Entrevista com Elaine Valente

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Akúztika│Entrevista

por Fred Mendonça

Elaine Valente: “Foi destino!”

O

rock ‘n’ roll é um estilo no qual a figura masculina é mais característica ou predominante, porém isso não significa ser exclusivo. Janis Joplin foi uma das pioneiras a dar os passos iniciais em direção à quebra de padrões sociais e também padrões do próprio meio rocker. Desde então, meninas e mulheres encontraram no rock uma forma legítima de expressão de ideias e comportamento, batendo de frente ora com preconceitos, ora com machismo. Afinal, quem disse que uma menina não pode tocar guitarra? Elaine Valente, como o próprio nome já diz, está aí para mostrar que talento independe de sexo e prova que um pouco de esmalte não desvirtua a arte dos riffs e distorções. Elaine é violonista, iniciou seus estudos aos 13 anos de idade, é formada em Música pela UEPA e desenvolve um belo trabalho social através da Fundação Carlos Gomes onde é professora de violão. Em 2003 fundou a banda Mahara, trabalho que a inseriu no meio musical com apresentações regulares na cidade. Atualmente, divide o palco com Nanna Reis, outra jovem referência feminina da música paraense, parceria essa que lhe proporcionou uma reaproximação com estilos locais, que por sinal estão sendo usados no novo trabalho do Álibi de Orfeu, ainda em pré-produção. E por falar no Álibi, Elaine atua como guitarrista na banda desde outubro de 2010, tocando ao lado de Rui Paiva, Sidney KC e seu namorado Rafael Mergulhão. Nesta entrevista Elaine nos fala um pouco da sua vivência na música, suas experiências, influências, relacionamentos, mercado, inclusão social e algumas novidades sobre o Álibi.


Akúztika: Em seu currículo consta que você iniciou seus estudos em música aos 13 anos de idade. Como foi esse início, quem ou o que te despertou o desejo de trilhar esse caminho? Elaine: Tudo começou quando peguei em um violão pela primeira vez, não era meu e sim de minha amiga, nós duas não sabíamos nada, mas ficávamos arranhando (tentando arrancar um som), foi aí que pintou a idéia de estudarmos música no Conservatório Carlos Gomes, ela me chamou, nós fomos fazer o teste e passamos, desde então não sai mais dessa vida. Akúztika: Você estudou dois anos de violão popular e quatro de clássico. Como você tem explorado esse estilos do violão? Elaine: Ter estudado um pouco de cada estilo só veio a somar no meu trabalho. Para um músico quanto mais conhecimento sobre técnicas e estilos mais possibilidades de fato você tem e isso é muito bom. Akúztika: Fale um pouco das suas influências musicais. Qual delas te define melhor, aquela que tem mais afinidade com sua essência? Elaine: Essa pergunta é muito interessante porque há dez anos teria uma única resposta que seria o Rock ‘n’ Roll. Essa resposta não mudou até hoje, mas essa lista aumentou, a música é meu trabalho e como instrumentista e educadora tive meus momentos MPB, reggae, jazz, blues, black, clássico, entre outros, dos quais me identifico bastante, mas o rock é a minha maior influência. Akúztika: Quais seus equipamentos preferidos e porquê? Elaine: Minha pedaleira no momento é a GT-10 da Boss, eu gosto bastante dela para o que faço, mas aqui em casa tem a VOX ToneLab LE do Rafael que já usei e que um dia compro uma. Já as guitarras, eu adoro o modelo Les Paul tenho uma Epiphone. Como guitarrista tenho meu desejo de consumo, quero uma PRS Tree Of Life Custom ou Swamp Ash Especial Narrowfield. Akúztika: Como instrumentista há outro(s) instrumento(s) que você toque ou que tenha interesse em tocar? Elaine: Tirando o violão e a guitarra eu arranho algumas coisas, nada muito sério como bateria e canto. Esse ano quero comprar um teclado, quem sabe... Akúztika: Estamos vivendo uma valorização e divulgação muito forte da música que vem das massas. Em contrapartida vemos insurgir manifestações negativas desses movimentos serem consideradas como


tal. Technobrega e Funk são as principais manifestações a receber duras críticas. O que você pensa sobre o assunto?

“Existe uma banalização daquilo que se tem e do que se faz, falar de música é falar de mercado e no mercado existe oportunismo”

Elaine: Eu vejo que atualmente não só na música, mas em vários seguimentos existe uma banalização daquilo que se tem e do que se faz, falar de música é falar de mercado e no mercado existe oportunismo. Temos no ramo da música boas produções para as grandes massas, mas também tem muita porcaria dentro de cada estilo. É uma pena, pois vejo um bom funk perdendo espaço para o funk apelativo. Já perdemos o controle! Infelizmente a massa paga e sustenta tudo isso. Sinto orgulho de ver bandas, músicos e artistas ganhando destaque lá fora, mas ainda é uma minoria. Akúztika: Falando em mercado, assunto mais recente foi a prisão de Kim Dotcom, fundador do site MegaUpload junto com outros responsáveis pelo site, foram até chamados de gang e de piratas pela grande mídia. O assunto é no mínimo complicado porque envolve direitos autorais e também interesses diretos de grandes gravadoras e produtoras de vídeos pelo fato do rombo financeiro que vêm sofrendo. Como você observa essa movimentação toda envolta do tema?

Elaine: Vejo a pirataria moderna cada vez mais escrachada e criminosa. Enquanto consumidores não nos damos conta da gravidade do que estamos fazendo, quando passamos a ser vítimas ficamos mais críticos e exigentes com nossos direitos. Não acho justo com artistas, diretores, gravadoras enfim com toda essa gente que trabalha duro e sério pra produzir um produto de qualidade para ser comercializado, enquanto outros sem o seu consentimento e às suas custas tiram proveito disso e você ainda tem o seu produto comercializado com baixa qualidade. Acho isso um desrespeito com o trabalho alheio. O mercado já mudou bastante, com a internet, o artista pode divulgar seu trabalho e disponibilizá-lo ou vendê-lo por conta própria e isso é ótimo, porém somos minoria e vítimas perto de milhões que alimentam e fazem esse mercado ilegal crescer cada vez mais.

“Enquanto consumidores não nos damos conta da gravidade do que estamos fazendo, quando passamos a ser vítimas ficamos mais críticos e exigentes com nossos direitos”

Akúztika: Em termos de música regional, você tem tido oportunidade de explorar esse lado? Alguma experiência, por exemplo, com as guitarradas ou outro estilo local? Elaine: Como paraense é impossível fugir das origens, elas fazem parte da minha formação. Recentemente tive a oportunidade de tocar com a cantora Nanna Reis e me reaproximei de tudo isso. E apesar do peso, o novo trabalho do Álibi vem com alguns temperos regionais, já estamos trabalhando


nisso, logo logo vocês poderão conferir. Akúztika: Como surgiu a possibilidade de trabalhar junto com Rui Paiva e Sidney KC no Álibi de Orfeu? Elaine: Foi destino! Eu estava fazendo uma gravação no estúdio do Kim e pelos corredores encontrei com Rui e KC, batemos um papo e rolou o convite pro teste, logo de cara não levei a sério porque já conhecia e admirava o ÁIibi com os excelentes guitarristas que passaram pela banda dos quais sou fã. Após duas semanas o Rui me ligou chamando para o teste, aí pensei: nossa é sério mesmo, vou tentar. Akúztika: Como tem sido a convivência e troca de informações entre vocês? Elaine: Desde o inicio tem sido maravilhosa, o meninos são pessoas super bacanas pessoalmente e no coletivo, nos identificamos e nos respeitamos. Já criamos laços afetivos e para um trabalho em grupo tudo isso é fundamental. Akúztika: Ainda falando em relacionamentos, como é tocar junto com o namorado Rafael Mergulhão na Mahara e no Álibi, facilita o entrosamento? Elaine: Tocar junto com o Rafael é maravilhoso por vários aspectos, tanto profissional quanto emocional, temos muitas coisas em comum a música é uma delas. Minha realização profissional é a realização dele e vice versa, isso nos permite compreender e falar de igual pra igual... isso facilita nosso entrosamento. Akúztika: A saída de Gabriella Florezano pegou muita gente de surpresa, inclusive nós. Como estão os projetos da banda nesse exato momento? Elaine: Dentro de uma empresa temos de estar preparados pra tudo, no Álibi não está sendo diferente. Apesar de ainda estarmos sem vocalista, não paramos, nosso trabalho continua entre ensaios, gravações, composições e testes. Muita coisa nova está por vir, aguardem. Akúztika: À parte o trabalho com o Álibi e lembrando que você tem uma formação acadêmica e eclética, há algum projeto musical pessoal que você gostaria de tocar em frente? Há a possibilidade de isso se concretizar? Elaine: Tenho em mente um projeto solo ou em parceria, mas não para agora.


Akúztika: Conte-nos um pouco da sua experiência junto ao Projeto Música e Cidadania desenvolvido pela Fundação Carlos Gomes.

“Pra mim está sendo uma honra e um presente ter a oportunidade de contribuir com a formação musical de pessoas que no primeiro momento estão descrentes de suas capacidades”

Elaine: O música e cidadania é um projeto de educação musical desenvolvido em diversos pólos na região metropolitana de Belém com objetivo de acessibilizar os conhecimentos sobre música à crianças, jovens e adultos. A Associação Paraense das Pessoas com Deficiência (APPD) é um dos pólos agraciados pelo Música e Cidadania, nosso foco é educação inclusiva, lá nós atendemos alunos em situação normal de aprendizagem e outros com necessidades educacionais especiais em uma turma heterogênea. Eu ministro aulas de violão popular, e pra mim está sendo uma honra e um presente ter a oportunidade de contribuir com a formação musical de pessoas que no primeiro momento estão tão descrentes de suas capacidades por alguma deficiência, e depois percebem que não há limites quando se quer e tem força de vontade, exemplos de superação não faltam e os resultados obtidos ao longo desses anos são maravilhosos, aprendo muito com eles dentro e fora de sala, posso garantir que é um enriquecimento pessoal e profissional sem igual.

Akúztika: Dave Mustaine quando saiu do Metallica houve muito ressentimento e uma das metas traçadas por ele foi tocar mais rápido e mais pesado que eles. Na verdade Dave buscava ser melhor e superar os antigos companheiros. O que você entende por ser um bom ou ótimo guitarrista? Ser veloz é sinônimo de excelência? Elaine: Foi-se o tempo em que virtuosismo era sinônimo de excelência, quando se é novo e inexperiente você acha isso ‘’tudo’’. Um bom guitarrista tem que ser criativo, ter bom gosto, sensibilidade com ou sem velocidade... tem que ter emoção. Akúztika: Você concorda que esmalte, batom e um pouco de glítter são capazes de deixar o rock ‘n’ roll mais interessante? Elaine: [risos] Sim, sim, todo o aroma e toque feminino apimenta e deixa o rock mais prazeroso. Entrevista concedida a Fred Mendonça (Akúztika). Fotos: Hivana Laske.


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