Ruas da Mooca - um olhar perdido

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ruas daumMooca olhar perdido fotos e organização | Francisco Sanches textos | Nelson Brissac


Vd. S찾o Carlos

Av. Presidente Wilson

Av. Dian처polis

R. Pedro Paulucci

R. Domingo da Fonseca

R. Frei Gaspar

Al. Rubi찾o Jr.

As ruas da Mooca


R. Americo Vespucci

R. Canuto Saraiva

R. Javari

Próximo a R. João Caetano

Próximo à R. Marina Crespi

R. Pres. Costa Pereira

Vd. Prof. Alberto M. de Camargo

R. Borges de Figueiredo

R. São Nicásio

R. Barão de Monte Santo

R. Celso Azevedo Marques

R. Cdor. Roberto Ugolini

R. João Antônio de Oliveira

Próximo à R. dos Trilhos

R. Sarapuí

R. Nova Trindade


o olhar perdido

A paisagem urbana atual no bairro da Mooca, em São Paulo, está bastante diferente daquela que poderia ser vista no começo do século XX. Por óbvio, mudanças são naturais, dado o crescimento do bairro juntamente com a cidade ao passar dos anos. Porém, as dezenas de obras que acontecem simultaneamente - a maioria delas de grandes construtoras que planejam construir prédios comerciais e residenciais – chamam a atenção para onde anteriormente havia galpões e indústrias. Por outro lado, ainda se vê diversos prédios quase centenários de antigas fábricas, que seguem completamente abandonados.

Boa parte dessa perda ocorre porque a população que ali vive, deixou, de certa forma, de preocupar-se em conservar a identidade do bairro. A perda de consciência deve-se, em parte, a perda de olhar do morador para sua própria moradia à medida que o tempo imprime uma rotina pesada à vida das pessoas e as torna alheias aos pequenos elementos poéticos que moram bem ao lado. Dessa forma, convida-se o leitor ao resgate deste “olhar perdido”.

Por meio de imagens, é possível evidenciar as transformações que acompanharam as mudanças da cidade. Essa transformação caracteriza-se pela diferença de configuração do espaço urbano, pela transformação de hábitos de vida da população e pela mudança de papel do bairro para a cidade.

Ao final, diante das construtoras comprando terrenos para suas gigantes obras, os territórios que ainda não foram pleiteados sofrem com o visível abandono e desgaste pela degradação provocado pela especulação imobiliária. O bairro tem se tornado, portanto, um grande não-lugar, onde pessoas vem e vão, transitam livremente pelo local, porém sem jamais notarem o que está bem ali, invisível aos seus olhos.

A problemática deste livro surge quando o bairro deixa de assumir a identidade que havia construído até então. Toda a sua vivência, todas as tradições, experiências e história são deixados para trás com o tempo, ao passo que ícones históricos como antigas indústrias que ali estavam, são trocados por condomínios de alto padrão.

Assim, a principal proposta deste livro é transmitir, através de suas imagens, o olhar do autor e sensibilizar o leitor da sua mensagem, quase que como um convite para que todos reparem em seus bairros, cidades, países e percebam o quanto os pequenos elementos influenciam no conjunto que forma a identidade cultural de qualquer região.

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A cidade – os sistemas de comunicação e transporte – impõe ganhar tempo. Andar depressa é esquecer rápido, reter apenas a informação útil no momento. Seria a anamnese o antípoda da pressa, da velocidade? Em vez de acelerar cada vez mais, diferenciar: conservar várias temporalidades no mesmo tempo, simultaneidade de passado e presente, presente e futuro. Introduzir um intervalo – uma diferença – no ritmo das coisas, provocando uma sobreposição de andamentos. Retardar o fluxo, criando um espaço vazio no qual outra coisa pode se instalar. Um mundo de lentidão, que se dá tempo. Devagar: sem destinação precisa, desacelerado. É o que permite que o passado, o tempo perdido, seja presente, como uma alusão, como uma brisa que sopra suavemente.



As paisagens urbanas passam despercebidas pelos olhos de quem a habita. Não há tempo para olhá-la, para descrevê-la, para senti-la. Esse cruzamento entre diferentes espaços e tempos, entre diversos suportes e tipos de imagem, é que constitui a paisagem das cidades.


É preciso saber ver, nas imagens de hoje, aquilo que muitas vezes nos escapa. O que não conseguimos ver. Essas imagens têm a beleza dos pequenos gestos e das grandes paisagens.


Janelas são, desde os primórdios da pintura, um dispositivo do olhar. Essas janelas, porém, não dão para nenhuma vista. Tudo o que se tem é um horizonte fechado. Essas janelas abrem para o problema da paisagem.









A imagem fixada pelo aparelho fotográfico é uma revelação. A visão fotográfica quer, seja qual for seu objeto, assinala a presença do mistério.


Não há visibilidade imediata. Não se vê, claramente, nada. A paisagem nega informações. O olhar, então, em vez de debruçar-se para ver ao longe o que se perde no horizonte, desloca-se na superfície.



Estamos acostumados a só ver aquilo que é dinâmico, que se agita ante nossos olhos, que acontece. Aí não se vê nada. Mas, de fato, tudo está acontecendo. Essas cenas são delicadas demais ou grandiosas demais para ficarem impressas na retina habituada só ao que é passageiro.



O excesso de nomadismo – a recusa da cultura – levou ao abandono das velhas catedrais, à perda do hábitat humano. Sabemos que são feitas de pedra e mármore, mas hoje não podemos chegar a um desenho arquitetônico. Não poderíamos construir catedrais ao lado das que já existem. Elas teriam de ser diferentes, ter credibilidade para nós. A cidade contemporânea deixou de ser um testemunho cultural, a arquitetura deixou de ser pensada como criação de um espaço de habitação. Perdeu-se a relação entre construir e morar. Quando se muda sempre de lugar, criam-se abrigos, não testemunhos culturais.


A cidade contemporânea deixou de ser um testemunho cultural, a arquitetura deixou de ser pensada como criação de um espaço de habitação. Perdeu-se a relação entre construir e morar. Quando se muda sempre de lugar, criam-se abrigos, não testemunhos culturais.













Nada, aparentemente, está acontecendo ali. Imobilidade, silêncio. Mas essas histórias são feitas de vazios. Tudo está nos pequenos gestos, no que não está sendo dito. A temporalidade é condição do acontecimento.




As cenas – feitas à margem do ritmo acelerado das informações e dos acontecimentos – consistem, em geral justamente nisso: imagens do invisível. Todas mostram rostos, gestos e vistas de lugares.






O invisível não é, porém, alguma coisa que esteja para além do que é visível. Mas é simplesmente aquilo que não conseguimos ver. Ou ainda: é aquilo que torna possível a visão.

Trata-se de transformar a cidade num campo de experimentação sobre a noção de observação. Levar o público a forjar um novo olhar sobre a cidade.





Ruas da Mooca - um olhar perdido, 2013 Todos os direitos reservados à Francisco Taborda Vieira Sanches fotografias Francisco Sanches e projeto gráfico Coordenação editorial Zuleica Schincariol tiragem 1 exemplar gráfica e editora InPrima tipografia

DIN Next LT Pro

papel Couché Fosco 170g/m2 câmeras utilizadas Canon G10, Nikon D70s e Nikon D5000 Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização prévia do autor. Textos retirados do livro Paisagens Urbanas, de Nelson Brissac Peixoto, 3.ed/2004 – Editora Senac. (exceto texto de Apresentação)


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