UERJ-FEBF UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA BAIXADA FLUMINENSE DEPARTAMENTO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
ALEXSSANDRA JULIANE VAZ
Caracterização e Avaliação dos Problemas de Saneamento e a Qualidade de Vida Ambiental no Bairro do Cangulo- Município de Duque de Caxias (RJ)
Monografia apresentada ao curso de Licenciatura Plena em Geografia, da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense/UERJ
Orientador: Andréa Paula de Souza
Duque de Caxias 2009
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FICHA CATALOGRÁFICA
Vaz, Alexssandra Juliane. Caracterização e Avaliação dos Problemas de Saneamento e a Qualidade de Vida Ambiental no Bairro do Cangulo- Município de Duque de Caxias (RJ)/ Alexssandra Juliane Vaz. Duque de Caxias, 2009. 87f.: il. Monografia (Licenciatura Plena em Geografia) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Educação da Baixada Fluminense, Departamento de Formação de Professores, 2009. Orientador: Andréa Paula de Souza 1. Problemas Urbanos. 2. Bairro do Cangulo. 3. Problemas Ambientais
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FOLHA DE APROVAÇÃO
Alexssandra Juliane Vaz
TÍTULO: Caracterização e Avaliação dos Problemas de Saneamento e a Qualidade de Vida Ambiental no Bairro do Cangulo- Município de Duque de Caxias (RJ)
Aprovado em Duque de Caxias, 13 de Março de 2009.
Banca Examinadora: ______________________________________________ (Andréa Paula de Souza – FEBF/UERJ Orientador)
______________________________________________ (Flavia Lopes Oliveira – FEBF/UERJ)
______________________________________________ (Valesca Silveira Silva – PROURB/UFRJ)
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Agradecimentos Durante os anos de faculdade tive o apoio incondicional de pessoas muito especiais, importantíssimos durante a minha caminhada e fundamentais para que esse trabalho chegasse ao fim. Agradeço a Deus que me ilumina e dá forças, e aos anjos que me protegem. Ao meu pai José, que mesmo sem ter sido alfabetizado soube me ensinar os maiores e mais importantes valores da vida, sempre me alertando sobre a necessidade de estudar acima de tudo. Assim como à minha mãe, Julia, que sempre cheia de ternura procurava me ajudar e dar apoio. Agradeço eternamente aos meus professores, por cada novo aprendizado, e que além de transmitir conhecimentos serviram de inspiração para a carreira geográfica. E de modo muito especial, à minha orientadora Andréa Paula de Souza, que sempre sorrindo conseguiu tornar as coisas mais fáceis, diminuindo meu desespero de estudante. Lembro ainda dos meus colegas de curso, fiéis companheiros de estudo e aventuras, que me viram rir e chorar, e me proporcionaram momentos de muitas risadas que jamais serão esquecidas. Infinitos agradecimentos também ao bairro Cangulo, palco da minha pesquisa, aos moradores, que muito me ensinaram durante a realização dos questionários, me recebendo com respeito e paciência em suas casas, sempre atentos às minhas indagações. Sem a importante participação de vocês a finalização desse trabalho não seria possível. Obrigada ainda a todos que me ajudaram na realização dos questionários, principalmente a minha irmã Juliana. Não poderia deixar de agradecer ao meu querido namorado William, presente durante todo o meu curso, por seu companheirismo, paciência, amizade e amor. Desculpa pelos momentos de estresse e nervosismo, você não merecia meu mau humor. E aos seus pais, Cícero e Dedé, que me aturaram durante horas na sua casa enquanto eu usava o computador. A Todos, meus sinceros e eternos agradecimentos.
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“Uma idéia de cidadania é mais invisível do que um cano de esgoto, sua instalação pode dar o mesmo trabalho, mas seu proveito público pode ser maior. Criar cidadãos conscientes dos seus direitos e do seu poder também é uma competência municipal”. (Luis Fernando Veríssimo)
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RESUMO Diante das diferenças sócio-ambientais presentes no espaço geográfico, surge a necessidade de estudar a relação existente entre o espaço físico e o bem-estar das populações humanas. Verificando aquilo que pode ser fundamental para a qualidade de vida ambiental. Tomamos como área de estudo o bairro Cangulo no município de Duque de Caxias, analisando as condições de vida da sua população, os equipamentos e serviços urbanos necessários ao bem-estar coletivo. Sobretudo os serviços de saneamento básico, que envolvem a oferta de água tratada e canalizada, a coleta dos resíduos sólidos, a captação e tratamento do esgoto doméstico e o manejo das águas pluviais, conforme a Lei Federal 11.445/07. É traçando um paralelo com o conceito de qualidade ambiental, ao considerar que o homem e o meio exercem influências mútuas entre e sobre si. Ao resgatar o histórico e a conjuntura da Baixa Fluminense, é possível avaliar o processo de formação do município caxiense e consequentemente do bairro Cangulo. Inicialmente ocupado por volta de 1955, o bairro e seus moradores ainda sofrem com problemas de infra-estrutura urbana, revelados na precariedade dos serviços de saneamento básico, que mantém a população sem abastecimento público de água e na presença de esgoto a céu aberto. O saneamento ambiental é considerado primordial para a garantia da qualidade de vida da população. Apesar de essa qualidade ser um desejo comum entre todas as pessoas, e considerando as diversas definições atribuídas ao termo, referentes às condições ambientais e socioeconômicas, vamos partir da análise da relação da população com seu local de moradia. Atentando às necessidades dos moradores que visem o seu bem-estar pleno. Avaliar temporalmente os investimentos públicos em infraestrutura voltados para o saneamento da região da Baixada Fluminense, seus planos de saneamento, as lutas e conquistas da população nas reivindicações por melhorias. Existe uma relação direta entre o saneamento e a saúde da população, condições ambientais impróprias para moradia acarretam diversos tipos de doenças, como parasitoses, infecções e problemas de pele. Tais enfermidades são ainda mais visíveis nos países não desenvolvidos, entre famílias pobres que habitam áreas desprovidas de saneamento básico, locais com presença de esgoto a céu aberto, água sem tratamento e ruas sem pavimentação, sobretudo na África, Ásia e América do Sul. Sendo inegável que as crianças são as mais prejudicadas. A solução desses problemas está no investimento em serviços e equipamentos de saneamento, principalmente na distribuição da água e posterior coleta e tratamento do esgoto, evitando conseqüências danosas desagradáveis para o meio e para a saúde humana. O respeito às leis que asseguram e regulamentam os serviços de saneamento, assim como o cumprimento de suas diretrizes, torna-se fundamental, constitui um direito do cidadão. Entretanto, compete a ele também participar dos planejamentos e da fiscalização. Assim com o cabe à sociedade civil participar da elaboração do plano diretor municipal. Sendo assim, governantes e cidadãos devem trabalhar em conjunto na construção e preservação do espaço, para que possamos todos gozar de um ambiente limpo e sadio, indispensável para uma vida com qualidade. Palavras Chave: 1. Problemas Urbanos; 2. Bairro do Cangulo; 3. Problemas Ambientais
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Lista de Figuras Figura 1. Localização da Baixada Fluminense (A), em destaque o Município de Duque de Caxias (Modificado de Farias, 2005), visualização dos distritos (B) e imagem do bairro do Cangulo (C) em 2008. Fonte: Google Earth Figura 2. Planta do Bairro do Cangulo (Duque de Caxias), em A (2006), nota-se a falta de infra-estrutura urbana como calçamento, enquanto em B (1985) temse uma pequena lagoa que aterrada entre 2006 e 2007, em C visualiza-se área de remobilização de material, utilizado em obras. Em D tem-se a vista geral da REDUC, próximo do bairro do Cangulo. Fonte: Próprio autor Figura 3 Bacia hidrográfica sujeita a inundação, a qual pertence o rio estrela (ressaltado em circulo), em A. Destaca-se em B o número dos pontos de enchentes em Duque de Caxias (Modificado de SEMADS, 2001), enquanto em C visualização de área de inundação no bairro do Cangulo (Jornal do Brasil, 2003). Figura 4 Esquema demonstrando a importância da ação conjunta do poder público e da participação da comunidade para melhor condição de vida ambiental (Kobiyama et. al., 2008). Figura 5 Estimativa de países afetados por mortes a partir da precariedade de qualidade e acesso a água, esgoto e falta higiene em 2000 (Clarke e King, 2005). Figura 6 Esquema do ciclo de relação entre água, saneamento e pobreza (Razzolini e Günther, 2008).
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Figura 7 Espacialização das operadoras de Água e Esgoto do Estado do Rio de Janeiro, nota-se que o município de Duque de Caxias tem como operadora a
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CEDAE (Sales, 2007). Figura 8 Planta do bairro do Cangulo, em A, nota-se manchas representativas das áreas onde foram realizados os questionários de forma aleatória, enquanto em B, encontram-se tracejadas as ruas onde foram aplicados os questionários em domicílios. Figura 9. Distribuição da classe etária, em A, nível de escolaridade, em B, renda média dos amostrados, em C, e tempo de moradia, em D, dos entrevistados para o Bairro do Cangulo.
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Figura 10 Condições de moradia e propriedade de habitação (terreno), conforme questionário aplicado por entrevistados (%) por domicilio.
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Figura 11 Maiores problemas locais por percentagem de entrevistados. Fonte: Próprio autor
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Figura 12 Percentual de exploração/uso da água, em A, e classes de qualidade da
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água por entrevistados, em B. Figura 13 Variação percentual dos locais comuns de despejo do esgoto, segundo moradores. Fonte: Próprio autor Figura 14 Variação dos problemas ambientais associados à degradação ambiental e o problema de saneamento, por ordem de importância, na percepção dos entrevistados. Figura 15 Resposta sobre realização de avaliação da qualidade de água dos domicílios, em A, e se o entrevistado gostaria de ser informado sobre a qualidade em relação ao risco à saúde, em B. Figura 16 Formas de abastecimento de água por domicílio, em A, características de qualidade da água, em B, periodicidade de abastecimento pela rede geral, em C, e periodicidade de compra de água em D, por entrevistado/domicílio. Figura 17 Freqüência de ocorrência (%) das possíveis causas da poluição em recursos hídricos por entrevistado/domicílio. Fonte: Próprio autor
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Figura 18 Despejo do esgotamento sanitário, em A, distância média entre fossa e poço, em B, característica de auto-contrução poço/fossa, em C, visão geral de falta de cuidado do bombeamento da água próximo à vala, em D. Fonte: Próprio autor
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Figura 19 Associação dos entrevistados (domicílio) em relação a doenças versus problemas ambientais, em A, e ocorrência de doenças na família com falta de controle ambiental, em B.
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Figura 20 Intenção da população local em ter algum tipo de informação ou participação efetiva no planejamento de obras públicas, em A, alegação de falta de informação sobre obras, em B, e visão das obras de saneamento no bairro, em C e D. Fonte: Próprio autor
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Figura 21 Percepção dos moradores (domicílio) sobre o que está atrelado a qualidade de vida, em A, percepção sobre a vivência em local com qualidade, em B, opinião sobre responsabilidade na geração de poluição, em C e associação de qualidade de vida com preservação ambiental, em D.
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Lista de Quadros
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Quadro 1 Modelo de classificação ambiental de infecções e principais medidas de controle (Razzolini e Günther , 2008)
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Quadro 2 Relação entre o nível de acesso a água versus necessidades atendidas e grau de efeitos à saúde (Razzolini e Günther, 2008)
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Quadro 3 Processos e definidores da poluição das águas
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Quadro 4 Máximos valores de padrão permitidos de bacteriologia na água (Roque, 2002)
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Lista de Anexos
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Anexo 1 Questionário básico para fins de caracterização geral da população local.
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Anexo 2 Questionário complementar aplicado aos domicílios, para fins de aprofundamento dos problemas ambientais.
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Anexo 3 Questionário Básico do Censo de 2000, conforme IBGE.
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Anexo 4 Questionário Suplementar de Meio Ambiente de 2002, conforme IBGE. Anexo 5 Fotografias ampliadas
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Lista de Siglas ABCON ABM ANAC BID BNH CEBs CEDAE CIDE CPRM CSBF DNOS DSBF ENSP ETE FASE FAT FEEMA FGTS FIOCRUZ GT IBGE ICMS IDH IDH-M IEF IPEA JK MAB MTE MUB ODM OGU OMS ONG PAC PBV PDBG PIB PLANASA PMDC PNUD PPP PSDB REDUC SEDEBRE M SEMA
Associação Brasileira das Concessionárias de Serviços Públicos de Água e Esgoto Amigos de Bairro de Meriti Agência Nacional de Aviação Civil Banco Internacional de Desenvolvimento Banco Nacional de Habitação Comunidades Eclesiais de Base Companhia Estadual de Águas e Esgotos Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro Serviço Geológico do Rio de Janeiro Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense Departamento Nacional de Obras Públicas Diretoria de Saneamento da Baixada Fluminense Escola Nacional de Saúde Pública Estação de Tratamento de Esgoto Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional Fundo de Amparo ao Trabalhador Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente Fundo de Garantia por Tempo de Trabalho Fundação Oswaldo Cruz Grupo de Trabalho Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Imposto Sobre Circulação de Mercadorias Índice de Desenvolvimento Humano Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Instituto Estadual de Florestas Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicada Juscelino Kubitschek Movimento Amigos do Bairro Ministério do Trabalho e Emprego Movimento União de Bairros Objetivos do Desenvolvimento do Milênio Orçamento Geral da União Organização Mundial de Saúde Organização Não Governamental Programa de Aceleração do Crescimento Programa Baixada Viva Programa de Despoluição da Baía de Guanabara Produto Interno Bruto Plano Nacional de Saneamento Prefeitura Municipal de Duque de Caxias Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Parcerias Público-Privadas Partido Socialista Democrático Brasileiro Refinaria Duque de Caxias Secretaria do Estado de Desenvolvimento da Baixada e Região Metropolitana Secretaria do Estado de Meio Ambiente
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SEMADS SERLA SESP SOSP TCE UERJ
Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável Superintendência Estadual de Rios e Lagoas Secretaria de Estado de obras e serviços Públicos Secretaria de Estado de Obras e Serviços Públicos Tribunal de Contas do Estado Universidade do Estado do Rio de Janeiro
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Sumário
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1 Introdução
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2 Objetivos
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3 Duque de Caxias na conjuntura da Baixada Fluminense
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3.1 Breve característica do meio físico com relevância aos problemas ambientais 4 Qualidade de Vida e Saneamento Ambiental
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4.1 Qualidade de Vida
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4.2 Saneamento Ambiental
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4.2.1 História do Saneamento na Baixada Fluminense: lutas e ações 30 4.2.2 O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara
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4.2.3 Saneamento e saúde
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4.2.4 Tipos e Equipamentos de Saneamento
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4.3 Características e Contraposições da Lei de Saneamento
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4.4 Estatuto da Cidade e Plano Diretor: como instrumento de qualidade 59 5 Etapas de Desenvolvimento do Trabalho 5.1 Questionários 5.1.1 Desenvolvimento e tratamento dos dados
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6 Análise dos Resultados
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7 Considerações Finais
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8 Referencias Bibliográficas
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1 Introdução As diferenças sócio-ambientais são visíveis nos inúmeros espaços terrestres, existindo uma série de fatores responsáveis e determinantes pela qualidade de vida ambiental das cidades. A contaminação dos recursos naturais e a poluição do meio são fatores contribuintes para a desvalorização do espaço, que acaba por abrigar uma população de baixo poder aquisitivo, constituindo áreas de segregação sócioespacial (Souza, 2000).No entanto, é importante não somente compreender como essa desvalorização ocorre, mas também quais os interesses sociais envolvidos nos processos relacionados à produção espacial. Considerando as condições precárias em que vive exposta grande parcela da população brasileira, o saneamento básico é encarado como um desafio para os governantes administradores do país e uma meta a ser alcançado dentro do planejamento urbano. Sabemos que as características do meio determinam de certa forma as atividades humanas, assim como os homens exercem influência sobre o espaço. Portanto, torna-se necessário que haja um equilíbrio entre a vida e o meio em que vivem, onde os aspectos negativos que interferem na qualidade de vida e ambiental devem ser superados, em prol do bem-estar das populações e gerações futuras. Se as oportunidades e condições de vida não são iguais para todos os seres humanos, ao se considerar as diferenças de qualidade de vida entre os indivíduos de uma mesma cidade, torna-se imprescindível investigar as razões das desigualdades sócio-espaciais e a lógica de interesses dos agentes modeladores do espaço (Feu, 2007). E que o planejamento urbano, com as contribuições do Plano Diretor, deve ser instrumento para o desenvolvimento sócio-espacial, pensando as políticas públicas em saneamento básico como direito assegurado por lei a todas as pessoas, independente de posição social, visando eqüidade no atendimento e melhoria na qualidade de vida ambiental. O município de Duque de Caxias apresenta uma configuração espacial desordenada onde a maioria dos recursos são destinados ao Centro, ou seja, os investimentos aplicados no município são mais direcionados para o primeiro distrito. Tal constatação se dá mediante as carências infra-estruturais básicas verificadas, por exemplo, no segundo distrito de Campos Elíseos do município, que abriga diversos bairros precariamente equipados com serviços urbanos, onde se localiza o
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bairro do Cangulo, recorte espacial em questão. O bairro como parte importante na vida social e econômica da cidade, merece ser estudado como parte integrante da sua conjuntura, principalmente por se localizar espacialmente próximo a Reduc (Refinaria Duque de Caxias), uma das maiores fontes de arrecadação econômica para o município e para o Estado do Rio de Janeiro. A análise do bairro envolve discussões acerca da qualidade de vida, considerando a definição do termo que refere seu uso ao atendimento das satisfações e necessidades humanas que visem o bem-estar coletivo. O que não será possível sem a análise da sua inter-relação com o conceito de qualidade ambiental. Esses, são termos de difícil definição devido às suas complexidades, trata-se de conceitos amplos e subjetivos, cheios de componentes, que trabalhados conjuntamente permitem resultados mais precisos. Silva (2006) diz que a qualidade de vida depende fundamentalmente das características do meio, e termina constatando que “a melhoria da qualidade de vida da população passa por uma correspondente melhoria da qualidade ambiental do local onde ela se encontra instalada” (p. 7). 2 Objetivos Faz-se relevante caracterizar o processo de ocupação do município de Duque de Caxias e, consequentemente, à compreensão da ocupação desordenada do bairro Cangulo, permitindo avaliar a infra-estrutura urbana do local. Pode-se dizer que os maiores problemas das cidades, em geral, está pautado na ausência de instrumentos urbanos como a falta de rede de esgoto que evite o lançamento direto dos dejetos humanos nos córregos da região; de um fornecimento de água canalizada e tratada que evite a necessidade de perfuração de poços nos quintais, assim como a utilização de água imprópria pelos moradores; da coleta de resíduos sólidos nas residências para evitar o acúmulo de lixo em terrenos baldios, capazes de facilitar a proliferação de animais transmissores de doenças para o homem. Sendo necessário analisar como o homem altera o lugar e de que forma essas alterações retornam para a população local e são percebidas pela mesma. Desta forma, analisar qual o “impacto” da organização estrutural do espaço na qualidade de vida ambiental da população local e traçar um paralelo entre a urbanização, seus impactos no meio físico e social. Sendo assim, o presente trabalho visa:
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- Caracterizar e apontar alguns problemas associados à falta de infra-estrutura urbana; - Assinalar e analisar os serviços de saneamento básico relacionados à água, ao esgoto domiciliar e a coleta de lixo residencial, assim como sua aplicação no bairro; - Analisar a relação entre a qualidade de vida e a falta de infra-estrutura urbana, traçando um paralelo entre os conceitos; 3 Duque de Caxias na conjuntura da Baixada Fluminense Será feito um breve resgate histórico e conjuntural da Baixada Fluminense (Figura 1A) na tentativa de compreender o processo de formação, assim como as condições de vida da população do município de Duque da Caxias (Figura 1A), que faz parte da região metropolitana do Rio de janeiro e situa-se a 22º 47' 09'' S e 43º 18' 43''. A ocupação populacional da Baixada Fluminense teve seu marco no ciclo da cana de açúcar, que contava com mão-de-obra escrava e no ciclo do ouro, que utilizava a região como passagem para o escoamento da produção, e seus rios pertencentes à bacia hidrográfica da Baia de Guanabara faziam a conexão entre o interior (Minas Gerais) e o litoral (Rio de Janeiro). No final do século XIX, o ciclo do café (que não substituiu a cultura da cana) propiciou a construção das primeiras vias férreas. No mesmo século, foram instaladas as primeiras fábricas, de pólvora e indústria têxtil, que proporcionou o surgimento de vilas operárias, igrejas, armazéns, escolas, entre outros (Silva, 2007). Destaca-se ainda no final do século o início do cultivo da laranja, principalmente em Nova Iguaçu. Investimentos públicos foram realizados no final da década de 1920 para expansão do sistema de transportes: abertura das avenidas Washington Luís, Automóvel Clube e antiga rodovia Rio-São Paulo. Além da expansão da rede elétrica, da eletrificação da Ferrovia Central do Brasil, que caracterizou uma expansão urbana pelo eixo ferroviária entre 1940 e 1960 e a implantação de programas de saneamento em 1934, durante o governo Getúlio Vargas. Essas medidas contribuíram para o desenvolvimento da região, importante fornecedora de mão-de-obra para a cidade do Rio de Janeiro, o que caracterizou os municípios como “cidades dormitório” entre os anos de 1940 e 1970 (Figuerêdo, 2004 apud Silva, 2007). Durante o auge do processo migratório a região foi importante por
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absorver o excedente populacional da capital, devido sua fácil ligação com a metrópole e os baixos custos de moradia. Como os serviços e programas sociais eram direcionados à metrópole, a região apresentou ao longo da sua história um déficit de equipamentos urbanos de cultura, lazer, hospitais, universidades, transportes etc. Verifica-se assim uma precariedade nas ofertas de serviços públicos ou privados que contribuem para a marginalização social dos seus moradores. De acordo com o SEDEBREM (Secretaria do Estado de Desenvolvimento da Baixada e da Região Metropolitana) 2005, a região conta atualmente com 13 municípios, sua área total representa 61% da área total da região metropolitana. E segundo o Censo Demográfico do IBGE (2000) sua população corresponde a 33% dos habitantes da região metropolitana, correspondendo a 25% do contingente populacional do Estado. Tratando especificamente de Duque de Caxias, seu povoamento data do século XVI, começou em uma área doada a vários sesmeiros por Estácio de Sá em 1565, onde hoje fica o Núcleo Colonial São Bento. O cultivo da cana-de-açúcar foi a atividade econômica que ensejou a ocupação da área. Foi importante ponto de passagem durante o ciclo da mineração, e quando esse entrou em declínio funcionou como ponto de descanso, abastecimento e transbordo de tropeiros e mercadorias. Até 1943 chamava-se Vila Meriti, pertencente ao município de Nova Iguaçu, conseguindo a emancipação política em 31 de dezembro do mesmo ano. Em 1971, Duque de Caxias foi decretada como Área de Segurança Nacional pelo regime militar, e retomou sua autonomia em 1985. Seus limites fazem fronteira com os municípios de Miguel Pereira, Nova Iguaçu, Petrópolis, Magé, São João de Meriti e Rio de Janeiro. Possui quatro bacias hidrográficas principais: Meriti, Sarapuí, Iguaçu e Estrela. Até o ano 2000 a população caxiense correspondia a 23% da população da Baixada, enquanto em 2007 contava com 842.686 habitantes (IBGE, 2007). Nas últimas décadas seu crescimento populacional se manteve estável em 1,7% ao ano. O bairro Cangulo em análise localiza-se no segundo Distrito do município, ou seja, o distrito industrial de Campos Elíseos, responsável por 10% da arrecadação de ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias) do Estado (Prefeitura de Duque de Caxias), e que engloba os bairros Jardim Primavera, Saracuruna, Vila São José, Parque Fluminense, Campos Elíseos, Cangulo, Cidade dos Meninos, Figueira,
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Chácaras Rio-Petrópolis, Chácaras Arcampo e Eldorado. De acordo com a planta do bairro fornecida pela prefeitura sua área é de 371,35 hectares, e foi instituído oficialmente no ano de 1987, (Decreto nº 1.864, artigo 1º) a partir do Plano Diretor Urbanístico sob mandato do prefeito José Carlos Lacerda (Secretaria de Planejamento e Urbanismo). Começou a ser ocupado por volta de 1955 (Magalhães et al, 2006) e conta atualmente com 5.539 habitantes (IBGE, 2007). Trata-se de uma área próxima aos mangues, de difícil ocupação e escassez de água potável, onde era comum a plantação de arroz, até os desastres de 1966 e 1967 onde diversos óbitos ocorreram em decorrência das chuvas, segundo informação do Corpo de Bombeiros do Estado (Magalhães et al, 2006). Já com 50 anos de existência o bairro não dispõe de posto de saúde, de opções de lazer, serviço de abastecimento de água encanada e tratada, nem rede de esgoto. A coleta de lixo começou a ser promovida recentemente, mas apenas em algumas ruas de mais fácil acesso e locomoção. Tem apenas uma escola municipal, uma praça, e poucas ruas asfaltadas. Possui muitas igrejas e alguns pontos comerciais, como padaria, mercadinho, pequenas lojinhas e duas casas de material de construção que atendem a população local. 3.1 Breve característica do meio físico com relevância aos problemas ambientais O município de Duque de Caxias tem área total de 464,573 km², divida em quatro grandes Distritos: 1º Centro, 2º Campos Elíseos, 3º Imbariê e 4º Xerém (Figura 1B). Em termos de características de ocupação da superfície ocupada pelo homem
associada
à
geomorfologia
existem
dois
principais
domínios
geomorfológicos segundo Dantas (2000), o primeiro são planícies Colúvio-AlúvioMarinhas (Terrenos Argilo-Arenosos das Baixadas). Superfícies subhorizontais, com gradientes extremamente suaves e convergentes à linha de costa, e interface com os Sistemas Deposicionais Continentais (processos fluviais e de encosta) e Marinhos. Terrenos mal drenados com padrão de canais meandrante e divagante. Presença de superfícies de aplainamento e pequenas colinas ajustadas ao nível de base das Baixadas. O outro domínio é o de Colinas Isoladas, com formas de relevo residuais, com vertentes convexas e topos arredondados ou alongados, com
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sedimentação de colúvios, remanescentes do afogamento generalizado do relevo produzido pela sedimentação flúvio-marinha que caracteriza as baixadas litorâneas. Estão também classificadas ilhas oceânicas. Densidade de drenagem muito baixa com padrão de amplitudes topográficas inferiores a 100m e gradientes suaves. A geologia é caracterizada como depósitos fluviais e flúvio-marinhos, arenosiltico-argilosos com camadas de cascalheiras associadas a depósitos de tálus e sedimentos lacustrinos e de manguezais retrabalhado. Além de depósito marinho e flúvio-marinho, síltico-areno-argilosos, ricos em matéria orgânica, englobando linhas de praias atuais e antigas, além de manguezais (CPRM, 2001). Outra característica é de colinas isoladas, com formas de relevo residuais, com vertentes convexas e topos arredondados ou alongados, essas áreas, em geral são utilizadas para retirada de material para a construção e obras, que acaba sendo agravante, uma vez que feições como estas estão sendo apagadas da paisagem, além do material mobilizado ficar exposto a erosão superficial e posteriormente carreado para os canais, o que acaba por contribuir para processos como enchentes (Figura 2B e C). Assim como na grande parte da Baixada Fluminense, no município de Duque de Caxias predomina o clima tropical semi-úmido, com uma temperaturas média de 24ºC. Porém, apresenta temperatura mais amena no 3º e 4º distrito (Imbariê e Xerém, respectivamente) em virtude da área verde e da proximidade com a Serra dos Órgãos. As chuvas são abundantes no verão, enquanto o inverno se apresenta seco. O bairro do Cangulo se encontra inserido na Bacia do Saracuruna que abrange parte dos Municípios de Duque de Caxias e Petrópolis, e a partir da confluência com o Inhomirim, passa a se chamar Rio Estrela (Figura 3A). Os formadores têm suas cabeceiras nas escarpas da Serra do Mar, com acentuada declividade e alta densidade de drenagem. O início da área de planície coincide com os primeiros núcleos urbanizados, onde as inundações são decorrentes, principalmente, da baixa declividade e de estrangulamentos (SEMADS, 2001). As enchentes urbanas constituem-se num dos mais importantes impactos sobre a sociedade, são normalmente localizadas e podem ser provocadas por crescimento desordenado, além do estrangulamento da seção do rio devido a aterros e pilares de pontes, estradas, assoreamento do rio e lixo. Outro impacto em relação à produção de sedimentos (Figura 2C) tem conseqüências ambientais graves para as áreas urbanas, como assoreamento da drenagem, com redução da
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capacidade de escoamento de dutos, rios e lagos (Figura 2B); transporte de substâncias poluentes agregadas ao sedimento devido à lavagem das ruas, ressalta-se ainda a degradação da qualidade da água drenada pelos esgotos pluviais e contaminação dos aqüíferos. Pode-se dizer que o Município de Duque de Caxias não é diferente da realidade brasileira, pois segundo SEMADS (2001), em 2000 existiam 123 pontos, isto é, responsável por 19.2% do total de pontos críticos da Região Metropolitana (Figura 3B). O bairro do Cangulo também é alvo do processo de inundação, conforme pode ser notado na Figura 3C, que mostra a ocorrência de enchente em 2003.
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Município de Duque de Caxias
B
A
A
C
Figura 1 Localização da Baixada Fluminense (A), em destaque o Município de Duque de Caxias (Modificado de Farias, 2005), visualização dos distritos (B) e imagem do bairro do Cangulo (C) em 2008. Fonte: Google Earth 8
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Sentido REDUC
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Figura 2. Planta do Bairro do Cangulo (Duque de Caxias), em A (2006), nota-se a falta de infra-estrutura urbana como calçamento, enquanto em B (1985) tem-se uma pequena lagoa que aterrada entre 2006 e 2007, em C visualiza-se área de remobilização de material, utilizado em obras. Em D tem-se a vista geral da REDUC, próximo do bairro do Cangulo. Fonte: Próprio autor 9
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Figura 3. Bacia hidrográfica sujeita a inundação, a qual pertence o rio estrela (ressaltado em circulo), em A. Destaca-se em B o número dos pontos de enchentes em Duque de Caxias (Modificado de SEMADS, 2001), enquanto em C tem-se a visualização de área de inundada no bairro do Cangulo (Jornal do Brasil, 2003). 10
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4 Qualidade de Vida e Saneamento Ambiental 4.1 Qualidade de Vida A qualidade de vida é um desejo comum entre as pessoas, independente da sua posição social e de suas aspirações futuras, sendo imprescindível para o bemestar humano em qualquer fase da vida, desde a infância, quando é fundamental para o desenvolvimento físico e mental, até a velhice. O viver bem pode ter diversas visões e significados, mas talvez seja o objetivo fundamental das sociedades humanas, assim como a busca por felicidade. Após os anos 1920, os cientistas sociais se dedicaram a desenvolver indicadores socioeconômicos como: perfil demográfico, atividade econômica e infraestruturas. Com o passar dos anos, a noção de qualidade de vida também começou a ser discutida, e do ponto de vista do desenvolvimento, passou por uma evolução (Silva, 2007), ganhando mais expressividade nos últimos 30 anos (Feu, 2007). Até os anos 1950, o conceito estava relacionado diretamente ao víeis econômico (renda, PIB, emprego), uma década depois já havia entrado no debate a questão do bemestar. Na década de 1970 o conceito ganhou uma conotação mais abrangente ao considerar a questão social, como escolaridade, saúde e emprego, se tornando “uma referência nas discussões do planejamento do desenvolvimento e dos padrões de intervenção do Estado, principalmente no nível local” (Vitte, 2002 apud Silva, 2007, p. 40). Já na década de 1980, é incorporado ao debate a questão ambiental. Tanto no Brasil, como nos demais países da América do Sul, o fator ambiental ganhou mais visibilidade a partir de três eventos de importância internacional: a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, realizado na Suécia, em 1972; a divulgação do “Relatório Brundtland”, no documento “Nosso Futuro Comum” da Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1988), marco referencial do conceito de desenvolvimento sustentável (Viola, 1992), e na Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - Rio-92 (1992). Dentre esses, a Rio-92 destaca-se como um marco na discussão ambiental brasileira, onde o ambiente, passou a ser visto também como ambiente social e o movimento ambientalista ganhou destaque como importante ator social (Viola, 1992). Contando com a participação de diversos segmentos da sociedade, o evento
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teve como principal fruto a elaboração da Agenda 21, colocando em pauta direitos e responsabilidades em relação ao meio ambiente (Viola, 1992). Dessa forma, a manutenção da qualidade de vida futura depende da sustentabilidade urbana, que segundo a Agenda 21 brasileira depende, entre outras estratégias, de: - buscar o equilíbrio dinâmico entre população e a base ecológico-territorial, diminuindo significativamente a pressão do homem sobre os recursos disponíveis ou remanescentes; - ampliar a responsabilidade ecológica, disseminando informação e promovendo a capacidade dos diversos atores de identificar as relações de interdependência dos fenômenos sociais, ecológicos, econômicos, e aceitar o princípio da co-responsabilidade, isto é do governo e da sociedade para a gestão de recursos (naturais e humanos), conforme exemplo da Figura 4; - formular e implementar políticas sistemáticas de alteração dos padrões atuais de produção e consumo. Buscar uma utilização menos intensiva de recursos naturais na própria confecção dos produtos. Controlar e diminuir resíduos. Na linha do consumo individual, vale a cultura dos “três erres” – reduzir, reciclar, reutilizar; - recuperar áreas degradadas e repor estoque de recursos estratégicos (solo, água, cobertura vegetal); - manter a biodiversidade natural e cultural; - combater a pobreza urbana, praticando os princípios da economia solidária e promovendo sempre que possível estratégia de desenvolvimento econômico que integrem dimensões ambientais relevantes (troca de lixo reciclável por cestas básicas, mutirão de reflorestamento com remuneração da comunidade, garis comunitários, recuperação de praças e jardins).
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Figura 4 Esquema demonstrando a importância da ação conjunta do poder público e da participação da comunidade para melhor condição de vida ambiental (Kobiyama et. al., 2008). Se o bem-estar social depende das condições do meio físico, deve haver um equilíbrio entre os componentes do sistema, que propicie um estado de normalidade. Mudanças podem provocar um stress ambiental, sendo preciso compensá-lo posteriormente por meio da restauração, recuperação ou reabilitação da condição ambiental anterior. Toda localidade deve possuir a capacidade de produzir e consumir reduzindo impactos, possibilitando assim uma sustentabilidade urbana. Para que os municípios cumpram esse papel a administração pública deve assegurar determinados serviços, que atendam às necessidades humanas de sobrevivência de forma satisfatória. A qualidade de vida ambiental deve ser produzida
de
forma
socialmente
justa,
ambientalmente
sustentável
e
economicamente viável (Silva, 2006). Constata-se que a qualidade de vida depende da interação entre os aspectos do meio físico, do meio biótico e dos elementos socioeconômicos, e caminha junto com a qualidade ambiental, devendo haver um equilíbrio entre ambas, porque “a melhoria da qualidade de vida passa, necessariamente, pelo atendimento do contexto ambiental onde se insere uma determinada população” (Silva, 2006).
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A palavra ambiente já não remete somente à idéia de natureza, é encarado como “produto social resultante da relação sociedade-natureza no processo de construção do espaço” (Galvão, 1992 apud Feu, 2007), ou seja, está associada ao processo histórico de ocupação do espaço geográfico, a transformação da natureza a partir do trabalho humano. Assim, o meio é analisado como ambiente socialmente construído, houve uma junção entre o urbano e o ambiental. E sendo os problemas ambientais todos aqueles que atingem negativamente a qualidade de vida das pessoas, a partir da sua interação com o ambiente (Souza, 2000), estima-se que as questões ambientais devem levar em consideração a forma como as sociedades se organizam no espaço. Sendo assim, são questionáveis os grandes eventos ambientais de caráter internacional, como os já citados acima, que lançam propostas e objetivos em escala global, desconsiderando as peculiaridades de cada lugar. Juntam no mesmo pacote diversos países que viveram processos históricos diferentes, onde as relações sócio-ambientais são diferentes, com formas de ocupação diferentes, devido à cultura diferenciada de cada povo. Dessa forma, os debates ambientais precisam estar de acordo com o ambiente socialmente construído, políticas ideais para um país podem ser irrelevantes para outro, se considerarmos que nem todos os lugares apresentam as mesmas necessidades e deficiências. A qualidade de vida é uma abordagem de diversos campos disciplinares, mas sobre o prisma geográfico é considerada a partir da construção social e histórica do espaço. Em uma perspectiva geográfica, o conceito de qualidade de vida e seu uso como instrumento à gestão do território (através de seus indicadores) permite a detecção de desigualdades espaciais que um determinado território apresenta, constituindose em uma base de diagnóstico e perspectiva útil aos processos de planejamento e formulação de políticas públicas para o desenvolvimento. (Feu, 2007, p. 2).
Para Souza (2002), o desenvolvimento vai além da esfera econômica, se
traduz numa mudança para melhor, porque altas taxas de crescimento econômico não garantem a erradicação da pobreza, nem melhoria nas condições de vida. Tem aqueles que acreditam que para o desenvolvimento de fato acontecer é necessário haver um controle da natalidade e distribuição de terras. Mas o desenvolvimento sócio-espacial só será de fato possível, quando houver mais justiça sócio-ambiental, com melhor distribuição de renda e conseqüente erradicação da pobreza, não adianta ter a posse da terra e viver segregado, sem os equipamentos urbanos
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mínimos necessários, como o saneamento básico, que permitam uma melhor qualidade de vida ambiental. A população tem o direito não somente ao saneamento básico, mas principalmente ao saneamento ambiental que, conforme Kobiyama et. al. (2008), visa o aproveitamento do meio ambiente para obter um bom saneamento, pois possui alta potencialidade no alcance do desenvolvimento sustentável. Ainda de acordo com Souza (2002), havendo justiça social “a satisfação das necessidades básicas dos grupos menos privilegiados terá prioridade sobre a satisfação das necessidades não-básicas dos grupos mais privilegiados” (p. 64), o que parece inatingível nas sociedades modernas capitalistas, onde não existe equidade nem comprometimento com os ideais de justiça entre os homens. De acordo com Silva (2007), o debate sobre qualidade de vida ganha ainda mais fôlego nos últimos anos a partir do planejamento, que para Souza (2002) deve ter como objetivo fundamental o desenvolvimento urbano, que deve levar ao aumento da justiça social, afirma ainda que “a finalidade última do planejamento e da gestão é a superação de problemas, especialmente fatores de justiça social, e a melhoria da qualidade de vida, ambos deveriam ser vistos como pertencentes ao amplo domínio das estratégias de desenvolvimento” (p. 73). Segundo Souza (2000), esses dois fatores estão interligados, são essencialmente complementares. O planejamento é então referência para instrumentalizar à ação pública mediante o conhecimento das necessidades coletivas, já que o planejamento ajuda no cumprimento dos compromissos sóciopolíticos. “A avaliação das condições de vida da população de um município através dos indicadores sociais pode revelar situações importantes na identificação de carências e deficiências quanto ao acesso a serviços e bens públicos” (Silva 2007, p. 1). Segundo o mesmo, a qualidade de vida de uma população não deve ser discutida “sem antes identificar e refletir sobre as condições que permitem satisfazer as necessidades de bem-estar social dessa população” (p. 7). Assim, a qualidade de vida depende tanto das condições de vida, que engloba a má distribuição de renda, o baixo nível de escolaridade e as condições de habitação, quanto do déficit social, definido por Jannuzzi (2003, p. 3) como a “parcela da demanda populacional não atendida adequadamente em termos de programas sociais ou de bens públicos e privados, segundo um padrão normativo desejável de bem-estar”.
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Outro fator importante na busca por qualidade de vida é a possibilidade de maior autonomia para os indivíduos, nas palavras de Souza (2002), “sem autonomia individual, dificilmente muitos dos fatores que garantem uma boa qualidade de vida podem ser concretizados” (p. 66). Assim, qualidade de vida significa menos privação, como acesso aos bens e serviços públicos, e mais liberdade (Feu, 2007). Verifica-se que a complexidade do tema qualidade de vida engloba diferentes dimensões no debate dos autores que tratam à questão, há inclusive, aqueles que falam de fatores que negam a qualidade de vida, como o desemprego, a exclusão social e a violência (Minayo et al., 2000). De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), a qualidade de vida é definida como sendo “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (Silva, 2007. p. 10). Em Nahas (2002 apud Silva, 2007): o uso da expressão “qualidade de vida” remete à demanda por melhores condições de saúde e bem-estar, face aos impactos e desigualdades sociais geradas pelo crescente processo de urbanização, mas remete sobretudo, a componentes de caráter imaterial, imprimindo ao conceito o enfoque indivíduo, da pessoa, vinculado a aspirações por felicidade, bem-estar e satisfação social (p. 27).
Essa afirmação vai ao encontro de Souza (2000), que diz que a qualidade de vida engloba:
coisas que não podem ser simplesmente adquiridas pelos indivíduos no mercado (e, em vários casos, nem se quer podem ser mensuradas, a não ser eventualmente, em uma escala ordinal), mas que interferem no seu bem-estar. Exemplos são a beleza cênica, a qualidade do ar e a liberdade política (p. 117).
Akerman (1996 apud Silva, 2006) “afirma que a qualidade de vida pode ser entendida como a possibilidade de melhor distribuição e usufruto da riqueza social e tecnológica auferida por um determinado agrupamento humano” (p. 29). O PIB (Produto Interno Bruto) e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) servem de índices para avaliar a qualidade de vida em escala nacional, porém, não são adequados para a realidade brasileira devido às suas diferenças regionais e enorme heterogeneidade (Silva, 2006). Em âmbito nacional, dados da pequena minoria detentora de renda escamoteia os resultados reais. Por isso, foi criado pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) e pela Fundação João Pinheiro (1996), o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), considerando os indicadores: renda familiar per capta média, o número médio de anos de estudo da população adulta (acima de 25 anos) e a taxa de analfabetismo. Cabe ressaltar que
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esse índice também é falho, em geral seus resultados não são capazes de mostrar o conjunto da realidade, e acarretam na distorção quando avaliados. Assim tanto os elementos ambientais quanto os socioeconômicos servem para qualificar a vida da população, mas de acordo com Silva (2006), as características sociais e econômicas sempre receberam maior atenção, assim como todos os critérios sempre privilegiaram a vida na cidade em detrimento da vida no campo. É preciso considerar também que os padrões de qualidade podem variar de um lugar para outro, de um indivíduo para outro, e da percepção individual dos sujeitos. Segundo Feu, a “qualidade de vida não diz respeito somente a necessidades básicas, os demais fatores estão ligados diretamente ao que cada sociedade ou cultura valoriza” (2007, p. 9). Logo, a qualidade de vida não é percebida da mesma forma em todos os lugares, não sendo possível um consenso universal para o termo, principalmente devido à carga de subjetividade que carrega. As prioridades para alcançar qualidade de vida ambiental nos países da Europa são muito diferentes das prioridades dos países latino-americanos, por exemplo. Nesses, onde o processo de urbanização acelerado não contou com o planejamento necessário, a qualidade de vida é mais discutida a partir da não universalização de parâmetros como direito à moradia, alimentação saudável, serviços de saúde, educação e saneamento básico (Feu, 2007). Os tipos de bens e aspirações almejadas pelas diferentes classes sociais variam muito, mesmo que concentradas na mesma área territorial da cidade, já que as realizações possíveis e as oportunidades oferecidas não são acessíveis a todos. São grandes as diferenças em relação aos níveis de exigência para a satisfação, “isso está ligado à questão da percepção individual, e também às conquistas já realizadas (ou não realizadas) pela população em relação aos direitos sociais, fazendo com que as aspirações e níveis de exigência mudem” (Feu, 2007, p. 20). Se analisarmos do ponto de vista da habitação, sendo a salubridade, no tocante à habitação um indicador muito útil para avaliar a qualidade de vida (Souza, 2002), percebe-se que algumas pessoas possuem rede de esgoto em casa enquanto outras não, o que acaba sendo igual para todas se considerarmos a necessidade de um rede coletora que envolva todo o bairro, já que os dejetos de todas as casas tem o mesmo destino final, ou seja, algumas questões que envolvem a qualidade de vida só fazem sentido quando pensadas a partir da coletividade,
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como bens e investimentos públicos, obras de engenharia e infra-estrutura em saneamento básico, que visam o bem coletivo da população. Assim, concorda-se com todas as interpretações sobre a qualidade de vida apresentadas acima, mas pretende-se analisá-la a partir da questão estrutural da população com seu local de moradia. Devido à multiplicidade do conceito, vamos pensá-lo no âmbito local, mediante as necessidades coletivas do conjunto dos moradores que podem refletir em melhoria de vida ambiental para todos, avaliando suas satisfações e insatisfações, mesmo que não tenham consciência sobre seus direitos sociais garantidos juridicamente. Segundo Feu (2007), a imprecisão com relação à qualidade de vida está associada ao uso que se dá ao conceito, e não a sua definição, aqui vamos utilizá-lo para atentar às necessidades dos moradores do bairro que visem seu bem-estar pleno. 4.2 Saneamento Ambiental 4.2.1 História do Saneamento na Baixada Fluminense: lutas e ações A Baixada Fluminense, ao longo da sua história, passou por vários processos de crescimento econômico com importância significativa para a economia do Estado do Rio de Janeiro, principalmente devido a sua localização e às características do solo e dos rios, que eram navegáveis. Participou da produção açucareira (século XVII); do escoamento do ouro entre Minas Gerais e a metrópole, através dos portos (século XVIII); da produção cafeeira (século XIX); e da produção de laranjas (século XX). Devido esses fatores econômicos, durante as décadas de 1920 e 1930, aumentaram os investimentos públicos visando a melhoria de infra-estrutura da região, porém, de acordo com Amador (1997) o saneamento da Baixada foi sem dúvida um dos exemplos mais perversos de agressão a natureza e reprodução e acumulação de capital, praticados com recursos públicos. Enormes somas de dinheiro foram utilizadas na valorização das terras de grandes proprietários, que as adquiriam (se é que adquiriram) por preço vil, e as revenderam com grandes lucros, na medida em que passaram a ser loteadas e vendidas para a população proletária, que foi empurrada para a Baixada inóspita (p. 338).
Já na década de 40, com o declínio do ciclo da laranja houve a necessidade
de redirecionar as atividades econômicas, passando a interessar os loteamentos
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populares (Oliveira, 1991). “Os loteamentos que se desenvolveram na Baixada Fluminense na sua grande maioria não tiveram nenhum planejamento nem seguiram as condições mínimas de infra-estrutura” (p. 11). Resultando em uma ocupação desordenada e predatória sob o ponto de vista urbano e ambiental. A ocupação sem planejamento mais o assoreamento dos canais ocasionou problemas de insalubridade que afetavam a qualidade de vida daquela população. Para o autor, a luta pelo saneamento básico era a luta pela democracia, porque ela permite o acesso de milhões de pessoas a melhores condições de vida. O saneamento básico possibilita melhores condições de saúde, acessibilidade, segurança, lazer e relação saudável como o meio ambiente. O direito ao saneamento básico possibilita, enfim, uma melhor apropriação da cidade por seu habitante (p. 65).
Segundo Monteiro (2008), entre os anos de 1906 e 1930 ocorreram algumas
tentativas de sanear a Baixada Fluminense, foram propostas políticas de saneamento para toda a região que se encontrava em estado pantanoso propício às endemias. Em 1910, durante o governo Nilo Peçanha foi criada uma comissão para estudar a região, desencadeando algumas obras até 1916. No governo Getúlio Vargas em 1930 foram criadas propostas um pouco mais eficazes para a configuração da área (Monteiro, 2008). Em 1933 foi criada a Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense, sob subordinação do Departamento de Portos e Navegação do Ministério da Aviação e Obras Públicas. Esta tornou-se autônoma em 1936 passando a chamar-se Diretoria de Saneamento da Baixada Fluminense, “que representou a consolidação da atuação dos engenheiros na intervenção ambiental visando o saneamento de regiões rurais” (Fadel, 2008, p. 1), legitimando as medidas de combate à malária, sob comando do engenheiro Hildebrando de Araújo Góes. Órgão de escala nacional, o DNOS (Departamento Nacional de Obras e Saneamento) criado na década de 1940, afirma em seus relatórios ter saneado 4.500 quilômetros da região e desobstruído 3.800 quilômetros de rios, além da construção de diques, canais e reservatórios de compensação (Monteiro, 2008). Anos mais tarde, o autoritarismo do golpe militar de 1964 desarticulou diversas organizações e perseguiu lideranças populares e sindicais. Na Baixada a desarticulação mais imediata foi nos centros pró-melhoramentos de bairros (Oliveira et. al., 1995). Ainda assim, no final da década de 70 a ONG FASE (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional) começa a atuar na Baixada,
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articulando as federações de moradores e capacitando suas lideranças, papel desempenhado até os dias atuais. O PLANASA (Plano Nacional de Saneamento) foi criado em 1971 com recursos do BNH (Banco Nacional de Habitação) para superar o déficit no acesso aos serviços de saneamento, se antes o objetivo era o controle das enchentes vinculado aos interesses econômicos da Baixada, dentro desse projeto a meta para a região passou a ser o abastecimento de água. Durante esse período, segundo Porto “a Baixada Fluminense, na qualidade de espaço periférico, tem intervenções pontuais, geralmente concentradas nos centros dos seus municípios e capturadas pelos interesses políticos e eleitorais que dominam essas cidades” (2003, p. 63). Na segunda metade da década de 70 ressurgem os movimentos populares, articulados com dois atores importantes, a igreja católica com as comunidades eclesiais de base (CEBs) e os partidos comunistas, com destaque para o PCB (Partido Comunista Brasileiro) e o PC do B (Partido Comunista do Brasil). Ambos atuavam na denúncia do autoritarismo e na crítica à espoliação urbana, principalmente na questão da saúde e das enchentes. “As enchentes eram nesse período a calamidade pública que denunciava a ausência de serviços de saneamento que atingia o conjunto dos moradores da região” (Porto, 2003, p. 65). Até início da década de 1980 a luta pelo saneamento da Baixada se apoiava no discurso da espoliação urbana e da desigualdade social. Em 1984 surge o Comitê Político de Saneamento da Baixada Fluminense, uma conquista das federações de moradores de Nova Iguaçu – Movimento Amigos do Bairro (MAB); Duque de Caxias – Movimento União de Bairros (MUB); São João de Meriti – Amigo de Bairros de Meriti (ABM); Nilópolis – Pró-Federação das Associações de Moradores de Nilópolis. Inicialmente faziam manifestações públicas diante
da
sede
dos
governos
municipais,
posteriormente
estenderam
as
reivindicações ao governo do Estado. Lutavam com o apoio da igreja católica pela melhoria das condições de habitalidade, denunciando o abandono da região, promoviam encontros para discutir os problemas comuns e elaborar as reivindicações, sendo as principais: •
Maior aplicação de verbas públicas em saneamento básico para a
Baixada; • básico;
Prioridade dos orçamentos municipais e estaduais para saneamento
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•
Participação das associações de moradores através de suas
federações, nos planejamentos e projetos de obras; •
Aplicação de recursos de maneira integrada, oriundos do governo
municipal, estadual e federal. Toda essa articulação promoveu um encontro com o então Secretário de Obras e Meio Ambiente, Luis Alfredo Salomão, em dezembro de 1984, culminando na elaboração do Plano Global de Saneamento e Meio Ambiente na Baixada Fluminense. As obras começaram em 1985, mas foram paralisadas no ano seguinte com a extinção do BNH, pelo governo José Sarney. As obras retomadas em 1987 sob o governo Moreira Franco não foram suficientes para evitar as enchentes de 1988 que deixaram milhares de desabrigados na região. Outras ações importantes foram a inauguração da primeira estação piloto de tratamento de esgoto da Baixada, em Vilar dos Teles (1989) e as obras de limpeza e canalização dos rios e afluentes (1990). As enchentes de 1988 que deixaram à região em estado de calamidade reorientaram a agenda política do comitê, elaborando um plano emergencial de saneamento. Mobilizações de massa serviram para que o Estado elaborasse um projeto de macro e mesodrenagem que viesse a minimizar as enchentes, dentro do Projeto Reconstrução Rio. Entretanto, o comitê precisou organizar uma caravana para Brasília com mais de 20 ônibus para pressionar o Governo Federal, pois mesmo com a aprovação do projeto pelo Banco Mundial as obras esperaram dois anos para ter início. Esse projeto foi de ação emergencial e esteve centrado na prevenção das enchentes. Entretanto, devemos considerar o caráter paliativo dessas obras, “visto que as condições climáticas (de chuvas intensas), de topografia (terrenos baixos) e de geologia serão mantidas, e que persistem os fatores responsáveis pelo assoreamento dos canais fluviais, como o desmatamento, o uso irracional do solo e a erosão na bacia” (Amador, 1997, p. 377). Dessa forma, o cerne do problema persiste, ocorrendo apenas uma ilusão temporária de recuperação da área, que estimula as ocupações. Em 1990 a dimensão ambiental foi incorporada à luta do comitê, que passou a chamar-se Comitê Político de Saneamento e Meio Ambiente da Baixada Fluminense. Mais tarde, em 1994, introduziu uma nova temática - a habitação, passando a chamar-se Comitê Político de Saneamento, Habitação e Meio Ambiente da Baixada Fluminense. Esse órgão era reconhecido pelo Estado como interlocutor
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do movimento organizado, se constituiu como uma das principais organizações populares do Rio de Janeiro. A luta do comitê era uma luta clara pela cidadania, por justiça sócioambiental. Em 1991, solicitaram uma audiência pública com o então, governador do Estado Leonel Brizola, através de uma carta com o título “Saneamento Básico: direito à cidade, direito à vida”, que ressaltava: A luta pelo saneamento básico da Baixada significa para sua população sofrida melhores condições de vida. Significa diminuir os índices de mortalidade infantil e os números de doentes; ter mais segurança no seu local de moradia; ter direito a morar com dignidade, com espaços de lazer e um ambiente ecologicamente saudável. Enfim, a luta pelo saneamento altera consideravelmente as desigualdades sociais impostas ao povo da Baixada Fluminense.
Com a eleição de Marcelo Alencar para o governo do Estado pelo PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) houve uma desarticulação do Comitê com a esfera governamental, que estruturou uma política enfraquecedora em torno do saneamento, dando vez às máquinas partidárias clientelistas locais (Porto, 2003). Passou a vigorar uma nova política de saneamento dentro do Programa Baixada Viva (PBV), com atuação reduzida para o âmbito dos bairros, contando com atuação da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) no intuito de desenvolver estudos e reuniões com objetivo de intervenção no PBV. 4.2.2 O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara É de suma importância, considerar o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG) ao analisar os programas de saneamento na Baixada Fluminense, de acordo com Kornis e Vargas (2002) esse é o mais ambicioso projeto de intervenção ambiental da história recente do Estado do Rio de Janeiro. E um “instrumento de melhoria da qualidade de vida dos habitantes dos 15 municípios limítrofes com a Baía de Guanabara” (Kornis e Vargas, 2002, p. 16). Constitui uma tentativa de reverter o quadro de degradação ocasionado pelo modelo de desenvolvimento, segundo Amador (1997), o modelo agrícola-exportador e depois o industrial-urbano promoveram “modificações radicais no cenário físico e humano da região da Guanabara” (p. 8). Segundo o mesmo, a ocupação da região foi predatória, e as atividades no seu entorno geram problemas ambientais assim como sua utilização para transporte de cargas e mercadorias, “a atividade que é dádiva da baía colabora efetivamente para sua destruição” (p. 333). Com a execução do Plano de Metas do presidente JK (marco do crescimento da poluição da Baía de
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Guanabara) a baía passou por vários aterros para instalação de indústrias, com destaque para a construção da refinaria de Duque de Caxias (REDUC), hoje considerada a principal fonte de poluição das águas da baía. Esse
crescimento
urbano-industrial
atraiu
um
fluxo
migratório
de
trabalhadores ocasionando um incremento populacional da metrópole, o que aumentou consideravelmente os níveis de degradação da baía devido à falta de planejamento urbano: A maioria esmagadora da população da Bacia da Guanabara vive em condições de miséria, desassistida dos serviços urbanos mais elementares como saneamento básico, rede de esgoto, coleta de lixo, transportes adequados etc. o que acaba comprometendo a Baía de Guanabara, que recebe quase todo o esgoto bruto produzido na Baixada e o lixo flutuante trazido pelos rios (Amador, 1997, p. 346).
Outros problemas são decorrentes dos desmoronamentos, assoreamento,
lançamento de esgoto e resíduos sólidos, elementos líquidos industriais, entre outros. O PDBG começou a ser discutido na década de 1980, principalmente a partir de 1987, quando foi criada a Comissão para a Recuperação Gradual da Baía de Guanabara, integrada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA), Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA), Instituto Estadual de Florestas (IEF), Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (SERLA), e a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Urbano e Regional. Em 1991, é firmado um convênio entre o Brasil e o Japão para realizar junto a FEEMA um diagnóstico dos processos de deterioração socioambiental da Baía de Guanabara, e em 1993 o governo do Estado cria a Comissão Coordenadora para a Execução do PDBG. Com apoio do Banco Internacional de Desenvolvimento (BID), o programa entra em funcionamento em 1994 com a missão de recuperar a Baía de Guanabara, tendo como prioridade o saneamento básico (Kornis e Vargas, 2002), e como principais objetivos reduzir a carga orgânica industrial, a carga orgânica do esgoto lançado “in natura”, a carga tóxica industrial, o volume de óleos e graxas e o destino do lixo produzido. Para os autores, esse é um ambicioso projeto ambiental com impacto direto sobre o desenvolvimento do Rio de Janeiro. O programa é realizado por etapas e conta com agências co-executoras para gerenciamento técnico, administrativo e financeiro em unidades próprias. Sob a coordenação da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE), pretende melhorar a oferta de água tratada na Baixada Fluminense, e em São Gonçalo, beneficiando 1 milhão de habitantes. Outros 5 milhões serão beneficiados com os
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investimentos em esgotamento sanitário, mediante a construção e recuperação de estações de tratamento de esgoto (ETE), assentamentos de rede coletora, construção de emissários terrestres e submarinos, estações elevatórias e ligações domiciliares. Já os resíduos sólidos ficam a cargo da Secretaria de Estado de Obras e Serviços Públicos (SOSP), para melhorar os sistemas de coleta e destinação do lixo, com instalação de usinas de reciclagem e compotagem, aterros sanitários e aquisição de veículos de coleta. Neste setor Duque de Caxias merece atenção especial devido à presença do aterro sanitário de Jardim Gramacho, devido a sua extensão, e sua localização às margens da Baía, e pela consequente quantidade de resíduos que recebe (5.000 toneladas/dia) de vários municípios do Estado. Calculase o beneficiamento de 2,8 milhões de pessoas. A macrodrenagem é de responsabilidade da SERLA, e compreende obras de canalização, retificação e recuperação dos muros laterais de rios, visando o controle de enchentes, sendo capaz de beneficiar 550 mil habitantes, principalmente de comunidades ribeirinhas. Em suma, no decorrer das três últimas décadas, a Baixada recebeu pelo menos seis grandes projetos de saneamento: Plano de Impacto (1975); Projeto Especial de Saneamento para a Baixada Fluminense e São Gonçalo (1984); Plano de Setorialização da Rede de Abastecimento de Água da Baixada (1986); Projeto Reconstrução Rio (1988); Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (1994); Programa Nova Baixada (1995). Porém, para Porto (2003), ainda está “longe de expressar maior justiça social e ampliação dos direitos da cidadania. Na região ainda vigoram fortes desigualdades sociais e ambientais, que se traduzem no baixo acesso a bens e serviços urbanos” (p. 14). O saneamento é encarado como uma questão social na Baixada Fluminense, porque as políticas adotadas atendiam as necessidades de uma clientela específica. Para o autor, o padrão das políticas públicas de saneamento adotadas na Baixada nos últimos 30 anos foram patrimonialistas e clientelistas, fundado na apropriação privada dos recursos públicos, para atender as elites locais e as empreiteiras responsáveis pela execução das obras. O que explica o fato de 1 bilhão de dólares investidos não terem causado alterações significativas na qualidade de vida da população.
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4.2.3 Saneamento e saúde É de conhecimento mundial a relação existente entre saneamento e saúde, principalmente por parte da ciência médica, responsável pelo diagnóstico e tratamento das enfermidades humanas. Países desenvolvidos apresentam melhores condições de saneamento ambiental, o que pode ser atribuído a uma melhor qualidade de vida da sua população. Enquanto países não desenvolvidos, principalmente na África, América do Sul e partes da Ásia, enfrentam problemas de saúde quase inexistentes entre os países ricos. São problemas associados à falta de infra-estrutura urbana, como os serviços de saneamento básico, que ainda matam centenas de pessoas todos os anos (Figura 5), principalmente aquelas que vivem em áreas abandonadas pelo poder público, em contato com valas-negras, esgoto a céu aberto, água sem tratamento, ruas sem pavimentação. O quadro de desigualdade social verificado entre países e regiões está associado aos problemas de saúde relacionados à pobreza e à falta de acesso a políticas sociais, e os investimentos em promoção de saúde não dão vazão à demanda. Pesquisa do Datafolha revelou que 29% dos entrevistados citaram a saúde como sendo o principal problema do Brasil (Folha de São Paulo, 31/03/2008). No país, a falta de saneamento básico ainda é responsável por um grande número das internações nos hospitais públicos. Ou seja, fica evidente que a “dimensão ambiental penetra no social” (Iniguez e Oliveira, 1996, p. 2). É possível estabelecer uma relação entre a queda da mortalidade infantil e o aumento da expectativa de vida às melhorias das condições sanitárias (Minayo et al., 2000; Minayo, 2006). Vemos constantemente ruas sem calçamento, inexistência de redes de esgotos e para o escoamento das águas pluviais, valas negras e mosquitos. Toda essa precariedade urbana é intensificada pela falta de postos de saúde e hospitais capazes de atender as necessidades dos moradores. Assim, o descuido com a saúde pública e o saneamento faz com que essas periferias tornem-se espaços de endemias e epidemias (Corrêa, 2001). É inadmissível, o número de pessoas acometidas por parasitoses, doenças de pele, respiratórias e diarréicas, que na maioria das vezes tem como causa a falta de higiene e, como agravamento o próprio local de moradia, que deveria ser assistido pelo poder público. Sendo o espaço geográfico produzido socialmente, possui formas associadas ao poder político, econômico, sócioambiental e cultural. É uma das funções da geografia, assim como
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de outras ciências, estudar a produção do espaço e seus agentes modeladores, buscando a compreensão das desigualdades sociais e do ordenamento espacial. Dessa forma, encontra-se na saúde da população mundial respaldo para as lutas e reivindicações por melhores condições de moradia, de vida. Em Corrêa (1988) vemos que caminham juntos, “a subnutrição, as doenças, o baixo nível de escolaridade, o desemprego, ou o subemprego (p. 29)”. Enquanto, Jannuzzi diz que os tipos e formas dos domicílios é outro fator que deve ser considerado, para buscar melhores condições de vida: A adequação domiciliar na zona urbana depende, entre outros fatores, do acesso à rede de serviços de infra-estrutura básica de luz elétrica, abastecimento de água tratada, saneamento e coleta de lixo. Historicamente os grandes progressos contra a mortalidade infantil no Terceiro Mundo, decorrente de doenças infectoparasitárias, se devem à ampliação da cobertura desses serviços. (Jannuzzi, 2003, p. 109)
A água como substância essencial à existência dos homens é um direito de todas as sociedades, mas segundo Clarke e King (2005) mais de 1 bilhão de pessoas não tem acesso a fontes de água segura, e que 2,3 bilhões de pessoas sofrem de doenças disseminadas pela água, informações compartilhadas também pela OMS. O Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (2007) aponta a febre tifóide, a disenteria, o cólera, a diarréia, a hepatite, a leptospirose e a giardíase como sendo as enfermidades mais transmitidas pela água no país. Dentre elas, a diarréia é a de maior abrangência entre os países não desenvolvidos, “cerca de 4 milhões de pessoas são afetadas anualmente, e muitas delas, na maioria crianças, morrem em conseqüência da desidratação que acompanha os casos de diarréia” (Clarke e King, 2005, p. 47), conforme mostra a Figura 5. O TCE-RJ (2007) ressalta ainda que “a água de qualidade também é importante fator de inclusão social, uma vez que a população de baixa renda dificilmente tem condições de pagar medicamentos para tratar as doenças de veiculação hídrica, ou até mesmo ter recursos para acesso à água de qualidade para beber” (p. 15).
39
Figura 5 Estimativa de países afetados por mortes a partir da precariedade de qualidade e acesso a água, esgoto e falta higiene, em 2000 (Clarke e King, 2005). Muitos estudiosos têm desenvolvido pesquisas que apontam a relação direta entre a qualidade da água servida e disponível e a saúde da população, dentre os serviços de saneamento básico, esse é o que tem recebido maior atenção nos trabalhos acadêmicos. Razzolini e Günther apontam que “a falta ou a precariedade do acesso à água representa situação de risco que propricia aumento da incidência de doenças infecciosas agudas e da prevalência de doenças crônicas” (2008, p. 21), conforme Quadro 1. Ainda corroboram, que as condições de abastecimento trazem conforto, bem-estar, prática de hábitos de higiene e produtividade econômica. Áreas sem rede de abastecimento de água, além de agravar as condições de vida obriga a busca por fontes alternativas, onde a qualidade sanitária é duvidosa. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em trabalho desenvolvido em 2005, estabeleceu como meta no documento Objetivos do
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Desenvolvimento do Milênio, reduzir em 50% a população mundial sem acesso à água segura. Assim, reduziria as longas distâncias percorridas diariamente por pessoas (principalmente mulheres e crianças) para buscar água em outras fontes, que pode comprometer sua estrutura física, devido o peso carregado em baldes e vasilhames, às vezes sobre a cabeça, propiciando a ocorrência de doenças crônicas, como as dores nas costas. Essa prática é ainda mais grave quando praticada por crianças, já que a ossatura não está devidamente formada, comprometendo seu desenvolvimento (Razzolini e Günther, 2008). O abastecimento seguro e constante também evitaria a prática de estoques, que propicia a criação de larvas. Na maioria dos casos a coleta, o transporte e o armazenamento da água são feitos de forma inadequada, os utensílios utilizados ficam nos quintais, sem proteção alguma, e podem estar sujos, contaminando a água. E por dispor de um volume diário baixo, muitas atividades são comprometidas, como a higienização das roupas, o banho diário, a lavagem das mãos e utensílios domésticos e o preparo dos alimentos (Quadro 2). Segundo Feachem e col (1983 apud Razzolini e Günther, 2008) existem cinco grupos de enfermidades associadas à água: a) vinculadas à falta de higiene pessoal e doméstica pela ineficiência do abastecimento; b) contato com a água; c) transmitida por vetores aquáticos; d) as que são disseminadas pela água, e e) as que são transmitidas pela água. Exemplos são os casos de febre tifóide, de tracomas, de diarréias, de parasitoses, dores de barriga e doenças de pele. E os indivíduos mais atingidos e suscetíveis a essas doenças são aqueles com sistema imunológico comprometido, seja por desnutrição ou por não estar plenamente desenvolvido, como as crianças menores de cinco anos. Também se enquadram os idosos e os imunodeprimidos. No mundo todo, as crianças são indiscutivelmente as mais prejudicadas. A diarréia que atinge amplamente essa classe etária pode matar por causar desidratação, e em sua fase crônica a criança já desnutrida fica ainda mais vulnerável. Quando não mata debilita o doente de tal forma que torna-se facilmente suscetível a outros males. Um bom exemplo é a esquistossomose, parasita que retarda o crescimento e o desenvolvimento das crianças. Não dá para afirmar se a pobreza agrava essas doenças ou se é a própria causa delas. No Brasil, a qualidade da água para atendimento humano deve atender a padrões de potabilidade, segundo a Portaria nº 518/2004 (Ministério da Saúde), a lei
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especifica parâmetros físico-químicos, químicos e bacteriológicos por contaminação fecal. Fezes humanas ou animal contaminam a água com bactérias e outros agentes causadores de doenças infecciosas (disenteria amebiana, cólera, tifo, e poliomielite). O solo também é contaminado por esses agentes patogênicos, constituindo perigo para as pessoas que estão em contato direto com ele. Quadro 1 Modelo de classificação ambiental de infecções e principais medidas de controle (Razzolini e Günther , 2008) Classificação
Infecção
Via dominante de transmissão
Principais medidas de controle
Doenças fecoorais nãobacterianas
Enterobíase,amebíase, giardíase, balantidíase
Pessoal e doméstica
• Abastecimento doméstico de água • Educação sanitária • Melhorias habitacionais • Instalação de fossas
Doenças fecoorais bacterianas
Salmonelose, cólera, disenteria bacilar, diarréia por E. Coli
Pessoal, doméstica, por água e alimentos
Helmintos do solo
Ascaridíase, tricuríase, ancolostomíase
Teníases
Teníases
Jardim, campos e culturas agrícolas Jardim, campos e pastagens
Helmintos hídricos
Esquistossomose e outras doenças causadas por helmintos
Água
Doenças transmitidas por insetos
Filariose e todas as infecções anteriores, das quais moscas e baratas podem ser vetores
Vários locais contaminados por fezes
• Abastecimento doméstico de água • Educação sanitária • Melhorias habitacionais • Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes do lançamento ou do reuso da água • Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes da aplicação no solo • Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes da aplicação no solo • Instalação de fossas • Tratamento dos excretas antes do lançamento na água • Controle do reservatório animal • Identificação e eliminação de criadouros de insetos vetores
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Quadro 2 Relação entre o nível de acesso a água versus necessidades atendidas e grau de efeitos à saúde (Razzolini e Günther , 2008) Nível de acesso
Distância percorrida e tempo gasto > 1 km e > 30 minutos
Provável volume coletado Muito baixo (em torno de 5 L per capita por dia)
< 1 km e < 30 minutos
Média não excede a 20 L per capita por dia
Acesso intermediário
Água fornecida por torneira pública (à distância de 100 m ou 5 minutos para coleta)
Média aproximada de 50 L per capita por dia
Acesso ótimo
O Suprimento de água ocorre mediante múltiplas torneiras
Média aproximada de 100 L a 200 L per capita por dia
Sem acesso
Acesso básico
Demanda atendida Consumo não assegurado, o que compromete a higiene básica e dos alimentos Consumo pode ser assegurado e devese possibilitar a higiene básica e dos alimentos. Há dificuldade de se garantir a lavagem da roupa e banho, atividades que podem ocorrer fora dos domínios do domicílio Consumo assegurado. Não há comprometimento da higiene básica e dos alimentos. É possível garantir a lavagem da roupa e o banho, que provavelmente ocorrem dentro dos domínios do domicílio Consumo assegurado. Práticas de higiene não comprometidas. Lavagem da roupa e banho ocorrem dentro dos domínios do domicílio
Grau de efeitos Muito alto
Alto
Baixo
Muito baixo
A ausência da rede de esgoto agrava ainda mais esses problemas, “o descarte seguro das fezes humanas é um fator básico na luta contra muitas doenças infecciosas, e o esgoto seguro sem tratamento constitui um problema de saúde permanente” (Clarke e King, 2005, p. 50). O despejo sem tratamento em rios, lagos e oceanos é um problema a ser enfrentado por todos os países, mas nas áreas mais pobres existe carência até de instalação de vasos sanitários. Assim, falta privacidade e incentivo para as práticas de higiene, é impossível ensinar as crianças a lavar as mãos após fazer suas necessidades fisiológicas se elas não dispõem de banheiro, torneiras e água. Razzolini e Günther completam que “as ações de
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saneamento se tornam ainda mais efetivas quando acompanhadas de intervenção de educação sanitária, capazes de promover mudança comportamental na população, que se traduz na incorporação de hábitos e práticas de higiene” (p. 29). Melhores condições de governabilidade, desempenho do governo são necessários para terminar com esse quadro de insustentabilidade ambiental e desrespeito aos direitos humanos. Verificados na iniqüidade social, na degradação ambiental e na exclusão dos serviços públicos básicos. Analisando especificamente os dados de saneamento básico do município de Duque de Caxias, o estudo socioeconômico do município apresentado pelo TCE-RJ (2007), apurou dados no ano 2000, informando que “no tocante ao abastecimento de água, Duque de Caxias tem 69,3% dos domicílios com acesso à rede de distribuição, 27,9% com acesso à água através de poço ou nascente e 2,7% têm outra forma de acesso à mesma” (p. 17). Pesquisas também foram feitas com relação aos resíduos urbanos, no tocante ao município caxiense, o TCE-RJ (2OO7) informou que “88,9% dos domicílios tem coleta regular de lixo, outros 3,6% têm seu lixo jogado em terreno baldio ou logradouro, e 6,8% o queimam” (p.18). Já a Fundação CIDE (2006) informa que são coletadas 756,8 toneladas de lixo por dia em Caxias, tendo como destino o Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho, no próprio município. No relatório do TCE-RJ (2007) “a rede coletora de esgoto sanitário chega a 57,1% dos domicílios do município; outros 20,9% têm fossa séptica, 4,3% utilizam fossa rudimentar, 13,2% estão ligados a uma vala, e 3,5% são lançados diretamente em um corpo receptor (rio, lagoa ou mar)” (p. 18). Pesquisa divulgada pela ENSP (Escola Nacional de Saúde Pública) com dados do IPEA (2008) revela que “apesar do crescimento de 3,2 pontos percentuais desde 2001 na cobertura dos serviços de saneamento no país, 34,5 milhões de pessoas ainda vivem sem acesso à coleta de esgoto nas áreas urbanas” (Fiocruz, 2008). No mesmo artigo, pesquisadora da instituição diz: "os mais pobres têm menos saneamento, é isto que temos que discutir" (p. 01) e pesquisador do Ipea e Anac “cita dados dos censos demográficos de 1980 a 2000 e mostra que as famílias com renda acima de dez salários mínimos têm cobertura de água 50% maior e, na coleta de esgoto, quase 100%, concluindo que os investimentos, embora majoritariamente públicos, não conseguiram anular os efeitos da concentração de renda (p.02). Confirmando a relação direta entre pobreza, carência dos serviços de saneamento básico e doenças, conforme elucida a Figura 6.
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Figura 6 Esquema do ciclo de relação entre água, saneamento e pobreza (Razzolini e Günther, 2008).
4.2.4 Tipos e Equipamentos de Saneamento A distribuição pública de água exige sua posterior coleta, para afastamento da área servida capaz de evitar a poluição do solo e contaminação das águas superficiais e subterrâneas. De acordo com Pereira (2003) “o rápido afastamento dos dejetos e águas servidas é um dos objetivos quando da construção das habitações, o que precisa ser realizado de forma tecnicamente correta, pois, caso contrário, essas águas residuárias poderão poluir/contaminar as proximidades e até mesmo locais mais distantes da habitação, trazendo conseqüências danosas e desagradáveis para o meio ambiente e para a saúde pública” (P. 37). São comuns as reivindicações por abastecimento de água, mas pouco notase em relação as manifestações em prol da instalação de rede de esgoto, e muitos ainda desconhecem sua necessidade de tratamento. Considerando o abastecimento de água e a rede de esgoto que são elementos fundamentais e inseparáveis do saneamento básico, segue uma abordagem sobre os principais tipos desses equipamentos (Layrargues, 2002, Rosso et. al., 2002, Braga et al., 2002). Esgoto e Água Existem três tipos básicos de esgoto:
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1)
Esgoto
Sanitário:
proveniente
de
atividades
domésticas,
comerciais e públicas, composto basicamente por substâncias orgânicas, água de banhos, fezes, urina, restos de comida, sabão e detergentes; 2)
Esgoto Industrial: composto por substâncias orgânicas e
minerais, pode causar obstruções e corrosões na tubulação devido à presença de resíduos ácidos; 3)
Esgoto Pluvial: é intermitente e sazonal por depender do regime
de chuvas, a precipitação provoca lavagem do terreno, telhados, tubulações, entre outros. Possui elevada carga poluente e muitas vezes é difícil conter seu fluxo para tratamento. A população em sua maioria não dá muita atenção ao manejo de águas pluviais, que consiste no “conjunto de intervenções estruturais e não estruturais, com o objetivo de controlar o escoamento superficial das cidades, evitando assim desastres naturais relacionados ao excesso de água e doenças decorrentes de inundações” (Bernardes et al., 2006 apud Kobiyama et al., 2008). Segundo os autores, o manejo das águas pluviais é fundamental no contexto da saúde pública, as inundações podem acarretar contaminações, principalmente quando poços e fossas se rompem e transbordam espalhando os detritos. Vamos nos ater ao esgoto sanitário, que tem por objetivo coletar e remover de forma rápida e segura as águas residuárias, evitar a poluição do solo, tratar os afluentes e eliminar odores e aspectos estéticos desagradáveis. É constituído por 99,9% de água e 0,1% de matéria sólida orgânica ou mineral, além de bactérias aeróbias (Layrargues, 2002, Braga et al. 2002). Um esquema de esgoto sanitário é constituído por dispositivos e canalização para coletar e afastar os resíduos das residências, existindo diversos tipos de coletores (Rosso et al., 2002). Exemplo: - coletores prediais: canalização que leva as águas residuárias das edificações para coletores públicos; - coletores secundários: canalização que recebe os efluentes dos coletores prediais; - coletores tronco: canalização principal que recebe afluente de vários coletores e conduz para interceptores ou emissário; - coletores interceptores: canalização que evita descargas diretas em praias, lagos e cursos d’água por interceptar fluxos coletores;
46
- emissários: conduto final que afasta os efluentes da rede pública até seu local de lançamento não recebendo contribuições ao longo do curso; - estação elevatória: instalações eletromecânica comum em terrenos planos que empurra as águas através de bombeamento, não necessitando de declividade para o escoamento, para entrada dos efluentes em estação de tratamento ou corpo d’água receptor. Em locais que não dispõem dos serviços públicos de esgoto são adotadas medidas individuais por parte dos moradores, sendo comum à privada sanitária ou a fossa séptica. A primeira é mais comum em áreas rurais e com pouca disponibilidade de água, porque não ocorre o transporte dos dejetos. A segunda é uma solução para residências que dispõem de abastecimento de água. •
Privada Sanitária: as excretas humanas são lançadas em um buraco no
terreno, o solo possui um poder depurador que irá decompor a matéria orgânica presente nas fezes e na urina através da ação das bactérias. Ocorre decomposição aeróbia (presença de oxigênio) na parte externa da excreta e anaeróbia (sem oxigênio) na parte interna, gerando odores fétidos. Devem ficar longe de poços porque as excretas podem contaminar o lençol freático. Logo a adoção de privadas sanitárias não é uma solução adequada para o bairro Cangulo, onde grande parte das residências utiliza água de “poções” perfurados nos quintais. •
Fossas Sépticas: consiste em câmaras construídas abaixo do nível do
terreno, onde o esgoto fica retido para decantação dos sólidos e retenção das gorduras provenientes das cozinhas, lavanderias, chuveiros, vasos, ralos, entre outros. A fossa permite a saída de líquido isento de matérias decantáveis e flutuantes, mas com odor desagradável devido a decomposição, e grande quantidade de bactérias. Esse material será lançado em corpos de água receptores (geralmente rios); em sumidouros (escavações com paredes protegidos com tijolos, pedras ou madeiras sem rejuntamento para facilitar a infiltração. Deve ficar localizado a uma distância mínima de 20 metros de qualquer fonte subterrânea, segundo NB-41/81); vala de infiltração (manilhas de juntas abertas ou tubos perfurados para infiltração no terreno); vala de filtração (duas canalizações superpostas com camada de areia entre elas, imprópria para solo com baixa capacidade de absorção segundo NBR 7229/93); filtros de areia (mesmo princípio da vala de filtração, mas utilizado para unidades maiores de fossas sépticas).
47
A parte sólida (lodo) que fica retida no fundo da fossa deve ser removida no máximo a cada três anos pra não comprometer sua eficiência. Antes de começar a limpeza a fossa deve ficar aberta para permitir a saída do gás produzido, que é danoso à saúde (Kobiyama et al., 2008). Quando em pequena quantidade pode ser descartado na solo ou em rios, caso contrário deve ser transportado até uma ETE. Já as medidas coletivas de disposição do esgoto podem ser e três tipos: 1º) Lagoas de estabilização: é um sistema de tratamento biológico mediante a decomposição da matéria orgânica pela ação de bactérias (aeróbias e anaeróbias) e algas. Tem como vantagem o baixo custo de operação e manutenção; 2º) Emissários submarinos: sistema que utiliza o poder de depuração da água do mar (mais rápido que em água doce) para matar bactérias. Ocorre grande diluição e dispersão, dos poluentes para bem longe das praias. No Rio de Janeiro é obrigatório que haja um tratamento prévio do esgoto antes de ser despejado no mar para retirada de sólidos grosseiros; 3º) Estação de tratamento de esgoto (ETE): o Rio de Janeiro foi à terceira cidade do mundo a ter uma ETE, um conjunto de instalações que tratam o esgoto em diferentes
níveis
(preliminar,
primário,
secundário,
terciário)
e
tempo
de
processamento de acordo com o uso que será dado no corpo receptor (banho, irrigação, abastecimento). Sua implantação se justifica quando se pretende atender toda uma bacia ou região. O grau de tratamento pode conter processos físicos, químicos e biológicos. Pereira (2003), chama atenção para os inconvenientes do lançamento de esgoto bruto em corpos de água, como o prejuízo ao aspecto estético, a redução do teor de oxigênio e a contaminação da massa líquida. Complementa dizendo que após o tratamento do esgoto é preciso cuidar do destino final dos subprodutos gerados, o lodo e os gases. Geralmente, os efluentes gasosos são coletados e lançados na atmosfera, enquanto o lodo é encaminhado para aterros sanitários e incineradores. Em relação à água para consumo, pode-se dizer que estas são poluídas de diversas formas, o que depende da origem, a qual poder ser de fonte poluidora natural ou humana, conforme o Quadro 3 abaixo, nota-se os principais processos poluidores.
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Quadro 3 Processos e definidores da poluição das águas Processos Definição Contaminação Lançamento em água de substancias químicas orgânicas, inorgânicas e microorganismos, nocivas a saúde e as espécies de vida aquática, como por exemplo, patogênicos e metais pesados. Assoreamento Acumulo de areia. argila e outras substancias minerais ou orgânicas (lodo) em um corpo d'água que provocara a redução de sua profundidade e de seu volume útil. Eutrofização Lançamento de excesso de nutrientes na água (nitrogênio e fósforo), ocasionando um crescimento excessivo e descontrolado de algas e plantas a aquáticas. Acidificação Queda de pH, como decorrência da chuva acida (chuva que carreia substancias químicas, tais como bióxido de enxofre, óxido de nitrogênio, amônia e bióxido de carbono, provenientes da poluição do ar), contribuindo para a degrada da vegetação e da vida aquática. Deve-se ressaltar a questão da poluição do solo, uma vez que eventuais mudanças em suas características podem acarretar em problemas nocivos à população. Os cuidados quanto à poluição do solo estão principalmente associados à relação água-solo superficial e subsuperficial, assim como a preservação da qualidade das águas. Em relação à poluição associada a atividades humanas, são atribuídas à disposição de resíduos sólidos e líquidos, a urbanização e ocupação do solo, as atividades agropecuárias, as atividades extrativas e a acidentes no transporte de cargas (Rosso et al., 2002). Atividades de cultivo, plantações de diversas espécies vegetais, fundação para edificações, aterros, estradas, sistema de disposição de resíduos, entre outros, podem ocasionar impactos ou modificações importantes relativos às: ●obras civis, a partir de urbanização e ocupação do solo, alterações na estrutura e no ciclo hidrológico; ●na exploração extrativa do solo: remoção de grandes quantidades de materiais, alteração do relevo e erosão; ●nas atividades agrícolas com a aplicação de nutrientes e defensivos agrícolas altera o ambiente, polui as águas superficiais e subsuperficiais. A remoção sazonal da cobertura vegetal ocasiona a erosão. A solução para o controle da poluição da água e do solo leva em consideração estratégias que se considere a bacia hidrográfica como um todo, para
49
efeito de planejamento das atividades urbano-ambientais, uma vez que tal não ocorra o controle terá eficiência limitada. Desta forma, deve-se considerar a implantação de sistemas de coleta e tratamento de esgotos sanitários e industriais; o controle de focos de erosão, sendo importante considerar o papel da drenagem pluvial; recuperação dos rios, permitindo a restauração de suas condições naturais, anteriores a degradação. Conforme o PDBG (Rosso et al., 2002, Roque, 2002), as medidas que devem ser tomadas visam atender as leis de controle de poluição vigentes: abastecimento de água, esgotamento sanitária, coleta e destino de lixo, disciplinamento dos usos e da ocupação do solo, reflorestamento e reintrodução de espécies de animais e peixes. Segundo Roque (2002), em relação ao padrão de potabilidade da água, o Ministério da Saúde define no Brasil os padrões de água para consumo humano. Enquanto que a resolução CONAMA no 20/86 divide as águas do território nacional em função dos usos em águas doces (salinidade <0,05%), salobras (salinidade entre 0,05% a 0,3%) e salinas (salinidade 0,3%). A Portaria no 36/90 do mesmo ministério estabelece um
conjunto de valores
máximos permissíveis
das
características da água. Em relação a algumas características das águas, ressaltamse as seguintes: ●Cor - a cor da água, quando e de origem natural, não apresenta riscos à saúde, mas se a origem for de atividades humanas como, por exemplo, despejos industriais podem ser tóxicos. A cor existe devido a material dissolvido na água. ●Sabor e Odor - não apresentam riscos à saúde em águas naturais, o sabor é associado à combinação entre o gosto (salgado, doce, azedo e amargo) e o odor (cheiro), podem causar repulsa ao consumo. ●Turbidez - o grau de turbidez traduz a turvação da água, de forma geral não apresenta
inconvenientes
sanitários
diretos,
porém,
é
esteticamente
desagradável e os sólidos suspensos que geram a turbidez podem servir de abrigo para microorganismos patogênicos. Algumas substâncias causam desconforto visual, como: o ferro e o manganês causam manchas nos tecidos, louças e tem grande importância na fabricação de papel e celulose; enquanto os sulfatos e o magnésio produzem efeitos laxativos; a dureza pode causar odor desagradável e não permite a formação de espuma,
50
aumentando o consumo de sabão, podendo causar incrustações em tubulações de água quente, como caldeiras e aquecedores. Dentre os padrões nocivos associados ao consumo humano, deve-se considerar os que são provenientes das atividades industriais, dos detergentes, do processamento e refinamento de petróleo e dos agrotóxicos. Relevantes também são as características bacteriológicas da água, as quais indicam a presença de coliformes fecais, diretamente associadas ao saneamento, conforme Quadro 4 notam-se os valores de padrão máximo. Quadro 4 Máximos valores de padrão permitidos de bacteriologia na água (Roque, 2002) Características
Unidade
Valor máximo permitido
Bacteriológicas Coliformes fecais
NMP/100ml
ausente*
Coliformes totais
NMP/100ml
ausente
Ausente - NMP/100ml – número mais provável de microorganismos coliformes ou coliformes fecais por 100 ml de água. *Somente se aplica quando for água para consumo
Os coliformes são grupos de bactérias indicadores de contaminação da água por fezes ou esgotos, utilizados para detectar microorganismos patogênicos capazes de causar doenças em uma determinada amostra de água, para cada individuo a media de eliminação de bactérias é em torno de 10 a 100 bilhões de bactérias/por dia. Os coliformes totais são utilizados como indicadores indiretos da probabilidade de a água estar contaminada por outros microorganismos, capazes de causarem doenças, enquanto os coliformes fecais são utilizados como indicadores para padrões de banho como mar e piscina, com limite de NMP coliformes fecais 1000/100m (Braga et al. 2002). O Documento-Base para Formulação da Fase II do PDBG (Rosso et al., 2002) especifica os sistemas responsáveis pelo abastecimento de água dos municípios que integram a bacia da Baía de Guanabara, que juntos atendem a 7.700.000 habitantes: Sistema integrado do Rio de Janeiro e Baixada Fluminense (Guandu, Ribeirão das Lajes e Acari); Sistema integrado de Niterói e São Gonçalo; Sistemas isolados para municípios de Itaboraí, Magé, Cachoeiras de Macacu e Rio Bonito.
51
O município de Duque de Caxias é abastecido pelo primeiro dos sistemas expostos, ficando sob responsabilidade da CEDAE, que infelizmente não atende a todos os bairros do município, como verificado no bairro Cangulo. O sistema de distribuição da água precisa ser monitorado periodicamente para evitar estragos à água servida, já que ela pode sofrer uma série de mudanças no caminho que percorre entre a estação de tratamento e a casa do consumidor, como variações químicas e biológicas. Segundo Freitas et al. (2008), “a qualidade da água liberada para o consumidor pode variar espacial e temporalmente dentro do sistema de distribuição” (p.111). Os principais fatores dessa variação podem ser: a qualidade química e biológica da fonte hídrica; a eficácia no processo de tratamento, reservatório e distribuição; a idade e o projeto de manutenção da rede; a qualidade da água tratada; e a mistura de diferentes fontes (Clark e Coyle, 1990 apud Freitas et al., 2008). Esse cuidado com a rede de distribuição, além de melhorar a qualidade da água distribuída, evitaria as perdas, principalmente de água já tratada e potável, que dependendo do caso pode chegar a 60% (Kobiyama et al., 2008). Os domicílios que não contam com abastecimento público utilizam água proveniente de: poço freático; poço artesiano; cisterna; carro-pipa. Ou percorrem longos caminhos para buscar água em bicas e canos, o que pode ocasionar problemas físicos (conforme item Saneamento e Saúde) e contaminação da água (Quadro 2). Fica sempre a dúvida quanto à qualidade dessas águas, sobretudo para as populações mais carentes que desconhecem a existência de laboratórios de análise de potabilidade da água, ou não podem arcar com os custos cobrados. A ONU, reconhecendo o elevado número de mortes infantis em conseqüência da carência de água potável, condições higiênicas saudáveis e esgotamento sanitário adequado, instituiu o ano de 2008 como o Ano Internacional do Saneamento. Dados do PNUD (2008) confirmam que 41% da população mundial não tem acesso ao saneamento básico. O objetivo da ONU é promover um alerta mundial para essa situação, promovendo uma sensibilização que acelere o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). A cúpula do milênio, que contou com 189 países, reunida em Nova Iorque no ano 2000 estabeleceu uma série de objetivos visando melhoras em saúde, educação, habitação, saneamento, meio ambiente e promoção da igualdade de gênero.
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No tocante ao saneamento, a meta é reduzir pela metade, até 2015 o contingente populacional sem acesso a água potável e esgotamento sanitário. No Brasil, melhoras são esperadas com a implantação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado em 2007 pelo Ministério do Planejamento. De acordo com o Ministério das Cidades (2008) 40 bilhões deverão ser investidos no setor entre 2007 e 2010. Dentro do PAC fica estabelecido: políticas de desenvolvimento econômico, de infra-estrutura, de urbanização de favelas e saneamento, contando com investimentos do Orçamento Geral da União (OGU), do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A participação do Brasil no Ano Internacional do Saneamento contou com um Grupo de Trabalho (GT) formado pelo governo e pela sociedade civil e coordenado pela Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades. Foi criada uma agenda de ações com os seguintes objetivos: avançar na universalização dos serviços; colaborar no alcance aos ODM; apoiar a produção e disseminação de informações sobre o setor integrando pessoas e instituições; mobilizar e articular entidades gestoras, prestadores de serviços, instituições de ensino, pesquisadores, entre outros. A necessidade estabelecer um ano como “O Ano Internacional do Saneamento” acena para a gravidade do problema em âmbito mundial e para o descaso em que vivem milhões de pessoas pela falta dos serviços básicos de saneamento. Porém, no Brasil, somente com cumprimento da Lei 11.445 é que os objetivos
apresentados
poderão
ser
alcançados,
beneficiados
ainda
pela
regulamentação da Lei dos Consórcios (11.107/2005), o que caracteriza um momento promissor para o setor no país (Costa, 2007 apud Sales, 2007). 4.3 Características e Contraposições da Lei de Saneamento No Brasil, existem diversas leis elaboradas para assegurar e regular os direitos e os deveres da população brasileira, assim como garantir sua segurança e bem-estar. Segundo as intenções desse trabalho, a Lei das Águas (9.433/1997) e a Lei de Concessões (8.987/1995) que regulamenta a participação do capital privado nos serviços públicos, são exemplos claros, por abordar especificamente assuntos relacionados ao saneamento básico. Entretanto, vamos nos ater a Lei 11.445, aprovada em 2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento
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básico e cria regras para usuários, operadoras e titulares. Pode-se dizer que essa Lei, elaborada pelo Ministério das Cidades, é um marco regulatório do saneamento no país, "acenando para um novo tempo de investimentos" (Sales, 2007, p. 17). Dessa forma, o setor de saneamento passa por uma reformulação, durante o governo militar, o PLANASA foi um modelo centralizador, mas com a aprovação da Lei 11.445/2007 o setor caminha para sua descentralização (Sales, 2007). Durante a década de 1980 o país passou por um processo de democratização, e com a promulgação da Constituição Federal de 1988 houve uma descentralização de poder e de responsabilidades. União, Estados, Municípios e Distrito Federal são dotados de autonomia, ao contrário do que ocorria nas Constituições anteriores, principalmente com relação aos municípios. Com a maior autonomia dos municípios houve a municipalização de alguns serviços, assim como a transferência de verbas. Mas, segundo Oliveira Filho (2007 apud Sales, 2007) “as mudanças começaram a serem sentidas com a criação de políticas originadas pelo processo de democratização, como a elaboração de leis orgânicas municipais, a criação de planos diretores, do orçamento participativo, o fortalecimento dos conselhos municipais e das transferências de verbas” (p. 68). Quando trata-se de governo, descentralização é o mesmo que transferência de responsabilidades e poder da União para outros entes da Federação, com destaque para o município, já que a maioria dos serviços é de interesse local. Assim sendo, essa esfera governamental ganha novas atribuições e responsabilidade, além de subsídios para a sustentação dos serviços, exigindo uma reestruturação das prefeituras. Segundo Sales (2007), "a titularidade dos municípios não impede, no entanto, que outras esferas de governo atuem nos mesmos setores, desde que amparados por legislação pertinente" (p.36). Este é um fator importante, tendo em vista a desigualdade existente entre as regiões. De acordo com o censo demográfico do IBGE, em 2005 o Brasil contava com 5.564 municípios, mas nem todos possuem capacidade de gerar receitas próprias, sendo dependentes de transferências de recursos financeiros de outras esferas do governo. Em valores absolutos, o município de Duque de Caxias apresenta um dos maiores PIB do estado, no qual a força econômica explica-se, principalmente, por sua inserção na cadeia produtiva do petróleo, conforme a Fundação CIDE (2003) o PIB per capita (R$) é de 11.477,26, em relação ao Estado do Rio de Janeiro. Talvez ainda não esteja claro que esfera governamental é de fato
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responsável pelos serviços de saneamento básico, mas fica evidente que existe disputa pela titularidade de determinados serviços capazes de gerar lucros orçamentários. Diz-se que "se as estruturas físicas necessárias à prestação do serviço ultrapassam os limites municipais, o serviço deixa de ser de interesse local e passa a ser de interesse comum, assim de competência do Estado" (Sales, p. 39), entretanto, o interesse gira em tomo das concessões, principalmente sobre as grandes cidades e regiões metropolitanas. Prefeituras sem recursos econômico-financeiros precisam ser atendidas pelas companhias estaduais que, "perdendo as concessões das grandes cidades, ficariam impedidas de praticar o princípio da subsidiaridade e arcariam com o ônus de espaços geográficos que não apresentam capacidade de auto-sustentação" (Sales, 2007, p. 39). Ou seja, o Estado não quer perder as concessões sobre as áreas lucrativas, e o município deseja receber subsídios para o setor. A verdade é que as companhias estaduais continuaram com o monopólio do setor mesmo após a titularidade municipal, e isso só começou a ser modificado com a aprovação da Lei de Concessões (8.987/1995) em 1995. Sabe-se que o objetivo da Lei 11.445/2007 é atingir a universalização nos serviços de saneamento básico, e os serviços de água e esgoto no Brasil vêm sendo feito através dos contratos de concessão, conforme pode ser observado na Figura 7 para o Estado do Rio de Janeiro. Ou seja, uma entidade privada ou uma concessionária fica responsável pelos serviços nas atividades de gestão, manutenção, operação e investimentos, por um período de 15 a 30 anos, mas os ativos permanecem como propriedade do poder público. Ao término do contrato, se o investimento não for recuperado a concessionária deverá ser ressarcida pelo concedente. Os serviços prestados são pagos diretamente pelo consumidor, e se os custos de operação e capital ultrapassar a renda líquida o próprio órgão privado arca com as despesas extras. Essa modalidade tem sido adotada no país principalmente após a aprovação da Lei de Concessões (8.987/1995). No setor de saneamento, de acordo com a ABCON (Associação Brasileira das Concessionárias de Serviços Públicos de Água e Esgoto), 51 municípios apresentam concessões privadas, dentre estes se encontra o Estado do Rio de Janeiro conforme Figura 7.
Município de Duque de Caxias
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Figura 7 Espacialização das operadoras de Água e Esgoto do Estado do Rio de Janeiro, nota-se que o município de Duque de Caxias tem como operadora a CEDAE (Sales, 2007). O mercado de concessões nos serviços de água e esgoto entra em expansão no país após a aprovação da Lei de Saneamento Básico, porque serve de estímulo para a realização de parcerias com o poder público (gerando enorme competição no período de licitação), visando à ampliação dos serviços necessária para a universalização no atendimento. Essa meta depende fortemente dos
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municípios, “responsáveis” pela titularidade do setor, não existe em âmbito nacional uma agência reguladora e as agências estaduais já não têm capacidade de investimento. O PLANASA foi o primeiro plano de saneamento a nível nacional, sob regulação do BNH, almejava o abastecimento de água para 90% da população e os serviços de esgoto para 65% da população de regiões metropolitanas e cidades de grande porte, (conforme item 5.1) até 1990, não atendendo as zonas rurais, já que concentrou os investimentos nas áreas mais desenvolvidas. Entretanto, existia a necessidade de regulação do setor, através da criação de regras que delineassem seu desenvolvimento. Tal necessidade decorreu na aprovação da Lei de Saneamento Básico no início de 2007. Esta Lei constitui um marco regulatório para o saneamento básico do país ao anunciar um novo cenário de desenvolvimento, que pode ampliar a participação do capital privado no setor, porque diminui os riscos de investimentos. Isso pode ocasionar uma ampliação das Parcerias Público-Privadas (PPP) que segundo a ABCON é o caminho necessário para atingir a universalização no atendimento. Uns dos princípios fundamentais da Lei é a universalização do acesso, a integralidade dos serviços e a transparência das ações. E considera como serviços de saneamento básico a limpeza urbana, o manejo e drenagem de águas pluviais, o abastecimento público de água potável e o esgotamento sanitário. Também estabelece a integração entre os serviços e os recursos hídricos, tendo como base a bacia hidrográfica na qual se insere o município. O problema é que a própria Lei torna-se confusa por não apresentar clareza na distribuição das tarefas entre as três esferas do governo, não define a quem cabe as competências, atribuições e responsabilidades estipuladas em seu corpo. Também não define uma estrutura para conselhos federais, estaduais e municipais que venha a constituir um sistema nacional, e isso torna ainda mais difícil o controle dos serviços pela população. A existência de conselhos com participação no âmbito municipal, estadual e federal, conforme a esfera de interesse e a titularidade facilitaria o controle das atividades pela sociedade. Esse grupo de interesse precisa de uma participação maior, não só para exigir e reivindicar, mas porque são importantes fontes de consulta para os órgãos, empresas e concessionárias responsáveis pela execução das obras e serviços de saneamento prestados. Entretanto, de forma geral, ainda não há de fato casos em que a população local seja consultada antes da intervenção ambiental para obras públicas, mesmo
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sabendo-se que eles conhecem mais que ninguém seu local de moradia. Trata-se de um conhecimento empírico, adquirido no cotidiano, que pode ignorar, por desconhecimento, os termos técnicos dos profissionais, mas sabem relatar com precisão os problemas locais, assim como a incidência dos fatos negativos que afligem a comunidade. Cita-se como exemplo as características da água e a regularidade do abastecimento, que podem ser informados pelos moradores, conforme pesquisado nos questionários aplicados nas residências do bairro Cangulo. Além de contribuir com a experiência vivida os moradores locais deveriam atuar na fiscalização do cumprimento das normas, tarefa que dificilmente será desempenhada sem a concretização de uma agência reguladora. A ausência da agência reguladora é outro ponto negativo a ser analisado, porque caberia a ela definir e fiscalizar o cumprimento da Lei de acordo com as normas estabelecidas. Juntamente com a sociedade civil organizada, conforme exemplo de organização e ação do orçamento participativo verificado em algumas cidades. Porém, com intuito de controle sobre as políticas de saneamento, não tendendo apenas para o caráter reivindicatório como é mais comum nesse tipo de participação. No capítulo II que trata da titularidade dos serviços fica uma impressão ambígua que compromete sua implementação (Feu, 2007), apenas estabelece ser dever do titular formular a política pública de saneamento básico, elaborando planos que deverão ser revisados dentro de um prazo de até quatro anos, antecedendo a elaboração do Plano Plurianual. É dever dos titulares também fixar os direitos e deveres dos usuários, assim como estabelecer mecanismos de controle social. A Lei aponta o controle social como um dos princípios da prestação dos serviços, mediante a seguinte definição de controle social: “o conjunto de mecanismos
e
procedimentos
que
garantem
à
sociedade
informações,
representações técnicas e participações nos processos de formulação de políticas de planejamento e de avaliação relacionados aos serviços públicos de saneamento básico” (Inciso IV, Artigo 2º). Assim, parece demonstrar que o saneamento não é apenas um direito do cidadão, mas que compete a este também participar do seu planejamento e da sua fiscalização. Porém, não define os mecanismos para que o controle social seja exercido. Outro fator negativo que cabe ser mencionado é a não garantia da
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participação popular no planejamento (Capítulo IV), apenas divulga a realização de audiências e consultas públicas. Se o usuário constitui o principal beneficiado com a eficiência da prestação dos serviços de saneamento, o interesse da coletividade popular deveria no mínimo ser levado em consideração. Mesmo que a Lei assegure o acesso às informações sobre os serviços prestados mediante divulgação pública, contando com registros atualizados, nada estabelece sobre a periodicidade desse tipo de publicidade. Resta ainda outra questão relevante, ainda que a Lei garanta o acesso às informações sobre os serviços prestados, permanece a dúvida quanto aos órgãos de reclamação. Não se sabe a quem recorrer para fazer reclamações, a responsabilidade pelos serviços é da prefeitura ou da empresa/concessionária contratada para sua execução? Se a Lei estabelece que o saneamento básico é um direito, deveríamos ser tratados como cidadãos e não como meros consumidores de um serviço prestado (Feu, 2007). Considero o saneamento básico como um direito social, que constitui uma conquista da população, dessa forma, não deveríamos procurar um órgão de defesa do consumidor para fazer uma reclamação, como quem compra uma mercadoria com defeito. Ainda que, a Lei faça menção à qualidade de vida (satisfação das necessidades básicas e manutenção do bem-estar coletivo) ao estabelecer sua articulação com políticas de interesse social (desenvolvimento urbano, habitação, combate à pobreza, promoção da saúde, proteção ambiental), comete falhas que precisam ser reparadas, porque sua legislação parece ser insuficiente, apresenta acertos importantes e necessários para a política de saneamento, mas parece esquecer de alguns pontos chaves indispensáveis para sua eficácia. Sabe-se que, a manutenção da qualidade de vida ambiental depende, entre outras coisas, do monitoramento permanente dos serviços de saneamento básico prestados, tanto pelo poder público quanto por empresa privada. A fiscalização desses serviços é indispensável para o seu cumprimento, mas, sobretudo para monitorar sua regularidade, por isso a participação da população é tão importante. Se o abastecimento de água não é regular obriga a população a manter a prática de estocagem e reduzir o volume de consumo diário, que pode comprometer sua higienização. Se a coleta de lixo domiciliar não é periódica provoca o acúmulo de resíduos sólidos que podem atrair vetores. Diante das informações apresentadas, esclareço tratar-se de interpretações
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pessoais sobre o corpo da Lei, com base nas interrogações que ela deixa no ar, já que não disponho do conhecimento jurídico necessário para uma análise mais sucinta. 4.4 Estatuto da Cidade e Plano Diretor: como instrumento de qualidade Institucionalmente, o país teve alguns avanços no que concerne à proteção ambiental para garantia de ambiente mais sadio para sua população. Em âmbito nacional, foi criada dentro do Ministério das Cidades (2003), a Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, tendo como missão “assegurar os direitos humanos fundamentais de acesso à água potável e à vida em ambiente salubre nas cidades e no campo, mediante a universalização do abastecimento de água e dos serviços de esgotamento sanitário, coleta e tratamento dos resíduos sólidos, drenagem urbana e controle de vetores reservatórios de doenças transmissíveis” (Rezende & Heller, 2008). O Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001) é uma legislação criada com o princípio de construir cidades ideais, ou seja, sustentáveis, estipulando a criação de planos diretores municipais. Segundo o Estatuto, até o ano de 2006, os municípios com mais de 20.000 habitantes, os que pertençam a regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, e integrantes de áreas de interesse turístico e sujeitas à atividades de impacto ambiental, deveriam promover a elaboração e aprovação de seus plano diretores. Dessa forma, preconizado pelo Estatuto da Cidade, o Plano Diretor é uma lei municipal que estabelece diretrizes para a ocupação da cidade, devendo identificar e analisar suas características físicas, as atividades predominantes, as vocações da cidade, assim como seus problemas e suas potencialidades. Sua elaboração deve considerar aspectos econômicos, sociais, culturais, ambientais e urbanos. Ele deve ser discutido e aprovado pela Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito, mas além dos setores do governo podem participar da sua discussão e elaboração, associações de moradores, sindicatos, conselhos comunitários, comerciantes, universidades, ONGs, conselhos regionais, incorporadores imobiliários, entre outros. Segundo Brandt (2008), “o Plano Diretor é um instrumento da Política Urbana, é o plano de desenvolvimento da cidade, de modo a garantir uma cidade eqüitativa no que diz respeito a condições de moradia, trabalho, transporte, saúde, mobilidade e
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equipamentos urbanos”. Já em Silva apud Brandt (2008), “o Plano Diretor é um plano, porque estabelece os objetivos a serem atingidos, o prazo em que estes devem ser alcançados, as atividades a serem executadas e quem deve executá-las. É diretor porque fixa as diretrizes do desenvolvimento urbano no Município”. Assim sendo, Duque de Caxias instituiu seu Plano Diretor Urbanístico em outubro de 2006, estabelecendo diretrizes e normas para o ordenamento físicoterritorial e urbano do município, tendo como um dos seus princípios fundamentais: Art. 3º. Este Plano Diretor e suas revisões sucedâneas devem promover o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade e o uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado do território, de forma a assegurar aos habitantes condições de bem estar e segurança. Assim, é possível trabalhar para uma cidade mais justa, diminuindo as injustiças sociais. De interesse direto para o tema deste trabalho, cito como sendo fundamental os artigos abaixo apresentados do presente plano diretor: Capítulo II - dos objetivos estratégicos Art. 6º. III Promover a destinação de verbas orçamentárias para elevar as condições gerais de mobilidade e segurança pública, de habitação de interesse social e saneamento ambiental, em especial de infra-estrutura de rede de esgotos, de macro-drenagem, de abastecimento de água, bem como para áreas verdes urbanas, de interesse ambiental e para o ordenamento urbano. Capítulo II - das políticas sociais Art.12. As políticas sociais são aquelas que visam prover benfeitorias e serviços de saúde, educação, lazer e habitação de interesse social à população, de forma a garantir e promover eqüidade social e qualidade de vida. Capítulo IV – da política de obras e de infra-estrutura urbana Art.20. Constituem infra-estrutura urbana os Sistemas de Abastecimento de Água, de Drenagem Pluvial, de Esgotamento e Tratamento Sanitário, de Fornecimento de Energia em suas diversas modalidades, de Iluminação Pública e de Disposição de Resíduos Sólidos, com foco permanente em processos de reciclagem; Art.22. O órgão municipal competente de obras deverá promover a integração de ações de instalação e manutenção de infra-estrutura de água, esgotos e drenagem pluvial aos programas de saúde pública e educação sanitária, em consonância com as normas de proteção ao meio ambiente.
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Verifica-se no município que o centro (1º distrito) é mais contemplado com infra-estruturas e equipamentos urbanos, em detrimento das áreas periféricas distantes da sede administrativa, naturalmente ocupadas por população mais carente, onde predomina a precariedade na oferta de serviços. Seguidas as metas do recente aprovado Plano Diretor da cidade será possível uma melhor alocação de recursos, e reordenamento de acordo com as peculiaridades da dinâmica da cidade, contribuindo para solucionar e abrandar seus problemas, decorrentes do seu processo histórico e da ineficácia das políticas até então implementadas. 5 Etapas de Desenvolvimento do Trabalho Para a melhor compreensão das características dos problemas urbanos e ambientais, faz-se necessário o desenvolvimento de nível compilatório e correlatório, importante salientar, para uma melhor avaliação dos resultados. Além disso, foi e é de primordial importância as etapas como de levantamento bibliográfico da área de estudo, para a análise mais detalhada da formação espacial e localização do município de Duque de Caxias e do bairro do Cangulo, assim como a etapa de campo para o reconhecimento da área, estudo do meio físico e da infra-estrutura local, a qual permite a avaliação dos problemas sócio-ambientais associados ao saneamento. 5.1 Questionários Questionários são instrumentos para se aferir dados quantitativos, assim como qualitativos, já as entrevistas são primordiais na obtenção direta de informações qualitativas, embora seja possível a obtenção de informações de caráter quantitativo. Muitas vezes, essa última é indispensável para se iniciar a construção de questionários. Em relação aos questionários, é importante ressaltar que estes devem apresentar uma redação objetiva, clara, seguida de um agrupamento das questões, uma boa apresentação gráfica e concisa (Marangoni, 2005). Para não haver problemas na obtenção dos dados em campo, faz-se primordial uma preparação prévia na elaboração do questionário, sendo assim foi realizado um primeiro campo prévio de reconhecimento da área. Posteriormente, a percepção de alguns problemas ambientais no Bairro, foi-se elaborado o
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questionário (Anexo 1 e 2) e discutida a relevância das perguntas a partir da base teórica do trabalho. Para uma maior acuidade das informações foram utilizadas no trabalho algumas variáveis com base no questionário básico do censo demográfico do IBGE, de 2000, conforme Anexo 3, assim como o questionário suplementar de meio ambiente da mesma instituição, de 2002, com mostra o Anexo 4. Uma vez finalizada tais etapas o mesmo foi aplicado em um universo total de 123 questionários, tais foram levados para laboratório com fins de quantificação e análise dos dados, o que permitiu a geração de informações. 5.1.1 Desenvolvimento e tratamento dos dados Para a obtenção de resultados de qualidade faz-se necessário alguns critérios como: considerar os objetivos da pesquisa, elaborando um questionário apropriado ao tema proposto. Ressalta-se que, cada quesito a ser abordado deve ser cuidadosamente analisado quanto a sua utilidade para os resultados a serem alcançados, uma vez que a aplicação de questionário no campo exige um grande dispêndio de tempo e trabalho. Algumas indagações foram realizadas para fins de caracterização da população local, isto é, se constituiu como técnica de classificação socioeconômica do indivíduo. Para fins de uma boa investigação o universo de amostragem foi caracterizado e delimitado em duas etapas, a primeira foi realizada com indivíduos ao acaso e a segunda , posteriormente foi proferida em unidades domiciliares (Figura 8 A e B).
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A
Área de distribuição dos questionários em rua
B
Área de distribuição dos questionários em rua domicílios
Figura 8. Planta do bairro do Cangulo, em A, nota-se manchas representativas das áreas onde foram realizados os questionários de forma aleatória, enquanto em B, encontram-se tracejadas as ruas onde foram aplicados os questionários em domicílios. (Fonte: Prefeitura de Duque de Caxias, 2009, adaptada pelo autor)
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Segundo Marangoni (2005) o pesquisador deve ter um prévio conhecimento das pessoas que serão alvo das questões formuladas. É de fundamental importância que o pesquisador tenha prévio conhecimento das pessoas que serão alvo das questões formuladas, principalmente no que se refere à linguagem a ser utilizada, uma vez que deve ser adequadamente compreendida pelo público. Pode-se dizer que para um bom desenvolvimento da pesquisa de campo a partir de questionários é importante: - elaboração de listagem de toda e qualquer pergunta que possa ser feita, cuja resposta deva atender de forma direta ou indireta as intenções do pesquisador, possibilitando a seleção posterior das perguntas que de fato interessem ao melhor conhecimento em relação ao objeto de estudo e a hipótese de trabalho. - composição de lista de possíveis cruzamentos das variáveis em questão, tal pode ser fundamental para elaborar quesitos não lembrados, ou para mostrar a inutilidade de dados que a priori seriam interessantes. Ressalta-se que cada pergunta que não se refira ao tema específico resulta em perda de tempo e pode prejudicar o desenvolvimento e analise dos resultados. - deve-se considerar uma ordem lógica de encadeamento entre as perguntas, acaso essas sejam desconexas podem acarretar em má compreensão do indivíduo questionado. - para cada quesito indagado deve-se pensar no formato da resposta, como por exemplo, o número de categorias possíveis, assim como a facilidade de aplicação do questionário e tabulação dos dados. Pode-se dizer que cada pergunta corresponde a uma variável, e as respostas possíveis, a categorias da variável, conforme Marangoni (2005). Segundo o mesmo autor as perguntas podem: prever respostas abertas sem condução, quando não se prevêem as categorias possíveis, ou fechadas, quando se predeterminam as categorias que devem ser indicadas. Ressalta-se que embora formato fechado facilite o preenchimento do questionário e a tabulação dos dados, não se deve utilizá-lo de forma indiscriminada, dessa forma acaba-se perdendo informações preciosas. Normalmente, questionários utilizados para obter uma grande variedade de dados apresentam mais de uma maneira de formulação de questões. - importante fazer teste de aplicação e tabulação dos dados e posteriormente corrigir eventuais problemas.
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- posteriormente a aplicação dos questionários deve-se proceder à tabulação dos dados, o mais cedo possível, para que não se percam detalhes sobre o procedimento e se possam corrigir eventuais falhas de informação. Ressalta-se que a sistematização de dados quantitativos, aplica-se a qualquer tipo de informação, seja ela produto de questionários ou mesmo de medições específicas em cada área do conhecimento (Galvani, 2005). A analise de um conjunto de dados com uso de tendência central nos permite avaliar para onde converge o dado. Desta forma, foi aplicada no tratamento dos dados a média aritmética e freqüência. A media aritmética é uma metodologia simples e comum, passível de aplicação a qualquer conjunto de dados, e expressa o somatório de todos os elementos da serie dividido pelo numero total de elementos. Em que Xi e cada elemento da serie, e i varia de 1 a ni n e o numero de elementos e o símbolo L significa somatório de todos os elementos da série (Galvani, 2005). Tal é expressa pela equação abaixo:
Já para o calculo de variáveis ordinais ou quantitativas estas se expressam a partir da freqüência, tal é o número de vezes que determinado evento ocorreu entre todos os elementos amostrados, isto é, segundo Galvani (2005) o número de vezes que determinado evento ocorreu (na) em relação ao número total de elementos da serie (n), a qual é dada pela seguinte equação:
Obs. Ambos os dados gerados no questionário foram manipulados em termos de percentagem.
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6 Análise dos Resultados O resultado dos questionários realizadas no bairro Cangulo (Anexo 1), possibilitaram uma boa avaliação quanto à infra-estrutura local, no que tange a ausência ou precariedade dos serviços de saneamento básico, considerados fundamentais para a qualidade de vida ambiental. Para a obtenção dos mesmos foram
aplicados
72
questionários
e
descartados
quatro,
totalizando
68,
posteriormente foram quantificados os dados no quesito perguntas fechadas e, assim como, a criação de classes quanto a perguntas abertas. Foram realizadas perguntas relacionadas à faixa etária, renda, escolaridade, profissão, tempo de residência no bairro, características de condições de saúde, oferta de serviços, competência do trabalho da prefeitura, e problemas locais. Além desses, também foram avaliados o acesso à água e qualidade da mesma, coleta de lixo, ocorrência de alagamento, condições da rede de esgoto e sua relação com problemas de saúde e degradação ambiental. Após a análise dos resultados obtidos no primeiro questionário, foi elaborado um segundo questionário (Anexo 2), no mesmo formato do primeiro, porém, com perguntas mais específicas sobre as questões apontadas pelos moradores no questionário anterior, aprofundando tanto os dados quantitativos quanto os qualitativos obtidos no primeiro contato. Ressalta-se que, durante a elaboração do segundo questionário seguiu-se alguns padrões já pré-estabelecidos pelo IBGE (Anexo 3 e 4). A diferença é que no questionário 1 os entrevistados foram abordados aleatoriamente nas ruas do bairro, enquanto no questionário 2, foram feitas visitas às residências, totalizando um total de 51 casas, distribuídas por 23 ruas do bairro. Apenas três perguntas se repetiram em ambos os questionários, as referentes à faixa etária, escolaridade e tempo de moradia no bairro. As demais perguntas eram referentes à forma de abastecimento de água, a periodicidade do recebimento, o volume das caixas da água, o tipo de poço, a qualidade da água para consumo, assim como do rio local, e as possíveis fontes poluidoras do recurso hídrico, conforme Anexo 2. Questionou-se também o tipo de escoadouro dos dejetos humanos e do esgoto doméstico, o destino dos resíduos sólidos, se existia relação entre esses serviços de saneamento e a saúde dos moradores. Interrogou-se sobre a atuação da prefeitura ou de outros órgãos públicos no monitoramento da qualidade da água e no diálogo com a população local sobre as obras de pavimentação
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realizadas atualmente no Cangulo e finalizando com questões relacionadas à percepção dos moradores sobre a qualidade de vida ambiental do lugar em que vivem. Em relação às características gerais da população local (conforme questionário 1) e relações de propriedade (conforme questionário 3), pode-se dizer que o maior número de entrevistados está na faixa etária dos 20 aos 50 anos (Figura 9 A), em conformidade com o município (Farias, 2005). Em torno de 75% têm apenas o primeiro e segundo seguimento do ensino fundamental de escolaridade (Figura 9 B), possuem uma renda média de dois salários mínimos (Figura 9 C), e em maioria trabalham com serviços e comércio, característica também encontrada para o município como um todo (MTE, 2003). E conforme Silva (2006), deve-se observar que a qualidade de vida depende tanto das condições de vida, que engloba a má distribuição de renda, o baixo nível de escolaridade e as condições de habitação, quanto do déficit social. Trata-se de pessoas que, em sua maioria, residem no bairro entre 11 e 25 anos (Figura 9 D), dando maior consistência as informações obtidas, uma vez que moram a mais de 10 anos, assim como nasceram no próprio local. Em cada domicílio residem em torno de 3 pessoas, em média, o que vai de acordo com o trabalho de Farias (2005) para o Município de Duque de Caxias. Tais informações foram reafirmadas a partir das três perguntas repetidas, conforme colocado anteriormente, quais obtivemos resultados semelhantes aos do questionário 1, ou seja, trata-se de pessoas com idade entre 20 e 50 anos, que moram no bairro a mais de 16 anos e possuem o ensino fundamental incompleto, na sua maioria, conforme pode ser percebido na Figura 9.
68
A
C
B
D
56
Figura 9. Distribuição da classe etária, em A, nível de escolaridade, em B, renda média dos amostrados, em C, e tempo de moradia, em D, dos entrevistados para o Bairro do Cangulo.
69
Já em relação ao quesito posse do terreno ou domicílio, de grande importância por indicar relações com o espaço vivido, pode-se observar que 85% dos entrevistados têm domicílio próprio (Figura 10 A), enquanto ao que se refere a posse da propriedade (terreno) 77% é proprietário, menos de 20% vive em terreno cedido e apenas uma pequena parcela tem algum outro tipo de condição sobre a propriedade ou não respondeu, por não saber quais suas condições de habitação (Figura 10 B). próprio (quitado)
A
próprio (quitando) alugado cedido (por empregador) cedido (outra forma) condição do domicílio
outra condição
B
próprio
cedido
outra condição (aluguel ou invasão) condição do terreno
não respondeu 0
20
40
60
80
100
% entrevistados Figura 10. Condições da fora de moradia e propriedade de habitação (terreno), conforme questionário aplicado por entrevistados (%) por domicilio.
70
A grande maioria dos moradores não mostrou vontade de residir em outro bairro, principalmente pela baixa violência, entretanto em um primeiro instante detectam que a falta de infra-estrutura, transporte e serviço são piores problemas locais, conforme 80 % dos amostrados, e associam tal a baixa qualidade do trabalho da prefeitura. Ao questioná-los quanto à qualidade do serviço de saneamento, o abastecimento de água foi considerado o pior serviço para 41% dos entrevistados, enquanto a coleta do lixo foi considerado o mais eficiente, contemplando 91% das residências, por atender a maior parte do bairro (Figura 11). Próximo dos 40% percebem que suas casa se encontram em área de alagamento, mas não tem consciência que estão sujeitos a enchentes.
Figura 11 Maiores problemas locais por percentagem de entrevistados. Fonte: Próprio autor A quase totalidade dos domicílios não dispõe de abastecimento de água encanada, de responsabilidade da CEDAE, 82% das residências utilizam poços perfurados nos quintais para o consumo familiar, a minoria compra e alguns não sabem nem de quais lugares provem à água de consumo (Figura 12 A). Porém, muitos duvidam da qualidade da água disponível que consomem, foram apontados problemas relacionados principalmente a cor (27%), ao sabor atrelado ao salobro (21%) e a poluição (24%), conforme Figura 12 B. Tais classificações variam
71
conforme a localização do domicílio no bairro, uma vez que o mesmo se encontra em área de ocupação sobre mangue. Em suma, pode-se dizer que o abastecimento de água é tão precário quando a captação do esgoto. Este conjunto de fatores acarreta nas condições de saúde da população.
A
B
Figura 12 Percentual de exploração/uso da água, em A, e classes de qualidade da água por entrevistados, em B. Quanto ao sistema de esgotamento sanitário, percebe-se o desconhecimento dos moradores sobre o que é a rede de esgoto, já que quase metade dos entrevistados (49%) disseram dispor da mesma em sua casa, contraditoriamente apontaram como destino final dos dejetos as valas negras presentes nas ruas (Figura 13), enquanto outros, simplesmente não souberam responder. Tal retrata a situação do próprio município, pois conforme o censo (IBGE, 2002), expõem-se que em relação ao saneamento que apenas 56% dos domicílios no município têm saneamento adequado, isto é, esgotamento sanitário, abastecimento de água e coleta de lixo. Ressalta-se que o IBGE considera como adequada às ligações de esgoto na rede geral, não há distinção entre galerias de captação de esgoto e galerias de captação de águas pluviais. Sabe-se que em geral, as galerias são utilizadas com dupla função, o que ocasiona o despejo do esgoto “in natura” nos rios da região e na Baía de Guanabara. Em geral, os domicílios não possuem saídas de esgoto ligadas à rede geral ou fossa séptica, o que significa que continuam a lançar o esgoto diretamente nas valas.
72
Os entrevistados afirmam saber que a falta de tratamento do esgoto traz prejuízos ambientais, mas não sabem apontar quais são de fato. Quando indagados da relação esgoto sem tratamento x saúde, foram quase unânimes em concordar com a questão, as doenças foram apontadas como o maior prejuízo decorrente do esgoto a céu aberto. No entanto, não souberam identificar quais são as doenças advindas da questão. Ou seja, sabem da relação entre os dois fatores, mas desconhecem as causas e os problemas afins. Quanto aos problemas decorrentes do esgoto a céu aberto, os moradores classificaram como sendo os maiores: a transmissão de doenças (38%), a presença de insetos e ratos (22%) e o mau cheiro (22%), conforme Figura 14.
Figura 13 Variação percentual dos locais comuns de despejo do esgoto, segundo moradores. Fonte: Próprio autor
73
Figura 14 Variação dos problemas ambientais associados à degradação ambiental e o problema de saneamento, por ordem de importância, na percepção dos entrevistados. Quando do maior aprofundamento dos quesitos relativos às questões domiciliares (questionário 2) explana-se, de forma geral, que mais de 50% não dispõe de abastecimento de água pública, fazem uso de poços, construídos principalmente pelos próprios moradores, sem a participação de um técnico responsável pela perfuração. Tal vai de encontro ao exposto por Faria (2005) e TCE –RJ (2007), pois o Município de Duque de Caxias tem 69.3% com fornecimento de água por rede geral. Enquanto, do tocante da população do município 27,9% tem acesso à água através de poço ou nascente e 2,7% têm outra forma de acesso à mesma. Desta forma, deve-se advertir para a questão da concentração de alguns equipamentos urbanos principalmente na área do primeiro distrito (centro) do município, o que não responde a realidade local. Além disso, mais de 90% dos poços nunca passaram por nenhum tipo de análise quanto à qualidade da água (Figura 15 A), ou seja, a prefeitura não tem a preocupação de monitorar a água consumida pela população ali residente. E os próprios moradores não têm essa iniciativa, seja por desconhecimento ou pelo alto valor cobrado em laboratórios que fazem esse tipo de serviço, considerando aqui o baixo poder aquisitivo da população local (Figura 9 C), que recebe em média um
74
salário mínimo, conforme resultado do primeiro questionário. Porém quando perguntados se era de interesse saber a qualidade da água que consomem e se ela traz algum risco para a saúde, mais de 90% dos entrevistados disseram que sim (Figura 15 B). avaliação sobre qualidade da água
A
informações sobre 7,84% informações sobre de água 9,8% qualidade qualidade de água
B
avaliação sobre qualidade da água
92,2% sim não
sim não
90,2%
Figura 15 Resposta sobre realização de avaliação da qualidade de água dos domicílios, em A, e se o entrevistado gostaria de ser informado sobre a qualidade em relação ao risco à saúde, em B. Do total de moradores que utilizam água proveniente de poço (Figura 16 A), mais de 50% deles utilizam uma espécie de poço coletivo, ou seja, um único local de perfuração atende a diversos domicílios, concomitantemente, devido o fato de serem poucos os locais possíveis de captar água em condições para consumo imediato. Quanto às características associadas à falta de qualidade da água, o sabor foi apontado como o principal fator negativo, seguido da cor e do odor (Figura 16 B). Muitos moradores informaram que não possuem poço no próprio quintal porque a água captada naquele ponto apresenta-se muito amarelada, com alto teor de ferrugem e gosto salgado, não servindo para beber, mesmo após processo de filtração. Conforme Roque (2002), de forma geral, a cor e sabor quando de origem natural não são tão nocivas à população. Entretanto, algumas substâncias causam desconforto visual e alguns pequenos problemas domésticos como manchas em roupas ou utensílios, que acabam por onerar o gasto como, por exemplo, o sabão. Entre os moradores usuários de poços, mais de 50% dispõem de água canalizada em pelo menos em um cômodo da casa, através da instalação de canos e bombas
75
que fazem a sucção da água diretamente do poço para caixas de água, a maioria com capacidade para mil litros de água, sendo necessário o reabastecimento diário da mesma, o que é feito por mais da metade desse percentual de pessoas. Entre os demais moradores que não dispõe de poço (Figura 16 A), 20% deles são abastecidos por uma rede geral, ligada ao sistema da CEDAE. Porém, a irregularidade no recebimento da água faz com que muitos moradores se vejam obrigados a comprar água, prática realizada através de carros pipas. Pouco mais de 40% dos entrevistados disseram receber água diariamente através dos canos da CEDAE, outros quase 40% informaram receber água entre uma e duas vezes por semana, enquanto quase 20% só são abastecidos a cada quinze dias (Figura 16 C), cabe ressaltar que foi percebido, em diversas vezes, que os moradores confundem o bombeamento da água de poço com o fornecimento da CEDAE, pois alguns têm os dois sistemas. É importante salientar, que a compra de água é praticada também entre alguns moradores usuários de poço, porém esses compram garrafões de água apenas para beber e preparar alimentos para crianças ainda de colo, por desconfiarem da qualidade da água que utilizam. Há ainda uma parcela menor de moradores que não dispõe de poço nem são abastecidos por sistema público de água. Desse percentual de pessoas, mais de 40% compram água, segundo os dados analisados, apresentando uma certa freqüência de uma a duas vezes por semana, enquanto outros só podem efetuar a compra quinzenalmente (Figura 16 D), não por dispor de uma capacidade maior de armazenamento do galão para consumo, mas por não ter condições financeiras de comprar em intervalos menores. Concomitante ao já mencionado, a maioria dos residentes do bairro sobrevive com um salário mínimo (Figura 9), sendo assim, a necessidade de comprar água, além de comprometer o orçamento das famílias faz com que o uso diário seja reduzido, comprometendo sua higiene pessoal e consequentemente sua saúde, conforme demonstra o trabalho de Razzolini e Günther (2008). E ainda conforme os mesmos, se o abastecimento de água não é regular obriga a população a manter a prática de estocagem e reduzir o volume de consumo diário, que pode comprometer sua higienização.
76 1,32% 11,8%
B
A
somente da rede geral poço ou nascente
23,7%
Odor Cor
rede geral e compra
Sabor
poço e compra
nenhum
36,8%
somente compra outras formas 0
10
20
30
40
50
60
C periodicidade de abastecimento de água
quinzenal
não resondeu
26,3%
forma de abastecimento de água
periodicidade na compra de água
quinzenal
1-2 vezes por semana
1-2 vezes por semana
diáriamente
diáriamente
D 0
10
20
(%)
30
40
50
0
10
20
(%) 30
40
50
64
Figura 16 Formas de abastecimento de água por domicílio, em A, características de qualidade da água, em B, periodicidade de abastecimento pela rede geral, em C, e periodicidade de compra de água em D, por entrevistado/domicílio.
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Ao interrogá-los sobre as possíveis causas da poluição desse recurso hídrico, o despejo de esgoto doméstico foi apontado por mais de 40% dos entrevistados, constituindo, na opinião dos moradores, o principal motivo da contaminação, logo após foram assinalados consecutivamente, a disposição inadequada dos resíduos sólidos, o despejo de resíduos industriais, o derramamento de óleos ou graxas, entre outros (Figura 17). Notou-se que, embora não estejam satisfeitos com a água consumida os mesmos não tem informações plausíveis sobre a qualidade da água consumida o que deve ser considerado um problema, pois conforme a Lei de saneamento é assegurado o acesso às informações sobre os serviços prestados mediante divulgação pública, contando com informação atualizada, embora não sejam encontrados registros sobre a periodicidade desse tipo de informação.
possíveis causas da poluição da água
Ocupação irregular em área de proteção permanente Disposição inadequada de resíduos sólidos (lixo) Despejo de esgoto doméstico (inclusive fossa rudimentar) Ocupção irregular em área de recarga de lençois óleos ou graxas (inclusive derramamento de petróleo) Despejo de resíduos industriais 0
5
10
15
20
25
30
35
Figura 17 Frequência de ocorrência (%) das possíveis causas da poluição em recursos hídricos por entrevistado/domicílio. Fonte: Próprio autor
78
Assim como no primeiro questionário, o serviço de coleta dos resíduos sólidos apresentou resultado positivo, representando novamente o melhor dos serviços de saneamento desenvolvido pela prefeitura no bairro. Mais de 70% dos entrevistados disseram ter seu lixo coletado por serviço público de limpeza, pouco mais de 10% precisam levá-lo até uma caçamba de coleta, outros jogam em terreno baldio ou queimam se o carro de coleta demorar demasiadamente para fazer o serviço, tais dados obtidos vão de acordo com o trabalho de Faria (2005) e TCE-RJ (2007). Sendo assim, não vamos nos ater a questão do lixo doméstico, e sim a análise do esgoto doméstico. Na observação do destino do esgoto (Figura 18 A) das residências do bairro, mais de 40% das casas utilizam à fossa séptica, a fossa rudimentar foi apontada por um número inexpressivo de entrevistados. Outros 40% apontaram como destino a rede geral de esgoto, que no caso do bairro está atrelada à rede de coleta de água pluvial, ou seja, o esgoto pluvial e o esgoto doméstico têm o mesmo destino. E menos de 10% dos entrevistados mostraram como destino do esgoto as valas, ainda existentes em alguns logradouros, tendo em vista que nem todo o bairro foi atendido pelas obras de pavimentação recentemente implementadas, entretanto vale ressaltar que a diferença temporal entre os questionários nos mostra dois momentos, uma vez que quando do primeiro instante a maioria colocou as valas como destino final do esgoto (Figura 12), enquanto no segundo momento tal não aparece com mesmo percentual. Cabe contrapor tal informação, as obras recentemente implementadas são perceptíveis e já causaram mudanças no sistema de coleta do esgoto ou muitos moradores realmente não tem consciência do despejo final. Com a tentativa de verificar a relação existente entre esgoto doméstico, poluição e saúde, os moradores foram interrogados quanto a esses fatores. Constatamos que quase 70% dos domicílios possuem apenas um banheiro com sanitário, mais de 20% disseram ter dois banheiros e outros disseram não ter nenhum ou mais de dois banheiros. Entre o total de entrevistados, mais de 60% não acreditam que seu esgoto seja capaz de poluir a água, mesmo o esgoto doméstico tendo sido considerado um dos principais fatores de contaminação do recurso, conforme já mencionado na Figura 17. Essa resposta foi mais comum entre aqueles que utilizam o chamado poço coletivo (mais de 50% dos entrevistados), até por que
79
a distância entre o poço e a fossa destes é bem maior do que aqueles que possuem poço próprio, ou seja, no quintal. Adverte-se que, dentre as estratégias da Agenda 21 Brasileira tem-se a questão de ampliar a responsabilidade ecológica, disseminando informação e promovendo a capacidade dos diversos atores de identificar as relações de interdependência dos fenômenos sociais, ecológicos, econômicos, e aceitar o princípio da co-responsabilidade, isto é, do governo e enfatizando da sociedade para a gestão de recursos, embora a grande maioria não tenha consciência quase nenhuma de suas responsabilidades. Toda localidade deve possuir a capacidade de produzir e consumir reduzindo impactos, possibilitando assim uma sustentabilidade urbana (Silva, 2006). A maioria dos entrevistados não soube dizer qual é a distância existente exata entre o poço e a fossa. Mas em um grande número de residências essa distância não chega ao mínimo necessário (20 metros) para evitar a contaminação da água do poço. Em mais de 10% das residências essa distância não chegou aos quinze metros, e em apenas quase 30% a distância é maior que trinta metros (Figura 18 B). Embora, muitos domicílios tenham sistema de esgoto ligado à rede geral ou fossas, cabe ressaltar que, a grande maioria não somente faz autoconstrução para o poço, mas também para sua fossa, Figura 18 C e D, logo indaga-se a forma ou padrão destas construções. Dentre a carga poluidora da água os efluentes domésticos possuem elevada concentração de carbono orgânico, cloretos, nitrogênios, sódio, magnésio sulfato, alguns metais pesados, dentre os de maior risco à água são os nitrogênios e microorganismos patogênicos. Hirata (2001), exemplifica tal mostrando que em áreas de densidade populacional de 20 pessoas por hectare pode gerar uma carga de 100kg/ha/ano de nitrogênio que se oxidado por 100mm/a de infiltração de água da chuva, pode resultar em recarga local de 100mg/L de nitrato para o aqüífero, isto é, dez vezes maior que o aceitável para o nível de potabilidade. Segundo o mesmo autor, o estabelecimento de zonas de proteção em torno de um poço é fundamental, pois tal estratégia baseia-se na idéia de que, quanto mais próxima uma atividade do poço, maior é o perigo de contaminação.
80
rede geral de esgoto ou pluvial
A Distância em metros
fossa séptica fossa rudimentar rede geral mais fossa vala rio, lago ou mar
ligação sanitária do domicílio
outro tipo de escoadouro 0
10
20
30
40
(%)
3,45%
55,2%
50
B 15-30
> 30
não sabe 0
5
10
15
20
25
30
35
40
(%)
C
41,4%
distância entre fossa e poço
até 15
D construção de poço/fossa
auto-construção poço/fossa construção coletiva técnico
Figura 18 Despejo do esgotamento sanitário, em A, distância média entre fossa e poço, em B, característica de auto-contrução poço/fossa, em C, visão geral de falta de cuidado do bombeamento da água e próximo à vala, em D. Fonte: Próprio autor 68
81
Na sequência do questionário, a saúde e as doenças começaram a ser abordadas, perguntando sobre os problemas de saúde que atingem as famílias. Com relação aos problemas associados às doenças, mais uma vez a poluição do ar ganha destaque, foi o fator mais apontado pelos entrevistados, assim como a presença de esgoto a céu aberto, presença de lixo na proximidade e questões relacionadas à água, como poluição e contaminação (Figura 19 A). Fatores como desmatamento, ocupação irregular, contaminação do solo, queimadas e a poluição sonora foram apontados quase na mesma proporção pelo total de entrevistados. A poluição atmosférica apontada como o principal fator pode estar relacionada à proximidade com a Refinaria Reduc, já que os moradores conseguem perceber que a constante presença de fumaça, próximo às casas, polui o ar, comprometendo o bom funcionamento dos pulmões, e consequentemente a saúde, sobretudo das crianças que apresentam problemas respiratórios, conforme apontado no primeiro questionário. Em segundo lugar, apontaram à qualidade da água como provável fator dos problemas de saúde, seguida pelo esgoto e pelo lixo. Entretanto, um número considerável de entrevistados (em torno de 20%) não apontou nenhum desses problemas ou não soube responder, Figura 19 B.
82
Contaminação de nascente ou de água subterrânea Desmatamento Ocupação irregular e desordenada do território Tráfego pesado em vias urbanas Contaminação de rio, baia, lago, lagoa, açude
doenças versus problemas ambientais
Escassez de água Poluição do ar Presença de esgoto a céu aberto Contaminação de recurso solo Inundação Poluição sonora Queimadas Deslizamento de encosta Presença de lixão na área de ocupação
A
não respondeu 0
3
6
9
12
15
associação de saúde com problemas
qualidade de água sanitário esgoto resíduos lixo poluição atmosférica nenhum dos itens
B 0
5
10
15
20
25
30
Figura 19 Associação dos entrevistados (domicílio) em relação a doenças versus problemas ambientais, em A, e ocorrência de doenças na família com falta de controle ambiental, em B.
83
Ao se observar as obras de reestruturação do bairro realizadas durante o período de pesquisa do trabalho, também constatou-se com a população local a ausência de diálogo entre os setores responsáveis pela infra-estrutura do bairro e seus moradores, interessados diretos no investimento em equipamentos urbanos. Mais de 90% (Figura 20 A, C, D) dos entrevistados mostraram interesse em participar de alguma reunião de esclarecimento ou de simplesmente ser informado sobre as obras em andamento. Porém, mais de 60% deles alegaram não ter recebido nenhum tipo de informação sobre o que seria feito (Figura 20 B, C, D). Cabe ainda retornar a questão da Lei 11.445/07, na qual aponta o acesso as informações pela sociedade como um dos princípios de prestação dos serviços, mediante a seguinte definição de controle social: “o conjunto de mecanismos e procedimentos que garantem à sociedade informações, representações técnicas e participações nos processos de formulação de políticas de planejamento e de avaliação relacionados aos serviços públicos de saneamento básico” (Inciso IV, Artigo 2º), compete ao cidadão não somente o direito, mas também participar do seu planejamento e da sua fiscalização, mas nem tais premissas foram expostas à população local, pois o interesse da coletividade popular deveria no mínimo ser levado em consideração.
A
5,88%
1,96%
intenção de ser informado e de participar de reuniões
B
1,96%
Informação à população sim
35,3%
92,2%
62,7% sim não não respondeu
sim não não respondeu
C
D
Figura 20 Intenção da população local em ter algum tipo de informação ou participação efetiva no planejamento de obras públicas, em A, alegação de falta de
informação sobre obras, em B, e visão das obras de saneamento no bairro, em C e D. Fonte: Próprio autor
84
Na finalização do questionário, algumas situações básicas foram apontadas como necessárias à qualidade de vida, o fato de ter ou não hospital próximo à residência foi o item mais assinalado pelos moradores, considerado primordial para que vivam bem, ficando à frente de questões como a canalização da água, a regularidade no abastecimento e a presença de rede de esgoto. Podemos estabelecer uma relação com a constante necessidade de cuidados médicos dos moradores e a distância dos postos de saúde e hospitais públicos. Por fim, buscou-se avaliar o que é qualidade de vida na opinião dos moradores do bairro, através de uma pergunta aberta os entrevistados puderam dar sua definição. O item saneamento básico foi apontado pela maioria, aparecendo com freqüência de 25% (Figura 21 A), confirmando a importância do investimento nesse setor para o bem-estar da população, assim como esse trabalho almejou demonstrar. O item saúde ficou em segundo lugar, o que mais uma vez revela a carência dessa população nesse setor, que tem relação direta com o saneamento ambiental. Respostas referentes à cidadania e assistência social ficaram na terceira colocação (Figura 21 B), merecendo atenção emergencial por parte das autoridades do governo, sobretudo do poder executivo municipal. O complemento a essas respostas aparece na quarta colocação, o emprego. A geração de postos de trabalho que atenda a uma mão-de-obra de baixa escolaridade e qualificação, o que não é um problema apenas local. O lazer, a moradia e o meio ambiente também foram apontados, em menor índice, como importantes para a qualidade de vida ambiental dos moradores do Cangulo. De acordo com as definições de qualidade de vida apontadas pelos moradores, percebe-se que eles são privados daquilo que consideram mais importante para que possam viver bem, coisas que dependem mais da atuação da prefeitura, no investimento em serviços de infra-estrutura urbana. Pode-se dizer que a percepção de qualidade de vida para os entrevistados ainda é dúbia, uma vez que ao se indagar sobre a qualidade de vida da família a diferença entre o ter e não ter foi entorno de menos de 15% (Figura 21 C), além de não se perceberem imbuídos no processo de degradação do ambiente, pois em 64% das vezes não se acham fontes de poluição para os recursos hídricos, embora mais de 80% acreditem na relação entre qualidade de vida e meio ambiente preservado (Figura 21 D).
85
saúde
A
percepção sobre ter qualidade de vida
saneamento
B
1,96%
emprego lazer
43,1%
moradia
ter qualidade de vida sim
cidadania e assistencia social meio ambiente
não não respondeu não respondeu não respondeu
percepção de qualidade de vida
não respondeu 0
5
11,8%
C
10
15 20 25 população como (%) geradora de poluição
23,5%
64,7%
população como geradora de poluição
sim não não respondeu
54,9%
3,92%
30
D
9,8% qualidade de vida versus ambiente preservado qualidade de vida sim não não respondeu
86,3%
73
Figura 21 Percepção dos moradores (domicílio) sobre o que está atrelado a qualidade de vida, em A, percepção sobre a vivencia em local com qualidade, em B, opinião sobre responsabilidade na geração de poluição, em C e associação de qualidade de vida com preservação ambiental, em D.
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De certa forma, os entrevistados disseram não ter qualidade de vida, justamente pela má atuação da prefeitura no bairro, que ainda não conseguiu atender às suas necessidades básicas de cidadãos. Tal resultado concorda com o encontrado no primeiro questionário, onde 80% dos entrevistados reprovaram o trabalho realizado pela prefeitura no bairro. O Exposto vai de encontro ao Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001), assim como ao art. 3º do Plano Diretor de Duque de Caxias, de 2006, uma vez que tem premissas em promover o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade e o uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado do território, de forma a assegurar aos habitantes condições de bem estar e segurança. Deve-se considerar a relação do morador com a identidade do espaço vivido, pois grande número dos entrevistados não tem como objetivo morar em outro bairro ou cidade (ver questionário 1), por acreditar que esses problemas podem ser resolvidos mediante investimento em serviços públicos, como os de saneamento e saúde, já que consideram o Cangulo como um bairro tranqüilo para morar, com baixos índices de violência, fator que tem afligido considerável parcela da população do Estado.
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7 Considerações Finais Após o primeiro estudo do bairro Cangulo, notou-se a baixa qualidade de vida ambiental dos moradores, no que se refere às condições de saneamento básico, consideradas medidas indispensáveis para o bem-estar da população. Apesar de a grande maioria dispor de domicílio e terreno próprio, as condições de moradia muitas vezes são consideradas insalubres, devido à presença de esgoto a céu aberto, não abastecimento de água canalizada e tratada, dúvida quanto à qualidade da água dos poços, e ruas sem calçamento e sistema de drenagem. Dentre os serviços de saneamento, a coleta de lixo é o único que atende a maior parte dos moradores. Compreende-se que a falta desses serviços compromete o meio físico trazendo prejuízos diretos para a saúde, o que impede o desfrutar de uma vida saudável. Mesmo os moradores não tendo consciência dos problemas ocasionados à sua saúde pela carência em saneamento, é consenso que a falta desses serviços constitui o maior problema do bairro. Pode-se dizer que os moradores não tem consciência de serem integrantes do ambiente que vivem, uma vez que não se percebem como possível fonte poluidora, embora a grade maioria tenha interesse em obter informações referentes a intervenção do espaço, mas também sobre a qualidade do meio físico. Recomenda-se o desenvolvimento de trabalhos mais acurados a partir de monitoramento da qualidade de água e suas relações com o desencadeamento de doenças nocivas a população. Sendo assim, o investimento nesse setor contribuiria indiscutivelmente para a melhoria da qualidade de vida ambiental dos moradores do Cangulo. Constata-se aqui o descaso com o saber e os interesses dos moradores, pois quando não são consultados sobre as intervenções no seu próprio espaço perdem o direito de opinar sobre aquilo que julgam melhor para si. E nem é preciso dizer que a preservação do meio só se concretiza com a participação conjunta do poder público e dos habitantes da cidade, por isso é proposto à participação das associações de moradores e organizações da sociedade na formulação dos planos diretores municipais. Em suma, pode-se dizer que é a partir da prática de participação que se faz o aprendizado social, uma vez que permite a maior integração e estreitamento das relações sociais no espaço e a conseqüente defesa dos interesses coletivos e
88
alcance das informações. Para tal, retoma-se a importância primordial da valoração do saber local, que juntamente com o conhecimento da ciência possibilita maior eficiência em políticas públicas, no planejamento urbano e ambiental, assim como uma justa qualidade de vida ambiental.
89
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ANEXO 1 Questionário básico para fins de caracterização geral da população local.
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ANEXO 2 QuestionĂĄrio complementar aplicado aos domicĂlios, para fins de aprofundamento dos problemas ambientais.
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ANEXO 3 Questionรกrio Bรกsico do Censo de 2000, conforme IBGE.
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ANEXO 4 Questionรกrio Suplementar de Meio Ambiente de 2002, conforme IBGE.
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ANEXO 5 Fotografias utilizadas nos grรกficos, de modo ampliado. Fonte: prรณpria.
(Pรกgina: 9)
(Pรกgina: 9)
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(Pรกgina: 9)
(Pรกgina: 10)
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(Pรกgina: 58)
(Pรกgina: 58)
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(Pรกgina: 60 e 65)
(Pรกgina: 65)
104
(Pรกgina: 68)
(Pรกgina: 71)
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(Pรกgina: 71)