Nota_Tecnica_Juridico_AGERGS (2)

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO

NOTA JURÍDICA

DIREÇÃO, COORDENAÇÃO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONSULTORIA E ASSESSORAMENTO JURÍDICOS NO ÂMBITO DAS AUTARQUIAS, INCLUSIVE AS ESPECIAIS. AGÊNCIA REGULADORA. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DE MEMBRO DA CARREIRA DE PROCURADOR DO ESTADO. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

1. O Supremo Tribunal Federal assentou, em diversos precedentes, que, por força do art 132 da Constituição da República, compete exclusivamente aos Procuradores dos Estados a representação judicial, o assessoramento e a consultoria jurídica do Estado, suas autarquias e fundações públicas.

2 A despeito das características das agências reguladoras, autarquias de regime especial, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu que a sua representação judicial, bem como a coordenação e a prestação de assessoramento e consultoria jurídica compete exclusivamente aos Procuradores do Estado, por força do disposto no art 132 da Constituição Federal, não se enquadrando em nenhuma das exceções constitucionais (STF, ADI 5 262/RR)

3 É inconstitucional qualquer previsão normativa que admita a direção jurídica de autarquias por quem não é Procurador do Estado (STF, ADI 7420, Relator Min. FLÁVIO DINO, Relator p/ Acórdão Min. CRISTIANO ZANIN, Tribunal Pleno, julgado em 18-03-2024)

4 A representação judicial, a consultoria e o assessoramento jurídico, assim como os cargos de direção jurídica da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul - AGERGS, autarquia de natureza especial,

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integrante da Administração Pública Indireta do Estado, devem ser desempenhados, exclusivamente, por membro da carreira de Procurador do Estado do Rio Grande do Sul, sob pena de violação ao disposto no art. 132 da Constituição da República.

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O Projeto de Lei nº 365/2024, proposto pelo Governador do Estado, em trâmite na Assembleia Legislativa do Estado, propõe a reestruturação da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do SulAGERGS, e, em seu bojo, traz, no § 2º do art 11, a determinação de que a coordenação e prestação dos serviços de natureza jurídica no âmbito da AGERGS competirá à Procuradoria-Geral do Estado, por meio de Procuradoria Setorial específica e permanente.

Essa proposição legislativa, dentre as demais modernizações e atualizações proposta no projeto de lei, busca corrigir a inconstitucionalidade presente no Lei nº 10 931, de 09 de janeiro de 1997, em seus arts 5º, alínea “c”, combinado com o art 13 e, por arrastamento, o disposto no art 24 do Regimento Interno da AGERGS

Isso porque o art. 5º, alínea “c”, da Lei nº 10.931, de 09 de janeiro de 1997, cria, na estrutura básica da AGERGS, uma Diretoria Jurídica e, o art. 12 da referida Lei dispõe que os diretores serão escolhidos pelo Conselho Superior, preferentemente dentre os servidores efetivos da AGERGS

Por sua vez, o art 24 do Regimento Interno da AGERGS, Resolução Normativa nº 27, de 18 de outubro de 2016, editada com fundamento no art 13 da Lei nº 10 931, de 09 de janeiro de 1997, estabelece as atribuições da Diretoria Jurídica como

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sendo as seguintes:

“Art 24 Compete à Diretoria de Assuntos Jurídicos:

I - examinar a legalidade dos instrumentos de delegação de serviços públicos, emitindo sugestões para alterações;

II –examinar editais de licitação e de pregão para a aquisição de bens e contratação de serviços para a AGERGS, bem como manifestar-se nos expedientes administrativos de contratação direta por dispensa ou inexigibilidade de licitação, incluindo as minutas dos respectivos contratos;

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III - prestar assessoramento jurídico ao Conselho Superior e aos demais órgãos da Agência;

IV - analisar as minutas de convênios, acordos, contratos ou similares a serem firmados pela AGERGS ou de interesse desta e sugerir seu aperfeiçoamento;

V – emitir pareceres, quando demandada, nas questões pertinentes à regulação dos serviços públicos delegados, bem como em matérias administrativas internas;

VI – subsidiar a Procuradoria-Geral do Estado nas demandas judiciais que envolverem a AGERGS;

VII – examinar as minutas de atos normativos da AGERGS e orientar sua elaboração, em articulação com os demais órgãos da Agência;

VIII – organizar e manter a Biblioteca Jurídica no âmbito de suas instalações;

IX – manter contato com representantes de entes e órgãos públicos e privados em assuntos de natureza jurídica de interesse da Agência;

X – disponibilizar estudos técnicos para subsidiar os interessados em participar de consultas e audiências públicas, mediante autorização do Presidente ou do Diretor-Geral;

XI - executar outras atividades correlatas ”

Como se pode ver, referido conjunto normativo atribui funções de orientação, consultoria e assessoramento jurídicos, bem como a direção de tais atividades a qualquer pessoa (ou seja, mesmo estranha ao serviço público estadual) ou a servidor efetivo da AGERGS.

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Contudo, a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal é unânime em declarar inconstitucional, por violação ao disposto no art 132 da Constituição da República (princípio da unicidade orgânica das Procuradorias Estaduais e exclusividade de representação judicial, consultoria e assessoramento jurídico do Estado, suas autarquias e fundações públicas), as normas que permitam o exercício de direção de assuntos jurídicos no âmbito das autarquias

O Supremo Tribunal Federal decidiu, de modo expresso, no recente julgamento da ADI nº 7420, Relator Min FLÁVIO DINO, Relator p/ Acórdão Min CRISTIANO ZANIN, Tribunal Pleno, julgado em 18-03-2024, que “[É] inconstitucional qualquer previsão normativa que admita a direção jurídica de autarquias por quem não é Procurador do Estado”.

A competência exclusiva para prestar consultoria e assessoramento jurídicos, no âmbito dos Estados e suas autarquias e fundações públicas, decorre diretamente do art 132 da Constituição Federal, conforme exemplificam os seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE REFERENDO EM MEDIDA CAUTELAR LEI

ESTADUAL QUE ATRIBUI A CONSULTORIA E O ASSESSORAMENTO

JURÍDICO DE AUTARQUIA A AGENTES QUE NÃO SÃO PROCURADORES

DO ESTADO 1 Ação direta de inconstitucionalidade contra dispositivos da Lei nº 7 751/2015, do Estado de Alagoas, que, ao reestruturar a gestão do regime próprio de previdência dos servidores públicos estaduais, criou a autarquia denominada ALAGOAS PREVIDÊNCIA, como unidade gestora única, estruturando seus órgãos internos e definindo as respectivas competências

Atribuição de funções de consultoria e assessoramento jurídico a órgãos

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e agentes da própria autarquia, em estrutura paralela à Procuradoria-Geral do Estado. 2. Plausibilidade do direito alegado. O art. 132 da Constituição Federal confere às Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal a atribuição exclusiva das funções de representação judicial, consultoria e assessoramento jurídico das unidades federativas. O exercício da atividade de representação judicial e de consultoria jurídica no âmbito dos Estados e do Distrito Federal é de competência exclusiva dos Procuradores do Estado, organizados em carreira única. O modelo constitucional da atividade de representação judicial e consultoria jurídica dos Estados exige a unicidade orgânica da advocacia pública estadual, incompatível com a criação de órgãos jurídicos paralelos para o desempenho das mesmas atribuições no âmbito da Administração Pública Direta ou Indireta Precedentes 3 Perigo na demora. Notícia da prática recente de típicos atos de assessoria jurídica pelos órgãos da ALAGOAS PREVIDÊNCIA, sem a participação da Procuradoria-Geral do Estado [ ] Situação fática resultante do quadro normativo impugnado, cuja permanência poderá produzir efeitos de difícil reversão 4 Medida cautelar deferida, para que, até o julgamento definitivo da presente ação direta de inconstitucionalidade: (i) seja conferida interpretação conforme a Constituição ao inciso V e aos §§ 4º e 8º do art 7º da Lei nº 7 751/2015, do Estado de Alagoas, para que o cargo de Diretor Jurídico da ALAGOAS PREVIDÊNCIA, bem como seus eventuais substitutos, seja necessariamente ocupado por um Procurador do Estado; (ii) seja suspensa a eficácia da palavra “jurídica” no inciso VII do art 13 da Lei nº 7 751/2015, do Estado de Alagoas, para que se assegure a exclusividade da competência da Procuradoria-Geral do Estado para prestar consultoria jurídica e dirimir questões jurídicas na administração pública estadual, em que se inclui a atribuição de editar resoluções com o fito de consolidar entendimentos na área jurídica; (iii) seja conferida interpretação conforme a Constituição ao Anexo I da referida lei, nas disposições que

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definem as atribuições do cargo de analista previdenciário da área jurídica da ALAGOAS PREVIDÊNCIA, para que o assessoramento jurídico ali previsto seja compreendido como atividade instrumental, de assistência e auxílio aos Procuradores do Estado, aos quais incumbe constitucionalmente a consultoria jurídica e a representação judicial daquela autarquia. Ficam suspensas, portanto, quaisquer interpretações do Anexo I da Lei nº 7 751/2015, do Estado de Alagoas, que concluam no sentido de que os analistas previdenciários poderiam desempenhar, por si mesmos, competências exclusivas da Procuradoria-Geral do Estado 5 Interpretação teleológica do art 11, § 1º, e analógica do art 27, ambos da Lei nº 9 868/1999, para determinar que os efeitos da presente medida cautelar deverão incidir somente após 60 (sessenta) dias, a contar da intimação da última autoridade responsável pelo ato normativo impugnado (Governador do Estado ou Presidente da Assembleia Legislativa).

(ADI 6397 MC-Ref, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG 02-10-2020 PUBLIC 05-10-2020)

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AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DIREITO ADMINISTRATIVO LEI COMPLEMENTAR 734/2013 DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO ATRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES DE REPRESENTAÇÃO JUDICIAL E DE CONSULTORIA JURÍDICA DE AUTARQUIA ESTADUAL A PESSOAS ESTRANHAS AOS QUADROS DA PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO INCONSTITUCIONALIDADE OFENSA AO DISPOSTO NO ARTIGO 132, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ALEGADA PERDA DE OBJETO INEXISTENTE AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONHECIDA E JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE 1 A atividade jurídica contenciosa ou consultiva das autarquias cabe exclusivamente a pessoas pertencentes aos quadros das respectivas procuradorias-gerais

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estaduais, salvo nos casos de (i) manutenção dos órgãos de consultoria jurídica já existentes na data da promulgação da Constituição Federal de 1988 (art 69, ADCT); (ii) “ocorrência de situações em que o Poder Legislativo necessite praticar em juízo, em nome próprio, uma série de atos processuais na defesa de sua autonomia e independência frente aos demais Poderes, nada impedindo que assim o faça por meio de um setor pertencente a sua estrutura administrativa, também responsável pela consultoria e assessoramento jurídico de seus demais órgãos.” (ADI 1557, Rel. Min. Ellen Gracie, Plenário, DJ de 15/4/2004); e (iii) concessão de mandato ad judicia a advogados para causas especiais (Pet 409-AgR, Rel para o acórdão Min Sepúlveda Pertence, Plenário, DJ de 29/6/1990). Precedentes. 2. O anexo único da Lei Complementar 734/2013, assim como o Anexo IV, da Lei Complementar 890/2018, ambas do Estado do Espírito Santo, na parte em que conferem ao cargo de Técnico Superior - formação Direito, do Departamento Estadual de Trânsito do Estado do Espírito SantoDETRAN/ES atribuições de representação judicial e de consultoria jurídica da autarquia estadual, violou o artigo 132, caput, da Constituição Federal, que atribuiu aos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas. 3 Ação direta conhecida e julgado parcialmente procedente o pedido, para declarar a inconstitucionalidade do Anexo Único da Lei Complementar 734/2013 e do Anexo IV da Lei Complementar 890/2018, ambas do Estado do Espírito Santo, especificamente quanto às expressões “representar em juízo ou fora dele nas ações em que haja interesse da autarquia” e “bem como a prática de todos os demais atos de natureza judicial ou contenciosa, devendo, para tanto, exercer as suas funções profissionais e de responsabilidade técnica regidas pela Ordem dos Advogados do Brasil – OAB”, resguardada a validade dos atos já praticados (ADI 5109, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 13-12-2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-094 DIVULG 07-05-2019 PUBLIC

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO 08-05-2019)

O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADI 5 215-GO, fixou, ainda, a seguinte tese:

É inconstitucional a criação de Procuradorias Autárquicas no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, em razão da violação à unicidade orgânica da advocacia pública estadual

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Vale, ainda, ressaltar que a natureza jurídica de autarquias especiais das agências reguladoras não altera a conclusão de que as atividades de consultoria e assessoramento jurídico devam ser desempenhadas exclusivamente por Procurador do Estado, conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal quanto à Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Roraima no âmbito da ADI nº 5 262/RR

Por derradeiro, vale ressaltar que, além de ser determinação constitucional de que a consultoria e o assessoramento jurídico da AGERGS seja feita exclusivamente por Procurador do Estado, conforme acima exposto, referido ajuste está em consonância com o modelo federal, no qual órgão vinculado à AGU (Procuradorias Federais) realizam essas tarefas, bem como com o modelo dos demais estados, como se pode ver na recente Lei Complementar nº 1.413, de 23 de setembro de 2024, do Estado de São Paulo, que estabelece, em seu art. 41, que “[A]s atividades de representação judicial e extrajudicial, de consultoria e de assessoria jurídica das agências reguladoras serão exercidas pela Procuradoria Geral do Estado”

Dessa forma, a disposição constante do § 2º do art 11 do Projeto de Lei nº 365/2024, proposto pelo Governador do Estado, atribuindo a coordenação e prestação dos serviços de natureza jurídica no âmbito da AGERGS competirá à

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Procuradoria-Geral do Estado, por meio de Procuradoria Setorial específica e permanente, busca solucionar o estado de inconstitucionalidade e consequente insegurança jurídica presente no âmbito da estrutura orgânica da Agência Reguladora.

Conclui-se, assim, que não apenas não viola a autonomia da Agência Reguladora o exercício de consultoria e assessoramento jurídico ser realizado por Procurador do Estado, como é o único modelo constitucionalmente admitido, conforme assentou o Supremo Tribunal Federal em diversos precedentes, sob pena de violação ao disposto no art 132 da Constituição da República

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Porto Alegre, 19 de novembro de 2024.

EDUARDO CUNHA DA COSTA, Procurador-Geral do Estado

THIAGO JOSUÉ BEN, Procurador-Geral Adjunto para Assuntos Jurídicos

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GUILHERME DE SOUZA FALLAVENA, Procurador do Estado.

ANDRÉ DA FONSECA BRANDÃO, Procurador do Estado

DOCUMENTO ASSINADO POR

Eduardo Cunha da Costa

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Nome do arquivo: Nota Tecnica Juridico AGERGS

Autenticidade: Documento íntegro

20/11/2024 21:54:14 GMT-03:00 96296992068 assinatura válida

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