Vozeiro de Primeira Linha
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Ano XIII • Nº 48 • Segunda jeira • Abril, Maio e Junho de 2008
Mudemos o rumo das cousas
Editorial No anterior editorial do Abrente apelávamos a avançar para conquistar o futuro. As dificuldades no dia a dia da vida da imensa maioria social, provocadas polo imparável incremento nos preços dos produtos básicos de alimentaçom e dos combustíves, estám a gerar um estado de opiniom caracterizado pola combinaçom do mal-estar, a preocupaçom e a resignaçom. O incremento anual de mais de 20% no consumo de ansiolíticos é eloqüente expressom da natural ansiedade de umha sociedade que tem interiorizado que o presente é melhor que o incerto futuro que nos aguarda, mas que, perante o descontentamento, procura fórmulas inadequadas para os problemas que padece. @s comunistas sabemos que, contrariamente à gravidade da situaçom, de momento nom há possibilidades subjectivas para que adopte a forma de protestos contra os responsáveis directos pola perda de poder aquisitivo e polo aumento da pobreza e da exclusom social. As amplas massas do povo trabalhador ainda nom identificam as vinculaçons directas entre inflaçom, congelaçom salarial, incremento do desemprego, da precariedade laboral, emigraçom maciça –só em 2007, as estatísticas oficiais reconhecem ser mais de 74.000 o número de galeg@s, metade jovens, que tivérom que abandonar a Comunidade Autónoma– abusivo incremento do leite, pam, carne, fruta, energia e combustíveis, com as políticas neoliberais aplicadas de forma sistemática nos últimos quinquénios polos governos do PSOE e do PP a escala estatal, mas também polos governos autonómicos de Fraga e Tourinho-Quintana. Boa parte do que está a acontecer é fruto destas receitas inquestionáveis. No entanto, amparando-se na crise financeira e económica por que atravessa o capitalismo internacional, os partidos do sistema tentam justificar e maquilhar a actual situaçom que já nom podem nem ocultar nem minimizar. Simultaneamente a esta realidade tam pouco alentadora e enormemente preocupante, geradora de tragédias quotidianas, as grandes empresas, os bancos e entidades financeiras, as companhias seguradoras, vem multiplicar exponencialmente as suas milionárias taxas de margem de ganho. Nesta conjuntura tam adversa para a classe trabalhadora, basicamente para os sectores mais fracos: mulheres, juventude e pensionistas, a grande burguesia está a obter enormes
lucros à custa de intensificar o desenvolvimento de políticas especulativas e predadoras que só provocarám maiores desigualdades sociais. É a lógica da economia de mercado, do capitalismo real! Mas nom podemos cair na resignaçom paralisante, assumir que estamos condenad@s a ter que pagar a crise, nem confiar em falsas soluçons emanadas das promessas demagógicas de políticos oportunistas. Só a mobilizaçom social poderá mudar o rumo das cousas, forçar a re-orientaçom da política socioeconómica do governo espanhol e do governinho autonómico, obrigá-los a flexibilizar posiçons. Nom podemos interiorizar que nom há alternativa, que nom existem possibilidades nem margens para reduzir boa parte dos efeitos da grave crise internacional em que o modo de produçom capitalista está inserido. É evidente que nom tem que ser a classe operária e o conjunto das camadas populares que tenhamos de pagar esta situaçom. Nom podemos consenti-lo. Nom devemos permiti-lo. A esquerda independentista apresentou há cerca de três anos um integral programa de choque tendente a corrigir e evitar esta situaçom, com o objectivo de melhorar as condiçons de vida do povo galego com base numha lógica socioeconómica de redistribuiçom da riqueza. As 444 medidas concretas para umha nova política nacional e de esquerda elaboradas por NÓS-UP em Setembro de 2005 nom obtivérom mais que o silêncio e a desconsideraçom por parte do governinho do PSOE-BNG. A prepotência e desprezo com que se manifestou esta fraude, pretensamente autodenominada alternativa progressista, instalada em Sam Caetano prognosticava que sem lugar a dúvidas ia aplicar semelhantes formas e políticas das desenvolvidas polos dezasseis anos de fraguismo. Hoje é umha evidência. Governam igual que os de antes e para os de sempre, para os ricos a quem servem, e para os ámbitos familiares e sociais das castas políticas corruptas, com o único objectivo de se enriquecerem o antes possível à custa do povo trabalhador, empregando os enormes recursos da administraçom e os mecanismos de poder que gerem. Os enormes défices de controlo democrático permitem burlas permanentes ao senso comum, como os sobre-salários ou o incremento das suas obscenas remuneraçons económicas pola actividade parasita que desenvolvem ao serviço dos seus amos, o grande capital.
Sumário 3 Carvalho Calero no século XX Galego Maurício Castro
4 Revoluçom sexual e soberania sobre os nossos corpos Ângelo Meraio
4-5 Fascistas de passeio polo
mercado de títulos universitários Iago Barros Minhons
6 Os coentros da rebeldia também som
condimentos imprescindíveis da Revoluçom Carlos Morais
7 Francisco Martins Rodrigues in memoriam 8 Concluírom XII Jornadas Independentistas Galegas Reafirmada vigência dos princípios revolucionários marxistas
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Nº 48. Abril, Maio e Junho de 2008
Editorial
Nom podemos depositar esperanças em soluçons por parte dos responsáveis polo problema
Contrariamente à ideia generalizada, temos que recuperar a confiança nas nossas forças, no poder imenso que possui a classe unida e mobilizada, disposta a nom continuar a pagar os pratos que partem outros. Mas as fracas mobilizaçons do 1º de Maio constatam as dificuldades de abrirmos um ciclo de luitas, manifestando a actualidade de diversas reflexons que nom devemos infravalorizar na hora de agir para mudar a situaçom. A desmobilizaçom popular provocada por depositar expectativas no incumprimento das promessas do acordo de governo bipartido, mas também a ausência de umha estratégia de luita com base num programa concreto de reivindicaçons tangíveis e assumidas por amplos sectores proletários e populares, provoca que a data fique reduzida a umha jornada sem conteúdo reivindicativo e esvaziada da sua dimensom de dia de luita e combate. A CIG é, nos dias de hoje, a única entidade de massas do País com capacidade real para gerar um clima de mobilizaçom social tendente a traduzir o mal-estar geral em luita social, para activar esse descontentamento cada vez mais visível em centros de trabalho e na rua. Mas, por enquanto, nom existem possibilidades de que se converta nessa ferramenta de defesa dos interesses colectivos do povo trabalhador por várias razons. A dependência político-ideológica de boa parte da sua direcçom das diversas expressons do regionalismo neoliberal esteriliza a enorme potencialidade da central, condenando-a a continuar a ser um gigante com pés de barro, paradoxalmente inofensiva. Boa parte das rigorosas análises empregadas na hora de avaliar a situaçom socioeconómica da Galiza, os retrocessos nas condiçons sociais e laborais, nom passam de simples retórica de consumo interno, pois nom se plasmam na prática numha orientaçom sindical que procure no curto prazo forçar umha nova
Ferrol, 1º de Maio de 2008
política –progressista e de esquerda, baseada na combinaçom dos interesses populares e nacionais– e muito menos umha mudança de governo. O primeiro objectivo seria viável se apostasse numha estratégia de confrontaçom, de movimentaçom social, empresa por empresa, sector por sector, mas também dirigido a activar e procurar convergências com outros sectores populares nom enquadrados organicamente no seio nem na área de influência directa da central, que force a bipartido a aplicar umha nova política. Embora no esteja garantido o sucesso, sim dificulta que se consolide a desmobilizaçom social e a penetraçom da ideologia reaccionária que a longo prazo terá efeitos nefastos para a luita de libertaçom nacional e social de género.
Obviamente, o segundo carece de realismo, pois nom existe ainda umha alternativa de esquerda soberanista que contribua para articular esse espaço sociopolítico imprescindível para mudar a carência de alternativa estratégica nas batalhas concretas de carácter táctico em que a central tem atingido certas vitórias. E aqui obviamente bate com a contradiçom irresolúvel para aqueles sectores que reclamando-se da esquerda soberanista e anticapitalista continuam na actualidade integrados no regionalismo neoliberal que aplica sem complexos nem escrúpulos a privatizaçom dos serviços públicos, as reformas laborais, legitima rescissons de contratos e adopta medidas fiscais e económicas só favorecedoras dos interesses dos actuais donos deste País.
A actual direcçom da CIG nom defende os interesses objectivos da classe trabalhadora, pois carece de autonomia política do regionalismo, e da valentia para promover um amplo movimento de massas que reclame incremento salariais, políticas intervencionistas nos preços, a recuperaçom da titularidade pública dos serviços privatizados, políticas fiscais para as camadas mais desfavorecidas, paralisaçom das estratégias predadoras contra os recursos naturais e ambientais, a retirada das ajudas públicas ao grande capital. Sem despreender-se desse lastro, está condenada a continuar a mostrar os dentes sem capacidade para morder. Como se pode entender pois que responsáveis directos no apoio às políticas que denunciamos assistam com toda
a normalidade e absoluta impunidade às mobilizaçons do 1º de Maio? Que Quintana, os conselheiros e os vereadores do BNG participem nesta jornada? Porque a CIG permite esta burla? Porque na actualidade continua, com todas as contradiçons que quigermos expor, considerando-os parte do mesmo campo, e nom os vê como aquilo que som: inimigos declarados da classe operária galega e do projecto de libertaçom nacional da Galiza. Para podermos avançar é imprescindível superar esta dependência que tanto dano provoca na hora de aplicarmos umha coerente intervençom táctica e estratégica que contribua para conseguirmos avançar na nossa emancipaçom de classe e género e na libertaçom como naçom oprimida.
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Maurício Castro
Nº 48. Abril, Maio e Junho de 2008
ANÁLISE
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Carvalho Calero no século XX Galego
Nos últimos meses, entidades sociais e figuras muito diversas do nosso país tenhem aderido à campanha que a Fundaçom Artábria, da comarca de Trasancos, lançou para reclamar um verdadeiro reconhecimento social e institucional a quem foi um dos grandes intelectuais galegos do século passado. É sabido, porque assim foi reconhecido por algum dos seus integrantes, que a Real Academia Galega, instituiçom tomada por sectários anti-reintegracionistas incapazes de integrar a pluralidade do País que aposta em si mesmo, leva dezoito anos, desde o mesmo momento da morte do erudito ferrolano, a tentar enterrar de vez as suas ideias sobre o que o nosso idioma deve ser e sobre que política lingüística precisa a Galiza para garantir um futuro digno ao nosso milenário idioma nacional. O herético Ricardo Carvalho Calero, cuja vida atravessou a prática totalidade do século XX galego, representa nom apenas o mais alto cume da formaçom intelectual em matérias como a investigaçom literária e lingüística, junto à criaçom literária de grande nível de qualidade em todos os géneros. Representa também, e sobretodo, o serviço ao Pais como máxima aspiraçom em tam diversos contextos sociais como ele viveu: a República, a ditadura franquista e a Restauraçom bourbónica que se estende até hoje. Mas, se a unanimidade é absoluta na importáncia dos seus trabalhos de investigaçom e difusom literária, com a monumental História da Literatura Galega Contemporánea ainda plenamente vigente como referência para qualquer pessoa que quiger aproximar-se do fenónomeno literário galego nos últimos séculos, tal unanimidade nom se dá na hora de reconhecer o seu papel como estudioso da nossa língua, nomeadamente no que di respeito à dimensom social e à orientaçom que deve ter a construçom de um padrom moderno. Aí, a partir do seu claro posicionamento logo em 1975, surgiu a anatemizaçom contra o velho professor, primeiro catedrático de língua e literatura galegas desde 1972, e redactor das normas académicas de 1970-71. Foi no artigo intitulado “Ortografia galega”, publicado em La Voz de Galicia, que afirmou que “estamos no momento em que cumpre já umha revisom da nossa normativa à luz desses factos” (…) “Inserido o nosso idioma no complexo ibero-románico ocidental, qualquer grafia que resulte dialectalmente rechamante produzirá umha impressom de indisciplina cultural, que deve evitar-se se pode sê-lo (…) restabelecendo a continuidade que pode ter sido alterada polo momento dialectal que a língua viveu durante séculos”. É importante sublinhar que Carvalho assumiu posiçons reintegracionistas avançadas quando começou a estudar-se a possibilidade de introduzir o galego no ensino, pois, como afirmou num artigo de 1985: “Quando nom existia oficialmente Galiza, quando nom existia oficialmente o galego, quando nom existia oficialmente o ensino do galego com umha consciência de substantividade da língua deteriorada por longos séculos de alienaçom, o uso da escrita castelhana, em que todos éramos alfabetizados, podia ser único expediente realista para fomentar a escrita do galego. Onde ensinar outra ortografia? Com que professores se contava para isso? Aumentar as difiduldades do uso do galego naquelas circunstáncias tam adversas, nom seria mi contraproducente? Mas desde que o galego é idioma (co)oficial e há ensino oficial do galego, imos perpetuar indefinidamente a ruptura com a ortografia histórica que, adaptada às circunstáncias do presente, se emprega no mundo lingüístico que tem o galego como torgo?” Nos anos 70, diante da iminência da morte do ditador e na perspectiva da cooficializaçom do galego, era o momento de passar das ideias reintegracionistas, que sempre impregnaram o pensamento galeguista e nacionalista galego já desde os ilustrados do século XVIII, aos factos da orientaçom do novo padrom, imprescindível para introduzir o galego nas novas instituiçons autonómicas e no ensino. Lembremos que o primeiro presidente da Real Academia Galega, Manuel Murguia, foi um grande entusiasta da unidade lingüística galego-portuguesa, tal como as principais figuras do nacionalismo dos anos 20 e 30: Joám Vicente Biqueira, Antom Vilar Ponte, Afonso Daniel Rodrigues Castelao… o próprio Carvalho, que na sua juventude chegou a presidir a agrupaçom ferrolana do Partido Galeguista, bebia já naquela altura da tradicional orientaçom reintegracionista do pensamento galego.
Trajectória de compromisso e dignidade
A trajectória de Carvalho Calero ao serviço das ideias da soberania nacional e da esquerda, junto ao compromisso com o idioma e a cultura da Galiza, constituem nele um património que mantivo com dignidade apesar das dificuldades e represálias que implicárom para quem viveu o exílio interior durante
ele o comprovou na década seguinte, que os entraves do poder político e o factor ideológico impedírom que as cousas corressem como poderiam ter corrido.
Normalizaçom, reintegracionismo e “consquista dos mecanismos de poder”
a longa ditadura fascista e a marginalizaçom imposta polo estreito autonomismo nascido nos primiros anos da década de oitenta. Na juventude, como estudante, participou na fundaçom da organizaçom estudantil republicana FUE, que protagonizou mobilizaçons contra a ditadura de Primo de Rivera e mais tarde, como político, assinou junto a outros conhecidos militantes comunistas e nacionalistas, em 1931, um abaixo-assinado intitulado “A esquerda galeguista fala ao País”, chamando à abstençom activa numhas eleiçons em que o nacionalismo galego ainda nom conseguira apresentar umha alternativa ao espanholismo rampante. Colaborador do “Centro Obrero de Cultura” que funcionava em Ferrol naqueles anos, defendeu a orientaçom progressista e republicana do Partido Galeguista, do qual fora cofundador em Dezembro de 1931, junto a Castelao, Outeiro Pedraio e Vicente Risco. Em 1936, publicou um artigo com motivo da derrota das posiçons da ala direita, celebrando a adesom à Frente Popular em 1936 sob o título “Já somos esquerda”. Apesar da sua juventude, foi um dos redactores do Estatuto de Autonomia para a Galiza, que nom chegou a entrar em vigor polo levantamento militar fascista, que o apanha em Madrid. Ali adere imediatamente como voluntário ao exército republicano, num batalhom de milícias de ensinantes adscrito ao Quinto Regimento, atingindo o grau de oficial. Com a vitória fascista, chega a prisom, a perda da vaga de funcionário público em Ferrol e o ostracismo dos assinalados pola sua condiçom republicana, galeguista e de esquerda.
Da ditadura à II Restauraçom bourbónica
Protagonizou, portanto, Carvalho Calero um percurso vital dificilmente digerível polos defensores do statu quo, que nunca conseguírom integrar a sua natural tendência libertária no selecto clube dos intelectuais orgánicos. Isso, sem dúvida, determinou a
condena à marginalidade que padeceu, apesar de ser evidente a sua superioridade intelectual em relaçom aos que, com a chegada do novo regime monárquico de 78, assumírom o protagonismo das políticas lingüísticas e culturais. Na década de 70, na iminência da morte de Franco, Carvalho viveu um período de expectaçom polas possibilidades que se abriam para umha mudança substancial no estatuto legal e social do galego e, de umha maneira mais ampla, da identidade nacional galega. Foi aí, como dizíamos, que se manifestou abertamente por um galego reintegrado no seu espaço próprio, o que o converte num idioma internacional e intercontinental e nos permite olhar de tu a tu o prepotente poder lingüístico espanhol. Frente às posiçons dos dialectólogos do Instituto da Língua Galega, defensores de um modelo de língua baseado da separaçom do português e na dependência do espanhol, mal maquilhada com apelos à “fala do povo”, Carvalho Calero defende que, como acontece em todas as línguas estatais, também o galego deve contar com um padrom baseado na história e numha forma nom directamente resultante da média entre as variantes diatópicas. Umha posiçom inassimilável pola casta política em formaçom naqueles anos iniciais do novo Estado das Autonomias, que apoiárom a via isolacionista. Mas as esperanças de Carvalho nom se situavam só na dignificaçom do corpus lingüístico galego, aspirando também à recuperaçom social dos usos. Sem partir de umha concepçom essencialista ou idealista do papel da língua na identidade galega, defendia que “qualquer idioma sentido como próprio por umha comunidade, seja qual for a sua extensom e a sua distinçom dentro do mundo em que vive, tem direito à existência, e ao agarimo do poder político”. Ao contrário do que sucedia na II República, nos anos 70 o galego foi assumido como ferramenta política por toda a oposiçom antifranquista, o que convidava Carvalho ao optimismo. Hoje sabemos, e também
Frente às curtas visons do espanholismo e de boa parte do nacionalismo galego, reivindicou a “fortuna histórica do galego” face ao euskara e o catalám, em funçom da projecçom internacional do nosso idioma, e olha com sá inveja o sucesso da via reintegracionista e normalizadora na Flandres, no seu célebre artigo “O voo do flamengo”. Analisando a história com perspectiva materialista, situou o esmorecimento do nosso idioma no papel das classes dominantes, as únicas que podiam ter garantido a viabilidade de umha comunidade lingüística, ao serem referenciais para o conjunto de qualquer formaçom social. Afirmou que “se no tránsito da Idade Média para a Idade Moderna se castelhanizou lingüisticamente a nobreza, no tránsito da Idade Moderna para a Contemporánea castelhanizou-se a burguesia”. Apesar do optimismo aparentemente ingénuo dos ano 70, Carvalho viu logo para onde se encaminhava o novo aparelho político-institucional posto em andamento polo regime surgido da Constituiçom de 1978. Já em 1979, expom claramente que o submetimento histórico do galego deriva “do monopólio polo castelhano de todos os mecanismos de poder”, e propom como única alternativa, literalmente “a conquista desses mecanismos poderia permitir ao galego luitar pola sua sobrevivência”. Encontramo-nos diante de umha crítica implícita de qualquer projecto de teor bilingüista, como o que começava a cozer-se com a iminente estreia do monárquico Estado das Autonomias. Só o recurso a “todos os mecanismos de poder” que garantem o “monopólio” do castelhano podem permitir a sobrevivência do galego. Umha leitura actual e técnica dessa formulaçom é a de que só um modelo de oficialidade de tipo territorial para o galego pode garantir-lhe a viabilidade social. Um modelo como o suíço ou o flamengo, que é reivindicado ainda mais claramente na década seguinte, em artigos como “Bilingüismo e bigámia”: umha situaçom de alegado bilingüismo social desemboca sempre “na monarquia de aquela das duas línguas que possui maior potência social”. Podemos afirmar, sem exagero, que Carvalho Calero foi um verdadeiro visionário, ao avançar com acerto em que iria dar o caminho encetado nos primeiros 80 pola nova autonomia. Nesses anos, o optimismo anterior converte-se em denúncia da política lingüística autonómica, do papel empobrecedor que começava já a jogar a Televisom da Galiza, do burocratismo inoperante que caracterizava esse híbrido entre centralismo histórico espanhol e autonomismo limitado que negava qualquer poder de decisom ao nosso povo. Carvalho, defensor explícito do direito de autodeterminaçom para a Galiza, morrerá mantendo umha saudável distáncia dos centros de poder e das novas elites intelectuais, que o condenárom ao mesmo ostracismo que já padecera nos anos da ditadura. A soberania nacional, cultural e lingüística nom estava na ordem de trabalhos dos neo-regionalistas empoleirados à autonomia, como ele os chamava. Porém, contra o prognóstico oficial realizado no ano 90 pola cúpula lingüística do oficialismo, as ideias de Carvalho nom morrêrom com ele. Som férteis, e continuam a alimentar novas geraçons de galegos e galegas que nom renunciamos a voltar a fazer do nosso idioma nacional o que sempre foi: o nosso principal sinal de identidade, que voltará a florescer numha Galiza plenamente emancipada: independente. Maurício Castro é membro do Comité Central de Primeira Linha
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Nº 48. Abril, Maio e Junho de 2008
Ângelo Meraio
Opiniom
Da perversom à transgressom
Revoluçom sexual e soberania sobre os nossos corpos
Será que nas nossas organizaçons nom há pessoas trans, lésbicas ou gays? Ou será que nom estabelecemos mecanismo de visibilidade porque a sexualidade e a identidade de género ainda nos causam arrepios? De onde esse medo, de onde esse rejeitamento? Quanto temos ainda de puritanismo e moralidade religiosa? Quanto temos ainda de homofobia e transfobia? Falar de sexualidade e afectividade no ámbito da esquerda revolucionária da Galiza ou de realidades próximas ao nosso país, ainda pode ser hoje motivo de desprezo, vergonha, rejeitamento, marginalizaçom, burla. Os blocos do género estabelecidos como ferramenta de opressom por este inumano sistema capitalista, masculinofeminino, homem-mulher, som salpicados com vermelho e lilás e transferidos à nossa alternativa. A nossa proposta de reconstruçom do mundo tem umha grave conta pendente, a reconstruçom profunda de nós próprias e próprios, dos nossos corpos, dos nossos afectos, do nosso desejo. Arrastamos e fixamos activamente limitaçons que tenhem perpetuado o afastamento das reivindicaçons LGBT-Queer da base da nossa luita emancipadora. De que maneira pedimos soberania para os nossos povos se nem questionamos o poder que temos sobre os nossos corpos? Como vamos ser pessoas livres se vivemos o nosso desenvolvimento sexual, intimamente ligado com o intelectual, de umha maneira pateticamente limitada e falseada? Afinal trata-se de quanto nos sentimos a salvo dessa falsa consciência sobre nós próprias/os, sobre em que medida ainda consideramos pervertido/perverso o transgressor.
Visibilidade e heterossexismo, umha ideologia opressora
Podemos partir de umha ideia principal, esta é que a sexualidade nom é nunca umha questom íntima, privada, à margem do sistema. A sexualidade como o género som polo contrário elementos decisivos no nosso desenvolvimento pessoal e na nossa saúde. Condicionante do nosso status social, da nossa vida laboral, até da nossa integridade física. Solteira/o ou casada/o? Tés moça/o? E como é que nom tés moça/o? Fulano/a
e acompanhante... Falamos continuamente da nossa sexualidade, de umha maneira cinicamente mascarada mas contodo sempre presente e sempre heterossexual. Porque a heterossexualidade nom é umha orientaçom afectivo-sexual, é umha ideologia opressora. Quando falamos em visibilidade, em “sair do armário”, ainda no ámbito da esquerda é geral cair no craso erro de que é umha questom de escolha pessoal, chegase a falar em liberdade para decidir. A pergunta é: Quando decidiste viver como heterossexual? Quando tiveste essa liberdade? A visibilidade nom é umha opçom, é umha necessidade, visibilidade é igual a normalidade. Quem achar que nom é assim pouco sabe do que é ter de ocultar publicamente o modo em que sentes, a afectividade, os sentimentos. Afinal, é assim tam íntima a esfera afectivo-sexual ou polo contrário vive atrapada numha armadilha de limitaçons, falsidades e perversas duplas morais?
Preconceitos e lobby gay
O tema da visibilidade liga com a integraçom real da libertaçom afectivo-sexual na nossa luita global. O lobby gay há uns tempos que é faca de dous gumes para as nossas luitas, em primeiro lugar provoca desconfiança preconceituosa da esquerda revolucionária, contodo heterossexista, que identifica os padrons do lobby gay, criados polo próprio mercado, com o conjunto da populaçom LGBT. Por outro lado é para o movimento de libertaçom sexual e de género umha pesada lousa que cai principalmente sobre o povo trabalhador LGBT. Depois de décadas de luita e logros, a obscenidade capitalista criou o seu modelo do perfeito gay. Os maricons de antes agora passam a ser gays de gostos requintados, corpo perfeito e Visa Ouro. Que tanto operam o nariz como se casam como as pessoas “normais”. É claro que esta é umha realidade fictícia para a imensa maioria dos homens gays, para quem em lugar dessa “maravihosa” vida sofrem, em muitos casos desde crianças, a mais crua marginalizaçom social traduzida por exemplo numha taxa de tentativas de suicídio juvenil 5 vezes maior à dos jovens hetero. As mulheres entretanto, continuam a ver negada a sua existência como lésbicas, agredidas por machos de “pénis mágicos”
que se acham com a capacidade de “curar” a maneira de sentir e desejar das nossas companheiras.
Despatologizaçom e soberania sobre o corpo
O género converte-se nom numha simples questom de identidade mas de soberania sobre o nosso próprio corpo. As pessoas trans, pessoas que nom se identificam com o género que lhes é atribuído polo seu sexo biológico, transgridem de umha maneira radical a imposiçom do género. Por causa disto vivem numha situaçom de extrema intoleráncia e marginalizaçom social. Isto deve levar-nos ao ponto de questionar qual é o poder real que temos sobre o nosso corpo, onde se encontram os limites, já nom só os sociais e culturais mas os institucionalizados. No dia 17 de Maio de 1990 a Organizaçom Mundial da Saúde retirou a homossexualidade da sua lista de doenças mentais. O fim a mais de um século de homofobia médica, muito longe ainda do fim da homofobia social. No entanto, hoje no ano 2008 a transexualidade ainda é considerada um trastorno pola OMS. O termo “transtorno de identidade de género” tem sido usado para descrever a chamada disforia de género desde 1980, com a publicaçom do DSM (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders). O uso do termo transexualismo e transtorno de identidade de género, legitimou um lugar para esses ”transtornos” no universo psiquiátrico e médico. No Estado Espanhol, onde existe umha das legislaçons mais avançadas, as pessoas trans som submetidas a sofrer um processo psiquiátrico obrigatório. Nega-se a soberania sobre o próprio corpo, o Estado deixa em maos da psiquiatria determinar se umha pessoa é homem ou mulher. Apropriam-se da competência de decidir sobre a própria identidade, sobre o próprio corpo. Isto é, umha negaçom do direito ao desenvolvimento da própria personalidade. As pessoas trans e especialmente as mulheres vivem um estado de excepçom sobre os seus seres, estado que as degrada extremamente na sociedade e que as patologiza legalmente. A esquerda revolucionária nom pode ficar alheia a esta luita pola soberania do
próprio corpo, da própria vida, da nossa própria autodeterminaçom.
Como combatemos o patriarcado? (Se é que o combatemos)
Nas últimas décadas temos experimentado umha incorporaçom (a diferentes ritmos locais) do feminismo como parte integrante da nossa bagagem transformadora, parte integrante e por justiça um dos alicerces da mudança. Contodo, esta imprescindível incorporaçom, tem sido equiparada erradamente com a luita global de combate ao patriarcado. Luita que todas e também todos, temos de assumir e interiorizar. No entanto, tenhem sido deixadas ficar no caminho duas reflexons fundamentais: Em primeiro lugar o questionamento do próprio género, adaptámos os blocos rígidos homem-mulher às nossas “necessidades revolucionárias”. A falta de reflexom sobre o que é um homem e o que é umha mulher e a falta de assunçom deste binarismo como enteléquia política, instrumento básico de manutençom de toda a opressom. Neste sentido, da criaçom de necessários espaços de organizaçom e discussom integrados exclusivamente por mulheres passámos ao total desinteresse e falta de implicaçom dos homens e um modo de encaixotamento estanco de mulher e homem, sem nos despojarmos de tantos lastres caducos e preconceitos sobre o nosso corpo. Em segundo lugar a crítica radical à vivência da nossa(s) sexualidade(s), depois de umha assunçom razoável da separaçom sexo/funçons reprodutivas, a sexualidade continua a ser considerada alheia à política e ao sistema económico. Falsa consciência e reducionismo ao feminismo como único motor da luita antipatriarcal. Tem permitido deixar tranqüila a consciência do “macho revolucionário” e provocar o sofrimento da incompreensom e ocultaçom de quem neste contexto tem transgredido esses limites. Barreiras que nom conseguimos superar e as quais em muitos dos casos nem sequer questionamos formalmente. Heterossexismo e binarismo de género como pesadas cargas para a nossa emancipaçom como humanas e humanos, como revolucionárias e revolucionários. Ângelo Meraio é activista gay e militante de Primeira Linha
Mais de três meses transcorrêrom já desde que AGIR foi exposta na cena mediática como mais umha inimiga do Estado espanhol: Já se sabe, inimiga da democracia, da liberdade de expressom, dos direitos das pessoas físicas e jurídicas, da integridade física e moral dos súbditos do Estado, etcétera. Mais umha organizaçom desse enigmático círculo crescente, e potencialmente totalizador, integrado por “quem fomenta(mos) o terrorismo”, e cujo traço podemos visibilizar graças ao ingente trabalho da judicatura e da imprensa espanholas, que se encarregam com profissional veemência de riscar com nomes e apelidos aqueles colectivos e pessoas que o vam(os) alargando, e alargando, e alargando... Nom somos @s primeir@s a passar polo espectáculo criminalizador. Tampouco @s primeir@s na Galiza. O preço da portagem por este passeio pode alcançar valores que nom conhecemos nem tenhamos experimentado por enquanto, mas sobre cujo eventual tratamento haveremos de encarregar-nos no seu momento, com a esperançosa sensaçom de agilidade organizativa que o estudantado independentista soubo mostrar desta volta. A criminalizaçom arredor do “assunto San Gil” foi suficientemente grotesca para a concebermos como a fazer parte do sensacionalista linchamento político do nacionalismo espanhol, que nom distingue entre os conteúdos de um programa “rosa” e os conteúdos do parte de notícias do governo de serviço no telejornal oficial e “sério”. Esta é umha peculiar fórmula empregue polo poder desta sociedade da comunicaçom de massas para atentar expansivamente contra a identidade das pessoas e colectivos que agimos no páramo de liberdades que é o Estado em que vivemos. Porém, quanto a eventuais e maiores represálias, também é de considerar a possibilidade de isto ficar na cena pré-eleitoral do aparelho mediático espanhol. Apesar da persistência de umha decana cavernícola e dos interesses fascistas do sistema, (fins aos quais coadjuva a desmobilizaçom estudantil generalizada) talvez nom lhes preste queimar mais pólvora nesta ocasiom.
Os media apontam, o Estado dispara
Quiçá AGIR fosse durante uns dias a organizaçom estudantil mais popular em todo o Estado espanhol. Tal é a debilidade do movimento estudantil nos dias de hoje, numha conjuntura de tímida recuperaçom, nomeadamente à volta da crítica ao Processo de Bolonha, que dificilmente se poda pensar o contrário em nengum canto deste mercado, onde até a educaçom se vende em pacotes de graus e post-graus, chamado Espanha. Esta afirmaçom, um pouco a frivolizar, é umha boa síntese do que aconteceu após o boicote na Faculdade de Económicas e Empresariais da USC à fascista e cúmplice da repressom María San Gil, presidenta do Partido Popular no País Basco. É este o território de umha naçom amiga, repartido administrativamente entre os Estados espanhol e francês, onde a resistência ao capitalismo e à espanholizaçom se paga com torturas, mortes, ou a prisom. Disto sabem muito os nossos e as nossas contemporáne@s; jovens, estudantes e/ou trabalhadores/as que, fazendo parte de organizaçons como a nossa, sofrem por terem nascido bascos e bascas e se reconhecerem como tais. Eis umha das fulcrais identificaçons que como internacionalistas fazemos entre nós, e as vítimas do capitalismo espanhol torturador e assassino. O que aconteceu no próprio boicote (gravaçons diversas mediante) por tod@s é sabido. Porque repararmos entom na popularidade; no fenómeno mediático? Porque, evitando seguir em paralelo o discurso exaltado e inquisidor sobre umha pretensa violência in crescendo entre um alunado carente de disciplina, falto de respeito aos maiores e consideraçom
Iago Barros Minhons
Nº 48. Abril, Maio e Junho de 2008
opiniom
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Fascistas de passeio polo mercado de títulos universitários
polos valores tradicionais, (discurso dos Cáncio, Cancelo, Barro, Barreiro, Blanco-Valdés, Lagares e demais chusma) devemos iludir a armadilha de cair num discurso que sobrevalorize a nossa acçom, os nossos métodos de luita, o grau de confronto com as autoridades universitárias, et cetera... Fazer o contrário impediria umha focagem realista dos factos, e favoreceria de resto entrarmos numha dinámica enganada e autocomplacente que também prejudicaria a correcta percepçom sobre aquilo que somos (AGIR, o estudantado independentista, o estudantado rebelde ou qualquer actor na universidade galega) e qual o papel que podemos jogar na actualidade nas universidades espanholas da Galiza. Enfim, todas e todos concordaremos que nom tivo grande mérito a praxe, digamo-lo assim, executada umha manhá de Fevereiro, em plena época de exames. Cousa diferente é parabenizar-se pola capacidade inesperada de mobilizaçom num dia complicado por diversos factores, contra a invasom da USC por parasitas fascistas, e a utilizaçom da mesma como palestra propagandística nas eleiçons espanholas de Março de 2008. Mas, daí a concluirmos que o Inverno “mais denso” da nossa história organizativa, após os anos da luita contra a LOU, veu dado polo grau de combatividade destes meses passados nas aulas, seria mentir largamente. Nada mais longe da realidade. A combatividade nas salas de aulas do País é, de facto, nula. O ambiente que se vive dentro das Faculdades é próprio de um conformismo burguês com centelhas de compromisso militante mui isoladas, concretas, e sempre marcadas polos ritmos que o ambiente abafante nos impom. Foi um fenómeno mediático desproporcionado, é certo. A história de umha Universidade como a compostelana permite-nos tirar de hemeroteca exemplos similares a esgalha, e compreender portanto a surpresa com que recebemos a excitadíssima reacçom que se sucedeu. Umha surpresa mitigada polo dever imediatamente assumido de aproveitar o efeito, pôr maos à obra, e lançar umha mensagem combativa de resposta e um exemplo militante no qual nos formamos ano após ano. Todo para semear o terreno. Já veremos se recolhemos boa colheita com o exercício que, mais bem do que mal, figemos.
A Universidade de mercado, umha feira capitalista
Meses após o “assunto San Gil”, basta lermos os jornais com ediçons locais para vermos novas breves e “cartas ao director” que tencionam manter viva a lembrança da “paixom” de San Gil na USC, mormente escritos com o propósito confesso e convicto de que se corte algumha cabeça entre o estudantado. Embora os ritmos da repressom espanhola podam tornar inoportunas quaisquer medidas drásticas a nível académico, nestas últimas semanas pudemos observar dous fenómenos que, um por acçom e um outro por omissom, demonstram o progressivo amoldamento da Universidade aos novos tempos. A Universidade do século XXI... é mais um conto. E sobre isto devemos reflectir. O primeiro exemplo é o do Reitor Senén Barro, “pai de família” da comunidade universitária da USC, físico de estudos e tecnocrata prototípico em exercício. Se analisarmos com algum rigor a sua conduta ao longo deste pe-
ríodo, nom custará concluir que: 1º) se moveu permanentemente ao compasso da decana e membro da extrema-direita espanhola Maite Cancelo, tornando um monicreque dos grupos de poder que o mantenhem em activo. O discurso de “condena que algo fica” de PP-PSOEBNG, os seus principais patrocinadores, foi assumido sem matizes. Apenas, e talvez por fortunas do destino, nom tenha respondido positivamente ao requerimento da decana de permitir que os antidistúrbios entrassem na Faculdade e, em conseqüência, arrasassem com todo. O qual sim teria sido um espectáculo doutra magnitude –provavelmente o que perseguia a decana; 2º) O mesmo dia dos factos, apenas transcorridas umhas horas desde que o cortejo de estudantes concentrad@s abandonássemos espancad@s a Faculdade de Económicas e Empresariais, demonstrou umha habilidade própria da sua posiçom, ao emitir as oportunas condenas, mostras de solidariedade, compaixom polas vítimas, e demais parafernália de “pompa y olé” sem nem saber de que é que se falava. Ele próprio reconheceu estar a par do acontecido... através das chamadas telefónicas insistentes da decana; 3º) Em nengum momento deu qualquer valor à versom dos e das estudantes; muito menos nos pediu ou deu a palavra; e nem por acaso mostrou qualquer indício de solidariedade com aqueles e aquelas que pagamos a matrícula no seu negócio e império particular todos os anos lectivos em troca de detençons e duras campanhas de assédio e criminalizaçom. Tampouco se interessou polos detidos, nem polo facto de estarem encausadas duas pessoas que nom participárom nos factos (duas pessoas estudantes da sua universidade (!!) e “inocentes” de todo “delito”), e tampouco reagiu perante a denúncia assinada por dous militantes de AGIR contra a acçom armada da polícia dentro dumha Faculdade. Lembremos ainda o uso de armas nom regulamentares, a introduçom das mesmas no interior da Faculdade, o recurso a polícias nom fardados para instaurar a “segurança” a ferro e fogo contra o estudantado concentrado, et cétera... 4º) Para que ninguém duvide da sua integridade de burocrata que acredita no que fai e fai o que acha que deve fazer, indivíduo de boa linhagem, atiça o lume a cada vez que consultado pola imprensa, e ainda um mês após os incidentes sentenciava com mao de ferro que “entre as medidas a adoptar após o processo judicial,
evidentemente está a expulsom” (sic). Todo um crack, macho de altos voos, nom se apouca... Quem fala de expulsar na USC... como quem fala de corrigir um exame. Um segundo exemplo do acomodamento de todos os sectores ao novo regime de universidade de empresa, empresa universitária ou títulos por dinheiro (como se quiger denominar), é o demolidor silêncio dos, noutra altura, representantes do sindicalismo estudantil nacional e de esquerda. A organizaçom maioritária a nível eleitoral, mediático e simbólico na USC (cousas da inércia), os CAF, filh@s dos mesmos nacionalistas que estreitavam a mao dos “batasunos” em tempos idos, nom tenhem aberto a boca em todo este tempo. Isto, apesar de terem participado no acto jovens pertencentes ao regionalismo galego adscrito à UPG-BNG. Nom é só covardia e conveniência eleitoralista –que também: sabe-se lá o dinheiro que pujo sobre a mesa a UPG para que os meios nom dessem saída a umha notícia que procuravam denodadamente, esta é, a implicaçom no boicote de membros filiad@s ao BNG. Cousas dos “novos tempos”. A tal ponto é correcta a crítica das esquerdas patriotas basca, galega e catalá, sobre o totalitarismo político e social no Estado, que os mesmos fenómenos de autoencerramento e bloqueio que se sucedem em estádios institucionais elevados dos poderes públicos –fenómenos como o bipartidarismo, a clausura de meios de informaçom alternativos, o esfarelamento das frentes de emancipaçom nacionais na estrutura do sistema, a ilegalizaçom de partidos políticos, tenhem um correlato noutras esferas, mesmo na própria esfera universitária ou, por extensom, estudantil. Aqui também, a dissidência nom se tolera, e os cachorros da pseudo-esquerda nacional fam parte do coro de cúmplices com a criminalizaçom. A saudade de aquelas e aqueles que nos achamos sós na luita tem que servir para a propagar, tomar referência entre os e as estudantes, e aprender da queda sistemática da esquerda ao foxo da comodidade e a crítica entre sofás de veludo. Ora, do mesmo jeito que certas dinámicas decadentes envolvem estádios etários, de origem de classe, de sexo, et cétera, diversos, cumpre tomarmos consciência de que a viragem desta situaçom no ámbito estudantil é inviável sem coesionarmos ao máximo movimentos políticos sólidos, em que a mútua con-
vivência e envolvimento das luitas sectoriais representa a interdependência sob a égide de um Povo Trabalhador Galego autoorganizado, conhecedor do seu papel histórico na luita pola emancipaçom de classe, nacional e de género, único caminho para que a educaçom no nosso país deixe de ser um instrumento de opressom contra a juventude, nomeadamente contra as mulheres, em contra do enriquecimento da nossa identidade individual; deixe de ser um instrumento de aniquilaçom de identidades colectivas e culturas; deixe de ser um instrumento de perpetuaçom do sistema de produçom capitalista que implique a assimilaçom do sistema educacional como correia de transmissom das relaçons sociais que inseminam a ignoráncia nas massas e fomentam as sub e contraculturas, nomeadamente entre a mocidade, meras ficçons de um conflito que encobrem e ajudam a ocultar. Entretanto, a Universidade progressa sobmetida à ditadura burguesa que a controla, numha deriva em que autonomia é sinónimo de corrupçom, futuro equivale a precariedade laboral e concorrência desumana, e ofertas de estudo significa hipóteca para umha vida.
Liçons da prática que fortalecem o futuro organizativo. A camaradagem revolucionária
Duas entradas acima, referia-me à nula contribuiçom nos métodos que AGIR fijo com o “assunto San Gil”, polo menos se nos referirmos aos métodos de luita. Mas, com independência da natureza mediática na origem desta situaçom, foi todo um mero espectáculo televisado? Ou será que devemos extrair também liçons da nossa própria prática? Acabase a militáncia nos 5 minutos de gravaçom da entrada e saída de umha fascista na nossa Universidade? É inegável a importáncia da camaradagem e da unidade organizativa em percursos áridos como este. A unidade interna, a coesom e a solidariedade activa d@s companheir@s, todo aquilo que sugere a palavra “camaradagem”, nom surgem da nada nem significa exactamente o que a ideologia dominante transmite: Nom som rostos sorridentes e reconhecimentos histéricos do que precisa umha organizaçom revolucionária e a sua militáncia represaliada em momentos críticos como o que vimos de percorrer. A camaradagem revolucionária é muito mais do que isso, e joga um papel basilar na identidade
do colectivo. Camaradagem é o que há antes de que se produza umha detençom, antes de que nos linchem em cada página de qualquer diário e/ou em cada segundo de umha tertúlia radiofónica. A experiência partilhada na luita e a formaçom no compromisso militante som dous traços materiais que vam determinar a nossa espontaneidade reactiva –rosto visível da camaradagem, quando o inimigo ataca. Estes traços som trabalhados com ímpeto no seio do MLNG, conscientes do valor que tenhem na coesom organizativa. Os laços intersubjectivos, o carinho dentro de umha organizaçom como a nossa, como AGIR, apenas (o qual nom é pouco) realçam a título pessoal e simbólico aquilo que só a seriedade e a determinaçom no combate ao capitalismo e a Espanha, só a experiência activista gerida assemblearmente, podem construir. Essa é a autêntica camaradagem. Umha conquista histórica da verdadeira esquerda revolucionária. Nom há camaradagem em qualquer colectivo. O seu aparecimento em forma espontánea ocorre como manifestaçom, exclusivamente ocasional, de um conflito entre acçom revolucionária e reacçom repressora do Estado que se gesta na quotidianeidade. No nosso caso, é um sintoma do madurecimento e vigor da mocidade galega militante da esquerda independentista, além de um evidente orgulho como membros de colectivos que respondem assim. Nengum experimento passional ou construçom verborreica de modelos organizativos mais acaídos ao presente, dos que tanto escuitamos falar no “ambiente universitário”, se encontra por trás de umha formaçom sólida na Escola Galega como é AGIR: única organizaçom de espírito revolucionário que intervém no ámbito estudantil galego. Um inimigo da burguesia espanhola, quer nas ruas, quer nas aulas, um autêntico inimigo, nom se destrói de um dia para outro com umha campanha agressiva a partir dos meios. E tampouco se constrói com desconhecidos contributos para a actividade militante de três fascinantes opinadores para consumo juvenil num século que o único de novo que tem é o número, e talvez a máscara. O verdadeiro inimigo só o construímos com o exemplo militante que, na Galiza, a esquerda independentista galega está a dar dia a dia. Cumpre analisarmos quais som, na prática, as derivas organizativas que se manifestam como efeito imediato detrás de pontos de inflexom na história de um colectivo. Pontos de inflexom como o vivido recentemente por AGIR. Sem esquecer a particular natureza de umha organizaçom estudantil, em permanente renovaçom subjectiva, e em constante flutuaçom por períodos históricos, há algo que manter para nom morrer: deve prevalecer a essência revolucionária que tanto trabalho custa adquirir, na formaçom teórica e prática, de umha mocidade estudantil comprometida com a emancipaçom nacional e social de género. Teoria e prática que vimos herdando de quem nos precedeu e que agora devemos legar a quem continuar na frente estudantil. Se nom for assim, e assumindo todos os erros que fam parte da nossa história, nunca teríamos chegado aqui, e nunca chegaremos a mais. Só fruto da camaradagem revolucionária é que podem abrolhar no futuro luitas mais intensas e reais do que este balom de ár, e prever sem a estúpida credibilidade e confiança de um beato que havemos de estar preparad@s para atacar, para digerir os erros, e para nos defendermos quando vinher outra maré como esta. É o que figemos nesta ocasiom. E nom muito mais aprendemos dela. Provavelmente nom seja pouco: acho que, definitivamente, ganhamos esta batalha. Iago Barros Minhons estuda Direito na USC e é membro do Conselho Nacional de AGIR
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Carlos Morais
Internacional
Os coentros da rebeldia também som condimentos imprescindíveis da Revoluçom
Sem perder a calma, com essa serenidade, discreçom, ternura e precisom que o caracterizavam, transmitiu há dous meses a camaradas e amizades a gravidade do seu estado de saúde. Nesses fulgurantes instantes de ansiedade e profunda tristeza, sem tempo a superarmos a natural comoçom que provoca umha notícia assim, constatamos novamente o que de forma permanente tinha demonstrado ao longo da sua dilatada vida. Francisco Martins Rodrigues era um ser excepcional, umha dessas pessoas que nom é habitual encontrarmos nos caminhos da vida, das que deixam umha pegada indelével. Sem desfalecer, com serenidade, discreçom, ternura e precisom, qualidades difíceis de achar neste mundo devorado polo stress, a aparência, a desconsideraçom e o barulho, embora consciente de nom poder mudar o curso dos acontecimentos, até o último fôlego combateu pola vida, seguindo com atençom as notícias, a nova PO, os debates. Assim foi, com dignidade e coragem, o Chico enfrentou a última viagem. Ao dia seguinte do seu falecimento em Lisboa, na madrugada do 22 de Abril, os meios de comunicaçom da burguesia –alguns deles dirigidos por medíocres canalhas carentes de pudor que se consideram “antigos camaradas”– vírom-se obrigados a noticiar que já nom estava connosco, mas obviamente figérom-no com ferocidade, sem respeitar a sua memória e integridade. O Chico já nom podia responder. Era necessário acertar contas contra a rebeldia que os desconcertava e irritava. Sabíamos que a imprensa burguesa, simples empresas de alienaçom de massas, carece de moral e de valores, que o seu único código de conduta é contribuir para deformar a realidade, para gerar mundos virtuais e multiplicar a acumulaçom de ganho dos seus donos. Embora nom fosse aconselhável ocultar a sua morte, como até o momento fijo a direcçom do PCP, devorada polo ressentimento, a infámia do negócio do espectáculo da desinformaçom optou por verter injuriantes falsidades e mentiras sobre umha das biografias mais limpas, genuínas e coerentes do melhor Portugal revolucionário do século XX. Sem pretendermos polemizar com renegados complexados, unicamente queremos manifestar o grave erro de apreciaçom e análise que cometem os Fernandes e Cia. O Chico Martins, contrariamente à definiçom que inundou jornais e outros meios, nom era um velho comunista. Que enganados estám! Francisco Martins Rodrigues combateu sem trégua o capitalismo desde que praticamente tivo possibilidades de o fazer. Assim foi durante longas e adversas décadas, sempre sem desfalecer, com tenacidade e inteligência. Fijo-o basicamente na segunda metade do século XX, mas os ideais que o movêrom a passar meia vida na clandestinidade a combater o fascismo, a resistir as torturas da PIDE, a nom perder o rumo nem o entusiasmo durante cinco detençons que somam doze longos anos nas masmorras da ditadura salazarista, fam parte do século que iniciamos. A constância a indicar-nos o caminho para atingir o mundo novo que contribuiu para desenhar, permitiu que nunca deixasse de ser um eterno jovem, carregado de futuro, um de esses horizontes aos quais recorrermos em momentos de dúvida e confusom. Os contributos teórico-práticos do Camarada Campos –nome de guerra empregado na clandestinidade– convertêrom-no na indispensável argila que se deve empregar para a emancipaçom das geraçons futuras de trabalhadoras e trabalhadores do Portugal do século XXI. Francisco Martins Rodrigues nom é um anacronismo do Portugal de Abril: é umha figura essencial nessa alvorada que dará passagem à cada vez mais necessária Revoluçom Socialista.
Um legado teórico-prático que devemos valorizar
Para avaliarmos com rigor e profundidade o legado teórico do Francisco Martins Rodrigues, é necessário recorrer à sua admirável biografia de combatente revolucionário comunista. Fijo parte dessa geraçom de homens e mulheres que já desde a década de quarenta investiu o melhor da sua juventude na luita contra o fascismo, umha das mais brutais formas de dominaçom que adopta o capitalismo. Obviamente, iniciou-se militando no PCP, a única força antifascista organizada que na altura combatia o Estado Novo com eficácia, entrega e capacidade. Foi no seu seio que aprendeu a pensar por ele próprio, onde descobriu a teoria marxista, o seu insuperável método dialéctico de análise, a integridade da sua escala de valores, a superioridade moral que move um/ha revolucionári@. Aqui foi onde onde se converteu no indomável rebelde que sempre foi, só vencido pola morte. Mas, contrariamente ao acrítico seguidismo aos ditados de Moscovo que promovia a direcçom cunhalista, e movido sempre polo abc do comunismo, por essa “arma secreta de ódio e desprezo polos poderosos, pola necessidade de os
combater sempre”, que lhe transmitiu o Chico Miguel –tal como magistralmente desvendou na sua última intervençom pública na festa do vigésimo segundo aniversário da revista Política Operária a 19 de Janeiro– tivo a coragem suficiente para questionar a estratégia política do levantamento nacional, da “unidade dos portugueses honrados”, essa mimética adaptaçom à realidade lusitana da doutrina soviética da coexistência pacífica convertida em dogma após o XX Congresso do PCUS de 1956. A madurez militante e intelectual permitia começar a dar as primeiras batalhas contra a capitulaçom revisionista que tinha penetrado até o cerne do partido, apoderando-se da sua natureza de organizaçom revolucionária. O Chico iniciava o desafio ao oportunismo reformista que Álvaro Cunhal tam bem disfarçava de marxismo original e criativo, sentando as bases para a recuperaçom do projecto revolucionário sem as deturpaçons impostas pola ortodoxia. Ainda assim, após ter participado na mítica fuga de Peniche a 3 de Janeiro de 1960, junto a outros dez destacados dirigentes do PCP, de manter heroicamente a estrutura clandestina comunista na margem sul do Tejo, passa a integrar a Comissom Executiva, máximo organismo de direcçom no interior do país, conformada por só três pessoas. O Chico assume mais responsabilidades, riscos e compromissos pola sua íntegra consciência comunista, mas contrariamente à lógica interna de um partido dogmático como o PCP nom renuncia a analisar a realidade sem depender das orientaçons emanadas de Moscovo. Seguindo as ensinanças leninistas, considera erróneo abandonar a insurreiçom popular armada, converter o proletáriado em simples massa de manobra da pequena burguesia republicana aplicando a linha centrista emanada da doutrina dimitroviana, manter umha posiçom ambígua a respeito da guerra colonial. Embora nom tenham eco as suas posiçons, nem tenha possibilidades de as transmitir ao conjunto de camaradas, o Chico nom desiste, nom se rende. Insiste em abrir debates, questionar umha linha geral que considera errónea. Mas o modelo e a concepçom organizativa do PCP –amparando-se nas difíceis condiçons de repressom– nom permitia exercitar a democracia socialista no seu seio. E tal como fijo ao longo da sua coerente trajectória militante, nom cede às pressons, tampouco às sedutoras ofertas, nem se deixa deslumbrar pola estadia de vários meses na URSS, que realiza em 1963. Cunhal nom admite os questionamentos e o Francisco Martins Rodrigues sabe que já nom é possível continuar no PCP mantendo umha coerente linha marxista revolucionária. Nom vacila! Com a coragem e a audácia que aprendeu de Marx e Lenine, opta por abandonar, promovendo a primeira organizaçom marxista que rompe com o reformismo do PCP. Assim nasce a FAP e o CMLP. Era necessário começar de novo. Aplicar às específicas condiçons de Portugal umha coerente estratégia revolucionária. Após visitar Pequim e Tirana para conhecer directamente as posiçons contrárias a Kruchev, podendo ter ficado comodamente em Moscovo ou Paris como fun-
cionário, o Chico opta polo mais difícil mas também polo mais honesto e coerente: enfrentar a repressom salazarista, entrar de novo em Portugal para reconstruir o comunismo revolucionário. Após uns meses na clandestinidade, em 1965 é capturado, torturado e condenado com já 38 anos a 19 anos de prisom. Transgessor dos dogmas, das verdades inquestionáveis, indomável e incorruptível é, perante as resistências de Spínola a assinar a amnistia, o último preso político a abandonar Peniche 27 de Abril de 1974. Já em liberdade, foi determinante na convergênca dos grupos maoistas que dérom lugar à criaçom da UDP em Dezembro de 1974, e à constituiçom do PCR aos poucos meses do contragolpe revolucionário do 25 de Novembro de 1975, que enterrou o PREC inaugurado no 25 de Abril. Mas o Chico, com essa sólida formaçom marxista, com um profundo conhecimento teórico, com umha dilatada experiência militante fraguada em adversas condiçons, voltou a demonstrar a sua enorme capacidade analítica. Consciente das limitaçons do maoismo, da degeneraçom do modelo chinês, da reproduçom no seio da UDP-PCR das piores deturpaçons do modelo de partido estalinista provocado polo contaminado ADN importado do autodenominado “movimento marxistaleninista”, da linha oportunista que se tinha imposto no seu seio polas parciais readaptaçons –mais retóricas que reais– das bases fundacionais bolcheviques, nega-se a renunciar aos objectivos estratégicos e aos princípios fundamentais do marxismo revolucionário. Novamente, opta por questionar de maneira implacável o presente, sem concessons nem falsas saídas que impossibilitassem compreender e solucionar as causas do estagnamento e do retrocesso. É necessário continuar na procura do antídoto. A magnífica experiência da derrotada Revoluçom de Abril em que tivo o privilégio de viver e intervir contribuiu para avançar e acelerar na segunda grande ruptura política com o marxismo estalinista, agora na versom da matriz sino-albanesa. Consciente das invisíveis limitaçons políticas geradas pola inexperiência, das dificiências teóricas, da superficial ruptura com o marxismo soviético virtualmente realizada pola entusiasta geraçom militante fascinada polo radicalismo que Mao exercia na juventude durante o confronto ideológico sino-soviético, questiona elementos fulcrais da linha política da UDP e do adulterado modelo albanês. Consciente que o proletariado é quem se tem que emancipar com as suas próprias forças, fugindo de qualquer forma de colaboraçom de classes, da necessidade de construir umha corrente comunista caracterizada por umha clara demarcaçom entre a linha operária e a pequeno-burguesa, da necessidade de empregar todas as formas de luita para tomar o poder, sem ceder ao “respeito supersticioso polo parlamento e pola ordem burguesa”, o Chico estuda em profundidade as teses do VII Congresso da Internacional Comunista que lhe tinham solicitado da direcçom. E as conclusons a que chega som contrárias às que pretendia o Diógenes Arruda para justificar a linha de moderaçom e aplicaçom do modelo frentepopulista. O Chico novamente nom comunga com rodas de moinho. Agora já nom é com as directrices de Moscovo, sim com as de Tirana via PCB. Como nom podia ser de outro jeito pola sua lucidez, profundo conhecimento das ferramentas proporcionadas polas leis da dialéctica materialista, pola capacidade analítica e capacidade crítica e autocrítica, nom só nom secunda as teses dimitrovianas, impulsiona um revulsivo que culmina no “Anti Dimitrov. 1935-1985 meio século de derrotas da Revolução”, com o posterior abandono da UDP em 1983. Mas, como bom marxista militante, como magnífico polemista armado desse sentido autocrítico da procura permanente do rigor analítico para a sua aplicaçom na intervençom política, era consciente das sombras que possuía esta reflexom sobre as origens da penetraçom do reformismo no movimento comunista internacional. Por este motivo, afirmava que, coincindo no essencial nos dias de hoje com o seu ensaio, mudaria alguns argumentos e apreciaçons sobre a etapa estalinista. Assim era o Chico!! Inconformista, procurando sempre o caminho certo, pois “nom nos deve impressionar a acusaçom de “sectarismo” que os reformistas nos lançam, nem a impaciência dos militantes que nom se resignam a um trabalho apagado e querem resultados palpáveis em pouco tempo”.
O projecto estratégico da Política Operária
Mas, novamente, contrariamente ao que teria feito a maioria, nom desiste, nom abandona, nom se rende. Prossegue, com a bússula que o Lenine e o Chico Miguel lhe tinham mostrado, o caminho de construir a ferramenta defensiva e ofensiva que necessita a classe operária. Assim nasce a Política Operária em
LIVROS Narciso Isa Conde En el Siglo XXI, ¿Cuál democracia? ¿Cuál Socialismo? Santo Domingo, Escuela Política “Orlando Martínez”, 2006. 223 páginas A recente visita de Narciso Isa Conde ao nosso país, no quadro das XII Jornadas Independentistas Galegas, permitiu-nos conhecer a figura e o pensamento deste revolucionário dominicano, assim como umha melhor compreensom da situaçom política e da esquerda tanto na República Dominicana como no contexto caribenho e latino-americano. Para aprofundar mais neste conhecimento, temos este livro do “Secre” (como é conhecido no seu país), em que traceja algumhas das características desse “socialismo do século XXI” popularizado por Hugo Chávez a partir da Venezuela bolivariana, e também dos caminhos que as esquerdas revolucionárias latino-americanas poderiam seguir para atingir este objectivo. Fala-nos Isa Conde de como a revoluçom recuperou actualidade na América Latina, após o evidente fracasso do neoliberalismo imposto polo império do Norte e com o surgimento de processos como o venezuelano, a resistência de Cuba ou a continuidade da insurgência guerrilheira colombiana, sem ocultar as carências e perigos destas e outras experiências actuais. Para o autor, membro da Coordenadora Continental Bolivariana, é vital a articulaçom de todos os processos emancipadores do continente, recuperando o internacionalismo para construir a Pátria Grande sonhada pol@s revolucionári@s latino-american@s desde Simón Bolívar, atingindo a “segunda independência” superadora da independência formal actual herdada do século XIX e sob a tutela ianque. Um internacionalismo necessário para fazer face ao imperialismo já que umha revoluçom isolada tem poucas possibilidades de vencer. Também remarca a necessidade de um socialismo superador dos fracasados processos do século XX, com umha profunda participaçom popular e integrador de todas as luitas emancipadoras. Mas, para chegar a esse novo socialismo, Isa Conde defende a necessidade de criar novos modelos de vanguarda e também processos de acumulaçom de forças na linha chavista de defesa da soberania nacional, democratizaçom e alternativas ao neoliberalismo. Um bom achegamento, polo tanto, aos debates e propostas actuais da esquerda no continente da esperança. (Anjo Torres Cortiço)
Vários Autores. Cuba: A transição Dinossauro edições, 2008. 127 páginas @s nossas camaradas portugues@s da Dinossauro apresentam-nos, em forma de livro de bolso, umha muito interessante colectánea de artigos à volta da situaçom actual do processo revolucionário em Cuba. Seis som os textos recolhidos, da autoria de Janette Habel, James Petras, Robim Eastman-Abaya, Narciso Isa Conde, Guillermo Almeyra e Heinz Dieterich. Intelectuais todos eles de reconhecido prestígio na esquerda mundial, e conhecidos polo seu decidido apoio à luita da Revoluçom Cubana no seu confronto contra o imperialismo ianque e na construçom do socialismo. É precisamente o currículo destas pessoas o que obriga a prestar umha especial atençom a este pequeno livro, já que nom se trata de mais umha louvança da Revoluçom Cubana escrita com umha vontade meramente laudatória; mas de umha aproximaçom crítica ao estado em que se encontra a revoluçom neste momento, pondo umha especial atençom nos seus défices. Os artigos que integram esta obra fôrom aparecendo em diversos meios, muitos deles electrónicos, nos últimos anos e, em boa medida, tenhem a sua origem nas intervençons de Fidel na Universidade de Havana em 2005 e de Raul Castro no 26 de Julho de 2007. Discursos em que os máximos dirigentes da Revoluçom Cubana advertírom sobre os reptos e riscos que se enxergam no futuro, fazendo umha especial ênfase na possibilidade de umha involuçom derivada das deficiências e debilidades internas da sociedade cubana. Trata-se pois de um livro “crítico” com Cuba, mas nom ao estilo das críticas que estamos habituad@s a ler na imprensa imperialista. As diferentes autoras e autores apresentam as suas analises à volta de problemas sociais, económicos, culturais e mesmo políticos; mas num sentido totalmente divergente com aquele que podemos ler nas páginas onde escrevem os propagandistas do capital. Aqui nom depararemos com os tópicos conhecidos da suposta violaçom constante dos direitos humanos pola “tirania castrista”, nem demandas de liberalizaçom económica; muito ao contrário, o objectivo de quem escreve estes artigos é chamar a atençom sobre aqueles aspectos críticos que podem derivar numha queda da via de avanço em direcçom o socialismo. Neste caso, as preocupaçons polos défices democráticos ou pola orientaçom da política económica em Cuba tenhem um sentido radicalmente oposto ao que estamos habituados a ouvir. Porém, nom deixa de ser sintomático que nengum dos autores seja cubano e que, até o momento, as únicas críticas aos défices da revoluçom, conhecidas publicamente fora da ilha, saíram da boca dos máximos dirigentes da revoluçom. É evidente que no momento actual Cuba passa por um momento de especial delicadeza, justo quando se estám a superar os efeitos mais nocivos da crise derivada da implosom do sistema soviético e a geraçom que participou directamente da revoluçom no 1959 começa a desaparecer. É lógico que a partir da esquerda revolucionária a nível mundial e continental se preste umha maior atençom ao que se passa em Cuba, nomeadamente quando a luita anti-imperialista na América latina passa por um momento álgido. (André Seoane Antelo)
Christophe Charle e Charles Soulié (coordenadores) Les ravages de la “modernisation” universitaire Éditions Syllepse, Paris, 2008, 292 páginas O que se nos vende como unha Convergência Europeia em Educaçom Superior e umha revoluçom educativa em resposta às novas demandas sociais é na realidade umha subordinaçom da Universidade em conteúdos e formas às empresas cada vez mais anárquicas e ligadas à especulaçom bolsista. Trata-se ainda de criar trabalhadores e, muito importante, um exército de bolseiros ao serviço dessas mesmas empresas. E toda umha linguagem pedagógica mascara tal mercantilizaçom e acaba por apresentá-la como progresso, orientaçom ao trabalho, flexibilidade, transversalidade, mobilidade, criatividade, iniciativa e busca de horizontes abertos, de inusitadas oportunidades. Tenta-se reduzir o tempo e os conteúdos das licenciaturas para as complementar com estudos de pós-grau que agrandam os caminhos da privatizaçom. Os professores mudan-se en assessores, aplicam-se receituários de empresas, as palavras ‘rendibilidade’ e ‘hierarquizaçom’ estám na moda, abre,-se vieiros à precarizaçom de ensinantes e investigadores, vira-se a tábua dos valores académicos e som cada vez menos os professores que acreditam no papel crítico do saber. E o espelho no que se olha tal reforma é o modelo privado dos EUA. Este processo de Bolonha torna a juntar homens políticos de tendências, polo menos em aparência, opostas e um reduzido número de universitários que lhe estám a tirar partido. Este livro é umha denúncia que, entre outros assuntos, deita luz sobre a controversa economia do conhecimento e o management público; explicita o risco de umha falsa soluçom no Estado espanhol; apresenta a dialéctica da Universidade Italiana entre mercado, formaçoçs profissionais e poder político; assinala a retórica de autonomia e o bloqueio do sistema en Alemanha; indica a encruzilhada em Inglaterra de vontade política e lógica económica; mostra os paradoxos e os grandes problemas na Universidade Grega; avisa do abandono dos estudos universitários em França e o inserimento profissional dos estudantes; examina a liberalizaçom do Ensino Superior no Japom; etc, etc. 14 especialistas de diferentes países fam umha leitura nada complacente de um futuro que parece inevitável, e nom só na Europa. Como en tantos outros campos, cumpre afastar-se do fatalismo que nos paralisa e ver como fazer frente a umha reforma que para nada toma em consideraçom o que pensam os alunos, os mestres e a sociedade que nom se presta a cair nas gadoupas da unidimensionalidade que denunciava há mais de quarenta anos Herbert Marcuse. (Domingos Antom Garcia Fernandes)
WEB Cátedra Ché Guevara. Colectivo Amauta www.amauta.lahaine.org O Colectivo Amauta, gestor desta página web, é um grupo de activistas do movimento popular argentino que centra o seu trabalho na difusom e a elaboraçom de teoria revolucionária.
Assim, este web é mais umha ferramenta de onde difundir e facilitar o acesso a materiais teóricos, tanto clássicos como de nova fornada, úteis para a acçom revolucionária guiada polo marxismo. O site fornece umha multitude de textos, dentre os quais desta-
camos, por tratar questons desconhecidas ou pouco conhecidas no contexto europeu, aqueles que abordam analises à volta do marxismo de matriz latino-americana. Nom por acaso o Colectivo Amauta fai umha reivindicaçom explícita do mariateguismo e o guevarismo.
Nº 48. Abril, Maio e Junho de 2008
1984. “O partido comunista, corpo estranho na sociedade burguesa que pretende derrocar, sofre umha tremenda pressom da parte desta para ser digerido e destruído: pressom policial e militar quando necessário, mas também política e ideológica, na actividade legal de todos os dias. Pressom que provém nom apenas do aparelho de poder burguês mas também das camadas pequeno-burguesas contíguas ao proletariado e das flutuaçons no seio do próprio proletariado, hoje em grande medida desarticulado e desmoralizado polas derrotas que tem sofrido”. A Política Operária dirigida polo Chico é umha revista teórica de grande qualidade, a partir da qual analisou e prognosticou as contínuas mudanças da sociedade portuguesa das duas últimas décadas, mas também os fenómenos e a conjuntura internacional, sempre sob um único objectivo: armar ideologicamente a classe obreira e assim contribuir para promover a Revoluçom socialista indispensável para atingir a sua emancipaçom. Nom é, nem nunca tivo essa concepçom inofensiva caractrística do marxismo académico. Desde as suas origens, tem a vocaçom de ser o germe do partido comunista revolucionário. Ainda nom foi possível atingir este objectivo porque todas as cousas som pequenas quando começam. Contrariamente ao que figérom os grandes partidos “comunistas” oficiais de meio mundo, mas também prestigiosas organizaçons revolucionárias com apoio social, a queda da URSS e do socialismo realmente inexistente nom surpreendeu o Chico nem a PO. A acertada caracterizaçom do modelo imperante, esse “estado operário burocraticamente degenerado”, permitia prever e compreender com suficiente anterioridade que irremediavelmente estava condenado a abalar e desaparecer. Era mera questom de tempo. Tampouco o actual modelo misto de capitalismo de estado e economia de mercado sem mais regras que as que impom a lógica neoliberal, em que derivou a China, podia ser alternativa algumha. O integral questionamento do delirante regime albanês tinha contribuido já três lustros antes para a ruptura com o PCR. O Chico acompanha e denuncia sem concessons a procura de terceiras vias –“o trabalho comunista entre as massas requer muito esforço e brilha pouco”– a ofensiva global do imperialismo contra as massas oprimidas e empobrecidas, contra os povos, o discurso do pensamento único, a imposiçom pola força do neoliberalismo e da globalizaçom. E como brilhante marxista que era, sem renunciar aos princípios e aplicando o pensamento dialéctico, comprendeu as profundas mudanças operadas na luita de classes, os novos fenómenos que nem Marx nem Lenine prevêrom ou aos quais nom dérom atençom suficiente. Isto permitiu que, procedendo de umha área político-ideológica impermeável a qualquer discurso incómodo ou de difícil acomodo com o economicismo, mas que paulatinamente foi superando, tenha permitido realizar com enorme coragem um percurso tam genuíno e original. A partir de claras coordenadas anticapitalistas e anti-imperialistas, foi capaz de incorporar à arquitectura teórico-pratica da PO o conjunto de rebeldias geradas polo capitalismo ao património teórico-prático de que, sem lugar a dúvidas, é alicerce insubstituível do comunismo revolucionário português. A PO, nestes quinze anos, demonstrou a enorme capacidade para compreender que o antagonismo da contradiçom Capital-Trabalho é o cerne da luita contra a dominaçom, a exploraçom e a opresssom, mas sem se deixar tingir polas cores das diversas rebeldias específicas geradas polo modo de produçom capitalista, ou simbiotizadas por este, nom é possível avançar na reconstruçom e desenvolvimento do comunismo do século XXI. A específica opressom da mulher, o internacionalismo militante, a plena liberdade e direito à independência dos povos, a defesa do meio-ambiente e combate à destruiçom da natureza, a superaçom do poder adulto exercido sobre a geraçons jovens, a libertaçom sexual, a denúncia de toda forma de autoritarismo e defesa do permanente exercício da autodeterminaçom, quer queiramos, quer nom, atravessam transversalmente a luita de classes. Nom se reduzem nem se simplificam ao discurso e à reflexom da contradiçom principal emanada dos manuais soviéticos que posteriormente reproducírom diversas correntes da esquerda revolucionária. Igual que desde criança sabia que sem o aroma dos coentros nom é possível elaborar a magnífica gastronomia do seu Alentejo, o Chico soubo compreender com mestria que sem o lilás da luita feminista contra o machismo e o patriarcado, sem o arco iris da libertaçom sexual, sem as cores das bandeiras negadas das naçons e povos oprimidos, sem a simbologia da rebeldia juvenil, do antiautoritarismo, sem o verde ecologista, a bandeira vermelha de libertaçom integral está orfa e incompleta. Porque na Revoluçom Socialista confluem as luitas parciais e só ela pode dar soluçom plena e satisfatória às reivindicaçons parciais negadas, desconsideradas polas experiências revolucionárias do século XXI e XX. Esta imensa capacidade para se libertar dos espartilhos, dos anacronismos, da anorexia e comodidade ideológica de boa parte da esquerda, essa insaciável curiosidade e firme decisom para explorar novos caminhos sem perder nunca o objectivo estratégico de superar a propriedade privada, foi o que permitiu que o proletariado português posterior à crise revolucionária do 25 de Abril, que tam lucidamente soubo interpretar e explicar, tenha contado no seu seio com um militante tam destacado e difícil de substituir. Como bom conversador gostava de ouvir e de perguntar. Com umha voz suave e um tom sereno era umha pessoa dialogante, mas nunca desfaleceu na hora de questionar com intransigência toda forma de desigualdade e injustiça. Era conciliador e respeitoso com a diversidade e o pluralismo ideológico d@s que combatemos o capitalismo, permeável e aberto com os excluídos, audaz frente às inércias e o conservadorismo; mas também era dos que nom toleram enganos e tretas na hora de justificar com discursos moles e edulcorados a dominaçom capitalista. “Claro que a participaçom nas eleiçons pode ser necessária, mas numha condiçom: termos a certeza de que vamos utilizar as instituiçons burguesas e nom deixar-nos utilizar por elas”. Tinha esse dom para lograr que dúzias de jovens aos quais podia superar em mais de seis décadas seguissem com atençom e fascinaçom as suas opinions de veterano combatente que nem capitulava nem renunciava a tomar o céu por assalto. O Chico era dessas pessoas que continuamente nom deixa de surpreender. A sua ruptura com os dogmas e os fetiches do passado, a permanente adequaçom teórica às mudanças do presente foi o que permitiu evoluir a partir desse refractário marxismo característico das potências imperialistas, permanentemente contaminado polo chauvinismo, a compreender a justeza da luita de libertaçom dos povos oprimidos europeus. Isto foi o que converteu –inclusive superando incompreensons e contradiçons na sua própria corrente– o Francisco Martins Rodrigues no melhor amigo da causa nacional galega em Portugal, no permanente embaixador da independência da Galiza.
A melhor homenagem é proseguir a inacabada obra que iniciou
Hoje é um dia de combate contra o Capital, mas também de imensa alegria e orgulho de pertencer a esta classe, de satisfacçom colectiva e afirmaçom comunista. Mas este 1º de Maio é também de enorme tristeza porque, após 34 anos consecutivos, o Chico nom desfilou nas ruas de Lisboa. O seu corpo lamentavelmente nom está connosco. Mas sim o seu legado, o seu entusiasmo, a sua vitalidade, a suas contribuiçons para o sucesso da Revoluçom portuguesa e internacional. Errou no discurso com que finalizava a intervençom na última festa da PO ao afirmar que “podemos ainda ser poucos e fracos. Mas as tempestades que aí venhem vam-nos obrigar a ser muitos e muitas. O partido que dizem que já passou de moda -nom o partido-empresa, nom o partido-administraçom, nom o partidonegócio, mas o partido d@s revolucionári@s, esse há de voltar. Porque é preciso acabar com o pesadelo e começarmos a viver como seres humanos”. Errou pola sua modéstia ao desconsiderar na sua análise a importáncia da sua obra, o imenso capital teórico concentrado e acumulado na PO na hora de contribuir para reconstruir o partido comunista revolucionário nesta singular e específica luita de classes chamada Portugal. A melhor homenagem que se lhe pode tributar é continuar avante como projecto revolucionário a que consagrou inteiramente a sua vida. Está na hora de recuperar, centralizar, ordenar e publicar as suas reflexons, mas também de evitar o menor sintoma de desmoralizaçom e dispersom que provoca a sua grande ausência. A sua memória nom deve ficar encerrada só entre @s que fomos afortunad@s de compartilhar momentos e combates com um militante comunista da sua dimensom e capacidade, entre quem tivemos o imenso orgulho de o conhecer, de compartilhar com ele as alegrias e insatisfaçons da luita por esse novo mundo. É preciso difundir o legado que nos deixou e a melhor maneira é polo único caminho em que sempre apostou: a luita organizada comunista. Nom queria finalizar estas breves reflexons de homenagem da Galiza rebelde e combativa que tem umha dívida impagável com o Chico sem umha confessom. Nunca tivem, nunca tivemos oportunidade de lho podermos dizer pessoalmente. Agora reconheço que estou arrependido. Mas por pudor, por um respeito mal entedido, embora em mais de umha ocasiom estivesse a ponto de o fazer, nunca fum capaz de transmitir que sempre gostei e admirei muito o mestre, o companheiro, o amigo, o irmao, o camarada Chico Martins Rodrigues. Carlos Morais é Secretário-Geral de Primeira Linha
internacional
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Francisco Martins Rodrigues in memoriam Nom por esperada, a notícia do falecimento do nosso camarada português, Francisco Martins Rodrigues, deixa de entristecer as comunistas e os comunistas galegos. Umha delegaçom do Comité Central já se tinha deslocado a 6 de Abril a Lisboa para homenagear e agradecer umha vez mais os contributos do Chico Martins na difusom e defesa da causa nacional da Galiza em Portugal. Memória viva do heróico movimento revolucionário português, luitador incansável e insubornável da causa proletária, com ele Portugal perde um dos grandes combatentes pola revoluçom e a Galiza um amigo solidário da nossa independência nacional e o socialismo. Em 23 de Abril, umha delegaçom de Primeira Linha assistiu ao sepélio realizado no cemitério lisboeta do Alto de São João. A seguir, reproduzimos o comunicado enviado polo Comité Central do nosso partido aos camaradas e às camaradas do colectivo comunista português Política Operária, assim como o artigo dedicado por Carlos Morais, quem participou 1º de Maio em Lisboa na homenagem em lembrança do Chico Martins realizada nos locais da Associação Abril em Maio, no Regueirão dos Anjos. Após a projecçom de umha entrevista realizada por António Louçã
e emitida há uns anos pola RTP, Ana Barradas abriu e apresentou a emocionante sessom evocativa de Francisco Martins Rodrigues, na qual intervinhérom a historiadora especialista na resistência antifascista Paula Godinho, o jornalista e militante revolucionário António Louçã, o secretário-geral de Primeira Linha, Carlos Morais, o redactor da Política Operária António Barata, e um dos filhos do homenageado, Pedro Martins. A sessom de homenagem contava com umha exposiçom de fotografias, cartas, trabalhos prisionais e artigos, muitos deles inéditos. Também se recolhiam alguns comunicados de condolência e homenagem ao grande revolucionário comunista provenientes da Catalunha (Endavant e MDT), Galiza (AGIR, NÓS-UP e Primeira Linha), País Basco (Batasuna), Estado francês (Lutte Ouvrière), Brasil, etc; assim como de organizaçons e movimentos sociais portugueses. Tal como comunicou Ana Barradas ao início da sessom de homenagem, na actualidade está a trabalhar-se na compilaçom, selecçom e catalogaçom dos contributos teóricos de Francisco Martins Rodrigues, para a posterior publicaçom dos mesmos. A Abrente Editora colabora com as Edições Dinossauro nesta iniciativa para difundir a obra do grande teórico e militante marxista.
Cravos vermelhos choram lágrimas de dor Faleceu Francisco Martins Rodrigues Com enorme tristeza e consternaçom, recebemos a esperada notícia. Às duas da madrugada do dia 22 de Abril, acompanhado de familiares e camaradas, falecia em Lisboa o revolucionário comunista português Francisco Martins Rodrigues. O Comité Central de Primeira Linha quer manifestar o seu profundo pesar pola morte deste excepcional militante da liberdade e da causa operária, transmitindo a familiares e amig@s do Chico, com destaque para os e as camaradas da Política Operária, as nossas mais sinceras
condolências pola sua morte. Com o falecimento do Chico Martins, a Galiza perde um dos melhores amigos da luita nacional do povo galego em Portugal, e a classe operária portuguesa um dos seus maiores e insubornáveis defensores. A sua coerente trajectória de toda umha dilatada vida consagrada aos ideais da emancipaçom humana é todo um exemplo para as novas geraçons de combatentes no país irmao, mas também para @s revolucionári@s galeg@s que tivemos o orgulho e o imenso prazer de o conhecer, de o tratar e aprender da sua imensa lucidez, capacidade analítica e humildade revolucionária. No passado dia 6 de Abril, umha delegaçom do nosso partido visitou o Chico em Lisboa, compartilhando com ele momentos de camaradagem e reconhecimento polo profundo respeito, amizade e solidariedade com que sempre tratou a luita de libertaçom nacional e social de género do povo trabalhador galego. Nesse momento, sabíamos que estávamos a despedir-nos de um formidável amigo e camarada que livrava com tranquilidade e coragem a sua última batalha, contra a morte e pola vida. Por este motivo, no sábado 12 de Abril, Francisco Martins Rodrigues foi homenageado nas XII Jornadas Independentistas Galegas, nas quais participou em 2002, 2004 e 2006. Nesta ocasiom, o grave estado de saúde impossibilitou a sua prevista intervençom no programa que tínhamos desenhado. Na nossa retina colectiva, sempre lembaremos o Chico manifestando-se no 25 de Julho pola ruas de Compostela em prol da liberdade da nossa naçom, o Francisco Martins Rodrigues intervindo nos actos políticos de NÓS-Unidade Popular, nas Jornadas Independentistas Galegas, nos actos internos, nas festas e sessons políticas da PO em Lisboa, com a sua serenidade e rigorosidade, com as suas agudas e acertadas opinions, em definitivo, com a arma secreta da vitalidade juvenil com que até o seu derradeiro fôlego combateu o capitalismo e sonhou por um novo mundo. Umha imensa gratitude para o embaixador da esquerda independentista galega em Portugal, para um de esses velhos bois imprescindíveis para arar o porvir. Obrigado por nos ensinar o caminho para lograrmos ser revolucionári@s, o degrau mais elevado da espécie humana que acertadamente definiu o Che no seu Diário da Bolívia; polos contributos teóricos no combate ao reformismo e oportunismo, por nos ensinar o orgulho de sermos comunistas; por nom desfalecer após doze anos de prisom; polos longos anos de clandestinidade; por nom ceder nos princípios irrenunciáveis do marxismo revolucionário neste mundo de buscadores de ouro; em definitivo, por ter consagrado a vida à Revoluçom. A dívida que temos contigo nunca poderá ser paga. Até sempre camarada! Comité Central de Primeira Linha Galiza, 22 de Abril de 2008
Edita: Primeira Linha. Redacçom: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Telefone: 616 868 589 / www.primeiralinha.org Conselho de Redacçom: Comité Central de Primeira Linha. Fotografia: Arquivo Abrente. Correcçom lingüística: Galizaemgalego. Maqueta: ocumodeseño. Imprime: Litonor S.A.L. Encerramento da ediçom: 25 de Maio de 2008 Correspondência: Rua Costa do Vedor 47, rés-do-chao. 15703 Compostela. Galiza. Correios electrónicos: sgprimeiralinha@primeiralinha.org / primeiralinha@primeiralinha.org / Tiragem: 3.000 exemplares. Distribuiçom gratuíta. Permite-se a reproduçom total ou parcial dos artigos sempre que se citar a fonte. Abrente nom partilha necessariamente a opiniom dos artigos assinados. Impresso em papel reciclado. Depósito Legal: C-901-1997
Concluírom XII Jornadas Independentistas Galegas
Reafirmada vigência dos princípios revolucionários marxistas Sessom da tarde: Argentina e Euskal Herria
As décimas segundas Jornadas Independentistas Galegas fôrom clausuradas a última hora da tarde do sábado 12 de Abril. O Socialismo do século XXI foi analisado e debatido em Compostela no forum marxista anual e monográfico de debate que, de maneira inenterrupta, o nosso partido vem realizando desde 1997. Narciso Isa Conde, Néstor Kohan, Iñaki Gil de San Vicente e Elena Martínez Canals abordárom a análise do projecto revolucionário socialista deste novo século, reafirmando a vigência e a actualidade dos princípios fundacionais marxistas e do pensamento das principais figuras da história do movimento obreiro e popular internacional.
Néstor Kohan apresentou umha tese que iniciou abordando a história e os traços actuais do neoliberalismo capitalista. Seguidamente, insistiu na vital importáncia do debate teórico, nom apenas à volta da imprescindível tomada do poder polo movimento popular, como também sobre a construçom desse novo poder, descartando teorias pós-modernas como as defendidas por Toni Negri ou John Holloway. Iñaki Gil de San Vicente realizou umha pormenorizada exposiçom sobre a situaçom global do capitalismo, sobre a profundidade da crise que enfrenta e as perspectivas para os países dependentes do centro capitalista como pontas de lança do movimento revolucionário no continente europeu, a partir da perspectiva da luita basca pola independência e o socialismo. Ambas sessons finalizárom com intervençons e debate de companheir@s presentes entre o público, adscritos a diferentes correntes da esquerda galega.
Francisco Martins e Raúl Reyes homenageados na sessom matutina
As Jornadas fôrom inauguradas polo secretario-geral de Primeira Linha, que iniciou a apresentaçom do evento referindo-se a ediçom do ano passado, dedicada a analisar e reflectir sobre “quem sem lugar a dúvidas representa um dos referentes do socialismo do século XXI”, em referência ao Che Guevara. Posteriormente, antes de passar a apresentar o dirigente revolucionário dominicano Narciso Isa Conde e a militante do Partido Comunista Cubano Elena Martínez Canals, Carlos Morais lembrou o veterano camarada comunista português Francisco Martins Rodrigues, velho amigo da causa da liberdade da Galiza, participante em três ediçons anteriores das Jornadas Independentistas Galegas, as de 2002, 2004 e 2006, que na altura luitava contra umha grave doença “impossibilitando que nos poda acompanhar com as suas lúcidas contribuiçons de veterano mestre na arte da Revoluçom”. Pola primeira vez em doze anos de Jornadas Independentistas Galegas, com a sala em pé e um cálido e sentido aplauso de reconhecimento e admiraçom, Primeira Linha dedicou o encontro a “um combatente por essa sociedade sem exploraçom, por um novo mundo sem dominaçom, onde os povos sejamos livres e unicamente concorramos por ver quem se aproxima mais da felicidade”. Carlos Morais transmitiu, em nome das comunistas e os comunistas galeg@s, o mais sentido pesar pola morte do dirigente e resto de militantes revolucionári@s das FARCEP, vilmente assassinados polo governo narcoterrorista de Álvaro Uribe com o apoio do imperialismo norte-americano. Simultaneamente às palavras de lembrança e homenagem ao comandante Raúl Reyes, foi situado o seu retrato na mesa, entre a ovaçom do numeroso público presente na sala.
Intensa agenda de Narciso Isa Conde
@s participantes nas XII Jornadas Independentistas Galegas concluírom a visita à Galiza com diversos actos públicos em universidades, locais sindicais e centros sociais, entrevistas a meios de comunicaçom, assim como dirigindo seminários e assistindo a reunions de carácter interno. Narciso Isa Conde foi o último a abandonar a Europa, participando na quinta-feira 17 de Abril no seu último acto público: umha palestra na sede da CIG em Ferrol. Previamente interviu no Clube Internacional de Imprensa, em Compostela, onde manifestou a sua explícita solidariedade com o projecto independentista galego, solicitando a retirada da bandeira espanhola do estrado donde dirigiu as suas palavras ao público presente. Na noite do mesmo dia 16, Narciso participou numha entrevista no programa ‘Aqui já é noite’, da Rádio Galega, onde expujo o ideário revolucionário bolivariano e a existência de umha onda de luitas de carácter continental na América Latina, que deve contar com a solidariedade internacionalista do povo galego. Na terça 15, participou em Vigo na conferência de imprensa de apresentaçom do colectivo de imigrantes dominicanos para posteriormente realizar umha visita guiada polos locais da CIG. A sessom do dia finalizou com um acto público no centro social Baiuca Vermelha de Ponte Areias. No dia anterior, 14 de Abril, Isa Conde interveu na Corunha num acto público organizado conjuntamente por BRIGA e AGIR, dando a conhecer o projecto libertador da insurgência colombiana e a necessidade da solidariedade internacionalista para fazer frente à estigmatizaçom que padecem as FARC-EP pola manipulaçom mediática a que se vê submetida polas grandes agências de (des)informaçom.
Intervençom cubana e dominicana
Elena Martínez Canals, do Partido Comunista de Cuba, apresentou a situaçom do seu país e as contribuiçons da experiência cubana para a causa anti-imperialista e para a revoluçom internacional. A sua intervençom foi centrada em explicar a heróica resistência e exemplo aos povos do mundo que durante décadas, basicamente nos piores anos do “período especial” posteriores à queda do muro de Berlim, tem sido capaz de manter o povo cubano. O histórico dirigente comunista dominicano Narciso Isa Conde realizou umha exposiçom de grande profundidade teórica sobre a crise do socialismo ‘irreal’ derrotado a finais
Actos de Néstor Kohan e Elena Martínez Canals
do século passado, e sobre a onda de revolta popular que se estende polo continente americano, incidindo na necessidade de dar forma orgánica e internacional ao movimento antiimperialista, situando o objectivo revolucionário socialista no horizonte continental. Narciso Isa Conde expujo também a experiência da Coordenadora Continental Bolivariana como exemplo da cons-
truçom de um espaço internacional para a confluência e a coordenaçom das luitas. À sessom matutina assistiu Miriam Arestuche, em representaçom do consulado de Cuba na Galiza, desculpando a ausência do cônsul, por doença. Também participou o cônsul da República Bolivariana da Venezuela na Galiza, Pedro Ugueto Rosario.
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O teórico marxista argentino participou em Vigo na tarde do 14 de Abril num acto organizado pola CIG sobre a vigência do pensamento de Che Guevara. Durante a manhá, tinha sido recebido por umha delegaçom da central que lhe mostrou as instalaçons sindicais. Já na terça-feira 15, Elena Martínez Canals falou num acto público sobre os reptos e perspectivas da Revoluçom Cubana. Foi na Faculdade de Geografia, Arte e História de Compostela, com importante assistência de jovens.