01
Intervenções em segurança pública Julho de 2021
FICHA FICHA TÉCNICA: TÉCNICA
VISÃO MUNDIAL
VISÃO MUNDIAL Diretora Nacional: Martha Yaneth Diretora Nacional: Martha Yaneth Diretor de Ministério: Thiago Machado Diretor de Ministério: Thiago Machado Diretor de Advocacy e Relações Institucionais: Welinton Pereira Diretor de Advocacy e Relações Institucionais: Welinton Pereira Gerente de Mobilização: Kess Jones Gerente de Mobilização: Kess Jones Organização: Reginaldo Silva Organização: Reginaldo Silva Revisão: Laura Ribeiro Revisão: Laura Ribeiro Colaboradores: Rômulo Silva, Izabel Accioly, Luiz Fábio, Ana Lins,para Derick Coelho,de José Colaboração criação conteúdo: Sérgio, Tatiane Anjos, Edgleison Rômulo Silva, Izabel Accioly,Rodrigues. Luiz Fábio, Ana Lins, Derick Coelho, José Sérgio, Tatiane Anjos, Edgleison Rodrigues. Gráfico: Máquina do Bem FǢŁɯŜƼϱ Máquina do Bemdo Monitora*Material inspirado no Manual mento Jovem de Políticas Públicas organizado *Material Nacional, inspiradosob no Manualde do pelo Colegiado a liderança Monitoramento Jovem de Políticas Públicas Reinaldo Almeida e Maria Carolina. organizado pelo Colegiado Nacional, sob a liderança de Ana Reinaldo Almeida e Maria Tradução (Espanhol): van Eersel Carolina. Tradução (Espanhol): Ana van Eersel
UMÁRI
02
03 04 05 06 18 34 40
03
Introdução Introdução
Objetivo Objetivo
Apresentação Apresentação
Monitoramento jovem Monitoramentojovem de depolíticas políticaspúblicas públicas de desegurança segurança
Segurançapública: pública: Segurança compreedendo compreedendo a violência noBrasil Brasil a violência no
Pensandoem emsoluções: soluções: Pensando intervenções em em intervenções segurançapública pública segurança
Considerações Consideraçõesfinais finais
04
Foto de Gabriel Dias (Salvador)
“Quando se cresce puxando água do poço sabemos que ela sai da terra e não de uma torneira”. Criolo
05
INTRODUÇÃO A frase acima demonstra um pouco da realidade desigual que separa ricos e pobres no Brasil, este apartheid que começa na infância, com o acesso a um bem básico, a água, e se transforma na pior das violências, a morte por assassinato.
Minhas homenagens ao trabalho incansável do colega e amigo Reginaldo, carinhosamente chamado por nós de Régis, por conseguir orquestrar junto com os meninos e meninas do MJPOP tanta coisa bonita em meio a tantas adversidades.
O Guia “Eu sinto na pele: intervenções em segurança pública” não é um guia teórico apenas, mas é fruto da prática de muitos jovens, educadores e educadoras, gente da academia, e da comunidade em geral. Queremos com este Guia enaltecer a voz de tantos meninos e meninas que vivem nas periferias de nossas cidades, e que além de ǷƼţŀчŀчţūɯчŜƐŰƲŜƐŀчƲƼчŀƧŜŀƲŜūчţŀǪчǟƼƧƒǷƐŜŀǪч públicas para uma vida plena e saudável, ainda se tornam o alvo prioritário das ações policiais.
Que este Guia seja realmente um guia para a promoção da vida plena para todas as crianças, adolescentes e jovens de nossas comunidades, especialmente aqueles e aquelas que têm seus direitos negados cotidianamente.
Welinton Pereira Diretor de Advocacy e Relações Institucionais da VM
06
OBJETIVO O Guia #EuSintoNaPele, Intervenções em Segurança Pública, nasceu com o objetivo de contribuir com a redução da violência em cinco estados nordestinos, que apresentavam um alto índice de homicídios na adolescência. Os grupos do MJPOP participaram durante os anos de 2018 e 2019 de atividades de mobilização social, articulação governamental e implementação de experiências comunitárias com o foco na área de Segurança Pública. Essas experiências começaram a ser desenvolvidas ainda no ano de 2018 nos estados do Amazonas, Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Alagoas, Bahia e no Distrito Federal. Durante esses anos foram realizadas diversas atividades de formação sociopolítica e capacitações para a elaboração de intervenções juntamente a diversos grupos juvenis. Este guia, elaborado através das diversas contribuições das juventudes periféricas do Nordeste, é para ser utilizado para e por jovens. As principais contribuições sobre as temáticas a serem debatidas vieram através da orientação destes próprios grupos. É a garantia da participação das juventudes em processos que gerem as oportunidades necessárias para poderem ser tudo aquilo que sonharem ser, rompendo com o clico da violência e da morte.
Banco de Imagens da Visão Mundial
07
SENTAÇÃO O Brasil possui uma das maiores taxas de homicídios do mundo. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o ano de 2018 apresentou uma redução de 10,8% do número de homicídios em relação com o ano anterior. Mesmo com essa redução, 57.341 pessoas foram assassinadas, uma taxa de 27,5 por 100 mil habitantes, a mesma de 2013. Entre as vítimas, 99,3% eram homens, 77,9% tinham entre 15 e 29 anos de idade e 75,4% eram negros, desenhando o perfil já conhecido das vítimas de homicídios no Brasil. Sabemos que romper com esse ciclo de violência não é fácil. A diminuição na taxa de homicídios em alguns anos não são sustentáveis, pois os números tendem a crescer novamente. Sem contar, que a redução dos índices de homicídios nem sempre representam a redução da violência nas comunidades mais vulneráveis. Se faz necessário pensar políticas públicas que não sejam imediatistas e que que não utilizem uma lógica militar e violenta para poder criar comunidades pacíficas. É preciso elaborá-las com a participação ativa daqueles e daquelas que mais sofrem com a violência e que sabem os caminhos para poder reduzi-la. Por isso, esse guia preza pela participação das juventudes em todo o processo construtivo das políticas públicas de segurança. Nesses dois anos de atuação do projeto utilizamos como instrumento metodológico inspirativo a metodologia do Monitoramento
Jovem de Políticas Públicas (MJPOP). Essa metodologia nos permitiu ter uma maior articulação comunitária, sem perder o foco na atuação juntamente aos governos locais, às vezes questionando a implementação de políticas públicas que não respondiam a necessidade da população, em outros momentos sugerindo novas medidas para conter a violência dentro das comunidades. Esse guia traz todo o processo metodológico para a criação de intervenções comunitárias em Segurança Pública. Na primeira parte temos as diretrizes para a formação de grupos juvenis que irão intervir na realidade de seus territórios, através da mobilização e do diálogo, com grupos comunitários, associações, organizações locais, prestadores de serviços e o poder público. A segunda parte desse guia desenvolve a formação continuada para esses grupos de jovens, trazendo conceitos como Segurança Pública, Necropolítica, Violência de Gênero e outras reflexões sobre a violência no Brasil. Nas primeiras experiências realizadas detectamos que, por muitas vezes, os participantes não tinham conhecimento sobre as causas da violência e como podemos atuar para intervir. Por fim, na última parte encontram-se 3 experiências de intervenções criadas pelos adolescentes e jovens que participaram das ações do #EuSintoNaPele.
08
Monitoramento Jovem de Políticas Públicas de Segurança
1 Banco de Imagens da Visão Mundial
09
A metodologia MJPOP foi elaborada e reeditada pela Visão Mundial ao longo de 13 anos e aposta na capacidade que indivíduos e comunidades têm de possibilitar a mudança de seus contextos e de exclusão, de falta de acesso a serviços públicos de qualidade e de ausência de participação nas decisões políticas que afetam a vida de milhares de pessoas em cada município. Construída a princípio para avaliar a qualidade da prestação de serviços públicos, a metodologia se tornou uma ferramenta de mobilização comunitária capaz de agregar os mais diversos setores da sociedade, para juntos encontrarem soluções para os problemas que estavam vivenciando. Dessa forma, a metodologia com o passar dos anos tornou-se um movimento que agrega as mais diversas juventudes presentes nas periferias do Brasil.
O projeto #EuSintoNaPele nasceu com o objetivo de contribuir com a redução dos homicídios na adolescência no Distrito Federal e em seis estados brasileiros: Amazonas, Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Alagoas e Rio de Janeiro. Os resultados desse primeiro ano, na área de mobilização, mostraram que poderíamos alcançar contribuições ainda maiores para a redução da violência. Adolescentes e jovens conseguiram se integrar a diversas outras organizações que trabalhavam o tema da Segurança Pública, formando uma grande rede em defesa da vida dos mais vulneráveis: jovens e adolescentes que estavam sendo assassinados nas periferias brasileiras. Durante o ano de 2019 focamos as ações do Projeto no Rio de Janeiro e nos estados que estavam localizados no Nordeste.
O movimento MJPOP monitorou diversos serviços: reformas de escolas, construção de praças e conselhos tutelares, serviços de abastecimento de água e muitos outros. Entretanto, percebemos que outra realidade era constante nos grupos: a perda de amigos e familiares para a violência letal. Essa violência se dava das mais variadas formas e por muitas vezes nos sentíamos incapazes de poder fazer frente a essa dura realidade. Os adolescentes e jovens sentiam na pele a dor da exclusão, da violência policial, da ausência de oportunidades para poder viver dignamente. As políticas governamentais na área de Segurança Pública tinham apenas caráter repressivo e letal, não atendendo as expectativas daqueles que gostariam de poder andar tranquilamente no lugar onde nasceram.
Um dos princípios da política pública de segurança é que ela garanta a participação popular em sua elaboração e implementação. Entretanto, no Brasil, as políticas públicas nessas áreas são elaboradas de acordo com a vontade de determinados gestores políticos e grupos com interesses em pautas específicas, nem sempre levando em conta o contexto local e a escuta comunitária. Dessa forma, somente o caráter repressivo aparece nas comunidades, deixando de lado questões como a prevenção à violência e a proteção à vida. A Metodologia do MJPOP foi adaptada para poder atuar nessa área, entendendo que não se trata de uma pauta fácil para ser trabalhada dentro das comunidades, cercadas por diversos sistemas repressivos que tendem a minar a participação popular. Por isso, todas as ações devem prezar pela segurança do indivíduo e do grupo, garantindo que ninguém seja exposto a situações de risco iminente.
Diante desse contexto, no ano de 2018, iniciamos uma ação ousada, mas necessária e esperada por todo o movimento: monitorar a Política Pública de Segurança.
10
Os elementos que norteiam a aplicação da metodologia no contexto da Segurança Pública são os seguintes: Participação, Informação, Diálogo e Territorialidade. A metodologia está dividida em três fases:
FASE 1 : MOBILIZAÇÃO E FORMAÇÃO DO GRUPO DE TRABALHO Essa é a primeira fase da metodologia. Nela os grupos territoriais serão formados e prepara-se todo o processo de mobilização da comunidade. O grupo formado levantará as informações necessárias sobre os temas de segurança pública dentro da comunidade. O Diagnóstico Rápido Participativo é construído pelo GT.
FASE II: CONSTRUÇÃO DA INTERVENÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO Essa é a fase em que a comunidade mobilizada começa a desenhar a intervenção que será realizada dentro do seu território. As propostas construídas serão levadas ao poder público para que possam ser implementadas em uma parceria com o grupo, ou rede formada dentro da comunidade. Esse ponto é importante, pois nessa fase chama-se à responsabilidade os gestores públicos.
FASE III: PRESTAÇÃO DE CONTAS DO GRUPO E DO PODER PÚBLICO Na última fase se realizam audiências públicas para apresentar os resultados da intervenção realizada no território. Não somente o grupo prestará contas, mas os entes do poder público envolvidos na execução da intervenção. Se analisará nessa fase a capacidade de replicação em outros territórios.
11
Foto de Edgleison Rodrigues (Mossoró/RN)
12
FASE 1
MOBILIZAÇÃO DA COMUNIDADE E PARCEIROS
13
Na primeira fase é necessário seguir alguns passos que estarão detalhados abaixo. É importante nunca avançar para o passo seguinte, sem antes concluir a etapa. As atividades estão conectadas, podendo dessa forma ser prejudicadas se deixarmos de observar algo importante do passo anterior. Por isso, ao final de cada fase e passo realizem uma revisão das atividades.
I. FORMANDO O GRUPO DE TRABALHO A primeira ação é a sensibilização de adolescentes e jovens do território para a formação do Grupo de Trabalho. O grupo será responsável pela implementação das fases e passos da metodologia durante o período que estiverem monitorando a política pública de segurança. O grupo necessitará ter plena consciência do trabalho a ser realizado, qual metodologia será utilizada e qual objetivo se quer alcançar. Acima de tudo, todos precisam estar comprometidos com a implementação de políticas públicas de segurança que tenham caráter preventivo e nasçam da participação popular. É importante que o GT tenha uma representatividade ampla, com participação de adolescentes e jovens moradores da comunidade, que sejam representantes das mais diversas manifestações sociais, políticas e culturais existentes no território e comprometidos com a transformação social da região que pertence. Recomenda-se que o GT tenha no mínimo dez e no máximo quinze componentes. O trabalho deve ser dividido entre todos, com cada componente assumindo sua responsabilidade com a coletividade e com o compartilhamento de tarefas e afazeres. É importante que o grupo nomeie um facilitador: ele deverá ser escolhido através de eleição dos membros do grupo, e ficará responsável pela representação do grupo em diversas instâncias, garantindo a entrega dos produtos nos prazos combinados.
II. ELABORANDO O PROTOCOLO DE SEGURANÇA Não podemos iniciar o monitoramento de uma política pública de segurança sem antes estarmos conscientes dos riscos que estão diante de nós. Por isso, é importante realizar uma avaliação de riscos e elaborar um protocolo de segurança para todos do grupo. Os riscos podem ser os mais variados, desde ações que possam se caracterizar como abuso policial ou ações hostis cometidas por organizações criminosas que não concordam com a implementação das políticas públicas que venham reduzir a violência. Para elaborar um protocolo de segurança siga o modelo abaixo:
14
PROTOCOLO DE SEGURANÇA DESCREVA BREVEMENTE O SEU CONTEXTO COM RELAÇÃO A SEGURANÇA PÚBLICA Fale um pouco do seu contexto, quais são os principais índices de violência, quais organizações sociais estão presentes nas comunidades.
QUAIS SÃO OS RISCOS CONCRETOS QUE VOCÊ E SEU GRUPO ESTÃO SUBMETIDOS DIANTE DESSE CONTEXTO Exemplos: Violência policial, retaliação por grupos armados...
15
QUAIS SÃO AS MEDIDAS DE SEGURANÇA QUE VOCÊS PODEM TOMAR PARA MITIGAR ESSES RISCOS? Exemplos: Reuniões em locais públicos com segurança; Construção de narrativas que priorizem a prevenção e não a repressão.
QUAIS SÃO AS MEDIDAS DE SEGURANÇA QUE VOCÊ E O SEU GRUPO PODEM TOMAR PARA MITIGAR OS RISCOS NA INTERNET Exemplos: Exposição em redes sociais; Reuniões onlines realizadas com segurança e criptografadas.
LISTE ABAIXO UMA REDE DE CONTATO COM AS PRINCIPAIS ORGANIZAÇÕES QUE PODEM SER ACIONADAS EM CASO DE PERIGO IMINENTE. NÃO ESQUEÇA DE COLOCAR OS CONTATOS DE ¸.f.E}r.ч.ч.Тp Rf Exemplos: 1. Defensoria pública; 2. Visão Mundial; 3. Fórum Popular de Segurança Pública; 4. Ministério Público
16
III. DETECTANDO E SENSIBILIZANDO PARCEIROS Com o grupo de trabalho formado e o protocolo de segurança preenchido, agora é o momento de se buscar parceiros para realização do monitoramento em conjunto. A metodologia MJPOP crê que não é possível fazer incidência política isoladamente, por melhor que sejam as intenções e por mais justas que sejam as causas defendidas. Por isso, se faz necessário realizar o mapeamento político, que é o levantamento de todos os agentes sociais que ǟƼţūưчƃƼǢǷŀƧūŜūǢчūчŀǟƼƐŀǢчƼчǟǢƼŜūǪǪƼчţūчưƼśƐƧƐȧŀşŘƼчŜƼưǿƲƐǷŁǢƐŀчūчţūчƐƲɰчǿŰƲŜƐŀчǟƼƧƒǷƐŜŀϯч Deverão ser envolvidos nos processos parceiros da sociedade civil em geral, como movimentos, ONGs, coletivos, igrejas, entre outros. Importante ressaltar também a importância da participação de agentes públicos durante o monitoramento. Os agentes públicos podem ser escolas, conselhos de direitos, delegacias, secretarias de governos, comissões de direitos humanos, educação, centros de referências de assistência, ou qualquer ente governamental presente dentro da comunidade.
MAPEAMENTO POLÍTICO AGENTE SOCIAL Descreva o nome do Parceiro da sociedade civil ou governo.
CONTRIBUIÇÃO Como ela contribuirá com o monitoramento?
PONTO FOCAL Nome do contato na organização parceira.
OBSERVAÇÕES Espaços para poder destacar questões importantes sobre o parceiro.
17
Os contatos com os agentes sociais deverão ser realizados pelos participantes do GT. O primeiro propósito dessa iniciativa é apresentar a metodologia e o que ela propõe. A apresentação deverá ser feita com muita objetividade, possibilitando que o ator político em questão vislumbre nesse processo metodológico um aliado para atingir o que é um objetivo comum: a melhoria das políticas de segurança dentro da comunidade, permitindo uma vivência comunitária livre da violência.
IV. COLETANDO INFORMAÇÕES FUNDAMENTAIS ƼưƼч ơŁч ŀɯǢưŀưƼǪч ŀƲǷūǢƐƼǢưūƲǷūϰч ŀч informação é um dos elementos constituintes da metodologia MJPOP. Quando falamos sobre Segurança Pública, muitas das informações repassadas às comunidades são manipuladas, criando uma sensação que algumas ações desenvolvidas pelos governos locais são as únicas possíveis, gerando um estado de medo e de conformidade. Conforme as pessoas vão tomando conhecimento sobre os direitos que lhes são negados, quais são as causas das violências e das injustiças cometidas, bem como os meios para ǪǿǟūǢŁЙƧŀǪϰчǟƼţūưƼǪчŀɯǢưŀǢчǡǿūчūȜƐǪǷūчǿưч amadurecimento para a vivência plena da cidadania. São necessários conhecimentos prévios essenciais para a mobilização comunitária e o monitoramento das políticas públicas de segurança: o saber sobre a realidade social sobre a qual se quer intervir e o conhecimento dos direitos de homens e mulheres que ali estão inseridos, em contextos, muitas vezes, de injustiça e privação. O GT poderá obter as informações por meio da realização de um DRP (Diagnóstico Rápido Participativo), no qual, através de algumas perguntas objetivas, realizadas por meio de
roteiro estruturado, se poderá constatar os principais anseios e o grau de satisfação dos moradores com os serviços oferecidos. Outro caminho é trabalhar lentamente o levantamento desses dados em grupos focais para descobrir como determinadas parcelas da comunidade estão recebendo os serviços públicos relacionados com a sua segurança e proteção. Além disso, é interessante recorrer aos diagnósticos produzidos por outros atores sociais e aos ţŀţƼǪч ƼɯŜƐŀƐǪч ţƐǪǟƼƲƐśƐƧƐȧŀţƼǪч ǟūƧƼч ǟƼţūǢч público. Por outro lado, não basta ter a ciência da realidade, o conhecimento de como as coisas são. É importante saber também como elas deveriam ser: quais os direitos que os moradores daquela comunidade possuem? O que está previsto na legislação sobre a execução da política pública que será monitorada e quais os projetos governamentais que estão sendo implementados? Qual o orçamento público destinado para esta área durante o ano vigente e como o mesmo está sendo executado? Estas respostas são obtidas ơǿƲǷƼчŀƼǪчƽǢƄŘƼǪчƼɯŜƐŀƐǪчţƼчǟƼţūǢчǟȀśƧƐŜƼчūч são fundamentais para nortear o rumo que a mobilização comunitária deverá seguir na fase posterior. Para concluir esta etapa, deverá ser criado um quadro de informações iniciais, que sistematizará as informações levantadas nesse passo e será apresentado aos moradores durante a criação da intervenção comunitária, a ser realizada na fase seguinte. De maneira simples, o quadro apresentará a situação real da comunidade, com um resumo dos dados obtidos nos diagnósticos comunitários, comparando-os com os direitos detectados nas pesquisas realizadas junto ao poder público. É a partir do choque entre “o que é” e o “como deveria ser” que a comunidade, em comunhão com os líderes locais e os prestadores de serviço, se sentirá instigada a mudar sua própria realidade, assumindo-se como sujeito desse processo de transformação social.
18
QUADRO DE INFORMAÇÕES SOBRE O SERVIÇO PÚBLICO QUALIFICAÇÃO URBANA:
Comunidade José Vicente CARACTERÍSTICA OU TIPO DE DADO LEVANTADO
A QUE TEMOS DIREITO?
COMO É AGORA? Г£. fR$ $.Д
Iluminação Pública
Espaços iluminados e seguros
As ruas da comunidade José Vicente não possuem iluminação adequada.
Equipamentos sociais que visam reduzir a vulnerabilidade da comunidade
Estabelecer/Regulamentação das Zonas de Interesse Social (ZEIS) em territórios vulneráveis.
A comunidade não possui equipamentos de intervenção social para a redução da violência.
COMENTÁRIOS
19 19
Banco de Imagens da Visão Mundial
20
FASE 2
CONSTRUÇÃO DA INTERVENÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO
21
A fase dois será o processo de construção da intervenção comunitária e a sua implementação no território escolhido. Vale lembrar que nessa fase é importante estar com uma rede de parceiros formada com os dados sobre as políticas públicas desenvolvidas na comunidade que contribuem com a redução da violência, com informações sobre os números da violência na comunidade e com o mapeamento da percepção comunitária sobre esse problema. A fase dois é o momento de aprofundar o conhecimento e, juntamente com a rede de parceiros, elaborar a intervenção. Igualmente à Fase I, alguns passos também devem ser seguidos:
I. COMUNICANDO PARA MOBILIZAR Temos aqui um ponto crítico em nossa metodologia de monitoramento das políticas públicas de segurança na comunidade. A comunicação de ações que promovem a transformação social e mudanças nas políticas relacionadas à Segurança Pública em diversos territórios é algo bastante perigoso e pode colocar em risco a vida dos integrantes do GT. Por isso, se faz necessário a realização de uma comunicação que demonstre o objetivo do grupo: melhorar os serviços públicos nas comunidades, principalmente em relação àqueles que darão oportunidades para que adolescentes e jovens se desenvolvam com segurança. A comunicação nessa fase tem como objetivo mobilizar a comunidade para participar dos processos de criação da intervenção que resultará na elaboração do plano de ação e na sua implementação. Essa comunicação deverá ser direcionada para pessoas que tenham interesse na transformação de sua comunidade, como também fazer conhecido o GT do MJPOP. Sempre revise as mensagens que serão
publicadas em redes sociais, através de faixas, rádios comunitárias, entre outros, para que não se provoque conflitos com qualquer grupo dentro do território. Antes de realizar o convite para esse momento esteja atento ao Protocolo de Segurança construído na primeira fase. Ele irá direcionar a melhor maneira de comunicar a presença do GT na comunidade e como realizar a integração de novas pessoas ao grupo.
II. CONSTRUINDO CAPACIDADES NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA Nesse passo, juntamente com os membros da comunidade mobilizados, passa-se a construir a intervenção comunitária. É importante, antes do início da criação da intervenção propriamente dita, que os participantes possam adquirir capacidades sobre os tópicos relacionados à segurança pública e práticas baseadas em evidências para reduzir a violência. As juventudes nesse processo não são apenas beneficiárias, mas parte da construção das ações. O formato do primeiro encontro de formação para a construção de capacidades será definido pelo GT. Por exemplo: pode ser realizado em um final de semana ou em dias e horários escolhidos durante a semana. Veja qual a melhor maneira para que o seu grupo passe por esse processo. Os textos de apoio estão na segunda seção desse manual que é intitulada: Segurança Pública, compreendendo a Violência no Brasil. Nos anexos, você encontra a descrição da oficina, que também pode ser adaptada à localidade. Observação: Não se esqueça de passar por todos os temas (gênero, racismo, segurança pública).
22
III. CONSTRUINDO INTERVENÇÕES EM SEGURANÇA PÚBLICA Com as capacidades construídas no segundo passo dessa seção pode-se partir para a construção das intervenções. Os participantes já devem ter uma noção básica sobre as causas da violência dentro da comunidade e a qualidade dos serviços públicos prestados. ƄƼǢŀч Ŭч ŀч ƋƼǢŀч ţūч ŀƄƐǢϯч ƼưƼч śūưч ŀɯǢưŀч ŀǿƧƼч EǢūƐǢūϰч ūưч Ǫǿŀч Pedagogia da Autonomia, “meu papel no mundo não é só de o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não sou apenas objeto da História, da cultura, da política, constato não para me adaptar mas para mudar”. Como a metodologia do MJPOP ressalta, a intervenção que será construída precisa ser, em primeiro lugar, muito objetiva, evitando teorizações. Depois, uma vez que se trata de um plano comunitário, é preciso que se garanta que sua elaboração ocorra da forma mais democrática possível, garantindo a diversidade de opiniões e compartilhando as tarefas entre os diversos atores sociais que estarão participando desse processo. Aos membros do GT caberá o processo de mediar essa construção, cuidando para que a contribuição de cada um seja valorizada e animando o envolvimento de todos os que estiverem presentes, uma vez que cada um tem algo para aportar nesse processo. Para elaborar a intervenção, observe os seguintes pontos:
01. A intervenção resultará de um diagnóstico prévio sobre a natureza e a magnitude do problema enfrentado. Observar o “Quadro de Informações Iniciais” e os aportes trazidos durante a formação. 02. A intervenção é territorializada, ou seja, tem um foco num determinado segmento populacional de uma determinada região, bairro, comunidade, etc. 03. Articula instâncias da sociedade civil com o forte componente da participação comunitária. 04. Articula instâncias variadas do poder público com forte participação do poder local. 05. São ações de corte predominantemente preventivo.
23
Na terceira seção desse manual você encontrará exemplos de intervenções construídas por adolescentes e jovens nos processos formativos do #EuSintoNaPele durante os anos de 2019 e 2020. Nos anexos, vocês encontrarão o modelo utilizado para a elaboração dessas intervenções e que os seus grupos deverão usar.
IV. IMPLEMENTANDO INTERVENÇÕES EM SEGURANÇA PÚBLICA Nesse passo espera-se que todos os participantes, educadores sociais, líderes comunitários e prestadores de serviços que participaram dos encontros formativos e da construção da intervenção tenham se comprometido com a execução de alguma tarefa descrita no plano de ação. Esse é o momento em que a comunidade conscientizada sobre os seus direitos, assumirá o protagonismo na luta pela transformação da realidade em que vive. pǿƲƐţƼǪчţūчƐƲƃƼǢưŀşŘƼчǟǢūŜƐǪŀчūчǡǿŀƧƐɯŜŀţŀϰчƼǪчŜƼưǿƲƐǷŁǢƐƼǪчǪūǢŘƼч capazes de elevar suas vozes e de dialogar abertamente com os representantes do poder público, sem pedir favores ou negociando assuntos de interesses particulares, mas reivindicando o que lhes é garantido por lei. As tarefas descritas deverão ser realizadas e acompanhadas por todos. É importante garantir o engajamento do poder público nas ações a serem desenvolvidas. Ao mesmo passo precisamos estar cientes que os grupos do MJPOP representam um espaço de cuidado, acolhimento e pertença. Portanto, mesmo que as ações que são de responsabilidade dos gestores públicos demorem a tornar-se concretas, os grupos precisam encontrar formas de se apoiarem mutuamente.
24
FASE 3
PRESTAÇÃO DE CONTAS DO GRUPO E DO PODER PÚBLICO
25
A última fase é marcada pela realização de audiências públicas para apresentar os resultados da intervenção no território. Não somente o grupo prestará contas, mas também os entes do poder público envolvidos na execução da intervenção. Se analisará nessa fase a capacidade de reprodução em outros territórios, ampliando o espaço de impacto das ações dos grupos comunitários.
I. REALIZANDO AUDIÊNCIAS PÚBLICAS PARA APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS A realização das audiências públicas para divulgação dos resultados das intervenções é um importante instrumento para entender o impacto alcançado, como também uma maneira de responsabilização do poder público para que mais ações de corte preventivo sejam construídas. As audiências devem ser realizadas na própria comunidade, se houver segurança, ou em espaços do poder público. Toda a comunidade deve ser convidada a participar dos diálogos. Para as audiências públicas recomendase que os facilitadores dos GTs cuidem de sistematizar tudo o que for sendo executado, entendendo-se por sistematização todo o processo de registro da história que o grupo foi construindo coletivamente, a fim de preservar a memória de tudo o que foi sendo realizado e de como foi possível alcançar o que se alcançou. A sistematização acontece por meio de relatórios, atas, listas de presença nas reuniões, fotos, vídeos e outras formas que o grupo considere mais oportunas. Todo o material deverá ser lançado na plataforma online do MJPOP e ficar acessível para aqueles que desejarem acessar.
Os resultados alcançados deverão ser amplamente divulgados durante a audiência pública e posteriormente para toda a comunidade. A comunidade deve se reconhecer pertencente a todo o processo e se entender como um agente importante nas mudanças ocorridas durante o período. As evidências das conquistas precisam ser reais para todos e todas que participaram do processo ou foram beneficiados por ele. A comunicação também se deve estender a outras comunidades próximas, animandoas a se integrarem nessas ações coletivas em prol da transformação social.
II. AVALIANDO AS ATIVIDADES ESTRATÉGICAS Um dos componentes essenciais em processos de construção coletiva é o momento de avaliação. No MJPOP não é diferente. É necessário que constantemente o GT reflita sobre as suas práticas. No entanto, isso se torna ainda mais importante quando se chega ao final da caminhada: é fundamental, em primeiro lugar, que os membros do GT façam uma análise crítica de sua própria atuação enquanto mobilizadores do processo, verificando o que precisa ser corrigido nas próximas intervenções a serem realizadas. O Plano de Intervenção construído, em conjunto, pela comunidade e pelo GT deve ser a referência. Todas as atividades nele inseridas deverão ser objeto de reflexão, verificando-se quais os resultados que, a partir delas, foram alcançadas, quais lições foram aprendidas durante a sua execução e qual impacto que se conseguiu ao final de seu exercício. Recomenda-se que o GT conduza o processo colocando o
26
foco avaliativo sobre a dimensão coletiva da intervenção política, evitando julgar indivíduos que atuaram na dinamização das ações.
III. DEFININDO OS PRÓXIMOS PASSOS O processo avaliativo é um processo de amadurecimento do grupo ŜƼưƼчǪǿơūƐǷƼчǟƼƧƒǷƐŜƼчŜƼƲǪǷǢǿǷƼǢчţƼчǟƼǢȖƐǢϯч¸ŀƧȖūȧчɯǡǿūчţūưƼǪǷǢŀţƼч que os objetivos propostos pela intervenção ainda não tenham sido alcançados ou ainda estão em fase de implementação. Portanto, se faz necessária a criação de um plano de ação para que as atividades de monitoramento continuem a ser realizadas. Se já alcançadas, é preciso avançar para o monitoramento de outro serviço público que contribua com a redução da violência dentro dos territórios. Mas, também é importante avançarmos para que outros territórios tenham conhecimento das ações realizadas e adaptá-las para que ǟƼǪǪŀưч ūƲƃǢūƲǷŀǢч ƼǪч ţūǪŀɯƼǪч ţŀч ǪūƄǿǢŀƲşŀч ǟȀśƧƐŜŀч ūч ŜƼƲǪǷǢǿƐǢч ūǪǟŀşƼǪч ǪūƄǿǢƼǪч ūч ǟǢƼǷūǷƐȖƼǪϯч rŀч ţūɯƲƐşŘƼч ţƼǪч ǟǢƽȜƐưƼǪч ǟŀǪǪƼǪч deverá ser contemplada a partilha da metodologia utilizada na implementação das intervenções. Outros adolescentes e jovens, que vivem em comunidades vulneráveis, deverão ser capacitados pelo GT local, ampliando a atuação do Movimento Jovem de Políticas para toda a cidade. Recomendamos que os GTs nos diversos territórios integrem os fóruns populares de Segurança Pública, se esses existirem em suas cidades. Observem que todas as ações para a redução da violência devem ser realizadas em coletivo, evitando atuações individualizadas que põem em risco à vida de seus idealizadores.
27 27
Banco de Imagens da Visão Mundial
28
Segurança Pública, compreendendo a violência no Brasil
2 Banco de Imagens da Visão Mundial
29
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O QUE FALAMOS QUANDO FALAMOS DE VIOLÊNCIA NO BRASIL.
Luiz Fábio Paiva Universidade Federal do Ceará Departamento de Ciências Sociais Programa de Pós-graduação em Sociologia Laboratório de Estudos da Violência (LEV)
Entender a violência, no Brasil, passa pela compreensão de que a violência é um fenômeno social constituído historicamente e com repercussões culturais . Quando uma pessoa decide cometer um crime, matar outra pessoa ou tocar fogo em ônibus para reivindicar interesses, ela tem responsabilidade por seus atos. Quando muitas pessoas fazem a mesma coisa e isso se repete ano após ano, temos que começar a pensar sobre quais os elementos que estão levando essas pessoas a tomarem tais decisões. Isso não ǪƐƄƲƐɯчŜŀч ŀɯчǢưŀǢч ǡǿūч ūǪǪŀǪч ǟūǪǪƼŀǪч ǪūǢŘƼч destituídas da responsabilidade por seus atos, mas que precisamos pensar e analisar a repetição do fenômeno. Ao considerar sua extensão é possível examinar se o fenômeno não evidencia problemas sociais que possibilitam sua reprodução, afetando a integridade de determinada sociedade. Isso nos ajudar a compreender as condições sociais que possibilitam a existência de situações de violência. Nesta breve discussão sobre o tema, exploramos não todas as possibilidades conceituais
ţƼч ǷūǢưƼч ȖƐƼƧŰƲŜƐŀϰч ưŀǪϰч ūǪǟūŜƐɯчŜŀưūƲǷūϰч da violência urbana caracterizada, grosso modo, como o resultado da conjunção de ações como assaltos, disputas territoriais ūƲǷǢūч ƄǢǿǟƼǪч ŀǢưŀţƼǪϰч ǷǢŁɯчŜƼч ţūч ţǢƼƄŀǪч ūч ŀǢưŀǪϰч ƋƼưƐŜƒţƐƼǪч ūưч ȖƐǢǷǿţūч ţūч ŜƼƲɰчƐǷƼǪч entre pessoas que fazem o crime e participam de coletivos criminais, entre outros problemas que impactam na vida em territórios urbanos. A violência urbana é um fenômeno que afetas as rotinas das cidades, pois seu impacto afeta desde a circulação de pessoas até sua integração em bairros urbanos destituídos de relações de vizinhança em virtude da expansão do isolamento privado . Para continuar a leitura do texto é preciso saber de antemão que não existem causas generalizáveis da violência urbana em determinada cidade, ưŀǪч ŀǪǟūŜǷƼǪч ǡǿūч ŀơǿţŀưч ŀч ƐţūƲǷƐɯчŜŀǢч relações e aproximações para algumas respostas. Estudos demonstram que as ǢūƧŀşǚūǪч ţūч ȖƐȧƐƲƋŀƲşŀϰч ŀч ūɯчŜƐŰƲŜƐŀч ţƼǪч serviços de proteção social de crianças e jovens, as condições de justiça social, Ƽч ŀŜūǪǪƼч ŀч ţƐǢūƐǷƼǪч ūч ŀǪч ŜƼƲɯчƄǿǢŀşǚūǪч das desigualdades econômicas podem apresentar relações em determinados contextos sociais . É muito importante entender os efeitos sociais da desigualdade e injustiça em uma sociedade, pois, em geral, são elementos que funcionam como estruturantes em determinadas ŜƼƲɯчƄǿǢŀşǚūǪч ǪƼŜƐŀƐǪч ţūч ţƐƃǿǪŘƼч ţŀч violência. Neste aspecto, o Brasil é um caso emblemático, pois o País se constituiu como uma comunidade política e moral em que determinadas pessoas são tão ricas quanto as mais ricas das maiores economias do mundo. Neste mesmo País, os mais pobres desfrutam de situações de miséria semelhantes aos das economias mais miseráveis do planeta . A esmagadora
1. Cf. PAIVA, Luiz Fábio S.; JACÓ DE FREITAS, Geovani. Ecos da violência nas margens de uma sociedade democrática: o caso da periferia de Fortaleza. Sociedade e Cultura, v. 18, n. 2, 2015. 2. Cf. MACHADO DA SILVA, Luiz Antônio. Violência urbana: representação de uma ordem social. Brasil urbano: cenários da ordem e da desordem. Rio de Janeiro: Notrya, p. 131-142, 1993. ͷϯч ƃϯч$}ч£R}ч f$.R£ ϰч¸ūǢūǪŀч ƐǢūǪϯч.ƲŜƧŀȖūǪчƃƼǢǷƐɯчŜŀţƼǪϱчŀчƲƼȖŀчǪūƄǢūƄŀşŘƼчǿǢśŀƲŀϯчrƼȖƼǪчūǪǷǿţƼǪч . £ ϰчȖϯчͻϰчǟϯч͵Йͻͺϰч͵ͽͽͻϯ ϯ ƃϯчp}£.r}EEϰчbūɬчǢūȝч$ϯϲч« p «}rϰч£ƼśūǢǷчbϯϲч£ ¿$.r ¿«Mϰч«ǷūǟƋūƲч×ϯчrūƐƄƋśƼǢƋƼƼţчƐƲūǡǿŀƧƐǷȝϰчŜƼƧƧūŜǷƐȖūчūɭ ччŜŀŜȝϰчŀƲţчǷƋūчǪǟŀǷƐŀƧчţȝƲŀưƐŜǪчƼƃчǿǢśŀƲчȖƐƼƧūƲŜūϯч ǢƐưƐƲƼƧƼƄȝϰчȖϯчͷͽϰчƲϯчͷϰчǟϯч͵ͻЙͼϰчͶʹʹ͵ϯ
30
maioria dos pobres brasileiros vive do seu trabalho duro, com rotinas exaustivas e ǢūưǿƲūǢŀşǚūǪч ưƐǪūǢŁȖūƐǪч ūч ƐƲǪǿɯŜƐūƲǷūǪч para o sustento básico de uma família. O mesmo Estado nacional que estabelece o pagamento de um salário mínimo inferior a mil reais estabelece remunerações superior a dez, vinte, trinta ou mais vezes o valor do salário mínimo. Muitos dos pobres brasileiros são descendentes dos povos ancestrais, negros e caboclos explorados ao longo do processo de colonização. São populações não reconhecidas como portadoras de direitos e violadas durantes anos em sua honra e dignidade. Ao desconsiderar a história das populações marginalizadas, o Estado brasileiro desconsidera os sofrimentos sociais que criaram uma situação de injustiça social generalizada. Não enfrentar esse problema por meio de políticas públicas é impossibilitar uma convivência democrática e republicana entre as diversas classes que compõem a sociedade brasileira. O problema do Brasil, então, envolve seu processo de formação histórica, o que possibilitou o surgimento de territórios estruturados pela pobreza e o sentimento de revolta diante da impossibilidade de ascensão social por meio do trabalho . É possível trabalhar muito e durante muitos anos sem experimentar qualquer ascensão social na sociedade brasileira. Muitos jovens avaliam as trajetórias de vida do pai e da mãe como exemplos de que a pobreza pode ser uma condição difícil de superar . O sustento da família envolve ưǿƐǷƼч ǷǢŀśŀƧƋƼч ūч ţƐƲƋūƐǢƼч ǪǿɯŜƐūƲǷūч ǟŀǢŀч o básico, sem luxos ou gastos de lazer incluídos nos orçamentos domésticos. Enquanto aparelhos de videogames e computadores fazem parte do cotidiano de meninos ricos e de classe média, eles compõem os sonhos de jovens pobres que
não conseguirão ter esse bem de consumo por meio dos rendimentos dos trabalhos de seus pais e mães. Mesmo assim, a maior parte desses jovens irá para escola procurar meios de mudar a sua situação de vida. Apesar disso, algo permanece, uma ideia persistente de que esta sociedade é injusta e, portanto, não merece ser respeitada. Se essa ideia não consome a maioria, ela consegue penetrar uma minoria que passou a ver o crime como um meio de obter não ŀǟūƲŀǪчǢūŜǿǢǪƼǪчɯƲŀƲŜūƐǢƼǪчŜƼưƼϰчǷŀưśŬưϰч reconhecimento e respeito . Desde o período colonial, as vilas e cidades brasileiras se constituíram como espaços de acolhimento de pessoas e grupos que cresceram fazendo uma avaliação negativa de como a sociedade brasileira funciona. Desde a década de 1970, pelo menos, esses grupos se estruturam de diferentes maneiras em periferias e presídios brasileiros, assumindo em determinados momentos alcunhas como gangue, quadrilha ou facções, para citar apenas os mais conhecidos. Nenhuma dessas ŜƼƲɯƄǿǢŀşǚūǪч Ǫūч ŜŀǢŀŜǷūǢƐȧŀч ŜƼưƼч ǿưч coletivo envolto em questões referentes a uma provável luta de classe. Muito menos são grupos que questionam o modelo econômico vigente. Pelo contrário, ao seu modo, eles buscam encontrar meios de se articular, trocar ideias, praticar atos ilegais, fazer crimes e participar de uma sociedade de consumo. Apesar de utilizarem meios ilegais e subversivos à ordem social, ainda ŀǪǪƐưϰч ƼǪч ɯƲǪч ǪŘƼч ŜƼǢǢūǪǟƼƲţūƲǷūǪч ŀƼǪч ideais de uma sociedade de consumo . Em estados como o Ceará os grupos denominados “gangues” eram coletivos ưŀǢŜŀţƼǪч ǟƼǢч ŜƼƲɰƐǷƼǪч ǷūǢǢƐǷƼǢƐŀƐǪϰч ŜƼưч pessoas que estabeleciam rivalidades e se encontravam para brigar. Quando as armas e as drogas passaram a fazer parte das rotinas de bairros pobres de Fortaleza,
5. A desigualdade social não apenas é evidenciada por aspectos econômicos como criou uma cultura política em torno das relações de mando e subserviência. Essas ǢūƧŀşǚūǪчưŀǢŜŀưчŀчƃƼǢưŀşŘƼчţūчƲƼǪǪŀчŜƐţŀţŀƲƐŀчūчţūчǪūǟŀǢŀşǚūǪчūƲǷǢūчƼǪчǡǿūчǟƼţūưчǢūŜƼƲƋūŜƐţƼǪчŜƼưƼчŜƐţŀţŘƼǪчūчƼǪчǡǿūчǪŘƼчţūǪǷƐǷǿƒţƼǪчţūǪǪŀчŜƼƲţƐşŘƼϯчч чͺϯч ƃϯчR rrRϰч}ŜǷŁȖƐƼϯч чǡǿūǪǷŘƼчǪƼŜƐŀƧϯч ƐŰƲŜƐŀчӅч¸ǢƽǟƐŜƼϰчȖϯч͵ͻϰчƲϯчͶϰч͵ͽͼͽϯ чͻϯч ƃϯч £ p}ϰчMūƧūƲŀч×ϯϲчÖ.r¸¿£RϰчFǿǪǷŀȖƼϲч £ r }ϰч ūţǢƼч ŀǿƧƼчpŀǢǷƼƲƐϯч£ūǷǢŀǷƼǪчţŀчơǿȖūƲǷǿţūчśǢŀǪƐƧūƐǢŀϱчŀƲŁƧƐǪūǪчţūчǿưŀчǟūǪǡǿƐǪŀчƲŀŜƐƼƲŀƧϯчRƲǪǷƐǷǿǷƼч ƐţŀţŀƲƐŀϰчͶʹʹϯч 8. Cf. DIAS, Camila Caldeira Nunes. Da pulverização ao monopólio da violência: expansão e consolidação do Primeiro Comando da Capital (PCC) no sistema carcerário ǟŀǿƧƐǪǷŀϯчͶʹ͵͵ϯч¸ūǪūчţūч$ƼǿǷƼǢŀţƼϯч¿ƲƐȖūǢǪƐţŀţūчţūч«ŘƼч ŀǿƧƼϲчE.f¸£ rϰчFŀśǢƐūƧϯчRǢưŘƼǪϱч¿ưŀчƋƐǪǷƽǢƐŀчţƼч ϯч«ŘƼч ŀǿƧƼϱч.ţƐǷƼǢŀч ƼưǟŀƲƋƐŀчţŀǪчfūǷǢŀǪϰчͶʹ͵ͼϲч R}r$Rϰч dŀǢƐƲŀϯчbǿƲǷƼчūчưƐǪǷǿǢŀţƼϱчǿưŀчūǷƲƼƄǢŀɯŀчţƼч ϯч«ŘƼч ŀǿƧƼϱч.ţƐǷƼǢŀч¸ūǢŜūƐǢƼчrƼưūϰчͶʹ͵ͼϯ
31
ǟƼǢч ūȜūưǟƧƼϰч ǷǿţƼч ɯŜƼǿч ưŀƐǪч ţƐƃƒŜƐƧϰч ŜƼưч territórios marcados por acertos de contas entre pessoas que faziam o crime. Essas pessoas, também, buscaram exercer maior controle das comunidades, objetivando o silêncio e a colaboração para esquemas criminosos. Periferias urbanas se tornaram espaços sociais de trocas de tiro, com participação de forças policiais atuando para “combater” o crime de maneira violenta. Em pelo menos meio século de “guerra ao crime” se generalizou a violência e as violações de direito de pessoas pobres, com jovens de duas ou três gerações de jovens socializados em meio a tiroteios e vidas perdidas de parentes e amigos . A situação da violência, no Brasil, se deteriorou, qualitativamente, quando a partir dos presídios pessoas envolvidas em esquemas criminosos e articuladas em gangues e quadrilhas entenderam que ǟƼţūǢƐŀч ǪǿǪǟūƲţūǢч ŜƼƲɰƐǷƼǪч ƐƲǷūǢƲƼǪч ǟŀǢŀч se colocar em uma “missão” de maior envergadura. Para se constituir como facções criminosas “lideranças” e pessoas respeitadas (“consideradas”), no mundo do crime, agenciaram o Estado nacional como inimigo e as injustiças sociais como elemento mobilizador capaz de povoar imaginações e criar crenças fundamentadas em ideias de paz, justiça e liberdade entre quem faz o crime . Ao longo de sua existência, as facções conseguiram algo importante: não apenas são grupos, mas coletivos que agenciam envolvimentos em diversas escalas, dentro e fora dos presídios. Elas funcionam como comunidades políticas e morais estruturadas em torno de valores éticos que sustentam crenças, ideologias e associações. Alguns ganham muito dinheiro atuando no gerenciamento de mercados ilegais de armas e drogas, outros atuam nos acertos de contas e uma multidão se encontra na periferia realizando
todo tipo de trabalho possível para que uma complexa engrenagem funcione. Trata-se de um “todo” comporto por múltiplos fragmentos que podem funcionar separadamente ou em conjunto. Menos do que modelos e estruturas existem métodos e saberes compartilhados entre pessoas que se sentem parte de uma “irmandade”, ŜŀǢǢūƄŀƲţƼч ǪƐƄƲƼǪч ǡǿūч ƼǪч ƐţūƲǷƐɯŜŀưч ūч separam . Apesar de trabalharem com visões de mundo que mobilizam ideais e críticas sociais, coletivos criminais não têm poupado às populações das periferias de regimes opressivos, violações aos direitos humanos e injustiças sociais . É comum a exigência de adesão, o que pode acontecer por participação, colaborações eventuais, simpatia pelo coletivo sem envolvimento nas ações ou omissão diante de práticas ilegais. Denunciar integrantes de facções por crimes que eles efetivamente cometeram ǟƼţūч ǪƐƄƲƐɯŜŀǢч ǿưŀч ǪūƲǷūƲşŀч ţūч ưƼǢǷūϯч /ч preciso ainda obedecer a determinações quanto ao comportamento aceitável e não aceitável em comunidades dominadas por determinado coletivo. Em Fortaleza, por exemplo, em 2016, facções criminosas ɯȧūǢŀưч ŀч ШǟŀȧЩϰч ūǪǷŀśūƧūŜūƲţƼч Ƽч ɯưч ţūч ŜƼƲɰƐǷƼǪч ǷūǢǢƐǷƼǢƐŀƐǪч ǡǿūч ǟūǢţǿǢŀȖŀưч ƋŁч mais de vinte anos e proibindo pessoas de roubar nas “quebradas”. O que aconteceu quando jovens dessas comunidades ousaram desobedecer? Muitos foram aprisionados por integrantes dos coletivos, submetidos a linchamentos, sessões de tortura ou mesmo assassinados. Quando divergências começaram a acontecer entre as facções que atuam, no Estado do Ceará, familiares de envolvidos ou suspeitos de ǪūǢūưч ǪƐưǟŀǷƐȧŀƲǷūǪч ƃƼǢŀưч ƐţūƲǷƐɯŜŀţƼǪч dentro do território, ameaçados e expulsos de suas casas.
чͽϯч ƃϯчp.£¸}rϰч£ƼśūǢǷчdϯч«ƼŜƐŀƧчǪǷǢǿŜǷǿǢūчŀƲţчŀƲƼưƐūϯч ưūǢƐŜŀƲчǪƼŜƐƼƧƼƄƐŜŀƧчǢūȖƐūȗϰчȖϯчͷϰчƲϯчϰчǟϯчͺͻͶЙͺͼͶϰч͵ͽͷͼϯ ͵ʹϯч ƃϯч« ϰчfūƼƲŀǢţƼϯч чŜƼƲţƐşŘƼчţūчЪśƐŜƋŘƼчţŀчƃŀȖūƧŀЫчūчŀчśǿǪŜŀчǟƼǢчЪŜƼƲǪƐţūǢŀşŘƼЫϱч¿ưŀчūǷƲƼƄǢŀɯŀчţūчơƼȖūƲǪчŀǢưŀţƼǪчūưчƃŀȖūƧŀǪчőчśūƐǢŀЙưŀǢϯч$ƐƧūưŀǪЙ£ūȖƐǪǷŀчţūч.ǪǷǿţƼǪч ţūч ƼƲɰƐǷƼчūч ƼƲǷǢƼƧūч«ƼŜƐŀƧϰчȖϯчϰчƲϯчͶϰчǟϯчͷͷͽЙͷϰчͶʹ͵͵ϯчч ͵͵ϯч ƃϯч£ E .fϰч ƲǷƿƲƐƼϯч«ūƄưūƲǷŀǢƐţŀţūчūчǷǢŁɯŜƼчţūчţǢƼƄŀǪчƲƼч£ƐƼчţūчbŀƲūƐǢƼϯч ƧŜūǿϰчȖϯчͶϰчƲϯчͷϰчǟϯч͵ͺͺЙͻͽϰчͶʹʹ͵ϲч fÖ £.çϰчpŀǢŜƼǪч ŬǪŀǢϲч« ff ϰчEūǢƲŀƲţƼϲч$R «ϰч ŀưƐƧŀч rǿƲūǪϯч$ŀǪчŜƼưƐǪǪǚūǪчţūчǪƼƧƐţŀǢƐūţŀţūчŀƼчǟǢƐưūƐǢƼчŜƼưŀƲţƼчţŀчŜŀǟƐǷŀƧчūưч«ŘƼч ŀǿƧƼϯч¸ūưǟƼч«ƼŜƐŀƧϰчȖϯчͶϰчƲϯч͵ϰчǟϯчͺ͵ЙͼͶϰчͶʹ͵ͷϯϯ ͵Ͷϯч R}r$RϰчdŀǢƐƲŀϯч ǢƼƐśƐţƼчǢƼǿśŀǢчƲŀчǡǿūśǢŀţŀϱчǷūǢǢƐǷƽǢƐƼϰчƋƐūǢŀǢǡǿƐŀчūчƧūƐчƲƼч ϯч.ţƐǷƼǢŀч¸ūǢŜūƐǢƼчrƼưūϰчͶʹ͵ͼϯ
32
E qual a ação dos governos estaduais diante dos cenários de violência que se proliferaram em suas cidades depois da ascensão de coletivos criminais? Em São Paulo, por exemplo, até hoje é possível ouvir representantes do governo estadual falando que a maior facção em atuação no País, simplesmente, não existe. Mesmo com dezenas de estudos importantes mostrando o papel de um coletivo criminal paulista na redução dos homicídios, assim como no controle social dos presídios, o Governo do Estado de São Paulo não reconhece a existência e a força da facção em seu território. A experiência de São Paulo se tornou modelo para outros Estados. No Ceará, enquanto as facções cresciam no sistema penitenciário o governo seguia indiferente ao seu poder. É importante destacar que, em diversos estados, os governadores e as forças policiais, simplesmente, se omitiram diante das violências praticadas por esses grupos. A omissão diante da violência não é um fenômeno do presente. Pesquisas feitas pelo Laboratório de Estudos da Violência (LEV) revelam que, no Ceará, é comum ver pessoas mortas, nas periferias, serem tratadas como “bandidos” e sua morte como o resultado de acertos de conta entre “bandidos”, mesmo sem nenhum investigação preliminar ou provas substantivas. Assim, os sistemas de vinganças entre criminosos se ǷƼǢƲƼǿчơǿǪǷƐɯŜŀǷƐȖŀчǟŀǢŀчūȜǟƧƐŜŀǢчƋƼưƐŜƒţƐƼǪч e sua não investigação. Em levantamento feito pelo Comitê Cearense Pela Prevenção dos Homicídios na Adolescência, apenas 2,5% de 1.548 casos de assassinatos de adolescentes tiveram o responsável pelo ŜǢƐưūчŀǟƼƲǷŀţƼчƲƼǪчǟǢƼŜūǪǪƼǪϯчRǪǷƼчǪƐƄƲƐɯŜŀч que não existe justiça na prática para essas pessoas, gerando a ideia de que elas são donas do seu próprio destino, tendo que “se virar” para sobreviver.
Outra situação importante é quanto ao preconceito e a discriminação generalizada que recai sob os mais pobres. Não é incomum escutar de adolescentes negros e pobres testemunhos de “esculachos” que são humilhações que alcançam pessoas envolvidas e não envolvidas com o crime. Em uma Ação de Extensão do LEV, o Projeto ¸ǢŀɯŜŀƲţƼч «ŀśūǢūǪч ϰч ǡǿƐƲȧūч ơƼȖūƲǪч ūч ǪǿŀǪч mães narraram por duas horas histórias de violências cometidas por policiais, consideradas por eles como abusos. Situações nas quais pessoas estavam detidas e sem possibilidade de reação, mas, mesmo assim, foram torturadas. Situações ŀƐƲţŀч ưŀƐǪч ƄǢŀȖūǪч ƃƼǢŀưч ȖūǢƐɯŜŀţŀǪч Ʋŀч Chacina da Messejana, quando onze pessoas foram assassinadas a sangue frio com a participação e omissão de policiais . Situações como essa de profundo desrespeito aos direitos das populações mais pobres foram fundamentais para a consolidação do que é a maior força das facções criminosas, qual seja a sua enorme capacidade de produzir adesão. As dinâmicas de envolvimento possibilitaram que hoje as facções não sejam apenas grupos, mas um fenômeno de massa, com múltiplas repercussões sociais. Massacres nas periferias e presídios, como os do Carandiru, foram fundamentais para que esses coletivos construíssem a ideia de que são necessários para proteger aqueles que não estão alinhados ao modelo social vigente e desejam conquistar pelo crime os meios de participar de uma sociedade de mercado, consumindo e gozando dos benefícios que “muito dinheiro” pode trazer. Obviamente, poucos realmente ganham “muito dinheiro” e vivem vidas luxuosas, ưŀǪчŀчūɯŜŁŜƐŀчţŀчƐţūƐŀчƲŘƼчūǪǷŁчŀǟūƲŀǪчƲƼч que ela realiza em termos de resultados econômicos e sim na fantasia mobilizadora de desejos que ela cria.
ч͵ͷϯч ƃϯч ££}«ϰчbƼŘƼч ŀǿƧƼч ūǢūƐǢŀчūǷчŀƧϯчШ ŀŜƐɯŜŀşŘƼЩчƲŀǪчǟūǢƐƃūǢƐŀǪϱчţƐǪŜǿǢǪƼǪчǪƼśǢūчŀǪчȖƐƼƧŰƲŜƐŀǪчūчƼчŜƼǷƐţƐŀƲƼчţūчơǿȖūƲǷǿţūǪчūưчEƼǢǷŀƧūȧŀϯч£ūȖƐǪǷŀчţūч ǪƐŜƼƧƼƄƐŀϰчȖϯч 9, n. 1, 2018. ͵ϯч ƃϯч ££.R£ ϰч ŬǪŀǢϲч ¢¿Rr}ϰчbňƲƐŀч ūǢƧŀчţūϲч« ϰчfūƼƲŀǢţƼч$ŀưŀǪŜūƲƼчţūϯчЋ}ǢƄϯЌϯчÖƐƼƧŰƲŜƐŀϰчRƧūƄŀƧƐǪưƼǪчūчfǿƄŀǢūǪчpƼǢŀƐǪϯч ŀưǟƐƲŀǪϰч« ϱч ƼƲǷūǪϯ ͵ϯч ŀǢŀчƐƲƃƼǢưŀşǚūǪчǪƼśǢūчƼчǟǢƼơūǷƼчŜƼƲǪǿƧǷŀǢчƋǷǷǟϱϼϼȗȗȗϯŀŜƼūǪūȜǷūƲǪƐƼƲƐǪǷŀǪϯǿƃŜϯśǢϼŜŀưǟǿǪЙţƼЙśūƲɯŜŀϼţƐǢūƐǷƼǪЙƋǿưŀƲƼǪЙūЙơǿǪǷƐŜŀϼǟǢƼơūǷƼЙǷǢŀɯŜŀƲţƼЙǪŀśūǢūǪϼ ͵ͺϯч ƃϯч RÖ ϰчfǿƐȧчEŁśƐƼϯчpƼǢǷūǪчƲŀчǟūǢƐƃūǢƐŀϱчŜƼƲǪƐţūǢŀşǚūǪчǪƼśǢūчŀчŜƋŀŜƐƲŀчţūч͵ͶчţūчƲƼȖūưśǢƼчūưчEƼǢǷŀƧūȧŀϯч}чǟȀśƧƐŜƼчūчƼчǟǢƐȖŀţƼϰчȖϯч͵ϰчƲϯчͶͺϰчͶʹ͵ͺϯ
33
Superar a violência urbana não é uma tarefa fácil e a cada eleição brasileira se torna mais difícil. Ao se aproveitarem do fato de segurança pública ser algo sensível à população, políticos tem usado de má fé para explorar os sentimentos de ódio e indignação das pessoas. Isso faz com que os eleitores escolham com base na maior bravata e mais contundente declaração. Qualquer possiblidade de oferecer outro ponto de vista é rechaçada e mais dinheiro público é gasto em políticas públicas inúteis e unilaterais, em geral, focadas na ação de polícia militar. Ao se depararem com situações de crise, os Governos Estaduais clamam por mais policiais e ao colocar novos soldados nas ruas o problema permanece. As forças policiais tem um papel fundamental na gestão da segurança pública, mas é uma tolice quase infantil acreditar que os problemas de segurança se tratam apenas de uma brincadeira entre mocinhos e bandidos. rŘƼч ƋŁч ŜŀưƐƲƋƼч ŜǿǢǷƼч ǟŀǢŀч Ǫūч ŜƋūƄŀǢч ŀƼчɯưч ţŀчȖƐƼƧŰƲŜƐŀч ǿǢśŀƲŀϯч Deveríamos começar pelo primeiro passo, elegendo políticos que ousem estudar e considerar, seriamente, a articulação de programas de segurança a um sistema abrangente de proteção social que atinja 100% das crianças e adolescentes brasileiros. O que pode vir a transformar a sociedade brasileira não são balas, mas investimentos sociais abrangentes para crianças e adolescentes, com possibilidades reais para que essas pessoas não tenham apenas um futuro como, também, ajudem a construir, coletivamente, o futuro de uma sociedade inteira ainda muito injusta e desigual.
34 34
SEGURANÇA PÚBLICA: DIREITO DO POVO, PARA O POVO
Foto de Reginaldo Silva (Fortaleza/CE)
35
SEGURANÇA PÚBLICA: DIREITO DO POVO, PARA O POVO Ana Letícia Lins Universidade Federal do Ceará Departamento de Ciências Sociais Programa de Pós-graduação em Sociologia Laboratório de Estudos da Violência (LEV)
Derick Coelho Visão Mundial Articulador Regional de Juventudes Movimento Jovem de Políticas Públicas
rƼч ǢŀǪƐƧϰч ŀч ǟŀǢǷƐǢч ţƼчɯưч ţŀч ţƐǷŀţǿǢŀч ŜƐȖƐƧЙ ưƐƧƐǷŀǢчЋ͵ͽͺЙ͵ͽͼЌϰчŜƼƧƼŜƼǿЙǪūчŜƼưƼчţūǪŀɯƼч a incorporação de práticas democráticas nas instituições que compõem o Estado. A Constituição Federal 1988 representa um marco na iniciativa de democratização política, inclusive orientando o tipo de relação que deve ser estabelecida entre polícia e sociedade. O que se colocava na época no debate público e acadêmico e, de certa forma, se coloca até hoje, é como forjar novos modelos de polícia e de política que garanta direitos para a população, principalmente a mais pobre. A democracia é o modelo de governo que praticamos no Brasil, em que através das eleições, a cada quatro anos, podemos alterar as pessoas que nos representam em todos os cargos que já conhecemos, pois é assim que esse sistema político deve funcionar, a partir do povo que é maior afetado e interessado na forma como vão ser conduzidas as coisas, mas sendo representado pelos políticos, que ƼŜǿǟŀưч ƼǪч ŜŀǢƄƼǪч ƼɯŜƐŀƐǪϯч $ūч ǿưŀч ƃƼǢưŀч justa e igual para todos, independentemente de qualquer interesse de grupo, religião
ou classe, a política não é estar a favor da maioria ou dos mais ricos, é equilibrar todos os resultados para que ninguém seja ǟǢūơǿţƐŜŀţƼчƲƼчɯƲŀƧϯч$ūǪǪŀчƃƼǢưŀϰчǟƼţūЙǪūч perguntar: a democracia é perfeita? Não é, tem muito o que melhorar. Principalmente a nossa participação como cidadãos, que não pode ser apenas de quatro em quatro anos, ǟǢūŜƐǪŀưƼǪчɯŜŀǢчţūчƼƧƋƼчūưчŜŀţŀчǟŀǪǪƼчūч cobrar participação nas decisões. Juntos ǟƼţūưƼǪчūǪŜƼƧƋūǢчưūƧƋƼǢϰчɯǪŜŀƧƐȧŀǢчưŀƐǪчūч assim participar de uma construção melhor para o Brasil e escolher de uma forma mais consciente quem nos representa.
I. O QUE É SEGURANÇA PÚBLICA? A segurança pública enquanto atividade desenvolvida pelo Estado é responsável por empreender ações de repressão e oferecer estímulos ativos para que os cidadãos possam conviver, trabalhar, produzir e se divertir, protegendo-os dos riscos a que estão expostos. As instituições responsáveis por essa atividade atuam no sentido de impedir, parar ou conter a prática de atos socialmente reprováveis, assegurando a proteção coletiva e, por extensão, dos bens e serviços. Norteiam esse conceito os princípios da dignidade humana, das várias disciplinas, da imparcialidade, da participação comunitária, da legalidade, da moralidade, ţƼч ǟǢƼɯǪǪƐƼƲŀƧƐǪưƼϰч ţƼч ǟƧǿǢŀƧƐǪưƼч organizacional, da descentralização estrutural e separação de poderes, ţŀч ɰūȜƐśƐƧƐţŀţūч ūǪǷǢŀǷŬƄƐŜŀϰч ţƼч ǿǪƼч limitado da força, da transparência e da responsabilidade, para que tudo garanta a proteção e respeito aos cidadãos sem diferenciação de gênero, raça e classe social.
36
II. SEGURANÇA PÚBLICA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Segundo o Capítulo III, a segurança pública é “dever do Estado, direito e responsabilidade de todos”. Sua função é “preservar a ordem pública e da proteção das pessoas e do patrimônio”. A segurança pública é exercida pelos seguintes órgãos: 1) Polícia Federal: apurar infrações de ordem política ou social ou em prejuízo de bens, serviços e interesses da União, assim como infrações com repercussão interestadual e internacional. É polícia marítima, aérea e de fronteiras e exerce as funções de polícia judiciária e de apuração das infrações penais, exceto as militares. 2) Polícia Rodoviária Federal: responsável pelo patrulhamento das BR’s no país. 3) Polícia Ferroviária Federal: responsável pelo patrulhamento trilhos e trens. 4) polícias civis: investiga ações que são crimes de acordo com a legislação. 5) polícias militares: combate diretamente e previne os crimes, buscando manter a ordem pública. 6) corpos de bombeiros: tomam ações de preventivas, de socorro ou assistência à sociedade, decorrentes de desastres naturais ou de outro tipo.
III. SISTEMA ÚNICO DE SEGURANÇA PÚBLICA Quando uma pessoa está doente e não tem plano de saúde, consegue ter acesso a uma UPA, hospital ou posto graças ao Sistema Único de Saúde, popularmente conhecido como SUS. Quando alguém sofre um acidente, recebe o atendimento de uma ambulância gratuita graças ao SUS. Há defeitos no sistema, mas não é possível negar que ele controla, armazena informações e fornece serviços. Nessa perspectiva, já que o Brasil passa por uma crise de segurança pública, por que não criar um Sistema Único de Segurança Pública (SUSP)?
37
O SUSP foi apresentado pela primeira em 2002 a partir do plano de governo do presidente Lula, em um documento intitulado “Projeto de Segurança Pública no Brasil”. Ao ser eleito, a ideia era que o SUSP servisse de orientação para a Secretaria Nacional de Segurança Pública. No entanto, quando se trata de segurança pública, há pouca ou nenhuma iniciativa de reformas estruturais. A ideia foi abandonada, pois resultaria em muito desgaste político, com brigas internas por causa interesses diferentes, infelizmente. O SUSP foi retomado e, em 2018, recebeu aprovação pelo governo Michel Temer com a lei Nº 13.675, de 11 de junho de 2018. pŀǪϰчŀɯчƲŀƧϰчƼчǡǿūчǪƐƄƲƐɯчŜŀчƃŀƧŀǢчūưч«ƐǪǷūưŀч Único para a Segurança Pública? Pesquisas e experiências nacionais e internacionais indicam que um dos elementos para ter um bom êxito em uma política de segurança pública é a integração. O SUSP pretende integrar o trabalho dos órgãos da segurança pública, ou seja, as polícias militar, civil e federal vão trabalhar juntas e interligadas, para um resultado melhor. Além disso, as guardas municipais e secretarias de segurança pública e/ou defesa social trabalharão contribuindo umas com as outras de forma harmônica. A integração será executada a partir da criação de unidade de registro das ocorrências policiais, facilitando o acesso integrado às informações da segurança ǟȀśƧƐŜŀϯч pūƧƋƼǢūǪч ţŀţƼǪч ǪƐƄƲƐɯчŜŀưч ưŀƐǪч fortalecimento e focalização das políticas públicas que garantem direitos às cidadãs e aos cidadãos. Uma das principais reivindicações de governos estaduais é a pouca participação do governo federal na resolução dos problemas de segurança pública nos estados. O SUSP mantém a segurança
pública como responsabilidade dos estados, mas cria orientações e instruções, a partir do governo federal, que devem ser cumpridas pelos governos estaduais para que as metas sejam alcançadas. Duas metas são de extrema importância: a redução de homicídios e a melhoria nas formações policiais. É preciso que os estados sejam cobrados de cumprir o compromisso para uma vida melhor nas cidades e nos estados.
IV. O QUE VOCÊ TEM A VER COM ISSO? A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO POPULAR NA SEGURANÇA PÚBLICA.
A segurança pública é um direito que não pode ser vendido ou cedido e deve ser construída com participação da sociedade. Quando falamos que a segurança pública é coisa do povo para o povo, queremos superar o pensamento de que “polícia é segurança pública” pois acreditamos que vai muito além disso. É possível construir a segurança pública de formas que parecem ser simples, mas que gerarão grandes resultados com o passar do tempo, como por exemplo uma iluminação pública de qualidade, pontos de ônibus mais seguros, áreas de cultura e lazer no bairro, atividades no contraturno das escolas, investimento na saúde e oportunidades de emprego. Como conseguimos isso? Primeiro, conversando sobre o assunto, nos organizando e cobrando quem deve (seja a prefeitura ou o governo do estado). A organização local é importante e simples de ser feita: todo
38
mundo conhece alguém que conhece outro ŀƧƄǿŬưϰчūϰчƲƼчɯƲŀƧчţūчǷǿţƼϰчǟƼţūчƋŀȖūǢчǿưŀч boa mobilização para melhorar a segurança do bairro e, consequentemente, da cidade e do estado. Construir locais seguros é dever do Estado, mas compromisso de todos/as os/as cidadãos/ãs. Apenas com o apoio popular e a coragem para enfrentar problemas de segurança de maneira democrática é que podemos transformar nossas sociedades. O caminho da repressão e violência policial já demonstrou de maneira evidente seu fracasso e a tragédia que é capaz de produzir. Acreditamos que agora é a vez das classes populares falarem e serem ouvidas por aqueles que devem servir de maneira democrática a nossa sociedade. Pensando nisso, entidades, pesquisadores/ as e organizações que defendem os direitos humanos e lutam por uma nova política de segurança pública têm se organizado formando os Fóruns Populares de Segurança Pública (FPSPs). Atualmente há dois fóruns com esse caráter e nome, um no estado de Pernambuco e outro no estado do Ceará. Os FPSPs têm como objetivo serem espaços de debates, monitoramento, articulação entre defensores/as, denúncias e formulações em torno das políticas de segurança pública nos estados. O princípio fundamental dos FPSPs é o respeito, defesa e promoção dos direitos humanos como base da concepção da segurança pública. Por isso, os FPSPs têm atuado junto com vítimas de violência, seja institucional ou não, assim como com seus familiares. Os Fóruns têm se tornado iniciativas ƃǿƲţŀưūƲǷŀƐǪчǟŀǢŀчŀчƐƲɰǿŰƲŜƐŀчǟƼƧƒǷƐŜŀчơǿƲǷƼч aos governos e secretarias de segurança pública e/ou defesa social, na defesa dos direitos humanos e cobrança para que pautas da população, principalmente a
parcela mais vulnerável à violência, sejam atendidas. Essa atuação se dá de diferentes formas. No estado do Ceará, por exemplo, que sofreu com 7 chacinas que vitimaram 48 vidas no ano de 2018 , o FPSP-Ceará tem sido atuante na denúncia das chacinas, das violações aos direitos humanos no estado e no respeito à memória das vítimas. O Fórum Popular de Segurança Pública do Ceará foi lançado em novembro de 2017 e se constitui como uma articulação de entidades, movimentos sociais, coletivos, organizações da sociedade e pesquisadoras/ es que tem como objetivo ser um espaço de debates, monitoramento, denúncias e formulação de proposições no campo das políticas públicas de segurança. O FPSPCeará tem como princípios fundamentais: 1) A promoção e respeito aos direitos humanos no centro; 2) A defesa da Democracia; 3) A participação popular e auto-organização; 4) O combate a todas as formas de opressão (racismo, LGBTfobia, violência de gênero); 5) A prioridade absoluta de crianças, adolescentes e jovens; 6) O ɯưч ţƼч ūƲŜŀǢŜūǢŀưūƲǷƼч ūưч ưŀǪǪŀч ūч ţŀч degradação nas prisões; 7) A legalização das drogas e democratização do cuidado; 8) A desmilitarização da polícia e da política; 9) O desarmamento e controle de armas; 10) O direito à cidade como garantia da segurança pública; 11) O direito humano à comunicação e a uma mídia livre de violações. Também em Pernambuco, o Fórum surgiu no mês de maio de 2017, que teve um número recorde de 5.427 homicídios e um sentimento enorme de insegurança, a partir disso algumas pessoas que fazem parte de várias organizações, muitas de base comunitária, com objetivo de exigir a participação da sociedade nas construções da segurança pública do estado e
39
contribuíram para a formação do FPSP/PE. Desse modo, foi possível haver ações como a chamada de audiência pública e de ato público, além de outras articulações locais. Já em 2018, foi realizada pela primeira vez a Conferência Popular de Segurança Pública, que realizou em torno de 55 pré-conferências do sertão à capital, ou seja, no estado inteiro, tendo a participação de quase 2 mil pessoas. Foram feitas muitas escutas e conversas em comunidades, associações, conselhos, igrejas e terreiros, numa forma e linguagem em que o todos podiam discutir a segurança pública, tornando ǟƼǪǪƒȖūƧч ŜǢƐŀǢч ǿưч ţƼŜǿưūƲǷƼч ɯƲŀƧч ŜƼưч ǷƼţŀǪч ŀǪч ǟǢƼǟƼǪǷŀǪч levantadas nos sete eixos que tivemos: 1) Gestão Democrática e ǷǢŀƲǪǟŀǢŰƲŜƐŀчƲƼǪчţŀţƼǪϲчͶЌч ƼƲţƐşǚūǪчţūчǷǢŀśŀƧƋƼчţƼǪчǟǢƼɯǪǪƐƼƲŀƐǪч da segurança pública; 3) Prevenção social; 4) Encarceramento em massa; 5) Política de drogas e segurança pública; 6) Gênero, Raça, Classe e Segurança Pública; 7) Violência no contexto de grandes ūưǟǢūūƲţƐưūƲǷƼǪϯч}чţƼŜǿưūƲǷƼчɯƲŀƧчƃƼƐчǪƐǪǷūưŀǷƐȧŀţƼчūчǷŀưśŬưч entregue ao atual secretário de defesa social. Dessa forma, foi possível falar do processo popular da conferência, solicitar uma, conferência estadual de segurança pública, por parte do governo e cobrar a criação do Conselho Estadual de Defesa Social, para participação mais direta da sociedade.
V. DECLARAÇÃO DOS DIREITOS M¿p r}«чТч чRp }£¸ r R ч DOS DIREITOS HUMANOS PARA A SEGURANÇA PÚBLICA. MƼơūч ưǿƐǷƼч Ǫūч ƃŀƧŀч ţƼч ǡǿūч ǪƐƄƲƐɯŜŀưч Ƽǿч ţūȖūǢƐŀưч ǪƐƄƲƐɯŜŀǢч os direitos humanos. Políticos, mídia e sociedade repetem frequentemente ideias como “direitos humanos só para humanos direitos” ou ainda “direitos humanos só protegem criminoso”. Vivemos em um tempo de pouco conhecimento do que realmente ǪƐƄƲƐɯŜŀчţūƃūƲţūǢчƼǪчţƐǢūƐǷƼǪчƋǿưŀƲƼǪчūϰчŜƼưчƃǢūǡǿŰƲŜƐŀϰчǟūǪǪƼŀǪч são levadas a acreditar que os direitos humanos não dizem respeito a elas, quando na verdade eles valem para todos nós. Os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados. Ou seja, dizem respeito a uma vida digna para todos os indivíduos, em todas as sociedades, independente da sua condição, não podendo ser renegado por nenhum governo. São direitos humanos: o direito à vida, à liberdade de ir e vir, à liberdade de expressão, à educação, à moradia digna, ao acesso à saúde, ao transporte, ao trabalho, entre outros.
40
VI.MAS QUAL A IMPORTÂNCIA DOS DIREITOS HUMANOS PARA A SEGURANÇA PÚBLICA? Frequentemente nos deparamos com notícias e relatos de violência policial contra grupos vulneráveis, ou seja, os que mais sofrem ataques de vários lados, como negros/as, mulheres e LGBTs. O ǟǢƐƲŜƐǟŀƧчǟūǢɯчƧчţŀǪчȖƒǷƐưŀǪчƲƼч ǢŀǪƐƧϰчƐƲŜƧǿǪƐȖūчǟƼǢчǟŀǢǷūчţŀчȖƐƼƧŰƲŜƐŀч policial, é de jovens, negros e periféricos. O primeiro ponto de importância dos direitos humanos para a segurança pública é que, para mudar esse quadro, é preciso que a sociedade entenda o valor da vida desses grupos. Além disso, é necessária a compreensão de que a formação policial deve ser pautada pela promoção e respeito aos direitos humanos de todas as pessoas. Com isso a ação de rua das polícias e rotineiras dentro das periferias será mais segura para todos. O segundo ponto, tão importante quanto o primeiro, são as políticas de prevenção à violência. Não é possível pautar a segurança pública apenas com armas e ostensividade por parte da polícia. É preciso que a política de segurança pública seja orientada principalmente para prevenir que grupos vulneráveis sejam vítimas da violência. Para isso, as políticas públicas precisam trabalhar de forma articulada e localizada para assegurar que os direitos fundamentais dessas populações sejam respeitados e garantidos. O atual momento da sociedade brasileira inspira a urgência de tratarmos a segurança pública a partir de princípios democráticos e de defesa dos direitos humanos. O medo e a insegurança, principalmente nas grandes cidades, não podem ser mobilizados por desejos de vingança ou ódio. Conhecer a segurança pública, para que ela serve e reconhecê-la como direito de todos/as é de fundamental importância para construirmos uma boa convivência com base no respeito. Por isso, as iniciativas governamentais são importantes para mudanças profundas. Mas, além disso, a organização da sociedade em torno de um projeto para a segurança ǟȀśƧƐŜŀч Ǫūч ŜƼƧƼŜŀч ŜƼưƼч ţūч ǪƐƄƲƐɯчŜŀǷƐȖŀч ƐƲɰчǿŰƲŜƐŀч ǟŀǢŀч ǡǿūч ŀǪч políticas sejam efetivadas ou alteradas. É isso que buscamos fazer acontecer, isto é, a participação popular, da sociedade é que faz a diferença na construção de políticas públicas de qualidade, quebrando alguns clichês, como o de de que mais polícia é mais segurança. Quando se passa a entender que a polícia é só uma parte de um todo, é possível olhar de outra forma e ter ações diferentes. Segurança pública se faz pensando por completo e com a participação de todos/as.
͵ͻϯчF͵ч . £ ϯч«ūǷūчŜƋŀŜƐƲŀǪчƲƼч ūŀǢŁчţūƐȜŀǢŀưчͼчưƼǢǷƼǪчūưчͶʹ͵ͼϲчǢūƧūưśǢūчŜŀǪƼǪϯч$ƐǪǟƼƲƒȖūƧчūưϱчƋǷǷǟǪϱϼϼƄ͵ϯƄƧƼśƼϯŜƼưϼŜūϼŜūŀǢŀϼƲƼǷƐŜƐŀϼŜūŀǢŀЙǷūưЙͼЙưƼǢǷūǪЙūưЙǪūЙ ǷūЙŜƋŀŜƐƲŀǪЙūưЙͶʹ͵ͼϯƄƋǷưƧϯч ŜūǪǪƼчūưчͶчţūчţūȧϯчţūчͶʹ͵ͼϯч
41 41
41
Foto de Reginaldo Silva (Fortaleza/CE)
42
SEGURANÇA PÚBLICA E RACISMO Izabel Accioly Universidade Federal de São Carlos Programa de Pós-graduação em Antropologia Social Grupo de Estudos Violências Raciais e Resistências Negras (UFC-CE)
Rômulo Silva Universidade Estadual do Ceará Programa de Pós-graduação em Sociologia rȀŜƧūƼчţūч.ǪǷǿţƼǪч«ƼśǢūч ƼƲɰƐǷǿŀƧƐţŀţūчūч Violência (COVIO-UECE)
Raça é a ideia segundo a qual a natureza teria produzido humanidades distintas, reconhecíveis por traços inerentes e ŜŀǢŀŜǷūǢƒǪǷƐŜŀǪчūǪǟūŜƒɯŜŀǪчǡǿūчŜƼƲǪŀƄǢŀǢƐŀưч as suas diferenças, ordenando-as segundo uma escala de desigualdade. Neste sentido, ŀч Ǣŀşŀч ƲŘƼч ǟŀǪǪŀч ţūч ǿưŀч ɯŜşŘƼч ȀǷƐƧϯч ¿ưŀч metafísica destrutiva de dominação. É por meio da invenção do Outro como ǪǿǟūǢƐƼǢϼƐƲƃūǢƐƼǢч ǡǿūч Ŭч ơǿǪǷƐɯŜŀţƼч ƋƐǪǷƽǢƐŜŀч e socialmente o racismo estrutural, estruturado e institucionalizado no Brasil e em diversos países do mundo. Pois, conforme Frantz Fanon, “é o racista que inventa o inferiorizado”, jamais o contrário! O racismo é uma ideologia que se realiza e concretiza-se nas relações entre pessoas e grupos, no planejamento e desenvolvimento das políticas públicas, nas estruturas de governo e nas formas de organização e racionalidade dos Estados. Para isso solicita vários instrumentos capazes de mover os processos em favor de seus interesses e necessidades de continuidade, mantendo e perpetuando privilégios e hegemonias . No Brasil, por exemplo, o racismo acontece orientado pela cor da pele das pessoas, desde os mais claros que ocupam lugares superiores na hierarquia social, por outro
lado, os mais escuros são mantidos nas posições inferiores. O racismo institucionalizado pode ser pensado como parte de um sistema, nas ǟŀƧŀȖǢŀǪч ţƼч ɯƧƽǪƼƃƼч ŜƋƐƧƧūч pśūưśūϰч uma lógica do recinto fechado que revela ǿưч ǟǢƼŜūǪǪƼч ţūч ШŜƼƐǪƐɯŜŀşŘƼЩч ţƼч ǪǿơūƐǷƼч Negro (leia-se todos aqueles e aquelas marginalizados) constituído por uma “ordem colonial”. A lógica do recinto fechado funciona a partir da “ideia segundo a qual a Humanidade está dividida em espécies e subespécies, que podemos diferenciar, ǪūǟŀǢŀǢчūчŜƧŀǪǪƐɯŜŀǢчƋƐūǢŀǢǡǿƐŜŀưūƲǷūЩϯч.ǪǷŀч ŜƧŀǪǪƐɯŜŀşŘƼϰч ŜƼƲƃƼǢưūч ŀƐƲţŀч pśūưśūϰч acontece “tanto do ponto de vista da ƧūƐч ŜƼưƼч ūưч ǷūǢưƼǪч ţūч ŜƼƲɯƄǿǢŀşǚūǪч espaciais, tais espécies e subespécies devem ser mantidas à distância uma das outras” . Em outras palavras, os objetivos destes processos de racialização presentes na institucionalidade contemporânea, por exemplo, é marcar grupos e populações inteiras; determinar de forma mais precisa os limites dos quais podem ou não circular e estipular exatamente os espaços que podem ocupar. Portanto, funciona sob ŜƧŀǪǪƐɯŜŀşŘƼϰчǪūƧūşŘƼчūчƋƐūǢŀǢǡǿƐŀчǪƐưśƽƧƐŜŀч por meio de um emaranhado processo de invisibilização, silenciamento, afastamento, precarização e eliminação simbólica e instrumental de vidas precárias. Neste sentido, o racismo institucionalizado, como essa lógica do recinto fechado, isto é, mecanismo estrutural e estruturante que garante a exclusão seletiva de indivíduos, grupos e populações inteiras racialmente subordinadas. É, portanto, uma estratégia garantidora e atualizada de como o racismo se apropria da exploração histórica e sistêmica de populações inteiras quando o quesito é, por exemplo, a apropriação e manutenção de riquezas pela
͵ͼϯч £ŀŜƐǪưƼч RƲǪǷƐǷǿŜƐƼƲŀƧϱч ǿưŀч ŀśƼǢţŀƄūưч ŜƼƲŜūƐǷǿŀƧϯч $ƐǪǟƼƲƒȖūƧч ūưϱч ҅ƋǷǷǟϱϼϼȗȗȗϯƼƲǿưǿƧƋūǢūǪϯƼǢƄϯśǢϼȗǟЙŜƼƲǷūƲǷϼǿǟƧƼŀţǪϼͶʹ͵ͺϼʹϼERr fЙ×. Й£ŀŜƐǪưƼЙRƲǪǷƐǷǿŜƐƼnal-uma-abordagem-conceitual.pdf>. ͵ͽϯчp .p .ϰч ŜƋƐƧƧūϯч ǢƒǷƐŜŀчţŀч£ŀȧŘƼчrūƄǢŀϯч¸ǢŀţǿşŘƼчţūчpŀǢǷŀчfŀƲşŀϯчͶϯчūţϯчfƐǪśƼŀϱч ƲǷƒƄƼƲŀϰчͶʹ͵чч Ͷʹϯчp .p .ϰч ŜƋƐƧƧūϯч ƼƧƒǷƐŜŀǪчţŀчRƲƐưƐȧŀţūϯч¸ǢŀţǿşŘƼчţūчpŀǢǷŀчfŀƲşŀϯчfƐǪśƼŀϱч ƲǷƒƄƼƲŀϰчͶʹ͵ͻ
43
branquitude (capitais econômicos, culturais e simbólicos), assim como a manutenção, fragmentação e distribuição desta riqueza no seu interior. O racismo institucionalizado tem como função manter, induzir e regular a natureza da organização e ação do Estado, assim como suas instituições e políticas públicas assim como nas instituições privadas -, por meio da produção e reprodução da lógica do recinto fechado, na forma da hierarquização das raças, por exemplo! Esta lógica racista adoece a vida e, em uma reversão permanente, toma a morte pela vida e a vida pela morte numa versão atualizada do colonialismo. Esta relação oscila constantemente entre o desejo de explorar o Outro e a tentação de exterminálo. De acordo com Achille Mbembe, o capitalismo neoliberal tem deixado “em sua esteira uma multidão de sujeitos destruídos, muitos dos quais estão profundamente convencidos de que seu futuro imediato será uma exposição contínua à violência e à ameaça existencial. ” Comparado ao sistema de plantação (plantation), o escravo moderno é resultado de uma tripla perda: “a perda de um ‘lar’, a perda de direitos do corpo de cada um, ou de cada uma, e a perda de um estatuto político”. É neste sentido que Mbembe pensa o capitalismo na contemporaneidade como processos necropolíticos: formas de “subjugação da vida ao poder da morte” . O caso das mulheres negras: quando opressões de raça e gênero se combinam O Atlas da Violência 2018, elaborado pelo Ipea e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), nos apresenta ǿưч ţŀţƼч ƐưǟƼǢǷŀƲǷūч ǟŀǢŀч ǢūɰūǷƐǢưƼǪч ǪƼśч a perspectiva da interseccionalidade : no Brasil, o feminicídio de mulheres negras
está aumentando enquanto o de mulheres não negras está diminuindo . A pesquisa analisou os feminicídios ocorridos entre 2006 e 2016 e constatou que ocorreu um aumento de 54% de mortes de mulheres negras enquanto, no mesmo período, houve a diminuição de 9,8% de assassinatos de mulheres brancas. Quais fatores estão implicados nesse dado? Segundo Jackeline Aparecida Romio, ţƼǿǷƼǢŀч ūưч $ūưƼƄǢŀɯŀч ǟūƧƼч RƲǪǷƐǷǿǷƼч ţūч EƐƧƼǪƼɯŀч ūч ƐŰƲŜƐŀч MǿưŀƲŀǪч ţŀч ¿rR p ϰч esses números nos revelam que as mulheres negras não estão sendo atingidas pelas políticas públicas mais amplas e que há necessidade de criação de ações ūǪǟūŜƒɯŜŀǪч ǟŀǢŀч ūǪǪŀч ƃŀƐȜŀч ţŀч ǟƼǟǿƧŀşŘƼϯч Apenas através da adoção de certos cuidados direcionados às negras brasileiras, será possível corrigir essa tendência e fazer com que o feminicídio delas também diminua. A Lei do Feminicídio é um importante marco para a promoção da proteção das mulheres, entretanto, ainda é preciso pensar a categoria mulher não como uma massa uniforme, mas entendendo as ūǪǟūŜƐɯŜƐţŀţūǪч ţūч Ŝŀţŀч ƄǢǿǟƼϯч pǿƧƋūǢūǪч negras estão vulneráveis a articulação entre o racismo e o sexismo o que sobrecarrega as violências de gênero e o preconceito racial. “A mulher negra é a síntese de duas opressões, de duas contradições essenciais: a opressão de gênero e de raça. Isso resulta ƲƼчǷƐǟƼчưŀƐǪчǟūǢȖūǢǪƼчţūчŜƼƲɯƲŀưūƲǷƼϯч«ūч a questão da mulher avança, o racismo vem e barra às negras. Se o racismo é burlado, ƄūǢŀƧưūƲǷūч ǡǿūưч Ǫūч śūƲūɯŜƐŀч Ŭч Ƽч ƋƼưūưч negro. Ser mulher negra é experimentar essa ŜƼƲţƐşŘƼчţūчŀǪɯȜƐŀчǪƼŜƐŀƧЩчЋ«ǿūƧƐч ŀǢƲūƐǢƼЌϯч
21. Interseccionalidade (ou teoria interseccional) é o estudo da sobreposição ou intersecção de identidades sociais e sistemas relacionados de opressão, dominação ou discriminação. ͶͶϯч.ǪǪŀчţƐƃūǢūƲşŀчūƲǷǢūчưǿƧƋūǢūǪчƲūƄǢŀǪчūчśǢŀƲŜŀǪчơŁчūǢŀчŀǟƼƲǷŀţŀчƲƼǪчŀƲƼǪчŀƲǷūǢƐƼǢūǪϯчrƼчpŀǟŀчţŀчÖƐƼƧŰƲŜƐŀчͶʹ͵ϰчūƧŀśƼǢŀţƼчǟūƧŀчEŀŜǿƧţŀţūчfŀǷƐƲƼЙ ưūǢƐŜŀƲŀчţūч ƐŰƲŜƐŀǪч«ƼŜƐŀƐǪчЋEƧŀŜǪƼЌϰчŀǟƼƲǷŀчǿưчŀǿưūƲǷƼчţūчҗчūưчţūȧчŀƲƼǪчƲƼчƲȀưūǢƼчţūчƋƼưƐŜƒţƐƼǪчţūчưǿƧƋūǢūǪчƲūƄǢŀǪϰчǟŀǪǪŀƲţƼчţūч͵ϯͼͺϰчūưчͶʹʹͷϰчǟŀǢŀчͶϯͼͻϰчūưчͶʹ͵ͷϯчrƼч ưūǪưƼчǟūǢƒƼţƼϰчŀчǡǿŀƲǷƐţŀţūчŀƲǿŀƧчţūчƋƼưƐŜƒţƐƼǪчţūчưǿƧƋūǢūǪчśǢŀƲŜŀǪчŜŀƐǿчͽϰͼҗϰчǪŀƐƲţƼчţūч͵ϯͻͻчūưчͶʹʹͷчǟŀǢŀч͵ϯͻͺчūưчͶʹ͵ͷϯ
44 44
Banco de Imagens da Visão Mundial
45
POLÍTICAS PÚBLICAS FOCADAS EM FATORES DE RISCO E PREVENÇÃO Algumas experiências exitosas na prevenção da violência podem ser observadas nos três exemplos abaixo. Elas são políticas de prevenção focadas em fatores de risco e prevenção que funcionam em locais públicos e de alta vulnerabilidade. A observação de cada uma delas pode nos ajudar na criação de nossas intervenções comunitárias.
I.PROGRAMA DA UNIDADE DE GERENCIAMENTO DE PROJETOS DE PREVENÇÃO DE VIOLÊNCIAS Local de implementação: Sobral (CE), desde outubro de 2017, como parte integrante da Secretaria dos Direitos Humanos, Habitação e Assistência Social. Como funciona: Sobral era o 27º município do país em taxa de homicídios em 2014. A partir de 2017 foi implementada uma agenda de políticas públicas de prevenção de violências na juventude. A UGP de Prevenção de Violências organiza-se em dois Eixos: a. Observatório da Violência: vem realizando, de forma sistemática, formações permanentes, consolidação de dados e informações estratégicas sobre violência e cultura de paz, assim como estudado a trajetória de vida de adolescentes e jovens. b. Gestão de Ações Territoriais: trabalha de forma customizada, intersetorial, criativa e territorial desenvolvendo ações de integração, intervenção, articulação, formação e acompanhamento das juventudes que vivenciam em suas trajetórias múltiplas vulnerabilidades. O seu ponto chave é a intersetorialidade e a transversalidade, uma vez que a temática da violência está inserida em diferentes aspectos e pode ser trabalhada por inúmeras áreas através de ações conjuntas. Dessa maneira, a UGP/PV é formada por células que visam trabalhar e discutir medidas intersetoriais para o enfrentamento da violência juvenil na cidade de Sobral.
46
II. PROGRAMA CADA JOVEM CONTA, CRIADO PELO INSTITUTO CIDADE SEGURA Local de implementação: Canoas (RS) em 2016, desde 2017 passou a ser aplicada na cidade de Pelotas (RS), no âmbito do Pacto Pelotas Pela Paz, e em 2019, na cidade de Lajeado. Em Pelotas, o Cada Jovem Conta conta atualmente com 17 Núcleos Territoriais, com o apoio da Comunitas e da Open Society Foundation. Como funciona: a cada quinze dias a direção das escolas, das Unidades Básicas de Saúde, dos serviços de Assistência Social que têm atuação em cada território se reúnem, debatem cada caso, desenvolvem os Planos Individualizados, deliberam ações de intervenção integradas e monitoram o que foi realizado e os impactos. O RƲǪǷƐǷǿǷƼч Ɛţŀţūч«ūƄǿǢŀчţūǪūƲȖƼƧȖūǿчƃƼǢưǿƧŁǢƐƼǪчǟŀǢŀчƐţūƲǷƐɯчŜŀǢчƼǪч fatores de risco de cada jovem e para acompanhar a sua evolução. Os dados são cadastrados num sistema online que permite o monitoramento do Programa pelas equipes. Vinculado ao Cada Jovem Conta está o Banco de Oportunidades, ǡǿūч ƼƃūǢūŜūч ȖŀƄŀǪч ūưч ƼɯчŜƐƲŀǪч ŜǿƧǷǿǢŀƐǪч ūч ūǪǟƼǢǷƐȖŀǪч ūч ǷŀưśŬưч encaminha os jovens para oportunidades de trabalho, geração de renda e educação, através de parcerias com empresários e ONGs das cidades. Em 2018, 280 adolescentes foram acompanhados pelo Programa e as professoras registraram uma melhoria de 80% no comportamento e aumento da frequência escolar em mais de 50% desses jovens.
III. BECOMING A MAN Local de implementação: Chicago (USA) Como funciona: Foi percebido que a maioria dos homicídios em Chicago resulta de discussões e desavenças que se transformam em tragédias porque alguém reage de forma exagerada a uma provocação. O programa Becoming a Man (BAM) da Orientação Juvenil tem ǪƐţƼчŀƧǷŀưūƲǷūчūɯчŜŀȧчūưчƧƐţŀǢчŜƼưчƼчǷƐǟƼчţūчǢūǪǟƼǪǷŀǪчŀǿǷƼưŁǷƐŜŀǪч e impulsivas que podem levar à violência. O BAM oferece sessões semanais em grupo para jovens durante o dia escolar e usa terapia cognitivo-comportamental para ajudar os jovens a desacelerar em situações de risco. https://urbanlabs.uchicago.edu/projects/becoming-a-man
4747
Foto de Gabriel Dias (Salvador)
48 48
Pensando em soluções: Intervenções em Segurança Pública
3 Banco de Imagens da Visão Mundial
49
Durante o segundo semestre de 2019 e início de 2020 foram realizadas 08 formações na metodologia do MJPOP adaptada para o contexto do monitoramento das políticas públicas de segurança. ¸ƼţƼǪчƼǪчƄǢǿǟƼǪчǪŀƒǢŀưчŜƼưчƼчţūǪŀɯчƼчţūчŀƼчǢūǷƼǢƲŀǢūưчǟŀǢŀчǪǿŀǪч comunidades implementarem ações que tivessem como objetivo ɯчƲŀƧчŀчǢūţǿşŘƼчţŀчȖƐƼƧŰƲŜƐŀчŜƼƲǷǢŀчŜǢƐŀƲşŀǪϰчŀţƼƧūǪŜūƲǷūǪчūчơƼȖūƲǪϯч As intervenções foram criadas a partir das capacidades construídas durante as formações, permitindo que os GT´s do MJPOP pudessem trabalhar questões centrais que levavam aos altos índices de violência em suas comunidades. Temas como racismo, violência de gênero e violência policial foram constantes nas ações desenhadas e implementadas pelos GT´s. É importante observar que o contexto de Pandemia, iniciada em março de 2020, interferiu na implementação das intervenções em algumas localidades. Elas tiveram que se adaptar a uma nova e desconhecida realidade. Nessa seção você poderá conhecer algumas dessas experiências. Que elas sejam inspiração para sua ação comunitária.
ϯчp £R ч.p }$.£ $ «чФч EMPODERANDO MULHERES PARA SUPERAREM A VIOLÊNCIA. Derick Coelho $ŀţƼǪч ţƼч RƲǪǷƐǷǿǷƼч pŀǢƐŀч ţŀч ūƲƋŀч Ȗūưч ŀŜǿǪŀƲţƼч ǪǿśƲƼǷƐɯчŜŀşŘƼч de casos de violência doméstica durante a pandemia no Estado de Pernambuco, em um momento onde entidades sociais apontam um aumento da gravidade desse problema. Pernambuco registrou uma queda contínua no número de boletins de ocorrência (BO) desse tipo de crime no período de quarentena. Em abril, houve um recuo de 25,45% em relação ao mesmo mês do ano passado. Se comparado março de 2019 e o mesmo período em 2020, a baixa foi de 22,18%. As informações são da Secretaria de Defesa Social (SDSPE). Tudo isso afeta o combate à violência contra a mulher durante a ǟŀƲţūưƐŀϰчƼƲţūчɯчŜŀчưŀƐǪчţƐƃƒŜƐƧчǪūчƐţūƲǷƐɯчŜŀǢϰчţūƲǿƲŜƐŀǢчūчǢūƄƐǪǷǢŀǢч os casos tal como são. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontou em um levantamento que os relatos no Twitter de brigas de casal com indícios de violência doméstica aumentaram 431% entre fevereiro e abril deste ano, sendo mais da metade deles publicados apenas no último mês. Outros monitoramentos indicam a mesma conclusão: o aplicativo da loja Magazine Luiza, que possui um botão de emergência para mulheres denunciarem casos de violência, as
50
queixas tiveram um crescimento de 400% ƲƼч ŜƼƲɯƲŀưūƲǷƼϯч RǪǪƼч ưŀƐǪч ǿưŀч Ȗūȧч ǷǢŀȧч ŀч ǢūɰūȜŘƼч ǪƼśǢūч ŀч ţƐɯŜǿƧţŀţūч ţūч ǢūƄƐǪǷǢƼǪч ţƼч ŜŀǪƼǪч ūч ǪǿśƲƼǷƐɯŜŀşŘƼч ţǿǢŀƲǷūч Ƽч isolamento social. Todas essas questões demonstram a importância de trabalhar ações de prevenção e enfrentamento a violência contra as mulheres, sobretudo nas periferias, que são carentes de informação e do poder público. As atividades do projeto remetem primeiramente a combater tais questões a partir de um processo formativo. Durante todo o processo, contamos com parceiros da comunidade, que fazem a execução ser ainda mais próxima das pessoas e da realidade da comunidade. Contamos com a Casa Herbert de Souza, Centro Dom Helder Câmara e Associação de Moradores. O território onde o projeto foi desenvolvido é a Comunidade do Tururu, Comunidade Dom Hélder Câmara, Comunidade da Rua do Meio, Loteamento Gilberto Freire. Todas localizadas no bairro do Janga, em Paulista, territórios que possuem em torno de 20 mil pessoas. Baseado no trabalho de incidência pública, o Coletivo Tururu, nesse debate de prevenção à violência doméstica no período da pandemia fez um chamamento da responsabilidade das Secretarias de Assistência Social (Estado e Município), da Secretaria de Saúde (do município) e da secretaria de Defesa Social do estado, fazendo as devidas cobranças para presença dos poderes públicos nos espaços sociais da periferia. As ações do projeto Marias Empoderadas estavam ocorrendo conforme o planejamento que foi feito. É importante lembrar que a iniciativa partiu de jovens que foram formados pelo Coletivo Força
Tururu que viram a necessidade de levar um debate na comunidade em torno do tema da prevenção e enfrentamento à violência contra as mulheres. O retorno das atividades pela comunidade estava sendo bem expressiva com uma ƐţūƲǷƐɯŜŀşŘƼчūчūƲȖƼƧȖƐưūƲǷƼчǟŀǢŀчŜƼƲȖūǢǪŀǢч sobre um tema tão intenso que é presente em muitos lares da comunidade do Tururu. Infelizmente com o avanço da pandemia do novo coronavírus no Brasil as atividades foram impedidas de continuar, pois foi decretada a quarentena e posteriormente o lockdown no estado, mudando o planejamento das ações. Porém foi visto que o momento da pandemia é importante para que se tome um debate em torno da prevenção à violência contra as mulheres, sobretudo em tempos de isolamento social. Todas as ações têm os protocolos de prevenção e combate ao COVID-19 respeitados, conforme orientações dos órgãos de saúde, governos municipais, estaduais e Organização Mundial de Saúde. As atividades aconteceram da seguinte forma: - Entrega de cestas básicas e material informativo de prevenção e enfrentamento à violência contra mulheres, como por exemplo : bottons e as máscaras personalizadas com o tema. - Circular anuncicleta (bicicleta com anúncios) na comunidade, abordando a importância de denunciar em casos de violência contra as mulheres, expondo o número e os meios de denúncia. - Debates nas redes sociais através de lives. Realização de sorteio das camisas que com o tema da prevenção e enfrentamento à violência contra as mulheres.
51
B. REDE PROTETIVA DE POLÍCIA }p¿rR¸ £R чФч £¸R ¿f }ч.r¸£.ч SOCIEDADE CIVIL E POLÍCIA PELA VIDA DAS MULHERES DE MOSSORÓ Edgleison Rodrigues Em 2015 foram assassinadas no Brasil 4.621 mulheres, que correspondem a uma taxa de 4,5 mortes para cada 100 mil mulheres. Mesmo que a taxa de homicídios de mulheres tenha aumentado 7,3% entre os anos de 2005 e 2015, quando analisamos os anos ưŀƐǪч ǢūŜūƲǷūǪϰч ƃƼƐч ȖūǢƐɯŜŀţƼч ǿưŀч ưūƧƋƼǢŀч ƄǢŀţǿŀƧϰч ǪƼƃǢūƲţƼч ǿưŀч queda de 5,1% no ano de 2015. Entretanto, se compararmos o assassinato de mulheres negras e não negras, temos que destacar algo bastante importante. Enquanto a mortalidade de mulheres não negras teve uma redução de 7,4% entre 2005 e 2015, atingindo 3,1 mortes para cada 100 mil mulheres não negras – ou seja, abaixo da média nacional -, a mortalidade de mulheres negras observou um aumento de 22% no mesmo período, chegando à taxa de 5,2 mortes para cada 100 mil mulheres negras, acima da média nacional. Um levantamento realizado junto as Secretarias de Segurança dos Estados do Brasil e divulgado na Folha de São Paulo (https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/02/feminicidiocresce-no-brasil-e-explode-em-alguns-estados.shtml?aff_ source=56d95533a8284936a374e3a6da3d7996 ) apontou que no ano de 2019 o número de feminicídio aumentou 7,2% em todo o país. O levantamento mostrou que nesse ano foram mortas 1.310 mulheres vítimas da violência doméstica ou por sua condição de gênero. No Diagnóstico Rápido Participativo realizado no ano de 2018 com 890 adolescentes e jovens de diversos estados do Brasil, apontou que 275 respondentes disseram que a violência doméstica é uma das violências mais presentes nas comunidades. O feminicídio é uma cruel realidade que impacta a vida de milhares de mulheres no Brasil todos os anos, e para as mulheres que estão nas periferias essa realidade tende a ser muito mais presente em suas vidas. Nesse ano de 2020, no mês de março, O Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou dados que colocam o estado do Rio Grande do Norte com um dos Estados com maior número de violência doméstica durante o período de isolamento social, devido a pandemia da COVID-19.
52
Segundo dados do Observatório da Violência do Rio Grande do Norte (OBVIO/RN) os números dos casos de violência doméstica, no período de 12 a 18 de março de 2020, apresentaram uma diferença de 258 casos a mais, referente ao mesmo período no ano de 2019. Apesar dos altos índices de violência contra as mulheres no Estado, apenas dois municípios, Mossoró e Natal, oferecem algum suporte para as vítimas de violência doméstica em perigo de morte. Nesse sentido que essa proposta de intervenção vem somar na proteção das jovens e mulheres de Mossoró, buscando contribuir para que os índices de violência contra elas sejam reduzidos, a partir da formação de uma ampla rede que mobilizará diversos atores, tanto da sociedade civil quanto do poder público, para juntos atuarem na proteção e prevenção às violências contra as jovens e mulheres. Diante do aumento de casos de violência contra mulheres no Brasil e principalmente no estado do Rio Grande do Norte, a proposta de intervenção foi realizada no município de Mossoró – RN, mas ūǪǟūŜƐɯŜŀưūƲǷūч ƲŀǪч ŜƼưǿƲƐţŀţūǪч ţƼч bairro Nova Vida. A proposta de intervenção na área da segurança pública apresentada tinha como objetivo trabalhar com o segmento das jovens e mulheres, tendo em vista que são as que mais sofrem com a violência doméstica ou por serem apenas do gênero feminino. Para a execução da proposta de intervenção na área de segurança pública apresentada, foram mobilizados diversos atores da sociedade civil, como o Grupo Mulheres em Ação, a Marcha Mundial de Mulheres, o Centro Feminista Oito de Março, as juventudes do MJPOP Ousadia Juvenil, ACREVI, os Conselhos Comunitários, a Fundação Potiguar, dentre outros. Para a redução das violências contra as mulheres
é necessária que seja criada uma força tarefa que envolva, além da sociedade civil, o poder público. Para essa proposta de intervenção contamos com o apoio do corpo efetivo feminino da Polícia Militar e o mandatos de deputadas estaduais. Também mobilizamos, para apoiar a nossa intervenção, o Ministério Público e a Defensoria Pública. A proposta de intervenção para a área de segurança pública apresentada teve as seguintes atividades: Atividade 1: Mobilização dos atores da sociedade civil e poder público - Nessa atividade foram mobilizados todos os atores propostos, tanto da sociedade civil quanto do poder público, para uma reunião virtual, em virtude do cenário da pandemia do COVID-19, para apresentação da proposta de intervenção, visando conseguir o apoio para a execução da proposta. Atividade 2: Distribuição de kits de prevenção e materiais informativos sobre o combate ao COVID-19 e sobre como agir numa situação de violência doméstica ou de gênero. Nessa atividade os jovens do MJPOP apoiaram as jovens e mulheres da periferia com materiais de proteção, como kits de higiene para as mãos, contendo álcool em gel, assim como aproveitaram para divulgar informações de combate à violência contra as mulheres, informando que mecanismos elas podem procurar em caso de violência contra elas. Atividade 3: Lives Formativas: Tendo em vista que nesse cenário do COVID-19 a Organização Mundial da Saúde recomenda evitar todo tipo de aglomeração, os jovens do MJPOP realizaram momentos formativos virtuais sobre temáticas ligadas a prevenção e proteção de jovens e mulheres, utilizando os canais de comunicação já existentes.
53
Atividade 4: Confecção e distribuição de informativos nas redes sociais sobre o combate à violência contra as meninas e mulheres. Foram elaborados informativos sobre a temática da violência contra as mulheres que foram divulgados nas redes sociais, através dos canais existentes.
C. REDE DE PROTEÇÃO COMUNITÁRIA ÀS MENINAS DO SANTA MARIA Edgleison Rodrigues No ano de 2019 uma pesquisa divulgada pelo site da Rede Brasil Atual (https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2019/09/brasil-registra-uma-mulher-agredida-a-cada-quatro-minutos-e-uma-morta-a-cada-oito-horas/) mostrou que o Brasil registrou um caso de agressão cometida por homens a mulheres a cada quatro minutos. Segundo o levantamento do Ministério da Saúde, divulgado pelo jornal Folha de S. Paulo, houve um aumento expressivo de casos de violência física, psicológica e sexual registrados. Foram 145 mil casos denunciados nos últimos anos, ante pouco mais de 120 mil denunciados em 2014. O número, no entanto, poderia ser ainda maior, considerando que esse tipo ȖƐƼƧŰƲŜƐŀчŀƐƲţŀчŬчǪǿśƲƼǷƐɯŜŀţƼϯч No Ceará, o relatório CADA VIDA IMPORTA, referente aos meses de Janeiro a Junho de 2019, elaborado pelo Comitê de Prevenção ao Homicídio na Adolescência, apontou que em Fortaleza, 53 meninas foram assassinadas. O feminicídio é uma triste realidade no Brasil, que afeta principalmente as jovens e mulheres das periferias. Em uma pesquisa elaborada por adolescentes e jovens do MJPOP Fortaleza, na comunidade do Santa Maria, 78% das meninas e mulheres já sofreram algum tipo de violência e que muitas delas não entendiam como violência alguns atos contra as mesmas, demonstrando um temor na denúncia e desconhecimento das redes de apoio. Nesse sentido, a proposta de intervenção na área de segurança pública apresentada teve como objetivo contribuir para a criação de uma rede proteção de mulheres, através da criação de um canal onde elas pudessem ter informações corretas sobre como agir em uma situação de violência doméstica ou de gênero. Para a execução dessa proposta de intervenção foram mobilizados diferentes atores da comunidade do Santa Maria, visando fortalecer essa rede proteção. Dentre os atores convidados estiveram a Associação Santos Dias, devido à forte presença na comunidade e o apoio que sempre tem dado aos jovens do MJPOP e também o IDESQ, outra forte
54
associação presente na comunidade que tem uma ampla articulação para a defesa dos direitos. Acredita-se que é necessário um trabalho em conjunto para que se posa superar todos os tipos de violências que afetam as comunidades e contar com o apoio do poder público é fundamental, tendo em vista que é papel dessas instâncias a implementação das políticas públicas que garantam os direitos das juventudes, dentre eles os direitos à proteção à vida. Para essa intervenção buscaram mobilizar a Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Vereadores de Fortaleza e a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Ceará. Essas duas instâncias políticas são reconhecidas na cidade pela atuação em prol da vida das juventudes. A metodologia da proposta de intervenção se deu da seguinte forma: Atividade 1: Mobilização dos atores da sociedade civil para apresentação da proposta de intervenção. Reunião virtual com os possíveis parceiros apoiadores da iniciativa para apresentação da ideia, dos objetivos e dos passos a serem executados. Atividade 2: Confecção e distribuição de informativos nas redes sociais sobre o combate à violência contra as meninas e mulheres. Produziremos informativos sobre a temática da violência contra as mulheres para serem divulgados nas redes sociais, através dos canais existentes. Atividade 3: Fixação de banners informativos em locais públicos da comunidade. Foram produzidos banners com informações sobre o enfrentamento à violência contra as meninas e mulheres para ǪūǢūưчɯȜŀţƼǪчƲŀчŜƼưǿƲƐţŀţūчūưчƧƼŜŀƐǪчǟȀśƧƐŜƼǪчūчţūчƄǢŀƲţūчŜƐǢculação. Atividade 4: Realização de atividades virtuais, durante a pandemia da COVID-19 e presenciais quando possível, para abordar temáticas sobre a prevenção a violência doméstica e de gênero.
55 55
Foto de Reginaldo Silva (Fortaleza/CE)
56 56
CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho comunitário de base não é fácil de ser realizado. .ƲŜƼƲǷǢŀǢūưƼǪчţǿǢŀƲǷūчūǪǪŀчơƼǢƲŀţŀчţƐȖūǢǪƼǪчţūǪŀɯƼǪчǡǿūчţūȖūǢŘƼчǪūǢч superados através do diálogo e da negociação franca com todos os atores envolvidos no processo de monitoramento da política pública. Reforçamos que durante a aplicação da metodologia o protocolo de segurança deve ser constantemente revisitado, atualizando-o quando ƲūŜūǪǪŁǢƐƼчǟŀǢŀчưūƧƋƼǢчƄŀǢŀƲǷƐǢчŀчǪǿŀчūɯŜŁŜƐŀϯч ƼƲǷǿţƼϰчƲūƲƋǿưчǟǢƼŜūǪǪƼчţūȖūчǪūǢчƐƲɰūȜƒȖūƧϯч ţŀǟǷŀşǚūǪчőǪчǢūŀƧƐţŀţūǪч locais deverão ser realizadas para respeitar seus processos comunitários. Portanto, sempre que achar necessário, adeque a metodologia à sua comunidade, sem perder a essência da mesma e sem distanciar dos seus princípios. Fique atento ao tempo de implementação das ações e seja um animador ou animadora do seu grupo, mostrando e dando visibilidade a cada ganho alcançado coletivamente. Como uma ação territorializada, a intervenção criada atuará somente na localidade do GT. Entretanto, o problema da violência é algo muito mais estruturante, por isso é necessário o apoio de outras organizações ūч ƄǢǿǟƼǪч ơǿȖūƲƐǪч ǟŀǢŀч ŀƧŜŀƲşŀǢч Ƽч ƼśơūǷƐȖƼч ɯƲŀƧϱч ưūƧƋƼǢŀǢч ƼǪч ǪūǢȖƐşƼǪч públicos nas comunidades, principalmente em relação àqueles que darão oportunidades para que adolescentes e jovens se desenvolvam com segurança. Enquanto implementa a ação em seu território, comece a divulgar com outras comunidades os avanços que vocês têm conseguido. Motive-as para também implementar o processo em seus territórios e assim ampliarmos o movimento em prol da criação de lugares seguros para adolescentes e jovens.
57
Banco de Imagens da Visão Mundial
58
ANEXOS PLANO DE IMPLEMENTAÇÃO ANUAL
I Fase
MOBILIZAÇÃO DE COMUNIDADE E PARCEIROS •
Formando o Grupo de Trabalho
•
Elaborando o Protocolo de Segurança
•
Detectando e Sensibilizando Parceiros
•
Coletando Informações Fundamentais (DRP)
2 meses
II Fase
CONSTRUÇÃO DA INTERVENÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO •
Comunicando Para Mobilizar
•
Construindo Capacidades
•
Construindo Intervenções em Segurança Pública
•
Implementando a Intervenção
7 meses
III Fase
PRESTAÇÃO DECONTAS DO GRUPO E DO PODER PÚBLICO •
Realizando Audiências Públicas.
•
Avaliando as Atividades Estratégicas
•
$ūɯƲƐƲţƼчƼǪч ǢƽȜƐưƼǪч ŀǪǪƼǪϯч
3 meses
59
OFICINAS CONSTRUINDO CAPACIDADES NOME DA FORMAÇÃO: #EuSintoNaPele
CARGA HORÁRIA: 16h/a
ÁREA: Formação sobre Segurança Pública NOME DO(A) FACILITADOR(A): INÍCIO:
TÉRMINO:
HORÁRIO:
DIAS DA SEMANA:
OBJETIVO: .ǪǪŀч ƼɯŜƐƲŀч Ƿūưч ŜƼưƼч ƼśơūǷƐȖƼч ưƼśƐƧƐȧŀǢч ūч ŜƼƲǪǷǢǿƐǢч ŜŀǟŀŜƐţŀţūǪч ƲƼǪч ƄǢǿǟƼǪч ŜƼưǿƲƐǷŁǢƐƼǪч ǪƼśǢūч tópicos relacionados à segurança pública e políticas e práticas baseadas em evidências para reduzir a violência. OBSERVAÇÕES: Rϯч}ǪчţƐŀǪчūчƋƼǢŁǢƐƼǪчţūчƃƼǢưŀşŘƼчǪŘƼчţūɯƲƐţƼǪчǟūƧƼчF¸ϯч чŜŀǢƄŀчƋƼǢŁǢƐƼчǷƼǷŀƧчŬчţūч͵ͺчƋƼǢŀǪϯч Ͷϯч .ƲȖƼƧȖūǢч ǷƼţƼǪч ūч ǷƼţŀǪч ƲƼч ǟǢƼơūǷƼϯч Ǫч ơǿȖūƲǷǿţūǪч ƲŘƼч ǪŘƼч ŀǟūƲŀǪч śūƲūɯŜƐŀǢƐŀǪϰч ưŀǪч ǟŀǢǷūч ţŀч construção. 3. Os parceiros mobilizados participam ativamente da formação. DATA
CONTEÚDO I Dinâmica de Apresentação •
Que som tem sua cidade? Em círculo cada um se apresentará e dirá que som tem sua cidade. Depois todos farão juntos o som citado pelos participantes.
MJPOP (Movimento Jovem de Políticas Públicas). •
Apresentação do Movimento Jovem de Políticas Públicas
ŀǢǷƼƄǢŀɯŀч ƼǢǟƼǢŀƧчЋEƒǪƐŜƼчūч«ƼŜƐŀƧЌ •
Dividir os participantes em quatro grupos de trabalho.
•
O primeiro momento trabalhar as questões relacionadas ao contexto e as trajetórias individuais dos adolescentes e jovens da comunidade.
•
Criar um mapa de trajetórias individuais: Em uma folha de papel grande desenhar um adolescente. Um dos participantes poderá deitar-se sobre o papel enquanto ƼǪч ţūưŀƐǪч Ƽч ţūǪūƲƋŀưϯч }ч ƄǢǿǟƼч ţūśŀǷūǢŁч ǡǿŀƧч Ƽч ǟūǢɯƧч desse adolescente da comunidade, qual sua história,
60
ǪǿŀǪч ǟǢƐƲŜƐǟŀƐǪч ţƐɯŜǿƧţŀţūǪϰч ǪūǿǪч ǪƼƲƋƼǪϯч ŀţŀч ǿưŀч dessas características deve ser escrita no desenho. O ƼśơūǷƐȖƼчŬчƐţūƲǷƐɯŜŀǢчƼчŜƼƲǷūȜǷƼчţūчȖƐƼƧŀşǚūǪчţūчţƐǢūƐǷƼǪч e os encontros que as trajetórias nos proporcionam. •
O segundo momento eles desenharão em um grande papel a comunidade que vivem. O debate nesse momento é sobre a relação com a polícia nos territórios. Eles
podem
contar experiências vividas
por eles
ưūǪưƼǪϰч Ƽǿч ŀƐƲţŀч ǡǿūч ǷūƲƋŀưч ǟǢūǪūƲŜƐŀţƼϯч rƼч ɯƲŀƧϰч eles terão um mapa da ação policial em seus territórios, construído a partir de suas experiências. •
Após essas construções coletivas, os grupos deverão apresentar
os
seus
trabalhos
e
compartilhar
os
aprendizados. •
Os materiais construídos devem ser colocados no meio da roda e sempre visitados durante toda a formação. Temos
as
trajetórias
dos
adolescentes
e
jovens
participantes e o um mapa da ação policial dentro dos seus territórios. Essa atividade é importante para podermos abordar os conteúdos seguintes.
Lanche e Socialização Para Compreender a Violência no Brasil •
Discutir texto do Professor Luiz Fábio sobre a Violência no Brasil
DATA
CONTEÚDO II Atividade de Integração •
Dinâmica: Derrubando muros e com os entulhos construindo pontes. “Desenha-se” uma ponte no chão e divide a turma em dois grandes grupos, um para cada lado. Depois liga uma música dançante e pede para um de cada lado atravessar a ponte de forma que se encontrem no percurso e busquem alternativas de se ajudar para atravessar o “abismo”.
61
O Que é Segurança Pública •
O texto base para a roda de conversa foi construído pelo Fóruns Populares de Segurança Pública do Ceará e de Pernambuco, nas pessoas de Ana Letícia Lins e e Derick Raphael. Ele deve ser enviado antecipadamente aos participantes para que possam realizar uma leitura prévia.
•
A roda de conversa deve ser realizada em círculo onde todos podem contribuir suas percepções acerca do tema. É importante que os conceitos que forem sendo discutido estejam visíveis a todos. Sugerimos que utilizamos tarjetas para os facilitadores marcarem os conceitos que estão sendo desenvolvidos.
Lanche e Socialização Que Segurança Pública Nós Queremos?
•
Dividir novamente em quatro grupos, podendo ser os mesmos que trabalharam o conteúdo anterior. Eles devem revisitar tudo o que foi construído durante a formação. No desenho da comunidade eles começarão a debater sobre qual tipo de política pública eles têm direito. No mapa da comunidade, deverão ser colocadas novas tarjetas falando de qual modelo de segurança pública ele deseja que seja implementado dentro da comunidade.
DATA
CONTEÚDO III Atividade de Integração Dinâmica: Árvore de Poemas – Uma grande árvore será desenhada no local da atividade (po-de ser em cartolinas, papéis madeira) – No início dessa atividade cada participante es-creverá algo positivo (frutos) dos primeiros dias de formação. Eles irão colar os frutos na árvore e depois realizarão um debate para o resgate dos temas já trabalhados. Segurança Pública e Racismo •
Assistir o Documentário Nossos Mortes Têm Voz. O documentário foi produ-zido pela Quiprocó Filmes.
62
A narrativa do documentário é construída a partir do depoimento e do protagonismo das mães e familiares vítimas da violência de Estado da Baixada Fluminense. Tendo como ponto de partida esses casos, o documentário aborda as histórias atravessadas por essas perdas. Pretende-se resgatar a memória dessas vidas interrompidas trazendo uma visão crítica so-bre a atuação do Estado através das polícias na Baixada Fluminense, sobretudo no que diz respeito à violência contra jovens negros. Para mais informações so-bre o documentário, acesse o site da ǟǢƼţǿǷƼǢŀч ŀǿţƐƼȖƐǪǿŀƧϱч ч ƋǷǷǟǪϱϼϼȗȗȗϯǡǿƐǟǢƼŜƼɯƧưūǪϯŜƼưϯ br/ •
Realizar uma roda de conversa com os seguintes motes: O que vimos? O que ouvimos? O que sentimos?
Lanche e Socialização Segurança Pública e Racismo?
•
Realizar roda de conversa baseada no texto Segurança Pública e Racismo, pro-duzido por Izabel Accioly e Rômulo Silva. Observar os conceitos e temas discu-tidos durante o texto.
DATA
CONTEÚDO IV Atividade de Integração •
Dinâmica: Essa é o último conteúdo a ser desenvolvido nas ƼɯŜƐƲŀǪч ţūч ŜƼƲǪǷǢǿşŘƼч ţūч ŜŀЙǟŀŜƐţŀţūǪϯч ŀǢŀч ǟƼţūǢưƼǪч ɯƲŀƧƐȧŀǢч ūǪǪūч ǟǢƼŜūǪǪƼϰч Ŝŀţŀч ǟŀǢǷƐŜƐǟŀƲǷūч ūǪŜǢūȖūǢŁч ūưч uma tarjeta os aprendizados dos últimos dias. Aqueles e aquelas que dese-jam compartilhar, poderão fazê-lo rapidamente.
Segurança Pública, Racismo e Opressões de Gênero •
ƼƧŀǢч ǿưŀч ɯǷŀч ŀƼч ƧƼƲƄƼч ţƼч ūǪǟŀşƼч ǡǿūч ǪūǢŁч ǢūŀƧƐȧŀţŀч a atividade, de modo a dividi-lo em dois lados. Pedir que que se formem dois grupos, cada um no lado da
63
ɯǷŀϰчţūчưƼţƼчǡǿūчɯǡǿūưчǿưчţūчƃǢūƲǷūчǟŀǢŀчƼчƼǿǷǢƼϯч ч facilitadora fará uma série de perguntas sobre situações ȖƐȖūƲŜƐŀţŀǪчǟūƧƼǪчǟŀǢǷƐŜƐǟŀƲǷūǪчƲƼчţƐŀчŀчţƐŀчūчǡǿūчǢūɰƐǷŀưч a violência e o racismo. A cada pergunta os participantes que vi-venciaram aquela situação deverão se deslocar ŀǷŬчŀчƧƐƲƋŀчɯŜŀƲţƼчūưчŜƐưŀчţūƧŀϯч$ūǟƼƐǪчǟƼţūưчǪŀƐǢчǟŀǢŀч próxima pergunta. Sugestão de perguntas: 1. Já te pediram que você alisasse o seu cabelo na escola ou em qualquer outro espaço? 2. Você já foi seguido ao entrar em alguma loja do shopping? 3. Alguém já te perguntou se poderia tocar em teu cabelo ou como você tinha uma aparência exótica? 4. Quando em companhia de sua namorada, já pediram que se reti-rassem de algum lugar ou não demonstrasse seu afeto? 5. Você já percebeu se as mulheres são tratadas de modo diferente ou ocupam papel diferenciado na família? 6. Na sua infância você teve uma boneca negra? Você já foi maltrata no posto de saúde por conta de sua cor? Você já escutou que deveria se relacio-nar com homem ou mulher “branca” para melhorar a cor de sua família? Para você, mulheres negras são representadas de forma negativa na televisão? Você já foi “encoxada” no transporte público? •
Depois de realizado esse momento, realizar uma roda de conversa sobre a per-cepção dos participantes sobre a dinâmica.
Lanche e Socialização O Casa das Mulheres Negras: Quando Opressões de Raça e Gênero se Combinam.
•
Voltar ao texto construído por Izabel Accioly e Rômulo «ƐƧȖŀϰчūǪǟūŜƐɯŜŀưūƲǷūчƲŀчǟŀǢǷūчǪƼśǢūчƼчŜŀǪƼчţŀǪчpǿƧƋūǢūǪч Negras, quando opressões de raça e gêne-ro se combinam. £ūɰūǷƐǢчǪƼśǢūчƼǪчŜƼƲŜūƐǷƼǪчǡǿūчŀǟŀǢūŜūưчƲƼчǷūȜǷƼчūчƼǪчƲȀЙ meros da violência contra as mulheres negras.
64
MODELO DA INTERVENÇÃO NOME DA INTERVENÇÃO DESCREVA QUAL O TERRITÓRIO E O SEGMENTO POPULACIONAL (CRIANÇAS, ADOLESCENTES, JOVENS, MULHERES...) SERÃO ATENDIDOS POR ESSA AÇÃO:
DESCREVA O CONTEXTO QUE ESSA AÇÃO SERÁ REALIZADA. APRESENTE DADOS DE DIAGNÓSTICOS, COMO POR EXEMPLO, O DRP OU OUTRO QUE VOCÊ TENHA ACESSO SOBRE O TERRITÓRIO:
QUAIS INSTÂNCIAS DA SOCIEDADE CIVIL FORAM OU SERÃO ARTICULADAS PARA EXECUTAR ESSA INTERVENÇÃO?
QUAIS INSTÂNCIAS DO PODER PÚBLICO FORAM OU SERÃO ARTICULADAS PARA EXECUÇÃO DESSA AÇÃO?
DESCREVA A EXPERIÊNCIA, CITANDO DETALHES DE SUA EXECUÇÃO E METODOLOGIA UTILIZADA.
O QUE VOCÊ ESPERA ALCANÇAR COM ESSA INTERVENÇÃO?
PLANO DE AÇÃO DA INTERVENÇÃO Qual o problema?
Como resolver?
Quem pode ajudar?
Quando vai ser feito?
Comentários
65