Politica Operaria 124

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Fundador: Francisco Martins Rodrigues

MARÇO / ABRIL 2010 Nº 124

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IRAQUE Democratizar à bomba É a vida… No nosso país, volta, não volta geram-se estranhas unanimidades. As mais recentes vieram com a crise. De repente, descobriram que os especuladores financeiros são uns malandros, os offshores abomináveis, o neoliberalismo a causa de todas as desgraças por que a humanidade está a passar e, mais recentemente, que os salários e prémios dos gestores das empresas públicas são imorais. Comentadores, fazedores de opinião, associações patronais, grandes e pequenos patrões, banqueiros, políticos, governantes, gestores, que ainda há menos de dois anos defendiam com unhas e dentes o que condenam agora, escandalizam-se com os ganhos milionários dos gestores públicos, que num só dia auferem, cada um deles, milhares de salários mínimos anuais. Como se pode pedir sacrifícios aos trabalhadores se aqueles que dispõem do poder de decidir dos seus ganhos se fazem pagar principescamente? — moralizam. Ao ponto de os visados, à defesa, hipocritamente dizerem que sim, mas que a culpa não é deles, apenas se limitam a receber aquilo que determinam as comissões de vencimentos e as assembleias de accionistas. O governo, por seu lado, diz que vai propor a redução das remunerações e prémios. Mas nenhum destes sobressaltos é para levar a sério. Da mesma forma que, passado o susto inicial, voltaram as antigas práticas especuladoras e a cantiga do “menos Estado” — quando os tão incensados “produtos financeiros” passaram a não valer nada e os bancos a ameaçar falir uns atrás dos outros — também, daqui a umas semanas, quando o assunto já estiver esgotado e não for politicamente relevante, toda esta cambada vai descobrir que “o mérito deve ser devidamente recompensado”, da mesma forma que já redescobriu que afinal a crise e a corrupção no nosso país só se ultrapassam quando o “Estado sair da economia e a deixar entregue aos privados”. Muito prosaicamente, a EDP e a ZON já recusaram a proposta do Estado de redução de remunerações e prémios dos seus gestores. Consta que o mesmo vai acontecer nas outras empresas públicas. Pronto, é a vida… O governo cumpriu o seu dever, que mais se lhe pode pedir? Desiludam-se os que pensam que o capitalismo é regulável. O problema não está no capital financeiro, está no capital.

As “eleições” iraquianas não foram livres porque se realizaram com este país sob ocupação. O seu único objectivo foi legitimar a invasão e a ocupação e criar as condições mínimas para a consolidação do controlo interno do Iraque capaz de permitir a retirada Pág. 13 americana em 2011.

Abaixo o governo PS

Um 1º Maio de luta a sério - Se aquilo que nos oferecem os partidos que nos têm governado nos últimos 30 anos é salários congelados, agravamento do desemprego e das condições de vida, do que está à espera a esquerda parlamentar e não parlamentar para exigir e trabalhar para o derrube do governo e fazer os ricos pagar a crise que provocaram? Assinala-se a 22 de Abril o segundo aniversário do falecimento de Francisco Martins Rodrigues, fundador e director da Política Operária. No último estádio da sua vida, dizia: “Não vai ser no meu tempo, mas há-de ser: os pobres hão-de desagrilhoar-se”.

SUPLEMENT SUPLEMENTOO PO A culpa foi do esquerdismo? FRANCISCO MARTINS RODRIGUES

Kollontai, dissidente ou estalinista? ANA BARRADAS

Nos primórdios do comunismo português ÂNGELO NOVO


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} OS CÚMPLICES DE MARX - Há neste mundo gente tão atrasada que não entende porque é que os povos de Leste que estão a despedir os seus patrões “comunistas” corruptos precisam, para ser inteiramente felizes, de voltar a trabalhar para os patrões capitalistas. Dúvida ingénua: está-se mesmo a ver que enquanto os bancos e empresas do Leste não forem privatizados, os direitos humanos desses povos continuam sob ameaça permanente. Está provado que o sistema da propriedade privada e da livre empresa é o grande esteio das “sociedades abertas” e o único antídoto seguro contra o totalitarismo. Assim o mundo todo vai sendo educado nos bons princípios da democracia. Desde muito jovens todos aprendem que é má educação perguntar porque é que uns hão-de ser proprietários e outros assalariados, ou criticar o direito das pessoas donas de um capital viverem à custa do trabalho alheio, ou pôr em causa a lógica de os salários subirem à medida que as pessoas andam de costas mais direitas. Todos sabem que pensar nesses coisas não faz bem à cabeça e “não leva a parte nenhuma”.

} PADRALHADA COBRA FACTURA – Torna-se difícil saber o que é mais espantoso: se a ingenuidade cínica dos mais ousados analistas, ao descobrirem a avidez da Igreja pelo dinheiro e pelo poder; se o jesuitismo das críticas com que todos, do CDS ao PCP, passando pelos restantes candidatos aos canais de TV, acolhem o tratamento de favor reivindicado pela padralhada… a força e a autoridade dos bispos e cardeais junto do poder não vem tanto da sua base social de apoio, mas sim do papel por eles desempenhado após o 25 de Abril como, por exemplo, durante o “Verão quente” e nas campanhas da AD. Ao reivindicar um tratamento privilegiado e ao recordar as promessas de Sá Carneiro, a Igreja está unicamente a exigir uma contrapartida pelo seu trabalho de agitação política nas homilias e missas a favor da contra-revolução, dos bombistas do ELP/MDLP, do CDS e do PPD contra o “demónio vermelho”.

} PCP: LUTA ENTRE DUAS LINHAS OU DESMANCHAR

E FEIRA? – Veja-se esta “lição” espantosa que o PCP colhe dos acontecimentos, e que vale por uma confissão cabal: “Com a consolidação do Estado socialista, o poder popular efectivo foi substituído por um poder fortemente centralizado e cada vez mais afastado do vontade do povo”. (Teses do CC ao XIII Congresso). Como é possível, perguntamos, que se consolidasse o Estado socialista quando o poder se afastava da vontade do povo? Chegar ao fim de 70 anos a uma “lição” destas não equivale a confessar que a vossa concepção de socialismo é completamente alheia ao marxismo e à classe operária?

Na PO 24, Março/Abril de 1990: - PS monta cartel das “esquerdas” - Presos políticos espanhóis em greve da fome - Centrais sindicais – Revolta a menos, realismo a mais - PCF: fracturas múltiplas - África do Sul – Inevitável a transição por compromisso? - URSS – Criar bom ambiente ao capi tal estrangeiro - A explosão dos nacionalismos na URSS

FRANCISCO LOUÇÃ E A REVOLUÇÃO Foi publicada na editora Bertrand a biografia oficial de Francisco Louçã, assinada pelo jornalista, editor e historiador António Simões do Paço. Na verdade é uma autobiografia. A chave para a compreensão desta (auto) biografia está na página 137, onde o autor recupera excertos de uma entrevista feita por José Manuel Fernandes a Francisco Louçã em 8 de Setembro de 2009. À insistente pergunta sobre se Francisco Louçã continuava a ser um revolucionário, este respondeu que era o que sempre foi: um socialista. Se recuarmos algumas décadas, vemos o jovem Louçã, que nasceu numa família onde se respirava um ambiente antifascista. Em Dezembro de 1972, por curiosidade, vai ver o que se estava a passar na capela do Rato. Ainda é estudante do liceu. Em 1973 matricula-se no ISCEF, uma escola considerada por Marcelo Caetano como “ um antro de comunistas”. No final desse mesmo ano adere à recém-formada LCI, onde pontificam Francisco Sardo, no Porto, e Cabral Fernandes, em Lisboa. No Porto, já em finais de 1972 se tinha constituído a UOR, resultante de uma cisão no primitivo grupo de trotskistas daquela cidade, que ainda não tinha sigla oficial. Quando se dá o 25 de Abril, Louçã é militante da LCI e estudante do ISCEF. Nessa altura inicia-se a discussão para a fusão entre a UOR e a LCI, que se vem a consumar em Julho. O resto de 74 e 75 são anos de brasa. A agitação social espontânea ultrapassa muitos militantes e algumas organizações de esquerda. Em 75, no Verão, a Revolução está num ponto crucial. Os trabalhadores estão na rua e nos quartéis os soldados conquistam poder e criam a sua própria organização (SUV). A LCI realiza um congresso (II). Ganha a tendência liderada por Francisco Vale, que derrota a tendência de Cabral Fernandes e Francisco Louçã e a de Francisco Sardo. Repare-se que Francisco Vale vem da UOR, que resultou de uma cisão com o grupo de Francisco Sardo e Cabral Fernandes, em 72, acusados de revolucionários de gabinete. A LCI adere à FUP (depois FUR, com a saída do PCP). O Revolução está num momento decisivo. Louçã não está no Bloco Revolucionário. Não concorda com a participação da LCl na FUR. Louçã tem medo da Revolução. Em 25 de Novembro a Revolução é derrotada por um golpe militar levado a cabo por uma ampla frente com toda a direita e extrema-direita, PS e PCP.

Após o 25 de Novembro, Louçã prepara o assalto ao poder na LCI. No III Congresso, em Janeiro de 1976, conquista a direcção com Cabral Fernandes e outros. Verdadeiramente ninguém na nova direcção queria a Revolução. Francisco Louça, no quadro da democracia burguesa, inicia a sua carreira política. É candidato em sucessivos actos eleitorais até ser eleito deputado em Outubro de 99 à frente do Bloco de Esquerda. De então para cá, com o PS cada vez mais à direita apostado em destruir o PSD, o BE conquista cada vez mais eleitorado moderado escorraçado pelo PS e que não tolera o sectarismo do PCP. Agora Louçã diz: “sou socialista”. O PS é que já não é socialista. Virá Louçã a ser primeiro-ministro?

R. (ex-militante trotskista) - Porto, 4 de Fevereiro UE DE OLHO NO PROLETARIADO GREGO Mando-vos esta notícia que acho de interesse. Com a sua intervenção na Grécia, nunca até agora tinha sido tão claros os objectivos e a razão de ser da União Europeia. O ataque foi dirigido directamente contra a classe operária grega, que tem uma tradição de luta mais importante do que noutros países da UE. Porque o que se trata é de metê-la na ordem a partir dos órgãos da UE, já que o governo grego demonstra ser incapaz de fazê-lo. Acho que a isto deve ser dada a importância que tem, ao invés de se focar, como fazem os meios de comunicação europeus, o volume da dívida. Um abraço António Doctor – Saragoça

dinopress@sapo.pt Colaboraram neste número: Ana Barradas, António Barata, Antonio Doctor, António Vinhas, Ângelo Novo, Fernando Pulido Valente, José Borralho, Paulo Jorge Ambrósio, Ricardo Noronha, Vítor Colaço Santos Propriedade: Cooperativa Política Operária Correspondência: Apartado 1682 - 1016-001 LISBOA | TM: 960 135 270 | Periodicidade: Bimestral | Tiragem: 1100 exemplares Publicação inscrita na DGCS com o número 110858

ASSINATURAS 5 números (1 ano)

Continente e Ilhas Europa Resto do Mundo

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5 números (apoio)

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Ciclo infernal O Banco Central Europeu premiou a irresponsabilidade dos bancos europeus concedendo-lhes créditos baratos em nome da resolução da crise. Os bancos pegaram nesses empréstimos a juros baixos e foram emprestar ao Estado grego a taxas exorbitantes. Portugal é o próximo na fila para a mesma operação. A Islândia é que foi esperta, que disse que não pagava as dívidas dos bancos. Entre nós, com o centrão aliando-se para fazer passar o PEC e a esquerda parlamentar lamuriando-se, aceitam-se todas as imposições da Comunidade Europeia, por mais gravosas que sejam. A nós dizem-nos que o Estado previdência é insustentável e que tenhamos paciência, vamos ter de apertar o cinto. A demagogia sobre os perigos da bancarrota pública é uma maneira de vergar-nos a todos aos interesses dos mercados financeiros. Os credores do Estado não são outros Estados, mas sim investidores privados, bancos, companhias seguradoras e fundos financeiros que compram de bom grado pacotes de dívida pública, por deles obterem juros muito lucrativos, como se viu agora com a crise da Grécia: as seguradoras e os bancos franceses, suíços e alemães são os seus principais credores, seguidos por bancos britânicos e norte-americanos. Esta especulação com a dívida pública é um abuso que os cidadãos vão ter de subsidiar. Por isso nos dizem que cada um de nós deve uns tantos milhares de euros, não sabemos bem e a que credores. Por isso se privatiza quase tudo, a pretexto de falta de liquidez do Estado, sabendo-se de antemão que o Estado está assim a delapidar a propriedade pública e a empobrecer-nos ainda mais. Com a aprovação deste PEC do governo, temos pela frente tempos mais duros. Entretanto, é patetice pensar que está tudo a correr bem porque a burguesia está em crise. Isso branqueia as oportunidades que a esquerda tem vindo a deixar passar e toda a inactividade e falta de espírito ofensivo que campeia por aí. Na realidade, o sistema só se irá abaixo no dia em que as classes oprimidas começarem a fazer-lhe frente. Até lá, ele sempre recuperará, cada vez menos, é certo, e cada vez mais à nossa custa, mas não cai por si. As crises de sobreprodução e de subconsumo suceder-se-ão em espiral porque a taxa de lucro desce sem parar, o desemprego aumenta e a baixa dos salários tem um limite. Se é de saudar esta decadência por ela anunciar novos tempos, cabe aos revolucionários apressar a sua chegada. É de recear pelo futuro do mundo no seu todo, com tantos focos de conflito, guerra e violência e com o agravamento da crise global, que não se defronta com nenhuma resistência firme por parte dos povos e dos explorados. É preciso que o proletariado se ponha em marcha para acabar com esse ciclo infernal e tomar conta dos meios de produção. As premissas já existem, só é preciso ir à luta. Não há razão para desânimos, porque é sabido que, não se sabe ainda onde nem quando, esse processo se iniciará.

Quando o crime compensa Lembram-se de, há cerca de dois anos, Domingos Névoa, um dos patrões da Braga Parques, ter sido condenado por corrupção, ao ter tentado comprar o então vereador do BE, José Sá Fernandes, sendo obrigado a pagar a ridícula quantia de 5 mil euros? Pois agora, o mesmo senhor acaba de ganhar um processo por difamação contra o irmão de Sá Fernandes, que lhe chamou corrupto, e recebeu uma indemnização de 10 mil euros! Ou seja, a mesma justiça que prova que Domingos Névoa é de facto corrupto e o condena por isso é mesma que depois condena quem se limita a repetir aquilo que os tribunais deram como provado, atribuindo uma indemnização superior à que o corrupto foi condenado a pagar.

Vícios privados, públicas virtudes Papa Bento XVI vem a Fátima caucionar um crime, porventura ainda pior que o da pedofilia, que o clero de Ourém cometeu, em 1917, contra três crianças daquela freguesia. A 12, 13 e 14 de Maio, o papa Bento XVI vem a Portugal, sem querer saber para nada de tudo o que ultimamente está a ser revelado na comunicação social sobre os inúmeros e escabrosos casos de pedofilia ocorridos no interior da Igreja, inclusive com clérigos em cargos de grande visibilidade e cujos bispos, no passado, foram seus cúmplices (o próprio papa, na qualidade de cardeal Ratzinger, à frente da Congregação para a Doutrina da Fé, terá feito de conta, quando, há anos, foi sabedor de um desses casos mais escabrosos). No mínimo, é uma insensatez que o papa Bento XVI está a cometer. Perante tudo o que está a ser divulgado (e, em muitos casos, até já confirmado pelos tribunais de cada país), o papa Bento XVI, se tivesse um mínimo de pudor, já teria anunciado, nesta data, urbi et orbi, que essa e outras viagens “pastorais” de chefe de Estado do Vaticano ficariam canceladas sine die. Tanto mais no caso presente de Fátima, das três crianças da freguesia escolhidas e arregimentadas em 1917 pelo clero de Ourém. Sim. Em verdade, em verdade vos digo: o teologicamente imbecil fenómeno das “aparições” de Fátima foi, perversa e metodicamente, preparado pelo clero de Ourém, e, por isso, perfaz uma barbaridade de todo o tamanho, certamente pior, muito pior, que os inúmeros casos de pedofilia, à excepção, porventura, daqueles casos mais escabrosos. Hoje, sabemos bem quais foram os resultados dessa barbaridade, com tudo de crime sem perdão: – duas das três crianças, Jacinta e Francisco, irmãos de sangue e primos direitos de Lúcia, a mais velha das três e vizinha, porta-com-porta das outras duas (como se vê, ficou tudo em família!), quando a pneumónica, poucos meses depois das “aparições”, atingiu o concelho de Ourém (como vêem, nem a senhora de Fátima lhe valeu! Pudera! E como havia de lhe valer, se aquilo é tudo mentira e invenção do clero de Ourém?!), não lhe resistiram, de tão fraquinhas que andavam com todos aqueles estúpidos “sacrifícios pela conversão dos pecadores”. Morreram ambas, num total abandono, por parte do clero de Ourém que, meses antes, as havia utilizado para aqueles perversos fins moralistas. Morreram as duas devoradas por

indescritíveis dores e mergulhadas em horrendas alucinações, sobretudo a Jacinta, sozinha no Hospital D. Estefânia, em Lisboa. E quanto à outra menina sobrevivente, a mais velhinha, é absolutamente obsceno o que o clero de Ourém e o próprio bispo auxiliar do Patriarcado, candidato a bispo e depois bispo titular efectivo, da restaurada Diocese de Leiria, lhe fizeram (já, então, pelo andar da carruagem, era previsível que Fátima viria a ser a galinha de ovos de oiro da Igreja em Portugal e da Cúria Romana e, por isso, uma e outra se apressaram a restaurar a Diocese!...). Obrigaram Lúcia, pela força – e com um chorrilho de mentiras clericais à mistura, de que ela era “vidente”, etc. e tal – a sair de Fátima e da família. Sequestraram-na até à morte, primeiro no então Asilo de Vilar, Porto, depois num convento de Doroteias em Tui, na Galiza, onde lhe foi imposto pelo confessor que tinha de ser freira, e, finalmente, freira de total clausura no Convento das Carmelitas, em Coimbra. Horrendo! Só mesmo de clero celibatário à força, eunuco à força, não, obviamente, eunuco pelo Reino /Reinado de Deus! A pobre rapariga tinha a terceira classe quando a sequestraram, e assim ficou (ou pouco mais!), pelo resto da vida. E à mãe dela, que sempre disse que a conhecia bem e que aquela sua filha era compulsivamente mentirosa e vaidosa (por isso nunca acreditou nem na filha nem nas “aparições”), nem mesmo na hora da sua agonia deixaram que ela visse a filha; tão-pouco permitiram que, pelo menos, a mãe ouvisse a voz da filha pelo telefone! (Digam lá se os sacerdotes e as freiras do Ídolo Religioso não são cruelmente vingativos e sádicos?!). Ora, é este horrendo crime e esta mentira sem perdão que o papa Bento XVI vem caucionar com a sua visita de chefe do Estado do Vaticano a Portugal e a Fátima, numa altura em que sobem de tom e de número os clamores de inúmeras vítimas de casos de pedofilia, cometidos por clero, inclusive, de grande visibilidade, todos funcionários exemplares do Institucional Religioso-Eclesiástico católico. Haja modos e pudor, meu irmão Ratzinger! PADRE MÁRIO DE OLIVEIRA (Jornal Fraternizar, Abril-Junho 2010)


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O Mês em Relance SÓCRATES mente compulsivamente, o que em nome da esquerda negou e renegou tudo!, bandeou-se para e com a direita, procedendo às mais graves traições, não ousa nem tem marca ideológica, ignora o que são convicções, não tem esforço de estadista e orgulha-se numa mediocridade feliz, escondida numa verborreia retórica que, fartas vezes, reconhecemos num vendedor de banha da cobra. O engenheiro técnico é tolo, ingénuo ou altamente sinistro! Tomara que não escrevesse isto, mas... enuncio os defeitos acima com suave benevolência. PEC – “Nós consideramos que, teoricamente, academicamente, tecnicamente, o PEC é um bom documento” – Alberto João Jardim. Diz-me com quem andas, dirte-ei quem és. Rosto nº 1 do PEC, José Sócrates – o Programa de Estabilidade e Crescimento ou Programa de Extermínio dos Contribuintes, porque nós, os tansos fiscais, vamos continuar a pagar a irresponsabilidade e incompetência deste governo, que, para reduzir o défice para 2,8% em 2013, será à custa de um brutal agravamento da carga fiscal sobre as famílias portuguesas. Os que já pagam vão pagar muito mais. Os que não pagavam porque não tinham rendimentos suficientes vão passar também a pagar. Só quem ganha pouco mais do que o ordenado minimíssimo nacional não terá a sua taxa agravada. A partir daqui, é tudo (pelo vistos) rico...! Entre 7.250 euros e 17.979 euros brutos, o IRS sobe 100 euros; até 41.349 euros, o aumento é de 180 euros, valor que cresce para 390 euros até 59.926 euros. E assim sucessivamente, até chegar ao pagamento de 700 euros de IRS. Enquanto vampiriza os contribuintes cumpridores, incluindo o congelamento da dedução específica ao rendimento bruto, o PEC é servil para quem fugiu ao fisco e colocou o dinheiro em offshores. Mediante uma simpática e reduzida taxa de 5%, todos os faltosos, particulares e empresas, que colocaram ilegalmente dinheiro no exterior vão poder trazê-lo para Portugal, sem nenhuma garantia para o Estado de que não voltarão a fazer o mesmo dentro de algum tempo... Este PEC é também para os que puseram o dinheiro em paraísos fiscais, imoral! O mesmo governo que ainda não vai aplicar a taxação das mais-valias bolsistas “por causa da crise económica” (?) decidiu usar o ataque ao rendimento social de inserção e ao subsídio de desemprego como armas. Depois de ir aos que já pagam, foi aos que não podem, para não ir aos que podem – os ricos, claro! – mas que não querem. O preço que os mais pobres vão pagar por esta crise não merece nem perda de tempo, nem debates sobre o PEC. Os mais pobres nunca interessaram para nada, e agora muito menos. Fala-se exclusivamente em classe média. Esta classe está a proletarizar-se. Não tem acesso aos jornais nem a colunas de opinião. Não tem grupos de pressão, nem asso-

ciação de classe. Foram escolhidos como alvo, porque é fácil atacar quem dificilmente se pode defender. Os vários cortes sociais prevêem retirar ao Serviço Nacional de Saúde, até 2013, 715 milhões de euros! “Classes baixas” mais não traduz do que a violência da nossa sociedade, cujas prostrações assumem a feição de um sintoma neurótico. Estamos doentes de resignação e de debilidade moral.

A OUTRA SENHORA foi corrida a pontapé sem dó nem piedade. Coitada da srª Manuela F. Leite, que Deus a tenha no PSD, pois é um trunfo da esquerda, pelas bacoradas, contradições, erros e posições fascizantes que toma. A lei da rolha que aplaudiu é o último tiro dado nos pés mancos do PSD. Pedro Passos Coelho, a contrafacção de Sócrates, foi eleito novo presidente do equívoco que leva o PSD a dizer-se social-democrata. Este ex-jota e político profissional nunca fez nada de relevo na vida, nada de nada se lhe conhece, para amanhã poder vir a ser primeiro-ministro. Escreveu um livro Mudar – o quê, para quê, para quem? – para os mesmos: Belmiros, Amorins, Espíritos Santos e toda esta gente que subiu a pulso (dos outros). É um manual mal escrito para capitalistas. Tem que desde já começar a pagar a factura (leia-se despesas do próximo congresso). Combina a timidez com pedantismo. Também, coitado, não lhe gabo a sorte. A geriátrica Manuela Leite não o suporta (escorraçou-o das listas para as eleições legislativas, o Bokassa da Madeira acha-o intolerável, o cara-de-pau de Belém detesta-o, o renegado Pacheco Pereira tem-lhe azar, o criptofascistóide Rui Rio odeia-o, o sabe-tudo Marcelo [delfim de Caetano] gagueja quando fala nele... A eleição deste figurão ameaça para pior a continuidade desta política miserável em que estamos atolados. Que nomes irão substituir os nomes? Que aparelho irá substituir o aparelho?

ORA LÁ VAI UM... – Apesar de já ter deixado a presidência da REN, cargo agora ocupado por Rui Cartaxo, José Penedos teve direito a prémio na empresa pública. O arguido no processo Face Oculta recebeu 243.750 euros de bónus no final do ano passado. A este valor soma-se ainda um salário de quase 27 mil euros por mês na companhia, o que totaliza 621 mil euros de remuneração. No total, a REN atribuiu quase 3,2 milhões de euros em salários e prémios aos seus administradores, quer executivos, quer não executivos, embora estes últimos não tenham direito a bónus. Só em prémios, os gestores receberam, na totalidade, mais de um milhão de euros. E Outro... – O ex-administrador da PT, Rui Pedro Soares, aos 32 anos já era supervogal duma empresa pública, com um salário de 10.000 euros e despesas de representação. E Ainda Mais Outro... – Inês de Medeiros recebe diariamente da Assembleia da República 528• (16.368 euros por mês) porque é deputada do PS pelo circulo de Lisboa, mas tem residência em Paris. Além disso, tem uma viagem paga a Paris, ida e volta, aos fins-de-semana, mais as senhas de presença diárias da Assembleia.

coisa-chata... dizem-nos: “Infeliz momento colectivo de distracção”. Santana foi capaz de electrizar melhor que Hitler 352 pessoas, que ficaram suspensas da sensibilidade exterior e dos movimentos voluntários... dando um sim à expulsão de militantes que criticassem a direcção do partido. Para quem berrou durante meses contra a “asfixia democrática” e a “tentativa de controle da comunicação social” por parte de Sócrates, é uma contradição(zita). Esta gente, caso tivesse o poder, não usava a rolha, usava o bastão eléctrico!

PRETO – O deputado do P“SD”, escolhido pela drª Manuela, António Preto, quer “um mecanismo de sorteio que seleccionará anualmente, com o propósito de fiscalizar, 5% das declarações de interesses e de património dos titulares de cargos políticos”. Pasme-se! Como é possível alguém que recebeu uma mala cheia de dinheiro a propósito de pagamento de luvas, arguido por via disso a LEI DA ROLHA – No penúltimo congresso contas com a justiça, transvestir-se em arauto da transpado P”SD” foi aprovada a lei da rolha proposta rência? A Assembleia da República é um sítio mal frequentado. VÍTOR COLAÇO SANTOS por, claro!, Santana Lopes, democrata, vira-lata,

MAIS DO MESMO – Amado ou odiado, o nome líder do P“SD” começou a ser um homem sob vigilância. Apertada. Passos Coelho é pouca coisa e coisa nenhuma. Besuntem-se com ele!


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Solidariedade com os guerrilheiros bascos Dá que pensar a prisão de dois combatentes da ETA que, perseguidos pela Guardia Civil, entraram em Portugal, e depois a descoberta de uma casa onde se abrigavam outros dessa organização independentista basca, com explosivos. Primeiro, sobre o grau de empenhamento do Estado português na “luta antiterrorista”, na qual se revêem os partidos da alternância – PS, PSD e o parceiro menor CDS – mas também a chamada “esquerda”, a parlamentar e a outra, que sobre estes acontecimentos guardam um cauteloso e comprometido silêncio, coisa que só surpreende os mais distraídos e os eternos ingénuos. Verdadeiro tabu, a prisão dos independentistas não mereceu da esquerda qualquer gesto de solidariedade, uma palavra a favor do direito à autodeterminação do povo basco, um estremecimento de alma face à tortura que espera esses militantes quando forem entregues aos torcionários espanhóis. É como se nada tivesse acontecido. Longe vai o tempo em que intelectuais, jornalistas, partidos e organizações de esquerda se mobilizavam contra o julgamento, condenação e extradição de militantes bascos no nosso país. E no entanto, a direita (a socialista e as outras) e a comunicação social, num coro previsivelmente afinado, não se cansaram de diabolizar a ETA e a guerrilha basca, de fazer tábua rasa do direito do povo basco a autogovernar-se e de amedrontar o “tranquilo povo português” com a ameaça terrorista que, mais dia, menos dia, poderá fazer ir pelos ares o mais incauto cidadão. É também de salientar a subserviência do Estado português ao espanhol. Começou por não ver nada de mais no facto de ser desmentido sobre a quantidade de explosivos, aceitando como boa a explicação do país vizinho, que conseguiu multiplicar por dois a

quantidade encontrada (se um quilograma em Portugal são mil gramas e em Espanha dois mil, isso nada tem de estranho. É mera “questão técnica”). Depois, as pressões para que os “terroristas” sejam extraditados rapidamente, e para o estabelecimento de acordos de colaboração entre as polícias dos dois países (anunciados com pompa e destaque na imprensa), numa demonstração clara de que a separação de poderes não é mais que mera formalidade para enganar papalvos. Assim, à pala da luta contra o terrorismo, não só os nacionalistas bascos ficam sob vigilância, como se incrementa a vigilância e criminalização de toda a actividade revolucionária na península Ibérica. Por último, a burguesia, os seus partidos, a esquerda parlamentar (PCP e BE) e extraparlamentar, a imprensa, a secção portuguesa da Amnistia Internacional e outros organismos que tanto se preocupam com os direitos humanos remeteram-se ao mais absoluto silêncio. Como não se trata da China nem do Tibete, da Colômbia e das FARC, de Cuba, da Coreia, nem do Hamas, não é de bom-tom falar dessas coisas, apesar de se saber e haver documentação em quantidade a provar que o Estado espanhol pratica a tortura de forma sistemática (não se trata de excessos de um ou outro torcionário mais desempoeirado) – espancamentos, tortura do sono, simulação de fuzilamento e afogamento, choques eléctricos, violações – e o assassinato político. Estas são denúncias que, apesar de partirem de insuspeitos organismos internacionais como a Amnistia Internacional e a Comissão da ONU para os Direitos Humanos, são sistematicamente silenciadas pelos poderes institucionais e pela comunicação social. ANTÓNIO BARATA

Tão radical como os tempos que correm O caminho é sempre igual, entre a casa e o trabalho. Entro no metro, saio do metro. Publicidade, notícias, publicidade. Coloco o passe que permite a leitura magnética que abre a porta de vidro que me permite passar. A porta abre e fecha, como se nos mastigasse um a um. É hora de ponta e a carruagem está cheia de gente séria e silenciosa que olha para o vazio. Somos todos filmados para nossa própria segurança. Publicidade, notícias, publicidade. Entro no metro, saio do metro. O movimento operário do século XIX organizava-se em torno da fábrica através do sindicato mas, paralelamente, construía “sociedades de resistência”, espaços de agregação social e apoio mútuo. A produção capitalista era entendida não só como um problema económico, mas também social. A luta contra o capitalismo representava uma luta contra as formas de vida mercantis, indo para além da reivindicação sindical e dos direitos laborais. Quando chego ao trabalho faço log in e os minutos começam a contar. O sistema informático já foi informado da minha chegada quando usei outro cartão para abrir a porta que dá acesso à sala do atendimento. Coloco o head-set e preparo-me para ler o script. Abro a aplicação, fecho a aplicação. Cumpro rigorosamente o tempo de handling enquanto espero pelo break, entretendo os clientes com a música da publicidade quando os coloco em hold. Aqui no call center comunicamos desta maneira extremamente moderna e sofisticada. Actualmente, o processo de valorização capitalista incorporou como força de trabalho as capacidades cognitivas, comunicativas e afectivas do humano. Uma das dimensões mais dinâmicas da produção social é um tipo de força de trabalho imaterial. Operadores de informática, desenhadores de páginas web, publicitários, artistas, jornalistas, são parte da actual composição social do trabalho. As novas formas de trabalho, no marco da produção pós-fordista, introduziram a discussão relativa às formas de organização social que podem fazer frente à situação de flexibilidade, mobilidade e precariedade laboral, mas também às formas de vida que produzem as relações sociais capitalistas. Flexível, disponível, atencioso, polido e com um sorriso na voz, o assistente de apoio ao cliente está lá para o que der e vier. Ele é a cara da empresa, a voz da empresa, a ferramenta humana da empresa, o capital humano da empresa. Ele é da empresa. Tempos de trabalho e desempenho constantemente vigiados e controlados, chamadas gravadas para avaliação, nome disponível para reclamações. Férias quando for possível, intervalo quando for possível, prémios quando for possível, alteração de folgas quando for possível, novo horário quando for possível, ajuda do supervisor quando for possível, a vida quando for possível. Chamam-lhe um colaborador. Só a luta contra a exploração pode conferir aos trabalhadores uma identidade sociológica de classe, porque só a esse nível eles encontram uma comunidade fundamental e estabelecem elos de solidariedade. O grande problema hoje é o de partir das lutas fragmentadas com o objectivo de contribuir para que elas ultrapassem a fragmentação. Pode ser um grupo de intermitentes que ocupa o espaço audiovisual para dar a conhecer as suas condições de trabalho. Uma orquestra de samba que irrompe num centro comercial numa manhã cinzenta de sábado. Imigrantes que se concentram para exigir documentos. Operadores de call center que partilham entre si os segredos da profissão para se furtarem ao controlo informático patronal. Caixas de supermercado que se “enganam” a favor dos clientes. Empregados de lojas de roupa que saem do trabalho estranhamente bem vestidos. Podem ser greves, manifestações, sabotagens, afixação de cartazes, distribuição de panfletos, negociações salariais ou um contrato colectivo de trabalho. Tudo o que inspire conflito, tudo o que produza comunicação, tudo o que ultrapasse a fragmentação, tudo o que coloque as nossas vidas nas nossas mãos. A precariedade é um ataque que precisa de um contra-ataque. Nem mais nem menos radical do que os tempos que correm. Nota - Os parágrafos a itálico foram retirados do blog do Mayday Lisboa 2007 (http://www.maydaylisboa.net/) RICARDO NORONHA


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O poeta do exército morto Regressado em 2010 a Angola, ao trágico teatro de guerra que foi Nambuangongo, o futuro candidato presidencial Manuel Alegre evocou os seus compatriotas combatentes que “estavam aqui, defendiam a bandeira e cumpriam o seu papel”, apesar de se tratar de “uma guerra sem sentido, fora do tempo”. Não lhe deu o nome próprio, mas falava da guerra colonial-fascista. Passados dias, logo um representante desses combatentes veio reclamar que, tal como se fez já nas outras ex-colónias, se procure e recolha em Angola os restos dos soldados mortos em combate. Este episódio faz lembrar irresistivelmente a história do livro O general do exército morto de Ismail Kadaré, de um general italiano que vai recolher os restos mortais de compatriotas abatidos na Albânia. À medida que se apercebe da imprevista dificuldade da missão e depois de se encontrar com outro general, alemão, também este procurando as ossadas dos seus soldados, vai perdendo o ânimo altivo e começa a conhecer melhor o ressentimento dos albaneses vítimas da agressão. A analogia é tanto mais pertinente quanto em tempos Manuel Alegre foi sensível ao significado profundo da guerra e distanciou-se dela, pagando o preço obrigatório da perseguição e da vigilância policial. A sua poesia fez passar a mensagem dolorosa dos traumas da guerra e serviu de referência a muitos dos que se recusaram a participar no massacre dos povos das colónias: “Não sei se alguma vez nós voltaremos/ Da guerra onde deixámos partes d’alma./ As minas ainda estão a rebentar/ Trazemo-las por dentro e ninguém pode/ Desarmálas./” (Nambuangongo, meu amor - os poemas da guerra). O seu livro Jornada de África registou também o

terror desencadeado pela tropa portuguesa: “Vi gente a arder regada pelo napalm, e tochas humanas ateadas por estas mãos. É por isso que é preciso dar outro sentido a esta coisa” (...). “Coxos, manetas, paraplégicos. O resto ficou nas picadas, Angola é nossa, venham ver, há bocados de carne por aí, são pedaços de Portugal florindo, algures no mato, sangue e merda, duarte de almeida é o nosso nome, Para Angola e em força, braços, pernas, mãos...”. Nessa altura Alegre não queria saber do cumprimento do “dever” de “defender a bandeira” criminosa em nome da qual massacres horrendos foram cometidos pela “soldadesca tuga” – como lhe chamavam os movimentos de libertação. Mas isso foi há muito tempo. Agora a conversa é outra. Nem sequer lhe ocorreu homenagear os combatentes anticoloniais e as populações que,

O prestígio a que temos direito Temos que sair um bocado desta mesquinhez e inveja em que se vive e começar a avaliar as pessoas que têm mérito e contribuem para o desenvolvimento do país. Mas este é um debate que tem que ser feito daqui a umas semanas e com serenidade… não só orgulham quem os recebe como prestigiam o país.” (António de Almeida, presidente do Conselho de Administração da EDP, sobre as remunerações milionárias pagas a António Mexia, Jornal de Negócios, 15/4).

No alvo Mira Amaral considera “obscenos” os 3,1 milhões de euros que António Mexia ganhou no ano passado à frente da EDP... Eu também considero. Mas tenho uma dúvida: este é o mesmo Mira Amaral que em 2002 foi nomeado administrador do banco público Caixa Geral de Depósitos, preenchendo a quota política do PSD, e saiu um ano e meio depois, com uma pensão de reforma vitalícia de 18.000 euros por mês? Se é o mesmo, como suponho, não percebo a sua noção de obscenidade: Mexia, como toda a gente sabe de há muito, é um homem que tem servido todos — Cavaco, Durão, Santana, Sócrates. Como ele há outros mais, que fazem parte desse selecto clube de crânios que vivem luxuosamente à conta das quotas político-partidárias nas empresas públicas ou empresas privadas com ligações privilegiadas ao poder político. Se há coisa que Mira Amaral não ignora é como funciona o sistema. (Miguel Sousa Tavares, Expresso, 10/4).

na sua própria terra que agora o recebeu sem rancor, arrostaram o horror destrutivo de uma guerra de agressão. Foi assim que, para reunir nas próximas eleições mais votos à direita, o ex-resistente e poeta de intervenção renegou em duas ou três frases o seu passado anticolonialista. É caso para o parafrasear, em jeito de epitáfio: “Em Nambuangongo tu não viste nada”. ANA BARRADAS

Corrupção: regra ou excepção? A crise capitalista mundial tem sido acompanhada por uma onda cada vez maior de um aparente e indignado anticorrupcionismo. Esta onda, impulsionada e aproveitada pelos média, serve às mil maravilhas o revisionismo capitalista. De facto, os paladinos deste sistema proclamam que a sua excelência não está posta em causa, pois se trata simplesmente, não de uma doença congénita, mas somente de uma espécie de gripe, causada por agentes indesejáveis estranhos ao próprio sistema, que é possível e necessário combater. Na sua original pureza, o capitalismo nada teria que ver com esta horrorosa infecção daquilo que se considera agora como sendo a sua corrupção. No entanto, o fenómeno não é evidentemente de natureza apenasnacional, nem tão-pouco surgiu de imprevisto, com carácter epidémico – os casos de corrupção que quase todos os dias são denunciados pelos média em Portugal não passam, em geral, de casos de funcionamento completamente “normal”, à luz do sistema capitalista mundial. Com efeito, não passam, na verdade, de casos todos os dias relatados a nível internacional de influência dos agentes económicos privados na política. O que é agora relatado sensacionalmente pelos média nacionais não é mais, muitas vezes, do que a prática corrente assumida internacionalmente, em particular sob a forma de lobbying.

Com a intensificação da luta partidária pelo poder político, as denúncias de corrupção – zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades – tomam a forma de armas de arremesso. Novos casos de corrupção surgem todos os dias: Freeport, submarinos, banqueiros, sucateiros etc., etc. Estes casos vão-se acumulando, mas nada nos garante, evidentemente, que alguma vez se descubra a verdade e que as responsabilidades sejam apuradas. Nenhuma das partes envolvidas está interessada, apesar das proclamações em contrário, em que tal aconteça. Passada esta erupção anticorrupcionista, certamente voltará tudo à desejada “normalidade”, e o sistema continuará a funcionar com até agora, mantendo-se a promiscuidade entre a política e a finança, fundamental à economia capitalista. Nem poderia deixar de ser assim, pois não se vê, por enquanto, qualquer alternativa. Desgraçadamente, a análise histórica dos resultados das tentativas de mudar o sistema capitalista, instaurando um sistema dito comunista, mostra que também nestes casos a corrupção acabou por se instalar no sistema, contrariando os seus objectivos idealistas teóricos. Infelizmente a resposta à pergunta que figura no título deste texto só pode ser uma: A corrupção não é excepção; a corrupção faz parte de todos os sistemas até agora conhecidos: é a regra. FERNANDO PULIDO VALENTE


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Não à guerra contra os trabalhadores, não à NATO Mais de 700 mil desempregados, meio milhão de trabalhadores precários e a recibo verde, mais de 2 milhões de pobres, salários em queda contínua, reformas de miséria e cada vez menores, mais de 350 mil desempregados sem subsídio de desemprego, cortes crescentes na saúde e noutros benefícios e regalias sociais, liberdade sindical mal tolerada pelas empresas ou proibida, os trabalhadores sujeitos a maior arbitrariedade e chantagem patronal… É caso para perguntar, agora que passam 36 anos sobre o 25 de Abril, o que resta dele? Que é feito daquela dignidade e rebeldia dos trabalhadores, da gente do povo, que descobria não haver motivos para temer patrões e governos, se reunia para discutir e resolver os seus problemas colectivos e se manifestava espontaneamente nas ruas? Já muito pouco resta de Abril. A liberdade transformou-se no direito de os ricos se tornarem ainda mais ricos e os trabalhadores cada vez mais pobres e descartáveis; o pluralismo partidário e a governação são meros exercícios de tráfico de influências e troca de favores, um trampolim para aceder aos dinheiros e altos cargos públicos, para enriquecer rapidamente e de forma obscena – a economia já pouco mais é que um negócio de “padrinhos” e “famílias” político-partidárias. Se aquilo que nos oferecem os partidos que nos têm governado nos últimos 30 anos é o agravamento deste quadro negro, do que está à espera a esquerda parlamentar e não parlamentar para exigir e trabalhar para o derrube do governo e fazer os ricos pagarem a crise que provocaram? Hoje, 36 anos depois do fim da guerra colonial, o país encontra-se de novo em guerra, envolvido em conflitos alheios iniciados pelo imperialismo americano com a conivência da União Europeia, no Afeganistão, na Somália e na ex-Jugoslávia. São guerras justificadas com mentiras e realizadas pela NATO, que só têm levado a morte, a fome e a destruição a milhões de pessoas, acirrado ódios e feito do mundo um lugar cada vez menos seguro. Todos os governos justificam o envolvimento de Portugal nas aventuras imperialistas com os compromissos assumidos no quadro da NATO. Na realidade, trata-se de uma total dependência e identificação com os interesses dos EUA e as potências europeias. Se os compromissos com a NATO nos arrastam para guerras de agressão a povos com quem não temos qualquer conflito; se não é tido em conta o repúdio popular pela guerra, então devemos sair da NATO, exigir a sua dissolução e manifestar o nosso repúdio pela realização da cimeira da NATO em Novembro, no nosso país. Abaixo o governo PS! Os ricos que paguem a crise! Não ao congelamento dos salários! Subsídio de desemprego para todos! Não aos cortes nos subsídios e regalias sociais! Retirada dos contingentes portugueses ao serviço da NATO! Portugal fora da NATO! Não à cimeira da NATO!

Política Operária 25 Abril/1.º Maio de 2010

HOTEL TIVOLI

Trabalhadores não se intimidam Esta é mais uma luta que indicia que começam a surgir condições para os trabalhadores experimentarem formas de luta mais audazes e eficazes que aquelas a que estamos habituados. No dia 3 de Abril os trabalhadores da cadeia de hotéis Tivoli (centro de Lisboa, Seteais e Sintra) realizaram uma greve exigindo aumentos salariais. Aproveitaram a Páscoa, a altura que lhes é mais favorável devido à grande procura que as unidades hoteleiras têm nestes dias. Nada melhor que os hotéis cheios para dar eficácia e contundência a uma greve, fazendo os patrões senti-la onde mais lhes dói – o bolso. Por volta das quatro da manhã os trabalhadores que integravam o piquete de greve do Hotel Tivoli (Lisboa), quando exigiram verificar se a empresa estava a violar a lei da greve contratando “fura-greves” foram agredidos pelos seguranças a mando da administração, perante a passividade da polícia. Tal não os impediu de verificar que as suas suspeitas eram fundadas. De facto, a administração, perante a recusa dos trabalhadores sazonais (contratados a prazo para atender ao pico de ocupação da Páscoa), que, em solidariedade com os seus colegas grevistas se recusaram a furar a greve, tinha resolvido contratar à pressa outros, violando a lei da greve. A Inspecção do Trabalho, que três

dias antes já tinha sido alertada pelos trabalhadores para esta eventualidade e para as pressões, ameaças e chantagens a que estavam a ser sujeitos pela administração para os forçar a trabalhar, não apareceu. Demonstrando uma combatividade exemplar, os trabalhadores não se deixaram intimidar. No plenário realizado no sábado à tarde resolveram responder à altura prolongando a greve por mais um dia e accionar a justiça. Veio a Inspecção do Trabalho e, como a administração continuava a manter-se intransigente, os trabalhadores avançaram para a greve por tempo indeterminado. Então a administração cedeu, aceitando negociar as actualizações salariais. Os trabalhadores suspenderam a greve, com a promessa de que retomarão a luta se a administração não apresentar uma proposta aceitável.

MDF E METANOVA

25 anos à espera que lhes paguem Pouco mais de vinte trabalhadores da antiga MDF - Metalúrgica Duarte Ferreira, do Tramagal, e da Metanova, concentraram-se à entrada do Tribunal de Abrantes, a 15 de Março, para entregar um requerimento exigindo saber quando lhes pagam os salários e as indemnizações que lhes devem desde 1985, devido à falência daquelas metalúrgicas. A última ordem de pagamento foi dada em Setembro do ano passado, através de um despacho do Conselho Superior de Magistratura. À porta do tribunal, Álvaro Branco, ex-dirigente sindical e trabalhador da MDF, hoje com 71 anos, afirmou que os mais de 200 trabalhadores daquelas duas empresas esperam há 25 anos pelo pagamento de um milhão de euros de salários e pelas indemni-

zações por “despedimento colectivo ilícito”. O pagamento da dívida tem sido bloqueado pelo Estado que, através da Segurança Social, tem interposto sucessivos recursos. Álvaro Branco revelou que os trabalhadores – alguns já falecidos – e as suas famílias tem sido “vítimas de um bloqueio judicial sistemático. De recurso em recurso, do Tribunal de Abrantes até às mais variadas instâncias, passando pelo Supremo Tribunal de Justiça, todos nos deram razão e reconheceram os nossos direitos. Passadas mais de duas décadas, os trabalhadores-credores não receberam um cêntimo do activo financeiro de que são coproprietários.” A maioria dos trabalhadores da MDF e da Metanova são hoje idosos e sobrevivem com fracas reformas.


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Tácticas, para que servem? É cedo ainda para saber por que vias chegará o proletariado a recuperar a independência política e ideológica e a apropriar-se de novo do marxismo. Vai ser preciso encontrar respostas novas para tudo, como única forma de reatar o caminho aberto pelo leninismo e pela revolução russa.” Francisco Martins Rodrigues, Anti-Dimitrov As políticas do governo PS são claramente as políticas definidas pela União Europeia, ditadas sob a liderança do grande capital, e apresentam duas grandes linhas orientadoras: a primeira diz respeito ao reaccionarismo das medidas profundamente antisociais contidas no Orçamento de Estado para 2010, e no Programa de Estabilidade e Crescimento até 2013, com a evidência de que as medidas económicas representam o aprofundar da dependência e da crise, e em que os programas sociais se transformaram em medidas mínimas para conter a miséria nos limites do suportável; a segunda torna evidente que o chamado Estado-nação foi mandado definitivamente às malvas, restando o hino, a bandeira, e uns quantos figurões que fazem o papel de corta-fitas para cumprimento do protocolo europeu. O que temos de diferente da Grécia é que ainda não apareceram propostas para comprar as ilhas Atlânticas. Ou reduzem o défice até aos 3% e baixam a dívida pública, ou acabam-se as remessas da União Europeia que fazem engordar os burgueses e criam no povo a ilusão de progresso. Por isso a escravatura do défice vai continuar, mesmo sabendo que o crescimento económico é uma miragem. Foi a União Europeia que impôs cotas de mercado para as pescas e a agricultura, e tornou estes sectores meros apêndices dos países grandes produtores. E a mesma política utilizaram para as indústrias; naval, siderúrgica, química, têxtil e vidreira. Os documentos citados dão continuidade às políticas económicas que conduziram à crise. Surgem assim três perspectivas (e três tácticas) para a resolução da crise em que o capital está mergulhado. A táctica utilizada pelo governo (com mais ou menos apoio dos partidos da direita PSD e CDS), que se compromete perante Bruxelas a levar a cabo medidas de ataque aos trabalhadores através da contenção salarial, do desemprego e precariedade laboral, de aumento de impostos por via da diminuição das deduções no IRS, do congelamento das reformas de três milhões de pessoas de baixíssimos rendimentos, da diminuição de subsídios aos 700.000 desempregados actuais e aos que inevitavelmente vão surgir, a começar pelos funcionários públicos: saem três, entra um. Diminuir tudo o que são direitos sociais e privatizar empresas públicas para ir buscar milhões. Unir tudo o que pode ser unido no campo burguês para afrontar o povo e fazê-lo pagar a crise capitalista; este é o plano e a táctica dos bandos capitaneados por Sócrates, Vara & Cª, Manuela, Loureiro & Cª, Portas, Guedes & Cª. Tudo o que há de reaccionário e mafioso se junta para se salvar e à sua sacrossanta propriedade privada. Uma segunda perspectiva com uma táctica acoplada surge de um dos partidos que se reivindicam do comunismo, concretamente o PCP. O maior e mais combativo partido à esquerda do regime, com uma influência sindical e nos sectores mais explorados das massas, e uma inegável tradição de luta, este partido debate-se com contradições insanáveis dada a mudança da sua natureza de classe, bem visível nas suas propostas políticas. O abandono da

perspectiva revolucionária, combinada com uma descarada e insípida fraseologia marxista, fazem dele o típico partido pequeno-burguês para operários. Da sua estratégia interclassista, (defende a existência de várias formas de propriedade dos meios de produção e a convivência pacíficas das várias classes) decorrem as suas propostas tácticas actuais. A sua táctica assenta no pressuposto segundo o qual a mobilização dos trabalhadores, em conjunto com os pequenos e médios empresários, acabará por impor uma “ruptura democrática” que abrirá caminho a uma alternativa desenvolvimentista e de progresso económico e social. As suas reivindicações imediatas – com algumas das quais concordamos – estão assim ao serviço de uma política reformista e gradual que vai ao encontro das classes das quais quer ser o representante. As mudanças substanciais, quer no retrocesso do regime democrático burguês em Portugal, quer na queda do modelo de capitalismo de Estado dos regimes de Leste tão do agrado do PCP, em ligação com o abandono da perspectiva revolucionária marxista, conduziram este partido ao papel do moralista que não vê meio de o mundo entrar no seu esquema. É possível e acertado que os revolucionários trabalhem nas organizações de massas sob influência do PCP, mas sempre na condição de não calarem a crítica ao seu reformismo na acção e ao seu revisionismo na ideologia. À direita do PCP, mas à esquerda do espectro do regime, apresenta-se o Bloco de Esquerda. A sua táctica consiste na permanente apresentação de alternativas políticas, económicas e reivindicativas, e os seus interlocutores privilegiados são a base de apoio do PS. Querem constituir-se como a grande esquerda alternativa ao liberalismo do PS, representando uma corrente de pensamento que poderíamos classificar como correctora dos pecados de direita da social-democracia, derivando daqui toda a sua política. Partindo da ideia (correcta) de que é preciso estar sempre com as reivindicações dos trabalhadores, fazem-no extrapolando a sua política para a lógica implacável da apresentação de programas de governo, inserindo-se cada dia mais na dinâmica parlamentar, como se um íman atraísse irresistivelmente o Bloco para uma completa e total inserção no sistema giratório da democracia burguesa parlamentar. Diríamos que os dirigentes do BE já foram absorvidos pelo parlamento e pelo chamado jogo democrático, restando de positivo as suas denúncias dos aspectos mais malévolos da política do grande capital. A sua táctica serve que estratégia? A sua táctica é a sua estratégia. Como vão longe os ideais de uma sociedade sem exploradores! Diga-se, em abono da verdade histórica, que um punhado de revolucionários encabeçados por Francisco Martins Rodrigues rejeitaram esta via denunciando-a como uma deriva pequeno-burguesa: a vida deu-lhes razão. EXISTE AFINAL UMA ALTERNATIVA REVOLUCIONÁRIA AO CAPITALISMO? A luta de classes não ensina a todos o mesmo, e isso acontece porque quem se coloca desde o ponto de vista de classe do proletariado retirará para a sua luta ensinamentos que a esta e só a esta classe interessam. Marx e Lenine uniram tudo o que era possível

unir contra a sociedade burguesa e o seu sistema de exploração capitalista, nunca pugnaram por políticas unitárias sem princípios. Estamos com eles. Há que contribuir para fortalecer uma corrente de pensamento e de acção anticapitalista e anti-imperialista que não se recuse a ir à luta nos domínios político, ideológico e prático, sem receio de arrasar o que é revisionismo e reformismo, sem complexos de atacar em conjunto com outras correntes as diversas lutas operárias e populares, desde que sirvam para acrescentar combatividade à luta anticapitalista. A situação actual de aprofundamento da crise do sistema, em que o proletariado está debaixo do fogo do capital nacional e internacional, é altura ideal para levantar políticas unitárias e de classe num programa mínimo que nos ajude a golpear o inimigo. Partindo do princípio de que o sistema é incapaz de resolver os problemas das grandes massas, ergamos então as reivindicações que nos aproximem do nosso alvo. Todos estaremos de acordo em que a reivindicação principal para uma corrente de pensamento que se quer revolucionária é a luta contra o desemprego, embora tenhamos a certeza de que o capital vai aumentar os despedimentos. A luta contra o desemprego, mais que uma reivindicação de carácter económico, transformou-se numa reivindicação política que revela a impotência do sistema para evitar este flagelo. Só um movimento político e sindical combativo apoiado pelos trabalhadores se poderá opor com êxito aos despedimentos, sabendo utilizar de forma hábil a negociação com a luta. Não bastará a exigência de subsídios, é preciso ir mais longe, desde a expropriação dos capitais pessoais dos patrões até à ocupação da empresa pelos trabalhadores. Naturamente que estas formas de luta vão requerer uma muito maior radicalização do movimento operário e dos activistas políticos e sindicais, mas pensamos que é por aqui o caminho. Serve de exemplo a ideia exposta, não pretendemos apresentar aqui o conjunto das reivindicações operárias e populares que deveriam ser elaboradas pelos revolucionários e pelos activistas anticapitalistas do movimento sindical e social. Quanto a nós, o cerne de uma alternativa na luta imediata passa por pôr em evidência as fortunas dos burgueses em contraste com a miséria para a qual são lançados os produtores de riqueza. É nesta lógica política de confrontar o capital com os seus crimes que poderá reforçar-se uma corrente anticapitalista que conduza as massas a rejeitar o podre sistema que já só reproduz a miséria para os de sempre, e o capital senil que a todo o custo quer sobreviver. A táctica serve apenas para nos aproximar do nosso alvo: a revolução proletária e o socialismo. JOSÉ BORRALHO


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Professores: romper a paz podre No anterior número da PO escrevemos que a “aparente acalmia nas escolas” – resultante da assinatura do acordo de 7 de Janeiro entre as maiores direcções sindicais e o Ministério da Educação (ME) – seria “sol de pouca dura”. De facto, os primeiros sectores a quebrar a paz podre do acordo e a sair para a rua foram, significativamente, os mais explorados e inconformados: os professores contratados e os professores das AECs que, mobilizados pelos órgãos de precários do SPGL, protestaram simbolicamente frente ao ME a 18 de Fevereiro e a 11 de Março. O mote para a retoma da luta estava dado. Quatro dias depois, a 15 de Março, o ministério lançou mais achas para a fogueira, avançando com uma proposta de revisão de carreira que previa a liquidação dos quadros de escola e do concurso nacional. A pronta reacção dos professores e movimentos, secundada pelos sindicatos, goraria contudo essa intenção do governo, que optou por adiá-la. Mas no primeiro dia do concurso nacional, 12 de Abril, os professores contratados (e não só) foram confrontados com problemas na aplicação informática e com o facto de a nota da avaliação

de desempenho continuar a ser factor de graduação para a classificação profissional. O ministério manteve assim o prémio aos oportunistas que no ano passado entregaram os objectivos individuais e requereram avaliação pedagógica completa. Abriu-se deste modo nova frente de luta. A revolta aumentou quando se percebeu que o secretariado nacional da FENPROF tratou de forma displicente este assunto, chegando ao ponto de afirmar que se estava na presença de uma “anomalia” que o acordo de 7 de Janeiro com o ministério já teria sanado, e que a prova de que esse problema já teria sido resolvido era que no próprio aviso de abertura dos concursos não constava “qualquer referência à consideração da avaliação para efeitos de graduação profissional”. A ameaça de uma concentração externa aos sindicatos levou as suas cúpulas a jogar na antecipação, convocando protestos de rua para 19 de Abril. Agravando o descontentamento dos precários, a 15 de Abril, PS, PSD e CDS, em escandalosas votações cruzadas, chumbaram na AR dois diplomas do PC e do BE (este extremamente recuado)

Realiza-se o congresso da FENPROF a 23, 24 e 25 de Abril. O local, nem de propósito, é em Montemor-o-Novo, com câmara PC. Apresentam-se três tendências — a maioritária, que dirige a Federação, e duas minoritárias: Autonomia Sindical e outra ligada ao POUS de Carmelinda Pereira (apesar de já se encontrar aposentada). Por isso o congresso não vai dar em nada. Grande parte dos delegados são-no por inerência, são quadros sindicais do “aparelho”. Tudo vai continuar na mesma visão reformista em que, de vez em quando, há uma “lutas” e depois faz-se um acordo, depois novas “lutas” e novo acordo, etc., etc. Portanto o único suspense está na “luta” entre as lideranças das várias sensibilidades para assegurar a direcção e a hegemonia. Os dois blocos são o Sindicato da Grande Lisboa (aliança PS/BE/Renovadores) e o Sindicato do Centro, 100% PCP. O actual secretário-geral Mário Nogueira, da lista 100% PCP, na última vez esteve contra os poderosos sindicatos (as direcções) do Norte e Grande Lisboa, com o apoio do do Centro e os pequenos sindicatos da Madeira, Açores e Sul (Algarve e Alentejo). Por vezes, a corrente unida PS/BE/Renovadores tem posições sindicais mais direitistas que as do PCP. A actual ministra foi sindicalista no Sindicato da Grande Lisboa… outros tempos que já lá vão.

ANTÓNIO VINHAS

} O número de desempregados inscritos nos centros de emprego em Portugal subiu 19,6 por cento em Fevereiro face ao mesmo mês do ano passado e aumentou 0,2 por cento face a Janeiro. “Este valor significa uma estagnação do desemprego, situação sazonal e positivamente anómala, já que em Fevereiro do ano passado, face ao mês anterior, por exemplo, houve um acréscimo de 21.333 pessoas (4,8 por cento)”, refere uma nota do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP). } A dívida externa, que em 2008 se

situava nos 100%, em 2009 vale 111% do PIB, e continua a aumentar, segundo um estado do Diário Económico publicado em Março. “Nós somos o país da Europa que

tem a maior dívida externa líquida em percentagem do PIB; neste momento, no final de 2009 era cerca de 110% do produto. Esta é líquida, a bruta é de cerca de 250%”. (Vítor Bento, presidente do SIBS/rede Multibanco, Global, Março).

} Em Janeiro registou-se um agrava-

mento do crédito de cobrança duvidosa no sector da habitação: as famílias portuguesas devem 1900 milhões de euros, tendo esse valor aumentado 1,73%, segundo dados do Banco de Portugal. Os lucros do BPI aumentaram 280%; os lucros da Soares da Costa subiram para os 7,4 milhões, mais 46,7%; a REN regista ganhos de 116 milhões; os bancos pagam menos 50 milhões de impostos. (Dos jornais).

que contemplavam a efectivação dos professores contratados. A paz podre com o socratismo será quebrada no X Congresso da FENPROF, a 23 e 24 de Abril, com propostas de ruptura com o ramerrame do reformismo sindical. PAULO JORGE AMBRÓSIO

EMEF

Operários queixam-se da falta de trabalho Cerca de 150 trabalhadores das oficinas da EMEF (Empresa de Manutenção e Equipamento Ferroviário) do Entroncamento realizaram um plenário no fim de Fevereiro em que, como já tinha acontecido nas oficinas da Figueira da Foz e do Barreiro, discutiram e contestaram a diminuição do trabalho nas oficinas da empresa, responsabilizando a CP por retardar os trabalhos de manutenção do material circulante, que agora faz mais quilómetros que os recomendados sem ir à manutenção. E porque desconfiam que a redução do trabalho está relacionada com o contrato assinado com a Siemens, querem saber quais os termos desse acordo, para saberem se os seus portos de trabalho estão ou não em causa. Outra preocupação é a situação de precariedade dos jovens contratados a prazo, que no Entroncamento são cerca de 70 dos 460 operários que aí trabalham e vivem na permanente incerteza do despedimento, sem serem integrados. Os trabalhadores elaboraram uma moção que entregaram na Câmara Municipal onde, além destas questões, manifestam a sua preocupação com a ausência de uma proposta da administração de acordo de empresa para o sector, o impasse na negociação do regulamento de categorias profissionais, que está a impedir as promoções, e o não cumprimento dos compromissos assumidos em 2008 sobre o pagamento de subsídio de turno.

Ferroviários recusam congelamento de salários Com uma adesão próxima do 80%, os ferroviários estiveram em greve a 24 de Março contra a intenção do governo de congelar os salários no sector, este ano e até 2013. Segundo o Sindicato Nacional dos Ferroviários, tanto a REFER (Rede Ferroviária Nacional) como a EMEF ( Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário) seguiram as instruções da administração da CP (Comboios de Portugal) e apresentaram-se na reunião de negociação salarial “afirmando que, para sa-

lários e remunerações, este ano é de zero por cento” e, relativamente ao “regulamento de carreiras, não haverá evolução nas matérias que impliquem aumentos de custos”. A greve afectou o transporte de mercadorias e causou o caos nos transportes de passageiros, sendo particularmente sentida em Lisboa e Porto. Sobre estas empresas pende ainda a ameaça de privatização dos seus sectores rentáveis, prevista no PEC recentemente aprovado, o que, a acontecer, ir á lançar no desemprego mais trabalhadores.


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Imperialismo tropeça no Peru O massacre de Bagua, ordenado por Alan Garcia, foi impotente para travar os indígenas peruanos, que impuseram aos interesses imperialistas e aos EUA uma importante derrota há cerca de um ano. Por cá, com a imprensa na altura toda virada para o contrato milionário de Cristiano Ronaldo, as suas férias e aventuras amorosas, a luta exemplar dos peruanos não foi notícia. Por isso a recordamos.

Com a assinatura do Tratado de Comércio Livre entre os EUA e o Peru, mais de 60% da floresta da Amazónia foi aberta à voracidade das multinacionais. Petróleo, gás natural, minerais, madeira são alguns dos recursos naturais há muito na mira das multinacionais, que com este tratado viram abrir-se-lhes as portas da maior reserva natural do planeta. De imediato as multinacionais Perenco (França), Petrobrás (Brasil), BPZ Energy (EUA), Repsol (Espanha), entre outras, começaram a instalar-se, o que levou à expropriação e expulsão das várias comunidades indígenas peruanas que habitam há séculos nesses locais. Os indígenas peruanos, que desde a assinatura do tratado tinham vindo a resistir às expulsões e à instalação das multinacionais, iniciaram em 9 de Abril de 2009, pelo segundo ano consecutivo, uma jornada de luta nacional em defesa dos seus direitos, exigindo

INFORMAÇÃO ALTERNATIVA

Diário Liberdade é um projecto jornalístico alternativo anticapitalista e anti-imperialista, virado para a realidade social e as lutas de classes na península Ibérica, América Latina e África de expressão portuguesa e castelhana www.diarioliberdade.org

a revogação das “leis da selva”, como lhe chamam. Bloquearam estradas, portos fluviais, pistas de aterragem, e iniciam uma marcha, encabeçada pela Associação Regional de Povos Indígenas da Selva Central, em direcção a Lima. Sob o pretexto de que estavam a ser “instigados pelo comunismo internacional” e pelo governo venezuelano, o presidente social-democrata Alan Garcia (o mesmo que em Julho de 1986 ordenou o massacre de 259 presos políticos do Sendero Luminoso amotinados) mandou o exército tratar do assunto. Nos dias 5 e 6 de Junho, em Bagua, os manifestantes foram selvaticamente atacados por terra e ar, morrendo 44. Outros 200 foram feridos, não se sabendo o que aconteceu a outros 60, desde então desaparecidos. O movimento indígena começou então a cortar os acessos à capital interrompendo o seu abastecimento, nomeadamente de alimentos, ao mesmo tempo que vários edifícios estatais foram incendiados e polícias sequestrados. Depois foi convocada, por tempo indeterminado, uma greve nacional que paralisou vários sectores da economia. Os indígenas apelaram à solidariedade internacional. Alarmado com a dimensão dos protestos, a ineficácia da campanha de diabolização dos “revoltosos” e a intransigência obtusa de Alan Garcia, o Congresso anulou as leis que abriam a Amazónia peruana às multinacionais, por uma maioria de 82 votos. Esta importante vitória da movimento indígena foi comentada assim por um dos seus dirigentes: “Ganhámos, mas não nos sentimos triunfantes. É lamentável que o governo, que podia ter solucionado isto antes, tenha precisado de tanta violência e tantos mortos para o fazer”.

O ciclo infernal da guerra Parece-me que os políticos escondem o que é óbvio: os problemas económicos dos Estados Unidos não estão alterando os problemas no Iraque. De facto, a guerra contra o Iraque e o seu custo em sangue e tesouros estão impulsionando este período de instabilidade económica, recessão e perda de empregos. Como? Pois, ainda que as indústrias de defesa, como as empresas petrolíferas e agenciadoras de mercenários, por exemplo a Blackwater, ganhem dinheiro ilimitado, esta riqueza distribui-se estreitamente. Durante as guerras do passado, operárias e operários viam-se obrigados a entrar nas fábricas, onde construíram os armamentos para a primeira e para a segunda guerra mundial. Portanto, o dinheiro circulou amplamente, em particulare entre os negros recém-chegados do Sul segregado, ou entre as mulheres que entraram nas fábricas para manejar as máquinas deixadas por milhões de homens brancos chamados à frente de batalha (lembram-se de Rosita, a Rebitadora?). O chamado “exército de voluntários” que temos hoje é, em grande parte, produto do “alistamento” económico dos jovens pobres da classe operária que esperam obter vantagem na carreira militar para terem acesso às universidades, cada vez mais inacessíveis. Se esta esperança, este sonho não é alcançado, quais são as perspectivas para dezenas de milhares de homens e mulheres que regressam sem pernas, sem braços e sem capacidade mental depois de suas repetidas voltas pelo Iraque? A guerra no Iraque, que provavelmente custará triliões de dólares, é desenhada, na verdade, para o benefício de umas poucas empresas petrolíferas e suas filiais. (Claro, os combustíveis fósseis provenientes de depósitos de petróleo têm os seus próprios custos ecológicos e sociais que ainda não começámos a calcular.) Bush e os príncipes sauditas bailam a dança das espadas, enquanto a economia e a ecologia ardem. Os embargos de géneros de sobrevivência disparam; as manufacturas fogem da China; os preços da gasolina sobem; os bairros decadentes transformam-se em buracos infernais onde as pessoas tentam sobreviver; as escolas parecem campos de treino para a prisão. E as prisões? Talvez sejam a única indústria em crescimento nos Estados Unidos. As guerras são pobres substitutos para as economias enfermas porque apenas causam dor, perdas e, afinal, mais guerra. Esta guerra, iniciada pelos imbecis neoconservadores e pela máfia Bush/Texas, produziu dor, perdas e mortes em escalas épicas. Nenhum político tem a menor ideia de como pôr fim ao ciclo, porque todos eles também estão amarrados numa rede imperial, tecida pelos grandes negócios. Nem sequer prometem uma solução, apenas mais do mesmo, talvez em outro lugar. Do corredor da morte, Mumia Abu-Jamal


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CUBA

Impotência do regime Os grevistas de fome cubanos – todos eles condenados em julgamentos públicos regulares e com todas as garantias jurídicas comuns no Ocidente, a penas leves ou intermédias, por infracções, algumas de delito comum – pertencem na sua maioria a um movimento de gente muito determinada politicamente, ultra-reaccionário e assumidamente americanista. O seu vice-presidente faz-se fotografar com a bandeira de Cuba do lado esquerdo e a bandeira dos EUA do lado direito. No seu americanismo há um forte pendor republicano, traduzido até em desconfianças em relação ao Partido Democrata: quando Obama foi eleito, dirigiu-se-lhe oficialmente para assegurar a continuação do financiamento na linha ilimitada e inquestionável que Bush tinha com ele estabelecido. Fundado há nove anos e com uma estratégia perfeitamente delineada, usando uma linguagem escrita ao estilo caceteiro de Miami, o movimento das greves de fome foi planeado para ser durável no tempo, de forma rotativa, com o objectivo de pressionar o governo cubano a introduzir nas eleições municipais de 24 de Abril um referendo que propõe, além da libertação incondicional dos “presos políticos”, algumas alterações na ordem constitucional que criem condições para a sua legalização e entrada no jogo eleitoral. E claro, atingido esse objectivo, a intenção será não ficar por aí...

e mostra tendência para se esgotar. Com efeito, com Raul Castro o regime virou-se mais para dentro e as discussões internas têm revelado uma insatisfação profunda e um crescendo de críticas à direcção. Com um pano de fundo de grave e prolongada crise económica causada em grande parte pelo bloqueio dos Estados Unidos, que prossegue com a administração Obama, Cuba vê-se a braços com mais uma crise política a nível externo cujos efeitos só podem prejudicá-la, pesem embora as maniOs sindicalistas, que Uribe considera “elementos festações de simpatia que apesar de subversivos”, são alvos preferenciais da repressão. tudo consegue suscitar. Durante as duas últimas décadas, foram assassinados 2.245 sindicalistas e desapareceram 138; 3.400 sindicalistas estão ameaçados de morte. Mais de 90% destes casos não foram sequer investigados porque mais de 40 legisladores são suspeitos de ligação aos paramilitares. (Relatório da Amnistia Internacional).

O governo de Cuba aparece hesitante ao sabor destas pressões, autojustificando-se em matéria de “direitos humanos”, e algo impotente para lidar com o problema. Entretanto, a evolução do modelo castrista tem-se feito em plena crise estrutural

OS VERDADEIROS PIRATAS

Sarauís em greve de fome

CIVIS TERRORISTAS

Em 2005 havia 800 barcos pesqueiros que realizavam pesca irregular nas águas de Somália, país que não pode controlar a depredação da sua costa. Os pesqueiros espanhóis capturam 200 mil toneladas anuais de atum de forma ilegal na Somália, contribuindo com 40 por cento do consumo doméstico. (Relatório da Amnistia Internacional). OS VERDADEIROS TERRORISTAS Em 2007, aconteceram na Colômbia 280 execuções extrajudiciais. As vítimas, na maioria camponeses, foram apresentadas pelos militares como sendo ”guerrilheiros mortos em combate”. Por seu lado, os grupos paramilitares cometeram 230 assassinatos. Estes grupos, ligados ao narcotráfico, roubaram 4 milhões de hectares de terra a camponeses pobres. Os que se queixam destes crimes à justiça correm sérios riscos, tal como os seus advogados de defesa, alguns dos quais foram assassinados, como as advogadas Carmen Romaña e Yolanda Isquierdo.

Um vídeo polémico com três anos e só agora divulgado por fontes anónimas mostra um helicóptero norte-americano a abater civis em Bagdad, incluindo um repórter da Reuters. O WikiLeaks, um site de fontes anónimas, diz que os tiros mataram onze homens, entre os quais o repórter da Reuters e o motorista que o acompanhava. (TSF, 6/4/10) HEBRON APRISIONADA O número de palestinianos presos na região de Hebron, actualmente nas cadeias de Israel, é de 1540, dos quais 350 foram detidos este ano. Entre eles contam- se 80 menores de idade, presos no mês de Fevereiro. Segundo Amjad Al Najar, comparativamente com as outras regiões da Palestina, Hebron é a que tem mais palestinianos nas prisões de Israel. (Middle East Monitor, 7/4/10).

Ahamed Alansari, Brahim Dahane, Yahidih Ettarouzi, Rachid Seghir, Salem Tamek e Ealek Labini foram presos pelas autoridades marroquinas em 8 de Outubro de 2009, quando regressavam de uma visista aos campos de refugiados sarauís na Argélia, administrados pela Frente Polisario. Acusados de pôr em causa a segurança e a “integridade territorial” de Marrocos, aguardam há seis meses o julgamento em tribunal militar, apesar de serem civis. No dia 18 de Março cinco deles iniciaram uma greve de fome em protesto contra a sua prisão sem julgamento, tendo-se-lhes juntado um outro na terceira semana de Abril. Encontram-se na prisão se Salé, perto de Rabat, longe das suas casas no Sara Ocidental, e de tal forma debilitados que não conseguem sair das celas para receber visitas.


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Carnaval da crise Todo o comerciante sabe das dificuldades na venda de mercadorias danificadas, e das filigranas que há que tecer para lhes dar saída. Desde remendos e camadas de tinta num carro até dentes postiços, se for um burro. E, como convém, as necessárias recriações verbais para convencer os incautos de como será para eles boa e benéfica a operação a ser executada. O beco em que o capitalismo se meteu quando a avareza que o caracteriza desenvolveu todo o seu pleno potencial torna cada vez mais difícil “vender” o produto, isto é, a tarefa de convencer o público de que não há alternativa. Com a crise, quando as chagas purulentas se vão espalhando por todo o corpo, já não há pintura suficiente nem dentes postiços que possam cobri-la. O que resta? O disfarce, a máscara. Portanto, necessita imperiosamente de expandir ao máximo e controlar os meios de comunicação para, através deles, construir um mundo virtual, uma espécie de carnaval perpétuo, no qual a câmara de horrores que nos apresenta diariamente, sem paralelo na história, encontre cabimento como fenómeno natural, humano. Assim, a máfia dos especuladores bem-sucedidos deu em chamar-se “mercados multinacionais”, a resistência natural de quem como nós não

se deixa enganar é denominada “terrorismo”, os explorados são os “desfavorecidos” ou “perdedores”, a resignação perante as enormes diferenças no trato social é apelidada “coesão so-

HONDURAS

Resistência apela à solidariedade internacional Entrevista a Berta Cáceres, dirigente da Resistência Nacional

Que balanço fazem da luta? O nosso povo deu grandes passos em termos organizativos de e de consciência política. Agora estamos organizados por bairros, fábricas e outros sectores. Já não há grandes mobilizações com centenas de milhares de pessoas, mas a luta prossegue, agora centrada na Assembleia Constituinte, o que apanhou os golpistas e o imperialismo desprevenido. O balaço que fazemos, após o 24 de Novembro, é que estamos no caminho certo, porque o povo hondurenho deu uma resposta firme aos golpistas, ignorando a farsa eleitoral. 75% da população não foi votar.

Quem é o novo presidente? A equipe de Porfirio Pepe Lobo é constituída por gente que durante a administração do ex-presidente Maduro foi responsável pelo desaparecimento de 2.500 jovens em menos de quatro anos. São múltiplas as denúncias de grupos de direitos humanos e de defesa dos meninos de rua. Ele apoiou o golpe de Estado desde o início, embora agora apareça a querer marcar distâncias. Mas não nos engana. Não pode falar de reconciliação deixando impunes os golpistas, os assassinos e torturadores dos nossos companheiros. Pensamos que vamos enfrentar um período de militarização, repressão selectiva e de maior presença de tropas ianques no nosso país. A Resistência reivindica um estatuto de força beligerante? Estamos a trabalhar nesse sentido. Em todos os fóruns em que participamos apelamos aos movimentos populares, governos revolucionários e progressistas, para que multipliquem a solidariedade com a Resistência. Queremos que a Frente Nacional contra o Golpe de Estado seja reconhecida como força política importante e beligerante. É isso que vamos tentar em organismos como a ONU. (Resumen Latinoamericano, Jan./Fev.)

cial” e necessidade angustiosa de se desfazer de milhões de produtos absolutamente desnecessários que as fábricas vomitam é mascarada de “crescimento económico”. Poderíamos continuar, mas penso que estes exemplos são suficientes. Resta examinar a outra frente: os países que apresentam tentativas para dirigir a economia por caminhos diferentes, como tem acontecido nas últimas décadas na Venezuela, Bolívia e Equador (em Cuba não preciso de falar, é um velho empestado, com quem já gastaram a frioleira de 51 anos a preparar-lhe o túmulo). Na Venezuela, (com uma economia de mercado), o analfabetismo foi erradicado e está em marcha um processo centrado na educação, saúde e participação dos cidadãos no processo político e económico. Todas as organizações internacionais o atestam, começando pela ONU. Solução: Ignore-se o facto nos média (mesmo esquecendo que se trata, actualmente, de um país capitalista) e foque-se o sátrapa Chávez, ditador, inapresentável, mal educado, e assim por diante. Não importa que tenha ganho 8 vezes nas urnas aos opositores ou que a maioria dos meios de comunicação venezuelanos se dediquem a insultá-lo todos os dias, sem que ninguém os incomode. Porque o que ele fez aos meios de comunicação faz-se diariamente nos países capitalistas, isso sim, aos média que não se sujeitam ao guião dos conglomerados de tipo berlusconiano. E é que hoje a Venezuela continua na órbita do capitalismo, mas de uma maneira que parece perigosa para o futuro. De passagem, podemos ver até que ponto os países capitalistas estão interessados na saúde, educação ou erradicação da miséria. A obsessão dos média, para não dizer o engodo, em nada contempla esses aspectos sociais, mas apenas a nunca definida liberdade e há que retorcer os factos para que esta pareça ser a vítima. Mesmo que regularmente se realizem eleições avalizadas pelos organismos que as vigiaram. A gritaria pela liberdade é agora uma das máscaras mais usadas no carnaval. ANTÓNIO DOCTOR


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IRAQUE

Democratizar à bomba Dizem-nos que as eleições recentemente realizadas no Iraque foram um êxito, um sinal claro de que começa a dar frutos a nova orientação posta em marcha pelo general Petreus e Obama: a ida às urnas aumentou, os sunitas abandonaram em grande número a resistência armada, deixaram de boicotar o “Estado” e as eleições, a Alcaida caminha para a derrota, o país democratiza-se, garantem. Vista mais de perto, a realidade dos factos aponta numa direcção diferente. Em primeiro lugar, as “eleições” não foram livres porque se realizaram com o Iraque sob ocupação. E nunca o poderão ser enquanto esta durar; em segundo lugar, o seu único objectivo foi legitimar a invasão e a ocupação e criar as condições mínimas para a consolidação do controlo interno do Iraque capaz de permitir a retirada americana em 2011. Nestas circunstâncias, as eleições foram tudo menos a normal expressão da vontade do povo do Iraque, que tem 40 mil dos seus habitantes presos por actividades políticas e de guerrilha e outros 5 milhões refugiados ou deslocados. Tal como no Afeganistão, não passaram de uma farsa em que a vontade popular foi substituída por “arranjinhos” locais entre lacaios e colaboracionistas internos e as potências regionais, num quadro de preservação dos interesses imediatos dos EUA e da EU. E acima de tudo, uma mão sobre os recursos energéticos do Médio Oriente. Se, ao contrário do que aconteceu nas eleições anteriores, a resistência decidiu não recorrer a acções armadas contra a campanha nem impedir ou dificultar a adesão popular, a verdade é que não participou nelas por as considerar ilegais. Se a isto juntarmos o facto de os resultados eleitorais não terem correspondido ao que se esperava, apesar do “processo eleitoral” ter sido condicionado desde a primeira hora para que os resultados fossem convenientes aos EUA e aos seus parceiros ocidentais, o que ressalta é a fragilidade da orientação estratégica dos EUA pós-Bush. PRESOS NA SUA PRÓPRIA ARMADILHA Tal como aconteceu no Vietname, os norte-americanos encaminham-se para o desastre com a ideia de substituir os seus soldados por iraquianos e, principalmente, por mercenários; de apoiar e promover o poder fictício de lacaios, grupos sectários e provocadores, uns ao serviço dos ocupantes, outros de interesses regionais sauditas e iranianos; de aliciar e acenar com concessões às resistências sunita e xiita e aos nacionalistas curdos com o objectivo de os manterem sob controlo. É certo que diminuíram as baixas americanas, o que permitiu reduzir a pressão contra a guerra nos EUA e na Europa. Mas multiplicaram-se as iraquianas, nada se sabendo quanto às ocorridas entre as forças mercenárias, não contabilizadas, que constituem o maior contingente militar e de segurança no Iraque. Basta um olhar mais atento e informado para facilmente percebermos que não diminuiu a oposição dos iraquianos à ocupação, que as tensões sectárias, étnicas e nacionais permanecem, que o Curdistão iraquiano é de facto um Estado dentro do Estado, que as milícias sunitas e xiitas que observam tréguas não só não desarmaram, como podem a qualquer momento voltar à luta, que os interesses e agentes das potências re-

gionais estão à espreita e trabalham para a desagregação do Iraque, nomeadamente o Irão, país cujo regime tem forte influência entre os xiitas e no Sul do Iraque, e com quem Obama se tem procurado entender sobre a partilha das influências regionais, o acesso aos recursos do Iraque e à consolidação do poder interno. Evidência clara das dificuldades dos ocupantes, e do terreno movediço em que assenta o pseudopoder que tutelam, os resultados eleitorais acabaram por não produzir os efeitos esperados no que respeita à consolidação do poder interno iraquiano e à criação de condições para uma retirada dos EUA no próximo ano. Ao contrário do que se esperava, quem ganhou as “eleições” não foi Nouri al-Maliki, o homem de mão dos EUA e agente da CIA durante o regime de Saddam Hussein (ficou em segundo lugar), mas Ayad Allawi, o candidato colaboracionista xiita apoiado pelos sunitas. Ficou em terceiro lugar a Aliança Nacional Iraquiana, integrando vários grupos xiitas, o maior grupo étnico. Por seu lado, os curdos, numa clara afirmação de que são um estado dentro do Estado iraquiano e de que a sua ligação ao Iraque é apenas formal, ignoraram mais uma vez o acto eleitoral. Em consequência, em vez da pacificação, democratização e reforço do poder interno, multiplicam-se os implacáveis e violentos confrontos armados a que as facções colaboracionistas têm vindo a recorrer para a resolver as disputas políticas, e que tiveram início no Verão passado, como forma de pressão negocial. Estes resultados, além de provocarem já o acirramento das disputas sectárias, vão também obrigar a renegociar o frágil acordo que permitiu a realização das eleições, ano e meio depois da data inicialmente anunciada. Esse foi o tempo necessário para as facções colaboracionistas xiita, sunita e curda se entenderem sobre a divisão do poder, o controlo dos ministérios e territórios, a garantia para cada uma das etnias e nacionalidades de uma fatia do parlamento, a repartição dos lucros do petróleo (a privatizar), a revisão da lei eleitoral (foram impedidos de participar nas “eleições” 16 partidos e mais de 500 candidatos, suspeitos de ligações à resistência ou ao partido de Saddam Hussein, o Baas), etc. A renegociação ainda vai ter de lidar com a complicada exigência sunita de integração no Estado dos mais de 100 mil milicianos sunitas armados por Petreus para combater a sua própria resistência – o que fizeram com relativo êxito. O frágil princípio de compromisso pré-eleitoral, a não ser satisfeito, levará ao rompimento dos acordos estabelecidos por esta facção com os norte-americanos e os seus parceiros de poder, com os consequentes boicotes ao parlamento e ao governo, o recrudescimento das lutas sectárias, do banditismo armado e, em menor número, a passagem de algumas destas milícias para a resistência, onde de resto algumas delas já estiveram, o que faria a guerra voltar à intensidade e aos caos dos primeiros quatro anos.

melhor manobrar e dominar. Com isso liquidaram qualquer possibilidade de a médio prazo se vir a constituir um poder interno, do tipo neocolonial, minimamente viável, o que compromete uma retirada americana nos prazos previstos e a mais longo prazo. Há quem fale na eternização da presença militar ocidental. Se os norte-americanos retirassem em 2011, seria o colapso do poder fantoche iraquiano, a guerra civil e o desmembramento do Iraque. Todos o sabem, não é novidade nenhuma. Perante um quadro destes, com um poder interno de tal maneira frágil e volátil, o Iraque transformar-se-ia numa segunda Somália. Para um desastre destes não acontecer – o que implicaria o catastrófico enfraquecimento do controlo geoestratégico das potências ocidentais sobre o Médio Oriente e os seus recursos naturais, perigando a sua tutela sobre uma das maiores reservas mundiais de petróleo e deitando por água abaixo os negócios fabulosos da “reconstrução”, das empresas de mercenários e da indústria de guerra dos EUA – o governo norte-americano não tem outra solução que não seja continuar a ocupação e manter uma dispendiosa e sofisticada presença militar que está a absorver uma fatia em crescimento galopante do seu Orçamento de Estado, que já se situa acima dos 700 mil milhões e é responsável pelo acelerado aumento da colossal divida externa dos EUA. Sintoma claro das dificuldades em que se encontram os ocupantes para saírem do atoleiro em que se meteram é o silêncio cauteloso da admiPERSPECTIVAS SOMBRIAS nistração Obama, ao mesmo tempo que os chefes militares dos EUA no Iraque pedem novo adiaOs EUA estão a ser vítimas da sua própria mento da retirada das suas tropas. acção. Ao invadirem o Iraque, submeteram-no a uma lógica colonial, de fragmentação social, para ANTÓNIO BARATA


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TRIUNFAR OU PERECER www.diarioliberdade.org

Não podia ser mais auspiciosa a escolha do nome deste belo portal que a iniciativa dos nossos irmãos galegos pôs à disposição dos revolucionários lusófonos de todo o mundo: Diário Liberdade. Liberdade todos os dias, sempre e já – é esse o território que reconhecemos como nosso, aquele em que podemos exprimir o nosso pensamento, ex-planar planos de luta, acção e subversão, debater com outros as ideias que nos ajudem a progredir na luta anticapitalista, gizar programas para um futuro mais possível que este impossível presente. É com a maior alegria e confiança que saudamos a equipa fundadora que se atirou a esta empresa ambiciosa de cumprir a missão de “defender os interesses da maioria social” e “dar voz aos que não têm voz”, muito necessária missão neste mundo cada vez mais bárbaro e perigoso. Com o Diário Liberdade, podemos ganhar um inestimável novo espaço de informação e formação livres das mentiras e pressões ideológicas dos mídias do sistema. Aqui de Portugal, propomo-nos consultar, criticar, debater, apoiar e participar no Diário Liberdade, o único portal internacional lusófono de cariz anticapitalista e revolucionário. Além do mais, é de salientar o aspecto linguístico. Com os galegos e todos os povos lusófonos partilhamos a nossa primeira pátria comum, a bela língua galaico-portuguesa a que estamos ligados por laços afectivos e que nos une a todos como zona de afirmação de identidade e de pensamento. Importante como é, ela será também a nossa pátria derradeira, pois perdurará para lá da extinção das pátrias, num espaço infinitamente mais amplo, a esplendorosa comunidade internacional que, esperemos, verá a luz do dia quem sabe se bem mais cedo do que muitos imaginam. Desde que entretanto demos a morte ao dragão horroroso que nos asfixia com o seu bafo ardente. Por fim, recordem-se dois poemas que nos podem inspirar. Primeiro, os versos de Paul Eluard contra o fascimo: Et par le pouvoir d’un mot Je recommence ma vie. Je suis né pour te connaître, Pour te nommer Liberté.

Por fim, as estrofes finais do hino da Maria da Fonte, aquela mulher de valor que, de lá do seu Minho raiano, “de pistolas à cintura, a cavalo e sem cair”, tocou a reunir e clamou: Ei avante, Não temer, Pela santa liberdade Triunfar ou perecer! Ana Barradas

DESOBEDIÊNCIA A GUERRA DA ÁGUA Licínio de Azevedo, Moçambique

de água. Nesta espera, as mulheres têm que superar a preocupação com os filhos, a fome e as tensões geradas pelos conflitos entre elas. Na noite de 24 de Junho, véspera do 35º aniversário da independência, será projecto na Ler Devagar o filme que Fonseca e Costa realizou em Moçambique em 1975 – com imagens de celebridades já desaparecidas, como Samora Machel, Miriam Makeba e outros – precedido do documentário “Sonhos Guardados”, sobre os guardas, “esses homens quase invisíveis que, do lado de fora das nossas casas, guardam o sono e nos permitem sonhar (...), entre o medo, o frio, o silêncio da noite e a vontade de ver mais uma madrugada chegar.”

listas progressistas que os antecederam e varreram o subcontinente nos anos 50 e 60. Embora não abra grandes perspectivas relativamente à revitalização da esquerda e à superação revolucionária do capitalismo, é muita a informação que aí se pode encontrar relativamente aos processos em curso na Venezuela e Bolívia e sobre as estratégias norte-americanas para a região.

DONDE VIEMOS? António Borges Coelho, ed. Caminho, 2010, 25 •

PERSPECTIVAS – Revista de Ciências Sociais, Jan./Jun. 2008, Universidade Estadual Paulista/UNESP, São Paulo.

7 de Abril é o Dia da Mulher Moçambicana. A assinalá-lo foram exibidos dois filmes do cineasta Licínio de Azevedo, um na Livraria Ler Devagar, outro na embaixada daquele país. Ambos baseados em factos reais, um deles é “Desobediência” a história de uma camponesa acusada de ter causado a morte do marido, desgostoso por ela não lhe obedecer. Uma carta deixada pelo suicida, apresentada nas cerimónias fúnebres e lida perante todos, recomenda que os cinco filhos do casal e os bens sejam entregues ao seu irmão gémeo. Rosa, para provar a sua inocência, submete-se a dois julgamentos polémicos, um organizado pelo curandeiro, outro pelo tribunal local. Nos dois casos é considerada inocente e absolvida. Quanto ao segundo filme, “A Guerra da Água”, a personagem principal é também uma mulher. Com o amanhecer, sai de casa para ir buscar água, deixando três filhos sozinhos com pouco alimento e água. O furo mais próximo está a quilómetros de onde mora. Terá de passar a noite ali. As mulheres agrupam-se em torno de uma fogueira, cantando e falando sobre as dificuldades de quotidiano e sobre as suas relações pessoais. A espera acaba por prolongar-se por vários dias por causa de uma avaria na bomba

Saído com algum atraso, este número debruça-se sobre a vaga anti-imperialista surgida na última década na América Latina, que se expressa tanto no movimento bolivariano e na chama corrente “socialismo do século XXI”, animadas pelos adeptos de Hugo Chávez, como no regime cubano e nas correntes mais moderadas, de centro-esquerda, que governam o Brasil, a Argentina e, até há pouco tempo, o Chile. Com interesse diferente, os textos que abordam os processos nacionalistas e as dinâmicas regionais após a segunda guerra e a guerra fria e procuram situar e actualizar o debate sobre a esquerda, o capitalismo, o socialismo e a democracia, têm em conta tanto o colapso das correntes tradicionais da esquerda latino-americana que animaram vários movimentos de guerrilha como os processos naciona-

Este é o primeiro volume de uma série a publicar sobre a história de Portugal, pelo octogenário historiador marxista que ao longo das suas muitas obras tem lançado um olhar lúcido sobre o modo de reconstruir os factos e as ideias que presidiram à nossa evolução como Estado-nação. Este livro de abertura trata das nossas origem mais remotas, com especial realce para a presença romana na Hispânia, a civilização árabe no Gharb Al-Andalus e por fim o Ocidente cristão peninsular. Na introdução à matéria histórica, Borges Coelho reflecte sobre Portugal: “Somos iberos. A península hispânica é o nosso torrão. A História podia ter dado outras voltas, mas quis perpetuar durante quase nove séculos um Estado português que modelou profundamente as consciências e acumulou um fantástico património material e espiritual. A perda total da independência política atingiria gravemente a nossa memória e afectaria a fala e a invenção da língua que criámos e partilhamos com outros povos.”


MARÇO / ABRIL 2010 | 15

O valioso tempo dos maduros 5 Maio – Marcha contra a Europa do Capital e as suas Crises, partidas de Lisboa e Porto até Madrid. Organizada pela CGT (Espanha) e PAGAN. 7, 14, 21 de Maio, 4 e 18 de Junho – Sempre às 18.30 h, Museu da República, Ciclo “Ateísmo, laicismo e anticlericalismo em Portugal, com Onofre Varela (Saber sobre Deuses e crer em Deus), Ludwig Krippahl (Argumentos científicos contemporâneos intitulados Deus não existe), Carlos Barroco Esperança (Ateísmo, Laicidade e Democracia, Amadeu Carvalho Homem (A Religião e a República), Isabel Lousada (O anticlericalismo em Portugal: uma perspec17 Abril a 29 Agosto – Exposição tiva). Documental “Memória do Cam- 23 e 24 Maio – Festa do jornal Lutpo de Concentração do Tarrafal”, te Ouvrière , Presles, Val-d’Oise, Museu do Neo-Realismo, Vila Franca Paris. de Xira (Rua Alves Redol, 45).

23 e 24 Abril – Arraial Popular do 25 de Abril, Largo do Carmo, durante a tarde e a noite. Este ano tem por tema a paz. 1º Maio – Manifestação da CGTP, do Martim Moniz até à Alameda. Concentração PO no Largo do Chafariz de Dentro, Av. Almirante Reis, 14h.

2 Maio – Assembleia Geral Nacional da PAGAN, Paltaforma Anti-Guerra e Anti-NATO, 14,30 h., no Ateneu Libertário de Lisboa, Rua do Salitre, 139 – 1º.

A Batalha, nº 238, Lisboa Alambique, nº 10, Aljustrel Boletim Anarco-Sindicalista, 34, Lisboa Challenge, 14 Abril, Nova Iorque Che fare, Abril/Maio, Roma Contramarcha, Abril/Maio, Madrid Contropiano, 1/2010, Roma Dans le monde une classe en lutte, Fev., Paris Éxodo, nº 102, Madrid Jornal Fraternizar, Abril/Junho, S. Pedro da Cova Lutte de Classe, 126, Paris Lutte Ouvrière, nº 2175, Paris Monthy Review, Março, Nova Iorque O Militante Socialista, Fevereiro, Lisboa Octubre, Março, Madrid Partisan, nº 237, Paris Proletari Comunisti , Jan./Fev., Taranto Resumen Latinoamericano, Jan./ Fev., San Sebastian Utopia, nº 27/28, Lisboa

No n.º 122 da Política Operária (página 11) publicámos um texto do nosso amigo e assinante Fer nando Pulido Valente chamando-lhe impropriamente Francisco Pulido Valente. Pelo facto apresentamos as nossas desculpas aos leitores e em especial ao próprio.

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço. Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha. Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário geral do coral. As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa... Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade, Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade, O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essencial!

Mário de Andrade (1893 – 1945) Mário Raul de Morais Andrade nasceu em S. Paulo, no Brasil. Modernista, foi poeta, romancista, crítico de arte, musicólogo, professor universitário e ensaísta, sendo reconhecido como um dos mais importantes intelectuais brasileiros do século XX. A sua arte é atravessada pela busca da identidade cultural brasileira, tendo dedicado aos ritmos nordestinos uma atenção particular.


Esquerda parlamentar pela trela do PS Sem qualquer surpresa, o governo fez aprovar o Orçamento de Estado e a simbólica resolução sobre o PEC – Plano de Estabilidade e Crescimento – com a ajuda da direita. Era o que se esperava e todos sabiam que ia ser assim. Só os eternos ingénuos poderiam acreditar e acalentar alguma esperança sobre a possibilidade de se forçar o PS a fazer um acordo “à esquerda”. O PCP e o BE não obtiveram nas últimas eleições nenhuma vitória capaz de alterar o rumo da política nacional e obrigar o governo e a direita a fazer cedências. É certo que consolidaram ou reforçaram a sua votação e representação parlamentar, mas isso não significou qualquer princípio de alteração na correlação de forças entre o mundo do trabalho e o do capital. A imposição do PEC e a aprovação do OE são a prova não só disso mesmo, mas também da falência da estratégia seguida pela esquerda parlamentar, que se julga em condições de arrancar cedências a Sócrates. Aquilo que se está a verificar é precisamente o contrário. Ao acenarem aos trabalhadores com essa ilusão, apenas os fazem passar por parvos úteis e conduzem-nos para novos desastres. E quando isso acontecer, não faltarão as velhas e esfarrapadas desculpas com que se habituaram a alijar as responsabilidades: a culpa é da direita, da outra parte que foi sectária, da (eternamente) insuficiente unidade dos trabalhadores e do povo, etc. Mas a culpa é do PCP e do BE, de facto, por se recusarem a exigir e a trabalhar para derrubar o governo (no que de resto são acompanhados por quase toda a esquerda não parlamentar). Ao recusarem-se a fazê-lo por mero cálculo politiqueiro e partidário (com a grave crise estrutural que o país vive, é eleitoralmente muito mais vantajoso deixar o governo governar e “malhar” nele, do que assumir o seu derrube), o PCP e o BE meteram-se num beco sem outra saída que não seja a de, em alternância com a direita, irem arrastando os pés, dar conselhos e sugestões “construtivas” sobre como deveria ser uma política ao serviço do povo, como se poderia ter uma melhor justiça fiscal, como os patrões e o Estado poderiam contribuir para uma mais justa distribuição da riqueza e uma “economia justa”, elencar as malfeitorias do governo, as mordomias dos gestores, para no fim, em nome do mal menor, ajudarem o governo do PS a aprovar as suas medidas “sociais”. Os magros resultados eleitorais do PS e do PSD, somados ao significativo reforço do PP, apenas expressam a divisão do bloco central, ao contrário do que defendem o PCP e o BE. Essa divisão é provocada pela grave crise

económica que, ao contrário do que era habitual, desta vez também afectou a sua base de apoio, a dita classe média, e acirrou as guerras de interesses mafiosos, de que os sucessivos escândalos vindo a público são a expressão visível. Os maus resultados do PS e do PSD não são fruto do combate movido ao governo pela esquerda parlamentar. Se assim fosse, há muito o grande patronato e as suas confederações teriam feito soar os alarmes, em vez de andarem calmamente a dar “recados”, fazendo saber que o governo não é para ir abaixo (por enquanto), o que querem ver feito e aprovado, e a multiplicar os discretos reparos morais sobre os escandalosos ordenados e prémios dos gestores públicos (os privados já é outra coisa), a pouca qualidade e idoneidade dos políticos, a necessidade de não serem só os de baixo a pagar a crise, etc. Ou seja, se os resultados eleitorais ditaram que agora nenhum dos partidos do “arco do poder” pode governar sozinho porque o “centrão” se encontra dividido, isso não significa que a grande burguesia, o patronato, tenha ficado desarmado, impotente, remetido à defensiva. Ao contrário, são eles, a grande burguesia e o patronato, quem dita as regras, obrigando os seus partidos, da direita e do centro (CDS, PSD e PS) a manter as suas disputas pseudopolíticas em níveis que não prejudiquem a realização de acordos necessários à “estabilidade” (a este propósito é significativa a simpatia e unanimidade em torno da eleição do novo líder do PSD) e fazer os pobres pagar a crise. Só assim se podem entender as cambalhotas do PS, CDS e PSD, que agora dizia uma coisa e logo outra (onde estão as preocupações do PSD com as PMEs, o fim do pagamento especial por conta, as juras de que não apoiariam nenhum aumento de impostos? E as juras do governo de que não iria privatizar nenhum sector estratégico, a intransigência de há meses relativamente ao ensino e às obras públicas faraónicas, por exemplo?). Ao não quererem perceber isto, insistindo na fantasiosa possibilidade de arrancar concessões ao governo de Sócrates, o PCP e o BE colocaram-se de facto na dependência das estratégias do governo e do patronato e são prisioneiros delas. Se no curto prazo até podem capitalizar alguma simpatia ao explorarem as responsabilidades do governo no agravamento da crise, do desemprego e da miséria, resta saber por quanto tempo poderão manter essa postura e continuar a iludir os trabalhadores sobre a possibilidade de, no actual quadro social, provocarem uma mudança do rumo político do país. ANTÓNIO BARATA

Não acredito neste 8 de Março Deixei de acreditar no 8 de Março desde que soube que o rendimento médio do homens portugueses no final de 2008 foi de 1112,4 euros por mês, contra os 871,6 euros das mulheres – uma diferença de 21,65% –, que os patrões portugueses devem a cada trabalhador 1259 euros e que o sismo do Chile desviou o eixo da terra. É que é muita coisa a mais, custa a digerir. Tal e qual como quando se deixa de acreditar no Pai Natal, na Fada dos Dentes ou no Menino Jesus. Eu pensava que o 8 de Março servia para alguma coisa, que podíamos forçar uma melhoria da vida das exploradas e oprimidas, que a data comemorada tocava nos corações mais empedernidos – cento e tal meninas-operárias sacrificadas nas chamas do edifício da Triangle Waist de Nova Iorque há mais de cem anos fizeram tremer os alicerces do mundo do trabalho: os protestos que se seguiram puseram os patrões em sentido por uns tempos e a energia libertada pela indignação diante desse holocausto continua a fazer-se sentir até hoje, por mais que nos queiram fazer esquecê-lo e convencer-nos de que o 8 de Março foi uma invenção gentil da bondosa burguesia em prol da mulher. Contra essas falsificações patéticas, nunca é de mais recordar que, faz este ano precisamente cem anos, em 1910, o II Congresso de Mulheres Socialistas aprovou, por proposta da comunista Clara Zetkin, a realização de um dia de luta internacional da mulher, a exemplo do 1º de Maio, dia de luta da classe operária, para lutar pelas reivindicações laborais das operárias e defender os direitos políticos das mulheres. Na Europa, a primeira celebração do Dia Socialista das Mulheres, organizado por iniciativa do Secretariado Feminino Internacional, deu-se a 19 de Março de 1911, por decisão da Secretaria da Mulher Socialista, órgão da Internacional. Levou às ruas mais de um milhão de mulheres na Europa e nos Estados Unidos, evidenciando o seu carácter massivo. A luta pela participação política da mulher e a ideia da emancipação feminina encontram-se em primeiro lugar nos escritos de Marx e Engels. A frase de Marx, “A opressão do homem pelo homem iniciou-se com a opressão da mulher pelo homem” e a perspectiva sobre a família, a mulher proletária e a mulher burguesa contidas em A Origem da Família, da Propriedade e do Estado, de Engels são parte do legado teórico que dá base à noção da necessidade da libertação da mulher proletária. E o eixo da terra? O eixo da terra devia desviar-se, sim, mas quando se ouvisse o clamor triunfal da classe revolucionária por excelência – o proletariado das fábricas, aquela de produz mais-valia, não esse falso proletariado que nos vendem agora em que cabem todos os assalariados, síntese teórica da colaboração entre classes em que os de baixo ficam sempre a perder porque são carne para canhão dos de cima – e se levantasse um terramoto tal que o mundo tremesse e oscilasse e uma nova ordem surgisse sobre o caos em que hoje vivemos. Uma nova ordem com as mulheres dentro. Isto é, em igualdade, em simetria e em sintonia com o resto da espécie humana. Uma ordem que promulgasse uma coisa muito simples: a trabalho igual, salário igual. O resto viria atrás. Depois do pão, as rosas. Nesse ainda incumprido 8 de Março (ou 23 de Junho, ou 14 de Novembro) é que vou acreditar. ANA BARRADAS


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