Dt fva 2010

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Relatório do Seminário

Questões fundiárias relativas à presença humana em unidades de conservação: aspectos conceituais, jurídicos e metodológicos

Manaus/AM – Novembro de 2008

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Relatório do Seminário Questões fundiárias relativas à presença humana em unidades de conservação:

aspectos conceituais, jurídicos e metodológicos

24 e 25 de novembro de 2008 – Teatro Gebes Medeiros, Manaus/AM

Equipe responsável Coordenação geral: Yara Camargo Planejamento e metodologia: Carlos César Durigan, Sérgio Henrique Borges e Yara Camargo Moderação: Maria Jasylene P. de Abreu Relatoria & Design: Satya Caldenhof Apoio: Leokeline Queiroz da Silva, Maria da Saúde Barbosa da Silva, Paula Ferreira Pinto e Simone Iwanaga

Apresentação e objetivos A regularização fundiária é apontada como uma das principais limitações para a gestão de Unidades de Conservação no Brasil, principalmente as de proteção integral. A questão fundiária relativa à presença humana em unidades de conservação é um problema complexo com múltiplas abordagens possíveis. O seminário “Questões fundiárias relativas à presença humana em unidades de conservação: Aspectos conceituais, jurídicos e metodológicos” pretendeu reunir profissionais de diferentes linhas de trabalho a fim de apontar diretrizes - tais como para a construção de Termos de Compromisso - que sejam úteis para minimizar os conflitos entre as populações locais e os órgãos gestores e contribuir para uma gestão mais efetiva das unidades de conservação.

Apoio:

Fundação Vitória Amazônica Rua Estrela d’Alva 146, Loteamento Parque Morada do Sol, Aleixo, CEP 69.060-093 Manaus/AM, Brasil Tel.: 55 (92) 3642 7866/4559 - Fax: 55 (92) 3236 3257 www.fva.org.br - E-mail: fva@fva.org.br

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Lista de participantes

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37

Nome

Instituição

Adílson Vieira Adriana Ramos Adriane A. Morais Alcilene de Araújo Paula Alessandro Marcuzzi Alexandre Victor S. Ribeiro Ana Flávia Ceregati Zingra Tinto André Medeiros Lopes Arleson Andrade dos Santos Artemísia Souza do Valle Aurely Pereira de Freitas Brenda Kawanna Vale Góes Bruno Marchena Romão Tardio Carlos César Durigan Carlos Eduardo Marinelli Cesário Magalhães Alves Clarice Bassi Cláudio Brandão Nina Cristina Fisher Domingos Macedo Elane Uchôa Gomes de Lima Fernando Passos Flávia Dinah Rodrigues de Souza Francisco Ademar da Silva Cruz Francisco Carlos Borges de Souza Francisval Akerley da Costa Gilberto Alves Moreira Giovanna Palazzi Guillermo Moisés B. Stupiñhan Henrique S. Alberto Carlos Hênyo Trindade Barreto Filho Igor Matos Soares Ivanilda Gonçalves Jasylene de Abreu José Marcelo V. Cunha Karine Lopes Narahara Karla Oliveira

IPDA ISA-Brasília FVA CEUC ICMBIO/ PARNA Jaú Centro Holos ICMBIO Parque Estadual do Rio Negro - setor Norte PARNA Jaú/comum. Floresta/AMORU IPAAM Ministério Público Estadual - MPE Secretaria de Estado do Meio Ambiente - AP ICMBIO FVA ISA-Brasília RDS Amanã/comun. Vila Nunes/AMORU CEUC Conselho FVA Corredores Ecológicos CEUC Documentário Preservação da Amazônia UNICAMP INPA CEUC PERN Setor Sul/Comun. Bela Vista/Jaraqui Secretaria de Estado do Meio Ambiente - MT PARNA Jaú/comun. Seringalzinho ICMBIO/PARNA Anavilhanas CEUC CEUC IEB ICMBIO/PARNA Anavilhanas comissão ex-moradores do PARNA Jaú WWF-Brasil INCRA IBAMA - AC Serviço Florestal Brasileiro

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Lista de participantes

38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75

Nome

Instituição

Leonardo Kurihara Leokeline Queiroz da Silva Levi Castro da Silva Lino Fernando S. de Viveiros Lívia Andrade de Matos Lúcia da Costa Ferreira Luciano Pohl Luciene Pohl Ludmila Caminha Barros Luís Antônio Nascimento de Souza Luís Sérgio Ferreira Martins Luiz Antônio Coltro Júnior Manuelle Lago Marques Marcelo P. Moreira Márcia Ledeman Marcos Pinheiro Marcos Rocha Maria José Nunes Mariana Gama Semeghini Marina Antongiovanni da Fonseca Odécio L. de Oliveria Oscar Sarcinelli Patrícia Ribeiro S. Pinha Paula Ferreira Pinto Paula Jane Amorim França Rafael Illenseer Raquel R. Lange Roberto Medeiros de Souza Sarita de Moura Satya B. L. Caldenhof Sérgio Henrique Borges Silvia de Melo Futada Sinomar F. Fonseca Júnior Tatiana Alves F. Franco Thaís Brianezi Thiago Walber Feijó Yara Camargo

IPÊ FVA AMOTAPI IBAMA - RESEX Xingu - PA AGU/DIJUR/IBAMA/ICMBIO NEPAM/UNICAMP FVA OAB Brasília UFAM ICMBIO/REBIO Jaru - RO WWF Brasil - PA FVA FVA GTZ WWF-Brasil IPAM RDS Amanã/comun. Vila Nunes/AMORU IPÊ ISA SEMA - AP IPÊ ICMBIO/ REBIO Piratuba - AP FVA Secretaria de Estado do Meio Ambiente - MT IPÊ FVA SEMA/AP IPÊ UFAM FVA ISA CEUC ICMBIO/PARNA Anavilhanas Canal Futura IPÊ IBAMA - PA FVA

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Lista de abreviaturas AGU - Advocacia Geral da União ALAP - Área de Limitação Administrativa Provisória AMORU - Associação dos Moradores do Rio Unini AMOTAPI - Associação dos Moradores de Tapiira

Estados Brasileiros: AC - Acre AM - Amazonas

AP - Área Protegida

AP - Amapá

APA - Área de Proteção Ambiental

MT - Mato Grosso

CDB - Convenção sobre Diversidade Biológica

PA - Pará

CEUC - Centro Estadual de Unidades de Conservação

RO - Rondônia

CONAMA - Conselho Nacional de Meio Ambiente

SP - São Paulo

DIJUR - Diretoria Jurídica ESEC - Estação Ecológica FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz FLONA - Floresta Nacional FOIRN - Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro FUNAI - Fundação Nacional do Índio FVA - Fundação Vitória Amazônica GT - Grupo de Trabalho GTA - Grupo de Trabalho Amazônico GTZ - Cooperação Técnica Alemã IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBDF - Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICDP - Integrated Community Development Project (Projetos Integrados de Conservação e Desenvolvimento Socioeconômico para Grupos Locais) ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INPA - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia IPAAM - Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas IPAM - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia IPDA - Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Amazônico IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas ISA - Instituto Socioambiental

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Lista de abreviaturas ITEAM – Instituto de Terras no Amazonas IUCN - International Union for Conservation of Nature (União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais) MMA - Ministério do Meio Ambiente MPE - Ministério Público Estadual MPF - Ministério Público Federal NEPAM - Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais OAB - Ordem dos Advogados do Brasil ONG - Organização Não-Governamental PAREST - Parque Estadual PARNA/ParNa - Parque Nacional PCE - Projeto Corredores Ecológicos PERN - Parque Estadual do Rio Negro PNJ - Parque Nacional do Jaú PNPCT - Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente RDS - Reserva de Desenvolvimento Sustentável REBIO - Reserva Biológica RESEX - Reserva Extrativista SDS - Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas SEMA - Secretaria de Meio Ambiente SEMMA - Secretaria Municipal de Meio Ambiente SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação SUFRAMA - Superintendência da Zona Franca de Manaus TAC - Termo de Ajustamento de Conduta TC - Termo de Compromisso TI - Terra Indígena UC - Unidade de Conservação UFAM - Universidade Federal do Amazonas UNB - Universidade de Brasília UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas WWF - World Wildlife Fund (Fundo Mundial para a Natureza)

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Índice 1o dia – apresentações e palestras

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Gente(s) e áreas de proteção integral: Os (des)caminhos de uma querela até o SNUC.

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Hênyo Barreto Filho

Pequenos usuários da biodiversidade em UCs de proteção integral. É possível, desejável ou nenhuma das anteriores?

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Gente e áreas protegidas: Avanços pós SNUC e as políticas públicas voltadas para o uso de recurso natural e UCs de proteção integral.

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Rodada de depoimentos

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A presença humana em Unidades de Conservação: aspectos jurídicos.

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Construção de termos de compromisso: a experiência da Reserva Biológica do Lago Piratuba

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Lúcia da Costa Ferreira

Adriana Ramos

Ludmila Caminha

Patrícia Pinha

2o dia – apresentação da FVA, grupos de trabalho e resultados/recomendações

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Geopolítica da conservação do Rio Negro: avanços e perspectivas

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GT Conceitual

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GT Metodológico

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GT Jurídico

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Carlos César Durigan e Sérgio H. Borges

Anexos

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1o dia – apresentações e palestras Jasylene de Abreu deu abertura ao evento, com a formação de uma mesa composta por representantes da FVA (Carlos Durigan), ICMBio/PARNA Jaú (Alessandro Marcuzzi), SDS/CEUC (Domingos Macedo) e AMORU (Cesário Magalhães).

Abertura Carlos Durigan cumprimentou a todos e explicou que a realização do seminário se deve a preocupação e interesse da FVA em trabalhar a questão da regularização fundiária em unidades de conservação, contando aqui com a presença de representantes de comunidades do interior e moradores de unidades de conservação do Estado. Disse que a idéia é buscar uma metodologia para encontrar na legislação os caminhos para resolver essa questão da regularização fundiária. Salientou que tem se avançado muito nessa questão, mostrando que é possível a proteção integral e o uso sustentável na bacia do Rio Negro, com a criação da RESEX do Unini, por exemplo, que acabou sendo o resultado de anos de trabalho. A idéia é ter áreas na região que equilibrem esse mosaico de áreas protegidas, que se possa construir essa agenda comum e disse esperar que tenhamos resultados que nos ajudem nessa caminhada, para avançar na busca de uma solução definitiva. Alessandro Marcuzzi, do ICMBio, agradeceu a participação, salientando que a FVA é uma antiga parceira do IBAMA e que até o fim do ano devem estar renovando o termo de cooperação técnica, pois precisam de parcerias. A questão fundiária no Jaú é muito parecida com a de outras unidades de conservação, um problema criado pelo Estado com a criação de UCs, que é um grande desafio em uma série de aspectos, especialmente o jurídico. Disse esperar que se consiga, após esses dois dias, algum resultado que ajude a resolver a questão da regularização fundiária.

Domingos Macedo, do Centro Estadual de Unidades de Conservação/CEUC salientou que no Estado também existe essa preocupação para avançar nos direitos das pessoas que vivem, usam ou moram em unidades de conservação. As UCs estaduais de proteção integral próximas ao Jaú também sofrem esse tipo de problema, para tentar trabalhar uma gestão viável para o gestor, a conservação e os usuários. Considerou uma pena não ter a participação dos órgãos fundiários (INCRA e ITEAM), que são peças fundamentais do debate e dos quais se precisa ter uma participação mais pró-ativa. Mesmo com o diálogo é preciso avançar na questão jurídica, onde não se tem conseguido avançar. É preciso melhorar a nossa qualidade técnica e jurídica, ter uma assessoria mais adequada nesse aspecto e convencer a Procuradoria Geral do Estado a ter um protocolo mais adequado e positivo para solucionar esse tipo de situação. Existem exemplos práticos que já vem ocorrendo em UCs de proteção integral, mas é necessário expandir e esclarecer melhor quais são os direitos para dar tranqüilidade para essas pessoas. Acredita que após esses dois dias seja possível tirar daqui alguns encaminhamentos para a questão. Esse é o terceiro debate no ano para tratar da questão fundiária. A FVA é parceira do Estado também no termo de gestão técnica e co-gestão, mas é preciso dar seguimento. Propôs que após o evento sentem juntos para ver como dar prosseguimento, para que a discussão não termine no vazio. Agradeceu o convite e disse que o Estado tem muita disposição para abrir essas portas e para criar jurisprudência para essas questões. Cesário Magalhães, presidente da AMORU, cumprimentou os presentes e disse que hoje representa a Associação de Moradores. Agradeceu a Deus e disse que espera levar um resultado positivo aos seus associados, lembrando e ouvindo bem para dar continuidade ao seguimento, lembrando da forma participativa das pessoas que lá residem, a importância de envolver os moradores nesse debate, que o acesso é muito difícil para quem mora distante, mas é importante que a gente traga as nossas propostas pra que a gente consiga dar seguimento e viver de forma produtiva que não prejudique ninguém e para

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que não sejam infratores da lei. Disse que o melhor pra nós também não é destruir nem acabar nada, mas conservar. Temos também lá a AMOTAPI, que infelizmente não pode se fazer presente, e que a forma de trabalhar hoje é em parceria com os representantes que vão levar o conhecimento. Disse que é desta forma que está pretendendo trabalhar.

Jasy deu inicio a uma roda de apresentações na plenária: Sarita (geoprocessamento/IPÊ), Leo (IPÊ), Rafael (IPÊ), Aurely P. Freitas (MPE), Caê (ISA), Márcia (GTZ), Flávia Souza (INPA), Karla Oliveira (Serviço Florestal), Ana Flávia (ICMBIo, Resex Unini), Giovanna (PARNA Anavilhanas/ ICMBio), Bruno (PARNA Anavilhanas/ ICMBio), Luiz (REBio Jaru/RO/ICMBio), Francisvaldo (UCs do Estado), Paula (Mato Grosso), Ludmila (advogada/direito

ambiental), equipe de filmagem, Francisco (presidente da comunidade Bela Vista, Parque Estadual do Rio Negro - setor sul), Patrícia (ICMBio), Alessandro (PARNA Jaú/ ICMBio), Thais (canal futura), André (presidente da com. Castanho), Luciene (populações indígenas), Luciano (FVA), Maria José (AMORU), Henrique (CEUC), Sinomar (CEUC), Adriane (FVA), Ivanilda (ex-moradora do PNJ), Gilberto (morador do PNJ), Arlesson (AMORU/morador da RESEX do Unini), Adilson (GTA), Fernando (Unicamp), Adéssio (coordenador de gestão de UCs estaduais), Tauana (Amapá), Roberto (SEMMA - Amapá), Adriana Ramos (ISA), Lena (ICMBio – Terra do Meio), Marcos Rocha (IPAM), Lúcia (Unicamp), Satya (UFAM), Christina (PCE/ SDS), Hênyo Barreto (IEB), Yara (FVA). Deu-se início então a apresentação das palestras.

Gente(s) e áreas de proteção integral: Os (des)caminhos de uma querela até o SNUC. Hênyo Barreto Filho – IEB Iniciou a palestra agradecendo o convite e disse que sua apresentação está estruturada em três pontos: primeiro um conjunto de observações, depois uma parte mais substantiva para mapear questões implicadas no debate do conservacionismo (congressos, assembléias, reuniões sobre o tema, etc) e uma terceira parte com conclusões e propostas para discussão. Começou sua apresentação com uma citação do f ilósofo francês Michel Serres sobre a historicidade das paisagens, e as diferentes escalas de tempo (cósmico, geológico e da vida humana). Acha que podemos usar isso para entender também as leis – mostrou um esquema que montou para mostrar a historicidade dos

conceitos e dos dispositivos legais, onde quis destacar os vetores que se cristalizam no SNUC. Salientou que não irá falar de todos os vetores, mas apenas de um. Isso reflete uma perspectiva critica e reflexiva para estudar o fenômeno legal que vê as leis como fenômenos históricos e culturais, como par tes integrantes de processos sociais. Precisamos entender os conceitos, valores, projetos ideológicos expressos e consolidados nessas normas, os interesses sociais efetivos aos

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Anseio de sistematização e disciplinarização da administração pública dos espaços – Brasil (séc. XIX/XX) > anseio de sistematização – mundo (anos 60) > “unidade conservacionista” (1947) – distinção entre “uso direto” e “uso indireto” 1965 – Código Florestal (1967) – controvérsia gente/pessoas em parques –Parque Nacional x Parque Indígena (1969) - Congresso de áreas protegidas que serviu de base para o plano do SUC do B (1979 e 1982) > necessidade de regulamentar o art. 225 § 1, inciso III/Constituição Federal de 1988 > criação do IBAMA em 1989 (junção do IBDF com a SEMA) > caminho sinuoso de debates que culmina no SNUC, em 2000, fruto desse conjunto diversificado.

quais correspondem, o inter-relacionamento de valores e interesses de grupos com contextos sociais mutáveis e com outros usos sociais e costumes pré-existentes e alternativos, e por fim a(s) lei(s) como cristalização de uma dada correlação de forças em uma conjuntura histórica. Propõe analisar a lei não só pelo grau de sua efetiva aplicação, mas por seus outros efeitos enquanto mecanismo de codif icação e instrumento de formalização, independentemente dela ser efetivada/aplicada e/ou dispor de instrumentos para ser imposta, a simples existência da lei enquanto limite e horizonte dos modos de intervir socialmente em face de certos problemas, torna-os passíveis de controle objetivo. Adotar uma perspectiva diferente da do “cumpra-se” (pense-se, por ex., na criminalização do aborto e do consumo de maconha, na impossibilidade de união civil de pessoas do mesmo sexo, etc.).

Gentes e UCs de proteção integral: vetores do debate: 1) a dinâmica sócio-política: a resistência nativa à implantação de áreas protegidas, principalmente na África e no Sudeste Asiático, em que os sistemas de conser vação são identificados ao regime colonial; 2)o desenvolvimento da pesquisa científica: o aprofundamento do conhecimento sobre as características das sociedades e os ecossistemas do domínio neotropical (revisão das idéias sobre a história ecológica e cultural da Amazônia); e 3)* as consequências dessa dinâmica nos debates no âmbito do conser vacionismo internacional: as mudanças no âmbito das formulações e orientações produzidas nos fóruns internacionais de discussão sobre os estatutos, os objetivos e as metodologias de gestão das áreas protegidas. Influência do cenário internacional quando se fala de áreas protegidas de proteção integral (AP).

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A revisão das idéias sobre a história ecológica e cultural da Amazônia Até pouco tempo, tínhamos a imagem de: uma planície monótona; uma floresta tropical amplamente uniforme; um ambiente hostil à civilização e de ocupação relativamente recente (paradigmas da Betty Meggers); uma área esparsamente povoada, sociologicamente anestesiada e culturalmente dependente de áreas mais desenvolvidas; e habitat preferencial de grupos isolados, pequenos e dispersos, tidos como autônomos, autocontidos, igualitários e tecnologicamente austeros, em virtude de condicionantes estabelecidas por recursos naturais escassos (ex.: solos férteis e proteína animal). Nada mais contrário à visão que aos poucos se consolida (através de pesquisas arqueológicas) de: uma área originalmente populosa, complexa sociopoliticamente e com uma ecologia significativamente alterada pela ação humana; composta de paisagens em que a plasticidade da inter venção humana desempenhou um papel fundamental o que as torna, hoje, mais ou menos adequadas a distintos empreendimentos humanos (incluindo ações de conservação); Padrões de assentamento e de uso da terra (Heckemberg – Xingu) que denunciam a existência de sociedades complexas e formas pré-históricas de urbanismo; chega a se falar em “paisagens cultivadas” no Sudeste da Amazônia – artigo da revista Sciense.

Transitando para propostas conservacionistas... Para muitas das circunstâncias em que se pensa na criação de UCs de proteção integral, não seria correto falar em áreas “naturais” a serem protegidas. Esse reconhecimento tem se traduzido em propostas normativas: ao se decidir que atributos ecológicos particulares são dignos de proteção,

devem-se considerar as necessidades e desejos daqueles que contribuíram para moldar a paisagem e que precisarão se adaptar às mudanças desta posição consagrada na CDB (1992).

A querela no âmbito do conservacionismo internacional: O debate em torno do suposto problema da presença de grupos humanos em APs – definidas como instrumentos de conser vação da biodiversidade in situ – caminha paralelamente à construção da noção de “populações/povos/ comunidades tradicionais. O reconhecimento da existência de “estilos de vida tradicionais” no âmbito do conservacionismo deu-se na conjuntura da incorporação oficial do princípio do zoneamento à definição das APs e do surgimento da preocupação em relacionar conservação da biodiversidade in situ com o desenvolvimento sócio-econômico à escala local na gestão dessas áreas.

I Congresso Mundial de Parque e APs (Seatle/1962): princípio geral para ParNas admitiu a possibilidade de, na prática, existirem “exceções” à regra geral de ampla proteção legal contra a exploração de seus recursos naturais ou quaisquer outros danos ocasionados (direitos privados de habitação, agricultura, pecuária, prospecção mineral e caça porventura existentes antes da criação do parque, atividades que deveriam ser manejadas aspirando-se à redução ou ao fim das mesmas). dadas as dificuldades de definir uma área inteira por uma categoria apenas, pela primeira vez foi proposta a divisão dos parques em zonas, def inindo as atividades permitidas e proibidas em cada uma delas.

11a assembléia geral da IUCN (Banff/ Canadá/1972) ·em sua tentativa de estabelecer uma def inição unitária de ParNa de aplicação mundial, incorporou-se oficialmente o princípio

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do zoneamento à definição de ParNa (decisão ratif icada no II Congresso Mundial, em Yellowstone). a anexação do zoneamento ao conceito de ParNa trouxe consigo o reconhecimento de que comunidades humanas com características culturais específ icas faziam parte dos ecossistemas a serem protegidos, na figura das “zonas antropológicas”: zona de ambiente natural com culturas humanas autóctones, zona com antigas formas de cultivo e zona de interesse especial. Comentário do Stefen Adrian onde se reconhece os moradores cuja herança cultural é valiosa para se proteger:

É um aspecto da polícia administrativa, que representa forte intervenção no ordenamento e regulação da apropriação do espaço.

”el concepto [...] se amplió con el principio de zonificación por el cual se reconoce a los pobladores del área como parte del ecossistema (mediante la acceptación de zonas antropológicas protegidas), que ejecutan una agricultura tradicional adaptada al ecosistema y cuya herencia cultural es valiosa conservar y proteger”

III Congresso Mundial de ParNas e APs (Bali/1982):

Admitiu-se que o manejo restritivo era contraproducente aos princípios da conservação, não se adequando às situações encontradas na maioria das APs do mundo (estudo da UICN revelou que mais de 80% das APs no mundo tinham o mesmo problema): sendo preciso envolver os moradores no manejo do parque. É indispensável “fortalecer el principio de la zonificación, que en casos bien definidos permite la presencia a largo plazo de asentamientos humanos, involucrándolos al máximo en el manejo del parque”. Reconheceram-se, assim, culturas originárias, que efetuavam uma agricultura tradicional, supostamente adaptada ao ecossistema, e cuja herança cultural se considerava valiosa, apenas mediante a sua aceitação das zonas em que seriam administradas.

“Zoneamento é negativo: não é outra coisa que [a] proibição abrangente, aplicada simultaneamente a todos os lugares [de um] território em questão” (Nitsch).

12a assembléia geral da IUCN (Zaire/1975) Ao admitir que o estabelecimento de APs poderia ocasionar a expulsão (como se ainda não tivesse acontecido) ou o reassentamento forçado de grupos humanos, alertou formuladores e executores de políticas públicas para que o estabelecimento dessas áreas não trouxesse como conseqüência a desagregação cultural e econômica dos grupos que não afetavam a integridade ecológica da área.

MacKINNON, J.; K. MacKinnon; G. Child e J. Thorsell. Manejo de Áreas Protegidas en los Trópicos. Gland: IUCN, 1990 [1986]. Chama a atenção que a parte que se refere as populações locais não estão nas bases para o estabelecimento de APs (parte A), mas obtenção de apoio (parte B, cap. 5 e 6) - um exercício de persuasão e não efetivo planejamento para a gestão das APs Se trata de conseguir adesão e apoio. Oferece compensação quando as comunidades perdem seus direitos e privilégios. É uma política claramente compensatória, de onde surgem os ICDPs – projetos integrados de Conservação e Desenvolvimento Socioeconômico para os grupos locais. ICDPs: amplo e diversif icado leque de iniciativas que tentam articular a conservação da biodiversidade em áreas de proteção integral com o desenvolvimento sócio-econômico para grupos humanos em escala local, ofertando fontes alternativas de renda que não ameacem a “integridade ecológica” das APs. Leitura critica de Débora Lima: é evidente a perspectiva compensatória. “projetos integrados apresentam a intenção de promover a melhoria das condições de vida da população como ‘retorno’ por sua cota de sacrifício e como incentivo à sua aceitação da proposta de preservação” (Lima, 1997, p. 288).

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Citou o artigo publicado na revista do Banco Mundial sobre os elefantes, onde mostra a armadilha das políticas compensatórias. Os dois últimos documentos são de 1991 e 1992, quando começa a tramitar o projeto de lei do SNUC no congresso, por articulações do recém-criado IBAMA – temas importantes: def inição de populações tradicionais, sobreposição de TIs com UCs, questão dos conselhos das UCs e a possibilidade de reclassificação das UCs de proteção integral onde existem grupos humanos. O SNUC é o resultado de quando o pessoal se esgotou e cansou de discutir e enfim deixou a coisa como estava.

IUCN, PNUMA e WWF, 1991: “Permitir que a comunidades cuidem de seu próprio meio ambiente” – uma providência principal: reconhecer os direitos dos povos às suas terras e recursos, e a sua participação efetiva na tomada de decisões que os afetam.

Workshop “Populações e Áreas Protegidas” do IV Congresso Mundial de ParNas e APs (Caracas/1992): respeito maior “pelas populações tradicionais, possuidoras, muito freqüentemente, de conhecimento secular sobre os ecossistemas onde vivem; a rejeição da estratégia de reassentamento em outras áreas; e, sempre que possível, sua inserção na área de parque a ser criada”.

Algumas conclusões: Verifica-se ao longo do tempo uma postura ambígua: de um lado reconhecer os direitos dos grupos locais à autodeterminação social, econômica, cultural e espiritual, efetuar consultas e obter consentimento ou acordo dos mesmos e assegurar sua par ticipação efetiva em processos decisórios; por outro lado, conhecer melhor para poder convencer, persuadir, mudar o seu modo de produzir e viver para que evoluam (como se fossem primitivos); subordinar e instrumentalizar seus sistemas de manejo ao interesse prático de administrar as APs, fazendoos aceitar uma agenda exógena.

Ambigüidade que se reflete na ambigüidade da caracterização das populações tradicionais: por um lado, inextricavelmente ligadas à natureza, quase que uma extensão do mundo natural, afetando os ecossistemas locais de modo mimético aos distúrbios naturais que os modificam; e, por outro, destacadas da natureza, por possuírem profundo conhecimento empírico, objetivo e técnico – por conseguinte, distanciado dos processos e ciclos ecológicos e dos recursos naturais, que manejam com maestria. As propostas de integrar desenvolvimento e conservação no manejo de UCs de proteção integral não têm encontrado outra resposta que não a proposição de mecanismos compensatórios para os grupos sociais locais que sofrem os efeitos da limitação imposta pela restrição à apropriação dos recursos naturais valorizados. A participação - como forma de mediação de conflitos - não se estende ao ponto de colocar em jogo a estratégia de conservação da biodiversidade in situ: o direito de dizer não.

Questões: West (1991: xix): os conflitos mais pungentes não são aqueles entre o bem e o mal, mas os entre o bem e o bem, pois nestes “o equilíbrio entre imperativos morais é doloroso e difícil, sem implicações claras para um curso correto de ação”. No caso da partilha da herança territorial autoritária e tecnocrática (conjunto de UCs criadas na Amazônia até meados da dec. de 90 onde não houve nenhuma consulta ou participação, pois as populações eram invisíveis sociologicamente naquele momento), não se deveria considerar a opção de sacrificar objetivos conservacionistas* em prol dos grupos sociais? Termo de compromisso de quem com o quê? A residência de pessoas em APs, apesar de, em alguns casos, ecologicamente incompatível, não é politicamente inevitável, dada a realidade que enfrentamos na região? West diz que a definição da categoria de manejo deveria ser o resultado do processo de

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planejamento, no entanto quando se vai sentar para planejar as áreas as categorias e limites já estão predefinidas.

DEBATE: Cesário - AMORU: lembrou que a palavra dita: paradigma – onde possa existir populações tradicionais vivendo dentro de APs de proteção integral.

Resposta - Hênyo: deixou de acompanhar as experiências in situ há algum tempo e o que conhece é de segunda mão. Disse que as experiências que tem sucesso são aquelas que a criação da UC vem de um pleito de um grupo local e que o grupo tome a frente do processo. Exemplo dos Kuna no Panamá. O elemento crítico é o protagonismo dos grupos locais na gestão da área.

Foi iniciada a segunda paletra.

Pequenos usuários da biodiversidade em UCs de proteção integral. É possível, desejável ou nenhuma das anteriores?

Lúcia da Costa Ferreira - Unicamp Agradeceu o convite, explicou que vai dividir a palestra em duas partes: (1) as pesquisas que a equipe tem feito na região, para dar um retorno aos parceiros (PARNA Jaú, FVA, etc), (2) questões mais gerais sobre o tema: pequenos usuários de biodiversidade em UCs de proteção integral. Não seria possível abordar o assunto sem ter em vista a historicidade dos conceitos com os quais trabalhamos, explicada por Hênyo Barreto. Lúcia explicou que pretende estudar as divergências da política de conservação imposta pelo regime militar com influências estrangeiras e características colonialistas, além da

necessidade de se pensar sobre a proteção da biodiversidade em uma época que o desenvolvimento era a categoria central para o mundo, ver os lugares onde a democracia capitalista não seria possível. A conservação vai necessariamente resultar em um dilema, quando se tem pessoas que acreditam que a modernização é a melhor forma de melhorar o mundo, outras que acreditam em alternativas possíveis. Clivagem entre a formação das ciências humanas e biológicas – diálogo de surdos. Questão central da pesquisa: começou a trabalhar na Mata Atlântica, queria entender por que as pessoas se organizavam em torno da conservação do Brasil, um país pobre, com gravíssimos problemas sociais de distribuição da riqueza. Nunca daria certo como projeto de organização política no Brasil se pensar a conservação. Chegou a resultados ruins porque os grupos organizados no litoral de SP na Mata Atlântica eram pescadores organizados em torno de associações: organizações muito conservacionistas, ligadas a valores patriarcais, assistencialistas e despolitizadas do ponto de vista das questões democráticas. Queria saber se essas mesmas dif iculdades haveria na Amazônia tendo em vista o movimento social existente na região. Será que essas políticas, esse envolvimento traria resultados mais produtivos para toda essa dinâmica? Num primeiro

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momento a idéia era um estudo comparativo entre Mata Atlântica e Amazônia. Está na região desde 2002 entre o PNJ, RDS Amanã e Mamirauá. Suas perguntas eram: Quem são essas pessoas? Existe um projeto social que agregue essas pessoas? Há um movimento conservacionista ou um ante-projeto conservacionista onde as pessoas se oponham aos preceitos da conservação? Na Mata Atlântica esta não era a questão central, o que as pessoas buscavam é o desenvolvimento humano, os direitos de um país emergente, direito a casa, escola, condução, direitos mínimos. As pessoas não queriam de fato participar da discussão da biodiversidade e a esperança era aqui encontrar outra coisa. Hoje há uma arena ambiental, não se pode mais retirar os atores, ela existe e ela que produz a dinâmica social que leva as decisões futuras sobre a região (exemplo da FVA e o PARNA Jaú).

do Parque Estadual da Serra do Mar, onde existem quilombos e outros grupos sociais. Participou de uma reunião para o mosaico do PARNA Serra da Bocaina e do PAREST da Serra do Mar. Um dos moradores parceiro do gestor, quando chegou em outra arena para a criação de uma nova UC, o mosaico que integraria as duas, ele disse que a relação era totalmente conflituosa e que existe uma agenda de reivindicações nem sequer vistas. Conflito é isso, resolve alguns, aparecem outros. Coflito social não é ruim; essa é a contribuição das ciências sociais. Existe uma confusão entre conflito e problema. O conflito pode ser visto como solução, pois aponta onde não está funcionando, ele que deve direcionar o rumo da arena. É só assim que podemos pensar na possibilidade real de grupos humanos parceiros da proteção da biodiversidade, sem ter que abrir mão dos seus direitos.

Principais resultados

3) a adoção de um sistema legítimo de recursos coercitivos de barganhas.

No fundo existe uma política de resistência ou um comportamento adaptativo/passivo em função das políticas implementadas de cima pra baixo? Na verdade a resposta é uma soma dos dois, onde o sujeito vê uma oportunidade, existe uma grande capacidade de adaptação e ao mesmo tempo a decisão de atuar como atores, de decidir os rumos futuros – ação orientada. Durante todo o tempo há uma arena de debates e discussões, é aí que nós temos que mexer. Ela não é uma só, é uma arena maior com atores externos e outra menor com as pessoas que estão ali com o pé no chão, onde se vê as prioridades sendo definidas no dia-a-dia. Viu o processo de produção de uma liderança, hoje o morador do Jaú pode falar por si mesmo e dizer o que pensa diante do mercado das idéias.

1) capacidade de se reconhecer 2) capacidade de enfrentar conflitos. Ex: hoje se quer uma coisa nas APs, até que se consiga. Amanhã, busca-se então outra coisa. O conflito pode ser gerido, mas nunca vai ser terminado, pois ele é o propulsor da mudança. Caso de sucesso entre a conservação e o uso dos recursos no PNJ e no núcleo de Picinguaba

Do ponto de vista teórico, tradição não é um bom conceito: é uma postura de biólogo querer conservar gente como se gente não tivesse historicidade, da mesma forma que hoje a gente tem que reconhecer a historicidade da floresta. A categoria tradicional para inglês ver, para que seja visto um típico “traditional people” do Brasil. Quer discutir sim a chave do cofre, porque discutir conservação é saber com quem vai ficar, porque é direito, é poder, responsabilidade social de não jogar a chave do cofre no lixo por picuinhas. Como estratégica política é uma categoria adequada. A pergunta é: que futuro nós queremos, que país, que comunidade eu quero pra nós? Nós queremos um Estado de São Paulo aqui na Amazônia? Eu sei que estudando essa área não se vê a Amazônia, porque não se está vendo o agronegócio. A agricultura familiar, a pequena produção não só alimenta a Amazônia, como o resto do Brasil. Se isso não der certo, essa política de conservação, vai se chegar ao agronegócio. Impedir que o sonho capitalista penetre nessas regiões. Em todas essas áreas, mais ou menos isoladas, viu a modernização penetrando, porque as pessoas querem a modernidade, acreditam que esse ainda é o melhor futuro. Apesar de ser

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conservacionista, não pode admitir que as pessoas só tenham direitos se discordarem da modernização. Na hora de conversar com as pessoas, sabe que elas acreditam na modernização e essa decisão é racional, porque significa o que se quer para o seu futuro. As pessoas querem participar da discussão da conservação porque querem discutir o seu futuro. Chamaram o artigo de Encontro das águas por uma licença poética, porque esse ponto ali mostra bem a interpenetração sociocultural entre grupos distintos que a arena socioambiental ajudou a produzir, entre grupos muito diferentes, o que não fez com que o caboclo desaparecesse, mas ele não está parado no tempo.

Apresentação: Encontro das Águas: Dinâmicas Sociais e Biodiversidade na Amazônia Brasileira A democratização do processo decisório - uso e a conservação de recursos naturais no Brasil (~1990) policy makers, usuários, pesquisadores - conflitos sociais Disseminação pesquisas científicas sobre: divergências de opiniões, interesses, metas coletivas; a atuação da sociedade sobre os sistemas naturais; Nesse fenômeno › banalização do conceito de conflito social, perdeu força como categoria explicativa: conflito e problema = sinônimos outro foco de atenção › papel de grupos nativos de regiões com alta diversidade biológica na conservação: 1) modelo ilhas de biodiversidade 2) modelo bioregional

Hipóteses derivadas: 1) a conservação e a sustentabilidade são opções possíveis e o processo decisório é orientado pela dinâmica social produzida por conflitos de interesses, interpretações e intencionalidades; 2) há uma arena ambiental organizada por decisões coletivas definindo as regras para o uso de recursos escassos ou prioritários para a manutenção da biodiversidade, e essa arena é constituída pela interação de diversas arenas locais também conflituosas; 3) essa arena promoveu a interação entre grupos sociais heterogêneos e levou o projeto moderno de racionalização até localidades antes consideradas pré-modernas.

Questão Central: como e por que se dá a formação de grupos sociais para atuar frente à conservação da biodiversidade e qual a sua influência sobre a mudança social em direção a um futuro viável, devido ao uso sustentável dos recursos naturais? Questões derivadas: 1) Quais são esses grupos e como se caracterizam social e politicamente? 2) Quais suas principais motivações e objetivos? Quais seus modos de ação e estratégias preferenciais? 3) Há um projeto social que os agregue?

Escalas de Análise e Métodos Cruzamento entre Cotidiano e História (através).

Métodos: Hipótese Principal: os conflitos promovem as mudanças na organização do uso dos recursos naturais e não a agregação de sujeitos ao redor de uma identidade conservacionista ou projeto de sociedade sustentável.

análise situacional (Glukmann) análise de processos (Habermas, Offe, Touraine)

Conceito integrador:

Arena (Haningann, Ostrom) Campo (Bourdieu) & Espaço Público (Habermas)

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Procedimentos de Pesquisa

Área de Pesquisa

Sujeitos Pesquisados: Lideranças políticas, comunitárias e institucionais e grupos de influência (pesquisadores, jornalistas, igrejas);

Dois tipos de áreas protegidas na Amazônia brasileira/Estado do Amazonas, Brasil:

Pesquisas de campo: desde 2002 Procedimentos: 1) abordagem aleatória no trajeto dos principais rios das áreas de pesquisa para coleta de histórias de vida e da coletividade, registradas em gravador; 2) abordagem etnográfica em comunidades selecionadas para estudo vertical, onde alguns dos membros da equipe permanecem por um período de no mínimo um mês em observação direta do cotidiano dos atores, registrada em diário de campo; 3) abordagem situacional de eventos coletivos de negociação; 4) dados cruzados com fontes documentais para comparação e complementação.

1) Proteção integral: Parque Nacional do Jaú (PARNA-Jaú); 2) Uso sustentável: Reservas de Desenvolvimento Sustentável: a. RDS Mamirauá b. RDS Amanã Comentários sobre o mapa do corredor central da Amazônia: o fato das duas RDS serem de uso sustentável e o PNJ de proteção integral faz diferença? A população da RDS Amanã é muito mais organizada do que na RDS Mamirauá, pela presença da igreja católica, porque em Mamirauá a organização veio no bojo da própria conservação.

Mapa 1: Corredor Central da Amazônia e Área de Pesquisa

Fonte: modificado a partir de http://www.conservation.org.br/arquivos/corredor (acesso em 15/07/2007)

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Estrutura do Artigo 1) arcabouço teórico; i) debates sobre conflitos de usos de recursos naturais ii) papel de pequenos grupos nativos na conservação da biodiversidade

2) processos de mudanças relacionados à conservação in situ da biodiversidade i) situações de ação no PARNA JAÚ ii) situações de ação na RDS Mamirauá

3) Conclusões Principais Resultados: Padrões de conduta mais observados Se cruzarmos a literatura sobre conflitos sociais relacionados ao uso de recursos naturais X a produção sobre o papel de pequenos grupos nativos na conservação da biodiversidade para analisar os dados apresentados, pode-se chegar a algumas conclusões relevantes: Existe aparente clivagem entre condutas possíveis dos grupos pré-modernos diante da invasão de projetos modernos de racionalização do uso dos recursos naturais, representados por agências governamentais e ONGs, em adição ao incremento do mercado do turismo de extração, representados pelos empresários da pesca esportiva e comercial: 1) comportamento de resistência (MANDER e CORPUZ, 2005), através de uma atitude orientada para a defesa da tradição, em uma recusa da mudança provocada pelo apego coletivo ao passado; 2) comportamento adaptativo ou uma concordância passiva aos benefícios da modernização, em uma postura afirmativa produzida pelas restrições impostas pela legislação. Entretanto, os dados apontam conduta capacidade dos sujeitos de se auto-adaptarem a novas dinâmicas sociais, ao mesmo tempo em que participam ativamente da produção coletiva dessas dinâmicas. Opção: atuar como atores,

ação orientada ao futuro que desejam (verificação óbvia: as mudanças em curso são parte essencial da vida social e coletiva). Sendo assim, os dados apresentados demonstram que o sucesso das políticas de conservação da biodiversidade depende muito mais da ação coletiva nos sub-sistemas social e político dos atores em confronto, do que das características culturais dos usuários diretos e indiretos dos recursos a serem preservados (FERREIRA, 2006; FERREIRA, 1999; FERREIRA et al., 2002). Nos casos de Mamirauá e Amanã eles definem suas prioridades de acordo com a orientação da política pública e não em resistência a ela.

Principais Resultados De modo similar às observações de Levi (1991), as situações de ação pesquisadas conf irmam que as instituições formais distinguem-se de outros arranjos organizacionais que incluem os costumes e a cultura, porque o rumo da ação de grupos nativos depende de: 1) sua capacidade de se reconhecer/ser reconhecidos como sujeitos portadores de direitos, deveres e poder; 2) sua capacidade constante de enfrentar conflitos intra e extra-grupais; 3) a adoção de um sistema legítimo de recursos coercitivos de barganhas que os habilitem a delimitar a decisão de outros.

Principais Conclusões As vitórias de movimentos sociais e grupos de pressão, apesar da impor tância para minimizar os impactos de políticas excludentes de conservação da biodiversidade sobre a vida social ideologizaram o debate científico: a tradição não é adequada como categoria analítica para compreender o processo decisório sobre restrições ao uso ou sobre o controle do acesso aos recursos naturais; As condições de representatividade dos habitantes de áreas de alta biodiversidade junto ao sistema político, não se baseam em tipos de identidade; a idéia genérica somente teve sentido quando usada como opção estratégica,

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em face de uma situação política de negação de direitos; O sucesso das políticas de conservação da biodiversidade depende mais da ação coletiva nos sub-sistemas social e político dos atores em confronto, do que das características culturais dos usuários diretos e indiretos dos recursos a serem preservados. Na maior parte das vezes, eles definem suas prioridades de acordo com a orientação da política pública e não em resistência a ela. Investigando um subconjunto particular de instituições, caracterizado por arranjos formais de agregação de sujeitos e de regulação comportamental, foi possível demonstrar que o papel de pequenos grupos nativos de regiões de alta biodiversidade depende de sua capacidade de se reconhecer e serem reconhecidos como sujeitos portadores de direitos e poder. Por fim, pesquisando dinâmicas sociais em localidades distantes e de alta biodiversidade na Amazônia brasileira, é possível afirmar:

em uma exata oposição a Latour (1991), jamais fomos tão modernos. Tendo em vista que o padrão preferencial encontrado na dinâmica social local foi a interpenetração socio-cultural entre grupos distintos, graças à arena ambiental produzida pela criação das áreas protegidas. Utilizando-se de uma licença poética, esse padrão parece reproduzir o encontro dos rios Negro e Solimões, cujo fenômeno acontece em um lugar denominado O Encontro das Águas; a partir dali eles seguem juntos por longo tempo, formando o rio Amazonas, mas sem misturar as águas pretas com as de coloração marrom. Isso se dá vagarosamente, quase de forma imperceptível a olhares pouco atentos. A existência do Amazonas não destrói os rios que o precederam.

Houve um breve intervalo e iniciou-se a palestra a seguir.

Gente e áreas protegidas: Avanços pós SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação) e as políticas públicas voltadas para o uso de recurso natural e UCs de proteção integral. Adriana Ramos – ISA A despeito do titulo da apresentação, não houve avanços em políticas públicas da forma como se poderia pensar.

O que a aprovação do SNUC significou com relação aos entraves? Tramitação do SNUC – reflexos dos dilemas • 1989 – 2000 Não foi a toa que levou onze anos até a aprovação e sanção da lei do SNUC (1989-2000). Até a última versão na relatoria do deputado Gabeira na Câmara, na sua origem que permitiria

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que a proposta fosse mais avançada para reconhecer os direitos de fato, isso não aconteceu. O exemplo dos casos da Amazônia, apesar que podemos considerar outros casos como o do PARNA de Itatiaia, o 1o do Brasil, onde consideraram que as casas de veranio estavam em concordância com os objetivos de conservação do parque, havendo claramente um preconceito social contra as populações tradicionais. Quando o projeto de lei chega no Senado, havia uma pressa do governo brasileiro, até em função da reunião da CDB que haveria, no sentido de que não retornasse a Câmara. Vetos à def inição de Populações Tradicionais e ao artigo que estabelecia a reclassificação de UCs de uso indireto em virtude da presença de população tradicional em seu interior (parques nacionais, estações ecológicas ou reservas biológicas). Também foi vetado o uso sustentável de RPPNs e o artigo que se dizia que só se poderia criar UCs por lei. Perspectiva de reassentamento e indenização. O que restou do SNUC para lidar com a situação foi a perspectiva de reassentamento e indenização. Def inição aprovada na Câmara dos Deputados: “grupos humanos, culturalmente diferenciados, vivendo há no mínimo, três gerações em um determinado ecossistema, historicamente reproduzindo seu modo de vida, em estreita dependência do meio natural para sua subsistência e utilizando os recursos naturais de forma sustentável”. O que ficou então no artigo 18, quando se fala em reservas extrativistas e populações tradicionais. Art. 18. A Reserva Extrativista é uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno

porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.

Justificativa dos vetos “O conteúdo da disposição é tão abrangente que nela, com pouco esforço de imaginação, caberia toda a população do Brasil. De fato, determinados grupos humanos, apenas por habitarem continuadamente em um mesmo ecossistema, não podem ser definidos como população tradicional, para os fins do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. O conceito de ecossistema não se presta para delimitar espaços para a concessão de benefícios, assim como o número de gerações não deve ser considerado para definir se a população é tradicional ou não, haja vista não trazer consigo, necessariamente, a noção de tempo de permanência em determinado local, caso contrário, o conceito de populações tradicionais se ampliaria de tal forma que alcançaria, praticamente, toda a população rural de baixa renda, impossibilitando a proteção especial que se pretende dar às populações verdadeiramente tradicionais. Sugerimos, por essa razão, o veto ao art. o 2 , inciso XV, por contrariar o interesse público.”

Regulamentação DECRETO Nº 4.340, DE 22 DE AGOSTO DE 2002

Processo de discussão e negociação ampliados – tentativas de reposição de aspectos não contemplados na Lei Diferentes níveis de aprofundamento Depois da lei, veio sua regulamentação num decreto aprovado em 2002, num processo amplo de discussão que retomou os conflitos que existiam. Sua regulamentação foi feita de forma irregular: há temas bastante aprofundados e outros que passaram de forma genérica e que deveriam ser novamente regulamentados. O que ficou foi a participação dos moradores e do entorno nos conselhos, e a parte que trata do reassentamento (artigos 35, 36, 37 e 38). O conflito é maior entre as instituições que devem

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lidar com a situação do que entre as populações em geral. Artigo 39 prevê a elaboração dos termos de compromisso com prazos já ultrapassados há pelo menos quatro anos. Art. 17 Do Conselho •§ 2º A representação da sociedade civil deve contemplar, quando couber, a comunidade científica e organizações não-governamentais ambientalistas com atuação comprovada na região da unidade, população residente e do entorno, população tradicional, proprietários de imóveis no interior da unidade, trabalhadores e setor privado atuantes na região e representantes dos Comitês de Bacia Hidrográfica.

DO REASSENTAMENTO DAS POPULAÇÕES TRADICIONAIS •Art. 35. O processo indenizatório de que trata o art. 42 da Lei nº 9.985, de 2000, respeitará o modo de vida e as fontes de subsistência das populações tradicionais. •Art. 36. Apenas as populações tradicionais residentes na unidade no momento da sua criação terão direito ao reassentamento. •Art. 37. O valor das benfeitorias realizadas pelo Poder Público, a título de compensação, na área de reassentamento será descontado do valor indenizatório. •Art. 38. O órgão fundiário competente, quando solicitado pelo órgão executor, deve apresentar, no prazo de seis meses, a contar da data do pedido, programa de trabalho para atender às demandas de reassentamento das populações tradicionais, com definição de prazos e condições para a sua realização. •Art. 39. Enquanto não forem reassentadas, as condições de permanência das populações tradicionais em Unidade de Conservação de Proteção Integral serão reguladas por termo de compromisso, negociado entre o órgão executor e as populações, ouvido o conselho da unidade de conservação. •§ 1º O termo de compromisso deve indicar as áreas ocupadas, as limitações necessárias para assegurar a conservação da natureza e os deveres do órgão executor referentes ao processo indenizatório, assegurados o acesso

das populações às suas fontes de subsistência e a conservação dos seus modos de vida. •§ 2º O termo de compromisso será assinado pelo órgão executor e pelo representante de cada família, assistido, quando couber, pela comunidade rural ou associação legalmente constituída. •§ 3º O termo de compromisso será assinado no prazo máximo de um ano após a criação da unidade de conservação e, no caso de unidade já criada, no prazo máximo de dois anos contados da publicação deste Decreto. •§ 4º O prazo e as condições para o reassentamento das populações tradicionais estarão definidos no termo de compromisso.

Tópicos pendentes de regulamentação Consulta pública para criação (não existem critérios quanto a localização e as regras para sua realização) Detalhamento dos critérios e mecanismos para gestão compartilhada – Experiências pré-SNUC – Proposta feita ao governo de SP – Resolução CONAMA

Mudanças na conjuntura política Eleição do Lula Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente Valorização do papel das populações tradicionais Política nacional de Povos e comunidades tradicionais Plano Nacional de Áreas Protegidas A eleição do Lula teve uma mudança nessa perspectiva. O posicionamento era majoritariamente conservacionista quando se aprovou o decreto. Com a eleição do presidente Lula e, especialmente, a posse de Marina Silva, representaram uma mudança, com a valorização das populações tradicionais e a Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais – PNPCT, que traz diretrizes importantes, reconhecendo os conflitos em UCs. Há também o Plano Nacional de Áreas Protegidas, um documento de diretrizes que deveria ter orientado o estabelecimento das

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outras coisas que já estavam aprovadas, ainda que seja um avanço para tratar da questão das populações tradicionais. Surje no governo também como uma coisa forte, a questão das

terras indígenas e áreas de quilombo. A Constituição, que é quem prevê a legislação indígena, usa a palavra tradicional, que é bastante ambígua.

Sobreposições entre UCs e outras áreas protegidas

Dupla afetação: onde há casos de terras indígenas com UCs, obriga-se os órgãos a sentarem e discutirem junto com os índios a destinação daquelas áreas. A ninguém interessa levar essa discussão adiante porque a Constituição é clara e impede que se revogue as terras indígenas, apontando para a revogação da UC. No caso do Alto Rio Negro, são 14 FLONAS criadas na época do governo militar para que a reserva indígena fosse criada em ilhas. Quando houve o primeiro concurso público do IBAMA houve uma luta por parte da FOIRN para que não fossem indicados funcionários para lá, pois não eram áreas criadas para os fins de florestas nacionais. No Alto Rio Negro isso se resolveu em parte, se ignorando então as FLONAS. Continua o problema na Terra Yanomami com a FLONA de Roraima.

O GT do CONAMA A dupla afetação O caso das Flonas do Rio Negro

O SNUC também não resolve a questão das sobreposições entre áreas protegidas. Havia uma proposta de Reservas Indígenas de Recursos Naturais, inviabilizada pelos conflitos entre a FUNAI e o IBAMA, que teriam que trabalhar juntos. A proposta foi discutida no GT do Conama, porque na época havia os Guarani da Mata Atlântica e a fala de um major dizendo que eram índios paraguaios.

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identidade, suas formas de organização e suas instituições. Na PNPCT, pela primeira vez um documento formal reconhece que a criação de UC de proteção integral pode ter gerado conflitos com as populações. Art. 3o São objetivos específicos da PNPCT: I - garantir aos povos e comunidades tradicionais seus territórios e o acesso aos recursos naturais que tradicionalmente utilizam para sua reprodução física, cultural e econômica; II - solucionar e/ou minimizar os conflitos gerados pela implantação de Unidades de Conservação de Proteção Integral em territórios tradicionais e estimular a criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável;

Princípios

DECRETO Nº 6.040, DE 7 DE FEVEREIRO DE 2007. Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. • Art. 2o - A PNPCT tem como principal objetivo promover o desenvolvimento sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais, com respeito e valorização à sua

I - o reconhecimento, a valorização e o respeito à diversidade socioambiental e cultural dos povos e comunidades tradicionais, levando-se em conta, dentre outros aspectos, os recortes etnia, raça, gênero, idade, religiosidade, ancestralidade, orientação sexual e atividades laborais, entre outros, bem como a relação desses em cada comunidade ou povo, de modo a não desrespeitar, subsumir ou negligenciar as diferenças dos mesmos grupos, comunidades ou povos ou, ainda, instaurar ou reforçar qualquer relação de desigualdade; II - a visibilidade dos povos e comunidades tradicionais deve se expressar por meio do pleno e efetivo exercício da cidadania; III - a segurança alimentar e nutricional como direito dos povos e comunidades tradicionais ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades

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essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis; IV - o acesso em linguagem acessível à informação e ao conhecimento dos documentos produzidos e utilizados no âmbito da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais; V - o desenvolvimento sustentável como promoção da melhoria da qualidade de vida dos povos e comunidades tradicionais nas gerações atuais, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras e respeitando os seus modos de vida e as suas tradições; VI - a pluralidade socioambiental, econômica e cultural das comunidades e dos povos tradicionais que interagem nos diferentes biomas e ecossistemas, sejam em áreas rurais ou urbanas; VII - a promoção da descentralização e transversalidade das ações e da ampla participação da sociedade civil na elaboração, monitoramento e execução desta Política a ser implementada pelas instâncias governamentais; VIII - o reconhecimento e a consolidação dos direitos dos povos e comunidades tradicionais; IX - a articulação com as demais políticas públicas relacionadas aos direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais nas diferentes esferas de governo; X - a promoção dos meios necessários para a efetiva participação dos Povos e Comunidades Tradicionais nas instâncias de controle social e nos processos decisórios relacionados aos seus direitos e interesses; XI - a articulação e integração com o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; XII - a contribuição para a formação de uma sensibilização coletiva por parte dos órgãos públicos sobre a importância dos direitos humanos, econômicos, sociais, culturais, ambientais e do controle social para a garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais; XIII - a erradicação de todas as formas de discriminação, incluindo o combate à intolerância religiosa; e XIV - a preservação dos direitos culturais, o exercício de práticas comunitárias, a memória cultural e a identidade racial e étnica.

I - Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição; II - Territórios Tradicionais: os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações; e III - Desenvolvimento Sustentável: o uso equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da qualidade de vida da presente geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras.

Plano de gestão de Áreas Protegidas Estabelece a questão da participação e da repartição equitativa dos custos e benefícios.

Eixos Temáticos Planejamento, Fortalecimento e Gestão: propõe ações relacionadas à implementação e ao fortalecimento do SNUC e à gestão da biodiversidade nas terras indígenas e nas terras quilombolas. Formulado no âmbito da abordagem ecossistêmica, busca a efetividade do conjunto de áreas protegidas e sua contribuição para a redução da perda de diversidade biológica. Governança, Participação, Eqüidade e Repartição de Custos e Benefícios: prevê ações relacionadas: I - à participação dos povos indígenas, comunidades quilombolas e locais na gestão das unidades de conser vação e outras áreas protegidas;

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II - ao estabelecimento de sistemas de governança; III - à repartição eqüitativa dos custos e benefícios; e IV - à integração entre unidades de conservação e entre outras áreas protegidas. Capacidade Institucional: ações relacionadas ao desenvolvimento e ao fortalecimento da capacidade institucional para gestão do SNUC e para conservação e uso sustentável da biodiversidade nas terras indígenas e nas terras quilombolas. Prevê, ainda, o estabelecimento de normas, bem como de uma estratégia nacional de educação e de comunicação para as áreas protegidas. Avaliação e Monitoramento: ações relacionadas à avaliação e ao monitoramento das áreas protegidas, bem como à gestão, ao monitoramento e à avaliação do PNAP. Existe um corpo formal hoje que assegura e reconheça os direitos, mas na prática é muito difícil que se assegure, por exemplo, a questão dos preços mínimos. Lei de gestão de Florestas Públicas: define comunidades locais e diz que áreas públicas ainda não destinadas, onde haja a presença de comunidades locais, deve haver a destinação de reservas extrativistas e RDS. • X - comunidades locais: populações tradicionais e outros grupos humanos, organizados por gerações sucessivas, com estilo de vida relevante à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica; • Reconhecimento dos direitos territoriais das populações tradicionais • Art. 4o A gestão de florestas públicas para produção sustentável compreende: • I - a criação de florestas nacionais, estaduais e municipais, nos termos do art. 17 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e sua gestão direta; • II - a destinação de florestas públicas às comunidades locais, nos termos do art. 6o desta Lei; • III - a concessão florestal, incluindo florestas naturais ou plantadas e as unidades de manejo das áreas protegidas referidas no inciso I do caput deste artigo.

CAPÍTULO III - DA DESTINAÇÃO ÀS COMUNIDADES LOCAIS •Art. 6o Antes da realização das concessões florestais, as florestas públicas ocupadas ou utilizadas por comunidades locais serão identificadas para a destinação, pelos órgãos competentes, por meio de: •I - criação de reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento sustentável, observados os requisitos previstos da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000; •II - concessão de uso, por meio de projetos de assentamento florestal, de desenvolvimento sustentável, agroextrativistas ou outros similares, nos termos do art. 189 da Constituição Federal e das diretrizes do Programa Nacional de Reforma Agrária; •III - outras formas previstas em lei. •§ 1o A destinação de que trata o caput deste artigo será feita de forma não onerosa para o beneficiário e efetuada em ato administrativo próprio, conforme previsto em legislação específica. •§ 2o Sem prejuízo das formas de destinação previstas no caput deste artigo, as comunidades locais poderão participar das licitações previstas no Capítulo IV deste Título, por meio de associações comunitárias, cooperativas ou outras pessoas jurídicas admitidas em lei. •§ 3o O Poder Público poderá, com base em condicionantes socioambientais definidas em regulamento, regularizar posses de comunidades locais sobre as áreas por elas tradicionalmente ocupadas ou utilizadas, que sejam imprescindíveis à conservação dos recursos ambientais essenciais para sua reprodução física e cultural, por meio de concessão de direito real de uso ou outra forma admitida em lei, dispensada licitação.

Outros instrumentos de política Área de Limitação Administrativa Provisória (ALAP) • Criada por Medida Provisória em 18 de fevereiro de 2005 • Instrumento legal que autoriza o governo a paralisar todas as atividades econômicas que

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causem novos desmatamentos ou sejam potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental em uma área determinada. Instrumento de ordenamento territorial.

impactos não mitigáveis (que não possam ser evitados) ocorridos quando da implantação de empreendimentos, e identificados no processo de licenciamento ambiental.

Compensação ambiental

· princípio da responsabilidade objetiva ambiental (Lei 6.938) • § O órgão ambiental licenciador fixará a compensação a partir do grau de impacto; • § O grau de impacto deverá ser determinado a partir dos estudos ambientais realizados quando do processo de licenciamento, considerando-se os impactos negativos, não mitigáveis e passíveis de riscos que possam comprometer a qualidade de vida de uma região ou causar danos aos recursos naturais; • § Os percentuais deverão ser f ixados, gradualmente, a partir de meio por cento dos custos totais previstos para a implantação do empreendimento.

A Compensação Ambiental é um mecanismo financeiro de compensação pelos efeitos de

(Decreto 4.340/2002 – regulamenta o SNUC)

Estava no SNUC no processo de consolidação, não ficou e foi criada por medida provisória em 2005, autorizando o governo a paralisar todas as atividades econômicas que causem desmatamento ou possam causar danos.

Distritos Florestais • nova modalidade de gestão territorial aplicada à gestão de florestas públicas. • principal função é a promoção de atividades econômicas sustentáveis.

Cuiabá-Santarém O exemplo da BR-163

Fonte: IPAM, WHRC, UFMG Estudos da BR 163 quanto aos impactos diretos da pavimentação de rodovias. O cenário previsto para 2026 já foi atingido antes de 2010, mas só não é pior pela criação de um bloco de UCs na área, fechando a região para o desmatamento.

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Hoje se tem mais de 40% da Amazônia protegida, seja por TIs ou UCs. Mecanismo do código florestal:

Relações com outras Políticas setoriais

Regularização Fundiária por compensação de Reserva Legal

“Começaram ontem, as consultas públicas para discussão das propostas de criação de unidades de conservação na área de influência da BR-319 que interliga Manaus (AM) a Porto Velho (RO). A proposta apresentada pelo governo federal, para discussão com a comunidade, prevê a criação das Reservas Extrativistas de Ituxi e Médio Purus, da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual do Igapó-Açu, das Florestas Nacionais de Tapauá e Iquiri, da Floresta Nacional ou Estadual de Beruri, dos Parques Nacionais do Umari, Coari e Jari, além da ampliação da Floresta Nacional de Balata-Tufari ou criação de uma Reser va Extrativista.” - (www.amazonia.org, julho de 2006)

• Art. 44 - § 6o – limitação de falta de recursos financeiros para a regularização fundiária pode ser resolvida por compensações. • O proprietário rural poderá ser desonerado, pelo período de trinta anos, das obrigações previstas neste artigo, mediante a doação, ao órgão ambiental competente, de área localizada no interior de Parque Nacional ou Estadual, Floresta Nacional, Reserva Extrativista, Reserva Biológica ou Estação Ecológica pendente de regularização fundiária, respeitados os critérios previstos no inciso III deste artigo.” (NR) Antigamente se achava que o governo criava áreas sobrepostas por desconhecimento, mas hoje se viu a criação de assentamentos de reforma agrária no parque mais antigo da Amazônia.

“Pressionado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão que planeja a produção de energia, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o recém-criado Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ChiBio) já concederam autorizações para que estudos

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fossem realizados em pelo menos duas unidades de proteção integral amazônicas.” - (Gustavo Faleiro, em O ECO, 22/08/07, sobre a Reserva Biológica do rio Trombetas e a Floresta Nacional de Saracá-Taquera) “As UCs são áreas restritivas que (...) são impostas às comunidades e ao segmento produtivo. Assim como uma UC pode assegurar a preservação de um ecossistema, pode fechar as portas para o desenvolvimento de atividades sócioeconômicas, que promovam o bem-estar de seu entorno. A participação do Poder Legislativo na discussão deste tema é essencial, já que a forma adequada e democrática de se criar uma UC é por meio de proposta de projeto de lei ao Legislativo e não por ato único do Executivo. Isso porque, uma vez no Parlamento, tais propostas poderiam ser analisadas com mais equilíbrio e respaldada pelas forças da sociedade.” - (Instituto Brasileiro de Mineração, junho, 2007) “”vários assentamentos estão sobrepostos a unidades de conservação”, como o Parque Nacional da Amazônia (área de proteção integral em Itaituba)”. - Agência Brasil, agosto de 2007

Desafios para o sistema de UCs Efetividade na participação – Consultas – Conselhos Sustentabilidade (do sistema e das UCs) – Serviços ambientais – Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação O que é a atividade sustentável hoje? Todos os exemplos possuem subsídios, então a gente tem que também subsidiar essas atividades no âmbito das comunidades. Mecanismos financeiros como o recém-criado Fundo da Amazônia tem o papel e o potencial de contribuir para a solução de problemas nessas UCs. Falta de integração entre as partes na estrutura de governo

– (ministérios partidarizados / captalização de iniciativas / interação majoritariamente em situação de conflito) Macro-políticas não interagem Integração no território é inevitável Vulnerabilidade às mudanças climáticas O nosso sistema de UCs está apto a enfrentar o problema das mudanças climáticas? Isso ainda está um pouco fora de discussão.

Limitantes da Regularizacao Fundiária Limitação dos programas de cooperação internacional (faz-se todo o resto: plano de uso, de manejo, etc, mas não faz a regularizacao fundiária porque o dinheiro está posto para outras coisas); Falta de interação entre os órgãos públicos Prioridade para regularização fundiária fora das áreas protegidas: – Medida Provisória da “Grilagem” – Propostas de simplificação na legislação

Desafios para a regularização em áreas de proteção integral Levantamentos das famílias dentro das áreas Definir critérios entre ocupação boa e de má fé Estabelecimento de termos de compromisso Clarear a demanda da população e a capacidade da UC Estabelecer pactos institucionais (ex: Incra e ICMBio)

Jasy formou a mesa com os palestrantes e abriu para a roda de perguntas.

DEBATE Marcos - WWF: entende na linha do SNUC que o termo de compromisso, gestão compatilhada, conselhos foram conquistas. O que deixou a política incompleta, o que faltou?

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A questão do veto, para 5 anos, se isso não empurrou a discussão para gerações futuras. Odécio: sobre os produtos extrativistas e o preço mínimo, questão com a Natura e moradores de uma comunidade sobre o preço mínimo pago pelo breu branco, se existe algum estudo para tachar o preço e também sobre o valor das compensações ambientais. Roberto Medeiros: no caso da RESEX Acajari, existe uma comunidade dentro da Reserva e o IBAMA entrou pedindo para retirar a comunidade. Como gerente, sugeriu que fosse convocada uma audiência pública. Com relação à participação comunitária, prevê as consultas, não há necessariamente a participação e não existem normas e critérios para estabelecer como devem ser feitas. O que poderíamos fazer para mudar isso? Jasy: uma das alegações com relação ao caso do Roberto é a questão da comunidade ter criação de gado e exploração madeireira, incompatíveis com a RESEX. Resposta - Adriana: Em relação aos instrumentos, eles foram avanços, a questão é como se trabalhar para que eles funcionem. Ter clareza da obrigação do poder público para se apoiar as comunidades para que elas participem, garantir a participação. Para se garantir uma participação efetiva é preciso dar os meios: transporte, alimentação, acesso e meios para o entendimento. O processo deve acumular e as pessoas devem saber quem são as pessoas que podem dar respostas ao que se precisa. Recentemente houve um movimento de levar populações de áreas de RESEX que estavam pendentes para ir a Brasília pressionar para a sua liberação e houve respostas do setor de Energia sobre os potenciais interesses que haveria no futuro e etc. Em relação aos outros vetos no SNUC, há também outros sobre penalização. O governo e o Congresso compartilham de uma dificuldade de assumir compromissos futuros. Os prazos são dados sem responsabilidade e a sociedade também não pressiona para o cumprimento da lei. Sobre os preços mínimos foi instituída uma lei recente para 10 produtos para que o comprador não possa determindar por qual

preço ele quer comprar. A política de preços mínimos deve garantir que a CONAB vai comprar pelo preço mínimo, foram estabelecidos os primeiros dez produtos prioritários. Para as medidas compensatórias, não existe um valor máximo. O que a lei estabelecia era um percentual mínimo (0,5%) do valor do empreendimento que poderia ser cobrado, mas foi derrubado pelo Supremo. Deve haver cerca de 20 projetos de lei tramitando sobre o assunto no governo. Caso da RESEX do Cajari é surpreendente, que é mais um problema institucional. Perguntar para a pessoa da tarde, que é advogada. Seu Francisco – Parque Estadual: A grande dificuldade que nós moradores temos é que nós não sabemos os nossos direitos. A nossa educação é precária, quando chega alguém com um pouco de educação, é espertalhão, quer tirar proveito e se formos aceitar indenização, vamos ter que pegar empréstimo com o FMI, porque já vamos estar devendo. O governo deve dar condições de um comunitário acompanhar as coisas, que ele deve levar respostas. O povo de reservas e do entorno é um povo esquecido, no nosso caso do Parque Setor Sul, a gente só recebe não. Resposta - Lúcia: gostaria de frisar a questão da participação e da RESEX. Sobre participação, existe um problema de método, como se faz a participação. Viu por exemplo no plano de manejo da ilha do Cardoso o que eles reivindicavam para ser parceiros da conservação, mas tinham que colocar tudo em poucas palavras em tarjetas. No final ficou o direito ao resgate da cultura caiçara. O caso é tão emblemático, a forma como a participação se dá. Sobre a questão da RESEX, ouviu vários casos de objetivos que são incompatíveis com a conservação. Entre o direito ao desenvolvimento humano e o direito a preservação, qual se privilegia? A questão é qual o padrão de atividade econômica que se permite. O objetivo de uma reserva extrativista ainda é a conservação da biodiversidade. Se o objetivo não for esse, então deveria ser um assentamento, etc. Esse é um tema de pesquisa, a confusão da política de conservação acontecendo na prática.

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Resposta - Henyo: Sobre os instrumentos que podem ser considerados avanços, por um lado sim, mas por outro eles traduzem um certo tipo de posição política. Parte-se do pressuposto de que as pessoas estão em níveis relativamente similares de poder, e não estão. Não se pode achar que conselho e termo de compromisso são a materialização de um ideal de participação e conciliação, porque vai haver conflito ali dentro também. Não se falava em conselho pra reserva extrativista, porque o sujeito era a associação de moradores, não havia chefe de RESEX, quanto mais conselho. Além de avançar mais na qualificação destes conselhos, na minha cabeça precisa limpar esse entulho (acha um absurdo ter o conselho e chefe de RESEX). Existem as transições dentro das RESEX já criadas e as mal criadas, onde já havia gente fazendo algo – criando búfalo por exemplo – antes da RESEX. Existe a pecuarização das RESEX e as RESEX que já foram criadas para resolver problemas que já existiam. Resposta - Lúcia: Conceito de ciência política não pressupõe que são todos iguais. Ele pressupõe que todos devem ser tratados de modo igual, pessoas de relações completamente assimétricas. Caê - ISA: Hoje, o que temos na prática são os instrumentos que temos com suas limitações: planos de uso, termos de compromisso, ordenamento. O que deve ser considerado nessa nova pauta para resolver os problemas fundiários em UCs? Cesário - AMORU: pediu maior esclarecimento sobre a necessidade das UCs, se fala apenas da gestão ambiental, ou se também está defendendo o homem. Patrícia - ICMBio: O que pensam e imaginam que vai acontecer no futuro com as UCs de proteção integral e qual seria a melhor opção? Os termos de compromisso, em tese, são transitórios, como então zonear as UCs de proteção integral, qual o futuro das mesmas partindo da realidade onde existe a presença humana? Thaís – canal Futura: sobre o direito de dizer não, se não é papel do movimento conserva-

cionista perguntar se, dizendo não, eles têm direito de dizer sim ao quê? Parece que só vai se preocupar com o morador da Amazônia quando ele está dentro de UC. Resposta - Lúcia: gosta de ouvir perguntas se pensando em daqui há cinco anos como vai estar. É inevitável que os parques continuem existindo porque há um grupo muito forte que acredita que eles são necessários, mas o que acha cada vez mais difícil é que se tire as populações de lá. Hoje em dia é impossível não dar as pessoas o direito de dizer não, a única saída que temos é a democracia participativa. A participação democrática e cidadã nos levam a um aprendizado muito grande, é o único ponto positivo dessas arenas. Ouvir o outro já é uma situação em que se obriga a refletir. As relações de domínio e coerção total acabaram. A tendência é que a gente consiga avançar fortalecendo as políticas que a gente tem. O morador vai ter cada vez mais o direito de dizer não. Resposta - Henyo: é bom o clima de despedidas pra que a gente possa dizer maiores barbaridades (risos). Considerou a fala do seu Francisco onde os moradores não puderam dizer não, mas a eles foi dito. Em 1999 foi tentar recuperar os motivos que levaram a criação do parque Estadual e das duas APAs. Na época não se sabia porque esses parque haviam sido criados, não havia documentação no IPAAM sobre a criação dessas duas áreas. Para mim é uma irresponsabilidade submeter grupos humanos a restrições em sua vida por razões que sequer o gestor sabe. No fundo são temas muito importantes, precisamos de ousadia e coragem política inclusive para enfrentar posições consolidadas que existem nos setores com os quais a gente dialoga e precisamos resgatar um pouco o projeto ideal com o qual a gente sonha. Ditado: Aos inimigos tudo, aos inimigos a lei. Temos feito ao contrário, usado a lei para os menos privilegiados, e para os inimigos, que a gente sabe quem são, somos no mínimo lenientes, deixamos eles “tocando o pau”, os caras do agronegócio, etc. Precisamos inverter, pois é sobre isso que estamos falando quando falamos de regularizacao fundiária e populações em UCs. Falava na época da FVA para

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trabalhar como se não fosse parque, para construir. Sobre o que vão ser as UCs de proteção integral, recomenda a leitura de “Mundos Imaginários” do físico Camille Flammarion. Diz que daqui há 10 milhões de ano nós não seremos mais humanos, enquanto uma parcela vai parecer humana. Quem vai ter poder ou dinheiro pra poder ir para outros universos e colonizar. Vai haver uma turma para vir a terra para ver como era a vida no passado, a Terra vai ser como um parque nacional com gente vivendo dentro onde as pessoas vão vir visitar para ver como era. Nesse futuro as UCs de proteção integral têm um papel importante. Parece brincadeira, mas acha que é isso que vai acontecer. Aprendeu com o professor Pablo Pádua ao estudar ecologia na UNB. No futuro vai ficar tudo como parque nacional, acha que não vai haver mais outras categorias, como ESEC ou REBIO. Acha que vão se aproximar dos modelos europeus, e não americanos, com gente vivendo dentro. Vai haver uma mega categoria de proteção integral negociada e uma mega categoria de uso sustentável. Acha que a mudança de categoria de Anavilhanas é o exemplo do que vai acontecer. Resposta - Adriana: acha que a tendência é que se faça um esforço de ajuste regulatório para conhecer as situações de fato. A lei do SNUC hoje não reconhece isso, ela foi pensada para ser uma lei de conservação na biodiversidade e não para propiciar às pessoas melhores condições de vida. Teremos de fato que repensar uma série de áreas e uma série de situações. Acredita que se avance nesses mecanismos para transformar a conservação em um bom negócio. A tendência é garantir a essas áreas um certo valor que possa ser partilhado e que faça com que a permanência naquela área possa ser favorável. Hoje há críticas severas ao modelo das Reservas Extrativistas, mas não existe uma reser va extrativista modelo com tudo implantado para que se possa avaliar se o modelo é ou não adequado. Para se ter um projeto de conservação adequado no qual as pessoas sejam parte do projeto e não um problema a ser resolvido. A questão é saber se no âmbito das pessoas que estão à frente da coisa pública e se vão ter vontade política para

resolver. Isso herdamos de um discurso internacional que diz que a pobreza impacta o ambiente, então precisamos regular o acesso dessas populações. Cesário - AMORU: a falta do poder público e político para dar assistência a essas populações. Se em outros países não existe isso, aqui nós temos outros problemas.

Houve uma pausa para o almoço. Ao retornar do almoço, Jasylene convidou os membros de comunidades a compor a mesa: Seu Cesário Magalhães, morador da RDS Amanã e atual presidente da AMORU, Seu André, da comunidade Castanho – Parque Estadual Rio Negro Setor Norte, Dona Ivanilda, ex-moradora do PNJ, Seu Francisco, morador da comunidade Bela Vista /Jaraqui no Parque Estadual Setor Sul.

Rodada de depoimentos Seu André, morador do Parque Estadual do Rio Negro – Setor Norte: Boa tarde,meu nome é André, eu moro no parque estadual, na margem esquerda, eu estou representando a comunidade, não tenho muito tempo lá, tem seis meses que estou representando a comunidade e quase não entendo nada, do que vocês falaram, os primeiros, eu entendi muito pouco. Quando eu nasci eu era pequeno e hoje eu to grande, to com 63 anos, não tenho como teoria, mas na prática eu tenho. O parque lá, eu moro lá há seis anos, se vocês quiserem passar lá, comer um cupuzinho. Antes do parque eu não tinha uma noção do que era parque, as meninas passavam por lá, da SDS, da Fundação e eu não participava porque não tinha interesse. Mas depois eu fui me interessando e depois que me chamaram eu me interessei porque a nossa comunidade é muito carente. O motor de luz chegou lá e não teve como chegar nas 13 casas que tem lá, os fios tudo embolado.

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Depois que começou o parque mudou um pouco porque a gente foi ter o conhecimento do que podia fazer pra preservar, porque antes a gente preservava sem saber. A gente não estraga madeira, não derruba a toa, não. Eles fazem canoas, fazem remos, o que eles podem fazer porque eles não tem da onde tirar. Quando sai de lá leva todo o peixe, pega o peixe, vão vender em Novo Airão, chega lá o peixe que eles vendem não dá nem pra comprar o gelo, aí pega fiado. Agora nós temos uma ajuda das balsas lá, elas tiram areia pra ponte, vão tirar toda areia que tem lá. Eles não ajudam nada, dá um dieselzinho que não dá pra nada. E aí o que eu posso fazer? Só espiar eles tirando. Depois a gente passa lá e eles levando. Graças a Deus que ainda tem o peixe pra gente comer. A Clarice, a Daniela, a Lene, todos eles já passaram por lá e foram eles que me incentivaram a vir pra cá. Vou falar alguma coisa pra eles lá, do que eu entendi. Seu Francisco, morador do Parque Estadual do Rio Negro – Setor Sul: Meu nome é Francisco, moro no Setor Sul, ali no Bela Vista, no Jaraqui, e também venho observando pelos novatos, eu também sou novato, estou lá há 8 anos. Falei com meu patrono, Deus, e aí comecei o trabalho, estou em busca de melhor condições de vida. Como agora falou o nosso amigo, a gente sendo roubado sem saber como reclamar. Atualmente nesse ano creio eu que por algum movimento superior, os donos de nossas terras, porque a terra não pertence a nós, pertence aos estrangeiros, porque eles que administram. Em toda a Amazônia Legal tem pessoas estrangeiras colocando verbas, porém não nos dá apoio, vem fazendo pesquisas, não sei porque esse interesse tanto. Os cientistas também tem deixado a

desejar, porque eles tem cultura, mas nós temos o conhecimento, só não sabemos nos expressar. Se a Amazônia não está toda derrubada é porque tem um povo tradicional ali zelando. Nós temos que nos preparar para uma outra maneira de sobrevivência, os nossos antepassados trabalhavam de uma maneira que não agradava a natureza. Sou sabedor, temos alguns conhecimentos do ecoturismo e outras maneiras de sobreviver, mas nós não temos apoio. A gente vê os navios vindo usufruir a nossa beleza e não deixam um centavo pra nós. Inclusive aonde eu moro teve até uma intenção de uma invasão. Procuramos o socorro e graças a Deus o socorro chegou a tempo. Eu tenho como ponto de vista, acho que chegou a hora de pegar o caco velho e botar pra fora. Nós estamos preocupados com hoje, o que fazer hoje? Eu dei uma lida sobre uma situação que ocorreu lá na Reserva da Serra, em São Paulo, aonde se foi lançado um povo tradicional ali. Nós somos meros copiadores, está na hora de copiar as coisas boas. Por exemplo, essa carta de compromisso que já está vencida, já tinha que ter sido feita há 4 anos. Porque o nosso povo, 80% é analfabeto. Tem pessoas do IPÊ que disseram que tem até 8 a serie, mas infelizmente é um estudo mentiroso, não porque o IPÊ mentiu, mas porque hoje uma criança que está na 4a série não sabe nem assinar o nome. Que futuro vai ter a nossa juventude? Nós que já estamos cansados, nosso futuro já está quase certo. Alguns têm a oportunidade de querer o seu ganha-pão na madeira, erroneamente, mas e as nossas crianças? Se nós não procurarmos fazer uma integração dos estudos de meio ambiente com a nossa comunidade, em vão é as nossas reuniões. Porque nós já estamos na hora de acordar, mesmo que para isso tenhamos que fazer vista grossa pra essas leis absurdas de coisas que foram colocadas, foram impostas.

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Dona Ivanilda, ex-moradora do Parque Nacional do Jaú: Boa tarde a todos e a todas, eu estou aqui hoje representando 65 famílias que residem em Novo Airão, faço parte de uma comissão que foi criada por necessidade nossa. Eu sou ex-moradora do Parque Nacional do Jaú, saí de lá em 1994 e não tinha muito conhecimento de que nós tínhamos que ser indenizados e infelizmente até hoje nenhuma das famílias recebeu indenização. A dififucldade que nós encontramos porque nenhuma família tinha onde morar, eu sou mãe de 10 filhos, a minha mais velha tinha 15 anos e nunca tinha entrado na porta de uma escola, porque dentro do parque não tinha escola, não tinha posto de saúde. Eu estou falando de 85 pra cá, na época que ainda era IBDF, foi uma vida difícil pra gente, porque em momento nenhum as pessoas que criaram o parque sentaram com a gente e conversaram. Só de saber o que podia fazer e o que não podia fazer, colocaram pessoas lá que não tinha formação nenhuma pra ser fiscal, os fiscais às vezes trabalhava até bêbado, pisava na banana, na farinha que a gente trazia e assim fomos nos desgostandos e tivemos que sair. E assim uma família foi convidando a outra, pegava apenas só as roupas e as outras coisas ficavam pra trás, deixando sua casa, seu sítio, a mercê da própria sorte sem saber o que ia fazer da vida. Chegamos a morar em casa que não tinha luz, não tinha água, emprego e nem estudo pra conseguir um emprego e a coisa se tornou mais difícil do que era. Uma vez uma vizinha nossa, a Lindalva, foi querer ter um auxílio-saúde no sindicato e ele perguntou cadê o documento de terra, e ela disse que não tinha. Então ele disse que nós devíamos se reunir, que tinha direito de ser indenizados, e aí fomos convidar os nossos parceiros e começamos a fazer reunião e dessa reunião tiramos 12 pessoas pra fazer uma comissão. O presidente do sindicato falou que nós ia ter que lutar, viajar bastante, correr atrás. Muitas vezes a gente era convidado pra participar das conferências, mas não ia porque não tinha dinheiro. O presidente incentivava a gente muito, o Aldenor Sobrinho Barbosa, sou muito grata a ele, e assim nós fizemos, criamos a comissão, fomos dentro do parque e lá conversamos com nossos parceiros, demos entrada no Ministério Público, com muita luta. Com cinco anos, o processo já está com cinco anos e ganhamos, a sentença foi favorável pra

gente aqui em Manaus, a juíza assinou, só que recorreram pra Brasília, alguém aí do Instituto Chico Mendes recorreu e nós não podemos fazer nada. Estamos tentando nos organizar, conversar com o Alessandro, que é o chefe do parque e com o pessoal da FVA, o professor Durigan, pra ver como pode nos ajudar, e espero que seja favorável, quando nós for julgado. Muito dos nossos companheiro já morreram em busca dessa indenização que nunca saiu. É triste você sair de um lugar sem ter onde morar, as crianças não têm uma alimentação saudável, eles passam muita necessidade em Novo Airão. Eu acredito que na época se nós tivesse tido a orientação que nós temos hoje, eu acredito que nós já teria sido indenizado. Se não me engano tinha 160 familias quando foi criado o Parque Nacional do Jaú. Eu convidei os companheiros que fazem parte da comissão, muitos não puderam vir. Nós precisamos de apoio. Com esses antropólogos que foram lá da época da FioCruz, tem uma associação registrada dos quilombolas lá, muitas vezes a gente está melhorando a situação através da associação dos quilombolas, já conseguimos cesta básica e medicamentos. E é isso que eu tenho pra dizer e obrigada. Cesário Magalhães, morador do rio Unini: Boa tarde a todos, meu nome é Cesário, sou morador da RDS de Amanã, onde também tem o Parque Nacional do Jaú e uma RESEX. Falar um pouco da história pra mim é importante até onde a Jasy disse que sou um autor de toda história. Começamos com um convite da FVA para o João Moraes e Levi pra participar de um encontro de ribeirinhos e quando voltaram disseram que tinham vontade de criar uma associação de moradores e foram trabalhando e eu engajei na luta com eles. Formamos uma comissão e saímos na luta pra tentar sensibilizar o povo de que uma associação era bom e conseguimos em 2002 criar a AMORU. Aí começamos a ser incomodados e a incomodar porque existia uma invasão de geleiros naquele rio, existia os empresários usando os recursos guardados por nós. O principal objetivo da associação era criar uma RESEX na outra margem do rio, criamos a RESEX em 2006. Logo em seguida, antes um pouco, fizemos o acordo de pesca do rio Unini, onde começou a amenizar um pouco, que até fomos ameaçados pelos geleiros. Essa associação começou a dar frutos,

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conseguimos elaborar um acordo de pesca onde na qual tudo se montou, o setor 1 pra pesca de subsistência, o setor 2 para pesca comercial e o setor três para pesca esportiva. Com a criação da RESEX em 2006 quebrou-se a instrução normativa do acordo de pesca de 2004 e aí nós começamos a ter muitas discussões entre nós e as coisas tomaram outro rumo, até que nós conseguimos sentar e pensar novamente. Muita coisa mudou e melhorou naquele rio com a associação, mas muita coisa ainda tem que ser trabalhada. Quando se fala na questão de reassentamento, a casa do ribeirinho não tem um grande valor pra depois o governo construir uma outra casa lá e quando for na hora de pagar, não paga não. Nós ribeirinhos somos muito ricos em recursos naturais, mas não temos condições de explorar. Hoje eu já tenho um neto que mora lá, está morando no rio Unini. Não é gratificante a gente destruir hoje e depois não ter mais nada. Hoje, a associação, o ICMBio/IBAMA, já estamos trabalhando dentro de um conselho consultivo, estamos trabalhando o plano de uso da RESEX, pra alguns meses do ano que vem já vamos dar um passo para a primeira reunião do conselho deliberativo da RESEX. Esse plano de uso, ele tem que servir pra nós. Se as pessoas que moram ali no parque não tivessem que sair, eu garanto a vocês que lá mesmo eles ficavam. Nós mesmos criamos uma área pra eles poderem ir e tem que ver direitinho de que forma essas pessoas vão ser mudadas. Já foi feito o croqui de uma nova comunidade pra 9 famílias que vão se mudar, pra área do Patauá, que nós já decidimos em assembléia da AMORU. Eu também tenho visto casos de jovens que abandonaram o Unini e pela falta de preparo cai naquilo que o companheiro acabou de dizer. A minha história, eu sou nativo de Manaus, não vou dizer que sou filho do Unini, mas me considero filho nativo do Unini, primeiro, minha mãe era nativa do Unini, teve quatro filhos no Unini, mas conhecendo a minha esposa que era filha do Jaú e saiu de lá pra estudar, os pais, o casal resolveram ir embora com eles. Minha esposa com 16 anos foi trabalhar numa panificadora pra se sustentar e como os filhos menores abandonaram a escola, tentaram voltar para o rio Jaú, aí eles subiram o rio e foram parar no rio Unini, nas cabeceiras, em Amanã. Eles não queriam morar em comunidade e aí a miha esposa que eu conheci aqui em Manaus, a gente

foi visitar em 1999 e lá ficamos. Abandonei tudo que tinha em Manaus. Eu queria falar mais, mas o tempo é curto, mas queria fazer um apelo que a gente tem que ter comunicação lá, seja na RESEX, seja no parque, fazer aqui esse apelo pro gestor do parque, tem até o pedido do orelhão pro Alessandro que está aí.

DEBATE: Adilson - GTA: pediu que Ivanilda explicasse como saiu do Jaú e para Cesário sobre o reassentamento das pessoas. Adriana - ISA: quais as maiores dificuldades para conseguir a criação da RESEX? Henyo - IEB: quando a Adriana falou sobre os povos tradicionais, tinha um item sobre segurança alimentar, hoje se fala em soberania alimentar. Trocar ovo de tracajá por lingüiça e salsicha é de lascar, salsicha e ovo de granja. Resposta - D. Ivanilda: nós saímos de lá porque realmente a gente não estávamos acostumados a conviver com aquela fiscalização, porque na época antes do parque ia regatão pra lá que levava as coisas pras pessoas, e depois da criação do parque não entrava mais, muitas vezes como adoecia uma criança não tinha alimento nem medicamento, nós nos sentimos pressionados a sair. Resposta - Cesário: realmente já existe um levantamento de 9 familias pra sair do parque, uma das nossas maiores dificuldade é construir as casas mesmo. Eles são um povo, eu não posso nem me considerar, mas eles são um povo muito nativo. É como nós avaliarmos hoje os grandes arquitetos da natureza, o joão-de-barro, as abelhas. Eles vão dar o jeitinho deles, mas eles já querem outro padrão. É difícil pra nós estarmos entrando na mata de 2 em 2 anos ou de 1 a 5 anos pra refazer a cobertura. O processo da RESEX foi mesmo para o reassentamento das pessoas. Foi feita a consulta pública, nós mesmos da associação pegamos e mandamos famílias e mandamos para outras RESEX pra conhecer lá, não tivemos muitos problemas..

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Foi fechada a roda de perguntas e Jasylene chamou o diretor Fernando Passos para falar sobre o vídeo que seria apresentado a seguir. Fernando - Unicamp: Não vou falar porque o que ouviram é do que trata o vídeo, não precisa falar, apenas sobre a produção. Está dentro de um projeto de pesquisa do Nepam coordenado pela Lúcia, foi um registro mas não apenas antropológico, mas de afeto mesmo aos moradores do Unini e do Jaú. O que manda é uma linguagem de respeito, poética, do que uma linguagem científica.

Apresentação de vídeo:

Jaú: sonhos e memórias.

Fernando salientou após o vídeo o apoio da FAPESP e que o vídeo é um pouco a idéia da voz do sujeito que vive nessas áreas. Diferença existe entre o mundo oral e o mundo escrito. O audiovisual não se presta a ser um documento antropológico como é a escrita, que tem uma lógica espacial. Na oralidade as pessoas relatam e sempre vai espiralando, a memória é importante para pensar e o pensamento é feito na palavra. O trabalho é com o sujeito da ação, que também é vitima, e trazer a sua dimensão humana, deixando de ser estatística. Os atributos são afetivos de relação viva com o ambiente, a relação viva que se tem com o mundo real.

Houve um intervalo e após o mesmo, a apresentação de duas palestras.

Direção de Fernando Passos. Unicamp/28 min.

A presença humana em Unidades de Conservação: aspectos jurídicos. Ludmila Caminha Baixo rio Negro: moradores no interior de UCs de proteção integral, moradores de UCs de uso sustentável, mas usando recursos de UCs de proteção integral, ex-moradores de UC de proteção integral não indenizados, remanescente de quilombola reconhecido no interior de UC de proteção integral.

A par tir dessa exposição pensou a apresentação.

Introdução - Regularização fundiária de Unidades de Conservação Admite presença de grupos humanos: · incorporação ao domínio público, · titulação da população beneficiária e · sua proteção possessória Não admite presença de grupos humanos: · incorporação ao domínio público. Muitas vezes a gente observa uma legislação que foi formulada sem considerar a realidade local onde deve ser aplicada.

Da designação de espaços territoriais especialmente protegidos Constituição Federal 1988, Capítulo VI, artigo 225.

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Parágrafo primeiro incumbe ao poder público definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos A constituição federal – art. 225 – diz que todos têm direito ao meio ambiente. Designação dos espaços territoriais especialmente protegidos é um regulamento territorial.

instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº. 6938/81): art. 9º VI, “ a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual e municipal” Resex Decreto nº 98.897/1990 “espaços territoriais destinados à exploração auto-sustentável e conservação dos recursos naturais renováveis, por população extrativista.” espaços de interesse ecológico e social, “as áreas que possuam características naturais ou exemplares da biota que possibilitem a sua exploração auto-sustentável, sem prejuízo da conservação ambiental.” Descreto que cria as RESEX em 1990. Depois dele nenhum outro foi tão específico ou avançou tanto no que tange as pessoas em UCs. Diz o objetivo da unidade e seus beneficiários. · Dá o conteúdo mínimo do ato de criação: limites geográficos, população destinatária e medidas para implementação. Cabe ao IBAMA promover a desapropriação e a regulação se dá por contratos de concessão real de uso e o plano de utilização formulado pelo IBAMA Esse foi o mais longe onde se chegou e a partir daí houve até retrocessos.

As Unidades de Conservação e sua situação dominial

Áreas de proteção integral Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional: posse e domínio públicos - áreas par ticulares em seus limites devem ser desapropriadas. Monumento Natural e Refúgio de Vida Silvestre: incompatibilidade dentre objetivos da UC e os usos promovidos pelo proprietário é o ‘gatilho’ da desapropriação

Uso sustentável Área de Proteção Ambiental – APAs, Áreas de Relevante Interesse Ecológico são constituídas por áreas públicas e privadas. Não têm destinação definida. Floresta Nacional - FLONAS são também de posse e domínio públicos; admite-se a permanência de populações tradicionais, de acordo com o regulamento do SNUC e o Plano de Manejo. Reservas de Fauna são de ‘posse e domínio públicos’, as desapropriações das áreas privadas seguem a legislação pertinente. Resex foram incorporadas pelo SNUC: são de domínio público, com uso concedido às populações extrativistas tradicionais As UCs são via de regra áreas de domínio público, pertencem ao Estado e seguem sua regulamentação específica. Reserva de Desenvolvimento Sustentável – RDS tem situação dominial indefinida: domínio público, mas áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas quando necessário (e quando é necessário?) Reserva Particular de Patrimônio Natural – RPPN é área de propriedade privada.

Com a lei do SNUC (Lei nº 9985/2000), divide-se as UCs em de proteção integral e de uso sustentável.

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Posse e domínio públicos: · Decreto imite na posse o autor do ato de criação; · incorporação ao patrimônio público pode ser por diversas vias: o Da desapropriação até a cessão de uso; · a alienação de direitos sobre essas áreas observa a legislação patrimonial;

A desapropriação nas Unidades de Conservação Ocorre em casos previstos em lei (Constituição Federal de 1988), por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social; por contrariedade ao Plano Diretor da cidade; por interesse social para fins de reforma agrária, de imóvel em descumprimento da função social da propriedade; procedimento contraditório especial, de rito sumário. Desapropriação: Natureza jurídica por ato de império – não se pode questionar a desapropriação em si, somente o preço, mas não o ato. Quando falamos do direito da comunidade dizer não, esbarra-se nos limites que qualquer cidadão tem de questionar o Estado, mas o Estado deve questionar o interesse social. O direito de uns esbarra no direito da sociedade. Destinação de terra pública é de interesse do público e deve haver um mínimo de concordância. Os decretos de criação das UCs afirmam o interesse ecológico – uma vez que não se enquadram nos interesses previstos, ficam por trás na ordem de prioridade. As RESEX e outras UCs de Uso Sustentável têm um formato de reforma agrária ecológica. Hoje não se afirma nos decretos de criação a sua intenção de promover o acesso a terra. Se as áreas fossem consideradas de interesse de reforma agrária, teriam os processos agilizados e simplificados para a desapropriação. Implementação prejudicada pela demora nas desapropriações.

A presença humana nas UCs de Proteção Integral SNUC trata como situação excepcional e transitória - incompatibilidade entre a presença humana e o alcance dos objetivos da unidade. Decreto nº 4340 de 2002, reforça a excepcionalidade e transitoriedade - Capítulo específico regulamenta o reassentamento de populações tradicionais. O processo indenizatório deve respeitar o modo de vida e as fontes de subsistência das populações tradicionais. Nega-se as comunidades residentes o reconhecimento do domínio. Fala-se dos territórios que as pessoas usam e ocupam e não que elas detêm ou possuem, o que reconheceria seu direito a terra. Assegura-se apenas o direito a indenização. É uma mesquinharia, um vexame afirmar na lei que se vai descontar o valor das benfeitorias que o poder público realizar no local. O órgão executor solicita ao órgão fundiário competente programa de trabalho para reassentamento das populações tradicionais, definindo prazos e condições de realização. O sujeito só é de direito quando infringe a lei, vive totalmente desassistido e ainda tem que passar por isso. O regulamento do SNUC reafirma essa transitoriedade, ao regulamentar o reassentamento e colocar a incompatibilidade entre as populações e os objetivos da UC. O uso indireto, da forma como é definido, proíbe o uso de recursos. A população reassentada ou removida sem indenização: Ação Indenizatória. Ao se negar o reconhecimento de domínio, nega-se a indenização pela perda da terra. A maior perda não é a material, mas a imaterial, do lugar onde se vivia, que se reconhecia como seu, que se trabalhou, que se manejou. Como se pode quantificar a tragédia social vivida? O sofrimento tem preço? A perda que as pessoas têm no processo de reassentamento é difícil de valorar. O dinheiro vai ajudar a minorar o sofrimento, mas nada paga o que foi passado. Não se define a participação da comunidade para repensar o assentamento. O espaço que

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tem é o termo de compromisso, que diz enquanto não se sai, pode fazer isso ou aquilo e não pode fazer aquilo. Reforça ainda mais a transitoriedade. Tratam as pessoas como se fossem acidente de percurso, um problema que precisa ser resolvido. Quando a indenização chegar, a maioria do sofrimento já terá sido superada. A maior perda é imaterial e tem repercussões intergeracionais, para que a comunidade se reorganize e se reaproprie do território novo.

Sobreposição entre área quilombola e UC de Proteção Integral art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988 reconhece a propriedade def initiva aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras, impondo ao Estado o dever de emitir-lhes os títulos respectivos. Sobre as populações quilombolas: único caso em que se reconhece a propriedade definitiva da terra, a propriedade plena, e o Estado tem o dever de titular a comunidade, reconhecer o domínio e emitir os títulos. Não se avança, entretanto, além disso, além dos enunciados dos direitos. Como se efetivam os direitos? Como se integram as pessoas nas novas atividades, na manutenção do parque, como fazer que as pessoas migrem de suas antigas atividades, que se integrem a proteção da área?

decreto nº 4.887/2003 trata a sobreposição de forma imprecisa. manda que a Fundação Palmares e os órgãos gestores dessas terras conciliem os interesses do Estado de forma a garantir a sustentabilidade dessas comunidades. Depois do decreto, nada mais foi feito. Nenhum regulamento ou decreto avançou um passo nesse sentido, sobre quais os procedimentos para se regular ou traduzir a norma jurídica para uma norma técnica. O mais longe que se vai é reconhecer a sobreposição. A transição precisa ser trabalhada, a cabeça das pessoas não muda com a criação de um decreto.

Instrução Normativa nº 49 de 2008 · manda que o relatório técnico de identif icação e delimitação das áreas quilombolas identifique a área onde ocorre a sobreposição, em terras públicas, estejam elas afetadas a outras destinações ou não. Incompatibilidade entre o reconhecimento da propriedade quilombola de caráter privado e o caráter público do domínio da UC de proteção integral. Ou se retifica a área/perímetro da UC, ou realiza o reassentamento da comunidade quilombola (onde cabe direito de desapropriação da comunidade quilombola, mas deveria haver toda uma argumentação para convencer o juiz).

Conclusão: UCs são, via de regra, áreas de domínio público, podendo haver o uso dos recursos naturais concedidos às populações que as habitam. Desapropriação não recebe prioridade (uma vez que deixaram de ser de interesse social, se houvesse objetivo de reforma agrária, para considerar o interesse ecológico). Presença humana em UCs de proteção integral é considerada fortuita. não se pode regularizar o uso de recursos de UC de proteção integral por população habitante em UC de proteção Sustentável – a legislação não tem instrumentos previstos para isso. a sobreposição de diversas formas de afetação leva à indefinição de atribuições entre os órgãos gestores e à lesão dos direitos das populações locais postura dos órgãos gestores - “cachorro que tem muito dono passa fome” reconhecimento da propriedade quilombola – pleno e de caráter privado – é incompatível com o caráter público do domínio da UC de Proteção Integral Enunciação de direitos territoriais feita sem o reconhecimento de domínio: Não se fala em posse, mas em uso e ocupação. Não há regulamentos estabelecendo os procedimentos para a efetivação dos direitos territoriais.

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Construção de termos de compromisso: a experiência da Reserva Biológica do Lago Piratuba Patrícia Pinha, chefe da REBIO Lago Piratuba - ICMBio. Criada em 1980 (Decreto n° 84.914, de 16/ 07/80 e Decreto n° 89.932, de 10/07/84) no litoral do Estado do Amapá, na região dos lagos com cerca de 400 mil ha e uma grande floresta de manguezais, matas e campos de várzea. Existem ao longo do rio Araguari 4 comunidades (52 famílias) e 13 fazendas que se dedicam a pecuária extensiva de búfalos, cujas famílias praticam a agricultura, pesca e caça de subsistência. Existe no entorno a Vila do Sucuriju (600 pessoas), que vive da pesca em lagos (laguistas) e no mar, através de sistemas de crédito por aviamento – sujeita a pororoca do rio Araguari.

campos alagados onde se pesca o pirarucu com arpão pelos laguistas. O pescador costeiro pesca com anzóis em uma linha de cerca de 2 km – espinhel – com o qual se pesca a gurijuba, peixe da região. Com a criação da Reserva Biológica, os laguistas tornaram-se ilegais, pois os lagos ficam dentro da área da reserva. A ação do IBDF e IBAMA era esporádica e além de apreender os materiais e multar os pescadores, chegavam a queimar suas casas. Considerou o termo de compromisso como algo um pouco mágico, pelo pouco tempo que demorou, onde se conseguiu caracterizar as casas como de feitoria sazonal, ainda que as pessoas vivam entre a vila e o lago. Havia tratamentos diferenciados: repressivos com a comunidade e tolerância com os pecuaristas ao longo do rio Araguari que não residem na área, com residência fixa, na maioria, em Macapá, que teriam que ser indenizados e continuaram criando seus búfalos. Fazer um termo com eles é muito mais difícil do que com os pescadores. Hoje há 50 pescadores laguistas cadastrados e um rebanho de 20 mil búfalos, que realmente impacta a unidade causando degradação.

Exibição do vídeo: O Arpão e o anzol. 6 min. Direção: Carlos Emanuel Sautchuck (disponível no youtube). Segundo a tradição local, a Vila do Sucuriju surge no início do séc. XX quando uma cobra grande abriu a boca do rio. O lago é uma região de

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Resultados: Reconhecimento dos direitos históricos e culturais da comunidade do Sucuriju; Regulamentação da pesca: regras que normatizam acesso, cadastramento de pescadores, apetrechos de pesca, quantidade e tamanho do pescado, períodos e locais de pesca, sanções; reuniões semestrais; Aproximação extremamente positiva que ainda não havia sido possível desde a criação da Reserva; Maior comprometimento da comunidade do Sucuriju com a conservação da Unidade, através da utilização ordenada dos lagos; Art. 42 do SNUC (LEI 9.985 18/07/00) que estabelece o termo de compromisso: As populações tradicionais residentes em unidades de conser vação nas quais sua permanência não seja permitida serão indenizadas ou compensadas pelas benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo Poder Público, em local e condições acordados entre as partes.

Não foi um convencimento, mas uma situação peculiar de interesses diversos que levaram a um acordo que satisfazia as duas partes. Resolveu o problema de invasão dos pescadores da capital, aumentando o estoque pesqueiro. Contou com apoio da coordenação de Brasília e da procuradoria jurídica – respaldo necessário.

Comunidades ao longo do Araguari e os fazendeiros

§ 2° Até que seja possível efetuar o reassentamento de que trata este artigo, serão estabelecidas normas e ações específ icas destinadas a compatibilizar a presença das populações tradicionais residentes com os objetivos da unidade, sem prejuízo dos modos de vida, das fontes de subsistência e dos locais de moradia destas populações, assegurando-se a sua participação na elaboração das referidas normas e ações.

1) Oficinas em cada comunidade de formas separadas, bem como com os pecuaristas (da associação de pecuaristas do Amapá). 2) Cursos: manejo bubalino e de produção de alimentos (em cada comunidade, para os funcionários das fazendas). 3) 2a Oficina para a elaboração do termo de compromisso (2 comunidades por vez). 4) 3a oficina (com as 4 comunidades).

Histórico do trabalho:

Termo de compromisso x termo de ajustamento de conduta: não se conseguiu avançar com os fazendeiros.

Seminário na Vila do Sucuriju em março de 2005. 4 assembléias comunitárias. Assinatura do termo em novembro de 2006.

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Termo de compromisso com as comunidadades do Araguari: REGRAS E NORMAS PARA: Pecuária bubalina Roças Criação de pequenos animais Pesca Lixo e tratamento de efluentes Construção e/ou ampliação benfeitorias Averbação de reservas legais

indenização? Concessão de áreas mais distantes em nome da associação? Pode-se vender terra de quilombola, uma vez que é de domínio pleno?

de

Recomendações: monitoramento periódico do cumprimento do termo (fiscalização e avaliação) realização de pesquisas para aperfeiçoamento dos termos necessidade do ajustamento de conduta dos fazendeiros gestão integrada com as comunidades. Salientou que o termo de compromisso, mesmo sendo provisório e não o ideal, pode e deve ser utilizado, está previsto desde 2000, foi o primeiro a ser implementado, é uma experiência que deu certo, que não é facil.

Debate: Marina - ISA: se o termo de compromisso tem prazo de validade e até que ponto pode-se contestar o valor das indenizações. Caê - ISA: parabenizou pelo trabalho e perguntou qual a classif icação dos lagos (categoria) e se pensam em uma estratégia para atrair mais pessoas para a atividade ou evitar que isso ocorra. Luiz - ICMBio: sobre a carteirinha de cadastro dos pescadores e a evolução da relação do ICMBio com as comunidades. Fafá - ICMBio: parabenizou ambas pelas apresentações. Para Ludmila, se fica garantido aos moradores, ao assinar o termo de compromisso, a indenização; se eles saindo, poderiam receber os créditos para construção das casas; e se isso seria descontado da

Adécio - SEMMA/AP: Voltou-se o não nas apresentações. Na criação do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque o não da população não foi respeitado, foram até Brasília. Se no caso dos quilombolas vale o não sobre o governo, além do resto da população. Resposta - Patrícia: é preciso ter a vigência pela lei. O plano de manejo ainda não existe e o pessoal de Brasília queria que f icasse até somente o plano ser concluído ou três anos após, mas foi assinado como vigência indeterminada. Com relação ao zoneamento a proposta é colocar a classificação dos lagos como zona histórico-cultural em razão da imaterialidade da pesca artesanal e tradicional. Provavelmente será aprovado como zona de uso temporário. Acredita que não vai se estender os termos de compromisso para outras populações e este é o motivo das carteirinhas, que fornecem o controle de quem está usando ou acessando. Sobre o relacionamento, é muito melhor do que sabe que era antes, mas estão em constante aprendizado e pretendem colocar uma base na vila, para estreitar os laços e atender as demandas de fiscalização. Resposta - Ludmila: sobre o valor, quando é o caso de uma desapropriação, para se questionar o valor é preciso chamar uma perícia para reavaliar. Uma indenização por danos imateriais (perda do território pela comunidade), avalia-se o dano causado. O IBGE não vai até os povos da floresta, as pessoas têm uma enorme dificuldade de fazer valer os seus direitos. Encontra-se apenas em casos de reservas de proteção. Caso emblemático do ISA, trabalho por povos do Xingu sobre uma nação indígena que foi quase dizimada e transferida para lá. Muito da indenização consiste em mostrar qual foi o dano, relacionado à perda de identidade e modo de produção e reprodução cultural. O dano imaterial e o sofrimento em decorrência disso. Sobre a indenização para a população da UC de população integral, ela é pensada apenas sobre o dano material. A transferência para uma área de uso sustentável é vista como uma forma de

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minimizar o dano. Para que elas saiam e tenham algum direito sobre indenização, isso deve constar nos termos de compromisso. Moradores de RESEX fazem jus aos benefícios de reforma agrária e acredita que isto não deve entrar no valor das indenizações. Há uma coincidência de situações, mas depende de como se argumenta no curso do processo. Sobre a área de uso comum, a área é um todo e para todos. O grande diferencial de quando a categoria foi proposta é que antes se fazia regularização fundiária pela legitimação de posse que incluía apenas as áreas da família e não as áreas de uso comum da comunidade. Quando se faz o contrato, ele pode ser feito para a associação de moradores e esta faz um acordo com cada família. A área não pode ser fragmentada, fracionada ou restrita, deve permanecer de uso comum. A concessão é feita de toda a área da Reserva. Cada família assina um termo sobre a sua área particular (que pode ser até 300 ha). A área comum é para todos. Sobre o domínio pleno quilombola, é sim permitido que vendam a área. O governo, com seu poder de desapropriação, pode desapropriar a área quilombola, como a área de Alcântara, no Maranhão, onde se argumenta que ela atrapalha o lançamento de foguetes da base. Equipara-se a qualquer outra propriedade plena. Por f im, sobre o caso do PARNA Tumucumaque, o direito de cada indivíduo da sociedade é limitado pelo interesse da sociedade como um todo, ainda que possa ser desinteressante para uma comunidade. Muitas vezes são questões de conveniência política. Caso da Reserva Renascer, que não sai pelo interesse de cinco madeireiros. Na ditadura se impôs os parques nacionais sobre a Terra Indígena. Bruno – ICMBio: parabenizou o trabalho da Patrícia e falou sobre o caso de Anavilhanas, onde trabalha. Como caracterizaram a pesca como de subsistência artesanal e qual a exigência do próprio instituto sobre as limitações? Roberto – SEMMA/AP: concordando com seu amigo, o PARNA Tumucumaque foi colocado goela abaixo e não houve um estudo. Questionou sobre a RESEX Cajari e o IBAMA que

quer jogar para que ele resolva a competência. Teve um caso prático em uma APA onde quilombolas estavam vendendo terras. Entraram com pedido de reintegração de posso na justiça estadual e encaminhou inquérito para a polícia federal com os recibos. Henyo – IEB: Sobre a REBIO do lago Piratuba. Quais as regras e normas que o gestor deve seguir, como fica isso no termo de compromisso e como isso pode ser fiscalizado? É um exemplo em que o gestor colocou entre parênteses a categoria e quis trabalhar, de forma não formalista e não legalista. Importância do conhecimento denso e qualificado da situação local – referência ao trabalho do Carlos. Não caiamos nas vertigens dos diagnósticos participativos rápidos. Em relação a apresentação da Ludmila: 1) sobre o decreto original das RESEX de 1990. A idéia era que o plano de utilização seria uma obra sociopolítica da associação de moradores. Considera o roteiro para elaboração inviável pelos moradores. 2) em casos como o do Jaú há um valor simbólico do pagamento das indenizações, do ponto de vista do aprendizado do setor público, uma vez que todos os que saíram, saíram sob algum tipo de pressão e existe uma expectativa de direito que precisa ser preenchida. Necessidade de elaborar uma metodologia eficiente para que possa ser replicada. 3) Dentro do previsto em lei, criou-se o PARNA. Antes do SNUC o que regulava a criação de parques era o decreto de 1979 que previa o que deveria ser feito. Se não foi feito o previsto, deve-se questionar judicialmente e se se demonstrar isso empiricamente, o parque cai. Seu Francisco – Parque Estadual Setor Sul: na situação do nosso parque a área é federal, o decreto estadual e existe uma área na parte de trás do parque que é da SUFRAMA. Como o órgão gestor se sensibilizou com a situação? Caê – ISA: necessidade de se construir procedimentos. Se existe um espaço para questinar decretos, existe ainda mais espaço pra se questionar uma categoria de zoneamento (zona de uso conflitante/zona de uso especial no âmbito cultural).

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Aurely – MPE: precisa-se respeitar os direitos fundamentais das pessoas que vivem em UCs por serem direitos fundamentais. Não só a criação está irregular como se pode discutir a própria criação. Existe uma recomendação do MPF para o Parque Estadual da Serra do Mar para haver a compatibilização dos direitos fundamentais de quem mora com os direitos ambientais. Nestes casos, é bom incluir o MPF, uma interpretação conforme a constituição, onde se defende o meio ambiente e os direitos humanos. Resposta - Patrícia: não tinham estudos para embasar os termos de compromisso, partiram da legislação de pesca e das assembléias com os comunitários, com atitude de precaução com a ajuda de um técnico da área. O mais importante é o monitoramento do desembarque do pescado, mas é muito importante ter pesquisa. A parte de sanções para o órgão foi retirada pelo procurador e neste primeiro termo não há tanta contrapartida do órgão gestor. No outro que está tramitando em Brasília, sim, por exemplo, necessidade de rádio nas comunidades. A vigência ficou condicionada a realização da regularização fundiária. Sobre a sensibilização do órgão gestor, se deu quando começou a conhecer as comunidades e as pessoas na Vila do Sucuriju, que é de difícil acesso, só por oceano, não tem água, só salobra. É do primeiro concurso público do IBAMA e logo que chegou logo assumiu a chefia e começou a sensibilizar outros técnicos e as outras pessoas do ICMBio. Quanto às zonas, existe o roteiro que se não for cumprido vai encontrar muita resistência. Existe muito a questão da proposta em si estar bem elaborada e que caia nas mãos de um procurador que se sensibilize. Resposta - Ludmila: sobre a venda das terras quilombolas, o que constitui o direito de propriedade é o registro, o título. Se elas tiveram o direito de venda questionado por um juiz, muito provavelmente é uma área quilombola não-titulada. No caso da RESEX do Cajari, o órgão gestor era o IBAMA, agora é o ICMBio e é ele quem deve atuar e não empurrar as coisas pro Estado. Pode-se fazer uma ação civil pública para compelir o órgão a cumprir seu papel. Quanto ao plano de utilização das RESEX, ele foi substituído pelos planos de manejo. O que

se deve buscar é a modificação da instrução normativa (roteiro para elaboração dos planos de uso) para que seja mais simplificado e possa ser posto em prática. Acredita que o valor não pode ser simbólico, é até maior. Henyo - IEB: independente do valor monetário, existe o processo mais barato que se possa fazer, que é simplesmente deixar que as pessoas saiam e lavar as mãos, custo zero para o governo. Resposta - Ludmila: o valor deve ser alto e quanto maior a demora para sair, maior deve ser. Quando a questão do S. Francisco, uma das maiores dificuldades é a falta de diálogo entre os órgãos públicos. Pra quem está no chão, governo é governo. O problema é a visão compartimentada e a falta de diálogo entre os órgãos. Quanto a questão da Aurely, acha ótimo que venha com a perspectiva dos direitos fundamentais. O que o direito protege é o direito humano ao meio ambiente equilibrado. Qualquer proteção ao meio ambiente deve ser vista sob uma perspectiva antropocêntrica. Enquanto diversas legislações se limitam a indicar direitos e não a forma como eles podem ser adquiridos, terminam por inviabilizar os direitos fundamentais.

Jasy encerrou as atividades e Durigan tomou a palavra, onde enfatizou o objetivo das atividades do dia seguinte para traduzir as contribuições de hoje para questões práticas, reforçando o convite para todos.

2o dia – apresentação da FVA, grupos de trabalho e resultados/ recomendações Jasylene abriu o segundo dia e Durigan iniciou fazendo uma apresentação sobre o Programa Geopolítica da conservação, da FVA.

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Geopolítica da conservação do Rio Negro: avanços e perspectivas Carlos César Durigan e Sérgio Henrique Borges Carlos Durigan iniciou a apresentação com um mapa mostrando a criação de UCs na Amazônia a partir da década de 70. Focou-se então na área de atuação da FVA na bacia do Rio Negro, com o mosaico de UCs do Baixo Rio Negro e o Parque Estadual da Serra do Aracá.

Cenário Geopolítico Atual Grande área constituída como UC no baixo rio Negro Maior parte dessas UCs são voltadas à proteção integral Grande parte dos Grupos Socias com os quais trabalhamos vivem em condições de irregularidade frente a legislação ambiental Dif iculdade na implementação de projetos de geração de renda neste contexto restritivo

O mosaico se constituiu não como mosaico (planejado), mas como um conjunto de unidades de conservação com problemas de limites; passou-se a trabalhar com a geopolítica da conservação pensando o que podia ser feito para minimizar os problemas e buscar soluções. Buscou-se tentar equilibrar áreas de proteção integral com áreas de uso sustentável, procurando garantir a permanência de algumas comunidades, como aconteceu no caso da RESEX do Unini, ainda que a maior parte delas seja de proteção integral e as APAs não garantam a posse e permanência das famílias. Diante disso, os grupos sociais da região vivem de forma irregular, dif iculdado a possibilidade de implementar projetos de melhoria e geração de renda, já que muitos financiadores não financiam projetos do tipo em UCs de proteção integral. Busca-se então a ampliação das áreas onde possam ser implementados projetos de geração de renda, como as RESEX por exemplo; o fortalecimento da parceria com o governo do Estado, especialmente no PAREST Rio Negro Setor Norte, buscando maior envolvimento dos moradores na gestão das áreas através dos conselhos. Tenta-se pensar as UCs não como obstáculos, mas como oportunidades ao desenvolvimento local. Percebeu-se que as famílias dentro de UCs, tendo possibilidades de melhorias nas condições de vida, sentem-se bem vivendo em UCs devido ao aumento da quantidade de recursos gerado com a preservação. Busca-se ao máximo envolver as populações no desenho dos planos de manejo e dotar as unidades com estes instrumentos.

Cenário Geopolítico Desejado Ampliação de áreas onde possam ser implementados projetos de geração de renda (Unidades de Uso Sustentável)

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Fortalecimento da agência estadual no manejo das UCs sob sua responsabilidade Grupos locais fortalecidos para participação dos processos de gestão destas UCs (Conselhos, acordos etc.). UCs se tornem oportunidades e não obstáculos ao desenvolvimento local UCs do baixo rio Negro dotadas de instrumentos mínimos de planejamento (planos de manejo)

Estratégias para ampliar o valor de conservação do mosaico de UCs

Criação de novas UCs Redelimitação de UCs já existentes Reclassificação de UCs já existentes Composição de Conselhos Consultivos Elaboração de Planos de Manejo

Neste cenário, pensando a conservação no contexto local e mundial, busca-se a criação de novas UCs, especialmente de uso sustentável, e a redelimitação e reclassificação das UCs já existentes. Ainda que seja complicado e tendo a questão dos precedentes, seria o mais lógico. Por que não? Sabe-se que isso ainda é muito difícil no cenário atual, enquanto as regulamentações não aparecem e a legislação não ajuda, por isso o foco nos termos de compromisso para se pensar essa questão a mais longo prazo. Enquanto isso, a importância dos conselhos consultivos, com grande par ticipação comunitária, e a elaboração de planos de manejo como importantes instrumentos de gestão.

Resultados: Criação e Implementação de uma Reserva Extrativista no rio Unini: criada com atrasos devido a divergências políticas, mas pensada desde o começo no sentido da gestão integrada com o Parque Nacional do Jaú. Fase de implementação além do desejado, mas com grandes avanços alcançados neste ano, como a criação do conselho deliberativo e do plano de uso praticamente concluídos. Elaboração do Plano de Gestão do Parque Estadual do rio Negro Setor Norte: aprovado pelo CEUC/SDS e elaborado de forma participativa (zoneamento, discussão dos programas). Revisão, atualização e implementação do Plano de Manejo do Parque Nacional do Jaú: Revisão dos encartes técnicos finalizada Proposta de zoneamento concluída Planejamento dos programas bem encaminhado Previsão de finalização para meados de 2009

Revisão dos limites e categorias de UCs Sérgio Borges deu prosseguimento.

A revisão dos limites e categorias de unidades de conservação podem ajudar na solução dos conflitos fundiários da região do baixo rio Negro? SIM Parque Estadual do Rio Negro – Setor Norte Área de Proteção Ambiental da Margem Direita do Rio Negro

Geopolítica: como as correlações de forças políticas se estabelecem no espaço geográfico? – conceito bem trabalhado por Bertha Becker. Nenhuma UC da Amazônia resiste a uma análise crítica de limites e categorias. Isso só não aparece porque elas não são de fato implementadas. Já que não se pode remover a população da UC, porque não remover a UC da população? Ninguém quer contestar a importância das UCs, mas é preciso ter um olhar crítico sobre elas. É preciso

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contestar sim parte do processo, e foi feito esse exercício no PAREST do Rio Negro - Setor Norte.

PAREST do Rio Negro - situação atual 1) Limites não são totalmente naturais 2) Presença de moradores 3) Não incorpora toda heterogeneidade ambiental regional 4) Os limites atuais não contribuem com estratégias de conservação em escalas maiores (Ex. PARNA Jaú, Sítio do Patrimônio, Reserva da Biosfera) Já foi uma vez redelimitado, mas ainda não está bom. Existem moradores, foi criado préSNUC, o que representa problemas tanto para os moradores quanto para os gestores. Não abrange todos os tipos de vegetação da área e não tem limites naturais, o que dificulta sua implementação. Não interage com os limites do Parque Nacional do Jaú. A proposta da FVA é aumentar os limites para o sul, na bacia do Carabinani, de modo a abranger as cabeceiras e vegetações como chavascais e campinas, além de um paleocanal, que mereceria ser protegido e ampliaria seu valor de conservação. A maior parte das comunidades reside ao longo do rio Negro. A nova configuração não resolveria a questão, mas ajudaria muito. No decreto original do PAREST,

Velho Airão ficou fora e na nova configuração ficaria dentro, por considerar que ele é de fundamental importância para a região, historicamente, propondo inclusive sua mudança de nome para PAREST Velho Airão.

APA da margem direita do Rio Negro 560.497 ha Inclusão de três municípios: Novo Airão, Iranduba e Manacapuru Incorpora áreas com caractéristicas sócioeconômicas e de conservação muito distintas Complementariamente a redelimitação do parque, haveria a reclassificação da APA da margem direita do rio Negro, por considerar que não é uma categoria adaptada ao rio Negro, mas uma unidade de transição, além de incluir três municípios com características socioeconômicas totalmente diferentes. Grave processo de degradação ambiental na região sul, onde deveria haver uma UC de proteção integral para impedir o processo de ocupação desordenada que vem ocorrendo. No entanto, ao norte de Novo Airao não há esse processo, mas comunidades com perfil agroextrativista e poderia ser recategorizada como uma UC de uso sustentável mais adequada à região.

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APA da margem direita do Rio Negro Setor sul

• Infra-estrutura de acesso ao Rio Negro estrada que liga Manacapuru e Novo Airão • Infra-estrutura e populações urbana crescentes (Iranduba e Manacapuru) • Estabelecimento de empreendimentos hoteleiros na margem do rio Negro • APA da margem direita do Rio Negro Setor norte • Ausência de infra-estrutura urbana • Presença de moradores com características agro-extrativistas • Ausência de suporte governamental para atividades produtivas • Grupos locais que estão iniciando processos de auto-organização: exemplo Associações de Produtores do Rio Puduari, Aracari e Sobrado

O cenário político não é favorável, já que Novo Airão tem a maior parte de seu município inserida dentro de UCs. Pensou-se em dois cenários, um que inclui totalmente a bacia do rio Puduari e outro que libera um pouco a sede do município, a partir do igarapé do Sobrado. Neste cenário, haveria uma conf iguração geográfica e geopolítica mais interessante, com um núcleo de UCs de proteção integral e no entorno áreas de uso sustentável. Este cenário envolve o aumento de área de UCs, tanto de proteção integral quanto de uso sustentável. Foi apresentado para o Estado, sendo recebido resistência, até pela questão dos precedentes. E isto está sendo trabalhado em outro nível. Existem justificativas técnicas para a proposta e trabalho de campo e sobre imagens de satélite, com uma revisão criativa que pode ter um impacto positivo na questão fundiária da região.

Proposta de reclassificação parcial da APA Margem direita do Rio Negro Cenário 1

Proposta de reclassificação parcial da APA Margem direita do Rio Negro - Cenário 2

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Geopolítica da Conservação do Baixo Rio Negro - perspectivas • Negociação produtiva e criativa dos conflitos fundiários das UCs • Consolidação do turismo ecológico nas unidades de proteção (uso público destas áreas gerando renda) • Consolidação da geração de renda em bases sustentáveis nas unidades de uso (plano de manejo, articulações com oportunidades econômicas)

DEBATE: Jasy abriu para uma rodada de questões: Marina - ISA: achou que a proposta tem vários problemas, gostou da proposta do PAREST mas achou que deve-se pensar no ordenamento de outra forma que não necessariamente seja UC. Acha que UC de proteção integral não deve ser usada para barrar o desenvolvimento desenfreado, lembrando que a região de Novo Airão entrou como área prioritária para o turismo, acreditando que deve se pensar com muito cuidado em deixar uma área liberada para o município. Tatiana - PARNA Anavilhanas/ICMBio: Queria saber sobre outras propostas que existem dentro do CEUC de criar UCs mais ao Sul foram levadas em consideração. Henyo - IEB: perguntou sobre o mosaico apresentado, onde entram as TIs e se entram o conjunto de áreas protegidas municipais, como áreas de Manacapuru, Lago do Limão, etc. Acha importante o amadurecimento na questão geopolítica no rio Negro e considera sobre a geração de renda, a autonomia de os grupos gerarem sua própria soberania alimentar. Considerou que em uma escala se pode pensar as UCs como sendo elas mesmas instrumentos de gestão territorial, mas que outra dimensão das características sociológicas das populações que não necessariamente se encaixam em qualquer categoria que existe hoje. Considera que algumas categorias de usos de áreas que se limitam a famílias e não a comunidades. Pensa que devemos garantir a posse e segurança de

alguns grupos usando instrumentos clássicos, como os assentamentos do INCRA. Luiz - UFAM: pediu que explorasse o conceito de valor de conservação. Contou uma paródia do futebol, com a idéia de não combinar com o outro, buscando outros interlocutores. Preocupa-se com o uso de imagens georreferenciadas, indicando o uso de um mapa do INCRA sobre as propriedades que já existem na área, sobre áreas ocupadas, griladas, propriedades privadas, etc. Levi – RESEX/AMOTAPI: falou sobre a criação de UCs sem um estudo aprofundado. Considera que o maior problema para a preservação não é a criação de UCs, mas políticas públicas. A questão não é a proteção e a imagem que isso trará. Eu moro dentro de três UCs e acho que essas áreas do Unini trouxeram problemas e não estão resolvendo os problemas das pessoas. Acho que há um grande conflito entre a preservação da natureza e o ser humano, pois quando foram construídas as políticas e leis ambientais, esqueceu-se o ser humano. Se não houver recurso para investir e pessoas bem capacitadas para gerir, não vai resolver os conflitos que já existem hoje. O negócio é recurso, políticas públicas e ordenar. Ademar: olhando-se a questão de conservação e a questão fundiária, hoje o gargalo das UCs do Estado do Amazonas é a questão fundiária. Achou a proposta importante para a ordenação do recurso e da questão da conservação, restando saber nesta região, qual é a parte das áreas tituladas. Que tipo de comprometimento as pessoas vão ter com a conservação? Resta trabalhar de fato quem ocupa essas áreas. Nos parques no rio Negro, chega-se lá e vê as pessoas fazendo espeto e reclamando. Para onde vamos levar todas essas pessoas, que não são poucas? As pessoas não querem mais saber ouvir falar em UC, para elas de uso sustentável e proteção integral é a mesma coisa. Toda essa discussão é bem vinda. É preciso ter o controle dessas áreas para que não virem propriedades particulares e depois pastos. Resposta - Durigan: é importante saberem que o que propõe é uma idéia e que estão abertos e flexíveis. Em relação ao levantamento

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da Marina, concordaria se não tivesse o cenário que está vendo agora, onde o que está segurando a devastação são as UCs. Vê-se falar de área metropolitana, numa metrópole que vai ser construída, e infelizmente o ordenamento que se faz não é o que gostaria. As idéias que se levantam é porque acreditam que as TIs e unidades de uso sustentável garantem que as pessoas continuem vivendo na área, de uma forma ou de outra. Bem ou mal estão garantindo o meio de vida. As APAs estão sendo destruídas. Sobre a Tatiana, nasceu uma proposta dentro da SDS de criar a Unidade Saracá. Na época que apresentaram a proposta para o Virgílio Viana, ele sugeriu que trouxesse a proposta mais para baixo. Na época da criação do Unini, muita gente das comunidades do Puduari, Aracari e Sobrado disseram que queriam algo similar. As áreas estão sendo destinadas para empreendimentos turísticos e internacionais sem a consulta e participação dessa população. O mundo hoje já é industrializado, a economia, veja, por exemplo, o Distrito Industrial. Sobre o Hênyo, com relação a ausência de outras áreas, o foco foi específico no município de Novo Airão, já existem novos dados que ainda não foram atualizados. Resposta - Sérgio: concorda com Marina que a proposta mais refinada é a do parque estadual, mas acreditam que uma proposta complementar para a APA é necessária e deve ser mais detalhada. A APA é estratégica e enquanto ela tiver essa categoria, não vai contribuir como área protegida. Sobre a pergunta da Tati, desenvolveram a proposta para o Parque no setor norte e acredita que a proposta de redelimitação e redefinição pode ser replicada. Sobre o Hênyo, as unidades estaduais são importantes e não têm sido trabalhadas por limitação técnica. Com relação aos grupos sociais e suas territorialidades, há uma tentativa de trabalhar isso. Sobre o que disse o Luiz, vem se trabalhando com os outros há muitos anos. Pretendem que o conhecimento das populações locais deve ser não só reconhecidos e valorizados, mas aplicados em políticas públicas, devem ser usados na gestão das áreas, influenciando as políticas locais. Já conversaram com o pessoal do Puduari, Aracari e Sobrado e houve uma resposta positiva. Esse processo não

deve de forma alguma ser impositivo, existe um estudo técnico que é a contrapartida da FVA e a participação social e política é uma outra parte. Concorda com o Levi que o que falta é política pública e acha que quem faz política pública no rio Negro é o IBAMA. Não existe uma proposta dos municípios para desenvolver o interior. Não existe titulação de terra. Acreditam que na ausência da política pública, as UCs são uma resposta ao ordenamento territorial. Levi pediu a palavra para dizer que quando falou que não recebiam atenção, não se referia a FVA, mas ao governo.

Jasy encerrou a rodada de perguntas e explicou que os Grupos de Trabalho terão mediadores para discutir a questão fundiária e serão divididos em: conceitual (Hênyo Barreto), metodológico (Lúcia da Costa Ferreira) e jurídico (Ludmila). Cada GT terá um relator e cada grupo terá 15 minutos para expor, 5 minutos para dúvidas e depois ao final irá abrir para o debate. Sérgio - FVA explicou que o sentido do evento é ter referenciais e proposições para se pensar as próprias estratégias da FVA. Dentro dos instrumentos que existem hoje, pensar especialmente nos termos de compromisso. Juntamente com as pessoas que trouxeram as apresentações, foram tiradas perguntas norteadoras.

Cada moderador leu as perguntas de cada grupo de trabalho e três grupos foram formados, buscando responder a algumas perguntas norteadoras. Os grupos se reuniram até o horário do almoço e após o almoço houve a apresentação dos resultados por grupo.

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Apresentação dos resultados

GT Conceitual mediador: Hênyo Barreto relator: Sérgio Borges Perguntas orientadoras: 1) As UCs de proteção integral na Amazônia desempenharam, historicamente, algum papel no desenvolvimento regional e na melhoria da qualidade de vida dos moradores locais? 2) É possível integrar as UCs de proteção integral em planos de desenvolvimento e conservação regionais, e com o desenvolvimento local? 3) Quem são e quais as características dos grupos que residem em UCs de proteção integral na Amazônia e como os órgãos gestores das unidades têm interagido com essas populações?

Seria importante que os órgãos gestores planejassem e interagissem mais com as comunidades, como em capacitações locais internas para o órgão. A cultura institucional do IBAMA também não privilegia o entorno e reforça apenas a própria UC, sem captar recursos para o entorno, o que causa conflitos com seus moradores. Seria muito importante a interação das comunidades do Baixo Rio Negro com as organizações indígenas do Alto Rio Negro para o intercâmbio das organizações locais e possibilidade de capacitação para lideranças e das novas gerações. Falou-se na questão da redelimitação, ainda que seja uma questão difícil, pode ser trabalhada como estratégia para melhorar a gestão das áreas em geral. 3) A relação se dá muito em função da fiscalização e já está muito desgastada, uma vez que as atividades são muitas vezes ostensivas e agressivas. Os fiscais poderiam ser envolvidos em fóruns para estar mais próximos e discutindo essas questões.

Respostas:

Complementos das pessoas do grupo:

1) Não, as UCs de proteção integral não contribuíram com a melhoria da qualidade de vida das populações locais. Por outro lado houve algum avanço na escala microrregional, em se considerando a região do Baixo Rio Negro. O entendimento foi que as áreas protegidas têm papel importante no resguardo de recursos naturais, bem como potencial para o desenvolvimento regional pelo uso público das UCs, especificamente o turismo nos parques nacionais.

Caê - ISA: ficou muito claro de que o grupo pensou dentro da questão conceitual de que existem marcos legais na região, do micro ao macro. Existem limitações de procedimentos e instrumentos. Sobre a questão das UCs federais e estaduais, não existe uma aproximação e há uma ambigüidade nas propostas de gestão.

2) Sim, é possível em escala mais macro. Será difícil que as UCs de baixo pra cima se planejem para ter um impacto na região, mas em escalas maiores, como o Projeto Corredores Ecológicos ou a gestão do Mosaico, esse planejamento pode suscitar efeitos. É importante que ações sejam formalizadas com as comunidades locais, como em termos de compromisso. Foi colocado que a gestão de UCs é uma loteria e fica sujeita a abordagem que o gestor do momento esteja trabalhando. Por isso a necessidade da formalização. A face mais visível da relação do gestor com as comunidades é a da fiscalização.

Marcelo - INCRA: um dos pontos importantes é o zoneamento de UCs de proteção integral, mudança do perímetro e possibilidade de reclassificação da UC, pelo menos parcial, para uma UC de uso sustentável. Vê o INCRA como um possível parceiro para os gestores, especialmente para as UCs de uso sustentável, uma vez que é previsto o crédito de reforma agrária. Pode ser parceiro no assentamento e no reconhecimento das UCs de uso sustentável.

Questão de esclarecimento: termo de compromisso. Sérgio - FVA: termo de compromisso é um instrumento que pode ajudar no reconhecimento da possibilidade do uso de

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recursos por família em áreas de proteção integral. Seria um instrumento em algum nível de segurança jurídica para as famílias, estabelecendo um compromisso mútuo, para evitar que as populações não fiquem a critério da postura pessoal do gestor.

GT Metodológico

moderadora: Lúcia da Costa Ferreira relator: Carlos César Durigan Perguntas orientadoras:

1) Por que os órgãos gestores têm dificuldades para resolver questão fundiária concernentes às populações residentes em UCs de proteção integral? 2) Os órgãos gestores têm estruturas que atendam as demandas para solução fundiária das UCs de proteção integral com populações residentes no seu interior? 3) Qual o papel das entidades de base e como elas devem se organizar para colaborar na solução fundiária das UCs de proteção integral? 4) Quais as dificuldades para se estabelecer Termos de Compromisso e como vencer/resolver os entraves?

Respostas: O grupo se concentrou na metodologia para resolver os entraves na construção de termos de compromisso. 1) A resposta vai desde a vontade do gestor, a dificuldade de comunicação entre os órgãos gestores de diferentes instâncias, falta de recursos, etc. 2) tem mas acabou, ou tem mas não está funcionando. Os processos dependem muito do que acontece localmente. Foi uma inspiração a experiência da Patrícia no Lago Piratuba. 3 e 4) Tentaram estabelecer um passo a passo, premissas para a construção do TC e questões transversais. Criação de uma equipe de trabalho mista (pode se formar dentro do conselho da UC),

sensibilização dos envolvidos, estabelecimento de parcerias, adequação da metodologia às peculiaridades de cada UC. Realização de diagnóstico socioeconômico, com envolvimento de moradores e associações, estabelecer diferentes estratégias para diferentes atores (TAC ou TC); estabelecimento de sanções. Durante todo o processo deve haver reuniões e participação das comunidades. Premissas: foco no acesso a UC (questões de saúde, educação, etc), prazos de validade de cerca de 2 anos, avaliações e monitoramento periódicos, busca por melhorar a infra-estrutura comunitária, busca de recursos humanos e financeiros. Obrigação de indenização caso a família deseje sair da UC e garantia de indenização e realocação justa. Questões transversais: mudança de limite de UCs, mudanças na definição das categorias de UC. A questão de obras e benfeitorias também deve ser trabalhada em termo de compromisso, além de medidas compensatórias.

Complementos das pessoas do grupo: S. Francisco: nas nuvens foi representados nossos sonhos e precisamos ter uma data para dar o primeiro chute, começar a jogar o jogo. Lúcia: o foco foi nos TC e não em termos de conduta para se pensar no que pode ser feito agora e o quanto antes.

GT Jurídico

moderadora: Ludmila Caminha relatora: Yara Camargo Perguntas orientadoras:

1) O tratamento jurídico para as pessoas residentes em UCs de proteção integral é uniforme? 2) A lei do SNUC atende as necessidades de uma política fundiária eficiente para UCs de proteção integral? 3) Quais as bases legais existentes à questão fundiária para UCs de proteção integral? As

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bases existentes são eficientes e suficientes? Como aplicá-las? 4) Quais as bases legais e como podem ser acionadas para contribuir na construção de termos de compromisso em UCs de proteção integral? 5) O decreto No. 6040, que institui a política de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais, gera conseqüências para as políticas fundiárias concernentes à presença de populações humanas em UCs de proteção integral?

Respostas: 1) Sim, a interpretação da legislação prejudica a todos de maneira uniforme. 2) Não, o SNUC não se aplica a questões fundiárias. Existe uma contradição ao se reconhecer os direitos dos moradores enquanto não tem sua condição regularizada. Para se fazer regularização fundiária se usam os instrumentos previstos na legislação patrimonial. 3) A legislação atualmente existente para fazer a regularização fundiária não se aplica as UCs de proteção integral. Deveria haver uma complementariedade entre a legislação. Onde se faz regularização fundiária, suas normas não se aplicam as áreas de proteção integal e a lei que se aplica para elas é o SNUC. 4) O SNUC deve ser interpretado à luz da Constituição Federal, uma vez que enquanto cidadãos, ainda que esperando por regularização, têm os mesmos direitos que qualquer cidadão comum. Não se deve causar a lesão ao direito das pessoas em função da legislação ambiental. Os moradores de UCs podem buscar a ajuda do Ministério Público quando se sentirem lesados em seus direitos. Necessidade de sensibilizar o setor judiciário sobre os direitos dos povos e comunidades tradicionais. 5) O grande avanço do decreto No. 6040 não está na enunciação dos direitos, e sim em reconhecer os conflitos gerados nas UCs de proteção integral onde há grupos humanos. Não avança na implementação dos direitos, em como

efetivá-los. Foi proposta de encaminhamento do S. Levi que a redelimitação das UCs levem em conta a presença das comunidades. O SNUC é uma conquista mas não pode ser visto como uma vaca sagrada e intocável que não pode ser melhorada. A possibilidade de questionar os avanços institucionais deve permanecer aberta. Encaminhamento da Aurely - MPE: houve do PARNA da Bocaina e PAREST da Serra do Mar o zoneamento histórico e cultural das comunidades, proposto pelo MPF e previsto no plano de manejo das UCs, garantindo os usos.

Complementos das pessoas do grupo: Yara: quando discutimos no grupo, a Aurely explicou que a proposta da zona histórico-cultural garante aos moradores locais os direitos fundamentais dessas pessoas. A questão do uso de recursos deve ser prevista nos termos de compromisso. No caso dos planos de manejo que já existem seriam feitas portarias para o ajuste. Levi quis complementar que defende o termo de compromisso de imediato e que outras propostas possam vir para o futuro.

Questão de esclarecimento: Caê - ISA: sobre a questão da zona históricocultural, viu ontem que se dá no âmbito de territorialidade, e outra com características antropológicas que garantam a manutenção do modo de vida das pessoas e podem se relacionar com o uso de recursos. Fala-se de zoneamento ou de uma categoria?

Jasy sugeriu abrir para o debate.

DEBATE: Marina - ISA: dúvida em relação aos termos de compromissos mais curtos de dois anos, se isso não pode complicar a aprovação? Ludmila disse que não existem bases legais para a regularização fundiária em UCs de proteção integral. Não entendeu isso.

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Sinomar/CEUC: Considerou que não apareceu a questão de regularização fundiária em terras indígenas e áreas sobrepostas. Resposta - Durigan: diferença entre termo de compromisso – TC e termo de ajustamento de conduta – TAC, que ainda que mude o nome e os atores, a idéia é a mesma, existindo, portanto um tratamento diferenciado. Sobre a questão da validade, seria condicionada a regularização da área, mas precisa ter a reavaliação esporádica para sua atualização. Na discussão, compreendemos que esta validade está relacionada ao prazo para a indenização realocação, sendo desta forma indefinida. Mas achamos que deve haver um prazo de dois anos para atualização. Resposta - Patrícia/REBIO: deve haver a vigência nos termos e pode ser indeterminada, até que aconteça a regularização fundiária. É preciso ter o plano de manejo das áreas, que serão revisadas após certo tempo, assim como com os termos de compromisso; não se deixa de ter. Resposta - Aurely/MPE: sobre a zona histórico-cultural, foi proposto pelo MPF no Parque Estadual da Serra do Mar, como forma de regularização das comunidades do parque como um ato administrativo de competência do órgão gestor no âmbito do plano de manejo, levando em consideração fatores ambientais, sociais e jurídicos, sobre o direito das comunidades a permanecerem no local. Um novo olhar sobre a legislação, diferente do olhar do órgão gestor, que não é final, até porque o próprio SNUC é contraditório, pois não garante a realização prática dos direitos previstos dentro do próprio sistema. O TAC é para regularizar uma situação de fato para que não precise ser corrigida judicialmente, mas administrativamente, para ajustar a conduta ao que diz a lei. Um fazendeiro não sendo população tradicional, não se faz um TC, mas um TAC. No caso, o TC é um instrumento mais específico, previsto, provisório e paliativo para populações tradicionais até que o governo do Estado faça a regularização (indenização e reassentamento). O TC está atrelado ao reassentamento e deve ser elaborado com cada família.

Resposta - Ludmila: o TAC não é bilateral, gera compromissos e obrigações apenas para quem está sendo ajustado e em desacordo com a lei. Já o TC é bilateral em termos de deveres e direitos que o poder público deve assegurar. Gera a obrigação para as duas par tes contratantes. Sobre regularização fundiária em UCs, quando não admite a presença humana em seu interior, se limita a incorporação ao domínio público, das terras afetadas pela UC ao Patrimônio da União. O SNUC não admite formalmente a presença das pessoas. Existe a indenização por serem removidas, mas não tem o direito a regular a sua terra e o uso do recurso que fazem. Os TCs são pensados para serem provisórios. S. Francisco - morador do Parque Estadual – setor sul: salientou que já houve precedentes nos casos relatados e queria saber dos gestores se é mais viável a recategorização ou recorrer ao MP para resolver a situação. Satya - UFAM: é possível fazer TAC depois que o caso já está na justiça? TC é previsto apenas para populações tradicionais? Cesário - AMORU: temos que lembrar que para se montar um TC numa UC onde existem seres humanos, é preciso se trabalhar o conhecimento da lei com as pessoas. Quando o SNUC foi criado, as pessoas já estavam lá. Foi mais um desabafo. Resposta - Sergio/FVA: sobre a pergunta de Seu Francisco, acredita que deve haver várias opções: a idéia da redelimitação e recategorização é uma estratégia, do TC é outra e ambas podem ser trabalhadas juntas ou não. A idéia é se montar um grupo multi-institucional que envolva o pessoal do jurídico. Outra possibilidade foi a questão do zoneamento histórico-cultural, que pode ser uma terceira opção de trabalho, e que faz parte dos planos de manejo, onde existe a zona de ocupação temporária, que muitas vezes deve coincidir. Acredita que a adequação destas opções pode trazer soluções. Guillermo - CEUC: houve um caso no Parque Estadual do Rio Negro Setor Norte onde

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classificaram como zona de uso conflitivo a área das comunidades, pois conflita com a categoria da UC. Entende que o termo de compromisso deve ser associado ao plano de uso, para que se cumpram as regras de uso previstas. Acha que pode se partir da tentativa que houve no Jaú para ver o que não deu certo. Achou também que o caso da Serra do Mar não resolve a situação porque a regularização fundiária não foi resolvida. Marina: queria saber se a Patrícia, quando fez o TC de Piratuba, a intenção era que as pessoas pudessem usar o recurso até que a regularização fundiária aconteça, porque a regularização fundiária pode ser realizada sem a indenização. Resposta - Aurely: o TAC pode sim arquivar um procedimento judicial como encaminhamento para o processo. O TAC é unilateral, mas deve haver conversa para isso. O TC foi criado para as populações tradicionais – artigo 39, que prevê o prazo e a condição para o reassentamento, está muito atrelado ao reassentamento. E tem que ser com cada família. Resposta - Ludmila: na UC de proteção integral, não se regulariza a posse da terra ou o uso dos recursos. A regularização fundiária que se faz é reincorporar a terra ao órgão gestor, ao patrimônio da União, por ser de domínio público, o que é diferente de indenização e reassentamento. Resposta - Patrícia: do ponto de vista do Instituto, a incorporação da terra para a União e o ICMBio é prevista, mas não foi concluída, uma vez que ainda tem gente vivendo dentro. Cesário - AMORU: gostaria de saber de que forma o Estado/CEUC poderia ajudar as pessoas que moram em UCs, que são esquecidas pelo Estado, pelo governo de forma geral. Falta financiamento, condições para escoamento dos produtos, projetos, etc. Resposta - Guillermo: hoje temos dificuldades enormes de implementar projetos de geração de renda por problemas fundiários não resolvidos. O governo pode ajudar através

dos programas previstos, mas a maioria das questões breca nas questões fundiárias e, principalmente, florestais. Elane - turismo: pediu que após a conclusão do trabalho, do seminário, seja não só colocado na internet, mas colocado em prática e perguntou se depois de concluído isso pode passar para o Solimões. Resposta - Sérgio: a idéia do evento é buscar encaminhamentos práticos. O primeiro deles seria se criar o grupo de trabalho sugerido no GT metodológico para desenvolver propostas de trabalho para as UCs do Baixo Rio Negro, podendo ser replicado para outros lugares se der certo, devendo ser composto pelos órgãos gestores (ICMBio, CEUC), parceiros e moradores para estudar a possibilidade de trabalhar dentro de cada UC, caso a caso. É necessária a representatividade para o grupo funcionar. Jasy lembrou que isso são encaminhamentos e passou para Durigan. Durigan: a próxima questão norteadora é o que podemos fazer. Temos aqui pessoas da região e outras que trabalham em outros locais, sugeriu que cada um dê as sugestões para encaminhamentos que achar viáveis. Levi: ficou em dúvida sobre a indenização e o reassentamento. Resposta - Ludmila: a lei prevê ambos. Levi: levantou a questão porque já são obrigados a não construir benfeitorias na área do parque, vão receber indenização simbólica de no máximo 5 a 10 mil reais e no reassentamento, no projeto da casa, se for descontado esse valor, vai estar pagando com a indenização a sua transferência. Luiz/ICMBio: quer saber qual a previsão para receber o material. Resposta - Sérgio: a idéia do evento é consolidar as discussões em uma publicação, com o conteúdo das palestras e o resultado dos GTs, até março no máximo, idealmente. Outra

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questão é criar-se um fórum de discussão permanente sobre a questão para ser o espaço para tirar dúvidas, disseminar experiências interessantes, que pode ser gerenciado dentro da estrutura da FVA, que ficaria circunscrito aos técnicos e excluiria as comunidades. A FVA se comprometeria a levar a discussão para as comunidades. O grupo de trabalho deveria ser um grupo técnico envolvendo gestores e parceiros, inicialmente com um caráter técnico mais restrito, envolvendo INCRA, ITEAM, IBAMA/ ICMBio, CEUC, FVA, IPÊ e poderia, mais pra frente, ser aberto aos moradores. Lúcia: acha que o grupo não deve ser representativo no sentido político, mas um grupo de trabalho com moradores da comunidade, sim, mas não no sentido representativo, mas para trabalhar, poucas pessoas, além do Ministério Público.

Jasy questionou sobre quem f ica responsável por puxar as questões. Durigan: estarão finalizando o termo de parceria com o ICMBio, onde está previsto o termo de compromisso, e acha que pode ser o momento para puxar a discussão entre as duas instituições para levar adiante o processo. Salientou que o grupo não pode ser engessado, com instituições que não queiram participar. Marcelo - FVA: sugeriu que o grupo pudesse ser puxado dentro dos conselhos. Levi: sugeriu que o grupo fosse iniciado hoje, pois essa discussão já começou desde 2003 na CPT com os ribeirinhos. Durigan achou boa a proposta e se tirou nomes de interessados: Carlos Durigan, Yara, Serginho (FVA), Levi, Cesário, Francisco. Tatiana - ICMBio: considerou importante estarem as duas representações, do Jaú e do Unini, além de se buscar a procuradoria do IBAMA.

mito de Anavilhanas não ter problemas fundiários. Caê - ISA: pensou se os grupos de trabalho não são atividades “como”, se é nisso que se quer chegar. Lúcia - Unicamp: sugestão de se diponibilizar tudo o que foi discutido aqui antes de março para subsidiar o GT. Jasy encaminhou para o encerramento. Durigan: quiseram ser específicos no tema do evento para se pensar essa questão da regularização fundiária onde se está emperrado e este é o grande problema, e a resposta de Brasília sempre é: estamos trabalhando nisso. Por isso fizeram o encontro para poder caminhar nessas questões, criar uma dinâmica para que o trabalho não pare aqui, são muitas idéias, muitas incertezas, mas devemos procurar as brechas para trabalhar e buscar soluções. Agradeceu a presença de todos, especialmente quem veio de longe para ajudar a discutir essas questões. Salientou que gostaram muito e foi muito produtivo, que infelizmente não puderam por questões logísticas e de tempo trazer mais moradores. Parabenizou Yara pelo mérito do seminário. S. Francisco: perguntou aos atores se pode chegar na comunidade e dizer que deram o chute na bola e que valeu a pena o sacrifício e a paciência e que agora se deu o chute. Lúcia – Unicamp: perguntou sua opinião sobre isso. S. Francisco: Se sair daqui a lista conforme foi falado com pelo menos oito atores, eu creio que se começou a andar. Durigan agradeceu também a Jasy por fazer a facilitação do evento, a Satya pela relatoria e disse que a idéia agora é ter uma apresentação de Seu Gilberto.

Bruno - ICMBio: também deveria incluir uma representação de Anavilhanas para discutir o

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Anexos Relatoria: GT – Conceitual

Mediador: Henyo Barreto - IEB Relator: Sergio Borges – FVA Participantes: Cezário – RESEX Unini/AMORU Artemísia – IPAAM Maria José – RESEX Unini/RDS Amanã Marcelo – INCRA Marina – ISA Caê Marinelli – ISA Leo – IPÊ Bruno – ICMBio Tatiana – ICMBio Mariana – IPÊ Oscar – IPÊ Perguntas Norteadoras: 1. As UCs de proteção integral na Amazônia desempenharam, historicamente, algum papel no desenvolvimento regional e na melhoria da qualidade de vida dos moradores locais? 2. É possível integrar as UCs de proteção integral em planos de desenvolvimento e conservação regionais, e com o desenvolvimento local? 3. Quem são e quais as características dos grupos que residem em UCs de proteção integral na Amazônia e como os órgãos gestores das unidades têm interagido com essas populações? Sérgio: resposta à 1a pergunta orientadora: tentar construir referenciais de conceito, método e jurídico para dar conta desse problema de gentes em UCs. Não se conseguiu avançar para além das disposições do plano de manejo. Não sente que a coisa caminha. Por isso ampliar o debate para colher subsídios. As palestras

chegaram até a contestar o valor das UCs de proteção integral. Se justifica ainda a sua existência do ponto de vista conceitual, das necessidades de adaptação regional? Artemísia: No SNUC está muito claro: não se permite a presença de pessoas. Temos a lei. Desapropriação. Alternativas a legislação. Tatiana: Relação com outras realidades fora do baixo rio Negro. Leo: Grandes problemas na relação entre as UCs de Proteção Integral e populações locais por restringir o acesso aos recursos naturais. Mariana: Relação histórica complexa no início da criação das UCs, principalmente na fiscalização. Nas UCs estaduais sem presença do estado. Falta de informação. Oscar: Restrição ao acesso dos recursos naturais é prejudicial. Gera benefícios pela reflexão e por trazer reflexões para conservação dos recursos. Tatiana: Pouca presença no entorno. Uso mais ampliado do SNUC. Respaldo para trabalhar com o entorno com limitações do próprio órgão. Órgão deveria atuar mais no entorno, mas por limitações se trabalha mais no interior da UC. Financiamento vem para o próprio reforço das atividades na unidade e pouca coisa vai para o entorno. Fiscalização com foco muito no ribeirinho pelas facilidades. O trabalho de fiscalização deve ser trabalhado na base da inteligência, descobrindo os verdadeiros infratores. Cultural organizacional-institucional deve ser mudada para trabalho maior no entorno. A resposta a pergunta 1 é não. Trabalho na geração de renda. Mariana: Referencial para uma resposta adequada. Antes e depois da criação da unidade. Mudanca inicial, mas que depois teve pouco efeito. Efeito histórico de cada unidade. O que teria acontecido se nada tivesse sido feito: vários problemas ambientais (seixo, madeira). Paradigma com ou sem gente não muito adequado na região amazônica e poderiam existir situações de UCs de Proteção Integral com gente.

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As áreas de Proteção Integral numa perspectiva histórica. A questão de implementação de UCs é recente (período democrático). O papel da sociedade na gestão democrática destas áreas. A falta de espaço. Caê: A questão fundiária é base, mas não condicionante único para desenvolvimento regional e melhoria de qualidade de vida. Novas alternativas para geração de renda nem sempre estão ligadas à questão fundiária. A continuidade de criação de UCs de Proteção Integral em regiões com presença humana. A visão de espaços vazios na Amazônia e criação de UCs de Proteção Integral. Implementação das unidades e consolidação das mesmas. Construção de redes de parcerias, visão interdisciplinar com diferentes atores. Fortalecimento dos instrumentos já existentes. Bruno: Desenvolvimento regional proporcionado pelas UCs é desigual. A perspectiva do morador local é nula. Geração de emprego. Instalação de empreendimentos turísticos. Fiscalização de atores externos pressionando os recursos naturais como benefício indireto. Gestão das unidades é loteria e envolve a dependência das vontades e anseios dos gestores locais. A resposta a pergunta é não. Falta de instrumentos e bom uso dos existentes que incluam a melhoria da qualidade de vida dos moradores.

Relatoria: GT Jurídico Mediadora: Ludmila Caminha (OAB /Brasília)

Relatora: Yara Camargo (FVA) Participantes: Levi - AMORU Ademar - CEUC Alcilene - CEUC Sílvia – ISA - Brasília Aurely - Ministério Público Estadual – Manacapuru Luiz - WWF-PA

Roberto - SEMA-AP Ivanilda - Comissão de Ex-moradores do PARNA Jaú Elane - Turismo na Selva O grupo iniciou o trabalho com a leitura da primeira pergunta norteadora por Ludmila que gerou um debate na questão. Ludmila: o tratamento jurídico dado às pessoas residentes em unidades de conservação de proteção integral é sim uniforme e que a criação de unidades de conservação de proteção integral (pré Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC) não considerava pessoas morando no seu interior, e por isso, na interpretação do SNUC, todos os moradores de unidades de conservação de proteção integral são prejudicados. Yara: a proposta de discussão do GT tinha um foco em termos de compromisso. O grupo achou melhor deixar a discussão mais livre, considerando que termo de compromisso é provisório, que a apresentação do Termo de Compromisso da Comunidade Sucuriju pela Patrícia Pinha foi muito boa e que forneceu elementos suficientes e a discussão foi retomada. Ludmila: as unidades de conservação de proteção integral foram pensadas/criadas para não ter gente dentro, mas as pessoas estão presentes e esta situação é subordinada aos objetivos da unidade de conser vação e, retornando ao tratamento jurídico e citou a Política Nacional das Populações Tradicionais (decreto No. 6040 que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais) o artigo 3º que garante o acesso e uso dos recursos naturais aos povos e reconhece a existência de conflitos, mas não diz como resolvê-los. O decreto é mais um instrumento a enunciar direitos e territórios que as populações usam e ocupam mais não trata o domínio da terra. Aurely: o termo de compromisso é uma forma de atender os anseios da comunidade, atender necessidades emergenciais e solucionar conflitos, lembrando o caso apresentado do

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termo de compromisso da Comunidade Sucuriju. Foi colocado, também, que a questão fundiária não entra o uso do recurso. Ademar: colocou a situação do Parque Estadual Rio Negro Setor Sul, onde há pessoas morando no interior do Parque, vivendo economicamente da fabricação de espetinho e a necessidade de se resolver esta questão com a possibilidade de recategorização ou redelimitação da área do Parque. Sílvia: colocou que para modificação no status, de mudança é por projeto de lei, mesmo instrumento legal de criação da unidade de conservação, e o receio é como o processo vai ser conduzido no congresso nacional. Foi questionado no grupo se o decreto de criação de uma unidade de conservação pode ser anulado juridicamente Aurely: respondeu que sim, mas não administrativamente, e o processo é lento. Um exemplo é a terra indígena Raposa Serra do Sol. A base é mostrar que a unidade de conservação foi criada em acordo com a legislação da época e que não satisfaz as necessidades da população residente na unidade de conser vação de proteção integral. Esse tempo, desde sua criação, gera efeitos sociais e econômicos para as pessoas residentes na unidade de conservação de proteção integral e quem vai pagar esses danos? Ademar: a situação da população nas unidades de conservação de proteção integral é muito preocupante como, por exemplo, a dos ex-moradores do PARNA Jaú que foram pressionados a sair do Parque devido às proibições ao uso dos recursos naturais, sem serem reassentadas e não serem indenizadas. Ludmila: Nesse caso, o SNUC diz que tem que fazer o reassentamento ou a indenização na criação das unidades de conservação com pessoas dentro, mas não diz como fazer. O órgão gestor usa a legislação ambiental SNUC que é menor que a constituição e isso fere o direito como cidadão. Por que não ter telefone, não ter escola nas comunidades no interior da unidade

de conservação de proteção integral? SNUC diz que apesar da presença humana em unidades de conservação de proteção integral, essa tem seus direitos respeitados, mas não diz como. Portanto, o SNUC pode não ser a melhor e mais eficiente base legal. Ludmila: perguntou ao grupo se há conformidade da retirada da população residente em unidade de conservação de proteção integral ou há conformidade da presença das pessoas fazendo algo transitório. Aurely: o SNUC coloca 5 anos para elaboração de planos de manejo e 2 anos para resolver a questão fundiária após a criação da unidade de conser vação. O termo de compromisso ajuda definir o tempo para realizar a regularização fundiária da unidade de conservação e citou o caso do Parque Estadual da Serra do Mar, a recomendação do Ministério Público que é um tipo de tentativa de resolução extra-oficial, é um novo olhar para o gestor e uma forma diferencial do órgão gestor regularizar a presença de pessoas nas unidades de conservação de proteção integral. É uma nova visão jurídica sobre o assunto. Sugerido ao grupo pensar a médio e longo prazo para buscar soluções para esses conflitos. Levi disse que prefere ser indenizado e reassentado e coloca que as pessoas do PARNA Jaú já tiveram a vida tão impactada e vivem com tanta restrição. No Unini existem duas posições quanto à presença de pessoas residindo em unidade de conservação de proteção integral: a primeira é que os moradores trabalharam para a criação da RESEX e não faz sentido não poder usar recursos por causa do Parque Nacional do Jaú. Ele quer sair com seus direitos e agilidade do processo de indenização e reassentamento. A segunda posição é pressionar para definição do governo quanto à permanência das pessoas na área. Ademar: na situação do Parque Estadual Rio Negro Setor Sul, a maioria dos moradores não quer sair da área e quer que os limites do Parque sejam alterados.

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Aurely: o Ministério Público Estadual defende a posição de garantir/reconhecer os direitos dos moradores mesmo em unidade de conservação de proteção integral e uma possibilidade é a zona histórico-cultural baseada no direito fundamental previsto na constituição. O SNUC tem que ser interpretado segundo a Constituição.

O tratamento jurídico é uniforme: prejudica (a interpretação) todos os moradores da unidade de conservação de proteção integral.

Yara: se é uma zona temporária, pois esta zona entraria no zoneamento da unidade de conservação que está inserido no plano de manejo da mesma e os planos de manejo a cada 5 anos passam por processos de revisão e o zoneamento é um processo dinâmico.

Não. Além de ser contraditório sobre os direitos dos moradores, o SNUC não se aplica à regularização fundiária. UC é, via de regra, domínio público. Regularização fundiária, onde pode, se faz pela legislação patrimonial.

Aurely: uma vez que a zona foi definida a partir dos direitos fundamentais das pessoas que moram na área há muitos anos e tem uma história/relação com a mesma, isso garantiria a permanência da zona e os direitos dos moradores. Yara: Nos casos de unidades de conservação que ainda não possuem plano de manejo ou que os mesmos estão em processo de revisão, discutir esta zona seria possível, mas como fazer com as unidades de conservação nas quais seus planos de manejo estão em vigor? Aurely: inserir a zona no plano de manejo, fazer uma retif icação do plano de gestão referente ao zoneamento da unidade de conservação via portaria do órgão gestor. Sílvia: os órgãos executores são órfãos nas questões jurídicas. Alcilene: o Amazonas tem a lei complementar No. 53 que prioriza o reassentamento das populações tradicionais. Ludmila: Complementou a fala, as desapropriações não saem por interesse ecológico. Após debate mais amplo, o grupo voltou-se para responder as perguntas orientadoras, que se seguem: 1) O tratamento jurídico para as pessoas residentes em unidades de conservação de proteção integral é uniforme?

2) A lei do SNUC atende as necessidades de uma política fundiária eficiente para unidades de conservação de proteção integral?

3) Quais as bases legais existentes à questão fundiária para unidades de conservação de proteção integral? As bases existentes são eficientes e suficientes? Como aplicá-las? A legislação atual para regularização fundiária não se aplica às unidades de conservação de proteção integral. 4) Quais as bases legais e como podem ser acionadas para contribuir na construção de termos de compromisso em unidades de conservação de proteção integral? Interpretar o SNUC à luz da proteção constitucional aos direitos fundamentais. 5) O decreto No. 6040, que institui a política de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais, gera conseqüências para as políticas fundiárias concernentes à presença de populações humanas em unidades de conservação de proteção integral? O decreto 6040/2007 enuncia direitos, mas não diz como efetivá-los. Avança ao reconhecer os conflitos gerados na criação de unidades de conservação de proteção integral. Durante o debate em grupo saíram como possíveis encaminhamentos propor normas para: Como fazer a transição da saída das pessoas das unidades de conservação de proteção integral? Como efetivar os direitos das pessoas em unidades de conservação de proteção integral? Como órgão gestor deve proceder?

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Encaminhamentos: 1) O zoneamento histórico-cultural é uma alternativa viável por meio do plano de manejo e outros atos administrativos do órgão gestor (retificação por portaria). 2) Moradores das unidades de conservação devem buscar o apoio do ministério público. 3) Redelimitação das unidades de conservação de proteção integral para acomodar as comunidades e proteger seus direitos (onde possível).

Relatoria: GT – Metodológico

Mediadora: Lúcia C. Ferreira – NEPAM/UNICAMP Relator: Carlos Durigan – FVA

Participantes: Gilberto – PNJ Ana Flávia (Fafá) – RESEX Unini Arlesson – Unini/AMORU Patrícia Pinha – ICMBIO/Amapá Adriane – INPA/FVA Sinomar – CEUC/SDS Marcelo P. Moreira – FVA Rachel – FVA Francisco Borges – PERN Sul Luiz Sergio – ICMBIO/REBIO Jaru Francisval – SEMA – MT Clarice – SDS/CEUC Igor – ICMBIO/PARNA Anavilhanas Paula – SEMA – MT Perguntas Norteadoras: 1. Por que os órgãos gestores têm dificuldades para resolver questão fundiária concernentes às populações residentes em UCs de proteção integral? 2. Os órgãos gestores têm estrutura que atendam as demandas para solução fundiária

das UCs de proteção integral com populações residentes no seu interior? 3. Qual o papel das entidades de base e como elas devem se organizar para colaborar na solução fundiária das UCs de proteção integral? 4. Quais as dificuldades para se estabelecer Termos de Compromisso e como vencer/resolver os entraves? Optou-se por utilizar as perguntas para nortear a chuva de idéias e trabalharmos mais focados na metodologia/passo a passo na construção do Termo de Compromisso (TC). Início dos trabalhos com a apresentação dos presentes: 16 participantes Lúcia: O que tem sido feito para resolver o problema da presença humana em UCs? Chuva de idéias: Por onde começar? Termos de compromisso e outras possibilidades de resolução de problemas. Durigan: levanta o problema de falta de um instrumento normativo que direcione a questão. O que temos atualmente são ações subjetivas que emperram ou ajudam a implementar as ações voltadas à questão. Patrícia: devemos trabalhar termos de compromisso e outras possibilidades como a questão do reassentamento. Luiz: levantar os entraves existentes em relação à questão fundiária. Conhecimento prévio dos atores locais é o mais importante e o início de tudo. O Termo de Compromisso depende praticamente do gestor. Não existe metodologia e isso às vezes compromete a implementação. Francisco: Não acontece, ficamos sempre apenas na discussão. Luiz: temos que garantir que no caso do reassentamento, que as pessoas ao saírem, que a vida deles não piore.

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Sinomar: Termo de Compromisso é mais para regular o uso dos recursos. Quais procedimentos temos que seguir? Qual a seqüência das ações? Quais as prioridades? Depois podemos construir uma cartilha para divulgar a ferramenta/ proposta? Fafá: As informações estão pulverizadas e precisamos ordenar os procedimentos para seguirmos um passo-a-passo. Lúcia: O Termo de compromisso virou um bicho de sete cabeças. Definir uma ferramenta, aplicar e mostrar como isso pode funcionar. Vermos o processo do começo ao fim. Fafá: falta conversa entre os órgãos, em especial o INCRA e IBAMA/ICMBIO. Francisval: Eles têm uma experiência de maior interação entre o órgão de terras do estado. Para iniciar o trabalho, eles conseguem sobrepor as informações fundiárias. Lúcia: O TC não pode ser visto apenas como regulador de uso de recurso. Marcelo: Se o gestor não estiver puxando o TC não sai. Não tem nenhuma comunidade para brigar pelo TC. Rachel: o TC pode ser um alívio para os moradores que não precisarão mais esconder suas atividades tradicionais. E para o gestor, pois ajuda na consolidação. Alguns motivos de não ter: nunca se pensou em ter um TC adequado, como é o caso com a data prevista para a saída dos moradores. Teria que ser por família, pois nem todos trabalham os mesmos produtos. É bom para ambos os lados. Luiz: O TC não pode ser imposto. No Jaru conseguiram fazer informalmente e discutindo as restrições. Patrícia: O ideal é que a demanda saia das próprias comunidades. Concorda que seja bom para os dois lados. Gilberto: O TC dá uma ajuda para quem mora lá dentro, pois além da segurança vai dar orientações de como viver na comunidade.

Quanto mais rápido melhor para todo mundo. A indenização está demorando demais. Rachel: No PNJ ainda existe muita confusão com os conceitos. Os constrangimentos pelos quais os moradores passam poderiam ser amenizados com este instrumento. Fafá: Traz de volta a situação que coloca o morador como um entrave. O órgão gestor deve tratar os moradores de forma mais justa e direta. Rachel: Plano de Manejo é uma ferramenta, o TC e outra, e temos que aplicar. E quando sair a indenização... Lúcia: Se as indenizações não saírem ou não houver nenhuma solução, a situação entre gestores e moradores tenderá a piorar. Luiz: Colocar no TC que a pessoa terá seus direitos garantidos caso saia antes de receber a indenização. Para fazer o TC, fazer o levantamento das pessoas, as pessoas morrem de medo de dar informações com receio de que as informações sejam usadas para prejudicá-los. Sinomar: Minha preocupação é com os procedimentos. Sem gestão compartilhada o governo não consegue avançar. Temos que dar os passos e depois amarrarmos nas leis. Francisco: Já foram feitos estudos, já foram feitas reunões, mas não há acompanhamento dos passos seguintes. Durigan: ordenar as idéias para focar na construção do documento. Clarice: Não há apenas UCs de proteção integral no baixo rio Negro. Precisamos discutir não apenas os TCs. Estes já são concensuados entre os gestores. Seria importante definirmos o passo-a-passo neste processo de construção de TCs.

Roteiro: · · ·

Procedimentos Seqüência Elaborar cartilha

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Metodologia para resolver entraves na construção do Termo de Compromisso TC - Passos:

comunicação, etc.) e acessos (ex.: um morador que sai por uns tempos pode voltar à sua moradia?) e ações de diversos atores: comerciantes, prefeituras (saúde e educação).

A: Necessidade/ação paralela: Busca por recursos financeiros e humanos para garantir o processo.

C. Necessidade de um acordo de convivência Gestor e Comunidades.

B: O TC não é focado apenas no uso dos recursos, mas também na questão de infraestrutura comunitária, ser viços (turismo,

D. Deficiência de infra-estrutura pessoal para o acompanhamento pré e pós do termo de compromisso.

Passos: 1. Estabelecer parcerias – formação de equipes mistas (morador interessado, gestor, parceiro técnico, órgãos fundiários – Institutos de Terra). Reuniões de Trabalho. 2. Sensibilização dos atores envolvidos – Comunidades e Gestores (incluindo jurídico) – Oficinas. 3. Diagnóstico multifinalitário (socioeconômico – uso dos recursos, ocupacional e fundiário) – Oficinas. 4. Identificação dos casos: população tradicional - (TC) e demais usuários (fazendeiro, empresário, etc.) - (TAC - Termo de Ajustamento de Conduta) – Oficinas. 5. Elencar os temas prioritários dentro de cada UC (pesca, infra-estrutura, extrativismo vegetal, caça, alimentação, comércio, etc). 6. Estabelecer diferentes estratégias para diferentes atores. 7. No caso de TC: - garantir a possibilidade de indenização, caso a família saia antes de recebê-la. (Indenização e Realocação Justa). - No TC existir a obrigatoriedade de indenização caso o desejo do morador seja deixar a UC - garantir uma nova área adequada e negociada com a família, com a titulação devida. Negociar com os órgãos de terra. - construir medidas compensatórias para as ações não permitidas. Por exemplo, substituir atividades impactantes por alternativas e construir projetos para isto. - negociar com setores de financiamento de projetos que o TC permite o desenvolvimento de projetos produtivos acordados. - Na lei do SNUC determina-se a necessidade de autorização prévia de obras e benfeitorias. Um ponto a ser considerado na construção do TC é o de promover a discussão de como isso pode se dar no caso das infra-estruturas comunitárias. - Estabelecimento conjunto de sanções. - Processo de avaliação e monitoramento – no máximo de seis em seis meses. - Estabelecer prazo de validade – Validade até a indenização/reassentamento e atualizações periódicas, de preferência Bianuais. 8. Realização de Assembléia de consolidação e aprovação.

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