Homenagem a Rui Mário Gonçalves

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HOMENAGEM A RUI MÁRIO GONÇALVES

SÃOMAMEDE GALERIA DE ARTE



Homenagem a

Rui Mário Gonçalves Fevereiro / Março 2015

De um modo geral, pode dizer-se que as obras modernas realizadas durante o século XX não foram explicitamente solicitadas pelo público, mas resultaram essencialmente da vontade dos artistas. A liberdade interior dos artistas que as produziram apela, porém, para a liberdade de cada um dos indivíduos componentes do público. A história da arte precede a história do gosto. São os artistas que estão formando o público. Rui Mário Gonçalves

SÃOMAMEDE GALERIA DE ARTE


JĂşlio Resende, anos 50, Ă“leo sb madeira, 36x24cm


Rui Mário Gonçalves licenciou-se em Ciências Físico-Químicas pela Universidade de Lisboa, mas desde muito cedo se interessou pelas artes plásticas, tendo promovido diversas exposições, nomeadamente a Primeira Retrospetiva da Pintura Não-Figurativa Portuguesa em 1958. Iniciou atividade como crítico de arte no início dos anos 60, tendo recebido uma bolsa da Fundação Gulbenkian para estudar em Paris com Pierre Francastel e outros mestres de renome internacional. De volta a Portugal, não mais parou de desenvolver diversas atividades de promoção e divulgação das artes plásticas, colaborando com a Galeria São Mamede por diversas ocasiões, nomeadamente na elaboração de textos para catálogos das exposições de António Areal, Carlos Calvet, Fala Mariam e Sofia Areal, entre outros. Rui Mário Gonçalves sempre manifestou grande apreço por Cruzeiro Seixas. A este propósito recordo as suas palavras no último texto que escreveu para a Galeria São Mamede em Maio de 2009: “A concluir, deve lembrar-se que a actividade de Artur do Cruzeiro Seixas como consultor artístico da Galeria S. Mamede, a partir de 1968, permitiu revelar briosamente ao público lisboeta estes artistas que, agora, a Pintora Sofia Areal quer evocar, ao mostrar o que ela própria faz no âmbito da expressão plástica. Nesta iniciativa duma artista muito mais nova do que os surrealistas por ela escolhidos, não há apenas sentimentalismo, mas também responsabilidade cultural e homenagem a quem atempadamente soube criar um lugar de difusão do Surrealismo, em perfeito entendimento com o fundador da Galeria S. Mamede, Francisco Pereira Coutinho (Pai). Cruzeiro Seixas, além de exposições de António Areal, Carlos Calvet, Eurico Gonçalves, Jorge Vieira e Mário Cesariny, organizou outras de Júlio (Reis Pereira), Paula Rêgo, Manuel D’Assumpção, Vieira da Silva, Henri Michaux, Grupo Cobra e as primeiras exposições de Mário Botas e de Raul Perez. Fica hoje por aqui esta breve evocação que, a pedido, gostosa e nostalgicamente fiz…«ainsi qu’un voyageur qui retourne la tête/ vers les horizons bleus dépassés le matin». (Baudelaire)”.

Rui Mário e os irmãos Eurico e Maria Dulce, 1945

Rui Mário e os irmãos Nuno e Eurico, 1966

Surge agora o momento da Galeria São Mamede agradecer e homenagear Rui Mário Gonçalves enquanto importante crítico de arte em Portugal, com uma exposição coletiva de obras do acervo da Galeria e da autoria de artistas sobre os quais Rui-Mário já escreveu, a que conseguimos juntar algumas das mais relevantes obras da sua própria colecção. A quase totalidade destes artistas está representada no livro “100 Pintores Portugueses do séc. XX”, da sua autoria, com exceção dos três mais novos, sobre os quais Rui Mário Gonçalves só viria a escrever depois da edição daquele livro. Sobre todos eles o pintor e crítico de arte Eurico Gonçalves, irmão de Rui-Mário, escreveu-nos uma breve nota biográfica. Francisco Pereira Coutinho

Rui Mário dando uma aula na biblioteca da SNBA


1 Jorge Barradas (1894-1971) Nasceu, viveu e morreu em Lisboa.Sensível à influência da Arte Nova, a sua figuração estilizada e decorativa tanto se evidencia na pintura e nas artes gráficas de pequeno formato, nomeadamente na ilustração de revistas dos anos 20, como a Seara Nova, ABC e outras, como adquire maior impacto visual na cerâmica, designadamente nos paineis de azulejos de grande formato, onde se notabilizou como um dos maiores criadores desde 1945.Trata-se de uma arte amável, delicada e de cromatismo sensorial. Da mesma geração de Almada (1893-1970) e António Soares (1894-1978), os três figuram entre os decoradores do café “A Brasileira” de Chiado e do Bristol Clube, nos anos 20. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986. 2 Júlio (1902-1983) Nasceu, viveu e morreu em Vila do Conde.Em 1919 descobre reproduções de pinturas de Chagall, que o levam a conceber um expressionismo lírico, próximo do surrealismo onírico, chagalleano, o que não o impede, nos anos 30 de satirizar a burguesia admirando o caricaturista alemão George Grosz e o português Bernardo Marques. Júlio participou em numerosas coletivas, nomeadamente no primeiro Salão dos Independentes (Sociedade Nacional De Belas Artes, 1930) e em todas as Exposições Gerais de artes plásticas (Sociedade Nacional De Belas Artes, 1946-1956). A partir de 1937 realiza a “série Poeta” de desenhos aguarelados como o que se mostra nesta exposição, datado de 1975, sendo o principal ilustrador da revista “Presença”, dirigida pelo seu irmão, o poeta José Régio. Além de pintor e desenhador, Júlio foi também poeta com o pseudónimo de Saúl Dias. “Privilegiando o sonho, Júlio deve ser considerado um precursor do Surrealismo em Portugal” conforme declara Rui Mário Gonçalves no seu livro “100 Pintores Portugueses do Séc. XX”, Edições Alfa, 1986 Jorge Barradas, Figura Feminina, 1932, Guache sb papel, 33x25cm

Julio (Reis Pereira), Poeta e palhaço, 1956, Tinta da china sb papel, 46x34cm

3 Júlio Resende (1917-2011) Nasceu no Porto e aí frequentou, desde 1937, a Escola Superior de Belas Artes, sendo discípulo de Dório Gomes e, mais tarde, professor de pintura dessa mesma escola, numa notável acção pedagógica na formação de jovens artistas modernos, hoje historicamente reconhecidos como os quatro vintes: Jorge Pinheiro, José Rodrigues, Ângelo e Armando Alves. Na representação do povo, a pintura Neo-realista, expressionista e abstratizante de Júlio Resende associa a deformação intencional à geometrização cubista de vultos humanos, de contornos ora duros e tensos, ora moles e diluídos. Dir-se-ia que Resende privilegia o acto de pintar, tornando-o gestual e espontâneo, sem deixar de ser sensível à estrutura formal da composição. Como síntese da sua linguagem realista, cubo-expressionista, esquemática e gestual, destaca-se o monumental mural, intitulado “Ribeira Negra”, no Porto, porventura a sua obra-prima, datada de 1986. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986, e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 4 Nadir Afonso (1920-2013) Nasceu em Chaves e formou-se em arquitetura na Escola Superior de Belas Artes do Porto. Na capital nortenha, começou a expor em 1943 como pioneiro do Abstracionismo Geométrico em Portugal, juntamente com o arquiteto-pintor Fernando Lanhas (1923 - ) da mesma geração. A harmonia é para Nadir a qualidade essencial da composição abstrata-geométrica, cujas formas repetitivas e rebatidas no plano do suporte, destacadas com cores puras e lisas, desencadeiam ritmos. Na sucessão de signos geométricos, que se podem prolongar horizontalmente para além dos limites laterais do suporte, estas pinturas de grandes dimensões, dos anos 50, intitulam-se “Espacilimitado”. Expondo em Paris, na galeria Denise René, em 1956 e 1957, depois de ter trabalhado com os arquitetos Le Corbusier e Óscar Niemeyer, em 1952-54, Nadir publica em Francês “La sensibilité Plástique” em 1958, ilustrado com obras da sua autoria e de Mondrian, Vasarely e Herbin. “O homem tem necessidade de beleza”, diz ele. “A arte clarifica os espíritos e dignifica o homem. A arte humaniza (...). O homem que encontra a arte pode ser curado.” Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986.


Nadir Afonso, Brooklin, 1983, Guache sb papel, 26x47cm


Cruzeiro Seixas, História Trágico-Marítima, 1971, Desenho à pena sb papel, 35x24cm

Cesariny, “Ele é a afeição e o presente...”, 1969/72, Pintura sb papel, colado em tela, 68x48cm

Carlos Calvet, S/ Título (série fósforos), 1969, Guache sb papel, 25x32cm

5 Cruzeiro Seixas (1920) Nasceu na Amadora, estudou na escola António Arroio, onde, desde de 1942, conviveu com os colegas Cesariny, Azevedo, Vespeira, Pomar, Moniz Pereira e António Domingues, que oscilam entre o Neo-realismo e o Surrealismo, com atitudes juvenis Neo-dadaístas, que escandalizaram a frequência burguesa do café Herminius, na avenida Almirante Reis, em Lisboa. Em 1949-50, Cruzeiro Seixas participa nas exposições do grupo Os Surrealistas, com Cesariny, António Maria Lisboa, Pedro Oom, Risques Pereira, Fernando José Francisco, Fernando Alves dos Santos, Carlos Eurico da Costa, Mário Henrique, Carlos Calvet e outros. Cruzeiro Seixas cedo se revelou notável desenhador surrealista onírico, na descendência boscheana da Poética do Maravilhoso e do Fantástico, além de autor de colagens metafóricas que exploram a livre associação de imagens deslocadas do seu contexto habitual. Como objectualista, Cruzeiro Seixas é um caso único e original de invenção irreverente e provocatória. Em toda a sua obra, ressalta a concepção meticulosa da sua imagética gráfica, que não abdica do claro/escuro, declarando: “uma arte sem sombra não tem mistério e o que mais me fascina é o mistério”. A sua experiência vivida em África/Angola, durante mais de 10 anos (1953-64) foi para ele “um amor inteiramente correspondido”. Com o inicio da guerra Colonial e na impossibilidade de viver num clima de guerra, regressou à Europa, expondo individualmente pela primeira vez em Lisboa em 1967 na Galeria Bucholz, dirigida por Rui Mário Gonçalves. Foi decisiva a colaboração de Cruzeiro Seixas na orientação estética da Galeria de São Mamede que, dirigida por Pereira Coutinho, veio a ser considerada uma das melhores galerias do Pais, como promotora do Surrealismo em Portugal desde os anos 60/70. A Cruzeiro Seixas se deve a revelação dos então jovens surrealistas Raúl Perez e Mário Botas e a consagração de Paula Rego, Areal, Carlos Calvet, Júlio, Cesariny, Michaux, Alechinsky, Escada e outros que expuseram e ainda expõem na Galeria de São Mamede. Representado em diversas obras da autoria de Rui Mário Gonçalves: “100 Pintores Portugueses do Século XX”, Edições Alfa, 1986; “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004; “Cruzeiro Seixas, Com a asa por dentro”, Editorial Caminho, 2007. 6 Mário Cesariny (1923-2006) Nasceu, viveu e morreu em Lisboa. Em 1947, no imediato pós-segunda guerra Mundial, Cesariny, Michaux e Wols foram os primeiros, entre outros, a assumirem historicamente o Surrealismo informal e abstrato através da prática do automatismo psíquico. Mais conhecido como poeta Cesariny declara que “ao contrário do que pode parecer foi a des-pintura que me ajudou a desregrar e a desmembrar a linguagem que, a partir daí, pratiquei nos meus versos”. Cesariny é, porventura, a personalidade mais marcante do surrealismo em Portugal. A ele se deve a organização de uma Antologia do Surrealismo-Abjeccionismo Português, com textos e imagens de diversos autores que tentam responder à seguinte pergunta, formulada por Pedro Oom: “O QUE PODE FAZER UM HOMEM DESESPERADO, QUANDO O AR É UM VOMITO E NÓS SERES ABJECTOS?” Nesta condição e na época negra de má memória a que se reporta, o Surrealismo--Abjeccionismo Português é talvez o menos conhecido do mundo e o mais assumidamente marginal e marginalizado pelo sistema dominante. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 7 Carlos Calvet (1928-2014) Nasceu, viveu e morreu em Lisboa. Diplomou-se em Arquitetura na escola do Porto. Desde 1946, dedica-se à pintura surrealista metafísica com influência de Chirico. Em 1948/50, pratica com Mário Henrique Leiria e Areal a técnica do cadavre-exquis. Na sua pintura tudo se objectualiza. Em algumas paisagens aparecem ondas do mar e nuvens representadas como se fossem sólidos geométricos. No jogo ambíguo de perspectivas invertidas e desproporções intencionais, representa o infinito (uma paisagem), dentro do finito (uma caixa de fósforos), dados monumentais lançados pela mão humana gigantesca, no espaço onde tudo se recorta, na nitidez da cor lisa e contrastante. Numa unha vê-se representado um arco-íris – “paradoxos da representação imagética” – elucida o pintor. Prémio AICA/Soquil 1968. Carlos Calvet realizou 4 exposições individuais na Galeria de São Mamede, em 1979, 1986, 1987, 1996, prefaciadas por Rui Mário Gonçalves. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004.


Nikias Skapinakis, S/ TĂ­tulo, 1958, Guache sb papel, 22x31cm


8 Jorge Pinheiro (1931) Nasceu em Coimbra, frequentou a escola Nacional de Belas Artes em Lisboa e no Porto onde foi professor de pintura. Expõe desde 1954. Em 1966, adere ao abstracionismo-geométrico que executa com extremo rigor e grande sensibilidade cromática, em composições minimalistas de subtil impacto visual, sobre tela de grandes dimensões (120x190cm), como a que aqui exibe, datada de 1981.Com o mesmo rigor técnico e meticulosa concepção surge a sua posterior Figuração Emblemática da série “bispos” e outras figuras hieráticas. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986.

Jorge Pinheiro, “Penélope” (Série Ulisses), 1981, Acrílico sb Tela, 120x190cm

Eurico Gonçalves, “Árvore da Vida”, 1958, Pintura sb platex, 84x63cm

António Areal, s/ Título (Série Coleccionador), 1976/77, Tecnica mista sb papel, 70x50cm

9 Nikias Skapinakis (1931) De família grega, nasceu em Coimbra. Participou nas Exposições Gerais de Artes Pláticas da Sociedade Nacional de Belas Artes, desde 1948 a 1956. Resolutamente figurativo, “Skapinakis começa a sua pintura numa oscilação entre um lírismo de cores vivas e um paisagismo urbano utrilhiano”. Notabiliza-se na arte do retrato colectivo, designadamente no quadro “Tertúlia”, 1960 (os escritores Cochofel, Joel Serrão e Augusto Abelaire) e no Café “A Brasileira” no Chiado, os críticos d’ arte Rui Mário Gonçalves, Francisco Bronze, Fernando Pernes e José-Augusto França, 1971, membros do júri que seleccionou os pintores dos quadros que decoram o café desde 1971. Cerca de 1967, o seu processo de representação absorve elementos da arte do poster e, desse modo, Skapinakis dá o seu contributo para a satisfação do gosto pop, com cores lisas de silhuetas figurativas, rebatidas no plano frontal do suporte. Além dos retratos pinta séries contestatárias, como os “Caminhos da Liberdade”, 1969/70 e “Sedução de Miss Europa”, 1970. Depois do 25 de Abril, um grande quadro alegórico, “Delacroix no 25 de Abril em Atenas, 1974/75. Com o paisagismo dos anos 80, Skapinakis recupera o seu inicial lirísmo cromático, conforma afirma Rui Mário Gonçalves, no seu livro: “100 Pintores Portugueses do Século XX”– Edições Alfa, 1986. 10 Eurico Gonçalves (1932) Nasceu em Penafiel. Vive em Lisboa. Pintor, professor e crítico d’Arte membro da AICA. A inocência Original e a Poética do maravilhoso no Surrealismo Onírico de Henri Rousseau, Chagall e Miró, a que Eurico foi muito sensível, desde 1949. Em 1950-51 escreveu e ilustrou 4 Cadernos de Juventude, com poemas, narrativas de sonhos e textos automáticos. Estes cadernos só viriam a ser publicados quarenta e cinco anos mais tarde, em 1995. O automatismo psíquico puro está na origem da posterior Pintura Gestual e caligráfica, de inspiração Zen, desde 1962. Eurico expõe desde 1954, prefaciado por Mário Cesariny, Cruzeiro Seixas, José Augusto França, Rui Mário Gonçalves, António Nóvoa, Fernando Pernes, Sílvia Chicó, Dalila D’Alte, Ernesto Sampaio, Melo e Castro, Ana Hatherly, Maria João Fernandes, Fátima Lambert e outros que reconhecem o Surrealismo e o Zen na sua obra. Em 1966-67, Eurico foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, sob a orientação artística do pintor francês Jean Dagottex. Em 1972, prefaciou uma importante exposição de pintura de Henri Michaux, na galeria de São Mamede, em Lisboa. Nos anos 60 e 70, exerceu intensa atividade critica em jornais e revistas portuguesas. Eurico Gonçalves é autor dos livros: “Pintura das crianças e nós-pais, professores e educadores”, Porto editora, 1976; “A arte descobre a criança, a criança descobre a arte” (4 volumes), Raiz editora, 1991/93; (colaboradora e co-autora Dalila D’Alte); “Dádá-Zen – Pintura escrita”, Editora Quasi, 2005; Ilustrou “Canções de beber” de Fernando Pessoa, Editora Tiragem, 1997 Expôs na Galeria de São Mamede, em 1970 e 2000, prefaciado por Mário Cesariny e Ernesto Sampaio. 11 António Areal (1934-1978) Cunhado de Carlos Calvet, cedo se revelou um extraordinário desenhador surrealista, distinguido com prémio de desenho na Primeira Exposição Gulbenkian, em 1957. Depois de 1960, inicia-se como pintor e objectualista abeirando-se da Arte Conceptual ou de citação na figuração de segundo grau, onde a caixa e o disco surgem como arquétipos do inconsciente. Em 1964, Areal realiza e expõe objetos acompanhados de títulos intrigantes: Presépio sentimental; Projecto de Monumento a Robespierre, Lautréamont Zangado etc. Areal cita Velasquez e Picasso, em 1966/67. Realizou 4 exposições individuais na Galeria de São Mamede, em 1969;1971;1973;1989, 2 prefaciadas por Rui Mário Gonçalves, 1 com texto do autor e 2 prefaciadas por Lima de Freitas e João Pinharanda. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. Em 1976, realizou desenhos da série “Colecionador”.


12 José Escada (1934-1980) Nasceu e morreu em Lisboa. Frequentou a escola António Arroio e a Escola Superior de belas-Artes de Lisboa. Participou no grupo KWY, em Paris, nos anos 60, com Lurdes Castro, René Bertholo, Gonçalo Duarte, João Vieira, Costa Pinheiro, Voss e Christo. Em 1965, a sua pintura emblemática de microfiguras simétricas, que emergem luminosas de um fundo sombrio, revelam reminiscências do subconsciente. Em 1967, objectualiza essas figuras simétricas recortadas em relevo. Numa exposição em 1979, na Galeria São Mamede, mostrou pintura autobiográfica da sua ultima fase, que representa cães, ciprestes, paisagens longínquas e infinitas. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 13 João Vieira (1934-2009) Nasceu em Vidago. Frequentou a Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, em 1951-53. Adere à Poesia Visual de Melo e Castro e Ana Hatherly, que motiva e inspire a sua pintura letrista, gestual e espatulada, desde 1960-61, em composições neo-barrocas de densa cor matéria táctil, que evocam os informalistas espanhóis Saura, Feito e Millares. Em Paris, em 1959, funda o grupo KWY com René Bertholo, Lourdes Castro, Escada, Gonçalo Duarte, Costa Pinheiro, Voss e Christo, que publica uma revista e expõe em Lisboa, em 1960, na Sociedade Nacional de Belas Artes. O letrismo e o antropomorfismo inter-relacionam-se na pintura gestual de João Vieira, em vias de se condensarem na performance corporal, que recorre à utilização de máscaras populares de Trás-os-Montes, sua terra natal. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 14 Helena Almeida (1934) Nasceu e vive em Lisboa. Filha do escultor Leopoldo de Almeida, casada com o arquiteto e escultor Artur Rosa, mãe da desenhadora Joana Rosa. Diplomada em pintura pela Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, Helena Almeida participou na II Exposição Gulbenkian, em 1961 e em 1964, parte como bolseira para Paris, interessando-se pela pintura abstrata-lírica, que exalta a pureza da cor lisa e contrastante, rebatida no plano do suporte de grandes dimensões como a que se exibe nesta exposição, datada de 1966, onde a ritmicidade das formas geometrizadas e das cores estabelecem uma imediata relação com o acto de pintar, a que se associa o movimento corporal da autora, que viria a registar fotograficamente como principal e única protagonista da body-arte conceptual. A fotografia regista sequências sugestivas de acções corporais da autora, intituladas: engolir o azul; desenhar a linha “que é a linha mesmo” (José Augusto-França); perfurar a tela, como Fontana; Negro exterior, onde a tinta negra nega os limites do corpo, provocando a sensação de expansão física no espaço. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 15 René Bértholo (1935-2005) Nasceu em Alhandra. Frequentou a Escola Superior de Belas Artes em Lisboa e aí se relacionou com Lourdes Castro, Escada, Lopes Alves, Sebastião Fonseca, Nuno Portas e outros, que criaram a revista de estudantes Ver (1953), animaram a Galeria Pórtico (1955-56) e partilharam com Gonçalo Duarte e João Vieira um atelier em cima do café Gelo no Rossio. A este grupo juntaram-se Costa Pinheiro, Jan Voss e Christo que, em Paris, criaram a revista KWY, em 1959. Com inevitável influência de Paul Klee, René Bértholo é sensível à “linearidade pura” do desenho que cria figuras-signos de objectos simples do quotidiano, ao alcançe de qualquer mão. É bom lembrar que esta nova figuração lírica dos anos 60 é antecedida, no final dos anos 50, pela prática da pintura informalista, gestual e abstratizante. O seu informalismo permitiu-lhe, no desenho estar atento às figuras emergentes (...)identificadoras de pequenos objetos alusivos à vida do quotidiano português como: emblemas, bandeiras, carros em miniatura, etc... Com o mesmo espirito ludico da imaginação que se reporta ao conhecido e ao desconhecido, desde a infância, René Bértholo realizou também objetos-brinquedos que se movem com motores eléctricos ocultos. Recorrendo à imagem digital aperfeicoou o seu vocabulário neo-figurativo, em favor da poética do maravilhoso. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004.

José Escada, “Ciprestes com Cães (Gitane e Strof)”, 1977, Óleo sb Tela, 50x76cm

João Vieira, S/ Título, 1991, Óleo sb Tela, 100x100cm

René Bértholo, S/ Título (Composição abstracta), 1957, Pintura sb platex, 65x49cm


16 Ângelo de Sousa (1938-2011) Nasceu em Lourenço Marque (Maputo). Diplomou-se em Pintura na Escola Superior de Belas Artes do Porto, onde foi professor desde 1963. O então jovem artista Ângelo e o consagrado Almada Negreiros expuseram juntos na inauguração da Galeria Divulgação, no Porto em 1959. Sobressai a pureza do cromatismo tímbrico na pintura abstrata, de estrutura minimalista, de Ângelo de Sousa. Observada como um todo em função da textura do suporte, a autonomia da cor sensorial, consequente da sobreposição das três cores primárias, evidencia a transparência da tinta muito diluida, rigorosamente aplicada, em sucessivas camadas. A vocação musical da sua pintura extremamente depurada, cria grandes superficies aparentemente monocromáticas, de súbtil vibração luminosa. A maturidade técnica da sua obra original é reconhecida e premiada na Bienal Internacional de São paulo em 1975. Ângelo de Sousa é um Caso Notável da Arte Moderna Portuguesa, representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986.

Ângelo de Sousa, S/ Título, 1972, Pintura sb platex, 100x70cm

Eduardo Nery, 1968, Pintura sb madeira, 65x65x12cm

Emília Nadal, “Sonata”, 2005, Acrílico s/ Tela, 50x65cm

17 Eduardo Nery (1938-2014) Nasceu na Figueira da Foz.Viveu e morreu em Lisboa. Desde os anos 60, praticou o Abstraccionismo Geométrico de ilusório efeito óptico-op-Arte, criando uma rigorosa relação entre a pintura e a arquitectura urbana. Daí a razão de ser da sua Arte Pública, integrada no espaço urbano. Em Lisboa há grandes murais de Eduardo Nery na Avenida Infante Santo, na estação de metropolitano do Campo Grande, e no edifício “Franjinhas”, perto do Marquês de Pombal. Jogando com a ilusão d’óptica da perspectiva na representação de volumes no plano bidimensional do suporte, Eduardo Nery desenha arquitecturas como nos compêndios de design, que parecem flutuar no espaço, alheias à força da gravidade. Esta figuração de 2º grau podemos observar na pintura exposta no espaço interior do café “A Brasileira” do Chiado. A sua imagética não se cinge à pintura, abrange também a colagem da livre associação de imagens, desviadas do seu contexto habitual, na exposição individual, intitulada “O Museu Imaginário da Sociedade de Consumo”, em 1976. Na obra de Eduardo Nery, o cubo é um arquétipo do espírito construtivo, que joga com a ilusão d’óptica na op-arte do abstraccionismo geométrico. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 18 Emília Nadal (1938) Nasceu em Lisboa e termina o curso de pintura na Escola Superior de Belas-Artes em 1961. Gravadora, Pintora, Objectualista, a sua Arte oscila entre o Sagrado e a Contestação de valores instituídos de Arte, Civilização e Progresso, que desembocam em guerras absurdas. Arte de atitude conceptual neo-dádá. No caso de Emília Nadal, sobressaí a relação afectiva com o mundo que a rodeia, tão direta e delicada quanto sensível e profunda. Há um respeito mútuo pela personalidade de cada um, que proporciona o diálogo no melhor sentido, aberto à confrontação de ideias, projectos e sensações. Neste jogo de equilibrio entre palavras, ideias e imagens – o pensamento verbal e o pensamento visual – a arte de Emília Nadal, não dispensa, antes estimula o confronto de pontos de vista, na formação de opiniões divergentes, absolutamente necessárias para o enriquecimento, desenvolvimento e aprofundamento da atitude mais correcta, capaz de vencer todas as limitações ou regras demasiado rígidas para o Poema livre que se propõe construir no seu verdadeiro sentido lúdico, que começa na infância e se prolonga ao longo da vida. A sua serenidade reside na relação entre a verticalidade do fio de prumo e a horizontalidade das águas em repouso, a que contrapõe a obliquidade da luz, da paisagem de infinito. As suas paisagens obliquas de infinito elevam o ser a atitudes inesperadas, onde tudo se dissolve na fluidez da luz. Assim se promove o sentido do sagrado do espaço sem fim da inquietante e enigmática natureza humana, que descobre e aprofunda a transcendência da alma para além da morte. Não há Arte sem alma! A alma anima a Vida! 19 Álvaro Lapa (1939-2006) Nasceu em Évora. Licensiado em Filosofia e pintor autodidata, cedo aderiu ao Surrealismo e à Arte Bruta de Jean Dubuffet, que se manifesta “Contra a Cultura Asfixiante”. Na nova figuração narrativa e autobiográfica da Àlvaro Lapa dos anos 60-70, inscrevem-se títulos e frases que acentuam a atitude conceptual da sua obra. A formação literária do pintor, não só incide


Helena Almeida, S/ TĂ­tulo, 1966, Pintura sb Tela, 130x110cm


Alvaro Lapa, n/d, Pintura sb papel colado em madeira, 70x100cm

Guilherme Parente, 1970-74, Acrílico sb tela, 95x62cm

Jorge Martins, 1961, Pintura sb Tela, 90x120cm

António Sena, n/d, Pintura sb cartão, 60x80cm

predominantemente na Poesia e Filosofia, como abrange também a Psicanálise de Wilhelm Reich e o Budismo Zen. Recordo que ele e o poeta António Ramos Rosa, a quem comprei um livro de Suzuki, foram, porventura, os portugueses que se interessaram pelo espírito Zen, tais como eu, o Herberto Helder, o António Maria Lisboa, o Manuel Lima, a Ana Hatherly, o Victor Pomar, o Sebastião Resende, Alberto Carneiro e poucos mais. “Pinto porque sou um escritor falhado. Escrevo porque sou um pintor falhado” – declarou Álvaro Lapa. Entre estes dois falhanços, revela-se uma autenticidade expressiva única e original. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986. 20 Guilherme Parente (1940) Vive em Lisboa e Cascais. Cedo se tornou conhecido como gravador e pintor, expondo em salões colectivos da S.N.B.A. e individualmente em galerias comerciais e instituições culturais, designadamente na Galeria São Mamede e no Palácio Nacional da Ajuda, em 2006. A sua nova figuração onírica, de apurada sensibilidade cromática, é referenciado no livro “Vontade de Mudança” – cinco décadas de artes plásticas – 1940/1990 – de Rui Mário Gonçalves – Edições Caminho, 2004. Como membro do MDAP (Movimento Democrático de Artistas Plásticos), Guilherme Parente participou na realização do monumental painel – 25 x 4,5 m de homenagem ao 25 de Abril de 1974, Dia da Libertação – pintura colectiva de 48 artistas, do MDAP, que o fogo destruiu, sete anos depois em 1981, com João Hogan, Sérgio Pombo, Júlio Pereira, Teresa Magalhães e Virgílio Domingues. Guilherme Parente pertenceu ao grupo 5+1. Em1979, foram representadas na S.N.B.A. obras pertencentes à coleção da SEC e da Fundação Calouste Gulbenkian, realizadas entre 1968 e 1978, de Guilherme Parente, Alberto Carneiro, António Sena, Emília Nadal, Costa Pinheiro, Batarda, Helder Baptista, Henrique Manuel, Justino Alves,Teresa Magalhães, Rocha de Sousa, Luís Dourdil, Manuel Baptista, Maria Gabriel, Menez, Skapinakis, Paula Rego e outros autores conhecidos. Na obra gráfica e pictórica de Guilherme Parente, sobressai a autenticidade expressiva da sua imagética delicada e sensível da Nova-Figuração Onírica, onde a cor prevalece como elemento primordial de encantamento e fascínio. 21 Jorge Martins (1940) Nasceu em Lisboa. Em 1957, inscreveu-se no curso de Arquitetura da Escola Superior de Belas Artes De Lisboa. Cedo revela a sua vocação para a pintura, expondo guaches abstratos, em 1958, numa coletiva organizada pelo Rui Mário Gonçalves, na associação de estudantes da Faculdade de Ciências. Em 1961, realizou a sua primeira exposição individual na Galeria Diário de Notícias em Lisboa e logo a seguir, partiu para Paris, onde se fixou, durante vários anos, convivendo com José Escada e outros artistas portugueses aí exilados, por razões politicas. A pintura de Jorge Martins transitou do neoimpressionismo abstrato para o neofigurativismo que, a partir de 1945, surge também nas obras de artistas portugueses da mesma geração como René Bértholo, Eduardo Luís, Gonçalo Duarte e outros, residentes na capital francesa. No seu peculiar neo-figurativismo, Jorge Martins representa peças de puzzle justapostas no plano do suporte, simulando o relevo dos contornos, através de luz rasante. A cor-luz é, aliás o elemento primordial da pintura neo-figurativa, nos anos 70, e abstratizante, nos anos 80, quando se torna cada vez mais depurada, na recuperação da nudez do suporte. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 22 António Sena (1941) Nasceu em Lisboa. O seu grafismo gestual cedo revelou grande autenticidade expressiva em desenhos e pinturas que valorizam a nudez do suporte (papel e tela). A sua pintura-escrita começa por evocar a garatuja infantil em composições informais abstratas-líricas, de estrutura elementar. Da inicial pureza e simplicidade de processos, que estimulam a expressão imediata do gesto espontâneo, transita para uma posterior pintura porventura mais elaborada e não menos


António Palolo, 1970, Óleo sb Tela, 122x99cm


significativa. Nos anos 60, António Sena expôs nas Galerias 111 e Divulgação, em Lisboa, obtendo favoráveis referências criticas de Fernando Pernes e Rui Mário Gonçalves. Bolseiro da Fundação Gulbenkian para frequentar em Londres a Saint Martins School of Arts, Sena aí se manteve de 1965 a 1969. Publicamente reconhecido pela critica mais exigente, obteve o importante prémio de vanguarda, o prémio GM67. Na colecção de arte de Rui Mário Gonçalves, surge uma tela dessa época pintada a spray. “Uma vibração subtil é conseguida através da interação das estruturas frontais (...), valorizando desse modo o plano do suporte” – escreve Rui Mário Gonçalves in 100 Pintores Portugueses do Séc. XX. “Sensorial e emotivo são os diversos modos de comtemplação despertados, na consequência dos signos informais e da pintorura contagiante da mancha livre”. Pinturas mais recentes sobre cartão (60 x 80 cm), expostas na Galeria de São Mamede, em Lisboa em 2014, valorizam a textura informal da matéria pictórica. Noronha da Costa, n/d, Pintura sb Tela, 54x65cm

Raúl Perez, S/ Título, 2009, Óleo sb Tela, 25x43cm

Fernando Calhau, 1972, Pintura sb Tela, 55x55cm

23 Noronha da Costa (1942) Nasceu em Lisboa, onde estudou arquitectura. Em 1966 iniciou-se na pintura a spray que cria um écran (daí a sua relação com o cinema), onde a figuração difusa, discretamente iluminada, emerge do fundo sombrio envolvente, suscitando mistério e fascínio. A sua imagética fantasmática, de delicada textura transparente, joga com valores visuais para além a para aquém do plano do suporte, onde por vezes surgem informais relevos tácteis. Esta écran como prototipo do espaço plano e em relevo, tende a objectualizar-se em espelhos foscos, onde se diluem os contornos da imagem ilusória, provocando uma experiência sensorial, intimista e neo-romântica, que tanto evoca a pintura metafísica de Magritte, como a antiguidade clássica de mestres holandeses, num espirito de pesquisa audacioso, simultaneamente cartesiano e barroco. Prémio AICA/SOQUIL em 1969. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986. 24 Raúl Perez (1944) Nasceu no Minho. Vive em Lisboa. A convite do pintor surrealista Cruzeiro Seixas, expôs individualmente na Galeria de São Mamede, Lisboa, em 1972. Desde 1973, participa em exposições colectivas do Movimento Internacional Phases. Em 1977, expõe em Amsterdão com o inglês Philip West, o holandês Rik Lina e o português Cruzeiro Seixas. Meticulosamente elaborada, a pintura de Raúl Pérez cria uma imagética contagiante e organicista de seres hibridos, de contornos moles e ondulantes em áridas arquiteturas e crepusculares ambientes metafísicos. Realizou 6 exposições individuais na Galeria São Mamede, prefaciado por Mário Cesariny em 1972, Cruzeiro Seixas e Lima de Freitas em 1982 e 1985, Lauraens Van Krevel em 1988 e Maria João Fernandes em 2009. 25 António Palolo (1946-2000) Nasceu em Évora, onde conviveu com artistas mais velhos. Charrua, Joaquim Bravo e Álvaro Lapa. Descoberto por Rui Mário Gonçalves a António Areal, expôs individualmente pela primeira vez em 1964, com 18 anos de idade, na Galeria 111 em Lisboa. A sua pintura transita do informalismo abstracto para o neo figurativismo geometrizado, realçado com cores lisas e contrastantes, criando uma relação lúdica e ambígua entre o plano frontal da tela e a sugestão de volume, tal como se pode observar no quadro, datado de 1970, pintura sobre tela com 120 x 100 cm – exposto na Galeria São Mamede. Em 1971, como neofigurativo de inspiração pop neo-dádá, Palolo cita um ready-made de Marcel Duchamp, na pintura que realizou para a decoração do café “A Brasileira” do Chiado. Posteriormente, a sua pintura evolui no sentido da nova Abstração Geométrica e Minimalista de estruturas primárias, rebatidas no plano do suporte, com cores lisas e contrastantes. Aliás, o cromatismo vivo e alegre é preponderante na sua obra, surpreendentemente inovadora. “A Alegria é a coisa mais séria do Mundo” – Almada Negreiros Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986.


26 Fernando Calhau (1948-2002) Nasceu em Lisboa, onde viveu e morreu. Pintor abstracto-geométrico, minimalista, representado na Colecção do Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian e no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986. A sua pintura aparentemente monocromática com subtis variações tonais da mesma cor, quase sempre verde luminoso, é concebida e executada com extremo rigor e apurada sensibilidade visual à estrutura elementar da forma geométrica, cuja textura da superficie de contornos rectilíneos bem definidos oscila entyre a transparência da cor-luz e a opacidade da cor matérica. 27 Carlos Carreiro (1947) Nasceu nos Açores em Ponta Delgada. Diplomou-se em Pintura na Escola Superior de Belas Artes do Porto, onde é professor.Começou a expor em 1967. Em 1973, o critico Fernando Pernes chamou-lhe “o Jerónimo Bosch da sociedade de consumo”. A sua nova figuração narrativa, minunciosa e acumulativa de inspiração pop, não só evoca cenas hilariantes e festivas do quotidiano contemporâneo, plenas de fantasia e humor, como se abeira da poética do Maravilhoso na intencional desproporção afectiva de personagens de histórias de encantar. As fábulas e os contos de fadas, reportam-nos ao fascinio do poder imaginativo da infância, sensível ao colorido minuncioso de pormenores de multiplas cenas diversas, acumulativas na pintura de Carlos Carreiro. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 28 Mário Botas (1952-1983) Nasceu na Nazaré, viveu e morreu em Lisboa. Médico e pintor autodidata, expôs pela primeira vez em 1973, na Galeria São Mamede, Lisboa: “Seis contrações de matrimónio seguidos de 18 ilustrações profundamente autobiográficas. A Galeria São Mamede, na altura orientada pelo pintor surrealista Cruzeiro Seixas, a quem se deve a revelação deste pintor, bem como a de Raúl Perez (1944), que, a seu convite aí expuseram em 1972/3. Três surrealistas que mantiveram uma relação amistosa de mútua admiração, realizando “cadavres-exquis”, apresentados na galeria Ottolini, em Lisboa. Em 1980, Mário Botas apareceu juntamente com o desenhador satírico Henrique Manuel, na Galeria do Jornal de Noticias (Porto). Mário Botas releu atentamente e ilustrou poemas que admirava de autores como Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Raúl de Carvalho, Eugénio de Andrade, Luis de Camões, Maria Alcoforado, Baudelaire, entre outros. A sua paixão pela literatura levou-o a misturar dados autobiográficos nas ilustrações, onde surgem auto-retratos. Os seus numerosos desenhos aguarelados, revelam apurada sensibilidade gráfica, associada ao simbolismo cromático e à iluminação discreta da sua imagética fantasmagórica. Vitima de uma doença incurável (leucemia), Mário Botas morreu em 1983, com 31 anos de idade. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986. 29 Luis Camacho (1956) Nasceu em Moura. Estudou na Escola António Arroio e na Escola Superior De Belas Artes De Lisboa. Começou a expor em 1974, na Galeria Futura. O formato do suporte, alongado na vertical e/ou na horizontal, obriga os olhos a percorrerem a pintura de cima para baixo e/ou da esquerda para a direita. Nessas duas direções, na vertical e na horizontal, se inscrevem signos lineares e manchas de cor informais e complementares. Na vertical, num fundo de cores quentes (laranja e amarelo), se inscrevem manchas e signos de cores frias (azul e verde). Na horizontal, áreas de cores quentes de contornos moles e ondulantes, contrapõem-se a áreas de cores frias de contornos duros, rectilineos e angulosos. Sem perda de sensualidade, as formas moles e duras e as cores quentes e frias, criam um clima propicio à rêverie. Os próprios títulos são sugestivos: Amo-te (1986), Manhã (1988), Secreto (1988), Rosa (1988), Carne (1988), Paisagem para um fruto (1983). Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986.

Carlos Carreiro, Encenação complicada demais para um ovo estrelado, 2010, Acrílico sb tela, 80x100cm

Mário Botas, 1977, Técnica mista sb papel, 18,5x14cm

Luís Camacho, “Sítio”, 1984, Guache sb papel, 21x30cm


30 Sofia Areal (1960) Filha de António Areal, participa nesta exposição Eurico com Gonçalves pintura emblemática, gestual e de vibrante cromatismo, intitulada “PXP”, 2014 – uma pintura com 100 x 150 cm. O automatismo psiquico da sua pintura gestual revela arquétipos do inconsciente colectivo, como o círculo e a espiral, que irradiam luz solar e movimento, em composições elementares de cores vivas e contrastantes, incluindo o preto e o branco. Os seus círculos sugerem bolas, sois que rodopiam, associados a espirais que desencadeiam ritmos circulares, arabescos, que a cor realça na vibração contínua do gesto impulsivo que, com os inevitáveis salpicos da tinta do pincel, se inscreve no espaço topológico do suporte (papel ou tela). “é no ar que ondeia tudo, é lá que tudo existe” (Mário Sá Carneiro) Rui Mário Gonçalves escreveu o texto do catálogo da sua exposição realizada pela Galeria São Mamede em 2009.

Sofia Areal, “PXP”, 2014, Pintura sb papel, 150x101cm

Pedro Proença, 2002, Pintura sb Tela, 200x150cm

Fala Mariam, “Os Domínios”, 2009, Acrílico sb Tela, 80x100cm

31 Pedro Proença (1962) Nasceu em Angola. Frequentou o curso de formação Artística da Sociedade Nacional De Belas Artes e na Escola Superior De Belas Artes De Lisboa. Expõe desde 1984 com Manuel João Vieira, Xana e Pedro Portugal. Pedro Proença faz parte do grupo Homeostático, que expôs colectivamente na Sociedade Nacional De Belas Artes. A sua nova figuração estilizada e distorcida evidencia, em grandes superficies, a pureza do desenho linear, minuncioso e ornamental, realçado na pintura com cores lisas. Na Galeria de São Mamede, em Lisboa em 2015, expõe pintura sobre tela de grandes dimensões – 200 x 150 cm de cromatismo vibrante e inspiração pop, datado de 2002. Representado no livro “100 Pintores Portugueses do Século XX” de Rui Mário Gonçalves – Edições Alfa, 1986; e em “Vontade de Mudança”, Edições Caminho, 2004. 32 Fala Mariam (1962) Nasceu em Lisboa onde vive. Expõe desde 1986, prefaciada por Fernando de Azevedo (1987) e José Augusto-França, na Fundação Gulbenkian (1992). Rui Mário Gonçalves, na Sociedade Nacional De Belas Artes (1995) e na Galeria São Mamede, em Lisboa em 2007. Bolseira da Fundação Gulbenkian, em 1986/88. Prémio Nacional de pintura Júlio Resende, em Gondomar em 1997. Participou em Salões colectivos da Sociedade Nacional De Belas Artes, nomeadamente “Mitos e transfigurações” (2000); “100 anos 100 artistas” (2002). A pintura é antes de mais nada uma superficie coberta de tintas dispostas de uma certa maneira”, como dizia o simbolista Maurice Denis. Efectivamente, uma das caracteristicas em que primeiro se repara na pintura de Fala Mariam é a nitidez com que os elementos pictóricos, se apresentam, sejam eles as linhas e as cores, a mancha livre e a contornada, (...), o contorno aberto e o fechado, a coloração lisa e a manchada, o valor luminoso e o abafado. Predomina em muitos dos seus quadros um fundo homogéneo e unificado com o plano de suporte, fazendo-nos considerar a sua pintura como uma peculiar escrita de “signos concisos e ageis, disponiveis para fixar o inefável”- escreve Rui Mário Gonçalves, no prefácio que lhe dedica, na exposição individual na Galeria de São Mamede em 2007, acrescentando: “os seus quadros sensuais e refinados revelam-se menos ao consciente do contemplador, do que ao seu inconsciente, pois esta parte do mundo psiquico está naturalmente mais incapacitada para tão complexa percepção. Esta é aliás a mais profícua percepção estética. A pintura concebida como escrita, encontra pois uma versatilidade extraordinária na expresão de Fala Mariam (...), que se concentra no que é genuinamente seu, e pelo qual se responsabiliza.” É uma autenticidade expressiva livre, pessoal e original, que nos surpreende como um caso único, digno da mais apurada sensibilidade e admiração. Eurico Gonçalves


Rui-Mário de Melo e Sousa Gonçalves nasceu em 1934, em Abragão (Penafiel). É licenciado em Ciências Físico-Químicas pela Faculdade de Ciências de Lisboa. Enquanto estudante, foi dirigente associativo, ocupando-se da secção cultural. Começou então a realizar exposições didácticas com reproduções, promoveu conferências e colóquios com especialistas e organizou exposições com obras originais, nomeadamente a Primeira Retrospectiva da Pintura Não-Figurativa Por tuguesa, em 1958. Começou a publicar regularmente críticas de ar te no Jornal de Letras e Ar tes, em 1961. Em 1963, obteve por unanimidade do júri, o Prémio Gulbenkian da Crítica de Ar te. No mesmo ano, par tiu para Paris, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, para estudar com Francastel, Cassou e outros. Em 1966, voltou a Lisboa, continuando a sua actividade de crítico. Em 1967, ingressou na equipa de Professores do Curso de Formação Ar tística da Sociedade Nacional de Belas-Ar tes, onde leccionou durante dezanove anos. No final da década de 60, dirigiu a Galeria de Ar te da Livraria Buchholz, Lisboa, onde organizou inúmeras, relevantes exposições, conferências etc. Em 1972, integrou o professorado do Conservatório Nacional, nas escolas de Cinema e de Teatro, numa acção de renovação pedagógica. Em 1974, passou a professor convidado, no Depar tamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde se jubilou como Professor Catedrático. Par ticipou nos corpos directivos da Sociedade Nacional de Belas-Ar tes, Secção Por tuguesa da Associação Internacional de Críticos de Ar te – AICA, na Cooperativa de Gravadores Por tugueses. Manteve intensa actividade como ar ticulista e conferencista sobre ar te do século XX. Par ticipou numa investigação de educação pela ar te, no Centro da Ar te Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, de que resultou a publicação de Primeiro Olhar, (2003). Colaborou em enciclopédias e histórias da ar te. Entre livros publicados contam-se entre outros:

- Pintura e Escultura em Por tugal – 1940-1980, 1ª edição 1980 (3 edições esgotadas), Biblioteca Breve, Instituto de Cultura Por tuguesa; António Dacosta, col. Ar te e ar tistas, Ed. Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1984; Em colaboração com o Arqº Francisco Silva Dias, Dez Anos de Ar tes Plásticas e Arquitectura em Por tugal, 1974-1984,Editorial Caminho,1985; O Fantástico na Ar te Por tuguesa Contemporânea, Ed. Fundação C. Gulbenkian, 1986; Pioneiros da Ar te Moderna, vol. 12 da História da Ar te Por tuguesa, Ed. Alfa, 1986. – De 1945 à Actualidade, vol. 13 da História da Ar te Por tuguesa, Ed. Alfa, 1986; Cem Pintores Por tugueses do Século XX, 1986; O Fantástico na Ar te Por tuguesa Contemporânea, Ed. Fundação C. Gulbenkian, 1986; O Imaginário da Cidade, ed. F. C. Gulbenkian – Acar te , 1989; O Sagrado e as Culturas, Ed. F. C. Gulbenkian (Acar te), 1989; Os Anos 50, Ed. Fundação Calouste Gulbenkian, 1992; A Ar te em Por tugal no séc. XX, Círculo dos Leitores, 1998; O Que Há de Por tuguês na Ar te Moderna Por tuguesa, ed. Instituto de Comunicação Social, 1998; Vontade de Mudança, Editorial Caminho, 2004; Almada Negreiros. O Menino de Olhos de Gigante, col. Caminhos da Ar te Portuguesa no Século XX, editorial Caminho, 2005; Amadeo de Souza-Cardoso. A ânsia de Originalidade, Coleçcão Caminhos da Ar te Por tuguesa no Século XX, Editorial Caminho, 2006; Cruzeiro Seixas. Com a Asa por Dentro, colecção Caminhos da Ar te Por tuguesa no Século XX, Editorial Caminho, 2007. Colaborou no livro «Isto é Isto» sobre o ar tista Fernando Lemos, Ed. EDP., 2011 Os seus ar tigos foram publicados em: Jornal de Letras e Artes (1961-1968), A Capital, Expresso, República, Diário de Notícias, Jornal de Letras, Ar tes e Ideias, etc. Teve dois programas de ar tes plásticas na Radiodifusão Por tuguesa, Antena 2: As Cores e as Formas (1980-1989), A Dádiva das Formas (1995-2000).


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