Exposição "Entre o Rumor e o SIlêncio" Abril/2015

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Realização

entre o r umor e o silên c i o Apoio

marcílio costa


GALERIA THEODORO BRAGA Governo do Estado do Pará Simão Jatene

Capa: frame do vídeo A hora dos assassinos | 2013

Presidente da Fundação Cultural do Pará Dina Oliveira Diretor de Interação Cultural Walter Figueredo Gerente da Galeria Theodoro Braga Guilherme Teixeira Equipe da Galeria Theodoro Braga Eliane Moura Renato Torres San Rodrigues Gonçalo Neto Adan Costa (Estagiário) Curadoria Ednaldo Britto Projeto Gráfico Cria Comunicação Digital

Fotografia Marcílio Costa Montagem e Iluminação San Rodrigues e Gonçalo Neto

Exposição contemplada pelo edital de pautas da GTB/Fundação Cultural do Estado do Pará Galeria Theodoro Braga 09 a 30 de abril de 2015 Av. Gentil Bitttencourt, 650 (91) 3202-4313 galeriatheodorobraga@gmail.com


Marcílio Costa Poeta e Artista visual. Graduado em artes visuais pela Universidade Federal do Pará – UFPA. Principais Atividades e Produções Artísticas: • 2015 – selecionado para o projeto SESC Confluências; • 2015 – Selecionado para o VI Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia; • 2014 – Selecionado para Feira Independente latino-americana de Arte Contemporânea , São Paulo-SP; • 2014 – Selecionado para o Festival 5 minutos expandidos com a videoarte “Crescemos”; Salvador – Bahia;

entre o r umor e o silên c i o

• Selecionado para o III Salão Xumucuís de Arte Digital - 2014 (Belém – Pa); • 2014 – Roteiro e direção de Pedaços de Pássaros, curta-metragem. Projeto Selecionado pelo edital do Ministério da Cultura – Minc; • 2012 – Roteiro e direção de Para VLER poesia, séria de três curtas metragem. Projeto selecionado pelo Edital Curta cultura de Animação; • 2011 – Roteiro e direção de A outra voz; videoarte, 2º lugar no II Prêmio Cidade de Belém – Prefeitura Municipal de Belém/IPAMB;

marcílio costa

• 2011 – Prêmio Fotografia no II Prêmio Cidade de Belém – Prefeitura Municipal de Belém/IPAMB; • 2012 – depois da sede. Livro de poemas vencedor do “Prêmio Dalcídio Jurandir de Literatura – 2010”, Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves; • 2010 – celina. Livro de poemas vencedor do “Prêmio Vespasiano Ramos” da Academia Paraense de Letras. Editora: Paka – tatu; • 2010 – Todas as Ruas, projeto de criação literária – Bolsa FUNARTE de Criação Literária; •

2009 – Roteiro e codireção de Muragens: crônicas de um muro. Curta-metragem de animação;

Contatos: marciliocaldascosta@gmail.com (91) 98167-9867

Belém - Pará 2015


Entre o rumor e o silêncio Marisa Mokarzel

“Uma substância inerente à arte e não uma exclusividade da palavra”, assim Marcílio Costa define a poesia, pensando-a a partir de Octavio Paz em O Arco e a Lira. Poeta, artista visual locomove-se em um universo sem margens, ou acredita que a margem “é o limite entre uma coisa e outra, é a separação mas também o encontro entre essas coisas, é a zona incerta que é mar e terra ao mesmo tempo.”1 Por isso transita entre imensidões, mergulha e flutua por áreas distintas, permitindo-se atravessar por seres diversos. Um único papel não é suficiente, viver é mais, implica em voltar-se para si mesmo sem deixar de ver o outro e inserir-se no mundo sendo capaz de ir além das margens. Entre o rumor e o silêncio situa a sua arte que emerge do fluxo de seus movimentos, da fatura que não distingue o poeta do artista visual. Assim caminha-se pelas obras, amalgamados às palavras e às imagens, envoltos em sentimentos e incertezas, na inquietude da ação poética que desestabiliza, faz pensar e sentir. Ao nos convocar para o exercício dos sentidos o artista nos propõe “capturar, iluminar, o que a sombra e o silêncio sussurram.” Pode-se, então, começar por Walt Whitman, o som da Canção de mim mesmo que ecoa enquanto a imagem do poeta é evocada das páginas iniciais de Folhas de Relva. Da pose capturada pelo daguerreótipo de Gabriel Harrison e gravada por Samuel Hollyer, surge o homem comum, despojado de artifícios. A gravura e o poema são matérias constitutivas da instalação Whitman, Whitmen é delas que Marcílio Costa retira a celebração do humano, aproximando-se, dessa forma, do poeta norte-americano. A aproximação o conduz ao processo de reprodução da pose clássica de Whitman, na qual a figura do homem comum prevalece. O que importa é o cotidiano em seu incessante percurso, daí o artista convidar pescadores, pedreiros, professores, garis, prostitutas para experimentarem a pose corriqueira criada, interpretada por um poeta do século XIX. O que significa essa reprodução? Que sentido adquire em pleno século XXI? Quais papéis se fundem? Criação ou realidade? Mais uma vez as margens dispensam demarcações; livres, fluem no ato poético, no espaço da arte. Diante de nós é o que se apresenta, o movediço caminhar seguido da instigante afirmativa “Mesmo com os teus sapatos, impossível”. A série de 12 gravuras, criadas por Marcílio, traz a impossibilidade de repetir o caminho – não há olhar que perceba a mesma imagem, nem leia a mesma palavra com igual e silenciosa sonoridade. Os olhos de diferentes poetas podem abrigar-se no rosto de outro poeta, mas não o fará perceber de forma igual o mundo. A poesia irá, então, transferir-se para a imagem inusitada do retrato híbrido que ganha nova faceta a cada olhar concedido. Baudelaire, Allan Poe, Max Martins, Dylan Thomas, Walt Whitman, Rimbaud, Maria Lúcia Medeiros, Rui Barata, Drummond, João Cabral de Melo Neto, T. S. Eliot e Ezra Pound estarão ali presentes em novo corpo, todavia não serão mais eles, assim como Marcílio Costa não será quem é. Nascem identidades inventadas, olhos que cruzam outros olhos: o do espectador, que já não será mais aquele que somente contempla, uma vez que a inquietude não lhe permitirá o sossego de unicamente ver e sentir. De novo, é preciso atravessar as margens, pensar, seguir.

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A hora dos assassinos | 2013 | videoinstalação BRIZUELA, Natalia. Depois da fotografia: uma literatura fora de si. 1ª ed. Rio de Janeiro: Rocco, 2014, p. 231.


O leitor, artista e poeta se fundem em um único personagem para compartilhar os nomes ícones de sua formação, da mesma maneira que divide com o leitor/espectador as suas memórias tecidas com literatura. Em o vídeo instalação A hora dos assassinos, o artista/poeta ironiza o mundo contemporâneo em que as testemunhas, os crimes têm mais espaço na mídia do que a arte, a literatura. Sendo assim, coloca diante do público os depoimentos daqueles que serão reconhecidos não por seu rosto, mas por sua poesia. O jogo ultrapassa a ludicidade e vai ao encontro da ideia matriz concebida a partir de Uma temporada no inferno de Rimbaud que ressoa em O tempo dos assassinos de Henry Miller. Assim como Miller, o artista coloca em xeque a sociedade contemporânea e a própria condição humana, utilizando a arte e a poesia como instrumentos de trincheira e resistência. Posiciona-se diante do mundo com a estética da palavra, da imagem.

O traço marcante dos principais poetas do século 19, bem como do 20, é seu tom profético. Ao contrário de Blake e Whitman, cuja obra está impregnada do êxtase de uma visão cósmica, os nossos poetas mais recentes ocupam as profundezas de uma floresta negra. O fascínio pelo milênio, que obcecou visionários como Joachim de Floris, Hieronymus Bosch e Pico della Mirandola, e que hoje está assustadoramente mais próximo do que nunca, foi substituído pela sujeição ao aniquilamento total. Na voragem de trevas e caos que se avizinha – verdadeiro tumulto – os poetas atuais se retraem, embalsamando-se em uma linguagem enigmática cada vez mais incompreensível. E à medida que, um a um, vão-se apagando, os países que lhes deram origem mergulham resolutamente na desgraça. O trabalho de assassinato, pois, é do que se trata, em breve chegará ao fim. Quando se sufoca a voz do poeta, a história perde o sentido e a ameaça escatológica irrompe como nova e terrível aurora nas consciências humanas. Somente agora, à beira do abismo, é possível compreender que “tudo o que nos ensinam é falso”. A prova dessa afirmação devastadora está aí, visível, todo dia em toda parte: no campo de batalha, no laboratório, na fábrica, na imprensa, na escola, na igreja. Vivemos inteiramente no passado, alimentados por pensamentos estéreis, crenças obsoletas, ciências mortas. E é o passado que nos devora, não o futuro. O futuro sempre foi e sempre será do poeta.

Crescemos e Esta ave estranha e escura são dois vídeos que trazem o silêncio, o sussurro da estética adotada que cerze fios delicados da memória e das andanças de quem se encontra atento à vida. O primeiro vídeo tem como referência um fragmento do poema de Paulo Plínio Abreu, A estranha mensagem. O cenário úmido e o som da chuva revestem de vazio e melancolia o quintal que reacende a memória da infância, carregada de personagens não visíveis ao espectador. Com o vídeo Crescemos, testemunha-se somente a ação da natureza, a ausência mensurada no isolamento de cada um, no oscilar do balanço, no lamento do cair da água. A ausência em Esta ave estranha e escura se dá em meio aos transeuntes que, alheios ao músico, seguem com suas vidas, seus compromissos. Não escutar, não ver o que se encontra no entorno fornece a imagem solitária que acolhe a paisagem de concreto e asfalto – cada vez mais áspera ao homem. O título do vídeo remete ao verso do poema O Corvo de Edgar Allan Poe. Em um ambiente de indiferenças ouve-se a música que destoa dos sons dos passos quase inaudíveis. E de repente o músico solitário transforma-se nessa “ave estranha e escura”. Para Marcílio, se formos além da superfície da cena urbana perceberemos “a insinuação de uma substância, de uma potência poética que, sutilmente se desprende.” A obra de Marcílio Costa se constrói nessa sutil substância que revela o potente estado poético da vida. Perspicaz, segue o som das palavras bafejadas pela sua voz2 , os contornos insinuados pelas suas imagens.

Henry Miller

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Referência a um trecho de Canção de mim mesmo de Walt Whitman


SĂŠrie Mesmo com os teus sapatos, impossĂ­vel 2014 | serigrafia | 41 x 30 cm


Esta ave estranha e escura | 2013 | vídeo | 2’27”


SĂŠrie Mesmo com os teus sapatos, impossĂ­vel 2014 | serigrafia | 41 x 30 cm


Crescemos | 2013 | vídeo | 3’46”


Whitman, Whitmen | 2014 | [detalhe]

SĂŠrie Mesmo com os teus sapatos, impossĂ­vel 2014 | serigrafia | 41 x 30 cm


CANÇÃO DE MIM MESMO [fragmento] EU CELEBRO a mim mesmo, E o que eu assumo você vai assumir, Pois cada átomo que pertence a mim pertence a [ você. Vadio e convido minha alma, Me deito e vadio à vontade .... observando uma [ lâmina de grama do verão. Casas e quartos se enchem de perfumes .... as [ estantes estão entulhadas de perfumes, Respiro o aroma eu mesmo, e gosto e o [ reconheço, Sua destilação poderia me intoxicar também, [ mas não deixo. A atmosfera não é nenhum perfume .... não tem [ gosto de destilação .... é inodoro, É pra minha boca apenas e pra sempre .... estou [ apaixonado por ela, Vou até a margem junto à mata sem disfarces e [ pelado, Louco pra que ela faça contato comigo.

Whitman, Whitmen | 2014 | [objeto]

A fumaça de minha própria respiração, Ecos, ondulações, zunzuns e sussurros .... raiz [ de amaranto, fio de seda, forquilha e videira, Minha respiração minha inspiração .... a batida [ do meu coração .... passagem de sangue e [ ar por meus pulmões, O aroma das folhas verdes e das folhas secas, [ da praia e das rochas marinhas de cores [ escuras, e do feno na tulha, O som das palavras bafejadas por minha voz .... [ palavras disparadas nos redemoinhos do [ vento, Uns beijos de leve .... alguns agarros .... o [ afago dos braços, Jogo de luz e sombra nas árvores enquanto [ oscilam seus galhos sutis, Delícia de estar só ou no agito das ruas, ou pelos [ campos e encostas de colina, Sensação de bem-estar .... apito do meio-dia [ .... a canção de mim mesmo se erguendo [ da cama e cruzando com o sol. Walt Whitman, 1855


Whitman, Whitmen | 2014 | instalação [gravuras, objeto e áudio] | [detalhe]


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