COMO SURGIU A CAATINGA? Autor: Francisco de Paula Almeida
Xikão
LITERATURA DE CORDEL 1ª Edição - Campina Grande - Paraíba - Brasil - Outubro/2014
XICÃO ALMEIDA por JÚNIOR CORDEIRO Uma fala sereníssima. Um riso largo na cara. Um jeito franciscano (fazendo jus ao nome que lhe deram na pia) de portar-se frente às imposições do consumo. Um estilo de vida inquieta e itinerante, típico dos destemidos ciganos que desbravam o globo em busca de aventuras. Um gosto impressionante pelos animais. Um apurado poder de observação das minúcias da natureza. Uma maneira peculiar e pura de fazer arte (como artista plástico, poeta, fotógrafo da alma dos bichos e das plantas) e, sobretudo, uma resposta certeira, rápida e irônica a tudo e a todos na ponta da língua, típica dos grandes repentistas nordestinos. Estou falando de Xicão Almeida, o Francisco dos rabiscos, dos óleos sobre telas, desenhos e formas surreais, das fotos curiosas e dos versos brincantes e debochados. Todas essas improfícuas definições se juntam num termo mais genérico e palpável que apresenta muito bem essa forma despojada de gente de quem eu falo agora: Xico de Inácio Francisco(esse é o termo mais completo). Xico é carinhosamente chamado de Xicão porque é um aumentativo por excelência, não só pela sua estatura avantajada, mas pela sua grandeza como artista e pessoa. Puxou a Seu Inácio em todos os sentidos, sobretudo no tocante ao gosto intenso pela poesia popular e a insistência encantadora numa vida desapegada às tolices do nosso tempo e concentrada em gracejos, piadas e zombarias sobre as dificuldades humanas de cada dia. A arte de Xicão é inseparável do seu excelente caráter, da sua índole altruísta. Esse incansável cavaleiro das caatingas não pede nada em troca do seu fazer artístico. Faz arte apenas pelo prazer da existência, dando sentido a sua vida e à das pessoas que têm o prazer de desfrutar da sua companhia e do seu rico trabalho. Não perderei tempo aqui tentando dizer o indizível ou definir com clareza esse artista complexo, que se faz assim, paradoxalmente, pela extrema simplicidade do seu ser e da sua obra. Deixo esse difícil ofício para quem pretenda categorizar em vão o trabalho intimista de Xicão, e queira se aventurar em estabelecer conceitos ou limites aonde não há. JÚNIOR CORDEIRO Poeta, cantor e Compositor
Num passado bem distante não havia plantas, animais mas o Céu e o Sol exis am os dias passavam iguais porque nada acontecia só tédio e monotonia só tristeza e nada mais Só com poeira e as pedras a Terra também exis a porém sem nenhum vivente nem água sequer havia nada de fauna e de flora passo a contar agora em forma de poesia O Sol era todo amarelo a Terra toda cinzenta nenhuma gota de água deserta e poeirenta Norte, leste, Oeste e Sul o Céu só nha o azul na ro na sonolenta O Sol numa estranha tarde no momento de par r olhou para a Terra e o Ceu logo ao se despedir mandou uns raios coloridos Terra e Ceu foram ngidos tudo pareceu sorrir 01
Foram tão belas as cores destes raios ru lantes emi dos pelo Sol iguais a mil diamantes o Céu se pintou de cores lindos tons mul colores com luzes tão radiantes A Terra olhou para o Céu ficou muito encantada com a beleza que viu nunca antes vislumbrada o Céu para Terra olhou sua beleza, o encantou nesta visão tão sagrada Passaram a noite inteira comentando o ocorrido sobre tamanha beleza nunca nham conhecido a Terra alegre a sorrir o Sol se pôs a surgir com cara de aborrecido O Céu disse venha cá! a Terra chamou também obrigado grande Sol você não sabe o bem que causou pra nossas vidas com suas bolas coloridas mostrando a força que tem
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Como assim? Falou o Sol o que foi que eu lhes fiz? a Terra olhou pro Céu eu digo ou você diz? o Céu se pôs a falar começou a relatar com emoção e feliz Você ontem ao fim da tarde quando de nós despediu jogou seus raios de luzes virou as costas e par u cores que você lançou grande mudança causou o Sol alegre sorriu Foram tantos obrigados o Sol ficou sa sfeito o Céu pediu para o Sol que repe sse o seu feito toda tarde sem faltar com suas cores alegrar causando tão bom efeito E assim o Sol cumpriu sempre ao entardecer irradiando seu brilho também ao amanhecer modificando o cenário rigoroso no horário enriquecendo o viver
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O Céu olhava a Terra que era cinzenta e feia agora estava tão bela brilhante sem ter pareia por ela se apaixonou e com um sopro a beijou com encanto de sereia Ao ver a beleza um do outro os dois se apaixonaram misturando suas cores as suas formas dançaram foi tão linda esta paixão com tão fina perfeição num belo coro cantaram O Céu pediu para o Vento que acariciasse a Terra se enfeitou com as nuvens abraçou o topo da serra num enlace carinhoso soprou um vento gostoso como final duma guerra O Céu cuidava da Terra feito copa de Taiúva em sintonia perfeita como a mão para a luva como o dedo para o anel a caneta pro papel como o vinho para a uva
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A Terra sen u vontade de retribuir também tudo quanto recebia do seu amor, do seu bem era pobre feito Jó só nha pedra e pó como dar, se nada tem? Isso a deixou muito triste por não ter nada pra dar pensou qual a solução como iria compensar tantas bênçãos recebidas tantas graças coloridas pensou, tornou a pensar Já estava desis ndo quando foi um certo dia percebeu que algo estranho do pó da terra surgia era uma linda semente que brotava em sua frente como um milagre nascia Brotou do ventre da Terra esta tão bela semente deixando a Terra feliz extremamente contente por seu sonho realizar ao Céu iria ofertar o mais sublime presente
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Esta semente milagre foi fruto do grande amor entre o Céu e a Terra como um ato de louvor pelas bênçãos derramadas pelas carícias trocadas abelha, pólen e flor Guardou a bela semente com todo amor e cuidado bem jun nho do seu peito tesouro ficou guardado esperando ela se abrir para uma planta surgir presenteando o amado Mas o tempo foi passando a semente não se abria a terra ficou tristonha piorando a cada dia ela tá morta, pensou e a semente enterrou com muita dor e agonia O Céu vendo a tristeza da sua Terra amada chorou a semana inteira que a Terra ficou alagada a água molhou a cova a semente se fez prova desta paixão tão sagrada
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Com a água a tal semente se abriu feito um sorriso brotou árvore tão bonita de se perder o juízo cresceu e mul plicou-se por toda terra espalhou-se compondo tal paraíso A Terra ficou feliz que inda hoje ela canta todos sons da natureza inebriada encanta abriu o ventre e plantou a semente então brotou nascendo a primeira planta Foi nesta bela mistura cada qual com seu valor que nasceu a primeira árvore como canto de louvor as folhas, frutos e flores espalhando suas cores neste cenário de amor Da Terra, do Céu, das plantas cada qual com seus poderes sementes, flores e frutos cumprindo seus afazeres deram origem a vida nesta explosão colorida todas espécies e seres
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Foi linda a festa de cores que todos se admiraram flores nasceram também seus odores exalaram o Céu foi impregnado pelo néctar encantado que estas flores lançaram A Terra toda feliz quis expandir suas cores para agradar mais o Céu se abriu num leque de flores exalando seus perfumes por todo Céu, vales, cumes espalhando seus odores Das flores surgiram pássaros outras espécies também uma explosão de vidas de tudo que a Terra tem o mundo virou paraíso toda boca virou riso sem exceção de ninguém Plantas mais perto do Céu tudo que a Terra queria ficar próxima do amado a Terra era só alegria escolhida as escudeiras aves como mensageiras desta linda sinergia
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Quando na manhã seguinte o Sol viu toda nobreza quase morre de ciúme de vislumbrar tal beleza pensou que não estava só o que era pedra e pó agora tem realeza Ficou cheio de inveja por não brilhar mais sozinho nha agora um rival o pássaro perdeu o ninho não podia ficar assim um pensamento ruim para abrir o seu caminho Como pode? Disse o sol vou perder o meu cajado dividi todo o meu trono tô me sen ndo humilhado de onde vem tantas cores não vou dividir meus valores nem vou perder meu reinado Eu pensei que fosse o dono dos movimentos, das cores da força da criação o controle dos motores agora esta ameaça vai virar minha desgraça vou queimar, plantas e flores
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Assim cheio de inveja decidiu tudo queimar com aumento do seu fogo inimigos vão tostar reduzir a pedra em pó sem clemência e sem dó e nada vai escapar O Sol tomado de fúria o seu plano efetuou por pouco não explodiu pelo fogo que lançou queimou até se cansar seu intuito era acabar só parou, quando apagou O Sol ficou muito exausto da batalha que travou porém cuidadosamente o seu plano mensurou as plantas sobreviveram viu que muitas não morreram pensando alto falou: Tem nada não, me aguardem amanhã eu voltarei descansado e mais forte com forças retornarei eu vencerei esta guerra vou atacar o Céu e a Terra com meu fogo os matarei
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Escondido um urubu ouviu o Sol resmungando escutou toda maldade que estava planejando para a ngir a terra com o seu plano de guerra ficou calado escutando Foi logo avisar a Terra branco da cor duma garça chamou a Terra e o Céu para contar da trapaça que ouvira inda pouco pensaram ele está louco quando falou da desgraça A Terra ficou surpresa ques onando as razões de tanto ódio do Sol o porquê destas tenções pois não via nenhum sen o que nha acontecido buscando explicações É por isso que sen mos quentura insuportável durante todo este dia um calor abominável murcharam folhas e flores efeitos devastadores o Sol foi o responsável
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Sempre julguei que o Sol fosse o meu melhor amigo precisamos um do outro pois sempre contou comigo ele fornece calor sua luz me dar a cor nunca fui seu inimigo Tudo inveja amiga terra disse firme o urubu tá dentro de todos nós dele, de mim e de tu como semente do mal eu nunca vi nada igual disse nervoso o tatu Ficaram desesperados que plano iriam fazer? para conter esta fúria o Sol tem muito poder precisamos duma saída ou será ex nta a vida daqui para o anoitecer O Ceu disse eu já sei descobri a solução cobrirei toda a Terra as nuvens dão proteção não vamos perder a guerra isolarei o Sol da Terra evitando a destruição
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Discu ram tal proposta e também as consequências suas causas e seus efeitos falaram com eloquências buscando explicações em busca de soluções nos saberes, nas ciências Chegaram a um consenso pois isto seria letal não teria a fotossíntese para a flora tão vital sem o Sol nós morreremos não é isso que queremos voltam ao ponto inicial Sem encontrar soluções o tempo ia se passando todos unidos a pensar refle ndo e meditando propostas foram surgindo aos poucos se dirimindo o dia já se aproximando Passaram a noite inteira opinando, discu ndo sem chegarem a um consenso o dia próximo surgindo só as árvores acordadas sozinhas desesperadas todos estavam dormindo
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Quando o dia amanheceu o Sol surgiu violento feito um vulcão em chamas aquecendo a Terra e o Vento com seu brilho radiante com seu bafo escaldante deixando tudo ao relento E queimou o dia inteiro com toda fúria e poder viu toda a flora secar sem dó e sem padecer o verde ficou cinzento cessou o clima, o vento cenário triste de ver O Sol sorriu sa sfeito ao ver tal destruição que tudo nha ocorrido conforme toda armação executou seu projeto agora tá tudo certo pois cumpriu sua missão O Sol olhou para Terra viu que ex nguiu toda a vida pois tudo estava cinzento a Terra descolorida posso agora descansar sozinho volto a reinar veloz fez sua a par da 14
Depois do Sol ir embora para além, muito distante todos os seres da Terra surgiram neste instante comemorando a vitória vou lhes contar a história do plano mirabolante O Sol nem desconfiou que se tratou de um plano pra ludibriar o mesmo para levá-lo ao engano levando ele a pensar que a todos ia matar para reinar soberano Fingindo que estavam mortas folhas secaram, caíram formando grande camada a Terra inteira cobriram protegendo-a do calor um escudo protetor no solo distribuíram Folhas viraram espinhos lagos ficaram rachados animais com mime smo ficaram adaptados uma cor acinzentada o Sol olha, não ver nada deixando-os abandonados
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Toda a flora combinou es pular a missão dividir ao ano inteiro a época da floração não ocorrer de uma vez fingindo grande escassez pra não chamar atenção Pra marcar onde chover de forma muito su l o Juazeiro e o angico grande missão assumiu sinalizando que há vida na Caa nga ressequida que a vida não sucumbiu Por toda estação chuvosa a flora fica coberta pelas nuvens protegida toda natureza alerta as nuvens como um lençol para cor nar do Sol de forma muito esperta Foi desta forma heróica com força, inteligência que a Caa nga surgiu com amor e competência a Caa nga é encantada você olha, não ver nada Mata Branca, resistência
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PROJETO CONHEÇA O POETA
Projeto que nasce sem nenhum arrojo de grandeza, nem pretensões maiores, apenas buscar imprimir as cores da poesia destes vates anônimos constituintes da Geografia
psico-espacial dos Cariris Velhos, viajando através dos caminhos da Literatura de Cordel. Conhecer o Poeta, busca proporcionar maior dizibilidade e visibilidade a estes artistas que nascem frutos de sementes plantadas no solo popular, com suas raízes fincadas no imaginário coletivo desta Nação Caririzeira. Também não perdendo de vista, o objetivo de possibilitar o contato poético entre o leitor e o autor, através da própria obra, com o intuito de incentivar, promover, publicar, semear, apoiar, divulgar e principalmente, trazer a obra empoeirada lá do fundo do baú, para apreciação do público. A semente foi plantada... Francisco de Paula Almeida Poeta Semeador
PROJETO Conheça o Poeta
Desenhos, Edição e Impressão Francisco de Paula Almeida e-mail: franciscodepaula.almeida@gmail.com Facebook: francisco almeida.almeida