Revista - Práticas de Reciclagem

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Relatório Pedagógico Aplicação do Projeto Instituto Jacarandá de Educação Infantil

Fotografias Aplicação do projeto

Conclusão Agradecimentos



Universidade Estadual de Campinas - Faculdade de Educação

Relatório

Pedagógico Aplicação do projeto Instituto Jacarandá de Educação Infantil

INTRODUÇÃO

cos). Esta etapa pode ser realizada com participação direta da população ou não (MARTINS, 2003).

O gerenciamento de resíduos sólidos é práti-

Para facilitar a identificação e separação dos

ca fundamental nas economias preocupadas com o

materiais na chamada pré-triagem, o Conselho Na-

desenvolvimento sustentável, porque leva em conta:

cional do Meio Ambiente (CONAMA, 2011) estabe-

a importância da preservação ambiental, o valor da

leceu uma resolução (No 275 de 25/04/2001) que

redução na geração de resíduos e a saturação dos

envolve um código de cores para os diferentes tipos

espaços disponíveis para aterros sanitários. Para-

de resíduos, conforme Tabela 1.

lelamente, a reciclagem auxilia na preservação de

A triagem ocorre após a coleta em galpões,

recursos naturais, na economia de energia e na ge-

usinas e unidades de triagem; e consiste em separar

ração de empregos diretos e indiretos (TERRA et al.;

os recicláveis conforme o tipo de material seguindo

2011).

de um pré-tratamento, isto é, lavagem, prensagem e Uma das formas para reduzir os resíduos só-

enfardamento (MARTINS, 2003).

lidos aterrados em solo é a reciclagem que pode ser

Na etapa final, o material sofre modificações

definida como o processo no qual materiais que não

de suas características físicas e um novo produto é

se degradam facilmente são utilizados como matéria

fabricado (RUBERG et al., 2000). Ou seja, o mate-

prima na obtenção de outros materiais que, em ge-

rial, antes lixo, é matéria prima para a obtenção de

ral, têm características semelhantes (SANTOS et al.,

um novo material. Segundo Monteiro e colaboradores (2001), a

2004; VALLE, 1995). O processo de reciclagem envolve 3 etapas:

reciclagem pode trazer vários benefícios, entre eles: diminuição da quantidade de lixo a ser aterrada, pre-

a coleta seletiva, a triagem e a fabricação. A coleta seletiva consiste em separar os ma-

servação de recursos naturais, economia de ener-

teriais reciclados daqueles não reciclados (orgâni-

gia, diminuição dos impactos ambientais e geração

Tabela 1: Código de cores para os diferentes resíduos estabelecidos pela ANVISA Tipo de Resíduo Papel / papelão

Cor Azul

Plástico

Vermelho

Vidro Metal

Verde Amarelo

Madeira

Preto

Tipo de Rsíduo

Cor

Perigosos

Laranja

Ambulatoriais e de serviços de saúde

Branco

Radioativos Orgânicos Geral não reciclável ou misturado, ou contaminado não passível de separação

Roxo Marrom Cinza

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Projeto de Problematização da Prática Sociocultural na Reciclagem

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de empregos diretos e indiretos.

lixo, auxiliando e incentivando a reciclagem é algo

No Brasil, há uma classe de trabalhadores de

cultural que requer ensinamento e estímulo desde a

baixa renda que usufruem da atividade de coleta de

menor idade. Desta forma, a escola passa a ter pa-

resíduos recicláveis e acaba por inserir o país entre

pel fundamental associado ao desenvolvimento de

os maiores recicladores mundiais. Mesmo estando

conhecimentos e valores ligados à questão ambien-

nesta classificação, dados apresentados pelo Institu-

tal.

to Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) infor-

A presente proposta buscou problematizar a

maram que apenas 1% do lixo produzido no Brasil é

prática sociocultural de separar o lixo por meio de um

reciclado (SANTOS et al., 2004).

passeio à cooperativa de reciclagem com uma turma

Santos e colaboradores (2004) afirmam que

de educação infantil, com crianças na faixa etária de

os materiais mais utilizados para reciclagem no Bra-

4 a 5 anos do Instituto Jacarandá de Educação Infan-

sil são, por ordem, o alumínio, papelão, vidro e plás-

til, em Campinas-SP.

tico. Aproximadamente 85% do alumínio descartado

Para promover o desenvolvimento social,

é reciclado no Brasil, 72% do papel/papelão, 42% do

cognitivo e afetivo dos alunos, Freinet elaborou al-

vidro e 26% do plástico. O fato de estes materiais se-

gumas técnicas, que ficaram conhecidas como Téc-

rem os mais reciclados, justifica as lixeiras com se-

nicas de Freinet. Entre estas está a que ele chamou

paração de lixo possuírem, em geral, as cores azul,

de aula passeio, que consiste em fazer saídas ao

vermelho, verde, amarelo e marrom.

ar livre explorando o meio além dos muros da esco-

Resultante de um concurso público promovi-

la, promovendo a interação entre a vida e o ensino.

do por uma empresa de Chicago, a Figura 1 a seguir

Desta forma, o estudioso propõe que a criança es-

é considerada o símbolo internacional de reciclagem

tabeleça contato com a própria realidade que será

e, quando presente em um material, identifica o seu

fator motivador para aguçar a curiosidade (FREINET,

potencial para a reciclagem (JONES e POWELL,

1975). Durante as aulas passeio, os alunos se ex-

1999):

pressam livremente, realizam descobertas a partir da experimentação, praticam o senso de cooperação e refletem, direta ou indiretamente, sobre suas ações individuais e coletivas (COSTA, 2006). Souza (2008) ressalta ainda que através da aula passeio a criança vive situações reais que exigem dela responsabilidade, além de despertar novos conhecimentos que a tornam mais consciente Figura 1: Símbolo Internacional de Reciclagem

de suas habilidades e limites. Desta forma, pode-se afirmar que a aula passeio promove a autonomia da

Segundo o site da prefeitura de Campinas

criança.

(2012), a cidade possui 14 cooperativas de reciclagem, nas quais estão envolvidos mais de 600 trabalhadores (ACOOP, 2011).

JUSTIFICATIVA

A educação ambiental é uma das alternativas mais eficazes para promover a proteção ao meio

A prática de reciclagem de lixo tem a partici-

ambiente. Participar do processo de separação do

pação direta em indireta de muitas pessoas. Desde


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a decisão precisa de onde descartar determinado

foi inserida nas atividades pedagógicas tendo sido

material até a realização dos processos físicos pelos

dada continuidade exclusivamente pela auxiliar de

quais certos materiais classificados como lixo pas-

desenvolvimento infantil atuante na turma.

sam. Muitos conceitos científicos e sociais podem

Para efeito do trabalho da disciplina EP 473,

ser associados a esta prática, o que contribui para a

serão apresentadas apenas as etapas nas quais

ação cidadã de toda a população.

houve a participação do grupo como um todo; o que

No bairro de Santa Genebra, em Campinas, está localizada uma das cooperativas de reciclagem

envolveu 4 dias de atividades (04, 05, 06 e 08 de outubro de 2012), em um total de 9 horas.

da cidade, trata-se da mesma região onde está o Ins-

Nestes dias, foram realizadas as 5 etapas

tituto Jacarandá de Educação Infantil. A instituição

previstas no projeto inicial: levantamento das concep-

atende cerca de 200 crianças com até seis anos de

ções sobre o lixo, visita a uma cooperativa, pesquisa

idade e a realização desta prática foi autorizada pela

com a população, reflexão das novas “descobertas”

coordenadora pedagógica para ser feita em umas

e simulação de uma cooperativa de reciclagem.

das classes de educação infantil, cuja auxiliar de desenvolvimento infantil da turma é integrante deste

Etapa 1

grupo de atividade da disciplina EP 473. Concepções sobre o lixo (~ 2 horas/aula) OBJETIVO

As educadoras iniciaram a atividade questionando os alunos se eles sabiam o que é o lixo.

De maneira geral, pode-se afirmar que o ob-

Conforme as respostas dadas por eles, as educa-

jetivo deste trabalho foi proporcionar uma reflexão

doras foram realizando novos questionamentos, tra-

com os estudantes sobre os problemas do lixo na so-

balhando conceitos relacionados ao destino do lixo,

ciedade moderna, assim como as possíveis práticas

à poluição do meio ambiente, além de aspectos as-

de reciclagem que visam a minimizar tais problemas.

sociados a valores e à participação efetiva de todos

Ao realizar a problematização através da prática so-

para amenizar os problemas causados pelo excesso

ciocultural pretendeu-se estimular as crianças a ob-

de lixo gerado pela população atual.

servarem e refletirem, construindo os significados a

Foi introduzido para os alunos o conceito de

partir de uma situação concreta, da fala e da intera-

reciclagem, apresentando a eles materiais reciclá-

ção com os demais sujeitos.

veis diferentes (plástico, alumínio, papel), além de

Além disso, a aula passeio teve como objeti-

se mostrar o símbolo internacional de reciclagem.

vo promover a integração e cooperação entre os es-

Para exemplificar a importância dos símbolos

tudantes, favorecer a autonomia e iniciativa própria e

para a comunicação das pessoas na sociedade em

abordar novos conceitos a partir das ações, observa-

que vivemos, as educadoras mostraram aos alunos

ções e constatações feitas pelas próprias crianças.

diversos símbolos que estão próximos do universo/ cotidiano deles, por exemplo, de canais de televisão, empresas de telefonia, lojas de alimentação, etc.

METODOLOGIA

Foi apresentada às crianças a lixeira de coleta seletiva com cores específicas, que em breve

Devido ao interesse das crianças e ao retorno positivo que a proposta proporcionou, a mesma

será implantada no Instituto, conforme comunicado da administração.

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Projeto de Problematização da Prática Sociocultural na Reciclagem

Na sequência, foram apresentadas informa-

Na cooperativa, vários aspectos foram levan-

ções sobre a cooperativa e descrições sobre o tipo

tados com os educandos desde o tipo de materiais

de trabalho que é realizado lá, as etapas pelas quais

reciclados que lá existem até aspectos de higiene,

o material passa, etc. As educadoras perguntaram

odor, etc.

aos educandos quais as dúvidas que eles tinham so-

Em especial, nesta etapa, as educadoras fo-

bre este tipo de trabalho/ação e o que eles gostariam

caram no conceito de volume, para justificar a neces-

de saber sobre as cooperativas.

sidade de prensar e enfardar os materiais; as van-

Com ciência prévia dos pais / responsáveis e da coordenação do Instituto, foi proposto aos alu-

tagens em se realizar estes procedimentos, o que acontece com os materiais, etc.

nos que visitassem uma cooperativa, e diante das

Conforme combinado, os alunos fizeram “a

anotações feitas quanto às curiosidades destes, as

entrevista” com os cooperados e as educadoras re-

educadoras sugeriram que eles entrevistassem os

gistraram esta etapa.

trabalhadores da cooperativa. Também foi proposto aos educandos que fi-

Etapa 3

zessem uma entrevista com as pessoas que encontrassem na rua, para saber quantas delas separam

Pesquisa com a população (~ 1 hora/aula)

ou não o lixo em suas casas. Aproveitando que a ida até a Cooperativa foi Etapa 2

feita a pé, propôs-se previamente aos alunos que eles fizessem uma pesquisa com a população que

Visita à Cooperativa de Reciclagem Santa genebra (~ 1,5 horas/aula)

mora ou trabalha na região do Instituto Jacarandá. As crianças receberam dois sacos plásticos, sendo que em um deles havia pedaços de papéis

Após terem conversados com os membros da Cooperativa de Reciclagem de Santa Genebra,

laminados do mesmo tamanho, nas cores verde e rosa e outro que estava vazio.

que permitiram a visita e se predispuseram a explicar

As educadoras explicaram aos educandos

o processo de reciclagem, os alunos foram levados à

que cada papel representaria uma pessoa que eles

cooperativa pelas educadoras nos dia 05 de outubro

entrevistariam na rua, sendo que uma cor seria as

de 2012.

pessoas que responderam que separam lixo em

Os estudantes foram a pé até a cooperativa,

casa, e a outra cor as que não separam.

realizando a entrevista (Etapa 3) com a população

Conforme obtivessem a resposta do entrevis-

durante o percurso. Ao longo do passeio, surgiram

tado, um dos educandos deveria retirar o pedaço de

diversas conversas entre eles, assim como observa-

papel da cor correspondente e colocá-lo no saquinho

ções e ações que foram registradas pelas educado-

que estava vazio no início do passeio. Por decisão

ras e serão apresentadas no item 5 (Resultados e

dos próprios educandos, a cor rosa representaria os

Discussão).

que separam o lixo, enquanto o de cor verde, os que

Auxiliadas por um dos cooperados (Jarbas), as educadoras mostraram aos estudantes todas as

não separam. Também foi decisão das crianças qual delas ficaria responsável pelos saquinhos.

etapas pela quais passa o material que será recicla-

Durante o trajeto de ida para a Cooperativa,

do na cooperativa: da chegada do material no cami-

os alunos perguntaram para as pessoas da rua, das

nhão, até o enfardamento do mesmo.

casas ou das empresas se elas faziam separação do


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lixo residencial.

uma mesa em um espaço do Instituto. Foi proposto

Posteriormente, na sala de atividades do Ins-

que os educandos separassem os materiais confor-

tituto, as crianças contaram o número de entrevista-

me o tipo. Para isso, as crianças determinaram onde

dos e criaram um gráfico relacionando quem separa

cada tipo de material deveria ser colocado. Antes de iniciar a separação, os alunos rece-

e quem não separa o lixo, conforme descrito na Eta-

beram luvas plásticas, obedecendo a uma das fases

pa 4.

reforçadas pelos membros da cooperativa: uso de Etapa 4

equipamento de proteção individual. Depois de separado os materiais, os educanReflexão (~ 1 horas/aula)

dos sugeriram construir as lixeiras coloridas, já que o instituto não dispunha delas. Sendo assim, a auxiliar

No dia seguinte da visita à Cooperativa, as

da classe providenciou caixas de papelão que foram

educadoras fizeram uma reflexão sobre o passeio

pintadas pelos próprios estudantes com as cores

da aula anterior. Os educandos falaram de várias

correspondentes aos materiais que dispunham, se-

observações feitas ao longo do passeio, dos fatos

gundo a classificação do CONAMA (Tabela 1).

ocorridos; não se atentando exclusivamente para o que ocorreu na Cooperativa. Após as colocações, e para atender a curio-

RESULTADOS E DISCUSSÃO

sidade da maioria das crianças, as educadoras propuseram que elas contassem quantas pessoas fo-

A proposta da Prática de Reciclagem foi re-

ram entrevistadas durante o passeio, quantas delas

alizada em uma turma de Ensino Infantil do Instituto

responderam que separavam lixo em suas casas e

Jacarandá cuja auxiliar da classe (Giselle Cristina) é

quantas delas alegaram não fazer isso. Em seguida,

membro integrante do grupo da disciplina EP 473.

as educadoras propuseram que eles colassem estes

A referida turma é composta por 13 crianças

papéis em uma cartolina, construindo duas “torres”

entre 4 e 5 anos. A ida de pessoas novas ao Institu-

uma de cada cor. As educadoras explicaram que o

to estimulou as crianças e reforçou a proposta, pois

que eles estavam fazendo era um gráfico e, diante

tratou-se de uma atividade que não era habitual para

do resultado, propuseram várias operações mate-

a turma. Na primeira etapa, ao iniciar a discussão com

máticas que serão detalhadas no item Resultados e

os estudantes sobre o lixo, ficou claro que nenhum

Discussão.

deles sabia para onde o lixo era destinado. Alguns Etapa 5

alunos tinham ideia do que era o lixo, mas não sabiam o que significava um material ser ou não reciSimulação de uma usina de reciclagem (~ 1 hora/aula)

clado. Para todos os educandos, lixo seria todo material que não tem mais utilidade. Apenas uma crian-

Foi sugerido aos estudantes que simulassem

ça levantou o questionamento alegando que havia

uma cooperativa de reciclagem a partir da separação

“coisas” que não serviam mais para ela, mas pode-

de materiais diversos conforme a matéria prima dos

riam servir para outra pessoa e “isso” não era lixo.

mesmos. Então, estes materiais foram colocados em

O curioso foi saber que na residência de 4 alunos é feita a coleta seletiva do lixo, isto é, há li-

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Projeto de Problematização da Prática Sociocultural na Reciclagem

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xeiras para material reciclado e para o lixo orgânico,

em função da poluição, estava ficando desbotada. A

mas, mesmo as crianças estando cientes da exis-

mãe natureza solicitava a ajuda das crianças para

tência destas 2 lixeiras, não sabiam por que os pais

recuperar seu colorido. Então, as crianças propuse-

faziam esta separação e nem qual material deveria ir

ram alternativas para ajudá-la: fechar a torneira na

em cada uma. Esta situação nos permitiu constatar

hora de escovar os dentes, não demorar no banho,

que a proposta era muito mais rica, pois fez com que

não apertar demais a descarga do vaso sanitário,

as crianças tomassem consciência das ações que

não brincar no bebedouro, não jogar lixo pela janela

ocorriam no seu cotidiano, alterando a dinâmica do

do carro, etc.

núcleo familiar. Esta constatação pode ser reforçada

Aproveitando as propostas das crianças, as

pelo relato de um dos educandos, transcrito a seguir:

educadoras sugeriram a elas um passeio a uma co-

“Vocês sabiam que minha mãe desperdiça o lixo e água? Não pode só separar o material para ajudar a mãe natureza, é preciso fechar a torneira ao lavar a louça e escovar os dentes” (R. David)

Na sequência, foram mostradas cartelas com símbolos diversos presentes na mídia (Figura 2). Todos os educandos reconheceram e souberam associar o símbolo às marcas, mas apenas uma criança tinha conhecimento do símbolo universal da reciclagem:

operativa de reciclagem, onde alguns trabalhadores separam o material reciclado e o preparam para ser transformado em outro. As crianças se encantaram com a ideia e se agitaram, principalmente com a possibilidade de saírem do Instituto. As etapas 2 e 3 deste trabalho consistiram na aula passeio, isto é, a ida até à Cooperativa e as entrevistas com a população. Após organizar a turma em duplas e apresentar as “regras” do passeio, os alunos foram com as educadoras até a Cooperativa. Durante a realização da aula passeio, foi possível constatar ansiedade e expectativas que circulavam entre os educandos, à medida que se envolviam, a cada instante, com a ideia de sair do Instituto e conhecer coisas e pessoas novas.

Figura 2: Símbolos apresentados aos educandos na primeira etapa do projeto

Apresentar os diversos símbolos aos educandos permitiu que eles constatassem que no universo em que vivem muitas coisas são representadas apenas pelo símbolo e que ele pode trazer muitas informações. “Se o símbolo do Instituto é uma árvore, então Jacarandá é uma árvore?” (A. Vasconcellos)

Dando continuidade à proposta, contou-se às crianças uma história sobre a mãe natureza criada por uma das educadoras, a qual relatava o drama da mãe da natureza que antes era colorida, tendo todas as cores (verde, amarelo, rosa, azul, etc) e que,

Na saída da instituição, o grupo se deparou com um senhor, para quem foi perguntar se ele fazia a separação de lixo. O senhor afirmou que fazia e ainda mostrou uma espécie de carriola onde armazenava o material reciclado que ele vendia. Encantado com as crianças, o senhor perguntou a elas se queriam balas. Nós, educadoras, ficamos ressabiadas, num primeiro momento, com esta oferta, mas, ao colocar um baleiro na frente das crianças com uma grande variedade de balas, foi impossível não autorizar que elas aceitassem os


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Em uma praça,

doces. Por decisão das crianças, foi organizada

próxima à Coope-

uma fila, e uma por vez escolhia as balas que queria.

rativa, havia mui-

Apesar da quantidade de balas disponível, todas as

to lixo espalhado,

crianças agiram com educação, pegando uma pe-

o que chamou a

quena quantidade delas.

atenção das crianças.

Durante todo o trajeto, as crianças perguntavam sobre a reciclagem para os pedestres e, em

Elas ficaram indignadas e tiveram a iniciativa de re-

alguns casos, até tocavam a campainha das casas.

colher o material reciclável para levar para a Coope-

A pergunta era feita em “coro” e todas as crianças se

rativa. “Olha quanto lixo! Vamos levar para a coope-

certificavam se o papel correspondente à resposta

rativa?” (B. Oliveira) Era

do entrevistado estava sendo colocado no saquinho

tanto

material, que as

corretamente. Depois de es-

crianças não con-

perarem algum tem-

seguiam

po após tocarem a

com as próprias

campainha de uma

mãos,

casa

esforçavam

constatando

segurar mas

se para

que não havia nin-

isso com determinação. Vendo o esforço delas, a

guém nela, um dos

garçonete de um bar foi até nós, educadoras, e ofe-

alunos fez a seguinte informação: “aqui eles não re-

receu alguns sacos plásticos, para que pudéssemos

ciclam o lixo, olha só que sujeira” (J. Dantas).

armazenar o material recolhido.

Ao passar em frente à Medley para irmos

Chegando à Cooperativa, as crianças avista-

para a Cooperativa, os educandos cujos pais traba-

ram um cavalo, o qual chamou muito a atenção e promo-

lham na empresa se manifestaram, afirmando que a

veu uma discussão no grupo. Ficou claro que algumas

mãe/pai trabalhava ali e apontavam o carro, etc.

crianças não reconheceram de que animal se tratava

“Olhem ali no carro da minha mãe: é meu paninho

e juntas chegaram à conclusão que era um cavalo. Devido à pata lar-

de dormir!” (T. Henrique)

ga e à presença da ferradura, uma

Ainda no caminho para a Cooperativa, as

criança fez o se-

crianças fizeram a pesquisa com um senhor que em-

guinte comentário,

purrava um carrinho com uma caixa de isopor, com o

o qual deu ferra-

qual ele vendia trufas. Depois de perguntarem

se

ele separava o lixo, com a curiosidade aguçada, uma das crianças o questionou: “Moço o que tem aí na caixa? (T. Félix)

menta para novas discussões: “Gente! Esse cavalo tem pé de curupira” (B. Silva). Ao se aproximarem da cooperativa, as crianças não perceberam que já haviam chegado e, automaticamente, muitas taparam os narizes devido ao odor desagradável. Uma das crianças fez a seguinte colocação: “Nossa, eles são porcos aqui. Quanto lixo!” (B. Oliveira)


Ao afirmarmos para elas que estávamos na Cooperativa, as crianças compreenderam o porquê de tanto “lixo”. Ao entrarmos, fomos recebidas pelo Jarbas, que pegou os sacos com os materiais recolhidos pelas crianças e fez uma observação para todas. Segundo ele, é essencial que a coleta de material, quando realizada fora de nossa residência, seja feita com o uso de luvas para evitar contaminação, cortes, etc. Ele ainda ressaltou que as luvas devem ser individuais, ou seja, cada pessoa tem que ter a sua; por isso as luvas são consideradas um equipamento de proteção individual (EPI). Uma das crianças perguntou ao Jarbas se ele separava o lixo na casa dele ou só na Cooperativa. Tendo ele respondido que separava, um papelzinho rosa foi colocado no saco dos entrevistados. Acompanhadas pelo Jarbas as crianças conheceram todas as etapas pelas quais passam os materiais que chegam para a reciclagem. Jarbas explicou para as crianças que o material chega por um caminhão da prefeitura de Campinas e que é recolhido nas ruas da cidade. Ao chegar à Cooperativa, as mulheres cooperadas separam em tonéis os materiais conforme a matéria prima dos mesmos. Para exemplificar, Jarbas disse que um dos tonéis continha apenas caixas Tetra Pack®, um aluno mais atento percebeu que neste tonel só havia caixas de leite e de suco, concluindo que este era o tal material mencionado pelo cooperado. Após a separação, os materiais eram prensados.



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Projeto de Problematização da Prática Sociocultural na Reciclagem

A prensa chamou muito a atenção dos alunos que

bas explicou que na Cooperativa não havia lixo e sim

quiseram vê-la funcionar. Jarbas propôs fazer uso

material com capacidade para ser reciclado. Portan-

da prensa usando alguns materiais de papel. Antes

to, não havia “comida” para baratas e para os ratos.

da máquina ser ligada, as educadoras pediram para

Mesmo assim, em função da presença de materiais

que os estudantes observassem o quanto de mate-

sujos como copinhos de iogurte e caixas de leite,

rial estava no compartimento de compactação e o

Jarbas disse às crianças que a prefeitura mandava

espaço que ocupava antes e depois de passar pela

agentes de dedetização ao local em períodos regu-

prensa.

lares.

As crianças constaram que a prensa diminui o espaço ocupado pelo material, dando a impressão

Na volta para o Instituto, as crianças recla-

de que há menos material. No entanto, como elas

mavam de fome, pois se aproximava o horário do al-

observaram que não foi retirado nem colocado mais

moço. Até que uma delas avistou algumas amoreiras

material, concluíram que a prensa permite diminuir

e perguntou às educadoras se podia comer. As árvo-

o espaço que o material reciclado ocupa, o que é

res estavam carregadas e todas as crianças degus-

melhor para armazenar, transportar e enfardar.

taram das frutas maduras. Os mais altos auxiliavam

Após a prensagem, o material é enfardado,

os mais baixos para apanhá-las. As manchas roxas

isto é, uma quantidade fixa é unida para facilitar o

deixadas nas mãos e nas línguas era uma diversão

transporte até a usina de reciclagem, que fará uso

à parte para o grupo.

deste produto para a obtenção de um novo material, finalizando assim o processo de reciclagem.

Uma das educadoras, formada em Química, contou para as os educandos que o quê deixava as

Antes de irem embora, uma das educandas

mãos e a língua coloridas era uma substância pre-

perguntou ao Jarbas por que não havia baratas e

sente na casca da amora que dava cor a fruta e, por

nem ratos se na Cooperativa havia tanto lixo. Jar-

isso era chamado de corante. Os cientistas chamam

Passeio pela Cooperativa


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este corante de antocianina e ele também está pre-

Após contagem dos papéis de cada tor-

sente em outros alimentos de cor roxa como uva e

re (todos os alunos quiseram conferir e contaram),

jabuticaba.

algumas crianças sugeriram colocar o número cor-

No dia seguinte, as educadoras retomaram a

respondente à quantidade de papéis representada

atividade com os alunos perguntando os fatos mar-

por cada cor. “O rosa tem mais, eu ‘tô’ torcendo pro

cantes. Várias situações foram relembradas e deta-

rosa!” (R. Garcia)

lhadas pelas crianças. Os educandos mostraram-se curiosos em saber se havia mais pessoas que separavam o lixo que aquelas que não separavam entre as entrevistadas, As educadoras questionaram os alunos de que maneira eles poderiam saber e, em coro, eles definiram que bastava contar os papeis. Então, as educadoras propuseram que eles colassem os papéis em uma cartolina fazendo duas “grandes torres”: a que representava as pessoas que reciclavam (rosa) e as pessoas que não reciclavam (verde).

Uma das alunas perguntou qual a quantidade de papéis faltou para que a “torre verde” ficasse da

Todos os alunos participaram da construção

mesma altura da “torre rosa”. Então o grupo sugeriu

“das torres”, passando cola nos papéis e os colando

contar e colar papéis brancos que representassem

na cartolina. Era nítido o prazer com que faziam isso.

este “número faltante”. Embora fosse uma ideia inicial do projeto elaborar o gráfico com as crianças, foi gratificante para as educadoras constatarem que esta também foi uma “ideia” dos educandos, que se mostraram empolgados com a atividade e, de maneira

lúdica,

realizaram operaApós a colagem dos papéis, as educadoras falaram que o que eles fizeram é chamado de gráfico e que só de olhar o tamanho das “torres” já era possível saber se a maioria das pessoas separava ou não o lixo.

ções matemáticas que ainda não são propostas

para

crianças nesta faixa etária. Ao todo foram entrevistadas 22 pessoas, das quais 17 alegaram separar o lixo em suas residências A última etapa da proposta consistiu na simulação de uma cooperativa de reciclagem dentro do Instituto Jacarandá, na qual as crianças eram os agentes na vivência desta proposta. O projeto mobilizou as famílias através das crianças o que contribuiu para a interação escola-


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Projeto de Problematização da Prática Sociocultural na Reciclagem

-casa-comunidade. Sabendo que simulariam uma

levarem na “cooperativa do Jarbas”. Então, uma das

cooperativa (“cooperativinha do Instituto Jacaran-

crianças sugeriu fazer as lixeiras coloridas. Como o

dá”), muitos pais enviaram bilhetes ou falaram direta-

único material disponível eram caixas de papelão, a

mente com a auxiliar da classe se poderiam mandar

auxiliar da classe utilizou este material que foi colori-

material reciclado, pois os filhos estavam insistindo

do pelos alunos conforme o CONAMA.

em levá-los para a “cooperativinha do Instituto”. Autorizadas, as crianças levaram uma grande quantidade de material e, quase 1 mês depois da simulação, elas continuam levando-os. Para a cooperativinha todos os alunos receberam luvas descartáveis. O uso das mesmas foi colocado como necessário por uma das crianças, uma vez que este fato foi abordado na Cooperativa como essencial, pois o equipamento de proteção individual (EPI) pode evitar que quem faz a coleta se machuque, contamine ou se suje. Tal fato mostrou que houve aprendizado significativo e assimilação do conteúdo no passeio à Cooperativa.

CONCLUSÕES Os resultados obtidos com a realização deste projeto permitiram constatar que é possível realizar a educação ambiental mesmo com crianças de baixa idade, que frequentam a educação infantil. Os conteúdos matemáticos não dissociados da realidade do aluno tornam-se mais interessante e seu aprendizado mais efetivo. Além disso, outros conceitos podem ser abordados além da questão ambiental. A aula passeio foi significativa para os estudantes, que foram despertados para uma nova forma de aprendizado. Os eixos descritos por Freinet (cooperação, livre expressão, autonomia e trabalho) foram observados e presentes o tempo todo em que as crianças participavam da atividade. A pesquisa com a população permitiu aos alunos o contato com o outro e a descoberta das diferenças e semelhanças, além de integrar o grupo e

A simulação da cooperativinha foi gravada na forma de vídeo. Durante toda esta etapa, as crianças trocaram conhecimento para definirem de que material era feito cada objeto. Foi nítido o espírito de cooperação, livre expressão, trabalho e autonomia das crianças.

proporcionar uma ação para o bem social. Cabe ressaltar que muitos outros aspectos e conteúdos poderiam ter sido explorados, mas isso requereria um tempo maior de dedicação de que o grupo, infelizmente, não dispõe para a sua realização. Mesmo assim, a proposta despertou o interesse do instituto e das crianças, continuando a ser executada pela a auxiliar da classe. RELEVÂNCIA PEDAGÓGICA PARA AS EDUCADORAS (ESTUDANTES DA DISCIPLINA EP 473) A realização deste trabalho favoreceu a in-

Após terem separados todos os materiais, os educandos questionaram onde iriam guardá-los até

tegração entre os membros do grupo (educadoras) que descobriram suas habilidades pessoais não só


Universidade Estadual de Campinas - Faculdade de Educação

na elaboração de um trabalho acadêmico, como

MARTINS, Clintia H. B.; Trabalhadores da reciclagem do lixo:

também no contato com crianças.

dinâmicas econômicas, sócio-ambientais e políticas na pers-

Através do trabalho foi possível verificar na prática a teoria freinetiana relacionada à aula pas-

pectiva de empoderamento, tese de doutorado, Sociologia, Universidade Federal do Rio grande do Sul, Porto Alegre, 2003.

seio, o que despertou maior interesse do grupo pelas demais técnicas propostas por este autor.

MONTEIRO, José H. P.; FIGUEIREDO, Carlos, E. M.; MAGALHÃES, A. F.; DE MELO, Marco A. F.; DE BRITO, João C. X.; DE ALMEIDA, Tarquínio, P. F.; MANSUR, Gilson L. Manual de

AGRADECIMENTOS

gerenciamento integrado de resíduos sólidos, Rio de Janeiro: IBAM, 2001.

As autoras deste trabalho agradecem às crianças que participaram das atividades, assim

Prefeitura de Campinas: http://2009.campinas.sp.gov.br/

como aos pais/responsáveis que autorizaram a di-

infraestrutura/departamentos/dlu/cooperativas/ (acesso em

vulgação das imagens das mesmas.

26/09/2012).

Também agradecem à coordenadora pedagógica do Instituto Jacarandá e à professora respon-

RUBERG, Claudia; AGUIAR, Alexandre; PHILLIPI JUNIO, Arlin-

sável pela turma, que abriram as portas de sua uni-

do. Promoção da qualidade ambiental através da reciclagem de

dade para que o trabalho fosse executado.

resíduos sólidos domiciliar. In: FRANKENBERG, Cláudio L. C.

Não podemos deixar de agradecer aos membros da Cooperativa Santa Genebra, em especial ao

et al. (Org). Gerenciamento de Resíduos e certificação ambiental. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000.

Jarbas, que permitiram a visita das crianças. SANTOS, Amélia S. F.; AGNELLI, José A. M.; MANRICH, Sati;

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

“Polímeros: tendências e desafios da reciclagem de embalagens plásticas”, Polímeros: Ciência e Tecnologia 2004, 14 (5), 307.

ACOOP: http://economiadostrabalhadores.blogspot.com. br/2010/11/acoop-assoc-das-cooperativas-de.html (acesso em 26/09/2012).

SOUZA, Luciana M.; Perspectivas e desafios da Pedagogia Freinet em uma instituição privada e urbana: reflexões acerca da defesa de Freinet à escola pública para o povo em meio ao

CONOMA: http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res01/ res27501.html (acesso em 26/09/2012).

ambiente natural - um estudo de caso da pré-escola da Escola Criar, monografia de conclusão de curso, Pedagogia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, São Gonçalo, 2008, 24.

COSTA, Michele C. C.; “A pedagogia de Celestin Freinet e a vida cotidiana como central na pratica pedagógica”; Revista HISTEDBR On-line 2006, 23, 26.

TERRA, Juliana; ROSSI, Adriana V.; TERCI, Daniela B. L.; PINHEIRO, Tânia A. L. “Separando e Identificando alguns plásticos” in Material de Apoio do III Química e Ação, 2011.

FREINET, Celestian. As Técnicas Freinet da Escola Moderna. Estampa, 1975.

VALLE, Cyro E.. Qualidade ambiental: como ser competitivo protegendo o meio ambiente. São Paulo: Pioneira, 1995.

JONES, Penny; POWELL, Jerry; “Gary Anderson has been found!”, Resource Recycling 1999, may, 1.

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