jovem. Seja só de aparência, como é o caso dos modelos equipados com blocos menos potentes, seja de alma, como aquele que conduzimos. O 2.0 litros a gasolina com 220cv apresenta-se com tudo o que se poderia exigir a um carro desta estirpe: linhas dinâmicas e agressivas aliadas a uma motorização potente e muito bem gerida pela caixa automática DSG de dupla embraiagem. Face ao seu antecessor, o bloco foi recheado com mais 10cv e 70 Nm de binário, totalizando agora um torque máximo de 350 Nm. Mesmo com o aumento da potência, diz a marca que todos os blocos estão mais eficientes. E se é verdade

que a Volkswagen se pode gabar de ter conseguido colocar a fasquia de emissões a respeitar a exigente norma Euro 6, também é verdade que, mesmo observando uma redução nos consumos médios divulgados, é difícil verificar o mesmo no visor do carro. Entre as alterações à versão anterior do Scirocco, destacam-se no exterior as novas ópticas tanto dianteiras como atrás, encaixadas nas também redesenhadas frente e traseira. Entre os detalhes do design, é fácil de reparar na bainha lateral que parece sair para fora de um carro que, sendo baixo (1406mm), dá a sensação de se agarrar à estrada que nem uma lapa. Certo é que mesmo em curvas mais apertadas nada parece fazer crer que possa fugir-nos das mãos a qualquer instante. Facto que promove a sensação de segurança e nos leva a pesar mais o pé (só um bocadinho no acelerador). Até porque, ao nível da segurança, o Scirocco angariou em 2009 as cinco estrelas Euro NCAP, com 87% na segurança dos ocupantes adultos, 73% na dos ocupantes crianças, 53% na dos transeuntes e 71% na dos dispositivos auxiliares, pontuação que, mesmo com os parâmetros mais exigentes do organismo independente que avalia a segurança dos veículos automóveis comercializados na Europa, não deverá sofrer grandes alterações, uma vez que nesta renovação

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BARÓMETRO diversão s Potência, de condução, lista

de equipamento

visibilidade tConsumos, traseira

a VW não deixou de incluir sistemas essenciais ao conforto e ao bemestar de todos. Não é só ao nível da segurança que o Scirocco foi aprimorado. A marca não poupou em equipamento e mesmo a versão de entrada apresenta um nível razoável de equipamento, nomeadamente chassis e suspensão desportiva, sensores de luz e de chuva, alavanca de mudanças e volante multifunções em couro, jantes de liga leve de 17’’, piscas e luzes tra-

seiras em LED, bancos dianteiros desportivos, climatizador, auxílio ao arranque em subida, rádio/CD, indicador da pressão dos pneus, sistema Start/Stop, vidros escurecidos, apoio de braços à frente, porta-luvas refrigerado, etc. O nível Sport, que nos chegou às mãos, junta à extensa lista faróis em xénon, climatizador bizona, jantes de 18’’, retrovisores laterais rebatíveis automaticamente e com rebaixamento quando se engrena a marcha-atrás, um sistema áudio melhor, cruise control e conexão Bluetooth. Entre os opcionais, pagos à parte, além da pintura metalizada (426€), Adaptative Chassis Control (908€), Hill Hold Control com XDS (194€), estofos em couro com inserções em carbono (2045€) e Bluetooth “Premium” (291€). Depois de bem apreciadas as alterações no exterior e na lista de equipamento, há que destacar os pormenores nos acabamentos do

interior e que colocam o coupé entre os premium, com o bónus de três pequenos mostradores circulares sobre o tablier, com cronómetro, indicador da pressão do turbo e indicador da temperatura do óleo. Porém, há que ser-se justo. Nem tudo neste carro é sinónimo de um coupé desportivo. É que pode só ter quatro lugares, como é de esperar, mas quem segue atrás, depois de alguma ginástica para lá chegar, consegue encontrar uma boa posição de viagem, com espaço q.b. para as pernas. Até quando o condutor, altura de perna o exige, é forçado a chegar o banco quase totalmente para trás. De lamentar apenas a fraca visibilidade traseira: sem ninguém no banco de trás, o vidro traseiro já se mostra demasiado cortado para se ter uma ideia correcta de tudo o que se passa atrás de nós, com o banco preenchido a tarefa fica muito dificultada.


CÓMODO

DE CORTE COUPÉ

EQUIPAMENTO

É um fado costumeiro nos desportivos de corte coupé. À frente, há espaço de sobra. No banco de trás, sentam-se miúdos ainda naquela idade em que os pés não chegam ao chão. Mas no Scirocco conhecese uma realidade diferente. É verdade que a entrada para trás não é a mais prazenteira, sendo necessária alguma maleabilidade. Mas, depois de acomodados, os passageiros de trás — apenas dois, sublinhe-se — conseguem encontrar conforto mesmo em viagens mais longas.

A linha com que as janelas se desenham, emolduradas por um curvilíneo tejadilho, não engana ninguém. O Volkswagen Scirocco é um coupé em toda a sua génese. No entanto, não há mundos perfeitos. E o corte evidenciado que vai caindo até ao spoiler traseiro tem os seus inconvenientes. Sobretudo em dias de chuva. Assim que se abre o vidro, o carro enche-se de água, o que não pode ser bom para os vários comandos eléctricos situados nas portas e que comandam tanto os vidros como os espelhos. Solução: não abrir nem uma pequeníssima fresta assim que começa a pingar.

Segurança ABS: Sim Controlo electrónico de estabilidade: Sim Controlo de tracção: Sim, com auxílio à travagem de emergência Airbags dianteiros: Sim Airbags laterais: Sim, à frente Airbags de cortina: Sim Airbag de joelhos para o condutor: Não Auxílio ao arranque em subida: Sim Sistema de fixação Isofix para cadeiras de crianças: Sim Aviso de colocação do cinto de segurança: Sim Vida a bordo Vidros eléctricos: Sim Vidros escurecidos: Sim Fecho central: Sim Comando à distância: Sim Direcção assistida: Sim Espelhos retrovisores com regulação eléctrica: Sim Volante regulável: Sim em altura e profundidade Volante multifunções: Sim Volante em pele: Sim Comandos de rádio e telefone no volante: Sim Rádio/CD com MP3: Sim Bluetooth e USB: Sim Ar condicionado: Sim Porta-luvas refrigerado: sim Bancos dianteiros ajustáveis em altura: Sim Bancos traseiros rebatíveis: Sim Bancos dianteiros desportivos: Sim Estofos e bancos em couro: Sim Reg./limitador de veloc.: Sim Função Start/Stop: Sim Computador de bordo: Sim Jantes em liga leve: Sim, 18’’ Sensores de luz e chuva: Sim Faróis de nevoeiro: Sim Luzes de dia: Sim

AREJADO FICHA TÉCNICA* Mecânica Cilindrada: 1984cc Potência: 220cv às 4500-6200 rpm Binário: 350 Nm às 1400-4400 rpm Cilindros: 4, em linha Válvulas: 12 Alimentação: Gasolina, com sistema de injecção directa turbo e intercooler Tracção: Dianteira Caixa: Manual de 6 velocidades Suspensão: à frente, tipo McPherson, molas helicoidais; atrás, paralelograma deformável, molas helicoidais. Direcção: Pinhão e cremalheira, com assistência eléctrica Diâmetro de viragem: 10,6m entre passeios, 11,0m entre paredes Travões: Discos ventilados à

frente; discos atrás Dimensões Comprimento: 4256mm Largura: 1810mm Altura: 1406mm Distância entre eixos: 2578mm Peso: 1394kg Pneus: 235/40 R18 Capac. depósito: 55 litros Capac. mala: 312 litros (1006 litros com os bancos traseiros rebatidos) Prestações Veloc. máx.: 244 km/h Aceleração 0-100 km/h: 6,5s Cons. misto: 6,4 litros/100 km Emissões CO2: 148 g/km Nível de emissões: Euro 6 Preço 44.604€ (viatura ensaiada, 48.468€) * Dados do construtor

É verdade que as janelas não se podem abrir, mas isso não significa que o ambiente não seja arejado. Facto que advém muito do muitíssimo eficiente ar condicionado que equipa este como qualquer outro carro do grupo. Bastam poucos segundos para que o ambiente se torne agradável mesmo em dia de geada. Ou, pelo contrário, em dias quentes, é num instante que se consegue uma temperatura amena por toda a viatura.

POTENTE São 220cv de potência e um binário de 350 Nm. Mas não é “só” isso que faz do Scirocco um desportivo de corpo e alma. Tudo no carro transpira desportividade. Desde as linhas exteriores até aos detalhes no interior. Por exemplo, os três pequenos mostradores redondinhos no centro que assentam sobre o tablier evidenciam ainda mais o lado aguerrido com que o Scirocco se apresenta. Para consultar e explorar, e, claro, para vivenciar o lado mais divertido, cronómetro, indicador da pressão do turbo e indicador da temperatura do óleo.

FUGAS | Público | Sábado 14 Março 2015 | 35


Motores Mazda6 e Mazda CX-5 renovados

Reconquistar fatia de mercado Após um período de certa estagnação, a Mazda renova a gama de veículos. Primeiro, com a nova geração do utilitário Mazda2. Agora com as actualizações do Mazda6 e do SUV médio CX-5. E para breve anuncia-se o novo SUV compacto CX-3. João Palma

A

Mazda volta a mexer-se. Depois do novo Mazda2, é actualizado o navio-almirante do fabricante japonês, o Mazda6 de 2013, agora mais confortável e silencioso, com novos equipamentos e melhorias nos materiais usados e acabamentos, para se aproximar dos veículos premium do segmento D. Disponível desde já em Portugal, terá duas carroçarias (carrinha e berlina de quatro portas), três níveis de equipamento e duas declinações (150cv e 175cv) do bloco 2.2 a gasóleo e preços desde 34.375€. Também a geração de 2012 do SUV médio CX-5 foi alvo de renovação que é lançada em simultâneo com a do Mazda6. Para Portugal, são propostas as mesmas duas variantes do bloco 2.2 a gasóleo, com 150cv e 175cv. Com três níveis de equipamento, Essence, Evolve e Excellence, o mais acessível Mazda CX-5 é o 2.2 de 150cv 4x2 Essence, com caixa manual de seis velocidades, que custa 31.711€. Tanto para o Mazda6 como para o CX-5, há outros propulsores a gasolina disponíveis, mas para Portugal, face às especificidades do mercado, só virão as referidas duas variantes do bloco 2.2 a gasóleo. A versão de 150cv, tanto no Mazda6 como no CX-5, tem tracção dianteira e vem acoplada a uma caixa manual de seis velocidades. Já o propulsor mais potente de 175cv, pode também vir acoplado a uma caixa automática de conversão de binário com seis relações de fabrico Mazda, que, segundo o construtor, combina os benefícios desse tipo de caixas com os das de variação contínua e de dupla embraiagem. A tracção é dianteira com o motor 2.2 de 150cv ou integral no CX-5 de 175cv. O Mazda6 tem tracção dianteira em ambas as variantes do 2.2 a gasóleo, mas a

FICHA TÉCNICA Motorizações

Ac. 0-100km/h

Veloc. Máx.

Cons. Médio

Emis. CO2

Preço*

Mazda6 Gasóleo 2.2 Skyactiv-D 4x2 (150cv)

9,1s

210 km/h

3,9 l/100km

104 g/km

34.375€

2.2 Skyactiv-D 4x2 (175cv)

7,9s

223 km/h

4,5 l/100km

119 g/km

40.726€

2.2 Skyactiv-D 4x4 (175cv)

8,2s

214 km/h

5,0 l/100km

132 g/km

48.904€

CX-5 Gasóleo 2.2 Skyactiv-D 4x2 (150cv)

9,2s

202 km/h

4,6 l/100km

119 g/km

31.711€

2.2 Skyactiv-D 4x4 (175cv)

8,8s

207 km/h

5,2 l/100km

136 g/km

44.176€

* Preço de venda ao público (a partir de) carrinha com 175cv pode ter agora tracção integral (neste caso, só com caixa automática). Destaque para novas afinações da tracção integral com sistema de aviso e detecção de escorregamento da frente e dos amortecedores dianteiros e traseiros, além de modificações no design, materiais e acabamentos bem como novos equipamentos de segurança e infoentretenimento. Ambos os pro-

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pulsores, que já cumprem a norma de emissões Euro 6, apresentam médias reduzidas de consumos e emissões, com sistema de Start/Stop, de paragem e arranque automáticos do motor e, no caso do Mazda6, o i-ELOOP, sistema de regeneração de energia de travagem específico da marca japonesa. No que se refere ao Mazda6, o exterior apresenta uma grelha tridimen-

sional redesenhada e, no nível de equipamento superior, Excellence, iluminação adaptativa com ópticas em LED e outras pequenas alterações no visual. Mas é na mecânica (como foi descrito acima), equipamento e interior que as diferenças são mais marcantes. Houve um esforço de melhoria dos materiais e acabamentos com diminuição do ruído percebido em 1,2 dB (-30%), bem

como uma simplificação do design e da instrumentação para nivelar por cima este modelo do segmento D, o dos familiares médios. Com travão de estacionamento eléctrico e auxílio ao arranque em subida de série em toda a gama, o nível intermédio, Evolve, que a marca prevê ser o mais vendido com o motor de 150cv e tracção dianteira (37.896€), traz climatizador bizona, sensores de luz e de chuva, cruise control, o sistema de infoentretenimento MZD Connect, com ecrã táctil de 7’’ (e também comandos por um botão na consola) e o Smart City Brake Support, de prevenção de colisão, que além de funcionar para a frente, agora também actua na marcha atrás a velocidades de dois a oito km/h. O nível superior, Excellence (único e exclusivo na variante de 175cv), adiciona aviso de ângulo morto e de fadiga do condutor, auxílio à manutenção na faixa de rodagem, faróis adaptativos em LED, projecção de informação do computador de bordo e sistema de navegação no pára-brisas, sistemas de navegação e áudio Bose, câmara e sensores de estacionamento. O Mazda CX-5, um SUV médio mais vocacionado para o asfalto (embora com tracção integral esteja apto a enfrentar trilhos de dificuldade média), tem os mesmos níveis de equipamento, Essence, Evolve e Excellence, com conteúdos similares. A principal diferença é que o nível Excellence também está disponível com o motor de 150cv, embora continue a ser o único para a variante de 175cv. Mas a aposta é no CX-5 2.2 4x2 de 150cv com caixa manual e nível Evolve (34.661€). No exterior, houve pequenas alterações, mas, tal como no Mazda6, as melhorias mais marcantes residem no sistema de tracção total, na suspensão, no design interior, materiais e acabamentos, com simplificação da instrumentação, travão de estacionamento eléctrico em toda a gama, bem como os novos sistemas de conectividade, conforto e vida a bordo e de segurança.


Motores Pneu Michelin CrossClimate

Uma revolução no mundo dos pneus Ninguém usa pneus de Inverno em Portugal, mas agora a Michelin inova com um pneu que, sendo um verdadeiro todas-as-estações, não só irá revolucionar o mercado europeu, como pode ser muito útil em certas regiões do país. João Palma

A

Michelin, um dos líderes em inovação entre os fabricantes de pneus, apresenta um novo produto que irá provocar grandes alterações no mercado europeu de pneus. O CrossClimate, disponível em Maio, tem no Verão prestações similares ao pneu economizador Energy Saver Plus mas também está homologado para uso em condições invernais de chuva, neve e gelo pela certificação 3PMFS (3 Peaks Mouintain Snow Flake) representada por um pictograma de uma montanha de três picos nevados na parede do pneu. Em muitos países do Norte da Europa é comum os automobilistas terem dois jogos de pneus: um de Verão e outro de Inverno. Quando a temperatura baixa tem de se trocar os pneus de Verão por uns de Inverno, quando sobe, faz-se o procedimento inverso. Isso representa uma incomodidade acrescida, ainda que necessária. Por vezes, as casas de pneus guardam os jogos não utilizados dos seus clientes e procedem à troca de acordo com a estação do ano. Agora, só em condições extremas com neve intensa e persistentes temperaturas negativas, como por exemplo na alta montanha, continua a ser requerida a troca de pneus. Mas os pneus de Inverno funcionam bem até +7º C: quando a temperatura sobe, as prestações reduzem-se drasticamente e eles degradam-se rapidamente. O novo Michelin CrossClimate é o primeiro pneu de Verão homologado para uso no Inverno e em 90% das situações vem acabar com o calvário da troca de pneus. A certificação 3PMFS permite o seu uso todo o ano, incluindo em países como, por exemplo, a Alemanha, onde

com o tempo frio é obrigatório por lei equipar os veículos com pneus de Inverno. O novo produto da Michelin foi testado e aprovado em temperaturas que variaram dos -30ºC até

aos +40ºC. Em testes comparativos efectuados pela TÜV SÜD, uma entidade independente de certificação e testes, o CrossClimate obteve o máximo de 5 estrelas na travagem em seco, na aderência

em curva e na tracção em subida com neve, superando no global os outros pneus testados: o pneu de Verão Michelin Energy Saver +, o de Inverno Michelin Alpine e um pneu All-Season considerado referência, de um outro fabricante. Em testes efectuados na apresentação internacional à imprensa, na cidade francesa de Divonne-LesBains, foi possível apreciar as qualidades de travagem em seco (iguais às do Energy Saver +), aderência em molhado (superior ao Energy e ao Alpine) e tracção em subida com neve (equiparável ao do Alpine). Num percurso por estrada de montanha, avaliámos o conforto, o baixo nível de ruído (obteve o mínimo de uma onda de ruído na etiqueta europeia de certificação, bem como o grau máximo A na travagem em molhado) e a estabilidade em recta e em curva, tanto em troços secos, como molhados ou cobertos de neve.

Quem lê estas linhas poderá comentar: “Isso é tudo muito bonito, mas num país com um clima como o português, para que é que serve um pneu de Inverno como o CrossClimate?” Pois bem, pode servir muito e não é por acaso que a Michelin decidiu comercializá-lo em Portugal. Um pneu de Inverno clássico só em certos pontos do país e em situações pontuais bem definidas é que se poderia justificar, por isso nenhuma marca de pneus tem no seu catálogo português esse tipo de produtos. Porém, o CrossClimate é um produto radicalmente diferente, o primeiro verdadeiro pneu para todas as estações. Em Portugal, pode ser usado todo o ano e em todas as zonas do país. A sua grande vantagem é a segurança e estabilidade de condução que ele proporciona a baixas temperaturas, em estradas com gelo, neve e até chuva e lama. Muitos de nós já enfrentaram, mesmo ocasionalmente, essas situações com pneus de Verão tradicionais e sentimos a perda de aderência do carro, com os perigos inerentes. Graças aos compostos usados no fabrico do CrossClimate, bem como ao desenho exclusivo em V da banda de rodagem com lamelas tridimensionais, este pneu tem performances, durabilidade e baixa resistência ao rolamento (com a consequente redução do consumo de combustível) similares ao pneu de Verão economizador Michelin Energy Saver + e, ao mesmo tempo, ter desempenho de pneu de Inverno. Este “seguro de vida” será comercializado por um preço cerca de 5% superior ao Energy Saver +. No lançamento, estará disponível em 23 medidas, para automóveis com jantes de 15’’ a 17’’ e índices de velocidade de T (até 190km/h) ao W (até 270 km/h), cobrindo assim desde já cerca de 70% do mercado europeu. Em 2016 serão introduzidas novas medidas e também pneus CrossClimate para SUV, veículos 4x4 e comerciais ligeiros.

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Plano de viagem

RUI GAUDÊNCIO

Ao longo de 10 dias, testemunhe a importante riqueza histórica, arquitectónica e cultural do Irão, lar de uma das civilizações mais antigas do mundo. Desde 2580€/pessoa (saída a 25 de Março) e 2415€ (saída a 17 de Maio e 11 de Setembro). Inclui avião de Lisboa, transfer em autocarro Porto/Lisboa/Porto, alojamento com pensão completa, guia e visitas conforme o itinerário.www.pintolopesviagens.com Surf, bodyboard, stand up paddle e skate em Matosinhos Para as férias da Páscoa, a Escola Surfaventura organiza, na praia de Matosinhos, um programa de aulas e cursos intensivos de surf, bodyboard, stand up paddle e skate, para crianças dos sete aos 12 anos. Os preços variam

consoante a modalidade entre os 70€ para os cursos (com excepção do skate, que custa 45€) e os 125€ para 10 aulas de surf e bodyboard. Inclui o material necessário e professor. www.surfaventura.com DANIEL ROCHA

Ar livre

Surf na Costa da Caparica

Cá dentro

Circuito de quatro noites à Madeira, com estadia em hotel, oito refeições e visitas, com preços desde 599€ por pessoa em quarto duplo. Partidas de Lisboa ou Porto no dia 28 de Março e 4 de Abril. www.abreu.pt

Lá fora

Zambujeira do Mar Aproveite a promoção especial Páscoa no Zmar Eco Campo, localizado próximo da Zambujeira do Mar. Estadia de quatro noites em alojamento pelo preço de três — a partir de 366€ em regime de meia pensão. De domingo a quinta-feira nas datas entre 22 a 26 de Março e 29 de Março a 2 de Abril. www.zmar.eu

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Lagos italianos Roteiro de cinco dias pelos lagos do Norte de Itália, Como e Maggiore, com preços a partir de 1275€/pessoa. Inclui transporte aéreo de Lisboa e Porto no dia DARRIN ZAMMIT LUPI/REUTERS

Madeira

Na Lufi Surf School há aulas de surf durante as férias com preços desde 130€ por semana ou 35€ por dia, com material necessário, almoço e seguro incluído. De 23 a 27 de Março e de 30 de Março a 3 de Abril. Opção de transporte casa/escola/casa por 60€ para cinco dias. www.lufisurfschool.com

28 de Março, taxas, estadia em hotéis com algumas refeições e visitas. www.viagenstempo.pt

Mergulho em Malta Descubra a fascinante vida aquática de Malta, que oferece um pouco de tudo, como enseadas, recifes com diferentes formas de vida e águas cristalinas, nesta viagem de mergulho à ilha, com partida em voo especial a 1 de Abril. Preço: a partir de 455€ por pessoa em quarto duplo; 175€ pack de seis mergulhos com garrafa e lastro e 205€ com equipamento completo. Inclui voo de Lisboa, taxas e cinco noites de alojamento. Telefone: 211319759 www.topsub.com.pt



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