Um Novo Olhar às CICATRIZES URBANAS: Ferrovia, Cidade & Transformações

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um novo olhar às

CICATRIZES URBANAS ferrovia, cidade & transformações



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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE ARQUITETURA E URBANISMO

um novo olhar às

CICATRIZES URBANAS ferrovia, cidade & transformações

GABRIELLA DA CUNHA TAKAUTI

Trabalho Final de Graduação apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito de conclusão do curso em Arqutietura e Urbanismo. Orientadora: Profª. Ms. Larissa Ferrer Branco

SÃO PAULO 2018



GABRIELLA DA CUNHA TAKAUTI

um novo olhar às

CICATRIZES URBANAS ferrovia, cidade & transformações

Trabalho Final de Graduação apresentado à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito de conclusão do curso em Arqutietura e Urbanismo. BANCA EXAMINADORA _____________________________________________ Profª. Ms. Larissa Ferrer Branco (orientadora) Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________ Prof. Prof. Ms. Paulo Olivato (convidado interno) Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________ Prof. Profª Dra. Yara Cristina Labronici Baiardi (convidado externo) Universidade Presbiteriana Mackenzie



ORLA FERROVIÁRIA NA REGIÃO DA BARRA FUNDA autoria própria

“A estrada de ferro corta a cidade como uma cicatriz, através de fábricas, moinhos e pátios ferroviários abandonados. Um percurso que se faz numa área esquecida, para a qual a cidade deu as costas. Viagem por um mundo em suspensão; apesar da passagem do trem, reina a mais completa imobilidade. Esses espaços estão à espera que alguma coisa aconteça. Aqui, o passado aguarda o futuro”. Nelson Brissac Peixoto

PEIXOTO, Nelson Brissac. Arte/Cidade. São Paulo, Sesc SP, 2002, p. 105



~ APRESENTAÇAO Para quem se espanta com meu encanto pelas grandes escalas não imagina que meu percurso começou no detalhe. Formada em Design de Interiores em 2010 pela ETEC Carlos de Campos, tive ali, na pequena escala, no detalhe do desenho de móveis e no Desenho Técnico Arquitetônico, o meu primeiro contato com a Arquitetura. Foi ali que me encantei pelo desenho de edifícios, pela composição de espaços e decidi que seria arquiteta. Naquele momento, a palavra “Urbanismo”, que compunha o nome do curso que eu desejava, me soava secundária e desinteressante. Mal imaginava eu que me encantaria cada vez mais pela escala da cidade, e todas as complexidades e dinâmicas que ela envolve. Iniciei o curso de Arquitetura e Urbanismo em 2013, e não foi de imediato que compreendi o abrangente e complexo universo da Arquitetura, quem dirá do Urbanismo. O início da faculdade foi um momento em que a nebulosidade do novo universo se misturava com o êxtase das novas descobertas, quando nem tudo fazia sentido, mas o desejo de compreender tudo isso me acompanhava. Mais de um ano se passou para que os nexos começassem a se fazer mais claros, junto com minha vontade cada vez maior de investigar sobre o tema Urbano. Meu interesse me levou a workshops e palestras fora da sala de aula, incluindo debates abertos sobre o Novo Plano Diretor que, ainda em 2013 estava sendo discutido, e em 2014 entraria em vigor na gestão do então prefeito Fernando Haddad. A efervescência política da época, somada aos debates urbanos que essa gestão trouxe, não só ajudou na compreensão do Urbanismo, como alimentou ainda mais o meu desejo de entender e explorar a cidade, agora compreendendo um pouco mais o papel que um arquiteto e urbanista pode ter. Poder compreender a complexidade da cidade sob a ótica do urbanismo, suas dinâmicas, seus conflitos, seus


agentes, e poder propor à ela novos desenhos e soluções se tornou uma paixão. Desde então, nunca mais larguei o Urbanismo. Ou o Urbanismo nunca mais me largou. 2015 pra mim, ano atípico em que estive longe de escritórios, foi um ano intenso em que, sedenta por conhecimento, me envolvi em inúmeras experiências extra-classe que envolviam o tema Urbano. Entre elas, tive o prazer de fazer parte do Laboratório de Projetos e Políticas Públicas (LPP), coordenado por Valter Caldana e Larissa Ferrer Branco, dos quais também tive a grande honra de tê-los como orientadores de projeto e monografia deste meu Trabalho Final de Graduação. Ali, fizemos a proposta da requalificação do eixo comercial da Rua Teodoro Sampaio, em São Paulo, propondo um novo desenho à ela, sendo o VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) um importante elemento de conexão entre dois importantes nós de transporte: as estações de metrô Faria Lima e Clínicas. Já assumidamente encantada pela escala da cidade, fui por duas vezes monitora nas disciplinas de Urbanismo. A experiência como monitora de Urbanismo V 1 me expandiu os limites do estudo urbano, me mostrando que a escala da cidade ainda é pequena perto da escala regional. Ali, compreendendo o Planejamento Urbano, estudamos o impacto que a implantação do projeto do trem rápido2 poderia causar nas cidades por onde ele passa, e as diversas leis e agentes envolvidos no processo. A monitoria em Urbanismo VI e a oportunidade de acompanhar o professor Heraldo Borges me permitiu compreender melhor o papel da Morfologia no Desenho Urbano. Enquanto a ferrovia me mostrou a dimensão da escala regional, a mesma me instigou em escala local no exercício de Projeto VII, que tinha como tema a Cidade. A desconexão do tecido urbano e os vazios gerados pela ferrovia no distrito da Lapa me inquietaram, e foram meu objeto de estudo e proposição. Foi este percurso que me trouxe o desejo de investigar o tema das ferrovias mais uma vez, sendo ela o tema escolhido para o desenvolvimento deste meu Trabalho Final de Graduação. Por sua vez, ele representou para mim a oportunidade 1  Urbanismo V: Regional (2016/2o semestre). Acompanhada pelas docentes Ms. Larissa Branco e Dra. Denise Antonucci. 2  Projeto proposto pelo governo do Estado que, no trecho estudado, ligaria São Paulo à Jundiaí.

Diagramas elaborados em Projeto VII


relação movimento e estaticidade

de transitar entre as diversas escalas que a ferrovia abrange. Chego ao final do curso ainda encantada pela complexidade da Arquitetura e do Urbanismo, que permite à nós, arquitetos em eterna formação, trabalharmos com questões sociais, culturais, políticas, ambientais, econômicas e, sobretudo, questões humanas, e aplicar nosso conhecimento a diversas escalas: do desenho do encaixe de um móvel ao estudo do impacto de um trem nas cidades por onde ele passa.



AGRADECIMENTOS aos mestres; Larissa Branco. por me acompanhar tantas vezes desde o despertar do meu interesse por urbanismo até esta etapa final. Gratidão pela confiança, entusiasmo, amizade, incentivo e inspiração. Mulher guerreira, que abraça o mundo, e abraça com amor. Valter Caldana. pelas trocas e referências enriquecedoras, e especialmente pela confiança e incentivo ao meu desejo de enfrentar a escala urbana neste trabalho final. Viviane Rubio, Paulo Olivato, Carol Maciel, Luciano Abbamonte, Heraldo Borges, Igor Guatelli, Mauro Claro, Lizete Rubano, Larissa Campagner, Rodrigo Loeb e Márcio Lupion, por terem me inspirado em algum momento do meu percurso.


Aos amigos; Lucas Dalcim. por ter revolucionado minha formação como arquiteta, urbanista e ser humano. Gratidão pela parceria, carinho e inspiração em cada pequeno ou grande momento. Aya e Ana Paula. pela amizade, leveza e alegria. Kássio Massa. Pelas prosas deliciosas, pelos croquis inspiradores, por compartilhar ideias, referências e pensamentos. André França. Pelas prosas infinitas, e infinitamente enriquecedoras. Pela parceria e pela experiência de vivenciar São Paulo a partir dos diferentes modais de transporte. Victor Hugo, Júlio Eiji e Felipe Favero. pela presença, e por compartilharem ideias e opiniões. Bruno Brito. pela companhia e energia que transmite. Rachel Lisboa. pela amizade, carinho e cuidado. Bárbara Mola e Gabriela Rodrigues. pela amizade de longa data e por me acompanharem mais uma vez nessa minha loucura. Débora Mayumi. pelo entusiasmo e grande incentivo ao meu trabalho. À família; Mãe, Pai, Giu e Tia Mia por vocês meu amor e gratidão não cabem em palavras.

À todos que de alguma forma me acompanharam e me incentivaram.



SUMÁRIO APRESENTAÇAO 7 AGRADECIMENTOS 11 INTRODUÇAO 17

PARTE I FERROVIA, CIDADE E TRANSFORMAÇÕES CAPÍTULO 1 - Ferrovia Cidade e Transformações 1.1. A ferrovia transformando as dinâmicas urbanas O Surgimento da Ferrovia  A ferrovia chega ao Brasil  Contexto Paulista: As ferrovias transformando São Paulo  1.2. As dinâmicas urbanas transformando o significado da ferrovia Contexto Internacional  Contexto Nacional   Contexto Paulista: São Paulo transformando as ferrovias.   1.3. A ferrovia como cicatriz urbana

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CAPÍTULO 2 - Como lidar com as cicatrizes urbanas? 2.1. Estratégias projetuais para a Orla Ferroviária Paulistana 2.2. Concurso Praia Ferroviária de Palermo (1º lugar) 2.3. Crossrail Place e as Docas Londrinas

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CAPÍTULO 3 - A ferrovia como cicatriz urbana na Lapa e Barra Funda 3.1. A ferrovia e o processo de transformação do território da Lapa e Barra Funda A ferrovia transformando as dinâmicas do território  As dinâmicas políticas e urbanas transformando o significado da ferrovia: as consequências no território da Lapa e Barra Funda.  3.2. Planos e Propostas para a área 3.3. Análise da situação atual

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PARTE II ENSAIO PROJETUAL CAPÍTULO 1 - Metodologia de Projeto CAPÍTULO 2 - Ensaio Projetual

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CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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GIULIANA TAKAUTI fotografia por Gabriella Takauti

~ INTRODUÇAO As cicatrizes contam histórias. São marcas deixadas na pele muitas vezes por consequência de algum acidente ou de um corte cirúrgico. A perda da integridade dos tecidos subcutâneos causam um impacto estético em quem as carrega e provoca diversas maneiras de se lidar com elas. Algumas vezes, procuram-se por cirurgias plásticas para corrigí-las, buscando uma uniformidade com o restante da pele não lesionada. Outras vezes, por carregarem histórias de superação, são assumidas em sua natureza, como motivo de orgulho e força. Outras vezes, assumem-nas, mas busca-se ressignificá-las, através, por exemplo, de tatuagens. No contexto urbano, essa história se repete. As cidades também carregam cicatrizes geradas por estruturas que contam histórias e que muitas vezes trazem um impacto ao segregar o tecido urbano. Nesse sentido, a ferrovia pode ser considerada uma cicatriz urbana. Sua estrutura linearmente rígida e inflexível desintegra a malha que compõe a cidade ao desconectar os seus lados. As maneiras de se lidar com ela são diversas. Alguns defendem enterrá-las como uma maneira de resolver o problema da segregação do tecido urbano. Mas, assim como a cirurgia plástica, enterrar a ferrovia seria uma maneira de escondê-la e, portanto, de negá-la. Também é possível assumir as ferrovias em sua natureza, como testemunho de seu importante papel histórico na formação das cidades. Ou ainda, assim como a arte da tatuagem, é possível trazer um novo olhar à elas, ressignificando-as através da arte da arquitetura e do urbanismo, potencializando sua história, sem necessariamente negá-la. Partindo desta ideia de cicatriz urbana, a intenção desta pesquisa é propor um novo olhar à ferrovia, revelando à ela um novo significado através de um experimento urbano e arquitetônico. A proposta de um novo olhar parte do conhecimento

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da história de sua relação com a cidade e as transformações ocorridas ao longo do tempo. Parte-se do pressuposto que, em um primeiro momento, a chegada das ferrovias provocou, em diferentes escalas, inúmeras transformações. Ao cumprir seu papel de transportar grandes quantidades de carga por longas distâncias, impulsionou não apenas a economia em escala nacional e regional, como também estimulou a criação e o desenvolvimento de diversas cidades ao longo de seu percurso. Em um segundo momento, com o crescimento das cidades, a chegada do automóvel e a modernização dos sistemas produtivos, a ferrovia perde sua importância, assim como as zonas industriais instaladas em sua orla passam a ser abandonadas, gerando grandes vazios urbanos englobados pela cidade em constante crescimento. Apesar de ainda ser um elemento fundamental de conexão em escala regional, em escala local, a ferrovia carrega um valor de barreira, uma vez que desconecta ambos os lados dos territórios por onde passa. A situação urbana atual ao longo da orla em diversas partes do mundo apresenta sinais de degradação e desvitalização. Em São Paulo, grandes quadras, remanescentes industriais subutilizados, muros e ruas vazias caracterizam grande parte das áreas próximas à linha férrea. Busca-se então possibilidades de intervenção urbana e arquitetônica que incorporem as estruturas existentes, a fim de ressignificar a ferrovia e suas bordas respeitando sua história. O trabalho foi organizado em duas grandes partes, sendo a primeira denominada “Ferrovia, Cidade e Transformações”, que abrange a contextualização teórica da relação cidade-ferrovia, enquanto a segunda, apresentará um ensaio projetual aplicado à orla ferroviária dos distritos da Lapa e Barra Funda, no município de São Paulo, trecho escolhido para ensaio de sua ressignificação. A Parte I está dividida em três capítulos: O primeiro, intitulado “Ferrovia, Cidade e Transformações” contextualiza o processo de transformação histórico-urbana da relação ferrovia-cidade, abordando dois momentos; no primeiro, o auge da ferrovia, sendo ela a protagonista ou elemento ativo das transformações das dinâmicas urbanas, partindo do seu surgi-

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mento na Inglaterra, no período industrial, sua chegada ao Brasil e, por fim, no Estado e cidade de São Paulo; no segundo momento, será abordado o declínio da ferrovia, sendo ela elemento passivo de transformações, no momento em ela perde seu protagonismo mediante às transformações urbanas, até a condição atual da ferrovia como cicatriz urbana. O segundo capítulo apresenta alguns exemplos de projetos que buscam possíveis respostas à pergunta: “Como lidar com as cicatrizes urbanas?”. O terceiro tem o seu foco no estudo e análise dos distritos da Lapa e Barra Funda e seu desenvolvimento em função da ferrovia, apresentando planos e propostas para a área, e uma análise da atual situação urbana do território. A Parte II - Ensaio Projetual está dividido em dois capítulos: o primeiro aborda a metodologia aplicada no desenvolvimento do projeto, fundamental à todo processo; o segundo, apresenta os desenhos da proposta de intervenção no território escolhido para o ensaio projetual. Unindo minha paixão pelas ferrovias e motivada por uma das pessoas que mais amo que, no decorrer dessa pesquisa, recebeu uma linda cicatriz como fruto de uma cirurgia, iniciou-se o projeto Pretty Scars que busca trazer um novo olhar às cicatrizes, sejam elas cicatrizes humanas ou cicatrizes urbanas. Muito além de fazer parte de seu trabalho final de graduação, este projeto é uma tentativa de empoderar àqueles que ainda não aprenderam a lidar com suas cicatrizes. Portanto, este trabalho é acompanhado por um pequeno livro anexo, que busca materializar o trabalho desenvolvido no projeto Pretty Scars, desde o momento de seu lançamento1 até o momento atual da publicação deste trabalho.

ORLA FERROVIÁRIA NA REGIÃO DA BARRA FUNDA autoria própria

1  Plataforma digital do Projeto Pretty Scars, lançada em fevereiro de 2018: <www.instagram.com/_pretty_scars>

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~ FERROVIA, CIDADE E TRANSFORMAÇOES

A ferrovia transformando o significado da cidade e a cidade transformando o significado da ferrovia.



CAPÍTULO 1 Ferrovia, Cidade e Transformações Desde seu surgimento, a relação entre ferrovia e cidade passou por diversas transformações. Neste capítulo, dividimos o estudo dessa relação em dois momentos: no primeiro, “a ferrovia transformando as dinâmicas urbanas”, quando a ferrovia teve papel protagonista na relação cidade-ferrovia, sendo um elemento ativo nas transformações de diversas cidades; em um segundo momento, “as dinâmicas urbanas transformando o significado das ferrovias”, quando, por diversos motivos políticos e econômicos ligados à dinâmica global e urbana, as ferrovias perdem seu protagonismo, sendo elementos passíveis de transformações. “(...) no Brasil, em apenas um século, as ferrovias passaram por um processo de nascimento, apogeu e decadência1. Inicialmente tidas como a imagem do progresso, foram rapidamente aceitas pela sociedade, vistas como um elemento que potencialmente auxiliaria o país a se livrar do estigma de ex-colônia e entrar no rol dos países “desenvolvidos”. Porém, analisando mais atentamente, percebemos que em um panorama mais amplo da economia mundial, o papel do Brasil, enquanto fornecedor de matéria prima e importador de produtos industrializados, permaneceu praticamente idêntico aos séculos anteriores, começando a se alterar apenas no segundo quartel do século XX” (FINGER, 2013)

1  FINGER (2013) analisa a implantação da malha férrea brasileira entre 1852 e 1957, dividindo seu estudo em quatro períodos que também retratam momentos de auge e decadência da ferrovia. São eles: 1) Empreendedorismo (1852-1873); 2) Novos incentivos e multiplicação das linhas (1873-1889); 3) Formação das grandes companhias ferroviárias (1889-1919); 4) Sucateamento e estatização (1919-1957)

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1.1. A ferrovia transformando as dinâmicas urbanas O auge da ferrovia, no momento em que ela atuou como protagonista ou elemento ativo das transformações das dinâmicas urbanas, partindo do seu surgimento na Inglaterra no contexto da Revolução Industrial, sua chegada ao Brasil e, por fim, no Estado e cidade de São Paulo.

O Surgimento da Ferrovia A Era Pré-Industrial era essencialmente rural. A cidade provinciana ainda pertencia essencialmente à sociedade e à economia do campo. O termo “urbano” incluía a multidão de pequenas cidades de província, onde o homem podia vencer, a pé e em poucos minutos, a distância entre o pequeno centro urbano e o campo. Apesar do sistema de carruagens ter se expandido consideravelmente após o final das guerras napoleônicas, o transporte de passageiros por terra ainda era pequeno e o transporte de mercadorias, também por terra, era vagaroso e caro. Para a maioria dos habitantes, o ato de viajar - exceto o ir e vir dos mercados - era absolutamente fora do comum. Se eles ou suas mercadorias se moviam por terra, isso era feito na imensa maioria das vezes a pé ou então nas baixas velocidades das carroças (HOBSBAWN, 1977). Foi então com a eclosão da Revolução Industrial que a indústria do carvão, necessitando de meios de transporte eficientes para levar grandes quantidades de carvão das minas aos pontos de embarque, estimulou a invenção da ferrovia (HOBSBAWN, 1977). Desde então, ela se transformou em um dos mais potentes símbolos da Era Industrial. Segundo o autor, nenhuma outra inovação da revolução industrial incendiou tanto a imaginação quanto a ferrovia, pois era “a única invenção que revelava para o leigo de forma tão cabal o poder e a velocidade da nova era”. Ela anunciava tempos modernos, a transformação da economia e a reorganização da sociedade com a precisão dos seus horários (MAZZOCO e SANTOS, 2005). Para GUNNING (2001), ela representava “um desmoronamento das distâncias e uma nova experiência do corpo e da percepção do ser humano, moldada pela viagem a novas velocidades e por novos e atraentes potenciais de

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perigo”. Assim, sua criação não só impactou a paisagem, como também alterou profundamente a sociedade, transformando as relações espaço-tempo e as noções de velocidade e distância. “As ferrovias foram, no século XIX, a vanguarda do capitalismo e da modernidade. Possuir ferrovias era condição para o desenvolvimento e porta de acesso ao mundo moderno. Os trens mudaram a noção de velocidade e de distância, as estações eram o centro de uma nova vida urbana e as estradas de ferro dinamizaram as localidades agrícolas e os emergentes centros industriais. Trens e ferrovias eram sinônimo de modernidade. [...]. A impressão de que estava começando uma nova era, referida por Stanley2, era decorrência também do impacto perceptivo causado pela velocidade do trem, algo completamente desconhecido na época.” (NASCIMENTO, 2003)

Para a Associação Brasileira de Preservação Ferroviária: “[o trem] marcou o início de um tempo de movimento e velocidade, em contraposição à estagnação dos costumes dos séculos anteriores. Foi um período em que alternaram-se o entusiasmo pelas novidades e o temor coletivo frente aos avanços da ciência que, aos olhos do cidadão comum, parecia inverter as leis da natureza, dando aos homens o supremo poder de controlar o tempo e interferir mais incisivamente no espaço. Alterava-se rapidamente o cotidiano das pessoas, sobretudo na Europa, então senhora do mundo.” 3

Além dessas intensas transformações, a ferrovia foi uma das principais responsáveis pela padronização universal de horários, colocando fim ao mundo do local e do particular através do chamado Fuso Horário, criado em 1894 por pressões das companhias férreas. Isso porque com a nova dinâmica econômica e a necessidade de expansão dos negócios, o fato de cada região ter seu próprio padrão de horários tornara-se incompatível com o aproveitamento econômico e nacional do sistema de circulação. Os caminhos de ferro também simbolizavam o progresso material das nações do século XIX. O crescimento das estradas de ferro intensificou a propagação de ideias e culturas. Os trilhos foram um poderoso instrumento de unidade econômica e social, linguística e cultural, bem como de propagação de ideias, crenças, 2  Edward Stanley, uma das 400.000 pessoas que foram assistir à viagem inaugural da linha ferroviária Liverpool-Manchester em 1830, narrou a impressão que teve com a ferrovia, uma das primeiras do mundo. 3  Disponível em: <http://www.abpfsp.com.br/ferrovias.htm>. Acesso em 28/11/2017.

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sentimentos e costumes. Por outro lado também, as ferrovias serviram de instrumento de colonização e dominação utilizados pelas grandes potências, servindo de elemento modernizador e civilizador, segundo os interesses dominantes. As vias férreas, portanto, também expandiram-se a serviço da hegemonia política das grandes potências e da acumulação capitalista. (BORGES, 2011) William Turner, pintor britânico e autor de Rain, Steam and Speed - The Great Western Railway, de 1844, retrata bem a atmosfera provocada pelo trem no século XIX. A pintura, grande parte dissolvida em tons de azul e amarelo, não apresenta formas muito precisas; porém, a forte presença da ferrovia é marcada pelos tons mais escuros que rasgam a tela em direção ao ponto de fuga, e pela negra chaminé do trem, única forma bem marcada pelos seus contornos. A agressividade e o impacto causado pelo trem na paisagem são muito bem transmitidos através da pintura, sendo quase possível sentir a velocidade e o som do trem vindo em nossa direção.

IMAGEM 1 Rain, Steam and Speed – The Great Western Railway (1844) - William Turner Disponível em: http://www.galleryintell.com/artex/rain-steam-and-speed-jmw-turner/. acesso em 28/11/2017

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A ferrovia chega ao Brasil Segundo FINGER (2013), as ferrovias possivelmente desempenharam o papel mais importante na transformação do território brasileiro do que qualquer outro processo ocorrido nos três séculos anteriores de colonização. Elas foram responsáveis pela ocupação e pelo desenvolvimento econômico de regiões inteiras e ajudaram a transformar os hábitos sociais e culturais dos brasileiros. Contribuíram com o desenvolvimento urbano do interior, uma vez que pelo seu sistema baseado em energia a vapor, era necessário implantar uma estação de abastecimento das composições com água e carvão, supervisão e manutenção daquele trecho da linha, a cada intervalo de aproximadamente 20 km. Assim, no entorno de cada estação, estabeleceram-se núcleos urbanos dotados de infraestrutura para abrigar os funcionários que trabalhavam no trecho. Através das linhas férreas circulavam diariamente jornais, correios e viajantes, propiciando um clima de constante renovação e novidade. As estações ferroviárias tornaram-se importantes referenciais urbanos, que atraíam para suas proximidades instalações comerciais e hotéis para viajantes. (FINGER, 2013)

Contexto Paulista: As ferrovias transformando São Paulo Enquanto no contexto nacional a implantação das ferrovias visava a maior integração territorial, no Estado de São Paulo sua implantação deu-se por razões de ordem econômica. Com a queda do comércio açucareiro em 1805, as plantações de cana-de-açúcar do Vale do Paraíba passaram a ser substituídas por cafezais. O aumento do comércio internacional de café e a prosperidade das cidades valeparaibanas incentivaram a expansão das lavouras em direção ao Oeste Paulista, de solo fértil e adequado à sua cultura, fazendo com que em poucas décadas São Paulo se tornasse o maior produtor mundial de café. A crescente importância do produto para a economia do Estado e até mesmo do país, fez com que extensas áreas de florestas fossem derrubadas para a implantação de novas áreas de cultivo. Com essas áreas instaladas cada vez mais distantes do litoral, o sistema de transporte em lombo de mulas não mais atendia às necessidades. Era necessário escoar gran-

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IMAGEM 2 A Expansão das estradas de ferro e o café paulista Disponível em: http://slideplayer.com.br/ slide/365389/ Acesso em: 30/11/2017

des quantidades de café das fazendas até o porto de Santos, em tempo reduzido. Em 1855, em discurso de defesa à construção de ferrovias em São Paulo, o presidente da província, José Antônio Saraiva, enumerou as vantagens de sua implantação: “O desenvolvimento do comércio de Santos, o desenvolvimento do trabalho livre e da colonização espontânea, a redução dos preços do transporte a uma terça parte do que se paga atualmente, o melhoramento dos processos industriais, o aumento do valor das terras, a cessação das despesas públicas com a estrada que tem que ser substituída pela linha férrea, a influência da facilidade das comunicações sobre o estado moral e político da província, a criação do espírito de empresa” (MAZZOCO e SANTOS, 2005) Assim, com financiamento do capital inglês e com incentivos do governo imperial, a partir de 1867, o café começa a ser transportado pelos trilhos da primeira ferrovia paulista: a São Paulo Railway, que ligava Jundiaí até o porto de Santos. Pelos seus trilhos chegaram a escoar cerca de 70% dos produtos brasileiros destinados à exportação, porcentagem representada pelo café (Ibidem). O momento de sua inauguração marca uma significativa transformação e aceleração no ritmo

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de desenvolvimento da província de São Paulo, que passa a receber uma grande quantidade de imigrantes europeus, novos produtos, novas tecnologias e novas ideias. A SPR foi o ponto de partida para a implantação da extensa malha ferroviária de São Paulo. Guiada segundo os interesses dos produtores, sem um planejamento global, um grande número de ramais e pequenas ferrovias completava a rede, ligando direta ou indiretamente as fazendas para o terminal de Jundiaí, centro de dispersão de tropas e caminhos (Ibidem). A implantação dessas linhas férreas fixou povoamentos e desenvolveu regiões. Algumas vezes, a chegada dos trilhos precedeu a abertura de fazendas e a criação de povoamentos. Outras, houve sincronismo entre o avanço das estradas de ferro e a instalação de povoamentos (Ibidem). Durante 90 anos, foi concedido à São Paulo Railway o direito exclusivo de exploração da linha Santos-Jundiaí, garantindo sua condição de maior empresa ferroviária do Brasil, sendo também a mais rentável da América do Sul, e considerada uma das maiores do mundo em densidade de tráfego, apesar de sua pequena extensão. Apenas dois anos após sua inauguração, a companhia já superava todas as expectativas ao transportar quase 70 mil passageiros e mais de 78 mil toneladas de carga. Após o prazo de concessão a empresa foi nacionalizada, passando a se chamar Estrada de Ferro Santos Jundiaí, posteriormente integrada à Rede Ferroviária Federal S.A. A primeira companhia a quebrar o monopólio da SPR foi a Companhia Sorocabana, ao estabelecer a ligação com o litoral sul de São Paulo, em 1938. (Ibidem) Na passagem do século XIX para o século XX, São Paulo já contava com quase 2,3 milhões de habitantes, mais de meio milhão de pés de café e mais de 3350 quilômetros de ferrovias. (Ibidem) Na capital de São Paulo, os trilhos da SPR cruzavam a cidade de leste à oeste, percorrendo as várzeas e outros terrenos planos. A cidade tornou-se um importante nó de estrada de ferro, beneficiando sobretudo seu comércio. Segundo LEITE (2002), a ferrovia foi um instrumento viabilizador da economia industrial paulistana, e seu desenvolvimento determinou definitivamente a estruturação metropolitana. A partir da década de 1870, houve um notável impulso no desenvolvimento da

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IMAGEM 3 Mapa da Província de São Paulo, 1886 Disponível em: <http://www.sp-turismo.com/mapas-historicos/seculo-xix.htm>. Acesso em 15/03/2018.

cidade, sendo considerada pelo historiador Eurípedes Simões de Paula (1954) como “a segunda fundação de São Paulo, por conta dos grandes investimentos em obras de infra-estrutura básica e viária.” Nessa mesma época, fazendeiros e capitalistas começaram a ganhar dinheiro com a exploração do café e passam a construir domicílios temporários e residências na cidade. Por instalarem-se em áreas de várzea, consideradas de menor interesse às ocupações pelos portugueses, os terrenos próximos aos trilhos eram baratos e atraíram a instalação de grandes indústrias, galpões e armazéns, funções menos nobres das quais a cidade urbanizada não queria conviver. Assim, a orla ferroviária paulistana foi renegada pela cidade, assim como seus rios. Porém, foi justamente essa instalação voltada às indústrias que promoveu o desenvolvimento de bairros como a Lapa, Campos Elíseos, Luz, Brás e Mooca, e impulsionou a riqueza da metrópole na segunda metade do século XX (LEITE, 2002).

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1.2. As dinâmicas urbanas transformando o significado da ferrovia O declínio da ferrovia como elemento passivo de transformações, no momento em ela perde seu protagonismo diante às transormações urbanas, até a condição atual da ferrovia como cicatriz urbana.

Contexto Internacional Depois da Segunda Guerra Mundial, o transporte ferroviário entrou em declínio em diversos países industrializados, provocando a desativação de parte significativa de linhas ferroviárias e o abandono de inúmeras estações. Isso se deve à concorrência da ferrovia com o transporte rodoviário e aéreo como meio de transporte mais rápido e eficiente. (KÜHL,1998). Mesmo provocando menores prejuízos à natureza e à paisagem, as ferrovias, antes principais responsáveis pelo transporte de cargas, passaram a ser substituídas pelas estradas de rodagem e por veículos motorizados. A desativação das ferrovias geralmente persiste por elas não serem consideradas economicamente rentáveis. (Ibidem) Este fato aconteceu com a Grã-Bretanha, que possui um enorme patrimônio ferroviário e é rica em exemplos de linhas abandonadas. Entre 1963 e 1976, mais de 3.500 estações da British Rail foram fechadas ao tráfego. O mesmo aconteceu na França, que teve 300 quilômetros de linhas ferroviárias desativadas a partir de 1960. Nos Estados Unidos, aproximadamente metade das 40.000 estações construídas desde o século XIX subsistem, e grande parte delas encontra-se sem uso. Nos países ocidentais, o mesmo fenômeno pode ser observado. (Ibidem)

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Contexto Nacional As ferrovias passaram a representar uma imagem de decadência apenas cem anos após a construção da primeira linha, em 1867. Isso aconteceu por uma série de fatores nacionais e internacionais que alteraram os fluxos de importação e exportação do país, afetando diretamente as atividades ligadas à circulação de matéria prima pelas linhas ferroviárias. A crise europeia decorrente da I Guerra Mundial (1914-1918) foi um dos fatores que impactaram as exportações dos produtos primários brasileiros, tendo efeito direto sobre a rentabilidade das ferrovias construídas em função do transporte dessa produção, levando muitas à falência (FINGER, 2013) Até o momento, apenas a Região Sudeste não foi afetada por essa crise, uma vez que o principal consumidor do café produzido nessa região eram os Estados Unidos, nação que saíra da Guerra como a mais poderosa do mundo. Porém, em 1929, a Grande Depressão Econômica que afetou diretamente o comércio internacional, atingiu também a produção cafeeira a partir de 1930. Assim, não sendo possível obter créditos no exterior para continuar adquirindo o excedente da produção cafeeira, a solução encontrada foi diminuir a produção, significando o abandono de parte das plantações. A crise internacional e o endividamento do governo para tentar salvar a economia cafeeira contribuíram para o enfraquecimento do poder dos cafeicultores do Sudeste. Além disso, o golpe político de 19304 pôs fim à chamada “República Velha”, marcada pela “Política do Café com Leite”, pondo fim também à influência dos cafeicultores no cenário político e econômico nacional. Getúlio Vargas, presidente que tomou posse após o golpe, procurou implantar um programa de desenvolvimento no país com foco na industrialização, fato que trouxe um novo destino às ferrovias da Região Sudeste. As ferrovias paulistas, em combinação com fatores como a disponibilidade de mão de obra e capital proveniente da antiga produção cafeeira, serviam à política de industrialização como infraestrutura de transporte: 4  O Golpe de 1930 foi um Golpe de Estado que derrubou o presidente da república Washington Luís e impediu a posse do presidente paulista eleito Júlio Prestes, colocando o gaúcho Getúlio Vargas no poder.

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“Com a diminuição no transporte do café, assim como vinha acontecendo no restante do país, muitas linhas e ramais que conectavam regiões cafeeiras e serviam quase que exclusivamente ao transporte daquela produção foram consideradas “antieconômicas” e começaram a ser desativadas. A malha férrea começou então a ser reorganizada de forma a privilegiar a produção industrial e o abastecimento do mercado interno – e não mais os portos de exportação.” (FINGER, 2013)

A aproximação entre Brasil e Estados Unidos devido às exportações de café contribuíram para que o Brasil fosse influenciado pela expansão da indústria automobilística americana, levando o país a importar os primeiros automóveis e a investir em infraestrutura rodoviária. A política de investimentos no setor rodoviário inicia-se com o governo de Washington Luís (1926-1930), que tinha como slogan “governar é abrir estradas”. Já durante o Estado Novo, com o progressivo destaque ao sistema rodoviário, foi criado o Departamento Nacional de Estradas de Rodagem - DNER, que recebia verbas cada vez mais expressivas, enquanto diminuíam os investimentos em ferrovias. “(...) era perceptível a priorização dos investimentos em estradas de rodagem por parte do Governo, que nos dez anos seguintes à criação da RFFSA teriam crescido 136%, enquanto em ferrovias apenas 5%. Além disso, a desvinculação entre o traçado das linhas e os novos pólos econômicos, a pluralidade de bitolas e do material rodante, as tarifas obsoletas, entre outros aspectos, contribuíram para a gradual decadência do sistema ferroviário. Diversas linhas e ramais, considerados “antieconômicos”, foram sendo progressivamente desativados e substituídos por rodovias” (FINGER, 2013)

Com a falta de investimentos nas ferrovias, diversas linhas foram desativadas, deixando regiões inteiras sem um sistema de comunicação confiável, agravando a crise produtiva e contribuindo para a crise econômica. Grandes áreas e edificações voltadas ao uso ferroviário foram abandonadas, “passando de focos de atração para elementos de incômodo político e social” (FINGER, 2013).

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Contexto Paulista: São Paulo transformando as ferrovias. Após o declínio industrial, o território metropolitano paulista sofreu enormes transformações, marcadas por abandonos e desperdícios urbanos. A cidade pós-industrial atualmente comporta zonas industriais subutilizadas, armazéns e depósitos industriais desocupados, edifícios abandonados, corredores e pátios ferroviários e industriais desativados. O declínio industrial provocou o esvaziamento de enormes áreas urbanas. (LEITE, 2002) Em meio à uma era de aceleradas transformações, a metrópole materializa em seu território fragmentado os pontos de ruptura e de falta de urbanidade. Espaços desqualificados, terrenos vagos, resíduos de antigas áreas produtivas emergem nas cidades como consequência das rápidas transformações da metrópole pós-industrial. “Transformam-se funções, usos e espaços de modo dinâmico e inusitado. Reciclam-se espaços de uso aparentemente consagrado. O perene dá lugar ao passageiro. Imensos ambientes historicamente configurados perdem as suas funções. Centros históricos ficam esvaziados. Territórios industriais percebem-se, repentinamente, desqualificados. Bairros inteiros são objeto de especulação à transformação. Espaços esquecidos recebem impulsos de desenvolvimento imobiliário. Áreas residenciais luxuosas emergem em meio a antigas periferias desvalorizadas como ilhas fechadas em meio à total falta de urbanidade. Surgem anticidades em meio ao território metropolitano. Ambientes sob proteção ambiental são ocupados e reurbanizados: a cidade ilegal se sobrepõe à cidade legal. A legislação urbana é obrigada a correr atrás da realidade ilegal.” (LEITE, 2002)

Com as transformações da cidade industrial para a metrópole pós-industrial, a ferrovia também sofreu grande depreciação ao perder seu protagonismo como principal meio de transporte das indústrias, carente de incentivos como meio de transporte público eficiente: Com o esvaziamento da ocupação industrial, a ferrovia perdeu muito de sua função. A falta de incentivo claro à malha ferroviária paulistana, enquanto sistema de transporte público eficiente e integrado ao sistema do metrô, corroborou decisivamente para esse esvaziamento de importância. Sua decadência nas últimas décadas representa também a desqualificação espacial de suas bordas. Tem-se então um território fragmentado e descaracterizado. As estruturas que definiram a sua ocupação e consolidação hoje representam a sua obsolescência: os terrenos vagos. (LEITE, 2002)

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1.3. A ferrovia como cicatriz urbana A ferrovia como cicatriz urbana é entendida a partir do momento em que as transformações da cidade alteraram o papel protagonista da ferrovia como indutora de transformações, fazendo com que ela passasse a ser vista como uma barreira capaz de segregar o tecido urbano em contínua expansão. Enquanto em escala regional a ferrovia cumpre seu papel de conectar longas distâncias, em escala local, ela se caracteriza como um limite ou fronteira. Apesar de sua grande importância histórica na construção e desenvolvimento de diversas cidades, a estrutura linearmente rígida e inflexível da ferrovia gera impacto ao desconectar o tecido urbano. Nos casos em que a ferrovia deu suporte ao desenvolvimento industrial, soma-se a este impacto os grandes vazios e áreas subutilizadas que o declínio deste uso gerou em sua orla, compondo à esta estrutura o que Jane Jacobs chama de “zona de fronteira deserta”5 Segundo JACOBS (1961), as linhas férreas são um exemplo clássico de fronteira, significando algumas vezes também fronteiras sociais: “do outro lado da linha do trem”. Para ela, as fronteiras geram influências físicas e funcionais sobre sua vizinhança urbana imediata, podendo o distrito que fica em um dos lados dela se dar melhor que o distrito que fica do outro lado. Kevin Lynch também trata da definição de “limites” como sendo interrupções lineares ou fronteiras entre duas partes, que geralmente não são usados nem considerados pelos habitantes como vias. Segundo ele, esses limites podem ser barreiras mais ou menos penetráveis que mantém uma região isolada das outras. Neste subcapítulo, fruto de uma ‘deriva virtual’6 por linhas férreas no mundo, serão apresentadas imagens de alguns trechos onde a ferrovia, destacada em vermelho, nitidamente se faz presente como um elemento de limite ou fronteira, gerando situações diferentes entre o tecido urbano de um lado e do outro da linha. 5  Usos únicos e de grandes proporções que geralmente criam bairros decadentes. (JACOBS, 1961, p. 285) 6  À deriva: Sem rumo certo, ao sabor dos acontecimentos (Disponível em <www.dicio.com.br/deriva>). A deriva virtual foi feita através de um despretensioso “sobrevoo” pelas ferrovias do mundo, através do Google Earth e foi feita especialmente nos países que foram citados ao longo da pesquisa, onde a ferrovia provocou e sofreu transformações ao longo do tempo.

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IMAGEM 4 Mapa da “Deriva Virtual” Elaborado pela autora.


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Moscavide, Portugal fonte: Google Earth


Lisboa, Portugal fonte: Google Earth

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Paris Franรงa

fonte: Google Earth


Buenos Aires, Argentina fonte: Google Earth

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Moinho, SĂŁo Paulo fonte: Google Earth


Ipiranga, SĂŁo Paulo fonte: Google Earth

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CAPÍTULO 2 Como lidar com as cicatrizes urbanas? Como respostas à questão da ferrovia como cicatriz urbana, diversas maneiras de se lidar com ela são debatidas e propostas em projetos urbanos mundo afora. Algumas vezes defende-se enterrá-las como uma maneira de resolver o problema da segregação do tecido urbano. Porém, ao transportar toda a estrutura ferroviária ao subterrâneo, além de ser uma solução custosa e simplista, nega-se também a presença da ferrovia como forte testemunho histórico da cidade. Além disso, perde-se também a experiência urbana de se apreciar a paisagem ao longo do percurso, substituindo-o pelo percurso alienado de se locomover pela cidade subterraneamente. Mas existem também propostas que assumem a ferrovia como parte integrante da malha urbana, e buscam ressignificar sua orla e recompor o tecido através do desenho urbano e arquitetônico. Essa solução, além de enfrentar o desafio de se lidar com ela em sua natureza, permite que se aprecie a paisagem da cidade ao longo do percurso do trem que, com um novo desenho mescla uma nova paisagem composta dos edifícios históricos e dos novos edifícios. De forma geral, foram consideradas para esse estudo projetual três possíveis ações: esconder/enterrar: transportar a estrutura ferroviária ao subsolo; assumir: assumir as ferrovias em nível, ou seja, da maneira como originalmente ela foi implantada; ressignificar: assumir e incorporar a ferrovia como parte integrante e indutora de um novo desenho urbano e arquitetônico, trazendo à ela e à suas bordas, um novo significado. Em seguida serão mostradas algumas propostas de como se lidar com as cicatrizes urbanas através da terceira possibilidade de ação: ressignificando-as através da arquitetura e urbanismo.

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2.1. Estratégias projetuais para a Orla Ferroviária Paulistana Diante da diversidade de soluções e abordagens ao tema das ferrovias, optou se por iluminar algumas possibilidades de se intervir na orla ferroviária a partir da metodologia apresentada por Carlos Leite em seu projeto-tese de doutorado. A partir dela, o autor discute a fragmentação, o retalhamento, a desarticulação, os terrenos vagos, a fluidez e a rede de fluxos presentes na complexidade deste território metropolitano frente às suas transformações no contexto pós-industrial. Para ele, as “fraturas urbanas” oferecem uma nova possibilidade de projeto, onde as áreas residuais (terrenos vagos) podem articular novas territorialidades, sendo instrumento potencial para a construção do novo espaço público. Contrário à ideia modernista de tábula rasa, onde as renovações urbanas aconteciam de maneira impositiva, ele defende a intervenção na cidade existente, sem negá-la, partindo da aplicação de um urbanismo dinâmico, adequado às demandas das transformações presentes na metrópole contemporânea. Para isso, ele define um trecho da antiga linha férrea Santos-Jundiaí, do Moínho Central (Barra Funda) à Estação Mooca como território de estudo e ensaio projetual, e estabelece uma estratégia urbanística que prepara as condições para a construção do território, de forma que ele receba diversos programas urbanos e arquitetônicos, sem a necessidade de definir formas arquitetônicas finais.

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Sua estratégia parte de quatro matrizes: 1) Infraestruturas: • Reutilização de infra-estruturas e estruturas urbanas históricas presentes no território • A modernização do sistema ferroviário e sua transformação em metrô de superfície • Modernização das estações existentes e criação de novas estações; • Reativação do patrimônio existente (edifícios históricos, galpões e moinhos permanecem como testemunhos históricos da memória do território e devem receber programas e usos atuais) • Recapacitação da área industrial em processo de reconversão por uma nova indústria de base tecnológica e unidades produtivas do tipo dos “clusters industriais” • Recuperação do rio Tamanduateí e a sua utilização como meio de transporte de curta distância para cargas e lixo. 2) Fluxos: • Combinação de projetos para o sistema de transportes: viário, de pedestres e coletivo, que resultem na otimização dos fluxos no eixo metropolitano; • Incentivo à intermodalidade entre os modos de transportes [rodo-metro-ferroviário]; • Maior acessibilidade para o território [transposição transversal da ferrovia]; • Continuidade do tecido urbano, permitindo a existência de uma rede de fluxos contínua do novo território com as suas bordas existentes e pré-configuradas; • Criação de uma “linha inteligente” enterrada [fibras óticas e canais de fluxos informacionais] junto à linha férrea que possibilite o desenvolvimento dos novos programas, principalmente da nova indústria metropolitana.

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3) O eixo verde: • Eixo verde junto à ferrovia (um parque linear metropolitano), cuja imagem final constitua um gradiente verde que varie de densidade do corpo florestal central, para a sua diluição nos territórios urbanizados. • Conjunto de parques urbanos articulado ao parque linear, em pontos que se apropriam dos vazios mais significativos e articula-se aos equipamentos já existentes na área lindeira. • Presença da água sempre que possível. • Captação das águas pluviais através de linhas, faixas e grandes espelhos d’água, contenção do fluxo de águas fluviais e alternativa aos atuais “piscinões” subterrâneos 4) Bordas urbanas: • Consolidação da Orla Ferroviária como integradora de atividades prioritariamente públicas – aos territórios lindeiros, as bordas urbanas. • Implementação de habitação coletiva de interesse social nas franjas urbanas e junto ao parque linear. • Tipologias habitacionais variáveis e flexíveis. • Desenvolvimento de lâminas habitacionais de densidade média e grande altura, justificando a sua implantação junto ao parque linear: 1.298.500 m2 de área construída; 23.084 unidades; 67.810 moradores; densidade demográfica: 589 hab./ha. IMAGEM 4 : Ilustração da proposta do projeto vencedor Praia Ferroviária de Palermo Disponível em <https://www.archdaily.com.br/br/01122061/primeiro-lugar-no-concurso-praia-ferroviaria-de-palermo?ad_medium=gallery>. Acesso em 28/11/2017

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2.2 - Concurso Praia Ferroviรกria de Palermo (1ยบ lugar) Concurso: Playa Ferroviaria Palermo (Argentina) Arquitetos: Mario Boscoboinik, Jorge Iribarne Colaboradores: Juliรกn Santarsiero, Pablo Vrecic y Javier Herrera Ano: 2013

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O projeto vencedor do Concurso Nacional para o Desenvolvimento do Master Plan - Praia Ferroviária de Palermo propôs a requalificação da orla ferroviária a partir de algumas premissas: a) Criar um espaço público unificado predominantemente verde, com bordas definidas materializadas por ruas. O desenho deve incorporar novas atividades, boas condições de iluminação e segurança. b) Integrar as novas construções à cidade existente, respeitando a escala do bairro através de um gabarito condizente com as construções mais antigas. c) Propor alternativas de parcelamento que permitam seu desenvolvimento por diferentes agentes construtores da cidade d) Incrementar o espaço público ao destinar uma superfície menor às parcelas edificáveis à exigida ao Código de Planejamento Urbano, mas respeitando o volume de construção exigido. A proposta também contou com o desenho de tipologias de quadra, para as quais definiram-se a altura da edificação, a área construída, recuos, usos e parcelamento.

IMAGEM 5 Perspectiva Geral da proposta do projeto vencedor Praia Ferroviária de Palermo Disponível em <https://www. archdaily.com.br/br/01-122061/ primeiro-lugar-no-concurso-praia-ferroviaria-de-palermo?ad_medium=gallery>. Acesso em 28/11/2017

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2.3 - Crossrail Place e as Docas Londrinas Escritório: Foster + Partners​ Ano: 2008-2015​ Localização: Londres, United Kingdom ​ Área: 34.837 m²​ IMAGEM 6 Crossrail Place Disponível em <https://www. standard.co.uk/news/transport/ elizabeth-line-stunning-aerial-images-show-new-stations-taking-shape-across-london-a3451056.html>. acesso em 10/04/2018

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Apesar de não se tratar da ressignificação de uma orla ferroviária, a semelhança entre o contexto do projeto do Crossrail Place e o contexto pós-industrial que envolve as orlas ferroviárias é de grande significância para a abordagem da pesquisa, demonstrando um interessante caso de intervenção arquitetônica como potencializadora de áreas degradadas onde antes aconteciam intensa atividade econômica. O projeto realizado em 2015 localiza-se na Canary Wharf Crossrail Station, que faz parte de um grande projeto de infraestrutura na Europa que conectará Londres de leste à oeste. O edifício situa-se nas águas das docas norte de Londres, entre o bairro residencial de Poplar e a zona empresarial de Canary Wharf, servindo como uma ponte de uso misto que conecta as duas áreas.

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Em uma situação urbana semelhante à causada pela desindustrialização paulistana, as seculares áreas portuárias das grandes cidades europeias se deterioraram nos anos 60 e 70, processo induzido especialmente pela transformação do modal de transporte de carga marítima, ocorrendo um lento esvaziamento das áreas mais inapropriadas as novas modalidades de carga (GUERRA, 2005). A nova realidade de degradação e abandono trouxe a tona uma nova realidade negligenciada durante o período de apogeu das atividades portuárias. Assim como as ferrovias paulistanas, os rios e baías, que durante séculos abrigaram atividades di-

IMAGEM 7 Localização do projeto Crossrail Place Fonte: Google Earth. Edições pela autora.


nâmicas que geravam substancial parte das riquezas locais e muitas vezes nacionais, uma vez abandonados pelas atividades portuárias tradicionais, converteram-se rapidamente em verdadeiros “muros”, que dividiam as cidades em partes diferentes e estranhas entre si (GUERRA, 2005). As zonas portuárias abandonadas e/ou obsoletas no mundo inteiro tornaram-se peças desconectadas da malha urbana. Para enfrentar o problema e superar o isolamento, projetos de infraestrutura urbanística como pontes, túneis, passarelas, avenidas e metrôs foram implantados, gerando uma nova territorialidade e ressignificando essas antigas áreas portuárias obsoletas. “Com o Crossrail, um dos objetivos do novo jardim no telhado é conectar Londres de leste a oeste, fornecendo um espaço público acolhedor entre o bairro residencial de Poplar e a zona empresarial de Canary Wharf, demonstrando o papel da infra-estrutura como a ‘cola urbana’ que liga a cidade.” – FOSTER7

IMAGEM 8 Corte Perspectivado Crossrail Place Disponível em <https://www.themanufacturer.com/articles/crossrails-whole-life-has-a-common-language/ canary-wharf-crossrail-station-creating-spaces-leading-regeneration-and-boosting-economy>. acesso em 10/04/2018

7  disponível em: <https://www.dezeen.com/2015/04/30/foster-partners-crossrail-place-london-roof-garden-leisure-complex-canary-wharf/> acesso em 20/05/2018

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CAPÍTULO 3 - A ferrovia como cicatriz urbana na Lapa e Barra Funda O trecho da orla ferroviária Lapa-Barra Funda localizado na zona oeste da cidade de São Paulo foi selecionado para a investigação da relação ferrovia-cidade, partindo da análise das transformações decorrentes desde o momento de sua implantação até os dias atuais. A área coincide com o ponto de encontro de duas linhas ferroviárias de grande peso histórico para o Estado e para a cidade: as antigas São Paulo Railway (atual linha 7 da CPTM8, margeando a porção norte) e Sorocabana (atual linha 8 da mesma companhia, margeando a porção sul), que seguem paralelamente até a região da Luz, rasgando o tecido urbano de leste a oeste. Ao norte da ferrovia, o Rio Tietê também corta a área no mesmo sentido e atualmente abriga em suas marginais largas vias expressas.

IMAGEM 9 Localização da área de estudo em relação à malha ferroviária da Região Metropolitana de São Paulo. Disponível em: Google Earth. Edições pela autora.

8  Companhia Paulista de Trens Metropolitanos

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Ao sul das ferrovias a ocupação urbana encontra-se bastante consolidada, e une-se ao restante da cidade, onde a dinâmica urbana se faz presente e intensa, apresentando uma grande diversidade de usos e tipologias. Ao norte, delimitada pelo Rio Tietê, a ocupação é feita por grandes quadras, antigos galpões e extensas áreas vazias e subutilizadas. Neste trecho, grande parte das ruas encontram-se vazias, sem uma ativa vida urbana.

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IMAGEM 10 Trecho Lapa-Barra Funda e as duas linhas ferroviárias. Disponível em: Google Earth. Imagem editada pela autora.


IMAGEM 11 Mapa da Cidade de São Paulo em 1905 Disponível em: <http://smul.prefeitura.sp.gov. br/historico_demografico/img/ mapas/1905.jpg> acesso em 30/03/2018

Atualmente, mesmo com as contrastantes ocupações entre a porção norte e sul, as ferrovias que cortam o trecho encontram-se englobadas pela metrópole. Mas ainda no início do século XX a área ainda não pertencia ao núcleo urbano consolidado, sendo a ferrovia “uma primeira tentativa de conquistar esse território através da infraestrutura” (BARBOSA, 2016) Para poder compreender sua atual configuração analisou-se o processo de formação urbana desta área e a influência - direta ou indireta - da ferrovia no seu desenvolvimento.

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3.1. A ferrovia e o processo de transformação do território da Lapa e Barra Funda A ferrovia transformando as dinâmicas do território Construída no limite da várzea do Rio Tietê, a ferrovia e o rio tiveram, direta ou indiretamente, grande influência no processo de ocupação urbana na porção norte do eixo ferroviário, trazendo até hoje características que a diferem da ocupação e desenvolvimento urbano da porção sul. Segundo BARBOSA (2016), a ferrovia foi o primeiro elemento infraestrutural a repousar na área onde antes fora domínio exclusivo do rio e, junto ao seu legado industrial do final do século XIX e início do século XX, representam os únicos elementos que ainda permanecem da primeira onda de desenvolvimento da área. Originalmente, os sinuosos meandros do Rio Tietê compunham a característica natural da área, formando zonas inundáveis compostas por lagoas e ilhas fluviais. Essas áreas coincidiam com o local de passagem para outras vilas, como a Freguesia do Ó, localizada a noroeste da vila de São Paulo, e com as rotas bandeirantes que partiam para o interior do país. As primeiras ocupações da área datam ainda do século XVIII, quando estabeleceram-se sítios e chácaras de pequena produção agrícola. Naquele momento, a região da Lapa passa a ser um importante local de passagem para o escoamento da produção de cana de açúcar que vinha do interior paulista. A construção da ferrovia no limite da várzea entra em um segundo momento de conquista desse território. A inauguração da Estrada de Ferro Santos Jundiaí em 1867 intensificou e orientou a incipiente ocupação da planície, ancorando as atividades e transformando a paisagem natural, “criando uma barreira artificial para o desenvolvimento urbano da área, dando origem a uma paisagem urbana dividida na cidade” (MARCHI, 2008 apud BARBOSA, 2016).

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IMAGEM 12 Trecho Lapa - Barra Funda em 1905 Disponível em: <http://smul.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/img/mapas/1905. jpg> acesso em 30/03/2018. edições pela autora.

IMAGEM 13 Trecho Lapa - Barra Funda em 1916 Disponível em: <https://pt.map-of-sao-paulo.com/ mapas-da-cidade/ex-s%C3%A3opaulo,-1916-mapa> acesso em 30/03/2018. edições pela autora.

IMAGEM 14 Trecho Lapa - Barra Funda em 1924 Disponível em: <http://lapaquarta.blogspot.com/p/ blog-page.html> acesso em 30/03/2018. edições pela autora.

IMAGEM 15 Trecho Lapa - Barra Funda em 1930 (SARA) Disponível em: <http://geosampa.prefeitura.sp.gov. br.aspx> acesso em 30/03/2018. edições pela autora.

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A Estação Água Branca, uma das primeiras estações da SPR inaugurada ainda em 1867, foi implantada no ponto de convergência entre as estradas para as vilas de Nossa Senhora do Ó (pela antiga Estrada Santa Marina), Butantã (atual bairro de Pinheiros) e o caminho para o interior Paulista. Nesta região, devido à qualidade do barro junto às margens do Rio, instalaram-se uma série de olarias (AUGUSTO e MENDES, 2005) como a Vidraria Santa Marina, instalada em 1892, formando um pequeno fragmento urbano próximo à estação (BARBOSA, 2016). Na região da Lapa havia um pequeno rancho que atendia os tropeiros que utilizavam a ponte do sítio do Cel. Anastácio, fazendo com que os trens obedecessem uma parada não oficial próximo à esta ponte, denominada “Parada do Anastácio”. Mais tarde, graças às extensas áreas planas desocupadas e à disponibilidade de água proveniente do Rio, essa mesma região serviu de alternativa para a instalação de oficinas de manutenção ferroviária, suprindo a insuficiência das oficinas instaladas na região da Mooca e Brás. (AUGUSTO e MENDES, 2005). Naquela época já notava-se a influência da ferrovia como limite, trazendo um desenvolvimento e ocupação diferentes entre a porção norte e a porção sul. Na Lapa, a parte norte era popularmente conhecida como “Lapa de Baixo” e a parte sul conhecida como “Lapa de Cima”, sendo esta última mais procurada tanto para moradias quanto para o comércio (Ibidem), característica ainda notável nos dias atuais. Em 1884, a estação Barra Funda foi construída, colaborando para a ocupação das áreas ao norte da ferrovia. Inicialmente ocupada por antigos escravos libertos do regime escravista a partir de 1888, o assentamento evoluiu para um bairro que até hoje preserva no nome das ruas, características físicas do território original Rua da Várzea, Rua do Bosque - “demonstrando uma forte relação entre a primeira urbanização e as estruturas da paisagem” (BARBOSA, 2016). Em 1891, o bairro da Lapa foi oficialmente loteado, nomeado “Grão Burgo da Lapa”. Oito anos mais tarde, em 1899, foi inaugurada a estação da Lapa, colaborando para o desenvolvimento do bairro a norte da ferrovia, cujo largo da estação passa a ser um importante ponto comercial. Nesta região da Lapa de Baixo assentaram-se os trabalhadores de baixo escalão da ferrovia, que criaram sindicatos e atividades comerciais para atendê-los. (AUGUSTO e MENDES, 2005)

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IMAGEM 16 Loteamento Grão Burgo da Lapa Disponível em: <http://www.saopauloantiga.com.br/ grao-burgo-da-lapa/> acesso em 30/03/2018.


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Com o estabelecimento da ferrovia, as áreas inundáveis foram consideradas espaços secundários, propícios à instalação de indústrias e outras funções indesejadas que não se encaixavam nos espaços primários, caracterizando espaços urbanos periféricos, “fora da cidade”. (BARBOSA, 2016). LANGENBÜCH (1971) reforça esse fato com o que ele chama de “trinômio ferrovia - terrenos grandes e planos rejeitados pela ocupação residencial - curso fluvial”. Por não serem atrativas ao mercado imobiliário, essas áreas tornaram-se convidativas para a industrialização. Fábricas instalaram-se em eixos de transporte estruturantes que se direcionavam às principais estações de trem da área, como a Avenida Santa Marina (levando à Estação Água Branca), e a Avenida Thomas Edson (que levava à Estação Barra Funda (BARBOSA, 2016), eixos ainda presentes na atual configuração do território. Diferente da porção sul da ferrovia, que gradativamente intensificava sua ocupação unindo-se ao restante da cidade, a porção norte permaneceu com uma ocupação incipiente até a década de 1930 - apesar de outras áreas da várzea terem sido ocupadas intensamente, como as regiões do Brás e Belém. As áreas entre as estações e paradas de trem apresentavam maior densidade de ocupação. (Ibidem) Para BARBOSA (2016), “até o final dos anos 1930 a ferrovia representa uma plataforma, figura que suportava a ocupação industrial, enquanto a maior parte da várzea permanecia como domínio das estruturas de paisagem.”

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As dinâmicas políticas e urbanas transformando o significado da ferrovia: as consequências no território da Lapa e Barra Funda. Antes mesmo de se começarem as obras de canalização do Rio Tietê (a partir da década de 40) a ferrovia começa a entrar em declínio. O Plano de Avenidas de 1930 foi definido em um período em que acontecia uma mudança de paradigma de mobilidade, onde o modelo sobre trilhos começou a ser substituído para um modelo sobre rodas. Seguido à esses fatos, o então presidente Getúlio Vargas passou a investir pesadamente em infraestrutura de suporte para industrialização, (FIGUEIREDO, 2005 apud BARBOSA, 2016). IMAGEM 17 Trecho Lapa - Barra Funda em 1954 (VASP Cruzeiro)

Disponível em: <<http://geosampa.prefeitura.sp.gov. br.aspx> acesso em 30/03/2018. edições pela autora.

A partir de 1940, a retificação do Rio Tietê alterou drasticamente sua forma, mas ainda não influenciou a ocupação da várzea, que ainda se dava mais intensamente ao sul do eixo ferroviário. O Plano de Avenidas representou uma tentativa de ocupar o território da várzea como espaço primário. A retificação do rio, somada à construção das avenidas expressas marginais, afastou a paisagem urbana da paisagem natural, suportando a dispersão urbana e uma segunda onda de industrialização. (BARBOSA, 2016)

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Durante as décadas de 1950 e 1960, a imensa planície ao norte da ferrovia antes ocupada pelos meandros do Rio Tietê, ainda encontrava-se majoritariamente desocupada e não parcelada. Ainda na década de 50, uma regulação de ruídos foi promulgada e restringiu os usos industriais às áreas de várzea (BARBOSA, 2016). Isso explica o porquê, na área que compreende a Lapa e Barra Funda, as indústrias se concentraram na porção norte da ferrovia, confinando os usos industriais entre os trilhos e o rio retificado. “Cercada por urbanização extensiva, a várzea do Tietê permaneceu como uma periferia interna (...) formando um arco isolado de uso industrial decadente, enquadrado pela ferrovia e o rio canalizado. Os trilhos, uma vez o símbolo do movimento, tornaram-se a imagem de imobilidade e vacância” (BARBOSA, 2016)

Segundo RAMOS (2006), entre 1914 e 1971, o arruamento ao sul das ferrovias na região se consolidou totalmente, enquanto ao norte ainda havia terrenos não edificados e sem arruamento, configurando um “vazio” que vem sendo preenchido nas últimas décadas Mas ainda no início da década de 1970, devido a uma nova lógica de reestruturação produtiva, deu-se início a um deslocamento funcional das indústrias para outras regiões do Estado de São Paulo, provocando um esvaziamento industrial (MORAES, 2010). Essa desconcentração das indústrias teve reflexos na região da Lapa e Barra Funda, provocando grandes vazios urbanos e espaços residuais. Os reflexos da reestruturação produtiva da RMSP (...), em relação a Água Branca, pode ser observado diretamente pela forma como se constituiu esse território urbano. Marcado ao norte da ferrovia principalmente pela presença de indústrias que lá se estabeleceram desde o início do século XX, o bairro da Água Branca consolidou-se historicamente em descontinuidade com a lógica do mercado nos bairros imediatamente próximos. (MORAES, 2010)

LEITE (2002) situa este período como uma passagem da cidade industrial para a metrópole pós-industrial, quando observa-se a desativação de vários estabelecimentos e a transferência deles para outras localidades que oferecem melhores vantagens fiscais, terra e mão de obra barata, somado a um crescimento do setor terciário. Dentre as indústrias que instalaram-se na área no início do século XX destaca-

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-se o conjunto de edifícios das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo (IRFM), que tiveram suas fábricas gradativamente desativadas a partir da década de 1960, tendo em 1985 suas atividades completamente encerradas. RAMOS (2006) afirma que com a derrocada da IRFM e com a desindustrialização generalizada nas antigas áreas industriais da cidade, lindeiras às ferrovias, que este terreno valorizou-se e tornou-se objeto de acirrada disputa pelo mercado imobiliário. Ainda nesse período foi criado o Plano Urbanístico Básico (PUB) que, de acordo com suas diretrizes estruturais, “a área entre a Lapa e a Barra Funda deveria ser desenvolvida como uma área de uso misto, configurando uma nova centralidade apoiada por uma estação de metrô na Barra Funda” (BARBOSA, 2016). Porém, apesar da lei de zoneamento de 1972 estabelecer uso misto em praticamente todo território da cidade, o uso industrial foi mantido na maior parte entre a Lapa e Barra Funda, embora este uso tenha perdido importância como setor produtivo a partir de meados dos anos 1970. (SOMEKH; CAMPOS, 2002, p. 152).

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3.2. Planos e Propostas para a área Uma série de planos propuseram a reestruturação espacial da área, promovendo diferentes estratégias que contavam com parcerias público-privadas. Ao longo da década de 1990, a área foi transformada através de Operações Urbanas, instrumento que tinha como objetivo revitalizar e transformar áreas urbanizadas decadentes e subutilizadas através de parcerias público-privadas combinando o poder transformativo do mercado imobiliário e a direção do poder público em processos de renovação urbana (SOMEKH e CAMPOS, 2002 apud BARBOSA, 2016) “Vários outros instrumentos urbanísticos foram concebidos nesse plano [de 1988], como o IPTU progressivo no tempo - pensado como uma forma de prevenir a vacância e induzir um parcelamento de vazios urbanos na área urbanizada -, as Operações Urbanas, concebidas como intervenções pontuais, mudando o regime legal da propriedade urbana e criando novos parâmetros de uso e ocupação do solo - dando à prefeitura prioridade na aquisição da terra -; o estabelecimento de direitos de superfície, que permitia a exploração econômica da terra desassociada da propriedade; parcelamento e ocupação compulsórios, que obrigavam os proprietários a das uso a lotes localizados em áreas urbanas, prevenindo vacância e especulação urbana.” (BARBOSA, 2016)

IMAGEM 18 Perímetro da Ocupação Urbana Água Branca Disponível em: EMURB, s/d, sem escala apud CASTRO, 2006, p. 131

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Por conta da ocupação de baixa densidade, com lotes vazios ou subaproveitados e da potencialidade de se implementar atividades terciárias que se beneficiariam pela acessibilidade promovida especialmente pelo terminal intermodal da Barra Funda, justificou-se a Operação Urbana Água Branca (OUAB), que reestruturaria uma área de aproximadamente 550 ha. (CASTRO, 2006) MORAES (2010) destaca que entre os objetivos principais encontra-se fomentar o adensamento da região, incentivando a ocupação dos vazios urbanos por meio do estabelecimento de novos padrões urbanísticos. O Concurso Nacional Bairro Novo de 20049 buscou estimular discussões sobre a relação entre o plano e projeto, afim de elaborar um projeto urbano para a área da OUAB que induzisse o mercado a atuar na região. A proposta selecionada deveria auxiliar na superação dos obstáculos identificados, propondo o pleno desenvolvimento da região, através de um conjunto de ações da municipalidade. O projeto deveria reorganizar lotes e quadras por meio de critérios de uso e ocupação do solo. (ALVIM; ABASCAL; MORAES, 2011)

IMAGEM 19 - Planta de massas do projeto vencedor disponível em: http://www. vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/04.044/2398?page=6. acesso em 10/05/2018

9  O Concurso Bairro Novo foi promovido pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil - Departamento do Estado de São Paulo (IAB-SP) e pela Prefeitura (Sempla e Emurb)

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No contexto do Plano Diretor Estratégico (PDE) do Município de São Paulo de 2014, a área de estudo está inserida no que se denomina “Setor Orla Fluvial e Ferroviária”, uma das Macroáreas de Estruturação Metropolitana. O plano reconhece o setor como um território estratégico onde deverão ser desenvolvidos Projetos de Intervenção Urbana (PIU), que orientarão as transformações urbanísticas, sociais, econômicas e ambientais. Apesar das intenções explícitas de se transformar a área através da OUAB e de um projeto urbano que articula as preexistências, o conjunto de empreendimentos já construídos, habitação social, equipamentos públicos e espaços verdes não se efetivaram. Atualmente, verifica-se o predomínio de formas usuais de atuação do setor imobiliário, predominando condomínios particulares isolados nos grandes lotes, em detrimento de projetos que incluam equipamentos e espaços públicos.

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IMAGEM 20: Website de divulgação de um novo empreendimento na antiga área das IRFM, no ano de 2010 disponível em: https://casadascaldeiras.wordpress.com/. acesso em 13/05/2018


3.3. Análise da situação atual Foi realizada uma análise da situação atual do território de estudo com base em mapas e visitas, ora realizadas caminhando ou percorrendo a área de bicicleta. Através dos mapas foi possível compreender a situação do território no contexto metropolitano, sua atual configuração morfológica, notando-se a presença dos vazios e consolidações, identificando-se a hierarquia viária, a proporção das quadras, a localização das estações, edifícios tombados, remanescentes industriais, áreas verdes e algumas transposições sobre a ferrovia. Entretanto, apesar de fundamental, a análise através de mapas não é o suficiente para a real compreensão do território. Enquanto as cartografias facilitam a análise técnica, vivenciar o território e entrar em contato com as dinâmicas que acontecem nele permite uma percepção sensível da cidade que os mapas são incapazes de trazer. “A forma da cidade, sua imagem mental, não corresponde em nada ao conjunto que o urbanista e o engenheiro projetam, não se decidem numa prancha de desenho os ritmos que tornam a cidade mais ou menos suportável ou solidária. A cidade existe quando indivíduos conseguem criar vínculos provisórios em um espaço singular e se consideram citadinos. Se a cidade tem um nome singular que se identifica e singulariza, ela é ao mesmo tempo plural e atravessada por ritmos diferenciados. Ela favorece os desequilíbrios e os descentramentos sem os quais não se habita uma cidade.” (MONGIN, 1951)

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Linhas A área é atendida por duas linhas da CPTM (linhas 7 e 8) que seguem quase paralelas ao longo da área no sentido leste-oeste. No trecho entre o Tendal da Lapa e a Casa das Caldeiras as ferrovias se afastam, gerando um grande vazio entre as linhas férreas. A aproximação das duas linhas transformaria o vazio antes confinado entre os trilhos em um grande vazio potencial para a criação de um novo espaço público voltado à cidade.

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Estações Atualmente a área apresenta 4 estações da CPTM. • Estação Lapa (Linha 7, CPTM) • Estação Lapa (Linha 8, CPTM) • Estação Água Branca (Linha 7, CPTM) • Estação Intermodal Barra Funda (Linhas 7 e 8 da CPTM; Linha Leste Oeste do Metrô; Terminal Rodoviário Intermunicipal; Terminal de Ônibus) Das quatro estações, duas delas encontram-se na região da Lapa, distando aproximadamente quinhentos metros uma da outra. Enquanto uma delas serve a linha 7 da CPTM (que margeia a porção norte), a outra serve a linha 8 da mesma companhia (margeando a porção sul), sendo possível considerar a unificação das duas estações.


Viadutos A área apresenta quatro viadutos, caracterizando as transposições da linha férrea dedicadas sobretudo à veículos. São eles: Viaduto Comen Elías Nagibe Breim Viaduto Pompeia Viaduto Antártica Viaduto Pacaembu IMAGEM 21: Espaços residuais sob o Viaduto Pompeia, ao lado norte da ferrovia. autoria própria

Apesar de se apresentarem como uma solução para a infra-estrutura viária, ao nível dos pedestres os viadutos costumam gerar uma condição nada agradável, caracterizando-se como um espaço residual, sem iluminação natural e sem usos apropriados.

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Poucos pedestres e ciclistas atravessam a linha férrea através de estreitas calçadas nas bordas do viaduto. Uma possível solução seria transformá-los em túneis, transferindo o fluxo de veículos existente “sobre” linha férrea para baixo da ferrovia, melhorando assim a paisagem e a experiência do pedestre.

IMAGEM 22: Faixa dedicada aos pedestres e ciclistas sobre o Viaduto Antártica autoria própria

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IMAGEM 23: Espaços residuais sob o viaduto Antártica. autoria própria

IMAGEM 24: Espaços residuais sob o viaduto Antártica. autoria própria

IMAGEM 25: Espaços residuais sob o viaduto Pompeia. autoria própria

IMAGEM 26: Sobre o Viaduto Pompeia autoria própria

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Passagens de Pedestres Na área existem três tipos de passagens de pedestres que atravessam a linha férrea: • Passagens subterrâneas (presentes na área da Lapa) • Passarelas de transposição (presentes na área da Lapa e Água Branca) • Passagem em nível (cruzamento da linha 7 em nível na Água Branca) As transposições exclusivas de pedestres são escassas, e se concentram especialmente na Lapa que, apesar de possuir duas passagens subterrâneas, elas são pouco convidativas para o pedestre.

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IMAGEM 27, 28 e 29 Cruzamento em nível (Água Branca) autoria própria


IMAGEM 30: Passagem subterrânea Lapa autoria própria

IMAGEM 31: Passagem subterrânea Lapa autoria própria

IMAGEM 32: Passarela da Estação Lapa (L7) autoria própria

IMAGEM 33: Passarela de pedestres Água Branca autoria própria

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Vazios e Áreas Subutilizadas Pátio de Oficinas da Lapa Confinado entre os trilhos das linhas 7 e 8 da CPTM na porção oeste do território estudado, o espaço se apresenta como uma grande área subutilizada. Apesar disso no século XX, o Pátio de Oficinas da Lapa foi considerado o verdadeiro berço da indústria nacional ao se constituir a empresa Mafersa e foram fundamentais para a consolidação da SPR, uma vez que ali se realizavam trabalhos como uma simples manutenção até complexas reformas de rodagem, além da fabricação de locomotivas e vagões (AUGUSTO e MENDES, 2005) Vidraria Santa Marina Instalada ainda no final do século XIX, ainda hoje a fábrica mantém suas atividades em uma grande quadra na área. Mas na década de 1990 cogitou-se sua transferência, desativando o complexo instalado na Água Branca, por conta da limitação do espaço em termos de crescimento, visto que a urbanização já havia ocupado as áreas lindeiras à fábrica. Entretanto, após muitas discussões, em 1993 optaram em permanecer no local, reformando edifícios para plantas mais adequadas. (RAMOS, 2001). O complexo abriga alguns remanescentes industriais tombados pelo CONDEPHAAT10, sendo eles os edifícios Amazonas e São Paulo, Torre de Energia e chaminés. Bairro Parque Industrial Tomas Edson Grande área na porção norte da ferrovia entre os viadutos Pompeia e Antártica que pertence ao bairro Parque Industrial Tomas Edson, que possui poucas vias desconexas e abriga grandes galpões industriais. Espaços residuais lindeiros à ferrovia A área apresenta diversos espaços residuais que encontram-se vazios ou subutilizados lindeiros à ferrovia e entre os trilhos. Os grandes vazios e áreas subutilizadas ainda estão presentes no território, especialmente na parte norte. As atividades que ocorrem nas áreas subutilizadas desse território podem ser transferidas para fora do núcleo urbano consolidado, proporcionando espaço potencial para um novo parcelamento e novos usos que trazem dinâmica à vida urbana.

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10  CONDEPHAAT: Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico

Pátio da Lapa

Vidraria Santa Marina

Bairro Parque Industrial Tomas Edson

Áreas residuais entre trilhos

IMAGENS 34 e 35: Espaços vazios e subutilizados lindeiros à ferrovia autoria própria


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Consolidações de Interesse Público Os equipamentos ou espaços de interesse público que beiram a orla ferroviária se fazem presentes especialmente na porção sul. Dentre eles, podemos apontar:

Área da Lapa em destaque

Na área da Lapa: Mercado da Lapa inaugurado em 1954 e tombado pelo Conpresp11 em 2009

Mercado da Lapa

Shopping da Lapa Estação Ciência antigo galpão industrial tombado pelo Conpresp em 2009 Estação Especial da Lapa antigo galpão industrial onde atualmente funciona o centro de saúde destinado ao atendimento de pessoas com deficiências físicas Rede de Reabilitação Lucy Montoro Terminal de Ônibus Urbano da Lapa projeto realizado em 2003 pelos arquitetos Luciano Margotto Soares, Marcelo Ursini e Sérgio Salles, compondo o nó de transporte existente já pela estação da Lapa

Shopping da Lapa

Estação Ciência

Estação Especial da Lapa

Terminal de Ônibus Lapa

Largo da Lapa Um dos poucos pontos onde uma intensa vida urbana acontece na porção norte da ferrovia.

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11  Conpresp: Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo

Largo da Lapa


IMAGEM 36: Largo da Lapa

Na área da Água Branca:

autoria própria

Área da Água Branca em destaque

Tendal da Lapa

Poupatempo da Lapa

Tendal da Lapa Antigo entreposto de carnes, construído em 1938, atualmente abriga um Centro Cultural. Foi tombado pelo CONPRESP em 2007. Poupatempo Lapa Até os anos 1930, o imóvel era utilizado como fábrica de beneficiamento de couro e, na década de 1970, a atividade industrial foi desativada. Edifício do Instituto Rogacionista tombado pelo Conpresp em 2009

Edifício do Instituto Rogacionista

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Na área da Barra Funda: Memorial da América Latina projeto de Oscar Niemeyer, inaugurado na década de 1980 e tombado pelo Condephaat em 1995

Área da Barra Funda em destaque

Espaço das Américas casa de shows e eventos Expo Barra Funda antigo galpão industrial que atualmente abriga uma grande casa de eventos como exposições, feiras, convenções, festas e formaturas Parque da Água Branca Inaugurado em 1929, é um dos poucos espaços verdes na região, tendo cerca de 137 mil metros quadrados. O Parque possui Arena Hípica, Centro de Referência em Educação Ambiental e espaços para exposições e feiras. Allianz Parque conhecido popularmente como Arena Palestra Itália ou Arena Palmeiras, é uma arena multiuso construída para receber espetáculos, concertos, eventos corporativos e, principalmente, partidas de futebol do Palmeiras Casa das Caldeiras Construído na década de 1920, funcionava como antiga geradora de energia para todo parque industrial que funcionava na região. Foi tombado em 1986, pelo CONDEPHAAT e IPHAN, como edifica-

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Memorial da América Latina

Espaço das Américas

Expo Barra Funda

Parque da Água Branca

Casa das Caldeiras

Casa das Caldeiras


ção remanescente das IRFM – Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo.

Universidade e Escolas Técnicas

Universidades e Escolas Técnicas Destacam-se a Universidade Estadual Paulista (UNESP) ao norte da estação e a Universidade Nove de Julho (Uninove), ao sul da mesma. A área também abriga duas escolas técnicas. Shoppings Na área estão instalados o Shopping West Plaza, inaugurado em 1991 e Shopping Bourbon, inaugurado em 2008.

Shoppings

Atualmente, a grande concentração de equipamentos voltados ao interesse público encontram-se na porção sul da ferrovia, evidenciando o contraste entre as condições de urbanidade entre o lado norte e sul das linhas férreas.

IMAGEM 37: Expo Barra Funda autoria própria

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Consolidações de Interesse Privado Estão presentes na orla ferroviária, algumas edificações classificadas aqui como “de interesse privado”. Dentre elas, destaca-se: Condomínio Jardim das Perdizes Um dos maiores exemplos da atual transformação da área pelo mercado imobiliário, a implantação desse condomínio que apresenta a escala de um bairro demandou aproximadamente sete anos de negociação entre a empresa Tecnisa e a SP Urbanismo, que assumiu um papel mediador entre as lógicas mercadológicas e a necessidade de um desenho urbano que atendesse as dinâmicas urbanas da região. Foi de consenso entre os atores a criação de um amplo espaço público aberto e acessível no loteamento, que foi materializado na forma de um parque (BARBOSA, 2016). Porém, os condomínios fechados do empreendimento foram implantados ao redor do parque público, confinando-o entre esses espaços privados com prédios de grande altura, tornando-o pouco atraente para o público.

Localzaòàao Jardim das Perdizes

IMAGEM 38: Perspectiva Jardim das Perdizes disponível em: <www.tecnisa.com.br> acesso em 20/05/2018

Residencial Casa das Caldeiras Implantado na área onde antes se localizavam as Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, o condomínio também exemplifica o atual tipo de transformação da área realizado pelo mercado imobiliário. Localização Residencial Casa das Caldeiras

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Residencial da Lapa e residências da Rua Constança. Diferente dos grandes condomínios fechados implantados nas últimas décadas, essas áreas próximas à linha férrea, se constituem de pequenos sobrados e apresentam uma outra condição de vida urbana. Residencial Parque da Lapa e Rua Constança

IMAGEM 39: Residencial Parque da Lapa (ao norte da linha férrea) e rua Constança (ao sul) fonte: Google Earth. Edições pela autora.

IMAGEM 40: Placa colocada na Rua Constança em um domingo a noite. autoria própria

O Residencial da Lapa é composto por vias locais de traçado ortogonal que abrigam pequenos sobrados e é separado pela linha férrea pela rua William Speers, do lado norte da ferrovia. Enquanto isso, na porção sul, a rua Constança tem acesso pela Rua Guaicurus e termina nos muros da ferrovia, caracterizando-a como uma rua sem saída. O Tendal da Lapa também tem um pequeno acesso não muito utilizado voltado à ela. Esta pequena rua possui uma presença inexpressiva no mapa se comparada com as outras características da área estudada. Mas através de visitas ao local ela destacou-se ao se observar a diferenciada ocupação dos moradores desse espaço público geralmente ocupado por veículos. Em uma primeira visita realizado na tarde de um dia útil, a rua estava praticamente deserta e silenciosa, exceto pela música alta que surgia de um sobrado específico. Em uma segunda visita realizada na noite de um sábado de Carnaval, vizinhos mantinham seus portões abertos e, sentados em bancos na calçada, observavam as crianças andando de bicicleta. Uma placa no início da rua indicava: “Cuidado, crianças”. A presença da barreira da ferrovia nestas ruas possibilitou a criação de uma atmosfera local propícia à criação de uma diferenciada relação entre os moradores e o espaço público.

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Áreas Verdes Atualmente a área apresenta escassez de áreas verdes e espaços públicos, estando elas concentradas em especiamente em duas grande áreas: Parque da Água Branca Localizado ao sul da ferrovia, o parque possui área verde total de 79 mil metros quadrados

Áreas Verdes

Parque Jardim das Perdizes Localizado ao norte da ferrovia e rodeado pelo empreendimento privado, o parque apresenta uma área verde total de 44 mil metros quadrados

Futura Linha 6-Laranja do Metrô

Conhecida como a “linha das universidades”, a futura linha do metrô passará pela área seguindo o eixo da Avenida Santa Marina em direção à Brasilândia. A linha conectará diversas universidades ao longo de seu trajeto, e terá duas estações implantadas na área de estudo: as futuras estações “Água Branca”, próximas à estação já existente da CPTM, e “Santa Marina”, no encontro das avenidas Santa Marina e Ermano Marchetti, ao norte da linha férrea.

IMAGEM 41: Mapa esquemático da implantação das estações da futura linha 6 laranja disponível em <http://www1. folha.uol.com.br/cotidiano/2016/09/1810499-sem-recursos-consorcio-suspende-obras-da-linha-6-laranja-do-metro.shtml> acesso em 30/05/2018

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Considerações sobre a análise atual Apesar da gradativa ocupação da área pelo mercado imobiliário, o contraste entre a ocupação das porções norte e sul da ferrovia ainda se faz evidente. Vazios e áreas subutilizadas ainda estão presentes no território, especialmente na parte norte, ao mesmo tempo em que as consolidações (tanto de usos públicos quanto de privados), se fazem presentes mais intensamente na porção sul. A área também apresenta escassez de áreas verdes, estando elas concentradas basicamente em duas grandes áreas de parques. A área apresenta diversos remanescentes industriais que atualmente comportam novos usos, mas ainda apresenta alguns galpões industriais subutilizados que podem ser reciclados proporcionando usos mais adequados à nova dinâmica urbana. A futura linha 6-Laranja do Metrô que trará duas novas estações na área, proporcionará uma nova dinâmica à área, sendo grande potencial de transformação da porção norte da ferrovia, especialmente se somada à outras intervenções urbanas de transformação do território. Na maior parte dos casos, a barreira gerada pela presença da ferrovia gera uma condição de precariedade em um dos lados, e prejudica a conexão entre os lados da linha férrea. Em outros casos, é justamente essa barreira que possibilita a criação de uma condição urbana caracterizada pela atmosfera local, como nos casos da rua Constança e do Residencial da Lapa.

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Os 3 trechos A partir da análise da área, definiu-se, para intervenção projetual, três trechos baseados nas diferentes características de cada um. São eles: TRECHO 1: LAPA (Polo comercial) A área da Lapa apresenta forte caráter comercial, marcado especialmente pelo eixo da Rua 12 de Outubro e suas ruas adjacentes, pelo Mercado Municipal e Shopping da Lapa, todos localizados na porção sul da ferrovia. Na porção norte a dinâmica urbana não se faz tão intensa quanto a porção sul, embora, se comparada à porção norte da Água Branca e Barra Funda, que apresentam grandes áreas subutilizadas, a porção norte da Lapa apresenta ao menos uma certa vida urbana gerada pela ocupação de pequenas quadras comerciais e residenciais. TRECHO 2: ÁGUA BRANCA (Polo Cultural e Universitário) Neste trecho, os vazios e áreas subutilizadas apresentam-se como grandes potenciais de transformação da área. Com a aproximação das duas linhas férreas que atualmente se bifurcam gerando um grande vazio confinado entre elas, gera-se um grande espaço potencial para a criação de um novo espaço público voltado à cidade. Ao norte da ferrovia, a grande quadra atualmente ocupada pela Vidraria Santa Marina pode ser reparcelada, criando novas conexões e frentes urbanas propícias à criação de uma ativa vida urbana. Na porção sul, próximos à área da Água Branca concentram-se alguns equipamentos culturais como o Tendal da Lapa, a Estação Ciência e o SESC Pompeia. Nesta área irão se instalar duas estações da futura “linha das universidades”, que trarão um grande potencial de transformação da área, sendo uma área propícia à instalação de equipamentos de interesse público, especialmente voltados a estudantes.

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TRECHO 3: BARRA FUNDA (Polo de Eventos) A área da Barra Funda traz uma condição diferenciada em relação aos outros dois trechos por apresentar, na porção sul da ferrovia, grandes equipamentos que comportam grandes acontecimentos itinerantes e um significativo público flutuante, potencializados pelo terminal intermodal da Barra Funda. É o caso do Allianz Parque, onde acontecem jogos de futebol e shows; o Memorial da América Latina, o Espaço das Américas e o Expo Barra Funda, onde acontecem variados eventos como festas de formatura, exposições, feiras e shows; a Casa das Caldeiras, que abriga festas e eventos; e até mesmo o Parque da Água Branca, que também comporta feiras e eventos. A porção norte apresenta, assim como a área da Água Branca, grandes áreas subutilizadas, embora abrigue, logo acima do Terminal, o campus de artes de uma importante universidade estadual. Um marcante eixo que conecta o Terminal da Barra Funda até o Parque da Água Branca foi criado de forma espontânea através das passagens geradas pelos vazios residuais da área. Este eixo é marcado, em meio ao percurso, por uma chaminé e um antigo galpão industrial subutilizado, sendo um grande potencial de reconversão do mesmo para novos usos.

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ENSAIO PROJETUAL

A arquitetura e o desenho urbano transformando o significado das orlas ferroviรกrias


CAPÍTULO 1 - Metodologia de Projeto

O diagrama abaixo ilustra a metodologia aplicada pelo orientador de projeto Prof. Valter Caldana, no início do desenvolvimento do Trabalho Final de Graduação. Ela foi fundamental para a estruturação de todo este trabalho, guiando inclusive a definição do tema. A metodologia parte de alguns princípios: • o projeto não começa do “partido”; Entende-se que o projeto começa do “Interesse Primário”, ou seja, o tema que desperta a curiosidade (se aplicada à vida profissional, o projeto começa da “encomenda”); • o objetivo do arquiteto não é projetar o objeto construído. O objetivo do arquiteto é projetar a realidade transformada. O objeto construído é apenas o meio para que essa realidade seja transformada.

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1. Interesse Primário A Orla Ferroviária como interesse primário, e a relação ferrovia-cidade como desejo de investigação.

a ferrovia, a partir da cidade

a cidade, a partir da ferrovia

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2. Repertório 2.1. Repertório Vivencial: O percurso até chegar o tema

A primeira aproximação com a orla ferroviária foi em projeto VII, quando tínhamos a Lapa como objeto de estudo e proposição. A partir da problemática situação que a orla ferroviária gerava naquele território, enxerguei um grande potencial de transformação. A orla ferroviária, formada pelas linhas da antiga SP Railway e Sorocabana, não apenas rasgava a Lapa em dois, dificultando a relação entre os lados, como também gerava um espaço residual entre elas no momento em que elas se bifurcavam, além da enorme área subutilizada do grande pátio ferroviário poderiam ser transformados. Depois de muita discussão sobre enterrar, semi-enterrar ou manter os trilhos, decidimos em grupo que a melhor soluçao seria manter os trilhos. E decidi me apropriar do espaço residual entre elas para propor meu projeto, que tinha como objetivo: ocupar o espaço vazio entre os trilhos conectar as duas áreas segregadas pela orla ferroviária aproximar a população com as duas linhas ferroviárias, historicamente importantes para a formação da cidade de São Paulo

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2 MONITORIA URB V MOMENTO

MOMENTO

1 PROJETO VII

Mais uma vez aconteceu uma aproximação e o interesse pelo impacto que a ferrovia causa nas cidades por onde ela passa, porém, diferente da aproximação que tive com a orla em Projeto VII (escala local), em Urbanismo V estudamos o impacto da ferrovia em escala regional, reforçando sua abrangência metropolitana.


MOMENTO

3 PROJETO VIII + METODOLOGIA PROJETO VIII A ideia inicial era desenvolver o edifício-ponte iniciado em Projeto VII. Mas tive que resolver a questão: qual será o uso do seu edifício-ponte? Foi então que se deu início a uma intensa pesquisa partindo de algumas perguntas: Qual seria um bom uso para uma área como a Lapa?

METODOLOGIA Apresentei 3 propostas de tema: 1) Linhas Ferroviárias e Transformações Urbanas: da Expansão Urbana à Obsolescência Pós-Industrial. 2) Linhas Ferroviárias e Transformações Urbanas: articulação metropolitana ou barreira urbana local? 3) A Arquitetura como Potencial de Transformação de Áreas Pós-Industriais: O Caso da Lapa.

Como poderia se dar uma reestruturação urbana a partir da linha férrea, na área da antiga Vidraria Santa Marina, adjacente à ferrovia e com características industriais? O que se tem feito no mundo em áreas com características semelhantes? Foi então que conheci alguns projetos urbanos como o 22@Barcelona e o Bilbao Ria, de requalificação dessas antigas áreas industriais a partir da implementação de usos voltados à tecnologia, inovação e criação.

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2.2. Diagrama do Repertório Técnico: Conteúdo estudado até o momento da escolha do tema

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Título: Fraturas Urbanas e a Possibilidade de Reconstrução de Novas Territorialidades Metropolitanas: a orla ferroviária paulistana.

Palavras-Chave: vazios urbanos, terrain vague, território desarticulado, transformação da metrópole pós-industrial, intervenção linear. Propostas: - A cidade deve ser pensada a partir de suas estruturas existentes, sem negá-las - Modernização do Sistema Ferroviário e das estações existentes. - Criação de Novas Estações - Reativação do Patrimônio existente - edifícios históricos, galpões e moinhos como testemunhos históricos devem receber novos usos e programas atuais. - Reconversão da Área Pós-Industrial por uma indústria de base tecnológica. - Eixo Verde, presença da água, captação de águas pluviais. - HIS de tipologias variadas, de alta densidade.

PROJETO CONSTRUÍDO

TESE DE DOUTORADO

1 PROJETO-TESE CARLOS LEITE 2 CROSSRAIL PLACE arquiteto: Foster + Partners local: Londres, UK ano de construção: 2015

contexto: Durante séculos, rios e baías abrigaram atividades dinâmicas que geravam substancial parte das riquezas locais e muitas vezes nacionais ↓ progresso tecnológico (“revolução dos contêineres”) → utilização de navios cada vez maiores → necessidade de canais e áreas de cais compatíveis (maiores) + Queda das atividades industriais ↓ Anos 60 e 70: degradação e abandono das seculares áreas portuárias das grandes cidades européias e norte-americanas ↓ Zonas portuárias abandonadas e/ou obsoletas no mundo inteiro tornaram-se peças desconectadas da malha urbana, apartando a vida urbana cotidiana das águas dos mares e rios ↓ Superação do isolamento, possível com o aporte de uma nova infra-estrutura urbanística – pontes, túneis, passarelas, avenidas, metrôs, etc.


CONCURSOINTERNACIO IYA - MoMA

3 INTERSECÇÕES URBANAS

local: São Paulo, SP, Brasil | ano produção: 2011 | cliente: International Young Architects - Ideas Awards and Exhibition escritório Entre Arquitetos - O trabalho foca na fratura urbana que a orla ferroviária representa, hoje em dia, na cidade de São Paulo - A proposta parte do entendimento da necessidade de cruzamentos na área ferroviária da cidade, e busca-se aliar transposições articuladas com equipamentos públicos. -Essa “costura urbana” poderia ocorrer em vários pontos da linha férrea ligando duas margens segregadas, e se valendo da transposição como forma de potencializar o uso de um espaço público. - A intervenção se focou aos arredores da estação de trem Mooca, onde foi uma das regiões que mais participaram do processo de industrialização da cidade e

que atualmente sofre com a saída das indústrias, com áreas desestruturadas em relação à dinâmica urbana nas proximidades da linha férrea. - Também se agrega a um ponto de travessia outros usos, outros valores, na intenção de promover espaços que participem da dinâmica da cidade.

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3. Posicionamento Crítico • Reconhecimento da ferrovia e das paisagens ao longo da orla ligadas à sua história, como memórias históricas urbanas; • Através da arquitetura, é possível conectar a cidade fragmentada, sem necessidade de negar as infraestruturas disponíveis; • Além do alto custo, a ideia de enterrar a ferrovia seria negar a memória, a paisagem, e a experiência urbana de se percorrer a cidade a partir do trem deve ser explorada. Enterrá-la seria negar essa memória e essa experiência; • Trabalhar com as estruturas históricas urbanas (ferrovias) e arquitetônicas (remanescentes históricos ligados à ferrovia), sem negá-las.

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4. Realidade transformada 4.1. Objetivos do Projeto RESSIGNIFICAR REQUALIFICAR TRANSFORMAR

a orla ferroviária em São Paulo

RECONHECER VALORIZAR

a importância histórica, urbana e econômica da ferrovia para SP

CONECTAR COSTURAR

a cidade interrompida pela ferrovia

ASSUMIR INCORPORAR POTENCIALIZAR

as (infra)estruturas urbanas, arquitetônicas, naturais ao longo da orla

OCUPAR

os espaços vazios ao longo da orla

a orla ferroviária como parte integrante da cidade consolidada

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4.2. Plano de Ações Apreciando a paisagem ao longo do percurso

LONGITUDINALMENTE (...em escala metropolitana)

ATRAVESSAR

(...de dentro do trem)

A ORLA FERROVIÁRIA

TRANSVERSALMENTE (...em escala local) (...a barreira urbana)

[como?] Em nível Por cima Por baixo

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[com quem?] Sozinho Com os amigos Com colegas de trabalho Com colegas da escola Com colegas do curso Com a família Com desconhecidos Com namorad_

De forma fluida/contínua aos percursos urbanos

[pra quê?] Para chegar à Para alcançar Para encontrar Para conhecer Para descobrir Porque sim Porque deu vontade

[quando?] De manhã De tarde A noite De madrugada


PERMANECER

[pra quê?] Para sentir Ver As cores Olhar Os movimentos Observar As ações Enxergar Ouvir A música Escutar As conversas Os ruídos Olfatear As flores Cheirar O café O suor A comida Tatear Texturas Temperaturas

[onde?] Na orla Acima da orla Próximo á orla

[pra quê?] Para descansar Para comprar Para apreciar Para observar Para esperar Para interagir Para conversar Para se distrair Para se divertir Para descobrir Para conhecer Para compartilhar Para aprender

[quando?] De manhã De tarde A noite De madrugada

[pra quê?] Para vender Para trabalhar Para cuidar Para aprender Para fazer arte Para ouvir Para jogar Para ler Para presenciar

[com quem?] Sozinho Com os amigos Com colegas de trabalho Com colegas da escola Com colegas do curso Com a família Com desconhecidos Com namorad_

[como?] A pé De bike De carro De ônibus De cadeira de rodas Com tênis de rodinhas De pé Sentado Deitado Pendurado Dançando Andando Escalando Correndo Voando Patinando Ensaiando

105


4.3. Ilustrações da Realidade Transformada ATRAVESSAR LONGITUDINALMENTE (percurso através da metrópole) de dentro do trem

ATRAVESSAR TRANSVERSALMENTE (caminhar contínuo aos percursos urbanos)sob/sobre/no nível do trem

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PERMANECER (ocupando o espaรงo hoje sub-utilizado) sob/sobre/ao longo da orla ferroviรกria

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[possibilidades de lugar]

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5. PARTIDO DE PROJETO ANÁLISE existências TRECHO 1 LAPA Polo comercial

TRECHO 2 ÁGUA BRANCA Polo comercial

TRECHO 3 BARRA FUNDA Polo comercial

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- Rua 12 de Outubro - Mercadão da Lapa - Shopping Center Lapa

- Estação Ciência - Tendal da Lapa - Maurício de Souza - SESC Pompeia - * futura linha 6 metrô: linha universitária

- Allianz Parque (jogos e shows) - Espaço das Américas (shows, formaturas) - Expo Barra Funda (Exposições) - Memorial da América Latina (Exposições, Eventos Gastronômicos, Formaturas, Shows) - Casa das Caldeiras (festas) - Parque da Água Branca (feiras orgânicas) - Shoppings Bourbon e West Plaza


PROPOSTAS programa

partido

- edifício ponte comercial (potencializar o eixo comercial da Rua 12 de Outubro, do outro lado da linha férrea) - Habitação, comércio e serviços

- Habitações Estudantis - Centro de Investigação Tecnológica Universitária - Centro de Esportes - Museu Santa Marina

- Restaurantes, bares, praças - Hoteis - Edifício Garagem

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CAPÍTULO 2 -Ensaio Projetual (6. OBJETO CONSTRUÍDO)

novo traçado ferrovia

áreas previstas para reparcelamento

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MASTER PLAN - PROPOSTAS

vias existentes + conexões propostas (vias e transposições)

novas áreas públicas

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MASTER PLAN

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ÁREA DE INTERVENÇÃO 1 - LAPA

oH

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o

Residencial da Lapa ESTAÇÃO LAPA (L8)

Rua 12 de Outubro

Viad u

ESTAÇÃO LAPA (L7)

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Elías Nag ibe

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Largo da Lapa

Mercado da Lapa

Estação Ciência

Shopping da Lapa Terminal de Ônibus

A área da Lapa apresenta forte caráter comercial, marcado especialmente pelo eixo da Rua 12 de Outubro e suas ruas adjacentes, pelo Mercado Municipal e Shopping da Lapa, todos localizados na porção sul da ferrovia. Na porção norte a dinâmica urbana não se faz tão intensa quanto a porção sul, apesar do Largo da Lapa representar um pequeno espaço público com uma forte presença de vida urbana. Atualmente, as duas estações da Lapa encontram-se separadas, cada uma servindo uma das linhas da CPTM (L7 e L8). A presença do viaduto entre o Mercado da Lapa e o Terminal de Ônibus1, a nível do pedestre, prejudica as condições visuais e de caminhabilidade. Um evidente eixo diagonal interrompido pela linha férrea aparece nos mapas desde o início do século XX, embora não se tenha encontrado comprovações de que ele se constituiu antes da implantação da ferrovia. 1  (projeto arquitetônico de 2002 pelos arquitetos Luciano Margotto Soares, Marcelo Ursini e Sérgio Salles)

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ESTRATÉGIAS E PARTIDO PROJETUAL

Largo da Lapa

ESTAÇÃO INTEGRADA LAPA

Residencial da Lapa

Mercado da Lapa

Estação Ciência

Shopping da Lapa Terminal de Ônibus

• continuação do forte eixo comercial presente na rua 12 de Outubro para o outro lado da linha férrea • unificação das duas estações da Lapa em uma que sirva as duas linhas. • criação de um novo espaço público próximo mercado e à rua 12 de Outubro • evidenciar o eixo histórico dividido pela linha férrea através do desenho, resgatando sua memória • transformação do viaduto Comen Elías Nagibe Breim em túnel, eliminando o espaço residual existente abaixo dele, e dando melhores condições urbanas ao pedestre • transformação dos espaços instersticiais próximos à antiga Estação Lapa (L8) e Estação Ciência em um novo espaço público, podendo ser ocupado, por exemplo, por containeres de usos comerciais

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C

ÁREA DE INTERVENÇÃO 1 - LAPA

A

C

B

PLANTA ÁREA DE INTERVENÇÃO 1 - LAPA

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A B

N

121


ÁREA DE INTERVENÇÃO 1 - LAPA

CORTE LONGITUDINAL A-A (NORTE)

CORTE LONGITUDINAL B-B (SUL)

CORTE TRANSVERSAL C-C

122


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ÁREA DE INTERVENÇÃO 1 - LAPA Parque Residencial da Lapa

Estação Es

Estação Integrad (Edifício Ponte C Edifícios Conectores

CORTE PERSPECTIVADO

124


special da Lapa

da da Lapa Comercial)

Estação Ciência

Terminal de Ônibus

Largo do Mercado

Mercadão da Lapa Rua 12 de Outubro

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ÁREA DE INTERVENÇÃO 2 - ÁGUA BRANCA

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Vidraria Santa Marina

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ESTAÇÃO ÁGUA BRANCA (L7)

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Rua Guaicurus

Tendal da Lapa

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Poupatempo da Lapa

Neste trecho, os vazios e áreas subutilizadas apresentam-se como grandes potenciais de transformação da área. Com a possível aproximação das duas linhas férreas que atualmente se bifurcam gerando um grande vazio confinado entre elas, gera-se um grande espaço potencial para a criação de um novo espaço público voltado à cidade. Ao norte da ferrovia, a grande quadra atualmente ocupada pela Vidraria Santa Marina pode ser reparcelada, criando novas conexões e frentes urbanas propícias à criação de uma ativa vida urbana. Na porção sul, próximos à área da Água Branca concentram-se alguns equipamentos culturais como o Tendal da Lapa, a Estação Ciência e o SESC Pompeia. Nesta área irão se instalar duas estações da futura 6 laranja do metrô, a “linha das universidades”, que trarão um grande potencial de transformação da área, sendo uma área propícia à instalação de equipamentos de interesse público, especialmente voltados a estudantes.

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ESTRATÉGIAS E PARTIDO PROJETUAL

RA

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e Curtum

ida

n Ave

o Rua d Previsão de Parcelamento

HA

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ESTAÇÃO ÁGUA BRANCA UNIFICADA (L7 e L8)

A

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Rua Guaicurus

Tendal da Lapa

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Poupatempo da Lapa

• aproximação das duas linhas férreas, eliminando o espaço vazio confinado entre elas, e oferecendo um novo espaço público em potencial próximo à estação. • parcelamento da gleba atualmente ocupada pela vidraria Santa Marina, considerando a transferência de sua fábrica para fora da cidade consolidada + novas conexões viárias • incorporação dos remanescentes industriais tombados (edifícios, torres e chaminés) da Santa Marina no novo desenho urbano • novas transposições da ferrovia voltadas à ciclistas e pedestres • incentivo de usos voltados à cultura e ao público estudantil • incorporação da linha 8 (CPTM) na atual estação Água Branca, que atualmente só atende a linha 7.

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ÁREA DE INTERVENÇÃO 2 - ÁGUA BRANCA C

A B

C

PLANTA ÁREA DE INTERVENÇÃO 2 - ÁGUA BRANCA

128


A B

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129


ÁREA DE INTERVENÇÃO 2 - ÁGUA BRANCA

CORTE LONGITUDINAL A-A (NORTE)

CORTE LONGITUDINAL B-B (SUL) 䘀䄀䈀 䰀䄀䈀 ⠀攀搀椀昀挀椀漀 挀漀渀攀挀琀漀爀 甀爀戀愀渀漀⤀

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130

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131


ÁREA DE INTERVENÇÃO 2 - ÁGUA BRANCA Edifícios Conectores Urbanos

Tendal d

Térreo Comercial

PARQUE DOS TRILHOS

CORTE PERSPECTIVADO

132


Estação Ciência

da Lapa

Museu Santa Marina

(Remanescentes industirais Tombados)

Previsão de Parcelamento Gleba Vidraria Santa Marina

Remanescente Industrial Tombado

Estação Água Branca (integração L7 e L8)

Ciclopassarelas

Futura Estação Metrô (L6)

Centro de Investigação Tecnógica Universitária

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ÁREA DE INTERVENÇÃO 3 - BARRA FUNDA Universidade Pública de Artes

Memorial da América Latina Universidade Shopping West Plaza

Expo Barra Funda

Espaço das Américas

Memorial da América Latina Galpão remanescente industrial

Universidade

Parque da Água Branca

A área da Barra Funda comporta um dos maiores terminais intermodais da cidade e apresenta grandes equipamentos que comportam grandes acontecimentos itinerantes e um significativo público flutuante, caracterizando-se por um forte polo de eventos. A porção norte apresenta grandes áreas subutilizadas, embora abrigue, logo acima do Terminal, o campus de artes de uma importante universidade estadual. Um marcante eixo que conecta o Terminal da Barra Funda até o Parque da Água Branca foi criado de forma espontânea através das passagens geradas pelos vazios residuais da área. Este eixo é marcado, em meio ao percurso, por uma chaminé e um antigo galpão industrial subutilizado, sendo um grande potencial de reconversão do mesmo para novos usos.

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ESTRATÉGIAS E PARTIDO PROJETUAL Universidade Pública de Artes

Memorial da América Latina Universidade Shopping West Plaza

Expo Barra Funda

Espaço das Américas

Memorial da América Latina Galpão remanescente industrial

Universidade

Parque da Água Branca

• implantação de usos que atendam ao grande público flutuante atraído pelo Terminal Intermodal e pelos eventos que ocorrem na área, como hoteis, restaurantes e edifícios garagem. • requalificação do eixo que conecta o Terminal Barra Funda ao Parque da Água Branca através de um novo desenho de piso e da implantação de novos usos voltados à essa passagem já existente • reconversão do uso do galpão industrial presente nesse eixo, atualmente subutilizado, em um novo uso. • requalificação da grande área subutilizada ao norte da Estação, propondo o desvio do fluxo de veículos da via lindeira ao terminal, além de um novo desenho de quadra que incorpore novos usos, trazendo uma nova dinâmica à região. • ampliação do Terminal Barra Funda afim de aumentar sua capacidade, considerando o possível aumento da demanda com as futuras intervenções

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ÁREA DE INTERVENÇÃO 3 - BARRA FUNDA

A B

PLANTA ÁREA DE INTERVENÇÃO 2 - ÁGUA BRANCA

136


C

A

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137


ÁREA DE INTERVENÇÃO 3 - BARRA FUNDA

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CORTE LONGITUDINAL A-A (NORTE) 唀渀椀瘀攀爀猀椀搀愀搀攀

CORTE LONGITUDINAL B-B (SUL)

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CORTE TRANSVERSAL C-C

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ÁREA DE INTERVENÇÃO 3 - BARRA FUNDA

AMPLIAÇÃO TER EDIFÍCIO GARAGEM

PARQUE DA AGUA BRANCA MERCADO (reconversão do uso de remanescente industrial)

UNIVERSIDADE

TERMINAL BAR

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CORTE PERSPECTIVADO


RMINAL BARRA FUNDA HOTEIS E HABITAÇÃO

QUADRA ABERTA Térreo Comercial AMPLIAÇÃO UNESP

RRA FUNDA

141


142


Considerações Finais Se, em um primeiro momento, a ferrovia foi um elemento indutor de transformações nas cidades e, em um segundo momento, a cidade transformou o significado das ferrovias atribuindo à elas uma negativa conotação de barreira, o desafio atual da arquitetura e do urbanismo é provocar uma nova transformação na relação ferrovia-cidade, aproveitando o potencial disponível em sua orla, sem negar as estruturas que compõem seu passado histórico. Buscando incorporar alguns dos conceitos discutidos ao longo do trabalho, foi desenvolvido o ensaio projetual de uma nova realidade transformada ao longo do trecho da orla ferroviária Lapa-Barra Funda: através de um novo desenho urbano, buscou-se a ressignificação dos espaços residuais presentes ao longo da orla ferroviária, trazendo uma nova relação ferrovia-cidade. Um dos grandes desafios enfrentados no processo dessa pesquisa foi desenvolver um tema que abre discussões sobre escalas tão distintas: a ferrovia nos leva à transitar entre a escala regional e a escala local. Dentro do complexo e abrangente universo das ferrovias é possível discutir expansão urbana, mobilidade, desarticulação territorial, patrimônio histórico, planejamento urbano, industrialização, política, economia, morfologia urbana, a atuação do mercado imobiliário nas áreas em transformação da orla, soluções para os transportes de carga, a atual dependência do transporte rodoviário e até mesmo a experiência de se percorrer a cidade de trem. Apesar da pesquisa ter tocado em alguns desses diversos assuntos, ela teve como foco uma abordagem específica que parte da investigação da ferrovia como Cicatriz Urbana, e as possibilidades de sua ressignificação. Além disso, o desejo de investigação da relação ferrovia-cidade através de uma análise morfológica me acompanhou durante toda a pesquisa, embora o período de um ano não fosse o suficiente para desenvolver esse enfoque de forma mais aprofundada. A pesquisa buscou provocar reflexões frente às maneiras com que as cidades lidam com essas cicatrizes urbanas que, embora apresentem desafios como a

143


fragmentação, descontinuidades e vazios territoriais, revelam grandes potenciais de transformação e ressignificação através de projetos urbanos e arquitetônicos que respeitem e incorporem as estruturas históricas presentes.

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145


146


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• tfg • faumack • 2018 • g a b ri el la t a ka u ti



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