Cultura, Identidade e Disney

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Cultura, Identidade e Disney Trabalho realizado para a disciplina de Antropologia Cultural, ministrada pelo professor Claudio Bertolli FIlho no curso de Comunicação Social: Habilitação em Jornalismo na Universidade Estadual Paulista. Giovanna Hespanhol de Oliveira RA: 121032752 Victor Francisco Rezende RA: 121031985


Do mundo de sonhos às telas de cinema De Mickey Mouse às princesas, a Disney ainda domina quando o assunto é o universo infantil

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abe aquele filme animado que você assistiu quando criança? Existe uma grande possibilidade de ele ser da Disney. Cada década foi marcada por uma ou mais animações que fizeram sucesso e perpetuaram esse desempenho no imaginário de crianças, jovens e adultos. Como exemplos, podem ser citados os filmes Branca de Neve e os Sete Anões (1937), Pinóquio (1940), Cinderela (1950), 101 Dálmatas (1961), Robin Hood (1973), A Pequena Sereia (1989), O Rei Leão (1994), Lilo & Stitch (2002) e Frozen - Uma Aventura Congelante (2013). Essas e muitas outras histórias ajudaram a construir o imaginário do mundo encantado da Disney, já que tal associação começa, geralmente, desde a infância. Assim, é comum ver e ouvir referências a filmes desse estúdio no dia a dia: “caso conte mentiras, o seu nariz vai crescer” é uma

referência a Pinóquio; outro exemplo pode ser o elo entre o filme Cinderela e um dia de limpeza da casa para alguém. A fim de discutir a relação entre o mundo Disney e a visão desse universo por parte das pessoas, esta reportagem elaborou uma pesquisa, sem caráter científico, que foi distribuída via redes sociais. A pesquisa tem como função primordial identificar o que uma parcela mínima de usuários de redes sociais pensam acerca do tema proposto. Em relação a faixas etárias, a pesquisa atingiu, principalmente, pessoas entre 14 e 21 anos de idade (52%) - nascidos, portanto, entre 2001 e 1993. Outros 41% se enquadram na categoria adultos, entre 22 e 64 anos. O restante se encaixa na faixa entre zero e 13 anos. Também se questionou o grau de escolaridade da amostra na pesquisa. O resultado revelou que 71% dos entre-

Giovanna Hespanhol Victor Rezende vistados cursa ou já cursou o ensino superior; 23%, o Ensino Médio. Por fim, o Ensino Fundamental foi citado por 7% das pessoas.

Primeiro filme

Examinando as respostas dadas para as recordações do primeiro filme da Disney assistido, três clássicos se destacam como os mais citados: Branca de Neve e os Sete Anões (1937), O Rei Leão (1994) e Cinderela (1950). Vale ressaltar que, nas respostas deste item, por ser dependente de recordações da infância, pode ter havido dificuldade das pessoas para lembrar do primeiro longa dos estúdios ao qual assistiram. Assim, pode-se inferir que, em alguns desses casos, é utilizada a memória, muitas vezes afetiva, de filmes que tenham marcado algum momento da história de cada um que respondeu ao questionário.


Uma breve história de Walt Disney

wbeem/Flickr Creative Commons

Alguns o veem como um gênio, o criador de um mundo de sonhos que até hoje se mantém vívido no imaginário das pessoas. Outros, tem-no como um homem controverso, de caráter duvidoso. O fato é que Mickey, Minnie, as princesas e as outras criações de Walt Disney são lembradas por muitos, desde crianças a adultos. Disney nasceu em 1901 na cidade em Chicago, Estados Unidos. Ainda jovem, viu de perto a Guerra em seu trabalho para a Cruz Vermelha. Ele trabalhou também com publicidade, um treino inicial para a jornada que viria pela frente. E foi com Ub Iwerks que ele criou sua primeira empresa. Por ela,

a dupla produzia desenhos animados que os cinemas locais exibiam. Em 1923, eles levaram essas produções para Hollywood. Foi lá onde conheceu sua futura esposa, Lilian Marie Bounds, com quem teve duas filhas. O grande sucesso de sua carreira, Mickey Mouse, foi criado em 1928 para o primeiro desenho animado sonoro, Steamboat Willie. O próprio Disney dublou o personagem e comandou a orquestra responsável por dar melodia à trilha sonora. Um tempo depois, Mickey ganhou seus companheiros Minnie, Pato Donald, Pluto e Pateta. A primeira princesa a ganhar uma animação foi Branca de Neve, seguida por

Cinderela, três anos depois. A partir de então, o sucesso apenas cresceu. Em 1932, Flowers and Trees deu a Disney o Oscar de Melhor Curta-Metragem de Animação - categoria que venceu por todos os anos seguintes da década de 1930. Ao todo, foram 26 vitórias na premiação, sendo 4 delas após sua morte. A Disneyland foi criada em 1955 na Califórnia, enquanto a Disneyworld veio apenas 16 anos depois, em 1971 na Flórida. Walt Disney, no entanto, não presenciou a criação desse último parque - em dezembro de 1966 ele faleceu em Los Angeles, com 65 anos, vítima de câncer.


Filme preferido A ligação existente entre as pessoas que responderam à pesquisa e o universo Disney começou a ser traçada a partir das perguntas sobre os primeiros filmes vistos por cada um que pertenciam aos estúdios e sobre os filmes preferidos de cada entrevistado. Em relação ao filme preferido de cada um, duas coisas podem ser destacadas. A primeira estaria no fato de que muitos longas produzidos e exibidos a partir de 2000 foram citados. É o caso de Frozen - Uma Aventura Congelante (4%); Malévola (2%) e Operação Big Hero (2%). Isso mostra que os estúdios não deixaram de produzir filmes de qualidade e que conquistam um espaço de destaque na memória das pessoas. Frozen, por exem-

plo, pode ser considerado o maior sucesso da Disney depois de O Rei Leão. Em todo o mundo, o longa arrecadou mais de 630 milhões de dólares. No entanto, a grande maioria optou por filmes lançados antes dos anos 2000. Os mais indicados pelos entrevistados foram O Rei Leão (22%), A Bela e a Fera (9%) e A Pequena Sereia (6%). Deve-se levar em consideração, ainda, os resultados de filmes que não pertencem aos estúdios Disney e que foram citados, reforçando a ideia de que algumas pessoas atribuem aos estúdios a criação de muitas animações que pensem ter qualidade. São os casos de Valente e de Procurando Nemo, dentre outros.

Cada boneco representa 1% de menções na entrevista. Foram inseridos filmes que conseguiram mais de 2% de indicações


Identificação Na infância, as associações com personagens de animação são inevitáveis. Diante do lúdico e do diferente, as crianças são “encantadas” pelas narrativas e, muitas vezes, sentem o forte desejo de fazer parte delas, assumindo a identidade das figuras de destaque. Pensando nessa identificação, questionou-se com qual personagem do universo Disney as pessoas mais se identificam. Do resultado, foi possível perceber que 76% se consideram heróis, dentre os quais se destacam duas princesas: Mulan e Bela. Ambas passam mensagens de determinação, coragem e gentileza em seus respectivos filmes. Apenas 3% se identificam com vilões, personagens que comumente são estigmatizados e não têm um “final feliz”. O restante se identifica com figuras de caráter cômico, a exemplo de Pateta. Por outro lado, há aqueles que não se identificam com nenhum personagem ou não souberam responder - um total de 6%. Apesar da maioria dos personagens mencionados serem de produções anteriores à década de 2000, vale ressaltar a presença de figuras consideravelmente recentes no universo Disney que foram escolhidas pela amostra. A exemplo disso, destacam-se Anna e Elsa de Frozen - Uma Aventura Congelante, que representam 7% das menções.


Influência

A pergunta “Como você avalia o grau de influência da Disney na sua infância?” aponta um número considerável de pessoas que responderam que este nível é alto ou muito alto: 71% dos entrevistados; enquanto 10% indicam que esse grau é baixo ou muito baixo. Um número tão expressivo da quantidade de pessoas que admitem que a Disney influenciou, de alguma maneira, em suas identidades reforça o poder cultural da empresa na sociedade desde os anos 1930. O elevado grau de influência que esse mundo encantado apresenta na infância pode ser percebido também na adolescência e vida adulta. Uma prova disso é que 85% ainda acompanham, mesmo que parcialmente, as novidades da Disney. Ainda mais se for levado em consideração que a amostra apresenta 71% dos entrevistados com o ensino superior completo ou em curso.

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A Disney no século 21 Por fim, o último tópico proposto pelo questionário levantou a questão das tentativas da Disney de se adequar a temáticas pautadas pela nova geração, como o empoderamento feminino, a igualdade de gênero, diversidade de personagens, entre outros. Percebe-se que 86% acreditam que a Disney tem se saído de forma satisfatória ou muito satisfatória nesse quesito, o que indicaria uma grande vitória para os estúdios. Ao final da pesquisa, um espaço foi aberto para comentários sobre a pergunta anterior. Por meio deles, percebese uma série de apontamentos sobre o desenvolvimento das

personagens femininas das animações. “Mudou o estereótipo de princesa, perfeita, dona de casa, passiva, frágil, esperando pelo príncipe encantado que a salve pelo beijo de amor, para uma princesa ativa, contestadora, imperfeita, que constrói a própria e não tem medo de quebrar a tradição e lutar por aquilo que acredita”, indica uma das respostas. Por outro lado, há quem acredite que as tentativas de mudança ainda não são o suficientes para fazer justiça a essas temáticas. Diz uma delas: “a Disney continua a propagar muitos estereótipos e peca em retratar as minorias. Quando tenta incluir minorias, parece

que o faz apenas de forma aparente, paliativa, sem discutir as questões a fundo e de forma muito lenta.” Efetiva ou não, a mudança no roteiro dos filmes da Disney já se mostra perceptível, mesmo que de forma tímida. É possível perceber isso através da criação de personagens como a rainha Elsa de Frozen, que questiona a ideia de “amor verdadeiro” da irmã; ou de pequenas frases de incentivo, como no live action de Cinderella (em dado momento ela comenta: “nós mulheres temos que ajudar umas às outras”). Tudo isso sem deixar de lado seu “modelo” de finais felizes.


Alguns comentários Ao final da pesquisa, havia um espaço para as pessoas justificarem suas respostas quanto às tentativas da Disney de se adequar às tendências da nova geração. Abaixo, estão algumas delas. O nome será omitido, com indicação apenas da idade. Satisfatórias “Apesar de tentar acompanhar o novo contexto mundial para atualizar a sua narrativa, a Disney ainda está muito presa ao “felizes para sempre” e, muitas vezes acaba recorrendo a clichês para que o final seja o desejável.” R. - 20 anos Pouco Satisfatórias “A Disney continua a propagar muitos estereótipos e peca em retratar as minorias. Quando tenta incluir minorias, parece que o faz apenas de forma aparente, paliativa, sem discutir as questões a fundo e de forma muito lenta.” L. - 21 anos Pouco Satisfatórias “Por mais que a Disney esteja tentando acompanhar a evolução da sociedade (especialmente no que se refere ao papel da mulher nela), ainda falta muito, principalmente no quesito representatividade, pois ainda faltam protagonistas não-brancas, gordas, trans e deficientes.” A. - 20 anos Satisfatórias “A nova geração represen-

ta uma sociedade na qual as mulheres estão cada vez mais independentes, e o amor não é esquecido, mas também não é levado tão em conta como nos filmes de 20 anos atrás. Outro ponto satisfatório é a consideração de que um personagem não é totalmente mau ou bom, ele tem seus defeitos e qualidades, seja o protagonista ou o vilão.” D. - 21 anos Satisfatórias “A Disney tem acompanhado as mudanças do século XXI mostrando o empoderamento da mulher nos filmes, reforçando a aceitação das diferenças e os dois últimos filmes de princesa não terminam com um casamento como foco, então acredito que isso reforça a ideia de que a mulher não precisa de um homem para ser feliz, e vice-versa” M. - 21 anos Satisfatórias “Para mim, é difícil aceitar algumas novidades nos roteiros de clássicos, como no caso de Malévola e Enrolados, mas entendo que as histórias têm que ser inseri-

das em nosso atual contexto e, assim, manterem-se próximas ao público. E mesmo fugindo do roteiro original, as filmagens mantiveram os padrões de qualidade dos filmes Disney e são encantadoras. “ V. - 22 anos Muito Satisfatórias “Mudou o estereótipo de princesa, perfeita, dona de casa, passiva, frágil, esperando pelo príncipe encantado que a salve pelo beijo de amor, para uma princesa ativa, contestadora, imperfeita, que constrói a própria e não tem medo de quebrar a tradição e lutar por aquilo que acredita. Além de outras questões atuais, como vegetarianismo e proteção dos animais, que passam em muitos outros filmes desde O Rei Leão.” I. - 30 anos Satisfatórias “Acredito que os filmes mantém-se com padrões excelentes que atingem os gostos das crianças de modo geral e também de alguns adultos. No entanto, os filmes antigos trabalham com temas mais importantes do que os atuais. Por exemplo, no caso do filme


Mulan, mostra-se a força e o poder da mulher, questões culturais, machismo. Enquanto os filmes atuais têm questões menos relevantes como questões familiares de personagens. Ou seja, questões que não tem importância para a formação da criança. Outra questão é que os filmes atuais focam cada vez menos em histórias sobre princesas que não existem e que todas devem se casar com príncipes encantados. Por exemplo, no caso de Frozen, o foco é a família. Isso, para mim, é um grande avanço pois não é saudável criar imagens de príncipes e princesas na cabeça das crianças.” R. - 20 anos Satisfatórias “Ao meu ver tem sido satisfatórias pelo fato de acompanharem o papel da mulher, a mulher moderna que não necessita de um homem para sentir-se completa, ela pode viver por seus próprios caminhos,definir seu futuro através de suas conquistas.” A. - 17 anos Satisfatórias “Durante o passar dos anos,

vi grandes mudanças positivas e lições de moral nos filmes da Disney, como a Princesa Sapo, que apesar do clichê de ela ser Negra e pobre, ser retratado de uma forma interessante,. Isso tudo é muito legal e satisfatório de se ver, sabendo que as próximas gerações irão assistir oque assistimos e aprenderão grandes lições com os filmes assim como eu aprendi. Entretanto, já se passaram pelo menos vinte anos que eu assisto os filmes da Disney e, até hoje, não vi nenhuma princesa gordinha. Finalizo com meu questionamento: nenhuma gordinha pode ser princesa?” G. - 22 anos Muito satisfatórias “As mulheres estão cada vez mais independentes e nao tem mais o pensamento de que sua vida se resume em entrar o ‘principe encantado’, ou seja, casar, cuidar da casa-filhos e ser subordinada de seu marido.E por isso a disney inovou em seus filmes, para não perder sua grande influencia sobre as pessoas (influencia para fins lucrativos).” A. - 17 anos

Muito Satisfatórias “Se for em relação a criar mais protagonistas femininas diversificadas, complexas e interessantes, a Disney tem se saído muito bem. Dentre escritores e roteiristas atuais, há discussões sobre criar personagens femininas que, muitas vezes, caem no engano de que o tipo “donzela indefesa” é superficial, então a solução é criar “badass violentas que falam o que pensam”. Esse segundo tipo vem se tornando mais comum ultimamente, mas, muitas vezes, é tão superficial quanto as donzelas indefesas, servindo apenas para o propósito de enfeite (a badass tem que ter corpão) e interesse romântico do protagonista masculino. A Disney não tem caído nessa armadilha. Em vez disso, ela nos apresenta personagens femininas com personalidades bem desenvolvidas, que têm objetivos na história, que fazem a história avançar. Isso tudo independentemente de elas precisarem ser salvas de vez em quando ou conseguirem se salvar sozinhas.” T. - 22 anos


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