DIGITAL NATIVES UMA ABORDAGEM VISUAL
DIGI TAL NA TIV ES
DIGITAL NATIVES
UMA ABORDAGEM VISUAL
©
Box 1824 em parceria com
ii Franklin Lopes Visual Ethnography & Photography
retrato cultural
A era digital abre espaรงo para diferentes formas de se relacionar com o mundo; estimula novos hรกbitos, atitudes e comportamentos; e interfere na maneira como percebemos o que se coloca ao alcance dos olhos.
Neste sentido, o Retrato Cultural dos Digital Natives surge para entender como a
cultura digital estå mudando a relação dos jovens com seu universo material e com sua forma de interagir e se posicionar no mundo.
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Para atingir os objetivos a que se prop천e, o projeto realizado na cidade de S찾o Paulo entrevistou mais de 100 jovens entre 12 e 18 anos, dos quais 15 foram selecionados para abrir seus quartos e contar um pouco do significado dos objetos presentes nesse ambiente, resultando em um material visual de mais de 800 fotos. 6
MET OD OLO GIA
etnografia visual Mais do que um mÊtodo de coleta de dados, a etnografia visual Ê uma maneira de experienciar, interpretar e representar o universo visual e cultural das pessoas. É uma forma de
quebrar a automaticidade do olhar
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ETAPAS
front stage 9
back stage
FRO NT STA GE
o que mostro de mim... Para entender a relação que os Digital Natives estabelecem com os objetos que carregam, eles foram estimulados a escolher dentre seus diferentes pertences aqueles que melhor os representam ou com os quais estabelecem uma relação mais próxima.
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Com este exercício o projeto investigou os significados e relações que os Digital Natives estabelecem com seu mundo material e como tais aspectos os ajudam a perceber e expressar aquilo que são ou projetam ser.
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Dentre os objetos apresentados pelos Digital Natives ĂŠ possĂvel destacar 3 mais recorrentes e expressivos: celulares;
sketch books; e objetos que simbolizam mĂşsica.
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ícone de uma geração Sem dúvida o objeto mais recorrente, o celular pode ser considerado um símbolo do comportamento dos Digital Natives ao materializar a forma como eles percebem e interagem com o mundo que os rodeiam.
“
Celular faz você se manter próximo de tudo, dos seus amigos, da sua família, das coisas que estão acontecendo. Se você está sem celular, você fica
”
isolado no seu mundo. João, 18, estudante de economia
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traços de personalidade Um aspecto que revela a relação próxima que os Digital Natives têm com seu celular são os traços de personalidade que estes objetos adquirem com o uso. Seja a partir do estado de conservação, acessórios (capinhas), ou aplicativos, os celulares são capazes de revelar comportamentos e atitudes marcantes de seus donos.
“
Acho que o objeto que mais me representa é meu celular porque ele esta sempre comigo e também porque esta com a tela destruída. Meus amigos até me zoam porque
”
eu sou muito desastrada. Julia, 16, estudante
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traรงos de personalidade
mais que um objeto O celular pode ser percebido como uma extensão daquilo que os Digital Natives são, fazem e escolhem compartilhar com o mundo. Em vários momentos os aparelhos serviram como ferramenta para ajudar a mostrar momentos importantes, hábitos, gostos e feitos relevantes da vida desses jovens.
“
”
Um brother tirou esta foto lá na quadrinha do prédio dele. A gente meio que se junta lá para ficar dando rolê de skate, jogando bola, trocando idéia, essas coisas... Curto para caramba essa foto, acho que ficou da hora. Diz ai? Leonardo, 14, estudante do 1º colegial
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uma forma de interagir Embora alguns jovens apontem sua alta dependência do celular e internet como algo negativo da própria geração, associada a alienação e distanciamento, o que se percebe é que ele em muitos momentos intensifica as
interações, aumenta a participação e revela interesses comuns.
“
O Facebook uso mais pelos grupos. Não sou de ficar postando porque não gosto de ficar compartilhando
”
minha vida com todo mundo. O grupo é diferente. A gente posta coisas que meio que interessa todo mundo. Todo mundo se ajuda muito! Débora, 17, estudante de comunicação
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interest gathering Entre os apps mais usados por Digital Natives destacam-se Whatsapp, Instangram e Snapchat. sugerindo certo movimento em direção a redes sociais mais flexíveis na construção de hubs de acordo com diferentes grupos de interesse. Analisando os porquês por trás desse comportamento pode-se destacar quatro aspectos:
intimidade
relevância
intensidade
instantaneidade
interest gathering
mobilização
colaborativismo
novos hábitos
Mais que uma tecnologia, o celular
representa um comportamento. Por meio da conectividade que o gadget sugere, os Digital Natives aprendem noções de coletividade, participam mais da vida um dos outros e passam a se associar de acordo com causas e interesses compartilhados e não apenas círculos sociais.
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espaço de devaneio Outro objeto bastante apresentado pelos Digital Natives como algo especial, que melhor os representam ou que está sempre nas mochilas e bolças foram cadernos e sketch books. Mostrados com certo orgulho, estes cadernos reúnem histórias, idéias, desenhos, poemas, trechos de livros e citações que carregam muitas das dúvidas e angustias experimentadas pelos jovens durante seu processo de construção da própria identidade.
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espaรงo de devaneio
mais e melhor Este comportamento não é necessariamente uma particularidade dos Digital Natives. Toda a melancolia, angustia e sentimentalidade que derramam nas páginas são características da adolescência e pode ser observada em outras gerações. Contudo, o que é peculiar dos Digital Natives e merece atenção é a facilidade com que compartilham este conteúdo com o mundo, recebem feedbacks, buscam referências, encontram afinidades, aprendem novas ferramentas e uma série de outros aspectos que o incentivam a produzir mais e melhor.
“
Essa é a foto de um dos stencils de que falei para você. Esse eu fiz com uma amiga ali na Vila Madalena no começo do ano,
”
eu acho (...) Sempre gostei dessas coisas. Para mim é uma forma de me comunicar com a cidade, de me expressar. Isabela, 15, estudante do 1º colegial
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mais e melhor
audiĂŞncia
referĂŞncias
ferramentas
intuitive generation Outra peculiaridade importante dos Digital Natives é a precocidade com que eles começam a reconhecer e desenvolver suas habilidades. Desde muito cedo são expostos a uma infinidade de estímulos, experimentam uma série de possibilidades, se aprofundam facilmente naquilo por que se interessam e, em pouco tempo, já sabem exatamente em quais áreas e atividades têm mais potencial ou pelo menos, mais interesse e aptidão.
“
Desenho desde muito pequeno. Entrei em meu primeiro curso de desenho com 4 anos por vontade minha. É uma coisa que simplesmente faço desde que me entendo por gente. Não
”
entendo como pode haver alguém que não sabe desenhar. Pedro, 16 anos, estudante do 2º colegial
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esboço de mim mais que um bloco de notas, o caderno é um espaço de livre expressão Ao forrar as páginas de seus cadernos com pensamentos, idéias e referencias, os Digital Natives mostram certa facilidade em se expressar, em compartilhar um pouco daquilo que vivem. Combine esta vontade de criar, produzir e se expressar com a melancolia, angustia e hiperbolismo próprios da idade e o resultado se revela naturalmente em arte.
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trilha sonora da vida Outro objeto bastante apresentado pelos Digital Natives foram fones, ipods, Mp3 players e aplicativos que ilustram sua paixão por música. De maneira geral, se afirmam muito ecléticos, embora façam certas ressalvas em relação a alguns ritmos musicais, e não possuem um momento específico para ouvir música, visto que ela está presente em grande parte de seu dia.
“
Música eu ouço o tempo todo, desde a hora que eu acordo até a hora que vou dormir. Nem sei quantas músicas tenho no meu Ipod, acho que umas cinco mil.
”
Guilherme, 16, estudante do 1º colegial
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musicoterapia Falar da relação do jovem com música não sugere diretamente nenhuma peculiaridade relacionada aos Digital Natives. Contudo, é importante ressaltar a importância deste tipo de conteúdo em seu dia-a-dia, a ponto de ser apontada como uma das coisas que os representam. Ao serem questionados do porque a música os representariam, falam da sua importância em suas vidas, da quantidade de horas que passam ouvindo e do impacto que tem em seu estado de espírito.
“
Música para mim é tudo. Estou sempre com meu ipod... Escolho o que vou ouvir meio pelo que estou sentido no
”
momento, mas as vezes uso justamente para mudar o que estou sentido. Música tem esse poder sobre mim... Joana, 17, estudante do 3º colegial
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tocando o que há em mim Esta correlação que os Digital Natives fazem entre música e aquilo que estão sentido no momento de escolher o que vai tocar, de maneira sutil sugere uma atenção maior dos Digital Natives àquilo que sentem, o que transforma a música em uma ferramenta de autoconhecimento, uma vez que os ajudam a lidar com tantos sentimentos que afloram nesta fase da vida.
“
Ouvir música, para mim é quase uma terapia. As vezes me fecho no meu quarto, coloco meu fone e me fecho um
”
pouco no meu mundo. Anna Paula, 17, estudante do 3º colegial
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pills of mood
além do caráter gregário e social, a música ajuda a lidar com a turbulência do mundo externo A música exerce uma forte influência sobre o comportamento dos jovens. Interfere no seu estilo, define círculos sociais e influenciam inúmeros aspectos da construção de sua identidade social. Mais do que isso, diante de um playlist quase sem fim, os Digital Natives passam a ter um estilo ideal de música para cada momento. Seja para criar, pensar, se divertir ou dançar, a música é peça-chave para construir o mood ideal. 31
o que escrevo sobre mim... AlÊm de mostrar alguns dos objetos que carregam, os jovens foram convidados a escrever sobre si e sobre seus sonhos, desejos e vontades por meio de uma dinâmica simples que sugeria que completassem duas frases: EU SOU e EU QUERO.
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A idéia por trás da dinâmica é observar os discursos utilizados pelos Digital Natives quando convidados a se expressar de forma escrita, algo bastante comum para alguém que a todo instante é estimulado a escrever sobre o que pensa, curte ou compartilha nas redes sociais.
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direto ao ponto Os Digital Natives são taxativos na hora de se definirem. Enumeram facilmente vários adjetivos que ajudam a dar forma àquilo que são. É interessante perceber a espontaneidade e confiança com que fazem isso, deixando pouco espaço para inseguranças e incertezas.
“
EU SOU... criativo, inteligente, determinado, perfeccionista, bobão, engraçado, gamer, conectado, kpopper. Liferson, 17, estudante
”
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construindo meu perfil Agrupando alguns sinônimos e descartando características mais particulares e pontuais, é possível perceber certo padrão na forma como os Digital Natives se percebem e classificam. Ao observar os adjetivos mais recorrentes, é possível construir uma imagem clara dos principais atributos que marcam o perfil dessa geração.
EU SOU... Determinado, sonhador, curioso, questionador EU QUERO... Lutar pelos meus sonhos, alcançar meus objetivos e fazer o bem para as pessoas. Kaique, 15 anos, estudante do 1º colegial
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construindo meu perfil
espaço para me expressar A segurança com que se expressam, no entanto, não conduz a qualquer pragmatismo. A página em branco abre espaço também para olhares mais filosófico, poéticos e sentimentais sobre si mesmos, trazendo à superfície a sensibilidade que marca os dos Digital Natives, já observada em seus cadernos e sketch books
“
EU SOU... um pastiche de vidas e corpos, influenciada por todas as vidas que passei e não só meu corpo físico. EU QUERO... sentir
”
Yasmin, 17, estudante do 3º colegial
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aprendendo a compartilhar Ao observar desejos e vontades apresentados pelos jovens também é possível identificar alguns padrões. Embora haja certa influência da conjuntura do país no discurso dos entrevistados, chama a atenção o senso de altruísmo e coletividade apresentados pelos entrevistados,
“
EU QUERO... Fazer a diferença, ajudar os outros o máximo que puder.
”
Catharina, 14 anos, estudante do 1º colegial
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orientados para fora É marcante o ímpeto de querer ajudar, tocar, inspirar. Por meio do que produzem, os jovens percebem seu poder de atuação no mundo, Neste sentido, parece que as ferramentas digitais serviram de alavanca para levantá-los do estado fragmentado e limitado do indivíduo para se conectar com um todo e integrado Ser, materializado pela internet, onde aquilo que produzimos só faz sentido a partir do momento que é compartilhado com o outro.
“
EU QUERO... Fazer filmes que façam as pessoas pensarem. (EU QUERO) Inspirar as pessoas. Camila, 17 anos, estudante
”
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fiéis a seus ideais A facilidade e segurança que apresentam na hora de se expressar, se definir e se posicionar diante do mundo traz aos Digital Natives a confiança necessária para quererem viver de acordo com seus ideais e a partir de sua noção de realidade. Parece que o contexto digital esta ajudando os jovens a assumirem de uma forma mais segura aquilo que pensam e são, uma vez que é mais fácil encontrar pessoas com afinidades e perspectivas comuns. Sob esta ótica, o real passa a ser uma escolha e não uma imposição.
“
EU QUERO... Muitas coisas, mas principalmente ser feliz vivendo conforme os meus princípios e de acordo com as coisas que acredito.
”
Talita, 18 anos
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on/off merge
O mundo digital, mais do que gadgets e aplicativos,
trouxe aos jovens noção de coletividade. Ajudar, participar e querer fazer a diferença parece algo natural para aqueles que nasceram em um ambiente marcado por conceitos como colaborativismo, creative commons e compartilhamento.
BA CK STA GE
betas em expressividade De acordo com o que foi observado no Front Stage é possível perceber os betas entre os Digital Natives como aqueles que melhor utilizam as ferramentas digitais para se aprimorar e se expressar no mundo. Geralmente são muito seguros ao falar de suas habilidades, interesses, e expectativas e começam desde muito cedo a identificarem seus próprios talentos. Foi a partir dessa definição que os participantes desta etapa foram selecionados
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esferas cognitivas Para sistematizar o processo de análise, o universo material dos Digital Natives foi dividido em três esferas cognitivas (autoexpressão, inspiração e criação) que investigam como os jovens se percebem e se apresentam ao mundo; como expandem seus conhecimentos e referências; e como traduzem e materializam suas idéias.
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esferas cognitivas
criação
auto-expressão
inspiração
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território de expressão O quarto tem um papel fundamental na nossa vida, principalmente durante a adolescência. Ele representa nossa primeira tentativa de criar um espaço só nosso, um lugar que nos separa do mundo lá fora e nos ajuda a perceber aquilo que somos ou pretendemos ser.
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Com bastante autonomia para configurar e modificar seu quarto, os Digital Natives acabam construindo intuitivamente um reflexo muito genuíno de sua forma de pensar e ser. Ao observar a simples organização de seus quarto, estamos também testemunhando a construção de uma identidade, um processo de auto-expressão.
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tudo ao alcance das mãos Uma primeira característica bastante marcante no quarto de muitos dos jovens entrevistados (principalmente aqueles com maior poder aquisitivo) é o volume de objetos que acumulam em estantes, prateleiras e gavetas. Parte deste comportamento é associada a um comportamento próprio da adolescência, fase em que tendemos a acumular muitos objetos como forma de lidar com a indefinição que sentimos em relação a vida, o que explica porque é extremamente difícil nos desfazer de certas coisas nesse período.
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Contudo, parte do que se observa pode ser associada a uma característica bem peculiar dos Digital Natives: o grande volume de informação a que estão expostos. Essa relação particular que têm com conteúdo e informação fica fácil de ser entendida ao observar que a maioria dos objetos que estes jovens escolhem para compor seu quarto está justamente associado a conteúdo, tais como livros, revistas, CDs e DVDs.
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uma internet analógica Interessante perceber que é exatamente objetos relacionados a conteúdo que se esperaria que desaparecesse das prateleiras dos Digital Natives, visto a disponibilidade e facilidade sugerida por seus equivalentes digitais. No entanto, contrariando as expectativas, o que se pode observar é que para eles o mundo material não está sendo substituído pelo mundo digital. Ambos são reflexos de uma mesma forma de pensar.
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Tudo aquilo que se coleciona, curti, compartilha, seleciona e taggea na internet, ganha também um espaço na prateleira. O quarto se torna, portanto, uma versão analógica de um comportamento adquirido digitalmente que pode ser percebido não só pelo volume, mas também pela forma como estes objetos estão agrupados e categorizados.
“
Nas prateleiras eu agreguei tudo que me fazia lembrar de coisas importantes ou de coisas que eu gosto, mais ou menos como inspiração talvez. Por exemplo, tem os
”
meus CDs, meus caderno, meus bonecos, máscaras e livros favoritos. que eu já li várias vezes ou que gosto de consultar, ou que eu só de olhar já fico mais alegre. Igor, 17 anos.
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games PS3
filmes caixa de colares e pulseiras
caixa de anéis coleções
livros que estou lendo
pinterest identity Diante do espaço que objetos relacionados a informação e conteúdo ocupam no quarto dos Digital Natives, é natural entender porque eles sejam tão importantes na hora de expressar aquilo que são. Na tentativa de se apresentar a partir de seus objetos, os Digital Natives mostram que seus interesses são o que melhor compõe sua identidade.
“
Esses óculos eu uso por causa da cultura Beatnik. Me identifico com a forma como eles viam o mundo, os ante-hippies que viajavam o mundo, o desprendimento... Não é por causa do Ozzy ou John Lennon, como todo mundo pensa... Pedro, 17 anos
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”
condensação da nuvem o mundo digital não substitui o mundo material, mas o ressignifica As mesmas características e comportamentos observado no mundo digital, marcado pelo volume de conteúdo, acúmulo de informação e facilidade de acesso é transposto para a relação com objetos. Gostos e interesses não definem o perfil dos Digital Natives apenas no mundo virtual, mas transpõem as barreiras digitais para ser expresso fisicamente em roupas, objetos e demais aspectos que consomem.
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um mundo em que se inspirar Ao longo de nosso desenvolvimento, vamos ampliando o
território de exploração
que
compõe nosso mundo e assim vamos acumulando repertório suficiente para compor nossa forma particular de perceber aquilo que nos rodeia.
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No contexto digital, a internet ganhou espaço relevante no processo de composição de nosso repertório de experiências. O que vemos online define muito do que experimentamos e trazemos ao mundo a partir de nossas escolhas
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navegando por fragmentos Ao falar de fonte de inspiração e referência, o primeiro aspecto que chama atenção é a diversidade de assuntos e interesses. Uma simples conversa entre amigos, um post interessante, um passeio na livraria, uma música no rádio, tudo serve de estímulo para despertar o olhar curioso de quem está acostumado a explorar o mundo a partir de fragmentos e queries
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Este caráter fragmentado da navegação online, marcada por múltiplas abas, hyperlinks e mídias tem certa influência na forma como montam seu repertório, ampliando de maneira sutil sua capacidade de relacionar diferentes temas e assuntos, o que potencializa mais uma vez seu poder de criação.
“
Minha tia estava mexendo no Movie Maker um dia, tentando colocar umas fotos com música e tal. Na
”
hora tive a idéia de fazer uns vídeos para meu blog e fui direto no youtube para ver como fazia. Dá trabalho, mas é fácil. Uso o Premiere porque é mais profissional. Amanda, 12 anos
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realidade fantástica Além da diversidade, outro particularidade que chama a atenção ao se falar de inspiração é o peso de quadrinhos, animes, mangas e literatura fantástica na vida dos Digital Natives.
“
Os Animes são quase tudo para mim. Pode parecer meio bobo, mas eles me ensinam algumas coisas. Acabo trazendo dessas histórias
”
valores como perseverança, determinação. Trago muito disso para mim. Erica Yuri, 16 anos
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Ao serem questionados sobre a importância do tema entre suas referências, eles justificam ressaltando a qualidade gráfica de alguns quadrinhos e mangas e a narrativa envolvente característica da literatura fantástica, aspectos que convidam a certa fuga do pragmatismo sugerido pelo cotidiano escolar, pelo processo de escolha por uma profissão e tantas outras coisas que preenchem a vida dos jovens durante a adolescência.
“
Eu gosto dessas histórias mais surreais, fantasiosas, meio dark. Acho que é uma conexão com o mundo lúdico, irreal, uma fuga da realidade. Uma forma de ir para outros mundos para tentar ver o seu. Igor, 17 anos
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”
Turma da Mônica Jovem
Harry Potter e a ordem da fênix
One piece manga
Série morada da noite
O mar de monstros
Água para Elefantes
overloaded mind Tanta curiosidade e diversidade, entretanto, é motivo também de angustia e ansiedade. Parece não haver espaço e tempo suficientes para absorver o volume de coisas que se quer conhecer, aprender e guardar. Esta ansiedade vem a tona quando listam entre seus sonhos vontades utópicas como conhecer de tudo, ter tempo para realizar todas as idéias ou ainda ter uma memória infinita para guardar tudo que aprenderam na vida.
“
Meu sonho é saber muita coisa, ler tudo o que eu tenho para ler e não consigo terminar. É isso, meu
”
sonho é conhecer de tudo um pouco. Isabela, 14 anos
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portas da percepção
acesso a informação amplia o repertório e sugere um maior questionamento do real Realidade aumentada, literatura fantástica, avatares, games, mangas, todas estas referências servem de referência para os Digital Natives acessarem múltiplas realidades, reinventar aquilo que são e questionarem os padrões a que são submetidos.
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materializando o que há em mim Produzir é a única forma que temos de materializar nossas idéias, de trazer ao mundo um pouco do que passa em nós. A partir daquilo que criamos nos tornamos capazes de nos conectar socialmente, compartilhar pensamentos e experiências que nos ajudam entender o que somos.
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A possibilidade de se expressar por diferentes formas e múltiplos meios somada ao volume de referências e a proximidade da audiência faz dos Digital Natives grandes produtores de conteúdo.
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muita pauta para pouca linha Uma característica bastante emblemática destes jovens é o volume de compromissos, projetos e tarefas que mantém em sua agenda. São cursos, oficinas, trabalhos voluntários, blogs, projetos pessoais, uma série de responsabilidades que demandam sua atenção.
“
Fico o dia inteiro na escola por causa do cursinho, depois vou para o grupo de robótica, depois vou estudar, fazer alguma lição. Quando tenho um tempo, fico
”
conversando com as pessoas no Skype e no Facebook ou escrevendo alguma coisa para publicar no Blog. Aos finais de semana eu trabalho com minha mãe. Erica, 16 anos
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no time to play A determinação e o compromisso que os Digital Natives apresentam em tudo que fazem sugerem uma seriedade e uma maturidade um tanto precoce. Ao serem questionados sobre isso, afirmam que já viveram muita coisa, já brincaram bastante e que gostam daquilo que fazem, por isso se envolvem tanto.
“
Fora a escola, participo de um projeto da PUC que pensa o uso de tecnologias dentro das escolas públicas, trabalho como voluntário no FOCA, uma agência comunitária de pesquisa e escrevo para CBN em um projeto chamando “Jovens Antenas.” Natan, 14 anos
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”
hooked on produtivity São tantos interesses e possibilidades que os Digital Natives se vêem em um processo constante de produção. Parece que o mesmo volume de coisas que forram suas prateleiras e enche seus olhos nas timelines, abas e hyperlinks transborda para seu to do list.
Produzir, realizar, materializar idéias
nunca foi tão necessário.
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tudo é ferramenta Diante da necessidade de fazer e produzir, tudo vira ferramenta. Transitam entre o digital e o analógico com bastante desenvoltura e naturalidade. Tudo faz parte de um processo de criação e se torna plataforma para colocar para fora o resultado de tantas referências, vontades e anseios. Achar a melhor maneira, mídia ou plataforma para se expressar parece ser o grande objetivo.
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crio, logo sou Mais do que resultados, metas ou reconhecimento, estes jovens conseguem entender que ao produzirem alguma coisa, materializarem seus pensamentos e idéias, eles se aproximam de si mesmos, reconhecem suas habilidades, suas preferências e se aproximam de pessoas com interesse comuns. Diante disso parece que os Digital Natives não produzem só por prazer, mas por uma busca por autoconhecimento.
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crio, logo sou
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digital as fuel
mais que facilitar, as ferramentas digitais
incentivam a produção e o autoconhecimento Ao nascer em um contexto digital, os Digital Natives entendem a tecnologia como uma ferramenta capaz de potencializar aquilo que são. Por meio de ferramentas digitais reconhecem suas habilidades, se conectam com pessoas com interesse comum, compartilham, trocam, produzem. São cada vez mais proprietários do real que lhes é oferecido. E ESSE É SÓ O COMEÇO!
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OBRIGADO
Franklin Lopes
Visual Ethnography & Photography
Outubro, 2013 S達o Paulo franklinlopes.com box1824.com.br