O vampiro e a ciência na literatura de Stoker e no cinema de Murnau e Herzog

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI DESIGN DIGITAL - MA7 TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

O Vampiro e a ciência na literatura de Stoker e no cinema de Murnau e Herzog.

DIEGO VIEIRA FELIPE VASCONCELOS GABRIEL GALVÃO JÚLIO FALCO MARIA DO CARMO GALLO

São Paulo 2008



UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI DESIGN DIGITAL - MA7 TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

O Vampiro e a ciência na literatura de Stoker e no cinema de Murnau e Herzog.

DIEGO VIEIRA FELIPE VASCONCELOS GABRIEL GALVÃO JÚLIO FALCO MARIA DO CARMO GALLO

Trabalho de conclusão de curso apresentado à banca examinadora como exigência parcial da obtenção de título de Graduação do Curso de Design Digital, da Universidade Anhembi Morumbi. Coordenação: Profa. Rachel Zuanon Orientadores: Prof. Marcelo Vieira Prioste Prof. Carlos Alberto Barbosa

São Paulo 2008



DIEGO VIEIRA FELIPE VASCONCELOS GABRIEL GALVÃO JÚLIO FALCO MARIA DO CARMO GALLO

O Vampiro e a ciência na literatura de Stoker e no cinema de Murnau e Herzog. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como exigência parcial para a obtenção do título de Graduação do Curso de Design Digital pela Universidade Anhembi Morumbi

Aprovado em:

Banca ___________________________________________ ___________________________________________ ___________________________________________ ___________________________________________



Resumo O presente trabalho procura analisar a imagem da ciência no final do século XIX pela visão da obra literária “Dracula”, de Bram Stoker, e no século XX através das adaptações dessa mesma obra para o cinema alemão, realizadas em 1922 e 1979 com o nome “Nosferatu”, dirigidas por Friedrich Murnau e Werner Herzog respectivamente.Através de um panorama geral de fatos dessas épocas - que vão desde pensamentos positivistas graças a novas descobertas científicas até a descrença nas mesmas por sua utilização em guerras - descrevemos suas influências sobre essas histórias, resultando em uma análise de como a natureza foi retratada visualmente em ambos os filmes, apresentando um espaço fílmico com resquícios da pintura Romântica alemã do século XVIII.

Palavras - chave: D racula, Nosferatu, Bram Stoker, Friedrich Murnau, Werner Herzog, Ciência, Natureza



Abstract The present study aims to analyze the image of science in the end of the 19th century through the vision of the book “Dracula”, by Bram Stoker, and in the 20th century through the adaptations of the same book to the German cinema, made in 1922 and 1979 with the name “Nosferatu”, directed by Friedrich Murnau and Werner Herzog respectively. Covering many facts from those times – that go from positivist thoughts, thanks to new scientific discoveries, to the disbelief in those since they were utilized in wars – we will describe their influence over those stories, resulting in an analysis of how nature was portrayed visually on both movies, presenting a filmic space with influences from German Romantic painting of the 18th century.

Keywords: D racula, Nosferatu, Bram Stoker, Friedrich Murnau, Werner Herzog, Science, Nature.



Sumário 1 1.1 1.2 2 3 4 4.1 4.2

INTRODUÇÃO......................................................................................................................15 O vampiro na literatura: Drácula de Bram Stoker..........................................................17 Integração do mito do vampiro ao livro de Stoker........................................................17 A ciência na visão de Bram Stoker: uma esperança de mudança.................................18 Murnau, o cinema expressionista alemão e a Alemanha Pós-Primeira Guerra: Uma nova visão sobre a ciência...............................21 Herzog e o Novo Cinema Alemão: A renúncia à ciência e o desejo de volta a natureza.............................................................................................25 Desvendando a natureza: a ambientação em Nosferatu................................................29 Nosferatu: eine Symphonie des Grauens..........................................................................29 Nosferatu: Phantom der Nacht............................................................................................38 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................47 BIBLIOGRAFIA........................................................................................................................49 ÍNDICE DE FIGURAS............................................................................................................51 ANEXOS...................................................................................................................................53



Introdução Esse trabalho visa discutir a representação do conhecimento científico, em três momentos distintos da história alemã, com o livro Drácula e suas adaptações para o cinema alemão. No primeiro momento temos o livro Drácula de Bram Stoker, escrito no final do século XIX, onde se percebe que crenças e superstições, que exercem grande apelo entre a população, foram combatidas com inovações que surgiam com a ciência. Dr. Van Helsing, a representação da ciência na obra, usa as descobertas desse conhecimento para combater o vilão, sendo então um personagem de suma importância no desenvolvimento da história. Anos mais tarde, em 1922, o diretor alemão Friedrich Murnau realizou no cinema sua versão da novela de Stoker. Nosferatu: eine Symphonie des Grauens trouxe características claras de um período situado após a Primeira Guerra Mundial, onde os novos conhecimentos científicos foram utilizados na indústria bélica, trazendo caos e destruição na Europa. Com isso, a figura do cientista no filme de Murnau tem um papel diferente do livro de Stoker, aparecendo poucas vezes e se mostrando incapaz de derrotar o mal sobrenatural.

No final da década de 1960, em meio a Guerra Fria, jovens diretores alemães propuseram uma retomada de seu cinema. Werner Herzog é um desses diretores e realiza, em 1979, Nosferatu: Phantom der Nacht, uma adaptação do filme de Murnau, de 1922. Devido ainda as conseqüências da Segunda Guerra Mundial, o medo da utilização do conhecimento científico novamente como instrumento de destruição traz ao filme uma terceira retratação do cientista que, em relação à Murnau, ganha um papel mais relevante na história, e novamente é mostrado como alguém incapaz de utilizar seu conhecimento com eficácia. Após descrever ao longo dessa pesquisa os fatos que motivaram essa mudança na estruturação da imagem da ciência nas obras, mostramos também como a natureza, elemento que é trabalhado como contraponto ao pensamento racionalista, foi retratada pelos diretores em suas produções, através de uma visão com influências da pintura Romântica Alemã do artista Caspar David Friedrich no século XVIII.

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O vampiro na literatura: Drácula de Bram Stoker

1.1 – Integração do mito do vampiro ao livro de Stoker As crenças e temores em deuses e espíritos de civiliza­ ções antigas, como as do Egito, da Grécia e de Roma cultuadas nas tradições orais, através de lendas, mitos e ritos, resultaram no conhecimento do gênero de horror que habitou por muito tempo a imaginação dos povos antigos, povoando as suas mentes com vampiros, lobisomens, feiticeiras e diversos demônios. (LEITE, 2002) A fim de se compreender o vampiro mais famoso da literatura mundial, o Drácula de Bram Stoker, vemos que foram utilizados o mito e as crenças de criaturas vampíricas, que já vinham sendo construídos muito antes da palavra escrita. No século XIX, muitas doenças e óbitos que não tinham respostas nu­ma determinada região, por exemplo, desencadeavam uma histeria sobre vampirismo e resultavam na exumação e destruição de inúmeros corpos. O vampiro na literatura surge em obras como a do jovem escritor e médico John Polidori, com o conto The Vampyre,

que contava sobre um vampiro que atraía e matava mulheres inocentes a fim de se alimentar de seu sangue, e em Carmilla, escrita por Sheridan Le Fanu, onde este incorpora as crenças vampirescas a uma ambientação gótica. Vemos que no século XIX houve uma grande produção de histórias que traziam um tema sobrenatural. (MELTON, 1998) Em 1897, o romance Drácula, de Bram Stoker é publicado. Nesse período era complicado voltar-se a temas sobrenaturais porque muitas respostas foram encontradas pela sabedoria e a racionalidade atribuídas à ciência. Segundo Lucia de La Rocque: Isso se explica pelo fato de que a natureza do mal explorado no romance gótico do século XVIII, evidenciado na depravação e nas forças satânicas que circundavam seus personagens, aos poucos ia deixando de fazer sentido para as camadas letradas européias, que obtinham cada vez mais conhecimento das descobertas e teorias científicas do período.Assim, o elemento trágico, claramente ligado ao lado espiritual nos tradicionais romances góticos, veio a se desencantar

(ROCQUE, 2001, p.13 ).

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Na literatura, o termo gótico se refere a uma forma de romance popular do século 18, que continuaram a ser escritos no século 19. Os romances góticos retratam forças de manifestações sobrenaturais contra a racionalidade, impondo o sentimento de pavor através de elementos como terror, morte, horror, confrontação direta com uma força desconhecida e o misterioso, nos levando a crer que o mundo é muito maior que os nossos poderes ou nossa compreensão poderiam dominar. (MELTON, 1998). Stoker quebra o convencional e nos traz novamente um tema sobre vampiro e permeado com características góticas, utilizando elementos de Polidori e Le Fanu. A história é ambientada, no primeiro capítulo, em um castelo misterioso, num lugar isolado, onde Drácula é um vilão terrível que se alimenta do sangue de pessoas. Esses elementos unem o mundo gótico para a Londres do século XIX, soltando o mal de uma terra estranha (Transilvânia) sobre uma família britânica. Outro fator que diferenciou a obra é a utilização do conhecimento e das descobertas tecnológicas que a ciência proporcionou ao personagem Doutor Abraham Van Helsing no combate ao vampiro. Veremos no próximo item como essa visão em relação à ciência foi abordada na obra.

1.2 – A ciência na visão de Bram Stoker: uma esperança de mudança Vemos no livro Drácula que o monstro deve ser combatido, já que este representa um inimigo sobrenatural. As mortes relatadas no conto traziam medo aos outros personagens, que não sabiam realmente com o que lidavam e com isso atribuíam esse fato a uma entidade maligna, formulando conceitos irreais para sua explicação. Por outro lado, aqueles que possuíam o conhecimento científico não enxergavam isso, e buscavam algo no mundo físico que pudesse resolver o problema que enfrentavam. Pesquisavam, analisavam e concluíam os fatos com evidências, sendo então o que acontece em Drácula quando surge o personagem Abraham Van Helsing,“[...] uma combinação de professor, médico, advogado, filósofo e cientista.” (BOTTING apud ROCQUE, 1996, p. 22) Portanto, começa a existir uma luta entre crenças e ciência. Por fatos históricos podemos buscar de onde partiu esse principio de mudança de identidade, quando vemos que antes se acreditava na concepção de mundo estabelecida por “Deus”, não havendo outra forma de pensamento.A Reforma e o Protestantismo trazem uma libertação do pensamento individual com relação à instituição Igreja, o Humanismo, o Renascimento e o Iluminismo trazem o principio do homem como centro de todas as coisas, utilizando pesquisas científicas para decifrar os mistérios da natureza e do próprio homem (HALL, 1992). Preocupação com a “ciência”: pela qual quero não somente

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dizer técnica ou tecnologia, mas mais comumente “o estado de conhecimento, conhecimento que cobre ver­dades gerais ou a operação de leis gerais”, é um elemento comum na

Nesse momento, o saber médico deixa de se relacionar somente à cura, transformando-se em guardião da saúde individual e coletiva contra o ataque dos mais diversos e desconhecidos flagelos. É

ciência, fantasia e filmes de horror. Os Personagens procuram por conhecimento, são criados através do conhecimento, e podem ser destruídos pelo conhecimento. Conhecimento, em

a ciência médica, aqui representada por Van Helsing e Seward, a responsável pelas quarentenas que impedem a deflagração de epidemias exóticas através dos portos das grandes cidades; são seus profissionais que esquadrinham cada porção do espaço urbano em busca de elementos nocivos — muitas vezes invisíveis — que possam trazer doenças; da mesma forma, são os médicos os encarregados de analisar minuciosamente os corpos de vivos e de mortos à procura de pistas de um mal que possa se alastrar pela sociedade. (ROCQUE, 2001, p. 23)

poucas palavras, é poder (HEILBROWN, p.113, 1990) 1

Diversas obras literárias abordaram a questão das des­co­ ber­tas cientificas. Os autores do século XIX são reflexo de sua so­ cie­dade, abrindo discussões em suas obras relacionando esse novo co­nhecimento. Alguns, como Mary Shelley em seu livro Frankenstein, vêem essa ciência com extrema desconfiança e negativismo, onde re­lata a história de Victor Frankenstein, um cientista que constrói um monstro em seu laboratório e que depois se rebela contra seu criador. Com uma opinião positiva sobre esse conhecimento, autores como Júlio Verne, em Vinte Mil Léguas Submarinas, exploram a ciência como um benefício às pessoas, onde nesse caso é contada a aventura do Capitão Nemo que, a bordo de seu submarino movido somente à eletricidade, pode viajar a lugares nunca antes explorados. Abordando Drácula de Bram Stoker vemos como a sociedade do século XIX, na Inglaterra, capturava o espírito confiante nas revoluções industriais, científicas e tecnológicas, representado na figura do Dr.Van Helsing, que tenta derrotar o mal através dessa nova esperança na ciência. Isso evidencia uma característica do período, marcado pelo desenvolvimento da medicina experimental, que obtém grandes avanços na identificação e prevenção de doenças contagiosas, e pela forte valorização social da medicina.

Percebemos na obra de Stoker a incansável busca por respostas para tudo o que é desconhecido e que o conhecimento científico é benéfico, pois disponibiliza recursos tecnológicos na luta contra um mal incomum. Vemos então que a ciência é tratada como uma solução aos problemas que a sociedade enfrentava, garantindo segurança por trazer a esperança que os males, até então desconhecidos, poderiam ter uma explicação racional através da intervenção do homem, representado na história por Dr.Van Helsing. No entanto, devido a fatos históricos que mostraram as conseqüências que a real utilização do conhecimento científico trouxe ao mundo, a figura desse personagem foi perdendo sua intensidade e, no cinema alemão, isso resultou em um novo modo de retratar o cientista, como veremos adiante.

1 Preoccupation with “science”: by which I mean not only technique or technology, but more generally “the state of knowing, knowledge covering general truths or the operation of general laws,” as in Webster, 1051 is a common element in science fiction, fantasy, and horror films. Characters in these films search for knowledge, are created through knowledge, and may be destroyed by knowledge. Knowledge, in short, is power.

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2 Pós-Primeira Guerra: Uma nova visão sobre a ciência

Murnau, o cinema expressionista alemão e a Alemanha

O desenvolvimento tecnológico na Europa no século XIX causou um aumento da produção industrial. No inicio do século XX, para alimentar essa produção crescente, houve a necessidade da busca por recursos naturais, um dos principais motivos que gerou um processo de expansão imperialista entre alguns paises europeus, como Inglaterra, França, Alemanha, Itália, entre outros. O descontentamento de alguns desses países com a partilha dos territórios resultantes dessa expansão, principalmente a Alemanha, fez com que o nacionalismo ficasse mais evidente, gerando como medida de defesa uma política de aceleramento de produção bélica. Esses fatos culminaram no que seria conhecido como a Primeira Guerra Mundial, marcada pelo empenho dos paises envolvidos em conseguir novos equipamentos e armas que pudessem lhes propiciar a vitória, como gases tóxicos, metralhadoras, tanques de guerra e aviões. (PAZZINATO, 1995)

Como reflexo desse conflito, artistas alemães passaram a retratar em suas obras sua visão sobre esses acontecimentos, surgindo então a estética Expressionista Alemã, que...

Após os conflitos da Primeira Guerra Mundial, a Europa se vê frente a um caos, o clima externa uma atmosfera de terror, destruição e morte. A Alemanha sofre as sanções impostas pela derrota, fazendo surgir o desemprego, a fome e o abandono da população.A ciência, que no século anterior era retratada como algo benéfico, agora era motivo de desesperança e destruição, já que foi utilizada a favor da tecnologia militar.

Cineastas como Robert Wiene e Friedrich Wilhelm Murnau foram adeptos dessa nova forma de expressão artística. O filme “Nosferatu, eine Symphonie de Garuens” (1922), fil­mado por Murnau, foi uma adaptação do romance de Bram Stoker, “Drácula” do século XIX, tornando-se um dos maiores clássicos do cinema expressionista alemão, sendo responsável pe­la inserção do vampiro nos meios cinematográficos. Não con­seguindo os direitos autorais

é um movimento artístico que, a partir da pintura, vai inflamar todas as artes, quebrando as fronteiras, para fazer do material, da realidade, o simples pretexto para a exteriorização do eu. Ele se manifesta como uma reação muito violenta ao naturalismo e ao impressionismo e esboça em todas as artes uma estética nova (...) Sendo assim nunca o Expressionismo constituiu uma corrente estruturada, uma Escola. O Expressionismo é, antes de tudo, um clima de revolta e de desespero, uma atmosfera que se desenvolve entre a juventude alemã das grandes cidades, que vai mais tarde exaltar tanto a pintura quanto o teatro, a poesia e a literatura e depois o cinema (...) o que permanece é um furacão que agita todas as formas artísticas, um clima de utopia, de angústia, de desespero e de revolta, uma comunhão de desejos da qual partilham numerosos artistas alemães (...). (PALMIER apud BARSALINI, online)

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de Florence, a viúva de Stoker, Murnau opta por alterar o nome do filme para “Nosferatu”, ligado ao mito romeno do “morto vivo” (BARSALINI, online). O Drácula passou a se chamar Conde Orlock, uma figura com partes do corpo desproporcionais, com aparência de roedor, presas, orelhas compridas e pontiagudas, que caminha vagarosamente e carrega em si uma enorme força obscura, a própria representação do mal, mas ao mesmo tempo, demonstra ser uma figura frágil e solitária.

Ao mesmo tempo demonstra também o “desenvol­vi­ mento” cientifico, através do personagem do Professor Bulwer, sen­do este o representante de Van Helsing da obra original de Bram Stoker, que surge mostrando para os alunos o poder da natureza no processo agressivo de alimentação das plantas car­nívoras (Figuras 01 e 02), horrorizando seus alunos, como explicitado no intertítulo do filme (Figura 03).

Esse filme tentava retratar o momento conturbado entre ciências e civilização, demonstrando a eterna luta do homem contra as forças do mal.Murnau,em algumas de suas cenas,revela a fragilidade do conhecimento cientifico perante a natureza, externada na cena da epidemia propagada por Nosferatu e seus roedores, onde parte da sociedade é dizimada propagando o medo e a morte. Porque a figura do cientista perde sua intensidade no combate ao vampiro? Provavelmente devido ao fato do diretor ter experimentado dire­ta­ mente o horror da Primeira Guerra Mundial, sendo piloto do exér­ cito alemão, sua produção reflete os resultados que a ciência trouxe ao mundo e, com isso... No despertar do Expressionismo na rejeição da perspectiva racional, prosaica da sociedade burguesa de Wihelmine, Murnau parece sugerir que a tecnologia e a ciência são falsas esperanças. Essas formas modernas de conhecimento não derrotam o vampiro, mas produzem as máquinas, interesses comerciais, e novas descobertas que trouxeram a devastação da Primeira 1

Guerra Mundial. (VACCHE, 1996, p. 171)

Figuras 01 e 02 – Aula do Professor Bulwer, mostrando planta carnívora. Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

1 In the wake of the Expressionist rejection of the rational, prosaic outlook of Wilhelmine bourgeois society, Murnau seems to suggest that technology, science, and trade are false deities. These modern forms of knowledge do not defeat the vampire, but they produce the machines, commercial interests, and new discoveries that bring the devastation of World War I.

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Figuras 03 – Intertítulo Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

Figuras 04 – Professor Bulwer Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

Da mesma forma que representa o desenvolvimento, a figura do cientista nesse caso é retratada como uma sátira, com uma aparência caricatural (Figura 04) que não tem informações e soluções de como conter a praga, se mostrando impotente. Como também podemos observar, ao término do filme, o Professor falha ao chegar a tempo para salvar a esposa de Hutter, Ellen, que se sacrifica para salvar a população do vampiro.

sangue até o sol nascer, fazendo com que o Conde seja destruído pelo próprio poder natural da luz do dia. Com isso, vemos que a adaptação do diretor para a obra de Stoker traz diferenças que refletem o pensamento da sociedade alemã, que não trazia mais a esperança do século anterior em relação ao conhecimento cientifico, pois este não trouxe o benefício esperado para a população. Mesmo assim, a fragilidade do país em decorrência da perda da guerra ainda fez com que alguns acreditassem que a nação pudesse ser reerguida. Alguns anos mais tarde acontece a Segunda Guerra Mundial, onde a ciência foi utilizada novamente de forma destrutiva e, posteriormente com o inicio da Guerra Fria e a divisão da Alemanha com o Muro de Berlim, resultou com que o cinema alemão, através de Werner Herzog, retomasse a história de Nosferatu em mais uma adaptação, apresentando uma terceira abordagem sobre a ciência.

Com isso, a utilização de ambientes naturais na filmagem de Murnau nos remete a um desejo do diretor de retratá-la como um contraponto a ciência, levando a crer que ela poderia ser a melhor solução para combater um mal sobrenatural. Como citado anteriormente, Ellen, uma personagem pura e sentimental, é a única que pressente o vampiro e decide se sacrificar para livrar a população do mal trazido por ele, permitindo que sugue seu

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Herzog e o Novo Cinema Alemão : A renuncia a ciência e o

-desejo de volta a natureza

Com o fim da segunda guerra mundial, o cinema internacional entrou numa fase de transição onde a principal característica foi a rejeição às formas tradicionais de produção, com a renovação da linguagem e da temática dos filmes. Assumindo uma atitude mais crítica em relação aos problemas humanos, o cinema rompeu com os métodos de produção em estúdios, passando a procurar nas ruas e em ambientes naturais o cotidiano da população e buscando formas de retratar sua realidade (BERNARDET, 2006). Na década de 1960, um dos movimentos de maior destaque desse período foi a Nouvelle Vague francesa, caracterizada pela juventude dos seus autores, unidos por uma vontade comum de transgredir as regras normalmente aceitas para o cinema mais comercial, e buscava, além de tudo, o interesse pelas questões existenciais de seus personagens. Seguindo essa linha, cineastas alemães despertaram para uma retomada de seu cinema, realizado no pós-guerra basicamente na Alemanha Ocidental, onde foram motivados culturalmente e economicamente a produzirem seus filmes. Entre eles surgiram grandes nomes como Rainer Werner Fassbinder, 1

Alexander Kluge, Wim Wenders e Werner Herzog, sendo este último o diretor de “Nosferatu: Phantom der Nacht” (1979). Assim, o então chamado Cinema Novo Alemão não definiu uma linguagem única e sim, de forma particular, as abordagens técnicas foram surgindo através da liberdade de expressão de cada diretor (CÁNEPA apud MASCARELLO, 2006). Os filmes de Herzog marcam um momento de inflexão, “Nosferatu”, estrelado por Klaus Kinski e baseado no cinema expressionista de Murnau, explora de maneira intensa os limites entre realidade e ficção, privilegiando sempre o contato físico e sensorial com a realidade. Nas palavras de Herzog: “Em nossos filmes, estamos tentando construir uma estreita ponte com o passado. Nós não estamos fazendo um remake de Nosferatu, mas trazendo-o a uma nova vida, com novos personagens para uma nova era.” 1 (HERZOG apud MAYNE, 1986, pg. 119) A versão do diretor para o filme de 1922 dirigido por Murnau trouxe consigo adaptações particulares que representam muito do pensamento pós-Segunda Guerra que culminou na Guerra Fria e que permeava a sociedade alemã, principalmente em relação aos

We are trying in our films to build a thin bridge back to that time. We are not remaking Nosferatu, but bringing it to new life and new character for a new age.

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efeitos da ciência sobre o mundo, que ainda tinha em sua memória recente as marcas deixadas pelos anos no governo de Adolf Hitler. Os objetivos principais de Hitler em seu governo se referiam ao resgate do nacionalismo alemão, abalado desde o final da Primeira Guerra Mundial, a conquista de territórios tomados da própria Alemanha em virtude da perda da Guerra e a busca de uma raça pura, denominada por ele de ariana, segundo a qual somente os alemães mais fortes deveriam sobreviver (GONÇALVES, online). Hitler defendia a utilização da ciência para atingir tais objetivos, o que acabou resultando em conseqüências chocantes para a humanidade. A eugenia pregada por ele para a construção de uma raça perfeita, por exemplo, resultou na morte de milhões de judeus, além da utilização de pessoas como cobaias em experimentos científicos. Na mesma época, cientistas se vêem motivados nos Estados Unidos com a construção da bomba atômica, pois o governo os convencia de que ela seria uma solução para a Guerra. No entanto, “os cientistas não opinam sobre seu uso, assistem perplexos ao bombardeio de duas cidades povoadas por civis, e começam rapidamente a se questionar sobre o que fazer com os conhecimentos que possuem.” (SCHWARTZMAN, online) Mesmo com o fim da Segunda Guerra, as conseqüências deste período sobre a humanidade são bem claras,principalmente em relação à desilusão com a utilização do conhecimento científico como um instrumento para a destruição em massa da humanidade. Os países vencedores da Segunda Guerra decidiram

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dividir a Alemanha, sendo que a partilha ficou entre França, Inglaterra, Estados Unidos e União Soviética. Não existindo consenso ideológico entre a União Soviética comunista e os países capitalistas, houve a crise de Berlim, dando início a Guerra Fria em 1947, que consistiu em um conflito entre Estados Unidos e União Soviética, envolvendo uma guerra econômica, diplomática e tecnológica pela conquista de zonas de influência. Devido a constante migração da população da Berlim Oriental, controlada pela União Soviética, para a Ocidental, controlada pelos Aliados, a Alemanha teve sua cidade divida ao meio pelo Muro de Berlim, construído pelo lado Oriental, evitando as constantes evasões de famílias inteiras que buscavam melhores condições de vida no setor Ocidental. Essa divisão da Alemanha durou aproximadamente 30 anos, quando houve a derrubada do muro em 1989 (PAZZINATO, 1995). Além disso, a Guerra Fria trouxe ao mundo o real temor de uma guerra nuclear, que já havia demonstrado seu potencial de destruição anteriormente nos ataques às cidades de Hiroshima e Nagazaki. Esse medo do potencial da ciência em ir longe demais em suas tentativas de dominar a natureza e se tornar um instrumento de destruição já havia sido apresentados em obras literárias do século XIX, como Frankenstein de Mary Shelley, e no cinema surgiram como... [...] uma dupla dicotomia, com uma aproximação racional a dominação da natureza oposta as “velhas” forças fora do mundo natural delineadas pela ciência, e em outra por uma natureza onde as forças começam pelo foco da razão, mas


quando liberadas provam estar além do seu controle. As duas forças díspares são unidas em oposição a ciência pragmática e ao mundo da tecnologia industrial que ela cria. Esses temas surgiram mais na era nuclear, como medos sobre destruição em massa e medos sobre o valor da tecnologia se espalharam. 2

(HEILBROWN, 1990, p. 113)

A ciência no filme de Herzog, seguindo os passos de Murnau em 1922, é retratada de forma caricatural, sem a esperança a qual era representada na obra original de Stoker. A visão de Herzog sobre a posição dos cientistas no mundo é bem clara, o retratando como “[...] um racionalista que é impotente a frente do poder supernatural.” (HEILBROWN, 1990, p. 113) Ao recontar Nosferatu, Herzog foca em Lucy e Van Helsing como pontos de transformação. Esses personagens tem funções que os trazem mais perto da novela de Stoker, do século XIX. Dr Van Helsing, nesse filme, é uma caricatura, como a versão de Murnau do doutor, em 1922. Mas sua função no filme de Herzog é similar a sua função na novela de Stoker, devolvendo a Helsing a tarefa de matar o vampiro, mesmo que aqui seja somente um detalhe para o sacrifício de Lucy. Como o Van Helsing de Stoker, esse personagem representa as forças da ciência e da razão, sendo constantemente apresentado nos momentos em que a ameaça do vampiro é maior. Enquanto a ciência confronta o

sobrenatural e a irracionalidade na novela de Stoker, no filme de Herzog ela simplesmente corre e se protege com clichês sobre superstição, sendo que isso se torna explicito quando o cientista mata o vampiro através da estaca no coração. Assim, Herzog e Stoker podem dar ao cientista papéis completamente opostos. Diferentemente do livro Drácula, onde Helsing representa as forças triunfantes da razão, em Herzog é o reino onde o que Helsing chamaria de “superstição” que vence. (MAYNE, 1986) Deixando clara a visão do diretor pela ciência em Nosferatu: Phantom der Nacht, podemos perceber também sua intenção em demonstrar o desejo pela volta à natureza, tanto explicitado no roteiro como quando Jonathan diz, antes de ir à Transilvânia, que está “feliz em se afastar de sua cidade, dos canais cujas águas sempre retornam ao mesmo lugar” (Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979), como através da escolha pela utilização de paisagens naturais para a filmagem, na Holanda. Com isso, Herzog nos leva a pensar que a natureza surge como uma mudança na vida dos personagens, algo que pode representar o desejo de fuga da vida em uma sociedade que, durante muito tempo, pregou falsamente seus avanços científicos como se pudessem trazer novas esperanças para uma vida melhor.

2 A sort of double dichotomy, with the rational approach to the domination of nature opposed on the one hand by “order” forces outside of the natural word delineated by science, and on the other by a nature whose forces begin within the scope of reason but when unleashed prove to be beyond its control. The two disparate forces are united in their opposition to pragmatic science and the technological industrial world it fosters. These themes have become more pressing in the nuclear age, as fears about mass destruction and doubts about the value of technology have become widespread.

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Desvendando a natureza: a ambientação em Nosferatu

4.1 – Nosferatu: eine Symphonie des Grauens

Como visto anteriormente, o filme de Murnau em 1922 é comumente enquadrado no gênero expressionista, dado o contexto de época a qual foi realizado. O cinema expressionista tem características bem claras, como a movimentação dos atores que funciona a favor da mise-en-scéne, fazendo com que eles se “alinhem” junto ao cenário criando novas composições visuais, e, acima de tudo, a utilização de cenários estilizados, distorcidos, com exagero e justaposição de formas similares (BORDWELL, 2002). O maior representante desse estilo é o filme de Robert Wiene, “O Gabinete do Dr. Caligari” (1920), fazendo então com que este se assemelhasse com a arte expressionista apresentada na Alemanha até então. Podemos perceber alguns desses elementos em Nosferatu, mas que aparecem no filme de forma mais tímida em relação ao filme de Wiene, como a justaposição de formas similares representada pela figura de Conde Orlock e o arco da porta, na cena onde Hutter é atacado no castelo pela primeira vez (Figura 06). Murnau também utiliza filtros coloridos para ambientar as cenas, sendo que em ambientes internos que se passam à noite temos o amarelo como principal cor, nas externas a noite, o azul e nas externas durante dia, o vermelho (CRUZ, Online).

Figura 05 – Cenário gabinete do Dr. Caligari Fonte: O Gabinete do Dr. Caligari, 1920.

Figura 06 – Conde Orlock entrando no quarto de Hutter Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

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No entanto, Lotte Eisner (1988) argumenta que o estilo visual de Murnau é inspirado na pintura Romântica, trazendo a sensibilidade desse estilo para dentro do Expressionismo. Com

A principal característica da pintura Romântica Alemã, que nasce no final do século XVIII na Alemanha, é sua oposição ao racionalismo, difundido pelo Iluminismo. Este pensamento

isso percebemos que...

racionalista rouba o encantamento do mundo na visão desses artistas, que acreditam numa conexão com o sobrenatural, em uma imagem do Homem que não é só razão, mas sentimento, desejo místico, atração pela Natureza. (SANTANA, Online). Com isso percebemos que, mesmo apresentando aspectos expressionistas em seu filme, as conexões entre esse estilo e o Romântico são extremamente aparentes em Nosferatu.

A maioria dos chamados filmes Expressionistas (mas mais especificamente os de Murnau) pertencem a herança estilística da pintura Romântica Alemã... ao invés das cores audaciosas, a mudança de perspectivas e as linhas irregulares dos artistas associados a Die Brücker ou a Der Blaue Reiter. 1 (ELSAESSER apud VACCHE, 1997, pg. 166)

Figura 07 - Ernst Ludwig Kirchner, artista da Die Brücker. Banhistas em Moritzburg, 1909. Fonte: BEHR, 2000

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Figura 08 - Franz Marc, artista da Die Brücker. Vaca Amarela, 1911. Fonte: BEHR, 2000

1 Most so-called Expressionist films (but especially Murnau’s) properly belong to the stylistic heritage of German Romantic painting… rather than to the bold colors, the shifting perspectives and the jagged lines of the artists associated with Die Brücke or Der Blaue Reiter.


Vemos essa relação no próprio conceito de oposição ao pensamento racional, o que remete a idéia anteriormente discutida de que a ciência no início do século XX não trouxe os benefícios esperados a humanidade, e sim destruição. Com isso, a natureza representa a capacidade de abalar as estruturas do mundo dessa época, trazendo de volta ao homem o desejo pela busca de algo sublime. No filme de Murnau, quando o personagem Hutter faz a viagem ao castelo do Conde Orlock, vemos que ele não está atento aos conselhos da população local quanto ao sobrenatural que o aguarda, mas quando ele atravessa a ponte rumo ao primeiro encontro com Orlock se dá conta que entrou em outra realidade, um reino de sombras e fantasmas (Figura 09). Verificamos uma alteração acelerada no ritmo da cena onde a carruagem aparece e provoca estranhezas e aflições a Hutter que ruma ao desconhecido (Figura 10).

Figura 09 – Hutter atravessando a ponte a caminho do Castelo de Orlock Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

A continuidade e a construção desse universo fantástico se torna evidente no decorrer do filme, quando Hutter chega ao portão do castelo e este se abre sozinho, com o conde surgindo da escuridão e vindo recebê-lo (Figuras 11 e 12). Percebemos que quanto mais Hutter adentra ao universo do conde mais ele se torna impotente e uma presa fácil a este ser com poderes e atitudes estranhas.

Figura 10 – Carruagem indo em direção a Hutter Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

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Figura 11 e 12 – Hutter chegando ao castelo e encontrado-se com o Conde Orlock Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

O conde utiliza Hutter para conseguir uma propriedade na cidade, e este chega de navio atracando no porto, trazendo e espalhando a peste, já que centenas de ratos portadores da praga estavam dentro de seus caixões (Figura 13). A doença começa a dizimar a cidade, consumindo a sociedade que está a mercê desse mal (Figura 14). O cientista, que antes lutava e descobria maneiras racionais de combater esse estranho fenômeno aparece em poucas cenas do filme, sem um papel relevante, e a única forma de combate foi a própria natureza, quando o conde é destruído pela luz solar (Figura 15).

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Murnau trabalha a natureza em seu filme de forma que esta, em primeiro momento calma e inofensiva, vá crescendo

aos poucos e adicionando elementos estilísticos que se tornam de suma importância na construção da narrativa e do ritmo das cenas, fazendo com que o diretor encontre nas obras do pintor Romântico alemão Caspar David Friedrich claras referências para os elementos visuais a qual desejava transmitir, afinal o artista... [...] resultava impossível contemplar a natureza com olhos de cientista, apesar da minuciosidade com que a contemplou. Temia uma espécie de corrupção cientifica da arte que assim perderia sua elementar força profética para o espírito. (JENSEN apud PARODI, Online)


Figura 13, 14 e 15 – Ratos no navio propagadores da peste. População transportando mortos dizimados pela peste. Conde Orlock agonizando perante a luz solar. Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

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Percebemos, primeiramente, que a utilização da natureza no filme se torna mais evidente quando Hutter sai da cidade e

mostrando uma relação com a obra de Friedrich Landscape with Solitary Tree, de 1822 (Figura 17), que demonstra uma situação

parte em direção ao castelo de Orlock. Em sua jornada nota-se que a natureza ganha um papel que, em certos momentos, chega a se sobrepor ao dos próprios personagens, demonstrando sua grandeza.

similar, onde um homem encostado na árvore contempla a paisagem em meio a animais. Pode-se perceber também que o enquadramento utilizado por Friedrich serve de base para Murnau, não somente nesta como em outras cenas.

A cena em que Hutter acorda na hospedaria ao raiar do dia mostra como ele, feliz, admira uma cena onde existe uma paisagem que contém arvores, montanhas e cavalos (Figura 16),

Já no castelo de Orlock, temos uma cena em que Hutter admira a paisagem no topo do castelo onde, ao escrever uma carta para sua esposa, relata sua viagem (Figura 18).

Figura 16 e 17 – Cavalos correndo no campo. Caspar David Friedrich, Árvore solitária, 1822. Fontes: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922. WOLF, 2003

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Após a fuga do castelo de Orlock, Hutter segue de volta a sua cidade. Em seu caminho, ele parece começar a se perder na imensidão da natureza, aparentando integrar-se ao cenário (Figura 19). Essa integração é comum nas obras de Friedrich, onde geralmente vemos uma figura anônima em meio ao universo natural, em que este é somente mais um mero integrante e então a contempla (Figura 20). Murnau passa a impressão que o homem não tem mecanismos para dominar a natureza, nos fazendo remeter ao pensamento de Friedrich, que dizia ”Tenho que me render ao mundo que me rodeia, unir-me as suas nuvens e pedras, para poder ser aquilo que sou. Preciso da solidão para poder comunicar com a natureza.” (FRIEDRICH apud WOLF, p.1, 2003)

Figura 18 - Hutter olhando a paisagem no castelo de Orlock. Fontes: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

Figuras 19 e 20 – Hutter após fuga do castelo de Orlock. Caspar David Friedrich, Ravina Rochosa 1822. Fontes: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922. WOLF, 2003

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Em um terceiro momento, onde Orlock já adentra a cidade de navio, o mar se mostra completamente agressivo (Figura 21).Aqui a natureza demonstra sua grandeza, se impondo sobre qualquer figura ou intervenção humana que possa vir a seu encontro, algo que também notamos em Vista do Báltico, de Caspar David Friedrich. (Figura 22). Como citado anteriormente, o filme utiliza filtros coloridos para demonstrar as transições de tempo durante o dia. Sempre que isso ocorre Murnau inclui uma cena de apoio, mostrando paisagens com claras referências à obra de Friedrich (Figuras 23 e 24). Figura 21 – Caspar David Friedrich,Vista do Báltico, 1820. Fonte: WOLF, 2003

A utilização da iconografia Romântica mostra “algo através da qual o homem pode mais uma vez recapturar seu contato perdido com as forças da natureza dadas por Deus, quase revertendo a direção da teoria da evolução de Darwin.” 2 (ROSENBLUM apud VACCHE, p. 187, 1997), fazendo com que Murnau, assim como Friedrich, perceba que a ciência afastava o homem do seu lado mais natural, retirando-o de seu sentimento emocional em relação à natureza e colocando esta como a base para as dúvidas e incertezas do homem em relação a seu meio ambiente. Esse pensamento foi retomado por Herzog ao realizar sua adaptação, como veremos a seguir.

2 Through wich man might once again recapture his lost contact with the forces of a Godgiven nature, almost reversing the direction of Darwin’ theory of evolution.

Figura 22 – Ondas agitadas Fonte: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

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Figura 23 – Quadro de Caspar David Friedrich, Paisagem da Boemia 1810. Fonte: WOLF, 2003

Figuras 24 – Cena de transição. Fontes: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922.

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4.2 – Nosferatu: Phantom der Nacht Os cineastas do Cinema Novo Alemão, após a reclusão de seu cinema devido ao nazismo, encontraram no cinema expressionista a “legitimidade” nacionalista que buscavam reconquistar em seus filmes. Foi através de sua versão de Nosferatu que Werner Herzog fixou sua conexão com esse estilo (MULHALL, 2008). Podemos perceber as influências desse estilo em cenas como a que Jonathan janta no castelo de Drácula, em um plano onde a visão de câmera se dá de cima para baixo e que, juntamente com a utilização de sombras, cria uma ambientação tipicamente expressionista. (Figura 25).

A história de Herzog é estruturalmente similar a de Murnau, tanto em relação a alguns pontos do roteiro como pela influência de Caspar David Friedrich, onde os traços desse artista se tornam ainda mais evidentes. A natureza se mostra presente desde o começo do filme, onde vemos animais e plantas na casa de Jonathan, ajudando a compor o ambiente e criando uma sensação de paz e tranqüilidade (Figura 26). A presença da natureza também pode ser notada nas cenas em meio a cidade, mostrando uma atmosfera pura e livre de problemas. (Figura 27).

Figura 25 – Jantar no castelo de Drácula. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

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Figura 26 – Casa de Jonathan. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

Figura 27 – Cidade em tranquilidade. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

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Jonathan recebe a notícia de sua viagem para a Transilvânia, onde teria que vender um imóvel para Drácula. Sabendo disso, Lucy tem um mau pressentimento, pedindo a seu marido que fique e o levando ao local onde se apaixonaram pela primeira vez, recorrendo a paisagem da praia para resgatar o sentimento perdido do casal. Vemos uma ambientação parecida na obra de Friedrich Paisagem ao entardecer com dois homens, de 1935 (Figuras 28 e 29). Nesse ponto, já podemos notar que... Herzog certamente retrata a natureza de maneira similar aos pintores Românticos.A aparência da paisagem em volta de seus protagonistas quase sempre pode ser usada como um barômetro para o estado interno do personagem em destaque. Quão longe Herzog vai na antropoformização de suas paisagens? Ele admite que gosta de dirigir suas paisagens, assim como faz com atores e animais. Definitivamente parece que Herzog, exatamente como os pintores Românticos, usa a natureza como um espelho para refletir os trabalhos internos de seus personagens com a qual ele tão profundamente se associa. 3 (MULHALL, p. 13, 2008)

A trajetória de Jonathan ao castelo de Drácula deixa claro seu desejo pelo encontro com a natureza, que na visão de Herzog é demonstrado de forma mais explícita que na de Murnau em 1922. O caminho é composto por grandes paisagens, que parecem sugerir que o personagem está adentrando cada vez mais no ambiente natural. (Figura 30 e 31).

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Na busca pelo castelo de Drácula, Jonathan segue boa parte de seu caminho em direção a nascente do rio, como se estivesse indo ao encontro de sua essência (Figura 32).

Figuras 28 e 29 –Lucy e Jonathan na praia e quadro de Caspar David Friedrich, Paisagem ao entardecer com dois homens, 1835. Fontes: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922. WOLF, 2003


Figura 30 – Harker indo em direção ao castelo do Conde Drácula. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

Figura 31 – Caspar David Friedrich, O Caçador no Bosque, 1814. Fonte: WOLF, 2003

Figura 32 – Harker subindo a montanha em busca do castelo de Drácula. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

3 Herzog certainly portrays nature in a similar way. The appearance of the landscape around his protagonists almost always can be used as a barometer of his subject’s inner state. How far does Herzog go in his anthropomorphization of his landscapes? He admits he “likes to direct [his] landscapes like he does actors and animals”. It definitely seems that Herzog, exactly like the Romantic painters, uses nature as a mirror to reflect the inner workings of his characters with whom he so deeply associates.

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Quando o personagem chega perto do território de Drácula, uma cena demonstra através do céu a sensação que

Tal preocupação com a retratação do céu também pode ser notada nas obras de Friedrich, onde este tem grande

algo sobrenatural esta por vir, pois este fica nublado em pouco tempo (Figuras 33, 34 e 35).

destaque na composição da cena (Figura 36).

Figura 33, 34, e 35 – Seqüência de imagens da transição do dia para a noite. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

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Figura 36 – Caspar David Friedrich, Neubrandenburg, 1817. Fonte: WOLF, 2003


Em sua espera por Jonathan, Lucy aguarda em frente a praia, que dessa vez é retratada com solidão é tristeza através

Drácula realiza parte de sua viagem em uma jangada, dentro de seu caixão e seguindo a correnteza (Figura 40).A analogia entre

de uma paisagem onde o mar se junta a um céu enevoado, e as cruzes ao redor da personagem trazem a sensação de que algo pior possa ter acontecido com seu marido (Figura 37). Isso é uma referência direta ao filme de Murnau que, por sua vez, se baseou em Friedrich (Figuras 38 e 39).

rios e vida pode ser notada em vários pontos do filme,como quando Lucy diz que “A morte nos cerca. Os rios continuam correndo sem nós” (Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979), no momento em que o vampiro chega à cidade e começa a espalhar a peste, sendo que ela é a única a saber o motivo da doença.

Figura 37 – Caspar David Friedrich, Nascer da lua no mar, 1822. Fonte: WOLF, 2003

Figura 38 e 39 – Comparação de cenas entre os filmes de Herzog e Murnau. Fontes: Nosferatu: eine Symphonie des Grauens,1922. Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

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Lucy cria então uma armadilha para o vampiro, dando

Figura 40 – Drácula sendo transportado em seu caixão pelo rio. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

Lucy relata a Dr. Van Helsing que Drácula é o responsável pelas mortes, mas este diz que isto é fruto de sua imaginação e que “Vivemos num século de conhecimentos. A ciência refutou todas essas superstições” (Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979). Lucy rebate demonstrando suas crenças na fé, dizendo que “Fé é um dom no ser humano, que nos possibilita acreditar em coisas que sabemos serem irreais” (Idem). Com a propagação da peste a cidade, que em primeiro momento foi retratada de forma pacifica e bela através de elementos naturais, agora esta destruída e caótica mas, apesar disso, a população se mostra “feliz”, aproveitando seus últimos momentos de vida (Figura 41).

sua própria vida para destruí-lo. Ao perceber que chegou tarde demais, Van Helsing admite seu erro ao não acreditar no que a personagem tinha dito anteriormente, utilizando então a crença popular da estaca no coração para eliminar definitivamente Drácula (Figura 42). Após isso, Jonathan entra por completo no mundo do vampiro e encontra com o seu lado natural, sua essência, que havia sido camuflada pela vida regrada na ciência. Ao final ele vira o próprio vampiro e parte da cidade entrando em contato com a imensidão da natureza, demonstrada na cena em que percorre a praia com seu cavalo (Figura 43). A conexão artística mais forte entre Caspar David Friedrich e Werner Herzog é sua dependência com a natureza selvagem, que inspira homens a perseguir sua inocência e revelar suas naturezas internas. 4 (BLUMENTHAL, 2006)

Com isso, podemos perceber o claro desejo de Herzog em dar um papel de suma importância à natureza em sua obra, assim como Friedich, demonstrando sua imensidão em relação ao homem. Nesse filme, o cientista não apresenta nenhum poder contra as forças naturais, não encontrando respostas para as mortes. Aqui, o homem não consegue dominar a natureza, se mostrando apenas mais um ser integrado a seu ambiente.

4 The strongest artistic link between Caspar David Friedrich and Werner Herzog is their common dependence upon wild nature to inspire men’s pursuit of innocence and to reveal their inner natures.

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Figura 41 –Cidade em caos. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

Figura 42 – Van Helsing após a morte de Drácula. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

Figura 43 – Harker transformado em vampiro, cavalgando para seu novo refúgio. Fonte: Nosferatu: Phantom der Nacht, 1979.

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Considerações finais Percebemos que fatos históricos influenciam diretamente na visão de autores sobre suas obras. Em um período de, aproximadamente,80 anos,a imagem do conhecimento científico, retratado primeiramente no final do século XIX como recurso benéfico à sociedade, é mostrado em ambas as adaptações no cinema do século XX como algo na qual a humanidade perdeu a credibilidade, devido sua má utilização. Esse processo de desgaste com relação ao pensamento cientifico aconteceu ao se ver como algo, que em primeiro momento poderia ser extremamente útil ao homem, e se tornou uma ferramenta de destruição resultando, como visto nas versões dos alemães Murnau e Herzog, em filmes que buscam o sentimento de volta as origens, encontrando na natureza um refúgio para os males do homem moderno, resgatando o pensamento que os pintores Românticos já pregavam no século XVIII. A influência do pintor Romântico Caspar David Friedrich sobre os diretores alemães é clara, onde a forma com que as paisagens naturais foram trabalhadas refletem os sentimentos de uma nação que perdeu o contato com a natureza, devido a evolução do pensamento racionalista Stoker, Murnau e Herzog trouxeram diferentes versões de um mesmo tema, desenvolvendo questionamentos que levavam em conta o contexto sócio-cultural em que cada um se encontrava. Essa reconfiguração da história de Drácula nos

traz um exemplo de como trabalhar uma obra de maneira que possamos adaptá-la para qualquer época, integrando uma linguagem atual para que essa possa ser encaixada no projeto, dando maior coerência a sua realização. O design utiliza-se destes mesmos mecanismos para a realização de um projeto, onde referências visuais e temáticas são geralmente base para futuras produções, como foi feito por Murnau em 1922 e Herzog em 1979 nos seus filmes ao utilizar como referência os quadros de Friedrich, do século XVIII. O designer também se influência pelo seu contexto de época, onde a sociedade é sua maior referência e os conflitos desta podem ser trabalhados dentro do projeto, como visto em ambos Nosferatu, realizados em contextos pós-guerra. Este também pode assumir um papel influenciador na sua sociedade dependendo de sua atitude perante o projeto, podendo ser neutro quanto ao sistema ou propor uma mudança.

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Índice de figuras FIGU RAS 01 e 02 Aula do Professor Bulwer, mostrando planta carnívora - p. 22 FIGU RA 03 Intertitulo – p. 23 FIGU RA 04 Professor Bulwer – p. 23 FIGU RA 05 Cenário gabinete do Dr. Caligari - p. 29 FIGU RA 06 Conde Orlock entrando no quarto de Hutter - p. 29 FIGU RA 07 Ernst Ludwig Kirchner, artista da Die Brucker. Banhistas em Moritzburg, 1909. - p. 30 FIGU RA 08 Franz Marc, artista da Der Blaue Reiter. Cavalos vermelho e azul, 1912. - p. 30 FIGU RA 09 Hutter atravessando a ponte a caminho do Castelo de Orlock - p.31 FIGU RA 10 Carruagem indo em direção a Hutter - p. 31 FIGU RAS 11 e 12 Hutter chegando ao castelo e encontrado-se com o Conde Orlock - p. 32

FIGU RAS 13, 14 e 15 Ratos no navio propagadores da peste. População transportando mortos dizimados pela peste. Conde Orlock agonizando perante a luz solar. - p. 33 FIGU RAS 16 e 17 Cavalos correndo no campo. Caspar David Friedrich, Árvore solitária, 1822. - p.34 FIGU RA 18 Hutter olhando a paisagem no castelo de Orlock - p. 35 FIGU RAS 19 e 20 Hutter após fuga do castelo do Conde Orlock. Casper David, Ravina Rochosa 1822. - p. 35 FIGU RA 21 Ondas agitadas - p. 36 FIGU RA 22 Caspar David Friedrich,Vista do Báltico, 1820. - p. 36 FIGU RAS 23 e 24 Cena de transição e quadro de Caspar David Friedrich, – p. 37 Paisagem da Boemia 1810. FIGU RA 25 Jantar no castelo de Drácula. 38 FIGU RA 26 Casa de Jonathan. 39 FIGU RA 27 Cidade em tranquilidade. 39

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FIGU RAS 28 e 29 Lucy e Jonathan na praia e quadro de Caspar David Friedrich Paisagem ao entardecer com dois homens, 1835. – p. 40 FIGU RA 30 Harker indo em direção ao castelo do Conde Drácula. - p. 41 FIGU RA 31 Caspar David Friedrich, O Caçador no Bosque, 1814. - p. 41 FIGU RA 32 Harker subindo a montanha em busca do castelo de Drácula. – p. 41 FIGU RAS 33, 34 e 35 Sequência de imagens da transição do dia para a noite. – p. 42 FIGU RA 36 Caspar David Friedrich, Neubrandenburg, 1817. – p. 42 FIGU RA 37 Caspar David Friedrich, Nascer da lua no mar, 1822. - p. 43 FIGU RAS 38 e 39 Comparação de cenas entre os filmes de Murnau e Herzog. – p. 43 FIGU RA 40 Drácula sendo transportado em seu caixão pelo rio. - p. 44 FIGU RA 41 Cidade em caos. – p. 45 FIGU RA 42 Van Helsing após a morte de Drácula. – p. 45 FIGU RA 43 Harker transformado em vampiro, cavalgando para seu novo refúgio. – p. 45

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Anexos Biografia de Bram Stoker Mundialmente conhecido como o autor do livro Drácula, Abraham “Bram” Stoker nasceu Dublin, Irlanda, em 1847.Aos 16 anos ele ingressou no Trinity College da Universidade de Dublin e filiou-se na Sociedade Filosófica, onde escreveu seu primeiro ensaio, “Sensationalism in Fiction and Society”. Tornou-se, mais tarde, presidente desta sociedade e auditor da Sociedade Histórica. Graduou-se em bacharel, com honras, em 1870, indo trabalhar, assim como seu pai havia feito, como funcionário público no Castelo de Dublin, mas continuou estudando meioperíodo para desenvolver seu mestrado, defendido em 1875. Stoker era fascinado pelo mundo do teatro (ele ficou impressionado com o ator Henry Irving, que futuramente seria uma figura decisiva na sua vida) e ofereceu-se, sem remuneração, para ser crítico de teatro do jornal Dublin Evening Mail. Suas críticas começaram a aparecer em vários jornais, fazendo com que Stoker fosse bem-recebido nos círculos sociais de Dublin (ele chegaria a conhecer os pais de Oscar Wilde). Em 1873 foi oferecido a ele a editoração do novo jornal Irish Echo, mais tarde rebatizado como Halfpenny Press, por meio-período e sem remuneração. O fracasso comercial deste jornal o faria pedir demissão em 1874 e, então, ele mergulharia no mundo do teatro, começando a escrever suas primeiras peças de ficção,

contos e seriados, que eram publicados nos jornais locais. Seu primeiro texto na linha do terror foi “The Chain of Destiny”, apresentado como seriado no periódico Shamrock, em 1875. Neste momento, a figura de Henry Irving entra definitivamente na vida de Stoker. Irving assumiu a direção do Lyceum, em Londres, e convidou Stoker para ser o gerente do teatro. Muitos estudiosos acreditam que a forte figura de Irving, praticamente “sugando” tudo de Stoker, pode ter sido a inspiração para a criação da imagem forte e dominadora do personagem Drácula. A amizade/sociedade entre Stoker e Irving duraria até a morte deste último, em 1905. Outra figura que pode ter inspirado diretamente o texto de Drácula foi sua esposa, Florence Stoker. Ela era uma das mais lindas e disputadas mulheres de Dublin, tendo sido, inclusive, prometida pelos seus pais para ser a esposa de Oscar Wilde. Florence escolheu Stoker por causa da segurança do emprego público dele, situação que se alteraria quando ele foi para Londres dirigir o Lyceum. A bela e dominante Florence estava longe de ser a típica esposa dos padrões ingleses da época, ou seja, submissa ao marido: ela se impunha na relação, situação que deixava Stoker constrangido. O domínio de Drácula sobre as mulheres era uma crítica à sua própria vida doméstica.

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Durante seus primeiros anos em Londres,Stoker escreveu seu primeiro livro de ficção, uma coletânea de histórias para

dragão). E a forma de contar a história através de personagens diferentes em diferentes documentos (diários, cartas, recortes

crianças (Under the Sunset), publicada em 1882. Seu trabalho no Lyceum o obrigava a escrever, sendo que seu primeiro romance publicado, The People, em 1889, nasceu como um seriado para o teatro e foi transformado em livro em 1890.

de jornal, etc.) foi inspirada no livro The Moonstone, de Wilkie Collins.

Os estudiosos não chegaram a uma conclusão das reais razões de Bram Stoker escrever uma obra como Drácula. Podemos notar uma mudança de estilo e temáticas a partir de 1890, pois seus textos ficaram mais ricos e o sobrenatural e o terror ganharam um espaço maior, em particular no conto “The Squaw”. Aparentemente, Stoker tomou sua decisão de escrever sobre vampirismo depois de um pesadelo na qual ele viu um vampiro se levantando do túmulo. Ele tinha referências literárias, pois tinha lido Carmilla (1872), de Sheridan Le Fanu, e o conto “The Vampyre” (1819), de John Polidori, além de tomar conhecimento de discussões sobre o sobrenatural, discussões estas comuns no final do século XIX na Inglaterra.

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Muitas características da vida de Stoker e da Inglaterra do final do século XIX foram retratadas em Drácula. Já citamos a forte presença de Henry Irving e as dificuldades de Stoker em conviver com Florence - Drácula tinha uma presença poderosa e dominava as mulheres; a presença de um grande número de estrangeiros na Inglaterra, resultado da imigração que ocorreu no período, assustava o homem inglês - não coincidentemente Drácula era estrangeiro, trazendo doenças e desgraças para a “limpa” vida inglesa; sexo e sangue são temas presentes no livro - as doenças venéreas eram o grande temor do homem inglês da época, pois tanto a gonorréia quanto a sifílis eram contraídas através de relações sexuais e contato com sangue, além de não existir cura para ambas; a ciência era fascinante na época - e o confronto entre o sobrenatural Drácula e o mundo científico de Van Helsing deu a vitória a este último.

Mas a inspiração final surgiu nas suas pesquisas sobre

Publicado em 1897,Drácula recebeu uma acolhida dividida entre a crítica da época, com alguns elogiando a obra como

um nobre do século XV que viveu na região da Transilvânia, localizada na Romênia, que impediu a penetração dos turcos na Europa, conhecido como Vlad, o Empalador (ou Vlad Tepes), pois este empalava (perfurava com uma madeira pontuda) seus inimigos. O nome Drácula foi tirado do pai deste nobre, chamado Vlad Dracul (este último termo significava diabo ou

uma poderosa peça de fascinação lúgubre e outros criticando-a pela estranheza da temática e de certa crueza na abordagem. A mãe de Stoker elogiou a obra vigorosamente, comparando-a ao livro de Mary Shelley, Frankenstein. Na época do lançamento do livro, Stoker realizou uma leitura do texto em quatro horas no Lyceum, sendo que o evento foi apresentado completo, inclusive


com anúncios, como Dracula, ou The Un-Dead, para proteger a trama e o diálogo de furto literário. Foi a única apresentação dramática de Drácula durante a vida de Stoker. Nunca mais Stoker escreveria uma obra tão importante como Drácula.Aliás, sua carreira literária entraria em decadência, apesar de ter produzido um grande número de textos na virada dos séculos XIX e XX. Um incêndio no Lyceum destruiu a maior parte do guarda-roupa, adereços e equipamentos, deixando as condições do teatro precárias. A saúde de Henry Irving, já em declínio, piorou. O teatro seria transferido para um sindicato, fechando de vez em 1902. Irving morreria em 1905. A partir daí, Stoker teria grandes dificuldades para escrever, pois sua saúde também piorara: ainda em 1905 ele teve um derrame e, em seguida, contraiu a doença de Bright, que afeta os rins. Sua saúde foi declinando cada vez mais até sua morte, em sua casa, ocorrida em 12 de abril de 1912. Florence Stoker herdou os copyrights do marido e deu permissão para o teatrólogo Hamilton Deane transformar Drácula em peça de teatro, o que daria grande fama ao texto de Stoker, precedendo seu futuro sucesso nas telas do cinema - meio este que transformou Drácula num dos mais famosos e conhecidos personagens do século XX.

Texto disponível na integra em: http://www.bocadoinferno.com/ romepeige/artigos/bram.html. Por Orivaldo Leme Biagi, Doutor em História pela UNICAMP. Acesso em 21 de junho de 2008

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Biografia de F.W. Murnau Friedrich Wihelm Plumpe, que mais tarde passaria a assinar F.W.Murnau, nasceu em Bielefeld, Alemanha, em 28 de dezembro de 1889. Estudou literatura, filosofia, música e história da arte nas universidades de Heidelberg e Berlim. Por volta de 1 910, aproximou-se do diretor teatral Max Reinhardt e colaborou em diversos filmes de propaganda durante a primeira guerra. Sua carreira como diretor de cinema teve início em 1919 com Satanas, hoje considerado perdido. O reconhecimento viria com os filmes Fantasma (1922) e Nosferatu (1922) e, principalmente, com A última gargalhada (1924), que o transformaram em celebridade na Alemanha. Convidado por William Fox para trabalhar em Hollywood, partiu para os Estados Unidos em 1926. No ano seguinte, realizou para os estúdios da Fox aquela que é considerada por muitos sua obraprima: Aurora (1927), com roteiro de Carl Mayer e cenários de Rochus Gliese. Embora o filme não tenha sido um sucesso de bilheteria, recebeu três prêmios na primeira cerimônia de premiação da Academia de Artes e Ciências de Hollywood, em

dos irmãos Robert e David Flaherty: o filme Tabu (1931), realizado no Taiti. Murnau morreu em 1931, num acidente automobilístico na Califórnia, dias antes de lançar seu último filme. Quase esquecido por muitos anos, foi reabilitado pela crítica Lotte Eisner quando esta lançou sua biografia, na década de 1960. Então, foi finalmente reconhecido como o grande mestre das paisagens poéticas, permanecendo como um dos personagens mais geniais e misteriosos do cinema alemão.

1929: melhor atriz (Janet Gaynor), melhor fotografia (Charles Rosher e Karl Struss) e melhor qualidade artística.

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Conhecido em Hollywood por seus hábitos excêntricos, Murnau ainda faria mais dois filmes para Fox, mas, após um desentendimento, lançou-se em um projeto independente ao lado

Texto retirado de: MASCARELLO, Fernando. História do cinema mundial . Campinas, SP.Editora Papirus, 2006 – p.84 - 85.


Biografia de Werner Herzog Werner Stipetic, que depois passaria a assinar Herzog, nasceu no dia 5 de setembro de 1942, em Munique, e cresceu numa granja nas montanhas da Baviera. Estudou história, literatura e teatro em Munique e Pittsburgh ( EUA) nos anos de 1960, mas interrompeu os estudos para se dedicar ao cinema, sua grande paixão. Pertenceu ao movimento do jovem cinema alemão, desde o começo, alternando filmes de ficção e documentários. Como aponta Lúcia Nagib, Herzog explorou de maneira intensa os limites entre realidade e ficção, privilegiando sempre o contato físico e sensorial com a realidade. Segundo ela, “sua capacidade narrativa depende essencialmente da possibilidade da sua experiência (...) e seus esforços se concentram na procura daquele instante mágico em que o homem vê, sente ou faz algo pela primeira vez” ( 1991, p.20), daí seu interesse em contar histórias que se passam em lugares nunca antes filmados (como a selva amazônica) e em abordar personagens como Kaspar Hauser, cujo olhar para o mundo é o de constante descoberta. Herzog também seria aclamado por Lotte Eisner nos anos 1970 como o melhor e o mais “ alemão” de sua geração, o que o levaria a retomar narrativas da cultura germânica, como se vê nos filmes Nosferatu e Woyzseck. Sua amizade com a autora deu origem ao livro Caminhando no gelo ( 1979 ), em que ele

narra sua peregrinação a Paris com o objetivo de cumprir uma promessa feita pela recuperação da saúde de Eisner, que viria a falecer poucos anos depois, aos 97 anos de idade. A partir do final da década de 1980, dedicou-se mais aos documentários a até mesmo a direção de ópera. Em 1991, dirigiu nos EUA um de seus poucos filmes de ficção no período, No coração da montanha, retomando um de seus temas prediletos: o alpinismo. Também realizou, em 1999, o documentário Meu pior inimigo, sobre sua conturbada relação com Klaus Kinski ( 1926 – 1991) – ator que estrelou alguns de seus filmes mais importantes.

Texto retirado de: MASCARELLO, Fernando. História do cinema mundial . Campinas, SP.Editora Papirus, 2006 – p.328 - 329.

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Biografia de Caspar David Friedrich Caspar David Friedrich foi um dos melhores pintores do Romantismo no Século 19 e suas belas paisagens e marinhas são não apenas uma observação meticulosa da natureza, como também representam alegorias. Friedrich nasceu em 5 de setembro de 1774 em Greifswald e estudou na Academia de Copenhague. Em 1798, instalou-se em Desden, onde se tornou membro de um circulo artístico e literário, imbuído de ideais do movimento romântico. Seus primeiros desenhos, delineados com lápis ou com sépia, exploravam motivos recorrentes em seu trabalho: praias rochosas, planícies áridas, cadeias infinitas de montanhas e árvores se agigantando em direção ao céu. Mais tarde, seu trabalho passou a refletir uma resposta emocional ao cenário real e visível.

da composição tem um significado simbólico. As montanhas são alegorias da fé; os raios de sol simbolizam o fim do mundo précristão; e os pinheiros marcam o surgimento da esperança. As cores frias mas ácidas de Friedrich, com brilhante luminosidade, e a variedade de contornos, aumentam o sentimento de melancolia, de isolamento, trazendo a sensação de impotência humana diante das forças da natureza expressas em suas pinturas. Como membro efetivo da Academia de Dresden, Friedrich acabou por influenciar muitos pintores românticos alemães que vieram após ele. Ainda que sua projeção tenha diminuído após a morte, é certo que os observadores do Século 20 permanecem fascinados com sua imaginação.

Friedrich começou a pintar óleos em 1807. Uma de suas primeira telas, A cruz nas montanhas, é bem representativa do amadurecimento de seu estilo. Nela, há um ousado rompimento com a pintura religiosa tradicional e um destaque especial para a paisagem.A figura do Cristo crucificado se reproduz em silhueta, criada pelo Pôr-do-Sol na montanha, dominando o ambiente.

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Como escreveu o próprio pintor, todos os elementos

Texto disponível na integra em: http://www.pitoresco.com.br/universal/ friedrich/friedrich.htm. Acesso em 21 de junho de 2008





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