TribunaldeJustiçadoEstadodoRioGrandedoSul
20ªVaraCíveledeAçõesEspeciaisdaFazendaPúblicadoForoCentralda ComarcadePortoAlegre
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AÇÃOCIVILPÚBLICACÍVELNº5107966-40.2021.8.21.0001/RS
AUTOR:MINISTÉRIOPÚBLICODOESTADODORIOGRANDEDOSUL
RÉU:MUNICÍPIODEPORTOALEGRE/RS
RÉU:CAMARAMUNICIPALDEPORTOALEGRE
RÉU:ARADO-EMPREENDIMENTOSIMOBILIARIOSSA
SENTENÇA
Vistos.
I-RELATÓRIO
O MINISTÉRIO PÚBLICO ajuizou Ação Civil Pública com pedido liminar em face do MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE, CÂMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE PORTO ALEGRE e ARADO - EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S.A. Relatou que em novembro de 2015, a Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente instaurou o Inquérito Civil nº. 00833.00087/2015 para a apuração da existência de danos ambientais causados pela implementação do empreendimento imobiliário denominado Condomínio Fazenda Arado Velho, na Estrada do Laminº.2.229,bairroBelémNovo,emPortoAlegre/RS.Namesmaépoca,aPromotoriade Justiça de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística instaurou o Inquérito Civil nº. 01202.00105/2015 para investigar potencial infração à ordem urbanística em razão de eventuais irregularidades do empreendimento Narrou que a Ponta do Arado está registrada no Cadastro Nacional de SítiosArqueológicos – CNSA/SGPA– do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, sob o nº CNSA RS 02265, porque foram localizadosartefatoslíticosecerâmicosprópriosdatradiçãoGuaraninolocal,nãovisíveisna superfície do terreno. Ademais, não houve manifestação daquele órgão no processo de licenciamento. Aduziu que a proteção desse patrimônio foi objeto de apuração pelo MinistérioPúblicoFederalequeolocalseriaoecótono(encontrodedoisbiomas)doPampa com a MataAtlântica.Acrescentou que para o licenciamento do empreendimento, em março de 2012, a SMAMS emitiu o Termo de Referência nº. 02/12 (fls. 469-481 do IC 918/2020) para a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental do empreendimento A respeito do EIA/RIMA, considerando a notícia de que possuía diversas inconsistências, foi instaurado o Inquérito Policial nº. 199/2016/700705-A, finalizado com a conclusão de que o estudo era falso, omisso e incompleto Referiu que houve manifestação da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre para proteção – via tombamento ou inventário – da Fazenda do Arado Velho, aprovada pelo Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural –COMPAHC - e homologada pelo Prefeito Municipal Afirmou que Projeto de Lei Complementar foi encaminhado à Câmara de Vereadores, para fins de regulamentar a ocupaçãodeumaglebade426ha(quatrocentosevinteeseishectares),comfrenteparaaAv. do Lami, nº. 2229, de propriedade da empresa Arado Empreendimentos Imobiliários Ltda., gleba 4, localizada no extremo sul do Município, a sudeste do bairro Belém Novo Relatou
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queoPLCestariaembasadonoEIAdoempreendimentoobjetodoreferidoinquéritopolicial Paraaviabilizaçãodoempreendimento,restoueditadaaLeiComplementarnº.780/2015,de iniciativa do Prefeito Municipal, alterando a Lei Complementar nº. 434/1999 do Município de Porto Alegre, que instituiu o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental da Capital. A referida Lei Complementar modificou os limites do Regime Urbanístico da Fazenda Arado Velho, aumentando os índices construtivos da área rural do Município. Alegouqueapesardaprevisãodecriaçãoderegimesespeciaisurbanísticosnoartigo54-Ado Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Porto Alegre, a motivação da referida Lei Complementar foi apenas viabilizar que um empreendedor que adquiriu a área, sabendo das restrições urbanísticas relacionadas, pudesse lhe dar nova conformação Diante de tais irregularidades, ajuizou a Ação Civil Pública nº 001/1170011746-8, perante a 10ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto Alegre, postulando a declaração da ilegalidade de todo o processo legislativo que levou à edição da Lei Complementar nº 780/2015 e, por consequência, do próprio diploma legal Referiu que a ação foi julgada procedente, pendendo de apreciação os recursos de apelação. Aduziu que nesse ínterim, sobreveio notícia de tramitação do Projeto de Lei Complementar nº. 16/2020, visando a ratificar, para todos os efeitos, as alterações dos limites da macrozona, idêntico objeto da alteração do regime urbanístico do Condomínio FazendaArado Velho preconizada pela Lei Complementar nº. 780/2015. Referiu que o Prefeito Municipal vetou totalmente o novo ProjetodeLeinº 016/20porvíciodeiniciativa Entretanto,oMunicípiodeuprosseguimento à alteração pontual do Plano Diretor para a viabilização do empreendimento, elaborou um novoProjetodeLeiComplementarerealizouumaaudiênciapúblicavirtual,desdobradanos dias 12 e 13 de agosto de 2021, para debater a alteração do regime urbanístico da área da Fazenda do Arado. Relatou que o projeto estaria prestes a ser encaminhado à Câmara Municipal deVereadores para a conversão do regime de Ocupação Rarefeita incidente sobre partedeumaglebagravadacomoÁreadeProteçãodoAmbienteNatural–APANeÁreade Produção Primária em Área de Desenvolvimento Diversificado Aduziu que essa foi a motivação do ajuizamento da presente ação civil pública. Narrou que o Ministério Público Federal ajuizou aAção Civil Pública nº 5041487-8620194047100, para que a União e a FUNAI realizassem o processo de identificação, delimitação e demarcação de possível terra indígenaGuaraninolocaldoempreendimento.Deferidaliminarnaquelaação,ponderouque essa questão seria prejudicial ao encaminhamento do projeto de lei do empreendimento imobiliário, na medida em que há possibilidade de o imóvel ou parte dele vir a ser reconhecido como terra indígena.Assinalou que tramita no Município de PortoAlegre, nos autos do Expediente Único nº. 002.330742.00.5, o projeto de parcelamento do solo (loteamento) do empreendimento “FazendaAradoVelho” Explicitou que o empreendimento consiste em um loteamento com atividades residenciais, comerciais e serviços, inclusive hotelaria e, segundo Estudo de Impacto Ambiental e Urbanístico realizado em 2012, o número de economias seria de 1323, mas, com a alteração no regime da gleba do empreendimento (considerando o projeto apresentado em 2011), o número poderia chegar a 2.341 economias, ou seja, uma ampliação ainda maior desses dados, com um incremento no número de unidades proposto Asseverou que o enquadramento como Projeto Especial de Impacto Urbano de 2º Grau deve-se à necessidade de alteração do índice de aproveitamento dagleba,nostermosdoart.58,parágrafoúnico,doPDDUA,etambémporqueseinsereem umaÁreaEspecialdeProteçãodoAmbienteNatural–APAN,nostermosdoart.86,§3º,do PDDUA Portanto,paraaviabilizaçãodoprojeto,hánecessidadedealteraçãodessespadrões 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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urbanísticos por meio de uma lei especial Descreveu que atualmente o núcleo urbano de BelémVelhoapresentadiversosbensculturaisinventariadosqueconvertempartedaglebade 426hectaresemÁreadeInteresseCultural–AEIC.Alémdisso,cercade200hectaresdesse território ostentam importantes atributos ambientais, que justificaram o seu reconhecimento no PDDUA como Área Especial de Proteção do Ambiente Natural – APAN. Essa porção é gravada com o regime de Ocupação Rarefeita. Em sua porção norte, esse mesmo território é umaáreaqueapresentacaracterísticasrurais,comapresençadepequenossítiosdedicadosà produção primária Por esse motivo, é uma área definida pelo Modelo Espacial do PDDUA como Área de Ocupação Rarefeita (AOR) – em relação ao seu adensamento – e como Área deProduçãoPrimária(árearural)emparceladagleba–emrelaçãoaozoneamento Destacou que a área de inserção do Projeto Especial Ponta do Arado possui interface periurbana e o aludido projeto representará a urbanização intensiva de uma região com fisionomia rural e dotada de importantes atributos ecológicos e culturais Elencou, em síntese, as seguintes ilegalidades do processo administrativo atinente ao empreendimento: a) o Projeto de Lei Complementarrepresentaexpansãourbanaparaumaáreadeocupaçãorarefeita(rururbana)e ambientalmente vulnerável, o que alterará as características socioeconômicas, ambientais e paisagísticas deste território, b) o Projeto de Lei Complementar alterará o índice de aproveitamento da área e os usos previstos para as glebas, proporcionando intensa urbanização de uma região que é classificada como de Ocupação Rarefeita pelo fato de suas glebas serem, atualmente, gravadas como Área de Produção Primária (rural) e Área de Proteção doAmbiente Natural, razão pela qual se faz necessária a elaboração de um Projeto de Urbanização, estudos técnicos e diagnósticos adequados sobre a região para determinar a expansãourbana,c)ainexistênciadeprevisãodeáreasparahabitaçãodeinteressesocial,d) a inexistência de critérios técnicos para o estabelecimento de contrapartidas urbanísticas e e) a inexistência de EIA/RIMA válido para instrumentalizar o Projeto de Lei Complementar. Dissertou sobre princípios administrativos e ambientais, bem como os fundamentos constitucionais e legais, em especial o direito fundamental à cidade e os dispositivos da Lei nº. 10.251/01 - Estatuto da Cidade. Postulou a concessão de liminar para a determinação de que o Prefeito se abstenha de apresentar o Projeto de Lei Complementar à Câmara de Vereadores e para que a Câmara Municipal de Porto Alegre se abstenha de prosseguir no trâmitedoProjetodeLeiComplementar.Nomérito,emsíntese,pugnoupelaprocedênciado pedido, com a confirmação da liminar.Alternativamente, requereu a declaração de nulidade da lei oriunda da aprovação do referido projeto (que altera o regime urbanístico ou aprove qualquer proposta urbanística para a Fazenda do Arado), bem como a condenação do Município de Porto Alegre à abstenção de realização de quaisquer licenciamentos, regularizações e/ou recolhimentos de contrapartida com base na legislação declarada nula Anexoudocumentos
Foram intimados os demandados para a prestação de informações, previamenteàapreciçãodopedidodeliminar(evento7,DESPADEC1)
O Ministério Público informou que em 28/09/2021 o Prefeito Municipal encaminhou ao Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre o Projeto de Lei Complementar que define o Regime Urbanístico referente à área da Fazenda Arado Velho, sob o número 24/2021 Reiterou o pedido de concessão de liminar Anexou documento (evento13,PROMOÇÃO1)
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A CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE alegou, em síntese, a inexistênciadeprevisãonoordenamentojurídico,autorizandoaimpugnaçãopeloMinistério Público, por meio de Ação Civil Pública ou Ação Popular, dos atos praticados durante o processolegislativoparafinsdedeclaraçãodesuainconstitucionalide(evento18,PET1)
ARADO - EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SA discorreu sobre os supostos direitos indígenas que não são de competência da Justiça Estadual, os estudos prévioseadiferenciaçãoentrelicenciamentoambientaleregimeurbanístico Sustentouque: a) no EVU, as edificações históricas foram analisadas e destacadas conforme indicação do órgão municipal, b) a lei alterou o regime da Área Urbana Rarefeita, não da Área Rural, c) quem identificou o sítio foram os profissionais responsáveis pelos estudos contratados pelo empreendedor, d) a classificação era rururbana ou AOR (Área de Ocupação Rarefeita), ou seja,eraclassificadacomoáreaurbanacombaixaocupação,e)apropostadeloteamentopara a Fazenda doArado tem densidade média inferior ao TerraVille, f) o PLC não transforma a área em um local de urbanização intensiva, e sim de urbanização rarefeita, g) o PLC propõe uma restrição maior de ocupação dentro da área de APAN, isso porque o Plano Diretor permite a ocupação de 1 unidade para 5.000m² - 2 econ/ha, enquanto que o PLC permite 1 unidade para cada 7520m² - 1,3 econ/ha, h) na área lindeira existe a Estação deTratamento deEsgoto-ETEeoempreendimentoproverálocalparaaEstaçãodeTratamentodeEsgotoETA, ou seja, a infraestrutura para tratamento de água e esgoto estará junto ao empreendimento, i) o projeto não altera o perímetro urbano e, sim, as subunidades do plano diretor; altera o índice de aproveitamento, mas mantém a característica rarefeita, e não intensiva; estão previstas doações de áreas específicas para a instalação de equipamentos públicos e melhorias em equipamentos já existentes, j) o projeto está plenamente de acordo com o ideal de cidades compactas e, ao estruturar e consolidar um núcleo urbano que atualmenteestádesassistido,oProjetodeLeiComplementarvisaareduzirosdeslocamentos dosmoradoresparaa“cidadeconsolidada”,k)nãofazsentidoqueoAradosejaconsiderado desconectado do tecido urbano, se está diretamente conectado ao Belém Novo, l) o Projeto EspecialdeImpactoUrbanode2ºGrauestánaleidoPDDUAquenãoexigeoutrasdiretrizes gerais, a não ser as próprias diretrizes gerais do Plano Diretor, m) o projeto de lei não altera os usos naAPAN que continuam sendo prioritariamente residenciais, destinadas a atividades de lazer e turismo, aliados à proteção da fauna e flora, e n) a ocupação proposta continuará com caráter rarefeito. Afirmou a regularidade dos estudos de impacto ambiental realizados entre 2011 e 2013 perante o órgão ambiental municipal Referiu que a equipe de fauna que trabalhou no projeto fez o levantamento sazonal, conforme indicado no termo de referência, inclusive em período noturno, porém, não identificou a presença do gato-maracajá. Aduziu que as áreas úmidas e os banhados estão em sua maioria nas partes mais baixas do terreno, mais próximas ao Guaíba, onde já não se propôs construções inicialmente, portanto, não mudaria em função do EIA/RIMA. Assinalou que embora o EIA não tenha quantificado o volume de corte e aterro necessário para a implantação do empreendimento, o que foi apresentado demonstrou a necessidade de volumes significativos de aterro Finalizou, referindo que diferentemente do que ocorre na FEPAM, o Termo de Referência teve contribuiçãoesolicitaçãodeitensdepraticamentetodasassecretariasmunicipais Postulouo indeferimentodaliminarpretendida(evento23,PET1)
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Designada audiência de conciliação e determinada a suspensão da tramitação do Projeto de Lei Complementar que definia o Regime Urbanístico referente à área da FazendaArado Velho (Projeto de Lei Complementar 24/2021) até a decisão relativa aopedidodeliminar(evento26,DESPADEC1)
A parte autora reiterou o pedido de concessão de liminar (evento 52, PROMOÇÃO1).
Foram indeferidos os pedidos de participação na audiência, deduzidos pelosapoiadoresdacampanhaPreservaArado(evento61,DESPADEC1)
Realizadaaaudiência(evento70,TERMOAUD1)
O MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE anexou os slides apresentados na audiência(evento73,INF1)
Foideferidaaliminar,comadeterminaçãodequeaCâmaraMunicipaldePorto Alegre se abstivesse de prosseguir no trâmite do Projeto de Lei Complementar nº. 24/202 (evento85,DESPADEC1).
Citado, o MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE apresentou contestação Discorreu sobre a tramitação administrativa do processo do empreendimento, culminando comaelaboraçãodoprojetodelei,atualmentejáaprovado(LCnº.935/2022).Aduziuqueo encaminhamentodoProjetodeLeiComplementarparaaalteraçãodoRegimeUrbanísticoda áreaédacompetênciadoPoderExecutivo,ponderandoqueapromulgaçãodareferidaleinão possui caráter licenciador/autorizativo do empreendimento. Sustentou que a tramitação do processo administrativo impugnado pelo Ministério Público obedeceu o o Plano Diretor vigente Afirmou que não há, no Plano Diretor, delimitação territorial para abrangência dos projetosespeciais,aplicáveisemtodooterritório.AcrescentouqueopróprioPlanoDiretorde PortoAlegre-PDDUA(LCnº.434/99)extinguiuaZonaRuraldoMunicípio,tornandooseu território Urbano na integralidade Alegou, em síntese, que a avaliação do processo não foi concluída e não se extingue com a Lei aprovada na Câmara de Vereadores, não sendo estabelecida qualquer garantia ao empreendedor. Assinalou a inexistência de impedimento para a tramitação ou aprovação de EVU ou projeto no local, ao argumento de que se, no futuro,ocorreralteraçãodaáreaemrazãodedemarcaçãodeáreaindígena,novotrabalhoserá desenvolvido,porpartedoempreendedoredosórgãoslicenciadores,paraareanálisedaárea. Asseverou que o Regime Urbanístico proposto é mais restritivo nas áreas deAPAN Aduziu que a aprovação da LC não gera risco para o desenvolvimento sustentável Sustentou não se tratar de expansão urbana e alegou que as subunidades 11, 12, 14, 15 e 16 terão Regime Urbanístico que configura ocupação de transição entre os padrões Intensivos e Rarefeitos, gerando integração com área urbana já consolidada (Bairro), mantendo regimes compatíveis (Mista 01 e Pred.Residencial). Acrescentou que existem critérios técnicos para o estabelecimento das contrapartidas urbanísticas. Argumentou que a análise ambiental será realizada no processo de licenciamento ambiental específico, quando o órgão ambiental estadual exigirá os estudos que reputar necessários. Assegurou que a incidência de Mata Atlântica foi observada nos estudos preliminares e não é impeditivo à ocupação da área. Narrou que o estudo ambiental que se constituiu nessa etapa, para a proposta da minuta de 5107966-4020218210001
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Projeto de Lei, não se confunde com os estudos ambientais do processo de licenciamento ambiental, que inclusive indicarão as compensações e mitigações ambientais específicas. ApontouqueoProjetoEspecialAradoencontra-selindeiroaoNúcleoUrbanoconsolidadodo Belém Novo de caráter intensivo, empreendimento de característica rarefeita e apresentando pequena faixa de ocupação intensiva justamente para melhorar a integração da área com o bairro, garantir acesso público às áreas de interesse ambiental, dar suporte de estrutura, infraestrutura e equipamentos públicos urbanos e comunitários Afirmou que as melhorias nos Equipamentos Públicos de Saúde, bem como qualificações do patrimônio histórico e cultural, que estão entre as contrapartidas a serem aportadas pelo empreendedor não se confundem com as medidas compensatórias e mitigatórias Postulou a improcedência dos pedidos(evento112,CONT1)
O MINISTÉRIO PÚBLICO postulou o deferimento de medida liminar para a suspensão da aplicação da Lei Complementar Municipal nº. 935/2022 até o julgamento da ação(evento114,PROMOÇÃO1)
Citada, a CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE apresentou contestação. Preliminarmente, sustentou a ilegitimidade ativa, ao argumento de que o Ministério Público não possui direito público subjetivo de fiscalização do processo legislativo Outrossim, arguiu a perda parcial do objeto da ação, a partir da conversão do projeto de LC na Lei Complementar nº. 935/22. No mérito, discorreu sobre a validade do referidoDiplomaLegal.Postulouaimprocedênciadospedidos(evento117,CONT1).
Citado, ARADO - EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SA apresentou contestação. Discorreu sobre os estudos prévios e diferenciação entre licenciamento ambiental e regime urbanístico. Sustentou que uma vez aprovada a lei, as obras não se iniciarão de imediato, pois serão ainda realizados ou concluídos estudos de viabilidade urbanísticaedeimpactoambiental AduziuqueparaaconclusãodoEIA-RIMAénecessário que o Município forneça uma certidão de zoneamento que seja compatível com o empreendimento proposto para a análise ambiental Repisou os argumentos deduzidos no evento23,PET1.Postulouaimprocedênciadospedidos(evento118,CONT1).
Houve réplica (evento 121, RÉPLICA1) com reiteração do pedido liminar deduzidonoevento114,PROMOÇÃO1.
Foram intimados os demandados para manifestação a respeito da liminar requerida(evento127,DESPADEC1)
Com a manifestação das partes (evento 133, PROMOÇÃO1, evento 134, PET1 e evento 136, PET1), restou indeferida a antecipação de tutela pretendida pelo MP e intimadasaspartessobreaproduçãodeoutrasprovas(evento139,DESPADEC1)
As partes manifestaram desinteresse na dilação probatória (evento 144, PET1,evento146,PROMOÇÃO1,evento147,PET1eevento158,PET1).
Vieramosautosconclusos
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Éobreverelato.Decido.
II-PRELIMINARMENTE
Legitimidadeativa ad causam
O ordenamento jurídico brasileiro conferiu legitimidade ativa ao Ministério Público para a propositura de ações civis públicas na defesa do meio ambiente e da ordem urbanística.
Sualegitimidadeativaestáamplamenterespaldadanalegislação,aexemplodo art.129,III,daConstituiçãoFederal1 queoutorgouao Parquet aincumbênciadepromovera defesadomeioambiente,podendo,paratanto,exercerodireitodeação Ademais,oart 5º,I, daLeinº.7.347/85,comanovaredaçãodadapelaLeinº11.448/07,previuexpressamentea legitimidadeativadoórgãoministerialparaoajuizamentodeaçãocivilpública2 .
Cabimentodaaçãocivilpúblicanocasoconcreto
O Ministério Público, principal legitimado para a propositura da presente ação, objetiva, em síntese, a declaração de nulidade da lei oriunda da aprovação de projeto que altera o regime urbanístico da cidade. Pretende, ainda, evitar a aprovação de qualquer propostaurbanísticaparaaFazendadoArado,bemcomovisaàcondenaçãodoMunicípiode Porto Alegre à abstenção de realização de quaisquer licenciamentos, regularizações e/ou recolhimentosdecontrapartidacombasenalegislaçãodeclaradanula.
Noponto,consignoqueaLei7347/85nãolimitouseuobjetoàsalvaguardados danos transindividuais já concretizados, mas abrangeu em igual medida a prevenção dos riscosambientais.
A propósito do tema, a lição doutrinária de Édis Milaré 3 para quem a Lei de Ação Civil Pública "não limitou seu objeto às consequências de uma condenação por danos na esfera civil", tratando-se de verdadeiro instrumento processual para a responsabilidade civil em matéria de interesses transindividuais. Segundo o autor, a referida lei supera "uma semânticadodanoelançasuaabrangênciatambémaosriscosambientaisintoleráveis",como éocasovertidonestesautos
Por tais razões, inegável o cabimento da presente ação civil pública que visa à salvaguarda da ordem ambiental e urbanística, buscando uma tutela preventiva contra riscos ecológicosgraves,intoleráveisedegrandeproporção
Possibilidade de controle judicial dos atos administrativos que compõem o processolegislativo
Notadamente,apresenteaçãocivilpúblicadiscuteavalidadedoProjetodeLei Complementar nº 24/2021 - posteriormente, convertido na Lei Complementar Municipal nº. 935/2022 - que redefine o Regime Urbanístico da área da Fazenda Arado Velho, no 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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contextodeumProjetoUrbanodeImpactode2º Grau
Tratando-se, portanto, de projeto de lei (convertido em lei, durante o trâmite processual) que versa sobre zoneamento, regime urbanístico e de plano diretor, possui natureza de ato administrativo, passível de ser impugnado como os atos administrativos em geral
A propósito, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça a respeitodamatéria:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIDADE APONTADA COMO COATORA PREFEITO MUNICIPAL ATO APONTADO COMO COATOR LEI ESTADUAL QUE DISPÕE SOBRE A CORREÇÃO MONETÁRIA DOS CRÉDITOS DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL NORMA GERAL ABSTRATA LANÇAMENTO NORMA INDIVIDUAL E CONCRETA PREFEITO ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM TEORIA DE ENCAMPAÇÃO INAPLICABILIDADE
1 Mandado de segurança, impetrado em 17 01 2006, que se dirige contra ato de Prefeito do Município de Petrópolis, que sancionou a Lei Municipal nº 6 305, de 02 de dezembro de 2005 (cuja produção de efeitos iniciou-se em 01º de janeiro de 2006), autorizando o Poder Executivo "a atualizar monetariamente todos os créditos da Fazenda Municipal, tributário ou não, constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa, em 11,28% (onze vírgula vinte e oito por cento), a partir do próximo exercício fiscal", vale dizer o exercício de 2006.
2 É cediço que ato normativo de caráter geral e abstrato não é impugnável pela via do mandado de segurança, ante o teor da Súmula 266/STF, segundo a qual "Não cabe mandado de segurança contra lei em tese".
3 Por seu turno, as leis e os decretos de efeitos concretos são passíveis de mandado de segurança, desde sua publicação, por se equipararem aos atos administrativos nos seus resultados imediatos.
4. À luz da doutrina: "por leis e decretos de efeitos concretos entendem-se aqueles que trazem em si mesmos o resultado específico pretendido, tais como as leis que aprovam planos de urbanização, as que fixam limites territoriais, as que criam municípios ou desmembram distritos, as que concedem isenções fiscais; os decretos que desapropriam bens, os que fixam tarifas, os que fazem nomeações e outros dessa espécie. Tais leis ou decretos nada têm de normativos; são atos de efeitos concretos, revestindo a forma imprópria de lei ou decreto por exigências administrativas. Não contêm mandamentos genéricos, nem apresentam qualquer regra abstrata de conduta; atuam concreta e imediatamente como qualquer ato administrativo de efeitos individuais e específicos, razão pela qual se expõem ao ataque pelo mandado de segurança" (Hely Lopes Meirelles, in "Mandado de Segurança, Ação Popular, ... " , 28ª ed.atualizada por Arnold Wald e Gilmar Ferreira Mendes, Malheiros Editores, São Paulo, 2005, pág. 41).
5 A jurisprudência das Turmas de Direito Público do STJ perfilhou o entendimento de que, em se tratando de mandado de segurança que ataca ato normativo de efeitos concretos, a parte passiva legítima será a autoridade a quem compete a aplicação concreta da norma (RMS 21 183/PR, Rel Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 26 06 2007, DJ 02.08.2007; REsp 599.705/DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 18 08 2005, DJ 07 11 2005; RMS 15 258/RJ, Rel Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 23 11 2004, DJ 14 02 2005; RMS 15 898/SP, Rel Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 03.06.2003, DJ 23.06.2003; AgRg no Ag 438766/MT, Rel. Ministro Paulo Medina, Primeira Turma, julgado em 04 02 2003, DJ 17 02 2003; e REsp 293821/MT, Rel Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23 10 2001, DJ 18 02 2002)
6 O ato de aplicação da lei ao caso particular consiste na expedição de norma individual e concreta pelo sujeito competente, sendo certo que "a regra-matriz de incidência tributária é 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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u'a norma geral e abstrata que atinge as condutas intersubjetivas por intermédio do ato jurídico-administrativo de lançamento ou de ato do particular, veículos que introduzem no sistema norma individual e concreta" (Paulo de Barros Carvalho, in "Direito TributárioFundamentos Jurídicos de Incidência", 4ª ed , Ed Saraiva, São Paulo, 2006, pág 38)
7 Destarte, a autoridade a ser apontada como coatora é aquela que verte em linguagem competente o fato jurídico descrito na norma geral e abstrata (regra-matriz de incidência tributária, entre outras), expedindo norma individual e concreta (lançamento)
8 In casu, conquanto a causa de pedir do writ of mandamus consista na ilegalidade da Lei Municipal 6 305/2005, não é o Prefeito o responsável pela expedição do ato de lançamento cuja anulação se requer no âmbito do remédio constitucional (Precedentes do STJ: RMS 15 898/SP, Rel Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 03 06 2003, DJ 23 06 2003; e RMS 7 180/SP, Rel Ministro Edson Vidigal, Quinta Turma, julgado em 29 06 1999, DJ 06 09 1999)
9 Nada obstante, a adoção da "teoria da encampação" autoriza o afastamento da ilegitimidade passiva ad causam da autoridade erroneamente apontada como coatora que, ao prestar suas informações, não se limita a alegar sua ilegitimidade, mas defende o mérito do ato impugnado, requerendo a denegação da segurança
10 Entrementes, a aplicação da aludida teoria condiciona-se ainda à observância de outros dois requisitos, quais sejam: (i) a existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a que ordenou a prática do ato impugnado; e (ii) a ausência de modificação de competência estabelecida na Constituição Federal (MS 12 779/DF, Rel Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 13 02 2008, DJe 03 03 2008)
11 No caso em comento, a ilegitimidade passiva ad causam do prefeito importa na modificação da competência jurisdicional prevista na Constituição Estadual (artigo 161, IV, "e", nº 7), que deixaria de ser originária do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, razão pela qual inaplicável a teoria de encampação à espécie
12 Recurso ordinário desprovido, extinguindo-se o mandado de segurança sem julgamento do mérito, por carência de ação (ilegitimidade passiva da autoridade apontada como coatora), ex vi do disposto no artigo 267, VI, do CPC (RMS n 22 499/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 16/10/2008, DJe de 3/11/2008 ) [grifei]
Assim, cabível o controle judicial versado na presente ação, prerrogativa decorrente do princípio da inafastabilidade da jurisdição, consoante já decidiu o Tribunal de JustiçadoRSemcasoanálogo:
AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICA DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO MUNICÍPIO DE GUAÍBA ALTERAÇÃO DO PLANO DIRETOR ALEGAÇÕES DE VÍCIO DE INICIATIVA E DE VÍCIOS NA TRAMITAÇÃO DO PROCESSO LEGISLATIVO. TUTELA DE URGÊNCIA 1 O Ministério Público, no Procedimento Administrativo de Acompanhamento de Políticas Públicas n ° 00970 000 185/2019, relativo ao processo de revisão do Plano Diretor do Município instituído pela Lei Municipal nº 2 146/06, expediu recomendação ao Município de Guaíba para suspender o curso do processo de revisão, com fins de garantir a participação popular, inclusive na fase consolidativa e de elaboração do texto final, o que não teria sido observado pelo Município, dando ensejo ao ajuizamento da presente Ação Civil Pública, na qual postulada, liminarmente, em relação à Câmara de Vereadores de Guaíba, que retire do plenário o PLL n º 083/2022 e anule eventuais votações para aprovação do referido projeto, bem como abstenha-se de cadastrar novas propostas legislativas oriundas do próprio Poder Legislativo e que tenham como escopo a modificação do Plano Diretor Municipal de Guaíba, devendo realizar eventuais sugestões de alterações ao PDM no escopo do Grupo de Trabalho de atualização do Plano, coordenado pelo Poder Executivo, de modo a propiciar a revisão conjunta e integral do PDM, assim como o cumprimento integral de todas as etapas
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estabelecidas para revisão do Plano A tutela de urgência foi deferida na origem, dando ensejo ao presente recurso 2. Consoante já decidiu esta Corte, é possível o controle judicial dos atos administrativos que compõem o processo legislativo em eventual desconformidade com a lei, prerrogativa decorrente do princípio da inafastabilidade da jurisdição. 3. A questão da iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo Municipal para a propositura de projeto de lei que altera o Plano Diretor do Município é controvertida na doutrina e na jurisprudência. Precedentes do TJ/RS no ambito do controle concentrado de constitucionalidade. 4 É precoce determinar, initio litis, à Câmara de Vereadores de Guaíba que se abstenha de cadastrar novas propostas legislativas oriundas do Poder Legislativo, cujo escopo seja a modificação do Plano Diretor de Guaíba, tal como fez a decisão agravada Tal entendimento significa adiantar de plano o mérito da demanda e, considerando a controvérsia acerca do propalado vício de iniciativa, não verifico, ao menos no presente momento processual, probabilidade do direito alegado, mormente porque tal tutela, da forma como posta, pode significar supressão das prerrogativas constitucionais e legais do Poder Legislativo, em violação ao Princípio da Separação dos Poderes (art 2º, CF) 4 É crível a tese do Ministério Público de que o Projeto de Lei Complementar nº 83/2022 não observou a participação popular na forma dos artigos 283, 284 e 290 do Plano Diretor do Município de Guaíba, tampouco as disposições do art 177, §5º, da Constituição Estadual e do art 40, §4º, I a III, da Lei Federal nº 10 257/21 (promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos e o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos - deveres impostos tanto ao Poder Executivo quanto ao Poder Legislativo), consoante se evidencia dos autos, isto é, a despeito da discussão sobre o vício de iniciativa, há provável vício de legalidade na tramitação do projeto de lei em questão, circunstância que deverá ser aprofundada no curso da demanda 5 Agravo de instrumento parcialmente provido para reformar o item "2" da decisão agravada, considerando a parte agravante - Câmara de Vereadores Municipalmantendo apenas a suspensão do PLL n º 083/2022 até o julgamento definitivo da demanda, bem como a multa fixada na decisão recorrida AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO (Agravo de Instrumento, Nº 51846364020228217000, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em: 30-032023) [grifei]
Comefeito,oPoderJudiciáriopodeedevecontrolaracompatibilidadeentreos motivoseoobjetodoatoadministrativo
Noponto,importamalgumasconsideraçõesarespeitodoprincípiodaproibição de retrocesso ecológico, consubstanciado nos deveres estatais de proteção, proibição de proteção insuficiente e dever de progressividade do regime jurídico ambiental no âmbito legislativo,administrativoejurisprudencial
Partindo-se da consagração, pela Constituição Federal, do ambiente ecologicamenteequilibradocomodireitoedeverfundamental,comoestabelecimentodeum conjunto de princípios e regras em matéria de tutela ecológica, é possível afirmar que a ordemconstitucionalalçouaproteçãoambientalàcondiçãodeobjetivoelementardoEstado que, por imposição constitucional - e em conjunto com a sociedade, assume a função de proteçãoegestãodopatrimônionaturalemsuaintegralidade
Daí se segue que ao Estado foi atribuída a cogente incumbência de adoção de políticas públicas para a tutela e promoção ecológica, expressa no dever de atuação até mesmo para antecipar à ocorrência do dano ambiental Outrossim, restou limitado o poderdever de discricionariedade estatal, vinculando a atuação administrativa à imperiosa 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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obrigação de emprestar, em maior grau, efetividade à tutela ambiental Logo, inegável a existência de um dever estatal na adoção de condutas positivas e negativas, objetivando a potencializaçãodaproteçãoaomeioambiente.
Por tais razões, é possível afirmar que o dever de proteção ambiental assumido pelo Poder Público não encontra margem para omissão, tampouco se admite atuação administrativa insuficiente, sob pena de violação ao princípio da proibição de proteção deficiente Em outras palavras, a vinculação normativa de todos os órgãos estatais na concretização de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o que no caso destes autos seconsubstancianodeverdeevitaraampliaçãodeperímetrourbanosemosestudosprévios indispensáveis, conduz à necessária aplicação do princípio constitucional da proibição de retrocesso ecológico e ao correlato dever estatal de progressividade no regime jurídico ambiental.
O sistema normativo edificado para a salvaguarda do meio ambiente não pode ser submetido ao retrocesso 4 , o que implicaria uma não desejada fragilização da tutela ecológica Ao contrário, há de se dar continuidade e amplitude ao conjunto de medidas que resguardam o meio ambiente, sem supressão das diretrizes protetivas já alcançadas em todas asesferas.
Nesse contexto, merece destaque o apontamento de Ingo Wolfgang Sarlet e Tiago Fensterseifer a respeito dos contornos conceituais e normativos do princípio da proibição do retrocesso ecológico relacionado ao dever de progressividade do regime jurídicoambiental:
A garantia da proibição de retrocesso ecológico, nessa perspectiva, seria concebida no sentido de que a tutela jurídica ambiental – tanto sob a perspectiva constitucional quanto infraconstitucional – deve operar de modo progressivo tanto no âmbito normativo quanto institucional, a fim de assegurar a ampliação da qualidade de vida existente hoje e atender a padrões cada vez mais rigorosos de tutela da dignidade da pessoa humana, não admitindo redução no seu regime jurídico, em termos normativos e fáticos, a um nível de proteção inferior àquele verificado hoje 5
Desse modo, cumpre esclarecer, com o ajuizamento da presente ação civil pública, não propõe o Ministério Público eventual interferência na análise do mérito do projeto de lei, prerrogativa do Poder Legislativo Aqui, foram suscitadas as nulidades procedimentais atinentes "à elaboração do projeto encaminhado (como ausência de estudos técnicos válidos para instrumentalizar o Projeto de Lei Complementar correspondente ao Projeto Especial Ponta doArado, nos termos do art 42-B do PDDUA; dissociação de alteração pontual quando está em tramitação a Revisão do PDDUA; dentre outras ilegalidades que maculam o PLC desde a origem)" (evento 52, PROMOÇÃO1,fl 09),oquepodeedeveserobjetodecontrolejurisdicional,atémesmoem observânciaaodeverestataldecooperaçãoeatuaçãoconjuntanatutelaecológica.
Perdaparcialdoobjetodaação
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Não merece prosperar a arguição de perda parcial do objeto da ação, a partir daconversãodoprojetodeleinaLeiComplementarnº.935/22.
Tratando-se de típica ação estrutural, registro que a alteração dos fatos, a exemplodaaprovaçãodoprojetodeleiocorridanestecaso,écaracterísticadessaespéciede processo, o que exige uma condução diferenciada do feito Consoante já decidiu o Superior Tribunal de Justiça "[N]os processos estruturais, a pretensão deve ser considerada como de alteração do estado de coisas ensejador da violação dos direitos, em vez de se buscar solucionar pontualmente as infringências legais, cuja judicialização reiterada pode resultar em intervenção até mais grave na discricionariedade administrativa que se pretenderia evitar ao prestigiar as ações individuais" (REsp n. 1.880.546/SC, relatora MinistraAssusete Magalhães,SegundaTurma,julgadoem9/11/2021,DJede16/11/2021)
Amutabilidade dos fatos e dos pedidos é, indubitavelmente, característica das ações estruturantes que buscam solução para conflitos e aplicabilidade a direitos coletivos, ambos apresentando-se, não raras vezes, em um encadeamento complexo Não olvido que o CódigodeProcessoCivilpreviuanecessidadedeformulaçãodepedidocertoedeterminado, dispôssobreanecessidadedeestabilizaçãodoselementosdademandaeestatuiuoprincípio da adstrição Todavia, não é possível submeter o processo coletivo a um regramento tipicamente individualista, ignorando a imprescindível adequação do processo àtuteladosdireitosenvolvidosnesseslitígiosestruturais.
De acordo com a lição do processualista Sérgio Cruz Arenhart, a lógica do processo coletivo, necessariamente, deverá ser diversa da lógica que rege as típicas ações individuais:
"Além da necessidade de uma revisão conceitual da noção de contraditório, os processos estruturais também impõem um procedimento diferenciado, que não se amolda aos parâmetros tradicionais do processo individual
Elementos como a adstrição da decisão ao pedido, a limitação do debate aos contornos da causa de pedir, a dimensão da prova, a amplitude do direito ao recurso e os limites da coisa julgada exigem reformulação completa, quando se pensa em processos estruturais" 6 [grifei]
Comefeito,oprocessoestruturalexigeuma"releituradosinstitutostradicionais do direito processual", o que "inclui a própria redação da petição inicial"7 , conforme já decidiuoSuperiorTribunaldeJustiça,emcasoanálogo:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CAUSA DE PEDIR APONTANDO ABUSIVIDADE CONTRATUAL LEGITIMIDADE DE ASSOCIAÇÃO DE DEFESA DE "CONSUMIDORES DE CRÉDITO" PARA AJUIZAR AÇÃO COLETIVA COM O PROPÓSITO DE VELAR DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DE CONSUMIDORES EXISTÊNCIA SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL DEMONSTRAÇÃO DOS FATOS CONSTITUTIVOS MEDIANTE APRESENTAÇÃO OU INDICAÇÃO DE INÍCIO DE PROVA NECESSIDADE, EM REGRA PRAZO PRESCRICIONAL DO ART 27 DO CDC RESTRITO AOS CASOS EM QUE SE CONFIGURA FATO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO AÇÃO CIVIL PÚBLICA PRAZO PARA AJUIZAMENTO 5 ANOS DEVER DE DIVULGAÇÃO DA CONDENAÇÃO EM JORNAIS DE GRANDE CIRCULAÇÃO INEXISTÊNCIA TESE VINCULANTE, 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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SUFRAGADA EM RECURSO REPETITIVO
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3 Há uma diferença tênue, de natureza quantitativa, na formulação da causa de pedir na demanda coletiva Enquanto numa ação individual é factível que a substanciação desça a minúcias do fato, que não inerentes à própria relação jurídica de cunho material e individual, isso não se verifica com tamanho rigor na demanda coletiva, na qual a substanciação acaba tornando-se mais tênue, recaindo apenas sobre aspectos mais genéricos da conduta impugnada na ação. Mesmo nas ações em defesa de interesses individuais homogêneos, basta a descrição da conduta genericamente, o dano causado de forma inespecífica e o nexo entre ambos, sendo impossível a especificação da narrativa com relação a cada um dos possíveis lesados A descrição fática deve ser formulada no limite da suficiência para a demonstração da situação material mais ampla, decorrente da própria essência dos interesses metaindividuais
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12 Recurso especial parcialmente provido
(REsp n 1 583 430/RS, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/8/2022, DJe de 23/9/2022) [grifei]
Nãoédemaisdestacar,odenominadoprocessoestruturalobjetiva"decisões que almejam a alteração substancial, para o futuro, de determinada prática ou instituição 8 " [grifei], o que se verifica no caso em apreço De fato, independente da conversão do projeto emleiduranteotrâmiteprocessual,aquestãojurídicafundamentaldebatidanapresenteação permanecehígida,sendonecessáriaasoluçãodoconflitoparaatuteladomeioambienteeda ordemurbanística
No ponto, cumpre destacar o ensinamento doutrinário a respeito da relativizaçãodoprincípiodademandanasaçõesestruturais:
"Imagine-se o princípio da demanda Segundo sua essência e a consequente ideia da adstrição o juiz está limitado ao pedido formulado pela parte Assim, cabe à parte-autora determinar exatamente aquilo que pretende em juízo, devendo o juiz observar esses limites em sua atuação Ora, é fácil perceber que a discussão judicial de políticas públicas implica conflitos cujas condições são altamente mutáveis e fluidas As necessidades de proteção em um determinado momento, muito frequentemente, serão distintas daquelas existentes em outra ocasião Isso impõe uma dificuldade imensa para o autor da demanda em determinar, no início do litígio, exatamente aquilo que será necessário para atender adequadamente ao direito protegido. Por isso, neste campo, exige-se que esse princípio tenha sua incidência atenuada, permitindo que o juiz possa, em certas situações, diante das evidências no caso concreto da insuficiência ou da inadequação da “tutela” pretendida pelo autor na petição inicial, extrapolar os limites do pedido inicial 9 "
Ademais,oprincípiodaefetividadesecontrapõeàextinçãoparcialdaaçãopela parcial perda do objeto, pois tal medida conduziria ao ajuizamento de nova e quase idêntica açãocivilpública,apenascomasubstituiçãodefundamentoslegais
A respeito do tema há precedente do Supremo Tribunal Federal (ADI nº. 2418/DF, de Relatoria do Ministro Teori Zavascki), no qual assentado que posteriores alterações legislativas, sem modificações no núcleo essencial das questões debatidas,nãoacarretamaperdadoobjetodaação 10
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III-MÉRITO
Segundo estudo técnico anexado à inicial, a área objeto da proposta legislativa esgrimida pelo Ministério Público nesta ação, seria de interesse histórico, cultural, paisagísticoearqueológico(evento1,OUT4)
No ponto, cumpre registrar, a prova apresentada pelo Ministério Público não é meramente especulativa, mas cientificamente ancorada em conclusões que satisfazem de forma razoável o juízo a respeito da probabilidade e magnitude dos riscos ambientais e urbanísticos que passam a existir com a alteração legislativa Em outras palavras, consubstanciam-se em elementos que justificam a imposição de medidas antecipatórias, mesmo em face de incertezas a respeito da quantificação e espécies de danos ambientais envolvidos, pois se está diante de graves riscos a "recurso patrimonial especial e não renovável" (evento 1, OUT4 , fl. 26). Trata-se, portanto, de estudo com capacidade probatória de uma hipótese cientificamente ponderável, seguindo um padrão probatório precaucional,comoexigeocontextodasalvaguardaecológica
No caso, a proposta legislativa posta em questão, redefinindo o Regime Urbanístico da área da FazendaAradoVelho, no contexto de um Projeto Urbano de Impacto de 2º Grau, foi elaborada sem levar em consideração as características do local, o suposto interesse cultural, paisagístico e, especialmente, a dimensão do impacto nas comunidades indígenas. Ainda que não seja de competência da Justiça Estadual a definição da área comodeinteresseindígena-oquejáestásendoapreciadonaJustiçaFederal,esferaemque estão sendo realizados e apresentados os pertinentes estudos antropológicos - é evidente a fragilidade da modificação legislativa proposta sem os cuidados indispensáveis e sem a análisedetodasasvariáveisambientaiseurbanísticasenvolvidas.
Nesse ponto, a justificativa do projeto é demasiadamente frágil, desamparada de qualquer estudo ou fundamento capaz de rechaçar os riscos, problemas e impactosambientaiseurbanísticosapontadospeloMinistérioPúblico.
Não se pode olvidar que o conceito de meio ambiente abrange elementos naturais, artificiais e culturais cuja interação propicia o desenvolvimento das mais variadas formasdevida.
O advento da Lei nº. 6.938/81 - Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, trouxe em seu art 3º, I, definição legal de meio ambiente, conceituado como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abrigaeregeavidaemtodasassuasformas"11 Ademais,étambémconsiderado"patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo"12 , consoantedispõeoart 2º,I,doDiplomaLegal
De acordo com a lição doutrinária de Paulo Affonso Leme Machado, a "definição federal é ampla, pois vai atingir tudo aquilo que permite a vida, que a abriga e rege" 13 .
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No Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo,ALei nº 15434/2020 (Código Estadual do Meio Ambiente), define em seu art. art. 2º, XXXIX, o meio ambiente como o "conjunto de condições, elementos, leis, influências e interações de ordem física, química, biológica,socialeculturalquepermite,abrigaeregeavidaemtodasassuasformas"
Nesse passo, consoante observou LEME em análise de diversas leis editadas pelos estados no território nacional, a maior parte das "conceituações estaduais não limita o campo ambiental ao homem, mas a todas as formas de vida, antecipando assim a definiçãofederal" 14
AConstituiçãoFederalde1988,emseuart 225 15 ,assimcomoajáreferidaLei de Política Nacional do Meio Ambiente, em seu art. 2º, I, conferiram especial proteção ao meioambientenacondiçãodepatrimôniopúblico,detalmodoqueaquele,emseuconjunto, passouaconstituiroPatrimônioAmbientalNacional
Com efeito, a visão holística do meio ambiente, bem apontada por Édis Milaré16 , conduz à necessidade de consideração do seu caráter social, na medida em que o meio ambiente é definido, constitucionalmente, como um bem de uso comum do povo e resultadodasrelaçõesdoserhumanocomotecidonaturalquelhecircunda.
Assim, a vanguardista visão constitucional brasileira conduz à inclusão, no conceito de meio ambiente, além dos ecossistemas naturais, "as sucessivas criações do espírito humano que se traduzem nas suas múltiplas obras Por isso, as modernas políticas ambientais consideram relevante ocupar-se do patrimônio cultural, expresso em realizações significativas que caracterizam, de maneira particular, os assentamentos humanos e as paisagensdoseuentorno" 17 .
A tutela jurídica do patrimônio cultural, prevista no art. 216 da Constituição Federal18 , está consubstanciada nos bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem, dentre outros, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico,ecológicoecientífico.
A propósito dos bens incluídos no patrimônio cultural brasileiro, leciona MILARÉ:
"Destarte, não se discute mais se o patrimônio cultural constitui-se apenas dos bens de valor excepcional ou também daqueles de valor documental cotidiano; se inclui monumentos individualizados ou igualmente conjuntos; se dele faz parte tão só a arte erudita ou de igual modo a popular; se contém apenas bens produzidos pela mão do homem ou mesmo os naturais; se esses bens naturais envolvem somente aqueles de excepcional valor paisagístico ou, inclusive, ecossistemas; se abrange bens tangíveis e intangíveis Todos esses bens estão incluídos no patrimônio cultural brasileiro, desde que sejam portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da nacionalidade ou sociedade brasileiras, nos exatos termos constitucionais" 19 [grifei] 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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No âmbito da consagração normativa de proteção ambiental, importa referir a Lei nº. 10.257/01 - Estatuto da Cidade que conciliou as exigências ambientais estatuídas na Constituição Federal e na Política Nacional do Meio Ambiente com a necessidadededesenvolvimentodeumaPolíticaNacionalUrbana
Desse modo, o Estatuto estabeleceu normas de ordem pública e de interesse social que regulam o uso da propriedade urbana, sem desconsiderar a necessária preservação do equilíbrio ambiental Exemplo disso é a previsão do art 26, VIII, daquele Diploma Legal, concedendo autoridade ao Poder Público para a "proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico" 20 , em outras palavras, observando a imprescindível tutela ao meio ambiente em seu conceito mais amplo e abrangente, afinado comocontextonormativoconstitucional
A propósito do reconhecido valor paisagístico dos bens naturais, colaciono o precedentedoSuperiorTribunaldeJustiça:
RECURSO ESPECIAL AMBIENTAL CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIO VERTICAL CONJUNTO CÊNICO E PAISAGÍSTICO MORRO DO CARECA E DUNAS ASSOCIADAS DANO AO MEIO AMBIENTE. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 1.022 DO CPC NÃO CARACTERIZADA LICENÇA MUNICIPAL DE CONSTRUÇÃO ANULAÇÃO POR AUTOTUTELA ADMINISTRATIVA POSSIBILIDADE ZONA COSTEIRA PROTEÇÃO DA PAISAGEM. HISTÓRICO DA DEMANDA
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19. Finalmente, consigne-se que seria despropósito imaginar que o ordenamento jurídico brasileiro não reconheça, ignore ou não atribua valor jurídico à paisagem. É exatamente o contrário, a começar pelo Código Civil ("O direito de propriedade deve ser exercido [...] de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais", art. 1.228, § lº, destaque acrescentado). Na mesma linha, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente considera poluição "atividades que direta ou indiretamente afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente" (Lei 6.938/1981, art. 3º, III, "d", grifo acrescentado).
E, mais especificamente, o Estatuto da Cidade, como diretriz geral da Política Urbana: a "proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico" (Lei 10.257/2001, art. 2º, XII, grifo acrescentado). CONCLUSÃO 20 Recursos Especiais providos para restabelecer a sentença (REsp n. 1.820.792/RN, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5/12/2019, DJe de 22/10/2020 ) [grifei]
Ademais, a abrangência do conceito de meio ambiente já foi assentada no Supremo Tribunal Federal, a exemplo do voto prolatado pelo Ministro Celso de Mello, oportunidade em que destacou estarem inseridos nessa definição ambiental as noções "de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano)edemeioambientelaboral" 21
Desse modo, objetivando a suspensão da tramitação de projeto de lei - e o reconhecimento da nulidade do projeto convertido em lei durante o trâmite processual, em virtude de ilegalidades que permeiam a alteração do Regime Urbanístico da Fazenda do AradopormeiodoinstrumentourbanísticoProjetoEspecialdeImpactoUrbanode2º Grau, 5107966-4020218210001 10058478241 V72
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o Ministério Público pontua a inarredável necessidade de mínima apresentação de estudos técnicos prévios, o que o Município de Porto Alegre não logrou comprovar no caso destes autos.
Aindaqueatesedefensivagravitesobreoargumentodequeoencaminhamento do projeto legislativo não possui caráter licenciador/autorizativo do empreendimento ou não assegure a obtenção do licenciamento, isso não afasta a necessidade da apresentação de estudos técnicos prévios Afinal, se está diante de modificação legislativa com o escopo de regrar o direito de construir e viabilizar, juridicamente, a futura aprovação do Projeto UrbanísticodoArado.
Defato,aalteraçãodoPlanoDiretornessaáreaextensaegravadacomregimes de ocupação rarefeita e de proteção ambiental, somente poderia ser feita por meio do instrumento do Projeto de Urbanização disposto no art. 42-B do Estatuto da Cidade, de iniciativadoMunicípio,nocontextodesuacompetênciaparaoordenamentodosolourbano, a teor do que dispõe o art 30, VIII, da Constituição Federal Indubitavelmente, esse instrumento deve ser precedido de diagnósticos e estudos que têm por finalidade fundamentar a necessidade (ou não), à luz do interesse público, da ampliação do perímetro urbanopretendidopeloMunicípio
Com bem apontou o órgão ministerial, "a alteração do Plano Diretor é a condição sine qua non para a futura tramitação do licenciamento ambiental, que deve ser, obrigatoriamente instruído com certidão de compatibilidade com as normas de uso e ocupação do solo, nos termos do art 10, §1º, da Resolução 237/97 do CONAMA" (evento 52, PROMOÇÃO1, fl. 10). Ademais, restou evidenciado que sob as normas vigentes, "o licenciamento seria refutado, porquanto incompatível com o Plano Diretor.Assim, diante do interesse de o empreendedor adensar a ocupação no imóvel de sua propriedade, que hoje ostenta uma fisionomia rururbana e é regido por normas de ocupação rarefeita, é necessário que,primeiro,obtenhaaalteraçãodopróprioregimeurbanístico"(evento52,PROMOÇÃO1 , fls 10) Essa é a cabal demonstração de incompatibilidade entre a motivação e o ato administrativo,oraimpugnado.
As exigências mínimas para a ampliação do perímetro urbano vieram claramenteelencadasnoart.42-BdoEstatutodaCidade,nestestermos:
Art. 42-B. Os Municípios que pretendam ampliar o seu perímetro urbano após a data de publicação desta Lei deverão elaborar projeto específico que contenha, no mínimo:
I - demarcação do novo perímetro urbano;
II - delimitação dos trechos com restrições à urbanização e dos trechos sujeitos a controle especial em função de ameaça de desastres naturais;
III - definição de diretrizes específicas e de áreas que serão utilizadas para infraestrutura, sistema viário, equipamentos e instalações públicas, urbanas e sociais;
IV - definição de parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e contribuir para a geração de emprego e renda;
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V - a previsão de áreas para habitação de interesse social por meio da demarcação de zonas especiais de interesse social e de outros instrumentos de política urbana, quando o uso habitacional for permitido;
VI - definição de diretrizes e instrumentos específicos para proteção ambiental e do patrimônio histórico e cultural; e
VII - definição de mecanismos para garantir a justa distribuição dos ônus e benefícios decorrentes do processo de urbanização do território de expansão urbana e a recuperação para a coletividade da valorização imobiliária resultante da ação do poder público
§ 1o O projeto específico de que trata o caput deste artigo deverá ser instituído por lei municipal e atender às diretrizes do plano diretor, quando houver
§ 2o Quando o plano diretor contemplar as exigências estabelecidas no caput, o Município ficará dispensado da elaboração do projeto específico de que trata o caput deste artigo
§ 3o A aprovação de projetos de parcelamento do solo no novo perímetro urbano ficará condicionada à existência do projeto específico e deverá obedecer às suas disposições
Com efeito, a alteração legislativa proposta pelo município não é mera aplicaçãodahipóteseprevistanoartigo58,parágrafoúnico,doPDDUA,quepermiteajustes pontuais do plano diretor Em verdade, o município pretende substancial alteração do Plano Diretor e de seus perímetros, sem a observância das exigências mínimas estabelecidas no Estatuto da Cidade, gerando uma inadvertida expansão urbana em região considerada em parte como área rural, com vulnerabilidades históricas de infraestrutura, de serviços, de habitação,ecaracterizadaporinegáveisinteressessociaiseambientais
Consoante já exposto, a alteração do zoneamento urbano versada nestes autos é desprovida de qualquer estudo técnico imprescindível para a garantia do equilíbrio ecológico e urbanístico, capaz de justificar e amparar legalmente a pretendida ampliação O intento legislativo municipal desconsidera os interesses culturais, paisagísticos, ambientais, urbanísticos, históricos e arqueológicos, menosprezando o impacto sobre as populações indígenasedesafiandooEstatutodaCidade
Por todas as razões e fundamentos expostos, a decretação de nulidade da alteraçãolegislativaémedidaqueseimpõe.
IV-DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL em face do MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE/RS, da CÂMARAMUNICIPALDEPORTOALEGREedeARADO-EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOSS.A.naAçãoCivilPúblicaparadeclararanulidade daLeiComplementar Municipal nº. 935/2022, condenando o Município de PortoAlegre à abstenção de realização dequaisquerlicenciamentos,regularizaçõese/ourecolhimentosdecontrapartidacombasena legislaçãodeclaradanula
PoderJudiciário
TribunaldeJustiçadoEstadodoRioGrandedoSul
20ªVaraCíveledeAçõesEspeciaisdaFazendaPúblicadoForoCentralda ComarcadePortoAlegre
Defiro a liminar para determinar a suspensão da aplicação da Lei ComplementarMunicipalnº.935/2022.
O Município de Porto Alegre/RS e a Câmara Municipal de Porto Alegre são isentas do pagamento das custas, nos termos do art 11 da Lei Estadual nº 8121/85
Condeno a Arado - Empreendimentos Imobiliários S.A. ao pagamento das custasprocessuais.
Deixo de condenar ao pagamento de honorários sucumbenciais, aplicando-se porsimetriaodispostonoart 18daLei7347/1985,jáquenãocomprovadamá-fé
Havendo recurso de apelação, intime-se a parte apelada para a apresentação de contrarrazões, devendo o Cartório diligenciar o processamento do recurso, conforme o dispostonoart 1010,§§1º,2ºe3ºdoCPC
Comotrânsitoemjulgado,arquive-secombaixa.
Publique-se.
Registre-se
Intimem-se
Documento assinado eletronicamente por PATRICIA ANTUNES LAYDNER, Juíza de Direito, em 5/6/2024, às 11:16:4, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc1gtjrsjusbr/eproc/externo controladorphp?acao=consulta autenticidade documentos, informando o código verificador10058478241v72eocódigoCRC799c6b10
1.Art.129.SãofunçõesinstitucionaisdoMinistérioPúblico:(...)III-promoveroinquéritocivileaaçãocivilpública, paraaproteçãodopatrimôniopúblicoesocial,domeioambienteedeoutrosinteressesdifusosecoletivos 2 Art 5oTêmlegitimidadeparaproporaaçãoprincipaleaaçãocautelar:(RedaçãodadapelaLeinº11448,de2007) (VideLeinº13.105,de2015)(Vigência)(...)I-oMinistérioPúblico;(RedaçãodadapelaLeinº11.448,de2007).
3 MILARÉ,ÉdisMilaré,AçãoCivilPública PARTEIV–AÇÃOCIVILPÚBLICA:APLICAÇÃOPRÁTICA2 AÇÃO CIVILPÚBLICA,ACESSOÀJUSTIÇAEMMATÉRIAAMBIENTALEOCUSTODOPROCESSO 2020 EBOOK Page:RB-14.8.Disponívelem:https://nextproviewthomsonreuterscom/launchapp/title/rt/monografias/246259771/v1/page/RB-148%20 Acessoem23demaiode 2024
4 Arespeitodoprincípiodaproibiçãoderetrocesso,emsuaconcepçãogeral,bemapontamSarleteFensterseifer:"A garantiadaproibiçãoderetrocessotemporescopopreservarobloconormativo–constitucionaleinfraconstitucional–já construídoeconsolidadonoordenamentojurídico,especialmentenaquiloemqueobjetivaassegurarafruiçãodosdireitos fundamentaisdetodasasdimensõesougerações(liberais,sociaiseecológicos),impedindoouassegurandoocontrolede atosquevenhamaprovocarasupressãoourestriçãonossuasníveisdeefetividadevigentesnaatualidade"SARLET, IngoWolfgang;FENSTERSEIFER,Tiago DireitoConstitucionalEcológico SãoPaulo:ThomsonReutersBrasil 2021 E-BOOK Page:RB-64 Disponívelem:https://nextproviewthomsonreuterscom/launchapp/title/rt/monografias/93001289/v7/page/RB-64%20 Acessoem19abr2024
5 SARLET,IngoWolfgang;FENSTERSEIFER,Tiago DireitoConstitucionalEcológico SãoPaulo:ThomsonReuters Brasil 2021 E-BOOK Page:RB-65 Disponívelem:https://nextproviewthomsonreuterscom/launchapp/title/rt/monografias/93001289/v7/page/RB-64%20 Acessoem19abr2024
6 ARENHART,SérgioCruz Processosestruturaisnodireitobrasileiro:reflexõesapartirdocasodaACPdocarvão In: RevistadeProcessoComparado:RPC,v 1,n 2,p 211-229,jul/dez 2015 Disponívelem: http://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/109152.Acessoem22demaiode2024. 5107966-4020218210001
10058478241 V72
PoderJudiciário
TribunaldeJustiçadoEstadodoRioGrandedoSul
20ªVaraCíveledeAçõesEspeciaisdaFazendaPúblicadoForoCentralda ComarcadePortoAlegre
7 VITORELLI,Edilson PROCESSOCIVILESTRUTURAL-TEORIAEPRÁTICA SãoPaulo:EditoraJusPodvm, 2024.p.264.
8 ARENHART,SérgioCruz Processosestruturaisnodireitobrasileiro:reflexõesapartirdocasodaACPdocarvão In: RevistadeProcessoComparado:RPC,v 1,n 2,p 211-229,jul/dez 2015 Disponívelem: http://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/109152.Acessoem22demaiode2024.
9 ARENHART,SérgioCruz Processosestruturaisnodireitobrasileiro:reflexõesapartirdocasodaACPdocarvão In: RevistadeProcessoComparado:RPC,v 1,n 2,p 211-229,jul/dez 2015 Disponívelem: http://bdjurstjjusbr/jspui/handle/2011/109152 Acessoem22demaiode2024
10 "ACortedestacou,deinício,quenãoteriahavidoaperdadeobjetodaação,relativamenteaoparágrafoúnicodoart 741doCPC/1973,revogadopelaLei13105/2015,queestatuiumnovoCódigo Amatériadisciplinadanoreferido dispositivoteriarecebidotratamentonormativosemelhante,emboranãoigual,nos§§5ºa8ºdoart 535enos§§12a15 doart 525donovoCPC Asalteraçõessofridaspelanormaemquestão quecuidaramapenasdeadjetivaroinstitutoda inexigibilidadeporatentadoàsdecisõesdoSTF nãoteriamcomprometidoaquiloqueelateriademaissubstancial,ou seja,acapacidadedeinterferirnacoercitividadedetítulosjudiciais Esteseria,defato,oaspectoobjetodeimpugnação peloautordaaçãodireta,paraquemoinstitutofrustrariaagarantiaconstitucionaldacoisajulgada Portanto,nãohavendo desatualizaçãosignificativanoconteúdodoinstituto,nãohaveriaobstáculoparaoconhecimentodaação"(ADI 2501/MG,DJede19122008) InformativoSTFnº 824de2016
11 Art3º-ParaosfinsprevistosnestaLei,entende-sepor:I-meioambiente,oconjuntodecondições,leis,influênciase interaçõesdeordemfísica,químicaebiológica,quepermite,abrigaeregeavidaemtodasassuasformas;
12 I-açãogovernamentalnamanutençãodoequilíbrioecológico,considerandoomeioambientecomoumpatrimônio públicoasernecessariamenteasseguradoeprotegido,tendoemvistaousocoletivo;
13 MACHADO,PauloAffonsoLeme DireitoAmbientalBrasileiro SãoPaulo:EditoraJusPodivm,2023,p 84
14 MACHADO,PauloAffonsoLeme DireitoAmbientalBrasileiro SãoPaulo:EditoraJusPodivm,2023,p 85
15.Art.225.Todostêmdireitoaomeioambienteecologicamenteequilibrado,bemdeusocomumdopovoeessencialà sadiaqualidadedevida,impondo-seaoPoderPúblicoeàcoletividadeodeverdedefendê-loepreservá-loparaas presentesefuturasgerações
16.MILARÉ,Édis.DireitodoAmbiente.SãoPaulo:RevistadosTribunais,2021.E-BOOK.Disponívelemhttps://nextproviewthomsonreuterscom/launchapp/title/rt/monografias/91624456/v12/page/RB-241%20 Acessoem:14abr2024
17 MILARÉ,Édis DireitodoAmbiente SãoPaulo:RevistadosTribunais,2021 E-BOOK Page:RB-241 Disponível emhttps://next-proviewthomsonreuterscom/launchapp/title/rt/monografias/91624456/v12/page/RB-241%20 Acesso em:14abr2024
18 Art 216 Constituempatrimônioculturalbrasileiroosbensdenaturezamaterialeimaterial,tomadosindividualmente ouemconjunto,portadoresdereferênciaàidentidade,àação,àmemóriadosdiferentesgruposformadoresdasociedade brasileira,nosquaisseincluem:I-asformasdeexpressão;II-osmodosdecriar,fazereviver;III-ascriaçõescientíficas, artísticasetecnológicas;IV-asobras,objetos,documentos,edificaçõesedemaisespaçosdestinadosàsmanifestações artístico-culturais;V-osconjuntosurbanosesítiosdevalorhistórico,paisagístico,artístico,arqueológico,paleontológico, ecológicoecientífico
19 MILARÉ,Édis DireitodoAmbiente SãoPaulo:RevistadosTribunais,2021 E-BOOK Page:RB-241 Disponível emhttps://next-proviewthomsonreuterscom/launchapp/title/rt/monografias/91624456/v12/page/RB-241%20 Acesso em:14abr2024.
20 Art 26 OdireitodepreempçãoseráexercidosemprequeoPoderPúbliconecessitardeáreaspara:( )VIII–proteção deáreasdeinteressehistórico,culturaloupaisagístico; 21.ADI-MCnº.3.540/DF,RelatoriadoMinistroCelsodeMello.Julgadoem01/09/2005. 5107966-40.2021.8.21.0001 10058478241.V72